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| CUPIADORA WiINT 1 4b) 2 tase Pag 9 ie 49a J DAHL, Gustavo. Mercado é cultura, Kevista Cultura, Brasilia, v VI, n. 24, p. 12 127, jan.-mar. 1977 (Republicado em /i/me Cultura, n. $2, out. 2010, p.66-68) Quando Humberto Mauro, na década de 20, em Cataguases, produzia seus filmes, praticamente todo 0 seu esforgo concentrava-se na criagao do objeto filmico. Certa vez, com um filme na lata, ele ¢ varios companheiros, entre os quais Pedro Comelto, foram ao Rio de Janeiro tentar colocar esse filme em algum cinema da capital. Muitas vezes, tentativas como essa no obtinham sucesso, ¢ os filmes ficavam restritos ao piblico de Cataguases, Quando, na década de 50, a Vera Cruz organizou uma grande linha de produgdo, com estiidios, grandes contratos, etc., a nogao do proceso econdmico cinematografico terminava na produgao. A distribuigdo dos filmes da Vera Cruz, como € do conhecimento de todos, foi dada Columbia Pictures, Na década de 60, o Cinema Novo repetiu esses ciclos de pradugao brasileira e realizou mais uma série de filmes, mas 0 estimulo basico era mais uma vez calcado na produgao Um pouco mais tarde, j amadurecido o Cinema Novo, houve uma tentativa de se adentrar pela comercializagao, com a criagdo de uma cooperativa distribuidora chamada Difilm Quando o Governo brasileiro, através da Embrafilme, fomenta - como faz ha alguns anos — a produgao do cinema brasileiro, o enfoque dado ainda permanece 0 mesmo, isto & permanece 0 mesmo até que seja fundada uma distribuidora. Praticamente, todos os estimulos governamentais ao cinema brasileiro se referem & produgao. Isso nos da a sensagao de que o cinema brasileiro vé a si mesmo como uma arvore que se satisfaz em produzir frutos e que esses frutos ali permanegam, ou caiam, sejam comidos por passeros ou por algum passante eventual Cinema entretanto néo é um produto da natureza, mas uma empresa humana, ¢ seu destino, fundamentalmente, ¢ ser projetado numa tela, A referéncia deve-se 20 fato de o Processo cinematogrifico ser feito em duas etapas: a primeira, a da produgao, que Preexiste a segunda, que é a projecdo em uma tela de cinema, Essa segunda parte s6 muito recentemente vem sendo considerada como de importancia fundamental, e eis aia grande novidade atual do cinerna brasileiro. A partir da constituiggo da sua distribuidora, a Embrafilme comegou a entender que a conseqiiéncia légica da produgao € a ocupagao das telas dos cinemas brasileiros. Tanto que, quando se fala em cinema brasileiro, associa-se quase sempre essa idéia a de produgao, esquecendo © conjunto produgdo-distribuigao-exibigao, que é a maneira de pensar dos americanos (Zukor, em 1910. quando comegou a estruturar suas companhias), franceses (os irmaos Hakim, em 1930), Luis Severiano Ribeiro, no Brasil, na virada dos anos SO (ele possuia as salas de exibigdo e fazia seus filmes - através da Atlantida -, invariavelmente com éxito}, ¢ também daqueles exibidores que. entre 1908 1913, no Brasil, comegaram a produzir filmes para exibigdo em seus proprios cinemas A tela de cinema é um mays-mectice, como ¢ a televiso, como & um jornal. A tela de um cinema nao é uma prateleira de sta permercado, ela é um instrumento de comunicacao. © consumo € uma experigncia de fruiglo. A cultura é uma reflexdo, é a fruigio da reflexao, Num certo sentido, essa mistura tenta criar a coincidéncia que existe nos fgrandes momentos do cinema, aqueles momentos em que, segundo Salles Gomes, 0 espectador tem vontade de, “existindo ou nio Deus, sair pela rua gritando que ele (o homem) foi feito a sua imagem e semelhanga” A originalidade do trabalho da Embrafilme ¢ a grande demonstragio de visto dada pelo Ministério da Educagio e Cultura, sobretudo nesses tltimos anos ~ nao oferecendo privilégios @ expresso industrial, em detrimento da expresso cultural, nem favorecendo 0 inverso ~, foi deixar que ambas se casassem Quando Carlos Diegues vai ver ica da Silva num cinema da Zona Norte do Rio - @ zona proletéria — repleto, e a sesso que presencia the da a impressao de uma “festa barbara”, neste momento se rompe a barreira entre consumo e cultura. O que passa a existir € uma cerimdnia antropolégica. O lazer amalgamado a informagdo cultural decorrente da produgdo industrial. O cinema reencontra afinal, na sociedade, a posigzo que havia perdido.

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