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CONVENTO N. 8. DOS ANJOS


( Cabo Frio , Estado do Rio de Janeiro )
Desenho de Aldemir Martins

PREFEITURA DO MUNICIPIO DE SAO PAULO


DEPARTAMENTO DE CULTURA

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REVISTA

DO

A R QUI V O

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PUBLICAÇÃO DO DEPARTAMENTO
MUNICIPAL DE OUL TUR A

Redação :

Divisão do "
Arquivo
Histórico

Rua Cantareira , 210


Tolofone 2-8378

Oficinas :

Grá fica da
Prefeitura

Telefone 8-1051

Assinaturas :
para o Estado de São Paulo
Cada 12 nameros Cr . $ 40,00
Numero avulso Cr . $ 6,00

Para os outros Estados


Cada 12 namerou Cr . $ 60,00
Nomero avalso Cr. 6,00

1
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL
Publicação da Divisão do Arquivo Histórico , do Departamento de Cultura ,
da Secretaria de Educação e Cultura , da Prefeitura de São Paulo
São Paulo, Rua Cantareira n . ° 216
Diretor ANO XV VOLUME CXXV Secretário
José do Barros Marthas JUNHO DE 1949 Nuto Sant'Aana :

SUMÁRIO

SÃO JOÃO E SUA TRADIÇÃO NO BRASIL .. Aureliano Leite

INTRODUÇÃO AO ROMANTISMO BRASI- ..


LEIRO Jamil Almansur Haddad

ÍNDIOS E CABOCLOS Francisco S. G. Schaden

PERFIL DE AMADEU AMARAL Hélio Damante

ORDENS RÉGIAS PAPÉIS AVULSOS ATAS DA CAMARA DE


SANTO AMARO DEORETOS E LEIS MUNICIPALS
PRESERVATION
COPY ADOTO
ORIGINAL TO BE
RETAINED

NOV 1 9 1992

PREFEITURA DE SÃO PAULO

RUA LIBERO BADARO , 277

Prefeito

ASDRUBAL EURITYSSES DA CUNHA


F2501

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v . 125-128

SÃO JOÃO E SUA TRADIÇÃO NO BRASIL

( Palestra proferida em São Carlos)

AURELIANO LEITE

Senhoras
e Senhores

Quando Rubens do Amaral me levou o vosso convite para esta pales


tra, aceitei-o, desde logo, por ele e por vós . Por ele, porque me acostumei
a admirá -lo é a estimá-lo, desde tempos quase imemoriais. Por vós, por
que também já trazia São Carlos no meu coração , desde a mesma época.
Conheci Rubens e São Carlos, o que significa dizer, o filho e o solo pater
no, quase ao mesmo tempo. Foi isto aos 1909. Eu era ainda estudante de
direito e Rubens já um jornalista de verdade, não pela idade, claro, mas
pela valia da sua pena. Iniciava - se no Brasil a campanha Rui-Hermes.
E ambos , Rubens eeu, cada um vindo do seu lado, nos alistamos ao lado
do Marechal Hermes . Eu não tenho e por certo também ele pejo de
o dizer , agora e sempre : fomos contra o formidável Rui Barbosa . É fo
mos , porque éramos contra o governo de São Paulo e porque Hermes, no
momento , encarnava uma candidatura de reação a uma candidatura ofi
eial – a de David Campista, levantada pelo Presidente Afonso Pena .
Fomos , pois , hermistas, por uma questão de princípios . Depois , quando
Afonso Pena morreu de traumatismo moral e Rui Barbosa substituíu a
David Campista , assumíramos já compromisso ao lado de Hermes da
Fonseca , o que não nos permitia falsearmos a fé jurada . Não se cambia
de idéias como se muda de camisa. Por sinal que constituíamos em São
Paulo uma minoria ínfima. Aquilo, longe de nos tirar a coragem , nos
estimulava para a luta . Éramos jovens. O lado mais fraco nos atraía , nos
empolgava . E lutamos contra tudo e todos, certos da aspereza da partida.
Isto, de alguma forma, nos redime de haver combatido a Rui Barbosa e,
quicá, o agredido com apodos quentes e atos decididos de moços ardentes.
Todavia, quero marcar melhor o meu encontro com Rubens do Amaral
e com esta terra hospitaleira, que, aliás, está bem perto do meu berço
natal, ligados ambos pelas águas mansas do Mogi-Guaçú, que nasce ao
pé das montanhas virentes de Ouro - Fino.
Rubens escrevia para o jornal “ São Paulo " , onde eu também rabis
eave alguma coisa. Aí nos conhecemos e marchamos juntos pela rude cam
papha afora . E a vossa terra ? O chefe hermista de São Carlos era o Co
ronel Marcelino Barreto. Um dia, trouxe de São Paulo até aqui um ran
eho de convidados para festa política de arromba. Nesse rancho vim eu
também e , porventura, Rubens do Amaral. Era a primeira vez que eu

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4 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

tomava contacto com o solo de São Carlos, Aqui tivemos um dia cheio e
raidogo . Banquete, baile e espetáculo. Tudo na correspondência do vosso
adiantamento. São Carlos dava a nota ... hermista . O exemplo nos foi
reconfortante, porque, em quase tôda a parte do Estado, nós continuáva
mos totalmente por baixo. Isto não está de forma nenhuma em contradi
gão com que afirmei acima, que lutávamos com mais calor por sermos
em ínfima minoria , visto como, quem luta, quer vencer, deseja a glória
de impor a sua bandeira e muito mais quem procede de uma minoria
ínfima. A recepção de São Carlos ofereceu -se realmente acima de tudo
quanto aguardávamos e, nestas condições, ficou perpetuada em minha
memória e em meu coração de rapaz que fui.
Está aqui, em tudo quanto até aqui vos disse, porque, quando Rubens
do Amaral me levou o vosso convite para esta palestra, aceitei - o desde
logo, duplamente satisfeito, por ele e por vós.
Mas surgiu , daí a pouco, uma dificuldade : e o assunto ? Pensei em
falar acérca do próprio Rubens do Amaral, o que na certeza , vos agra
daria imenso. Mas ele protestou veementemente e quase me bateu. E, de
mais, já haviam se ocupado dêle, aqui , em São Carlos. Propus-me então
de discorrer sôbre a própria cidade e os seus filhos ilustres, que são mui
tos. Mas também outros já o fizeram . Pensei em tratar da política inter
nacional da hora presente, da vitória dos aliados, da resistência da In
glaterra, da grandeza dos Estados Unidos, da surpresa da Rússia ( a
ameaçar com as suas garras portentosas o ocidente ), da volta da glorio
sa Itália ao bom caminho, da ressurreição da França, da constância da
vasta China, das façanhas reconfortantes dos nossos expedicionários ...
Imaginei de me ocupar do nosso Brasil , da constitucionalização do
país, dos gestos incompreendidos de Luís Carlos Prestes, das candidatu
ras de Eduardo Gomes e Gaspar Dutra, do desaparecimento precoce de
Armando de Sales Oliveira, das greves, do custo astronômico da vida, da
lei eleitoral e das eleições , que muita gente afirma que não vêem ...
Deus nos livre, nada, nada disto ! Deixássemos a política, lá fora ,
deixássemos, lá fora, as coisas sérias , que nos atormentam , dia e noite, e
cuidássemos de assuntos mais suaves e de menos responsabilidades, e,
sobretudo, de menores riscos...
Que tarefa realmente difícil achar o tema para uma palestra ! Aca
bou, afinal, por nos socorrer uma idéia, quando nos lembramos de que a
minha palestra estava fixada para hoje, véspera de São João. Falássemos
do santo glorioso e da tradição dos seus festejos e cantos . Foi assim
escolhida esta matéria, que mereceu depois a vossa aprovação.
É realmente um assunto muito da nossa alma e que enleva a todos,
mas que a nenhum brasileiro pode trazer novidades, muito menos a este
sabido auditório de São Carlos.
Proponho -me, desta arte, a recordar convosco algo do que todo o
mundo conhece, neste salão prenhe do espírito masculino e resplandes
cente da graça de Eva, enquanto , lá fora, tenta aquecer a noite fria e
chuvarenta o espoucar dos fogos de ruído, ajudados pelo faiscar e treme
luzir das luzes policrômicas, sem falar num ou outro balão, que iludindo
a vigilância das posturas municipais e afrontando o mau tempo , giram
valentemente no céu, levando da terra às nuvens, enfarruscadas e amea
çantes, mensagens rubras e bojudas de paz.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 5

São João ! Quem foi o São João de amanhã ? Não existe nome mais
popular em todo o arredondado mundo que o de João. Nos santos, nos
príncipes, nos papas, nos nobres, tanto quanto nos humildes e pobrezi
nhos. A história da civilização humana está repleta dêsse nome herdado
dos vales e colinas da Judéia . João, em português, espanhol, francês, ita
liano, provençal e rumaico : sucessores do latim , João em inglês, alemão,
stieco, dinamarquês, e norueguês. João em russo, polaco, boêmio, búlga
ro , serbo , sloveno e em tantos outros idiomas .
Sem falar no hebraico, a língua de alguns capítulos da primitiva Bi
blia, e no basco, língua sem parentesco no orbe, e no sânscrito, língua sa
grada dos brâmanes.
João, antes de ser um nome essencialmente brasileiro, já era pois um
nome essencialmente universal. E o do nosso santo não constituía , como
já lembrei, privilégio de São João Batista. Êle foi o primeiro. Mas depois
déle, outros surgiram . São João Evangelista pertenceu ao seu tempo e foi
da sua companhia. No “ Flos Sanctorum ”, do Padre Diogo do Rosário, e
muito antes desta obra, na Bíblia livro dos livros, já se debulham tocan
temente a vida e os feitos religiosos de ambos, que vêm sendo, pelos sécu
Jos afora, fontes de inspiração, em especial o primeiro , dos mais fulgu
rantes mestres da pintura e da estatuária. A São João Batista, de prefe
rência , deram os antigos os primores da sua arte divina e eterna. Nós, os
pobres dos modernos, não lhe podendo oferecer tão grandes dádivas do
espírito concedemos- lhe, todos os anos, oblatas do coração, com os nos
403 festejos ingênuos e barulhentos,
Aliás , fazemos lembrar o irmão saltimbanco do conto de Anatole
France.
Numa velha comunidade da França, os frades costumavam dedicar à
imagem padroeira da capela, em certos dias, cânticos e harmonias.
Ora, havia sido admitido no convento um ex-histrião de grande pie
dade, mas incapaz de qualquer participação naquelas lindas coisas.De
maneira que o pobre “ irmão saltimbanco " era invariàvelmente excluído do
côro entoado. Aquilo feria- lhe a sensibilidade religiosa. Afinal , ele con
seguiu sossegar o seu coração, indo sempre à capela, às escondidas , para
oferecer ao santo as artes de que era capaz: saltos e equilíbrios. Não o
castigou o superior, encontrando -o , um dia, naqueles exercícios, ante o
altar-mor. Ao contrário, compreendeu o pobre irmão e louvou -o, pois que
chegou a divisar no rosto de madeira da imagem homenageada contenta
mento por isso !
Assim acontece porventura com o querido São João. Ofereceram - lhe
os antigos, por meio de Donatello, Murillo , Andrea de Sarto, Fra Angéli
co , Tintoreto , Van Dyck , Leonardo da Vinci , Rubens e tantos outros,
belos mármores, mosaicos, bronzes, telas incomparáveis de magnificência
estética. Damos -lhe, nós , da idade moderna , apenas estrondos e lumina
rias, em todas as gradações de barulho e de côr.
Retomemos, porém , o fio, tratando em alguns traços mais da vida de
João Batista, um João menos divino e mais humano, embora não despre
zemos as informações bíblicas.
Judeu de origem , como Jesus Cristo, de quem foi o precursor, João
não podia ser de raça pura . Desde aquele tempo, desde antes daquele
tempo, reinava o ecletismo nas genealogias. Os próprios Jesus e sua mãe,
Maria, tinham na carne, tal qual lembra o irreverente Renan, umas gotas
de sangue egípcio e doutras raízes africanas.
6 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Aliás, o Padre Antônio Vieira, fazendo a apologia da côr preta de que


provinha, pigmento que dava a tez morena das filhas de Jerusalém , es
tende - a também até Nossa Senhora, invocando o testemunho do monge
Nicéforo e de Santo Epifânio. E mais do que tudo ( lembra Vieira ), o
demonstra o retrato natural da Virgem Maria , pintura da mão de S. Lu
cas, que se vê e venera em Roma, na basílica de Santa Maria Maior. As
sim , também a famosa Sulamita, que mereceu de Salomão o mais sublime
dos cantos, o Cântico dos Cânticos, dizia : Nigra sum , sed formosa !

Trigueira sou, mas formosa,


ó filhas de Jerusalém ,
Como as tendas de Kedar,
Como os pavilhões de Salomão,
Não admireis de eu ser morena ,
Porque o sol me mudou a côr,
Os filhos de minha mãe indignaram -se contra mim ,
Puseram -me por guarda das vinhas ,
A minha vinha , porém , não a guardei.

Ora, São João Batista não podia fugir à regra . Pertencia à mesmir
família de Maria Santíssima, sua prima consanguínea. Mas isto , acaso ,
tornaria São João menos querido aos brasileiros e, antes dêles, aos italia
nos , aos espanhóis e aos portuguêses ? Não, isto , ao contrário, é motivo
para mais amar - se no Brasil o santo que nasceu aos 24 de Junho . Um
santo moreno, a côr predileta da nossa gente! A côr das nossas rapariga
mais queridas, dessas lindas criaturas que um francês célebre decantou,
chamando-as “ Les jennes filles vertes du Bresil ” !
Porém , socorramo - nos do Padre João Batista Lehmann, entrando
mais na vida do nosso santo :
“ Em Hebron, nas montanhas da Judéia , oito milhas além de Jeru
salém , vivia um casal Zacarias e Isabel. Ambos justos diante do Se
nhor. Não tinham filhos , o que muito os afligia , e eram já idosos. Zala
rias, sacerdote, um dia em que estava ocupado em suas funções , no tem
plo de Jerusalém , entrou no santuário para queimar o incenso , enquan
to o povo orava no adro. Apareceu-lhe, então, à direita do altar dos per
fumes, um Anjo . O Anjo , porém , lhe disse : “ Não temas, Zacarias,
porque Deus ouviu tua oração. Tua mulher te oferecerá um filho, a
quem darás o nome de João . Terás uma forte alegria e muitos se regozi.
jarão pelo seu nascimento, porque será grande diante do Senhor. Não
usará vinho, nem bebida alguma fermentada e será cheio do Espírito
Santo. Reconduzirá os descendentes de Israel , em grande número a Deus.
( teu próprio filho o precederá em espírito e com o poder de Elias, a fim
de preparar ao Senhor um povo perfeito ”.
Zacarias objetou ao Anjo : " Como saberei com certeza que isto
acontecerá ? Já estou velho e minha mulher já vai adiantada em anos " .
Respondeu -lhe o Anjo : “ Eu sou Gabriel, e meu lugar é diante de
Deus . Ele é que me manda trazer- te esta feliz nova . Mas , como não deste
crédito a estas minhas palavras, ficarás mudo, até o dia em que tudo isso
se cumprir. "
Fora, o povo se admirava da longa demora de Zacarias no santuá
rio . Afinal saiu , sem poder falar. Por sinais entretanto, deu a compre
ender que tivera uma visão.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 7

Tudo que o Anjo Gabriel predissera, se cumpriu ao pé da letra. Seis


meses depois, o mesmo Anjo foi mandado por Deus à cidade da Galiléia,
chamada Nazaré, a Maria Santíssima, para comunicar -lhe que tinha
sido escolhida para ser Mãe do Salvador. Disse-lhe também que sua
prima Isabel, apesar de idosa e estéril, tinha concebido um filho, porque
a Deus nada era impossível.
Maravilhada pelos acontecimentos extraordinários, cheia de gratidão
a Deus, que coisas tão maravilhosas operara, Maria pôs-se a caminho e
pressurosa foi à casa da prima. Isabel, ouvindo a voz de Maria, ficou.
cheia do Espírito Santo e exclamou : “ Bendita sois entre as mulheres e
bendito é o fruto do vosso ventre ! Donde me vem a felicidade de ser
visitada pela Mãe do meu Senhor ! Logo que chegou aos meus ouvidos a
voz da vossa saudação, o menino saltou de prazer no meu ventre ! Bem
aventurada sois , por terdes crido ! Pois tudo que vos foi dito da parte do
Senhor, se realizará " .
É opinião unânime dos Santos Padres, que os sinais de prazer que
João deu, antes do nascimento, foram causados pelo fato de o Precursor,
por uma graça especial de Deus, ter conhecido a presença do Senhor e
The haver prestado homenagem de adoração. Dizem mais que, ao mesmo
momento, teria João sido santificado, como o Anjo o prometera.
Chegada a época , Isabel deu à luz um filho. Sabendo os vizinhos e
parentes, dêsse grande favor, que lhe fizera Deus, correram todos jubilo
sos a felicitá -la .
No oitavo dia , se reuniram para a circuncisão da criança e propu
seram que se chamasse Zacarias, nome do pai. A mãe, porém , opôs -se e
disse : “ Não ; deve chamar -se João ".
Disseram - lhe : “ Mas, na tua família não há pessoa desse nome " .
Isabel , porém , insistiu que ao menino fósse dado o nome de João .
Então fizeram sinal ao pai, para que manifestasse a sua opinião, Za
carias pediu uma tabuinha e escreveu : “ João é seu nome " .
Ficaram todos admirados. No mesmo instante se lhe abriu a boca,
desatou-se- lhe a língua e Zacarias falou, bendizendo a Deus.
Tendo ciência desses acontecimentos, tôda a região vizinha sentiu
medo e, por toda a parte, nas montanhas e nos vales da Judéia, se con
tavam estas maravilhas e cada qual dizia : “ Que será um dia dêste
menino ?"
De fato, a mão do Senhor estava com ele.
Alguns dos Santos Padres opinam que Isabel procurou com o filhi
nho o deserto, para salvá- lo da perseguição e crueldade de Herodes . Ou
tros dizem que João, tendo apenas cinco anos, levado pelo Espírito San
to , foi para o deserto, com o intuito de santificar -se ainda mais e prepa
rar -se para a alta missão, que Deus The dera . Aspérrima foi a vida de
São João no deserto . Trajava veste de pele de camelo, cingidos os rins
com cintura de couro e alimentava -se de gafanhotos e de mel silvestre.
Gastava o tempo na ação e na penitência. Diz Santo Agostinho que
em João o mundo, pela vez primeira, viu o exemplo mais tarde imitado
pelos santos eremitas. “ Que saiste a ver no deserto ?” perguntou Je
sus Cristo às turbas. Uma cana agitada pelo vento ? Mas, que saistes a
ver ? um homem regaladamente vestido ? Eis os que se vestem com regalo
estão nos palácios dos reis. Mas, que saiste a ver ? Um profeta ? Sim,
digo -vos, e mais que profeta . Porque este é aquele do qual está escrito :
Eis que eu envio meu Anjo adiante de ti , que preparará teu caminho . E
8 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

eu vos declaro : Que entre os nascidos de mulher , não há maior profeta


que João Batista ” . Essas palavras do Divino Mestre contém 0 maior
elogio, que homem jàmais recebeu , e são equivalentes a uma formal cano
nização, a única que o Filho de Deus em vida pronunciou .
Enfim, tendo trinta anos de idade, recebeu S. João Batista ordem
divina para sair do deserto e encetar sua missão, que era a de preparar os
caminhos ao Messias . O santo homem percorreu todo o vale do Jordão, pre
gando o batismo da penitência, para a remissão dos pecados. Vieram,
então de Jerusalém e de toda a parte da Judéia, grandes turbas. Todos se
faziam batizar por ele no Jordão, confessando os pecados.
Os santos Evangelhos contam minuciosamente o que ele pregou, que
conselhos deu às pessoas que o procuravam , entre estas aos soldados; fa
lam da grande graça que teve, de receber a visita de N. Senhor, que quis
por ele ser batizado e naquela ocasião o Espírito Santo desceu visivel
mente, pairou sobre Jesus Cristo e ao mesmo tempo se ouviu do céu uma
voz : " Este é meu Filho muito amado , em quem pus minha compla
-cência ” . Lemos ainda, com que amor e dedicação trabalhou pelo advento
do reino de Deus, dando testemunho de Jesus Cristo . “ Eu batizo na
água, para a penitência ; mas , vem outro, que é mais poderoso que eu e
de quem não sou digno de desatar as correias das sandálias; êle vos bati
zará no Espírito Santo e no fogo . Ele tem a joeira na mão e vai limpar
sua eira. Ajuntará o trigo no celeiro , e queimará a palha no fogo, que
não se apaga nunca ! Em certa ocasião, os Judeus de Jerusalém manda
ram tratar com João uma pleiade composta de sacerdotes e de levitas,
que lhe perguntaram : " Quem sois vós ? Por que batizais, se não sois
nem o Cristo , nem Elias, nem Profeta ?
João respondeu -lhes : “ Eu batizo em água ; mas há em meio de vós
alguém que não conheceis. É ele que deve vir depois de mim e não sou
digno de desligar -lhe os cadarços das sandálias ” .
No dia seguinte, diz o Evangelista , João viu aproximar- se Jesus e
disse :
“ Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo ” . Com essas
palavras foi apresentado ao mundo o Messias , como o tinha profetizado
Isaias.
O fim de João Batista narram - no ainda os “ Evangelhos ”. No ano de
31 ou 32, antes portanto da crucificação de Jesus , João Batista apresen
tou-se na pomposa corte de Herodes Antipas, tetrarca da Galiléia , a fim
de lhe censurar os hábitos desregrados e escandalosos .
Só de um santo ou de um louco essa audácia ! Quem é que é capaz
Hisso em todos os tempos ? Quem, por ventura, teria a valentia de subir
as escadas de mármore e bronze do Catete, para ir dizer, de frente, cara
a cara, ao nosso ditador as verdades que mereça ? Ninguém , por desven
tura, a não ser um João Batista. Éste porém não existe mais. Mandou
Herodes trancafiá -lo numa das suas fortalezas. E lá, temendo-o ainda,
temendo que as suas pregações sociais de humanidade e igualdade che
gassem até o coração do seu povo , condenou-o à decapitação .
Esta é talvez a versão mais humana e mais crível . Mas corre tam
bém uma outra . Herodes Antipas atendia muito uma dançarina de nome
Salomé, sua sobrinha, que se não deve confundir com Santa Salomé, pri
ma de Nossa Senhora , nem mesmo com a irmã de Herodes , “ o grande” .
Aquela doidivana fanatizara o tio, por incumbência de sua mãe He
rodíades, dêle espôsa incestuosa . Para verem -se, uma e outra mulher,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 9

Livres dos olhos severos de São João, Salomé pediu ao tio a cabeça do
santo, o que lhe foi satisfeito , em rica salva, merecendo éste episódio um
dos mais inspirados quadros de Leonardo da Vinci.
Os discípulos de São João foram buscar -lhe o corpo e o inumaram
en Sebaste, no túmulo dos profetas Eliseu e Abdias.
Aí estão, em resumo, um tanto atropelado, mas respeitadas as fon
les, a vida e obra gloriosa do filho de Santa Isabel e primo de Nossa
Senhora .
O seu nome e a sua devoção ficaram eternos. O seu nome, como já
lembrei, vai sendo repetido em centenares de milhares de seres humanos.
A sua devoção, na igreja e fora dela, comemora -se em muitas partes do
mundo. As festas de São João, nos fogaréus e regabofes , apresentam ori- .
gem pagā e parecem quase tão velhas como o universo , existindo nos
cultos orgíacos da Ásia e da África. A igreja viu- se obrigada a não só
tolerá - las como a adotá - las .
Tal qual recorda Gustavo Barroso, adotou -as, adaptando-as ao seu
espírito e dando- lhes como patronos São João, São Pedro e Santo Antô
nio . De maneira que os festejos joaninos antecedem o próprio São João .
Passaram depois, antes porventura de atingir os povos do Sul da Europa,
para os costumes góticos, reforçados em presença dos árabes, em Portu
val e Espanha. Note-se que na China, desde os primeiros séculos da era
cristā, usavam -se fogos de artifício, foguetes, etc ..
O filósofo Teófilo Braga, citado por Luís da Câmara Cascudo, estu
da as origens dos festejos joaninos em " Epopéias da Raça Moçarabe ”.
Mas nós, brasileiros, recebemos as festas e cantos consagradas a São
João dos lusos e espanhóis. Com os primeiros dias da nossa vida colonial ,
São João, como Santo Antônio e São Pedro, instalou-se no Brasil. Para
São Paulo trouxe-o inquestionàvelmente o nosso avô luso : João Ramalho .
( ) outro nosso avô, Antônio Rodrigues, trouxe Santo Antônio. Com João
Ramalho, que alguns chegam a acreditar que tivesse aportado ao nosso
litoral antes de Pedro Álvares Cabral descobrir o Brasil, iniciaram - se evi
dentemente essas festividades da tradição ibérica .
No Norte do Brasil, segundo Frei Vicente do Salvador, já aos 1603,
erguiam -se fogueiras e organizavam -se “ Capelas ”, em louvor de São João.
Consistiam as " capelas ”, que ainda hoje ali têm voga nos festejos
sto campo, segundo Pereira da Costa , em ranchos de homens e mulheres
coroados de flores e folhas, percorrendo alegres as estradas e ruas das
povoações e cantando :

" Capelinha de melão,


É de São João ;
É de cravo, é de rosas,
É de mangiricão ...

Provêm ainda do Norte do Brasil umas certas adivinhações que, no


Sul , parece-me, não se praticavam tanto. São elas dedicadas , em especial,
as moças solteiras. Vou repetir a mais interessante. Esta reserva mara
vilhas . Prestai bem atenção na receita, moças de São Carlos :
Na tarde da véspera de S. João, deita - se a clara de um ovo dentro de
uin copo, com água até o meio. Cobre -se o copo com um lenço branco .
Colocam -se por cima uma tezoura aberta, em forma de cruz, e um rosá
10 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

rio bento. Depois da meia noite, a pessoa vai ver a sua sorte, rezando
antes um Padre Nosso . Segundo a imagem que a clara representar, nun
fundo do copo, assim é o destino.
Por exemplo : se fôr um navio , viagem próxima. Uma igreja, o espe
rado casamento. Uma cruz, a morte anda perto.
No Norte, ainda acredita -se em coisas espantosas, que acontecem na
véspera de São João : se o alho plantado, amanhece germinado, é uma
boa sorte . Quem se mirar nágua e não divisar a cabeça , não chega ao
fim do ano ...
Outra adivinhação para moça é colocar uma moeda na fogueira e , 110
outro dia, retirá-la e dá -la ao primeiro pobre, perguntando -lhe o Senz
nome . Será êsse nome o do futuro marido . Antigamente a moeda era un
vintém . Hoje, nestes amargos tempos getulianos, em vintém deve ser ,
pelo menos , um cruzeiro ...
Para aumentar o cabelo das raparigas, usava -se cortarem -se-lhes as.
pontas, na manhã de São João. Contra a calvície , em Veneza, costumava
se recolher em um frasco , para uso diário , o orvalho da madrugada de
24 de Junho .
Uma crendice ( que era muito comum em São Paulo e Minas ) é a da
imunidade de quem tem fé contra as brazas da fogueira de São João. Já
vi com estes olhos, que a terra há de comer , algumas pessoas passarem
lentamente , sem se queimarem , por cima de tições acesos e flamejantes.
Experimentem-n'o os que tenham fé ... Mas aviso que nem sempre
São João pode fazer milagres ... Não venham depois atirar a ele próprio
na fogueira, para puní-lo da sua falta de proteção ... Aqui perto de São
Carlos, na adiantada Jaú , havia um rico fazendeiro, muito devoto do sall
to, que acabou arremessando - o ao fundo rio Tietê.
O caso foi este. O inverno andava castigando de rijo, naquele ano,
os fecundos cafesais. O nosso lavrador prometeu de levantar uma capela
ao santo , se não geasse em Junho . O coitado de São João não pôde aten
der o lavrador. Nunca geou tanto, em Jaú , como por essa época. O santo
teve o destino do início do caso , foi arremessado ao fundo do rio Tietê.
Da minha infância, em Minas, lembro -me, como se hoje se passasse,
de uma outra prática , que devia também ser de liábito aqui, em São
Paulo . Um rapaz , ou uma moça , cada um por sua vez , tinha que pular,
três vezes , a fogueira. Feita a peraltagem , punha -se atrás de uma porta,
à espera de ouvir o primeiro nome pronunciado, se era rapaz, o de uma
moça, se era moça, o de um rapaz. Ésse nome seria o do seu marido ou
esposa. Afirmava-se que esta arte não falhava .
Entre as sortes galantes, narra Afonso Arinos, havia sortilégios ter
ríficos, que ninguém revelava para não cair na abominação geral: tal era
o pacto com o diabo.
“ O homem de grandes ambições e sem temor nem escrúpulo, que
rendo " tomar parte com o diabo ”, para que tudo lhe corresse bem e fà
cilmente no mundo, armava -se de facão, e , sozinho, à meia -noite, ia ao .
fundo de um mato distante ou a uma encruzilhada deserta . Aí invocava
três vezes o filho das trevas, que lhe aparecia, a princípio, sob a forina
de um galo prêto, sob a de um porco, de um bode e, por sucessivas trans
formações, cada vez mais horrendas , tentando infundir o terror e que
brantar o coração de quem o desafiava ! Mas este , de facão em punho ,
tem de defender-se contra as arremetidas do inimigo que, por último, sob:
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 11

a forma de homem , cruza o ferro com o contendor, despedindo em tôrno


chispas de luz azulada. E a luta continua, furiosa e encarniçada, até o
diabo convencer -se da força do homem . Então, forma com este ó pacto
sinistro . O cancioneiro do norte dá-nos em versos característicos, postos
na bôca de um cabra famanaz, a descrição de um desses duelos com
Maligno ".
Mas, Senhores, ninguém pintava mais coloridamente o que era o nos
so São João , nem Franklin Távora, nem mesmo Melo Morais, do que
Paulo Setúbal. O que “ era ”, disse eu, e não o que " é " . Vede, Senhores .
se o São João, em nosso meio, ainda é isto :

É noite ... O santo famoso,


O doce, o meigo S. João,
Tivera um dia glorioso ,
Dia de festa e de gozo ,
Que encheu de estrondo o sertão.

Já cedo, em meio aos clamores,


Aos vivas do poviléu
Lindo, enramado de flores,
Um mastro de quentes côres ,
Subira em triunfo ao céu !

E agora , enquanto, alva' e lesta,


Palpita a lua hibernal,
Na fazenda, tôda festa ,
Referve a alegria honesta
Da noite tradicional .

Dentro, com grande aparato ,


Brilha, enfeitado, o salão :
Que há, nessa festa do mato,
Pessoas de fino trato ,
Chegadas para S. João ...

Destaca -se entre essa gente


A flor do mundo local :
O padre, o juiz, o intendente,
O próprio dontor Vicente
Que é deputado estadual!

Ante o auditório pasmado,


Que, num enlêvo, sorri ,
A Isabelinha Machado
Batuca , sôbre o teclado,
Uns trechos do Guarani...

Tudo o que toca e assassina,


Recebe imensa ovação ;
Todos, quando ela termina,
Põem - se a exclamar : “ Que menina !
Dá gosto ! Que vocação ! '
12 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

E ela , entre ingênua e brejeira,


Com ares de se vingar :
" Agora, queira ou não queira,
Seu Saturnino Pereira
Há de também recitar ".

Surge, à fôrça , o Saturnino ...


Rugem palmas em redor !
É um tipo , esgalgado e fino,
Que sabe, desde menino,
Dizer Castro Alves decor .

Na sala , muda e tranqüila,


Tombam , com chama, os versos seus ;
E ele, o letrado da vila,
Ao som da velha Dalila ,
Lá vai : “ Foi desgraça , meu Deus ...'

Após ouvir a estupenda


Flamância do seu falar,
No amplo salão da fazenda,
Os velhos jogos de prenda
Reclamam o seu lugar.

Começa então a berlinda.


Risos . Cochichos. Zum -zum .
De pé, donairosa e linda ,
Pergunta a D. Florinda
Os dotes de cada um :

Por que razão, seu Martinho,


Foi à berlinda a Lêlê ?
“ Porque olha muito ao vizinho ” ;
“Porque é má ; porque é um anjinho ” ;
" Porque é vaidosa " ; " porque...

E todo o mundo, a porfia ,


Põe farpas na indiscreção ...
E enquanto, ingênua e sadia,
Essa campônea alegria
Faz tumultuar o salão,

Lá fora, alegre e gabola,


Num terreiro de café,
Ao rude som da viola,
A cabocla rebola
Num tremendo bate-pé !

A filha do Zé- Moreira


É o mimo dêste São João ;
À luz da rubra fogueira,
Requebra a guapa trigueira
Ao lado do Chico Peão.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 13

Candoca, a noiva do Jango ,


Baila num passo taful;
É a flor que, nesse fandango,
Tem lábios côr de morango ,
Vestido chita azul.

No sapateio se nota,
Aos risos dos que lá estão,
Nho Lau, de esporas e bota,
Dançando junto à nha Cota,
Viúva do Conceição ...

À voz do pinho que chora,


Por sob a paz do luar,
Fremindo vai, noite afora,
Essa alegria sonora
Da cabocla a bailar !

E do salão, que ainda brilha


Num faiscante esplendor,
Chegam os sons da quadrilha,
Que alguém ao piano dedilha
Com indomável furor.

E no sarau campesino,
Nessa festa alegre e chã,
Ruge a voz do Saturnino,
Que grita, esgalgado e fino :
Balancez ! Tour ! En avant ... ”

Ouvistes, ainda que muito mal recitados , os versos de Paulo Setúbal .


Mas, respondei-me agora, Senhores e Senhoras de São Carlos, é isto o
nosso São João atual. Não, não é mais. Perdeu o encanto. Perdeu a graça .
Perdeu a poesia. Ésse São João, como tudo que respira antiguidade, está
transformado.
Embora continuem as solenidades de igreja, que possuem o privi
légio de se repetirem sempre iguais (e está na conservação da tradição
do seu rito a sua fôrça) , os festejos de salão e terreiro, tais quais ocor
riam noutros tempos, findaram -se. Os que numa ou noutra fazenda, num
ou noutro vilarejo, se realizam, são sempre procurando imitar as novida
des citadinas.
E as novidades citadinas suprimiram as fogueiras, as tiradas de sor
te, mesmo os balões, já se não diga a “ quadrilha ” dos nossos pais e avós ,
os jogos de prendas, a voz do pinho, a própria lua hibernal...
Substituiu -se tudo por barulho infernal, barulho que lembra a guer
ra , que recorda combates ragorosos.
Fundam -se sociedades de amigos da cidade, de amigos da América ,
de amigos de Rui Barbosa , de amigos da cultura inglêsa ... Porque se
não há de fundar também , em cada centro do Brasil, uma sociedade de
amigos das nossas tradições ? Um país sem tradições não será nunca uma
nação, muito menos uma nacionalidade. Não basta falarmos uma só lin
gua , possuirmos um só governo, vivermos num só território, manterinos
14 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

os mesmos ideais, orgulharmo-nos do mesmo passado. Tão cedo não tere


mos, na verdade, uma raça homogênea. Supramos entretanto esse marcan
te requisito, mantendo as tradições do país. Revivamos São João, Santo
Antônio e São Pedro, com a sua graça passada. Revivamos as cavalha
das, as congadas, os cateretês, os presépios ingênuos, substituídos pelas
árvores de natal dos povos dos países frios. Revivamos as movimentadas
quadrilhas, os lânguidos recitativos, os encafifantes jogos de prendas.
Revivamos tudo quanto nos fale doutros tempos, quanto nos aperte em
aconchego de irmãos, numa recordação mútua dos lares antigos e da
grande árvore humana de que descendemos. A vida não para. A vida de
fato prossegue em marcha batida. Mas a humanidade, sem o patrimônio
do passado, sem o alicerce dos séculos, voltaria à caverna e à pedra las
cada. Vivamos a vida que o rádio, o cinema, o avião, o automóvel, a tele
visão, o ôlho elétrico , nos estão trazendo. Mas não esqueçamos do passa
do, porque é dêle que nós viemos . Não queiramos suprimir as raízes que
nos prendem à terra.
Oh ! o passado. O passado é a vida. O presente é um instante ilusório.
O momento em que eu falo já está longe de mim disse o filósofo. E o
futuro ? O futuro, não sei se chegue a viver... O futuro não é nosso, a
Deus pertence .
Cuidemos do passado. Cuidemos das nossas tradições.
INTRODUÇÃO AO ROMANTISMO BRASILEIRO

( Especial para a “ Revista do Arquivo " )

JAMIL ALMANSUR HADDAD

a) Romantismo e Psicologia Coletiva

Se romantismo é estado de alma, maneira de sentir, maneira de pen


xar, numa palavra, maneira de ser, a sua aceitação e alastramento tem
que depender de condições psicológicas preexistentes. Não somos eviden
temente dos que acreditam possível reduzir todo o amálgama heterogêneo
de um povo como o nosso a uma unidade psíquica, a um denominador co
inom psíquico. Porém , a coisa posta em função de têrmo médio, é possí
vel lobrigar -se certo número de tendências, se não exclusivas, pelo menos
preponderantes a marcarem de seu determinismo a nossa vocação e o nos
50 destino.
Quase que não há estudioso aplicado à dissecação da famosa realida
de brasileira que não tenha voltado as vistas para os dados psicológicos
que dão certo sentido de unidade às nossas diversas atitudes de povo. É
am Artur Ramos que vem apontar como característicos de nossa índole
o culto da palavra , o culto do doutor e a caça do diploma, primarismo,
autodidatismo, o culto das coisas concretas, os totens estrangeiros, à " in
doctrination ” ( a orientação interessada prejudicando muitos setores do
pensamento ). É um Almir de Andrade que considera símbolo da psicolo
gia do brasileiro o carnaval que seria a exacerbação patológica de um
estado fisiológico, com a sua fascinação do mistério, a tendência para a
dissolução de todas as hierarquias sociais, a natureza primitiva, espon
tánea , selvagem de suas expansões interiores. É um Paulo Prado, assina
lando as causas da tristeza brasileira , a " apagada e vil tristeza " que Ro
nald de Carvalho via resultantes de duas melancolias imensas, a do ne
gro e a do índio escravizado. É um Afonso Arinos de Melo Franco que vê
marcarem a nossa índole, resíduos afro-índios: a imprevidência, a dissi
pação, o desapreço pela terra, a salvação pelo acaso, o amor à ostentação
po desrespeito pela ordem legal. É um Fernando de Azevedo que vê, na
Dossa psicologia comum , o predomínio do afetivo, do irracional, do místi
€ 0 , a preponderância dos valores da sensibilidade...
E se somarmos aquelas tendências carnavalescas ” apontadas por
Almir de Andrade, com a tristeza de Paulo Prado e Ronald de Carvalho,
com os dados ainda apontados por Fernando de Azevedo, o que é que
teríamos afinal ? Todos esses dados somados dão numa palavra Roman
A VO MUNICIPAL
16 REVIST DO ARQUI

tismo. Tristeza , ensimesmamento , fascinação do mistério , tendência para a


dissolução de hierarquias, desrespeito à ordem legal, predomínio do afeti
vo, do irracional, do místico ... Romantismo ... romantismo... E vem o
já citado Artur Ramos que apontando o sentido de nossa cultura, inclui
nos entre os “ galiléicos ” de Kurt Lewin , homens 66 de pensamento dinâ
nico, móvel , fora da lei , e que se contrapõem aos aristotélicos ” , orienta
dos dentro das noções rígidas de causalidade, de pensamento classificatório
e esquemático .
E a pre-existência de uma realidade psicológica desta ordem explica
uma porção de coisas na história de nosso pensamento. Explica como o
Romantismo, como escola literária, uma vez instalado em nosso país,
agarrou -se ao nosso destino literário, custando muito a apareceremos
movimentos de desagregação romântica. O Romantismo continuava por
nossas plagas muito tempo depois que movimentos anti -românticos já en
contravam pleno florescimento e solução pelos países europeus. Aqui nem
só ésses movimentos de decomposição romântica custaram a aparecer,
como foram em certa medida ineficazes, pois as características que defi
nem o espírito romântico continuaram a viver pela literatura brasileira a
dentro, que, em certo sentido, continua romântica mesmo depois do Ro .
mantismo, numa perpetuidade romântica, sintomática de nosso romantis
mo congênito e irremediável.

b) Da influência estrangeira

Estabelecida a premissa da existência de fatores autóctones , respon


sáveis pelo Romantismo nosso, resta estudar a parte que cabe às influên
cias alienígenas.
O fenômeno influência estrangeira é de singularíssima importância
no desenvolvimento do pensamento brasileiro, a influência compreendida
num amplo sentido, social, político e literário. A influência é fator que
no determinismo das nossas formas de pensamento, sobreleva qualquer
outro, inclusive as peculiaridades de nossa psicologia coletiva. É fator que
sobreleva o econômico e o social. Sem o Romantismo europeu , é impos
sível compreender-se o Romantismo brasileiro. Há várias palavras de
ordem , mas a decisiva é dada muito mais pelo pensamento europeu do
que pelas realidades ambientais brasileiras. A influência da literatura
européia, como fornecedora de modelos, é muito mais importante do que
as peculiaridades de nosso substrato econômico e social na época. Anali
sem-se os temas dos poetas românticos brasileiros e não se vislumbrará
jàmais caso de poeta nosso haver descoberto originàriamente os seus te
mas ou de se ter utilizado de temas que não fossem moeda corrente nas
literaturas da Europa. A Europa, a França sobretudo, representa um
papel fundamental do ponto de vista da organização do temário dos poe
tas de nosso Romantismo que, de acordo com as suas afinidades e idio
sincrasias, iam escolhendo em meio a esse repositório alienígena, o que
mais afinava com as suas peculiaridades.
Goethe, nas suas famosas palestras com Eckermann, havia proclamii
do a tendência para a universalidade da literatura, a criação de una
weltlitteratur, que desanimaria os bastante aferrados a critérios rigura
samente autóctones de inspiração.
O Romantismo marcou-se pela preocupação do cosmopolitismo literá
rio , tão cara a Mme. de Stael . Uma onda de exotismo inclusive inundou
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL • 17

a literatura do mundo. Daí a inocência de certos críticos nossos ao vis


lumbrarem no nosso período romântico um período de autonomia. A no
ção de autonomia se pelo menos os vocábulos tiverem o valor que lhes
confere o dicionário é absolutamente contrária à de influência . Insus
tentável portanto .
Autonomista dêste tipo é Sílvio Romero que descobre em nossa evo
lução literária um período de desenvolvimento autonómico que, na pri
meira edição de sua História da Literatura Brasileira vai de 1750 a 1830,
cronologia modificada na 2. ed . para o período de 1758-1836. Ronald de
Carvalho segue as pegadas do Mestre e estabelece também a existência de
um “ período autonômico " posterior a 1830.
Não há autonomia . À libertação da tirania do modelo português (bas
tante relativa aliás, pois Garret, Tomás Ribeiro, Herculano e tantos outros
marcam os nossos românticos ) correspondeu a submissão a escravidões
mais prementes como as que nos impôs o modelo francês, de ação verda
deiramente coercitiva na história do pensamento brasileiro do século XIX.
Todavia, uma pesquisa de fontes deve estar submetida a cautelas .
Nem sempre é possível estabelecer onde termina a imitação e principia a
coincidência. Por outro lado , adquirida a certeza de que determinado
aspecto de um romântico nosso seja de origem européia, nem sempre é
possível um grande rigor na afirmação de qual tenha sido o autor que
rigorosamente serviu de modelo, pois que vários autores podem ter con
vergido na elaboração de determinado tema. Donde o aproximado dos
resultados que se podem obter.
Em folclore, quando se estudam os temas das lendas , os especialistas
estão acordes em admitir que o fenômeno de uma mesma história se repe
tir por várias partes do mundo , pode -se explicar ou pela migração da
lenda ou por seu nascimento concomitante, porém independente, em vários
pontos da terra , o que ocorre quando temos condições sociológicas e psico
lógicas iguais. Temos pois que condições semelhantes dão origem a lendas
semelhantes, independente de qualquer processo de assimilação ou conta
minação externas. Êsses dados da literatura popular podem ser transfe
ridos para os domínios da literatura erudita, onde iríamos encontrar
igualmente esse duplo processo genético .
Ao comparatista ( é o nome que se tem dado ao estudioso de literatu
ra comparada), a tarefa de estabelecer rigorosamente, relações de causa
! ť efeito, de autor influenciante a autor influenciado talvez não seja a
mais importante. O que se deve procurar fundamentalmente é derivar -se
da observação de diversos autores de determinado período histórico, o
clima ideológico, a atmosfera em que medram as criações e os mitos da
literatura . E para a reconstituição deste clima, importa o estudo dos auto
res que o criaram ou foram por ele criados, como ainda a descoberta das
idéias que, não sendo especificamente dos autores , estão “ no ar ” .
À primeira vista, a influência não dependeria de mera subserviência
cega perante o modelo forasteiro, fascinador. E teríamos no Brasil um
caso semelhante ao da influência plástica egípcia sôbre a grega, caso em
que, segundo Spengler, não existe pròpriamente influência, o que há é
que " a vontadegrega de forma tomou daquelas velhas artes alguns cara
cteres que a não serem encontrados ali , ela os teria descoberto de uma
maneira ou de outra”.
Aplicar-se -iam estas vistas ao caso do Romantismo brasileiro ? Se não
houvesse Europa para dar-nos o molde do Romantismo, tê -lo -íamos desco
L
18 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPA
1

"berto alhures ? De fato, em tôda literatura coexistem um elemento nacio


nal e um universal. Não seriam as determinantes locais, as condições so
ciológicas e psicológicas locais que dariam a última palavra quanto ao
destino final da adaptação dos padrões literários estrangeiros ?
Viu-se que somos um povo essencialmente romântico e de um roman
tismo ' avant la lettre". Mas isto não bastaria para explicar o surto
romântico entre nós. Se a adoção de certos caminhos depende de virtua
lidades pre-existentes, estas virtualidades por si no Brasil nunca basta
ram . Em literatura, o modelo exerce a ação deflagradora necessária à
descoberta de nossa própria realidade social ou psíquica ; ação de catálise
poderosíssima, sem o que, embora sejamos desde o berço os tristissima
mente românticos de Paulo Prado, Ronald de Carvalho, Afonso Arinos,
Fernando de Azevedo e Artur Ramos , não obstante todas as constantes
de nossa psicologia étnica, não fosse a presença imperiosa e redentora do
modélo, continuaríamos para todo o sempre com o corpo da literatura na
cional deformado dolorosamente ao uso do espartilho do mais antinacio
nal e para nós antipsicológico dos classicismos.

c) Papel de Ferdinand Denis

O prefácio de Cromwell do Romantismo brasileiro não foi lançado


em 1836, como afirmam os compêndios (Suspiros Poéticos e Saudades... )
mas em 1824 por um livro de Ferdinand Denis que a história oficial des
denha mas que é de importância fundamental: " Scènes de la Nature sous
les Tropiques, et leur influence sur la poésie " , cujas idéias são corrobo
radas pelo Résumé de l'Histoire littéraire du Portugal et du Brésil do
mesmo autor.
O primeiro livro de Denis é marcado pela tradição da influência me
sológica, não sendo de molde a deixar nenhuma dúvida a citação, em epí
grafe, de Humboldt: “ Não se poderia duvidar de que o clima , a configu
ração do solo, a fisionomia dos vegetais, influem sôbre o progresso das
artes e sôbre o estilo que distingue as suas produções ”. E faz uma exal
tação retórica da grandeza, da beleza , da luxúria da natureza americana ,
plenamente na linhagem de Rocha Pitta e de todos os nativistas do perío
do colonial brasileiro, prenunciando ainda de maneira clara , Domingos
de Magalhães, Gonçalves Dias e Castro Alves. ( " nosso céu tem mais
estrelas ” nasce positivamente com Ferdinand Denis para quem " os rios
aqui correm suas águas com mais majestade, as florestas aqui são mais
vastas, as montanhas mais elevadas ” e depois : “ os animais são revesti
dos de roupagem mais variada, os pássaros ornados de plumagem mais
brilhante ” e ainda : “ o próprio céu se enfeita de fogos que tem mais
brilho ... ?
E a tarefa dos poetas do Novo Mundo está aí visível : que grandes
êles seriam é o pensamento de Denis no dia em que se aproveitas
sem desta natureza como Bernardin de Saint Pierre e Chateaubriand .
Ferdinand Denis publica ainda, em 1826 , um resumo da história literária
de Brasil e Portugal, em que faz uma exortação nacionalista aos brasi
leiros . Começa por proclamar que “ A América deve ser enfim livre em
sua poesia como em seu governo ”. E para conseguir este objetivo reco
menda o abandono do obsoleto aparato mitológico e a entrega em pleni
tude à natureza americana . E recomenda ainda com veemência a poesia
do índio .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 19

Domingos Magalhães viveu em Paris o tempo e em época suficientes


para conhecer plenamente os trabalhos de Denis. A par da influência sô
bre Gonçalves Dias, Ferdinand Denis não pode ter deixado de influenciar
o próprio Castro Alves.
O nacionalismo de Castro Alves abebera -se nos postulados do fran
cês. As suas " Impressões da Leitura das poesias do sr. A. A. de Mendon
ça", momento único do pensamento crítico de Castro Alves, apresentam ,
no seu corpo de doutrina, mais de um símile com as idéias já expostas de
Denis. Bebeu nêle a humboldtiana concepção mesológica. É por isso que
Castro Alves entende que a poesia “ assimila a si todas as nuanças do
manto da natureza que a cerca. Tem ainda que trazer as marcas da época
em que medra. É em virtude da afinidade que o poema deve ter com a
natureza ambiente que a poesia brasileira “ deve ser majestosa como as
matas virgens da América, arrojada como seus rios gigantes, livre como
os ventos, que passam gementes por suas várzeas e que zurzem os costa
dos pedregosos de seus gigantes de granito. A poesia deve ser o reflexo
desta terra .” Em virtude da lei de coerência com o meio, que o crítico
Castro Alves proclama, ele passa a censurar um erro que lavra em nossa
literatura: “a falta de brasileirismo nas composições ”. É rigorosamente
o sonho de Denis . E aduz : “ temos nossas montanhas gigantes com suas
grunas trevosas, onde o índio faz dormir o gênio do mal ; em vez destas
colunas partidas por terra nós temos essas colunas de verdura, que se
elevam para o céu ; em vez destas pedras que falam de um passado duvi
doso, nós temos essas nuvens que se somem no azul do firmamento e que
nos apontam um futuro certo " .
É rigorosamente o desenvolvimento da fórmula denisiana : abandono
da mitologia antiga e de outros temas da velha poética e adesão vital aos
mistérios da terra.

d) José Bonifácio e Domingos Magalhães

Posta de lado a ação desencadeadora de Denis, vamos a outro aspecto


da questão .
Clàssicamente, os historiadores de nossa literatura conferem a Do
mingos José Gonçalves de Magalhães a glória de primeiro romântico bra
sileiro, o que não impediu uma tentativa original de Afrânio Peixoto de
dar a José Bonifácio de Andrada e Silva essa posição inicial. As razões
em que se assenta a tese do romancista de “ Bugrinha” são as seguintes :
a) O seu livro foi impresso em Bordeus em 1825, antecipando -se,
pois , aos “ Suspiros Poéticos e Saudades ” de Magalhães, que são de 1836.
b ) José Bonifácio , em seu livro , cita Ossian, Byron e Walter Scott.
e ) Traduz Young.
d ) Faz os seus poemas em versos brancos .
e) Dá aos seus poemas côr local , com comparações da natureza bra
sileira e em vozes brasileiras.
f ) Faz odes à liberdade da Grécia e à liberdade do Brasil ( Ode aos
Baianos ).
Analisemos, item por item , o arrazoado do polígrafo baiano .
a ) O argumento cronológico não vale nada. Se o livro de José Boni
fácio é de 1825, é lógico admitir -se que conste de poesias compostas antes
desta data. E é-nos extremamente fácil a tarefa de determinar a data de
composição de seus poemas, pois muitos dêles vem datados pelo Patriarca :
20 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

1 ) Ode à Poesia 1875.


2) O Inverno 1788 .
3) Ode ao Príncipe Regente de Portugal. — “ No tempo da Invasão
dos franceses .' ... por 1808 por conseguinte.
4 ) Epístola. “ escrita em Coimbra no começo da primavera de 1785 " .
5 ) Ausência em Paris 1780.
6 ) Improvisado " feito quando o autor tinha 16 anos ” 1781 por
conseguinte .
7 ) Soneto · 1781.
8 ) Soneto - Improvisado na partida para Portugal - em 1783.
Os poemas de Américo Elíseo ( pseudônimo de José Bonifácio, como
se sabe) foram publicados em 1825, contando o poeta então 60 anos. Mas
pelo que ficou assinalado acima quase tôda a sua obra poética é obra de
mocidade. A dar-se valor ao argumento cronológico, temos que José Bo
nifácio foi romântico antes de Lamartine, Chateubriand e Hugo, romântico
muito antes do Romantismo. No Brasil, estes movimentos literários sem
pre chagavam com considerável atraso , mas agora graças ao gênio poético
de José Bonifácio, nós é que nos antecipávamos. A hipótese de haver
precursor desta ordem é aceitável pelo menos do ponto de vista doutriná
rio. Mas francamente não é o caso do Sr. Américo Elíseo .
b ) Essas citações não dizem nada a favor do Romantismo do poeta ,
pois na mesma ocasião em que os cita, fala em Apolo, Gregos e Roma
nos etc..
c ) Traduz Young. Mas o sr. Afrânio Peixoto se esquece de dizer as
outras coisas que José Bonifácio traduziu. Completemos a sua lista de
traduções : traduziu dois trechos da Teogonia de Hesiodo a que dá tanta
importância que a antecede de uma “ advertência ” em prosa em que afir
ma que encontra no grego “ trechos de grande valentia e sublimidade.”
Traduz ainda a Ode Primeira das Olímpicas de Píndaro, que ele consi
dera “ o maior e o mais sublime dos líricos antigos ”. Traduz Meleagro;
66
traduz Virgílio ; tem poemas que chama uns * sáficos ” e outros " ana
creônticos ” e a outros por fim “ báquicos ”. A quase totalidade das peças
que José Bonifácio traduziu era constituída, pois, de autores clássicos e o
pré-romântico Young aparece apenas como exceção que serve para confir
mar a regra .
d ) Verso branco nunca foi sinal de Romantismo. Muito antes de
haver Romantismo já havia poesia e o verso nascera branco, sendo a rima
aquisição posterior ( ao contato da poesia árabe como quer Sedillot ).
Se verso branco fosse documento, então teríamos que recuar o início do
nosso Romantismo até Basílio da Gama, cujo “ Uruguai” é todo em ver
sos brancos.
f) Esta nota brasileira é excessivamente tênue. Não merecia ser
assinalada.
g ) Quanto à liberdade da Grécia está certo , mas quanto ao Brasil,
analisemos os fatos com mais cuidado.
Realmente em “ Ode aos Baianos encontramos esta estrofe :

“ Amei a liberdade e a independência


Da doce cara Pátria a quem o luso
Oprimia sem dó, com riso e mofa,
Eis o meu crime todo."
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 21

Esta demonstração de patriotismo do poeta não convence, porque ,


pelo menos a julgar a coisa pelos seus versos , o seu patriotismo sempre
foi um patriotismo... português. Em 1820 pelo menos era assim , que
nos dá a impressão de que ele não sofria tanto com o jugo lusitano, pois
que, nesta ocasião fazia uma ode " no gôsto oriental ” ao Senhor D.
João VI :

"O infante que apenas lava os beiços


No leite maternal, teu doce nome
já repete risonho ..."

Antes disso já se havia esfalfado na realização de uma ode ao Prín


cipe regente de Portugal:

“ João do Brasil glória e esperança ! ".

Terceira ode bajuladora perpetra ainda para o Senhor D. João VI


“ po faustíssimo dia 13 de Maio de 1820 ",

“ E tu , João Augusto, ouve êstes versos


Que o Brasil arrancou do esperto peito " .

José Bonifácio sente-se feliz em ver o Brasil qual

nova China
que teus lusos povoam fértil, rica."

Às páginas 68 de seu dissaborido livro chama o Brasil de " Nova Lu


sitânia " o que era muito pouco decente para quem estava destinado a ser
dois anos depois o Patriarca da Independência brasileira .
Na sua “ Ode aos Baianos ” , temos o seguinte verso :

“ Para mim o Brasil não é mais Patria " .

Para chegarmos à conclusão de que o Patriarca nada tem de român


tico, nem é preciso abrir o seu livro. Na capa, em vez de aparecer por
extenso o nome do Sr. José Bonifácio de Andrada e Silva, temos o de
Américo Elíseo. Ora, éste pseudônimo é de ressonância tìpicamente arcá
dica. Pelo menos tanto quanto Termindo Sepílio, Glauceste Satúnio , Al
dindo Palmireno e outros poetas moradores da Arcádia. De modo que
sem ler o livro, temos o direito de suspeitar que José Bonifácio não é
om romântico mas um árcade. E a leitura então confirmará a suposição.
José Bonifácio é realmente um clássico de ampla tonalidade arcádica.
As suas amadas recordam as pastoras aborrecidas dos árcades. Uma de
las é Eulina ( os nomes de tôdas as suas mulheres é suspeito de arcadis
mo) e ele ao gôsto árcade apresenta - a como pastora :

Amor entre pastores não é crime.

Outra amada arcádica : Nize, com ressonâncias típicas dos velhos


poetas da chamada "escola mineira ” :
22 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Nize tirana,
Tem dó de Armido.

Outra amada arcádica : Narcina :

" O colo de alabastros nu mostrava


A meu desejo ardente a incauta avara
Com ponteagudas setas que ela hervara
Bando de Cupidinhos revoava ..."

Não é romântico mas absolutamente clássico quem fala em " euros


suspendidos ”, “ gentis Camenas” , “ os frescos vales do sagrado Pindo ”,
“ zéfiro prazenteiro ” , “ bárbaras Napéas ” , “divina Urânia ”, “ ódio de
, " tágides ”, “ férvidos etontes " , " buliçoso favônio ” , “negro Aver
Jove " ko
ከሁ " , o festivo esquadrão dos Cupidinhos ” ... Enfim todo o aparato
mitológico dos clássicos está em José Bonifácio , imponente no seu ranço .

1
!

ÍNDIOS E CABOCLOS

Páginas de etnografia e folclore

FRANCISCO S. G. SCHADEN

P R E F A C I O

Nem sempre é fácil determinar até que ponto as tradições folclóricas


das diferentes regiões do Brasil podem e devem ser consideradas como so
brevivências do patrimônio mítico de tribos ameríndias . E' notorio que a
grande disparidade de contingentes étnicos que se amalgamaram na for
mação do povo brasileiro fez com que em nosso folclore se fundissem ele
mentos das mais diversas procedências. Além disso, as particularidades da
paisagem geográfica, muito variada em conseqüência da enorme extensão
do território, contribuiram, por sua vez, para modificar as formas primiti
vas dos mitos, imprimindo- lhes diferentes cunhos regionais.
O estudo do folclore nacional deve, por isso, atendor de modo especial
as particularidades históricas, étnicas e geográficas, evitando, em primeiro
lugar, as generalizações apressadas. Muitas vezes, um nome qualquer, como
saci, mbol- tata , jurupari, curupira etc., corresponde a representações muito
diferentes, de acordo com a região em que o mito foi registado. Por esse
motivo, 08 nossos trabalhos de folclore, para serem satisfatórios, hão de
estribar -se, cada vez mais, em pesquisas cuidadosas e pormenorizadas. As
belas construções teóricas por si só são insuficientes para a Justa
compreensão da realidade.
Os assuntos abordados neste livrinho poderiam é claro ser desen -
volvidos consideravelmente de vários pontos - de - vista. Não tivemos, porém ,
a pretensão de estudá - los de modo exaustivo. Quisemos tão somente discu
tir alguns dos aspectos mais interessantes - a título de sugestoers e notas,
e não como realização dum estudo sistemático . Quisemos mostrar aos lei
tores uma diminuta parcela da grande variedade de conhecimentos que os
assuntos brasilicos sobretudo a etnografia e o folclore proporcionam
24 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

a quem os encare com o devido interesse. Sirvam , pois, as páginas deste


pequeno volume como estímulo aos que, dispondo de mais abundantes re
cursos bibliográficos, e possuindo meios de pesquisas direta, queiram de
dicar - se a esse gênero de estudo, tão úteis para a compreensão da terra e
da gente do Brasil.

i
1. ERVA SANTA

Não foram poucas, certamente , as curiosidades e esquisitices que o


homem branco veio encontrar no seio das populações indígenas da Ame
rica. Mas talvez não seja exagero afirmar - se que, dentre todas elas, i que
maior repercussão teve no Velho Mundo foi o uso do fumo. As estatísticas
comerciais evidenciam como é considerável o peso que o consumo do taba
co exerce de há muito na balança, econômica de quase todos os países civi
lizados. Os impostos sobre charutos, cigarros e produtos congêneres repre
sentam parcela considerável nos orçamentos anuais de muitos governos.
Já Cristóvão Colombo, ao arribar às Antilhas, observou entre os sel .
vagens o hábito de fumar tabaco. Foi um companheiro do descobridor ge
Lovės, o Padre Roman Pane, quem descreveu pela primeira vez ésse vege
tal, no ano de 1496 . Mais tarde, verificou - se o uso do fumo entre numero
sag tribos indígenas do Novo Mundo. Umas o fumavam , outras o masca
vam , outras ainda usavam - no em forma de rapé.
Donde teria vindo o hábito de fumar ? Ao contrário do que muitos
afirmam, talvez não seja costume originariamente americano. Em sepultu
ras pré - históricas da Europa e da Ásia se encontraram cachimbos, parecen
do que se fumavam várias espécies de vegetais aromáticos, como o canha
mo, a língua- de - vaca, a alfazema e outros mais. Segundo a opinião de al.
guns autores ( 1 ) é, porém, provável que o tabaco também já tenha sido
fumado pelo homem pré - histórico do Velho Mundo. Na China, onde se de
senterraram cachimbos antiqüíssimos, cresce também uma espécie nativa
dessa planta. Nas suas migrações pelo estreito de Behring, os povos asiá
ticos apontados como os primitivos povoadores da América do Norte teriam
trazido consigo também o hábito de fumar e o tabaco .
Em escavações feitas no continente norte- americano, acharam - se ca
chimbos em lugares outrora ocupados por habitações e sepulturas, mas
que já estavam cobertas de cerrada mata virgem . Os fornilhos desses ca
chimbos, feitos de pedra - sabão, serpentina ou barro cozido, ostentam geral
mente artísticos trabalhos de escultura e gravação. Uma parte dessas es
culturas representa fisionomias humanas com traços nitidamente mongol6i
des, fato que se tem invocado em apoio da hipótese que acabamos de
mencionar.
Para nós, o hábito de fumar é simplesmente um vício. Para os indios,
porém , tinha de ordinário significação essencialmente religiosa ou , pelo
menos, mágico- medicinal. Além disso, é notório, entre outras coisas , a
importancia do cachimbo -da - paz nas relações intertribais entre os indr.
genas da América- do - Norte. Para eles, o cachimbo constituia um símbolo
Kugrado.

( 1 ) Veja- se, entre outros, o interessante trabalho de C. Arrieng, “ Wie


der Wilde raucht und schnupft " . Die Koralle , n.° 5 , págs. 49-56 . Berlim,
agosto de 1925.
26 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Na vida de numerosas tribos sulamericanas, o tabaco era de fato a


erva santa " , o santo remédio para curar toda sorte de males do corpo e
da alma, Em delicioso estilo quinhentista , informa, por exemplo, o je
suſta Fernão Cardim no seu tratado Do principio e origem dos índios do
Brasil : " A alguns faz muito mal e os entordoa e embebeda ; a outros faz
bem e lhe faz deitar muitas reimas pela boca, As mulheres também o
bebem, mas são as velhas e enfermas, porque é ele muito medicinal, prin
cipalmente para os doentes de asmas, cabeça ou estômago, o daqui vem
grande parte dos Portuguêses beberem este fumo, eo tempor vício ou
por preguiça , e imitando os indios gastam nisso dias e noites" ( 2 ) . Essa
observação, que se refere aos primitivos habitantes do litoral, o que con
corda com os informes de quase todos os cronistas dos primeiros séculos,
aplica-se de modo geral à grande maioria das tribos selvagens. indios
que ignoravam o uso do fumo ao entrarem com contato com os brancos
constituíam verdadeira exceção. Estão neste caso os Parintintin do Rio
Madeira, 'os quais , segundo o depoimento de Curt Nimuendaju , pareciam
mostrar a principio verdadeiro horror diante do vício de fumar . Informa
êsse etnologo que " não eram capazes de chegar perto de uma pessoa que
estivesse com cigarro aceso na bôca, e de longe pediam que o atirasse
fora " ( 3 ) . Entretanto, trata-se aqui, como já dissemos, de um caso ex
cepcional. Em regra , dava- se exatamente o contrário. Aliás, os próprios
Parintintin não tardaram a fazer os primeiros ensaios com o uso do fumo.
E ' o mesmo Nimuendaju que mo diz em seu relatório etnográfico : “ Hoje
já existem rapazes que tomam o cigarro da boca de qualquer um dos
nossos tiram, desajeitadamente e tossindo, algumas baforadas, metendo
outra vez o cigarro na boca do seu dono " ( 4 ) .
Os métodos de aplicação mágico - terapêutica do tabaco variam pouco
do uma tribo para outra. Uma das descrições mais interessantes é a do
viajante francês Jules Crevaux, que visitou os Rukuiena ou Urukuiuna
pertencentes à familia linguistica karaib e estabelecidos nas Güianas fran
cesas e brasileira .
O enfermo, acompanhado de alguns membros da família ou de vários
amigos, é conduzido à cabana do médico - feiticeiro, junto à qual está ar
mado, num terreiro. pequeno rancho de folhas de palmeira, parecido com
uma grande jaula. Depois de enfeitar-se com penas e uma porção de
outros aderêços, o feiticeiro entra na jaula, enquanto as pessoas presentes
guardam silêncio, Dentro em pouco, porém, ouvem - se as vozes dos animais
da mata virgem, desde o chilreio das aves e o rugido das onças até o
assobio dos macacos eo sibilo das serpentes, tudo magistralmente imitado
pelo feiticeiro no interior da jaula. Essa representação tem o objetivo de
dar ao doente a idéia de que o feiticeiro se aconselha com os espíritos
que habitam os corpos dos animais. Após uma solene canção final, du
rante a qual o médico bate constantemente os pés no chão , ele se retira
do pequeno recinto. Segue- se o tratamento do paciente. O médico -feiti
ceiro fuma alguns charutos fornecidos pelo doente ou por amigos dele .
Sopra a fumaça com força sobre a parte do corpo em que o enfermo sente
a dor. Nos intervalos, chupa enèrgicamente o charuto e amassa, com vio

( 2) Fernão Cardim , Tratados da terra e gente do Brasil ( 2.a edição ;


Brasiliana , vol. 168 ) , págs. 151-152. São Paulo 1939.
( 3 ) Curt Nimuendaju , " Os índios Parintin do Rio Madeira ". Journal
de la Société des Americanistes de Paris , n. s., tomo XVI, pág . 23 .
Paris 1924 .
( 4 ) Ibidem .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 27

lência , o corpo do doente, afim de extrair - lhe o mal . Concluindo a cura,


fax ainda ao enfermo uma série de recomendações, que se reduzem todas
a uma dieta rigorosa. Se o paciente recupera a saúde, feiticeiro costuma
ser recompensado com uma rede- de - dormir .
A significação religiosa do uso do fumo aparece, por exemplo , com
especial evidência no costume dos indios Tapirapé, do Brasil central, de
enterrarem o pagé “ com um cachimbo cheio de tabaco na boca , de modo
que possa fumar para extinguir a fadiga durante a viagem para Marata
va " (5 ). No Xamanismo desses indios, o tabaco desempenha, aliás, um
papel verdadeiramente extraordinário .
Os indios Vitoto cozinham folhas de tabaco, que, assim, se transfor
mam em massa de consistência viscosa. Para discutir assuntos de im
portância , como sejam expedições guerreiras ou de caça , reunem-se
noite na maloca em torno dum pote com essa massa . De tempos em tom
pos, mergulham nela os dedos indicador e médio, para lambe - los em se
guida. A esse ato dá-se importância tal que o consideram como espécie
de juramento , que obriga a todos os que lambem a massa a participarom
de todas as empresas que a assembléia resolve organizar ( 6 ) .
Os indios Mura possuem um jogo no qual a ação de fumar assume uma
feição curiosíssima. Primeiro , queimam determinadas plantas, inalando a
fumaça ; a seguir , abraçam - se, dois a dois, soprando, uns aos outros, 0
fumo aromático no nariz . Depois de frenético berreiro, acompanhado de fan .
tásticas gesticulações e extraordinário fluxo de palavras confusas o dis
paratadas, os parceiros desmaiam e às vezes até chegam a cair mortos.
Entretanto , a maneira mais comum entre as várias populações indige
nas era o de fumar charutos. Dos Tupi do litoral informa o já citado Pa
dre Fernão Cardim : " Costumam estes gentios beber o fumo da petigma ,
por outro nome erva santa ; esta secam, e fazem de uma folha de palma
uma canguera , que fica como canudo de cana cheio desta erva, o pondo
lhe o fogo na ponta metem o mais grosso na bôca, e assim estão chupando
e bebendo aquele fumo, e o tem por grande mimo e regalo, e deitados
em suas redes gastam em tomar estas fumaças parte dos dias e das noi
tes" ( 7 ) . No último quartel do século passado, o Dr. Karl von den Steinem
observou, entre os Bakairi do Xingu , charutos de mais de 25 centímetros
de comprimento ( 8 ) . Não é de admirar, portanto, que, ao fumar um cha
ruto desses, um ou outro selvícola ficasse um tanto atordoado , embora
nem sempre o tabaco fosse excessivamente forte. O uso de cachimbos pa
rece ter sido muito raro entre os índios do litoral. Alguns conheciam o
cahimbo tubular, empregando -o nas fumegações rituais. Várias tribos do
interior fumavam cachimbos de barro com fornilhos. ( 9 ) .

( 5 ) Maratava é a morada dos mortos. 0 costume é referido por


Charles Wagley , " Xamanismo tapirapé ' '. Boletim do Museu Nacional, n. S.,
Antropologia , n.º 3 , pàg. 24. Rio de Janeiro, 15 de setembro de 1943.
( 6 ) A descrição deste costume, observado também entre os Miranya,
encontra -se no segundo volume da obra Zwei Jahre unter den Indianern ,
de Theodor Koch -Grünberg, pág . 302 ; Berlim 1910.
(7 ) 0. e ., pág. 161.
( 8 Karl von den Steinen, Unter den Naturvölkern Zentral-Brasiliens,
págs. 68-69. Berlim 1894.
( 9 ) A. Métraux, La civilisation matérielle des tribus tupl- guarani,
págs. 116-117. Paris 1928 ,
28 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Concluindo, resta- nos lembrar qeu as palavras portuguêsas pito " o 1


" pitar " são derivadas do têrmo tupi - guarani petigma ou pityma, que ocorre
no texto de Cardim há pouco citado.

***

2. O PÃO DOS INDIOS

Pode se considerar indício de elevada inteligência dos índios sul - ame


ricanos o terem transformado a mandioca, planta de raízes primitivamente
fibrosas e tóxicas, em alimento de real valor ( 1 ) . O papel que coube à
batata na economia do império incaico do Peru, foi desempenhado, em grau
bem mais notável , pela mandioca na vida dos aborígenes da costa oriental
e de outras regiões da América do Sul. A mandioca silvestre produz ape
nas raízes pouco desenvolvidas e com pequena quantidade de amilo . E '
sòmente com o cultivo prolongado e intensivo que essas raízes finas se
tornam grossas e feculentas. A extração do ácido cianidrico, que se con
segue prensando e aquecendo a massa, foi uma das invenções mais im
portantes dos nossos selvícolas.
Os portuguêses aceitaram o cultivo da mandioca tal qual o praticavam
os indígenas. Aperfeiçoaram apenas os métodos de preparação, servin
do - se, para ralar as raízes e prensar a massa, da fôrça hidráulica, que os
indios não sabiam aproveitar. Em toda parte, foram surgindo grandes en
genhos de farinha, que produziam a farinha de mandioca para os colonos
das povoações recém - formadas e para o abastecimento dos navios que apor
tavam no litoral .
Entre os índios , o plantio de mandioca era trabalho das mulheres. Os
homens faziam somente o roçado. Plantava- se em qualquer época do ano,
ou melhor, toda vez que se arrancavam raízes, preenchia - se imediatamente
a lacuna, plantando novos ramos. Na preparação da farinha, os homens
ajudavam apenas quando se precisava de maiores quantidades para longas
viagens ou expedições guerreiras.
Já os primeiros viajantes que visitaram a América , como, p. ex., Amé
rico Vespucci, mencionam a mandioca . Hans Staden deixou - nos indicações
sôbre o seu cultivo e preparação entre os índios do litoral.
" Quando querem plantar, derrubam as árvores do lugar que para isso
escolheram , e deixam - nas por cerca de três meses. Então lhes deitam
fogo e queimam - nas. Depois fincam as mudas da planta de raizes que
usam como pão, entre as cepas das árvores. Este vegetal se chama man
dioca. E ' u marbusto de um abraça de altura e que cria três raízes .
Quando querem prepará - las, arrancam os arbustos, destacam - lhes as raízes
o enterram de novo os pedaços das hastes. Estas pegam e se desenvolvem
tanto em seis meses, que podem ser utilizadas.
Preparam a mandioca de três modos. Primeiro : trituram sôbre uma
pedra as raízes totalmente, em pequenos grumos, extraindo o suco com

( 1 ) A primeira descrição científica da mandioca aparece na Historia


Naturails Brasiliae ( 1648 ) , de Guilherme Piso e Jorge Marcgrave . No
princípio , havia , entre os botânicos , muita discordância quanto à classi
ficação dessa planta. Ora era incluída no gênero Curcas, ora nos gêneros
Janipha , Jatropha etc. Hoje os livros de botânica a registam como per
tencendo ao gênero Manihot , da família das Euforbláceas .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 29

uma cana , feita de casca de palmas e chamada tipiti. Deste modo se torna
sêca a massa, que depois passam numa peneira. Da farinha fazem bolos
fininhos. A vasilha na qual secam e torram sua farinha é feita de barro
queimado e tem a forma de uma grande travessa.
Segundo : , Tomam as raízes frescas, deitam - nas nágua, deixando -as aſ
apodrecer ; retiram -na então e secam -nas na fumaça sobre o fogo. Chamam
a estas raízes secas carimã. Conservam - se por muito tempo . Quando os
selvagens querem utilizá - las, esmagam - nas em um almofariz de madeira.
Isteo dá uma farinha branca. Com ela fazem bolos que se chamam beijus.
Terceiro : Tomam mandioca bem apodrecida, não a secam, mas a mis
turam com seca e verde. Obtêm assim , torrando, uma farinha que se con
serva perfeitamente um ano. E ' boa também para comer. Chamam- na
uitán " ( 2 ) .
A cultura da mandioca já devia ser bem antiga quando os europeus
arribaram a América, o que se depreende das múltiplas aplicações do pro
duto entre os índios da época.
Em primeiro lugar, os Tupi-Guarani da costa faziam da farinha os seus
bolinhos, a que chamavam mbeû , nome que os portuguêses transformaram
em beiju . Membeka era o nome dado pelos índios ao pirão, que se gene
ralizou entre grande parte de nossa população rural . Havia também um
bolo de mandioca chamado pokeka . Na preparação do kurubá emprega
va - se , além da farinha de mandioca, o fruto da sapucaia. E assim po
der- se - iam enumerar muitas outras comidas feitas com esse produto, de
que se fabricavam também bebidas fermentadas (kauíme kaumſ) , bem
como molhos para temperar os alimentos.
padre Manuel da Nóbrega refere ter ouvido dos índios Tupinamba
que a mandioca lhes fôra doada por um homem de nome Zomé. Esse
personagem é freqüentemente identificado com o Apóstolo São Tomé, que
teria estendido a sua viagem , pela China e pela Índia, até o Brasil . Ou
tros consideram a denominação Zomé como corruptela de Zemi , nome de
uma divindade venerada pelos aborígenes de Haití, que, além de lhes trazer
o fogo, teria ensinado a esses índios o cultivo de plantas de raízes tuberosas
( 3 ) . Zomé ou Sumé é o grande herói civilizador dos Tupinamba. O mito dessa
figura foi registrado principalmente por André Thevet, no século dezesseis.
A origem da mandioca ocupa um lugar de destaque na mitologia de
muitas tribos ameríndias.
Os índios Pareci , tribo aruak do Brasil central , explicam - na da seguin
te maneira :
* Zatiamare e sua mulher, Kökôtêrô , tiveram um casal de filhos : um
menino, zokððie, e uma menina Atiôló. O pai amava o filho e desprezava
a filha. Se ela o chamava, ele lhe respondia por meio de assobios ; nunca
lhe dirigia a palavra.
Desgotosa, Atiôlô pedia à sua mãe que a enterrasse viva, visto como
assim seria útil aos seus . Depois de longa resistência ao estranho desejo,
Kokotêrô acabou cedendo aos rogos da filha , e a enterrou no meio do
cerrado . Porém , ali não pôde ela resistir, por causa do calor, e rogou

( 2 ) Hans Staden , Duas Viagens ao Brasil . Tradução de Guiomar de


Carvalho Franco. Págs. 162-163. São Paulo 1943 .
( 3 ) Manuel da Nóbrega, Cartas do Brasil, págs. 91 , 101. Rio de Ja
neiro 1931. Robert Southey, História do Brasil. Traduzida pelo Dr. Luís
Joaquim de Oliveira e Castro. Tomo I, págs. 323-324 . Rio de Janeiro 1862 .
30 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

que a levasse para 0 campo onde também não se sentiu bem . Mais
uma vez suplicou a Kökôtêrô que a mudasse para outra cova, esta última
aberta na mata ; al sentiu - se à vontade. Pediu , então, à sua mãe que se
retirasse, recomendando - lhe que não volvesse os olhos, quando ela gritasse
Depois de muito tempo gritou ; Kökôtêrở voltou - se, rapidamente. Viu,
no lugar em que enterrara a filha, um arbusto mui alto, que logo se
tornou rasteiro assim que se aproximou . Tratou da sepultura . Limpou
o solo. A plantinha foi se mostrando cada vez mais viçosa. Mais tarde,
Kókôtêrô arrancou do solo a raiz da planta : era a mandioca " ( 4 ) .
Em seus traços essenciais, esse mito se repete em muitas tribos ame
rindias. De tipo bem diferente é a tradição registrada por Karl von den
Steinen entre os Bakairi, tribo caraiba das nascentes do Xingu .
Contam ésses indios que a mandioca lhes foi doada por Kléri, que por
sua vez a recebera do veado . O primitivo dono da planta era , porém , o
peixe bagadú ou pirarara . Foi da seguinte maneira que o veado entrou
na posse da mandioca :
" O veado estava com sede e foi procurar água . Nessa ocasião encon
trou o bagadů . O bagadú estava em sêco e respirava com dificuldade.
Disse então ao veado : " Carrega -me! Trança um laço de imbira , para
carregar- me ' ' . Depois de trançar o laço de imbira, o veado pós o bagadú
nas costas, levando - o ao barranco do Rio dos Beijus. AI disse : " Agora
tenho muita vontade de descansar " . Mas o bagadú não queria que a veado
parasse. Assim , conversando , desceram o barranco , Em baixo, lançaram - se
no rio. O veado sentia- se bem na água , O bagadú levou o veado para
sua casa. Depois de aí chegarem , o veado bebeu pogú e também comeu
beijus. O bagadú conduziu o veado à plantação de mandioca ; @sse foi
caminhando atrás daquele. Vendo a mandioca, quebraram ramos , atando
66
três em feixe. Depois foram para casa. “ Amanhã quero ir - me embora " ,
disse o veado e ainda dormiu essa noite na casa do bagadů. Na outra
manhã, disse o bagadú : “ Leva os ramos de mandioca. Faze o roçado , e
em seguida planta os ramos " . E acrescentou : " Se estiverem bem planta
das, em breve terás mandioca " . “ Passa bem " , disse o bagadů ao veado .
Este saíu da água . " Pois bem, vai ! ' ' “ Eu vou para casa " , disse o veado .
Entretanto pós os ramos no chão , empilhando - os na margem do rio . Não
rodia carregá- los sozinho e deixou - os aí . Foi para casa, aonde só chegou
de noite. Dentro em pouco voltou para o lugar 'acompanhado do filho
os dois então levaram os ramos para casa. Depois de pequeno descanso ,
foram fazer roçado no campo . Mas a mandioca não dá no campo . Por
isso derrubaram árvores no mato . Fizeram fogo, queimaram a roca
em seguida plantaram a mandioca ” . ( 5 ) .

( 4 ) O mito foi recolhido pela Comissão Rondon , que o divulgou em


um dos seus relatórios oficiais. Para a presente transcrição servimo - nos
do livrinho de Clemente Brandenburger, Lendas dos nossos indios, págs .
34-35 . Rio de Janeiro 1931. Em seu estudo “ Los Paressís " , incerto no
tomo VI da Revista de la Sociedad Científica del Paraguay ( Assunção
1943 ) , escreve o Prof. Dr. Max Schmidt: “ tenho que assinalar que não
é Zatiamare a mãe e Kôtôtêrô o pai da criatura Atiolo , como o indica o
General Rondon , mas que, pelo contrário , Kötötêrô é a mãe e Zatiamare o
pai. Ambos são mencionados com tal freqüência nos textos das lendas dos
Paressí que não pode haver dúvida a esse respeito. " Nota a pág. 250 .
( 5 ) Karl von den Steinen , Unter den Naturvölkern Zental- Brasiliens .
Pag. 382. Berlim 1894 . Edição brasileira : Entre os aborígenes do Brasil
Central, Trad . de Egon Schaden . Págs. 487-488 . São Paulo 1940 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 31

Foi assim que o veado se tornou senhor da mandioca. Kéri, o herói


civilizador dos Bakairí, fazia os seus beijús de barro vermelho, pois não
tinha mandioca . E o veado não lha quis dar . Zangado, Kéri pegou o
veado pelo pescoço e , soprando, fez aparecer armação sobre a cabeça
dele. Riu -se e exclamou : “ Ora vejam de que jeito ficou o senhor da man
dioca !" Depois, levou a mandioca às mulheres bakiri e ensinou - lhes a
extração do veneno , que ele aprendera com o veado. “ Eo veado agora tem
sua armação, come folhas e roi a casca dos ramos " . Os Bakairis acredi
tam sinceramente que o veado conhece a manipulação da mandioca. En
sinou - a a Kéri , que foi o professor das mulheres bakairi ( 6 ) .
Para terminar, vejamos ainda uma interessante tradição ameríndia do
vale do Amazonas :
O aru , sapo de forma achatada , vive de preferência nas clareiras da
mata e nas plantações, mas nestas altimas somente quando limpas e bem
cuidadas. E ' esta a crença popular. Das roças procuradas pelo aru espe
ra - se uma colheita abundante. Conta- se que, oportunamente, o aru se
transforma num moço bonito, subindo o rio até as nacentes, a fim de buscar
a Mandiokamanya, ou “ mãe da mandioca ” . Esta passa então pelas roças,
à semelhança da deusa Freya dos antigos germanos, abençoando -as
com 0 seu olhar, quando cultivadas com diligência .
Nas margens do Rio Negro encontram - se, de quando em quando , pe
daços de ramos que parecem provir de uma tribo de há muito desaparecida.
A forma dêsses ramos difere consideravelmente da que hoje se observa
na região. Os habitantes costumam designar esses dados achados com a
denominação de Aruapukuitá, i. é , “ remo de aru " . Acreditam que o " aru "
os tenha usado nas suas viagens com a Mandiokamanya ( 7 ) . Observa
Nimuendaju ( 8 ) que no Rio Içana esses remos são encontrados na época
da estiagem , sôbre o rio, em que aparece o sapo aru e em que se formam
densas neblinas igualmente chamadas “ aru ” . Assim se explicaria, segundo
aquêle autor, serem os remos atribuídos aos lendários sapos “ aru ” , dos
quais se acredita viajarem apressadamente rio acima durante esses ne
voeiros.

***

3. SOBRE A HISTÓRIA DA BATATINHA

A batatinha é uma planta americana cujo cultivo se espalhou por todas


as regiões do globo, mormente pela Europa, que chegou a fornecer mais ou
menos cinco sextos da produção mundial. A América do Sul , de onde é
criginária, contribui talvez com 1 % do total de todos os países, o que equi
vale, aproximadamente a produção do continente asiático .
No Brasil, a batatinha, a que os botânicos chamam Solanum tuberosum ,
é conhecida também sob a denominação de batata inglêsa . Esta designação,

( 6 ) Ibidem .
( 7 ) Ermano Stradelli, “ Vocabulários da língua geral português -nheen
gatu e nheengatu -português ” . Rev. do Inst. Hist, e Geogr. Bras . Tomo 104 .
Vol . 158, pág . 380 . Rio de Janeiro 1929 .
( 8 ) Apud Nunes Pereira, Ensaio de etnologin amazônica ( 2.2 edição ) ,
pág. 41 . Manaus 1942 .
32 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

formada provavelmente com o fim de se estabelecer uma distinção entre


essa batata e a batata doce ( ou jetica ) , cujo nome científico e Ipomoea
hatatas, tem levado muita gente à opinião errônea de que a planta é ori
ginária da Inglaterra.
Quando Francisco Pizarro , o descobridor e conquistador do império in
cáico, chegou ao Peru no ano de 1531, já encontrou a batata inglêsa culti
vada em grande escala naquela região, como também no Chile. Constituia
niesmo um dos gêneros alimentícios mais importantes produzidos pela agri
cultura indígena de toda a zona andina, Informa Prescott que no México
era desconhecida, o que esse autor apresenta como prova " da inteira igno
rância em que as respectivas nações dos dois continentes ficaram umas em
relação às outras" ( 1 ) . Como refere Bukasow ( 2 ) , os aborígenes do Mé .
xico e de Guatemala cultivam uma espécie diferente, o Solanum andigenum .
Segundo informes divulgados pela câmara agrícola de Tortosa , Pizarro
niandou à Espanha as primeiras sementes, juntamente com uma carta em
que acentua as excelentes qualidades do " fruto " , ao qual até atribui a fa
culdade de restituir aos anciãos o vigor da juventude. Por intermédio do
Papa ( 3 ) , as sementes do vegetal foram introduzidas na Bélgica, onde a
batata entrou, como planta exótica, em vários jardins botânicos. A sua
importância como gênero alimentício foi reconhecida só muito mais tarde .
Os espanhóis, p . ex . , como salienta G. Friederici ( 4 ) ' tinham - na por “ ali
mento indigno " , como também desprezavam , por plebéias, as roupas feitas
de tecido de algodão.
Não é impossível, mas até muito provável , que outros europeus , além
do conquistador espanhol, tenham conhecido a batata em terra americana ,
levando sementes ao Velho Mundo, onde, pouca a pouco , a planta se foi
tornando conhecida. Refere - se, p . ex . , que em 1586 ( portanto muito depois
de Pizarro ) , o navegador Francis Drake enviou batatinhas a um amigo na
Inglaterra, o que lhe valeu a fama de ter introduzido a planta na Europa .
Em 1850, erigiu - se na cidade de Offenburg, na Alemanha, um monumento
em homenagem a esse navegador inglês.
Existe também na Alemanha um monumento dedicado à própria batata
inglêsa. Encontra- se no Oberharz, nas proximidades de Baunlage, e é pouco
conhecido , mesmo no interior do país. Numa chapa de ferro, lê - se a se
guinte inscrição : " No ano de 1748 fizeram - se neste lugar as primeiras ex
periências com o cultivo da batata " .
Na Alemanha, onde se tornou conhecida muito depois de se espalhar por
outros países da Europa , introduziu - se a batata depois de passar pela

( 1 ) William H. Prescott , History of the Conquest of Mexico and His.


tory of the Conquest of Peru , nota à pág. 803 . The Modern Library,
Nova York, s. d.
( 2 ) Veja- se Karl Sapper, Geographie und Geschichte der indianischen
Landwirtschaft, nota à pág. 29 . Hamburgo 1936 .
( 3 ) Nos livros dos anigos cronistas, a batata aparece geralmente sob
a denominação de papa ; ésse têrmo não tem relação alguma com o chere
da Igreja , mas é tomado ao idioma dos Quetchua do Peru. Também na
língua dos Chimu encontra - se o têrmo papa para designar a batata ingle
sa. Geogr. Friederici, Hilfswörterbuch für den Amerikanisten, pág. 75.
Halle 1926 .
(4) Veja - se Karl Sapper, o. c., pág. 73.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 33

Italia. Ainda em 1616 o produto era tão raro que só as pessoas abastadas
o podiam comprar. Foi somente com o interesse que lhe dispensou Frode
rico o Grande que o cultivo desse vegetal se incrementou na Prussia e
em outros estados alemães.
Na época do descobrimento, a batata inglêsa era cultivada pelos indios
num território que se estende de Chile, i. é , de 430 de latitude sul, até
Bogotá e o vale do Cauca, no norte ( 5 ) . O primeiro " habitat” da planta
não pode ser ainda delimitado com exatidão. Embora tenha sido encon
trada em estado silvestre somente na planičie úmida e nas ilhas adjacentes
do Chile meridional, Rimbach julga que o primitivo território tenha sido
bem mais extenso , alcançando mesmo no planalto andino ( 6 ) , Tribos nômades
de economia coletora ( ou " extratora " , como alguns preferem ) exploravam
o Solanum commersonil, que cresce em estado silvestre no Uruguai e no sul
do Brasil. Esta espécie, porém, não chegou a ser cultivada pelos aborígenes.
( 7 ) . Modernamente foi plantada no estrangeiro, onde já deu resultados apre
ciáveis ( 8 ) .
Baseado em observações pessoais, o autor destas linhas é de opinião
que a batata inglêsa se encotra, em estado silvestre, também no sul de
Santa Catarina . Referimo - nos a uma planta encontradiça nas nascentes
do rio Capivari. E ' certo , em todo caso, que não se trata de batatas de .
cultura degeneradas. Seria interessante talvez o estudo da questão da
parte dum especialista. A folhagem do vegetal é um pouco mais midda
do que nas variedades cultivadas, e como a haste também é mais fina, a
planta se abre um pouco no centro, caindo para os lados. As partes ver
des não são revestidas de pêlos. A flor é um pouco menor do que na ba
tata cultivada, mas aparece em abundância . Os tubérculos alcançam 0
tamanho de um Ovo de pomba . Embora a planta apareça logo depois do
inverno, o período de seu crescimento se prolonga muito pelos meses de
verão.

***

O MITO DO SUME

André Thevet, um dos franceses que estiveram no Rio de Janeiro em


meados de século XVI, deixou , em sua Cosmographie Universelle, um
dos relatos mais completos acerca das crenças religiosas e da mitologia -
dos indios Tupinambá, que habitavam aquela região do litoral brasileiro..
Expondo a mitologia dêsses aborígenes, o monge francês apresenta
tôda uma linhagem de heróis civilizadores, cuja multiplicidade é, porém ,
só aparente, como Alfred Métraux teve ocasião de demonstrar no seu es
tudo sobre a religião dos Tupinambá ( 1 ) . Como já o supunha Ehrenreich

( 5 ) Sapper, o. C., pág. 73.


( 6 ) Sapper , 0. C., pág. 29.
( ? ) Sapper, 0 , C., pág. 73.
( 8 ) João s . Decker, Aspectos biológicos da flora brasileira , pág. 294
São Leopoldo, 8. d .

( 1 ) Alfred Métraux, La religion des Tupinambá et ses rapports avec ·


celle des autres tribus tupi- guarani. Paris 1928 .
34 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

( 2 ) , o primeiro deles, Monan , qualificado como criador do universo e, ao


mesmo tempo , como o destruidor da primeira humanidade, identifica - se
provavelmente como O segundo, Maire - Monan , descendente de Irin -Magé,
que foi o único homem que escapou ao incêndio e à inundação com que
Monan destruiu o universo. Também Sumé ( Sommay ), “ grande pagé e
caraiba " , como o designa Thevet, não parece ser outro senão Maire- Monan.
E , finalmente, Maire - Atá, o “ grande peregrino ” , apresentado como o pai
dos gêmeos míticos ( Tamendonare e Aricute ) , também se confunde com O
mesmo personagem .
A esse herói civilizador atribuía- se, entre os Tupi de várias regiões da
América do Sul , uma série de ações e de ensinamentos de maior ou menor
importância para a vida tribal . Segundo Thevet, os Tupinambá diziam
ter aprendido dêle os conhecimentos sõbre o curso da lua e do sol , a cren
ca na imortalidade das almas, o conhecimento de frutos, árvores e plantas
boas ou más, venenosas ou medicinais, a prática de não comerem a carne
de certos animais vagarosos, para eles próprios não se tornarem lerdos e
pesadões, a cerimônia a que submetiam os recém - nascidos, a fim de torná
los guerreiros fortes e valentes. Ainda outros benefícios deviam - se ao
grande herói : a introdução da agricultura e das plantas cultiváveis, como
a mandioca e o milho , bem como as normas da organização social . Os
homens, porém , indignados com as metamorfoses a que os submetia usando
de seu poder mágico, resolveram afinal acabar com êle. Armaram três
fogueiras, mandando - o saltar sobre elas . Ao saltar sôbre a segunda, pe
gou fogo e foi consumido pelas chamas. Estalou - lhe a cabeça com gran
de estrondo, do qual se originou o trovão.
E quando os franceses aportaram na Guanabara, informa Thevet, os
Indios, vendo as coisas maravilhosas que os estrangeiros sabiam fazer,
viram nêles sucessores e descendentes de seu herói civilizador Maire - Atá,
Vaire -Monan ou Sumé.
Já no mais antigo documento em que se faz referência ao mito do
Sumé, aparece a indentificação dêste com o apóstolo São Tomé, confusão
provocada pela semelhança dos nomes, e repetida inúmeras vezes por cro
nistas e historiadores . O documento, a “ New Zeutung ausz presillandt” ,
folheto do primeiro quartel do século XVI , contém o seguinte trecho : “ Éles
têm também recordação de São Tomé. Quiseram mostrar aos portuguêses
as pegadas de São Tomé no interior do país. Indicam também que tem
cruzes pela terra a dentro. E quando falam de São Tomé, chamam - lhe o
Deus pequeno, mas que havia outro Deus maior. E ' bem crível que te
nham lembrança de São Tomé, pois é sabido que está corporalmente por
trás de Malaca ; jaz na Costa de Siramat, no Golfo de Ceilão. No país
chamam também, freqüentemente, seus filhos Tomé" ( 3') .
Está, pois, enganado o cônego Fernandes Pinheiro ( 4 ) , quando, em nota
à Crônica do P. Simão de Vasconcelos, considera forjada pelos jesuitas a
tradição de que o apóstolo São Tomé esteve na América, “ piedosa fraude
inventada com o manifesto fim de convencer aos indígenas que os novos

( 2 ) Paul Ehrenreich, Die Mythen und Legenden der Südamerikanis


ehen Urvölker und ihre Beziehungen zu denen Nordamerikas und der alten
Welt, pág. 41. Berlim 1905.
( 3 ) Clemente Brandenburger, A Nova Gazeta da Terra do Brasil,
págs. 37-38. São Paulo 1922.
( 4 ) Fernandes Pinheiro, em Simão de Vasconcelos, Crónica da Com
panhia de Jesus do Estado do Brasil , pág. 297. Rio de Janeiro 1864 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 35

tuissionários eram sucessores imediatos do grande apóstolo, a quem haviam


éles desconhecido e maltrado " . O erro do anotador da Crônica já foi, aliás,
apontado por Vale Cabral , que lembra também o fato de que os Tamoio
( ou Tupinambá ) do Rio de Janeiro, entre os quais Thevet encontrou o
mito do Sumé, não haviam sido visitadas ainda pelos jesuitas ( 5 ) . De
outro lado, afigura - se - nos evidente que os missionários jesuitas procuras
sem tirar da confusão do herói mítico com o santo cristão as vantagens
que dai decorriam para o trabalho da catequese.
Nas suas cartas, o P. Manuel da Nóbrega se refere várias vezes ao
mito do Sumé. Vale a pena reproduzir essas passagens, em que se men
cionam algumas particularidades especialmente interessantes que não apa
recem no relato de Thevet . Em 1549, escrevia omissionário : " Também
me contou pessoa fidedigna que as raízes de que cá faz pão, que S.
Tomé as deu , porque cá não tinham pão nenhum . E isto se sabe da fama
que anda entre eles, qui apatres corum nuntiaverunt eis. Estão daqui
perto umas pisadas figuradas em um rocha, que todos dizem ser suas .
Como tivermos mais vagar, havemo - las de ir ver " ( 6 ) . Em outra carta ,
do mesmo ano, informa : “ Tem notícia igualmente de São Tomé e de um
seu companheiro e mostram certos vestigios em uma rocha , que dizem ser
deles, e outros sinais em S. Vicente, que é no fim desta costa, Dêle con
tam que lhes dera os alinhamentos que ainda hoje usam, que são raízes
e ervas e com isso vivem bem ; não obstante dizem mal de seu compa
Theiro, e não sei porque, senão que, como soube, as flechas que contra
Ele atiravam voltavam sobre si e os matavam " ( 7 ) . E, finalmente, na
" Informação das Terras do Brasil ", que parece ser também de 1549 : Di
zem éles que São Tomé, a quem êles chamam Zomé, passou por aqui, e
isto lhes ficou por dito de seus passados e que suas pisadas estão sina
ladas junto de um rio ; as quais eu fui ver por mais certeza da verdade
e vi com os próprios olhos, quatro pisadas mui sinaladas com seus dedos,
as quais algumas vezes cobre o rio quando enche ; dizem também que
quando deixou estas pisadas ia fugindo dos indios, que o queriam flechar,
e chegando ali se lhe abrira o rio e passara por meio dêle a outra parte
sem se molhar, dali foi para a india. Assim mesmo contam que, quando
o queriam flechar os indios, as flechas se tornavam para eles, e os matos
lhe faziam caminho por onde passasse : outros contam isto por escárneo.
Dizem também que lhes prometeu que havia de tornar outra vez , a
Te-los" ( 8 ) .
Pertence antes ao domínio do folclore do que a mitologia a questão
das pegadas de São Tomé. Em todo o Brasil, como em outras terras, en
contram - se, em rochas e rochedos de toda espécie, sinais mais ou menos
parecidos com a impressão de pés humanos. Desde sempre, a imagina
ção popular se tem deleitado em estabelecer uma relação entre esses veg
tiglos e algum personagem mítico ou histórico. A julgar pelos relatos an
ligos, os indios já falavam em pegadas de Sumé, que em virtude da con
lusão estabelecida passaram logo a figurar como impressões de São Tomé.
Algumas, tão pequenas que mal correspondem ao pé duma criança , eram
apontadas como sendo de algum companheiro de Sumé ou, posterior

(5) Vale Cabral, em Manuel da Nóbrega, Cartas do Brasil, pág. 101.


Rio de Janeiro 1931.
( 6 ) Nóbrega , 0 . C., pág . 78.
( 7 ) Nobrega , o. C., pág. 91.
( 8 ) Nóbrega , o. C., págs. 101-102.
36 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIP
AL

mente, do Apóstolo cristão. Encontram - se também sinais atribuídos a


outros santos, como, p. ex., a São Luís. Coma já dissemos, essas tradi
ções não se limitam , porém, ao território do Brasil. Existem em todo o
mondo. Vejamos algumas delas, a título de comparação com a que se
refere ao Sumé. Colhêmo- las num antigo volume do Globus, onde Ri
chard Andree reuniu uma série de exemplos do fenômeno, a fim de mos
trar a sua universalidade ( 9 ) .
Na terra dos Mixes ( México ) , diziam os índios, surgira outrora um
homem de longas barbas, vindo do lado do Pacífico e ensinando uma
nova religião. Perseguido pelos homens, que não acreditavam em suas
palavras, refugiou - se no cume da montanha de Zempualtepec, onde desa
pareceu depois de deixar no solo a impressão de seus pés ( 10 ) ,
São muitas as pegadas de Buda. Destas, a mais conhecida é a Sri
pada, a sagrada impressão do pé de Buda no cume do pico de Adão, na
ilha de Ceilão. Nesse ponto, Buda teria pisado a terra pela última
vez antes de entrar no nirvana ( 11 ) .
Certa ocasião, em Damasco , Maomé quís descer de seu camelo, quando
lhe apareceu o arcanjo Gabriel, dizendo - lhe que não entraria no paraiso
celeste se entrasse no paraiso terreno ( Damasco ) . O profeta, que já pu
sera um pé no chão, tornou a montar no camelo, deixando, porém , o seu
rasto no solo pedregoso ( 12 ) .
E por aí a fora . Crenças semelhantes existiram na Grécia clássica,
entre os cristãos da Idade Média, entre os negros da África , etc.. Das tra
dições cristãs dessa categoria a mais importante é a que se refere à
impressão do pé direito de Jesus Cristo no alto do Monte das Oliveiras..
Segundo a crença , essa pegada marca o último ponto em que Cristo pisou
a terra, antes de subir para o céu .
Segundo os relatos antigos, os índios do nosso litoral teriam imagi
nado a Sumé como homem de cor branca e longas barbas. Entre os po
vos das antigas civilizações americanas, o herói civilizador era apresen
tado de maneira semelhante. Homem de longas barbas, usando comprida
veste branca, aparecera entre eles, vindo dos lados do oriente, ou mesmo
do ocidente, para , depois de cumprida a sua missão, tornar a desaparecer
no este ou no oeste com a promessa de voltar um dia . Os tipos mais
conhecidos são as figuras de Quetzalcouatl entre os mexicanos, de Gucu
matz e Itzamna entre os Maya, de Bochica e Nemterequeteba entre OS
Chibcha, de Pachacamac e Viracocha entre os Peruanos ( 13 ) .
Da mesma forma como no litoral brasileiro os franceses e os jesuitas
foram recebidos como descendentes ou emissários de Sumé, os índios me
xicanos receberam a Cortez como sendo Quetzalcouatl, cujo retorno se
esperava. De um modo geral, aborígenes sulamericanos viam nos eu
ropeus representantes de seu herói de cultura, que lhes vinham trazer
uma porção de objetos enviados por este ( 14 ) .

( 9 ) Richard Andree, “ Fusspuren " . Globus . Vo . XXX , pág . 207


Braunschweig 1876 .
( 10 ) Mühlenfordt, em R. Andree, o.
( 11 ) Schmarda, em R. Andree, 0.
( 11 ) Schmarda , em R. Andree, 0. c.
( 12 ) Palgrave , em R. Andree, O.
( 13 ) Ehrenreich , 0. C., pág . 41 ,
( 14 ) Ehrenreich , 0. C., pág . 58 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 37

Cma particularidade curiosa de que nos fala Nóbrega é a das flechas


lançadas ora contra o companheiro de Sumé, ora contra o próprio herói,
e que voltavam , matando aos que as haviam atirado. Embora o jesuita
se refira apenas a flechas, acreditamos tratar-se de " bumerang" ou de
alguma arma parecida. Certo, o bumerangi' ' , cujo emprego se limita
em geral a regiões desprovidas de densas florestas, não se enumera entre
as armas de guerra das tribos tupi- guarani do litoral. Entretanto, é
vem possível que os caraibas ou pagés o tenham usado em suas práticas.
E' , pelo menos, o que se pode depreender do seguinte trecho do P. Simão
de Vasconcelos: " Um troço de soldados portugueses, que tinha partido
em companhia de grande quantidade de indios a fazer guerra ao sertão,
viu com seus olhos, e depôs uniformemente o caso seguinte. Postos em
fronteira dos inimigos os nossos, entraram em dúvida, se se havia de aco
meter , ou não, porque estavam entrincheirados fortemente, e com melhor
partido de defensores. Eis que um dos indios, que por nós militavam , sai
a um terceiro fronteiro ao inimigo, e fixando na terra duas forquilhas,
amarrou fortemente sobre elas uma clava , ou maça de pau, que é sua
espada , e chamam tangapema, toda galanteada de penas de pássaros va
riadas em côres. Depois que teve amarrada a clava, convocou a muitos
dng seus para que dançassem , e cantassem ao redor dela : e acabadas suas
danças, e cantos, começou o mesmo feiticeiro a fazer as suas per si só,
ao redor da mesma maça , acrescentando a elas ridículas cerimônias,
momos e esgares. Feito isto, chegando - se à espada, ou maga , disse en
tre dentes certas palavras mal pronunciadas, e pior entendidas : e ditas
estas, soprando além delas três vezes sõbre a espada, de improviso ficou
exta xolta das ligaduras em que estava, saltou fora das forquilhas, e foi
voando pelos ares com assaz de admiração dos portugueses, que, desejo
10x de ver o fim , perseveravam em um lugar. Coisa espantosa ! Dalí a
pouco espaço de tempo, viram todos que tornava a vir a mesma espada
voando pelos ares, pelo mesmo caminho, e à vista de todos se tornava
* pôr no próprio lugar, e sobre as mesmas forquilhas : porém , com gran
de diversidade, porque vinha toda ensangüentada , e estilando sangue ,
qual se viera de grandes matanças. Ficaram confusos os portuguêses , po
rém o feiticeiro contente , e declarou - lhes o prognóstico a sinal certo de
* itória : acrescentando que podiam seguros acometer, porque haviam de
matar os contrários, e derramar dêles muito sangue. Ele o disse, e o su
resso o mostrou brevemente , porque mataram sobre quatro mil, e puse
ram em fuga inumeráveis " ( 15 ) .
Em todas as partes do mundo, verificou - se a existência do " bume
rang' ou de instrumentos mais ou menos parecidos com essa arma . А
mitologia germânica fala do “ martelo " de Wodan ou Thor, que voltava
A mão do deus que o arremessava. Uma arma de tipo semelhante aparece
em representações de caças do antigo Egito. Encontramo - la também
entre os Papua , que a usam na caça de avestruzes e cangurús, Na Amé
rica do Norte, os índios do Arizona e da Califórnia empregavam - na igual
miente na caça . Por séu turno, as flechas que “ voltavam sobre si" , de
que fala o P. Nóbrega quando se refere ao mito do Sumé, bem como
o trecho de Simão de Vasconcelos que acabamos de reproduzir, pare
rem - nos indicar que alguma arma do tipo do " bumerang " tenha existido
também de qualquer modo entre os Tupi da costa brasileira.

( 15 ) Simão de Vasconcelos, o. 1.a parte, pág. 73 .


38 REVISTA DO ARQUIVO INICIP !!

Para terminar, vejamos ainda um trecho da Viagem ao norte do Brasil,


do P. Ivo d'Evreux, capuchinho francês que esteve no Maranhão em prin
cípios do século XVII. O missionário reproduz as palavras de um indio
que lhe relatou o mito do herói civilizador da tribo : “ Nossos pais já por
tradição nos contaram que outrora veio aqui um grande Maratá de Tapan ,
isto é, Apóstlo de Deus, nas províncias onde residem , e lhes ensinou
muitas coisas de Deus : foi ele quem lhes mostrou a mandioca , as raízes
para fazer pão, porque antes só comiam nossos pais raízes de mato . Ven
do este Maratá , que nossos antepassados não faziam caso do que dizia,
resolveu deixá - los, mas antes quís dar- lhes um testemunho de sua vinda
aqui, esculpindo numa rocha uma espécie de mesa, imagens, letras, a for
ma de seus pés, e dos seus companheiros, as patas dos animais que tra
ziam , os furos dos cajados a que se arrimavam em viagem , o que feito
passaram o mar, procurando outra terra . Reconhecendo nossos pais a
falta , procuraram -no muito , porém nunca dele tiveram notícia , e
hoje ainda não veio visitar - nos algum Maratá de Tupan ' ( 16 ) .
Vê - se, pois, que o mito do Sumé se repetia de forma mais ou menos
semelhante entre as várias tribos tupi - guarani estabelecidas ao longo
de nosso litoral .
5
.

0 HEROI DAS SEXTAS-FEIRAS

Os autores que se ocupam com os problemas do folclore brasileiro


são unânimes em assinalar o sincretismo índio - africano - europeu de nos
sas tradições populares em muitos casos, mormente no que se refere às
tradições míticas, já não é possível distinguir quais os elementos devi
dos a cada uma das correntes étnicas que contribuíram na consittuição
do folclore atual. Não admira, por isso, o ter havido até hoje tão poucas
tentativas sérias para se descobrir o que há de realmente ameríndio nas
crenças, nos contos e nas lendas do Brasil .
O meio mais seguro de se conseguir alguma coisa nêsse sentido ,
sem dúvida , um estudo mais aprofundado das culturas tribais aqui en
contradas pelo colonizador europeu . Além disso, é, porém , conveniente
encarar as tradições folclóricas em suas relações com a fauna, a flora e
os acidentes da paisagem geográfica .
Assim , o elemento fundamental no mito do saci se nos apresenta
como genuinamente ameríndio , desde que 0 encaremos como personifica
ção da ave conhecida, ora pelo mesmo nome, ola como sem - fim , tempo
quente, cris - pim , fem - fem , matinta -perera , sêde - sede, séco - fica etc ..
figura da ave, do primitivo duende da mitologia tupi- guarani, perdeu - se
em grande parte das populações sertanejas . Hoje é encontrada de prefe
rência no Brasil meridional , sobretudo no Rio Grande do Sul, onde se
costuma imaginar o duende em forma de ave, do tamanho duma galinha ,
aproximadamente, e de uma única perna .
Em seu maravilhoso livro sobre A fisionomia do Brasil , infelizmente
ainda não traduzido para o português, Konrad Günther, arguto observador
( 16 ) Ivo d'Evreux, Viagem ao norte do Brasil . Tradução do Dr.
César Augusto Marques. Pág. 249 . Rio de Janeiro 1929 .
39
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

de nossa fauna e de outros aspectos da natureza brasileira , conta as


dificuldades que teve certa vez para descobrir um “ saci" ou " sem - fim " ,
cujos gritos ouvira durante muitos dias seguidos ( 1 ) . De fato, é muito
difícil localizar o " sem - fim " em seu ambiente natural. Seguindo - se - lhe
a voz, para procurá- lo, emudece logo ao sentir o perigo ; e uma vez
que o mimetismo da plumagem o protege muito bem , costuma ser perce
bido apenas no momento em que levanta vôo para fugir.
O seu grito monótono, ouvido horas a fio durante o dia, como em
noites luarentas e bochonais de inverno, pode muito bem ser interpre
tado como “ saci- saci” ou “ sem - fim , sem - fim " , como preferem os habi
tantes do norte. Em algumas colônias teutas do sul , explicam - no até
como " Siegfried , Siegfried " . A cada grito , erica- se a pequena poupa, como
se a atividade lhe exigisse um esforço extraordinário.
No Brasil , a família dos cuculídeos é representada por 16 espécies ,
entre as quais figura o saci ( Tapera naevia naevia ) . Existe não Sº
mente em todo território do Brasil, desde o extremo norte até os con
fins do Rio Grande do Sul , como ainda em outras terras sul-americanas.
Vive solitário, mas é, por assim dizer, senhor absoluto em seu dominio,
que abrange alguns quilômetros quadrados. Sente -se bem apenas em am
biente de máxima tranqüilidade, razão pela qual não é encontradiço na
proximidade das habitações humanas. Prefere os arredores das taperas e
og campos cobertos de mata rasteira e raquítica.
Vejamos uma ligeira descrição dessa ave : O comprimento total da
saci mede 28 cm . , cabendo 15 mm. ao bico. Como em todos os cuculídeos,
este é de feitio vigoroso e achatado lateralmente. Na raiz do bico, al
gumas sedas. No dorso, plumagem branco-acizentada com manchas escu
ras. O peito é de um branco sujo, enquanto a garganta e a barriga são
um pouco mais claras. Na cabeça, de côr castanha, distinguem - se estrias
pretas. Acima dos olhos, corre uma faixa branca, que se estende até
a nuca .
Da mesma forma como os cuculídeos da Europa , não se dá ao traba
lho de construir o seu ninhumo. Põe os ovos nos ninhos de outras aves ,
especialmente no do João Tenenenm .
A ligação entre o saci - ave e O saci - mito se estabelece precisamente
pela dificuldade acima referida, de se localizar a ave quando faz ouvir os
seus gritos. A esse respeito, informa Rodolfo von Ihering : " Na opinião
do povo, o saci tem pacto com o " coisa ruim ' e é fácil tirar a prova.
Vá um caçador acercar - se do sací que está cantando na capueira ; guiado
pela voz, o caçador aproxima- se da árvore onde deve estar pousada a
ave . Mas em lá chegando , percebe que se enganara e que o saci deve
se achar além , em outra moita ; lá também não o encontrará e, errando
sempre, não conseguirá descobrí - lo. A1 está o começo da meada : o saci
tem artes que só o curupira ou caipora lhe pode ter ensinado " ( 2 ) .
E ' bem possível que o “ macachêra ” , arrolado por Simão de Vascon
celos ( 9 ) entre os espíritos malignos dos primitivos indígenas e por ele
caracterizado como espírito dos caminhos, não seja outra coisa senão o
saci. Para Olavo Bilac, o saci é de fato o duende que faz os caçadores

( 1 ) Konrad Guenther, Das Antlitz. Brasiliens, Leipzig 1927 .


( 2 ) " O tupi na geografia nacional" . Boletim do Museu Nacional, vol.
XI, ns. 3-4 , págs. 57-70 ; Rio de Janeiro, set. - dez. de 1935 .
( 3 ) Crônica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil, 2. * edição .
Pág. 72. Rio de Janeiro, 1864 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

perderem - se na floresta. Entretanto , na Historia natural do Brasil de


Jorge Marcgrave ( 4 ) , o macachera, embora classificado igualmente entre
os espíritos maus, aparece como " divindade dos caminhos, guiando os
viajantes' .
Em vários relatos de etnografia ameríndia, a ave saci ou matinta
perera é ligada a concepções relativas as almas dos defuntos. Para os
· Tupinambá, o matinta - perera era mensageiro de parentes falecidos, e seus
gritos eram mensagens do Além (5 ) . Na crença dos Munduruků, e dos
Chririguano, as almas dos mortos se incarnam no matinta - perera para
caçarem sobre a terra ( 6 ) . Em comentário a um mito dos índios Tembé,
recolhido por Curt Nimuendaja , em que ocorre um espírito que grita
***tati " , Koch -Grünberg, dizendo tratar - se sem dúvida do “ saci" dos bra
sileiros ( segundo ele, Coracina sp. ) , acrescenta : “ Essa ave é sagrada
para várias tribos, porquanto julgam que recebe as almas dos defuntos "
( ? ) . Na religião dos Bororo, são principalmente as araras que exercem
a função de abrigos das almas.
A primitiva concepção do saci ameríndio como duende foi muito pouco
estudada quanto a sua natureza e a suas manifestações. Às vezes afir
'ma -se ser ele, ou serem eles, os sacis se é que podemos falar no plural
os filhos da Tatamanya , a qual, aliás, não lhes dispensa extraordinário
carinho e desvelo. Como habitação do jovem saci , antes de completar a
idade de sete anos, indicam - se os intermédios da taquara . Monteiro Lo
bato , em seu belo o saci, livro tão apreciado pelas crianças, escreve :
“ E' aqui dentro destes gomos que se geram e crescem os meus irmãos de
uma perna só, disse o saci. Quando chegam em idade de correr mundo ,
racham os gomos e pulam fora . Reparem quantos gomos rachados. De
cada um deles já saiu um saci" ( 8 ) . Mais adiante , fala o saci : “ A conta
da nossa vida dentro dos gomos é de sete anos. Depois saimos para viver
1.o mundo setenta e sete anos. Alcançando essa idade, viramos cogumelos
venenosos, ou orelhas -de- pau" ( 9 ) .
Aqui evidentemente já se infiltraram elementos do folclore europeu .
Mas originariamente talvez tenha havido alguma relação entre o duende
e o " bicho da taquara ” , nome que se dá às formas imaturas da mariposa
( Myelobia ) . Sobre o bicho da taquara escreve o Padre José de Anchieta
em sua conhecida Epistola quamplurimarum rerum naturallum , datada de
1560 : “ Nascem entre as taquaras certos bichos roliços e compridos, todos
brancos, da grossura de um dedo, aos quais os índios chamam raha, e
costumam comer assados e torrados. Há os em tão grande porção, indis
tintamente amontoados, que fazem com êles um guisado que em nada
difere da carne de porco estufada ; serve não só para molecer o couro,
taguaras, outros, porém, se transformam em lagartas, que rocam as er
nias também para comer - se. Destes insetos uns se tornam borboletas,
outros saem ratos, que constroem a sua habitação debaixo das mesmas
faquaras outros, porém , se transformam em lagartas que rocam as er

( 4 ) Tradução de Mons. Dr. José Procópio de Magalhães ; págs.


278-279 ; São Paulo 1942 .
( 5 ) Léry e Thevet, apud A. Métraux, La religion des Tupinamba et
wes rapports avec celle des antrex tribus Tupi - Guaraní, pág. 69 ; Paris 1928 .
( 6 ) Ibidem ,
( 7 ) Indlanermärchen ans Südamerika, pág. 327 ; Jena 1920 .
( 8 ) 6.a edição, pág. 34 ; São Paulo 1938.
( 9 ) Pág. 35 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 41

vas ' ' ( 10 ) . Não possuímos elementos para verificar a nossa hipótese de
que, em parte, a figura mítica do saci deve a sua caracterização a certas
pecullaridades do bicho da taquara. Em todo caso, é interessante confron
tar as frases de Monteiro Lobato acima citadas com a explicação do na
turalista a respeito daquelas " larvas de insetos, que se desenvolvem no
oco das taquaras'': “ Haverá várias espécies dessas lagartas, mas predo
mina entre elas a da mariposa Myelobia , cujos insetos adultos em certos
anos, à noite invadem as cidades aos milhões, traídos pela iluminação .
A larva da mariposa, logo ao sair do ovo, faz um minúsculo furo da
taquara e assim passa a habitar um internodio, cuja parede interna lhe
fornece também o alimento. Cresce então até 10 cms . de comprimento,
e, antes de tecer seu cásculo, rối uma janelinha' oval , deixando - a , porém ,
ainda fechada, isto é , não rompe a parede externa. Continuando, pois,
bem oculta, está , contudo, com a saida de tal forma preparada que mais
tarde, depois da fase de ninfa, e já transformada em mariposa e, portanto,
desprovida de maxilares, o inseto, quando quiser sair, sem mais trabalho,
empurra a porta com a cabeça." ( 11 ) .
Entre os habitantes da várias regiões do Brasil e das repúblicas do
sul , a figura do saci , do mesmo modo como a ave homônima, aparece sob
muitos nomes mais ou menos diferentes, como sapere, saterê, sererê, siriri ,
taperê, pererê, tapererê, mati - taperere , Matintaperera, Matim Pereira e
outros. Sob oʻ verbete " Matintaperera " informa Osvaldo Orico em seu
Vocabulario de crendices amazônicas ( 12 ) : " E ' a designação de pequena
coruja , que goza , entre os nativos, da faculdade de transformar -se em
gente e pintar o sete, brincando, ralhando, castigando os meninos vadios
e mal- criados. No interior, e até mesmo na Capital do Amazonas e Pará,
a gurizada acredita que a ave solerte ronda as casas pela calada da noite,
a fim de roubar os meninos travessos ou fazer estrepolias. Oferece - lhe, en
tão, grande quantidade de tabaco, convidando - a a aceitá - lo : “ Matintape
rera , podes vir buscar a encomendazinha " . Mau destino está reservado à
pessoa que, pela manhã seguinte, é a primeira a entrar na casa em que
se faz semelhante convite. Fica encaiporada para o resto da vida, é
como se virasse Mati . Todas essas crendices foram herdadas das supersti
ções indigenas e chegaram até nos pelo veículo dos pagés e curandeiros,
interessados em arranjar sempre maior número de motivos para as suas
artes misteriosas ".
A idéia mais comum que hoje em dia se costuma fazer do primitivo
duende silvestre inclui vários traços que revelam influência direta ou
indireta do elemento africano no Brasil. Aparece, nesta concepção, como
anãozinho de cor preta e de uma só perna ( como no caso da galinha) ,
o que não o impede de correr e pular com grande agilidade, e de virar
mesmo as mais extravagantes cambalhotas. O saci, nesse feitio, é de ordi
nário desprovido também de quaisquer órgãos anatômicos destinados à
evacuação e à micção. Além disso , enxerga muito mal , ou só de noite,
Tazão pela qual escolhe as horas noturnas para praticar suas diabruras.
Em tupi - guarani, a palavra “ saci" traduz “ vista doente ” . As insignias do

( 10 ) P. Joseph de Anchieta , Cartas informações , fragmentos histo


ricos e serrades . Pág. 121 . Rio de Janeiro 1933.
( 11 ) Rodolfo von Ihering, Dicionário dos Animais do Brasil, págs.
151-152 ; São Paulo 1940 .
( 13 ) Págs. 168-169 ; São Paulo 1937.
42 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

pequeno espírito são um gôrro vermelho e um cachimbo . O gorro corres


ponde mais ou menos à longa cabeleira de Sansão, porquanto sem
O saci não tem poder algum . Serve - lhe de ritmo o número sete : sorve
sete tragadas de fumaça do seu cachimbo, chega ao completo desenvolvi
mento aos sete anos, e assim por diante.
O seu temperamento é caracterizado geralmente como o dum garoto
arteiro que passa o tempo a inventar tôda sorte de peraltices e traqui
nagens. Ora espanta os cavalos no pasto , fazendo - os debandar; ora assus
ta as galinhas no poleiro, derrubando - as ao chão ; ora faz apodrecer os
OVOS, ou atormenta os porcos no chiqueiro, fazendo - os grunhir. Faz das
suas também no interior das habitações humanas. Extravia a tesoura ,
faz cair o dedal pela fresta do soalho, quebra a ponta da agulha , emara
nha a linha de coser, apaga luz, desarruma a cama, faz o leite coalhar
antes do tempo, faz cair môscas na sopa , e mil coisas dêsse gênero .
Além do saci de uma só perna, fala- se de outro, bípede e quase
antropomorfo ; neste caso , entretanto , tem uma ferida em cada joelho , ra
zão pela qual coxeia um pouco . A côr da pele não é preta, mas bronzeada
como a dos indios, Faltam - lhe os órgãos da evacuação e da micção .
vez do gôrro vermelho, possui longa cabeleira vermelha que lhe esvoara
desordenada em torno da cabeça, quando faz as suas piruetas.
Poder - se - ia ampliar em muito a idéia que acabamos de dar do saci.
Mas não era este 0 nosso objetivo. Contentamo - nos com êste , esboço,
porque as minudências turvariam , por certo , a clareza da imagem , Aos
que desejam aprofundar o estudo dessa curiosa figura mitológica reco
mendamos , em primeiro lugar, o excelente material recolhido , há uns
trinta anos, pelo jornal O Estado de S. Paulo num inquérito realizado
entre os seus leitores ( 13 ) . Os depoimentos que compõem esse volume
sobremodo interessante revelam numerosas feições que 0 duende toriou
entre as nossas populações sertanejas.
Ezequiel Freire retratou o saci - pererê nestes admiráveis versos :

" Das noites sem luar nas horas mortas ,


quando a lareira não tem mais gravetos ,
e é tudo escuridão pelas senzalas,
e só se escuta o ressonar dos prêtos ;
surge d'além das bandas da tapera,
cavalgando um corcel de taquari ,
0 pavoroso espectro das modornas ,
o herói das sextas-feiras o Saci .
Traja quimão de baetilha escura,
carapuça em funil, hirta e vermelha ;
guarda na dextra as rédeas da tabua
e a ponta de um cigarro atrás da orelha " .

Esse " herói das sextas- feiras " , uma das crendices mais comuns
nossas populações sertanejas, bem mereceria em vez das despreten
ciosas notas que lhe dedicamos um estudo folclórico aprofundado quan
to à proveniência dos motivos míticos que nele se exprimem , quanto as .
feições que assume nos diferentes cenários da paisagem física étnica
do Brasil, e quanto a suas ligações com outras crenças populares.

( 13 ) O saci - perere Resultado de um inquérito. São Paulo , S. d .

***
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8. LOBOS E LOBISOMENS

Quem examina o folclore das diferentes regiões da Europa verifica


com facilidade que en numerosas tradições e crenças populares dessa
parte do mundo cabe um lugar de destaque ao lobo, animal selvagem
conhecido e temido pela sua extraordinária rapacidade. O seu habitat, que
outrora se estendia por toda a Europa, limita - se hoje principalmente a
região oriental e as montanhas do oeste. Mas há também espécies de lobos
na Ásia e na América do Norte. Reunindo - se em grandes alcatéias, esses
animais constituem sério perigo para os rebanhos como para as popula 1
ções humanas ; não receiam penetrar , em aldeias e ' vilas, aparecendo mes
mo nos arredores das grandes cidades.
Os modos de vida peculiares ao lobo prestam - se muito bem para
sugerir as histórias horripilantes de todo gênero que dele se contam . De
índole esquiva e insidiosa, acoita - se de dia nas florestas cerradas e nos
desfiladeiros. Na Espanha , ensina Brehm , costuma esconder - se mesmo
em campos de cereais, e é provavelmente por motivos semelhantes que as
populações campesinas da Alemanha setentrional e central onde, aliás ,
é quase extinto o consideram como demônio - do- trigo. A última gavela
dum campo de trigo dá- se o nome de Wolf ( lobo ) . À tardinha sai do
seu esconderijo, para dedicar - se à rapinagem. De ordinário, vagueia pelos
campos sózinho ; quando aparecem em número de dois, trata - se geral
mente dum casal . Estando reunidos em alcatéias, os lobos empreendem
a caça em comum.
Sobremodo sanguinolento, o lobo agarra a prêsa pela goela , dilace
rando - a imediatamente. Não se contenta com saciar a fome, mas em geral
trucida tudo o que consegue agarrar. Em épocas de penúria, come até
escaravelhos, larvas e carniça.
Revela muita astúcia em suas batidas. Estando juntos vários lobos ,
dividem -se em dois grupos : um deles levanta a prêsa, enquanto o outro
lhe tolhe a fuga.
Muito constante na corrida, 0 lobo percorre de seis а dez milhas
numa única noite. Assim, aparece muitas vezes inesperadamente em re
giões em que dantes não havia indício dêle, e de onde torna a desapare
cer não menos inesperadamente .
Símbolo da voracidade e da sanguinolência, o lobo assume essa feição
também nas representações míticas e em outros elementos folclóricos.
Wodan , o principal dos deuses germânicos, é acompanhado de dois lobos ,
Geri e Frek. São eles que devoram todos Os alimentos oferecidos a
Wodan , pois que este vive apenas de Met ( espécie de hidromel ) .
Lobos míticos mencionam - se igualmente no Völuspa . No crepúsculo
dos deuses, um devora o sol e outro a lua . E ' nessa ocasião que tam
bém se liberta o Fenriswolf, andando de fauces escancaradas ; a queixada
superior toca o céu , e a inferior a terra, e se mais espaço houvera, mais
as abriria. O fogo arde - lhe nos olhos e nas ventas. Dirige - se à Wigri
debene, onde enfrenta a Wodan armado de ponto em branco. Depois de
terrivel luta, Wodan é devorado pelo lobo . A seguir, este é enfrentado
por Widar. Colocando - lhe o pé na queixada inferior, Widar agarra
com a mão a queixada superior e rebenta - lhe as fauces. Essa é a morte
do Fenriswolf .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL -

Semelhantes referências são numerosas nas tradições míticas do norte


da Europa.
Mas encontramo - las também entre os gregos e os romanos . Como
exemplo, mencionamos a Lykaon , rei da Arcadia, a quem Zeus castigou
por sua impiedade, transformando - o em lobo sanguinolento . O próprio
Zeus aparece na mitologia grega sob a forma de lobo. No mito romano ,
Romulo e Remo são amamentados por uma loba. E assim por diante.
Pelos séculos 10 e 11 da nossa era , compuseram-se na Europa as cha
madas epopéias de animais, em que também ocorre a figura do lobo com
o nome de Isegrimus, o que equivale a Eisenhelm , elnio de ferro , Foi
por volta do ano de 1170 que Heinrich dem Glichensäre, poeta alsaciano,
escreveu o Isengrines nôt, poesia que deu origem ao Reinecke Fuchs,
assunto épico explorado também por Goethe. O papel de verdugo que
nesse poema cabe ao lobo corresponde ao de estrangulador, que caracte
riza o lobisomem.
Entre os nomes próprios do Edda são muitos os que se referem ao
lobo. Vejamos apenas alguns exemplos : Wölbschelf, Wölfinge,
Windwolf, Weltwolfsfisch, Hildewolf, Fenriswolf, Wolfee, Wolfstein ( 1 ) .
Katharina Dorothea Viehmann, a velha que narrou tantos contos aos
irmãos Grimm , contou - lhes também a história do Chapéuzinho Vermelho ,
em que aparece a figura do lobo. Incluida no rol dos contos infantis ,
essa história está hoje traduzida em todos os idiomas do mundo civi
lizado .
A feição principal assumida pelo lobo nas tradições folclóricas é , po
rém , a do licantropo ou lobisomem, i. é, de um indivíduo humano que em
certas ocasiões se transforma em lobo. A crença nessa figura, ou em
seres a ela correspondentes, não é privativa das culturas européias, mas
constitui uma das ocorrências mais freqüentes do folclore universal. En
contramo- la nas civilizações antigas e modernas, como em numerosas
culturas primtivas de diferentes partes do mundo .
Além disso, a idéia do lobisomem tem sido elaborada, repetidamente,
como tema literário. Assim , Willibald Alexis compôs o romance histórico
“ Der Wärwolf ” . Hermann Löns é autor de outro romance histórico, “Der
Wehrwolf ” , cujo título é também inspirado na crença no lobisomem, se
bem que 0 enrêdo não tenha relação alguma com idéias licantrópicas .
Num romance de Luise Westkirch, “ Der Werwolf ” , a tradição do lobiso
mem constitui o tema central do enredo.
Vejamos primeiro, de maneira sumária , os traços gerais com que a
crença do lobisomem Werwolf em alemão, e were- wolf em inglês,
Varulf em dinamarquês ; de wer var, homem , e wolf, ulf, lobo se apre
senta nas populações européias em geral, mas sobretudo no folclore ger
manico . Cumpre, porém , frisar que há variações regionais por vezes con
sideráveis.
Lobisomens são indivíduos que de algum modo empenharam a alma
ao diabo, não podendo, por isso , em toda a sua vida, recuperar a liber
dade. Às vezes, olicantropo toma figura humana e rosto também hu
mano pelo espaço de alguns dias, mas, afora êsses intervalos, está con

( 1 ) Ainda hoje em dia são comuns na Alemanha e em outras regiões


numerosos nomes próprios relacionados com o lobo : Wolf, Wolfdietrich ,
Wolfgang , Wolfhagen , Wolfram , Beowulf , Isegrim etc. Nos paises escaa
dinavos ocorrem Ulv , Uif, Ulfila .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 45

denado a viver como lobo na tloresta e a praticar atos peculiares aos


lobos. Fica sob as ordens de seu infernal mestre, e é esto quem determi
na o namero de vítimas humanas que lhe cabe fazer. Ele então os es
trangula , mesmo que sejam seus parentes ou outras pessoas queridas. Ha
até lobisomens que em sua voracidade comem os próprios filhos. Pois
esta é a sina medonha do lobisomem : mal o diabo o veste com a pele de
lobo, ele se torna lobo em seu coração, e não pode pensar o que não seja
norte, nem alegrar - se com outra coisa do que sangue. Estrangula e mata
sem parar, pois somente assim consegue diminuir um pouco a avidez e o
fogo que lhe ardem nas entranhas.
Lobisomens podem ser velhos e moços, homens e mulheres. Nos in
tervalos em que assumem forma humana, não se distinguem de outra
gente . São geralmente pessoas consideradas, e bem sucedidas em todos
os empreendimentos. E ' que o demônio ajuda neste mundo aos que no
outro lhe pertencem . As crianças inocentes e as pessoas nascidas numa
sexta - feira atribui-se às vezes a faculdade de reconhecerem o licantropo
pelo brilho peculiar dos olhos. Pois estes são a única coisa que não muda
quando o lobisomem vira gente.
O lobisomem não pode morrer sob um teto cristão. Precisa de morrer
à beira da estrada , e sempre com figura humana, mesmo que a ferida
fatal lhe seja aplicada enquanto lobo. No homem , o ferimento aparece
então no mesmo ponto em que o lobo foi atingido. Ainda depois da
morte pode agir, atuando então como fantasma - licantropo. Para que tal
não aconteça , deve -se decepar- lhe a cabeça antes de enterrá- lo.
A crença do lobisomem muitas vezes se confunde com a de outras fi
guras . Um exemplo : Segundo antigas tradições registadas entre a po
pulação de Dantzig ( 2 ), é preciso queimar o cadaver do lobisomem, em
vez de sepultá- lo. Se fosse enterrado, acordaria dentro de poucos dias
devorando a carne das próprias mãos e dos próprios pés, à meia- noite,
satria da sepultura, assaltando os rebanhos e entrando nas habitações para
sugar o sangue dos seres humanos. • Aqui , portanto, as idéias licantrópicas
fundiram com crenças relativas ao vampiro, o que se observa, aliás, em
muitas regiões da Europa, sobretudo entre os povos eslavos. Em sérvio ,
lobisomem se traduz vukodlak ( pele de lobo ) , palavra que significa também
vampiro . Com as duas acepções a um tempo , encontra - se a mesma palavra,
modificada de acordo com as peculiaridades idiomáticas, nas seguintes lín .
guas : polonês, boêmio, bulgaro, eslovaco, russo - branco, dálmata e grego
( 3 ) . Ao lado das correspondências que possa haver entre vampiros e lo
bisomens como sejam sanguinolência e hostilidade em relação aos homens,
poderes sobrenaturais e atividade noturna ha todavia uma diferença fun .
damental: a de que o lobisomem é um homem ainda vivo , mas de figura
transformada, enquanto o vampiro é um homem falecido, que retorna a
forma humana ( 4 ) .
Não parece haver dúvida de que, pelo menos em seus elementos essen
ciais as representações licantrópicas existentes entre as populações sertane .

( 2 ) Ernst Havekost, Die Vampirsage in England, pág. 319 . ( O autor


cita os trabalhos de Hertz e de Karl . ) Halle 1914.
( 3 ) Ernst Havekost, o . C., ibidem .
( 4) W. Hertz, Der Werwolf ; pág. 129 . Stuttgart 1862. Citado por
E. Havekost, 0. C. pag . 40 .
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jas de todas as regiões do Brasil remontam a antigas fontes ibéricas, de


onde certamente vieram já nos primórdios da colonização .
Entre os moradores das imediações de Cuiabá, Karl von den Steinen
teve oportunidade de recolher alguns dados relativos ao lobisomem . Cor
respondem , em suas linhas gerais, aos informes posteriormente registados
em outros territórios , do Brasil. São os seguintes :
“ Das pessoas anêmicas admite - se freqüentemente que, na noite de sexta
feira, vão ao cemitério para desenterrar e comer defuntos. Transformam
se em “ lobisomem " . Este tem a aparência dum grande cachorro, com as
pernas traseiras muito mais compridas que as dianteiras ( como quem apoia
a cabeça nos cotovelos ) dobradas para cima, na direção das orelhas. Há
lobisomens prêtos, amarelos, conforme a côr do homem. Se uma mulher
dá à luz sete filhos homens, o primeiro ou o último se transforma em lo
bisomem . Ele mesmo não tem culpa disso, é o seu fado . Come imundicias
em riachos e canais, voltando a forma humana para tornar a vomitá-las ;
daí o aspecto livido e descorado.
Certa vez, um homem , suspeitando de outro que fosse lobisomem, con
vidou - o a tomar um trago : " quer matar um bicho ?" Estando com ele a
sós, coçou - o subitamente atrás das orelhas, como se faz com os cachorros.
outro ficou furioso e saiu correndo ; fôra, pois, reconhecido.
Desencanta - se o lobisomem : primeiro, por meio duma facada, que para
ser eficaz, precisa provocar a perda de uma gota de sangue apenas ; segundo ,
por meio dum golpe desferido com uma lasca de bambú ou uma faca ( não
se deve empregar o facão ) ; terceiro, com auxílio duma pedrada. O desencan
tado torna-se, porém , inimigo fidagal de seu libertador ; procura matá - lo ,
prometendo - lhe, ao mesmo tempo, muito dinheiro, em recompensa do be
nefício " ( 5 ) .
No Brasil , a propensão para transformar - se em lobisomem é atribuida
geralmente as pessoas pálidas e amareladas ( 6 ) . Trata- se muitas vezes,
como já observou João Ribeiro ( 7 ) , de vítimas do amarelão, esgotadas de
anemia. Lobisomem é também, como acabamos de ver, o primeiro ou o
sétimo filho masculino do mesmo casal.
No folclore sertanejo , nem sempre o fado do lobisomem se apresenta
como destino fatal e inelutável. Senão, vejamos : “ Como se pode evitar a
fatalidade legendária que vem pesando sôbre o sétimo filho dos casais , ha
mais de século ? Simplesmente pela escolha do irmão mais velho para pa
drinho de batismo, devendo ser efetuado antes da primeira Quaresma, após
o nascimento ou imediatamente ao nascer, se o condenado vier à luz no
decurso desta " ( 8 ) ,

( 5 ) Karl von den Steinen, Unter den Naturvölkern Zentral- Brasiliens ,


pág . 556 . Berlim 1894 . Tradução portuguesa de Egon Schaden : Entre
os aborígenes do Brasil Central, págs. 706-707. São Paulo 1940.
( 6 ) No sertão cearense, Gustavo Barroso ouviu a seguinte versão :
“ Todo sujeito amarelo vira lobisomem. Nas noites de quinta para sexta
feira veste a roupa pelo avesso, espoja - se muito tempo no espojadouro dos
burros e cavalos, por sobre o estrume, e depois sai a correr, com grandes
orelhas esvoacantes, roncando. Triste de quem o encontrar ! Não há
cacête que lhe faça mossa, nem bala que lhe romp o couro ; só se pode
lutar com ele com uma faquinha curta e dura. " Gustavo Barroso , Temn
de sol, pág. 264 . Rio de Janeiro 1912.
( 7 ) João Ribeiro, O folk -lore, pág. 37 . Rio de Janeiro ( 1919.
( 8 ) 1. G. Americano Brasil, Lendas e encantamentos do sertão , pág .
São Paulo S. a .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 47

Como vimos atrás, no trecho citado de von den Steinen, há também


várias maneiras de se quebrar o encantamento. Dados semelhantes regis
laram - se em outras partes do Brasil.
E ' somente em determinados casos que o destino desses infelizes assu
me feições desesperadoras : “ Se acaso qualquer pessoa deparar os trajes do
fantasma e voltá- los as direitas, então, ai do infeliz, que está irremedia
velmente condenado a ser eterno lobisomem. Não há possibilidade mais,
aestas condições, de volver a forma humana " ( 9 ) .
Como a própria crença do lobisomem, encontram - se em tôda parte
dentro e fora do Brasil histórias fantásticas e horripilantes relativas a
essa figura medonha . Contentamo -nos com alguns exemplos.
No sertão do Ceará conta - se a seguinte história :
" Havia em certa ribeira uma mulher casada com um homem opilado ,
comedor de barro. Diziam à bôca pequena que ele era lobisomem, mas
cia de nada sabia. Uma feita, iam os dois de viagem, a plé. Era noite e
noite de quinta para sexta-feira! Numa várzea deserta, o marido pediu a
mulher que se sentasse num tronco, esperando - o , porque ia a certa distân
cia, satisfazer uma necessidade qualquer.
Tinha- lhe dado o " fado ! " . Ela ficou sem desconfiança . Dal a pouco
saiu do arvoredo um lobisomem horrível, rangendo os dentes, uivando, que
avançou furiosamente contra a pobre. Ela mais que depressa trepou numa
árvore. O monstro, entretanto, conseguiu segurar- lhe o chale de la ver
melha, despedaçando - o com as garras e os dentes. Depois, ao raiar da
nanhā, fugiu , bufando. Ela desceu da árvore e já o dia ia claro e alegre
quando o marido tornou , inventando desculpas, para justificar sua prolon
gada ausência. Contou -lhe a assombração e ele atribuíu tudo ao medo de
estar sozinha. Ao chegarem à casa, mais tarde, ele deitou - se fatigado e
ferrou no sono. Passando junto da sua rede, a esposa olhou - o e, com o
maior espanto, viu - lhe na boca aberta, entre os dentes, os fiapos verme
Thos do seu chale..." ( 10 )
No folclore chinês, que é rico em elementos desse gênero, encontra- se
uma história bem parecida com a precendente :
"No ano de 765, no distrito de Tcheng- Ping, do Kiangtcheu, um velho
camponês foi atingido duma moléstia que durou vários meses. Depois de
curar - se, ficou dez dias sem comer e uma noite desapareceu de casa, sem
que se soubesse para onde fora . Uma tarde, um aldeão, indo cortar lenha
na montanha, foi atacado por um grande lobo. Trepou apressado numa ár
vore, que não era muito alta. O lobo, pondo - se de pé sobre as patas trasei
ras, segurou com os dentes a calça do homem , que lhe deu uma machadada
na cabeça . Apesar de ferido, o bicho ficou deitado ao pé da árvore até o
nascer do sol, quando foi embora. Então, o nosso lenhador seguiu - lhe a pis
ta , verificando que ela terminava na porta da casa do velho camponês já ci
tado . Chamou os filhos do velho e contou - lhes o fato. Eles examinaram
o pai e encontraram na sua testa a marca da machadada e nos seus dentes
08 fiapos da calgan

( 9 ) I. G. Americano Brasil, Lendas e encantamentos do sertão, pag. 18.


São Paulo 8. d.
( 10 ) Gustavo Barroso , O sertio e o mundo , págs. 59-60 . Rio de Ja
Deiro 1923.
48 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

E mataram - no, a fim de que não atacasse mais ninguém,


Depois de morto, o velho transformou - se num lobo terrível. Os filhos
e o lenhador contaram o caso ao mandarim , que os absolveu do nomi
cidio " ( 11 ) .
Em sua afamada conferência sobre " O Diabo " , Olavo Bilac reproduz
uma velha lenda francesa relativa ao lobisomem e colhida em Michelet :
“ Certa noite, um caçador atirou sobre um lobo. Não o matou, mas
cortou -lhe com o tiro uma pata. O caçador levou consigo essa pata , e
foi hospedar- se num castelo vizinho.
Então, que tal a caçada ? perguntou o castelão.
Số cacei uma pata de lobo ! disse ele, gracejando .
E quando ia mostrar ao castelão o troféu da sua caçada , viram os dois
com espanto que o que ali havia era uma mão, uma mão de mulher , em
um dos dedos da qual o castelão encontrou o anel de sua própria esposa ...
Foi chamada a castelã : apareceu, pálida, e escondendo o braço. Esse
braço não tinha mão, a mão, arrancada di loba, adaptava - se perfeitamente
ao punho decepado ... A castelã confessou então que todas as noites, dis
farçada em loba, ia encontrar o Diabo na floresta , e foi queimada
viva " (12)
Como atrás observamos, há, em várias regiões do mundo, tradições
mais ou menos análogas às idéias licantrópicas. A título de exemplo, lem
bramos a do “ were - leopard ” , ie, do homem-leopardo, registada em terras
africanas. A esse respeito, deu-se um fato curioso há poucos anos. ( 13 )
Em suas colonias, o governo inglês trata de reprimir as superstiçoes
dos aborígenes somente quando estas se tornam diretamente prejudiciais
à coletividade. Tal foi o caso a que nos referimos. A uma aldeia da
Nigéria foi enviado, no ano de 1936, um funcionário inglês incumbido de
abrir sindicância acêrca de tríplice assassínio cometido por toda a comu
nidade em três membros da própria aldeia. Logo que a autoridade Co
municou o objetivo da visita , foi procurada pelo habitante mais velho, que :
era ao mesmo tempo chefe do culto religioso, e por mais dois anciãos con
ceituados na localidade. Vestiam grossos mantos de capim trançado, in
dumentária com que costumam resguardar - se das chuvas. Longe de nega
rem a autoria dos assassinios, vangloriavam - se da façanha de terem li
quidado três perigosos " homens- leopardos ”. Diziam que, em noites escu
ras, aqueles três individuos, virando homens - leopardos, havlam roubado
não somente ovelhas e cabras, mas até crianças de pouca idade, " para
matar a fome" . A comunidade toda, em solene assembléia noturna , iden- .
tificara os três infelizes como homens - leopardos, resolvendo matá-los .
Dirigindo - se às cabanas das vítimas, arrastaram - nas para fora, enforcan ..
do -as numa árvore. O funcionário inglês não logrou convencer os assas
sinos da imoralidade de seu procedimento. No fim da sessão judicial, re
correram à seguinte justificação : Se não os tivéssemos liquidado, eles nos

( 11 ) Léon Wieger, Folk - Lore chinois , apud Gustavo Barroso , O xer


tão e o mundo, cit. págs. 60-61 .

( 12 ) Olavo Bilac, Conferências literárias ( 2.1 edição ) , págs . 146-747 .


Rio de Janeiro 1930.
( 13 ) Colhemo - lo no resumo dum relatório oficial de 1936 , reproduzirlo
no jornal Der Kompass, de Curitiba, em 9-6-1936 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

teriam morto a nós todos, e neste caso o digno governo não poderia re
ceber os impostos que lhe devemos pagar.
Do ponto de vista psicológico, parece - nos indiscutível que as idéias li
cantrópicas se fundam , pelo menos em inúmeros casos, em conceções dua- ,
listas ou pluralistas da alma humana ( 14 ) .
A esse respeito, conviria estudar detidamente as formas de animismo
observadas entre os povos primitivos. Se bem que, p. ex., entre os abo
rígenes do Brasil não se tenham registado muitas crenças rigorosamente
correspondentes à tradição do lobisomem ( 15 ) , não há dúvida de que o
conceito da alma humana, tal qual o encontramos em numerosas tribos,
não está longe de sugerir alguma analogia com idéias licantrópicas.
Dentre os casos mais típicos, e por certo mais significativos , está o
dos Apapokuva -Guarant, horda indigena estudada, há mais de trinta anos ,
por Curt Nimuendaju ( 16 ) . Acreditam esses índios que a alma humana se
compõe de dois elementos distintos, o ayvukué e o acyiguá . Ao primeiro
dêsses elementos, com que o homem vem ao mundo , atribuem - se as ma
nifestações brandas e pacíficas do indivíduo, enquanto o segundo que se
associa ao ayvukué pouco após o nascimento é a alma de um determi
nado animal, e responsável pelas manifestações violentas e más. Em
outras palavras, todo indivíduo é ao mesmo tempo homem e animal. Αο
passo que o nyvukué é sempre bom , não se pode afirmar que o acyiguá
seja necessàriamente máu , porquanto pode ser a alma dum animal de
Indole pacífica , como, por exemplo , uma borboleta . Se o acyiguá é a
alma dum animal feroz, ele se torna anguéry (fantasma ) perigoso depois
da morte do indivíduo ( 17 ) .
E ' conhecida também a crença dos Bororo , que se julgam simulta
neamente homens e araras vermelhas ( 18 ) .
Os Kaingang, por sua vez, se consideram verdadeiros parentes das
cnças, chegando mesmo, como observa Nimuendaju , a apresentar pertur
bações mentais, alucinações em que o indivíduo, julgando - se amado pela
" filha do senhor das onças ” , abandona os parentes e compenheiros, desa
parecendo na solidão da mata virgem ( 19 ) . Este fenômeno assemelha - se
muito a uma doença mental também chamada licantropia, e na qual o

( 14 ) Edward B. Tylor era de opinião que as representações licantro


picas se explicavam pela crença de que as almas de homens maus deixam
durante a noite, os corpos humanos, entrando em corpos de animais sel
vagens, com o fim de trucidar os companheiros. Veja- se, por exemplo, E.
B. Tylor, Anthropology, vol . II. pag . 97 , Londres 1937 .
( 15 ) No Dicionário kainjgang -português” ( Separata da Revista do
Museu Paulista , tomo XII, São Paulo 1920 ) , do missionário capuchinho Frei
Mansueto Barcatta de Val - Floriana , encontra - se a expressão kaingang
ningréin buðngh ( orelha grande ) como " nome de um ser supersticioso " ,
equivalente ao lobisomem . ( págs. 148 e 265 ). Infelizmente o autor se
contenta com essa indicação demasiado imprecisa .
( 16 ) Curt Nimuendaju Unkel, " Die Sagen von der Erschaffung und
Vernichtung der Welt als Grudlagen der Religion der Apapocúva -Guarani" .
Zietsehrift für Ethnologie , vol. 46. , págs. 284-403, Berlim 1914.
( 17 ) C. Nimuendaju, 0. C., págs . 305 , 370 et passim,
( 18 ) Karl von den Steinen, O. e . , pág. 511.
( 19 ) " C. Nimuendaju , o. e ., pág. 371 .
REVISTA DO ARQUIVO JUNICIPAL

enfermo se crê transformado em lobo . Há também doentes que se julgam


metamorfoseados em galinhas, tigres, cobras etc.
Para melhor compreensão da crença no lobisomem, e em outras meta
morfoses, convém lembrar ainda como, aliás, tam blém já o fez Nimuen
daju ( 20 ) a facilidade com que, nas lendas indigenas, os homens se
transformam em animais, e vice - versa .
Finalmente, um exemplo interessante relativo aos indios Kobéua, tribo
tukano do Brasil norte -ocidental. Conta Koch -Grünberg, que, na opinião
dêsses selvícolas, os pagés da tribo, quando ficam velhos e alquebrados, se
' transformam em onças. De vez em quando , embrenham - se na mata, onde,
' tomando a forma de onças, trucidam e devoram animais como também
homens. Segundo as palavras de um informante, o pagé " guarda a pele
de onça acima de sua rede, sob as ripas do telhado " . E quando morre
um pagé, “ enterra - se com ele a sua' pele de onça " , ao passo que a sua
alma fica vagueando pela floresta, como " onca muito ruim ” ( 21 ) . Na
maior parte dos idiomas betoya ou tukano, emprega-se a mesma denomi
nação para dizer onça e pagé ( 22 ) . Crenças mais ou menos " licantrópicas " ,
ou melhor, zoantrópicas, com relação aos médicos - feiticeiros foram regis
tadas em grande número de tribos indígenas da América do Sul ( 23 ) .

***

A LARA E A LORELEY

E ' notório o fato de que, apesar das grandes distancias que separam os
continentes, se encontram, em quase todas as tribos ameríndias, mitos e
lendas que, em suas linhas principais, correspondem com as do Velho
Mundo. $6 em pouquíssimos casos essa correspondência remonta a ele
mentos do folclore europeu , espalhados, desde os tempos do descobrimento
e da conquista, entre os indios da América , ao contato dêstes com coloni
zadores, aventureiros e missionários. A grande maioria dos mitos regis
tados entre os ameríndios, por maiores que sejam as suas semelhanças
com lendas européias, fazem parte integrante do primitivo patrimônio
cultural das tribos indígenas .
Como exemplo de uma lenda espalhada entre os mais diferentes povos
do mundo, pode- se mencionar o mito conhecido no Brasil pelos nomes de
Mãe d'água ou Iara ( Uiara, Oiara etc. ) e aproveitado por vários escritores
nossos para a composição de belas produções literárias em prosa e verso.

( 20 ) Ibidem .
( 21 ) Theodor Koch -Grünberg, Zwei Jahre unter den Indianern , vol .
II, pág. 155 . Berlim 1910 .
( 22 ) Ibidem .
( 23 ) Veja - se, por exemplo , Theodor Koch -Grünberg. Vom Rorolma rum
Orinoco , vol. III, pág. 200 , Stuttgart 1923 , e Rafael Karsten, The Civilisation
of the South American Indians, págs. 267 ss. , Londres e Nova York 1926 .
Karsten reuniu abundante material sobre concepções ameríndias de espí.
ritos animais e, particularmente, sõbre idéias relativas ao "man - tiger"
entre indios sulamericanos .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 51

Dos mais conhecidos é o trabalho de Afonso Arinos, pautado pela versão


amazônica de Manáus ( 1 ) .
Cassiano Ricardo, um dos nossos grandes poetas modernistas, cantou &
lara nos seguintes versos :

E havia
no país das palmeiras,
que era todo um rumor
de água clara
e de alegria matinal,
uma estranha mulher, muito linda ,
muito clara,
como ainda não houve no mundo
outra igual:
cabelos verdes, olhos amarelos:
Chamava - se Uiara ( 2 ) .

A lara dos nossos ' Indios e cablocos amazônicos corresponde, em suas


linhas gerais, & Loreley do Reno. Esta se tornou popular pela poesia que
The dedicou Heinrich Heine e de que possuimos belíssima tradução por
tuguêsa, de autoria do mestre João Ribeiro.
Para melhor compreensão da similitude existente entre a lenda da Lo
reley e a da Iara, é de utilidade fazer um cotejo dos ambientes geogra
ficos a que se ligam as duas tradições .
Entre São Goar e Oberwesel, o Reno se estreita a ponto de formar
um canal de apenas 115m . de largura, limitado, nas duas margens, por ro
chedos ingremes . E' nesse trecho que se encontra a Loreley, imponente
penhasco de contornos irregulares, que se eleva a 1312m acima das águas
do rio . Desde tempos imemoriais, contam-se várias lendas e tradições
ligadas a esse lugar, onde, além de outras coisas, se teria dado o afun
damento do “ Nibelungenhort " .
E' possível que em tempos imemoráveis as águas do Reno al tenham
devorado grande número de vítimas, o que explicaria a localização da fi
gura mitica nesse ponto. Considerando -se, ainda, o fato de que nas
imediações do penhasco o rio se estreita entre dois precipicios rochosos,
onde cada palavra dita em voz alta ressoa em maravilhosos ecos de várias
sílabas, compreende -se perfeitamente que o lugar em apreço constituía ótimo
ambiente para a formação da lenda.
Condições semelhantes observam - se também no Rio Amazonas. Esse
rio, cujo leito corta 3828 quilómetros de territorio brasileiro numa lar
gura de vários quilómetros, reduzindo-se a 1.600 metros em um ponto
apenas, nas proximidades de Óbidos, com as suas enormes enchentes
anuais de janeiro a junho, desarraigando florestas inteiras, naturalmente
devia insuflar receio e incutir pavor aos aborígenes que navegavam em
suas águas com as mais primitivas embarcações. Quantas ubás ou igaras
não terão desaparecido com a respectiva tripulação na voragem das
águas, fornecendo, com o seu trágico destino, os fundamentos para
a fromação do mito ? Em substituição ao eco, a que audimos em relação

( 1 ) Lendas e tradições brasileiras. 2.. edição. Págs. 56-60. Rio de


Janeiro 19317 .
(2) Martim Cerert . 6. ° edição. Pág . 27. São Paulo 1938 .
52 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ao Reno e que falta no ambiente amazônico, temos aqui a pororoca, que,


em certas épocas do ano, sobe por sobre as águas do rio- mar, em forma
de onda violentissima, arrastando consigo tudo que se põe a sua investida .
Comparando - se a tradição brasileira da Iara com a lenda germânica
da Loreley, tem - se, num e noutro caso, uma jovem bela e graciosa que,
com os seus encantos aqui os lábios sedutores oferecidos para o beijo,
ali a cabeleira dourada faz perecer o jovem barqueiro no fundo das
águas. Diferem as duas tradições no seguinte aspecto : ao passo que a
figura da Loreley aparece ligada a um determinado lugar geográfico , a
da Iara pode aparecer em qualquer ponto do Rio Amazonas e mesmo de
seus afluentes e igarapés. Melo Morais Filho, em sua poesia “ O palácio da
Mãe d'Agua " é um dos poucos autores que fixam a Iara a um lugar, deter
minado : " as margens do Portel " . O índio não a vê nalgum rochedo imóvel ;
para ele, a traiçoeira personagem pode surgir em todos os pontos em que
se , avista o bộto branco ( Inía geoffroyensis ) . O boto branco é um delfim
que alcança comprimento superior a dois metros e um peso de mais de
cem quilogramas ; a sua côr é ardosia na parte superior, enquanto a barri
ga é branca. Na Língua Geral, segundo ensina Gonçalves Dias, bộto se
traduz " pirá uiara " ( 3 ) .
Há também os que imaginam a lara em forma de mancebo dotado de
todos os encantos capazes de seduzir qualquer donzela . Essa duplicidade
da figura mítica é favorecida pelo próprio idioma tupi- guarani, que, desco
rhecendo o gênero gramatical, não distingue entre o Iara e a Iara.
Iara como personagem masculino vive às margens do rio Amazonas ,
onde possui luxuoso e resplendente palácio debaixo das águas. Segundo
a crença popular, uma cunhatã que se encontre ajoelhada às margens do
rio a lavar, que se esteja banhando nas águas cristalinas da corrente,
ou que, debruçada sõbre o espelho do rio , contemple vaidosa a sua própria
imagem , está em perigo de ser agarrada pelo jovem misterioso , que
conduzirá ao seu palácio. Nas noites luarentas, ao que se conta, quando os
reflexos luminosos dançam sobre a superfície rendilhada das águas, pode
se ouvir uma música suave e os passos rítmicos das danças executadas no
fundo do rio. E ' nessas noites que o jovem realiza as núpcias com a sua
vítima, que acaba perdendo a vida.
Foi Raimundo de Morais , um dos grandes apaixonados da Amazônia ,
quem nos deixou a mais conhecida versão da crença no Iara masculino ( 4 ) ..
Nessa variante, como se percebe desde as primeiras palavras, a lenda já
tomou feição bem moderna, tendo se sacrificado a primitiva simplicidade
das formas, tão característica do mito ameríndio . O lara, que seduz a
pobre cunhată, aparece al como " monstro, que, transformado num jovem
príncipe de espada à cinta, pluma no chapéu - gola dos Médicis, punhos de :
renda , dedilha o bandolim sentado num tronco da ribanceira " . Assim mes
mo, são bem evidentes os traços ameríndios do mito, pois a rapariga se
duzida pelo lara , depois de passar a noite nos braços do mancebo, desco
bre “ com espanto, que os pés de seu amante apresentam os calcanhares.
voltados para a frente. Percebe ter sido vítima do demônio das águas, e.

( 3 ) “ Vocabulário da língua geral usada hoje em dia no Alto Amazo


nas " . Rev , do Inst. Hist. e Geogr . do Brasil, 3. série, n ° 16 , pág . 540 ;
4 • trimestre de 1854 .
( 4 ) Na planicie amazônica ( 3. edição ) , págs . 81-82 . Rio de Janeiro ,
S. d .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 53

aterrada, num lampêjo fugindo da memória, recapitula os prudentes conse


Thos maternos. Ao gritar espavorida, olhos fora das órbitas, pedindo so
corro , o gală, tresandando a pitiu , dá um pulo e mergulha na corrente para
logo em seguida, traindo a identidade, vir à tona mostrar o focinho ver
melho e soprar zombeteiro um jacto dágua na direção da infeliz ” .
Cumpre observar ainda que o mito não ocorre apenas na Amazônia e
no Reno, mas também em Cuba , na Islandia, na Irlanda, na Suécia , na Fin
landia e até no interior da África . Em todas essas regiões aparece a en
cantadora jovem , que, depois de seduzir o rapaz, o faz morrer afogado.
Entre os islandeses há, como em nosso país, não só uma rapariga, mas
também um mancebo que assume o papel de Iara. Em toda parte, porém,
lenda é a mesma, salvo variações nos pormenores, devidas, pelo menos
parcialmente , as diferentes dos ambientes geográficos.

***

8. COBRA DE FOGO

I'm mito brasileiro ainda pouco estudado quanto a suas origens e as


formas que assumiu no seio de nossas populações rurais é o do mboi - tata ,
isto é, cobra de fogo. Seria de interesse determinar de que maneira as
características da paisagem geográfica e do meio étnico influíram na for
mação das diferentes versões regionais do mito.
Onde quer que se tenha originado, a figura do mboi - tatá deve certa
mente a sua existência à personificação do fogo - fåtuo. Todos sabem o que
são fogos- fatuos : pequenas chamas azuladas, bastante intensas e um tanto
efémeras, que aparecem , a pequena altura, sõbre pântanos e brejos, bem
como nas paragens adjacentes . Quanto à sua origem e natureza, há duas
explicações diferentes : ao passo que a grande maioria dos autores fala
apenas em processos de decomposição de matérias vegetais ou de organis
mos animais, outros há que julgam tratar -se às vezes de simples descar
gas elétricas do solo. Neste caso, seria um fenômeno análogo ao fogo
de Sant - Elmo, " o lume vivo que a marítima gente tem por santo " , e que
deve o seu nome ao santo padroeiro dos marujos entre os povos latinos :
e observado, de vez em quando, nas pontas dos mastros, como também em
para - raios ou em torres, e deve a sua origem a descargas de eletricidade.
Não se deve estranhar que o fogo - fatuo, que flameja misteriosa e fan
tasmagoricamente na escuridão, apagando - se de súbito, para ressurgir logo
em seguida , seja olhado com espanto e terror. Um fogo que parece arder
sem ter o que queimar, sem produzir calor e sem deixar cinzas ou outros
sinais, facilmente pode ser explicado como duende ou espírito , ou, pelo
menos, como assombrosa manifestação dalgum ente sobrenatural.
Não sabemos se o mito do mboi- tata é tradição puramente ameríndia
ou se foi influenciado por traços africanos. E ' certo que os indios o co
nheclam , como se vê pelo testemunho de Anchieta , quando, numa carta de
1660, descreve os " fantasmas" da capitania de São Vicente : " Há também
outros, maximé nas praias, que vivem a maior parte de tempo junto do
mar e dos rios, e são chamados baetata, que quer dizer " coisa de fogo " ,
o que é o mesmo como se se dissesse " o que é todo fogo " . Não se vê outra
colsa senão um facho cintilante correndo daqui para ali ; acomete rapida
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

mente os indios e mata-os, como os curupiras : o que seja isto, ainda não
se sabe com certeza " ( 1 ) . Mais para o sul, a denominação indígena era
maboi - tata , cobra de fogo. Entre as populações sertanejas das diferentes
partes do Brasil, transformou -se em boitatá , baitata, batatão, bitatatá etc.
Como já foi notado por Teodoro Sampalo, em sua obra " O Tupí na
Geografia Nacional" , as palavras macal, macalera e macachera também
significam fogo-fatuo em tupi- guarani. Segundo Marcgrave e O padre
Simão de Vasconcelos, o mito do macachera é um " numen viarum " , como
escreveu o naturalista, ou : " espírito dos caminhos ” , como traduziu o padre
jesuita. Nessa qualidade, confunde - se com o saci; o há realmente pontos de
contacto entre os dois mitos. Escreve Gustavo Barroso, que, em vários es
tados do norte, “ se acredita que o Batatão ensina o caminho errado a
quem o seguir, persegue os que correm com medo dele, ou leva o indivi
duo até uma sepultura próxima, se o acompanhar' ( 2 ) . E explica : " A
primeira crendice é comum a quase todos os povos. A segunda vem do
fato da deslocação do ar , produzida pela carreira do medroso, atrair 0 .
fogo errante. E a terceira promana da própria verdade do fato : esse fogo
nasce das putrefações, sendo natural que apareça perto dos charcos e das
sepulturas" ( 3 ) .
Nesse mesmo livro ( 4 ) , Gustavo Barroso reproduz um mito africano,
" a lenda de Bingo " , colhido na “ Anthologie Nègre" de Blaise Cendrars, e
em que ocorre uma personificação do fogo -fátuo com o nome de Mboya
é a mãe que anda errando eternamente pela floresta à procura do filho
que foi atirado a um precipício. E' estranha a coincidência de nomes, que
ainda não encontrou explicação satisfatória .
E ' no sul do Brasil que o mito do mboi - tatá deu origem as mais curio
sas variantes regionais.
Em Santa Catarina, refere Crispim Mira, " é grande como um touro ,
com patas como os gigantes e com um enorme Olho no meio da testa , a .
brilhar, que nem um tição de fogo . Ninguém sabe onde seja o seu antro ,
nem do que se alimenta. O certo é que ora se mete pelo mar a dentro
como um cavalo - marinho, ora voa por cima das árvores como um fantás
tico pássaro infernal. A esse respeito não há a menor dúvida . Os incré
dulos têm pago caro a fanforronice " ( 5 ) . E contam - se horripilantes his
tórias das dsegraças que o monstro tem causado, das pessoas que morre
ram , das plantações que definharam, das famílias que ficaram reduzidas
à mistéria somente porque lhes passara por perto esse " coisa ruim " ( 6 ) .
Segundo uma versão riograndense, recolhida por Silvio Júlio, e repro
duzida por vários autores, omboi- tatá é uma cobra que escapou das
águas do diluvio, refugiando - se numa toca ao alto dum monte. Na escu
ridão, arregalava os olhos, para exergar alguma coisa ; assim , dilatando
se, ficaram cada vez mais luminosos, até que afinal a serpente se metamor .
foseou em cobra de fogo.

( 1 ) José de Anchieta , Cartas, informações , fragmentos históricos


sermões , págs. 128-129 . Rio de Janeiro 1933.
( 2 ) Gustavo Barroso , o sertão e o mundo , pág. 41. Rio de Janeiro,
1923 .
( 3 ) Ibidem .
( 4 ) Págs. 43-44 .
( 5 ) Crispim Mira, Terra catarinense, pág. 139. Florianópolis 1920.
( 6 ) Ibidem .
I

REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Não se informa, infelizmente, se ness& variante do mito, que, aliás, se


coaduna de modo excelente com a mentalidade dos indígenas, é maléfica
ou benética a influência do mboi- tata sõbre a vida e os negócios humanos ..
Segundo a opinião de José Verissimo, Sant'Ana Neri e outros, o mboi
tată serla gênio protetor do campo, vingando queimadas e outras devasta
ções, da mesma forma como existem, na , mitologia tupi, espíritos como
guardas da floresta, da água , da casa , etc., E' evidente que esse significado
de " gênio protetor" pode muito bem ser um traço europeu, posteriormento
acrescentado aos primitivos mitos indígenas.
Outra versão, em que o mboi - tata lé apresentado como ser perigoso, é .
interessante pela sua estreita ligação com os modos de vida da população
da campanha riograndense : " Conta - se entre a gauchada das estâncias que
ros passeios e nas viagens à noite, aparece um fogo volante, els vezes
em forma de cobra, outras vezes em forma de pássaro, voando na frente
do cavaleiro, impedindo - lhe a marcha. E ', porém , crença entre a gente do
campo que a Boitatá se deixa atrair pelo ferro. E, então, o meio para
ver - se livre do ataque dela consiste em desatar o laço dos tentos
arrastá - lo pela presilha, prèviamente presa esta à argola da cincha . Desde
então, a Boitatá atraida pelo ferro da argola do laço, deixa assim de em
baraçar a marcha do andante, segue - o atrás na altura do extremo do laço .
até amanhecer o dia, hora em que o abandona, deixando-o ir em paz" ( ? ) .
Na bacia do Uruguai, segundo o padre Teschauer ( 8 ) , o mito do mboi
tata se liga ao ciclo das lendas do ouro. Reza a tradição que os Incas
afundaram imensas riquezas no Titicaca, para que não caissem nas mãos :
dos conquistadores. Da mesma forma, os lendários tesouros das Sete Mis.
sões estariam escondidos nas lagoas das depressões do planalto sul- rio
grandense. As águas aí se cobrem anualmente de uma camada de vegetais,
que no inverno é destruída pelas geadas; torna, porém, a reaparecer den
tro em pouco, enquanto os restos das plantas anteriores se vão decom
pondo lentamente no fundo das águas. E nessas lagoas, de pouca profun..
didade, que às vezes desaparecem quase inteiramente, estariam depositados
os tesouros jesuíticos.
O guarda desses tesouros é o mboi - tata, ou nhandu - tatá (avestruz do .
fogo ) , segundo a crença de outros. Pequenas chamas azuladas reluzem
sobre a camada de algas, ou na circunvizinhança. Desaparecem quando al
cum curioso se aproxima, ou procuram enganá- lo, afastando -se pouco
pouco. Um dia, quando vier o dono das riquezas, descendente dalgum indio .
missioneiro, o guarda lhe indicará o lugar do tesouro.
Assim , o mito do mboi-tatá varia de região em região, de acordo con
o meio. Ora se liga com outras crenças e tradições, ora se confunde com
elas. Um estudo comparativo de todas as variantes brasileiras constituiria,
certamente, valiosa contribuição para o conhecimento do folclore nacional.

( 7 ) Cezimbra Jaques, apud Roque Calage, Vocabulário gancho ( se ..


gunda edição ) , pág. 27. Porto Alegre 1928.
( 8 ) Carlos Teschauer, S. J. , Poranduba riograndense , págs. 437-438..
Porto Alegre 1929.

***
56 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

9. O MACAUA

Entre os povos primitivos de todas as regiões do mundo observam-se


crenças ou idéias religiosas ligadas a determinadas espécies do reino ani
mal. Os representantes mais numerosos da categoria dos “ animais sagra
Cos" são as aves . A faculdade de elevar- se a grandes alturas e de cortar
OS ares em rápido vôo deve ter impressionado profundamente o espírito
do homem primitivo como algo de misterioso e de inacessível aos seres hu
manos. Não admira, pois, que tantas religiões aborígenes estabeleçam
uma conexão entre as aves e as almas dos defuntos, que ordinariamente se
imaginam libertas da lei da gravidade e com o poder de transitarem, sem
mais nem menos, pelas mais longinquas regiões estéreas.
Em certas regiões tribais, como, por exemplo, entre os Bororo do
planalto oriental matogrossense, a analogia entre o mundo dos espíritos
e a avifauna influencia profundamente as crenças totêmicas e determina,
em grande parte, as particularidades da atitude mental do homem primitivo
em face da vida e da morte, do ambiente natural e dos seres humanos com
os quais convive.
A nossa civilização, por sua vez, contém ainda reminiscências do papel
qu eem remotas eras as idéias relativas as aves desempenhavam na men
talidade de muitos povos do Mediterrâneo e do norte da Europa. Águias,
falcões, corvos e corujas repetem - se insistentemente na heráldica. E ' ver
dade, porém, que hoje ésses traços perderam as suas primitivas significa
ções, passando muitos deles a ter valor simplesmente simbólico.
Não foram, de ordinário , as aves canoras que deram o fundamento
para representações míticas e religiosas, mas de preferência aquelas que
fazem ouvir sons estridentes ou até grassantes. Em parte, talvez, porque
as aves canoras geralmente não se distinguem pelo porte. Outro motivo
talvez seja o de que sobretudo as aves de rapina se prestam para sugerir
a idéia de coragem , vigor e perseverança, qualidades essas que nunca dei
xam de impressionar o espírito do homem primitivo.
Muitos índios sul - americanos também possuem as suas " aves sagradas ” .
Exemplo dos mais interessantes é o do macauã , uacauã ou acauā, ave a
que se ligam noções míticas ou religiosas em muitas regiões do continente,
desde o extremo norte até o sul. Tanto Montoya como Barbosa Rodrigues
mencionam - na em seus trabalhos. O macauã ( Herpetotheres cachinnans )
é uma ave de rapina de vigorosa constituição. Alimenta - se especialmente
de cobras, venenosas ou não, e presta assim ótimo serviço aos homens.
Há um vegetal de folhas largas, conhecido entre os índios pelo nome de
macauã- caá ; segundo afirmam, o macauã come essas folhas como antídoto
contra o veneno das cobras. Diz - se que o nome da ave não é outra coisa
senão onomatopléia de seu grito compassado " maca - u - ã " , e, como afirmam
os índios, todas as cobras fogem assustadas quando o percebem.
Entre as populações da Amazônia, o macauã é tido como ave agoureira
ou mensageira das almas. O seu grito anuncia a morte ou, pelo menos,
alguma desgraça. “ Em outras localidades amazônicas dizem que esta ave
é o terror das mulheres, porque o acauā se apossa do espírito delas e as
obriga a cantar com ele as três sílabas do seu nome" ( 1 ) . Barbosa Rodri
gues, por sua vez, informa que, entre os indios, o uacauã " é tido por

( 1 ) R. von Ihering, Dicionário dos animais do Brasil, pág. 70. São


Paulo 1940 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 57

agoureiro , circunstância que influi sobre alguns tapäias nervosos, a ponto


de adquirirem uma moléstia que é bem conhecida com o nome de Vacauă,
no municipio de Faro ; sobretudo no Lago Grande ou do Algodoal, onde
comumente aparece " ( 2 ) . Em outro trabalho, o mesmo autor conta como
viu, na aldeia de Faro, u'a mulher " pegada pelo macaua " . Ouvira, pois, o
canto funesto do gavião. Estava numa choupana, deitada na rede, ator
doada e com o peito arfante. Repetia seguidamente as palavras : nacua !
r.acuá !, seguidas da gargalhada estridente peculiar ao pássaro. Silenciava
por alguns instantes, para depois recomeçar o canto inspirado pela ameaça
do infortúnio que pairava sobre a pobre tapula. Era tão perfeita a imita
ção dos gritos da ave que o naturalista, a princípio, tinha a impressão de
ouvir o próprio macauã ( 3 ) .
O tuxaua dos Anambé, do Tocantins, contou certa vez ao General Couto
de Magalhães um mito acerca duma velha gulosa , em que o macauã e
um dos principais personagens. Para livrar - se da velha, que o vem per
seguindo , um moço se esconde na casa do surucucu . O surucucu e sua
mulher fazem um moquém para moquear o pobre fugitivo. Este ouve a
voz do macauã e conta- lhe qual a sorte que o espera. O macauã come os
dois surucucus e O rapaz consegue fugir ( 4 ) . E' O motivo mítico cha
mado " auxilio de animais " , que ocorre, com uma infinidade de variantes,
Das mitologias de todas as partes do mundo. Barbosa Rodrigues publicou
um mito dos indios do Rio Solimões, em que a cobra grande, " boiauaçu " ,
é também morta pelo macauã ( 5 ) .
De um modo geral , o papel do macauã é comparável ao dos corvos
de Wodan na mitologia germânica .,
Ao Visconde de Taunay devemos uma série de interessantes notas s -
bre os aborígenes do território sul - matogrossense e de outros pontos do
krasil. Muitas dessas observações, em parte dos tempos da guerra do Pa
raguai, encontram - se num pequeno volume intitulado Entre os nossos indios,
Na parte referente aos Kadiueo , há informes curiosos sôbre o culto do
macauã, e té, sõbre a evocação da ave sagrada pelos “ padres" ou médicos
feiticeiros da tribo. " Por qualquer motivo : colheitas, chuvas excessivas,
sol ardente , pendoar do milho e motivos ainda menos importantes, cantam
noites inteiras, denunciando presságios e conversando com a ave macauã
fou acauả ), que fingem chamar de longe, imitando - lhe o cantar tristo
nho" ( 6 ) . A ave é objeto de veneração da parte dos médicos - feiticeiros, ao
passo que os outros índios não tem sequer receio de matá - la. " As práticas
do sacerdote incluem grosseiros exercícios de prestidigitação : finge en
gulir penas compridas, tira- as do nariz, introduz flechas no estômago, etc.
etc.” (7 ) . Mas a parte mais importante das cerimônias é, sem dúvida, a

( 2 ) " Poranduba amazonense ” , Anais da Biblioteca Nacional do Rio de


Janeiro, tomo XIV ( 1886-1887 ) , fascículo n .° 2.° nota à pág. 188. Rio de
Janeiro 1890 .
( 3 ) Apud C. Teschauer, Avifauna e flora nos costumes , superstições e
lendas brasileiras e americanas ( 3.a edição ) , pág. 99. Porto Alegre 1925 .
( 4 ) O Selvagem ( 3.a edição ; Brasiliana, vol. 52 ), págs . 267-271 . São
Paulo 1935 .
( 5 ) 0. c ., págs. 187-189.
( 6 ) Pág . 22 .
(7 ) Ibidem .
58 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

evocação do macauă . Primeiro soa ao longe o grito do gavião, a que res


pondo o sacerdote. Os pios do macaua ouvem - se cada vez mais perto, até
que afinal começam as " revelações" ao médico-feiticeiro. " Esta cena , es
creve Taunay, não deixa de impressionar, pois a imitação do cantar do
macauã , ao longe e sucessivamente, mais e mais perto, é feita com toda
a perfeição " ( 8 ) .
Igualmente o padre Teschauer ( 9 ) , apoiado em Denis, fala no culto do
macauã entre os Guaikuru, referindo o uso do maracá parai a evocação da
ave profética , que viria trazer avisos benéficos como mensagens das almas.
dos defuntos.
Encerramos estas ligeiras notas sobre o macauã com o mito tribal dos
Guaikuru, em que o herói é outro falconideo, o caracara . Segundo a
crença desses abrigenes, foi o caracará quem os criou . O mito foi recolhido,
em fins do século dezoito, por Francisco Rodrigues do Prado, então co
mandante do forte de Coimbra. Escreve o seguinte : “ Dizem que, depois de
serem criados os homens, e com eles repartidas as riquezas, uma ave de
rapina que no Brasil chamam caracará sa lastimara de não haver no mun
do Guaicurus ; que os criara e lhes dera o porrete, a lança , o arco e as
flechas, e dissera que com aquelas armas fariam a guerra as outras na
ções, das quais tomariam os filhos para cativos, e roubariam o que pudes
sem : mas a este seu criador não tributam culto algum, antes o matam as
vezes que podem " ( 10 ) .
E ' interessante observar como esta e outras versões do Gênege desses
aborigenes concordam perfeitamente com os modos de vida e a mentalidade
da tribo. Os guaikuru, também chamados indios Cavaleiros, desenvolveram
verdadeiro imperialismo, guerreando e subjugando as tribos vizinhas. Fo
ram, por isso, caracterizados recentemente como “ tribo senhorial" .

***

10 . LUZ E CALOR

Refere uma conhecida lenda tupi, publicada por Couto de Magalhães


que " no principio não havia noite dia somente havia em todo tempo " .
A Cobra Grande mantinha a noite fechada dentro dum caroço de tucumã .
Três rapazes muito curiosos, incumbidos de levar a noite a filha da Cobra
Grande, abriram o côco e a escuridão se espalhou por toda parte. Foi af
que começou a alternância rítmica de dia e noite ( 1 ) .

(8 ) Ibidem .
(9) 0. C., pág. 97 .
( 10 ) " História dos indios Cavaleiros ou da nação Guaicuru " , Rev. do
Inst. Hist. e Geogr. Bras ., tomo I ( 3.4 edição ), págs. 28-29. Rio de Janeiro
1908 .

( 1 ) General Couto de Magalhães, o selvagem ( 3. edição ; Brasiliana ,


vol . 152), págs. 231-234 . São Paulo 1935 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 5!!

Essa lenda é interessante sobretudo porque representa uma inversão de


outra , mais comum, que explica a obtenção da luz do dia . Assim , os Karaja ,
que vivem nas margens do Araguaia , contaram ao explorador Fritz Krauso
que no principio dominava a escuridão, até que um avoengo da tribo man
dou o urubu -rei ou o jaburu ( segundo outra versão ) trazer o sol. Depois
de apresentar as estrelas e a lua, a ave entregou finalmente o sol e fez
aparecer a luz do dia ( 2 ) .
O indio Karajá Dyuasá relatou esse mito a Herbert Baldus nos seguintes
termos : “ Karajá chamou o Räraresá, Räråresá é urubo-rei. Quando Rārā .
resa veio, Karajá o apanhou abraçando e perguntou- lhe onde havia o sol.
Porque o sol é o enfeite da cabeça do Rārāresa . Rārāresá é para Karajá
o que Deus é para tort ( os brancos ) . Karajá não mata urubu -rei. Mas
mata o räärá , o urubu comum, porque este é manso, Ourubu -rei é bravo.
Quando Karajá mata o Rāråresá , fica muito doente, se bem que não mor
reu . Primeiramente, Räräresá trouxe a lua, que tambiém é enfeite da
cabeça dele. Karajá disse : Isto não quero. Rărăresa disse : Tenho o sol .
Räräresá trouxe ao Karajá o sol. Por isso há sol. Então Karaja pode
fazer as pulseiras e as ligas de joelho, apanhar tartaruga, fabricar a corda
do arco , pescar, caçar, fazer roça e construir canoa. Räräresa ficou um dia
com Karajá , ensinando - lhe fazer as pulseiras e as ligas do joelho, apanhar
tartaruga, fabricar a corda do arco, pescar, caçar, fazer roca e construir
canoa " ( 3 ) .
Há alguns anos, o etnologo brasileiro Carlos Estêvão ouviu entre os
indios Fulnio ou Karnijo, do Nordeste, um mito excepcionalmente bonito
sobre a obtenção do dia. Pode- se ressumi -lo da seguinte forma : Não havia
dia na terra . Os animais mandaram então a seriema como emissária ao sol
para lhe pedir o dia. O sol lhe deu o dia, mas a seriema, muito egoista,
não o quis entregar. Usava a claridade somente para si, e conseguia mais
facilmente achar a sua alimentação. Quando os outros animais se aproxi
mavam , fechava o dia e retirava -se. Até que uma vez a prenderam dentro
dum grande circulo. · Sentindo estar cercada, a seriema correu para o nas
cente e abriu o dia para esse lado . Mas como não podia passar, fechou - o
e corren para o poente, onde o abriu também. Mais uma vez mal suce
dida , correu para o norte, e a seguir para o sul . Depois, tornou a fechar
o dia e correu para o centro. Para al se dirigiram também os outros ani
mais. Interpelada , a seriema negou a principio que tivesse trazido o dia,
mas não lhe deram crédito. Afinal, “ sufocou o egoismo e rasgou o dia para
todos" ( 4 ) .
Se o aparecimento da luz do dia é um problema que preocupa o pensa -
mento mítico dos primitivos, com muito mais razão preocupa - o a obtenção
do fogo, que de fato foi uma das primeiras grandes conquistas do homem
pre -histórico . Talvez algum incêndio ateado pelo raio pudesse o homem pela
primeira vez em contato com o fogo. Transportado à caverna, e " domesti

( 2) Fritz Krause, In den Wildnissen Brasiliens, págs. 344-345. Leip


zig 1911 .
( 3 ) Herbert Baldus, Ensaios de etnologia brasileira ( Brasiliana, vol .
101 ) , págs. 190-191 . São Paulo 1937.
( 4 ) Carlos Estêvão. " O ossuário da " Gruta do Padre" e , Itaparica e
algumas notícias sobre remanescentes indígenas do Nordeste " . Boletim
do Museu Nacional, XIV -XVII, 1938-1941 . Rio de Janeiro 1042. Págs .
177-178 .
60 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

cado " , o fogo foi se tornando, aos poucos, um auxiliar indispensável, a


humanidade. E apagado talvez em conseqüência dum descuido ou dum
acidente qualquer, o selvagem fez por certo mil e uma experiências, baten
do, esfregando e brocando pedra ou madeira , para produzi - lo artificial
mente. Dessa maneira , inventou o seu primeiro instrumento ignígeno, um
dos passos mais decisivos na marcha para a civilização.
Muitos povos possuem um mito sobre a obtenção do fogo . o aconteci
'mento impressionou de tal forma o espírito do homem primitivo que veio
a constituir um episódio sobremodo freqüente nas tradições tribais das vá
rias partes do mundo.
Nos mais antigos escritos sobre o Brasil lê - se que os Tupi acreditavam
numa divindade, chamada Tupã, que presidia ao raio e ao trovão. “ Esta
gentilidade diz o Padre Manuel da Nóbrega, em carta de 1549 coisa
nenhuma adora , nem conhece a Deus; somente aos trovões chama Tupane,
que é como quem diz coisa divina. E assim nós não temos outro vocábulo
mais conveniente para os trazer ao conhecimento de Deus, que chamar
The Pai Tupane" ( 5 ) .
Ora , essa divindade indigena, notdriamente a mais discutida de quantas
havia na religião dos Tupi litorâneos, era ao mesmo tempo o deus - do- fogo
ou o herói - civilizador que teria ensinado aos índios a técnica de produzir o
lume. Isto, porque, se identifica ou confunde com Maira - monhã ou Sumé,
que são propriamente os heróis civilizadores na teogonia tupinamba , tal
como a descreve André Thevet, o autor que mais aprofunda o assunto. Os
Tupinambá contaram a Thevet que algum tempo após o diluvio os ante
passados da tribo aprenderam , durante o sono da noite, a arte de produzir
o fogo por meio de fricção , ensinada por um " caraiba chamado Bicbotou,
o que vem a ser trovão " . De outro lado, corria entre eles o mito de que
Monhã , a divindade criadora, havia colocado o fogo sobre o dorso duma
preguiça, donde os irmãos Tamendonare e Aricute o retiraram , para en
tregá- lo aos homens. E ' por isso que o ar tem as costas manchadas de
preto ( 6 ) .
Como deus do fogo e do raio, Tupã chamava- se também Tupã- Beraba,
e pela voz troante dava - se - lhe o epiteto de Tupã-Cininga. Os selvícolas con
sideravam - no como benfeitor, i. é como doador do fogo , mas não lhe tri
butavam nenhum culto especial. Ao mesmo tempo, a sua voz lhes inspirava
medo e terror. Tupã corresponde perfeitamente a Tor, o deus - trovão dos
antigos germanos.
Em seu livrinho " Lendas e encantamentos do sertão " , J. G. Americano
Brasil reproduz o seguinte mito, por ele ouvido nalguma parte do sertão
brasileiro :
“ Tupā, quando fez a terra, colocou no cimo de varios montes uma bola
de fogo que alumiasse os vales e desse fogo para o povo se aquecer e
cozer os alimentos ; mas, com o tempo, essas estrelas foram se apagando,
porque o fogo foi queimando a terra e se aprofundando cada vez mais.
Não se podia tirá - lo senão com risco de vida, tendo muitos tentado tal e

(5) Manuel da Nóbrega, Cartas do Brasil, pág. 99. Rio de Janeiro


1931 .
( 6 ) André Thevet, apud A, Métraux, La religion des Tupinamba et ses
rapports avec celle des autres tribus tupi- guarani, págs. 15 e 48. Paris
1928 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 61

fiacram enterrados, lá no fundo do buraco. Demais, o povo estava aumen- ,


tando muito e os que precisavam de fogo tinham que andar longe. Então
mandou - se a águia pedir a Tupã que desse um jeito naquilo . O api do
mundo pensou , matutou , e disse : " Eu vou dar as providências precisas " .
Chamou o cariá, seu secretário, e o encarregou de colocar muitas bolinhas
de fogo pelo céu afora e, sempre, derrubar uma na terra, bem no lugar
onde a fumaça não saísse do teto das casas.
Assim é que, de quando em quando, à noite vê - se descer uma estrela,
faiscando pelo espaço a fora e cair là longe, além do chapadão ou atrás da
serrania, levando fogo às tabas distantes, que ficaram sem ēle " ( 7 ) .
Americano Brasil não teve, infelizmente, o cuidado de indicar a região
em que colheu o texto. Não oferece, assim, o necessário ponto de apoio
para se estudar a ligação que possa haver entre a lenda e os caracteres
geográficos dalguma parte do continente sul-americano . Em todo caso , O
mito não se originou, por certo, em terra brasileira. Veio trazido, talvez ,
de longe por alguma tribo que se dirigiu para cá. Os montes de que se
fala na primeira parte eram provavelmente vulcões ; também a afirmação
de que " o fogo foi queimando a terra e se aprofundando cada vez mais ' '
parece referir- se a fenômenos de caráter vulcânico . Se a narração é de
origem tupi, poder -se - ia ver néla um argumento para corroborar a teoria,
tantas vezes exposta, de que foi nos Andes que esses indígenas iniciaram
a sua marcha para ocuparem grande parte do Rio Grande do Sul, o litoral
brasileiro e a planície amazônica. A Cordilheira dos Andes, estendendo - se
com seus vulcões, através das Américas Central e Meridional poderiam
muito bem constituir a base sõbre a qual se teria formado a lenda .
evidente que tudo isso não passa de simples hipótese, que, porém , no caso
de ser verificada, forneceria interessante exemplo de como um povo pri
mitivo representa na tradição mítica o relevante episódio da aquisição do
fogo, quando esta remonta a origem vulcânica.
Referimo - nos acima à técnica da produção artificial do fogo . Entre
os índios brasileiros, o método mais comum consistia na fricção de dois
pedaços de madeira. Eis como o descreve o General Couto de Magalhães :
" toma-se um cerne de madeira dura que esteja perfeita no centro, mas que
tenha uma camada de alguns oitavos de polegada já poida ; faz - se com a
unha uma covazinha na madeira já poída , e nela se coloca a extremidade
de uma vareta de madeira de cerne bem duro e, tomando esta última entre
as palmas das mãos, imprime- se -lhe um movimento rotatório rápido ; ao
cabo de alguns minutos o fogo prende- se ao pó da madeira poida , comu
nica-se a ela e assim o acende" ( 8 ) . Poderia, pois, parecer ser muito sim
ples a arte de " tirar fogo da madeira " . Entretanto , é um processo que
requer muita habilidade e é bastante penoso ; o índio que o emprega co
meça a suar por todos os poros. Uma vez obtido o fogo, trata de conserva
lo com todo cuidado, levando consigo, nas excursões, uma acha acesa, para
não se ver forçado a produzi-lo em caminho. Não admira que os fósforos
trazidos pelo homem branco figurem entre os objetos cobiçados pelos
selvícolas que entram em contato com a civilização.

( 7 ) J. G. Americano do Brasil , Lendas encantamentos do sertão.


São Paulo , s. d.

(8) Couto de Magalhães, 0. C., págs. 61-62 .


02 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

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TESCHAUER , CARLOS Poranduba riograndense. Pôrto Alegre 1929 .
TYLOR, E. B. Anthropology ( 2 volumes ) . Londres 1927 .
VAL- FLORIANA, FREI MANSUETO BARCATTA DE " Dicionários kainj
gang-português e português - kainjgang " . Separata da Revista do Museo
Paulista , tomo XII. São Paulo 1920 .
VASCONCELOS , SIMÃO DE Crônica da Companhia de Jesus do Estado
do Brasil ( 2.a edição ) . Rio de Janeiro 1864 .
WAGLEY, CHARLES " Xamanismo tapirapé" . Boletim do Museu Nacio
nal, n . 8 .; Antropologia, n.° 3 ; pág . 24 . Rio de Janeiro, 15 de se
tembro de 1943.
PERFIL DE AMADEU AMARAL

HÉLIO DAMANTE

O mérito dêste pequeno ensaio reside , talvez, no fato de ter sido


escrito há três anos, em 1946, quando Amadeu Amaral permanecia quase
inteiramente esquecido.
Pouco interesse oferecem as razões porque só agora vem à lume. De
proporções modestas, escritas de um só fôlego, com raros vagares para
pesquisas e consultas, as páginas que se vão ler visam fixar, de leve, o .
perfil do poeta de “ Espumas", do estilista do “ Memorial de um passagei
ro de bonde ”, do homem de jornal e do homem de coração, que ele o foi
integralmente.
Amadeu é uma figura apaixonante . Mesmo assin , pouco mais de três
lustros transcorridos desde a sua morte, um véu de esquecimento caira
xôbre seu nome. Com exceção de seus amigos, é claro. Mas o grande públi
co, cujas vibrações ele tão bem captava e traduzia como jornalista, éste -
o tinha, então, em grande parte olvidado.
Felizmente, tornado do exílio, Paulo Duarte, fiel a uma amizade que
não conheceu nugas, devotou-se ao trabalho de avivar recordações e re
constituir todo o imenso e precioso acervo legado por Amadeu às letras
brasileiras. O éxito de " Tradições Populares ” o livro que inicia a pu
blicação de suas obras completas, lançado pelo IPÊ e organizado e pre
faciado por Paulo Duarte, testemunha que o véu se rompeu. As homena
gens, de cunho popular, que se preparam para assinalar, em outubro pró
ximo, o 20.º aniversário de sua morte, revelam outro sinal ineludível de
atuante e benfazeja presença.
Contribuições como a excelente conferência de Sud Mennucci na Aca
demia Brasileira de Letras, em 1942 ; a publicação, em 1938, do “ Memo
morial", pelas Edições Cultura ; os estudos e notas de Manuel Cerqueira
Leite, que figuram no vol . 58 “ Amadeu Amaral" da Pequena Bi
blioteca de Literatura Brasileira ( Editora Assunção, S. P. , 1946 ); publi .
cações na “ Revista da Academia Paulista de Letras ”, além de vários tra
balhos esparsos, inclusive de Amadeu Amaral Júnior, precederam a vito
riosa emprêsa de Paulo Duarte. Seria injusto olvidá-los, embora não tives
sem a ressonância que seria de desejar, alimentando apenas em círculos.
restritos a chama do culto ao grande escritor.
Aliás o esquecimento que envolvera, quase completamente, Amadeu
Amaral parece ser regra que se dá com os grandes. Essa penumbra, ésse
território neutro e frio, parecem constituir imperativo das galas da poste
ridade. Depois, sim, vem a revivescência de um nome, o culto de uma arte,
surgidos ainda titubeantes, imprecisos, espaçados , mas decididos, até que
€6 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

o futuro, no seu lento trabalho de seleção inexorável, dêles se apossa para


as consagrações definitivas.
E há santos , heróis, artistas e poetas que esperam dos séeulos, do
suceder de gerações sem conta, a justiça que lhes é devida. Com o nosso
Amadeu, por certo, essa longa espera foi abreviada. Na verdade, acha-se
ele ainda muito perto de nós, para que à nossa perspectiva visual possa
o seu vulto desdobrar-se com tôda a majestade. Não obstante estas con
turbadas gerações de hoje não necessitam de grande esfôrço para com
preendê-lo e amá-lo na sua verdadeira grandeza. A sua arte está junto
de nós, viva e imortal.

S. Paulo junho de 1949.

H. D.
3
I

Filho de João Arruda Leite Penteado e de d. Maria Carolina de Ar


ruda Leite, ambos falecidos, Amadeu Ataliba Arruda Amaral Leite Pen
teado êsse o seu nome todo - nasceu aos 6 de novembro de 1875, na
propriedade agrícola paterna (herdada de seu avô ) chamada “ S. Bento
da Boa Vista e que, desde a criação do município de Capivari, localiza
Va-se em suas terras. No entanto fato curioso e pouco conhecido
aconteceu que ao ser criado, em 1871, o município de Monte-Mor, antes
chamado Água - Choca, a fazenda “ S. Bento da Boa Vista ” foi incluída en
tre as terras do novo município . Somente sete anos mais tarde, pela lei
de 18 de março de 1878, aquêle trato de terra reverteu à jurisdição an
terior.
Dessa forma, Amadeu, que sempre teve pela sua Capivari um amor
filial, eloquente é despreendido, deveria ser, administrativamente, consi
derado montemorense . Conta Amadeu Amaral Júnior, nas "Notas para
uma biografia de Amadeu Amaral ” ( “ O Estado de São Paulo " de 19,21
e 22-5-40 ), que o poeta jamais admitiu semelhante coisa. Chegava a zan
gar -se com quem se lhe atrevia a falar no assunto . Fazer pilhéria a pro
pósito, escreveu o filho, era querer ganhar-lhe a inimizade. Certa vez,
segundo as mesmas “Notas ”, por ocasião de sua candidatura pelo 4.° Dis
trito, teve séria zanga com o escritor Menotti Del Picchia, por ter pilhe
riado a respeito , zanga essa que as disparidades políticas ainda mais agra
varam . E, diga -se de passagem , um dos mais belos exemplos de sua vida
foi aquele amor, misto de veneração e de ternura, que Capivari lhe mere
ceu . Nome já consagrado nas letras nacionais era para ele motivo de pra
zer o ver-se ehamado, simplesmente, o “ poeta capivariano ”.
O pai de Amadeu Amaral, João de Arruda Leite, trouxera do berço
o traço de uma vocação espinhosa, mas constante, que haveria de trans
mitir ao filho: o jornalismo. Fazendeiro, não tardou que se tornasse dono
de um jornal um dêsses difíceis e até certo ponto temerários pequenos
jornais do interior: “ A Gazeta de Capivari". Nessa fôlha fêz à propa
ganda republicana e perdeu muito dinheiro ganho em suas lavouras. Îrans
ferindo-se depois para S. Carlos e a Capital do Estado, João de Arruda
Leite ainda fêz jornalismo. Em São Paulo adquiriu e manteve o " Lavou
ra e Comércio ” , que, segundo ainda Amadeu Amaral Júnior, consumiu
lhe o resto das economias e até vinte. contos ganhos na loteria. Amadeu
Amaral, jornalista inveterado e brilhante, já se vê, tinha por quem puxar ...
E se do pai herdou o gôsto pelos misteres de homem de jornal, no
convívio dos quais se tornou grande poeta e escritor, de sua mãe, d. Ma
ria Carolina, herdou Amadeu os traços nobres, puxados a alemão ou ho
landês, que dêle fizeram um belo tipo de homem .. Assim , ao atingir o
TA IVO IPAL
68 REVIS DO ARQU MUNIC

apogeu de sua existência, a beleza conjugada da alma, da inteligência e


do físico teve nêle um dos seus raros eleitos,
Cabe aqui outro esclarecimento, de que, aliás, exaustivamente, tem
tratado a maior parte dos que já escreveram sôbre o autor de " Páginas
Floridas ”. Porque adotava Amadeu o sobrenome Amaral, quando no
mínimo éste devera ser Arruda Leite ou Leite Penteado ? Amadeu Atali
ba Arruda Amaral Leite Penteado era o seu nome todo. O Amaral pro
vinha de suas duas avós, que eram irmãs, e uma delas o usava, Amadeu,
por amor à simplicidade e talvez ao ritmo, adotou-o desde suas primeiras
incursões nas letras,

Ainda que relativamente próxima, poucas notícias temos da infância


de Amadeu Amaral. Mas não é difícil reconstruí- la. Até os 11 anos viveu
o filho de João de Arruda Leite em Capivari. Repartidos entre a perma
nência na fazenda e as frequentes estadas na cidade, chegaram depressa
os anos da escola. Em Capivari aprendeu as primeiras letras e teve seus
primeiros contatos com a imprensa , companheiro do pai, ao lado dos
irmãos , nos trabalhos sem conta que dava a pontual publicação da “Gaze
ta de Capivari", órgão republicano. E enquanto avançava nos estudos e
recebia as tinturas dos preparatórios, o tumulto do mundo lhe arrojava ,
como confessou mais tarde " últimas e trêmulas rugas da onda que
morrem aos pés de uma criança na praia " algumas folhas do Rio e de
São Paulo .
Aos 11 anos , em 1886, vem Amadeu para São Paulo, onde o aguarda
va um emprêgo de moços de recados na firma “ Leon & Cia . ” . E também
a possibilidade, logo frustrada, do bacharelado... Acompanhou -o nessa
viagem o seu irmão João, pouco mais velho do que ele e, hoje, único so
brevivente dos cinco filhos de João Arruda Leite . É veterano funcioná
rio da Biblioteca e Arquivo d " O Estado de São Paulo " . Assina-se João
Arruda ( 1 ) .
Na Capital, o menino Amadeu lutou pela vida, ingressou nos prepa
ratórios da Faculdade, fêz propaganda política e ... jornalismo. Republi
cano, filho de republicanos, foi aqui, nos seus treze anos republicanissi
mos, como ele mesmo os classificou, uma espécie de correspondente nato
do jornalzinho paterno que “ publicava terríveis catilinárias contra D.
Pedro II” ( Notas p. uma biografia ...) .
O golpe de Estado de 15 de novembro de 1889 o alcançou com seus
catorze anos completos. Certo que o imberbe Amadeu participou do júbilo
público próprio dessas ocasiões. E dá seu primeiro “ furo ” . Em carta diri
gida à mãe, logo após o acontecimento, expressa Amadeu a sua satisfa
ção “por termos dado o fora no velho regime e no seu Imperador ”. Essa
carta valeu em Capivari ( 2 ) , por uma confirmação da notícia. Segundo as
1) João Arruda , faleceu nesta Capital, a 11 de julho de 1949, quando
estavam sendo revistas estas páginas.
2) - Esse fato foi repetidamente narrado por Amadeu Amaral Júnior,
que talvez o tenha romanceado . Paulo Duarte, no estudo que escreveu para
preceder as " Obras Completas" , dá o acidente al narrado como ocorrido em
S. Carlos, onde João Arruda Leite manteve " O Popular" ( nesse jornál te .
riam saído os primeiros versos de Amadeu ) . E' essa também a opinião
de Rubens do Amaral. Manuel Cerqueira Leite endossa o relato de Amadeu
zinho, mas também está em duvida quanto ao local . S. Carlos ou Capi
vari? " O Popular ou “ A Gazeta“ ?
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 69

eitadas “ Notas ” de Amadeuzinho , João de Arruda Leite correu ao seu


jornal para lançar uma edição especial com a grande nova. O velho em
pessoa redigiu a notícia da proclamação da República, " a notícia que re
digiu com mais gôsto em sua vida ”, enquanto o filho mais velho, José, na
afobação de colocar o papel na máquina, foi infeliz e o prelo lhe levou a
ponta de quatro dedos da mão direita ... “ Castigo de Deus ” asseverara
o avó materno, Joaquim Vaz, sempre fiel à sua majestade o Imperador.
Mudando -se o velho Arruda Leite para a Capital, o filho,que o al
tancara no gôsto pelos espinhos da vida de jornal, foi seu compa
panheiro, por certo,6 nas lutas da vida efêmera de " Lavoura e Comércio ”.
Aos 17 anos, no Correio Paulistano ” , Amadeu iniciava-se na vida da
“ grande imprensa ", para nunca mais abandoná -la.
Já então era um enamorado das musas. Os primeiros versos surgiam
limidamente. Talvez nem chegassem a aparecer em letra de forma. Cons
tituiam , porém , para aquele moço alto e belo, precocemente amadurecido
é a sen tanto desdenhoso dos folguedos da idade, uma preocupação domi
nante. A matéria prima era boa e a forma, ainda inconsistente, lutava
nas ánsias da libertação. “ Urzes ”, primeira escalada de sua arte, surgia
timidamente no horizonte .

II

Foi em um fim de século a seu tanto melancólico, o século da razão,


o século XIX, que Amadeu fêz a sua estréia nas letras.
Exatamente dez anos tinham se passado desde a proclamação da Re
pública: O poeta não fôra estranho às desilusões políticas do novo regime
e aos percalços, sempre agudos e dolorosos, de uma época de transição.
A nóvel República, com o seu pesado e puritano liberalismo, a seu tanto
inadatado às condições do país - uma experiência ao mesmo tempo bela
e temnerária, cheia de contradições e incongruências, que o passar dos anos,
sos solavancos, vai consertando muito lentamente, não deixava , com
Os seus contrastes, de influir melancolicamente nos seus fiéis sonhadores.
Por outro lado , uma época agnóstica e que acreditou demasiado no ho
mem como centro exclusivo do mundo e na razão, deusa de barro, como
senbora absoluta do homem , dava seus frutos.
Amadeu, de uma sensibilidade extraordinária, intrinsecamente espiri
tualista e de um idealismo muito puro e inocente, via chocarem-se suas
melhores aspirações com a dura realidade dos fatos: os homens engalfi
nhados e as coisas nem sempre afins às proporções em que foram sonha
das e amadas. E também na órbita individual a vida não se lhe apresen
tava fácil. Deixara o curso anexo. Lutava pelo pão de cada dia e via
suas responsabilidades crescerem naturalmente.
Já agora amadureciam os traços inconfundíveis do seu caráter : uma
grande vontade de compreender, de interpretar metodicamente, equilibra
da com o seu traço indelével de independência pessoal ; um misto de digni
dade e de amor próprio, incapaz de se confundir com o orgulho ou o exclu
sivismo, e, muito menos, de descer pela rampa fácil dos servilismos for
tuitos.
Amadeu, o bumano Amadeu , possuia o dom da boa vontade, a fé não
o desamparara; era com rara vontade de compreender, de amar e pos
suidor, como bem o disse Altino Arantes, de um funda e perene sinceri
dade, que se voltava para o lado real , para as urzes desta vida ...
70 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIP
AL

Por tudo isso, o seu primeiro livro de versos, a obra prima de um


sonhador de pouco mais de vinte anos, trazia não poucas marcas de me
lancolia (melancolia e não descrença ), mas também , janela aberta, bus
cava compreender e interpretar. A poesia de “ Urzes” , filha da época, não
era no entanto rebelde, negativista, mas contemplativa e ... penitente,
sendo o poeta

Monge vagando em corredor escuro


alheio aos écos da comunidade,
mudo e grave e alquebrado, como um frade
que sonha um sonho religioso e puro.

E seus versos de amor dos vinte anos, a lembrar, na frase de Maga


lhães Azeredo, que o recebeu na Academia Brasileira, “ caminhos ásperos
onde os pés, dilacerados por espinhos, vão deixando longas estrias de san
gue”, e outra não era a realidade de seu pequeno mundo não se ato
lam na desesperança. Resultam , antes, num misto de romantismo e realis
mo, a que dá fundo o sentido de renúncia e abnegação sempre presente
na poética de Amadeu :

O castelo de sonho, onde eu vivia,


e que erguera com tanto enlevamento,
veio a rolar por terra, enfim, um dia,
num doloroso desmoronamento.

Culpa foi minha ! Como poderia


resistir o castelo, um só momento
se era tão falsa a areia, em que se erguia,
e se era assim tão poderoso o vento ?

Hoje vivo em humílimo casebre,


revendo o meu passado, que tão belo
me aparece ao olhar aceso em febre.

Casebre, sim , mas flóreo e sossegado ;


e se um dia cair, como o castelo,
perderei pouco ... seja Deus louvado !

" Urzes ” fêz sucesso naquele São Paulo de 1899, fervilhante de cau
sas políticas. Aquêle São Paulo que se preparava para o seu largo e in
término vôo de cidade grande. No jornalismo, Amadeu já era figura de
projeção e a sua afirmação como poeta de valor, viera - lhe sagrar um lu
gar de liderança nas letras paulistas.
Frequentador assíduo do Café Guarani , o cenáculo por excelência
de tôda uma geração, êmulo paulistano do Café das Belas Artes do Rio de
Janeiro, iniciou Amadeu, por essa época, com sabedoria e amor, o seu
sacerdócio no mundo das letras.
A revista “ Paulópolis ” e outras de caráter literário que apareceram
em São Paulo nos princípios deste século, tiveram nêle colaborador assí .
duo e animador entusiasta . Aliás, como veremos mais adiante, as revistas.
foram sempre o seu fraco. Foi para aquela revista, em uma tarde de
1903, no Café Guarani , que Amadeu entregou a Veiga Miranda o soneto
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

que " especialmente define em síntese a sua intrínseca santidade ", o qual
foi incluído depois nas páginas de “ Névoa” e que aí vai, em sua forma
original, conforme citou -o Veiga Miranda no discurso de recepção a Alti
no Arantes, na Academia Paulista de Letras :

VOZ INTIMA

Fecha -te, sofredor, na alva túnica ondeante


dos sonhos! E caminha, e prossegue, embebido,
muito embora, na dor de um fiel celebrante
de um estranho ritual desdenhado e ,esquecido !

Deixa ressoar em torno o bárbaro alarido,


deixa que voe o pó da terra em torno ... Adiante !
Vai, tu só, calmo e bom, calmo e triste, envolvido
nessa túnica ideal de sonhos alvejante.

Sê, nesta escuridão do mundo, o paradigma


de um desolado espectro, uma sombra, um enigma,
perpassando sem ruído o caminho do Além.

E só deixes na terra uma reminiscência :


a de alguém que assistiu à luta da existência,
triste e só, sem fazer nenhum mal a ninguém.

Assim se identificavam em Amadeu Amaral o homem e o poeta. Am


bos foram , sempre, inseparáveis, nos liames franciscanos da irmã Bonda
de e da irmā Ternura ...

III

Entrementes, nas lides jornalísticas , depois da iniciação no vovô “ Cor


reio Paulistano ", passara - se para “ A Platéia ” e depois para o “ S. Pau
lo " e o “ Comércio de S. Paulo ", jornais que marcaram época e nos quais
conviveram alguns legítimos luminares da vida política e literária do seu
tempo. Enquanto isso Amadeu, silenciosamente, dava -se todo à sua arte
de eleição a poesia. Aperfeiçoava-se sem torturas , sem pressa e com
elegância, com os cuidados de cavaleiro antigo a aprestar -se para o tor
neio . Sua dama o esperaria. O êxito farto de " Urzes ” não o atirou à im
provisação que detestava, nem o impeliu a lançar-se tão cedo a nova
aventura. Um espaço de dez anos mediaria até a publicação de “ Névoa ” .
No ano de 1901 ou 1902, em S. Carlos, casava -se com sua prima Er
cília Vaz do Amaral. Os pais de Amadeu eram também primos entre si .
Das vésperas de seu casamento , conta ainda Veiga Miranda, data
aquele belo soneto com que se dirigiu aos amigos, convocando -os a manter
perenes os laços que os uniam :

Oh ! Como é bom sentir na treva incerta


a amiga voz que à nossa voz responde,
a doce mão que a nossa mão aperta !
12 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Vamos, rodeai-me sempre assim ... Cuidado !


Quero, na escuridão que nos esconde,
ouvir os vossos passos ao meu lado.

Ao lado do jornalismo e de sua arte, de dois outros misteres se ocu


pou mais especialmente Amadeu : o magistério e o funcionalismo público .
Servir ao Estado é um destino ao qual não escapa a maioria dos escrito
res. Como funcionário, a título de informação, registemos que entrou , por
concurso, na Repartição Central de Polícia, aí ocupando, em 1905, o lugar
de oficial de gabinete do chefe de Polícia, dr. Antônio de Godoy, seu ami
go e companheiro do “ Correio ” , até a morte dêste, naquele mesmo ano,
se não há equívoco. Mais tarde, com intervalos, foi funcionário da Secre
taria da Justiça, do Recebedoria de Rendas da Capital (chefe de Secção )
e da Inspetoria de Rendas do Rio de Janeiro . Sua admirável independên .
cia moral, que se não coadunava com os hábitos políticos da época, levou - o
constantemente a exonerar - se das funções públicas que, com intervalos,
exerceu .
Como professor é voz corrente que descuidava da matéria obrigató
ria do ensino. Em compensação tinha o dom de prender os alunos com sua
prosa fluente, elucidativa, encantadora. Ao morrer era um dos diretores
do Ginásio Moura Santos, desta capital .
A cidade de São Paulo foi realmente o centro de todas as atividades
de Amadeu Amaral. Aqui escreveu a maior parte de sua bagagem literá
ria. Teve uma experiência no Rio de Janeiro, mas logo voltou a S. Paulo .
Ao mesmo tempo, diversas cidades do interior paulista , além da sua Capi
vari, lhe mereceram insigne amizade. É o caso de Atibaia e Jundiaí, por
exemplo.
Também morou algum tempo em S. Carlos do Pinhal, onde se dedi
cou ao magistério. Tudo indica que as exigências da luta pela vida
Amadeu foi sempre pobre e desde a morte do pai ( 1902) tinha aos ombros
os encargos de toda a família o levaram , em fins de 1907, à progressis
ta cidade da Paulista. Assim é que nos exemplares de princípios de 1908
do “ Correio de S. Carlos ” depara -se o seguinte anúncio :

“ AMADEU AMARAL prepara alunos para a matrícula


nos cursos normal e complementar e para exames preparatórios " .

Dava as lições em sua própria residência em S. Carlos, à Rua 13 de


Maio, 39, ou na residência dos alunos. Abriu ainda o " Instituto Sancar
de pouca duração. Assegura - se que parte da produção de " Espu
ma ” foi composta nessa cidade, ou pelo menos boa parte de “ Névoa ” .
Como não podia deixar de ser, fêz jornalismo no “ Correio de S. Car
Jos ” , onde também colaboraram Rubens do Amaral , Tiago Masagão , Le
mos da Cruz, Artur Bilac e outros . No “ Correio ” redigiu a secção “ Notas
e Notícias " . E ... fêz também caricatura. Não manejava mal o lápis.
Além de outras, o citado periódico publicou, em sua edição de 22 de ja
neiro de 1908, uma caricatura de Guerra Junqueiro de autoria de Ama
deu. Talvez muitos não saibam que Amadeu pintava regularmente e deixou
alguns quadros. S. Carlos sempre o teve em grande estima . Não faz mui
to deu seu nome à Biblioteca Municipal da cidade.
Em S. Carlos , fundou um jornal para crianças . Redigiu e ilustrou o
primeiro número , que não chegou a sair. Jornais para crianças constitui
J.W.R.

AMADEU AMARAL
( Desenho de Wasth Rodrigues )
1
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 73

ran outra das suas constantes preocupações. Ainda pouco antes de morrer
editava aqui em S. Paulo o “ Malazartes ", de que sairam apenas cinco
números. Não encontrou ambiente e está fazendo falta .
Já em 1909 estava de volta à capital paulista. Chamavam -no para
ocupar um lugar na redação do “ Comércio de S. Paulo", onde logo che.
you a secretário. Na bagagem trazia quase todos os versos de " Névoa " e
muito dos célebres poemas de “ Espumas ” .
Um episódio relevante ocorreu então : a fundação da Academia Pau
lista de Letras, que se tornou possível graças à intervenção realmente pro
videncial de Amadeu . Adoentado, éste voltara para S. Carlos a refazer
as forças. Substitui -o na secção “ Dia a Dia " do Comércio ” Roberto Mo
reira, que logo entra em acesa polêmica com o dr. Joaquim José de Car
valho (J. J. de Carvalho ) , médico ilustre, pai da idéia da fundação da
Academia e que a desejava não exclusivamente literária , mas o cenáculo
dos grandes nomes da vida paulista. Roberto Moreira e os de seu grupo a
queriam no modelo de sua congênere Brasileira : uma academia literária .
la acesa a polêmica quando, em carta aberta a Roberto Moreira, intervém
Amadeu, mostrando a conveniência de concretizar -se a iniciativa ( 1 ) .
Amainaram -se como por encanto os ânimos acirrados. Estava vitoriosa a
Academia, que viera à luz a 5 de setembro, dando asso ao debate, e oficial
mente instalara -se a 27 de novembro desse mesmo ano de 1909 .
A Amadeu, sócio fundador, coube a cadeira número 33, que tem por
patrono Teófilo Dias, o poeta maranhense da “ Lira dos Verdes Anos ” ,
** Fanfarras ”, “ Canticos Tropicais ”, - tribuno eloquente e político apai
xonado, por certo uma antítese do modo de ser de Amadeu Amaral, mas
por este mesmo escolhido para seu patrono, talvez por essas misteriosas
afinidades espirituais, em que não se pode ver contradições ... Ocupa
hoje a mesma cadeira o sr. Altino Arantes.
O nosso poeta estava destinado a ser um verdadeiro nume tutelar da
Academia Paulista de Letras. Já nos últimos anos de sua vida, presidin
do -a, veio -a sacudir do torpore indolência, reorganizá -la, refundí-la,
deixá - la, enfim , com pujança, tradição e grandeza .

IV

Tivera início o período áureo da vida de Amadeu Amaral. Contava


31 anos, um nome feito e um grande cabedal de experiência, estudo e
trabalho. Chefe de família seu último filho não nascera ainda, cheio
de preocupações econômicas, continuava o mesmo idealista sincero de tô
das as boas causas. Detestando a teatralidade, amando , “ com nobre orgu
lho de pobre " , a sua dignidade de homem , o que o levava a desprezar
a subserviência, os penduricalhos dos amigos influentes e as tertúlias de
auto -elogio das infalíveis " capelas " literárias , Amadeu, em plena matu
ridade, colheria desde aí as vitorias do seu próprio mérito ,
De fato . O ano de 1910 marca o início das grandes afirmações de seu
espírito . Registam - se nêle dois fatos de grande influência na vida do nos
so poeta - a publicação de “ Nevoa ”, que veio dar-lhe um lugar de proa
1) Paulo Duarte, no estudo que precede " Tradições Populares " , e
Roberto Moreira, em duas recentes conferências, focalizaram pormenori
zadamente esse episódio da fundação da Academia. Outro documento va
lioso a esse respeito é a carta que Amadeu dirigiu ao seu substituto na
secção " Dia a Dia " , contendo, em pagina digna de antologia, verdadeira
lição sõbre a arte da polêmica.
74 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

nas letras brasileiras, e a sua entrada para a redação d " O Estado de


S. Paulo " .
A mudança de orientação do “ Comércio ” deixara-o, voluntariamen
te, no desemprego ( 1 ) . Júlio Mesquita mandou chamá-lo para o " Esta
do ” , onde, afinal, a sua sincera e indestrutível vocação de homem de jor
nal encontrou um campo de segura expansão. A solidez do jornal de Jú
lio Mesquita e a sua projeção, coisas então raras na imprensa brasileira,
que era ainda uma aventura temerária de idealistas e sonhadores, permi
tiram -lhe realizar, com continuidade, amor e rara visão, a sua obra jor
nalística. Ali mesmo no “ Estado ”, entre rapazes obscuros da revisão ou
jovens companheiros da redação , e até entre os clássicos " sapos ” ou al
gum longinquo correspondente do interior, formou numeroso grupo de
discípulos , dentre os quais teve alguns de seus melhores amigos. Fêz épo
ca, por ocasião da 1.a Grande Guerra, o chamado grupo do Estadinho ” ,
que tinha em Amadeu um dos seus chefes.
Aliás, Júlio Mesquita, mestre de tôda uma geração de jornalistas e
sempre parcimonioso no elogiar, já antes dissera de Amadeu : " Êste moço
vai longe no jornalismo ”. Não errou. Amadeu foi, de fato, uma das mais
legítimas expressões da imprensa brasileira contemporânea, digno de figu
rar, lado a lado, naquela galeria de pioneiros, misto de políticos e de filó
sofos, que tanto brilho emprestaram à imprensa do Rio em algumas fases
decisivas da história pátria, mormente nas campanhas abolicionista e
republicana.
Menos político, não possuia, entretanto, menor senso do povo do que
êsses, ou seja : a preocupação de interpretar, de traduzir, de reinvidicar
as aspirações coletivas; de dar-lhes formas concretas no encalço de solu
ções justas.
Conduzindo -se, sempre, por uma linha de honestidade que, na pro
fissão, era o reflexo do seu próprio “ eu ” ; incapaz de se deixar cegar
pelas paixões do momento ; situando-se acima das competições pessoais,
exerceu na imprensa, em que muitas vezes teve postos de mando ( foi se
cretário d ”“ O Comércio " e d " O Estado ” , diretor da “ Gazeta de No
tícias ” e do “ Diário Nacional” , redator-chefe do “ Diário da Noite " ),
um verdadeiro sacerdócio. Nem mesmo quando se dedicou à luta política,
abdicou ele dêsses característicos. Sabia interpretar, como é preciso, o
relativismo das coisas e das paixões humanas. Sabia amar, procurar e
servir à verdade. Eis a sublime lição, o raro exemplo de Amadeu Amaral
jornalista.
Acrescente-se ainda que em Amadeu Amaral jornalista, o escritor e
o poeta jamais permitiram se ofuscasse o comentarista atento à interpre
tação honesta, imediata e acessível dos fatos de todo o dia. Como em
Amadeu escritor e poeta, o jornalista não absorveu ou generalizou apres
sadamente os caracteres inconfundíveis de sua arte. E nesses dois aspe
ctos paralelos, igualmente distintos, de manifestações intelectuais , ele se
nos apresenta no pleno equilíbrio de sua inteligência criadora, revelan
do - se , de uma e de outra forma, com a marca inconfundível que lhe era
própria a marca do gênio.

1) Seu artigo " Tico - Tico " , publicado no “ Comércio " em fins de
1990, foi considerado o primeiro embate da candidatura civilista , a qual.
desde a primeira hora, filiou - se Amadeu.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 75

Mereceria todo um estudo à parte o concurso ativo de Amadeu às


revistas literárias de seu tempo . Em tôda a sua vida, apagado rapaz do
interior que se aventurava na capital provinciana ou homem consagra
do pelos lauréis da Academia e o respeito do grande público, sempre
achou tempo para , em desvelados cuidados, dirigir, editar e, não raro,
redigir por inteiro, numerosas revistas, nas quais, invariavelmente, aco
lbia os neófitos das letras, dava -lhes agasalho, estímulo e direção amiga.
" Paulópolis ”, “ Revista Literária ", “ A Cigarra ' “ Vida Moder
6
na “Revista Americana ”, “Palas”, ' Terra de Sol” . Revista do Bra
sil ", " Kosmos ", a irreverente " Farpa" e o alegre " Queixoso ", além de
sua tentativa de editar um periódico infantil em S. Carlos e a publica
ção do " Malazarte ", também periódico infantil ( S. Paulo, 1929 ), foram
as principais revistas que receberam dêle o melhor interêsse e uma pre
sença salutar, quando não a própria iniciativa da publicação.
D ” A Cigarra ", que, ao lado do esquecido Gelásio Pimenta, seu
fundador, dirigiu e redigiu por muitos anos, dando a São Paulo o que
muito lhe falta hoje uma boa revista literária e popular, pode-se dizer
que foi a menina dos olhos de Amadeu. Deu-lhe algumas de suas melho
res páginas e um esforço que nem as ingentes dificuldades de semelhan
te obra fizeram desanimar.
Na “ Revista do Brasil ” , a ousada e empolgante realização de um
grupo de intelectuais paulistas, continuada depois por Monteiro Lobato
e cujo título pertence hoje ao poderoso consórcio dos “ Diários Associa
dos " , Amadeu Amaral, além de participar de sua fundação ( foi um dos
acionistas da sociedade anônima que lançou a Revista e cuja diretoria
era presidida por Ricardo Severo ), colaborou desde o primeiro número,
saído em 1916. Nêle assina (páginas 31 a 36 ) o “ O elogio da mediocrida
de ”, página clássica que deu depois nome a um de seus livros.
Leo Vaz, em artigo escrito por ocasião do jubileu do " Jeca Tatu ” e
publicado em “ O Estado de S. Paulo ” de 29-8-43 ( 1 ), conta , com riqueza
de detalhes, o que foi a vida dessa admirável publicação sob a direção de
Monteiro Lobato. Lembra os nomes ilustres que ali faziam “ ponto”, trans
formando - a num verdadeiro cenáculo das letras.
A convite de Lobato, Amadeu, juntamente com Afrânio Peixoto , as
sumiu em janeiro de 1921 a direção da “ Revista do Brasil ” . “ Chefiada
por dois azes dessa envergadura, notavam os Editores em “ Declara
cão " estampada na primeira página editorial do n .° 61 ( janeiro de 1921 ) ,
temos a certeza de conseguir o que sempre constitui o nosso objetivo :
fazer dela uma publicação sem rival entre nós, como elevadíssimo expoen
te da cultura brasileira, que será”.
Permaneceu o nosso poeta apenas seis meses nesse cargo , tempo su
ficiente, porém , para que correspondesse à confiança demonstrada pelos
Editores. Uma de suas iniciativas foi abrir a publicação a muitos dos no
vos, tidos como revolucionários e que traziam em germe a Semana da
Arte Moderna. Entre eles, Mário de Andrade.
No n.º 66, junho de 1921, justamente o último saído sob a direção
conjunta de Amadeu e Afrânio Peixoto ( este continuou ainda na dire
ção ), o primeiro trabalho ( páginas 193 a 211 do vol. XVII ) é um estudo
de Mário intitulado “ Debussy e o Impressionismo” .
A apresentação desse artigo, de indubitável lavra de Amadeu , assi
nala em grifo :
1) Esse artigo foi reproduzido em " O Estado " de 8-7-1948 .
76 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

“ O Autor é um dêstes jovens que, cheio de estranho vigor e ga


lharda independência, vêm revolucionando as idéias no campo da lite
ratura e da arte, em S. Paulo. Este seu estudo deve ser lido com
prazer e proveito por aqueles a quem não sejam indiferentes as ques
tões relativas à evolução artística nos tempos modernos”.
Já não está aí definida a perfeita compreensão com que Amadeu as
sistiria , pouco depois, sem alarmar -se, o deflagrar da célebre Semana
de 22 ?
A sua vida ficou, tôda ela, pontilhada por essas realizações em prol
da cultura, por essas incessantes buscas da sensibilidade pública, essas
insistentes, embora a mor das vezes perdidas sem eco , mensagens de con
vívio às festas do espírito ...

A partir de 1910, como ficou dito, a vida de Amadeu Amaral entra


em seu período áureo. Os ideais da mocidade e, principalmente, aquela
sêde insaciável que leva os auto-didatas a percorrer todos ou quase todos
os caminhos do conhecimento, afirmam -se agora de maneira lúcida, segu
ra , a garantir a sobrevivência de sua arte.
" Névoa ” revelava, amadurecido, o poeta vigoroso que se deixara an
tever nas páginas primitivas de “ Urzes ”. Editada pela Livraria Maga
Thães , “ Névoa ”, hoje raridade bibliográfica, era dedicado “ Aos meus ” .
Como de uso na época trazia , em medalhão, o “ clichê” do Autor, que
usava então fartos bigodes.
Apresentando - a escrevia “ A quem lê ” :

Só te posso ofertar estes versos nevientos ,


ondas em que ouvirás , indistinto e confuso ,
um remoto fragor de vagas e de ventos.

Composições de grande beleza reunem-se neste livro. Assim o já cita


do soneto “ Voz íntima" e outros como “ Rios ” , “ Sonhos de Amor " etc.,
além dos ciclos poéticos de “ A velha comédia ” ou “ Fôlhas ao vento ".
À publicação de “ Névoa ” seguir -se-ia, com intervalo longo, embora
a obra já estivesse em parte pronta, a de " Espumas" ( 1917 ) , considerada
o seu livro máximo. Uma intensa atividade jornalística assinala também
êsse intervalo . Pela “ Revista do Brasil” divulga numerosos trabalhos,
reunidos depois em livros, inclusive o primoroso ensaio “ O dialeto cai
pira ” ( nºs. 10 e 11, out. e nov. de 1916 ) , que abre a série de seus valiosos
estudos folclóricos. Ali também aparecem ensaios críticos, como o já refe
rido “ O elogio da mediocridade ”, logo seguido de " O Brasil, terra de
poetas” (Sesra de Aristarcho ) etc ..
E se avançarmos até 1920 , teremos, depois de seu “ Discurso' na
Academia (1919), as “ Letras Floridas ”, “ A Pulseira de Ferro ”, “ Um
Soneto de Bilac e o “ Dialeto Caipira " .
Foi nessa mesma década ( 1910-1920 ) que o mundo assistiu, sem apren
der -lhe os brutais ensinamentos, a catástrofe de 14-18 ; que alguns países,
entre eles o Brasil, completaram ante os perigos que rondavam os po
vos fracos ou inermes a sua formação nacionalista, motivando, por ou
tro lado, vigoroso renascimento intelectual e, no campo econômico, ras
gando, pelo impulso da indústria, as primeiras clareiras na vegetação co
lonialista ; que, reflexos imediatos dos sucessos da guerra , de novas ideo
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

logias em choque e das primeiras desilusões da paz, problemas sem conta


se precipitavam de roldão, abalando os fundamentos de tôda uma ordem
social que envelhecera do dia para a noite.
Amadeu, que nunca foi homem para “torres de marfim ” , viveu a
sua época com intensidade. Não fosse ele jornalista ... Todos os dramas e
contradições desse tempo conturbado, antevéspera de dias ainda mais
negros e incógnitos, não mataram a sua grande fé nos destinos do ho
mem . Acreditava na nobreza da vida e nos seus ideais. Não era um agnós
tico, e com certeza os detestava cordialmente . Cria que o bem sempre
venee a última batalha e que nada se perde, ainda que tudo ao redor se
manifeste em contrário, por acreditar nêle.
Daí, com convincente despreocupação, ter preferido, a vestir a cota
do cruzado, tão própria do tempo, tomar o bordão do peregrino e derra
mar, pela sua poesia, a pregação da bondade e da beleza. “ Espumas” e,
depois, " Lâmpada Antiga" , assim nô - lo mostram .
Ama o que é forte e puro, odeia o que é perverso ,
o que é baixo, o que é .vil, tudo que anda de rastros
E põe- te em comunhão, no entusiasmo que abrasa,
com a Beleza, esplendor da Vida e do Universo,
com a poesia, os heróis , os abismos e os astros.
( A um adolescente - " Espumas " )
Seus versos não refletem outra filosofia, outra fé, muito embora êle
situasse aquém a sua preocupação de artista, como a interpretou no fêcho
do soneto com que apresenta “ Espumas ” :

passam a vaga e as flores ;


nada impede que o mar ondule e o chão floresça ...

Eu não construo : canto ... E entre todas as glórias


Basta-me a de espelhar em poemas incolores
o perpétuo esplendor das coisas transitórias.

Às vezes, porém , o idealismo é suplantado pela outra face das coisas ,


aquela, infelizmente, mas afim com a realidade cotidiana e quase sem
pre divorciada do sublime. E o poeta, então, faz concessões à ironia, como
em “ A Delícia da Vida " ou põe à mostra , nua, tôda a crueza dos cami
nhos do mundo, como se lê em “ Jesus entre as crianças ”, no “ O Vagalu
me e o Escaravelho " ou se subentende em " A Vida ” a

deixar pelos caminhos


mil farrapos de carne e o sangue de mil chagas.

Em " Vencedor ”, como esses outra jóia de " Espumas ", êle canta a
vacnidade da glória :

entrarás bocejando a áurea porta da Glória,


e olharás com surpresa a multidão calada.

A onda humana avançou, cresceu, ergueu -te numa


investida triunfal ; depois, recuou desfeita ...
Como há de a onda parar, para que brilhe a espuma ?
78 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

E aí, nesses momentos de meditação, de piedade ante o relativo e as


contradições da existência, vemô-lo como que à procura de um erimitério,
mais perto de Deus e mais longe dos homens, no suave refúgio das soli
dões e belesasda terra natal, a reavivar,noconvívio das coisas amadas,
a fé por ventura ameaçada. " Tapera ” , “ Crepúsculo Sertanejo ” , “ A Boa
Árvore e “ Prece da Tarde ”, todos de “ Espumas ”, assim como nume
rosos outros, o revelam nesta sua fuga consciente para o ámago das coi
sas belas, porque puras e simples, de onde retorna enrijecido e forte.
Gênios mansos da tarde, escutai minha prece.
Sinto-vos deslizar por éstes ares ... Pondes
um véu de sêda azul no ombro nu da colina.
Entre os moitas, o rio, em silêncio adormece.
E sobe, lento e lento, entre os cimos e as frondes,
da fadiga da terra o sonho da neblina.

Passada esta hora, leve, em que assim se repousa


sem ilusão nem dor, numa serenidade
que surpreende e seduz o espírito contrito,
deixai-me carregar comigo alguma coisa
dêste instante feliz de beleza e verdade,
de plenitude e paz, de sonho e de infinito .
Alguma coisa, enfim , que se fique no peito,
que me fique na dor como um suave despojo,
no tumulto e no pó do mundo estreito e amargo,
como num barco prêso em pôrto esconso e estreito
parece ainda pairar, entre as velas e o bojo,
à ampla palpitação das carreiras ao largo !

( " Prece da Tarde " )

VI

Um poeta assim por tantos modos brilhante e incomum , ainda que


pregasse no deserto, operaria o milagre de se fazer ouvir ,compreender e
estimar. À publicação de “ Espumas com uma capa de Helios Sellinger,
que alguém classificou de horrível, e em edição de “ A Cigarra ” (prati
camente do próprio Autor ) , o sucesso e a glória o aguardavam .
A Academia Brasileira de Letras, que ele aliás não desdenhava, sor
ria -lhe, se é quese possa admitir esta imagem .
Falecendo Olavo Bilac, de quem Amadeu foi não só amigo e admi
rador, como soldado da primeira hora na admirável cruzada nacionalista,
tôdas as vistas convergiram para o poeta de “ Espumas ”. Candidatou -se,
pois, ao lugar de segundo ocupante da cadeira n .° 15 que, na Academia
Brasileira, tem por patrono outro grande poeta – Gonçalves Dias e é
hoje ocupada por Guilherme de Almeida. Foi seu concorrente Lauro Mül
ler, um adversário de valor. Mas as musas, desta vez, foram francamente
favoráveis ao capivariano. Foi como poeta tão só que ele conquistou a
ambicionada cadeira, pois até essa época ( 1919 ) , não publicara nenhum
livro de prosa .
Vencido o pleito , pouco depois ( novembro de 1919 ) , tomava, como é
de praxe, a solene posse.
Nessa ocasião, conta Amadeu Amaral Jr., nas “ Notas para uma bio
grafia ” , deu-se interessante episódio.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 79

O poeta, se tinha na verdade em alta conta os louros acadêmicos, por


certo era ao seu tanto avesso ao cerimonial da posse e, em especial, ao
fardão ... Paulo Duarte, então nos primeiros passos de sua carreira jor
nalística , acompanhou -o ao Rio. Quase à hora da cerimônia, em meio ao
atarentado dos preparativos, deu-se por falta do espadim . Foi necessário
que, às pressas, se arranjasse um, emprestado. Afinal, quase pronto, ao
vestir a casaca verde, virou -se o poeta para o jovem amigo que o ajudava :
- Imagine, “ seu ” Paulo ! Tanto trabalho para se conseguir uma
imortalidade temporária ...
Na sessão de posse um êxito brilhante aguardava Amadeu. O seu
discurso , que assim começa :

“ Senhores,

Entre os sonhos de minha ambição não acostumava aparecer a


Academia. Entretanto, uma vez ou outra, de longe em longe, é possí
vel que tenha surgido... A vaidade não tem boa memória. O que,
porém , vos posso garantir, é que tais sonhos nunca se permitiram a
audácia de voejar em torno de uma cadeira como esta, em que me
vejo. A cadeira de Bilac !"

E vêm depois, numa sucessão de traços fortes, concatenados com


maestria, escritos com amor e arte, aquelas tantas imagens de eloquência,
de poesia e de civismo que se fundiram em um só grande homem Olavo
Bilac. Dêle, do Bilac jornalista, do Bilac poeta, do Bilac prosador e do
Bilac civilista, o Discurso de Amadeu nos dá uma visão tão completa
quanto possível nos limites de uma hora de oratória.
São páginas, naturalmente rebuscadas, em que o novo acadêmico em
pregon o melhor de si e de sua linguagem para se fazer expressar. A isto
a mão do artista inato deu toques surpreendentes, interpretações fidelis
simas, que abrangem , também pelas diretrizes de uma análise psicológica
do homem e do seu tempo, algo da própria interpretação da Pátria, como
a sonhon, como a quis e como lutou para que fosse o grande esquecido de
" O Caçador das Esmeraldas ".
É nesse discurso ( Secção de Obras d " O Estado de S. Paulo " S.
P. - 1919 ) que deparamos em Amadeu um aspecto quemuitos desdenha
ram nêle, na ocasião em que mais tarde viveu a sua aventura política : a
do poeta, do artista, a dar-se bem com a análise dos nossos empedernidos
problemas e a lhes desvendar o amago.
Recordando o início, em S. Paulo , da Campanha Nacionalista , em que
Bilae, nada patrioteiro, jogou o peso de sua veemência para sacudir o
patriotismo brasileiro quando este, em meio à desorientação geral, a frase
é de Amadeu, depois “ de se ter exacerbado em nervosos excessos repou
sava em uma estagnação abjeta ” , - o Discurso justifica o porque de
Bilac ter preferido s. Paulo ao Rio para dar início à memorável cam
panha. E, em página memorável, faz interpretação fiel de sua terra em
seu papel dentro da nacionalidade ( Discurso, páginas 62 a 65) , que vale
por uma das melhores análises que até hoje a dinâmica missão civilista
de S. Paulo mereceu dos seus grandes homens .
80 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

VII

Eis o nosso poeta em pleno zenite. O lugar que conquistou e mante


ve passaria indelével para o patrimônio das belas letras, como fonte cons
tante de inspiração e beleza. Pelo próprio valor alçar-se às alturas e
nelas manter -se sem declínio foi a melhor lição de sua vida de peregrino
da arte .
Voltando a S. Paulo, coroado pela imortalidade acadêmica, Amadeu .
sentia - se como que obrigado, ao contrário dos que preferem dormir sõbre
os louros, a voltar -se com maior afinco às preocupações de escritor. Pro
moveu uma como que revisão de sua bagagem esparsa, dando à publici
dade, em 1920, “ Letras Floridas ” livro em que reuniu várias das con
ferências que proferira na capital e no interior. Publica também “ A Pul
seira de Ferro ”, uma pequena amostra do seu valor como ficcionista, logo
depois vertida para o castelhano por Benjamim de Garay e estampada en
"La Nacion ” .
Ainda em 1920, em agôsto, profere em Jaú a consagrada conferência
“ Um Soneto de Bilac”, considerada o seu maior éxito oratório. Pelo Na
tal dêsse ano, em Ribeirão Preto, brindou o seu público com esse mimo
de patriotismo e sentimento humanitário, que é a conferência “ Cuidar da
Infância ”, publicada no n.° 62, fevereiro de 1921, da “ Revista do Bra
sil " e logo depois editada ( Secção de Obras do Estado de S. Paulo
1921 ) .
Sai em livro , naquele mesmo ano, o “Dialeto Caipira ” ( Casa Edito
ra “ O Livro " S. P. 1920 ), obra essencialmente de honesta e labo
riosa pesquisa científica, inaugurando os trabalhos de Amadeu em terre
no que se fazia mister cultivar, para que se preservasse, ao lado das tra
dições populares, todo um patrimônio de conhecimentos linguísticos.
Amadeu Amaral, desde anos antes, vinha se entregando , com paciên
cia beneditina, às pesquisas folclóricas e linguísticas no meio caboclo .
Neste particular é de todos conhecida a contribuição inestimável que, mui
tas vezes como pioneiro, trouxe ao meio cultural do país. Apelou, debal
de, à Academia de Letras66 para que centralizasse os estudos folclóricos
brasileiros. Seu discurso ' Uma tarefa a executar ”, feito na Academia
( 1925 ) é amostra da veemente paixão e do zelo com que se entregava &
êsses estudos. Bateu-se pela fundação de entidades folclóricas, procuran
do insistentemente despertar os mais vários interesses para esse campo
fecundo, que se hoje tem muitos cultores estava então à míngua. Se uen
sempre, quase nunca, foi ouvido, realizou sozinho trabalho monumental ,
revelando qualidades de sociólogo e pesquisador ( 1 ).
Nesse ingente esfôrço, mobilizava, da ' redação dº Estado”, OS
correspondentes das cidades do interior, enviando-lhes circulares e car
tas. Solicitava -lhes, insistentemente, como em uma delas datada de 20-1
1920, “ cópia ou indicação de quaisquer composições poéticas, de autor
paulista ou não, conhecido ou não, referente a assunto Paulista de qual
quer naturesa história, lenda , costumes, etc .; e apanhados fiéis de
todos os versos populares paulistas, com as respectivas variantes,
se
houver. ”
Entre uns papéis de família encontrei a seguinte carta autógrafa que
Amadeu Amaral dirigiu a Francisco Damante, meu pai, ao tempo mestre
escola em Bom Jesus dos Perdões, neste Estado, e também apaixonado
1) " Tradições Populares" ( IPE 1948 ) dá bem amostra da
riedade e qualidade desses estudos de Amadeu .
Máscara mortuária de Amadeu Amaral , da qual existem dois exempla
res : um pertencente à Academia Brasileira de Letras e outro ao escritor
Paulo Duarte.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 81

pelo folclore ( 1 ) , carta que dá bem amostra do zelo que colocava eca
suas pesquisas e do valor que representa o material contido e comentado
nos vários trabalhos seus, artigos e livros, que consubstanciaram tais es
forços :

“ S. Paulo, 5 - II - 1920 .

