You are on page 1of 24
jmpossibilidade do objeto, de cumprimento no direito das obrigacées: didlogos com a solucao adotada no Cédigo Civil Alemao invalidade e falta Renata Carlos Steiner Sumdrio: 1.A doutrina germanista de Pontes de Miranda; 2. A teoria do fato juridico: entre existéncia, validade e eficdcia; 3. O regime das impossibilidades do objeto; 3.1 Diferentes im- possibilidades; 3.2 Impossibilidade e validade; 3.3 Impossibi- lidade e resolugdo; 4. A solugéo alemda; 4.1 O BGB antes da Reforma; 4.2 A discussdo sobre o conceito de Unméglichkeit; 4.3 A figura da quebra de deveres e a validade do negécio juridico; 5. Consideragées finais. 1.Adoutrina germanista de Pontes de Miranda Em 2002 0 Biirgerliches Gesetzbuch (BGB), Cédigo Civil Alemio, sofreu a maior Reforma desde sua entrada em vigor, em 1900." Significa dizer que por mais de cem anos 0 direito priva- do alemio foi regido pela obra mais auténtica da Pandectistica —__ igags ida pela Lei de Mcrefete-se a Reforma do Direito das Obrigacées, ecapreendis AT lernizacio do Direito Obrigacional, que entrou em vig\ ue serd tratada no presente texto por Reforma. 701 Digitalizada com CamScanner do século XIX. Nao se pode descurar que, peste Tonge Periodo, a Alemanha passou por duas grandes gu fiat ia reunificreae nazismo, pela divisao no periodo da guerra ee S Rcana a0 final da década de 80 por todas as couseaiieneias, econémi. cas e sociais, daf decorrentes. O século XX me ne Por certo, imune a tumultos e grandes modificagées. O , NO entanto, f "Emr 1984, Pontes de Miranda publica a primeir: a edigao de seu Tratado de Direito Privado, a maior obra de Direito Civil jg produzida no Brasil, alastrando-se por sessenta volumes, tendo bebido diretamente de fontes alemas para o desenvolvimento de seus estudos. E patente a influéncia germanica no pensamento de Pontes, recheado de citagées 4 doutrina daquele pais. A Pr6- pria construcio cientffica ponteana € tipicamente alema: l6gica e concatenada. Pontes é, pois, um germanista em terras brasi- leiras. : O Direito Privado alemao tem exercido especial influéncia na constru¢do do Direito brasileiro. Com efeito, desde ao menos a Pandectistica do século XIX, o regramento civil alemao tem sido utilizado como paradigma de construgao do arcabouco juri- dico brasileiro, reverberando tanto na Parte Geral do Cédigo Civil de 1916, mantida no atual Cédigo Civil, quanto no proprio estudo do Direito Civil, vez que, nado raro, a doutrina alema é tomada como pardmetro de estudo nas escolas brasileiras. Mais do que a construgao de um Cédigo, no entanto, o Direi- to alemao nao pode ser esquecido por sua competente possibili- dade de adaptagao aos novos tempos. Veja-se, por exemplo, que a doutrina da violagéo positiva do contrato’, nao surgiu nem se 2 Trata-se de construcao elaborada logo apés a entrada em vigor do BGB, no inicio do século XX, pelo advogado berlinense Hermann Staub, que partiu de uma “lacuna conceitual” na regulacao dos casos de descumprimen- to contratual naquele Codigo, Trabalhada ao longo do século XX pela doutri- Digitalizada com CamScanner termos do nas, antes da utilizacéo deste como ponto de partida pene ento de estudo em referencia ao Principio tra do que estamo: em demons! $s a tratar. Os alemies sio criati yos 0 suficiente para encontrar solucées para lemiidotexts jegal, e rigidos e cientificos 0 bastante Para nao transformar tal gtitude em libertinagem académica, O presente estudo dirige-se 4 questdo pontual no universo compreendido pelo direito alemio e brasileiro. Delimitando-se seu objeto, diga-se que 0 co: nceito de impossibilidade do objeto é fundamental ao estudo da teoria do fato juridico, a maior e mais viva contribuicio de Pontes a teoria do Direito. Somente para citar dois exemplos, liga-se a possibilidade do objeto a pré- pria validade do negécio juridico e utiliza-se a possibilidade ou nao de cumprimento da obrigacio como forma de diferenciar os regimes da mora e do inadimplemento absoluto. O Direito Obrigacional alemio mudou. Mudou com ele a importancia, os limites e as conceituagdes das diferentes facetas da impossibilidade. Pretende-se, a partir das linhas que seguem, tracar algumas consideragées sobre tais modificacdes e, em es- pecifico, cotejé-las com a divisio de planos do mundo juridico apresentada por Pontes de Miranda. da boa-fé objetiva 2. A teoria do fato juridico: entre existéncia, validade e eficdcia Pretender tratar o tema das impossibilidades do objeto a partir de Pontes de Miranda requer, como condicao sine qua non, que se estude igualmente sua teoria do fato jurfdico, lapida- da ao longo dos seis primeiros volumes do Tratado de Direito Privado. escrev i exidade intra-obrigacional e des- Serever Renata Carlos Sn cro do cna Dect de Mecrade Universidade Federal do Parans. Orientador Prof. Dr. Paulo Ro- berto Ribeiro Nalin, 2009). 703 Digitalizada com CamScanner to da concepsao de fato juridico defendida por Pontes de Miranda esté na ee eee oe Conceito € 0 de eficécia juridica. Com efeito, 0 Bee eeeoaes aaa claro que existéncia no mundo jurfdico nao pode s ere ida com eficdcia.) Assim, define fato juridico somo ° at es complexo de fatos sobre o qual incidiu a regra jurt Ac Leite ci © fato que dimana agora, ou mai tarde, talvez cont ees inte, ou talvez nao dimane, eficdcia juridica”. E a incidéncia que se destaca i lamental. : oe eter Leela partic, dentro do qual esto os planos O grande méri ina de qualidade costuma qualificar 0 fato juridico Saco Aecace| ee epics psidical Neste sentido, Francisco Amaral, “fatos juridicos sao acontecimentos que produzem efeitos juridicos, causan- do o nascimento, a modificagdo ou a extingao de relages juridicas ede seus direitos” (Francisco Amaral, Direito Civil: introducio. 7 edicgao. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 379) ou Arnoldo Wald, “os fatos juridicos sio aqueles que repercutem no direito, provocando a aquisicio, a modificacSo ou a extingao de direitos subjetivos” (Arnoldo Wald, Direito Civil: introdugaoe parte geral. 