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Diagnést; AENOstico @ tratamento | € crianca Sem tem a pos de Pslcomedicalizacao Rosa Maria Marini Mariotto En nossos tempos contemporaneos fratar e/ou educar uma crianca é também se confrontar com a questao do_uso de psicotrépicos por parte delas. Enquanto clinicos do sujeito, torna-se urgente e necessario que nos interro- guemos sobre os efeitos desta onda psicomedicamentosa | que alcancam tanto a crianca, quanto sua ordem familiar € - aescola. Tema este trabalhado nao apenas dentro do escopo | de estudos académicos e de pesquisa, mas que permanece a | se impor como questao onde quer que nos deparemos com | criangas e suas caixinhas de tarja preta. A substituicao do nome proprio das criangas pelo Jacionadas constitui Totulo diagndstico ao qual foram re ae ratica cada vez mais Irequente nas escolas, al e ert belos discursos da neurociéncia, da psiquiatria : ij uma éncia ao : a {a-se ai uma tendénc! desert das sng Soa ivas, na medida em das t imento singularidades subje! meds aoe a Ja vez mais, a set definidas por 1 cor eee aa Se palo ninadas ques tm Conjunto de sintomas € patologias deter nace - lais, tém por efelto a homogeneizacao ¢ ae ie an !ndividuais. Generaliza-s¢ © sofrimento, pe ate Tistia, o “desafino", destituindo-os ca signin que estabelecem em cada existencla- Digitalizado com CamScanner a: i 290 Rosa Maria Marini Mariotto Deste modo, a indicagao de psicofarmacos Para = oO tratamento de problemas de saude mental em crangay = reocupacao. Esperai az esperancas, mas também nea Pela possibilidade de novas drogas ajudar a diminutr grey prejuizos que os transtornos mentais acarretam As crian; a8, 0 Drazo, Drea tanto a curto quanto a longo prazo. Preocupagao pel, isco dessas indicagdes tenderem a banalizar 0 uso como solucao imediata e néo como _um recurso possivel a partir da _avaliacao risco-| . Psicopatologizacao da infancia A pratica clinica com criangas e a circulacao nos meios escolares, revela um aumento expressivo no uso de_medicacao psicotrépica pelos pequenos pacientes e alunos. A psicofarmacologia em nossa atual experiéncia tem ocupado lugar estratégico, transcendendo para além da _pratica psiquiatrica, migrando para a clinica médica pediatrica. Isto é, recebemos muitas vezes criangas diagnos- ticadas e medicalizadas com psicotrépico por seus médicos Pediatras, dispensando a consulta com 0 especialista neuro- pediatra ou psiquiatra. A despeito dessas ressalvas, no sentido de que o medi- camento deve ser a excegao, é fato que o numero de criangas medicadas nao para de crescer e seu impacto tem sido sentido tanto nas escolas como também no ambiente familiar. Com pais cada vez mais atarefados e com menos tempo part a educa¢ao dos filhos, a promessa de medicagao para tratar crlangas-problema €coou como uma solucao magica. Nos eae comprimitios Para melhorar a concentracs lanchetra do lian Irrequietos passaram a fazer Ren. con freienae Jn ano infantil. Aqui vale um comental cS de pesqutsas oo Panes nas escolas visitadas, em ee atendidas, acid ua 4s de acompanhamento de a baleao de farmécla ca da professora transformou-se NU! ‘ mentos a serem ad, Pols all se espalha uma série de medica Melhoral Infant ate tins Por ela durante o dia, desde Digitalizado com CamScanner POR wm c. amento de ertangas em tempos de... 29) ™Mpre, en, nicos © may fos como consequéncias de desajustes eNta vam em ¢ inlomas que se ter de pertur- es i a > Cas por meio da " air PSIqUICO cana tacos I azes de’ © Ue processos de condicionamento compctéencia» que ec Supostamente, criar mecanismos de restituido, © Permit confi itam ao sujeito ter seu equilibrio desajuste que pri! Para essas correntes, corresponde a um Com efeitg, »° ~ © deve — ser contornade then 2008). © poder ¢ , médico na pantteacio conferido pela nomeagao do sintoma : Pectiva da medicina clinica ¢ 6 poder de aenacio Proporcionado Pelo signo da anatomo-patologia Pl mM uma aderéncia descomunal do sujeito e dos seus Tesponsaveis a essa homeagao de doente, o que muitas vezes sela irremediavelmente um destino. O fruto do limite do discurso médico, Gite € 0 encaminhamento para o servico de satide mental, Muitas vezes