Prezado Sr. Damante

Agradeço- lhes a remessa dos interessantes versos que colheu e peço


lhe encarecidamente que, podendo, continue a ceifa e expedição. Aqueles
que eu não aproveitar agora irão para o arquivo, e terão a sua oportuni
dade. Muito curiosos os do poeta sertanejo .
A sua bondade autoriza -me a recomendar -lhe o seguinte:

a) colher de preferência versos que correm no seio do povo, repeti


dos anonimamente;
b) escrevê- los sem modificação alguma;
e) quando colher versos de autor conhecido, declará-lo expressa -
mente, para não se confundirem com esses que correm de bôca
em bôca e cuja procedência em regra se ignora ;
d) apanhar também os versos, refrãos, parlendas, etc., das crianças .

Desculpe -me o paulífico ... Publicarei, ent breve, o artigo que me


enviou sôbre a festa de S. Gonçalo. Continue a mandar trabalhos nesse
gênero, contanto que bem fiéis nas narrativas e na reprodução dos versos ..
Disponha do amº. obrº.
Amadeu Amaral"

Assim , indo diretamente às fontes da formação popular essa carta


vale por um pequeno método de pesquisa , rigorosamente científico -
Amadeu reuniu e divulgou, num inestimável serviço à cultura nacional,
o precioso cabedal linguístico e folclórico que se encontra no “ Dialeto
Caipira ” , na “Poesia da Viola " , publicada um pouco mais tarde ( Socie
dade Editora Olegário Ribeiro, S. Paulo , 1921 ), e nos numerosos traba
lhos que deixou inéditos, inclusive todo o “Cancioneiro Caipira ". Assim
pagava às letras brasileiras a sua consagração pela Academia .

VIII

Amadeu Amaral foi orador ? Sim. As suas numerosas conferências,


o seu Discurso de posse e outros na Academia, as suas campanhas polí
tieas, deixaram do poeta como oradar uma imagem viva e precisa. Sem
teatralidade, Amadeu falava fluentemente, com essa eloquência comedida
que tanto desagrada as platéias dos comícios encenados. Não era na ver
dade orador para as massas.
O seu porte talhava-se para a tribuna e do seu êxito discursando dão
prova os convites sem conta que recebia para proferir conferências aqui
e ali. () timbre excelente da voz aliava -se à autoridade com que tratava
de temas capazes de impressionar e fazer meditar. Não era orador de

no 1 ) S. Paulo
Francisco Damante publicou , no gênero, “ Na Roca " ( Tip. Cumi
1919 ) e "O Bom Povo " ( Gráfica Editora Monteiro Lo
bato S. Paulo - 1925 ) .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

temas fortuitos ou simplesmente agradáveis. Não improvisava, porém .


1 Sempre negou tal concessão ao temperamento brasileiro. A isso se deve
-acharem -se preservados todos os seus discursos e conferências .
Contudo, Amadeu Amaral Júnior atribui a conferência “ Um Soneto
de Bilae " a uma semi-improvisação. A conferência foi proferida no Jaú
Clube, a 20 de agosto de 1920, na cidade do mesmo nome. E a propósito
conta o filho que, chegando à cidade ( segundo ele Jundiaí ) , à hora do
almoço no hotel, foi Amadeu surpreendido com a obrigação de proferir
uma conferência, dali a instantes , e uma conferência sobre Bilac. Pediu
papel e tinta , fechou -se num quarto e dali a duas horas dirigiu -se ao
salão levando no bôlso seu maior sucesso oratório.
O mais certo, porém , é ter ido a Jaú com o fim precípúo de fazer a
conferência. E se, de fato, a escreveu à bôca do pano, nada há de estra
nbável, justamente em se tratando de Bilac, que ele conhecia como pou
cos, e de poesia, o seu próprio elemento .
De qualquer forma essa conferência, logo mais publicada (Edição
do Jaú Clube ), é realmente uma obra prima de oratória e de estilo.
Trata -se de “ uma viagem de recreio em torno e por dentro de um so
Deto " o soneto “ Língua Portuguêsa ", de Olavo Bilac, no qual se en
contra aquele verso imortal :
última flor do Lácio, inculta e bela .

Depois de uma viagem em torno do soneto, demonstrando que é da


queles raros que não admitem amplificações , situado como está no ponto
preciso de condensação, estudou o soneto de Bilac por dentro, a sua forma
e fundo, o seu vocabulário, a sua métrica.
Este trabalho revela, particularmente, um aspecto de sua personali
dade que convém ainda ressaltar: Autodidata como os que mais o sejam ,
Amadeu foi homem culto como poucos . Amou o convívio dos clássicos e
dos mestres do pensamento. Leitor insaciável, estudioso, sabia ordenar e
selecionar aquilo que passava a integrar o seu “ eu ”, como parte de um
conhecimento que se ampliava sempre.
As duas conferências sobre Dante ( Sociedade Editora Olegário Ri
beiro, S. P., 1921 ) , o estudo sôbre Machado de Assiz, o ensaio “ Estudo
crítico sôbre a arte " e este outro sôbre Luís de Camões ( publicado na
“ Revista da Língua Portuguêsa ” e por esta editado 1924 ), em que
situa, com maestria , a época, a vida, o caráter, a formação de Camões e
& vitalidade e atualidade de suas obras são exemplos, ao lado de ou
tros, de seu valor como homem de pensamento e de estudo. E aqui, como
se vê em “ Um Soneto de Bilac ” , o artista completava harmoniosamente
o erudito .

Em 1923 Amadeu mudou -se para o Rio. Ia secretariar “ A Gazeta de


Notícias ” , que dirigiu depois. Exerceu ainda um cargo na Inspetoria do
Impôsto Sôbre a Renda. “ Lâmpada Antiga ", “ Luís de Camões " e " O
elogio da mediocridade " datam de sua permanência na Capital da Repú
blica ( 1 ) , embora, com exceção do segundo, publicados e escritos em
1) O prefaciador das " Obras Completas" conta que, por ocasião
dessa estada no Rio, Amadeu realizou ( 1923 ), lá ficando um mês. Foi,
por certo, a viagem mais longa que fez, Do Rio manteve intensa colabo
ração no " Estado " .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 83

grande parte em S. Paulo. Ambos os cargos que ali ocupou, no jornal e


no funcionalismo federal, deixou para não quebrar sua linha de conduta.
Sempre o mesmo inflexível Amadeu ! Do Rio eria assistido à Revolução
de 24 e é fácil calcular -se suas apreensões e cuidados.
Não tardou ( fins de 1925 ) e reinstalava -se no seu velho S. Paulo e
na sua velha banca da redação do “ Estado ” . Coube-lhe mais tarde, sem
abandonar essa fólha, dirigir o “ Diário Nacional". Em novembro de 1928
aceitou o lugar de redator- chefe do “ Diário da Noite ” , cuja sociedade
anônima também presidiu. Nesse pôsto o alcançou a morte.
Como ainda hoje tantos escritores de valor neste país, pouco ou ne
nhum proveito pecuniário auferia de seus livros, ao contrário do jorna
lismo, do qual, pràticamente, sempre viven. Muitas vezes custeou de seu
bolso as próprias edições. A esse propósito é sugestiva a carta que, em
t'ins de 1921, dirigiu a seu primo Trajano Assunção Pacheco, residente
em S. Carlos e já falecido.Ela aí vai, por gentileza de Clóvis Pacheco :

" Trajano
Depois que recebi sua carta, não me lembro se mandei ou não
nova remessa de volumes , tantas coisas se me remexem na cabeça .
Porisso despacho agora mais dez vols. Se por acaso o pessoal aí achar
caro 2 $500 , pode mandar vender a 2 $000 .

Remeti a v., há dias, um exemplar.


Recebeu ?
Lembranças a todos . Primo amigo
Amadeu

10 Dezº. 1921 " .

De que livro se trata , já que a carta não se refere a ele especifica


mente ! Provavelmente “ A Poesia da Viola ” .

IX

Através dos anos que se sucederam ao triunfo acadêmico, não se des


cuidou Amadeu de sua poesia. “ Lâmpada Antiga ” ( Imprensa Metodista,
S. Paulo, 1924 ), o seu último livro de versos, reune a produção poética
que se sucedeu às páginas de “ Espumas ”.
Esse livro teve o destino singular de ser a menos conhecida de suas
obras. A Editora parece que sofreu séria crise. Pelo sim , pelo não, a obra
não teve distribuição regular. Talvez devido à agitação política da época
em que apareceu e de que era um sinal de contradição.
‘ Lâmpada Antiga” dá bem idéia da tranquilidade e da visão das
grandes alturas por ele atingidas. É este o livro que escreveu para si pró
prio e para os de sua casa. O seu Livro de Horas. O seu breviário para a
tarde da vida. É o único de seus livros de versos que tem um prefácio
em prosa, ao contrário dos outros três, apresentados com as galas de um
soneto trabalhado :
" Isto que vai aqui é uma dessas velhas lâmpadas toscas, nutridas
porém do bom óleo antigo e eterno das graves e fortes preocupações
bumanas. Não há neste livro nenhuma concepção nova, e este é
dos seus defeitos o que mais me agrada ” .
84 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Em duas partes divide - se " Lâmpada Antiga " . A primeira, escrita


em 1922, intitula -se “Carta de Guia aos meus filhos". São os versos que
escreveu para os íntimos, um como evangelho de pai aos herdeiros do seu
nome. No primeiro soneto da “ Carta de Guia ” dirige-se aos seus quatro
filhos, cantando nêles o enlêvo da vida do lar, outro de seus refúgios
certos :

AOS MEUS FILHOS

Ave canora, lépida Maria ;


Ziza, serena flor do meu rosal;
Yola, ânfora de graça e de alegria ;
Dedeu, meu bom rapaz, doce e leal :

Por vós descubro em mim nova poesia,


um senso religioso amplo e jovial;
e, árvore, canto em vós, ó ramaria,
que outra não vejo pelo mundo igual.

Algo, certo, deveis -me, como devo,


como deveis a vossa, Mãe robusta ;
mas eu vos devo maior soma. Olhai :

Vós influis -me um precioso enlêvo ,


e o bem de achar a sorte sempre justa,
e o suave orgulho de ser vosso pai.

Em seguida enumera, para os filhos, as grandes leis que elegeu para


norte da existência e que quer deixar ensinadas aos seus e, quiçá , ao mun
do : A Lei do Amor A Lei da Humanidade A Lei da Paciência
A Lei do Trabalho A Lei da Energia – A Lei da Ascensão.
Os amigos e a humanidade, na primeira série de sonetos da “ Carta
de Guia " ( A Lei do Amor ) , são lembrados e exaltados, com o carinho de
quem soube ser, sempre , verdadeiro amigo e sentir o convívio dos homens
naquilo que ele tem de universal, acima de tôdas as diversificações e
antagonismos, a sua fraternidade. É nesse sentido que se o deve com
preender quando aos filhos ensina que sejam “ humildes, isto é lúcidos”
e divisem " liberdade, até na dor " .
A segunda parte de “Lâmpada Antiga " , escrita nos anos que me
deiam de 1922 à publicação do livro, intitula - se “ Um punhado de sone
tos ”. Revela-se aqui o poeta preocupado com o eterno relativo da existên
cia ; com a vacuidade das vaidades dos homens e a vanglória que alimen
ta suas paixões insaciáveis. São, pois, versos de filósofo meditando sôbre
o transitório do rumorejar do mundo, admoestando - o às vezes, dando-lhe
os descontos que merece, sempre, porém , revelando a essência de uma fé
transcedente, extravasando uma como caridade sem limites...
Dentre os muitos trabalhos de “ Um punhado de sonetos ” , em intros
pecção viva e penetrante o autor situa em si mesmo a melancolia, o pre
cário da vida ("Estando o Autor em sua terra natal” , “ Sôbre os males
da bondade ” ; “ Em que o Autor se dirige a si mesmo várias interroga
ções sem respostas” e outros ), destaca-se o soneto “ Ao Rio Capivari ".
Esqueçamos o homem que retrata suas desilusões e suas dores nestes
versos simples e puros, mas pujantes ; o homem que no próprio refúgio
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 85

da terra querida o vê sob o prisma inseparável da relatividade o ho


nem que pode ser cada um de nós para nêles gravar uma visão iner
mum e inolvidável do artista :

AO RIO CAPIVARI

Velho Capivari, quanto mudaste !


Tinhas outrora tanta fôrça e brio,
tão lento agora vais, e tão macio,
por entre o mato que te forma engaste.

Quem te mudou assim ? Que rude estio,


que castigo do céu fez o contraste ?
Parece que em riacho te trocaste
depois de seres caudaloso rio .

Mas ... tu terás mudado, ou eu me engano ?


Vi-te com vista de menino outrora ;
e quanto errava o olhar com que te vi.

Se eu olhava o futuro era um oceano ,


e o tempo e tudo que lá vai agora ,
inda é menos que tu, Capivari!
X

Amadeu Amaral prosador deu-nos ainda, nos últimos anos de sua


vida, duas produções repassadas de vivo senso de humour: “ O Elogio da
Mediocridade" ( crítica ) e “ Memorial de um passageiro de bonde ” .
Ambos esses livros, e mais especialmente o segundo (só publicado
pòstumamente, em 1938, Edições Cultura Brasileira S. A.), dão interes
sante e equilibrada mostra do autor fundindo, numa só, várias das face
tas do seu espírito : o artista, o jornalista, o crítico, o ensaista, o roman .
eista e, por fim , o humorista , já fielmente retratado por Sud Mennucci
( " Amadeu Amaral” Conferência na Academia Brasileira de Letras
in “ Jornal do Comércio ” de 12-7-1942 ).
Cabe aqui assinalar, com a autoridade do saudoso autor de “ Roda
pés”, que Amadeu, não tendo sido embora “ um humorista no sentido es
trito do termo " e nem o seu temperamento dava-se com essa atitude
de interpretação literária soube- o ser sempre que circunstâncias já de
si humorísticas o exigiam. É o que se depreende do seguinte trecho do
" Elogio da Mediocridade” ( 1 ) , especialmente citado por Sud Mennucci
para ilustrar suas considerações, resumidas nas poucas linhas anterio
res, sôbre o " sens of humour " de Amadeu :

" A mediocridade é necessária, absolutamente necessária , quer no


sentido de coisa inevitável, quer no sentido de coisa útil. É porque
tem de ser ; além disso, é benéfica ” . E explicando :
“ Tôda a literatura pressupõe uma multidão de mediocres e não
só de mediocres, se não também de inferiores, de rudimentares, de
1) Boa parte dos trabalhos reunidos no “ Elogio da Mediocridade "
figurava antes nos " Arredores da Crítica", que não chegou a ser po
blicado. 1
86 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

falhos e de decadentes. Tanto mais luminosa ela é, tanto mais grossa


a multidão rasteira . Esse mato sustenta a indispensável capa de hu
mus, resguarda e entretem a vida incipiente das árvores destinadas à
máxima expansão. Finalmente, como por determinação providencial,
a mediocridade serve de mediadora entre a mata e a massa, livrando
os grandes de se empequinitarem demais com a preocupação de se
fazerem compreender pelo maior número . Graças a ela podem os que
ficam de cima, desencadear correntes de audaciosas idéias e de so
nhos atrevidos . Ela impede que essa água viva caia de chofre cá em
baixo, o que seria positivamente um desastre ; interposta às altas nas
centes e ao vale fundo, como um flanco de morro sulcado de fendas
e degraus, reparte - a em filetes inumeráveis, adelgaça - a em espadanas
e chuveiros, e leva - a aos lavradores da baixada, em estado de servir
humildemente à cultura das couves e das abóboras ” .

Já no " Memorial” esta sua acuidade psicológica, a capacidade de


sua arte de fixar o ámago das coisas, revelam -se com uma plenitude digna
da estirpe machadiana.
O " Memorial" é, antes de tudo, obra de jornal, uma ampla reporta
gem sôbre o cotidiano, cujo terra -a -terra, cujos contrastes violentos ou
simplesmente ridículos e cujas desilusões, às vezes irreparáveis, vêm des
critos, até com ternura, por um homem já experimentado na vida e capaz
de olha -la por inteiro, como realmente é, sem preconceitos ou distorções.
Amadeu escreveu o “ Memorial” em rodapés no " Estado ”. Assina
va -os sob o pseudônimo de Felício Trancoso e assim , mais à vontade pelo
eclipse voluntário do nome do escritor consagrado, pinta um largo mural
da paisagem humana. Desse modo Felício, no fundo um filósofo para
quem " a melhor maneira de estar só é achar-se no meio de uma porção
de estranhos”, vai relatando suas impressões do bonde de cada dia, no
qual os tipos se confundem e desfia a humanidade êle, o Felício, que
não trocava seu lugar no elétrico nem mesmo ante o sedutor convite de
amigo solícito , a se pavonear na direção do último e sólido modelo do
insuperável “ Dodge" de há vinte e cinco anos ...
Porisso mesmo, pelo seu conhecimento “ ao vivo", pôde Felício dar
nos o seu retrato, algo melancólico, mas não pessimista, do “ Homem Per
feito ” o sr. João Cesário da Costa ( de certa forma êmulo burguês do
medíocre literário ) solidamente instalado na vida, o tipo acabado do
homem comum, mas imprescindível inclusive à ordem pública, para não
falar nos bons costumes e na sã moral ! Felício Trancoso justifica - o e
consagra - o no seu lugar comum : Suponha -se agora estes inumeráveis
“ Cesário ” preocupados em fabricar idéias, esmaltá -las sob formas gra
ciosas e cortantes. Que calamidade !...
Mas, de vez enquando, lá deixa o subconsciente do homem essen
cialmente bom que foi Amadeu, escapar alguns trechos de real e impen
sada autobiografia como se lê neste trecho de escol do “Memorial ” ,
tarħbém destacado por Sud Mennucci na sua citada conferência :

“ Os homens só nos avaliam, nos pesam , nos apreçam pelas nos


sas projeções exteriores. E essas projeções, para terem valor, se bão
de articular com as necessidades, os desejos, as conveniências, as as
pirações dos que nos rodeiam. Valem pela soma de utilidade e de
oumplicidade que levam consigo. Mas um indivíduo realmente e sim
plesmente bom é o mais desvalido dos homens. É, talvez, uma árvore
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 87

frutífera , mas que produz frutos quando é sazão, e fora disso não
produz mais nada. Ali está , no seu lugar , quieta, sem movimento ,
sem iniciativa, sem préstimo, sem solicitudes, sem graça. Apenas dá
sombra. Uma sombra igual para todos. Mas que importa aos ho
mens uma árvore que dá sombra ! A " sombra aproveita quando ader
ga, gosa -se, saboreia -se, mas não se tem nnehuma gratidão para a
planta equânime que não nô-la reservou para nós e que dará ao pri
meiro vagabundo que a procure. Assim, a árvore de boa sombra vive
realmente isolada, cercada por uma densa muralha de impenetrabi
lidade própria e de alheia indiferença ! "

Eis, na verdade, Amadeu Amaral em um aspecto incomum de sua


generosa e humilde grandeza.

XI

De uma sensibilidade excessiva, desconfiado e tímido, Amadeu Ama


ral escreveu com açêrto um dos seus necrologistas - entendeu, certa
vez , que devia lançar -se num terreno onde um homem puro , a cada passo
que dá, recebe no coração um golpe rude e na cabeça uma vaga de lama.
Fêz- se político e disputou cargos de representação ... Colheu, como era :
natural, o que um homem do seu feitio devia colher em seára tal, dece
nções e tristezas. Voltou com as asas do idealismo imaculadas, mas com
o peito de homem sangrando ...
Sim . Amadeu teve aventuras políticas. Largas, idealistas, elas cara
eterizaram alguns dos episódios marcantes dos últimos anos de sua vida,
talvez dos mais vividos. Por duas vezes , a primeira como candidato avul
so, em 1922, e a segunda, nas eleições de 1928 na chapa do Partido De
mocrático, no qual se inscrevera desde a primeira hora, tentou , sem êxito,
conquistar uma cadeira de deputado pelo 4.º Distrito , o distrito eleitoral
a que pertencia Capivari. Já antes êle fôra ardoroso partidário de Rui e .
na Liga Nacionalista, que patrocinou sua primeira candidatura , um dos
pioneiros da causa do voto secreto, que, em 30, deu o tombo na República
Velha.
De suas primeiras sortidas eleitorais, reunindo conferências, discur
sos e artigos, chegou a imprimir um livro “ Política Humana ” (Em
prêsa Editôra Nova Era · S. Paulo 1924 ), cujas provas reviu e emen
dou . Entretanto, o livro não veio 'a sair. “ Política Humana ” é o nome da
conferência que proferiu em S. Roque, em 1922, nos primórdios da cam ..
panha política.
Revelou-se na luta com grande despreendimento pessoal e com aque
le espírito de independência que o levou, várias vezes, a demitir -se de
empregos e cargos de confiança, para não torcer sua linha de conduta .
Não lhe faltou entusiasmo na disputa do cargo representativo. Mobilizou
amigos, escreveu cartas, travou polêmicas.
A Francisco Damante escrevia nos princípios de março de 22 :

“Não sei como lhe agradecer, nem sei como mereci as expressões
do seu artigo sobre a minha candidatura. Vou transcrevê- lo no Esta
do, com outros. Se eu não fôr eleito, nem porisso deixarei de me
sentir vitorioso com estas honrosas e confortaveis expressões -
dos meus poucos mas bons amigos " .
88
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Entrementes, a tempestade desencadeára -se sõbre sua cabeça e per


seguia - o com obstinação. Sentiu a fundo, na carne, o guante das mesqui
nharias políticas. Quando nos libertaremos delaş ! ...
Combatido, injustiçado , durante e depois de suas campanhas, foi ain
da alvo de severos e infundados ataques pelas secções livres. Mas a no
breza que o caracterizava não se abateu ante essas injunções. De sua ati
tude superior diz bem a entrevista que, por ocasião da sua segunda can
didatura, concedeu a " O Estado" e que foi, justamente, denominada " pá
gina admirável de filosofia política”.
Em um terreno em que, tão só, pisara movido pelo mais puro idea

ang
lismo cívico, teve desgostos sérios e colheu mágoas . Talvez que muitas
reflexões do “ Memorial” se estribem nessa dura experiência do trato
com os homens , sejam um desabafo. O que, sem dúvida, sob outros aspe
ctos e em outros campos, não constituia novidade para ele.
Acostumara -se o suave mestre da “Carta de Guia " a colher injusti
ças onde semeara boa vontade e compreensão. É esse o destino dos bons.
Não seria a política que o haveria de atirar , irreconciliável, contra a vida
ou os seus semelhantes. Não . Sem tirar vinganças de qualquer espécie,
sem descer aos destratos pessoais, o Amadeu dêsses instantes de sofri
mento e desilusão, de incompreensão, quizá de abandono, não é outro se
não aquele que pregava aos próprios filhos :

Ora, porém , vos digo ; a tôda gente


amai :
Amai ao vosso próximo. Carrega,
como nós, a paixão , víbora cega :
filho e escravo da dor, é nosso irmão.

E seria aqui, já ao concluir, que a imagem de Amadeu como homen


belo, nobre, idealista, despreendido, livre e fiel nos deva , como' a do ar
tista , ficar indelevelmente na retina grande pela sua arte, grande pelo
seu coração .

XII

A morte não foi madrasta para Amadeu Amaral. Alcançando - o em :


bora no climax do seu talento , como sustentador indômito de todas as
vitórias e posições que conquistara pelo próprio valor ( sua última tarefa
foi restituir à vida, presidindo- a numa fase delicada, Academia Pau .
lista de Letras ) não o fulminou de repelão, nem nas insídias das len
tas depauperações orgânicas.
Vitimado pelo tifo, sucumbiu nesta Capital , a 24 de outubro de 1929,
poucos dias antes de completar 54 anos de idade. O óbito deu-se às 11
horas da manhã, na residência da família, à Rua Bela Cintra, 309. Deixou
viúva a sra. Ercília Vaz do Amaral e os seguintes filhos : Maria de Lour
des, Inocência , Yolanda e Amadeu Amaral Júnior. D. Ercília e Amaden
zinho são mortos.
A notícia lutuosa correu tôda a cidade. A casa da Rua Bela Cintra
foi pequena para conter os amigos . E, num instante, de todos os nontos
do país, recebia sua memória consagração justa e expontânea. A impren
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Um
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Amadeu
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REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 89

Sa, sem excessões, rendeu - lhe o devido tributo . As Academias de Letras,


escolas, associações, tributaram -lhe carinhoso preito . Seu nome foi evo
cado nos corpos legislativos. O dia foi de recordações sentidas para os
seus companheiros do " Estado ”, do “Diário da Noite " e do **Diário
Nacional". Conterrâneos reuniram -se para guardar-lhe o corpo. Capivari
domou luto pelo seu grande filho . E leitores anônimos, amigos distantes
o esquecidos e os adversários ainda de ontem vieram para o derradeiro
adeus. 1
O entêrro realizou -se no dia seguinte, às 9 horas, no cemitério S. Pau
lo, onde se conservam os restos mortais de Amadeu Amaral. A despedida
foi terna e singela, em meio a muitas lágrimas sentidas.

1
1

90 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

FONTES PRINCIPAIS

AMADEU AMARAL “ Névoa " " Espumas ' “ Discurso " “ Um


Soneto de Bilac ” – " O Dialeto Caipira ” " Lâmpada Antiga "
- " Elogio da Mediocridade " “ Memorial " etc.
AMADEU AMARAL JÚNIOR “ Notas para uma biografia de Ama
deu Amaral ” .
ALTINO ARANTES “ Discurso ” ( Posse na Acad. Paulista de Letras,
em 23-9-30 ) .
ENÉIAS CAMARGO “ Amadeu Amaral escreveu algum livro em S.
Carlos ?" ( Artigo in “Correio de S. Carlos ” de 5-3-42 ).
MAGALHÃES AŽEREDO “ Discurso ” ( recepção a Amadeu Amaral
na Acad. Brasil. de Letras 1919 ) .
MANUEL CERQUEIRA LEITE Introdução , seleção e notas (" Ama
deu Amaral ” Vol . 58 da Peq. Biblioteca de Lit. Brasileira
Editora Assunção ).
SUD MENNUCCI “ Amadeu Amaral" (Conferência em sessão come
morativa da Acad. Brasileira de Letras 1942 ).
VEIGA MIRANDA “ Discurso " ( Recepção ao sr. Altino Arantes na
Acad. Paulista de Letras ).
“ REVISTA DO BRASIL ” ( especialmente os volumes de 1916 ( Ano 11
e do 1.º semestre de 1921 ) .
" REVISTA DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS " ( em particu
lar o vol. 3 Ano I agôsto de 1938 ) .
“ O ESTADO DE S. PAULO " .
“ DIÁRIO DA NOITE " .
ORDENS RÉGLAS

( 1743 )

N. 19 - Regto . de kuma ordem de S. Mgde , aos offs . da Camern


desta Cidade sobre a despesa que dovem fazer dos bens do Senado .

Dom João por graça de Deos Rey de Portugal, e dos Algarves da quem,
e dalem mar em Africa Senhor do Guinê &*. Faço saber a vos officiaes da
Camera da Cidade de Sam Paulo que eu sou servido ordenarvos cumpraes
O VOBO regimento incorporado na ordenação não fazendo mais despezas do
que a ley vos premite penna de as pagares de vossa caza, e quando ne .
cessiteis de Provizões pa. alguns ordenados ou propinas, mo deveis fazer
prezente para que vistas e examinadas as rendas desa Camera, e a neces
sidade dos ordenados ou outras despezas extraordinarias se vos poderem
regullar e premitir como for justo . El Rey nosso Senhor o mandou pello
Dezembargador Thomê Gomez Moreyra, Manoel Caetano Lopes de Lavre
conselhros .' do seu Conso. Ulrtamarino, e se passou por duas vias. Caetano
Ricardo da Sylva a fez em Lxa . a dezoito de Março de mil setecentos e
quarenta e trez o Secretro. Manoel Caetano Lopes da Lavre a fez escrever .
// Tomê Gomes Moreyra e Manoel Caetano Lopes de Lavre 1 / E não se
continha mais na dita ordem que aqui fez registar bem e fielmente do pro
prio original o que me reporto porque a ly corri conferi com a propria
sobscrevy e asigney nesta Cidade de São Paulo aos de dezoito dias do mes
de julho de 1743 . eu Manoel da Luz Silveyra escrivão da Camera que
sobscrevy a asigney e conferi, Manoel da Luz / Silveyra. Conferido pr. mim
Silveyra .

N. 20 - Regto . de huma ordem de S. Magde, aos officiais dn


Camera desta Cidade sobre o que se deve observar a factura do camo ,
do mar para o Cubatão de

Dom João por graça de Deos Rey de Portugal e dos, algarves da quem
e dalem mar em Africa senhor de Guinê & . Faço sabe a vos officiaes da
Camera da cidade de São Paulo que se vio a vossa carta de vinte e hum de
junho de mil e setecentos quarenta e hum em que representaveis achares
Tos gravados com a obrigação da factura do caminho que vay dessa ci
dade the o Cubatão lugar chegado , ao mar que vay para a Villa de San
tos, rezão porque me pedieis fosse servido ordenar que a metade do ca
minho que debaixo do destrito dessa cidade, e das partes de serra asima
a façais vos, e a outra metade que he destrito da villas da marinha ,
Santos e São Vicente a fação estas, e vistas as vossas razões, emformação
92 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

do ouvidor dessa cappitania sobre o que foi ouvido o procurador de minha


coroa . Me pareceo dizer vos que os reparos das estradas os devem fazer
os donos dos predios, cada hum na sua testada , o quando a obra for
mayor o insoportavel aos donos dos predios se devem fazer pellos bens
do Conselho do destrito, o que asim o fareis observar. El Rey nosso se
nhor o mandou pello doutor Thomê Gomes Moreira e Manoel Caetano Lo
pes de Lavre conselheyros do seu Conselho Ultramarino ; e se passou por
duas vias Theodoro de Abreu Bernardes a fez em La. a treze de março
de mil e setecentos quarenta e tres. O secretario Manoel Caetano Lopes
de Lavre a fez escrever / Thomê Gomez Moreyra // Manoel Caetano
Lopes de Lavres // 1.6 Via Il e não se continha mais na dita que aqul
fis registar bem e fielmente do proprio original a que me reporto que fica
no livro do Senado da Camera por que a li corri confery e sobscrevy e asig
ney nesta cidade de Sam Paulo aos dezoito dias do mes de Julho de mil
e setecentos e quarenta a tres annos e eu Manoel da Luz Silveyra escrivão
da Camera que o sobscrevi, assigney e confery. Manoel da Luz Silveyra
Confo. pr. mim Silveyra ,

N.° 2 - Registo de huma patente de cappm . mor confirmada


por S. Magestado a Manoel Mendes de Almeyda desta cidade de San
Paulo por tempo de tres annos como nella se declara .

Dom João por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves da quem
e dalem mar em Africa senhor de Guinê da conquista navegação comercio
de Etiopia e Arabia , Persia e da India &'. Faço saber aos que esta minha
carta patente virem que tendo respeito a Manoel Mendes de Almeyda estar
provido por Dom Luiz Mascarenhas governador cappitam general da
Cappitania de São Paulo no posto de cappitam mor daquella cidade que o
dito governador creou de novo em virtude da minha real ordem de vinte
e hum de abril de mil e setecentos e trinta e nove, porque determino que
as ordenanças do Brazil se regulem na mesma forma que se pratica neste
Reyno : Attendendo ao dito Manoel Mendes de Almeyda ser pessoa de
conhecido prestijo, destinção e merecimento, e melhor servido na mesma
cidade no cargo de provedor da caza da rendição com grande zello e fede
lidade, e por esperar delle que da mesma maneyra se haverá daqui om
diante em tudo o mais de que for emcarregado de meu serviço, conforme
a confiança que faço da sua pessoa. Hey por bem fazer lhe merce de o
nomear / como por esta o nomeio / no posto de cappitam mor das ordenan
ças da cide. de Sam Paulo por tempo de tres annos, no fim dos quais se lhe
tirará rezidencia com o qual não haverá soldo algum de minha fazenda ,
mas gozará de todas as honrras, previlegtos liberdades, izenções, e fran .
quezas que em rozão delle lhe pertensserem : Pello que mando ao meu
governador e cappitão general da Cappitania de Sam Paulo conheça ao
dito Manoel Mendes de Almeyda por Cappitão mor das ordenanças daquella
cidade, e como tal o honrre e estime, deixe servir e exercitar o dito posto
pelo dito tempo de tres annos debaixo da mesma posse e juramento que
lhe deu quando nelle entrou, e aos officiaes, soldados e mais pessoas suas
sobordinadas ordeno tambem que em tudo lhe obedeção, o cumprão suas
ordens por escripto o de palavra , como devem esam obrigados, que por
firmeza de tudo lhe mandey passar esta por duas vias por mim asignadas
digo por mim asignada e sellada com o sello grande de minhas armas.
Dada na cidade de Lixboa aos quatro de março . Anno do Nascimento de
Nosso Senhor Jezus Cristo de mil e setecentos e quarenta e tres // A
Raynha // Lugar do sello grande // Patente por que V. Magestade ha
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 93

por bem fazer mercê a Manoel Mendes de Almeyda de o nomear no posto


de cappitão mór das ordenanças da cidade de Sam Paulo por tempo de
tres annos, no fim dos quaes se lhe tirará rezidencia o qual posto creou
de aovo Dom Luis Mascarenhas governador e cappitão gnal. da Cappitania
de S. Paulo em virtude da Real ordem de V. Magestade de vinte e hum
de abril de mil o setecentos e trinta e nove, em que o proveo como nella
30 declara que vay por duas vias // Para V. Mage. ver // 1.4 via // Por
despacho do Conselho Ultramarino de dezesseis de Fevereiro de mil e sette
contos e quarenta e tres // Pedro Aleixandrino de Abreu Bernardes a
tes // o Secretro . Manoel Caetano Lopes da Lavre a les escrever // Ale
xandre Metello de Souza e Menezes // Thomé Gomes Abreu // Regista
da a 11. 30 v. do Lº 27 de Oltcios e Secretaria do Conselho Ultramarino
Lisboa quinze de Março de mil e setecentos e quarenta e tres // Manoel
Caetano Lopes da Lavre // Registada na chancellaria mór da Corte e
Reyno no Livro de Officios e mercês a fl. 147 vo. Lisboa 30 de Março de
1743 // Francisco Jozeph de Saa // Fica assentada esta Carta Patente nos
livros das Mercês e pg. quatrocentos rs. // Paulo Nugueira de Andra . //
Joseph Vas de Carvalho // Pg. sinco mil e seiscentos rs. e aos officiaes
dous mil cento e vinte e quatro rs, Lisboa 30 de Março de 1743; // Dom
Miguel Maldonado // Cumprase como s . Magestade manda, e registe se
aonde tocar. Praça de Santos 27 de Junho de 1743 // Dom Luis Masca
renhas // Registada a fl. 83 do lo. 3.º de Registo geral da Secretaria deste
governo. Praça de Santos 27 de Julho de 1743 / Bento de Castro Car
neyro // E não se continha mais na dita patente que aqui fiz registar
bem e fielmente do proprio original ao qual me reporto e a entreguey ou
tra vez a parte, e vay na verdade sem couza que faça duvida porque este
confery corri com a propria concertey sobscrevy e asigney nesta cidade de
Sam Paulo ao primeyro dia do mes de Agosto de mil e setecentos e qua
renta e tres annos. E eu Manoel da Lus Silveira escrivão da Camara que
osobscrevy, asigney, e confery. Comfo. pr. mim . Manoel da Lus
Silveyra . Silveyra .
PAPÉIS AVULSOS

Doe. CLIV

Pagamento de aluguéis

Snr. Penteado Na primra . Seção da Camra. mande passar Mandado


pa . se pagar a Sra . D. Anna Joaqna. trez mezes de Janro.- Fevro. e Março
dos alugueis de sua caza , onde eu moro a razão de doze mil rs. pr. mez,
adiantandose - lhe somte. hum mez pa. a da. Snra. remir suas precizoens
e pa, o futuro lhe mandará fazer os pagamentos em quarteis de trez em
trez mezes De seo affo. Amo. Medrog.. S. Paulo 18 de Fevro. de 18231
No verso : " Mdo. N.° 9 Passou - se Mandado de pagamto, aos le evro .
de 1823 Toledo.

Doc . CLV

Reclamações de alguns preson

Illmos. Senhores Juiz pela Ley e Offes. da Camara desta Cide.


Incluzo remeto a V. Sas. o reqto. de Diogo Lopes, e outros, que se
achão nas Cadeias desta cidade, para seguirem seus destinos, as Cidades
de Coiaz, e Cuyaba, na conformide. do § 37 do regimto. dessa Camara quei
rão V. Sas, arbitrar a despeza que com os mmos. se deve fazer, do sustento
nos dias em que eizistirem nas das. Cadeias, e pa, o transporte dos mmos.
pa . aqlas. Cidades. Ds. Ge. a V. Sas . S. Paulo 24 de Fevero. d'1823 O
Dezor . Quvor . da Comca . João de Medeiros Gomes - No verso : " Cumpra
se, e registe São Plo. em Vereação de 26 de Fevro. de 18231 Penteado
Salino Boeno Barbosa.
Illmos. e Exmos. Snres. Dizem Diogo Lopes, Anto. Fernz., Jose de
Andre., Vicente Anto. Duarte, e Lourenço Anto. , Prezos na cadea desta
cide., vindos da Corte do Rio de Janro. , pa . seguirem pa. a nova Povoação
de Goarapoava ; que elles suppes . athe esta cide . sempre forão socorridos
de Municoens de Boca ; e depois q . entrarão nesta cadea lhes tem faltado
as ditas Municoens pr. isso q . tem experamentado extremas necessides.
pr. tanto implorão ; e P. P. a V. Exas . se dignem haver commizeração
dos mizeraveis Suppes. mandando - os socorrer com o necessario alimento,
afim de não morrerem de fome. E. R. Mce. Como porcurador Anto, Jose de
Soares Remettida ao Sr. Dezor. Ouvidor geral da Comarca, e Commissa
rio da Policia da Corte, á cuja ordem vierão remettidos 08 Supptes ., para
dar as providencias sobre o sustento, e condução dos ditos supptes. con
forme as Ordens q . se lhe tiverem dirigido a este respeito. Palacio do
96 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Governo de S. Paulo 19 de Fevro. de 1823 Souza Passos - Ornellas


Trancozo Lima No verso : “ Rego . no' Lo. de Regtos. Geral a fl. 85
São Plo . 26 de Fevro . de 1823 - Toledo " .

Doc . CLVI .

Nomenção de presidente para a provincia de Sao Paulo


Illmos. Snrs. Juiz de Fora,. Prezidente, e mais Vereadores da Camara
da Imperial Cide. de S. Paulo Havendo -me Sua Magestade Imperial, em
Carta Regia de 25 de Novembro do corrente anno, feito a honra de Nomear
Prezidente para a Provincia de s; Paulo, em virtude da Carta de Ley de
20 de Outubro proximo passado, cumpre levar esta participação ao Conhe
cimento de V. V. S. S., aquem pessoalmente entregarei a Carta Regia, que
para este fim lhes dirige o mesmo Augusto Senhor . Entretanto rogo desde
já a V. V. S. S. , se dignem dar -me as Instrucoens, e noticias, que forem
convenientes do Serviço Nacional, em quanto me não forem Subministradas
pelo Conselho da Provincia, a cuja eleição Procederei, immediatamente que
chegar, na forma determinada pela mesma Carta de Ley , cuja religiosa
observancia procurarei, bem, cumpridamente manter para prosperidade e
Segurança dos povos, principal objecto da Sollicitude de Sua Magestade
Imperial. Deos Guarde a V. V. S. S. pr. muitos annos Rio de Janeiro 20
de Dezembro de 1823 e Segundo da Independencia , e do Imperio, Lucas Anto.
Montro. de Barros. No verso : Registado no Lo. de Registo Geral a fl. 218 .
Verso. " Decretos, Ordens Reglas " .

Doc . CLVII

Oriação de uma Universidade

Srs. Juis de Fora pela Ley Presidte, e Offes. da Camara desta Cide.
Havendo a Soberana . Assembleya Geral Constituinte e Legisdativa deste
Imperio projectado, q. huma das Universidades q . se tem de criar, deve
ser estabelecida nesta Provincia, acaba de participar a este Governo
Exmo. Deputado della Joze Arouche de Toledo Rendon, q. algumas Provin
cias requerem q.e a Universidade destinada para esta se transfira para ellas ,
e q. por isso hé de toda importancia q. as Camaras das cabeças das tres
Comarcas dirijão & Mesa Soberana Assembleya hua bem organizada repre
sentação, pedindo q . se não altere aquelle estabelecimento, de q . tantas
vantagens devem rezultar a Provincia , e mostrando em summa as utillda
des do local a commodidade de ter já o Edeficio do collegio e as rendas
do subsidio, e contribuição Litteraria, q . montão em mais de 28 contos
annuaes ; e nestas conrcunstancias este Governo, confiando muito no pa
triotismo de vmces., espera hajão de faser com brevidade esta represen
tação , nos termos os mais energicos, e patrioticos , bem proprios dos hon
rados, é briozos Paulistas, amantes da sua Patria, e solicitos pela sua
prosperidade e augmento ; o g . feito participarão ao referido Governo . Ds
ge, a vmces. Palacio do Governo de Sm. Paulo 3 de 9bro . de 1823 Candido
Xer , de Almda . e Souza João Bapta . da Sa. Passos Bonifacio de Frey
tas Trancozo João Gonçalves Lima - Cumpra - se e Registe. São Pio .
em Camara de 6 de 9bro. de 1823 Penteado -- Ramos Vaz Bar
boza . No verso : “ Regdo. a fl . 188 do Lo. actual de Registos s . Pla
17 de 9bro. de 1923 ' '.
97
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Doc. CLVIII

Derassa sobre a morte de um Capitão do Mato

Illmos. Snres. do Nobre Senado Diz Francisco Jose Barbosa pri


meiro Tabellião desta Imperial Cidade, que na Divaga a que se procedeo
por este Juizo sobre a morte do Capitão do Matto Jose Antonio em qual
não houve pessoa alguma Pronunciada, importarão as custas da mesma
a quantia de quatro mil duzentos e quarenta e cinco reis, isto he a metade
das referidas Custas, que na comformidade da Ley devem ser pagas pelos
bens deste Concelho pr. tanto P. a V. S. S. sejão servidos em vista da da.
Devaça inclusa mandarem passar Mando. de paga ao Suppe. da referida
quantia de 4 $ 245 reis E. R. Mce. Acordão em Vereança &*. Que se
passe Mdo. São Paulo em Camara de 8 de Novembro de 1823 Penteado
Ramos Safino Barboza . No verso : “ P. Mdo. N." 34' a fl. 158 vo. to .
fl. 159 do Livro actual de S. Plo. 12 de 9bro. de 1823
qtia, de 4 $ 245 rs. Toledo " .

Doc . CLIX

Consertos em uma ponte

Snres. Juiz de Fora pela Ley Prezidte., e Offes . da Camara desta Ch


dade. - O deploravel estado, a que se tem reduzido a ponte do ribeirão
denominado Pacaembú , exige que Vmces. lhe mandem aplicar a mais
prompta providencia , e igualmente nas passagens do Pacaembú de baixo,
antes que o tempo occazione maiores desmanxos, trabalhos, e despezas
consequentes. Deos ge. a Vmces. Palacio do Governo de S. Paulo 19 de
9bro. de 1823 Candido Xer. de Almda. e Souza João Bapta . da Sa..
Passos Anastacio de Freytas Trancozo João Gonçalves Lima. Consta
DO verso : Regdo. a f. 193 do Lo. actual de Regto. S. Paulo 13 de Dezbro .
de 1823

Doc. CLX

Acusando recebimento de um oficio


Illmos. Snres. Juiz de Fora pella Lei Prezide. e mais offes, do senado da
Camara Illmos. Senres. a recepção do Offe. de V.
Sas, de 8 do corrente 9bro. acompanhou hum requerimto. de Geronimo
junta ; e proceguindo na indagação do
e o do. requerimto., por V. Sas. a mim determinados sem rezul
tado, e o mais que depois sobre segunda denuncia que se
me deo do do ... ao Snr. Juiz de Fora pella,
Ley para de tudo tomar conhecmto. na forma das Ordenacoens ge. nos
Regem , Ds. Ge. a V. Sas. S. Paulo 18 de 9bro. de 1823 . O Juiz Almotace ,
Matheus Fez . Cantinho . No verso : do Lo.
de Regto. actual S. P .. 13 de Dezbro . de 1923 " :
Doc . CLXI

Copia de uma Portarla

O Governo Provisorio remette por copia a Camara desta cidade a Por


taria de 23 de Outubro pp., expedida pela Secretaria d'Estado dos Negocios .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

do Imperio, em q . se participa ter a Assembleya Geral Constituinte e Le


gislativa deste Imperio rezolvido, q. os dias 7 de Setembro, e 12 de Outubro
sejão declarados de Festa Nacional, para 9 . nesta inteligencias faça
registar a mencionada Portaria no respectivo Livro. Palacio do Govo .
de Sm, Paulo 12 de 9bro. de 1823. Souza Passos Trancozo Lima ,
Cumpra -se , e registe-se São Paulo em Camara de 15 de ebro. de 1823
Penteado Ramos Safino Barboza .
Copia Tendo a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Im
perio do Brasil resolvido , que o dia 12 de Oltubro, por ser o Faustissimo
Anniversario da Aclamação de Sua Magestade O Imperador, seja declarado
Dia de Festa Nacional, emquanto senão publica a tabella competente de
taes festividades, e que igualmente o seja o de 7 de Setembro , por ter
sido aquelle, em que o mesmo Augusto Senhor tomou a sublime resolução
de praclamar a Independencia do Brasil no sitio do Piranga, Assim 0
manda sua Magestade Imperial , pela Secretaria d'Estado dos Negocios do
Imperio participar ao Governo Provisorio da Provincia de São Paulo, para
sua intelligencia , e execussam , fazendo - se as necessarias participacoens ás
Estaçoens, e Authoridades competentes . Palacio do Rio de Janeiro em 23
de Oitubro de 1823 Jozé Joaquim Carneiro de Campos. Está conforme .
O secretario interino do Governo João Gonçalves Lima. Cumpra -se, e
registe - se São Paulo em Camara de 15 de 9bro. de 1823. Penteado
Ramos . Consta nos versos de ambos documentos : " Regdo . a f. 90 do Lo .
actual de Regtos. S. Paulo 20 de 9bro. de 1923 " .

Doc. CLXII

Contribuição voluntária para a Marinha de Guerra


Illmos. Snres. do Nobre Senado A Commissão incarregada por offi
cio de V. Sas. de 3. de Abril, de agenciar, e arrecadar, em parte desta cide.
a subscripção voluntaria de 800 rs. mensaes, estabelecida plo. Decreto de
24 de Janro. do corrte. anno, pa . a Marinha de Guerra deste Imperio , leva
a prezenca de V. Sas. a relação do resultado desta delegencia , no 2.• tri
mestre de Julho, Agosto e 7bro ., cuja quantia de 197 $ 600 rs. constante da
mea. relação, fica pronpta pa. ser entregue ao Brigro. Manoel Rodrigues
Jordão, Thezoureiro gal. desta contribuição, logo q. pr. V. Sas. assim for
determinado. Ds. gde. a Vs. Snras . São Paulo 10 de 8bro, de 1823 Joze
Joaqm, de Vazcos . Alambary. Severino Pinto da Silva Franco , de
Paula Xer. de Toledo. Consta no verso : " Registado no Livro de Registo
Gl . deste Senado a f. 178' vo. Sam Plo. 221 de 8bro , de 1823 " .

Doc . CLXIII

Publicação de dois editais


1
Domingos Affonco de Santa Anna, Porteiro atual do Senado da Camara ,
e publicos Audithorios desta Imperial Cidade de Sam Paulo , por Provizão
Certifico, a posto por fé debaicho do juramento do meo Cargo, que
no dia primeiro de Desembro deste Corrente anno, publiquei pelas ruas
publicas desta Imperial Cidade, dois Editais escritos em letra redonda, com
data de dezecete do mes de Novembro prochimo passado, vindos da Corte,
do Rio de Janeiro, e inviados pelo Mereticimo Dezembargador da Caza
da Supplicação, e Intendene Geral da Policia da Corte, e Imperio do Bra
zil Estevão Ribeiro de Rezende, ao Juis de fora pela Ley desta Cidade
Capitão Bento Jozé Leite Penteado ; e depois de publicados, os affechei
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 99

Dos Lugares mais publicos, e do custume. O referido hé verdade em té do


que passo a prezente, e asigno. Sam Paulo 1.9 de Dezembro de 1823
Domos. Affonso de Sta . Anna A' margem : " Ex Off."

Doc . OLXIV

Dispensa sobre nomenção

Illmos . Senhores do Nobre Senado Muito me lizongea a lembramsa


Q. V. V. S. S. tiveram em me nomear pa. huma Comisam tão honroza, fi
cando -me ao fesmo tempo o pezar de não poder aseitala , pois ho publico e
notorio os emcommodos pr. q . pasei, quaze pr. espaso de hum anno, e ainda
não fazem seis mezes q . me acho recolhido a minha caza , sem poder re
medlar os perjuizos q . sofri tanto nos meos bens, como na minha saude,
alem dos gastos, e dispezas emcalculaveis, e pr. isso tomando V. V. S. S.
em considerasam estas minhas justas razoens hajam de dispensar -me, sem
q . pr. 1860 perca pa , com V. V. S. S. aquele conseito q . sempre tive a honra
de mereser como qm. he com todo o respeito De V. V , S. S. Sudo . e Vor .
obro . So. Franco . Alvares Ferra . do Amal . S. Paulo 3 de Dezbro de
1823. No verso : Regdo. a fl. 193 v. do Lo , de . S. Paulo 13. de
Desbro. de 1923.

Doc . CLXV

Recebimento de um edital

Gonssalo Correa escrivam do Juis vintenario da freguezia de Santo


Amaro certifico que recebi aos 23 do corrente mes de Novembro o com
petente Idital ao Corte da Crane vrede a quem ache quizer de lançal o
qual prubriquei tres dias festivos e fixei no lugra do costume o q . a todos
constou - o referido é verdade em fe do g. paso o prezente . Santo Amaro
aos 9 dezembro de 1823 Gongsalo Correa.

Doc. CLXVI

Edital sobre o projeto de Constituição

Sua Magestade o Imperador, Fiel a promessa que Fez de offerecer as


Camaras deste Imperio hum Projecto de Constituição : Manda pela Se
cretaria de Estado dos Negocios do Imperio remetter á Camara da Impe
ria) Cidade de São Paulo os inclusos exemplares. Palacio do Rio de Ja
neiro em 17 de Dezembro de 1823, João Severiano Maciel da Costa ,
Illustrissimos Senhores Temos a honra de participar a VV. ss ., que
havendo o espirito publico declarado manifestamente o desejo de jurar o
Projecto de Constituição, offerecido por Sua Magestade o Imperador, este
Senado tomou a deliberação de publicar o Edital, que levamos ao conheci
mento de vv. ss ., em consequencia do qual, a grande parte dos Homens
bons, e que verdadeiramente se interessão pela felicidade da sua Patrla,
já tem abertamente declarado, que vão já assignar ; a fim de que este Se
nado peça , e represente a Sua Magestade o Imperador, que Mande já jurar
o Projecto como Constituição do Imperio ; e como as differentes Camaras
deste Imperio , e com muita expecialidade essa, tenhão em tudo seguido os
100 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

mesmos passos da desta Capital, a fim de conseguirmos a Independencia , e


inteira Constitucionalidade deste Imperio ; por isso desde já concebemos
a bem fundada esperança de que unindo -se VV. SS . a nós em sentimentos,
hajão com a possivel brevidade de ajudar -nos nesta interessante tarefa ,
representando a Sua Magestade Imperial que para a felicidade do Impe .
rio, e pela vontade da Nação, O Mesmo Augusto Senhor Deve, e todos nós
jurar o Projecto como Constituição, que para sempre deverá ficar sendo a
do Imperio. Este Senado poderia alargar - se sobre as vantagens deste
passo, mas ellas não podem escapar á prespicacia de VV . SS ., e tendo re
cebido tantas, e tão decisivas provas dos desejos Patrioticos de todas as
Camaras deste Imperio, para sua consolidação, desde já conta com a sua
cooperação. Deos guarde a VV . SS. muitos annos . Rio de Janeiro 20 de
Dezembro de 1823 . Illustrissimos Senhores Prezidente, Vereadores , e
Procurador da Camara da Cidade de S. Paulo 0 Snr. Preside .. , ..
Soares. Teixra , de Souza- Antonio Joze da Costa Ferreira - Mel. Gomes...
1
ATAS DA CÂMARA DE SANTO AMARO

( 1913 )

ANTA DA SESSÃO ESPECIAL PARA DISCUSSÃO DA LEI ORCAMEN


TARIA PARA O EXERCICIO DE 1913

Presidencia do Sr. Carlo Schmidt

Aos vinte e oito de Outubro de Mil Novecentos e doze, nésta cidade


de Santo Amaro , Comarca da capital do Estado de São Paulo, no pago da
Camara Municipal, as duas horas da tarde, presentes os Senhores vereado
res Carlos Schmidt - presidente, Tenente João Felippe da Silva - vice - presi
dente, Brazilio Procopio da Luz prefeito, Izaias Branco de Araujo, José
Guilger Sobrinho e José Conrado, o senhor presidente declarada a sessão
que para hoje fora especialmente convocada, pelo orgam do poder executivo
desta corporação, afim de ser discutido, na forma da lei, a lei orçamentaria
que tem de vigorar no exercicio financeiro de 1913. Lido por mim Secre
tario da Camara, abaixo nomeado e assignado esta lei orçamentaria
projecto assignado e rubricado pelo Senhor Prefeito Municipal, o senhor
presidente o submetteu á discussão e votos artigo por artigo, paragrapho
por paragrapho, tendo votado contra os dizeres, isto é, contra as disposi
ções estatuidas nos artigos 2.º da receita, os vereadores Izaias Branco de
Araujo , José Guilger Sobrinho e José Conrado, por entenderem que essas
disposições devem ficar affectas á Camara Municipal e não ao prefeito,
Relativamente aos $ 1. °, 2.°, 3. , 4.°, 5.0, 7. , 8. , 10. , 11. , 12. , 13. , 14 ..
e 15. , por, digo, pelos votos dos Senhores Izaias Branco de Araujo, José
Guilger Sobrinho e José Conrado foram approvados ; sendo, entretanto, não
acceitos por estes vereadores os $$ 6.°, 9.º, 16.º, e 17.º, isto com reprovação
dos senhores vereadores presentes á sessão. Em relação ao artigo 4.º da
despesa constante do citado projeto de lei orçamentária , votaram ainda
coatra 08 senhores Izaias Branco de Araujo, José Conrado e José Giulger
Sobrinho . Quanto aos $$ 1.°, 3., 4.°, 5. , 6. , 7. , 8. , 9.°, 10. , 11., 13.°
14., 17. , a que se refere a despesa do mesmo projecto de lei Capitulo
Segundo foram approvados, sendo contestados por estes ultimos vereado
res as $$ 1.°, 3.°, 4.0, 5.0, 6.0, 7.º, alias $$ 5. °, 12.°, 15,9 e 16 , º, que apre
sentaram as emendas seguintes : Quanto o ordenado do prefeito Rs .
1 :800 $000 por anno, em vez de Rs. 2 :400 $ 000 ; quanto ao administrador do
Mercado Rs. 1: 200$000 em vez de Rs, 1 :680 $ 000 ; quanto a verba " Auxilio a
pobresa " Rs. 500 $ 000 em vez de Rs. 700 $ 000 ; quanto a verba “ expediente "
Rs. 600 $ 000 em vez de Rs. 1:000 $000 ; quanto a verba " Auxilio as escolas de
bairros" Rs. 2 : 400 $000, em vez de Rs. 2 :700 $ 000. Em referencia aos $$
102 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

18., 19. , 20. , e 21.", tambem votaram contra , estes tres ultimos vereado
reg . Em vista do ocorrido o Senhor presidente encerrou a presente sessão .
E para constar, eu, Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario da Ca
mara a escrevi e assigno conjunctamente com os Senhores vereadores reu
nidos. Carlos Schmidt. Izaias Branco de Araujo, José Guilger Sobri
nho. José Conrado. João Felippe da Silva. Brazilio Procopio da
Luz, Alfredo de Andrade Arruda Botelho. -
ACTA DA SESSÃO ESPECIAL PARA A SEGUNDA DISCUSSAO DA LEE
ORÇAMENTARIA PARA O EXERCICIO DE 1913
Presidencia do Sr. Carlos Schmidt
Aos trinta e um de Outubro de Mil Novecentos e doze, nesta cidade de
Santo Amaro, Comarca da Capital do Estado de São Paulo , ás 8 horas da
manhã, reunidos 08 senhores vereadores : Carlos Schmidt presidente, Te
dente João Felippe da Silva vice-presidente, Brazilio Procopio da Luz
prefeito Municipal, Izaias Branco de Araujo , José Conrado, José Guilger
Sobrinho, o Senhor presidente declara aberta a sessão para a segunda
discussão do projecto da lei orçamentaria para o exercicio de 1913. Posta
em discussão as emendas constantes da acta da primeira sessão, realisada
no dia vinte e oito do mez vigente, o vereador Izaias Branco de Araujo ,
apresentou, ainda a emenda de ser redusido à Rs. 1 :200 $ 000 o ordenado do
Secretario . o ultimo vereador citado pedio a suspensão da sessão por
quarenta minutos. Attendido pelo Sr. presidente, este vereador, solicitou
a entrega daquelle projecto de lei, para exihibir, por escripto, como lhe
fora pedido pelo presidente da Camara, as emendas constantes da sessão
de vinte ( 1 ) oito do ocrrente e a concernente que fez na presente. Terminado
este praso , e reaberta a sessão, foi apresentado pelo vereador Izaias Bran
co de Araujo, o seguinte documento : “ Ao projecto N.° 4. Na Receita . Artigo
2.• Supprima - se os $$ 6.°, 9.º, e 17.º. Na despesa . Artigo 4.º ao paragrapho
129, em logal de 700 $000, digo $ 20.º, em vez de Rs, 2 : 160 $ 000, diga- 86 Rs.
1 :440 $000, ao 12.• em logal de Rs. 700 $ 000 diga-se 500 $ 000 ; ao ſ 15.º em
logar de 1.000 $000 - 600 $ 000, ao 16.º em logal de 2 :700 $000 2 :400 $ 000 .
19.º em vez de 2.050 $000 diga- se 550 $ 000 ; e suprima-se o que consta do
Artigo 5.º, Sala das Sessões, 31 de Outubro de 1912. José Guilger Sobrinho .
Isaias Branco de Araujo . José Conrado ” . Posta em discussão o documento
supra transcripto e depois de prolixo debate entre os Senhores vereadores,
pelo Senhor presidente foi lido o seguinte : “ Em virtude da desintelligencia
occasionada na presente sessão entre os vereadores Izaias Branco de Arau
jo, José Conrado, e José Guilger Sobrinho e os demais vereadores acerca
do projecto da lei orçamentaria para 1913; em vista de não haver accordo
entre os mesmos vereadores, visto que aquelles trez primeiros citados, ne
gam o direito de voto ao prefeito Municipal para a mesma lei orçamentaria
de accordo com as leis que regem as Camaras, declaro suspenso os traba
lhos referentes ao mesmo projecto orçamentario e que vigorará, em face
do exposto, o orçamento de 1912, no exercicio de 1913. 31 de Outubro de
1912. Carlos Schmidt presidente " . Nada mais havendo a tratar, o Se
nhor presidente encerra a sessão. E para constar, eu, Alfredo de Andra
de Arruda Botelho, lavrei a presente que firmo em seguida a assignatura
do ultimo vereador. Carlos Schmidt, Os vereadores abaixo assignados,
s6 estão de accordo, apresente acta, referente ao projecto da lei orçamen
tarta , apresentado pelo Prefeito e de accordo com as emendas apresentada ,

(1) Consta a margem : Vale a entrelinha que diz - " vinte " . Botelho .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 103

a pedido do Senhor Presidente . Izaias Branco de Araujo . José Gullger


Sobrinho. José Conrado. Afavor João Felippe da Silva. Brazilio
Procoplo da Luz. Alfredo de Andrade Arruda Botelho. Secretario .

Termo de comparecimento

Aos quatro de Novembro de Mil Novecentos e doze, nesta cidade de


Santo Amaro, Comarca da Capital do Estado de São Paulo, no paco da Ca
mara Municipal, achando - se reunidos os vereadores senhores José Conrado,
Izaias Branco de Araujo , José Guilger Sobrinho, faltando sem causa par .
ticipada 08 demais vereadores Carlos Schmidt presidente, Tenente
João Felippe da Silva vice - presidente e Brazilio Procopio da Luz pre
feito, não havendo, portanto, numero legal para funccionar a sessão ordi. )
naria conrespondente ao presente mez, foi, por mim Secretario da Camara,
abaixo nomeado e assignado, lavrado, na forma da led o presente termo,
que é devidamente assignado pelos trez vereadores pre, digo, vereadores
reunidos. José Conrado Izaias Branco de Araujo . José Guilger So- .
brinho. Alfredo de Andrade Arruda Botelho. Secretario.

AOTA DA SESSÃO ORDINARIA REALISADA NO DIA 2 DE


DEZEMBRO DE 1913
Presidencia do Senhor Carlos Schmidt

Aos dois dias do mez de Dezembro de Mil Novecentos e doze, nesta


cidade de Santo Amaro , Comarca da Capital do Estado de São Paulo, ás
onze horas da manhã , no paço da Camara Municipal, achando-se reunidos
os Senhores vereadores : Carlos Schmidt presidente, Tenente João Felippe
da Silva - vice -presidente, Brazilio Procopio da Luz prefeito, Izaias Bran
co de Araujo, José Conrado e José Guilger Sobrinho, o Senhor presidente
declara aberta a sessão. E ' lido por mim Secretario da Camara , adianto
nomeado e assignado, a acta da sessão effectuada no dia dois de Setem
bro do anno vigente, a qual, depois de ter sido posta em discussão, foi
approvada e respectivamente firmada. Em continuação, foi lido, tambem
por mim Secretario da Camara , o expediente infra mencionado, que depois
de ser precisamente discutido, foi despachado como se segue : Indicação :
Tendo fallecido no dia 30 do p. passado mez a respeitavel esposa do Se
nhor Marechal Hermes da Fonseca, Chefe da Nação, indico que seja con
signado na acta desta sessão um voto de pezar por tão infaustoso aconteçi
mento . Indico mais que a Camara dirija ao Chefe da Nação, referido , um
telegramma de condolencias. Sala das Sessões, 2 de Dezembro de 1912.
João Felippe da Silva " . Tendo sido approvada por unanimidade de votos
a indicação acima transcripta, fica assim consignado, nésta acta, o voto
de pezar a que a mesma se refere. O telegramma de condolencias, foi, por
ordem do Senhor presidente, expedido nesta data. Balancetes : Os balance
tes correspondentes ao movimento da receita o despesas da Camara Mu
nicipal e referentes ao segundo e terceiro trimestre do presente anno fi
Danceiro, foram , á pedido do vereador José Guilger Sobrinho, adiados para
a sessão . REQUERIMENTOS : De Joaquim Cerqueira, Americo José Vieira ,
Alvaro Rodrigues, Guiseppe Muraro, Pedro Branco da Luz e Augusto de
Miranda, solicitando datas de terras do patrimonio Municipal situadas
no bairro denominado " Cordeiro " . (Segundo despacho ) “ Empatado em se
104 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

gunda discussão " . De Alvaro Rodrigues reiterando o pedido feito em suas


petiçoes anteriores, pedido este que versa na concessão de umas datas de
terras que deseja adquirir no mesmo bairro do “ Cordeiro " . " Empatada
a votação, em primeiro discussão " . De Adolpho Aurelio de Souza Guerra e
Julio P. de Souza Guerra , solicitando relevação da multa que lhes fol im
posta por não terem pago, como deviam fazer, os impostos Municipaes em
que se acham tributados. Declaram estes dois ultimos requerentes que se
melhante falta foi devido a imprevistos motivos. O vereador José Guilger
Sobrinho, após a leitura destes requerimentos, apresentou a Resolução se
guinte : " Artigo 1.º - Fica prorogado até o dia 10 do corrente mez, o praso
para o pagamento, sem multa de todos os impostos Municipais. Artigo 2.º
Para a presente resolução fica concedida a urgencia a que se refere o
Regimento interno. Artigo 3.0 Revogadas as disposições em contrario ,
Sala das Sessões 2 de Dezembro de 1912. José Guilger Sobrinho " . 0
Senhor presidente submetteu à votos esta indicação e em virtude de ser
ella approvada unanimemente, assim despachou as petições dos cidadãos
Adolpho Aurelio de Souza Guerra e Julio P. de Souza Guerra : " Como re
quer, em virtude da resolução approvada nesta data ” .
Nada mais havendo a tratar - se , é , pelo senhor presidente, encerrada a
sessão. E para constar, eu, Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario
da Camara Municipal desta cidade, lavrei a presente que firmo após a
assignatura do ultimo vereador. Carlos Schmidt. Izaias Branco de
Araujo. José Guilger Sobrinho. José Conrado. João Felippe da Silva .
Brazilio Procopio da Luz, Alfredo de Andrade Arruda Botelho , Se
cretario.

Termo para inatilisar a presente pagina

Aos cinco dias do mez de Janeiro de Mil Novecentos e treze, nesta Ci


dade de Santo Amaro, Comarca da, Capital do Estado de São Paulo, na Se
cretaria da Camara Municipal, ás treze horas da tarde, compareceu o Se
rhor Carlos Schmidt , presidente desta corporação, e ordenou a mim Se
cretario, adiante nomeado e assignado, que lavrasse este termo para inu
tilisar esta pagina que deixou em branco o escrivão de paz Octavio Ma
chado , que em vez de começar a escrever nella a acta constante da pagina
cincoenta e dois e cincoenta e dois verso, a deixou em branco. E para
constar foi lavrado este que é assignado pelo mesmo senhor presidente e
por mim Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario da Camara que o
escrevi. Carlos Schmidt. Alfredo de Andrade Arruda Botelho.

Acta da reunião dos senhores Vereadores e Suplentes da Camara Mu


nicipal para a eleição de trez membros da Commissão de alistamento elei
toral, sob a presidencia do senhor Capitio Symphronio Olymplo da Silva,
ajudante do Procurador da República .
Aos cinco dias do mez de Janeiro de mil novecentos e treze; as onze
horas da manhã, nesta cidade de Santo Amaro , comarca da capital do Es
tado de São Paulo, no Paço da Camara Municipal, sobá presidencia do
senhor Capitão Sympronio Olympio da Silva, ajudante do Procurador da
Republica, reuniram -se os senhores vereadores Carlos Schmidt, Brazilio
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 105

Procopio da Luz, José Conrado, Izaias Branco de Araujo, José Guilger So


brinho e Tenente João Felippe da Silva e os inmediatos em votos Adão
Helfenstein , José Schunck, Joaquim Martins Collares, Amaro da Silva Do
mingues e Benedicto Branco de Miranda, para o fim de se organisar a
Commissão de Revisão de Alistamento eleitoral. Procedeu - se em primeiro
logar a eleição para os membros e supplentes eleitos pelo governo Muni
cipal que deu o seguinte resultado em primeiro escrutinio : Para membros
effectivos : João Teizen Sobrinho, quatro votos ; Joaquim Adolpho Araujo e
Adão Antonio da Luz trez votos cada um . Para supplente : Carlos Schmidt
um voto : Para os dois supplentes mais procedeu - se a eleição em segundo
escrutinio dando o seguinte resultado : José Guilger Sobrinho seis votos e
Pedro Pinheiro Guarany cinco votos. Em seguida o senhor presidente apre
sentou , as listas dos maiores contri, digo, dos quinze maiores contribuintes
do Imposto sobre o Capital propriedade immovel rural e dos quinze maiores
contribuintes do Imposto Predial, relativas ao exercicio de mil novecentos
e doze. A lista dos maiores quin , digo, dos maiores ( quinze ) contribuintes
do imposto sobre immovel rural e a seguinte : João Klein, Antonio José de
Oliveira, Henrique Schunck , José Henrique Roschel, João
Christe, Pedro Rumberg, José Schunck , José Pedro Roschel , João Antonio
de Andrade, Antonio José de Almeida, Henrique Grassmam , Laurindo de
Oliveira, Pedro Glanir, e Pedro Klem do Nascimento. A lista dos quinze
maiores contribuintes do imposto predial é a seguinte : José Agostinho de
Borba , Bento Branco de Araujo Mendes, Antonio Forster, Francisco Fe
lippe Filho, Salvador Satyro Prado, Antonio Vieira da Silva, Amaro An
tonio da Luz, Claudino José Branco, Arthur Antonio da Luz, Augusto An
tonio da Silva, Esiquiel Andrelino Moreira, Theodoro Lindau, Henrique
Schunck , Adão Helfenstein e Brazilio Procopio da Luz. Procedendo - se o sor
teio de conformidade com a lei, entre os quinze maiores contribuintes, de
pois de excluido por sorte Manuel Pires de Moraes Pedroso, isto entre os
contribuintes do Imposto rural deu a voto o seguinte resultado . Para mem
bros effectivos João Christe e Pedro Klun do Nascimento . Para supplentes :
Henrique Roschel e João Antonio de Andrade. Entre os quinze maiores con
tribuintes do imposto predial foram sorteados : Para membros effectivos :
tenente Amaro Antonio da Luz 1.º tenente Augusto Antonio da Silva . Para
supplentes : Claudino José Branco e Henrique Schunck , Finda a organisa
cão da Commissão de alistamento o sr. Presidente designou a sala da
Prefeitura para as reuniões da Commissão e ao escrivão que esta lavrou
para secretariar os respectivos trabalhos, ordenando no mesmo que de .
pois de affixados os respectivos editaes, se officiasse ás auctoridades com
petentes de accordo com a lei : Nada mais havendo a tratar- se encerrou - se
os trabalhos a uma hora da tarde do que para constar lavrei a presente
acta que vai assingnado. Eu , Octavio Machado, escrivão do Judicial designa
do para o alistamento a escrevi e assigno. Symphronio Olympio da Silva
- Carlos Schmidt. Brazilio Procopio da Luz. João Felippe da Silva .
Jogé Guilger Sobrinho, José Conrado. Izajas Branco de Araujo.
Amaro da Silva Domingues. Joaqum. Martins Collares . - José Schunck.
Benedicto Branco de Miranda. Adão Helfenstein .

Termo de comparecimento

Aos dez de Janeiro de Mil Novecentos e treze, nesta cidade de Santo


Amaro, do Estado de São Paulo, no daço da Camara Municipal , ás onze e
106 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

meia horas da manhã , achando -se reunidos og Senhores Carlos Schmidt -


presidente, Tenente João Felippe da Silva vice-presidente e Brazilio Pro
copio da Luz prefeito, faltando sem cauga participada os demais senho
res Vereadores, o Senhor presidente, em vista de não haver numero legal
para funccionar a sessão extraordinaria convocada para hoje, ordenou a
mim Secretario da Camara, abaivo assignado, que lavrasse o presente termo
e que novamente convocasse outra sessão, em substituição a que devia
ser hoje realisada , na qual serão exhibidas as contas e documentos Munici
paes dependentes de approvação da Camara . Nada mais havendo a tratar,
eu, Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario da Camara, lavrei a
pregente que assigno conjunctamente com os vereadores reunidos. Carlos
Schmidt. João Felippe da Silva. Brazilio Procopio da Luz.
DECRETOS E LEIS

DECRETO N.º 1.070, DE 1 DE JUNHO DE 1949

Declara de utilidade pública o imóvel ne


cessário à construção do Grupo Escolar Almi
rante Barroso, situado à Avenida Jabaquara,
22.º subdistrito , Sarde, nesta Capital.

O Prefeito do Município de São Paulo, usando das suas atribui


ções, nos termos do disposto nos artigos 5.', letra " m ” , e 6.', do de
creto -lei federal 3.365 , de 21 de junho de 1941 ,
Decreta :

Art. 1.* Fica declarado de utilidade pública, para o fim de ser


desapropriado amigável ou judicialmente, um terreno situado à ave
nida Jabaquara, 22.• subdistrito, Saúde, assim caracterizado :
Área 3-4-5-6-9-10-3 com cerca de 5.303, 88 ms2. Frente : reta 3-10
na extensão de 67,70 ms ., mais ou menos, pelo alinhamento da aveni
da Jabaquara ; lado direito : reta 9-10, na extensão de 83,40 ms. , mais
ou menos, dividindo com propriedade de quem de direito ; lado es
querdo : linha quebrada 3-4-5-6 , formada pelas retas : 3-4 na extensão
de 2,50 ms., mais ou menos, canto chanfrado entre os alinhamentos
da avenida Jabaquara e de uma rua projetada (Madresselva ) ; 4-5 na
extensão de 86,75 ms. , mais ou menos, pelo alinhamento da rua pro
jetada ( Madresselva ) ; 5-6 na extensão de 1,80 ms. , mais ou menos,
canto chanfrado entre os alinhamentos das ruas Professor Souza Bar
ros e da rua projetada (Madresselva ) ; fundos : reta 6-9, na extensão
de 54,60 ms., mais ou menos, pelo alinhamento da rua Professor Sou
za Barros, terreno esse necessário à construção do Grupo Escolar Al
mirante Barroso e assinalado nas plantas anexas, sob n .° P- 4322, que
rubricadas pelo Prefeito passam a fazer parte integrante dêste decreto .
Parágrafo único O imóvel acima referido é constituido de duas
áreas, de propriedade das pessoas abaixo indicadas ou de quem de
direito, a saber : a ) área 7-8-9-10-7 com 2.793,28 ms2, mais ou menos ,
108 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

que consta pertencer ao Dr. João Silveira , ou General Gaudie Leye


outros, ou quem de direito ; b ) área 3-4-5-6-8-7-3 com 2.510,60 ms2 .
mais ou menos, que consta pertencer a Victório Bianconi , Jerônimo
Bianconi ou quem de direito.

Art. 2.° É de natureza urgente a desapropriação de que trata


o presente decreto, para efeito de imediata imissão de posse do imó
vel em referência , na forma do artigo 15 do decreto- lei n .° 3.365 , de
21 de junho de 1941 , com a alteração constante do decreto-lei n.º
9.811 , de 9 de setembro de 1946 .

Art. 3.° As despesas com a execução deste decreto correrão


pela verba 940.8392 (Material Permanente ) do Convênio do Ensino
Primário , consignada no orçamento vigente .

Art . 4.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica


ção, revogadas as disposições em contrário .

Prefeitura do Município de São Paulo , 1 de junho de 1949, 396 .;


da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha . O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos , Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e
Pessoal , da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 1 de ju
nho de 1949. - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .

DECRETO N.° 1.071 , DE 7 JUNHO DE 1949

Declara de utilidade pública o imóvel ne


cessário à construção do Grupo Escolar “ Vis
conde de Taunay ' ', situado à Avenida Tomaz
Edison, 4.° subdistrito, Nossa Senhora do Ó ,
bairro do Limão , nesta Capital.

O Prefeito Municipal de São Paulo, usando de suas atribuições,


nos termos do disposto nos artigos 5.° letra “ m ” , e 6.°, do decreto - lei
federal n .° 3.365 , de 21 de junho de 1941 ,

Decreta :

Art. 1.º Fica declarado de utilidade pública para o fim de ser


desapropriado amigável ou judicialmente , um imóvel situado entre
1

DECRETOS E LEIS 109

a Avenida Tomat Edison e ruas Eva (não oficial ), e General Carno


na, com a área total de 13.202,50 ms.2 (treze mil e duzentos e dois
metros e cinquenta decimetros quadrados ) , mais ou menos, 4.° sub
distrito, Nossa Senhora do Ó, nesta Capital , assim caracterizado :
107,00 ms. (cento e sete metros ) , mais ou menos, no alinhamento da
Avenida Tomaz Edison ; 134,40 ms. (cento e trinta e quatro metros e
quarenta centímetros ) mais ou menos, no alinhamento da rua Eva
(não oficial ) ; 9,82 ms. ( nove metros e oitenta e dois centímetros )
com frente para a rua General Carmona, nos fundos, por uma linha
quebrada, na extensão de 169,10 ms. (cento e sessenta e nove metros
e dez centímetros ) mais ou menos, dividindo com quem de direito, e
finalmente, do lado esquerdo na extensão de 80,00 ms. (oitenta me
tros) , dividindo com propriedade particular, imóvel èsse necessário
à construção do Grupo Escolar " Visconde de Taunay " e assinalado
nas plantas anexas sob n.° P.4302 G 15-A 2 , do Departamento do
Cadastro e que rubricadas pelo Prefetio passam a fazer parte inte
grante deste decreto .

Parágrafo único O imóvel acima referido é constituido de duas


áreas, de propriedade das pessoas abaixo indicadas ou de quem de
direito, a saber : a ) área 1-2-3-4-5-1 , com 3.762,50 ms2 (três mil e se
tecentos e sessenta e dois metros e cinquenta decimetros quadrados ) ,
mais ou menos, que consta pertencer a Manoel Alves Moreira e sua
mulher , ou quem de direito ; b ) área 2-6-7-8-9-10-11-12-13-14-15-4-3-2 ,
com 9.440,00 ms2 (nove mil e quatrocentos e quarenta metros qua
drados) , mais ou menos, que consta pertencer a Maria Fernandes
Gonçalves ou quem de direito.

Art. 2. ° --- É de natureza urgente a desapropriação de que trata


o presente decreto, para efeito de imediata imissão de posse do imó
vel em referência, na forma do artigo 15 do decreto -lei federal n . "
3.365, de 21 de junho de 1941 , com a alteração constante do de
ereto-lei federal n .° 9.811 , de 9 de setembro de 1946.

Art. 3.° As despesas com a execução dêste decreto correrão


pela verba 940.8392 consignada no orçamento vigente .
Art. 4.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica
ção, revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura do Município de São Paulo, 7 de junho de 1949, 396.*


da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.
110 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 7 de junho
de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira ,

DECRETO N.° 1.072, DE 7 DE JUNHO DE 1949

Declara de utilidade pública o imóvel ne


cessário à construção do Grupo Escolar " Dr.
Reinaldo Ribeiro da Silva " , situado à rua dos
Botocudos, em Vila Anastácio, 15.° subdistrito ,
Lapa, nesta Capital.

O Prefeito Municipal de São Paulo, usando de suas atribuições,


nos termos do disposto nos artigos 5.", letra " m ” , e 6.', do decreto
lei federal n .° 3.365 , de 21 de junho de 1941 ,
Decreta :

Art. 1.° Fica declarado de utilidade pública , para o fim de ser


desapropriado amigável ou judicialmente, um imóvel situado à rua
dos Botocudos, entre as ruas Camacan e Guaiapós, em Vila Anastá
cio, de propriedade de quem de direito, com a área total de 4.036,00
ms2 ( quatro mil e trinta e seis metros quadrados ) , mais ou menos,
assim caracterizado : 115,60 ms. (cento e quinze metros e sessenta
centímetros ) , mais ou menos, com frente para a rua dos Botocudos ;
35,00 ms. (trinta e cinco metros ) , do lado direito onde divide com
Augusto Gaspar, ou quem de direito ; 115,00 ms. (cento e quinze me
tros ) , mais ou menos, nos fundos, onde confina com terreno munici
pal, e finalmente 35,00 ms. (trinta e cinco metros ) , no lado esquer
do, dividindo com quem de direito, terreno esse necessário à cons
trução do Grupo Escolar “ Dr. Reinaldo Ribeiro da Silva” e assina
lado nas plantas anexas, sob n.° P.4308-G 15 - A 2, oraganizadas pelo
Departamento do Cadastro , as quais, rubricadas pelo Prefeito, pas
sam a fazer parte integrante deste decreto.

Art . 2.• É de natureza urgente a desapropriação de que trata


o presen te decreto , para efeito de imediata imissão de posse do imó
vel em referência , na forma do artigo 15 do decreto -lei federal núme
ro 3.365, de 21 de junho de 1941 , com a alteração constante do de
creto-lei federal n.º 9.811 , de 9 de setembro de 1946.

Art. 3.° As despesas com a execução deste decreto correrão


pela verba n . ° 940.8392, consignada no orçamento vigente .
DECRETOS E LEIS 111

Art. 4.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica


ção, revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 7 de junho de 1949, 396. "
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha . 0. Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson, O Secretário das Finanças, João. Pa
checo Fernandes. - O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 7 de junho
de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .

DECRETO N.º 1.073, DE 9 DE JUNHO DE 1949

Dispõe sobre classificação de vias públi


cas para o efeito da incidênciu da Taxa de
Pavimentação .

O Prefeito do Município de São Paulo, usando de suas atribui


ções e nos termos do artigo 5.', do Decreto-lei n .° 64, de 19 de dezem
bro de 1940,

Decreta :

Art. 1.° — Na conformidade do disposto no artigo 5.º do Decreto


lei n.º 64, de 19 de dezembro de 1940, para os efeitos da incidência
da Taxa de Pavimentação, ficam assim classificadas as seguintes vias
t logradouros públicos:
a ) 1.' categoria Principais : Avenida do Estado.
b ) 2.' categoria Médios : Rua Tomaz Carvalhal Aveni
da Mazzei - Avenida Tucuruvy Avenida Guilherme Cotching
Avenida Regente Feijó Rua dos Miranhas Rua dos Morás Rua
Itambé Rua Dna. Veridiana Rua Marquês de Itú Rua Piauí
--- Praça Vilaboim Avenida Pacaembú . Praça Wendel Wilkie
Rua Almirante Pereira Guimarães Avenida de Guarulhos Rua
Copselheiro Furtado Rua Pires da Mota Rua Teixeira de Carva
lho – Avenida Sumaré Rua Tácito de Almeida Rua Cardoso de
Almeida Estrada de Itapecerica Rua Carneiro da Cunha Rua
Reliquia Rua Imbui Rua Melo Freire Avenida Conde de
Frontin Rua Greenfeld Rua Pedroso de Morais Estrada do
Imirim Rua Imirim Estrada do Mandi .
c) 3.* categoria Secundários : Rua Barão de Capanema
Rua General Fonseca Teles - Rua dos Italianos Rua Bucarest
112 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Rua João Pinheiro Rua Sarutaiá Rua Otávio Nébias Rua Ar


ruda Alvim Rua Acaraú Rua Araquan Rua Avanhandava
Rua Spartaco Rua da Suiça Rua Saturno Rua Serra da Bo
caina Rua Turquia Rua Itaguasstú Rua Itaguacaba Rua
Roma Rua Mairinque Rua do Areal Rua Iguasstú E Rua Pi
menta Bueno Rua da Graça Rua da Paz Rua Alcino Braga
Rua Dom Bosco Rua João Pacheco Rua João Antônio de Oli
veira Rua Dr. Eduardo Gonçalves Rua Afonso de Freitas
Rua Marcelina Rua Tefé Rua Olavo Freire Rua Anhaia
Rua Mourato Coelho Rua Boracéa Rua Ouro Branco Ruit
Carumbé Rua Catalão Rua Vicente Felix Rua Rio Preto
Rua Oliveira Dias Rua Baturité Rua Dna . Eliza Rua Tucir
man Rua dos Macunis Rua Sampaio Viana Rua Aurélia
Rua Valinhos Rua Dinamarca Rua Maestro Elias Lobo Rua
Gironda Rua Suzano Rua Primavera Rua General Mena Bar
reto Rua Luxemburgo Rua Henrique Martins Rua Bento de
Andrade Rua Oliveira Pimentel Rua Fernando Borges Rua
Pacheco Miranda Rua Colatino Marques Rua Teixeira Pinto
Rua Feliciano Maia Rua Afonso Ferreira Rua Cândido do Nas .
cimento Rua Vieira Maciel Rua Lima de Barros Rua São
João Batista Rua Gabriel Piza Rua Artur de Azevedo.
Art. 2.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica
ção, revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 9 de junho de 1949, 396.*
da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha . O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 9 de junho
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Vogueira.

DECRETO N.º 1.074 , DE 9 DE JUNHO DE 1949

Declara de utilidade pública áreas de


terreno necessárias à construção da Galeria
Cambuci, no trecho compreendido entre
muro da Gráfica Municipal e a rua Muniz de
Souza .

O Prefeito do Município de São Paulo, usando de suas atribui


ções, nos termos dos artigos 5.°, letras “ d ” e “ i ” , e 6.', do decreto
lei federal n .° 3.365, de 21 de junho de 1941 ,
DECRETOS E LEIS 113

Decreta :

Art. 1. — Ficam declaradas de utilidade pública, para o fim de


serem desapropriadas judicialmente ou amigávelmente, as áreas de
terreno necessárias à construção da Galeria Cambuci , nos seguintes
trechos assinalados em amarelo nas plantas sob n.ºs 2.706 e 1.904 -A
do Departamento de Obras que , rubricadas pelo Prefeito , ficam fa
zendo parte integrante deste decreto :
1.• trecho : entre o muro da Gráfica Municipal e a rua Ce
sário Ramalho ;
2. • trecho : entre a rua Cesário Ramalho e a rua Lavapés ;
3.º trecho : entre a rua Lavapés e a rua Muniz de Souza.
Art. 2.° É de natureza urgente a desapropriação de que trata
o presente decreto , para o efeito da imediata imissão de posse das
áreas atingidas, na forma do disposto no artigo 15 do citado decreto
lei federal n.° 3.365, com a alteração constante do decreto-lei federal
n.° 9.811 , de 9 de setembro de 1946.
Art. 3.0 As despesas com a execução dêste decreto, .correrão
por conta do crédito especial aberto pela lei 3.725 de 27 de dezem
bro de 1948.
Art. 4. ° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica
ção , revogadas as disposições em contrário.
Prefeitura do Município de São Paulo, 9 de junho de 1949 , 396."
da fundação de São Paulo . 0 Prefeito, Asdrubal Euritysses du
Cunha, O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos , Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente do
Pessoal , da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos , em 9 de ju
nho de 1949. – 0 Diretor , Paulo Teixeira Nogueira.

DECRETO N. ° 1.075 , DE 18 DE JUNHO DE 1949

Declara de utilidade pública imóvel ne


cessário à abertura do prolongamento da ruu
do Fico .

O Prefeito do Município de São Paulo, usando de suas atribui


ções, nos termos do disposto nos artigos 5.°, letra " i " e 6.' , do De
creto -lei federal n.° 3.365, de 21 de junho de 1941 ,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Decreta :

Art. 1.º Fica declarado de utilidade pública, para o fim de ser


desapropriado judicial ou amigávelmente, o imóvel situado à Aveni
da Thereza Christina, Ipiranga, 19.º Subdistrito desta cidade e comar
ca da Capital, pertencente ao espólio de Pedro Magalhães ou a quem
de direito e assim caracterizado : Área 1-2-3-4-1 , de forma irregular,
com cerca de 513,83 metros quadrados, dividindo, pela frente, na
extensão de 20,93 metros , mais ou menos, ao longo do alinhamento
da avenida Thereza Christina (linha 1-2 ) , com o leito desta avenida ;
pelo lado direito de quem do terreno olha para a avenida Thereza
Christina, na extensão de 28,50 metros, mais ou menos (linha 3-2 ) ,
com terreno pertencente a Francisco Galazzo , ou quem de direito ;
pelo lado esquerdo, na extensão de 27,00 metros, mais ou menos (li
nha 4-1 ) , com o prédio n.º 65 da avenida Thereza Christina , de pro
priedade de quem de direito ; e , pelos fundos, na extensão de 21,75
metros, mais ou menos (linha 3-4 ) com o leito da rua do Fico , pelo
antigo leito do ribeirão Ipiranga, imóvel esse necessário à abertura
do prolongamento da rua do Fico e configurado na planta anexa ,
n . ° D-1.217, G 2-A-2 , que , autenticada pelo Prefeito , fica fazendo par :
te integrante deste decreto.
Art. 2.• É de natureza urgente a desapropriação de que trata .
e presente decreto, para efeito de imediata imissão de posse do imó
vel em referência , na forma do art. 15 do Decreto-lei federal número
3.365, de 21 de junho de 1941 , com a alteração constante do Decreto
Lei n.º 9.811 , de 9 de setembro de 1946 .
Art. 3.° As despesas decorrentes da execução do presente de
creto correrão por conta do crédito aberto pela lei n .° 3.701 , de 7 de
agosto de 1948 , item “ a ” do § único do art. 1.', modificada pela lei
n . ° 3.746, de 18 de março de 1949 .
Art. 4.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica
ção , revogadas as disposições em contrário ,

Prefeitura do Município de São Paulo , 18 de junho de 1949, 396.°


da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário das Finanças , João Pa
checo Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno .

Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes .


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos , em 18 de junho
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .
DECRETOS E LEIS 115

DECRETO N.º 1.076, DE 21 DE JUNHO DE 1949

Regulamenta a lei n .° 3.737, de 3 de janei


ro de 1949.

O Prefeito do Municipio de São Paulo, usando da atribuição que


lhe confere o art. 1.º da lei n .° 3.737 , de 3 de janeiro de 1949 ,
Decreta :

Art. 1.º A Junta Administrativa da Casa Própria , instituída


pelo art . 7.º da Lei n .° 3.737 , de 3 de janeiro de 1949, será presidida
e secretariada por aqueles de seus membros para esse fim designados
pelo Prefeito, competindo - lhe o exercício das funções auxiliares pre
vistas na citada lei e as seguintes atribuições :
a ) estudar e submeter à aprovação do Prefeito os planos de
loteamento e arruamento dos terrenos a que se refere o art. 1.º da
Lei n .° 3.737 e elaborar os projetos de construção, com todas as pre
visões ou indicações de ordem financeira , administrativa e urbanis
tica em geral ;
b ) opinar sôbre as propostas apresentadas pelos construtores
interessados na execução das obras ;
c ) fiscalizar o andamento e a execução das obras e dos servi
ços necessários á realização dos fins visados pela Lei n .° 3.737, bem
como o cumprimento dos contratos ;
d ) solicitar ao Prefeito material e funcionários de que necessi
te para a execução de seus trabalhos ;
e ) sugerir as alterações que julgar necessárias à Lei n .° 3.737
€ ao seu regulamento e representar ao Prefeito sobre qualquer assun
to de interesse à perfeita consecução de suas atribuições e dos objeti
vos da mesma lei ;
f ) promover a inscrição dos pretendentes à casa própria e pro
ceder o sorteio para a entrega dos prédios, tudo nos termos da Lei
n .° 3.737 e do presente regulamento ;
g) fornecer guias para o recolhimento das prestações ao Tesou
ro Municipal.
Art. 2.° A Junta Administrativa da Casa Própria ficará direta
mente subordinada ao Prefeito, com o prefixo PREF. C. P.
Art. 3.° A concorrência pública a que se refere o art. 2.º da
Lei n.° 3.737 será procedida pela Junta Administrativa, cabendo ao
Departamento Jurídico a elaboração da minuta do respectivo edital ,
cujos termos deverão ser aprovados pelo Secretário de Negócios In
terpos e Jurídicos.
116 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Art. 4.° - O edital de concorrência será publicado no Diário


Oficial cinco vezes, pelo menos, em periodo não inferior a 30 dias,
podendo ser autorizadas pelo Prefeito publicações em órgãos da im
prensa particular. 1
Art. 6.° No mesmo dia, às 15 horas, na presença dos niembros 1
ção das obras serão entregues sem emendas ou rasuras, em envelopes
fechados e lacrados e com as firmas reconhecidas, mediante recibo
assinado pelo Secretário da Junta Administrativa , até às 14 horas do
dia marcado para o encerramento da concorrência .
Art. 5.° As propostas dos construtores interessados na execu
da Junta Administrativa e dos concorrentes que compareceram, se
rão as propostas abertas, lidas, examinadas e rubricadas por todos
os membros da Junta e pelos concorrentes, lavrando-se, em seguida,
têrmo da ocorrência.

Art . 7.° Aceita a melhor proposta , a critério do Prefeito , será


celebrado o competente contrato , cuja minuta será elaborada pelo
Departamento Jurídico e aprovada pelo Secretário de Negócios Inter
nos e Jurídicos.

Art. 8.° – Logo após a elaboração e aprovação dos projetos das


casas, será aberta a inscrição dos concorrentes, em livro próprio , no
qual será registrada a qualificação dos inscritos .

Art . 9.° O livro a que se refere o artigo anterior conterá ter


mos de abertura e de encerramento e terá todas as suas folhas nume
radas e rubricadas pelo Presidente da Junta Administrativa .

Art . 10.• As inscrições receberão número e serão feitas em


ordem cronológica , sem qualquer despesa para os interessados , aos į
quais será fornecido um cartão que conterá a data , o número e os
demais elementos constantes da inscrição .
Art. 11 Poderão inscrever-se os candidatos que satisfaçam as
exigências legais, mediante requerimento que dará entrada no Pro
tocolo da Junta Administrativa e apresentação dos seguintes docu
mentos : 1

a) certidão de casamento civil ;

b)atestado de residència, na Capital , há mais de cinco anos ,


passado por autoridade policial ou judiciária ;

c ) certidão ou atestado que, a juizo da Prefeitura , prove não


receber o candidato vencimentos , ordenado, salário ou proventos
superiores a Cr$ 3.000,00 ( três mil cruzeiros ) por mês .
DECRETOS E LEIS 117

Art. 12 As inscrições serão encerradas 20 dias antes da data


marcada para a realização do sorteio.

Art. 13 - O sorteio sera procedido publicamnete, na presença


de todos os membros da Junta Administrativa e de quantos queiram
assisti- lo , observando - se as seguintes formalidades :
a) o Presidente da Junta Administrativa encerrará em urna
de cristal, tantas papeletas numeradas no ato, quantos forem os ins
critos ;
b ) logo após, um menor escolhido dentre os internados de qual
quer asilo da Capital , retirará, uma a uma, tantas papeletas quantas
forem as casas a serem sorteadas e mais cinco, considerando-se con
templados os candidatos cujos números de inscrição coincidam com
os das papeletas retiradas da urna ;
c ) em seguida, no livro próprio, lavrar-se-á têrmo suscinto do
ato , assinado pelos membros da Junha Administrativa, pelo funcioná
rio incumbido da lavratura e pelos presentes que quiserem fazê-lo.
§ 1.º Aqueles, cujos números de inscrição se identificarem
com os das cinco últimas papeletas retiradas da urna , considerar
se - ão suplentes e serão admitidos a assinar a escritura de compromis
so devenda e compra , só no caso de eliminação ou desistência dos
demais sorteados, obedecida a ordem do sorteio e atendidas as exi
géncias da lei n .° 3.737 e do presente regulamento ,

§ 2. – O sorteio será repetido sempre que , por qualquer motivo,


for eliminado qualquer dos candidatos sorteados, ressalvado o dis
posto no parágrafo anterior.

Art. 14 - O contrato de compromisso de venda e compra , será


celebrado no praso improrrogável de 60 (sessenta ) dias , contados da
data da realização do sorteio .

Art. 15 Serão eliminados e substituidos pelos suplentes, na


forma do § 1.º do art. 13, os candidatos que, no praso do artigo ante
rior , não fiserem a prova de não possuirem outro imóvel , mediante
a apresentação de certidões negativas de todos os Registros de Imó
veis da Capital.

Art. 16 As chaves das casas serão entregues aos compromissá


rios compradores, logo após a celebração do contrato de compro
misso de venda e compra .

Art. 17 O praso de pagamento, atendido o disposto no art. 3.°


da Lei n.° 3.737, de 3 de janeiro de 1949 , será estabelecido de acórdo
com a vontade do compromissário comprador.
118 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Art. 18 --- As repartições municipais prestarão toda colaboração ,


assistência e informações que lhes foreni solicitadas pelo Presidente
e pelo Secretário da Junha Administrativa .

Art. 19 Na forma legal cabivel na espécie , poderão ser postos.


à disposição da Junta Administrativa os funcionários municipais cuja
colaboração seja indispensável e cujo afastamento dos cargos que
estiverem ocupando não seja inconveniente , a critério do Prefeito.
Art . 20 Depois de instalada, a Junta Administrativa elaborará ,
dentro de 60 dias contados da data da instalação, o seu Regimento
Interno, que deverá ser aprovado pelo Prefeito.

Art. 21 O presente decreto entrará em vigor na data de sua


publicação , revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Municipio de São Paulo, 21 de junho de 1949, 396.°
da fundação de São Paulo . O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 21 de junho
de 1949. - O Diretor , Paulo Teixeira Nogueira.

DECRETO N. 1.077, DE 30 DE JUNHO DE 1949

Declara de natureza urgente a desapro


priação de imóveis situados à rua do Gazô
metro.

O Prefeito do Municipio de São Paulo, usando das atrbiuições


que lhe são conferidas por lei,

Decreta

Art . 1.º E de natureza urgente, para o efeito de imediata imis


são de posse, de acórdo com o disposto no artigo 15 do decreto - lei
federal n .° 3.365, de 21 de junho de 1941 , com a alteração constante
do decreto-lei n .° 9.811 , de 9 de setembro de 1946, a desapropriação
dos imóveis situados no trecho da rua do Gazômetro, compreendido
entre as ruas Corrêa de Andrade e Jairo Góis, declarados de utilida
de pública pelo decreto municipal n.º 975, de 28 de maio de 1947,
que aprovou o projeto de alargamento da referida rua .
DECRETOS E LEIS 119

Art. 2.• Este decreto entrará em vigor na data de sua publi


cação, revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Municipio de São Paulo , 30 de junho de 1949 , 396.*
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha . Pelo Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Paulo
Teixeira Nogueira . — Respondendo pelo Expediente da Secretaria . -
O Secretário das Finanças, João Pacheco Fernandes. O Secretário
de Obras, Dario de Castro Bueno.
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pess
soal da Secretaria dos Negócios Internos e Jurídicos, em 30 de jus
,
nho de 1949. -- O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.765 , DE 3 DE JUNHO DE 1949

Dispõe sõbre construção da " Cidade dos


Menores ' ', no antigo Hipódromo da Mooca.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com o que de-


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 20 de maio de 1949, pro
mulga a seguinte lei :

Art . 1. -- A Prefeitura Municipal construirá, na área do antigo .


Hipódromo da Mooca, a “ Cidade dos Menores ” .

Art. 2. - A "Cidade dos Menores” compreenderá : Créches, In


ternatos, Jardim da Infância Modelo, Grupo Escolar, Escola Profis-
sional Masculina e Feminina , Centro de Saúde, Salão de Teatro e Ci
nema Educativo, Biblioteca Infantil, Praça de Esportes, devendo ter ,.
no mínimo, uma área arborisada de vinte mil metros quadrados
(20.000 ms2. ) .

Art. 3.° A direção dos órgãos de assistência, instituidos por


esta lei, caberá à Secretaria de Educação e Cultura , podendo, a juizo ,
desta, ser confiada a entidade particulares, de fins idênticos, sempre
sob a fiscalização da mesma Secretaria .
$ 1.° ---- A outorga da direção a entidades particulares depende
rá, sempre, de aprovação da Câmara.
$ 2.º O Grupo Escolar, o Centro de Saúde e as Escolas Profis-
sionais obedecerão às leis que regulam o seu funcionamento .
Art. 4.° As instituições, as quais forem confiados os trabalhos
de assistência , poderão , mediante consentimento prévio da Secreta-
120 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ria de Educação e Cultura, ampliar e melhorar, com recursos parti


culares, seus serviços e instalações dentro da área que lhes haja sido
entregue, sem direito a indenização se desistirem de suas atividades,
ou yierem a extinguir - se.

§ único Não terão direito quer à direção e permanência na


" Cidade dos Menores ” , quem à indenização , as instituições que, por
desvio de suas finalidades ou alteração essencial em seus estatutos,
perderem o carater de instituições de assistência, sem fins de lucro,
ou ainda se se tornarem inconvenientes aos objetivos da presente lei .
Art. 5.0 Dentro de sessenta dias a contar da data de publica
ção dêste diploma, o Executivo elaborará e submeterá à aprovação
do Legislativo a regulamentação da “ Cidade dos Menores " .
Art. 6.° - A Municipalidade auxiliará, com subvenções anuais e
outras, as entidades particulares investidas de direção nos termos
da regulamentação .

Art. 7. - As despesas com a execução desta lei correrão por


crédito especial, a ser aberto oportunamente , e figurarão nos orça
mentos futuros .

Art. 8. ° - O arruamento aprovado pelas repartições competentes


terá prioridade na execução das obras .

$ único -- As vias públicas serão periféricas à " Cidade dos Me


nores” e dotadas de passagens inferiores para pedestres e veículos
bem como de passagens superiores para pedestres, de modo a asse
gurar trânsito destituído de qualquer perigo.

Art. 9. – Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,


revogadas as disposições em contrário ,

Prefeitura do Município de São Paulo, 3 de junho de 1949, 396 .


da fundação de São Paulo. O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson, O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.
-- O Secretário de Educação e Cultura, Elias de Siqueira Cavalcanti.

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do


Pessoal , da Secretaria de Negócois Internos e Jurídicos, em 3 de ju
nho de 1949. - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.
DECRETOS E LEIS 121

LEI N.° 3.766, DE 8 DE JUNHO DE 1949

Dá nova redação à Lei n.° 3.741 , de 17


de janeiro de 1949.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 1.° de junho de 1949 , pro
molga a seguinte lei :
Art. 1.º Passa a ter a seguinte redação o § 1.° letra “ a ” do
art. 2.° da Lei n.° 3.741 , de 1949: " a ) Não possue outro ' imóvel,
mediante declaração expressa do interessado, com firma reconheci
da, sob as penas da lei ” .
Art. 2.° Passa a ter a seguinte redação a letra “ f ” do mesmo
art . 2.° daquele diploma : " f ) Estar quite com o imposto sindical,
inediante atestado fornecido pelo sindicato da respectiva categoria ,
do qual deverá constar o número da guia de recolhimento da última
contribuição ".
Art . 3.0 Acrescente - se ao art. 2.', o seguinte parágrafo : " § 3.°
Na hipótese verificada a falsidade da declaração prevista na letra “ a ”
do parágrafo 1. do artigo 2.º, o interessado, além das responsabili
dades criminais, ficará sujeito ao recolhimento, em dôbro, dos im
postos devidos " .
Art . 4.° Passa a ter a seguinte redação o art. 8.º da mesma
lei : " Art. 8.° Os requerimentos e a documentação necessários à
obtenção do benefício fiscal de que trata esta lei são isentos de quais
quer emolumentos ou taxas municipais ”.
Art. 5.º Acrescente- se ao artigo 9.', da mesma lei o seguinte :
" g único Não se incluirão no cadastro a que se refere este artigo as
publicações cuja organização permita periódicas ou eventuais con
dições de subsistência aos que nela exercem atividades” .
Art. 6.° – A presente lei entrará em vigor na data de sua publi
cação, revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 8 de junho de 1949, 396.°
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha, O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Frar.cisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário das Finanças, João Pache
co Fernandes .
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 8 de ju
nho de 1949, - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.
122 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

LEI N° 3.767, DE 13 DE JUNHO DE 1949

Autoriza a concessão de um auxilio de


Cr $ 100.000,00 ao Instituto de Engenharia .

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 6 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :

Art . 1.º Fica o Prefeito Municipal autorizado a conceder , no


presente exercicio , um auxílio de Cr$ 100.000,00 ( cem mil cruzeiros )
ao Instituto de Engenharia , para o fim especial de atender a despe
sas com a realisação , sob o seu patrocinio , do I Congresso de Trân
sito da Cidade de São Paulo, no período de 12 a 19 de junho de 1949 .
Art. 2.° As despesas decorrentes desta lei correrão por conta
da verba 910.89.94 letra “ F ” , do orçamento vigente.
Art. 3.• Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 13 de junho de 1949, 396."
da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stenson, O Secretário das Finanças, João Pacheco
Fernandes.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 13 de
junho de 1949. - O diretor, Paulo Teixeira Nogueira ,

LEI N.° 3.768, DE 17 DE JUNHO DE 1949

Dispõe sobre oficialização e denominação


de vias públicas no bairro do Butantã .

O Prefeito do Municipio de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 3 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
Art. 1.º Ficam declaradas oficiais, nos termos da legislação
em vigor, as vias públicas situadas no Bairro do Butantã , 13.° sub
distrito, abertas em terreno de propriedade da " City of São Paulo
Improvements and Freehold Land Co. Ltd." , cujos leitos foram doa
dos ao Município de São Paulo por escrituras públicas lavradas em
DECRETOS E LEIS 123

4 de junho de 1941 e 20 de julho de de 1944 , nas notas do 4.º Tabe.


lião desta Capital.

Art. 2.° As vias públicas mencionadas no artigo anterior, cons


lantes da respectiva planta rubricada pelo Presidente da Câmara e
pelo Prefeito , terão as seguintes denominações :
Rua Alvarenga, antiga rua “ 1 ” , prolongamento da rua já oficia
lizada com a mesma denominação, e que começa na praça n.° “ 3 ” e
termina na Avenida Dr. Vital Brasil ;
Rua Coronel Palimércio de Rezende Comandante em 1932
antiga rua " 10 " , e que começa na praça n .° “ 1 ” e termina na rua “ 1 ” ;
Rua Engenheiro Bianor -- setor paulista de 1932 — antiga rua
" 12 ” , e que começa na praça n.° " 4 " e termina na Avenida Dr. Vi
tal Brasil ;
Rua Romão Gomes Gomandante de setor em 1932 antiga
rua “ 13 ”, e que começa na rua “ Marginal" e termina na praça nú
mero " 4 " ';
Rua Murtinho Nobre Médico 1878-1945 antiga rua “ 14 ” ,
e que começa na rua "Marginal” e termina na praça n .° “ 1 ” ;
Rua Moncorvo Filho Médico 1872-1944 antiga rua “ 16 ” ,
e que começa na praça n .° “ 1 ” e termina na Linha de Transmissão
da Light & Power ;
Rua Moura Brasil Médico 1846-1928 antiga rua “ 17 ” , e
que começa na avenida n.° “ 1 ” e termina na rua n.° " 1 " );

Rua Gaspar Moreira, antiga rua " 18 " , prolongamento da rua ja


oficializada com a mesma denominação, e que começa na avenida
n.º “ 2 ” e termina na rua Estevam Lopes ;
Rua Professor Horácio Berlinck Economista 1868-1948
antiga rua “ 20 ” , e que começa na rua “ Marginal” e termina na
rua “ 1 ” ;
Rua Hilário Magro Junior Professor e Jornalista 1857-1946
- antiga rua “ 21 ” , e que começa na rua “ Marginal ” e termina na
rua “ 1 ” ;
Rua Blandina Ratto Educadora 1869-1948 antiga rua
“ 22 ” , e que começa na rua “Marginal ” e termina na rua das Aldeias;
Rua Alvares Florence deputado 1896-1948 antiga rua
“ 23 ” , e que começa na avenida n .° " 2 " e termina na rua " 13 " ;
Rua Engenheiro Teixeira Soares 1848-1928 antiga rua “ 24 " ,
e que começa na rua “Marginal” p termina na Linha de Transmis
são da Light & Power ;
124 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Rua Professor Guilherme Milward 1878-1932 antiga rua


“ 25 ” , e que começa na avenida n.° “ 2 ” e termina na rua “ 1” ;
Rua Engenheiro João de Ulhôa Cintra 1887-1944 antiga rua
“ 26 ” , e que começa na praça n.° “ 2 ” e termina na rua “ 18 ” ;
Rua Pedro Bruno Professor e Pintor 1888-1949 antiga
rua “ 27 ” , e que começa na rua “ 26 " e termina na rua “ 25 ' ';
Rua Alexandre Marcondes Machado Juó Bananére 1892
1933 antiga rua “ 29 ” , e que começa na praça n.° “ 2 ” e termina
na rua “ 1” ;
Rua Hans Staden Cronista da época colonial antiga rua
“ 30 ” , e que começa na avenida n.° “ 2 ” e termina na rua “ 1 ” ;
Rua Modesto Tavares de Lima Professor e Músico 1891
1948 antiga rua “ 32 ” , e que começa na rua “ 20 ' ' e termina na
avenida n .° " 1 " ;
Rua Waldomiro Guilherme de Campos Médico - 1893-1941
- antiga rua “ 33 ' ', e que começa na rua “ 20 ” e termina na aveni
da n.° “ 1 ” ;
Rua Magalhães Castro Médico 1865-1942 antiga rua
" Marginal ” , e que começa na avenida n .° “ 2 ” e termina na rua Ge
rivatiba ;
Rua das Aldeias, antiga rua do mesmo nome, prolongamento do
trecho já oficial da mesma , e que começa na avenida nº “ 2 ” e ter
mina na rua Pirajassara ;

Rua Catequese, antiga rua do mesmo nome, prolongamento de


trecho já oficial da mesma, e que começa na praça n.° “ 4 ” e termina
na rua Pirajussara ;
Avenida Afrânio Peixoto Cientista e Professor 1876-1947
antiga avenida n .° “ 1” (2.º trecho ) , e que começa na Linha de
Transmissão da Light & Power e termina na praça n.° “ 1 ”';
Avenida das Missões, antiga avenida n.° “ 1 ” ( 1.º trecho ), e que
começa na praça n.° “ 1 ” e termina na rua Pirajussara ;
Avenida Valentim Gentil deputado 1900-1948 antiga ave
nida n .° “ 2 ” , e que começa na praça n.° “ 3” e termina na praça
n .° “ 1 ” ;
Praça dos Expedicionários, antiga praça n . ° “ 1 ” , situada entre
a avenida n.° “ 2 ” , ruas " 16 " e " 10 " , praça n.° “ 4 ” , avenida núme
ro “ 1 ” e rua “ 14 ”);
Praça Monteiro Lobato Homem de Letras 1882-1948 an
tiga praça n .° “ 2 ” , situada entre a avenida R.• “ 2” e ruas ns. “ 25 ” .
" 29 " e " 26 " ;
DECRETOS E LEIS 125

Praça Alberto Rangel Escritor 1871-1945 antiga praça


n.' “ 3 ” , situada entre a Linha de Transmissão da Light & Power,
rua “ 1 ” , avenida n .° “ 2 " e Adutora de Cotia ;

Praça Monte Castelo, antiga praça n.° “ 4 ” , situada entre as ruas


Catequese e " 13 ” , praça n . ° “ 1 ” , ruas Gaspar Moreira, Camargo
e " 12 " .
$ único As placas de nomenclatura conterão , em caracteres
menores , os dizeres e datas que se seguem aos nomes.

Art. 3.° Os lotes de terrenos e construções com frente para


as vias ora oficializadas ficam sujeitos às exigências do art. 775, ali
nea e S , do Código de Obras, aprovado pelo Ato n .° 663, de 10 de
agosto de 1934 .

Art. 4.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,


revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura do Município de São Paulo, 17 de junho de 1949, 396.


da fundação de São Paulo . - O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário de Obras, Dario de Cas
tro Bueno.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 17 de ju .
nho de 1949. - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.769, DE 18 DE JUNHO DE 1949

Dispõe sobre denominação de via pública,

O Prefeito do Municipio de São Paulo, de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 8 de junho de 1949, pro
inulga a seguinte lei :
Art. 1º - Passa a denominar-se rua Dr. Ribeiro de Almeida a
atual rua Baixa , no subdistrito de Barra Funda .
& único As placas de nomenclatura conterão , em letras meno
res, os seguintes dizeres : Joaquim Ribeiro de Almeida Médico
1882-1943 .
Art. 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Municipio de São Paulo, 18 de junho de 1949 , 396 .
da fundação de São Paulo. O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
126 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Cunha , O Secretário de Negócios Internos e Juridicos , Francisco


Oscar Penteado Stevenson. O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal , da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 18 de
junho de 1949. - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.770 , DE 18 DE JUNHO DE 1949

Dispõe sobre denominação de via pública.

O Prefeito do Municipio de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 8 de junho de 1949 , pro
mulga a seguinte lei :

Art. 1.º Passa a denominar -se rua Professor Tranquilli a atual


rua Floresta , e que começa na rua Santa Cruz e termina na rua
Loefgren , no subdistrito de Saúde.
$ único As placas de nomenclatura conterão ainda , em letras
menores, os seguintes dizeres : " Tranquilo Tranquilli 1878-1947 " .

Art . 2. ° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,


revogadas as disposições em contrário.
Prefeitura do Município de São Paulo, 18 de junho de 1949, 396.0
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha, O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson , O Secretário de Obras, Dario de Cas
tro Bueno.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos , em 18 de
junho de 1949. O Diretor , Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.771 , DE 18 DE JUNHO DE 1949

Altera dispositivos do Ato n.° 1.327, de


5 de janeiro de 1938.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 8 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
DECRETOS LEIS 127

Art. 1. * O artigo 3.º do Ato n .° 1.327, de 5 de janeiro de 1938


passa a ter a seguinte denominação :
"Art. 3." As comunicações de lançamento, sejam as realizadas
por aviso direto, sejam as publicadas na Imprensa, serão feitas nas
épocas seguintes : a ) Imposto de Indústria e Profissões, Licença
e Publicidade , durante os meses de janeiro e março ; b ) Imposto
Territorial e Predial Urbanos, Taxas de Viação e Sanitária , durante
os meses de abril e agosto ” .
Art. 2.• Revogam- se as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 18 de junho de 1949, 396.'
da fundação de São Paulo . ---- O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. — O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 18 de
junho de 1949. - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.772, DE 21 DE JUNHO DE 1949

Dispõe sobre denominação de via pública.

O Prefeito do Município de São Paulo , de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 15 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
Art. 1.º Passa a denominar-se rua Comandante Ismael Guilher .
me a atual rua Aviz situada no distrito de Ibirapuera .
$ único Constará da placa de nomenclatura , em caracteres
menores , o seguinte : Comandante da Aviação Militar de 1932 .
Art. 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,
revogadas as disposições em contrário.
Prefeitura do Município de São Paulo, 21 de junho de 1949 , 396.°
da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Juridicos , Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 21 de junho
de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.
128 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

LEI N.° 3.773, DE 24 DE JUNHO DE 1949

Autoriza a construção de velórios nos ce


mitérios municipais.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com o que de-


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 13 de junho de 1949 , pro
mulga a seguinte lei :

Art. 1.º Fica o Executivo autorizado a mandar construir vtlo


rios nos cemitérios existentes no Município.

Art. 2.° O Executivo fará as despesas decorrentes da presente


lei por verbas próprias do orçamento vigente.
Art. 3.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo , 24 de junho de 1949 , 396. "
da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretários das Finanças, João Pa
checo Fernandes, O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 24 de junho
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .

LEI N. ° 3.774, DE 24 DE JUNHO DE 1949

Modifica o art. 48 do Ato n .° 326 , de 23


de março de 1932.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 10 de junho de 1949 , pro
mulga a seguinte lei :
Art. 1.• O artigo 48 do Ato 326 , de 21 de março de 1932 , fica
substituído pelo seguinte : " Art. 48 Nos errenos em que houver
sido feito enterramento de pessoa que era portadora ou que falecer
em consequência de inoléstia contagiosa, não se fará a exumação de
que trata o parágrafo 3.º do Artigo 43, salvo se precedida de autori
zação da repartição competente , da Secretaria dos Negócios da Saúde
Pública e Assistência Social ” ,
DECRETOS E LEIS 129

Art. 2.• Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,


revogadas as disposições em contrário ,

Prefeitura do Municipio de São Paulo, 24 de junho de 1949, 396 .


da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno.

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 24 de junho
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.775 , DE 27 DE JUNHO DE 1949

Dispõe sobre denominação de praça pú


blica.

O Prefeito do Município de São Paulo , de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 24 de junho, promulga a
seguinte lei :

Art. 1.• Passa a denominar -se Praça Alfredo Paulino a atual


praça triangular sem nome, limitada pelas ruas Sebastião Pereira e
Frederico Abranches, no subdistrito de Santa Cecília .
$ único As placas de nomenclatura conterão em caracteres me
nores os dizeres e datas : Professor 1876-1928.

Art. 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,


revogadas as disposições em contrário ,

Prefeitura do Municipio de São Paulo, 27 de junho de 1949, 396."


da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha .
O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno.

Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 27 de junho
de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.
130 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

LEI N.° 3.776, DE 27 DE JUNHO DE 1949

Declara de utilidade pública lote de terre


no situado à rua Comendador Cantinho.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 24 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :

Art. 1.• Fica declarado de utilidade pública , para o fim de ser


desapropriado judicialmente ou adquirido mediante acordo, o lote de
terreno situado à rua Comendador Cantinho , esquina da rua Frei
Germano , de propriedade do espólio de D.' Angelina Genosa ou quem
de direito, e configurado na planta anexa, rubricada pelo Presidente
da Câmara e pelo Prefeito, e que será destinado ao alargamento da
rua Frei Germano, esquina da rua Comendador Cantinho, terreno éste
de forma irregular, com a área aproximada de 312,60 m², confinan
do : pela frente numa extensão de mais ou menos 37,00 m com a rua
Frei Germano ; pelo lado direito de quem do terreno olha para a rua,
numa extensão de mais ou menos 8,80 m com a rua Comendador
Cantinho ; pelo lado esquerdo de quem do terreno olha para a rua,
numa extensão de mais ou menos 9,00 m com quem de direito ; pelos
fundos numa extensão de mais ou menos 37,50 m , confinando com
propriedade de Rogério Monteiro, ou quem de direito.

Art. 2.° As despesas com a execução desta lei correrão por


conta da verba n .° 940.8894 do orçamento vigente.

Art. 3.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,


revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 27 de junho de 1949, 396. "
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson, O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno. 1
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 27 de
junho de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.
INDICE
|
1
1
INDICE

COLABORAÇÃO

São João e sua tradição no Brasil, por Aureliano Leite . 3


Introdução ao romantismo brasileiro, por Jamil Amansur Haddad 15
indios o caboclos, por Francisco S. G. Schaden 24
Perfil de Amadeu Amaral, por Hélio Damante 65

DOCUMENTACAO

X. 19 Registro de uma ordem de Sua Magestade aos oficiais da


Câmara desta cidade, sôbre a despesa que devem fazer dos bens
do Senado 91
N.. 20 Registo de uma ordem de Sua Magestade aos oficiais da ca
mara desta cidade, sobre o que se deve observar na fatura do ca
minho do mar para o Cubatão etc. 91
N.° 21 — Registo de uma patente de capitão - mor confirmada por Sua
Magestade a Manoel Mendes de Almeida, desta cidade de São Pau
lo, por tempo de três anos como nela se declara 92

Papéis Avulsos
Doc. CLIV Pagamento de aluguéis 95
Doc. LV Reclamações de alguns presos 95
Doc. CLVI Nomeação de presidente para a provincia de São Paulo . 96
Doc . CLVII Criação de uma Universidade . 96
Doc. CLVIII Devassa sobre a morte de um Capitão do Mato 97
Doc. CLIX Consertos em uma ponte 97
Doc. CLX Acusando recebimento de um ofício 97
Doc. CLXI - Cópia de uma portaria 97
Doc. CLXII Contribuição voluntária para a Marinha de Guerra . 98
Doc. CLXIII Publicação de dois editais . 98
Doc. CI XIV Dispensa sobre nomeação .
Doc. CLXV Recebimento de um edital 99
Doc. CLXVI Edital sõbre o projeto de Constituição .

Atas da Câmara de Santo Amaro


Ata da sessão especial para discussão da lei orçamentária para o exer
cscio de 1913 101
134 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Ata da sessão especial para a segunda discussão da lei orçamentária


para o exercício de 1913 102
Termo de comparecimento . 103
Ata da sessão ordinária realisada no dia 2 de dezembro de 1912 103
Termo para inutilisar a presente página . 104
Ata da reunião dos senhores Vereadores e Suplentes da Câmara Muni
cipal para a eleição de três membros da comissão de alistamento
eleitoral, sob a presidência do senhor Capitão Symphronio Olym
pio da Silva, ajudante do Procurador da Republica 104
Termo de comparecimento 105

Decretos e Leis

Decreto n .° 1.070 , de 1 de junho de 1949 Declara de utilidade pa


blica o imóvel necessário à construção do Grupo Escolar Almirante
Barroso, situado à Avenida Jabaquara, 22. ° subdistrito, Saúde, nesta 107
Capital
Decreto n.o 1.071 , de 7 de junho de 1949 Declara de utilidade pú
blica o imóvel necessário a construção do Grupo Escolar " Visconde
de Taunay ” , situado à Avenida Tomaz Edison , 4.° subsdistrito, Nossa
Senhora do Ó, bairro do Limão, nesta Capital 108
Decreto n .° 1,072, de 7 de junho de 1949 Declara de utilidade pa
blica o imóvel necessário à construção do Grupo Escolar " Dr. Rei
naldo Ribeiro da Silva " , situado à rua dos Botucudos, em Villa
Anastácio, . 15," subdistrito, Lapa , nesta Capital 110
Decreto n.º 1.073 , de 9 de junho de 1949 Dispõe sobre classificação
de vias públicas para o efeito da incidência da Taxa de Pavi
mentação 111
Decreto n.º 1.074 , de 9 de junho de 1949 - Declara de utilidade pú
blica áreas de terreno necessárias à construção da Galeria Cam
bucí, no trecho compreendido entre o muro da Gráfica Municipal
e a rua Muniz de Souza 112
Decreto n. ° 1.075 , de 18 de junho de 1949 - Declara de utilidade pú .
blica" imóvel necessário a abertura do prolongamento da rua do
Fico 113
Decreto n: 1.076, de 21 de junho de 1949 Regulamenta a lei n .° 3.737 ,
de 3 de janeiro de 1949 . 115
Decreto n .. 1.077, de 30 de junho de 1949, Declara de natureza 'ur
gente a desapropriação de imóveis situados à rua do Gazômetro , 118

Leis

Lei n .° 3.765 , de 3 de junho de 1949 Dispõe sõbre construção da


“ Cidade dos Menores ' ' , no antigo Hipódromo da Mooca 119
Let n.o 3.766 , de 8 de junho de 1949 Dá nova redação à Lei n . 3.741 ;
de 17 de janeiro de 1949 . 121 .
Lei n .° 3.767 , de 13 de junho de 1949 Autoriza a concessão de um au
xílio de Cr $ 100.000,00 ao Instituto de Engenharia 122
Lei n.º 31768 , de 17 de junho de 1949 Dispõe sobre oficialização e de
nominação de vias públicas no bairro do Butantã 122
Lei n .° 3,769 , de 18 de junho de 1949 Dispõe sõbre denominação de
via pública 1125
DECRETOS E LEIS 135

Lei n.° 3.770, de 18 de junho de 1949 Dispõe sobre denominação de


via pública 126
Lei 'n.° 3.771, de 18 de junho de 1949 Altera dispositivos do Ato n.o
1.327, de 5 de janeiro de 1938 126

Lei n.° 3.772, de 21 de junho de 1949 Dispõe sobre denominação de


via pública 127
Lei n.e 3.773, de 24 de junho de 1949 Autoriza a construção de velo.
rios nos cemitérios municipais 128
Lei n.° 3.774, de 24 de junho de 1949 - Modifica o art. 48 do Ato n.o
326 , de 21 de março de 1932 . 128
Lei n.° 3.775, de 27 de junho de 1949 Dispõe sõbre denominação de
praça publica . 129
Lei n.° 3.776, de 27 de junho de 1949 Declara de utilidade pública
lote de terreno situado à rua Comendador Cantinho 130
Sło mit 6

REVISTA DO ARQUIVO

MUNICIPAL

CXXVI

DOCUMENTS DEPARTMENT

APR 7 1960

LIBR RY
UNIVERS ! OF CALIFORNIA

SAMPAIO FERRAZ
Famoso Chefe de Polícia do Rio.

PREFEITURA DO MUNICIPIO DE SÃO PAULO


DEPARTAMENTO DE CULTURA
1 9 4 9
REVISTA

DO
1
A R Q U I V 0

M U N ICI P A L

PUBLICAÇÃO DO DEPARTAMENTO
MUNICIPAL DE OULTURA

Redação :

Divisão do

Arquivo
Histórico

Rua Cantareira , 210


Telefone 2-8576

Oficinas : 4

Gráfica da

Prefeitura
Telefono 8-1051

4
Assinaturas :
para o Estado de São Paulo
Cada 12 nameros .. Cr.$ 40,00
Nomero avulso .. Cr . $ 5,00

Para os outros Estados


Cada 12 nameron . . Cr . & 60,00
Namero avulso ... Cr. 6,00
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL .
Publicação da Divisão do Arquivo Histórico , do Departamento de Cultura ,
da Secretaria de Educação e Cultura , da Prefeitura de São Paulo
São Paulo, Rua Cantareira n.° 216
Diretor JULHO E AGOSTO DE 1949 Secretário
José de Barros Martins ANO XVI VOLUME CXXVI Nuto Sant'Anna

SUMÁRIO

LIGEIRO ESBOÇO BIOGRÁFICO DE FRAN


CISCO ADOLFO DE VARNHAGEN Orlando de Carvalho
Damasceno

25 DE JANEIRO Tito Livio Ferreira

DO DELITO , CÓDIGO PENAL E ORGANIZA


ÇÃO POLICIAL NA INGLATERRA Sampaio Ferraz

GOETHE Abrahão Ribeiro , Wilhelm


Hausenstein, Renato Cirell
Czerna e Albert Schweitzer -

EVOCAÇÃO DE UM BANDEIRANTE Gabriel de Rezende Filho.


Antônio de Toledo Piza ,
Eduardo Vilhena de Mo.
rais , J. G. Morais Filho e
Carlos da Silveira

ORDENS RÉGIAS PAPÉIS AVULSOS ATAS DA CÂMARA DE


SANTO AMARO - PUBLICAÇÕES — DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS
PREFEITURA DE SÃO PAULO

RUA LIBERO BADARO , 277

Prefeito

ASDRUBAL EURITYSSES DA CUNHA

1
LIGEIRO ESBOÇO BIOGRAFICO

DE FRANCISCO ADOLFO DE VARNHAGEN

(Primeiro e último Visconde de Pôrto Seguro)

POR ORLANDO DE CARVALHO DAMASCENO

( Trabalho premiado ao concurso instituido


em 1946, pela
Divisão do Arquivo Histórico )
1
À GUISA DE PREFACIO

Não compreendemos por que ainda não se cuidou, no Brasil, de dar


estímulo oficial às atividades intelectuais. O pouco que se tem feito nesse
sentido limita-se às belas artes. Embora em proporções modestas, pinto
res e pianistas, escultores e violinistas têm merecido a assistência do Es
tado, que lhes proporciona viagens ao estrangeiro e meios de aperfeiçoa
mento nos seus estudos . Ainda não há muito tempo, o Conselho de Orien
tação Artística de São Paulo, reiniciou as suas beneméritas atividades, res
tabelecendo o concurso ao Prêmio “ Aperfeiçoamento Artístico " que fora
interrompido devido à conflagração mundial em que nos vimos envolvi
dos. Podem , assim , prosseguir os seus estudos, no país e no estrangeiro,
vários destacados artistas nacionais contemplados com aquele prêmio.
Ésse estímulo que os poderes públicos de São Paulo, dêste grande
São Paulo, colmeia ruidosa , ativa e progressista, orgulhoso do seu brilhan
te passado histórico que é, aliás, o próprio passado histórico do nosso
amado Brasil, que endossou sempre os compromissos comuns de trabalhar,
trabalhar sempre, mais e melhor pela grandeza moral e material da gran
de pátria brasileira, dão, há longos anos, aos estudos artísticos, não sabe
mos por que ainda não foram estendidos a outros setores da atividade
intelectual. Se, todos os anos , o Governo Paulista também promovesse
concursos destinados a incentivar, a estimular os estudos históricos e geo
gráficos, sociológicos e filosóficos , literários e linguísticos, bem como de
monografias jurídicas, médicas ou de outros setores científicos , certamen
te estaria prestando um serviço altamente patriótico e deveras inestimá
vel à cultura de São Paulo e do Brasil .
A propósito, a Prefeitura de São Paulo , vinha dando, há anos , admi
rável exemplo nesse sentido com os seus interessantes e bem organizados
concursos de História Nacional, que proporcionaram à nossa literatura
especializada alguns excelentes trabalhos . Mas, nem a Prefeitura prosse
guiu nesse empreendimento, nem foi êle seguido, como era de esperar, pelo
Estado. Entretanto, agora, através de sua Divisão de Documentação His
tórica e Social , do Departamento de Cultura, a Edilidade Municipal re
enceta auspiciosamente suas patrióticas atividades nesse sentido , graças
ao tirocínio e clarividência de Francisco Pati e à boa vontade e organi
zação de Nuto Sant'Anna.
As belas letras não podem decentemente definhar à míngua de prote
ção oficial , sob a égide da República, na terra que prodigalizou o seu
ouro, os seus diamantes e as suas especiárias a D. João V , o instituidor
da Academia Portuguêsa ; que acolheu e agasalhou D. João VI, o funda
dor da Academia de Belas Artes , e que foi governado durante meio sécu
lo pelo Sr. D. Pedro II, o sábio e inspirador criador do Instituto Histó
6 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

rico e Geográfico Brasileiro e imperante que mais se ufanava de ser sábio


do que de ser monarca . É verdade que passámos da soberania constitucio
nal de um só passo para a soberania coletiva e absoluta do Povo. O núme
ro dos protetores não deve, porém, ter feito mais do que crescer na razão
direta do número dos reinantes.
Ficando nós a dever gratidão a tão crescido rol de padrinhos, disper
sando -se, portanto, esse sentimento naturalmente fluido, corre menos o
risco de perder-se a bela independência em que vivíamos, e na qual, como
Cyrano de Bergerac, podíamos exclamar :

..moi, lorsque j'ai fait um vers , et que je l'aime.


Je me le payen en me le chantant à moi-même !

Também seria um mal o excesso opôsto. Chega - se a certo grau em


que o abuso da independência se converte em improdutividade, em que o
espírito tanto blasona de livre que se torna anárquico. A convivência de
intelectuais entre si, nas pugnas, nas maratonas e concursos literários é,
aliás, o remédio mais eficaz e seguro para um tal perigo, porque reduz,
a quase nada, os exageros individuais de opinião fomentando, entremen
tes, a solidariedade pelo concurso de mútuas concessões. Quando nisto se
cifrasse a ação de nossas egrégias instituições literárias e científicas já
não teria sido inútil as suas respectivas organizações. Elas, contudo, vi
sam a fins mais positivos .
Conta Léon Gozlan ou um dos outros satélites que, despindo Balzac
das suas chinelas, da sua bengala, melhor do seu guarda-fato, são os
verdadeiros responsáveis da nudez disforme, mal disfarçada pelo famoso
roupão que Rodni amassou , e que na casa das Jardies o grande romancis
ta marcara a giz nas paredes os lugares para os quadros de mestres e as
tapeçarias de preço , nas quais, uma vez paga a dívida torturante, se trans
formariam os milhões produzidos pela publicidade dada às criações da
sua imaginação fértil e prodigiosa. Esta é, pouco mais ou menos, nossa
situação . Temos planos de grandes trabalhos coletivos, um programa so-
berbo para ser levado a cabo por nós ... e por nossos sucessores . Aí resi
de tôda a diferença, Balzac sucumbiu debaixo da faina gigantesca da “ Co
média Humana ” . As nossas instituições literárias e científicas não podem
sucumbir, mesmo quando trabalhem muito , por que os obreiros nunca fal
tam. Seguem-se uns aos outros , concatenados pela imperecível tradição e
pelo grande ideal comum. Não descuremos, porém , o nosso quinhão de tra
balho, sob pena de sermos em excesso maltratados pelos intelectuais e
obreiros do futuro, pelos porvindouros. Homenageando, pois, nesta feliz
oportunidade, o meu ilustre biografado, a Divisão de Documentação Histó
rica e Social, do Departamento de Cultura, da Prefeitura Municipal, ofe
receu - se , a si própria, o magnífico exemplo de um labor ininterrupto que,
como quase sempre acontece, os pósteros recompensarão de maneira mais
liberal, dispensando a Francisco Adolfo de Varnhagen, primeiro e último
Visconde de Pôrto Seguro, o merecido epíteto de reformador, no Brasil,
dos estudos históricos e dedicando-lhe, como diria a linguagem do seu
tempo, um vistoso altar no templo da Minerva Americana, um seu monu
mento que relembrasse, enfim , às gerações futuras o muito que fêz pela
nossa História e por nossa querida pátria.
Há, em São Paulo, atualmente se não nos enganámos dois bem
organizados concursos anuais para trabalhos literários, ambos promovi
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 7

dos por entidades privadas e com prêmios oferecidos por particulares: 0


da Academia Paulista de Letras que tem revelado alguns inegáveis valo
res da literatura do nosso São Paulo, e o que foi instituído mais recente
mente, pela Associação Brasileira de Escritores, e que, pela primeira vez,
foi disputado em 1945, entre os autores de livros de ensaios publicados e
trabalhos inéditos versando problemas nacionais.
Por que São Paulo não estende, não amplia a sua ação, já tão benéfi
ca e fecunda no que diz respeito ao estímulo às artes, com a instituição
de prêmios compensadores para esses outros setores da atividade intelec
tual ? Uma verba anual de Cr$ 200.000,00 ou de Cr $ 300.000,00, permiti
ria certamente , a realização de grandes e interessantes concursos, com
prêmios de Cr $ 20.000,00, no mínimo, que teriam a virtude de atrair a
atenção de centenas de escritores e estudiosos aos quais, o que falta, para
que se revelem , é, muitas vezes, uma oportunidade como essa. Não a en
contrando, acabam por se desviar para outras atividades, provavelmente
com grande desvantagem pessoal porque a arte de escrever ainda não
é, infelizmente no nosso caro Brasil, perfeitamente compensadora, sufi
eientemente remuneradora mas com prejuízo para a própria coletivi
dade, cujo patrimônio cultural certamente se enriquecerá com a apresen
tação, todos os anos, de trabalhos que não se escreveriam se não fôsse o
estímulo representado por esses mesmos concursos .
Autor de alguns despretenciosos livros ( todos eles ainda por publi
car) , tenho apelado infrutiferamente, levado pela falta absoluta de recur
sos financeiros, ao poder público da nossa pátria. Viagens difíceis e one
rosas, ao Rio de Janeiro , foram por mim encetadas, porém , debalde ; não
fui bem sucedido. Em face de tão grandes contratempos e decepções,
oriundas, todas elas da ausência de amparo por parte das autoridades
competentes, desisti de bater à porta de quem realmente nos poderia aju
dar, para prosseguir, como prossigo, sem desfalecimentos e sem jamais
perder a esperança, no extenuante e ingrato labor de escrever, escrever
sempre, na espectativa de melhores dias, em busca de melhor oportunidade.
A necessidade de um órgão técnico que patrocinasse e estimulasse o
estudo de tantos e preciosos documentos com os quais se pode vir a co
nhecer a origem dos mais importantes feitos dos nossos antepassados, ou
esclarecer noções erróneas sobre fatos que merecem ser devidamente co
nhecidos , era uma destas lacunas que se afiguravam difícil de ser pre
enchidas .
Felizmente, para gáudio dos estudiosos a oportuna, louvável e patrió
tica iniciativa da Divisão de Documentação Histórica e Social , do Depar
tamento de Cultura, da Prefeitura Municipal , está fadada a ser coroada
do melhor éxito pois, de há certo tempo a esta parte, com pequenas inter
rupções, entretanto , e em pequena escala vem ela proporcionando e esti
mulando aos estudiosos da nossa bela História, os meios de concorrerem
com suas luzes para assegurar o enriquecimento do nosso já opulento pa
trimônio histórico.
E outra coisa não era de esperar da clarividência e do patriotismo
da figura, por todos os títulos simpática, do brilhante administrador e
insigne intelectual patrício Dr. Francisco Pati , coadjuvado eficientemente
como é, pela competência e denamismo de Nuto Sant'Anna , que tudo tem
feito, à frente daquela Divisão, para o maior realce da inconfundível ges
tão daquele, na superior direção do Departamento de Cultura, da nossa
Edilidade.
3 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

O concurso sôbre assunto histórico , instituído e patrocinado por aque


le órgão, em prosseguimento ao seu programa de atividade, é já uma pro
va cabal e eloquente de que o seu trabalho fortifica-se no estudo da his
tória, que tem valor inestimável, e muito pode servir para que, nós, os
moços da atual geração aprendamos a conhecê-la e bem assim para que
outros estudiosos pesquisadores que a ela se dediquem, possam, no futu
ro, continuar a obra , que é bem pequena, no entanto, em relação à im
portância de que se reveste o assunto .
O Departamento de Cultura se encontra diante de uma impositiva
tarefa : concorrer, em São Paulo, para o desenvolvimento de concursos e
maratonas intelectuais .
Essa tarefa, é fascinante, porque tais competições literárias concor
rem para que a nossa juventude, os nossos moços e homens de letras se
dediquem à exploração deste vasto campo de atividade, enriquecendo o
nosso patrimônio cultural ; e é difícil , no entanto, porque, na ealidade ,
para desenvolvê-lo, tanto pelo aspecto cultural, como pelo econômico,
muito há que fazer.
Entretanto, basta ter em vista as grandes possibilidades que, para
nós, em São Paulo, esta questão apresenta, que vale a pena dedicar à
sua instituição efetiva e definitiva todo o nosso esfôrço, secundado pelo
. Governo Estadual que, num amplo sentido, tudo poderia fazer a fim de
tornar São Paulo um centro ainda maior da cultura e inteligência na
cionais.
A paisagem brasileira, a peculiaridade de sua civilização, o seu so
berbo passado histórico, oferecem um grande encanto e motivos sem con
ta, e o brasileiro é, naturalmente, um apaixonado sincero do que é nosso
e capaz, portanto, de oferecer-nos magistrais peças literárias.
Aí estão as principais premissas, quase por si sós capazes de confe
rir a vaidade de virmos a ser, em grau superlativo, o Estado da federação
onde mais se trabalha e se produz em prol das ciências, das artes, da
literatura , como, em parte, já somos.
Refiro-me , evidentemente, ao Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernam
buco, Bahia, Rio Grande do Sul, etc. , etc., que vêm realizando sua pre
destinação cultural, no traçado ascendente, imprimindo pelos respectivos
órgãos estaduais , eficientemente coadjuvados pelos centros e instituições
literárias .
Repetir essa mesma tarefa em São Paulo possuindo , para estímulo,
o exemplo dos extraordinários resultados que aqueles Estados têm obtido
eis o que se deveria fazer na dinâmica e formosa Paulicéia , precursora
dos mais alevantados ideais, muito embora alguns espíritos caracteristica
mente egoistas creiam que pouco recebemos que sirva de incentivo e enco
rajamento.
A tarefa , porém , é, porisso mesmo, sedutora.
Reclama, apenas , dos órgãos que tenham a si a incumbência de insti
tuir tais concursos como praxe normal e ativa, uma inteligência objetiva
to hábito de desaparecer dentro de uma certa ordem de iniciativas, só
coroáveis de êxito pela coletivização dos esforços e conjugação dos reais
valores em função de um programa incisivo e certo .
Escrevendo como concorrente a um concurso de caráter literário, pen
so dever revelar o plano que me anima em relação às competições dessa
natureza, a fim de que seja julgado no que, porventura ofereça de básico
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 9

e viável. Fazem principal parte deste plano a propaganda inteligente c


bem dirigida e a instituição de prêmios realmente tentadores, à altura,
portanto, do fim a que se destinam .
Onerosa, como ainda é, a propaganda, para que se realize em quanti
dade maciça, capaz de se fazer sentir em tôda parte, dando a nossa Pre
feitura presente à conjectura dos sucessos e despertando, sistemàtica
mente, o interesse por essas competições, seria necessário completar os
recursos orçamentários que a Edilidade paulopolitana para este fim con
signe, com outros, que venham a ser oferecidos pelos estabelecimentos
culturais e científicos e por particulares.
Reunidos esses fundos poder -se -ia dissiminar, por tôda parte, folhe
tos e prospectos explicativos com enumeração dos concursos já realizados
e respectivos resultados colhidos e outros dados e estatísticas, julgados
interessantes.
Evidentemente, a quadra, momentaneamente, talvez não seja própria
para um empreendimento de tão grandes proporções. Entretanto, essa
dúvida deve desaparecer, considerando que a afluência de concorrentes, de
candidatos, cessados os primeiros momentos de indecisão, seria a mais
animadora possível, em face dos vastos recursos intelectuais da atual ge
ração bandeirante.
Despertemos e mantenhamos, pois, dêsse modo, a primazia de São
Paulo, dentro do Brasil, pelo culto às letras, às ciências e às artes.

O AUTOR
LIGEIRO ESBOÇO BIOGRÁFICO

DE

DE FRANCISCO ADOLFO DE VARNHAGEM

( Primeiro e último Visconde de Porto Seguro )

Não há recanto do imenso território da querida terra brasileira , com


alguma cultura intelectual, onde não seja conhecido, quase familiar o
nome do historiador nacional por excelência, de quem até o seu fogo
so adversário, o finado João Francisco Lisboa, escrevia que era " o pai
de nossa história ”. Entretanto, tendo passado quase todos os seus dias
nas outras terras do Continente Americano e na Europa, muito pouco ou
pouco se conheceu, no país, da própria pessoa do paulista Francisco Adol
fo de Varnhagen, e não mais, talvez, das variadas esferas de suas explên .
didas e extraordinárias investigações literárias.
O presente e dispretencioso esboço biográfico que nos propuzemos
traçar, aproveitando da feliz oportunidade que nos oferece a Divisão de
Documentação Histórica e Social , do Departamento de Cultura, da Prefei
tura Municipal, não tem por objetivo apresentar aos ilustres Membros
da Comissão Julgadora um estudo crítico dos trabalhos do notável e
enciclopédico escritor e insigne historiógrafo patrício. O nosso escopo
único e exclusivo é tentar despertar a atenção, tanto quanto possível, dos
curiosos para esses mesmos trabalhos e solver, dentro de nossas fracas
possibilidades, um pequeno tributo de respeito ao que, mais do que qual
quer outro , houve por bem contribuir para a elucidação clara e precisa
da história do nosso grande país e da do Novo Mundo, e que , também
mais do que qualquer outro seu contemporâneo, concorreu a que, na velha
Europa se respeitassem os estudos e apuradas investigações literárias e
científicas dos brasileiros.
Porisso, felicito -me a mim mesmo pela feliz lembrança de evocar a
figura ímpar do maior e brilhante historiógrafo brasileiro natural de São
Paulo .
O Barão, mais tarde Visconde de Pôrto Seguro foi o terceiro filho
do Coronel de Engenheiros, de nacionalidade germânica Frederico Luís
Guilherme de Varnhagen, que foi quem , com reconhecida autoridade e
capacidade técnica e profissional restaurou as fundições nacionais exis
tentes na localidade de São João do Ipanema, na então Província de São
Paulo. Aí nasceu ele aos 17 de fevereiro de 1816, e não em 1819 como
por engano se tem escrito.
12 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Depois de começar o estudo das primeiras letras na cidade do Rio de


Janeiro passou o jovem Francisco Adolfo de Varnhagen a estudar em
Portugal, onde fixara residência . Ainda residia nesse Reino quando o ex
Imperador do Brasil, o Sr. D. Pedro I, procurava estabelecer a restau
ração constitucional em Portugal. O jovem e ardoroso Varnhagen , pôsto
que ainda menor, alistou -se imediatamente como voluntário nas fileiras
que sustentavam esta causa , e só depois do desenrolar daqueles graves
acontecimentos, isto é, em 1834, foi concluir os seus estudos superiores,
de engenheiro -militar. Antes, porém , de deixar os bancos acadêmicos, já
Francisco Adolfo revelara gösto apurado e decididamente profundo pelos
estudos especiais sobre o nosso caro Brasil, pátria que jamais olvidara .
Também aos 22 anos de idade, antes mesmo de concluir o curso superior,
escrevera umas “ Reflexões Críticas ” sôbre o escrito surgido no século
XVI , e impresso sob o título de “ Notícias do Brasil ” , obra de autoria
de Gabriel Soares de Souza , publicada em 1825, pela Academia Real das
Ciências de Lisboa. É tal e tão surpreendente a erudição dêste trabalho, e
a novidade e variedade das investigações de que estava eivado, que a
mesma Academia admitiu o brilhante e culto autor como sócio, aprovan
do-o para as suas três classes, sendo que, para sua admissão naquele
cenáculo bastaria a aprovação para uma delas.
Um dos ilustres censores a quem foi confiado esse trabalho foi o céle
bre literato Conde D. Francisco de São Luís que exprimiu -se desta forma
no seu provecto parecer :

“ Êste trabalho, que por sua natureza seria importante em


qualquer outra obra, é de muito maior interêsse na presente: por
quanto sendo ela uma das melhores e mais estimadas que no tempo
antigo se escreveram acerca do Brasil, e, sendo por isso mesmo con
sultada e citada a cada passo pelos sábios modernos que se têm
ocupado da história geográfica , natural e civil daquele país. Cum
pre ao próprio crédito e honra da Academia ( já que a sua edição
saiu tão incorreta ) emendar os principais defeitos que nela se en
contram e firmar, ao mesmo tempo o genuíno título , a verdadeira
data e o legítimo autor da obra , circunstâncias que, tôdas devem
concorrer para lhe conciliar a fé e autoridade que convém . Isto é o
que faz ( segundo o meu conceito ) o erudito autor das “ Reflexões
Críticas ”, com bom juízo e discernimento, com estilo claro e con
ciso e com erudição curiosa, oportuna e não enfastiada ” .

Três meses depois, ainda escrevia o mesmo sábio aristocrata portu


guês ao jovem brasileiro a seguinte carta, participando -lhe sua admissão :

“ Ilmo. Sr. Venho da sessão do Conselho da Academia , aon


de tive o gosto de ouvir ler as censuras das três classes feitas à
Memória ou “ Reflexões Críticas ” de V. S., tôdas de uniforme
aprovação . O meu mesquinho louvor ficou a perder de vista, e eu
não desgostei de me ver excedido em tal matéria .
“ Duvidou -se em que classe deveria V. S. ser proposto. Eu limi
tei-me a refletir que V. S. tinha estudos em diferentes classes e
que tôdas as três da Academia estavam pobres de gente e tôdas
ganhariam com a sua admissão. Resolveu - se que devia ser proposto
pela classe a que se reputava pertencer “ particularmente a sua
obra. Consequentemente ficará V. S. na classe das Ciências Morais
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 13

e Belas Letras não sei se à sua vontade, mas, certamente à minha ;


que muito estimei que V. S. ficasse na minha classe para ilustrá - la
e enriquecê- la ”.

A referida obra “ Reflexões Críticas ” e também a publicação do “ Diá


rio de Pero Lopes ” , ( 1530-1532 ) , abriram -lhe igualmente as portas do
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro que pouco antes havia sido
fundado no Rio de Janeiro.
Surgiram , entretanto, por essa ocasião , algumas dificuldades acérca
da nacionalidade a que pertencia o notável historiógrafo patrício ; apenas,
pois, concluiu os seus estudos na capital lusitana, embarcou, pressuroso
de volta ao Brasil, a fim de solvê-las tão depressa quanto possível e de
uma vez por tôdas. Chegando aqui, porém , encontrou o espírito público
muito comovido em consequência da recente revolução que redundou na
maioridade temporária do Sr. Dom Pedro II ; não sendo, portanto , a oca
sião oportuna, encetou , então, viagem para o interior, onde ainda se acha
va em 1841 , quando, recebendo notícia de que seu ilustre progenitor se
achava perigosamente doente na Europa, apressou-se em ultimar sua par
tida para lá.
A ventilada questão da sua nacionalidade brasileira foi logo depois
decidida definitivamente pelo Decreto Imperial de 24 de setembro de
1841, e justamente nesse dia do ano seguinte, exalava seu velho progeni
tor o derradeiro suspiro de uma vida , de tantos e valiosos préstimos ao
nosso caro Brasil , terra que soube estimar e honrar.
Em 1842, isto é, no mesmo ano em que perdera o pai , Francisco
Adolfo de Varnhagen ingressou na carreira diplomática ao mesmo tempo
que era admitido, como oficial regular, integrante do estado efetivo do
Corpo de Engenheiros, de cujo pôsto se demitiu nove anos mais tarde,
precisamente por ocasião de se reorganizar o nosso Corpo Diplomático , em
virtude de disposição legislativa .
Como Adido e depois Secretário de Legação, Francisco Adolfo de
Varnhagen foi, por nosso Governo encarregado de várias, importantes e
honrosas comissões junto aos Arquivos de notáveis instituições literárias
e científicas da Península Ibérica, sendo o objetivo primordial de quase
todas elas a pesquisa e o estudo de documentos valiosos e relativos aos
limites de nossa querida pátria. Ao mesmo tempo que desempenhava caba )
e brilhantemente estes difíceis e delicados encargos, coligiu muitos e pre
ciosos dados e esclarecimentos históricos, que lhe deviam ser tão úteis no
futuro e também obteve os dados e elementos indispensáveis ao seu “ Flo
rilégio da Poesia Brasileira ”, de que publicou três alentados volumes en
tre 1850 e 1853, em Lisboa e Madri , respectivamente. Esta obra é consti
tuída de uma coleção das mais notáveis composições de nossos poetas
falecidos, contendo , outrossim , as biografias de muitos deles , tudo prece
dido de um “ Ensaio Histórico Sôbre as Letras no Brasil " .
Antes, porém, de publicar esta obra, bem como outra, menor, do mes
mo gênero e intitulada “ Épicos Brasileiros ” , Francisco Adolfo de Varnha
gen deu à publicidade muitos e valiosos trabalhos, entre os quais sobres
saem uma “ Narrativa Epistolar ", do Padre Fernão Cardim , Jesuíta e
Missionário no Brasil; um drama de caráter histórico, subordinado ao
título “ Amador Bueno ” e o importantíssimo volume das “ Trovas e Can
tares de um Códice do XIV Século ” , que é o célebre “ Cancioneiro do
Colégio dos Nobres ”, editado e ilustrado por ele mesmo, contendo muitas
e oportunas observações explicativas . Também apresentou cremos que
14 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

no decorrer do ano de 1845, ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro ,


uma “ Memória ” intitulada “ O Caramuru perante a História " - trabalho
êste pouco conhecido dos críticos, mas cuja importância se pode aferir pelo
fato de que foi premiado pelo Instituto com uma belíssima medalha de
ouro no valor, então, de Cr $ 400,00 — prêmio , todavia , que o autor cedeu
em troca de outra remuneração de ordem mais literária.
A literatura e a história não tinham ainda absorvido inteiramente a
sua atenção. Na verdade, no mesmo ano em que Varnhagen publicava ,
em Madri, as suas “ Trovas e Cantares ” , e desta maneira facilitava imen
samente o estudo das primeiras épocas da literatura portuguêsa, ele não
se esquecia da sua própria pátria, mas dedicava-lhe estudos sérios e pro
fundos sõbre o seu progresso, governo e administração interna. Assim ,
êle cogitou de uma nova e mais perfeita divisão territorial de nossas Pro
víncias, e a necessidade , julgada imprescindível da mudança imediata da
Capital do Império ; depois ocupou - se, decididamente, da questão do trá
fico de africanos, que então ainda existia em escala mais ou menos gran
de, e da própria escravidão cujo problema encarou de frente e dispensou
a melhor das atenções .
O resultado destas suas locubrações se acha consignado em dois pe
quenos folhetos publicados em Madri , em 1849 e 1850, sob o título de
Memorial Orgânico ” , que foi posteriormente transcrito nas colunas do
jornal “ Guanabara " , da cidade do Rio de Janeiro.
As 66 páginas in- 8 dos dois folhetos reunidos partiram evidentemen
te do íntimo do coração do grande escritor e são fruto incontestável do
seu grande espírito de justiça aliado a um não menos grande e acendrado
patriotismo.
Alguém sugeriu, nessa época, que a Capital do Brasil devia ser trans
ferida para Salvador, capital da Província da Bahia. Francisco Adolfo de
Varnhagen combateu esta idéia infeliz : a Capital do Império, sustentou
êle, deve ser localizada no interior, como as capitais da Inglaterra , Fran
ça, Prússia, Ástria, Rússia, Espanha e outros países. A situação da Capi
tal na costa do mar expõe a Nação a muitos vexames e humilhações que
passam à história e que bem se podiam evitar, estivesse ela no interior do
país . Em conclusão, o autor, sem lembrar uma outra cidade para servir
de sede à Capital, instou que se devia, desde então, ir ensaiando e estu
dando qual o local que se poderia escolher em vez de o Rio de Janeiro
ou outro qualquer dos nossos portos de mar.
Nesta altura, permito-me abrir um parágrafo para pôr em realce o
patriotismo incontestável e sem jaça do inolvidável precursor da nossa
História, cuja vida, votada exclusivamente à causa sacrosanta do Brasil,
foi sempre reafirmação insofismável dos conceitos clássicos, imutáveis e
eternos que não podem sofrer a influência de interesses sectários e per
versos .
E este conceito foi tão vivo no fim do século XVIII como no século
XIX e neste segundo quartel do século XX.
Fôsse vivo Varnhagen e essa seria, sem dúvida, sua opinião :
O chamado patriotismo evoluído ou dialético, que se nega a si mesmo,
e representa , na verdade , a ponta de lança estrangeira assestada contra
o coração da pátria, não existe. Tentar a revisão do conceito clássico
equivale a atraiçoar o sentimento eterno da pátria. Eu vos pergunto , meus
ilustres senhores Membros da Comissão Julgadora ; haverá, por acaso, um
patriotismo específico para determinadas classes ou profissões ? Haverá,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 15

por ventura , algum recanto do mundo que seja pátria dos que ali nasce
ram e, ao mesmo tempo, a pátria de todos os que trabalham no mundo ?
Não e não. A esse cosmopolitismo dissolvente Tiradentes opusera o genuí
no patriotismo, que sempre morou tanto nas montanhas alcantiladas de
Minas Gerais, como nos pampas sulinos, nos mares verdes do nordeste,
como às margens dos caudais impetuosos do rio -mar, nas emaranhadas e
densas florestas do Brasil central, como nas campinas verdejantes da glo
riosa Piratininga , teatro de lutas memoráveis.
Voltemos, agora , ao primitivo assunto :
Quanto a uma nova divisão territorial das Provincias do Brasil, não
admira que os seus limites de então tivessem evocado um forte protesto
do ilustre brasileiro, então residindo em Madri, na qualidade de nosso re
presentante diplomático. “ As Províncias do Sertão", diz-nos ele mesmo,
' foram -se criando à medida que se iam descobrindo mais minas de ouro,
e era necessário pôr autoridades para a cobrança dos quintos ou para
proteger uma nova casa da moeda ... Depois da Independência, por ver
gonba nossa, quase que não se tem pensado a respeito da tão necessária
divisão do território ” ( Páginas 6 e 7 , primeira parte ) .
Entre outras anomalias, que Varnhagen cita, notamos a que se refere
existir, então, no Brasil, uma povoação chamada " Pedras de Fogo ", da
qual a mesma rua pertence a duas Províncias, as casas de um lado , a
Pernambuco, as do outro a Paraíba. A linha do norte do Espírito Santo
ainda era exatamente a mesma do primeiro donatário . E como éstes, há
inúmeros outros exemplos. Este mal é de caráter grave, e o autor propõe,
assim , as bases de uma reforma : Cada Província deveria ter uma
extensão de território proporcionada à das outras e suficiente população
e riqueza para que gozasse proximamente de igual importância um pla
no de certo patriótico e de longo alcance, mas, a nosso ver, inteiramente
irrealizável, na época, como o foi, por exemplo, nos Estados Unidos da
América do Norte .
Acerca da escravatura e da traficância de africanos para o Brasil, as
opiniões do autor não podiam ser menos sensatas, generosas e nobres do
que sôbre o mais que forma o assunto do seu bem compilado “ Memorial” .
" A escravatura dos africanos ” , diz êle a certa altura, com suma verdade,
" torna o país escravo de si próprio ; pois, como diz o Marquês de Maricá,
o cativeiro apostema e tortura os escravos e seus senhores ” .
O remédio ' apropriado que Varnhagen propôs para se erradicar este
mal é o mesmíssimo que só vinte e dois anos mais tarde foi adotado no
Brasil com benéficos resultados e depois de muita e acirrada oposição .
Eis o que escrevia, a propósito , o ilustre e notável brasileiro , em 1849 :
" Cumpre, pois, que uma lei declare já, quando ficam livres todos os filhos
de escravos ” . Se naquele tempo se tivesse aceito e adotado esta idéia
humana de que se achavam possuídos os verdadeiros patriotas, estaría
mos, há muito mais tempo, sem um só escravo . O nosso povo, porém,
jamais deixou de procrastinar não só nesta magna decisão, como em quase
tôdas qu e conduzi-lo -iam infalivelmente a seu maior bem -estar, como por
exemplo, a reforma religiosa, a Guarda Nacional e tantas outras medidas
de relevante importância.
Prosseguindo neste ligeiro e dispretencioso esboço biográfico, vemos
Francisco Adolfo de Varnhagen fazendo uma visita à pátria que lhe era
tão cara, em 1851. Neste mesmo ano, foi êle eleito Primeiro Secretário do
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro ; quando , porém, prestava- lhe
16 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

seu precioso concurso na execução de eminente e relevantes serviços, reor


ganizando a Biblioteca, o Museu e o respectivo Arquivo, é despachado , na
qualidade de nosso Encarregado de Negócios, para Madri, a bela capital
de Espanha .
Em 1854 publicou, naquela capital, o primeiro volume da sua impor
tantíssima “ História Geral do Brasil ”, cujo segundo e último volume foi
publicado, também , em Madri, em 1857. Esta obra de grande vulto foi
recebida, como é natural, com geral aplauso , e deu margem a entrada do
douto e eminente autor, nas principais sociedades e instituições literárias
e científicas da Europa. Algumas das proposições emitidas nesta sua
grande obra foram sustentadas, posteriormente, em dois bem alentados
opúsculos. O primeiro, publicado na linda Paris, em 1858, sob o título
" Examen de quelques points d'histoire géographique du Brésil ", Paris ,
1858 é uma análise completa e circunstanciada do parecer que, sõbre a
“ História Geral do Brasil” , foi apresentado à Sociedade de Geografia de
Paris, por M. D'Abezac. O segundo, impresso na capital espanhola, em
1867, intitula-se “ Os Índios Bravos" e é resposta a algumas das observa
ções feitas através as colunas do “ Jornal do Timon, de propriedade do
Sr. João Francisco Lisboa, maranhense, o qual , todavia , numa de suas
cartas endereçadas ao ilustre autor, o cognomina mui justamente de o
pai da nossa história ” ( “ Os índios Bravos ” ; página 68 ) .
Em 1859, voltou o nosso biografado aos Estados Unidos da América
do Norte, sendo, por essa ocasião, nomeado Ministro Residente na Repú
blica do Paraguai.
Governava, então, aquele vizinho país, Lopez, o primeiro ( Carlos Lo
pez ) , que fez pasmar o nosso ilustre representante diplomático por seus
atos de requintada crueldade pelo sadismo de que dera sobejas provas e
pela indiscritível miséria que infligia a seu pobre país .
Francisco Adolfo de Varnhagen ficou tão exasperado, tão revoltado
com o que lhe fóra dado a observar, que preferiu sujeitar-se a uma pos
sível pena de demissão de seu elevado cargo, vindo ao Rio de Janeiro,
sem a devida licença, a continuar a viver em Assunção, capital do país
guarani.
O Governo Imperial ouviu atentamente a sua detalhada exposição de
motivos acerca dos negócios paraguaios, porém, recebeu - a com certas dú
vidas , transferindo -o, entretanto, para a Venezuela, Colômbia e Equador,
com instruções especiais de visitar as Províncias do Norte do país e as
Antilhas e , dali, enviar todo o gênero possível de informações e outros.
possíveis elementos sobre o progresso agrícola daquelas longínquas re
giões . A este respeito Francisco Adolfo de Varnhagen escreveu ao nosso
Ministério da Agricultura várias cartas sôbre o café, o tabaco e o açúcar.
Mais tarde, e no caráter de Ministro, passou às Repúblicas do Peru
e Chile , junto de cujos respectivos governos foi credenciado nosso repre
sentante ; e, nessa alta investidura, coube-lhe a glória invulgar de protes
tar contra a prática da brutalidade bestial e tradicional dos espanhóis,
então em hostilidade contra os governos dêsses dois países amigos. Alénı
disto, Varnhagen protestou , ainda, em Lima , a artística capital peruana ,
contra o modo por que Prado, então presidente da República do Peru ,
defendia o governo despótico do Paraguai à custa mesmo da estrita cor
tezia que lhe cumpria preservar e guardar para com a nossa pátria .
O sucessor daquele estadista , felizmente, deu, por isso, a mais com
pleta satisfação ao nosso Governo .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 17

Na mesma capital andina Varnhagen deu início a publicação de suas


criteriosas investigações, muito curiosas e originais, aliás, acerca do famo
so navegador florentino Américo Vespuccio, investigações que depois
prosseguiu em Viena da Áustria .
Éstes profundos e magníficos estudos acerca de Vespuccio causaram,
como não podia deixar de ser, uma sensacional e inesperada revolução no
mundo científico da geografia e dos próprios descobrimentos. Como nos
sos ilustrados e cultos Membros da Comissão Julgadora sabem, por lon
gas eras, por muitos e muitos anos os espanhóis acusaram , injusta e acer
bamente a Vespuccio de ter querido sonegar e mesmo roubar a glória de
Cristóvão Colombo no descobrimento do Novo Mundo. As muitas, pacien
tes e conscienciosas investigações do nosso sábio e incansável escritor e
historiador por excelência, não só em Florença, berço de Américo Ves
puccio, mas na própria América, levaram - no a crer definitivamente que
Vespuccio é um vulto contra o qual a história tem sido até aqui madrasta,
inexplicavelmente injusta.
Em uma de suas inúmeras cartas o valente e audaz navegante floren
tino fala de sua viagem ao Continente Americano, em 1497 e 1498. Ora,
precisamente esta viagem tem sido considerada como uma mera ficção,
produto de pura fantasia, e Alexandre de Humboldt que já tão favorável
foi a Vespuccio, a crê muito problemática. Varnhagen fêz uma análise
escrupulosa e completa dessa preciosa carta , chegando, em consequência,
à conclusão de que Américo Vespuccio, com efeito esteve na América,
exatamente naqueles anos , nas alturas das costas de Honduras, Iucatão ,
do Golfo do México e da Flórida; que a sua destemerosa expedição de
morou - se por algum tempo no cabo Canaveral , aproximadamente aos 28
e 1/2 graus de latitude, norte ; que , pela circunavegação da península da
Flórida e pela rota que seguiu para continuar sua viagem para a Europa,
aportou nas ilhas Bermudas, então habitadas por tribos de selvagens
antropófagos, com quem teve de travar luta ; e, finalmente, que o acom
panharam como elementos integrantes desta expedição Vicente Yañez
Pinzon e Juan Diaz de Solis que, aliás, eram eles mesmos os chefes e res
ponsáveis pela mesma .
Além disto, prova, com documentos irrefutáveis , o nosso incansável e
erudito historiógrafo que Vespuccio realizou mais quatro viagens à Amé
rica. Na primeira destas, ou na sua segunda viagem , aproximadamente
pelos anos de 1499-1500, ele teve por companheiro de aventura a Alonzo
de Hojeda ; então tiveram a oportunidade de tocar no Brasil , no hoje
moderno e progressista Estado do Rio Grande do Norte, de onde veleja
ram até a foz do Maracaibo .
A sua terceira viagem ocorreu precisamente em 1501-1502. Então
visitou êle os cabos de São Roque e Santo Agostinho , a Bahia, o Rio de
Janeiro e a entrada do Rio da Prata. Nesta viagem , Vespuccio ficou con
vencido de que tôdas essas extensas e ricas regiões eram parte de um
muito grande e vasto continente, bem diverso dos continentes Europeu,
Asiático e Africano. A sua quarta viagem ocorreu no ano de 1503, sob o
. comando do navegador Gonçalo Coelho, que perdeu , nessa expedição, dois
de seus seis navios nas proximidades da ilha, hoje Território Federal de
Fernando de Noronha, e Vespuccio , então , foi parar às alturas do Cabo
Frio e daí passou -se a Lisboa, onde chegou no mês de maio de 1504. Fi
nalmente a sua quinta e última viagem foi levada a cabo em 1505, quando
realizou a exploração minuciosa da costa americana desde o dito cabo
18 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Canaveral até para além do Dariano e do Atrato . Além destas, Varnhagen


ainda admite a hipótese, muito provável, de uma sexta e última viagem
acompanhado de um tal Cosa.
Quase todos os críticos, como já aludimos linhas acima, não têm
acreditado na primeira das viagens acima enumeradas, viagem , cuja his
tória de autoria do próprio Vespuccio o sábio Alexandre de Humboldt
considerava como uma cópia pervertida da ulterior e verdadeira narrativa
correspondente à viagem encetada em 1499 , em companhia de Alonzo de
Hojeda. Varnhagen não só prova a veracidade intrínseca dessa narração
relativa à primeira viagem , como também prova suficientemente que, três
anos depois da sua publicação, apareceram traduções sucessivas nos idio .
mas italiano e francês e em latim ; que, por perto de um século, não se
duvidou jamais de sua autenticidade, até que o historiador do rei de Es .
panha, Herrera, se lembrou de acoimá -la de impostora . Além disto o pró
prio Cristovão Colombo julgara Américo Vespuccio como merecedor e
digno de tôda confiança ; as próprias e magníficas honras que Portugal e
a Espanha lhe conferiram em vida eram demasiadas para um mero subor
dinado de expedições, como se pretende que haja sido ; e Pierre Margry,
escrevendo a Colombo sobre a baía de Honduras , admite que já havia
sido ela visitada e explorada por outros expedicionários, o que é também
plenamente confirmado por Oviedo , na sua “ História das Índias " .
Estas trabalhosas e extraordinárias investigações do notável histo
riógrafo patrício, repetimos, causaram grande celeuma e foram muito de .
batidas na Europa, e, talvez elas, mais do que qualquer outro trabalho seu
concorreram sobremodo para tornar o seu já ilustre nome ainda mais
conhecido, admirado e respeitado.
Em 1868, Francisco Adolfo de Varnhagen é transferido para Viena
da Áustria, na categoria de nosso Enviado Extraordinário e Ministro Ple
nipotenciário , posição que ocupou por largo espaço de tempo , com grande
honra para nossa terra. Naquela ultra-civilizada capital européia conti
nuou os seus apurados estudos sobre a personalidade impressionante de
Américo Vespuccio, dando a publicidade dois outros opúsculos intitulados,
respectivamente, “ Nouvelles Recherches sur les Derniers Voyages du Navi
gateur Florentin, etc.” e “ Le premier Voyage de Américo Vespuccio dèfini.
tivement expliqué dans ses détails ” . Além destes dois bem feitos traba
Thos também imprimiu, em Viena, em 1869, um em língua italiana,
“ Sull'importanza d'un manoscritto inedito... per verificare quale fu la
prima Isola scoperta dal Colombo, etc.” Já no Chile publicára, em 1864,
nos ' Anales de Chile " uma memória sôbre “ La verdadera Guanahani de
Colon ” , depois traduzida para o idioma alemão , provando que a Maia
guana e não nenhuma das outras Lucaias imaginadas por Navarrette, W.
Irwing, Humboldt e Becker era a Guanahani de Colombo.
Posteriormente, o nosso incansável e erudito biografado ocupou-se
com desvelo e carinho todo especial ao preparo de uma segunda edição
revista , aumentada e melhorada da sua brilhante “ História Geral do
Brasil". Em julho do ano de 1872, foi feito Barão de Pôrto Seguro, um
título nobiliárquico que, recordando o berço, a célula mater da nacionali
dade e da própria História do Brasil, lhe apresentaria muito bem , se o
distinto e nobre paulista não tivesse ainda maior título no seu próprio
augusto nome, já tão amplamente conhecido em todo o mundo civilizado.
E agora, a título de mera curiosidade, e, mesmo, como subsídio à nos
sa gloriosa História Pátria , transcrevemos, prazeirosamente, a seguir, al
gumas das preciosas
19
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CARTAS DE VARNHAGEN

Carta datada da cidade de Santos, 6 de janeiro de 1841 .


" Ilmo. Amigo Firme. Já lá terá sido entregue duas cartas que lhe
escrevi ; uma de Paranaguá e outra de Curitiba . Agora vai esta por têrmo
de meu giro . Nada lhe conto a êste respeito, porque incluso remeto, aber
tas, duas cartas em que alguma conta dou enquanto não sou mais extenso
para o nosso Instituto e para o Público. Delas verá que me vejo obri
gado a ir -me embora sem o tornar antes a ver e a sua pátria. Por isso
o pedido que de Curitiba lhe fiz de algumas frutas é agora que ainda
tem mais lugar. Pode mandá-las entregar no Beco dos Barbeiros ao
sr. Rodrigues, que ele tem outras coisas que me remeter e vem tudo junto .
Na Cananéia fui examinar o Padrão de que falo a página 90 do Diá
rio de Pero Lopes. - É falso o que diz Cazal de se ler ali certo ano, do
que ele tira um argumento. Não teve nem tem ano algum especificado. Eu
fiz disso lavrar um auto com testemunhas que algum dia apresentarei.
Parece-me que vou tomando alento para o futuro Curso de História Pá
tria . Dizem -me que a viagem do Bispo Capelão-mor está impressa.
Se assim fôr rogo me arrange algum exemplar ; porque enquanto o não
tiver visto não me animarei a apresentar ao nosso Instituto descrição
alguma quando já exista impressa na mesma língua outra melhor e
mais exata. É por isso que por enquanto cingir-me-ei a escrever para
Paris uma carta meio geográfica por Via do Visconde de Santarém . Nisto
mesmo ainda estou irresoluto . Já aí chegaria o Bulletim em que vem u
notícia das minhas publicações ? Como serão feitas pelo meu rival Vis
conde não espero nelas muito favor: No mar pequeno da Cananéia vi
vários sambaquis com caveiras e ossos ainda meio inteiras cuja forma
conforma-se em tudo com a descrição do tal Elliot de Filadelfia. Só pare
ce que foi casualidade o êle encontrar ali ossos de homens de maior esta
tura — Não sei se terei em São Paulo cartas de V. S. , por isso reservo -me
a ser mais extenso para o correio seguinte. Não esqueça a carta para
0 Ataide -e a outra para o Paranaguá do De V. S. Amigo Firme,
F. A. de Varnhagen " .

CARTA DIRIGIDA AO DR. J. C. RODRIGUES datada de Viena ,


1.° de março de 1873

" Depois de haver estado ontem no correio a assegurar a minha carta,


com data de ante - ontem , e a franquear o maço de documentos impressos
e o retrato, que não pode ser assegurado , me ocorreu que talvez não pos
sua V. S. nessa grande cidade nenhum exemplar da minha História Ge
ral do Brasil, em cujo 2.º volume dedico uma secção a 53.a aos ser
viços de meu pai no Ipanema, que talvez V. S. deseje conhecer Lem
brei-me, pois, de enviar a V. S., por empréstimo, as folhas adjuntas ( jú
preparadas para as adições da 2." edição ) que contêm essa secção ; e as
quais rogo a V. S. me devolva apenas as possa dispensar. Devo aqui
acrescentar que em 1858 se gravou por Caquet, em Paris , uma medalha de
bronze , com a efígie de meu pai e a inscrição Varnhagen , Restaura
dor do Ipanema à roda, e no verso “ Ao dia 1 de novembro de 1818 "
etc. Também me esqueceu de advertí -lo que o folheto ps. Schorner e
20 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

P. Apiames vai embrulhado em um jornal de Milão, onde V. S. encontrará


um folhetim a respeito da nova ópera de Carlos Gomes — Fosca que
o Comendador Lopes Neto me escreve haver visto logo em 3.9 representa
ção e muito aplaudida . — É notícia que poderá V. S. aproveitar para a
seu interessante jornal . Creio escusado dizer a V. S. que do número
onde publique o meu retrato e as suas linhas , desejaria eu ter uns 20
exemplares ou pouco menos . Sabe V. S. que fico às suas ordens como
Obrgº.... B. do Pôrto Seguro:
“ P. S. Creio ter dito na outra correspondência que em agosto do ano
p. p. fôra eu aclamado um dos Vice-Presidentes do Congresso Histórico de
São Petersburgo. Devia dizer Vice-Presidente honorário. A estampa
do Ipanema não requer devolução. Desculpe-me V. S. se tomo a liberdade
de lhe recomendar que esteja prevenido contra os juízos de Adolfo Coelho
e Teófilo Braga contra Castilho e outros seus amigos. São todos apaixo
nados e só poderiam fazer mal. Eu estive em Portugal, no ano passado e
conheci tôdas essas misérias..."

CARTA DIRIGIDA AO DR. J. C. R. datada de Viena, 12 de


maio de 1873

“ Ilmo. Sr. Em meio dos afazeres e apuros em que me vejo metido,


com a Vice-Presidência da Comissão Brasileira na Exposição desta cidade,
nomeado à última hora e com os produtos enviados também à última hora
( e que por mercê de Deus deixaram de vir no naufragado vapor Gambie,
como havia já sido resolvido) recebi as finezas de V. S. patenteadas ao
mundo no seu belo jornal n .° 31 e resumidos lucidamente na sua favore
cida de 25 de abril . Acredite V. S. Sr. Dr. Rodrigues, que por tudo lhe fica
rei eternamente grato. Os ligeiros descuidos que escaparam na biografia,
o principal dos quais se reduz a uma data errada talvez por falta de com
positor, ( isto é a de se dizer que fui proseguir depois da guerra os estu
dos em 1840, em vez de se dizer 1834 ) são de pouco monto. para uma
compa. periódica. O que não há dúvida é que devo a V. S. o ter abarcado
por 1. “ vez um resumo dos meus disseminados trabalhos . Com esta
receberá V. S. o meu relatório sobre o Congresso Estatístico em São Pe
tersburgo no qual tive a honra de representar o Brasil, sendo eleito um
dos Vice - Presidentes. O retrato não podia sair melhor. Fui até logo reco
nhecido pelo meu filho menos de 4 anos de idade . Preferia que tivesse sido
com o brazão, pois deve ser reformado em conformidade das regras he
ráldicas depois do título que me deram ; mais assim mesmo deverei a V. S.
novo favor se me puder dar a gravura , pois a darei na 2.a edição da mi
nha História. A respeito desta rogo a V. S. que se não esqueça do
capº: com margens, que lhe mandei a respeito de meu pai ; pois é o em
que destino pôr os assentamentos para servir a compor a 2.a edição. Re
pito a V. S. os meus mais sinceros agradecimentos e peço que creia que
terá em mim um grato patrício . V. de Pôrto Seguro.
“ P. S. - Creio escusado dizer que me constituo, por prazer e por
gratidão, assinante do seu importante Novo Mundo porquanto ele dure.
Mas não tenho agora tempo de dar providência ea. os pagamentos. Não
poderei fazê - lo em Hamburgo ?” .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 21

CARTA DIRIGIDA AO DR . J. C. RODRIGUES datada de Viena,


9 de abril de 1874

" Meu caro Sr. Redator : Espero que me desculpará a resolução que
tomei de preferir confiar a V. S. a publicação da minha desafronta con
-
tra os tais pseudo -eríticos portuguêses, a qual com esta lhe remeto.
Por pouco que V. S. se entregue ao estudo da questão, reconhecerá que
tenho carradas de razão , que necessito, desde já de um protesto justifi
cativo, e que este protestos, a não ser um livro, que agora não posso es
crever, não pode ser senão no estilo em que vai . Inteire-se V. S. das gra
tuitas e ingratas acusações que recebi, da minha 1.6 resposta ( Provarás ),
para o caso bastante cortez e moderada, da insana violência com que de
pois disso fui agredido e me dará tôda a razão. Não chego, porém , a pe
dir que m'a dê nas suas linhas de cabeçalho, se preferir manter-se fora
da questão ; mas a publicar a minha carta, porquanto há não a acompa
nhe de censura contra mim. Então antes não a publique. Creio que pode
ria manter um têrmo meio informando os seus leitores da verdade e la
mentando os precedentes que me obrigam a essa carta. Nos apontamentos
juntos reuno algumas frases que penso poderão satisfazer a essas condi
ções ; mas tudo quanto vier de mais a meu favor aceitarei com o maior
reconhecimento. Em todo o caso , de novo peço a V. S. que se ponha
em guarda contra os artigos dos tais dois sujeitos, conforme creio que já
em outra ocasião lhe escrevi. Na literatura portuguêsa um e outro quase
não -têm por si mais que a si mesmos, elogiando o Sr. Coelho as obras do
Sr. Braga e o Sr. Braga as do Sr. Coelho . E se não veja a tal Bibliogra.
fia Crítica que parece já morreu . Requiescat in pace. A minha carta não
lhe ocupará quando muito mais que uma coluna do Novo Mundo. A mi
nha letra, para sair um pouco mais clara, como pede a imprensa, alarga
muito . Da 1.* Ed. da História das Lutas com os Holandêses ( 1630
1654 ), que acaba de fazer-se em Lisboa em bom tipo e papel , volume gros
so de 8 gde., ainda não recebi nenhum exemplar e lhe mandarei um quan
do cheguem : o mesmo quando se aprontem as novas páginas acerca de
Américo Vespucci. O mais prometido irá tudo acompanhando esta , em
pacote separado de impressos. Tenho continuado a ler com interesse
o Novo Mundo, e em prova de interésse, vou expôr -me ao desagrado dan
do-lhe um conselho amigável. Evite V. S. no seu, aliás, claro e belo estilo,
tanto quanto puder, o demasiado emprego dos pronomes pessoais e pos
sessivos, riscando na minuta todos os que se poderem dispensar ; e ainda
mais a repetição frequentíssima ( à francesa ) do pronome um , por exem
plo : Fulano de tal, um homem de raro talento, etc. Porque não simples
mente homem de raro , etc. ? – Perdoe o atrevimento de um velho, que
se confessa de V. S. muito reconhecido e 0. C. P. Seguro ” .

CARTA DIRIGIDA AO DR . J. C. RODRIGUES datada de Viena,


31 de outubro de 1876

" Ilmo. Amigo e Sr. Tenho demorado a resposta da sua última , por
que o meu enoadernador, ou antes brochador, me esteve continuamente en
ganando a respeito do prazo em que daria uma nova porção de exempla
res brochados que agora promete para esta semana sem falta. Satisfa
22 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

zendo a sua pergunta direi que eu me referia a 6 $ fracos cada exemplar


do papel ordinário, pago à vista, ou 8$ do mais forte e fino . Mas como os
livreiros querem sempre ganhar pelo menos 33 % , para o público não se
poderão dar a menos de 13$ os finos e 10$ os menos incorpados, como o
que lhe mandei . Assim espero me cheguem os exemplares, prepararei
dêles uma pequena caixa que lhe remeterei, para aí os vender de uma vez
ou os fazer pôr à venda . Como aí se dá tanta importância ao papel e
luzimento das edições irão só dos de papel incorpado, de a 13 $ avulsos,
e por conta da venda futura lhe peço tenha a bondade de mandar abonar
as quotas de transporte: mas não admito que seja V. S. quem.... os
exemplares que lembra como os de con .... oferecer aos Srs. Whitney e
Rohrig e à Nation , para concorrerem à venda cada um com um artigo pelo
menos. Rogo a V. S. tenha a bondade de oferecer. êsses três exemplares
da minha parte. Espero que com o produto da venda de alguns exempla
res me ficará aí com V. S. crédito para as assinaturas do Novo Mundo
nos anos seguintes. Por esta ocasião lhe mando para êste seu valioso
jornal dois artigos que creio poderão concorrer favoravelmente ao desen
volvimento de duas indústrias importantes no nosso país. Um é respectivo
ao segredo acerca da sementeira das plantas do mate e o outro aconselha
que se experimente entre nós a cultura do vinho nos sertões do norte,
onde chove menos e haja menos orvalhos.
Na Rússia foi o imperador recebido com entusiasmo não menor que
nessa República : hurras e arcos triunfais au roi citoyen . Nem sei como
a polícia consentiu.
Sabe V. S. quanto sou seu venerador, amº, e obrº. Pôrto Seguro.

Como complemento indispensável , quase obrigatório dêsse ligeiro es


bôço biográfico, permito -me interrompê-lo, por instantes, para estender-me
em outras digressões e considerações não menos interessantes e integran
tes dêste estudo, as quais reputo de inestimável valia como subsídio, ainda,
à nossa gloriosa História Pátria.
Cabem -nos, certamente, alguns dos defeitos por que somos acoima
dos. Como raça e como povo latinos pela cultura, portuguêses pelo sau
gue , brasileiros pela nacionalidade do que não podemos, entretanto ,
ser facilmente acusados é de ser minguada a nossa admiração pelo talen
to, pelo valor e pelo sucesso. Ela é antes fácil e ruidosa. O pior, porém , é
que, constituindo a admiração, quando consciente e fundamentada, a pro
jeção do epicurismo intelectual, os que procuram a harmonia das facul
dades espirituais tanto quanto o equilíbrio da vida material, podem , pelo
efeito de uma conhecida lei física, ser naturalmente levados a incurtar
o reconhecimento , que é a projeção da ternura do coração . Não creio,
contudo , incompatíveis as suas manifestações, e se, como para alguns sóe
acontecer, a admiração é característica dos talentos inferiores e o reco
nhecimento distintivo das almas pusilâmines, aceito de bom grado uma
e outra qualificação para dizer- vos, alto e bom som, caríssimos e ilustres
senhores Membros a Comissão Julgadora, quanto me alegra e quanto me
honra vir, hoje, por este meio , externar de público o meu maior reconheci
mento de brasileiro e dar largas à minha admiração pelo mais notável 1
dos nossos historiadores, porquanto foi o mais ardoroso trabalhador e
valente forjador da belíssima História Nacional.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 23

Quando, muito novo ainda , eu estudava paleografia num dos mais


acreditados e antigos estabelecimentos religiosos de ensino de nossa que
rida Pátria, tendo por mestres sábios e eruditos sacerdotes Jesuítas, cos
tumava, habitualmente, impelido por invencível curiosidade e anciosamen
te, esquadrinhar, nos maços de papéis amarelecidos e bolorentos, de caracte
res semi-apagados debaixo da poeira dos séculos, algum documento que
na minha prosápia juvenil julgava dever ser decisivo para a solução fu
tura de qualquer dos enigmas da nossa História, que os tem, conquanto
date de ontem.
Celebrando agora e por este meio sua memória inolvidável, faço mais:
do que instintivamente recorrer a um modelo, traduzo uma saudosa im
pressão da primeira mocidade, além de prestar uma das mais merecidas
e justas homenagens que reclamam os verdadeiros fundadores do nosso
inconfundível patrimônio intelectual e histórico .
Modelo também poderia chamá-lo, como diplomata e homem de le
tras que foi, e mais prezando esta qualidade do que aquela , no que, aliás ,
revelava o bom senso germânico que herdára, porque, ao passo que a
literatura se torna cada vez mais árdua pela soma de conhecimentos que
requer, a diplomacia torna -se cada vez mais fácil pela soma de predica
dos que dispensa. Não é maldizer da diplomacia lembrar que , mercê da
maravillosa facilidade de comunicações, do devassamento da vida política
pelos jornais, da virtual cessação de todo sigilo de Estado, da colocação
dos cargos públicos ao alcance de todos os cidadãos inteligentes e cultos,
não mais permanecendo privilégio de uma determinada casta, a quem se
atribuiem , injustamente, vantagens e prerrogativas em detrimento de ou
tras classes dignas, e de outras circunstâncias ainda, deixando de ser ela
uma arte para tornar-se uma profissão.
Os diplomatas dependem agora tão de perto e descansam tanto sôbre
o chefe da sua corporação, gozam assim de tão pouca iniciativa e autono-.
mia, que já foram irreverentemente tratados de meros tocadores de certo
instrumento anti-musical que Rossini tinha em horror, e que a gravidade
do momento me dissuade de mencionar. Pelo contrário, o escritor, o his
toriador moderno carece de ser, além de um erudito, um artista ; de des
cobrir ele próprio as fontes, analisar-lhes o valor, saber aproveitar o ma
nancial que delas brota, quando ainda livre de impurezas, e arrecadá - lo
em vaso do mais puro cristal por ele mesmo facetado .
Nas páginas inspiradas e eloquentes dedicadas por um ilustre aca
dêmico francês, o falecido Duque de Broglie, a Victor Duruy, lê-se o
que deve ser hoje o historiador, como tem de combinar a sagacidade da
verificação com a facilidade e o talento da exposição, aliar a circunspecção
do pesquisador à habilidade característica do perfeito narrador, o que,
demandando em rigor para aplicar- se à evolução de um povo ou de umu
nacionalidade tempo mais que o de uma vida e inteligência mais do que a
humana, convida a elaboração das monografias, como consequência, pro
duz a dispersão da matéria histórica. Não há, com efeito, quem não es
teja convencido de que o século atual será irremediavelmente o século
dos especialistas. Aquelas eloquentes palavras do Duque de Broglie são
tanto mais dignas de meditação quanto é bem verdade o que antes afir
mara Augustin Thierry, um dos grandes mestres da moderna história
francesa , que a direção intelectual dominante no século XIX seria a ne-
cessidade da história.
24 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

O século atual, o século da luz, das grandes invenções, das grandes


descobertas, descobertas inacreditáveis, encontra bem aproveitados todos
os recantos dêsse campo , cuja vastidão, contudo, desafiava a das savanas
imensas, incomensuráveis por onde vagueou o espírito errático e irriquieto
de Chateaubriand, que foi o primeiro a torná -lo pitoresco. Aplicando ao
próprio gênio o aforismo baseado na curiosidade mental da sua época,
revelou -se o mesmo Augustin Thierry um magistral e profundo conhece
dor dos tempos sumidos, um conhecedor competente como na língua por
tuguêsa só se encontra análogo em um formidável Alexandre Herculano
- sóbrio, vigoroso, animado, apoiando diretamente nos textos primitivos
e nos documentos originais as suas informações honestas, claras e precisas ;
até liberal intransigente de julho, como foi Herculano em política um
ferrenho carlista.
Caberia a Francisco Adolfo de Varnhagen dentro da categoria supe
riormente delineada pelo ilustre Duque de Broglie ? Teria sido ele, o gran
de paulista e brasileiro um erudito e um artista, um Niebuhr, e um Beu
lè ? Se não, aproximar -se -ía êle siquer daqueles representantes legítimos
e eméritos do gênero severamente, tipicamente histórico, que não faz ab
solutamente concessões extraordinárias às galas do estilo , e na consciênte
gravidade põe seu maior encanto ? Não forma acadêmica, tal como a
consagraram os franceses, é inevitável o gasto de leves e mal disfarçadas
ironias. Nós, porém , não estamos empenhados neste momento na re
cepção de um novo membro da Academia, nem no elogio de um compa
nheiro de ontem, cujas fraquezas de escritor quem deixará de tê-las ?
ou cujas antipatias de gostos literários estejam realmente presentes e
vivas. Empenhamo-nos, satisfeitos e orgulhosos, em glorificar um morto
emérito e ilustre escritor desaparecido de longa data, que já a ninguém
faz sombra e não mais é discutido. Não se trata de um predecessor a
criticar, mas, sim , de homenagear, e relembrar um grande vulto do nosso
passado histórico . Seriam assim inconvenientes as ironias sobre serem
descabidas e extemporâneas. Lembrados de que Francisco Adolfo de
Varnhagen , foi sem contestação o criador máximo da história pátria,
senão em síntese luminosa, pelo menos na comprovação essencial , é tão
somente com respeito e acatamento que devemos encarar essa figura
máscula e grandemente saliente da nossa literatura, pôsto sejamos força
dos pela justiça a salpicar das reservas indispensáveis em todo estudo, a
nossa legítima admiração perante ela .
O fato é que os fastos literários se não ufanam entre nós de um his
toriador parecido com qualquer dos espíritos superiores de cujos nomes
fiz menção, Francisco Adolfo de Varnhagen foi, por certo, o mais notó
rio, o mais audaz e o mais merecedor dos estudiosos do passado brasi
leiro : foi um ardente e incansável investigador, um singular e infatiga
vel rebuscador, um ressuscitador de crônicas esquecidas nas estantes das
bibliotecas, e de documentos soterrados sob a densa poeira nos arquivos,
um valioso e consciente corretor de falsidades e ilustrado colecionador
de fatos . Porém , o dom admirável de comunicar vibrações às turbas de
saparecidas, que caracteriza um Michelet, ou a extrema habilidade de re
constituir com um aglomerado de pormenores um caráter humano , ou dêle
deduzir uma lei da evolução , que particulariza um Taine, os não possuiu
o enciclopédico autor da “ História Geral do Brasil ” . Faltava -lhe, para
isto, mais do que uma faculdade psicológica aguçada por sólida e moderna
preparação científica, a ingente obra crítica que aquêles outros escritores
contavam a ampará -los.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 25

Remontando mesmo mais longe, dentro do século passado, do que


a Michelet e Taine, Thierry escudara -se com os pascientes trabalhos dos
provectos Beneditinos e com os resultados das brilhantes pesquisas das
Academias, e Alexandre Herculano, ainda que abrangendo a sua farta
produção um longo esmiugar de monumentos históricos, sentia -se arrimado
aos faustosos, mas excelentes frutos oriundos da atividade da Academia
de História e da Academia das Ciências. No Brasil, apenas a partir dos
primórdios dêste século, graças, justamente, ao labor proficuo e indefeso
de Varnhagen, a estudos especiais como os de Norberto de Sousa sobre
a Conjuração mineira, do Dr. José Higino sôbre o período do domínio
batavo no Norte do país e do sr. Lúcio de Azevedo sobre os beneméritos
Padres Jesuítas no Grão Pará , e ao louvável impulso prestado às mono
grafias, dissertações e comparações de documentos pelas associações e
institutos literários e científicos de que são modelos o Instituto Histórico
e Geográfico Brasileiro , no Rio de Janeiro e , em escala mais ou menos
grande, os Institutos Históricos e Geográficos de Pernambuco, Ceará ,
Bahia, Rio Grande do Sul, São Paulo, etc., poderá um sincretizador ten
tar firmar, numa vista de conjunto, a sua concepção particular do desen
volvimento pátrio .
O traço dominante, a característica marcante e inconfundível da
impressionante individualidade de Varnhagen é a paixão singularíssima
e extraordinária da investigação histórica, à qual subordinou todas as
suas manifetsações de escritor de raro brilho. Êle , com sua invulgar in
teligência e atividade sem par, traz-nos à memória o faiscador atraído
pelas palhetas de ouro ou o garimpeiro hipinotizado pelos diamantes, es
quecido da beleza sem par da paisagem em que labuta de sol a sol, an
cioso por descobrir os tesouros ocultos na terra, cego diante da formo
sura da perspectiva e da transparência da atmosfera que seduziramo
pincel de um pintor, surdo ao marulhar rítmico das ondas do mar, ao
sussurro das folhas e ao canto suave das aves, que acordariam o estro
de um vate.
Se compunha um drama como o “ Amador Bueno ' Lisboa, 1847,
Varnhagen escolhia um ponto controverso da história do Brasil, aprovei
tando, em tôda sua plenitude, a legenda que a sua crítica segura e sagaz
não podia acolher sem resalva ' História Geral do Brasil ” - 2. * Edi
ção , volume II, página 693. Se esboçava uma novela como a " Crônica
do Descobrimento do Brasil ” Panorama, 1840 fazia-o, segundo de
clarou Inocêncio, em o " Dicionário Bibliográfico ” , volume II, página
320, para vulgarizar o primeiro documento histórico relativo ao Bra
sil, que foi a carta descritiva redigida por Pero Vaz de Caminha, por
"achar que a forma do romance era o melhor meio de adatar ao gôsto de
todos a história do país”. Se reeditava os nossos épicos, tais como Ba
sílio da Gama e Santa Rita Durão — Lisboa, 1845 , ou outros dos nossos
épicos no Florilégio, buscava, sobretudo, um pretexto para escrever- lhes
as notícias biográficas as melhores e mais completas que até então
tinhamos -e recheiar e enriquecer as publicações de notas prenhes de
erudição. Se traçava algumas páginas sôbre arquitetura a propósito da
igreja de Santa Maria de Belém, não o impulsionavam tanto sentimentos
de arte como o desejo de aproveitar mais uma contribuição para fixação
de épocas históricas.

A carreira diplomática, da qual percorreu todos os graus da respecti


va hierarquia, ofereceu -lhe principalmente feliz ensejo para indagações
26 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

as mails valiosas em arquivos e livrarias. Da Torre do Tombo, em Lis


boa, extraiu documentos sem número , conforme o testemunho insuspeito
de ilustre membro da Academia Brasileira de Letras que assim se mani
festara a propósito
66 de suas buscas e investigações, por ocasião de sua
recepção : ... era com viva surpresa e não menos vivo desapontamento
que , em quase todos aqueles papéis, se me deparava marca discreta
do lapis de um pachorrento investigador que me precedera na faina, e
que verifiquei não ser outro senão Francisco Adolfo de Varnhagen ”.
Dos dados e elementos preciosos extraídos dos velhos documentos
existentes nos valiosos arquivos de Salamanca está cheia a primeira edi .
ção da sua “ História Geral do Brasil”, publicada, como já dissemos, em
Madri, em 1854-1857, servindo-lhe aqueles de que então se não apro
veitou para, quando no seu retorno à América do Sul, preparar o substan
cioso ensaio sôbre o período da ocupação holandesa do Norte do Brasil
e escrever, simultaneamente a famosa e estupenda defesa do navegador
florentino Américo Vespuccio.
Na formosa Viena delineou a história da nossa independência política ,
a qual, se não nos enganámos, ainda permanece inédita e confiada, no
inicio deste século ao não menos ilustre e famoso patrício José Maria
da Silva Paranhos , Barão do Rio Branco, em grande parte baseada nas
preciosas informações de fonte diplomática do Ministro austríaco acre
ditado no Rio de Janeiro , admiravelmente colocado para seguir a trama
íntima que envolveram aqueles acontecimentos como representante de uma
côrte parenta , e possuindo , no próprio seio da família real portuguêsa uma
natural e ótima informante na augusta pessoa da Arqui quesa Leo
poldina .
Ninguém contestará que éste rol de serviços seja superior ao que
podem apresentar muitos diplomatas, mesmo aqueles saídos de fresco do
torvelinho de negociações difíceis e espinhosas. Mais vale, em todo o
caso, escrever história com autoridade do que ajudar a fazê-la sem que
esteja investigado das credenciais e da capacidade que se fazem mister em
tão importante incumbência .
Varnhagen é um exemplar precioso, para a justificação da célebre
teoria de Taine, da raça, do meio e do momento, que os exageros dos dis
cípulos não lograram desacreditar
Nascido, como sabemos e foi dito anterioremnte, na então Província
de São Paulo , era , porém , filho de um alemão, mineralogista distinto que
restaurou e administrou com reconhecida proficiência a conhecida fábrica
de ferro de São João do Ipanema, a primeira no gênero instalada no
Brasil , nas proximidades da formosa e progressista Sorocaba e que, com
Eschwege, Debret, os Taunay e tantos outros vultos de estrangeiros ilus
tres sábios, fazia parte do grupo de europeus do Norte , ao qual o nosso
caro Brasil deveu um inestimável concurso intelectual nos começos da
sua existência de nação soberana e independente.
Descendente da raça germânica, recebeu ele, em legado, o amor en
apêgo ao trabalho apurado, a pasciência e o carinho na elaboração de
uma obra , o meticuloso cuidado na exatidão dos resultados, que a sua
educação de engenheiro competente só podia ter fortalecido mais e mais.
Viajando para Portugal aos oito anos , criou-se entre aquela geração
do Panorama, ávida de renegeração mental, anciosa de saber, seduzida.
pela evocação do longinquo e glorioso passado nacional , dominada pela
grande e insopitável corrente de curiosidade histórica de que falava
Thierry
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 27

Os primeiros ensaios de Varnhagen , surgidos depois do aparecimento


das “ Reflexões Críticas” encontram-se precisamente no mencionado órgão
da propaganda romântica tomando esta expressão no seu sentido mais
largo e mais levantado colaborado por Herculano, Oliveira Marreca,
Rebelo da Silva e tantíssimos outros ilustres escritores e intelectuais do
tempo .
O meio e o momento, portanto , não podiam ser mais acolhedores e
propícios ao desabrochar dessa forte vocação de historiador, cuja corola,
ainda desmaiada se volvia , sequiosa de luz e de calor que lhe avivassem
as côres, para o sol magnífico que roura cada dia o píncaro do Monte
Pascoal.
A influência do meio e a própria educação literária recebida na glo
riosa pátria de Camões , nas condições apontadas , não impediu, entretanto,
antes contribuiu poderosamente para que a pátria de nascimento e de
opção " – " Réplica Apologética de um Escritor Caluniado ” – lhe ocupas
se total e exclusivamente o espírito desde que enveredou pela trilha que
o levou a encetar a vitoriosa e brilhante carreira das letras.
Não falando já das " Reflexões Críticas ' a edição patrocinada pela
Academia das Ciências , do “ Roteiro do Brasil ” , de autoria de Gabriel
Soares, do qual ele daria, mais tarde , nova e correta edição Volume
XIV, da Revista Trimensal, o primeiro inspirado trabalho que lhe
devemos foi em 1839, aos 23 anos de idade, a publicação do “ Diário da
Navegação ao Brasil de Martim Afonso de Sousa ”, escrito pelo irmão
dêste ilustre donatário, Pêro Lopes, enriquecido com curiosas e interes
santíssimas anotações explicativas.
Depois contam -se por dezenas e dezenas os manuscritos referentes
ao Brasil , que salvou da destruição certa e inapelável, os papéis e demais
documentos históricos que livrou de criminoso esquecimento.
Desde a “ Narrativa Epistolar ” do Padre Fernão Cardim até a " Des
crição do Maranhão " , de Heriarte Viena, 1874, - é um nunca acabar
de subsídios valiosos e raros fornecidos por Francisco Adolfo de Var
nhagen ao estudo dos nossos três séculos que compreendem precisamente
o últimos de nossa vida colonial. Era como se ele tivesse avocado, para
cumpri- la, uma tarefa gigantesca que de ordinário se reparte por uma
porção de sociedades de descanso mútuo.
A fundação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, na cidade
do Rio de Janeiro, no próprio ano da sua estréia na difícil e complexa
literatura histórica , veio bem a propósito para estimular -lhe o zelo e
provocá -lo a redobrar seus esforços de excavador, já recompensados pro
digamente pela Academia de Ciências de Lisboa com a admissão para só
cio em suas três classes. Também o seu espírito era perfeitamente o de um
acadêmico do século XVIII , com a compreensão mais larga das cousas
da inteligência dada pela cultura moderna . Nem lhe faltavam aquelas
birras literárias, aqueles melindres profissionais tão característicos, e
que nêle deram nascimento a várias , conhecidas e instrutivas polêmicas,
azedas umas , urbanas a maior parte, com Abreu Lima, com o Visconde
de Santarém , com M. D'Avezac, com Richard, Major, com João Francisco
Lisboa, com Netscher, com Antônio Henriques Leal. Não havia competi
dor que lhe inspirasse receio, nem sumidade que o fizesse recuar . O seu
singular talento de polemista era, contudo , fraco sob o ponto de vista
literário : nada do sarcasmo cru de um Camilo Castelo Branco, ou da
ironia alada de um Otaviano .
28 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Varnhagen tinha a falta de espírito de qualquer privatdocent de


Bonn ou de Heidelberg, que não possuísse sombra da ciência de escarne
cer de Heine ou do penetrante talento de motejar de Schopenhauer . A
zombaria era - lhe estranha. Quando tentava ter graça, metendo alguém
a ridículo, nada mais conseguia do que fazer-nos sorrir da sua insipidez.
Esgotando a argumentação sem nunca fulminar o adversário com um
raio de indignação ou submergí-lo numa desconcertante tempestade de
galhofa, descendo às últimas minudências pelo hábito de insistir nos de
talhes, os seus ataques e defesas tornam-se enfadonhos e caracterizam -se
pela ausência completa de todo cunho artístico mais parecendo desenxa
bidos arrazoados de praxista que vibrantes desabafos de escritor con
sumado.
Varnhagen era não, só suscetível e de índole combativa, como afeito
a apaixonar-se por uma tése e especialmente por um personagem . Na
“ História das Lutas dos Holandeses no Brasil”, extensa monografia de
real merecimento, constitui êle a André Vidal de Negreiros o objeto do
seu louvor, mostrando para com os heróis João Fernandes Vieira, Henri
que Dias e Felipe Camarão uma viva antipatia.
A sua grande , absorvente e mais antiga afeição histórica foi, porém ,
o florentino Américo Vespuccio, cuja importância de navegador, serie .
dade e critério de correspondente e fidelidade impecável de narrador de
fendeu com entusiasmo e grande cópia de convincentes argumentos his
tóricos e geográficos, citações de textos e comparações de roteiros no
trabalho geral sobre história do Brasil, em trabalhos especiais Lima,
1865 e Viena, 1869-1870, - e na resposta à análise crítica contida no pa
recer do eminente M. D'Avezac sobre a “ História Geral do Brasil "
Examen de quelques points d'histoire géographique du Brésil , Paris, 1858,
“ Vespuccio, que chegado ao ocaso da vida começara enfim a viver sos
segadamente, foi, depois de morto, alvo de ataques grosseiros, injustos e
acriminiosos. Sua memória tornou-se a vítima inocente da própria fama
que de princípio lhe fóra dispensada. Olvidemos, de uma vez por tôdas
êste mal e pernicioso costume; não sigamos mais este miserável sistema
que consiste em vilipendiar a honra sem mácula dos pequenos para exal
çar a glória, por vezes inexistente, às vezes duvidosa dos grandes e, es
clarecendo a história das viagens de Vespuccio, advoguemos uma questão
a um tempo de justiça e de moralidades Le premier voyage de Amé
rico Vespuccio, Viena, 1869, no Prefácio.
E se bem o disse, melhor o fês.
Os dois trabalhos especiais dedicados ao denodado navegador floren
tino são, incontestavelmente, de grande valia pelo intuíto com que foram
elaborados, pelo método rígido e imparcial que seguiram e pela riqueza
de erudição que ostentam.
Em nenhum dos seus livros talvez exista tanta abundância, um tal
luxo de ilustração histórica .
Percorrendo-se êsses dois deleitantes volumes esguios tem-se a im
pressão perturbadora de uma compacta e emaranhada floresta dos trópi
cos, densa e perfumada, onde tudo se nos afigura misterioso e estranho,
cujas árvores parecem formar uma trama contínua pontilhada de orquí
deas exquisitas, mas onde acabassemos por orientar-nos perfeitamente.
São êles extensivamente aproveitados em obras monumentais como a
de Justin Windsor — “ Narrative and Critical History of America " - 3
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 29

volumes, pois que Varnhagen foi um dos raros brasileiros cujas abali
zadas e luminosas opiniões gozam de incontestável prestígio e autoridade
fóra do nosso mundo intelectual “Francisco Adolfo de Varnhagen ”
Relatório do Ministro de Estado para os Negócios Estrangeiros, José A.
Saraiva, 1866, páginas 118. a 119 .
Ferdinand Denis apelidava Vernhagen, por ocasião dos seus primei
ros trabalhos, “ june savant, un des plus laborieux et instruits Bresi
liens de notre temps ”.
M. D'Avezac assim se exprimiu no luminoso parecer emitido sobre a
“ História Geral do Brasil ” :

“ O livro do sr. Varnhagen é seriamente, conscienciosamente


escrito por um homem que consagrou todo o seu tempo, tôdas as
suas afeições, todo o seu estudo ; fôrça era tomar a sério um tal
livro ... Eis porque revelamos , sob o ponto de vista geográfico, tô .
das as imperfeições que nos pareceu descobrir neste trabalho, cer
tos de que o autor tem seus estudos em estima bastante para pre
ferir, ao elogio banal e fácil, páginas de crítica atenta como as que
traçamos e das quais resalta um testemunho indiscutível do valor
que ligamos ao fruto das suas vigílias ...
" ... O Sr. Varnhagen merecia que assim nos demorassemos
com o exame do seu trabalho : o primeiro a desejar corrigir- lhe as
imperfeições, ele revê os capítulos escritos à medida que compõe
novos, e enquanto tinhamos em mãos o seu volume, mandou -nos uma
fôlha de 16 páginas compactas, formando um suplemento inteira
mente repleto de anotações retificativas ao mesmo volume, prova
admirável do seu amor sincero aos estudos conscienciosos , tão de
molde a despertar em nós para com o autor a mais verdadeira esti
ma e a mais real simpatia ” .

Referindo-se, especialmente às monografias escritas sôbre Américo


Vespuccio, diz Justin Windsor, no volume II, página 156, da sua conhe
cida obra “ Narrative and Critical History of America ” :

“ Os esforços de Varnhagen para elucidar a carreira de Ves


puccio foram ardentes, sinão a todos os respeitos decisivos ” .

Tratando longamente do mesmo assunto escreveu o professor norte


americano John Fiske, na sua “ Discovery of America ” :

" The only intelligent modern treatise ou the life and voyages
of this navigator is Varnhagen's collection of monographs... Var
nhagen's book has made every thing else antiquadet, and no one
who has not mastered it in all details is entitled to speak about
Vespucius. In the English language there is no good book on the
subject ".

Apesar de, por um efeito pura e seguramente de simpatia reflexa ,


interessar -me vivamente pelo bom nome de Américo Vespuccio, não me
aventurei a decidir do pleito em que o nosso maior historiógrafo se em
penhou unguibus et rostro.
Graças a nímia gentileza e influência de bondosos e ilustrados ami
gos tive o feliz ensejo de ler muitas das importantes peças do processo
30 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

instaurado sobre o assunto , e, se fosse juiz chamado a proferir a sentença


diria, com tôda sinceridade que a questão da autenticidade das primeiras
navegações de Américo Vespuccio, particularmente da viagem encetada
no decorrer do ano de 1497, com a consequente feliz descoberta de terra
firme , parece -me uma destas questões aventadas para nunca serem defini.
tivamente decididas.
A nossa brilhante Academia de Letras, por exemplo, poderia em peso
tentar a solução dêsse intrincado e velhíssimo problema que empolgou ,
século XV sem conseguir, entretanto, encontrar- lhe o enigmático X.
O famoso Dicionário da Academia Francesa ainda pode antever sua
terminação, dada a perpetuidade da instituição que encarregou -se de sua
execução ..
A questão Vespuccio , entretanto , mais se complicará com o perpas
sar dos tempos: pela sua perplexidade, ela é uma das muitas que nos fa
zem duvidar da veracidade das premissas de que a história costuma tão
solenemente tirar mais insofismáveis conclusões.
Eis, em resumo retrospectivo, as preciosas contribuições de Francisco
Adolfo de Varnhagen para a história das viagens não só de Américo Ves
puccio como de Cristóvão Colombo . No Bulletin de la Societè de Geogra
phie de París janeiro de 1858, publicou êle as supostas notas de
Cristóvão Colombo, também atribuídas a seu irmão Bartolomeu Colombo
à primeira edição da Imago Múndi do Cardeal Pierre d'Ailly. Essas notas
foram escritas nas margens do livro, cujo exemplar é religiosamente con
servado na antiga e preciosa Biblioteca Colombiana de Sevilha.
A referida publicação de Varnhagen oferece tanto mais interêsse
quanto Pierre Margry pretende, para lustre da ciência francesa , provar a
inteira influência exercida pela leitura daquela obra para a descoberta
do Novo Mundo, com tal intuito antedatando a primeira edição, ou por
outra, opinando que existe uma edição anterior a geralmente aceita como
a primeira.
No mesmo ano de 1858, publicou Varnhagen , em Valência, na Espa
nha, sob o pseudônimo de Volafan e numa tiragem muito limitada, uma
carta escrita por Cristóvão Colombo, datada da ilha de Santa Maria, a
18 de fevereiro de 1493 , de regresso, portanto, da sua primeira viagem à
América, e dirigida a Gabriel Sanchez . Voltando a este assunto, em 1869 ,
publicou, em Viena da Áustria, um folheto sôbre “ uma carta de Colombo
enviada de Lisboa a Barcelona em março de 1493 ” .
Sôbre a identidade dessa carta com outras variantes conhecidas e na
conformidade de todas com o original, existe grande diversidade de opi
niões e levantou-se, desde então, séria controvérsia, sustentando Varnha
gen e com êle, pensa Harrisse, que a carta publicada em Valência é o texto
que serviu para a tradução latina , de Cosco, em 1493, a qual serviu, por
seu turno, de texto às subsequentes edições e traduções em diferentes lín
guas que divulgaram o grande feito do valoroso navegador genoves .
Tendo - se ocupado de Cristóvão Colombo como anotador, e de Colom
bo como correspondente, Varnhagen não deixou de lado a muito disputa
da questão relativa ao local da primeira terra em que ele desembarcou.
Segundo sua esclarecida e abalizada opinião, aliás, criteriosa, a ver
dadeira Guanahani é, no grupo das Bahamas, a ilha de Mariguana.
É difícil , no entender de muitos, dar -lhe razão neste ponto, tendo em
vista o que Colombo escreveu no “ Diário ", que a ilha tinha abundância
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 31

de água e uma lagoa muito grande no centro dela, pois, como é sabido, não
possui Mariguana, água interior.
Verdade é que Varnhagen não deixa de citar o mesmo “ Diário " em
abono da sua hipótese.
O resumo por ele utilizado, dêsse desaparecido e preciosíssimo docu
mento , do qual, já Las Casas se teria aproveitado na forma resumida,
existe na antiga Biblioteca dos Duques de Osuna, em Madri. O texto de
que se serviu Varnhagen é diferente do de Navarrette, idêntico éste, ao
de Las Casas, se é que, como pretende Harrisse, este último escritor não
empregou o texto completo.
No tocante a Vespuccio a questão reside em saber -se se ele fês, no
Novo Mundo, as quatro viagens que são apontadas e nas datas alegadas.
A data da primeira viagem , sobretudo, é importante, porque dela
depende o verificar-se o florentino foi realmente o primeiro descobridor
da terra firme americana, catorze meses antes de Cris vão Colombo e
uma ou duas semanas antes dos Cabots.
A convicção, não superficial e empírica, mas muito estudada , de Var
nhagen sôbre a veracidade dessa viagem de 1497 é, entre outros, forte
mente partilhada e defendida com grande cópia de valiosos argumentos
pelo historiador americano do norte , John Fiske.
Deve mesmo dizer - se que a opinião de Varnhagen é, atualmente, re
-
conhecida de preferência como a correta. Segue- a também Gaffare
“ Histoire de la Découverte de l'Amérique " , - e a este respeito escreve
John Fiske, o qual , no seu entusiasmo pela reabilitação do florentino che
ga a encontrar novas razões para confirmar -se na sua asserção, que foi o
gigantesco saber de Alexandre de Humboldt que fêz raiar a primeira “ luz
clara ” nas trevas que obscureciam totalmente as viagens de Vespuccio,
mercê de um erro tipográfico ou alteração ignorante na tradução de Saint
Diè de uma falsificação bem intencionada de Bandini, no século passa
do, e de outras muitas circunstâncias mais. Coube, no entanto, ao grande
Varnhagen , a glória incontestável de , desvendando a não autenticidade
dessa carta de Bandini, e deslindando gravíssimo erro da tradução de
Saint Diè , tornar tudo perfeitamente inteligível.
“ Pode - se, ajunta John Fiske, não aceitar todas as conclusões
de Varnhagen, mas já não existe sombra de dúvida sobre a integridade
de Vespuccio” .
Em verdade, nada há que prove absolutamente a negativa , como nada
há que prove conclusiva e afirmativamente, além do testemunho do prin
cipal interessado.
O Visconde de Santarém baseia sua argumentação em contrário à rea
lidade da viagem de 1497, no fato de se não encontrar nos documentos
contemporâneos existentes nos arquivos a mínima referência ao aconte
cimento e grande resultados dêle derivados.
Isto, quando Vespuccio afirma na sua carta de 1504, endereçada a
Soderini, publicada na íntegra, em Saint Diè, em 1507, e cujo original
nem se sabe bem em que língua foi escrito supondo -se, com bons e
sólidos fundamentos que o foi em italiano meio adulterado pela esidên
cia, na península, sendo o folheto editado na própria Itália, em 1505
1506, que a expedição se levara a cabo por ordem do rei e que a este
apresentou ele, no regresso, seu bem cuidado relatório, de que ninguém
dá fé.
32 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Alexandre de Humboldt, apesar de grandemente afeiçoado a Américo


Vespuccio, também quis provar, com a autoridade de Muñoz e Navarrette,
e dos documentos por estes publicados, que, de abril de 1497 a maio de
1498 , Vespuccio que era sócio da casa comercial Berardi, de Sevilha ,
estava muito ocupado com os preparativos da organização e aprestos
da frota, com a qual Colombo realizou sua terceira viagem .
No justo dizer de Sidney Gay, este caso tem de ser julgado sôbre
prova circunstancial e é todo ele constituído de probabilidades morais ,
variando a sentença segundo as convicções e disposições dos juízes cha
mados a se pronunciarem sobre o momentoso assunto.
A ida de Américo Vespuccio, em 1501, terceira das alegadas via
gens ocupando uma posição tipicamente subalterna na expedição orga
nizada e mandada por D. Manuel III de Portugal, cognominado o Ven
turoso, a descobrir a passagem ocidental para as ilhas das Especiárias do
Oriente, é que está fora de tôda e qualquer dúvida.
Essa viagem foi das mais importantes, pois explorou a costa oriental
da América Meridional, desde 5.º até 38.°, e chegou mesmo no mar alto,
a 52.° de latitude, Sul.
De semelhante viagem e não das duas anteriores é que resultou o ser
dado , por proposta de Waldseemüller, na “ Cosmographia e Introductio ',
impressa em Saint Diè, em 1507, o nome de América, ao mundo novo des
coberto e percorrido por Américo Vespuccio, continente desconhecido e
localizado ao sul do Equador e que , para vários entendidos, nada parecia
ter de comum com as Índias, com as quais já permaneciam identificadas
as descobertas de Colombo .
Na quarta viagem encetada por Américo Vespuccio , em comando de
dois navios da expedição, chegou ele até as alturas do Cabo Frio, aí le
vantando um forte, primeiro estabelecimento militar europeu nas terras
virgens do imenso continente que , no dizer de um historiador americano,
devéras mereciam, por êsse fato auspicioso o nome de América.
Varnhagen sustenta que , além das quatro citadas viagens, Vespuccio
fêz duas outras viagens, mais à costa norte da América do Sul, o que, em
parte, Harrisse quer confirmar.
No que Varnhagen discorda, entretanto, de todos os outros prévios
comentadores, mesmo favoráveis a Américo Vespuccio, é quanto ao ponto
onde o feliz navegador italiano abordou à terra firme, por ocasião da sua
primeira viagem .
Em seu entender foi no Cabo Graças a Dios , na atual próspera Re
pública de Honduras , de onde Vespuccio teria depois navegado para o
Norte, até a baía do Chesapeake, tocando nas Bermudas, no seu regresso
para Sevilha.
Desde 1839 até 1874, Varnhagen, mais ou menos diretamente escre
veu sôbre este assunto , não devendo ser omitidas referências a um seu
folheto cuja tiragem foi apenas de 100 exemplares Viena da Áustria,
1872 relativo à influência dos cosmógrafos Schöner e Apianus, na esco
lha e adoção definitiva do nome de América e contendo, ainda a notícia
acerca dos primeiros globos universais e mapas -mundi com este nome, e
a outro folheto impresso na cidade russa de São Petersburgo, no mesmo
ano de 1872 -- edição comportando apenas 40 exemplares em que se re
imprimia uma carta de autoria de João Schöner, datada de 1523, relativa
ao seu globo.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL . 33 '

O original desta carta redigida em latim, encontra -se apenas nas Bi


bliotecas de Viena e de Londres .
Em Varnhagen superabundava em erudição o que escasseava, como
já dissemos, em espírito propriamente filosófico.
Qualquer orientação que a sua inteligência pudesse ter manifestado,
de comêço , para a consideração das coisas e dos acontecimentos e para
algumas páginas dos seus primeiros trabalhos vê-se que tal preocupação
lhe não foi alheia – desviou -se na continuação pela insistente pesquiza .
de documentos para o restabelecimento da verdade dos efeitos ou fatos.
Durante sua longa residência no velho Portugal, ao tempo da sua
convivência com Almeida Garret, José Estêvão, Frei Francisco de São
Luís, que lhe dispensava uma paternal afeição, e os outros corifeus da
grande geração portuguêsa da primeira metade do século , e ainda depois .
da sua transferência diplomática para a capital espanhola, foi que ele
se devotou a estudos propriamente literários .
Data de 1849 Madri - a edição das “ Trovas e Cantares ou mais
provavelmente o livro das cantigas do Conde de Barcelos ”, a qual Inocên
cio qualifica de “ inegável e valioso serviço à literatura em geral e muito
particularmente à portuguêsa” – Volume citado, página 320 — Na ca
pital lusitana e na capital espanhola publicou, em 1850 e 1853, os três
volumes do “ Florilégio ”, cuja introdução é julgada excelente, ao ponto
de a considerar um crítico da autoridade do Sr. José Veríssimo Dias de
Matos “ a fonte da nossa história literária à qual teria Varnhagen aí as
sentado o critério geral ”.
É verdade que sôbre aquelas páginas reveladoras repousam os traba
lhos críticos posteriores, mais avultados e mais acabados, que retomaram
o fio abandonado pelo grande trabalhador no seu prurido de descobrir
novas informações , nêle mais forte do que o deleite de enfeixá-las com
garbo.
Dir-se-ia que mais tarde lhe roubou todos os momentos a pura inves
tigação, até estendida aos domínios da pre -história americana, da qual já
se havia ligeiramente ocupado no opúsculo “Sumé, lenda mito -religiosa ” ,
anteriormente publicada no Panorama.
Para ser, contudo, um arqueólogo ou um etnógrafo de valor igual ao
do erudito historiografo que era, faltava - lhe a base que só podia haver
The fornecido uma instrução especial, compatível , aliás, com o meio e o
momento em que se educou a sua inteligência privilegiada, mas que ficara
um tanto fora da esfera peculiar de atração do seu espírito.
As suas informações sobre os selvagens são, por via de regra , fide
dignas, porque se apoiam no testemunho insofismável dos antigos autores
que de continuo manuseava; porém , as suas reflexões sôbre etnografia
brasileira, condensadas no livro " L'Origine Touranienne des Americains
Tupis-Caribes et des anciens E'gyptiens indiqués principalement par la
philologie comparèe ”, não passam de ligeiras divagações de diletante.
Varnhagen possuía, todavia, uma condição singularmente vantajosa
para uma serena e despreocupada observação das hipóteses que consti
tuem, ainda hoje, o melhor do haver dêsse ramo dos conhecimentos hu
manos.
Único, talvez, entre os escritores brasileiros da sua geração, nunca.
revelou simpatia pelos indígenas .
34 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Conta éle, na “ Réplica Apologética ” que, ao ser apresentado, em


Portugal, pelo pai ao Sr. Dr. Pedro I, entrevista da qual resultou o alis
tamento do jovem Varnhagen nas fileiras liberais, na campanha então
encetada pelo irrequieto Duque de Bragança contra seu irmão D. Miguel ,
o ex -imperador do Brasil reparara na sua elevada estatura, ajuntando
“ que era do sangue paulista ".
O sangue dos bandeirantes e o sangue alemão, que de mistura lhe
corriam nas veias, não podiam gerar o sentimentalismo sôbre que assen
tou, em boa parte, a corrente indianista da nossa literatura. E como teve
sempre a coragem das suas opiniões, mesmo se apodadas de pouco huma
nitárias, sustentou-as com serena convicção quando vinha a propósito, e
com vivacidade e fervor ao travar, a tal respeito , com o ilustre prosador
maranhense João Francisco Lisboa, a polêmica de que ficou por memória
o folheto “ Os Índios Bravos e o Sr. Lisboa ” Lima, 1865.
Varnhagen era francamente anti-indianista, como logo o notou M.
D'Avezac , estranhando que, em vez de começar sua História pela dos
aborígenes, ele a iniciasse pela de Portugal, terra dos colonizadores, da
qual o Brasil assim formava um mero desdobramento peculiar no ultramar.
Era antiindianista em tudo, menos a ,linguagem , na qual dava caloroso
abrigo aos têrmos tipicamente americanos, ao passo que acusava os ne
gros de haverem estragado, no Brasil, a língua portuguêsa. Os índios, no
estado selvagem , lhe não mereciam , porém , simpatia alguma : todos os en
cantos de Atala não quebrariam sua frieza. Sem odiá-los, como raça, nem
pretender exterminá - los como parte pouco desejável da população nacio
nal , nenhum direito lhes reconhecia que valessem perante as exigências
da civilização européia , aquilo que o poeta Rudyard Kipling com tanto
sucesso denominou o White Man's burden.
Devera , antes, ter nascido anglo -saxão quem tão firmemente exibia o
orgulho do branco, tão gostozamente lhe zelava os foros, tanto lhe enal
tecia os serviços.
No seu íntimo, Varnhagen não acreditava nos brandos esforços da
catequese para amansar os índios, elevá-los à vida social, “ reabilitá -los ”,
como dizia, a espécie do Ramantismo que não preferia o puro estado na
tural ,
No chamado Discurso Preliminar “ Os Índios perante a nacionalidade
brasileira ” , ele o declara mesmo : contava tão somente com a fôrça para
contê-los, “ avassá-los ", repelí-los quanto preciso , obrigá- los a tornarem
se úteis trabalhando em benefício dos invasores para o progresso mate
rial, que por fim lhes aproveitaria também .
Não podemos, no entanto , acusá- lo de inabalável escravocrata .
Sujeição dos índios, era , para ele , equivalente a redução na impor
tação dos africanos, cuja emancipação, lenta e gradual acabou por advo
gar com animação e veemência, após ter pretendido substituir a servidão
indígena à escravidão negra. Para combater o seu desprezo profundo
pelas raças inferiores atuava o fermento da sua fé , visto haver êle sido
um crente num meio em que o voltairianismo estava na moda, assim como
se revelou um conservador esclarecido e adiantado numa época em que o
epíteto de liberal andava comumente atribuído aos que afixavam ou es
posavam idéias revolucionárias.
A sua ascendência era assaz fidalga para permitir - lhe essa postura
meio reacionária ; a sua natureza assaz altiva para dispensá-lo de corte
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 35

jar uma fácil popularidade, baseada no esquecimento das suas convicções


e tradições de família e das suas predileções morais.
Como objeto de estudo, entretanto, em sua expressão, como origem
dos " mitos dos tempos heróicos da nossa história ” , os índios nunca dei
xaram de atraí -lo.
A criação , do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da secção
etnográfica é-lhe devida, e bem assim sustentou a conveniência de fun
darem -se cadeiras de língua tupí . Dando ele próprio o exemplo , adquiriu ,
no campo da linguística americana, como em todos que cultivou , uma só
lida competência, que a outros bastaria para satisfazer a ambição de sa
ber, se bem que nada houvesse aí levado a cabo de notável ou de singu
larmente interessante. Contudo, escreveu Richard Burton na introdução
sôbre índios brasileiros da sua tradução de Hans Staden , que foi Var
nhagen o primeiro a esclarecer a confusão etnológica que reina nas obras
dos escritores anteriores , de quem dependera Southey
Se não era um homem de ciência como Alexandre de Humboldt, tão
pouco era Varnhagen um estilista como Renan . Escrevia com gravidade,
com correção , por vezes com fluência, mas sem elegância nem brilho.
Quando mais apurada , isto é , quando mais se eleva ou mesmo se empola
para condizer com o assunto , ou para traduzir os sentimentos nobres que
a animam, a sua lingugem perde tôda agilidade sob o peso dos atavios
que, embora pouco graciosos, não seriam ainda assim julgados excessivos
e de máu gosto se por causa dêles não ficasse emperrada a expressão do
autor. Nos tempos da colaboração no Panorama, particularmente na “ Crô
nica do Descobrimento do Brasil” , enxerga -se na sua forma a preocupa
ção dos têrmos apropriados, novos ou obsoietos, mas concretos e diretos,
que distingue a linguagem sua contemporânea, e foi particular objeto da
escola romanticano tocante à exposição . Pode até apodar- se de excessiva
essa tendência no referido trabalho de mocidade, obscurecendo ou antes
embaraçando por momentos a narração, tal é a cópia dos vocábulos usa
dos, peculiares à navegação de outr'ora.
Como o trabalho incessante o tornava um progressivo, alguns senões
do escritor corrigir-se-iam pelo tempo adiante e aperfeiçoar- se-ia a sua
redação, ganhando em distinção. De resto, a frequência da leitura dos
clássicos desde a juventude, ajudada pelo constante folhear, durante toda
à vida, de documentos dos séculos de português mais castiço, e igualmen
te pelo natural efeito da reação devida ao esfôrço que sobre si próprio
exercia para se não deixar influenciar pelos outros idiomas em que com
punha, conservou sempre à sua linguagem uma boa vernaculidade que a
recomenda, mesmo nas ocasiões em que a forma se torna mais frouxa .
E como poderia deixar de ser purista, de desvelar-se pela dignidade
do estilo mediante a autonomia do vocabulário, um discípulo do Cardeal
Saraiva, cujo amor à língua portuguêsa foi tanto que, julgando desairosa
a sua tão próxima descendência de um idioma comparativamente novo
como o latim, com grave escândalo dos filólogos lhe foi procurar ascen
dência entre os idiomas célticos , falados na Lusitânia, pôsto que sensivel
mente enriquecidos com aquisições do latim culto ou das línguas néo
romanas ,
Varnhagen tinha, entretanto, em si a melhor e primordial das con
dições para ser um escritor tinha idéias . No panegirico do eminente
fisiologista Claude Bernard , a quem sucedeu na Academia Francesa, Re
nan aventa , com muita propriedade que um grande pensador é sempre
36 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

um grapde escritor, porque a bela e adequada expressão dos pensamen


tos levantados é, por assim dizer instintiva. Ora, Varnhagen é mais, mui
to mais do que um cronista erudito . Entra de direito na categoria dos
escritores da variedade a que os alemães dão o nome de história pragmá
tica, a saber, a história que não propriamente a filosofie, ou que, dos
acontecimentos deduz as leis que governam , na sua marcha, as sociedades .
humanas, mas que vai além das simples exposições dos fatos, acompa
nhando - os de reflexões e considerações sociológicas.
“ História Geral da Civilização do Brasil" intitula- se , no prefácio , o
seu trabalho de conjunto, ajuntando o autor que tal civilização era , no
seu entender, fruto da invasão européia e herói nacional nenhum outro
senão o invasor.
" A História Geral da Civilização do Brasil, deixaria de ser lógica
com o seu título, desde que aberrasse de simpatizar mais com o elemento
principalmente civilizador" página XXV do Prefácio, no volume II ,
da 1.' Edição, MLCCCLVII:
Nas próprias polêmicas Varnhagen guardou sempre certa elevação de
linguagem porque nele era natural a elevação e superioridade das idéias,
que nem buscava divulgar mediante o sacrifício das suas convicções às
inclinações ou caprichos do momento entre a maioria, despindo-as , por
tanto, de originalidades; nem tão pouco procurava revestir de singulari
dade com fórmulas impraticáveis eexcêntricas. Suas idéias eram pratica
das e sãs , para o que de certo influiam , não só disposições hereditárias
o fundo ancestral de bom senso germânico a que já fiz alusão linhas aci
ma, tão predominante que ia por vezes de encontro ao meio como as
lições bebidas nas demoradas estadias em países estrangeiros, longe da
azafama burocrática e dos enredos políticos, e em dilatadas e aproveita
bilíssimas viagens feitas ao serviço diplomático do seu país ou como
fito especial de realizar observações e indagações históricas, dando-lhe,
estas oportunidades, ininterrupta ocasião de exercer prodigiosamente sua
faculdade especial de observador arguto, sagaz e inteligente .
Sôbre agricultura, sôbre comércio e sôbre indústria, exarou , a meio
de seus muitos e notáveis escritos, um sem número de ponderações sensa
tas e aproveitáveis.
No domínio da agricultura ocupou -se, em pequenas, porém , explêndi
das monografias dos meios de melhorar, principalmente a indústria do
açúcar, o tratamento adequado do fumo e o fabrico racional de charu
tos, e bem assim do cultivo do café e do trigo.
No terreno político, uma ponderação sua me acode agora , na qual
corajosamente insiste, repetidas vezes, e que na rotação contínua e inces
sante dos acontecimentos volveu à atualidade, como no tempo da moci
dade de Varnhagen, decorrida ao som do éco persistente das periódicas
revoluções movidas pela quimera separatista , excrescência do ideal federa
lista que assoberbava e inflamava os corações : a da necessidade da imo
lação do sentimento de provincialismo ao de patriotismo.
“ Ao provincialismo, escreveu êle à página 17, de “ Os Índios Bra
vos e o Sr. Lisboa ” , associam-se apenas idéias de interesses provinciais
quando principalmente as de glória andam anexas ao patriotismo, senti
mento tão sublime que faz até desaparecer, no homem , o egoísmo, levan
do - o a expor a própria vida pela pátria, ou pelo soberano que personifica
o seu lustre e a sua glória ” .
37
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

O seu centralismo chegava a fazê -lo aconselhar fortemente a funda


ção de uma Universidade Central Brasileira no centro da Província de
Minas Gerais, no louvável intuito de unificar e plasmar uniformemente o
sentimento nacional.
Esmaltadas de idéias impregnadas de singular patriotismo, não po
dem , jamais, ser consideradas monótonas as suas produções.
A grande e extraordinária cópia de conhecimentos históricos e literá
rios que Varnhagen possuia e da qual ele, mais do que ninguém , estava
capacitado, por outro lado impede a sua obra de ser alguma vez banal ou
enfadonha. 1
A sua reconhecida probidade profissional levava -o não só a infor
mar -se de quanto existia publicado e inédito sôbre um determinado assun
to, como a indagações locais, topográficas, para uma mais apurada per
cepção e explanação dos fatos.
Foi assim que, animado dêsse firme propósito visitou os famosos
Montes Guararapes e percorreu detidamente os pontos mais notáveis da
prolongada e sangrenta luta com os holandeses, que seguių no encalço dos
bandeirantes até os frescos planaltos de Goiás e os abafados e perigosos
påntanais de Mato Grosso : não ia, como Chateaubriand, à Palestina e a
. Granada em busca da sensação aguda do extinto, nem como Flaubert, ao
Egito, em sôfrega busca da côr local , mas como um sizudo cronista mili
tar e político, em procura da compreensão completa e do perfeito conhe
cimento do terreno, para mais exata e fiel reconstituição das cenas da
guerra e das aventuras colonizadoras. E não só possuia ele saber e cons
ciência, como o faro, a intuição que precede a corroboração, e que é mais
do que a plenitude, é a pedra de toque do talento singular do historiador.
Na mencionada “Crônica dos Descobrimentos do Brasil", por exemplo,
Varnhagen , muito antes das recentes e pouco conclusivas inquirições nes
te sentido, confessa repugnar-lhe imputar, ao mero acaso, à descoberta
das terras de Santa Cruz, abordando, franca e honestamente os motivos
posteriormente invocados.
O profundo amor às letras, amor que lhe absorvia todo o tempo além
do dedicado à rotina da máquina burocrática oficial e vicissitudes diplo
máticas nas várias capitais do Pacífico e da Europa, em que esteve acre
ditado, junto, talvez , com aquele intenso sentimento da própria valia, o
qual, conforme aponta Joaquim Manuel de Macedo no curto e indiferente
necrológio proferido no Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Ja
neiro, se convertera, por fim , num orgulho desmedidamente intolerante
e irritável que não admitia oposição Revista Trimensal, volume XLI,
parte II, 1878 —, combinaram -se para afastá-lo constantemente do campo
sedutor da política, tão accessível ao seu mérito e tão simpático à grande
maioria dos seus e nossos compatriotas .
Tão longe e apartado dela se conservou Varnhagen que , sendo um
laborioso e um polígrafo, que até sôbre caça discreteou , apenas escreveu ,
em 1849 e 1850 , duas magras brochuras políticas, e em 1856 , alguma coisa
versando sôbre colonização agrícola, questão de absoluta preferência
social.
Poupou -se desta arte algumas decepções, pôsto que delas não hou
Tesse ficado isento.
Já nos últimos tempos da sua vida não posso infelizmente dizer na
Delhice porque Varnhagen morreu contando 62 anos queixava- se ele

.
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de ter “ o ânimo quebrantado ”. Deveis ter notado, ilustres senhores Mem


bros da Comissão Julgadora, como é familiar esta frase entre nós, onde
os escritores têm poucas e raras pugnas a sustentar para abrirem seu
caminho , e a estima dos entendidos e os próprios favores do Estado quase
sempre os recompensam.
O desânimo não é só devido à escassa resistência do nosso tempera
mento. É que alguma coisa existe de pior do que a hostilidade: é a apatia
da multidão, a frieza ou indiferença do meio, a impossibilidade de chegar
à grande massa, de grangear a verdadeira e envaidecedora popularidade,
a ' que é trazida pela ação do intelecto .
A energia e a paixão que, no entanto, o caracterizavam e residiam
em seu caráter firme e que deixava de malbaratar nas discursões partidá
rias, reservou -as Varnhagen, mui ciosa e avaramente para a defesa de
algum tema histórico que sofresse contradita e para a apologia ou o vitu
pério que algum personagem histórico que, em sua opinião, não ocupasse
o devido lugar no juízo da posteridade.
Mais do que a Vespuccio, mais do que a qualquer figura humana
amou ele, porém , a nobre e altiva terra que lhe foi berço, o seu caro e
estremecido Brasil, e tanto mais o estremecia quanto lhe não fôra muito
fácil seguir a nacionalidade da sua predileção.
Filho, como sabemos, de pai estrangeiro, engajado no serviço da Co.
lônia, depois nação livre e independente, levado menino ainda para Por:
tugal, aí tendo seguido todos os cursos, havendo - se alistado nas briosas ·
fileiras do glorioso exército do Duque de Bragança e estando até prestes
a ser nomeado capitão de engenheiros, parecia que a pátria de nascimen
to lhe devera ser indiferente. Não assim , porém , reivindicou -a tenaz
mente pela inteligência e pelo coração , ofertou -lhe as primícias do seu
estupendo talento e cultura, e a custa de muito esfôrço pessoal logrou ,
aos 25 anos, fazer- se reconhecer como cidadão brasileiro – Decreto de 24
de julho de 1841. O que para tantos outros fôra puro presente do acaso,
para ele foi uma árdua conquista, que mais lhe fazia querer os despojos
da vitória, a saber, a sua carta de naturalização e o lugar diplomático
que imediatamente deveu à generosa proteção do augusto, do magnânimo,
do sábio e benevolente Imperador Sr. Dom Pedro II, sempre pronto em
animar o culto das letras e das ciências em nossa Pátria .
Também ao Brasil e só ao Brasil consagrou Varnhagen o melhor da
sua imensa e brilhante atividade intelectual.
Abrazando -se na exaltação patriótica promovida pela realização da
Independência, ao ponto de proclamar horror ao cosmopolitismo que devia
ser a consequência da sua esmerada educação, e até querer transferir a
Capital do país para o interior, a fim de não se desnacionalizar, pelo con
tato inevitável de um porto, com a parada obrigatória de estrangeiros, ao
Brasil , levantou, num movimento de sinceríssimo e quente entusiasmo o
monumento o têrmo não é hiperbólico representado pela “ História
Geral do Brasil ” .
Os cabouços encheu-os com essas dezenas e dezenas de publicações
nas quais se comprazia, como M. D'Avezac, Harrisse e outros tantos ilus
tres historiadores, de detalhes e descobridores de fontes, em transbordar
o excesso da sua erudição, esclarecendo aqui um ponto, retificando ali
outro, além discutindo uma hipótese, aventando nova, ou defendendo uma
opinião . Dir-se - ia que o perseguia a idéia de perder seus preciosos apon
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tamentos nas constantes remoções a que o compelia a agitada e intensa
vida diplomática ; tanta era a pressa de comunicar ao público o que lhe
ocorrera, tanto o dominava um constante desejo de conversar com os seus
muitíssimos leitores.
Com aquelas publicações avulsas, sempre úteis e sempre interessan
tes, organiza - se a mais curiosa das bibliotecas, com volumes de todos os
formatos: bulindo em não sei quantos assuntos, escritos em português,
em espanhol, em francês, em alemão, pois que ele conhecia profundamen
te e redigia em uma porção de línguas vivas e mortas, impressos nos mais
variados lugares, ora em Lisboa, ora em Stockolmo, ora em Madri, em
Caracas, em Viena, em Lima, em Havana, em Santiago, etc. , etc ..
Seja -me lícito entrar em todos estes pormenores bibliográficos , já que
dêles era tão amigo o escritor de que, mercê da feliz oportunidade que
se me oferece, me estou ocupando.
A feitura da “ História das Lutas com os Holandeses ” foi primeiro
empreendida por um móvel de patriotismo, para reanimar alguns fracos
e pusilânimes, algumas coragens desfalecidas ante as sérias dificuldades
oriundas de imprevistos vários, com que se apresentava, não raro, a guer
ra a que nos arrastou o despótico governo Paraguaio, rememorando a
lição admirável do século XVII, que é , ainda hoje, a página épica e uma
das mais puras e mais tocantes da nossa história.
Que melhor prova de patriotismo podia, outrossim , Varnhagen dar,
do que concentrar o vigor mental de que fora dotado, sôbre a ressurreição
gráfica do passado de sua terra ? O amor do passado é comum às nações
que farejam sua decadência, para as quais constitui um regresso a tem
pos melhores, aos tempos da grandeza e da epopéia, e bem assim às 'na
ções em via de progresso, para as quais representa a necessidade impres
cindível da unidade, da coesão, da continuidade histórica , dos anteceden
tes próprios, da tradição.
O réveil napoleoniste correspondeu , em França , à primeira orienta
ção : a segunda encontra, nos Estados Unidos da América do Norte, o
exemplo mais frizante.
O estudo da história pátria é, pois, muito mais do que uma tarefa
simpática e agradável : é a satisfação de uma tendência da alma nacional.
O passado não só envolve a tradição, como gera o incentivo da ação
pela lembrança dos feitos gloriosos de qutras gerações, que, com a dis
tância do tempo perdem as asperidades e imperfeições, e mais glorio
sos parecem ainda na sua idealização vaporosa não se lhes conhecendo as
sombras nem os defeitos.
Assim , na pintura, por efeito da perspectiva , esfumam -se os contor
nos, esbatem -se as côres, corrigem -se as desigualdades e uniformisa - se a
visão. Além disso, o passado pesa com todo o seu peso sobre o presente,
engrinaldando - o com a messe das suas peregrinas virtudes e manchando - o
com a recordação dos seus crimes.
O historiador que exalçando-as , evoca as primeiras e , vilipendiando -os
tenta corrigir os segundos, faz obra de moralista e merece mais do que a
admiração,tem jus à veneração pública
Os sentimentos de honestidade profissional e de equidade social eram
em demasia arraigados no caráter do Visconde de Pôrto Seguro, para que
ele se esquivasse a tão bela missão, cujo cumprimento empresta relêvo ao .
seguimento da sua sábia narração.