11* edicdo. Séo Paulo: Saraiva, 2009, p. 219). Conquanto seja correto ligar fatos juridicos a producio de efeitos, razdo de sua existéncia, € igualmente correto advertir que a mera entrada no mundo jurfdico nao pode ser qualificada como suficiente para que haja eficécia, E dizer: hé fatos juridicos que nao produzem eficdcia, ou que a tem suspensa. Neste sentido, afirma José Carlos Barbosa Moreira com precisio: “evite-se inserir no concei- to de validade referéncia aos efeitos do negécio ou, o que dé na mesma, inserir no conceito de invalidade (ou de qualquer de suas espécies) refer6en- cia a privacdo dos efeitos. Certo que a eficécia, de ordinério, pressupse a validade; mas € possivel que neg6cio nulo produza efeitos, assim como é possivel que negécio vélido nao os produza, por algum motivo especificado em lei, ou que nao os produza durante certo tempo, ou que nao os produza para determinadas pessoas.” (José Carlos Barbosa Moreira, Invalidade e Ine- ficdcia do Negécio Juridico, in: Revista de Direito Privado, n. 15, coordena- 40 Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Sao Paulo: Revista dos Tribunais, jul-set 2003, p. 224). 4 Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado. Tomo I. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954, p. 77, § 22. 5 “O mundo juridico nao é mais do que o mundo dos fatos juridicos, isto é, daqueles suportes faticos que lograram entrar no mundo juridico” (Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado. Tomo Il. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954, p. 183, § 159) 704 Digitalizada com CamScanner ,existéncia, nee e eficdcia, dé-se pela incidéncia da norma sobre um suporte atico. Para que tal corra, € indispensavel que suporte fatico seja suficiente a incidéncia: “quando, no mun: do, tornam-se realidade (= se concretizam) os fatos descritos os suportes facticos hipoté ticos, as normas jurfdicas inci aier juridicas incidem, erando fatos juridicos ° Em outras palavras, e adotando-se ¢ nomenclatura utilizada por Pontes, ter-se-ia de reconhecer que o suporte fatico deva conter todos os elementos de seu nucleo (cerne € elementos completantes). Adentrado a0 mundo juridico, os fatos juridicos serio classi- ficados a partir de dois crit€rios principais: a) a conformidade ou nio-conformidade com 0 direito eb) a presenca ou nao do ato humano volitivo no cerne do suporte fatico,” Passarao a0 plano da validade aqueles atos que sejam conformes ao ordenamento juridico e que tenham a vontade no seu suporte fatico. Portanto, negocios € atos juridicos em sentido estrito, Os demais, entram no mundo juridico e passam direto ao plano da eficdcia, tais como os fatos naturais (fatos juridicos em sentido estrito) e os atos ilcitos. O presente estudo circunscreve-se aos negécios juridicos. O suporte fatico dos negécios juridicos analisados no plano da validade é, portanto, suficiente a incidéncia da norma. Estdo no mundo juridico. Havendo a auséncia de algum elemento complementar, 0 negécio juridico (ou seu suporte fatico) seré considerado deficiente e, portanto, invdlido. Nesses casos, a norma novamente incide, desta vez sobre suporte fatico sufi- ciente, porém deficiente, e 0 retira do mundo jurfdico (daf por- que os negécios juridicos inv4lidos sejam existentes). A decreta- Gio de invalidade, seja ela nulidade ou anulabilidade, faz com 0 que o suporte fatico do negécio juridico invalido seja retirado do mundo juridico. E no plano da validade, conforme ensina Marcos Bernardes de Mello, que se fard a triagem entre o que é perfeito, pois nao 6 Marcos Bernardes de Mello, Teoria do Fato Juridico: plano da existéncia, 15? edicao, Sa : Saraiva, 2008, p. 89. ‘ ‘ 7 gi, So Pa edo Fa Juric: lao da itn cia., cit., p. 118. 705 Digitalizada com CamScanner dade, e o que esté eivado de vicios i [mundo juridico] que se the vai — o nao ser deficiente; Porque io de invali tem qualquer vicio de inval Nas palavras de Pontes, “é aqui ith a eficiéncia, quer dizer — 0 no ser deficiente; aqui é eae ‘cfeitos se terao de irradiar (eficdcia)” > i cio juridico iré produzir Sendo existente e villdes ae 2 Saran ches the eg, us fic ea validade e eficdcia. Hé invalidade ene nossivel guess conkuns to putativo ou na eficdcia inter. eficécia, como se vé no casamento put f er. ‘ ios jurtdi uléveis, e hé validade sem efics. m{stica dos negécios juridicos an' nize cia, tal como nos negécios sujeitos a condicao. ce : A invalidade, portanto, faz como que © suporte fatico seja retirado do mundo juridico. Em outras palavras, repele-se aque- le negécio juridico com vicio de invalidade. ee mesma forma, se © negécio jurfdico est4 polarizado ao adimp! lemento, tal como afirmou Clévis do Couto e Silva'®, o cumprimento da obrigacao faz com que se extinga a obrigacio, isto é, a propria Telacao juridica, O descumprimento, por sua vez, também pode ensejar a resolugao do negécio juridico, com a conseqiiente Teparacio em perdas e danos. So formas de saida do mundo juridico, Do exposto, e como linhas mestras do estudo que segue, deve-se retirar a conclusio de que decretacio de invalidade ¢ inadimplemento so conceitos inconfundiveis. E, Ppressuposto do adimplemento e do inadimplemento da obrigagao que o negécio juridico seja valido. Se invdlido, a sua desconstitui ‘40 opera-se logo no plano da validade, com a retirada do mundo juridico." Havendo invalidade, nao haverd lugar para falar-se em inadim- 8 Marcos Bernardes de Mello, Teoria do Fato Jurtdico: plano da existén- cia., cit., p. 103. 9 Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privad ‘Tome IV. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954, p.05, § 356.0 Drei? Privado, 10 Clovi i igacao come : ia ae Pa €SSilva, A obrigacao como processo. Sao Paulo: Bushats- 1 i A afloat Que se faz parte exclusivamente da compreensio dos deveres Pe — Panny do contrato, excluindo-se, portanto, aqueles laterais lidos ode Ghae a he Sobre o descumprimento de contratos invé- as Anspriiche wegen ‘positiver Vertragsver- ing fir Dritte"bei nichtige Vertragen. In: Juristen- 706 Digitalizada com CamScanner Jemento ou adimplemento, Alias, na eventualidade di havi do cumprimento da obrigacéo, este ser atingido la de a cio de invalidade com eficécia Tetroativa, a Resta saber como a teoria das impossibilidades teoria do fato juridico de Pontes de Miranda, sendo ee 3 compreensao do que segue as Conceituagées acima tragadas. 