tem essa Conotacao de destino, uma vez que insiste e Pretende tamponar esse furo com a nomea¢ao que inscreve no encaminhamento. (Diniz, 2008, on line) Para a psicanilise, distintamente, 0 conflito é marca éstrutural da subjetividade, razao pela qual seu pressuposto Jase estabelece como diametralmente oposto aquele subja- cente as intervencdes médicas: rcula hoje como saber médico no social se scene : um Saas de procedimentos, uma medicina Temediativa, sem moralizacdes para o futuro. Muito mals Pautada no controle da vida cotidiana, numa Peace habitos do Presente. No mundo contemporaneo, o ta remédios é expressao das maneiras encontradas Ee Para negar um mal-estar estrutural, (Guarido e . 2009, on line; grifo nosso) : vis- 'y,0¢8tacamos aqui o comentario de uma mie ee nine 2 0 seguinte quando perguntada 0 4 tro clinico ‘iy: Pediatra — teria dito a respeito Se rativo, hor ‘2 falou que ele é superalivo ° oe oleé meio é centra, “ie Superativo, porque ele se con ficar o tempo todo * R40 para um segundo, tem que Digitalizado com CamScanner 292 Rosa Maria Marini Marlotto nexendo em alguma coisa ou outra e é tudo rapido assim, [Foi feito 0 eletro e foi tudo normal. E ela recettou Tofranit 19 idrias”. mg tal de esclarecimento, 0 Tofranil é umd antidepressivo triciclico. Além de anti. depressivo, atua também como bloqueador das crises de panico. Pode ainda ser usado para controlar certos tipos de dores prolongadas e para tratar enurese noturna (criancas que urinam enquanto dormem depois de ja terem adquirido controle). A imipramina é uma droga usada para casos de TDAH, mas que ainda nao foi aprovada pelo FDA; recomenda-se EEG antes € depois de aumento de dose. Assim, destacamos aqui uma espécie de psicopato- logizacao da infancia e nao somente da crianga, fazendo com que a condicao perversa polimorfa do infantil seja medicalizada. Segundo Coser (2010) (...) a intolerancia social diant acarreta a prescrigdo de antipsicdticos, suplantando toda e qualquer barreira de contengéo que uma consciéncia temerosa dos eventuais danos que uma atitude deste tipo poderia acarretar frearia. Tais medicamentos sao usados sem que exista razao formal que o justifique. (p- 120) No que se refere ao diagnéstico de TDAH, encontramos um abuso justificado pela ciéncia ainda maior. Destacamos aqui o que Maria Aparecida Affonso Moyses (2011), profes- sora titular de pediatria da Unicamp comenta a respeito do 0 SNAP IV — protocolo oficial para o diagnostico do TDAH. P; este ii in ela. este nstrumento contém eritérios que est80 deser al ctivos, quantificavels, de facil avaliagao € que uma Se encuarin neles se tivesse algum problema neu nese. loge de qualquer racionalidade cientifica. Bast muspeliae ne alguns itens do material para verificarmos 45 ; 's levantadas pela médica: Costuma ' a perder, e rc meni Ps ee colsas ou nao saber aonde ae escolar, livros, cadernos, roupas: 2) Parece nao estar ouv! amente com 0 i indo quando se fala direta Imipramina, um e da turbuléncia infantil Digitalizado com CamScanner —_.. — Diagnéstico ¢ tratamento de erianeas em tempos de. =n 3) cou muita energia fisica, parece estar “Hgado na toms a plcmpo todo : Gee, ae conta ou se envolve contra a vontade em : ‘xigem esforgo mental prolongado re eee. em seu brilhante “O mal-estar na civili- bihdadene he feinava que os métodos com maior proba- ike ned ar 0 sofrimento sao justamente aqueles que © quimiee = Proprio organismo, entre os quais se inclui tanbeane ee segundo ele, € “o mais grosseiro, embora ain aes, eficaz”. Se, por um lado, 0 autor identifica Pecto positivo desse “amortecedor de preocupacées” (Sorgenbrecher), capaz de afastar os seres humanos da pressao da realidade, algando-os a um mundo proprio no qual se pode refugiar, por outro, aponta que (...) € exatamente essa propriedade dos intoxicantes que determina o seu perigo e a sua capacidade de causar danos. Sao responsaveis, em certas circunstancias, pelo desperdicio de uma grande quota de energia que poderia ser empregada para 0 aperfeicoamento humano. (p. 86) E incrivel situarmos ja nessa época a ideia de que num futuro nada distante, esse ‘excesso de intensidade psiquica’ seria transformado em um