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Nas próprias palavras dêle, a história deve ter, por intenção, " for
mar e melhorar o espírito público nacional", e foi sem tergiversações que
desempenhou cabalmente este papel de moralista, na acepção mais eleva
da da palavra, a saber, do historiador que faz servir a história de ensi
namento para os seus contemporâneos, porque, como Varnhagen disse
algures, o presente não é mais do que a repetição do passado.
O escritor que se segrega da sociedade para, na solidão do seu gabi
nete chamar de novo à vida o passado, com os seus personagens, os seus
dramas, os seus horrores e as suas glórias, e com esse encantamento visa
realizar não só uma primorosa reconstrução artística mas uma nobre tare
fa de pensador, corre muito risco de falsear sua missão pela ignorância
em que forçosamente cai das necessidades morais do presente .
Para prevenir este mal, é mister conservar o interesse ligado ao mun
-vdo exterior e não se isolar na torre de marfim da especulação mental.
Varnhagen não podia sofrer das consequências de semelhantes circunstân
cias, porque a sua vida intelectual é inseparável da sua vida pública.
Com efeito, não podemos esquecer que se foi principalmente, essen
cialmente um homem de letras, ele foi oficialmente um fino diplomata .
Sua extraordinária atividade neste campo não pode, portanto , ser
passada sob silêncio.
A primeira nomeação na carreira que preferira à militar, veio - lhe no
ano de 1842, na categoria de Adido à nossa Legação em Lisboa, de onde
passou, mais tarde, em idêntica categoria, para a Legação na Espanha, em
1847, sendo, nesse mesmo ano promovido a Secretário e, em 1851 a Encar
regado de Negócios.
Em Madri demorou-se até o ano de 1858, o que perfaz um total de
dezesseis anos de bons e assinalados serviços nas duas capitais da Penín
sula Ibérica, tempo que empregou no revolver sofregamente dos arquivos
e no preparo da primeira edição da sua estupenda " História Geral do
Brasil " , coroando um já elevado monte de pequenos trabalhos.
Ninguém , penso , se queixará de que durante esse período, Varnha
gen ocupasse seu tempo mais nas bibliotecas, arquivos e nos cartórios,
que na Chancelaria, ou por outra, que combinasse e mesmo preferisse os
estudos históricos à fofice e a superficialidade diplomática, e os ensaios
literários à ociosidade burocrática ; pois não me consta que houvesse, en
tão , outra questão pendente entre a real Côrte de Madri e a Imperial
Côrte do Rio de Janeiro, além de umas tediosas reclamações espanholas
por apresamentos de navios , e outras não menos tediosas reclamações bra
sileiras consequentes de fornecimentos não satisfeitos e efetuados por
particulares a forças estacionadas no Rio da Prata , datando todas de de
zenas de anos e afetas a uma comissão mista, constituída para tal fim,
sendo as negociações a elas pertinentes conduzidas pelo ministro espa
nhol acreditado junto ao Governo Imperial do Brasil.
Eu bem sei a diplomacia não se compõe só de negociações importan
tes, felizmente raras ; que o ramerrão é muito mais natural , e que o trato
constante dos agentes de uma nação com os respresentantes políticos e
sociais da outra se impõe como um dos meios de fomentar, intensificar e
solidificar as relações internacionais, de desmanchar quaisquer atritos
supervenientes, de tornar mais íntimo e recíproco o conhecimento dos dois
países e, conseguintemente mais enraizada sua mútua estima.
Varnhagen era por demais inteligente e bem educado para descurar
esta parte necessária do ofício , a chamada representação, começando por
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facilmente ganhar, pelo seu merecimento indiscutível de escritor, as boas


graças dos cultores mais nisignes das letras castelhanas de então, e gran .
geando depois, entre a exigente aristocracia madrilena , a nomeada de
perfeito “ gentleman ” , de perfeito homem de salão, a qual, aliás, tem que
apanágio comum dos diplomatas e o é sempre que corresponda a uma
condição nacional.
Em 1859, começou a atividade de Varnhagen , como diplomata, na
América do Sul, com a promoção à categoria de Ministro Residente da
República do Paraguai, depois de restabelecidas as relações do Império
do Brasil com essa República e de concluído o tratado de 12 de fevereiro
de 1858, pelo qual foi aberto, a todas as bandeiras, o Rio Paraguai “ sob
condições iguais e muito favoráveis ao comércio geral”.
Como prova de boa vontade e amizade acabava, outrossim , o Gover
no Imperial de interpor seus valiosos préstimos e bons ofícios para não
degenerar, em séria divergência, a dissidência aberta entre o Paraguai e
Os Estados Unidos da América do Norte, a qual foi amigavelmente
ajustada .
Curta foi, porém , a residência de Varnhagen em Assunção.
Abafando, na atmosfera de sangue e de pavor, qual a produzida pelo
despotismo sem igual do primeiro Lopez ( Carlos Lopez ), abandonou certo
dia o pôsto que lhe fôra, confiado, sendo, em janeiro de 1861, acreditado
junto aos governos da Venezuela, Colômbia e Equador.
A nossa diplomacia entrara, então, francamente na quadra da sua
maior expansão .
Fechado o cíclo pernicioso das revoluções que durante mais de meio
quarto de século tinham embaraçado seriamente o firme estabelecimento
da monarquia nacional, e iniciada a política de desenvolvimento material
que pedia instantemente o aproveitamento dos nossos fabulosos recursos
naturais e a capacidade da nossa produção, o Governo Imperial procura
va, pelo impulso de Ministros da têmpera de um Uruguai, Abrantes, Rio
Branco, geração de homens de Estado de que Cotegipe foi o último gran
de representante, solver nossas questões de fronteiras e assegurar nossa
natural hegemonia no Rio da Prata.
A aplicação de semelhante política implicava nossa hegemonia em
todo o Continente meridional, e o seu abandono só poderia coincidir com
o desprestígio e o consequente funesto abatimento do Brasil.
No prosseguimento dessa tarefa de estreitar os vínculos internacio
nais na América Meridional, assinara-se, com a vizinha República da Ve
nezuela, precisamente a 5 de maio de 1859, um solene tratado sôbre limi
tes e navegação dos Rios Amazonas e Orenoco.
O objetivo principal da missão confiada a capacidade e tirocínio de
Varnhagen era , porém , " promover a demarcação da fronteira entre os
dois países e, para complemento do tratado, celebrar o acórdo convenien
te à navegação fluvial, o qual ficara dependente de regulamentos fiscais
e de polícia Relatório do Ministro de Estado dos Negócios Estrangei
ros, Magalhães Taques, 1862 , página 3. Tendo, ademais, chegado a ajustes
com as Repúblicas limítrofes do Peru e Venezuela, pretendia, com boa
razão, o Governo Imperial, negociar também um tratado com a Repúbli
ca de Colômbia, então denominada Nova Granada, baseando-se no uti
possidetis e não indo mais adiante das questões que tinha a Espanha com
Portugal por esse lado da fronteira de seus domínios Relatório do Mi.
nistro de Estado dos Negócios Estrangeiros, Conselheiro Sá e Albuquer .
que, 1861 , página 15 .
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A notável paciência de Varnhagen em tudo quanto se relacionava


com a geografia histórica e colonial, exarada mesmo em algumas memó
rias sôbre nossas questões de limites Encontram -se inéditas, na valio
síssima Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro tornava - o singularmen
te apto para a tarefa de que fôra incumbido .
As negociações com a Venezuela foram , contudo, adiadas por circuns
tâncias imprevistas e alheias à sua boa vontade no desempenho da mis
são ; as com Nova Granada ( ou República da Colômbia ) , semelhantemen
te, não tiveram andamento, e, em 1864, já o encontramos residindo em
Lima e acreditado, simultaneamente, junto ao governo do Peru, Equador
e Chile.
Tinham surgido pouco antes algumas dificuldades com o governo de
Lima sôbre a aplicação da convenção fluvial de 22 de outubro de 1858,
resultantes da subida do Rio Amazonas por dois navios de guerra perua.
nos empregados também no transporte de mercadorias.
O incidente ficara resolvido com a justa interpretação de que em
semelhantes casos os navios de guerra se não prevaleceriam das suas imu
nidades, nem ficariam isentos das medidas . fiscais e de polícia , aplicáveis ,
com as devidas deferências nacionais, aos navios mercantes , aos quais,
de nacionalidade peruana, era, entretanto, desde logo franqueada a nave
gação do Amazonas, mesmo não estando ainda acordado o sistema de
polícia fluvial e de fiscalização previsto no ato internacional Relató
rio do Ministro de Estado dos Negócios Estrangeiros, Marquês de Abran
teş , 1864 .
A indiscriminada abertura do Amazonas aos pavilhões de todas as
nacionalidades , alcançada , mormente, pela admirável campanha na im
prensa , de Tavares Bastos , cujo saudoso nome vai aqui ser tão justamen
te glorificado, a breve trecho, simplificaria muito a natureza e reduziria
consideravelmente a importância destas questões, por tanto tempo salien
tes e insolúveis em nossas discussões internacionais.
Neste caso prendiam -se elas especialmente com o receio fundado e
nutrido pelo Governo Imperial de que as facilidades concedidas pela Re
pública do Peru ao comércio estrangeiro, dentro do seu próprio territó
rio, interferissem com a 'afirmação da soberania nacional no território
brasileiro por causa do trânsito nos rios que decorrem das regiões åndi
nas para o Atlântico .
Ainda conservava um resto de vitalidade a política dos tempos de
isolamento colonial .
As questões de facilidades comerciais na feroz região amazônica jun
taram -se para dar pasto à atividade diplomática de Varnhagen ao tempo
da sua residência efetiva em Lima, questões na fronteira e questões de
fronteira ; sem que, no entanto, se mostrasse aparentemente tão absor
vente o seu conjunto que o impedisse de ali publicar a sua primeira gran
de e notável defesa de Américo Vespuccio, conhecida entre os bibliógrafos
pelo Vespuccio de Lima, para diferençá - lo do de Viena, isto é, da ulterior
defesa mais detalhada e comprovada.
Quando mesmo, porém , ignorassemos as negociações melindrosas que
aqueles incidentes motivaram , se não poderiam inferior deste fato que a
vida oficial de Varnhagen no Peru fôra sem graves cuidados, porque, do
que se vê em sua vida, ele tinha o privilégio de interessar -se sempre pelos
seus queridos assuntos históricos em meio as maiores preocupações polí
ticas, e até distraia-se com o prazer de tais estudos a despeito das possí
veis contrariedades que os outros assuntos pudessem acarretar -lhe .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 43

No Chile, igualmente , o encontramos, por esse tempo, em plena ebuli


ção determinada pelo conflito desta República com a Espanha, publican
do à sua contribuição, mais tarde reeditada em alemão Viena, 1869,
para a fixação da verdadeira Guanaani de Colombo, memória apresentada
à Faculdade de Humanidades da Universidade de Santiago.
O conflito híspano -pacífico -americano daria ensejo a que Varnhagen,
de ordinário refratário a pôr -se diplomaticamente em evidência, estrito,
pôsto que não passivo cumpridor das instruções do seu Governo, se tor
nasse notável por uma comunicação oficial que honra o seu espírito de
justiça, confirma cabalmente a sua independência de caráter e lança viva
luz sôbre o seu extraordinário americanismo, mas que foi julgada pouco
oportuna, incorreta ou demasiado expansiva qualquer dêstes três têr
mos parece-me apropriado ao ponto de vista adotado pelo nosso circuns
pecto Ministério dos Negócios Estrangeiros.
A nota estava, é quase escusado dizer, concebida nos têrmos mais
cortezes : a linguagem diplomática dos nossos representantes fôra afeita
a zelar as tradições de polidez e timbrava em seguir os bons modelos.
O princípio ali contido é que não era consoante e destoava algo da política
imperial brasileira . O enviado do Governo de Washington , que veio ao
Rio de Janeiro com o único fito de saudar o Governo brasileiro por essa
manifestação de fervor americano, achou- se frente a frente com uma
reprovação dela, e teve de deglutir suas congratulações .
Consideremos em particular éste episódio, o mais interessante certa
mente da longa carreira de Varnhagen .
Acreditado, como já dissemos antertórmente, junto aos governos das
três vizinhas Repúblicas do Equador, Peru e Chile, o Ministro do Brasil
resolveu mudar sua residência para Santiago no momento em que o con
flito com a Espanha para ali se estendeu da sua primitiva sede . Fôra esta,
em Lima, sendo ocupadas e desocupadas pelas forças navais da nação eu
ropéia as ilhas de Chincha , sob o pretexto, tão extraordinário, que foi
desaprovado pelo Gabinete de Madri, de não haver ainda o Governo de
Sua Majestade Católica , solenemente reconhecido a independência do Peru.
O Governo Imperial declarou então que ofereceria, com prazer , a sua me
diação aos governos dissidentes, e por isto mesmo guardara rigorosa neu
tralidade, em suas próprias expressões, não indagando sequer de que lado
estava a justiça .
Depois do conflito com o Peru, serenado e diretamente ajustado entre
os dois países litigantes, surgiu, contudo, ó conflito com o Chile.
Varnhagen chegava a Valparaíso no momento mesmo em que, apre
sentado pelo almirante espanhol ao governo chileno um ultimatum , aca
bava o corpo diplomático de pôr todo o seu empenho em evitar hostili
dades e promover as necessárias negociações .
À sua chegada, comunicou - lhe o decano daquele corpo, o Ministro
norte-americano T: H. Nelson, as notas trocadas com aquela alta patente
espanhola Relatório do Ministro de Estado dos Negócios Estrangeiros ,
José Antônio Saraiva, 1866.
A resposta pela qual Varnhagen se associou ao pensamento dos seus
colegas, expresso em três notas coletivas, é que foi redigida em têrmos
que o nosso Governo entendeu não perfilhar, sendo esta espontânea desa
provação recebida e interpretada pelo Governo Espanhol como uma pro
va de não equívoca imparcialidade de certo advinhasse que esta frase
de cautelosa redundância é própria da prosa oficial.
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O nosso infatigável escritor e diplomata tinha qualidades negativas


em diplomacia : era um impulsivo com rompantes de colérico e que se dei
xava instigar por considerações de equidade e de pundonor.
Para êle a diplomacia não era a arte suprema de engulir desfeitas e
disfarçar desaires . Achava-se compatível com a franqueza e a honestidade.
Repugnava -lhe mentir, mesmo por conta de outros, e o que era justo não
via muito bem porque devesse ocultá -lo . Numa linguagem mais direta 'e .
portanto, mais tensa, condenou, como já os seus colegas de outras repre
sentações diplomáticas haviam condenado em têrmos mais emolientes,
porém , bastante expressivos, o proceder do almirante Pareja em não dar
cumprimento à letra das suas instruções, procurando um ajuste amigável
das dificuldades pendentes antes mesmo de chegar a um declarado rom
pimento .
Por interessante, tomemos conhecimento da seguinte carta, relacio
nada com o assunto :

Com os mais expressivos agradecimentos por essa atenta


remessa ( das Notas coletivas ) , devo, em resposta manifestar-lhe
que, se aqui me achasse, houvera eu tido a maior satisfação em
associar a minha firma à de meus nobres colegas nas ditas três
notas . E aproveito esta ocasião para acrescentar que, havendo re
solvido passar da residência do Peru à desta República, apenas mc
constou, por certas conversações havidas em Lima e nas águas de
Caláu, que chegaram ao meu conhecimento, que as questões entre o
Chile e a Espanha iam provavelmente a complicar -se, jamais con
cebi a possibilidade de uma rutura em tão poucos dias. Pelo contrá
rio, nunca pensei que semelhante rutura teria lugar antes de se
haver o comandante da esquadra de Sua Majestade Católica, feito
acreditar devidamente como plenipotenciário, por meio da apresen
tação da carta credencial autógrafa da S. A. Soberana, nem antes
de proceder de novo a discutir as antigas queixas, já que um de
creto e uma real ordem . haviam ante o mundo pôsto em dúvida o
bom critério do Ministro público que as havia suscitado, formulan
do reclamações exageradas até contra os meninos dos colégios : e
isto no momento em que todo o Chile se alarmava com razão ao ver
proclamados no território vizinho, direitos de reivindicação ; procla
mação que envolvia uma verdadeira ameaça de agressão, não moti
vada, à sua independência nacional , e que o Governo de Sua Majes
tade Católica não tardou em desaprovar.
Se, porém , cheguei tarde para me associar aos meus colegas no
seu nobre empenho em favor da paz e em defesa dos direitos da
civilização moderna, resta -me a esperança de que os nossos bons
ofícios, ou os dos nossos respectivos Governos, quer coletivos, quer
parciais, poderão ainda ser aproveitados logo que o Governo de Sua
Majestade Católica seja melhor informado, por juízes imparciais
e desprevenidos, de tudo quanto ocorreu, e chegue a reconhecer que
esta guerra , que por ora neste país mais prejudicial está sendo ao
comércio e súditos estrangeiros que aos próprios chilenos, decidi
dos, segundo vejo, a sustentar a todo o transe a sua honra e os
seus direitos, poderá vir a causar notáveis perdas e danos à con
siderável marinha mercante espanhola , não no Pacífico , mas nas
costas da Europa e nos mares das Antilhas.
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Assim o passo a informar mais minuciosamente ao meu Gover


no, que, aliás, conhece bem os meus sentimentos a respeito da mes
ma Espanha, onde residi onze anos, durante sete dos quais fui seu
representante em Madri, dando sempre patentes provas de intentos
conciliadores e benévolos e do mais sagrado respeito pela verdade
e pela justiça .
Tenho a honra, etc ..
( a) Francisco Adolfo de Varnhagen . ”

( Relatório do Ministro de Estado dos Negócios Estrangeiros,


José A. Saraiva, 1866, páginas 118 e 119 ) .

A referida tentativa dos representantes diplomáticos das nações neu


tras ficou frustrada, e bem assim uma segunda a que igualmente se asso
ciou a Legação Brasileira , propondo, depois de rôtas as hostilidades, a
negociação de um armisticio a fim de convencionar -se um possível arbi
tramento .
Não terei o mau gosto de escolher a ocasião não remota em que a
Espanha foi despojada dos restos ainda dourados do seu opulento patri
mônio colonial e para todo o sempre excluída das terras livres da jovem
América como nação soberana , para ensaiar novas variações sôbre o co
nhecido tema do bombardeio de Valparaíso.
Quis apenas, em complemento do elogio de Francisco Adolfo de Var
nhagen, recordar a sua atitude digna nessa ocasião, uma das que maior
interesse levantaram no nosso Continente, mesmo porque, na frase da
nota coletiva de 24 de setembro de 1865 ( anterior à chegada do Ministro
do Brasil ) , deu-se o caso novo em lei internacional de ser apresentado um
ultimatum antes de entaboladas quaisquer negociações como seria natu
ral e lógico.
Bastará acrescentar, para melhor compreensão dos fatos citados , que
a disposição do Governo Imperial, enxertando -se nas suspeitas levanta
das e propaladas com a declaração de guerra ao Paraguai, se viu habil
mente explorada pelos inúmeros adversários da nossa pátria, sendo o seu
sistema político culpado de nímia condescendência para com a monar
quia européia, em detrimento da solidariedade americana e do bom direi
to internacional.
Aumentada a nossa representação diplomática além dos Andes , ficou
Varnhagen exclusivamente acreditado no Peru , onde ainda o ocuparam
os oferecimentos de bons ofícios e depois os protestos dessa República
contra o tratado da Tríplice Aliança além das queixas motivadas pela
forma por que o Brasil cumpria a neutralidade da guerra sustentada
contra a Espanha, pelo Peru e pelo Chile .
Por seu turno teve Varnhagen de protestar energicamente contra as
simpatias menos discretamente testemunhadas em favor da República do
Paraguai pelo presidente do Peru .
Do bulício do Pacífico, a bem da literatura, foi o dinâmico e ardoro
so diplomata e ilustre historiografo destacado, em 1868, para Viena da
Áustria, em cujo país centro-europeu passou a substituir a Araujo Gon
dim , que pouco antes sucedera a Domingos de Magalhães,
As letras e a diplomacia faziam , naqueles velhos tempos, como pouco
mais tarde, muito bom consórcio, e da mesma forma apontamos para um
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Joaquim Nabuco e um Rio Branco , na representação exte :ior brasileira


de então, pois eram numerosíssimos os homens como Varuhagen, Pontes
Ribeiro, Joaquim Caetano da Silva, Azambuja, que se aproveitavam das
grandes facilidades oferecidas pelos cargos que exerciam para estudar,
in loco, nas próprias fontes, a nossa história e reivindicar nossos sagra
dos direitos territoriais.
Na Áustria as questões diplomáticas eram nulas, e Varnhagen pôde,
assim , empregar o melhor do seu tempo e o melhor dos seus titânicos es
forços, e os de últimos anos da sua proveitosa vida numa febril produ
ção puramente intelectual.
De Viena acham -se datadas muitas das suas contribuições para a
elucidação da cartografia medieval e da Renascença e da História dos
primeiros descobrimentos do Novo Mundo, que já sabemos quão respei
tado o tornaram entre os americanistas, não sendo possível escrever, hoje,
a respeito daqueles assuntos sem tomar em consideração suas apreciadas
observações, sempre valiosas, pela originalidade de que se revestem , pro
vindas sempre de pesquisas pessoais e não da utilização do trabalho de
outrem.
Em Viena preparou as segundas e mais completas edições das Lutas
' e da História Geral do Brasil, e o seguimento desta.
Extremeando o exame dos antigos globos e portulanos como com
pulsar contínuo e ininterrupto dos velhos cancioneiros, que na sua mo
cidade o haviam impressionado ao ponto de extorquirem do seu porten
toso talento pouco poético o romance histórico, em verso , por título Cara
muru, escrito em quadras de redondilha de seis sílabas, segundo o " Di.
cionário Bibliográfico Brasileiro ” .
Ainda na capital austríaca foram publicados o Cancioneirinho coli
gido do códice do Vaticano e os opúsculos sôbre a literatura dos livros de
cavalaria. Na mesma capital, finalmente, como se já não bastasse para
preenchimento de uma vida, tão grande sucessão de trabalhos, infeliz
mente é quase impossível organizar-se uma relação perfeita dos livros ,
folhetos e outras publicações de autoria de Varnhagen, tantos e tão va
riados são seus trabalhos, muitos editados avulsos e outros impressos em
jornais e revistas .
A lista mais completa que conheço encontra-se no Dicionário de Sa
cramento Blake, obra que em muitos pontos supre com vantagem e corri
ge a de Inocêncio, denotando da parte de seu autor muita consciência e
rara perseverança .
Dirigiu cuidadosamente a reprodução dos raríssimos trabalhos filo
lógicos do sábio Jesuíta Montoya “ Arte, Vocabulário y Tesoro de la
legua guarani ” ; entretanto, não devemos confundir esta reedição de Vie
na , do ano de 1876, com a que, no mesmo ano foi feita em Leipzig sob a
competente direção de Júlio Platzmann e sõbre a qual Ferdinand Denis
escreveu um dos seus últimos e lúcidos pareceres apresentados à Société
Américaine de France “ Témoin em quelque sorte des offorts rei
tèrès de ce dernier editeur pour arriver à une parfaite correction de tex
tes, nous aimons à rappeler ici qu'aucun soin, aucune démarche n'a
été épargnée par lui pour obtenir une pureté complète d'impression " -
Rapport, etc. , página 140 do Anuário de 1876 .
Eis como ele cooperava eficiente e desinteressadamente para o bom
renome da nação de que era filho e que representava, o Ministro do Bra
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sil, na Áustria, cuja cultura, sabedoria e benemerência , a tocante e dis


tinta atenção do magnânimo Monarca Sr. Dom Pedro de Alcantara, nos
so Segundo Imperador galardoára com o título de Barão e depois Viscon
de de Pôrto Seguro, assim comemorando o fato invulgar e fundamental
da história brasileira, a descoberta que acordou , para a vida civilizada, o
nosso formosíssimo e opulento país, naquele que, com tão profundo sa
ber e largo conhecimento, descreveu com particularíssima propriedade as
fases da sua evolução. Repito, é como homem de letras mais do que
como diplomata que Varnhagen será conspícuo para a posteridade e re
lembrado perenemente na sua pátria, da qual foi o historiador até hoje
sem rival.
Num discurso necrológico , pronunciado no Instituto Histórico e Geo
gráfico Brasileiro, dizia o Sr. Joaquim Nabuco do nosso ilustrado e eru
dito patrício, Sr. Pereira da Silva, que fôra um aperetivo para o estudo
da história : ao que acrescentava com malícia muito acadêmica o Sr. José
Veríssimo Dias de Matos que aperetivo sim, mas com a condição de não
se ir até o fundo do copo .
Prosseguindo estas comparações sugeridas pela gastronomia, pode
ríamos dizer que Varnhagen foi e continua a ser a peça de resistência da
nossa refeição histórica, o assado sólido , gordo, apetitoso na sua simpli
cidade, pois é cozido à velha moda portuguêsa, sem adubos nem temperos
franceses , com um môlho leal e nenhum acompanhamento.
Dessa peça, um artista menos escrupuloso ou mais destro corta uma
lasca , condimenta -a, guarnece- a de tubares e de cogumelos e apresenta
um novo prato, menos substancial , porém , grato ao paladar e falsamente
leve para o estômago .
O abuso de tais pratos, dizem , todavia , os médicos que predispõe à
gộta, a qual, para os diletantes do espírito se chama a impotência criadora.
Aquele que se alimenta de comidas nutrientes, mas singelas e sãs ,
tem mais probabilidades de resistir aos anos, com saúde, como resistiu
Varnhagen às inovações literárias, aos caprichos do estilo, ás variações da
forma, porque nele primava a preocupação do fundo, e porque resolvera
manter-se firme à sua concepção histórica, que era a indagação do ponto
verdadeiro, e obediente à sua norma literária, que procedia e primava
pela verificação da opinião aventada .
Revelai-me, ilustres senhores Membros da Comissão Julgadora , seme
lhantes comparações culinárias . Varnhagen me as perdoaria, estou con
vencido , ele era um excelente cozinheiro justamente por que era um con
sumado amador da boa mesa.
Sabemos ainda que, Varnhagen quando fatigado de redigir, nada lhe
assentava melhor para espairecer do trabalho, que bater um pudim ou
compor um pastelão.
Note- se que os seus pastelões não eram daqueles cuja concepção e
execução Mark Twain diz ser um escuro e sangrento mistério, mas produ
ções que Carême perfilharia.
Até neste gôsto aparece-nos ele como a encarnação de um intelectual
de passados tempos, porque nós , da atual geração, vivemos tão depressa ,
andamos tão entontecidos pela sucessão rápida dos acontecimentos e tão
ferretoados pela ambição de conservarmo-nos em dia com a evolução das
idéias e modo de sua expressão, que não temos mais tempos para tais
desenfados.
48 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL ,

Alexandre Dumas pai, que não foi acadêmico, porém , tinha em si:
pano para meia dúzia dêles, ainda podia afirmar que o " Dicionário de
Cozinha” que escreveu era o digno remate do seu milhar de volumes, e ,
chegada a ocasião, deleitava -se em pousar a pena para atar o avental :
branco e tentar a experiência das suas receitas .
Como imaginarmos um Paul Bourget ou um Pierre Loti, com tôdas
as suas preocupações psicológicas e perplexidades sentimentais, entre
gando -se a uma tão desanuviada tarefa ? Para se achar prazer nesta como:
em outras distrações manuais, não a exemplo dos gentil-homens france
ses do século findo que, por luxo ou simples vaidade aprendiam um ofício ,
mas meramente por desfastio, como o fazia Varnhagen, o qual, segundo.
parece, se dava a vários misteres, para os quais requerem -se uma alta
dose de satisfação profissional , perfeito desprendimento de esnobismo e
ausência de inquietação intelectual.
Todos estes predicados possuia o autor da " História Geral do Bra
sil ” ; era um orgulhoso, um simples e um forte.
Não o esqueçamos, nós, os da geração contemporânea, cuja vaidade.
nem sempre é contrapesada pelas duas outras qualidades.
Tão pouco devemos esquecer, agora, meus pacientes e ilustres Julga
dores que com tão louvável afã festejaremos, em 1950, precisamente qua-.
tro e meio séculos decorridos do descobrimento de nossa muito amada Pá-.
tria, quando, então , deveremos proceder a novo balanço do que temos .
realizado como contribuição para a história da humanidade, que foi , há
mais de um século, o digníssimo homem de letras cuja fisionomia moral
procurei relembrar e enaltecer neste ligeiro e dispretencioso esboço bio
gráfico, quem descobriu jubiloso e piedoso apontou à gratidão brasileira
o túmulo de Pedro Álvares Cabral, esquecido e já ignorado na Capela do .
vetusto Convento da Graça, de Santarém.
Como não bateria apressado o coração de Varnhagen decifrando na :
lousa gasta pelo perpassar de gerações de crentes, o singelíssimo epitáfio
do ilustre almirante e navegador lusitano à cuja vista atônita primeiro se
desvendaram as opulências inimagináveis da Terra de Santa Cruz, e agora
dorme o último sono na Terra que Almeida Garret chamou " pátria dos
rouxinóis e das madressilvas, cinta de faias belas e de loureiros viçosos ” .
Recordando com o poeta “ que não parece senão que a paz, a saúde, o
sossêgo do espírito e o repouso do coração devem viver ali, reinar ali um:
reinado de amor e benevolência ” – Viagens na minha Terra, volume Is
é para consolar que a ação terrivelmente niveladora da morte haja con
fundido as ossadas do navegador insigne e de pessoas da sua ilustre famí
lia ; pois que de outro modo, apesar de ser quase uma impiedade, não po $
deria resistir a exprimir o voto que me acudiria aos lábios neste momen
to, de que, algum dia , quando formos verdadeiramente grandes, valoro
sos, tolerantes e bons, os restos de Pedro Álvares Cabral sejam conduzio
dos às plagas de Santa Cruz a exemplo da nova peregrinação além do
Atlântico, como o foi a transladação , reclamada pela voz de um nosso
patrício ilustre que foi ardoroso propagandista da República , do corpo do
Monarca Magnânimo que tanto presou as coisas do espírito e a nação .
que governou, e do da sua santa companheira de trono, modelo de tôdas.
as virtudes
Menos do que em Santarém, o nobre coração de Varnhagen, não exul
ta neste instante o meu coração, com poder associar o nome do descobri;
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 49

dor ao do historiador do Brasil, cuja memória deve ser particularmente


cara aos que respigam no mesmo campo, e a cuja ' vida honrada e tão
exclusivamente proveitosa, me coube, neste feliz ensejo prestar o tributo
que ele consideraria, posso jurar, a sua melhor recompensa porque lendo-o
e analisando-o o julgará uma das mais cultas,provectas e escolhidas Co
missões que honra a inteligência do Estado bandeirante, Comissão que
é constituída da fina flor da inteligência paulista !
Celebrando por essa forma sua memória, faço mais do que instinti
ramente recorrer a um modelo, traduzo uma saudosa impressão da pri
meira mocidade, além de prestar uma das mais merecidas homenagens
que reclamam os fundadores do nosso patrimônio intelectual.
1
25 DE JANEIRO

TITO LÍVIO FERREIRA


( Do Instituto Histórico e Geográfico
de São Paulo )

Há cinquenta anos precisos, no fim do século passado, comemorava


São Paulo, pela sua elite intelectual de então, a personalidade marcante
de José de Anchieta, o primeiro mestre-escola de Piratininga. Dêsses fes
tejos espirituais dizia Machado de Assiz, romancista imortal e fundador
da Academia Brasileira de Letras, em crônica do tempo : " Emquanto eu
cuido da semana, São Paulo cuida dos séculos, que é mais alguma coisa.
Comemora -se ali a figura de José de Anchieta, tendo já havido três dis
cursos, dois dos quais foram impressos, e, em boa hora impressos ; hon
ram os nomes de Eduardo Prado e de Basílio de Magalhães, que honra
ram por sua palavra elevada e forte ao pobre e grande missionário je
suíta. A comemoração parece que continua. () frade merece-a de sobra.
A crônica dera-lhe as suas páginas. Um poeta de viva imaginação e gran
de estro, o autor do “ Cântico do Calvário ”, pegou um dia da figura dele
e meteu - a num poema. Agora é a apoteose da palavra e da crítica (1 ) .
Assim, com essas expressões compassadas o autor de “ Dom Casmurro '
anota e comenta o extraordinário acontecimento ocorrido em fins do sécu
lo passado, na provinciana cidadezinha de São Paulo , cuja população
não ia além de cerca de 100.000 habitantes . Machado de Assiz fala das
conferências anchietanas, tão importantes e tão famosas na vida cultural
dessa época. E ressalta-lhes o valor espiritual, por terem sido a " apoteo
se da palavra e da crítica ”.
Pouco adiante, nessa mesma crônica, o mestre ímpar da literatura
brasileira observa : “ Uma feição caracteriza essas homenagens, é a neu
tralidade. Ao pé de monarquistas há republicanos, e à frente dêstes vi
mos agora o presidente do Estado. Dizem que este soltara algumas pala
vras de entusiasmo paulista, por ocasião da última conferência ":
Refere -se, o autor de “ O Memorial de Aires ” , ao entusiasmo paulis
ta. Não podia ser mais feliz o emprêgo desse adjetivo, junto de tão belo
substantivo .
Quais foram as palavras do governador paulista de então ? Machado
de Assiz não as reproduz. Nem por isso deixa de salientar-lhes o senti
mento cívico e o aspecto sociológico. E assinala, com inteligência e com
preensão, as características paulistas.
1) Conferência no Teatro Municipal de São Paulo, em 25-1-1949.
52 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Assim o grande escritor registra, mesmo de longe, os fatos dêsse


tempo, que nos tocam tão de perto , para acentuar -lhes os aspectos inte
ressantes. Daí, como observador esclarecido ei-lo a comentar : “ De fato,
uma terra em que as opiniões do dia podem apertar as mãos por cima de
uma grande memória é digna e capaz de olhar para o futuro, como o é
de olhar para o passado. A faculdade de ver alto e longe não é comum ”;
declara Machado de Assiz . O elogio nos sensibiliza a nós Paulistas, cujo
passado comum constitui, no presente, motivo de confiança no futuro de
nossa terra e nosso povo. Gente de opinião, gente de idéias, gente de
princípios , nem por isso deixamos de ver claro no momento preciso. E
por isso o psicólogo admirável de “ Quincas Borba " em duas palavras re
vela, com acuidade, os traços fundamentais da gente bandeirante, que é
o entusiasmo paulista.
Mas, proferido o julgamento, com serenidade e confiança, Machado
de Assiz continua : “ É doce contemplar de novo uma grande figura. Aque
le jesuíta, companheiro de Manuel da Nóbrega e Leonardo Nunes , está
preso indissoluvelmente à história destas partes . A imaginação gosta de
vê-lo, a séculos de distância, escrevendo na areia os versos do poema da
Virgem Maria, por um voto de castidade, e confiando-os um a um à im
pressão da memória. É preciso remontar às cabeceiras de nossa história
para ver bem que nenhum prêmio imediato e terreno se oferecia àquele
homem e seus companheiros. Cuidavam só de espalhar a palavra cristã e
civilizar os bárbaros; para isso era tudo Anchieta, além de missionário ”.
Por essa forma o autor de “ Memórias Póstumas de Brás Cubas ” as
sinalava , há meio século, o grande acontecimento cultural ocorrido em
nossa cidade. Engana -se ele apenas quando escreve : “ Ò frade merece - a
de sobra ”. Quem a merece de sobra é o jesuíta. Porque o Irmão Anchie
ta, primeiro mestre- escola do Colégio de São Paulo, só mais tarde, cerca
de 1567, quando o Padre Manuel da Nóbrega fundou o colégio do Rio de
Janeiro, veio a ordenar- se sacerdote, no colégio dos Jesuítas , na Bahia.
Motivaram a página do escritor carioca, as comemorações a anchie
tanas, realizadas há cinquenta anos, por iniciativa de Eduardo Prado.
Nela o cronista recorda conforme suas próprias palavras, Anchieta,
" aquele jesuíta , companheiro de Manuel da Nóbrega ”. Para reviver essa
vida extraordinária , para reavivar - lhe as ações piedosas, para referir-lhe
os feitos memoráveis da catequese do brasilíndio, reuniram -se então os
intelectuais paulistas, ao apêlo de Eduardo Prado. Homenagearam o pri
meiro mestre -escola do Colégio de São Paulo . Exaltaram -lhe a figura mis
sioneira. Coroaram - lhe a fronte de um halo de glória. Esqueceram -se , no
entanto , da personalidade vigorosa do Padre Manuel da Nóbrega, o Pro
vincial da Companhia de Jesus, o fundador do Colégio e da cidade de
São Paulo, o primeiro estadista colonial , a quem a civilização brasileira
tanto deve e cuja dívida de gratidão ainda está aberta na consciência de
todos os Brasileiros. Mesmo relegado à penumbra do esquecimento, o Pa
dre Manuel da Nóbrega, fundador de São Paulo, compartilharia das ho
menagens prestadas ao seu companheiro de lutas , de renúncias e sofri
mentos. Bem as mereceu e as merece o companheiro devotado e fiel de
Manuel da Nóbrega. Ambos viveram entre São Paulo e Rio a dividir, fra
ternalmente , o pão do sacrifício onde o sal da terra punha às vezes a
gôsto consolador da amargura . E ambos trabalharam , por dilatados anos,
para “ aquela célebre e pequenina casa , mandada fazer por Nóbrega em
1553 e inaugurada em 25 de janeiro de 1554 " ( 2 ), segundo refere Pa.
dre Serafim Leite .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 53

Ao fundar a Casa de São Paulo, Manuel da Nóbrega lança os alicer


ces da futura cidade a cuja ilharga se acolheriam , para defendê-la, am
pará -la e sustentá -la, João Ramalho, o Patriarca dos Bandeirante e sua
gente de Santo André da Borda do Campo. E a ele, João Ramalho cabe
ria a glória de levantar, ao redor da vila nobreguense, os muros de defe
sa , como se ela fôsse um burgo da Idade Média erguido na aurora da Re
nascença em pleno planalto paulista.
Sim, fôra o Padre Manuel da Nóbrega, o fundador de São Paulo.
Escolhera ele o local para o levantamento do Colégio dos Jesuítas, quan.
do com o filho mais velho de João Ramalho, o primeiro paulista, percorria
os campos de Piratininga, no verão de 1553. Nóbrega entreparara no alto
da colina banhada pelas águas sobrantes do Anhangabaú e Tamanduateí,
onde situa a soleira do sertão aberto diante de seus olhares inquietos e
indagadores. Logo ao seu aceno, ao seu gesto , os guaianases levantam a
capela primitiva, de pau -a - pique, e folhas de palmeiras são escolhidas
para fazer -lhe a cobertura. Por incumbência do Padre Manuel na Nóbrega,
a 25 de janeiro de 1554, o Padre Manuel de Paiva reza ali a primeira
missa, assistida pelos Brasilíndios do planalto. Desse começo fala o Pa
dre Serafim Leite, com estas palavras : “ O princípio fôra diferente e hu
milde como todas as coisas grandes. Mas tal como foi, é hoje o orgulho de
São Paulo, porque é a sua própria origem a mais bela do mundo. Nem
sabemos se há outra cidade com origem semelhante. Poderia ter sido in
tento de escravização ou violência ; poderia ter sido o da cobiça , ou cál
culo mercantil ; poderia ter sido qualquer ato de expressão ignorada, como
foi a origem de tantas outras. São Paulo foi uma escola, ato liberado de
expansão moral e intelectual , com o fim prático de formar homens que
pudessem substituir os da Europa no Brasil que amanhecia.
O seu fundador, continua o Padre Serafim Leite, homem de cultura
e homem de administração, estudara em duas das mais célebres Universi
dades da Europa, Coimbra e Salamanca ; e era também o admirável polí
tico e administrador que com Tomé de Sousa e Mem de Sá lançara as
bases unificadoras do Brasil. Essa dupla qualidade, que Nóbrega reunia
em si a desdobrou em dois, quando mandou inaugurar a Casa de São
Paulo ; a administração superior confiou -a ao Padre Manuel de Paiva e o
ensino a um jovem canarino, aluno de Coimbra, o Irmão José de An
chieta ” ( 3) .

Assim , esta nossa cidade de São Paulo nasceu numa escola. Fatn
único, fato ímpar na história do mundo, onde as maiores cidades surgi
ram à beira de uma estrada, na confluência ou à margem de um rio, num
acantonamento militar, ou num pouso perdido no descampado. Nessa es
cola de São Paulo, tempo adiante, andou Pedro Taques , o nosso linhagis
ta-mor, na sua infância. Conheceu ali o gosto dos estudos genealógicos e
históricos, através da latinidade e das letras humanas. E muitos, muitos
outros frequentaram o Pátio do Colégio, estudaram nas aulas dos jesuítas
para ocuparem , mais tarde, o lugar dos homens da Europa, no Brasil que
ia alvorecendo.
Presente à inauguração do Colégio de São Paulo, nessa remota ma
nhã de 25 de janeiro de 1554, Padre Manuel da Nóbrega, o fundador da
cidade, continuou a dirigir - lhe os destinos, a partilhar a sua atividade en
tre os colégios de São Vicente e de São Paulo, assistir os primeiros passos
54 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

da Vila de Piratininga. Por esse tempo já os franceses do Rio de Janeiro


lançavam os tamoios confederados contra a obra de catequese dos jesuí
tas, contra a civilização portuguêsa no planalto , contra o abrasileiramen
to do brasileiro, com o propósito de destruí-la para sempre. Assim assal
tavam as povoações de Itanhaen, de São Vicente e Santos. Rondavam a
Vila de Santo André da Borda do Campo, a primeira vila do planalto,
com a sua Câmara Municipal em funcionmento , desde abril de 1553. Ins
trumentos cegos dos franceses de Villegaignon, os tamoios matavam o
gado, arrazavam as plantações e roubavam as mulheres dos colonizado
res. Eliminavam os portuguêses e poupavam as portuguêsas, fiéis aos
princípios seculares, até hoje existentes nas tribos dos sertões brasileiros,
e resumidos no seguinte: salvar o elemento feminino e destruir o adver
sário masculino. Assim eles já ameaçavam, com suas correrias pela vár
zea de Tamanduateí e Anhangabaú, a colina onde o humilde colégio dos
Jesuítas estava defendido apenas pelos guaianases de Tibiriçá, postados,
como sentinelas avançada, no atual Largo de São Bento e na Ladeira do
Carmo.
Manuel da Nóbrega planeja dividir os tamoios, para anular as inves
tidas preparadas pelos franceses do Rio de Janeiro . Com João Ramalho
e Mem de Sá combina a mudança da sede do município de Santo André
da Borda do Campo e da gente ramalhense, para junto do Colégio de São
Paulo. Em 1560 opera -se a mudança. O Patriarca dos Bandeirantes man
da erguer ao redor da vila os muros defensivos e prepara o seu exército
composto de guaianases e portuguêses para inutilizar o assalto dos adver
sários . Quando este se realiza , João Ramalho, nomeado capitão -defensor
da Vila de São Paulo, repele com o auxílio de seu sogro , o bravo Tibiriçá ,
o ataque dos inimigos. Depois de três dias de luta, começada a 9 de julho
de 1562, os adversários de São Paulo foram vencidos e derrotados. João
Ramalho, primo de Manuel de Paiva, o celebrante da primeira missa no
planalto, a 25 de janeiro de 1554, com Tibiriçá, evitam a destruição da
cidade nascente, reduto da ação espiritual da catequese e da civilização
portuguêsa, nos campos de Piratininga.
Pouco depois , Manuel da Nóbrega celebra, na companhia de José de
Anchieta, 0 Armisticio de Iperoig, isto é, o primeiro tratado de paz entre
portuguêses e brasilíndios, nas terras americanas. Mais tarde Nóbrega
leva Mem de Sá a expulsar os franceses da baía de Guanabara, auxilia
na fundação da cidade do Rio de Janeiro e ergue o colégio dos Jesuítas
no Morro do Castelo, hoje desaparecido. Estava, por essa forma, comple
tada a obra grandiosa do grande estadista colonial . Estavam lançados os
alicerces da unidade nacional. Para isso o fundador de São Paulo sacrifi
cara a sua existência. Viera para a Terra de Santa Cruz, quando esta
amanhecia, com cerca de trinta anos de idade. Falecia vinte anos depois,
em plena maturidade de sua obra grandiosa . Aos cinquenta anos de vida.
Estavam lançados os alicerces da unidade brasileira. Para isso o funda
dor de São Paulo fizera a transferência da Câmara Municipal de Santo
André da Borda do Campo e da sua população, para junto do Colégio de
São Paulo, providenciara, com João Ramalho e Tibiriçá a defesa da vila
nobreguense, celebrara o Armisticio de Iperoig e fundara o colégio do
Rio de Janeiro . Por isso mesmo o insuspeito escritor inglês e protestante,
Robert Southey em sua magnífica História do Brasil, ao referir-se à obra
de Manuel da Nóbrega diz : " Ninguém há a cujos talentos deva o Brasil
tantos e tão permanentes serviços " ,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 55

Razão tinha Machado de Assiz, há cinquenta anos atrás, em lembrar


Manuel da Nóbrega esquecido pelos promotores das conferências anchie
tanas. Daí Capistrano de Abreu, mestre da heurística brasileira, asseve
rar : “ Quanto mais estudo Anchieta, mais admiro Nóbrega.” .
Admiremos a ambos, sem esquecê -los, sem colocá-los em planos dife
rentes. Porque se Manuel da Nóbrega foi o fundador da cidade de São
Paulo, José de Anchieta foi o mestre- escola número um do Pátio do Co
légio. E os dois deram, esta nobre e leal metrópole, a glória ímpar de ter
nascido numa escola, sob o signo do espírito, da cultura e da fé católica.
Por isso mesmo, numa estrela de cinco pontas poderíamos dispor as
figuras históricas dessa manhã remota de 25 de janeiro de 1554, quando
São Paulo amanheceu para a civilização européia e para a glória da cris
tandade. Assim, no vértice, ao alto, Padre Manuel da Nóbrega, o funda
dor ; no vértice direito, Padre Manuel de Paiva, celebrante da missa de
25 de janeiro ; no vértice esquerdo , Irmão José de Anchieta, primeiro
mestre -escola de Piratininga ; no vértice inferior, direito, João Ramalho,
Patriarca dos Bandeirantes, primeiro chefe civil do Planalto, e no vértice
inferior esquedo, Tibiriçá, chefe dos guaianases, os brasilíndios dos Cam
pos de Piratininga.
Assim com esses homens a guia-lo, a dirigí-lo a ampará -lo a defen
dê-lo, São Paulo menino e moço alcançou os fins do século dezesseis . No.
declinar dessa época e no começo de mil e seiscentos, os paulistas resol
vem deixar as muralhas da vila, donde viam, de quando em quando, 4
chegada ruidosa dos adversários, cujos ataques deviam repelir para longe.
Durante meio século êles se viram cercados pelos assaltos dos inimigos.
Cansado de batê-los e abatê-los nos arredores da vila, resolveram caçá-los
no interior das selvas, na solidão imensa das florestas , nos sertões ainda
virgens da terra brasileira. Durante dois séculos os Bandeirantes reali
zam a obra imortal de devassar tôdas as zonas sertanejas, através de va
les e montanhas, chapadões e taboleiros. Do cíclo da caça ao brasilíndio,
passam ao ciclo do gado, do ciclo do gado passam ao ciclo do ouro , do
cíclo do ouro passam ao cíclo do café. E nesses dois séculos de alargamen
to do território, incorporam ao Brasil cerca de seis milhões e duzentos mil
quilômetros quadrados de terras, que reunidos aos dois milhões e trezen
tos mil quilômetros quadrados situados entre a Linha de Tordezilhas e o
Atlântico , perfazem os oito milhões e quinhentos mil quilômetros qua
drados do território brasileiro.
Mas durante esses duzentos e cinquenta anos de existência, a Vila
de São Paulo conservou -se entre os banhados do Anhangabaú e a várzea
do Tamanduateí. Daí o aspecto primitivo e apagado da cidade, fundada
havia dois séculos e meio. Em fins de 17100 e começos de 1800, cochila
sob a garoa fria e fina. Passa os dias e as noites arripiada sob o capuz
de névoa compacta a envolver-lhe o casario antigo e os arredores cober
tos de mato. Deixa escapar o tempo, indiferente ao escorregar dos acon
tecimentos vazios , cujas horas cinzentas ligam o então presente indeciso
ao passado e ao futuro. Vencera crises econômicas terríveis ; sentira os
efeitos da ausência de seus moradores andejantes e fascinados pelo mis
tério envolvente das florestas e dos rios perdidos nas solidões selvagens.
Amargara -lhe a sede do ouro mosqueado pelo sangue das lutas nas mi
nas gerais. E vira a economia da terra golpeada pelo decrescimento da
população em marcha contínua para outras paragens onde lhe acenava &
esperança da riqueza e da fartura.
56 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Tempo adiante a situação do planalto vai se agravando . Definham ,


anemiados, o comércio, a indústria, a pecuária e a lavoura. Escasseia a
moeda circulante. E como a importação míngua, por sua vez também a
exportação quase desaparece.
No soerguer do século dezoito a Capitania de São Paulo fôra rude
mente golpeada em seu território . Primeiro desmembra -se, do território
paulista, à Capitania de Minas Gerais. Depois separam -se a de Mato
Grosso e a de Goiás. Perde a jurisdição do sul até o estuário do Rio da
Prata. Apenas o Paraná ficou até um século atrás integrado em territó
rio paulista. Em meados de 1700 São Paulo perde a própria independên
cia, para tornar -se, durante dezessete anos, simples comarca da Capitania
do Rio de Janeiro . Derramados pelos sertões de Mato Grosso, Minas Ge
rais, Goiás, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, para o norte
da Bahia, para cima até o Amazonas e por tôda a região nordestina, os
paulistas não mais regressavam ao planalto. Voltavam as costas e para
sempre ao trato do chão onde haviam nascido. Alongados por outros hori
zontes, fundavam cidades nas regiões sertanejas do Brasil, onde eles
abriam currais de gado ou construiam engenhos. E atraídos pela fascina
ção do ouro partiam , todos os anos, desta cidade, levas de homens para
os terrenos das lavras.
Em meados de 1700 ei-los perdidos nos rincões mais remotos da
terra brasileira. Assim os desbravadores dos sertões pátrios, os pioneiros
das descobertas do ouro , os povoadores de gado do centro , do norte, do
nordeste, do oeste e do sul, os sertanistas fundadores de cidades em todos
os pontos do território nacional, dormiam para sempre debaixo do solo
rastreado por eles nas jornadas imortais, por todos os quadrantes do con
tinente. E no cair do século dezoito , a Capitania de São Paulo era for
mada por esta cidade nobreguense, Conceição de Itanhaen, Santos, Soro
caba, São Vicente, Itu, Taubaté, Mogi das Cruzes e Parnaíba.
Restabelecida a governança da Capitania , pelo Marquês de Pombal,
já no derradeiro quartel do século dezoito, ela ainda se acha em " mise
rável estado " econômico e social, segundo a carta de Francisco Xavier
de Mendonça Furtado ao Conde da Cunha. De tal forma empobrecera a
Capitania de São Paulo, que certo Capitão -General não hesitou em de
nominá-la : “ Uma formosa sem dote " . Sem dote e sem pretendentes. E
nem mesmo havia quem quizesse noivar a outrora rica donatária de Mar
tim Afonso de Sousa, por não haver quem a desejasse.
Em meados do século passado a cidade de São Paulo ainda continua
cochilante entre os charcos do Anhangabaú e a várzea do Tamanduateí.
A vida, a ambição, o interesse jogaram os paulistas desta velha cidade
para outros pontos do país, onde se estabeleceram. Agiram sob o impera
tivo das fôrças criadoras de riqueza e da função econômico-social do Ban.
deirismo. Os homens que aqui permaneceram , ficaram pacientando. Não
se imobilizam na contemplação do passado. E enquanto a cidadezinha de
Manuel da Nóbrega espera, esquecida e cansada, o refluir dos descen
dentes de seus filhos, que haviam irradiado por todos cantos do Brasil, os
paulistas do segundo reinado entreabrem o cíclo do café, cujas culturas
começam a surgir no vale do Paraíba e no interior do planalto.
Estava terminado, havia mais de meio século , o primeiro e mais im
portante período da história colonial paulista, onde se inscreveram, por
mais de duzentos anos, os três grandes ciclos econômicos dêsse tempo : 0
do brasilíndio, o do gado e do ouro . Passaram as famosas gerações dos
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 57

intrépidos " calções de couro " empenhados na grandiosa aventura de


dilatar as fronteiras nacionais, de povoar os sertões brasileiros, de fundar
cidades nos pontos mais distantes desta cidade de Manuel da Nóbrega e
José de Anchieta, de onde pas ram em manhãs cheias de sol, abençoa
dos pelas esperanças divinas e pelos augúrios humanos. E nessas colunas
formadas pelos Bandeirantes paulistas avultam as figuras de Antônio
Raposo Tavares, o rei do Bandeirismo, que Tietê abaixo, rumo ao Oeste,
atravessou o território de Mato Grosso, passou além dos Andes, fêz o
percurso do Amazonas até a ilha de Marajó, subiu o Tocantins e o Ara
guaia, para regressar à sua fazenda em Quitaúna, hoje Caxias, donde
saiu para o sul, muitas vezes jornadeou até as coxilas gauchas e ainda
levou aos Pernambucanos reforços panlistas para auxiliar a expulsão dos
holandeses do nordeste brasileiro ; de Francisco Pedroso Xavier que inva
diu o Paraguai e de lá trouxe ricos despojos; de Domingos de Brito Pei
xoto, fundador de Laguna e Lages em Santa Catarina e de Viamão junto
a Porto Alegre e explorador das campinas do sul até o estuário do Rio
da Prata; de Domingos Jorge Velho, o destruidor do quilombo de Palma
res e povoador dos sertões de Alagoas, Pernambuco , Paraíba, Rio Gran
de do Norte, Ceará, Piauí e Maranhão ; de Fernão Dias Pais, o caçador
de esmeraldas e descobridor das riquezas auríferas de Minas Gerais, esse
de quem Olavo Bilac disse, ao traçar uma epopéia -mirim :

“ Violador de sertões, plantador de cidades,


Dentro do coração da pátria viverás " ;

de Pascoal Moreira Cabral, fundador de Cuaiabá e descobridor do Mato


Grosso; de Bartolomeu Bueno da Silva, o Anhanguera, fundador de Goiás
e explorador dos vales do Araguaia e do Tocantins; de Manuel da Borba
Gato, o Tenente-General dos descobertos das Minas Gerais e fundador de
Sabará ; de Antônio Dias e Padre Fialho, fundadores de Ouro Preto , e de
tantos outros devassadores, povoadores civilizadores da Terra de Santa
Cruz. E a descendência dessa “ Raça de Gigantes ” , conforme a denomina
ção que lhe deu Saint-Hilaire, o grande naturalista francês, pacientava
nas longas tardes do Pátio do Colégio e dos antigos Largos da Sé, de
São Bento, do Carmo e de São Francisco, enquanto, no dizer de Bilac,

“ Via lenta subir do fundo do horizonte,


A clara procissão dessas bandeiras de ouro.”

Mas enquanto resistem, no tempo e no espaço, as forças velhas da


cidade trissecular, à espera da transfusão do sangue novo, destinado a
reavivar-lhe as funções biológicas e eugênicas, a população meio anemia
da, espia, longamente, a tarde, a envolver as ruas desertas de São Paulo.
Nos sobradões antigos, ou nas casas térreas de longos beirais a cobrir as
calçadas rústicas, feitas de lages, chamadas pé de moleque, o barulho vai
sossegando. Divisam-se ainda, nas paredes de taipa, escudos e brazões
senhoriais meio apagados pela ação silenciosa do tempo. Candieiros de
azeite de peixe iluminam , escassamente, as noites de garoa e de cerração,
para acenderem esperanças nos oratórios reintrantes nas paredes ou sa
lientes nas esquinas. Recortam- se no espaço as torres vigilantes das igre
jas coloniais, cobertas pelas cinzas de três séculos. Alteiam-se as velhas
cruzes de ferro. Os sinos fatigados começam a murmurar por cima dos
58 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

telhados de duas águas. Essas vozes graves partem da Igreja do Colégio


para a de São Bento, de São Bento para a de Santo Antônio, de Santo
Antônio para a de São Francisco, de São Francisco para a do Carmo, do
Carmo para a da Sé, da Sé para a do Colégio, de torre em torre, dialo
gando . Madrugaram os velhos sinos paulistanos, na voz pausada e grave
dos antigos Bandeirantes. Vibraram , tempo a fora, pela Fé e pela Cristan
dade e pelos homens da cidade de São Paulo que iam morrendo pelo Bra
sil que ia nascendo para a manhã civilizadora das Américas. Ressoam
agora, um século depois, quando a cidade de Nóbrega e de Anchieta re
nascida , remoçada, aformoseada e saneada pela higiene e pelo progres
so, já não é mais a formosa sem dote, mas a formosa com dotes e preten
dentes sobejantes. E ressoam agora , mais alto ainda, em conjunto, no
mesmo tom de voz pausado e grave dos antigos paulistas, a dirigir aos
paulistas de hoje e de amanhã, o mesmo apêlo de todos os tempos e de
todos os séculos, para manterem , vivo e irradiante, esse espírito de solida
riedade humana , cujo sentido social, econômico e democrático foi bem
sentido e melhor executado pela ação incisiva de nossos ancestrais, os
Bandeirantes de São Paulo quando viveram , com sua vida, paixão e mor
te, a “ Gesta: Paulistorum per Brasiltam ” , nesse movimento magnífico ,
civilizador por excelência, espalhado por todo o chão da unidade nacional
e aberto em alto relêvo no surpreendente mural da História do Brasil ,
em cujas páginas se alteia a história de nossa terra e nossa gente.

1) Machado de Assiz A SEMANA .


2) Padre Serafim Leite HISTÓRIA DA COMPANHIA DE JESUS
NO BRASIL .
SAMPAIO FERRAZ

(Antigo Promotor Público e Chefe de Polícia do Rio de Janeiro )

DO DELITO, CÓDIGO PENAL E A ORGANIZAÇÃO


POLICIAL NA INGLATERRA

INTROITO DO RELATÓRIO APRESENTADO AO


GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO

SOMULA BIOGRAFICA POR AMADEU AMARAL, MONTEIRO


LOBATO , AFRÅNIO PELXOTO , AFFONSO DE E. TAUNAY E
MARIO DE SAMPAIO FERRAZ .

1
i
SAMPAIO FERRAZ
-

}
DUAS PALAVRAS

Neste instante deixo, comovido, o meu fone. Avisa-me Afonso de


Taunay que arranjara nesta conceituada revista municipal, um bom lugar
para publicar o " Introito ” do relatório que meu saudoso Pai escrevera,
em Londres, sôbre o regímen penal e a polícia inglêsa . Desacostumado a
tais gentilezas , exultei. O trabalho já fôra aproveitado, na parte técnica ,
mas a Introdução fôra condenada a pena máxima ... Amigos velhos que
anos atrás passaram pela Segurança e Polícia — Pinheiro Prado , Virgi
lio Nascimento, Artur Rudge, A. Campos Sales, Ciro Costa e outros, já me
haviam falado a respeito . Um dia , afinal, recebi o " Introito ” das mãos
de Ciro Costa , que me disse : - " Olha, Mário , aqui está o bichão , e agora
trate de segurá-lo para publicar, como tanto merece. Teu pai , acrescen
tou, que tive a grande ventura de conhecer, era homem verdadeiramente
excepcional, e foi, no Rio, um formidável Chefe de Polícia. Aqui , nessas
páginas que lhe entrego, é a grande alma bandeirante que escreve e se
comove diante da Inglaterra sem códigos , sem regulamentos, mas plena,
sábia, com toda a justiça, com todo direito, encravados na própria cons
ciência ! Que pode haver de mais humano e de mais belo ?
Há dias mostrei-o em casa a um querido amigo, de quem me orgulho
de ser parente próximo Afonso de Taunay brasileiro ilustre, caráter
cristalino, da melhor rocha, e agora considerado, por recente escrutinio
cultural norte-americano, um dos dez maiores historiadores do mundo . Leu
algumas páginas, pegou-me pelo braço e exclamou : Vamos ressuscitá-lo .
Não contendo o ímpeto sentimental , aqui rebentou às portas da Prefei
tura de São Paulo, onde encontramos o espírito brilhante e cavalheiresco
de Nuto Sant'Ana, á cuja acolhida rendo neste momento imorredouro
preito. Ampliando o " beau geste ", a revista transcreverá a súmula bio
gráfica há tempos lançada parcialmente pelo meu querido primo Amadeu
Amaral, e logo a seguir pelos saudosíssimos Monteiro Lobato e Afrânio
Peixoto, que a encaixaram na resenha da “ Revista do Brasil ” de abril
de 1921.
64 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Há cincoenta anos, portanto, eu via meu grande e saudoso Pai varar,


diàriamente, o denso “ fog " de Londres. Moço, sacudido, nos seus trinta
poucos, ele topava, firme e " sharp ” , os olhos acêsos dos “coroners”
da Great Scotland Yard. Hoje, nas vésperas dos meus setenta, aqui esta
mos, nas margens do Tietê, bons paulistas, bons brasileiros, para recor
darmos essa figura varonil, bandeirante inteiro, sem quebrados, sem que
brantos, que se chamou João Baptista de Sampaio Ferraz, " o vencedor
dos capoeiras ” .
MÁRIO DE SAMPAIO FERRAZ
PARTE I
i

APANHADO GENEALÓGICO

Sampaio Ferraz nasceu em Campinas no ano de 1856, na fazenda de


Santa Maria . Era filho de Joaquim Bueno de Sampaio Góes, o “ Quito -
Sampaio ", como era conhecido e assim figura na obra genealógica de Sil
va Leme. Homem dotado de excepcional energia , foi membro da Conven
ção de Itú, em 1873, e possue no Museu Histórico dessa cidade um gran ..
de retrato a óleo, mandado colocar pelo então diretor Affonso de Taunay.
Foram avós de Sampaio Ferraz o professor Mendes Ferraz e D. Maximia
na Adelaide Ribeiro de Castro Camargo , filha do Capitão -Mor Miguel Ri-
beiro de Camargo, que era casado com D. Querubina Rosa de Castro Ca
margo , sobrinha e primorosamente educada pelo tio Marechal de Campo
Candido Xavier de Almeida e Souza, militar-bandeirante, descobridor dos -
Campos de Guarapuava, no Paraná, no ano de 1771 , e mais tarde membro
do triunvirato do governo de São Paulo na Independência e Presidente do
Governo Provisório do mesmo Estado em 1823 e 24. Os tio-avós de Sam
paio Ferraz, Dr. Miguel Arcanjo Castro Camargo e Comendador Queru
bim Uriel Castro Camargo, campineiros eminentes, foram dos maiores ín
timos do Regente Feijó, de quem, como Sampaio, são primos, perto, como
Camargos que são, todos.

Ainda recentemente, na “ Revista do Instituto Histórico e Geográfico


de São Paulo ” , vol. XLIII, ano 1944, o ilustre Dr. Ricardo Gambleton
Daunt, parente do grande padre Diogo, reafirma essa intimidade tradicio
nal dos antepassados de Sampaio, declarando testualmente que o Dr. Mi
guel Arcanjo de Castro Camargo " foi o verdadeiro herdeiro do sentimento
político e moral do famoso Regente .”

Nesse mesmo documento, em carta dirigida ao Barão Homem de Mel


lo, repete-se aafirmação em que se declara que o tio avô de Sampaio Fer
raz
esta“difôra
sta doo Im
discípulo
pério ".favorito, o mais intimo confidente do inolvidável

É deveras interessante investigar- se como se formou o lendário e des


comunal espírito de energia e hombridade do famoso Chefe de Políciado
Rio. Somos levados a admitir a influência de certos antepassados, diante
da extraordinária e singular afinidade de temperamento e ideais.
68 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

O nosso homenageado era, sem dúvida, um Sampaio, um Góes, etc., mas


possnia, e de modo característico, o recorte vehemente, incisivo, de certos
Camargos, dos quais Feijó foi o maior.

Casou -se Sampaio Ferraz no Rio de Janeiro com D. Elisa Vidal Leite
Ribeiro, filha dos Barões de Itamarandiba, figuras de destaque do segun
do Império. A essa família pertencem o Visconde de Taunay, Barões de
Santa Margarida, Ayruóca, Vassouras etc., Domiciano Leite Ribeiro, Vis
conde de Araxá , que governou o Estado de São Paulo, no ano de 1848,
tendo sido seu décimo oitavo governador.
JOAQUIM DE SAMPAIO GOES
Convencional de Itú em 1873 Pai de Sampaio Ferraz.
UM VIGOROSO PAULISTA NA HISTORIA DO BRASIL

SAMPAIO FERRAZ

samula biográfica organizada por Amadou


Amaral, Monteiro Lobato, Afranio Peixoto, Alton
80 de Taunay e Mário de Sampaio Ferraz.

Numa época de aterradora crise moral, nada nos parece mais oportu
no do que reviver, ante as gerações de hoje, os vultos da velha e sólida
fibra brasileira. Ao recordar-lhes os feitos, invade-nos o orgulho do pas
sado . A rijesa do caráter, a sobranceria admirável dessa gente há de
causar espanto à geração de hoje. Os povos não se impõem unicamente
pela inteligência , mas pelas qualidades de caráter e viriſidade.
Roma, no auge da cultura, teve que baquear sob a imensa vaga de
corrupção que a envolvêra. A Inglaterra, viril e honesta , encravada na
solidez granítica de um patriotismo formidável fêz do pequeno rochedo
do Mar da Mancha o maior Império da terra e resiste, inabalável, a todos
os fermentos revolucionários da época. Como numa apoteose à própria
grandeza moral, assistiu ao fenômeno, único na História, de vêr, durante
as grandes guerras de 1914 e 1939, os próprios vassalos, - produtos de
todas as raças e religiões, correr pressurosos em defesa da metrópole da
liberdade e da justiça !!
Fanáticos das tradições da raça , inimigos de tudo que possa alterar
a personalidade inconfundível, o inglês, sem ser jacobino, é a obra prima
do patriotismo, porque ama, prefere e sobrepõe a Pátria a tudo mais que
exista sôbre a terra .
A História nos ensina que o destino dos povos são mais a obra da
energia moral do que da inteligência. Quem mais fêz pela nossa nacio
nalidade do que José Bonifácio, D. Pedro II, Feijó, Caxias, Osório, Rio
Branco , Floriano ! Não foram , entretanto, os " gênios" da raça. Po
nham - se, pois, em primeiro plano aqueles que, pelas virtudes, amavam a
pátria, a retidão e a altivez, tanto quanto os " patriotas ” de hoje amam
o proprio estômago e & velhacaria .
Provoca - nos tais comentários o aniversário da morte de Sampaio
Ferraz, brasileiro que se distinguiu por essas raras qualidades cívicas,
hoje tão desvalorizadas. Paulista da velha têmpera , sua popularidade
irradiou de tal modo da capital do país, que raro o brasileiro que não
haja ouvido falar do seu nome quase lendário. Qual o motivo dessa cele
bridade Únicamente porque o bravo propagandista da República foi o
72 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

será sempre apontado como um dos maiores modelos da velha energia


brasileira. Sobranceiro, ' estóico no desencadear das tempestades, Sam
paio Ferraz era uma organização moral de escol, e, a êsse respeito, na
história do Brasil, raríssimos o igualam . Poucos, muito poucos, nestes
tempos de hoje, compreendem tal natureza de homem .
Tudo sacrificou pela República : tôda a mocidade, a brilhante posi
ção no Império, a família, a grande fortuna, e a própria vida ! Há fatos,
rasgos de abnegação e desassombro, a maioria dos quais ficaram no círcu
lo restrito dos íntimos, mas que bem mereciam ser divulgados, para que
os brasileiros soubessem, de que massa era feito o famoso Chefe de Polí
cia do Governo Provisório de 1889. Por falta de espaço, nos limitaremos
a alguns traços biográficos, relembrando um e outro incidente e episódios
mais sugestivos da vida dêsse inolvidável patrício.
Promotor público do Rio de Janeiro aos 24 anos e neste pôsto per.
manecendo 6 anos, Sampaio Ferraz nele se portava com tal brilho e reti
dão, que, apesar de se manifestar republicano, o imperador D. Pedro II,
por duas vezes, recusou a sua demissão, solicitada pelo conselho de mi
nistros, o que só aconteceu em 1888, quando, ao lado de Silva Jardim
defendeu à mão armada o ideal republicano, no célebre conflito da tra
vessa da Barreira, o mais sério de todos os combates travados na pro
paganda e em cujo conflito o promotor público do Império foi ferido a
bala.
Demitido, não esmoreceu. Assentou logo fortes baterias contra a
monarquia, fundando com grande dispêndio de dinheiro , o “ Correio do
Povo ”, fôlha revolucionária, em que ao lado de Silva Jardim , padre João
Manuel , Xavier da Silveira, Aristides Lôbo, Ubaldino do Amaral e Ani
bal Falcão, se revelou jornalista eloquente, desassombrado e cavalheiresco.
Propagandista, temperamento combativo e arrojado, servido por ex
traordinários dotes oratórios , lançou-o logo numa propaganda de movi
mento e de audácia . Assim foi o grande companheiro de Silva Jardim ,
com quem viajou pelo sul do Império, ora colhendo triunfos, ora arris
cando a vida, como narrado pelo próprio punho de Silva Jardim em sua
obra “ Memórias de um propagandista ”. Neste livro, elaborado quando o
heróico pregoeiro da Democracia amargurava, no exílio, a mais negra das
ingratidões, ele esboça, à página 414, o interessante retrato de Sampaio
Ferraz :

“ Tenho muitas vezes feito referências a este bravo companheiro da


propaganda republicana. A sua fisionomia política porém é de tal modo
característica, que chamo de novo para ele a atenção do meu leitor. Já
era então bem conhecido o futuro chefe de polícia da capital . Uma natu
reza de escolha, no corpo e no espírito : um rapaz alto , gordo, forte, ele
gante, atlético ; côr bronzeada de caboclo, como ele se chamava, cabelo
prêto , um tanto hirto e revolto ; olhos grandes de uma doçura enérgica,
um ligeiro bigode a deixar vêr os lábios vermelhos, a compostura desim
pedida e correta . Espírito alegre e comedido, tão expansivo na intimi
dade quanto reservado diante do mundo, uma inteligência lúcida, capaz
de num relance abranger as questões, uma palavra fácil, quente e per
suasiva . Sampaio era um rapaz bem equilibrado, um bom cérebro sòlida
mente firmado em um sangue robusto.
Chamava-se " caboclo ” na conversação, quando queria dizer - se homem
decidido, capaz de sacrificar-se pelos ideais. Daí veio que espontânes
3 N °605
ANNO 16 CAPITAL FEDERAL, 1890 .

3
EVISTA AILUSTRADA

ESTADOS
CAPITAL PUBLICADA POR ANGELO AGOSTINI. ANNO 201000
ANNO 45000 A corrsspandencia e reclamacdes devem ser dirigielas SEMESTRE 411000
SEMESTRE 81000 ÁREA DE CONFAVES DIAS N °50,SOBRADO AVULNO 48000
TRIMESTRE 1000

DIECA

Se poressemos ser attendidos pediamos no Or Sampaio Ferraz que


trocasse os seus futuros triumphos parlamentares, pelo gloria de tersido e
continuar a ser o melhor comais respeitodo chefe de policiade nossaCapital
1
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 75

wente formássemos um núcleo de bôa e sã palestra que denominamos


“ Clube dos Caboclos”. Eram caboclos sob a presidência do “ caboclo
mór ” Xavier da Silveira, o padre João Manuel, o Anibal Falcão, Teixei
ra de Sousa, eu e mais uns três cidadãos ”.

(Memórias de um propagandista " , pág . 415 )

Paremos aquí. O estilo vivaz e pitoresco, a atração do assunto nos


levariam longe.
Revolucionário em 15 de novembro de 1889 a sua abnegação desdo
bra-se nesse dia em atos de verdadeira bravura. Transfigurado em tri
buno -soldado, arenga , a cada momento, às tropas indecisas, incitando- as
a fazer a República,em discursos memoráveis, alguns dos quais são lem
brados no livro de Ernesto Senna “ Subsídios para a História da Repú
blica ” . Aos batalhões formados no Campo de Sant'Ana, justamente no
quadrilátero em frente da atual Escola Normal, dizia, com veemência, o
tribuno revolucionário :
“ O sol que ilumina estes canhões hiantes, estas espadas ainda limpas
de sangue, não se esconderá atrás das nossas montanhas, no seu ocaso ,
sem que primeiro se resolva a empolgante mudança do regimen político
para o Brasil ! Soldados ! Peço me acompanheis num brado vitorioso :
Viva a República ! ” Estas palavras produziram tal entusiasmo e sobres
salto nas fileiras que dentro de um minuto o marechal Deodoro mandava a
Sampaio Ferraz esta simples frase : Ainda é cedo !
Um homem de tal têmpera não podia ser esquecido . Organizado o
ministério, no Instituto dos Surdos -Mudos, de que era diretor Benjamin
Constant, o marechal Deodoro mandou chamar Sampaio Ferraz para
ocupar o cargo que, naquele momento, era talvez o mais importante de
todos o de chefe da Segurança Pública da República. Nenhum mo
mento houve, em nossa história, mais perigoso do que o da implantação
do novo regímen , pois era certo que o Imperador gozava da estima popu
lar e de não poucas dedicações nas classes armadas, principalmente na
Marinha. Cada um tinha, pois, que jogar a sua vida. Foi bem o momen
to psicológico em que se acentuaram as grandes energias morais. A no
meação de Sampaio fôra medida acertada. Um pulso de ferro, desme
dida coragem , aliadas à proverbial sagacidade e inquebrantável senti
mento de justiça, deram-lhe tal relêvo que o seu nome começou a correr ,
célere e aclamado, por todos os recantos do Brasil !
Falta-nos espaço para recordar aqui todos os feitos dessa polícia
memorável, a mais famosa que tivemos, bastando lembrar o acontecimen
to mais empolgante : a tremenda e vitoriosa campanha contra os céle
bres capoeiras, desordeiros contumazes, muitos dos quais facinoras que,
impondo-se pelo terror, dominavam vários antigos bairros da cidade e,
quando o queriam , o próprio centro da Côrte . As crônicas do tempo refe
rem que o capoeira constituia no Rio de Janeiro verdadeira potência, es
tranhamente indebelável ! Nas campanhas eleitorais , nas festas, forma
76 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

turas de batalhões, armavam luta feroz, a navalha, ferindo -se, deforman


do -se e, por vezes, fazendo cair sem vida o adversário . Formavam grupos
poderosos entre os quais se destacavam os Nagoas e Guaiamus. Da riva
lidade nasciam lutas sanguinolentas. Ao lado destes, havia o grupo dos
capoeiras amadores, os " cordões elegantes” , cuja especialidade era pro
mover conflitos e desordens nos teatros, casas de jôgo e demais lugares
frequentados pela alta roda da Côrte.
A polícia imperial, em sucessivas campanhas, jamais conseguira do
minar a terrível malta que, ao lado da febre amarela, constituia então
verdadeira calamidade nacional .
Pois o que o Império não conseguira em 40 ou 50 anos , Sampaio Fer
raz realizou em menos de 6 meses ! Como medida preliminar, porém ,
começou dando o exemplo : não mandava prender e atacar os redutos mais
poderosos; ia , pessoalmente, e, não raras vezes, usava da conhecida ro
bustez e agilidade física . Além dêste recurso valioso, usou de outro , mais
decisivo ainda, o que lhe assegurou , talvez, o triunfo da campanha : come
çou prendendo todos os capoeiras -amadores, da alta roda, espécie de “ me
ninos bonitos" avalentoados, e . sem fazer exceção de espécie alguma
trancafiava -os no xadrês da polícia , ao lado dos mais reles desclassifi
cados !
Em seguida, deportava- os para o presídio de Fernando de Noronha ,
ao norte de Pernambuco . Assim , com as duas grandes armas, a coragem
moral e a justiça, Sampaio Ferraz, amparado pela opinião pública, triun
fava desde o primeiro dia numa campanha de cujo êxito muitos duvida
vam. Não tardou, porém , que surgissem grandes contrariedades e aborre
cimentos alguns dos quais se tornavam memoráveis e realçam o ânimo
varonil do jovem e impávido chefe de polícia.
O primeiro desgôsto proveio de Lopes Trovão , grande tribuno da
propaganda e seu amigo íntimo. O conhecido republicano teve, sob o Im
pério , de afrontar nos “ meetings” o punhal ameaçador. Em uma dessas
ocasiões foi um dos mais terríveis capoeiras , então conhecido , o braço forte
que o livrou de um golpe mortal. Nestas condições , sabendo da prisão e
iminente destêrro do homem que lhe salvara a vida, o ardoroso tribuno
tentou em vão libertá - lo não só junto de Sampaio Ferraz , como mais tar
de perante o próprio generalíssimo Deodoro , presidente da República ,
nada, porém , conseguindo.
Êste fato, passado com um dos maiores amigos do chefe de polícia,
produziu tal impressão no espírito público que, dias depois , fugiam do
Rio de Janeiro, vários capoeiras importantes entre os quais um filho de
conhecido e estimado almirante, a fim de não cair nas malhas da polícia.
( Êstes fatos vêm citados na obra de Dunshee de Abraneles " Atos e
atas do governo provisório " ).
O acontecimento, porém , mais ruidoso da campanha e no qual Sam
paio Ferraz se houve com extraordinária energia e desassombro , foi o da
prisão e destêrro de José Elísio dos Reis , filho do conde de São Salva
dor de Matozinhos, importante capitalista e figura de alta roda carioca .
prisão esta que provocou uma crise ministerial .
“ Bela figura de rapaz forte, estroina e maneiroso, trajando sempre
com apurada elegância, José Elísio dos Reis o Juca Reis, como era
mais conhecido, tinha -se tornado famoso nas vielas do crime, por seus
constantes conflitos e violências , frequentes espancamentos em mulheres
O
SE

Pooleanos, porens, ficar tranquillos: guer es capoeiras


plne navailac, gnet os da political, terão de se baver c0111
o Sv: Chefe de policia , que 1960 é para graças ....
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 79

decaídas e pela autoria ou cumplicidade de um assassinato ocorrido em


meados de 1888, na Rua dos Andradas, junto ao Largo de São Francisco
de Paula ” .
Pouco antes da proclamação da República havia partido para a Euro
pa, onde ainda se encontrava , quando foi encetada a enérgica repressão
daqueles perversos delinquentes. Conhecendo as estreitas relações de ami
zade entre o chefe Quintino Bocaiuva, então ministro do Exterior e o
conde de Matozinhos, proprietário d " O País ” , Sampaio Ferraz lembrou
ao chanceler republicano a conveniência de um aviso da família para que
José Elísio não regressasse ao Rio de Janeiro, pois que estava disposto a
não o deixar pisar impunemente as ruas cariocas.
Foi, pois , com grande surpresa que, no dia 8 de abril de 1890, a
Sampaio Ferraz se deparou o famoso valentão, todo de cartola cinzenta e
luvas , bem em frente da Confeitaria Pascoal , na rua do Ouvidor, haven
do desembarcado horas antes de um vapor das Messageries Maritimes.
Dá-lhe Sampaio Ferraz imediata voz de prisão e fá-lo recolher ao
xadrês da polícia, junto com os demais capoeiras . Ao mesmo tempo que
o ministro do Exterior se mostrava profundamente constrangido e pedia
a liberdade do prêso, filho do seu protetor e antigo proprietário d'O
País ” , Sampaio Ferraz declarava ao governo que, ou Juca Reis seguia o
destino dos demais capoeiras , ou êle abandonaria o cargo de Chefe de
Polícia.
No primeiro despacho coletivo com Deodoro , a 12 de abril de 1890,
declara -se a crise ministerial. Quintino Bocaiuva solicita a demissão do
cargo de ministro das Relações Exteriores , declarando que as relações
pessoais que o ligavam à família do moço encarcerado, determinavam a
sua retirada .
O marechal Deodoro levanta - se e diz não consentir na retirada de
tão ilustre companheiro . Campos Sales e Rui Barbosa defendem o ato
do chefe de polícia, enquanto outros ministros o julgam excessivo ( Vede
“ Atos e atas do Governo Provisório ” – D. de Abranches ).
No dia seguinte, dá-se a entrevista entre o marechal Deodoro e a
condêssa de Matozinhos, digníssima matrona , de belas virtudes pessoais,
e que , em tão angustioso momento, ia interceder pelo filho.
Deodoro chama, em seguida, Sampaio Ferraz ao palácio Itamaratí,
e, grande coração que era, narra sua penosa situação, referindo haver-se
a ilustre fidalga ajoelhado a seus pés, aljofrando-os de lágrimas e supli
cando a poupassem de ver o filho em afastado presídio de criminosos vul
gares, e acrescentou que, compungido diante de tão emocionante cena ,
prometera acudir ao angustioso apêlo.
A estas palavras do ditador enternecido, responde Sampaio Ferraz :
Tudo está bem, general , mas permita -me ponderar a v. excia. , neste dolo
roso momento, que igualmente já sofri a funda mágoa de vêr aos meus
pés uma porção de outras mães aflitas intercedendo por estremeci
dos filhos, a quem resistí em nome dos interêsses sociais e da dignidade
da República. Eram humildes criaturas, pobres mulheres do povo, algu
mas talvez fiéis companheiras de bravos soldados do Exército Nacional,
e , entretanto, mães tão extremosas e dignas de compaixão quanto a con
dessa de Matozinhos !
Fitando Sampaio Ferraz com as fulgurações de um olhar que se ume
decia e apertando -lhe as mãos com afeto , o velho cabo de guerra excla
mou , comovido : Tem razão, tem razão. Mande o homem !
80 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

No dia seguinte Glicério e Campos Sales, no intuito de conciliar os


interesses em jôgo e pôr fim à crise ministerial provocada por Bocaiuva
que insistia no pedido de demissão, propuseram ao chefe de polícia o alvi
tre de fazer embarcar Juca Reis até Pernambuco e dali facilitar-lhe o
regresso à Europa, mediante petição despachada pelo próprio chefe de
polícia .
Sampaio Ferraz, porém , disposto, desde o primeiro momento , a não
recuar , a tudo resistiu e, por fim, venceu. E no dia 1.º de maio de 1890
era Juca Reis deportado , com os demais capoeiras, para o presídio de Fer
nando de Noronha , a bordo do vapor “ Arlindo" , alı permanecendo, en
carcerado, durante 6 meses , sendo dali deportado para Portugal. Quintino
Bocaiuva , mais conformado, resolveu continuar no pôsto de ministro do
Exterior.
Apenas o conde de Matozinhos resolveu abandonar a propriedade
d " O País ", passando- a ao conselheiro Mayrink .
Êstes acontecimentos, que tanto agitaram , no momento, a opinião
pública, unânime ao lado do chefe de polícia que dela recebeu grandes e
festivas demonstrações de apláuso, vem narrados nos “ Atos e Atas do
Governo Provisório ' de Dunshee de Abranches, “ Subsídios para a His
tória da República ” de E. Senna e nas “ Reminiscências ” insertas há
tempos na “ Noite ", do Rio de Janeiro .

Almeida Nogueira, em seu interessante trabalho “Tradições e Remi


niscências ” (9. série ) , narra , à pág. 260, outro fato histórico passado na
administração Sampaio Ferraz, o qual merece ser lembrado.
“ De outro serviço inenos celebrado por ser menos notório , são deve
dores a Sampaio Ferraz os primeiros dias do Governo Provisório . Infe
lizmente, o destino alheio não se demorou em vir desfazer sua obra de
benemérito patriotismo. Referimo-nos ao assalto brutal, na noite de 29
de novembro de 1890, ao escritório e oficinas da “ Tribuna ", instalados
na rua do Ouvidor, fato éste que ocasionou o pedido de demissão coletiva
do ministério .
Os antecedentes dêsse verdadeiro desastre político que tanto macu
lou a vida do Governo Provisório, vieram ao contrário, pela eloquên
cia mesmo do contraste , realçar a figura varonil de Sampaio Ferraz .
Como ainda se acha na memória dos contemporâneos, a " Tribuna ” ,
sucessora da " Tribuna Liberal” , movia , sob a direção de Antônio Medei
ros , violenta oposição ao governo do Marechal Deodoro. Este, e, ainda
mais do que ele, os parentes e alguns oficiais militares sofriam com mal
contida paciência aqueles ataques. Não tinham a mais tênue intuição do
que fosse a liberdade de imprensa :
Em certa ocasião, foi o dr. Sampaio Ferraz procurado em seu gabi
nete, por dois oficiais militares, sendo um de patente superior o gene
ral Piragibe e outro, que presentemente... sim , mas então não passa
va de capitão, ainda que capitão e sobrinho do “ tio " . ( Trata -se do
marechal Hermes Rodrigues da Fonseca, mais tarde presidente da Repú
blica ) . Ao dr Sampaio vinham declarar que haviam deliberado pôr côbro
à injuriosa campanha da “ Tribuna ” contra o Marechal e por isso preve
niam a polícia de que estava assentado para “ a noite seguinte " um as
Balto à mão armada àquela redação e às suas oficinas !!
BODA

Grande revolução, medonho sarilho, tem feito o smr.


córonel chefe de policia . Cartomantes, feiticeiros, e
fool'as a sorte de spiritors tim levado a bréca
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 83

Jamais consentirei nesse atentado ! interrompeu -os com severida


de, Sampaio Ferraz,
Piragibe sorriu com ligeiro laivo de zombaria e depois perguntou :
Mas não consente , de que modo ?
Opondo-me ... por todos os modos . Farei sair à rua, com as armas
embaladas, tôda a fôrça da brigada policial, a cuja frente, me colocarei.
Mandarei fazer fogo contra os perturbadores da ordem e na ação proce
derei com a maior energia : prenderei e mandarei processar os crimino
sos, quem quer que sejam, mandantes e mandatários. Se tiver de enfren
tar fôrças superiores, lutarei sem pavor, sucumbirei , talvez , cumprindo o
meu dever, mas sucumbirei em defesa dos direitos do cidadão, da liberda
de do pensamento e da honra da República !
Esta nobilíssima resposta , proferida com firmeza e energia varonil,
teve o efeito de conjurar por algum tempo, a medonha borrasca que devia
mais tarde desabar. Com efeito, dias depois, por desavença com o gover
no, a propósito de um ato administrativo que o contrariava, Sampaio Fer
raz pedia demissão do elevado cargo que exercera com tanto zêlo, nobre
za e patriotismo.
Com a sua retirada desapareceu o mais poderoso amparo da “Tribu
na’e esta, a 29 de novembro de 1890, cerca de um mês depois, sucumbia
vitimada pelo atentado que contra ela perpetraram amigos ursos do fun
dador da República .
Tais atitudes, assumidas por um jovem ainda na flôr da mocidade e
cheio de natural ambição em face de poderosa ditadura militar, consti
tuem lições de civismo, de desassombro , dignas de ser divulgadas.

Deixando a Polícia, coberto de louros e em meio de manifestações


populares das mais estrondosas realizadas no Rio de Janeiro, o povo agra
decido, quis presenteá - lo com um palacete. Sampaio Ferraz mandou sus
tar a subscrição popular, pedindo que revertesse em favor de um dos asi
los da cidade, no que foi atendido.
Querendo premiar os extraordinários serviços por ele prestados, o
Governo Provisório galardeou-o com a patente de coronel do exército bra
sileiro. Quase ao mesmo tempo era êle feito coronel comandante da Bri
gada de Cavalaria da Guarda Nacional do Rio. E, como mais tarde, em
1892, ao fundar o famoso Batalhão Tiradentes, foi êle aclamado coronel
comandante do mesmo, ficou o íntegro republicano sendo coronel três vê
zes, o que deve ser, presumimos, o ‘ record ” dos coronelatos no Brasil ...
E não valeria éle, na realidade, 3 ou 4 " coronéis ” dos nossos ?...
Nessa época Sampaio Ferraz já se havia tornado a individualidade
mais querida e popular do Rio de Janeiro. Por toda a parte lhe celebra
vam a coragem , decantavam - lhe a energia e o sentimento de justiça. Nas
revistas teatrais, nas modinhas da lira popular, nos artigos da moda, etc.,
figurava o nome de quem fôra, com espanto de todos, o pesadêlo dos de
linquentes, o terror e vencedor dos capoeiras! Muitas outras figuras sur
giram depois, algumas com feição mais nacional , se quiserem ; porém tô
das com os seus adversários mais ou menos extremados, enquanto Sam
paio Ferraz conseguiu o milagre da unanimidade absoluta. A natureza do
cargo, as excepcionais qualidades do homem, eram das que mais fàcil
mente empolgam a massa popular.
Ao lado de Oswaldo Cruz e Pereira Passos, os grandes saneadores do
84 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Rio de Janeiro, Sampaio Ferraz deverá figurar, com justiça, como o ser
saneador_social. Foram estes, na República, as três grandes figuras do
Distrito Federal.
No ano de 1891, viu-se eleito deputado à Constituinte, pelo Rio de
Janeiro , obtendo o maior sufrágio até hoje verificado naquela capital.
Logo revelou, ao lado da proverbial eloquência, tal desassombro de atitu
des que cela va sans dire –, em pouco tempo se recolhia aos ostracis
mo, deixando a política que, já então, deitava os primeiros tentáculos de
corrupção, prometendo ser o que hoje é . Entregou -se, depois, à advoca
cia, em cuja profissão sempre brilhára pelo talento, cultura e proverbial
honradez. Especializando-se no crime , pois , fôra durante seis anos, um
dos mais notáveis promotores públicos da “ Côrte ” , voltou logo a ser das
grandes figuras do Juri. E não era fácil um promotor da justiça sobres .
sair naqueles tempos, em que o Tribunal do Crime, além de respeitável,
conseguia atrair oradores do valor de Silveira Martins, Bush Varela, Fer
reira Viana , Viveiros de Castro, Sizenando Nabuco , Jansen Júnior e ou
tros de igual estirpe.
Com efeito, a sua eloquência veemente tinha cunho inconfundível e
empolgante. Improvisador habilíssimo , jamais preparava um discurso.
Nas festas populares ou nos grandes acontecimentos, uma vez descoberto
pelo povo , era sempre aclamado e forçado a ralar. O temperamento arre
batado, ardoroso, à veemência excepcional, a que tonalidades magníficas
e raras davam admirável relêvo, fizeram - no mais um orador judiciário ,
um tribuno popular do que parlamentar. Fôra, com Lopes Trovão e Silva
Jardim , um dos maiores tribunos da propaganda republicana na Capital
do país . A eloquência era, no bravo republicano, a feição intelectual
predominante. Assim a retratou Teodoro de Magalhães. em formoso elo
gio fúnebre pronunciado no “ Instituto da Ordem dos Advogados do Rio
de Janeiro ” Sampaio Ferraz possuia maravilhosa intuição da arte de
dizer ; ilustrara - se na leitura de Cícero, folheava Danton, mas era -lhe
inata a eloquência. Os predicamentos de tribuno êle os reunia, realçan
do-os seus discursos que empolgavam auditórios adormentados e conven
cia assembléias granizadas de dubiedade : voz robusta e bramidora , olhar
fulminante e generoso, busto de atleta, sustentando cabeça senhoril, ges
ticulação sóbria e viril , fisionomia contractil definindo todos os seus sen
timentos ; a barba negra, nazarena, e trunfa romântica , que parecia cris
par ao ar tôdas as centelhas de sua cerebração potente. Quem o ouvia,
disputando um acusado, assombrava-se ( “ Gazeta dos Tribunais de 31 de
julho de 1921 , do Rio ) .
Desprendido, de uma generosidade que chegava às raias da ingenuida
de, recusou, por questões de princípios e irredutível intransigência , vários
cargos da mais alta relevância, entre os quais hastaria citar o de presi
dente do Rio Grande do Sul, no Governo Provisório, ao deixar a Chefig
de Polícia .
Sustando a nomeação do General Cândido Costa , o Marechal Deodo
ro ofereceu o pôsto a Sampaio Ferraz , que aceitou a honrosa incum
bência, apesar dos telegramas de Júlio de Castilhos e seus companheiros
aplaudindo o pensamento do Generalíssimo.
Por este motivo, e pelas posteriores e íntimas relações com elemen
tos políticos do grande Estado sulino, Pedro Moacir, ao responder, em
1906, numa manifestação pública, a um discurso de Sampaio Ferraz, pro
clamou - o Rio Grandense honorário.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 85

Foi convidado, em janeiro de 1891, para entrar como ministro da


Justiça, na primeira organização ministerial, após a dissolução do Gover
no Provisório, recusando o elevado posto por simples divergência relativa
à questão do Porto de Torres . Em 1892, sendo -lhe oferecida a cadeira de
senador pelo Distrito Federal, recusou imediatamente, indicando o seu
companheiro mais antigo Aristides Lobo , que foi eleito.
De 1894 em diante, viajou pelo mundo afóra, fixando residência na In
glaterra , país estrangeiro de sua predileção e onde, mergulhando na ma
ravilhosa e modelar engrenagem da “ Great Scotland Yard ” (Departa
mento Central da Polícia Inglêsa ) , adquiriu vastos conhecimentos relati
vos a questões policiais e penitenciárias. Nesta ocasião apresentou notá
vel relatório ao Governo de São Paulo, trabalho este mais tarde aprovei
tado, provocando o início das primeiras reformas policiais no Estado .
Deixando alí os fillios, regressou ao Brasil, em 1897, para atender ao
apêlo de Campos Sales, seu grande amigo, que o convidava para o cargo
de Chefe de Polícia. Mais uma vez teve ocasião de se mostrar o mes
mo homem , de rara envergadura, prestando assinalados serviços, entre os
quais a criação da polícia civil, o desenvolvimento dos serviços de inves
tigação, identidade e outras reformas importantes.
Sampaio disse- lhe o grande Campineiro, você deveria ser agora,
pelo menos, Ministro da Justiça. Bem o sei. Mas deixe-me explicar. Vou
entrar em fogo bravo , principalmente aqui no Rio. Vou fazer um gover
no duro, de implacáveis economias, e, por isto mesmo, govêrno de quei
xumes, interêsses feridos , agitações , etc .. Preciso, portanto, de um ho
mem como Você, de irredutível lealdade e comprovada energia . No dia
seguinte voltava Sampaio Ferraz, mais uma vez, à rua do Lavradio ...
Não obstante a tremenda agitação que, como se sabe, irrompeu logo
nos primeiros dias daquele quatriênio, pôde Campos Sales , todavia , go
vernar sem a menor perturbação da ordem e sem apelar um dia sequer
para o estado de sítio. Nunca a Imprensa e o Parlamento deste país des.
frutaram tanta liberdade e nunca homem público sofreu tantas injusti
ças e tantas ingratidões ! Por aí se pode avaliar a firme vigilância e ha
bilidade com que se houve o seu grande e fiel Chefe de Polícia ! Campos
Sales deixa o Tesouro Nacional repleto de dinheiro e volta a São Paulo com
as algibeiras tão vasias, que , anos depois, morria na penúria ! Foi com
esse dinheiro, por ele amontoado, que se pôde acabar com a febre amare
la, que se pôde sanear o Rio de Janeiro , construir - se o cáes do porto, e
rasgar - lhe as belas avenidas .
Pouco tempo permaneceu Sampaio Ferraz na Polícia esta segunda
vez, exonerando-se por motivo que muito o honra , para não criar aborre
cimentos ao seu velho anngo e parente .
Eleito novamente deputado pela Capital , demonstrou nessa fase par
lamentar espírito profundamente liberal. Tanto que, ainda recentemente.
depois de sua morte , a imprensa do Rio ( Vêde a " Noite” de 5 de Março
de 1920) declarava, na primeira página, que grande parte das questões
que agitam atualmente as classes operárias e que fizeram parte do pro
grama do Congresso da Paz, poderia estar resolvido entre nós, há vinte
anos,
Câmarsi o Congresso houvesse aprovado, vários projetos apresentados à
a,
em 1902, pelo velho republicano. Entre tais projetos figuram o
le mento 8 dhoras
quecifixa e 1 e para
25 % o a dia
maido trabalho nas oficinas da União; o estabe
s sôbre os vencimentos dos operários com
86 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

1902 ), e mais outros tornando obrigatório o pagamento da metade das


diárias aos que permanecessem doentes até 6 mēses, e diárias inteiras aos
que recebessem contusões causadas pelo serviço etc., etc.. Todos estes
ojetos, tão profundamente humanos, ficaram enterrados nos arquivos
do nosso Parlamento .
Deixando de novo a política, realizou, em 1903, longa viagem aos Es
tados Unidos e Inglaterra, dedicando -se exclusivamente ao comércio de
café. Foi o primeiro brasileiro que se animou a instalar- se em plena
Front Street, Nova York, realizando a importação direta de cafés paulis
tas, a maior parte proveniente de parentes seus, fazendeiros. Infeliz
mente, sua patriótica iniciativa coincidiu com a tremenda baixa de pre
ços, a maior crise jamais sofrida pelo nosso primeiro produto. Em 1903
estava de volta à Pátria.
A onda de corrupção, de traficância, crescia, então, e já havia inva
dido todos os recantos da República . Sampaio e meia dúzia de incorrup
tíveis que o cercavam, não mais podiam vencer a avalanche. Deslocado,
êle mesmo chegava a confessar, nas rodas íntimas : Já respiro mal ...
Sou peixe fóra dágua ... Pensava, talvez , como Martim Francisco, o
último : o passado está esquecido, o presente podre e o futuro ... ne
gociado !

Ao fechar esta pálida homenagem ao inolvidável cidadão, transcre


vemos aquí uns belos períodos, publicados num dos grandes jornais ilus
trados do Rio de Janeiro, por ocasião de sua morte e que parecem traça
dos por quem devêra tê- lo conhecido bem de perto :

“ Sampaio Ferraz não teve a preceder -lhe a morte, essa degra


dação corpórea que com tanto pesar verificamos em muitos homens
superiores. Mas é certo que sua bela cabeça de rei mouro, em que
a penetrante finura do olhar e coquetismo da barbicha cuidada,
pareciam dignas do pincel de Fromentin, havia ultimamente uma
tristeza fatigada de criatura que se sobrevive. Ao encontrá -lo ,
tínhamos a impressão de vêr um revenant... E evocamos, então,
comovidamente, a vida dêsse grande tribuno, um dos maiores de
sua época, do chefe de polícia sagacíssimo é famoso, do escritor
sem peçonha e do advogado avêsso aos sofismas e aos enredos da
casuística forense. Nunca , porém , abastardou a sua natural elo
quência na cultura dos discípulos de Gongora ou na verborréa de
magógica dos máus sequazes de Castelar. Podiam acoimá- lo de ro
mântico retardatário, acusando-o de fazer, como tribuno, arte pela
arte, sem atender ao carater da vida ambiente, sem compreender o
utilitarismo do século, sem acompanhar a evolução mercantil da
sociedade atual .
Fazendo advocacia não ocultava ele o desprazer com que se
via forçado a suportar uma profissão tão grosseiramente materia
lizada pelos rábulas sem escrúpulos, pelos hábeis empreiteiros de
absolvições , por todos os traficantes que pululam nos domínios fo
renses, como vermes numa árvore apodrecida. Themis transfor
mando - se em Jano , passado de cega e bifronte, horrorizava -o. — Dis
se -nos, uma vez, com espírito , a propósito dos nossos tribunais, que,
no Brasil , o gládio e a balança da justiça converteram -se numa faca
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 87

e dois pratos ... Tal o homem singular, cujas modalidades físicas


e cujo feitio moral eram diversas das ações externas a que o obri
gavam as rudes limitações do ganha-pão cotidiano . Aí estava o
segredo da sua graça , do seu aticismo, de sua fidalguia espiritual,
de sua fascinação sôbre todos que se lhe aproximavam ; mas aí
está também a razão do seu relativo insucesso na vida pública. E si
a magia de sua palavra sincera e arrebatadora não trouxe resulta
dos propícios, se a sua oratória magnífica foi uma irrupção de flô .
res que não dão frutos, é que Sampaio Ferraz era um delicado, um
“ hidalgo perdido na civilização brutal da época, um poeta nau
seado pelo alarido dos argentários e plutocratas ...

É doloroso ouvir -se, em plena campanha de regeneração nacional, que


os homens de bem estão fóra do seu tempo ! Se assim é, que se erga
então o lábaro “ Os mortos governam os vivos ” !
Sampaio Ferraz foi extraordinário exemplo de carater e formidável
padrão da antiga energia brasileira . Sua: tradição viverá tanto quanto
existir nesta terra um pugilo de consciências.
PARTE II
772

i
DO DELITO , CÓDIGO PENAL E ORGANIZAÇÃO
POLICIAL NA INGLATERRA

RELATÓRIO
apresentado pelo Dr. Sampaio Ferraz ao Governo do Estado de São Paulo

INTRODUÇÃO

Tendo -me sido confiado pelo Governo do Estado de São Paulo em


cuja direção se achava nesse tempo o ilustre Dr. Bernardino de Campos
- a incumbência de estudar na Inglaterra diversos assuntos conexos con
matéria penal, lamento que não me fôsse facultado ampliar a área restri
ta em que tive, de fazer a minha observação e de colher os dados para o
presente relatório . Não fôra o grande empenho que sempre tive de cor
responder a honrosa missão a mim confiada, eu teria por certo de baquear
diante das dificuldades de tôda ordem que se me antolharam , das quais
desde logo destacarei a da inexistência de codificações naquele singular
país , onde desde a própria constituição até os mais ligeiros preceitos das
legislações municipais, tudo reside nos arquivos, em documentos dispersos,
que se disseminam por entre todos os departamentos inumeráveis da admi
nistração pública.
Raça que avulta de poderio perante todas as nações modernas, nacio
nalidade que se constituiu a golpes de uma vontade de ferro, submetida
aos ideais da ordem , da justiça e do poder, admira que o famoso espírito
de disciplina e de sistema que caracterizam o povo britânico não tives
sem recebido uma consagração efetiva na organização das suas codifica
ções e práticas judiciais .
Os moldes de punir a delingüescência, nas modalidades originalíssi
mas, que tem revestido ali, marcam , no entretariiv , um sulco luminoso ,
sem soluções, cheio da magestade da justiça, ainda que revestida das
asperezas de uma severidade implacável e fria , traçando a maneira por
que se conduzem o juiz, o magistrado e os tribunais, na missão solene
de prestigiar o direito e fazer respeitar a lei. Não esquecidos da domi
nação romana, embora exercida há séculos , puderam adquirir daquela
raça imortalizada de dominadores, as noções fundas, que não se apagam
nunca do espírito do direito , manancial fecundo que serviu às organiza
ções relativamente mais sábias que o ser humano conhece e que se espar
giu nas codificações monumentais, verdadeiras colunas de pedra que nem .
92 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

o tempo, nem as revoluções trazidas pelo desenvolvimento e pelo progres


so do homem , têm podido aluir. Admira, que só no respeito às prescri
ções costumeiras, ao tradicionalismo, ao modo de agir da autoridade, aten
do -se à consciência geral do povo se tivesse limitado a grande herança
do período romano.
A tendência para a sistematização das regras, o prurido de codificar,
a índole afeita à definição de preceitos regulando o procedimento de cada
um perante o poder organizado, tudo isso que fêz dos Romanos um povo)
de sábios e de legisladores , é verdade que não existia ainda naqueles
tempos de barbarismo, em condições de transmissão a raças mais bárba
ras, modificando -se através das invasões de outras raças e da fusão com
outras nacionalidades.
A História ensina que numerosos acidentes impediram por muito
tempo a formação típica da Inglaterra, como país autônomo e soberano,
com linhas divisórias claras e definidas . O que porém é um fato, e geral
mente desconhecido, é que este país até os tempos atuais ( 1 ) , ainda não
codificou a sua legislação penal.
A Inglaterra , em cujos domínios, na frase repetida pelos seus súdi
tos, “ o sol não tem ocaso ” -, é um país sem códigos em matéria im
portante como a que diz respeito à ordem social , à liberdade, à punição
do crime. Parecerá à primeira vista que o serviço da Justiça será defi
ciente, incompleto, feito confusamente ou praticado coin irregularidades
e desvios. Supor -se- á talvez que a sua organização judiciária se ressente
dêsses senões ou o magistrado será um árbitro supremo, fazendo do seu
entendimento a base única da sua conduta, ou sentimentalista e benévolo,
poderá desarmar a sociedade diante do criminoso , tornando - a inca
paz de julgar equitativamente a sua ação perturbadora. Afigurar-se -á ao
estrangeiro, hóspede dessa nação , que as suas garantias se acham à mercê
da primeira autoridade , sem atribuiçõse definidas, sem jurisdição fixa,
sem regras para o exercício das suas solenes funções, ou que, calcando o
solo de tão estranho país , se acham rompidos os líames do escrúpulo e
abertas de par em par as portas da licença, da tolerância e dos abusos.
Quanta ilusão e quanto êrro !
Não se veja na falta de códigos ou de regulamentos processuais de
finindo a conduta do magistrado inglês ou a dos tribunais, a mais leve
sombra de perigo ao direito de quem quer que seja. Não é possível no
seio daquela coletividade, atirar sobre o forte ou sôbre o fraco, sôbre o
nacional ou o estrangeiro sobre o mais humilde homem do povo, um áto
mo siquer de pressão ou de arbítrio . Um dia já se simbolisou a Justiça de
olhos vendados , tendo nas suas mãos uma balança fidelíssima que pesava
com absoluto rigor o mérito ou o demérito das ações humanas ; pois tal
símbolo serve admiravelmente para aplicar-se aos processos de justiça so
cial na Inglaterra, quer se considere a ação solene do magistrado, quer se
atente para as garantias individuais do cidadão, vivendo sob o regimen da
lei , da grandiosa e mútua concepção do respeito devido ao direito, da ne
cessidade indeclinável que este seja consagrado a bem do interêsse geral.
A lei e o direit são luas imagens que de geração a geração os pais gra
vam na memória dos filhos, e o cidadão, acostumado desde a mais tenra
infância, a vêr naqueles dois símbolos de engrandecimento moral as
duas bases do seu aperfeiçoamento, entrega-se ao trabalho, tranquilo do

1 ) - O presente relatório foi escrito no ano de 1898.


Diretoria do Club Tiradentes, celata republicana das mais ardorosas. Da esquerda para
direits capitão Carlos Gusmão, Dr. Sa Valle, Dr. Sampato Ferraz, Theodolo Pupo de
Moraes e Balbino de Mendonça .

Sampaio Ferraz em Nova Iorque, ano de 1902 , vendendo cafés de São Paulo.
Nesta fotografia estão juntos sua filha D. Sylvia, Dr. Garcia Leão, Vice
Consul do Brasil e o saudoso Dr. Caramurů Paes Leme, de São Carlos do Pinhal.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 95

seu futuro, não vendo mais do que as linhas gerais que o costume cria e
desenvolve, não vacilando ante a repulsa dos que se afastam do dever
comum e aplaudindo, incondicionalmente, a conduta dos bons, a prosperi
dade dos dignos e a elevação dos que mais lutam.
Há uma grande frase nas páginas de um dos maiores historiadores
inglêses. Macaulay, o intemerato analista das qualidades e defeitos so
ciais dos seus contemporâneos, dizia que a Inglaterra constitúe curiosa e
extranha aristocracia onde predominam os sentimentos mais democrátı
cos e ao mesmo tempo, uma democracia em que medra o mais acentuado
espírito aristocrático ...
O grande apotegma de que nas sociedades livres todos os cidadãos
são iguais perante a lei, é um lábaro naquelas ilhas cobertas de névoas
e onde vive a agremiação humana mais poderosa e que tem decidido da
sorte do próprio Universo, arrojando-se a todas as plagas, invadindo to
dos os hemisférios para demonstrar que a civilização e o engrandecimen
to resultam em parte da vontade e do trabalho. Não há exageros otimistas
na crítica do que vimos esboçando . Ao invés de uma reconhecida admi
ração pela Inglaterra, o nosso juízo se funda em considerações de alta
valia, sopesando os fatos e o desenvolvimento social daquele país que
se incumbem de pôr à luz, a elevação do espírito nacional, ùnicamente
preso à idéia da grandeza e do poderio da pátria. Povo rico, por um fe
nômeno econômico singularíssimo, mantém as grandes riquesas quasi que
monopolizadas pelo grupo de proprietários territoriais ; povo essencial
mente industrial, imprime ao marasmo que acompanha o capital tradu
zido pelos vastos latifúndios o impulso da movimentação reclamada pelos
industriais, inerente à moeda , à circulação do agente das trocas e só então
a sua riqueza se unifica , depois que ela foi um instrumento poderoso de
transformação , de melhoramentos e de progresso.
Povo excêntrico, por excelência, a singularidade do seu viver e a sin
geleza dos seus costumes se modelam por uma calma absoluta, contínua,
mantida em tôdas as eventualidades . À índole pacata que o caracteriza,
o afeiçõa ao silêncio e à ponderação . O inglês, como coletividade social,
é um tipo obediente, quasi passivo , porém cheio de personalidade. Quan
do porém a injustiça o fere, o seu protesto é frio, mas firme, como o seu
temperamento. Homem de luta, ele a trava em todos os terrenos , para
ter o seu direito respeitado. No fundo, a agitação, a espetaculosidade,
inerente à natureza humana, transformam-se nele em pertinácia e teimo
sia . É impossível, no entanto, encontrar quem mais firmado tenha no
espírito , o sentimento da ordem. É difícil desmontá - lo da firmeza e do
estoicismo com que domina o seu eu . Balzac , psicólogo que abriu veredas
novas no estudo da alma humana, ponderava que o egoismo é o exercício
superior da vontade do homem sobre si , o domínio sôbre os ímpetos da
fraqueza, a submissão do entendimento às riquezas do raciocínio e do
cálculo. O inglês começa por se dominar a si próprio para poder depois
dominar os outros . Todo o seu viver se modela pelo plano de vida, prè
viamente concebido , tôda a sua existência se circunscreve à consecução
do ideal que sonhára. As contingências da fraqueza, ele substitúe por
uma reação tenaz e nunca desfalecida . Os impulsos da paixão êle as
combaté pela inatividade e pela inércia .
Povo de heróis porque é um povo que aceita o sofrimento com a
resignação impassível dos que não desesperam nunca . Convencido de que
cada um é o árbitro supremo das suas ações, o agente único da sua feli
96 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

cidade, ele recebe o sucesso, sem o estonteamento dos que o não aguardam
ou encara a miséria sem os terrores dos que a não promovem .
O espetáculo das grandezas sociais, as ostentações do luxo, os ouro
péis dos nababos, não filtram na alma do mais baixo mendigo esse senti
mento vilão da inveja e da revolta. Quando pequeno e miserável, se
adapta ao seu meio, vive entre os seus pares, recordando que a sua inca
pacidade ou o seu vício é que o acorrentaram àquela existência infeliz e .
mesquinha. Êle vê passar no brilho das galas, do ouro, do poderio e da
grandeza, a rainha ou o camponês enriquecido , o príncipe ou o industrial
favorecido pela fortuna, o político eminente erguido ao fastígio das posi
ções oficiais ou o fabricante de fósforos que possúe milhões, com a supre
ma indiferença dos que compreendem que tudo resulta do esforço, do
mérito acumulado, da ação contínua para um objetivo certo, ainda que o
imprevisto possa às vezes desnortear a sua concepção. O acaso, o azar,
o destino, a bôa , ou má sorte, são palavras vãs, entidades abstratas que
não se conhecem naquele país, saturado de um " filosofismo” inato, emj.
nentemente verdadeiro e, por isso mesmo, estranhamente estimulante.
O domínio sobre si é a qualidade social que resulta dêsse modo de
vêr as cousas da vida e, daí vêm o retraimento, a reflexão, a paciência, a
quietude de ânimo que caracteriza o inglês .
Com tais elementos, não é de extranhar-se a inextência de codifica
ções. A lei principal reside na consciência de todo o cidadão e nesta n.
sentimento que predomina é o supremo dever de respeitar a autoridade ,
ainda que esta seja um méro símbolo. A concepção de que para a ordem
é necessária a submissão de cada um ao que está estatuído pela consciên
cia geral, êsse bom -senso prático extraordinário que ensina o respeito
sagrado , quasi fanático ao Direito, são os dois bronzes, sem oxidação pos
sível , sôbre os quais se levantam todas as instituições sociais na Ingla
terra, desde a mais insignificante associação de esporte até a eminente
estrutura de governo, que eles aceitam e não discutem, representando o
eixo concêntrico para o qual convergem as aspirações gerais da Nação e
donde se irradiam todos os estímulos de engrandecimento moral para o
povo .
A absolvição de um crime não satisfaria o criminoso, ainda que con
fesso de culpa. A condenação do inocente não necontraria reação da víti
ma, porque, esta lamentaria diante da própria corda dos enforcados, o
êrro do julgador.
2 A plataforma e a imprensa unificam a opinião nacional e diante de
uma situação política que se desmoronasse, chocada pelos embates de
uma oposição honesta, ou perante a bandeira negra que hasteiam na velha
cadeia de Newgate, quando o carrasco estrangula aquele que perturbou :
gravemente a ordem social , a multidão não sai do silêncio respeitoso a
que submete o calmo temperamento.
Cada membro do organismo social conhece o lugar, a função, o dever,
a atitude que lhe assiste na vida coletiva . Todos têm noção nítida, clara
e imperturbável dos privilégios que possuem e das garantias que gozam.
E ninguem ignora as proibições que se lhes impõem. A esfera do exercí
cio de um direito, qualquer que seja o seu revestimento, é um terreno
firme em que não há depressões . E se o direito existe deixa de ser um
privilégio para se constituir um símbolo. É O NOLI ME TANGERE das
virgens que guardavam o fogo sagrado... Os privilégios os mais odiosos .
nascem do costume, residem na tradição, flutuam , dispersos, nos estábulos.
políticos ou vivem na consciência acorde de cada cidadão, e deixam por
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 97

isso de se revestirem daquele carater para ser exercido como dogmas da


religião de civismo. Reis, nobreza, clero, etc., todos vivem do prestígio
da consagração popular : é o noli me tangere do patriciado e da plebe que
se irmanam na figura magestosa da Pátria.
Quebrar élos dessa cadeia de ferro que o costume creou e a tradição
alimenta, desviar dêste círculo infrangível de um convencionalismo vo
luntário , espontâneo e inflexível, seria obra de Sisipho a rolar a pedra
da montanha ...
Túnica de Nessus, agarrada à concepção de cada qual, seria baldado
que os problemas sociais, dentro em séculos ainda , lograssem ter o poder
de abrir uma brecha nesta estrutura de aço. A alavanca de um novo Ar
quimedes nesse espaço infindo das aspirações modernas para o nivela
mento da raça humana pela emancipação dos fracos, pela libertação dos
oprimidos e pela distribuição da riqueza, apoiada no conjunto dos prin
cípios sãos de sociologia, teria que se quebrar mil vêzes antes que uma
chanfradura fosse aberta nesse estranho edifício, soerguido por um povo
que pensa , que age como se fôra um só homem .
Éste espírito de solidariedade e de uniformização do sentimento polí
tico e social, facilita tudo. A relação social de qualquer natureza se de
sencadeia em meio plácido e sereno, onde é quasi impossível a movimen
tação desordenada ou o anarquismo desvairado. Tudo se faz com méto
do e com ordem, porque a comunidade atende de preferência ao interêsse
coletivo, aos magnos problemas impostos à nacionalidade do que às mes
quinhas ambições individuais que tudo perturbam e desnaturam . O mais
infimo súdito da rainha, acompanha, do seu anonimato resignado, os
grandes movimentos das fôrças sociais, e difícil se não impossível seria
arredá-lo da compreensão clara que tem sôbre a engrenagem adminis
trativa. Êle supõe tão necessário o padeiro como o juiz , os palácios dos
reis como as penitenciárias.
Glorificar o méritonão é mais do que render homenagem a si próprio,
quando, acima de tudo, estão a grandeza e o poderio da Nação . Punir
com serenidade implacável o criminoso audaz, é função social que se re
veste de tanta magestade quanto a de erguer às mais elevadas cumiadas
do poder os abnegados que se consagram ao bem público.
Para que codificações se as leis resultam de movimentos e atitudes
inspirados pela própria consciência nacional ? Para que regulamentos
casuísticos e minuciosos se aos tribunais não se confere outro poder que
não seja o de homologar o direito ?
Um movimento de revolta nas ruas da grande metrópole londrina,
com mais de sete milhões de almas, revestir -se - ia talvez das mesmas tona
lidades que uma cena de pugilato . Arrastada à anarquia grande massa
de cidadãos inglêses, ainda nos furores da sedição, obedeceria a um fim
prèviamente delineado, agindo com ordem, com conhecimento detalhado
dos meios a empregar, indicando que o cálculo poderia invadir até os
mais imprevistos acidentes de uma tempestade social. Com tais compli
cações morais, qual o agitador que poderia lançar no seio daquele povo a
semente das revoluções ?
Punir para ele é função social como educar. O castigo se exerce com
a mesma frieza do ensino.
Dirigir a criança ou enforcar o bandido, são atos análogos em uma
sociedade que aspira um fim e põe ao serviço do seu escopo supremo,
tôdas as forças vivas da Nação .
98 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

A fôrca se levanta no páteo sombrio de uma penitenciária com a


mesma serenidade com que se distribuem medalhas de ouro a jovens lau
reados. O açoite que abre as carnes do criminoso irremissível é instru
mento tão util quanto o livro. O presídio fica junto da escola. Corrigir,
ainda que suprimindo a vida, é exercer ato tão util quanto levantar sindi
catos industriais ou agrícolas ... Minera - se nos antros das montanhas
como se joeira pick -pockets, nas vielas de White-Chapel. A miséria é
uma condenação onde o trabalho é hábito instintivo, mero esporte. 0
decaído é a fôlha amarelecida que, às primeiras rajadas do outono, ar
rancam dos troncos quasi nús dos castanheiros dos parques. Se não en
contra força para resistir ao desaparecimento e ao nada, pior para si,
porque a sociedade só tem afagos para os fortes, para os que lutam e
para os que vencem.
Maravilhosa engrenagem que ensina a cada um o apostolado de todas
as virtudes a luta pela vida !
Extraordinária estrutura que atira à consciência de todos a centelha
que impede a morte nos espíritos o amor ao trabalho .
Em outros países os problemas da criminalidade estão a agitar os
filósofos e os pensadores, enquanto na Inglaterra o principal objetivo é
bater o crime com medidas práticas .
A experimentação se constitue único instrumento do saneamento
social.
As estatísticas se levantam, o poder público opera tateando sempre
e o resultado determina novas experiências, novos elementos postos em .
ação, novas orientações, a bem do aperfeiçoamento do serviço de re
pressão.
Ninguem desconhece as grandes dificuldades dos problemas que o
vício e o mal estão impondo às sociedades modernas.
Êles vêm o sem número de sistemas pelos quais o criminalista pro
cura explicar a persistência da criminalidade.
Reconhecem que no mínimo de todas as cogitações científicas uma:
grande série de descobertas vai conseguindo os fóros de princípios abso
iutos e de conquistas definitivas. Em todos os departamentos da ativida
de intelectual o pensamento do homem vai afirmando a existência de
importantes verdades que se constituem marcos para o desenvolvimento
das condições da existência.
É assim que a economia política assentou a sua base científica na
lei da oferta e da procura, que regula , como um ponderador absoluto , os
fenômenos ainda os mais estranhos e singulares da vida econômica e agre
miações humanas. O desenvolvimento industrial , comercial e moral dos
povos acha -se superintendido pelo grande princípio da divisão do traba
lho, regulador tão absoluto dos fenômenos sociais como o calor, a luz e a
humidade na sua ação permanente de trazer ao seio da terra a fecundi
dade e a vida . Na astronomia , da concepção geocêntrica da antiguidade,
sem embargo da visão de Pitágoras , seis séculos antes de Cristo , à concep
ção heliocêntrica de Copernico , com as demonstrações de Laplace e New
ton , até a designação exata da trajetória de todos os astros com quasi o
domínio da vida misteriosa dos mundos que rolam pelo firmamento
há um assombro de conquistas.
Hoje lamenta- se Galileu e Giordano Bruno para se reconhecer que &
Terra é apenas um planeta secundário do nosso sistema solar moven
Sampaio Ferraz no Museu Histórico de Ita .
i

i
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 101:

do-se no seio dos espaços infindos em face de outras constelações sem


número, prodigiosamente maiores e mais importantes.
Na biologia, desde a concepção fantasista da matéria creada, da fixi
dez das espécies com a interferência do sobrenatural até a explicação .
positiva da antropologia, atestando que o homem é apenas um élo na .
cadeia interminável dos seres vivos regulando - se na sua existência con
forme as leis da sua organização ; até a verificação de que ele está passi
vamente submetido às leis gerais da influência física ; desde a formação
dos mundos pela vontade de Deus, do milagre atestado pelas religiões até :
o determinismo reconhecido pela fisiologia que teve em Huxley e Claude
Bernard os seus grandes mestres; desde a concepção de uma gênesis en
gendrada por um poder misterioso concentrado nas mãos de um ente su
perior, até o transformismo de Lamark , generalizado por Darwin nas leis
da luta pela vida e da seleção natural , tudo indica que o espírito huma
no caminha firme e resoluto, e que, pouco a pouco, do seio da própria
Natureza irão saindo as soluções para todos os problemas julgados inex
plicáveis.
Na química, desde a homogeneidade aparente dos corpos até a desig
nação matemática da sua composição; da concepção eivada de alquimia .
até o conhecimento exato do número dos corpos simples e compostos e a
sua transformação operada pelo calor que é apenas o movimento, desde
o charlatanismo de Van Helmont , fazendo surgir ratos de trapos apo.
drecidos até as verdades de Wurtz sobre a composição atômica da maté
ria, comprovadas modernamente pelas experiências de Crookes ; desde a
ponderação de Secchi sôbre a estrutụra dos espaços infinitos até as ila
ções de Socker sôbre a composição química dos corpos, arrancadas às .
observações spectroscópicas, indicando a unidade de organização, susce
tível de estados moleculares diversíssimos, tudo patenteia a verdade da
grande generalização de Spencer quando adivinha a lei da evolução nas
entranhas e nos mistérios do Increado.
Malthus, o grande observador, ainda que suspeitado de cogitações
imorais, assenta no princípio da progressão geométrica para as raças hu
manas, o terror em face da incapacidade do planeta para as conter.
Stuart Mill, prescrutador dos fenômenos econômicos, não vacila em
aplicar às ciências morais o método positivo que prende as sociedades ao
desenvolvimento imposto pelas condições mèramente fisiológicas que
atúam sôbre o homem
Nas próprias relações de governo entre os povos, aí estão as estrutu
ras democráticas , as libertações das raças oprimidas, as grandes conquis
tas do bem e do altruismo , demonstrando o avanço da civilização, com as
vitórias obtidas nos domínios da ciência política o sufrágio universal , a
representação das minorias parlamentares e essa numerosa seriação dos
postulados modernos.
Sòmente a natureza humana mantem-se como um ponto de interroga-
ção perante as cogitações dos espíritos estudiosos. A dúvida e a incer
teza reinam ainda sõbre ' a área imensa da criminalidade , salientando a
pungente resistência aos dictames do bem e o caráter mórbido de que se
reveste a luta contra o altruismo e a confraternidade social .
O crime avança ainda em proporções ascendentes e chega a ser quasi.
um fator homogêneo com os estádios mais acentuados do progresso e da .
civilização.
102 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Uma ligeira e resumida análise das diversas escolas, acentuará quan


to se tem modificado os princípios e as doutrinas relativamente a tão
importante assunto. Por longo tempo prevaleceu, como verdade absoluta ,
entre os tratadistas de matéria penal, que o crime era a transgressão
consciente da lei, por motivo da perfídia e malignidade do agente.
O criminoso não era mais do que um rebelado contra a ordem social
e por isso mesmo se tornava passível de castigo imposto pela coletivida
de. Dizia -se que o sentimento do bem era inerente à consciência de cada
um. Todos eram dotados do livre arbítrio ou da faculdade de dirigir a
sua conduta, entre o cumprimento regular dos deveres sociais e a resistên
cia aos bons impulsos, pela prática das más ações . Todo homem vivendo
em sociedade tinha a noção nítida do que era moral e justo e cumpria -lhe
assim modelar o procedimento, de acórdo com os sábios preceitos impres
sos em sua consciência por um poder sobrehumano e superior.
Assim, o crime era ato consciente, resultando de deliberação racioci
nada e refletida, a qual se incorporava a premeditação de ofender a so
ciedade, lesando o direito de quem quer que fosse ou reagindo contra os
deveres gerais impostos por um poder organizado.
A delinquescência era considerada a livre escolha do mal com rebel
dia aos ditames do bem. Daí veiu que a pena era considerada um instru
mento epicurista de utilidade social, empregada para bem de suas conve
niências e como uma reparação aos gravames nascidos do delito .
Bentham , aliás grande espírito , assim explicava o fundamento do
direito de punir. Mais tarde, esse fundamento de utilidade pública em
punir o criminoso, foi transformada por outra escola, cujo chefe foi
ilustre criminalista Rossi, em outra de base essencialmente abstrata
qual a constituída pela necessidade de consagração dos preceitos da justi
ça absoluta . O sentimento da justiça era um predicado de cada homem e
por ele o seu procedimento deveria pactuar -se sempre. Atrofiado pela
prevalência dos máus instintos e inclinações, a sociedade tinha o direito
de vingar-se do delinquente, impondo -lhe penas proporcionais à gravida
de da ofensa praticada. Todos os criminalistas, apenas com variantes
de formas, no fundo aceitaram essa ordem de idéias , de modo que,
geralmente , as codificações dos povos modernos se inspiravam nelas, apre
sentando os preceitos legislativos uma quasi reprodução daqueles prin
cípios .
Sòmente nas últimas décadas dêste século é que começaram a surgir
novos sistemas, tendentes a explicar de uma maneira diversa todos os
fenômenos da criminalidade. A sociedade emprega ùltimamente proces
sos modificados de repressão e caracteriza uma nova terapêutica para 1
prevenção do crime procurando detê-lo na sua marcha ascendente. Espí
ritos eminentes que dispõem de métodos modernos de experiência e obser
vação têm- se arregimentado em linha de combate contra os preconceitos
das antigas teorias penais.
O critério de julgamento hoje, deixou de ser a adaptação dos fatos
vigentes aos preceitos legislativos para se constituir a análise minuciosa
do agente do delito .
Antigamente era estudada a entidade abstrata chamada o “ crime” ;
hoje, estuda- se a entidade positiva e real que se chama o criminoso ”.
Abertos novos horizontes às percrustações dos fenômenos sociais de
qualquer natureza, atribuída à marcha dos agrupamentos humanos, nos
seus mais insignificantes detalhes, à causa de ordem geral e ao influen
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 103

ciamento de motivos vários acumulados, verificou-se essa nova feição aos


velhos métodos, do crime.
A tendência do espírito moderno acentua-se com o objetivo de expli
car os fenômenos do organismo social como se se tratasse de organismo
vivo, submetido à ação contínua dos agentes da ordem externa . É assim,
por exemplo, que o indivíduo, o agrupamento, a tribu, a raça , os povos,
desenvolvem -se e acentuam as modalidades da sua índole, os elementos do
seu carater e as tendências do seu temperamento, sòmente pela influên
cia dos agentes exteriores, de ordem física e fisiológica.
O clima, a temperatura, o sólo, a direção dos ventos, as correntes
hidrográficas, a umidade, as formações geológicas, creando a alimenta
ção própria a cada região, cada um desses elementos influenciados impri
me aos seres vivos, por eles afetados, modalidades peculiares de exis.
tência, formas diversas de desenvolvimento, hábitos peculiares, conforme
a sua ação psicológica .
A compleição do homem , que os metafísicos denominam moral, não
é mais do que o resultado da ação exterior.
Ativo, belicoso e forte, se habita uma área fria, onde a circulação
do sangue exige a constância do movimento e da atividade muscular, na
luta pela vida.
Indolente, pusilânime e fraco, se a canícula das regiões tropicais
enca ndece-o e afrouxa o funcionamento do sistema nervoso.
Aventureiro, sagaz, industrioso se, pela hereditariedade, lhe foram
transmitidos esses predicados; apático, ingênuo, simples, se os antepas
:sados não precisaram desenvolver os instintos do artifício e da simulação.
Tudo vem a ser o resultado dos elementos prèviamente acumulados,
mas que a contingência da observação e a ignorância do seu modo de
agir, afastam do conhecimento humano.
Quetelet, o grande creador da estatística, estabelece dados matemá
ticos comprovando que o ato, o mais aparentemente pessoal, o próprio
suicídio , que " é uma sugestão subjetiva, personalíssima, não é mais do
que uma resultante de motivos desconhecidos, mas prèviamente acumu
lados ” ,
Já Buckle havia afirmado, na sua “ Introdução da Histório da In
glaterra " que os acontecimentos humanos, os mais extraordinários ,
poderiam , porventura, ser previstos, se fosse possível reunir uma grande
massa de elementos de observação, dando em resultado a prefixação dêles.
Esse notável escritor pondera que dados dois períodos iguais na vida de
uma nação, sem perturbações graves como uma guerra, uma grande cares
tia, uma peste, ou qualquer abalo profundo , o curso normal dos fatos
sociais se acentuaria o mesmo, sem variantes notáveis, regulando as mes
mas proporções para tôda a seriação, ainda dos atos os mais dependentes
da vontade do homem , como o assassinato , o roubo, os atentados ao pudor,
as agressões de tôda natureza, etc..
Isso indica que dada a ação normal dos agentes exteriores, era tam
bém normal a série e o revestimento das eventualidades da vida social.
obseAmpliando
rvação esse ponto de vista, sem dúvida apoiado nos fatos e na
novas explicações vieram aclarar o ato criminoso, dando
esperanças à possibilidade de sua atenuação , estabelecidos os processos
reativos contra os elementos perniciosos e predisponentes da criminalidade.
Entre os modernos tratadistas ,surgiu o vultonotável de Lombroso,
que, com generalizações obtidas nesses assuntos, tem operado verdadeira
104 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

revolução entre os pensadores e filósofos. Aproveitemos judicioso resu


mo do Dr. Viveiros de Castro sobre as teorias desse escritor: " Longe
de aceitar o livre arbítrio como uma faculdade inerente ao homem para
distinguir o bem do mal, assim , para se conduzir preferenciando um ao
outro , ele atira- se resolutamente à outra orientação procurando antes
estudar o criminoso e os fatores do crime para depois justificar a atitude
do poder social, estendendo o seu manto de proteção ao interesse comum .
Estuda os fatores da criminalidade, as causas predisponentes do seu de
senvolvimento, procura fazer uma classificação científica dos criminosos
e após lembrar os remédios, organiza a terapêutica social . Afirmando
que o determinismo delituoso provém das predisposições inatas dos de
linquentes, registra -lhe a conformação fisiológica, a diátese orgânica, às
psicoses, as várias caracterizações físicas como sendo os fatores da aber
ração mórbida do crime. Êle descobre pois e descreve com os mais inte
ressantes detalhes, o criminoso nato . Condições gerais de temperatu
ra , condições do solo, meio, alimentação, formando a índole dos delin
quentes, removidos às condições dos sexos, idade, desvios ou enfraqueci
mento da vontade , moléstias, diáteses, perturbações mentais, nervosas,
epilepsias, neurastenias etc., determinam em geral a predisponência ordi
nária para a prática dos atos anormais , sendo que, também poderiam
influir certos e determinados elementos de ordem puramente moral, como
a religião , a educação, a miséria, o estado social , a depressão oriunda do
álcool e outros vícios existentes na sociedade.
Para Lombroso foi primeiramente o crime uma retroação às condi
ções primitivas do homem ; constituia manifestações por atavismo dos an
tigos hábitos de barbarie e do estado da natureza. A violência de cara
ter traduzida em atos irreprimíveis de agressão , de ataque e de revolta
contra a lei e a civilização não eram mais do que o velho sangue da besta
fera. Lembra então certos hábitos do criminoso, a tatuagem , o " argot ” ,
o calão especial, o mancinismo e outras singularidades características.
Posteriormente , reiterando acuradas observações sobre as modali
dades fisiológicas dos delinquentes , impressionando com a sua conforma-
ção especial do crâneo, fonte fugidia, manifestações nervosas, fenômenos
de verdadeiras epilepsias larvadas, modificou em parte as suas primei
ras cogitações, concluindo que o crime era fenômeno mórbido, perfeita
mente caracterizado . Garofalo explica a deliqüescência como o atrofia
mento dos instintos e sentimentos da piedade e da probidade indispensá
veis à civilização. Êle vê na criminalidade a lei da saturação, isto é,
acredita que o crime seja antes um resultado de certas e determinadas
condições sociais, como se fôsse uma refração, mudando conforme va
riam os agentes que o produzem , quer de ordem física, quer de ordem
social . Julga que as penas sejam ineficazes e então supõe que o remédio
para deter a marcha da criminalidade deve ser antes preventivo do que
repressivo .
Apresenta planos de reformas sociais que compreendem diversos de
partamentos da atividade geral, nos quais novos sistemas penais poderão
dar resultados práticos admiráveis .
A instituição do livre câmbio, por ex., constituiria uma ante-mural
para a miséria pública, embaraçando indiretamente a emigração, o impos
to sobre o luxo, as medidas proibitivas sôbre o álcool , o crédito agrícola
batendo o interesse usurário, associações de mútua proteção, sociedades
cooperativas, socorro aos desprotegidos e aos inválidos, colônias agríco
las para vadios e mendigos seriam práticas utilíssimas.
Sampaio Ferraz com seu filho Mario, em 1904 , na praia do Flamengo , perto
do Morro da Vidva, onde moravam .
!
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 107

A paixão política se amorteceria com reformas liberais, boas leis de


eleição que trouxessem para os parlamentos as verdadeiras aspirações
populares. Imprensa, telégrafos, amplas redes ferroviárias, leis sábias
sôbre a sucessão , sociedades anônimas de tôda a natureza , regras precisas
sôbre as ofensas civis e as suas prontas reparações, propaganda religiosa,
convenientemente dirigida, guerra ao celibato e aos conventos e a à men
dicidade exercida como uma profissão, o divórcio amplo, a preferência .
dada aos casados para as funções públicas, enfim , uma educação perfeita
para o menor que abrangesse o seu desenvolvimento físico e moral, acom
panhada de uma propaganda tenaz contra os vícios sociais mais pernicio
sos como o jôgo, a prostituição, a orgia, o alcoolismo, tudo isso contri
buiria para sanear a sociedade e drenar o crime para a sua diminuição e
desaparecimento ".
Ferri, Benedict, Tarde e muitos outros espíritos eminentes têm enve
redado por esta mesma ordem de idéias, acreditando que o crime ou é o
resultado de perturbações fisiológicas e psicológicas ou apresenta -se como
consequência de certas condições sociais favoráveis. O que é verdade é
que pouco a pouco vão se afundando para os domínios da tradição histó
rica os princípios básicos consagrados pelos códigos penais e que consti
tuiram por muito tempo o classicismo em assuntos de crime. Já hoje
escritor algum aceita a pena como uma vingança, e o castigo deixou de
ser uma utilidade social. O espírito moderno se desprende de preconcei
tos que por tanto tempo dominaram , e pouco a pouco se vai assentando
que a sociedade apenas se defende e se garante contra o criminoso, que é
considerado antes um desgraçado impelido por motivos que não pôde e
não pode vencer. Êsses princípios vão aluindo todas as resistências e
estão invadindo com vigor e energia todos os campos das observações
científicas sõbre a criminalidade.
O criminoso deve pois ser sequestrado e punido, de acórdo com a
terribilidade que inspiram o seu carater, hábitos, conduta dentro da cole
tividade social, conformando -se tudo isso com o interêsse da maioria.
Propagados como se acham hoje na Inglaterra êsses pontos de vista
das novas escolas penais , se reconhecem, entretanto, que muito antes de
traduzidos em livros ou em polêmicas jornalísticas, êles revestiam a su
prema orientação dos seus juízes ou tribunais. Ainda que não consagra
dos por algum tratado cujo intuito fosse exclusivamente a sua divulga
ção , o que a prática demonstra é a completa filiação do espírito nacional
à essa maneira de vêr os assuntos da criminalidade. O método experi
mental reconhecidamente mais sábio para tôda a ordem de investigações,
tem se constituído o guia supremo da função julgadora, quer esta prove
nha do espírito refletido e judicioso do magistrado , quer resulte da discre
ção e comedimento da consciência do Juiz – cidadão na prática dos deve .
res impostos pela augusta instituição do Juri .

A maior ou menor severidade das sentenças , a importante questão da


sua durabilidade, as condições do cumprimento da pena, a fiscalização
interrompida do poder policial sôbre as massas enormes do proletariado,
as organizações variadíssimas sôbre o amparo à miséria e à juventude, a
disseminação larga e generosa dá instrução elementar abrangendo até as
penitenciárias, as associações de socorro e proteção aos que se retiram
das prisões, tendo cumprido pena , os estabelecimentos numerosos para
menores delinquentes e abandonados, o rigor exercido contra o alcoolis
108 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

mo, a prostituição e a vadiagem , os moldes sumaríssimos de julgamento


para os delitos mais leves e comuns, tudo isto constitue uma série inter
minável de medidas, de práticas judiciárias que se ensaia e utiliza persis
tentemente, variando, modificando -se de acórdo com o resultado que aufe
re o poder público . O que se verifica constantemente é a grande vanta
gem dos sistemas e métodos que se atêm de preferência às medidas pre
ventivas. E é por essa razão que a Polícia, poder preventivo por exce
lência, é ali uma organização extraordinária, verdadeiramente sábia, cons
tituindo uma engrenagem , cheia de originalidade e cujos melhoramentos
e progresso são a constante preocupação do legislador e dos governos.
Suas leis não são própriamente normas gerais preceituando deveres e
criando direitos . São antes hipóteses figurativas, casos delineados das
ocurrências possíveis na vida social. É assim que nas definições gerais
dos crimes graves como das leves transgressões entram sempre os ele
mentos expositivos de tempo, logar, ocasião e as várias e detalhadas cir
cunstâncias de que podem revestir - se os casos ocurrentes.

Todos os delitos, quer públicos, quer particulares, ou sejam atenta


do às pessoas ou às cousas, ou demandem para a sua consumação a vio
lência ou a fraude ou sejam dirigidas contra o Estado ou o indivíduo ,
contra o velho ou a criança, contra o homem ou um simples animal, tudo
está previsto nos “ Acts " do Parlamento, nas desenvolvidas e meticulosas
estatuições que corporificam o sentimento geral da Nação que , por sua
vez, emana dos costumes, dos hábitos, do modo de vêr e de apreciar as
eventualidades da vida.

É pois evidente que se torna difícil para um estrangeiro, atenta a


especialíssima técnica jurídica, fazer um estudo completo das práticas
criminais inglêsas. Seria preciso desempoeirar dos arquivos públicos e
das bibliotecas um sem número de .atos delituosos e, ao mesmo tempo ,
cotejar lei por lei, disposição por disposição — procedendo a um exame
longamente comparativo, para chegar -se ao pequeno resultado de conhe
cer o que se acha em plena vigência ou o que já foi em todo ou em parte
revogado .

Acresce que a revogação de uma lei anterior por uma posterior, nun
ca é feita completamente, na generalidade dos seus preceitos subsis
tindo a primeira apenas como um documento cronológico por entre as
coleções legislativas.

A lei nova, em geral, mantém algum proveito util da antiga e o pro


cesso dessa conservação é o de simples referência à parte não revogada.
Como vimos, a legislação penal continua esparsa, sem codificação.
Mas , em nenhuma outra parte do mundo o “ Código" está, como lá, en
cravado na consciência popular. Em nenhum outro recanto do mundo
o direito , a justiça reinam , gozam de maior magestade. Com estas pri
meiras impressões redobrei a velha admiração pela Inglaterra. Para nós ,
brasileiros, mòrmente para os que estejam investidos de autoridade públi
ca julgo de máximo proveito uma viagem de observação e estudos nesse
país .

Vamos agora entrar na parte pròpriamente técnica do Relatório


a que trata da organização da polícia metropolitana. Há aí muita cousa
feita especialmente para o inglês, cousas que o seu temperamento sabe
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 109

tão bem compreender e melhor ainda executar. Nem tudo pode ser trans
portado de uma sociedade para outra e funcionar igualmente, tanto a
beira do Tamisa como nas regiões tropicais. Entretanto, com conheci
mento de causas, saberemos tudo examinar, promovendo, “ quantum satis ”,
as providências de adaptação.
Trata -se do povo inglês,
66 estirpe singular, impar, formada por um
quasi isolacionismo, com signets e virtudes características, bem suas.
mais suas do que doutrem .

Entremos pois na “ Great Scotland Yard . ” ,

SAMPAIO FERRAZ

( Antigo Promotor Público ' e Chefe de Po


lícia do Rio de Janeiro ).
SOCIEDADE GOETHEANA DE SÃO PAULO

GOE THE

CONFERÊNCIAS COMEMORATIVAS DO
BICENTENÁRIO DO GRANDE POETA
TRADUÇÕES DO FAUSTO
ABRAHÃO RIBEIRO
( Presidente Honorario da Sociedade Goethena .
e Membro da Academia Goethea ) .

A “ Sociedade Goetheana de São Paulo ” , recem-fundada por inicia


tiva de um grupo de idealistas de escól , que ainda acreditam' na supre
macia do espírito sobre a matéria, e na influência salutar e decisiva que
a formação literária da juventude exerce nos destinos de uma nação ,
tem uma finalidade bem marcada : cultivar todas as atividades litora
rias e científicas relacionadas com Goethe , incentivando-as e coordenan- .
do-as , a fim de realizar uma maior profundidade de conhecimento e uma
maior fecundidade de vida, através das idéias daquele colosso do pensa
mento humano , que não é alemão , nem francês , nem tampouco inglês
ou espanhol , italiano ou grego , mas simplesmente e totalmente universal.
Há 200 anos desabrochou em solo germânico, para gáudio da huma
nidade inteira , essa flor magnífica de intelectualidade e de sentimento,
que vicejou durante quase um século , e cujo colorido ainda seduz , e .
cujo perfume ainda embriaga , como certamente continuarão a empolgar
indefinidamente todos os espíritos , porque representam a Verdade, a
Bondade e a beleza .
Daí a preocupação ansiosa que têm todos os povos de traduzir as
obras de Goethe, repositório magnífico de belezas e verdades eternas ,
cuja fama lhes transpôs as fronteiras , despertando o interêsse e a curio
sidade dos intelectuais , responsáveis pela grandeza da Nação.
Uma dessas obras é a tragédia FAUSTO , em cuja primeira parte o
poeta , ainda moço , vasou a sua fecunda mocidade inteira ; e cuja segun
da parte , depois de uma pausa de longos anos , é um tecido de experiên
cias, sofrimentos e desilusões , sem os arroubos que a velhice não per
mite , mas com os lampejos do gênio , que ela não conseguiu apagar.
É sôbre algumas passagens dêsse monumento da literatura germâ
nica, apreciadas através de várias traduções , que eu recebi da jovem
" Sociedade Goetheana de São Paulo ” a honrosa incumbência de fazer :
esta palestra ; assunto, aliás, que se poderá desdobrar em muitas con
ferências.
Não cabe aqui , porém , pela própria natureza desta festividade , um
comentário completo dessas traduções , nem a interpretação da obra pri
ma do genial poeta , mas apenas um ligeiro confronto das mais belas pas
sagens do original da emocionante tragédia, com certas traduções que
dela têm sido feitas , e pelas quais chegaram até nós , mais ou menos ou
completamente deturpados, os seus mais profundos e lindos pensamentos..
116 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

A primeira indagação que nos ocorre , ante semelhantes traduções,


é esta : Será possível traduzir integralmente e com absoluta fidelidade
uma obra literária dessa natureza ? Haverá utilidade em traduzir-se ape
pas trêchos da mesma, quebrando-lhe a unidade do pensamento , vasado
numa forma adequada e insubstituível , que constitue a própria estética
da linguagem que lhe serviu de veículo ? Devem as obras poéticas ser
traduzidas também em versos, ou o devem ser de preferência em prosa ?
Qual o sentido e a utilidade das traduções de obras literárias ?
Eu , que já tive a veleidade de fazer dessas traduções, inclusive do
Fausto , desisti completamente da tarefa que me havia impôsto , abando
nando-a a meio-caminho , pela convicção sincera que me dominou , não
de que seria inútil, mas, sim , impossível , sem trair o pensamento do au
tor, traduzir-lhe a obra de um játo , num só bloco harmonioso , com o
mesmo sabor local e o mesmo espírito da época em que foi produzida.
A tradução que não conseguisse isso , não seria uma tradução , sinào
apenas uma imitação , uma paródia , uma paráfrase , ou simplesmente
uma caricatura do original , como são quasi todas as traduções de obras
literárias , em que a forma sobrepuja o fundo , principalmente quando
são feitas, não diretamente da lingua em que foram escritas, mas através
de outras traduções.
O Fausto , por exemplo , está traduzido em todas as línguas. Con
frontando-se , porém , essas traduções entre si e com o original, verifi
ca-se que são traduções de traduções, onde , exatamente por isso , se repe
tem os mesmos erros ; e , às vezes , quando .o tradutor não conhece bem a
língua da tradução da qual traduz , e nem tampouco a sua própria língua,
dá-se um verdadeiro disparate, a lembrar aquele brinquedo de salão ,
em que a primeira pessoa da fila diz ao ouvido da que lhe está ao lado .
ràpidamente, uma palavra ou frase qualquer, sem repetí-la , para que
ela a passe adiante da mesma maneira , e como a entendeu , e assim suces
sivamente , até chegar à última da fila,
É divertidíssimo , pelos disparates que apresenta, o confronto da
primeira palavra ou frase , com a última , e das intermediárias entre si.
Assim também no confronto das diversas traduções da mesma obra, fei
tas de afogadilho , umas pelas outras , de empréstimo , sem a menor pre
ocupação da verdade . Um exemplo : Gerard de Nerval , francês , que foi
um dos primeiros tradutores da tragédia de Goethe, encontrou , logo no
início , a palavra juristerei, que traduziu por jurisprudência. De aí por
diante , todos os tradutores do Fausto , que o traduziram provavelmente
do francês , repetiram a mesma palavra jurisprudência , que é um erro
manifesto , para quem conhece o alemão . Quando eu comecei a traduzir
o Fausto, diretamente do original , esbarrei também com essa primeira
dificuldade : Eu sabia que juristerei não era propriamente jurisprudên
cia , mas um pejorativo de jurisprudência , como literatice o é de literatu
ra. Entretanto , eu não achava uma palavra correspondente em portu
guês , nem tive capacidade para criar um neologismo . Recorri, então, ao
meu velho e saudoso mestre Dr. Estevam de Almeida , que não sabia
alemão , mas era profundo em português . Imediatamente , depois de ouvir
o sentido da palavra juristerei, traduziu : Jurissabença . É perfeito ! Este
exemplo serve para mostrar a necessidade do conhecimento completo e
profundo das duas linguas , embora tal conhecimento se reparta entre
o tradutor e o seu auxiliar . Foi por isso que eu desisti .
A propósito da citada tradução de Gerard de Nerval , conta-se que
o próprio Goethe a elogiava , considerando-a perfeita . Não é verdade !
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 117

Goethe foi de uma ironia cruel . Perguntando-lhe Eckermann , que tal


achara êle aquela tradução , respondeu - lhe: “Depois que li o Nerval,
não gosto mais de lêr o Fausto em alemão ; essa tradução francesa tem
outro sabor ; tudo nela é fresco , novo, espirituoso ” .
Era evidente a orinia do poeta, que não podia deixar de ter visto
com desagrado a deturpação do seu pensamento e a mutilação da sua
obra prima. Por isso acrescentou ele ao seu interlocutor , ainda com iro
nia : “ O Fausto é qualquer coisa incomensurável, e todas as tentativas
para compreendê- lo são vãs ' '. E concluiu assim : “Mas, também a gente
deve lembrar - se de que, a primeira parte provém de um estado um tanto
obscuro do indivíduo ; mas , justamente essa obscuridade é o que excita
os homens, que se dão a um grande esfôrço , como em todos os proble
mas insolúveis ' '.
Ora, não é admissível que o próprio Goethe considerasse incompre
ensivel a sua obra magna, da qual ele mesmo se orgulhava, como sendo,
por assim dizer , a síntese de toda a sua vida.
O que o grande pensador quis , foi criticar e censurar o procedi
mento daqueles que se metiam a traduzi-lo superficialmente , sem lhe
conhecer a origem e a profundeza das manifestações poéticas , como mal
conheciam a sua e a própria lingua. Foi assim que , certa ocasião , refe
rindo-se a um estrangeiro que o procurava frequentemente , com a pre
tensão de lhe traduzir as obras , disse : " Ele é um bom rapaz ; mas , lite
rariamente falando , é um verdadeiro diletante , pois, ainda não sabe o
alemão , e já fala em fazer traduções ”. “ Essa acrescentou é exata
mente a mentalidade dos diletantes, que não conhecem as dificuldades
das coisas, e sempre pensam em empreendimentos para os quais lhes
faltam as fôrças ” .
Mas, não é só a ignorância dos diletantes e amadores , o que os leva
a empreender traduções de obras clássicas ; é principalmente a vaidade
( Que eu , felizmente , a tempo puz de lado ) de aparecer em público, no
afan de exibir , mais as suas próprias qualidades de tradutor-literato, do
que às dos autores traduzidos .
O exemplo mais frizante desta afirmação , está na célebre tradução
do Fausto, feita pelo Visconde de Castilho , que é incontestavelmente um
ás na literatura portuguêsa , mas confessadamente um ignorante com
pleto da lingua alemã. É ele mesmo quem honestamente o diz , no pre
fácio do seu trabalho , com estas palavras : “Dadas certas circunstâncias,
pode um poeta de consciência, verter a obra de um outro, sem allás
lhe conhecer a língua ' ' .
Essas circunstâncias , a que se refere Castilho , são as seguintes : Um
seu irmão que vivera em Hamburgo , e já havia feito várias' traduções,
resolveu ajudá-lo na tradução do Fausto ; mas , diz o próprio Casti
lho, textualmente houve êle ( o irmão ) de reconhecer que todo o seu
alemão , laboriosamente grangeado naquelas versões , não bastava para
autor tão absurdo no pensamento ( Era Goethe ! ) , tão fora do comum no
estilo e tão cheio de nós-górdios na linguagem ; e que não havia outro
remédio sinão recorrer a algum valente e zeloso auxiliar ” ( Essa expres
são " valente -auxiliar ' é deliciosa ! E diz bem da coragem necessária ).
Recorreu , então , ao amigo Laemmert, alemão residente no Rio de Ja
neiro. ( Como seria o português dêsse alemão ? )
“ Com essa colaboração , pois , explica o poeta português levou
o meu irmão a cabo a sua tradução , em metros variados, do , em mais
118 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL ,

de um sentido, terribilíssimo e verdadeiramente diabólico poema Fause


to ”. É simplesmente fantástico !

Castilho, ignorando completamente a obra do poeta de Weimar,


sempre se refere à mesma em frases retumbantes , que impressionam ,
mas não dizem nada de verdadeiro :

“ Poema terribilíssimo e verdadeiramente diabólico ..." Nada dis


so ! Terribilíssimo é o alemão , como o português , para quem o não co
nhece .

" Cordilheira de poesia , rebentada a súbitas de profundezas desco


nhecidas e cheia de trevas e monstros ”, é outra definição do Fausto ,
com que Castilho procura encobrir a sua ignorância, nesse particular.
" Cordilheira de poesia ' ', sim ; mas “ rebentada a súbitas de pro
fundezas desconhecidas” é que não.
Goethe levou a vida inteira alimentando o sonho que lhe vinha da
infância, escrevendo e burilando o Fausto, cujas origens não são “ pro
fundezas desconhecidas ' ' , a não ser para quem ignore , por completo , o
movimento literário da Alemanha de então, iniciado por Kloptock e
mantido pelo gênio altamente crítico de Lessing, pela ciência universal
de Herder , pelo calor entusiasta de Schiller e pela graça infinita Wiel
land. Goethe desenvolveu -se e aperfeiçoou-se nesse meio, ao qual
emprestou , por sua vez , o explendor do seu gênio, numa assidua corres
pondência com todas as notabilidades literárias e científicas da época .
À míngua de expressões sensatas e verdadeiras com que pudesse
qualificar e explicar a obra cuja tradução afoitamente empreendera com
o irmão, Castilho diz que em Portugal corria há muitos anos “uma cer
ta adoração pânica ” do nome de Goethe eo " contagioso assombro da
tragédia Fausto , esta Bíblia ou Alcorão diz ele esta como que filo
sofia mal distinta, esta reforma da religião poética, apenas , enxerga .
mui por longe entre neblinas ” .
Si em Portugal , só “ de longe e entre neblinas ” se lobrigava a poe
sia de Goethe , era naturalmente porque só a conheciam por traduções à
moda de Castilho , para quem ( Textualmente ) “ parecia questão ociosa,
esta de se perquirir si um tradutor sabe , ou não , a língua do seu origi
nal ' '. “ O que importa , e muito afirma éle é si expressou bem na
sua, isto é , com vernaculidade , clareza, acerto e com elegância possível,
as idéias e os afetos do autor ' .
Ora , as idéias e os afetos de um autor , a serem traduzidos “ com
acerto e clareza ” , exigem , sinão um profundo , pelo menos um regular
conhecimento da lingua original . Ignorá-lo por completo, é que não é
possível !
O resultado dessa ignorância , que era também do irmão que lhe
serviu de muleta , e do esparadrapo do alemão-carioca, vemo-lo do início
ao fim da tradução , feita , sem dúvida, em ótimo português (Pudera !
Era Castilho ) , mas errada de todo em todo , de fio a paviu ; tão errada ,
que podemos afirmar com segurança que , si traduzissem para o alemão
o Fausto de Castilho , o próprio Goethe o não reconheceria , embora per
cebesse tratar-se de assunto semelhante . Para respigar os erros dessa
tradução, como das demais existentes, sejam elas francesas, inglesas,
italianas , hespanholas ou portuguesas, seriam necessárias várias confe
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 119

Tências , um verdadeiro curso de traduções comparadas, que seria diver


tidíssimo e , ao mesmo tempo, muito instrutivo , como demonstração das
cautelas que se devem tomar, quando se busca o verdadeiro pensamento
de um autor estrangeiro, maximé quando esse pensamento possa signi
ficar alguma coisa para a formação da nossa mentalidade, e, assim , para
& felicidade da nossa gente,
A importância de uma tradução sobre de ponto , quando se trata
de uma obra científica , em que a precisão técnica dos têrmos emprega
dos é condição sine qua non da utilidade da obra.
Um tratado de química mal traduzido , pode produzir uma explosão
aum laboratório , sacrificando propriedades e vidas. Um manual de avia
ção que Castilho traduzisse , como traduziu o Fausto , projetaria em ter
ra o avião, e levaria para o céu os passageiros. Quantos erros comete
riam os juizes , quantas injustiças praticariam , si tivessem de aplicar o
Código Comercial alemão, servindo-se da tradução francesa de Moele
paire . Nela vemos “ Fahrzeug ” ( Embarcação ) traduzido por navio ;
“ Verschollen ” ( Desaparecido ) traduzido por ausente ;. " Vontade ” por
" Consentimento ” ; “ pagamento ” em vez de “ prestação " . E assim por
diante, uma série de erros crassos, deturpando, a cada passo , o pensa
mento do legislador.
É , pois, evidente , que para obras dêsse gênero , as traduções têm
que ser tecnicamente perfeitas, embora literariamente imperfeitas. Não
assim , porém, quando se trata de obras puramente literárias ou de ficção ,
em que predomina a preocupação de belas-letras , de pensamentos ele
vados, sem imediata aplicação prática.
Mas, neste caso , indagamos : Que sentido e utilidade terão as tra .
duções erradas ?
Pouco importa ! dirão não prejudicam a ninguém . Entretanto,
não é bem assim . Podem prejudicar e muito !, principalmente a quem o
zeloso do seu bom nome de pensador ou de artista, do qual pretenda
tirar as vantagens correspondentes, que tanto podem ser de ordem mo
ral , como de ordem patrimonial ; numa instituição internacional , de pre
mios por exemplo ,
Mas , quando assim não fosse, não é honesto atribuir aos outros
idéias e pensamentos que eles não tiveram , ainda que sublimes ; como
honesto não seria , tomar para si idéias e pensamentos alheios.
Castilho atribui a Goethe, imagens e pensamentos que nunca lhe
passaram pela mente, e que nem direta , nem indiretamente figuram no
Fausto .
Veja-se , por exemplo , esta passagem da imortal tragédia, vista pela
tradução do Visconde lusitano:
Quando Margarida foi à fonte buscar água , de bilha ao ombro , en .
controu -se ali com a sua amiga e vizinha Luiza, da qual ouviu que se
espalhara na aldeia um boato a respeito das relações amorosas de uma
outra amiga , de ambas, cujo estado começava a tornar -se “ interessan
te ' ' para a visinhança.
A pobre Margarida, a quem Mefistófeles já tinha posto em contacto
com Fausto remoçado , sentia-se vítima da mesma desgraça, agravada a
situação pelo fato de haver involuntariamente matado a própria mãe , a
quem propinara um narcótico , que lhe facilitou , sem a vigilância mater
na, a visita amorosa do jovem amigo. Desesperada , passa a noite om
claro , chorando e rezando ; e pela madrugada, colhe dos vazinhos de
barro que ornam a janelinha do seu quarto, algumas flores que vai colo
120 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

car aos pés da Virgem Dolorosa, que sofria também , num nicho dos
muros da aldeia, onde se lia :

“ Stabat mater dolorosa


Juxta crucem lacrimosa,
Dum pendebat filius " .

E aí, desfeita em lágrimas , ergue Margarida uma prece fervorosa


à Nossa Senhora , confessando o seu pecado , e implorando misericórdia ;
e ao depositar as flores que levava apertadas ao peito aflito, excla
ma : “ Mãe ! Hoje, pela madrugada , ao colher estas flores dos vasinhos
de barro da minha janela, reguei-os, orvalhei-os com as minhas lá.
grimas ” .
O modo por que Castilho traduziu essa cêna comovedora da tragé
dia, simplemente cômico. Como vimos Margarida disse à Virgem Santa,
ter orvalhado com as suas lágrimas , os vasinhos de barro da sua janela
( “ Die Scherben vor meinem Fenster ” ) . A palavra “ Scherben ” , traduzi
da ao pé da letra , significa caco , pedaço de telha , Os alemães, antiga
mente , davam o nome de cacos ( Scherben ) a êsses vasinhos modestos ,
de barro, semelhantes , mesmo, a um caco de telha. Ignorando isso , Cas
tilho, intrigado com aqueles cacos da janela de Margarida , e imaginan
do que , por causa do seu crime ( Que , aliás, ninguém conhecia ) , The
houvessem quebrado as vidraças , traduziu assim :

“ Quando hoje abro a janela


E a vejo apedrejada ,
Com choro sufocada ,
Sem luz no chão caí ” .

Jamais a janela da infeliz Margarida foi apedrejada ; nem havia motivo


para essa molecagem , pois , até então ninguém suspeitava siquer do que
lhe acontecera.
É também uma fantasia de Castilho , dizer que a menina, ao ver
aquêles cacos, caiu no chão sufocada e sem luz . Não há nada disso na
tragédia.

Mas, como se explica que todas as traduções de Fausto , e em geral


das obras alemãs, tenham tão graves sinões ? Assim : É uma grande
preguiça dos tradutores ( Quando não se trata de confessada ignorân
cia ) , uma preguiça mental , que os inibe de procurar até encontrar a
verdadeira tradução de um têrmo , o verdadeiro sentido de uma frase .
Satisfazem -se com o primeiro vocábulo encontrado ; têm o dicionário à
mão, e dentre os muitos significados ali registrados , escolhem um qual
quer, a Olho.
É muito comum dizer-se que o alemão é uma lingua difícil , que
pem tudo o que nela se escreve pode ser traduzido. É um engano ! A
menos que aquilo que se pretende traduzir não tenha sentido , e forme
um simples jogo de palavras sem nexo .
Não são as palavras o que se traduz numa obra , mas apenas o sen
tido que elas formam .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 121

Podemos generalizar o conceito do direito romano : " Scire leges


non est verba earum tenere , sed vim ac potestatem ” . “ Conhecer as leis
não é conhecer as suas palavras, mas a sua fôrça e o seu poder ' ', isto é,
o seu sentido. Assim também , quando se traduz qualquer obra.
Por conseguinte, si uma obra não tiver um sentido próprio e origi
nal , não vale a pena traduzí-la.
Os lugares comuns, as idéias universais, aquilo que todo mundo já
sabe , não interessa divulgar , porque seria, como se diz na giria, “ chover
no molhado ” . Um exemplo : Que interêsse haverá em se traduzir para o
alemão , ou para qualquer outra língua , o célebre soneto de Raimundo
Correia “ Mal Secreto ' ' ? Em que reside a beleza desse soneto, que justi
fique a sua tradução e transmissão a povos de outras linguas ? E ele é,
certamente, incontestavelmente belo , na forma e no fundo. O fundo,
porém , não é dele , de Raimundo ; é uma idéia universal , conhecidissima ,
do domínio comum de todos os povos, consubstanciado neste brocardo
popular : "Quem vê cara , não vê coração ” . De fato ,

" Si a cólera que espuma, a dor que mora


N'alma, e destroe cada ilusão que nasce ;
Tudo o que punge , tudo o que devora
. O coração , no rosto se estampasse ' ' ... etc ..

Vemos, nos 14 versos dêsse soneto, sempre o mesmo “ leit -motiv ' ) :
" Quem vê cara não vê coração ''.
De fato ,

" Quanta gente talvez no mundo existe ,


Cuja ventura única consiste ,
Em parecer aos outros venturosa ' .

O fundo, a essência mesma deste soneto , não é de Raimundo Cor


reia. A forma, esta sim, é sua ; e é de uma beleza incomparável . Mas ,
forma não se traduz . Por isso , não se traduzem as artes plásticas, nem
tampouco a música ; reproduzem-se ou interpretam -se .
A tradução que se fizesse do “ Mal Secreto ” , para qualquer língua,
qualquer que fôsse a forma que se lhe desse , nunca seria a forma de
Raimundo Correia. Poderia ser melhor ou peior , mas nunca a mesma.
Guilherme de Almeida, o nosso grande poeta , o mágico das tradu
ções , tem posto em formas maravilhosas , idéias ( Algumas banais, outras
lindas, mas familiares em todo o mundo ) dos melhores poetas franceses ,
que invejariam , si as pudessem apreciar , as roupagens com que ele ves
tiu as idéias deles. O que vale nessas traduções deliciosas do grande
vate paulista, não é tanto o seu conteúdo , quanto a sua forma. Retra
duzam-se essas traduções para outra língua , e elas perderão todo o seu
sabor. Guilherme- tradutor, é creador. As suas traduções são obras de
arte autônomas , com vida própria, haurida no seu próprio ser. Por con
seguinte , as obras puramente literárias , que têm mais forma do que es
sência, não devem ser traduzidas, não precisam ser traduzidas ; a menos
que o objetivo do tradutor, seja mostrar , não as idéias do autor que tra
duz, mas as suas próprias habilidades literárias , num duelo com o tra
duzido , convertida, assim, a homenagem , em quasi agressão.
Quando , porém , a obra literária , que se pretende traduzir , alia as
duas coisas , forma e fundo, essência e técnica, então compreende -se o
122 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

interesse em traduzi-la, pela utilidade em divulgar a idéia nova, o con


-ceito-novidade, a concepção original de um fato conhecido , embora . O
tradutor faça o inevitável , isto é, dê a essas idéias e conceitos uma outra
forma, qualquer que ela seja, prosa ou verso , contanto que não defor
me o pensamento do autor , ainda que o melhorando . O ideal para tra
duções dessa natureza , não é o verso, mas a prosa, onde há mais elas
1ticidade, e maior liberdade de composição . O metro limita, e força o
tradutor, pela necessidade da medida e da rima, a sacrificar o verda 1
deiro pensamento que pretendia transmitir.
Uma outra causa da infidelidade das traduções , principalmente das
obras antigas , como é o Fausto, reside na incapacidade, oriunda da
ignorância , de se transportaremos tradutores para a época, e para o
local em que viveu o autor traduzido , o que faz com que eles despresem
os principais elementos de tempo e de espaço , que entram na formação
das mentalidades de então , refletindo -se nas suas obras .
Fala-se muito em “ técnica da tradução ' ', em “ teoria da tradução ' '.
em “ arte da tradução ' '; mas , rigorosamente , nada disso existe. Tradu . 1
zir é traduzir . Não existe teoria alguma que justifique a substituição de
um conceito por outro . Não pode haver arte , em escolher a palavra ade
quada a uma determinada noção. O que há , é ciência , ou conhecimento
exato das línguas . Quem sabe traduzir , é porque conhece, de verdade,
a própria e a alheia língua. Quem as não conhece, pode empregar a
técnica, a teoria ou a arte que quizer, que sai tudo errado .
Dir-se-á que a arte e a técnica de traduzir consistem em transpor
tar -se o tradutor mentalmente e pela leitura para a época e para o local
do autor traduzido, estudando aí o ambiente e os elementos que forma
ram a sua cultura , o seu estilo , a sua mentalidade. Mas , isso não é tra
duzir ; é preparar-se para a tradução. Obtidos esses conhecimentos , o tra
dutor de coisas antigas procede exatamente como o tradutor de coisas
modernas : Traduz porque sabe, conhece as línguas e não porque adote
esta ou aquela teoria , tenha esta ou aquela técnica, seja mais ou menos
artista .
Si assim não fosse, as traduções poderiam variar de tradutor para
tradutor, sem que se pudesse saber qual a mais fiel ou verdadeira, pois,
cada um teria a sua técnica , a sua teoria e a sua arte.
Técnica, teoria e arte servem para cri não para traduzir . Não se
deve confundir a coisa que se diz, com o modo de dizê - la . O tradutor,
( como tradutor, e não como artista, cientista ou técnico ) , tem que ser
um espelho : Plano, polido e frio , luminoso a verdadeiro . Não sendo as
sim , deformará a imagem do objeto que reflete , criando um outro ser,
mais bonito talvez , ou mais feio , mas sempre um outro ser. Certas tra
duções são tão enfeitadas, têm uma maquilagem tão completa e espessa,
que são como certas mulheres : A verdadeira está por baixo da “ casqui
nha " ... E, quasi sempre, é a mais bonita.

Gerard de Nerval, Henri Blaze , Franchetti, Jacques Porchat, Cas


tilho, Gustavo Barroso e Jenny Klabin Segall foram espelhos côncavos
ou convexos, fóscos ou corrugados , que deformaram a beleza do Fausto ,
ou lhe emprestaram uma , que não era a dêle .
Cada um dêsses notáveis escritores devia ter retomado a sua obra
e poll -la de novo para aproximá- la o quanto possível do original alemão.
o que está fazendo , felizmente , com louvável coragem , Jenny Segall,
segundo nos informa Augusto Meyer em artigo de domingo, no “ Correio
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 123

da Manhã ” , que começa com estas palavras : “ Boa nova é o último arti
go de Sérgio Buarque de Holanda, que nos revela que a Sra. Jenny Kla
bin Segall , dando um exemplo de probidade , que é raro na tribu dos
tradutores, retomou a sua tradução do Fausto , com o mesmo espírito
de pertinácia que já transparecia no primeiro texto , corrigindo ou apu
rando a sua notável tentativa, a mais completa em língua portuguêsa ” .
“ Tentativa completa !!! ... Como os nossos críticos são cautelosos !
Jenny Segall faz bem em refundir o seu trabalho , o qual nos dá a
impressão de um diamante bruto , a pedir lapidação.
A tradução de uma peça como o Fausto, é tarefa ingente e dificili
ma, que nenhum literato de valor deve dar por terminada, antes de sub
meter o seu trabalho ao buril consciencioso dos mais competentes. Tem
que ser um trabalho de equipe , de colaboração honesta e despretenciosa,
para que não induza a enganos , a falsas interpretações, e afirmações
como esta de Pierre Lafitte, para quem " o Fausto é uma tentativa notá
vel, mas abortada, de um poema sociológico " .
É uma dessas frases bem sonantes , mas sem o mínimo fundo de
verdade, revelando, antes, uma falta absoluta de conhecimento da obra
criticada. Faz lembrar a já citada frase de Castilho : “ O Fausto é uma
cordilheira de poesia , povoada de trevas e de monstros , rebentada a sú .
bitas de profundezas descohecidas ' '.
Pura fatasia ! O " Fausto " , de Goethe , como a “ Divina Comédia ' ,
de Dante, a " Gerusaleme Liberata ” , de Tasso , o “ Paraizo Perdido ” , de
Milton, e “ Os Lusiadas ", de Camões é uma dessas belezas de fama
universal, mas que ninguém viu , completamente desconhecida do comum
dos homens.
Conhecem-lhe só a ponta do nariz :
“ Habe nun , ach , Philosophie,
Juristerei und Medizin und leider
Auch Theologie , mit heissem Bermühen
Studiert ' .

“ Nel mezzo del cammin di nostra vita,


Mi ritrovai per una selva oscura .”

“ As armas e os barões assinalados


Que da ocidental praia luzitana "

O resto, sabem que é muito bonito , por ouvir dizer.


o que há de mais curioso em todas as traduções do Fausto, não
são os erros propriamente de tradução ; são os enxertos .
Que traduzissem errado, compreende -se ; não conheciam bem a
lingua .
Que suprimessem um verso , um esquecimento, o explicaria . Mas,
um acréscimo , não de uma palavra, mas de frases inteiras , de grandes
124 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

períodos que não existem no original , como se vê na tradução de Casti


lho, é revoltante !
O Prólogo no Céu , que é realmente uma peça admirável , termina
com uma quadra em decasílabos , muito singela, em que Mefistófeles , só ,
depois que o céu se fecha e os arcanjos se vão , diz ironicamente , refe
rindo-se a Deus, com quem acabava de dialogar :

" De tempo em tempo vejo com prazer esse Velho,


E tomo cuidado em não romper com Ele ;
É muito bonito que um grão-Senhor
Fale assim humanamente com o próprio diabo' '.

É textual , literalmente traduzido.


Admirem agora a tradução de Castilho :

" E está bem conservado ! Não desgosto


de o vêr de vez em quando. O meu sistema
de não quebrar com ele , inteiramente ,
mesmo assim não é mau . Tamanho
vulto conversar tão à mão com
um diabrete , não é leve honraria.
E si eu lhe ganho a aposta , oh ! que ufania ! ... "

É simplesmente inacreditável !
Aquela frase “ Si lhe ganho a aposta , oh ! que ufania ! ” com não
estar no original , deixa mal o coitado do Mefistófeles , o qual momentos
antes , na sua prosápia, tinha a certeza de ganhá-la.
Quando Deus , desafiado , lhe disse : “ Um homem bom , no seu mar
char na treva , o caminho direito há -de guardar” respondeu -lhe o po
bre diabo : " Pois bem ; isso não há -de durar muito ; não temo pelo resul
tado da minha aposta ” .
Si quizéssemos apontar todas as passagens de todas as traduções
que conhecemos , teriamos que transcrever as traduções inteiras da tra
gédia , o que seria mais uma tragédia .
A “ Sociedade Goetheana de São Paulo " , na sua nobre e desinte
ressada missão cultural, prestará , ao mesmo tempo , um serviço ao Bra
sil e a maior das homenagens à memória de Goethe , no bicentenário do
seu nascimento , si promover a tradução das suas obras , sem preocupa
ção de exibições literárias , mas com o único fito de lhe propagar as
idéias , aqui no nosso meio , onde ele é sinceramente admirado por pou
cos , simuladamente admirado por muitos, e completamente ignorado
por quasi todos .

Quanto à tradução do “ Fausto ' ', permito-me a sugestão , de que ela


seja feita em prosa ; e manifesto a esperança de que o seu texto , sim
ples na sua forma, verdadeiro e cristalino no seu fundo , caia nas mãos
feiticeiras de um Guilherme de Almeida, que a transformará , sem lhe
deturpar a essência , numa jóia finissima, de que se orgulhará a litera
tura brasileira .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 125

É preciso , porém , que nesse mistér , os tradutores que aceitarem a


árdua incumbência, sejam tão competentes quanto honestos , seguindo
este conselho do próprio Goethe :
" O tradutor não deve empenhar - se em luta aberta e direta com a
língua estrangeira ; ao aproximar - se do intraduzível, deve respeitá -lo ;
pois, nele reside exatamente o valor e o caráter de cada língua ” .
O “ Fausto ” , como um todo inteiriço e harmônico, é intraduzível.
Respeitemo- lo !
GOETHE E A MÚSICA 1

WILHELM HAUSENSTEIN ( * )
(Membro correspondente da Academia Goe
theana de São Paulo ) .

Solicitado a pronunciar algumas palavras a propósito do grande


nome que especialmente nos comove neste ano de 1949 , palavras que
deveriam ser de júbilo e de reconhecimento -, não precisei meditar lon
gamente sôbre o que me cumpria dizer. É bastante sabido que Goethe
situava - se, frente a Mozart , numa relação francamente aprobatória, en
quanto que mostrava uma atitude menos incondicional para com Beetho
ven , não obstante a emocionante carta que lhe dirigiu Betina sobre o
compositor, e sem embargo de haver este comovido Goethe até as lágri
mas, com sua execução no concerto de Teplitz , em 1812. Também é bas
tante notório que Goethe apreciava Zelter, um espírito mediocre, cujas
canções não devemos entretanto subestimar, ao passo que, frente a
Schubert que verdadeiramente igualava as estrofes do poeta com
melodias do mesmo nível , fechava-se Goethe num constante mutismo ,
que hoje nos espanta, embora devamos saber que existem certos limi
tes para a compreensão, mesmo em se tratando dos homens mais geniais.
Para não nos afastarmos entretanto do assunto : todas estas coisas são
para ' nós de há muito conhecidas, não havendo portanto necessidade de
repisá -las aqui . Tudo isto me foi sempre bem claro , como também aqueles
fatos sobre os quais realmente vos devo falar . Sem desviar-me do tema
proposto, quero desde já esclarecer qual a finalidade desta minha con
ferência : ela deve limitar - se, com toda a necessária brevidade , a um
único trabalho de Goethe, um dos menores àquelas páginas publica
das em 1826 , que poeta designou com o título de “ Novelle ' '. Assim se
chamam elas : “ Novela " nada mais que simples novela.
E de fato , elas devem , para muitos, ficar como simples novela : No
velle, “ novella ” , significa desde Boccaccio e Bandello , “ Novidade ' '.
*) - - O Prof. Wilhelm Hausenstein , grande cientista , historiador da
arte, poeta e romancista alemão, é professor de História da Arte e Presi.
dente da Academia de Belas Artes da Bavária Suas obras mais conhecidas
são: " Rembrandt' ' , “ História da Arte " , " Artistas e Obras ', “ Viagem por
Baden “ , " Capitais Européias " , " Diálogo sobre D. Quixote" , " Lux Perpetua “ ,
" As máscaras do cômico Karl Valentin " , "Encontro com quadros” , “ Munich
ontem, hoje, amanhã " .
Ao Prof. Hausenstein, hoje considerado um dos mais eminentes ensais
tas e literatos da Europa, foi conferido, este ano, o Prêmio de Literatura
do Estado de Baden . Como membro correspondente, que é, da Academia da
Sociedade Goetheana de São Paulo, oferece a conferência ora publicada,
como homenagem à cidade de São Paulo e a Sociedade Goetheana .
128 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Estas páginas são, todavia , relativamente pouco conhecidas , e isso não


obstante pertencerem aos mais preciosos capítulos da prosa goetheana
se é que não se possa, e até mesmo não se deva afirmar, sejam elas
a mais bela prosa que Goethe jamais escreveu . A quem , entretanto, tal
afirmação pareça exagerada, sem considerar que as “ Novelas ” , que na
edição Cotta, de 1840 , das obras completas de Goethe , ocupavam apenas
vinte e sete páginas como convinha aos modos simples e sábios de um
homem de setenta e sete anos, replicamos : é preciso ao menos reco
nhecer que a “ Novela ” traz , em sí, o signo da perfeição , que somente
a maturidade mais nobre , a mais alta e mais calma superioridade de um
dos maiores gênios da humanidade poderiam produzir.
Neste sentido , deve-se acrescentar que este pequeno trabalho de
prosa encerra o Goethe total ; ele representa uma verdadeira " Summa ' '
de suas experiências humanas e de sua capacidade poética. E nem pode
ria ser de outra maneira , pois a “ Novela ” foi escrita quando Goethe
terminava, aos poucos , os “ Wanderjahre ” , dedicando-se ainda à segun
da parte do “ Fausto ” e escrevendo , nas “ Observações sôbre o crânio de
Schiller ' ', o poema de um homem velho que não amava a morte , que
não encontrava , para com ela , nenhuma relação decisiva , mas que medi
tativamente sabia prescrutar-lhe os olhos sombrios .
Que se passa , entretanto , na “ Novela " ' ?
Um príncipe alemão , reconhecidamente com a fisionomia de um
pequeno ou mediano potentado do século dezoito, suzerano , mas cheio
de humanidade ou , se quizermos empregar a linguagem daquela época,
68
" esclarecido” na mais perfeita acepção do vocábulo êste príncipe sai
à caça com seu séquito , e procura, num gesto de solicita delicadeza con
jugal , compensar a encantadora e jovem princeza . que não é prdpria
mente uma Diana, com uma excursão , a cavalo , ao castelo ancestral da
dinastia dominante , na agradável companhia de seu tio e de um jovem
e belo cavalheiro da côrte . Constituiria tarefa verdadeiramente fascinan
te mostrar como se acumulam , na “ Novela ” , os pontos de vista , as con
cepções básicas, as possibilidades e as necessidades de Goethe. Observa
ções assim exatas levar-nos-iam , entretanto , muito longe . Em lugar dis
so , ressaltaríamos, aqui , um único motivo dominante : refiro-me à con
cepção de Goethe das relações entre Arte e Natureza, como essa concep
ção se reflete na “ Novela ” , qual traço dominante de sua natureza huma .
na e poética,
Esse castelo , alvo da excursão da princeza e de seus dois compa
nheiros e que constitui , mais minuciosamente , o assunto da novela , acha
se em ruínas . Cresce -lhe a mata em derredor , com o vico primitivo
da floresta virgem . Mas é paixão da côrte transformar esse estado sel
vagem tanto do castelo em ruínas, como daquela floresta , em algo cui
dadosamente tratado e dominado por mãos de artista, transfigurar o es
tado natural da coisa, pelo dedo da forma , numa obra civilizada de
tal modo, entretanto , que sem perder-se o encantamento da natureza , se
introduza ali o da arte , que se deve acrescentar ao fascínio do natural .
Peço-vos encarecidamente que não julgueis porém , caros ouvintes ,
seja isto na verdade muito pouco . Oh ! não , pois , significa muitíssimo :
trata-se do ponto de intersecção entre Arte e Natureza , que constitui
uma das preocupações dominantes de Goethe e que deveriamos tam
bém reputar muito mais valioso do que costumamos . Natureza como
algo obtido através da Arte , natureza e arte em equilíbrio relativo , o
isto graças a uma discreta superioridade da segunda , a saber, da Arte,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 129

e também o inverso : Arte sem domínio da Natureza , Arte com a força


de uma torrente natural e eu me permito indagar se Goethe , com
tais aspectos, não teria essencialmente razão, mesmo acima de seu pró
prio tempo, em que predominavam os jardins ingleses ? ' " A Arte deve
primàriamente aperfeiçoar , se não quizer envergonhar-se diante da Na
tureza ” . Esta é a melhor “ proporção ” entre arte e natureza , traçada
pelo próprio Goethe na “ Novela ” .
Prossigamos, porém , no exame desta, até o fim.
A meio caminho , em sua escalada, percebem os três cavaleiros, lá
em baixo , na cidade principesca, fogo e fumarada : um incêndio , o qual ,
embora de dia , se afigura mais perigoso , eis que ali tem lugar uma quer
messe onde se exibem animais selvagens. E embora se leia que “ a luz
do dia amortecia as chamas' ' , tratava-se , sem dúvida, de um incêndio
com toda a força destruidora dos elementos. Não tarda muito , e eis que
surge , no caminho da princeza, um tigre que galga ràpidamente a escar
pa, fugindo ao fogo . O jovem cortezão aponta e atira, espicaçado pelos
ardores do cavalheirismo e da nobre paixão , salvando sua dama do
perigo iminente .
Perigo sim , pelo menos aparentemente. Mas só agora, entretan
to, atinge a “ Novela ” o seu momento culminante , revestindo-se de espe
cial significação para o nosso círculo musical : na verdade , não teria sido
necessário sacrificar a fera , pois esta poderia ser subjugada pela huma
na autoridade da Arte , através do poder da música. Chega a proprietá
ria dos animais selvagens , acompanhada de um menino que traz consigo
uma flauta , e exorta os excursionistas, aos quais vieram juntar-se os
nobres caçadores , atemorizados com os sinais do incêndio , a pouparem
pelo menos o leão , fugitivo também da feira em chamas , e em busca de
um refúgio naquelas montanhas . Afirma que a fera torna-se mansa e
cbediente ao som da flauta e das canções. E tudo sucede , a seguir, se
gundo suas assertivas.
Senhores e senhoras : onde chegamos afinal ?
Atingimos justamente o ponto em que Goethe empreende , nada
mais nem menos , que a tarefa de conjurar um estado quasi paradisiaco
na terra, tanto dos animais , como da fôrça bruta dos homens, que lhes
corresponde.
A transmutação no paradisíaco , ou digamos melhor , num estado
semelhante ao paradisíaco, pois o Paraiso mesmo continua impossível
nesta terra de pecado a transformação , portanto , nesse símile de
paraiso , se processa por meio do poder moralisante da Arte , especialmen
te da música. É esta, a música, como a Arte em geral , que pode condu
zir o homem à mais alta e verdadeira imagem de Deus : à quêle estado
de segura superioridade sôbre a natureza ' bruta.
Compreendamos esta verdade e esta sabedoria em seu alcance total :
Goethe deixa entender ( e com razão ) , que a liberdade do homem , da
qual o nosso poeta jamais duvidou seriamente, não se encontra ali onde
a exigem falsos profetas , para os quais o homem deveria simplesmente
entregar-se à sua própria natur za , mas onde uma liberdade metafísica
do homem mantém em disciplina sua natureza, sem desta nada abdi
car, pois já se disse : apenas impondo-lhe uma lei .
Creio poder-se afirmar que esta sabedoria e esta verdade da “ No
vela " estão conformes não apenas ao Humanismo , mas ao próprio Cris
* tianismo. Sabe-se como se tem discutido a posição de Goethe em relação
130 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ao Cristianismo. As palavras contra este e contra a Igreja poderiam ser


legião : torna-se todavia bem claro que prevalece o ponto de vista favo
rável , a saber, qualitativo, no sentido de que , substancialmente , o Cris
tianismo é mais que o Humanismo. É o que testemunha, de certo modo ,
seu diálogo com Eckermann, em 4 de fevereiro de 1829 : “ A religião
cristã é uma essência poderosa por si mesma, na qual a humanidade ,
abatida e sofredora, de quando em quando se reconforta ; e enquanto
se lhe reconhece esta força, ela se sobrepõe a todas as filosofias , e dis
pensa qualquer apôio destas ” .
Na verdade, isto não é exatamente a fórmula de um credo. Mas não
exprimiu Goethe todas as verdades em linguagem empírica, tal como era
seu próprio modo de ser ?
E acrescente-se : se uma passagem como essa da conversa com
Eckermann nada provasse , ainda restaria , como fato indiscutível , não
ser possível pensar-se em Goethe senão nessa atmosfera do Ocidente
cristão-humanista.
Mas voltemos agora, para terminar, à própria “ Novella ” .
O menino , a cantar e a tocar flauta ( e na verdade, para abrandar
as feras bastaria apenas a inocência de uma criança, no sentido do
Evangelho ) , êsse menino , com sua fiauta e suas canções, subjuga a
leão, e o conduz , sem resistência , a lugar seguro .
Se julgássemos descobrir , na Novela , apenas um traço transparente
do pensamento cristão do Paraiso , seríamos igualmente obrigados a re
conhecer , ali , por outro lado , também a influência dos clássicos da an
tiguidade.
Orfeu , cantor mítico , filho de Caliope , a de bela voz , musa da poe
sia épica, e filho também de Apolo ' que declamava as odes O som da
citara, cantor e educador , enfeitiçava com seus melismas as árvores e
campos , as féras e os rochedos . Com todas estas faculdades , foi ele o
iniciador de uma escola teológica, a teologia órfica.. E música , educa
ção, civilização , cultura e teologia, tudo isso se desenvolve conjunta
mente , constituindo ali uma unidade .
Arion , filho de Netuno e de uma ninfa , poeta lendário e músico de
Lesbos, criador , mais ou menos no ano 600 A. C. , dos artísticos ditiram
bos , um poema para flauta , regressando a Corintho , de volta dos
torneios poéticos de Tarento , lançou-se à travessia pelo alto mar, amea
çado pelos piratas , e empunhando a lira é conduzido à praia de Taiña
ron por um delfim , que lhe ouvira tanger as suaves canções . Narra-o
Heródoto , e August Wilhelm von Schlegel , inspirado no assunto , com
pôs mesmo uma balada .
E ainda Daniel incólume na cova dos leões, não é bem uma repre
sentação da sabedoria divina expressa nos Testamentos ? E não se dá
o leão por companheiro a Jerônimo , Padre da Igreja , leão como que
moralmente humanizado pelo poder superior , humano e cristão do espi
rito, e ao qual o Santo na hierarquia das criaturas de Deus , também ser
via ao retirar-lhe o espinho que lhe atravessava a garra amizade
essa representada por Dürer e Cranach ? E quantos santos da Cristan
dade não mostraram essa força apaziguadora do espírito , essa sobera
nia espiritual , ao chamarem à disciplina os animais selvagens, até o
mais musical dos santos, Francisco de Assis , abrandando o lobo de Gub
bio ? Não discuto aqui a autenticidade dos fatos : trata-se apenas do espi
rito do Cristianismo, o qual uma simples legenda poderia evidenciar.
E ainda mais : animais selvagens não foram reduzidos a um estado
pacífico , como em Regensburg , na igreja de São Jacob ou em Freising ,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 131 .

nas Colunas dos Animais , na cripta da Catedral ? Leões domesticados


não suportam as colunas de pórticos romanos ? Não se acham os animais
selvagens como que integrados nas catedrais , como se foram inofensivos ?
E para ficarmos ainda no círculo da “ Novella " : à vista do tigre
inanimado , exclama a princesa : “ Tudo que no coração existe de miseri
cordioso , desabrocha a um tal espetáculo ! ' '
Desejo finalmente fazer sentir, ainda uma vez , como a “ Novela "
de Goethe se aproxima do antigo Humanismo , e mais ainda, de uma con
cepção cristã da vida, quando o menino canta, entre floreios da flauta :

Ressoando das profundezas , lá da cova dos leões ,


Ouço a voz do profeta.
Anjos pairam no ar, reconfortando - o ...
Que poderia o justo ali temer ?
Sensíveis aos hinos suaves e piedosos ,
Vêm-lhe o leão e a leña, amorosos, aos pés ...

Reina o Eterno sobre a terra,


E seu olhar domina tôda a amplidão do mar ...
A vaga retrocede , torna-se o leão cordeiro ,
E o gládio refulgente estaca no ar !
Soou a hora da fé e da esperança ,
E poderoso é o amor que se encerra na prece !

Anjos abençoados
Aconselham-se com as puras criancinhas ,
Para promoverem o bem , desviando a vontade do mal ...
E o tirano das selvas, como filho querido ,
Vem-lhes ao doce regaço ,
Tocado pela piedade e por suave melodia ..."

Não será isto mais que o dúbio sentido de uma simples alegoria ?
Sim . Aí temos , antes , um como que legado , cheio de pressentimentos,
dos últimos instantes ...
Seria preciso recordar que em 1820 havia Goethe traduzido o “ Veni
Creator Spiritus ” , e que em 25 de fevereiro de 1824 declarava a Ecker
mann : “ Com Lorenzo de Médici gostaria de dizer que já estão mortos ,
para esta vida , aqueles que não esperam nenhuma outra ' ' ?

( Tradução de W. Treumann . )
REFLEXÕES SOBRE A DIALÉTICA DO FAUST

RENATO CIRÉLL CZERNA


( da Academia Goetheana de São Paulo ) .

Ao leitor desprevenido , o que está acostumado a pensar e julgar


“ logicamente ” , no sentido da lógica comum , ou de um ponto de vista
que poderíamos denominar, juridicamente, absolutamente “ legalista " o
estritamente “ formalista ' ', a leitura do Faust poderia causar uma im
pressão de contradição e incorência , ou , pelo menos, de surprêsa.
Não analisaremos a tão discutida relação entre o romantismo da
primeira parte e o classicismo da segunda ( que , como é sabido, surgiu
depois que Goethe , como vulgarmente se diz " descobriu ” o mundo clás
sico ) relação que , apesar de encerrar , como todas as coisas do espírito ,
problemas profundamente filosóficos , possui um interêsse principalmen
te histórico-literário, e, em todo caso , formal .
Existem , mesmo assim , no Faust, vários momentos característicos
pela sua oposição, que permanece aparentemente irresolvida , e que ,
como tal , deixa um sentimento de insatisfação . Sobretudo , porém , é o
próprio tema e motivo informador de todo o drama , que parece encer
rar a maior contradição, que parece a conclusão impossível de sua pró
pria premissa.
Vemos Faust, doutor e alquimista medieval , espírito profundamen
te insatisfeito e inquieto, concluir um pacto com o demônio , com as
célebres palavras :

Werd'ich zum Augenblicke sagen ;


Verweile doch ! Du bist so schoen !
Dann magst Du mich in Fesseln schlagen,
Dann will ich gern zugrunde gehn,
Dann mag die Totenglocke schallen ,
Dann bist Du deines Dienstes frei ,
Die Uhr mag stehn , der Zeiger fallen,
Es sei die Zeit fuer mich vorbei.

O pacto consiste em que Faust pede ao demônio que lhe faça


conhecer novos prazeres , realizar novas ações , efetuar novas experiên
cias , adquirir novos conhecimentos , possuir a vida em toda a sua pleni
tude ; em troca éle , Faust , dar - lhe- á a sua alma, mas , assim mesmo,
com uma condição, contida na implícita declaração de que , apesar de
todas estas novas experiências materiais e espirituais , ele nunca sentir
se - á inteiramente satisfeito , que nunca dirá ao " momento "?: permanece !
134 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

és tão belo ! Se isto acontecer, ele será de Mefisto. É pois um pacto a


uma aposta. E Mefisto aceita a aposta. E , quanto a ele , cumpre-a inte
gralmente, dando a Faust tudo o que este pedira. Faust, por seu lado,
não a cumpre : porquanto , no fim da vida, chega um momento de supre
ma felicidade, ao qual diz :

Dem Augenblicke duerft'ich sagen :


Verweile, doch, Du bist so schoen !

A aposta pois , foi perdida por Faust. E Mefisto constata-o com.


satisfação , com os seus servidores :

Die Uhr steht still ...


Steht still,
Der Zeiger faellt

Assim mesmo , porém , o pacto que devia ser cumprido em virtude


daquela aposta, não é cumprido . Os anjos , intervindo no último momen
to , levam a alma de Faust ao Paraíso . E Mefisto exclama, irritado :
“ Wer schafft mir mein erworbnes Recht ? ”
Na interpretação de alguns ( 1 ) , entretanto , Mefisto só tem razão
em relação à sua aposta com Faust ; mas acontece que ele havia efetua
do também outra aposta , e esta com Deus , aposta que Deus mesmo , de-
pois de permitir a Mefisto tentar conquistar Faust, assim sintetiza :

" Und steh beschaemt, wenn Du erkennen musst :


Ein guter Mensch in seinem dunklen Drange
Ist sich des rechten Weges wohl bewusst.

O que é confirmado mais tarde , quando os anjos , carregando a alma .


de Faust, declaram :

Wer immer strebend sich bemueht,


Den koennen wir erloesen .

Em que pese o seu pacto com Mefisto, Faust sempre tende à reali
zação de valores , e realiza-os justamente em sua ação , em suas expe
riências, em seus novos conhecimentos . E como éstes valores são eter
nos, Faust não pode perder-se :
Es kann die Spur von meinen Erdetagen
Nicht in Aeonen untergehn ...

É de se notar o paradoxo que , indiretamente , ele deve esta realiza


ção de valores , que o eterniza, esta constante tendência, mesmo que in
consciente , ao bem , que o salva, ao próprio demônio , porquanto tôdas.
estas experiências e realizações deve-as ao pacto com ele firmado . Isto,
entretanto só do ponto de vista material .
Mefisto não compreende que tendo cumprido o pacto e vencida a.
aposta, ele saía , contudo , perdendo . Acontece porém que éle , enquanto
potência inferior ou " chtonica " , não compreende : os valores aos quais
tendem , ou que indicam , aquelas mesmas ações que ele facilita. Só o
espírito humano , só o homem , que , em potência, é ao mesmo tempo ,
Deus e Demônio , é “ cidadão de dois mundos ' ', age em referência a valo
1) Sauer Juristische Methodenlehre Zur Deutung von Goethes :
Faustdichtung .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 135

res, ou seja, princípios validos que transcendem a vida e a realidade


material,
Segue- se que Mefisto nem sequer pode compreender o espírito hu
mano , justamente no que ele tem de mais essencial , aquela tensão
( Spannung ) entre polos opostos, entre Bem e Mal ( que já outro gran
de poeta sintetizara com as célebres palavras : “ Video meliora proboque,
deteriora sequor " Metm . VII , 20 - ) , tensão que o condiciona como
espírito humano . Por isto mesmo , no fundo , Mefisto não pode dar a
Faust realmente tudo . E é o próprio Faust quem o diz , e prediz :

Was willst Du armer Teufel geben ?


Ward eines Menschen Geist in seinem hohen Streben,
Von deinesgleichen je gefasst ?

Contudo , esta interpretação corriqueira , que põe de um lado o dua


lismo irredutível de Mefisto , ou melhor , o seu estrito formalismo, e do
outro o espírito “ tri-dimensional” de Faust, ainda que , no fundo , seja
verdadeira , não satisfaz plenamente , especialmente porque lhe falta uni
dade intima, e porque, permanecendo neste plano , a passagem de uma
a outra destas esferas que descreve, permanece inexplicada e sem jus
tificação. É insuficiente e incapaz de preencher a lacuna que consiste na
aparente contradição a que acima aludimos. E a unidade a cuja expres
são quer chegar , no Faust, o espírito do próprio Goethe, unidade que
á síntese de opostos num plano superior que os abrange e os condiciona,
permanece irrealizada.
Esta unidade, entretanto , poderá achar expressão de um outro pon
to de vista ; procuremos analisar um pouco mais alguns dos pontos que
aparecem como polos contraditórios, e veremos que, na realidade, cons
tituem partes de uma unidade, se forem analisados à luz da dialética
que exprimem e que os anima.
A lacuna da interpretação a que acima aludimos , e que consistia
justamente numa superposição de esferas demasiadamente arbitrária e
afirmativa, será preenchida unicamente , a nosso ver , si adotarmos um
ponto de vista lógico-dialético .
O Mundo ideal que aquela interpretação stricto-sensu metafísica
afirma existir acima da aparência sensível , unicamente compreendida
por Mefisto, mundo ideal ésse que, ao contrário , é intuido por Faust, o
afinal , a afirmação de que o sentido da vida transcende a vida. Nós po
rém , reconhecemos esta transcendência , reconhecemos a validez eterna
de uma esfera supra -vital, supra -material, supra-temporal , justamente
partindo da esfera da lógica pura. Porque é aí que nos damos conta do
próprio conceito de transcendência , o qual , neste caso, se revela no fato
da inexistência ou pelo menos da irrelevância de qualquer conteúdo con
ceitual em si, sem referência a outro que não é ele mesmo , da não -vali
dez de um conceito fechado em si mesmo , sem relação com a forma que
o condiciona, ou seja , com uma dialética que o ultrapassa enquanto de
terminado, para que ele exista enquanto tal conceito . É este justamente
o setor a partir do qual lógica e metafísica tornam-se um todo.
Uma das maiores expressões desta síntese reside na concepção Kan
tiana da “ Tarefa infinita ” . ( Unendliche Aufgabe ) . Nela reside , em par
te, o profundo sentido de suas doutrinas , que as tornam formalmente
insuperáveis pela evolução material das concepções Efetivamente, a dou
trina kantiana, da razão teorética , das condições a-priori que estrutu
136 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ram necessàriamente a própria experiência, as intuições puras de espaço o


tempo, e as categorias , têm sido repetidamente criticadas em nome da
evolução da concepção natural do Mundo , na qual se baseavam , e acusa
das de uma certa rigidez em relação , por exemplo , às categorias à priori,
etc.. Entretanto , além do conteúdo de suas doutrinas, para nós, em par
te , ainda hoje válido, porquanto a evolução da representação natural do
universo , pode modificar o seu conteúdo material mas não a sua forma,
Kant acentua que a conquista , por parte do conhecimento , da idéia en
quanto Verdade , é uma tarefa infinita. Nesta concepção é que reside
justamente a mais alta síntese entre o aspecto puramente “ lógico ' de
sua doutrina gnoseológica , tantas vezes acusada de formalismo , e o seu
aspecto profundamente metafísico , em seu sentido autêntico de trans
cendente, de válido acima da realidade imediata, mesmo que lógica , ( ou
seja a experiência como síntese de conteúdo e forma a priori ) . E , atra
vés dela, nos damos conta de que é principalmente o sentido e não o
conteúdo material , que vale numa verdade filosófica. A concepção de
Kant da infinitude e inexgotabilidade do conhecimento , oposta de certo
modo ao seu “ conteúdo " fixo e , superável , mostra o sentido de supera
ção que reside , como dialética em germe , na própria idéia de Tarefa
infinita. O “ Sentido" é que é sempre fecundo. Daí também estar esta
verdade expressa na inegável superioridade da síntese sôbre a análise,
até mesmo no próprio estudo de qualquer verdade enquanto representa
da temporalmente por um sistema ou um problema. Por isto , admi
tir-se a forma ( ou idéia ) como imanente à coisa, com o realismo aristo
télico, ou o valor como imanente ao fato ( com o realismo crítico ) , e
uma posição insustentável. Do próprio ponto de vista realista, bem ana
lisada , esta afirmação é uma contradictio in adjecto . Porquanto , mesmo
admitindo-se a autonomia da coisa, quando dizemos : “ a forma é ima
nente à coisa ” , das duas uma : ou temos a intenção de negar à idéia,
forma ou valor , qualquer sentido , qualquer validez , e neste caso intro
duzimos o seu conceito e o seu nome de maneira absolutamente arbitrá
ria e jocosa ; ou , pelo contrário, admitimos essa validez, e neste caso ,
idéia, forma ou valor possuem uma validez lógico-objetiva que trans
cende a coisa como tal.
Do ponto de vista idealista porém , a coisa ou ser é sempre objeto
do espírito , e como tal inteiramente estruturado pelas suas leis, Eis por
que o objeto , qualquer objeto , qualquer conceito , é necessariamente mo
vido por princípios dialéticos . Enquanto pensado , e condicionado pelo
pensamento , em sua essência está incluído o seu oposto, numa grande,
interdependència de relações . Bem e Mal, Universal -singular, não são
pensáveis sinão um referido ao outro , do qual é , pelo menos num pri
meiro momento , oposto . Posto um dêstes princípios , está pôsto ao mes
mo tempo o outro .
O princípio dialético , lei fundamental do espírito, é o processo atra
vés do qual os opostos , que não são contradição real mas funcional , atin
gem novamente a unidade, na sintese que os transcende, mas que , ao
mesmo tempo, os funda , e que por fundá-los possibilita -os como opos
tos , e é por sua vez possibilitada através desta mesma oposição , num
movimento contínuo e vivo , inexistente no conceito fechado, ou na coisa
em si , irredutível e imóvel .
À luz dêste princípio dialético é que conviria analisar algumas das
oposições e contradições existentes no Faust , que se revelarão como tais
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 137

apenas no plano imediato, não porém no plano transcendente, em que


se unem sinteticamente .
A primeira das oposições que chama a atenção é a oposição entre
Bem e Mal. Aqui , somos forçados a proceder com grande cuidado, e a
estabelecer várias distinções e comparações .
Faust, como foi dito, é um espírito inquieto e insatisfeito , que
tende à aproximação sempre maior , mas nunca alcançada , aos supremos
princípios de Beleza, de Sabedoria , Justiça , às “ figuras Originais ' ' (Ur
bilder ) . O seu espírito é , por excelência “ Streben ” , impulso , tendência
ansiosa. E como tal , começa por apresentar -se como uma verdadeira
tensão entre dado e ideal , terrestre e supra-terrestre, entre Bem e Mal .
Esta tensão é representada com grande dramatismo e realidade pelas .
palavras :

Zwei Seelen wohnen , ach, in meiner Brust,


Die eine will sich von der andern trennen ;
Die eine haelt in derber Liebeslust
Sich an die Welt mit klammernden Organen .
Die andre hebt gewaltsam sich von Dust
Zu den Gefilden hoher Ahnen ...

Em Faust temos assim , dêste ponto de vista, dois elementos que:


ainda que em estreita relação recíproca, são contudo distintos : a tensão
entre Bem e Mal , ( Spannung ) e o impulso ( Streben ) à superação desta..
mesma tensão , à superação da matéria, em direção aos “ Originais ' '.
Streben e Spannung, com efeito , não se identificam . Tensão , em si, não
significa ultrapassar a coexistência de Bem e Mal , e muito menos abolir
éste último ; enquanto que “ Streben ” é sempre tendência a superação .
Assim mesmo , especialmente no espírito de Faust, éste impulso esta
condicionado pela própria tensão , enquanto tendência a superá-la.
Temos porém , que considerar que , para tornar mais complexa a
situação que devemos esclarecer , de certo modo , a tensão entre Bem e
Mal, revela-se também ... em Mefisto . Mefisto , que em muitos aspectos
poderia ser considerado nada mais do que a parte má de Faust , define-se
a si próprio como sendo “ uma parte daquela fôrça que sempre quer 0 .
mal e sempre promove o bem "

Ein Teil von jener Kraft ;


Die stets das Boese will usd stets das Gute schafft.

Mefisto mesmo é potência do mal , diz ele próprio que o mal “ é seu ele
mento ' . Será interessante então constatar que a tensão entre bem e mal ,
a dialética íntima entre os dois princípios , existe , de certa maneira,
também no espírito mau , e não é mera invenção . Quando , com efeito ,
Faust está morto , e os anjos chegam para levar a sua alma, a arma qua
usam contra Mefisto e os seus espíritos , não é o poder físico , mas é , de
certa maneira , despertar-lhe uma certa intuição de bem , e mesmo de
bondade , um sentimento de pena que lhe produz , é verdade , um extremo
mal estar ( afinal , trata-se do diabo ) mas que , apesar de ser-lhe imposto
por forças contra as quais é impotente, e não ser expontâneo , produz o :
efeito desejado, Mefisto então , constata com ira e surpresa que os anjos ,.
que detesta, lhe parecem amáveis :

Die Wetterbuben , die ich hasse,


Sie kommen mir doch gar zu lieblich vor !
138 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

E quando os anjos chegam , afinal ao Empireu , trazendo o “ espírito


imortal ” de Faust, declaram que os demônios , e até o velho satanás ,
sentiam amor, ao invés dos castigos do inferno :

Statt gewohnter Hoellensqualen


Fuehlten Liebesqual die Geister,
Selbst der alte Satansmeister
War von spitzer Pein durchdrungen.

Mas deixemos esta intima dialética de Mefisto e voltemos a Faust ,


do qual ele, sem dúvida, sempre foi a parte má . E que o foi , prova-o ,
entre outros, o pequeno episódio de Baucis e Filemon , dois pobres ve
lhos que Faust, senhor de toda a região que queria transformar , para
bem de milhares , desejava deslocar, tendo disso encarregado a Mefisto,
o qual , ao invés de cumprir a ordem de Faust e limitar-se a deslocar o
casal e sua residência , destrói-a , incendia tudo , os infelizes morrem ,
Faust , recebida a notícia, exclama , com ira e tristeza :

Wart ihr fuer meine Worte taub !


Tausch wollte ich, wollte keinen Raub.

Independentemente do momento dialético que poderíamos denominar


“ interno ' ', da vontade de Faust , que ao mesmo tempo quer e não quer
quer realizar a sua grande obra e eliminar o empecilho , e ao mesmo
tempo não quer que seja feito mal aos velhos oposição que , como
muito bem observa Rudolf Kassner ( 2 ) encontra a sua unidade na Ver
dade total em que ele quer e não quer, existe ainda o que poderiamos
denominar a dialética do seu destino ,
Cumpre - se afinal , o destino , porque , na realidade , Faust queria o
Bem, mas cumpria o Mal; cumpria o Mal , mas queria o Bem. E , com
êste traço , aproxima-se do : “Video meliora proboque , deteriora sequor " .

Então temos três tipos de tensão entre Bem e Mal :

Video Meliora , deteriora sequor

Mefisto que é uma parte daquela fôrça, que sempre quero


Mal e sempre promove o Bem .

E Faust, que cumpre o mal , mas tende ao Bem .

A tensão é especialmente entre Mefisto quer o bem, faz


o mal , e Faust : sequer deteriora , sed volo meliora.

Em Faust pois , entra propriamente , ao contrário de Mefiso, que ,


se indiretamente faz o bem ( condicionando o impulso de Faust ) , contu
do quer o mal , em Faust entra , dizemos, o momento “ Streben " , inclu
sive como vontade ao Bem , e portanto a idéia de liberdade e auto - cria
ção do espírito , contraria ao fatalista Ovidio, que , bem ou mal , com sua
fórmula, limita-se a constatar.
Por outro lado , justamente enquanto faz o mal , mas quer o bem .
é oposto a Mefiso que quer o mal , mas faz o bem .

2) Das Neunzehnte Jahrhundert 1947.


REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 139

Assim mesmo, Mefisto aparece comº o outro polo dialético de Faust :

1 ) Enquanto Faust quer o bem mas faz o mal, e, fazendo-o , também


o quer , no momento ; e aqui Mefisto aparece justamente como a
parte má de Faust. Contudo , não basta dizer-se no sentido , por
exemplo, da psicologia de Jung ( 3 ) que Mefisto não passa de po
tência psíquica , de " função arquetípica " de Faust, porque além
de sua dialética própria ( quer o mal faz o Bem ) , subsiste a
outra, que consiste em que a identidade é também objetividade ,
autonomia de Mefisto , enquanto outro polo de uma alteridade
transcendental .

2 ) Como outro polo de uma unidade que scindiu -se em :


querer o Bem fazer o Mal
querer o Mal fazer o Bem .
Há pois , de qualquer forma, uma relação dialética entre Fausto
Mefisto , que deixa vislumbrar a unidade originária e posterior , o prin
cípio e o fim do processo , o Alfa e o Omega.
Porque , apesar de tudo , e especialmente daquilo que parece mais
paradoxal , ou seja a indireta criação de Bem por Mefisto , e até mesmo
aquele estranho sentimento que os anjos lhe inspiram depois da morte
de Faust , a Unidade da qual tudo provém , e na qual vige , para falar
.com Nicolas de Cusa , uma “ Coincidencia Oppositorum ” , é implícita em
todos estes momentos , em todas as aposições e paradoxos . Porque todas
as oposições não são senão a cisão da Unidade , que está antes e depois,
que é princípio e fim : é a Allgemeinheit Hegeliana ( 4 ) , a Universali
dade que precede os particulares , os quais de la provém , mas dos quais
é também fim , porquanto através de seu processo dialético voltam a Ela .
O próprio Mefisto dá a entender o sentido dêste Um , do qual ele pro
vém , e Faust , e todas as oposições citadas :

Ich bin ein Teil des Teils, der Anfangs alles war
Ein Teil der Finsternis, die sich das Licht gebar ...

Eu sou uma parte da parte que antes era o Todo


Uma parte das Trevas que geraram a Luz

Outro par de momentos antitéticos , que constitui um aspecto pro


fundamente significativo e que é para nós de grande interésse , é forma
do pela oposição entre Natureza e Espírito.
Aqui também os momentos integrantes são extremamente movimen
tados e apresentam-se com uma considerável variação .
A principal forma sob a qual se nos apresenta a oposição acima é ,
pelo menos na primeira parte , representada respectivamente por Faust
e Wagner, seu fâmulo .
Faust , com efeito , aparece , desde o princípio , ansioso por aprofun
dar -se na natureza , sentí-la , captá-la , possuí- la , deixar-se inteiramente
dominar e levar pelo seu todo , como Cosmos , sentir a própria intimida
de e realizar , de certo modo , a própria identidade com ela . A este senti
3) Jung Symbolik des Geistes 1948 .
- V. Iljin Die Philosophie Hegels als kontemplative Gotteslehre.
140 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

mento da natureza, a esta inquieta ansiedade por entrar em contacto


com ela , contrapõe-se , desde o princípio , o conhecimento , como tal, a
ciência , o saber . Já no primeiro monólogo , pouco antes de invocar o
“ Espírito da Terra ” , Faust dá a entender a insuficiência desta “ scien
cia " :
Da steh ich nun, ich armer Tor
Und bin so klug als wie zuvor ...

Queixa-se amargamente da vida de “ estdioso ” que leva, absoluta


mente oposta ao seu impulso para a Natureza, vida na qual “ ao invés
de estar cercado pela natureza viva , em que Deus criou os homens,
acha-se rodeado , em fumaça e pó , por ossos de animais e de esqueletos " :

Statt der lebendigen Natur


Da Gott die Menschen schuf hinein,
Umgibt in Rauch und Moder nur
Dich Tiergeripp und Totenbein.
E exclama, pouco depois , ansiosamente :
Wo fass ich dich , unendliche Natur ?

No passeio que realiza com Wagner , novamente exprime esta ansie


dade , esta “ Sehnsucht ” para a Natureza, o imenso desejo de embeve
cer-se com sua beleza e seu poder . Wagner não o compreende, e res
ponde que “ as alegrias do espírito , que nos levam de livro em livro , sáo
muito mais atraentes " :

Wie anders tragen uns die Geistesfreuden


Von Buch zu Buch, von Blatt zu Blatt !

Mas Wagner não compreende a Natureza , ou , pelo menos , enten


de-a escolasticamente como um dado , a ser usado pela razão científica ,
e por isto não a intui em sua totalidade viva e fecunda . Wagner repre
senta , de certo modo , esta mesma razão científica , é homem sem ge
nialidade e sem intuição , que se esforça por compreender , por ordenar e
classificar, numa generalidade vazia , abstraída da realidade fragmentá
ria e sem unidade . Por isto mesmo , o seu Homúnculo , homenzinho arti
ficial criado por ele , que , na segunda parte , torna-se alquimista, homún .
culo que , ao contrário , representa de certo modo , em germe, a ansia
do homem que , antes de entrar em contato com a natureza , é artificial ,
em apreender esta mesma natureza para poder surgir ( entstehen ) , po
derá dizer-lhe , sarcasticamente , que o seu destino é descobrir as insig
nificâncias , os pontos dos iis , e que isto merece como recompensa : ouro,
honra , fama, ciência talvez virtude :

Indessen ich ein Stuckchen Welt durchwandre


Entdeckst Du wohl das Tüpfchen auf das i
Dann ist der grosse Ziel erreicht ;
Solch einen Lohn verdient ein solches Streben :
Gold , Ehre, Ruhm , gesundes langes Leben ,
Und Wissenschaft und Tugend auch vielleicht.

Deixemos de lado agora , a opinião histórico-cultural de alguns ( 5 ) ,


segundo a qual a tríade Wagner-Homúnculos e Faust querem simboli
5 ) - Richard Nönigswald - " Homunculus" in Fritz medicus Festschrift
1946.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 141

zar, respectivamente a Idade Média , e a intuição ainda obscura, o im


pulso ainda inconsciente que dela provém ( Homunculus , como criatura
de Wagner, homem medieval ) , para o miundo clássico e a liberdade do
espírito, da renascença, que Faust encarna plenamente ; e limitemo -nos
a constatar que , de qualquer maneira, Wagner é bom o representante
da razão estreita e classificadora , e Faust do impulso à natureza e ao
espírito. Mas qual a relação entre estas duas entidades , especialmente
em face de sua aparente contradição ?
Faust detesta esta ciência , e declara a Mefisto que tem repugnan
cia a este " saber ” .
Des Denkens Faden ist zerrissen
Mir ekelt lange vor allem Wissen.
Será interessante notar, porém , que por outro lado , o próprio Me
fisto declara que o despreso por razão e ciência, que são a suprema força
do homem , é prejudicial , leva-o às potências inferiores , adversárias do
espírito, simbolizadas por ele, Mefisto :
Verachte nur Vernunft und Wissenschaft
Des Menschen allerhoechste Kraft,
Lass nur in Blend und Zauberwerken
Dich vor dem Luegengeist bestaerken
Dann hab'ich dich schon unbedingt!

Teria então Wagner razão ? E Faust, será apesar de seu famoso


impulso, que vimos anteriormente , um inimigo do espírito ? Talvez , se
ficarmos só nas aparências ; mas o próprio espírito que está atrás des
tas, revelar - se - á novamente como unidade, como síntese armonizadora,
be analisarmos a já mencionada oposição.
Mefisto, como se viu , apesar de reconhecer o perigo do desprezo da
ciência , é sem dúvida o maior interessado em provocá-lo em Faust ,
( dann habe ich dich schon unbedingt ) , e rejubila-se por poder -lhe insti
lar, como sentimento oposto ao amor pela ciência , o impulso à natureza,
através da qual acredita afastá-lo do espírito . Mas é que Mefisto , sem
pre , e apesar de tudo , um pouco superficial , confunde Natureza e
Sinnlichúet, materialidade sensível , gôzo material da vida. Wagner, por
sua vez, identifica espírito e saber científico, mas , especialmente em vir
tude de sua pouca inteligência, torna éste saber mera erudição e pedan
teria. Não ama a Natureza , porque não intui nela , o espírito.
Mefisto, e isto lembra o que foi dito de sua estranha dialética,
engana-se, porque Faust não vê na Natureza apenas materialidade , mas
aspira a superar a estreitez do mero “ saber ” wagneriano , para o todo
que a Natureza representa . A sua oposição não é ao espírito , mas ao
esteril intelectualismo de um Wagner , ao “ saber ” meramente classifi
cativo, utilitário , à pedanteria intelectual e mera erudição. Então
temos finalmente que concluir , que " saber ” enquanto tal , e " espírito ” .
não se identificam . E por isso Faust opõe-se a Mefisto e a Wagner, for
malmente. Wagner elogia o saber e a ciência , Mefisto procura destrui
los. Mas ambos acreditam que opor-se-lhe é de certo modo opor-se ao
espírito.
Faust entretanto intui , na natureza , justamente o espírito.
Que a natureza seja aí entendida, não como um mero dado à razão,
comum , nem como conjunto de coisas e fatos opostos ao espírito en
quanto construtor de teorias científicas , nem como impulso aos prazeres
materiais, mas sim como totalidade espiritual, como símbolo do proces
142 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

so divino no mundo , parece claro nas próprias palavras do “ Espírito da


Terra ” , por Faust invocado , e que descrevem realmente esta totalidade,
e a maneira pela qual éste espírito tudo penetra, na eterna variação da
vida e das ações , de nascimento e morte, e " no tear do tempo tece o
vestido vivo da divindade " :

In Lebensfluten , im Tatensturm
Wall ich auf und ab
Webe hin und her
Geburt und Grab
Ein ewiges Meer
Ein wechselnd Weben,
Ein gluehend Leben
So schaff ich am sausenden Webstuhl der Zeit
Und wirke der Gottheit lebendiges Kleid ....

A natureza enquanto espírito contrapõe-se então à pequena “ ciên


cia ” erudita . Ou por outras palavras : enquanto só “ ciência ” a razão é
insuficiente para representar o todo. Mas , na verdade , natureza e razão
unem-se numa síntese , que é o espírito que está na base de ambas. Con
tudo, seria errado pensar que isto representa uma espécie de animismo
ou de “ pan -psiquismo" , de " beseeltheit” da natureza. Com efeito, e
êste é o ponto em que mais forte se revela o princípio dialético , a natu
reza é espírito justamente enquanto como tal é captada pelo espírito en
quanto pensamento . E por isto , nada mais contrário à natureza como
espírito, do que a tendência puramente , afetiva de aniquilamento psíqui
co. A própria identidade de eu , enquanto pensamento, e natureza , dá-se ,
para o eu , no próprio eu , e constitui uma síntese transcendental que
ultrapassa éste e , em seu aspecto físico e psíquico , num momento de
eternidade .
Homúnculo , que é uma criatura artificial , tem um forte impulso
para a natureza , da qual, aliás , do ponto de vista alquimistico, provém.
Com que ansiedade exclama , depois de ouvir , na “ Klassische Walpur
gisnacht” Thales e Anaxagoras falar em natureza :

Ich horchte zu, es hiess : Natur, Natur !

Mas, como criatura artificial , quando entra em contato com a Na


tureza, aniquila-se e desaparece.
Tal não se dá com Faust : a síntese é em seu próprio espírito , por
que é através dêle que , por sua vez , intui a natureza como espirito .
Nesta unidade de Natureza e espírito , em que ela própria é como
tal intuída , temos , de certa maneira a síntese das sínteses. As demais
oposições tendem , de certo modo , a unificar-se nela . E isto da-se tanto
com a oposição entre Bem e Mal, como forma fundamental , como uma
das leis constitutivas da dialética do espírito , como também com a opo
sição entre Romantismo e Classicismo . Analisar esta última em seus
elementos e múltiplos aspectos seria demasiadamente longo , e trans
cenderia os limites destas breves considerações. Diga-se de passagem
que esta oposição , uma das fundamentais do Faust , revela -se em parte ,
como de início mencionamos , na posição esquerda de Mefisto , espírito
pertencente ao mundo romântico , no mundo clássico , no cenário da
" Klassische Walpurgisnacht ” , ( lembrem-se a éste respeito as palavras
de Homunculo , dirigidas a Mefisto :
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 143

Romantische Gespenster kennt ihr nur allein


Ein echt Gespenst auch klassisch hat's zu sein !

e também no estranho episódio do castelo medieval de Faust nos domi


nios de Helena , em plena Grécia clássica, que exprime da ' maneira mais
profunda a dialética , incompreensível à primeira vista , daqueles dois
mundos, sintetizados numa espécie de momento eterno , de presença e
entrelaçamento de clássico e romântico no pensamento do próprio poe
ta : e limitemo-nos a constatar que , sem dúvida , esta oposição é de
carater histórico-cultural , e como tal, no fundo, uma projeção do espírito,
Por outro lado , se voltarmos novamente a considerar por alguns
instantes a oposição entre Bem e Mal , veremos facilmente que aí tam
bém há uma estreita relação com a oposição natureza e espírito . Não é
por mero acaso que o chanceler imperial exclama que “ Natur ist Suen
de ”, o se nos lembrarmos da visão cosmogônica de um Jacob Boehme
( da qual tanto atingirá Hegel para a sua Teodicéia, o sofrimento divi
no em seu vir-a-ser no mundo ) , com a sua coincidência de Bem e Mal
em Deus , e o seu surgir temporal , em que Bem e Mal cindem-se , cisão
em que o mundo é o Mal , tornar-se-á ainda mais clara a intima unida
de que reside em todas estas intuições.
Mas fiquemos por aqui . O que interessa é refletirmos no sentido
da unidade suprema a que aludimos, como momento eterno, ou seja
aquele momento do espírito, objetivado e transcendental , em que a uni
dade é atingida. Com referência a éste “ momento eterno ” compreende
remos então, porque , no fundo , não há contradição entre as duas atitu
des de Faust , a inicial , em que declara que nunca dirá ao momento :
permanece, és tão belo!, ou seja nunca sentir -se- á satisfeito ou acre
ditará ter alcançado o fim supremo , e a final, em que , pelo contrário .
declara gozar o seu “ supremo momento ” ' :

Im Vorgefuehl von solchem hohen Glueck


Geniess ich detzst jen hoechsten Augenblick ;

e porque não há incoerência na sua salvação , apesar de ter , aparente


mente , perdido a aposta com Mefisto . A explicação meramente metafi
sica da intuição de princípios transcendentes por parte de Faust e não
por parte de Mefisto, é insuficiente se não fôr informada pela intuição ,
lógico - dialética da conexão acima. Do ponto de vista dialético, porém ,
não há contradição entre o “ Werde ich zum Augenblicke sagen ..” , e o
"Geniesse ietzt den hoechsten Augenblick ''. Porque, na realidade , cum
pre -se a parte material, ou seja a morte material de Faust , porque a
sua vida material não tinha mais sentido , não possuia “ impulso " de su
peração, " Streben ” . Mas não se cumpre a parte formal , a morte eterna
de Faust, exatamente em virtude da dialética do conceito “ Augenblick "
Na realidade Faust queria dizer : "se eu identificar o momento material
com
O momento eterno , serei teu ' ' . Mas isto não se dá . Faust nunca
perde de vista que “ tudo o que passa é somente um símbolo ” ' :

Alles Vergaengliche
Ist nur ein Gleichnis.
momen eternidade vislumbrada
A to, não se ident por Faust , quando exclama gozar o seu
ifica como “ Verweile doch , du bist so schoen ! ” .
144 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

A segunda vez “ Dem Augenblicke duerft’ich sagen , etc." , é entendida


do ponto de vista temporal como uma réplica de “ Werde ich zum Augen
blike sagen , etc." , e por isto Faust morre . Mas do ponto de vista eterno ,
como intuição da Eternidade. É que, enquanto eternidade, ele não se
identifica com o momento enquanto só material e temporal .
Podemos então realmente concluir com o Poeta, que, neste sen
tido, o Momento é Eternidade :

Der Augenblick ist Ewigkeit,


GOETHE ALS DENKER UND MENSCH 5

ALBERT SCHWEITZER

( Membro Correspondente da Academia Goe


theana de São Paulo ) .

Goethe ist ein Denker. Dies bekommt jeder zu erfahren , der sich
irgendwie mit ihm beschäftigt. In so manchen seiner Dichtungen klingen
Weltanschauungsfragen an .
Aber dieser Denker will nichts mit Denksystemen zu tun haben,
Stolz bekennt er von sich , er habe es so weit gebracht, weil er nie über
das Denken selbst nachgedacht habe . Er hat also eine gewisse Abneigung
gegen das , was man Philosophie nennt.
Wie ist er darauf gekommen ? Gleich wo er mit der Philosophie
der Aufklärung bekannt wird , zuerst in Leipzig , dann in Strassburg , hat
er eind gewisses Misstrauen gegen sie. Er hat den Eindruck , dass er das ,
was er von ihr auf den Hochschulen erfährt, eigentlich von sich selber
gewusst habe . Was ihn an dieser Philosophie des 18. Jahrhunderts
abschreckt, ist, dass ihr Begriff des Ethischen nicht geläutert ist. weil
sie immer , und zuweilen in fast oberflächlicher Weise, versucht, das
Ethisehe . als das Nützliche zu begründen und begreiflich zu machen,
Unsympathisch an dem Denken des 18. Jahrhunderts ist ihm auch , dass
es meint , alles erklären zu können , und dass es keine Geheimnisse
bestehen lässt. Darin offenbart sich für ihn , dass es keine tieferen
Begriffe vom Wesen des Seins und von dem des Ethischen hat.
Nun vollzieht sich bei ihm , in Strassburg , die Loslösung vom Denken
der Aufklärung. Und zwar kommt der Bruch durch Voltaire . An Voltai
res Denken missfällt Goethe , dass er, um die Kirche zu bekämpfen, über
soundso viel Dinge der Bibel spottet. Zwar weiss Goethe selber , dass in
den Dokumenten des Christentums die Geistigkeit und das Ethische
nicht immer in derselbeu Klarheit und Tiefe vorhanden sind. Aber als
Dokumente des christlichen Glaubens sind ihm die Bücher der Bibel
heilig. Er leidet nicht, dass man leichtfertig von ihnen redet . So ist seine
Abneigung gegen die Philosophie seiner Zeit völlig geworden durch die
französische Aufklärung. Mit dem Denken überhaupt, wie es an den
Hochschulen gelehrt wird , will er nichts zu tun haben . In Dichtung und
Wahrheit bekennt er, dass er und seine Freunde ganz auf die Natur
zurückgehen wollen.
Sie wollen sehen , wie weit sie mit der Natur kommen . Überall,
wo Goethe dann in der Zeit der Blüte einer neuen , kühnen Philosophie,
die er miterlebt, irgendwie mit einem philosophischen System zusam
146 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

menkommt, stellt er drei Fragen an es. Je nachdem das in diesem


System sich kundgebende Denken diese Fragen beantwortet , verhält er
sich zu ihm .
Erste Frage : Inwieweit ist es dem Denken möglich , ohne Vor
eingenommenheit durch irgendein System auf die Natur einzugehen und
den Menschen in unmittelbarer, harmonischer Weise mit der Natur
verbunden sein zu lassen ? Zweite Frage : Inwieweit ist dieses Denken
zu einem Begriff des Ethischen gekommen ? Dritte Frage : Inwieweit
ist es, wo es zu den letzten Fragen des Daseins vordringt und sie zu
lösen , versucht, gewillt , sich einzugestehen , dass er vor Geheimnissen
steht, deren Schleier es wohl niemals ganz lüften kann ?
Goethe versucht sich in die grossen Systeme , mit denen er bekannt
wird, hineinzufühlen und hineinzudenken , soweit er nur immer kann .
Zuweilen tut er sich geradezu Zwang an . Wo er mit den grossen Donkern
seiner Zeit zu tun hat , empfindet er , dass seine natürliche Abneigung
gegen das philosophische Denken ihn nicht ganz beherrscht. In einem
Brief an Zelter sagt er einmal geradezu , dass die natürliche Abneigung ,
die jeder Mensch , der auf Erfahrungswissenschaft ausgeht, gegen das
philosophische Denken besitzt, nicht zu einer dauernden Abneigung
ausarten darf, sondern sich in eine kluge, stille Neigung zum Denken
auflösen muss .
Wie verhält er sich nun zu den Denkern , mit denen er es in
seinem Leben zu tun hat ? Der erste Denker , der auf ihn einwirkt , ist
Herder , dem er im Jahre 1770 in Strassburg begegnet . In Herder mach :
er mit einem Menschen Bekanntschaft, der von dem allzusehr verstan
desmässigen Denken des 18. Jahrhunderts losgekommen ist und die
Ansicht hat , dass wir uns durch ein tiefes Miterleben in die Natur
einfühlen müssen , um sie einigermassen zu versteheu . Herder , ein wirk
licher historischer Kopf , der sich mit den Problemen der Geistesge
schichte und der Sprachgeschichte der Menschheit beschäftigte , öffnet
ihm Horizonte , die er nicht geahnt hat. Goethe ist ihm dankbar für die
Anregung , die er von ihm empfängt .
Von Strassburg wieder nach Frankfurt zurückgekehrt, findet er
seinen eigentlichen Meister in Spinoza . Spinoza hat es gewagt, den
Gedanken zu denken , dass Gott und die Natur ineinander sind und nicht
nebeneinander bestehen . In seinem Hauptwerk “ Die Ethik ” versucht
er, in dem Nachdenken über Gott und die Natur zugleich zur Erkenntnis
des Wesens des Guten zu gelangen .
Was zieht Goethe an Spinoza an ? Dass er die Überzeugung, dass
Gott und die Natur zusammen gehören und dass Gott in der Natur wirkt
und sich in ihr offenbart , die er selber in sich trug , nun in klarer Weise
ausgesprochen findet. Weiter schätzt er an ihm , dass dieser die Ethik
darin bestehen lässt , dass der Mensch die Vervolkommung erstrebt, zu
der er bestimmt ist. Also nichts von Nützlichkeitserwägungen, wie sie
sich in der Philosophie des 18. Jahrhunderts fanden. Das Glück besteht
in Innerlichkeit , Durch Spinoza wird Goethe auf sich selber zurückge
lenkt . Er läutert sich . Das allzu ungestüme Wesen legt sich . Man kann
sich fragen , was aus dem jungen Goethe in der entscheidenden Zeit
nach der Rückkehr aus Strassburg geworden wäre, wenn ihn der Geist
Spinozas nicht in seine strenge Zucht genommen hätte .
Und nun , ganz von Spinoza erfüllt , ist er vorerst ziemlich un
interessiert für das, was in der Philosophie seiner Zeit vorgeht. Dafür
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 147 "

haben wir ein Zeugnis von Schiller. Im Jahre 1787 , während Goethe in
Italien weilt , kommt Schiller nach Weimar , und in einem Briefe ap '
Köorner lässt er sich über Goethe und seine Freunde aus . Er urteilt, dass
Goethe und die Seinen keine Lust haben , sich mit Philosophie abzugeben .
sondern dass sie von einem bis zur Affektion getriebenen Attachement
an die Natur beherrscht seien . Eine gewisse kindliche Einfalt der
Vernunft kennzeichne ihn und seine Freunde. Man suche lieber Minera .
lien, als dass man sich mit philosophischen Spekulationen abgebe.
Ein Jahr später aber , als Goethe aus Italien zurückkehrt , muss er
sich mit der Philosophie beschäftigen . Denn an der Universität Jena
wird Kantsche Philosophie gelehrt .
Die “Kritik der reinen Vernunft " war erschienen . Der Grund
gedanke der Kantschen Philosophie ist , dass wir die Dinge nicht sehen ,
wie sie sind. Wie sie wirklich sind , ist für uns unerkennbar. Wir dürfen
die Sinnenwelt nicht als Wirklichkeit , sondern nur als Erscheinung der
Dinge in Raum und Zeit nehmen. Sich in diese Lehre einzudenken,
damit quält sich Goethe nun ab . Aus einem Brief an Wieland vom
Februar 1789 erfahren wir , dass er mit grosser Applikation das grosse
Werk von Kant studiert . Im Jahre 1794 schliesst er Freundschaft mit
Schiller . Durch diese Freundschaft ist er gezwungen , sich weiter mit
Kant zu beschäftigen . Schiller geht so in Kant auf , dass er fast sein
eigenes Wesen verliert. Ihm zuliebe versucht Goethe , sich die Kantsche
Erkenntnistheorie zu eigen zu machen . Es will ihm nicht gelingen . Im
mer wieder kommt er zu seinem natürlichen Realismus zurück , in den :
Dingen Wirklichkeit zu sehen und sich mit ihnen als mit solchen zu
beschäftigen. In der Gedenkrede , die er 1813 auf Wieland hält , sagt er,
dass ihm und dem Verstorbenen das gewaltige Werk der Kritik der
reinen Vernunft , wie eine Zwingfeste erschienen sei , durch die die
Menschen abgehalten werden sollten , sich unbefangen in der Natur zu
ergehen . Aber etwas findet er in diesem Werke , das ihm Kant lieb .
macht , nämlich die Lehre vom “ kategorischen Imperativ ' '. Kant versucht
nicht , das Gute als das Nützliche zu begründen . Das Gute ist ihm etwas
viel Tieferes . Nun ist ihm Kant der Bundesgenosse gegen die oberflächli
che Auffassung vom Guten .
Nach Kant erfährt das deutsche Philosophieren eine merkwürdige .
Wandlung. Es folgen eine Reihe von Philosophen , deren Denken etwas
Phantastisches an sich hat , Ihren Gedankengang zu verstehen , ist nicht
leicht . Sie gehen darauf aus , die logische Notwendigkeit zu begreifen ,
dass das reine, zeitlose , einheitliche Sein sich in ein vielgestaltiges , in
der Zeit Ablaufendes entfalte . Bei diesem Unternehmen sind sie von der
Uberlegung geleitet, dass die Erkenntnis des Wesens und des Sinnes
dieser Entfaltung des Seins die des Sinnes unseres Lebens in sich enthält.
Die grössten Vertreter dieses sogenannten spekulativen Denkens :
sind Fichte , Schelling und Hegel . Mit allen dreien hat Goethe sich befasst.
Von sich aus steht er solchem Denken ablehnend gegenüber . Seine
Parole ist ja , in unbefangener Weise auf die Natur einzugehen . Hier
stellt sich aber irgendein phantastisches Denken zwischen die Natur
und den Menschen . Aber das Ergebnis dieses Denkens , dass das Unendli
che sich in dieser gewaltigen , vielfältigen Natur entfaltet habe , zieht
ihn an.
Irgendwie hat der gewaltige Geist dieses Denkens es ihm angetan.
Er fühlt sich mit ihm in dem Streben verwandt . In dem Verfahren aber
geht er seinen eigenen Weg. Die Erkenntnis, zu der die andern durch
148 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

die Schaffung kühner Systeme zu gelangen suchen, erwartet er von der


Versenkung in die Natur.
Zu Fichte hat er kein innerliches Verhältnis . Er ist ihm ein Brau
sekopf. Mit Schelling aber ist er befreundet. Bei Hegel imponiert ihm
das gewaltige historische Wissen. Deswegen will er ihm verzeihen , dass
er alles in einer ganz ungeniessbaren Sprache ausdrücke. Er sagt von
ihm , dass er ein ganz bedeutender Mensch sei und sogar manches vorzüg.
lich ausspreche , wenn man es sich in seine eigene Sprache übersetze .
Aber er geht doch davon aus , dass dieses philosophische Unternehmen
keinen rechten Boden unter den Füssen habe . Und während die ganze
Umwelt in dem Glauben lebt , dass man mit diesem kühnen, logischen
Denken eine Erkenntnis erreicht habe wie nie zuvor, weiss er, dass es
etwas Vorübergehendes ist und dass das Denken wieder dazu kommen
muss, sich in sachlicher Weise mit dem Sein , wie es uns in der Natur
entgegentritt, auseinanderzusetzen. Darin hat er recht behalten . Um das
Jahr 1848 ist dieses Denken zusammengebrochen .
So hat sich Goethe mit allem Denken , das ihm in seinem langen
Leben begegnet ist, befasst. Er hat von keinem etwas angenommen ; aber
aus' Gewissenhaftigkeit hat er versucht , in dem fremden Denken sein
eigenes zu klären.
Welches sind nun die Gedanken , die seine Weltanschauung ausma
chen ? Er hat sie nie in ihrem Zusammenhang dargestellt. Sie finden
sich zerstreut in dem , was er geschrieben hat. Aber ganz natürlich fügen
sie sich zu einem Ganzen zusammen. Sein Denken ist einfachste Natur
philosophie . Zur Wahrheit gelangt man, meint er , wenn man zur Natur
nichts hinzudenkt , sondern ohne vorgefasste Meinung an sie herantritt ,
sich in sie versenkt und mit aufmerksamem Ohr lauscht, ob man etwas
von den Geheimnissen , die in ihr sind, vernehme. Wo man immer mit
der Natur sich auseinandersetzt, ob man viel oder wenig bei ihr finde,
so reiche , was man in ihr entdeckt, aus , um Helligkeit auf den Lebensweg
zu werfen und dem Menschen etwas zu bieten , von dem er geistig leben
kann . Von vornherein habe man darauf vorbereitet zu sein , auf diese
Weise nicht zu einer vollständigen Weltanschauung zu gelangen wie
diejenigen , die ein System erdichten , sondern dass man in einem
unvollendeten Hause leben müsse. Auszugehen ist von dem Gedanken,
dass , wo die Natur alles ist, die tiefste Gotteserkenntnis dadurch zu
erreichen ist , dass wir Gott in der Natur suchen und uns in die Ansehau ng
hineinfinden , dass er in allen Dingen und alle Dinge in ihm sind . Sie
sind es zunächst in natürlicher Weise . Alles , was geschieht , ist äusserung
des uns unbegreiflichen Wesens Gottes als des Urgrundes des Seins.
Dieser in der Natur begründeten Erkenntnis des Wesens Gottes und der
Zugehörigkeit zu ihm gibt Goethe in so manchen Gedichten Ausdruck.
Er spricht damit nichts Neues aus. Die Mystik aller Zeiten , die des
Altertums , des Mittelalters und der Neuzeit , beruht auf diesem Gedan
ken . Das Eigentümliche bei Goethe ist aber , dass er ihn in einem äusserst
lebhaften Naturempfinden und als Ergebnis einer in die Tiefe gehenden
Naturwissenschaft ausspricht. Er ist ein Denker, der Naturwissenschaft
treibt.
Sein Verhältnis zur Natur ist durch den tiefen Ernst, mit dem er
sich ihr naht , gekennzeichnet. Darin steht er über den Denkern der
Renaissance .
Wie er zu der Natur steht, spricht er als Greis in den Worten aus :
" Die Natur ist immer ernst. Sie ist immer streng. Sie ist immer wahr.
Alle Irrtümer sind immer auf seiten der Menschen. Dem Unzulänglichen
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 149

verschliesst sich die Natur, und nur dem Zulänglichen und Wahren und
Reinen gibt sie sich gerne hin und offenbart ihm ihre Geheimnisse. "
Charakteristisch für Goethes Waltanschauung ist ihre Wahr
haftigkeit und ihre Einfachheit. Von der Natur ausgehend , versenkt er
sich in sie. Dabei stellt sich ihm die Frage , an der alle Naturphilosophie
anlangt : wie aus der Ergründung der Natur die Idee des Ethischen zu
gewinnen sei. Mit diesem Problem hat die Naturphilosophie sich abzu
mühen. Goethe verfährt dabei in einfacher Weise. Ihm zufolge ist das
Ethische in der Natur enthalten und kommt in ihr zur Entwicklung.
Es gibt, sagt er einmal , nicht nur physische Evolution in der Natur ;
auch die Geistesgeschichte der Menschheit ist nicht etwas für sich ,
sondern eine Bewegung in der Evolution der ganzen Natur . Wie sich die
Struktur von Pflanzen und Tieren verändert, so bleibt auch in dem
geistigen Leben nicht alles stehen, sondern nach der Anlage , die darin
ist , entwickelt es sich . Wenn bei den Propheten und bei Jesus der
Gedanke des Ethischen als der Gedanke der Liebe aufkommt , so will
dies heissen, dass der Gedanke der Liebe in dem Urgrund des Seins selber
ist und dass Gott, der diese Natur erhält und den wir als Schöpferkraft
erkennen . zugleich Urgrund der Liebe ist. Durch die Erfahrung , das
heisst , durch Natutbeobachtung , stellen wir fest , dass das Gute nicht
irgendwelche Einbildung, sondern etwas Naturhaftes ist, das auf Gott
zurückgeht, dass also der Mensch sich in seiner wahren Art entwickelt,
wenn er gut ist.
Obwohl wir in der Natur nichts von Liebe sehen , ist die Liebe in
der Natur. Sie ist in der geistigen Evolution der Menschheit in Erschei
nung getreten .
Und nun, wo der Mensch sein Verhältnis zur Natur als ein ethisches
begriffen hat , weiss , er, dass er auch seinem geistigen Wesen nach Gott
angehört , dass er durch die Liebe in Gott ist und dadurch die Bestimmung
seines Lebens erfüllt. Mehr braucht er , nach Goethe , nicht zu wissen .
Goethe bescheidet sich , in einem unvollendbaren Hause zu wohnen.
Wenn er nur die Gewissheit hat , seiner Bestimmung nach ein ethisches
Wesen zu sein , kann er die anderen Fragen , wenn er sie nicht zu lösen
vermag, dahingestellt sein lassen . Seiner Resignation gibt er in dem
Worte Ausdruck , dass man im Endlichen bis nach allen Seiten des
Erforschlichen zu gehen habe, das Erkennbare verfolgen solle bis zu den
Urphänomenen, in denen sich die Gottheit offenbart, und sich bescheide ,
das Unerforschliche als Geheimnis zu verehren . Wir sind nicht da , urteilt
er, die Probleme der Natur zu lösen , sondern zu sehen , wo die Probleme
anfangem , um unsern Weg in dem Erkennbaren zu suchen .
Er ist also davon befreit , mit soundso viel Fragen , die man sonst als
wichtig für die Weltanschauung angesehen hat , beschäftigt zu sein und
sie zu lösen zu suchen . So hält er dafür , das er sich nicht damit abzuge
ben habe, wie das Ewige und das Zeitliche sich zueinander verhalten .
Es genügt ihm zu wissen , dass in allem Zeitlichen sich ein Ewiges offen
bart. Ebenso hält er es mit dem Problem , wie das Geistige und das
Materielle sich zueinander verhalten . Er kann sich dabei beruhigen , dass
in derselben Weise , in der Gott und die Natur zusammengehören , dies
auch für das Materielle und das Geistige der Fall ist . In diesem Gedan
ken , dass er das Ewige in dem Zeitlichen hat und dass er nicht über die
Natur hinaussehen muss findet Goethe eine merkwürdige Ruhe. So sagt er :
“ Willst du ins Unendliche schreiten , geh nur im Endlichen nach allen
Seiten " und " Was ist Unendlichkeit , wie kannst du dich so quälen ? Geh
in dich selbst. Entbehrst du drin Unendlichkeit, im Sein und Sinn, so ist
150 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

dir nicht zu helfen ." Sein Gedanke ist, tiefste Versenkung in die Natur ,
In diesem Suchen steht er einsam da in seiner Zeit .
Noch eine Frage, die er dahingestellt sein lassen kann : die der
Fortexistenz . Goethe trägt den Unsterblichkeitsglauben in sich . Dern
alles Zeitliche ist für ihn nur eine Erscheinungsweise des Ewigen. So
sagt er einmal in einem Gespräch : " Ich lebe ganz ruhig , denn ich weiss,
das menschliche Wesen ist unvergänglich . " Aber wie es unvergänglich
ist, das ist ihm ein Geheimnis . Wir können , meint er , uns Gedanken
darüber machen ; aber wenn wir uns vorzustellen suchen , dass wir unver
gänglich sind , werden wir immer auf Widersprüche stossen, die uns
hindern , dies ganz auszudenken . Was wir mit einiger Sicherheit von
unserer ewigen Fortexistenz wissen , ist, dass wir fortwirken . Wenn etwas
sicher ist , dann ist es , dass jedem einzelnen Menschenwesen von Gott
ein Wirken bestimmt ist, das nicht erst in diesem Leben anfängt oder
mit ihm aufhört , sondern unendlich ist. Manchmal finden wir bei Goethe
Versuche, sich diese unendliche Existenz des Wirkens vorzustellen . Auf
de Heimweg von dem Begräbnis von Wieland innerlich bewegt, wie
er in jener Stunde ist , geht er aus sich heraus und redet davon , wie er
versuche , sich das ewige Leben vorzustellen . Alsbald aber fügt er hinzu ,
dass das alles nur vage Gedanken sind. Der wahre Unsterblichkeitsglaube
des Menschen ist nicht , dass er gequält ist von der Sehnsucht nach
Unsterblichkeit . Ihm zufolge gilt es , den Unsterblichkeitsglauben durch
Wirken in dieser Welt zu bewähren , dass er sich durch dieses. Wirken
läutere auf das ewige Wirken hin , das ihm Gott bestimmt hat . Dies ist
in seiner Schlichtheit der Unsterblichkeitsglaube Goethes.
Nun noch die letzte Frage : die der Weltanschauung . Weil sich das
Denken , um zu einer vollständigen Weltanschauung zu gelangen , nicht
mit dem Erkennbaren zufrieden geben kann , sondern Gedanken hinzu
denkt, um sich das Unsichtbare , den Sinn der Welt , begreiflich zu
machen , unternimmt er etwas Beanstandbares . Goethes Ansicht ist die ,
dass der Mensch viel zu klein ist , um der Welt einen Sinn geben zu
können . Während die andern darauf bestehen , dies zu tun, um den Sinn
ihres ethischen Wirkens in ihr begreifen zu können , bedarf Goethe dessen
nicht . Ihm zufolge hat der Mensch aus innerer Notwendigkeit ethisch
zu sein . Kein Ding der Welt ist Zweck auf einen Zweck hin , sondern die
Dinge der Welt sind Zweck für sich selber . Aber , sagt Goethe , in dem
lebendigen Geschehen hat jedes einzelne Geschehen zugleich eine
Beziehung zum Gesamtgeschehen , das heisst , es geschieht nichts , was
nicht eine Beziehung zur Gesamtheit hat . Der Sinn der Welt erfüllt sich
also, wenn jedes einzelne Wesen seinen Sinn erfüllt. So ist der Mensch
davon befreit , zu einer Erkenntnis des Sinnes der Welt gelangen zu
müssen . Er hat sich dem Gedanken hinzugeben , dass er den Sinn seines
Lebens , wie er ihn empfindet , erfüllen muss . Der Sinn des Lebens ist,
dass der Mensch das Gute , das in ihm ist , entwickle und dem Bösen , das
diesem Guten hemmend entgegenwirkt, widerstehe .
Die Bestimmung des Menschen ist , dass er er selber werde . Dies
kann , nach Goethe , in nichts anderem bestehen als in dem Wahrhaft
Gut-Werden . Goethe erkennt den in der Überlieferung enthaltenen , in
der Geistesgeschichte der Menschheit entstandenen Begriff des Guten als
allgemeingültig an , während ihn Nietzsche verwirft.
Goethes Ethik ist beherrscht von dem Begriff des Edelwerdens.
In dem Spruch “ Edel sei der Mensch , hilfreich und gut" nennt er es an
erster Stelle , weil es in seiner Vorstellung des Guten diesen Platz
innehat . Dass der Mensch das Gute , wie es in einer Persönlichkeit
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 151

vorhanden ist , verwirkliche und damit in höchster Weise er selber


werde , darauf kommt es an. Nach Goethe haben wir uns nicht alle unter
einen Begriff des Guten zu beugen und das Gute als etwas anzusehen ,
das uns auferlegt ist. Wir haben das Gute , das zu unserem persönlichen
Wesen gehört, zu verwirklichen , also als Persönlichkeit gut zu werden ,
nicht jeder in derselben Art , sondern jeder als ein ethisches Wesen für
sich . Das Ethische ist für Goethe etwas Allgemeingültiges , aber in indivi
dueller Ausprägung. Er selber hat es als Edelwerden zu leben gesucht.
Als das eigentlich Gute in seinem Wesen war ihm verliehen Wahrhaftig
keit , Lauterkeit und Friedfertigkeit. Dass er dies sein wollte und in
aller menschlichen Unvollkommenheit auch war , kann man ihm nicht
absprechen . Wer sich in sein Leben vertieft, ist ergriffen von der Art,
wie er sich anhält. die Wahrhaftigkeit, die Lauterkeit, die Friedfertig
keit, die in ihm ist, in seinem Leben zu verwirklichen . Niemals hat
Goethe irgendwie reagiert auf all die vielen offenen und versteckten
Feindseligkeiten , die ihm begegneten. Er ist bei allen diesen Angriffen
still und ruhig seines Weges gegangen.
Und dann auch die ungeheure Lauterkeit. Er geht immer seinen
Weg. Man wirft ihm vor , dass er für die tätige Liebe nicht genug Ver
ständnis habe , dass ihm das Enthusiastische abgehe , Aber wo das Licht
der tätigen Liebe in etwas mattem Glanze bei ihm brennt , strahlt es
doch in tiefer Flamme . Er hat die Liebe , die ihm eigentümlich war,
verwirklicht. Er hat eine Abneigung gegen alles Enthusiastische . Sein
Ideal ist das Gediegene . Er will nicht, dass man dem Menschen zumute.
im Enthusiasmus anders sein zu wollen , als er von Natur aus ist. Höher
als das Enthusiastische steht ihm die Innerlichkeit. Darum bekämpft er
die Ethik seines berühmten englischen Zeitgenossen Bentham , die den
Einzelnen für die Gesamtheit in Dienst nehmen will , um durchrsein Tun
das möglichst grosse Wohl möglichst vieler Menschen zu verwirklichen
Er schilt Bentham einen alten Narren , weil er , indem er den Einzelnen
nicht als Einzelnen leben und sich betätigen lässt, die natürliche Beziehung
zwischen dem Einzelnen und der Gesamtheit stört. Das höchste Mass von
Liebe in der Welt, urteilt er, wird nicht dadurch erreicht , dass man den
Einzelnen immer wieder zwingen will , sein eigenes Wesen aufzugeben ,
sondern dadurch , das jeder Einzelne Liebe verwirklicht , die eigentüm
liche Liebe , die in ihm ist. Dann wird viel mehr Liebe sein , in natür
licher Weise aus dem Einzelnen hervorgegangen , und damit viel mehr
Glückseligkeit , als wenn man den Einzelnen seine Persönlichkeit aufge
ben lässt und ihn nur noch etwas sein lässt , das für die Allgemeinheit da
ist. Dies ist der Kampf zwischen Goethe und Bentham .
Das menschliche Denken kommt nicht voran , wenn nicht Men
schen einen Gedanken , der in ihnen ist , in seiner ganzen Echtheit und
Reinheit denken. Goethe und Bentham sind die beiden Pole des ethischen
Denkeng. Denn Goethe ist nicht, wie man zuweilen sagt, der grosse
Egoist gewesen. Er war steif , ungeschickt , schüchtern . Dies verbarg er
hinter einem angenommenen majestätischen Wesen. Aber seinem inneren
Wesen nach ist er schlicht und mitfühlend geblieben. Jetzt wo fast alles,
was sich in den Archiven und den Briefen findet , veröffentlicht ist,
kennen wir sein eigentliches Wesen und sein Leben und können sagen ,
dass er sich keinem entzog , der seiner wirklich bedurfte. Er hat Zeit und
Geld daran gewandt , um Menschen über Wasser zu halten . Wo ihm mit
Undank begegnet wurde, ist er still seines Weges gegangen . Von einem
Arzt Vogel wissen wir , dass ihm Goethe Mittel zum Helfen zur Verfügung
stellte. Wenn er unter seinen Patienten Bedürftige hatte , konnte er
152 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

darüber verfügen, nicht nur talerweise , sondern in ansehnlichen Summen ,


bis zu der Höhe , die ihm angebracht schien. Bis auf das Totenlager ist
Goethe damit beschäftigt gewesen , dem und jenem zu helfen. Gewiss , er
überrascht manchmal durch zur Schau getragene Kälte. Aber solche,
die ihn näher kannten , bezeugen , dass doch lebendige , tätige Liebe in
ihm war. Sein Ideal vom Menschen ist der Mensch, der sich verinnerlicht
und als solcher die Liebe übt, die bestimmt ist, in ihm zur Geltung zu
kommen.
Zur Goetheschen Weltanschauung gehört die Resignation . Auch in
dem Sinne , dass man nicht um des Erfolges willen wirken soll, sondern
einfach aus innerer Notwendigkeit. Sehr schön drückt er dies einmal in
Anlehnung an ein Gleichnis Jesu aus , wenn er sagt, dass der wahre , zum
Wirken bestimmte Mensch sein müsse wie der Mann im Gleichnis , der
den Samen nach allen Seiten auswirft, unbekümmert darum , wo und
wie er aufgeht. Damit hat er den Sinn dieses Gleichnisses verstanden ,
Dies sind die Hauptzüge des Denkens Goethes , das er niemals im
Zusammenhang dargestellt hat. Sicherlich hätte er Einflus auf seine
Zeit gehabt, wenn er sich selber überwunden und es als Ganzes vorge
tragen hätte . Er aber meint , dass ihm bestimmt sei , das Ergriffensein
von dem Geheimnis der Welt und von dem des Edelwerdens in seine .
Dichtungen hineinzulegen und es in ihnen durch Generationen hindurch
weiterglühen zu lassen . In dieser Weise hat er seine Bestimmung erfüllt .
Was kann der Mensch von seinem Geistigen der Welt hinterlassen ?
Goethes Meinung ist, dass dieses Vermächtnis nicht in Systemen , sondern
in Bekenntnissen besteht, aus denen die Späteren entnehmen können ,
was wir gemeint, gedacht, erlebt und gewollt haben . Aus dieser Selbst
mitteilung werden diese sich aneignen , was ihnen wertvoll erscheint
und ihnen den Eindruck bleibender Wahrheit macht. So ist Goethe sich .
selber treu geblieben, indem er uns keine geschlossene Weltanschauung
hinterlassen hat , sondern einfach ein Bekenntnis zu Gedanken einer
Lebensanschauung, die er in menschlicher Unvollkommenheit in seinem
Leben zu verwirklichen suchte .
Das Grösste an einem Denker wird immer bleiben , dass seine Gedan
ken und sein Leben eine Einheit bilden . Dies ist bei Goethe der Fall .
Darum ist er auch , wenn er eine gewisse Abneigung gegen die Philoso
phie hat, ein Denker, ein einflussreicher und wohltätiger Denker. Keiner ,
der sich mit ihm beschäftigt , geht bei ihm leer aus, sondern nimmt von
ihm etwas mit für sein Leben .