3. O regime das impossibilidades do objeto Conforme bem anota Paulo Luiz Netto Lébo, 0 Cédigo Civil brasileiro nao adota tratamento sistemético da matéria acerca da impossibilidade da Prestacao, que se encontra dispersa e dividi- danas modalidades das obrigacdes.!2 0 termo impossibilidade é utilizado em ao menos trés a momentos essenciais, a0 longo da codificagao civil: (i) quando da anilise dos pressupostos de validade do negécio jurfdico; (ii) quando da andlise da valida- de do termo e da condicio; e (iii) quando da anélise das obriga- goes de dar e fazer na Parte Geral do Livro das Obrigacoes. Ainda que sem expressa mengio legislativa, nao se pode descurar que a conceituacio da impossibilidade é fundamental ao regime do descumprimento contratual, em especifico a mora € 0 inadimplemento absoluto. Na recorrente frase de Agostinho Alvim, “d4-se inadimplemento absoluto quando a obrigagao nao foi cumprida, nem poders sé-lo, como no caso de perecimento do objeto, por culpa do devedor”.' E, portanto, a possibilidade de cumprimento da obrigacdo pedra de toque para a definicio do regime aplicavel. Desta oe sistematizando para fins deste trabalho a con- ceituacio de impossibilidade, pode-se ligé-la a duas formas es- 12 Paulo Luiz. Netto Labo, Teoria Geral das Obrigagées. Sao Paulo: Saraiva, 2005, p. 73. eee oa gosti ita; Dad fo das obrigagées ¢ suas conseqiiéncias. 3 Saoaany nae Feceyessis Paulo: Editora Juridica e Universitéria Leda., p. 25. 707 Digitalizada com CamScanner «dco: a decretacao de nulidade senciais de saida do mundo Laue ein inal dimpleniees 4 6cio juridico, ' . a oe oe dade do objeto pode fazer com que o aoe ae Scio juridico seja defeituoso, por auséncia i fe dooms Jemento complementar. Nestes casos, a ae inci. it vob : ele suporte fatico deficiente para retiré-lo do mun. a : naa do waridien: Em outros casos, @ impossibilidade are se ma- fe taré quando do cumprimento da obrigacio, | ‘azendo com o putesrers a ‘ossa ser alcancado. Nestes, haverd inadimplemen. haa al a tdvel ao devedor, ou simplesmente resolugig to, se tal for imput ue ° or impossibilidade, se esta nao lhe for imputével. eee idade, ensejando nulidade do nego. Seja ligada ao plano da validade, ne io jurfdieo seja ligada ao inadimplemento ou 8 resolucio, a a y . impossibilidade de que se trata ie exatamente ia mesma, Em outras palavras, é possivel classificé-la anteriormente hi andlise das diferentes conseqiiéncias e tal, lids, é incl ae lesejével para seu correto conhecimento. A diferenca, conforme se verd, diz respeito ao momento em que ocorre. 3.1 Diferentes impossibilidades Na conceituagao de Pontes de Miranda, a impossibilidade do objeto pode manifestar-se de cinco diferentes formas, a saber: impossibilidade cognoscitiva, légica, moral, juridica ou fisica.'S As duas primeiras levariam a insuficiéncia do suporte fitico, nao havendo negécio juridico; a impossibilidade moral se confunde 14 Na teoria do fato juridico de Pontes de Miranda, tanto a entrada quanto a sada do mundo juridico esto suj safda do mun ijeitas a incidéncia sobre o suporte fatico. Hi fatos juridicos que criam relaces juridicas, e juridicizam determinado fato do mundo, colorindo-o. Outros ha, no entanto, que incidem justamente Para retirar 0 suporte fatico do mundo juridico, desjurisdicizando-o, tais como a decretacio de nulidade, a anulacéo, Tevogacéo da manifestacao de vontade, rescisio, resolucdo, resilicao ou a cessacio de eficdcia por satisfacio, os Mirands, Trowel nto, yer exemple, (Francisco Cavalcanti Pontes és 2 “ivado. Tomo I. cit., p. 114-115, § 38). Tonos. ea gr © Mind, Trad de i Pinde 708 Digitalizada com CamScanner ilicitude do objeto d ‘i com a ilici © negécio, sendo i . splicive cab 7 a nulidade sangio Dar-se-ia impossibilidade cognoscitiva na hi 5 - a te tratagdo de objeto que nao pode ser conhecido Mere oT negocio juridico. Seria 0 caso, jeto de no exemplo dado pernardes de Mello, de contrato entre duas es aquela que ioirease primeiro guardasse um lugar bom para 0 outro no céu.'® Nestes casos, faltaria ao contrato o objeto. O mesmo se pode dizer quanto a impossibilidade légica.” Restam, portanto, as impossibilidades juridica e fisica que conforme afirma Pontes de Miranda, nfo tem o condio de impe- dir a entrada do elemento correspondente no mundo juridico."8 Em outras palavras, o negécio juridico dirigido & prestacio fisica ou juridicamente impossivel, é existente. Ha impossibilidade fisica quando a prestacio nao for realizé- vel pelo homem com suas préprias forcas, tal como a regulagao dos fluxos das marés ou a mudanga do curso de um rio, que passe a correr do mar para a nascente."° A impossibilidade juri- dica, por sua vez, € a decorrente de determinacio legal ou con- tratual que assim disponha como a constitui¢io de direito real que nao pode ser inscrito ou a divisdo da propriedade rural em parte ideal menor que o médulo rural. Delimitando-se o estudo exclusivamente a referidas hipéte- ses de impossibilidade, é relevante que se distinga entre aquela prestacio que é, em si, impossivel, e aquela que é impossfvel Pessoas para que 16 Marcos Bernardes de Mello, Teoria do Fato Juridico: Plano da Validade. 9 edicdo. So Paulo: Saraiva, 2008, p. 112. : 17 De se diferenciar a impossibilidade l6gica que alcance todo ° negécio, que entio ser4 inexistente, daquela que somente diga respeito a pare le, caso em que se teria como nio escrita. (Marcos. Bernardes de Melos faite do Fato Juridico: Plano da Validade. cit., p. 112 ¢ Francisco avacan i Pontes de Mixanda. Tratado.de Diraitu Privado: Tome TV. sit i DV¢r § 397). Se 18 ae Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado. i 97. : : ander paste Serio, Teoria do Fato Juridico: Plano da Validade. cit., p. 113. 