transtorno psiquiatrico! Hoje nao sabemos o que fazer quando vemos isso em algumas criangas. Uma das alternativas é: diagnosticar e medicar. O desenvolvimento tecnolégico e o maci¢o investimento de pesquisas nesse campo permitiram um avango sem Precedentes a respeito da anatomia e fisiologia cerebrais, a Ponto do periodo compreendido entre 1990-2000 ter ficado Conhecido como “a década do cérebro”. Diversas pesquisas desenvolvidas no mundo inteiro a esse respeito, em “onjunto, elucidaram mais sobre o funcionamento cerebral © que o que havia, até entao, sido produzido ao longo de da a histéria, Em razdo dessa ampliagdo, uma ampla #ma de informagdes passou a ser divulgada e colocada SPosigdo da coletividade, ganhando espago para além “reulo dos especialistas. Esse movimento se deve, em % re Medida, ao expressivo aumento de estudos dedicados Noyt®lonamento cerebral, realizados por uma nova area, a ‘encia. Portanto, a psicopatologia da pos-modernidade do \ Digitalizado com CamScanner Rosa Marla Marini Mariotto acteriza segundo Birman (2005), por sua q de pesquisa, fundada justamente nas tee cna psicolarmacologia. Seguindo seu raciocinio, as psiee® rapias neste sentido acabam ocupande tum lugar secu rente as intervencdes medicamentosas, ja que as pert goes do espirito passam a ser interpretadas, nesse contexte, pelos saberes da genctica, bioquimica e psicofarmacolo, ia em que a finalidade de um tratamento é regular as verlag; dos humores e das paixdes, para. normalizar justamente os tais excessos de intensidades psiquicas. * OQ levantamento feito pela Agéncia Nacional de Vigilancia Sanitaria - Anvisa (SNGPC, 2012J, indicou que as vendas no pais do remédio cloridrato de metilfenidato, usado para © tratamento de transtorno de déficit de atengao e hipera-~ fividade (TDAH), aumentaram quase 75% para criancas e adolescentes de 6 a 16 ano: i Em 2009, foram comercializadas 557.588 caixas — ou 156.623.848 mg — do medicamento em todo o Brasil, para todas as faixas etarias. Em 2011, foram vendidas 1.212.850 caixas ou 413.383.916 mg do produto. Esse numero abrange os registros de 47 mil farmacias e drogarias particulares do pais, coletados pelo Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC). Os dados do Sistema Unico de Satide (SUS) nao entram na conta. ‘Sendo assim, fica-se com uma grande interrogagae: de_ que modo o uso de psicofarmacos por criancas pode impactar, modificar, transformar e estruturar a posi a0 discursiva dos paisem relagao ao _{ilho mediealizade? Quando uma crian¢a recebe um diagnéstico médico, & em razao dele passa a fazer uso de uma determinada e dessa nova medicacao, como os pais se colocam diant o realidade? Qual seu papel quando as relagoes familiares passam a incorporar esse novo elemento? Que efeitos nao 86 parentais, mas fraternos e sociais a medicacao provoca? A familia tem de se adaptar para atender especificidades - 8 criangas cuja subjetividade se constroi. também, ea da nomeagao de um certo tipo de “t ranstorne + podendo vir a_m: Irremediavelmente uma existencl@ 0 signo “doente7anormal™, ml Digitalizado com CamScanner = = Diny 'RAMORLICO © trntamento de crtanean em tempos de. 26; Stacamos 0 comentario de uma ‘uvir do neuropediatra que een fhe apresen. me geo de TDAH (seu Aho faz uso de Ritalina, 15 Re disse: teu filho & TDAH e deve tomar medicacé Super porque até entao f ips 0 médico jogou: teu filho @ isso alert Tana esate! te eu par qtas * Vorearo (2011) comenta do melas ean 2.qUe as indeterminacd ésticas pee mag : nacoes diagnésticas podem produzir or aads. Ou seja, diante do “super ative a : fanto a mae quanto a crianea fic: deriva de uma identidade, engolidos por um cir “posto Ge eeura a nao pertinéncia da identificagao parental" retirando a crianga de ao menos se localizar simbolicamente nhuma patologia reconhecivel (p. 228). Vamos nos valer aqui da nocdo de discurso proposta por Lacan (1969-1970), entendida como a forme pela qual os sujeitos tecem e estruturam seus lacos sociais a partir da linguagem e das leis do inconsciente. E sempre no lacgo discursivo que devemos procurar a posi¢ao subjetiva de cada um, interrogando-nos sobre que sujeito se manifesta, Ja que cada discurso, em