( Vortrag 1982 ) .
SOCIEDADE GOETHEANA DE SÃO PAULO

Presidente honorário :
Dr. Abrahão Ribeiro .
Presidente :
Dr. José Horacio Meirelles Teixeira .

Vice - Presidente :
Dr. Renato Cirell Czerna .
1.º Secretário - Tesoureiro :
Dr. Wolfgang Pfeiffer
2.• Secretário :
Dr. José da Veiga Gonçalves de Oliveira.
Conselheiros :
Dr. Pedro Xisto de Carvalho ,
Dr. Werner Treumann ,
Dr. Carl Albert Loo ,
José Antonio Benton ,
Prof. Dr. Pedro de Almeida Moura .

ACADEMIA GOETHEANA DE SÃO PAULO

Diretor da Academia :
José Antonio Benton ,
Secretário :
Dr. Wolfgang Pfeiffer,
Os Membros :
São Paulo :
Geheimrat Prof. Dr. Martin Ficker ,
Desembargador Prof. Dr. F. Pontos de Miranda ,
Dr. Abrahão Riboiro ,
Prof. Dr. Henrique da Rocha Lima,
Prof. Dr. Alfonso de E. Taunay,
1 Prof. Dr. Sergio Buarque do Holanda ,
154 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Prof. Dr. Herbert Baldus ,


Prof. Dr. J. H. Meirelles Teixeira,
Prof. Dr. Raul Briquet ,
Dr. René Thiollier ,
Dr. Nuto Sant'Anna ,
Dr. José de Reis ,
Dr. Renato Cirell Czerna ,
Sr. Cleomenes de Campos.

Membros Correspondentes da Academia Goetheana :

Belo Horizonte :
Prof. Dr. H. G. Ritter .

Rio de Janeiro :
Prof. Dr. Florivaldo Linhares.
Pernambuco :
Prof. Dr. Pinto Ferreira.
Chile :
1 Prof. Dr. Alberto Theile , Santiago ,
Dr. Udo Rukser, Quillota,
Prof. Dr. Humberto Diaz Casanueva , Santiago ,
Prof. Dr. Yolando Pino Saavedra , Santiago ,
Prof. Dr. Ramon dela Serna , Santiago ,
Prof. Dr. Enrique Molina, Concepcion.
Argentina :
Prof. Dr. Werner Bock , Buenos Aires ,
Prof. Dr. h . c . Carlos Vaz Ferreira, Buenos Aires,
Prof. Dr. Emilio Oribe , Buenos Aires ,
Dr. Luis Giordano, Buenos Aires ,
Dr. Eduardo Mallea , Buenos Aires ,
Dr. Jorge Luis Borges , Buenos Aires ,
Dr. Luis Emilio Soto , Buenos Aires,
Prof. Dr. Francisco Romero , Buenos Aires,
Dr. Ezequiel Martinez Estrada, Buenos Aires.
México :
Prof. Dr. Alfonso Reyes , México.

Estados Unidos :
Prof. Dr. Erich von Kahler , Princeton ,
Prof. Dr. Karl Loewenstein , Amherst,
Prof. Dr. Werner Vortriede, Madison Wisconsin ,
Prof. Dr. Arnold Bergstraesser, Chicago,
Maestro Fritz Busch , New York ,
Dr. Carlo Francisco Weiss , New York .
Canadá :
Prof. Barker Fairley , Toronto.
Prof. Victor Lange , Cornell University..
Lambarene Congo :
Prof. Dr. Albert Schweitzer ,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 155

Alemanha :
Prof. Dr. Anton Kippenberg, Marburg/ Lahn,
Prof. Dr. Gustav Radbruch , Heidelberg,
Prof. Dr. Wilhelm Hausenstein , Tutzing Muenchen,
Prof. Dr. Oscar Schuerer, Aschaffenburg,
Prof. Dr. Werner Milch , Marburg / Lahn ,
Ministro Dr. Erwin Stein , Wiesbaden ,
Prof. Dr. Ernst Beutler, Frankfurt a. M. ,
Geheimrat Dr. Wilhelm Hertz , Friedberg,
Dr. Fritz Usinger, Bad Nauheim ,
Prof. Dr. W. Bultmann , Marburg / Lahn ,
Prof. Dr. Heinrich Frick, Marburg / Lahn,
Prof. Dr. Ernst Benz , Marburg / Lahn ,
Prof. Dr. Alwin Kuhn , Marburg / Lahn ,
Prof. Dr. Max Deutschbein , Marburg / Lahn,
Prof. Dr. Walter Fischer , Marbur / Lahn ,.
Prof. Dr. Richard Hamann , Marburg / Lahn ,
Prof. Dr. Walter Ziesemer, Marburg / Lahn,
Geheimrat Dr. Volkmann, Hamburg ,
Prof. Dr. Strunz , Hamburg ,
Dr. Rudolf Alexander Schroeder.

:,
(
EVOCAÇÃO DE UM BANDEIRANTE

Capitão -mor João de Toledo Piza Castelhanos

No auditório da Biblioteca Mu brasilidade da gente daquele for


nicipal realizou -se no dia 30-12-48 moso rincão de nossa pátria ; dr.
uma sessão solene comemorativa Antônio de Toledo Piza, represen
do 2.° centenário do falecimento tando o ramo masculino da famí.
do capitão -mor João de Toledo lia do homenageado ; prof. Eduar
Piza Castelhanos, um dos funda do Vilhena de Morais, em nome
dores do arraial de Santo Antônio dos seus conterrâneos, lendo tele
do Val da Piedade da Campanha gramas recebidos das autoridades
do Rio Verde, hoje cidade de de Campanha e de membros dos
Campanha, Minas, cujos filhos diretórios dos dois principais par
residentes em São Paulo , resolve tidos políticos locais, confrater
ram homenagear naquela efemé. nizados nas homenagens, e, final
ride bisecular a memória do gran mente, o dr. Carlos da Silveira,
de patriarca paulista, tronco que desvendando a árvore genealógica
ali se tornara de numerosa e lu do nobre patriarca paulista.
zida estirpe. Encerrando a solenidade , o dr.
Presidiu a sessão o dr. J. A. Sousa e Silva acentuou o alto
de Sousa e Silva, tendo falado os significado da presença das auto
seguintes oradores : dr. Gabriel de ridades , dos representantes da
Rezende Filho, paulista , descen descendência e dos convidados,
dente de um filho de Campanha, bem como do cônsul geral dos Es
exaltando as virtudes, as quali tados Unidos, sr. Cecil Cross e do
dades e o profundo sentimento de de Portugal, dr. Álvaro Brandão.
!
FALA O PROF. DR. GABRIEL DE REZENDE
FILHO , DIRETOR DA FACULDADE DE DIREITO
DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO .

Resolveram dignos patrícios, oriundos de Minas Gerais, residentes


nesta Capital, comemorar solenemente a data do bicentenário do falecimen
to do grau de patriarca paulista, capitão-mor João de Toledo Piza Caste
Thanos, que deixou numerosa prole, tronco de ilustres famílias de Ca
panha do Rio Verde ou Campanha da Princesa, tradicional e gloriosa
cidade do sul de Minas, à qual me acho ligado por ter sido berço de meu
saudoso pai.
Ešta, :or certo, a principal razão pela qu : não me pude esquivar ao
delicado convite que me fez a comissão promotora dessa homenagem à me
nória daquele venerável brasileiro , sem embargo dos meus parcos conheci
mentos da história do grande Estado vizinho e da estreiteza de tempo para
o preparo de um trabalho digno desta solenidade, assoberbado, como estou,
neste fim de ano, com pesados encargos oficiais.
Que se me excuse, pois, a ligeireza e despretensão desta oração, a
qual,todavia, é feita prazeirosamente, tanto mais quanto estimo a gente
mineira pelas suas qualidades e virtudes e pelo civismo de que sempre
deu prova em todos os tempos.
Reuniões como esta, em que vamos recordar coisas, do passado do
Brasil, evocando a lembrança dos dias em que se ia plasmando a consciên
cia nacional por um forte e acentuado espírito de liberdade ; reuniões
como esta , de tão elevada significação, em ambiente afetivo e cultural,
justificam -se de si mesmas, atestando a perfeita união de mineiros e pau
listas, que têm indeclinável missão dentro do Brasil, na vigência e de
fesa das suas mais caras tradições.
O nosso passado é deveras grandioso. Prova o valor e as virtudes da
nossa gente, desde os primeiros tempos de adaptação até às incursões
pelo Interior, quando a terra se cobriu de glória no sulco que as bandeiras
abriram em seu corpo , com homens rudes e valentes rasgando caminhos,
escalando montanhas, para a definitiva conquista dos sertões desco
nhecidos.

E a dilatação territorial e o povoamento da Pátria se deve a êsses


audazes bandeirantes, em sua maioria partidos de São Paulo de Pirati.
ninga, os quais realizaram uma obra formidável, com avanços de tal gran
deza que de iguais não há memória , espalhando-se pelo continente afora,
até aos Andes, às Guianas e ao Prata .
Engrandeceu -se, destarte, o Brasil, não só geogràficamente, mas
também pela valorosa epopéia de seus filhos , cujos nomes a história guar
160 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

da carinhosamente : Raposo Tavares, Lourenço Castanho, Anhanguera,


Pais Leme e tantos outros, que modificaram o mapa do Brasil, fazendo
recuar o meridiano arbitrário das Tordesilhas.
No afã de conquistarem novas terras, galgaram os bandeirantes 2
Serra da Mantiqueira pela garganta do Embaú e foram em busca do ouro
nos sertões afastados, chegando aos férteis vales dos rios Verde e Sa
pucaí, onde abundava o metal precioso.
E, ali, no principal núcleo das minas do rio Verde, ao sul da Capita
via das Minas Gerais, fundou-se arraial de Santo Antônio do Val da
Piedade da Campanha do Rio Verde.
Nệle surgiu o paulista João de Toledo Piza Castelhanos, como tantos
outros atraídos pela fama do lugar, que florescia extraordinàriamente,
ali constituindo família e tornando -se , afinal, um verdadeiro patriarca,
pela numerosa descendência que deixou.
Refere o eminente professor Alfredo Valadão, no seu magnífico e
autorizado trabalho sobre a Campanha da Princesa, que a “ descendência
de João de Toledo Piza Castelhanos avulta no quadro da Campanha, der
ramando-se daí pelo sul de Minas, retornando para São Paulo e ainda
espalhando-se por outros pontos do país”.
Dirão outros nesta noite de valor da estirpe paulista, salientando a
projeção que seus descendentes tiveram não só em Minas Gerais, como
em São Paulo, contribuindo sempre, nos mais variados setores da ativi
dade humana, para o engrandecimento da Pátria comum.
Reservo- me para homenageando a sua memória falar da Cam
panha, terra que ele ajudou a formar, em que viveu e morreu , depois de
de uma longa e proficua vida de trabalho.
O primitivo arraial, assentado no vale do rio Verde, com a crescente
invasão dos que vinham buscar o ouro, veio a transformar -se em vila , com
o sugestivo nome de Campanha da Princesa.
O bicentenário destà formosa cidade sul-mineira, celebrado há pouco
mais de dez anos , ensejou a ereção, em sua praça principal, de um mo
desto mas sugestivo monumento, no quau se lêem estas palavras, que de
monstram o valor de sua gente e a valiosa contribuição que trouxe para o
progresso do Brasil : auro soli, fide, cultu, civilibusque filiorum virtu
tibus effulsit ”, isto é, refulgiu pelo ouro da terra, pela fé, pela cultura
e pelo civismo de seus filhos.
Sim , a Campanha da Princesa refulgiu, a princípio, pelo ouro da terra
" auro soli effusilt ” .
De seus dilatados campos foi este precioso metal extraído em quan
tidades enormes e conduzido à Côrte portuguêsa para satisfazer a sua
clesmedida ganância .
Foi o ouro, certamente, o atrativo máximo que fêz'afluir para aque
las paragens milhares de aventureiros, formando -se, assim, aos poucos,
aglomerados humanos que se transformariam em vilas palpitantes de
vida e animadas de intenso sentimento nativista.
Com o tempo, porém, passada a febre do ouro e amortecidos os ex
cessos que a sua exploração acarretava, a Campanha da Princesa foi so
tornando conhecida sob outros aspectos.
Diz a inscrição, há pouco mencionada , que ela refulgiu também
pela fé - “ Fide effulsit ” .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 161

Realmente, a tradição cristã da cidade bem se ajusta ao fervor reli


gioso da gente brasileira.
Queira Deus que assim continue sempre, pois nascemos para a vida
com a celebração da missa que foi rezada logo após o primeiro contato
dos portuguêses, nas praias da Bahia, com a misteriosa paisagem da nova
terra .
A fé, sem dúvida, foi a alavanca suprema para a formação da na
cionalidade. O Brasil cresceu à sombra da Cruz de Cristo .
E aí estão para atestar a religião dos nossos ancestrais e o nosso pri
mitivo estilo de vida estas capelinhas e igrejas que se derramam por todo
o interior do País, marcando a nossa fisionomia social e demonstrando o
apêgo de nossa gente à Igreja de Cristo e aos sãos princípios que, feliz
mente, norteiam as nossas atividades.
Não fugindo a esse destino comum, a Campanha mostrou sempre
grande zelo pela religião, conseguindo, depois de perseverante trabalho de
várias gerações, a criação de um bispado para a sua cidade, com a satis
fação duplicada de ver nomeado bispo um filho seu, o venerando d. João
de Almeida Ferrão, notável prelado que tive a honra de conhecer pessoal
niente.
Talvez tenha sido d. João de Almeida Ferrão o primeiro bispo brasi
leiro a pregar as excelências da famosa encíclica de rerum novarum
do Papa Leão XIII, segundo observa Alfredo Valadão, recomendando aos
sacerdotes de sua diocese, em pastoral cheia de fé e caridade, que “ há,
entre as ovelhas que vos estão entregues, uma classe que deve merecer um
cuidado especial em vosso ministério. É o pobre, o proletário. Nunca se
viu tão abandonado e desprotegido espiritual e temporalmente como hoje.
Uma sociedade egoísta promove tôda espécie de gôzo e bem - estar à custa
do suor do desvalido da sorte. Recompensa mal o seu trabalho, não se
compadece de seus sofrimentos e vive de sua desgraça. Para cúmulo da
infelicidade, tudo emprega para arrancar -lhe da alma a idéia de Deus,
da vida futura e do Céu " .
Justificou a Campanha também o título, que se lhe deu outrora, de
Atenas sul-mineira, pois , em verdade, ela refulgiu pela cultura - " cultu
cffulsit”.
No albor do Império , pugnando pela nossa emancipação intelectual, a
então vila da Campanha solicitava a Assembléia Constituinte a urgente
criação de uma Universidade a fim de poderem os brasileiros estudar con
venientemente em sua terra e sob a direção de mestres seus.
Pouco depois, ao se fundarem no País os cursos jurídicos, mercê da
famosa lei de 11 de agôsto de 1827, e instalada em São Paulo, a Academia
de Direito, matricularam -se trinta e três jovens procedentes de diversas
pirovíncias, entre eles quatro mineiros, três dos quais filhos da Campanha,
a saber : Tristão Antônio de Alvarenga, João Cristiano Garção Stockler e
Cirino Antônio de Lemos.
Daí por diante, um sem número de mineiros vieram para São Paulo
para ingressar na Academia, sendo certo que em muitas turmas havia
filhos da tradicional Campanha , vários dêles notáveis na vida pública,
seja no exercício da advocacia é da magistratura, seja na alta adminis
tração , no jornalismo, nas letras e na política.
Impossível citar o nome de tão ilustres campanhense, bastando lem
brar algüns, quemais se projetaram na vida intelectualdo País .
162 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Assim , Perdigão Malheiros, jurisconsulto de muita fama em seu tempo.


que muitos têm colocado logo após Teixeira de Freitas e Lafayette, o.
o grande advogado da causa da emancipação dos escravos, e cujo traba
lbo a respeito logrou enorme sucesso, dêle dizendo Joaquim Nabuco que
foi o livro mais fecundo e benfazejo que até então se havia escrito no.
Brasil.
Assim também José Bento Leite, conhecido pelas suas ardorosas .
campanhas liberais, como a que culminou com a de abril e a revolução de
1842; e Fernando Lobo, o austero político, de larga visão e incontestável.
autoridade ; e . Américo Werneck, e Evaristo da Veiga e outros mais.
No campo da justiça, lembremos os nomes de Ferreira de Rezende e
Américo Lôbo, ministros do Supremo Tribunal Federal.
Filhos da Campanha foram João Pedro da Veiga Filho, sobrinho -neto.
do grande Evaristo da “ Aurora Fluminense ” e sobrinho do outro Evil
risto, parlamentar do Segundo Império e Xavier da Veiga, autor das.
“Efemérides Mineiras ” eminente jurisconsulto, professor da Faculdade
de Direito de São Paulo, cujos trabalhos sobre econômia política e finan
ças ainda se lêem com agrado e proveito ; Gabriel José Rodrigues de Re
zende, meu inesquecível pai, professor de Direito Comercial da Faculuiade .
de Direito, de quem diz Spencer Vampré, nas “ Memórias para a história
da Academia de Direito ” , que “ ninguém o sobrepujou em cultura, em ci
vismo, em dedicação pelas causas nobres e generosas, passando pela Aca
demia entre o respeito dos lentes e a amizade dos alunos, não se saberinio.
se era mais amado do que respeitado, ou mais respeitado do que amado"..
Francisco Luís da Veiga , fundador da Faculdade de Direito de Minas
Gerais, hoje incorporada à Universidade, com sede em Belo Horizonte;
Estêvão Lobo Pereira, professor da mesma Faculdade; Vital Brasil Mi
neiro da Campanha, notável cientista, glória do Brasil, com renome in
ternacional, e outros e outros mais.
Refulgiu, ainda, a Campanha, pelo civismo de seus filhos “ civili
busque filiorum virtutibus effulsit ” .
São de Alfredo Valadão estas palavras : “ na Campanha se escreveli:
uma das páginas mais brilhantes e comovedoras da Inconfidência, a desta .
trindade Alvarenga Peixoto, o vate luminoso do canto genetlíaco, Bárbara.
Heliodora, a heroína da Inconfidência e Maria Ifigênia , a princesa do
Brasil; ali, as urnas historicamente independentes derrotam , em 1831, 0 .
candidato de Pedro I , derrotam , em 1856, o filho do Marquês do Paraná,
candidato ostensivo do Ministério, derrotam tempo em fora tantos outros
candidatos governamentais às Câmaras do Império ; ali , o primeiro centro
de propaganda republicana que se conta em Minas Gerais, elegendo, em
1885, um deputado republicano, Álvaro Botelho, que juntamente com Pru
dente de Morais e Campos Sales, eleitos por São Paulo , são os primeiros.
que entram para as mesmas Câmaras do Império ” .
A Campanha teve também um famoso colégio , onde havia grande rigor
no estudo das humanidades, a ponto de afirmar Valadão que ali era banal
que em latim se fizessem muitos discursos e comum ainda que parte da ,
assistência os entendesse perfeitamente...
E recordemos ainda a Escola Normal, onde ensinou o meu avô, dr..
Joaquim Leonel de Rezende Alvim, profundo humanista e notável juris
consulto .
Meus senhores : - Cidade aprasível, de clima ameno , de paisagem ,
colorida , engastada numa zona fundamentalmente brasileira , com um ,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 163

longo passado de glórias, a Campanha bem merece , os louvores que de co


ração lhe faço, aproveitando -me desta solenidade, quando reverenciamos,
na data do bicentenário de seu falecimento, a memória de um de seus
fundadores, o paulista capitão -mor João de Toledo Piza Castelhanog.
Paulista, mas descendente de um filho destra tradicional cidade, to
pho a grata satisfação de haver podido exaltar as virtudes, as qualidades
e o profundo sentimento brasileiro da gente daquele formoso canto da
nossa Pátria.
E só desejo que Minas e São Paulo, vinculados estreitamente pelos
mesmos interesses e propósitos, contribuam , pela continuidade de sua
ação, para a harmonia e a unidade do Brasil, a fim de que o nosso País.
tenha um futuro radioso, cumprindo os seus altos destinos !

1
1
RESUMO DO DISCURSO DO DR. ANTONIO DE
TOLEDO PIZA .

Acentuando o alto significado das homenagens que estavam sendo


prestadas à memória de um benemérito patriarca paulista, contemporâneo
da expansão povoadora do chamado Ciclo do Ouro, eonfessou o orador sua
ielutância inicial em aceitar o honroso convite que lhe fôra feito para
falar em nome do ramo varonil da família fundada em São Paulo por D.
Simão de Toledo Piza e da qual descendia o homenageado daquela noite.
É que esta ilustre família, que tanto se notabilizara no passado pelos notá
veis feitos dos seus filhos, ainda se encontra em plena florescência de
vida nos dias atuais, e mais acertado teria sido, o gesto da Comissão Pro
motora das comemorações que se estavam ali realizando, se a sua esco
lha recaisse em pessoa mais qualificada, de maior projeção social, como
lhe seria fácil encontrar, na política e na magistratura, na administração
pública e nas profissões liberais, na indústria e na lavoura, onde tantos
nomes de pessoas ilustres se destacam pelo seu saber, talentos e virtu
des e que poderiam com maior brilhantismo e capacidade representar
uma família que por sua vez se orgulha, com justificada ufania, de
contar entre OS seus ancestrais Capitão -mor João de Toledo
Piza Castelhanos, cuja benemérita memória estava sendo cultuada.
Moveu-o finalmente a aceitar a honrosa incumbência o fato de se
lembrar que também era descendente mais próximo de um outro patriarca,
oriundo da mesma estirpe o qual, um século mais tarde e não mais em
busca de ouro e pedras preciosas, mas de campos dilatados para a pacífica
criação de seus rebanhos, se havia transportado para terras de Mato
Grosso e ali se tornara chefe de numerosa família e um dos fundadores da
cidade onde ele, orador, nascera , vindo depois para São Paulo . Era por
isso que tinha grande satisfação de ali se encontrar nas mesmas condições
de outros muitos descendentes de pioneiros paulistas, que não se sentiaia
em terra de todo estranha, pois pisavam a que fôra berço dos seus esfor
çados avoengos .
Associando - se portanto de todo o coração a estas homenagens presta
das a um desbravador de sertões e plantador de cidades, fêz um rápido
restropecto histórico da família Toledo Piza de São Paulo, detendo-se em
referência ao seu homônimo e tio-avô, Antônio de Toledo Piza, notável
166 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

historiador, cuja obra dispersa merece ser coligida em volumes especiais.


Destacando depois alguns grandes nomes de mortos, sobre os quais os jul
gamentos insuspeitos da História já se tem feito ouvir, evocou uma bri
lhante coorte de valtos notáveis — juízes da Suprema Côrte, embaixadores,
deputados e ministros não incluindo as personagens vivas, com receio
de cometer injustiças de apreciação ou de omissão, pois a série é longa .
Fica portanto a tarefa para o sociólogo que se disponha a atualizar
a história de uma tão notável família, que vem galhardamente se adaptan
do às novas condições de vida que os tempos atuais oferecem, sem por
isso desprezar as normas e tradições essenciais dos seus antepassados,
cujas virtudes buscam sempre imitar, para o bem da humanidade e maior
glória da Pátria e de Deus.
UMA HISTÓRIA DIFERENTE, POR EDUARDO
VILHENA DE MORAIS .

As recentes comemorações do 2.° centenário do falecimento do capi


tão -mor J. T. Piza Castelhanos, guarda -mor das famosas Minas do
Rio Verde, vieram pôr em foco a história da cidade que se originou do
arraial de mineração onde ele “faleceu da vida presente ” , segundo consta
da certidão de óbito assinada então pelo pároco Antônio Garcia da Rosa,
que acrescentou : e morreu com todos os sacramentos e foi sepultado no
adro desta Matriz de Santo Antônio de Val da Piedade desta Campanha
do Rio Verde, por assim determinar no seu testamento que é o que segue ” .
Neste testamento, além das usais declarações e protestos de fé e do
reconhecimento de débitos de contribuições atrasadas para com as irman
dades de que fazia parte ( o que os próprios vigários não se esqueciam de
lembrar) notam -se outras recomendações de pagamento de pequenas di
vidas não documentadas, o que indica os escrúpulos de uma conciência ri
gorosa, de quem deseja sair deste mundo sem dever nada a ninguém , as
piração fácil de se realizar para quem deixava abundantes cabedais des
critos. Fora disto, o que sabemos a respeito da vida do nobre patriarca
paulista é o que consta das sucintas notas de Pedro Taques e dos aponta
mentos de L. G. da Silva Leme, na sua “ Genealogia Paulistana ” .
Presume -se que Piza Castelhamos tenha se transportado para as
Minas do Rio Verde antes da entrada do Ouvidor Cipriano e haja coope
rado para o bom sucesso da missão daquele emissário do Governador da
Capitania de Minas Gerais, assim como teria concorrido para evitar um
eminente reencontro sangrento entre fôrças paulistas, sob o comando de
Bartolomeu Bueno e o corpo expedicionário enviado de São João d'El-Rei
para repelir a invasão de territórios já sob jurisdição mineira. O certo
é que em 1743 já residia Piza Castelhanos no arraial de Santo Antônio,
e no ano seguinte foi nomeado guarda -mor das minas.
O mais antigo documento que se conhece a respeito destas minas foi
citado por Orville Derby, que em 1884 deu uma breve notícia sôbre as
jazidas auríferas de Campanha e São Gonçalo do Sapucaí. Trata -se de
uma informação prestada em 1693 por Bento Teixeira a D. João de
Lancastre, na qual se lê : " o ouro destas minas não merece a confian
sa por ser de lavagem ”.
Sendo assim , existe um longo período de pelo menos 44 anos de explo
ração livre daquele ouro , que apesar de ser de lavagem e não merecer
confiança ” , muitas arrobas rendeu aos felizes faiscadores, que não se
limitavam a revolver e batear os cascalhos das várzeas e leitos dos cór
regos, mas penetravam pelas encostas, abrindo largas escavações a céu
168 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

aberto em seguimento dos filões mineralizados, deixando assim assinala


da a sua operosidade por estes colossais e imperecíveis monumentos - as
catas que as erosões não combatidas vão aumentando cada vez mais .
Neste ponto não há diferença entre as catas de Campanha e as exis
tentes em outros centros de idêntica formação geológica.
A diferença flagrante se nota é na história destas explorações aurífe
ras, a começar pelo longo período inicial de exploração clandestina, porém
ordeira e pacífica, que permitiu formarse um arraial completo , com ruas
e praças e muito boas casas, onde mourejava uma população perfeitamente
estabelizada nas suas atividades agro - pecuárias e de rudimentar indústria,
acrescidas pelos trabalhos de mineração.
Não se aplica66portanto àquele território o conceito de Oliveira Viana
ao afirmar que o ouro transformou o guerreiro sertanista em industrial
pacífico. Depois, este industrial pacífico se fêz agricultor ” .
Os mineradores que se estabeleceram nos vales dos rios Verde e Sa
pucaí provinham de uma região onde já exerciam atividades produtivas
que, postas ao serviço conjunto da mineração , tornaram esta “self-suppor
ting ” , evitando a elevação exagerada do ousto da vida, que se verificou
em outros distritos de mineração , ocasionando às vezes tremendas crises
de escassez dos gêneros de primeira necessidade, pois tôda gente se ati
rava apenas aos trabalhos de faiscação do ouro .
Exemplos como os de Campanha podemos encontrar, é certo, em outros
distritos, mas que não sobressairam como centros de produção aurífera.
Assim, conta -nos C. Garden no seu livro “ Barbacena ” , que em 1698 dois
paulistas de Taubaté, Garcia Rodrigues Pais Leme e seu cunhado , Do
mingos da Fonseca Leme, resolveram abandonar a indústria de mineração ,
dedicando- se à lavoura e criação.
Em Campanha todas as atividades rurais proseguiram normal e con
juntamente, atendendo-se também às necessidades do culto religioso e
elevando-se capelas até junto das lavras de mineração.
Infelizmente, como em todas a parte, não eram ainda em nossa
terra racionalizadas estas explorações das riquezas do subsolo e muito
menos as do solo , exauridas logo pela devastação das matas e pelos . primi
tivos processos de cultura, que obrigavam ao nomadismo agrícola.
Neste ponto a história econômica de Campanha não difere da dos
outros centros de mineração, decaídos a um triste estado de estagnação
e marasmo, uma vez esgotados os seus mais ricos e fàcilmente exploráveis
depósitos aluvionários de ouro . A diferença notável é nos aspectos so
ciais, políticos e culturais que fazem de Campanha uma cidade diferente
daquelas em que predominou a influência mais direta e mais recente do
elemento português recém -chegado, atraído pela fascinação do ouro , que
os enriqueceu , propocionando meios de influência e preponderância sôbre
os outros, como os baianos e paulistas, em que o elemento lusitano já
vinha caldeado pelo sangue brasílico.
Para acentuar esta diferença, basta assinalar que em Campanha
não existem os belos templos que os portuguêses amontoaram sôbre as
colinas de Ouro Prêto, Mariana e São João d'El-Rei, em uma progalidade
que era mais fruto da ostentação e vaidade dos " nouveaux- riches ” do
que propriamente de piedade cristã ; nem os palácios de cantaria, reves
tidos de custosos azulejos ... Existe na cidade apenas uma pequena e
pobre igreja em estilo barroco, construída pelo português José de Jesus
Teixeira, sendo as demais de taipa, estilo paulista.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 169

Alguns destes aspectos da história de Campanha foram estudados


pelo dr. Alfredo Valladão na sua justamente apreciada obra “ Campanha
da Princesa ” , em 4 volumes. A tarefa a completar-se, para separar a
influência persistente do grupo paulista fundador, é do sociológo, que
encontra felizmente o indispensável arcabouço histórico já traçado por
aquela magnífica obra do nosso eminente patrício. E o sociólogo não po
derá deixar de tomar em consideração o estudo de um tronco familiar
importante como este que Piza Castelhanos implantou no arraial onde
jazem seus ossos e é hoje uma cidade de gloriosas tradições.
E havemos de constatar quanto é importante o grau de cultura ini
cial de um grupo que imigra e se estabelece em novos horizontes, como os
dêstes pacíficos e operosos agricultores do vale do Paraíba que se tran
portaram para as Minas do Rio Verde , onde conseguiram, a custa de in
gentes esforços e consumada tática, relativa predominância sôbre outros
concorrentes.
Isto porque, como bem diz Edward B. Reuter, no capítulo dedicado
à raça e cultura do belo livro “ New Outline of the Principles of Socio
logy ” , à pg. 146 : “ The culture of a group, its mode of life, is perhaps
more stable and persistent than its physical and racial character ”. E
acrescenta mais adiante : " the body of culture fact, in the absence of
catastrophic phenomena, persist through successive generatios with little
alteration in fudamental character ” .
Razões de sobra temos portanto em prestar nossas homenagens, pa
gar nos tributo de reverência e veneração à memória do grande patriarca
paulista que se tornou , nas virgens terras da Campanha do Rio Verde
tronco de uma numerosa família, hoje espalhada por vários recantos do
Brasil, levando porém sempre aceso o facho da civilização cristã, que
seus antepassados europeus ajudaram a defender contra as arremetidas .
de povos inimigos de sua fé, e que seus antepassados brasileiros soube
ram respeitar e propagar por toda a parte onde se estabeleciam, plan-
tadores de cidades que ainda continuam a ser até os tempos atuais.
i
1
IGREJA DAS DORES
( Campanha Minas )
IEM

CAPELA DAS MERCES (RUINAS )


( Campanha - Minas )

CAPELA DE SÃO SEBASTIÃO


( Campanha Minas )
UMA FIGURA QUE RESSURGE, POR J. G.
MORAIS FILHO .

A 30 de dezembro de 1748 falecia no arraial de Santo Antônio do


Val da Piedade da Campanha do Rio Verde o paulista Capitão -mor João
de Toledo Piza Castelhanos, ali deixando numerosa descendência.
A história da cidade originada dêste arraial é muito interessante
sob todos os aspectos, tendo dado margem a uma copiosa literatura em
que sobressaem os trabalhos de José Pedro Xavier da Veiga, Bernardo
Veiga, Francisco Lôbo, Veiga Miranda , Ferreira deRezende e Cônego
Lefort, avultando a magnífica obra do Dr. Alfredo Valladão, que se es
merou na síntese biográfica dos filhos de sua terra natal que mais se
distinguiram nas ciências, na política e nas letras.
Todos estes escritores deixaram , entretanto , sem o devido esclareci
mento o importante capítulo da fundação do primitivo arraial de mine
ração aurífera, onde o precioso metal fôra explorado livremente durante
longos anos, a tal ponto que, ao instituir- se ali o regime legal, em outu.
bro de 1737, pôde o Ouvidor da Comarca do Rio das Mortes, Cipriano
José da Rocha, registrar o elevado número de 6.800 escravos empregados
nos trabalhos de lavra naquela região.
Alguns escritores, ladeando a questão , limitaram -se a reproduzir uma
lenda adrede forjada e inteiramente destituída de fundamepto , segundo
a qual a povoação fôra fundada por dois criminosos evadidos da cadeia
de Ouro Preto, os quais teriam se acoitado junto a um quilombo de ne
gros fugidos, existentes em local, cujas coordenadas geográficas , por um
malicioso requinte de precisão, sabiam reproduzir, para mostrar que coin
cidiam exatamente com as da atual cidade de Campanha, onde tal deter
minação geodésica somente muito mais tarde fôra realizada.
Outros, como Ferreira de Rezende, mostraram -se admirados de que
" os paulistas, sempre inquietos e sempre aventureiros, que tão cedo co
meçaram a devassar todo o continente, parece que por ali nunca passa
ram , nem deixaram de si sinal algum ” ... ( 1 ) .
Foi o Dr. Nicolau Navarro, ilustrado Juiz de Direito da comarca e
devotado estudioso da história local , o primeiro a publicar interessantes
documentos, cujo encontrọ fôra fruto de suas pesquisas, ao revolver a
poeira dos arquivos que permitiram avaliar-se a importância da contri
buição dos paulistas na fundação e desenvolvimento do arraial que o
Ouvidor Cipriano fôra encontrar “ povoado com praças e ruas em boa
ordem e muito boas casas e que tão favorável impressão lhe causou , que
se moveu então a sugerir ao Governador da Capitania a conveniência de
elevar-se logo dita povoação à vila.
1) F. P. Ferreira de Rezende, “ Minhas recordações " , pg. - 42 .
172 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Apareceu entre os citados documentos e foi então publicado, o testa


mento do Capitão -mor Piza Castelhanos, nome que havia caído inteira
mente no olvido da tradição local , como esquecidos ficaram seus ossos,
com a demolição da primitiva igreja matriz , em cujo adro fôra sepultado..
Por iniciativa do mesmo Dr. Navarro foi então o nome do grande pa
triarca paulista doado a uma modesta rua da cidade, originada do pe
queno arraial em que fizera outrora prevalecer a dupla autoridade de
que se achava investido, como chefe da sua clā familiar e como repre
sentante do governo da Metrópole, pôsto éste em que foi sucedido por
seu genro Salvador Correia Bocarro, também paulista e elemento operoso,
pacífico e construtivo.
Prosseguindo no seu louvável empenho de honrar e exaltar a figura
do nobre bandeirante que ali se tornara tronco de luzida e numerosa es
tirpe, fêz ainda o Dr. Navarro publicar pelas colunas do hebdomadário
local “ Sul de Minas ” , de que era redator-chefe, um resumo da frondosa
árvore genealógica de Piza Castelhanos, extraída da “ Genealogia Paulis
tana ” de L. G. da Silva Leme, Livro V, por onde se verificou que a
descendência do patriarca paulista abrangia as principais famílias sul
mineiras e muitas outras que retornaram a São Paulo ou se dispersaram
por todo o Brasil.
Tornou - se assim patente que a cidade fôra fundada por um grupo
de paulistas da melhor estirpe , cujos nomes apareceram nos registros pa
roquiais, felizmente conservados, que foram organizados ao se instalarem
as primeiras irmandades da nova freguesia, pois a vila somente foi cria
da muito mais tarde, por alvará régio de 9 de março de 1798 , isto é,
depois dos trágicos acontecimentos da Conjuração Mireira, em que tomou
parte ativa o Dr. Alvarenga Peixoto, opulento minerador estabelecido
naquela região .
Destruiu-se assim a legenda negra da fundação da cidade que pode
com justiça ufanar -se de suas origens remotas, que muito bem explicam
o prosseguimento de toda sua história , fértil em episódios grandiosos que
provam o valor e as virtudes de sua gente.
Surgiu o arraial em uma zona que permaneceu durante longos anos
como território contestado, ao se separarem as Capitanias de São Paulo
e Minas , permanecendo o dissídio ainda após a separação das ouvidorias
de Guaratinguetá e São João d’El-Rei, em 1914, por tal forma que não
tiveram as autoridades das referidas capitanias e comarcas nenhuma in
gerência direta nos negócios do nascente núcleo de população, que pode
assim desfrutar o privilégio inaudito de gozar por algum tempo de plena
autonomia, inclusive a de comércio e exportação do ouro, “ descaminhado
pelos pequenos portos do litoral, entre Santos e Rio de Janeiro, princi
palmente por Parati.
Nestas condições, somente vigorou o regime patriarcal bem organi
zado, que já imperava no vale do Paraíba, de onde se moveram famílias
inteiras, conduzindo todos os seus haveres, escravos e rebanhos, para o
território das minas recém -descobertas, onde se instalaram , cuidando ao
mesmo tempo da lavoura e criação , pelos processos primitivos a que esta
vam afeitos. Implantou -se assim automàticamente, graças as boas dis
posições anteriores, um regime de liberdade, justiça e ordem , estimulando
e amparando , pela cooperação, a iniciativa e o trabalho dos novos habi
tantes , que iam entrando pacificamente e pacificamente se estabelecendo,
sem necessidade de lutas com os aborígenes daquelas zonas, que os aco
Thiam com as mesmas disposições amistosas que os de Piratininga. En-
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 173

traram assim na maior harmonia, sem os lamentáveis conflitos sangren


tos com grupos de formação e procedência diferentes, como acontecera
alhures .
Crescendo o arraial e se desenvolcendo economicamente, passou logo
a constituir sério problema para o governo da Metrópole, empenhado
que se achava em extinguir o contrabando do ouro e evitar novos confli
tos entre paulistas e emboabas, que haviam quase travado uma verdadeira
guerra .
Constituiu por isso uma brilhante e pacífica vitória, a entrada do
Ouvidor Cipriano e a instituição do regime legal de exploração do ouro
em outubro de 1737. Acolhido favoravelmente pela maioria da popula
ção local graças às boas disposições com que se apresentou, concedendo
plena anistia fiscal e dando as minas como descobertas, sofreu entretanto
êste regime uma solução de continuidade em 1743, quando Bartolomeu
Correia Bueno , a mando do governador de São Paulo, D. Luís de Masca
renhas tomou, sem encontrar resistência, posse do arraial, já então fre
guesia, depondo as autoridades em exercício.
Foi então que estêve quase a pique o reacendimento destas lutas,
pois de São João d’El-Rei foi enviado um forte contigente , armado e
equipado pela respetiva Câmara Municipal, com o deliberado propósito
de repelir a invasão.
Os lacônicos e inexpressivos documentos conhecidos, relatando os
fatos, apenas dizem que os paulistas, desistindo dos seus intentos, recua
ram ante a aproximação dos adversários, que retomando posse do arraial
repuseram as autoridades obedientes ao governo de Vila Rica. Acres
centam apenas que, havendo falecido no ano seguinte o guarda -mor das
Minas do Rio Verde, um reinol que havia entrado em companhia do
Ouvidor Cipriano e fóra indicado por recomendação dêste, foi em sua
substituição nomeado Piza Castelhanos, ao qual sucedeu, como já disse
mos, seu genro Salvador Correia Bocarro , paulista como ele.
As disputas territoriais entre paulista e emboabas deslocaram - se
para as minas do Sapucaí e a questão de limites gerada por estas pre
tenções de direitos somente foram definitivamente derimidas em 1935,
como é sabido e aludido apenas para acrescentar que, se é certo que
Campanha não se envolveu diretamente nestas disputas, a cidade man
teve -se sempre fiel às suas tradições de origem, nunca desmentidas no
decorrer de tôda sua história.
E foi por isso que os filhos de Campanha residentes em São Paulo,
terra de onde partiram os audazes mineradores e primeiros desbravado
res dos sertões em que fundaram o arraial que deu origem à cidade, ten
do resolvido comemorar solenemente a data do falecimento do grande pa
triarca paulista, ao qual muitos dêles se achavam ainda ligados pelos
laços do sangue, descendentes que eram do tronco familiar por ele fun
dado, deram execução a um programa de singelas porém expressivas ho
menagens do qual constou uma sessão solene realizada no auditório da
Biblioteca Municipal, onde falaram diversos oradores, cujos discursos
serão publicados ou resumidos pela Revista do Arquivo Municipal, que
gentilmente resolveu se ' associar a esta comemoração de civismo, que
nierecera também o apoio da Câmara Legislativa Estadual e da Câmara
Municipal, graças a moções apresentadas pelos ilustres senhores depu
tado P. João Batista de Carvalho e vereador dr. João Carlos Fairbanks
e que foram unanimente aprovadas pelas respetivas corporações legisla
tivas.
Fala o Dr. Carlos da Silveira, primeiro secretário
Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo , 80
bre : QUEM ERA DOM JOÃO DE TOLEDO PIZA
CASTELHANOS, SOB O PONTO DE VISTA GE
NEALOGICO ?

Genealogia, em discurso , torna -se coisa fastidiosa. Nestas condições,


organizei dois quadros, a seguir, pelos quais é sumamente fácil ter uma
boa idéia da família do homenageado.
O primeiro dos quadros refere-se aos Toledos de Espanha, com os
seus dois ramos principais : OROPESA O ALBA DE TORMES, subdi
vidindo -se os segundos em Albas, Toledo Osórios, e estes abrangem os
Vila Franca , os Vila Nova de Valdueza ..... No segundo quadro mos
tro a origem e desenvolvimento dos Toledos, em São Paulo.
É muito antiga a família, na Espanha . Antiga e importante, cheia
de grandes nomes, sobretudo guerreiros, devotados absolutamente ao
seu rei, combatendo pela fé católica.
Dois Toledos guerreiros de Espanha são particularmente citados
no Brasil : Dom Fernando Álvares de Toledo, terceiro duque de Alba,
que morreu em Lisboa em 1582 ; e Dom Fadrique de Toledo Osório, que,
em 1625, veio com sua forte esquadra, para expulsar o holandês da
Bahia . Os espanhóis dizem Fadrique, e nós Fradique.
Do bloco de todos estes numerosos Toledos de Espanha, do século
DEZESSEIS , saiu Dom João de Toledo Piza , " pertencente às casas dos
Condes de Oropesa e Duques de Alba de Tormes, SEM QUEBRA DE
BASTARDIA ” . Ignorando -se ainda a filiação de Dom João de Toledo
Piza , não tem sido possível, até agora , completar a fôlha genealógica dos
Toledo Pizas daqui. Têm sido infrutíferas as tentativas feitas, até a
presente data, para que seja eliminada tão antipática solução de con
tinuidade. Dom João de Toledo Piza contraiu núpcias, em Madri, com
D. Ana de Castelhanos, e deixou pelo menos o filho Dom Simão, que
vem a seguir.
Foi militar de valor, esse filho, Dom Simão de Toledo Piza. Como
capitão, combateu em Lepanto ( 1571 ), e como sargento -mor , na Ilha
Terceira ( 1583 ). Por haver perdido um ôlho nesta batalha, desembar
cou para tratar- se, foi reformado e ficou residindo em Ângra, e aí con
sorciou -se com Dona Grácia da Fonseca Rodovalho, açoriana, filha de
Vasco Fernandes Rodovalho e de Dona Maria Abarca . Do matrimônio
provieram quantro filhos, sendo o primogênito também chamado Simão,
como o pai.
176 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Éste segundo Dom Simão de Toledo Piza, oficial do exército espa


nhol, morgado do Pico Redondo ( Ilha Terceira ), teria nascido por 1585 .
Andaria assim pelos cinquenta e cinco anos, ao casar-se na então Vila
de São Paulo , em 12 de fevereiro de 1640 , usando no ato o nome de
“ Simão da Fonseca Rodovalho ” . A mulher era Maria Pedroso, que
pertencia aos Baião, Ribeiro, Pedroso, Alvarenga, Freitas. Depois de
haver exercido cargos importantes, morreu o segundo Dom Simão de
Toledo Piza, cercado de respeito e estima, aqui, no ano de 1668 , com
citenta e três anos presumíveis. Três dos seus quatro filhos cresceram ,
constituiram família e lhe deram a ele trinta netos, que se contam
entre a melhor gente da Capitania. Um destes trinta netos, muito li
gado à história do descobrimento do ouro nas Minas Gerais, é o mestre
de - campo Carlos Pedroso da Silveira .

Outro neto, Dom João de Toledo Piza Castelhanos, é agora lem


brado pelos campanhenses, na efeméride de hoje, 30 de dezembro de
1948, passagem do segundo centenário do falecimento do seu eminente
guarda -mor e grande povoador. E razão há, de sobejo, na homenagem
de campanha ao ilustre paulista . Que descendência numerosa e brilhan
te ! Deixou onze filhos , e, por eles, uma geração que não se acaba
mais. Sua mulher era Maria Pedroso, oriunda de Taubaté.
Dom João de Toledo Piza Castelhanos teve os predicados essenciais
do seu grupo genealógico : longevo, sóbrio, altivo , honestíssimo, devo
tado à família, ao Rei; repúblico exemplar, profundamente religioso.
Eis a lista dos seus onze gênitos :
1 Ana , casada com Salvador Correia Bocarro ( S. L., III, 88 ) , com
dez filhos sendo um familiar do Santo Ofício ;
2 Joana, casada com Miguel Pires Barreto, irmão de Salvador ( S.
L., III, 88 ) , com doze filhos sendo um padre secular;
3 Maria, casada em 1737, com Manuel Cavalheiro Lumbria ( S. L.,
VI, 522 ) ;
4 Maria Phoenix, casada com Manuel de Campos de Oliveira ( S.
L., IV, 174 ) ; moravam em Santa Luzia , de Goiás;
5 Branca, casada com Francisco Xavier da Silva, português, com
onze filhos sendo um padre secular ;
6 - Ângela, casada com José da Costa , português, com seis filhos ;
7 Teresa, casada com o alferes Manuel Correia Harnaut, português,
com treze filhos ;

8 Dom Francisco de Piza, casado em Pôrto Feliz com Escolástica


de Oliveira Pais , viúva de Pedro Vaz de Campos ( S. L. , IV, 173
e 369 ) . Escolástica era mãe de Manuel de Campos de Oliveira,
acima ;
9 Dom João de Piza e Toledo, familiar do Santo Ofício ;
10 Dom Antônio de Toledo, solteiro ;
11 Dom Inácio de Piza, solteiro .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 177

FONTES

1 " Genealogia Paulistana " , de Luís Gonzaga da Silva Leme;


2 – " Nobiliarquia Paulistana " , de Pedro Taques de Almeida Pais Leme;
3 “ Theatrum nobilitatis Europeae ", Fr. Philippi Jacobi Speneri,
( 1668 ) ;
4 “ História genealógica da Casa de Lara ” , Don Luís de Salazar y
Castro ;
5 Enciclopédia Espasa ;
6 Enciclopedia Larousse ;
7 -- Documentos do Arquivo da Cúria Metropolitana ;
8 Documentos do Arquivo Público do Estado de São Paulo.
1
ORDENS RÉGIAS

( 1737 a 1757 )

N.° 22 - Registo de hum Alvará porq . S. Magde, hs por bem


fazer mce, a Andre Corsino de Mattos de lhe conceder faculdade para
que possa renunciar em seu fo . primogenito Diogo Pinto do Rego a
propriedade do officio de enscrivam dą Ouvedoria Geral desta cidade
de Sam Paulo como nelle se declara .

Eu el Rey fasso saber aos que este meu alvará virem que tendo res
peito a me representa André Corssino de Mattos cappitão de Infantaria
paga de huma das companhias da Praça de Santos que pella copia da
carta que juntou constava averlhe eu feito mercê de o encontrar na pro
priedade do officio de escrivam da Ouvidoria geral da Comarca de Sam
Paulo, e por quanto o suplicante em rezão do seu posto o não podia servir
tem seu filho primogenito chamado Diogo Pinto do Rego que o exercitou
e tem idade suficiente para o tal officio e se acha cazado com huma filha ,
do provedor da fazenda real que foi da Praça de Santo Thimoteo Correa
de Goiaz que he falecido como melhor constava das certidoens que apre
zentou, e para se haver de manta digo se haver de manter conforme o .
seu estado não tem outra couza mais que o suplicante lhe possa doar
o refferido officio de escrivam da Ouvidoria de Sam Paulo de que he
proprietario ; pedindo me que em attenção a elle suplicante me estar
actualmente servindo no dito posto de capitão de Infantaria com bom
procedimento, e dezejar ver seu filho aumentado, e que possa sustentarsse
com aquella decencia de vida, lhe fizece mercê conceder licença para poder
renunciar nelle a propriedade do dito officio vistas as razões referidas e
sendo visto seu regimento doumentos que juntou e o que respondeu o
Procurador de minha Coroa a que se deu vista. Hey por bem fazer lhe
mercê de lhe conceder faculdade para que possa renunciar na pessoa de
seu filho primogenito Diogo Pinto do Rego a propriedade do do. officio -
de escrivam da Ouvedoria geral da Comarca de Sam Paulo e nos registos
da carta de propriedade que se lhe passou delle se porão as verbas ne
cessarias e este se cumprirá inteyramente como nelle se conthem sem
duvida alguma, e valerá como carta sem embargo da ordenança do 1.° 2.°
tto. 4.° em contrario e se passou por duas vias e pagou de novo direito
dous mil e quinhentos rs. que se carregarão ao thezoureyro Manoel Anto .
Bottelho de Ferreyra a fl : 18 vo . do 1.º 3.º de sua receita e deu fiança no
lo. 1.o dellas a fl . 166 a pagar do mais rendimento que tiver e no mesmo
lo. a fl. 166 deu outra fiança a mostrar se tem pago os direitos da pro
priede., ou a pagallos no cazo que os não tenha pago como constar de
seu conhecimento em forma registrado no lo. 2.o do Registo geral a fl . 272
Lxa. Occidental dezouto de Julho de mil setecentos trinta e nove // Rey
// Alvará porque V. Mage, ha por bem fazer mercê a Andre Corssino de
196 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Mattos de lhe conceder faculdade para que possa renunciar na pessoa de


seu filho primogenito Diogo Pinto do Rego a propriedade do offo. de escri .
vam da Ouvedoria geral da Comarca de São Paulo como nelle de declara
que vay por duas vias // Para V. Mage. vêr 11 1.* Via // Por rezolução
de S. Mage. de vinte e tres de Dezembro de mil e sètecentos trinta oito
em consulta do seu Conselho Ultramarino de des de setembro do dito
anno // Pedro Alexandrino de Abreu Bernardes a fez // o Secretário Ma
noel Caetano Lopez de Lavre a fez escrever // Jozê de Carvalho Abreu //
Alexandre Metello de Souza Menezes // Registado a fl. 133 do Lo . 21
de officios da Secretaria do Conselho Ultramarino e posta a verba que
requer Lxa. Ocidental o primeiro de Agosto de 1739 // Manoel Caetano
Lopez da Lavre // Fica assentado este Alvará nos los. das mercês e
posta a verba que requer Lxa. Occal. 5 de Agosto de 1739 // e pg. du
zentos e outenta rs. // Paulo Nugra. de Andrade // Jozeph Vaz de Car
valho // Pg. 888 rs. e aos officiais trezentos e des rs . Lxa. Occal . 8 de
Agosto de 1739 // Dom Miguel Maldonado / A. Nos los. da Chansellaria mor
da Cortte e Reyno a margem do Registo da Carta que se passou ao dito
Andre Corssino de Mattos da propriedade deste officio fica posta a verba
que este se requer Lxa.. Occal . 8 de Agosto de 1739 // Do. Xavier Alz. de
Moura // Registada na chancellaria da Corte e Reyno no lo. dos officios
e mercês a fl. 229 // Lxa. Occal. 12 de Agosto de 1739 // Joaquim Gui
lherme // Cumprasse e registe se adonde tocar Sam Paulo 3 de Dezembro
de 1740 // Lugar da Rubrica do Illmo. e Exmo. Dom Luiz Mascarenhas
general desta Cappitania // Camera // e continue a servir debaixo do
juramento que perante mim tomou de que se fará termo nas costas desta
Sam Paulo 4 de Dezembro de 1742 // Campello // Aos quatro dias de
Dezembro de mil e setecentos e quarenta e dous ans. nesta cidade de Sam
Paulo em cazas de apozentadoria do Dor. Joam Roiz Campello Ouvidor
geral e corregedor desta Comca, donde eu tabaſião ao diante nomeado fui
chamado e sendo ahy apareceu prezente Diogo Pinto do Rego escrivam
da Ouvedoria geral desta comarca pello que foi dito que pello Alvará de
mercê que aprezentava de S. Mage. queria continuar com a serventia do
dito officio na forma do cumprace do Illmo. e Exmo . Senhor general desta
cappitania e delle dito Dor. Ouvidor geral o que sendo por este visto e
ouvido mandou que o dito escrivam continuace a servir o seu officio em
observancia do dito Alvará debaixo do juramento que perante elle havia
tomado para bem servir o dito officio e de como assim se obrigou fiz
este termo que asignou com 0 do. Doutor Ouvidor geral e eu Damazo
Alz. de Abreu tabalião que o escrevy // Campello // Diogo Pinto do Rego
// E não se continha mais no do. Alvará de S. Mage. e o mais que nelle
se conthem que aqui bem e fielmente fiz registar do proprio original e
vay sem couza que duvida faça porque ly corri concertey e confery com
o proprio ao qual me reporto e o torney a entregar a parte e sobscrevy
e assigney nesta cidade de Sam Paulo aos dous dias do mes de Agosto de
1743 // e eu Manoel da Lus Silveyra, escrivão da Camera que o sobscrevy
asignei, e confery Manoel da Luz Silveyra Confo. pr. mim,
Silveyra.

N. 23 Registo da Carta de lugar por que S. Magde, que


Deos guarde faz mce . ao Dor. Domingos Luiz da Rocha . de Ouvidor
geral desta Comarca ,

Dom Joam por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves da quem
e da lem mar, em Africa senhor de Guiné e da conquista navegação, co
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 197

mercio da Ethiopia, Arabia, Percia e da India & * Faço saber aos que esta
minha carta virem que havendo respeito as letras e mais partes que con
correm no Doutor Domingos Luiz da Rocha, e que no de que o emcarregar
me servirá como cumpre a meu serviço e boa boa administração da justiça,
como o fez nos lugares de letras que ocupou e ultimamente no de Juiz
de fora na cidade de Miranda que servio e de que deu rezidencia . Hey
por bem fazer lhe mercê do lugar de Ouvidor geral da Cappitania de Sam
Paulo por tempo de tres annos e alem delles o mais que houver por bem
emquanto eu lhe não mandar tomar rezidencia o qual elle servirá segundo
forma de minhas ordenações, asim e da maneira que o servirão as mais
pessoas que antes delle o ocuparão, e haverá ordenado proes e precalços
e dos que digo e precalços que direitamente lhe pertenserem ; e mando
ao governador da dita Cappitania, officiaes da Camera pessoar da , gover
nança della e suas anexas lhe deixem servir o dito cargo e haver o dito
ordenado proes e precalços como dito he sem cazo lhe ser posto duvida,
ou embargo algum por que asim he minha mercê, e na Camera da dita
Cappitania lhe será dada posse deste cargo pellos officiaes della ; e jurará
na chancellaria aos santos evangelhos de que bem e verdadeiramente
sirva guardando em tudo meu serviço, e as partes seu direito de que se
fará asento nas costas desta carta que por firmeza diço lhe mandey passar
por mim asignada e sellada de meu sello pendente que se lhe cumprirá
como nella se conthem ; e pagou de novos direitos quarenta e tres mil du
zentos e cincoenta rs. e deu fiança a outra tanta quantia no lo primeiro
dellas a fl . 21 vo. e pagou mais trinta e oito mil novecentos e trinta e
quatro ries de quatro annos e vinte e sete dias que mais servio o lugar
de Miranda , e tudo foi carregado ao thezro . delles no lo. 3.º de sua receita
a. fol . 96 como se vio de seu conhecimento em forma registado no l. 7.0
do Registo geral a f1.7 vº. ' Dada em Lxa. aos onze de outubro de mil
setecento e quarenta e dous. Pagou quinhentos reis // A Raynha // Lu
gar do sello pendente // Carta do lugar do ouvidor geral da Cappitania de
Sam Paulo de que V. Magestade faz mcê. ao Dor. Domingo Luiz da Rocha
por tempo de tres annos // e alem delles mais que houver porbem em
quanto lhe não mandar tomar rezidencia na forma asima declarada //
Para Vossa Magestade ver // Por rezolução de de S. Magestade de tres
de março de 1742 // e Portaria do doutor Gregorio Pereyra Fidalgo da
Silveyra como rezidente // Gregorio Pereyra Fidalgo da Silveira // Joam
Galvão de Castello Branco a fez escrever // Registada na chancellaria
mor da Corte e Reyno no lo. de officios e mercês a fl. 51 Lisboa treze de
outubro de 1742 // anns. // Francisco Joseph de Saâ // Maone] Caetano
de Payva a fez // Antonio Teixeyra Alves // Fica asentada esta carta
nos livros das mercês e pg. duzentos rs. // Paulo Nugueira de Andrade //
Jozeph Vás de Carvalho // registe se // Pg. sinco mil e seiscentos rs. aos
officiais seiscentos e quatorze rs, Lisboa treze de outubro de mil e sete
centos e quarenta e dous // Dom Miguel Maldonado // E eu lhe dey
juramento Lisboa treze de oitubro de mil e setecentos e quarenta e dous
! / Jozeph Vas de Carvalho // E não se continha mais na dita carta de
S. Magestade que aqui bem e fielmente fiz registar do proprio original
a qual me reporto em tudo e portodo e a torney entregar ao mesmo
doutor ouvidor geral Domingos Luiz da Rocha vay na verdade
sem couza que duvida faça porque a confery e concertey sobscrevy e asi
gney nesta cidade de São Paulo aos vinte e oito dias do mes de Setembro
de mil e setecentos e quarenta e tres annos e eu Manoel da Luz Silveyra
escrivão da Camera que o sobscrevy, asigney e confery Manoel da
Luz Silveyra Confo. pr. mim . Silveyra,
?
1

PAPÉIS AVULSOS

Doc . CLXVII

Portaria expedida pela Secretaria d'Estado dos Negócios do Império

Snres. Juiz de Fora pela Lei Preze., e Officiaes da Camara desta Im


perial Cidade. , O Governo Provisorio remette a V. Mces. a Proclamação
inclusa, que na prezente datta faz aos habitantes desta Provincia , para
que ficando na intelligencia do seu contheudo, a fação com a possivel
brevidade, publicar nesta cidade, e Termo pa. conhecimento dos mesmos
habitantes, por assim convir ao Imperial Serviço. Deos ge . a V. Mces.
Palacio do Governo de S. Paulo 18 de Dezembro de 1823 Candido Xer.
de Almda. e Souza João Bapta , da Sa. Passos Anastacio de Freitas
Trancozo João Gonçalves Lima.

Snres. Juis de Fora pela Ley Presidte ., e Offes. da Camara desta Ci


dade. Sua Magestade o Imperador, por Portaria de 22 de 9bro. ultimo,
expedida pela Secretaria d'Estado dos Negocios do Imperio, Mandou re
metter å este Governo Exemplares dos Seus Imperiaes Decretos de 12, e
17 do mesmo mes, pelo primeiro dos quaes dissolveu a Assembleya Geral
Constituinte e Legislativa deste Imperio, convocando immediatamente
huma outra, e pelo segundo ordena, q . quanto antes se proceda a eleição
dos Deputados q. devem compor á nova, Assembleya, e q. para esta eleição
se Observem as Instrucçoens de 19 de Junho do anno proximo passado,
combinadas com o Decreto de 13 de Agosto do mesmo anno : por tanto o
referido Governo remette a Vmces. hum Exemplar de cada hum dos ditos
Decretos, para q. sem demora executem o disposto no de 17, passando a
proceder nas eleições á seu cargo, na forma das sobreditas Instrucoens, q.
devem existir no respectivo Archivo, e em consequencia, das quaes prati
carão 0 mesmo q. teve lugar para a nomeação da Assemblya dissolvida,
fasendo primeiro publicar os preditos Decretos para o necessario conheci
mento dos habitantes desta cidade, e seu Destricto ; e espera o Governo
da fiel obediencia de vmces. ás Ordens de S. M. I. , e da efficacia com q .
se prestão para o bem, e prosperidade deste Imperio assim o hajão de
cumprir promptame. Ds. ge. a vmces. Palacio do Govo , de S. Paulo 12 de
Dezbro. de 1823 Candido Ver. de Almda. e Souza João Bapta. da
Sa, Passos Anastacio de Freytas Trancozo João Gonçalves Lima.
Sua Magestade o Imperador HouIve por bem Determinar, pela Portaria
de 22 de 9bro. pp., expedida pela Secretaria d'Estado dos Negocios do Im
perio, q . este Governo faça dar toda a publicidade aos Diplomas, q. com
este remette a vmces. e são os seguintes 1.0 O Decreto de 13 de No
vembro, em q. S. M. I. Declara não confundir os dignos Representantes
200 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

da Nação com a conhecida facção, q. dominava a Assemblea Geral Consti


tuinte e Legislativa deste Imperio, e anhelava vinganças ainda á custa
dos horrores da anarchia. 2.° O Decreto de igual data, pelo qual s. M. I.
convoca hum Conselho d'Estado para trabalhar no Projecto de Constitui
cão, q . deve apresentar ás Camaras das Provincias, para estas faserem
suas observações, e as apresentarem aos representantes das mesmas. 3.
O Manifesto de S. M. I. , em q. fas ver aos Povos do Brazil as arduas, e
arriscadas circunstancias q. o obrigarão a lançar mão da medida extraor
dinaria da dissolvição da Assembleya, unica capas de restabelecer a tran
quilidade Publica . 4.° Finalmente a Proclamação do Mesmo Augusto Sr.
recommendando aos Povos do Brasil união, tranquilidade, e ilimitada con
fiança na sua Magnanimidade, declarando q. a Bases q. se devem seguir
são Independencia do Imperio Integridade do mesmo - e Systhema
Constitucional. Por tanto ordena este Governo, que vmces, ficando nesta
intelligencia, fação publicar nesta cidade, e seu Destrictos os menciona
dos Diplomas, para cabal conhecimento de seus habitantes. Deos guarde
a vmces. Palacio do Governo de Sm. Paulo 12 de Dezembro de 1823
Candido Xer, de Almda. e Souza João Bapta. da Sa. Passos - Anastacio
de Freytas Trancozo João Gonçalves Lima Snres. Juis de Fora pela
Ley Presidte. e Officiaes da Camara desta cidade.

Doc . CLXVIII

Compra de pas de ferro


4 Pas de Ferro a 1440 5 $ 760 S. Plo. 2 de 8bro. de 1823 Je.
Teixra. de Carvo.Sa. Rby a qta. assima de sinco mil sete sentos e ses
senta S. Plo. era et supra Je. Teixra . de Carvo. Sa. Reconheço
Toledo.

Doc. CLXIX

Pagamento da obra da Ponte Grande


Illmos. Senhores do Nobre Senado Dis Francisco Antonio Baruel
q. por Vossas Senhorias foi revisto a obra da Ponte Grande do caminho
de Santa Anna, e como está na forma do juste pr. tanto Pe. a V. S. S.
sejem servidos mandarem passar mandado de cento e vinte mil rs. 9. hé o
q, se lhe resta E. R. M. Acordão em Vereação &a. Que se passe
Mdo. S. Plo, em Camara de 8 de 8bro . de 1823 Penteado Safino
Barboza . No verso : " Mdo . N.° 32 afl. 157. Para se pagar ao Alfes, Franco .
Anto. Baroela qta . de 120 rs.

Doc. CLXX

Conserto de calçada e aterrado


Illmos. Snres. do Nobre Senado Diz o Sargento Mor Franco. Joze
da Sa. que tendo rematado o consserto da calçada , desde a porta da Igreja
de Nossa Snra. da boa Morte, thé ao Rio Tamandaty, e o Atherrado desde
a ponte the a Chacra das Freiras ; pella qta . de coatro centos e vinte mil
reis : e tendo recebido da da. qta. a metade na forma condicionada , porem
como se acha comcluida a recontada obra pr. isso P. a VV . S. Sas. se sirvão
proseder a vistoria na da. obra e achando -a na forma da rematação se
passe mandado pa. ser o supe . pago. E. R. Mce. Acordão em Vereação
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 201

& a. Que no dia sabbado 18 do corrente ao meio dia se ade esta Camara
achar nos lugares das calçadas e atterrado pa. se fazer a competente vis
toria requerida, e a vista della se lhe defirirá. São Paulo em camara de
15 de 8bro. de 1823 Penteado - Ramos Cantinho Barbosa. No
verso : “ P. Mdo. no Lo, compete. e se ve a N.° 33 a fl. 157: v. da qtla, de
210 $rs.”

Doc. CLXXI

Desobediência de capitães do mato

Snr. Juiz de Fora pela Lei Os Editaes não são pa. correição, sim
pondo em praça os contractos do Concelho, como sejão os cortes, q. todos
os as. assim se prática. O Capam, do Matto Anto . não o quis
mandar levar o Edital, mandei q. a ordem de V. Sa. notifica- se ao Capm.
do Matto Salvador, q. mora no curral, e pr. q. o do. Salvador não quizesse
obedecer a sua ordem foi q. mandei o mmo. Anto. q. o prende - sel ordem
de V. Sa,; e a isto hé q. elle dezobedeceo ; de modo, q. não quis hir prender
ao primeiro dezobediente do. Salvador, digo do. Manoel Capm. do Matto o
q. agora melhor explico a V. Sa. q. mandará o q . for servido. Ds. ge. a
V. Sa. S. Plo . 27 de 9bro, de 1823 . De V. Sa, subdo . obdiente Sor .
Manoel Benedicto de Toledo No verso : “ Torno a dizer, q. todo e ql. qr.
que dezobdecer prenda - o, e pa. maior segurça . mande pelo Portro . fazer
essa notificação Penteado " .

Doc . CLXXII

Obras na Tabatinguera

Avaliemos e calqulemos a despeza da obra de tabatinguera pa. aterrar


C ..... de calcar o que pertence a Camara desde o rrio the
ao Buqueirão q. dece pa . a chacra de João Mora. na dita entrada no todo
se fara 16 braças do lado esquerdo subindo pa , a boa Morte principiara
da largura das testadas acabbando na largura de 25 palmos onde forma
aquela cinta do lado direito de frente a caza da esqina se devera ladrilhar
10 braças ; e retocar a calçada velha a onde persizar, concerto ; toda esta
obra declarada avaliemos e calqulemos a despeza do que pode emportar
Mais ou menos em 691 $ 560.

Doc . CLXXIII

Aterrado do Fonseca

Nos os avaliadores do Conselho serteficamos que vendo todo o aterado


que he nesesario se fazer desde a ponte do fonseca ate a saida dal xacra
velha das com hun pedaso de aterado novo que se vai fazer
ficando todo aterado velho e novo sem defeito que sera obrigado a rema
tante obrigado a por seguro e ser visto pela Camera e seus Lovados se
esta in termos e seguro e avaliamos na qta. de duzentos e oitenta mil
reis Com maderas sofisientes que honde ser reconhesidas pelos avaliadores
Jozo Ferra . Leite Manoel Joze Antunes da Sa. No verso : " Arrema
tou -se depois de ter-se preenchidos os necessarios requizitos da Lei
Toledo .
* 202 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Doc . CLXXIV

Ponte da Emboaçava

Sertificamoz Noiz abaxo asinados que fomos nois e mais Srs. do , Senado
: a Ponte de Boa Sava pa, efeito de se fazer huma, Ponte Nova pa. se pro
ceder na avaliação della. Deve ser a ponte de vinte palmos de largo com
vinte tanxão de cada lado inbaxo de cada trayeça dois que fazem a soma
todos elles de oitenta tanxam e sendo ' mto. bem travada pr..baxo afim
de ficar bem forte com grades de hum e otro lado ' comforme esta de Sta .
Anna devera as cabeças serem asentadas em hum ladrio de pedras e toda a
madeira deve de ser canella ligitima e os tanxam todos de vamirim com
seis palmos de roda e trinta palmos de arto e as vigotas pa. as grades
serem de vatinga e a estiva tudo madeira de Lei As travecas palmo e
meio de lagro e palmo de groço de vinte quatro palmos de comprido de
canella boa o vigamto. que recebe a estiva sera de palmo inquadar tera
de conprido cada viga trinta e dois palmos e tera quatro andares de viga
o atreso ficara no meio bem abaulado e sera guarnicida as cabeças das
estivas com taboas de asoalho afim de não apordecre as cabeças das esti
vas cuja a ponte da forma que a de ser contorida avaliamos comformes
as contição asima de calrada avaliamos comforme intendemos na quantia
de hum conto e duzentos Milrez e pr. ser verdade o referido mandemos
pacar este que vai pr. nois anbos asinado . Sm . Paulo 4 de Janeiro de 1823
Manoel Jose Antunes da Silva Joze Ferra. Leite. No verso : " 800 + 400 +
+ 100 1 : 300 + 1120 2 : 420 . 960 + 160 = 1 : 120 " .

Doc. CLXXV

Avaliação de madeiras da Praça do Curro

Nos abaixo e asinados serteficamos que avaluamos toda madeira e


telhas q. se acha no Curo pertencente ao nobre senado avaliamos tudo o
que la se acha pela quantia de sem mil reis e por verde. pasamos este
por nos asinado. S. Paulo 29 de Abril de 18231 Joze Ferra. Leite
Manoel Alvs. dos Reis.

Doc. CLXXVI

Construção de ponte

huma ponte de tirta palmos de compirdo da lalgura do aterado com


seis tanxois de madera de Lei com 3 palmos de voda 4 vigas de 36 palmos
de compirdo palmo inquardar 6 travesas de palmo de gorso e palmo e dois
dedos de lalgo com estivas de boa qualidade e aterado com tera e perder
gulho bem abaulada avaliada na qta. de sento e vinte minreis as cabesas
da ponte estaqueada e socada com mão de pilão e por aşim tremos feito
pasamos o perzente por hum de nos feito e por ambos asinados. São
Paulo 22 de Maio de 1823 Joze Ferra, Leite Manoel Joze Antunes
da Sa.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 203

Doc . CLXXVII

Avallação de terreno

Sertificamos nos os avaloadores do Conselho que avaloamos, hum


tereno de tera defronte o palasio do Sr. Bispo cujo tereno tem nove barsas
e meya de frente e quinze de fundo com seus muros avaloamos cada
brasa a tirta e dois minreis que importa tudo a qta. de trezento e quatro
minreis, e por verdade pasamos o perzente por hum de nos feito e por
ambos asinados. São Paulo 2 de Mayo de 1823 Jose Ferra. Leite 3
Manoel Ribro. de Aro.

Doc. CLXXVIII

Aterrado do Carmo

Nos os avaloadores do Conselho que avaloamos o Conserto do atrado


da ponte do Carmo athe a ponte do ferão pela qta , de hum conto de reis
sendo tudo visto pelos avaliadores do Conselho e por ser verdade pasa
mos o perzente por hum de nos feito e por nos asinados. São Paulo 14
de Junho de 18 de 1823 Jose Ferra. Leite Manoel Joze Antunes da
Sa. Sertificamos que avaloamos o aterado da ponte do ferão athe honde
fas.... a Capela do Sr. Bom Jesus levantado .4 palmos de alt :)
tudo visto pelos avaloadores do Conselho e avaloamos pela qta. de hum
conto de reis e por ser verdade pasamos o perzente por hum de nos feito
e por ambos asinados, São Paulo 14 de Junho de 1823 Jose Ferra.
Leite Manoel Joze Antunes da Sa. Lavrou - se auto como consta a fl.
57 do Lo . compete.
Doc. CLXXIX

Avaliação de materiais da Câmara

Nos os avaloadores do Conselho que fomos a Curo e axamos muito


desturido tudo robado em termos deste Senado perder tudo qto. la exinte
porque ja não tem mais artimancas nem portais nos camarotes perten
sentes a Camera o que axamos que hoje pode valer o que iziste avaloamos
na qta. de corenta minreis e por ser verdade pasamos o perzente por hum
de nos feito e por ambos asinados - São Paulo 30 de Junho de 1823
Jose Ferra . Leite Manoel Joze Antunes da Sa , Lançado a fl. 55 te verso
do Lo . de Semes.
1

|
ATAS DA CÂMARA DE SANTO AMARO

SESSÃO EXTRAORDINARIA

Presidencia do Sr. Carlos Schmidt

Aos quatorze de Janeiro de Mil Novecentos e treze ( 1 ) , nesta Cidade de


Santo Amaro, Comarca da capital do Estado de São Paulo, no paço da
Camara Municipal, as trez horas da tarde, reunidos os senhores vereado
res : Carlos Schmidt -presidente, Tenente João Felippe da Silva - vice- presi
dente, Brazilio Procopio da Luz prefeito, Izaias Branco de Araujo , José
Conrado e José Guilger Sobrinho, o Senhor presidente declara aberta a
sessão convocada especialmente para d'apresentação das contas, relatorio,
balanço e outros documentos referentes as transações desta Camara no
decorrer do exercicio proximo findo. Em acto continuo o Senhor Prefeito
Municipal leu um extenso relatorio da sua gestão durante o mesmo exerci
cio. Terminada a leitura deste documento, o vereador Senhor Izaias Bran
co de Araujo solicitou a palavra e disse que o Senhor Prefeito Municipal
muito escreveu em seu relatorio, mas que deixou de fazer menção do
" quantum " tem pago ao empreiteiro da ponte sobre o rio Jurubatuba e
se essa ponte já foi recebida de accordo com o contracto celebrado entre
esta Municipalidade e o referido empreiteiro. O Senhor Prefeito declarou
que a ponte ainda não foi officialmente entregue e que tem sido entregue
ao contractante por conta da quantia pela qual foi contractada dois con
tos de reis. Pelo Senhor Vereador Tenente João Felippe da Silva. vice
presidente da Camara, exhibiu o seguinte parecer : “ Parecer. O abaixo
assignado, Membro da Commissão de Contas, tendo attentamente feito mi
nucioso exame no relatorio, balanço e todos os documentos concernentes as
transações da Camara Municipal desta cidade no exercicio financeiro de
1912 é de parecer que seja tudo approvado em virtude de acharem - se na
devida ordem . Sala das sessões, 9 de Janeiro de 1913 . João Felippe da
Silva " . O Senhor presidente submetteu a votação este parecer e votaram
contra o mesmo os vereadores Izaias Branco de Araujo, José Conrado e
José Guilger Sobrinho, declarando o primeiro que o seu voto contrario era
bazeado no seguinte : “ Não existindo commissões nomeadas, como se justi
fica que não houveram dentro deste, digo, dentro o ultimo exercicio não
podia de modo nenhum votar favoravel ao parecer alludido. E nada mais
havendo a tratar, o senhor presidente declara encerrada a sessão . Em tem
po : O Vereador Sr. Izaias Branco de Araujo , pedio que fosse rectificado o
topico desta que se refere a ponte do Rio Jurubatuba, pois que apenas re

1 ) Consta na margem : Valem as emendas que dizem : Janeiro e treze


O Secretario Botelho.
206 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ferio - se as anormalidades que se tem dado na construção demorada : que,


por isso votava contra todo o conteudo da parte que, digo, referente a par
te já citada e que consta do relatorio, bem como os mais dizeres deste do 1
cumento ; tambem votaram em igualdade de condições os senhores Verea
dores José Conrado e José Guilger Sobrinho. E para constar foi lavrado esta
por mim Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario da Camara .
Carlos Schmidt. Izaias Branco de Araujo. José Guilger Sobrinho.
José Conrado. João Felippe da Silva. Brazilio Procopio da Luz.
Alfredo de Andrade Arruda Botelho. Secretario.

ACTA DA SESSÃO ESPECIAL PARA A ELEIÇÃO 'DE PRESIDENTE


VICE - PRESIDENTE , PREFEITO E VICE - PREFEITO MUNICIPAL

Presidencia do Sr. Carlos Schmidt

Aos quinze de Janeiro de Mil Novecentos e treze, nésta Cidade de


Santo Amaro, Comarca da capital do Estado de São Paulo, no paço da
Camara Municipal, ao meio dia, achando - se reunidos todos os Senhores
Veredores, é, pelo Senhor presidente aberta a presente sessão especialmen
te destinada a eleição de presidente, vice-presidente, prefeito e vice - prefeito
Municipal , de conformidade com a lei. O Senhor Presidente convidou aos
Senhores Vereadores para votarem na eleição para presidente. Foram
colocadas na urna, que se achava sobre a mesa, seis s, digo , seis cedulas
que, apuradas, deram o seguinte resultado : Para presidente : Carlos Sch
midt, 3 votos e José Guilger Sobrinho, trez votos. Empatada a votação,
foi considerado eleito o Senhor Carlos Schmidt, pela idade. Em continua
ção procedeu -se a eleição para Vice - presidente, sendo eleito, por seis vo
tos, o vereador José Conrado . Em seguida procedeu - se a eleição para pre
feito Municipal , que deu este resultado : Brazilio Procopio da Luz, trez
votos ; João Felippe da Silva, trez votos. Empatada esta votação e em
vista do vereador mais velho João Felippe da Silva, não ter acceitado
à sua eleição , o Sr. presidente declarou que se ia proceder nova votação,
Procedida esta, com o mesmo resultado da primeira, foi novamente deter
minada pelo senhor presidente a eleição do citado cargo, pela terceira vez ,
visto que o Sr. vereador João Felippe da Silva continuou a insistir em
não acceitar a eleição ; em consequencia o senhor presidente reconheceu
eleito o Senhor Brazilio Procopio da Luz, fazendo a seguinte declaração :
" Em virtude do Senhor João Felippe da Silva, pela terceira vez não accei
tar a sua eleição para Prefeito Municipal, todas as vezes empatadas com
o Senhor Brazilio Procopio da Luz, declaro eleito para este cargo o mes
mo Senhor Brazilio visto figurar com votação igual. Foram tambem,
recolhidas á urna seis cedulas para Vice -prefeito, obtendo o Senhor Tenente
João Felippe da Silva, trez votos. Nesta votação appareceram tambem
trez cedulas para o cargo de prefeito Municipal, votos dados ao Senhor
vereador Izaias Branco de Araujo e os quaes pela a inopportunidade não
foram apurados. Nada mais havendo em referencia á eleição supra re
ferida, Senhor presidente nomeou estas commissões : Contas : José
Guilger Sobrinho e João Felippe da Silva ; Justiça e Obras Municipaes :
Brazilio Procopio da Luz e Izaias Branco de Araujo. Nada mais havendo á
tratar, o Senhor presidente declarou encerrada a sessão.
E para constar, eu, Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario
da Camara lavrei a presente que firmo conjunctamente com os Senhores
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 207

vereadores reunidos. Carlos Schmidt, Izalas Branco de Araujo. José


Guilger Sobrinho. José Conrado. João Felippe da Silva. Brazilio
Procopio da Luz. Alfredo de Andrade Arruda Botelho. Secretario.

TERMO DE COMPARECIMENTO

Aos vinte de Janeiro de mil Novecentos e treze, nesta cidade de San


to Amaro, do Estado de São Paulo, no paço da Camara Municipal , achan
do - se reunidos os Senhores vereadores Carlos Schmidt- presidente. Izaias
Branco de Araujo e José Guilger Sobrinho , e faltando, com causa parti
cipada , os demais Senhores vereadores, não podendo por isso funcionar a
sessão ordinaria determinada para hoje, o Senhor presidente, ordenou á
mim Secretario da Camara, abaixo nomeado, e assignado, que lavrasse a
presente e que convocasse, para o dia vinte e sete do corrente, outra sessão
em substituição a que devia ser hoje efftctuada. E para constar, foi la
yrado este, por mim Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secetario da Ca
mara que assigno após aos Senhores vereadores supra mencionados.
Carlos Schmidt. Izaias Branco de Araujo. José Gullger Sobrinho.
Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario.

ACTA DA SESSÃO ORDINARIA REALISADA NO DIA 27 DE JANEIRO


DE 1913

Presidencia do Senhor Carlos Schmidt

Aos vinte e sete dias do mez de Janeiro de Mil Novecentos e treze,


nesta Cidade de Santo Amaro, Comarca da capital do Estado de São Paulo,
no paço da Camara Municipal, a hora regimental, achando- se reunidos os
Senhores vereadores Carlos Schmidt. -presidente, José Conrado - vice- presi
dente, Brazilio Procopio da Luz-prefeito, Tenente João Felippe da Silva
vice - prefeito , Izaias Branco de Araujo e José Guilger Sobrinho, o Senhor
presidente declara aberta a sessão. Lida, por mim Secretario da Camara,
a acta da sessão anterior, foi esta approvada sem debate. Em acto succes
sivo, foi lido, discutido e despachado o expediente seguinte :
OFFICIOS : de Pedro Pinheiro Guarany, administrador do Mercado,
enviando a conta deste proprio Municipal, pela qual se verifica que o ren
dimento referente ao mez de Dezembro do anno proximo findo foi do
Rs. 1.107 $ 290. " Approvado " . De Brazilio Procopio da Luz, prefeito, so
licitando providencias no sentido de ser recebida provisoriamente a ponte
denominada " 15 de Novembro " , já franqueada ao tranzito publico, e bem
assim a vinda de um engenheiro para verificar a solidez da mesma. Por
proposta do vereador Senhor Izaias Branco de Araujo, foi adiada para a
proxima sessão a discussão deste officio , De Egydio José Moreira, Admi
nistrador do Cemiterio Municipal , enviando , um mappa das pessoas que
alll foram sepultadas no ultimo semestre de 1912. “ Inteirada " . De Pe
dro André Claus, fiscal desta Municipalidade, despensando em favor da
Irmandade de São Vicente de Paula, desta localidade, os 10 % de emolu
mentos que tem sobre as multas impostas durante o exercicio de 1912
e de outras que por ventura possam ser executadas dentro do exercicio
vigente. Após a leitura deste officio, o senhor vereador Izaias Branco de
Araujo pedio a palavra e disse que optava para que a Camara não tomasse
conhecimento dos dizeres do mesmo, pois que, o empregado referido não
necessitava trazer ao conhecimento desta corporação o seu acto generoso ;
208 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

que, a elle competia dispor dos seus emolumentos como entendesse. " A
Camara não tomou conhecimento " . RESOLUÇÃO : “ Artiĝo primeiro. Fica
creado o imposto annual de Rs. 150 $000 a cada empresa cinematographica ,
uma vez que seja domiciliada nesta cidade. Artigo segundo Para as
demais empresas não domiciliadas fica prevalecendo o imposto a que se
refere a actual tabella em vigor. Artigo terceiro. O imposto de que
trata o artigo primeiro poderá ser pago semestralmente. Artigo quarto.
Para a presente resolução fica concedida a urgencia de que trata o regi
mento interno. Artigo quinto . Revogadas as disposições em contrario.
Sala das sessões, 27 de Janeiro de 1913. Brazilio Procopio da Luz " . Esta
resolução foi adiada para a proxima sessão, á pedido do Sr. vereador
* Izaias Branco de Araujo. INDICAÇÕES : " Indico que o senhor Prefeito
Municipal mande fazer os concertos de que necessita uma ponte, digo, uma
parte da estrada do Socorro dannificada com a ultima enchente. Indico
mais que o Prefeito Municipal apresente a Camara um orçamento em
quanto poderá montrar as despesas com os reparos que necessita a Capella
do Cemiterio Municipal . Sala das Sessões em 27 de Janeiro de 1913.
João Felippe da Silva . " Quanto a primeira indicação , prejudicava ;
quanto a segunda, a Camara approvou unanimemente ' '. “ Indico que a
Camara auctorise ao Senhor Prefeito para com a maxima urgencia fazer
o seguinte serviço : Levantar o aterrado na parte onde sempre por enchente
do rio Jurubatuba tem impedido passagem e retocar todo o aterrado até
a ponte denominada 15 de Novembro , podendo o Senhor Prefeito gastar
com esse serviço até a quantia de seiscentos mil reis. Sala das Sessões,
27 de Janeiro de 1913. – Izaias Branco de Araujo " . Submettida a discussão
e em seguida a approvação da Camara, esta indicação foi approvada sem
debate. REQUERIMENTOS : Do Dr. Francisco Ferreira Lopes e Estanis
lau Pereira Borges, solicitando previlegio por quinze annos para extrahir
arela e pedregulhos no rio Jurubatuba, desde a embocadura do Ribeirão
da Traição até o ponto de juncção do rio Guarapiranga, de modo a poder
esse rio ser, em tempo normal navegavel . De Octavio Machado, escrivão
de paz, designado para Secretario da Commissão do Alistamento eleitoral,
pedindo um auxilio na importancia de Rs. 200 $ 000 para occorrer as des
pesas do alistamento que ora se procede cuja quantia será destinada ao
pagamento de auxiliares e não uma renumeração ao requerente. De Do
mingos de Oliveira Orlandi, juntando diversos titulos de datas que lhe fo .
ram concedidas em sesão de 5 de Maio de 1891 e pedindo, para conhecer os
limites dessas datas, o preciso alinhamento. De Gattas Attuy, solicitando
concessão por cinco annos para a montagem de um Chalet de estyllo ele.
gante, destinado à venda de bebidas, compromettendo - se a fazer por conta
propria a limpesa do jardim publico, nos domingos, dias santos e feriados ,
cujo chalet será construido, no referido jardim , no local indicado pela
prefeitura Municipal . De João Coelho Ferreira, pedindo seja- lhe suppridos
os titulos de datas referentes ao recibo firmado pelo ex - secretario da
Camara Octavio Machado , em 31 de Julho de 1901 e appenso ao seu re
querimento . — “ Adiado para a proxima sessão " foi o despacho dado
pelo senhor presidente, nos mencionados requerimentos em virtude de to
marem essa deliberação os Senhores Vereadores Izaias Branco de Araujo
José Conrado e José Guilger Sobrinho. De Claudio José Branco, solici
tando providencias acerca de uma ponte illegalmente feita, em terreno de
sua propriedade , pelo Cidadão Amaro Roque, e que tornou um desvio sem
pre alli existente e franqueado ao transito publico em franca estrada para
vehiculos, Para estudar a questão e dar o necessario parecer, sobre a
questão digo, parecer а Camara nomeiou uma Comissão composta dos
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 209

vereadores Brazilio Procopio da Luz, prefeito, José Conrado e Tenente


João Felippe da Silva. De Montanari Bomfilio, de Barçalli Victoria, pe
dindo a verificação e legalisação de datas de terras concedidas pela Camara
em sessão de 3 de Novembro de 1890. " Informe a prefeitura Municipal" .
De Alvaro Rodrigues, solicitando algumas datas de terras no lugar deno
minado “ Cordeiro " Segundo despacho : “ Indeferio " . O vereaddor senhor
Izaias Branco de Araujo , declarou que em vista de não estar ainda resol
vido pela Camara a questão sobre concessões de datas, que, com seus
collegas José Conrado e José Guilger Sobrinho, votava a favor do indefe
rimento desta petição. Da The São Paulo Tramway, Light and Power
Company, Limited , enviando a planta e locação para a estação transfor
madora de corrente elettrica para o serviço de viação, luz e força neste Mu
nicipio e pedindo approvação da mesma. Essa planta que é de numero
303947, foi estudada pelos senhores vereadores reunidos, na meza das
sessões, e approvada por todos. Foram igualmente approvadas as plantas
da citada companhia, sob , numeros 303910. e 303889, ficando o nivelamento
desta sujeita a approvação da prefeitura Municipal. Nada mais havendo
a tratar o Senhor presidente declara encerrada a sessão, E para constar,
foi lavrada esta por mim Alfredo de Andrade Arruda Botelho, secretario
da Camara que a escrevi, Carlos Schmidt. Izaias Branco de Araujo.
José Guilger Sobrinho. José Conrado. João Felippe da Silva . Bra
zilio Procopio da Luz. Alfredo de Andrade Arruda Botelho. Secretario,
* 212 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Fraga, Secretário do Interior e Jus . titui, também, um acervo de leitura


tiça, do Prefeito de Salvador, o his de agora em diante imprescindível
toriador Wanderley Pinho, publica a quem deseje entrar em contacto
também um artigo do sr . Alberto Sil com a “elite ' ' intelectual do Brasil.
va a respeito de Tomé de Souza, o No meio dessa variada colaboração
fundador da Cidade do Salvador. deparamos alguns artigos que nos di
Constam ainda das suas páginas o zem respeito mais de perto. Em pri
- regulamento do Primeiro Congresso meiro lugar, o pequeno mas excelen
de História da Bahia e a relação das te trabalho do Sr. Joaquim Cardoso
teses oficiais que nele deverão ser sôbre a aplicação de azulejos na Ar
discutidas. A simples leitura dessa quitetura Brasileira . Notou, o dis
relação basta para demonstrar o alto cretíssimo poeta pernambucano , a im
aprêço e rigoroso critério que os nos portância que o azulejo vem tendo
sos patrícios baianos nutrem não só ultimamente na moderna arquitetura
pela história do seu glorioso estado do Brasil, a que ele serve de elemen
como também pela História do Bra to decorativo e, ao mesmo tempo ,
sil, ambas tão estreitamente ligadas corresponde à funcionalidade indis
que até certo ponto se confundem . pensável à moderna arte de construir .
Traz, também , um farto noticiário Num suscinto histórico do azulejo
do 4.º Centenário da Bahia e publi distinguiu o A. três períodos que
ca os postulados do Municipalismo considera fundamentais 1 ) os azule
Americano . C. M. jos policrômicos, de relevo ou lisos,
fabricados de acórdo com o proces
CULTURA Revista quadrimensal so de Nicoloso Milano, com desenhos
publicada pelo Serviço de Documen em forma de padrão ou, em compo .
tação do Ministério da Educação e sição mais vasta, imitando tapetes ;
Saúde. Tomo 1 Número 1 . 2 ) em que predominam ladrilhos pin
tados em azul sobre fundo branco ,
O Ministério da Educação conti
rua, graças à admirável dedicação sempre lisos e possuindo um caráter
já bastante distanciado dos primi.
de alguns dos seus ilustres funcioná
tivos modelos mouriscos ; 3 ) a fase
rios, a manter o alto nível de suas
industrial em que os azulejos passam
publicações. Acabamos de receber o
a ser desenhados e fabricados por
primeiro número da revista “ Cultu
processos mecânicos. Assinalou o A.
ra ” , editada pelo Serviço de Docu
a existência de várias fachadas re
mentação e dirigida pelo sr. José Si .
meão Leal. Do seu sumário constam vestidas de azulejos no Recife, na
artigos sôbre variados assuntos des Bahia , no Rio de Janeiro e em ou
de “ A América e 0 Nacionalismo tros pontos do Brasil, como tivemos
Musical ” , de Renato de Almeida até ensejo de apreciar em Santa Catari.
“ Shakesdeare a condição huma na. Sob o título de “ Panorama das
na ” , de Otto Marià Carpeaux. Den Artes em 1948 ” o Sr. Mário Pedro
tro dêsse inteligente ecletismo, a re sa arrola o movimento pictórico no
vista consegue despertar o interesse Rio de Janeiro, com o comedimento
do todos os tipos de leitores e cons co equilíbrio que se exigem em tra
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 213

balhos desse gênero. Destaca uns nica que deve, precipuamente, cuidar
poucos nomes de artistas como Dja dos complexos problemas da admi
nira , Pancetti, Bruno Giorgi, Fayga nistração, a “ Revista do Serviço Pú
Ostrower, Balloni e outros. Julga, blico ” , não poderia deixar de des
com justificado pessimismo, o Salão pertar especial interêsse entre os que
Nacional que, dia a dia, ou melhor, dedicam suas atividades ao serviço
ano a ano, parece afundar no mais do Estado. Interessou -nos, sobrema
deplorável amadorismo. Dêle diz com neira, nesse volume, o trabalho do sr.
amargura : “ Ali, apenas, aglomeram Konrad Kowalewski que trata de al
se os artistas, confusamente, como guns aspectos do problema do petró.
numa feira ” . É pena que Mário Pe- . leo na França. Devido à atualidade
drosa tenha limitado o seu “ panora do assunto transcrevermos , em segui
ma " ao Rio de Janeiro, principal da, as conclusões a que chegou o con.
mente quando um crítico carioca ceituado articulista :
como o sr. Antônio Bento, reconhece “ 1. Pelo exame da solução fran
que , o eixo artístico do Brasil está
cesa verifica-se a importância da
atualmente em São Paulo . Publica, criação da indústria de petróleo como
ainda, o presente número de “ Cul verdadeira indústria -chave da adian .
tura ” , a conhecida “ Árvore da Pin tada e industrializada economia na
tura Moderna ” , de R. H. Wilenski cional ;
que apesar de velha ainda pode aco 2. a razão de ser desse setor da
lher à sua sombra os iniciantes na
indústria não depende exclusivamen
pintura contemporânea. Deixamos, te da disponibilidade das reservas
porém, propositadamente, para um suficientes de óleos crú no território
mais longo comentário o importante nacional,
e oportuno estudo do arquiteto Lúcio
Costa sôbre o ensino do desenho no 3. o êxito das iniciativas nesse sen
curso secundário. É êste um assunto tido depende duma acertada e eco
nômicamente razoável regulamenta
que demanda acurada análise e me
rece ampla divulgação. Pois, todos ção da matéria por lei, com a parti
nós estamos plenamente convencidos cipação ativa dos poderes públicos
na aplicação de tal programa, sobre
de que a má orientação do ensino do
tudo mediante a concessão de uma
desenho ou , por outra, a inteira de
série de providências protetoras, al
sorientação do ensino dessa discipli
na tem sido a principal responsável fandegárias, tributárias e outras ;
pela profanação do gôsto artístico 4. no que diz respeito ao progra
da mocidade brasileira. C. M. ma da participação do capital es
trangeiro na criação e desenvolvi.
mento desse setor da indústria de
REVISTA DO SERVIÇO POBLICO
Ano XII Volume II N.° 1 combustíveis, progra éste tão ampla
Abril de 1948. mente debatido, não paruce impor
8e a opção entre duas soluções nìti
órgão do Departamento Adminis damente opostas e inconciliáveis : a
trativo do Serviço Público, subordi da estadização nacionalista e a da
nado portanto a uma repartição téc entrega dêsse setor ao capital estran .
212 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Fraga, Secretário do Interior e Jus titui, também, um acervo de leitura


„ tiça, do Prefeito de Salvador, o his de agora em diante imprescindível
toriador Wanderley Pinho, publica a quem deseje entrar em contacto
também um artigo do sr. Alberto Sil com a " elite ' ' intelectual do Brasil.
va a respeito de Tomé de Souza, o No meio dessa variada colaboração
fundador da Cidade do Salvador. deparamos alguns artigos que nos di
Constam ainda das suas páginas o zem respeito mais de perto. Em pri
- regulamento do Primeiro Congresso meiro lugar, o pequeno mas excelen
de História da Bahia e a relação das te trabalho do Sr. Joaquim Cardoso
tcses oficiais que nele deverão ser sôbre a aplicação de azulejos na Ar
discutidas. A simples leitura dessa quitetura Brasileira . Notou , o dis
relação basta para demonstrar o alto cretíssimo poeta pernambucano , a im
aprêço e rigoroso critério que os nos portância que o azulejo vem tendo
sos patrícios baianos nutrem não só ùltimamente na moderna arquitetura
pela história do seu glorioso estado do Brasil, a que ele serve de elemen
como também pela História do Bra to decorativo e , ao mesmo tempo,
sil, ambas tão estreitamente ligadas corresponde à funcionalidade indis
que até certo ponto se confundem . pensável à moderna arte de construir.
Traz, também , um farto noticiário Num suscinto histórico do azulejo
do 4.º Centenário da Bahia e publi distinguiu o A. três períodos que
ca os postulados do Municipalismo considera fundamentais 1 ) os azule
Americano, C, M. jos policrômicos, de relevo ou lisos,
fabricados de acórdo com o proceso
CULTURA Revista quadrimensal so de Nicoloso Milano, com desenhos
publicada pelo Serviço de Documen em forma de padrão ou, em compo :
tação do Ministério da Educação e sição mais vasta , imitando tapetes ;
Saúde. Tomo 1 Número 1 . 2 ) em que predominam ladrilhos pin
tados em azul sôbre fundo branco,
O Ministério da Educação conti
rua, graças à admirável dedicação sempre lisos e possuindo um caráter
já bastante distanciado dos primi.
de alguns dos seus ilustres funcioná
tivos modelos mouriscos ; 3 ) a fase
rios, a manter o alto nível de suas
industrial em que os azulejos passam
publicações. Acabamos de receber o
a ser desenhados e fabricados por
primeiro número da revista “ Cultu
processos mecânicos. Assinalou o A.
ra ” , editada pelo Serviço de Docu
a existência de várias fachadas re
mentação e dirigida pelo sr . José Si .
meão Leal. Do seu sumário constam vestidas de azulejos no Recife, na
artigos sobre variados assuntos des Bahia, no Rio de Janeiro e em ou
de “ A América e 0 Nacionalismo tros pontos do Brasil, como tivemos
Musical ” , de Renato de Almeida até ensejo de apreciar em Santa Catari
“ Shakesdeare a condição huma na. Sob o título de “ Panorama das
na ? ', de Otto Marià Carpeaux. Den Artes em 1948 " o Sr. Mário Pedro
tro dêsse inteligente ecletismo, a re sa arrola o movimento pictórico no
vista consegue despertar o interesse Rio de Janeiro, com o comedimento
cdo todos os tipos de leitores e cons. e o equilíbrio que se exigem em tra
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 213

balhos dêsse gênero. Destaca uns rica que deve, precipuamente, cuidar
poucos nomes de artistas como Dja dos complexos problemas da admi
nira , Pancetti, Bruno Giorgi, Fayga nistração, a “Revista do Serviço Pú
Ostrower, Balloni e outros. Julga , blico " , não poderia deixar de des
com justificado pessimismo, o Salão pertar especial interêsse entre os que
Nacional que, dia a dia, ou melhor, dedicam suas atividades ao serviço
ano a ano, parece afundar no mais do Estado. Interessou -nos, sobrema
deplorável amadorismo. Dêle diz com neira, nesse volume, o trabalho do sr.
amargura : “Ali, apenas, aglomeram Konrad Kowalewski que trata de al
sc os artistas, confusamente, como guns aspectos do problema do petró.
numa feira ” . É pena que Mário Pe . leo na França . Devido à atualidade
drosa tenha limitado o seu “ panora do assunto transcrevermos , em segui
ma ao Rio de Janeiro, principal da, as conclusões a que chegou o con
mente quando um crítico carioca ceituado articulista :
como o sr. Antônio Bento , reconhece " 1. Pelo exame da solução fran
que o eixo artístico do Brasil está cesa verifica- se a importância da
atualmente em São Paulo. Publica, criação da indústria de petróleo como
ainda, o presente número de “ Cul verdadeira indústria-chave da adian.
tura " , a conhecida “ Árvore da Pin tada e industrializada economia na
tura Moderna ” de R. H. Wilenski cional ;
que apesar de velha ainda pode aco 2. a razão de ser desse setor da
lher à sua sombra os iniciantes na indústria não depende exclusivamen
pintura contemporânea . Deixamos, te da disponibilidade das reservas
porém, propositadamente, para um suficientes de óleos crú no território
inais longo comentário o importante nacional.
e oportuno estudo do arquiteto Lúcio
3. o êxito das iniciativas nesse sen.
Costa sôbre o ensino do desenho no
tido depende duma acertada e eco
curso secundário. É este um assunto
nômicamente razoável regulamenta
que demanda acurada análise e me
ção da matéria por lei, com a parti
rece ampla divulgação . Pois, todos
cipação ativa dos poderes públicos
nós estamos plenamente convencidos
na aplicação de tal programa, sobre
de que a má orientação do ensino do
tudo mediante a concessão de uma
desenho ou, por outra, a inteira de
série de providências protetoras, al
sorientação do ensino dessa discipli
fandegárias, tributárias e outras ;
na tem sido a principal responsável
pela profanação do gôsto artístico 4. no que diz respeito ao progra
da mocidade brasileira. C. M. ma da participação do capital es
trangeiro na criação e desenvolvi.
mento dêsse setor da indústria de
REVISTA DO SERVIÇO PÚBLICO
Ano XII Volume II -- N.° 1 combustíveis, progra êste tão ampla
Abril de 1948. mente debatido, não parece impor
se a opção entre duas soluções nìti
órgão do Departamento Adminis damente opostas e inconciliáveis : a
trativo do Serviço Público, subordi da estadização nacionalista e a da
nado portanto a uma repartição téc entrega dêsse setor ao capital estran
214 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

geiro. São perfeitamente aceitáveis mento que estudou a constituição e


e. em determinadas condições até se a população indígena de Angola. São
recomendam muito as soluções inter as seguintes as conclusões a que che
mediárias entre êsses dois polos opos gou, após um minucioso e bem fun
tos. Como é natural, não existem damentado estudo :
nessa matéria soluções abstratas “ I – A população indígena de
ideais, aplicáveis em tôda a parte, Angola é constituída por 3.665.289
de vez que elas teem que ser rigoro habitantes, sendo de 2,9 a sua densi
samente adaptadas às condições na dade no território da Colônia .
cionais de todos os países interessa II Nesta população há um pre
dos, encarados separadamente. domínio das fêmeas em relação aos
5. A criação de uma vigorosa e di varões, sendo a proporção de 89,6
nâmica indústria de refinação do pe homens para 100 mulheres no con
tróleo possibilita , por sua vez, quan junto total.
do a economia nacional já é uma eco III A Província onde essa desi
nomia industrial , O estabelecimento gualdade é maior é a da Huila , onde
dos diversos ramos da indústria de o sex-ratio é de 85,4 .
equipamento de refinarias, como IV A Província onde essa desi
aconteceu na França , com a conse gualdade menos se manifesta é a de
quente possibilidade do seu promis Benguela, com um sex-ratio de 92.3.
sor aproveitamento para a montagem V Apenas num pequeno grupo
da indústria refinadora em outros étnico de Angola o dos Quimba
países como no Brasil.” C. M. res se nota um maior número de
liomens em relação às mulheres ( sex
ratio de 103,7 ) .
SOCIEDADE DE GEOGRAFIA DE
VI Os grupos étnicos onde e
LISBOA - Novembro e dezembro
desigualdade entre o número de mu
1948 - 66.a série - números 11 e 12.
lheres e homens é mais acentuada
O Boletim da “ Sociedade de Geo são os humbes, os chindongas, os
grafia de Lisboa '' é uma publicação quicongos e cuanhamas.
que transcende o interesse exclusivo VII Nos umbundos, nhanecas e
dos especialistas. Esses dois últimos lunda-quiocos verifica -se uma certa
números publicam , entre outros, um tendência para o equilíbrio entre os
artigo do coronel Lopes Galvão que dois sexos.
a convite do Governador Geral de VIII Nas crianças, observa -se
Angola passou uma semana no sul uma tendência para a igualdade no
daquela conhecida colônia portuguê mérica entre os dois sexos, apenas
sa . Apesar do tom nitidamente en: com um leve predomínio do mascu
cominiástico de suas impressões o A. lino.
traz alguns dados de interesse para IX A partir da puberdade, o
os estudiosos de geografia e de 80
desequilíbrio entre os sexos acentua
ciologia .
se, correspondendo então cerca de 80
O trabalho mais importante dessa homens para 100 mulheres, fenôme
publicação é o do sr . Alexandre Sar no éste também observado nas popu
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 215

lações bantus doutras regiões afri 4 FAMILIA JORDÃO E SEUS


canas , AFINS Frederico de Barros Bro
X - A população indígena de An tero São Paulo 1948.
gola pertence ao tipo progressivo,
visto contar com 40,3 % de crianças. Há quem considere a Genealogia
XI – A população indígena das um ramo subalterno da História .
províncias do Congo, Benguela, Ma Basta atentarmos, porém, para os
lange e Huila pertence também ao valiosos subsídios que ela poderá
mesmo tipo. fornecer ao historiador, para olhar
XII A população indígena da mos, não só com simpatia como tam
província do Bié ( que representa bém com admiração, a ésses pesqui
18,9 % da população total de Ango sadores infatigáveis, verdadeiros
la ) pertence ao tipo estacionário , abnegados, que vivem vasculhando os
visto contar com 35,8 % de crianças, arquivos e perquirindo pessoas, a fim
XIII · A natalidade indígena em de encontrar um fio que poderá le
Angola é de 35,8 por mil. vá -los a reconstituir toda a meada,
XIV A percentagem de mulhe muitas vezes apenas entrevista.
res indígenas estéreis é de 29,1 % . O sr. Frederico de Barros Brotero
XV Este indice é de 3,9 na pro ocupa, merecidamente , um lugar de
víncia do Congo, ascendendo a 4,2 destaque entre os nossos genealogis
do distrito do Huambo. tas. A volumosa bagagem que apre
XVI Em conjunto, todos os fa senta, coloca - o na vanguarda dos pes
tos apontados no decorrer dêste tra quisadores da história paulista, Orien
balho deixam boa impressão quanto tado pelo mais rigoroso escrúpulo na
às perspectivas demográficas da po colheita de dados, o sr. Frederico de
pulação indígena de Angola , deven Barros Brotero, dá, com o seu último
do porém esclarecer -se e frisar- se volume, acerca da “Família Jordão e
que, por absoluta falta de elementos seus afins uma contribuição valiosa
estatísticos, se não pôde fazer refe aos que amam e estudam a história de
rência a importantes fenômenos de Piratininga. Naturalmente, a sua
mográficos. obra não é perfeita ; apresenta, mes
XVII Impoem-se a criação ur mo, várias lacunas que fàcilmente
gente em Angola dum Instituto es . poderão ser preenchidas nas próxi
pecialmente consagrado ao estudo mas edições. Nem se poderia esperar
de sua População, dado o grande in extrema correção numa obra dêsse
terêsse de que tal estudo se reveste gênero, dada a indiferença que os
para a nossa obra colonizadora, e nossos patrícios ostentam por essa
atendendo a que nesse campo de in espécie de estudos. Contudo, a obra
vestigação médica, antropobiológica, que o gr . Frederico de Barros Brote
raciológica, social, etc., há ainda uma ro pacientemente elaborou , servirá,
vastíssima tarefa a realizar e que entre outras coisas, para a reconsti
só um estabelecimento dessa nature tuição de um dos mais importantes
za a pode levar a cabo com seguran troncos da gente do Planalto.
ça e com êxito. " C. M. C. M.
216 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

“SANGUE LIMPO " por PAULO Citam -se versos de Castro Alves
Eiró. que se parecem com os de Eiró, o qual
usava de imagens grandiloquas como
Com respeito à peça teatral do a da seguinte quadra, dedicada a
brilhante poeta paulista, Paulo Eiró, Gonçalves Dias e que se encontra nas
peça que recentemente apareceu em Obras Póstumas dêste, sem citação do
segunda edição, publicada nesta re autor :
vista e em separata, encontramos no
" Jornal do Comércio ” , do Rio de Ja “ Deus num acesso de amor,
neiro de 16 de Julho de 1949 , a se Ao poeta soberano,
guinte referência, do eminente es Deu - lhe por bêrço o equador
critor patrício Dr. Cláudio de Souza, E por túmulo o oceano ."
que muito nos desvaneceu, e quo
agradecemos : À autoridade poética de quem as
O Sr. Cláudio de Souza ofereceu sim o julga, acrescente-se a seguinte
à Academia , em nome do Sr. José apreciação de Amadeu Amaral, um
A. Gonsalves, um exemplar no drama dos príncipes de sangue da métrica
Sangue limpo, dizendo : “ Paulo Eiri brasileira : “ Eiró era um poeta de
é o autor dêsse drama, representado nascença , poeta até à medula, fazen
a 2 de Dezembro de 1861 , em São do versos a propósito de tudo " .
Paulo. A vida e a obra de Paulo
Das oito peças da obra teatral de
Eiró, o desventurado poeta paulista Paulo Eiró, apenas se salvou do tem.
que morreu louco, já tem sido refe po a que ora se reedita por iniciativa
ridas na Academia , não só por quem de meu eminente consócio do P. E. N.
ora fala, como por outros acadêmicos, Clube e da Academia Paulista o bri.
entre os quais o saudoso e queridíssi. lhante escritor Nuto Sant'Anna, que
mo Amadeu Amaral, cuja minuciosa se dedica devotadamente ao exercício
conferência consta da Revista da do cargo de Diretor da Divisão do
Academia de Maio de 1936 .
Arquivo Histórico do Departamento
Foi vida triste, amargurada e su de Cultura de São Paulo . Essa re
marenta de pobre e desfalecida ter edição é um real serviço à história
nura. Há quem , como o poeta Jamil
da cultura nacional, e torna-se ainda
Almansur Haddad, afirme que “ se mais preciosa pela autorizada e cri
não fôsse interrompida pela demên teriosa notícia bio- bibliográfica que
cia sua trajetória poética chegaria contém , da autoria do escritor José
mos a ter provavelmente nele um poe A. Gonçalves.. A bibliografia, aju
ta com a significação histórica de
dada por informações da família , é
Castro Alves ” . E conclui que Paulo completa e servirá à excelente publi
Eiró merece o título de precursor do cação Autores e Livros, de nosso in
poeta de A Cachoeira de Paulo Afon signe companheiro Mucio Leão, quan
80". do houver de tratar dêsse poeta ” .
DECRETOS E LEIS

DECRETO N.° 1.078 , DE 6 DE JULHO DE 1949

Dispõe sôbre a localização do " Monumento aos


Mortos de 32 ” , no parque Ibirapuera.

O Prefeito do Município de São Paulo, usando das suas atribui


ções e com fundamento no que dispõe o art. 3. da Lei n .° 3.758, de
20 de maio de 1949,

Decreta :

Art. 1.° - O “ Monumento aos Mortos de 32 ” , será erigido no ·


Parque Ibiraquera , na parte central da praça circular localizada no
prolangamento da avenida Brasil , a 1.100,00 metros, aproximada
mente, da avenida Brigadeiro Luis Antonio .
Art. 2.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica
ção , revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 6 de julho de 1949, 396 .
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson , O Secretário de Obras , Dario de Cas
tro Bueno .
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 6 de julho
de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

DECRETO N.º 1.079, DE 13 DE JULHO DE 1949

Declara de utilidade pública uma área de terre


no necessária à construção de um grupo escolar, no
bairro do Tatuapé.

O Prefeito do Município de São Paulo, usando da atribuição que


lhe confere o artigo 6.', combinado com o artigo 5.', letra “ m ” , do
Decreto-Lei federal n .° 3.365 , de 21 de junho de 1941 ,
218 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Decreta :

Art . 1.º Fica declarada de utilidade pública, para o fim de ser


desapropriada , amigável ou judicialmente, a área de terreno de forma
irregular, situada no bairro do Tatuapé, 28.° subdistrito desta cidade
e comarca da Capital , com 3.207,50 m2 (três mil duzentos e sete me
tros e cinquenta decimetros quadrados ), mais ou menos, de proprie
dade do “ Cotonificio Guilherme Giorgi , Sociedade Anônima ” , e que
assim de descreve e confronta : divide, pela frente, na extensão de
95,00 metros, mais ou menos (linha 1-2 ) , ao longo dos alinhamentos
da rua “ 2 ” ( não oficial ) e sua continuação , rua “ 10 ” ( não oficial )
com os leitos destas ruas ; pelo lado direito de quem do terreno olha
para a rua , na extensão de 30,50 metros, mais ou menos (linha 2-3 ) ,
pelo lado esquerdo, na extensão de 40,00 metros, mais ou menos (li
nha 4-1 ) , e, pelos fundos , na extensão de 70,00 metros, mais ou me
nos , (linha 3-4 ) , com imóveis de propriedade do “ Cotonificio Gui
lherme Giorgi , Sociedade Anônima ” , ou de quem de direito , área de
terreno essa que faz parte integrante da quadra n .° 8 do plano de lo
teamento e arruamento do “ Jardim Textil ” (não aprovado pela Pre- '
feitura ) , tudo de acórdo com a planta anexa , n . ° P-4183 que , autenti
cada pelo Prefeito , fica fazendo parte integrante dêste decreto.

Art. 2. — É de natureza urgente a desapropriação de que trata o


presente decreto , para o efeito de imediata imissão de posse do imó
vel em referência , na forma do artigo 15 do Decreto Lei n . ° 3.365 , de
21 de Julho de 1941 , com a alteração constante do Decreto -Lei n.º 9.811 ,
de 9 de setembro de 1946 .

Art. 3.° As despesas decorrentes da execução deste decreto


correrão por conta da verba 940.8392 , consignada no orçamento vi
gente.

Art. 4.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica


ção , revogadas as disposições em contrário .

Prefeitura do Município de São Paulo, 13 de Julho de 1949 , 396.0


da fundação de São Paulo . O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos , Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário de Obras, Dario de Cas
tro Bueno. O Secretário das Finanças, João Pacheco Fernandes .

Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 1 ! de julho
de 1949. --- 0 Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 219

DECRETO N.º 1.080, DE 20 DE JULHO DE 1949

Revigora e amplia a declaração de utilidade


pública de imóveis necessários à canalização do Rio
Tietê e obras complementares.

O Prefeito do Município de São Paulo, usando das atribuições


que lhe são conferidas pelo art. 5.', alineas “ d ” e “ i ” e art. 6.°, am
bos do Decreto-lei Federal n.° 3.365, de 21 de junho de 1941 ,

Decreta :
Art. 1. ° Fica parcialmente revigorado o Ato n .° 1542, de 24 de
fevereiro de 1939 , para que sejam novamente declarados de utilidade
pública, a fim de serem desapropriados amigável ou judicialmente os
imóveis necessários à abertura do canal do Rio Tietê e avenidas mar
ginais, no trecho compreendido entre a Penha e a Ponte das Ban
deiras.
Art. 2.° Ficam declarados de utilidade pública , para o mesmo
fim de serem desapropriados judicial ou amigávelmente os imóveis
necessários ao alargamento de trechos da Avenida Marginal Direita e
a obras complementares , de urbanização nos bairros da Corôa e Ca
nindé, imóveis êsses a seguir descritos e configurados na planta ane
Xa, n .° 1.582, que, autenticada pelo Prefeito, fica fazendo parte inte
grante dêste Decreto, a saber :
I uma área de forma irregular cujos limites são os seguintes :
partindo de um ponto no alinhamento leste da projetada Praça Nor
te da Ponte das Bandeiras, a 418,00 metros da intersecção dêsse ali.
nhamento com o alinhamento do limite da avenida direita adjacente
ao canal do Tietê, com uma deflexão a direita de 98°, segue em ali
nhamento reto numa distância de mais ou menos 286,00 metros até
encontrar o alinhamento impar da avenida Cruzeiro do Sul , aprova
do pelo decreto n . 971 , de 14 de abril de 1947 ; daí, defletindo à di
reita segue por esse alinhamento numa distância de aproximadamen
te 153,00 metros ; nesse ponto defletindo novamente à direita segue
em alinhamento reto numa extensão de 113,00 metros , onde defletin
do à esquerda , atravessando a rua Voluntários da Pátria , em alinha
mento curvo com 130,00 metros de raio e desenvolvimento de cerca
de 93,00 metros, atinge novo trecho reto tangente à curva anterior,
pelo qual numa extensão de aproximadamente 124,00 metros, encon
trando o alinhamento leste da aprovada Praça Norte da Ponte das
Bandeiras ; dai defletindo à direita segue por esse alinhamento numa
distância de aproximadamente 244,00 metros, onde atinge o ponto
inicial da presente descrição ;
220 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

II uma área de forma irregular, com os seguintes limites : par


tindo de um ponto no alinhamento par da avenida Cruziero do Sul
(aprovada com 50,00 metros de largura pelo decreto 971 , de 14 de
abril de 1947 ) distante 363,00 metros, mais ou menos, da intersecção
dêsse alinhamento com o limite externo da avenida direita adjacen
te ao canal do Tietê, já aprovado, deflete à direita 112° 25 ', com re
lação ao alinhamento da avenida Cruzeiro do Sul , segue em alinha
mento reto numa distância de 507,00 metros, mais ou menos ; daí , em
alinhamento curvo, defletindo à direita , com raio de 930,00 metros
e desenvolvimento de aproximadamente 405,00 metros, até um ponto
situado a cerca de 96,00 metros além do chamado “Caminho do Cam
po ” ; dêsse ponto, defletindo à direita , segue numa distância de 30,00
metros até encontrar o alinhamento externo da avenida marginal di
reita, já aprovado , pelo qual segue , o sentido de rio abaixo cerca de
128,00 metros, onde faz ângulo à esquerda e segue numa distância de
aproximadamente 293,00 metros, sempre pelo limite já aprovado ; dai
defletindo à direita segue em alinhamento reto, numa distância de
72,00 metros, aproximadamente, onde defletindo à esquerda segue, em
alinhamento reto, numa distância de aproximadamente 485,00 metros
até encontrar o alinhamento par da Avenida Cruzeiro do Sul , já apro
vado, pelo qual segue , depois de defletir à direita , numa distância de
aproximadamente 132,00 metros, onde vai encontrar o ponto inicial
da presente descrição ;
III uma área de forma irregular com os seguintes limites : par
tindo do ponto de intersecção do alinhamento par da avenida Cru
zeiro do Sul ( aprovada com 50,00 metros de largura , pelo decreto nú
mero 971 , de 14 de abril de 1947 ) com o limite externo da avenida di
reita adjacente ao canal do Tietê, segue pelo referido alinhamento
par numa distância de 31,90 metros , onde defletindo à direita, segue
em reta à distância de 190,00 me os, onde defletindo novamente à
direita , segue em reta à distância de 27,00 metros, tornando ao ponto
inicial da presente descrição pelo limite da avenida direita adjacen
te ao canal do Tietê, de alinhamento já aprovado , medindo neste lado
aproximadamente 192,00 metros ;
IV uma faixa de 40,00 metros de largura constituindo uma
avenida auxiliar, abrangendo e prolongando a Rua Porto Seguro, es
tendendo-se desde a Praça dos Esportes até 340,00 metros além do
alinhamento par da avenida Cruzeiro do Sul , aprovado pelo decreto
n .° 971 , de 14 de abril de 1947 ;
V uma faixa de 18,00 metros de largura , normal ao alinhamen
to da avenida marginal esquerda e no prolongamento da travessa Pôr
to Seguro, com uma extensão aproximada de 208,00 metros, ligando
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 221

a avenida marginal esquerda à avenida auxiliar já descrita, entre a


Praça dos Esportes e a Avenida Cruzeiro do Sul ;
VI uma faixa de 18,00 metros de largura, cujo eixo está situa
do a 209,00 metros do alinhamento par da Avenida Cruzeiro do Sul ,
medido na avenida auxiliar, ligando a Avenida Marginal Esquerda à
avenida auxiliar, tendo seus alinhamentos paralelos à rua descrita no
item anterior, medindo esta faixa , aproximadamente, 262,00 metros de
extensão ;
VII uma faixa de 30,00 metros de largura , paralela e adjacen
te ao limite externo da avenida marginal direita , de alinhamento an
teriormente aprovado, iniciando-se a cerca de 96,00 metros do cha
mado “ Caminho do Campo ” na Vila Guilherme, sendo um trecho em
reta, medindo cerca de 579,00 metros de extensão ; um trecho em
curva , medindo aproximadamente 436,00 metros até novo trecho reto ,
com cerca de 155,00 metros , onde começa a estreitar-se gradativa
mente, até terminar em zero , defronte à estaca 371 + 5,00 metros,
estaca essa situada a cerca de 300,00 metros à montante da ponte da
avenida Guilherme Praun, na Vila Guilherme ;
VIII uma faixa de largura crescente, próxima à anteriormente
descrita e adjacente ao limite externo da avenida marginal direita ,
de alinhamento anteriormente aprovado, iniciando - se defronte à es
taca 360 + 17,50 metros, estaca essa situada a cerca de 680,00 metros
à juzante da ponte da Avenida Guilherme Cotching, de onde , partin
do com largura zero , atinge 30,00 metros de largura na estaca 352 +
2,20 metros, estaca essa situada a cerca de 484,00 metros à juzante da
ponte da Avenida Guilherme Cotching; daí , mantendo - se constante
essa largura até a estaca 339 + 15,00 metros, situada a cerca de 238,00
metros à juzante da ponte da Avenida Guilherme Cotching; daí , tendo
como limite externo uma curva composta de três arcos de circulo,
respectivamente com raio de 1.150,00 metros e desenvolvimento
aproximado de 432,00 metros ; com raio de 2.700,00 metros e desen
volvimento aproximado de 670,00 metros ; com raio de 800,00 metros
e desenvolvimento aproximado de 288,00 metros , até a estaca 262 +
18,00 metros, situada a cerca de 70,00 metros aquém da Rua Alcân
tara , em sua intersecção com o traçado do canal do Tietê, no bairro
de Vila Maria, e como limite interno o alinhamento , já aprovado , para
a avenida marginal direita ; dessa estaca 262 + 18,00 metros até a
de número 155 + 2,97 metros, situada a cerca de 155,00 metros à
montante do prolongamento do eixo da Rua São Jorge , segue sempre
paralela e adjacente à avenida marginal direita , mantendo a largura
constante de 15,00 metros. Da estaca 155 + 2,97 metros em diante, o
limite externo é em reta, até atingir uma curva de raio 400,00 metros,
concordando este alinhamento curvo com o limite da avenida margi
nal direita, já aprovado, situando-se este último trecho na altura da
224 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

DECRETO N.º 1.082, DE 8 DE AGOSTO DE 1949

Declara de utilidade pública imóveis necessá


rios à construção de um grupo escolar, no bairro
de Vila Formosa .

O Prefeito do Município de São Paulo , usando das atribuições


que lhe são conferidas pelo art . 5.', letra “ in ” e art. 6.', ambos do
Decreto-lei federal n .° 3.365 , de 21 de junho de 1941 ,

Decreta :

Art . 1.0 Ficam declarados de utilidade pública , para o fim de


serem desapropriados amigável ou judicialmente, por serem neces
sários à construção de um edificio destinado à instalação do 2.° Gru
po Escolar de Vila Formosa, os lotes de terrenos e respectivas cons
truções e benfeitorias, sob ns . 1 (um ) , 2 (dois ), 3 ( três ) , 4 ( quatro ) ,
21 ( vinte e um ) , 22 ( vinte e dois ) e 23 (vinte e três ) , da quadra
n . ° 42 do arruamento de Vila Formosa, imóveis êsses pertencentes å
“ Predial De Lucca S. A. ” ( lotes ns . 1 , 2 e 23 ) , à Sra . Maria Furlan
( lote n .° 3 ) e aos Srs. Eugênio Luiz Roque ( lote n .° 4 ) , João Nicolitz
( lote n . ° 21 ) e Diodato Beneducci ( lote n . ° 22 ) , ou a quem de direito ,
e que perfazem uma área total de 4.574,00 m2 ( quatro mil quinhentos
e setenta e quatro metros quadrados ) mais ou menos, confrontando ,
pela frente , por uma linha curva , na extensão de 46,40 metros, mais
ou menos, ( linha 5-7 ) , e por uma linha reta, na extensão de 2,00 ms.,
mais ou menos ( linha 7-8 ) , segundo o alinhamento da rua 40-A , com :
o leito desta rua ; pelo lado direito de quem do terreno olha para a
rua , na extensão de 51,00 ms., mais ou menos (linha 8-9 ) , ao longo
do alinhamento da rua 41 , com o leito desta rua ; pelo lado esquerdo,
na extensão de 42,90 ms., mais ou menos ( linha 1-5 ) , ao longo do
alinhamento da rua 40, com o leito desta rua e , pelos fundos, por
uma linha quebrada nas extensões sucessivas de 56,80 ms . , mais ou
menos ( linha 1-10 ) e 59,40 ms., mais ou menos (linha 9-10 ) , com os
lotes ns . 20 , 7 , 6 e 5 da quadra n . ° 42 do arruamento de Vila Formosa,
de propriedade de quem de direito, tudo de acórdo com a planta in.
clusa, n . ° P - 4245 , que , autenticada pelo Prefeito , fica fazendo parte
integrante deste Decreto ,

Art . 2.° É de natureza urgente a desapropriação de que trata o


presente decreto, para o efeito de imediata imissão de posse dos imó
veis em referência , na forma do art . 15 do Decreto-lei Federal núme
ro 3.365, de 21 de junho de 1941 , com a alteração constante do De
creto-lei federal n.º 9.811 , de 9 de setembro de 1946 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 225

Art. 3.º – As despesas decorrentes da execução do presente de


creto correrão por conta da verba 940.8392, consignada no orçamen
to vigente.
Art . 4.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica
ção, revogadas as disposições em contrário.
Prefeitura do Município de São Paulo, 8 de agosto de 1949, 396."
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pache
co Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.

Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do


Pessoal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 8 de agôs
to de 1949. – 0 Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.
224 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

DECRETO N.º 1.082, DE 8 DE AGOSTO DE 1949

Declara de utilidade pública imóveis necessá


rios à construção de um grupo escolar, no bairro
de Vila Formosa.

O Prefeito ďo Municipio de São Paulo , usando das atribuições


que lhe são conferidas pelo art . 5.', letra " in " e art. 6.' , ambos do
Decreto-lei federal n .° 3.365 , de 21 de junho de 1941 ,

Decreta :

Art. 1.º Ficam declarados de utilidade pública , para o fim de


serem desapropriados amigável ou judicialmente , por serem neces
sários à construção de um edificio destinado à instalação do 2.° Gru
po Escolar de Vila Formosa , os lotes de terrenos e respectivas cons
truções e benfeitorias, sob ns . 1 (um ), 2 ( dois ) , 3 ( três ) , 4 (quatro ) ,
21 ( vinte e um ) , 22 ( vinte e dois ) e 23 ( vinte e três ) , da quadra
n .° 42 do arruamento de Vila Formosa, imóveis êsses pertencentes à
“ Predial De Lucca S. A. ” ( lotes ns . 1 , 2 e 23 ) , à Sra. Maria Furlan
( lote n . ° 3 ) e aos Srs. Eugênio Luiz Roque (lote n .° 4 ) , João Nicolitz
( lote n . 21 ) e Diodato Beneducci (lote n . ° 22 ) , ou a quem de direito,
e que perfazem uma área total de 4.574,00 m2 (quatro mil quinhentos
e setenta e quatro metros quadrados ) mais ou menos, confrontando,
pela frente , por uma linha curva , na extensão de 46,40 metros , mais
ou menos, (linha 5-7 ) , e por uma linha reta , na extensão de 2,00 ms.,
mais ou menos ( linha 7-8 ) , segundo o alinhamento da rua 40-A , com
o leito desta rua ; pelo lado direito de quem do terreno olha para a
rua , na extensão de 51,00 ms ., mais ou menos (linha 8-9 ) , ao longo
do alinhamento da rua 41 , com o leito desta rua ; pelo lado esquerdo,
na extensão de 42,90 ms ., mais ou menos (linha 1-5 ) , ao longo do
alinhamento da rua 40, com o leito desta rua e , pelos fundos , por
uma linha quebrada nas extensões sucessivas de 56,80 ms., mais ou
menos ( linha 1-10 ) e 59,40 ms., mais ou menos ( linha 9-10 ) , com os
lotes ns . 20 , 7 , 6 e 5 da quadra n .° 42 do arruamento de Vila Formosa,
de propriedade de quem de direito , tudo de acórdo com a planta in
clusa , n . ° P- 4245 , que, autenticada pelo Prefeito , fica fazendo parte
integrante deste Decreto .

Art. 2. ° É de natureza urgente a desapropriação de que trata o


presente decreto, para o efeito de imediata imissão de posse dos imó
veis em referência , na forma do art . 15 do Decreto-lei Federal núme
ro 3.365, de 21 de junho de 1941 , com a alteração constante do De
creto-lei federal n.º 9.811 , de 9 de setembro de 1946 .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 225

Art . 3.° As despesas decorrentes da execução do presente de


creto correrão por conta da verba 940.8392 , consignada no orçamen
to vigente .
Art . 4.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publica
ção , revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura do Município de São Paulo , 8 de agôsto de 1949, 396."


da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos , Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pache
co Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 8 de agos
to de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .
LEI N.° 3.777 , DE 1 DE JULHO DE 1949

Altera o disposto no artigo 4.º da Lei n.° 3.744 ,


de 4 de fevereiro de 1949.

O Prefeito do Município de São Paulo , de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 30 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
Art. 1.º - O artigo 4.º da Lei n.° 3.744 , de 4 de fevereiro de 1949,
passa a ter a seguinte redação : “ Art. 4.° . O valor do presente cré
dito extraordinário será coberto com os recursos provenientes do
saldo financeiro transferido para o exercício de 1949 ” .
Art . 2.• Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação ,
retrotraindo -se os seus efeitos desde 4 de fevereiro do corrente ano,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo , 1 de julho de 1949, 396.°
da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Sceretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 1 de julho
de 1949. – O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.778 , DE 2 DE JULHO DE 1949

Autoriza o Prefeito a dispender a importância


de Cr$ 2.800.000,00 para ocorrer às despesas com
a construção de uma passagem inferior sob a Aveni- .
da São João , no cruzamento com a Avenida Anhan
gabaú - Tiradentes.

O Prefeito do Município de São Paulo , de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 30 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
228 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Art. 1. ° - E o prefeito auotrizado a dispender a importância de


Cr$ 2.800.000,00 (dois milhões e oitocentos mil cruzeiros ) para ocor
rer às despesas com a construção de uma passagem inferior sob a
Avenida São João, no seu cruzamento com a Avenida Anhangabaú
Tiradentes, conforme o projeto constante das plantas que fazem par
te integrante desta lei.
Art. 2.° Para ocorrer à despesa com a execução da presente
lei, fica aberto, na Secretaria das Finanças, um crédito especial de
Cr$ 2.800.000,00 (dois milhões e oitocentos mil cruzeiros ) , por con
ta do saldo disponível apurado no Balanço encerrado em 31 de de
zembro de 1948 .

Art. 3. ° – A presente lei entrará em vigor na data de sua publi


cação, revogadas as disposições em contrário.
Prefeitura do Município de São Paulo, 2 de julho de 1949, 396.0
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pa
checo Fernandes . O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno .
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 2 de julho
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.º 3.779 DE 2 DE JULHO DE 1949

Autoriza o Prefeito a dispender a importância


de Cr$ 7.000.000,00 para atender às despesas res
tantes com as desapropriações dos imóveis neces
sários à execução do melhoramento público já apro
vado pelo Decreto n.º 975 , de 28 de maio de 1947.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 30 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :

Art . 1. ° – Fica o Prefeito autorizado a dispender a importância


de Cr$ 7.000.000,00 (sete milhões de cruzeiros ) , para atender às des
pesas restantes com as desapropriações, amigáveis ou judicais , dos
imóveis necessários à execução do melhoramento público já aprova
do pelo Decreto n .° 975 , de 28 de maio de 1947.
Art . 2.° O Executivo enviará à Câmara , dentro de sessenta (60 )
dias após a promulgação desta Lei , cópia fiel dos cálculos avaliativos
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 229

efetuados pelo Departamento do Cadastro e Avaliações, referentes à


área objeto da desapropriação.
& único - Serão , igualmente, enviados à Câmara cópias dos acor
dos de desapropriação amigável e certidões das decisões judiciais
quando as desapropriações se processarem através da ação competen
le, dentro de dez ( 10 ) dias após lavrada a escritura do acórdo ou
transitada em julgado a sentença desapropriatória.
Art. 3.° Para ocorrer a despesa com a execução da presente
lei , fica aberto na Secretaria das Finanças, um crédito especial de
Cr$ 7.000.000,00 ( sete milhões de cruzeiros ) , por conta do saldo dis
ponível apurado no balanço encerrado em 31 de dezembro de 1948.

Art. 4.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,


com vigência até 31 de dezembro de 1950, revogadas as disposições
em contrário ,
Prefeitura do Município de São Paulo, 2 de julho de 1949, 396.°
da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário das Finanças, João Pache
co Fernandes. O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno ,
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 2 de julho
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N. ° 3.780 , DE 4 DE JULHO DE 1949

Eleva os vencimentos do funcionalismo , munici


pal e reclassifica as carreiras de procurador, médi
co e engenheiro.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 27 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
Art . 1.º - Fica instituída a seguinte escala de vencimentos para
o funcionalismo público do município :

Padrões Cruzeiros

А 1.280,00
B 1.440,00
С 1.650,00
230 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

D 1.800,00
E 2.100,00
F 2.240,00
G 2.520,00
H 2.800,00
I 3.360,00
J 3.920,00
K 4.300,00
L 5.000,00
M 5.500,00
N 6.000,00
0 6.500,00
P 7.000,00
Q 7.500,00
R 8.000,00
S 8.600,00
T 9.200,00
U 9.800,00
V 10.300,00
W 10.900,00
X 11.500,00
Y 13.800,00
z 15.000,00

Art. 2.° Alémda escala prevista no artigo 1.º, ficam criados os


seguintes padrões especiais e fixados seus respectivos vencimentos :

Padrões Cruzeiros

Q-1 7.500,00
R-1 8.400,00
S-1 9.200,00
T-1 10.000,00
U-1 10.900,00
V-1 11.700,00
W- 1 12.500,00
X- 1 13.400,00
Y-1 14.200,00
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 231

Art. 3.° Os “ Procuradores ” , o “ Assistente Administrativo da


Diretoria do Departamento Jurídico ” , o “ Assistente Jurídico ” , o “ Di
retor do Departamento Jurídico " e o " Chefe da Divisão de Cobran
ça Amigável e Inscrição da Dívida Ativa ” ficam , respectivamente, re
classificados nos padrões de vencimentos previstos na tabela do arti
go anterior, da seguinte maneira :

Situação atual Situação proposta


a) Procuradores Padrão

Padrão M Q-1
Padrão N R - 1
Padrão O S - 1
Padrão P T-1
Padrão Q U-1
Padrão S W-1
Padrão T X - 1
b) Assistente Administrativo da Diretoria do Departamento Ju
ridico
Padrão S padrão W- 1
c) Assistente Jurídico
Padrão T. padrão X-1
d) Diretor do Departamento Jurídico
Padrão U. padrão Y- 1
c) Chefe da Divisão de Cobrança Amigável e Inscrição da Di
vida Ativa
Padrão l .. padrão U-1

$ 1.º Ficam reclassificados , na forma do disposto neste artigo


as carreiras de " Médicos ” e “ Engenheiros” e os cargos isolados de
provimento obrigatório por diplomados nessas profissões e por eles
ocupados, de forma a assegurar-se, para todos os efeitos, absoluta
equiparação aos funcionários titulares de cargos cujo provimento de
penda obrigatoriamente da apresentação do diploma de Bacharel em
Direito .
§ 2. - Para efeito da reclassificação prevista no parágrafo an
terior, os padrões “ L ” , “ M ” e “ N ” , em que estão os médicos escalo
inados em carreira , ficam equiparados, respectivamente, aos padrões
“ M ” , “ N ” e “ O ” , passando o padrão " P " a constituir final da car
reira .
§ 3.° Nenhum dos funcionários mencionados neste artigo terá
direito à percepção da porcentagem de 2/3 (dois terços ) , calculada
sôbre os seus respectivos padrões de vencimentos, em virtude de, com
232 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

a presente reclassificação , ter sido atingido o limite de remuneração


previsto no artigo 15 (quinze ) das Disposições Transitórias , da Lei
Estadual n.º 1 , de 18 de setembro de 1947 (Lei Orgânica dos Muni
cípios ) e obedecido o critério estabelecido no go 25 (vin e cin
co ) do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Estadual,
S. 4.* -- Os médicos, engenheiros e procuradores ficam sujeitos
ao mesmo periodo diário de trabalho.

Art. 4.° Passam a ser alteradas pela forma seguinte as gratifica


ções estabelecidas na tabela V do quadro geral do pessoal :

De Cr$ Para Cr$

300,00 600,00
400,00 800,00
500,00 1.000,00
1.000,00 1.500,00

não excedendo a esta importância .


$ 1.º Fica elevada para Cr $ 300,00 por sessão a que compare
cerem a gratificação atribuída aos membros das Associações repre
sentadas no Conselho Municipal de Impostos e Taxas .
$ 2.° Aos membros que constituem a Comissão Municipal de
Serviço Civil será abonada gratificação idêntica a que foi abonada
aos membros da Comissão de Organização e Planejamento , ficando
ambas comissões no mesmo pé de igualdade com referência à grati
ficação que for abonada .

Art. 5.° As despesas -decorrentes da execução da presente lei


correrão por conta das verbas próprias do orçamento em vigor, su
plementadas oportunamente mediante utilisação dos seguintes recur
sos :
a ) vinculação da importância de Cr$ 22.500.000,00 do supera
vit financeiro apurado no balanço de 1948 ;
b ) aproveitamento das dotações correspondentes aos cargos ini
ciais das diversas carreiras do funcionalismo municipal declarados
vagos em virtude das promoções regulamentares .
Parágrafo único Para efeito do cumprimento da letra “ b ”
dêste artigo, ficam suspensas as nomeações para os cargos iniciais .
de car ra , pelo praso de um ano, a contar da data da publicação
da presente lei .
Art. 6. ° São extensivos aos inativos do município os beneficios
da presente lei , ressalvadas as proporções referentes ao tempo de
serviço .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 233

Art. 7.0 - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,


contando-se para efeito de vencimentos a partir de 1.° de julho de
1949, revogadas as disposições em contrário.
Prefeitura do Município de São Paulo, 4 de julho de 1949, 396.°
da fundação de São Paulo. O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha, O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson, O Secretário das Finanças, João Pache
co Fernandes . O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno. 0
Secretário de Educação e Cultura, Jaime Regalo Pereira. O Secre
tário de Higiene , Paulo Ribeiro da Luz.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 4 de julho
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.781 , DE 5 DE JULHO DE 1949

Dispõe sobre denominação de via pública.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 28 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :

Art . 1.º Será denominada Mário de Andrade a rua sem nome,


recentemente aberta , que começa na praça sem nome situada entre as
ruas Conselheiro Brotero e General Olímpio da Silveira e termina na
rua Lavradio, esquina da Avenida Pacaembu .
§ único As placas de nomenclatura conterão os seguintes di
zeres : rua Mário de Andrade (escritor 1893-1945 ) .

Art. 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,


revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 5 de julho de 1949, 396.'
da fundação de São Paulo. O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha, O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. - O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 5 de ju
lho de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .
234 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

LEI N. ° 3.782, DE 5 DE JULHO DE 1949

Aprova o novo alinhamento da Estrada do


Araçá.

O Prfeeito do Município de São Paulo , de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 24 de junho de 1949 , pro
mulga a seguinte lei :
Art. 1.• É aprovado o novo alinhamento da Estrada do Araçá,
compreendendo uma lagura de 24 m (vinte e quatro metros) , em
tôda a sua extensão entre a Avenida Dr. Arnaldo e a R. Cerro-Corá ,
tudo de acordo com as plantas e perfis anexos sob os ns. 3350-A-96,
4949-A- 96, 5240 - A - 95 , 5782-A-95 , 5799-A-95 , 5806 - A-95 , 4732 -A-95, nes
ta data rubricados pelo Prefeito e pelo Presidente da Câmara e se
gundo os quais são dados os novos alinhamentos .
$ único Os prédios a serem construídos futuramente na Es
' trada do Araçá, deverão ser recuados de cinco metros.
Art. 2.° Os imóveis porventura atingidos serão declarados de
utilidade pública , quando o julgar oportuno a Prefeitura, ou à pro
porção que seus proprietários pretenderem promover obras de cons
trução, ou reformas que afetem a estrutura dos prédios existentes,
abangidos, no todo , ou em parte essencial , pelo novo alinhamento.
Art. 3.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário.
Prefeitura do Município de São Paulo, 5 de julho de 1949, 396.°
da fundação de São Paulo . O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . – 0 Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 5 de julho de
1949. --- O Diretor , Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.783, DE 5 DE JULHO DE 1949

Dá nova redação ao art. 1.º do Decreto-lei n.º


92 , de 2 de maio de 1942.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 13 de junho de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 235
1

Art . 1.º Passa a ter a seguinte redação o corpo do art . 1.º do


Decreto- lei n.º 98 , de 2 de maio de 1941 :

“ Ari. 1.° A primeira zona ou central é a contida dentro das


divisas seguintes : Começa no entroncamento da rua Tabatinguera
com a Avenida exterior do Parque D. Pedro II ; segue por esta aveni
da até seu encontro com a avenida do Estado ; por esta e pelas ruas
Mercúrio, Anhangabaú , Florêncio de Abreu , Mauá, Duque de Caixias e
Maria Teresa , largo e rua do Arouche, até encontrar a praça da Re
pública , de frente à direita , seguindo até encontrar o prolongamento
da rua São Luis , na esquina da rua Araujo ; segue pelo referido pro
longamento, pela rua São Luís, e seu prolongamento em direção ao
viaduto Jacarei ; pelo viaduto referido e rua Maria Paula, tendo pas
sado pelo prolongamento desta entre as ruas Santo Amaro e Genebra ;
segue pela nova via pública entre a avenida Brigadeiro Luis Antônio
e praça João Mendes, depois pela rua Rodrigo Silva , rua Alvares Ma
chado, largo Sete de Setembro, rua Conde do Pinhal e rua Tabatin
guera, princípio desta demarcação ” .
Art . 2.° Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, re
vogadas as disposições em contrário .

Prefeitura do Município de São Paulo, 5 de julho de 1949, 396.°


da fundação de São Paulo . – O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson , O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno .

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 5 de julho
de 1949. – 0 Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.784 , DE 12 DE JULHO DE 1949

Dispõe sobre denominação de via pública.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal,, em sessão de 30 de junho de 1949 , pro
mulga a seguinte lei :

Art . 1.º Passa a denominar-se Rua Januário Miraglia a atual


Rua Conchim , no sub-distrito de Jardim Paulista .
$ único As placas de nomenclatura conterão os seguintes di
zeres e datas : Januário Miraglia Tisiologista 1907-1947 .
236 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Art . 2.• Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,


revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 12 de julho de 1949 , 396."
da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno .

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 12 de julho
de 1949. – 0 Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.° 3.785, DE 4 DE AGOSTO DE 1949

Desincorpora terrenos da classe dos bens pú


blicos de uso comum do povo e transfere para a
dos bens patrimoniais do Município.

O Prefeito do Município de São Paulo , de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 20 de dezembro de 1948 ,
promulga a seguinte lei :
Art. 1.º Ficam desincorporados da classe dos bens públicos de
uso comum do povo e incorporados à dos bens patrimoniais do Mu
nicípio, oito terrenos com a área total de 8.457,54 metros quadrados,
que fazem parte do leito da avenida Cidade Jardim, avaliados em
Cr $ 8.000,00 (oito mil cruzeiros ) , imóveis ésses configurados na plan
ta anexa , que rubricada pelo sr. Presidente da Câmara e pelo sr. Pre
feito passa a fazer parte integrante desta lei a saber : Trapézio (Fi
gura XI ) com a área de 99,37 metros quadrados mais ou menos : fren
te, reta na extensão de 18,49 metros, mais ou menos , sôbre o leito
da ex - avenida Cidade Jardim ; lado direito : reta na extensão de 5,50
ms. mais ou menos, pelo prolongamento do alinhamento da Rua “ 6 ” ;
lado esquerdo : reta na extensão de 11,50 ms . mais ou menos, pelo
prolongamento do alinhamento da Rua “ 1 ” ; fundos : reta na exten
são de 26,26 ms . mais ou menos , dividindo com a Cia . Cidade Jar
dim ou sucessores , Figura III, com a área de 562,12 ms2 . mais ou
menos. Frente : reta na extensão de 104,57 ms. mais ou menos , pelo
antigo alinhamento da rua " 11 " '; lado direito : curva na extensão de
7,85 ms , mais ou menos, pelo canto arredondado entre a rua " 11"
(novo alinhamento ) e avenida “ B ” ; lado esquerdo : curva na exten
são de 7,85 ms. mais ou menos , pelo canto arredondado entre a Rua
" 11 " (novo alinhamento ) e Rua “ 6 ”!; fundos : reta na extensão de
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 237

114,57 ms. mais ou menos, dividindo com a Cia. Cidade Jardim ou


sucessores. Retângulo (Figura IX) com a área de 556,00 ms2 ., mais
ou menos; frente : reta na extensão de 111,20 ms. mais ou menos,
pelo novo alinhamento da Rua “ 11 ” ; lado direito : reta na extensão
de 5,00 ms. mais ou menos, dividindo com a figura VIII adiante des
crita ; lado esquerdo : reta na extensão de 5,00 ms. mais ou menos ,
dividindo com a figura XVII adiante descrita ; fundos : reta de 111,20
ms, dividindo com a Cia . Cidade Jardim ou sucessores. Figura VIII
com a área de 19,63 ms2 . , mais ou menos, limitada : por uma curva
na extensão de 8,85 ms. mais ou menos pelo canto arredondado entre
o novo alinhamento da Rua “ 11 ” e 1.º trecho da Rua “ 1 ” , por uma
reta na extensão de 5,00 ms. mais ou menos, dividindo com a Cia.
Cidade Jardim ou sucessores ; reta na extensão de 9,00 ms . mais ou
menos , dividindo com a figura IX já descrita . Figura XVII, com a
área de 77,40 ms2 . , mais ou menos ; frente : curva na extensão da
16,97 ms. mais ou menos , pelo novo alinhamento da Rua “ 11 ” ; lado
direito : reta na extensão de 5,00 ms . mais ou menos, dividindo com
a figura IX já descrita ; lado esquerdo : reta na extensão de 3,95 ms .
mais ou menos, dividindo com a figura XVIII, adiante descrita ; fun
dos : reta na extensão de 16,42 ms. mais ou menos , dividindo com a
Cia. Cidade Jardim ou sucessores . Figura XVIII Triângulo com a área
de 60,31 metros quadrados, mais ou menos , limitado : por uma reta
na extensão de 30,53 ms. mais ou menos, sendo 24,69 ms . mais ou
menos, pelo novo alinhamento da Rua “ 11 ” , e 5,84 ms. mais ou me
nos, dividindo com a figura XIX adiante descrita ; por outra reta ,
na extensão de 3,95 ms., mais ou menos , dividindo com a figura XVII
já descrita ; por outra reta na extensão de 30,75 ms. mais ou menos,
dividindo com a Cia . Cidade Jardim ou sucessores. Figura XIX Triân
gulo Mistelineo com a área de 0,91 ms2 . , mais ou menos, limitado por
uma curva na extensão de 11,68 ms. mais ou menos, pelo novo ali
nhamento da Rua “ 11 ”?; por uma reta na extensão de 5,84 ms . , divi
dindo com a figura XVIII , já descrita ; por outra reta na extensão de
5,85 ms. dividindo com a Cia . Cidade Jardim ou sucessores ; área da
ex-avenida Cidade Jardim ocupada pelo canal do Rio Pinheiros , Com
primento pelo eixo : cerca de 354,09 metros; largura : 20.00 ms. Área :
cerca de 7.081,80 ms2 .; Frente : leito da avenida Cidade Jardim ; lado
direito e lado esquerdo : limite do canal do Rio Pinheiros; fundos :
Avenida Cidade Jardim .
Art. 2. ° Fica a Prefeitura Municipal autorizada a permutar, nos
lêrmos da minuta de escritura respectiva, sem qualquer torna ou re
posição, os terrenos referidos no artigo anterior necessário à recom
posição parcial do plano de arruamento e loteamento do " Bloco 5 ' ' ,
da Companhia Cidade Jardim , bem como à doação que a mesma
238 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Companhia irá fazer a “ The San Paulo Tralisway Light and Power
Co. Limited ” , de terrenos que irão se integrar no leito , margens e
faixas do canal do Rio Pinheiros, por 17 terrenos com a área total
de 6.433,06 ms.2, avaliados em Cr$ 8.000,00 ( oito mil cruzeiros ) , de
propriedade da referida Companhia , situados no “ Bloco 10 ” , neces
sários ao alargamento da avenida Cidade Jardim , à abertura de par.
te de uma praça situada no entroncamento da avenida Cidade Jar
dim com a Avenida Nove de Julho, e à formação de parte do leito desta
última avenida, terrenos esses configurados na planta anexa , que , ru
bricada pelo Sr. Presidente da Câmara e pelo Sr. Prefeito, passa a fa
zer parte desta lei , a saber : Paralelogramo 1-2-3-4 (situado na quadra
“ I ” ). comprimento pelo eixo, cerca de 294,77 ms . largura 4,00 ms. e
área cerca de 1.179,08 ms2 , Frente. leito da Avenida Cidade Jardim
(divisa-alinhamento do antigo leito do Rio Pinheiros ) ; lado direito :
doadora ou sucessores ; lado esquerdo : antigo alinhamento da Avenida
Cidade Jardim ; fundos : Antônio da Costa Pacheco. Paralelogramo 5
6-7-8 ( situado na quadra " F ' ') comprimento pelo eixo , cerca de 20,925
ms.; largura 4,00 ms. e área cerca de 83,70 ms2. Frente : prolonga
mento do alinhamento da Rua João Augusto ; lado direito : doadora
ou sucessores ; lado esquerdo : antigo alinhamento da Avenida Cida
de Jardim ; fundos : João Alves Carneiro ou sucessores . Paralelogra
mo 9-10-11-12 (situado na quadra “ F ” ) : comprimento pelo eixo,
cerca de 67,045 ms.; largura 4,00 ms. e área cerca de 268,18 ms2.
Frente : João Alves Carneiro ou sucessores ; lado direito : doadora
ou sucessores; lado esquerdo : antigo alinhamento da Avenida Cida
de Jardim ; fundos : prolongamento do alinhamento da Rua Piraí.
Trapésio 54-12-15-55 ( situado na quadra “ D ” ) : comprimento pelo
eixo cerca de 50,27 metros; largura 4,00 ms, área cerca de 201,08
ms.2; Frente : prolongamento do alinhamento da Rua Pirai ; lado di
reito : doadora ou sucessores ; lado esquerdo : antigo alinhamento da
Avenida Cidade Jardim ; fundos : retângulo 51-54-55-53 adiante des
criio . Trapésio 51-54-55-53 ( situado na quadra “ B ” ) com cerca de
5,67 ms2.: Frente : reta 54-55 , na extensão de 4,00 ms., dividindo
com o trapésio 54-14-15-55-54 , já descrito ; lado direito : reta 53-55,
na extensão de 1,56 ms., dividindo com Arthur B. Hortas ou sucesso
res ; lado esquerdo : reta 51-54 , na extensão de 1,50 ms. mais ou me.
nos, pelo alinhamento antigo da Avenida Cidade Jardim ; fundos :
reta 51-53 , na extensão de 3,56 ms. mais ou menos, dividindo com a
área 50-51-53-52 adiante descrita. Trapésio 50-51-53-52 (situado na
quadra “ D ” ) com cerca de 1,02 ms2 .; frente : reta 51-53 , na extensão
de 3,56 ms., dividindo com a área 51-54-55-53, já descrita ; lado di
reito : reta 52-53, na extensão de 0,52 ms. mais ou menos , dividindu
com Arthur B. Hortas ou sucessores ; lado esquerdo : reta 50-51 , na
exiensão de 0,27 ms., pelo antigo alinhamento da Avenida Cidade
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 239

Jardim : fundos : reta 50-52 , na extensão de 4,00 ms . , dividindo con


a área 13-50-52-13A , adiante descrita . Retângulo 13-50-52-13A ( situado
na quadra “ B ” ) comprimento pelo eixo cerca de 101,36 ms.; largu
ra 4,00 ms. área cerca de 405,44 ms2 .; Frente : área 50-51-53-52, já
descrita ; lado direito ; doadora ou sucessores, Atlantic Refinig ou
sucessores , triângulo 13A -16A - 16 , adiante descrito ; lado esquerdo :
antigo alinhamento da Avenida Cidade Jardim ; fundos : cruza
mento entre a Avenida Cidade Jardim e as ruas Iguate
mí, D. Miguel Kruse (antiga rua Maria Antonieta ) . Triângulo 13- A
16A- 16, (situado na quadra “ D ” ) com cerca de 20,99 ms2. , confron
tando : por um lado, reta 13A-16A na extensão de 12,10 ms., pelo
novo alinhamento da Avenida Cidade Jardim ; por outro lado , reta
16-16A, na extensão de 3,50 ms. com a Atlantic Refinig ; pelo terceiro
lado , reta 13A- 16 na extensão de 12,10 ms. , pelo prolongamento da
Rua D. Miguel Kruse ( antiga Maria Antonieta ) . Trapésio 34-35-36-37
(situado na quadra “ C ” ) comprimento pelo eixo , cerca de 153,405
ms .; largura 4,00 ms.; área cerca de 613,62 ms2.; frente : prolonga
mento do alinhamento da Rua Piraí ; lado direito : antigo alinhamen
to da Avenida Cidade Jardim ; lado esquerdo : doadora ou sucessores
e Rua Projetada n .° 1 e canal a ser doado ; fundos : Iasi e Gaeta ou
sucessores. Trapézio 42-44-45-43 (situado na quadra “ G ” ) com cerca
de 61,93 ms2 .; frente : reta 44-45 na extensão de 10,38 ms . dividindo
com Manoel Moreira ou sucessores e com canto cortado entre a Ave
nida Cidade Jardim (novo alinhamento ) e a rua João Augusto ; lado
direito : reta 43-45 , na extensão de 20,95 ms . pelo antigo alinhamento
da Avenida Cidade Jardim ; lado esquerdo : reta 42-44 , na extensão
de 9,00 ms. , dividindo com a propriedade de quem de direito ; fun
dos : reta 42-43 , na extensão de 4,18 ms ., dividindo com João Alves
Carneiro ou sucessores . Paralelogramo 38-39-40-41 ( situado na qua
dra “ G ” ) com cerca de 254,72 ms2 .; comprimento pelo eixo , cerca
de 63,68 ms.; largura : 4,00 metros; área cerca de 254,72 ms2.; fren
te : reta 39-40 ; na extensão de 4,41 ms., com João Alves Carneiro ou
sucessores ; lado direito : antigo alinhamento da Avenida Cidade Jar
dim ; lado esquerdo : doadora ou sucessores ; fundos : prolongamento
do alinhamento da Rua Piraí . Trapésio 46-47-48-49 (situado na qua
dra “ H ” ') comprimento pelo eixo , cerca de 640,45 ms.; largura 4,00
ms. área cerca de 1.280,90 ms2.; frente : leito da Avenida Cidade Jar
dim (divisa alinhamento antigo leito do Rio Pinheiros ) ; lado direito :
antigo alinhamento da Avenida Cidade Jardim ; lado esquerdo : doa
dora ou sucessores , Rua Projetada 2 , a ser doada ; fundos : prolonga
mento da Rua João Augusto . Trapésio 30-31-32-33 (situado na quadra
" E " entre Rua Iguatemi e Praça Elitica ) ; comprimento pelo eixo,
cerca de 85,83 ms.; largura 4,00 ms, área cerca de 343,33 ms2., fren
te : prolongamento do alinhamento da Rua Iguatemi ; lado direito :
240 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

antigo alinhamento da Avenida Cidade Jardim : lado esquerdo : su


cessores e Mário Serveira ou sucessores ; fundos : reta 30-33 : Praça
Elítica (lado Sul ) . Figura irregular 17-18-19-19A - 20A - 20-17 ( situada
na quadra “ B ” entre a Rua Iguatemi e a Praça Elitica ) , com cerca
de 402,39 ms2 ., mais ou menos ; frente : reta 18-19 , na extensão de
11,42 ms., pelo prolongamento do alinhamento da rua Iguatemi; lado
direito : linha mista 19-19A- 20A-20 na extensão total de 87,56 ms ., di
vidindo com a doadora ou sucessores ; lado esquerdo : reta 17-18, na
extensão de 84,14 ms. pelo antigo alinhamento da avenida Cidade
Jardim ; fundos : reta 17-20 , na extensão de 10,88 ms. , dividindo com
Francisco do Vale Fontinhas ou sucessores. Figura 28-27-30-33-29 ( si
tuada na Praça Elítica lado sul ) com a área de 807,24 ms2., confron
tando com o 'antigo alinhamento da Avenida Cidade Jardim , com a
área 30-31-32-33 já descrita , com a doadora ou sucessores ; com área
25-26-27-28 adiante descrita e com Giovanni Toldi . Figura 21-22-23
24-A-24 ( situada na Praça Elítica lado Norte ) , de forma irregular,
com a área de 426,30 ms2 . , confrontando com o antigo alinhamento
da Avenida Cidade Jardim, com José Carazzini où sucessores, com
Adolfo Rodrigues ou sucessores e com a doadora ou sucessores . Figura
25-26-27-28 ( situada na Avenida 9 de Julho ) de forma irregular com
a área de 77,47 ms2 .; frente : reta 26-27 , na extensão de 6,70 ms. , di
vidindo com a doadora ou sucessores ; lado direito : curva 27-28, na
extensão de 14,25 ms. , dividindo com a Praça Elítica (lado sul) já
descrita ; lado esquerdo : reta 25-26, na extensão de 9,82 ms. , sôbre o
leito da Avenida 9 de Julho ; fundos : reta 25-28, na extensão de 8,43
ms. , dividindo com Giovanni Toldi ou sucessores.
Art . 3.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação
revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura do Município de São Paulo, 4 de agosto de 1949 , 396 .


da fundação de São Paulo. – O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos , Francisco
Oscar Penteado Stevenson , O Secretário das Finanças, João Pache
co Fernandes . O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno.

NOTA : A presente lei substitui a de n .° 3.728, de 30 de de


zembro de 1948, que foi expedida com incorreções.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 4 de agosto
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 241

LEI N.° 3.786, DE 12 DE AGOSTO DE 1949

Aprova o projeto de modificação de alinhamen


to no cruzamento da rua Boa Vista com a Ladeira
Pôrto Geral.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 8 de agôsto de 1949, pro
mulga a seguinte lei :

Art . 1.° – Fica aprovado o projeto de modificação de alinha


mento, no cruzamento da rua Boa Vista com a Ladeira Pôrto Geral,
conforme consta das plantas anexas n .° P-2763-A-G5-A11 , que rubrica
das pelo Prefeito e pelo Presidente da Mesa, ficam fazendo parte in
tegrante desta lei.

Art. 2.° Fica a Prefeitura Municipal autorizada a receber do


Banco Paulista do Comércio S. A. , D. Ester Mesquita, D. Rachel Mes
quita de Sales Oliveira, D. Maria Mesquita da Mota e Silva , Dr. An
tônio Mendonça e sua mulher D. Sara Mesquita Mendonça, D. Lia
Mesquita , Dr. Júlio de Mesquita Filho e sua mulher D. Marina Vieira
de Carvalho Mesquita , Dr. Francisco Mesquita sua mulher D. Alice
Vieira de Carvalho Mesquita e Alfredo Mesquita , a título de doação li
vre, a área de terreno necessária à modificação do alinhamento apro
vada pelo artigo anterior, assim caracterizada : de forma irregular,
com mais ou menos 20,10 m2. , tendo a extensão de 12,50 m . sobre o
alinhamento antigo da rua Boa Vista ( linha 3-4 ) , retorna a direita
pelo novo alinhamento dessa rua , parte em curva e parte em reta
até o alinhamento da Ladeira Pôrto Geral numa extensão aproxima
da de 14,95 m , onde confronta com terrenos remanescentes dos trans
initentes linha 4-1 ) ; segue à direita pelo alinhamento da Ladeira
Pôrto Geral numa extensão de 1,05 m , onde confina com o leito des
sa via pública (linha 1-2 ) por nova deflexão à direita, até encontrar
o alinhamento antigo da rua Boa Vista , numa extensão de 3,50 m , onde
confronta com as áreas que constituem o leito das ruas acima cita
da (linha 2-3 ) , fechando o perímetro ora descrito, área essa confi
gurada nas piantas ja reieridas .

Art . 3. ° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,


revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura do Município de São Paulo, 12 de agosto de 1949 , 396 .


da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses du
Cunha . O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos , Francisco
Oscar Pente do Sievenson . O Secretário de Obras , Dario de Castro
Bueno. ( ) Srcretório das Finanças , João Pacheco Fernandes .
242 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do.


Pessoal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 12 de
agôsto de 1949. – 0 Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .

LEI N.° 3.787, DE 20 DE AGOSTO DE 1949

Reserva a denominação de Praça Dom Gastão


Liberal para a área limitada pelas ruas General Me
na Barreto , Joaquim Floriano, fim da ' Avenida Bri .
gadeiro Luiz Antônio e começo da Estrada Velha
de Santo Amaro.

O Prefeito do Município de São Paulo, de acórdo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 8 de agôsto de 1949, pro .
mulga a seguinte lei :

Art. 1.• - Fica reservada a denominação de Praça Dom Gastão


Liberal para a área limitada pelas ruas General Mena Barreto , Joa
guim Floriano , fim da Avenida Brigadeiro Luiz Antônio e começo da
Estrada Velha de Santo Amaro, caso esta área venha a ser aceita e
entregue ao trânsito público , nos termos da legislação em vigor .,
1.° - Oficializada a área descrita neste artigo, o Executivo dar
lhe-á a denominação proposta .
§ 2.° As placas de nomenclatura conterão os seguintes dizeres
e anos de nascimento e morte : PRAÇA DOM GASTÃO LIBERAL
Bispo de São Carlos 1884-1945 .

Art . 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,


revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura do Município de São Paulo, 20 de agosto de 1949, 396 .


da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha. O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson. - O Secretário de Obras , Dario de Castro
bueno.

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 20 de agosto:
de 1949 . O Diretor , Paulo Teixeira Nogueira.
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 243

LEI N." 3.788, DE 20 DE AGOSTO DE 1949

Regula u requisição, pelos Vereadores, de obras


impressas da Biblioteca Municipal.

O Prefeito do Municipio de São Paulo , de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal , em sessão de 8 de agosto de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
Art. 1. • O Vereador à Câmara Municipal de São Paulo , poderá
requisitar obras da Biblioteca Municipal.
Art. 2.". As obras requisitadas pelo Vereador devem dizer res
peito diretamente ao trabalho da Comissão a que pertença.
§ único Poderá, também , o Vereador requisitar obras de ma
térias pertinentes a assuntos de outras Comissões.
Art. 3. ° A requisição de livros ou obras será feita pelos Pre
sidentes das Comissões Permanentes ao Diretor da Secção Legislativa
à qual está subordinada a Secção de Documentação e Biblioteca .
$ único O Vereador para obter o empréstimo de um livro de
verá apresentar o pedido' ao Presidente de sua respectiva Comissão ,
que julgará ou não de sua oportunidade.

Prefeitura do Município de São Paulo, 20 de agosto de 1949, 396.°


da fundação de São Paulo . ( Prefeito , Asdrubal Euritysses du
Cunha . O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário de Educação e Cultura,
Jaime Regalo Pereira ,
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 20 de agosto
de 1949. - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira.

LEI N.º 3.789 , DE 26 DE AGOSTO DE 1949

Aprova o plano de concordância dos alinha


mentos do Largo do Arouche com a rua Bento Frei
tas e da rua Bento Freitas com a rua do Arouche.

O Prefeito do Municipio de São Paulo, de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 19 de agosto de 1949, pro
mulga a seguinte lei :
1

244 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Art. 1. " Fica aprovado, de acordo com a planta n .“ 5.622 - B - 182,


organizada pelo Departamento de Urbanismo e que desta fica fazendo
parte integrante o plano de concordância dos alinhamentos do Largo)
do Arouche com a rua Bento Freitas e da rua Bento Freitas com in
rua do Arouche.

Art. 2." Os imóveis por ventura atingidos serão declarados de


utilidade pública , quando a Prefeitura julgar oportuno, ou à propor
ção que seus proprietários pretenderem promover obras de cons
trução ou reformas que afetem a estrutura dos prédios existentes.
Art. 3. “ Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo , 26 de agosto de 1949, 396.'
da fundação de São Paulo . ( Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha . ( ) Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno .
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 26 de agosto
de 1949. O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .

LEI V.“ 3.790, DE 26 DE AGOSTO DE 1949

Dispõe sobre denominação de via pública .

( Prefeito do Municipio de São Paulo , de acordo com o que de


cretou a Câmara Municipal, em sessão de 26 de agosto de 1949 , pro
mulga a seguinte lei :

Art. 1." A Rua Antiga Viação , situada no Subdistrito do Ipi


ranga, nesta Capital, passa a denominar - se “ Rua Benjamin Jafet ” .
S único As placas indicativas da rua conterão os seguintes di
zeres “ Benjamin Jafet Industrial 1864-1940 " ,
Art. 2. Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,
revoga das as disposições em contrário .

Prefeitura do Município de São Paulo , 26 de agosto de 1949 , 396."


cia fundação de São Paulo . ( Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha . ( ) Secretirio de Negócios Internos e Juridicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . - ( ) Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno ,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 245

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 26 de agosto
de 1949. -- 0 Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .

LEI N.° 3.791 , DE 29 DE AGOSTO DE 1949

Dispõe sobre oficialização e denominação de


via pública e di outras providências.

( Prefeito do Município de São Paulo , de acordo com o que de


crelou a Câmara Municipal, em sessão de 19 de agosto de 1949 , pro
mulga a seguinte lei :
Art. 1. “ Fica aceita e declarada entregue ao trânsito público
a rua aberta em terreno de propriedade da Caixa de Aposentadoria e
Pensões dos Ferroviários da Estrada de Ferro Santos - Jundiaí, situado
no bairro e Subdistrito do Ipiranga , cujo leito foi doado ao Munici
pio de São Paulo por escritura pública lavrada em 23 de julho de
1947 , nas notas do 14." Tabelionato da Capital , devidamente transcri
ta sob número 34.297 , na 6." Circunscrição do Registro de Imóveis
desta Comarca .
Art. 2." A rua mencionada no artigo anterior, situada entre as
ruas Lino Coutinho e Agostinho Gomes conforme planta que, devida
mente rubricada pelo Presidente da Câmara Municipal e pelo Pre
feito , fica fazendo parte desta lei , será denominada Almirante Protó
genes Guimarães.

Art. 3." --- Fica aprovado o compromisso assinado pela Caixa


ile Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários da Estrada de Ferr .)
Santos -Jundiaí, pelo qual essa autarquia se obriga a executar, às suas
expensas, sem qualquer ônus para a Prefeitura o nivelamento da rua
a que se refere esta lei , logo após a execução dos trabalhos de canali
zação de águas e esgotos.
Art. 4." Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, re
vogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Municipio de São Paulo , 29 de agosto de 1949, 396."
( la fundação , de São Paulo . ( Prefeito, Asdrubal Euritysses da
Cunha . O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson . O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno . O Secretário de Finanças , João Pacheco Fernandes.
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
} ' essoal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 29 de
agosto de 1949 . ( ) Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .
ÍNDICE
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"
-
1
1
1
ÍNDICE

( 0 IT A B 0 R x C : 0

Ligeiro esboço biográfico de Francisco Adolfo de Varnhagen , por Or


lando de Carvalho Damasceno
25 de Janeiro , por Tito Livio Ferreira 51
Do Delito , Código Penal e Organização Policial na Ingleterra , por
Sampaio Ferraz
Goethe, por Abrahão Ribeiro , Wilhelm Hausenstein , Renato Cirell
Czerna e Albert Schweitzer 10 .
Evocação de um Bandeirante , por Gabriel de Rezende Filho , Antônio de
Toledo Piza, Eduardo Vilhena de Morais, J. G. Morais Filho
Carlos da Silveira 119

DOCUMENTAÇÃO
Ordens Régias

N.. 22 Registo de um alvará porque Sua Magestade ha por bem


fazer mercê a André Corsino de Mattos de lhe conceder faculdade
para que possa renunciar em seu filho primogênito Diogo Pinto
do Rêgo a propriedade do ofício de escrivão da ouvedoria geral
desta cidade de São Paulo como nêle se declara 171
N. 23 Registo da carta de lugar por que Sua Magestade que Deus
guarde, faz mercê ao Dr. Domingos Luís da Rocha , de ouvidor geral
desta comarca 172

Papéis Avulsos
Doc. CLXVIT Portaria expedida pela Secretaria de Estado dos Ne
gócios do Império 173

Doc. CLXVII Compra de pás de ferro 176

Doc . CLXIX Pagamento da obra da ponte 176

Doc. CLXX Conserto de calçada e aterrado 1765


Desobediência de capitães do mato 177
Doc. CLXXI
Doc. CLXXII Obras na Tabatinguera
Fonseca 177
Doc. CLXXIII Aterrado do
Doc . CLXXIV Ponte do Emboacava
250 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Doc. CLXXV Avaliação de madeiras da Praça do Curro 178


Doc. CI.XXVI Construção de ponte 178
Doc. CLXXVII Avaliação de terreno 179
Doc. CLXXVIII Aterrado do Carmo
Doc. CLXXIX Avaliação de materiais da camara 179

ATAS DA CAMARA DE SANTO AMARO

Sessão Extraordinaria , de 14 de Janeiro de 1913 181

Ata da sessão especial para a eleição de presidente, vice -presidente,


prefeito e vioe - prefeito municipal, de 15 de Janeiro de 1913 182
Termo de comparecimento, de 20 de Janeiro de 1913 133
Ata da sessão ordinaria , de 27 de Janeiro de 1913 183

PUBLICAÇÕES

Arquivos da Faculdade de Higiene e Saúde Pública da Universidade de


Såo Paulo 137
Revista de Direito Municipal 187

Cultura , Revista do Ministério da Educação e Saúde 188


Revista do Serviço Público 189
Sociedade de Geografia de Lisboa 190
A família de Jordão e seus afins 191
Sangue Limpo 192

ATOS OFICIAIS

Dceretos

N. ° 1.078, de 6 de julho de 1949 Dispõe sobre a localização do


" Monumento aos Mortos de 1932 ' ', no Parque Ibirapuera 193

N. ° 1.079, de 13 de julho de 1949 Declara de utilidade pública uma


área de terreno necessária à construção de um grupo escolar, no
bairro do Tatuapé 193

N.° 1.080, de 20 de julho de 1949 Revigora e amplia a declaração de


utilidade pública de imóveis necessários à canalização do rio Tietê
obras complementares 195

N.° 1.081, de 27 de julho de 1949 Declara de utilidade Pública os


imóveis necessários à construção do Grupo Escolar " Coronel Pedro
Arbues ' ', situados à rua Lucinda Barreto ( Não oficial ) , em Vila
Manchester, Tatuapé, 28.º Subdistrito da capital 198

N.° 1.082 , de 8 de agôsto de 1949 Declara de utilidade pública


imóveis necessários à construção de um grupo escolar, no bairro
de Vila Formosa 200
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL 251

Leis

N.° 3.777 , de 1 de julho de 1949 Altera o disposto no artigo 4 .: da


Lei n.o 3.744, de 4 de fevereiro de 1949 201
N.° 3.778 , de 2 de julho de 1949 Autoriza o Prefeito a dispender a
tância de Cr $ 2.800.000,00 para ocorrer às despesas com a constru
ção de uma passagem inferior sob a Avenida São João, no cruza
mento com a Avenida Anhangabau - Tiradentes 202
N.° 3.779 , de 2 de julho de 1949 Autoriza o Prefeito a dispender a im
portância de Cr $ 7.000.000,00 para atender as despesas restantes
com as desapropriações dos imóveis necessários à execução do me
lhoramento público já aprovado pelo Decreto n.º 975, de 28 de maio
de 1947 . 202
N.• 3.780, de 4 de julho de 1949 Eleva os vencimentos do funcionalis
mo municipal e reclassifica as carreiras de procurador, médico e
engenheiro 203
N.° 3.781, de 5 de julho de 1949 Dispõe sobre denominação de via pa
blica 207
N.° 3.782 , de 5 de julho de 1949 Aprova o novo alinhamento da Es
trada do Araçá 2013
N.° 3.783 , de 5 de julho de 1949 Dá nova redação ao art . 1.º do
Decreto - lei n.º 92 , de 2 de maio de 1942 209
N. ° 3.784 , de 12 de julho de 1949 Dispõe sobre denominação de via
pública 210
N.° 3.785, de 4 de agosto de 1949 - Desincorpora terrenos da classe dos
bens públicos de uso comum do povo e transfere para a dos bens
patrimoniais do Município 219
N.° 3.786 , de 12 de agosto de 1949 Aprova o projeto de alinhamento
no cruzamento da rua Boa Vista com a Ladeira Porto Geral 215
N.° 3.787, de 20 de agôsto de 1949 - Reserva a denominação de Praça
Dom Gastão Liberal para a área limitada pelas ruas General Mena
Barreto, Joaquim Floriano, fim da Avenida Brigadeiro Luis Antô .
nio e começo da Estrada Velha de Santo Amaro. 216
N. ° 3.788 , de 20 de agosto de 1949 Regula a requisição, pelos Verea
dores, de obras impressas da Biblioteca Municipal 217
V.• 3.789, de 26 de agôsto de 1949 Aprova o plano de concordancia
dos alinhamentos do Largo do Arouche com a rua Bento Freitas e da
rua Bento Freitas com a rua do Arouche 218

N.° 3.790, de 26 de agosto de 1949 Dispõe sõbre denominação de via


- pública 218
N.• 34791, de 29 de agôsto de 1949 Dispõe sobre oficialização e de
nominação de via pública e dá outras providências 213
REVISTA DO ARQUIVO

MUNICIPAL

CXXVII
DO UVENTS DEPARTMENT

AUG 2 5 1950

LIBR RY
NNIVERSIFY OF CALIFORNIA

K. s .

INDIO CARAJA

Desenho de Quirino da Silva

PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO


DEPARTAMENTO MUNICIPAL DE CULTURA
1949
REVISTA

DO

A R Q U I VO

MUNICIPAL
PUBLICAÇÃO DO DEPARTAMENTO
MUNICIPAL DE CULTURA

Redação :
Divisão do

Arquivo
Histórico

Rua Cantareira , 216


Telefones 2-3 5 7 6
e 2-3256

Oficinas:
Gráfica da

Prefeitura

Telefone 3 - 1051

Assinaturas :

para o Estado de São Paulo


Cada 12 números . Cr$ 40,00
Número avulso Cr$ 5,00

Para os outro , Estados


Cada 12 números . Cr $ 60,00
Número avulyo . Cr $ 5,00
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL
4
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL
Publicação da Divisão do Arquivo Histórico , do Departamento de Cul
tura, da Secretaria de Educação e Cultura , da Prefeitura de São Paulo

São Paulo Rua da Cantareira n . ° 216


ANO XVI
Diretor Secretário
VOLUME CXXVII
JOSÉ DE BARROS MARTINS NUTO SANT'ANNA
SETEMBRO DE 1949

SUMÁRIO

MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA ANTONIO PAULINO DE


ALMEIDA

UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FI
LOSOFIA LUIS WASHINGTON

ELUCIDÁRIO DO " INFERNO VERDE ”, DE


ALBERTO RANGEL . L. G. DE SIYAS

OS TAPIRAPÉ HERBERT BALDUS

PUBLICAÇÕES ORDENS RÉGIAS PAPÉIS

AVULSOS ATAS DA CÂMARA DE SANTO

AMARO DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS


PREFEITURA DE SÃO PAULO
RUA LIBERO BADARO, 877

PREFEITO
ASPROBAL EURITYSSES DA COIRA
COLABORACÃO
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA

ANTÔNIO PAULINO DE ALMEIDA


( Chefe da Secção Histórica do Depar
tamento do Arquivo do Estado e Mern
bro Efetivo do Instituto Histórico de
São Paulo)

PARTE GEOGRAFICA

DIVISAS - A lei n . ° 56 de 5 de abril de 1870, que elevou


o bairro de Botujurú à categoria de Freguesia, dentro do terri
tório de Iguape, com o nome de Freguesia de Nossa Senhora de
Jocupiranga, assinalou para a mesma as seguintes divisas :
" Art . 1.º Fica elevada à categoria de Freguesia
bairro do Jacupiranga, no município de Iguape.
Art . 2.° — A nova Freguesia terá as seguintes di
vigas :
$ único Pelo lado da cidade de Iguape, será di
vidida pelo lugar denominado Praia - Redonda ; pelo
lado de Cananéia , pelas cabeceiras do Ribeirão
Cunha -, ( 1 ) do rio Guaraú e de seus afluentes ; e, final
mente, pelo lado de Xiririca, pelas cabeceiras dos Ribei
rões Capinzal, Turvo e Bananal .
Art . 3.° Ficam revogadas as disposições em con
trário .
Mando, portanto , a todas as autoridades, a quem o
conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que
a cumpram e façam cumprir tão inteiramente como nela
se contém .

(1) E ' o ribeirão do Canha, e não Cunha que nasce no municí


pio de Cananéia.
8 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

() Secretário desta Província a faca imprimir, pu


blicar e correr .
Dada no Palácio do Governo de São Paulo , aos cinco
dias do mês de abril do ano de mil oitocentos e setenta
Antônio Cândido da Rocha."

De acordo com o decreto n.º 9.775 de 30 de novembro de


1938 , que fixou o novo quardo da divisão territorial do Estado, o
município de Jacupiranga, constituido do distrito de paz da sede
e do de Pariquera-assú divide- se :
Com o município de Iporanga : Começam na Serra do Ca
deado, onde esta faz cruzamento com 0 " divortium aquarum "
Turvo -Jacupiranga, seguem pelo “ divortium ” até o ponto em que
êste cruza com o espigão divisor das águas dos rios Jacupiran
guinha e Batatal ;

Com o município de Xiririca : Começam na Serra que serve


de divisor de águas entre o rio Turvo, à esquerda, e o rio Jacupi
ranguinha, à direita, no ponto em que esse divisor cruza com a
Serra do Descanso , seguem pela crista desta e pela do Macaco
Branco e do Jaguari até a Serra do Hilário, que é o início do di
visor de águas entre o Ribeira de Iguape e o rio Jacupiranga, e
prosseguem por esse divisor, que tem as denominações locais de
Serra da Cotia e do Bananal Pequeno , até frontear a cabeceira
mais sententrional no ribeirão Quilombo ;
Com o município de Iguape : Começam na cabeceira mais
setentrional do ribeirão Quilombo, na Serra do Bananal Pequeno
descem por ele ao rio Jacupiranga , dirigem- se dêsse ponto, em
reta , à barra do ribeirão Braço Preto no rio Pariquera -mirim ,
sobem por este até a confluência do ribeirão Arataca vão por éste
acima até sua cabeceira , continuando pela Serra do Pariguera - assú
até frontear a cabeceira mais setentrional do rio Cordeiro ;
Com o município de Cananéia : Começam na Serra do Pari
quera-assú , em frente à cabeceira mais setentrional do rio Cor
deiro, prosseguem pela Serra, acompanhando a cumiada do divi
sor das águas do rio Jacupiranga e seus afluentes , divisor que
toma os nomes locais da Serra da Folha Larga, Serra do Canha,
Serra de Itapitanguí, Serra do Taquari, até o ponto de junção
desta com as Serras Negra e do Cadeado .
Com o Estado do Paraná : Começam na junção das Serras
do Taquari com a Serra do Cadeado e Serra Negra e prosseguem
pela crista da Serra do Cadeado até entroncar com o divisor das
águas dos rios Jacupiranguinha - Turvo, onde tiveram início estas
divisas .
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACIPIRANGA 9

DISTRITO DE PAZ DE PARIQUERA - ASSU

o distrito de paz de Pariquera - assu, terá as seguintes divi


sas internas com o distrito de paz da sede do municipio de Jacu
piranga : Começam na Serra do Pariquera- assu , que é o espigão
mestre entre as águas que vertem para o rio Jacupiranga, à es
querda, e as que vertem para o litoral , à direita, no ponto de cru
zamento com o espigão que deixa, à direita, as águas do rio Pa
riquera-assu , e à esquerda, as do ribeirão Canha e rio Jacupi
ranga , caminham por este último espigão indo até a barra do ri
beirão do Capinzal, no rio Jacupiranga, pelo qual descem até a
barra do ribeirão Quilombo .

POSIÇÃO A cidade de Jacupiranga, que se encontra a


SSO da Capital, está situada à margem direita do rio do mesmo
nome, logo acima da foz do rio Canha , em uma pequena e gra
ciosa colina , circundada ao Norte pelo rio Jacupiranga ; ao sul
por terrenos ondulados, marginais deste rio ; a leste , pelo rio Canha
é a oeste, pelos terrenos que margeiam o próprio Jacupiranga .
Sua posição geográfica é a seguinte : 24.0 40 de latitude Sul
e 4.° 49 de longitude Oeste do meridiano do Rio de Janeiro .

SUPERFÍCIE - O município abrange uma área de cerca


de 600 kil.2 em florestas virgens, sendo sua totalidade de 1.955
quilômetros quadrados, mais ou menos .
A área ocupada em pastos é de 922 alqueires .

ALTITUDE A cidade está situada a 52 metros acima


do nível do mar . O ponto culminante do município encontra - se
na Serra do Guaraú, a 1.000 metros de altitude, enquanto que á
Serra das Queimadas em seu ponto mais alto se encontra a 700
metros sobre o nível do mar .

POPULAÇÃO No ano de 1876 era a população do dis


tritoapenas de 2.871 almas, segundo Azevedo Marques. Segun
do o Relatório Provincial de 1887, era de 4.198 almas, elevando -se
para 4.416 em 1899 , como se verifica do Almanaque Iguapense
para esse ano .
O último recenseamento, organizado no ano de 1934 acusou
para o referido município, a população total de 13.015 almas,
assim distribuidas :

Sede do município 702


Zona rural 12.313
10 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ESCOLAS :
Sede 149
Zona rural 2.298

ASPECTO GERAL - O município de Jacupiranga, distante


60 quilómetros mais ou menos, da beira mar, na região com
preendida entre Iguape, Xiririca e Cananéia , ocupa uma grande
área territorial de " terras fertilíssimas e maravilhosamente apro
priadas à cultura de todas as plantas das zonas temperadas .
Para Oeste estende - se até a fronteira com o Estado do Para
ná o grande campo denominado FAXINAL , que constitue verda
deira fonte de riqueza, aliás, até hoje inexplorado , pela abundância
de pinheirais e erva -mate que aí se encontram .
O terreno é geralmente ondulado, cheio de mamotes e regado
por muitos ribeirões .
Pelas maginíficas pastagens naturais, podem ser considerados
os campos do Faxinal como dos melhores e adequados ao desenvol
vimento da pecuária em larga escala .
O território do município é banhado por muitos rios , entre os
quais se destaca o Jacupiranga com seus numerosos afluentes, que
concorrem para a fertilidade das terras, que são aí vendidas de 50
a 200 mil réis por alqueire .
Grandes florestas e numerosos saltos e cachoeiras completam
a magnificência desta região , tornando - a privilegiada entre as de
mais regiões do Estado .
O seu sub- solo é rico em minerais, de que avulta o ferro, que
se encontra quase à flor da terra ou em baixas profundidades ,
As conhecidas minas de Jacupiranguinha distam apenas 60
quilómetros do pôrto de mar.

CLIMA E ' em geral muito ameno, com oscilação máxima


da temperatura diária de 15 graus, não havendo , portanto , eleva
ções muito bruscas.
A temperatura média no inverno é de 16,41 graus ou diferen
ça para maior calor do inverno de 9,19 e para mínima notada de
9,21 graus .
Como disse Young, a zona da Ribeira de Iguape, pelo seu cli
ma temperado, pode comparar - se favorávelmente com a de qualquer
outra parte do Brasil .

SALUBRIDADE -- O municipio goza de uma salubridade


magnifica, não tendo sido constatada até a presente data epidemia
alguma ou moléstias infecto -contagiosas.

(2) G. E. Young, Almanaque Iguapense, 1899 .


MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 11

DISTÂNCIAS - A cidade fica distante 103 quilómetros do


rio Ribeira e 146 kil. da cidade Iguape, pelo mesmo Ribeira . Por
estrada de rodagem : 273 kil . da Capital , via Piedade, e 310 , 470,
via Santos; 59, de Iguape ; 54 , de Cananéa ; 27 , de Xiririca ;
35, kil . do pôrto de Subaúma ; 73 da estrada de ferro Juquiá ;
14 de Pariquera ; 41 de Registro.
Segundo Azevedo Marques, é de 30 lêguas ou 166,6 quilôme
tros da cidade de Iguape ; 14 de Pariquera-assú ; 22 quilômetros de
Xiririca. Segundo Young, a distância entre Jacupiranga e Iguape
é de 87 quilômetros; de Pariquera -Subaúma, cerca de 20 e Jacu
piranga -Subaúma, 40 quilómetros ( 3 ) .

RIOS - O principal dos rios do município é o Jacupiranga,


formado pela reunião dos rios Jacupiranguinha e Guaraú . Outro
ra navegável até certo ponto de seu curso por navios da Companhia
Fluvial Sul Paulista , é hoje apenas percorrido por canoas. Nasce
na Serra do Cadeado , na divisa com o Estado do Paraná .
Guaraú , afluente do Jacupiranga, pela margem ( lireita , nas
ce na Serra que lhe dá o nome, servindo de limite entre o municí
pio de Jacupiranga e parte do de Cananéia .
Canha, também afluente do Jacupiranga, pela margem direita ,
deságua pouco abaixo da cidade.
Ribeirões do Aceite, Grande, Quilombo, servindo éste último
de linha divisória com o município de Iguape; ribeirões Manuel
Gomes, Capinzal, Bananal, Turvo e Padre André, além de outros
menores, como os do Soldado, Gracui, Arataca, etc. Rio Jacu piran
guinha, pela margem esquerda, onde se encontram as jazidas de fer
ro magnético .
Rios Pariqucra -assú e Pariqucra -mirim , que deságuam no
Ribeira .

ILHAS Entre as ilhas que se encontram nos rios do muni


cípio, apenas é digna de ser mencionada a do -- Turvo no rio do
mesmo nome .

LAGOAS -- Muitas são as lagoas espalhadas por diversos


pontos do território de Jacupiranga, porém , sem denominações es
peciais .

SALTOS Cinco grandes saltos existem no município ,


avultando entre eles o do rio Guaraú , com uma queda dágua de cin
coenta metros de altura e o do Padre André, com 12 metros .

(3) G. E. Young, Rev. do Inst . e Geog . de S. Paulo , vol . 8 ,


pág . 278 .
12 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

SERRAS -- Da cordilheira marítima estendem -se pelo muni


cípio diversas ramificações, sendo que as mais importantes são as
que formam as serras do Guaraú e das Queimadas.

CURIOSIDADES – Entre as várias curiosidades que aí se


encontram é digna de menção a existência de uma caverna no Bair
ro da Capelinha, em cujo interior se constata um magnífico salão,
onde se observam “ numerosas esculturas naturais ” , havendo diver
sas divisões internas, todas elas interessantíssimas .

DIVISÃO ECLESIASTICA - Constitui uma paróquia, sob


a invocação de Nossa Senhora da Conceição de Jacupiranga, per
tecente à diocese de Santos .
Existem 2 templos católicos, 1 protestante, no bairro das La
vras e 1 de outra religião .

DIVISÃO DMINISTRATIVA E JUDICIÁRIA -- Ele


vado à Freguesia, pela Lei nº 56 de 5 de abril de 1870, o município
de Jacupiranga que pertencia ao de Iguape , dêste se desmembrou
pela Lei n° 2.253 , de 29 de dezembro de 1927. Possui um dis
trito de Paz, --- Pariquera -assú , - criado pelo dec . n.º 6.959 de
11 de fevereiro de 1935 e instalado a 11 de março do mesmo ano .
Pertence à jurisdição da comarca de Iguape, 2.º distrito judicial,
sendo sede de uma delegacia de Polícia .
Tem um juiz de paz , 1 tabelionato e cartório de paz .

ORGANIZAÇÃO POLICIAL -- No municipio há uma De


legacia de 6.a classe e a Sub-delegacia de Pariquera -assú, ambas
subordinadas â Delegacia de Iguape e Regional de Santos .

PRODUÇÃO Sua principal fonte de riqueza consiste na


exportação de arros , café , farinha de mandioca e milho, que produz
em maior escala , além de frutas em geral .
E ' regular a exportação de gado vacum e suinos.

TERRAS -- As terras do município são ótimas, podendo ser


calculadas em 60 % de terra preta arenosa ou salmourão .

AGRICULTURA --- As terras de Jacupiranga são boas para


toda e qualquer espécie de cereais, como feijão, milho, mandioca ,
batatas e cana de açúcar , café e sobretudo arrós, que constitui a
principal lavoura do município e frutas em geral especialmente ba
nana , laranja, limão, abacaxi, abacate, manga e outras mais.
Além disso, produzem fumo, algodão , mamona .
Também exporta regular quantidade de toicinho, além de ou
tros produtos.
MEMOLI TIISTÓRICA DE JACI PUNGA 13

MINERAIS – Como já dissemos, o município é rico em mi


nerais, principalmente ferro, cuja importante mina, distante 12 qui
lômetros da cidade, está situada à margem esquerda do rio Jacu
piranguinha, tendo sido descoberta pelo dr. Raymundo de Sacra
mento Black , o qual em ofício dirigido ao presidente da Província
dizia :

“ Ilmo. e Exmo, Snr . Tenho a honra de submeter à


consideração de V. Exa . e do Governo Imperial . o in
cluso trabalho em que se contém informações sobre as
minas de ferro magnético do Jacupiranguinha no muni .
cípio de Iguape, acompanhado de duas amostras deste
mineral , e do calcáreo a que se acha ligado . Com este
trabalho alias imperfeito tive por fim concorrer para o
estudo e descobrimento de nossas riquezas naturais que
hão sempre merecido a constante solicitude do Governo .
Deus Guarde a V. Exa . Distrito de Cananéa 3 de Fe
vereiro de 1871 M. D. Presidente d’esta Província .
Engenheiro do Ministério d'Agricultura , Raymundo de
Penna - forte Alves Sacramento Black . "

Era o seguinte o relatório a que se referia e que , por ser inte


ressante , transvrevemos na integra :

“ No tempo em que chegava á margem direita do Jacupiranguin


ha, no municipio de Iguape, e ia transpor aquelle rio, prosseguindo
no desempenho dos trabalhos a meu cargo , fui informado pelos mo
radores do lugar que na margem oposta do mesmo rio, onde de
sagão pequeninos ribeirões, seos tributarios, corrião agoas salitra
das, de gosto intragavel, e que segundo os seus effeitos parecião
insalubres , visto como todos que ião estabelecer -se alí fazendo us !
de taes agoas se tornavão em breve tempo doentes e opilados,
Para averiguar este facto que era exposto com lealdade, e que
podia offerecer amplos meios de observação e de estudos da sciencia,
tratei logo de explorar aquelles lugares, percorrendo-os attentamente
na maior parte de sua extensão .
Do resultado desta exploração, aliás proveitosa , do que pude
successivamente colher nos demais exames que procedi passo a fazer
a respectiva narração .
Subre a margem esquerda do rio Jacupiranguinha , no lugar
op posto ao que me achava, levanta- se um cordão de morros de al
tura pouco consideravel, o qual seguindo a principio em direcção ge
ral do Oeste, e tomando depois a de N.O. vai terminar na paragem
denominada Alegre, nas margens do rio Turvo, confluente importante
do rio Jacu piranga .
Estes morros, segundo as denominações que conservão, se divi
dem em duas partes que são : o morro Grande ou morro das pedras ,
e o morro do chapadão, e communicão -se com a serra nova, rami
ficação da importante e conhecida serra negra ; e formão a divisa
das agoas dos rios Turvo e Bananal, este confluente do Jacupiran
guinha, e aquele do Jacupiranga, como se disse .
Taos morros são formados de terras geralmente ferteis, o que
se dividem em duas classes distinctas que são : a terra roxa muito
argilosa , contendo fraguementos de calcidosi, e a terra preta for
14 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

mada principalmente de pequenos cristaes de peroxido de ferro,


misturadas com fragmentos de um rochedo eruptivo , tambem ferru
ginoso .
As agoas que vertem da terra roxa são geralmente potaveis ,
e as que tem suas fontes na terra preta são intragaveis , tem o sa
bor adstringente mais ou menos pronunciado , e são em fim aquellas
que nos forão indicadas .
Da vertente norte do Morro grande nascem quatro corregos
que tem as seguintes denominações: Area Preta , Faria, Braço do
Joelho , e Joelho , os dois primeiros que desagoão no Jacupirangui
nha, são os que contem as referidas agoas, e os dous ultimos vão
fazer barra no rio Turvo ; notando - se que no braço do Joelho cor
rem tanibém as agoas da mesma natureza , e de sabor ainda mais
pronunciado que o das dos corregos que vão ter ao Jacupiranguinha .
Os valles do Area Preta , Faria , e Braço do Joelho , que forão
examinados achão -se cheios ou mais propriamente atulhados de uma
formação diluvial que consistem quasi exclusivamente de mineral
e ferro magnetico ( protoxido e peroxido de ferro, de todos os ta
manhos, desde pedaços que representão alguns palmos cubicos até
arêa a mais fina ; todos arredodados e polidos pela acção das agoas ;
o que prova que se acham deslocados da sua posição primitiva .
Nota - se tambem que entre estes fragmentos achão -se muitos qu.
mostrão magnetismo polar, e tanto que atraem não só o ferro como
o proprio mineral . E ' bem de suppor-se que depois de menuciosa
exploração encontrem - se amostra de pedras iman de força assas
consideravel .
Para achar - se a procedencia d'este ferro tão abundantemento
accumulado no espaço supperior a uma legoa quadrada, passou -se
a examinar os morros visinhos, principalmente o denominado das
pedras . Penetrando em uma grota deste, encontram -se logo uma
rocha de natureza duvidosa , que é provavelmente volcanica, e que
se pode talvez classificar por um dolorito , contendo grande quantida
de de pequenos cristaes de protoxido e peroxido de ferro, que fazem
influir este rochedo sobre a agulha magnética, sem contudo mostrar
polaridade . Subindo -se depois no referido morro, chegou -se ao pé
de um grande paredão de pedras, mui alcantilado , que se levanta até
o cume do mesmo morro . Então notou -se tambem que sobre a su
perficie d'este rochedo se achão espalhados muitos cristaes de aspecto
metallico que o fazem brilhar aos raios do sol . A massa principal
d'este rochedo consiste n'um calcareo laminario, que pela simples
inspecção pode ser tomado por calcareo dolomitico . Abri os varia
dos cristaes de aspecto metalico são tambem de ferro magnetico , que
sobresaindo na superficie do calcareo em pontos salientes, parecem
como que cravados nelle, e isto como resultado da dissolução operada
pelas agoas pluviaes na mesma superficie .
A quantidade de ferro que se acha nesta formação é mui va
riavel, pois que existem camadas em que nem a decima parte será
talvez d'este mineral e outras ao contrario em que a sua totalidade
é composta de mineral, servindo apenas de cal como argamassa
para ligar os differentes cristaes .
O rochedo é schistoso, as respectivas camadas são inclinadas
para o sul, e toda esta formação tem muita semelhança com algumas
formações sedimentarias mais antigas: mas não se tendo encontrado
o mesmo signal de petrificação não foi possivel determinar- lhe a
idade geologica. ( mineral de ferro, O mais importante d'esta
formação, foi antes de tudo examinado , o reconheceo - se como com
posto de protoxido e peroxido de ferro .
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 15

Por effeito d'este exanie e do mais que successivamente foi


observado chegou -se á seguinte conclusão : que esse mineral é iden
tico como o que se encontrou abundantemente nos vales dos ribeirões
visinhos: e que taes depositos são formados pela decomposição da
rocha calcarea , tendo as agoas levado as partes calcareas, e deposi
tado o mineral de ferro .
Para seguraramo - nos da importância d'este mineral em relação
d'industria, aqueceu -se uma parte d'elle num tubo de vidro até a
temperatura roxa .
N'esta operação não appareceo sublimado algum , nem houve
desenvolvimento de gases à excepção da pequena quantidade de va
por d’agoa, o que prova a não existencia de sensivel quantidade de
enxofre e arsenico, os dous corpos que podião mais embaraçar a
applicação do mineral nos diversos misteres da industria .
E para obter-se uma ideia aproximada da composição do cal
careo fez-se a analyse chimica, procedendo -se do modo seguinte :
Tratou - se uma gramma d'este mineral em pó pelo acido nitrico
frio , do que resultou dissolver - se com a ebulição branda a maior
parte, e ficar insoluvel um residuo que pesou 0,100 gr, consistindo
do silex em forma de area fina .
Tratou -se a solução pelo sulfato de amoniaco do que resultou
um precipitado preto, que pesou 0,03 , o qual se reconhece pelo
massarico ser sulfato de ferro .
A solução restante tratou - se primeiramente pelo chloramonium ,
e depois pelo carbonato de amoniaco, e d'ahi precipitou - se 0,7 gr .
de carbonato de cal . Evaporou-se o resto da solução até secco , e o
residuo restante depois de ser calcinado pesou 0,06 gr .
Dissolveo -se ainda este residuo por meio do acido sulfurico esten
dido , e tratou -se a solução neutra pelo phosfato de soda , produzindo
um precipitado cristalino , que por si, e pelo rezultado obtido pelo
massarico reconheceo- se que era magnesia .
O rezultado total da analyse foi portanto o seguinte :

Silex ( em forma de area insoluvel ) . . 0,100 gr .


Oxido de ferro . . 0,024 gr .
Carbonato de cal . 0,700 gr .
Carbonato de magnesia 0,080 gr .
Perda e agoa 0,096 gr .

1,000 gr .

Esta analyse resentindo - se da falta de aparelhos e reajentes ne


cessarios não podia ser feita tão exacta , quanto era de desejar ; mas
prova entretanto que este calcareo não devia ser classificado na or
dem dos do'lomitas, por conterem em si muito pouca magnesia , pa
recendo ser um calcareo das formações de transicções, matermopho
siado pela acção do calor .
Por ultimo pode - se crer que as agoas que correm nos citados
ribeirões, as quaes chamarão a nossa attenção, devem o gosto sali
trado que apresentão a certa porção de magnesia que em si contem ;
e para confirmar ou antes averiguar - se esta causa deverão ser oppor
tunamente examinadas . E para que se realise logo com a pericia
que ora lhe fallei a analyse dos mineraes em questão, junto apre
sento duas amostras do mineral de ferro , e uma do calcareo para
serem examinadas pelos competentes na materia .
16 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CONCLUSÃO

Do expendido se ve que 08 terrenos do Jacupiranguinha, con


tem importantes minas de ferro , que forão por nos encontradas ao
transpormos aquella paragem ; e que tal importancia se revela não
$ 0 pela grande extensão que ellas occupão, e que se calcula em al
gumas legoas quadradas, como tambem pela natureza do mineral, que
por ser pura e de rara qualidade, admitte na sua extracção o em
prego dos processos mais abreviados .
E se não se pode encarecer o merecimento d'estas minas, con
signando a existencia de carvão de pedra , que ainda não foi des
coberto ; nem por isso ha que descrer da importancia d'ellas. visto
como a não contarem já com aquelle precioso combustivel, possuem
contudo como apanagio seo , as vigorosas mattas virgens que podem
fornecer abundante carvão vegetal; accrescendo mais que a fabri
cação de aço fundido, para a qual é propriamente aplicavel o ferro
que ellas em si contem , despende mui pouco combustivel, pondo -se
em pratica o novo systema de Bessemir ( ? ) pelo qual se descarvo
nisa o ferro fundido sem mais emprego de combustivel.
Estas minas porem parecendo vantajosamente situadas a res
peito dos rios Jacupiranga e Ribeira, não podem contudo utilisar - se
d'esta navegação que é sobretudo limitada . e feita em grande parte
por pequenas canoas, no enorme desenvolvimento de vinte cinco ou
mais legoas, para ir ter á cidade de Iguape .
Ellas, pois, parecem destinadas, como as demais riquezas natu
raes do paiz, a aguardar o almejado desenvolvimento das nossas vias:
de communicação .
Entretanto passando atravez de seus terrenos a projectada es
trada que deve ligar o porto da colonia de Cananéa com a cidade
de Castro , é de suppor que se approxime a epoca de participarem
do influxo d'esta via de communicação .
Distando ellas 7 legoas apenas do porto da Colonia de Cananéa
é certo que a estrada que d'ali partisse abrindo em seo começo
largo espaço a mineração e outras industrias, criaria simultanea
mente perenes fontes de receita para a construção das outras secções
da sua projeção .
Seja tambem consignado que verificando - se actualmente, ou
n'um futuro mais ou menos proximo a exploração d'essas minas,
é sobremodo necessario que se trate de acautelar as mattas, pre
Berva - las da implacavel destruição que lhes vota a lavoura roti
neira . Para esse effeito torna-se urgente que o Governo ordene
desde já a descriminação do dominio publico, fazendo - se effectiva
a respectiva demarcação ou por outro modo, mande verificar a de
sapropriação d'essas mattas no caso de pertencerem á propriedade
privada .
Sem esta providencia jamais colherá o Estado a minima van
tagem deste thesouro natural .
Districto de Cananéa de Fevereiro de 1871 Raymundo de
Penna-forte Alves Sacramento Blakc . »

Afim de serein examinadas, foram em 31 de março de 1874


remetidas diversas amostras, para o Laboratorio Real Metalúrgico
Vista parcial de Jacupiranga Fundo da Praça Hildebrando de Macedo

Prédio de propriedade de Miguel Abú - Yaghi, onde funcionam a Câmara


Viunicipal de Jacupiranga, a Culetoria Estadual e
a Caixa Econômica do Estado
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 17

da Escola de Minas , em Londres , “ amostras que foram extraídas


em um principio de mineração , dando resultados” . ( 4 )
Outras mais foram examinadas em 22 de junho de 1874 em
Paris e finalmente em Londres , em novembro de 1899, dando re
sultados magníficos .
Em seu trabalho sobre as minas do Brasil , Francisco Inácio
Pereira , diz o seguinte , sobre as análises feitas no minério de ferro
das jazidas do Jacupiranguinha e Turvo :
“Laboratório real Metalúrgico da escola de minas Londres,
31 de março de 1874 .
De três amostras analisadas os resultados :
N.° 1 minério metálico , contém ferro magnético, por cento,
ferro puro . 54,36
N.° 2 dito , dito de muito valor, ferro puro 55,61
N.° 3 Minério de ferro escuro , ferro puro 54,87

Dr, Percy W. J. Ward. "

" Laboratório de Saint George Hospital de Londres, Henrie M.


Nood Ph . D. membro da sociedade Real ao Sr. Clarck C. Leices
ter Terrace Hyde Parck .
N.° 1 Ferro magnético, contém ferro puro . 58,4
Nem enxofre nem fósforo
N.° 2 Ferro magnético, contém ferro puro 56,0
N.° 3 Hermalite hidratado escuro contém 55,3
N.° 3 Nem enxofre nem fósforo
8 de maio de 1874 Henri Noda "

" Escola de minas de Paris, extrato dos registros de Bureau


' essais ( oficina de análise ) para as substâncias minerais".
Laboratório, n .° 6321 . Paris, 22 de junho de 1874 .
Análises de três amostras de minério de ferro , titanado , entre
gues ao Sr. Daubrée, diretor de escola de minas, provenientes da
mina de Jacupiranguinha e Turvo , na comarca de Iguape .
Todas as três amostras são magnéticas, sendo de n . ° 2 magnética
polar .
o n.º 1 é negro , fratura cocoidal , brilho metálico , o seu po é
preto , o minério é massico e não se lhe vê ganga .
( ) n.º 2 pouco difere do precedente, contém alguma ganga disse
minada .
o n.º 3 contém ferro oxidado hidratado, é escuro, com pequenas
veias de quartz branco ; a rocha é cavernosa .
Graduado cada peso em cem partes, eis aqui a composição deste
minério .
Quartz vestígios
Ácido titánico 16,60
Per óxido de ferro 83,60
1.º Óxido de manganês Poucos vestígios
Cal Vestigios

(4 ) Diogo de Moraes . A zona da Ribeira 1910 .


18 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Magnésia 1,60
Quartz 5,60
Ácido titânico 20,00
Per óxido de ferro 74,30
2.° Oxido de manganês vestígios
Cal idem
Magnésia 1,60

OBSERVAÇÃO Este ferro parece achar - se , ao menos na maior


parte em estado de ferro oxidado . Os números supra indicados re
sultam do cálculo do ferro em estado de peróxido o correspondem a
ferro puro % n .° 1-58,60 ; n .° 2 52,1 .
Fez-se a análise por via seca , tomando por cem do mineral, vinte
partes de um solvente férreo , pêso igual de calcáreo e de argila deu
N.° 1 57,40 , metal branco de grão fino muito quebradiço .
N.° 2 51,70, metal cimento , tarjado, quebradiço .
N.° 3 Deu a seguinte análise :
Quartz e alguma argilla 35,50
Acido titânico 6,00
Peróxido de ferro 52,00
Oxido de manganêz Bastantes vestigios
Cal 0,30
Perda por calcinação 5,60
Cobre Vestígios sensiveis

o engenheiro de minas , cor do Bureau d'essais ( L. Mois


sent) ( 5 )

Vários foram os pedidos de concessão para exploração de fer


10 e outros minerais no território hoje pertencente ao municipio
de Jacupiranga .
Entre eles citaremos :

Dr. Joaquim Inácio Silveira da Motta , pedindo permissão pa


ra lavrar ferro e outros metais, no lugar denominado Jacupiran
guinha, concedida pelo Dec. nº 5152 de 26 de novembro de 1872 ,
e prorrogado pelos Decretos n . 6037 de novembro de 1875 , e 6753
de 24 de novembro de 1877 ; transferida a Abel Gomes da Silva
e outros , pelo Decreto nº 7622 de 7 de fevereiro de 1880 , sendo
lhes ainda prorrogado o praso para começo dos trabalhos, pelo De
creto 8913 de 24 de março de 1883 .
Concessão ao Dr. Jorge Scarboraugh Barnsle, por decreto de
30 de novembro de 1878 ;
Outra, a Manuel Moutinho de Avilez Carvalho, por decreto
de 22 de fevereiro de 1879, para explorar metais no município de
Iguape ;
1o ) Francisco Inácio arreira, Dicionário Geográi u das Minas
do Brasil, ( 1885 ) págs . 335-337 .
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 19

Ao dr . Witt Clinton van Tuyl e George F. Goff, decreto de


15 de maio de 1880, para lavrar ferro e outros minerais no rio
Ribeira e seus afluentes.
Diz Francisco Inácio Ferreira, em seu Dicionário de Minas,
que o Jacupiranguinha " possue minas importantíssimas de ferro
superior ao Ipanema e algumas de chumbo " .

PECUÁRIA Neste ramo já se evidencia franco desen


volvimento entre os criadores , tendo aumentado bastante a criação,
principalmente de suinos.

FRUTICULTURA A - pesar -da excelência das terras, só


mente de alguns anos a esta parte, é que se vem notando o interesse
dos agricultores, pela formação de pomares, intensificando - se tam
bém a plantação de bananeiras.

LAVOURA , INDÚSTRIA E COMÉRCIO

A lavoura do município é constituída por numerosos sitiantes,


que possuem pequenas glebas de terra e das seguintes fazendas :

“ Pouso Alto " . propriedade de


" Cortezias " 99 29 Alfredo Munis Costa
Alfredo Antunes de Almeida
“ Lavras " José Lucio Pereira
“Barra do Azeite ” . Julio Grothe Netto
' Rio do Azeite " » Sebastião Marques
* Rio do Azeite " 99 Estevão Antunes de Oliveira
" Vieiras ” 9 Agostinho José Vieira
" Bananal" Simeão Antunes de Freitas
" Fazenda Cap. Braz' 9
" Joaquim do Nascimento Piras
"Cachoeiras" Casimiro Antunes de Oliveira
" Indaiatuba " 99 Horacio Corrêa
" Indaiatuba " Acácio Corrêa
" Fazenda Padre An
dre " » Alexandre José de Lima
" Sant'Anna " 20 » Amancio Sant'Anna Ferreira
" Traira " Simeão Francisco de Lima
" Ioshikava " " Kinogushi Ioshikava
( Bairro do Quilombo )
“ Tanaka " Manuel Tanaka
( Bairro do Quilombo )
" Moreira " 99 Rafael Moreira de Lima
( Bairro do Quilombo )
“ Zanella " .. José Zanella & Cia.
( Bairro Pariquera
Mirim )
“ Martins " . Cristiano G. Martins
( Bairro Pariquera
Miri... )
Rangel " . Alexandre Rangel
( Bairro Braço Grande )
20 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

INDÚSTRIAS :

Machado, Abu - Yaghi & Zanon ( Engenho de beneficiar arrês) Cidade


Sócios :
Bernardo Ferreira Machado, Miguel Abu - Yaghi, Vitório Zanon
Luiz de Freitas Garcia ( Engenho de beneficiar arros) Cidade
Ricardo Moringh ( Olaria ) Cidade
Artur Carravieri ( Olaria ) Cidade
Ângelo Zanoni Giglio ( Olaria ) Cidade
Máximo Zanella & Cia. ( Engenho de arros ) Pariquera -assú
Sócios :
Máximo Zanella João Raymundi Ivo Zanella
Máximo Zanella & Cia . ( Engenho de Café ) Pariquera - Assa
João Narcizo Adrião (Olaria ) Pariquera - Assu
João Wach ( Olaria ) Pariquera-Agsú
Emilio Marietto ( Olaria ) Pariquera - Assú
Eizo Tashiro ( Engenho de Café ) Bairro do Capinzal )
Kinogushi Ioshikava ( Engenho de Café ) Bairro do Quilombo )

FÁBRICAS :

Juvêncio Mariano de Sales (Aguardente ) Bairro Ubá -Guassu


Américo Victor Pereira ( Aguardente ) Bairro Morro Grande
Alfredo Muniz Costa ( Aguardente ) Bairro Pouso Alegre
Sebastião Antunes de Oliveira (Aguardente ) Bairro Areia Preta
Nascimento A. de Oliveira ( Aguardente) Bairro Areia Preta
Domingos Filadelfo Ferreira ( Aguardente ) Bairro Morro Grande
Eizo Tashiro ( Aguardente ) Bairro Capinzal
Iosci Scimodaira ( Aguardente ) Cidade
Francisco Zanella ( Aguardente ) Cidade
Lorena & Irmão ( Aguardente ) Itopavossa
José Zanella (Aguardente ) Pariquera -Mirim
Cristiniano Martins (Aguardente ) Pariquera -Mirim
Pedro Antônio Martins ( Aguardente ) Pariquera -Mirim
Kiehiji NASUNO ( Açúcar ) Capinzal
Yokishi Uayassaki ( Açúcar ) Capinzal

Existem também algumas serrarias e oficinas mecânicas ;

CASAS COMERCIAIS :

Antônio Duarte de Castro ( Secos e Molhados ) Cidade


Antônio Gonçalves Saracura ( Secos e Molhados ) Cidade
Claudino Berto Damasceno ( Secos e Molhados ) Cidade
Eduardo Vicente Macedo ( Secos e Moihados ) Cidade
Fausto Alves Diniz ( Secos e Molhados ) Cidade
Gentil Brasil Macedo ( Secos e Molhados ) Cidade
Joaquim Mauricio Grothe ( Secos e Molhados ) Cidade
Jorge José de Lima ( Secos e Molhados ) Cidade
Miguel Stonoga ( Secos e Molhados ) Cidade
Norberto da Guia Franco (Secos e Molhados ) Cidade
Ricardo Mooringh ( Secos e Moihados ) Cidade
Bernardo Ferreira Machado (Fazendas e Varejo ) Cidade
Eduardo Brasileiro Macedo ( Fazendas e Varejo ) Cidade
Francisco Zanella ( Fazendas o Varejo ) Cidade
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 21

Frutuoso Moreira de Lima ( Fazendas e Varejo ) Cidade


João Cugler Sobrinho ( Fazendas e Varejo ) Cidade
Joaquim Rodrigues de Matos ( Fazendas e Varejo ) Cidade
Luiz de Freitas Garcia ( Fazendas e Varejo ) Cidade
Miguel Abu - Yaghi ( Fazendas e Varejo ) Cidade
Vitório Zanon (Fazendas e varejo ) Pariquera-Assú
Antônio Redis ( Fazenda e Varejo ) Pariquera -Assú
Estanislau Cugler ( Fazenda e Varejo ) Pariquera -Assú
Fortunato Zanella ( Fazenda e Varejo ) Pariquera - Assú
Ladislau Cugler ( Fazenda e Varejo ) Pariquera -Assú
Máximo Zanella ( Fazenda e Varejo ) Pariquera - Assú
Valentim Siedlarczyc ( Fazenda e Varejo ) Pariquera - Assú
Alfredo Antunes de Almeida ( Secos, Molhados , etc ) Bairro Cortezias
Alfredo Muniz Costa ( Secos; Molhados, etc ) Pouso Alto
Almeida & Cia ( Secos, Molhados, etc ) Capinzal
Amâncio Sant'Anna Ferreira ( Secos, Molhados, etc ) Cortezias
Eizo Tashiro ( Secos, Molhados, etc ) Capinzal
Francisco Ferreira Machado ( Secos, Molhados, etc ) Capinzal
José Zanella & Cia ( Secos, Molhados, etc ) Parq . Mirim
Oliveira & Baptista ( Secos, Molhados, etc ) Itopavassú
Paulo de Lima ( Secos, Molhados, etc ) Capinzal
Tayti ( Secos, Molhados, etc ) Capinzal
Viuva Almeida & Irmão ( Secos, Molhados, etc.) Pindauha
Zanon & Silveira ( Secos, Molhados , etc ) Cachoeira
Bernardo Ferreira Machado ( Calçados, Ferrag, roupas etc ) Cidade
Miguel Abu - Yaghị ( Calçados, Ferrag ., roupas, etc ) Cidade
Luiz de Freitas Garcia ( Calçados, Ferrag , roupas etc. ) Cidade
Frutuoso Moreira de Lima ( Calçados, Ferrag. , roupas etc. ) Cidade
Pariquera-Assú Máximo Zanella (Calçados, Ferag., roupas etc. ) Cid.
Pariquera-Assú Estanislau Cugler (Calçados, Ferrag. , roupas etc ) Cid .
Pariquera - Assú Valentim Siedlarczyc ( Calçados, Ferg. , rop . etc. ) Cid .
Pariquera - Assú João Beranger Martins (Açougue )
Pariquera - Assú João Barduco ( Açougue )
Pariquera - Assú Manuel de Ramos ( Açougue )
Pariquera-Assú João Kozikoski ( Oficina Mecânica )

ARTIGOS DE EXPORTAÇÃO
Arròs 27.000 Sicos, valor 1.00: 000 $ 000
Café 2.000 Sacos valor 120 : 000 $ 000
Feijão 600 Sacos, valor 24 : 000 $ 000
Suinos . 1.000 Cabecas 50 : 0008000
Aguardente 809.000 litros 320 : 000 $ 000

HOTÉIS:
" Jacupiranga " , de Miguel Stonoga , Jacupiranga ( Cidade )
" Paulista " , de Nina Lino, Pariquera -Assú ( Distrito )

COMÉRCIO - O comércio do Município é feito com as


praças de Santos, São Paulo e do Rio de Janeiro, servindo - se pa
ra isso do porto de Subaúma, no município de Iguape, por onde é
feito todo o movimento de exportação e importação.
A exportação é calculada em 1.200 :000 $000, cabendo ao ar
rôs , seu principal produto, a cifra de 750 :000 $ 000 .
22 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ECONOMIA PÚBLICA

Arrecadações 1935 1936

Coletoria Federal 40 : 105 $ 000 35 :000 $ 000


Coletoria Estadual 95 : 000 $000 94 :000$ 000
Prefeitura Municipal 37 :724 $800

Municipal 1932 1933 1934 1935 1936

Receita . 30 :863 $080 32 : 000 $000 36 :000$000 39 :000$000 45 :000 $ 000


Despeza 33 :663$ 500 31 :000 $ 0001 31 :000$ 000 38 :000$ 000 45 :000 $ 000
Patrimônio 183 :000 $0001 183 :000 $000 183 :000 $000
Prédios . 187 .207 210

No ano de 1932, o número de prédios da cidade era de 130 ,


A dívida total do Município é de 10 :094 $ 800 .

CAIXA ECONOMICA -- A Caixa Econômica, tendo sido


criada por Decreto n° 7.487 de 27 de dezembro de 1935 , iniciou os
seus trabalhos a 5 de março de 1936 , verificando - se no balanço de
30 de junho do mesmo ano a existência de um saldo a favor dos de
positantes , da quantia de Rs.152 :908 $ 500

ESTATÍSTICA AGRICOLA E ZOOTÉCNICA -- Nin


guém ignora a importância representada pelos dados estatísticos
dos municípios. Infelismente, porém , os que nos são fornecidos
por várias publicações ainda se encontram bem longe da verdade,
a avaliar pelos que dizem respeito a certos municípios que nos são
familiares e cujos números aí assinalados não passam de verdadeira
fantasia .
kecorrendo a um desses trabalhos , dêle extraimos as notas que
se seguem , correspondentes à produção do município de Jacupiran
ga em diversos anos.

1931-1932
Café . 12.364 arrobas
Açucar 30.663 arrobas
Arros 107.163 sacas
Feijão 16.942 sacas
Milho 91.850 sacas
Batata sacas
MEMORIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 23

Farinha de mandioca . 29.341 sacas


Aguardente 20.700 litros
Fumo
Polvilho
Rapadura
Algodão
Mamona

Soma 309.028

ESPÉCIES 1933-34 εε - ε6 !

Café . quilos 254.895 194.190


Açúcar quilos 120 ( ? ) 179.730
Arrós quilos 5.605.500 4.275.300
Feijão quilos 554.580 768.720
Milho quilos 4.855.200 4.275.300
Batata quilos 45.945
Farinha de Mandioca quilos 749.280 3.056.728
Aguardente . litros 16.360
Fumo quilos 225
Porvilho quilos 17.236
Rapadura quilos 300 25
Algodão quilos 2.970
Mamona quilos 4.300

Soma : 12.065.802 14.988.124

Laranjas caixas 11.566 44.277


Limões caixas 1.380 3.554
Bananas caixas 90.696 46.477
Abacaxis frutos 10.950 7.700
Uvas quilos 15 140
Mangas caixas 15 25
Abacates caixas 10 218
Peras caixas 8

Os quadros que ai ficam servem para confirmar o que antes


dissemos . Enquanto no ano de 1931 especificam -se o arros , açucar,
etc. , em número de sacas , nos últimos vêm tais produtos classi
ficados em quilos . Mesmo assim , é claro de ver- se que não re
presentará a verdade o número 120, para a produção de açúcar
em 32-33, quando antes foi de 30.663 arrobas e em 33-34 foi
de 179.730 .
24 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

INSTRUÇÃO PÚBLICA

A primeira escola criada no município de Jacupiranga data


de 1861. Vaga por muito tempo, foi preenchida em 1864 pelo
professor Antonio Rafael Carneiro .
Atualmente , a instrução pública é ministrada e distribuída
da maneira seguinte :
Por 2 Grupos Escolares , 7 escolas públicas, rurais , 5 escolas
municipais.

ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS :

Grupo Escolar de Jacupiranga . Cidade


Grupo Escolar de Pariquera-Assú Sede do Distrito
Escolas rurais situadas nos Bairros de :

Cortezias Quilombo
Lavras Braço Preto
Indaiatuba Pariquera -Mirim

ESCOLAS PÚBLICAS MUNICIPAIS, NOS DE :

Cachoeira Pedrinhas
Azeite Padre André
Areia Preta

1
II

PARTE HISTÓRICA

A REGIÃO DA RIBEIRA

À vasta região sul do Estado , compreendida entre a Serra


de Paranapiacaba e o Oceano, dá-se o nome de zona da Ribeira,
tendo sido explorada no ano de 1908 por engenheiros da Comissão
Geográfica e Geológica, “ atendendo- ao futuro que se acha reserva
do a esta bela povoação do Estado , devido à natureza e fertilidade
das terras , à ondulação suave do terreno e bem assim à magnífica
rede hidrográfica " ( 6 )
Região bastante conhecida pelo explendor de suas florestas
virgens, pelo deslumbramento do cenário e a riqueza do subsolo ,
pode ser dividida em duas partes : alta e baixa .
A primeira compreende os municípios de Apiaí , Ribeira'e
Iporanga, onde se encontram minas de ouro, prata, chumbo, ga
lena , calcáreo, etc.
A segunda , fornada pelos municípios marítimos de Cananéia
e Iguape e os ribeirinhos de Jacupiranga e Xiririca .
A cidade de Jacupiranga, sede do município do mesmo nome,
encontra- se ao centro de um triângulo cujos vértices são forma
dos pelas cidades de Iguape, ao norte, Cananéia ao Sul e Xiririca
na parte central.
* * *

(6) Dr. João P. Cardoso Exploração da Zona do Ribeira do


Iguape e seus afluentes .
20 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

O território paulista, como diz o dr. Afonso A. de Freitas,


compreende três grandes vertentes, sendo uma para o Rio da Pra
ta ou do Rio Grande Paraná ; e duas para o Oceano Atlântico ,
ou do litoral e do Rio Parnaíba .
Da vertente do litoral é o Ribeira de Iguape, o rio mais im
portante .
Nasce em território do Paraná e penetra em São Paulo pela
depressão divisora das serras Agudos Grandes e Cavoca , no mu
nicípio de Apiaí: sua direção geral é de sudoeste para nordeste,
correndo ao longo da Serra do Mar , até encontrar o Rio Juquiá
em cujo leito se lança obrigado pelas ondulações da serra dos Ita
tins, que se levantam à sua frente , seguindo por ele, a rumo de
noroeste para sueste até as proximidades de Iguape , onde faz bo
cayuva , mandando um braço para nordeste até o oceano' e outro
( Valo Grande) para o sui até o Mar Pequeno : éste último que é
um canal artificial aberto, em meados dos século passado, afim
de facilitar as comunicações do exterior com a região banhada pelo
Ribeira, separou da terra firme o território da cidade de Iguape
e de seus arredores, convertendo - o em ilha ( 7 )
As cabeceiras do rio Ribeira são as dos rios Ribeirinha e As
sunguí: da reunião de ambos é que ele se forma, seguindo o seu
curso até o mar .
Interessante é o modo de expressar- se do dr . Afonso de Frei
tas, quando diz que o Ribeira vai até encontrar o rio Juquiá em
cujo leito se lança .
Essa opinião também é seguida por outros, que admitem este
último como sendo um rio à parte, sobre o qual se lança o Ribeira.
É assim que o brigadeiro Machado de Oliveira , descrevendo
o curso do Ribeira de Iguape, ao tratar do último trecho compreen
dido entre Xiririca e o Oceano, declara que do rio ETÁ para baixo ,
1
é seu curso do oeste para leste , proseguindo desse ponto
até á confluência do Juquiá, na direção de sudoeste para nor
deste .
Encorporados os rios Ribeira e Juquiá , cedendo aquele ao
impulso e volume dêste, constrange-se o Ribeira e conforma-se
com a direção que desde a Serra traz o Juquiá, e assim escoam
se ambos para o Oceano ...

Mais adiante, procurando elucidar o que acima transcrevemos,


acrescenta :
“ O Juquiá A especial menção que fazemos deste rio,
que é geralmente classificado entre os afluentes do Ribeira, ain
da quando razão haja para negar- lhe essa classificação, por
que , como fica dito, obriga aquele rio ( Ribeira ) ao ajuntar -se
(7) Dr. Afonso de Freitas Geografia do Estado de São Paulo, 1906 .
MEMÓRIA HISTÓRICA DG ACUPIRANGA 27

lhe, ou pelo seu volume de águas, ou por impulso da sua cor


rente , atende -lo para o mesmo ponto amoldando -o ao seu cur
so, e levando-o aó Occano 110 próprio que traz o Juquiá desde
suas origens " ... ( 8 )

“ A parte alta do rio Ribeira é a região cia mineração e das


curiosas grutas calcáreas, principalmente nos arredores de Iporanga.
Depois de receber o Juquiá , o volume das águas como que
duplica e é onde o Ribeira é mais encantador (9 )
O seu curso em território paulista é calculado em cerca de
400 quilômetros , dos quais 150 navegáveis .
São seus principais afluentes pela margem esquerda: Itapira
puā, cujo curso coincide com a linha divisória entre São Paulo e
Paraná ; Claro, Calas Altas, Criminosas, Palmital, Taquari, Ipo
ranga, Jupuvura, Taquamvira, Tijuco, Turvo , Umbahú, Andaiatú ,
Pedro Cubas , Quitoca , Cubatão, Moçambique, Xiririca . Braço,
Coveiro, Etá, Poroupava, Una e Juquiá .
Pela margem direita : Água Grande, Ribeirão Grande, Taru
peva, Anhanguara, Batatal, Jaguari, Pedras, Pardo , Aboboral,
Arrelá, Carapiranga, Jataituba, Momuna, Pariquera -Assú, Piran
ga e JACUPIRANGA , além de outros.