709 Digitalizada com CamScanner somente ao devedor. Fala-se, aqui, em impossibilidade absolu., . ress respective npossivel apenas ao devedor, casos i fe iiea ou relativa, ou 4 eT ie Entao serg jeti bsoluta. Em nao sendo poss! fall imprido abies or ebrigacdo originalmente impessive levard, via de fein invalidade do negécio juridico, sSirlurancs/at no item abaixo.2° Desconsidera-se, em um prim’ ‘devedor. A ae impos. sibilidade relativa, que toca apenas sf nga at fa : Teside a definicdo tragada por Pontes de Miranda: 4 ere ie Presta. Gio que se nio pode fazer, por alguma Su e fr dl 7 (a) P21 O momento em que se aprecia a invalid fa Pec ra de toque ara o estudo de suas conseqiéncias no direito brasileiro. Assim, fsverd impossibilidades j4 existentes quando da conclusio do negécio juridico, as chamadas Eres origindrias, e aquelas que somente se ocorrem apés a conclusao, as impossibi. lidade supervenientes. O tempo em que ocorrem é fundamental para a conseqiiéncia juridica advinda, conforme anota Pontes de Miranda.” 3.2 Impossibilidade e validade A possibilidade do objeto da obrigacio, ou da prestagio, é elemento complementar ao suporte fatico dos negécios juridi- cos. Assim dispée, expressamente, o art. 104, II do Cédigo Civil, ao determinar que a validade do negécio juridico requer “objeto licito, possivel, determinado ou determindvel”. Objeto, aqui, é utilizado em sentido amplo, tal como explica Marcos Bernardes de Mello.” A possibilidade, portanto, deve 20 Diz-se via de regra porque o préprio Cédigo Civil excepciona a possibil- dade de que o contrato dirigido & Prestacdo impossivel, porém a termo, seja considerado vilido se, antes do seu advent fi vel econ ento, a prestacdo passe a ser possi 21 Francisco Cavalcanti Pontes de Mi ireito Privado. Teac ce raat es le Miranda, Tratado de Direito Privado. mifeates es - Grifou-se. rancisco Cavalcanti Pontes de Mi pera Tomo lV. cit, p. 166, § 397° Mitands, Tratado de Direito Privado. 2 Marcos Bemardes de Mell, Teoria do Fato Jurdico: plano da validade, no Digitalizada com CamScanner ocar tanto a0 objeto da obrigagao (a prestaca, 7 a da prestacio (ou objeto mediato ds ee obje- oes das impossibilidades encontram aqui grande cam Pie aga0- ~ qa efeito, nao € qualquer im, invalidade do negécio juridico. Em primeiro Ponto, a impossibi jidade deverd ser originéria, ou seja, existente ao tempo te, = tituicio do vinculo. Em sendo superveniente, we juridica ser a resolugao do negécio, to, conforme se ver4. Mais do que originaria, no entanto, é ne- cessrio que a impossibilidade seja também absoluta, é dizer alcance a todos e nao apenas ao devedor. : A impossibilidade relativa, que toca apenas ao devedor, nao invalida 0 negécio juridico, pois conforme afirma Orlando Go- mes, mais se assemelha a uma dificuldade de cumprimento.4 £ televante no estudo do plano da validade unicamente aquela impossibilidade origindria e absoluta.25 O legislador brasileiro, a par de ter firmado regra geral na tedagao do art. 104, II do Cédigo Civil, a complementa no art. 106, expressamente consignando que a impossibilidade inicial do objeto nao invalida o negécio juridico se for relativa ou, sendo absoluta, se cessar antes de realizada a condicao. Ou seja: quem Ppromete aquilo que, por questdes pessoais, nao pode cumprir, nao negocia invalidamente. Comentando referida disposigao legal, afirmam Gustavo Te- pedino, Heloisa Helena Barboza e Maria Celina Bodin de Mo- Taes que o negécio subordinado a condicao suspensiva, ainda que tenha objeto impossivel, serd vilido desde que este deixe de ser impossivel antes de implementada a condigao: “nesse caso, sua validade fica preservada, pois nao poderia produzir efeitos antes do cumprimento da condicio, independentemente da possibili- dade do objeto”.2> No mesmo sentido afirma Orlando Gomes, possibilidade que levaré a @ conseqiiéncia com ou sem inadimplemen- eit., p. 112. : 2 Orlando Gomes, Obrigagdes. 16a edicéo, atualizada por Edvaldo Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 44. : a 7 i ‘bo, Teoria Geral das Obrigagées.cit.p. 71. a aca ocsserl ‘Cédigo Civil interpretado conforme a Constitui. m Digitalizada com CamScanner inéria nem sempre impede g ao trazer que a impossbilidade widica.” constituicao vélida da rela Eom objeto possivel Portanto, a igaco nasce valida, 4 o condao de Sea oe impossibilidade rea oe ue os en Sea eee a conclusio repouss no fato ¢° 4 0s de sua eer om dicos levern set aval br no Pata da valida z are em sendo tornado imposs Ae 7 Portanto, have. sua constituigao. 7 dcio juridico. io do neg’ er rd abertura para a ee do na validade do negécio juridico, : O° et objeto 6 imposstvel, contratou invalida. irmou cont direito ao ressarcimento dos danos decorrentes de mente e tem por aquilo que nao teria perdido seu interesse negativo, ou seja, Por aqUND 18 se no houvesse conclufdo o negdcio jurfdico invélido. Em ou- tras palavras, a sentenca que decreta a nulidade tem a eficacia 7 preponderante de retirar o suporte fatico deficiente do mundo juridico e desconstituir seus efeitos, que sio somente aparentes, ‘A desconstituigao implica no retorno a0 status quo anterior, assim como na reparacio do credor, em especifico quando a causa de nulidade era de conhecimento do participe contratual. Asolucio, aqui, repousa integralmente no plano da validade. 3.3 Impossibilidade e falta de cumprimento Havendo impossibilidade superveniente, ficaré o devedor impossibilitado de prestar. Se a liberaco da prestacao é conse- qiiéncia ldgica, e até mesmo pacffica, o mesmo ndo se pode afirmar quanto 4 consideracao da falta de cumprimento como efetivo descumprimento contratual. Em outras palavras, é dis- gio da Repablica. volume I. 2* Renovar, 2007, p. 222. 2 Orlando Gomes, Obrigagses. cit ; idecacai ‘ : cit., p. 43. Frise-se, no entanto, que 2 consideracio somente pode ser utilizada a respeito das impossibilidades fis- eehiade we eee petra apenas no momento da conclusio, Miranda, Tratado ae ‘0 adimplemento. (Francisco Cavalcanti Pontes de Direit is 28 Francisco Cavaeant Ponte a aon Vsti B. 167, § 397). TomoV. cit, p. 170, $399 0° Mitanda, Tratado de Direito Privado edicdo, revista e atualizada. Rio de Janeiro: 72 Digitalizada com CamScanner j | cutivel se 0 devedor im, nao imputavel possa inc Aresolugio do nego: Possibilitado de i ‘orrer em efetiva fatec con® on cio juridico Por impossibilidade suy = niente opera-se ex lege, disciplinada na Parte geral do di eae obrigagdes ¢ ligada as diferentes modalidades de prestacbes “s especifico as de dar coisa certa ou fazer. Nestes calorie a propriedade, nao se pode falar em invalidade do negécio juan co. A resolugio € forma de saida do mundo juridico, ane a9 pode conviver com a invalidade. E di i ie vi a zer: ou se invalida, ou se resolve; nao se resolve o que é invalido, Nas ligdes de Joao de Matos Antunes Varela, a luz do direito portugués, porém aplicdveis também ao ordenamento juridico brasileiro, somente nos casos em que a falta dec i ‘umprimento for imputavel ao devedor € que se poderia, com propriedade, falar- se de falta de cumprimento.® Ainda que o Cédigo Civil nao traga tal conclusio de forma expressa, é certo que o devedor somente responde pela impossibilidade quando houver culpa, sendo me- lhor aqui falar-se em nexo de imputagdo (que poderé ser culposa ou objetiva, por exemplo). Em sentindo contrério € a ligio de Jorge Cesa Ferreira da Silva, para quem também a impossibilidade superveniente deva ser considerada espécie do género inadimplemento absoluto.” Ainda que a discussio tenha interesse académico elevado, nao se encontra espaco no presente ensaio para sua verticalizacio. importante, no entanto, que se frise que nestes casos, de impossibilidade superveniente, nao h4 como se falar em possibi- lidade de exigir a prestagio do devedor: este libera-se, de pleno direito, do dever de prestar. A obrigacao, nestes casos, pode extinguir-se por resolugéo automatica, casos em que caberé a volta ao estado anterior, ou modificar-se, para passar a ser com- pensada por perdas e danos, devida pelo devedor faltoso. 29 Joao de Matos Antunes Varela, Das Obrigagdes em Geral, Volume Il, 7* edicdo. Coimbra: Almedina, 2004, p. 63. pr deren 30 Jorge Cesa Ferreira da Silva, Inadimplemento das obrigages Bites de Direito Civil, estudos em homenagem ao Professor Miguel aa es Coal denacao Miguel Reale e Judith Martins-Costa. Sao Paulo: Revista dos nais, 2006, p. 36-38. 713 Digitalizada com CamScanner i -se de meio de extin. males Upbea detontes de Mic ara ave haja incidéncia dag sao das obrigagées sem ain das conseqiiéncias da impossibilida. Remarc ioe Jo Cédigo Civil) € imprescindivel que de (art. 2 e emictes acao validamente constitutd, Ou seja, peau pradiichs de seus efeitos proprios. As hipéteses sio incon. fundfveis, no direito brasileiro. 4. A solugio alema 4.1 O BGB antes da Reforma ue o atual direito brasileiro, © direito iene aa pees apresentava falta de sistematizacao quanto ao regime das impossibilidades. A conclusao é retirada de Antonio Menezes Cordeiro, que afirma que o mesmo pode ser dito quanto ao direito portugués. Conforme ae infere da ligéo do doutrinador, referido esquema fragmentério é “fruto de uma evolugio histérica conturbada e na seqiiéncia de falta de uma doutrina geral das perturbacées das prestagdes” 22 Com efeito, a regulagao da impossibilidade no direito ale- mao anterior a Reforma é basicamente idéntica Aquela encontra- da no Brasil e em Portugal: a) a impossibilidade absoluta origina- tia era causa de invalidade do negécio juridico (§ 306 — tedacgio antiga); b) a impossibilidade Superveniente e a relativa eram Causas de extingao do vinculo obrigacional por descumprimento (liberacao do dever de Prestar), sendo que a imputabilidade da impossibilidade era pedra de toque para o dever de reparar®; e 32 Antonio Menezes Cordeiro, Da modernizagai ireito Civil Gerais. Coimbra: ‘Almedina, 2004, p. 1 ee do Direito Civil. Aspectos nears : i Havia grupo que entendia que can didi ina aoe Com a impossibilidade relativa supervenien- 7 $40 quanto sua imputabilidade a0 devedor. A maior parte da Digitalizada com CamScanner ga impossibilidade absolut cessasse antes do impleme: 2 —redacao antiga). Em outras palavras, o momento temporal, antes ou depo; conclusio do negécio juridico, em que se di a impossibitis 2 possufa a mesma importancia hoje encontrada no direito be i leiro. As conseqiiéncias juridicas eram igualmente diversas a os casos de impossibilidade origindria superveniente. Tambér entrava em cena a distincao entre a impossibilidade objetiva e subjetiva. Importava, para a in ortava, p cidéncia da norma acerca da nuli- dade do negécio juridico, que a impossibilidade fosse “objetiva em si mesmo e por isso impossivel a todos” # Para Karl Larenz, a distincdo entre ambas as impossibilidades poderia ser feita inclusive quanto 4 nomenclatura: A absoluta, manter-se-ia 0 termo Unméglichkeit, que significa justamente impossibilidade; a relativa, por tocar apenas ao devedor, melhor seria dar-lhe o nome de Unvermégen, que em traducao livre significa incapacidade ou impoténcia para prestar.5 Apés tracar a diferenciagao, com fundamento legal, o doutri- nador alemao faz o seguinte questionamento, cuja importancia é vital para o texto que segue: “por qual razo a lei determina que um contrato voltado & prestagao objetivamente impossivel seja nulo enquanto que no caso de mera impossibilidade subjetiva o ta poderia nio levar A inval invali nto da condicdo ou do earn doutrina e a jurisprudéncia, no entanto, tendiam a concluir que a impossibi- lidade originéria relativa era sempre responsabilizada ao devedor, por inci- déncia de um regime de garantia legal, embasada em parte pelo sentido da romessa da prestacio, pelo principio da confianga e pela seguranca do tréfe- 80 negocial. (Karl Larenz, Lehrbuch des Schuldrechts. Band 1. Allgemeiner Teil. 14. Edigdo. Munique: C.H. Beck, 1987, p. 101). 34 Karl Larenz, Lehrbuch des Schuldrechts. cit, p.98. 35 Karl Larenz, Lehrbuch des Schuldrechts. cit., p. 98. A distingao é comum na doutrina alema. Exemplificativamente, veja-se a opiniao de Teed Ea cerus, Theodor Kipp e Martin Wolff, para quem a impossibilidade es en do literal s6 pode ser aquela prestagao que nao se pode realizar em e 3s ae Sendo possivel, porém nio ao devedor, haverd tao-somente ee ae 20 cumprimento. (Ludwig Ennecerus et.al., Tratado de Dee eae duccién de la 35. Edicién Alemana. Tomo II. Volume I. 2* edigao. Bosch Casa Editorial, s/a, p . 