RIO JACUPIRANGA

Deixando de parte o Rio Ribeira e todos os demais afluentes,


passamos a tratar do Rio Jacupiranga , único que nos interessa
como introdução à história do município do mesmo nome.
Uma das mais antigas descrições a respeito deste rio é a que
nos dá o chefe de Divisão, Paulo de Andrade, no tombamento
realizado em Iguape no ano de 1828 , o qual, depois de referir -se
ao rio Pariquera -Assú, diz :

, “ seguindo o rio da Ribeira mais duas mil braças, do mes


mo lado do Sul deita ( o Ribeira ) o 6.º Ramo, o qual se chama
Jacupiranga ; éste longo rio, segue a direção sudoeste, por es
paço de dia e meio de viagem de Canoa , que então se desman
cha em dois : ao que se me dirigie para o Sul e segue até as
vertentes dos morros da Cananéia é chamado Guaraú e outro
vai ao Noroeste, té próximo a Xiririca " ... ( 10 )

(9) Dr. João Pedro Cardoso Exploração do Rio Ribeira de


Iguape ( 1906 )
( 10 ) Paulo Freire de Andrade - Arquivo do Estado " Descrição
da Ribeira e dos seus ramos, té ao Juquiá com relação dos
possuidores do terreno das suas margens " ... 1828 .
(8) Machado de Oliveira Geografia da Província de São Paulo
1862.
28 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Azevedo Marques, referindo -se ao mesmo rio diz ser o seu


curso de " mais de 40 léguas ou 222,2 kil . E' formado pelos rios
Jacupiranga de Cina e Guaraú , tendo uma largura de 8 até 10
braças ou 22,m 2 .
Tem sua origem na Serra Geral, que por aquele lado borda
o muinicípio de Curitiba ” .

E acrescenta :

“ A existência de minas auriferas em quase toda a sua mar


gem, antigamente exploradas com sucesso, deveu a vila de Igua
pe a criação de uma casa de fundição, que trabalhou por al
guns anos como consta de documentos antigos ainda existen
tes ” ... ( 11 )

Da confluencia dos rios Jacupiranguinha ou Jacu piranga de


Cima e Guaraú , nasce o rio Jacupiranga , que depois de um curso
de mais de duzentos quilômetros, 70 dos quais navegáveis , lança
as suas águas no Ribeira de Iguape, pouco acima da barra do rio
Pariquera - Assú .
Possue três afluentes na margem direita, dos quais , o Canha,
que é o mais importante, foi estudado em 2 quil . pelos engenheiros
da Comissão Geográfica e Geológica do Estado .
Segundo o brigadeiro Machado de Oliveira , os seus afluentes
são : Bananal, Guaraú , Pindaiva , Salgado ( 12 ) Canha, Gracuí,
Manuel Gomes, Areia Preta, Mandii, Turvo, Padre André, Ca
pinzal, Quilombo e o ribeirão do Ascite.
O rio Guaraú foi estudado em 13 quil . do seu curso pelos
engenheiros da Comissão Geográfica e Geológica, e o Jacu piran
guinha em 26 quilômetros.
Tem este rio 5 Ilhas .
() rio Jacu piranga , importante pela extensão navegável que
oferece até a cidade a que deu o nome, possue 10 illas, tendo sido
estudado pela comissão já referida, em um percurso de 119 qui
lômetros.

PRIMORDIOS DA POVOAÇÃO

O municipio de Jacupiranga foi criado em território de Igua


pe , tendo sua origem remota nos fins do século XVIII , quando
alguns dos habitantes da antiga Vila de Nossa Senhora das Neves ,
mais tarde, do Senhor Bom Jesus de Iguape, subindo o rio Ribeira
( 11 ) M. F. de Azevedo Marques . Apontamentos históricos da
Prov . de São Paulo , pág . 6 , vol . 11 .
( 12 ) Deve ser o ribeirão do Soldado , não Salgado .
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 29

e enveredando pelos seus afluentes, trataram de examinar e conhe


cer o rio Jacupiranga, navegando-o em grande extensão, tendo
oportunidade de descobrir em suas margens pequenos veios de ourc ,
que passaram a ser explorados.
Esse fato, tornado público , naturalmente concorreu para que
novos aventureiros resolvessem transferir - se para ali , avolumando
se dessa maneira o número de habitantes que passaram a povoar
aquelas paragens , até então muito desconhecidas.
Da insignificância do ouro no rio Jacupiranga, encontramos,
entre outras, a referência feita por Martim Francisco Ribeiro de
Andrade, que descrevendo sua viagem pelo Ribeira acima, diz :

" A esta ribeira vem ter diversos ribeirões e rios como o


Pariqueraçú ( 13 ) Pariguemirim e Jacajeiranga ( sic ) á esquerda
e o Juquiá, onde vou trabalhar, despresando os outros por
menos nomeados em ouro " . ( 13 )

Como vimos , Azevedo Marques, alude à descoberta de ouro no


rio Jacupiranga, dizendo ter sido ésse o motivo da criação da casa
da fundição de Iguape, o que não é verdade, porquanto à luz dos
documentos históricos , claramente se vê que o Jacupiranga era
ainda inexplorado e quase totalmente desconhecido, quando a refe
rida casa já existia , pela necessidade da fundição do ouro proceden
te de Xiririca, Apiaí , Iporanga e Paranapanema , o que forçou o
governo a estabelecer o Registro, junto ao rio Ribeira, entre as
barras dos rios Jacupiranga e Juquiá, para a cobrança do quinto .
As primeiras habitações às margens solitárias do rio Jacupi
ranga , apareceram , como dissemos , nos últimos anos do século
XVIII e sòmente nos princípios do século XIX outras pessoas pro
curaram estabelecer -se nesse ponto da região sul paulista .
Ao contrário do que geralmente acontecia com as demais po
voações, que se formavam em terras possuídas por carta de Sesma
ria , constituindo assim como que o ponto de partida para as futu
ras vilas, a Freguesia de Botujurú teve o seu início em terras de
volutas , das quais se apossaram os primeiros povoadores .
No território hoje compreendido pelo município de Jacupiran-
ga , antes Botujurú, não houve portanto sesmaria alguma.
E tanto asim , que a 29 de dezembro de 1842 , a Câmara Muni
cipal da Vila de Iguape, remetendo ao Governo Provincial a “ Re
lação dos terrenos de Sesmarias contendo as especificações nela
declaracias, conforme as informações colhidas de pessoas antigas e
de notória probidade , de quem as houverão alguns esclarecimen
tos, ” --- na referida Relação , que especifica todos os rios do Muni
cípio, ao tratar do rio Jacupiranga diz :
( 13 ) Martim Francisco Diário de uma viagem mineralógica
1806 .
30 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL
1

“ Este rio desde a Barra até as cabeceiras que tem acha-se


povoado já por antigos moradores e já por modernos com ba
se, estabelecimento de Engenhos e pastos de gados e todos em
terras sem títulos, isto é, de Sesmarias , porém sómente como
colonos, cujas posses alguns já tem passado a terceiros possui
dores por compras e herança " . ( 14 )

Essa declaração vem assinada pelos membros da referida câ


mara de Iguape , José Xavier de Almeida Cruz, Luiz Álvares da
Silva , João Mâncio da Silva Franco , Francisco Carneiro da Silva
Braga Junior e Joaquim Manuel Junqueira e Castro .
Por aí se vê que tôdas as terras de Jacupiranga foram invadi
das por intrusos, que mais tarde legalizaram suas posses.
Assim , temos que os primeiros habitantes, sem títulos de posse ,
foram se estabelecendo nos pontos mais convenientes, assenhorean
do - se da terra que começaram a cultivar desde as margens do rio.
Simples posseiros, portanto , que no momento da invasão te
riam com sua presença afugentado os aborígenes, que habitavam
a parte central, onde se encontrava o lugar chamado Botujurii.

BOTUJURÚ
!
A povoação de Botujurú conservou esse nome até o ano de
1870 , quando passou a denominar-se Jacupiranga , por estar situada
à margem do rio do mesmo nome .
A anterior denominação é de origem tupi , provindo da confi
guração do terreno , pois que os índios costumavam batisar os lu
gares tendo em atenção os elementos naturais .
E porque passasse o sítio a assim chamar -se, o mesmo nome
foi estendido a um pequeno morro existente nesse ponto .
Botujurú , como nome de lugar , segundo a lição dos mestres,
é corruptela de Ibitu - jurú, de Ibitu , o vento, o ar, o clima , a núvem .
É vocábulo composto de ibi, terra e de tu golpe, impulso, queda .
Diz Teodoro Sampaio que a principio se pronunciava alterado
em Ibitú , Ibutí ou ubutu e ainda botu ou votú ; Jurú- boca, ( pes
coço, colo ) .
Botujurú, quer dizer bóca do vento , isto é depressão do ter
reno, garganta nas montanhas ou entre morros , por onde se enca
minha o vento .
E' equivalente ao que se denomina -bocâina . ( 15 )
( 14 ) Arquivo do Estado Tombamento de 1842 mario
út omsra da Vila de igu nd .
( 15 ) Dr. Teodoro Sampaio . O tupi na geografia nacional .
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 31

Entendem alguns que semelhante boqueirão , venha a ser for


inado pelo vale existente entre as serras do Guaraú e Itapitanguí,
por onde penetram os ventos do sul .
Entretanto, não é possível que os indígenas tivessem dado tal
nome ao local pela depressão do referido vale, que fica muito dis
tante, e sim pela abertura entre morros e mamotes existentes ao
redor da antiga povoação .
Não resta a menor dúvida ter sido o povoado em seus prin
cípios algum aldeamento de indios, não só pela origem do vocábu
lo como também pela presença de Sambaquis - embora um pouco
afastados – eentre os rios Pariquera-Assú e Jacupiranga, fato éste
que prova a existência de antigos habitantes nas suas imediações.
Quanto à denominação , é antiquíssima. E como tal era conhe
cida a mesma paragem , tanto assim que por decreto de 12 de
outubro de 1868 eram nomeados subdelegado e suplentes, para
o Bairro de Botujurú, nome com que ainda por muitos anos foi
conhecida a vila de Jacupiranga .
Tanto é verdade o que vimos de afirmar, que ainda depois de
sua elevação à categoria de Freguesia com a denominação de -- Ja
cupiranga, - a Câmara Municipal de Iguape dirigia ao dr . Antó
nio Cândido da Rocha , presidente da Província, o seguinte ofício :

* Illmo , Exmo . Snr .


Havendo sido criada a Freguezia de Botujurú e forman
do ella o 3.0 districto deste municipio , tendo sido outrosim no
meado sub-delegado de Policia para ali , exige e boa ademinis
tração de justiça : hajão juizes de Paz e por isso esta Camara
vem solicitar de V. Exa, se digne ordenar se proceda á compe
tente eleição, designando o dia em que ella deve ter lugar.

Sala da Camara Municipal de Iguape, 22 de Julho de 1870.


Deos Guarde a V. Exa .

Diogo Rodrigues de Moraes


João Carlos da Silva Carneiro
José Antonio Peniche
Joaquim Eduardo da Silva
João Ferreira d'Aquino e Silva
João Baptista de Castro e Souza
Florido Lopes Trigo " .

Como se vê , era a própria Câmara , que não se habituara ainda


com a nova denominação , motivo pelo qual foi a petição indeferida,
<le acordo com o parecer seguinte :

" Não consta na Secção ( 2.a ) que o Bairro de Botujurú


( 16 ) fosse elevado á fregrezia . Neste bairro, depois de nomea.
dos ub -delegado e suplcntes, ..', 2.0 e 3.' a 2 de 10 br.' de
de 1868, sustou - se á ! 9 a expedição dos respectivos Titulos, até
32 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

a fixação de divisas, que tambem não vierão á Secção.


No corre. ano creou- se no municipio d'Iguape uma fregue
sia a do Jacupiranga Lei n.° 56 .
Seria equivoco da Camara ?
Em todo o caso convem q'ella informe positivamente se se tra-'
ta desta ou d'aquella e neste último caso citará a Lei.
Se, finalmente, só pretende as nomeações policiais, pro
ponha as divisas para a sub -delegacia . Barbosa ” .

O equivoco da Câmara, ao qual se refere o parecer supra, foi


extensivo ao próprio consultor . Em Iguape, era natural o uso do
nome Botujurú – à nascente Freguesia de Jacupiranga .
O que houve foi a má redação dada ao projeto transformado
em lei , dizendo em seu artigo 1º.:

" Fica elevado à categoria de Freguesia o Bairro


do Jacupiranga , no Municipio de Iguape ” .

Ora, não existindo bairro algum com esse nome e sim de


Botujurú , - outra devia ser a redação do referido projeto, que,
elevando - o à Freguesia , ao mesmo tempo mudasse a denominação
para Jacupiranga

PRIMEIROS POVOADORES

Povoado o rio Ribeira em grande extensão de seu curso e


fundado o Registro, que fica situado alguns quilômetros acima
da barra do Jacupiranga, e ultimamente elevado à categoria de
municipio, novos povoadores se aventuraram a subir por este ,
estabelecendo - se em suas margens.
Se examinarmos os primeiros mapas da população, veremos
que tal povoamento começou da barra para o interior, numa in
vasão mansa e pacífica , não só pelo mesmo rio acima, como tam
bém estendendo - se por seus afluentes principais .
E à medida que os invasores se aproximavain da parte cen
tral, afastavam - se os naturais do país, que habitavam a região
do Botujurú, junto à barra do rio do Canha, afluente do Jacu
piranga .
No ano de 1805 apenas doze fogos existiam em todo o rio .
Jacupiranga a começar da barra, como é fácil de ver- se pelo res
pectivo mapa que abaixo transcrevemos, não passando de 63 in
divíduos o número de seus habitantes .

O grito é nosso .
Jacupiranga
de
parcial
Vista
|
1
MEMORIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 33

RIO JACUPIRANGA

1806

Nomes Idade Naturalidade Côr

Joaquim Domingues 43 anos Iguape preta


66 G
Maria Euphrazia 38 Paranapanema
Filhos :
Ana .. 11 Paranapanema
Inácia 9 Paranapanema
7 66
Rita Paranapanema
Luiza 4 Paranapanema
Luiza 2 Paranapanema

Antônio Ribeiro 83 Paranapanema


Ana Pereira 33 Iguape preta
Filhos : 66
Caetano 6 Iguape 46
Inácia 17 Iguape
66
Maria 9 Iguape

Maria Magdalena, viuva 44 S. Vicente branca


de João Soares .
Filhos :
66 66
Vicente 17 S. Vicente
66
Vitor 15 S. Vicente
Francisco 10 S. Vicente 06
Gordiano 8 S. Vicente
64 16
Ana 19 S. Vicente
66
Gertrudes 16 S. Vicente
Isabel 11 66
46 S. Vicente 63
Bento 24 S. Vicente

Manuel Gomes . 49 Iguape branca


Escolástica Maria 38 Iguape preta
Filhos :
Francisco 18 Iguape
Escolástica 17 Iguape
José 10 Iguape
4 6%
Isabel Iguape
46
Mariana 21 Iguape
Ana 18 Iguape
66 66
Antônio Pedroso 47 Iguape
Maria da Cunha 49 Iguape
Filhos :
66
Severino 3 Iguape
Francisco 7 Iguape
Isabel 8 Iguape
Ana .. 5 Iguape
11 66
Barbara Iguape
34 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Nomes Idade Naturalidade Cor

João José da Luz 34 anos Iguape branca


Catharina Gertrudes 31 Iguape
Filha :
Sizila 10 Iguape

André Pereira 33 Iguape branca


Antônia Ribeira 31 Iguape
Filha :
Inacina 4 Iguape

João Gomes, soldado miliciano . 49 Iguape


Albana Maria 33 Iguape
Filhos :
Francisco 7 Iguape
4 66 Iguape
Maria
Ana . 7 Iguape

Tomazia Maria, viura 40 Iguape


Filhos :
Domingos 18 Iguape
Maria 16 Iguape 66
Agostinha 9 Iguape

Manuel da Cunha . 57 Iguape


Dina Francisca 55 Iguape
Filhos : 66
Daniel Iguape
Gregório Iguape
Apolinário Iguape
Pedro Iguape
Januária Iguape

29 66
José da Cunha Iguape
Gertrudes da Cunha 22 Iguape
Filha :
Inácia 2 Iguape
66 65
Francisco Domingues 35 Iguape
Escolástica 37 Iguape

De então por dianie , novos elementos afluíram por essa re


gião, apossando- se cada um deles da gleba de terra que melhor the
parecia .
No ano de 1817 , existiam nada menos de 37 fogos espalhados
pelas suas margens, sendo seus últimos moradores : Francisco Go
mes, Vitor Mariano de Araujo e João Domingues Ribeiro .
Nas suas declarações, para o tombamento desse ano , dizia o
primeiro possuir “ 100 braças de testada com 100 de fundos, uni
camente por posse " .
MEMORIA HISTORICA DE JACUPIRANGA 35

Visinhava então com Vitor Mariano , que também possuia 100


braças de frente por meia légua de fundos, confinando por sua vez
com João Domingues, que se havia apossado de 400 braças de frente
e outras tantas da frente aos fundos .
Nessa época , era este o último morador do Rio Jacupiranga .
As terras de que havia se apossado Francisco Gomes, fica
vam ao longo do Jacupiranga .
Era o lugar chamado Botujurú . onde veio a ser edifi
cado a Freguesia .
Não deixa de ser interessante a relação dos “ posseiros" nesse
local, no referido ano de 1817 , relação digna de fé pela fonte de
onde procedia, como trabalho oficial.
Era o tombamento feito pelas autoridades da Vila de Iguape,
que com tanto cuidado assinalavam as propriedades em seguimen
to umas às outras , especificando a extensão de cada uma delas .
Assim , da barra para dentro , apareciam os fogos pela ordem
seguinte :

1817

1 - Rafael Morato rezidente nesta Va. possue -200 -braças de testa . neste
Rio com 50 de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva, Confta. com
2 Manoel Navaes rezide. nesta Va. possue 200-braças de testa. com
50-de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Confta .
com

3 Vicente d'Aro. rezide. nesta Va. possue no Estirão 50 -braças de testa.


com 100 -de fundo hunicamte. por posse e as cultiva com sua fama.
4 Joaqm. Mora. rezide, nesta Va. possue 50-braças de testa. com 100 -de
fundo hunicamte: por posse, e as cultiva com sua fama. Confta. com
5 Bento João rezide. nesta Va. possue 50 -braças de testa. com 100 - de
fundo hunicamte . por posse, e as cultiva com sua fama. Confta . coin
6 Maria Euírazia Viuva rezide. nesta Va. possue 200 -braças de testa.
com meia legoa de fundo pr. compra 4. por Escriptura fes seo fale
cido marido ao Capm . Joaqm . Pera. do Canto , e as cultiva com fa.
milia. Conſta. com um terreno desocupado pr. mto , alagado, e terá
1 legoa de testa. 110 fim do qal. se acha.
7 Salvor. da Silva rezide, nesta Va. possue 50 -braças de testa . com 100
de fundo hunicainte . por posse, e as cultiva com sua fama. Confta. com
8 - Pedro Alz ' rezide. nesta Va. possue 100 - braças de testa. com 100-de
fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Confta . com
9 -- Joaqm . Gomes rezide. nesta Va. possue 100 -braças de testa. com 100-de
fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Confronta com
10 Manoel Gomes rezide. nesta Va. possue 100 -braças de tesia. com 100
de fundo hunicainte. por posse, e as cultiva com sua fama. Conita . com
36 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

11 - José Ribro, rezide. nesta Va. possue 150 - braças de testa. com 100 -de
fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Confta. com
12 Anto. Pedrozo rezide. nesta Va . possue 50 -braças de testa . com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama.
Confta . com
13 Severino Gomes rezide. nesta Va. possue 50-braças de testada com
meia legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama.
Confta . com
14 Franco. Domingues rezide, nesta Va. possue 50-braças de testa . com
meia legoa de fundo, hunicante. por posse, e as cultiva com sua fama.
Confta . com
15 José Domingues rezide, nesta Va. possue 50 - braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte . por posse, e as cultiva com sua fama . Con
fta. com

16 Albina Maia viuva rezide. nesta Va . possue 50 -braças de testa. com


meia legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama .
Confta . com

17 Daniel da Cunha rezide. nesta Va. possue 60-braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta . com

18 Ingço . Mora . rezide. nesta Va. possue 100-braças de testa , com meia 1
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta. com

19 – João José de Carvo . rezide, nesta Va. possue meia legoa de testa , com
meia da . de fundo por compra q' fes aos primos. cultivadores, e par
te dellas a José Joaqm. d'Asumpção, e as cultiva com Escros. Confta .
com
20 José da Cunha rezide . nesta Va . possue 30 -braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte . pr. posse, e as cultiva com sua fama. Con
ita. com
21 Anto . Ribro , rezide. nesta Va . possue no Quilombo 100-de testa. com
meia legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama.
Confta . com
22 Anto . Domingues rezide . nesta Va . possue na Praia redonda 150-bra
ças de testada com meia legoa de fundo, hunicamte. por posse,, e as
cultiva com sua fama . Confta . com
23 Pedro Franco. rezide. nesta Va. possue 100 -braças de testa. com meia
legoa de fundo, hunicanite. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta. com
24 Anto. Felizardo rezide. nesta Va. possue 200 -braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta . com
25 Anto. Carriel rezide nesta Va . possue 100-braças de testa . com meia
legoa de fundo hunicante . por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta , com

1
MEMORIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 37

26 Anto. Gomes rezide. nesta Va. possue 100 -braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta. com
-

27 Bento de Souza rezide. nesta Va. possue 100 -braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta. com
28 Sebastião da Sa. rezide. nesta Va. possue 50 -braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
1

fta. com
29 - João da Sa. rezide . nesta Va. , possue 100 -braças de testa . com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta. com um hum terreno devoluto de 2 legoas de testa. sem morador
por pantanosas e sugeitas as correntes deste Rio, no fim do qal. se acha.
30 João da Guarda rezide, nesta Va. possue-200 -braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta. com
31 Anto. d'Olivra . Sza . rezide, nesta Va. possue 600-braças de testa. com
meia legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com 6 Escros.
Confta , com

32 Anto . Pinto d'Almda . rezide. nesta Va. possue 500 -braças de testa. com
meia legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com 9 Escros.
Confta . com
33 Chrispim de Pontes, rezide. nesta Va. possue 150 de testa. com 100
1

fundo hunicamte. por posse , e as cultiva com sua fama. Confta. com
34 Franco. Luis do Canto rezide, nesta Va. possue 100 -braças de testa .
com 100 de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama.
Confta . com
35 Franco . Gomes rezide . nesta Va. possue 100 -braças de testa. com 100
de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Confta. com
36 Victor Mariano rezide, nesta Va. possue 100 -braças de testa. com meia
legoa de fundo hunicamte. por posse, e as cultiva com sua fama. Con
fta . com
37 - João Domes . Ribro . rezide , nesta Va. possue 400 -braças de testa , com
400 do outro lado do Rio com meia legoa de fundo hunicamte. por
posse e as cultiva com sua familia .

Como se vê , eram simples “ sitiantes ”, que viviam isolada


mente ao longo das margens de Jacupiranga, do Guaraú, do Canha
do Pindauva, para o Sul, ou que se espalhavam pelo ramo do
norte, infiltrando - se pelo Jacupiranguinha acima e seus afluentes.
Até então , não havia povoado algum .
A maior parte do território estava ainda por colonizar, mo
tivo pelo qual novos indivíduos procuraram estabelecer- se nos pon
tos desocupados .
38 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Apenas existiam simples caminhos que da vila de Cananéia se


dirigiam para Iporanga, passando pela Freguesia de Xiririca atra
vessando o Guaraú , na região de Botujurú .
Daí a razão da procedência dos invasores, que tanto da vila
de Iguape como da de Cananéia, buscavam a zona banhada pelo
Jacupiranga e seus afluentes, aqueles subindo pelo Ribeira, estes,
caminhando pela estrada de Iporanga .
No ano de 1827, elevava - se para 54 o número de fogos, dos
quais 27 no lado do Norte ( Jacupiranguinha ) e 27 no do Sul.
Assim , em progressão crescente, ia aumentando o número de
habitantes , desenvolvendo - se a agricultura e formando -se peque
ninas pastagens pelas margens antes solitárias do tortuoso Jacu
piranga e ao mesmo tempo tornando -se conhecido o nome de BO
TUJURÚ , dado ao morro e mais tarde ao primitivo povoado.
E de que eram , todos eles , os primeiros povoadores, que in
vadindo as terras da Provincia, das mesmas se apossavam , pro
va-o ainda uma vez o documento que se segue, conservado no maço
número 21 ( T. I . ) - 1823-1841, sala 10 , prateleira 3, do Arquivo do
Estado .

1827

Relação dos possuidores de terras do Rio Jacupiranga


LADO DO NORTE

Núme Quantos pos


Nomes dos possuidores ro de Por que títulos suidores têm
braças estão de posse
havido

Mel. Martins Novaes 500 por compra 3.° possuidor


Maria Eufrasia 750 por herança 2.° possuidor
Joaquim Moreira 80 q'elle se apossou 1.° possuidor
José da Silva . 120 como acima idem
José da Cunha 30 idem idem
Francisco da Cunha 40 idem idem
Caetano Ribeiro . 40
António Domingues e idem idem
Benedicto Moreira 200 trabalha no terreno 1. ° possuidor
João Lima . 250 como acima idem
António Felizardo 300 como acima idem
António Gomes 50 como acima idem
Frco. António Peniche 150 por compra 2.° possuidor
---

Bento Moreira mora em ter. do acima paga foro ao


decimo
João Pereira Martins . 150 por compra consta ser o
3.° possuidor
António Carriel 200 q'elle se apossou 1.° possuidor
João da Silva 500 como acima idem
João da Guarda 500 como acima idem
Maria idang i !
AIEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 39

Núme Quantos pos


Nomes dos possuidores ro de Por que títulos suidores têm
estão de posse
braças havido

Antó . Pinto de Almeida 700 idem idem


Antónia Maria . 90 idem idem
Bernardino Pereira 150 idem idem
Gregorio da Cunha 200 idem idem
Domingos José 100 idem idem
Antó. José de Souza 200 idem idem
Severino Gomes 200 idem idem
João Ribeiro 400 idem idem

RAMO DO SUL

Raphael Gomes 150 q'elie se apossou cultivados


1.° possuidor
José Gomes Garcia . 250 como acima cultivados
1.° possuidor
Joaquim Moreira 200 q'elle se apossou cultivados
1.º possuidor
Ignacio Moreira 200 como acima idem
Salvador da Silva . 60 como acima idem
Pedro Alves e mais 150 como acima idem
Manoel Gomes e mais 200 como acima idem
Vidal Dias . 100 q'elle se apossou 1.º possuidor
António Pedrozo 200 como acima 1.° possuidor
João Jacinto de Toledo 75 por compra 2.° possuidor
Francisco Domingues 150 q'elle se apossou 1.° possuidor
Daniel da Cunha 50 como acima idem
João José Simoens 300 por compra 2. ° possuidor
António Gomes 50 q'elle se apossou 1.° possuidor
Bento Moreira 200 como acima idem
João da Silva e mais três 500 como acima idem
Bento de Souza e
Ignacio de Souza 150 como acima idem
António Gomes 400 como acima idem
Francisco Gomes ( 17) 200 idem idem
Victo Mariano 200 idem idem
Vicente Ferreira 150 idem idem
Bento Domingues 100 idem idem
José Miguel ... 100 idem idem
João Domingues 100 idem idem
Antonio Felizardo 400 idem idem

Como se vê dêsse mapa , Francisco Gomes e Vitor Mariano


de Araujo , que antes eram os últimos moradores, cediam o lugar
a outros, que se estabeleceram para cima do ponto em que se
achavam .

( 17 ) Este último está na confluência dos rios Jacupiranga e Canha, pon


to onde foi fundada 2 Freesia .
40 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Dos mapas , do ano de 1824 constam os nomes dos membros


de suas famílias.
Vitor Mariano , que contava 38 anos de idade , era casado com
d . Prudência Maria e tinha então os seguintes filhos : Sebastião ,
de 10 anos ; Firmino, de 8 ; Anacleto, de 5 ; Maria , 3 e Catarina
de 8 meses apenas .
Francisco Gomes , de 36 anos, era casado com d . Ana Maria
de Araujo , de 39 anos , irmã de Vitor Mariano de cujo consórcio
existiam os filhos Timóteo, de 8 anos ; Pedro de 6 ; António, 3 ;
Custódia, 11 ; Vidalina , de 9 e Maria de 4 .
Nesse ano a população total do Rio Jacupiranga era de 280
almas .
Não conseguimos descobrir o motivo pelo qual do mapa de
1836 não consta mais o nome de Vitor Mariano de Araujo , quando
é certo que em 1838 ainda era senhor e possuidor da mesma pro
priedade, devendo residir em Jacupiranga .
Nessa época, surgindo uma questão de terras entre ele e seu
cunhado Francisco Gomes, por causa das divisas dos respectivos
sítios , compareciam ambos em juizo, tendo havido medição e de
marcação , resultando assinarem um termo de conciliação , que teve
lugar em Botujurú a 27 de Janeiro de 1838, com a presença do juiz
de paz da vila de Iguape, António José Peniche e do alcaide An
1 tónio Felizardo Lopes , servindo de pilotos para os competentes
rumos, João Ferreira França e Manuel José Gonçalves.
De acordo com o decreto de 25 de Junho de 1834, que man
dava criar Guardas Policiais, a Câmara de Iguape a 14 de Feve
reiro de 1835 enviava ao governo a relação dos indivíduos que de
viam servir o município, formando uma Divisão com 5 companhias,
sendo uma delas a de Jacupiranga, na qual figuravam os nomes
de Vitor Mariano e Francisco Gomes, como se vê da mesma :

RELAÇÃO

Manoel da Cunha José Gomes


Antonio da Cunha Venancio, f.° de Joaquim Gomes
Janoario, f.° de José Morato Bartholomeu , genro do dito
Manoel Alves, aggregado de Joa Bento de Souza
quim da Silva Joaquim Sant'Anna, aggregado de
João, f.° de Francisco Alves Brizida Muniz
Ricardo, f.° de Francisco Alves Manoel Lopes, aggregado de Anto
Leonel , f.° de Venancio da Silva nio Pinto
Jacinto , f.° de Antonio Carriel José Cubas
Manoei Ignacio José, f.° de Gertrudes Martins
Jezuino Morato Bernardino Pereira
Victal Dias Francisco Gomes
Antonio, Sobrº do dito Victor Mariano
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 41

Mariano Domingues Vicente Pereira


André Pereira Antonio de Souza
José Domingues Agostinho Antonio
Bento Domingues Salvador Nunes
Francisco de Souza Francisco, f.° de Ignacio Fernandes
José da Silva Francisco Dias
José Felizardo Gregorio da Cunha
Francisco Pedroso Francisco Collaço
Maximiano, fo. do dito Bento da Guarda
José de Souza Manoel Lourenço
Salvador Alves

Os mapas do ano de 1836 são os últimos que especificam não


só os nomes dos habitantes do Rio Jacupiranga, como também suas
idades , côres, estados, naturalidades, etc , e até mesmo os rendi
mentos de cada família .
Dêles , como já dissemos, não consta o nome de Vitor Mariano
de Araujo, que talvez por essa ocassião não mais residisse na loca
lidade ou estivesse ausente, retirando - se por causa da divergência
entre ele e Francisco Gomes, do que resultou a conciliação a que
já nos referimos .
A verdade é que nessa ocasião como se pode verificar , eram
visinhos dêste os indivíduos Pedro Francisco e José António Cubas,
parecendo que a propriedade de Vitor estava ocupada por este
último .
Francisco Gomes , ao contrário , continuava residindo no mes
mo sítio e ainda no ano de 1857 ( ? ) registrava uma propriedade
situada no mesmo rio, com a declaração de que era

“... senhor e possuidor de umas terras no rio Jacupiranga, fa


zendo divisa rio abaixo com terras de Joaquim de Freitas Cou
tinho e rio acima com as de José Vieira ” .

Apresenta- se então, pela primeira vês aliás , o nome de Freitas Cou


tinho, importante para a história da novel povoação como adiante
veremos .
Concluindo o presente capítulo apresentamos o mapa dos ha
bitantes da localidade durante o ano de 1836 , não só por se tratar
de um trabalho apreciável e digno de ser conhecido de todos, como
também porque por ele tornam-se conhecidos os nomes dos pri
meiros povoadores dessa região, que pela magestade de suas flores
tas virgens, fertilidade de suas terras e riqueza do seu sub - solo , está
fadada a ser em futuro muito próximo uma das mais importantes
do Estado de São Paulo .

Ei -lo :
42 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Primeiro Destricto de Juis de Paz


da Freguezia de Nossa Senhora das Heves do municipio
de Iguape Anno de 1836
Quartairlo n. 14 da barra de Jacupiranga the o barracão

elsestesse

8Luantidades
Capinzal. Tem de distancia maior do seu limite a estação

Saturalidade
do Juiz de Paz .

Oburvaçoes
isa
1

durahdade
marang
estabelea

hospita
Paugen
E& xpence
captivos

man
testado

po
bobol

de
das
Se es

Profissão

minto
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Shades

de

.
on
leores

NOMES
ga

i Taneisco Domingues 80P Cag Sitio 50 % Arroz 80 Sabe es .


Escolastica Maria 80
6
crever , e
ler , suito
pouco
2 Jacintho Fernande :22 B s.eraf se 100 $ 2001 Sabe ler
2
D188 e escrever
Maria Jacintha P
Francisco 140 Capo Air . 39
Antonio 30 N
Manoel 20
Fernando 20 15
40 N
Felicidade
3 Betonio Gomes de
96 P Caso t 30
Jozepha Dias ho
Joana Maria 20
L

Bento Moreira 45 B Ige Cas ? Bos 160


Antonia Ribeira 42
Jeremias loreira 16 N S9
Euzebio Moreira 15
Zeferino Moreira 1
Joan Moreira 10
Ignacia Ribeira 5 13
Jacintha Ribeira 22
Maria Ribeira 19
Anoa Ribeira
co

Victel Dias 42 P Caso M


Antonia Cubas 30
Antonio Dias 5
Maria Dias 3

Antonio Domingues Go ? Cas ! z 708 1100


Antonia Waria 50 B
Harlano Domingue 22 "
Innocencio Doming
gues 81
Anna Maria 18 1
Maria Antonia 7 "
Rita Haria 60
Jacintha Har10 ' 3 "
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA

Glauonile
dades

Proficão
Estado
Share
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NOVES

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It sito 306 arroz 25
Felicia da Cunha 26
Latildes Domin
gues 3
8 Bento de Souza 46 B Саво L
Francisca Maria 32
Francisco de Sau
15 Se
Apna de Souza 2

23
9 Maria da Silva 60B 1189 V L 20$
Belarmino Antonio12 S
10 Francisco datu
pha 30 B Case 50
Lina Ribeira 33
Francisco
Jodo
Belxior
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11 Ignacio Moreira 45 Caso L EC
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Anna Gomes 40
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44 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

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Antonio 7
22 Francisco Pedro - 34 B cas
Anna da Silva 30
João Filho 6
Agostinno 3
1888 2
Anna 8
Blaria
P

23 Joaquim Gomes 70 P Eg ! Case 100 $ 190


Escolastica va
ria 160
Venancio 120 S
Manoel 5
Dlaria 25 N
Francisca 9 H
Jacintha 5 n
Salvador da 3 : 1 170 P
24 va
Ignacia da Silvg'64 11Ig . Case
João Filho 28 S
Cathering-dilha 6
25 Hangel da silva 38 E cas
Gorajano -
Lauriana
Joaquina
MEMORIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA in

NOMBS

26 José Gomes 145 B 169 Cas


Josepha Alves 40

S
Bento -Filho 25
Bartholomeu 9
Antonio
Joaquim
Domingos H
Marie 18

brancisco Dominguea.
espetor
RETISTA DO ARQUIVOJEVICIPAL

PRIMEIRO DESTRICTO DO JUIZ DE PAX da Freguesia de Nossa Senhora das re


ves , do Yunicipio de Iguape - Anno de 1836
QUARTEIRÃO Nº 15 do rio JACUP RUANGA, principiando da barra do capinzal
rio assima the o ultimo morador .
Idem de distancia maior de seu limite a estação do Juiz de Paz - La
guas

NOMES

1 Antonio Pinto de Al Sabe. I


52
Deida 61 cusitio soos arroz 168001& Sep
s , escre
Jacintha Maria 51
Filhos
Hanoel 23 g
Raimundo 19
Fe iano 14 61
Antonio 10
Francisca 22 ta 18
Florentina 16 24
ESCRAVOS OS 34
Lauriano 12 Capt
Antonio 45 03
Lourenço 12
Hermenegildo
Luiz 2
Francisco
Victo 10
Antonio 35 11 Afrca
João 30
Matheus
José 25
Joaquin 26
José 30 18 10
violanta 30 3
ariana 22
Victoriana 35
Josepha 16
Felisberta
Magdalena 9
Apolonia 8
Benedicta 5
Justina 3 H
Engracia 32
Elaria 50 te
Joana 26

2 Baiduino Pereira 45 BБ Igo Cas ? 250 $ 300 $


Pascua Maria 36
Filhos
Joaquin
Antonio 2 16
Joana 28 S
Anne 26 3
requelina 17 !
ancisca 12 10
3 Cerdido francisco 31 S 1009 14 2009
scrava
N Cap 86 20
MEMORIA HISTÓRICA DE JACCPIRANGA 47

NOMES

Venancio Pereira Pas e


808 Ig . Casa sitio 2003 roz 350
Brigida 34
Filhos 10
Benedicta 31
Ignacia
Aona
Maria
Izabel
Joaquina
Agregados 39
Joaquina 20
Antonio 3
Escravos
Benedicta 35 1 Capte $9
Fermina 6

Mathias Roiz Mattos 42 B Ig Casº 400 $ 450


Anna Fernandes 21
Filhos
Antonio 3
Maria 5
Escravos
Lanoel 50 Capta Arr . 3
André ao
Victoriano 11 Ig
Domiciano 6
Josepha 5 13 N
Jacintba w
Margarida 3
Benedicta 2 3)
Ignacio Fernandes 60 B Caso L
Daria Pereira 50 3
Florinda - agg ! 7
Escravog
José 50 N Capte S9
52 N
Joaquim 16 03 00
Rita 1
Thomasia 9
Ignacia 31
Florentina 2
Roberto Pires 48 B Igy 100 $ 120
Filhos 11 14
Henrique 7
Pelinto
Theolinda 8
Antonio Rosa 50 P 503
Domingos -agge 18
Domingos Rois B 300 400
Anna Pedrosa 55
Escravos
João 38 Capte Air S
Antonio 20
Sebastido 12
Buiteria 15
Rosa H
Sebastiana
48 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

NONES

Joaquim Lemos 22 18 . Caso sos Po


Anna Maria 19
Daria - Pilna 4
Ignacio Pereira Pas- 26 B ige Case L Sitio 505
вое
Adelinde Maria 21
Sacrave
Rita N Capt .
3
Laria Koea Pontes 50B Ig ? So
Filhos 16
Joaquin
Rita 12
Delfina
Brigiduramiz 60 В v
so Sitio
con en
DOS francisco Augustb33 genho de
Aggr 08 bilar ar
Joaquim 20 P roz .
Jacintho 26
custodia 22
Vicente 25
Joaquina 18
Justina 3
Escra vos
Captio

Antonio 371 Capt . 18 . So


Ricardo 18 30
Benedicto 14 11
Caetano 12 10
Doneciano 10
sepião 3 M
Izaias 2
Anda 38 10
Pulicena 37
Gertrudes 32 11
Florida 20 30
Clarinda 15
Fabiana 14 18 11
13
Laura 11
Bf igenia
Josefa 34
João da Guarda 70 P
Romana Lartins 66 Caso Sitio 80 $ boo
Sebastiana -aggr . 30 S.
Bento José 45 P Ig V
Pedro Filho 14 so
Salvador 12
MEMORIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 49

::::
Ignacio de Souza 30 P Casº L Sitio 100 arros

303
Thereza de Jesus 28
João - Filho 1 01
Laria - . 7
Bezarina * 5 10
Izabel
brancisco Pereira de 28 P ig ! Casa
SO
Har ia Navais 23
Rita Filha 2

Antonio Alz ' Carriel 481 B Casº R


Anna Maria 41 18
Jacintho - Filho - 18 S'
José 5
Antonio 2 N
Francisco 17 00
Anna 2 10

pussnoel Eugenio P 18. C9 sitio 100 $ 2 oz 280


Josepha Fernandes 39 88
Bento- Pilho 7
Genoveva 6
Constancia al
Justina 2
Candida 1

José Jacintho B 18 .
Joana da Silva 35 6 $0
Izidoro 14
Sodo 10 10
0
Pelicio 7
Delfina 8
Blena 6 #0 10
soana 2 #1
Victoriana 1 10
Jezuina Gomes 40 Cass sos 80
Maria do Nas cinto 35
Gregorio Per Passos 35 cas 2003
Benedicta Roiz 30
boathilde . F12,2 9
Antonia 8 .
Leonora
:v ::::

Florentina 3
TanCiSCO DIAS
trisula
anoel Coitinha
Ilho 17
:
09

Bento 16 $
50 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Arbor
out

Raimundo - Filho
Antonio 5 11Ig
Benedicta 7
Magdalena 2
Ignacie tanga 70 Sitio 100 $ erro N
Agostinho -Filho 39
Francisco 24
unria 120 33
Maria Neta
Mariana 5
Senedicte Moreira 27 P Ig . 1000
Janna Luiza 25
José - Filho - 2
Clara 2
Francisca " 2
Salvador Nunes 35
Boaquina Felizard 32 11
Francisco Palho 9
Vergilio 7
Antonio
rhereza
jacintno
intonio 14
Antonaria
Kaxiano- Filho
Fidencio
Sebastido al
Constancia 6 H
Anna 2
Antonio Felizardo 79 silio 30 $ 100 Sabe
aria Luiza Zer e
escret
ver .
Pedro Francisco 74 10
Maria das Neves 61
Caetara - Filhs - 22 11 S
Joaquina 12 71
Anna 2. 44
Luiza 5 #1
Francisco Gomes 56 B 200
Janna Naria 56
Thimot1o . Filho 18 . N So
Pedro 13 11
Antonio - escravo 40 N Capt . 24
Ignacia 30
Laria 11 11
Anna . 20
Josepna
16

José óntonio Cubas 32 8045 000


Justina da Silva

1
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 51

Joke Tilho 11
Hanoel 01
Maria 11
Anna 14

Joaquin Pedroso de 39 CL sitio 2005 ‫ סינתם‬: 300


Moraes
Josepha de Leinos 37
Filhos
Jacintho 17 Se
Joana 9 14
Celestina 6
Maria
Clarinda 1
dogros
Bruncisco 13
Existella 6
José - escravo - 30 N Cepte 13

Francisco Antanes 28 р1 Do
Anna de fontes 27
Fortunata - Filha - 2
.

Benigna

Joaquim Vicente 25 P
Laria de Pontos 16
Paulina - Filha 3

Jos Jacome Rodri. 35P


gues
Maria Antonia 33
Salvador - Bilho . 15
bos

Manoel 13
JA?3:

Domingos Pereira 32
Maris Pereira 18
Serino- Filho 3
Joaquim 2
Escravo
José 6 10 Capt
Francisco Justo da 463 18 . Leitio 100 180
Luz
:2

preria Pedrosa 49 .
Albog H
João 19 Se
Dionisio 131
Floriano 20 -
Antonio 16
saria 17
slora 35
srancisca
52 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Ignacio Domos a012 CL sito 2003 2.80


veira .
pgnacia kodrigues 39
Filhos
Jodo 26 #1
José 12 1
Antonie Ć
rhomaz 6
Rosa
Esaria
Benienne
Leonora
Florentino
TOPOGRAFIA DO MUNICÍPIO

O território de Jacupiranga está compreendido entre os muni


cípios de Xiririca, Cananéia e Iguape, do qual foi desmembrado no
ano de 1927 , para tornar- se município autônomo , sendo limitado
entre os seus visinhos por elementos naturais em sua quase tota
lidade .
Embora a cidade esteja situada a noroeste de Cananéia, grande
parte do território do município estende-se para o sul , por detraz
desta cidade, formando a região do Faxinal.
Por determinação do governo provincial, no ano de 1856 pro
cederam - se a diversos levantamentos de territórios, para o conhe
cimento das terras devolutas existentes na Província .
Pelo brigadeiro J. J. Machado de Oliveira, foi então apresen
tado a 4 de Julho desse ano um minucioso relatório a respeito dos
estudos realizados , do qual extraimos apenas algumas referências
sobre a parte jacupiranguense.
Para o trabalho em apreço , diz ele ter- se valido das informa
ções coligidas do relatório apresentado ao presidente da Província
em fevereiro de 1855 pelo dr . Carlos Rath ; da “ Memória Estatís
tica do Município de Iguape . ” escrita pelo comendador José Ino
cêncio Alves Alvim e do “ Diário das explorações mineralógicas, "
pelo conselheiro Martim Francisco Ribeiro de Andrada, no ano
de 1805 .
A -pesar-disso, entretanto , somos obrigados a confessar que o
referido trabalho muito deixa a desejar pelas informações às vezes
inteiramente erradas , como se verifica na parte referente a Cana
néia , quando declara afirmativamente que a cidade “ é vistosamente
assentada sobre a fralda do morro do Subauma e contigua à mar
gem do Mar de Trapandé ” .
54 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Ora , o morro do Subauma fica no município de Iguape e a


baia de Trapandé entre as ilhas de Cananéia e do Cardoso , agu
mas léguas ao sul .
Diz ainda, que a ilha do Abrigo está na emboscadura da haia
de Trapandé, quando se encontra no Oceano , além de outras faltas
menos graves .
Assim também na parte que diz respeito ao município de Ja
cupiranga .
A -pesar - disso, entretanto, não deixa se ser interessante a in
formação sôbre este município, pela época em que foi escrita .
Assim , diz ele :

" O primeiro territorio que apresenta mais probabilidade


de devoluto e que por isso está nas condições de ser medido
e demarcado officialmente, hé o que principia na fóz do Jacu
piranga, que se lança no rio Ribeira de Iguape pela sua mar
gem direita, vai alem dos confins desta Provincia com a do
Paraná extrema na Bahia dos Pinheiros . ( 18 )
Este territorio acha - se comprehendido entre a margem
direita do Jacupiranga e a esquerda do mar-pequeno na parte
do municipio de Iguape, e na do de Cananéia entre o rio Ja
cupiranga de Cima que traz sua origem da Serra Negra e o
litoral .
Sua extensão de nordeste-sudoeste hé de oito legoas, pouco
mais ou menos, contadas do logar em que da parte d'aquelle
Municipio se reputão as terras devolutas, athé a linha divisoria
da Provincia, e sua largura de norte a sul varia entre tres e
uma legoa, conformando-se com o curso do Jacupiranga que
quando atravessa o paiz montanhoso lhe dá estreitamento em
alguns logares.
No recinto deste territorio estão encravadas a serra d'Ari.
raia, ( 19 ) partindo de Iguape, que é a maior, a mais alta e
com diversas ramificações em varios sentidos ; a do Botujurú,
que lhe occupa o centro e a das Cadeas, na sua extremidade
meridional .
Estas tres serras, embora com nomes diversos, não for
mão se não um unico systhema e sem solução de continuidades .
Do centro para sudoeste, o territorio se alarga mais de
norte para sul, ( 20) porém é ahi que mais se desenvolve a ser
ra do mar , aproximando -se do Oceano e lança braços em todos
os sentidos, cada um dos quaes com seu nome local . Neste
territorio tem os rios Paricoera-açú e mirim , que desembocão
no Ribeira pelo lado direito ; os rios Caraenhy, Canha, Guara
hy (Guarahú ) e Bananal, tributarios austraes do Jacupiran
ga ; o Ararapira e Juriú, ( Iririú ) que fazem barra no Oceano
por intemédio do escoante da bahia de Trapandé em Cananéia ;
e finalmente os rios das Minas, Itapitanguy, Carapuy ( ? ) e
Ariraia, que desembocão no mar-pequeno . Em todo o lado

( 18 ) E ' a região do Faxinal , a grande porção de terras devolutas, que


está situada a S. 0. do município de Cananéia .
( 19 ) Serra de Aririáia , no município de Cananéia, não Ariraia .
( 20 ) E ' a mesma região do pinheirais e erva mate, conhecia por Faxinal,
cuja extenção parece ser desconhecida até hoje.
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 55

esquerdo do Jacupiranga ha algumas porçoens isoladas de ter


ras que ainda não são possuidas ou estão desaproveitadas, prin
cipalmente desde o ponto que fica fronteiro á Xiririca athé
ás nascente d'aquelle rio ; mas essas terras tem sido despresa
das por sua qualidade de montanhozas e por isso não aradas
para a cultura , porque sobre esse lado do rio projectão imme
diatamente varias cordilheiras de morros destacadas da Serra
do Mar, que conicidem com as do systhema desenvolvido no
territorio acima descripto.
Nas adjacencias do rio Turvo, um dos affluentes septen
trionaes do Assunguy, que desemboca no Ribeira termina - sc
a região montanhosa que depende da serra do Mar. D'ahi
para todos os lados d'onde procedem as vertentes do rio, apla
na - se algum tanto o terreno ou pelo menos não é tão acciden
tado e cheio de asperezas como o que está em contacto com a
serra e esta provavel condição tem chamado alguns morado
res que se ocupão em cultival-o em ponto pequeno, apesar de
por sua nimia fertilidade compensal- os grandemente . ( 21 )

Como já dissemos, avançando de nordeste para sudoeste , por


detraz do município de Cananéia, estendem-se os vastos campos
do Faxinal , que vão às fronteiras do Estado do Paraná, campos
magníficos para a criação e ricos em pinheirais e erva-mate .
Através dos mesmos se presume terem transitado a bandeira
de Pero Lobo Pinheiro, ( 1531 ) e as diversas expedições que fo
ram ter ao Paraguai.
Era a vereda para Curitiba e para estrada do Potunā .
No ano de 1836 abriu-se por aí uma picada para o planalto
parananiano, trabalho esse iniciado em 1829 pelo Capitão Manuel
Roberto de Almeida, das Ordenanças da Freguesia de Xiririca e
Joaquim José da Silva Benfica, inspetor de estradas, da vila de
Cananéia, que conseguira chegar aos campos do Potunã .
Nessa época , não poucas foram as explorações feitas nessa
região , afim de localizar -se a estrada para Curitiba .
Em 1836 duas ou três entradas foram levadas a efeito por
determinação do Prefeito de Cananéia, de acordo com as informa
ções que lhe haviam sido prestadas pelo vereador Francisco An
tónio Pacheco, que residia nas imediações do Faxinal e conhecia
os campos .
No relatório apresentado à Câmara da Vila de Cananéia a 4
de Julho desse ano, afirmava o mesmo : o “ caminho para Jacupi
ranga mais de metade já está concluido, tendo mandado abrir um
picadão para Curitiba " .
Mais tarde , o inspetor de estradas Silva Benfica, encarregado
da Inspeção da estrada do Potunā, informava em seu relatório de
16 de Agosto de 1848 :

( 21 ) Arquivo do Estado, Maço 64 , sala 10, CAPITAL , Relatório das


Terras Públicas . 1856 .
56 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

“ Encarregado de expecionar o pique aberto do rio das Mi


nas a os Campos de Potunā já feito pelo Capm . Manoel Ro
berto de Almeida, e acompanhado do mesmo acontece que de
pois de ter subido o Morro de Assunguy, distante quatro le
guas do Rio das Minas, e vendo q ' o pique seria melhor e mais
curta a estrada seguindo a oeste, por me parecer muito ao
Sul o pique feito, consultei com o mesmo explorador Capm .
Roberto e sendo anuido, picouce de novamente, seguindo o ru
mo indicado ; e em vinte e nove dias concluia o pique claro
saindo na estrada do Potunā, no Rio Pardo, muito conforme
como se desejava, não encontrando obstaculo algum nem ha
difficuldades de se fazer boa estrada, a excepção de alguns pe
quenos mamotes ; a mesina serra de cadeados desviou-se fazen
do uma subida muito facil ; todo o terreno hé bom , sem an
tanos, unicamente dous rios que se passão a váo e alguns pe
quenos regatos contendo muitos bons campos de faxinaes para
grandes estabelecimentos de Lavoura e criação q' logo será po
voado tendo estrada feita e muito concorrerá pa. um progres
sivo aumento de ambos os Municipios de Cananéa e Coritiba ,
tendo - se observado contentamento geral em os poucos morado
res de Potunã qdo. lá chegamos e logo sedestinou hum afazer
situação na serra de Capivary q . dista hua legoa do Rio Par
do e 4 do Potunā .
No transito deste encontrou - se erva mate e quina e : 11
abundancia ; deste pique em muitos lugares observou o Capm .
Roberto q' tem inteligencia de mineração aver formatura de
ter oiro em quantidade de pagar o trabalho de minerar, cq '
ajudará muito a concorrer para o melhoramento e commercio
da dita estrada . Hé o quanto posso informar .
Cananéa, 16 de Agosto de 1842 .
Joaquim José da Silva Bemfica . ( 22 )

Essa região, eivada de “ guapearas ” como dizem outras pes


soas, foi descoberta por moradores de Cananéia, nos tempos colo
nias e a - pesar- das misteriosas riquezas ocultas no seu sub -solo ain
da hoje se encontra inteiramente despovoada e sem vias de comi
nicações .
Jacupiranga, não só pela topografia como fertilidade de suas
terras, pode ser considerado como um município privilegiado, den
tro da região sul- paulista .
Ainda com referência às mesmas, encontramos a “ Informa
ção ” prestada a 25 de Janeiro de 1862 pela Câmara Municipal de
Iguape, que diz :
“ O Rio do Jacupiranga e seus numerosos tributarios na
vegaveis por canoas em grandes extensões, banhão uma área
grandemente fertil , povoada por perto de 5.000 habitantes, em
sua maior parte, ou antes em sua quasi totalidade livres, d'alli
ha excellentes veredas para Cananéa e Xiririca e mui proxi
mamente consta terem uns exploradores descoberto uma outra
para Iporanga , que toca no primeiro ponto . ( 23 )

( 22 ) - Arquivo do Estado, Marco 76 ( T. I. )


( 23 ) Arquivo do Estado, Maço 152 ( T. I. ) 1860-1862
MEMORIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 57

TENTATIVA PARA A ELEVAÇÃO DO POVOADO


DE BOTUJURÚ À FREGUESIA

Young, o saudoso historiador iguapense, escrevendo sobre a


Freguesia de Jacupiranga, disse que a mesma " teve começo , se
gundo documentos, aliás pouco seguros, que pudemos compulsar,
no ano de 1864 ” .
Estudando os manuscritos recolhidos ao Arquivo do Estado ,
em um dêles encontramos algumas referências sobre o assunto,
declarando os moradores da localidade, que o lugar para a capela
e cemitério, havia sido benzido entre os anos de 1838 a 1843, tendo
o doador de um novo terreno para aumento do patrimônio, man
dado lavrar escritura do mesmo a 12 de Agosto de 1865 .
A Capela, porém . havia sido iniciada muitos anos antes .
Naturalmente E. G. Young valeu - se dia representação que à
Câmara de Iguape dirigiram os habitantes da localidade, em De
zembro de 1868, na qual diziam :

Cerca de 400 fogos e 3.000 almas o attestam , numero


que de dia em dia cresce á um modo espantoso, e os predios já
edificados neste lugar dão ao observador que aqui chega, um
admiravel testemunho do seu engrandecimento e prosperidade,
visto como no curto espaço de 3 annos e de sua creação ( tem
po em que se edificou a primeira casa ) , já conta o numero de
16 casas construidas com solidas taipas e edificadas com gos
to e apuro " .

Não resta a menor dúvida sobre o assunto , porquanto , se os


signatários dessa representação feita em 1868 ( e quase todos eles
antigos moradores do rio Jacupiranga ) afirmavam que a primeira
casa tinha sido construida apenas 3 anos antes, ninguém melhor
do que eles devia conhecer de visu o local destinado à vila , onde
sòmente existiam o cemitério e os alicerces da Capela .
O documento em apreço , é , pois, de alto valor histórico .
Mas , se a primeira casa tinha sido construida no ano de 1864
ou 65 , como enião desejavam os jacupiranguenses a elevação de
Botujurú à categoria de Freguesia no ano de 1858, quando, por
êsse documento, – ainda não existia casa alguma ?
E ' que naturalmente o abaixo- assignado referiu -se às novas
construções, no terreno doado para o patrimônio, ao redor da Ca
pela, que estava em conièço .
Nesse tempo já devia existir o povoado, composto embora de
palhoças e casas diversas espalhadas pelas redondezas, a começar
pela de Francisco Gomes, - construidas a vontade, fora de qual
quer arruamento ou obedecendo a um plano de urbanismo, pois
só assim se justifica o pedido da Câmara Municipal de Iguape.
58 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

O fato é que estando as margens do Jacupiranga e seus afluen


tes bastante povoadas e sendo regular o número de habitantes nas
imediações da barra do rio do Canha, os quais ha muitos anos já
dispunham de cemitério, cujo terreno havia sido doado por Fran
cisco Gomes e benzido pelo Vigário Joaquim Manuel Alves Car
neiro, dirigiu -se a Câmara de Iguape à Assemblea Legislativa Pro
víncial , solicitando a elevação do povoado á categoria de Freguesia,
representação essa que foi à mesma apresentada na sessão de 6 de
Fevereiro do ano de 1858 e imediatamente enviada às comissões
de Estatística e Constituição ( 24 ) .
Tomando na devida consideração o pedido da municipalidade
iguapense, foi elaborado o necessário projeto que devia ser conver
tido em lei e remetido ao Governo, em ofício sob n .° 51 , de 22 de
Março , solicitando as informações do estilo .
A 24 do mesmo mês oficiava o Presidente da Província ao
Vigário geral, dizendo :

“ Remetto a V. S. a inclusa copia do projecto creando


no municipio de Iguape a Freguezia de N. S. da Conceição
de Jacupiranga, para que sirva-se informar acerca dessa crea
ção, afim de se poder satisfazer a exigencia da Assembléa Le
gislativa Provincial feita em officio de 22 do corrente sob
n.° 51 .
Ds . ge . V. Sa. José Joaquim Fernandes Torres . ( 25 ) "

Por sua vez, solicitava o bispado ao Vigário da paróquia de


Iguape, padre Antonio Carneiro da Silva Braga, que informasse
das condições e estado da povoação que se pretendia elevar à Fre
guesia ou Capela Curada, afim de comunicar ao Governo .
Tais informações não se fizeram esperar, mandando-as o re
ferido vigário nos seguinte termos :

“ Illmo . e Exmo . Snr.


Respondendo ao Officio que com data de 30 de março do
corre. me foi expedido por V. Exa, cumpre -me informar que
no Rio Jacupiranga nem em lugar algum de seus affluentes
existe Cappela ou Templo algum .
Os moradores do rio Jacupiranga, que estão entre esta
Parochia, a quem pertecem , e a de Nossa Senhora da Guia
de Xiririca, em suas necessidades espirituais recorrem á
aquella e a esta Parochia . Hé quanto tenho a informar a
V. Exa . a quem Ds . Guarde .
Iguape, 7 de Abril de 1858 .
Illmo . Exmo. e Rmo Vigario Geral do Bispado .
O Vigro. Antonio Carneiro da Silva Braga . ( 26 ) "
( 24 ) Anaeis da Assembléia Provincial , 1858, pág . 572 .
( 25 ) Arquivo do Estado, Livro 912, fls. 38 v. de Registro de Oficios ao
Bispo, 1856-1868 .
( 26 ) Arquivo da Assembléia Provincial de São Paulo, “ Papeis Diver
sos " , - 1858, pasta Informações Diversas, doc . n. ° 9 .
MEMORIA HISTÒRICA DE JACI PIRANGA 59

Portanto , não existia em Jacupiranga nenhuma Capela ou


Templo , a- pesar-do que fora conseguido em uma subscrição que
para isso havia sido apresentada aos moradores, por Joaquim de
Moraes Freitas Coutinho e dos donativos oferecidos pelo povo da
região.
Baseado nas informações do Vigário de Iguape, informava o
vigário Geral, ao Presidente da Província no seguinte ofício :
“ Illmo . e Exmo . Snr .
Respondendo ao officio de V. Exa . de 24 do mez pas
sado, a que acompanhou por copia o projecto da Assembléa Le
gislativa Provincial, creando no Municipio de Iguape a Fregue
zia de Nossa Senhora da Conceição de Jacupiranga, sou a dizer
a V. Exa. que Sua Exa. Redma, não presta o seu assenso á crea
ção desta Parochia por quanto mostra-se pela resposta do res
pectivo vigro. da Vara, que no Jacupiranga não existe Igra .
ou Capelia, que possa ser elevada á Freguezia . O que tenho
a honra de communicar a V. Exa . para ser presente á As
sembléa Provincial .
Ds . ge . a V. Exa . São Paulo, 21 de Abril de 1858 .
Illmo . e Exmo Sr. Dr. Joaquim Fernandes Torres .
Anacleto José Ribro . Couto . (27) ” .

Juntando tais informações, por ordem do Presidente da Pro


vincia oficiava o dr . João Carlos da Silva Telles ao dr . Américo
Brasiliense, devolvendo o projeto em questão, dizendo :

Illmo. Snr .
Determina -se o Illmo . Snr. Conselhero . Presidente da
Prova . que remetta a V. Sa. para ser prezte . á Assemblea
Legislativa Proval . , em satisfação á exigencia constante do
Offo. que V. Sa. me dirigio em data de 22 de Março ultimo
sob n .° 51 , a inclusa informação prestada pelo Vigro . Geral
deste Bispado acerca do projecto da Assembléa, creando no mu
nicipio de Iguape a Freguezia de N. S. da Conceição de Ja
cupiranga .
Deus guarde a V. S. Secretaria do Governo de S. Pau
lo, 22 de Abril de 1858 .
Sr. Dr. Americo Brasiliense Almeida Mello ( 1.° Secre
tario da Assembléa Legislativa Provincial. )
João Carlos da Silva Telles ( 28 ) ”
* *

Com pareceres tão desfavoráveis, foi o projeto apresentado à


Assembléia na sessão do dia 24 de Abril e encaminhado a quein
havia solicitado as informações .... continuando Botujurú , como
simples bairro do municipio de Iguape, por falta de Igreja ou de
Capela Curada .

( 27 ) Arquivo da Assembléia Provincial ( Papeis Diversos ) , 1858 .


( 28 ) Arquivo do Estado, Livro 594, Minutas de Ofícios à Assembléia
Provincial , 1858-66, fls . 12 V.
60 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Estava frustadla, pois, a primeira tentativa para a elevação do


bairro á categoria de Freguesia . Não falecera , porém , a espe
rança dos que, como o coronel Mesquita , não mediam sacrificios
para tão nobre e elevado fim .

DECADÊNCIA E RESURGIMENTO

( ) insucesso dessa primeira tentativa levou o desânimo aos


habitantes de Botujuru, tão rudemente explorados por um dos seus
povoadores, que a título de beneficiar a localidade com modesto
templo , percorrera a região, apelando para os sentimentos religio
sos dos seus concidadãos, recolhendo donativos em dinheiro e mer .
cadorias , depois do que não só deixou de cumprir com o prometido ,
como procurou dificultar ainda mais, o desenvolvimento da nas
cente povoação .
Homem de recursos e possuidor de diversas propriedades em
vários pontos do rio Jacupiranga e seus afluentes, propriedades
conseguidas por preços insignificantes, Joaquim de Moraes
Freitas Coutinho, português de origem , tratou por todos os meios
de cercear o crescimento da povoação , depois de haver se apro
priado da propriedade em que se achava a mesma situada .
Com ameaças e perseguições, fácil se lhe tornava levantar dú
vidas sobre terras, uma vez que para isso dispunha de recursos
pecuniários.
Foi assim , que conseguindo adquirir o sítio de Francisco Go
mes, o qual havia feito doação do terreno para o cemitério e para
uma Capela , não só negou -se a cumprir aquela doação , como a
praticar atos de violência , mandando demolir as modestas habita
ções levantadas nesse ponto, opondo-se a que outros constrissem
suas casas no mesmo local , o que lhe valeu a alcunha de pirracento,
como sinónimo de briguento, demandista .
Daí a denominação transmitida ao lugar, que ficou sendo con
hecido por sítio da PIRRAÇA , com que passou à história .
A atitude violenta de Freitas Coutinho , fez com que ninguém
mais se atrevesse a construir nesse ponto, ficando a novel povoa
ção inteiramente abandonada , ou melhor, interrompida em seu
desenvolvimento .
Mais tarde, o coronel António de Souza Pinto Magalhães
Mesquita , proprietário em Iguape, passando a residir no bairro de
Botujurú, onde se dedicou ao comércio e lavoura em grande escala,
plantando café, arrós e cereais diversos, recomeçou a vida do po
voado, que encontrou no filho adotivo seu melhor protetor e
porque não dize-lo — seu verdadeiro fundador .
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA

A ele deve a cidade de Jacupiranga sua elevação à categoria


de Freguesia , tendo sido ele o seu mais decidido defensor. (29 )
Homem trabalhador, dotado de recursos e de inteligência, o
coronel Mesquita agindo desassombradamente, procurou opor -se
às injustificáveis pretenções do ambicioso Freitas Coutinho, fa
zendo com que a população de Botujurú recorresse ao poder pú
blico contra os atos de prepotência pelo mesmo praticados.
E numa exposição clara e sucinta , levada à Câmara Munici
pal de Iguape, pedia à mesina para que intercedesse perante o
governo Provincial , pois não era justo que continuassem as coisas
como estavam .
E acrescentava :

“ A Soberania dos povos tão sabiamente respeitada pelas


leis de sua organisação, deve e hade triumphar, ante a ceguci
ra e ambição descomunal de um só homem , que pretende oppor
obices para o desenvolvimento de uma povoação, que deverá um
dia e em breve tempo , ter um nome na relação das Povoações
dla Provincia " :

Essa representação, que foi assinada por grande número de


habitantes do referido bairro, foi encaminhada à Câmara Municipal
c transmitida por esta ao Presidente de Provincia, como veremos
no capítulo seguinte .
E ' um documento importante, que por seu valor histórico não
podemos deixar de transcrever na integra .
Somente dessa data em diante foi que resurgiu o povoado ,
pela atitude do coronel António Magalhães Mesquita, que por isso
nesmo merece o título de fundador e as homenagens dos filhos
de Jacupiranga .
Assim , já o afirmava Young, quando em 1899 escrevia :

“ A existencia da povoação, que teve o primitivo nome de


Botujurú, é resultado dos constantes esforços do Sr. Antonio
Pinto de Magalhães Mesquita, portuguez de origem , e actual
mente importante negociante e fazendeiro naquella freguezia
Foi, ao principio auxiliado nesse intuito pelo finado Joaquim de
Moraes Freitas Coutinho, portuguez de origem e então impor
tante fazendeiro da zona e proprietario dos terrenos onde está
assentada a povoação.
Este, porém , mais tarde, por motivo que escapou á nossa
investigação, tentou impedir a continuação do povoado, reque
rendo e conseguindo desapropriação judicial do terreno desti
nado ao Patrimonio da Freguezia . Essa acção foi contestada
na téla juridica pela Camara Municipal, que obteve sentença a
seu favor. (30) ”
( 29 ) O cel . Mesquita nasceu na Freguesia de São Gregório dos Sellores,
Portugal, aos 21 de março de 1834 e faleceu em Jacupiranga 110
dia 14 de agosto de 1912 .
( 30 ) Almanaque Iguapense, 1899, pág . 78 .
62 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Ao coronel Magalhães Mesquita , portanto , coube a glória


da ereção da povoação em Freguesia , que não deixou de ter os
seus precalços, como adiante veremos e não a quem como Freitas
Coutinho tudo fez para dificultar a sua criação.
Além do cel . Mesquita, não menos esforçado pelo desenvol
viniento da Freguesia , foram também os Capitães António Sant'
Anna e Manuel Pinto de Almeida, cujos nomes jamais foram es
quecidos pelos filhos de Jacupiranga .
Ao primeiro coube, como já vimos, a iniciativa de promover
desde logo o desenvolvimento da localidade.
Vindo de Portugal ainda moço , estabeleceu - se desde logo na
quele ponto da região , abrindo uma casa comercial e procurando
promover entre os moradores, o incremento da lavoura local.
Auxiliado por Hildebrando de Macedo, Joaquim de Moraes
Freitas Coutinho, Manuel Pinto de Almeida, Francisco de Lara
França e outros , construiu a primeira Capela sob a invocação de
N. S. de Botujurú, sendo a excelsa imagem doação de Hildebran
do Macedo .
Ainda ao coronel António Mesquita, deve o Município a cria
ção do então núcleo colonial de Pariquera-assú , para onde foram
encaminhados numerossos colonos europeus .
Durante 40 anos administrou ele a nóvel localidade, sendo
proverbial a grande honestidade com que soube haver-se e o ele
vado patriotismo dispensado em todos os seus atos pelo engrande
cimento do povoado, que a ele deveu sua elevação à categoria de
distrito de paz , no ano de 1870 ,

DATA DA FUNDAÇÃO

Um dos mais sérios problemas no estudo da história de uma


localidade é geralmente o de fixar - se a data de sua fundação .
Enquanto a Vila de São Vicente teve o privilégio de ser cria
ila por Martim Afonso de Souza a 22 de janeiro de 1532, por efei
to da Carta Régia de dl . João III , de 20 de novembro de 1530
quando ainda nada existia nesse local , as outras foram surgindo
aos poucos, formando -se lentamente, até que , chegando a certo
grau de desenvolvimento , puderam ser erectas ein Fregusias ou
Capelas, como se verificou com as die Cananéia , Iguape, São Se
bastião, Ubatuba, Santos, e tantas mais, que já existiam na data
de sua elevação a essas categorias .
Pode -se mesmo dizer, que S. Vicente foi um caso único,
pela necessidade de ser estabelecida a primeira feitoria nesta parte
do sul do Brasil, para centralização de um governo nas terras da
nascente Capitania .
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRINGA 63

Jacupiranga , por isso mesmo, teve início como simples sítio


formado na porção de terra de que se apossara o lavrador Fran
cisco Gomes, o primeiro que ai foi ter , quando quase desconhe
cida era a mesma região .
Estabeecendo - se outros , nas proximidades de sua casa, e en
tre eles seu cunhado Victor Mariano, pouco a pouco foi se forman
do o “ Povoado ” , que no ano de 1870 era elevado à categoria de
Freguesia , por força da lei n .° 56 de 5 de Abril do mesmo ano .
Mas , se, " oficialmente” , essa data vem sendo tomada como
a da fundação da localidade, “ históricamente " outra se-lo - á , uma
vez que muito antes disso já existia a povoação, que era conhecida
pelo nome de Botujuri .
Tratando da fundação de Ribeirão Preto , disse Plínio T. San
tos , numa série de interessantes artigos publicados em 1935 :

“ A rigor, pode -se considerar a fundação de Ribeirão Pre


to como tendo sido feita em 1863, data da escolha do local de
finitivo para a edificação da capella que serviu de primeira
Matriz
A não ser essa, qual a data que se deverá fixar ?
A da escolha do primeiro local, em 1862, abandonado em
seguida ? A do primeiro requerimento, em 1852, pedindo a
construcção da Capella ? A da inauguração da Capella ? ...
Ha quem julgue dever ser fixada como data da fundação
de uma cidade a de qualquer
2 acto de reconhecimento desta,
principalmente official.

E conclue :

... não se pode fixar como data da fundação de Ribeirão


Preto, a do primeiro acto do poder publico que a contemplou,
que seria a da creação da Freguezia em 1870, isto é, do baptis
mo do povoado . (31 )

Sõbre assunto idêntico, já se havia manisfestado o dr . Arthur


Pequeroby Whitaker, no trabalho " Jaboticabal no primeiro cente
nário de sua fundação ” .

“ Em se tratando da fundação da cidade não se pode tomar


como data inicial a do primeiro acto do poder publico que a
contempla, porque este desfaz, por sua propria natureza , a pre
tenção de quem quizesse attribuir -lhe a virtude de a ella haver
dado nascimento, eis que apparece, precisamente, para attestar
a sua existencia, embora na infancia. Quem baptiza não faz
senão reconhecer a preexistencia do neophito. ” ( 32 )

( 31 ) Plínio T. Santos Ribeirão Preto. “ Correio Paulistano" de 1 de


Janeiro de 1835 . 65
( 32 ) Pequeroby Whitaker “ Jaboticabal " no 1.º Centenário de sua
fundação, pág . 11-1928 .
64 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Adotando o mesmo critério , diremos que a data de 5 de abril


de 1870, nada mais representa do que a do batismo, do reconheci
mento oficial da povoação, que a esse tempo já existia .
Qual será , portanto , a data de sua fundação ?
E' o que passamos a estudar à luz dos documentos, procuran
do a verdade histórica .

Pelo recenseamento do ano de 1805 verifica - se que os últimos


moradores do rio Jacupiranga, nessa época, eram José da Cunha
e Francisco Domingues, os quais residiam muito aquem do ponto
onde mais tarde teve assento a povoação.
Portanto, nesse ano, ainda era inteiramente deshabitada essa
parte do mesmo rio, sabido como é , que os posseiros iam se colo
cando mais ou menos próximos uns dos outros e em seguimento
aos que por ali já se achavam estabelecidos .
Somente do ano de 1813 em diante foi que começaram a re
sidir perto da confluência do rio do Canha com o Jacupiranga, on
de se acha a cidade, os lavradores Francisco Gomes, seu cunhado
Vitor Mariano e João Domingues Ribeiro .
A representação dos moradores, dirigida à Câmara da Vila
de Iguape em 1868, declara haver Francisco Gomes feito doação,
em tempos remotos, do terreno necessário à edificação de uma Ca
pela e do Cemitério , para a futura localidade .
Mais tarde, porém , “ envolvendo -se em negócio em que se viu
em complicação com o referido Freitas Coutinho ", foi obrigado a
" vender -lhe a propriedade ”, do que resultou negar - se éste último
a considerar valiosa aquela doação, que consistia em um terreno
medindo “ 50 braças em quadra, já ha tempos remotos” , acrescido
de outro lote de 50X80 concedido pelo próprio Coutinho a titulo
de ampliar a área já doada .
A bênção do lugar destinado à Capela, diziam os reclamantes,
havia sido feita " de 25 a 30 anos ” , pelo padre Joaquim Manuel
Alves Carneiro " , portanto entre 1838 a 1843 .
Depois disso, Freitas Coutinho, o novo proprietário das terras ,
começou a obra da Capela , abandonando - a em seguida .
Protestando a população contra esse ato, mesmo porque 0
próprio Coutinho, percorrendo a região havia conseguido nume
rário suficiente para sua edificação, viu - se ele forçado pela popula
ção a resolver, o caso, o que o levou , a passar uma escritura de
doação, que teve lugar a 12 de agosto de 1865 ( 33 ) , concedendo
uma área de 50 braças de frente por 80 de fundos, para “ patrimô

( 33 ) · Livro de Notas do Tabelionato Público e Judicial, de Iguape, n.º


38, fls . 75 v . 1865.
Vista geral de Jacupiranga
1
!
1
MEMORIA HISTORICA DE JACUPIRANGA 65

nio da Capéla e isto mesmo com condições onerosíssimas, privando


os povos de fazerem ali as construções dos prédios que precisam ,
não podendo nem ao menos lenhar, por que a área, concedida se
achava tomada pela Capela e casas que imediatamente haviam sido
construidas " .
Em 1868 a população do rio Jacupiranga era calculada em
três mil almas distribuidas por 400 fogos.
E os prédios “ já edificados nesse lugar diziam , davam
ao observador um admirável testemunho do seu engrandecimento
c prosperidade, visto como no curto espaço de 3 anos de sua cria
ção, ( tempo em que se edificou a primeira casa ) já conta o núme
ro de 16 , construidas com sólidas taipas e edificadas com gosto e
apuro ” .
Assim o afirmavam os signatários dessa representação, a 8 de
dezembro de 1868 .
Portanto, a " primeira casa ", situada ao lado da Capela , teria
sido construida mais ou menos , no ano de 1865, coincidindo com
a data da escritura a que nos referimos.
Compulsando a coleção do " Bouquet de Flores " , modesto se
manário que se publicava na vila de Cananéia, em o n .° 33 , ano 1.º,
de 19 de abril de 1888, deparamos com uma correspondência de
Jacupiranga, noticiando que a 22 de Janeiro tinham sido recome
çadas as obras da Capela, interrompidas 25 anos antes , isto é, em
1863, mais ou menos, ou melhor no ano de 1861, quando, segundo
os livros da Igreja, já funcionava a Irmandade de N. S. da Con
ceição do Botujurú e havia uma Capelinha humilde, onde se rea
lizavam os atos religiosos. Em 1862 começou a construção de
outra Capela maior.
Do orçamento provincial para 1872-1873, constou uma verba
de 1.000 $ 000, para as obras da Igreja de Jacupiranga ; de 800 $ 000,
no ano de 1886 , e uma terceira, de 500 $ 000 , em 1887 .
Daí podemos concluir que iniciada a construção da mesma
em época anterior ao ano de 1872, com os recursos conseguidos
por Freitas Coutinho e que se elevavam a cerca de quatro contos
de réis, foi a referida obra interrompida e recomeçada 25 anos
depois, quando pelo governo províncial foi decretada a verba de
um conto de réis para o prosseguimento dos trabalhos, como afir
mava o correspondente do Bouquet de Flores, cuja importância, di
zia ter cido recebida " pelo rev . padre Domingos Rossi, a cargo de
quem estavam as obras ” .
Em conclusão :
Francico Gomes fez a primeira doação da área destinada à
Capela e Cemitério , em tempos remotos, talvez, no decurso do ano
de 1836 a 37, tendo lugar, a bênção do terreno entre 1838-1843.
66 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Parecendo ter sido a doação feita verbalmente, e passando a


propriedade para as mãos de Joaquim de Moraes Freitas Coutinho,
a princípio não só declarou ele , concordar com a mesma, como tam
bém prometeu aumentar a área doada, providenciando para a ere
ção da Capela e até promovendo uma subscrição, que correu entre
os moradores do bairro , conseguindo cerca de quatro contos de
réis .
De posse dessa importância, deu início às obras, mais ou me
nos em 1863, para depois abandona -las, ainda a cumprir com a
concessão já feita por si e por Francisco Gomes.
Mas, forçado pela colera popular, resolveu - se a ratificar as
referidas doações verbais , sendo lavrada a escritura de 12 de agos
to de 1865, quando foi construida a primeira casa ao lado da Ca
pela , cujas obras tinham sido iniciadas em 1863, abandonadas em
1864 para 65 , e recomeçadas pelo padre Domingos Rossi, 25 anos
depois, isto é , a 22 de Janeiro de 1888 , quando as paredes de tai
1
pas já apresentavam grandes rombos .

Assim , não é possível considerar - se a data de sua fundação


como sendo a 5 de abril de 1870 .
Devemos recuá - la de alguns anos , buscando - a na do principio
da Capela, que , como dissemos, foi iniciada e logo após abandona
da, para recomeçar definitivamente depois da doação oficial do ter
reno por um documento público , desprezando as doações verbais,
feitas anteriormente por Francisco Gomes e Freitas Coutinho, pa
ra atendermos apenas à terceira, feita por éste último e praticada
por um ato público, expresso em documento de real valor, que foi
a escritura de 12 de agosto de 1865, que de fato, assinala a fun
dação da Capela e consequentemente a da povoação, data essa
que por uma feliz coincidência é duplamente histórica, para a re
gião sul paulista, porque assinala também o dia da chegada da es
quadra de Martim Afonso de Souza ao porto de Cananéia, no ano
de 1531 , primeiro ponto da Capitania de S. Vicente onde tocou ,
quando em sua derrota para o rio Santa Maria .

IGREJA MATRIZ

Em geral, o início das Capelas correspondia ao princípio da


Povoação .
Em Jacupiranga, segundo os manuscritos da Igreja Matriz
esse fato teve lugar alguns anos depois.
Além do que já ficou exposto no capítulo anterior, como ver
dade histórica devemos acrescentar ainda , que a modesta cape
MEMORIA HISTORICA DE JACUPIRANGA 67

linha existente no ano de 1861 e aumentada ou ampliada em 1862,


teve o seu trabalho de construção prorrogado em 63, quando se
procurava fazer o retábulo .
Em 1865, atendendo ao pedido da Irmandade, fazia Freitas
Coutinho a doação das 50X80 braças.
A bênção dessa Igreja teve lugar a 8 de dezembro de 1866 ,
como consta dos seus livros, por Provisão de 3 de outubro do mes
mo ano , dada pelo Bispo de S.Paulo , D , Sebastião Pinto do Rego.
Em Agosto de 1869, procedente de Iguape, chegava a Bo
tujurú o padre Christoforo La Polla , com licença para celebrar mis
sa , administrar sacramentos e fazer confissões .
Finalmente , em fins desse mesmo ano , de 1869, era a Igreja
Curada, sendo nomeado seu primeiro capelão o Revdmo . Padre
Domingues José Dias, de nacionalidade portuguesa .
A 5 de abril de 1870 era o curato elevado à categoria de Pa
róquia, com a promoção do capelão a vigário da mesma .

UM DOCUMENTO IMPORTANTE

O memorial dirigido à Câmara de Iguape no ano de 1868 ,


queixando -se do procedimento de Joaquim de Moraes Freitas Cou
tinho , é , como já dissemos, um dos mais importantes manuscritos
para a história de Jacupiranga .
Representação de um povo que se via sacrificado e oprimido
em seus direitos , pela vontade e capricho de um só homem , é a
mesmo digna de atenção, por traduzir a verdade do que , naquela
época, se passava na então freguesia de Botujurú . Tudo quanto
nela se contém deve expressar a verdade, pelo respeito que nos
merecem os nomes da maior parte dos seus signatários, entre os
quais o coronel António de Magalhães Mesquita, nome sobe
jamente conhec ido na região sul paul ista e por tod os acatado pela
retidão de caráter , cultura e represetanção.
E ' portanto um documento histórico e como tal , digno de fé .
E porque não fosse extranha ao povo iguapense a maneira
pelo qual Freitas Coutinho perturbava o desenvolvimento da po
voação, ao referido memorial emprestou aquela edilidade todo o
seu apoio , encaminhando - o ao Governo da Província, acompanhado
do ofício que se segue :

" Illmo . e Exmo . Snr .


A Camara Municipal da Cidade de Iguape, tendo em muita considera
ção a representação dos moradores do Bairro de Jacupiranga deste Muni
cipio, a qual tem a honra de passar ás maos de V. Sas . vem secundar aos
mesmos moradores no seu justo pedido, implorando á V. Exa . a necessaria
authorisação para a desapropriação do terreno reclamado por aquelles para
dar os comodos de que precisão n'aquella povoação por muitos titulos já re
68 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

comendavel. A rapidez com que se tem aquella povoação desenvolvido, co


mo attestão os edificios n'ella construidos no curto espaço de 3 annos, e
affluencia de pessoas que para ali tem concorrido ; o desejo ardente dos po
VOS em construir seus predios, mas são embarcados pelos possuidor
d'aquelle terreno, as acomodações precisas para a comodidade publica e dos
viajantes que ali passão por ser o cruzamento das estradas d'Iporanga á Ca
nanéa, que abrange Faxina e Apiahy e a Xirifica á esta Cidade é outras
povoações do centro, são razões bastante ponderaveis para que o governo se
digne providenciar no sentido desejado .
Certo como fica esta Camara Municipal d'Iguape, de que V. Exa . to
mará na devida consideração este justo reclamo, desde já, se confessa reconhe
cida pelo feliz exito de seu pedido, a importa o mais vital de seus inte
resscs .

Deos Guarde á V. Exa .


Iguape, 17 de Dezembro de 1868 .

Illmo . e Exmo . Snr . Presidente desta Prova . de São Paulo

Antonio Joaquim d'Araujo Aguiar


José Ribeiro de Carvalho
João Baptista da Silva Carneiro
Antonio Vaz Ferra . Jor .
Antonio Francisco de Athaide Pene .
Francisco de Souza Castro
Diogo Rodrigues de Moraes *

O oficio acima, com dissemos, traz incluso o valioso memo


rial, que é o seguinte :
" Illmos. Snres. Presidente e Membros da Camara Municipal
Dizem os abaixo -assignados moradores do rio Jacupiranga, que a bem
da comodidade publica dos povos deste rio precisão desapropriar a Joaquim
de Moraes Freitas Coutinho o terreno necessario para a construcção de pre
dios e comodidade publica, no lugar onde se acha colocado o Cemiterio pu
blico e a Capella de Nossa Senhora da Conceição, ultimamente benta, de uma
area que partindo da Barra do ribeirão Canha pelo rio de Jacupiranga á ci
ma vá ter em frente do porto do sitio de Luiz José Lobo ; correndo a rumo
do Sul, mais ou menos, até encontrar o caminho do engenho de Joaquim de
Moraes Freitas Coutinho, e dali a rumo de sueste, mais ou menos, até en
contrar o ribeirão Canha, em cujo terreno se acha incluido o de 50 braças
em quadra já a tempos remottos concedidos para o referido Cemiterio pelo
antecessor do referido Freitas Coutinho, e o de 50 braças de frente sobre 89
de fundo concedidos á edeficação da Capella pelo actual possuidor dito Cou
tinho .
Com quanto não seja talvez bastante a área que se pede em attenção a
grande concorrencia dos povos para este lugar, todavia por em quanto se
contentão os abaixo assignados pedir somente esta porção de terreno, que
em nada deminue a propriedade de seu possuidor em referencia a grande
extenção do terreno que possue aquelle proprietario, que se calcula em cer
ca de duas leguas de frente e seus fundos correspondentes, como porque fica
a área pedida dividida por limites naturaes que deve perpetuar a porção do
terreno pedido. As rasões em que se fundão os abaixo Assignados para
pedir a dita desapropriação, a bem dos de comonidade publica são igualmente
as da Justiça como se segue.
MEMORIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 69

Francisco Gomes possuidor da propriedade hoje de Joaquim de Moraes


Freitas Coutinho, attendendo a grande necessidade dos povos deste rio, onde
lutando constantemente com as difficuldades que soe offerecer um rio tão
sugeito ás influencias dos tempos, privavão seus habitantes de levar á cida
de seus cadaveres ficando muitas vezes insepultos, ou sepultando-os em lu
gares não sagrados, resolveu conceder por doação uma área de 50 braças de
terreno em sua propriedade para a edeficação de um cemiterio publico, o que
se resolveu fazendo - se benser a cerca de 25 a 30 annos pelo Revmdo . Padre
Joaquim Manoel Alves Carneiro, por autorisação do então Revmdo . Vigario
Collado desta Parochia , Padre José Alves Carneiro, ( 34 ) doação que fes já
com o firme proposito de fazer erigir igualmente nesta propriedade uma Ca
pella cuja invocação seria de Nossa Senhora da Conceição, como é notoria
mente publico, correndo logo uma subscripção entre o povo, que espontanea
mente se cotisou para a construção do edificio projectado.
Correrão os tempos, e não se dando andamento a obra, mais tarde aquelle
possuidor se foi envolvendo em negocios em que se vio em complicação com
o referido Freitas Coutinho, vendo-se obrigado a vender- lhe a propriedade,
ignorando -se se nesta venda fes ou não exclusão do terreno doado e do pro
mettido para a referida construção. O povo porem, sempre certo e convicto de
que estes terrenos serião respeitados, foi sobre maneira surprehendido quando
o então possuidor Moraes começou a oppor embaraços no proseguimento das
obras progetadas, dificuldades que mais tarde desaparecerão convencido como
estava das razões que acestião em favor dos povos . Assim resolvido, o mes
mo Moraes tomou a deliberação de correr em pessoa o rio fazendo nova co
tisação sobre o povo, de quem recebeu de uns, dinheiro ; de outros arroz ; e de
outros vales pagaveis à vista, orçando - se em 4 :000 $000 a quantia agenciada .
Comessou por tanto a obra da Capella sob a immediata administração
do referido Moraes, até que deixando-a em seu principio, assim permaneceo
por longo tempo até que os povos comessando a desesperar reclamarão a no
meação de outro encarregado, que mais zeloso dos interesses publicos pro
ceguisse em sua construção. Recahindo a nomeação na pessoa desta comis
são, porem sem ter até hoje prestado contas de sua administração, de novo
oppoz embaraços, negando -se até a conceder aquillo que o primeiro possuidor
havia promenttido, ( ou antes já doado visto que nesse sentido se havia cor
rido a cotisação já citada ) contra toda a espectativa ! De novo instava o po.
vo pelo compromisso feito, que Moraes empaleando e protelando sempre só
a 12 de Agosto de 1865 é que por uma escriptura publica de doação conce
deu aos povos a pequena área de 50 braças de frente sob 80 de fundos, pa
ra patrimonio da capella, e isto mesmo com condições onerosissimas, privan
do os povos de fazerem ali as construções dos predios que precisão, sofrendo
ainda de outras precisões, não podendo nem ao menos lenhar por que a área
concedida se acha tomada pela capella e casas que immediatamente se cons
truirão, não podendo ir mais alem por que o actual possuidor não permite
fazel-o .
Quando o referido Moraes tratava de agenciar dinheiro para a cons
trução do templo, soube sempre com falases promessas embalar o povo pro
mettendo conceder não só o lugar para aquella edificação como em varias
reuniões que em sua propria casa fez, declarou que daria para patrimonio
da capella uma porção do terreno contiguo que seria de 200 braças mais ou
menos de frente sob 105 de fundos : E certamente que se assim não fora,
qual seria o interesse dos povos cotisando -se em tão larga escalla como fez

( 34 ) Nomeado por Portaria de 15 de maio de 1840 - Livro 1.094. Re


gistro de Cartas de Professores, Escrivães e Párochos 1831-1842 .
Arquivo do Estado ,
70 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

e continua a fazer, se não contasse que este compromisso seria fielmente


cumprido .
Para que farião sacrificios desta ordem ? Seria para embelezar os ter
renos do Snr. Moraes, gastando nelle uma quantia já superior a seis con
tos de reis, sem outra esperança ? de certo que não serião tão cegos, com
quanto fossem tão simples em deixar - se levar .
A Soberania dos povos tão sabiamente respeitada pelas leis de sua or
ganisação deve e hade triumphar ante a cegueira e ambição descomunal de
um só homem que pretende oppor obices para o desenvolvimento de uma
povoação que deverá um dia e em breve tempo ter um nome na relação das
povoações da Provincia . Cerca de 400 fogos e de 3.000 almas o attestão,
numero que de dia em dia cresce á um modo espantoso, e os predios já
edificados neste lugar, dão ao observador que aqui chega, um admiravel tes
temunho de seu engrandecmento e prosperidade, visto como no curto espaço
de 3 annos de sua creação ( tempo em que se edeficou a primeira casa ), já
conta o numero de 16 casas construidas com solidas taipas e edeficadas com
gosto e apuro . Ainda outras rasões devem abalar no espirito dos Senho
res representantes do Municipio a necessidade da desapropriação pedida,
quando souberem que por mais de uma vez tem o possuidor deste terreno,
promovido serios conflitos no proposito de oppor embaraços á construção
de predios neste lugar . Bem recente é ainda o facto de vir aquelle Snr .
armado, e trasendo comsigo seus escravos armados de machados e outros
instrumentos de destruição, para demolir, como o fez, a casa que um pobre
homem tratava de levantar ao lado da Capelia, de que poz a povoação em
alarma, e que não ser a providencia de seus pacificos moradores teria de
resultar perdas de vidas, e sangue derramado por seu imprudente procedi
mento .
Os povos não pretendem com esta desapropriação gravar o cofre da
Municipalidade, não ; elles estão prontos a cotisar-se para pagar o terreno
pedido, esquecendo mesmo o compromisso de seus possuidores, de o cede
rem sem indemnisação : tal é sua indole, taes são seus ardentes desejos.
Nestes termos e esperançados, os abaixos assignados de que V. V. S. S.
providenciarão no sentido desejado .
P Pa V V. SS .
Benigno diffirimento
E E. R Mce .
Botujurú, 8 de Dezembro de 1868 .
Anto . de Sza . Pinto Mages . Mesquita
José Antonio Nunes Costa
Antonio Lopes Moreira
Luiz Jorge Lobo
Innocencio Gomes da Sa.
José Antonio Pereira
Bento Moreira da Silva
Ignacio Pera . d'Oliveira
Antonio Augusto d'Oliveira Muniz
Henrique Augusto Oliveira Muniz
Rodrigo de Freitas Coutinho
Manoel Pinto de Almeida Junior
José Moreira da Silva
José Joaquim Portella
Joaqm . Roberto Alves da Sa.
Domingos Avelino Ribeiro
Francisco José Alves Pinheiro
José Lino Alves Vieira
Manoel Pinto de Alma.
MEMORIA HISTORICA DE JACUPIRANGA 71

Evaristo Augusto d'Oliveira Muniz


Antonio J. Fernão
Ignacio Benedicto Antunes Olivra.
Felipe Pereira Porto
Jorge Antonio Deveras
Filadelfo Pereira dos Passos
Antonio Pedro da Maceno
Antonio Dom . Costa Jor .
Joaqm . Caetano da Costa
Agostinho José de Oliveira
Joaqm . Duarte Sa. Calado
Lusitano Pera . Soares de Castro
Reinardo Pinto de Almeida
Joaquim Gonçalves Camacho
Antonio d'Almeida d'Ola .
A rogo de Jacintho Antonio
Muniz de - José Moreira
Moraes de Pedro Dias, e de Raphael Ribeiro Ramos
Joaquim Carneiro da Silva Braga
Antonio Roberto de Morais
A rogo dos Snrs . Ignacio Pereira dos Passos
Vicente Jorge de Moraes
José Antonio Lemos
Joaqm . Antonio Lemos
Pe. Antonio Carvo . da Sa. Braga
José Marcellino Domingues
arrogo de meo Pay Venancio Pera . de Olivra .
Ignacio Benedicto Antunes de Olivra .
Joaquim Pedro de Cortes
Joaqm . Paulo de Camargo
Mattias José Dom .
Freitas Augto . Carneiro dos Santos
Zeferino José Pinto .

A rogo de Luiz Antonio Fernandes Pinto, de Ignacio Ribeiro Ramos


1.° de Joaqm . Roiz Carneiro, de Adrião Antonio Pereira, e de Joaqm . Pedro
Dias d'Ola .

Rodrigo de Freitas Coutinho

A rogo de Ignacio Ribro . Ramos, Jacintho Pedroso de Moraes, Joa


quim Lourenço da Cunha, de Sebastião Gomes, tutores de Franco. Roiz de
Pontes, e de Trucuato Mathias de Pontes .

Anto . de Sza . Pinto Mages .


A rogo de José Miguel
José Anto . Muniz Costa
Franco . Manoel Sezario
Antonio ds Costa Chagas
A rogo de Luiz Francisco Ribro .
de Antonio Marques da Sa.
de Ignacio Domingues de Oliveira, de Felicio Pires Monteiro,
de Venancio Gomes, e de Salvador Alves de Fontes
Antonio de Sza . Pinto Mages .
Mathias João da Costa
João Felipe Rodrigues
72 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Estevão Je . Raimundo
João Luiz do Nacimento
Manoel Roxa
José Furtado Roy Sumo.
Felisberto Marques d’Aguiar
Francisco José de Lima
Manoel Antonio Gonçalves
Casimiro Alves Vieira
a rogo de Rafael Pera . de Sza .
José Luis de Souza França
A rogo de Victor Pedrozo de Lima
e de Antonio Moreira de Moraes
José Luis de Souza França
A rogo de Manoel Dias
Ignacio Pereira d'Oliveira
A Rogo de Pedroso Ribr.° Ramos, de Imidiano José Miranda, de Antonio
Moreira da Sa. filho, de Je. Dias Subral, e de Rafael Anto. Mranda
Franco . de Sza . de Oliveira Rato
A rogo de Antonio Marques da S. , de Gregorio José Domingues
Luiz da Sa. Franco
Benedicto Jozé Rodrigues
Jozé Furtado Roiz (35) ”

Essa representação acompanhada do ofício da Câmara Muni


cipal de Iguape, sendo apresentada ao Presidente da Provincia , foi
remetida ao Procurador Fiscal em 30 de janeiro de 1869, recebendo
o parecer seguinte :

“ A lei que regula a respeito hé a provincial n .° 38 de 18


de Março de 1836 .
Parece-me que a desapropriação que se pretende hé pa .
utilidade municipal, Arto . 1.º T. 4.° e Arto . 1.° 2.° da lei de
8bro . de 1828, e por isso á Camra , cumpre assim declarar e
proseguir na forma determinada no Art. 3.° e seges. da 1.a
lei sendo a indemnisação feita pelos peticionarios como offere
cem . S. P. 13 de Janro . de 1869. Azevedo Junior. "

A 18 de Fevereiro do mesmo ano era o parecer acima apro


vado pelo Presidente da Provincia, Barão de Congonhas do Cam
po , mandando que se oficiasse à Câmara, remetendo - o por cópia .
Dessa maneira encerrava- se o incidente provocado por Frei
tas Coutinho, dando ganho de causa aos habitantes do rio Jacupi
ranga, que de então por diante puderam dar início à construção
de suas casas , livres das ameaças daquele.

( 35 ) Arquivo do Estado Março 25, 1860-80, Sala 9, Est. B. Prat. 3.


MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 73

DA ELEVAÇÃO A MUNICIPIO

A - pesar -da fertilidade do seu solo, amenidade do clima c si


tuação privilegiada , Jacupiranga pouco se desenvolveu, pela falta
exclusiva de meios de transportes, permanecendo estacionária, no
decurso de longos anos .
A prova do que afirmamos está no seguinte fato : elevada à
categoria de Freguesia a 5 de abril de 1870, sòmente poude con
seguir sua emancipação administrativa, passando o seu território a
Município em 1927, quando Ribeirão Preto, que foi elevado à Fre
guesia apenas três dias antes, isto é, a 2 de abril de 1870, no ano
seguinte já era município . Também outras povoações como Ava
ré, antigo Rio Novo, Cruzeiro , Bebedouro , Pirajú, e muitas mais,
erectas em Freguesia depois de Jacupiranga, são hoje grandes ci
dades paulistas e municípios de elevada produção .
A causa única de semelhante estacionamento, foi, como já dis
semos, devido à falta de meios de comunicações.
Mesmo assim , pelo progressivo aumento da produção e apa
recimento de algumas familias que transferiram suas residências
para a nova freguesia , foi esta prosperando, muito embora lenta
mente , contando como único meio de transporte a via fluvial,
transporte difícil e demorado, pouco prático também , pela falta de
água nos rios e insuficiência das embarcações.
Era que o rio Jacupiranga, sinuoso e atravancado de troncos
de árvores, que as enchentes espalhavam pelo seu leito, sòmente a
muito custo dava passagem às pequenas lanchas, que por isso mes
mo passaram a fazer ponto final junto à barra do rio Capinzal, im
possibilitadas de proseguir .
A primeira embarcação a vapor que o sulcou, foi a lancha
“ Ondina ", cuja viagem teve lugar a 12 de junho de 1887, em que
empregou 12 horas .
Daí para cima, as viagens penosíssimas como eram , realiza
vam - se em canoas até a sede da Freguesia .
Devido a isso, foi aberto um longo caminho, que partindo do
ponto final da , navegação à vapor ia ter à Jacupiranga .
Muito antes, porém , já haviam sido construidos ou abertos
vários caminhos através do município, como o que de Cananéia
se dirigia à Freguesia de Xiririca, concluido no ano de 1836 , sob
a direção do capitão -mor desta e do prefeito de Cananéia ; o ca
minho para Iguape, e mais tarde , outro, para o pôrto de Subauma,
no Mar Pequeno . Entretanto , como é fácil de ver- se, tais cami
nhos não passavam de simples trilhos, atravessando a grande re
gião da zona da Ribeira , para se dirigirem às vilas de Serra Acima,
como Faxina e Apiai , passando pela Freguesia de Jacupiranga .
74 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Somente depois de iniciado no Estado de S. Paulo o sistema


de rodovias, pelo grande estadista dr . Washington Luís, ou melhor
ainda, após sua visita à região sul paulista no ano de 1921, de que
resultou entre outros benefícios para a zona, o da abertura de es
tradas, ligando as cidades de Cananéia , Iguape e Xiririca, foi
que Jacupiranga iniciou a marcha para a frente, pois que dessa data
em diante várias rodovias cortaram o seu território, não só ligan
do - o às mesmas cidades , como também ao pôrto de Subauma, Pa
riquéra -assú e Registro .
Como que por encanto, teve então início o resurgimento da
antiga povoação, onde apareceram os primeiros automóveis, que
começaram a trafegar regularmente como grandes auxiliares do
progresso local.
Rápido foi o aumento da produção, pela facilidade de comuni
cações entre a cidade e os portos de embarque, e tão acelerado o
seu progresso, que imediatamente se fez sentir a necessidade da
elevação do distrito à categoria imediatamente superior, isto é, á
município, fato éste que significou a maioridade do antigo povoado
e sua emancipação da longa tutela em que se achava .
Incrementa - se a lavoura pela formação de novas fazendas ; au
menta o movimento comercial, surgem novos estabelecimentos e
aparecem as primeiras máquinas a vapor .
Finalmente , a lei n .° 2253 de 29 de dezembro de 1927, alevava
o distrito de Paz à categoria de Município, desmembrando - o do de
Iguape .
Por decreto de 9 de fevereiro de 1928 , ficava designado o
dia 24 do mesmo mês para se proceder à eleição para vereadores
à Câmara Municipal e Juizes de Paz .
Instalado a 23 de Junho do mesmo ano, realizando- se assim
a velha e justa aspiração de tantos anos, formou -se a primeira Ca
mara que ficou organizada da seguinte maneira :

Capitão Jorge José de Lima – presidente


Capitão Miguel Abu - Yaghi - prefeito
Vereadores
Snrs . Frutuoso Moreira de Lima, Eduardo Brasileito de Ma
cedo , Estanislau Cugler e Máximo Zanella .

A estes se deve o grande surto de progresso verificado nestes


últimos anos principalmente ao Capitão Miguel Abu-Yaghy, que,
filho adotivo de Jacupiranga, á ela consagrou toda a sua existên
cia , não poupando esforços, nem sacrifícios em prol do seu engran
decimento , servindo - a com o mais acendiado amor e patriotismo,
tornando- se por isso mesmo credor da amizade e admiração de
todos .
Uma rua de Jacupiranga

Vista parcial de Jacupiranga, vendo - se a Igreja Matriz


}


MEMÒRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 75

INSTALAÇÃO E POSSE DA PRIMEIRA CÂMARA

Em sua vida política -administrativa, foi o antigo distrito diri


gido principalmente pelo inesquecível coronel António Pinto de Ma
galhães Mesquita , depois, em 1900 , por António Sant'Anna Fer
reira, que, fiel continuador do mesmo, tudo fez em prol de seu en
grandecimento .
Por sua morte, veio a substitui-lo o capitão Manuel Pinto de
Almeida, que ha muitos anos vinha prestando inestimáveis servi
ços à causa pública, e que promovido a administrador, não poupou
esforços no sentido de elevá-lo e engrandecê-lo, servindo durante
dez anos de sã administração .
Falecendo no ano de 1920, foi substituido pelo capitão Ber
nardo Ferreira Machado, que tendo sabido grangear a estima dos
seus administrados, pela retidão de caráter e magnanimidade de seu
coração, soube conduzir os destino da localidade pela vereda do
progresso , dedicando -lhe o melhor dos seus esforços com felicida
de de ver realizado o seu grande sonho, que foi a emancipação po
lítica de Jacupiranga , fato éste ocorrido a 23 de junho de 1928 com
a instalação solene da primeira Câmara Municipal e posse dos res
pectivos vereadores e mais autoridades locais .
Nesse dia , de fato realizavam - se os grandes festejos comemo
rativos da emancipação política e administrativa do novo munici
pio , com o comparecimento de pessoas gradas das cidades visinhas
e presença da maior parte da população local, autoridades da co
marca de Iguape e representantes de outros municípios .
Pelas 11 horas da manhã , os alunos das Escolas Reunidas,
banda musical e grande massa popular, dirigiram - se ao hotel onde
hospedado se achava o dr . Phidias Monteiro de Barros, Juiz de
Direito da comarca de Iguape, que chegara na véspera, especialmen
te para presidir o ato da instalação, formando -se um grande prés
tito que se dirigiu ao Paço Municipal , sendo recebido pelos verea
dores recem -eleitos, a cuja frente se achava o sr . Miguel Abu
Yaghi, que ofereceu ao referido magistrado uma bandeira nacional,
para que o mesmo nomeasse , entre os presentes, aquêle a quem de
via caber a honra de hastea - la pela primeira vez na fachada do edi
fício da municipalidade.
A seguir S. Exa ., tomando do símbolo nacional pronunciou
brilhante improsivo, entregando- o ao sr . capitão Luís Gonzaga
Muniz , que o hasteou sob calorosos aplausos da multidão , ao som
do hino nacional cantado pelos alunos das escolas e executado pela
corporação musical .
Terminada essa cerimônia , foram introduzidos no recinto do
Paço Municipal pelos capitães Miguel Abu-Yaghi e Bernardo Ma
chado , o dr . Juiz de Direito, sua comitiva e pessoas gradas, tendo
76 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

lugar então a abertura da sessão, presidida pelo ilustre magistrado


da comarca , que convidou os novos vereadores a tomarem assento
junto à mesa , bem como ao dr . António Fernandes de Medeiros,
representantes da Câmara Municipal de Iguape, dr . Osório Sant'
Anna Ferreira, promotor público de Iguape, e tenente Hermelino
França Junior, representante do Partido Municipal da mesma ci
dade .
Em seguida, pelo escrivão do Juizo , sr . João Veríssimo da
Silva, foi lavrada a ata respectiva, que foi assinada depois de ha
ver o presidente deferido o compromisso aos vereadores, sendo o
mesmo ato realizado sob religioso respeito .
Depois disso, fez uso da palavra o dr . Juiz de Direito , para
incitar os Edis a que não poupassem esforços em favor do novo
município que acabava de ser instalado .
Dada a palavra ao sr . Miguel Abu - Yaghi, proferiu este um
substancioso discurso sôbre o ato, prometendo trabalhar pelo en
grandecimento da localidade onde ha longos anos residia e que to
mara por berço adotivo . Outros discursos foram ainda pronun
ciados pelo snr. dr . António de Medeiros, Domingos Bauer , Her
melino Franca , professor Ciro Gaia, Souza Passos e meninas Ma
ria Domingues e Lucilia Zanon .
A seguir foi servida lauta mesa de doces às pessoas presentes .
A' tarde teve lugar o banquete oferecido ao dr . Phidias de
Barros, falando por essa ocasião o vereador Eduardo de Macedo ,
e o homenageado, que em belíssimas palavras agradeceu , levantan
do um brinde de honra ao dr . Júlio Prestes, presidente do Estado .
A' noite realizava -se nos salões do Paço Municipal um gran
dioso baile , prolongando -se as danças até de madrugada, encerran
do -se dessa maneira os brilhantes festejos comemorativos do
grande acontecimento .

DISTRITO DE PAZ DE PARIQUERA-ASSU

A pequena cidade de Pariguera - Assú, séde do Distrito de Paz


do mesmo nome , pertencente ao município de Jacupiranga, encon
tra -se a 21 quilômetros de distância do pôrto de Subauma , no Mar
Pequeno, e 14 quilómetros da cidade de Jacupiranga, gozando das
vantagens de ser ponto irradiador das estradas de rodagem que
vão ter não só a esses dois pontos, como também às cidades de Xi
ririca, Iguape e Cananéia , e à margem do Rio Ribeira, onde se en
contra a colónia japonesa do Registro, em comunicação , portanto ,
com a Estrada de Ferro Sorocabana, em S. António do Juquiá .
Localizada próximo à margem do rio que lhe dá o nome, nu
ma distância de 18 quilómetros de sua barra no Ribeira, tem a al
MEMORIA HISTORICA DE JACUPIRANGA 77

titude de 58 metros acima do nível do mar . Cidadezinha alegre e


pitoresca, é favorecida por excelente clima que a torna um verda
deiro sanatório .

Em virtude de sua situação privilegiada, está destinada a um


franco progresso não só pela fertilidade de suas terras como pelo
desenvolvimento da agricultura e pecuária, já bem apreciáveis.
Possue cerca de cem prédios urbanos, entre os quais se des
tacam o grupo escolar, igreja, cadeia pública, casa do telégrafo,
grandes armazens, farmacia, engenhos centrais, etc. Em diversos
pontos do distrito funcionam algumas escolas rurais, engenhos de
aguardente e de beneficiar café . E ' centro exportador de primei
ra ordem , tendo sua origem no antigo núcleo Colonial cuja exis
tência pode ser dividida em três fases inteiramente diferentes .

GUARICANA

Fundado por determinação do governo imperial no ano de


1855 , teve o seu início no ano seguinte, sendo para isso escolhida
a parte do território do município de Iguape conhecida pela deno
minação de --- GUARICANA - naturalmente pela abundancia
dessa palmeira baixa e existente no mesmo local e cujo verdadeiro
nome é Guaricanga .
Em diversos documentos , aparece a denominação de Guaricana
e não de Pariquera -assú, como veremos adiante , e que somente
muito tempo depois adotada para o referido núcleo . A ela se re
fere o dr. Sacramento Blacke, quando foi tomar posse do núcleo ,
depois da exoneração do seu primeiro diretor .
Foi portanto , no sítio -- GUARICANA que se desenvol
veu a cidade de Pariquera - assú .
Disse o dr . Ernesto G. Young :

a demarcação do territorio da colonia foi inciado no anno


de 1856 e logo depois nomeado um director com a missão prin
cipal de preparar casas para recebimento de colonos, abortan- :
do essa primeira tentativa, em virtude de haver o director na
meado dado má applicação ao dinheiro recebido, com o qual,
em vez de mandar apromptal-as, construira uma bella viven
da, recusando -se a receber a primeira remessa de colonos " .

E acrescentou :

“ Foi suspenso o Director e a colonia jazeu abandonada


até o anno de 1875, quando o dr. Manoel de Barata Goes, di
rector da colonia de Cananéa, tentou estabelecer colonos no ter .
ritorio despresado de Pariquéra -assú " .
78 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Ainda assim , essa nova tentativa frustou , " ficando a colonia


abandonada de novo, pelo Governo " , e conservando - se na mesma
apenas algumas famílias de alemães e italianos . ( 36 )

Procurando estudar a vida do antigo núcleo à luz da histó


ria, consultamos não só os relatórios oficiais do Ministério do Im
pério, Ministro da Agricultura e do presidente da Provincia , 1855,
como também os maços de papeis sobre colónias , existentes no Ar
quivo do Estado .
Tais, foram as fontes para o presente resumo .

PRIMEIRA FASE

Havendo vastos terrenos devolutos em São Paulo , criou n


governo Imperial a inspetoria Geral de Medições de Terras, a 20
de Fevereiro de 1856, nomeando o então tenente , engenheiro Ru
fino Enéas Gustavo Galvão, para exercer o cargo de Inspetor Ge
ral, encarregado do trabalho da divisão das terras de vários muni
cípios da Província de S. Paulo , entre os quais , de Iguape e Ca
nanéia .
i
Assumindo o exercício do mesmo cargo . partiu o referido en
genheiro para a região sul paulista, afim de demarcar as terras
públicas ; e " depois de minucioso exame sôbre a localidade mais
conveniente” iniciou os trabalhos entre os dois municipios , “ em
terrenos que são férteis, com abundância de boas águas e não lon
ge de povoado e de porto de embarque " .
Examinando o local , opinou então que " o ponto mais apro
priado para o estabelecimento de um primeiro núcleo colonial de
colonos, era o 4.0 Território , do lado de S. O. , perto do porto de
Botujurú , sôbre o rio Jacupiranga ” .
Acrescentava o Relatório de 1857 : “ A determinação da me
ridiana foi feita em Outubro do ano findo ( 1856 ) . Devido ao
mau tempo , em fins de Dezembro retirara - se a inspetoria, fechada
a metade de um território " .
No ano de 1857 haviam sido medidas 52.970 braças correntes
no território que ainda " se estava demarcando no distrito de Igua
pe " em cujo trabalho haviam sido despendidos 19 : 332 $039, e que
" para facilitar o transporte de víveres para as linhas de demar
cações, se havia mandado abrir uma picada pelo centro do terri
tório , comunicando com a estrada de Iguape e Xiririca " .

( 36 ) Almanaque de Iguape, pág. 80, 1899 .


MEMORIA HISTORICA DE JACUPIRANGA 79

Sòmente no ano de 1858, por Aviso de 6 de Agosto, deter


minava -se que
em um dos quartos do dito território se mandasse fazer
derrubadas e aí construir arranchamentos provisórios para re
cepção de colonos " .

Note-se bem , que a demarcação das terras, ordenada no ano


de 1856 , fóra uma medida geral tomada para vários municípios
da Provincia .
Sòmente em 1858 mandava o governo imperial que se proce
desse ao serviço especial de derrubadas e preparo de arranchamen
tos para o projetado núcleo de que então nada existia .
E tanto é verdade, que por um novo Aviso, datado de 25 de
Outubro deste mesmo ano " autorizava" ao Presidente da Provín
cia de S. Paulo a " encarregar o dr . Fernandes Henriques Gui
lherme Gotthard, desse serviço " .
No Relatório de 1859 declarava o diretor da Repartição de
Terras, haver providenciado sobre os meios de comunicação do
território em Cananéia, concluindo que - " oportunamente " to
maria as medidas necessárias " a respeito de outro território já me
dido no município de Iguape" .
Mais tarde era o dr . José Joaquim Machado de Oliveira, di
retor das terras paulistas da Província, quem informava ao Gover
no , dizendo que os trabalhos de roçadas para o núcleo haviam sido
iniciados no dia 25 de Janeiro de 1859, e a 18 de Outubro do mes
mo ano o delegado de polícia de Iguape, Joaquim de Souza Cas
tro , oficiava ao presidente comunicando que naquele município . -
“ sòmente havia uma Colónia situada no lugar denominado Gua
ricana, fundada pelo Governo Imperial e habitada e dirigida pelo
dr . Gotthard, porém , sem culturas , por não ter nela ainda colonos " .
Como acabamos de ver , o então núcleo colonial de Iguape,
como era chamado, embora tendo sua origem na resolução Im
perial da demarcação geral das terras públicas, foi fundado
pela ordem expressa no Aviso de 6 de Agosto de 1858, reiterada
pelo de 25 de Outubro , com a nomeação de diretor provisório, sen
do que os trabalhos para esse fim começaram a 25 de Janeiro de
1859 .
A data de sua fundação deve ser , portanto, a 6 de Agosto de
1859 e não o ano de 1856, como declarou Young .
A 3 de Novembro de 1859 comunicava o governo da Provin
cia ao ministro do Império , haver sido o dr . Fernandes Gotthard ,
nomeado diretor da nova colónia que se ia criar no 1.º Território
de Iguape, com os vencimentos de 150 $ 000 mensais.
A 15 do mesmo mês oficiava o ministro ao presidente da Pro
víncia, pedindo informações dos serviços, pois que, em Março de
1860 pretendia mandar 40 famílias, que já estavam contratadas.
80 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Em 24 de Novembro voltava o governo imperial a solicitar


informações sobre o andamento dos trabalhos de derrubadas e ar
ranchamentos para os colonos .
Sòmente a 23 de Junho de 1860 oficiava o dr . Gotthard, di
retor da nascente colónia , declarando ao presidente da Província :

o serviço do primeiro assento acabou, excepto a colheita ;


os quatro ranchos estão promptos para receber a qualquer ho
ra as quarenta familias de colonos que o Governo Imperial
tenciona estabelecer aqui " .

Entretanto , já contrariado com a falta de esclarecimento sô


bre a execução dos trabalhos, porque o diretor interino apenas se
comunicava com o governo provincial , a éste se dirigia o ministro ,
para que o informasse de toda a verdade e também consultando -o
sobre a conveniência e possibilidade de colonizar o núcleo, não só
utilizando -se de elementos estrangeiros transferidos de outros pon
tos da mesma Província, como de naturais da região sul paulista,
agricultores residentes nas imediações da mesma colónia .
E ' o próprio diretor das Terras Públicas , quem afirma em seu
relatório referente ao ano de 1861 e publicado em 62 :
' ... mandando fazer as indagações necessarias, o governo da
Provincia a quem havia sido commettida a realisação deste pro
jecto, informou que sendo diminuta a população dos municipios
de Cananéa e Iguape e occupando - se partę na pesca e parte na
plantação de arroz, seria difficil formar- se naquelle lugar colo
nisação nacional e até o estabelecimento de estrangeiros que es
tivessem nas condições mencionadas, porquanto não existiam
nos municipios indicados nem nacionaes nem estrangeiros em
numero sufficiente para tal fim e poucas de fóra não se resol
viam a abandonar suas moradas, para se transferirem a pontos
onde nenhumas relações tinham " .

Não só essas informações como as denúncias feitas contra o


dr . Gotthard , que construira uma bela vivenda para si e desviava
utensilios e ferramentas pertencentes ao governo, além dos es
tragos e devastações que vinha praticando nas matas, — foram tô
das encaminhadas ao ministro do Império, dr . Bernardo Augusto
Nascentes de Azambuja, que tomou a resolução de extinguir a co
lónia ainda em estado de embrião, o que levou à efeito pelo Aviso
de 22 de Agosto de 1861, determinando ao presidente da Provín
cia que mandasse

retirar do dito territorio não só o director provisorio que


para alli fora mandado, como quaesquer outros empregados e
trabalhadores que estivessem sob suas ordens, remettendo ao
ministerio a conta das despezas effectuadas desde a nomeação
do director até essa data " .
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 81

Nessa mesma ocasião recomendava - se que por anúncio se con


vidasse a estabelecer -se à sua custa no mencionado distrito as pes
soas que quisessem comprar terras pelo preço mínimo da lei .
Em data de 11 de Setembro, em cumprimento ao Aviso de 22
de Agosto anterior, comunicava o presidente da Provincia ao dr..
Gotthard , sua exoneração do cargo de diretor, convidando -o a com
parecer à Tesouraria para prestar as necessárias contas, dispen
sando ao mesmo tempo os trabalhadores e empregados.
Dessa maneira encerrava-se a primeira fase do núcleo, que
nem sequer chegara a receber colono algum .

SEGUNDA FASE

Malograda a primeira tentativa, ficou a premeditada colónia


abandonada até o ano de 1876 , período éste que constitue sua se
gunda fase, em que quase nada se fez .
Com a retirada do dr . Fernandes Gotthard, foi o dr . Ray
mundo de Penaforte Sacramento Black , diretor da Colonia de
Cananéia, em 1863, encarregado de tomar conta da Colónia ( ? )
para ali se dirigindo e procedendo ao inventário geral de tudo quan
to foi possível arrecadar , nomeando ainda a Manuel Joaquim da
Silva Régio, para desempenhar o cargo de zelador, vencendo o or
denado de quarenta mil reis mensais, -- cargo de que foi dispen
sado a 6 de Fevereiro de 1870 como consta do Diário de S. Paulo,
do dia 6 de Setembro desse ano ,
Entretanto, como diz Young, no ano de 1876, o novo diretor
da Colónia de Cananéia, dr . Manuel Barata Góes , tentou estabe
lecer colonos no " desprezado território de Pariquera-assu ", para
onde se passaram alguns dos estrangeiros que vinham de abando
nar aquela colonia .
Fase de estagnação, nada se fez por essa ocasião em benefi
cio do projetado núcleo do quarto território, que fóra batisado com
o nome die “ Colónia de Iguape ” e ficara inteiramente abandonado
até o ano de 1886 , quando o dr . António da Silva Prado , então
ministro da Agricultura, encarregou o dr . João Bernardes da Sil
va, diretor da Comissão de Terras e Colonização, de " mandar exa
miuar e levantar a estatística dos antigos núcleos do município da
Capital e do de Pariquera-assú e reconhecimento das zonas em que
se aessentava , para reorganiza -los ” .
Pela primeira vez , em documentos oficiais , aparece o nome
PARIQUERA - ASSÚ dado ao Guaricanga ou Guaricana, co
mo vulgarmente se diz .
82 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

TERCEIRA FASE

A 1.° de Junho do ano de 1887 autorizava o governo provin


cial a despeza de 2 :000 $ 000 com as obras de continuação da Coló
nia de Pariquera - assú .
No dia imediado, por um novo aviso ficava o Inspetor Espe
cial de Terras e Colonização, autorizado a despender a quantia de
600 $ 000 com a construção de barracão para recepção dos imigran
tes que ali vão se estabelecer .
E a 18 de Novembro do mesmo ano era ainda o mesmo Ins
petor autorizado a mandar construir o " primeiro quilómetro de
estrada para serventia dos lotes ” .
A 19 do mesmo mês, apresentando o visconde de Parnaíba o
relatório de sua gestão , ao seu sucessor , o dr . Francisco de Paula
Rodrigues Alves, dizia :

“ Nucleo de Pariquéra-assú
Como consta do relatorio da Commissão de Terras Publi
cas , ( 1872 ), o “ Territorio de Iguape ", que hoje constitue este
nucleo, foi medido e demarcado em 144 Secções , de cujos tra
baihos não existem mais vestigios " .

Pela estatística então mandada levantar , verificava- se que os


seus habitantes eram quase todos nacionais, sendo :

Homens 188
Mulheres 153

Total 341
Lotes
Distribuidos 7
Disponíveis

Total 27

E acrescentava : “ Depois de ter a Comissão medido 27 lotes ,


mandei sustar os trabalhos deste núcleo a 13 de Outubro último
( 1887 ) para serem recomeçados, em virtude da nova ordem e sob
o plano que V. Exa . , julgar acertado " .
Os trabalhos a que se referia o visconde de Parnaíba, haviam
sido iniciados a 20 de abril dêsse mesmo ano e a 15 de setembro
seguinte recebia os primeiros colonos italianos, remetidos pela Hos
pedaria de Imigrantes da Capital .

*
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 83

Em relatório apresentado no ano de 1888 ao Inspetor Geral


das Terras e Colonização , referindo-se ao mesmo núcleo , dizia o
Inspetor Especial das Terras, de São Paulo :

* Está situado no 4.º territorio da extinicta colonia de Ca


nanéa , no municipio de Iguape, cortado pelo rio que lhe dá o
nome; e dista do porto de Subaúma 21 kilometros, e da fre
guezia de Jacupiranga 14, sendo deste porto facilmente commu
nicavel com a cidade de Iguape.
Actualmente estam alli medidos e demarcados 64 lotes, po
dendo ser de prompto dividido mais 200 nos terrenos devolutos
do territorio outr'ora descriminado .
A area medida e demarcada em lotes é de 26.094.035.000,
e a devoluta contigua, de 48 :000.000.000 metros quadrados
approximadamente.
Alem disto, foi reservada a area de 073.675.50 metros qua
drados ás margens do Rio Pariquéra - Assú, para a divisão em
lotes urbanos e estabelecimentos da Sede Colonial.
A cultura que mais enthusiasmo tem alli despertado, é a do
café, cuja producção affirma-se estar na relação de uma arroba,
sejam 15 kilos, por 10 pés.
Esta planta fructifera produz naquella região ao terceiro
anno .
As terras sam livres de geadas, tanto nas elevações como
nos vales .
Para a cultura de cereaes, não se pode imaginar melhores,
bastando para nos assegurar disso o aspecto das frondozas
mattas que vestem essas terras .
Só existem dados estatisticos sobre a população deste Nu
cleo, relativos ao anno de 1887, que não dariam hoje uma idéa
verdadeira do seu estado " . ( 37 )

A 28 de Março de 1888 oficiava o dr . Francisco de Barros


e Accioli de Vasconcellos, ao inspetor das terras na Província de
São Paulo , comunicando que tendo sido autorizado por Aviso de
23 do mesmo mês, a mandar efetuar demarcação das terras de
volutas e respectiva divisão em lotes , na ex-colónia de Pariquera
assu , ordenasse o mesmo ao engenheiro dr . Joaquim Rodrigues
Antunes. para esse fim " convindo que, por meios brandos e
suasórios obtivesse dos atuais habitantes das terras do Estado, o
pagamento da importância devida, facilitando - lhes a demarcação
dos lotes ocupados e bem assim a construção das estradas indica
das na memória que apresentara ” .

Sòmente de 1887 em diante, como já vimos, começou a ter


existência real a colónia de Pariquera -assu, depois de estabelecidas
( 37 ) Relatório apresentado ao Inspetor Geral das Terras e Colonização,
pelo dr. João Bernardes da Silva , Inspetor Especial, no ano de 1889.
84 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

as primeiras famílias de agricultores para ali encaminhadas, no pe


ríodo decorrente de 30 de Maio de 87 a 26 de Outubro de 1888,
quando existiam :

Sexo Sexo Sexo Sexo Sexo Total


Sexo | Sexo Sexo
M F м F M F M F

até 10 anos de 11 a 30 de 31 até 50 maiores de 50

10 6 12 6 6 7 1 0 48

Titulos provisórios expedidos 16

Do seu desenvolvimento, de então por diante , pode-se conhecer


pelo número de estrangeiros que a procuraram , como se verá pela
relação que extraimos dos competentes livros de assentamentos,
existentes no Arquivo do Estado, aos quais nos reportamos :

Anno de 1868 1887


Guilherme Goedke Alberto Barduco
Fortunato Zanella
1875 João Olivia
Fazoli Eugenio
Angelo Simonetti 1888
João Hanson Pedro Santini
Tancredo Carravier
1876 Arcari Giovanini
viuva Gustavo Melcher Ramponi Enrico
Rizzi Giacomo
1878 Gracioli Francesco
Fernando Melcher Pasini Giovani
Gustavo Nilsen Rizzi Vincenzo
Coppi Paulo
1880 Franc Constante
Julio Michaelis Carmine Ciandella
Alberto Goedk
1886 Luiz Cardillo
Ignacio Schulz Pellegri Luigi
João Haytzmann
1887 Pedro Haytzmann
Giuseppe Zanella Fava Vitto Guido
Marcello Marietto Augusto Sbissa
Zanella Baptista viuva Lodi Vincenzo
Raymundo Candido Carmine Luigi
Angelo Barduco Julio Marietto
Luiz Zanella Butturi Angelo
Giuseppe Pandovani Battarini Giuseppe
MEMORIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 85

1889 1892
Godlibe Barkmann Raphael Grupioni
Pedro Bellini Casemiro Berthoriko
David Dafoneli
Biaggio Franciosi 1893
Sanson Giuseppe José Kinckin Jor .
Franciosi Pietro João Garcia Alano
Buttini Carlos Antonio Hovilosky
Erick Erickson
Maximiano Gibertoni 1894
Navilli Ercole Bazoli Giacomo Felice
Lamagne Vincenzo Simoni Giacomo
Angelo Bertolleti Arcine Jacomo
Anna Grelte Affonso Bouillet
Marcon Vincenzo Leon Bouillet
Bonni Secondo Francisco Iwanski
Bonni Luigi Edmundo Bouillet
Vichi Angelo Delai Bartholo
Lamagne Angelo Maria Rossini Giovani
Pedro Salleti
1890 Antomdi Giuseppe
Valetim Olbnisz Felix Bouillet
Casemiro Blaski
João Ochocinski 1895
Josepp Paukowski Netis Adestem
Miguel Patykavski João Buaski
Josepp Paukowski Gregorio Gravinischi
Ignacio Kochorek Himon Joan
Ponssoni Gianni G. Roechi
Alexandre Weschesky Michol Hemon
Coppi Lourenço Milhoto Savokio
André Schiskwist Tlko Janovo
João Guttard Halom
Peter Zumbrum 1896
João Hardt Carlos Munkhammer
Maria Kinchin Godofredo Humphiers
Theophilo Redys Joseph Kuprich
Wladislau Hellegda Giroli Annibal
Pedro Witascki Antonio Brosmann
Joseph Zelisky Matheus Ilek
Adão Brzezinski Matheus Grozz
José Kugler João Baptista Bromler
João Paulkosky Augusto Abraham
João Kugler Stephan Kern
Adão Paulkosky João Oweraxski
Antonio Valdosky Christian Pulhl
André Paulkosky André Powieniecz
Hermann Arnord
1891 Josep Sanin
Emilio Orbelli Franz Lemberg
Concetta Buzzo Voichetz Stonoga
Bonni Giovanni Pedro Izarosky
Bonna Giuseppe João Owezarski
Arnoldo Lamagne Mathias Krimn
Grupione Archangela José Mireider
João Schmit
86 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

João Schule Rodolpho Shlenp


Ignacio Schule Menon Luigi
Demetrio Forme Augusto Knauft
Ernesto Forme Ernesto G. Wolff
Francisco Brosmann
Giovani Siberná 1898
Pedro Palinkas Antonio Bauer
João Verneck Louiz Chalet
Valentim Siedlarczyk Carlos Oscar Sohn
Venceslau Siedlarczyk José Jacob
Francisco Siedlarczyk Jacob Hans
Emilio Volgelein Floriano Kubalat
Mattes Yrlek Francisco Bauer
Previd Paschoal Francisco Chirom
Cremor Luigi Francisco Jacob
Pandoram João João George Madeleir
Italo Casela Simon Giuseppe
Stanislau Kugler Juliens Richard Dietrich
Stanislau Vesguerber George Lane

1897 1899
André Pavience Frederico Wenda
José Hellegda Stephan Pioker
Stephan Senik Max Alter
Luiz Bremar Otto Donath
George Engel Henrique Klepa
Standislau Kwiathowski Joseph Ambach
Michel Kotona Stephan Klettlinger .
Giovannini Valerio

NOVAS INFORMAÇÕES SOBRE A COLÓNIA

A 5 de Setembro de 1890 , apresentava o engenheiro Jeróni


mo Francisco Coelho, chefe da Comissão de Terras de Pariquera
assú , ao dr . António Cândido de Azevedo Sodré, Delegado de Ter
ras e Colonização do Estado de São Paulo, o seguinte e circuns
tanciado relatório :

“ A Colonia está situada a cerca de 46 kilometros da cidade de Iguape,


39 de Cananéa e 14 da freguezia de Jacupiranga, sendo atravessada pelo rio
Pariquéra - Assú, comprehendendo uma vasta zona de terra de excellente qua
lidade em que se encontram mattas de notavel desenvolvimento com abundan
cia de madeiras de lei , e presta-se a toda a especie de cultura .
“ A qualidade das terras e proximidade de dois portos de mar, Iguape
e Cananéa, mostrando o futuro que pode esperar a Colonia e se attender
á circunstancia de ser ella em breve atravessada na maior parte pelo ramal
da Estrada de Ferro Sul- Paulista que de Iguape se dirige ás minas de ferro
do Jacupiranguinha, cujos estudos já se acham bastante adiantados, e ao
desenvolvimento que se pode dar, pois ha grandes extensões de terras devo
lutas em seus arredores, poder -se -ha esperar que esta Colonia venha a ser
a 1.a do Estado de São Paulo .
“ O estado actual da Colonia resente -se da falta de direcção. A Cultura
preferida pelos colonos é a do café cujo desenvolvimento alli é notavel , pois
MEMÓRIA HISTÓRICA DE JACUPIRANGA 87

em 3 annos já remunera os lavradores , entretanto muitos colonos estabeleci


dos a mais de 3 annos tem ainda difficuldades em viver. Julgando eu de to
da a vantagem ser introduzido tambem outras culturas , pelo menos de al
guns cereaes para consumo dos proprios colonos, ordenei que tratassem des
sa cultura conjunctamente com as do café .
As casas dos colonos são pessimas, mal construidas, a maior parte sem
serem barriadas, e todas cobertas de palha ; além de pouco higienicas têm o
inconveniente de serem de muito pouca duração, estragando-se antes dos co
lonos se acharem em condições de edificarem suas casas definitivas .
“ Muitas casas assim construidas necessitam de reparos e n'esse sentido
recebi grande numero de reciamações . A viação interna da colonia é má ;
os caminhos vicinaes em vez de procurarem servir aos diversos lotes e o
terreno mais plano e portanto de mais facil tranzito, satisfazem justamente
ás condições contrarias ; deixam de passar em alguns lotes e quasi sempre
desviam -se dos lugares planos para subir a grandes alturas de onde tornam
se a descer, o que poderia ser perfeitamente evitado.
“ Duas são as estradas geraes que ligam a Colonia aos mercados mais
proximos ; Jacupiranga e Iguape. A construção da 1.a já foi encetada e
faltam apenas cerca de 4 kilometros para ser concluida ; a 2.a, que é mais
importante por ser mais necessaria , ainda não foi iniciada, existindo um pro
jecto que não tendo sido aprovado, foi devolvido afim de ser organisado no
vo orçamento e para isso necessito fazer alguns estudos , porque penso ser
de grande vantagem a modificação d'aquelle traçado para evitar grandes mo
vimentos de terras . O local escolhido para séde da Commissão foi o peior
possivel; muito proximo do rio Pariquéra - Assú é muito sujeito a grandes
innundações e a parte mais afastada é por demais accidentada, faltando tam
bem as condições necessarias para o desenvolvimento como deve ser a séde
de uma Colonia que não é mais do que as bases de uma futura povoação .
Os edificios que existem na sede são pequenos ranchos de palha em um dos
quaes funciona o escritorio desta Commisão e é alugado a um colono, não
havendo commodo para o pessoal estabelecer - se na séde da Colonia, condi
ção necessaria para seu progresso e boa ordem .
“ Existe tambem um barracão que serve de alojamento aos immigrantes,
composto de dois compartimentos e um quarto , acha - se porém em máo estado .
“ Em um outro pequeno rancho funciona a escola regida pelo interprete e
frequentada, segundo a matricula por cerca de 50 alunnos de ambos os sexos.
Acho de toda conveniencia ser esta escola creada officialmente e para isso
peço - vos a vossa attenção, lembrando - vos que na colonia de Cananéa ha uma
escola que não é frequentada e que talvez fosse conveniente a remoção do
pessoal d'aquella escola para a d'esta Colonia .
· Creio ter justificado as providencias seguintes, que julgo indispensa
veis para a execução das quaes vos peço autorisação : estudos, organisação
de plantas e orçamento para a construção da estrada geral da Colonia , cons
trução de edificios para administração, escola, posto policial e cadeia, mu
dança da séde para local mais conveniente, concessão de algum auxilio aos
colonos cujas casas ameaçam cahir, e aos nacionaes que quizerem pagar suas
dividas ao Governo, nomeação de um medico, creação de uma cadeira de ins
trucção primaria e acquisição de 4 animaes para o serviço da Commissão .
Tendo eu de organizar agora o serviço, tenho que fazer executar ordens con
trarias aquellas em cujo regimen tem vivido a Colonia até hoje e para ga
rantia de sua execução e tambem para manter a ordem , peço -vos soliciteis
do Sr. Governador ordem afim de que com urgencia parta para alli um des
tacamento policial as minhas ordens.
Tenho-vos mostrado o estado actual da Colonia, não para valorisar os
serviços que possa prestar, mas para salvar a minha responsabilidade futura
88 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

e se esta exposição excede a vossa espectativa, peço -vos que mandeis ins
peccionar aquella Colonia por pessoa de vossa confiança antes de me conce
derdes as autorisações que acima pedi.
" Saude e fraternidade. ( assignado ) O engenheiro chefe Jeronyın .
Francisco Coelho " .

Como acabamos de ver, somente dessa data em diante foi que


se verificou o primeiro passo para o desenvolvimento da colonia ,
com as novas medidas postas em prática pelo novo chefe da co
missão .
Tomando na devida consideração a proposta apresentada pelo
dr . Jerónimo Francisco Coelho, resolvia o governo do Estado , por
indicação do chefe de polícia em Ato de 12 de Dezembro de 1900 ,
criar um distrito policial no Núcleo Colonial de Pariquera -assu ,
do município de Iguape, com a denominação de Pariquera-assu e
com as seguintes divisas :

“ Com Iguape, divide - se no Pariquéra pelo travessão que,


do lote n.° 41 , divide-se com a fazenda da viuva Marciana Re
gis e filhos, seguindo pela linha que vai ao porto de Manoed
Alves, no rio Pariquéra -mirim , logar denominado Braço Preto
e seus affluentes; do lado do mar com o Subauma, a fazenda
do Serro Azul ( Biallé ) e a fazenda do dr. Castro, etc. Do
lado de Cananéa, com as cabeceiras do rio Aririaia -inirim e
com a cx -Colonia de Cananéa e com Jacupiranga e rio Canha
até as divisas da ex-colonia . Com os moradores do rio Jacu
piranga, pelo travessão do nucleo que divide os sitios das mar
gens do rio até o ultimo lote da linha 13 de Maio, nos fundos
da fazenda Indaiatuba e o travessão que segue até Jacupiran
ga, na ponte do rio Canha, e affluentes deste rio, bem como os
affluentes do rio Pariquéra, do lote n .° 41 e 42 para cima até
a sede do nucleo ” . ( 38 )

Era o primeiro ato para a vida da nova localidade que então


se iniciava na senda do progresso .
Outras medidas foram ainda tomadas pelo governo, afim de
incrementar o desenvolvimento do núcleo e atrair para o mesmo
maior número de colonos, como fossem a criação de escolas , no
meação de médico e farmacêutico , alem dos membros de sua dire
toria . Assim organizado , era natural o seu progresso rápido e se
guro . E tanto assim , que poucos anos depois já se verificava a
emancipação do núcleo, que teve lugar a 17 de Maio de 1923, pelo
decreto n . ° 2.602 .

( 38 ) Diário Oficial do Estado, 14 de Dezembro de 1900 .


UM CONGRESSO INTERNACIONAL
DE FILOSOFIA

Luis WASHINGTON

SUMÁRIO

1. História do Congresso 2. Ouvindo : Otto


Friederich Bollnow ; 3. Nicola Abbagnano ,
-- 4. Francisco Larroyo ; -- 5. Ramón Ceñal;
--- 6. Delfim Santos ; -- 7. Carlos Astrada --
8. Diário de Viagem – 9. Vicente Licinio Car
doso ( Um capítulo desconhecido na História da
Filosofia Atual no Brasil ) 10. Anexo : Con
fusão no Congresso (rapsódia ).

1 . --- HISTÓRIA DO CONGRESSO

Dentre os últimos congressos internacionais de filosofia, tal


vez nenhum déles se revestiu de tamanha importância não só
filosófica como jornalistica como o patrocinado pela Universidade
Nacional de Cuyo e que se encerrou solenemente em Mendoza
em abril último . Em torno dêsse certame tôda a imprenssa do
mundo, primeiro limitou-se a atacá-lo pelo possível " peronismo"
que podia eclodir, duma hora para outra, arrastando para essa ideo
logia da chamada “ terceira posição ” inadvertidos pensadores ; de
pois, houve uma espécie de espectativa angustiosa sobre as " po
nências” finais , que, quiça, iriam recomendar o fascismo como
doutrina salvadora do mundo e da metafísica . O que ocorreu , de
90 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

fato foi algo ben diverso , cuja história subterrânea procuraremos


narrar aqui sem " parti- pris ", objetivamente .
Como é de conhecimento de todos, caminha a Aragentina em
passos largos para uma teocracia . Por exemplo , só pode ser pre
sidente da República, segundo o artigo 77 , da nova Constituição,
aquele que " pertencer a la comunión Católica Apostólica Romana ".
Unida a Igreja ao Estado, gozam os padres dos mais amplos
poderes , estando em muitos postos -chaves, principalmente no setor
educacional em todos os graus . E , como não podia deixar de ser,
aos ilustres membros da Companhia de Jesus cabe a parte mais
difícil. Exatamente para definir a posição do pensamento filosófico
argentino como enquadrada na mais lidima linha aristotélico -to
mista , organizaram os jesuitas, à sorrelfa e à socapa , o Congresso
cuyano , certame éste puramente nacional . Nesta primeira etapa
dos trabalhos sobressairam -se os inacianos Ismael Quiles e Otávio
Nicolas Derisi, e o tomista sem sotaina Nimio de Anquim . E para
outubro do ano passado acertou - se a realização do Congresso em
apreço .
Nessa altura dos acontecimentos o Instituto de Filosofia da
Universidade de Buenos Aires dá o grito de alarme, apontando o
perigo eminente e conclama a reunião de todos para a causa co
mum : salvar o incipiente pensamento filosófico argentino de seu
total soçõbro, consequência imediata de sua iberização clerical e
medieval. Já agora não se distinguem cores políticas ou brigas
domésticas, e vemos então cerrarem ſileira, ao lado de Carlos As
trada e Juan Guerrero , os mais próximos amigos e discipulos de
Francisco Romero : Vasallo, Pucciarelli, Virasoro, Mondolfo e tan
tos mais .
O Congresso é adiado. Novos convites são feitos por ambas
as partes . Os católicos convocam jesuitas de Portugal, Espanha, ou
católicos do Canadá, México, Chile, Perú, Brasil, Itália , Alema
nha . Os não católicos, por sua vez, também convocam companhei
ros de idéias em muito maior número . Os campos estão agora
perfeitamente delimitados . Ha duas frentes antagônicas, e graças
a isto reune - se em Mendozza uma pléiade de pensacíores dos mais
expressivos na atualidade. Da Itália vem seu maior filósofo atual :
Abbagnano ; da Alemenlia, o discipulo dileto de Husserl, Eugen
Fink , editor das obras do criador da fenomenologia ; dos Estados
Unidos chega K. Leowith o maior heideggeriano da América ;
da Suiça , Wilhelm Szilasi , sucessor de Heidegger em Friburg ; e
isto sem contarmos Von Uexkuel , Grassi , Larroyo, Landgrebe,
Gadamer, Bollnow e Broecker . Impossibilitados de comparecerem
enviam teses e mensagens N. Hartmann , Croce , Heidegger, Marcel
e Russell
UM CONGRESSO INTERNACIONIL DE FILOSOFIA 91

As sessões particulares e plenárias se suceciem sob uma atmos ,


fera carregada, pois os jesuitas argentinos --- não os estrangeiros
se sentem não só derrotados como e aí está sua maior maglia
- lesados : o Congresso que parecia ser deles " acabou franca
mente existencialista . O caldo entorna quando Carlos Astrada,
numa sessão plenária , lê sua conferência na qual definia o existen
cialismo como “ filosofia de nossa época ", e que pode ser sinteti
zada numa frase : hoje só pode haver uma filosofia , a da existên
cia ; e só pode haver uma filosofia da existência , a não religiosa ;
tudo o resto não passa ou duma tentativa de vivificar múmias ou
de escamotear a verdadeira filosofia da nossa época . Não será
preciso dizer que tais afirmativas de Carlos Astrada criaram tu
multos, ensejaram protestos e até xingações. Charles de Koe
ninck , representante canadense formado pela Lovaina chegou mes
mo a desafiar o filósofo argentino para um debate público: tomis
mo " versuis ” existencialismo, debate éste que, afinal, não se rea
lizou .

Esta é a história subterrânea do Primeiro Congresso Nacional


de Filosofia , patrocinado pela Universidade Nacional de Cuyo .
Resta narrar a outra face da moeda e esta nada têm de escuso ou
sombrio . Tudo correu ás maravilhas, as teses foram semipre de alto
nível assim como as discussões se mantiveram em plano parla
mentar, bem comportado, não obstante a babel das línguas. Por
exemplo , a tese de Nicola Abbagnano --- " Il possibile e il virtuale"
foi discutida em alemão, francês , italiano, espanhol, inglés, e
outras linguas teriam intervido não fóra a premência de tempo .
Em verdade quen saiu ganhando com isso tudo foi o próprio
pensamento latino - americano , que somente com essa oportunidade
única pôde entrar em contacto vivo com tôdas as correntes do
pensamento atual e , no mais das vezes, por intermédio de pen
sadores que representam hoje o ápice dla filosofia contemporânea .
A comissão organizadora do Congresso mendozino (jividiu as
sessões ein plenárias e particulares, sendo livre a discussão somente
nestas ultima, pois os trabalhos apresentados foram definidos como
" teses ” , enquanto nas plenárias os trabalhos foram chamados “ coli
ferências " . Assim , na primeira sessão plenária, delicada á filosofia
na vida do espírito, foram lidos os seguintes trabalhos : Nimio sie
Auquin : “ Filosofia y Religión " ; Ernesto Grassi: " La filosofia nella
tradizione umanistica " ; Luis Juan Guerrero : “ Encenas de la vida
estética " ; Charles de Koenick : “ Votion marxiste et notion aristo
télicienne de la contingence" ; Angel Vasallo : " Subjetividad y trans
cendencia ( Esencia de la filosofia ) " . Na segunda sessão plenária,
92 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

dedicada à pessoa humana , foram lidos : D. Brinkmann : " Mensch


und Technik ” ; H. Delgado : “ La persona humana desde el punto
de vista psicologico ”, O. N. Derisi : “ Fenomenologia y ontologia
de la persona ” ; N. Hartmann : " Das Ethos der Personlichkeit ” ;
H. Kuhn : “An Approach to the Problem of a Philosophical An
thropology " . Na terceira sessão plenária, dedicada ao existencialis
mo : N. Abbagnano : - " L'Existencialismo nella filosofia contem
porânea " ; C. Astrada : “ El Existencialisino, filosofia de nuestra
epoca " ; H. Benitez : " Hacia a la existencia autentica " ; K. Leowith ,
“ Historical Background and Problem of Existenzialism " ; G. Mar
cel : " Le Primat de l'Existentiel . Sa portée éthique et religieuse "
Na quarta, dedicada à filosofia contemporânea, principalmente no
que diz respeito às direções filosóficas atuais em diferentes paises :
R. Ceñal : " La filosofia española contemporânea " ; Jean Hyppolite :
" La philosophie française contemporaine: du bergsonisme a l'exis
tencialisme" ; G. Mueller : " North - american philosophy " ; Luigi
Pareyson : " La filosofia italiana contemporanea " ; Wilhelm Szilasi :
“La philosophie allemande actuelle " . Na quinta, dedicada à filosofia
e à cidade humana : Gaston Berger : “ Le philosophie et la société ” ;
L. L. Bernard : " The changing patern of social philosophy in the
United States in the period of the Republic ; J. Corts Grau : " Co
munid y multitude " ; C. Cossio : " La filosofia y la ciudad humana " ;
U. Spirito; " Individualitá e collettivitá ” . Finalmente, a sexta ses
são foi dedicada às comemorações dos centenários de Francisco
Suárez, Wolfgang von Goethe e Enrique José Verona e a dois filó
sofos que atuaram pessoalmente na Universidade Argentina, Félix
Krueger e Guido de Ruggiero, cujos trabalhos foram lidos, respecti
vamente, por E. B. Pita, Fritz-Joachin von Rintelen , José Vascon
cellos , E. Pucciarelli e M. A. Virasoro .
As sessões particulares foram divididas nas seguintes sub
sessões I ) Metafisica , II ) Situação atual da filosofia, III ) Filosofia
da existência, IV ) Lógica e gnoseologia, V ) Axiologia e ética, VI )
Estética , VII ) Psicologia , VIII ) Epistemologia e filosofia da natu
reza , IX ) Filosofia da história , da cultura e da sociedade, X ) Fi
lofia da educação, XI ) Filosofia do direito e da política, XII ) His
tória da filosofia, XIII ) Filosofia argentina e americana. Realiza
ram - se ao todo 22 sessões particulares, tendo nelas tomado parte
55 delegados estrangeiros, representando 18 paises europeus e ame
ricanos e 94 delegados argentinos .
Como epilogo a ética profissional jornalistica impõe um es
clarecimento , que noutra situação seria perfeitamente dispensável :
durante a permanência dos delegados estrangeiros tiveram eles a
mais ampla liberdade de locomoção, de opinião e de interpelação .
-1
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 93

2. OUVINDO OTTO FRIEDERICH BOLLNOW

Logo na manhã seguinte à nossa chegada à Buenos Aires, se


guimos diretamente por via aérea para Mendoza, a bordo dum
DC-3 da " Zonda " . Em meio de turistas argentinos que iam assis
tir à famosa festa da vindima estavam vários delegados estrangei
ros que participariam do Primeiro Congresso de Filosofia . Uma
parte da delegação brasileira, presidida pelo acadêmico Carneiro
Leão, diretor da Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil,
seguiu também . Como companheiro de viagem , sentado ao nosso
lado, tivemos o prof. Otto Friederich Bollonow , nome este hoje
bastante conhecido do nosso público de filosofantes, depois da tra
dução portuguesa de seu livro " Filosofia Existencial" , feita por
Cabral de Moncada . O vínculo que este livro representa, entre o
pensador germânico e o público brasileiro, sugeriu - nos a idéia de
ouvi-lo, numa entrevista a três mil metros de altura, já que a pai
sagem pampeana , sempre a mesma e monótona, convidava-nos ao
recolhimento, ao sono, ou ... a metafisica .
O prefácio de Cabral de Moncada á sua tradução da “ Filo
soſia Existencial” omite qualquer dado bio -bibliográfico sôbre o
professor Otto F. Bollnow . No entanto , o atual catedrático de
filosofia e pedagogia da Universidade de Mainz tem um “ curricu
lum vitae” dos mais interessantes . Assim , em 1939, Bollnow era
professor de pedagogia na Universidade de Giessen , dissolvida de
pois da guerra, o que levou a transferir-se para a Universidade de
Kiel e depois , para a de Mainz .
Sua orientação filosófica, determinada pela escola de Dilthey,
hoje aparece estriada por profundas influências das teorias de Hei
degger. Além de numerosos artigos sobre filosofia das ciências do
espirito e sobre a filosofia existencial alemã e francesa, devem -se a
Bollnow eruditos tratados e ensaios, tais como : “ A filosofia da
Vida ", " Wilhelm Dilthey : uma introdução à sua filosofia " , " A
essência dos estados d'alma ", a já mencionada " Filosofia existen
cial”, etc. Presentemente está na última demão seu novo trabalho :
" O existencialismo francês ", que irá fazer parte da caletânea de
estudos filosóficos que, com o título de " Systematische Philoso
phie ”, é dirigida e editada em Berlim por Nikolai Hartmann .
Enquanto o " Douglas " vai vencendo os mil e duzentos quiló
metros que medeiam entre Buenos Aires e a capital de Cuyo, o
reporter faz perguntas e anota as respostas do professor alemão ,
num autêntico " tour de force " , pois Bollnow, tão simpático, pos
sui duas barreiras de difícil acesso : sua lingu ,a pois além do ale
mão, só é capaz de se exprimir em teuto - italiano; e sua infinita e
94 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

lírica timidez, o que complica tudo . Mas, as quatro horas de vôo


são tempo suficiente para um reporter paciente alimentar o dia
logo e trazer para os leitores uma coversa inteligente .
Assim , a uma pergunta sobre a situação atual da filosofia na
Alemanha , ainda sob os efeitos da guerra e , mais do que tudo,
sob os efeitos da paz, que no paíz de Heidegger quer dizer derrota .
respondeu o professor Bollnow .
“ Depois do hercúleo esforço bélico do povo alemão , é natu
ral que a nossa situação espiritual se ressinta da situação material,
que é de exaustão , de cansaço, de desespero e de desânimo . Con
tra tudo isto, porém , lutamos com denodo . E se por um lado , as
publicações filosóficas são minimas e de qualidade inferior, por
outro lado nos diálogos vivos e vivificadores das Universidades o
tom já é mais elevado . Naturalmente, longe estamos do ápice a
que atingimos antes da guerra, mas estou certo que voltaremos
àquela cumieira do pensamento e prosseguiremos na nossa rota
e no nosso destino " .
1
O tom otimista das palavras de Bollnow fez -nos esquecer sua
timidez, levando -nos a perguntar- lhe sobre os efeitos do nazismo
no pensamento filosófico alemão . Vêsse sentido, sua resposta foi
categórica :
" Antes de mais nada , o público não inteirado de filosofia
tem uma idéia errónea dêsse problema. Jamais o nazismo pesou
no nosso pensamento filosófico, pela razão simples de que a ideo
logia hitlerista era visceralmente contrária á filosófica e como tal
não teve nenhuma influência . Por exemplo , ninguém conhece os
livros de Rosenberg, pois estiveram sempre ausentes dos ambien
tes universitários não obstante os esforços do governo em impô
los . À propaganda do Estado totalitário reagiam os professores
tendo alguns deles pago com o exilio essa independência e essa
atitude ” .
Nessa altura do diálogo, impunha - se a pergunta sobre as atuais
correntes do pensamento alemão . Formulada, teve esta resposta .
“ Depois da guerra o fato mais curioso a assinalar é a in
fluência do existencialismo francês na Alemanha , e que aí surgira
antes de 1930 por obra de Heidegger e Jaspers, tendo durado até o
advento do nazismo. Estando o país sob o guarite da cruz ga
mada, ausentou -se o existencialismo das universidades alemãs para
refugiar- se em artigos de revista tão apenas . Seu retorno, hoje,
é triunfal, estudado agora nas universidades, principalmente o
pensamento de Karl Jaspers, mais que o de Heidegger. A expli
cação desta preferência me parece bastante clara : Jaspers com o
advento do nazismo, quebrara a pena , emudecera . Vinda a der
rota , começou a publicar seus trabalhos na Suiça , visando temas
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 45

que viessem esclarecer a presente situação espiritual européia, tais


como seu ensaio sobre a culpa da guerra, que obteve a inais
strondosa ressonância . Além disso , veio a lume seu livro sobre
a verdade, de mais de mil páginas , cuja redação levou mais de
dez anos, e que a meu vêr é o mais importante trabalho filosófico
saido depois da guerra . O escopo de Jaspers nesse livro , é en
contrar , através da existência , um novo conceito de razão para
fundamentar uma nova lógica filosófica " .
“ Quanto a Martin Heidegger – prossegue Bollnow -- , o se
gundo leader do nosso existencialismo, depois de “ Sêr e Tempo ”,
publicado em 1927 , não editou nenhum grande livro , mas apenas
alguns raros ensaios de diminuido tomo, como por exemplo aquele
sôbre a poesia de Hoelderlin , onde já se pode notar uma grande
revolução no pensamento heideggeriano . No ano passado , veio
a lume o último desses ensaios, versando o Humanismo, onde
se nota a mais importante evolução dêsse pensamento , do ponto
de vista da existência , para a filosofia do sêr e onde também se
encontra , pela primeira vez, uma grande afinidade co mos pen
sadores antigos , principalmente com os presocráticos . Nisso tudo,
porém , falta sempre o livro sistemático, carência esta, aliás , que
mais dificulta tôda a filosofia alemã dos nossos dias . Mencio
nar os discípulos de Heidegger seria excessivo, pois sua influência
é enorme, bastando assinalar que, com exceção de um só, todos
os delegados alemães ao Congresso mendozino ou são discípulos
diretos de Heidegger ou são por ele fortemente influenciados” .

" Há, ainda , outra corrente importante, cingida ao pensa


mento realista e que tende a uma ontologia, representada princi
palmente por Nikolai Hartmann . Sua filosofia , muito sistemática,
visa as diversas regiões do sêr . Seus discípulos são incontáveis
também . Quanto ao movimento neo -escolástico , não obstante sua
presença entre nós, seus representantes não têm , pelo menos até
agora , nenhuma notoriedade. De resto , no próprio catolicismo ale
mão há muitos pensadores que seguem a direção existencialista ,
como o caso de Romano Guardini, que muito influenciou a nossa
juventude. E ' também o caso de Peter Wust que quer sintetizar
a escolástica tradicional com o pensamento da filosofia existencial ” .
Nosso DC- 3 continua firme na sua rota . A paisagem que se
vislumbrava antes, campos de trigo, milho ou pastos verdes man
chados pelo gado marron , é agora outra, árida e desértica, pois já
navegamos em pleno céu das caatingas cuyanas . Estamos próximos
de Mendoza . E juntamente com o término da viagem caminha o
epilogo da entrevista filosófica . Os minutos que nos restam são
preciosos. Indagamos, então , com sofreguidão, a propósito do
1
1

96 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL


1

pensamento marxista na Alemanha de hoje. Bollnow responde


com grande dificuldade, talvez inibido pela própria pergunta :
- " É público e notório que o pensamento marxista, durante
a noite do nazismo, esteve fora da lei, exilando alguns ou fa
zendo calar outros . No primeiro caso está Mannheim e no se
gundo Tönnies . Atualmente, o transporte de livros de uma
zona para outra é proibido, dai nada se sabe o que ocorre no
outro lado da chamada " cortina de ferro " . Desta forma, posso
afirmar sem erro que o pensamento marxista é absolutamente
desconhecido na Alemanha, o que de resto não deixa de ser uma
lástima. O mesmo, aliás, se passa com o pensamento de Dilthey,
que é, sem dúvida, mais conhecido na América Latina do que na
própria Alemanha ... "
“ De qualquer forma, porém , ---- conclui o prof. Otto Fried
rich Bollnow - sob tais e tantas vicissitudes caminha o pensa
mento filosófico germânico . Suas perspectivas, é óbvio, são muitas,
sobressaindo - se por sua importância a ontologia que aparece nas
novas obras de Heidegger . Isto , com certeza, irá exigir logo mais
uma nova relação entre a filosofia radical e as ciências singulares .
Quanto à atual querela em torno do pensamento de Heidegger, que,
segundo uns, caminha com passos largos para um ateismo tipo
Nietzsche, e , segundo outros, está mais próximo do pensamento
tradicional aristotélico, nada se pode dizer por ora . No que diz
respeito à primeira solução, o ateismo em hipotese alguma che
gará a perturbar o sistema heideggeriano , mesmo porque o pensa
mento de Deus não encontra urn lugar certo na filosofia da exis
tência, de modo especial aquela representada por Martim Heideg
ger . Resta -nos, portanto , aguardar a evolução desse formidável
pensamento "
Į
O comissário de bordo manda -nos colocar os cintos de segu
rança . Das janelas do avião vêem - se agora as grandes moles andi
nas . Seus picos estão cobertos de neve, visão deslumbrante para
o reporter que nada parecido vira antes . Lá , longe, surge a
pista de concreto . Vamos aterrar ...

3. OUVINDO NICOLA ABBAGNANO

Em pleno coração dos Andes, numa altitude mais alta


que aquela mantida pelos aviões de rota São Paulo -Rio, tendo
por cenário enormes montanhas igneas recobertas de gelos persisten
tes, como se fossem descomunais sorvetes de chocolate com topetes
de chantilly, e sob o açoite de frigido vento de 3. ° C. , está loca
lizado a Hotel Perón , de helvético luxo e acariciante calefação.
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 97

Para ai se encaminham os filósofos estrangeiros que acorreram ao


Primeiro Congresso de Filosofia, patrocinado pela Universidade
Nacional de Cuyo. Enquanto se aguarda o almoço, beberica - se
no bar, ao pé de funcionais lareiras . Acertamos com o prof . Ni
cola Abbagnano uma entrevista durante a subida da serra, entre
solavancos e enjôos, num percurso de duzentos quilômetros de
zig -zags ascensionais, precipícios, diante duma aurora sangrenta
que se inaugura todo dia no této América . Lançando - se mão de
mais um farrapo da sovada frase de Churchill , não seria exagero
dizer -se que a beleza andina é conquistada com suor e sangue...
Mas, lá está Abbbagnano, vamos ouvi-lo .
Nicola Abbagnano é um filósofo ainda não devidamente co
nhecido entre nós . No entanto , o atual catedrático da Universi
dade de Turim é , nada mais nada menos, o último az da grande
quadra dos leaders da filosofia existencial dos nossos dias, cuja
trinca restante se compõe de Heidegger, Jaspers e Sartre . Nas
cido em Salermo, em 1901 , Nicola Abbagnano evoluiu do irra
cionalismo de sua tese de láurea para o atual existencialismo
positivo . Formado na escola de Aliotta, cedo abandona o ponto de
vista gnoseológico do mestre, sutentando que não é possível nos
servir do pensamento para sair dēle, mas, por outro lado, sus
tenta Abbagnano que " a crença espontânea e profunda do homem
comum ”, a que se traduz na " relação epistemológica e da verdade
como correspondência, é o produto de uma experiência diversa da
do puro conhecer ”, em cujo seio “ nunca poderia encontrar nasci
mento ” . Dez anos mais tarde, influenciado por Husserl , elabora
um existencialismo pessoal na obra “ A estrutura da existência"
( 1938 ), seguida depois da guerra pelas " Introdução ao Existen
cialismo", " Existecialismo positivo ” e “ Filosofia, Religião, Ciên
cia ” .
O conceito de " estrutura " é central na especulação de Abbag.
nano . Permite-lhe dar a seu existencialismo um carater positivo,
que lhe diferencia do de Heidegger e do de Jaspers. Para Abbag
nano é preciso considerar “ o esforço para o sêr, não só com rela
ção a sua situação inicial , nem só com relação a sua situação final ,
mas na unidade da situação final e da situação inicial " . Esta for
mulação conduz a análise existencial aos seguintes primeiros resul
tados positivos: 1.9 o constituir- se a existência enquanto estrutura
e problematicidade pura ; 2 ) O constituir- se a existência enquanto
estrutura da possibilidade, ou possibilidade transcendental" . Exa
tamente salientado a importância e a autonomia da categoria
do possível visou sua comunicação ao Congresso cuyano, tese esta
que empolgou a atenção de todos os congressistas, atacada de
modo cerrado pelo tomistas. Claro está que seria excessivo um tra
98 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

balho de síntese do pensamento abbagnânico, à guisa de nariz -de


cêra, nesta entrevista, mesmo porque não teria cabimento . O
que importa , por óra , é ouvi-lo . Ouçamo-lo, pois .
Nossa primeira pergunta , como não podia deixar de ser,
versou sõbre " porque” Nicola Abbagnano chegara ao existencia
lismo . Sua resposta foi esta :
“ Por uma razão simples : o existencialismo é a filosofia que
corresponde exatamente ao clima de nossa época . Exprime ele os
problemas, as dúvidas e as aspirações e as relativas certezas de
hoje . Sua principal caracteristica é o abandono de certos mitos
que dominaram a filosofia do século passado : o mito do infinito ,
por exemplo , a razão infinita de Hegel. Ao contrário, o existen
cialismo é a filosofia do finito , do homem como homem e não um
deus caido do céu ou uma besta surgida do inferno . Isto é , um
homem que aspira a razão mas não é a razão, a verdade mas não é
a verdade , pois sempre encontra dificuldades, obstáculos, contra
dições, necessitando lutar e, não obstante , sem uma garantia de
sucessso" .
" Naturalmente prossegue Abbagnano - o finito aqui
assume várias direções . Por exemplo, pode assumir o aspecto
negativo da condição humana, isto é , no sentido de impossibilidade
do homem de atingir qualquer condição de estabilidade, de certeza ,
a existência como impossibilidade, a morte , que é o grande tema
do existencialismo alemão . Por outro lado , o existencialismo pode
desenvolver-se no sentido duma liberdade existencial como indife
rença . Não há, pois, um critério para se assumir um modo de ser :
Finalmente, pode -se encontrar na própria liberdade da existência
uma norma, um guia para nossa existência ; é esta a direção que
eu sigo : o homem é livre de escolher seu ato de escolha . E um
ato só é livre quando pode ser repetido . E ' o caso , por exemplo ,
quando se escolhe uma companheira . Assim sendo , a escolha hu
mana é verdadeiramente livre quando, uma vez efetuada, é ainda
sempre possível, isto é quando atinge aquela categoria que chamo
de " possibilidade transcendental ” . conceito este que dá um cri
tério humano sem apelar a um critério transcendente ao homem .
Mesmo porque não há nada de de absoluto já que não há certeza ,
e já que a liberdade absoluta não salva o homem ” .
Depois de uma pausa , acrescenta Nicola Abbagnano :
" Numa palavra : a minha possibilidade de escolha é aquela
que eu ainda posso continuar a escolher . Dai o existencialismo
poder assumir um desenvolvimento positivo, pois não coloca a
existencia humana diante do nada , do absoluto, mas sim coloca o
homem diante dum risco próprio da vida humana e que, contudo,
pode ser orientado " .
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 99

Indagado sobre a presente situação da filosofia na Itália, o


professor Nicola Abbagnano respondeu :
- “ Ainda que pareça estranho para um público estrangeiro
o idealismo representado Croce e Gentile já não existe mais na
Itália . Pertence ao passado e hoje não passa dum mero capítulo
da história do nosso pensamento filosófico . Quanto às atuais cor
rentes imperantes, podemos esquematiza -las assim : 1. °) espiritua
listas , no sentido francês , de interioridade, análise de vida interior,
etc. , representada por Guzzo, Carlini, Sciacca e alguns mais 2. )
tomistas, idênticas as de todos os paises , cujo centro é Milão 3.° )
existencialistas, sob as mais variadas formas , sendo porém a mais
viva das correntes atuais . Inclusive o existencialismo católico tem
um valioso representante em Castelli , que é o nosso Marcel, sem
contarmos o padre Fabro , que se revelou aqui em Mendonza , e
que aprendeu o dinamarquês para traduzir Kierkegaard. Em Mi
lão, o marxismo tem um representante muito importante na figura
de Banfi , que já transitou pelo existencialismo 4.0 ) finalmente, há
vários representantes do positivosmo lógico, estudiosos da filosofia
das ciências e da metodologia " .
Esclarecendo seu pensamento , aditou o prof . Nicola Abbag
nano :
“ O caso de Croce, superado em vários pontos, resistiu na
estética , pois sua influência no campo literário foi universal . Hoje ,
porém ha uma certa desorientação nesse setor do pensamento cro
ceano, pois alguns dos seus canones estéticos se tornaram inadap
táveis principalmente nas artes figurativas. Assim sendo, o idealis
mo de Croce- Gentille, não obstante a grande influência que exer
ceram ambos os pensadores meridionais, hoje se debate numa agu
da crise de superação ”,
Concluindo suas declarações , acentuou finalmente o professor
Nicola Abbagnano :
“ Não tenho a menor dúvida que o existencialismo , numa
evolução próxima, tornar- se-á , mais do que um corpo de doutrina,
um clima da filosofia contemporânea , e no qual podem encontrar
a sua expressão filosófica ainda outras correntes . Oportunamen
te irei demonstrar como só no existencialismo podem encontrar
recolhimento efetivo e uma formulação filosofica rigorosa os pres
supostos das mais diversas correntes , chamem - se elas instrumen
talismo de Dewey ou positivismo lógico do Circulo de Vienna "
Exatamente no término desta entrevista soara o gongo cha
mando -nos para o almoço, cujo éco rolou das cumieiras andinas,
perdendo - se como um grito de dôr nos abismos infinitos ...
100 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

4. OUVINDO FRANCISCO LARROYO

No patio da Universidade Nacional de Cuyo, no intervalo


duma sessão particular, ouvimos o professor mexicano Francisco
Larroyo, sob o olhar pétreo dum San Martin esculpido em rocha
andina. Trata - se dum filósofo ainda jovem , meio azteca, formado
em Marburgo e com estágio em Baden o que quer dizer , saido dos
dois maiores centros do néo -kantismo, De resto, o néo -kantismo
tem em Francisco Larroyo o único representante digno de men
ção de toda a América hispânica. Em torno de si agrupou um
conjunto de jovens- cheios de inquietações , tendo publicado “ La
Gaceta Filosófica de los Neokantianos de Mexico ”, que, infe
lizmente, teve uma vida muito efêmera . Além de várias obras
de divulgação, Larroyo é autor de " La filosofia de los Valores" ,
" Exposição e crítica do personalismo espiritualista de nosso tem
po ” , no qual polemiza com Francisco Romero, “ El romanticismo
filosófico ” , no qual critica uma tese de Joaquim Xirau etc.
Sua concepção da filosofia se acha expressa numa série de ar
tigos e cartas de caráter polêmico, recolhidos , posteriormente na
obra " Dos ideas de la Filosofia ", de parceria com José Gaos .
Acredita Larroyo que a filosofia deve limitar - se ao mundo dos va
lores e voltar as costas ao " mundo da metafísica ", que, na sua
opinião, carece de sentido na atualidade .
A uma pergunta nossa sôbre a situação da filosofia no México ,
assim respondeu o professor Francisco Larroyo :
" Sem exagero, não poderia ser melhor a nossa situação
filosófica . O centro desses estudos no México , é a Faculdade de
Flosofia e Letras da Universidade Nacional , com sede no Distrito
Federal . Como requer toda verdadeira especulação, priva entre
nós a livre docência , a liberdade mais radical e absoluta de catédra .
Além disso, nossa Constituição proibe aos sacerdotes de quaisquer
cultos possuirem cátedras. Isto é , os padres , pastores ou rabinos
não podem ser professores universitários . A meu ver isto é um
bem , porquanto, não obstante a proibição em apreço , todas as
doutrinas são permitidas e livremente divulgadas em todas as cáte
dras . O que quer dizer que um professor católico pode fazer filo
sofia católica . Além do mais, julgo um bem a proposição consti
tucional , pois temos no México a experiência dolorosa de que os
adeptos de religiões , graças ao seu aiã de proselitismo , ficam im
pedidos e impedem a livre manifestação das idéias" .
Indagado a propósito das direções da filosofia atual mexicana,
acrescentou o prof. Francisco Larroyo :
UM CONGRESSO ÎNTERNACIONAL DE FILOSOFIA 101

" No México, hoje em dia, todas as direções e correntes im


portantes da filosofia contemporânea têm representantes capazes
e competentes . Por ordem cronológica posso enumerar : 1.° ) a filo
sofia neo -tomista, chefiada pelo prof . Osvaldo Robles, cuja obra
principal , dentre as publicadas , é a “ Propedeutica Filosófica " ; 2.° )
a direção neo -kantiana, autêntica " filosofia oficial", detentora de
quatro cátedras universitárias e representada por Guillermo Hétor
Rodrigues, Manuel Teran, Miguel Bueno e por mim . Estes pen
sadores giram em torno dos legados de Marburgo e Baden, levan
do também em grande conta o idealismo de Croce e, através do
velho mestre italiano , de Hegel ; 3 ) a direção historista , repre
sentada por Leopoldo Zea, que escreveu importante " História do
Positivismo no México " ; 4.° ) no México teve certo éxito a filo
sofia de N. Hartmann, cujo representante maior é Eduardo Garcia
Máynez ; 5. ) o exstencialismo está representado particularmente
pelos professores espanhois, discipulos dirétos de Ortega y Gasset ,
tais como José Gaos, Recasens Siches e Eduardo Nicol ; 6.° ) há
ainda o que eu chamaria de filosofia existencialista orientada
para as ciências e para a teologia , liderada pelo mestre espanhol
David Garcia Baca ; 7.' ) finalmente temos Samuel Ramos, que
sustenta uma filosofia eclética, a um tempo historicista e existencia
lista . Quanto ao mestre José Vasconcelios, é inquadravel em
qualquer esqueina, pois tentou vários campos e hoje acredita que
se aproximou do tomismo, não obstante chamar sua doutrina de
“ filosofia da coordenação ” . Nesta sucinta resenha não posso omi
tir o nome de Antonio Caso, falecido em 1947, e que foi o nosso
filósofo mais influente neste século e de cujas lições nasceram
todas as direções apontadas. Isto se explica porque Caso foi um
eclético, um maravilhoso expositor da história da filosofia, ganhan
do desta forma adeptos para diferentes doutrinas" .
A propósito da contribuição dos exilados espanhois , informou
ainda o prof . Francisco Larroyo :

" Sem dúvida a chegada dos filósofos espanhóis foi benéfica


para o pensamento mexicano . Promoveram a mais ampla discussão
tilosófica de nossa história . De resto , não podemos esquecer aqui,
mais uma vez , a contribuição do mestre Antonio Caso, que se em
penhou fundamente pela vinda dos pensadores espanhóis. Infeliz
mente, porém , até agora nenhum deles chegou a formar o que se
poderia chamar uma " escola " filosófica, não obstante serem ampla
mente conhecidos e muito ouvidos nas catedras . Atravéz do Fondo
de Cultura Economico, os exilados espanhóis intensificaram muito
o movimento editorial. Assim sendo , no México não só se vem
102 REVISTA DO ÁRQUIVO MUNICIPAL

publicado novas edições dos clássicos do pensamento como há


enormes facilidades para a publicação de trabalhos originais, mes
mo de principiantes " .
Concluindo suas declarações, aditou o prof. Francisco Larroyo :
- " A meu vêr, a filosofia é diálogo . Isto porque eu considero
que só através de uma discussão e ponderação das diferentes dou
trinas podemos e devemos afirmar a nossa própria posição. No
México há a convicção de que só graças e um intenso intercâmbio
de idéias manterá a filosofia o valor e hierarquia que até agora
teve na América Latina. No meu paiz, de fato, temos uma Facul
dade de Filosofia e Letras que, por sua riqueza de direções , pode
equiparar -se a qualquer Faculdade do genero das Américas . Pelo
visto, portanto , o futuro da filosofia no México será dos mais
promissores, e isto porque não esperamos pelo futuro, mas cami
nhamos para ele " .

5. OUVINDO O PE . RAMON CENAL, S. J. (*)

Num cenário de opereta , tendo pela frente o pico gelado de


Topungato e atrás a valada do Rio Mendoza , está localizado o
Hotel de Potrerillos, branco na sua arquitetura colonial . Nessa
ambiência andina irá realizar - se uma sessão plenária do Congresso
de Filosofia , patrocinado pela Universidade Nacional de Cuyo,
numa espécie de expediente nitszcheano, onde uma contrafação de
Sils- Maria será o palco de especulações metafísicas . Para ai se
dirige um enorme " corso ” de automóveis, levando cerca de 200
congressistas, entre os quais o jesuita espanhol Pe. Ramón Ceñal,
S. J. , que será por nós ouvido .
Nascido em Madrid em 1907, o padre Ramón Ceñal pertence
à nova geração de modernos pensadores espanhóis que, não obs
tante formados no tomismo tradicional, estão integrados nas cor
rentes atuais do pensamento filosófico . Licenciado em filosofia
e teologia pela Gregoriana de Roma, estanciou na Alemanha e
atualmente faz parte do Conselho Superior de Ensino da capital

(*) O padre R. Ceñal, a propósito desta sua entrevista , numa carta


enviada ao autor, fez as seguintes observações : “ Muito agra
deço a atenção ... que o sr . concedeu a minhas palavras e infor
mações . Como o sr . diz muito bem , não era fácil nas condições
em que o Sr. tomou suas notas, dar fiel expressão ao que eu
The comunicava ; mas, no fundamental, sua informação corres
ponde fielmente a meu pensamento , ainda que, naturalmente ,
eu mesmo houvesse, talvez em algum ponto, usado de matizes e
reservas, que definissem mais exatamente meu próprio sentir" .
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 103

espanhola . É também autor de dois ensaios bem recebidos : “ Teo


ria da Linguagem de Karl Buhler” e “ O problema da Verdade
em Heidegger ” , além de inúmeras traduções e prefácios, e notas
inseridas nas principais publicações filosóficas da Europa.
Curioso fato é o caso da delegação espanhola que compareceu
ao Congresso mendozino . Composta de sete membros, três reli
giosos ( dois jesuitas e um dominicano ) e quatro leigos, revela
ram -se estes últimos, por vezes, intransigentemente ortodoxos, en
quanto os padres, mais arejados e sem motivos para se transfor
marem em mais " papistas que o papa ", foram duma impermea
bilidade de espírito e arejamento de idéias dignas de todo o apreço .
Assim, o repórter sentiu-se à vontade na conversa que manteve
o padre Ramón Ceñal , cujos apontamentos aparecem em
seguida.
A uma pergunta do repórter sobre o pensamento atual na
Espanha e seus mais característicos pensadores, assim respondeu
o padre Ramón Ceñal:

" Antes de tudo, e não obstante tudo , hoje na Espanha há


um grande interesse pela filosofia , consubstanciado principalmente
numa tentativa de superação que visa conciliar uma fórmula ma
ravilhosa : a tradição nacional – Santo Tomás, Suárez, Balmes
-- como o que há de melhor no pensamento transpirinaico. Desta
maneira, várias são as correntes modernas hoje atuantes na mi
nha pátria , podendo ser distinguidas, entretanto, num grosso modo,
três : a escola de Ortega y Gasset, as escolásticas tradicionais e
as correntes modernas de Além - Pirineus” .
Exemplificando essas correntes apontadas, informou o padre
Ramón Ceñal :

“ O primeiro nome atual do pensamento espanhol a ser


obrigatoriamente lembrado é o de D. José Ortega y Gasset . Ante
esse portentoso escritor são obrigatórios o respeito e a admiração .
Numa sucinta fórmula poderíamos resumir nosso juizo assim : é
um grande estilo a serviço dum grande talento . De resto, Ortega,
sem ser existencialista, tem muitos pontos de contacto com o exis
tencialismo. Sua filosofia se concentra na razão vital ou " racio
vitalismo", de funda repercussão em todo o mundo hispânico . Há
ainda o pensamento existencialista com uma orientação transcen
dental, representado por Zubiri e Julián Marías . É, o primeiro,
autor do ensaio “ Acerca do Problema de Deus”, no qual propõe
a via da " religião ” para chegar à verdadeira transcendência : Deus .
Também integrado numa ontologia existencial está Garcia Mo
rente, que foi antes de tudo um grande mestre . Influenciado
104 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

primeiramente por Kant e Bergson, só em Husserl porém encon


trou a existência do sêr . Desde a mocidade até o fim dos seus
dias sempre manteve uma grande admiração por Ortega . Na
sua última fase, convertido ao catolicismo, aproximou- se plena
mente da filosofia cristã . Nesta acanhada resenha não podemos
omitir a presença de Miguel de Unamuno, cujo pensamento coin
cide como de Kierkegaard, como é o caso nítido de " A agonia
do cristianismo " . Finalmente temos, nessa corrente, a figura de
Eugenio D'Ors, cuja contribuição melhor é dedicada à filosofia
da história, da cultura e da arte . O pensamento de D'Ors visa
substituir a lógica tradicional por uma lógica figurativa ” .
Dando sequência às suas declarações, e reportando -se ao pen
samento tradicional na Espanha, disse ainda o padre Ramón Ce
ñal :

" O fenômeno mais importante do moderno pensamento


espanhol é o renascimento escolástico com suas duas zonas bem
caracterizadas : a tomista e a suarezista (sem omitir, naturalmente,
as outras correntes, tais como aquelas representadas pelos francis
canos, dominicos, etc. ) . Tal renascimento é devido, em grande
parte, às celebrações de Vitória , Balmes e Suárez que vieram in
centivar grandemente os estudos escolásticos entre nós . Contudo,
esta escolástica não se limita a seguir os grandes nomes atuais da
" philosophia perenais ”, pois preferimos ficar no pensamento ori
ginário sem adotar as concepções da neo-escolástica . É o caso ,
exatamente, da obra do padre Ramirez . Assim sendo, o nosso
tomismo se caracteriza por uma fiel observância da tradição sem
as audácias do neo - tomismo dos outros países. O suarezismo,
por sua vez , e principalmente, significa uma posição histórica
crítica ante determinadas interpretações da síntese tomista " .
Finalmente, perguntado sobre a filosofia espanhola, exilada
pela falange de Franco, localizada hoje principalmente no México ,
assim se exprimiu o padre Ramón Ceñal :

" Inicialmente é preciso termos em vista que não se pode


falar dum pensamento espanhol " no exilio " . Pela simples razão
que não há uma unidade de pontos de vista nem grandes expres
sões, se excetuarmos a figura de José Gaos , discípulo de Ortega,
e que segue um humanismo existencial. O que houve , em ver
dade, com os nossos filósofos no México, foi uma união sob for
ma de cooperativa comercial, de defesa econômica, cujo resultado
mais imediato foi a realização do " Fondo de Cultura Economica " .
Mas este é um assunto que preferimos não abordar " .
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 105

6. OUVINDO DELFIM SANTOS

Ao Congresso de Filosofia, patrocinado pela Universidade


Nacional de Cuyo , enviou Portugal dois representantes que defi
nem exatamente as correntes vigentes no pensamento filosófico
da lusa terra : o simpático jesuita Padre Severiano Lino Tavares,
de Braga, especializado no estudo de Francisco Sánchez, o cético
renascentista português ( não obstante a opinião em contrário do
humanista marxista dr. João Cruz Costa, que numa tese deu a
cidadania espanhola a Sánchez ) , e o jovem catedrático de peda
gogia prof . Delfim Santos . O primeiro, enquadrado na tradição
tomista ; o segundo, integrado nas novas correntes da filosofia
ocidental. Raramente tivemos, no Brasil, a oportunidade de
entrar em contato com filósofos portuguêses. Em verdade, nem
mesmo se sabe que em Portugal há um pensamento filosófico im
portante, iniciado com a docência de Leonardo Coimbra, que re
presentou o mesmo papel de Ortega y Gasset na Espanha, divul
gando , discutindo e assimilando o que de melhor se especulava
além - Pirineus. Discípulo e aluno de Leonardo Coimbra é o prof .
Delfim Santos , por exemplo, e este motivo foi suficiente para ou
vir sua palavra .
A não ser em diminutos círculos de filosofantes, o nome do
prof . Delfim Santos é naturalmente desconhecido . É natural,
portanto, que precedamos suas declarações com uma sucinta in
formação . Delfim Santos , nascido no Porto em 1907, é licen
ciado em filosofia pela antiga Faculdade de Letras de sua cidade
natal, onde teve a oportunidade de frequentar os cursos de Leo
nardo Coimbra . Como bolsista, esteve em Viena, onde estudou
na própria fonte o positivismo lógico . Da capital austríaca diri
giu - se para Berlim , a fim de seguir os cursos de Nikolai Hart
mann , concluindo sua preparação em Cambridge . De sua enorme
bibliografia , que já soma cerca de trinta títulos, destacamos os
seguintes ensaios : “ Situação Valorática do Positivismo ” ( Berlim ,
1938 ), " Heidegger e Hölderlin ” ( Pôrto, 1938 ) , “ Conhecimento
e Realidade " ( Lisboa , 1940 ), " O Valor da Ironia " ( Lisboa,
1943 ), “ Existencialismo” ( México, 1943 ), " Substância e Exis
tência " ( Lisboa, 1943 ), " Die Erziehung in Portugal " ( Berlim ,
1943 ) , “ Meditação sobre a Cultura ” ( Lisboa, 1946 ) etc.. Pre
sentemente é catedrático de Pedagogia na Universidade de Lisboa .
O prof . Delfim Santos , condicionado por sua preparação teó
rica, se interessou , no início de sua carreira universitária , pela
filosofia das ciências e especialmente pela filosofia das matemá
ticas, o que explica seu intimo contato com o chamado " Círculo
106 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

de Viena " . Depois entrou em relação com as modernas corren


tes, principalmente de Hartmann e Heidegger. Foi através do
primeiro dos filósofos citados, e preparado pelas lições de Leo
nardo Coimbra e pela tradição bergsoniana, que pôde desen
volver e atingir um pensamento ontológico pluralistico . Presen
temente, na sua cátedra de ciência da educação na Universidade
de Lisboa , o trabalho do prof. Delfim Santos consiste em tentar
autonomizar a pedagogia como ciência .
Como se vê, estamos diante de um pensador dos mais impor
tantes da península ibérica . E com ele, cujos apontamentos trans
crevemos abaixo, dialogamos. Assim, a uma pergunta sôbre quais
são os reflexos do pensamento filosófico contemporâneo em Por
tugal, respondeu o prof. Delfim Santos:
- " Em Portugal várias correntes contemporâneas estão re
representadas, desde o tomismo até a mais atual problemática da
filosofia existencial. Predominante continua sendo o pensamento
francés, tipo lógico - idealista . Mas há também a presença de cor
rentes germânicas, tais como a ontologia crítica, a filosofia exis
tencial, e as modernas correntes da logística , além do tomismo , re
presentado pelas congregações religiosas " ,
Em seguida, indagamos sobre o legado de Leonardo Coimbra
no pensamento português dos nossos dias . A resposta do prof .
Delfim Santos foi esta :
" A obra de Leonardo Coimbra agiu como um fermento,
sobretudo naquela camada de jovens que, como seus alunos, ouvi
ram-no na Universidade do Porto . Aliás, convém observar que
o talento pedagógico extraordinário de Leonardo Coimbra nunca
pretendeu fazer discípulos à sua imagem e semelhança, e isso ex
plica porque todos aqueles que foram seus ouvintes ou alunos,
hoje não se limitam a repetir as atitudes do mestre . Foi êle an
tes de tudo um emulador , como nenhum outro em Portugal , a
acordar vocações . Leonardo Coimbra surgiu numa época de com
promisso que apontava para novas tendências, de que aliás éle
já tinha tomado conhecimento, tais como as filosofias de Husserl
e Max Scheler . Desta forma, a missão de seus discípulos con
sistiu em continuar aquilo que implicitamente convidava a desen
volver. A melhor expressão dessa situação do compromisso fi
losófico de Leonardo Coimbra é o excelente livro de José Mari
nho sôbre o pensamento do grande mestre portuense . Nesse sen
tido, brevemente sairá o " In Memoriam ” dedicado a Leonardo
Coimbra, onde cerca de meia centena de amigos, discípulos e alu
nos tomam posição perante toda a obra leonardiana, que aliás ,
concomitantemente, será publicada em edição " omnia " , precedida
por uma antologia , que foi a mim encomendada ” .
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 107

Reportando-se aos resultados dessa influência no atual pensa


mento filosófico português e ao delinear aspectos originais, agre
gou o prof. Delfim Santos :
“ O problema da originalidade do pensamento filosófico
português merece das gerações novas a maior atenção . Nós , como
portuguêses, temos uma história, uma compreensão da vida, uma
forma de pensamento e uma linha de especulação, que por vezes
têm sido subordinadas a influências que lhe são contrárias e para
as quais, portanto, não há nem pode haver maturação suficiente.
Por outro lado, temos obras que nos distinguem na sua estrutura
e na sua intenção e que , portanto , revelam certos traços peculiares
da mentalidade que nos é própria, como Gilberto Freyre, na sua
significativa conferência sôbre “ Uma Cultura Ameaçada ”, já pôs
em relevo . Daí ser preciso salvar essa cultura que influências
estranhas e dispares desviou de sua autêntica finalidade, e daí o
alarma de Alvaro Ribeiro ao chamar a atenção para a necessidade
premente de se reencontrar as coordenadas fundamentais da cul
tura nacional lusitana . Isso não quer dizer que se deva confun
dir nacional com nacionalismo, pois julgamos que a hora presente
atingiu , quanto a este problema, atitude própria, e é de crer que
em breve se determine aquilo que caracteriza o pensamento filo
sófico português. Numa palavra : até agora nosso problema foi
incorporar almas alheias ; chegou porém a hora de revelarmos a
nossa própria alma no campo do pensamento filosófico . Corro
borando nessa busca, deverá sair algum dia uma obra cuja falta
tem sido em parte culpada de certa desorientação do pensamento
portugués . Refiro -me à " História da Filosofia em Portugal”, de
Joaquim de Carvalho, que também promete uma " Fenomenologia
e Metafísica da Saudade ” , cuja temática só pelo título e ainda por
seu autor se nos' a figura de relevante importância e oportunidade.
De fato, esta última obra será de excepcional interesse não só
para Portugal como para o Brasil , pois nos auxiliará a determinar
a nossa forma típica de pensar, uma vez que a saudade é o modo
de existência da lusa gente " .
Concluindo suas declarações, e respondendo a uma pergunta
sôbre as personalidades portuguesas que se têm revelado nestes úl
timos tempos, afirmou o prof . Delfim Santos :
“ Inúmeros são os nossos estudiosos dedicados aos pro
blemas filosóficos. Além dos já citados , e antecipadamente con
vencido de que a memória com certeza me trairá , posso alinhar
os seguintes nomes : Sant'Ana Dionisio, Augusto Saraiva, José
Bacelar, Orlando Vitorino, todos autores de apreciáveis traba
lhos no domínio da filosofia ; na crítica temos Gaspar Simões,
o padre Elidio Ribeiro, Eudoro de Souza . Nos jovens uni
108 ŘEVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

versitários já temos obras de diferentes tendências e desigual


maturação, mas prometedoras, tais como as de Délio Santos ,
de Miranda Barbosa , de Edmundo Curvelo e de outros mais em
vários domínios , próprios e próximos da filosofia . Por isso tudo
e por muitos outros sintomas que não se podem negar nem ser
desconhecidos, julgamos com objetividade que neste momento a
cultura portuguesa está em condições se não ótimas, pelo menos
prometedoras de marcar uma posição clara e segura nos domínios
da filosofia, como já aconteceu com a poesia e em geral com a
literatura " .

7. OUVINDO CARLOS ASTRADA

Depois de termos ouvido tantos filósofos europeus, era natu


ral que nos voltássemos para o pensamento latino -americano ; e de
todas as delegações presentes — Argentina, Brasil, Bolivia , Chile ,
Colombia , México, Guatemala, Peru , Venezuela e Republica Do
minicana -- sem dúvida um dos mais expressivos e originais foi
o pensador argentino Carlos Astrada, antigo discípulo de Heideg
ger em Friburgo e atual diretor do Instituto de Filosofia da Uni
versidade de Buenos Aires . Temperamento combativo e ânimo
resoluto , durante todo o transcorrer do Congresso de Filosofia ,
patrocinado pela Universidade Nacional de Cuyo, praticamente a 1
defesa do existencialismo esteve a seu cargo, o que quer dizer que
quase sòzinho, a não ser algumas intervenções de Nicola Abbag
nano, enfrentou todas as correntes adversas, principalmente as
tomistas. Esta pugnacidade e sua extraordinária contribuição ao
pensamento latino -americano no campo da filosofia foram suges
tões que nos convenceram a ouvi-lo nesta série de entrevistas.
Assim, numa luminosa manhã mendocina, naquele inolvidável ce
nário andino, ouvimos o prof . Carlos Astrada , num momento em
que o localizamos conversando com o heideggeriano filósofo ma
giar -teuto -helvético Wilhelm Szilási .
Lídimo paladino da filosofia existencial, indagamos ao prof .
Carlos Astrada como ele explicava o sucesso do existencialismo
na atualidade . Sua resposta veio nestes termos :
" O apogeu do " existencialismo", das diferentes tendências
filosóficas e problemas que se incluem nesta designação, é resul
tado da vigência de um clima espiritual , para cujo advento contri
buiram também a poesia com suas novas dimensões vivenciais, e
a literatura e a arte, mas que tem suas raizes mais profundas
na atitude filosófica do homem contemporâneo que, em meio de
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 109

uma situação histórica modificada, começa a vislumbrar no existir


( Dasein ) o único acesso à vida como peculiar modo de ser .
-- A visão filosófica se separa da objetividade do “ ego ” abstrato
do racionalismo e dos sistemas idealistas para atingir o homem
singular, histórico e concreto . Esta separação está insinuada já
nas posições racionalistas do idealismo alemão ( Fitche, Schelling
e Hegel ), mas só assume concreção no pensamento , não estrita
mente filosófico , mas religioso, de Kierkegaard e, com bem diversa
formulação, na afirmação vitalista e anti -racional da filosofia
nietzscheana " .
Prosseguindo nas suas declarações, aditou o prof. Carlos As
trada :

“ Dado o marcado interesse do existencialismo pelo sêr do


homem , adquiriu primazia para sua consideração filosófica e sub
jetividade humana e o âmbito de seu mais próximo comportamento
finalista, com tudo o que de imediatez pré-gnoseológica há nela .
O pensamento que , por imperativo de uma razão cognoscente,
ansiosa de universalidade e necessidade, se havia situado no ponto
de vista do objeto , e das categorias, pelas quais o conhecimento
desta se funcionaliza, retorna ao sujeito existente e trata de in
ferir, para a exploração filosófica, zonas de subjetividade que, em
virtude de uma sistemática e radical tendência objetiva, haviam
sido preteridas ou simplesmente consideradas como dominio do
puro arbitrio irracional e, portanto, irrelevantes e opacas para o
trabalho conceitual . Este voltar-se do interesse filosófico à exis
tência traz consigo duas possibilidades ou direções : ou só o con
tacto com a existência como um ponto de partida reputado inabo
livel , mas que é preciso sobrepassar no movimento de uma trans
cendência que não renuncia à objetividade e a postulados de vali
dez universal; ou o agarrar- se à existência considerada como um
começo e , ao mesmo tempo, como uma meta de tôda indagação,
de modo que a existência e seu esclarecimento está, como tarefa,
no principio e no fim da filosofia ” .
O prof . Carlos Astrada esclarece seu pensamento assim :

“ Dentro dessas duas possibilidades principais cabem pontos


de vistas intermédios ou mistos : daí que , no “ existencialismo",
possamos, distinguir diversas atitudes e tendências. Assim , há
um " existencalismo" que mais propriamente podemos chamar exis
tentivismo, no qual se outorga pujança aos conteúdos onticos da
existência humana , e à imanência de seus modos estruturais, com
uma possibilidade muito precária de transcender para uma ins
tância objetiva . Também se denomina a si mesma " existencia
lismo" , a tendência que identifica este com um " humanismo", com
110 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

predomínio do fator subjetivo e antropológico, ainda que esta po


sição implica supostos objetivistas e adota critérios idealistas.
Inclui - se da mesma forma no existencialismo a filosofia de Hei
degger que , se bem implica uma analítica fenomenológica da exis
tència humana, só considera esta como ponto de partida básico
para a interrogação pelo sêr ; não obstante termos em conta seu
ponto de partida, a posição do genial filósofo alemão também
faz recair seu acento no sêr do homem, na necessidade de res
gatá -lo do plano da razão abstrata para concentrá - lo na ec- sis
tência . Igualmente se conta na grande corrente o existencialis
mo católico, em cuja posição o problema da existência, por ser
contemplado como um mero trânsito, fica mediatizado por exi
gências extra -filosóficas, concretamente de tipo dogmático e con
fessional, e assim resulta uma mescla de existencialismo difuso e
dogmático espiritualista católico, na tentativa impossível de amal
gamar a temporalidade com os princípios da postulada " philoso
phia perennis ” ( as 24 teses , ad usum ecclesiae ) que , com inten
ção apologética, proclama a neo- escolástica . Porque de um exis
tencialismo cristão só é possível falar com referência a Kierke
gaard, que colocou o problema em função da fé como paradoxo
absoluto, que, na alma angustiada do homem existente, supõe a
síntese, sempre precária , do temporal e do eterno ” .
Depois de uma pausa , agrega o prof . Carlos Astrada :
“ A maioria dos representantes da filosofia tradicional acre
ditam ver no existencialismo um impasse transitório , condicionado
por fatores históricos da linha evolutiva , suposta invariável e já
definitivamente traçada , da filosofia tradicional . Mas esta expli
cação esquece que toda problemática filosófica nova, autêntica,
cria sempre uma discontinuidade com relação ao pensamento an
terior, e mediante a pugna com este se impõe passando assim
a informar em todos seus conteúdos vigentes, o espírito de
uma época determinada . Tal é o caso do existencialismo, que
não é uma “ filosofia da crise ”, mas uma crise da filosofia .
Esta crise está sob o signo de uma rutura radical com a con
cepção platónica de um mundo ideal objetivo e transcendente ,
a que, elaborada pela teologia cristã, pervive na problemática
filosófica . Esta rutura , que encontra sua origem no idealismo
alemão e nas direções por ele influenciadas ( Marx, Kierke
gaard, Nietszche , Fuerbach ) , realiza- se principalmente mercê da
filosofia de Heidegger que tomou como ponto de partida de
toda indagação filosófica a nua factividade da existência humana
( Dasein ) , manifesta em seu estar-no- mundo, a fim de estabelecer
sua verdadeira situação, tal como esta se apresenta aquem de toda
concepção religiosa e transcendental " .
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 111

Concluindo suas declarações, disse ainda o prof. Carlos As


trada :

" A filosofia existencial , como todo " ismo ", tem já sea
público, no qual assume a ditadura , por meio de umas notas e
receitas , o inominado senhor “ tôda gente ” . Para seu império, a
autenticidade originária da problemática subjacente costuma ficar
velada, como da mesma forma para suas exposições críticas e até
para seus adversários . A clareza discriminativa e a precisão bri
lham pela ausência nas formulações correntes e, sobretudo, nas
apreciações de carter polêmico ; tudo dá na mesma . Faz -se ne
cessário assim deslocar , dentro da comum denominação de exis
tencialismo , a de maior envergadura e estrita filosofia, represen
tada pelo pensamento de Martin Heidegger . Uma de suas con
sequências de maior alcance é a afirmação da existência concreta ,
com seu âmbito social- histórico e do destino do homem como sêr
terreno, para quem fica aberto o caminho que há de conduzi-lo
a sua humanidade plena, sem interferências transcendentalistas
nem chamados do além . A essência do homem está no que este
efetivamente é . Mas esta essência do homem sua humanitas
é histórica e não uma estrutura ou núcleo ontológico de carater
supra -temporal. Vale dizer que o sêr do homem há de realizar -se
na história , através de suas contingências, necessidades e mu
danças . Em meio disso tudo , imerso no tempo histórico, o ho
mem estará sempre próximo de sua grande peripécia terrena :
torna - se humano ” .

8. DIÁRIO DE VIAGEM

Março , 30 Há dois dias já me encontro aqui em Men


doza . Um pouco por comodismo e um pouco devido a certas
tarefas concernentes ao Congresso de Filosofia , em verdade ainda
não tive tempo de conhecer a cidade , a não ser de passagem ,
quando o carro da Universidade Nacional de Cuyo nos levou, a
mim e aos delegados brasileiros Carneiro Leão , Jamil Almansur
Haddad e João de Souza Ferraz , do aeroporto militar mendozino
ao Hotel Balbi.
Antes do almoço fizemos um passeio ao chamado “ Cerro de
la Glória ", prodígio de civismo progressista, pois nêsse deserto
das colinas pré - andinas o pedestal imenso da movimentada ale
goria ao “ Libertador ” , o general San Martin , é um florido bosque
artificial Cada pinheiro tem sua canaleta para alimentá - lo dá
112 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

gua. E o cêrro, que tem como pano-de- fundo nada menos que
os Andes recobertos de gelos persistentes, é uma vista panora
mica inesquecível.
À tarde o Congresso foi solenemente inaugurado com a pre
sença do ministro da Edur ação da Argentina, prof . Oscar Iva
nissevitch . Seu discurso, menos demagógico que o foi em
certo sentido - do que patèticamente ressentido, teve em mira
algumas abstrações que não foram bem decifradas pelos delegados
estrangeiros. Curiosa foi a tese defendida pelo simpático minis
tro platino, de que o preço da liberdade é a eterna vigilância ...
policial .
À noite foi oferecido o que os argentinos chamam de “ jantar
frio " aos delegados vindos de todas as partes civilizadas do mundo
e do Brasil . A coisa aconteceu no Salão dos Espelhos do
“ Plaza ", o hotel mais importante de Cuyo . Foi lauto, foi exu
berante, cabendo quase um perú a cada convidado – e estes so
mavam 300 pelo menos , entre nacionais e estrangeiros . Creio
ter notado que os filósofos europeus estavam terrivelmente ató
nitos e escandalizados -- principalmente os alemães, que vêm cur
tindo uma fome que data de 10 anos diante de tanta e tão
variada comida . Doravante , no meu fichário de frases- feitas, as
expressões " banquete oriental” e “ repasto pantagruélico ” serão
substituidas por " jantar frio platino ” ,

MARÇO, 31 - Foram iniciadas as primeiras sessões parti


culares do Congresso de Filosofia, nas salas de aula da Univer
sidade Nacional de Cuyo . A organização não poderá ser vista
como algo ideal no gênero , digno de ser imitado . Longe disso .
A experiência servirá para nos ensinar como não se deve orga
nizar sessões particulares onde funcionam ao mesmo tempo várias
reuniões em salões separados. Como ninguém é ubíquo, um pro
fessor de lógica que está interessado também em metafísica, por
exemplo, não tinha outra saída senão perder uma das sessões.
O pior é que eu não encontro outra solução ...
Almoçamos na fazenda da Faculdade de Ciências Agrárias,
algo " criollo ", com muita carne, muito pão e muito vinho OS
bois, o trigo e as parreiras tratadas pelos próprios acadêmicos
agrícolas . Daí seguiu um " corso " de automóveis - não obstante
estar racionada a gasolina com trezentos filósofos digerindo o
fortissimo " almuerzo " em seus bancos em demanda das plantações
de uvas , de oliveiras e de pêssegos em demanda do açude dis
tribuidor de águas.
Neste último aspecto está talvez a maior grandeza da Ar
gentina. Mendoza, que é um árido e pedregoso deserto, de ele
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 113

vada altitude e clima seco de rachar os lábios , é no entanto e


aquí está a grandeza o mais florido deserto do mundo . Mais
de uma geração de engenheiros hidráulicos vêm dotando Mendoza
de água em abundância , graças ao degêlo andino . Não há uma
só rua mendozina que não se apresente exuberantemente arbo
rizada de plátanos , assim como as estradas suburbanas, - plá
tanos de copas de largas folhas verdes, cujas frondes se unem
formando verdadeiros túneis . E onde não há plátanos, há ála
mos .
Como se explica essa floresta de árvores decorativas num
deserto ? A presença do homem disposto a resolver um problema,
eis a resposta . Cada árvore é diàriamente irrigada por um sis
tema de canais que é a nota característica da heróica cidade de
Mendoza . Exemplificando : imaginemos uma rua qualquer de
São Paulo . Entre o passeio e o meio- fio há um córrego ao
mesmo tempo decorativo e funcional, pois em determinadas horas
do dia as comportas são levantadas e a água cristalina corre . Eis
aqui uma experiência que bem poderia ser aplicada em São Paulo .

ABRIL , 1 - Prosseguem as sessões particulares pela manhã,


e à tarde realiza -se a primeira sessão plenária dedicada ao tema :
a filosofia na vida do espírito . Já se pode notar uma certa
rivalidade não só entre as diversas delegações como dentro delas
mesmas, como o caso mais curioso que foi a espanhola . Os dois
jesuitas se mostram mais arejados, permeáveis e tolerantes para
com as correntes modernas ; os “ paisanos”, mais tomistas que o
próprio Santo Tomás, representam uma comédia que eles julgam
ser um drama: a defesa da fé através da razão ... E todas suas
intervenções são reacionárias no campo do pensamento filosófico ;
e contra eles jesuitas e leigos se volta o único dominicano
presente , tão excelente teólogo quanto notável barítono .

ABRIL, 3 Domingo. Excursão à Puente del Inca, em pleno


Andes, a 3.000 metros de altitude . A história do mundo é aqui
vista num ato vivencial. Mergulha -se na pré -história , e apa
recem seixos rolados onde não há nem rio e nem mar . As moles
de pedras, cada uma com seu nome Sentinela ... Penitentes ...
--- são policromicas, com os cumes vermelho -rosa, topete de gelo
branco, base azul-garrafa e centro verde-claro . Arbustos enfe
sados e espinhosos . Os córregos cristalinos são de água frigi
díssima. A atmosfera rarefeita é sêca, o vento é frio, e se se
molham as mãos elas ficam dolorosas e cortadas . Mas há tam
bém o abismo... E o carro corre em vertiginosa ascenção ... Para
o teto da América , para o céu ...
114 REVISTA DO ARQLIVO JIUNICIPAL

ABRIL , 4 - As sessões particulares e plenárias de hoje fo


ram dedicadas exclusivamente ao existencialismo . À tarde, no
Teatro Independência, a conferência do prof. Carlos Astrada ori
ginou algum escândalo, principalmente quando ele afirmou que a
filosofia da existência da facção católica não passa duma esca
moteação da filosofia existencial autêntica . Os jesuitas ficaram
furiosos , e mais ainda os " católicos sem sotaiña ", que chegaram
a " inventar” um escândalo exatamente para ostentarem seu ca
tolicismo à tôda prova . A oportunidade era única e eles dela
tiraram as vantagens que puderam e desejaram .
Nisso tudo , curiosa foi a réplica de um fabuloso padre ita
liano e bem informado filósofo existencialista transcendentivista ,
o padre Cornélio Fabro , que ao ser informado por um confrade
de irmandade de que o trabalho do prof . Carlos Astrada não
passava dum amontoado de absurdos, respondeu :
São èsses absurdos que fazem caminhar a história da
filosofia !

ABRIL , 6 - À noite foi inaugurada a Exposição do Livro


Filosófico Argentino. Importantes publicações nesse campo, so
bressaindo-se naturalmente as traduções. Em matéria de filo
sofia entre o que se publica no Brasil e o que se publica na Ar
gentina há um drama ou uma farsa ? intermédia : nossa pobre
indigência . Quando conseguiremos superar a atual fase do best
seller ? Veja -se o caso de Portugal, com várias coleções filosó
ficas , como a Studium , dirigida por Cabral de Moncada, a Co
nimbricense tendo à frente Joaquim de Carvalho, sem contarmos
as edições dos jesuitas de Braga. E nós ? Ora, nós...

ABRIL, 11 - A grande viagem de volta . Dois vagões fo


ram reservados para os delegados estrangeiros no trêm que levou
doze terríveis horas de Mendoza a Buenos Aires . Depois de uma
seinana intensa de filosofia , ninguém tinha mais vontade de ler
ou discutir, a não ser o padre Fabro , que, representando agora o
papel de missionário , tenta converter l'go Spirito ao catolicismo .
Dorme- se ou conversam -se coisas de nossas pátrias . Para espai
recer , os espanhóis iniciam uma sessão de cantoria, repassando um
vasto repertório que foi desde as canções folclóricas até o hino
da Falange franquista , esta última recebida friamente pelos pro
fessores estrangeiros. De todas as canções ouvidas só ficou uma
na memória de todos :
Quando Fernando VII Quando Fernando VII
Gastava paleton . Gastava paleton , paleton .
Quando Fernando VII Gastava paleton !
Gastava paleton .
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 115

9. VICENTE LICÍNIO CARDOZO

UM CAPÍTULO DESCONHECIDO NA HISTÓRIA DA FILOSOFIA


ATUAL NO BRASIL

( O presente trabalho é a Comunicação do A. ao Con


gresso Nacional de Filosofia patrocinado pela Univer
sidade de Cuyo, especialmente redigida para o § V
do temário aprovado pelo Comité Executivo . Devido
a exigências regulamentares, nos Anais do conclave
foi publicado um resumo do presente trabalho, dai
inserimos nesta coletânea como foi originariamente
apresentado ) .

I. As poucas tentativas , que andam por ai , sôbre a evo


lução do pensamento brasileiro , dispensam -se de analisar os pen
sadores atuais do Brasil . As mais completas param em Farias
Brito e nos positivistas. No entanto, pelo menos dois pensadores
contemporâneos merecem ser incluidos nessas resenhas : Manuel
Amorosa Costa e Vicente Licínio Cardozo . Ambos engenheiros
e ambos professores da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, se
parecem também no destino de suas vidas e na predileção de seus
estudos . Divulgador e tambéın original pensador da filosofia das
ciências , principalmente das especulações matemáticas, Amoroso
Costa, no mesmo ano da publicação de sua obra principal - As
idéias fundamentais da matemática , 1929 morre num desastre
de aviação ; Vicente Licinio Cardozo , em 1931 , suicida -se . Estas
mortes violentas e prematuras vieram colher os dois filósofos ain
da no vigor de suas idéias e em pleno labor intelectual. E o
muito que se esperava dêles , com eles se findou . Contudo, de
suas obras inacabadas, que mundo de idéias fecundas se pode
colher ! Principalmente de Vicente Licínio Cardozo , que levou
tôda sua vida ampliando um livro que começou con10 una
breve observação num relatório sobre a arquitetura norte -anie
ricana, observação essa ampliada um ano depois ( 1917 ) no Pre
fácio à filosofia da arte, e desdobrada, já agora num tratado
em sua Filosofia da arte . No entanto , não seria esse o ponto
final , a edição definitiva, pois a publicação da segunda tiragem
desse livro ( póstuma) vem bordada em inúmeras notas, acres
cidas pelo editor, de trechos assinalados por Vicente Licinio Car
dozo para posterior desenvolvimento . Trata- se , pois , duma obra
inacabada quase, o que levou Agripino Grieco a dizer : “ A rigôr,
Vicente Licinio Cardozo não se completou, não nos legou o seu
grande livro ” . No ponto em que ele ficou , porém , é bastante
para consagrar qualquer pensador. E Vicente Licínio Cardozo
116 FEVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

fica perfeitamente enquadrado entre os grandes filósofos contem


porâneos, ainda que eles se chamem Maritain ou Croce, Ortega
y Gasset ou Heidegger, Carlos Astrada ou Leonardo Coimbra .
Com efeito, Filosofia da arte é algo inédito em tôda a lite
ratura filosófica brasileira e um dos trabalhos mais sérios no
gênero . Sendo um amplo estudo da posição da arte dentro da
totalidade dos saberes e atitudes humanos, Vicente Linício Car
dozo , numa luminosa intuição, distinguiu a filosofia da arte da
estética pròpriamente dita, uma vez que esta, a seu ver, devia li
mitar-se aos valores tão apenas . Mas, além disso, seu achado
maior foram as noções capitais e fundamentais para o estabele
cimento duma possível filosofia da arte, quando concebe a arte
como função do meio, a variação do grau de ideal em arte e a
arte como meio de expressão das civilizações. A primeira noção ,
convenientemente desenvolvida, leva à apresentação da arte como
fruto natural, fixo e definido de uma civilização : sem ela não
há apresentação perfeita da arte . A segunda leva ao estabeleci
mento da lei geral , segundo a qual cada arte evolui . A isto chama
Vicente Licínio Cardozo de “ lei do idealismo" . A terceira no
ção, finalmente, leva ao estabelecimento da variação das artes, de
acórdo com o evoluir das civilizações (“ lei de espiritualidade” ) .
Vejamos, por partes, como Vicente Licínio Cardozo aprecia
essa evolução triática das artes . Encarando a arte como fenômeno
cultural, ou melhor, como objetivação social , i.e. , deterininada em
forma e conteúdo pela estrutura social, liga- a desta forma tanto
às contingências históricas quanto à sociológicas. Duas influências
são patentes aqui : Comte e Vico . Sob forma alguma, porém , é
Vicente Licínio Cardozo um precursor de Spengler e sua morfo
logia da cultura, como o apontou com grande veemencia Alcides
Bezerra . Isto nos obrigará a uma digressão que, não obstante à
margem do tema, vem de certa forma elucidá-lo . Porque, se Vicen
te Licinio Cardozo e Spengler tiveram em Vico a mesma bôca - de
picada , suas rotas foram diversas . O primeiro teve a norteá-lo a
concepção histórica do positivismo ; o segundo se cingiu de corpo
e-alma às brumas líricas do expressionismo. Como Comte predi
cava , de Deus e das coisas ultraterrenas (metafisica ) nada pode
mos obter de positivo ; as especulações abstratas da filosofia não
nos podem dar um conhecimento da realidade . Desta forma, só
nos resta limitar- nos a ver os fenômenos reais em si , e tentar co
nhecê -los ( enquanto em sua natureza e nas leis de seus mútuos.
influxos ativos e passivos ) aplicando um método estritamente cien
tífico ( positivo " ) . Esse modo - de -vêr só será possível num está
gio superior da humanidade, quando a evolução do espírito hu
mano atingir seu ápice . Isto se dará depois da humanidade ter
UV CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 117

superado os estádios teológico e metafísico . No primeiro, domina


a concepção teológica ou fictiva, segundo a qual os homens expli
cam os fenômenos que os rodeiam por meio de poderes sobrenatu
rais. No segundo, domina a metafísica, ou seja, a concepção abs
trata que tenta explicar a realidade das coisas pelas idéias , subs
tâncias, etc. O terceiro período, positivo , científico , que corres
ponde ao mundo moderno, ainda não está completo nem se aplicou
a todos os domínios humanos. A concepção comteana, porém , não
pára ai : a evolução histórica da cultura é determinada também
por elementos psicológicos e, daí , poder chegar - se a determinar as
leis dessa evolução histórica comparando - se as distintas épocas
culturais , graças ao que Comte chama de método “histórico com
parađo ” . Nesta concepção só têm cabimento os fenômenos psi
cológicos de caráter coletivo ( e nunca os motivos psicológicos de
tipo individual) . Sòmente assim é possível chegar -se, segundo
Comte, às causas universais, às leis da evolução, únicas que têm
valor científico . Comte chegou a essa concepção através de Turgot
( sucessão das três idades ), de St. Simon ( teoria dos períodos
orgânicos, nos quais tudo obedece à idéia ) e de Condorcet ( as
massas como heróis da história ) . Seu discípulo mais importante,
nêsse setor historiológico, foi Karl Lamprecht que , de acordo com
Comte, via a história como determinação psicológico -social da evo
lução , explicando ainda as épocas culturais mediante o método com
parado e dependendo o indivíduo das relações dos fenômenos cole
tivos . Daí a necessidade de um conhecimento causal exato, segun
do Lamprecht e sempre de acordo com Comte, para que a histó
ria possa chegar a ser ciência, relegando os fatos singulares ao
dominio das descrições literárias não científicas . Esta doutrina po
sitivista é perfilhada " in totum ” por Vicente Licínio Cardozo .
Já em Spengler a causa é substituida pelo acaso , concebendo
a história como algo que carece em absoluto de sentido . Neste
sentido, Spengler se parece com Th . Lessing, teórico contempo
râneo da história, que também vê a história como uma série de
fatos casuais sem conexão alguma. Para Lessing a história não
pode ser " compreendida ” mas “ vivida ” . E para isto , mais que a
ciência importa a intuição . Spengler, porém, não obstante as ana
analogias das concepções, é mais consequente . Parte da oposição
entre a vida inconsciente e o pensamento consciente, à qual subor
dina tóda uma série de pares antagônicos desigualmente determi
nados , para caracterizar os fenômenos históricos e seus elementos
( as correntes do sêr e as relações da vigília ; o possível e o real ,
o evolucionável e o evolucionado ; a história e a natureza ; o tempo
e o espaço ; povo e nação ; essência e aparência, etc. ) . Também
o conhecimento fica submetido , segundo Spengler, a este contraste.
118 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Fora la intuição como Lessing e, ambos, de acordo com Berg


son --- não há vida . Diz Spengler: " Sòmente o que sucedeu pode
ser conhecido ; o que sucederá pode tão apenas ser sentido por meio
duma profunda compreensão, por uma percepção sem palavras. A
natureza ( o que chega a ser fixo ) pode ser tratada científicamente ;
sobre a história ( o vivente que chega a sêr ) só é possível uma
coisa : poetizar " ; pois não se trata apenas do que os fatos histó
ricos são em si , mas do que significam , do que indicam na sua apa
rência . Isto revela a falta que fez um ponto de vista morfológico,
que penetra profundamente o essencial . E em busca dessa morfo
logia da história - " intuição divina ", como diria Goethe - vai
Spengler. Mas, aqui, morfologia não é mais a acepção restrita da
biologia , i.e. estudo geral das formas dos seres vivos . Aplican
do o estudo morfológico ao mundo do espírito como investigação
das formas históricas, Spengler setenciava : “ todos os métodos
para compreender o universo podem , em ultima instância, chamar
se morfologia ". Distinguia então entre uma morfologia da exten
são --- do mecânico, do submetido à lei da causalidade ( sistemática )
e uma morfologia do orgânico e da história ( fisionômica ). Da
aplicação dessas categorias biológicas à história resultou a concep
ção morfológica spengleriana , que reduz as culturas e organismos,
a estruturas submetidas aos mesmos processos dos seres vivos .
Ora, as afirmações de Vicente Licínio Cardozo de que “ A
história da humanidade se compõe de várias histórias " ; de que --
“ a história já havia tendido, francamente, à apresentação da huma
nidade como a reunião de vários organismos sociais ” ; e , ainda de
que " a história não deve, como Hegel e Comte pretenderam,
ser o relato da evolução una de uma só humanidade, obedecendo
a uma dada iei apreendida, mas história que tem de ser a reunião
de várias histórias de várias civilizações , de vários organismos
sociais dentro de cada um dos quais há a tendência á evolução
constante, o espírito da lei dos três estados , lei que coube ao pró
prio Comte formular errando na sua aplicação e que, em re
sumo, não é senão a fixação ou caracterização de uma evolução
contínua dos estados mais importantes, conforme coube a Spencer
estabelecer , apresentando as sociedades como verdadeiros superor
ganismos " estas afirmações tôdas não podem justificar a se
guinte frase de Alcides Bezerra : “ Para dar o valor da contribuição
do pensador brasileiro à filosofia da história, baste dizer que, antes
de Spengler, concebeu uma morfologia da história semelhante a do
historiador alemão, na qual a lei dos três estados de Comte é ge
neralização e aplicação às sociedades como organismos " .
A " morfologia da história ” de Spengler -- e isto já foi visto
-- longe está da “ síntese positiva " de Vicente Licinio Cardozo .
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 119

E quando ele fala em " organismos sociais" não é no sentido bio


lógico , mas no sociológico, que esteve em grande voga com Spen
cer nos fins do século passado e cujos representantes mais impor
tantes no continente europeu foram Espinas e Worms . Sendo
a obra liciniana principalmente uma fecuda síntese de Vico e
Comte, ela aqui se resolvia na acrescentação do cientismo deste
à " nova ciência " daquele . De resto , é dos mais curiosos o fato de
Vicente Licínio Cardozo ter sido um dos primeiros pensadores
contemporâneos a dar toda a importância merecida à obra de Vico ,
além de seguir - lhe o esquema central , que propunha as leis da evo
lução cultural nêstes têrmos : em tôda cultura repetem-se três ida
des ( uma divina, uma heróica e uma humana ) , a cada uma delas
correspondendo uma forma de Estado, de direito , de linguagem e
de pensamento ( teocracia, aristocracia e monarquia ; Direito sa
cerdotal, Direito por imposição direta do interessado e Direito
racional de acordo com a autoridade ; escritura hieroglífica, lin
guagem simbólica e linguagem popular ; poesia, prosa e inte
lectualidade) . Cada uma das três etapas teem , pois , uma unidade
de estilo , uma perfeita correspondência de todas suas manifesta
ções, desde a forma de governo até a forma de expressão . Este
sincronismo viquiano será aproveitado por Vicente Licinio Car
dozo em toda linha . E coin isto chegamos ao fim de nossa di
gressão .

II . --- Posto isto , acreditamos esclarecido a posição de Vicente


Licinio Cardozo e as influências que atuaram no seu pensamento .
Assim , ao rebatermos uma idéia errónea de Alcides Bezerra , en
tramos fundamente em contato com as idéias centrais de Comte .
e Vico sôbre a história , exatamente por serem tão atuantes na Filo
sofia da arte e porque estes dois filósofos aparecem em cada pá
gina quase deste livro . E sempre precedidos por adjetivos elogio
Sos . Vico é " genio " e Comte é " augusto " (não obstante o trocadi
Tho ... ) . Esta bombástica adjetivação não impede Vicente Lici
nio Cardozo de esclarecer , numa nota de barra de página : " Quan
do nos referimos a Comte é sempre, exclusivamente, ao matemá
tico proíundo e ao grande filósofo , isolando - o sempre, implicita
merte, da parte de sua obra relativa ao positivismo como religião .
Mais a mais, reconhecendo nele o maior gênio produzido pela
civilização européia, estamos no entanto muito longe de aceitar
a totalidade de seus princípios , de suas afirmações e de seus ensi
namentos, mesino pondo de lado tudo quanto se refere à religião
da humanidade, como acabamos de dizer ” . Esta independência
fá - lo saltar da ortodoxia positivista, aceitando de Comte alguns es
quemas norteadores, e assim mesmo definindo -os à sua maneira .
120 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Assim , quando propõe uma “ filosofia positiva da arte ”, esclarece :


“ Empregamos a expressão filosofia positiva com o mesmo espí
rito que levara Comte a usar ésse pleonasmo, consequência natural,
por sua vez , do fato da palavra filosofia haver sido abertamente
empregada para uma série vasta de estudos metafisicamente leva
dos a efeito. O têrmo positivo é definido por duas noções por ele
mesmo encerradas : a de generalidade do conceito em sua aplica
ção à humanidade e a de relatividade de toda verdade apreendida
pelo homem . Filosofia positiva da arte indica a sistematização de
todos os nossos conhecimentos sõbre as manifestações artísticas no
tempo e no espaço da história : contém , em síntese, as leis , as ten
dências e os princípios que definem a evolução das artes e encerra ,
pela análise, a compreensão e a explicação dos desenvolvimentos
artísticos da humanidade. E ' positiva por ser , ao mesmo tempo ,
geral e relativa ” .
Esta delimitação do positivismo de Vicente Licínio Cardozo é
consequente de seu apêgo à filosofia da história de Vico, já que lhe
regunava a ecumenicidade da história. Diz Vicente Licínio Cardozo :
“ Em vez da aplicação da lei ( dos três estados ) a vários organis
mos , Comte apresentou toda a história como sendo o relato da apli
cação una da lei a toda a humanidade ” . Não obstante , tenta uma
síntese do autor do Curso de filosofia positiva com o autor da Ciên
cia nova, onde aparecem termos peculiares a estes dois filósofos :
“ Acreditamos que cada civilização tende a seguir a lei dos três
estados; sem que nenhuma delas , entretanto tenha ainda atingido
o estado positivo . As ações e reações, que se desenvolvem entre
civilizações contemporâneas, determinam nelas profundas modifi
cações, chegando por vezes até à assimilação e à absorção " . Isto
tudo porque conclui Vicente Licinio Cardozo “ Vico que
teve, aliás genialmente para a época, a verdadeira noção de que
a história da humanidade deveria ser o relato do desenvolvimento
de organismos sociais sujeitos a ciclos evolutivos" . Munido da lei
comteana da história, retemperada pela noção dos cursos e recur
sos viqueanos, pôde então o filósofo brasileiro esboçar sua filosofia
da arte . Os germes estavam em Comte ; mas as base definitivas
só aparecem com o filósofo brasileiro . E mais fecundas, porquanto ,
aceitando as idéias gerais de Vico, não obstante sua formação po
sitivista, adicionava por isso mesmo os ciclos culturais à evolução
da teologia à positividade .
Essa filosofia da arte, pois, tem sempre em consideração, à
maneira positivista, o evoluir coletivo . De resto , o estudo do
“ meio ” é um dos preceitos positivistas reconhecido pelo autor :
“ Nos termos em que a escola positiva coloca o problema do estudo
das artes , resulta impossível o estudo das manifestações artísticas
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 121

sem considerá -las como consequência, fruto e resultado dos meios


que a geraram e produziram " . Isto permite a Vicente Licinio
Cardozo se anteceder a Karl Mannheim no estudo da influência
do meio social ( estrutura e organização da sociedade) no modo
de colocar e solucionar os problemas do pensamento ou da arte .
Tais processos sociais são visíveis – segundo Mannheim atra
vés da estruturação histórica da sociedade. Desta forma, de acordo
com Mannheim , pela obra conhece- se o tempo em que foi possível
criá-la . Não é outro o pensamento de Vicente Licínio Cardozo,
já que ao seu ver é possível apreciar-se a evolução de uma sociedade
“ em consequência do estudo e da análise do desenvolvimento se
cular de uma dada arte ” . Contudo, o dado inicial de Vicente Lici
nio Cardozo é que a arte é o meio de expressão natural do homem,
o que explica porque a arte islâmica foi arabesca , já que essa civi
lização estivera sempre de posse do alfabeto , permitindo - se o em
prego da linguagem escrita em vez da " linguagem de imagens ” .
Também é o caso da pintura holandeza do século XVII , onde a
pintura de caráter acabara por anular a religiosa . Ora , sendo
a arte, segundo Vicente Licínio Cardozo como a religião , as
ciências, a filosofia “ frutos đo trabalho do homem ” , constata
mos aqui inclusive uma identificação com a sociologia marxista .
Essa é a base social da obra de arte . Seu estudo, porém ,
cabe à filosofia da arte, que é a “ sistematização dos fenômenos
artísticos, consequência de sua apreciação devidamente fudamentada
e de sua evolução suficientemente constatada ” . Concebendo a arte
como um meio " pelo qual uma civilização fala ao mundo ”, Vicente
Licínio Cardozo define a arte como o meio de expressão através
do qual os organismos sociais se expressam " . Numa palavra : " a
arte é o fruto lógico e consequente de determinado meio social ” .
O processo interativo arte : sociedade permite a Vicente Li
cínio Cardozo formular uma proporção : “ A evolução de uma dada
civilização está para a evolução mental do homem assim como a evo
lução da arte desenvolvida nesse meio social para o próprio evoluir
da civilização ” . E no estudo da evolução das artes tira o filósofo
curiosas ilações : " A princípio, a arte é uma simples emanação do
culto, serva humilde , é através dela que a religião fala aos crentes” .
Mas, impulsionada pela evolução social, a arte progride : “ Idealização
do real” , é o fruto da abstração e consequente formação de um ideal,
decorrente da observação do mundo, seguido de sua expressão atra
vés da obra modelada pela alma do artista . Sendo a arte , sempre,
uin meio de expressão, é através dela que cada civilização tem fa
lado ao mundo . Ora , cada sociedade gera uma arte peculiar , con
forme o estádio cultural. Daí a lei evolutiva das artes , definida
como um desenvolvimento do estado imaginoso ao positivo do
122 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

emotivo ao racional. Em sintese temos portanto a noção de “ meio


de expressão ", que deve ser encarada : a obra de arte atua em
função " do meio social, fruto natural que é fixo e definido
de uma civilização . Isto pressupõe uma variação de grau de ideal
em arte, e que possibilita o estabelecimento da lei geral segundo a
qual cada arte evolui. E' a chamada “ lei de idealismo " .
Vicente Licínio Cardozo, porém , sempre dentro do espírito do
positivismo, limita a noção de lei, não dando a ela nenhum caráter
absoluto , já que a seu vêr " uma lei não é senão uma aproximação
da verdade ” . Aliás, essa atitude pragmática é peculiar àquela ge
ração de pensadores neo-positivistas que substituiu os comteanos.
da primeira hora , como o caso de Vaihinger . Dentro desse relati
vismo, Vicente Licinio Cardozo define sua lei de idealismo nestes
termos : " lei geral, segundo a qual tôda arte , inicialmente simbó
lica , mística e imaginosa , tende, natural e fatalmente, para formas
de maior precisão no apreender da verdade, de maior justeza na
tradução de idéias , e impressionando, afinal, pelo seu caráter acen
tuadamente realistico ou naturalistico " . Ou, noutros termos : " em
um dado meio social , onde vitalmente se desenvolve uma determi
nada floração artística , através da qual essa civilização expressa
ao mundo os seus sentimentos e as suas idéias, há sempre uma ien
dência lógica e fatal que define a evolução da arte considerada” .
Ou ainda : “ dentro de cada arte, há a tendência fatal ao realismo,
i.e. , a evolução se faz do estado de ficção ao positivo , da imagina
ção à realiciade " . Esta lei pode facilmente ser comprovada com os
fatos da história da arte , onde é sintomático a " evolução nitida, pro
nunciada, segundo a qual a obra de arte , sendo a principio simbó
lica (escultura grega ) ou mistica ( pintura italiana ), tende conti 1
muamente a uma abstração cada vez menor ou a uma positividade !
crescente, traduzida pela diminuição acentuada do grau de idealiza
ção do real” . A noção da “ lei do idealismo " define, pois, — “ jus
tamente a passagem do estado imaginoso ao positivo, da ficção à
realidade, lei que nada mais é , resumindo, do que a tradução em arte
da própria evolução do espírito humano, do estado de impotência
ao estado de compreensão mais ou menos plausivel da realidade " .
Concluindo, temos: dentro de cada arte há sempre uma tendência
1
fatal ao realismo, i.e. , a evolução tende da ficção ao natural, da
imaginação à realidade. 0
Contudo, a arte não está apenas em função do meio social e
nem se limita a sua variação gradativa de ideal : a arte é também o
meio de expressão das civilizações . Esta terceira noção origina a
Ici de espiritualidade, i.e. , o estabelecimento da lei da variação das
artes, de acordo com o evoluir das civilizações . Ou, nos termos da
fórmula proposta por Vicente Licinio Cardozo : " O que a forma de
I'M CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 123

expressão da arte pende em materialidade , a idéia expressa ganha


em generalidade, em subjetividade ou em espiritualidade " . Esta lei
permite - lhe uma classificação das artes, classificação esta atenta às
manifestações artísticas no aspecto constitutivo e desenvolutivo, arti
culadas no espaço e no tempo, e ligadas à história do espirito e à
evolução dos organismos culturais. Ou seja : em primeiro lugar
vêm as artes materiais, aquela em que predomina a objetividade
a arquitetura , a escultura, e a pintura . Dentro mesmo dêsse grupo
a objetividade diminui da tridimensionalidade das primeiras à bidi
mensionalidade da pintura . Essas artes encontram ambiente propi
cio ao desenvolvimento no estado teológico . Caracterizam , aliás,
esse estado social . Em segundo lugar vem as artes da palavra , da
poesia à prosa , e correspondem ao estado metafísico . E, finalmente,
vem em terceiro lugar as artes imateriais, de ação moral, caracte
rísticas do estado positivo. De acordo com essa classificação orgâ-
nica as artes não aparecem arbitràriamente, mas, condições espiri
tuais e sociais possibilitam sua eclosão no momento oportuno . Nes
sa classificação das artes observa -se uma desmaterialização ascen
dente, indo as artes das maşsas a três dimensões, passando pelas
imagens a duas dimensões, até atingir as imateriais da palavra e
da ação, e cuja equação está representada pela lei de espiritualidade .
Nisto consiste, em largos traços , a filosofia positiva da arte
proposta por um dos maiores pensadores brasileiros ainda clandes
tino não obstante a pureza e elevação de sua mensagem filosófica.

10. ANEXO

CONFUSÃO NO CONGRESSO

( Rapsódia )

Na noite que precedeu ao embarque da delegação paulista, ou


mehor, dos membros de São Paulo da delegação brasileira ao Con
gresso de Filosofia patrocinado pela Universidade Nacional de
Cuyo, o notável escritor brasileiro Oswald de Andrade resolveu pro
piciar aos rapazes uma " reunião de despedida" no seu apartamen
to . O telefone, naquela tarde, não descansou . Muita gente foi con
vidada, alguns escritores, mulheres de escritores , primas das mu
lheres de escritores e até conhecidas destas . Regorgitava o ambiente
embalado pelos vapores de vermouth " dubar " (precisamos valo
risar as nossas coisas, para um Brasil Maior ! ) . Na confusão dos
convites foi convocado inclusive um bisonho reporter de setor, ledor
124 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

assíduo de Pitigrilli e portador de pesados óculos, que se tornaram


célebres depois de uma " charge " de Alvarus publicada no falecido
e bem enterrado “ D. Casmurro ", e que hoje são apelidados de
" existencialistas " .
O comes - e -bebes ofertado pelo notável escritor Oswald de An
drade além de significar uma liomenagem espontânea tinha tam
bém uma história subterrânea, explicável pelo teemperamento mo
desto e avesso às exibições do autor de “ Marco Zero ” . E' que Os
wald de Andrade ( notável escritor ) é incapaz de pedir sem dar, e
como teria ele muito gosto em ver uma tese sua agitando a temática
antropofágica debatida por pensadores internacionais, foi esse o
expediente adotado ; deu uma mesa de doce e arroz -de-forno para
pedir que os rapazes apresentassem suas especulações, que por sinal
no pensamento contemporâneo só têm similar com as especulações
de Heidegger . Tudo ajeitado, coube ao poeta e esteta Jamil Alman
sur Haddad a subida honra de ser o portador da tese de Oswald
de Andrade, escritor e notável .
Mas todos nós sabemos o que são essas reuniões onde impera
o que na gíria de reporter policial se chama libação . É isso mes
mo, a certa altura, as vozes eram pastosas ,0 entusiasmo fervente
e todo o prédio de apartamentos do Bexiga foi acordado por gritos
de “ Viva a filosofia ! ” . E nas primeiras horas da manhã lá se
foi o exegeta de Castro Alves --- axiològicamente interpelado
sobraçando algumas laudas, que seriam apresentadas em Mendoza
como " uma contribuição do pensamento Brasileiro ao pensamento
do Mundo " .
E de fato assim ocorreu . Antes, numa das salas da Uni
versidade Nacional de Cuyo, reuniu- se a delegação brasileira -
presidida pelo acadêmico Carneiro Leão e composta pelo ensaista
Jamil Almansur Haddad , pelo metafísico transcendista Vicente
Ferreira da Silva, pelo filósofo da educação Alvaro de Maga
lhães, pelo teólogo sulino padre Antônio Stefen, pelo psicólogo
João de Sousa Ferraz e pelo jornalista Luis Washington -- que
discutiu se a tese do notável escritor Oswald de Andrade deveria
ou não ser apresentada, tendo a facção mais moça vencido, com o
que o trabalho foi encaminhado à comissão de teses . Aqui a con
fusão aumentou ainda mais, pois seus quatro membros, cada um
de países diferentes , não chegaram a um acórdo, e a tese acabou
mesmo rejeitada . Grande injustiça contra a nossa cultura e que
só se explica pela atuação facciosa daquele jesuita que, como bom
argentino, não olha com olhos amigos o Brasil .
Que importa que o membro alemão fôra o discípulo dileto
de Husserl e é seu atual editor, que importa que o membro ita
liano seja tido como a maior expressão filosófica de sua pátria,
UM CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA 125

que importa que o membro francês, discípulo de Lavelle , hoje


seja maior que o seu mestre, que importa que o membro argen
tino, morto , Gradmann, seja o maior tomista da atualidade , que
importa tudo isso se a pedra atirada pelo notável escritor Oswald
de Andrade tenha ido mais longe do que suas vistas possam al
cançar ? Decisão injusta , personalista e erradíssima que o futuro
corrigirá, estamos certos ! Como prova disso traduzimos algumas
notas taquigráficas das discussões havidas na comissão de teses :
" Sinceramente , há vinte anos estudo história da filosofia,
inclusive tenho comigo a síntese de Leonel Franca sobre a filo
sofia brasileira , correspondo- me com Tristão de Athayde e nunca
ouvi falar nesse filósofo Serafim Ponte Grande. Sem dúvida
admito que se chegue à crueza de expressões, numa espécie de ex
pressionismo verbal e temático, para atingir à verdade em toda a
sua plenitude. Mas, por diós! filosofia é outra coisa, essa outra
coisa que vejo em “ Le Mur” , mas não aqui . Esta tese do dr.
Serafim precisa , deve ser rejeitada, eis o meu voto !"
Eis que na noite se fez luz . Estava tudo esclarecido . Na
confusão da " festa de despedida ", o poeta Jamil Almansur Haddad
confundiu as laudas e em vez de levar consigo as teses atropo
fágicas levou um capítulo inédito do saboroso e genial “ Serafim
Ponte Grande " . Mesmo assim andaram muito mal os filósofos
da comissão de teses, e por isso damos tôda razão ao notável es
critor Oswald de Andrade , cujo pensamento transcende não só
nossas fronteiras como até nosso tempo . Kierkegaard esperou
cem anos para ser compreendido e assim acontecerá com a Antro
pofagia, que em 1922 será a última palavra ein matéria de pensa
mento filosófico .
Antes de encerrar esta rapsódia conveni um esclarecimento :
depois das reflexões de Heidegger sobre a temporalidade, não se
deve ver na data “ 1922 " , colocada como " futuro " em relação a
1949, nenhum anacronismo ou êrro de revisão . Muito pelo con
trário . Pela simples razão de que na filosofia da existência o
homem, além de ser o produto de seu passado, é -o também de
seu futuro . E convem parar por aqui, senão acabaremos por
ensejar telefonemas impagáveis mas que não escondem o amargor
dos ressentidos que se esqueceram duma sabidíssima verdade exis
tencial: o homem passa a ser sombra de si mesino quando já não
tem reservas de futuro . Então o passado o sufoca, enterra-o .
É chegada a hora das memórias. E tôda tentativa de sair do tú
mulo de suas memórias é um ato ridículo, como andar de palhe
tinha do ano da Independência e da Semana de Arte Moderna,
heróica efeméride que agregou mais um bairro à cidade de São
Paulo, o Ipiranga , é mais um escritor å história de nossa litera
126 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

tura, René Thiollier . Não é à-tôa, portanto, que o problema


filosófico das gerações tem interessado a tantos dos maiores filó
sofos dos nossos dias ( Mannheim, Pinder , Ortega y Gasset, Peter
sen , Lain Entralgo, Thibaudet , J. Marías, Wechssler, Drerup, além
dos clássicos Ranke , Dilthey e Ottokar Lorenz ) . Mas com isto sai
ríamos da fisiologia viva do sangue correndo nas veias para cair
mos em cheio num laboratório médico -legal onde o único material
à mão seriam peças anatômicas. Longe estamos, porém , duma
possível aberração necrófila , porque assim como se dá batatas ao
vencedor, carnica é dada aos corvos .

Nota Representou o Autor, no Congresso Mendozino, o Departa


mento Municipal de Cultura de São Paulo, especialmente desig
nado pelo prefeito Asdrubal da Cunha . Os trabalhos aqui
reunitos, com exceção da tese inédita sôbre Vicente Licinio
Cardozo, foram antes inseridos 110 “ Diário de São Paulo ", tendo
o Diário de Viagem aparecido no “ Jornal de Notícias" .
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE ” ,

DE ALBERTO RANGEL

L. G. DE SIMAS
(Capitão de Mar e Guerra )

“ ESTA OBRA E ' DE DEVOÇÃO . PARA


FAZEL-A, FORAM PRECIGOS MUITO AMOR E
MUITA HUMILDADE ... "
“ MUITA HUMILDADE PORQUE, PARA
FAZEL-A, MAIS SE EMPREGARAM LONGA
PACIENCIA E CONSTANTE VONTADE , QUE
ENGENHO OU SABER ; QUALQUER UM A PO
DERIA FAZER ; NOS A FIZEMOS PORQUE
OUTROS NÃO APARECIAM PARA ESSE
DEVER " .

( Prefácio do Dicionário de “ Os Luziadas " ,


por Afrânio Peixoto e Pedro Pinto )
1
ALBERTO RANGEL

INFERNO VERDE

( SCENAS E SCENARIOS DO AMAZONAS )

COM UM PREFACIO DE

EUCLYDES DA CUNHA

E DESENHOS POR

ARTHUR LUCAS

GONZALO :
AN lor ment, trouble. wonder, and amaremont
Inbabits bere...
SHAKESPEAR - THE TEMPEST
ACT V - SCENE VIR .