154). ms Digitalizada com CamScanner devedor esti obrigado & PIEStOSTT Aosta ilogicidade da obri. proprio afirma, mas : ni possivel visto que seria plenamente Dede mess cm Parts emit eo eae ever de reparacio.” A solugao pela favalidede do versio em epousa no direito comumy Po ium nulla est enaeiss nulidade do contrato decorrente da impossibilida. de origindria da prestacéo, sendo este ae ou juridica, respon. dia o devedor que, ao tempo 09 conclusio oe soubesse su devesse saber de tal fato22 A responsabili lade, como desde Rudolf von Jhering se reconhece, 6 aquele advinda do interesse contratual negativo ou do dano da confianga na realizagio Plena e vilida do contrato. Sublinhe-se tal consideracao para 0 estudo da modificacio realizada no BGB, conforme se verd adiante, Mais do que ligada a validade do negécio juridico, a impor- tancia da impossibilidade no direito alemao anterior 4 Reforma era indiscutivel no estudo da sistematica do descumprimento contratual. Com efeito, a impossibilidade nao era conceito inse- rido na idéia de inadimplemento: era, ela propria, uma forma de descumprimento e liberacéo da prestagao, ao lado da mora. A questo da imputabilidade da impossibilidade superveniente era critério distintivo das duas conseqiiéncias possiveis: a extingio do vinculo, caso nao fosse imputavel, ou sua modificagao para pie * a ahd por descumprimento contratual, “ie ze este 0 entendimento que se retira, exemplificativamente, us-Wilhelm Canaris, ao afirmar que a cat ia dei eellcade possuia no BGB uma dupla fungao De. teen indamento de liberagio do devedor do de age ee eel tacao; por outro, fi ver priméario de pres- mento para o dirsita'de’ slenatats ee mandar reparagéo pela quebra de lo de Derecho Civil... cit .. cit,, p. 156, ido de Derecho Civil... cit. a 239. Digitalizada com CamScanner deveres.” A distingao era nitida na redacao do BGB anterior 3 Reforma. Tanto assim que Joseph Esser, ao tratar do tema em 1949, definiu a quebra de contrato (Vertragsverletzung), melhor pro- priamente chamada de violacio do crédito (Forderungsverlet- zung), como qualquer perturbagéo 4 normal execugao do con- trato, imputavel ao devedor ou ao credor.’! Ao elencar as formas de perturbacao, afirmou encontrarem-se divididas em dois gru- pos: a impossibilidade (§§ 275, 280-283, 323-325) e a mora do devedor (§§ 284-292, 326). Para além destes casos, o BGB trava expressamente sobre a mora do credor. Outras formas de descumprimento da obrigacdo, tal como a violagéo positiva do crédito ou mesmo a quebra da base objetiva do contrato, eram absolutamente relegadas pela redagdo do Cédigo Civil, tendo obtido enorme desenvolvimento a partir da doutrina e jurispru- déncia alemis ao longo de todo 0 século XX. A insuficiéncia do conceito foi um dos motivos a colocar-se na pauta de discussdes a manutencio da impossibilidade como centro do direito das perturbagées da relacao obrigacional. A principal razdo que justifica a criagio de um novo direito obriga- 40 Claus-Wilhelm Canaris, Zur Bedeutung der Kategorie der “Unmiéglich- keit” fiir das Recht der Leistungsstérungen. In: Reiner Schultze e Hans Schulte-Nélke. Die Schuldrechtsreform vor dem Hintergrund des Gemeins- chaftsrechts. Turingia: Mohr Siebeck, 2001, p. 44. 41 Josef Esser, BGB Schuldrecht: Allgemeiner Teil und Besonderer Teil. Karlsruhe: C.F. Miiller, 1949, p. 134. 42. Josef Esser, BGB Schuldrecht: Allgemeiner Teil und Besonderer Teil. cit., p. 134. Todos os pardgrafos do BGB citados so correspondentes a sua reda- do anterior & Reforma. 43 Assim afirmam Hans BROX e Wolf-Dietrich WALKER, ao trazer que 0 direito das perturbacées das obrigacées, que regula os conceitos e as conse- qiéncias juridicas das perturbacées, estava até 2001 polarizado nas figuras legisladas, quais sejam, a impossibilidade, a mora do devedor, a mora do credor assim como a responsabilidade por vicio do objeto no contrato de compra e venda. A violacao positiva do contrato, a culpa in contrahendo e a quebra da base do contrato nao estavam reguladas no corpo do BGB, como é sabido. (Hans Brox e Wolf-Dietrich Walker, Allgemeines Schuldrecht. 30 ‘Auflage. Munique: C.H. Beck, 2004, p. 222). n7 Digitalizada com CamScanner idade de adaptacio ag a na necessit S Dj. ion ena ate copeia, em especifico aquelas que di retivas da Unido sumidor, do e-commerce e a0 ate respeito a protest 39 cam ; no pagamento (mora).' ativa a ser implementada, yen, i de saa coca nodireito obrigacional, mas também a pres, so aee ee raficando-se o proprio BGB e no apenas editangoe, crigéo, modi fe ‘A Reforma é marcada pela influéncia de docu. serra lat necionals de unificagio do direc, dente, 0: gus destacam o Principles of European conte na we omisséo Européia de Direito Contratual e dos Princip ‘ernational IT. ial Contracts, UNI-DROIT. eal rad e fundamentais modificacées, certamente i i la empreendia no Tegime do poderia passar despercebida aquel 2 oo “im das impossibilidades, Oestudo da solugao alemi, aliada a divisig de planos de Pontes de Miranda é interessante ponto de partida Para discussdes em terras brasileiras. 4.2 A discussao sobre 0 conceito de Unméglichkeit Tratando do conceito da categoria de impossibilidade, ainda quando a Reforma do BGB era discutida, Claus-Wilhelm Cana- tis inicia sua exposigao afirmando que “pertencia declaradamen- “4 AP6s a entrada em vigor da Lei de Modernizagio do Direito Obrigacio- nal, fala-se, na Alemanha, em novo direito obrigacional, 0 que pode ser facilmente observado pelo nimero de Publicagses, pés 2002, que avaliam 0 neues Schuldrecht, 45. Assim afirmam Stephan Lorenz e Thomas Riehm, Lehrbuch zum neuen Schuldrecht. Verlag C.H.Beck Minchen, 2002, p. 01. Richtlinien 1999-44- EG, 2000-31-EG e 2000-35-EG. No mesmo sentido Claus-Wilhelm Cana- ris, a0 afirmar que a origem da Reforma estava na diretiva da Uniio Européia sobre Protecdo do consumidor que acabou por ser utilizada pelo Ministério da Justica alemio como forca motriz. para adogao de uma solugio ampla, abrangendo também a inexecucio e execugdo defei scrigio € contratos de venda na ecucao defeituosa, a prescri¢: Canaris Gadi ins as relagses de consumo, (Claus Wilhelm yy fo is Ge ri ‘lei Direito Comparado 35, i ae na Alemanha, In: Revista Brasileira de 718 Digitalizada com CamScanner te aos objetivos da ‘Comissio de Reforma do Direito Obrigacio- nal’ que ‘a impossibilidade deve perder sua Posicao central no direito das perturbagées obrigacionais”.*® Como conseqiiéncia tornou-se inevitdvel a discussio sobre a utilizagdo do conceito de impossibilidade no direito obrigacional alemao, sustendo-se que ela deveria ser reconduzida a apenas um dos casos de quebra de deveres.*” Embora a impossibilidade se encontre hoje reduzida a um dos casos de perturbagao da relacao obrigacional, é certo que sua importancia restou mantida no corpo do BGB. O § 275, que antes se referia tinica e téo-somente aos casos da chamada ver- dadeira impossibilidade (ecthe Unméglichkeit)*®, passou a tratar de forma indistinta todas as impossibilidades. A redacdo é clara o suficiente para se entender que o dever primério de prestagdo resta excluido quando a prestacio for impossfvel ao credor ou a qualquer outra pessoa. Com efeito, § 275 apés a Reforma determina que o dever primério de prestacdo se extingue na medida da impossibilidade da prestacio. A utilizacéo do verbo ser no presente, é imposstvel (unméglich ist), é sublinhada por Hans Brox e Wolf-Dietrich Walker ao afirmarem que nao tem qualquer relevancia o mo- mento temporal em que a impossibilidade ocorre.“® Basta que a 46 Claus-Wilhelm Canaris, Zur Bedeutung der Kategorie der “Unmiglich- keit" fiir das Recht der Leistungsstérungen. cit., p. 43. 47 Stephan Lorenz e Thomas Riehm, Lehrbuch zum neuen Schuldrecht. it., p.146. 48 Na visio de Dieter Medicus e Stefan Lorenz, seriam formas de verdadei- ras impossibilidades tanto a impossibilidade fisica do objeto, que se dé quan- do o devedor nao pode prestar pois, por leis da natureza, é impossivel a realizagéo da prestacdo, quanto a impossibilidade juridica, que se dé quando a execucao da prestacao é proibida ao devedor ou por razées legais, é proibi- da. (Dieter Medicus e Stephan Lorenz, Schuldrecht I Allgemeiner Teil. 18. ‘Auflage. Munique: C.H. Beck, 2008, p. 154). 49 Hans Brox e Wolf-Dietrich Walker, Allgemeines Schuldrecht. 30 Auflage. cit., p. 228. O mesmo se encontra em varios outros doutrinadores alemaes. Faz-se aqui referéncia apenas exemplificativa a Dirk Looschelders, que tam- bém encontra a conclusio no tempo verbal empregado por referido artigo. O autor ainda salienta que a redacio pretérita do § 275 era aplicdvel apenas & 79 Digitalizada com CamScanner tail J, até mesmo porque € ilégi prea ol ee nio le ser cumprido, ECO a Many. Caen ‘ira funcdo da impossibilidade, ial como apon, fi is, ter sempre lugar: j tay ied ‘ it liberagao do devedor. A es esse s' a 7 Prsdalidades de impossibilidade somente tem sentido qu, da andlise da responsabilidade pela quebra de deveres, remue® r sua vez nos § 280 a 283 do BGB. ada ‘Aunificagio das diferentes impossibilidades em tornode conceito e momento temporal dnicos, a par da aparente simu cidade, implica modificagao das conseqiiéncias juridicas aye vindas. Se antes da Reforma o devedor respondia frente by ad. dor pela contratacao de obrigacio originalmente impossi Cre. PS s . Possivel, r ponsabilidade esta fundada no interesse contratual negatiy, Ca de confianca, hoje a questéo deixa de ser resolvida nolan = validade para implicar responsabilidade contratual por i no da contratual positivo ou de cumprimento. interesse A impossibilidade da obrigacéo nao conduz, em qual circunstincia, a invalidade do negécio juridico. Tant. qualquer com légica e propriedade, pode-se falar em efetiva falta de que, primento em decorrénci 5o origi | de cum. vel. Conforme ee tae gas aes pee SDOset- direito brasileiro, em especifico, porque Morita le ser dito no cumpridos ou descumpridos: sao, antes, dé ~ nulos nao sio diante sentenca constitutiva negativa , desconstituidos me- Anova redacio do § 311 B dei sibilidade originaria da ae rae deixa claro que a impos- na validade do negécio juridico, e1 ao tem qualquer interferéncia A partir da nova opcio do Tegislado: coreeitice aqui do contrato. juntamente com Dirk Looschelde: alemio, deve-se entender, fato de o dever primério de areaiotae hi ligacao entre o ee do negécio juridico e a vail nao ser exigivel desde a valido, ainda que o objeto seja i validade deste. O contrato é Ja Impossivel originariamente. a Tentes impossibilidade su; i drecht Alleomog ery chiente (unméglich wi ‘ aan lgemeiner Teil. 6. Auflage, eet wird). (Dirk Looschelders, Schul- '8e. Munique: Carl Heymanns Verlag, 2008, 80. Dir chelders, Schu recht Allgemeiner Tei , ht Allg k Looscheld huldy iner Teil, 0 cit., p. 211. Digitalizada com CamScanner A explicacio para teferida muda: i nga pode se 2 forme assinala An ‘6a pode ser buscada, con: assis itonio Menezes Cordeiro, impossibilidade da Prestacdo vem a atingir, ae te, 0 dever Principal de prestacao. Ora, se a relagdo juridica obrigacional Nao é limitada apenas a esta Prestaco, nao haveria porque se invalidar todo o Contrato, sendo que apenas a presta- ao é que permanecer4 bloqueada, conforme expressio utilizada pelo autor.5! A falta de cumprimento decorrenti esta subjetiva ou objetiva, implicaré a reparagdo dos danos dat decorrentes que se dé, no direito alemao apés a Reforma, na figura da quebra de deveres, 4.3 A figura da juridico e da impossibilidade, seja quebra de deveres e a validade do negécio Apés a Reforma, as diferentes situagdes de perturbacio da Prestacao (Leistungstérungen) sio conhecidas na Alemanha em torno do sistema da quebra de deveres (Pflichtverletzung). Se- gundo afirmam Hans Brox e Wold-Dietrich Walker, quando se trata do direito da perturbagio da relagdo obrigacional deve-se necessariamente ter em mente que, em que pese o conceito albergar diferentes situaces, Ihes € comum 0 fato de que nao houve cumprimento ordenado dos deveres de prestacao ou de protecao.? Ha quebra de deveres, 4 luz do § 280 do BGB, quando o devedor descumpre um dever decorrente da relagdo juridica obrigacional, o que abre ensejo a reparacdo de danos pelo cre- dor, desde que a falta seja Aquele imputdvel. A modificacio empreendida no § 241 do Cédigo Civil alemao, por sua vez, expressamente sinaliza para a existéncia de deveres contratuais 51 Antonio Menezes Cordeiro. Da modernizagao do Direito Civil. cit., p. 106. 