GENOVA
SA I CLICHES CELLULOJDE BACKALONI
1999
ADVERTÊNCIA

Esto trabalho , não passando de tentativa a um elucidário do “ In


Terno Verde " , de Alberto Rangel, poderá servir também , na consulta
a obras sobre aquela região , visto serem as mesmas fauna , flora e
lendas, com outras roupagens de escritor .
Por ter sido o que lhe serviu de passaporte á admissão ao Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro , na frase do próprio autor “ resga
tou-se na meia indiferent pública e encontrou no cenáculo de histo
riógrafos, um tribunal suprêmo para os elevados sentimentos que o
ditaram " . Move -nos, igualmente , apreço e admiração ao concendioso e
erudito escritor nacional .
Muito embora tivessemos escolhido edição revista pelo autor, cons
tatamos diversos erros de impressão ; talvez por ter sido impressa na
Europa, onde viveu longos anos . Algumas notas foram demasiado
sumárias, nas forços é confessar nos terem falhado melhores
fontes de consulta Foram , outrossim , registadas palavras assaz co
nhecidas, mas possivelmente ignoradas por alguns leitores . Não foi
feito para eruditos, esses prescindem de consultá - lo .
A crítica colaborará para sua melhoria .

O AUTOR
1

1
ABREVIATURAS

AL . Alfredo Ladislau Gaertn . Gaertner


AB . Agnello Bittencourt Griseb . Grisebach
AC. Angione Costa Gal. Galicismo
AM . Armando Mendes HSR . Henrique Santa Rosa
Aul. ( Caldas) Aulete H. Hooker
Aubl . Aubler Hab . Habita
Alim . Alimentação Kth . Kunth
Barb. Rodr. Barbosa Rodrigues Kost . Koster
BIS . Bernardino José de LM . Leonardo Motta
Souga L. Linneu
Baill . Baillon Lamk . Lamark
Bern . Bernard Lindl. Lindley
B. H. Bentham , Hooker Mez . Mes
CM . Couto Magalhães Mart . Mariius
Calk . Calkins Muell . Mueller
Car . Carateristico PLC . Paul Le Cointe
Con F. B. S. Concgo Francisco B. RG . Raja Gabaglia
de Souza RM . Raymundo de Moraes
DL. Dic . Larousse Rep. Rois e Pavon
DC . Dic . Chompré RABL . Revista da Acad. Bras.
Des . Desusado de Letras
EC . Euclydes da Cunha RVI . Rodolpho Von Ihering
Engl. Engler SAO. Sebastião Almeida de
JA . Jorge Abreu. e José Oliveira
de Alencar ST . Hil . Saint Hilaire
JAP . Joaquim de Almeida Schum .' Schumanny
Pinto Spreng . Sprengel
IV . José Verissimo Ton . Toneladas
Jacq . Jacquin VC . Veiga Cabral
JWM . João Wilkins de VBR . l'isconde de Beaurepai
Mattos re Rohan
Flem . Fleming QV . Quod vide
G. Goeldi QC . Quintino Cunha
GC . Gastão Cruls Wall . Wallace
GS . Gabriel Soares Warb . Warbury
Gmel . Gamel
1.24 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ERRATA

Adornada Pg . 270 . Adernada


Arreara pg. 79, 102, 142 e 23i Arriara
Ar re av a Pg. 179 Arriava
Atros Pg . 193 Astros
Burúrú Pg . 119 Burúrúrú
Bararua Pg. 82 Bararoa
Cupuseiro Pg . 82 Cupuassuseiro
Curvivenervas pg . 117 Curvinervas
Caratheus Pg . 208 Cratheus
Conoa Pg. 253 Canoa ( Correto nas 1.a e 4.a ed .)
Caranahysal Pg . 233 Carananal
Carreia Pg . 264 Carreira (Correto nas 1.2 e 4.2 ed. )
Chegaram Pg . 265 . Chegarem ( Correto nas 1.2 e 4.a ed .)
Campanheiras Pg . 136 Companheiras ( Correto nas 1.a e
4.a ed. )
Cacaoeiros pg. 85 e 87 Cacaueiros Idem , Idem
Cacao Pg . 85 Cacau
Compozesse Pg . 181 Compuzesse
Deiados Pg . 76 Deitados ( Correto na 1.a ed. )
Devir Pg . 107 Devia ( Correto na 1.a ed . )
Deleixada pg . 224 Desicixada
Depozera Pg. 158 Depuzera
Entonguida Pg . 181 Enianguida ( Correto nas 1.9 e 4.a ed. )
Embalseirariam Pg . 79 Embaiçarariam
Epopea Pg. 187 Eropéia ( Correto na 1.a ed. )
Em trega Pg . 268 Em tregua ( Correto na 4.a ed. )
Fará braço Pg . 239 Fará o braço ( Correto nas 1.a e
4.a ed . )
Gilliat Pg . 164 Gilliatt
Japós Pg . 121 Japús
Inazciro pg . 145 Juazeiro
Jacurarú Pg 125 Jacuarú
Jurarás Pg. 215 Jussáras
Mulfloa pg . 82 . Multiflua ( Correto na 4.a ed. )
Macacheira pg . 254 e 259 Macaxtira
Macucauas Pg . 121 . Macucaus
Nos musculos Pg. 111 . Nos musculo ; ( Correto nas 1.0 e
4.2 ed .)
Obsediante Pg . 258 Obsedante
Obsediava Pg . 255 Obsedava
Os filhotes de todos Pg. 37 Os tuhotes de todo
Panisco Pg . 80 . Painço
Podesse pg 123 e 169 Pudesse
Pionniere Pg . 281 Pioniers
Quiobas Pg . 137 Quiboas
Touxeram Pg . 67 Trouxeram ( Correto na 1.a ed. )
Tetardos Pg . 98 Tetartos
Uixys Pg . 95 Uchys
Violaderes Pg . 39 Violadores ( Correto nas 1.4 e 4.a ed. )
NOTAS Verifica-se que alguns dos erros vêm sendo perpetuados desde a 1.a edição
e outros foram , posteriormente, cometidos pelos copiadores. Foi impressa
em Genova S.A.I. Cliches Celulloide Bacigalupi -- 1908 , talvez por isso .
Os números adiante dos vocábulos indicam as páginas onde se encontram
os mesmos .
A

ABAINHADO 224 Dar forma de bainha, debruar. “... abainhado


no barranco de massapê o sitio ... "
ABANCAR 179 Tomar assento , sentar - se . para subir
e me abancar ...
ABANDOANDO - SE 68 Unir - se em bando ; formar grupo .
#6
meio cento de corvos abandoando - se por cima da floresta ...
ABARROTÁRA 195 Encher de . 46... Abarrotára - o a en
xurrada ..."
ABATIZES 90 - Trincheira feita com árvores cortadas. ... uma
linha de abatizes na crista ..."
ABERTA 137 Lugar onde o campo , rompendo o mato mar
ginal , vem até à beira do rio ; ou o lugar onde as árvores rareiam .
RABL . , bras . , vol . 21 , “ ... Aproveitando a aberta da picada ... "
ABIEIRO 85 Lacuna caimito , Ruiz Pavon , Roem e Schult.
Sapotáceas. Fruto ovoide da grossura de um ovo de pata ou esférico
como uma laranja. Pele lisa , amarela quando madura , polpa gelati
nosa , le sabor adocicado, de cor branca esverdeada, PLC . “ afogada
nos cacaueiros e abieiros... "
ABIURANAS 35 Nome comum a várias árvores do gênero
Lucuma. Frutos globosos, amarelos , cobertos de pêlos. A mais conhe
cida é a Lucuna Lasiocarpa, Mart Da família das (Sapotáceas) Etim .
tupi - guarani abiu , q . v . e rana, parecido , semelhante . RABL. , bras .,
vol . 81. “ ... investida a cortina de abiuranas e acapuranas ...
ABOLETAR - SE 57 Alojar. “ . a aboletar - se no pavilhão
ruina ... "
ABROQUELARA 244 Revestir com broquel ; guardar-se .
Elle se abroquelára de ferro ... "
ABSTRUSAMENTE 66 Inexplicavelmente . O Pedro
abstrusamente , á noite, ferira um outro empregado ... " 102
Inesperadamente , O vento cessára abstrusamente de vez ... "
ABUÁUA 186 Talvez por Abuara afluente do Rio
Negro. “ .. suhincio O Abuaua , depois o Matheus.
136 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

AÇACALADO 227 Reluzente ; brilhante . encheu uma


garrafa do mineral açacalado ... "

AÇACUZEIRO 215 Hura ( repitans, Euforbiáceas, L. Co


mum na vårzea argilosa e alagadiça. Seiva muito cáustica e vene
nosa , produzindo ulcerações quando em contacto com as mucosas
até com a pele. PLC . Enorme, pavoroso , envenena as águas que lhe
banham as raízes tornando doentio as redondezas . RM.
de um assacuseiro ... ao pé

ACAFELANDO 124 Tapar com cal e areia ou com asfalto ;


encobrir “ acafelando arraias e puraqués ... "
AÇAÍ 98 Euterpe olerácea , Mart. Sinônimo: Palmito ; Ju
çara. Habita nos terrenos pantanosos do estuário amazônico e nas
margens dos riachos de terrı firme no baixo Amazonas. Tronco em
touceira. Frutos da grossura de uma cereja , violáceos. quase negros.
Com êles se prepara uma bebida chamada vinho de açaí, de grande
consumo no Pará e que é uma emulsão nágua da polpa gordurenta
adicionada de açúcar. Esta palmeira dá frutos todo o ano. PIC . “
ao pé de esguichos tremulos de assahys ..."
ACAPELADOS 153
Encapelar annuncia -se sem
trepito, nem empolamentos acapellados da. água
" ... " es
ACAPURANAS 35 Nome comum da Campsiandra Laurifólia.
Benth . Flores róseas vistosas, em grandes bouquets. O fruto é uma
vagem alongada e chata . Nas margens inundáveis de rios e lagos, em
tôda a Amazônia . PLC . Etim . tupi - guarani acapa , q. v, e rana ,
semelhante . “ . investida a cortina de abiuranas e acapuranas ...'
ACARÁ 213 Arbusto sempre verde, da familia das Zengibe
ráceas, de cujas folhas usam os indígenas do Malabar . Tipo de fumo,
muito divulgado no Norte . G.C. “ recortava o rolo de “ Acará ” ...
ACARICUÁRAS 58 Ou Acariúba . Minquartia guianensis.
Oláceas . AUBL . Habita na mata úmida da terra firme em toda a
Amazônia . O tronco é cavado de depressões, irregulares, e mesmo
vêzes , esburacado . Etim . tupi - guarani acari - wise q . v . e quara ,
buraco , cova , refúgio ; buraco do peixe . Acari é uma árvore ribeirinha
cujo tronco apresenta uma superfície muito irregular, cheia de depres .
sões e buracos, onde aquele peixe costuma refugiar - se nas horas de
canícula. RABL . , bras. , vol . 81. “ rica de louros e de acaricuáras ... "
ACEIRO 61-81 Terreno capinado em redor da roçada que
vai ser queimada ; faixa em volta das herdades, para evitar a comuni
cação do fogo ou facilitar o transporte de carros . ... Ella correra
para o aceiro do roçado ... "
ACHAMBOADO 272 Tornar chambão ; grosseiro . “ ... desses
esboços achamboados...
ACLIVE 275 Ladeira, inclinação do terreno considerado de
baixo para cima . Foi - se arrastando pelo acclive forte ... "
ACOCHAVAM 146 Apertar ; comprimir . “ emquanto elle
me desatava os relhos que me acochavam o corpo ...
ACORRIDO 125 Acudido ; correr a algum lugar . “ ... Cães
que tinham accorrido ladrando ... "
ACÚLEOS 258 Órgão ponteagudo, a maneira de espinhos,
que se desenvolve na casca das roseiras, mas sem nenhuma aderência
com os tecidos fibrovasculares . Espinho . Os aculeos traiçoeiros
podiam rasgar o fato ..."
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 137

ACURAUS 252 O mesmo que bacuráu na Amazônia . ( Veja


bacurau ) .
" AD -HOC ” 268 Para este caso ou fim . “ ... lavradores
* ad - hoc " por sedentários .
“ A DIA " 59 Remuneração diária ao trabalhador ou pelos
dias de trabalho . “ Trabalhára sempre " a dia " ... "
ADONIS 186 Divindade fenícia: moço de Biblog, de grande
beleza . Ficou símbolo de beleza efeminada . “ Um adonis que vienso
presidindo ... "
ADORNADA 270 Erro de impressão, por adernada . Incli
nar-se ( a embarcação ) para um lado . “ a lancha naufragada , sem
toldo, adernada ... "
ADUSTA 81 Queimada , ardente, ressequida , a terra
ennegrecida e adusta . 21

AFOGO 277 Ânsia ; sufocação . ... O corpo , no afogo, com


buria numa pyra ... 99
ÁGATAS 123 Nome dado a todas as variedades de quartzo
não cristalizados, que são translúcidas . " no frio brilho das ágathas
negras ... "
AGRESTE 136 Selvagem , zona intermediaria, que não é bem
sertão, nem litoral ou brejo . E ' procurada pelos sertanejos em tempo
de sêca para refrigerar o gado . E ' zona em que o gado não apanha o
" mal triste " , epizootia causada pelo carrapato . partimos do pouso
agreste ..."
AGUACENTA 123 --- Que ressuma e verte água ; impregnado de
... a solidão aguacenta desanimava ...
água . “ ..
AJOUJADO 189 - Unido ; ajuntado ; amarrrado ( uma pessoa
a outra ) . " ... um homem ajoujado a outro ..."
AJURI 79 Têrmo do Amazonas, o mesmo que adjunto, mu
tirão . só se afastava da lavoura e creação raramente, quando
obrigado pelo ajury ... "
ALAGAÇÃO 123 Inundação periódica das terras na Ama
zônia . " ... A alagação, penetrando por toda a parte ...
“ALAGADO num rebojo " 170 Naufragado ( Em Marajo , ala
gação, quer significar barco que faz água, que afunda, por analo
gia ... ) . UP. " ... talvez se tivesse " alagado num rebojo " ..."
ALBARDADOS 272 Feito toscamente ; mal vestidos . "
quelles manequins albardados... "
ALCÁCOVAS 152 Fortaleza ; castelo árabe . “ ... baluarter
metralhados de alcáçovas interminas... "
ALENCÓS 122 Família Palamedcideos, L. Palamedea cor
nuta . Uma só espécie . Nome vulgar “ unicorne " anhuma . Goeldi .
E ' ave grande , de 85 centímetros de comprimeito, comparável ao
perú , mas caracterizada por várias singularidades . Os pés têm
enormes dedos, o que lhe facilita a locomoção pelos banhados, sobre
as plantas aquáticas . Na cabeça um " chifre " , ou antes, um espinho
recurvado, córneo , de 12 centímetros de comprimento, esta plantado
sobre a pele, os bordos da asa são providos de dois esporões, dos
quais se utiliza como arma perigosa . O colorido geral é bruno dene .
138 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

grido e preto, exceto o ventre que é branco . A parte anterior e a


cabeça são chamalotadas . Seu grito é retumbante . Vive sempre a beira
dos rios e pousa nas árvores, seu vôo lembra o dos urubús . RVI,
Soavam metallicos gritos de alencos cornutos ... "
ALESTADOS 265 Tornar lesto ou desembaraçado, rápido.
ao cavar rapido e alestado dos remos... "
ALGARA 81 Investida . “ ... Nessa algára de fogo ... "
ALGOR 263 Frio intenso ; sensação de frio violento . “ .. : ora
em fogo, ora em gelo, no algor , o seu corpo... "
ALISEOS 276 -- Diz -se dos ventos regulares que sopram entre
os trópicos na direção de Oeste . " ao embalo quente dos alizeos ,
ao beijo do mormaço ...
ALJOFAR 193 Orvalho ; pérolas muito pequeninas. “ ... hi
pnotisada ao luar de aljófar ...'
ALTANADO 71 Soberbo ; altivo . " ... num suspiro profundo ,
respondeu altanado ..."
ALTO 245 · Têrmo em geral, empregado para designar , ora um
monte isolado, de pequena elevação sobre os terrenos circunjacentes,
ora um " têso " ou parte superior de um serrote, de um monte ; ora a ca
beça, o próprio cimo ou “ cabeço " de uma colina. V. Chermont diz :
" Tôso ", parte mais elevada nos campos baixos e mondongos, a qual
alaga pouco ou nada alaga no inverno. O “ alto ” quando rodeado de
“ pirizal " ou de “ aningal " toma o nome de escalvado . BJS . " ... elle
repassou os vinte e seis dias d'essa cidade ao " alto " ... "
ALVARENGA 231 Saveiro , lanchão . “ ... lanchas saveiros,
99
alvarengas e batelões ... "
AMACHUCÁRA 101 Abolára , encrespára . “ .. desamarro
tando por encanto a seda parda das aguas que amachucára ... "
AMADURARA 169 O mesmo que amadurecer : fazer chegar
ao estado de servir ou de aproveitar ou de surtir efeito. ... aquella
resolução já se amadurára na consciencia do expulso ... "
AMAINOU 235 Abrandou ; serenou . " ... Pouco a pouco o
tempo amainou ... "
AMATALOTALOS 230 Arranchados ; reunidos . .. todos
amalotados se recolhem ás rêtes...
AMATARI 99 E ' também um lago da Guiana, na margem
esquerda do Amazonas, entre o Arauató e Puraqué-cuara. Perto fica a
povoação de São José de Matari ou Amatari, na margem setentrional
do Amazonas. Há, ainda, outro lago Amatari, na margem direita do
rio Madeira , acima da freguesia do Borba, na Mundurucânia , F.B.S.
O Amaraty é barranco cheio de historia ... "
AMAZONAS ( rio ) 27 E ' incontestavelmente o maior rio do
planeta, pelo volume de suas águas e pela exuberância das terras que
atravessa . Desce da região andina chamada Telhado do Mundo ( La
Raia ) , a partir do pico Vilcanota , na República do Perú . Tem 6.800
quilómetros se considerarmos o Ucaiale como verdadeiro curso do
Amazonas . A largura é muito variável ; em tempo de transbordamento,
atinge 6 km . A profundidade é de mais de, em certos pontos, 80 me
tros. Conta mais de mil tributários que o rio recebe de ambas as mar
gens. AB. Imenso e profundo , magestoso e sereno , repleto de encantos
e despertando assombros, simples como um lago e misterioso como o
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 139

mar, o Amazonas certamente não nasceu como os outros rios... Dix a


lenda que antes do mundo ser mundo , o Sol e a Lua viviam casados,
amando - se numa fusão de ardência e doçura . Eis, porém , que Tupan
quiz crear a Humanidade e esta não poderia subsistir sob as chanias
do astro de fogo aticadas pelos arroubos do anor . En hodiêre'a pois .
ao desejo divino, o Sol e a Lua para sempre tiveram de se separar.
" E naquela noite escreve o poeta Gaston Figueira a Lua, sosinha,
ferida de amor, chorou. Suas lágrimas cairam ao mar ; porém , as doces
gotas dos olhos da Lua e as gotas amargas do mar não se puderam
misturar . Tôda aquela tristeza , toda aqueia dör em beleza se transfor
mou . E das lágrimas da Lua um rio maravilhoso nasceu ... Descido
de misteriosas regiões , desvirginador de florestas, morada da Lua e da
Cobra Grande , berço sempre ondante da Vitória Régia , leito caudaloso
sem par, rio que enfrenta o mül nas jororócas, éste rio certamente não
nasceu como nascem os outros rios ... ( Lendas Brasileiras de Valentim
Valente ) ' ... da água solapadora do Amazonas...
AMBÉCIMA 217 Philodendron imbé, Schott. Arácsas i vutras
espécies do mesmo gênero, Cipó . Sinônimo: Cipó imbé ; cipó ambé ,
tracuá, Curuba . Planta epífita . Ind . As raízes são compridas, del
gadas e resistentes, servem de cordas e, partidas, para tecer paneiros,
jamaxis ; a casca serve para tecer cestos . PLC . Atado com unut
pedaços de ambécima à " madeira " da estraii ...
AMBUSTÃO 194 Ato de queimar em roda ; cauterização .
para restringir o campo do topicon , a ambustão ...
AMONIA 273 Rio tributário da margem esquerda do médio
Juruá, no Território do Acre . AB . “ .. num mangue iam operar no
Ammonêa ... "
AMURADA 230 Cada um dos lados do navio, acima do
.. encostada á amurada ... "
convés, de pôpa à prða . “...
ANÁBASE 168 Isto é : Expedição ao Interior ou marcha
ascendente obra histórica de Xenofonte. Narrativa da retirada dos
10 mil de que participou. Essa expedição foi de Ciro, o Jovem , contra
Artaxerxes II . DL . nessa expedição históric : Anábase mo
derna que invadia o Amazonas... "
ANACREONTICO 279 À maneira de Anacreonte . ten
tando dellas coroar -se anacreontico , dum triumpho que não here
cesse ...
ANÁGUA , 212 Saia curta, usada pelas mulheres imediata
mente sobre a camisa . " só deixára uma anágoa no bahu de mill
rupá ... "
ANANAIS 33 Ave da familia Anatidtos, Vettiva Brasiliensis ,
E ' a marreca mais comum do Brasil, do Amazonas ao Rio Grande do
Sul . RVI . “ ... refugio de garças, ananahys, carões... "
ANAPLEROTICO 191 Medicamento antigo , que se supunha
determinar a reprodução das carnes e a cicatrização das feridas. “ a
applicação do ferro em braza constituia um anapierótico ..."
ANASARCA 96 Edema generalizado; inchada . “ ...
vela é uma bochecha tumefacta de anasarca ... '
" ANDAVA PANEMA " 162 Sein sorte , caipora .
Gabriel " andava panema " .
ANDIKOBA 108 Carapa guianensis , Aubi . Meliáceas. Si
nônimo : Andiroba aruba ou Andiroba saruba . Árvore grande. Habita
nas Várzeas e igapós . Característico : Ramificação vizinha da verileal,
140 REVISTA DO) ARQUIVO MUNICIPAL

grandes folhas penadas, escuras e pendentes. O fruto encerra várias


amêndoas oleaginosas: o óleo é espêsso, amarelaço , muito amargo,
excelente para raboaria e iluminação. Este bleo, misturado com urucú,
é utilizado em frieções pelos indios para evitar as picadas dos inse
tos e penetração do bicho de pé. PLC , *.... A lamparina d'oleo de
andiroba ... "
ANEMOMÉTRICO 96 Relativo ou pertencente aos ventos.
passado o regimen anemométrico do terral ... "
ANERVIADAS 278 Anervia : falta de sensibildade ; quietas.
( LF . , regista anervia ; apenas ) Não havia folha que boligse,
anerviadas na estagnação geral...
ANGICO 145 Dos cearenses; Viopó , alto Amazonas ; Paricá ,
Óbidos. Piptadenia peregrina , L, e Benth . Habita em regiões de cam
pos não inundados. Da casca exsuda uma goma parecida com a goma
arábica . Com as sementes, os índios fabricam uma espécie de rapé.
o niopo ; as sementes são secas ao sol e trituradas ; o pó soprado nas
ventas produz uma excitação muito grande, loquacidade, cantos, gri
tos , PLC . “ ... chocalhavam os galhos dos angicos ...
ANINGAS 98 Filodrendon imbé , Schott . Aráceas e outras
do mesmo nome . Sinônimo : Cipó imbé ; Ambé ; e Tracuá . As raízes
aéreas, compridas, delgadas e resistentes, servem de cordas e, par
tidas, para tecer paneiros e jamaxis. A casca das mesmas é utilizada
para tecer cestos.. PLC . ( Veja Ambécima ) ... em identica barra
de murisal, aningas e embaúbas ... "
ANTA 233 Mamífero ungulado, perissodáctilo da família
Tapirideos, Tapirus americanus. É uma das nossas maiores caças,
pois mede até dois metros de comprimento e um de altura ; tem
atro dedos nas mãos e três nos pés . Tem cauda curta ; as orelhas
são móveis como as do cavalo . Habita as matas cerradas, nas pro
ximidades dos rios ; nada e mergulha perfeitamente e é sompre en
direção a água que foge, quando acossada. E ' animal de fôrça extra
ordinária , podendo, na corrida, atravessar o mato mais trançado. E '
famosa pela reação desesperada que oferece à sucurijú , quando esta
enorme cobra , enrolada num tronco , a enlaça para a luta de morte : a
sucurijú se contraíndo até envolver a anta, e a anta correndo até partir
a sucurijú . Pasta e come fruta do mato ; também invade as rocas. Há
a preta : Pixuna ; e a cizenta claro : Tinga, em língua geral. RM e
um guisado de anta ... "
ANTRUOSOS 40 Recinto escuro e profundo : cova . (LF ,
apenas, antro ) “ . pelas firuces de gorgomillos antruosos ...
ANUNS -CORÓCAS 130 Vo Pará é o mesmo que Anu
guaçú . Cuculidcos ( rotofaga major . Mede 45 centímetros de compri
ento . E ' considerada a Vin 1oureira . Em algumas tribos é conside
? : da ave Sagrada . Hi portretas ir danga do anum em que imitam
carti . atitude dessa alp . l . da cor negra e lustrosa dos anuns
curocas... "
* APAIDEGUADO " 211 De dimensões a vantajadas. LM . “
monstro, grande, vigoro, forta , “ a paedeguado " ...
APALHADO 216 Cobrir com ail : colmado . Esse
rancho apalhado ...'
“ APAVHA dd ( AST : VITA " Saf colheita . Tempo
de apanha ou extraço dos prin !!! vegetais.. Diz -se : " O fábrico da
castanha , da borruichi . Sif ' . *** triam u Caboclo da “ apanha
i tih't
Campos Gerais , Amazonas

SERRE

Tercy Sau

Pescadores de Pirarucus

( Clichês cedidos pela “Revista


Brasileira de Geografia" )
1

1
CLUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 141

APERROL 219 Levantar o cão ( da espingarda ) itin, en


gatilhou . Tomando do rifle, perrou - o ... "
A PINO 277 A prumo ; verticalmente . A Sioria do
dia, a pino, exprimia-se no desespero de abrasar .
APODO 186 -Insulto. “ ... Todos os estymatisavam , enlà .
çando-os num apodo ...
APODRENTADOS 68 O mesmo que apodrecidos. * Os
apodrentados ... "
APOSTEMA 164 Supuração ; corrupção . “ ... por influen
cia da apostema do pantano ..."
APUIZEIRO 164 Ficus fagifolia . Monstro botânico. Surge
primeiro levado pelos ventos em semente, pelos pássaros, pelos mor
cegos, no galho das árvores, na entrecasca das palmeiras. Aſ cresce
parasitariamente . Depois de sugar, emparedar e matar o individu .
vegetal onde nasceu , substitui completamente a vítima, com outro
aspecto tão diferente que ninguém é capaz de perceber a transfor
mação botânica . RM . Chamam -no também de " cebola branca ”. AB.
Trata -se do nosso mata - pau , que mata por constricção as outras ár
vores sõbre as quais se insere . GC . o apuizeiro é um polvo
vegetal... "
APURO 185 Correção e esmero no trajar, no falar e es
crever etc .. tal o apuro de traje ... "
AQUARELOU 188 Descreveu . que a secular pretensão
de dous governos extrangeiros acquarellou ... "
AQUERONTE 37 Filho do Sol e da Terra . Foi mudado em
rio e precipitado no Inferno por haver provido de águas os Titans na
ocasião que estes declararam guerra a Júpiter . As suas águas se tor
naram enlodadas e amargosas; e é este um dos rios que as Sombras
passavam para nunca mais voltarem DC . " ... O Acheronte devia
seer assim , circulando os infernos ... "
ARAÇAÍ 224 Ou Araçá do campo . Psidium araça , Mirtáceas,
Baddi , Sinônimo : Araçá iba ; araçá pedra -i— ; araçá -mirim . Frutos
excelentes, parecidos com goiabas, mas mais ácidos ; muito aprecia
dos para doces . Da lenha e carvão de alto poder calorífico. PLC .
como franzino araçaí em meio do iguapó ... '
ARACATI 142 Cidade à margem do Rio Jaguaribe, com
importante fábrica de tecidos e fiação. VC . Diz Alencar que éste nome
significa : bom tempo : de ara o catú . Os selvagens do sertão assim
ehamavam á brisa do mar que sopra regularmente ao cair da tarde
e correndo pelo vale do Jaguaribe, se derrama pelo o interior e o
refrigera da calma abrazadora do verão . Daí resultou chamar - se
Aracatí o lugar de onde vinha a monção . Fabrica de chinelos e sa
patos baratos " sapato de Aracati " . Ainda hoje, em Ico, o nome é con
servado à brisa da tarde, que sopra do mar.'JA . “ ... Uma vez por
outra ia ao Aracaty ...
ARAÇAPIXUNA 35 Araçá prêto , vermelho escuro , azedo
mas saboroso . " uma nova ourela de araçápixuna ...
ARAÇARANAS 34 PSIDIUM e EUGENIA , Árvore da fa
nilia Mirtáceas . Araçás diversos, nas praias das margens dos rios de
aguas limpas; de frutos muito azedos, pouco ou não comestíves. PLC .
e a renda das araçaranas mascaram a posição ..."
" ARAME MUITO " 162 Rico, abastado . “ ... chofe brioso
e eom " arame muito "
1 +2 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ARAPAPÁS 33 Ave da família Ardeideos , Cancroma co


chleária ou Socó de bico largo Savacú, no Araguaya () bico é
largo, grande , convexo em cima, plano em baixo, comparavel , talvez
a uma canoa virada RVI.. arapapás e patos bravos..
ARARAS 96 Aves da família Psittacideos, gênero Ano
dorhynchus . São notáveis as dimensões do corpo e ein especial do
bico , hem como o comprimento da cauda, cujas penas mais longas
medem pouco mais de meio metro , perfazendo assim mais da me
tade do comprimento total dos espécimens maiores . Prevalecem as
côres mais vivas : vermelho , amarelo e azul . RVI . “ as garças pla
cidas e araras gritalhonas ... "
ARAUTO 97 Diz A.B. ser um " FURO " , donde daí em diante
se torna mais rápida a corrente do rio Urubu . “ não encostei no
Arautó ... "
ARBÚSCULOS 275 Pequena árvore que se ramifica desde a
base , mesmo que arbúscula : árvore pequenina, subarbusto .
a balaram para o refêgo dos arbusculos... "
AREAR 145 Perturbar - se, atrapalhar -se, perder o rumo no
mato . " .. , cheguei até a me arear...
ARIRAMBAS 82 Ave da família Alcedinídeos. Na Amazonia
6.
é o nome de diversas espécies de martim - pescador " . RVI grata
à hospedagem das arirambas grasnantes ...
ARPOEIRA 162 Corda do arpão. a arpoeira , o arpão
e a boia de boieira .
ARRACOADA 182 Dar rações a ; alimentar, dividir em ra
ções. ... E assim arraçoada ... "

44 ARRAIS 191 Mestre ou capitão de barco costeiro ou navio .


viera para arrais de barco no Funchal... "
ARRASTÃO 162 Levar de rastos ou de arrastão ; subjugar,
vencer . “ ... levar de arrastão ... "
“ ARREAÇÃO " 216 Cada série de golpes em sentido ver
tical com que se sangra a seringueira . “ ... sob o golpe pequeno e em
diagonal, na devida “ arreação ... "
ARREGOADO 140 Gretar - se ; fazer rêgo em . o solo
arregoado e molle das baixas... "
“ ARROCHO " 210 Processo de sangrar a seringueira para
obter a borracha, fazendo - se em cada árvore cerca de uma duzia
de entalhes em forma de ângulo , com o vértice voltado para baixo .
ou empregassem o “ arrôcho " ...
ÁRTICA 58 Setentrional ; boreal . como uma planta
exotica e arctica ...
ARTICULOSAS 258 66 Que tem artículos : espaço que fica99
entre os nós , em um caule . os galhos das articulosas tabocas ...
ASFALTITE 37 Lago da Palestina, à extremidade sul da
Síria ; tem 17 quilômetros de largura por 76 quilômetros de compri
mento . Fortemente salgado. DL . esse lago da idéia do
Asphaltite... "
ASTROCÁRIO 41 Há várias palmeiras com esse nome.
No alto Amazonas Astrocarium macrocarpum , Hubert. Frutos ama
relos quando maduros. A polpa dos frutos é comestível; os frutos
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 143

são mais carnudos que os de tucumã comum , mas as amêndoas são


66mais duras, de consistência quase córnea, menos oleaginosas. PLC .
como a fibratura do astrocario fosse d'aço ... "
ASSISTIR 193 --Estar presente ; comparecer. ao convite
para assistir ao curativo ... " 278 Acompanhar para tratar na
qualidade de médico ou enfermeiro , para dar consolação e conforto .
a buscar alguem para assistir ao doente ... "
ASSUNTARA 146 Presumir, “ ... das moitas de mofunbo
€ assumptára logo ... "
ATABAFA - SE 80 Abafar ; encobrir. “ ... A floresta ata
bafa -se ...
ATAFULHAR 228 Encher muito ; demasiadamente .
o impeto fóra de atafulhar um garrafão ... 9
ATASCADO 127 --- Atolado , cheio . “ ... miseravel rebotalho,
atascado de alcool..."
" ATIRAR NUNS PEIXES " 179 Pescar coin rifle . 66
fôra ao lago “ atirar nuns peixes ” .
ATLAS 92 Rei fabuloso da Mauritânia , filho de Júpiter.
Tendo recusado hospitalidade a Perseu , este fêz aparecer a seus olhos
a cabeça de Medusa e o metamorfoseou em terrificante montanha .
Como esta montanha seja muito elevada, os mitógrafos imaginaram
que Atlas tenha sido condenado a sustentar o céu sobre os ombros.
DL . “ o esforço do homem é o de Atlas sustentando o mundo ..."
ATONIADOR 32 Que atonia. ( Retardamento funcional ) .
e tudo em silencio atoniador e opprimente... "
ATRITOS 280 Magoados; atrição, por extensão. Pisadura
ou escoriação resultante de atrito . “ ... crispação de seus musculos
atrictos ... "
ATUMA 238 Rio que desce da serra de Uaçari e recebe
pela esquerda o Rio Jatapú . É afluente do Amazonas, VC .
Dizem que no alto Rio BRANCO, no Atuman , no Madeira ... ”
AUGURAIS 68 Agoureiros. “ ... que fazia pensar em
lamentos auguraes ..
AURIRROSADA 67 O mesmo que aurirróseo ; que tem
côr de ouro e rosa , A seda do ceu bordava - se da escarcha auri
rosada da aurora ...
AUTAZ 127 Canal que sae do lago dêste nome; é o escoa
douro de várias outras bacias lacustres ; segue aproximadamente a
direção do Rio Madeira, com o qual se liga pelo Paranamirim do Ca
tauixi. “ outros pontos do Autaz... "
AUTOCTONE 280 Que é natural do país em que habitam
e provém das raças que ali sempre habitaram ; aborigene. “ dos
povos autóchtones de onde provieram ... "
AVANT'ESMA 267 Ou abantesma ; fantasma ; espectro . “ ...
cuidava desopprimir - se para sempre do avantesma ..
AVEJÃO 127 Aumentativo de ave . Fantasma , nem
sabia como responder ao avejão ... "
* AVIADO " 265 Seringueiro que tem por sua conta , junto
xiu dono do seringal, um certo número de homens . E ' um interme
144 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

diário, parasita que vive entre patrão e o " toqueiro ", seringueiro
este que entrega a borracha no tôco da árvore por um preço vil . RM 0.
" .. Ao chegarem ao Funil, o “ aviado " agasalhou com piedadı ... '
AXI! 86 Expressão do Pará : de tédio ou desagrado ou re
pugnância para com alguma coisa, ou dito desagradável. ( Baixo- Jari)
Corresponde ao português : apre ! fora !, VBR . " ... Axi ! Tertuliana ... "
AZINHAVRADAS 69 Amarelo esverdeado . o soprar
do vento lhe vergava as frondes azinhavradas e tristonhas... "
AZUL DA PRUSSIA 211 Azul escuro de um leve tom
esverdeado, Calk . " o céo embebia - se de aguada azul da Prús
sia ... "

BACABEIRAS 82 OENOCARPUS BACABA , Mart. Sinônimo


Bacaba verdadeira . Bacaba ( Manaus ) . Tronco de 12 a 16 metros de
altura . Fölhas crispadas. O azeite da polpa dos frutos é de côr es
verdeada , comestível. Excelente palmito . PLC . “ ... Umas bacabeiras
e popunheiras ... "
“ BACALHAU " 119 Açoite de correias com que se castigavam
os negros no Brasil . “ ... que fugiam aos ferros e ao bacalhau ... "
BACURAUS 252 Parece aplicar -se a quase todas as espécies
de aves da família CAPRIMULGIDEOS . Ave noturna, de plumagem
mole e por isso , como as corujas, de voo silencioso . Muitas espécies têm
uma grande mancha semilunar, branca, na garganta , e possuem a unha
do dedo provida de um verdadeiro pente em miniatura . RVI. “ ... os
murucutús, rasga -mortalhas ” bacuraus ... "
“ BAIXO " - 97 Vento de baixo . Vento que sopra do Leste, da
foz do Amazonas . GC . * Acicates do vento fresco de " baixo " ... "
BALDAQUINAVAM 240 Cobrir ; ornar ou proteger ; guar
necer com baldaquino ( docel ) “ .. que lhe baldaquinavam , no
igapó ...
“ BALIZA " 137 O homem que carrega as balizas; e assim
também chamado . " Um baliza ficou tirando o couro ao bicho ...
BALSA 159 Paus atados uns aos outros em forma de jan
gada . " montarias e jangadas ou balsas ... "
BALSEIROS 121-126 Nome usado em várias partes do Brasil
para significar um emaranhado de vegetals . BJS. Também chamados
camalotes, são pequenas ilhas flutuantes, em regra formados por mu
rurés e outras plantas semelhantes, como define RG. “ para des
fiar -se mais tarde no balseiro ... "
BANDULHO 190 Barriga . 66 o emigrado europeu fartava
o bandulho ... "
BANZEIRO 29 Têrmo amazônico , que exprime a agitação
das águas do grande rio por efeito da pororoca . RABL, vol . 102 .
Agitação causada pelos ventos ou pela passagem dos vapores nas
águas quietas dos rios ou dos lagos, segundo Lauro Palhano . “ ... fi
cando o sacolejante banzeiro do bojudo transatlantico ...
BARARUA 82 Há uma ilha de BARAROÁ, é a antiga fre
guezia de Tomar, assim conhecida por Bararoa . " barranca verme
Thaça de Bararuá ..
ELUCIDARIO DO “INFERNO VERDE " 145

BARBACAS 152 Espécie de muro construido diante das mu


ralhas e mais abaixo do que elas. “ ... estirando - se em linhas de bar
bacās... "
BARIOLADOS 186 Gal . Mistura pizarra de diversas cores.
DL . "... o rancho de demonios bariolados e entrapados... 92"
BARRACAO 209 Na Amazônia , tem o sentido peculiar de
moradia do " patrão ” dono do seringal, a sua casa matriz , equivalente
mais ou menos a “ casa grande ", residência do senhor de engenho do
norte . E ' ao mesmo tempo habitação do proprietário do seringal ou
do seu administrador e depósito de mercadorlas indispensávels ou da
borracha colhida nos “ centros ” ; vivenda e armazém . Os barracões
são colocados na margem dos rios, ou orla da mata . São de madeira
o sobre barrotes elevados acima das possíveis enchentes a fim de evitar
a umidade . Lugar onde se abastecem os trabalhadores da mata , prin
cipalmente . BJS. Da cellula central, o barracão, irradiavam
outras cellulas... '
BARREIRO 138 Terra saloba do ocidente da planície, pre
ferida pelo gado ; o que não ocorre em Marajo , por falta de sal no
solo . Os barreiros amazônicos demoram em lugares onde chove
quase todo o ano, não dando tempo a que o sal se cristalize entretanto
o clorureto de sódio no solo amazonico, úmido, se bem que enxuto,
é abundante , RM . palminhando trilhos a algum barreiro ...
BARRIGUDAS 44 Hévea de qualidade inferior e conhecida
por seringueira barriguda GC . " Barrigudas " e " seringaranas ",
nas visinhanças innumeraveis ... "
BARROTES 56 Trave curta e grossa que se atravessa no
madeiramento para suster soalhos, tábuas etc. no peito descar
nado e rigido de traves e barrotes... "
BASILISCO 33 Lagarto fabuloso , a que se atribula o poder
de matar com a vista . parece filtrar um olhar de basilísco ... "
BATELOES 229 Barcaça de 3 , 4 , 5 , e 10 toneladas de des
locamento , e em geral de boca aberta , própria para ser tirada a remo
de mão ou de faia . Usam -no também rebocado no costa do das lanchas
que trafegam no Amazonas e seus afluentes . A. ita dba preta é ma
deira insubstituível nesse gênero de transporte . RM . “ ... O batelão,
atado ao flanco da lancha por grossas espías ...
BEIRADAS 86 Vocábulo português, usado no Norte do Brasil
com o sentido peculiar de arredores, cercanias . “ ... por aquellas bei
radas tristes ..." 176 Margem ; beira . " em duplo renque das
beiradas de ardosia ... ”
BERLIOZ 252 ( Hector ) Compositor francês, nascido em La
Cote Saint-André ( Isère ) . Suas composições são notáveis pelo poder
de sentimento dramático e a plástica DL. “ a solemne gravidade
de Berlioz ... "
BICHAT 40 (Marie François Xavier ) Anatomista notável e
fisiologista francês, nascido em Thoirette ( Jura ) ... " ... Bichat com
prehendeu como a reação contra a morte ... "
BIGUAS 96 Ave da família Carbonideos . Carbo Vigua , de
cauda, pescoço e bico enormemente alongados, éste rocurvado na ponta .
o colorido é geralmente prêto ; 86 o bico e as partes nuas da cara o
garganta são amarelos . Vive no litoral, como nas lagoas e rios do la
terior . E ' ave essencialmente aquática, vive só da pesca RVI . "
talhadas em azas elásticas de biguas... "
146 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

BISTRE 264 ( pintura ) Fuligem cozida e diluida em água


de que se usa para dar aguarelas e que substitui a sépia e a tinta da
China . " os olhos do Souto se emmolduravam num bistre... "
BIVACADOS 195 Acampados ao ar livre. “ ... deparei com
os peruanos bivacados..
BOCAÇA — 199 Boca muito grande, muito rasgada,
99 “ ... Uma
figura alentada e bruta , com a bocaça mascarada ... '
" BOLA ” 78 Refeição . “" ... Comer uns dias da “ boia " do
governo ...
BOIAO 46 Pote de boca larga ; fogão para defumar a bor
racha . " ... as tigelinhas, o balde e o bolão ... "
BOIEIRA 162 Solanum ... ( Solanaceas ). Paul Le Cointe
não dá mais . ARBUSTO . O tecido da madeira é muito grosseiro ,
poroso, mas firme, de cor branco pardacento , muito leve; é utilisada
para boia de redes de pescar e para salva -vidas. “ .. o arpão e a
boia de boieira ... "
BOITATAS 44 E ' o gênio que protege os campos contra
aqueles que os incendeiam ; como a palavra o diz “ boitata " é : cobra
de fogo ; as tradições figuram -na como serpente de fogo que de or
dinário reside nágua . As vezes transforma - se em um grosso madeiro
em braza , denominado “ meum " , que faz morrer por combustão aquele
que incendeia inutilmente os campos . CM . " inaty- pereres, boita
tas desasidos repassam ..

BOLANDEIRA 65 Grande roda dentada do engenho de


açúcar ; serve para mover o rodete de ralar mandioca , puxado por
animais . Diz Alencar, que este nome no Estado do Ceará , dão unica
mente, à roda que move o ralador da mandioca ; a que move as moen
das chamam de engenho ou almanjaras. “ trabalhava o Pedro na
bolandeira ... "
BOQUEIRÃO 175 Termo usado no nordeste do Brasil, nomeia
a abertura ou garganta nas serras por onde passam rios . E ' o resultado
da erosão das águas. BJS . eu me derivava na corrente escura ,
como ao fundo de um boqueirão ... "
BORBOTADO 278 Sair em borbotões, em jorros . “ era
>
aço liquido borbotado de um forno ... '
BORESTE 246 Lado direito da embarcação . “ ... botos por
boreste ... "
BOROS " 208 Antigo vale monetário, emitido em papel pelas
Municipalidades sertanejas LM . recusando -se а . adiantar OS
" borós " .
BOSCAREJA 225 Que pertence ao bosque . “ ... até a bog
9
pareja villasinha do Amazonas ...
“ BRABOS” 205 No Amazonas chamam de " brabos " aos tra
balhadores recém - chegados para a “ seringa " “ . e curiosa de uns
" brabos " que o vapor trazia ... "
BRAGANÇA - 191 Cidade a margem do Rio Caeté, a 16 qui
10metros de sua foz, no Estado do Pará . O clima de Bragança é repu
tado um dos mais saudáveis do Pará e os médicos aconselham a sua
residência para os que sofrem de afecções pulmonares . A vegetação
ali é poderosa como em todo o vale do Amazonas . Tem excelente o
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 147

abundante água potável ; possue salinas e extensas campinas de criação ;


há muita caça e peixe em abundância, ligada a Belém por ferrovia .
FBS. “ ... depois ... depois, em Bragança , no Pará ... "
" BRANCO " 127 Pereira da Costa registou esse termo como
senhor de escravo ; tratamento de respeito e submissão que os negros
davam ao brancos. FBS. Homem de raça branca . , “ sua submissão
ao " branco " ... 64 Educado . “ ... nos hábitos finos dos “ bran
cos " 127 Estrangeiro . Homem de raça caucásica , por exten
são . Data de pouco mais de um século a sua submissão ao
" branco " ... 237 Palidez & a phisionomia laivada de branco... "
“ BREUS ” e de “ LACRES ” 33 Breu branco verdadeiro
PROTIUM HEPTAPHYLLUM ( Aubl ) March . ( Burseraceas ) , igual a
ICICA HEPTAPHYLLA Aubi . Sin . Cicantuá ihuá ( em língua ge
ral ) . Almecegueira ; breu branco do campo ( R. Tapajoz ) . Arvore
grande . Habita em matas de terra firme arenosa . Madeira averme.
Thada, compacta para marcenaria, construção civil, torno, dá excelente
carvão . Dá uma resina , empregada no calafeto de embarcações . O
fruto é uma capsula vermelha contendo uma polpa branca de
gosto bastante agradável mas um pouco resinosa . Há de várias espé
cies . PLC . Atravez de “breus e de “ lacres " ...
“ BRIBA ESPRITADA" 65 Grandemente enfurecida ; tam
bém, víbora , adjetivo que da sempre idéia de avantajada . LM. “ ... Eu
Já estou que nem uma “ briba espritada " ... "
BRIGUE 225 Embarcação de guerra ou mercante do dois
mastros, dos quais o maior é inclinado para trás... “ . a tristeza
insondavel de um brigue negreiro ..."
“ BROCA " 80 Ato de derrubar arbustos ou mato , preparando
terreno para a roça . Com a floresta , a “ broca " é facil e o ma
chado completa a destruição ..." 82 Verme que ataca a raiz de
algumas plantas; bicho que fura a madeira ou ataca certas plantas.
Também é doença da cana de açúcar e moléstia dos cascos de cavalos .
44
RABL, vol. 6, bras. enfermados pelo mal da " broca " ... "
BURURO 118 Erro de impressão, por burururu, nome antigo
da cachoeira e dos índios que a habitavam ; no Rio Urubú , dos por
tuguêses . Além desses havia os Guada venes e Cabouquenas, exter
minados pelo capitão Costa Favella em 1664 ( Ver Favella ). “ ... das
suas cachoeiras rumorejando , Burúro ... "
BUZINAVA PARA CHAMAR O VENTO 102 E ' crença goral
que um certo “ assobio ” demorado o longo tern a singular propriedade
de chamar o vento ; assim conta Gustavo Barroso em “ Terra de Sol " :
“ Logo que o vento abranda, esmorece em sopros estafados, gritam uns
para os outros, para os meninos, que sempro, curiosamente , vêm olhar
a queima : " Assobia ! Assobia, menino ! ” “ ... Tirou della um som
longo e rouco . Buzinava para chamar o vento ... "

“ CABOCLO ONÇA " Valente para trabalhar, disposto .


“ ... caboclo onça " classificavam - no assim os "cearences ” das cor
canias ..."
" CABRA ” 106 Mulato ; indivíduo valente provocador; qual
quer individuo. “ um “ cabra " alto, corpulento ... "
148 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CACAORANAS 121 Ou cacau azul. Theobroma spruceanum ,


Bern . (Sterculiáceas ) . Sinonimo : Cacoarana de fruto azul. Caracterís
tico : Flores nos ramos, pequenas, de côr castanho - avermelhada ou
claro, ou rósea . Fruto verde-azulado quando maduro . Alimentação:
Polpa escassa , comestível, doce, mas sem aroma . Madeira propria para
marchetaria . PLC. “ ... Ramos de cacoaranas, socoros e oruas .
CACHOEIRINHA 238 Arrabalde de Manaus. Unico lugar
do mundo onde o diabo tem capela, “ Capella do Pobre Diabo ", onde
todos os anos se fazem festejos. (Ver Turumã Cachoeira de ) .
CAFURNA 119 O mesmo que cafua. Antro ; esconderijo ;
caverna , como uma cafurna escura ... "
CAIAUÉS 77 Elaeis Melanococca , Gaertn . Dendê do Pará..
Tronco muitas vezes recurvado no pé a parte horizontal emitindo
raízes adventícias delgadas . A polpa dos frutos do caiaués da Oleo
espesso vermelho -dourado, comestível . PLC . “ E uns caiaués, inajás
e tucumãs ... "
CAINAMANZINHO 120 Um dos canais do Rio Urubu, que
o comunica com o Amazonas, entrando acima da cidade de Serpa .
AB . ... Foi por um destes, o Cainamansinho , que a minha curiosi
dade enfiou ... "
CAIRELADO 122 Orlado de cairel: galão estreito para de
bruar . “ ... O lago era todo cairelado de uapés ... "
“ CAITETU " 60 Peça principal do aparelho de ralar man
dioca, e que consiste em um cilindro de madeira, ao longo do qual se
adaptam serrilhas metálicas, com uma das extremidades conformadas
em roldanas de gorne para a passagem da corda ou correia que im
prime rotação . G. Barroso, em " Terra de Sol ”, diz : ralo cilíndrico ,
assim chamado, cujo eixo faz nos mancais um barulho analogo ao
porco caiteta com os dentes . Definindo o animal desse nome da
Alencar a seguinte explicação : porco do mato , espécie de javali bra
sileiro de caeté : mato grande e virgem ; e-suá : caça , mudado o s
em - t -, na composição pela eufonia da língua . Caça do mato virgem .
Gabriel Soares : o que bate os dentes ruidosamente. João Ribeiro, (Lin
gua Nacional, pg. 235 ) cita o provérbio mineiro muito expressivo : “ Cai
tetů , fora da manada, cai no papo da onça". E ' conhecida a lenda
indígena, segundo a qual o “Caipora ", o padroeiro da caça, vem mon
tado sobre o último porco da vara . Ai! do imprudente caçador que
destrói esta riqueza da floresta e, não se contentando com a caça su
ficiente para o sustento . mata também o último porco da vara : o gênio
da floresta lhe aplicará cruelmente o merecido castigo . Admirem os
organisadores das “ grandes batidas ” esta sábia compreensão da " lei
da caça " , imaginada pelo Indio para seu próprio uso e proveito. RVI.
“ ... o banco com o " caitetu " a prensa ... '
CAJURANAS 240 Simaba guianensis, ( Aubl ) Engl . Sima
rubáceas . Pitombeira . Habita as margens dos lagos de terra firme do
Baixo Amazonas . Os frutos são dos preferidos pelos peixes “ tamba
quis ". Madeira amarelo claro , muito leve, fácil de trabalhar , para mar
cenaria fina . PLC . “ ... a pompa triste e meiga da sombra das ca
juranas ... "
CALAFETAR 79 Tapar com estopa, introduzindo à força.
nas junturas, buracos e fendas de uma embarcação e embebendo-a de
pez, alcatrão, etc. para vedar a água . “ ... ou calafetar a canoa ... "
CALANGO 254 Na Bahia é o mesmo que “ Taraguira ". No
Maranhão , conforme descrição de Wilson da Costa é um Iguanideo
do mato, que vive no chão e cujo colorido, adiante azul, atrás verde,
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 149

com linhas negras, o distingue dos demais. Goeldi e Le Cointe iden


tificam o calango da Amazônia com Tropidurus torquatho ( que é a
típica taraguira ). Na Paraíba, a graduação por tamanho é a seguinte :
Tejú : lagarto ; tigibú : calango e vibora (aliás pronunciado : “ briba " ) ,
que é o menor lacertilio . RVI. " ... Essa morada de calangos, tijubinas
e osgas ... "
CALHAMBEQUE 231 Pequena embarcação costeira . Traste
inútil , objeto de pouca valia . SA Oliveira . “ ... O calhambeque ar
riava o signal... '
CALIFORNIA 238 Fartura . Um dos Estados da América
do Norte . Riquezas de toda ordem ; ouro, petróleo , prata, cobre, mer
cúrio etc. VC. “ Uma varzea, no Amazonas, é a verdadeira Ca
lifornia ..."
CAMALOTE 154 Têrmo do sul do Brasil, especialmente, do
Mato Grosso, o qual designa ilhas flutuantes formadas de plantas aquá
ticas, aguapés que descem os rios à mercê da corrente, logo que
começam a receber as primeiras águas. É o mesmo que piriantās
da Amazônia . " Com os troncos derivam os camalotes ... "
CAMBANDO 101 Mudar dum bordo para outro, expressão
usada entre os veleiros e marítimos ( o vento, as escotas, as velas la
tinas etc. ) . " ... uma guinada do vento cambando as vellas ... "
CAMEOLHADA ( de ) 167 Em confusão . Desordenadamente
99 .
as populações immigradas de cambolhada ... !
CAMOCIM 208 Cidade à esquerda do rio do mesmo nome,
segundo porto do Estado do Ceará . " no porto de Camocim, cin
coenta ao todo ... "
CAMPOS GERAIS 58 Campos, lugares ermos, longínquos.
RABL. Vol . 17 , bras . Adolpho Ducke escreveu em referencia ao
“ campo geral” na Amazonia : A raiz da serra estende -se o campo ge
ral, campo alto ( com muitas hervas e poucas árvores espalhadas) ,
próprio para criação de gado nos meses chuvosos, ao passo que no
verão esse gado é obrigado a procurar pastagem nos campos, então,
j,a enxutos da " varzea " . BJS . " desde o Cariri aos campos geraes
do Rio Branco ...
CANARANA 122 Panicum spectabile, Nees Gramíneas
aquática que orla as margens do Amazonas, os lagos, os igarapés. A
o capim mals apreciado pelo gado da planície . O boi e a vaca del
xam qualquer gramínea em terra para, enterrados nágua, comerem
a canarana . Aſ são muitas vezes vítimas da piranha e do jacaré,
RM . Diz Q. C. que essas pequenas ilhas formadas de canaranas e
desprendidas rio abaixo são, comumente, a morada dos jacarés. " ... 8A
pemirim e canaranas ... ” Veja Cananaral .
CANANARAL 85 Grande quantidade de canaranas .
levava por entre o cananaral ao terreiro ... "
CANASTRO 192 Esqueleto do indivíduo , animal etc. Dar
cabo do canastro, matar . “ esse mal me vas dar cabo do canastro ... "
CANGUÇÚ 146 O mesmo que “ onça pintada" ; refere-se de
formas menores de cabeça mais grossa e cujo pêlo tem manchas
menores e mais numerosas, RVI. Em tupi - guarani : acanga 9 : cabeça,
ornato , enfeite ; ussú : grande. que nem um cangussa ..
CANHADA 35 Espaço de terreno baixo que medeia entre
duas coxilhas ou serras, mais ou menos banhado dágua e com vegeta
são própria das terras úmidas. Também é o vale que corre entre
duas lombadas longitudinalmente. “ ... Esta canhada surprehende .. , "
* 150 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CANINDE 63 Cidade à margem esquerda do rio do mesmo


nome, no Estado do Ceará ; Acossaram - no dos arredores de Ca
nindé os horrores tragicos... "
CANNES 225 Cidade francesa nos Alpes Marítimos. Esta
ção de inverno DL . a estadia em Nice ou Cannes ... "
" CAPAVAM ” 128 Cortar das plantas os rebentos ou as
floros supérfluas . " capavam " os brotos ao parco tabacal... '
CAPILACEO 165 Que tem filamentos capilares, isto é ,
fino como cabelo . “ . um pequeno pedaço de filamento capilaceo
colado ...
" CAPIM SANTO " 125 ANDROPOGON NARDUS L. (Gra
mineas ) Sin : capim cheiroso ; capim santo e capim marinho .
Indus . Da por distilação, o óleo de " citronela " ; é o Lemon grass
dos ingleses . PLC . mamoeiros, toucas de “ capim santo " ... "
CAPITARISEIRO 275 COURALIA TOXOPHORA , Benth
Hoock . Bignoniaceas . Pau dárco branco . Habita nas margens
das cabeceiras dos lagos . Flores róseas . As sementes fornecem um
Oleo sicativo , Ha os de flores amarelas e roxas , TECOMA CONSPICUA
O TECOMA VIOLACEA . PLC. um capitariseiro matisava - se
aparatoso de flores jalnes ..."
CAPITEIS 270 Parte de uma coluna que se eleva acima
do fuste e o coroa . " com os seus capiteis farfalhantes ... "
CAPIVARAS 248 É o maior de todos os roedores, HYDRO
CHOERUS . Hydrochoerus atinge 1 metro do comprimento ; a cor é
uniforme parda, nem muito avermelhada nem muito amarelenta .
Não tem rabo ; as orelhas são pequenas . Vivo sempre a beira d'água,
que é o seu refúgio , quando perseguidas; nada e mergulha bem . Na
Amazonia ás vezes, vem - se capivaras domesticadas, que acompanham ,
então, ao banho as crianças , RVI . GS . explica que , como andam
sempre n'água, são por isso chamadas “ porcos d'água ” e diz mais ,
definindo capivara : comedor de capim .
Estes animaes são atacados, como o cavalo, pelo " mal de cadei
ras " , pelo que alguns cientistas desconfiam que sejam estes roedores og
depositários do flagelado TRYPANOSOMA EQUINUM . De fato , é
sabido que, de tempos em tempos, a epizootia determina grande mor
tandade entre as capivaras . O distinto pintor Theodoro Braga afir
mou - nos que os Marajoaras criadores de gado incluem as capivaras
entre os mais perniciosos inimigos da criação, “ porque elas enve
nenam a água e fazem morrer o gado " . Ainda uma vez devemos
dar razão à intuição do povo que assim bem o saber, atinou , ante dos
cientistas, com os depositarios da causadora do " mal de cadeiras "
( ou quebra - bunda, como diz o povo ) . RVI. “ ... capivaras fugidias ;
seringueiras em festa ... "
“ CAPOTE " 227 Junção das proprias pallas da cumieira ;
junção das palhas do teto . “ ... No “ capote " das palhas da chou
pana ... "
CAPOEIRA 80 Vocábulo indigena de car -mato , mata , flo
resta ; e coera que foi . As ca pueiras ensina A.J. de Sampaio,:
" Bão formações arbóreas que surgem naturalmente nos terrenos
baldios abandonados por cansados, terrenos anteriormente florestais
e que após desflorimento e cultura comuns, foram deixados em pou
sio. BJS . “ ... Para atacar a capoeira nova o machado e inutil ... "
CAPUA 163 – Antiga Vulturno sobre o rlo do mesmo nome.
Cidade da Italia , Provincia de Nápoles. Esta cidade oferecia outro
ra a permanência a mais deliciosa de toda a Italia . Anibal dela se
ELUCIDARIO DO “ INFERNO VERDE ” 151

apossou e fez as seu quartel de inverno ; e deixando- se dormir sobre


28 delícias dessa cidade acarretou - lhe o desastre da campanha con
tra Roma . “ . amollentanado na Cápua de aguas piscosas... "
CARAFUZ 47 O mesmo que cafuz : descendente de prêto o
mulata ou mulato com preta . .. onde o mameluco , o carafuz
omulato ... "
CARANANAÇÚ 770 Mauritia carana , Wall , Carana grande,
em Manaus e Palmeira Leque , no Rio Negro . De 8 a 12 metros de
altura . Flores com forte perfume de trêvo sem espinhos . PLC .
num carcomido tronco do carananassú ... "
CARANAS 95 O mesmo que carnaúba Copernícia cerifera ,
Mart. Cultivada na Amazônia . Caule de 10 metros a 15 de altura . De
material para cobrir casas, fibras para espartaria e cordoaria . Das
folhas tira -se uma película de cêra vegetal, fusível. PLC . “ . 08 pe
nachos fasciculados dos urucuris e caranans... "
CARAPANAS 207 O mesmo que pernilongo, na Amazônia .
CARARA - 228 Nome que se dá ao “ bigua - tinga ” na Amazônia
e em Mato Grosso RVI “ porque um carará passava no ar azu
lino ... "
CARATEÚS 208 Crateús, êrro de impressão, cidade á mar
gem esquerda do Rio Mandaú , no Estado do Ceará . gente do
s
Crato e Caratheú ... "
CAREIRO 237 Paraná extenso e largo , comunica o Solimões
com o Amazonas, evitando que uma parte considerável das águas da
quele passem em frente do Rio Negro . Forma a ilha da Terra Nova.
FBS . " gabando um compadre do Careiro ... "
CARIUA — 127 O mesmo que “branco ". " mas o dolay &
violencia do caríua ... "
CARLINGAS 97 Naut. Peça fixada na sobrequilha, ou aber
tura nesta praticada , e em que se encaixam os mastros . “ ... desem
butem -se das carlingas... "
CARLYLE 97 Escritor escossês, nascido em Ecclefechan ,
autor de : “ Os herois ” o “ O culto dos herois " , etc. identificada
por Carlyle ao Direito ... '
CARÕES 33 Grande ave da familia Aramideos, ARAMUS
Scolopácens O nome é onomatopáico , pronunciado “ á nortista " . Mede
70 centímentros de comprimento . A cổr geral é pardo -denegrida ; a
fronte e a garganta são esbranquiçadas e a nuca e o pescoço posterior
estriados de branco . Os caçadores apreciam -lhe a carne. RVI. “ re
fugio de garças, ananahys e carões ... "
“ CARPA " 61 Ou capina . Limpeza de um terreno de hervas
más . Há, também , um peixe com esse nome. até na “ carpa " ou no
encolvarar... "
“ CARRASCO " 59 Espécie de mata anã , de arbustos do
caule e ramos esguios ; forma vegetativa mais espalhada , enfezada e
aspera do que a caatinga , composta em geral do arbusto “ mimosa du.
metorum " St. Hil, (B.J. Sousa ) algum trecho de " carrasco " ...
“ CARREGADOR DE LIUNETA ” 143 Carregador do trân .
sito . “ ... O tabareu “ carregador da “ iuneta " como ello próprio se
intitulava ... "
CARREGOSA 204 Pesada ; incomoda. LF . Då na forma mas
culina. " foi a de desafrontado de carregosa canga ...
152 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CARREIA 264 Erro de impressão, pois na 4. od . já vem


correto para carreira . Corrida veloz, “ ... Cahia no meio da carreira... "
CARREIRO 125 Nome que se dá aos atalhos, às verodas,
aos caminhos estreitos; e segundo Valdomiro Silveira , ao caminho ha
bitual da caça . Também ao indivíduo que dirige o " carrro de bol ".
BJS, “ . Segui pelo carreiro bordado de alastrante 'pega - pinto " ...
“ CARROCA DO LLOID " 54 Navio vagaroso . “ ... Mettera
so em seguida no “carroça da Lloyd " ... "
CARURU 125 Amarantus olerácea . L. Herva . Comida cha .
mąda carurú, que é a herva dêsse nome, guisada com quiabo e camarão.
uma roça pequena e mal tratada de “joão-gomo e caruru ... "
" CASA DA FARINHA " . 60 E ' um vasto telheiro sustido
por colunas de madeira ou de alvenaria . A mandioca , entulhada no
meio da casa , é raspada por mulheres sentadas no chão, armadas de
quicés, comumente. Uma raspa até ao meio , e outra acaba de raspar.
GB . " Mais tarde, o Catolé conseguira instalar no alpendre a ca sa
da farinha" ... "
" CASA GRANDE" 144 Nome que , no norte do Brasil se dava
e ainda se aplica, i habitação dos senhores de engenhos ou proprie
tarios de fazendas, donos das terras em torno onde se erguem as casas
dos moradores ou agregados, de antes as senzalas dos escravos. BJS.
“ ... que todas as noites eu fosse vigiar a “ casa grande " ..
CASCOS 85 Canoa . " aos saltos pelos outros cascos das
montarias... 234 Cavername de navios . " ... das cavilhas do
casco ao tope dos mastros .. "
CASTANHEIRAS 138 Bertholletia excelsa , HBK, Lecythi
dáceas . Sinônimo: Castanha do Maranhão , Tucari; Nha, árvore gran
de. Habita na mata grande da terra firme, alta, argilosa ou argilo
sllicosa , em toda a Amazônia . Atinge 60 metros de altura e 4 de dia
metro. PLC. " a tessitura da floresta castanheiras excelsas de nome
e de aspecto ...
CASTILOAS 186 E ' uma planta de que se extrái o caucho.
Die E. da Cunha : que é a castilda elástica que lhes fornece ( peruanos )
a borracha apetecida ; não permite , como as hévias brasileiras, uma
exploração estável. E ' excepcionalmente sensível . Desde que a gol
peiam , morre, ou definha durante largo tempo, inútil . Assim o extrator
derruba-a de uma vez, para aproveitá - la toda . Atóra -a, depois, de
metro em metro , abrindo no chão , ao longo do madeiro derrubado,
cavidades retangulares correspondentes às seções dos toros, delas re
tira ao fim de uma semana, as “ planchas " valiozas, em quanto 08
restos ficam aderidos à casca, nos rebordos dos cortes, ou esparsos a
esmo pelo solo, constituem , reunidos , o " sernambi de caucho ." de qua
lidade inferior . “ a procurar riqueza encorpada na entrecasca das
castilloas... "
CATINGA 145 Mato rude e garranchoso do sertão. RABL.
vol . 2 , bras. “ nos galhos dos angicos na catinga ... "
CATOLE 61 Espécie de palmeira , pertencente aos gêneros
Cocos e Atalea ,da zona árida central do Brasil cujos côcos se intro
duzem nas pontas de pequenos paus para confeção dos biltros. OS
próprios biltros são também assim chamados. RABL. vol. 6 , bras .
CATUQUINS 250 O mesmo que catuqui espécie de
maruim ou mosquito pólvora . Como diz o nome vulgar, parecem grãos
de pólvora , tanto pela dor da picada como pela cor e pelo tamanho
que varia de 1 milimetro, a pouco mais de 2 milímetros. As fêmeas
PERCY LAU

Regatocs

Buritizal, Amazonas

( Clichês cedidos pela “ Revista


Brasileira de Geografia" )
1
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 1:53

atacam o homem , o gado vacum o cavalar, cães e mesmo aves, réptels,


torturando -os por tal forma, que chegam a tornar certas paragens
inabitáveis . Aparecem em geral em grande número, principalmente
ao escurecer e à noite . 66 uma nuvem densa de catuquins..."
CAUASSÚ 254 CALATHEA LUTEA G.F.W.MEY . (Maran
taceae ). Planta herbacea. Hab. Na varzea alta ( Gurupa e B. Amazo
nas ) . Característicos : Folhas muito grandes e resistentes, empregadas
para forrar os paneiros de farinha e os toldos ( japás ) dos abrigos
nas pequenas embarcações . Indust . A face inferior das folhas é co
berta por uma pelicula de cera analoga á cera de carnauba ( ponto
de fusão 75 graus C. ) PLC . o teto do cauassa esburacado ..."
CAUCHEIRO 185 Assim se chama na Amazônia aos que se
entregam a extração da borracha do caucho, algo semelhante aos se
ringueiros extratores do latex da hévea . Tracou - lhes admirável perfil
E. da Cunha em " Å margem da história". para entender -se com
um caucheiro, que chegava ..."
CAUCHO 261 Árvore da família das Moráceas. Castiloa Ulet,
Warb . Latex coagulado dessa árvore ; borracha . Fazem - se balsas ex
clusivamente de caucho para seu próprio transporte, que E. da Cunha
chamou de : " o caminho que marcha " , a mercadoria que conduz os seus
condutores .. Marcavam elles que se penetrava na zona do
caucho ... "
CAUIXI 31 Substância que, em forma de esponja, se aglo
mera nas raízes das árvores à beira do rio . Diz o Cônego Franc. Bern .
de Souza que é matéria que no Rio Negro e em outros, mas somente
nos de água preta , se aglomera nas raízes das árvores das margens
destes rios . O cauixi apresenta a forma de esponja e tem propriedades
cáusticas . Os naturais utilizam -se da cinza dêle para fabricarem louça,
misturando - o com argila . o cauixy : caustico invieivel..."
CAVERNAME 229 Conjunto das cavernas de um navio .
... pesada do casco e cavername... "
CAVILOSO 157 Capcioso ; sofistico ; manhoso . Come
cara caviloso ... " 182 Enganadora . uma palustre cavi.
losa ..."
CEARÁ 59 Um dos Estados do Nordeste do Brasil . Diz A
tradição que significa na língua geral: canto da jandaia Alencar,
porém , da como sendo nome composto de cemo : cantar forte, cla
mar, e ara : pequena arara ou piriquito, afirmando ser a verdadeira
etimologia . No Ceará nunca pudera ser senhor de um pedaço de
vazante ... "
“ CEARENSE " 45 Apelido que se dá , na Amazônia , a todo
nordestino, além de ser o designativo do filho do Ceará . BJS . “ А
onda migratoria , esses cearenses ” , como elle se exprime ... "
“ CENTRO " 212 Têrmo que, na Amazônia , se da , no " in
ferno verde " dos seringais, indica o interior do seringal, onde a fre
guesia ( os seringueiros ) está " colocada ” ( trabalha ) para tirar a bor
racha nas diferentes “ estradas” a rumo ( a que segue em direção para
a frente ) ou “ enrolada ” ( a que não obedece à diretriz regular). Os
seringais compreendem o " centro ” ea “ margem ". BJS. para fazer
a viagem ao “ centro " ...
CERDA 227 ( Castelhano ) . Sedas de javali e outros animais.
A cerda que vestisse um idolo ... "
CERVICAIS 170 - Que pertence ao pescoço ou a cerviz , “ ... mal
fixa nas vertebras cervicaes ... "
154 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CEVAR 128 Por em agua (a mandioca ) por três ou quatro


dias, até ficar em principios de fermentação . “ ... depositavam -nas
nagua para covar ... "
" CHAMADA" 139 ( Parafuso de chamada ) parafuso para
movimentos muito lentos em instrumentos de precisão . e pelo
de “ chamada " levada com rigor ... "
CHAMALOTE 84 Tecido de pelo ou lā , geralmente , com
sêde . "... o corpanzil no chamalote e filigranas do rio ... "
" CHAMANDO CANOA " - 236 Procego usado pelos patrões de
gaiolas para que venham os botes buscar os passageiros a bordo, dando
sucessivos e prolongados apitos para serem ouvidos de terra. “ de
pois de prolongados o incessantes apitos “chamando candas " .
CHANTAR 276 Plantar de estacas, assentar . " ... chantando
pelo solo as mudas dessas roseiras... "
CHARÕES 85 Bandejas de pau , no Amazonas . ( Verniz de
lacca com que os japoneses e chineses pintam as que exportam , dal,
o nome, por extensão ). com 08 "Charðeg " cobertos de chicaras e
copoe ...
CHARONTE 37 Barqueiro do inferno, que passava em sua
barca, sobre a Stigio , as almas dos mortos por meio de um Obolo. Dal
veio o costume de colocar uma moeda na boca dos cadáveres antes
de Os enterrar . Recusava transportar aqueles que não tinham recebido
as honras da sepultura, e que eram condenados a vagar cem anos às
bordas do Stigio , antes de entrar no Inferno . DL. Segundo Dante,
porém , é o barqueiro que transporta as almas dos mortos ao Inferno ,
através do Rio Aqueronte . A lembrança classica de Charonte ...
CHARPA 27 Cinta larga de pano. uma charpa mais
clara ... "
CHAVARRASCAL 216 Essa vegetação é conhecida em Mato
Grosso também por chavascal; pertence à associação aberta , xerofila
e se aproxima dos tipos que na Argentina denominam “ espinhal " , no
México e Texas “ chaparral”, na Austrália " Scrub ” e no Sul da África
" bi ush " . E ' uma vegetação baixa , de cerca de 3 metros de altura , com
posta na sua maior parte de uma leguniinosa de flor amarela , de tronco
fino , reto e duro ; tão junta tem uma árvore da outra que não consegue
nela passagein para o corpo do homem ; tal é a densidade desta floresta
nä . Uma ou outra árvore de porte mais saliente cresco e ali vive
assoclada. Complicando mais esta trincheira natural, a parecem as lianas
e os espinhos de toda natureza , entre os quais é comum a japecanga
(Smilax -chequem chilensis ) , o gravatá de gancho ( Bromélia karatas ) .
o capim navalha ( Ichnanthus bombussiflorus Doll ), o terror dos ma
teiros . E ' comum associar-se à sua vegetação a cambauva , bambusa
cea que se alastra , confundindo as suas touceiras . Essa forma de ve
getação extende-se além do Rio Camararé, para o Poente, por largas
zonas, onde o explorador só de facão em punho consegue abrir passa
gem . Na condensação de tais plantas, se bem que baixas, a luz do sol
pouco penetra na época das chuvas, o que determina, pela umidade all
guardada , o desenvolvimento de musgos diversos já pelos troncos e
galhos das pequenas árvores, já no próprio solo , onde cresce comu
mente uma “ espécie " de aspecto semelhante ao da esponja do mar e,
por isso , chamada " esponja vegetal". ( E ' uma providência natural para
as aves rasteiras e animais de pequeno porte, essa vegetação ; ela absorve
abundantemente a umidade do ar, guardando - a para dar-lhes pela ma
nhã ) . Não é propriamente uma " caatinga " essa associação vegetal,
por que nesta se desenvolvem , às vezes, certas gramíneas, permitindo
a criação do gado , ao passo que no chavarrascal a não ser a acaiaúva
ELUCIDARIO DO “ INFERNO VERDE ” 155

e raramente o andrequicé, nenhuma outra existe, sendo absoluta &


falta de vegetais gordurosos, característicos da " caatinga ". Em uma
palavra , a densidade da vegetação fina é de tal natureza que a torna
impenetrável; assim a região charravascal nem pelos indios é atra
vessada e a anta raramente al se encontra . E ' o " habit ” preferido
das cotias, certas espécies de tatus, ratos, gambas e outros animais
pequenos . Essa formação só é encontrada nos valos dos rios o cabe
ceiras onde a areia constitui o solo, havendo uma transição do cerrado
para o chavarrascal e dêste para o mato, em que o pau rosa é o ca
racterístico . ( Botelho de Magalães,. “ Pelos Sertões do Brasil" ) .
CHAVASCAL - 216 O mesmo que chavarrascal, semelhante ao
que se denomina em algumas zonas " bamburro " . No rio Purus, cha
vascal é pantano trancado de raízes, alagadico com atoleiros, cheio
de vegetação . BJS. “ ... atolava - se no chavarrascal...
CHAVECO 243 Pequena embarcação . Barco pequeno e mal
construido ou velho . “ O chaveco voltava precipitadamente ... "
CHIBE -- 278 Água, açúcar e farinha dágua, em solução . Pe
regrino Júnior da' como : farinha dágua muito diluída em caldo ou
calda . “ ... engulindo o chibé sahiu a sondar os arredores ... "
CHILD HAROLD 118 ( Peregrinação do ) Menino Haroldo
Poema em quatro cantos de Lord Byron , ( celebre poeta inglez )
narrativa dum poeta em viagem , onde quadros magnificos se mistu
ram as impressões de uma alma agitada. DL .
CHIQUERADOR 146 Espécie de chicote, composto de um
cacete, e que tem numa das extremidades uma tira de couro, torcida
ou achatada . “ ... com o chiquerador na mão saltar ao pé de mim ... "
CHISPEANTE 84 Que lança chispas; brilhante . na
pedraria refulgente da enorme carapaça chispeante ... '
CHOFRARIA 45 Ir de encontro a : dar de chofre ; replicar
de pronto, retrucar . em vago resaibo de desprezo e despeito,
chofraria em praga ..
CHOREA 181 Doença que obriga a movimentos contínuos
de certos órgãos. “ que se agitava na choréa ... "
“CIGANAS” . 270 Ave d familia Opistooomídeos, opistocomus
cristatus Espécie amazônica , comparável aos jacus . Seu colorido é
amarelo - vermelho ferrugineo , com dorso mais bruno e peito branco ;
a cabeça é ornada por uma touca de penas longas e acumiadas . Vivem
em grandes bandos nos terrenos alagadiços que margeiam os grandes
rios da Amazônia, especialmente, sõbre as “ aningas" . o bando
lerdo de " ciganas ” intrometendo - se nas ramagens baixas dos arbustos .. ,"
CIPOTÁIA 139 - Capparis urens, Barb . Rodr. ( Capparidaceas ).
Cipo de flores brancas, cuja raíz contém um princípio ativo , volátil,
irritante, “ a capparina" PLC . “ ... torvelinho de ramas e sarmentos
de cipotala ..."
CIPO “ UNHA DE GATO " 120 Ou cipó de gato também
chamado cipo morcego . Bignonia unguis . Cati . L. Arbusto da família
dae bignoneáceas. Cipó grande . Planta ornamental , flores grandes,
numerosas, amarelo claro . Medicina pop . Diurético , adstringente.
PIC . “ ... o tiririca, o “ unha de gato " afiam os milhares de espículos ... "
CLAVINOTE BOCA DE SINO 142 Espécie de trabuco
catalão muito usado no Ceará , sempre carregado de palanquetas de
chumbo ( palanqueta : são as balas de chumbo muito compridas e finas.
Terra de Soi ) GB . ... e me entregava um clavinote bocca de sino ... "
156 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CLOPTOQUE 104 Onamatopaico, o ruido que fazem os remos


nas toleteiras a forquêtas. “ ... meus olhos cerravam - se aquele eloptoc
dos remps... "
COALHOS 28 Coagulos . Cobrir inteiramente , 46 ... um verde
montanha sem gradação nas alturas das copas informes e esparsas
como coalhos ... "
COATIPURU 249 O mesmo que " Serelepe " ou " Caxinguelê,
na Amazônia também chamado Agutipuru . O nome de esquilo não é
usado pelo povo do Brasil . São roedores da família Sciurídeos. Ca
racteriza - 08 a cauda longa, peluda , mais comprida que o corpo . Tem
côr pardo - escuro, finamente salpicada do ocre . As amas da Amazônia
o invocam para que faca dormir as crianças, pois é ele o mais dormi
nhoco de todos os quadrúpedes da fauna amazônica ( J. Verissimo,
" Cenas da Vida Amazônica ", pg. 62 ) e também Baena, cita a frase das
mães : " Acutipuru, empresta -me teu sono, para minha criança dormir . "
RVI . " ... que havia macaco e coatipura ... "
" COBRA GRANDE " 44 - O mesmo que cobra preta ; boidna .
Deusa autoctone. Vive nos Igarapés, nos lagos, rios, paranás. Trans
forma -se em navios, em barcos, em canoas, em galeras. Pelas noltes
escuras Os seus olhos, a flor dágua, parecem dois faróis bolando . A
boidna é um verdadeiro filão literário . Não há recanto da Planicle em
que se não ouça a história da boluna , RM . O Sr. Valentim Valente ,
autor do que se lê aqui, diz : no fabulario de todos os povos da terra
ha sempre uma lenda inspirada pelo conceito cristão do pecado ori
ginal o da redenção pelo amor . No fabulário brasileiro , esta lenda de
sentido mistico é a Cobra Grande ou Cobra Norato . Uma India tapuia
moradora da margem do Cachoeri , pariu um filho com aspecto de
cobra, que vivia durante o dia em águas de rlos, onde cresceu até so
tornar uma serpente monstruosa . Quando a noite subia, espalhando-se
ao longo do Tocantins, Honorato assim se chamava o filho invulgar
da tapuia despia a aparência de ofidia, largava a enorme carcaça
na beira de algum parana e usufria a vida dos homens , fazendo amigos
e privando com moças . Logo, porém , que alvejava a aurora, “ Norato "
voltava a ser cobra e mergulhava no paraná . Guapo e bom , o moço
esquisito fez amigos, e todos sabiam que o feitiço sob o qual vivia seria
desfelto de alguém , vencendo o medo e a repugnància , deltasse umas
gotas de leite de mulher na boca do monstro e lhe Berisse a cabeça
com faca de ferro ainda virgem de talhos . Dizem uns que um valente
assim fez e libertou Honorato do encantamento . Dizem outros que não,
que a Cobra Grande continua encrespando os rios da bacia do Tocan
tins . O leite necessário ao desencantamento lembra, por analogia , o
Sangue vertido no Calvário . Por sua vez, o ferro virgem evoca a lança
de Parsifal ea espada de Siegfried , celebradas nas sagas dos Nibelugen ,
Mesmo os povos desconhecedores da promessa e da vinda do Messias
sentiram e sentem que a Humanidade é escrava de um sortilégio e
esperam que um ato de amor e coragem algum dia a Mbertar . Va
lentim Valente. ( Propaganda da Comp . Rhodia Brasileira ) . Serela d '
água doce. GC. “ domiciliando tambem a “ cobra grande " aos roncos
apavoradores ... "
" COCANHA " 202 ( Franc. ) Abundancia. " um paiz de “ co
99
cagno " ...
COCORUTO 160 Sallência da terra em forma de montículos.
cocoruto de barro ... "
COIVARAS 77 Montículo de galhos ou gravetos, que não
foram queimados inteiramente, na roça a que se deitou fogo, e que
se juntam para serem reduzidos a cinza . " ... daria tempo a quelmar
as colvaras ... "
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 157

COLCHIDA 101 Antigo país da Asia , a leste do Ponto Euxino


e ao sul do Cáucaso, banhado pelo Faso , onde os argonautas, segundo
a tradição , foram conquistar o Tosão de Ouro . DL. O poento seria
a Colchida ..."
COLENDISSIMO 131 Respeitabilissimo. “ as pernas gafas
e tropegas do estafermo collendissimo... '
COLGADURA 175 Estoto vistoso ou rico, que se pendura
das paredes ou janelas . “ perdia-se na colgadura inconsutil... "
COLIMAR 35 Visar a ; observar por meio de instrumentos .
" ... no feixe já plantado e as collimar ... !
“COLONLA" 76 Modalidade de capim para alimentação do
10
gado . “ ... De campo plantado de “ mium " e de “colonia "
COMAS 35 Copa ( dals árvores ) C. Aulete . “ ... ao coar do
Sol nas comas ...
COMITENTES 267 Individuo que dá comissão ou encargo ;
constituinte . as obrigações profissionaes com os seus comiten
tes ... "
“ CONFIRMAÇÃO " - 118 Sacramento de confirmação do ba
tismo cristão . “ que beijos peccaminosos de mulher sacramenta
ram na “ confirmação " do Homem ... "
CONFLITIVO 186 Que origina conflitos . “ ... Surdo o con
90
flictivo despeito historico ... "
CONFRANGIDOR 196 Erro de impressão, por contrangedor :
que confrange . Confranger : afligir, angustiar . “ o choro confran
gidor da creança douda me flagellava ...
CONIBOS 186 Tribu do Ucaiali e Pampa del Sacramento ;
foi catequizada, entre 1683 1727. O padre Riter, uma das maiores
notabilidades da época das missões dos jesuítas, foi assassinado pelos
Conibos em 1695. Está quase toda convertida ao cristianismo graças
aos esforços dos padres Girbal e Plaza . E ' pacífica e tratável . Pinta
o rosto de listras vermelhas e azuis e usa argolas de ouro ncs lábios
e nariz. Os índios são muito aptos para a pesca e para tripulantes de
embarcações; empregam -se, também , para colheita de salsaparrilha
para o comércio . Esta tribo conserva ainda o costume de achatar a
cabeça dos filhos entre duas tábuas, colocando uma na testa e outra
no ocípute . Como os ticunas pratica a circuncisão nos dois sexos .
JWM . Diz H. Santa Rosa, que ocupam o Peru oriental; na margem
do Javari, e médio e balxo Ucalali; são ramos dos Panos . “ . Trans
portava - se no comboio de ubás, repletas de seus indios sepibos o
Conibos ... "
CONJETURAS 167 Encontro de circunstancias; aconteci .
mentos . creando situações peculiares a taes conjectures ...
CONSTRANGENTE 164 A pertando . " ... Avança constran
gente... "
CONSTRITIVAS 165 Que tende a constranger. Quo produz
constrição , apertar , impedir os movimentos de : travando com
todas as fibras constrictivas o desgraçado organismo.... "
CONTENSÃO 232 Grande esforço para adquirir um conhe
cimento ou remover uma dificuldade . “ .. A contensão que o caboclo
guardava ... "
CONVICIOS 230 Palavras Injuriosas; doestos , " ... entre
convites e convicios . . , ” .
158 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

" CORDA " 253 ( homens de ) Dá-se esse nome aos indiví
duos que se empregam para o serviço de sirga nas embarcações .
CORIACEAS 165 Duro como couro . A copa de peque
nas folhas coriaceas... "
CORICAS 248 Papagaio de mangue de encontros verdes,
aldra- curaua, jurucuruca, curica-curáu, quer dizer : maldizente . GS .
“ ... do bando espavorido de coricas ou papagaios ... "
CORNOCLARIM 273 Clarim feito de chifre . “ ... Notas de
cornoclarim rompiam em accentos argentinos ... "
CORNUTOS 132 Que tem cornos ; cornítero, cornudo .
* .. : gritos de alencos cornutos ... "
“ CORREGENDO " 163 Por corrigindo. Linguagem de ca
boclo. " ... tinha estado " corregendo " seu terreno ... "
“ CORTA - AGUAS ” 96 Ave aquática do norte do Brasil .
como voo das leves “ corta - aguas " ... "
COROAS DE AREIA 195 Aglomeração de areias acima do
nível das águas : Praia isolada, redonda de areias alvas, sem vegeta
ção . E a primeira na forma de terra a surgir do seto das aguas .
RM . " patentear de novo as corðas de areia , .. "
CORUTOS 271 Penacho do milho e de outras plantas . "
entre os corutos dos milhos ... "
COSMORAMA 248 série de quadros que represente, vistas
de diferentes países, para serem observados por instrumentos oti
cos ampliativos. Esse relancear pelo cosmorama da viagem ... "
COTIARAS 70 Diz R.Morais, no Homem do Pacoval quando
fala da caça na Amazônia : não vale falar da cotiara, muito menor
que ( cotia ) dona de uma pequena cauda que finda na reunião de alguns
cabelos, Carne muito tenra e apreciada. surgiam as cabecinhas
arruivadas de duas cotiáras ... "
COUCEIRAS 154 Coico da porta ; barra de ferro, de ma
deira sobre que gira a porta . Aulete ( Coiceira ) “ ... As serras hão
de partir em couceiras ...
CRAIONADO 107 Gall . do autor, no entido de enegrecido.
Craião : substância terrosa ou metalica para traçar linhas, desenhar.
Desenho feito com esse lapis. de um só aspecto vago e crayo
nado ... "
CRASTINO 253 Relativo ou pertencente ao dia
19 seguinte, ao
dia de amanhã . " ao ameaço do alvor crastino ...
CRATO 143 Cidade do Estado do Ceará, a margem direita
do Rio Grangeiro, notável por suas riquezas naturais e fertilidade
de suas terras. É a segunda cidade do Estado . Houve outra com o
mesmo nome, na foz do Jamari, sucessivamente, transferida de local.
VC. AB . “ ... gente do Crato e caratheus ... "
CRISPANTE 103 Que crispa ; contraído, franzido - crispar:
oncrespar ; franzir, Encrespante. “ ... desdobrada é valdosa ao beijo
crispante do nordeste ..."
CROCITOS 37 A voz do corvo, do abutre e de outras aves.
bulha de azas e crocitos... "
CROTOES 88 Codlaeam Variegatum e Croton Obamaedry
folins, Linney e Criseb . Euphorbiaceas. Originaria da India. Arvore
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 159

pequena e arbusto , Cultivado . Folhas de colorido de efeito muito


decorativo . O segundo habita em lugares abandonados. PLC . “ ...
plantados entre crotons e pimenteiras... "
CUIEIRA 105 Árvore da família das bignoniaceas Orecen
tia Cujete , L. tambem chamada árvore de cuia , cuie, cuitezeira , ca
baceira PLC . " uma cuieira viçosa ... "
CUMIADA 259 Linha formada pela série de cumes de
montanhas; cumieira . " não seria na cumiada que desanimasie ...
CUNHAES 82 Mulher ; menina de raça aborigene u ... três
cunhães solteiras ... 29
CUPUSEIRO ?? Erro de impressão , por cupuassuseiro
Theobroma Grandiflorum , Spreng ; Schum . Sterculiáceas, Árvore pe
quena . Habita Matta de terra firme . Frutos eliticos grandes ( 24/12
centimetros ) , pesando de 1 a 5 quilos. Casca dura , de cor castanho
escuro, lenhosa. A polpa que envolve as sementes é abundante e
exala . quando madura , um aroma agradavel; serve para preparar
deliciosos refrescos , sorvetes compota . Com as sementes pode -se
fazer chocolate. PLC . Um cupuseiro inexplicavelmente, não
sustentava os frutos... "
CURIMATÁS 179 Pronúncia amazônica e nortista, em ge
ral , por corumbata do Brasil meridional . Os dois nomes designam
o mesmo peixe . È evidente que a denominação encerra o radical
curimã, deste modo a etimologia de corimbata está ligada ao nome
da tainha, peixe marinho semelhante até certo ponto . RVI .
repleto de maparás curimatans e judiás ... "
CURRAL 87 E ' um cercado dágua onde os caboclos reunem
tracajás, tartarugas etc. , para abastecimento de suas necessidades, na
Amazônia . Espécie de viveiro . “ ... enquanto o curral fornecesse a
tartaruga ... " 90 Pateo onde se recolhe o gado. " a terra desa
bada fizera desaparecer toda a frente, com a mongubeira , a barraca , o
curral, as larangeiras... "
CURUMINS - 78 Rapazinho de 6 a 10 annos de raça abo
rigene . " ... os curumins aos quaes mimava sorrindo ... "
CURVIVENERVAS 117 Erro de impressão por curvi .
norvas Bot . Folhas que tem nervuras curvas . são as nervuras
secundarias curvivenervas ... "
“ CUSHMAS " 186 Espécie de manto de algodão , que os indios
Campas colhem, cardam , fiam , tecem e pintam de que se revestem
e decem - lhes dos hombros até os pés, com o feitio de longas togas
grosseiras. E. da Cunha . semi -nus, empanados em " cush
mas " ... "
CUTILAO 275 Cutelo grande ... empurrada ao cutijão
do carniceiro ... "
CUXIOS 270 Macaco amazônico Pithecia Satanas retor
cado de corpo, prêto, com topete em forma de boné bipartido e
mede 60 centimetros de altura. Tambem cabe o mesmo nome & espé
cie semelhante Pithecia Chiropotes, que difere por ter cauda mais
curta. Vivem em bandos, mas só aparecem de manhã e de tarde ;
durante o dia estão quietos, escondidos na mata . RVI . " ... outro,
experto, de cuxiús aos guinchos...
160 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

" DADO O PREGO " - 208 - Cansar ; “ morrer ". " cinco
haviam " dado o prego " com as febres ... "
" DANADA " 204 Leonardo Mota , da como : adjet!vo que
dá sempre a idea de avantajada. Parece ser aqui, porém , querida
tinha saudades, porém, da " damnada " da cabocla ... "
" DANADO " ( OH ! ) 262 Grande “ Bichão ! ” . “ Oh ! dam
nado ! "
" DAR UM LANCE AOS PEIXES " 247 Pescar com tar
rafa ou anzol . “ a ceifar capim para o gado ou a “ dar um lance
aos peixes " .
DE BUBOIA 30 Flutuar a mercê das aguas ; ser levado a
mercê. QC . “ ... como o tronco que de bubuia ... "
DECOTANDO 140 Cortar por cima ou em volta .
bater dos ferros decotando as ramas, os caules e as folhas...
DEDALO 124 Labirinto ; rodeio confuso ( dos caminhos )
" A montaria singrava por um dédalo ... "
DEFENSE AUX NOMADES DE STATIONNER 187 Proi
bido aos vagabundos de parar. se lê å borda de aldeias de
França ... "
“ DEFUMADOR " 276 Pequena choupana de palha, junto
da habitação, onde o seringueiro defuma a borracha, isto é , onde
coagula o leite da hévea por meio da fumaça dos caroços de uricuri
ou do cavaco de madeira de lei. E al que ele transforma a selva bran
ca , da árvore amazônica , em ouro negro. O líquido vegetal, para
la conduzido numa bacia, é derramado sobre uma pa de madeira que
mantida acima da boca dum grande boião de ferro ou de barro , da
altura de um metro , que jorra fumaça, vai formando, camada a ca
mada, a pele de goma elástica (bola ) , Minúscula barraca de palha
RM . " ... a solidão de um “ defumador ” ... "
DEISCENCIA 75 Ato de se abrirem as válvulas de um or
gão vegetal. “ ... se desprendem na dehiscencia bocados aligeros ... "
DELEVEIS 278 Que se pode apagar. “ ... Em volutas de
leveis ... "
DELINDO -SE 279 Extinguindo - se , " phrases que se estran
gularam delindo -se em murmurios ... "
DELIQUESCENCIA -171 Fenômeno que se observa em certos
corpos minerais e sólidos, os quais absorvem a umidade do ar e nele
se dissolvem . “ ... apodrecidos numa deliquescencia ignobil... "
DELUSÃO 238 Engano. “ ... O que ha é uma delusão ... "
“ DE MEIA " 78 Metade por metade “ creando o gado
" de meia ", plantando o milho ... "
DENEGRIDA 283 Infamar. " Por ti sou denegrida ... "
DENSIDÃO 58 Espessura . ( Talvez no sentido de : cer
cada, fechada ) “ se abriam na densidão da mataria ... "
DE PARELHA 57 Ao mesmo tempo . mas de parolha
diziam .. , "
ELUCIDÁRIO DỞ " INFERNO VERDE ” 161

DESAFRONTA 36 Alivia ; surge. “ ... deste modo o lago


desaffronta ...'
. ** ! DESALAGIN - LAS 02 257 Livravia agua (aquilo que estava
alagado por ela ) LE para desagal-as depois , attestando - as .
de novo ..."
DESALTERAR 96 Descansar ; acalmar, abrandar , 66
por epochi certa do anno desalterar os remeiros . * 915 ) it, ' iji
DESAREEI 145 Recuperar a orientação perdida . Expres
são cinegética . Com muito custo me desareei ... "

68 DESCOROCOAVA 161 Perder a coragem , 0 animo


Mas o Gabriel não descorocoava ...
DESEMARANHAMENTO 227 Desembaraçar; desenredar.
* ... As mãos ficam lanhadas pelo desemaranhamento ... "
} , " DESEMBUTEM 971. Tirar do enibutido. desemhutem -se
da dcarlinga ! ? ” 1)
b) (11.1, ha un
DESEMBUTIDOS 110 Saltados . 66 Meus olhos ,deviam
estar horriveis desembutidos das orbitas ! "
• 11. DESEMPLASTRANDO -SE 1170. Desgrudando-se Desemplas
tar ou desempastar: Soltar, separar ( o que estava em pasta ) . ... des
semplastrando -se tudo do revestimento de musculoso.. "
DESENVENCILHAR - SE 2-1 2041 iliDesembaraçar- se: livrar - se ."
“ ::: Conseguira desenvençilhar-se , mas sanhando... TMCIA shiny
DESSANGRANDO 211920) Escorrendo sangue !!!!! 'na lentura
de um oleo denso , desangrando por 'fino sangradouro ".
“ DE TERCEIRA " 232 São os passageiros de terceira clas
se nos navios le " gaiolas"! * ... que lhe offerecera outro ' passageiro
“ de terceira " ..."
DESVALIADAS 239 I Tirar a valia passou o cearense
as pyrites desvaliadas ..."
DESVOS Esconderijo; , recanto . um grupo deixa
os desvãos lacustres .
DEVASSAR A FERRO 257 Abrir caminho a facão, - "
era preciso repetidamente devassar a ferro o atulhado igarapé .
66
DILAÇÃO 281 Demora ; tardança . n . , na dilação impie .
dosa da justiça ...
1
DILOCULO 246 Crepusculo da manhã ; aurora . ) umat
madrugada , em diluculo de néyoas....
DIMANA - 152 = Correr serenamente ; fluir, aos ataques
da innundação vindoura dimana acastelado ... " ,
DISPARTEM 216 – Irradiar. Separar - se, dividir- se ( dar partir
em diversos sentidos ) . Por vezes dispartem d'ella outros poly
gonos ...
DISTRIÇÃO 164 Embaraço ; aflição . romper o laço da
districção ... " ... !!
DORNA 184 Vasilha formada de arruelas, grande, de bôca
mais larga que o fundo. sem tampa ,' onde se pisa a uva ' e conserva
o môsto para fermentar, corria para uma dorna ... "
KEVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

" DO ( 14 : 1 " :1
Pittt ceud dimint.00panhado
" de Capangas . ,
DOCÚCUS 252 Cita Barb . Rodrigues em Poranduba pg . 288 ,
como animais que emprestam sono os “ Xurucututús " (mochio ) e
* Dúcúcús " (cuja significação não escurece ) ! VI. “ .. barwios ,
ducucús e acuríos .
DUENDES Divindade mitológica ou espírito Suurena
tural que se supunha fazer travessuras de noite, dentro das Casas
candel: bros para uma festa de duendes ...

ECTIMA 190 Flegmasia dos folículos sebáceos caracterizada


por pústulas largas, arredondadas, ordinariamente discretas, de base
dura e inflamada . “ lembrando a pústula de ectyma ..
EDÊNICO 280 Paradisíaco . seu repouso edenico ... "
EDUCANDOS 54 Um arrabalde de Manaus . “ de São Ray
mundo ao Educandos... "
ELA-SE 80 Segurar -se a vide ou as plantas pelos seus élos.
A vegetação , ramosa e miuda , ela- se ou enrodilha ...
ELDORADO 89 Lugar banhado por um rio ou “ mar bran
co " cujas ondas rolavam areias de ouro e pedras de diamantes . Seu
corpo era marchetado de chispas de ouro . GS . Lugar de delicias .
mas a face do rio era o fundo chimerico do Eldorado ..."
ELISEO 193 - Lugar de bem -aventurança ; delícias . 66 ba
nhando elyseo o barracão ...
EMALHAVAM 160 Prêso nas malhas; enredar .
emmalhavam na posição ... "
EMBALSEIRARIAM 79 -- Erro de impresão por emtalcurariam ,
Esconder por entre balsas ; embrenhar . a- gitiranas e o mlao
de São Caetano embalseirariam a roça ...
EMBASTADA 29Acolchoar . " . , numa lama embastada... ?
EMBASTECIAM 64 Tornar espesso ; grosso . OS sonlius
enbasteciam a troca de confissões ...
EMBAÚBAS 27 Imbaúba . Nome comuni a várias árvores da
família Artocarpáceas, gênero Cecrópa, Pamatis , iiuinti bosset . ita !
Os índios utilizavam a madeira para fazer fogo por fricção com outra
madeira mais dura . Todas as embaúbas possuem qualidades semelhan
tes . PLC . Folhas recortadas em trevos enormes, ora em estrelas, cor
de gêsso por baixo e verde por cima, galhos em ângulo agudo, brincos,
como o tronco . RM . ... As embaúbas mais mimosas ...
EMBIARA 179 Qualquer présa ; aquilo que se colheu na
caça , na pesca ou na guerril . chegava o patrão de volta com a
embiára ...
* EMBONECAR " 79 Criar boneca ou espiga antes que
o milho comecasse a " embonecar"
ENBONECADAS ১৫ Enfeitadas; adornadas; Sohraga
tani as dama: embonecadils e sem fadiga ... "
CLICIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 103

EMBORCAVA 232 - Beber com avidez e em largos tragos todo


o conteúdo de , “ Vicente emborcava um bom trago de canna ...
EM MIRA 83 Em rumo a ; no objetivo de . “ ... teria de
partir ao escurecer em mira a um " pagode " ... "
EMPALAMADA 146 Pálida, como as pessoas opiladas,
ficou empalamada e branca ... "
panos .
66 .. EMPANADOS 186 Coberto de panos ; envolto em
empanados em “ cushmas"22
EMPANTANADO 90 37 Convertido em pântano . E no
covão empantanado ... '
EMPARDECIA 82 --Tornava pardo . 01.10 das queima
das rodeantes em pardecia os ares ...
EMPEDERNIDOS 274 Insensíveis . “ A floresta e o rio
beberam empedernidos o melodiar pungente das cornetas...
EM SETEMBRO ABALARAI ELES DA “ TERRA FIRME "
41 De fato , diz o Cônego F.B. Souza , é quasi sempre nessa época ,
quando já tem baixado os lagos teixando a descoberto as praias, que
pricipia a emigração, para eles, para a salga do pirarucú . Dura mais
ou menos 3 meses . Pará e Amazonas pg 84 II parte ) .
ENCAPELADURA 235 Ato de encapelar ; agitar -se formando
serras ( falando do nar ou das ondas ) . “ .. Na encapelladurit das
ondas... "
ENCARANGAR 70 Tolher . entrevar . “ fazendo encaran
gar e tiritar os membros..."
ENCARNECIDO 161 Teimoso . “ proseguir encarnecido até
o fim ... "
ENCAUCHADO 229 Tornar sêco e impermeável ( um saco,
pano etc. ) por meio do caucho . “ o homem não se separava de um
sacco encauchado..."
ENCHARCADIÇO 123 Que 1:: 2 uhar'c0 ; textelu . len
çoi encharcadiço ... "
ENCIA CAN Encher ( de luz ) ; ill . id luz, no
enir tanto no consegue encharcar a floresta .
ENCOIFADO 77 Pôr coifa em . “ ... um tapetebaseiro en
coifado da sua fronde reversa ...'71
ENCOIVARAR 61 O mesmo que que coivarar: reunir em
pilhas ou coivaras. “ Até na " carpa " ou no encoivarar, a rapariga
prestava auxilio ...
ENCONCHADAS 85 Abrigadas, ... outros cascos das mon
tarias enconchadas... "
ENCORTINAMENTO 80 Ato ou efeito de encortinar, Cheio
de cortinas. “ ... No seu basto encortinamento ...
ENDIREITOU 83/84 Caminhar ou navegar direito a. Ru
mou . “ ... endireitou para o largo ... "
ENFADADOS 264 Situação indefinível de aborreciinento e
mal estar, intermédia entre a saúde perfeita e a doença caracterizada ;
agastamento . “ num arrepio de todos os membros enfadados, or
denou ...
164 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ENFOGADAS 264 Tornar ardente ; afoguear , calça


vam - ihe luvas enfogadas de chispas ... "
LE ENGOLFAVAM - 136 Mergulhavam . " .. onde se engoita vam
dous pedaços de " queixada " ,
ENGRAZADO 260 O mesmo que engranar : ligar com slos
de uma cadeia ; enganchar . e o sol ardente e o engrasado das
arvores ... "
ENGRIFAM 28 Dar forma de garras a;. dispôr as grifas
para a luta ; no caso presente , parece poder traduzir - se por: emaranham
is . Os cipos que se engrifam pelas pernadas.....
EN LAS MONTAÑAS 187 - Diz A. Bittencourt: Galgaram
as encostas até o “ divortium aquarum " que inclina os seus três decli
ves : para o Pacífico , para o Titicaca e para a região da " montaña "
paradoxalmente, as regiões de descida para o Atlântico , as quais se
caracterizam pelas florestas em oposição a pobreza do solo do pianalto
andino . " ... A campanha " en el monte ", " en la montaña", fazia jas
a uma epopeia ... "
ENREDOUÇANTES 235 - Enredoiçar: embalançar na'redoiça
ou balanço . Que balança . estorvos de vagas enredouçantes...
ENREDOUÇAR 235 Embalar na redoiça . Redoiça : corda
suspensa pelas extremidades, ou assento suspenso , por cordas em que
a gente se balouça . " ... estorvos de vagas enredouçantes...
ENTABLAMENTOS 54 Cimalha ; o conjunto de arquitrave,
friso e cornija . “ ... entablamentos, platibandas e cumieira . , ,
ENTANICAR 79 Enrolar ( folhas de tabaco ) molho
para entanicar o tabaco . 29
ENTORTILHADO 181 Recurvado . “ ... 0 tronco entortis
Ihado ... "
ENVIREIRAS 126 1. Ou acoita - cavalo .. Loehea ( Tiliáceas )!
Arvore grande . Habita na terra firme alta de diversas localidades do
Pará . As flores são grandes, brancas, dispostas em paniculas 99 termi
nais . PLC . “ ... caraquentos e deformados de envireiras ..
ENXAMBRAR 56 Enxugar ligeiramente ; enxugar o bastante
66
( a roupa ) para passar , corar, enxaguar e enxambrar a roupa ... "
ENXAMEAR 157 Aparecer em grande número; formigar
64
( diz - se de um grupo de pessoas ) . 99 Por entre as luzinhas mágicas
• floraes enxameavam as moças...
" EPAVE " 154 ( Gal . ) Fragmentos do naufragio ; , restos,
. :: de longe divulgado o " épave” fluctuante ...
ESBORCINADOS 267 Quebrados os bordos ou -beiras de .
ao dobrar uma volta esborcinada do igarapé .. , "
ESBORCINAR 32 Desbordar, cortar pelas bordas. nem
o esbocinar vacillatorio dos incendios. ,
ESBORDADO 246 O mesmo que desbordar. “ ..9 1.9. Só mais
vasio e esbordado ...
EPICARPO 126 Película externa dos frutos . 66 tal o epi
carpo do genipapo ... " 1 ! : ? ega , si
"ERA ESPINHO MUITO ” 233 Em ' demasia : excessivo
" Era espinho muito ” circunstanciava o Vicente ...
ELUCIDÁRIO DO " INFERNO VERDE " 165

- $ 1721 “ ERA O GEITO » 2041 Único rémédio , récurso : " ... Fora
lhe bem duro apartar - se ; mas "era o geito " .. aj info !
ab “ERGASTULO 7_1 282 Cárcere; enxovia (ver pobre Jesuita
Foáð Daniely . Nha escuridão de um ergastulo . !!19.7 .)
: 9
'; 71 : 11 1 111,
ERVECENTEV_11275 Vicejar ; orivecer; vioejante. * ) ... erve
cente de membécą e “ malicia ” . ATO
ESBOFADOS 252 Esbaforidos ; ahelantes. ***!? De multos
apeitos humanos esbofados ..
ESCABUJANTES 229 Estrebuchantés, "agitados convulsiva "
mente , ... Cunha, tem uma poesia descrevendo esse espetáculo, muito
perfeita : " O encontro das águas " }(dos rios Amazonas, Negro ), em
seu livro “ Pelo Solimões ” . a lucta de dous monstros escabujan
tes12 .." . , #5145: 1 ! 216 0 ( 110 ) bir
ESCAMPADOS 136 Que serenou ( tempo ) . escampar : dei
xaro de chover : estiar , slim par- se de nuvens ; clarear - ge oicéu . Diz - se
do tempo sereno depois de um aguaceiro , " id . tudo , porém socegou
escampado;. *, 13-12-11 DIU ") 13. "nin
ESCANTILHÃO 235 ; De roldão . * 791110 ar de escantilhão ,
rasgava - se com a torva claridade ...
ESCANZELADA 78 Muito magra . amarella'e escan
zelada ... 1. )
ESCARAFUNCHAR 67 Esquadrinhar! !!. haviam cansado
de escarafunchar .
ESCARÇADA 131+;
1girar das 99colmeias ( a ' cêra ) ; esgarçar .
uma colmois de jatys, escarçada .; I
ESCARCHA 67 Fio de ouro ou 'prata tecido em sêda .. “
soda do céo bordava - se da escarcha auri-rosada .
ESCARCEO, em 178 Saltando, c.'Aulete. * !! Uma grande
9
vaga de luz, em escarcéo .
ESCARDEADO 2156 Limpo de cardos ( a terra ) " . о сатро
escardeado aguardava os romeiros ... "
ook! ESCARVALHO 194 - Falha ou cavidade na parte interior de
canhão . Ferida . verteu o liquido ardente no escarvalho da chaga
pavorosa : 1 .
DE ESCARVOADAS 175 Esboçadas; desenhadas a carvão . “
entre fragas escarvoadas ... "
. lun.ESCLEROSANDO -LHE 195 Tornar escleroso : qualquer en
durecimento morbido dos tecidos . * ' que ' o accidentavam , esclero
sando - lhe o fundo ... " ,
ESCOLA ( DE ) 273 Contemporâneo ' do periodo escolar .
Um collega de Escola " , alferes -aluno... "
ESCONSO - 128 Escondido ; escuso . ... do vir buscal- a no
resguardo esconso ...
ESCORSO - 249 -- Resumo . “ ... O igarapé era um escorço do
rio ... "
1. ESCORRALHO 4 267 Resto ; resíduo de líquidos nas bordas
ou fundo de vasilhas. “ ... junto ao escorralho putrido do pantano ...
‫܃܃ ܃ ܃‬ 1. VISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ESCORTAÇAR 263 Fazer em pedaços ; retalhavam . Em


quanto o caboclo e o Simeão escortaçavam o porco ...
ESCORTINAR 263 Guarnecer de cortinas ( falando - se de
fortalezas ) . Cortinas : parte reentrante de um parapeito que liga duas
obras salientes consecutivas tais como redentes, lunetas e baluartes,
etc. “ ... escortinada em fila dupla de monstros, que vomitavam fogo ...
ESCOTA 102 - Cabo para governar a vela do barco . “ .. Ma
noel com a escota frouxa ... "
“ESCRAVOS VERMELHOS " 195 Índios peruanos . Os
escravos vermelhos ” seguiam com o olhar... "
ESCURENTANDO- SE 278 Escurecendo . a pom pa fla
vescente do dia deseorava , escurentando - se ..."
ESFANICADA 199 Delgada como fanico ; magra . “ .. chu
pada, esłanicada de sezões e mau passadio ... "
ESFARPADO 181 Rasgado em farpões ou farpas. como
esſarjado por cilicios invisos... "
ESFERVILHADO 260 Revolver - se com rapidez e agitação .
um obstaculo rumoroso e esfervilhado... "
ESILORAMENTO 104 Tirar a fior a . o esfloramento
das canaranas ... "
ESFOLEGANDO 268 Tomar fulego ; respirando . .. esfole
gando amortecido no enlevo do sonho ... "
ESFUMINHAVA 82 - ( Itan ) . Dar cor indecisa a ; pintava com
esfuminho . “ ... Um artista divino esfuminhava ... "
ESMARRIDAS 81 Que não tem vigor ; estéril ; que perdeu
a stiva . “ ... estavam esmarridas, a morrer ... "
ESMERILHADOR - 226 - Diz - se do indivíduo que indaga e pes .
quisa miudamente . " .... esmerilhador de minucias ethnographicas ... '
ESMOLAMBANDO 139 Arrastar molambos ; esfarrapando
se . esmolambando -se ao pisar dos homens da turma ...
ESPASMADO 271 Causar espasmos a ; contração violenta e
convulsiva dos músculos e em especial dos que não obedecem à von
tide e que presidem a vida organea , como os do estômago , os dos in:
testinos etc. " Um , espasmado, enganchava-se numa cruz ..."
ESPAPAÇADO 40 Mole, reduzido a papas . espa paçado
de lana... "
ESPARRALHADA 53 Espalhar ao acaso ; derramar .
esparralhada á sombra de uma carnaubeira ... "
ESPARZIMENTO 176 Ou espargimento ; derramamento .
· em esparzimento de piscas brilhantes... "
ESPATAS - 270 – Grande bráctea membranosa ou foliácea que
envolve certas inflorescências, especialmente as em espadice . “9 ... com
Seus capiteis farfalhantes de espáthas e palmas bronzeas ...
ESPAVENTADA 256 Ostentosa . " o peitoral da floresta
espaventada ... "
ESPEDREGADO 189 Limpar de pedras. no leito vasio
e espedregado ... "
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE ”

ESPESSIDÃO 36 Espessura . não tem hiatos na sua


espessidão ... "
ESPÍAS 229 Cabo ou corda que serve para sustentar, ou re
puxar qualquer objeto . " ... atado ao flanco da lancha por espia :
grossas... "
ESPICHA 97 Vara de madeira muito comprida que se atra
Vissa em diagonal nas velas dos barcos pequenos ou botes para as se
gurar . " ... Fixo o panno na diagonal da espicha ... "
ESPICULOS 120 Ponta; aguilhão . 66 OS milhares de es-
picuios e púas ...
ESPIGUILHA 193 Espécie de renda estreita e denteada .
“ ... Frisos em espiguilha d'ouro ... "
ESPINGARDA “ PICA -PAU " 70 Espingarda antiga de car
regar pela bôca, o mesmo que lazarina . “ .. que de espingarda “ pica
pau “ ao hombro ... "
ESPIPOCAVAM 176 - O mesmo que pipocar ; saltar em pipo
cas . Por toda parte espipocavam tiros...
ESPIRÁCULO 3699 Respiradouro . o espiráculo por onde
Outil a luz interessa ...
ESPIRRANDO Proferindo .
9965 espirrando baixas e ex
panuvas expressões .
ESPLENDECENCIA 180 Qualidade do que é esplendente ;
66 na esplendecencia da manhã
luzir com extraordinário brilho .
tranquilla ... "
ESIOADOS 176 l'eneirar segunda vez ( ä idrinha ) para se
fabricar o pão mais fino . espoados por invisivel peneira ... "
ESPONTANDO --- 208 Cortando ou tirando as pontas . es
99
pontando as canaranas da beira ..."
ESPUMÍFERO - 193 Que traz espuma . “ ... desenrolava -se
espumifero no collo da noite ... "
ESQUADRINHANDO -- 170 Examinando atenta ( mudamente .
... esquadrinhando tambem o rio ...
ESQUALIDEZ 69 Sujidade ; sordidez . .... Era sombra do
lorosa na sua esqualidez e marasmo... "
ESQUIROLA 165 Lâmina ou fragmento de objeto duro, las
ca de 09 0 . vivem gerações num só corpo , numa só parte , numa
Sú esquirola ...
ESTADEA 188 Mostra ; assinala . nos mappas da Bo
Livia do Perú se estadea essa terra ... "
" ESTADO " 274 Serviço de 24 oras que o oficial das cor
porações armadas dá nos quartéis . Commandar a guarda, dar o
" estado " ... "
ESTÂNCIA 202 Têrmo riograndense do sul , que apelida
estabelecimento rural onde se cultiva a terra, principalmente, se atende
à criação do gado vacum e cavalar . BJS. “ ... não era a estancia de
gado ... "
ESTAPAFÜRDIO 255 Extravagante . nas imagens do
romance estapafurdio ..."
168 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

619 ESTELANTE 110 O mesmos que- estrelado.omafraon luz


da noite estellante ... "
47 ESTEMAVA 280V20 Engrinaldava ; shfeitava " ... matando o
Aventureiro , o estémmavärde rosas.08 . .6191do asspfiu9 16
ESTENTORICO 253 Que tem voz forte . “O ) magote salti
grado stertorico :910 ) ott 11121)fikkt OD 11. V
*** LAT die E650psa 600id zor ! 7:11 160021h 111 *
ESTERROIDAS gg Ação de exterroar ; desfazemni (os.torrões )
na beira esterroadą do rio ... "
. tit.1.6 i fino'I - 01
ESTESIA 249 Sensação . na sua esthesia de calor de
luze de yegetação , 131
ESTIGMATIZAVAM 186 Acusar de agão infame. * ... To :
dos os, estygmatizavam enlaçando -os num apodo : - ?.0:11 Beat
-BVESTILĦAMARAM - SE 23 £ ikbal Partironin 'iestilhaços ; .. do
um armario e vidros estilhacaram -se... '
OG ESTIROÉS 14:2474.1 Trecho reto de um rio entré duas curvas .
Em geral, na época do verão té sempre mais raso que a volta, devido
nas curvas,
a lençol ondese o canal, , conca a ao
dagua outra margem
a água que - se :sucede
, aprofunda RM .

na mesma faina de vencer praias, estirões... "


“ ESTIVA " 213 - Paus ou varas atravessados por sobre um
riacho ou pequeno rio, formando uma ponte tosca e pouca segura não
rarası mhzes . TBS.V. Chermontdiz : " madeiray ramps, plantas arbus
tivas, colocadas através de um atoleiro ou x4terêterê ” .para ser possível
transpô - lo . BJS. “ ... Transpoz a " estiva ” e afundou na matta . 17. )
JESTOLHOS 77 Lançamento ou rebento produzido pelos cau
les . rasteiros que se fixa na terra de distância em distância , e langa
raízes, como se vê no morangueiro . veria os estolhos dos mi
Thos ::: ” , bord
' ‫و روزه و‬ ‫ زرا‬.b33

ESTORCIDO 235 Destorcido ; direito . o doudo espume


java 'estorcido'..." .
‫ پژو‬5 (
sob ( ( ( ،،،
ESTORTEGADURA 272 () memo que estorcegar; torcer com
fôrça :: esperneando, no agitar de estortegadura macabra'. :
" ESTRADA ” -- ,, 206 Tem na Amazônia uma significação pe
culiar . Ali , ao que se chama estrada não é mais que um pique", isto
é , um caminha estreito ainda mais do que umå vereda , em cujo trilho
ficam mais ou meno,9 , de 140 a , 170 seringueiras chamadas " madei
rais Há duas espécies de estradas; a “ estrada a rumo” e a, " estrada
enrolada " . A primeira segue uma direção sempre para a frente ; e a
segunda é a que perfaz o número determinado de “madeiras” num
eerto espaço , aqui e ali, 'sem obedecer a uma ordem regular . A aber
tura de uma “ estrada ” é feita pelo " mateiro " , acompanhado do “ to
queiro " . BSJ . ( Ver mateiro e toqueiro ) . A estrada de dois
" frascos " e meio não era grande cousa á ; "
ESTREPADO 29 Defendido por espinhos . nem chão
resvaladio e estrepado em grimpas ou depressões ... '
ESTRUGINDO 235 Atroando ; vibrando fortemente , “ Tro
vões desabafados rolavam , estrugindo uns sobre os outros .. !!!
ESTUPEFICANTE 275 Que estupefica ; causar grande as .
sombro ; pasmo . Aquella ruina estupeficante . de miséria o aban
dono ... "
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 169

ESTIRRINDO . 143 Foncando , rugindo , RABL ., vol. 146


bras. dis ; nome dado ao cacarejar do jacami.. “ jamys longin
CS " esturando !'.
ESTURRICA 152 Torrar muito ; crestar O verão ' curto
cresta e esturrica ...
EXINANIDO 277 Desfalecido; esgotado . “ exinanido na py :
rexia tremenda , ..
EXORCIZAR 136 O mesmo que exorcismar ; usar de exor
cismo para expulsar os espíritos, os demônios do corpo de . quo
se tornára bemaventurada ao exorcisąr da aurora ... ?
EXSICADO 152 Secado bem . Num mez de sol tudo fica
exsicado ... "
EXTÁTICO 163 Imóvel ; parado . 66 Começou a demorar
se horas esquecidas, extatico no terreiro ...'
1

( : V70X! Oliy 1795 ; .


F
*. '13

FÁBRICO " .211 Registado por Teschauer como têrmo ama


zônico designativo de período seco, durante o qual se corta e faz a
borracha. No “ elucidário ” anexo a “ Amazônia que eu vi” de Gastão
Cruls, encontramos o mesmo vocábulo com o sentido de safra , colheita :
tempo de apanha ou extração dos produtos vegetais . Iniciara -go
o ramerrão do “ fabrico "
FAÇANHARA 63 Praticar façanhas; proezas . onde fa .
çanhára ás ordens de Placido de Castro ...
FACUNDO 208 Eloquente .. " .... no relatar fæcundo do Mar
ciano ... >
FADEJAS 282. Cumprir o fado ou o destino . Fadejas
desenraizado, descontente ... "
FALCAS 103 Pedaço da borda das faldas que se tira na oca
sião de receber a carga . lequilibrando - se pelas falcas , ,
" FAMILIAO " 160 Familia numerosa : " .. onde se metteria
com todo aquelle seu “ familião ” ,
FARINHA D'ÁGUA 205 Farinha grossa de qualidade inte
rior .. Escasseavam a “ farinha d'água ” , o piraruců .., "
FAROI , DE CÁS". -- 205 - Lampada a sis actiilono,
um". pharol de gaz" se prendia ao pendural..
FAROL VERDE E VERMELHO -- 84 ' -- São luzes regulamenta
res, designativas dos bordos dos narios : o verde e o da direita ; eo
verinelho 6o da esquerda . " com o pharol verde e vermelho regu
mintarės ..:
FARRUSCO 234 Negro; que tem a côr escura . perdidos
no ceu farrusco ... ".
FASCICULADOS 95 Diz - se das folhas ou raízes reunidas em
feixes ou que têm a forma de feixes . “ os pennachos fasciculadog
dos urucuris ... "
FAVELLA ( Pedro di Custa , Cituitio ) 131 Fui ativo
dirigente se obra di musitze dus indienas, autorizado por Cal
?! ? !! ? ! 1! ( TIV ) TI!!.

deira Castelo Branco e outros Governadores . No Tapajós, a adesi ) se


manifestou expontânca da parte dos próprios indios ( Tupinamisils )
aceitando, em 1664, o auxílio de Pedro Favella, de ordem de lui
Vaz de Siqueira , para repelirem os assaltos das terríveis horas dos
Caboquenas e Guidavenas, seus inimigos . HSR . A 'expedição coman
dada por Favella conipunba -se de 31 canĝas coni 500 indios, soi, o
as ordons de seus superiores e de i companhias de iropas regulares,
sob o comando de 4 capitios de infanteria e outros oficiais suhalter
nos . Depois de ferirem o combate e corrotarini og Inimigos , haviai
morrido 700 selvagens cairam prisioneiros 400 e as chamas de 300
aldeias alumiaram sinistramente essa cena de luto e sangue . Foi em
represalia ao massacre da escolta do Sargento -mór António Arnaud
Villela e de seus companheiros da qual apenas ca salimli o missionário
da orden das Merces, frei Rainiunde e seu companheiro). FIS .
Tomou parin ni expedicão de Pedro Teixeira a Quito , ficando . porém ,
em Quijos l'rovincia dos Eucabelarios ), em Junho de 1638. AB .
“ ... desde que o portuguez Favella o fez a pavorar-se na chacina ...
FAVEIRAS 95 VATAIREA GUIANENSIS . Aubl . Planta da
família das leguminosas . Várias espécies . Árvore dos igapos . “ . as
faveiras de floração arroxeadas ... !
FAUNOS 253 Divindades campestres, que derivam o seu
nome de Fauno , e que, como os Silvanos, habitavam os bosques . DC .
“ ... trilhos de frautas rusticas de faunos..."
“ FEITORIAS" Barraca de palha 64provisorlament? arinada
pelos que vão à salga . RABL . vol . bras . abalaram elles da
“ terra” firme para as " feitorias ” no lago ..."
FERAL 104 Fúnebre ; triste . “ ... No seu brilho fleral..."
“ FERIDA BRAVA " 190 Úlcera fagedenica ; tumor maligno
Chamam assim , também , ao câncer no Amazonas . uma das pernas
semi - devorada pela "ferida brava " ... "
FERRETE 280 Labeu ; epíteto . com ellas ganhava o
distico e o ferrete... "
FETICHICA 280 Relativo ao fetichisano: adoração mórbida
a uma coisa ; partidarismo faccioso. na herança fetichica e ve
nerativa ...
" FINA " 225 E ' assim chamada a coagulação do latex da
hóvea brasiliensis . E ' um tipo de borracha de qualidade superior. GC .
Chama - se de " fina " a borracha que é defumada até o fim sem que o
leite seja saturado . que o da seringa " fina " ...
FINFINS 270 O mesmo que “ fem - fem " ou saci ou matinta
pereira . Todas essas denominações são variantes onomatopáicas do as
sovio ou grito da ave da família CUCULÍDEOS . ( TAPERA NAEVJA ) .
Sua cor é pardo -amarelada, com numerosas manchas escuras nas co
berteiras das asas ; a barriga é branca ; o topete é mais avermelhado
bruno, com manchas claras e escuras . Para evitar os trabalhos que
dão o chocar os ovos e a criação dos filhotes o Saci divide sua postura
pelos ninhos dos diversos passarinhos, principalmente, dos canários, e do
“ João Tenenem ". RVI . " papa -arroz ” , “ viuvinhas ” e “ fin - fins " ... "
FISGAS 185 Fenda ; greta . “ ... A luz do sol setteava-o
pelas fisgas nas paredes e coberta ...
FLAGICIO 218 Tortura . " Tinha esse espetaculo de fla
gicio inedito a grandesa emocional ..
FLAVESCENTE 278 Que amarelece ; cor de ouro .
pempa flavescente do dia descorava ... "
LLUCIDÁLTO DO “ DELINO Vinni "* 171

FLITSNOEM deti cflibu.irinci priil der , nails


dos séculos XVII e XVIII . Aventureiro . “ .. Na flibustagem adianta
ram -se ao seringueiro ... "
FLOREJAR 227 Omar con iloits" ; 1.etar . (CONSO
lando - se no florejar sumptuoso desse segredo ..."
FLORES 57 Arrabalde de Manaus . para os lados de
Flôres ... "
“ FLUTUANTE " 230 Cais de Manaus, assim chamado por
ser construído, articulado, sobre cilindros flutuantes de metal, assoa
Thado como o convés duma nave, de bordas ferradas nos cabrestantes
que tesam e solecam o filame da amarração, de acórdo com a vazante
e a enchente periódicas . Também chamado “ Roadway " . Participa da
variação de nível do rio . Ora desce, ora sobe para a cidade , conforme
a vazante ou cheia do rio . A diferença de nivel chega a ser de 10
metros . “ . encostados ao “ flutuante " da Manaus Harbour... "
FLUTUOSO 89 Que faz ondas ; agitado . o rio alta va
inquieto , flutuoso ...
FOGÃO DE PROA 103 E ' uma espécie de banco largo, tri
ürígular ou trapezóide, na próa da montaria . E ' aí que sobre um
vaso de barro cheio de terra, acendem fogo para assar o seu peixe ou ·
ferver o café . JV. " o piloto , equilibrando - se pelas falcas, saltou
para o fogão de próa ... "
FOJO 109 Caverna . “ ... no seu fojo eu repousava ...
140 Esconderijo ; ... no intento suspeito de mudar de fojo ... "
" FOLGANÇAS” 157 -- Brincadeira ruido! a . “ ... Não estava
para " folganças " ..
" TORNO DE JACARÉ " 122 Nome que entre os naturais do
Amazonas dão à Vitória Régia . Diz JV . ser um dos petiscos preferidos
dos tracajás e tartarugas o bulbo da célebre Vitória Régia, o grande
uapé do indígena. “ Forno de jacaré ” consoante o local, que dá
forma de bacia chata , de bordos verticais, dos seus fórnos de torrar
farinha, lhe vem . annunciára o largo folhame fluctuante com
este nome vulgar “ forno de jacaré ” ...
FORTALEZA 53 Cidade do Estado do Ceará . Capital, com
175.000 habitantes, assentada sobre uma planície arenosa, banhada
pelo Rio Pageú, à beira do Atlântico e a 13 quilómetros do Rio Ceará,
na récua de embarcados em Fortaleza, tal um gado de refugo ... "
" FOULARD " 193 (Gal . ) Tecido de sêda leve para vestidos,
gravatas etc. “ ... o foulard das nebulosas ..."
F'RAGOADO 206 Cheio de pedras. por sõbre o igarapé
fragoado ... "
" FRASCOS " 206 Ou boião , cheio de leite ( de seringueira ) .
.. a estrada de “ dous frascos " e meio ... "
FRECHANDO 100 Atravesar com velocidade ; ir ou vir em
direitura . “ ... Frechando nessa direcção ..."
"FREGUESES DO TOCO " 209 São os empregados do se
ringal que vêm ao barracão do patrão se abastecer . og aviamen
tos parciaes eram transportados pelos " fregueses do toco " ...
FRENESIADA 280 O mesmo que enfrenesiar : impacientar ,
causar fronesi. “ ... á frenesiada dos musculos atrictos... "
172 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

" FRESCO " 263 Alimento não em conserva ; enlatado. “ ..cer


ta ' agitação animava a turma deante d'o' * fresco "
“ FRIAGEM ” 70 Queda brusca da temperatura no ocidente
da Amazônia . Inversão periódica dos ventos, que em vez de correrem
de baixo para cima, correm de cima para baixo Afiam -se na neve
dos Andes e descem galopando furiosos , matando peixes, pássaros,
o as
manifestações da vazante nos altos rios . E ' o céu que se turva''no
poente em srossas nuvens negras. Daí a neve cai em eo yento
em
ghase sempre , a, 3 de maio dia de Santa de que lhe tomou
: ‫ܕܐ‬
Geos , Estat . na minha de Junho á “ friagem
5 FRONDESCÊNCIA I - 155 60 desenvolver das i frondes ; folhea .
túrå ! sob a frondesceneia opulentisssimaottab ISVID P59 ,?
FUGENTE + - 246 Que parece fugir à vista . a mesma, mo
notonia no fugente verde negro ...
FI'LICINOSO 81 Denegrido com fuligem ; cheio de fuligem ;
Sotomibro é o mez fuliginoso e crepitante das queimadas ..
FÙMÍVORO 263 Que aspira fumo; aparelho, que absorve
o fumo dos bicos de gás. amplo fumívoro, océo aparava das
laharedas, us !!
FUNCHAL 191 Pôrto e Capital da ilha portuguêså da
Madeira .., para arrais de barco no Funchal .
FUNGOS * 27 - Cogumelo , grande divisão dos Criptogamos .
fungos, e lichens parasitarios .. "
“ FUROS" 118 Braço de rio que liga dois canais ; às vezes
um outroda
montaante
pelo lago ; muitas cursoum emfuro
foz, aovezes que desagúa
a outro . RM
furo; ou um afluento ,
A.
Bittencourt assim : furos são as passagens mais reduzidas entre pas
ranás, lagos e 'rios, às vezes, por baixo da floresta alagada . São ver
dadeiros atalhos que evitam , às canoas, as grandes curvas de um caudal
maior . * Emitte então os filetes dos " furos " .
" FUSAIN " 76 (Gal. ) Lapis de carvão de evônimos : ( planta
conhecida por zaragatoa ) . “ enorme rocado se delineava a traços
rades de grosseiro }" fusain " i 1

cities

)
G

“ GADINHO " . 75 Gado de uma fazendola . Poucas reşes . ,


Creava um gadinho " em cinco quadras .
GAFAS 131 Que tem gafeira ; lepra. *; as pernas gafas
e tropegas do estafermo ... 90
“ GAIOLAS " 55 beban Designa , os pequenos vapores que navegam
nos rios pondo em comunicação os povoados, as cidades, as vilas, e os
" barracões." . sitos á margem dos mesmos. BJS . O gaiola , diz Rai
mundo de Morais, que estudou a sua influência na vida amazonense
é o bonde, carro, a locomotiva da imensidade do vale . De elevada
superstrutura , desenvolvidas obras mortas, dois três conveses,
marotes nas amuradas, adveio - lhe o apelido irônico e pitoresco de
" güivla " , " que desembarca dos " gaiolas" ou paquetes ..."
ELUCIDÁRIO DO " INFERNO, VERDE " 173

201.4 " GALEOTAS # 96 * 4 Pequena embarcação movida a ve291


vela . " nas suas Tigarités e galeotas ....,"
14 ", GALRÃO H251, Que fala muito .. ... o perdia -se garão em
commentario tosco ...
70 GANGLIFORME 7,29 Que tem aspecto ou figura de San
ghios ••• quando a rede gangliforme, dos , lagos.
GARANÇA -- 273 . Francés garance . Planta tintorial chamada
branza , çôr vermelha. O vermelho garancé doş uniformes ... *
GARÇAS 33 Denominação genérica , que compreende viirias
aves da familia ARDEÍDEOS. Familia ' que abrange também os Socis ;
destes ultimos diferem por levaren vida diurna e por terem pescoço
fino. Alimentam - se de batráquios e peixes. Nem todas as garcas são
brancas; há gargas azues ou mcrenas, outras são brancas com cabeça
preta . Alvíssima, sem uma única penil de outra côr é a Garça branca
nenor LEUCOPHOYX CANDIDISSIMA ; tão perseguida pelos ho
mens por ser ae principal fornecedora de “ aigrettes " RVI., para
bebedouro e refugio de garças ...
3
GARCA MORENA ” - 2484-48 ou graça 'azul. FLORIDA CAE
RULEA . E ave de vasta destribuição por toda a América . Med..50
eentimetros de comprimentro : A plumagem é azul #emy algun pune
tos com tom mais vivo , em outros mais cinzentos na cabeça e ? opese
coço entremeiam - se plumas roxas ou castanhas. Tamheo O bico) é
azul, mas as pernas são pretas. A avé nova é inteirazione brinca e
$ 6 aos poucos vem aparecendo' nianchas azués. RVI. Uma gids
*morena" buscava tardia ... "
GARGANTUA 167 Principal personagem e título de um
livro famoso de Rabelais. É um gigante de enorme apetite , Cujo
appetite de Gargantua..
GAZEIO 37 Voz especial de algumas aves como a garça .
mesmo com o gazeio coesvoacar das aveș,
GÁZEOS 61 Verde esbranquiçado; azul claro . Os hos
gazeos e o riso eram de sua defuncta mulher ...
GEENA 281 Lugar de suplicio, de tormento < taino . *****
fogo ; tortura. " ... si é a gehenna de torturas...
GEMAS 103 Jóias ( no sentido figurado de pedras p ? ej:)
sas ) . “ ... engrinaldadas das gemmas das estrellas ... "
GENIPAPO 126 GENITA AMERICANA , L. ( Rubiáteas. )
Árvore média . ' Indígena, cultivada , nos terrenos argilosos da várzea ,
Boa madeira, branca , fácil a trabalhar . A casca e os frutos verdes
contém uma 'materia corante azul- escuro ou violetil com que os indios
pintam a pele e tingem os tecidos . A casca é adstringente, encontrando
se nela tanino . Fruto redondo, um pouco alongado, côr pardo- ama
relado , poeirento : polpa esponjosa, acre doce , suculenta, comestível ,
em compotas, sorvetes; com ele se prepara vinho , licor e refrescos.
PLC . Teodoro Sampaio . depois de decompôr a palavra diz significar :
* fruto das extremidades, " que dá suco . Visto serém os frutos quantos
forem os galhos, atendendo que são dos extremos dos mesmos, GS .
tal o 'epicarpo de genipapo maduro ... "
tid . " GENTLEMAN " 186 Angl .. Cavalheiro : homem distinto .
71
O “ gentlemam ” transportava - se no comboio de ubás ...
GEOTROPISMO 129 Qualidade que tem as plantas de diri
girem sempre as radiculas para a terra e o cauliculo para o céu .
no seu geotropismo. com ; as raizes, as , radiculas a buscar azoto
humidade... ?
174 VISTA DO JRQUIVO MUNICIPAL

GIBÃO 63 Casaco de couro ( vestimenta dos caboclos, peões


do nordeste ) Despindo i givão e as perneiras...
GIGAJOGA 1: 9 Coisa que oferece pouca estabilidade, moral
ou material. tid sigijogi do cambio .
GILLI TI E o personagem principal da obra de Vitor
Hugo " Travailleurs de la iner " A segunda parte do livro tem
por lituio : “ Cililait le nalin " e ſala todo tempo nêle. No primeiro
volume da ¢ d de 1866 , Pg . 101 , lê - se : dieshuit bras de la pieuvre ,
trois adhéraient à Gilliatt ... avait sur lui deux cent cinquante
surcoirs. Vitor Hugo escreve Gilliatt com dois t Criação do
autor, naturalmente . O polvo de Giliat dispunha de pit bra
cos e quatrocentas Ventosas ...
GLINIDA Desvio que o navio faz de sua rota ; mudan
va de direção do vento ein que estiva soprando . uma guinda
Vinto ...
GIRAT 101 Leito de varis , sôbre forquilhas cravadas no
chão , serve para guardar as panelas, os pratos, os legumees etc.
RAPL ., vol . 6 , brits . Umberto Peregrino, dá como : armação de ma
deira sõbre a qual ficam as casas por causa da umidade e da água ;
estrado rustico para guardar mantimentos, cama de varas . “ ... Re
clinei-me de COSUS sobre o Sirau ..
CITIRANAS ARGIEIA ALGOANA . Planta convol
vulácea . Tem o caule e fôlhas muito peludas . As ilôres são como
campainhas brancas e sem cheiro . O fruto é uma capsula cônica, com
quatro caroços redondos. ( Joaquim Pinto ) . “ ... e o feijão floreasse ,
as gitiranas ...
GLADRAS Diz - se dos órgãos que não tem pêlos, nem
glandulas. follas coriaceas e glabras ... '
GLOSSÍPIO 248 Livro ou vocabulário , em que se explicam
64 escreriam nas margens um glossario abun
palavras Cliscuras.
date ...
GOLCONDA utige reino do lindosio , hubad Hyrer
sabad. No, tabiial, arruinada por Aurangzei) en 167, os sultões
haviam acumulacio um número incrivel da pedras preciosas, Pilz - se
illusio, il late-laluit, 109 te scris de Golconda . D ..
das . riquis de Goiconda ...
GRANDE ( LILI ) Há pelo menos duus : ilha grande
de Serpa e ilha grande do Jocambo , ambas formadas pelo Amazonas.
Há, ainda outra formada pelo Rio Jauperi. VC . forçara -nos
para o canal da ilha Grande ...
GRASNIDO 138 mesmo que grasno ou grasnada, de
asnar : crocitar ; Soltar it de plumas coloridas ou brancas
O grasnidlo das avis ...
GRADNA 239 0 ! Tatúna ( Arumará , em Pernambuco e
Aligoas e outros nomes andet . De preferência cabe a graúna o nome
de CASSIDES ORIZILOR . ( uji niere 18 centimetros , com
primento iotal; o colorido pelo tem brilho violáceo e no macho as
penas alongadas ao redor do DASCOCO formām una espécie de CO
leira , Graúna é sinônimo de " Vira -bosta " ( MOLOTIRUS ) segundo
1. Tauras, em Mato Grosso . Ili " ... 1.7.- 31 silencio , cortado pelo
canto da grûna ...
GUALMUSS - Crusturomrinho Dacapode, Branquiuro
da família Cecarcinídeos Crema quanhumi. De corpo abrutalhado,
atingindo de 9 a 11 centímetros só a carapaça; o braço maior alcança
ULUG'IDÁRIO DO ** : UNTO VERDE " 175

30 centímetros. No macho sempre uma das pinças é maior que


outra ; a fêmea é conhecida por “ pata -choca " . Vivem de preferência
nas praias do interior das balas e enseadas. RVI . “ na marcha de
jabotis, ou de guayamuns num mangue ...
GUAJARÁ 125 Ou sórva do Peru . Chrysophyllum Excelsum .
Hubert . (Sapoiáceas ) . Irvrire grande , ilgumas vozes cultivada . Os
frutos cozidles são saborosos: Crus são muito pegajosos por causa do
látex . PLC . “ ... Em longitude, um guajará soberbu ... "
GOLDROPUS 21 ( rines con que se auxilia o governo do
leme “ ... a corrente do ltne ranginio 109 guuldrope's ... "

CUAPIPS O mesmo que bugio u laratio on C


rajá compl'ende ( spécies brasileiras do género LOLAITI. (An
tigamente conhecida por MIORTES . São animais corpulentos, mas
ainda assim lesios é ágcis quando querem ; il cabeça é maciça, 0
queixo barbida . En algun19 périna 0 rete á fêmea,
amarelo escuro ; pn ' Outros Os machos o ruivos e as fêmeas quase
prêtas . O macho mais velho é chamado “ capellão ". É o guia do
bando . Sevem ülizar- je ine !lor talinz, que os dentis quaj!'umanos
do sua quinta mão , pois confiam mais na força que têm na ponta
do rabo , do que na segurança Gas mãos. De manhà e à tardinha ,
quando o tempo ( stá para mudar, rõem -se a uivar icu a " roncar " ,
como diz o bilo ) todos juntos, not po de una grande i !! urn ; e ars
sa ocasiões se ouve & mais de meia legua de distancia . RVI. G.
Soares, traduz guariba indivíduo feio . Ha ditado : “ Guariba
roncou 12 Scir ? chuva 1: tama " . Liitu !! Beli dos guaritas
docrio o biri de um in 2:16 .

Н.

HARPIA 130 Monstro fabuloso com rosto de mulher , corpo


de abutre e asas ; mulher ávida e má . Mas essa harpia hydropica
e sostreira ... '
HEINE 38 (Henri) Poeta alemão nascido em Dusseldorf.
Autor de poesias líricas, de uma melancoliit irônica e dolorosa . DL .
end licine pôz ümit conditiil ... '
HELICOIDE 263 Que tem forma de hélice , Superfície ge
rada por uma reta horizontal que constantemente se apoia sobre uma
hélice e sobre o eixo vertical do cilindro reto onde está traçada esta
curva . por uma helicoide ... "
HEMATITES 181 Peróxido de ferro, de cor vermelha ou
parda. “ ... semelhavam duas hematites negras..."
HEMATOSE 54 Conversão do sangue venoso em arterial .
Anemia do sangue . Sanguinificação . Transformação das vilas em
cidades . * Á hematose do progresso , operara- se o prodigio da trans
formação ...
HÉRCULES 190 Semideus da Mitologia latina Filho de
Júpiter e Alcmene . Juno irritada contra ele enviou duas serpentes para
o devorarem em seu berço ; o menino já robusto as sufocou entre seus
braços . DL. “ ... no arcabouço d'Hercules... "
HETEROCLITO 96 Excêntrico ; estranho . “ ... no seu com
mercio heteroclito ... "
176 REVISTA DO ARQUIVO MUSICIPAL

HEVEAS 60 Hévea brasiliensis , Muelle Arg . Duforbiaceas,


ou seringueira roxa ou rosada : Habita no estuário do Amazonas è rios
Araguari e Amapá , baixo Jári, Tocantins e rios vizinhos até ao pé dai
primeiras cachoeiras . Falta na margem esquerda do Amazonas, do rio
Paru para cima . Encontra - se nas terras inundadas e nas terras altas
com solo de árgila , O latex dá por coagulação a “ borracha fina do
Para " , de primeira qualidade . Madeira branca, leve, para caixas. PLC .
ao pé das héveas... "
HIPNOSE 219 Estado particular caracterizado pelo sono
nervoso e pela sugestão . “ marmorisada numa hypnose ... "
HIPNOTIZADA - 192 Entorpecida ; adormecida pelos processos
psíquicos do hipnotismo . hypnotisada ao lunar de aljöfar ... "
HIPOCONDRIACA 248 Melancólico ; triste . “ ... a crise hy.
pocondriaca do Souto ..."
HOLOCAUSTO - 218 Sacrifício ; imolação . com a appa
rência de holocausto cruento ... "
HOMILIA 210 Prática , sobre coisas de religião, catequese .
resumia brutalmente, na homilia ... " . }

IARAS 130 Deusa autóctone. Emprestam - lhe atributos de


formosura tais, que seduzem os homens. Tem castelos no fundo dos
rios, dos iagos, e baías, recobertas de algas e ninféias. A sereia dos
nossos rios. A iara filha certamente da exaltação marítima do ibero
lido de Homero , modelada nas sereias irresistíveis de Ulisses, funda
dormitológico de Lisboa , é o espantalho do homem destas plagas .
Metade mulher, metade peixe, lindos cabelos compridos, hustos cheios,
cauda de escamas multicores, as formosas ninfas vivem nas margens
dos igarapés , nas bordas dos lagos, nos taludes dos rios : seduzindo)
08 tapuios, encantando -os e carregando - os para o fundo . RM . Valentima
Valente, narrando a lenda da Yara diz : que nasceu numa noite tro
pical do Amazonas, saturada de mistério e perfume. Que um indio
tapuio vogava nas águas mansas de um igarapé, quando ouviu uma
voz de mulher. Invadindo - o , a voz silenciou depois, reavivando os
bisbilhos da selva e o rumor grave da cachoeira do Turumã . Enleado
e alerta , o brasilindio encostou a igara e, afastando a cortina de ve
getação, descobriu uma mulher desnuda , reclinada á beira do igarape .
num abandono de tentação. O moço tapuio sentiu a vertigem de quem
se inclina sobre um abismo . Caiu de joelhos. Debruçou - se e, esque
cido do mundo, quiz agarrar a imagem feiticeira. A principio caute
loso , depois mais afoito . Até que , por fim , mergulhou na agua e nunca
mais apareceu . 0 sentido fundamental da lenda , contudo, é simbo
lisar a perfidia feminina . Nem sempre há perfidia na mulher, mas o
amor dos sentidos deixa sempre no homem um ressaibo de decepção.
É talvez por isso que a alma poética do povo do Norte, como deg
sabafo a essa universal decepção , criou a lenda da lara. Iara nascidu
das aguas, sereia de um rio majestoso como mar , é sinonimo indi.
gina de Afrodite . Sedutora e enganosa , seu nome é Mulher. (Propa
ganda da Comp. Rhodia Brasileira ) .
Em sua representação grafica da lenda do tesouro da lata , sem
gundo o folclore amazonico, o pintor Teodoro Braga, figura o poran
quê como guarda e defensor desse tesouro . A ideia, baseada na len
da tradicional , é verdadeiramente feliz pois melhor do que ninguem
de toda a fauna do grande rio , esse Cerhéro dotado de forças mister
ELUCIDÁRIO DO " INFERNO VERDE " 177

riosas, montará guarda e defenderå as preciosidades ocultas no fundo


do rio -mar . RVI . Os seus olhos seriam duas lagoas, a noite,
retendo yáras ..."
" IA TODO AO FUNDO " 160 Que se alagava nas enchentes,
inaproveitáveis. * Terra devoluta , que havia por ali , “ ia toda ao
fundo " com qualquer enchente ... "
ICÁ ( RIO ) 238 Ou Putumaio . Nasce nos contrafortes an
dinos da Colômbia, numa extensão de 1.700 quilômetros. E' o grande
caminho aberto as relações comerciais do nosso país com a Colombia,
que pretendeu por toda a extensão da sua importante bacia prolongar
seus domínios políticos até a povoação brasileira de Tonaning . VC .
Deve seu nome a tribo indígena que tem seu nome, ou como dizem
outros, por causa de uns pequenos macacos de boca preta, que abun
dam em suas margens e que são conhecidos por esse nome . FBS .
que fez vir de torna viagem , das bandas do rio Içá ..."
ICTIOLOGIA 38 Parte da zoologia que trata dos peixes .
todo um catalogo de ichtyologia ... '
IGAPOS - 237 Floresta alagada . Charco onde vegeta a mata
aquática . Em geral não se vê um raio de sol no igapó . Tudo por
eima é galho e folhagem . A abóboda é verde . Os grandes troncos de
árvores mergulham , na linfa cristalina, porém, negra . RM . “ , ato
lado na vasa dos igapós ... "
IGARAPÉ 29 - Riacho, rio pequeno ; caminho de canôa. RABL.
vol. 5 , bras . Dá RM . como : caminho de canoa , segundo a tradução
precisa do tupí para o português . Riacho amazônico, ribeiro, curso
em miniatura que tem como os grandes, todas as características flu
viais. Principia sendo central, oriundo da hinterlândia , por mais in
signifcante que seja o seu curso ; tem cabeceira , declive, voltas, afluen
bes, “ gitos” e foz . Não entra e sai no mesmo rio como os paranás.
Quem viaja num igarapé, mesopotâmia a dentro, tem a noção fiel dos
grandes caudais da planície, à semelhança dêle com os maiores rios.
Assim como nos lagos, nennuma canoa pernoita na bôca destes onde
se encontra batendo, fungando, mergulhando , nadando jacarés, bộtos,
sucurijus, puraqués piraíbas, que ali devoram os peixes miudos . De
noite, a foz de um igarapé é um verdadeiro inferno, um lugar pavoroso
das nossas lendas, tais os ruidos dantescos que se ouvem . Do guarani:
igara : canoa ; pé : caminho, estrada. Igarapé : rio pequeno . QC. onde
foi leito de igarapé... "
IGARAPÉ -AÇU S2 igarapé do Rio Tapajóz . ' VC . “ ... Do
alto do terreiro divisava-se para cima a Ponta Grande, o Igarapé -assú,
o Iranduba ...
IGARITÉ 96 Canoa pequena entre os índios tupís. RABL .
vol. % , bras, Diz UP. ser de um só mastro, mas ainda tem tolda.
que nas suas igaratés e galeotas...
ILOTA 47 Escravo . Entre os espartanos, eram os prisionei
ros escravisados, reduzidos a servos do Estado . que o pobre
ilota vingue... "
IMBELES 119 Tímidos . Sem armas . escorpiões ou
roptis imbelles ... "
“ IMEDIATOS " . 247 O segundo comandante dos navios . "
.ontava casos ao “ immediato "
IMPAR 158 Dar mostras de soberba, petulância ou despréso ..
99
e com elle impár de riqueza e de prestigio ... "
178 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

INAJÁS 77 Matisia Ochrocalyx , Schum . Bombácea. O fruto


da inajarana lembra um pouco no aspecto, um pequeno côco de pal
meira . Flôres brancas e odoriferas de forma original, PLC .
uns caiaués, inajás e tucumãs... '
INAPETENCIAS 266 Falta de apetite; anorexia . em
delírios, inappetencias e calmas passageiras ... "
INCONSÚTIL 175 Que não tem costuras; inteiriço . “ per
dia -se na colgadura inconsútil ... "
INEQUILATERAL 117 Que não é equilateral. Que não tem
lados iguais . " ... limbo de uma folha inequilateral... "
" IN EXTREMIS " 192 Nos derradeiros momentos. “ ... con
cordando “ in extremis " ... "
INGÁ 78 Nome comum a várias espécies de vegetais da fa
mília das leguminosas . A casca do ingá é adstringente e serve para
cortume . A pôlpa que envolve as sementes é muita aromática , doce
e comestível . Diz GS . que ingá : o que é embebido ; alusão a polpa
da fruta . “ trazia - lhes vagens de ingá ... "
INGLES DE SOUSA 118 ( Herculano Marcos ) . Nasceu em
Óbidos, cidade do Estado do Pará, em dezembro de 1853. Formado em
Direito pela Faculdade de São Paulo em 1876. Distinguiu -se muito
como professor de direito e jurisconsulto de mérito . Manteve no ro
mance o regionalismo e produziu bôas obras como o “ Missionário ".
Cenas da Vida Amazônica ” ou “Contos Amazônicos " , onde o estilo é
sobrio e a língua bem cuidada . Suas descrições de coisas interiores e
dos caboclos que o habitavam , maximé, do sertão Amazônico , são de
absoluta fidelidade a ponto de sensibilizar a quem conhece essas plagas
silentes e majestosos povoando a alma de sonhos, saudades, encan
tamentos e vaga tristeza. JA . " " onde Inglez de Souza pôz a roupeta
de um agitado missionario ..."
INHAMBÚ 78 Ou Nambú . Da família Tinamideos, gênero
Cripturús As 14 espécies brasileiras dêste gênero representam um
tipo homogêneo quanto ao feitio, variando apenas de tamanho e um
tanto de colorido . Os ovos são lisos e lustrosos, de cores verde-azu
lada ou branco - chocolate . RVI , QC . diz ser uma das aves mais ariscas
da Amazônia ; em compensação, qualquer caçador ouvindo - o cantar,
imita - lhe o canto , levando logo a arma ao rosto . Ĉle, de amoroso que
é , vem lhe cair aos pés, julgando ser a companheira que o chama
e ( que índios somos nós ) quasi sempre encontra a morte . Chamam
no , também , de “ galo da tarde ", pois é o arauto da noite . O povo
achou tão singular a falta de penais caudais nestas aves, que apro
veitou o fato para um provérbio : " inhambu de tanto fazer favor, ficou
sem rabo " ; assim confirma o conceito do ditado mais em voga na ci
dade : " quem em presta não melhora " . RVI. “ . vagens de ingá e ovos
de in hambu... "
INSONTE 283 Que não tem culpa, inocente . “ a terra
insonte ficou silenciosa ...
" INTRIGADO " 89 Como que estranhando ; desconhecendo .
“ ... onde devia estar o seu porto, Cordulo extranhou “ intrigado " ... "
INTPUZKO 188 Posse tomada contra o direito ou co Tio
lência . “ ... formulando a intruzão do patrimônio do Brasil... '
INVIA 282 Intransitável . 66 ... e a terra invia , confortada
e desdenhosa ... "
INVISOS 181 Não vistos. Aborrecidos. “ ... por cilicios in
visos a tenra pasta das carnes ...
ELUCIDÁRIO DO “INFERNO VERDE " 179

IPADU 125 Erytroxylum Coca , Lamk . Eritroxiláceas ou coca )


Arbusto . As folhas são estimulantes do sistema nervoso ; o princípio
ativo é um alcalóide, a cocaína . Os índios do Peru e da Bolivia mascam
essas fôlhas que parecem aumentar as fôrças, atenuar a sensação de
fome, produzindo uma espécie de embriaguez agradável . PLC .
pés de ipadů, outros de mastruço ... "
IRANDUBA 82 Ha um lago e povoação com O mesmo no
‫ סות‬nas vizinhanças do Amazonas e Solimões. AB . “ ... O Igarapé
assú , o Iranduba o Tapihira ... "
IRIÁRTEAS 270 Espécie de areca da América tropical .
São duas palmeiras : Palmeira Paxiúba barriguda e Iriartea Ventri
cosa , ambas de Martius . Habita nos igapós marginais de riachos de
água limpa. Palmeira elegante , tronco de 10 a 15 metros com 30 cen
timetros de diâmetro, sustentado por um pedestal cônico de raízes
aéreas de 1.50 á 2 metros de comprimento, cobertas de pequenos
espinhos. Da madeira os índios fazem arcos e lanças. As raízes, aéreas,
rigidas e ásperas servem de ralador. Quanto a segunda, as flores
queimadas dão cinza que substitui o sal comum . Com a parte bojuda
fazem -se canôas . Com o peciolo os índios fazem flechas que enve
nenam com o curare . PLC . “ ... Pelas borbas as paxiúbas, as iriarteas
de Martius... "
ISBA 56 Habitação de madeira , ordinariamente de pinho,
peculiar a diversos povos da Europa e Ásia . Consiste em duas caba
nas contiguas , a um páteo . “ ...vigilam em torno da isba equatorial..."
ITACOATIARA 105 Cidade do Estado do Amazonas, situada
á margem esquerda do Amazonas, em terreno elevado e de ligeira
ondulação . A etimologia do nome da cidade é : pedra pintada.
Pelas redondezas de Itacoatiára e do Autaz... "
IURATÍ 251 Mãe da lua . “ ... Despedia -as a " mãe da lua 99"
a yuraty sarcastica ... "

JABOTIS 273 Reptil da ordem dos CHELONIOS , TESTUDO ,


TABULATA . A fenea chama - se jabota e difere do macho por
ser m or e mais avermelhada, seu escudo entral é convexo e não
concavo , como o do macho. O jaboti atinge excepcionalmente 70 cent.
Em média 30 a 40 cent. O lado dorsal é preto, com um centro amarelo.
A carne é excelente e principalmente o figado é muito gabado pelos
entendidos. No folclore indigena cabe papel proeminente ao jaboti ,
que pela sua astucia tira melhor partido nas apostas que faz. com
eis outros animaes. Dizem que para tudo encontra solução ; só receia
que um taperibazeiro lhe caia em cima do corpo. Que sejam outros
troncos, não faz mal, pois ele esperará que apodreça , pacientemente,
para depois continuar seu passeio interrompido; mas com o taperi
bazeiro a coisa muda de figura, porque esse tronco, quando cai, brota
nor todos os lados e assim o jaboti nunca mais se desvencilharia .
Resumo algumas lerdas, em que o jaboti sempre esperto figura e
sae como vencedor.
Tanto o jaboti como o teiú queriam casar com a filha da onça .
O jaboti, para fazer pouco do teiú , disse que este nada valia e que até
The servia como cavalo . Usando de muita manha conseguiu no outro
dia que o teiu o levasse montado nas costas e assim envergonhou o
lagarto diante da filha da onça.
Um dia o caipora disse ao jaboti : “ Vamos ver quem tem mais
fôrça ? ” e o jaboti aceitou . O caipora cortou um cipó , estendeu - o ao
180 REVISTA DO ARQUIVO JUNICIPAL

jaboti e disse : “ Experimentemos; tu na agua e eu em terra ". O ja


boti saltou nagua, amarrou o cipó na cauda do pirarucú e voltou ,
escondido, para terra. O caipora puxou o cipo, mas o pirarucu quo
tinha mais força, arrastou o caipora para agua . Quando o caipora já
estava cançado, disse: “Basta jaboti ” . Este foi desatar a corda da
cauda do pirarucu e voltou à terra . " Tu estás bem cançado, jaboti ?
Não ! Não suei nada " ! Disse então o caipora : " Agora sei que tu és mais
valente do que eu , jaboti.
Tendo o jacaré roubado a flauta do jaboti, este, passado al
guns dias, foi a um cortiço, enguliu muitas abelhas e foi para o
lugar onde o jacaré , costumava tomar sol. Escondeu - se nas folhas,
deixando de fora o rabo, todo besuntado de mel ; de vez em quando
soltava uma abelha que saia voando : zum ... O jacaré, vendo aquilo
e supondo que al havia mel, meteu o dedo, que o jaboti apertou com
toda a força, até o jacaré lhe restituir a flauta .
O veado desafiou o jaboti para uma corrida. O jaboti disse :
" Espera um pouco, vou vêr por onde hei de correr " . Foi para a outra
banda e postou todos os parentes, de distancia em distancia , à mar
gem do rio. Depois começaram a corrida e cada vez que o veado
perguntava pelo jaboti um parente respondia sempre : pela frente .
O veado correu , correu e sempre um jaboti respondia adiante. E o
veado morreu, cansado de tanto correr . RVI .
JACURARU 126 Erro de impressão , por Jacuarú. Fa
mília de grande lacertílios –Tejideos cujo maior representante é ,
no Sul , o Teiú – atinge quasi 2 metros, inclusive a cauda a qual cor
responde a 2/3 do comprimento total. A carne bem preparada, parece
com de galinha . Alimenta -se de larvas, vermes e de insetos , e
chupa ovos, também , sem quebrar a casca ? RM . um jacuraru
fugiu experto ...
JALNES 275 Amarelo côr de ouro. um capitariseiro
matisava -se apparatoso de flores jalnes ..."
JAMAXIS 209 Espécie de paneiro feito de timbó o em que
os seringueiros transportam suas mercadorias. “ transportados pelos
"freguezes do toco " em jamaxis ... "
JANAUAIRAS 44 Ou “ Cachorro do mato ". Janaiui. Segun
do Batista Moura , é também um ser fantástico, lendario, do Tocantins,
muito temido, pois anda pela floresta em matilhas como cães, em
briagando as vítimas com forte catinga,, para depois saciar a sua
voracidade . RVI . “ .. os bandos das janauahyras catingosas... '
JAPÁ 110 Quadrilongo tecido de folhas de palmeira para
servir de porta , teto de paperi um rumor no japá da porta ... "
JAPIINS 121 Cassicus cela . Pássaro preto e amarelo.
Fam . Icterídeos. Há também vermelhos. Gosta da vizinhança das
casas. Faz o ninho em bolsas de fibras pardas pendentes das franças
das árvores. Tem fama de arremedar tôdas as vozes, menos a do
tamburupará. Quase sempre encontram -se 10 a 12 reunidos na mes
ma árvore e parece que escolhem de preferencia a vizinhança das
casas de marinbondos para aproveitar o respeito que estes infun
dem aos importunos, Este fato é tão notório que foi explicado pelos
indios do Juruá, na seguinte lenda colhida por BR . ( Poranduba
pg. 202 ) “ Dizem que antigamente os pássaros eram inimigos dos
japiins e quando estes iam passear ou quando iam buscar alimento , os
outros vinham quebrar- lhes os Ovos e matar- lhes os filhos. Então ,
os japiins foram conversar com a vespa e pediram para ser madri
nha dos filhos. A vespa disse- lhe : voces façam as casas perto da mi
nna para que possa velar pelos meus afilhados. Depois disso, sempre
os japiins fazem os ninhos perto da casa da comadre, RM , É o grande
ELUCIDÁRIO DO “ INEERNO VERDE " 181

cantor alado da Amazônia . Vêr também Tangurupará, ou Tambu


rupará J. Coutinho de Oliveira, conta uma lenda muito bonita ,
( Lendas Amazonicas, pg. 123 ) que explica porque este passaro ar
remeda os outros : Quando Tupan estava triste, o japiin cantava para
alegra - lo e Tupan , certa vez, mandou á terra , para consolar os afli
tos com seu canto. Então, ele cantou e todas as aves emudeceram para
o escutar ; mas o japiin começou a encher-se de soberba e por escar
neo passou a arremedar os outros passaros, de modo que estes não
cantavam mais. Mas Tupan, que aborrece a soberba castigou o japiim,
não permitindo mais que ele voltasse á arvore que dá flores de es
trelas, o ceu , e fel - o esquecer as belas melodias que ele Tupan , The
havia ensinado. Por isso , cada vez que o japiim tenta recordar o seu
canto, arremeda a voz das outras aves , que o perseguem, então . RVI
Viriato Correa conta que no Maranhão, a navegação fluvial deter
mina frequentemente esta cena : veljando contra o vento, a embar
cação cruza o rio obliquamente e assim nas voltas das “ engaitavas", os
panos batem na vegetação das ribanceiras. Quando os tripulantes per
cebem os ninhos de japiins, sabem também que serão atacados pelas
cabas assanhadas, cujos ninhos sempre se encontram junto ao das
aves. O “ salve-se quem puder ” termina, as vezes, com um banho in
voluntario. “ Estridulavam os japiins...
JAPÓS 121 Erro de impressão por japus. Gymnostinops
Yuracarium . Lafr . e d’Orb . Nome vulgar dado ao japu . Habita alto
Amazonas e países vizinhos. Oliváceo amarelo-claro, dorso inferior,
uropigio, parte posterior do abdomen vermelho escuro; cauda amarela.
Comprimento da asa 26 centimetros; da cauda 18 centimetros. As
retrizes medias pardas esverdeadas; ponta do bico amarela . ( Goeldi
" ... Estridulavam os japyis e os japós na alta ramada ...
JARINA 178 Phytelephas Macrocarpa . R. 6 P. Palmeira
acaule, ou de caule curto ( os machos ) . Sinônimo de marfim vegetal.
Habita e cresce em grandes familias na sombra das árvores altas, nos
lugares frescos. Abundante em Esperança ( Bôca do Acre ) . A amên
doa é dura, branca , como marfim , e se trabalha bem no torno, serve
para fazer botões99 etc. PLC . " de chofre me appareceram uns tec
tos de jarina ..
“JASMIM GENERAL " 88 Gardônia Florida . Flor branca,
maior que um cravo, e menor em número de pétalas. Tem um vivo
perfume. Dizem ter sido o General Andréia que, de tanto trazê -la ao
peito na capital paraense, The deram o nome de generai. ... evola
va - se o perfume penetrante de resedá e de jasmim “ general" ... "
JATAPU ( Rio ) 226 Este rio demora na região do Rio
Branco, o baixo Jatapu oferece, nas suas margens a mesma uniformi
dade do Amazonas, seu aspecto e vegetação são quase a mesma . Pelas
enchentes a semelhança é mais completa . AB . “ cortando borracha
no Jatapu ...
JATICÁ -- 43 Arpão de haste comprida, o oposto do “ itapuá " ,
que tem haste curta e larga . Serve de arremesso aos grandes peixes.
na seca com o jaticá ... "
JATIS 131 Família Melioponídeos. Trigona Jaty . Abelha
social, pequena, cabeça e tórax prêtos, abdomen bruno, com o pri
meiro segmento amarelo , pernas bruno amareladas. Muito tímidas
e produzem pouco mel, muito apreciado , porém RVI ( Pronúncia nor
tista e abreviada por “ Jatais " . ) uma colmeia de jatys escar
çada ... "
JEQUITIRANABOIA 186 Ou jaquiranaboia . Fuigora Ideas
lanternaria . Esta última é a pronúncia original indigena ; " cobra do ar
ou " de asas ", como se diz no norte. São insetos Homopteros da fa
182 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

mília Fulgorídeos, com várias espécies pertencentes ao gênero Lan


ternaria, as quaes pouco diferem entre si. A cabeça enorme, entume
cida, tem um tubérculo perto da base e que finge um grande par de
olhos, quando éstes de fato se acham ao lado e junto dêles há um
fio sobre um pequeno tubérculo , o qual representa a antena . As asas
são amarelo sujo pontilhadas de pardo e preto, a asa posterior tem
um grande ocelo ( olho de coruja ) . Mede ao todo 6 a 7 centimetros
com o dobro de envergadura . Não é venenoso RVI . “ ... Jequitira
naboia sinisra ... "
JOÃO GOME 125 O mesmo que Maria -gomes. Talinum
patens, Jacq . ( Portulaceas ) legume ( folhas ) melhor que a beldroéga .
.. maltrada de joão -gome e carurú ... "
JOSÉ DAS CHAGAS ( FREI ) 93 Foram muitos e impor
tantes os serviços que prestou esse virtuoso carmelita à catequese dos
índios da Província do Amazonas, em 1798, Vila Bela da Impera
triz, talvez só a ele deva a sua existência e a sua prosperidade. Canu
man, mereceu -lhe particular solicitude; a aldeia de São José de Ma
tari foi , por assim dizer, criada por ele ; Borba, sentiu os efeitos do
sua mão beneficente ; em uma palavra, tôda a região da Munduru
cânia conserva ainda viva a lembrança do seu nome, das virtudes
e dos seus benefícios. Era o verdadeiro tipo do missionário católico ,
o amigo dedicado dos índios que também lhe votavam essa afeição
sincera , profunda e dedicada dos filhos das selvas. Foi Frei José,
o primeiro que devassando as matas do Rio Maué -açu , conseguiu cha
mar a si grande número de indios da tribu Mauês, com os quais
aumentou a população de Vila Bella . Tratava os seus catecumenos
com a maior doçura ; apóstolo da caridade, repartia com eles do que
possuia , consolava -os em suas contrariedades e trata va - os com desvelos
em suas enfermidades, fornecendo - lhes não số os medicamentos ne
ċessarios, como a dieta. E não era somente aos indios que estendia
sua generosidade. Possuindo alguma fortuna , dela dispunha em bene
fício público, principalmente na sustentação do culto . Em testemunho
dêsse asserto, ainda estão em Vila Bela os ricos paramentos que ser
vem nas grandes solenidades : o missal, o frontal e outros objetos que
por ele foram comprados e doados à Matriz. Também foi , por ele ,
doado ao seu convento em Belém , no tempo que ali serviu de prior ,
o órgão que ainda lá funciona. Depois de uma vida afanosa , tôda de
dicada ao próximo , faleceu na Vila de Borba, em adiantado estado
de anos e caducidade. Falava com muita graça e propriedade a lin
gua geral, no púlpito somente dela fazia uso , quando se dirigia aos
índios . Foi o verdadeiro Anchieta da Mundurucânia. Teve de susten
tar longa e porfiada luta com o fundador da antiga Vila Nova da
Rainha, José Cordovil , que por fim foi obrigado a ceder - lhe o campo ,
pela impossibilidade de o sustentar, vendo-se abandonado do público
cujas simpatias e boas graças não soubera captar. FBS. “ Entre
estes dous extremos maloca e nucleo colonial , do indio Manuel
João e Frei José das Chagas ao coronel Bezerra ... "
JOSÉ DOS ( SANTOS ) INOCENTES ( FREI) 225 Em junho
de 1832 , uma sublevação do povo e da tropa proclamou o Rio Negro
Província , desmembrando - a da do Pará. Em seguida lavraram uma
ata e deputaram ao governo imperial o carmelita Frei José dos Ino
centes, o qual dirigindo - se ao Rio de Janeiro pelo Madeira, foi im
pedido de prosseguir pelo presidente de Mato Grosso e obrigado a
regressar . Os papéis de que se fazia portador chegam as mãos do
ministro Aureliano de Souza Coutinho , que " estranha severamente "
conduta do apóstolo de Christo, dizendo - lhe “ não poder apoiar
um ato de rebelião , um atentado tal , desligando -se da Capitania e
constituindo uma província separada . Fizeram parte dessa conspira
cão o frei mercenário Inácio Guilherme da Costa ( do Maranhão ) e
outro carmelita Joaquim de Santa Izabel ( da Paraíba ) . Esta acabou
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 183

mal e acarretou a morte do coronel Joaquim Filipe dos Reis . Teve


lugar a poucas braças de Vila Bela, no ponto chamado “ Correnteza '
e que se celebrizou por isso . FBS . No entanto , quando o governo do
Amazonas teve conhecimento da invasão dos ingleses, mandando mis
sionar nossos indígenas, ordenou ao frei dos Inocentes que os expul
sasse , em 1839. Nessa data originou -se a questão da Guiana Inglesa .
que apenas ao próprio Frei José dos Inocentes, em apuros de
fuga, não parecera absurdo ..."
JUAZEIRO 145 Escrita correta , e não joazeiro L.F.
Ziziphus Joazeiro, Mart. Planta medicinal, bonita, árvore frutífera
e de espinhos, nos ramos. RABL, vol . 4. bras, .chocalhava os ga
lhos dos angicos e joazeiros ... "
JUNDIÁS 179 É difícil definir quais os peixes de couro da
família Pimelodídeos, compreendidos sob esta denominação. Tem al
gurna semelhança com os bagres. RVI. “ . repleto de marapás, curi
matans e jundias... "
JURUÁ ( Rio ) 202 É um dos mais caudalosos tributários
do Solimões . Nasce na serra das Marcês, numa altitude de 453 metros
acima do nível do mar, com o nome de Paxiúba . Tem um curso de
3.283 quilômetros . Sua extensão avantaja - se de 40 milhas a do Purús.
AB. “ E ' o mais sinuoso de todos os rios do vale do Amazonas " . Rev.
Bras . Geografia, ano IV, n .° 4 pag . 738. “ . no Purús no Juruá ... "
JURCÁMIRI 265 É um tributário do esquerda do médio
Jurua. AB . “ . até a margem do Juruamiry ... "
JURUBEBA 79 Solanum grandiflorum , Ruiz e Pav . Sola
náceas . O fruto esverdeado, as folhas ( suco ) e a raiz ( extrato ) são
amargos, tônicos, uteis contra o engorgitamento e as inflamações
do figado e baço . PLC . “ as jurubébas, taxiseiros, embaúbas... "
JURARÁS 215 Por Jussáras Palmeira assí do Pará . EU
TERPE OLERACEA . Martius . Sin : Palmito jussára ( Alto Amazonas ) .
Hab . nos terrenos pantanosos do estuário do Amazonas e nas margens
dos riachos de terra firme, no Baixo Amazonas . Característicos :
tronco em touceiras . Alim . Frutos da grossura de uma cereja, vio
laceos, quase negros . Com eles prepara-se uma bebida chamada
vinho de assai de grande consumo no Pará e que é uma emul
são nagua da polpa gordurenta adicionada de açucar . Esta palmeira ,
då fruto todo o ano, mas principalmente em Maio e durante a estação
seca .
Dá bom palmito ( o palmito é o renovo terminal desembaraçado
das folhas verdes que o envolvem e reduzido ás folhas brancas do
centro ) . PLC . “ ... “ unhas de gato " e jurarás... "
JUTAT ( RIO ) 127 Menos considerável que o Javari, quer
pela extensão, 1.200 quilômetros quer pelo volume das águas. Nasce
ao norte das terras banhadas pelo Ipixuna , afluente do Juruá . Aflu
ente da margem direita do Solimões. AB . “ ... de Parintins a foz
do Jutahy ... ?

KANITAR 82 Penacho ou cocar que usavam os guerrei


ros tupis, quando em marcha para a guerra ou em solenidades. RABL .
vol . 2 , bras . “ cujos pennachos eram kanitares e immarcessiveis de
selvagens ..
184 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

“ LACRES " 33 WISMIA GUIANENSIS ( Gutiferas ) Marajó


e Obidos . Sin : Caaopiá ; pau de lacre . Arbustro e árvore pequena .
Habitação, muito com um nas capoeiras , Madeira : amarelo , cerne
castanho, empregado em marcenaria e carpintaria . PLC . O Cônego
F.B. de Souza , diz que por meio de incisões feitas no tronco se obtem
ainda em todas as suas partes, um suco gomo-resinoso o qual con
cretando -se torna -se em bagas de fogo . Esta goma guta resina é cha
mada de goma lacre ou goma guta da América, é resolvente e drás
tica e pode substituir a verdadeira goma guta . Há duas qualidades de
lacre : branco e vermelho . ( Pará e Amazonas, pg . 115 , I parte . Co
missão do Madeira ) .
“ LAGARTEAR " 70 Aquecer -se ao sol ( uma pessoa ) , “ ... “ la
gartear ” ao sol animante ...
LAGES -229 nome de Lages é devido a um lagedo . S
uma milha da foz do Rio Negro . Diz o Cônego F.B. de Souza que
em 1832 , levantaram os revoltados do Rio Negro uma espécie de for
tificação que foi conflada a direção ao frei Joaquim de Santa Luzin.
Quando por aquele simulacro de fortificação passou a barca de guerra
“ Independência ” que de Belem conduzia a força ao mando do Ten .
Coronel Domingos Simões da Cunha para sufocar a revolução ( a se
paração da capitania do Grão Pará ) foi saudada por alguns tiros
cujas pontarias eram dirigidas pelo dito carmelita ... A barca " Inde
pendência " entretanto passou incolume . ( Pará e Amazonas pg . 171 ,
II parte . Comissão ao Madeira ) . Hoje, nada mais existe , além do
uma casa, pelas Lages e Terra Nova aféra ... "
LAGO 33 “ O lago na Amazônia , sob os dois aspectos,
fisiográfico e subjetivo enfeixa duas grandes sínteses da terra e da
existência do homem regional: numa, condensa toda a riqueza estética
da paisagem , e , na outra , sumaría o passado e o presente de seus au
tótctones . Como entidade geográfica, que reponta com mais evidência
nos cenários equatorais, ele representa o índice de todo o encanto que
a natureza pode manifestar nestas telas, pinceladas com violentos re
levos cenográficos " . AL . “ ... A baixada é o lago... "
LAMBISCO 77 Comer pequenas porções . " . As labaredas
andaram ao lambisco ...
LAVRAR - 271 Sulcar . que a agua se incumbia de lavrar
a terra ... 146 Cortar . e senti uma “ parnahyba ” me lavrar
o peito ...
" LEGUMES” 71 Qualquer cereal no sertão nordestino . GB .
AN . Hortaliça, plantas verdes, preferentemente . GC . “ ... no nosso
Ceará é outra coisa , tem - se “ legumes " .
LENTURA 211 O mesmo que lentidão . “ ... as horas cor
riam na lentura de um oleo denso ... "
LEOPOLDÍNIA ( palmeira ) 226 LEOPOLDINIA PIASSABA,
Wallace . Sinônimo: piassava . Tronco de 6 a 10 metros de altura. com
folhas de 4 a 5 metros de comprimento . Na base dos pecíolos das
folhas, encontra - se um verdadeiro tecido de fibras grossas, trançadas,
formando bainha em volta do tronco . São de côr castanho escuro , con
sistência córnea , resistentes, flexíveis ; utilizam - se para fabricação do
vassouras, Covas , amarras que resistem bem à água salgada e flutuam
PLC . " descabellar a palmeira leopoldinia das fibras texteis ... "
Gaiolas e Vaticanos

Vaqueiro do Rio Branco, Amazonas

( Clichês cedidos pela “ Revista


Brasileira de Geografia" )
1
1
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ELUCIDÁRIO DO " INFERNO VERDE " 185

LEVIANTANS 84 Monstro de que há dúvida na Biblia , no


livro de Job , e cujo nome passou para a língua designando qualquer
-coisa de colossal e monstruoso . DL . “ ... que os focinhos dos Levian
thans scintillantes ... "
LEVIPEDES 122 Que tem pé leve, que anda com presteza .
" ... onde passeavam , levipedes, jaçanãs ou piassócas... "
* LEZES " 162 Deturpação da palavra “ Leis " pelo ca
boclo ( muito comum ) " que o caboclo fallará nas " lezes " ..
LEZIRIAS 152 ( Do árabe : al jazair ) . Terreno alagadico,
na margem dos rios. LF . “ ao pé das lezirias e chapadas ... "
LIAMBA 104 CANNABIS SATIVA . var . INDICA . L.
Canabíneas. Originária da India. As sumidades floridas empregam
se para diversas preparações que produzem efeito narcótico e certa
embriaguez voluptuosa . Às vezes, seguida de violenta excitação e mes
mo loucura furiosa . O extrato é conhecido por “ Haschisch ". Na ama
zônia , não é raro o uso dessa planta misturada com o fumo . PCL .
tinha effeitos narcoticos de liamba ... "
LIBRAR 181 Pairar . .. num esforço para se librar ... "
LIVINGSTON 226 ( David ) . Viajante inglês, nacido em Blan
tyre ( Escóssia ) , explorador da África Central e Austral da região do
Zambéze, do planalto dos grandes lagos . DL. “ se aventura annual
mente, sem receios, a consideravel façanha de um Livingston ...
LOCA 145 Toca ; furna . “ ... que nem um mocó , se escon
dendo na loca das pedras ..."
LOCANDO 118 Marcar com estacas os pontos singulares ( do
uma construção ) ou eixo de ( uma estrada) , Assinalar . “ ... quando
delle se ouviu fallar foi locando uma carnificina ... "
LOMBADA 155 Serra extendida e prolongada ; encosta .
Coroava aquella lombada de costa ... "
LONGEVA 129 Que dura muito . " ... Essa informe e lon
géva creatura ...
LOURO ARITU 229 Árvore grande . ACRODICLIDIUM
PUCHURY . ( Lauráceas ) . Madeira muito bôa para construções
marcenaria . PLC . e cavername de louro aritú ... "
LUCÍOLAS 176 Gênero de insetos coleópteros, que compre
ende pirilampos cujos dois sexos possuem asas e a faculdade de brilhar.
.. Lampejavam innumeráveis os luciolas... "
LUSTRE -- 193 Brilho ou polimento que se dá a um objeto
ou que ele tem naturalmente . “ Tomava um lustre de estanho ... "
LUZES - LUZES 176 O mesmo que pirilampo . “ ... chispeavam
os luzes- luzes ...

MACACHEIRA 254 Por macaxeira, segundo L. Freire . MA


NIHOT PALMATA , Muell . Arg . Manihot . AYPI . Pohl. ( Euforbiá
ceas . ) Arbusto . Car. Espécie de mandioca cuja raíz não tem princi
pios venenosos . A planta é menor do que a mandioca amarga , au
hastes não são angulosas, os frutos não têm alas . Os tubérculos
podem se comer assados, cozidos ou fritos, como a batata . PLC .
Alguns pés de macacheira e um molho de bananeiras...
186 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

MACHADINHO 46 Pequeno machado com que o seringueiro


corta a hévea a fim de lhe extrair o leite . Debaixo do golpe coloca
uma tijelinha de folha de Flandres ou de barro , para onde encorreo
liquido que vai chamar depois goma elástica , ou ouro negro . RM .
.. com o machadinho , as tigellinhas, o balde e o “ boião " ..
MACUCÁUAS 121 Erro de impressão por : macucaus
Ave da família TINAMÍDEOS , Substantivo feminino segundo J. Veri
ssimo . A espécie característica é o CRYPTURUS ADSPERSTS . Colon
rido bruno -azeitonado em cima, cinzento no lado inferior, porém
bruno avermelhado mais para trás, inclusive as calças . RVI .
macucáus piavam ...
MADEIRA ( rio ) 202 Ou “ Caiari ", dos indígenas. Foi Fran-
cisco de Melo Palheta que em 1725 lhe deu o nome de Madeira , em
consequência da grande quantidade de troncos de árvores ou madeiros
que incessantemente são arrastados pela correnteza . E ' o mais notável
dos afluentes do Amazonas, pela extensão, sendo um dos mais estuda
dos, desde o século XVII . Seu curso de 3.240 quilômetros é francamen
te navegável numa extensão de 1.241. quilômetros, desde a sua foz até
a cachoeira de Santo Antônio, na divisa de Mato Grosso . Daí para
cima, o rio apresenta 15 grandes cachoeiras e diversos saltos . AB .
E ' formado pelo Beni e pelo Mamoré, oriundos das vertentes dos Andes
Bolivianos . Rev. Bras Geog . ano IV, n .° 4 “ ... não era suficiente no
Madeira ...
" MÃE DÁGUA ” . 44 Fogo fatuo, ente fantástico . SAO . Es
pirito aquático das lendas amazônicas . RM . " ... Compraz -se a em
mergir a " mãe d'agua" ..
" MÃE DA SERINGUEIRA " 214 ( Mãe da mata ) : expressão
corrente entre os mateiros amazonenses, designativo de um duende
da floresta , que preside aos destinos da flora e fauna que a habitam :
é o " caaci " selvagem , que os portuguêses transformaram em “ sacy “ .
BJS . “ ... referindo -se ao capricho costumeiro da " mãe da seringuel .
ra que esconde as arvores ...
MAGOARI 248 Familia SICONIIDEOS ARDEA SOCOI . E '
pernalta , de corpo robusto com cerca de 1.15cm . de altura , o bico
grosso na base e afilado na ponta alcança 30cms . de comprimento ;
o pescoço é nú , prêto, destacando -se a parte inferior do papo , também
nú, pela côr encarnada ; a plumagem é branca, ainda que não muito
alva ; as pernas são pretas , ... 0 magoary pousado num mulateiro ... "
MALAGUETAS 223 Cada um dos cabos salientes da roda
do leme. com as mãos pelas malaguetas circungirar a roda do
leme ...
MALANDRINS 202 Vadios . “ Dir-se- ia uma nação de
malandrins... "
MALAQUITO 68 Carbonato hidratado de cobre, dum belo
verde aveludado e que se pode cortar e polir . DL . “ o cofre de
malachite discreto e impenitente ... "
MALEOLOS 190 Cada uma das saliências que constituem o
tornozelo . “ ... Do joelho aos malléolos ... "
MALHETAR 164 Encaixar ( uma peça de madeira ou de
metal em outra ) . • para malhetar a presa, a que substitue comple
tamente ... "
" MALICIA " 275 Das mulheres ou sensitiva juquerí
rasteiro . MIMOSA PUDICA , L. ( leguminosa . mimos. ) . Hab . margens
dos cursos dágua e campos alagados onde forma extensas manchas.
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 187

Car . Flores branco -róseo . E ' verdadeira " sensitiva " murchando ao
menor toque . Há outras espécies. PLC . " ... ervescente de membeca
e “ malicia ” ...
MAL NAS FRUTEIRAS 79 ( Veja “ broca " ) . “ ... ou désse
o mal nas fructeiras ... "
“ MAMA -NA - ÉGUA " 52 Que não vale nada . “ ... seu cara
de “ mama -na -égua ” .
“MAMÃO -MACHO" 53 Diz-se das pessoas de rosto longo e
chupado. seu ventas de “ mamão -macho " .
MAMELUCO 45 Filho de europeu e de mulher indígena .
a resistencia do elemento tapuyo ou mameluco ..."
“ MAHATA REMUNHÃ REYKO " ? Que está fazendo ?
A tradução destas frases tupi guarani, devo a nimia gentilesa
do Exmo . Sr. General Candido Mariano da Silva Rondon .
MANACAPURU 223 Vila situada à margem esquerda do rio
Solimões, em lugar pitoresco . Exporta goma elástica e madeiras ser
radas . “ Ja em Manacapuru não encontrára a Gertrudes..."
MANAUS HARBOUR 230 Companhia construtora e arren
datária do Porto de Manaus . " Dous
7 paquetes inglezes, encostados
ao “ flutuante " da Manaus Harbour ...
MANDACARUS 142 Ou Jamacaru CEREUS . Catáceas.
Planta que pode atingir grandes dimensões . Hab . em terrenos secos
e mesmo rochosos . O suco dos frutos é antiscorbutico . A tintura das
flores é diurética . PCL . " na volta da estrada dos mandacarus... "
MANDA -CHUVA 158 Chefão político ; maioral . .. que o
manda-chuva avassa lára ... "
MANGA 216 Assim se chama a um ramal da “ estrada " de
meringueiras, na Amazônia . “ . ou simples linhas as mangas
MANGRULHO 211 Pôsto militar de observação, em sítio
elevado, e formado de madeiras toscas, acima das quais se sobe para
observar . “ ... dominava um mangrulho a chateza da veiga ...
MANI ( lenda da ) - 128 - A lenda diz que a mandioca foi desco
berta assim : Em tempos idos apareceu grávida a filha de um chefe
selvagem , que residia nas imediações do lugar em que hoje está a
cidade de Santarem . O chefe quiz punir o autor da desonra de sua
filha, a ofensa que sofrera seu orgulho, e, para saber quem era enpre
gou , debalde , rogos, ameaças e severos castigos. A moça permaneceu
inflexível, tanto diante dos rogos, como diante das ameaças e castigos,
dizendo que nunca tinha tido relação com homem algum . O chefe
tinha deliberado matá - la quando lhe apareceu em sonhos um homem
branco , que lhe disse não matasse a moga , por que ela era efetiva
mente inocente e não tinha tido relação com homem algum . Passados
os nove meses ela deu a luz a uma menina lindíssima, e branca , cau
sando este fato a surpresa , não só da tribo, como das nações vizinhas,
que vieram visitar a criança, para ver aquela nova e desconhecida raça .
A criança , que teve o nome de Mani, e que andava e falava precoce
monte, morreu ao cabo de um ano, sem ter adoecido , sem dar mos
tras de dor .
Foi ela enterrada dentro da própria casa , doscobrindo -se - a , e re
gando - se diariamente a sepultura, segundo o costume do povo . Αο
cabo de algum tempo, brotou da cova uma planta que por desconhe
cida inteiramente, deixaram de arrancar . Cresceu , floresceu e deu
Irutog . Os pássaros que comeram as frutos se embriagaram , e este
fenomeno desconhecido dos índios, aumentou - lhes a superstição pela
188 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

planta . A terra afinal fendeu -se ; cavaram -na e julgaram reconhecer


no fruto que encontraram o corpo de Mani . Comeram - no e assim
aprenderam a usar a mandioca . O fruto recebeu o nome de mani.
oca , que quer dizer : "casa de Mani ou transformação de Mani", nome
que conservamos corrompido na palavra mandioca , mas que os fran
ceses conservam sem corrupção . Esta lenda conserva duas coisas co
muns a todas as religiões asiáticas: 1. °, a atribuir a um deus o ensino
do uso do pão ; 2.º, a concepção, sem perder a virgindade . A man
dioca é não só o pão do nosso selvagem como também a substancia
de que tiram diversos vinhos , como o cauim , o puchirum , a maniquera
e outros . Sua descoberta foi para eles mais importante do que a do
trigo o foi para os Arias . Couto de Magalhães, " Selvagens do Brasil "
arrancavam as raízes da mandioca ... "
MANIETADOR 165 Constrangedor . “ mas o manietador
parecia fazer-se mais forte ..."
MANITU 226 Uma das divindades dos indígenas da América
do Norte . que vestisse um idolo mau e repulsivo ...
MANIVA 128 O arbusto cuja raíz é a mandioca . “ ... abriam
covas á maniva ... "
MANUEL JOÃO 99 Índio da tribu Juma que foi aprisionado
em tenra idade no Maturá pelos Muras, que o criaram ; veiu a ser
em consequência de sua pouco vulgar inteligência e vivacidade o prin
cipal ou “ tuchaua " da própria tribu , fundando maloca , que depois,
no meiado do século passado , foi a missão de Matary, nome que tomou
do rio em cuja proximidade se acha, Con . FBS . “ ... do índio Manuel
João e frei José das Chagas ao coronel Bezerra ... "
MAPARÁS 179 Único representante em nossa fauna de uma
das familias, os HIPOFTALMIDEOs, peixe de couro NEMATOGNATA ,
tipo assaz curioso e com caractéres inconfundíveis . A única espécie
HYPOPHTHALMUS EDENTATUS , é de toda a Amazônia e do Rio
Paraná . Sua carne é bastante apreciada . A cabeça é deprimida, olhos
laterais situados sobre a articulação mandibular; a linha lateral emite
raios colaterais simétricos, para cima e para baixo , fomando - se assim
um desenho geométrico, como não tem nenhum outro peixe . RVI .
* ... repleto de marapás..."
MAQUEIRA 255 Rêde de fibras de tucum , para dormir .
.. O Chico Brabo, espichado na maqueira ... "
MAQUETA 181 (Gal . ) Pequeno esboço modelado em barro
ou em cêra , de alguma obra de escultura ou estátua . “ .. num gesso
de maqueta artistica ...
MARÍ 29 Vara para amarrar embarcação, impelir ou para
le retear a vela . ao lado de fragil mará ... "
MARACUJÁ 71 Várias espécies do gênero PASSIFLORA .
CÁNDIDA , PASSIFLORA LAURIFOLIA : PASSIFLORA QUADRAN
GULARIS . etc. Fruto ovóide, da grossura de uma pequena melância
( até dois a três quilos ), amarela esbranquiçado quando maduro ; liso .
A polna (arilhos das sementes ) é comestível, de gosto agradável , prin
cipalmente adicionando - se açúcar e Kirsch ou rhum . O pericarpo do
fruto, espêsso, é aproveitado para preparar doces e compotas. PLC .
Frei Antônio do Rosário em " Frutas do Brasil" , pg. 156/157 ( Lisboa,
1702 ) diz : Chegamos a falar da excelente fruta, do maracujá, que se
não é a rainha, é a duqueza das frutas pela flor com que a natureza
a enobreceu e sengularizou sõbre todas as frutas e flores da terra :
pintou o Creador, ao vivo, nesta misteriosa flor, a lamentável tragédia
da Paixão , a coluna, os acorragues, os cravos, as chagas , a corôa , o
sangue, com tanta perfeição e viveza , que por isso se chama a flor
LiUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 189

da Paixão porque como expirou o Salvador do mundo no monte Cal


vário : “ Flos Libani Elanguit" ; como flôr morreu inclinando a cabeça
“ Inclinato Capite " —, para que com a parábola da flor celebremos
a Paixão de Cristo e façamos memória do maior benefício que dovemos
a Deus, coroando a obra da monarquia das frutas do Brasil, com a
flor que produz a mesma terra, glória do Creador, lembrança e agra
decimento dos Redentos . GS . Maracujá, quer dizer : a coisa que se
toma de sorvo. GS. O significado que lhe dão, também , é : viveiro de
môscas; de fato, dizem que a flôr do maracujá atrái môscas e estas,
depois de fecundadas, poem ovos, dos quais nascem larvas dentro da
fruta . Na realidade, essa fruta costuma ser bichada muito rapidamente.
GS . “ ... onde as flores dos maracujás se ostentavam em chagas san
guinolentas... "
MARANGUAPE 54 Cidade do Estado do Ceará , no sopé
da serra do mesmo nome, a 26 q . da Capital, sendo importante pela
produção de algodão, cana de acucar e café. VC . " ... " tocar " para
Maranguapo e tornar o “ va por de terra " ... "
MARAPATÁ 223 - É uma ilha fluvial sem maior importân
cia para a geografia ou para a economiil da Amazônia . Quem sobe a
Amazonas deixa em Marapatá a vergonha, destino trágico mas que a
tragédia do desbravamento da planicie confirmou , transformando a
legenda em história , trágico - cômica, deploravelmente verdadeira . AC .
Raymundo de Moraes, filho da região , protesta dizendo : pe
quena ilha da foz do rio Negro, Celebre hoje pelo designio inepto
que o forasteiro lhe atribue : de guardar conciencias. Esta lenda irre
verente com que os brasileiros do sul , pretendem mostrar a falta de
escrupulos da gente hospitaleira, carinhosa , ordeira de Manaus
do Amazonas, só fulmina o proprio adventicio, pois se ha quem deixe
a conciencia para viver aqui, não somos nós, os nascidos na Planicie,
que morremos pobres, trabalhando sem ambição, e sempre orientados
no sentido de engrandecer a terra que Humboldt chamou o Celeiro
do Mundo . Os filhos da Amazonia jamais deixaram sua conciencia
em qualquer parte afim de prosperarem . “ ... Marapatá , ilhota rasa ,
a certa allusão de insulto ... "

“ MARCA DO SEGURO " 245 Limite de carga máxima de


que pode carregar um navio, sob responsabilidade da companhia se
guradora . " que lhe mettia nagua a “ marca do seguro " ... "
MARCA NOS TRONCOS ( SE ) 30 Vestigio que fica nas
árvores assinalando a que altura atingiu a enchente. “ . por onde a
a maior enchente se marca 'nos troncos... "
MAR DE JOIAS 89 Mar agitado e batido pelo sol, apre
sentando coruscações. GC. “ remava num mar de jóias... "
“ MAR DULCE " 84 Assim foi chamado o Amazonas por
Vicente Yanez Pinzon . onde o cascalho de ouro fulgurava no
“ mar dulce” ... "
MARGA 98 Mistura de terra em que predominam princi
pios calcáreos e argilosos e que serve já para o fabrico de tijolos
ou de louça , já para adubo das terras. .. corria orgulhosa , toda
alta , na marga endurecida ... "
“ MARINHEIRO " 194 Designação depreciativa dada aos
portuguêses em certas localidades do norte do Brasil. “ ... seguraram
" marinheiro " ... 97

MARISCANDO 248 Pescar ; apanhar peixe. alguns ja


burús na boca de um igarapé, mariscando ..."
190 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

" MARISCO " 79 Que é do mar. deixára a vida nomade


de " marisco " ...
MARNOTA 280 Terreno que pode ser alagado pela água
do mar ou de um rio , livres nas marnotas pelas bacias fluviais ... "
MARUPÁ 212 SIMARUBA AMARA . Aubl . ( Simarubáceas ).
Sinônimo: Papariúba . Habita mata da terra firme . Madeira branca
ligeiramente manchada de amarelo claro, leve, tenra, trabalhando -se
muito fàcilmente , muito amarga não atacada pelo cupim ; muito empre
gada para malas, caixas ete . a casca , principalmente , é um tônico
energico . Purgativa e vomitiva em alta dose . PCL , “ ... uma
anágoa no bahú de marupá ..."
* MASSAGADA " 63 Grande confusão de coisas. “ mas
sagada ” de notas... "
MASSAPÉ 224 Terreno lamacento ; atoleiro ; solo residuário
formado pela decomposição dos calcáreos, cretáceos, constituindo uma
argila compacta anegrada e de extrema fertilidade. BJS. “ ... abainha
do ao barranco de massa pé... "
MASSARICO 204 Ou batuira . Ave da família CHARADRI.
DEOS . A espécie Marinela ou Arenária interpres, a que também cabe
êsse nome, é cosmopolita e assim foi de Portugal que lhe veio o nome.
Porém , tanto lá, como aqui , o nome massarico designa diversas outras
aves de gêneros vários, de modo que é impossível reconhecer , pela
indicação deste nome, de que espécie se trata . RVI . o andar
miudo e ligeiro de um maçarico ... "
MASTIM 131 Cão de guarda ; por extensão qualquer cão
bulhento . outro mastim focinhava num monturo ...
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MASTODONTICO 257 - Corpulento, agigantado. “ ... Perante
o tronco mastodontico, barrando a passagem ...
MASTRUÇO 125 CHENOPODIUM AMBROSIOIDES . L.
Chenopodiaceas. Originária do México . Toda planta tem um cheiro
forte , desagradável. É empregada para afugentar pulgas e perseve
jos. Em pequena dose é tonica e aromatica ; em dose mais forte ver
mifuga, inseticida e emenagoga . PLC . “ .. pés de ipadú , outros de
mastruço ... "
“ MATA - PASTO " 80 Arbusto que cresce rasteiro . RABL .
vol 2 , bras . o mesmo que carrapicho . Nome de duas plantas medici
naes do Brasil da família das leguminosas ( CASSIA TORA . L e CAS
SIA ALATA . L. ) O primeiro habita nas capoeiras, beiras de estradas,
terrenos abandonados e campos artificiaes que invade ràpidamente .
As sementes torradas são um sucedâneo do café . Medicina popular .
Amargo, aperitivo e febrifugo . PLC . “ ... vinga sempre o * mata
pasto " ...
MATEIRO 211 Têrmo geral que designa o explorador de
matas, norteando - se por elas sem bússola , quase por instinto . Na
Amazônia , porém , este vocábulo tem acepção toda peculiar . Nos
seringais amazonenses , o pessoal que os trabalha se compõe das se
guintes criaturas: o patrão , que é o dono, e, dos seus empregados su
balternos. Estes são : o gerente, os caixeiros, os homens do campo, os
mateiros, os seringueiros, os aviados . Os mateiros , são os que conhe
cendo a mata perfeitamente, em todos os seus segredos e acidentes,
tem por oficio a abertura das estradas de seringa e a fiscalisação
das mesmas . BJS . estradas recem abertas pelo “ matteiro " ... "
MATEUS ( Rio ) 186 Ou Chaporé, rio na Bolívia, acerca de
19 gráus de latitude Sul . “... subindo o Abuaua , depois o Mateus ... "
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE ” 191

MATI - TAPERES 44 DIPLOPTERUS NAEVIUS Ave


trepadora e que come inseto. Reputada como descobridora de manan
ciais, que assinala com sua presença , o selvagem a tem como encar
nação de uma divindade silvestre. Às vezes, ela se transforma num
tapuinho capenga de barrete vermelho segundo a lenda, é , então, o
deus autóctone que castiga os meninos rebeldes, malcriados, desobedi
entes ás mães. Quando as crianças não se corrigem, êle as furta de
casa , RM, “ . caaporas, maty - tapérês, boitatás desasidos ... "
MATUPÁ 122 Orla de canarana na margem dos rios, dos
lagos, igarapés , também grupo de capim aquático . “ ... o matupá das
canaranas da beira ... "
MAUES 224 Cidade do Estado do Amazonas . Banhada pelo 1
Rio Mauês e paraná do Araria e Ramos. Elevada à cidade em maio
de 1896. Exporta guaraná . " ... elle seguiria de rota batida para
Mauês ... "
MEDUSA 130-167 - Uma das três Gorgonas. Era filha de Forco .
Netuno abusou dela no templo de Minerva. Esta deusa, irritada com
semelhante sacrilégio, metamorfozeou os cabelos dela em serpentes,
e deu à sua cabeça a virtude de converter em pedras todos que lh'a
olhassem . DFC . “ ... A Medusa indiana era uma relíquia ... "
MEFÍTICO 39 Pestilencial ( diz-se do ar viciado , dos vapores
ou dos gases que por sua natureza ou condição, além de mal cheirosos,
se tornam impróprios para a respiração, insalubres e até asfixiantes ).
Fetidos. “ ... Pastoso, putrido, mephitico é capaz de dar..."
MELÃO DE SÃO CAETANO 79 Espécie de hera, que re
veste ruinas de edifícios . Planta africana da família das curcubitáceas,
de largo emprêgo na medicina popular. MORMODICA CHARANTIA ,
L. Habita comumente em terrenos abandonados. Cheiro desagradável.
As folhas clareiam a roupa, tiram nodoas. Os frutos novos são co
mestíveis crus ( salada ) ou cozidos, depois de desembaraçados das
sementes e escaldados para tirar a amargura . As folhas e os frutos são
vermifugos . as gitiranas e o melão de São Caetano embalseira
riam a roça ...
MELIFICA 165 Doce ; agradável. Que produz mel. “ ...
Respondeu -me uma voz mellifica ....
MEMBECA 275 O mesmo que capim -membeca . ANDRO .
POGON VIRGINICUS, L. ( Gramíneas ) . Sinônimo : Barba de velho .
Forragem bôa, somente quando nova e vêrde . GC . dá como PASPA
LUM REPENS. Berg. ervescente de membéca e “ malicia " ..
“ MESTRE " 223 O marítimo que tem a seu cargo comandar
um navio de pouca consideração . ( Diz-se capitão de navio , quando de
grande lotes ; arrais, quando se trata de barco pequeno . Aul . “ ... Em.
quanto o “mestre ” da lancha ... "
“ METER GENTE NAS COLOCAÇÕES ” 211 Ao “ mateiro "
incumbe levar os novos “ seringueiros ” aos “ centros" e depois fiscalizar
o trabalho, isto é , ver como o seringueiro golpeia as árvores, se estraga
as " madeiras " , se usa certos procesos proibidos . “ ... A lufa - lufa de
“ meter gente nas colocações” cessou por fim ... "
METER O PÉ ATRÁS 206 Recuar da deliberação tomada .
“ não mettia o pé atraz " e que queria trabalhar ... "
METRALHADORAS MÁXIM 231 Armas de tiro rápido que
constituia o antigo armamento dos navios da Flotilha do Amazonas.
Nome do seu fabricante. “ ... á vista das metralhadoras Maxim de
um navio de guerra ..
192 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

MIASMÁTICO 254 Infeto . Que contém ou produz miasmas.


soffrerem tambem do pégo miasmatico ... "
MICHELET 46 ( Jules ) . Historiador e literato francês . Al
fredo Ladislau , já o fez em “ Terra Imatura ". " ... O lago é, pois, digno
de um capitulo de Michelet ... "
MIELITICO 73 Inflamação da medula espinhal
velho que mal se tinha nas pernas, myelitico e asmathico ...
MIGAL- O 112 Partir em migalhas. Cortar em bocadinhos .
o facão para migal- o ... "
MINHO 191 Antiga Província de Portugal . Da aldeia
no Minho ... "
MIRITI 144 Árvore da família das Palmáceas, MAURITIA
FLEXUOSA , LF . E ' sem dúvida a mais bela palmeira da planície.
Da foz do Xingu , para o montante do Amazonas ela some- se das mar
gens, buscando os lugares alagadiços dos terrenos alpestres . Då cêra,
fibra e fruta . Os índios do Orenoco chamam - na " árvore da vida " .
RM. “ ... A aba do chapelão de mirity ... "
“MISSIONÁRIO " 118 Romance de Inglês de Sousa , em dois
vols . onde Inglez de Sousa pos a roupeta de um agitado missio
nario ...
MIUDEANDO 232 Narrar minuciosamente ; esmiuçar. 64
Contou, longamente e miudeando, o seu romance de garimpo ...
“ MIUM ” 76 PASPALUM OVATUM (Gramineas ) . Originária
da África tropical . Herva excelente para terrenos secos, aumenta rà
pidamente ; resiste bem nas terras firmes siliciosas do Baixo Amazo
nas, servindo para alimentação do gado . “ ... de campo plantado de
“ mium " .
MOA ( Rio ) 272 Rio Tributário do médio Jurua, da margem
esquerda , no território do Acre . AB . “ ... Na varzea roçada de pouco
na bocca do Môa ... "
MOCAMBO 119 Palhoça ; choca em que os prêtos se abri .
gavam quando fugiam para o mata . “ ... Malocas, freguezias e mo
cambos tudo desappareceu ...
MOCO 208 Bairro de Manaus, para os lados do Bulevar Ama
zonas . mandára ao encalço dos homens foragidos no Mocó ... "
MOCOS -- 145 Roedor da família CAVIIDEOS, KERODON RU
PESTRIS , semelhante à preá , porém um pouco maior, de cor cinzenta ,
com mistura de pêlos prêtos e amarelos . Vive nas regiões pedregosas
do interior do Brasil e mora em tocas . No histórico da “moléstia de
Chagas " transmitida pelos percevejos “barbeiros" cabe papel interes
sante ao mocó pois foi nas tocas dêste roedor que o pesquisador en
controu , de início , reunidos o vector e o depositário natural do tripa
nozoma maléfico , RVI . e que nem um mocó, se escondendo na
loca das pedras... "
MOFINA 146 Enfraquecida ; debilitada; mesquinha . “ era
figurinha mofina ... " 181 uma roça mofina ... "
MOFUMBO 146 Fam . VIBORGIA POLYGALIFORMIS , cha
mada também : mofunbo - da -beira - do - rio . ( Leguminosas ) . JAP .
nome vem de uma planta trepadeira que, enrodilhando -se, forma ver
dadeiro esconderijo , onde se acoitam animais. BJS . atráz das
moitas de mofumbo ... "
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 193

MONÇÃO 83 Epoca favorável do vento à navegação . Nome


das antigas bandeiras ou caravanas que partiam em exploração pelo
interior, descendo o Tietê ou outros rios . “ na partida de alguma
monção de bandeirantes ... "
MONGUBEIRA 90 MAMORANA GRANDE , PACHIRA IN
SIGNIS , Schun . BOMBAX SPRUCEANUM , Duck . Bombáceas. Co
mum ) na margem inundada do Amazonas e de certos rios, em ter
renos de várzea argilosa . As flores purpúreas são notáveis entre as
maiores do mundo ( 30 a 40 cms. de comp. ) Fruto ovoide parecido
com o Bombax Aquaticum , maior e mais escuro. PLC . Diz, RM . que
das bombáceas, afigura -se - lhe ( o aborígene ) a mongubeira, não so
mente pela grande cápsula vermelha em que guarda a paina,, como
ainda porque perde as folhas em certos meses do ano, de maneira
que , nos dias de nevoeiro amazônico, parece uma árvore europeia ,
de galhos nus, sob a neve. com a mongubeira , a barraca , o cur
ral, as larangeiras... "
MONTARIA 42 Pequena embarcação em que se navega a
remo na Amazônia . É o cavalo do caboclo . Rasa , de 3 metros de comp.
el de bôca , não pega mais de 4 pessoas. RM . piloteam a humil
de montaria de cedro ou louro ... 99
" MONTRA 176 ? ( Franc . ) Mostruário de casi comercial .
esparsa na montra em duplo renque... "
MONTURO 131 Grande porção de esterco ; lixo . 10
cinhava no monturo ...
MOQUEM 125 - Grelha de madeira onde se põe a corar sô
bre o fogo a carne defumada . G. Cruis chama de assadouro ou grelha,
geralmente de forma triangular, com cada ângulo descansando 80
bre uma pedra ou sõbre uma forquilha de madeira . JA, dá como : assar
na labareda . Era a maneira porque os indígenas, conservavam a
caça para não apodrecer, quando a levavam em viagem . Nas cabanas
a tinham em fumeiro. “ ... no moquem um pouco de cinza ... "
MORDERAM O CHÃO 256 Cair. “ ... Tres palmos do ga
lho , apanhado alli perto, no qual se abrira entalhe caracteristico,
morderam o chão ... "
MORREDICO 76 Que vai morrer ; que está a acabar. “ ...
Afóra o campo morrediço ... "
MUIRAQUITĀ 126 Os tupís deram - lhe o nome de Mbyra .
kită, “ nó de pau " . Entre os ( Amazonenses ) Pedra da felicidade, Amu
leto de pedra verde atribuido às icamiabas , que moravam no lago
Espelho da Lua mulheres sem marido, tidas como pertencentes a
uma nação guerreira que enjeitava o filho varão . RM . Quanto ao
talismã é um fato . Existe . Feito de pedras verde- malva, com finos
veios ferruginosos, alguns são lavrados em forma simples, cilindrói
des, elípticos ou de conta . Outros de linhas zoomorfas representam
quelônios, batráquios etc. A essas reliquias emprestam atributos mi
raculosos. Dão amor, felicidade, saúde, riqueza . O mineral em que é
talhado o muiraquită amazônico é a nefrite . RM . MUIRAQUITĀ
pedra de99 chefe , insignia de poder. “ .. O disco branco do mui
rakitan ...
MUIRATINGA 124 OLMEDIA MAXIMA Duck . Moráceas.
Hab . na varzea , árvore notável; casca branca com manchas aver
melhadas, copa pequena , escura ; latex , amarelaço ; raminhos cadu
cos. PLC . .... uma muiratinga possante ...
MUIRATÍTICA 233 Deve ser Muira - queteca ou cipó dágua,
também chamado murucutua , sambaíba e cipó caboclo venenoso .
194 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

DOLIOCARPI'S ROLANDRI, Gmel . Dileniáceas . Cipo grande


da terra firme. Alim . Cortando -se rapidamente pedaços de (0,50 a
1.m. ) dos grossos sarmentos e virando - os por cima de um recipiente
qualquer, obtem - se em abundância, água fresca , clara e de gösto agra
dável . PLC . “ ... O que lhe valera á sêde era o muiratitica ...
MULATEIRO 248 Árvore amazônica, também chamada ,
pau mulato . o magoary pousado num mulateiro ... "
MULTÍFLOA 82 Erro de impressão por multíflua . que
flui abundantemente. 6. no esforço desesperado de sua borbulhosa
e multifloa correnteza .
MURAS 127 Enhrenreich indica como tribos da bacia ama
zônica , que se não pode ainda , subordinar a nenhuma das famílias
maiores pela diferença dos característicos . São nômades. HRS . AB.
dá como habitantes do Baixo Amazônas, Madeira Autaz , e afluen
tes Baetas, Manicoré, Matauará e Canumã. Diz Fernando Denis :
no Pará, existe uma nação mais vagabunda que as outras a que impu
seram o nome significativo de “ indios de côrso " . Estes são os Muras,
que por muitos respeitos, parecem viver nas margens do Amazonas,
como os botucudos na costa oriental . São os Muras um povo errante
essencialmente e á memória trazem por sua vida vagabunda ésses
Cepanos asiaticos . Os Muras, não só vivem do roubo e rapinas, como
são pelas outras tribos desprezados e perseguidos, e como se tem
observado parecem restos dum povo noutro tempo poderoso e que
ora espia as perseguições de que se tornou culpado. Se acreditarmos
em Aires Cazal, os Muras ainda hoje formariam , uma das mais nu
merosas nações da Amazônia. Expulsos pelos Mundurucus, uns ocupa
ram o paíz banhado pelo Tefé, outros se estabeleceram não longe de
Borba , na margem direita do rio Madeira . Dali se arremeçavam de im
proviso sobre os estabelecimentos dos colonos e repetiam naquelas
regiões desertas, as cenas de desolação. Os Muras são, talvez, a única
nação brasileira que ignora completamente a agricultura . Como de
vem em parte sua subsistência ao temor que inspiram , sem cessar
estudam algum meio de afeiar a aparência da sua fisionomia . Não
só furam o beiço inferior e as orelhas, como outras nações daquelas
regiões ; mas fendem também , as ventas e nelas lhes dão feiosissimo
aspecto . Não se contentam em pintar -se, muitos desenham sobre a
pele diversas figuras, usando dos meios os mais dolorosos. Há quem
diga que em diversos sítios os guerreiros se cobrem de lama, lodo,
para augmentar a antipatia e o temor que só o seu aspecto inspira .
( Brasil pg . 161 ) . ( Cônego Ber . Sousa diz ser arma de guerra muito
empregada pelos Muras o “ murucu " ordinariamente feita de pau
vermelho . Conta êsse mesmo autor a lenda da Sapucaia -oroca
uma pequena povoação á margem do rio Madeira, com esse nome .
Pouco abaixo do lugar em que se acha assentada , referem os índios
que existiu outrora uma povoação muito maior do que esta , e que
desapareceu da superfície da terra , sepultando -se nas profundidades
do rio . E que os Muras, que , então , a habitavam , levavam vida desor
denada e má e nas festas, que em honra de " Tupana " celebravam
entregavam -se a danças tão lascivas cantavam cantigas tão
impuras, que faziam chorar de dor aos “ angaturanas " que eram os
espiritos protetores, que por eles vela vam . Por vezes os velhos e ins
pirados “ pagés ", sabedores dos segredos de " Tupana " haviam -nos
advertido de que tremendo castigo os ameaçava , se não rompessem
com a prática de tão criminosas abominações. Mas regos e surdos
Os Muras não os viam , nem os ouviam . E , pois, um dia , em nieio ás
festas e das danças e quando mais quente fervia a orgia , tremeu de
súbito a terra e na voragem das águas que se erguiam desapareceu
a povoação. As altas barrancas que ainda se vêm ali, atestam a pro
fundidade do abismo em que foi irrojada a povoação e os réprubos ...
Depois de muitos anos, foi que começou a surgir a útual povoação ,
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 195

que ainda não poude atingir o grau de esplendor da que fôra sub
mersa . Foram de novo habitá - la os Muras ; mas em breve por entre a
escuridão da noite, começam a ouvir, transidos de medo, como o can
tar sonoro de galos, que incessante se ergue das águas . Consultados
Os “ pagés " venerandos, que prescrutavam os segredos do destino, de
clararam estes que aquele cantar de galos, ouvido horas mortas da
noite , provinha daqueles mesmos “ angaturanas " , que deploravam
outrora a misérrima sorte da povoação submergida e que sempre pro
tetores dos filhos da tribo dos Muras, serviam - se do canto dos galos
da “ Sapucaia -oroca ” ( quer dizer , galinheiro ) submergida, para re
cordarem o tremendo castigo por que passaram seus maiores e des
viarem a nova geração do perigo de igual sorte . É este o fato que
dou origem ao nome da povoação Sapucaia - oroca No médio
Juruá, há um paraná, na margem esquerda, com o nome de Muras
VC . “ .. Nelle inscreveu - se certa malóca de Muras... "
MURI 76 Gramínea aquática da Amazônia. O xerim
babo socorria - se do mury ... "
MURISAL 98 Lugar cheio de muris . “ em identica barra
de murysal... "
MURMUR 120 O mesmo que murmure ; ruído das ondas
ou da água corrente ; murmúrio . insinuava -se num murmur
brando ... "
MURUCUTUTUS 252 Ou “ Jucurutu " ou " coruja do mato "
É a grande coruja ou mocho de orelhas pretas. BUBO MAGELLA
NICUS de côr amarelada com salpicos e linhas escuras ; a garganta
é branca. RVI. os murucututus, “ rasga -mortalhas” ...
MURUMURÚ 140 ASTROCARYUM MURUMURÚ, Mart.
Habit. na sombra da mata , em terrenos argilosos da várzea e, as
vezes, da terra firme e fértil, em toda a Amazônia. A polpa que en
volve o caroço é comestível, doce e aromática ; passa por ligeiramen
to afrodisíaca. As fibras são muito usadas nos largos chapéus de
pescadores. RM . “ ... topara o grosso tronco dúm murunuru... ”
MURURES 122 Nome genérico dado ás plantas aquáticas,
segundo G. Cruls . NYMPHAEA AMAZONUM , M. e Zucc . (Ninfeá
ceas) . Planta aquática . Hab comumente nas águas paradas . Flores
branco- esverdeado . As flores da NYMPHAEA AMAZONUM desabru
cham somente de noite e são muito aromáticas ; podem dar óleo es
sencial para a perfumaria . PLC . 66 uapés mururés, sapemirim
e canaranas... "
MUTÁS 210 Palanque no tronco das árvores onde o caça
dor espera a embiara , reixe ou caça para frecha - la . RM , “ Cons
truissem mutás... "
MUTUCAS 254 Ou " butuca " . Dipteros BRACHYCEROS
da família TABANÍDEOS. Trata - se de um conjunto de cêrca de 200
espécies brasileiras. São moscas volumosas, de cerca de 1,5 a 2 cms ;
de cabeça larga, com olhos enormes, em geral, de belas cores ( verdo
esmeralda e prêto ) ; a tromba é um estilete, o tórax e o abdomen
são grossos. Só as fêmeas picam . Seu vôo é tão silencioso que se
não ouve o voltigear do moscardo . Algumas mutucas são suspeitas
como transmissoras de moléstia de gado . Pousam de mansinho e só
quando seu estilete já encravou na carne e começa a sução uma dôr
aguda nos adverte, bruscamente, que estamos sendo picados. RVI.
todos os piuns e mutucas do rio ... "
MUTUN FAVA 204 Pássaro negro, do tamanho de um
peru , bico encarnado , come prego , dedal, chifre, anéis, o que encontra .
RM . Há várias espécies CRAX ALECTOR O mutum - poranga; o mu
196 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

tum vulgar, CRAX CARUNCULATA , e o mutum fava , o mutum ca


valo, QURAX MITU , e o mutum - pinima. RM . Mutum , quer dizer
pássaro negro segundo GS. Diz Q. Cunha, que o mutum fava
tem na barriga penas brancas ou vermelhas cochonila como o mutum
piori, também . Cabelos do negro da poupa de mutum " fava " ... "

NAGOA 255 Nação de negros iorubanos do Sudão e que na


Bahia tiveram esse nome, usavam três lanhos na face . RABL . vol .
146 . reprisando uma canção nagða ... "
NÁPOLES 224 Cidade da Itália . Capital do antigo reino de
Nápoles, sobre o golfo do mesmo nome, formado pelo mar Tyrrheno
o não longe do Vesúvio . DL . recordando a viagem a Napoles ..."
NEGRIDÃO 77 O mesmo que negrura . em meio a
negridão calcinada ... "
NEGRO ( Rio ) 54 Nasce nas alcantiladas regiðes do Po
paiam , na Colombia . O rio tira o seu nome da côr das águas, que em
vaso cristalino parecem ser amarelas. Os mais notáveis naturalistas
que a examinaram , como Humboldt, Agassiz é outros, não puderam
surpreender a causa dessa coloração, que conjecturam ser devido a
presença de algas microscópicas ou de algum mineral em dissolução .
AB. A côr das águas dos rios é influenciada pelas matérias em sus
pensão ou em dissolução. A influência da cor do leito é bem menor ,
e pouco importante. Os rios que nascem e fazem grandes percursos
em regiões de rochas quartzíticas ou areníticas geraimente tem águas
claras e límpidas porque não têm ocasião de receber a contaminação
das árgilas. Dá- se o contrário nas zonas de granito, xistos cristalinos ,
filitos e diabáticos, cujos produtos de alteração “ sujam " as águas dos
rios. Salvo o caso de curso em zonas de quartzitos e arenitos, os rios
têm águas mais ou menos barrentas, de acórdo com o teor de árgilas
en suspensão. A coloração do río é função da árgila que ele trans
porta ; chega ao máximo de intensidade após as grandes chelas e baixa
ao mínimo nos períodos de estiagem . As águas pretas são devidas à
matéria orgânica, algumas vezes, em suspensao , porém a maior parte
e no caso habitual, em dissolução . A constituição química das subs
tâncias húmicas ainda não é bem conhecida, são compostos terciários,
oxigenados, provenientes da alteração dos vegetais em contato ou fora
do ar , e facilmente solúveis nas lixivias alcalinas. Seu poder corante
é muito intenso ; basta uma quantidade mínima de humus em disso
lução nas águas para ser um " rio prêto " . Os ácidos úlicos e crênicos
e seus sais coloram as águas em ambar quando estão presentes na
proporção de dezenas de miligramas por litro. Os rios que nascem ou
atravessam baixadas onde esta se processando a decomposição de ma
léria vegetal tornam - se logo " prêtos " , encerrando muito pouca matéria
em suspensão . Sua coloração é devida aos miligramas que as águas
contêm em dissolução. ( Da Rev. de Geog. e Estatística, vol . IV, ano IV ) .
villa da barra do rio Negro ... "
NEMORAL 125 Relativo ao bosque ; que existe nos bosques .
no canto nemoral de desamparo e miseria ..."
NEVOAÇA 257 - O mesmo que nevoeiro . " ... dissipavam a
nevoaça a espadeiradas fulgurantes ...
“ NINANDO ( SE - ESTAR )” 162 Incomodar - se pouco com
o que, em consequência de uma atitude tomada , possa acontecer ou
ser dito . Estavam “ se ninando
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE ” 197

NICE 225 Cidade da França . Antiga capital do condado do


Nice, nos Alpes Maritimos . Porto sobre o Mediterraneo . Estação in
vernal . DL . " a estadia em Nice ... "
NUBIL 203 Casadoira ; em idade de casar . * ... linda cunhã ,
enguico nubil... "
NINFEAS 122 Nome científico do nenúfar : nome dado as
plantas aquáticas da família das ninféaceas . " ... japonez pintára,
imaginoso, nymphéas monstruosas...

OBLAÇÃO 218 Oferenda ; sacrifício , a Deus , Havia uma


auréola de oblação nesse cadaver ...!
OBNOXIO 226 Estranho . “ ... explicar o caso obnóxio do
inicio dessa peregrinação ..."
" OBRA DE SANTA ENGRÁCIA " 66 - Que se 99 não acaba mais.
“ ... adquiria fóros de " obra de Santa Engracia” ..
OBSEDIATA 255 ( Gall . Erro de impressão por obsedava .
Preocupar constantemente. o pantanosinho toldado ohsediava - o ..."
OBUMBRANDO - SE 243 Escurecer ; ocultar . " ... que de
repente se apagou aos silvos, obumbrando - se ... "
ODISSÉIA 225 Poema de Homero, narrando a viagem aci
dentada de Ulisses de Tróia a ftaca . Série de acontecimentos anormais
e variados . « na mais espantosa das odisséias..."
OIRADO 215 O mesmo que ourar ; ter tonturas, andar à
roda ; alucinar . " oirado em paroxysmos de dôr ... "
OICANAS 29 Ocirana Alchornea Castaneaefolia . Benth . (Eu
phorhiárpas ) . Hah . nas margens do Rio Imazonas e dos afluentes im
portantes . Têm latex branco . PLC . Diz R. Morais que a oirana ribeiri
nha em forma de chorão quase cipreste, chamaram os naturalistas de
Salix Martiana , transmuda va - se nas praias dos altos rios, em oirana tipo
araçá bravo , espécie de salgueiro que os mesmos naturalistas haveriam
de chamar Salix Humboldtiana , Quintino da Cnhua , diz que no Soli
mões, chamam a êste arbusto , que se desenvolve nas praias de : Aua
rana , outros de Auayrana, outros de oirana ; os habitantes do Rio Ne
gro, Oerana . Compreendem - na assim : aua , cabelos ; y, água ;
rana . bravo ; não sabe se devido a oerana , por dois têrços do ano , viver
mergulhada , mal mostrando os últimos galhos , mas pelo velho anexim
da água não ter cabelos . propendeu para os naturais do Rio Negro ,
onde melhor se “ corta a língua ” , como lá se diz . “ oiranas guar
necem , é linda ..."
OITICICA 145 Ou oitiseiro . Licania (Moquilea ) Tormentosa .
( Rosácea ) . E ' originária do nordeste ( Oity da praia ) . Fruto comestível
E ' uma das principais árvores para arborização das ruas ; resiste ao
calor e à poeira . PCL . “ mesmo debaixo de uma oiticica ..."
ORESTES 47 Filho de Agamenon e Clytemenestra . Ele
matou sua mãe de acôrdo com sua irmã Electra, para vingar o assas
sinio de seu pai . DL . “ .. o caboclo é o Orestes da tragedia grega ... "
ORNITOLOGICA 96 Relativo a ornitologia : parte da zoologia
que trata das aves . se anima o rio com a nova fauna ornitho
logica ... "
198 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

OURIÇOS 138 Frutos da castanheira . BERTHOLLETIA EX


CELSA . Os ouriços lenhosos, vermelho escuro , de 12 cms. de diâmetro .
em média, contém os frutos, ( amêndoas ) revestidas de nozes em forma
de pequenos gomos, que vão de 13 a 20 castanhas. No tempo da colheita
qualquer vento da mata produz a queda perigosa dos ouriços, que,
pesando mais de quilo, acima de 30 metros desabam tão violentamente
a ponto de se enterrarem no solo. RM. “ ... ainda restavam ouriços,
quebrados da derradeira safra ... "
“ ORDEN ” 274 Leitura diária das ordens do Comando de
( Batalhão, Quartel etc. ) e por abreviação assim são chamadas .
Comandar a guarda, dar o “ estado ” ou assistir a uma " ordem "

PACOVEIRAS 250 O mesmo que bananeira . * ... entre


92
velhas pacoveiras..."
PAGE 157 São os sacerdotes e ao mesmo tempo os médicos
dos indígenas do Brasil . Diz ainda Gonçalves Dias, retiravam -se à
cabanas afastadas e obscuras, ao Oco das árvores, à lapa dos rochedos,
ou as cavernas tenebrosas, onde nenhum guerreiro entrava e de cuja
visita se abstinham : ali impondo -se privações, padecendo tormentos e
necessidades em um viver austero e misterioso durante longas noites
passadas no silêncio apenas interrompido pelo borborinho confuso das
matas, dados a meditação, a maceração, ao jejum , tornavam - se os Pagés
excessivamente nervosos e de uma sensibilidade exquisita . FBS. GS.
dá como o feiticeiro , o bruxo . “ foi ajuntar-se na barraca do velho
Agostinho e da irmã " page " .
“ PAGODE ” 83 Divertimento . a um " pagode " convi .
dado ... "
PAJURÁ 204 ( de Santarém ) Couepia bracteosa , Benth . (Ro
sáceas ) . Sinônimo : Pajurá verdadeiro . Árvore pequena ou média . Ha
bita na mata virgem de terra- firme, em tôda a Amazônia Madeira
amarelada, dura e pouco durável. Frutos comestíveis . Polpa espessa .
comestível. PLC. “ ... tingidos do sumo do pajurá ... "
PALIMPSESTO 99 Manuscrito em pergaminho, raspado, por
copistas da Idade Média, para dar lugar a nova escrita, debaixo da
qual se tem conseguido modernamente avivar os primeiros caractéres.
figura um palimpsesto em branco e humus ...
PALRAVAM 157 Chalrar, falar muito . “ ... Palravam ir
resistívelmente animados ... "
PĀ 211 Filho de Daemogorgon , deus dos campos, dos reba
nhos de toda espécie, e, particularmente, dos pastores .. Pã é palavra
grega que significa tudo de sorte que debaixo deste nome era .
segundo Servio, que se adorava tôda natureza . DC . “... num augusto
lavrar, para as seáras de Pan .
PAMPUAM 152 Espécie de capim . Panicum plantaginum ,
L. , a que os sulinos dão o nome de capim Guatemala . o “ colo
nia " , o pampuam , e o “ mium "
PANACARICA 249 Toldo de palha das igaratés . Também
talas em tecido duplo para resguardar qualquer objeto . AM . “ ... se
viu acordado sob a panacarica ..."
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 199

PANASCO 203 Herva das umbilíferas ( capim ) que serve


para pasto . com o campo de panasco e uns novilhos ... "
PANEIRO 87 E ' vocábulo português com a significação de
cesto, e nesse sentido é usado no Pará . VBR . Cesto muito comum na
Amazônia , feito de talas de palmeira , onde se acondiciona depois de
forrado com palha de ubim , a farinha dágua . RM . Tem a medida
de 10 a 12 quilas de farinha . “ . e os paneiros de farinha não se
esvasiavam ... "
PANISCO 80 Erro de impressão, por pânico ; painço gé
nero de plantas gramíneas a que pertence o painço . São várias as espé
cies . O painço, também chamado milho miúdo , Panicum italicum , L.
Originário da India . Pouco cultivado na Amazônia . Com a palha fa
zem - se espigas grossas, compridas e de ramificações curtas e apertadas,
de cor amarelada ou purpúrea ; são quase redondas, miúdas . Comes
tíveis . As sementes são principalmente utilisadas para alimentação dos
passarinhos criados em gaiolas ( canarios ) . PIC . querer abafar
os uteis paniscos ou gramineas... "
PAPA -ARROZ 270 Em especial Sporophila superciliaris, de
côr verde - azeitonado em cima, brancacenta sobre os olhos e duas faixas
amarelas na asa . RII . como ás maracanãs, papa -arroz " ... "
PAPA - CEIA 145 A estrela da tarde . " ... A lua era que nem
um beijú e a papa - ceia já devia estar se sumindo ..."
PAPOUCO 142 Tiro . “ ... Foi só um papouco ... "
PAQUITEIA ( Rio ) 186 Formado pelos rios Piquis e Palcazu ;
afluente da margem esquerda do Ucaiali . “ ... descendo pelo Pachitéa.
ao l'cayali ... "
PARAFUSO DE “ PRESSÃO " 139 Parafuso de fixação .
Apertado o parafuso de “ presão " e pelo de “ chamada ” levada com
rigor ... "
PARANÁ 87 Braço de rio , com saída pelo montante e pelo
jusante do mesmo rio , constituido em geral por uma ilha encostada a
uma das margens continentais da bacia . RM . " ... viéra até do paraná
da Eva ... "
PARANÁ DA EVA 87 Canal que corre entre a ilha Eva e
margem esquerda do Amazonas. VC. a caboclada viera até
do Paraná da Eva ... ”
PARAPLEGIA 181 Nome que se dá algumas vezes a pa
ralisia. Paralisia dos membros inferiores. Paraplegica e louca
por complemento ... "
PAR DE MACHOS ( UM ) 201 Argolas articuladas de ferro
que se fecham nos pés dos cativos, prisioneiros, ligadas por corrente
eurta, que os impede de correr. O debito era um par de machos ... "
PARÈNQUIMA 117 Tecido utricular ou celular; tecido es
ponjoso € mole que , nas folhas, frutos e vergônteas, ocupa os inter
valos que há entre os fascículos fibrosos destes órgãos e que também
se chama polpa . “ ... apertando em malhas o parenchyma das terras
florestaes ...
PARINTINS 127 Serra ao Sul do rio Amazonas, perten
eente a cadeia central do sistema brasileiro e limite entre os Estados
do Amazonas e Pará. VC . Nome da cidade à margem direita do Rio
Amazonas, com indústria extrativa de guaraná, copaíba e borracha .
... das corcovas da serra de Parintins... "
200 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

PARNAÍBA 146 Espécie de facão. RABL, vol 4. bras . “ ...


senti uma parnahyba me lavrar o peito ... ”
PAROXISMOS 215 Máximo grau de intensidade de um ases
80, de uma dôr. “ .. oirado em paroxysmos epilepticos ... "
PARRUDA 143 Mulher baixa e grosseira ; mulher virgem .
com moça nova e parruda ..."
PATO BRAVO 33 Ou pato do mato . Gênero Cairina Flem ..
da ordem Anseriforme. Cabeca e parte inferior do corpo pardo ene
grecido ; parte superior do corpo preta com lustro esverdeado e pur
púreo ; coberteira das asas superiores branca. Goeldi. “ carðes, ara
papás e patos bravos ... !
“ PATRÍCIO " 63 Conterrâneo . sem suspeitas as visi
tas do " patricio "
PAUL 131 Pântano ; terra encharcada ; alagadiça.
qualquer um sapo cururú á borda do paúl... " .
PAVÊS 236 Armação de madeira para resguardo da tri
pulação de um navio . “ com cuidados sacramentaes no pavés da
montaria ... "
PÁVIDO 180 --Assombrado . “ Dez interminaveis dias me
demorei nesse pávido casarão ...
PAXIÚBAS 254 Iriartea exorrhiza . Mart. Palmeira donde
se extraem fibras téxtis e tabuados em forma de ripas que servem
para soalhos de casas e de pontes . As raizes sobre as quais se assenta
o tronco parecem um feixe de espingardas ensarilhadas. RM. E. da
Cunha chamou - a de “ palmeira providencial do Amazonas ” . “ com
as paxiúbas a desfazerem -se ...
PEBA 171 Designação de tatu , cujo nome completo é tatu
peba , também conhecido por “ tatu de rabo mole . " Assim se diz no
Ceará “ pegar um peba " ( como no Rio Grande do Sul se diz " plantar
uma figueira ” ) “ por cair do cavalo " RVI . “ ... Na terra qual um
néha ... "
"PEDRA JACARE ” 98 E ' assim chamada a pedra comum
do Amazonas, preta , meio mole, irregular. ( Informação de trabalhado
res da região ) . “ cortes de " pedra jacaré" ... '
PEDRANCEIRA 82 Monte de pedras. uma pedranceira
que o rio teima em demolir ...
PEDREGAL 153 mesmo que pedral ou pedraria , na
Amazônia ocidental. Usa -se também no sentido português de lugar
em que há muitas pedras. esconder o pedregal das correntezas
estuantes ... "
" PEGA - PINTO " 123 Solidonia - boerharia paniculata , Rich .
( Nictagináceas ) . Sin . Pega - pinto e Celidônia. Hab . nos terrenos aban
donados . As sementes agarram - se na roupa e na pele dos animais
(carra pichos) como as da herva tostão ou pega - pinto de Belém .
PLC . “ ... Segui peleo carreiro bordado de alastrante " pega -pinto " ... "
PEIXE -BOIS 122 Ou Guarabá, Iuaraná ; Guaraguá e Ma
naí, na língua indígena . São os mamíferos da ordem Sirénios, fam .
Manatideos . Há uma só espécie T'ichechus Manatus no Brasil , e
que é hoje bastante rara nas costas do Norte e no Amazonas. São
animais disformes, um tanto semelhante às focas con cabeça de
bezerro , olhos pequenos , corpo quasi fusiforme, terminando em cauda
achatada, com a margem posterior oval , como um leque . Atingem a 2
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE ” 201

3 m . Os grandes pesam até 2.000 q.. Tem dentes de 6 a 8 em cada


maxilar. As fêmeas tem duas tetas peitorais muito desenvolvidas.
São mamíferos . Dão 200 a 250 litros de azeite, por animal . A carne
vai para o mercado sêca ou preparada . RVI . “ á appetencia dos
peixe-bois ... "
PEJADAS 83 Carregadas, repletas. Iam pejadas de
gente e bagagens ..
“ PELES " 265 Bloco de borracha bruta tal como se apre
senta no mercado , depois de preparada nos seringais. Pesa geralmente
40 quilos. GC . “ . que trouxera as “ peles " ...
PENDURAL 205 Peça central de um teto, donde pende
um gancho ou cordão , que sustenta uma lâmpada. se prendia ao
pendural das tesouras... "
PERCUCIENTE 184 Penetrante . " ... esse choro pa cia
mais percuciente ... " 110 Concentradamente, fixamente . “ Tudo
em mim attentava percuciente para a extranha visita ... "
PERDIDIÇO 224 Que facilmente se perde. “ perdidico
nas raias da Nação ... "
PERIGALHOS 238 Pele da barba ou do pescoço decaida
por velhice ou magreza . esvaecido nos perigalhos o sorriso be
nevolente ... "
PERIQUITEIRAS 178 Arvore da terra firme. Cochlosper
mum orinocense , H.B.K. e Steud . “Baxáceas” Sin. Algodão bravo ;
Botuto e Pacoté (rio Tapajoz ) . Hab, nas capoeiras velhas em terra
firme . Sementes em forma de hélices,, cabeludas . Flores grandes ,
amarelas, parecidas com as flores do algodoeiro . PLC . “ vencida
uma rebolada de burytis, periquiteiras ... "
PERMANECENTE 32 Estável; duradouro. “ a humida
de permanecente sob as ramagens... "
PERNAS MANCAS 69 Travessa de madeira. “ ... Cupins nas
ripas e pernas mancas ...
PERRAULT 35 ( Charles ) . Literato francês, nascido em
Paris, escritor hábil e engenhoso. Autor dos “ Contos de fadas ”, o
“ Pequeno Polegar ” etc. “ O Pequeno Polegar do conto de Perrault ... "
PERVAGADO 37 Percorrer em vários sentidos ; cruzar.
nem pervergado por visadas de agrimensores ...
“ PESCA DO CEDRO " 154 — É a apanha dos paus de cedro
que vem trazidos pela correnteza, rio abaixo ..." " Abre- se o tempo
da “ pesca do cedro " ... "
PIASSAVA 226 ( Veja : Palmeira Leopoldinia ).
" PICA -PAU ” 70 Espingarda antiga de carregar pela bôca .
66
RABL, vol . 2 , bras. que de espingarda “ pica pau ” ao hombro ... "
PICADA 137 Caminho estreito aberto nas matas e nos
campos cerrados. RM . dá como vereda aberta a facão . Caminho no
meio da floresta que mal dá passagem para uma pessôa . “ ... Apro
veitando a aberta da picada já feita ... "
PICO 29 Idêntico significado de picada .
PILOTEAM 42 O mesmo que pilotar. governar como piloto ;
dirigir. “ ... elles piloteam a humilde montaria ... "
202 REVISTA DO ARQUIVO SILNICIPAL

“ PILULAS CARAPANĀS " -- 207 Preparado de quinino que se


usa para combater o impaludismo na Amazônia . um par de
zuarte e “ pillulas carapanās ' ... "
PIMPANTE 236 O mesmo que pimpão ; fanfarrão ; valente.
“ ... deixaram o " gaiola ” pimpante de resistir ... "
PINICAPAUS 121 ( ) mesmo que pica - pau . Ave trepadeira ,
da familia PICIDEOS ... pinica paus martellavam nos tron
cos ... "
PINULAS 256 Pequena lámina de metal elevada perpendi
cularmente sobre cada extremo da alidade, com um pequeno orificio .
ou fenda por onde passam os raios visuais, e que servem para fazer
alinhamentos. ( Alidade : régua móvel de madeira ou de metal, tende
perpendicularmente em cada extremo uma placa ou pínula com uma
fenda vertical . ) “ ... Rebateu as pinulas... "
“ PIONNIERS " 281 ( Franc . ) Desbravador de regiões incul
tas, “ . humildes e pobres “ pionniere" do presente ...
PIPIRA 123 Na Amazônia e no Maranhão é sinônimo de
" Tiês " , "Sanhaço ” do Sul . Sanhaço ou sanhaçu, como se diz na Ama
zônia ou Assanhaço em Sergipe . Familia dos Tanagrideos, gênero
Tanagra , ( ) colorido do corpo é mais ou menos uniforme, variável
segundo a espécie ; e nas asas aparecem os enfeites de outras côres .
RVI . Popularmente dá - se esse nome à pessoa que gosta muito de
fruta . QC . “ ... nem o mais breve chilreio de pipira ... ”
PIRIRIOCA 85 Killingia . (Ciperáceas ) . Raiz aromática em
pregada pelas lavadeiras para perfumar a roupa . ( ) pó para perfumar
o cabelo . ( cozimento da raíz é febrifugo ( em hanhos ) . PLC . “ ...
caboclinhas cheirosas de pipirioca e baunilha ... "
“ PIQUE " - 61 Diz - se dos pontos reproduzidos a alfinetes se
gundo o desenho da renda, no papelão da almofada , onde se a vai
fazer . "" .. os alfinetes do “ pique " .
PIRACEMAS 41 Cardumes de peixes ; época da desova ;
em que os grandes cardumes de peixes arribam para as cabeceiras
dos rios. não se poude incorporar ás piracemas ..."
PIRAÍBA 84 Ou piratinga, da família Pimelodideos, Brac .
Chyplatystoma Filamentosum , da Amazônia, peixe de couro, Nema
tognatha . Atinge 3 m . de comp. e 1.40 de circunf . A côr é bronzeada.
mais clara , inferiormente. ( focinho é achatado . Dá saltos enormes
fora dágua , mostrando todo o corpo , envolto num lençol líquido e
sumindo - se com estrondo, formando largos círculos ondeados ( i nei
clias ) RVI. Engole os naufragos. RM . uma pirahyba se ergueu
fora d'água ... "
PIRANHEIRA 244 Tiranhea trifoliata , Bail . (Euforbiá --
ceas ) . Árvore grande . Hab . muito frequentemente em toda Ama .
zônia em matas de várzeas inundadas, argilosas. Há duas variedades :
preta e branca . A preta é mais estimada . Imputrescível; excelente
para estacas e dormentes . Na água , a madeira da piranheira endu
rece e torna - se perigosa para a navegação , os troncos encalhados no
fundo do rio perfuram facilmente os cascos das embarcações. PL .
espetado no tronco da piranheira ... "
PIRAPITINGA 163 Peixe branco, na tradução indígena .
Peixe dágua doce da fam . Characídeos, Chalceus opalinus. A pezar
de têr muita espinha é um prato delicado . RM . No Amazonas 0
mesmo nome se refere a um " pacu " RVI . uma banda de pira
pitinga moqucade ... '
ELUCIDÁRIO DO " INFERNO VERDE " 203

PIRARUCU 42 Familia ARAPAIM GIGAS . DEOS Sudis


gigas . Um dos grandes peixes da Amazônia . De escamas vernielhas ,
donde The vem 0 nome, é conhecido por bacalhau da Amazônia .
Fresco ou salgado é magnifico . As peças secas ao sol, chamam - se
de postas ou mantas. A Língua seca é uma grosa onde se rala guaraná,
madeira , tubérculos . As escamas servem de lixa . Choca OVOS nas
guelras e cria os filhos sob os opérculos . Tem um pulmão como
aruana, por isso respira à tona . RVI. mantas do valioso pi
rarúcú ...
PIREXIA 227 Estado febril ;. febre. " ... exinanido na pyre
xia tremenda ...
PIRITES 237 Sulfureto metálico, que tem a propriedade
66
de se inflamar em09 dadas circunstâncias . são pyrites ... bi-sul
tureto de ferro ... '
PISCHIS ( Rio ) 186 --- Um dos formadores do rio Paquitéia .
todos vindo de um " tambo ” no Pischis ...
PISTIAS 30 Pistias Stratiotes L. ( Marajó ) . Sin . Aguapé.
Flutda na superfície das águas tranquilas, mas límpidas e não estas
nadas, PLC . que utricularias, pislias e pontedeiras enfeitam ... "
PISTONS 234 - O mesmo que émbolo : disco ou cilindro que
se move em vaivém dentro do corpo da bomba para fazer funcionar
no rytmo bulhento de seus pistons em vae e vem ... "
PIUNS 247 Simullum Amazonicum . Abundante nos altos
rios. Tem forma dum bicho de milho, porém menor. Só voa de dia ,
mas obriga as populações a usarem capuz de pano na cabeça piu
neiro . Tão irritante é sua picada , que muitas vezes, de tanto coçar,
se abre em chaga . Há lugares, no Purus, e no Jurua, onde para ler
• comer, é necessário estar debaixo dum grande mosquiteiro. RM .
Pium o que pica, derreado , agachado . Vem do verbo pim : picar.
GS . Carapanans e Piuns nas barracas..."
PIZZICATOS 251 Itan . Passagem de música executada de
dilhando as cordas do instrumento. pizzicatos em bordões... ”
“ PLACER " 226 Angl . Local de minas, no tempo dos pio
neiros . assentasse num “ placer ” estupendo... "
PLÁCIDO DE CASTRO ( JOSE ) 63 “ O libertador do Acre " .
Bravo coronel gaucho que reunindo um pequeno exército de serin
gueiros levantou a 6 de agôsto de 1902, o grito insurrecional de liber
tação do Acre e sua integração ao Brasil . Era a terceira revolução
promovida pelos acreanos que, a 7 de agosto, na cidade Xapuri , pro
ciamaram novamente o Estado Independente do Acre . No dia 8 de
Setembro desse mesmo ano, no lugar denominado Volta da Em
prêsa, deu -se o primeiro encontro das fôrças acreanas e bolivianas e
sucessivamente , até 24 de janeiro de 1903, quando o Comandante bo
liviano se rendeu , incondicionalmente , com toda a sua tropa, ao gran
de defensor da causa acreana, o glorioso Plácido, que teve durante a
revolução o grande auxílio do intrépido coronel Dr. Gentil Norberto .
Conta Castilhos Goyocochêa , em seu livro “ O espírito militar na
questão acreana", que Plácido de Castro, na rendição de Puerto Acre,
ao lavrar a ata respectiva, não opôs nenhuma dúvida ao desejo ma
nilestado pelo Tenente Coronel em Chefe da guarnição boliviana , de
consignar no documento a bravura com que seus soldados haviam
combatido ; negou - se, porém , a fazer a mesma declaração em refe
rência aos próprios comandados, também solicitada pelo Comte. Ruiz ,
Não quiz , igualmente , para não humilhar os vencidos, na ocasião ,
receber as espadas dos chefes militares “ porque era um ato que au
mentava o infortúnio daqueles já infortunados pela derrota " . .. onde
façanhara ao ordens de Placido de Castro ... "
204 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

PLATANO 261 Plantago major, L. ( Plantagináceas ). Ori


ginária da Europa . Subespontânea no Amazonas. As folhas e as raízes
são febrifugas -tônicas e adstringentes, úteis contra anginas e paro
tites . PLC . “ ... nos seus estadios planta yuca e plátanos substan
ciaes... '
PLÊLIDAS 104 Nome das sete filhas de Atlas e de Pleiones ,
as quais foram metamorfozeadas em estrêlas e colocadas sobre o
peito do touro, um dos signos do Zodíaco , por causa de seu pai que
rer ler nos céus, afim de descobrir os segredos dos Deuses. DC . Diz
Alencar que os indígenas davam às Pleiades o nome de Ceyou
Cejy, que lhes servia para contar OS anos. O grupo das Pléiadas,
constitui hoje uma pequena constelação do hemisfério boreal . DL .
... o broche da Pleiada acolchetava os crepes da noite ..."
PLETORAS 151 Superabundância qualquer, que produz
efeito nocivo . 66 signaes inequivocos de redução na sua plethora ... ?
PLOMBAGINA 82 O mesmo que grafite : variedade de car
vão, de aspecto metálico , côr de chumbo, de que se fazem lápis . “ .
esfuminhara o desenho em plombagina da terra ..."
PLUMACHADA 37 Plumacho ; adorno de plumas para
enfeitar cavalos; enfeite. da população plumachada ... "
PLUMADOS 37 Coberto de piumas. “ ... os filhotes de
todo ainda mal plumados ...

POBRE jesuita vaticinou -me, na escuridão fria de um ergastulo


282 João Daniel ( Jesuita ) Autor da obra intitulada " Tesouro
descoberto no máximo rio Amazonas", escrita no ano de 1797 , nos
cárceres da fortaleza de São Julião , em Lisboa, onde föra recluso , em
consequênca da lei pombalina, após haver passado 17 anos a missionar
na Amazônia. AB . R. de Moraes adianta mais : diz ter sido inventor de
mais de cem aparelhos, inclusive processos de navegar , de observar,
de aproveitar a energia da hulha branca. Missionário de rara inteli.
géncia , fulgurante estilo e peregrina imaginação . No Dic . Port. de
Innocencio Franc. da Silva , lê - se : “ Jesuita e missionário no Brasil .
Viveu por muitos anos no Maranhão, donde veiu para Lisboa em 1757
e como preso do Estado , mandado recolher preso à Torre de S. Julião,
da. Barra, por ordem do Marquês de Pombal, aí findou seus dias,
ignorando -se ainda agora , a data de seu óbito e mais circunstâncias
que lhe dizem respeito . Barbosa , nem seu nome lhe acusou na Biblio
grafia. Seu livro “ Tesouro descoberto no máximo rio Amazonas " , e
um tratado completo e dividido em 6 partes. A 1.a, descrição geográ
fica e histórica do rio Amazonas e cousas notáveis ; e 2.a , da noticia
geral dos índios, seus naturais e de algumas nações em particular ;
a 3.a, dá notícias da riqueza das minas, fertilidade de suas margens
etc .; a 4. %, de sua agricultura , comércio e indústria ; a 5.a, mostra um
novo e mais fácil método de agricultura e os mais breves e úteis de
extrair suas riquezas e engrossar a sua povoação e comércio ; a 6.*,
trata de vários inventos para melhorar a navegação e de outros rela
tivos a construção de engenhos , bombas, aquedutos etc. Na Biblioteca
do Rio de Janeiro existem as partes I, II, III IV . As partes V e VI,
foram doadas ao seu irmão, pai frei Gregório José Veigas, religioso da
ordem 3.a de S. Francisco . Parece que frei Gregorio Viegas fizera delas
presente a seu mestre o arcebispo do Cenáculo e que assim passaram
afinal para a Biblioteca Eborene , que o dito arcebispo fundou e dotou
com seus próprios livros. A parte 5.8 foi publicada separadamente em
1820 , por diligência do bispo d'Elvas , D. José Joaquim da Cunha
Azevedo Coutinho , cuidando da impressão Antonio Marques Giraldes ;
saira com o título “Quinta parte do tesouro descoberto no máximo
rio Amazonas ". A revista do Inst. Hist, e Geog. Brasileiro publicou
algumas partes no tomo II, págs. 325. ( A quinta parte existe na Bi
ELUCIDÁRIO DO " INFEKNO VERDE " 205

blioteca Nacional , onde foi encontrada a frase ) . da pág . 282 “ seria "
delicias dos homens etc.
POÉ 112 ( Edgar ) Escritor americano, gênio a tormentado ,
duma imginação estranha e pungente. DL. que lembraria a
Poé ... "
POJAR 230 Desembarcar. encostada á amurada e ar
dendo por pojar ... '
PONGA 163 Corruptela de gaponga “ A pesca na Amazônia "
de Jl . pg. 103, dá : o nome de gaponga , talvez fósse primitivamente
“ aponga " , barulho , ruído, som de coisa redonda a esfera , semente,
caroço , e, " pong " igual à ponga -ruído, barulho ou quiça iaponga ,
igual á igaponga , barulho nágua de coisa redonda ( igual a ; ig , água ) .
Empregam também a ga ponga na pesca da pirapitinga, belo e gos
toso peixe sara pintado , pouco menol que o tambaqui. Em Q. da
Cunha, se lê sobre a ponga ou muponga o seguinte : Suponhamos um
canico com uma linha, tendo em lugar de anzol, uma pequena bola
de osso ; eis 0 instrumento auxiliar da pesca , a que eles chamam
“ muponga ". Batem com ela incessantemente, na água, e a queda do
pequeno peso semelha a queda duma fruta. Ato contínuo poem 0
anzol nágua iscado o peixe que se aproxima, vendo -o, pega - o ,
sendo colhido . Alguns chamam de ponga , por muponga . O emigrado
cearense que facilmente deturpa as palavras em lugar de dizer :
bater com a ponga , contraiu a expressão, fundindo - a ein : bater ca
ponga , que é aliás, mais usual hoje . “ o paneiro contendo catoarys
e a ponga ... "
PONTÃO 231 Barca chata e estreita destinada a formar
por si só ou com outras, as chamadas pontes de batéis, “ ... um re
bocador arrastando um pontão ... "
PONTEDERIAS 30 Murerú ( Par, de Adauacá ) PONTEDE
RIA ROTUNDIFOLIA L. ( Pontederiaceas )99 Herva flutuante dos pa
ranás. PLC . “ . pontederias enfeitam ...!
POPUNHEIRAS 82 Guilielina Speciosa , Mart. Tronco de
12 a 18 m . de alt. com 10 a 20 cms. de diam . armado de espinhos re
gularmente espaçados ; frutos ovais ou arredondados, vermelhos
amarelos quando maduros. Madeira muito dura , preta riscada ou de
amarelo ; os indigenas fazem com ela arcos e pontas de flechas : dá
bonitas bengalas. O fruto é comestível , cozido, de gosto agradável e
muito nutritivo PLC . Qualquer roçado aberto polo incola deixa 0
sinal da reverência indigena pelo maravilhoso pomo: a popunimira
em pé . RM . umas bacabeiras e popunheiras ... "
PORFIRO 29 Espécie de mármore muito rijo , de côr verde
ou purpúrea e salpicado de manchas esbranquiçadas ou de várias
eöres. “ ... vasto conglomerado de porphyro ... "
“ PORQUEIRA " , 159 De nenhum valor. por uma “ por
queira " elle se arriscára ... 99
" PORQUINHOS ” 233 São assim chamados no trivial os
filhotes de caitetus, segundo QC . “ ... o magote de “ porquinhos " ... "
“ PORTO ” ( DE LENHA ) 83 Lugar na barranca dos rios
onde o vapor encosta ou atraca para receber lenha, deixar passageiros.
o caboclo desceu ao “ porto ” com a Rosa ... "
“ POSITIVO " 144 Com segurança , certeza soube “ po
sitivo ", do acontecido ...
“ POSITIVO " - 146 Resolutamente . “ ... depois mandou “ po
sitivo " que eu tirasse o coração della ... "
200 ELIISTA DO ARQUIVO Mathilde

* POSSE " 170 Detensão ou ocupação do imóvel , ou coisa ;


sem o título de dominio . para o despejo da “ posse
POUPA 201 Topeie que adorna a cabeça de algumas aves .
da poupa do mutum ... '
“ POVO " 169 Familia ... estabelecer -se com seu “ povo " .
PRACUÚBA 162 Trichilia le Cointei, Duck . Miliáceas. Hab.
na mata de terrenos não inundáveis. Árvore média, usada para hastes
de arpões e construção civil. “ ... a haste de pracuúba ... "
* PRAGA " 203 Abundância de carapanãs. Nos altos rios em
vez de praga , chamam de mosquitos. RM . “ ... comido de “ praga "...
“ PRATICO " 234 Piloto maritimo que conhece bem uma
determinada paragem . um marinheiro e “ pratico " na próa ... "
PREÁ 146 Roedor da família Caviídeos , Cavia aperea , que
atinge 25 a 30 cms. de comp ., côr uniforme, cinzento - bruno, tirante ao
vermelho. Vive na borda da mata, de preferência nas baixadas úmidas ,
de madrugada e a noitinha o bandinho de 6 a 15 individuos vai ao
pasto, em procura de capim delicado e não raro causa danos nas hor
tas e no arrozal novo . No nordeste come-se esse animal . No Ceará ,
denominam Préa o indivíduo que toma parte nos divertimentos
nada dispensando dos mesmos . RVI . “ . ligeiro como um preá ... "
PREGUIÇA 270 Ou “ AI” ou “ Aig " na nomenclatura indi
gena . Nome genérico que compreende várias espécies de mamíferos
desdentados, da fam . Bradypodídeos . As preguiças são animais herbi
Toros, que passam quase toda a vida sõbre as árvores, de preferência
as imbaúbas . Mas tal fòrça tem nas garras, que é impossível arrancá
la de seu pouso ; é excusado aplicar violência , crueldade , pois é pou
co sensível à dôr. RVI. À chuvinha miuda , ou à garða, o povo do Norte
se refere como sendo “ chuva de preguiça ". " uma preguiça na em
laubeira ; um tacajá que mergulnava ... "
PRENSA 60 Enorme armação de madeiras rijas. GB . “
a prensa () corno € o rodo... "
* PRESTÍSSIMOS " 278 --- ( Music . ) De pressi , muito depressa.
... na matta chiando em " prestissimos " ... >9
PRIMEVAS 260 Relativo ou pertencente aos priimeiros
tempos ou a primeira idade. viam -se estas construções pri
mévas... "
PROFUNDOU 30 Tornar mais fundo ou fazer mais fundo.
“ ... que o repassar das pacas e cotias profundou ... "
PROGNATO 199 Que tem maxilas alongadas ou proemi
mentes . " ...
no queixo prognatho ... "
* PRÓPRIO 213 Mensageiro expresso . o " próprio "
de sohrerolda topava com o Sabino ... "
PULGÕES 27 Insetos parasitários, homoptéros, que vivem
nos vegetais. " ... Anemiadas por pulgões ... ?
PUNGÊNCIA 958 Qualidade do que punge : lancinante. “ ...
para augmentar de pungencia o sacrificio do Souto ,
PUNGITIVA 271 Penetrante, agudo . unica população
regional immóvel, essa , pungitiva , extravagante ... "
PURAQUES 124 Ou peixe elétrico . Electophorus electricus.
Firm . dos Electroforiduos, por não ter escamas ser provido de
Crnos pliitritos. A calcat é muito deprimida ; a albertura anal 2cha
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 207

se logo atrás da garganta ; de colorido mais ou menos uniforme, pardo


a vermelhado em cima , mais escuro em baixo . RVI. “ .. acafelando
arraias e puraqués ... "
PURUS 202 Nasce este rio com 0 nome de Pucani , nas
serranias que separam dêle a bacia do Ccaile . É imenso , cheio de
sinuosidade sobretudo , no seu curso inferior . Mede de extensão
3.209 q . sendo assim um dos maiores rios do globo , não obstante ser
um simples afluente do Solimões. E. da Cunha chama - o de “ uma
das maiores dádivas da natureza escandalosamente perdulária ... 99
Purús, deriva - se da palavra - puru - puru, que quer dizer : pintado ; ou
de mira -puru , gente pintada. FBS. O Purús foi cartografado e descri
to por Chandles, é um modelo clássico dos rios divagantes, ricos em
sedimentos ou deritos Rev. Geogr . e Estatística ano IV , n .° 4 .
“ ... no Madeira , no Purus, no Juruá ... "
PUTRESCENTE 170 Que começa a putrefazer - se ; que está
apodrecendo . ... Da terra revolvida a caveira surgia horrível, pu
trescente ..."

“ QUADRO " 230 Lugar onde ficam fundeados os navios, aliás,


amarrados á boia, visto ser muito fundo, defronte ao roadway" de Ma
naus. I'ma hora e meia mais tarde, no “ quadro " a lancha era
sitiada ...
" QUADROS ” 60 ( No Ceará ) Espaço de terreno compreen
dendo um quadrado cujas faces tem 75 m . BJS. uns quatro
“ quadros " de roca viçosa ... "
QUARTAU 144 Cavalo, pequeno mas robusto , próprio para
carga . LM . dá como : cavalo castrado . mandar 0 pagem gellar
o quartáo ... "
“ QUARTO " 234 Serviço, que se faz de 4 em 4 horas, a
berdo ou nos quartéis, nos dias de serviço. vigiavam no “ quarto "
regulamentar ... "
“ QUEBRA DO CORPO " 208 Furtar - se a cumprir o quo
deve fazer ; negacear . “ ... o gerente tinha “ quebrado o corpo " ... "
" QUEIXADA ” 136 É a espécie maior , também , chamada.
porco do mato " Taiaçú Albirostris. Também chamada Taiassú . Atin
ge 1.10 m. de comprimento e a côr é geralmente bruno - cinzenta carac
terisa -o a faixa branca, que de cada lado da boca se extende para
trás ao longo da queixada RVI . dois pedaços de “ queixada " ...
QUICE 236 Faca pequena e velha, geralmente partida e
sem ponta . cortando - lhe previamente a carotida, com uma
quicé
QUINCONCIO 246 Plantação de árvores dispostas em xa
dres uma de cada canto e outra ao centro “ ... As redes, em quincon
rio, embaraçadas... "
QUIOBAS 137 Erro de impressão, por quiboas - Arbusto
africano, talvez da família das gramíneas, de folhas glaucas, lanceo
Jadas e alternas, flores miúdas, que representam um perianto amare
lado. LF . Encontramos entre samambaias e quiobas , rifle
desarmado ..
208 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

RABEANDO 257 66
Serpear. A água, rabeando na flo
resta ... "
RACÍMOS 224 Cachos de uvag ou de qualquer flor . Fruto
ou flor em forma de cacho de uva ... bengalas, peixes o raci
mos ... ”
“ RAID " 188 ( Angl. ) Caminhada ; marcha . os cauchei -
ros faziam “ raid ” venturoso ...
RAIMUNDO ( SÃO ) 54 Arrabalde de Manaus . de
São Raymundo ao Educandos ...
RAIZAME 154 Conjunto de muitas raízes. “ apenas os
galhos ou o raizame... "
RAPACES 2 26 Roubadores ; rapinantes . com Os seus
olhos rapaces e perfil imperativo ... "
RÁPIDO 260 Corrente impetuosa ; cachoeira dos rios “
presas a cordas, montassem o rápido.
RASANDO 104 Pôr ao nível do terreno . 66 pareciam
estrellas rasando o rio ...
“ RASGUA -MORTALHA ” 252 No Amazonas é 0 mesmo que
" Suindara " . Não sabemos explicar a origem da palavra , mas é claro
que envolve idéia de mau agouro. Seu canto equivale ao romper da fa
zenda com que se fazem as 9 mortalhas dos defuntos . OS muru
eútús, “ rasga -mortalhas" ... "
RAUCISSONA 102 Que tem som rouco. “soprou mais forts
na trompa raucísona... ”
RAZZIA 119 ( Arabismo - rhaziat ) Palavra empregada na
Argélia para designar as incursões feitas em território inimigo com
o fim de roubar os rebanhos, colheitas etc. DL . na tremenda
razzia de vingança ...
REBOJOS 154 Espumarada que a água faz no mar e nos
rios ; sorvedouro que se forma nos rios pelo encontro das águas vivas
com as mortas, perigoso á navegação fluvial. A RABL, vol . 102. hras.
dá como : “torvelinho das águas de um rio encachoeirado. “ sacu
didos pelos rebojos... "
REBOLADAS 178 Área ocupada por uma só espécie do
plantas nativas ; touça. 66 vencida uma rebolada de buritys... "
REBOLCA Lançar ; rolar ; fazer rebolar. “ que a re
bolca ao mesmo antro ...
RECHINO 251 Produzir som estridulo e áspero . “ ... tro
pear de patas e rechinos ...
RECIPENDIÁRIO 53 Que tem de receber qualquer coisa .
... mandou desafogado que o novo recipendiário sahisse ... "
REFÊGO 275 Moita ., “ ... abalaram para o refêgo dos ar
búsculos... "
REGATOES 96 Embarcação de comércio ambulante . Galeo
ta , maior que a igarité, de tolda corrida, com um compartimento
fechado á popa . É tirada a remo de faia por dois tripulantes. Proprie
dade hoje, do turco. já do hebraico e do português. Trafega em toda.
ELUCIDÁRIO DO " INFERNO VERDE " 209

a Amazônia , vendendo artigo de estiva e artigos de armarinhos. Há,


no seu bôjo, desde o jabá, a conserva etc. Chamam indiferentemente
de regatão ao dono e a galeota . RM . “ Os regatões, que nas suas
Agarités e galeotas..."
REGOUGO 52 Gritar como a raposa ; falar com voz áspera
como a da raposa . era o regougo dos guaribas... "
“ RE IKÉ RE UAPYRÁ ” 126 Entre e sente - se . Falou
a abominável creatura ... " ( Ver “ MÀHATA REMUNHÃ ” etc ) .
REMANSOS 154 Porção de água estagnada ou que não99
tem movimento sensível ; paragem . retidos á flôr dos remansos ...
REMEDIOS 54 (Igreja de Nossa Senhora dos ) . Igreja
na praça do mesmo nome, em Manaus. “ da Matriz e dos Remedios ... "
REPIQUETE 153 Pequena enchente, parcial e rápida, nos
-rios amazônicos. Diz Angione Costa ser o nome dado á volta das águas ,
produzidas pelo degelo e pelas chuvas que caem nas nascente dos
afluentes dos rios centrais da Amazônia . Quando ele chega, o leito
dos rios, que estavam vazios se enchem de súbito e imediatamente,
os navios que haviam chegado no outro repiquete e achavam - se enca
lhados , descem na correnteza , R. Morais, dá como primeiras mani
festações anuais das cheias. Sinais de enchentes, acima do estuário
amazónico, onde não predomina a fôrça da maré atlántica .
o repiiuete da cheia annuncia -se sem estrépito ... "
REPROBOS 200 Condenados; detestados. “ guardando
99
dous réprobos ...
RESMONEEI 103 mesmo que resmungar : pronunciar
eonfusamente entre os dentes com mau humor . resmoneei
no travo do contra -teinpo ... "
RESSONO 252 Ato ou efeito de ressonar ; sono profundo e
prolongado. em resomno, na dormência da vasta noite ...
RESSICADO 152 Falto de umidade ; ressequido . mas
alto d'ellas tudo ressicado ...
RESTINGA 35 Pequena porção de mato nas margens de
um arroio . “ a lombada de uma restina imperceptivelmente mais
alta ... "
RESUPINO 67 Voltido para cima ; deitado de costas
encontraran o Catolé resupino ... "
RETOUÇAVAM 156 Brincar; correr brincando. espoja
vam - se ou retougavam por sobre as covas apagadas... "
RETRANCA 97 Vara de abrir a vela da jangada . “
esperando il prisão da retranca .
NICADA 239 Ericar ou encrespar . “ da graúna preludiando ,
ricada , numa jaulasinha ... "
RIOZINHO DA LIBERDADE 07 - VÚ Afluente do
médio Juruá , pela margem direita . AE . em fins de Julho come
cariam os vapores a avançar do Risonho da Liberdade para cima ... "
RIPA 154 Pedaço de madeira, estreito e comprido; sarrafo .
" ... em couceiras, ripas e pranchões ... "
NITORNELOS 255 Estribilho ; espécie de prelúdio pouco
extenso que se repete algumas vezes no fim ou mesmo no meio de uma
eomposição musical, e que The fixa o caráter, servindo para o tornar
lembrado . “ ... nos seus langorosos ritornellos ...
210 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

“ ROÇADÃO ” 89 Primeiro trabalho que se faz nas terras


para poderem ser cultivadas. ... elle tinha um “ roçadão " a encoi
varar ...
“ ROCEGA ” 205 Fandango ; dança . ... grande número de
freguezes enchia a sala maior do barracão para a “ rocegà " ... "
RODO 60 Utencílio de madeira com que se puxa a cinza
do forno “ o forno e o rodo ... "
ROLA CABOCLA 97 ( Pomba cabocla ) Ord. das Columbi
formes Fam . Peristerideos, GC . a vela mudou -se de súbito no
arqueio de papo duma rola cabocla .
ROREJANTE 136 Transudante ; que traz ou leva orvalho.
“ ... A matta rorejante...
ROSTRADOS 91 Que tem esporões ou bico. Que se parece
com um esporão falando dos nectários, corolas etc. “ .. No alto ros
trado as arvores da queimada ... '
RUBENESCA 194 - Meio vermelho . “ ... no collo da rube
nesca Doca ... "
RUBENS 180 ( Pierre Paul ) Pintor alemão , nascido em
Siengen ( Prússia Renânia ) autor de numerosos quadros nos quais
sobressaem a fecundidade de sua imaginação, a energia de seu dese
nho, a ousadia e graça de seu pincel, o poder e brilho de seu colorido .
DL. ' nesse quente colorido linhas opulentas de uma nayade de
Rubens ...
RUI 119 ( Vaz de Siqueira ) Sucedeu a D. Pedro de Melo ,
Toma posse do cargo de Governador e capitão- general do Maranhão ,
em 1662. Foi quem determinou a expedição em 1664 contra os índios
Burururús, Guadavênas e Cabouquenas, habitantes das margens do
rio Urubu, sob o comando de Cap . Pedro da Costa Favella . F.B.S. na
tremenda razzia de vingança por um certo governador Ruy Vaz de
Siqueira ...

SABATTO 277 Hebraico , Shabbat . Repouso sagrado que, se


gundo a lei de Moisés, os judeus deviam guardar no sétimo dia da
semana, consagrado a Deus ; assembléia noturna de feiticeiros e feiti.
ceiras, que, numa supertição popular, se realizava , à meia noite de sá
bado , sob a presidência de Satanás . “ ... a meio de alguma noite de
prodigios, para festões de um sabbato ..."
“ SABIDO " 237 Advogado , bacharel, sujeito da cidade. “ ..
moço “ sabido " sério, de que muito se fallava ... "
SABORIDOS 122 Saborosos. “ ... Saboridos á appetencia
dos peixe -bois... "
“ SACADOS " 247 Braço morto de um rio . Secionamento de
uma península fluvial pelo istmo . O caudal, depois de passar num
ponto dá uma, duas, três voltas e vem passar em sentido contrário ,
renteando a mesma margem . Quando sucede fazer - se enseada nos dois
lados do istmo, a água corre, fura a terra, abandonando o caminho
velho , fica morto como um lago e abre passagem nova . Em geral -- os
rios mais “ sacados " são os rios de água preta , de menor velocidade.
RM . " na mesma faina de vencer praias, estirões e " sacados " ... "
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE ” 211

SALTEANDO 258 Assaltando . “ Salteando os passageiros,


os galhos das articulosas tabocas...
SALTIGRADO 253 Que caminha saltando . “ ... O magote
saltigrado e estentorico dos símios ... "
SAMAUMEIRA 139 Ceiba pentandra , Gaertn . Bombáceas.
Hab . nas florestas inundadas ou pantanosas das várzeas e também na
terra firme alta, com solo argiloso, fértil . Árvore gigantesca , com enor
mes sapopembas . As sementes são envoltas em paina alva ou parda
centa, muito leve e elástica, que constitui o “ Kapok” de Java, cujas
propriedades hidrofugas são utilizadas na confecção de salva - vidas.
Aguenta 30 a 35 vêzes seu pêso nágua . Os toros da raíz descoberta
na margem dos riachos secos em tempo de verão, dão água potável
excelente . PLC . Diz RM . ser gigantesca , copa formidável, galhos ho
rizontais; também ela prendeu a atenção ( do aborigene) , não só pela
finíssima sêda loira que desprendia da frança, como pela umbela des
comunal, sempre superior . por cima da linha da floresta, à feição de
chapéus de sol verdes abertos por deuses autóctenes . uma sa
maueira se elevava para alem, das copas verdes ... "
SANGRADOURO 211 o local apropriado para se praticar
a sangria . “ ... dessangrando por fino sangradouro ... "
“ SANGRANDO AS MADEIRAS” 207 Sangrar : primeiros gol
pes que o seringueiro dá nas árvores antes de colher o leite. Madeira :
árvore . Designação que o seringueiro dá a hévea . Só cortei hoje 50
" madeiras ” . A seringueira antes de principiar a produzir, é sangrada
diariamente , para acostumar . Vou principiar a cortar amanhã . A es
trada já está sangrada . RM . queria estar "sangrando as ma
deiras "
SANGUISSEDENTAS 277 Que tem sêde de sangue ; que é
sanguinário . mutúcas pretas, sanguisedentas... "
SÃO PEDRO 82 Igarapé que deságua pela margem esquerda
no rio Acre. AB . e , para baixo, o S. Pedro , a barranca verme
lhaça do Bararua ..
SAPÉ -MIRIM 122 Nome de várias plantas da família das
gramíneas. Andropogon Bicorne péssima forragem . PLC . 66 caire
lado de uaupés, mururés, sapé -mirim ... "
SÁPIDOS 95 Que tem sabor ; saboroso. “ Os uxys 6
umarys de fructos rápidos ... "
SAPO -CURURU 131 Nome genérico dos sapos em tupi-gua
raní . De Pernambuco ao Ceará designa especialmente o gênero bufo
RVI... qual um sapo cururú á borda do paúl... "
SAPOPEMBAS 139 Raízes que se desenvolvem com o tron
co de muitas árvores formando em volta delas divisões achatadas...
áquele monstro calçado de sapopembas... "
66
SAPOTÁCEA 164 Relativo a sapota ou semelhante.
Da sapotacea restava afinal bem pouco ... "
SAPUCAIA 170 Lecythis Paraensis, Hubert . ( Lectidáceas . )
Hab . Várzeas do Baixo Amazonas. O fruto (ouriço ) é uma cápsula
lenhosa quasi esférica. de 18 a 22 cms. de diâmetro, fechado por uma
tampa deiscente ; contém de 35 a 40 nozes cujas amêndoas são co
mestíveis, muito apreciadas . Diz G. Soares que a sapucaia perde a
folha ao tempo da florescência e cobre-se de tantas flor amarela que
se não vê o tronco, nem galhos ; o mesmo sucedendo a embaúba, ao
pau d'arco e outras árvores. pelo enorme tronco de uma sa
pucaia ...'
212 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

SARACÁ 118 O lago Saracá fica a 9 léguas distante do


Amazonas, no qual deságua por seis diferentes boca ou cuais. No
canal chamado Arautó deságua o famoso rio lrubu . FBS . * inas
no entrefolho do lago de Saracá ..."
SARARÁ 162 Diz J. Vérissimo ser do tupi - guarani, verbo
sara - desatar a corda , desprender , soltar, e o seu frequentativo
rarà formando o gerúndio, o que se desenrola , desenrolando . Daí a
arma sararacá. Quintino Cunha, dá como sendo uma flecha especial
de flechar uirarás, e ser um instrumento auxiliar da pesca. É , pois,
possível, seja mais um erro de impressão . Nome de uma formiga de
asas, avermelhadas , que enxameia á luz, nos dias de sol, depois das
chuvas. Teodoro Sampaio diz ser corrutela de içá rará a formiga
solta em quantidade. uma sarará e uma flecha de " gommo " ...
SCHERZO 253 Ou Scherzando Expressão musical indi
cando que um pedaço deve ser alegre e vivo. concertando um
scherzo ... "
SCHUMANIANOS 252 Melodias á maneira de Schumann,
Acentos schumannianos... "
SCINTILAS - 83 Faisca, centelha. 64 ... a faixa tremula de
reflexos scintillas ...
SEDENTARISAVA 187 Que se exercita pouco ou anda
pouco ; inatividade . “ ... Na sociedade que se sedentarisava ...'
SEPIA 76 Substância escura , que se estrai das sibas e
é muito aplicada em pintura. Siba : gênero de moluscos celalóides de
que é tipo-a siba ou choco ordinário em cujo corpo se contém
o Osso calcáreo chanrado osso da siba, ou simplesmente, siba , que
reduzido a pó é um excelente dentrificio . São moluscos destes gêne
ros que segregam a tinta conhecida nas artes pelo nome de sépia .
Para se encobrir do adversário , no mar, obscurece a área em que se
encontra com a secreção avermelhada de que lança na água .
numa tinta forte se sépia ... "
SEQUIDÃO 152 O mesmo que secura ; enxuto . ao pé da
sequidão das lezirias... "
“ SEREIA " 209 Aparelho em que o vapor ou ar compri
mido produz um som grave ou estridenie, e que serve nas locomotivas
ou navios para dar alarma. “ ... Um apito roncante de “ sereia " ecoou
sinistro ... "
SERIA “ delícias dos homens, regalo da vida e inveja do mundo "
2 S2 Foi autor desta frase o frei jesuita João Daniel, que a es
creveu a pg. VI da Introdução á 5.a parte de seu livro " Tesouro des
coberto no máximo rio Amazonas ” , em Lisboa, no ano 1797. " ... He
certo que muitos tem já enriquecido aquelas terras, assim com esta
rem prutas e incultas; mas também he certo que se no princípio da
sua povoação pelos Europeos entrassem logo a ser mais cultivadas
seria hoje, “ delicias " dos homens, etc ... "
SERINGARANA - 44 -- () mesmo que murupita . Sapium Mar
miere, Hubert. Euforbiaceas. Sin ; Tapuru . O látex da borracha dá
boa qualidade . Mistura-se ao da hevea . PLC , “ .. barrigudas e serin
garanas nas visinhanças... "
SERINGUEIRO 177 Assim se chama o homem que extraí
o “ latex " da seringa , preparando - o para que se torne a borracha .
Colocados os “ seringueiros” pelos “ mateiros " nos diferentes centros
quando já são velhos fregueses do seringal, tomam conta das “ estra
das ". Em maio ou junho de cada ano, no início do verão , começam
a " sangrar " as árvores, isto é , a golpea -las. Os seus instrumentos são :
BLUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDR " 213

a machadinha de cabo comprido , o balde, o boião, a bacia e as tije


linhas. Em primeiro lugar “ entigela ” a " estrada " , isto é, dispõe ao
pé das seringueiras as tijelinhas, a serem embutidas, e começa no dia
seguinte a “ cortar” a “ estrada " . Feita a “ arreação" , um dia depois
começa a recolher no balde o leite das tijeelinhas, a fazer a " côlha " ,
a colheita, e depois a fabricação da borracha, que se realiza no “ defu
mador " ou “ fumaceira " , pequeno papiri , isto é, pequena barraca .
Despeja o leite na bacia , acende o boião, defuma o leite , fábrica a
" pele " , “ bola " dando - lhe uma forma arredondada , imprime
The sua “ marca ", picada ou impressa ", mandando -a afinal pelos “ com
boios " para a “ margem ” onde é entregue ao patrão , que lhe paga o ser
viço em relação a quantidade do " fábrico " . Os seringueiros são ás
vêzes denominados “ machadinhos ” em alusão ao instrumento que
usam . Não raro se ouve a distinção dos seringuais pelo número de
" machadinhos " que nêles trabalham : há de 50 , 100 , 200 , 300 , ma
chadinhos. Ainda mais ; em certas partes da Amazônia chama -se
“ apanhador ” ao seringueiro BJS. E. da Cunha, define assim ao fre
guês junjido à gleba das “ estradas : " " seringueiro realiza uma tre
menda anomalla : é o homem que trabalha para escravisar - se .
Não ha seringueiro, por assim dizer, que não possua um rifle ...
SERINGUÍFERO 262 Onde existem seringueiras ; que pro
duz seringa . “ ... no fundo lobrego desse igarapé seringuifero ... "
SETTLER 282 ( Angl . ) Povoador ; estrangeiro . “ ... ondo
foi o abarracamento provisorio do “ settler ” .
SFOGATOS 252 ( Mus. ) Diz -se do soprano agudo cuja ex
tensão de voz abrange mais de duas oitavas. song rоuc03
sfogatos ... "
SILOGISMO 251 Argumento composto de três têrmos que
formam combinadamente três proposições, das quais a terceira se
deduz da primeira por intermédio da segunda ... a premissa de
um syllogismo embotou -se num ronco ..
SILVES 118 Vila situada ao lado oriental do lago dôste
nome, numa ilha, antigamente, denominada Saracá . Foi fundada por
um mercenário que acompanhou o Cap . Pedro da Costa Favella , no
grande morticinio praticado aos indígenas do rio Urubu, no século
XVI ... " ... do lago de Saraca , ao pé de Silves..."
SINERGICO 165 Relativo a sinergia : ato ou esfôrço simul
tâneo de diversos órgãos ou músculos, na realização de uma função.
inseparavel na republica dos embriões, synergicos ...
SINUSOIDAL 124 Relativo a sinusoide : Curva de máxima
e minima constantes, representativa da função seno . recurvado ,
sinusoidal e escapadiço ... "
SIPIBOS 186 Tribo do Ucaiali . Começou a ser catequizada
em 1615. Em 1736. derrotaram em sangrenta batalha os Setebos.
Inimiga uma da outra , só em 1764 , puderam os franciscanos recon
cilia - las, e então, fundaram com estes índios uma povoação no rio
Pisque; mas ao cabo de 5 anos assassinaram a todos os missionários
que ali existiam . Depois dêsse fatal acontecimento só o padre Girbal
os visitou em 1790. JWM . Transportava -se no comboio de ubás,
repletas de seus indios Sipibos e Conibos ... "
SIRGA 269 Processo por que as canôas e batelões navegam
no Amazonas no tempo da vazante . Amarra - se á prôa uma linha de
barca ou cabo fino e os tripulantes, correndo pela praia , rebocam a
embarcação, que é guiada pelo piloto á popa , no jacuman ou no
leme . RM . " as areias das praias favoráveis á sirga .
214 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

SISIFO 92 Filho de Eolo, rei de Corinto , temível pelas ex


torsões e crueldades, é condenado depois de sua morte, a rolar nos
infernos uma grande pedra ao cume de uma montanha donde ela
cai sem cessar . " ... sua luta é de um Sysipho invertido ..."
SÍTIOS 100 Termo usado no Brasil para designar um esta
belecimento agrícola destinado a paquena lavoura, nas vizinhanças
das cidades . a sucessão das moradias, fazendas ou pequenos
bitios..."
“ SITUAÇÃO ” 160 Pequena fazenda de criação . LM . “ ... bem
sabia não valer nada sua “ situação " ..."
SMORZANDO 32 Termo musical italiano, significa : enfra
quecendo. em smorzando delicadíssimo..."
SOBREROLDA 213 O mesmo que sobreronda ; vigiar.
o " proprio " de sobrerolda com o Sabino... "
SOCA 183 A segunda produção das gramíneas, especial
mente da cana de açúcar, depois de cortada a primeira. no en
genho de moer a canna das sócas annuaes ...
SOCALCOS 36 Porção de terreno em um monte , em en
costa . “ ... semn alcantis ou socálcos ... "
SOCOROS 121 ( Prainha ) Mouriria ulei, Piig. (Melastoma
ceas ) . Árvore grande . Sin : Sorocozeiro, Apiranga (Obidos) Murteiro .
Madeira , muito dura PLC . “ ... Ramos de cacaoranas e socorós ... "
SOLERTE 142 Velhaco ; astuto . " ... E continuou num so- ,
lerte desabafo ... "
SOLHA 231 Peixe do mar da ordem dos Heterosomata , co
nhecido por " Linguaidos ” com os quais se parecem . Pertencem á fami
lia dos Solídeos . São peixes muito apreciados pelo fino sabor da car
ne., pelo que se lhes perdoa o aspecto pouco simpático da fisionomia
repelente de cara torta e repuxada RVI . " de um pequeno “ gaiola "
torto, feito uma sõlha ... "
SOLIMÕES ( Rio ) 154 Nome dado ao trecho do Amazônas
que medeia entre a foz do rio Negro e a fronteira de Tabatinga . Uns
pensam como La Condamine, que esse nome provém das flechas
intoxicadas do selvagem , e que significa rio dos venenos . Outros,
que ele se origina das frotas de Salomão que andaram por aqui em
busca de ouro, prata, cedro, macaco, pavão e que reproduz, num
eco biblico , o nome do rei sábio, ilustre e amoroso, que não só espan
tava a rainha de Sabá com sentenças maravilhosas, como cantava ,
nos Cânticos a graça e a beleza da infortunada Sulamita , RM. *
que escapamás balsas no Solimões... "
SOLVADO 203 De quites . “ .. Com a situação que se lhe
offerecia, de solvado o seu pobre coração renascia ..."
SOMBROSAS 123 · Veladas. RABL . , vol. 4 , bras . “ ... aquella
paragens, sombrosas e feraes ..."
SOPESADAS 179 Sustentar o pêso de : arreava de
vergonteas, sopesadas da carga dos fructos ... "
SOPRESADO 170 Apresar, apanhar ou tomar de assalto .
46" ... um trecho do seu sitio sopresado.

SORNO 128 66
Vagaroso " o furo " sôrno e retorcido na
matta ...
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 215

SORRELFA ( á) 213 Dissimuladamente; sorrateiramente .


“ ... encontrava o indiciado e, á sorrelfa, bispava alguma coisa ... "
SOSTREIRA 130 Suja ; enxovalhada . “ ... mas essa harpia
hydropica e sostreira ... "
“ STEEPLE - CHASE " 137 ( Angl . ) Carreira em linha reta .
66
... temivel corredor de " steeple - chase ” ...
SUÇUARANAS 59 Ou onça parda Felix concolor . É um
dos poucos felinos unicolores, como o gato mourisco. Atinge de com
primento 1,20 de corpo além da cauda de 65 cms, regula de altura
em geral 60 a 65 cnis. O peio curl , i amarelo vermeiho - queimado,
mais escuro. no dorso, amarelo - claro na parte ventral ; o peito, a gar
ganta o lado interno das extremidades são bracacentas, bem assim
algumas regiões da cara ; diante dos olhos nota -se uma mancha escu
ra RVI . Interessante é o seguinte conto , muito conhecido que lhe deu
o Visc . de Taunay ( Silvin Dinarte, 1879 ) e ao que parece baseado no
nosso folclore : “Certa vez, por uma dúvida qualquer, a araponga desa
fiou a onça para um duélo singular : venceria quem gritasse mais forte
e assim assustasse o outro . A onça começou e, com urros retumbantes
e medonhos, fez tremer as arvores e afugentou toda a bicharada
a araponga, fingindo valentia, nem piscou . Por sua vez o passaro teve
de se exibir . Mas começou e muito calmamente a fazer soar notas
plangentes, semelhantes á do aço tangido de leve pelo martelo e
tão suaves pareceram a onça aqueles sons harmoniosos, que ela bai
xou a cabeça, fechou os olhos e cochilou . Era o que a araponga queria
bruscamente sua voz mudou e um guincho estridente fez a onça
acordar, sobresaltada . Foi assim que a araponga venceu " . RVI. “
onde se acoitam as sussuaranas ...
SUCURIJÚS 123 Espécie de cobra grande do Brasil, Euneg
tes Murinus, L. , que atinge 10 m . de comprimento . Teodoro Sampaio
diz : " que atira o bote rápido " . " Serpente aquática que nada bem " .
" ... Sucurijús ennoveladas nos troncos... "
SULFÚREA 234 Que tem a natureza do enxofre , que tem
o cheiro do enxofre. " Fuzilou um raio, que varreu de luz sul
phurea as maisens.
SULLY 100 (Maxilliano de Bethune, duque de ) Barão de
Rosny, ministro e amigo de Henrique IV. Protestante, depois de
ter combatido ao lado de Henrique IV, tornou-se seu ministro e con
selheiro. Administrou as finanças com economia e protejeu a agri
cultura . DL . “ . soldado e financeiro que se chamou Sully ... "
SURUCUVACO 163 Parece ser o surucuá, de fam. dos Fro
gonideos. seg . G. Cruls. Ave. LF . .. perto um surucuvaco costu
mava em poleirar-se .
SURURINAS 121 Ave amazônica da mesma família dos
inhambus . Crypturus soui, de cor bruno -amarelada , quasi unicolor,
mais clara no lado ventral e com garganta alva. Na Bahia, diz o
povo, que o seu canto , marca as horas , RVI . Sururinas
macucavas piavam ... "
SUSPICAZ 216 Desconfiado ; suspeitoso . “ ... Zé Magro
seguia pensativo e suspicaz, á caça da seringueira phenomenal... "
1
216 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

TABACAL 128 Terreno plantado de tabaco “ capa


van os brotos ao parco tabacal... "
TABATINGA 105 Argila , geralmente branca e , às vezes
de outras côres, mole, untuosa , sedimentares com alguma porção do
materia orgânica . nuin montículo escorregadio de tabatingit ... "
TÁBIDO 40 Podre ; em que há podridão. “ ... que esse
buraco tábido... "
TABOCAL 176 Terreno onde nascem tabocas ; taquaral.
pareciam faiscas de tabocal incendiado ... "
TABOLEIRO 151 Praia alta, às vezes, renteando a terra ,
ás vezes, isolada a meio rio, onde desovam as tartarugas. Destes ta
boleiros de areia da Amazônia , fala R. Morais em “ Cartas da Flo
resta " , nesses termos : É quando começa a vida intensa dos ia bolei
ros, que os isolados no largo constituidos de areia fina e alva , prin
cipiam a surgir como colinas encantadas no meio dos rios. Nus de ár
voredo, sem um fio de capim , sem uma palma, sem uma folha que
lhes quebre a serena quietude lembram enormes tumbas de gigantes
inhumados no caudal. " ... Praias em taboleiro enormes , propicias à
desova ... ”
TACANICA 106 Viga que, da cumieira , vai ao canto for
mado pela lateral com a frente ( fachada ) nas casas com telhados
de quatro águas, e que, naqueles corretamente executados deve
fazer um ângulo de 135 graus. RABL. vol. 118. Lanço de trihado
que cobre os lados do edificio . “ ... contiguo a uma tacaniça ... "
TAIOBAS 82 XANTOSOMA SIGITTIFOLIUM , Se ? ott. Ará
ceas. Sin : Taro, Mangarito . Nizomni comestível cozido ; as folhas novas
substituem as Coures Inferior ao verd :ideiro taro ( Inhame branco )
PLC . algumas touças de tuyobas ... "
TAJAS 82 CALADIUM BICOLOR . ( Aroideas ) . Grandes fö
lhas manchadas de branco e de vermelho , algumas vezes quase compie
tamente brancas ou rosa pálidi , PLC " . algumas ivuças de layobis
e tajág ..."
TALOFITAS 38 De taldiito . Plania critogâmica sem caule,
nem folhas. esse resto d'água gosmenta e de tallophytas ..
TALUDE 34 Inclinação na superficie lateral de un terreno,
de um muro ou de qualquer obra , escarpa . “ ... qual o talude
rior de para peito ..."
TALVEGUE 124 Linha sinuosa no fundo do vale por onde
correm as águas. “ ... pela chanfradura do th : lvegue recurrido ...
“ TAMBO " 186 Barracão ; casa campestre, arm : zem , b ) * 60 .
GC . de un " tanıbo " no Pischis ... "
TAMPURUPARÁ 121 Familia B [ 'CUOXIDEOS. Gênero 10 .
NASA . Em geral cinzentos, cor de rato, com bico vermelho e alguns
enfeites brancos na fronte e nas asas. Diz Barbosa Rodrigues (Poran
duba pg . 201 ) “ Quando os japiins em bando, atravessam espaco ,
ouvindo o tamburupará cantar, abatem o vôo e caem todos com medo
déle, como mais de uma vez vi." Os índios explicam o fato pela se
guinte lenda , colhida pelo mesmo autor : “ Os ja piins caçoam muito
dos outros, principalmente de mim , disse o tucano ; êles também ar
remedam teu canto , tampurupari. Quando eu os ouvir, tucano , ar
medar meu ( anto, mata - los - e ! O tamburupa å vuviu depois os japiins
Balsas

Fabricantes de farinha no Nordeste

( Clichês cedidos pela “ Revista


brasileira de Geografia " )
1
ELICIDÁRIO DO " ISFEINO VERDE " 217

arremedá - lo . Matou o avô dêles. Depois disse aos filhos : " olhem par
êste meu bico" , isto, é sangue do avó de voces. “ Por isso, diz ainda
o povo, os japiins que arremedam o canto de todos os pássaros, não
imitam a voz do tamburupará. RVI . um tamburupará somno
lento ... "
TAMISADA 36 Depurada ; peneirada . “ .. tamisada , na
parte enxuta ..."
TÂNTALO 152 --Filho de Júpiter e de uma ninfa chamada
Plota . Para fazer prova de quanto podiam os deuses que uma vez
vieram à sua casa , lhes apresentou por ceia os membros de seu filho
Pelops, e Júpiter condenou este cruel a uma fome e sêde perpétuas .
Mercúrio o atou com cadeias, e o meteu até a ponta da barha no meio
de um lago nos Infernos, e lhe pôs junto da bôca um ramo carregado
de frutos, o qual se levantava todas as vezes que dêle queria comer, o
a água se retirava se acaso queria dela beber . Dahi se supli
car a terra tal um Tantalo ...
TAPERIBAZEIRO 77 SPONDIAS LUTEA , L. (Anacardia
ceas ) . Sin : Cajá ou cajázeiro . Hab . na várzea e na terra firme argi
losa. Fruto ovoide, da grossura de uma pequena ameixa amarelo,
perfumado, ácido, de sabor agradável, próprio para limonadas, cor
vetes . () decôto das flores é útil nas oftalmias e laringites. PLC .
Um taperebaseiro encoifado... "
TAPERIS 135 Cabana ; choga . ... chuva forte com trovo
adas alagára os taperys...
TIPIIRA 82 Lago tributário do rio Purus, da hargem
direita . Ha , outro com o mesmo nome ; tributário da margem esquer
da do Nhamunda , entre os rios Negro e Japurá . AB . " o Iranduba , o
Tapihyra ... "
TAPIÚ 31 Nome de várias vespas sociais grandes , cuja
picada é muito temida. Diz-se igualmente, “ Tapiúcaba ". Seu ninho, é
mais ou menos semelhante a um cupim arboreo, alcanca grandes di
mensões . RVI. " ou a tapiú com seu ferrão de brasa ... "
TAPUIO 45 Indígena já domesticado da Amazônia . RABL .,
vol. 5 , bras . Alencar dá : como significando : bárbaro , inimigo . De
taba aldeia ; e puir fugir ; os fugitivos da aldeia . “ ... do ,
elemento tapuyo ... "
“ TAPURU " 203 Ou Murupita , Pau de bicho , burra de
leite, seringarana. SAPIUM BIGLANDULOSUM , var. AUCUPARIUM ,
Mull . “ Arg . ( Euforbiaceas ) . Hab . nas várzeas . O latex dá borracha ,
-de hoa qualidade ( mistura - se ao da hévea ) . Madeira leve, branca . PLC .
Afóra um pouco de ta purú... "
TAQUARIS 79 --- MABEA ANGUSTIFOLIA , Benth . (Euforbia
eas ) e MABEA TAQUARY, Aubl . Nas capoeiras secas de Obidos . As
sementes são oleaginosas ; o óleo extraído é amarelo, inodoro, muito
sicativo. Os renovos são ôcos e tem 6. os nós muito espaçados, servem
para canudos de cachimbos . PLC . taxygeiros, embaúbas e ta
quarys ... "
TARDIGRADO 153 Que caminha lentamente ; que anda
de vagar. “ . mas a tardigrada , a custo, seguia ... "
TARIMBA 173 Vida de quartél; vida de soldado .
estreito circulo de tarimba ... "
TARUMA 67 É uma das mais lindas cachoeiras do rio
Negro , fica a 4 léguas pouco mais ou menos de Manaus. Domina
oma ribanceira , formada de pedras ; tem oito braças em sua queda
218 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

e a correnteza é de 4 milhas. É formada por um verdadeiro parale


logramo tão simétrico, que parece obra esmerada da mão do homem,
do que produto da natureza. As margens são ornadas de majesto
sos arvoredos e o fundo da cachoeira é todo como matizado de pe
dras delicadas. A pancada é tão forte que se chega a ouvir na distân
cia de 2 léguas e o nevoeiro que se desprende das águas, refletido
pelos raios do sol , forma um dos mais lindos e deslumbrantes pano
ramas. Em Manaus é conhecida por “ Cachoeira Grande" para se
diferençar da outra mais próxima da cidade e a que dão o nome de
“ Cachoeirinha ” . É um sítio do tradicionais recorris;des para os habi
tantes do lugar . FBS . “ da cachoeirinha do Taruman para o iga
rapé Grande ... " 62 Cemitério de Manaus . “ ... o corpo algido
foi em caminho do Taruman ... 99
TATUCABA 261 Ou vespa tatu ou cabatatu , ou simples
mente " tatu " vespa social . Na Amazônia é o mesmo que cabatatú .
SYNOECA CYANEA , de 24 mms. de comprimento, azul-metálica ,
com asas brunas e algum desenho avermelhado na cabeça. A cons-
trução do ninho tem forma de casco de tatu , preso ao tronco de
uma árvore ; essa casca semelhante a papelão grosseiro, é toda ondu
lada, rugosa. No interior ficam resguardadas as células diretamente
ao tronco . São vespas temidas pela dôr que ocasiona a ferroada e
pela braveza com que atacam . RVI. “ ou da casa d'uma tatúca
ba ...
TAUARI 88 COURATARY TAUARY, Berg. ( Lecitidáceas ) ou
pau d'arco do Ceará , e COURATARI GUIANENSIS, Mart. Quase bran
ca no alburno , indo avermelhando para o centro. Com o liber da
casca os indígenas preparam folhas delgadas que substituem o papel
para cigarros. Diz Q. Cunha, ser indispensável na pagelança o seu
uso, e, ser inspirador por excelência. “ ... do cigarro enrolado em .
tauary ...
“ TAURINAS" 207 Pílulas para combater os males do fi
gado . “ ... pillulas “ carapanans ” e “ taurinas ” ... '
TAXIZEIROS 79 TRIPLARIS SCHOMBURGKIANA , Benth ..
( Poligonáceas ) . Hab Várzeas altas, com solo de argila fértil do Alto
Amazônas. Folhas largas. PLC . As flores lembram hortências e de
coram profusamente as margens do baixo Amazônas , em julho 0
agosto. RM . as jurubebas e taxyseiros e embaúbas ... "
TEATRO 54 Edifício monumental de Manaus, chamado
Teatro Amazonas, notável pela sua cúpula e decorações interiores
" ... E ' o segundo do Brasil, foi inaugurado em Dezembro de 1897 ,
Sua construção data de 1884, cujo desenho é de autoria de Bernardo
Antonio de Oliveira. O “ plafond” traz representado 4 alegorias a Mir
sica, á Dansa , á Tragedia e a Carlos Gomes, Possue 29 candelabros de
cristal de Veneza . A rosacea é toda de bronze e foi executada na Eu
ropa . Quasi todas as pinturas são de motivos amazônicos . Aquelas fin
gindo alto relevo são de autoria de Crispim do Amaral. Notaveis com
panhias de opera nele se fizeram ouvir. dos Remedios e da cu
pula do Teatro ...
TEIRO 162 Teima ; rixa. " ... aguardava o resultado do
teiro ... "
TELHA-VĂ 51 Telhado sem fôrro . todo em telha
van ... "
TEMPESTUADO 235 Agitar
90 -se violentamente ; estrondear .
“ ... O Amazonas tempestuado ...
TERÇADO - 61 Espada de fôlha larga e curta ( facão )
e tomava do terçado ... "
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VEIDE " 219

“ TERNA CAÍDA " 89 - A famosa " terra caída " dos geógra
fos inexpertos, não é uma determinante geral de erosão ; nem se efe
tiva e aparece em todos os pontos da planície, mas só e exclusiva
mente onde flui o Canal. Os que observaram com ligeireza o caso na
Amazônia não viram o motivo desses esboroamentos de taludes, a ra
zão da água roer e desmoronar as ribanceiras, o afundamento, enfim ,
da “ terra caída " que é o Canal . Sómente quando ele lambe a orla
ribeirinha com sua lingua demolidora , carregada de detritos sede
mentícios, de massa aluvionária proveniente dágua branca ( nos rios de
de água preta e verde não existe o fenômeno ) é que se remarca o fato
singularíssimo da margem naufragar com o nome de “ terra caída " . O
Canal é o agente, único responsável pelo desastre . Sem êle todas as
beiradas amazônicas permaneriam se dilatando, se estendendo , se am
pliando numa perene conquista geológica, numa vasta projeção telu
rica, dentro de cujas linhas construtoras em breve a planície teria en
xotado de seu colo tôda a água mediterrânea . RM . " ... Ha de ser
“ terra cahida "
“TERRA FIRME ” . 41 Ou simplesmente, “ firmes " , têrmo da
Amazônia , nomeia os terrenos altos onde não chegam as águas das
enchentes. BJS. “ ... abalaram da “ terra firme” para as " feitorias" ... "
“ TERRA PRETA " 155 Cemitério . Na Amazônia , assim se
designa “ o terreno em que se encontram fragmentos de cerâmica in
dígena e onde deve ter sido aldeiamento de selvícolas . BJS . “ ... nesse
quadro de " terra preta " ia dormindo gente ..."
TERRAL 95 Que sopra de terra ( vento ) em oposição a " vi
ração " que sopra do mar . “ ... O terral , pelas tardes de Agosto ... "
TERREIRO 106 Solo varrido, limpo , plantado , na frente das
moradias no interior, à beira dos rios e lagos . até o terreiro do
rancho ... "
TESO 135 Elevação de terreno, onde não chega a água das
enchentes . GC . por um vasto teso de terra firme... "
TESOURAS 205 Conjunto de peças de madeiras ou ferro que
sustenta a cobertura dum edifício . se prendia ao pendural das
tesouras... "
TESSITURA 138 Contextura . “ ... dominavam de vez em vez,
a tessitura da floresta ..
TETANIFORME 97 Semelhante ao tétano : doença caracte
rizada pela rigidez convulsiva e dolorosa dos músculos. “ palpitava
todo com ondeios céleres, agitando -se tetaniforme... "
TETARDOS 98 Erro de impressão por tetartos . Têrmo de
composição que exprime a idéia de quatro . Significando que as quatro
ilhas estão enfiadas no mesmo alinhamento . “ Representadas nas
cartas, semelham tetartos . GC . supõe seja antes um neologis
mo tirado do francês TETARD Gerino .
THY TIDE WASH'DOWN THE BLOOD OF YESTERDAY
118 “Tua corrente transporta o sangue dos ancestraes”.
TIGELINHAS 46 Vasilha . Recipiente usado pelo seringueiro
para recolher o leite que escorre da cesura aberta pelo golpe de ma
chadinho no tronco da seringueira . “ as tigelinhas, o balde e o
“ boião " ... "
TIJUBINAS 254 Citado por Rod . Teófilo ( “Sêcas do Ceará " .
Pg. 217 ) : as cobras, os tijuaçus, os sapos, as tijubinas se incorporavam
aos carniceiros e iam se fartando de ovos ( das pombas avoantes ) . Pau
lino Nogueira escreve tejubina, palavra composta , cujo primeiro radical
220 TEVISTA DO IRQCIO MUNICIPI

“ teiú " significa : lagarto verde , pintado, do tamanho de um camaleão .


pequeno, e que vive nos campos, valendo o sufixo por um diminutivo .
RVI. Pequena lagartixa . LF . “ essa morada de calangos, tijubinas,
e osgas assustadiças ... "
TIJUPAR 57 ( mesmo que tijupá , palhoça; teto da canoa ;
cabana de índio , menor que a oca, de construção ligeira , feita, muitas
vêzes, para alojamento na guerra . GD . ( “ O Brasil e a Oceania " pg.
187) . " ... albergue do collossal tijupar ... "
TIMBÓ 107 LONCHOCARPUS NICOU , Aubl . , Benth . Timbó
legitmo ( rio Tapajoz ) , Timbó legítimo é um nome genérico dado no
extremo norte a todas as plantas venenosas usadas para narcotizar os
peixes . Corresponde ao tingui do Sul , segundo opina G. Cruls Timb6
branco pau ( rio Acara ) . Hab , somente encontrado em capoeiras ou cul
tivado ; pouco abundante. Flores purpurinas em espigas axilares. (flo
rece raramente ) . E ' o mais ativo dos cipós ; empregam -se as raizes e
os sarmentos . Nas raízes exite um pri io venenoso , a “ rotenona " .
PCL . “ ... matador como o timbó... "
TIPITI 125 Cilindro de talas de palmeiras tecido de forma
que, esticado nas duas extremidades, comprime a massa que está dentro
e faz escorrer o suco . E ' com ele que se obtém o tucupi e o vinho de
cacau . RM . Diz GC . que desseminado por todo o Brasil, o seu uso
principal é o de cevar a mandioca . pendurado a um esteio o
tipity ..."
" TIRANDO " 78 Criando . “ .. “ Tirando ” umas gallinhas ... "
* TIRAR SALDO " 201 Ou carta de saldo . E ' o documento
que o seringueiro recebe no barracão ao prestar suas contas, para re
tirar -se e ir embolsar o dinheiro nas casas aviadoras " de Manaus ou
de Belém . AC . “ ... “Tirar saldo ” é a obsessão do trabalhador, no se
ringal... "
TIRO 100 Cidade da antiga Fenícia , fundada pelos Sidonios,
outrora célebre pelo seu comércio , sua indústria de púrpura .
sól enrolava no seu throno todas as purpuras de Tyro ... "
" TOCADORES ” 86 Reunião de 4 ou 5 figurantes com seus
instrumentos, que tocam nas festas de amigos, de igrejas etc. “ .. Os
" tocadores ” revesavam - se com alguns dos que dansavam ..
TOCANDEIRA 31 Ou tocandira ou tocanguira . Nome de
uma das formigas mais notáveis de nossa fauna, Quem conhece al
guma coisa da etnografia dos índios do Brasil sabe, que pela “ prova
da tocandira " aqueles seiricolas revelam o máximo de estoicismo
com relação à dor fisica . A verdadeira Tocandira , PARAPOXERA
( LAVATA , Fabr. atinge 22 mms. de comprimento e caracteriza-se
por ter um tubérculo no protórax e no pendúculo n . 1 segmento abdo
minal. () ninho , que pode conter até 500 formigas operárias é subter
râneo . É muito agressiva e é encontrada não raro sôbre as árvores.
!! hita somente a Amazônia e o Brasil central. A dôr profunda ini
cial, ainda se intensifica durante as horas subsequentes, determinan
do calafrios e, às vezes, vômitos . Só ao cabo de um ou dois dias os sin
tomas cedem aos poucos. A esta espécie se referem muitas informa
ções sobre a picada , extremamente dolorosa. É bem de vêr que mes
mo homens os mais valentes são subjugados por dôr cruciante inflin
gida pela picada desta formiga terrível . No entanto são veridicas as
informações sõbre a “Festa da Tocandira ” , como fazendo parte do ri
tual que precede a emancipação dos adolecentes de várias tribus indi
genas. Resumimos a narrativa de Martius ( Viagens III pg. 1320 ) : ês
tes índios selecionam seus guerreiros taubmetendo -os ás picadas das
tocandiras. A primeira prova realizava - se quando as crianças tinham
8 a 9 anos ; algumas Tocandiras eram colocadas em uma espécie de luya.
ELUCIDÁRIO DO “ INFENNO VERDE " 221

ou manga e pasta os rapazes enfiavam o braço e para que não fugissem


a manga era atada nas duas extremidades. Durante o martírio a que
assim era submetida , os índios dansavam em redor da vitima e so
quando esta, estenuada pela dôr, caia desfalecida, retiravam as tocan
diras e o braço entumecido era pensado com suco de mandioca. Apenas
o paciente recobrava as forças entregavam - lhe um arco que devia dis
tender . Esta sombria cerimonia era habitualmente repetida até os 14
anos e só quando os candidatos a emancipação resistiam impassiveis
a dôr poderiam casar RVI . " Quando não é a tocandeira veneni
para ... "
" TOCAR ” 54 Encaminhar-se ; dirigir-se . “ " tocar ” para
Maranguape ..
TOCATA 157 Ajuntamento de gente em serenatas e
cantarias . RABL . vol . 6 bras . mau grado a tocata ... "
TOMAR SURTO 154 Amarrar ao barranco ; reter . e
fa - la tomar surto no baixo da orla de uma riba próxima ... "
TÓPICO 194 Diz-se do medicamento externo que se aplica:
sobre a séde verdadeira ou a parente do mal. .... restringir o campo
da applicação do tópicon ..."
TOPOGRAFADAS 30 Fazer a topografia de . ” nuina se
gurança de caminheiro por vias topographadas... "
TOQUEIRO Seringueiro que vende a borracha ao patrão (o
artigo, o produto ) é então embarcado por conta daquele. O " toqueiro "
é considerado como meio empregado . E ' geralmente quem toma parte
nas diligências e serviços pagos a dia. BJS . ( Veja estrada e mateiro ) .
TORREFATOS 224 Que se torrificou ; torrado . US tru
ctosinhos da sapindacea , torrefactos e triturados... "
TRACAJÁ 270 Tartaruga de água doce, PODOCNEMIS CA.
YENNENSIS , do mesino gênero que a tartaruga da Amazônia , porém
menor , pois atinge no máximo 50cms, de comprimento . A couraça dor
sal é mais abaulada, com um recorte em forma de --- Y- a parte an
terior e a côr é bruno -avermelhada ; a cabeça tem algumas manchas
côr de laranja . Não costuma passar muito tempo fora dágua, contudo
é visto às vezes, pousando na margem , sôbre troncos caídos, tomando
sol. Tanto os ovos como a carne são ainda mais apreciados que os de
espécie maior, por terem sabor mais delicado . Os ovos são ovais e não
esféricos e em cada ninhada encontram - se apenas 30 a 40. RVI . “
tracajá que mergulhava ... "
TRANSFUSIVO 48 Que faz passar de um vaso para outro ;
que difunde . “ .. um desfallecido meio para o transito transfusivo da
raça ... "
“ TRANSITO " 139 Teodolito americano que , sobre os de fa
bricação inglêsa , apresenta inúmeras vantagens, empregado pelos enge
nheiros brasileiros, em suas múltiplas variedades . RABL . , vol . 146,
bras . “ ... O " transito " fôra centrado na estaca ... "
TRAPEJANDO 214 Trapeando; agitar ao vento ; bater con
tra qualquer cousa ( um pano ) . “ ... calças trapejando nos pés ... ?
" TRASTES” 52 Inútil; sem préstimos. RABL . , vol. 146,
bras . “ ... e os conheço , seus " trastes " ..
TRATO 58 Região, espaço de terra . “ Era esse tracto
de terra um dos poucos... "
TRAUTEIO 213 Cantaroleio . cessando o trauteio ... "
222 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

TRAVES — 56 Viga de lenho grosso e comprido usado na cons


trução de edificios . “ ... descarnado e rigido de traves e barrotes ... "
“ TRAVESSÃO ” 213 Cêrca que separa os terrenos de criação
dos da lavoura. BJS. Também , queda d'água ; pedras que encachoei
ram as águas de um rio . GC . Cerca forte e bem fechada com a qual,
quer no agreste, quer na catinga, se separam os terrenos do brejo das
pastagens indivisas e não aproveitadas na cultura. (Pernambuco
Garcia- II ) . RABL., vol . 146 , bras. apparecendo pelo " traves
são " ... "
“ TREAD MILL " 183 ( ANGL . ) Moinho . “ Era um tra
balho de calcetas no "traead mill " ... "
TREPADEIRA DE DULCISSIMO NOME 224 PAULLINIA
SORBILIS , Mart . PAULLINIA CUPANA, H.B.K. ( Sapindaceas ) .
Arbusto sarmentoso . Car: Frutos encarnados, em cachos . Cultivado
em Mauês, rio Tapajoz , rio Acará, Belém e itacoatiara . As sementes
maceradas nágua para preparar o arilho polposo, lavadas , dessecadas,
torradas, trituradas num pilão e reduzidas a po , misturadas ou não,
com cacau ou com mandioca, e com água, servem a preparar pães,
bastões, que constituem o guaraná do comércio . Ê refrigerante , recons
tituinte, tônico, calmante do coração etc. PLC . “ ... A planta é uma
fina e sarmentosa trepadeira de dulcíssimo nome scientifico ... "
TRÊS OITO 142 Referente ao ano 1888. “ ... Isto deu - se no
anno dos tres oito ... 99"
T'RESVARIANTE 269 Alucinante . “ ... A febre tenaz, rá
pida, tresvariante, era implacavel... "
TRIANGULADO 135 Dividido em triângulos figura geome
trica de 3 ângulos. “ na triangulada breve ...
TRILHO 34 Caminho; direção . “ ... Emfim se encontra o
trilho ... "
TRONCHOS 272 Mutilados; curvado para um dos lados.
“ ... homúnculos e animaes, seres tronchos de varas... "
TROPPMANN 106 ( Jean Baptiste ) Célebre assassino, nas
cido em Cernais ( Alto Reno ) em 1849 e executado em Paris em
19/1/70 . DL . a folha de serviços do Troppmann sertanejo ... "
TUCANOBOIA 206 Designa no Ceará certa cobra, tida como
venenosa, 0 que ainda não foi comprovado pela classificação, por
ora ainda duvidosa. RVI, “ picado por uma tucanoboia ... "
TUCUM 126 Ou Marajá -açu . BACTRIS MARAJA , ACANTHO
CARPA , Mart. Comun nas várzeas alagadiças . Palmeira aculeada , de
tronco delgado . Frutos da grossura de uvas, de côr preta arroxeada ,
polpa branca mucilaginoso comestíveis . Com estes frutos prepara -se
uma bebida mto, apreciada . As folhas fornecem bôas fibras, com que
se tecem ótimas redes. PLC . Diz Alencar , que o fio preparado com
resina , de almacéga era fortissimo . GS . dá : tucum : espinho alon
gado, pua. As fibras tem o tom pardo e creme . RM . a um fio
de tucum ... 99
TUCUMAS 77 ASTROCARIUM TUCUMA , Mart. Sin : Tu
cumãi ; tucum verdadeiro Car : Tronco de 10 a 15 m . de altura com
25 a 30 cms . de diâmetro armado de espinho longos, finos e agudos.
Frutos esféricos, verde - amarelo quando maduros. Troncos isolados.
As fibras tiradas das folhas depois da maceração constituem o tucum ;
elas dão umas cordas e um fio muito resistentes, para tecer rêdes de
pescar, sólidas e de grande duração ou bonitas redes de dormir, ás vê
zes,caprichosamente, enfeitadas. As folhas servem para fazer abanos,
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE ” 223

chapéus. PLC. É espinhoso , entrava qualquer marcha lenheira na


mata , concorre para aumentar o fabulário . É o caso que a filha da
cobra grande tendo -se casado com um moço bonito, isto no tempo
que a noite ainda estava adormecida no seio das águas, não queria ,
por hipótese nenhuma se deitar . Então 0 marido mandou bus
car , com O pai da esposa a noite desejada . Enviaram -na dentro
do coquinho de tucuman com a recomendação de não o violarem. Du
rante a viajem os portadores ouviram dentro da encomenda um ruído
extranho, que parecia de grilos, insetos. Alvoroçaram - se . E apesar
das ordens terminantes de não abrirem a noz, durante a jornada, a
curiosidade os empolgou e venceu. E assim que a partiram , a escu
ridão alagou o espaço . Haviam soltado a Noite. Ora, o que a lenda
não explica, é o ruído dentro do caroço ouvido pelos portadores e que
não passa duma larva surgida com o apodrecimento da amêndoa ;
larva gorda, branca , que as crianças comem assada , verdadeiro tor
resmo, enfiada em espetos. RM . “ ... Inajás e tucumãs ... "
TUXAUAS 128 Do tupi . Chefe de uma tribo de aborígenes .
“ ... dos inermes tuxáuas... " 157. O poderoso . O “ rico ” o “ chefão " .
“ Unicamente o " tuxáua " prosperava ... ”

UAUPES 122 Vitória Régia . Lindl. Ninfeaoeas. Planta aquá.


tica . Planta anual : quando seca o lago , as sementes conservam - se no
lodo ; crescem com a enchente, o peciolo alongando - se conforme o nível
das águas . Flores enormes (até 30 cms . de diâmetro, em forma de
pratos ou taboleiros de bordas levantadas, semelhantes á fornos de tor
rar farinha . Chamado " forno de jacaré ” pelos índios e cujo bulbo é
um dos alimentos preferidos pela tartaruga . AM . Foi pela primeira
vês admirada pelo botânico Kaenke, e depois classificada pelo viajante
inglês Bridges, em 1845. AB . “ ... o lago era todo cairelado de uaupés ... "
UBÁ 186 Canoa feita com a casca inteiriça de uma árvore .
E ' nome também de uma planta “ Cana Brava GYNERIUM PARVI
FLORUM . Nees . (Gramineas ) . Planta herbacea . Industria . Com as
hastes floraes fazem -se flechas e rabos de foguetes . Grandes paniculos
de flores ornamentaes . PLC .. “ ... transportava -se no comboio de
ubás... "
UBIM 99 Geonoma Maxima, Kath . Há várias espécies dessas
palmeiras . Sin . Coqueiro -junco . Hab : Pará e Amazonas . O caule
substitui o junco . Das folhas extaem - se fibras . O cotonilho que cobre
as folhas pode servir como isca para acender fogo , PLC . Sua. fölha
sem ser grande é muito usada como forro dos paneiros que contém fa
inha dágua . RM . “ em vez do ubim paupérrimo e a banda do peixe
secco ...
UCAIALI 261 Rio da América do Sul ( Peru ) , recoby o Apu
rimã à direita ; à esquerda o Paquitéa ; e se lança no Amazonas pela
margem direita AB . É formado pelos rios Urubamba e Tombo,
tendo como afluentes o Paucartambo , e este com os tributários Apuri
mã e Mantavo . Rev. Geog . Est. ano IV, n .° 4 ,. “ ... tributários da
margem direita do Ucaíali... "
UICHIS 95 Erro de impessão por uchis . Saccoglotis ver
rucoso , Duke . ( Humiriáceas ) . Frutos redondos irregulares, da grossura
de uma tangerina, verde escuro . Polpa untosa, de sabor agradável ,
algumas vêzes um pouco amarga . Também há o Saccoglottis Uchi.
224 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Hab . na nata e terra firme . Fruto pouco carnudo , com caroço volu
moso . A polpa é muito aromática, doce , oleosa , de9 gosto agradável.
PLC. “ . os uichys e umaris de frutos sápidos ...'
UIRAPURU 130 Arapuru ou guirapuru . Passarinho da Ama
zônia , muito conhecido sob essa denominação, pois há varias lendas o
superstições, aliás, bastante generalizadas, que se prendem ao uirapuru ,
Dotado de lindíssima plumagem , em parte preta, o que dá ainda maior
realce ao vermelho escarlate ou amarelo, intenso, da cabeça e do peito .
RVI . Do guarani : guira pássaro ; puru do verbo puru : em
prestar , como traduziu C. Magalhães, pássaro que não é pássaro
pássaro encantado . Entre os índios é rei dos cantores ; no pajêismo é
uma “ mascote ” que dá felicidade . QC . Humberto de Campos o cha
mou de “Orfeu do seringal tranquilo " , no soneto de igual nome . Bar
bosa Rodrigues diz ser o uirapuru um pica pau de cabeça vermelha .
: 0 canto do enfeitiçado uyra purű ... "
ULULANDO 209 Uivando . “ ecoou sinistro , ullulando no
ermo...
CMARIRANA 61 Couepia Suboordata , Benth . e Hook , Ro
sáceas . Árvore copada , servindo para alamedas ; comum em Manaus ;
muitas vezes cultivada. PLC, “ ... o marido havia sido esmagado pela
umarirana ...
UMARIS 95 ( Veja Umarisal)
UMARISAL 212 Grupo de umaris . Poraqueiba Sericea , Tul .
( Icacináceas ) . Árvore média e pequena . Indigena e cultivada no Es
tado do Amazônas . Fruto comestível, como o umari do Baixo Amazô
nas, porém , maior da grossura de um ovo regular ; o caroço grande é
envolvido de uma camada delgada, de polpa oleosa e adocicada . PLC .
Na cidade de Belém , do Pará, há um bairro assim chamado. “ ... che
garia mesmo ao Umarisal...
" UNHAS DE GATO " 215 Bignonia Uuguis Cati L. Bigno
niáceas. Planta ornamental; flores grandes, numerosas, amarelo claro .
Diurético ; adstringente . “ ... depois de um oerrado de “unhas de ga
to " ... "
UNIÃO 142 Cidade do Estado do Ceará , situada numa ilha
formada pelo rio Jaguaribe, a 36 quilômetros de Aracati. VC . “ ... ia
ao Acarati ou á União ... "
* UOMO DELINQUENTE " - 107 ( Ital. ) Homem assassino . De
finição dada por César Lombroso, grande criminalista italiano . “ ... De
via ser assim o “ uomo delinquente" .
URUBU 117 Ifluente do Amazonas, margem esquerda , na
cente nas terras altas, que se prolonga até às fronteiras da Guiana In
glêsa . Suas águas são pretas . AB . Há umas montanhas com o mesmo
nome, de contornos nítidos e vades singulares entre emersões paralelas,
apresentando curiosos aspectos; uma arborisação só em uma encosta ,
da base ao vértice, mostrando - se nua a parte oposta ; outra simples
mente relvada até meia altura, enquanto o cimo se ostenta coberto de
altas florestas . HRS . Existe uma cachoeira com o mesmo nome no
rio Juruá. VC. No Dic. Histórico e Geográfico Brasileiro, lê -se : " no
tempo da viagem de Pedro Teixeira Os índios lhe davam o nome de
“ Burururu ", que era o da nação que lhe dominava o curso e também
o de “ Uarubé ”, que por corrupção deu Urubu..." a nervura se
cundária do Urubu ... '
“ URUBUGUAIAS ” 119 Os habitantes das margens do rio
Urubu ; como os do Paraguai e Uruguai são paraguaios e uruguaios .
“ ... em caça a pretos fugidos a cabanos, ou a " urubuguayas " .
Pirarucu
de
Pescador Caboclo
Amazonas
do Pará
do
Castanheiros

“Revista
pela
cedidos
"Clichês
Geografia
de
Brasileira
1

1
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE " 225

URUBURETAMA ( SÃO JOÃO DE ) 213 Uruburetama ,


quer dizer pátria ou ninho de urubus ; serra bastante alta . JA . Há no
Ceará uma serra com êsse nome, onde se encontram diversas grutas ,
notando -se uma próxima a São Francisco, formada por uma grande
lage soterrada, tendo uma abertura horizontal, pela qual mal pode pe
netrar uma pessoa . No interior pode -se andar de pé e a claridade so
faz por meio de uma abobada. Tem-se encontrado nessa caverna grande
quantidade de ossos humanos, bem conservados. Presume- se ser antigo
cemitério de índios . (Corografia da Provincia do Ceará, por José Pom
peu Cavalcanti, citado por Veiga Cabral) . “ ... autoridade policial em
São João de Uruburetama ...
URUCURIS 95 Ou Uricury Attalea Excelsa , Mart . Hab .
nas várzeas altas . Palmeira de folhas grandes, erectas, numerosas ;
tronco relativamente curto e grosso , de aspecto escamoso pela per
sistência da base do pecíolo de folhas calídas. Fruto com amêndoas
( 3 ) oleaginosas. PLC . Ourucuri ainda é famoso em virtude da pre
dileção que lhe dá o apuizeiro, sinistro monstro botânico, formida
vel parasita silvestre que o escolhe, de preferencia, no meio das vi
timas vegetais para em paredá-lo , sugá-lo, asfixiá-lo e devorá- lo . Os
caroços queimados servem para defumar a seringa, sendo tal matéria
a que empresta melhor elasticidade á borracha coagulada pela fuma
ça . RM . G. Cruls, condena a expressão “ monstro botânico ", e o " verbo
sugar " 03 penachos fasciculados dos urucuris ... "
URUS 253 Ou “capoeira" ave da fam . ODONTOPHORI.
DEOS, a espécie amazònica, PO . GUAYNENSIS, é mais avermelhada
caracteriza ambos a larga zona nua, vermelha ao redor dos olhos . O
macho tem um pequeno topete . Os urus piam de modo diverso , con
forme a significação de seu pio, a pêlo RVI . Urus trinavam
melodiosamente ...'
UTRICULARIAS 30 Gênero de plantas herbáceas e aquáti
cas . “ ... que utricularias e pontedorias enfeitam ... "

VADEO80 268 Que tem vau ; cheio de bancos de areia


ou de baixios . “ Vem o prodigo , vem vadeoso .
“ VAI DE GOLPE " 154 Ir diretamente a, “ vae de golpe"
a fugitiva ... "
VALEIRA 249 Vala pequena. pela estreitesa da valleira
que bordavam ..
VALVAS 236 Qualquer peça ou qualquer das peças sólidas
que revestem o corpo de um molusco ; concha “ ... o amago de suas
valvas de nacar ... "

“ VAPOR DE CASA " 205 São assim chamados os navios de


propriedade dos donos de seringais, e empregados no transporte
da borracha para exportação e abastecimento do pessoal que nele
trabalha . “ ... mas o “ vapor de casa estava para chegar ... "
“ VALOR DE TERRA " 54 Trem de ferro, comboio .
tomar o " vapor de terra " até á Capital..."
VAQUEJADAS 63 Lote de gado de cria tocado dos logra
douros para 0 curral . no monotono rolar das vaquejadas ..."
226 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

VARADOUROS 309 Caminho pelo qual se arrasta canoa,


para fugir aos acidentes do rio GC . “ É a vereda atalhadora que vai
por terra de uma vertente fluvial á outra . E. da Cunha , * .. Pelos
varadouros e igarapés ... "
VAZANTE 59 Cultura feita nos leitos secos dos rios , na
epocha de vazante . nunca poude ser dono de um pedaço de
vazante ... "
VEIGA 211 Planície fértil ; campo cultivado. ... domi
nava em mangrulho a chateza da veiga circumdante .
VELUDILHO 175 Tecido semelhante ao veludo, porém me
nos incorpado. “ Tudo quanto foi crépe ou velludilho ..."
VENENIPARAS 31 Que segrega veneno . quando não
é a tocandeira venenſpara ...
VERDACHO 254 Tinta verde mineral tirante a cor de cana .
assentada ao lado de pantano verdacho... "
VERDEAL 80 Que tem côr um tanto verde. encor
tinamento rocagante e verdeal..." ,
VERDE CRÉ 39 Verda sôbre ouro . nem para o verde
eré dos vegetaes ...
VERDE GAIO 180 Verde claro . " o extendal verde gaio
das canas ... "
VERDE- MONTANHA 28 Verde escuro . A cor verde com
tons levemente azulados. De um verde montanha sem gra
dação ... !
VERDE VERONESE 211 ( Paul- Calliari assim chamado )
pintor italiano da Escola Veneziana, nascido em Verona . Seus quadros
brilham pela elegância , a riqueza do colorido e harmonia de todas
as partes. Elle deu nome ao matiz de um determinado verde quo
hoje já se encontra em tubos de tinta para pintura, com O nome
de verde Veronèse Diz - se Verde Veronèse, como se diz, verde gaia ,
verde-cré etc. GC . “ ... A matta pintava - se de um mesmo verde Ve
ronèse ... "
VEREDAS 59 Caminho estreito pelo meio da mata . RABL ,
Vol. 6 bras. “ alvejando -as pelas veredas centraes.
VERTICILOS 106 Conjunto das partes das flores, ou dos
órgãos foliáceos, dispostos em volta de um eixo comum e no mesmo
plano horizontal . A doce expressão dos verticillos ...'
VIGILAM 56 Espreitar . “ ... ás victimas vigilam em torno ... "
VINHO “ ABAFADO " 85 Vinho que os caboclos preparam
( caju, genipapo etc. ) e conservam coberto alguns dias para apurar
suas qualidades Vinho " abafado ” e aguardente ... "
“ VIRAÇÃO ” 151 Expressão amazonense e goiana que desig
na as praias fluviais onde desovam as tartarugas, assim chamadas
porque nelas é que se faz a “ viração ” das tartarugas . Viração é a
captura da tartaruga , têrmo muito expressivo porque consiste em
imobilizar previamente os quelônios, voltando - os de costas para pas
sar - lhes um fio pelas 4 patas. BJS . “ ... propicia á desova
* viração... "
“ VIRA EM CACAIA " 80 Em carrascai . " Com o campo
é o mesmo, * vira em cacaia "
ELUCIDÁRIO DO “ INFERNO VERDE ” 227

“ VISAGEM " 146 Fantasma ; aparição sobrenatural , 66


ficou empalemada e branca que era ver uma “visagem ” ...
VITORIA RÉGIA 121 Definição do próprio autor em “Papeis
Pintados ”, pág . 231: " . golfão desmedido, condecorativa placa da soli
dão marasmada por sõbre a liquida malacacheta dos lagos mais tran
quilos ” .
Esta gigantesca ninfeácea, verdadeira maravilha do reino vegetal,
habita mansa e tranquilamente nas pacíficas águas dos lagos pouco
profundos do Amazonas e de seus afluentes , célebre botânico
KAENKE e frei DE LA CUEVA, missionário espanhol, navegando pelo
rio Mamoré , foram os primeiros europeus que tiveram a fortuna de
vêr a maior e a mais bela das ninfeaceas .
O sábio naturalista caiu le joelhos, e em ação de graças ao Ente
Supremo, que creou tão portentosa maravilha , entoou- o Te - Deum
ante seu companheiro admirado . Em 1845 , um viajante inglês, o Sr.
Bridges, navegando pelas margens do rio Iocouma, um dos tributários
do Mamoré , deu com um lago, no qual viu com surprêza uma quase
colonia dessa planta magnifica . Em sua admiração e em seu amor
.britanico deu - lhe o nome de sua soberana apelidando - a de Vitória
Régia ( É como conta o Cônego FB . de Souza em seu livro Pará
e Amazonas pg. 12 , II parte ) . Sin : Vaupé -jaçanã ; abati- uaupé ; forno
dágua mururú . Planta aquática . Lindl . Planta anual : quando seca o
lago, as sementes conservam -se no lodo , cresce com a enchente, o pe
ciolo alongando - se conforme o nível das águas . As sementes dão uma
fécula comestível; comem - se assadas . A batata é apreciada pelos indí.
genas . Flores enormes ( 30 cent. de diam . ) que só desabrocham de
noite ; brancas, com o centro rosado . Folhas flutuantes, de 1 m . a
1.80 de diam . em forma de pratos ou taboleiros, de bordas levantadas,
semelhantes, á fornos de torrar farinha . PLC . “ as victorias -régias
abriram as folhas circulares enormes ...
VOLTIVOLO 28 Volante ; que dá muitas voltas. " ... cotão
de ouro voltſvolo ... "
VOLUTAS 278 Curvas em espiral . Em volutas deleveis, o
fumosinho lento do fogo...
VON IHERING 177 ( Rudolph ) . Um dos maiores juris
consultos alemães do século XIX, autor da “ A finalidade do Direito " .
que Von Ihering formulou com menos crueza ..."

XERIMBABO 76 Animal doméstico, criado ou amansado


em casa . O xerimbabo socorria -se do mury .

WAGNERIANAMENTE 32 A modo de Wagner isto é,


poderoso, espléndido, colorido . “ Ella é wagnerianamente agitada ... "
WALTER 101 ( Raleigh ) Inglês. Poeta. Navegante. Di
plomata . Explorador. Famoso cortezão da corte inglêsa . Esteve na
bacia do Orenoco. Se bem que não tenha penetrado na Planicie Ama
zônica as suas estrofes, suas narrativas, as pitorescas e maravilho
228 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Kas histórias contadas aos pés da soberana do vasto Império Brita


nico, estão cheias das lendárias amazônas brasileiras . Favorito de
Isabel da Inglaterra, foi executado depois na vigência de Jaime I.
" ... o Eldorado esvaido de Walter Raleigh ... "
WINCHESTER 177 ( Clavina ) Arma de repetição, que subs
titui o clavinote ou bacamarte de carregar pela boca . GB . “ ... que
não possua um rifle : clavina Winchester ... "

ZAMBROS 77 Deformação em arco para trás, das tíbias e


peroneos. RABL ., vol . 8 , bras . Cambaio ; Torto . de sua fronde
reversa , de galhos zambros ...
ZIOZIAVAM 278 Onomotopaico, criação do autor.... "
Zioziavam cigarras occultas nos bastidores da matta ... "
ZOAR 55 Soar fortemente . “ ... do zoar das serras rasgan
do toroo ... "
BIBLIOGRAFIA

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Agnello Bittencourt * Corografia do E. do Amazonas
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230 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

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Peregrino Junior Pussanga I.a ed .
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Pinto ( J.A. ) Dic . de Botânica
Raymundo de Moraes * Aluvião I.a ed .
* Cartas da Floresta I.a ed .
* Na Planice Amazônica I.a ed .
* O meu dic . de coisas da Ama
zônia I.a ed .
* No país das pedras verdes
I.a ed .
* O homem do Pacoval I.a ed .
Rio- Branco ( Barão ) * Efemeridades 2.a ed .
Rodolpho ( Von Ihering ) * Dic. dos animaes do Brasil 1940.
Roquete Pinto ( E ) * Rondonia 3.a ed .
Sebastião Almeida Oliveira * Expressões do populario serta
nejo I.a ed .
Urnberto Peregrino * Imagens do Tocantins e do
Amazonas I.a ed .
Veiga Cabral * Corografia do Brasil 26.a ed .
Academia de Letras * Revista nums. 2, 4 , 5 , 17 , 21 , 81,
97 , 102 , 116 , 146 , e 148 .

Os volumes assinalados com o asterisco, são da coleção do autor


OS TAPIRAPÉ
TRIBO TUPI NO BRASIL CENTRAL

( spesial per a “ REVISTA DO ARQUIVO " )

HERBERT BALDUS

( continuação )

INFÂNCIA

O padre Fernão Cardim ( 310 ) escreveu com referência aos


Tupinambá : “ Os pais não têm coisa que mais amem , que os
filhos, e quem a seus filhos faz algum bem tem dos pais quanto
quer . " Grosso modo, esta frase poderia referir- se a quase todas
as tribos do Brasil e , entre elas , aos Tapirapé . Tal amor mani
festa- se na compreensão com que os adultos tratam as crianças.
A uma pergunta do filho, o pai índio nunca responderia : “ Isto
é coisa de gente grande que você não pode entender ” , destruin
do assim , a modo de certos pais brancos, a confiança com que
o menino procura o amigo mais instruido . O pai índio não fala
com ar de superioridade e assim não se abre aquele abismo divi
sório que, entre nós, freqüentemente separa as crianças dos adultos .
Aliás , já antes da criança chegar à idade de pedir explica
ções, o Tapirapé mostra, em relação a ela, seu espírito de paciên
cia . Nunca esquecerei a atitude de Vuanomanchí quando uma
criancinha sentada no seu colo, urinou nas suas pernas nuas .
Nada de agitação ! o digno pai de familia nem sequer se levantou .
Tomou do chão um pedaço de palha, empurrando com este o
líquido . Não se limpou esfregando nem lavando . Não disse pa
lavra nem fêz movimento que pudesse molestar a criança .
232 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Nunca também esquecerei o comportamento de Maeyma du


rante a doença de sua filhinha . Muitas mulheres estavam cho
rando ao redor da rede da menina e Maeyma era o único ho
mem que chorava . Sentado na sua rêde cobria o rosto com as
mãos e soluçava . Parecia ter emagrecido no curto tempo em
que a criança ficara doente . Como convém ao pai cuidadoso ,
nada comeu , nesse tempo, além de um pouco de caui de milho
e farinha de mandioca . No dia seguinte , tendo aparentemente
melhorado a menina, Maeyma, deitado na rede , a segurava como
uma coisa quebradiça e quando movia, às vezes, as mãos , as mo
via com embaraço .
Na tribo dos Tapirapé , como em muitas outras tribos índias,
a ligação intima e constante entre filho e pais é reconhecida e
respeitada pelos últimos por meio das abstenções a que se subme
tem em prol da criança durante longo tempo e não só quando
esta adoece . Também a época dos contactos físicos dura mais
que, em geral , entre nós . Embora seja exagerada a afirmação
de frei Vicente de Salvador ( 37 ) , segundo a qual certas mães
tupinambá davam de mamar aos filhos “ sete ou oito anos ”, po
demos supor que, a êsse respeito, se deu entre êsses Tupi , o mes
mo que observamos entre os Tapirapé e numerosas outras tribos
do Brasil, isto é, uma criança que já , sem a guarda dos adultos,
brinca correndo com outras crianças, se sacia ainda nos seios ma
ternos . As crianças karajá , segundo Lipkind ( 2 187 ) , dormem
com a mãe até desmamar . Em Tampiitaua encontrei , dormindo
com ambos os pais na mesma rêde , em 1935, 1 menino e 1 me
nina de 1 ano, 2 meninas de 3 anos e 1 menina de 4 anos , e , em
1947 , 2 meninas de 1 ano ; dormindo com a mãe, em 1935 , 1 me
nina de poucos meses , 1 menina de menos de um ano , 1 menina
de mais de um ano e 1 menino de 3 anos, e , ein 1947, 1 menino
de 1 ano, 1 menino de 2 e 1 menino de 4 anos ; dormindo com
o pai, sendo que a mãe dormia numa rede pegada, com criança
menor, em 1935 , 1 menina e 1 menino de 4 anos e 1 menina de
6 anos, e, em 1947 , 1 menino de 2 anos ; ainda no mesmo ano ,
dormindo com o pai , homem de 35 anos de idade, 1 menina de
aproximadamente 10 anos, enquanto a mulher, grávida de cerca
de sete meses, que não era a mãe da menina, estava deitada na
rêde pegada ; e , em 1935 , dormindo com a irmã maior da mãe,
1 menino de 6 anos, enquanto a mãe dormia em outra casa com
o marido, que não era pai do menino .
Com carinho especial os Tapirapé enfeitam as crianças . Mos
trei no capítulo VI ( fot . 13 ) , como já antes do nascimento do
filho preparam tamankurá para seus tornozelos. Vindo à luz,
tratam de guarnecê - lo com os adornos tradicionais da tribo , pen
OS TAPIRAPÉ 233

durando - lhe no pescoço, além disso, missangas obtidas dos bran


cos . Estas, como qualquer outra coisa que lhe dão, são respei
tadas, então , como sendo propriedade da criança . Um colecio
nador de museu teria, às vezes, dificuldade em obter um objeto
do qual dispõe exclusivamente uma criança ainda não bastante
crescida para poder entender o seu desejo .
Fiquei comovido quando vi uma mãe tapirapé que atravessava
a praça da aldeia , procurar proteger contra o forte sol do meio-dia
seu filhinho de poucos meses . Apertava-o contra o ventre e cor
ria profundamente curvada, de modo que a criança estava na
sombra produzida pelo corpo nu da mulher . Só ao alcançar a
maloca a mãe voltou a erguer - se e a carregar a criança nos braços .
Em geral , a criança de Tampiitaua , quando carregada, cavalga
no quadril do adulto e éste a segura com a mão . O mesmo vemos
entre os Karajá ( cf. também Krause 2 276 ) . Em ambas as tri
bos não observei o uso de charpas de carregar crianças , de que,
aliás , já tratei com certos pormenores no capítulo VI . Embora
as mulheres tupinambá, segundo Fernão Cardim ( 170 ) transpor
tassem os filhos " metidos nuns pedaços de rêdes” , carregavam
nos à maneira tapirapé " como ciganas escanchados no quadril" .
E como entre os habitantes de Tampiitaua , também entre os an
tigos Tupi orientais , segundo Vicente de Salvador ( 37 ) , eram
tanto as mães como os maridos que traziam o filho ao colo .
Referindo- se aos Taulipáng, Koch -Grünberg ( 2 III 147 ) ob
serva que os pais raríssimas vezes falam rispidamente ao filho ou
lhe batem , acrescentando : " Nunca vi punição exemplar " . Isso
poderia ser dito , também , a respeito de quase tôdas as tribos do
Brasil e, especialmente, acerca dos Tapirapé. Dos Tupinambá
observa Fernão Cardim ( 170 ) que não davam ao filho " nenhum
gênero de castigo " . Entre os Karajá, segundo Lipkind ( 2 187 ),
" sometimes ridicule is used as a sanction against particularity
recalcitrant children " . Os pais tapirapé costumam rir - se da crian
ça que chora , salvo se estiver doente .
Em 1935 encontrei em Tampiitaua 9 órfãos de pai e mãe
com menos de 10 anos de idade sendo 6 meninos , a saber , 1 de
3, 3 de 5 e 2 de 8 anos , e 3 meninas que tinham entre 6 e 8
anos . Destas últimas, uma tinha sua rede ao lado da do irmão
do pai, e outra tinha a sua na casa da madrasta . Um dos meni
nos de 5 anos tinha a rêde ao lado da rede da irmã do pai . Não
achei parentes chegados dos outros 6 órfãos . O menor destes, o
menino de 3 anos , não tinha sorte invejável. Servia de joguete
à aldeia , sendo vítima dos bons e maus humores de cada un .
Andava sujo e triste . Os órfãos maiores, porém , não estavam
41 tal estado lamentável, não se distinguindo no comportamento ,
234 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

das outras crianças da mesma idade . Segundo Wagley e Galvão


( 4 76 ), na tribo tupi dos Tenetehara (Guajajara ) do Maranhão ,
só os orfãos masculinos são descuidados . Em 1947 encontrei em
Tampiitaua um único órfão de pai e mãe com menos de 10 anos
de idade . Era um menino de cerca de dois anos . Quando os
Kayapó, pouco depois da minha visita assaltaram a aldeia, foi cap
turado por eles . O fato de ser a única criança roubada por essa
ocasião, talvez contribua para caracterizar a situação dos órfãos
de menos de quatro anos .
Contrastando com estas crianças insuficientemente protegidas
encontramos, entre os Tapirapé, uma figura que se distingue da
criança comum por ser tratada com muito mais atenção e mimo .
Em 1935 era Ampitania a " criança preferida ” . Esta menina de
quatro a cinco anos era realmente a princesinha de Tampiitaua .
Sempre se mostrava delicada e polida , revelando cada vez novos
encantos . Andava muito mais enfeitada que outras crianças , usan
do além dos enfeites de algodão pintados de urucu , penugem branca
colada no corpo e vários colares de missanga . Estava alternada
mente em companhia dos dois homens mais importantes da aldeia,
passando um dia e uma noite com Kamairahó e sua mulher, e o
dia e a noite seguintes com Vuatanamy e esposa . Morava, por
tanto , nas duas casas maiores e com os líderes que , de certo modo,
eram rivais . Tinha assim , sem dúvida , função unificadora .
Kamairahó fez questão de dizer-me, repetidamente, descender ela
de " capitães ", chamando assim a minha atenção para o " sangue
azul” da menina . Aliás, ele mesmo parece ter sido também crian
ça preferida" ( cf. Wagley 4 23 ) .
A instituição da “ criança preferida " existe igualmente entre
os Karajá, segundo minha averiguação feita em 1935 ( cf. Baldus
7 83 ) e confirmada, anos mais tarde , por Lipkind ( 2 186 ) . Estes
indios do Araguaia têm têrmo especial para tais crianças, deno
minando -as ioló .
Entre os Tapirapé como em todas as outras tribos sul-ame
ricanas que visitei , observei o comportamento das crianças entre
si e em relação com os adultos, o qual se distingue profundamente
do comportamento das crianças que conheci na Alemanha . Estas
aparentavam , por assim dizer , muito mais " infantilidade ” que as
crianças índias e também muitas crianças neo -brasileiras . Seu
interesse pelo mundo dos adultos era menor, por ser-lhes esse
mundo menos acessível do que para as crianças das selvas e ci
dades do Brasil . Por não discutirem com os adultos em pé de
igualdade, comportamento muito comum entre as crianças daqui ,
as crianças educadas no autoritarismo alemão do começo do nosso
século não tinham tanto " ar de adulto " . A atitude da criança
OS TAPIRAPE 235

india é determinada, porém , não só pela liberdade de que goza ,


como muitas crianças neo-brasileiras , mas também por dois outros
fatores que sempre a tornam parecidas com os adultos : 1 ) entre
indios, as atividades da criança se assemelham muito mais às dos
adultos do que entre nós , nunca representando espécies de traba
lhos diferentes das executadas pelos pais ; 2 ) a criança india
possui propriedade particular desde a mais tenra idade, proprie
dade da qual ela e exclusivamente ela pode dispor à vontade.
Ao rigor com que é respeitada a propriedade da criança
já aludimos acima . No tocante aos trabalhos pode- se dizer que
as crianças tapirapé aprendem brincando aquilo que é o trabalho
dos adultos . O menino de três anos já tem um pequeno arco
com flechas, cujo tamanho corresponde ao tamanho do dono . A
menina de três anos já possui uma pequena peneira , cujo tama
nho corresponde ao tamanho da dona . Assim , os dois vão pescar
como um casal adulto, o pequeno homem flechando os peixes, a
pequena mulher recolhendo - os na peneira . Naturalmente, o ta
manho dos peixes coresponde também ao tamanho dos pescadores .
Voltando à casa põem os peixinhos na brasa , assando -os . Depois
os comem , mostrando assim que Tapirapé de três anos já sabe
tratar da vida . Crescendo menino e menina, crescem arco e pe
neira também , até alcançarem , estando os donos na puberdade, o
o tamanho dum arco de homem e duma peneira de mulher . E
assim se dá com tudo que é manejado por esses indios , a saber,
com cacetes, cestos , pilões, fusos e outros utensílios . Isso , po
rém , não significa que os meninos , antes da puberdade, participem
tão seriamente da vida econômica como as meninas que, desde
pequenas , enquanto os meninos vadiam , ajudam freqüentemente
a mãe, na medida das forças e capacidades de sua idade, repre
sentando, assim , um fator cada vez mais produtivo .
Naturalmente , as crianças tapirapé imitam os adultos não só
nos trabalhos . Desde cedo já praticam o sorriso por assim dizer
automático, que caracteriza esses indios, um certo coquetismo e
aquilo que mais agita a alma de sua tribo, isto é, a dança e o
canto . Vi meninos de quatro a sete anos fabricarem para si más
caras de dança com folha de banana-brava , colocá-las na cabeça
e, então, dançarem e cantarem de modo correspondente à espécie
da máscara usada . Na aldeia karajá de Santa Isabel assisti em
1947 a cenas semelhantes .
Podemos dizer das crianças desta aldeia da ilha do Bananal,
de Tampiitaua e de muitas outras tabas brasileiras, o mesmo que
Fernão Cardim ( 175 ) escreveu com referências aos Tupinambá :
“ ... os meninos são alegres e dados a folgar e folgão com muita
quietação e amizade, que entre eles não se ouvem nomes ruins, nem
236 REVISTA MUNICIPAL DO ARQUIVO

pulhas , nem chamarem nomes aos pais e mães, e raramente quando


jogão se desconcertão, nem desavêm por cousa alguma, e rara
mente dão uns nos outros , nem pelejão ... ” Autores modernos
nos falam , de modo semelhante, das crianças agradáveis que en
contraram entre índios sul- americanos ( cf. por exemplo , Koch
Grünberg 2 III 147 ) . Crianças pequenas de ambos os sexos, até
cerca de cinco anos de idade, são chamadas antai em tapirapé .
No vocabulário nheengatú de Stradelli (656 ) encontramos o se
guinte verbete : “ Taina criança . Nome que serve para os
dois sexos durante os primeiros annos de vida, até que comecem
a andar e fallar, quando já tenham recebido um nome, e já come
cem a especializar -se nos respectivos serviços, porque então passa
o menino a ser curumi e a menina, cunhantaî. ” Os Tapirapé
usam , além disso, os têrmos am pyki para o menininho e pityngi
para a menininha . Yves d'Evreux ( 86 ), tratando dos “ degraus”
de idade dos Tupinambá do Maranhão, escreve : " Le premier de
gré supposé commun aux mascles & aux femelles sortans imme
diatement du ventre de leurs meres , appellé du mot, Peitan ...”
Em Montoya ( 2 384 ) lemos : " Niña, o niño hasta tres años,
Mitang. "
De cerca de seis até perto de doze anos, isto é, até a pri
meira menstruação da menina e o começo da puberdade do rapa
zinho, os Tapirapé chamam aquela de kutantai e esse de ekonomi .
Montoya ( 2 I 383 e 377 ) da Cuña tai para “ niña hasta diez años "
e Cunumi para “ Muchacho ” .
PUBLICAÇÕES
PUBLICAÇÕES

“ LINGUISTICA Y FILOLOGIA autor : " Es dificil sistematizar las


CLÁSICA , SU SITUACION personalidades, grupos y escuelas que
han dominado nuestra ciencia en los
AOTUAL ” ultimos cincuenta años ”, porque “ No
existe aun una obra de conjunto es
crita con anterioridad ( las dos obras
Antonio Tovar (Catedrático de la de conjunto de Pedersen y Thomsen ,
Universidad de Salamanca ) respectivamente, Linguistic Science
Coloccion Hesterna , Hodierna, La in Nineteenth Century, trad. Spargo,
herencia científica del siglo XIX Harvard University 1931 y Sprogvi
NOB otrog Revista de Occi denskabens Historie, Copenhague
donto Madrid , 1944 164 págs. 1902 ( traduzida na Coleção Labor,
em espanhol, sob o título da Histo
Com um natural retardo resul ria de la Linguística, p de que nos
tante da última conflagração mun ocupamos na “ Revista do Arquivo " ,
dial , tem'aparecido agora esta exce vol . CXIII, pág . 228 ) , el resumen
lente resenha crítica no Brasil , onde en Meillet en su Introduction a la
ela, mais que nunca , se faz necessá Grammaire Comparée des Langues
ria, pois aqui ainda assistimos à inau Indoeuropéennes, emanan de autores
guração de academias ou de publi formados hace muchos años ) , y a los
cações que, embora tratando da lin que hemos llegado más recientemen
guística, se intitulam de filologia , te al cultivo de nuestra ciencia , la
que é simples ramo da linguística . cantidad de publicaciones y revistas
O primeiro mérito, mesmo, do tra nos impide poder rápidamente, tra
balho de Tovar é este : delimitar, zar un cuadro ordenado e completo "
mais uma vez, com precisão , os do ( pág. 110) . Confessa, assim , o
mínios da filologia e da linguística. autor, que neste opúsculo faz, ape
O segundo , não menos grande, é de nas, um esboço, o qual, sem dúvida,
ser o único trabalho que nos traz a não deixa de ser de primeiríssima
história da filologia até hoje, embo ordem , além de extraordinàriamente
ra num rápido resumo essencial , útil, é único, até o momento, neste
pois, conforme observa o próprio domínio .
240 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

o quadro traçado por Tovar é mar, por pérdida de su indenpenden-


dos mais sugestivos, como se pode cia, asimilación cultural, extinción
ver pela simples enumeração dos de su personalidad politica, la de otro
capítulos: I, La Tradición. Créacion pueblo . Las formas de la lengua
de la Filologia Clásica Actual. II , anterior no son nunca sustituidas
La Filologia Clásica del Siglo XIX . completamente, y queda siempre en
III, Aparición de la Linguística. Sus los nombres de lugar, a veces en los
Ramas . IV, Las Grandes Corrien de persona , ciertos nombres que po
tes Teóricas en la Filologia y la demos llamar típicos ( de fauna y
Linguística. V , Filologia e Histó flora, vestidos, comidas, cosas domés
ria . Tendencias más Recientes . ticas, agrícolas, de oficios, etc. ), la
E entre as muitas incisivas obser huella de lengua anterior. Por otra
vações críticas de Tovar, duas são parte , queda en la misma lengua
de muita atualidade, no Brasil ou aprendida , en fonética, semántica, sin
sejam aquela em que ele confirma o taxis, la señal de la olvidada : cier
descrédito da escola idealista, quer tos conceptos se explican con la pala
entre filólogos, quer entre linguis bra nueva, pero en una extension o
tas, e aquela em que se refere ao especialización que desconocía ésta
discutido problema dos substratos, en su estado originario, ciertos soni
assim : dos se adaptan a la fisiologia here
" Los filólogos de época románti dada y desarrollada por la costum
ca, así como los positivistas de bre, etc. Se podria comparar en la
Schleicher y los jóvenes gramáticos teoria del sustrato a la nueva lengua
seguidores de Brugmann, tenían con con una imundación que cubre lo que
ciencia de su dirección y ésta se les ocupó el limo de la lengua antigua,
mostraba con claridad a ellos mism :ss pero dejando ciertas partes emergidas,
y a sus proprios enemigos y pole otras sobrenadando, otras finalmente
mistas. Pero diríase que a partir difundidas y disueltaj, dandole a la
del positivismo, que fué corregido lengua invasora un color nuevo . Se
en la linguística muy pronto de todo guramente es este campo del sustrato
excesso ( en verdad nunca, ni aun en en el que la linguista de nuestro siglo
el momento de optimismo de Shclei puede proporcionar novedades y des
cher, grande ) se ha conseguido una cubrimientos. Las lenguas indoeurope
base sólida, de la que parece imposi. as fueron llevadas por pueblos que se
ble mover nuestra ciencia . La instalaron muchas veces sobre viejas
enunciación de una pretendida ten culturas y civilizaciones . Hasta
dencia neoidealista por Karl Vossler ahora la linguística ha cuidado más
Idealismus und Positivisinus in de fijar las coincidencias indoerope
der Sprache 19 -- tropezó inmediata as, las palabras comunes a varios
mente con una repulsa general entre99 dialectos ; quizá va llegando el mo
indoeuropeistas y filólogos clásicos mento en que tengamos en el sus
( pág. 123 ). trato de cada dialeto el porqué de
“ El romanismo, en cuanto no se las diferencias, de las inovaciones
limita estrictamente a las leys foné en fonética, en morfologia, en sin
ticas dentro de cada dialecto, roza taxes, en léxico . Entre los proble
ya , y en condeciones muy especiales, mas actuales de la linguística, tai
con los problemas del sustrato. La vez no hay ninguno tan renovador
idea de este hecho linguistico del como éste. Han sido romanistas
sustrato ha surgido precisamente quienes han llamado primero la
aquí, en los estudios neolatinos, se atención hacia esta oscura fuerza
comienza a aplicar con fruto no ya del sustrato. El gran linguista
sólo en este campo, sino en el mis Hugo Schuchardt hizo agudas ob
mo de la linguistica indoeuropea . servaciones sobre sus fundamentos,
En el fondo el problema del sustrato si bien, sin reconocerle una impor
es el de hasta qué punto un pueblo tancia muy superior a la de lo que
puede abandonar su lengua para to podríamos llamar superstrato . Se
PUBLICAÇÕES 241

66
gún él , lo céltico, ibérico, itálico, págs . 30-31 ) , no seu suposto “ po
dacio, no seria de importancia mu sitivo ”, chama de discurso, palavra
cho mayor para diferenciar las len ou fala , ou seja a execução do idio
guas románticas que los contactos e ma pelo indivíduo, o que quer dizer
invasiones de germanos, árabes, es o mesmo que se vem definindo, des
lavos ” ( págs . 80-81 ) . de a antiguidade clássica, com o no
Estas duas longas citas, que não me de estilo ( ver, por exemplo, Vi
traduzimos por ser o castelhano, gilio Inama, Filologia Clásica Gre
pros brasileiros, tão acessível e com ca e Latina , 2a . ed ., Milão, 1911 ,
preensível quanto o português, cons pág . 111 ) .
tituem as duas últimas e mais mo Em relação com o tema do subs
dernas referências que temos sobre trato e do superstrato, a par da con
estes dois temas, ou seja sõbre o qüente mestiçagem linguistica, don
idealismo de Vossler e sua escola de não haver nunca linguas puras,
germânica , e sobre o problema do tôda lingua sendo produto de mesti
substrato a par do superstrato que çagem, é ele também oportuno no
engendram , em conseqüência , a mes. Brasil , onde se tem verificado, ùl
tiçagem linguística , ponto hoje já timamente, uma espécie de racismo
pacífico na ciência da linguagem , luso linguistico, no qual se tenta im
pois, tal como as raças , não há lin pedir, em conseqüencia, a realidade
guas puras . E estes dois temas , da lingua brasileira, porque se vem
eomo dissemos , são de muito atua tentando negar até a anterior mes
lidade no Brasil . tiçagem linguística do luso com O
De fato, arvorando, geralmente, o amerindio e o afronegro no Brasil,
nome de Vossler , se tem, entre nós, tal como se pode ver de dois recen
confundido estilo com idioma, como tes trabalhos : Serafim Silva Neto,
aconteceu, recentemente, com a cria Capítulos de História da Lingua
ção do que chamamos de “ escola Portuguêsa no Brasil, Rio, s/d
do estilo brasileiro " , de Sílvio Elia, ( 1946 ) , pág . 47 ; e Matoso Câmara
Serafim Silva Neto e Gladstone Cha Junior, Os Estudos Linguísticos Re
ves de Melo ( ver nosso comentário gionais, no “ Boletim de Filologia " ,
no vol. CXIII, pág . 223, da “ Re Rio, fasc . V ( Março de 1947 ) ,
vista do Arquivo " ), esquecidos de pág. 5 e passim. Tem o tema, tam
que a estilística de Vossler e sua bém , aplicação e relação com o re
escola germânica, ou a de Charles latório da comissão que, nomeada
Bally e sua escola franco suiça , em nossa última Constituinte ( 1946 ) ,
nada tem de idealista ou original em pra opinar sôbre a denominação da
relação com o chamado “ positivis língua brasileira, “concluiu ” que :
mo " do linguísta suíço Ferdinand " a nossa lingua nacional é a lingua
de Saussure , de quem , aliás Baily portuguesa , com pronúncia nossa ,
é discípulo . E isto pela simples ra alguma leves divergências sintáticas
zão de que tanto a estilística de em relação ao idioma atual de além
Vossler ( ver Karl Vossler, Positi mar, e o vocabulário enriquecido por
vismo e Idealismo en la Linguisti elementos indígenas e africanos e pe
ca, trad . , Madri, 1929, sobretudo o las criações e adoções realizadas em
capítulo Un ejemplo de análisis es. nosso meio " , o que quer dizer que,
tilístico, na pág . 182 ) , como a esti. apesar de mestiçagem a comissão
listica de Bally ( ver Charles Bally, afirma que, houve a “ reprodução '
Traité de Stylistique Française, 2a . biológica do português no Brasil .
od ., Paris, 1919, onde se concreti E isto depois de se ler no começo
zam as teorias do seu anterior Pré do mesmo relatório que : “ Encon
cis de Stylistique, Genebra, 1905 ), trou - se ( o português arcaico e co
nada mais são do que aquilo que lonial no Brasil ) , como era natural ,
com a lingua dos indios ; e durante
Saussure ( ver Ferdinand de Saus
sure, Cours de Linguistique Géné algum tempo, foi mesmo o tupi fa
rale , 3a . ed . , Paris, 1931 , sobretudo lado em maior proporção do que o
242 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

português. Não tardou, porém , nas aqui, como em outros casos, a


que se verificasse um principio lin lingua portuguesa , por decreto ofi
guístico que se tem reconhecido cial , é oficialmente ensinada, como
como verdadeiro ; postas em contac lingua estrangeira, em nossas esco
to duas linguas, uma instrumento las, sendo a língua do povo a brasi
de uma civilização muito superior leira, do mesmo modo que a dos nos
à civilização a que a outra serve, sos mais modernos escritores, em
esta cede o seu terreno à primeira . bora ainda disfarçada pela vestimen
Assim, o português, expressão de ta fonológica da pronúncia lusa na
uma civilização mais adiantada , ortografia oficial que, como todos
triunfou sobre o tupi ” . Esquece sabem , ainda é a portuguesa .
ram , assim, os da comissão , a mes É preciso, pois, que as bibliotecas
tiçagem linguística, o substrato e o de linguistica e filologia, na nossas
superstrato, ou seja a profunda al Faculdades superiores de ensino lin
teração do português no Brasil , que guístico, e formação de professores,
eles só conhecem através da litera se completem, paulatinamente, com os
tura lusa ou aqui lusificada ( como mais modernos livros sõbre a ciên
se pode ver pelos nomes dos escri cia da linguagem , como é, ainda
tores que exemplificam o mesmo pa agora, este notavel opúsculo de To
recer ) , além de afirmarem a existên var . E assim, no Brasil, nossos
cia dum princípio linguístico que estudantes de linguística e filologia,
não existe, ou seja a de que “postas não perderão mais tempo bebendo
em contacto duas linguas, a de civi os conhecimentos deles em segunda
lização superior vence a inferior " . mão, nas obras mal informadas ou ,
Se assim fosse, o tupi-guarani não apenas, tendenciosas ou arbitrárias.
seria, ainda hoje, a língua nacional
no Paraguai sem caráter oficial ( a C. C.
oficial é a castelhana ) ; o galês não
seria , no país de Gales, falado e es
crito a par do inglês ( a língua ofi
“ BOLETIM DE FILOLOGIA "
cial da Inglaterra ) ; na Bélgica não
se falaria o valão ( diaieto românico
francês ) , o flamengo ( dialeto holan Publicação Trimestral das Edi
ções Dois Mundos (Brasil Por
dês ) a par do francês ( este e o fla tugal ) Redatores : Antenor
mengo sendo as línguas oficiais ) ; e Nascented Ernesto Faria, Joa
nem na suíça se falaria e escreveria quim Matoso Camara Jr., Sera
reto- românico , italiano, francês e fim Silva Neto e Silvio Elia
Ano II, Junho 1947, Fasc . VI,
alemão, sem se saber qual das civili Rio de Janeiro .
zações destas línguas e dialetos é su
perior a outra ... E isto quer dizer
que, também , a mestiçagem linguisti Este número do Boletim , apresen
ca depende de fatores históricos e po ta a novidade de trazer Ernesto Fa .
líticos . Quanto à lingua geral ou tupi, ria entre os redatores efetivos, pois
no Brasil , se sabe, fartamente, que que o prestigioso cultor do latim
foi pela proibição sistemática dela, entre nós, autor de várias obras
que se conseguiu implantar o portu consagradas, já vinha abrilhantando
guês no Brasil, o português oficial, o Boletim , como ainda agora, com
porque a língua do povo, a lingua colaboração eficiente, feita, em regra,
subseqüente mestiçada nossa, cuja através de utilíssimas resenhas sô
mestiçagem, na proporção aqui veri bre as obras aparecidas na especia
ficada, é completamente diversa da lidade dêle, redigidas de forma sim
que resultou o português moderno ples, clara e atrativa, justo o contrá
em Portugal , é a língua brasileira, rio de Silvio Elia que, ainda neste
produto duma mestiçagem linguís número, não consegue dar pro leitor,
tica no espaço e no tempo, como que ainda não conheça o livro Essai
tôda mestiçagem idiomática . Ape sur la Structure Logique de la
PUBLICAÇÕES 243

Phrase , de Albert Sechehaye, uma em linguistica, na qual colide com a


idéia nítida ( pág . 92) . distinção fundamental, feita pelo lin
Serafim Silva Neto comparece guísta suíço Ferdinand de Saussure,
com Contacto Linguistico ( pàg . 67 ) , entre lingua ou idioma, como fato
Sôbre a Cronologia dos Textos Me social e como sistema linguístico, que
dievais ( pág . 82) , Apontamentos é a execução da língua pela coleti
Lexicográficos ( pág . 86 ) e Estudos vidade, a gramática da lingua, e pa
de Filologia Portuguesa , resenha do lavra , discurso ou fala, que é a ex
livro de F. da Silveira Bueno ( pág. cução da lingua pelo indivíduo, ou
111 ) , onde malha, mais uma vez, seja o que se chama, desde a anti
certas imprecisões técnicas do popu guidade clássica, de estilo ( 1 ) . As
lar professor paulista . De nossa sim , pois, admitir, em linguística, a
parte, porém, merecem reparos, os referida conciliação teórica socioló
dois primeiros trabalhos de Serafim gica de Worms e Wiese, é confun
Silva Neto . dir, linguísticamente, estilo , palavra ,
Realmente, em Contacto Linguis discurso ou fala, fenômeno indivi
tico ( duma introdução da História dual , com lingua ou idioma, feno
da Lingua portuguesa , da qual o meno coletivo, confusão esta, aliás,
autor vem publicando fragmentos feita pelo que, anteriormente (“ Re
desde muito ) , vemos Serafim Silva vista do Arquivo ", vol . CXIII,
Neto, novamente ( ver o que já es pág . 223 ) , chamamos de “ escola do
crevemos, a respeito, na “ Revista estilo Brasileiro " , da qual fazem
do Arquivo Municipal ” , vol . CXIII, parte Sílvio Elia, Serafim Silva
pág. 220 ) , se atrapalhando com a Neto e Gladstone Chaves de Melo,
sociologia misturada com a linguís escola esta, assim, já caducada na
tica, misturada é o termo porque o própria fundação . Mas agora , Se
autor não fixou bem, ainda, as res rafim Silva Neto, em Contacto Lin
pectivas perspectivas . Agora, por guístico , se deixa atrair, como dis
exemplo, ficou atraído por Gabriel semos , por Tarde, pra quem a imi
Tarde, depois de notar a posição tação é o cimento das relações in
conciliatoria de Worms, secundada ter-humanas, da própria sociologia,
por Wiese, entre o individualismo enfim . Daí conclusões de Serafim
de Tarde e o coletivismo de Durk Silva Neto como estas, em hiera
heim, quando Worms disse que quias imitativas : “ a ) o socialmente
social está composto de elementos superior é imitado pelo socialmente
individuais e o individual cheio de inferior ; b ) o rico é imitado pelo
elementos sociais " ( L. von Wiese, pobre ; c ) a cidade é imitada pelo
Sociologia, trad . , Madri, 1932, pág . campo ” ( pág . 68 do Boletim ) , ou
101 ) . sejam esquemas vasios, como vere
Realmente, desde logo acontece mos, e sobre os quais Serafim Silva
que tal posição sociológica concilia Neto deduz várias sortes de contac
tória ( se é que ela já é ponto paci tos linguísticos não menos vasios e
fico entre sociólogos ) nada resolve sem realidade, conseqüentemente .

(1 ) " Fra queste chi parla, o chi scrive, puó scegliere liberamente quelle che a lui
paiano rendere meglio il proprio pensiero . Codesta varietà di modi e libertá
de scelta va mano crescendo a seconda che dalle proposizioni semplici passia
mo a quelle composte e alla multiforme maniera di unirle, di combinarle,
d'intrecciarle insieme in periodi. Ognuno ha a sua disposizione un complesso
di parole e di forme che costituiscono quella parte di língua che diremo fissa
e tradizionale, ma nel suo discorso, sia nella scelta delle parole, sia nella loro
collocazione ed unione ognuno deve mettere qualche cosa di suo ; la língua é
come una materia molle che egli deve di volta in volta plasmare, secondo il
concetto che gli nasce nella mente, secondo i moti che gli si destano nell'ani
mo . Questa parte che ognuno mette di suo nel parlare e nello scrivere é lo
stile . La stilistica prende appunto le mosse dalla grammatica ; dove
questa cessa di poter dare regole fisse e costanti , incomincia la stilistica a
dettare le sua, che sono regole di gusto, di preferenza, che ognuno puó, ma
non é obbligato a seguire ” ( Vigilio Inama , Filologia Clássica Grecà e Latina,
2a. ed ., Milão, 1911 , págs. 111 e 112 respectivamente ) .
244 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

De fato, desde logo a linguística mo modo que caipirada na cidade,


mostra que havendo, dentro da lín ou linguagem urbana no campo, pra
gua comum ou nacional, linguagem falarmos em termos acessíveis . Dai
das classes ricas ( geralmente letra só a mobilidade vertical ou horizon
das e mais alfabetizadas ) e lingua tal em sociologia, e conseqüente
gem das classes pobres ( inferiores mestiçagem , ou assimilação, linguis
pela pobresa e analfabetismo ) , tais tica , e não a alegada imitação, se
classes são mais ou menos estanques rem as únicas bases possíveis pra
e, conseqüentemente, de contacto compreensão dos fenômenos nesta
mulo ou precário em nossa sociedade, interdependência linguística ou mes
como, aliás, a observação comum de tiçagem . Por isto mesmo, aliás, é
qualquer de nós pode notar . Mes que na conclusão que Serafim Silva
mo porque desde que tais linguagens Neto nos dá no trabalho em comén
se inter-penetrem ou mestiçem , é tário ( Boletim, pág . 81 ) , embora
que houve não imitação do social falando da imitação de Tarde, deixa
mente superior ou rico pelo social patente a coerção de Durkheim .
mente inferior ou pobre , mas sim Daí o podermos dizer, conclue
condições sociais modificadas, mobi Serafim Silva Neto, que a his
ridade vertical em sociologia . 0 tória da língua se concretiza como
mesmo se pode dizer da referida a coleção das iniciativas mais imi
" imitação da cidade pelo campo " , tadas, isto é, mais conformes com a
que depende de mobilidade horizon movimento geral da evolução ” (gri
tal em sociologia . De fato, e não fo do autor) . Porem isto é o mes
sabemos se isto já foi notado pelos mo que dizer : mais conforme com
sociólogos, ambos os fenômenos es a coerção social, com a própria so
tão subordinados pela circunstância ciedade na evolução dela, enfim .
da imitação do fato social de Tarde, Outros reparos poderíamos fazer,
equivaler , tanto linguística como so ainda, sobre as confusões de Sera
ciológicamente , à coerção do fato fim Silva Neto entre sociologia e
social de Durkheim , pois a inovação linguística, neste mesmo trabalho do
individual donde resultou a imita autor, mas o que ai fica é bastante
ção , de Tarde (Les Lois Sociales , pra exemplicação. Do autor, pas
Paris , 1910, pág . 52 ) , só se cole semos, agora, pra Cronologia dos
tiviza com a sanção social , ou , fa Textos Medievais ( pág . 82 do Bo
lando linguisticamente, na observa letim ) , onde há reparo importante
ção do linguista suiço Charles Bally , a fazer . De fato, tal como já fize
El Lenguaje y La Vida ( B.Aires , ra no seu Manual de Gramática
trad. , 1941, 168 ) , é o ouvinte , e não Histórica Portuguesa ( S. Paulo,
o falante, que introduz as novidades 1942, pág. 25 ) , novamente aqui Se
ma lingua, porque antes de propagar rafim Silva Neto repete, do mesmo
estas novidades, teve que adotar modo como temos visto até em his
elas , sancionou elas, sendo a altera tória pátria ( ver, Jónatas Serrano,
ção, pois finalmente , social , do ou dos Hitória do Brasil, Rio, 1931 , pág .
ouvintes, depois de vencida a coerção 23-4 ) , que foi o rei D. Denis que
social , a qual, por isto mesmo, pode decretou 0 uso escrito oficial do
regeitar e regeita, de fato, infinitas idioma vulgar, língua nacional ou
inovações individuais numa mesma português em Portugal . Não sabe
linguagem , ou na interpenetração de mos, até hoje, qual a data de tal de
linguagens diversas . Donde a coer creto, ou em que coleção de leis foi
ção tanto existir na classe inferior isto se buscar, porque até, pelo con
como na superior, na rica como na trário, é um linguista português de
pobre, no campo como na cidade , mérito que nos informa com preci
onde as inovações , respectivamente, são : “ Os mais antigoz documentos
podem ou não ser sancionadas : lin portugueses que se acham publicados
guagem granfina na classe pobre ri são uma noticia particular sem data ,
dicularizada, ou vice -versa , do mes mas que é considerada como remon
PUBLICAÇÕES 245

tando ao reinado de D. Sancho I ( de vulgar ganhou nos reinados de D.


Portugal ) e uma noticia de parti Afonso III e D. Denis resultou da
Thas datada do mês de março da era cultura literária, do emprego dela
MCXXX ( ano 1192 ) . Depois nas composições poéticas e em dife
dos dois documentos referidos só rentes obras em prosa " . É verdade
comec a aparecer outros em por que D. Denis muito contribuiu pra
tuguês , segundo João Pedro Ribeiro, isto, donde talvez a idéia de que te
do reinado de D. Afonso III e des nha decretado qualquer coisa , e como
de o ano 1255 ; esses documentos tor se pode ver de Fr. Joaquim de San
nam - se muito numerosos no reinado ta Rosa de Viterbo, Elucidário das
de D. Denis . Êste rei , porem , não Palavras. Termos e Frases que em
ordenou por lei que o português fos Portugal Antigamente se Usaram
Se empregado nos documentos públi ( Lisboa, 1865, 2a. ed., vol I, pág. 9 ) ,
cos ( grifo nosso ) . A importância o qual, depois de se referir à funda
que a língua vulgar ganhou nos rei ção da Universidade, em Lisboa
nados de D. Afonso IU e Denis ( 1290 ) , por D. Denis , comenta :
resultou da cultura literária, do em * Esta sem dúvida foi a época mais
prêgo dela nas composições poéticas feliz da literatura portuguesa, pois
e em diferentes obras em prosa . A nela se lançaram os fundamentos só
língua portuguêsa está definitivamen lidos a tudo o que havia de ser eru
te elevada à dignidade de lingua es dição sagrada ou profana . Então
crita ( F. Adolfo Coelho, 4 Lín . foi que o dialeto português tomou
gua Portuguêsa , Porto, 1881 , $$ 106 posse de quase tudo o que era pú
e 108 respectivamente ) . Mas sõbre blico e judicial , desterrado para as
o assunto as inexatidões não parain Cimerias sombras o estafermo, ou
ai, porque aqui mesmo no Brasil, já aparentes sombras do latim . Então
faz muito, se estabeleceu outra : “ Em foi que o mesmo soberano no pri
1400 D. Pedro I ordenou fossem os meiro de Agosto de 1281 fez passar
atos e instrumentos públicos escritos na língua do país a notável carta
em vulgar mas foi D. Denis, que circular sobre a retidão e brevidade
a exemplo de D. Jaime I, o Aragão, com que os seus ministros e oficiais
de D. Afonso X em Castela e Fer de justiça a deviam fazer às partes ,
nando II na Itália deu à lingua a qual se achará ( no verbete pon
romana ( o romanço luso do latim) taria . do Elucidário, onde se encon
direito de cidade em Portugal” ( M. tra transcrita, completa e por exten
Pacheco da Silva Júnior, Gramática so, a circular em questão , puramente
Histórica da Língua Portuguesa, jurídica, nada nela havendo com re.
Rio, 1878, pág . 45. parêntese nosso) . lação a decreto algum de oficializa
Sabido, pois , que Adolfo Coelho con ção de lingua) . Então foi quando
testa, formalmente, a existência de ( continua Viterbo ) as muitas tradu
qualquer lei de D. Denis , e sabido, ções, que o mesmo rei fez trabalhar
também , tal como já observou entre dos melhores livros espanhóis, ará
nós Sílvio Elia na revista A Ordem bicos e latinos, concorreram como à
( n .° de janeiro, de 1943, pág . 90) , porfia, para ser cultivada a elocução
que, em 1400, quem ocupava o trono dos portugueses " .
português era D. João I ( 1385-1433 ) No Boletim , vemos, em seguida,
e não D. Pedro I, que não podia, Joaquim Matoso Câmara Junior
assim, jamais ter decretado coisa al comparecer com resenhas sôbre The
guma em 1400, é bom nossos profes Indo Hittite Laryngeals, obra do
sores se absterem de informar erra norte-americano Edgar H. Sturte
damente, ou sem base segura , nos vant ( pág . 116 ) , sobre a Introdução
compêndios didáticos deles, a este ao Estudo da Filologia Portuguesa ,
respeito, onde, todavia, a informação do luso Manuel de Paiva Boléo
mais segura e real parece a de Adol ( pág . 113 ) e, finalmente , um peque
fo Coelho, 66 sobretudo quando infor no artigo Sôbre a Classificação das
ma que a importância que a língua Palavras ( pág . 87 ) , que merece
246 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

comentário . Aí trata o autor da determinado por el mismo acto de


ainda debatida classificação do pro la palabra o por una acción ( un ges
nome, têrmo não mais tido no sen to ) que acompaña el acto de la pa
tido etimológico de "palavra que labra" ( La Oración y sus Partes,
substitui o nome dos seres , defi 3a. ed., Madri, 1935, § 154 ) . Por
nição que nada significa sob as luzes tanto, conclue Lenz : " Hay tantas
da moderna linguística, e ainda me clases de palabras pronominais como
nos podendo ser confundido na já hay palabras conceptuales : 1º. Pro
caduca classificação de adjetivo de nombres substantivos ; por ejemplo :
terminativo dum lado e pronome eti yo, tú, él, ella, éste, alguien , quién ,
mológicamente dito do outro . De cada uno, etc. 2.° Pronombres ad
pois de várias considerações, dá Ma jetivos ; por exemplo : tal, tanto,
toso Câmara uma das conclusões cuál, cual, cuánto, cuanto , algún ,
que vem sendo aceita, ou seja a de cada , todo, este, ese , aquel, etc. 3.°
que, tal como os próprios nomes, Pronombres adverbiales o proadver
que podem ser substantivos e adje bios ; por ejemplo : asi, tan, como,
tivos, “ nomes e pronomes apresen como, cuándo, cuando, dónde, donde ,
tam a divisão secundária em subs entonces, etc .. 4.° Pronombres verba .
tantivos e adjetivos, de acordo com les o proverbios. Esta clase de pala
sua função no discurso" , comentan bras, a causa del carácter especial
do : “ Entre os pronomes, há alguns del verbo propriamente tal que ex
com função substantiva privativa ; pressa la combinación de um con
muitos, porém , prestam - se para as cepto de fenomeno com el concepto de
duas funções, e é às vezes até bas persona, existe sólo en pocos idiomas
tante sutil distingui-las. Assim, em que poseen pronombres conjugados.
aquele livro e éste , o pronome La idea correspondiente se indica en
êste estará em função adjetiva, como nuestras lenguas por verbos descolo
aquêle, com o substantivo oculto por ridos ( ser, estar, hacer, proceder ,
zeugma ; mas a função substantiva é etc.) con pronombres ( quién , cuándo,
inegável em Este que soecorer - lhe dónde, asi, cómo tal, etc.) ” ( local
não queria ” ( pág . 90 do Boletim ) . citado ) . Posteriormente, estudando
Esta doutrina, aliás, já está até com o mesmo problema, vemos o linguis
pendiada por livros escolares nossos, ta francês Ferdinand Brunot ( La
como se pode ver de Mário Pereira Pensée et la Langue, 3a. ed., Paris,
de Sousa Lima, Gramática Portu 1936, pág . 171 e ss . ) notar, tam
guesa , Rio, 1945, $ 65, b . Mas não bém, que mau grado definição eti
podemos deixar de observar que, ad mológica de pronome, o termo tem
mitir apenas pronome adjetivo sido aplicado a palavras que repre
( quando adjetiva um substantivo ) e sentar ( porque o pronome não subs
pronome substantivo ( quando, iso titui e sim representa o nome, obser
lado, indica um substantivo ) , é re va Brunot, op. cit., pág. 173) coisa
duzir a divisão conceitual das pala muito diversa de nome ou substan
vras, ou partes do discurso, apenas tivo, tanto que pode representar,
em nomes ( substantivos e adjetivos ), muitas vezes , adjetivos (bela, ela o
pois , tal como observou o linguista é ) , verbos ( vamos, isto é preciso )
teuto-chileno Rodolfo Lenz, tendo e, até, idéia ou frase inteira (ela
em vista a noção elementar das pa desfez a cabeleira, e isto com a sim
lavras como expressão de conceitos : plicidade duma criança ; bebo água ,
“ Pronombre es toda palabra que no o que me faz muito bem ) . Daí,
expressa por sí un concepto determi. observa Brunot, numa curiosa coin
nado, sino que reproduce formalmen cidência com Lenz ; “ II faudrait donc
te ( repite ) un concepto antes emi distinguer des pronoms, des proad
tido ( en los interrogativos e inde jectifs, des proverbes, de prophrases
finidos el concepto a menudo sólo pour éviter ces mots équivoques ou
ha sido pensado, no emitido, por el barbares, nous dirons représentants."
que habla ) , o indica um concepto ( op . cit . , pág . 173 ) . E com este
PUBLICAÇÕES 247

termo de representante dado por piamente dicho ", y que este es el


pronome , que assim não é mais o que sustituye a un nombre " ante
substituto do nome, mas sim, tal co riormente enunciado " ( no es esta
mo em Lenz, o representante do con una coletilla extraña puesta por un
ceito significado pela palavra ou gramático raro, sino la fórmula ge
frase que o pronome ( representante ) neral de las gramáticas ) . Enton
representa , Brunot estabeleceu , de ces, yo no es pronombre, no los es
pois de várias considerações , o se tú . Unicamente lo es el de tercera
guinte esquema, onde se tenta incluir persona : él, ella , ellos, ellas. Po
toda uma complexa nomenclatura demos, pues, aceptar que todos los
pronominal: Representações : pesso gramáticos, sin excepción, sabem que
ais ou simples ( gosto mais do teu no es necesario que una palabra “ es
irmão, ele pelo menos é franco) ; té en lugar de un nombre anterior
conjuntiva ( gosto mais do teu ir mente enunciado " , para ser un “ pro
mão, que pelo menos é franco ) ; pos nombre propriamente dicho " . En
sessiva ( gosto mais do teu irmão tonces, si se quita esta falsa razón, no
que do dêle ) ; demonstrativa ( dos queda ninguna otra para llamar a
dois irmãos que me apresentastes , los posesivos у demostrativos
gosto mais deste ) ; determinativa ou unas veces pronombres y otras
qualificativa ( dos teus dois irmãos, adjetivos . ... Sea el ejemplo : “ T :)
gosto mais daquele que foi ferido em ma tu livro ; yo me quedo con el
Verdun ; gosto mais do mais jo mío " . Se analiza aquí que tú es »
vem ) ; e numeral e distributiva ( tive adjetivo “ porque determina a libro
três irmãos, um foi ferido na guerra , y que el mío es pronombre " porque
os dois outros escaparam , todos pas reemplaza a livro " . Pero qué es
saram pela Escola Central ; mas ca “ reemplazar” ? “ He visto a Fer
da um tinha sua idéia de futuro, não nández ; él me ha dicho ... " EI
se pareciam muito tem com outro ) . reemplaza a Fernández, nombre an
Mas não é tudo, ainda recentemen teriormente enunciado ; de modo que
te, na Argentina, os bens informa se puede decir “ Fernández me ha
dos linguistas Amado Alonso e Pe dicho ... Quitamos el reempla
dro Henriquez Ureña (Gramática zante, él, y ponemos el reemplazado,
Castellana, Primer Curso, 3a. edi Fernández . Hágase ahora la prue
ção, Buenos Aires, 1943, págs . 224 ba con nuestro ejemplo, para ver si
e ss . ) , depois de examinarem as ve mio és “pronombre propiamente di
lhas doutrinas do pronome, fazem a cho " : toma tú libro ; yo me quedo
seguinte resenha e conclusão : “ De con el libro . Queda comprobado
modo que la cuestión tiene estos tres que mio no sustituye a livro, pues
térıninos : 1. El pronombre propia to que, si ponemos libro en lugar de
mente dicho es el que está en el 1:1 mio, la frase pierde su sentido .
gar de un nombre anteriormente Hasta ahora sólo hemos llegado a
enunciado . 2 . Por consiguiente, dos conclusiones principales, ambas
mon, en mon chapeau ( mi, en mi negativas : 1 , que el papel del pro
sombrero ) no es propiamente pro nombre no consiste en reemplazar
nombre ; en cambio, si lo es le mien al nombre ; 2, que los posesivos y los
( el mio ) , refiriéndo se, por ejemplo, demostrativos no son diferentes cla
a sombrero, anteriormente enunciado. ses de palabras cuando se emplean
3. La doctrina del pronombre como acompañando y cuando se emplean
sustituto es unánimemente rechaza sin acompañar al sustantivo . Pero
da, pero las gramáticas escolares si los pronombres son, sin duda, una
guen por rutina manteniendo una clase especial de palabras y deben
distinción basada en ellas . ... Ob consistir en algo especial . Previa
servese que el llamar a los posesivos mente, otra negación más : como
unas veces pronombres y otras adje Bello vió con entera certeza , los pro
tivos pronominales se basa en la nombres no forman una parte de la
idéia rigurosa del “ pronombre pr.) . oración ; en cuanto al oficio grama
248 REVISTA DO ARQUIVO VUNICIPAL

tical , los pronombres no pueden es tica . En resumen : las partes


capar de ser sustantivos o adjetivos de la oración y los pronombres son
o adverbios . En esto sólo coinci categorías heterogéneas, que no ea
den Bello y la Academia, las dos tran en serie y que pueden por lo
autoridades que se suelen citar en tanto coincidir en una misma pala
discrepancia , sino que es un hecho bra : por consiguiente, presentar en
generalmente admitido ( la Gramáti disyuntiva el que mi, o tuya , o esta,
ca de la academia, que ha sido he sean adietivos o pronombres, es tan
cha por diferentes académicos de di sin sentido como presentar la disyun .
ferentes épocas y ha ido creciendo tiva de si árbol es sustantivo o es
por agregación , enumera los pro masculino " .
nombres en un lugar, $8, entre las Como se vê, pois a doutrina dada
partes de la oración ( oficios grama como aceita por Matosn Camara
ticales ) y en otro lugar, $71 , decla Junior e outros, está longe de ser
ra que los pronombres a la vez que ponto pacífico em linguística, sendo
pronombres son adjetivos o sustan o assunto, pelo contrário, ainda pos
tivos ) . Las partes de la oración sível de largo estudo . Desde logo,
que se llaman sustantivos , adjetivo, aliás, podemos notar dois defeitos
adverbio. verbo, conjunción y pre em qualquer doutrina das acimas ex
posición son oficios oracionales , esto postas : 1.°) Se baseiam na tradi
es , categorías formales adecuadas a cional divisão das partes do discurso ,
los diferentes papeles que las pala essencialmente , em nome ( substan
bras desempeñan en la oración ( su tivo e adjetivo ) e verbo, divisão es
jeito, predicado, complemento , etc. ) . ta falsa , em linguística, porque se
Los pronombres cumplen uno u otro funda na lógica formal ( sujeito e
de estos oficios ; pero, además, tie predicado ) , além de não ser ainda
nen algo de peculiar, ajeno a la ponto pacífico a distinção conceitual
cuestión le los oficios oracionales . ou significativa ( a única que linguis
Los pronombres son un clase semán ticamente interessa ) entre nome e
tica de palabras , caracterizada por su verbo, e tal como já focalizamos em
especial modo de significación : la Definição Linguistica de Verbo , ar
significatión de los pronombres es tigo nosso publicado pelo diário ca
essencialmente ocasional ”. ... Las rioca “ O Jornal ", de 4 de Novem
demás palabras se refieren a su ob bro de 1945. 2. ) Morfológica ou
jeto como tal objeto, con su modo semánticamente ( na forma ou no
peculiar de ser : libro , velozmenie, significado ), os conceitos traduzidos
sufrir, blanco. Los pronombres , en pelas palavras tomadas isoladamente,
cambio, se refieren a su ohjeto por nelas mesmas, como organismos au
el rodeo de las tres personas gramá tônomos, pois tal é a clasificação
ticales ou del sustantivo anteceden tradicional das partes do discurso ou
te . Y como cualquier objeto puede oração ( substantivo é a palavra que...,
ser ocasionalmente primera, segunda adjetivo é a palavra que ... , verb ,
o terceira persona, y como cualquier é a palavra que ... , etc. ) , nada sig
sustantivo puede ser ocasionalmente nificam senão quando relacionada
antecedente del relativo, resulta que com a pessoa que fala, o sujeito fa
la significación concreta del pro lante e, assim sendo, a única classi
nombre tiene que variar en cada ficação que se poderá fazer das par.
ocasión , y por ese se dice que es tes do discurso ou oração, é psicoló
“ esencialmente ocasional" . En es gica, se traduzindo as palavras pelo
ta neta distinción entre categorías significado que representam , pelo
formales (oficios gramaticales ca menos, no esquema dado pela psico
tegorías de significación, y en poner logia : palavras significativas da nos
en éstas y no en aquéllas la natura sa vida afetiva ou sentimental, da
leza de los pronombres, coinciden nossa vida intelectual e da nossa vi
tanto los filósofos del lenguaje como da ativa . Isto, é claro, acrescido
los modernos teóricos de la grama das perspectivas linguísticas dadas
PUBLICAÇÕES 249

pelas três pessoas gramáticais ou do respondências fônicas idiomáticas


discurso, e sendo neste ponto , aliás, históricas e comparadas ( leis foné
que Rodolfo Lenz, Amado Alonso e ticas ) , devidamente entrosado o sin
Henriquez Ureña mais se aproxi crônico e o diacrônico, o fonológico
mam da verdade nas considerações e o fonético, a par do fonológico e
anteriormente transcritas . A pró fonético com o semântico, e a lin
pria história da linguística é, desde a guística dialetal com a literária ou
antiguidade clássica, um conflito entre filológica, são empregados aqui, mais
os vários pontos de vistas psicológicos uma vez, com a costumeira eficien
dados ( intelectual , afetivo e ati cia, por Yakov Malkiel especialista
vo ) , tal como pretendemos mostrar de alta classe no assunto e do qual
um dia em livro que preparamos , já tivemos ocasião de comentar, an
mas aqui ficando nisto, por quanto teriormente ( volume CIV da “ Re
maiores considerações nos levaria a vista do Arquivo " ) , dois outros es
exorbitar , excessivamente, dêste sim tudos do mesmo tipo e nível , se evi
ples comentário . denciando, ainda , exaustiva biblio
Apresenta o Boletim, por último, grafia .
as habituais e utilíssimas secções de E como sempre, Malkiel aborda
Através das Revistas ” ( pág . 118) , ângulos dos mais difíceis e, fre
Bibliografia ” ( pág. 125 ) e “ No quentemente, ou na totalidade, iné
ticiário " ( pág . 127 ) . E mais um ditos . É assim que, nestes três es
comentário final nosso : porque, na tudos, que farão a delícia dos eti
utilíssima secção de “ Bibliografia ”, mologistas, temos, conforme com as
não nos dá o Boletim, também , os próprias palavras do autor no pre
nomes dos editores, casas editoras ou fácio :
distribuidoras dos livros aí registra " O ensaio sobre mácula se baseia
dos ? Isto tem extraordinário inte principalmente, em material dialetal
rêsse pro leitor, sem dúvida . E ai hispânico, fàcilmente verificável atra
poderia também constar, pelo menos, vés da publicação de numerosos glos
o número de página da respectiva sários regionais. Cerca de tresentos
edição, base próxima pro preço do reflexos desta palavra e dos cognatos
livro desconhecido do leitor, pois, latinos dela, foram identificados con
pros preços, variando muito, como dialetos espanhóis e portugueses, in
se sabe, não conviria o registro dos clusive nos falados na América. A
mesmos . classificação destes produtos confor
C. C. me o critério formal e, em alguma
extensão, com o critério semântico -
a despeito da deficiência de docu
mentos literários pra vários ramos
“ THREE HISPANIC WORD aí implicados – deu um razoável e
STUDIES, LATIN MACULA IN bastante precisa reconstrução de fa
ses sucessivas do desenvolvimento
IBERO C ROMANCE ; OLD de toda esta família de palavras, du
rante um período de perto de dois
PORTUGUESES TRIGAR ;
mil anos ” .
HISPANIO LO (U) ÇANO " “ A questão se o antigo português
e antigo provençal trigar resultam
da mesma fonte, tem sido respondida
Yakov Malkiel University of negativamente, desde muito, porque
California Publications in Lin
guistics , volume 1 , n . ° 7, pp. as respectivas conexões, alem de dis
227-296 (Separata ) University paratadas, se mostram diametralmea
of California Press, Berkeley and te opostas . Todavia, cuidadosa pes
Los Angeles 1947.
quisa de antigas fontes indica que o
Os recursos da moderna técnica latim triari, tricare é a razão de
etimológica da linguística, indo des ambas as formações . E aqui se tem
de o uso adequado e crítico das cor um exemplo de como uma família
250 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

de palavras, agora quase completa Miranda, “ Glossário Paraense ou


mente extinta, mas existente, atra Coleção de Vocabulos Peculiares de
vés da Idade Média, em dois peque Amazônia e Especialmente à Ilha do
nos e distantes cantos do território Marajó , Pará, 1906, pág. 55 ) . En
romance ( Romania ) ; pode ter a his quanto isto, malhada , no sentido ru
tória linguística dela compreendida ral, para o gado vacum , existe não
apenas pela luz de documentos histó só em Pernambuco, conforme regis
ricos primitivos " . tra Yakov Malkiel ( pág . 237 ) , ba
“ Ohispânico lo ( u ) cano, motivo seado em Teschauer ( op . cit . ) , mas
de calorosos debates através de gera também no Pará : “espaço onde ha
ções de etimologistas, retardados no bitualmente se reune o gado para
falar dialetal, especialmente do norte ser trabalhado, e também lugar onde
e do oeste da península, embora os o gado costuma pernoitar em lotes "
modernos documentos do uso dele ( Chermont de Miranda, op . cit. ,
dificilmente conceda alguma chave pág . 55 ) , sendo que ainda no sentido
pra respectiva origem . Mas a clas de grupo de rezes " , se encontra
sificação dos mais velhos significa registrado por Euclides da Cunha ,
dos, preservados na literatura medie Os Sertões, conforme Pedro A.
val, sugere que esta palavra (limi Pinto, Os Sertões de Euclides da
tada e igualmente distribuida, na Cunha, Vocabulário e Notas Leri
pensínula, na reduzida zona catala ) cológicas . Rio de Janeiro, 1930,
pertence ao superstratum represen pág . 188, e no sentido de “ ajunta
tando, com toda a conformidade, um mento do gado, ou de sítio onde o
híbrido hispano - gótico " . gado costuma freqüentar e descan
Finalmente, dado o interesse que sar ” , é registrado, também , por Se
o autor revela pelas nuances semân bastião Almeida de Oliveira, Er
ticas dos vocábulos estudados no pressões do Populário Sertanejo
Brasil, cabe aqui algumas achegas ( meio rural paulista ), S. Paulo ,
nossas . Assim, no Brasil, malhar 1940, pág . 118, com material colhido
( de malha, do latim magalia) , não pelo autor, 66 com fidelidade, durante
tem apenas o sentido geral ou figu mais de um decênio, na tradição oral
rado de pernoitar, procurar abri do povo sertanejo junto aos confins
go ” , dado pelo autor ( pág. 236 ) , geográficos de três estados : São
que se baseou em Carlos Teschauer, Paulo, Minas e Mato Grosso, tendo
Novo Dicionário Nacional ( 2a. ed ., como pivot o município paulista
Porto Alegre, 1928, pág . 582 ), es Tanabí ” ( op. cit., pág . 11 ) . Por
te com a abonação única de, José de último, malhada ( ou maiada na pro
Alencar, Sertanejo, I, 68, pois que núncia roceira ou matuta ) , embora
tal sentido é antes extensão do ter dada como usual no R. G. do Sul
mo rural : malhar, “ estar na malha- . por Teschauer ( op . cit . , pág . 582 ) ,
da ( lugar sombreado onde se traba não é registrada por vocabulários
lha ou abriga o gado ), abrigar-se o sul-riograndenses ( Pereira Coruja,
gado da soalheira, reunir-se o gado, Romaguera Correia, Roque Callage
conforme a hora , em certos lugares e Luiz Carlos de Morais ), mas deve
cercados, para pastar ” ( Rodolfo
lá existir como termo rural, pois na
Garcia, Dicionário de Brasileirismos, Argentina há também o castelhano
Peculiaridades Pernambucanas, tomo majada ( de mallada ), “ manada ou
76, de 1913, da R. I, Hist . Bras . , hato de ganado lanar ” ( Diccionário
pág . 850-1 ) ; “ pastar, descançar, de la Lengua Espanhola, da Real
levar o gado à malhada " ( F. A. Academia Española, Madri, 1939,
Pereira da Costa, Vocabulário Per 16a . ed . , pág . 801) . É pois, termo
nambucano, R. I. Arq. Hist . e geral do Brasil rural, de gado va
Geogr. de Pernambuco, vol . 34, cum, de origem lusa mas com sig-
1937, pág . 437 ) ; “ freqüentar, per nificado aqui particularizado.
noitar, ter querência, diz-se somente
do gado vacum " ( C. Chermont de Cruz Cordeiro
DOCUMENTAÇÃO
ORDENS RÉGIAS

( 1737 a 1757 )

N.° 24 Registo de huma Provizão de S. Mage . q .


Ds . gde . pa . o dor . ouvidor gal . desta Comarca Domingos
Luiz da Rocha poder levar as propinas que se costumavão
pagar aos seus antecessores o cegtes .

Dom João por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves da


quem e dalem mar em Africa senhor de Guinê & .a. Faço saber aos que
esta minha provizão virem que eu hey por bem que o bacharel Domingos
Luiz da Rocha a qm. tenho nomeado por ouvidor geral da Cappitania de
São Paulo vença com o dito lugar as mesmas propinas que pella Camera
herão pagas a seus antecessores, e se custumão pagar aos ouvidores geraes
da Cappitania do Rio de Janeyro. Pello que mando ao meu governador e
cappitão general da Cappitania de Sam Paulo e aos officiaes da Camera da
mesma cidade cumprão e guardem esta provizão e a fação inteyramente cum
prir e guardar como nella se contem sem duvida alguma, a qual valerá como
carta e não passará pella chancellaria sem embargo da ordenação do lo. 2 .
ttos. 39 ; e 4.° em contrario. El Rey nosso senhor o mandou pello Dezem
bargor Thomé Gomes Moreyra, e Manoel Caetano Lopes da Lavre conselhros.
do seu Conselho Ultramarino ; Theodozio de Cobellos Pra. a fez a nove de
Outubro de mil e setecentos e quarenta e dous o Secretario Manoel Caetano
Lopes da Lavre a fez escrever e asinada // Thomê Gomes Moreyra //
Manoel Caetano Lopes da Lavre // Por despacho do Conselho Ultro. de
vinte e sete de abril de 1742 // Regda. a fl. 162 do lo. 9.º de provizoes
da Secretaria do Conselho Ultramarino Lxa. des de outubro de mil e
setecentos e quarenta e dous // Manoel Caetano Lopes da Lavre // E não
se continha mais na dita Provizão que bem e fielmente aqui fiz registar
do proprio original o qual em todo e por tudo me reporto e a entreguey
ao mesmo Doutor ouvidor geral e corregedor desta Comarga pella ma
haver dado pa. a registar e a confery sobscrevy e asigney nesta cide. de
São Paulo aos trinta dias do mes de setembro de mil e setecentos e qua
renta tres annos e eu Manoel da Luz Silveyra escrivão da Camera que
• sobscrevy asigney e confery Manoel da Luz Silveyra . Confo. pr .
mim . Silveyra.

Consta á margem : Emporta a escrita deste lo. de fl . 18 the qui


fl . 23 $464rs .
254 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

N.° 25 Registo de huma ordem de S. Mage . sôbre


1

os excecivos gastos que os ouvidores ges . mandavão fazer


com azeites, ferros, e mais couzas da cadea pellos bens do
Conselho , e aposentadorias delles tendo cazas proprias, e pro
pinas como nella se declara e rubricas de livros .

Dom João por graça de Ds. Rey de Portugal e dos Algarves da quem
e dalem mar em Africa senhor de Guiné &.a. Faço saber a vos officiais
da Camera da Cidade de São Paulo que se vio a representação que me
fizestes em carta de vinte e nove de Agosto do anno passado em que
insinuaveis que pellos exsessivos gastos que os ouvidores geraes manda
vam fazer com azeites, ferros e mais couzas da cadea pellos bens do Con
celho estava nos termos de se achar empenhado em dous mil cruzados,
cuja despesa pertencia as condenações da justiça, e não a esse Senado;
e que replicando vôs a mesma despesa vos passavão mandados os ouvido
res com pena para se dar porem prestimo ; e pedindo se aos thezoureyros
das taes despezas responderão não ter com que pagar ; ao que devia eu
de dar providencia, tanto pello que se pedia a esse Sennado como ao ca
minho que levam as condenaçoens das despezas da Justiça ; e que alem
da refferida despesa entrara ó ouvidor Joam Rodrigues Campello a ru
brica livros contra o estillo desse Sennado cujas rubricas as fazião os
prezidentes delle sem despeza algua, levando o dito ouvidor oitenta reis
por cada rubrica, que no espasso de nove annos que servira importavão
duzentos settenta e sete mil rs ; e que por huma e outra despeza se estava
devendo a Fazenda Real o que tocava a esse Camera pagar para os or
denados do do. ouvidor sem haver redito por donde se pudeçe pagar pellos
continuos gastos que os ouvidores obrigão fazer a esse Senado e que de
continuo estavão indo a Camara ocupar o lugar de presidente, dizendo
que a elles lhe tocava todas as vezes que quizessem ; perturbando desta
sorte os despachos do bem comum expondo mais que ignoraveis se nas
festas reaes que os Sennados custumão selebrar conforme as leys se lhes
devia dar propinas não assistindo as ditas festas , como temde obrigação,
e que tambem praticava o do. ouvidor Joam Rodrigues Campello nos actos
de correição levar desse Sennado fora das contas que lhe tomava de seus
rendimentos e despezas, alem dos emolumentos que lhe tocavão, de as to
mar, vinte mil rs . de apozentadoria, dizendo pertenser lhe naquele acto de
correição sem embargo de eu lhe prohibir por hua provizão de quinze de
novembro de 1735 /ị não levaçe apozentadoria por ter casas proprias dos
ouvidores compradas com o dro. das despesas da Justiça desde o tempo do
ouvidor Manoel de Mello Godinho Manço sendo ouvidor sobretudo o re
ferido, o procurador de minha croa. Me paresseo dizer vos, que quanto
as despezas da cadea se nessa cidade não ha alcayde mor a quem pertenção
as carseragens que por isso estejão obrigados as ditas despezas, havendo
carsereiro que perceba toda a carseragem , deve pagar conta certa aos quar
teis , pondo se em deposito para as duas despezas da cadea, e o que faltar
se pagará pellas despesas da Justiça havendo as, tomando se todos os
annos conta dellas ; e quanto as rubricas, dos livros pertencentes a Ca
mera, e governo da cidade as deve fazer o juiz ordinario sem sellario, e
não o ouvidor, não tendo para isso provizão ; declarando que os ouvidores
não podem hir a Camera occupar o lugar de Prezidente salvo na ocazião
de hir a ella fazer correição, ou eleyção ou em a entrada de seu cargo de
ouvidor nem ter propina de procissoes não assistindo a ellas, nem emolu
mentos alguns pella aposentadoria, tendo como dizeis casas proprias para
Os ouvidores e outro sim se vos declara que deveis fazer esta queixa na
rezidencia do ouvidor, o que asim ficareis entendendo para o praticares
sc tiveres semelhante motivo, e quando os ouvidores não pratiquem o que
nesta ordem disponho, recorrereis ao governador o qual ouvindo o ouvidor
ORDENS REGIAS 255

por escripto detreminará a duvida dando me conta . El Rey nosso senhor


o mandou pello dezembargador Raphael Pires Pardinho, e Thomé Joaquim
da Costa Corte Real consos. do seu Conso . Ultramarino e se passou por
duas vias ; Caetano Ricardo da Sylva a fez em Lisboa a doze de Mayo de
1744. O secretario Manoel Caetano Lopez da Lavre a fes escrever // Ra
phael Pires Pardinho // Thomé Joaquim da Costa Corte Real // Por despacho
do Conso. Ultro. de sinco de fevro. de 1744 // E não se continha mais
na dita ordem de S. Mage. q. Ds. ge. que aqui fiz registar e bem fielmente
do proprio original a que me reporto que fica no Arquivo do Sennado da
Camera desta cidade, e vay na verdade sem couza que duvida faça porque
o ly corri, conferi e consertey com a propria por mim somente sobscripta
e asignada nesta cidade de Sam Paulo aos vinte e oito dias do mes de
Agosto de 1744 // annos e eu Manoel da Luz Silveyra escrivão da Ca
mera que o sobscrevy asignei, e confery Manoel da Luz Silveyra
Confo. pr. mim . Silveyra.

Consta á margem : " A esta ordem se refere a de 6 de junho de 1748


neste lo. a fl. 45 vo " .
1
PAPÉIS AVULSOS

( 1823 )

DOC . CLXXX

Avaliações Diversas

Sertificamos nos abaxo assinados que emprezensia da Nober Senado


avaloamos o atero e levantar as cabeseras da ponte grande e avaloamos, o
conserto de duas cabeseras na qta. de oitenta minreis e . por, ser verdade
passamos o perzente por hum de nos feito e por. ambos asinados São
Paulo 27 de Zbro . de 1823 Joze Ferra. Leite Manoel Joze Antunes
da

Vistoria dos Snres. do Senado em 22 de Obro, de 1823 Calculo do


xafaris da ponte do Bexiga e encanamto, da sua agoa, a saber, principiando
do Pasto de dentro ; de S. Francisco, a encanar se puder ajutar hua" vertente
m mesmo pasto, onde levara hum paredão pa. a da. agoa pasar por cima,
vir se ha emcanando em telhois coberta com tijolos, terra por cima; the
varar a taipa, aiuntando- se com outra, no pasto de fora ; onde se fara outro
paredão para toda Junta pasar ; vendo se se pode ajuntar outra q. tem
neste mesmo lugar ; comtinuando, a emcanar da mesma forma, the pasar
a taipa da rua, a saber; estes paredois de pedra e cal os telhois bitumados
com galagala deixando pasage por vaixo pa. as agoas do monte , com hu
arco de tijolo, fazendo tres caixas em destancias proporcionaveis em que a
ultima ficara ... ou dentro da taipa, onde se posa ver facilmte: desta ,
principiava hum cano de chumbo por paixo da rrua , the ao xafaris ; para os
carros não desmanchar o mesmo canal ; pela terra q. tem atingido, e o
cano ficar alto na frente do xafaris ou bica levará hum parapeito de cada
lado com declinação pa. não porern em cima os potes, cem hua lage de
pedra em cima de cada hum , com hum tradi de pedra nas portas, e outro nas
Ilhargas, pa. os carros não desmanchar mais de altura da saida da agoa
the o cham ; levara hua cinta de cantaria, pedras lauradas, das
agoas the o rio , hua calcada toda esta obra, avalierros e calculemos: mais
ou menos por R $ 4923480
258 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Sertificamos que avaloamos a fatura da ponte nova do peiquebu cuja


ponte sera toda feita de madera rolisa e levara guardas pelos lados com
seis tanxois e quator na cabesa da ponte com boa estiva e cuberta com
pedergulho e avaloamos na qta. de corenta minreis e por verdade pasamos
o perzente por hum de nos feito e por ambos asinados. São Paulo 29 de
Obro. de 1823 – Joze Ferra. Leite Manoel Joze Antunes da Sa.
P. Edital em 27 de Ebro. de 1823 Toledo.

DOC . CLXXXI

Férias de Esgotos

1.a Feria do esgoto do rio denominado Tamandatihi, principiado


defronte a caza, q. serve de armazem do Mosteiro de Sam Bento desta Im
perial Cide., the o primeiro Asude do Padre João de Carvalho, fin da aos 18
de Bro. de 1823 Trabalhadores – Joze 4 dias a 200 rs. - $ 800 ; An
tonio , dos. dos. $800 ; Manoel, dos . dos. $800 ; Firmiano, 5 dias dos. 1 $000 ;
Fidellis, dos. dos . 1 $000 ; João, dos . dos. 19000 ; Clemente, dos. dos. 15000 ;
Valente, dos. dos. 1 $ 000 – Feitor Antonio Joaquim , 5 dias a 200 rs. 1 $ 000
Som. 8 $ 400 pode -se pagar Gabriel Frz. Cantinho Espetor da obra do
do rio, Anto. Joaqm. Rço. as assignaturas supras Toledo.

2.a Feria do esgoto do rio denominado Thamandatihi, desta cidade


de Sam Paulo, finda aos 25 de 8bro. de 1823 Trabalhadores - Joze
6 dias á 200 rs. 1 $ 200 Antonio, dos. dos. 1 $ 200 Manoel, dos. dos.
1 $ 200 Fermiano, 4 dias , dos. $ 800 Fidelis, 6 dias , dos. 1 $ 200 João,
dos . dos. 1 $200 Clemente, dos. dos. 1 $ 200 Valente, dos . dos. 1 $ 200
Feitor Antonio Joaquim 6 dias , a 200 rs . 1 $ 200 Som . 10 $ 400 pode - se
pagar Gabriel Frz. Cantinho Espetor da obra do rio Anto. Joaqm . Re
conheço as assignaturas supras Toledo.

3.a Feria do esgoto do rio denominado Tamandatihi desta, Imperial


Cidade de Sam Paulo, finda aos trinta e hum de oitubro de 1823 - Tra
balhadores Joze, 4 dias, á 200 rs. 0 $ 800 Antonio, dos. dos. 0 $ 800
Firmiano, dos. dos. 0 $ 800 Fidelis, dos. dos. 06800 Clemente, dos.
dios. 08800 Valente, dos. dos. O $800 João dos. dos. 08800 Miguel
dos . dos. 0 $ 800 Rafael, dos. dos. 0 $ 800 Manoel, dos. dos. 05800
Feitor Antonio Joaquim , 4 dias á 200 rs. 0 $800 Som . 8 $800 pode -se
pagar Gabriel Frz, Cantinho Espetor da obra do rio Anto. Joaqm .
Reconheço as asignaturas supras Toledo.

4.a Feria do esgoto do rio denominado Thamandathihi, desta Im


perial Cidade de Sam Paulo, finda aos oito de Novembro de 1823 Tra
balhadores - João, 6 dias á 200 rs. 1 $ 200 - Antonio, dos. dos. 1 $ 200 -
Manoel, dos, dos. 1 $ 200 Firmiano, dos. dos. 1 $ 200 Fidelles, dos. dos.
1 $200 Clemente dos. dos. 1 $ 200 Vallente, dos. dos. 1 $ 200 João,
dos. dos. 1 $ 200 -- Vicente, dos. dos. 1 $200 Miguel, dos. dos. 1 $ 200
Rafael, dos. dos. 1 $200 Feitor Antonio Joaquim, 6 dias á 200 rs .
1 $ 200 Som. 14 $400 podese pagar Gabriel Frz. Cantinho Espetor da
obra do rio Anto. Joaqm . Reconheço as assignaturas supras Toledo.
N.° 5 Feria do esgoto do rio denominado Thamandathihi, desta
Imperial Cidade de Sam Paulo, finda aos 15 de Obro . de 1823 Traba
lhadores João, 5 dias e meio, á 200 rs. 1 $ 100 Antonio, dos. dos.
PAPEIS AVULSOS 259

1 $ 100 Manoel, dos . dos . 1 $ 100 Firmiano, dos. dos. 1 $ 100 Fidellis,
dos. dos. 1 $ 100 Clemente, dos. dos. 1 $ 100 João, dos, dos. 1 $ 100
Joaquim 5 dias e hum quarto, a 200 rs. 1 $ 050 Vicente, 5 dias e meio
a 200 rs . 1 $ 100 - Manoel, dos. dos. 1 $100 Faustino, 4 dias, e hum quar
to, a 200 rs. 0 $850 Madeireiro Jozé da Paichão, botou 4 duzias de
tanxoes, a razão de 120 rs. cada páo, somão as 4 duzias já ditas 5 $ 760 -
Feitor Antonio Joaquim, 5 dias, e meio á 200 rs . 1 $ 100 - Som . 18 $ 660
podese pagar Gabriel Frz. Cantinho Espetor da obra do rio Anto .
Joaqm . Reconheço as assinaturas supras , Toledo .

N.° 6 - Feria do esgoto do rio denominado Thamandathihi, desta


Imperial Cidade de Sam Paulo, finda aos vinte does dias do mes de No
vembro de 1823 Trabalhadores Joze, 5 dias, a 200 rs. 1 $ 000 - An
tonio, dos. dos. 1 $000 Manoel, dos. dos . 1 $000 Firmiano, dos. dos .
1 $ 000 Fidellis, dos. dos. 1 $000 Clemente, dos. dos. 1 $000 João,
dos. dos. 1 $000 - Joaquim, dos. dos. 1 $ 000 Vicente, dos. dos. 18000
Manoel, com sua canoa, 5 dias, a 240 rs. 1 $200 Feitor Antonio Joa
quim, 5 dias a 200 rs. 1 $ 000 Som . 11 $ 200 podese pagar Gabriel Frz.
Cantinho Espetor da obra do rio Anto. Joaqm. Reconheço as assigna
turas supras Toledo.
N.° 7 Feria do esgoto do rio Thamandathihi, desta Imperial Cide.
de Sam Paulo, finda aos vinte nove de Novembro de 1823 Trabalhado
res Joze, 6 dias á 200 rs. 1 $ 200 Manoel, dos. dos. 1 $200 Firmiano,
dos. dos. 1 $ 200 Clemente, dos. dos . 1 $ 200 Joaquim , 5 dias, e meio,
dos. 1 $ 100 Vicente, 6 dias, dos. 1 $ 200 João, dos . dos . 1 $ 200 Ma
noel, com sua Canoa, 6 dias, á 240 rs. 1 $ 440 Feitor, Antonio Joaquim ,
dos. a 200 rs. 1 $ 200 Medeireiro Joze da Paixão, botou 3 duzias de
Tanxois, a 6 vinteis cada hum dos ditos Tanxões 4 $ 320 - Manoel Alvz .,
carpinteiro, fes 2 á 320 rs. cada hu 0 $640 Som. 15 $ 900 -
podese pagar Gabriel Frz. Cantinho Espetor da obra do rio Anto .
Joaqm. Reconheço as assignaturas supras Toledo.

N.° 8 Feria do esgoto do rio Thamandathihy desta Imperia Cide.


de Sam Paulo, finda aos seis de Dezembro de 1823 Trabalhadores
Joaquim , 6 dias, á 200 rs . 1 $200 - Mathias , dos . dos. 1 $ 200 - Felipi, dos .
dos. 1$200 Manoel, dos . dos . 1$200 Fermiano, dos. dos. 1 $ 200 Ma
noel, com sua canoa, á 240 rs. 1 $ 440 -- Clemente, 6 dias a 200 rs. 1 $ 200
Jozé, dos. dos. 1 $ 200 Feitor Antonio Joaqm. 6 dias á 200 rs, 1 $ 200
Madeireiro - Jozé da Paixão, botou 3 duzias, e dous páos a saber, q. as
3 duzias são de Tanxãos, e os dous páos são Travecoens de atraveçar o
rio de hum lado ao outro. Os ditos Tanxoes importão a 6 vintens cada
hum páo, soma 4 $ 320 e os dous Traveçaos, a 320 rs . cada hum, som .
0 $640 Soma o total 16 $000 Podese pagar a conta asima Gabriel Frz .
Cantinho Espetor da obra do rio Anto. Joaqm. Reconheço as
assignaturas supras. Toledo.

N.° 9 - Feria do esgoto do rio denominado Tamandathihi, desta Im


perial Cidade de Sam Paulo, finda aos treze de Dezembro de 1823 Tra.
balhadores Jozé 5 dias , a 200 rs. 1 $ 000 Bento, dos. dos. 1 $ 000
Felipi, dos . dos . 1$ 000 Fermiano, dos. dos. 19000 Clemente, dos. dos.
1 $000 Mathias, dos. dos . 1 $ 000 · Joaquim, dos. dos. 1 $ 000 Manoel,
com sua canoa , a 240 rs. 1 $ 200 Feitor Antonio Joaquim , 5 dias a
200 rs . 1 $ 000 som. 9 $ 200 podese pagar a feria Gabriel Frz. Cantinho
Espetor da obra do rio Anto. Joaqm. Reconheço as assignaturas supras
Toledo.
260 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

N.° 10 Feria do exgoto do rio denominado Thamandathihi desta


Imperial Cidade de Sam Paulo, finda a vinte de Dezbro. de 1823. Tra
balhadores Jozé, 5 dias á 200 rs. 1 $ 000 Antonio, dos. dos. 1 $000 –
Felipe, dos. e meio, dos. 1 $ 100 Mathias, dos, dos. 1 $ 100 Clemente,
dos. dos. 1 $ 100 Joaquim , 5 dias dos. 1 $ 000 Carpinteiro Manoel,
de apontar os Páos, dia e meio a quatorze vinteis por dia 0 $ 420 - Feitor
Antonio Joaquim 5 dias e meio á 200 rs. 1 $ 100 - Som.7 $ 820 podese
pagar a feria Gabriel Frz. Cantinho Espetor da obra do rio Anto .
Joaqm. Reconheço as assignaturas supras , Toledo.

N.° '11 – Feria do esgoto, e limpação, e Assudes feitos no ' Rio deno
minado Tamandathihi, desta Imperial Cidade de Sam Paulo finda a vin
' te quatro de Dezbro . de 1823 Trabalhadores Jozé 2 dias e meio, a
200 rs . 0 $ 500 — Antonio, dos. dos. 0 $ 500 - Jozé dos. dos. 0 $ 500 Fran
co. , dos. dos. 0 $ 500 Clemente, dos. dos. 0$ 500 Joaquim , dos. dos.
09509 Manoel, carpinteiro, dia e meio, a 280 rs. pr . dia de apontar os
páos para os Assudes, 0 $ 420 Quatro duzias de páos pa. Os Assudes, á
640 rs . a duzia, 2 $ 56 ) Feitor, Antonio Joaquim, 2 dias e meio á 200 rs.
pr. dia 0 $500 Som. 6$480 Podese pagar a feria e madeira que servio
para o apedre. S. Paulo 28 de Dezbro. de 1823 Gabriel Frz. Cantin
ho Espetor da obra do rio Anto . Joaqm . Reconheço as assignaturas
stipras Toledo.

DOC . CLXXXII

Depesas feitas por ordem do Senado .


Despezas feitas por ordem do Senado da Camara de varios consertos,
e outras despezas com a cadeia como abaixo se declara desde o fim de
Abril do corre, anno de 1823 the fim de Dezbro. do mmo. Por 68 Me
didas de Azeite pa. luzes das prezoens da cadeia 30 $ 240 22 vellas
de sera pa, o Oratorio, 4 $ 840 Esmola de 40 missas ao Capelão da Ca
cieia desde 31 de Mço. do corre. Anno the 30 de 7bro. do mmo. 168000
Ferias n.º 1, Despeza da Caixa d'Agoa do chafaris, 3$940 N.° 2, De
caiar as cazinhas e o mais q. nella refere, 4 $ 260 N.° 3, Principio da
Taipa do baracão, 1 $600 N.° 4, Concerto do bueiro que saie das ca
zinhas, 123960 N.° 5, Concerto do Atterrado do Carmo, 7$200 -- N.º
6, Concerto da rua do Rozario sendo do Patio da Sé the as cazinhas,
5 $ 440 N.° 7, Concerto na mma., 3$920 N.° 8, De tirar hum for
niigueiro na Prasa da Cide. Nova, 3 $200 N. ° 9, Concerto no chafariz,
118770 — N.° 10, Concerto na rua de S. Gonçalo no Patio da Sé, 2 $520 –
N.° 11, Concerto nos Alcatruzes do chafaris , 8 $ 440 N.° 12, Concerto na
Ponte do Marechal, 19540 N.° 13, Concerto da calsada da Ladeira do
Carmo, 13$560 Recibos n.° 1 , 19 carradas de pedra 9. se gastarão no
bueiro das Casinhas, e calçada q. segue das cazinhas the o Patio da Sé.
12 $ 160 – N.º 2, 2 barris pa. os prezos conduzirem agoa, 2 $ 560 N.° 3,
De por as letras de ouro em hum saco que levou hum officio pa. as Cor
Empe, do saco de Damasco, 19760 N.° 4, Concerto dos
tes , 38000
pezos e balança do Assougue e Cazinhas , 128720 N.° 5, de por as
Armas na frente da Cadeia , 6 $ 400 N.° 6, De por as letras de ouro
em hum saco q. 'levou hum officio a S.M.I. , 3 $ 000 173 $ 030 - Trans
ре 1739030 Empe. do saco de Damasco, 1 $ 760 Reci
bos n . ° 7, de por as letras de ouro em hum saco que levou hum officio
a S.M.I. 38000 Emporte do saco de Damasco, 1 $ 760 Ao servente
PAPEIS AVULSOS 261

q. conduzio os cavaletes e de servir ' o pintor qdo. foi retocar_as Armas


'Iniperiaes q. se achão no teto da Caza da Camara, $ 360 - Tres barris
pa. serventia dos Prezos, $ 480 Vellas pa. elluminar a Caza da Camera
nos dias Instalação das Cortes Restaurasão da Bahia Anniversario
da Independencia do Brazil Anniversario de S.M.I. Anniversario da
Coroação de S.M.I. 4 $ 800 Recibo N.° 8, Aferição dos pezos do Asou
gue e Cazinhas, 9 $ 260 194$ 450. S. Paulo 31 de Dezembro de 1823
O Procurador da Camera Antonio Joze Vira. Barboza.

DOC . CLXXXIII

Férias diversas

N.° 1 - Feria dos concertos de tres caixas do chafaris da Praça,


que serrebocarão, e setaparão os buracos delles, finda a 10 de Maio de
1823 -- Pedreiros João Amaro, dia e meio, á 480 rs. pr. dia $720
Teodoro, do. do. á 360 rs. $540 Serventes Clemente, dous dias, a
160 rs. $320 Bento, do. do. $320 Antonio, hum dia do. $ 160
Faostino, dia e meio do. $240 - Jozé do. do. do. $ 240 Manoel do. do.
do. $240 Cál Hum halqueire, e huma quarta $ 841 Feitor
Antonio Joaquim , 2 dias , a 160 rs. $ 320 Soma 3$940 Anto. Joaqm .
Revisto pr. mim Escram . Toledo .

N.° 2 Feria do caiamento das cazinhas, e hum Buraco q . tapou o


Pedreiro, q. caiou, finda a vinte oito de Maio de 1823 Pedreiro
Antonio, dia e meio, a 360 rs . $540 Servente Joaquim , dia e meio
a 160 rs. $240 - Cal, que se gastou, tres quartas a 800 rs . $ 600 Carro,
que carregou o lixo do Pateo da Sé $ 400 Pateo de São Gonçalo,
os Carreiros João e Manoel comdozirão 24 carradas de Pedregulho pa. a
Porta do Armazem , a 80 rs . 1 $920 -- Feitor, Antonio Joaquim , tres dias
e meio a 160 - $560 Soma 4 $ 260 Anto . Joaqm . Revisto pr. mim
Escrivão Toledo.

N.° 3 – Feria do serviço da Taipa do Buracão do Carmo finda a


trinta de Maio de 1823 M. Taipeiro, Manoel, dia e quarto, a 320 rs.
$ 400 Socadores , Clemente, dia e quarto a 160, $ 200 Antonio, do.
do. do. $ 200 Jozé Do. do. do. $200 Joaquim , do. do . do.
$200 Francisco, do. do. do. $ 200 Feitor, Antonio Joaquim , dia e
quarto a 160 $ 200 Soma 19600 Anto. Joaqm . Revisto pr . mim Es
crivão Toledo .

N.° 4 - Feria do concerto da Calçada do canto da Rua das Cazinhas ,


e cano das mmas. tanto fora, como dentro do quintal , finda a 5 de Julho
de 1823 Pedreiros, João 5 dias e meio, á 480 rs . 2 $640 Manoel, do.
do , á 320 rs . 1 $760 Serventes, Clemente, 6 dias á 160 rs . $960
Joaquim , 5 dias e meio a 160 rs. - $ 880 Carradas de Pedras, que se
gastarão neste concerto Franco. Jozé da Sa., botou 6 carradas, a 640 rs .
3 $ 840 - Manoel Montro., botou 3 carradas do. 1 $920 – Feitor Antonio
Joaquim , 6 dias a 160 rs . $960 Soma 12 $ 960 Anto . Joaqm . Revisto
pr. mim Escrivão Toledo.

N.° 5 Feria do concerto do Aterrado do Carmo, findo aos qua


torze de Junho de 1823 Serventes Jozé, 5 dias a 160 rs. $ 800
262 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Clemente do. do . $ 800 Carros, de Francisco Joze, 2 carros, 5 dias


á 480 pr. dia cada hu Soma 4 $ 800 - Feitor, Antonio Joaquim 5
dias a 160 rs. $ 800 Soma 7 $ 200. Revisto pr. mim Escram , Toledo.

N.° 6 Feria dos concertos , que se fizerão na calçada da rua de


S. Gonçalo, a saber do canto do Capm . Sergra. the o canto das Cazinhas,
finda a vinte hum do corre. mes de Junho de 1823 Pedreiros, João, 3
dias e meio, á 480 rs. 1 $ 680 — Benedito, do. do. a 320 rs. 1 $ 120
Serventes Joaquim , 4 dias a 160 rs. $ 640 Clemente do . do .
$640 Carreiro, João, q. comdozio terra, com seo Carro, $ 720 Feitor,
Antonio Joaquim , 4 dias a 160 rs . $ 640 Soma 5 $440 Anto. Joaqm .
Revisto pr. mim Escrivão Toledo,
ATAS DA CÂMARA DE SANTO AMARO

( 1913 )

Acta da sessão ordinaria realisada no dia 10 de Fevereiro de 1913.


Presidencia do Sr. Carlos Schimidt . Aos dez dias do mez de Fevereiro
de Mil Novecentos e treze, nesta Cidade de Santo Amaro, comarca da
capital do Estado de São Paulo, no paço da Camara Municipal , á hora
regimental, achando -se reunidos os Senhores Vereadores Carlos Schmidt.
presidente, José Conrado - vice- presidente, Brazilio Procopio da Luz- prefeito,
Tenente João Felippe da Silva -vice-prefeito, Izajas Branco de Araujo e
José Guilger Sobrinho, o senhor presidente declara aberta a sessão . Foi lido
por mim secretario da Camara, adiante nomeado e assignado, a acta sessão
realisada no dia 27 de Janeiro ultimo ; a qual, sendo posta em discussão, foi
approvada sem debate. Em continuação foi lido , discutido c despachado do
modo que se segue, o expediente seguinte : OFFICIOS : De Brazilio Proco
pio da Luz, solicitando providencias no sentido de ser recebido provisoria
mente a ponte denominada “ 15 de Novembro " ja franqueada ao transito pu
blico, e bem assim a vinda de um Engenheiro para verificar a solidez da
mesma segundo despacho : - " Para o Senhor prefeito dar informação
por escripto, na proxima sessão, sobre o que diz respeito a edificação da mes
ma ponte ; si tudo está de accordo com o contracto feito com o cidadão
José Claus . " Este despacho foi dado em consequencia de ter o vereador
Izaias Branco de Araujo, pedindo informação por escripto acerca do que
trata o mesmo, cuja informação o Senhor prefeito Municipal se propóz
fazer verbalmente, na presente sessão ; Mas, não sendo isso acceito por
aquelle vereador, o senhor presidente resolveu despachar o officio em ques
tão pelo módo acima declarado. De Pedro Pinheiro Guarany, adminis
trador do Mercado apresentando a conta do que rendeu essè proprio Muni
cipal no mez de Janeiro ultimo, na importancia de Rs. 964 $ 180. A pre
feitura " RESOLUÇÃO . A Resolução transcripta na acta da sessão
ordinaria realisada no dia vinte e sete de Janeiro ultimo, depois de ser
novamente discutida, é approvado, sem debate. REQUERIMENTOS: De
Octavio Machado, escrivão de paz desta cidade, solicitando um auxilio de
duzentos mil reis, na qualidade de secretario da Commissão de Alistamento
eleitoral para ocorrer as despesas feitas com dito Alistamento . Se
gundo_despacho : " Como requer . " De Domingos de Oliveira Orlandi,
264 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

pedindo alinhamento de terrenos ( datas ) que lhe foram concedidas em sessão


de cinco de Abril de mil oitocentos e noventa e um, localisadas ás ruas Ben
jamin Constant e Colonia, desta cidade. Segundo despacho : “ Informe
Ĉ Prefeitura Municipal . De João Coelho Ferreira, solicitando tampem
alinhamento das datas de terras, sob numeros trinta e sete, trinta e oito
e trinta e nove sitas á rua São Luiz e as de numeros cento e trinta e quatro,
cento e trinta e cinco e cento e trinta e seis situadas á rua General Ozorio,
datas essas que lhe foram transferidas pelos respectivos concessionarios
Joaquim Fernandes, Maria Epelida Simões e Maria José Segundo des
pacho : Ao Secretario para informar sobre o que requer o Supplicante
em referencia ao recibo incluso e mais dizeres da presente petição . De
Borcali Victoria, pedindo a verificação da legalidade de uma data de terras
situada á rua São Luiz, desta cidade, sob numero sessenta e nove, data
essa que lhe fóra concedida em sessão de trez de Nobro., digo, de Novem
bro de mil oitocentos e noventa. Tendo sido este requerimento despachado
ao Senhor Prefeito Municipal , em sessão de 27 de Janeiro ultimo, para a
devida informação, este assim o informou : “ Sou de parecer que a suppli
cante deverá provar que estava fechada a data alludida na occasião em que
foi promulgada a lei de quatro de Janeiro de mil Novecentos e dez. San
to Amaro , 10-2-913 Brazilio Procopio da Luz. ” Depois de discutido
este parecer, o Senhor presidente lançou no citado requerimento este des
pacho : “ De accordo com a informação do Senhor Prefeito ." De Mon
tanari Bomfilio, solicitando, igualmente, a legalisação de datas de terras
que adquirio da Camara em vinte seis de Setembro de 1913, digo, de 1891.
Parecer e despacho identico ao do ultimo requerimento supra referido. Do
Dr. Alipio C. de Borba, allegando que, ha mezes, propos a Camara fazer
a limpesa do rio Guarapiranga, sob condições estipuladas em uma proposta,
para a qual foi nomeada uma Commissão para com elle requerente organisar
as bases do respectivo contracto ; que apresentadas essas bases á Commissão
acceitou , elle requerente, as modificações exigidas pelo mesma; que assim
sendo fes as compras de Machinas e apparelhos necessarios a tal , empre
hendimento , compras essas que montam em quantia avultada ; que, achando
se prompto para dar começo ao trabalho, requer sejam as referidas bases
apresentadas á Camara e que esta auctorise seja lavrado o preciso con
tracto, para evitar prejuisos. Descutido e submettido a votos, foi impatada
a votação, por cujo motivo, o Sr. Presidente assim despachou esta peti.
ção : “ Empatada, em 1.a discussão . " De Amaro Vieira de Moraes e Silva,
solicitando providencias acerca da abertura illegalmente feita pelos cida
dãos João Teizen e Horacio de Andrade, em um exgostto que conduz as
aguas que percorrem a estrada do “Corredor .” Despacho : Nomeio os
Srs . vereadores Tenente João Felippe da Silva e José Conrado, para pro
cetlerem o exame requerido e darem parecer. De Claudino José Branco,
versando sobre uma ponte que em terreno de sua propriedade, foi, indebi
tamente feita por Amaro Roque. Segundo despacho : Em virtude do
parecer dado no verso deste, como requer. “ De Estanislau Pereira Borges,
propondo - se a fazer a desobstrução do rio Jurubatuba e pedindo previlegio
para entrahir do leito desse rio areia e pedregulho. Segundo despacho :
Continua adiada a discussão. ” De Gattar Attuy, solicitando concessão por
3ris annos para montar no jardim publico um chalet para a venda de be
bidas. Segundo despacho : “Empatada em 1.a discussão. " Nada mais
havendo a tratar, o Senhor Presidente encerra a sessão. E, para constar ,
eu Alfredo de Andrade Arruda Botelho, lavrei a presente que é assignada.
Carlos Schmidt. Izaias Branco de Araujo, vota contra a presente acta
José Guilger Sobrinho, vota contra a presente acta, José Conrado, vota
contra a presente acta João Felippe da Silva, Brazilio da Luz.
ATOS DA CÂMARA DE SANTO AMARO 265

Acta da sessão extraordinaria realisada no dia 19 de Fevereiro de 1913.


Presidencia do Sr. Carlos Schmidt. Aos dezenovs dias do mez de Fe
vereiro de Mil Novecentos e treze, nesta cidade de Santo Amaro, comar
ca da capital do Estado de São Paulo, no paço da Camara Municipal, ás
onze e meia horas da manhã, achando - se reunidos os Senhores Vereadores
Carlos Schmidt -presidente, José Conrado - vice - presidente, Brazilio Procopio
da Luz-prefeito Municipal, Tenente João Felippe da Silva - vice- prefeito,
Izaias Branco de Araujo e José Guilger Sobrinho, o Sr. presidente declara
aberta a sessão presente, convocada pelo orgam do poder executivo desta
Camara, para ser resolvida uma citação feita a mesma pelo o advogado
Dr. Oscar Fernandes Martins, na qualidade de patrono do cidadão José
André Claus, constante da seguinte contra-fé : “ O Doutor José Maria
Bourrul, Juiz de Direito da segunda vara civil e commercial desta Comarca
da Capital de São Paulo. Mando a qualquer official de Justiça deste Juizo
ao qual for este apresentado, estando por mim assignado, que em seu cum
primento e a requerimento de José André Claui, citem a Camara Municipal
de Santo Amaro, nas pessoas de seu presidente e prefeito, por todo o con
teúdo da petição do teor seguinte : * Excellentissimo Senhor Dr. Juiz de
Direito da segunda vara civil e commercial. Por seu bastante procurador
infra assignado, José André Claus, vem ponderar e requerer á V. Excia. O
seguinte : A Camara Municipal da Cidade de Santo Amaro, desta comarca ,
em sessão de 16 de Abril de 1912, acceitou uma proposta do supplicante
para a construção de uma ponte sobre o rio Jurubatuba ( Documento 2) .
No dia 20 do mesmo mez e anno o requerente assignou na prefeitura um
contracto ( documento 3 ) em o qual se encontram clausulas e condições
que foram plenamente satisfeitas pelo o supplicante. Segundo o referido
contracto, o pagamento pela construção seria de Rs. 4 :500$ 000, feito pela
fórma seguinte : A primeira prestação de Rs. 1 :000 $ 000, qinze dias após
o iniciou das obras ; a segunda de Rs . 1 :000 $ 000, tambem trinta dias depois
da primeira ; a terceira de Rs. 1 : 500 $000, no acto da inauguração das obras
e a quarta e ultima de Rs . 1 : 000 $000, seis mezes depois de feita a inaugu
ração da ponte, ficando esta quantia depositada na Thezouraria Municipal
durante este praso, como garantia da boa construção das obras ( clausula
D ) contractual ) ficanda. cutro sim , estipulado que, o recebimento definitivo
da ponte seria jeito :vis mezes depois da sua conclusão, por dois peritos,
sendo um de nomeação da Camara e outro por parte do constructor . Esta
exigencia da Municipalidade, foi tambem satisfeita como demonstra o docu
mento 4, firmado por um profissional de reconhecida competencia. As duas
primeiras prestações , foram recebidas com toda a pontualidade, dando, dellas,
o supplicante, quitação, com relação a terceira prestação, o pagamento tem
soffrido seria opposição da parte de uma redusia e insignificante minoria
que, insinuada por um seu collega systematicamente se oppõe aos mais
comezinhos deveres de representação, uma vez que não sejam partes os seus
correligionarios politicos . A ponte em questão já foi entregue ao transito
publico, isto é, inaugurada conforme se verifica do documento 5, tendo disso
sciencia a Camara, em se - são de 27 de Janeiro transacto. Nestes termos ,
e não podendo o supplicante esperar por mais tempo o pagamento da pres
tação a que tem direito, é a presente para requerer se sirva V. Excia. or
denar seja expedido mandado citatorio á Camara e prefeitura Municipal
dáquella cidade, nas pessoas do seu presidente e prefeito, para virem a pri
a
meira audiencia util verem - se-lhes propor uma acção decendiaria, em
qual se pede a sua condemmação ao pagamento da quantia de Rs. 1 :500 $ 000
juros da mora e custas, assignar- se - lhes o praso da lei para embargos, tudo
sob as penas de revelia e lançamento . Com os protestos de estylo, espe
cialmente pelo depoimento pessoal de cada um de per si , inquisições para
dentro e fóra, exames , vistorias, arbitramentos ; e pelas as demais provas
266 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

em direito permittidas, pede deferimento E.R.M. São Paulo, 17 de Feve


reiro de 1913. por procuração Oscar Fernandes Martins. Devidamente
isellado. Despacho: D. Ao 6 autuada. São Paulo, 17 de Fevereiro de 1913.
- Bourrul. O que compra. São Paulo, 17 de Fevereiro de 1913.
Eu Canuto de Oliveira, escrivão interino o escrevi. Bourrul. Nada mais
continha no dito mandado que foi passado em papel sellado. As audiencias
do Meritissimo Juiz, terão logar no edificio do Forum nesta capital á rua
onze de Agosto Numero 41 , nas terças feiras, á uma hora da tarde. São
Paulo, 17 de Fevereiro de 1913. O official de Justiça João Rufino Bar
boza.

Depois de lido a contra fé supra transcripta, pedio e obteve a palavra


o vereador Senhor Izaias Branco de Araujo, que declarou optar pelo o
pagamento amigavel e não pelos meios judiciaes, pois que o pagamento
feito por este modo importa em vexame á Camara que o não merece ;
opta portanto, pelo o pagamento amigavel, sem dispendido de custas e o
mais que requerer o contractante José André Claus, não obstante reconhe
cer que este cidadão não cumprio fielmente com o contracto assignado
com a prefeitura, nem tão pouco executou todos os serviços da mesma de
accordo com a planta que apresentou e que foi approvada. O Senhor pre
feito, por seu turno, pede a palavra e declara que, seria muito bom que
esse pagamento fosse feito amigavelmente, mas que isso depende de um
accordo com o advogado do Senhor Claus sem o que nada pode ser feito.
Disse mais que tendo pedido officialmente a Camara, como consta em acta
de 27 de Janeiro ultimo, providencias no sentido de ser feita o recebimento
provisorio da ponte em questão, e que tendo sido adiada a discussão do
seu citado officio parece-lhe justa a attitude tomada pelo Sr. Claus. Um
debate caloroso abre -se entre os Senhores prefeito, Izaias Branco de Arau
jo e José Conrado, em virtude do que o Sr. presidente submette á votos o
pedido constante da contra fé alludida. Votaram a favor do pagamento,
pelo modo pedido , os senhores presidente, Prefeito e Vice -prefeito, e con
tra os senhores Izaias Branco de Araujo, José Conrado, José Guilger
Sobrinho que declararam opinar pelo o pagamento amigavel, porém , inde
pendente de custas. Nada mais havendo a tratar é, pelo Senhor presidente
encerrada a presente sessão, a qual fol suspensa por trez horas, para ser
lavrada esta Para constar, eu, Alfredo de Andrade Arruda Botelho. se
cretario da Camara a escrevi. Carlos Schmidt. Brazilio Procopio da
Luz. - João Felippe da Silva.
Em tempo : Não tendo comparecido na reabertura da sessão os verea
dores Izaias Branco de Araujo , José Conrado e José Guilger Sobrinho,
os Senhores presidente, prefeito e vice-prefeito assignaram a respectiva
acta, isto é, a acta acima lavrada. Aquelles trez primeiros vereadores,
não communicaram o motivo pelo qual deixaram de comparecer. Eu Al
fredo de Andrade Arruda Botelho, secretario da Camara lavrei e firmo
a presente declaração. Alfredo de Andrade Arruda Botelho.
ATOS OFICIAIS
1

.
i

1
DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS

DECRETO N.° 1.083 DE 1 DE SETEMBRO DE 1949

Declara de utilidade pública imóvel situado à Avenida


Lins de Vasconcelos, esquina da rua Vergueiro .

O Prefeito do Município de São Paulo , usando de suas atribuições,


nos têrmos dos artigos 5.9, letra i, e 6.° do decreto - lei federal n.º
3.365 , de junho de 1941,

Decreta :
Art. 1.0 Fica declarado de utilidade pública para o fim de ser
desapropriado amigável ou judicialmente , o imóvel constituido pelo
terreno e benfeitorias sõbre o mesmo existentes , situado à rua Ver
gueiro, esquina da Avenida Lins de Vasconcellos, terreno êsse com
a área total de 342,75ms2 ( trezentos e quarenta e dois metros e seten
ta e cinco decímetros quadrados ) , mais ou menos, necessário à exe
cução do plano de alargamento da Avenida Lins de Vasconcelos , apro
vado pelo Ato 1.219 , de 19 de dezembro de 1936 , e assinalado em
amarelo , sob n.ºs 1 , 2, 3 , 4, 5 , 6 , 7 , 8 , 9 , 1 , na planta anexa n.º
P.4418-6 3 -A 15 , do Departamento do Cadastro, que, rubricada pelo
Prefeito , fica fazendo parte integrante dêste decreto .
Art. 2.0 É de natureza urgente a desapropriação de que trata
o presente decreto, para efeito de imediata imissão de posse do imóvel
em referência, na forma do artigo do decreto - lei federal n .° 3.365 ,
de 21 de junho de 1941 , com a alteração constante do decreto-lei
federal n.º 9.811, de 9 de setembro de 1946 .
Art. 3.0 As despesas decorrentes da execução do presente de
creto correrão por conta da verba n .° 940.8894 ( Despesas Diversas,
para obras, melhoramentos em geral e serviços municipais ) , consig
nada no orçamento vigente .
Art . 4. ° --- Este decreto entrará em vigor na data de sua publi
cação, revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 1 de setembro de 1949 ,
396.º da fundação de São Paulo , O Prefeito, Asdrubal Eurityøses

'
270 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Francisco


Oscar Penteado Stevenson O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno - O Secretário das Finanças, João Pacheco Fernandes.

Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 1 de setembro
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogaeira

DEORETO N.º 1.084, DE 6 DE SETEMBRO DE 1949


Determina que não se realizem feiras livres na Capital,
no dia 7 de setembro , em comemoração ao dia da Pátria .
O Prefeito do Município de São Paulo, usando de suas atribuições
e atendendo à representação de feirantes e chacareiros, para que, em
comemoração ao Dia da Pátria , não se realisem teiras livres na Capital,

Decreta :
Art. 1.º Não se realizarão feiras livres no Município de São
Paulo, no dia 7 de setembro, reservado à comemoração do dia da
Pátria .
Art. 2.° Este decreto entra em vigor na data de sua publica
cão, revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 6 de setembro de 1949,
396.° da fundação de São Paulo. O Prefeito Asdrubal Euritysses
da Cunha o Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário de Higiene, Panlo Ribeiro
da Luz
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 6 de so
tembro de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

DECRETO N.º 1.085, DE 8 DE SETEMBRO DE 1949

Declara de utilidade pública imóvel situado às ruas 00


riolano e Clélia, necessário à execução do plano de pro
longamento da rua Trajano, aprovado pelo Decreto n.°
955, de 12 de março de 1947 .
O Prefeito do Município de São Paulo, usando de suas tribuições,
nos termos dos artigos 5.9, letra i, e 6.° do decreto-lei federal n.º
3.365 , de 21 de junho de 1941,

Decreta :
Art. 1.º Fica declarado de utilidade pública, para o fim de
ser desapropriado amigável ou judicialmente um imóvel constituido
por terreno o benfeitorias, situado às ruas Coroliano e Clélia, 15.º
sub distrito , Lapa , de propriedade da Associação Therezinha do Me
nino Jesus ou de quem de direito , necessário à execução do plano de
prolongamento da rua Trajano, aprovado pelo Decreto n .° 955 , de
12 de março de 1947 , terreno aquele assim caracterizado : Área 1 , 2 ,
3 , 7, 6, 5 , 10 , 1 , de forma iregular, com mais ou menos 875,00 m2 ,
confrontando pela frente, linha 1-2 , com 16,00 ms . de extensão,
mais ou menos, ao longo do alinhamento da rua Coroliano, com
DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS 271

leito da referida rua ; pelo lado direito, de quem do terreno olha para
a referida rua , linha 2-3 , irregular, com 67,20 ms. de extensão mais
ou menos, e 3-7 , irregular, com 30,00 ms. de extensão, mais ou menos,
com um córrego ; pelo lado esquerdo, linhas 1-10 , com 18,40 ms. de
extensão, mais ou menos ; 10-5 , com 80,15 ms. de extensão, mais ou
menos, 5-6 com 3,00 ms. de extensão, mais ou menos, com terrenos
remanescentes de propriedade da transmitente ou sucessores e . pelos
fundos, linha 6-7, com 6,90 ms, mais ou menos, de extensão, ao
longo do alinhamento de rua Clélia, com o leito da referida rua ;
imóvel esse assinalado na planta anexa , sob n.° P4355 -G3 -A15, que,
rubricada pelo Prefeito, passa a fazer parte integrante dêste decreto.
Art. 2.0 As despesas decorrentes da execução do presente de
ereto correrão por conta do crédito aberto pela lei n .° 3.701 , de 7 de
agosto de 1948 , item “ a ” do § único do artigo 1.º modificada pela
lei n. ° 33.746 , de 18 de março de 1949 .
Art. 3.° Éste decreto entrará em vigor na data de sua pu
blicação, revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 8 de setembro de 1949 ,
396.º da fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário das Finanças, João Pacheco
Fernandes O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 8 de setembro
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

DEORETO N.º 1.086, DE 24 DE SETEMBRO DE 1949

Declara de utilidade pública área de terreno necessária


à execução do plano de retificação do alinhamento da
rua Bom Pastor , aprovado pelo Ato n.° 1.170, de 14 de
setembro de 1936 .

O Prefeito do Municíplo de São Paulo , usando de suas atribuições,


Ros têrmos dos artigos 5.9, letra i, e 6 . do decreto - lei federal n .
3.366 , de 21 de junho de 1941 ,

Decreta :

Art. 1. ° Fica declarada de utilidade pública , para o fim do


ser desa propriada amigável ou judicialmente, uma faixa de terreno
eom 512,00 ms2 ( quinhentos e doze metros quadrados ) , mais ou me
nos, situada ao longo da rua Bom pastor, lado impar, no trecho
compreendido entre as Ruas Comandante Taylor e Greenfeld, no
bairro do Ipiranga, 19.° subdistrito, de propriedade de Chucri Lotaif
e sua mulher , ou quem de direito, necessária à execução do plano
de ratificação parcial do alinhamento da rua Bom Pastor aprovado
pelo Ato n .° 1.170 , de 14 de setembro de 1936 , faixa aquela que as
sim se descreve e confronta : pela frente , numa extensão de 110,40
ms., mais ou menos, com o antigo alinhamento da rua Bom Pastor,
linha 1 , 8 , 7 ,; pelo lado direito de quem do terreno olha para a rua ,
numa extensão de 7,60 ms., mais ou menos, com a rua Comandante
Taylor, linha 1-2 ; pelo lado esquerdo , numa extensão de 8,60 mg. ,
mais ou menos, com a rua Greenfeld, linha 6-7 ; pelos fundos, numa
linha quebrada nas extensões de 3,40 69,40 37,10 e 3,50 metros,
respectivamente , pelo novo alinhamento aprovado pelo Ato 1.170 ,
de 14 de setembro de 1936 , com o remanescente da propriedade , linha
2, 3 , 4, 5 , 6 ; faixa do terreno essa , assinalada na planta anexa cob
272 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

n.° P- 4255 - G2 -A15 que, rubricada pelo Prefeito, passa a fazer parte
integrante dêste decreto .
Art. 2.0 As despesas com a execução do presente decreto cor
rerão por conta do crédito aberto pela lei n.° 3.725 , de 27 de dezem
bro de 1948 , item a do parágrafo do artigo 1.º.
AI 3.0 Este decreto entrará em vigor na data de sua pu
blicação , revogadas as disposições em contrário .

Prefeitura do Município de São Paulo, 24 de setembro de 1949 ,


396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário das Finanças João Pacheco
Fernandes O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno

Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 24 de setembro
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

DECRETO N.º 1.087 , DE 27 DE SETEMBRO DE 1949

Obriga a The S.Paulo Gaz Company a elevar a oltenta


metros cúbicos as quotas de gás inferiores a ésse limite ,
e dá outras providências .

O Prefeito do Município de São Paulo, usando das suas atribui


ções e nos têrmos do Decreto - lei n .° 137 , de 5 de janeiro de 1942 ,
considerando que a situação atual, decorrente de pedidos de liga
ção acumulados, conquanto não permita liberar completamente o
racionamento e restrições ao consumo de gás, não impede sejam to
madas medidas no sentido de melhorar - lhe o fornecimento à popu
lação desta capital ;
considerando que é conveniente sejam modificadas disposições dos
decretos n.º 986 , n . 1.031 e n . ° 1.058 , de 12 de junho e 25 de
novembro de 1947 e 27 de setembro de 1948 , de modo que os preten
dentes à ligação de gás fiquem inscritos em uma só lista, para serem
atendidos observada a ordem cronológica das inscrições ;

Decreta :
Art. 1.º Fica obrigada a The São Paulo Gaz Company a
proceder ao fornecimento e ligação de gás, nas seguintes bases :
a) As quotas de racionamento de gás , que até a presente data
são inferiores a 80 ms3 mensais, ficam elevadas até essa
quantidade, adotada doravante como quota mínima;
b) Serão efetuadas mensalmente, em média 540 ligações e
aberturas de gás, de sorte que, dentro de dez meses con
tados a partir de 1.° de junho de 1949 , tenham sido feitas,
no mínimo, 5.400 ligações e aberturas novas .
Art. 2.0 — As ligações e aberturas referidas no artigo anterior
deverão ser efetuadas com observância da ordem cronológica dos
pedidos, registados na conformidade do Decreto n . ° 288 , de 17 de ja
neiro de 1942 .
$ 1.0 Terão preferência os casos de despachos, das autorida
des municipais, proferidos nos têrmos do artigo 1.', $ 1.º, do Decreto
n .° 288 , de 17 de janeiro de 1942 .
$ 2.0 Será dada, também , preferência , em seguida, aos pré
dios de apartamentos , até o limite de 150 ligações mensais .
DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS 273

Art. 3.0 A colocação de canalização mestra , nos termos do


Decreto n .° 1.031 , de 25 de novembro de 1947 , não dispensa a conces
sionária de observar a ordem cronológica prevista no artigo 2.º dêste
decreto .
Parágrafo único Considera -se como data do registo de pedido
para ligação a em que é feito o pagamento da garantia relativa à
canalização por ser instalada, salvo se houver despacho anterior
mente publicado, nos termos do § 1.º, do artigo 1.º, do Decreto n.°
288 , de 17 de janeiro de 1942 , hipótesee em que prevalecerá a data
da publicação .
Art . 4.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publi
cação, revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 27 de setembro de 1949 ,
396.º da fundação de SEão Paulo . O Prefeito Asdrubal Euritysses
da Cunha , O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson , O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos em 27 de setem
bro de 1949 , O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

LEI N.º 3.792, DE 1 DE SETEMBRO DE 1949

Dispõe sôbre oficialização de via pública .


O Prefeito do Município de São Paulo, de acórdo com o que des
cretou a Câmara Municipal, em sessão do 26 de agosto de 1949 ,
promulga a seguinte lei :
Art. 1.º Fica declarada oficial e denominada rua José Com
parato, nos termos e para os efeitos da legislação em vigor, a via
pública cujo leito, doado à Municipalidade por escritura de 22 de
maio de 1946 , das notas do 11.º Tabelião da Capital, principia na
rua Coronel Diogo , termina na rua Dr. Dolzani e se localiza entre
as avenidas Lacerda Franco e Lins de Vasconcelos, em Vila Deodoro,
no Cambuci, 12.° subdistrito da cidade e comarca da Capital con
forme mostra a planta anexa sob n .° P- 3744 , que autenticada pelo
Presidente da Câmara e pelo Prefeito, passa a fazer parte integrante
da presente lei .
Art. 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 1 de setembro de 1949 ,
396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito Asdrubal Euritysses
da Cunha - O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Penteado Stevenson , O Secretário de Obras , Dario de Castro Bueno

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 1 de setembro
de 1949 . - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

LEI N.º 3.793, DE 1 DE SETEMBRO DE 1949


Torna obrigatória , a partir de 1950 , a publicidade da
“ Relação dos Contribuintes do Município de São Paulo " .
O Prefeito do Município de São Paulo , de acordo com o quo
decretou a Câmara Municipal, em sessão de 22 de agosto de 1949 ,
promulga a seguinte lei :
274 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Art. 1.0 Fica o Executivo obrigado a publicar, a partir de


1950 , a “RELAÇÃO DOS CONTRIBUINTES DO MUNICÍPIO DE .
SÃO PAULO " .
$ 1.0 - A “ relação dos lançamentos dos tributos imobiliários "
será publicada de três em três anos, feitas as relações necessárias .
§ 2.0 -- Orol dos contribuintes do imposto de Indústrias e
Profissões será publicado anualmente .
$ 3.° - Constituirá capítulo à parte da mesma relação o rol dos
contribuintes proprietários de estabelecimentos industriais e de ar
mazens em geral , bem como os de terrenos em glebas ou em lotes
não edificados .
Art. 2.° A relação dos contribuintes dos tributos imobiliários
obedecerá a ordem alfabética dos nomes das ruas, constando ainda,
além do local do imóvel e nome do proprietário, todas as demais
características necessárias e essenciais ao tributo para o qual o con
tribuinte fôr coletado , bem como a importância devida pelo lança- .
mento procedido .
$ único Oról dos contribuintes do imposto de Industrias e
Profissões será publicado na ordem alfabética nominal e conterá ,
também , os dados referentes aos lançamentos .
Art. 3.° Farão parte da publicação as leis reguladoras dos
lançamentos dos tributos cobrados pelo Município , bem como do
Regulamento do Conselho Municipal de Impostos e Taxas .
Art. 4.0 Da edição que fôr tirada, reservará o Executivo pu
blicações suficientes para distribuir a todas as repartições munici
pais que as conservarão para consulta de qualquer interessado, bem
como para distribuição a outras repartições públicas e bibliotecas
existentes no Município, como ainda para vendqa que não poderá
ser superior ao preço do custo .
Art. 5.° O Executivo, se assim o entender, poderá promover
a publicação por intermédio de terceiros , o que será feito por con
corrência pública , autorizando a publicação de anúncios .
ſ único No caso de ser autorizada a publicação por terceiros ,
o edital de concorrência fixará o número de exemplares, o formato da
publicação , a quantidade e disposição dos anúncios bem como o nú
mero de volumes a ser doado à Prefeitura .
Art. 6.° Fica o Executivo autorizado a abrir o crédito neces
sário para ocorrer às despesas com a publicação de que trata esta
jei, se pôr ele próprio promovida .
Art. 7.0 Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação ,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 1 de setembro de 1949,
396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário das Finanças, João Pacheco
Fernandes
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
goal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 1 de setembro
de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

LEI N.º 3.794, DE 3 DE SETEMBRO DE 1949


Dispõe sõbre denominação de via pública .
( Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com O que
decretou a Câmara Municipal , em sessão de 26 de agôsto de 1949 .
promulga a seguinte lei :
Art. 1.0 Fica a Prefeitura Municipal de São Paulo autorizada
a dar o nome da Rua de Retirada da Laguna a uma das ruas do
subdistrito Nossa Senhora do Ó, nesta Capital .
DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS 275

$ único As placas de nomenclatura conterão, em letras me


nores, os seguintes dizeres : “ Episódio da História do Brasil 1867 ".
Art. 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publica
gão, revogadas as disposições em contrário .

Prefeitura do Município de São Paulo, 3 de setembro de 1946 ,


396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha — O Secretário de Negócios Internos é Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário de Obras , Darlo de Castro
Bueno

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 3 de setembro
de 1949 , - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .'

LEI N.° 3.795, DE 3 DE SETEMBRO DE 1949

Dispõe sôbre denominações de vias públicas.

O Prefeito do Município de São Paulo , de acordo com o que decre


tou a Câmara Municipal, em sessão de 26 de agosto de 1949 , promulga
a genguinte lei :
Art. 1.º Fica a Prefeitura Municipal autorizada a dar as deno
ninações de Ernesto Nazareth e Catulo da Paixão Cearense a logra
douros públicos a serem oficializados .
ſ único As placas de nomenclatura conterão os seguintes dize
rez e anos de nascimento e morte : Ernesto Nazareth - Músico e Com
positor 1863- 1934 e Catulo da Paixão Cearense Poéta
1863-1945 .
Art . 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 3 de setembro de 1949,
396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha , O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bucno

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 3 de setembro
de 1949 , O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

LEI N.° 3.796 , DE 3 DE SETEMBRO DE 1949

Dispõe sôbre denominação de via pública .


O Prefeito do Município de São Paulo , de acordo com o que
decretou a Câmara Municipal, em sessão de 26 de agosto de 1949 ,
promulga a senguinte lei :
Art. 1.º Passa a denominar - se Rua Gabus Mendes a atual Tra
vessa 7 de Abril, que começa na rua 7 de Abril e termina na Rua
Basilio da Gama .
§ único As placas de nomenclatura conterão os seguintes di
zeres e data de nascimento e morte : Rua Gabus Mendes - Radialista
1906-1946 .
Art. 2.0 Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário .
276 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Prefvitura do Municipio de São Paulo , 3 de setembro de 1949 ,


336.º da fundação de São Paulo . O Preieito , Asdrubal Euritysts da
Cunha - O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno .
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
ssoal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 3 de setembro
de 1949 , O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

LEI N.° 3.797 , DE 3 DE SETEMBRO DE 1949


Abre crédito especial de Cr $ 217 138,90
o Prefeito do Município de São Paulo , de acórdo com 0 quo
decretou a Câmara Municipal, em sessão de 22 de agosto de 1949 ,
promulga a seguinte lei :
Art. 1.º Fica aberto , na Secretaria das Finanças, o crédito es
pecial de Cr$ 217.138,90 (duzentos e dezesete mil cento e trinta e oito
cruzeiros e noventa centavos ) destinado ao pagamento de diferenças
de " pro - labore ” devidas a funcionários da Biblioteca Municipal, e
correspondente ao período de 20 de maio a 10 de novembro de 1948 .
Art. 2.0 As despesas decorrentes desta lei correrão por conta
do excesso de arrecadação apurado no presente exercício financeiro .
Art. 3. ° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Municipio de São Paulo, 3 de setembro de 1949 ,
396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson, O Secretário das Finanças, João Pacheco
Fernandes .
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal, de Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 3 de setembro
de 1949 , - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

LEI N.º 3.798, DE 12 DE SETEMBRO DE 1949


Abre crédito especial de Cr $ 3.000.000,00 para a realiza
ção da Temporada Lírica Oficial de 1949 .

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com O que


decretou a Câmara Municipal , em sessão de 9 de setembro de 1949 ,
promulgou a seguinte lei :
Art . 1.0 Fica o Prefeito autorizado a realizar, por conta da
Prefeitura, nos termos da legislação em vigor, a Temporada Lírica
Oficial de 1949 .
Art. 2.0 Fica aberto , na Secretaria das Finanças , um crédito
especial de Cr $ 3.000.000,00 ( três milhões de cruzeiros ) para ocorrer
às despezas com a execução desta lei .
8 único O valor do presente crédito será coberto com os recur
sos provenientes do excesso de arrecadação previsto para o corrente
exercício .
Art. 3.0 Para organização e realização da Temporada, será
constituida uma Comissão de 5 ( cinco ) membros, sob a presidência
do Secretário da Educação e Cultura e com a participação do Diretor
DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS 277

do Departamento de Cultura, de i ( um ) Vereador designado pelo


Presidente da Câmara e por 2 ( dois ) membros de sociedades artis
ticas, de comprovada idoneidade e competência .
ſ único A Comissão de que trata este artigo funcionará a ti
tulo precário e gratuito .
Art . 4. ° A Prefeitura promoverá pelo menos 8 ( oito ) espetá
culos populares, aos seguintes preços: Gerais Cr$ 10,00 ( Dez cru
zeiros ) ; Arquibancadas Cr$ 20 , 00 ( Vinte cruzeiros ); Numeradas
Cr $ 30,00 ( Trinta cruzeiros ) .
$ único Um dos espetáculos será gratuito e realizado no Es
tádio do Pacaembú , em vesperal, num sábado ou em dia feriado , no
qual tomarão parte artistas célebres cantando arias de óperas esco
lhidas pela Comissão, intercalando-se no segundo ato o bailado da Ópe
ra " O Guaraní", de Carlos Gomes .
Art. 5.º A Prefeitura promoverá , ainda , um espetáculo inteira
mente gratis, sem distribuição de convites .
Art. 6.0 Para a Temporada Lírica serão contratados, tanto
quanto possível, maestros e artistas nacionais, bem como os aqui radi
cados, e obrigatoriamente utilizados os corpos estáveis do Teatro Mu
nicipal desta cidade .
Art. 7.0 Serão aproveitados nos papéis principais de 4 (qua
tro ) Operas, no mínimo, do programa da Temporada, 4 ( quatro artis
tas radicados em São Paulo , sendo 2 (dois ) brasileiros natos 2
( dois ) que residam no Brasil há mais de 2 ( dois ) anos .
Art . 8.0 A Prefeitura só alugará cenários e guarda - roupa no
exterior, caso seja impossível obtê - los no Brasil .
Art. 9 . O serviço de bilheteria será feito diretamente por fun
eionários da Secretaria das Finanças, designados pelo Executivo, de
vendo ser encaminhada à Câmara Municipal , 30 dias após o último
espetáculo , cópia da prestação de contas da Temporada .
Art. 10.º Fica permitida, sem exclusividade e sem ônus para
os cofres municipais, a irradiação de todos os espetáculos .
Art. 11. A renda líquida dos espetáculos destinar -se -á ao
reforço da verba " 920.8294 Subvenções, Contribuintes e Auxílios em
Geral ” , do orçamento vigente .
§ único Apurada a renda líquida, dela será retirada a impor
tància de Cr $ 30.000,00 ( trinta mil cruzeiros ), que será entregue à
Associação dos Albergues Noturnos para socorros aos necessitados
nem teto .
Art. 12.º Esta lei entrerá em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 12 setembro de 1949, 396.°
fundação de São Paulo. O Prefeito, Asdrubal Euritysses da Cunha .
O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco Oscar
Penteado Stevenson , O Secretário das Finanças, João Pacheco Fer
nandes , O Secretário de Educação e Cultura, Jaime Regalo Pereira .
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 12 de setem .
bro de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .

LEI N.º 3.799, DE 14 DE SETEMBRO DE 1949


Dispõe sobre medidas judiciais tendentes à recuperação da
posse dos terrenos municipais denominados “ Campo de
Marto " .
O Prefeito do Município de São Paulo , de acordo com 0 que
decretou a câmara Municipal, em sessão de 31 de agôsto de 1949 ,
promulgou a seguinte lei :
278 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Art. 1.9 - O Município impetrará no praso de 90 ( noventa )


dias, a competente ação judicial para recuperação da posse dos ter
renos de propriedade Municipal, denominados "Campo de Marte "
e situados no sub - distrito de Santana .
Art. 2.0 A providência determinada no artigo anterior deverá
correr paralelamente com os entendimentos administrativos que se
processam a respeito .
Art. 3.0 As despesas com a execução da presente lei correrão
por conta da verba própria do orçamento , suplementada se necessário .
Art. 4. ° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 14 de setembro de 1949 ,
396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito , Asdrubal Euritysses
da Cunha , O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Paulo
Teixeira Nogueira Diretor do Departamento do Expediente e do
Pessoal , respondendo pelo Expediente da Secretaria . O Secretário
das Finanças, João Pacheco Fernandes O Secretário de Obras,
Dario de Castro Bueno ,
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretária de Negócios Internos e Jurídicos, em 14 de
setembro de 1949 . O Diretor, Paulo Toixeira Noguein .
ÍNDICE

COLABORAÇÃO
Memoria Histórica de Jacupiranga, por Antônio Paulino de
Almeida
Um Congresso Internacional de Filosofia, por Luis Washington
Elucidário do “ Inferno Verde ", de Alberto Rangel, por L. G.
de Simas 127
Os Tapirapé , por Herbert Baldus 231

PUBLICAÇÕES
“ Linguistica y Filologia clásica , su situacion actual” 239
--- Boletim de Filologia ” 242
" Three Hispanic Word Studies, Latin Macula in
Ibero Romance ; Old Portugueses Trigar ;
Hispanic Lo ( u ) cano ; 249

DOCUMENTAÇÃO
Ordens Régias
N.° 24 Registo de uma Provisão de Sua Magestado que Deus
guarde, para o dr. ouvidor geral desta Comarca Domin
gos Luís da Rocha poder levar as próprias que se costu
mavam pagar aos seus antecessores o seguinte
N.° 25 Registo de uma ordem de Sua Magestade, sobre os
excessivos gastos que os ouvidores gerais, mandavam
fazer com azentes, ferros e mais cousas da cadeia pelos
do Conselho e aposentadorias dêles tendo casas próprias
e propinas como nela se declara e rúbricas de livros 254

Papéis Avulsos
Doc . CLXXX Avaliações Diversas 251
Doc . CLXXXI Férias de Esgotos 258
Doc . CLXXXII Despesas feitas por ordem do Senado 260
Doc . CLXXXIII Férias diversas 261
280 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Atas da Câmara de Santo Amaro

Ata da sessão ordinária realizada no dia 10 de fevereiro de 1913 263


Ata da sessão extraordinária realizada no dia 19 de fevereiro
de 1913 265

ATOS OFICIAIS
Decretos
Decreto n .° 1.083 , de 1 de setembro de 1949 Declara de uti
lidade pública imóvel situado á Avenida Lins de Vas
concelos, esquina da rua Vergueiro 269
Decreto n .° 1.084 , de 6 de setembro de 1949 Determina que
não se realizem feiras livres na Capital, no dia 7 de
setembro, em comemoração ao dia da Pátria . 270
Decreto n .° 1.085 , de 8 de setembro de 1949 Declara de uti
lidade pública imóvel situado as ruas Coriolano e Clé
lia , necessário à execução do plano de prolongamento
da rua Trajano, aprovado pelo Decreto n.º 955 , de 12
de março de 1947 270
Decreto n .° 1.086 , de 24 de setembro de 1949 Declara de uti
lidade pública área de terreno necessária á execução
do plano da retificação do alinhamento da rua Bom
Pastor, aprovado pelo Ato n .° 1.170 , de 14 de setem
bro de 1936 271
Decreto n .° 1.087 ,de 27 de setembro de 1949 Obriga a The
São Paulo Company a elevar a oitenta metros cúbicos
as quotas de gás inferiores a ésse limite, e dá outras
providências 272

Leis
Lei n .° 3.792 , de 1 de setembro de 1949 Dispõe sôbre oficia
lização de via pública 273
Lei n . ° 3.793, de 1 de setembro de 1949 Torna obrigatória ,
a partir de 1950 , a publicidade da “ Relação dos Con
tribuintes do Município de São Paulo " 273
Lei n .° 3.794 , de 3 de setembro de 1949 Dispõe sobre deno
minação de via pública 274
Lei n .° 3.795 , de 3 de setembro de 1949 Dispõe sobre deno
minações de vias públicas 275
Lei n .° 3.796 , de 3 de setembro de 1949 Dispõe sõbre deno
minação de via pública . 275
Lei n . ° 3.797 , de 3 de setebro de 1949 Abre crédito espe
cial de Cr $ 217.183,90 276
Lei n . ° 3.798 , de 12 de setembro de 1949 Abre crédito espe
cial de Cr $ 3.000.000,00 para a realização da Tempo
rada Lírica Oficial de 1949 276
Lei n . ° 3.799 , de 14 de setembro de 1949 Dispõe sôbre me
didas judiciais tendentes a recuperação da posse doe
terrenos municipais denominados “ Campo de Marte " . 277
REVISTA DO ARQUIVO

MUNICIPAL

DOUVENTS DEPARTMENT
CXXVIII

AUG 2 5 1950

TOR RT
UNIVERSITY OF CALIFORNIA

Casa do Capitão -mor em São Luiz do Paraitinga


Desenho de Nelson Nóbrega

PREFEITURA DO MUNICIPIO DE SÃO PAULO


DEPARTAMENTO MUNICIPAL DE CULTURA
1949
REVISTA

DO

ARQU I V O

MUNICIPAL 1
1
PUBLICAÇÃO DO DEPARTAMENTO
MUNICIPAL DE CULTURA i

Redação :
Divisão do

Arquivo
Histórico

Rua Cantareira , 216


Telefones 2-3576
e 2-3256

Oficinas :
Gráfica da
Prefeitura

Telefone 3 -1051

Assinaturas :
para o Estado de São Paulo
Cada 12 números . . . Cr$ 40,00
Número avulso Cr $ 5,00

Para os outros Estados


Cada 12 números . . Cr$ 60,00
Número avulso . Cr$ 5,00
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL
1
1
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL
Publicação da Divisão do Arquivo Histórico , do Departamento de Cul.
tura , da Secretaria de Educação e Cultura , da Prefeitura de São Paulo

São Paulo Rua da Cantareira n . 216


ANO XVI Secretário
Diretor
VOLUME CXXVIII
JOSÉ DE BARROS MARTINS NU TO SANT'ANNA
OUTUBRO DE 1949

SUMÁRIO

A CRÍTICA LITERÁRIA NO BRASIL VILSON MARTINS

TRADUÇÕES DE POESIAS TUPIS 1. LETOS BARBOSA

JONGO ALCEU MAYNARD ARAUJO

HERBERT BALDUS ,
VARIO MIRANDA ROSA ,
SOCIEDADE AMIGOS DO ÍNDIO GAL. CANDIDO MARIANO
DA SILVA RONDON , e
HARALD SCHULTZ .

PUBLICAÇÕES ORDENS RÉGIAS PAPÉIS

AVULSOS ATAS DA CÂMARA DE SANTO

AMARO DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS


PREFEITURA DE SÃO PAULO
RUA LIBERO BADARO , 877

PREFEITO
ASORUBAL EURITYSSES DA CUINA
COLABORAÇÃO
1
1
A CRITICA LITERARIA NO BRASIL (1)

WILSON MARTINS

INTRODUÇÃO

É recentissimo, entre nós, o interesse dos críticos pela natu


reza, funções e limites da crítica literária . Pode- se datá -lo de
1923, quando o sr . Tristão de Athayde julgou indispensável, no
início de um livro de crítica, expor as suas idéias sõbre o gênero .
Antes disso, se houve críticos que se preocuparam com o proble
ma, e nós veremos que houve, fizeram - no incidentemente e, o que
é mais significativo, no apogeu ou no fim de sua carreira, isto é,
depois de terem feito crítica empiricamente, durante anos e anos .
Dir-se-á que o método mais seguro é o que se se deduz da
natureza do trabalho já realizado e não o que se estabelece " a
priori” com um conhecimento forçosamente parcial da matéria .
Que mais vale o crítico sem método do que o crítico que se prende
desde o início a um método inflexível e que por isso mesmo não
poderá compreender a vasta complexidade do fenômeno literário .
O que é verdade somente em parte, pois um método, por sua
própria natureza, tem de ser anterior à pesquisa que se quer
realizar, consiste numa atitude diante das questões, fundada em
regras filosóficas de alcance geral e dotada, portanto , da elasti
cidade que se reclama .

(1) Livro ainda inédito .


8 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

A ciência só se constituiu no dia em que pode constituir o


seu método, ou o primeiro dēles ; a existência ou inexistència de
um método científico marca a distância que vai, por exemplo , da
astrologia à astronomia , ou da alquimia à química . Da mesma
forma, no campo das ciências chamadas sociais, se elas só mo
dernamente puderam alicerçar bases estáveis e fecundas, é porque
só modernamente se fundaram em métodos científicos de inves
tigação. Para os gêneros literários de pesquisa, isto é, para aque
les que não dependem apenas da imaginação, as exigências são
as mesmas ( 2 ) . Só nos últimos anos, porém , é que se tomou
consciência disso .
Os primeiros sinais desse novo estado de espírito, podem - se
contar, na literatura brasileira, daquele trabalho do sr. Tristão de
Athayde, que , por sua vez , refletia um estado de espírito gene
ralizado entre os escritores do momento , grupados no Modernismo.
De resto , esse desinteresse dos nossos escritores pelos gêne
ros que praticam não é exclusivo dos críticos . Nossos poetas
pouco ou raramente se ocupam da arte poética ( não da sua arte
poética, dêles , mas da arte poética como método de trabalho lite
rário, como instrumento capaz de permitir uma transmissão cada
vez mais perfeita do sentimento poético ) ; nossos romancistas , ao
que eu saiba , jamais se preocuparam seriamente com os problemas
do romance , a não ser para justificar , em casos eventuais , os ro
mances que escreveram . Possuimos uma literatura que não tem
o hábito de refletir sôbre si mesma, e menos ainda o de refletir
sôbre a natureza do fenômeno literário . Sinal inquietador de
inconsciência , de superficialidade e de transitoriedade, que explica
em muito o papel secundário que nos cabe nas lertas universais .
E que explica , ao mesmo tempo , por que a nossa crítica só começou
a aparecer , no sentido próprio da palavra , depois que três ou qua
tro movimentos literários de importância já tinham ocorrido na
literatura brasileira . O que, de certo modo, é inerente à sua
natureza : não pode ser senão posterior aos gêneros ditos de cria
ção . Mas , sendo filosòficamente posterior, deve ser cronològi
camente contemporânea dêles , o que no Brasil não aconteceu .
Quando apareceu nosso primeiro grande crítico , a poesia brasi
leira já encerrara três ou quatro ciclos de importância, e nosso
romance se constituira espontâneamente, sem nenhum apoio dou
trinário ponderável .
Se a natureza e função dos gêneros pouco nos têm interes
sado, menos interesse ainda tem despertado a sua história . De

(2) As exigências são as mesmas do ponto-de-vista filosófico , o


que não quer dizer que os métodos das ciências naturais , como
tais, devam ou possam ser aplicados na crítica literária .
A CRITICA LITERÁRIA NO BRASIL

qualquer forma, mesmo antes do Modernismo e do livro do sr.


Tristão de Athayde, como posteriormente a eles, várias tentativas
de classificação de nossa evolução crítica foram feitas, quase sem
pre incidentemente e de passagem . São todas imperfeitas no seu
método, puramente cronológicas ou arbitrárias, e incompletas nas
suas constatações. A maior parte revela conceitos hoje inacei
táveis de crítica , dai se apoiarem em nomes ou obras que hoje nos
parecem sem significação. Pois uma história da crítica depende
da conceituação prévia do gênero e , quanto a isso , raramente temos
passado das concepções pessoais e variáveis dos críticos .
Sílvio Romero, no seu destino de infatigável abridor de ca
ininhos, foi quem primeiro se ocupou do assunto com certo rigor
metodológico ( 3 ). Escrevendo sobre Dutra e Melo, dá a crítica
brasileira como se iniciando de 1840 a 1845, " dirigida por dois
estrangeiros, Santiago Nunes Ribeiro e Emilio Adet. Porto -Ale
gre, Tôrres Homem e Dutra e Melo deixaram amostras nessa
direção ” . Início muito incerto e intermitente , pois afora Dutra
e Melo, logo morto , nenhum deles encarava a crítica como gênero
autónomo. Mais tarde, segundo Sílvio , apareceram Norberto Silva
( 1841), o Cônego Fernandes Pinheiro ( 1852 ) e Sotero dos Reis
( 1866 ) ; " porém Norberto , foi antes um pesquisador de fatos his
tóricos do que um crítico, Fernandes Pinheiro e Sotero dos Reis
foram dois retóricos despidos de qualquer talento analítico " .
Depois de considerar que “ a crítica só pode tomar um forte ascen
dente nas literaturas abundantes e robustamente constituidas ” ,
Sílvio Romero silencia . O assunto, que o preocupava , é retomado
mais tarde . No retrospecto literário de 1888, agora incluído no
quinto volume da História da Literatura Brasileira, Silvio Romero
tenta pela primeira vez uma história sumária do gênero :

Nos tempos colonais não existiu entre nós ; seus pri


meiros rebentos são do tempo da Regência, com Januário
Barbosa , Abreu e Lima e o próprio Evaristo da Veiga .
Era ainda muito vacilante . Pouco depois apareceram os
primeiros e parcos ensaios de Magalhães, Pôrto Alegre
e Sales Tôrres Homem . Mais alentada se mostrou nos
primeiros anos do atual reinado pelo órgão de Santiago
Nunes Ribeiro e Norberto de Sousa e Silva . Já então
tinha preocupações nacionalísticas e cogitava de nossas

(3) Cf. História da Literatura Brasileira Rio, 1943 III, pg


183 , e V, pgs. 258/425/440 . Machado de Assiz Rio, 1936
pg . 75. Novos Estudos de Literatura Contemporânea Rio,
s/ d. , pg. 298. A Literatura Brasileira e a Crítica Moderna , pg.
186 ( cit. por Carlos Sussekind de Mendonça Sílvio Romero
São Paulo , 1938 pág. 91 ) .
10 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

origens. Pouco mais tarde descaiu imensamente nas


mãos de Fernandes Pinheiro e Sotero dos Reis . . Ves
tira, então, a velha túnica da retórica, tendo despido o
amplo 'manto da história . Depois seguiram -se algumas
tentativas de José de Alencar e Macedo Soares, e mais
tarde de Quintino Bocaiuva e Machado de Assis, segundo
as doutrinas do romantismo francês posterior à 1830 .
Estavam as coisas neste ponto quando apareceu o autor
destas linhas . Era em 1869-70 ” .

Sílvio Romero esclarece o sentido de sua atuação na crítica e entre


os resultados de maior importância assinala o da introdução " na
crítica e na história brasileira [ do ] verdadeiro princípio etnográ
fico " . Nega que Tobias Barreto se tenha ocupado da crítica
literária propriamente dita ; dá o ano de 1880 como o do início
da atividade de Araripe Junior ( 3-a ) , e assinala como " os mais
ilustrados cultores da difícil arte de criticar em 1888 ” os nomes de
Artur Orlando, Clóvis Beviláqua, Araripe Junior e Tito Livio de
Castro . Esclarece que se deve aplicar à crítica a filosofia darui
niana e não os métodos e processos especiais da biologia e acha
que as excursões do esteta prejudicam as análises do crítico Ara
ripe Junior . E aí terminam as reflexões de Sílvio Romero sobre
o assunto, que a elas retorna, no seu " Quadro sintético da evo
lução dos gêneros na literatura brasileira” . Ai, pela primeira vez,
e seria a única, Sílvio Romero nos oferece um quadro coerente
e menos arbitrário da evolução do gênero em nossa literatura .
Acho indispensável transcrevê - lo na integra, para melhor funda
mentar a discussão que se vai seguir :

I. Os precursores ( 1831-1851 ) Dá início a esta


fase o Parnaso Brasileiro ( 1831), de Januário da Cunha
Barbosa, e vai ela concluir no Florilégio da Poesia Bra
sileira ( 1851 ) , de Varnhagen , passando pelos nomes de
Abreu e Lima, Domingos de Magalhães, Emílio Adet,
Santiago Nunes Ribeiro, F. de Sales Torres Homem,
Porto -Alegre, J. M. Pereira da Silva, e mesmo Norberto
Silva que já em 1841 tinha nas Modulações Poéticas um
Bosquejo da história da poesia brasileira e em 1843 pu
blicava vários estudos na Minerva Brasiliense, cumprindo
não esquecer o nome de Francisco de Paula Menezes .

( 3a ) --A verdade, porém , é que existe um trabalho crítico de Ara


ripe publicado em 1869 ; Carta sôbre a literatura brasílica .
V. Araripe Junior José de Alencar Rio , s/ d., pg. 107 .
A CRITICA LITERÁRIA NO BRASIL 11

II . Periodo intermédio, sem as investigações eruditas


de alguns dos precursores e com veleidades retóricas de
estafado classicismo ( 1851-1870 ), com Antônio Joaquim
de Melo, Sotero dos Reis e o Cônego Fernandes Pinheiro .

III . Comêço de reação no sentido de mais adiantadas


doutrinas, com Macedo Soares, Eunápio Deiró e poucos
mais .

IV . Reação mais decisiva de Tobias Barreto, a prin


cípio sob a influência do criticismo de Vacherot , Renan
e Scherer e logo após com o germanismo, fazendo, não
em tratados longos e massudos, sim em rápidos e incisi
vos ensaios, crítica de religião, de filosofia , de política,
de literatura, de arte e de direito .

V. Crítica integral das manifestações espirituais da na


ção, estudando o meio, as raças, o folclore, as tradições,
tentando elucidar os assuntos nacionais à luz da filosofia
superior do evolucionismo spenceriano, procurando uma
explicação científica da nossa história e vindo encontrar
no mestiçamento ( físico ou moral), a feição original da
nossa característica , com Sílvio Romero ( de 1870 em
diante ) , a que se vieram juntar Celso de Magalhães,
Rocha Lima , Clóvis Beviláqua , Artur Orlando, Livio de
Castro, Adolfo Caminha , os jovens França Pereira , Au
gusto Franco , João Barreto de Menezes, Crisanto de Bri
to, etc ..

VI . A crítica psicológica e impressionista , umas vezes


paradoxal e metafísica, outras obscuras e rebuscada, de
Araripe Junior, que merece um lugar à parte .

VII . Os recentes críticos, nos quais se nota um como


retorno às considerações de ordem puramente retórica e
não raro gramatical José Veríssimo, Magalhães de
Azeredo e poucos mais são os principais representantes
dessa fase de retorno .