52 Hans Brox e Wolf-Dietrich Walker, Allgemeines Schuldrecht. cit., P. 211. De se notar, ainda, que na Alemanha apés a reforma nio se fala mais em descumprimento da obrigacao (Nichterfillung), mas, antes, de violacdo de deveres (p. 221). 721 Digitalizada com CamScanner 0 que se conhece no Brasiy s) e deveres nao ligados direrst (em suma, , traduzidos como deveres ‘secundério poderiam sé! rato voltado a prestacio impos. egras referentes 4 fala sk i jo as Lea Stephan Lorenz e Thomas ligados & prestacao deveres principais € mente a prestagao, que laterais de conduta. Em nao sendo nulo o cont! vel, eneonteal eae se aaa cumprimento, om alida stacao impossivel nao pod, i : da validade, a pre! eset cer fiaanura (§ 275), jindependente eo fato de o devedsr alee a invalidade ou nio”. A pare 7 constatacio, afir. mam 05 autores que hd igualmente queca Co Cever de contra. prestacao (§ 326 I 1, BGB), © ran Sneee tenha um, fo juridi deveres primérios aco. relacao juridica sem Se eae ars han Se a invalidade do contra x: interesse negativo, ou seja, aquele que decorre da legitima con. fianga de que o contrato firmado seria vilido, a impossibilidade origindria da prestagao surge, hoje, no dir eito alemao como jus. tificadora da reparacao do interesse positivo, ou seja, aquele que deriva da situagdo de descumprimento do curso normal da obri- gacao, esperado pelo credor. Ou seja: embora o devedor nao possa cumprir desde a con- clusao do negécio juridico, o credor poderd dele exigir a repara- gao de danos decorrentes de efetiva falta de cumprimento. Para isso, 0 § 31 1a II do BGB estabelece que cabe ao credor escolher dentre a reparagio de danos em lugar da prestacao faltosa, com base nas disposic6es aplicdveis 4 quebra de deveres, ou a indeni- za¢ao dos gastos que se tornaram intiteis com a falta de cumpri- mento (§ 284 BGB). ae beste a, a ate se demanda pela reparagéo dos credor seria estabelecer.se. situatio e ee Ee = Prestacao tivesse sido cum rida adore ace pee eit nitidamente de int prida a equadamente. Fala-se, aqui, €resse contratual positivo.54 De serem dife- 53. Stefan Los 5 a venz € Thomas Riehm, Lehrbuch zum neuen Schuldrecht. cit., p. 54 O interesse posit; 5 como interessenocumprig ea? Pot Hans Brox e Wolf-Dietrich Walket lento da Prestacao, sendo o dano que se demanda 722 Digitalizada com CamScanner renciados destes danos aqu i i tatam sb a rubrics de eparagle ea a gles lems wendungsersatz). Bestos ou despesas (Auf. A norma especffica do § 284 do BGB ri ea obrigacional © suportadas pelo credor que t 8 inda que a prestacio tivesse sido efetuad Imagine-se, por exemplo, a reforma no est4bulo que abri; a cavalo comprado, que acabou por falecer antes da tradiga Mes. mo que a prestacio fosse possivel e tivesse sido realizada pelo devedor, ainda assim os gastos seriam suportados pelo credor. Com a quebra da prestacao, no entanto, transformaram-se em despesas frustradas.°5 A luz do BGB, o credor pode opta pelas alternativas, porém nao as demanda concomitantemente. efere-se as despesas 5. Consideracées finais A escolha do legislador brasileiro pela nulidade do negécio juridico dirigido a objeto impossivel é clara e cogente. Certa- mente, nao ha espaco para discussdes referentes 4 conseqiiéncia daf advinda. O estudo da possibilidade aberta pela Reforma do BGB, porém, traz ao menos duas consideracées de interesse académico. A primeira delas é justamente demonstrar que a impossibilida- de origindria ligada a invalidade é apenas uma escolha legislativa. Nao se trata de conseqiiéncia légica dentro da teoria do fato juridi- co. Diferentemente se dé com a extingio do dever de prestar. Nao seria légico manter-se a obrigagao de prestar dirigida a objeto im- possivel: a liberagao do devedor é medida impositiva. A segunda é frisar que o direito brasileiro omite-se em parte essencial quanto as conseqiiéncias da impossibilidade superve- oriundo da situacdo em que o credor se encontra pelo néo cumprimento da prestacdo pelo devedor. Para isso, deve ser colocado na situacdo que estaria se a obrigacio tivesse sido regularmente cumprida. (Hans Brox e Wolf-Die- trich Walker, Allgemeines Schuldrecht. cit., p. 304). eco 55 Dieter Medicus e Stephan Lorenz, Schuldrecht I Allgemeiner Teil. 219. Digitalizada com CamScanner mbém quanto as conseqiiéncias niente e, porque ndo dizer, tO” écios juridicos nulos por advindas da desconstituicso dos ne! origins cio juridico com a superve. impossibilidade Cam efit, i resolusie do nee 48 do Codigo Cony, lidade do obj perdas e danos, é questig niente impossil ie Se cl vem scoparia doe pelt impossibilidade. A redacag tae deixa claro se hé ou nao inadimplementg do diploma legal nao aweneatespelto! ina, igualme i ’ aM eat raters tranqiilidade na doutrina brasileira enndenere de que, decretado nulo o negécio juridico, rest}. tiem se as ‘partes ao estado que se encontravam antes de sua ; fo da imputabilidade da falta ao devedor é celebragdo. A questdo da ee Pie cate abrangido'ea ooes i fins. desconsiderada para estes fins. iulincate releped pelo tare so retorno ao status quo ante € 1g Ie lador, que nao trata do chamado interesse contratual negativo, A reparagio dos danos causados ao participe contratual lesa. do pela impossibilidade da prestacdo, seja esta originaria ou su- perveniente e desde que imputdvel 4 outra parte, € certa. O fundamento de tal dever de reparar, por sua vez, nio é Pacifico, em especial quanto 4 impossibilidade originaria. Nesse sentido, ainda que a modificagdo empreendida na Alemanha seja deveras diversa da configuragao do regime das impossibilidades no direi- to brasileiro, os questionamentos ld efetuados podem ser pontos de partida para reflexdes em territ6rio patrio. Sem a intencao de transportar solugdes jurfdicas alienfgenas, até porque se trata de pretensdo nitidamente impossivel, é de se reconhecer que o problema juridico posto em causa nao conhece fronteiras: a impossibilidade do objeto é tema fundamental a a do fato e do negécio juridico, que h4 muito tem sido relegada e tratada de forma nio sistematica pelo Cédigo Civil. 724 Digitalizada com CamScanner

You might also like