É nos comentários a ésse quadro que se encontra o desenvol


vimento mais completo da idéia que Silvio Romero fazia da cri
tica : " A parte da lógica aplicada, que , estudadas as condições que
originam e as leis que regem o desenvolvimento de todas as cria
12 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ções do espirito fiumano, científicas, artísticas, religiosas, políticas,


jurídicas e morais, aprecia as obras dos escritores que de tais
fatos se ocuparam " .
Vê -se que mesmo Silvio Romero não distingue a crítica li
terária das outras formas de crítica e que, levado pela identidade
de método, que entrevia sem jamais chegar å têr dêle uma idéia
exata, confundia como idênticas, por exemplo, a crítica religiosa
e a crítica literária ( 3-b ) .
Quanto ao quadro em si mesmo, verifica -se que ele não passa
de uma esquematização das idéias mais ou menos empíricas que
Silvio Romero possuia sobre o assunto e de que ainda se ocupou
nos Novos Estudos de Literatura Contemporânea, ao criticar o
livro de Valentim Magalhães ( A Literatura Brasileira ) e, de pas
sagem , no seu trabalho sôbre Machado de Assiz .
O mais fundo defeito dessa classificação, como o de todas
as outras existentes, é o de uma crença romântica no progresso
necessário, que faz com que a crítica , tendo - se iniciado com pre
cursores, evolua, depois de um período intermediário , para uma
reação científica ou estética, conforme o caso , que depois se esta
belece plenamente e que reune todos os nomes verdadeiramente sig
nificativos da especialidade não passando outras correntes que
acaso existam , de atividades por vezes paradoxais e metafísicas ( o
que, na boca de Silvio Romero era quase um insulto ) , por vezes
obscuras e rebuscadas, ou, ainda , de pura e simples retrogradação .
Essa “ religião do progresso ", como a chamou Pierre Lasserre
( 4 ) , “ quoique commandée toujours par des passions bien proches
de celles qui constituent l'âme romantique, n'est pas un fait ex
clusivement romantique " . Ela consiste na fé em um progresso
necessário, " seja que , com Condorcet, consideremo-lo como " inde
finido ", seja que, com os panteistas alemães , Spencer, o extranho
Renan dos Dialogues Philosophiques, lhe marquemos um apogeu ,
um ponto supremo que se define, conforme os sistemas, \ equili

( 3b ) - Cf. , a propósito, Antonio Candido Introdução ao método


crítico de Silvio Romero São Paulo, 1945 , pg. 142 : " A sua
confusão vem de não distinguir a realidade autónoma das
diversas críticas : a literária , 0 científica , a filosófica, a
de arte " .
(4 ) Cf. Le Romantisme Français Paris, 1907 pgs. 417 e
segs .. Ainda : Euryalo Cannabrava Seis Temas do Espírito
Moderno São Paulo , s / d . pg. 122. Um bom estudo expo
sitivo e crítico da tendência a basear a evolução das ciências
e das artes sõbre a noção do progresso linear encontra -se em
Sorokin : “ Dynamique socio - culturelle et évolutionnisme " , no
livro de Gurvitch e Moore La Sociologie au XXè siècle
Paris, 1947 7. pgs. 96 e segs .. Cf. , ainda, P. Lacombe
Introduction à L'histoire Littéraire Paris, 1898 , pgs .
19+ SS .
A CRITICA LITERARIA NO BRASIL 13

brio perfeito da espécie com o meio', ' reino da razão ', ' consciên
cia absoluta do universo ”. Nesse misticismo do progresso en
contram - se os românticos e os seus implacáveis inimigos, os evo
lucionistas, daruinistas e outros " realistas ” das ciências ; e nele se
colocava Sílvio Romero lado a lado com o Cônego Fernandes
Pinheiro .
Ora, " não há progresso nas artes”, como diria Roger Caillois,
ou , pelo menos, o progresso , nas artes como em tudo, não é essa
linha reta e ascendente que os temperamentos ou excessivamente
românticos ou excessivamente lógicos amam se figurar. Pois a
história, como observou Henri Focillon , " est généralement un con
flit de précocités, d'actualités e de retards" ( 5 ) . As classifica
ções spencerianas terminam necessàriamente na preferência pelo
ponto mais alto da evolução do progresso , que é forçosamente aque
le em que o classificador se coloca donde uma negação impli
cita de ulteriores possibilidades de progresso . Ora , as classifi
cações só valem pelo que contém de objetividade, e nenhuma obje
tividade é possível quando se sabe, de antemão, que há uma cor
rente, a nossa , melhor que todas as outras .
Essa ascenção lógica, de um zero teórico a um absoluto tam
bém teórico , não existe . Menos ainda pode verificar- se em ati
vidades que escapam a todo contrôle metarial , que dependem não
de um crescimento espiritual, mas de uma afinação da inteligência .
A crítica que fazemos hoje, como a ciência que hoje realizamos,
não são necessàriamente melhores que as dos nossos antepas
sados ; e se de fato temos motivos para julgá -las melhores, a ex
plicação deve ser outra que a idéia, supremamente discutível, de
que nos encontramos num pináculo . Pois o nosso pináculo vale
tanto quanto o de Fernandes Pinheiro ou o de Sílvio Romero, e
não é com ilusões dêsse porte que se pode estabelecer nem uma
sólida ciência nem uma crítica sólida .
A classificação de Silvio Romero parece -me incompleta, ain
da, quanto aos detalhes . Pois não existe identidade entre os tipos
de crítica praticados pelos autores que ele inclue em cada um
dos seus períodos. Não sei que pontos comuns poderiam mar
car, ao mesmo tempo, a crítica de Varnhagen e a de Pereira da
Silva ; nem a de Sílvio Romero e a de Clóvis Beviláqua , nem por
que Tobias Barreto, cujas incursões na crítica literária foram
puramente acidentais, marcaria ele só todo um período .

(6) Ct . Vie des Formes Paris, 1947 08. 83. Julien Benda
Du style d'idées - Paris , 1948 pga . 127 e sgs . , Ch. V.
Langlois e Ch . Seignobos Introdução aos Estudos Históricos
São Paulo, 1946 pg . 201 .
14 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Menos sistemático , embora muito mais crítico, me parece o


esboço tentado por José Veríssimo ( 6 ) . Ainda por esse lado se
comprova que Silvio Romero era muito mais historiador qué cré
tico, ao contrário de Veríssimo que foi , acima de tudo, um crítico
literário ( 7 ) . É por isso que, como veremos , nossa crítica mo
derna tem suas fontes mais importantes não em Silvio Romero
mas em José Veríssimo . Este observara que a critica brasileira
tem raizes diretas na que se fazia em Portugal pelos órgãos das
Academias e Arcádias e pelos censores oficiais . Passou para o
- os hiperbólicos encômios, os cam
Brasil com a mesma índole
panudos elogios, o sentimento antes patrióticos que crítico - e a
que aquí se fez , no Patriota, na Minerva, no Guanabara, na Nite
roi, ainda lhe exagerou aquela tendência atávica . Esse espírito,
segundo Verissimo, permaneceu até " o advento do modernismo",
que era como se chamava naquele tempo, a exemplo do que ocorre
nas demais literaturas sul- americanas, o realismo ou naturalismo .
Mas a crítica , “ como um ramo independente da literatura ” , nasceu
com o Romantismo, ou , antes, precedeu -o, acentuava Verissimo,

nos estudos biográficos e literários do Patriota , de Araujo


Guimarães, do Parnaso Brasileiro, de Cunha Barbosa, da
Niteroi, de Gonçalves de Magalhães e Porto -Alegre . Era ,
porém , sobretudo louvaminheira e derramada em imperti
nentes considerações gerais, e acreditava ingênuamente
que preconisar a produção literária nacional era o mesmo
que valorizá - la e que o louvor, ainda indiscreto, seria
estímulo bastante ao fomento das nossas letras .

Depois de dar Varnhagen como o criador da crítica literária no


Brasil , Veríssimo assinala os nomes de Norberto Silva, Porto
Alegre, Magalhães, Macedo , Ferreira da Silva, Gonçalves Dias,
Paula Menezes , Dutra e Melo, Paranhos Schutel, Jací Monteiro,
e alguns estrangeiros, como Burgain e Adet , o espanhol Pascoal,
o chileno Santiago Nunes Ribeiro, os portugueses Zaluar e Mon
toro, que " se distinguiram como críticos” . Que passe essa ma
neira doméstica de indicar os críticos como “ o espanhol Pascoal "
e o " português Montoro " . Na segunda geração romântica, a
crítica teria sido exercida por Álvares de Azevedo, Junqueira Frei
re , Bernardo Guimarães e José de Alencar . Mas foram, todos,
ensaios dispersivos. O primeiro a se ocupar da crítica brasileira

(6) cf. História da Literatura Brasileira Rio , 1916 pgs .


289/404 .
(7) CI., a êsse respeito, Wilson Martins Interpretações Rio ,
1946 pgs . 293/294 .
A.CRITICA LITERÁRIA NO BRASIL 15

com certo espírito de sistema foi o Cônego Fernandes Pinheiro,


ao mesmo tempo em que o fazia Sotero dos Reis, no Maranhão .
Veríssimo fala no aparecimento da reação " modernista " , com To
bias Barreto, " o mais distinto prócer do movimento e cuja cultura
germânica parece ter sido cabal”, ao contrário dos nossos outros
germanistas ( leia -se : Sílvio Romero ) seus discípulos ou segui
dores que a fizeram " superficialmente e através do francês” . O
nome de Machado de Assiz é mencionado e a data de 1875 fixada
como a da publicação de livros própriamente de crítica, tais os
Ensaios e Estudos de Filosofia e Crítica, desse ano, e os Estudos
Alemães, de Tobias Barreto, e o Crítica e Literatura, de Rocha
Lima . Depois aparecem os nomes de Araripe Junior, o do pró
prio Veríssimo ( pois era moda no tempo os autores se incluirem
em suas histórias ) e outros menores .

Mas o primeiro dos escritores brasileiros que, de parte


um breve e malogrado excurso pela poesia, fez obra co
piosa de crítica geral e particular, é o sr. Sílvio Romero,
simultaneamente discípulo, por Tobias Barreto, dos ale
mães, e, muito mais diretamente, dos franceses por Taine
e Scherer, pelo que é da literatura propriamente dita, e
de Spencer, Haeckel, Noiré e Iehring, pelo que é da
filosofia e pensamento geral.

Que passe, ainda, todo o veneno contido nesse pequeno frasco


de perfume. Vê-se , no entanto, que José Veríssimo foi mais
arguto que Silvio Romero, em primeiro lugar localizando as raizes
portuguesas de nossa critica e, depois, pela maneira por que es
calonou o seu esquema. E , no fundo, o seu julgamento de Silvio
Romero não é o nosso ( 8 ) ? No que ambos se enganavam é nessa
preocupação de identificar o criador da crítica literária brasileira,
pois ésse criador não houve . Veríssimo evita de estabelecer um
gráfico como o de Romero, mas sente - se que a crença no pro
gresso necessário também o dominava .
A idéia que Ronald de Carvalho possuia da evolução de
nossa crítica ( 9) deriva essencialmente dessas duas . Mas tem

(8) Cf. , ainda, Estudos de Literatura Brasileira 1.a série


Rio , 1901 pgs . 63/174/215 . 34. série - Rio, 1903 , pgo .
222 e segs ., 6.a série Rio, 1907 , o ensaio dedicando à
História da Literatura Brasileira , de Sílvio Romero. Antonio
Candido Introdução ao método crítico de Sílvio Romero ,
pgs . 24/35/38 .
(9) CI . Pequepa História da Literatura Brasileira Rio , 1925
Pga . 358/360 .
16 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

a vantagem , que caracteriza em conjunto a sua Pequeno História ,


de oferecer uma interpretação mais profundamente estética dos
fatos, além de um julgamento sôbre Silvio Romero, Araripe Ju
nior e José Veríssimo que os coloca, à parte algumas retificações
que lhe possamos opor, nos seus definitivos lugares. Também
para Ronald de Carvalho a crítica se iniciou verdadeiramente entre
nós por volta de 1870 , com a Escola de Recife. A novidade que
apresenta sobre os quadros de Romero e Veríssimo consiste na
inclusão do nome de Joaquim Nabuco .
Um crítico português, o sr. Fidelino de Figueiredo, liga, de
passagem , esses nomes aos da moderna crítica literária do Brasil
( 10 ) . Num trabalho de 1920 sôbre José Enrique Rodó, fala
nos espíritos críticos que o Brasil " modernamente” tem produ
zido, como Silvio Romero, Araripe Junior e José Verissimo, todos
mortos nessa ocasião ; e ainda de

Nestor Vítor , ensaista psicólogo, João Ribeiro, filólogo ,


e o grupo dos modernos, Ronald de Carvalho, Amoroso
Lima, Jackson de Figueiredo, Andrade Muricy e Tasso
da Silveira .

Também para Nestor Vítor ( 11 ) , a nossa crítica se iniciou


em 1870, pois antes ela não passava de " ruidosa vacuidade, inopia
e desleixo de forma ” . É enorme a lista de nomes por ele esta
belecida, vendo- se que sua intenção foi mais a de alongá -la que
a de restringi -la aos críticos pròpriamente ditos . Era uma carta
ao sr . Andrade Muricy, legítimo temperamento de crítico que
abandonou a crítica literária pela musical, a quem Nestor Vítor
certamente constrangia equiparando -o, por exemplo, ao sr. Mário
Pinto Serva .
O sr . Nelson Werneck Sodré ( 12 ) parece atribuir o apareci
mento da crítica brasileira ao Florilégio ,de Varnhagen, e dá So
tero dos Reis e Pereira da Silva como outros iniciadores do gê
nero . Tudo isso, porém , de passagem , sem o ânimo de um es
tudo sistemático .
O sr. Alvaro Lins ( 13 ) acha que João Francisco Lisboa é,
na ordem cronológica, o primeiro espírito crítico em ação na li
teratura brasileira, o que vem introduzir um nome novo entre os
mencionados nos quadros de evolução anteriormente expostos .

( 10 ) cf. Estudos de Literatura Lisboa, 1921 III, pg . 105 .


( 11 ) CI . Cartas à Gente Nova Rio, 1924 pgs . 331 e segs ..
( 12 ) Cf. História da Literatura Brasileira Rio, 1940 pg . 120 .
( 11 ) Cr . Jornal de Critica Rio, 1947 5.4 série , Pg. 229 .
A CRITICA LITERARIA NO BRASIL 17

Xavier Marques, no primeiro volume dos seus Ensaios ( 14 ) ,


apresenta um resumo da história de nossa crítica . Seu trabalho,
puramente cronológico, não encerra nenhuma novidade sobre os
anteriores, pois da mesma forma assinala os prenúncios da crítica
em 1842 e sua solidificação a partir de 1870 .
Resta, assim , como ensaio mais sério sobre a evolução da
crítica literária no Brasil o artigo publicado pelo sr . Tristão de
Athayde no " Jornal do Comércio " , de 8 de novembro de 1936 .
São três as fases que, em sua opinião, marcam o desenvolvimento
de nossa crítica literária : a empírica, a construtiva e a estética,
" nomes que não pretendem se não facilitar a expressão coletiva
de cada uma ” .
Na fase empirica, que coincide com o movimento romântico ,
“ a crítica acompanha modestamente a criação" e seus nomes mais
importantes são os de Sotero dos Reis , Pereira da Silva, Fernan
des Pinheiro, ao lado da Ferdinand Dénis ou Wolf, entre os es
trangeiros , e Joaquim Norberto ou Varnhagen, entre os patrícios.
A fase construtiva, que vai de 1870 a 1920, " ou , antes, da publi
cação da História da Literatura Brasileira, de Sílvio Romero, à
publicação da Pequena História da Literatura Brasileira, de Ro
nald de Carvalho " , marca a aquisição, pela crítica , de consistência
e autonomia . Pode- se resumí-la em três nomes : Sílvio Romero,
Araripe Junior, José Veríssimo . Entre essa fase e a seguinte, o
inevitável período de transição, preenchido por João Ribeiro . A
fase estética inicia- se com o Modernismo, e dela foi precursor o
crítico Nestor Vítor . Caracteriza - se pela aplicação à literatura
de " critérios propriamente literários ” . Fase que, ( o sr. Tristão
de Athayde não o diz ) a aceitar- se essa divisão, deve começar
com sua atividade crítica, em 1919, e principalmente com o Afonso
Arinos, de 1923 , e da qual os nomes significativos seriam os de
Humberto de Campos, Agripino Grieco, Múcio Leão , Plínio Bar
reto, Tasso da Silveira, José Geraldo Vieira, Otávio Tarquinio
de Sousa e outros .
O que marca a diferença essencial entre a classificação do
sr . Tristão de Athayde e as demais é o critério acentuadamente
estético que a presidiu . Nem as datas , nem as escolas marcam os
diversos estágios , mas a identidade de posição dos autores classi
ficados diante do problema literário . Mas aí, justamente, reside
o seu principal defeito, e defeito irreparável , pois essa identidade
não existe. Nada há de menos idênticos entre si que os processos
críticos de Silvio Romero, de Araripe Junior e de José Veríssimo,
e se insistirmos em que eles caracterizam um período de nossa

( 14 ) Rio , 1944 p96 . 27 e sogs ..


18 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

evolução crítica , teriam de representar três fases, ou antes, três


faces, dentro desse período, e o critério adotado deixaria , por isso
mesmo, de ser válido . Nem o sr. Tristão de Athayde escapou
ao mito do progresso necessário, sendo visível que esse escalona
mento em fases empírica, construtiva e estética representa para ele
três degraus sucessivos e ascendentes, que marcariam a " evolução "
da crítica brasileira, no sentido spenceriano que essa palavra possue.
São essas as principais tentativas de história da crítica bra
sileira . Outros critérios poderiam ser empregados nessa tarefa,
todos com defeitos e vantagens que se compensam . Poder-se - ia,
por exemplo, tentar a história de nossa crítica pelo critério das
gerações literárias, colocando cada crítico no seio da sua e pro
curando os mútuos pontos de contacto e repulsão . Poder - se - ia
aplicar o método cronológico, que tentou , mais ou menos, todos
os estudiosos acima citados , mas dar-lhe um caráter mais
rigoroso e histórico. Poder -se - ia apelar para o critério estético,
que tanto parece agradar o sr . Tristão de Athayde, e ai classi
ficar os nossos críticos pelas posições que defenderam e pelas
idéias que aplicaram à critica literária . Poder -se-ia classificá -los
por séculos, que é a forma mais rudimentar que tais trabalhos
adotam . É longa a série de métodos possíveis, mas um só pa
rece -me oferecer sobre os demais vantagens indiscutíveis. É O
que se baseia não em caracteres acidentais e exteriores aos críticos
e à crítica , mas na própria natureza dessa atividade. É o que
procura oferecer dos autores não uma visão acidental, mas uma
visão essencial. É o que procura descobrir na crítica não as
suas aparências, mas o seu espírito . Trata - se da classificação por
familias espirituais.
Naturalmente, não ignoro, com Gustave Lanson ( 15 ) , que as
classificações constituem , quase invariàvelmente , “ sources inépuisa
bles d'erreur " . E se me arrisco , por minha vez , nos perigos que
elas proporcionam , é porque estou convencido de que os trabalhos
de crítica, mesmo reconhecendo o caráter transitório e um pouco
vago dos seus esforços, sempre se fizeram para chegar a uma
denominação, a uma classificação, a uma definição, e que se esses
pontos terminais são perigosos então devemos evitar, para maior
segurança e com prudência mais elogiável, os trabalhos de crítica
literária ( 16 ) . Enquanto não nos decidirmos por essa solução de

( 15 ) Cf. Histoire de la Littérature Française -- Paris, 8 / d., pp. 751 .


( 16 ) Cf. Wilson Martins “ Do perigo das classificações " , no
" Estado de São Paulo ", 1.º de maio de 1948. “ Un procédé
très voisin de la distinction des idées , dont use l'esprit pour
former des vues enrichissantes sur la réalité , est la classifica
tion ou répartition des phénomènes par classes . Cette opéra
tion semple si profondément inhérento au progrès de l'esprit
A CRITICA LITERÁRIA NO BRASIL 19

sesperada, as classificações continuarão a constituir a finalidade


dos nossos trabalhos . E, precisamente, a que procura identificar
em cada escritor a família espiritual a que ele pertence é a que ,
por alcançar mais intimamente a realidade psicológica, parece-me
menos exposta aos erros grosseiros.
A idéia, se não é inteiramente nova em nossa literatura ( 17 ) ,
não me consta que tenha sido empregada como deve . Pois não
se trata de uma arbitrária invenção de estudiosos. Henri Focillon ,
que dela faz um dos princípios de seu magnífico Vie des Formes,
acha que o estudo dessas famílias, como tais, nos é indispensável
e que elas possuem uma realidade histórica e psicológica não me
nos manifesta que os grupos linguisticos e étnicos . O conceito de
geração, ao qual Henri Peyre vem de dedicar um livro tão com
preensivo ( 18 ) , é , assim , de uma certa forma, retificado e am
pliado, desde que

chaque homme est d'abord le contemporain de lui-même


et de sa génération, mais il est aussi le contemporain du
groupe spirituel dont il fait partie

e que as gerações, longe de constituirem os blocos unitários que


supomos, são complexos em que se justapõem todas as idades do
homem ( 19 ) . As gerações, assim , como a história, caracterizam
se por ser " um conflito de precocidades, de atualidades e de atra
zos ", e se não um conflito, na idéia de hostilidade violenta que
essa palavra evoca, pelo menos uma convivência de diversas " ida
des " e de diversas " famílias " muitas vezes sem nenhuma possi
bilidade de conciliação .

dans son enquête sur le réel qu'un psychologue ( Stuart Mill )


pu dire que " savoir c'est classer " ; et, en effet, peu de dé
marches intellectuelles semblent vraiment étrangères, en
dernière analyse, à ce travail " . ( Julien Benda Du stylo
d'idées Paris, 1948 Pg . 87 ) . Ainda Euryalo Can
nabrava ( ob . cit . , pg. 211 ) : " E por isso que a primeira ta
refa do crítico será hierarquizar, ordenar e classificar os pro
blemas" . É verdade que, por vezes, as classificações não dão
como resultados senão “ masquer les vrais problèmes, émous
ger, étourdir des notre sentiment des époques non moins que
notre intuition des individus" . ( Jean Pommier Paul Valé .
ry et la création littéraire Paris, 1946 pg . 27 ) . São
defeitos, porém, que me parecem pertencer mais aos “ clas
sificadores ” e ao espírito com que trabalham do que as “ clas
sificações " em si mesmas .
( 17 ) O sr . Tristão de Athayde menciona -a na sua Estética Literá
ria Rio , 1945 , pgs . 76/77 , e nos Três Ensaios sôbre Macha
do de Assiz Belo Horizonte, 1941, pg . 72 .
( 18 ) Henri Peyre Les Générations Littéraires Paris, 1948 .
( 19 ) Cf. Vie des Formes, principalmente os capítulos : “ Les formes
dans l'esprit ” e “ Les formes dans le temps " .
20 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Aplicado o critério à nossa literatura, verifica - se que a crítica


brasileira não nasce com um determinado nome, mas numa época ;
e que se desenvolve não em outros nomes, ou datas, mas em linhas
divergentes que, partindo das matrizes de cada familia, possuem
representantes em todos os tempos, inclusive em nossos dias. A
discussão estéril sobre se foi Varnhagen ou Sílvio Romero o ver
dadeiro iniciador da crítica no Brasil perde a sua razão de ser,
porque o critério adotado nos demonstra que o método de Var
nhagen ou o de Romero, o de Araripe como o de Veríssimo, cria
ram correntes subterrâneas ou evidentes de onde derivam outras
tantas de personalidade própria .
Por outro lado, o estabelecimento dessas linhagens, partindo
do representante mais antigo de cada uma, é o único meio de
que podemos dispor para a aquisição de uma idéia exata da evo
lução da crítica brasileira . Por êle, transformamos a história li
terária , de uma justaposição mais ou menos feliz de capítulos, num
todo unitário e orgânico, onde os escritores não se sucedem como
os soldados de um desfile, mas se intercruzam como os filamentos
de um tecido . Pois a vida literária não é uma sucessão, mas uma
coexistência, e nada mais falso do que as histórias que pretendem
interpretar essa coexistência como uma sucessão . Já se vê que
as histórias gerais da literatura , e não apenas as histórias dos gê
neros, ganhariam com a adoção do critério nesta empregado .
Êle nos ajuda a compreender por que um determinado tipo
de crítica ou de crítico surge num dado momento , sem funda
mentos aparentes no que se vinha anteriormente praticando . Por
que, por exemplo, uma História, como a de Artur Mota , pôde
suceder a uma História como a de Veríssimo ou a de Ronald de
Carvalho . Por que um escritor como o sr. Eloy Pontes pode
sobreviver ao lado de um crítico como o sr . Tristão de Athayde.
Por que a crítica . do sr. Alvaro Lins é diferente, na forma e no
fundo, da de Humberto de Campos . E no que consistem essas
diferenças tôdas .
O ponto de partida de um trabalho como esse é o estabele
cimento do quadro cronológico do gênero, que os leitores encon
trarão como apêndice a este volume. Isso depende, naturalmente ,
de um levantamento bibliográfico perfeito, como ainda não existe
do Brasil e que, portanto , cada um deve suprir na medida de suas
fôrças, com o risco das graves imperfeições de que este livro, no
tadamente, não escapa . Depois, à medida que aparecerem os no
mes que deixariam , tácita ou expressamente , um método mais ou
menos definido, estabelecem- se os começos de linhagem, prolon
gadas, depois, pelos espíritos semelhantes que surgirem . Grupam
se , assim , várias linhagens de escritores , cada uma com caracte
A CRITICA LITERÁRIA NO BRASIL 21

res específicos e determinando um tipo uniforme de aproximação


do fenômeno literário . Daí uma idéia exata da evolução da cri
tica, palavra que se conserva no sentido que a Lalande parece
o que melhor corresponde ao espírito real e histórico do evolucio
nismo, isto é , não o que implica uma idéia de " progresso ", mas
o de uma transformação que faz passar um agregado do homo
gêneo ao heterogêneo, ou do menos heterogêneo ao mais hetero
gêneo .
Aquí se coloca um problema de complexidade ainda maior.
País de formação colonial, o Brasil não possue uma literatura
antes de 1822 ; na verdade, nossa autonomia literária é posterior
à independência política e se inicia , o mais cedo , por volta de
1830 ( 20 ) . A maior parte dos autores concorda nesse ponto ( 21 ) ,
mas nem por isso metade de nossa história literária deixa de ser
composta de autores portuguêses, que pertencem , não só de direito,
como diz o sr. Fidelino de Figueiredo, mas de fato, à literatura
portuguêsa . Nossos historiadores têm confundido duas coisas di

( 20 ) Cf. Wilson Martins “ Problemas de uma história da litera


tura " , no “Estado de São Paulo ", 25/4/1946 , e na “ Folha do
Norte " , suplemento , 18/5/1947 .
( 21 ) Cf.: Ferdinand , Wolf Histoire de la littérature brésilienne
Berlim, 1863 , pgs . 2 o segs . e 45 ; J. C. Fernandes Pi
nheiro Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasi
leiro, tomo XXXI, parte 2.a, pg . 14 , e também o Curso Ele
mentar de Literatura Nacional Rio 1862 , notadamente pgs.
10 e 533 ; Sotero dos Reis Curso de Literatura Portuguêsa
e Brasileira São Luiz, 1866/67 - I , pgs. 63/66/77 , e III,
pags. VI / IX ; Gonçalves de Magalhães Opúsculo histó ..
ricos e literários Rio , 1865 , pg . 262 ; José Veríssimo
Estudos de Literatura Brasileira 2.a série Rio, 1901 ,
pgs . 5 e sgs.; Oliveira Lima Aspectos da Literatura Colo
nial Brasileira Leipzig, 1896 pgs . 1 e segs.; Capistrano
de Abreu Ensaios e Estudos Rio , 1931 - I , pg. 99 ;
Fidelino de Figueiredo Estudos de Literatura Lisboa,
1918 II , pg. 75 ; Ronald de Carvalho Pequena História ,
pg . 211 ; Tristão de Athayde Contribuição à História do
Modernismo Rio , 1939 pg . 60 ; Lúcia Miguel Pereira
“ Revista do Brasil " , dezembro de 1939 , pg . 84 ; Fernando
de Azevedo A Cultura Brasileira Rio, 1943 pg . 177 ;
José Veríssimo História da Literatura Brasileira intro
dução , e conferência na Biblioteca Nacional , 26/9/1912 , nos
" Anais " , vol . XXXV ; José Lins do Rego Conferencias
no Prata Rio , 1946 pg . 28 , etc .. Ainda em 1872 , Joa
quim Nabuco ostentava extranha idéia a respeito de nossa
autonomia literária . Dizia êle, na tradução de Camões
e os Lusíadas ( pg. 10 ) . “ Escolhendo os Lusíadas para ob
jeto de meus estudos, acredito que tomei um assunto nacional .
Os Lusíadas são a obra prima da literatura portuguêsa, que
é a nossa ( sic ) . Varios ensaios, e alguns de grande mere
cimento , fizeram - se entre nós com o intuito de dar- nos uma
literatura própria , mas ela ainda não existe " ( sic ) .
22 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ferentes, que são a " história literária do Brasil " e a " história da
literatura brasileira " . Todo o período colonial e mesmo o do pri
meiro reinado, não passam da pre-história de nossa literatura .
Sua influência é inegável, maior ou menor , conforme os casos,
mas no mesmo sentido em que se fala da influência da pre-his
tória na história da civilização . Assim como os escritores por
tuguêses continuaram a exercer, mesmo depois da Independência,
séria influência sôbre os escritores brasileiros.
Foi a literatura portuguêsa do Brasil que preparou o terreno
para o aparecimento da literatura brasileira, e nada ganhamos com
êsse enriquecimeneto abusivo que avoca para a nossa história lite
rária autores profundamente portugueses, como Antônio José,
Anchieta, Gregório de Matos ou os árcades mineiros. Pois o
sentido nacional de uma literatura , como já o observara Machado
de Assiz , não reside no assunto nacional , mas no espírito nacional,
e espírito nacional não o possuiam , nem o poderiam possuir, os
escritores brasileiros antes de 1830 . O que os historiadores de
nossa literatura costumam identificar com o nome de “ nativismo"
não passa de um equívoco, como não passa de um equívoco essa
atribuição póstuma de espírito nacional com que nós outros, pos
suidores de uma nítida consciência de pátria , premiamos os escri
tores coloniais .
Assim sendo, divido o presente trabalho em duas partes. ' A
primeira, constituida pela pre-história, refere -se ao período pre
enchido por nosso arcadismo, de origem e natureza acentuada
mente lusitanas, e pela crítica poética de Manuel Inácio da Silva
Alvarenga . A segunda parte, reserva - se a história propriamente
dita da crítica brasileira , ocupada pelos precursores e pelas di
versas linhagens, assim constituidas:

1. LINHAGEM GRAMATICAL . Deve - se remon


tar, para apreender -lhe os primeiros sinais, até às Aca
demias do século 18. Depois, os críticos e censores por
tuguêses. Osório Duque Estrada . Carlos D. Fernan
nandes . Carlos de Laet. Os gramáticos.

2. LINHAGEM HUMANISTICA . Odorico Men


des . João Francisco Lisboa . Joaquim Nabuco . Joa
quim Maria Machado de Assiz . Mário de Alencar.
Fernando de Azevedo . Alfredo Pujol. Afrânio Cou
tinho . Cristiano Martins. Afonso Pena Junior .

3. LINHAGEM HISTORICA . Francisco Adolfo


de Varnhagen . Sotero dos Reis . Antônio Henriques
Leal. Capistrano de Abreu . Joaquim Manuel de Ma
A CRITICA LITERARIA NO BRASIL 23

cedo . Lerí dos Santos. F. A. Pereira da Costa . Sa


cramento Blake . Oliveira Lima . Araujo Jorge. Es
têvão Cruz . Francisco Prisco . Eloy Pontes. Artur
Mota . Silvio Rabelo . Hermes Lima. Sérgio Buarque
de Holanda .

4. LINHAGEM SOCIOLOGICA . Silvio Romero .


Tobias Barreto . Raimundo Antônio da Rocha Lima .
Tito Livio de Castro . Adolfo Caminha . Almáquio Di
niz . Euryalo Cannabrava . Vianna Moog Nelson
Werneck Sodré . Heitor Ferreira Lima. Gilberto Frey
re . Otávio de Freitas Junior . Astrogildo Pereira .
Antônio Cândido .

5. LINHAGEM IMPRESSIONISTA . Tristão de


Alencar Araripe Júnior . Mello Morais Filho . Escrag
nolle Taunay . Rozendo Moniz Barreto . Valentim Ma.
galhães. Eduardo Prado . Henrique Maximiniano Coe
lho Neto . Xavier Marques . Nestor Vitor . Miguel
Melo . Sousa Bandeira . Frota Pessoa . Dionísio da
Gama . Afrânio Peixoto . Alcides Maya . Medeiros e
Albuquerque. Jackson de Figueiredo . José Maria Belo .
Tasso da Silveira . Múcio Leão . Sud Menucci. Ar
mando Seabra . Péricles Morais . Elísio de Carvalho .
Jorge de Lima . Jorge Abreu . Carlos Dante de Mo
rais . Oscar Mendes . Humberto de Campos. Heitor
Moniz . Celso Magalhães. Agripino Grieco . Dante
de Laytano. Odilo Costa Filho . Augusto Meyer.
Eduardo Frieiro . Carlos Chiacchio . Cândido Mota
Filho . Roberto Alvim Correia . Henrique Abílio . Ed
mundo Lys . Manoelito de Ornellas. Tomaz Murat .
Raul Machado . Ascendino Leite . Livio Xavier . Pru
dente de Morais neto . Osório Borba . Rosário Fusco .
Edgard Cavalheiro . Olívio Montenegro . Clóvis Ra
malhete. José Lins do Rego. Jayme de Barros . Car
los Burlamaqui Kopke. Júlio ..
Silvio Júlio
Sílvio Moysés Velhi
nho . Guilherme Figueiredo . João Etienne filho. Os
mar Pimentel. Bezerra de Freitas . Manuel Bandeira .

6. LINHAGEM ESTÉTICA . José Verissimo .


João Pinto da Silva . Andrade Muricy . Tristão de
Athayde. Ronald de Carvalho . Mário de Andrade .
Lúcia Miguel Pereira . Eugênio Gomes . Afonso Ari
24 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

nos de Melo Franco . Álvaro Lins . Sérgio Milliet .


Ruy Coelho . Barreto Filho . Wilson Chagas. Temis
tocles Linhares .

São essas as principais familias espirituais que se podem dis


tinguir na evolução de nossa crítica . É claro que nesse decurso
de tempo existem inúmeros nomes que flutuam , indecisos , sem
uma orientação definida, e , portanto , impossíveis de classificar .
Mas, como são, invariávelmente, os nomes menores e sem influên
cia no desenvolvimento do gênero, nada se perde em deixá-los
naquela “ retaguarda característica dos incaracterísticos ” , que é a
vala comum de todas as literaturas .
Por outro lado, a distribuição de nomes pelas várias linha
gens, ainda que tenha sido feita dentro das mais rigorosas inten
ções, não tem nem pode ter um caráter dogmático. Por dois
motivos : em primeiro lugar, pela refração inevitável no espírito
de quem classifica , que muitas vezes desloca de seu lugar próprio
um ou outro nome; e depois porque muitos desses críticos, e al
guns dos mais importantes, pertencem , simultâneamente, a várias
linhagens . Assim, o sr. Sérgio Milliet , por exemplo, para citar
um caso dos nossos dias, estaria bem colocado na linhagem socio
lógica ou na linhagem impressionista . Como o sr. Euryalo Can
nabrava numa possível , ainda que escassa, linhagem filosófica , e o
sr . Tristão de Athayde na linhagem humanística. Nem as linha
gens indicadas são as únicas possíveis, nem os autores nelas colo
cados deixariam de admitir , algumas vezes, outras classificações.
Foram relacionados, entretanto, pelo caráter predominante de sua
crítica, pelo que nelas me pareceu existir como " faculté maîtresse " .
Da mesma forma , nem todos os representantes de cada linha
gem possuem importância e significação equivalentes. As cara
cterísticas de cada grupo serão fornecidas, assim , pelo seu iniciador
cronológico e pelos seus maiores vultos. Os demais serão indivi
dualmente considerados apenas na medida em que trouxeram para
o caráter da linhagem alguma contribuição pessoal, e se destinam
a desaparecer completamente das histórias futuras de nossa cri
tica . Nesta história, que não se pretende narrativa, mas crítica,
uma larga margem foi deixada para a interpretação pessoal do
autor (22 )

( 22 ) Sobre a interpretação na crítica literária , cf. Wilson Martins


Interpretações pg . 207 ; " Da interpretação na crítica
de literatura " ( “Letras e Artes" . 29/6/1947 ) “ Folha do
Norte ”, 6/7/1947 e “Estado de São Paulo " , 24/7/1947 ; “ Notas
sobre a crítica de literatura ", no " O Jornal ", 5/1/1947 , e
“ Idéias de um crítico de literatura " , no “ Estado de São Pau
lo " . 26/1/1947 .
A CRITICA LITERÁRIA NO BRASIL 25

Uma história da crítica brasileira seria incompleta se não re


servasse um lugar para os críticos estrangeiros que nela exerceram
e exercem influência por vezes predominante. Os precursores
mais longinquos de nossa crítica e de nossa história literária são
estrangeiros : Bouterwek, Sismondi, Ferdinand Dénis. Outros
estrangeiros encontram - se nos primórdios do gênero entre nós :
Santiago Nunes Ribeiro, Ferdinand Wolf , Castilho, Garret.
Outros, ainda, vieram trazer modernamente á crítica brasileira
um concurso cujo alcance será examinado a seu tempo : os srs .
Fidelino de Figueiredo, Manuel Anselmo, Otto Maria Carpeaux ,
Paulo Rónai , Roger Bastide. Um apêndice lhes será dedicado,
pois seria abusivo filiá - los a qualquer uma das linhagens, desde
que, ao contrário, são eles que muitas vezes servem de fontes
para uma renovação do espírito crítico no Brasil .
TRADUÇÕES DE POESIAS TUPIS

( Lopecial para a “ REVISTA DO ARQUIVO" )

A. LEMOS BARBOSA

NOTAS CRITICAS

A interpretação das poesias tupis escritas pelo Padre An


chieta, ou a ele atribuidas, tem -se tornado objeto de vivas e inte
ressantes controvérsias .
Duas são as principais causas dessas incertezas e dissensões :
falta -- até há pouco — dos textos originais ou de cópias autên
ticas, e pouco conhecimento do lídimo Tupi antigo, em que foram
vasadas aquelas rimas . Mesmo quando , enfim , surgiu em alguma
universidade o estudo da lingua indigena, éste se voltou , com in
compreensível preferência, para o dialeto platino, o Guaraní, seja
o antigo seja o moderno . E ainda isso com a principal pre
ocupação de elucidar " etimologias” de topônimos. Para com
pletar o contrassenso, articula -se um estudo, com tais intenções
filológicas, na Secção de Geografia e História , ao lado da Etno
grafia. Bem se pode pressupor qual o preparo filológico e lin
güístico, qual a vocação para crítica textual da maioria dos alunos .
Mas vamos a um rápido apanhado das versões portuguêsas
das poesias tupis .
O primeiro a meter mãos à obra foi d . João da Cunha , com
a sua tradução de 1732, que serviu para o exame canônico dos
escritos do Padre Anchieta , e cuja fidelidade o tradutor atestou
sob juramento .
Batista Caetano de Almeida Nogueira, em sucessivos artigos,
estampados no Diário Oficial na última dezena que precedeu a
28 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

sua morte ( 11-15 de dezembro de 1882 ), impugnou veementemente


a tradução de dom João da Cunha, qualificando - a de impostura.
Reproduzindo-a mais tarde, Afrânio Peixoto tachou a Batista
Caetano de exigente. " Nesse assunto de tradução - e do tupi ...
é ser demasiado querer talvez outra cousa além do sentido ... "
( p . 18 ) .
A verdade, porém , é que João da Cunha não traduziu nem
mesmo o sentido. Percebe-se que conhecia a significação de um
ou outro substantivo ou verbo . Norteado por esses vagos indi
cios e, pelo demais, na total ignorância da lingua, rivalizada ape
nas por uma rara audácia, não titubeou em perpetrar a sua fami
gerada versão .

Um ou outro exemplos:

Ms. , p. 31v.
Paranagoaçu raçapa
aju derepiapota
ejort orerauçubâ
Toj catu nde cuapa
xe uba Tupinỹba

Trad , lit. Trad . de dom João da Cunha


Atravessando o oceano , Pelo meio do mar grande,
eu vim , por desejar te ver. buscai o nosso coração.
Vem apiedar-te de nós, Vinde, nosso amador,
para que te possa conhecer porque vós mui bem sabeis
o meu pai Tupinambá . que eu sou Pai Tupinambá.

Examinemos o 2.º verso ( para ficar só num ) . O tradutor


não discerniu o verbo epia' " ver ” ; enxergou sim o substantivo !
pia " coração ” . De pota ( r ) “ querer ” (no ger . ) ele estendeu o
sentido para “ buscar " . De ( n )de “ te” fez " nosso " . Etc. !
Numa palavra, o algum conhecimento do Tupi foi pior para o
tradutor .
Só mais um exemplo, colhido a esmo :

Ms. , p . 24v .
Tapuijpepira guabo
xe ramuya poracei
xe Tupã reco ayucei
xeruba reco peabo .

Trad . lit. Trad . de J. da Cunha


Devorando os banquetes de escra
[ vos, Gente bravia do mato
Meu avô dansava, era aquela minha avó.
Eu desejo a lei de Deus, Eu quero ser batisado,
repelindo os costumes de meu pai . e só a Deus quero por pai.
TRADUÇÕES DE POESIAS TUPIS 29

E basta . Tradução dessas só interessa ao anedotário biblio


gráfico .
Outro tanto não se pode dizer de Batista Caetano . Conhe
cedor exímio do Tupi, e principalmen te do Guarani , já dera so
bējas provas de competência na tradução direta e original da Con
quista Espiritual. Nos citados artigos do Diário Oficial, arriscou
uma tradução de três poesias atribuídas a Anchieta, baseando - se
nas péssimas cópias, inçadas de erros, que Melo Morais estam
para em folhetins do Globo e na Revista da Exposição Anthro
pológica Brasileira .
Com tal material - o de que se dispunha então no Brasil
o trabalho de Batista Caetano não podia ser , e não foi per
feito. Ainda hoje, porém , causa admiração a sua perspicácia e
intuição em assunto de crítica textual . Só merece restrições a
tendência para nivelar os dois dialetos, Tupi e Guarani ( p . 574 ) ,
"guaranizando o Tupi" . Algo de semelhante ao vêzo que ele
castigou nos antigos gramáticos, e que se repete ainda em certos
autores recentes : o de descrever os fatos de uma determinada lín
gua , guiando - se exclusivamente pelas correlações com outras ( a
latina ou portuguêsa ) . Dessa falha é comprovante, p . ex . , o co
mentário de B. Caetano à palavra Cerobiá : " 51. H - erobiá ,
" crê -lo , crêr nelle , ter fé nelle " , é no infinitivo “ o verbo robiar...".
Não confundisse Batista Caetano Tupi com Guarani , e não escre
veria h em vez de c ( = s ) , nem esqueceria que em Tupi os
verbos terminados em q formam o gerúndio, assim chamado, pelą
apócope dessa consoante . Aliás é o próprio Batista Caetano quem
implicitamente desconfessa a sua tese unitária, cada vez que assi
nala inumeráveis divergências entre os dois dialetos,
Nenhum outro trabalho de vulto surgiu , referente às velhas
poesias indígenas, até que o P. Gentil da Frota S. J. , pouco antes
de 1930 , trouxe para o Brasil alguns documentos jesuíticos , foto
grafados nos Arquivos da Companhia e nas Bibliotecas européias.
Entre eles, vieram também inúmeras poesias de Anchieta e de
outros Padres .
Parte dessas poesias , confiadas ao Prof. Plínio Airosa , sai
ram publicados nos Boletins ns . XXIV e LI da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, com
a interpretação e as notas de M. de L. de Paula Martins. Tive
oportunidade de significar à operosa ex -assistente do Prof. Airosa
as divergências que entre nós existiam quanto à leitura e inter
pretação de não poucas passagens . • Não lhe regateei aplausos,
porém , pelo seu trabalho . Sublinhei -lhe mesmo o valor perene,
pelo fato de trazer anexas as reproduções fotográficas dos origi
nais, ---- providência essa omitida por outros estudiosos, que difi
cultam destarte ao leitor o contrôle das restaurações e transcrições.
30 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

A dra . Paula Martins, vendo em minhas modestas notas o


único intuito de colaboração, recebeu - as com simpatia .
Acaba de sair agora um estudo de J. Philipson, atual assis
tente do Prof. Airosa, Em Abono de Batista Caetano. O opús
culo , “ como que defesa ” ( p. 6 ) de Batista Caetano, diz - se moti
vado pelo pouco que đêsse autor teria feito Paula Martins nos 1
seus comentários. 1

Já externei minha admiração por Batista Caetano . Acredito


que dispusesse ele do material autêntico que hoje conhecemos,
e ninguém o superaria na execução da difícil empresa . Sinto -me,
pois, à vontade para um breve exame da questão. Limitar -me - ei
a estudar os reparos de Philipson . Através desse crivo é que,
ligeiramente, atingirei os seus antecessores .

Na primeira poesia analisada, a " Canção do Tupinambá ”, há


um verso, o 2.º, que tem dado o que fazer aos tradutores:

M8 . , p. 31
Xotapinābagoaçu
palgoaça yrüdiba

Não vou inventariar as explicações lembradas para yrūdiba.


Não entendo, porém , a tolerância de Philipson por uma das hipó
teses de Batista Caetano, segundo a qual yrūdiba seria " quatro " :
paigoaçu yrūdiba quatro bispos, prelados, etc. " . Não tanto pela
bizarra introdução de quatro eclesiásticos, que não se sabe quais
sejam . Como tradução de " quatro " , sempre tenho lido irundyk,
em nenhum locumento irundyb. O mesmo se deve dizer dos
compostos: ojeirundyk , monhe ( i) rundyk, etc. O cardinal irundyk
( não irundyka, que é ordinal) decompõe-se em irū “ companheiro"
e syk . Cfr. , sobre esta partícula distributiva, Restivo 22 e 248 ;
Araújo 44 ; Montoya , Tesoro 114 v .; Arte 8, VLB 256 ; Figueira 5
( é mais provável aqui do que um lapso pela palavra latina sic
" assim " , tradução do tupi nā ) . A decomposição, aliás, é de
Montoya, Tesoro 178 v.
Que é então irundyba ?
Muito simples: " o que costuma ser companheiro " . E pai
-gủasu -irundyba ? “ O que costuma ser companheiro do prelado
( visitador, etc.) ” . Restivo 324, estudando a partícula tyba, dá
lhe, entre outros, esse sentido : “ Ti costumbre... Com nombres
tal qual vez se usa , ut : quice rărută lo que suele ser váina de
cuchilo ... ” . Em geral têm -se esquecido essa função abundan
TRADUÇÕES DE POESIAS TUPIS 31

cial de tyba ( após nasal : ( n ) dybe ) . Exerce - a de modo parti


cular junto aos participios e nomes verbais ( s ) abo, ( s ) ara e
( te )mi-. Cfr. Restivo, ib ., VLB 97 , 160, 259, 340 ; Araújo 29
bis, 247. - É incompreensível que não venha uma só palavra a
respeito na monografia, aliás interessante, que Carlos Drummond
publicou sobre a partícula , tanto mais que há todo um capítulo
para o “ sentido da palavra tyb " ( pp. 64-70 ) .

Ms. , p. 31v. Trad . de Batista Caetano


Ore tupă oqueta para eles antes que o ( s) padro ( 6 )
de nosso Deus a casa fundasse ( m )
Ipupe oronhoboebo
( 100 possuisse ( m ) /
tapă reroblarotobo para nela nos instruirem
em Deus crendo verdadeiramente ,
tecopoera mõbopa os costumes que eram dantes ati
( raram fora de todo lou
ſatiramos fora de todo./

Trad . de Paula Martins Trad. de J. Philipson


Em nossas igrejas ?
bles nos instruiram , aprendendo
ensinando o Deus verdadeiro , a crer em Deus,
destruindo os velhos h & bitos . destruimos os velhos hábitos.

Paula Martins leu ogueta, quando tanto o original como a


cópia que serviu a Batista Caetano dizem claramente oqueta . E
traduz o 1.º verso, Ore tupã ogueta , por “ Em nossas igrejas ”.
Philipson cautelosamente esquiva -se a tocar no verso . Passa por
éle várias vezes em silêncio . Traduz os três versos restantes da
quadra, como se não houvesse o 1.º. Alguma dificuldade insu
perável ? Dir-se-ia que sim . Ora, tôda a estrofe é tão meridia
namente fácil :

Nós temos (muitas ) igrejas,


nelas instruindo -nos,
acreditando de verdade em Deus
( e) rejeitando todos os antigos costumes .

Sôbre a tradução do verbo " ter ", v . Anchieta 47v , Figueira


66-67 ; Restivo 42, etc. Batista Caetano lembrou essa possibi
lidade, mas enredou -se na tradução, tais as falhas da cópia que
estudou .
Seguem -se três frases, todas no gerúndio. Esse modo, em
Tupi, entre outras funções , tinha a de indicar a coordenação de
ações do mesmo sujeito. Em muitos casos , pode-se traduzir sim
32 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

plesmente pelo indicativo precedido ou não da conjunção " e " :


a -i-pysyk i gû-abo : “ tomei-o e ( o ) comi " . Cfr. Restivo 89, etc.
Nossa tradução ficaria, pois, mais espontânea :
Nos temos (muitas ) igrejas,
nelas nos instruimos,
acreditamos de verdade em Deus,
( e) abandonamos todos os antigos costumes

A palavra etá, de mero indefinido que foi primitivamente,


passou no Tupi colonial a ser também morfema de plural. A
tradução " muitas ” corresponde à função mais antiga .“
Mõbopa ( leia - se mombó - pá ) é o ger. de mombor, seguido de
pá ( b ) " tudo " , " todos " , etc.
Concordo com a correção de Philipson rerobiaretebo, não po
rém com a tradução " aprendendo a crer em Deus " . Para isso ,
seria preciso que no original estivesse : oronhemboebo Tupã rero
biareté resé. A coisa que se ensina ( mboé ) ou aprende ( nhe
mboé) leva sempre a preposição ( r ) esé . Cfr . Montoya, Tesoro
122, etc.
3
Ms. , p. 31v. Trad. de Paula Martins
Paranagoaçu raçapa Atravessando o grande rio
aju derepiapota eu vim ; queria ver-te.
ejori orerauçubâ Vem, nossa protetora !
Tej catu de cu ( a ) pa Oxalá possa conhecer-te
xeraba Tupināba , meu pai tupinamba .
Reconstituição de Philipson Eu traduziria :
Paraná guasú rasápa Atravessando o oceano ,
ájú ; de repiapotá vim desejando ( =no intuito de ) te
Elorí oré rausúba ! [ ver.
Teikatu de kuápa Vem compadecer-te de nos,
che rúba Tupinambá . para que te possa conhecer
meu pai tupinambá .

Philipson prefere ler oré rausúba, alegando a métrica ( p . 11 )


e deixando assim o verso sem rima . Ora, a palavra está oxi
tona no manuscrito ( 1 ) e, como tal , rima com o 29 e o 5º
(1) Para o incômodo acento , Philipson ( pg. 12 ) aventa uma ex
plicação : “ O acento escrito na última sílaba do original pro
vavelmente devido à distração do copista , que talvez o qui
zesso pôr no último i de eiori” isto é , 10 letras antes ... E
um circumflexo em vez de agudo ! “ Podemos porém aproveitar
uma outra distração em favor do nosso argumento : a última
palavra do verso seguinte está escrita cupa com um a sobrepos
to . E qual poderia ter sido o motivo, se não a assonância que
esta forma errada apresenta com rausúba ? " A nova divagação
teria quicá algum valor, se o copista não houvesse escrito em
cima orerauçubâ. Ou se, debaixo disso , ele escrevesse cu ( a ) pâ ...
TRADUÇÕES DE POESIAS TUPIS 33

versos e tem sentido perfeito em tupi . Com uma dúbia métrica,


argumentar contra tudo o demais, é um contrasenso . Tanto mais
que a redação do primitivo autor poderia ter sido jorí ou mesmo
ejor, variantes igualmente usadas de ejorí. Cfr. Anchieta 57v.;
Figueira 56 .
Acreditaria que Philipson só levantou a insustentável hipó
tese rausúba, por esquecer as acepções de ausubar, tão ade
quadas ao contexto : " compadecer -se ", etc. É o que dá a enten
der , pois só se refere à interpretação de Batista Caetano ( " prezar,
tratar bem , agasalhar " ) , " que pode ser aceita ” ( p. 11) . Entre
tanto, mais para o fim do volume (p . 28, nota 20 ), traduzindo
embora o mesmo verbo por “ agasalhar ”, lembra que o Dicionário
Brasiliano dá os seguintes significados para acauçubar : " ter dó
de alguem , usar de misericórdia, ter piedade ” . É uma observa
ção a título de erudição, e que, pelo demais, não influi nas ' tra
duções de Philipson . O que mais surpreende é que não cite os
testemunhos do Vocabulário na Lingua Brasilica, muito mais an
tigo, e, em dados casos, fonte do Brasiliano. Cfr . VLB 159 :
" Compadecer -se de alguem - Açauçubar ... ” ; 193 : “ Dô ter ou
“ auer de alguem Açauçubar ... " ; 297 : " Misericordia fazer ou
" uzar della pa. com alguem -- Açauçubar ... " ; 342 : " Piedade
" auer dalguem - Aimomboreauçub . Açauçubar . (act. Diferem
“ nisto q . o 1.º he auer piedade, ou compadecer -se de alguem como
“ quer, e o 2.º alem disso fazendo-lhe algum bem , ou ainda na
“ mesma pena fazer -lhe algum modo de fauor. ] ” ( 2 ) . A pa
lavra figura em inúmeras passagens do Catecismo de Araújo : pp.
8 , 9 bis, passim , e nos Poemas Brasílicos de Cristóvão Valente :
p . * ij v . Com o prefixo de classe humana ou pessoal , por ( 0 ) ,
e sob forma nominal, ocorre no sentido de “ misericordioso " :
Araújo 2 , passim ; Valente * iij v, * iiij v ; “ misericórdia ” : Araújo
2, etc. Cfr . ainda Poesias Tupis 22, v . 25 ; 25 , v . 24 ; 30 , v .
13 ; 40 , v . 1 ; etc.
Acresce , além de tudo, que a forma predileta de Philipson ,
rausúba, como infinitiva que é, entraria em grave conflito com a
sintaxe tupi . O verbo precedente, ejori, imperativo de ur " vir ” ,
pede o complemento de causa final não no infinito mas no cha
mado gerúndio, ou mesmo no futuro do participio ( s ) aba : ( s )
aguama regido em geral , nem sempre, de resé . Cfr . Figueira
158, 159, 162; Montoya, Arte 25 ; Restivo 87 , 88, 89, 102. -
Não se encontra uma só abonação de infinito como complemento
de causa final , a não ser talvez regido de preposição.
Em que modo está , pois , o rauçuba do original ?

(2) As palavras entre colchêtes não constam do codice da Biblioteca


Nacional do Rio de Janeiro.
34 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Está no gerúndio . Os verbos terminados em r formam o


gerúndio pela apócope daquela consoante, sem acrescentar nenhu
ma outra coisa : " Os de R. perdéno, vt Aipotâr, potâ ” ( An
chieta 28v ). “ Todos os verbos acabados na letra R , no gerún
dio o perdem . ut Akér . Guiké. Açacäár, cacäá. Aimopór, Mopo .”
( Figueira 113 ) ( 3 ) . É esse um nítido traço distintivo do Tupi,
com relação ao Guarani , que a maioria dos autores recentes es
quece ( 4 ) .

(8) Podem também formar o “ gerúndio ” com o sufixo -bo. Cfr .


Poemas Brasílicos III , 25. Mas não é essa a forma normal.
nem comum,
(4) a ) Paula Martins, Poesias Tupís I, 8 pota , 10 çançabuca ; V,
21 pota (nhe ), 24 oyemomota ; VI , 33 pobu , 36 reru , 37 reropo ;
VII, 43 reca , 45 pota , 48 rauçuba ; IX , 51 , pota . Todos ger , de
v. terminados em r, que passaram despercebidos à tradutora .
b ) Batista Caetano , Cantos ... 51 ( pg. 599 ) cerobiá ; 17 ( pg. 587 )
pota ; 18 ( ib . ) rauçuba , mostra ignorar a regra de Anchieta e
de Figueira . Diz mesmo : " aqui, para ficar regular, devia este
“ verbo estar no gerúndio -supino potabo , para dizer a - iúr nde
répiá - potabo , “ venho te ver querendo ” ou “ por te ver
querer " ; como al se acha, a tradução deve ser “ venho , te
ver quero " , e ainda assim não fica bom , pois que falta ' o
“ sujeito de quero expresso ; parece que está este verso deste
feitio só por amor do metro e do consoante ” ( pg. 587 ) .
c)
66 Philipson, pg. 12 , nota ( 6 ) repisa : “ Como Baptista Caetano
observa , de qualquer forma este verso gramaticalmente está
" defeituoso . Para ler a segunda versão seria necessário admitir
que repiapotá está por repiapotábo ". Sempre a falsa idéia
“ de que potá não seja gerúndio .
d ) Plínio Ayrosa, Poemas Brasílicos ... I , 30 ransubá ; II , 24
soroieupí; III, 19 reiá . Em seus comentários, nem de longe sus
peita Ayrosa que se trate de gerúndios de ausubar, rojeupir,
ejar. Para ele Ieupí é apenas uma variante de jeupír : “ Ieupí ou
jeupír " ( pg. 26 ) . E “ em seroieupí está evidente a forma relativa
he " em face da preposição ( sic ) ro = no " . Dêsses e outros “ equi
vocos " ( habituais ) surgem coisas incríveis. No Poema III ,
pede -se ao Anjo da Guarda ( Valente, p. * iiiij) :
Tupã robaké eicôbo Estando [ tu que estás ] diante de Deus,
Xe quí derecyTyki, não te afastes de mim ;
Naxemopyá tytyki ( para que ) não me cause sobressaltos
Anhânga xerapecóbo . o demônio, quando ele me visitar ( pro
Deiteé moxy oçôbo ( curar ) .
Oat6e xe heiá E assim ( maldito ! ) vá
Nde po guyrpe xe moingobo para o seu fogo ( inferno ) , deixando -me,
[ e ] pondo - me ( largando - me ) sob tua
( proteção.

Plínio Ayrosa apresenta esta tradução , que se desmente pela sua


propria incompreensibilidade ( pg. 37-38 ) :
Estando tu diante de Deus,
Não me deixes em abandono ,
Não tornes meu coração precipite
Ao encontrar o Diabo em meu caminho !
E indo assim o perverso ,
Ao avançar possas acolher-me,
Retendo - me sob tuas mãos.
TRADUÇÕES DE POESIAS TUPIS 35

Concordo com a nota ( 7 ) , em que Philipson corrige kucapa,


de Paula Martins, para kuapa . Que não haja ditongo e sim hiato
em kua- é indubitável diante não só da afirmação de Anchieta
mas também da cuidadosa anotação da diérese em Araújo , p . ex .
p. 11 , 281 , passim .
Uma observação sôbre a primeira palavra da estrofe, parana
goaçu .
Em Guarani, pará era " mar " , paranã ou ygủasu o " rio cau
daloso " , y o “ rio " . Em Tupi, " mar" dizia - se paranã, " rio cau
daloso " ygủasu, “ rio " y . Os dicionários acrescentam um porme
nor : " alto mar” paranã gầasu ( ou var. usu, etc. ) . A crer nos
vocabulários e gramáticas , não existiria pará em Tupi . Mas
outros documentos suprem esse silêncio ( 5 ) . Também pela an
tiga toponímia vemos que paranã e pará eram empregados como
denominações tanto do mar como de rios . Em conclusão , a dis
tinção lexeológica entre " rio " e " mar " não parece fosse clara
nem primitiva .
No caso , creio que se deva traduzir paranagoaçu por " alto
mar " ou 'oceano ", consoante a documentação e o uso autorizado
da época . O indio tupinambá, que ia recitar a poesia , teria vindo
de longe , por mar, como companheiro habitual que era da auto
ridade eclesiástica ( paigoaçu yrūndiba ). Isso explica também
por que o título da 3.a poesia não é o nome da uma aldeia, como
o são os das duas primeiras ( Paratii e Reritiba ) . O forasteiro
representava uma tribo distante : o nome de sua aldeia , talvez
desconhecida ali, não interessava . No título , Tupitába, houve
evidente equívoco ( o 2.° i ein vez de n : Tupināba ), que não pode
prevalecer diante da forma Tupināba, que volta duas vezes na
mesma poesia . Philipson prefere ler Tupitaba " a aldeia dos
tupis” . Mas isso só “ tirando aquele til ” ( como diz o mesmo
Philipson , p. 13 ) ( 6 ) . E resultaria um nome de aldeia , até hoje
ignoto : Tupitaba. Acresce que Tupitaba " aldeia dos tupis ” seria
exatamente a negação do que afirma o indio : " eu sou tupinam

E à pg . 36, faz este comentário, à altura da tradução : “ A


expressão oatápe, conquanto possa prestar - se a confusões
neste passo , deve ser considerada como decorrente do verbo
“ atá , guatá , andar, vagar, passeiar , etc.. Reiá , de ar , ou sim
“ plesmente de á com intercalação de i entre o radical e os
“ índices pessoais, significa : colher, apanhar, agarrar, pren
6 der " . Como se vê , confunde tudo: “ fogo ” com “ andar " .
ejar “ deixar " com ar “ colher ", o demônio com o anjo ... Não
vem a pêlo apontar as tantas outras cousas assombrosas, que
( custa crer ) couberam em tão minguado opúsculo de 50 pgs.
(5) “ Pará significa mar " . P. Antônio Vieira, História do Futuro ,
Bibl. de Autores Célebres, N.° 8. São Paulo. ( 1937 ? ) ; pg. 252 .
(6) Em nota ( 8 ) aventa ainda Philipson : “ Talvez nem seja til,
pois 0 acento em aluri ( verso 13 ; este acento não ocorre
36 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

bá”, " meu pai tupinamba” . Em todos os antigos documentos,


p. ex . no " Auto de São Lourenço ", distingue -se claramente entre
tribo tupi e tribo tupinambá. Só mais tarde é que se veio a
estender essas denominações a outras tribos . Além disso, na 3.2
estrofe da poesia, o indio dissera : Ore tupã oqueta " nós temos
igrejas ou muitas igrejas " . Em toda a tribo dos tupinambás,
compreende- se que houvesse, e havia de fato, várias igrejas ou
capelas. Numa insignificante e desconhecida aldeia, mais de uma
capela é demais .
Por tudo isso, fico com Tupinãba [ Tupinambá ] ( 7 ) .

Na 2.a poesia, estou inteiramente com o sr. Philipson quanto


às correções inõgatuabo ( em vez de imõgatuabo, que leu Paula

Martins) e ybyjme ( ybyime] ( em vez de ybyme), e quanto a


tudo o que diz à p. 17. Só me admira que não tenha anotado o
que reza o Vocabulário na Língua Brasílica, p. 211 : " Entranhas. –

“Ybigya, 1 , Ybignha.” ; “ Entranhavelmente. Ygbiyme ... ” ( 8 ) .

5
Na 3.a poesia, procede tanibem a correção a respeito de coi
[ koy' ) .
Lamento, isso sim , tanto esforço de Philipson ( p. 22 ) para
compreender acoeime. Lá está no tão pouco estudado Voca

na cópia da dra . Paula Martins ) é muito semelhante " . No


ms. o 1 de aluri leva inegávelmente til, em nada diferente do
que vem duas linhas abaixo sobre omebi, e duas linhas acima
sôbre Tupã . Nem vejo por que pôr em dúvida, se Anchieta 54
s6 fala em ī, e se Figueira 140-141 admite as duas formas í e i.
(7) Entre colchêtes, quando necessário , transcrevo as palavras dos
antigos documentos, em ortografia e acentuação atualizadas.
Nosso sistema gráfico substancialmente coincide com o de Fre
derico G. Edelweiss em sua obra Tupis e Guaranis ( Bahia ,
1947 ) .
(8) Gritamos sempre as palavras tupis, ainda que os atuores cita
dos não o tenham feito .
TRADUÇOES DE POESIAS TUPIS 37

bulário na Língua Brasilica, p . 210 : "Então, nesse tempo .


Aqueime. ”. Como há várias formas demonstrativas : akúéa
VLB 109, 361 ; akúéia VLB 174, 108 , 109, 394 ; akúéî VLB 108,
109 ( cfr. Araújo 152, 221, 231 , 241 ... ) , não são de admirar as
variantes akūé- me Araújo 140 e akúéi- pe VLB 92 , 98, Figueira
129. As oscilações entre o e u não causam espécie na ortografia
portuguesa, principalmente antiga; cfr. agoa, magoa, taboa .
Também o sentido de akúéime é mais amplo do que o regis

trado pelo fraco Dicionário Basiliano. Não se refere só ao pas


sado (“ antigamente ” ) mas em geral a qualquer tempo distante,
passado ou futuro : “ Então, nesse tempo ” ( VLB 210 ) . Em
nosso caso , só pode ter o sentido de futuro . O autor, em mau
Tupi , parece ter querido dizer : " Na ( quela ) hora em que eu
morrer, o demônio imediatamente ... " . Em tal hipótese, o ge
rúndio guimanomo peca mortalmente contra Anchieta, Figueira,
etc .; mas encontram - se exemplos semelhantes .
Os versos que se seguem constituem duro quebra-cabeças.
Batista Caetano, Paula Martins e J. Philipson competem na sua
decifração . O último, depois de tudo, acaba conformando - se com
Batista Caetano, ressalva feita do 1.º verso , acoeime guimanomo,
que ele preferiria traduzir : " sem ele morrendo ” ou talvez “ anti
gamente morrendo ” ( p . 24 ). Ambos alvitres insustentáveis . Tra
ta- se da 1 ° . , na qual ninguem pode dizer " antigamente ( eu )
morrendo " . Tambem a 19 versão falha por dois capítulos. Pre
cisaria estar no original acoeima e não acoeime . E ainda assim ,
não encontro um só exemplo que autorize o uso de eyma como
sentido de " sem ", junto a pronome ou demonstrativo . Nesse
caso, o que se usa é a preposição suí. Cfr. Anchieta 43, Restivo
220 ; etc.
Discordo da tradução de ajuça “ laço " . Para “ laço ” os di
cionários têm juçana ou nhuçana [ îusana, nhusana ). Admitindo
se embora uma apócope insólita no dialeto tupi , neste caso

teríamos juçã [ iusã ], sempre nasal . Ora o til não vem no ma


nuscrito . Nem poderia vir, pois a rima com açapiga [ asapyá ]
supõe a terminação é, não ã. Também a cedilha não me parece
muito clara : o traço debaixo do c mais se me afigura ser o til
do u da palavra inferior, irūmomo.
38 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Quem empreender uma nova interpretação desses obscuros


versos, deve partir do princípio que nesta poesia há vários erros
de transcrição ( se não de sintaxe também ), p. ex ., acauçu e acaucu ,
em vez de açauçu (asausu ') ; açapiga, em vez de eçapiga ou çapigo
[ esapyá, sapyá ). Sinal que o copista era bisonho na língua.
Brecha aberta para fundadas suspeitas de que haja outros erros.
Imaginando -se, p. ex ., um lapso comum ( c por r ) , teríamos, em
lugar de ajuca, ajura ( aîurá') gerúndio de ajurar “ laçar ” ( VLB
408 ), com margem para nova compreensão de toda a estrofe.
Escuso -me de analisar, no momento , essa e outras possibilidades .
Não cabe, numa crítica, perder-me pelo campo inseguro das hi
póteses.
6
Ms. , p. 31 Transcr . de Paula Martins
Con cau xe bia Sorykatá che mbyá
Iporangatu rece Iporangatu rese,
goribe ve yabe sorybá che labé
xeraba tupuna quija . che rúba tupána kyk .

Trad . de Paula Martins Trad. de J. Philipson


Exulta o meu povo Ela se alegra muito de meu povo
por sua virtude. que é virtuoso ;
Alegre, como eu, sua alegria sou eu também ,
meu pai se enfeitou . ( pois ) meu pai é Deus certamente.
( meu pai ( porém ) era indio im
puro. )

É a 2.a estrofe de Paratii, poesia que Batista Caetano não


estudou .
Não concordo, desde logo, com a interpretação " meu povo " ,
de Paula Martins e J. Philipson . O que leio no original é ibija
[ ibyia ] " íntimo, entranhas ” . Cfr. VLB 211 . No manuscrito
não vem sinal de nasal . À leitura ibija não obsta a falta do
pingo no primeiro i, pois não é este o único caso em que falta .
Cfr . , p. ex . , na estrofe seguinte, iporang .
Paula Martins, no 3.º verso, leu çoriba e transcreveu sorybá .
Philipson corrige para sory'ba. Na verdade, o ms . e o sentido
pedem é çoribe ( s -ory '-bé] " alegra - se também ” . Raramente o
ms . indica o acento tônico .
Philipson traduz yabe ( îabé ] por “ também ” , confundindo-o
com abé . Yabé ( iabé] significa " como" . Cfr., p. ex ., Restivo
217 , 265. Mas será necessário provar ?!
TRADUÇÕES DE POESIAS TUPIS 39

Tupuna é evidente equivoco por tupana “Deus” ( tupi colo


nial ) . A principio era essa a forma usada. A catequese mais
tarde unificou tão importante palavra, nivelando a forma tupi à
guarani. Manuel da Nóbrega ainda escreveu Tupane.
Para explicar quija transcrito como kya por Paula Martins
Philipson lembra um tal quiã de Restivo “ certamente ” . Mas

quija é o verbo ekvi, no gerúndio . Regularmente deveria levar

um e : Tupana ekvía ou melhor Tupan ekyła " invocando a Deus” .


A aférese do e não causa admiração, tanto mais dada a perma
nência do a final de Tupana .
A acepção de " invocar, chamar, implorar, pedir" não é re
gistrada pelos dicionaristas, que só arrolam os sentidos de " puxar,
arrastar , arrancar, tirar, pescar ( com anzol) ", etc. Mas os dois
exemplos seguintes de Antonio de Araújo tiram todas as dúvi
das : Oiaby bépe abá aipó Tupã nhëênga, opyápe catú oapixâra
çupé anhânga, coipó tëő, coipó iurûpari rekyła ? ( p. 104 ) : " Trans
gride também o homem aquele mandamento de Deus, chamando
( invocando, pedindo ), de coração, anhanga, a morte ou jurupari
para o seu próximo ? " ; Erecekyipe anhânga, tagoäiba, curupira ,
iurupari, coipó teõ abá çupé ? ( p. 229 ) : " Chamaste anhanga,
taguaíba, curupira, jurupari ou a morte para alguém ? " .

É a seguinte a minha tradução de toda a quadra :


Exulta o meu Intimo
com a ( pela ] beleza dela.
Exulta também , como eu,
meu pai, invocando a Deus.

Paula Martins leu em 1945, e traduzira já em 1941 :


jaço cori ymõbegoabo Vamos todos hoje, louvando - a ,
gnaibi moecay ãba. acabar a antiga cegueira.

J. Philipson corrigiu para :


jago cori ymõbegoabo Vamos hoje explicar ( apresentar )
a ela o lugar onde as mulheres
goaibi moevay ãba . velhas ( as mulheres ) estão cho
rando em pé .
40 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

De inicio , retifico a leitura da 1.a palavra . No ms . não

está jaço mas taco . É o chamado permissivo, que às vezes cor


responde ao nosso futuro . Cfr. Anchieta 22v.

Mombeú ( no ger . mombeguabo ) tem , entre outros, o sentido


de " contar, relatar, proclamar, referir ” : VLB 162, 370 .
Nada encontro no texto que dê margem à tradução de Paula
Martins " antiga cegueira " . Philipson, que já repudiara aquela
versão, traduz moesay por " chorar " . Ele bem sabe que os do
cumentos não dizem isso ; assim , em vez de alegá - los, prefere fa
zer deduções: “ O fato é que ( t ) esay' significa “ lágrimas " e
moesay' “ fazer lágrimas”, “ fazer chorar ”, “ chorar ” ( p. 32 ) .
Salta assim , corajosamente , de um verbo transitivo " fazer chorar "
para outro intransitivo “ chorar ” . Passa de um sentido abstrata
mente possível, de “ fazer ou tornar ( em ) lágrimas” para o de
" fazer ou produzir lágrimas " . Não seria impossível a sua tradu
ção, mas em frase de todo diferente , p. ex . : nde roryba aimoesay
“ ( d ) a tua alegria fiz lágrimas ”.
Mas há mais obstáculos . No 111s . Ven é inoe çay , e não
moecay,
moeçay [moeçay' de Philipson ]. Para Philipson, isso não é nada :
“ No texto está moecay ( transcr . moesay ), correspondendo assim

à pronúncia exata , que é nasal, por influência da palavra seguinte "


( p. 32 ) . -- De minha parte, só tenho visto exemplos do contrá
rio : quando em composição , o primeiro elemento , sendo nasal,
nasaliza o seguinte , e não vice - versa . Aliás , se fosse certa a

regra formulada por Philipson , devia -se dizer, p . ex . , aîukā áng - bae
mboîa " matei esta cobra " , e não aîuká áng - bae mboia ...
Em nota ( 25 ) , Philipson lembra distraídamente : “ Existe

também um verbo moesay " recrear ", etc. " . Mas passa adian

te, sem perceber que ali é que estava a solução . Existe realmente
o verbo, mas um tanto diferente : inoesãi. No VLB 86 , vem
mocsái “ alegrar o triste ” . O acento agudo, em vez do til , é equi

voco , talvez de transcrição. À p . 369, vem moesay " recrear ” .


O til na última vogal não tinha o valor corrente hoje. Nos velhos
TRADUÇOES DE POESIAS TUPIS 41

documentos, os ditongos nasais aparecem com o til ora na 1.a ora


na 2.a vogal, quando não por sõbre as duas. Cfr. também

Montoya, Tesoro 371/365 .


E āba ? Responde Philipson : " Ambá.b.a indica o lugar
“ onde se está em pé ”. Os dois têrmos reunidos significam pois
“ “lugar de chorar em pé ", e a tradução dos versos será : “ Vamos
40
hoje explicar ( apresentar ) a ela o lugar onde as mulheres ve
“ lhas ( as mulheres ) estão chorando em pé " ( 9) .
Mas que vêm a ser essas mulheres a chorarem em pé ?
Não sou eu quem pergunta . É o mesmo Philipson : " E o
significado disso ? Os etnólogos o sabem , e os “ só ” linguistas
podem aproveitar a seguinte passagem de Jean de Léry : ”
Não é pelo fato de arranhar um pouco de Tupi que me posso
considerar do número dos lingüistas. Mas uno -me a estes no desejo
de aprender em Jean de Léry aquilo que os etnólogos já sabem de
ciência própria, isto é, o que venham a ser aquelas " mulheres a
chorarem em pé ”, às quais — diz Philipson alude o poeta tupi .
Ouçamos , pois, atentamente, o viajante francês , e na mesma tra
dução que serviu a Philipson ( p. 33 ) :

“ São as seguintes as ceremonias que os tupinambás ob


servam ao receber seus amigos. Apenas chega o viajante
“ à casa do mussacá, a quem escolheu para hospedeiro, sen
ta-se numa rede e permanece algum tempo sem dizer pala
vra . É costume escolher o visitante um amigo em cada
" aldeia e para a sua casa deve dirigir - se sob pena de descon
“ tentá -lo .
Em seguida reunem-se as mulheres em torno da rede e
acocoradas no chão ( 10 ) põem as mãos nos olhos e pran
teiam as boas vindas ao hóspede dizendo mil coisas em
seu louvor ” .

(9 ) Em
66 nota ( 26 ) observa Philipson : “ Admitindo-se uma liberdade
poética poder-se -ia traduzir : “ Vamos hoje falar a ela no
lugar onde ... " . Neste caso a forma correta da última palavra
“ do texto deveria ter sido ambápe , reduzida a ambá , por causa
" da rima. Tanto as altimas palavras da citação de Léry , com
a qual termina êste Apêndice, como o uso da forma abreviada
" de ambába poderiam talvez apoiar esta hipótese." Mas, em
Tupi, a tal forma “ abreviada ” (ambá , kuapá , soroká ) so pode
ocorrer : 1 ) quando regida de preposição como -pe ; 2 ) quando
em função de genitivo ; 3 ) ou quando 1.º elemento de um voca -
bulo composto ou derivado. Philipson recorre à preposição
-pe para explicar por que vem ambá e não ambaba . E recorre
à rima para explicar a falta de preposição.
42 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Agora pergunto eu : que é o que diz Léry sobre o “lugar em


que as mulheres choram em pé ” ? Só vejo referência à saudação
lacrimosa, em que as mulheres choravam de cócoras !
Mas afinal de contas, que é aquele āba?
Não é preciso ser linguista nem etnólogo, para enxergar a
resposta no manuscrito . Se é que o escriba grafou primeiro āba
( com b ) , certo é também que logo corrigiu o b para g . A palavra
tupi é ãga ( angá ], não āba ( ambá ]. Lá está no original uma
inegável perna de g por baixo do b ...
E que é angá ? Uma partícula de carinho ou afeto . Dessas
que melhor é não traduzir, pois que as nossas linguas exprimem
os sentimentos menos por partículas do que pela entoação da voz .
Em outras palavras : o nosso vocabulário serve à linguagem lógica
e à linguagem ativa, não tanto à linguagem afetiva que se mani
festa mais " pela entoação, pela inflexão da voz, pela rapidez da
elocução, pela intensidade com que se carrega esta ou aquela pa
lavra, ou ainda pelo gesto que se junta à palavra " ( 11 ) . Em
Tupi, há partículas próprias para exprimir os sentimentos e es
tados dalma com que a pessoa que fala acompanha as suas des
crições : enfado, desgôsto, raiva, desprezo, carinho, louvor, sauda
de , dúvida , interrogação, certeza, ineia certeza, opinião baseada
em dito alheio , etc.
Sôbre angá, escreve Montoya, Tesoro 39 : “ Denota afecto de
amor, ruego, ternura ... " Erehóangape raé ! vaste ya ? Ahá angá
ycó, I. Cheangá ycó ahá, ya me voy con aquella propensión
de amor . " . Neste exemplo do Auto de São Lourenço ( ms .
português -tupi-espanhol, da Cúria Generalícia da Companhia de
Jesus , de Roma ) , vê - se como qualquer tradução é ao mesmo tempo
insuficiente e sobêja :

Um menino dirige- se a São Lourenço, e diz - lhe :

Yande iara mõbeguabo Confessando a Nosso Senhor,


teõ erei porara tu sofreste a morte ,
torepjatã anga ( para que ) sejamos fortes (angá !)
bae açi porarabo suportando as doenças
Tupana reçe nde la ( p. 92v. ) por ( amor de ) Deus, como tu .

( 10 ) O grifo aqui é meu .


( 11 ) J. Vendryes, Le Langage , Paris, 1989 , p. 165 .
TRADUÇÕES DE POESIAS TUPIS 43

Sobre a mesma partícula, em várias funções, cfr. VLB 85,


93, 130, 171 , 247 , 262, 268, 280 , 313, 360, 390. Etc. ! Observo
apenas que, em função nominal, a forma é angaba, equivalendo
mais ou menos a " o bom do ” .

Qual é , enfim , a minha tradução ? Vejamos as três estrofes :

Xeparatij çoj Eu , de Paratii


aiu tapad repiaca vim ( para ) ver a mãe de Deus,
gainhemoyegoayegoaca enfeitando -me todo ( freq .)
xeroribaðama ri. para festar,

Exulta o meu Intimo


Con cau xe tbla
Iporangata rece com a ( pela ] beleza dela .
Exulta também , como eu ,
Qoribe ve yabe
meu pai , invocando a Deus.
xeraba tupuna quija .
Vou me aproximar bastante dela
Arobicatapeca
para contemplar bem a sua beleza ,
iporang epia catuabo
para ir relatá - lo hoje,
taço cori ymõbegoabo
alegrando (angá !: que bom ! ) as
gooali moecay ãga ( 12 ) ( velhas.

Nada de admirar que o índio pense na alegria que vai causar


às velhas da sua aldeia com a notícia da chegada da imagem de
N. Sa. Mesmo nas poesias compostas pelos missionários, refle
te- se a cada passo a afeição dos índios para com os seus . A
descrição de uma imagem seria matéria bastante para deslumbrar
a imaginação das velhinhas da taba . Não é isto muito mais com
preensível do que a abstrusa lembrança de querer mostrar ( ou
explicar ! ) a N. Sa. , ou à sua imagem , o lugar onde as mulheres
estão chorando de pé ?

( 12 ) No gerúndio o verbo moesãi assume a forma moesãia , de


acordo com regra conhecida. Cfr. Anchieta 28 v.; Figueira
112. Aquí, entretanto, houve apócope do a, diante da seguinte
palavra angá. Cfr . VLB 171 guijabanga < guijabo + angá .
44 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

EDIÇÕES CITADAS

ALMEIDA NOGUEIRA ( Baptista Caetano de ) Cantos do Pro


dre Anchieta . Reprodução acompanhada de um prefácio de Basilio
de Magalhães. In Revista do Instituto Histórico e Geográfico Bra
sileiro. T. 84 ( 1918 ) . Rio . 1920 ; pp. 561-608 .
ANCHIETA ( P. Joseph de ) Arte de Gramática da Lingaa mais
umda na costa do Brasil. Ed . da Biblioteca Nacional ( fac - sim . ) . Rio.
1933 .

ARAUJO ( P. Antonio de ) Cathecismo Brasilico da Doutrina


('hristā . Ed . de Júlio Platzmann . Leipzig. 1898 ' .
AYROSA ( Plinio ) Poemas brasilicos do Po. Cristovão V'a
lente , S. J. ( Notas e tradução) . S. Paulo . 1941 .
DRUMOND ( Carlos ) Notas gerais sobre a ocorrência da par .
tícula tyb. do tupi-guarani, na toponímia brasileira. In Bol. XLVI da
Fac . de Filos ., Ciências e Letras da Univ. de S. Paulo . Etnografia e
Língua Tupi - Guarani . N.• 5. S. Paulo. 1944 .
EDELWEISS ( Frederico G. ) Tupis e Guaranis . Bahia . 1947 .
FIGUEIRA ( P. Luiz ) Grammatica da lingua do Brasil. Ed . de
Júlio Platzmann ( Fac - sim . ) . Leipzig. 1878 .
MONTOYA ( P. Antonio Ruiz de ) Arte de la lengua gua
rani, ó mas bien tnpi. Ed . do Visc . de Porto -Seguro . Viena, 1876 .
Vocabulario y Tesoro de la lengua guarani, ó mas bien tupi.
Ed . do Visc . de Porto -Seguro. Viena . 1876 .
PAULA MARTINS ( M. de L.) Contribuição para o estudo do
teatro tupí de Anchieta . Diálogo e Trilogia . Bol . XXIV da Fac . de
Filos., Ciências e Letras da Univ . de S. Paulo . Etnografia e Lingua
Tupí-Guarani. N ° 3. S. Paulo . 1941 .
Poesias Tupis ( Século XVI ). Bol. LI da Fac. de Filos. , Ciências
Letras da Univ . de S. Paulo. Etnografia e Lingua Tupi-Guaraní. N.° 6 .
S. Paulo . 1945 .
PEIXOTO ( Afrânio ) Primeiras Letras . Cantos de Anchieta ...
Rio . 1923 .
PHILIPSON ( J. ) Em abono de Baptista Caetano . São Paulo .
1947 .
RESTIVO ( P. Paulo ) Linguae Guaraní Grammatica ... adjecto
Particularum lexico ... “ Arte de la lengua Guaraní " inscripta ... Ed .
de C. Fred . Seybold . Stuttgardiae. 1892 .
VALENTE ( P. Christovão ) Poemas Brasilicos. In Catecismo
Brasilico ... de Antonio de Araujo ( q. v. )

VLB Vocabulario na Lingua Brasilica . Manuscrito português


tupí do século XVII, coordenado e prefaciado por Plínio Ayrosa . São
Paulo . 1938 .
* Outras obras : nas edições citadas por J. PHILIPSON, q.v.
JON GO

ALCEU MAYNARD ARAUJO


( Técnico de Administração Chefe
do Setor de Pesquisas Sociais do
Instituto de Administração da
Universidade de São Paulo )

O Jongo é uma dança de origem africana . Um dos mais


velhos jongueiros de Cunha , narrou - nos que seu pai era africano,
sabia o Jongo e que o dançava em Angola . Afirmou também que,
primeiramente, só os negros é que dançavam , porém hoje alguns
brancos aprenderam e dançam .
No dia 20 de janeiro de 1945, na cidade de Cunha, Estado
de São Paulo, quando o assistente de pesquisas sociais do Prof.
Emílio Willems , tomei parte em um Jongo que se realizava na
praça fronteiriça ao Clube Cunhense . É um local tradicional para
a dança do Jongo, desde os tempos da Escravatura, e é popular
mente chamado por “ Largo de Dona Vavá ” . Esta senhora é de
família tradicional, cujos antepassados fundaram Cunha, e arma
todos os anos o presépio em sua casa , tradição essa que vai de
saparecendo da cidade de Cunha , recebe a visita dos Foliões de
Reis de Caixa ( 1 ) , o que é uma deferência especial , também
auxilia aos jongueiros .
(1 ) FOLIA DE REIS Em Cunha por ocasião das Festas de
Natividade e Reis, que vão de 23 de dezembro a 6 de janeiro,
saem bandos alegres tocando e cantando, pedindo óbulos. São
os Foliões de Reis . Os que percorrem os sítios são chamados
" REIS DE CAIXA ", e seus instrumentos são : duas violas,
uma caixa ( tambor ) e um triângulo . Aquêles foliões que per
correm somente a cidade, sem sair além do perímetro rocio ,
são chamados “ REIS DE MÚSICA ", e seus instrumentos são :
violões, cavaquinhos, clarinete, pistão e pandeiro . " O pistão
é indispensável" , assim afirmam .
46 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Fizeram uma fogueira, e nas cinzas assavam algumas batatas


doces. Uma velha sobre u'a mesa improvisada, tinha uma cha
leira de " quentão" ( 2 ) , e vendia-o à razão de Cr$ 0,50 a chicara
média . Sobre um fogão improvisado com pedras toscas, numa
lata de querosene cheia d'água ferviam umas raízes de gengibre,
preparo para o “ quentão ” . Ao redor alguns negros e caboclos
comiam batata doce assada , mandioca cozida , e bebericavamo
" quentão ", dando estalidos com os lábios grossos, revelando imenso
prazer . Prazenteiramente ofereciam , aos que se aproximavam ,
aquela bebida . Ali estavam mais ou menos umas 30 ou 40 pes
soas . Eram pretos, brancos moradores da roça e da cidade, al
guns já de idade, outros moços, algumas mulheres e alguns “ zi
nhos " ( 3 ) .
Às 21,30 horas , chega o responsável pela dança , que é o
Sr. Augusto Rita ( 4 ) . Esta é a alcunha de Justino José dos
Santos , negro de 67 anos de idade, valeiro de profissão, e que
se diz filho de pai africano . Vem com mais alguns coinpanhei
ros . O festeiro , pessoa de destaque social em Cunha, que ficara
encarregado das festas, pediu a Augusto Rita que dirigisse e or
ganizasse o Jongo . Como é de seu costume, e pelo fato de ser
o dono dos instrumentos, desempenhou - se de bom grado desta
incumbência, o que há muitos anos faz .
Mais ou menos distante da fogueira uns 15 metros, Augusto
Rita coloca no chão um atabaque grande. Um menino, seu neto,
( 2) QUENTÃO Bebida alcoólica feita de aguardente de cana
de açucar misturada com infusão de gengibre . Dosa - se à
vontade, colocando mais pinga se se quer deixar mais forte,
ou menos se se quer mais fraco. Ajunta -se também um pouco
de açúcar . As vezes colocam pimenta do reino, algumas ba
gas , “ para não fugir o bom cheiro " . Para dar melhor gosto ,
quando estão fervendo as raízes de gengibre, ( zinziber offi
cinale ) , ajuntam raspas de noz moscada (myristica offici
nalis ) , cravo ( caryophyllus aromaticus ) , canela ( laurus cin
namonum ) ou fôlhas de laranjeira ( citrus aurantium ) .
(3) ZINHOS Nome que dão ao menino quando pequeno ; subs
titui iambém o substantivo “ filho " : “ sou casado e tenho
cinco zinhos " . Notei que em todas as danças a que assisti
em Cunha , os meninos tomam parte . Na Folia de Reis, o
“ tipe " é menino : 0 Alferes da Bandeira na Folia do Divino ;
os netos do Rei na dança do Moçambique são exímios mo
çambiqueiros, e no Jongo muitos meninos entram dançando ,
não cantam " ponto ", e não são hostilizados pelos adultos .
Alí vão aprendendo , e com isso a tradição vai sendo trans
mitida às novas gerações .
(4) AUGUSTO RITA Notamos que muitos homens têm nome
feminino . Assim : Augusto Rita, Zé Catarina , João Marica .
Informaram - nos que esses nomes são devidos ao seguinte
fato :quando aquela pessoa foi criança , começaram a chamá - la
de " José, filho da Catarina ", e com o correr do tempo , acabou
ficando Zé Catarina , sendo que muitos passaram a assinar o
nome feminino , materno . Fato constatado quando faziamos
a leitura do registro do Racionamento do Açúcar.
JONGO 47

traz uma cabaça cheia de água e uma " cuíca " . Outro preto
trouxe um atabaque menor e um caixão de querosene . Um velho
manquejante traz um " guaia ” . Ao redor dos instrumentos for
ma - se uma roda . Dela participam homens e mulheres . Há mui
tas mulheres olhando , porém tomam parte na dança apenas duas
pretas e duas brancas, aliás estas caboclas claras não gozam de
boa reputação . Não há ordem para a distribuição na roda , pois
há apenas quatro mulheres e cerca de vinte homens dançando .
Logo que Augusto Rita coloca o atabaque no solo , antes de
sentar - se sõbre ele , tira o chapéu , ajoelha - se, faz o Sinal da Cruz .
Dá uns toques no atabaque ( ou tambu ) . O tocador do atabaque
pequeno responde. Augusto Rita, deixa o atabaque, outro tocador
toma o seu lugar, então apoia a mão esquerda sobre o instru
mento, segura o chapéu com a mão direita , e olhando para o céu ,
levanta o braço direito , e , no meio de um silêncio absoluto , com
uma voz pausada, grita estentòricamente :

“ Viva as alma" ...


" Vivão São Binidito " ...
" Viva o Santo Cruzeiro " ...
" Viva São José ” ...
“ Viva nosso padroeiro” ..
“ Viva as autoridade " .
"Viva o povo de Cunha " ...
-- " Viva a padroeira" ...

Os presentes sempre que Augusto Rita dá um viva, respon


dem com um viva lacônico . Depois do último viva à padroeira,
Augusto Rita canta . No meio de seu canto há palavras africanas
que não consigo apanhar . Uma que repete sempre é “ o karatá
... burundum ” . Canta e os dançantes repetem diversas vezes um
verso, estribilhando . Foi um " ponto " ( 5 ) que A. Rita cantou

(5) PONTO - É uma pergunta versificada , cantada, que o adver


sário precisa advinhar o que seja ; se advinha, ele " desata
ou desamarra o ponto ” . Empregam figuras de metáfora di
fíceis de serem entendidas . No Batuque ( Tietê ) o sentido da
palavra " ponto " é diferente, embora haja nesta dança grande
semelhança quanto aos instrumentos usados no Jongo . Per
guntei certa vez a um preto que dizia ter 100 anos de idade
e que conhecia um pouco da lingua africana, disse que o
“ ponto " quer dizer, pergunta , e que em Quimbanda ou magia
negra era feitiçaría . Disse também que Jongo quer dizer :
" o que é que você está fazendo, vamos brincar ". Num dialeto
é assim : “ ginga unga tunga auchití auti" , e noutro dialeto :
" gina aonajaê , auaxuê axutá" . Perguntei o que quer dizer Ba
tuque , apenas me respondeu, “ o batuque é uma dança forte " .
48 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

e está à espera de que alguém desate, decifre o que ele . cantou .


Enquanto não desatam , repetem aquele estribilho e seguem dan
çando . Tomazinho, tipo popular, velho jongueiro, balança o
"'guaiá ” e grita fanhosamente : – “"Cachoeira
Cachoeira "” .. Cachoeira é um
termo usado no Jongo, que quer dizer " pare " . Todos param .
Ele balança novamente o " guaia ” que está em sua mão direita ,
tira o chapéu com a esquerda e canta :

" São Binidito me dá licencia" ...


“ Nossa Senhora de Cunha me dá licencia " ...
“ Nossa autoridade de Cunho me dá licencia ” ..
" Me dá licencia ... me dá licencia ” .

A seguir canta o seu " ponto " . Enquanto ele canta somente
a " cuíca" toca normalmente, o " candongueiro " e a " angona" fi
cam tocando em surdina até finalizar o canto . Depois de can
tado o novo ponto ou desatado o anterior, recomeçam a tocar alto ,
todos começam novamente a dançar e a cantar o estribilho, ro
dando em torno dos instrumentos :

“ Dei um toque no tambú


deu alto no guaia” .

foi Tomazinho quem cantou , e os dançantes deram três voltas


cantando :

" com alegria, com alegria " ...

Para cada " ponto" cantado costumam dar três voltas dançan
do e cantando um estribilho, que sempre é o último verso do
" ponto " , ou as duas palavras finais . No momento que balança
o " guaiá ”, todos se calam e param , porque ele gritou " cachoeira” .
Canta novo verso outro jongueiro :

“ Se soubesse que você vinha


eu mandava le busca
num par de mula branca ” ...

Qualquer pessoa pode cantar desatando o " ponto " . Sempre


que um cantor vai cantar pela primeira vez , ele sauda os santos
e padroeiros, autoridades e pede licença . Geralmente ficam por
fiando somente dois jongueiros, e cada qual procura cantar coisas
mais difíceis de serem desatadas. Os " pontos " são sempre feitos
de improviso . Num Jongo logo aparecem cs dois jongueiros
JONGO

que se destacam e põem a porfiar .. Ao jongueiro vencedor as


siste o direito de tomar posse dos instrumentos do adversário que
não conseguiu desatar seus " pontos" e, portanto, foi derrotado.
Bem difícil é desamarrar um " ponto " . Citemos um exemplo
entre muitos recolhidos. Um jongueiro cantou :

“Botei meu joelho em terra , São Binidito me valeu " .

A pessoa que " desamarrou " o " ponto " decifrou o canto .
Depois foi obtida a confirmação do jongueiro que o cantou , acres
centando que foi fácil desamarrá -lo porque aquela pessoa sabia
de sua caçada e dos apuros que passara . o " ponto " significava
o seguinte : Augusto Rita foi caçar, de volta , já havia gasto toda
sua munição quando, de repente, surge uma onça que mata seu
cachorro . Vendo que seria atacado pelo felino, ajoelha -se e su
plica o auxílio de São Benedito . Inesperadamente a onça toma
outro rumo e ele se vê salvo .
É um episódio da vida que o jongueiro levou para o Jongo,
narrando - o sob a forma de " ponto ". E , assim , são quase todos
os “ pontos ” .
Consigo notar que há uma correlação entre a adivinha e o
" ponto ” que os jongueiros cantam . A adivinha, como o " ponto " ,
toma sempre a forma versificada, rimada, pois é a melhor forma
de ser decorada, memorizada .
Por meio dos “ pontos” os escravos combinavam fuga, mar
cavam encontros, criticavam seus senhores, e atualmente essa mes
ma verve resta aos jongueiros, pois ao pesquisador compararam -no
a " galinha que come dado o milho ", pelo fato de anotar os
versos cantados, sem lhes pagar nada por “ esse milho ... da cul
tura espiritual" .
Uma crítica feita a um chefe político :
60
Tanto pau de lei
que tem no mato ,
embaúva é coroné" .

A explicação deste " ponto " é a seguinte: na cidade há tanta


gente boa e de caráter, e justamente o “ coronel” é que foi esco
lhido para um alto cargo . A gente boa é o " pau de lei", e a
madeira oca, inaproveitável, a umbaúba ( cecropia palmata ) é que
é escolhida .
Havia um fazendeiro muito rico, porém sovina, fazia festas,
mutirões, e dava pouca comida e bebida, foi criticado na roda de
jongo :
::250 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPA
L

" Ai é home rico,


tem fazenda trabaiano,
cum tanto escravo ,
tá no açougue,
comprano carne,
de quilo em quilo .
Porque num compra,
um boi intero ?

A filha do patrão, tinha encontros escusos no pomar, não


lhe faltou a critica :

" Laranjeira tá tremeno ,


no pomar tem gurundi" .

Um " ponto " que foi logo desamarrado foi este :

“ _ No alto daquele morro ,


tem duas muié serrano,
uma debaixo, outra de cima,
puêra tá caíno em baixo " ...

É o moinho . As duas mulheres representam a mó , e a poeira


é o fubá do milho que vai saindo .
O jongueiro mais idoso disse que há um ponto que até hoje
ninguem desamarrou , e que foi feito ha 50 anos :

Sapo qué se doto ,


arubú repubricano,
gavião que é mais ladino,
no gaio fica mirano" .

Nota - se que algumas palavras são de origem africana, e nou


tras a pronúncia sofre a influência africana, por exemplo : dizem
" sarava ", em lugar de salvar, saudar . Cantaram assim : - " pri
meiro saravá a Deus para despois sarava o povo " . Outras pa
lavras que presumo serem de origem africana são : " angona",
nome que dão ao atabaque grande, e , às vezes , à própria dança
do Jongo ; " candongueiro " ao atabaque pequeno ; " tambu ” , nome
comum e mais usual do atabaque; " Guanazamba " é Deus do céu ;
“ Zamba " é Deus , e " malunga " irmão . Notei também que quando
falam em Deus o chapéu permanece na cabeça, porém basta fa
lar o nome de um santo que imediatamente eles se descobrem .
JONGO 51

INSTRUMENTOS - No Jongo são usados os seguintes


instrumentos : três ou quatro atabaques, uia cuíca e guaia. Aos
atabaques dão o nome de tambu, angona, candongueiro, cadete,
guzunga , Pai João , Pai Tôco, João, Guanazamba, Joana. Ao ata
baque grande chamam : Pai Tôco , Pai João, João, Guanazamba
e o mais comum de todos os nomes TAMBU . Ao atabaque pouco
menor do que éste, chamam - no de Joana, Angona, e mais comu
mente Candongueiro . Ao menor do que este, chamam -no CADE
TE . A o pequeno, o menor de todos, GUZUNGA. O Tambu é
tocado com as mãos batendo em cheio, e o candongueiro e cadete
são tocados delicadamente, com as pontas dos dedos que os leva
a dizerem " arranhando a angona " .
O Tambu, atabaque grande , é um pedaço de madeira que
por meio do fogo fizeram um buraco, de ponta a ponta . Esse
tộco tem mais ou menos uns 100 a 120 centímetros de compri
mento, e um diâmetro aproximado de 40 centímetros. Numa das
extremidades colocam um pedaço de couro de boi, e a outra fica
livre . O tocador senta-se sõbre o tambu que é colocado hori
zontalmente no solo , acavala o instrumento e bate com as mãos
no couro, tirando sons cavos que são ouvidos à longa distância .
Para afinar o tambu , éles levam - no próximo ao fogo, o que lhe
dá um som mais limpo e mais agudo . Quando o couro está
frio , eles dizem que o tambu está rouco .
O Candongueiro, atabaque menor, é mais delicado e de me
nor dimensão, 80 a 100 centímetros, 30 de diâmetro, e o seu som
é mais agudo . Quando há sòmente dois tambús dizem o " casal
de tambu ” . Pelo fato de um ser maior e de som mais grave,
dão-lhe o nome de " João ”, e o outro menor, som mais agudo,
mais " mulher " dão-lhe o nome de " Joana " .
O cadete é bem menor do que o tambu e candongueiro, seu
som é mais agudo. O tocador senta-se sôbre ele, não tendo mes
mo mais do que 20 centímetros de diâmetro , e 50 a 60 centi
metros de comprimento .
Aos três primeiros, Tambu , Candongueiro e Cadete, sentam
se sobre eles para tocar Ao Guzunga, que é pequeno, ele é
carregado pelo tocador, por uma alça de couro que fica à tira
colo ou no ombro esquerdo . Tocam - no mais ao menos à altura
do peito . Afirma o Sr. Augusto Rita , que " devido preguiça de
fazer tambú e candongueiro, cuja voz alcança leguas de distância,
estão agora só usando cadete e guzunga , pois são menores, mais
fácil de serem feitos e de serem carregados ... e que trabalha
alto o mesmo que seja uma busina " .
A “ cuíca ” é um pau roliço, ôco, de mais ou menos uns 30
centímetros de comprimento e 15 ou 20 centímetros de diâmetro .
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Uma das bocas é recoberta por um couro . No centro deste amar


ram uma haste de madeira , bem lisa , de 30 centímetros de com
primento . Ela é tocada da seguinte, maneira : o cuiqueiro coloca
instrumento entre os joelhos pressionando -o, e com um pano
molhado, ou a própria mão molhada, esfrega a haste tirando sons.
De vez em quando, ele coloca uma das mãos sobre o couro, exter
namente , o que faz tirar sons diferentes, ruídos que mais parecem
grunhidos. Para conservar o pano molhado, trazem uma cabaça
com água. Tomam ou pouco d'água e depois cuspindo- a na mão
esfregam a haste . Há cuiqueiros que não usam pano, sòmente
a mão molhada e assim conseguem tirar uma gama maior de sons
do instrumento .
O " guaia " é uma latinha contendo dentro chumbo , pedrinhas
ou " conta de capiá " , tendo uma alça para segurar. Assemelha -se
a uma caneca fechada . É um chocalho com alça. É tocado sò
mente para mudar de canto , para desatar o " ponto” que está sendo
dançado. Toca o instrumento e grita a seguir : " Cachoeira" !
À vezes, na falta de tambu , batem num caixão de querosene
o que fatiga logo , e a mão fica doendo . Por isso seguidamente
revezam - se os tocadores.

MÚSICA O canto é monótono e cantam em dueto. Ge


ralmente os pretos tem voz boa . Há alguns de voz ótima . Al
gumas melodias são cantadas a três vozes . O comum é o dueto .
Há negros tenores cuja voz tem admirável melodicidade . Outro
fato que observei é u'a maneira especial de alguns pretos canta
rem em falsete . Uma preta canta sòmente em falsete . As
mulheres somente cantam o estribilho, elas não cantam " ponto " .
Cantam versos " linhados", isto é, um em seguida a outro ,
tirando " o ponto ", por exemplo :

" Como é bunito dois machado trabaia ,


um corta pau, outro chega prá laurá " ...

Logo que o jongueiro canta o " ponto ", os que estão dançan
so em volta do instrumento, repetem cantando e dançando o ver
so final , por exemplo, deste somente cantam : "eu num sô daqui,
eu só viajante" .

" Esta galinha come dado o mio


ela não é minha, ela não é minha ,
eu num sô daqui, eu sô viajante . (6)

(6) Obsequio do Maestro Martin Branwieger .


'JONGO $3

DANÇA Dançam em redor dos instrumentos, sendo o


" tambu " e o " candongueiro " colocados no solo, sentam -se sobre
eles com as pernas abertas, e o cuiqueiro senta - se sobre um cai
xão . É uma dança de roda que se movimenta em sentido con
trário ao dos ponteiros de um relógio ( 7) . Os passos são des
lisamentos para a frente com o pé esquerdo e direito, alternada
mente . Ao finalizar cada deslisamento, há um pequeno pulinho
ao aproximar o pé que está atrazado . De vez em quando os
dançantes dão um giro com o corpo, principalmente aqueles que
estão na frente das poucas mulheres que estão dançando. Estan
do na frente, vira e defronta - se com a mulher, e ambos mudam
os passos ora para a frente ora para atraz , duas vezes e depois
giram . O homem ao girar fica novamente com as costas para
a mulher . Também esta à vêzes, dá meia volta, defronta - se com
o homem que está atrás . Com este, ela dá um passinho para a
frente ao lado direito, balanceia para traz, depois balanceia para
a esquerda, gira e dá-lhe novamente as costas .
Os dançantes quando se cançam , saem da roda e descançam
ou perto da fogueira ou sentados na sargeta . A dança prossegue
noite a dentro, finda antes do nascer do sol, pois o Jongo só é
dançado à noite .

MAGIA Há muitas práticas de feitiçaria ligadas ao Jon


go . Acreditam que ao jongueiro que é derrotado acontece- the
uma desgraça . Quando vai enfrentar um adversário afamado é
bom enfiar uma faca de ponta fina num pé de bananeira, fa
zendo assim " fundanga " para que ele não seja capaz de desatar
o " ponto " .
Contam que Tomazinho, que é de fato fanhoso, criou bi
cheira no nariz porque não desatou um " ponto ", então apareceu
ozena, pois ele ficou dormindo daquele momento em diante na
cinza, até depois do raiar do sol, e aquilo ninguém cura porque
foi “ coisa feita ” .
Um jongueiro amarrou uma pessoa que estava zombando da
dança dos pretos, deixando - a com a frente virada para a parede
até ao amanhecer do dia . O jongueiro tem parte com o demô
(7) PONTEIRO DO RELOGIO Utilizo -me desta referência para
facilitar . Notei que somente nas danças de negros como o
Jongo, e, que dançam em sentido INVERSO aos dos ponteiros
de um relógio, pois várias danças de Fandango, Cururu, a
que assisti, 08 brancos dançam no sentido dos ponteiros do
relógio . Tendo na qualidade de observador participante, dan
çado uma 5 ou 6 vezes o Jongo, em épocas diferentes, na
cidade de Cunha, todas as vezes a roda movimentou -se no
sentido inverso ao dos ponteiros do relógio . Portanto, não é
coincidência . O mesmo fato verifiquei no Jongo em Taubaté,
São Luiz do Paraitinga o São Pedro do Catucaba .
54 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

nio (echú pagão ), assim afirmam , e todos os bons jongueiros,


já se pode saber, são também entendidos na arte da quimbanda
ou magia negra . Sabem " botá fundanga e õio grande” . Havia
um que era de fato bom , que de dentro de um corote vazio , ele
fazia escorer pinga e dava para os presentes beberem , e este mes
mo jongueiro , de um tubo de taquara , tirava uma rama de batata,
plantava, fazia crescer, colhia colocava na cinza , assava e depois
dava para os presentes comerem batata doce assada . Outro jon
gueiro famanás que morava lá pelas bandas do bairro do Capi
vara, colocava uma vara em cima do " candongueiro ” e a vara
florescia à meia noite .
Para se livrar de qualquer perigo, deve-se dançar com um
galhinho de arruda ou guiné na algibeira esquerda .
O Jongo só deve ser dançado à noite, pois as artes que são
feitas nêle sòmente são realizadas enquanto não há sol.
Zé Crioulo, afamado jongueiro do bairro do Cume, da Fa
zenda Palmeira, afirma que o Jongo vem desde o começo do mun
do, que é uma das danças mais antigas que existem . Os jon
gueiros, pelo que constatamos, gosam de uma auréola de mágicos
e feiticeiros , pessoas que têm determinados privilégios e têm ami
zade com o diabo .
Dançam o Jongo porque ele traz muita alegria e é um diver
timento aprovado por São Benedito, e que os leva a passar a
noite distraídos dançando ou presenciando a disputa de jongueiros
de fama . Há também libações alcoólicas .

RESUMO

O JONGO é uma dança de origem africana , na qual parti


cipam homens e mulheres . O canto tem papel importante nesta
dança, no desafio versificado, e a música é para dança , para fa
cilitar os movimentos, o que é uma função rítmica . Os instru
mentos são de percussão, mais adequados à música primitiva . Em
poucos lugares do Brasil ela sobrevive, e nesses núcleos , onde ha
via maior densidade de população negra escrava , possivelmente
oriundos de Angola , ainda ( O JONGO ) exerce uma função de
rivativa, recreacional, para os nossos habitantes do meio rural .
BOLETIM N. I
DA

SOCIEDADE AMIGOS DO ÍNDIO

SUMÁRIO

SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO .. Herbert Baldus

FINALIDADE DA SOCIEDADE AMI


GOS DO INDIO Mário Miranda Rosa

A CATEQUESE DO “ CIVILIZADO " Gal . Candido Mariano da


Silva Rondon

A CRIAÇÃO DOS HOMENS, LENDA


DOS INDIOS UMUTINA Harald Schultz

ESTATUTOS E INFORMAÇÕES DA SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO


SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO

HERBERT BALDUS

Desde os tempos mais remotos até os nossos dias, os homens


propendem à considerar os individuos de outros povos como es
sencialmente diversos de si mesmos e dos componentes de seu pró
prio povo .
Para os antigos gregos e romanos, os outros povos eram
bárbaros cuja escravização era tida como a coisa mais natural do
mundo. Euripides acha “ justo que os helenos dominem os bár
baros ”, é Aristóteles identifica a natureza dos chamados bárbaros
com a dos escravos .
Já antes da florescência da Grécia, já nos quadros egipcios
e assírios, o estrangeiro aparece servindo ou pagando tributo .
A Idade Média designou os povos que não pertenciam à cris
tandade como produtos do Diabo, representando-os pelas formas
mais estrambóticas. Assim figuravam os pagãos na imaginação
dos europeus como unípedes, cujo único pé lhes servia de guar
da-sol ; como gente que vivia até dużentos anos tendo branco o ca
belo na juventude e prêto na velhice ; como pessoas com cabeça de
cão e ladrido ; em resumo : como criaturas as mais fantásticas.
Contava-se que os moradores das cabeceiras do Ganges eram ho
mens sem bôca, alimentando - se do cheiro de raízes e maçãs . Fa
lava-se num povo do Himalaia com pés voltados para trás, cor
rendo, apesar disso, para frente .
58 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Também cronistas do século XVII deram , com referência ao


Brasil, notícias acerca de gente em semelhantes condições e de
‘nações " inteiras de gigantes, anões e amazonas . Em mapas
holandeses deste país aparece o retrato de um habitante de Iwai
panoma, homem sem cabeça e com a cara no peito . Essas fan
tasias, que em grande parte provieram da Antiguidade, perdura
vam ainda no século XVIII . O naturalista Rodrigues Ferreira
perguntava : “ Será certo que entre as muitas nações de gentios, que
inabitam no Juruá, confluente do rio Solimões, existe a dos Caua
nás, espécie de pigmeus, de estatura tão curta que não passam
de cinco palmos ? Será certo que a dos Uginas, do mesmo rio,
consta de Tapuias caudatos ? "
Indubitavelmente, tal sede de sensações causada pela imagi
nação de anormalidades tinha certa relação com o vivo interesse
pela antropofagia que já caracterizou os relatos quinhentistas sõbre
os índios do Brasil . E essa tendência .a saborear fenômenos
horripilantes é ainda hoje alimentada neste país por aquela im
prensa barulhenta que em vez de levar os leitores para o culto
do belo.e do bom , procura satisfazer -lhes os apetites mais baixos,
romanceando assuntos policiais e reproduzindo asquerosas e cho
cantes fotografias a respeito . No que se refere ao indio, a mesma
imprensa nunca o mostra como ele é na verdade, mas o pinta
cheio de monstruosidades . Seus repórteres, quando tentam en
trevistar o etnólogo, nunca se interessam pelas desgraças e feli
cidades do selvícola brasileiro, mas querem saber se ele come
carne humana, se atira flechas envenenadas contra os viajantes
e se há tribos de indios brancos . E ficam descontentes ao ou
virem que 1 ) das tribos atualmente existentes e conhecidas,
nenhuma é antropófaga; 2 ) os informes sobre o uso de setas
crvadas contra pessoas são rarissimos . e, na maior parte, duvi
dosos ; 3 ) as notícias sobre “ indios brancos ” costumam referir
se a albinos que , em certas aldeias; estão em pequeno número ,
não havendo, porém , tribos inteiramente compostas de tais indi
víduos não pigmentados.
Aliás, também os crédulos e imaginosos vizinhos sertanejos
contribuem para representar o indio como ente estrambótico .
Vendo pisada humana no chão, falam ou em " rasto de gente " ,
ou em " rasto de bugre", nunca admitindo, apesar de andarem des
calços como o indígena, que este também seja " gente " .
Naturalmente, os principais deturpadores da realidade e ex
ploradores do amor dos simplórios pelo extravagante e exagerado ,
são os fabricantes de um gênero barato de romances de aventuras
e narrativas de viagens nas quais, em quase cada página, o herói,
ou seja , o próprio autor, escapa pelo menos três vezes à morte
SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO 59

certa . É verdade que a criança e mạitos adultos gostam do fa


buloso e a vida ficaria cinzenta e mesquinha se esse gosto não
fosse satisfeito . Isto, porém , não justifica deixá-los guiar pelos
mistificadores que consideram educação heróica cultivar o espírito
da brutalidade e do sadismo. Para fertilizar a imaginação não é
preciso difamar indios como sendo cruéis e traiçoeiros. Omun
do, para a mente sã, está cheio de maravilhas sedutoras: ha
o resplendor do sol numa folha verde ; há as façanhas dum be
souro que atravessa o capinzal ; há as mães que se sacrificam
pelos filhos e os cientistas que sofrem e morrem pelo bem da
humanidade ; há , se vocês quiserem , os nossos indios, cujo estudo
revela cada vez mais possibilidades inauditas da alma humana .
Precisamos, primeiro, enxergar esta alma no indio, para de
pois poder admirar suas riquesas . Desde os começos do Brasil,
havia, ao lado dos caluniadores do indígena, os observadores com
preensivos e de boa fé . Já na sua célebre carta ao rei D. Ma
nuel , redigida em abril de 1500, Pero Vaz Caminha, escrivão da
frota de Cabral , exprime sua opinião sobre os habitantes da terra
descoberta, com as palavras seguintes: " Segundo o que a mim e
a todos pareceu , esta gente não lhe falece outra coisa para ser
toda cristã que entenderem -nos .”
( ) diário de Pero Lopes de Souza que , no ano de 1531 , em
companhia de seu irmão e capitão- mor Martim Afonso de Souza,
visitou os Tupi da Bahia, descreve éstes indios da seguinte forma:
" A gente desta terra he toda alva ; os homees mui bē dispostos e
as molheres muj fermosas q no hã nenhũa emveja as da Rua
nova de lixbõa . "
Como vemos , nada de monstros . Mas apesar dessas manii
festações sensatas, foi preciso o papa Paulo III , em 1537 cleclarar
numa bula que também os índios têm alma e merccem ser tratarlos
como criaturas de Deus para opor-se ás barbaridades cometilas
pelos espanhóis contra os aborígenes americanos.
Infelizmente, decorreram desde então , mais de quatrocentos
anos sem que essa bula tivesse produzido o desejado efeito . É
que as pessoas interessadas em escravizar e matar indio não estão
interessadas em bulas do papa , e mesmo se soubessem da exis
tência de tal decreto pontificio, não o tomariam em consideração .
Torna - se necessário, pois, colaborar com Paulo III e provo
car a indignação pública contra ésses malfeitores. O caminho
para isso consiste em vencer os preconceitos acerca do indio , mos
trando até que ponto ele se parece conosco , em que medida e por
que razões difere de nós, e o que devemos a ele .
Acerca da aparência física basta dizer que indios vestidos à
nossa moda, sem tatuagem e pintura, e usando o cabelo como nós ,
REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

chamariam sobre si , em geral; pouca ou nenhuma atenção nas


ruas de cidades brasileiras. Quanto ao aspecto psíquico , a peu
pulação da aldeia india não constitue, como antigamente se supu
nha, um conjunte homogêneo com " conciencia coletiva ", mas um
quadro multicor de personalidades tão individualizadas como nós,
apresentando, além disso, uma série dos mesmos tipos cuja exis
tência nos mais diversos grupos sociais dos brancos conhecemos
por nossa própria observação ou pela literatura, isto é , tipos como
o expansivo e o fechado, o generoso e o sovina, o agressivo e o
pacífico, o rebelde e o ordeiro, o arrogante e o servil, o abnegado
é o interesseiro, o corajoso e o covarde, o modesto e o vaidoso,
o carinhoso, o ríspido e muitos outros . Cada um deles pensa à
sua maneira, ora com tanta , ora com tão pouca individualidade
como cada um de nós, e a esta semelhança conosco corresponde
ainda a do aspecto geral do nosso pensamento com o aspecto ge
ral do pensamento dos povos -naturais.
Se chamarmos este último de " primitivo ", temos que designar
o nosso pensamento com o mesmo termo. Basta conversar com
um habitante da aldeia india e com o nosso homem da rua, para
perceber que nenhum deles é nem mais nem menos " lógico" do
que o outro ao tratar de assuntos de interesse vital, e que, no
tocante à afetividade, o pensamento de ambos é equidistante do
pensamento metòdicamente racionalizado e auto -controlado do cien
tista . O choque produzido entre este pensamento e o dos povos
naturais por ocasião de pesquisas contribuiu, talvez, para levar
alguns cientistas com pouco “ faro " psicológico, a criar o mito do
“ pensamento primitivo ". Na realidade, o pensamento científico
é excepcional não só pelo fato de pouquíssimos homens usarem
dêle, como também pelo fato de a maioria dêstes homens usar dêle
únicamente em determinadas oportunidades, isto é , durante as ho
ras em que se dedicam ao trabalho de sua especialidade, de modo
que um professor de filosofia, por exemplo, em matéria de poli
tica pode ser mais “ burro " do que a sua cozinheira .
Comparando-nos com os indios, apontar as semelhanças não
.significa menosprezar as diferenças de alimentação, habitação, in
dumentária , indústria, organização social, religião, arte, lingua e
padrão de comportamento, em resumo , as diferenças de herança
social e não biológica de cada povo, isto é, daquilo que os etno
logos chamam de cultura . Essas diferenças e não as semelhan
ças atraem , geralmente os que andam a procura do fabuloso . Para
compreender, porém , que elas aumentam realmente o patrimônio
de idéias da humanidade, representando mais do que meras esqui
sitices de um grupo , é preciso evitar juízos de valor a seu res
peito, não considerando una cultura superior ou inferior à outra .
SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO 61

Convém ainda lembrar que qualquer individuo pode adaptar -se


perfeitamente a uma cultura que não seja a de seus pais se desde
a primeira infância viver exclusivamente naquela ,
O poder criador das culturas pre -colombianas não se eviden
cia únicamente por tudo que produziramo império incaico e -os
grandes países da América Central, em matéria de política, indús
tria e arte . O número e alta qualidade dos diferentes vegetais
cultivados por pequenas tribos das selvas brasileiras são impressio
nantes . Para fazer idéia do que devemos ao indio, basta pensar
no papel desempenhado atualmente, na economia mundial, pela
batata, pela mandioca, pelo amendoim , pelo tomate, pelo cacau ,
pelo tabaco e por muitas outras plantas americanas .
Há pouco tempo , alguns estudiosos e homens de bem reuni
ram -se em São Paulo para trabalhar em prol do nosso selvícola ,
pondo ao alcance do grande público, por meio de publicações, con
ferências, exibições cinematográficas e exposições etnográficas, a
verdade até agora só acessível a um pequeno grupo de especialistas.
Fundaram a " Sociedade Amigos do Indio " que colabora na filan
trópica campanha feita por Paulo III, Las casas, José Bonifácio ,
Couto de Magahães, Rondon, Nimuendajú e outros defensores do
homem americano .
A sociedade está recebendo adesões por intermédio dos fun
cionários da Secção de Etnologia do Museu Paulista, caixa postal
32-B , São Paulo .
62 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

FINALIDADE DA “ SOCIEDADE AMIGOS DO ÍNDIO "

Mário MIRANDA Rosa

A “ Sociedade Amigos do Índio " tem o fim principal de tor


nar melhor compreendidos o indio e a sua cultura, desfazendo
certos mal - entendidos generalizados existentes a respeito .
Esses mal -entendidos persistem , apesar de já haver, ao alcance
dos especialistas, pelo menos, abundante documentação e trabalhos
científicos de real valor, suficientes para modificar muitas das
idéias erróneas que têm prejudicado os contatos entre os civili
zados e os indígenas , se forem colocados ao alcance do público
em linguagem popular .
Assim , o que a Sociedade tem em vista é fazer o grande pú
blico participar desses conhecimentos até agora só acessíveis aos
especialistas, por meio de publicações , conferências, exposições et
nográficas, etc. Dessa maneira se procurará orientar o sensacio
nalismo e combater a falta de escrúpulos adotados como forma de
comunicar ao grande público os assuntos referentes aos indios .
O indio brasileiro, que desde o descobrimento do Brasil tem
sido perseguido, escravizado e dizimado, encontrou na pessoa do
general Rondon o seu maior amigo e defensor . Desde 1910 existe
o Serviço de Proteção aos Índios , criado por sua iniciativa .
O povo brasileiro , não obstante a proverbial afetuosidade de
seu caráter , mantem - se em atitude de prevenção sistemática em
relação ao homem primitivo do Brasil . Isso se explica, em parte,
quando se pensa que desde o período das " bandeiras", o indio
brasileiro tem sido pintado como um ser feroz, pagão e antro
pófago. Para restituir - lhe as condições de vida laboriosa e paci
fica , que o próprio homem branco lhe roubara, tem o Serviço de
Proteção aos Índios empregado o máximo de seus esforços .
A obra de Rondon não está, porém , acabada . Além de de
fender materialmente o indio , é preciso desarmar o homem branco
de seus preconceitos, orientar a opinião pública, iniciá-la no conhe
cimento do verdadeiro caráter dos nossos indígenas , só enaltecidos
pelos poetas e romancistas .
A " Sociedade Amigos do Índio " tem em vista , pois, a difusão
de conhecimentos referentes aos antepassados indígenas e aos in
dios que ainda vivem em sociedades perfeitamente organizadas,
em nossos sertões . Seus fundadores estão , assim , dispostos a
iniciar uma campanha destinada a evitar que velha injustiça per
dure em nosso meio . E , aceitam a colaboração de todos quantos
desejem apoiar a iniciativa .
SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO - 63

A CATEQUESE DO " CIVILIZADO "

GENERAL CÂNDIDO MARIANO DA Silva RONDON

A margem direita do Gi é freqüentada por índios a que os


Jaru chamam Rama -Rama. A pessoa que me deu esta notícia,
contou-me um episódio característico da brandura dos instintos
destes últimos selvícolas .
Certo seringueiro, dos que sobem o Gi até a foz do Muqui,
tinha tão arraigada a prevenção contra os indígenas que punh:?
em prática , com inexorável pontualidade, a máxima : “ indio visto,
indio atirado " , apesar de jamais ter recebido de suas pobres víti
mas o menor insulto .
Cansados de tantos sofrimentos , os índios resolveram " cate
quizar, amansar" , ou , se quiserem , " domesticar " aquele " civili
zado ” sobre o qual , certamente, teriam uma opinião um tanto ou
quanto parecida com a que muitas vezes vemos expender- se a res
peito dêles mesmos , isto é, a de ser um bárbaro com instinto de
fera . Mas ainda assim não se resolveram a matá - lo ; preferiram
os meios brandos e eis o que engendraram : o trucullento seringueiro
atravessava habitualmente certo rio, sôbre um pinguela . Dois
Rama-Rama, puseram- se a esperá-lo, muito bem ocultos, cada qual
em uma das cabeceiras da rústica passagem . Vem o seringueiro ,
barafusta por ali e quando está todo absorvido com as dificul
dades naturais de semelhantes passos, levantam- se os índios, fe
chando - lhe as saidas . Atônito, o homem perde a presença de es
pírito e nem mais se lembra da espingarda que traz a tiracolo .
Porém , mais atônito deveria ter ele ficado, quando viu aqueles
" selvagens", que o podiam acabar em um instante e com toda a
segurança , estenderem-lhe as mãos desarmadas, oferecendo- lhe fru
tas : eram os “ brindes” com que tentavam iniciar o trabalho de
" catequese do civilizado " .

( Transcrito de Conferências , 2 ° edição,


Rio de Janeiro 1946 , pp. 98-99 )
REXISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

A CRIAÇÃO DOS HOMENS

LKXDA DOS INDIOS UMUTINA

HARALD SCHULTZ

Introdução

Mais ou menos 20 indios Umutina ou " Barbados " vivem ainda


hoje na margem direita do alto rio Paraguai, no norte do estado
de Mato Grosso .
Um pouco rio abaixo, a umas 7 léguas de suas malocas e 2
acima da localidade de " Barra do rio dos Bugres" encontram - se
cerca de 80 a 100 Umutina no posto " Fraternidade Indígena " do
Serviço de Proteção aos Indios, que lá foram educados, órfãos em
conseqüência de grave epidemia que grassou entre seus parentes
há uns 25 ou 30 anos .
O apelido “ Barbados ” provem do uso de rala barbicha, aliás
rara entre nossos aborígenes.
Outrora os Umutina foram tão afamados e temidos como,
até há pouco, os tão falados Chavante. Foram pacificados em
1913 pelo paulista Helmano dos Santos Mascarenhas.
Em 1924 foram visitados pelo etnólogo alemão dr. Max
Schmidt , cujas observações foram publicadas num volume da " So
ciedad Cientifica del Paraguay" sob o título " Los Barbados a
Umotinas en Matto Grosso ( Brasil ) " , Assuncion 1941 .
O autor os visitou em 1943/44 e 45 , fazendo observações de
sua vida , organização social e religião, que serão publicadas opor
tunamente numa monografia .
Os Umutina migraram provavelmente do médio rio Paraguai,
na altura do rio Sepotuba para seu atual habitat .
São lavradores e caçadores . Cultivam várias qualidades de
milho, mandioca, feijão, cará, pimenta , cana bananas, melancias e
un pouco de arros, além de outras plantas úteis. Uma planta
pouco conhecida entre civilizados, chamada " mandioca -cipo ” per
tence aos vinhos silvestres ( Vitacea ), lhes fornece ramas fe
culentas .
A caça foi quase exterminada em suas terras pelos civiliza
dos ávidos de ganhar dinheiro com suas peles e couros . A pesca
é de importância predominante para sua alimentação . No pis
SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO 65

coso rio Paraguai atiram os peixes com flechadas certeiras, e ,


nos numerosos lagos, que são propriedade familiar, pescam em
grupos com o entorpecente cipó -timbó .
O autor teve a felicidade de poder observar os rituais anuais
nos quais se cultuam as almas dos antepassados falecidos . Destes,
acreditam que se reincarnam em animais silvestres, e , após sua
morte , migrem para o céu indígena, onde reina Haipucú , a sua
divindade superior .
A lenda que se segue espelha o conceito da criação dos ho
mens . Um ciclo de lendas explica todos os fenômenos de sua
vida e de tudo que os circunda . Além de Haipucú existe um
número de heróis civilizadores , entre os quais sol e lua tomam
lugar de destaque.
É de acreditar- se que esta dualidade, sol e lua, cuja vida e
peripécias são contadas em numerosas e pitorescas lendas , tenha
sido ligada a uma divisão tribal , talvez exogâmica, dos Umutina .
O que , aliás , não mais pode ser observado nem explicado
pelos Umutina da mata, e cuja vida já sofreu modificações, em
conseqüência da redução de seu número .
A lenda da “ criação dos homens” foi contada pelo indio civi
lizado Cupodonepá, homem de mais ou menos 40 anos , e, que,
quando moco , vivia na aldeia com seus parentes . Casou -se com
uma moça Umutina que vivia no posto indígena e tornou- se assim
um chamado “ indio civilizado ” , É bom conhecedor do idioma por
tuguês, devido à sua grande e viva inteligência e ótimo infor
mante das coisas da cultura Umutina .
As expressões foram, em grande parte, conservadas conforme
usadas por Cupodonepá, exceto em casos que dificultariam sua
compreensão pelo leitor :

A CRIAÇÃO DOS PRIMEIROS HOMENS

Lenda contada pelo indio Umutina Cupodone pá

" Primeiro não tinha povo e Haipucú ( 1 ) andava triste, só


sinho . Ele foi pensando na vida . Foi inventar e experimentar
juntar fruta de Bacaba do Campo ( Oenocarpus spec . ) . E jun

(1) Haipucá é considerado pelos Umutina um ser divino ( pai pri


mário ) . Não gostam de falar dêle diante de estranhos . Ne
garam - se repetir as histórias ligadas ao mesmo, quando
foram pedidas pelo autor, demonstrando respeito e ao mesmo
tempo temor .
66 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

tava fruta macho e fruta fêmea ( 2 ) . Foi juntando, juntando,


emendando até ter dois pés de comprimento . Aí deixa de lado ... "
" Quando chegou de noite , ele ficou assustado com conversa .
Foi ver , e era gente que as frutas viraram . E ele ficou satis
feito com os companheiros. Eles ficaram com ele e fez familia
logo " .
“ Foi indo, foi indo, experimentou juntar fruta de figueira
de fôlha larga ( Ficus spec. ) . Juntou e botou debaixo da es
teira " ( 3 ) .
" De noite assustou da conversa de gente . Ai ele foi ver que
virou gente outra vez, e ficou satisfeito que já tinha muita gente
para companheiros dêle ” .
“ Depois de algum tempo achou que era pouco . E experi
mentou juntar fruta de Bacaba do Mato ( Oenocarpus spec .) .
Juntou até um palmo de comprimento, e saiu tudo gente de cabelo
comprido, dois e duas mulheres, dois casais” .
" Experimentou com mél de tataíra (Melipona cagafogo ) e
também saiu um casal, com a cabeça mais pelada " .
" Quando já tinha bastante povo ( 4 ) déle, criou barriga de
perna dos dois lados” .
" Quando Haipucú ficou apurado com a dor de criança , pro
curou um pé de figueira ( 5 ) . Aí racharam as duas pernas e
nasceram quatro crianças, dois meninos e duas meninas " .
" Da perna direita saíram dois Habusé, ( 6 ) indio e india,
e do lado esquerdo saíram os pais dos civilizados” ( 7 ) .

(2) o informante explica : " Fruta fêmea é curtinha e a fruta


macho é comprida " .
(3) A esteira é o objeto mais importante na religião Umutina .
Atribuem à mesma poderes para ressucitar mortos. Na festa
de culto aos espíritos dos antepass dos a esteira tem um pa
pel preponderante . É muitas vezes mencionada nos mitos
da tribo, ligando - se a ela sempre casos de ressurreição . Na
vida quotidiana é usada para trabalhar e dormir em cima da
mesma . É trançada de palha de buriti . Antigamente não a
trocavam ; hoje é muito difícil obter uma esteira dos Umutina.
(4) povo significa no português do informante umutina a familia
que mora na mesma casa .
(5) E uso das parturientes Umutina dar à luz na mata , encos
tando - se a uma árvore, de preferência uma figueira . Nesta
ocasião é assistida por uma parente feminina .
(6) Habusé, são uma tribo não identificada , muito comentada
pelos Umutina independentes . Afirmam que eram seus vizi
nhos e que dêles apreenderam as numerosas canções e danças
que executam durante as festividades de culto aos espíritos
dos antepassados. Em longas histórias contam peripécias de
encontros amistosos e guerreiros que tiveram com os Habusé .
Dizem que usavam o mesmo modo de atar os cabelos e os
demais adornos usados pelos Umutina . Não sabem onde ino
ram , nunca mais tendo aparecido .
(7 ) A interpretação de serem os “ Civilisados " que sairam da
perna esquerda de Haipucu deve ser muito recente . É pro
SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO 67

"Mas as crianças não quiseram ficar morando na casa do pai.


Ele ( Haipucú ), quando teve os dois casais de crianças foi em
casa dizer à mulher, e a mulher disse : “Porque não trouxe as
crianças ” ?
"Haipucu respondeu : As crianças não querem vir ! - Ai êle
mandou fazer dois Ametá ( 8) para as meninas e dois arcos para
os meninos" .
“ A menina civilizada não se ageitou ( 9) com a sainha, mas
a Habusé ageitou -se” .
" O menino civilizado também não se ageitou com o arco , mas
o Habusé ageitou-se” .
" Haipucú falou para eles ir com ele em casa dêle . Mas eles
não queriam. Queriam ir embora ”.
" Ele então perguntou : Para onde vocês vão ? - Eles fala
ram : Os civilizados para mando do rio Paraguai para baixo ( do
lado esquerdo ) e os Habusé para mando do rio dos Bugres ( 10 )
para cima "
“ Haipucú disse, que podiam ficar junto com ele , que ele teve
o trabalho de carregar “ bruto de barriga de perna” e assim mes
mo eles iam se esparramar no mundo " .
“ Mas, não há notícias destes índios , que dizem , parece se
acabou " .
" Ficaram só os filhos de fruteira junto com ele mesmo" .

Numa outra versão contada pelo mesmo indio, em sua se


gunda parte se nota nitidamente a influência exercida pelo con
tacto com os civilizados sõbre a forma primitiva do mito.
Depois de uma introdução quase idêntica, eliminada nesta
apresentação, na qual sòmente a ordem é invertida, nascendo pri
meiro as crianças da barriga da perna de Haipucú e, depois os
filhos das fruteiras, segue :

vável que a lenda primitiva atribua isto a uma tribo inimiga,


visinha dos Umutina , ou a eles mesmos, os próprios Umutina.
(8) Ametá é uma sala de algodão, usada pelas mulheres Umutina .
E tecida de algodão cultivado e tingida de vermelho com
Uruců . Max Schmidt acredita que apreenderam a confecção
dos seus vizinhos os indios Paressi. Nada indica tal possibili
dade, a não ser o fato de que os Paressi são muito mais hábeis
na confecção de tecidos de algodão .
(9 ) não se ageitou o índio, informante usou a forma " não
ageitou " .
( 10 ) Rio dos Bugres é um afluente direito da cabeceira do rio
Paraguai . Seu nome provém dos Umutina que habitavam
o barranco na confluência com o Paraguai .
68 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

" Quando estava Haipucú , não tinha mundo nem coisa al


guma ( 11) . Ele emendou tôda fruta junto até atingir dois pés,
ai deixa longe dele um tempo . Depois foi vez , ai virou com
panheiro dele"
· Nos primeiros tempos apanhavam nas brigas os civilizados .
Pois não tinham armas . Só tinham porrete e facão e jogavam
frutas de genipapo nos Barbados ( 12 ) . Eles tinham arco e fle
chas e espadas de siriva ( 13 ), e davam nos civilizados " .
" Depois os civilizados inventaram as armas de fogo " ( 14 ) .
Ai , nas primeiras lutas com os Barbados mataram tudo quanto é
indio . Pois estes não sabiam o que estalava, pensando que eram
faíscas . Em lutas seguidas mataram todos , menos um Barbado ,
um homem e uma mulher " .
“ Éste que é o pai dos Umutina de hoje , chamado Tumoniepá,
tendo aí acabado os filhos de Haipucú e das fruteiras ” .
“ Tumoniepá escapou e a outra mulher procurou até achar este
homem , e casou . E aí tiveram filhas e filhos” .
" Aí o pai mandou êles casar com as próprias irmãs ( 14 ) para
aumentar a casa e ai fez mais e mais malocas e muitas aldeias
dos Umutina " .

( 11 ) Esta frase deve ter sido influenciada pela religião christä ,


pois os Umutina não atribuem a Haipucú, senão a criação
dos primeiros homens .
( 12 ) Barbados é apelido dado aos Umutina pelos “Civilizados " .
Pois eles usam um pequeno bigode e cavanhaque , fato aliás
raro entre indígenas .
( 13 ) espadas de siriva são clavas de dois gumes de pesadissima
e dura madeira preta de uma palmeira chamada naquela re
gião de siriva pelos " civilizados " .
( 14 ) “ O pai mandou os filhos casar com as próprias irmās para
aumentar a casa " O casamento entre parentes consanguineos
de ambos os lados em primeiro e segundo gráu é hoje estri
tamente proibido . Antigamente teriam aplicado a pena de
morte aos infratores, se os tivesse acaso havido. Há todavia,
um mito em que “ a lua, que era um homem, seduz a sua
própria irmã . Ambos fogem à perseguição para o ceu , onde
se encontram como a lua e estrela d'alva " .
A ordem expressa para “ se casarem irmão e irmã afim de
aumentar a casa " ainda reforça portanto a proibição exis
tente do incesto , e até do casamento de parentes consangüi
neos relativamente distantes, lançando mão disso como única
alternativa para salvar a tribo quase extinta pela guerra com
os civilizados " .
SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO

ESTATUTOS
DA “ SOCIEDADE AMIGOS DO ÍNDIO "

Devidamente registrados no Quarto Registro de Títulos e


Documentos de São Paulo , sob o Número de Ordem 758, no Livro
A- 1 de Pessoas Jurídicas, e publicados no “ Diário Oficial do
Estado de São Paulo ", de 19 de agosto de 1948 ( número 185 ) .

1
CAPITULO I
DA SOCIEDADE , SEUS OBJETIVOS E DURAÇÃO,
Art. 1.º A sociedade “ AMIGOS DO INDIO ", com sede e foro
na Cidade de São Paulo, é uma sociedade civil, de intuitos não lucra
tivos, nem políticos, nem religiosos .
A sociedade tem por fim :
a) promover e fomentar atividades científicas e artísticas rela
cionadas com o Indio e a sua cultura ;
b ) divulgar, por todos os meios possíveis, os conhecimentos a
respeito do Índio e sua cultura, de modo a torná- los cada
vez melhor compreendidos .
c) cooperar com qualquer instituição ou pessoa que tenha obje
tivos iguais ou similares .
Art. 2.° — A sociedade funcionará por tempo indeterminado o
não se dissolverá por morte de sócios, só podendo ser dissolvida por
três quartos dos votos em Assembléia Geral , especialmente convocada
para este fim .
og unico No caso de dissolução da Sociedade, caberá à Ag
sembléia Geral resolver sobre o destino do patrimônio líquido que,
em caso algum , poderá resultar em proveito dos sócios : coleções, ar
quivos, etc. por princípio não serão separados ou divididos, podendo
ser doados globalmente ou em partes integrais, a instituição ou insti.
tuições que, a critério da Assembléia Geral , melhor uso possam fazer
dêles .
CAPITULO II
DOS SOCIOS E SUAS CATEGORIAS
Art. 3.° — São as seguintes as categorias de sócios :
a ) fundadores
b ) honorários
efetivos
beneméritos
correspondentes
$ 1.º São sócios fundadores os que participaram da “ Assem
bleia Geral Constituinte" .
$ 2.0 São sócios honorários pessoas de merecimentos reco
nhecidos pela causa do Indio, distinção que só poderá ser conferida
pela Assembleia Geral , por proposta da Diretoria .
$ 3.° -- São sócios efetivos os que se comprometerem à contri
buição regular e à devida colaboração .
$ 4.0 São sócios beneméritos pessoas que aderirem à Socie
dade com um múltiplo da contribuição regular .
$ 5.0 São sócios correspondentes os domiciliados fora de São
Paulo e que apoiem a Sociedade .
70 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CAPITULO III

DOS DIREITOS E OBRIGAÇÕES DOS SOCIOS


Art. 4.° São direitos dos Sócios uma vez quites com &
Sociedade :
a) assistir As Assembleias Gerais e tomar parte em todas as
discussões e dellberações destas ;
b ) votar ;
c) ser votado para os cargos da administração;
$ 1.0 Aos socios fundadores cabe, ademais, o direito de par
ticipar e votar nas deliberações da Diretoria .
$ 2.0 Os sócios , em caso algum, têm direito à participação
pessoal do patrimônio da sociedade .
Art. 5.9 São deveres dos sócios;
a ) cumprir estes estatutos e as resoluções da Asembléia Geral
da Diretoria ;
b ) exercer com zêlo as funções para as quais forem designados;
c ) comparecer as Assembléias Gerais ;
d ) pagar pontualmente as contribuições fixadas .
Art. 6.° Será excluido o sócio que :
a ) deixar de pagar suas contribuições durante seis meses sem
motivo considerado justificável pela Diretoria ;
b ) violar estes estatutos ou comportar-se de forma considerada
prejudicial aos interesses da Sociedade .

CAPÍTULO IV
DA ADMINISTRAÇÃO
Art. 7.º - A Sociedade será administrada e representada , ativa
o passiva, judicial e extrajudicialmente, pela sua Diretoria, a qual
será constituida de 8 ( oito) membros, devendo os mencionados nas
letras b, c, d, serem domiciliados na cidade de São Paulo :
a ) um Presidente Honorário ;
b) um Presidente em Exercício ;
c) dois Vice - Presidentes ;
d ) quatro Diretores .
$ único : Atos de rotina administrativa serão válidos desde
que assinados por dois ( 2 ) membros da Diretoria . Atos que importa
rem numa responsabilidade da Sociedade só serão válidos quando as
sinados pelo Presidente em Exercício , em conjunto com mais dois ( 2 )
membros da Diretoria .
Art. 8º. Cabe à Diretoria, além da administração e represen
tação da Sociedade :
a ) admissão dos sócios efetivos e correspondentes e nomeaçãı
de sócios beneméritos ;
b ) a proposta dos sócios honorários a qual será aprovada pela
Assembléia Geral ;
c) a exclusão de sócio do quadro social;
d ) a convocação das Assembléias Gerais .
Art. 9.° A Diretoria, eventualmente reforçada por sócios fun
dadores, conforme o artigo 4. ° $ 1.º, tomará suas resoluções com nunca
menos de três de seus membros, por maioria absoluta de votos, exceto
as que dizem respeito à exclusão de sócios, as quais demandarão, três
quartos dos votos . Nas votações por maioria caberá ao Presidente da
sessão o voto de desempate .
SOCIEDADE AMIGOS DO INDIO 71

Art. 10. O mandato da Diretoria será por dois ( 2 ) anos ,


podendo serem roeleitos os seus membros .
Art. 11.0 Em caso de vaga na Diretoria , a Assembleia Gera )
nomeará os substitutos para o período ainda restante .

CAPITULO V
DAS ASSEMBLEIAS GERAIS
Art, 12.º - As Assembléias Gerais realizar -se -ão :
a) anualmente , dentro dos quatro primeiros meses ;
b) sempre que pelo menos dez ( 10 ) associados, quites com as
suas contrituições, o requererem por escrito , em oficio diri
gido à Diretoria , especificando o assunto a ser tratado, exi
gência que deverá ser atendida dentro do prazo de um mês ;
c) por convocação da Diretoria, sempre que a mesma achar
necessário .
$ único As Assembléias Gerais decidirão, em primeira convo
cação com a presença da metade dos sócios quites. Não havendo Esse
número, reunir-se- ão meia hora depois, em segunda convocação, re
solvendo, então, por maioria simples de votos .
Art. 13.° Cabe às Assembléias Gerais :
a) deliberar sobre os relatórios da Diretoria sobre o andamento
dos trabalhos a seu cargo ;
b ) tomar conhecimento do Balanço Anual da Sociedade ;
en

eleger e dar posse aos membros da Diretoria ;


reformar os estatutos mediante proposta da Diretoria ;
e ) nomear sócios honorários ;
f ) fixar as contribuições periódicas dos socios;
8) deliberar sobre os assuntos, objetos de discussão, de confor
midade com o Artigo 12.º, letras b ) ec ) dêste estatuto ;
h ) resolver sobre a dissolução da Sociedade, segundo o que dis
põe o Artigo 2,0 ;
i) determinar , em caso de dissolução da Sociedade, o destino
do patrimônio , de conformidade com o artigo 2.0 § único .
Art. 14.° Salvo os casos de reforma dos estatutos, de dissolu
são da Sociedade e da distribuição consequente de seu patrimônio e da
nomeação dos sócios honorários que demandarão três Assembléias Ge
rais requererão apenas maioria absoluta de votos cabendo ao Presi
dente da respectiva Assembléia o voto de desempate .
Art. 15.º É admitido o voto por procuração, especial, outor
gada por escrito .

CAPITULO VI
DA ADMISSÃO E EXCLUSÃO DOS SOCIOS
Art. 16.0 Poderão ser Sócios pessoas de ambos os sexos, inte
ressadas nos problemas do Indio .
A admissão de sócios efetivos e beneméritos far-se - á mediante
proposta preenchida pelo interessado, apresentada por dois sócios e
aprovada pela Diretoria em escrutinio secreto .
o indeferimento eventual do pedido será comunicado apenas ao
interessado , sem menção dos motivos .
Art . 17.° - A exclusão de um sócio será determinada em sessão
da Diretoria, após o interessado ter sido ouvido pela mesma . O motivo
da exclusão será comunicado apenas ao interessado .
72 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

CAPITULO VII
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 18.0 O ano legal será o ano civil .
Art. 19 . Os associados não respondem quer solidária , quer
subsidiàriamente , pelas obrigações contraidas pela Diretoria .
Art. 20.0 Estes estatutos foram aprovados pela Assembléia
Geral Constituinte de 8 de Junho de 1948, e entrarão em vigor ime
diatamente , ficando 'a Diretoria autorizada a registrá - los em Cartório
do Registro de Pessoas Jurídicas.

Endereço da “ Sociedade Amigos do Indio " :


São Paulo, Largo de São Francisco , 19 - 2. ° andar ( Prédio
da Escola de Comércio “ Alvares Penteado " ) .
Endereço telegrafico : "Indioamigos São Paulo ".

AMIGOS DO ÍNDIO SOCIEDADE CIVIL

A Diretoria da Sociedade reune- se, todas as Quartas -feiras,


das 18,30 às 19,30 horas, no sótão da " Escola Álvares Penteado " ,
Largo São Francisco , 19 - 2º andar , fone : 2-7974 .
Os sócios e os interessados em geral, que desejarem se co
municar com membros da Diretoria ou obter informações, poderão
procurá -los no local e na hora acima indicadas .
Todos os dias úteis, das 10 às 11 e das 15 às 17 horas, o
Sr. Jaime Muller, na Secretaria da " Escola Livre de Sociologia
e Política ”, atende aos interessados , dando e recebendo informa
ções relativas à Sociedade .
A correspondência deve ser dirigida à " Sociedade Amigos do
Índio ", São Paulo Capital , Largo de São Francisco , 19 – 22 .

Para dirigir os destinos da Sociedade foi eleita a seguinte


diretoria :

Presidente de Honra : General Candido Mariano da Silva


Rondon
Presidente : Carlos Borges Teixeira
Primeiro Vice - Presidente : Harald Schultz
Segundo Vice - Presidente : Mario Miranda Rosa
Diretor Secretário -Geral: Francisco Bayerlein
Diretora Secretaria : Ashtar de Assis
Diretor -Conselheiro : Florestan Fernandes
PUBLICAÇÕES
PUBLICAÇÕES

ESTUDO ESTATÍSTICO DE O autor explica, no prefácio ,


porque o estudo incidiu sobre to
ADOLESCENTES DA dos os alunos do curso secunda
CIDADE DE SÃO PAULO rio : falta- nos o conhecimento de
certas características da popula
ção, sem o qual é impossível a
: o trabalho “ Contribuição para manipulação de amostras. O re
o Estado de Algamas Caracterís gistro obrigatório dos dados que
ticas Sociais Biométricas de interessavam ao autor, nos giná
Adolescentes da Cidade de São sios da Capital, tornou viável a
Paulo , alunos do ensino secundá pesquisas em semelhantes condi
rio", de autoria de Milton da Silva ções. “ Tais registros constituem ..
Rodrigues ( com a colaboração de se de fichas individuais em que,
seus assistentes Maria da Concei no início de cada ano letivo , se
ção Almeida Dias Baptista e Ju lançam algumas informações de
dith Kallier Lisboa Dias ) , publi ordem geral , tais como sexo, ida
cado como Boletim da Faculdade de, nacionalidade, etc. , a respeito
de Filosofia, Ciências e Letras da do aluno e, semestralmente, re
Universidade de São Paulo, cons sultados de mensurações de pêso,
titui uma tentativa de pesquisa estatura , perímetro torácico, etc..
das características sociais, escola Além dessas fichas, consultamos,
res e biométricas de adolescentes, para outros dados, os registros de
alunos do ensino secundario da matrícula mantidos pelas secre
cidade de São Paulo . Seus dados tarias dos ginásios ” ( pg. 1 ) . Os
foram tomados em 1942 , compre resultados das pesquisas possuem
endendo um total de 20.852 in grande interesse pedagógico, pois
divíduos de ambos os sexos ( cf. permitem considerar, além da dis
pg. 85 ) . E ' o trabalho mais com tribuição dos ginásios na capital,
pleto e rigoroso que foi feito em vários problemas da vida escolar
nosso país, até o presente, sobre dos alunos, como a distribuição
características antropométricas de por série, sexos e idades e a dis
adolescentes , tribuição pela nacionalidade dos
70 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

avos, bem como as características ESTUDOS


biométricas da população escolar
investigada ( estatura, pêso, indice LATINO - AMERICANOS
ponderal, perímetro torácico, in
dice cefálico ) . Continuando a série conhecida
Quanto ao caráter da contribui sob O título de Latin - American
cão, o próprio autor indica as li . Studies, patrocinada pelo Instituto
mitações dos dados compulsados de Estudos Latino - Americanos da
e o alcance dos resultados obti Universidade de Texas, saiu a
dos . “ Todos os dados biométricos quinta publicação editada nessa
aquí aproveitados são, natural . coletânea de monografias e en
mente, medidas sujeitas a erro . sáios, dedicada a aspectos educa
O fato delas terem sido tomadas cionais e antropológicos da Amé
por especialistas é garantia su rica Latina : “ Some Educational
ficiente da ausência de erro sis and Anthropological Aspects of
temático . Além disso , tendo tido Latin America . Papers read in a
cuidado de usar dessas medidas lecture series dealing with some
sempre com um grau de aproxi educational and anthropological
mação inferior à quêle com que aspects of Latin -America ; spon
elas foram tomadas, parece- nos sored by the Institute of Latin
que estamos suficientemente ga American Studies of The Univer
rantidos contra as flutuações pro sity of Texas ", Imprensa da Uni
venientes da multiplicidade de pes versidade do Texas, 1948. A pu
soas que afetuaram as medidas" blicação abrange os seguintes
( pg.1 ) . Doutro lado, salienta que ensaios: Harold Benjamin , Sar
a significação dos resultados obti miento, The Educator ( pgs. 7-16 ) ;
dos apenas diz respeito “ exclusi I. L. Kandel, Education in Latin
vamente a uma porção seleta da America ( pgs. 17-26 ) ; Ernesto
população de adolescentes da ci Galarza, New Molds for Latin
dade de São Paulo ", pois inclui American Youth ( pgs. 27-37 ) ;
somente “ aqueles que são alunos Erna Fergusson , The Individual's
de ensino secundario " ( pg. 2 ) . Role in the Pan American Pro
Parece- me desnecessário salien gram ( pgs. 38-47 ) ; Donald D.
tar 0 valor desta contribuição, Brand , The Present Indian Popu
para o conhecimento das caracte lation of Latin American ( pags.
rísticas antropométricas dos ado 48-55 ) ; Alfred L. Kroeber, Art
lescentes em nossa sociedade. Styles in Prehistoric Peru ( pgs.
Gostaria de assinalar, no entanto , 56-79 , contendo 14 ilustrações ) ;
a importância da orientação se Paul Kirchhoff, Civilizing the Chi
guida pelo Departamento de Es chimecs : A Chapter in the Culture
tatística da Faculdade de Filoso History of Ancient Mexico ( pgs.
fia, Ciências e Letras : as pesqui 80-85 ) .
F. F.
sas deste tipo representam o que
de melhor os estatísticos podem
oferecer como contribuição para
o conhecimento do meio em que
vivemos. Combinando as investi POPULAÇÃO ABORIGENE DO
gações puramente teóricas ensaios MEXICO NO SÉCULO XVI
como este, de estatística aplicada,
os especialistas que operam no
aludido órgão de ensino e de pes Uma meticulosa investigação
quisa de estatística correspondem historica foi feita por Sherburne
ao complexo e elevado padrão de F. Cook e Lesley Byrd Simpson :
trabalho universitário . The Population of Central Mexico
in the Sixteenth Century, Univer
F. F. sity of California Press, Berkeley
PUBLICAÇÕES 77

and Los Angeles, 1948 ( VI + 242 meiro volume acaba de ser posto
pgs. com ilustrações ) ; a publica em circulação . A direção desta pu
ção faz parte da coleção fbero . blicação foi atribuida , a J. Im
Americana, de que são editores belloni, nome consagrado nos cfr
Carl O. Sauer, Lawrence Kinnaird culos etnológicos da América do
e Arturo Torres- Rioseco. Uma Sul . Este autor consigna a se
excelente documentação inédita guinte explicação do vocábulo :
levou os autores a reexaminar o “ Runa , como todos sabem , é a
problema da população aborigene pa'lavra que na língua do Peru
no México na época indicada. No antigo , o Runasimi, significa “ Ho
trabalho é analisada a documen mem E ' plausível que adote
tação estatística disponível e são mos seu equivalente do idioma
cuidadosamente discutidas as es Runasimi, que foi a mais alta lini
timativas a respeito das tendên gua de cultura da América do
cias de desenvolvimento da po Sul " ( pg. 7 ) .
pulação entre 1519 e 1600 ( 1519 , O presente volume de Runa
1540-1570, 1597-1610 ) , cujo decli contém os seguintes trabalhos ori .
nio é impressionante. Quanto às ginais : Osvaldo L. Paulotti, Los
mudanças subsequentes, os auto Toba ; contribución a la somato
res indicam dados relativos a logia de los indigenas del Chaco
1650 e 1793. Em apêndice, são ( pgs. 9-96 ) ; Tibor Sekely, Ex
fornecidas as tabelas relativas à cursión a los Indios del Araguaia
população aborígene em 1565 , a ( Brasil ) , (pgs. 97-110 ) ; Osvaldo
lista alfabética das comunidades F. A. Menghin , Migrationes Medi
nativas do México Central no sé . terraneas ; origem de los Ligures
culo XVI e o índice numérico do Ibéros . Aquitanos y Vascos ( pgs .
mapa de distrbuição das comuni 111-195 ) ; J. Imbelloni, De la Es
dades nativas do México Central . tatura Humana ; su reivindicación
O interesse de semelhante es como elemento morfológico y cla
tudo é evidente . O conhecimento sificatorio ( pgs. 196-243 ) . As res
positivo do desenvolvimento da co tantes oitenta páginas da publi
lonização da América e das con cação são dedicadas a extratos e
dições de contacto entre brancos contribuições, a resenhas e noti
e nativos dependem estreitamente ciáros . Cabe - nos desejar amplo
de estudos deste tipo, meticulosos sucesso e continuidade à nova e
e bem documentados. Por este importante publicação de antro
prisma é que se deve considerar pologia .
o valor do modesto trabalho de F. F.
Cook e Simpson .
F. F.

FOLKLORE DOMINICANO

PUBLICAÇÕES DE. o importante trabalho de Ma


nuel José Andrade sõbre o fol
ANTROPOLOGIA
clore dominicano ( " Folk - lore from
Dominican Republic " . publ. da
A Revista do Arquivo Municipal American Folk -Lore Society , voi.
tem 0 grato prazer de assinalar XXIII , 1930 ) , foi recentemente
a criação de mais um órgão la traduzido para o castelhano e edi
tino -americano de antropologia . tado pela Universidade de Santo
Trata -se de “ Ruma. Archivo para Domingo : Folklore de la Repy : b !i .
las Ciencias del Hombre " , publi ca Dominicana , Ciudad Trujillo ,
cação do Instituto de Antropolo 1948. A tradução das partes es
gia da Faculdade de Filosofia y critas em inglês foi feita por Al
Letras de Buenos Aires , cujo pri fonso Alfau Galván, estando a
78 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

edição da obra entregue aos cui como o homem fossil mais antigo
dados de Juan Francisco San e preservado, descoberto na Amé
chez, que enriqueceu a obra com rica do Norte ou Central: Tepes
algumas anotações . Sobre o ca pan Man , The Viking Fund Inc.,
ráter destas, escreve 0 editor : New York , 1949 ( 160 pgs ., ilus
“ Algumas correções e esclareci trado com mapas e gravuras ) .
mentos foram introduzidos por O volume contém uma introdução
meio de notas, para eliminar êr e uma análise do homem primi.
ros, omissões ou må interpreta tivo no México, feita por Helmut
ções, inevitáveis em um trabalho de Terra ( pgs. 13-86 ) ; uma ana
feito por um estrangeiro que tri. lise dos aspectos físicos do Ho
Ihava um caminho quase inexplo mem de Tepexpan , realizada por
rado, pois os estudos folclóricos Javier Romero (pgs. 87-117 ) ;
em nosso país são de recente or uma análise comparativa entre o
ganização, tendo tomado caráter Homem de Tepexpan e outros fós
científico com a criação da Sec seis americanos, desenvolvida por
cão de Linguistica e Folclore, T. D. Stewart ( pga. 137-145 ) ; e
adstrita à Faculdade de Filosofia cinco apêndices, entre os quais
desta Universidade ” ( pg. VII ) . se salientam as comunicações de
O trabalho de Manuel José An Franz Weidenreich e T. D. Stewart
sobre os caracteres anatômicos do
drade é sobejamente conhecido,
dispensando comentários. Inician Homem de Tepexpan ( pags. 123
do a publicação de sua obra, a 124 e 125-126 , respectivamente ) ;
Universidade de São Domingos a análise de Samuel Fastlicht so.
bre os maxilares do Homem do
realiza uma empresa de mérito o
Tepexpan (pg8. 127-129 ) ; as im
de justiça, ao mesmo tempo que pressões de C. J. Connoly sobre
dá uma lição inegável aos insti
tutos congêneres latino -america a caixa craneana do 16 ssil recons
nos . São numerosas as obras que truido ( pgs. 130-131 ) ; e os testes
poderiam ser reeditadas por estes de William S. Langhlin sobre a
presença de grupo de substancias
institutos, segundo a forma pela
sanguíneas no esqueleto do Ho .
qual está sendo feita pela Secção
de Linguistica e Folclore daquela mem de Tepexpan ( pgs. 132-135 ) :
Unversidade com anotações e O escultor Loo Steppat executou,
tomando por base os resultados
correções indispensáveis. No Bra
sil, onde os estudos dessa natureza das investigações científicas, uma
reconstrução plástica do Homem
se desenvolvem por assim dizer
de Tepexpan , apresentada em fo
à revelia da iniciativa oficial, im togravura no frontespício da obra .
põe -se uma reflexão sõbre tal
acontecimento , pois muitas são as Seria inútil ressaltar a importàn
obras que merecem semelhante cia desta contribuição, quer em
destino . virtude das felizes circunstâncias
F. F. que rodearam a descoberta do
fossil e sua exploração científica
( cf., a respeito, as considerações
de Stewart, pg. 139 ) , quer em
O HOMEM DE TEPEXPAN virtude da orientação metodolo
gica adotada pela equipe de cien
tistas, que realizaram a análise
Na coleção de publicações an da região , dos dados arqueoló
tropológicas do Viking Fund saiu gicos encontrados e a reconstru
recentemente uma obra de cola ção do fóssil, quer em vista de
boração, em que Helmut de Terra, suas consequências com relação
Javier Romero e T. D. Stewart as pesquisas de antropologia fi.
expõem os resultados de suas pes sica nas Américas.
quisas sobre o Homem de Tepex
nar . considerado de Terra
PUBLICAÇÕES 79

O “ GRUPO DE ASCENDENCIA familia e do proprio tuu são on


caradas como parentes por afl
COMUM ” NA CHINA
nidade e exclusivamente sob cir
custancias especiais podem ser
O estudo da organização dos admitidas ao tsa do marido . Atra
grupos domésticos atrái cada vez vés de rituais, desenvolvidos em
mais a atenção dos etnologos e Honra do primeiro ancestral e
dos sociólogos contemporâneos. A dos ancestrais remotos , os laços
tendência para a investigação dos de parentesco e os llames de so
sistemas de parentesco de socie lidariedade grupal são atualizados
dades particulares ou dos segmen e intensificados . A seguinte expla
tos sociais que os compõe acen nação do autor situa claramente
0 tsu no sistema de parentesco
tua-se como uma das tendências chinês : “ Embora o tsu , como o
dominantes nas ciências socais,
enriquecendo -se com isso 0 CO chia , ou familia , e o círculo de
nhecimento que possuímos dessa parentes em luto seja organizado
esfera das relações humanas . En sobre laços de parentesco, ele di
fere de ambos tanto em sua fina
tre as contribuições recebidas pelo
comentarista desta secção, merece lidade quanto em suas funções. O
especial referência a obra de chia , que abrange pais, filhos e
Hsien Chin Hu : The Common netos, com ou sem os seus depen
Descent Group in China and Its dentes imediatos, funciona como
uma unidade econômica e de edu
Functions ( Viking Fund Publi.
cations in Anthropology, Number cação dos imaturos. O círculo dos
parentes em luto, que compreende
Ten , New York, 1948 ; 204 pgs .,
com ilustrações ) . Trata -se de uma todos os descendentes de um tri
investigação bem delimitada, pois savo, não possui propriedade co
mum , e como organização é me
o objeto do trabalho é circunscrito nos permanente e formal , embora
a um dos segmentos do sistema se espere que os membros do
de parentesco chinês, o tsu , ana
lisado em sua organização, quanto mesmo círculo mantenham inte
rêsse pelo bem estar dos demais
as suas funções e quanto à forma
e sejam obrigados a se ajudarem
de integração do mesmo à socie mutuamente de várias maneiras .
dade chinesa . A base empirica
Otsu é um clã patrilinear, In
manipulada pelo autor provém de
várias fontes : as genealogias tsu ; cluindo todos os que descendem
documento's e escritos antigos, do mesmo ancestral remoto. Ge .
ralmente, concentram-se em uma
que remontam 600 anos a partir vila ou vizinhança, ainda que as
da época atual ; e informações vêzes se espalhem sobre uma área
fornecidas por contemporâneos,
mais extensa . Comparado com O
cujas informações e experiências
chia , sua organização é mais am
pessoais puderam ser aproveitadas pla e menos rigida . As familias
pelo autor . pertencentes ao tsi possuem pro
Otsu constitui um " grupo de priedade em comum , mas esta
ascendência comum " . Como sa
destina-se antes a fins religiosos ,
lienta o autor, não se confunde educacionais e de amparo , do que
com o clã, embora seja comu
mente definido dessa maneira na à subsistência . Mais estreita e for
malmente organizado que o cír
literatura sobre a China, A ascen
dência dos membros do grupo, culo de parentes em luto, o teu
possui terras e uma escola para
que abrange somente os indiví. aproveitamento comum, uma
duos que descem de um mesmo “ câmara dos ancestrais ” ( 1 ) , onde
ramo patrilinear, é traçada até
um primeiro ancestral, estabele (1) Assim traduzi " ancestral ball " ; o
cido em determinada localidade. autor informa que as familias ri
As moças casadas fora da própria cas dispõem de “ câmaras dos an
80 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

são oferecidos os sacrificios aos trutura comunitária , e sua conexão


ancestrais, são celebradas as con com as “ eras ” de cada forma es .
3 trutural. O autor pretériu , no
ferênciats relativas aos negócios
do tsu e são resolvidas as disputas entanto , deixar de lado uma ten
eñtre os membros do tsu " ( pg. tativa aparentemente tão promis
9) . sora de verificação da teoria de
O autor analísa a organização Tönnies, limitando -se a uma sim
do tsu (pgs. 14-30 ) , a veneração ples ' referência dos dois conceitos
do ancestral ( pgs. 31-40 ) , as ge à situação social investigada .
nealogias ( pgs. 41-52 ) , os poderes
judiciários do tsu ( pgs. 53-63 ), a
propriedade comum do tsu (pgs .
64-90 ) , as relações entre os tsu
( pgs. 91-94 ) . As conclusões (pgs. UM ESTUDO . ETNOLOGICO
95-100 ) rematam teòricamente o
trabalho. Contudo, uma sequência SOBRE OS KASKA
de 62 apêndices contém a prin
cipal documentação empírica da
obra, completada por um glossá A bibliografia etnológica foi en
rio de termos chineses. A contri riquecida com uma monografia
buição de Hsien Chin Hu aos es sôbre os Kaska, de autoria de
tudos sobre sistemas de parentes John J. Honigmann : Culture and
co é deveras importante, em vir Ethos of Kaska Society, Yale Uni
tude da delimitação do objeto e da versity Publications in Anthropo
límpida análise que realizou do logy, N.° 40 , New Haven , Yalo
problema. Sua conclusão mais ge University Press, 1949 ( 368 pgs.,
ral sublinha muito bem o método com ilustrações ) . A monografia
que orientou a exploração dos da. foi apresentada em 1946 à Uni.
dos e a exposição dos resultados versidade de Yale, como tese de
da investigação : “ em síntese, a doutoramento em filosofia. O ma
organização do tsu é um produto terial exposto foi redolhido em
da antiga sociedade chinesa . Co pesquisa de campo realizada em
mo os velhos padrões da sociedade 1945 pelo autor, cujo relato sobre
chinesa continuam a desintegrar as peripécias por que passou na
se a desaparecer, parece que preparação e no desenvolvimento
subsistem limitadas possibilidades da pesquisa e sobre os dramas de
de sobrevivência do tsu " ( pg. 99 ) . ordem intelectual que enfrentou
Contudo, as manipulações do par na manipulação e na interpreta
de conceitos de Tönnies (Ge ção das teorias e dos dados de
meinschaft e Gesellschaft) são fato ( cf. prefácio e introdução ) ,
pouco penetrantes e convincentes. possui a minúcia habitual em tra
Focalizando a transformação de balhos deste gênero .
uma forma social no tempo , 0 O autor, como indica o próprio
autor dispunha de um bom cam título do trabalho , preocupou - se
po para aproveitar a “historici . por duas espécies de problemas:
zação " operada em seus conceitos a cultura e o ethos entre os
pelo sociólogo alemão : a emer
Kaska . Sua contribuição coloca
gência da estrutura societária , em se, assim , sob o marco das mo
conseqüência da destruição da es dernas tendências da etnologia, de
análise das bases pisíquicas da
cestrais com três salas , enquanto cultura e dos fundamentos cul
outras mais pobres possuem ape turais da personalidade . A in
nas um quarto à parte ou utilizam formação teórica indicada pelo
para os ritos a principal sala da
residência . A gravura 1 ilustra autor ( cf. introdução e apêndice
uma câmara do primeiro tipo ( pgs. B ) , é rica e variada, revelando a
32-88 ) . intenção de definir com clareza e
PUBLICAÇÕES 81

precisão o objeto da investigação, feita com segurança , objetividade


os conceitos empregados e os mé e penetração, atributos aprecia .
tpdos utilizados quer na inter veis quando combinados em um
pretação dos materiais, quer na mesmo trabalho . E a contribuição
exposição dos resultados obtidos. ao estudo do ethos da personali
Quanto à descrição da cultura dos dade e da cultura daqueles abo
Kaska, o autor agrupou os dados rigenes é digna de nota , embora
de acordo com a natureza adap a documentação empírica e os re
tativa ou integrativa dos compor sultados globais da investigação
tamentos observados . Por isso, as sofram no cotejo com contribui.
três divisões desta parte da mo ções da mesma natureza, feitas
nografia são referidas sob os se por outros especialistas. Contudo,
guintes tópicos : “ cultura técnica " , o trabalho contém alguns sendes
em que trata da adaptação dos lamentáveis, espcialmente toman
Kaska ao meio natural circun do -se em consideração o seu alto
dante ( pgs. 54-123 ) ; “ cultura so nível científico . Neste comentário,
cial", em que examina os proces terei que me limitar a alguns
sos integrativos através dos quais dêles .
os Kaska ajustam - se uns aos ou A preocupação de qualificar as
tros e ao meio social herdado ( pgs. diferentes esferas da cultura ( “ cul
124-212 ) ; " cultura ideacional ", em tura técnica " , "cultura social ",
que estuda as idéias e as atitudes “ cultura ideacional" ) , ressente-se
dos Kaska diante do sobrenatural , de fundamento 16gico . A inade.
da natureza e do meio social ( pgs. quação dos qualificativos é evi
213-248 ) . Quanto ao ethos, o autor dente , e as confusões a que eles
procurou combinar a aplicação de dão origem justificam sérias apre
várias técnicas e métodos de pes ensões . Se outros especialistas e
quisa , de modo a lidar igualmente os estudantes adotarem esses con
com os aspectos emocionais do ceitos, o que é provável, pelo me
comportamento e com os fatores nos em círculos limitados, da
que os determinam . A inspeção, contribuição do autor sairá um
por meio de Rorschach, mostrou resultado negativo . A mesma pre
ao autor que os Kaska, como um ocupação evidência a tendência
todo, “ posuem um razoável gráu " atomizadora ”, que aliás está im
de homogeneidade". Nesta parte pregnando também a orietanção
do trabalho, consegue estabelecer metodológica de outros especialis
as motivações dominantes da per tas contemporâneos, a que adere
sonalidade do Kaska, a autovisão a marcha da investigação seguida
e a cosmovisão dêstes nativos, e pelo autor . Em particular, a se
o desenvolvimento dos ethos em paração analítica das questões re
sua sociedade ( cf. pgs. 249-315 ) . lativas à cultura e ao ethos re
Uma análise especial dêstes abo pousa em bases artificiais. Por
rígenes ( pgs. 31-53 ) , e dois apên fim , é pena que Honigmann, que
dices, relativos sõbre personali revela 0 conhecimento de uma
dade recolhidos pelo autor e ao extensa bibliografia especializada ,
conceito de ethos ( pgs. 316-356 e tenha ignorado a contribuição de
357-359 , respectivamente ), com J. Stuart Mill. Quaisquer que se
pletam a monografia . jam as restrições que se possam
Sem dúvida alguma, a con fazer ao autor inglês, é inegável
tribuição de Honigmann situa-se que o Livro VI de A System of
entre as monografias recentes Logic representa uma das poucas
mais importantes, dedicadas ao es tentativas de fundamentação 16.
tudo de uma sociedade particular. gica da “ ethologia ” . As reflexões
A descrição das diferentes partes de Stuart Mill sõbre o problema
da cultura e do sistema organiza do método em semelhantes inves
tório da sociedade investigada é tigações , particularmente , enrique
82 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

ceriam e alargariam , se aproveita como se fossem pessoais, vários


das, o aparato teórico por meio “ contos populares " europeus que
do qual os etnologos hodiernos lhe agradaram , por ôle conhecidos
procuram abordar o assunto . A durante suas viagens . J. Wesley
ressalva de que suas reflexões te Childers empreendeu esse traba
riam “ va'lor ” somente com rela lho, dado a lume na coleção de
são as sociedades ocidentais é im publicações da Universidade de
procedente : pois compete ao eg Indiana ( N.º 5 da Série de Fol
pecialista a tarefa de determinar klore ) : Motif- Index of the “ Cuen
as condições de tratamento sis tos" of Juan Timoneda , Bloomin
temáico do fenômeno em outras gton , Indiana , 1948 ( XVI + 58
sociedades . pg8 . ). Segundo o autor, “ o pre.
F F. gente índice de temas das três
coleções de cuentos de Timoneda,
é o ponto de partida da obra de
classificação dos contos espahois
OS CONTOS DE JUAN de acordo com o Motif - Index
TIMONEDA : UMA of Folk - Literature do professor
Thompson ( 1 ) . Espera -se que ou
OONTRIBUIÇÃO tros índices semelhantes se segui
rão, até que eventualmente o con
BIBLIOGRAFICA AO teúdo da literatura espanhola
FOLCLORE esteja classificado uniformemente
para referência acessível ” .
F. F.
A idéia de realizar um indice
dos temas dos contos de Juan (1) Stith Thompson , Motif - Index of
Timoneda possui certo interesse Folk - Literature (6 vols .) , Indiana
para 08 folcloristas, pois o escri . University Studies, Bloomignton ,
tor espanhol adaptou, publicando 1982-1936 .
DOCUMENTAÇÃO
1
1

1
ORDENS RÉGIAS

( 1737 a 1757 )

N.° 26 Registo de huma carta do nimo. Exmo .


Snr. Gnal, desta Cappnja , com a qual remeto huma ordem
de S. Magde, para ser registada nos livros deste Sennado
sobre as Sesmarias de terras que se devem conceder abg
sesmeyros como abaixo se declara o ceguinte .

Carta //
Pella copia da real ordem que com esta remeto a vinces. consta ordena
S. Magestade o que se deve praticar a respeito dos gastos que os ouvidores
costumão fazer a esse Senado. o que participo a vmces , para que na con
formidade da referida real ordem asim a fação executar . Acompanhada
digo acompanha tambem a esta copia da real ordem pella qual he o dito
senhor servido detreminar que sejam ouvidas as Cameras nas cartas de
Sesmarias que se passarem , e para que a todo o tempo conste o que na
dita ordem se determina farão vmces. logo registrar nos livros do Sennado
remetendo me certidão por duas vias de como asim o executarão . Deos
guarde a vmces , muitos annos villa de Santos onze de setembro de mil se
tecentos e quarenta e quatro // Dom Luiz Mascarenhas // Snres. officiaos
da Camera da cidade de Sam Paulo //

Copia Ordem de S. Magde.


Dom Joam por graça de Deos Rey de Portugal e dos Alges. da quem
e dalem mar em Africa Snr. de Guiné & . Faço saber a vos governador a
cappitam general de Sam Paulo que havendo visto a carta que me deo o
governador que foi desta cappitania Antonio da Sylva Caldeyra Pimentel em
carta de dezoito de Abril de mil settecentos e trinta sobre haver observado
que a Sezmaria que eu confirmava nessa mesma Capitania e não só de mesa
legoa ainda que os governadores dessem mais exttenção aos sesmeiros aos
quaes se seguia prejuizo desta restricção que só podia ter lugar no caminho
das minas, fui servido determinar por rezolução de quinze de março de mil
e setecentos e trinta e hum em consulta do meu Concelho ultramarino que
as sesmarias que se houverem de dar nas terras donde houverem minas, e
86 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

nos caminhos para ellas, sejam somente de meya legoa em quadra, e que
no mais Certão sejão de tres legoas como está determinado, e que para as
ditas Sesmarias se concederem sejão tambem ouvidas as Cameras dos citios
a que ellas pertenção, e as que se derem nas margens dos rios caudalozos
que se forem descobrindo pellos certoens, e nessecitão de barca para se atra
vessarem se não dem sesmarias mais que de hua só margem do porto, e
que da outra se escreve ao menos meya legoa para ficar em publico ; e por
que convem ao meu serviço, que se cumpra esta minha resolução. Me
parceo ordenar vos que com effeito a executeis asim por virem alguas cartas
de Sesmarias sem as Camaras a que toca serem ouvidas, tendo entendido
que de outra sorte se não hão de confirmar; e para que a todo o tempo
conste desta minha real ordem a mandareis registar nas Camaras da vossa
jurisdição, remetendo me digo jurisdição remetendo certidãm dos escrivaes
dellas de como asim se tem executado ; El Rey nosso senhor o mandou por
Alexandre de Gusmão, e Thomé Joaquim da Costa Corte Real concelheyros
do seo Concelho Ultramarino e se passou por duas vias Theodoro de Abreu
Bernardes a fez em Lxa . a quinze de Abril de mil e setecentos quarenta e
quatro o secreto . Manoel Caetano da Lavře a ' fez escrever Alexandre de
Gusmão // Thomé Joaquim da Costa Corte Real // E não se continha mais
na dita carta do Ilmo. e Exmo . Snr . Gnal. Dom Luiz Mascarenhas, copia
da ordem de S. Magde. que aqui fiz registar bem e fielmente dos prios ( 1 )
originaes que ficão no archivo da Camera a que me reporto Sam Paulo
vinte e seis de 8bro . de 1744 // annos e eu Manoel da Lus Silveyra escrivão
da Camera que o - sobscrevy asiney, e confery, Mel . da Lus Silveyra
Comfo . pr . mim Silveyra .

N.° 27 Registro da ordem de s . Magde , mando .


aqui registar por ordem do Ihmo . e Exmo . Sr. Goal . e
remetida por elle a este Sennado, sobre o que se deve
praticar a respeito dos gastos que os ouvidores costumão
fazer a este Sennado cujas circunstancias he o mesmo
a que se acha registrada neste lo. a fl. 24 .

Dom Joam por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves da


quem e dalem mar em Africa snr. de Guiné e da conquista digo Guiné
& a .. Faço saber a vos governador e cappitão general da Cappitania de
São Paulo que vendo se a reprezentação que me fizerão os officiais dessa
cidade em carta de vinte e nove de Agosto do anno passado em que insi
nuavão que pellos excessivos gastos queos ouvidores geraes mandavam fazer
com azeite ferros e mais couzas da Cadea pellos bens daquelle concelho,
estava nos termos de se achar empenhado em dous mil cruzados, cuja despeza
pertencia as condenações da justiça, e não aquelle Sennado, e que replicando
elles a mesma despeza lhe passavão mandados os ouvidores com penna para
se darem porem prestimo expedindo se aos thezros . das taes despezas, res
pondião não tem com que pagar ao que devia eu dar provi
dencia tanto pello que se pedia aquelle Sennado, como ao caminho
g . levam as condenações da Justiça ; e que alem da referida despeza
entrara o ouvidor geral Joam Roiz Campello a rubricar livros contra o
estillo daquelle Sennado, cujas rubricas as fazião os prezedentes delle sem
despeza algua, levando o do . ouvidor oitenta rs . por cada rubrica, que no
espasso de nove annos que servira emportavam duzentos setenta e sete mil
reis, e que por huma e outra despeza se estava devendo a fazenda real o que
(1 ) -hnrios ".
ORDENS RÉGIAS 87

tocava a essa Camera pagar os ordenados do dito ouvidor sem haver redutos
por donde se pudesse pagar, pellos continuos gastos que os ouvidores obrigão
a fazer aquelle Sennado, e que de continuo estava indo a Camera ocupar o
lugar de prezidente, dizendo que a elles lhe tocava todas as vezes que qui
zesse perturbando desta sorte o despacho do bem comum , expondo mais que
ignoravão se nas festas reaes que os Sennados costumão selebrão conforme
a : leys se lhes devia dar propinas não assistindo as ditas festas como tem
de obrigação, e que tãobem praticavão o dito, ouvidor Joam Roiz Campello nos
actos de correição levar aquelle Sennado fora das contas que lhe tomava
dos seus rendimentos, e despezas alem dos emolumentos que lhes tocavão
de as tomar vinte mil reis de apozentadoria, dizendo pertenser lhe naquelle
acto de correição, sem embargo de eu lhe prohibir por huma provizão de
quinze de Novembro de 1735 não levaçe apozentadoria por terem casas pro
prias os ouvidores com ordenados com dinheyro das despesas de justiça desde
o tempo do ouvidor Manoel de Mello Godinho Manço e sendo ouvido sa
bretudo o referido, o procurador de minha coroa . Me pareceo dizer lhe
quanto as despezas da cadea se nessa cide. não hâ alcayde mor a que per
tenção as carceragens que por ... obrigados as ditas dispezas ; havendo
carcereiro toda a carceragem deve pagar quota certa aos quarteis
pondosse em deposito para as ditas despezas da cadea, e o que faltar se
pagará pellas despezas da justiça havendo as tomandosse todos os annos conta
dellas, e quanto a rubrica dos livros pertencentes a Camera e governo da
cidade as deve fazer o juiz ordinario sem sellario, e não o ouvidor não tendo
para isso provizão, declarando lhe que os ouvidores não podem hir a Ca
mera ocupar o lugar de Prezide ., salvo na ocaziam de hir a ella fazer cor
reição, ou eleyção, ou em outra de seo cargo de ouvidor, nem ter propina
de provizoens, não assistindo a ellas, nem emolumento algum pella apozen
tadoria, tendo como dizem cazas proprias para os ouvidores, e outro sim se
lhe declara que devem fazer esta queixa na rezidencia do ouvor. o que asim
ficarão entendendo para o praticarem se tiverem semelhante motivo, e quando
os ouvidores não pratiquem o que nesta ordem disponho recorrerão a vós
que ouvindo ao ouvidor por escripto detreminareis a duvida dando me conta .
De que vos aviso para que asim o tenhaes entendido e o façaes executar.
El Rey Nosso Snr . o mandou pello desembargdor . Raphael Pires Par
dinho, Thomé Joaquim da Costa Corte Real, conselhros . do seu concelho
ultramarino e se passou por duas vias . Caetano Ricardo da Sylva a fez
ein Lxa . a doze de Mayo de 1740 // O Secretario Manoel Caetano Lopes
da Lavre a fez escrever // Raphael Pires Pardinho // Thomê Joaquim
da Costa Corte Real, e não se continha mais na dita ordem de S. Magde.
que aqui bem e fielmente fis treslladar digo registar do proprio original
a que me repporto e vay na verde. sem couza que duvida faça porque a
ly corri, e conferi e assigney nesta cide ., de São Paulo em 26 de Ebro . de
1744 e eu Manoel da Luz Silveyra escrivão da Camera que o sobscrevy,
asigney e conferi . Mel . da Luz Silveyra. Confo. pr. mim. Silveyra .
1
PAPÉIS AVULSOS

( 1823)

Doc . CLXXXIV

Férias dirersas .

N.° 7 - Feria dos comcertos, que se fizerão na calçada, que desse de


São Gonçalo, a saber do canto do Capm . Sergra. the o canto das cazinhas
finda a 28 de Junho de 1823. Pedreiros - João, 2 dias, e meio á 480 rs.
1 $ 200- Benedito, do . do . á 320 rs . $ 800 . Serventes Joaquim 2 dias, e
nieio, á 160 rs . $ 400 - Clemente, do. do . do . $ 400 . Carreiro João , que
comduzio terra com seo carro , $ 720 . Feitor Antonio Joaquim , 2 dias e
meio, á 160 rs . $ 400 Som 3 $920 Anto . Joaqm . Revisto pr. mim Es
crivão Toledo .

N.° 8 Feria do Formigueiro tirado em huma das Ruas de Santa Ef


figenia, finda á honze de Julho de 1823. Trabalhadores Clemente, 5 dias
a 160 rs . $ 800 - Joaquim, do , do . $ 800 - Faostino, do. do. $ 800. Feitor
Antonio Joaquim , 5 dias a 160 rs . $ 800 rs . Som 3 $ 200 Anto . Joaqm .
Revisto pr . mim Escram . Toledo .
N.… 9 Feria do comserto da caicha do chafaris, finda a 18 de Julho
de 1823. Mestre Pedreiro.- Vicente Gomes Pereira, 4 dias, e hum quarto
a 1 $ 000 rs . 4 $ 250 . Serventes Clemente, 4 dias, e hu quarto, a 160 rs.
$ 680 - Jozé, dia e meio do . $ 240 . Cal, thijolo, e Azeite Alqueire e meio
de cal, á 680 rs . 1 $020 Hum cento , e hu quarteirão de thijolos, á
1 $ 280 rs . ao cento , 1 $600 Sinco medidas e meia de Azeite de Peiche, á
600 rs . á meda . 3 $ 300. Feitor Antonio Joaquim , 4 dias, e hu quarto, a
160 rs . $ 680 . Som . 11 $770 Anto . Joaqm . Revisto Toledo .
N.° 10 Feria do concerto feito na calçada que desse do Pateo de
S. Gonçalo , abaicho do Passo do falecido Manoel da Incarnação,
finda ao dois de Agto . de 1823 . Pedreiros João Amaro, hum dia, á
480 rs . $480 - Pedro , do . a 320 rs . $ 320 . Serventes Jozé, hum dia
90 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

a 160 rs . $160 . Carreiros Manoel, com seo carro botando tterra , venceo
a quantia de $120 - Jozé Joaqm . botou duas carradas de Pedras, a 640 rs.
1 $ 280 . Feitor Antonio Joaquim , hum dia, a 160 rs . $ 160. Som . 2 $ 520.
Anto . Joaqm . Revisto pr . mim Escrivam Toledo .
N.° 11 Feria do concero do chafaris, e Alcatruzes do mesmo, finda
a treze de Zbro . de 1823 . Mestres Pedreiros Vicente Gomes Pereira,
2 dias á 1 $000 rs .2 $ 000 - Pedro, dos . á 360 rs . $ 720 - João Ferreira, dos.
á 480 rs. $ 960. Serventes Clemente, 4 dias á 160 rs. $ 640 - Domingos,
dos. do . $640. Matteriaes Cal, Azeite, e Estopa, e Pedra Por huma
quarta de cal, á 800 rs . ao alqueire $ 200 . Por duas medidas e meia de
azeite de Peixe, a 640 rs . 1 $600 - Por duas libras de Estopa, a 200 rs . a
libra, $ 400 - Por huma carrada de Pedras, q . botou o Carro de Mel . Riz . ,
$640. Feitor Antonio Joaquim, 4 dias a 160 rs . $ 640. Sm. 8 $ 440
Anto. Joaqm . Revisto pr . mim escrivão Toledo .

N.° 12 Feria do Asento da Pedra, que se pos nos Asentos da Ponte


do Acú, e entupimento de hum buraco , q . se tapou na parede da Cadea
junto a Inxovia das mulheres, finda a tres de Obro. de 1823. Pedreiros
João Amaro , dia e meio, a 480 rs . 0 $ 720 - Theodoro, tem meio dia, á 360 rs.
0 $ 180 . Servente Caetano, dia e meio, á 160 rs . 0 $ 240 . Cal, meio al
queire, $ 400 Som . 18540 Anto . Joaqm . Revisto pr . mim Toledo .

N.° 13 Feria dos concertos das calçadas da Ladeira do Carmo, finda


nc dia vinte e quatro de Dezbro . de 1823. Pedreiros - João Amaro, 3 dias
e meio, a 480 rs . pr . dia 1 $680 - Theodoro, 3 dias, á 360 rs . por dia 1 $ 080 -
Antonio, 3 dias e meio a 360 rs . pr . dia 1 $ 260 . Serventes Manoel, 3 dias
e meio, á 160 rs . pr . dia 0 $ 560 - Jozé, dos. dos. 0 $ 560 - Franco ., dos. dos.
0 $ 560 - João, dos. dos. O $ 560 - João Carreiro, botou 11 carradas de tterra ,
á 60 ns. cada huma 0 $640 - Nove carradas de Pedras de Jozé Joaqm ., pa.
a da, calçada, á 640 rs. 5 $ 760. Som . 13 $ 560. Anto. Joaqm . Revisto Toledo.

DOC . CLXXXV

Recibos .

N.° 1 - Rbi . do Snr . Capm . Antonio Jozé Vieira Barboza , Procurador


da Camara desta Imperial Cide . a quantia de doze mil, cento e sessenta rs.
procedidos de dezenove carradas de pedras, q . mandei conduzir pa . o con
certo da rua q . desce do pateo da Cé pa. as Cazinhas, a preço de seis centos
e quarenta rs . cada hua, e pr . verdade de q . rbi. passo o preze ., pr . mim
some. assignado. São Paulo 11 de Julho de 1823 Franco . Jozé da Sa.
Rs. 12 $ 160 Reconheço. Toledo . No verso : 1823 Mandado N.° 35 a fl .
159 Despesa com varias obras, e outras despesas, da qtia . de 194$ 450 .

N.° 2 Receby do Snr . Antonio Casareiro a quantia de dois mil e


quinhentos e sesenta reis porcedidos de dois Barris q . fes pa . Agoa e pr.
ser verdade do refido paso o preze . pr . min some , asignado S. Paulo 1.º
de Junho de 1823 - Rs . 2560 Franco . de Freitas .

N.° 3 Rbi . do Illmo . Sr. Capam . Anto . Barboza Procurador do


Senado da Camara desta cide , a quantia de tres mil reis de por as letras
em hum saco q. levou hum oficio pa. a Asenblea Constituente e Legislativa
do Brazil, e pr. ter recebido passo o prezte . Manoel do Sacramto . Reco
nheço , Toledo .
PAPÉIS AVULSOS 91

N.° 4 Relação das Balanças, e Pezos que concertei, pertencentes ao


Assougue, e . Cazinhas desta Imperial Cidade, na conformide. das Ordens es
tabelecidas a tal respeito , sendo -me incarregado pelo actual Procurador do
Senado o Sr. Capm . Antonio Jozé Vieira Barbosa. a saber 8 balanças
que asertei a differentes preços, 2 $ 120 - 3 Pezos d arroba a 800, 2 $ 400
9 ditos de meia da . 400 - 3 $660 10 ditos de oito libras 200, 2 $000 9
ditos de quatro dos. 100, $ 900 9 ditos de duas libras 100, $ 900 - 8 ditos
de huma da . 100, $ 800, Somma Rs . 12$ 720 — Recebi do Senhor Capm . An
tonio Jozé Vieira Barboza , actual Procurador da Camara desta Imperial
Cide ., a quantia de doze mil setecentos e vinte reis, importancia dos pezos,
e balanças que assertei neste preze . anno, para o trafego das Cazinhas, e
Assougue desta mra. cide . , que menciona a Relação supra ; e para clareza
passei o prezente que vai por mim some. asignado . São Paulo 4 de Julho
de 1823. Jozé Alz . de Siqra . Reconheço Toledo .

N.° 5 - Rbi . do Illmo . Sr. Capam . Anto . Barboza Procurador da


Camara desta cide . a quantia de ceis mil, e quatro centos reis, de pintar as
Armas Imperiaes a Oleo, dando eu todas as tintas que forão percizas, as
armas grandes da porta principal da Cadea desta cide . , e por ser verde, o
ter recebido, passo o prezente pr . mim . feito, e asignado . S. Plo . 23 de
Agosto de 1823. Manoel do Sacramento . Reconheço, Toledo .
N.° 6 - Rbi do Illmo. Sr. Capam. Anto. Barboza Procurador da Ca
mara desta cide . , a quantia de tres mil rs . de por humas lettras de Oiro
em hum saco de Damasco pa . hir a sua Magestade Imperial, e pr . ter
reçebido passo prezente pr . mim feito e asignado. São Plo . 12 de Setembro
de 1823 Manoel do Sacramento . Reconheço, Toledo .

N.° 7 - Rbi. do Sr. Capam . Anto . Barboza Procurador da Camara


desta cide. a quantia de trez mil reis de pintar humas letras de oiro em hum
saco de damasco, pa . hir a S.M.I. , e por ter recebido passo o prezente por
mim feito e asignado . S. Plo . 4 de Dezembro de 1823. Manoel do Sacra
mento . Reconheço, Toledo .
N.° 8 Recebi do Sr. Capm . Antonio Je . Vieira Barba ., actual Pro
curador da Camara desta cide . a quantia de nove mil duzentos e cessenta
reis, importancia das Aferiçoens pertencentes ao Assougue, e Cazinhas desta
mma . cide. E para sua clareza passei o preze . q . q . vai pr . mim some. as
signado. S. Paulo 30 de Dezembro de 1823 Jose Antonio do Nascimento
Reconheço, Toledo .

DOC . CLXXXVI
Relações de rendas .

Ram . do que rendeu o contracto das Agoas ardentes das quaes entrarão
todo este prezente mes o seguinte - - Pr . 522 canadas a 160 reis por canada ,
83 $ 520 Abatida a ma . commição de 12 por cento emportante em 10 $022
Fica liquido que entrego ao Snr . Procurador da Camara Rs . 73 $498 .
São Paulo 31 de Janro. de 1823 - 0 Administrador Joze Mendez da Silva
No verso : 1823. Janro . Rendimento de Aguardte .

Ram . do que rendeu o contrato do Assougue desta cidade das rezes


que se cortarão todo este prezente mes o seguinte – Pr . 279 rezaz a 320
92 ICE VISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Teis por cada huma, 89 $ 280 – Abatida a ma . comição 12 por cento impor
tante em 10 $713 — Fica liquido que catrego ao Snr . Procurador da Caman
Rs. 78 $ 567 . São Paulo 31 de Janro. de 1823 - O Administrador Jove
Mendez da Silva Fes carga no Lo. compette. a fl. 79 v. S. Plo. 2 de
Fevro . dé 1823, Toledo . No verso : Mez de Jaoro. de 1823 rendimento
do Assougue.

Ram . do que reudeu o contrato das Cazinha ; dos effeitos que nellas
entrarão todo este prezente mes o seguinte – Pr . 841 capados a 40 reis
cada hum , 33 $640 – Pr . 125 cargas de mantimtos . a 10 reis por cada carga,
1 $ 250 – Pr. 138 ars . de Asucar a 20 reis por ars . 2760 – Soma 37 $650
Abatida a ma . Commição de 12 por cento emportante em 4 $ 518 - Fica
liquido que entrego ao Snr . Procurador da Camara rs . 33 $132 São Paulo
31 de Janro. de 1823 - O adminisrador Joze Mendez da Silva No verso :
Mes de Janro. de 1823 Rendimento das Casinhas .

Ram . do que rendeu o contrato das Agoasardentes das quaes entrarão


todo este prezente mes o seguinte . Pr . 516 canadas a 160 por canada, 823560
Abatida a ma . commição de 12 por cento emportante em 9 $ 907 Fica
liquido que entrego ao Snr. Procurador da Camara Rs. 728653 São
Paulo 28 de Fevro . de 1823 O Administrador Joze Mendez da Silva .
No verso : Mez de Fevro . de 1823 – Rendimento d'Agoaardte ..

Ram . do que rendeu o contrato do sougue desta cidade das rezes que
se cortarão todo este prezente mes seguinte – Pr. 234 rezes a 320 reis por
cada huma 74 $ 880 Abatida a ma. Commição de 12 por cento emportante
em 8 $ 985 Fica liquido que entrego ao Snr . Procurador da Camra . Rs.
65 $895 - São Paulo 28 de Fevro . de 1823 Administrador Joze Mendez
da Silva . Consta do verso : Mes de Fevro . de 1823 – Rendimento d:)
Assougue.

Ram . do que rendeu o contrato das Cazinhas dos effeitos que nellas
entrarão todo este prezente mes o seguinte . Pr . 697 capados a 40 reis por
cada hum, 27 $ 880 Pr. 185 cargas de mantos. a 10 reis por cada carga, 1 $850
Pr . 255 arrobas de asucar a 20 reis por arroba, 5 $ 100 . Soma 34 $830
Abatida a ma . commição de 12 por cento emportante em 4 $ 179 . Fica liquido
que entrego ao Snr . Procurador da Camara Rs. 30 $651. São Paulo 28 de
Fevro . de 1823 O Administrador Joze Mendez da Silva . No verso :
1823 Fevro . Rendimento das casinhas .

Ram . do que rendeu o contrato das Agoas ardes . das quaes entrarãɔ
todo este prezente mes o seguinte . Pr . 656 canadas a 160 reis por canada,
104 $ 960 Abatida a ma . commição de 12 por cento emportante em 12 $ 595
Fica liquido que entrego ao Snr . Procurador da Camara Rs . 92 $ 365 –
São Paulo 31 de Março de 1823 – 0 Administrador Joze Mendez da Silva.
No verso : Mez de Março de 1823. Rendimento d'Agoaardte.

Ram . do que rendeu o contrato do Asougue desta cidade das Rezes que
se cortarão todo este preze . mes o sege . Pr . 262 rezes a 320 reis por cada
huma 83 $ 840 Abatida a ma . commição de 12 por cento emportante em
10 $ 060 Fica liquido que entrego ao Snr . Procurador da Camara Rs . ...
73$780 São Paulo 31 de Março de 1823. O Administrador Joze Mendez
da Silva No verso : Mes de Março de 1823. Rendimento do Assougue.

Ram . do que rendeu o contrato das Cazinhas dos effeitos que nellas
entrarão todo este prezente mes o seguinte Pr . 823 capados a 40 reis
PAPÉIS AVULSOS 93

por cada hum 32 $ 920 Pr . 270 cargas de mantimentos a 10 reis cada


carga, 2 $700 - Pr. 404 arrobas de asucar a 20 reis por arroba, 8 $ 080
Soma 43 $700. Abatida a ma . commição de 12 por cento emportante em
5 $ 244 Fica liquido que entrego ao Snr. Procurador da Camara Rs. 38 $ 450.
São Paulo 31 de Março de 1823 O Administrador Joze Mendes da
Silva . No verso : 1823 Mço . Rendimento das Cazinhas .

Ram . do que rendeu o contrato das agoasardes . das quaes entrarão


todo este prezente mes o seguinte Pr . 543 canadas a 160 reis por canada,
86 $880 Abaida a ma . commição de 12 por cento emportante em 10 $425 .
Fica liquido que entrego ao Snr . Procurador da Camara Rs . 76 $ 455." São
Paulo 30 de Abril de 1823 O Administrador Joze Mendez da Silva. No
verso : Mez de Abril de 1823 Rendimento d'Agoaardte ..

Ram . do que rendeu o contrato do Asougue desta cidade de São Paulo


das rezes que se cortarão todo este prezente mes o seguinte. Pr . 294
rezes a 320 reis por cada huma 94 $ 080 Abatida a ma . commição de 12
por cento emportante em 11 $ 289 Fica liquido que entrego ao Snr . Pro
curador da Camara Rs . 82 $791. São Paulo 30 de Abril de 1823 - 0 Admi
nistrador Joze Mendez da Silva . Consta do verso : Mez de Abril de 1823
- Rendimento do Assougue .

Ram . do que rendeu o contrato das Cazinhas dos effeitos que nellas
entrarão todo este prezente mes o seguinte Pr . 818 capados a 40 reis
por cada hum, 32 $ 720 Pr . 212 cargas de mantos . a 10 reis por cada
carga 2 $ 120 . Pr . 326 arrobas de asucar a 20 reis por arroba 6$520. Soma
41$ 360. Abatida a ma . commição de 12 por cento emportante em 4 $ 963.
Fica liquido que entrego ao Snr. Procurador da Camara Rs . 36 $ 397. São
Paulo 30 de Abril de 1823. O Administrador Joze Mendes da Silva . Consta
do verso : 1823 – Abril Rendimento das casinhas .

}
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1
ATAS DA CÂMARA DE SANTO AMARO

( 1913 )

Acta da sessão ordinaria realisada no dia 3 de Março de 1913 Pre


sidencia do Sr. Carlos Schmidt Aos treze dias do mez de Março de
Mil Novecentos e treze, nésta Cidade de Santo Amaro, comarca da capital
do Estado de São Paulo, no paço da Camara Municipal, ás onze e meia
horas da manhã, achando -se reunidos os senhores Vereadores Carlos
Schmidt presidente, José Conrado vice-presidente, Brazilio Procopio
da Luz prefeito, Tenente João Felippe da Silva vice -prefeito, Izaias
Branco de Araujo e José Guilger Sobrinho, o Senhor presidente declara
aberta a sessão . E' lida, por mim Secretario da Camara, adiante nomeado
e assignado a acta da sessão anterior, realisada no dia 10 de Fevereiro
utlimo, e, em seguida o expediente, que constou de : OFFICIO : de Pedro
Pinheiro Guarany, administrador do Mercado fazendo a remessa da conta
do rendimento deste proprio Municipal, durante o mez de Fevereiro proximo
findo, na importancia de Novecentos sessenta seis mil trezentos e quarenta
reis ( 966 $ 340 ) “ A prefeitura . ” REQUERIMENTOS : De Domingos de
Oliveira Orlande, solicitando alinhamentos de datas de terras que lhe foram
concedidas em sessão de 5 de Maio de 1981, digo, em sessão de 5 de Maio
de mil oitocentos e noventa e um * Indeferido, de accordo com a infor
mação do Senhor prefeito. De João Coelho Ferreira, fazendo identico
pedido. “ Prove o supplicante que depois de publicada a lei numero quatro
de um de Janeiro de 1910, estavam fechadas as datas a que se refere.
De Gattas Attuy, solicitando concessão por seis annos, para montar no
jardim publico desta cidade um chalet destinado a venda de bebidas, doces,»
fructas etc. ( terceiro despacho ). " Indeferido, pelo segundo empate.
De Pedro Guilger Filho, fazendo igual pedido de concessão pelo praso de
déz annos . Ao ser submetido a aprovação da Camara este requerimento vo
taram pela concessão os Senhores Presidente, Prefeito e Vice- prefeito e con
tra os vereadores Izaias Branco de Araujo, José Conrado e José Guilger
Sobrinho Não obstante a seguinte ponderação do senhor Prefeito Muni
cipal : - " O voto do collega Guilger Sobrinho, não pode ser considerado
96 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

porquanto sua Senhoria é irmão do requerente . ” O vereador Guilger So


brinho protestou contra a asserção do orgam do poder executivo e declarou
que o seu voto seria, em Tribunal competente, devidamente justificado. Neste
requerimento o Senhor Presidente deu o despacho seguinte : Sim , contra
os votos dos vereadores Izaias Branco de Araujo, José Guilger Sobrinho
e José Conrado . " Do Dr. Francisco Ferreira Lopes e Estanislau Pereira
Borges, propondo a Camara fazerem por sua conta a desobstrução do rio
Jurubatuba, desde a embocadura do Ribeirão da Traição até o ponto da
junção do rio Guarapiranga, de modo a poder esse rio ser, em tempo nor
mal, navegavel . Pedem para esse emprehendimento, previlegio exclusivo para
extrahir do leito do rio , no trecho acima comprehendido, areia e pedregulho,
para o seu uzo e para o Commercio . Após a leitura desta petição, o ve
reador Izais Branco de Araujo uzando da palavra pedio para ser, nova
mente, adiada a discusão da mesma. Assim , pois, o senhor presidente sub
metteu á votos o pedido deste vereador, e, em face de estarem de accordo
com o mesmo pedido os demais vereadores, assim despachou : “Continua
adido, digo, adiada. Do Doutor Alipio C. de Borba, reiterando a proposta
anteriromente feita a esta corporação, proposta essa esclarecida na acta da
sessão anterior. O Senhor Izaias Branco de Araujo, declarou que : não
tendo o secretario reporodusido na acta da sessão de dez de Fevereiro ultimo
o inteiro teor desse requerimento e simplesmente feito um resumo do mesmo,
entendia que esta materia não deveria ser descutida na presente sessão. Depois
de prolongado debate entre este vereador e o Senhor Prefeito Municipal,
sobre a materia em questão, ficou a discussão transferida para a proxima
sessão . De Amaro Vieira de Moraes e Silva e outros, versando sobre a
abertura de um exgotto na estrada denominada Corredor " ( segundo des
pacho ) : “ Empatada em primeira discussão . " De Germano Gotzfriedt, de Pe
dro Hessel Netto, pedindo seja cancellado o imposto em que se acham tribu
tados para a venda de leite, visto não continuarem com este ramo de negocio.
Cancelle-se. ” De Felippe Laborde Auras pedindo, retribuidamente, á
concessão de um terreno que se acha em verdadeiro estado de abandono e
que fica situado no fundo de outro terreno que possue á rua Paulo Eiró. -
* A prefeitura para informar .” De Justino Augusto de Andrade, solicitando
uma data de terra na “ Varzea de Baixo ". - Empatado em primeira dis
cussão . " Nada mais havendo a tratar-se o senhor presidente declara encer
rada a sessão . E para constar, eu, Alfredo de Andrade Arruda Botelho,
Secretario da Camara Municipal a escrevi . Em tempo : A requerimento do
vereador Senhor Izaias Branco de Araujo, o Senhor presidente determinou
a mim Secretario da Camara, que fizesse a transcripção dos documentos lidos
pelo mesmo, na pagina sessenta e um verso, visto ser insufficiente para
dita transcripção o espaço aberto na presente acta .

Termo de comparecimento . Aos sete dias do mez de Janeiro, digo ,


do mez de Abril de Mil Novecentos e treze, nesta cidade de Santo Amaro,
Comarca da capital do Estado São Paulo, no paço da Camara Municipal,
ás onze e meia horas da manhã , presentes os vereadores José Conrado,
vice-presidente da Camara, Izaias Branco de Araujo e José Guilger So
brinho, faltando, sem causa communicada, os Senhores Carlos Schmidt, pre
sidente da Camara e Tenente João Felippe da Silva vice-prefeito, o
senhor vice - presidente ordenou a mim secretario abaixo nomeado e as
signado que lavrasse o presente termo de comparecimento e bem assim
que procedesse a leitura do expediente em atraso, no que foi, por mim Se
cretario attendido . Pelo mesmo vice-presidente foi dito que communicou os
vereadores presentes o fallecimento do Prefeito Municipal e que consultava
ATAS DA CÂMARA DE SANTO AMARO 97

aos mesmos sobre um voto de pesar que propunha fosse insirido neste
termo, ao que os mesmos accederam , officiando - se a familia communican
do -se esta resolução ; e que , nos termos do artigo 17 da lei 1103, convocava
aos Senhores vereadores para uma sessão extraordinaria, no dia 9 do cor
rente as 11 horas da manhã, afim de tratar- se da verificação, digo de as
sumpto referente ao preenchimento da vaga do mesmo prefeito Municipal.
E para constar, eu , Afredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario da Ca.
mara, lavrei o presente que é devidamente asignado . José Conrado. Izaias
Branco de Araujo . José Guilger Sobrinho .

Sessão extraordinaria Presidencia do Senhor Carlos Schmidt - Aos


nove dia do mez de Abril de Mil Novecentos e déz, digo, de Mil Novecentos
e treze, nesta Cidade de Santo Amaro, Comarca da capital do Estado de
São Paulo, no paço da Camara Municipal , ás onze e meia horas da manhã,
presentes os Senhores vereadores Carlos Schmidt presidente, José Con
rado vice -presidente, Izaias Branco de Araujo_e José Guilger Sobrinho,
faltando sem causa participada o Senhor João Felippe da Silva vice
prefeito, foi pelo senhor presidente aberta a sessão visto haver numero su
ficiente de vereadores. Pelo vereador senhor José Guilger Sobrinho foi apre
sentada a seguinte moção que todos os vereadores reunidos approvaram :
Moção. Propomos como homenagem devida a memoria do pranteado pre
feito Brazilio Procopio da Luz se insira na acta nos nossos trabalhos um
voto de profundo pesar que se digne a mesa officiar a Exma. Familia do
illustre estincto apresentando -lhe a comparcipação sincera da dor que a enlu
tou . Sala das sessões, 9 de Abril de 1913 . José Guilger Sobrinho . José
Conrado . Izaias Branco de Araujo ." O senhor presidente, designa o dia
doze do corrente ás 11 horas da manhã, para a eleição do novo prefeito
Municipal, na forma da lei. Em seguida, o mesmo senhor presidente ordenou
a mim secretario da Camara, a transcripção do seguinte officio : “ Santo
Amaro, 9 de Abril de 1913. Illustrissimo e Exmo. Senhor Carlos Schmidt,
M. D. Presidente da Camara Municipal desta Cidade . Communico á V.
Excia . e rogo de transmittir aos Excellentissimos Senhores vereadores que
compareci a sessão convocada para hoje, afim de assumir as funcções como
vereador que sou , em virtude do fallecimento do Senhor Brazilio Procopio
da Luz, e de conformidade com o que preceitúa o § unico do Artigo 18 da
lei numero 1103 de 1907. Saúde e fraternidade. José Schunck . Nada mais
havendo a tratar - se é, pelo Senhor presidente, encerrada a presente sessão.
E para constar, eu, Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario da Ca
mara , lavrei esta que é devidamente assignada . Em tempo : Ao officio supra
referido deu, o Senhor presidente, este despacho : “ Sim . Eu , Alfredo de
Andrade Arruda Botelho, Secretario da Camara a escrevi. Additamento :
Tendo o vereador upplente Senhor José Junck, comparecido após o en
cerramento desta, o Senhor presidente o convidou para , na forma da lei,
prestar o respectivo compromisso, no que foi atendido, tomando assento na
mcza, das sessões . Eu, Alfredo de Andrade Arruda Botelho, Secretario da
Camara o escrevi e assigno conjunctamente com todos os senhores verea
dores reunidos . Carlos Schmidt . - José Conrado . · Izaias Branco de
Araujo . - José Guilger Sobrinho . José Schunck . Alfredo de An
drade Arruda Botelho Secretario .

Acta da sessão extraordinaria destinada a eleição de Prefeito Municipal


- Presidencia do Senhor Carlos Schmidt. -Aos doze de Abril de Mil No
vecentos e treze , nesta Cidade de Santo Amaro, Comarca da capital do Es
98 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

tado de São Paulo, no paço da Camara Municipal, as onze horas da manhã,


achando -se reunidos todos os senhores vereadores, o Senhor presidente de
clara aberta a sessão especialmente destinada para eleição de prefeito Mu
nicipal, na vaga aberta pelo fallecimento do Senhor Brazilio Procopio da
Luz ; convida aos vereadores reunidos a votarem . Foram recolhidas a urna
seis cedulas que apuradas deu o seguinte rezultado : José Guilger Sobrinho,
3 votos ; José Schunck, dois votos . Houve um cedula em branco . Depois da
respectiva apuração, o Senhor presidente declara eleito prefeito Municipal o
vereador José Guilger Sobrinho, empossando - o do cargo em acto successivo,
de accordo com a lei . E, para constar, eu , Alfredo de Andrade Arruda Bo
telho, Secretario da Camara, a escrevi e assigno conjunctamente com todos
os vereadores reunidos. Carlos Schmidt. José Conrado . Izaias
Branco de Araujo . Joo Felippe da Silva . José Schunck . José
Guilger Sobrinho . Alfredo de Andrade Arruda Botelho Secretario .

Continuação da acta da sessão ordinaria, lavrada as folhas 59 , 59v e


60 . Documentos lidos pelo Senhor Vereador Izaias Branco de Araujo,
em sessão de 5 de maio de 1913: “ Senhor presidente, estando em discussão
a acta da sessão ralisada no dia 3 de Marco, peço á V. Excia . fique cons
tando que dou o meu voto para ser approvada, menos quanto na parte refe
rente a leitura e discussão do requerimento do Senhor Pedro Guilger Filho
solicitando concessão para construir no jardim publico desta cidade um kios
que para venda de bebidas, doces, etc, concessão que na mesma sessão foi
definitivamente negada ao Senhor Gattas Attuy . Posto m discussão tal re
querimento , votaram a favor trez vereadores e trez contra e V. Ecia . deu
o seguinte despacho : Sim, contra os votos dos Senhores José Conrado,
Izaias e José Guilger Sobrinho ” accrescentando que o voto deste ultimo
não podia prevalecer por ser elle irmão do peticionario . O despacho de V.
Ecia. (evidentemente ) não consultou o pensamento da Camara e o espirito
da lei , por que tal deferimento importou num contra- senso em relação ao in
deferimento feito em requerimento identico votado na mesma sessão . Com
esse indeferimento, a Camara manifestou sua opinião contraria a semelhante
pretensão e o meio que teve o requerente consistiu em 'repetir o pedido por
intermedio de terceiro que inutilisaria um voto e tanto assim era e foi que
hoje, por um contracto e uma escriptura publica é o mesmo Senhor Gattas
Attuy que pretende explorar tal concessão . Eu entendo pois, que o nosso
collega Guilger Sobrinho não estava empedido de tomar parte na discussão
e deliberação da Camara sobre o requerimento de Pedro Guilger Filho, prin
cipalmente quando votou contra dito requerimento . A lei ao prohibir ao
vereador de votar sobre negocio que diga respeito a seu irmão teve o intuito
de evitar a fraude ao presuposto de ser esse voto favoravel a tal negocio.
Na hypothese vertente tal não pode ser o espirito da lei, porque o Senhor
Guilger Sobrinho votou contra assim como já havia feito com o requeri
mento igual de Gattas Attuy . Peço pois á V. Ecia. que fique constando da
acta essa minha declaração e que nella seja transcripta a seguinte declaração
de voto assignada por trez collegas” : “ Declaramos que approvamos a acta
da sessão de trez de Março, menos na parte em que diz ter sido deferido
o requerimento de Pedro Guilger Filho, em tudo igual ao do Senhor Gattas
Attuy na mesma sessão indeferido . Tal requerimento não podia ter sido ap
provado, por que houve empate na votação e não estava inutilisado o voto
do collega José Guilger Sobrinho por isso que foi contra o mesmo . A lei
quando prohibiu ao vereador votar sobre negocio de seu irmão teve o pre
supposto de que esse voto fosse favoravel e facil seria a fraude . Sendo o
voto contrario, deixa de ter razão a prohibição, mesmo por que na referida
ATAS DA CAMARA DE SANTO AMARO 99

sessão foi indeferida a mesma pretensão solicitada por Gattas Attuy. Ap


provar, pois, a de Pedro Guilger Filho, seria burlar o pensamento da Ca
mara, certo como é de que Guilger Filho nada mais era do que um interme
diario de Gattas Attuy . Demais, a lei tambem prohibe que a Municipalidade
contracte com irmão de qualquer vereador e desta forma não podia tambem
ser tomado em con ideração o pedido de Pedro Guilger Filho. Não appro
vamos, pois a acta neste particular. Santo Amaro, 5 de Maio de 1913 .
Izaias Branco de Araujo . - José Schunck . José Conrado. Votaram
a favor da acta acima alludida e contra os documentos exhibdos pelo ve
reador senhor Izaias Branco de Araujo, os Senhores Carlos Schmidt
presidente e Tenente João Felippe da Silva vice - prefeito ; votaram a favor
da acta e dos referidos documentos os Senhores José Conrado vice -pre
sidente, Izaias Branco de Araujo e José Schunck, deixando de tomar parte
na votação o vereador Senhor José Guilger Sobrinho, prefeito Municipal.
Nada mais havendo a tratar - se, eu , Alfredo de Andrade Arruda Botelho,
Secretario da Camara , lavrei esta que firmo com os Senhores vereadores.
Carlos Schmidt. José Conrado . Izaias Branco de Araujo . José
Schunck . João Felippe da Silva . José Guilger Sobrinho . Alfredo
de Andrade Arruda Botelho . Secretario .
1
ATOS OFICIAIS
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2
|
1
DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS

DECRETO N.º 1.088 , DE 3 DE OUTUBRO DE 1949

Dispõe sôbre o regime de serviço para os cargos de dire


reção e chefia e outros análogos ,

O Prefeito Municipal de São Paulo, usando de suas atribuições,

Decreta :
Art. 1.º Quando a natureza e o vulto de trabalho de qualquer
dos orgãos que lhes estejam subordinados assim o exigir, poderão os
Secretários Municipais estabelecer, por portaria, e na conformidade
do disposto no art. 21 do Decreto - lei n .° 404 , de 8 de março de 1947 ,
e § 3.° do art . 1.º do Decreto n.º 917 , de 6 de novembro de 1946 , o
regime de até 8 horas diárias de serviço para os ocupantes de cargos
de Direção ou Chefia de tais orgãos .
Parágrafo único Estende -se o disposto neste artigo aos ocu
pantes dos cargos de Auditor, Assessor, Assistente, Gerente da Gráfica
e Montepio, e Inspetor da Auditoria da Fazenda , bem como aos que
exerçam funções gratificadas .
Art. 2.° Tal regime será cumprido no horário que for esta
belecido pelo Secretário, em um ou mais períodos, e o modo a permi
tir, tanto quanto possível, a presença do dirigente durante o expedi
ente normal de sua repartição .

Art. 3.° Este decreto entrará em vigor na data de sua publi


cação , revogadas as disposições em contrário .

Prefeitura Municipal de São Paulo, 5 de outubro de 1949, 396.0


de fundação de São Paulo . O Prefeito , Asdrubal Euritysses da
Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 5 de ou
tubro de 1949 . O Diretor , Paulo Teixeira Nogueira
104 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

DECRETO N.º 1.089, DE 13 DE OUTUBRO DE 1949

Regulamenta a concessão do prêmio “ Prefeitura de São


Paulo " , do Salão Paulista de Belas Artes, instituido pela
Lei n .•' 3.711, de 7 de outubro de 1948
O Prefeito do Município de São Paulo, usando de suas atribui
ções e, de acordo com 0 que preceitua o artigo 3.º da Lei n.º
3.711 , de 7 de outubro de 1948 ,
Decreta :

Art. 1.º - O prêmio “ Prefeitura de São Paulo " . instituido pela


Lei n .° 3.711 de 7 de outubro de 1948 , será conferido aos melhores
trabalhos executados por artistas brasileiros que, pessoalmente se
jam expositores nas seções de pintura, escultura e arquitetura do Salão
Paulista de Belas Artes, de acordo com a seguinte discriminação:

Na seção de pintura :
a) tipos e costumes paulistas, assuntos históricos e
paisagens paulistas : Pintura a oleo Cr$ 15.000,00
Aquarela, pastel, afresco, desenho em geral,
aguaforte, gravura , buril, xilografia e litografia Cr$ 10.000,00
b) qualquer outro gênero de pintura Cr$ 15.000,00

II Na seção de escultura :
a) esculturas decorativas trabalhos definitivos
ou maquetes próprias para jardins e praças,
podendo versar sobre o gênero humano . Sem
pre, porém , dentro do cunho de brasilidade Cr$ 15.000.00

III Na seção de arquitetura :


a) sugestões de urbanização Cr$ 15.000,00
b) composição arquitetônica Cr $ 15.000,00
$ 1.0 - O material da seção de arquitetura deve ser apresen
tado debaixo de cunho rigorosamente artístico e montado de forma
a facilitar sua exposição, indicada prèviamente pelo autor, si houver
maquete, a altura do respectivo pedestal .

$ 2.0 Só poderão fazer jús ao prêmio da seção de arquitetura


os trabalhos originais que satisfaçam , naquilo que for aplicável , o dis
posto no artigo 6.º do Regulamento do Salão .
Art . 2.0 As inscrições , entrega , seleção e julgamento dos tra
balhos processar - se -ão de acordo com as condições e prazos estabe
lecidos no Regulamento do Salão Paulista de Belas Artes, vigente à
época em que se realizar a exposição .
Art. 3.° Concorrerão ao prêmio todos os trabalhos aceitos pela
Comissão de Seleção, independentemente de inscrição especial.
Art. 4.0 O pagamento do prêmio não confere o direito de pro
priedade sõbre os trabalhos premiados .
Art. 5.0 Não havendo trabalho premiado , a importância cor
responde ao prêmio não conferido será acrescida , no Salão subse
quente, ao prêmio da mesma seção e espécie, obedecida a discrimina
ção constante do artigo 1.º.
.

DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS 105

Art. 6.° O prêmio “ Prefeitura de São Paulo " não poderá


recair em trabalho que já tenha obtido prêmio em dinheiro .
Art. 7.0 No que for omisso o presente decreto, aplicar - se - á
o Regulamento do Salão Paulista de Belas Artes, observado quanto
à distribuição do prêmio, o espírito do artigo 35 daquele Regimento.
Parágrafo único Não é aplicável ao prêmio " Prefeitura de
São Paulo ” o disposto no parágrafo terceiro do artigo 23 do Regula
mento do Salão .
Art. 8 . Este decreto entrará em vigor na data de sua publi
cação , revogadas as disposições em contrário .

Prefeitura do Municipio de São Paulo , 15 de outubro de 1949 .


396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Franciso
Oscar Penteado Stevenson O Secretário das Finanças, João Pacheco
Fernandes O Secretário de Educação e Cultura , Jaime Regalo
Pereira

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Peg


soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 15 de outubro
de 1949 . O Diretor Paulo Teixeira Nogueira

DECRETO N.° 1.090 . DE 25 DE OUTUBRO DE 1949

Declara de utilidade pública o imóvel situado à rua Faus.


tolo n.° 1.670, Lapa , 15.° subdistrito da Capital, neces
sário à execução do plano aprovado pelo Decreto n.º $55 ,
de 12 de março de 1947 .

O Prefeito do Município de São Paulo , usando de suas atribuições,


e de acordo com o que preceituam os artigos 5.°, letra " i " e 6. °, ambos
do Decreto Lei Federal n . ° 3.365 , de 21 de junho de 1941 ,

Decreta :
Art. 1.º É declarado de utilidade pública, para o fim de ser
desapropriado, amigável ou judicialmente, o imóvel consistente em
terreno e construção, situado à rua Faustolo n.º 1670 , Lapa , 15.° sub
distrito desta cidade e comarca da Capital, de propriedade da firma
“ Irmãos Farinelli " ou de quem de direito, compreendendo o terreno,
que é de forma irregular, a área de 2.081,60 m2 ( dois mil oitenta e
um metros e sessenta decímetros quadrados) , mais ou menos, a se
guir descrita : divide pela frente , na extensão de 30,00 m . , mais ou
menos ( linha 9-5 , ao longo do alinhamento da rua Faustolo, com
leito desta rua ; pelo ?ado direito de quem do terreno olha para
rua, na extensão de 60,00 m . , mais ou menos ( linha 8-9 ) , com pro
priedade de quem de direito ; pelo lado esquerdo, por uma linha
quebrada, nas extensões sucessivas de 51,20 m . , mais ou menos ( linha
5-4 ) , m. , mais ou menos ( linha 4-3 ) , e 10.00 m. , mais ou menos
( linha 3-2 ) , com o córrego Tiburtino ou do Mandi e terrenos do pro
priedade de quem de direito ; e , pelos fundos, na extensão de 30,00
m . , mais ou menos ( linha 2-8 ) , com terrenos de propriedade de quem
de direito , imóvel esse necessário à execução do plano de melhora
106 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

mentos urbanos aprovado pelo Decreto n .° 955 , de 12 de março de


1947 , e assinalado na inclusa planta, n .° P- 4373 C, G- 3, A- 15, que
autenticada pelo Prefeito, fica fazendo parte integrante deste decreto .
Art. 2.° Este decreto entrará em vigor na data de sua pu
blicação, revogadas as disposições em contrário .

Prefeitura do Municipo de São Paulo, 25 de outubro de 1949 ,


396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Eurltysses
da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário de Obras, Dario de Castro
Bueno O Secretário das Finanças, João Pacheco Fernandes

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Juridicos, em 25 de outu
bro de 1949. - O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

DECRETO N.º 1.091, DE

DECRETO N.º 1 092, DE 26 DE OUTUBRO DE 1949

Fixa o quadro do pessoal diarista para a Secretaria de


Higiene e dá outras providências .

( Prefeito do Município de São Paulo , usando das atribuições


que lhe são conferidas por lei,

Decreta :

Art. 1. ° -- Fica fixado o quadro do pessoal extranumerário (dia


rista ) da Secretaria de Higiene, na forma da tabela anexa ao presente
decreto .
Art. 2.0 Este decreto vigorará até 30 de junho de 1950 , ,data
em que será revisto o quadro .
Art. 3.0 Os extra - numerários diaristas, de que trata o presente
decreto, somente poderão ter ingresso pelas classes iniciais dos grupos
de salários .
8 único São admitidas exceções ao disposto no presente artigo,
quando o Secretário de Higiene as motive e o Prefeito as escolha, por
despacho expresso em processo regular .
Art. 4.° — Este decreto entra em vigor na data de sua publica
cão , revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 26 de outubro de 1949 ,
396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito , Asdrubal Euritysses
da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário das Finanças, João Pacheco
Fernandes O Secretário de Higiene, Paulo Ribeiro da Luz
Publicado na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes-
soal , da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 26 de outu
bro de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira
1.092-49
N.º
DECRETO
AO
ANEXA
TABELA
EXTRANUMERÁRIO
PESSOAL
DO
QUADRO DIARISTA
DE
PARA
H.
S.
.
1949
1 6('. 4,40 2.920 12.848,00
4 4C-
5,30 11.680 50.224,00
3
C-
25 4,10 299.300,00
73.000
59 3,80
4B- 172.280 654.664,00
1 3,00
A-6 2.920 8.760,00
117 1.494.748,00 5.252,00
DIVISÃO
E
SAUDE
DE 521-84-61
1 1D
-2 8,00 2.920 23.360,00 700.000,00
IDENTIFICAÇÃO 1 9
D. 6,80 2.920 19.856,00
1 8
D- 6.40 2.920 18.688,00
6 6
D. 5,80 17.520 101.616,00
5 4
D. 5.30 14.600 77.380,00
2 1
D- 4,70 5.840 27.448,00
7 C 7 4,50 20.440 91.980.00
1 C4 4.20 2.920 12.264,00
4 C 4,10 11.680 47.888,00
1 2
C. 4,00 2.920 11.680.00
1 C1 3,90 2.920 11.388.00
11 4
B- 3.80 32.120 122.056,00
41 565.604,00 134.396,00
DE
DIRETOR
GABINETE
ABASTECIMENTO510-84-91 180.000,00 180.000,00
TOTAL 3.705
operários 51.478.724,00 51.881.000,00 401.276,00

RESUMO
DUODECIMOS

Unidades Verba °N.


O. per Dotação Anual
Despesa Dotação Despesa

Abast
. Gabin 510-8491 180.000,00 15.000,00
.1
Abast 511-8491 166 2.500.000,00 2.468.860,00 208.333,33 205.721,69
.2
Abast 512-8491 581 9.000.000,00 8.957.100,00 750.000,00 746.425,00
.Hig 1 523-8851 2.797 38.000.000,00 37.992.412,00 3.166.666,00 3.166.034,33
Hig
.2 522-8411 117 1.500.000,00 1.494.748.00 125.000.00 124.562,33
Hig
.3 521-8461 41 700.000,00 565.604,00 58.333,33 47.138,66
TOTAL 3.705 51.880.000.00 51.478.724,00 Saldo
Cr
$de 401.276,00
DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS 107

DECRETO N.º 1.093, DE 27 DE OUTUBRO DE 1949


Declara de utilidade pública um imóvel situado à aveni
da Hortulânia ( não oficial) , destinado a instalações neces .
sárias ao serviço de limpeza pública .

O Prefeito do Município de São Paulo , usando de suas atribuições,


e de acordo com o que preceituam os artigos 5.°, letras “ d ” e “ g " e
6.°, ambos do Decreto - lei federal n.° 3366, de 21 de junho de 1941 ,

Decreta :

Art. 1.° — É declarado de utilidade pública , para o fim de ser


desapropriado amigável ou judicialmente o terreno situado à avenida
Hortulânia ( não oficial ), na Chácara Hortulània Paulista , Penha do
França , 3.º Subdistrito desta cidade e Comarca da Capital, de pro
priedade de João Pekny ou de quem de direito com a área de
28.719,00 m2 ( vinte e oito mil setecentos e dezenove metros quadra
dos ) , mais ou menos, que assim se descreve e confronta : divide, pela
frente, na extensão de 102,00 metros, mais ou menos ( linha A- B ) ,
ao longo do alinhamento da avenida Hortulânia ( não oficial ) , com
o leito desta avenida ; pelo lado direito de quem do terreno olha
para avenida, por uma linha quebrada, nas extensões, respectiva.
mente, de 31,50 metros, mais ou menos ( linha B-C ) , 185,50 metros,
mais ou menos ( linha C -D ) , por um córrego e 81,50 metros, mais ou
menos ( linha D- E ) , por uma valeta , com propriedade de quem de
direito ; pelo lado esquerdo, na extensão de 137,50 metros, mais ou
menos ( linha G -A ) , com terrenos da citada Chácara e, pelos fundos,
na extensão de 263,50 metros, mais ou menos ( linha E -G ) , com o
leito da Estrada de Ferro Central do Brasil, terreno esse destinado a
instalações necessárias ao serviço de limpeza pública, e assinalado na
planta anexa n .° P- 4525 , G- 4 , A- 15, que, autenticada pelo Prefeito,
fica fazendo parte integrante dêste decreto .
Art. 2.0 O Presente decreto entrará em vigor na data de sua
publicação, revogadas as disposições em contrário .

Prefeitura do Município de São Paulo, 27 de outubro de 1949 ,


396.° da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário das Finanças, João Pacheco
Fernandes O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 27 de outubro
de 1949 . O Diretor , Paulo Teixeira Nogueira

LEI N.º 3.800 , DE 19 DE OUTUBRO DE 1949


Autoriza o Prefeito a dispender a importância de Cr$
25.000.000,00, para início e prosseguimento de obras, me
lhoramentos e serviços públicos .

O Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com O que


decretou a Câmara Municipal, em sessão de 14 de outubro de 1949,
promulga a seguinte lei :
108 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

Art. 1.0 É o Prefeito autorizado a dispender a importância


de Cr $ 25.000.000,00 ( vinte e cinco milhões de cruzeiros ) para ini
cio e prosseguimento de obras, melhoramentos e serviços públicos.
$ único : A destinação dessa importância fica subordinada a Se
guinte especificação :
a ) Cr $ 15.000.000,00 ( quinze milhões de cruzeiros ) para a
construção das pontes sobre o Rio Tietê, nos bairros de
Casa Verde, Limão, Freguezia do O e Via Anhanguera ;
b) Cr $ 10.000.000,00 ( dez milhões de cruzeiros ) para a cana
lização do Rio Tietê, nos trechos compreendidos entre as
pontes de E.F. Santos - Jundiaí e Anhanguera, e Vila Elza
o Guarulhos .
Art. 2.° Para ocorrer às despesas com a execução da presente
lei, fica aberto, na Secretaria das Finanças, um crédito especial de
Cr$ 25.000.000,00 ( vinte e cinco milhões de cruzeiros ) , por conta do
excesso de arrecadação previsto para o corrente exercício.
Art. 3.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação,
e terá vigência até 31 de dezembro de 1950 , revogadas as disposições
em contrário .

Prefeitura do Município de São Paulo, 19 de outubro de 1949 ,


396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha O Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Francisco
Oscar Penteado Stevenson O Secretário das Finanças. João Pacheco
Fernandes O Secretário de Obras, Dario de Castro Bueno .
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do
Pessoal da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 19 de
outubro de 1949 . O Diretor, Paulo Teixeira Nogueira

LEI N.º 3.801 , DE 28 DE OUTUBRO DE 1949


Dispõe sõbre a abertura de um crédito de Cr $ 51.390.100,00

O Prefeito do Município de São Paulo , de acordo com o Que


decretou a Câmara Municipal, em sessão de 28 de outubro de 1949 ,
promulga a seguinte lei :
Art. 1.0 - Fica aberto, na Secretaria das Finanças, um crédito
de Cr$ 51.390.100,00 ( cinquenta e um milhões, trezentos e noventa
mil e cem cruzeiros ) , suplementar as seguintes verbas do orçamento
vigente :
Cr $
001.8000 Pessoal Fixo . 1.700.000,00
001.8002 Material Permanente 500.000,00
001.8004 Despesas Diversas 1.000.000,00
100.8023 Material de Consumo 60.000,00
201.8053 Material de Consumo 10.000,00
202.8052 Material Permanente 5.100,00
215.8131 Pessoal Variável 1.000.000,00
220.8090 Pessoal Fixo 120.000,00
222.8090 Pessoal Fixo 440.000,00
222.8093 Material de Consumo 60.000,00
223.8090 Pessoal Fixo 430.000,00
DECRETOS E LEIS MUNICIPAIS 109

323.8131 Pessoal Variável 800.000,00


332.8070 Pessoal Fixo 600.000,00
344.8071 Pessoal Variável 600.000,00
403.8834 Despesas Diversas 200.000,00
410.8892 Material Permanente 1.000.000,00
410.8893 Material de Consumo 300.000,00
410.8894 Despesas Diversas 900.000,00
412.8894 Despesas Diversas 800.000.00
413.8892 Material Permanente 225.000,00
413.8893 Material de Consumo 1.000.000,00
413.8894 Despesas Diversas 2.400.000,00
414.8892 Material Permanente 1.140.000,00
414.8893 Material de Consumo 2.000.000,00
414.8894 Despesas Diversas 6.500.000,00
421.8093 Material de Consumo 500.000,00
422.8811 Pessoal Variável 2.000.000,00
422.8813 Material de Consumo 300.000,00
432.8890 Pessoal Fixo 1.000.000,00
450.8891 Pessoal Variável 1.000.000,00
500.8404 Despesas Diversas 10.000,00
511.8491 Pessoal Variável 400.000,00
512.8491 Pessoal Variável 1.500.000,00
522.8410 Pessoal Fixo 900.000,00
522.8411 Pessoal Variável 300.000,00
522.8413 Material de Consumo 200.000,00
522.8414 Despesas Diversas 500.000,00
523.8850 Pessoal Fixo 800.000,00
523.8851 Pessoal Variável 1.000.000,00
611.8341 Pessoal Variavel 800.000,00
611.8344 Despesas Diversas 200.000,00
611.8894 Despesas Diversas 100.000,00
612.8341 Pessoal Variável 200.000,00
614.8371 Pessoal Variável 150.000,00
615.8393 Material de Consumo 40.000,00
711.8891 Pessoal Variável 200.000,00
910.8900 Pessoal Fixo 2.800.000,00
910.8930 Pessoal Fixo 3.400.000,00
910.8991 Pessoal Variável 800.000,00
A - 910.8994 Despesas Diversas 3.700.000.00
E - 910.8994 Despesas Diversas 2.000.000
F - 910.8994 Despesas Diversas 2.800.919.04)
TOTAL 51.390.001) ,60

Art. 2.° O valor do presente crédito será coberto mediante


a utilização dos seguintes recursos :
a) “ superavit” financeiro apurado no Balanço encerrado em
31-12-48 Cr $ 43.390.100,00 ;
b) anulação parcial da verba orçamentária n .° 622.8344
Cr$ 350.000,00 ;
c) excesso de arrecadação previsto para o corrente exercício
Cr $ 7.650.000,00 .
Art. 3.0 Esta lei entrará em vigor na data de sua publicacão,
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo, 28 de outubro de 1949 ,
396.º da fundação de São Paulo . O Prefeito , Asdrubal Eurityises
110 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

da Cunha Pelo Secretário de Negócios Internos e Juridicos, Paulo


Teixeira Nogueira , Diretor do Departamento do Expediente e do Pes
Boal O Secretário das Finanças, João Pacheco Fernandes

Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Peg


soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 28 de outu
bro de 1949 . ( ) Diretor, Paulo Teixeira Nogueira .

LEI N.º 3.802, DE 28 DE OUTUBRO DE 1949


Abre crédito especial de Cr $ 50.000,00

o Prefeito do Município de São Paulo, de acordo com o que


decretou a Câmara Municipal , em sessão de 17 de outubro de 1949 ,
promulga a seguinte lei :
Art. 1 . Para ocorrer as despesas com o pagamento das dife
renças de vencimentos dos Contínuos da Secretaria da camara Muni
cipal , determinado pela Resolução n.º 8 , do corrente ano, e para gra
tificação dos servidores " convocados ” do Teatro Municipal, fica aberto,
na Secretaria das Finanças, um crédito especial de Cr$ 50.000,00
( cinquenta mil cruzeiros ) , por conta do " superavit ” financeiro apu
rado no Balanço encerrado em 31 de dezembro de 1948 .
8 unico O crédito fica assim determinado : Cr$ 30.000,00
para pagamento dos contínuos da Secretaria da Câmara e Cr$
20.000,00 para o pagamento de gratificação aos convocados do Teatro
Municipal durante a atual Temporada Lírica .
Art. 2.° Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação .
revogadas as disposições em contrário .
Prefeitura do Município de São Paulo , 28 de outubro de 1949,
396.º da fundação de São Paulo . () Prefeito, Asdrubal Euritysses
da Cunha Pelo Secretário de Negócios Internos e Jurídicos, Paulo
Teixeira Nogueira , Diretor do Departamento do Expediente e do Pes
soal . O Secretário das Finanças, João Pacheco Fernandes
Publicada na Diretoria do Departamento do Expediente e do Pes
soal, da Secretaria de Negócios Internos e Jurídicos, em 28 de outu
bro de 1949 . J Diretor, Paulo Teixeira Nogueira
ÍNDICE

COLABORAÇÃO

A crítica Literária no Brasil, por Wilson Martins 7


Traduções de Poesias Tupis, por A. Lemos Barbosa 27
Jongo, por Alceu Maynard Araújo 45
Sociedade dos Amigos dos Indios, por Herbert Baldus, Mário Miranda
Rosa, Gal . Cândido Mariano da Silva Rondon e Harald Schultz 55

PUBLICAÇÕES
Estudo Estatístico de Adolescentes da Cidade de São Paulo 75
Estudos Latino - Americanos 76
População Aborígenedo México no século xvi : 76
Publicações de Antropologia 77
Folklore Dominicano 77
O Homem de Tepexpan . 78
O “ Grupo de Ascendência Comum ” na China 79
Um Estudo Etnológico Sobre os Kaska 80
Os Contos de Juan Timoneda : Uma Contribuição Bibliográfica ao
Folclore

DOCUMENTAÇÃO

Ordens Régias

N.° 26 — Registo de uma carta do Ilmo. e Exmo. Snr . Gal. desta


Capitania, com a qual remete uma ordem de S. Magd . para ser
registada nos livros deste Senado sobre as Sesmarias de terras
que se devem conceder aos sesmeiros como abaixo se declara o
seguinte 85
112 REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL

N.° 27 Registo de uma ordem de S. Magd. mandando aqui re


gistar por ordem do Ilmo. e Exmo. Snr . Gal. e remetida por
ele a este Senado, sobre o que se deve praticar a respeito dos
gastos que os ouvidores costumam fazer a éste Senado cujas
circunstâncias e o mesmo a que se acha resgistrada neste lo.
a fl. 24 . 86

Papéis Avulsos
Doc . CLXXXIV Férias diversas 89
Doc . CLXXXV Recibos 90
Doc . CLXXXVI Relações de rendas 91

Atas da Câmara de Santo Amaro

Ata da sessão ordinárią realisada no dia 3 de março de 1913 . 95


Termo de comparecimento do dia 7 de abril de 1913 96
Ata da sessão extraordinária realizada no dia 9 de abril de 1913 97
Ata da sessão extraordinária realizada no dia 12 de abril de 1913 97
Continuação da ata da sessão realizada no dia 3 de março de 1913 . 98

ATOS OFICIAIS

Decretos
Decreto N.° 1.088, de 5 de outubro de 1949 – Dispõe sobre o regime
de serviço para os cargos de direção e chefia e outros análogos 103
Decreto N.° 1.089, de 15 de outubro de 1949 Regulamenta a con
cessão do prêmio “ Prefeitura de São Paulo ", do Salão Paulista
de Belas Artes, instituído pela Lei n . ° 3.171 , de 7 de outubro
de 1948 104
Decreto N.° 1.090, de 25 de outubro de 1949 Declara de utilidade
pública o imóvel situado à rua Faustolo n.° 1.670, Lapa, 15.º
subdistrito da Capital, necessário à execução do plano aprovado
pelo Decreto n .° 955, de 12 de março de 1947 105
Decreto N.° 1.091, de 106
Decreto N.° 1.092, de 26 de outubro de 1949 Fixa o quadro do
pessoal diarista para a Secretaria de Higiene e dá outras pro
vidências . 106
Decreto N.° 1.093, de 27 de outubro de 1949 Declara de utilidade
pública um imóvel situado à avenida Hortulânia ( não oficial),
destinado a instalações necessárias ao serviço de limpeza pública 107

Leis

Lei n .° 3.800, de 19 de outubro de 1949 Autoriza o Prefeito a


dispender a importância de Cr $ 25.000.000,00, para inicio e pros
seguimento de obras, melhoramentos e serviços públicos . 108
Lei N.° 3.801 , de 28 de outubro de 1949 Dispõe sobre a abertura
de um crédito de Cr $51.390.100,00 109
Lei N.° 3.802, de 28 de outubro de 1949 Abre crédito especial de
Cr $ 50.000,00 110

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