sua particularidade, revela de que forma um agente ao agir sobre 0 outro Pproduz posicées subjetivas singulares. A subjetividade assim se manifesta como um efeito de discurso. Para nos ajudar e compreender o que se Passa hoje, buscamos Lébrun (2004). O autor localiza trés tempos discursivos distintos em relagao a ciéncia: }) O discurso do homem de ciéncias, que inaugura a ciéncia como lugar de onde o sujeito enuncia um saber e a enun- Ciagéo subsiste, embora ja exista intengao de fazé-la desaparecer io discurso cientifico, em que de fato a enunciacao se cala oat apenas fazer valer a autoridade do enunciado; e 0 discurso téenico, em que se lida somente com enun- Clados, sem o vestigio da enunciagao. _Deste modo reconhecemos que a tecnociéncia contem- "nea nog apresentou e difundiu com eficacia a ideia de no lugar q Digitalizado com CamScanner 296 Rosa Maria Marini Mariotto que é possivel alcangar a felicidade por meios extremam, simples: livros de autoajuda, cirurgias, listas de comport” mentos adequados ¢ medicagao (Jerusalinsky e Fendi, 2011). A partir disso, varias questoes se imp6em: qual o lugar entao que o discurso psicomédico ocupa nos lacgos discursivos em que a crianga esta inserida; ou seja na familia, na escola? E mais, onde esta 0 sujeito? Qual sua posicao no discurso? Sabemos que 0 trabalho do psicanalista nao é apenas atender pacientes, mas tentar entender e questionar og efeitos dos discursos sobre suas vidas. Sabemos também que a tentagao de operar a partir de uma pratica que considera os sinais objetivos como dados inequivocos é grande. Por isso, muitas vezes 0 clinico opta por abandonar a escuta ea decifracao, por uma pratica que s¢ cunha em categorias nosograficas. Diagnéstico: transtorno x estrutura De acordo com o Aurélio (2003), a palavra diagndstico se refere a: 1. Conhecimento (efetivo ou em confirmagao) sobre algo, ao momento do seu exame; ou 2. Descricaéo minuciosa de algo, feita pelo examinador, classificador ou pesquisador, ou 3. Juizo declarado ou proferido sobre a caracteristica, composicdo, 0 comportamento, a natureza etc. de algo, com base nos dados e/ou informacées deste obtidos por meio de exame. Ao retomarmos 0 significado semantico da palavra queremos dar destaque a condicdo de ‘conhecimento ¢™ confirmacao’ indicado em sua definigao. Dunker (2011) comenta que um diagnéstico em psie*= mento que se estabelece entre o sujeito e seus sintome® (p. 457; grifo nosso). E como um psicanalista tenta localizar 0 tipo-d¢ sujeito alienacao e de sofrimento e estabelece entre 0 » e seus sintomas? A partir da\ a Digitalizado com CamScanner PFE eer eee ree Te Di: 6 ‘ABndstico ¢ tratamento de criangas em tempos de 27 Acscuta é0 0 . a é 0 tink 2 j eau co instrumento de que dispde o analista issge a avaliacdo que se defina subjet 1880, e também pelo wank ubjetiva. Por Scalvravel pelodene, ato, que-a estrutura do sujeito s6 é Nalitiea ede re nao pelo dito, é que na pralica psica- Poneman cee aa A a ‘em confirmacao’ ) Signifieado da palavra diagnéstico a ‘ssim, quando pensamo ' a oo z amos na questao diagnéstica o estra : aes ao longo do trabalho, onde o aceite recai Pa e entre 0 clinico e seu Paciente e a escuta. ani doe! Dor (1991) € sempre no dizer que algo da ¢ ura do sujeito é localizavel. Na medida mesmo que a formaca oma ¢ tributaria da palavra e da linguagem, 0 diagnéstico nao pode deixar de se ver ai concernido. No entanto, os sintomas nao constituem por si so elementos conflavels nesta avaliacao diagnéstica, senao a condi¢ao de se poder desligar da identificagao dos sintomas. A iden- tidade de um sintoma nunca é sendo um artefato a ser colocado por conta dos efeitos do inconsciente. A investi- gacgdo diagnéstica entaéo precisa se prolongar para além do sintoma, isto é, num espago de articulagao da palavra. E somente no desdobramento do dizer que se manifestam o que o autor citado chama de painéis de significagao, ou seja, uma espécie de perfil predeterminado da economia de seu desejo, ou os chamados tracos estruturais. O que parece coincidir com o comentario de Dunker, citado anterior- mente: “o tipo de alienagao e de sofrimento que se estabelece entre o sujeito e seus sintomas™. Recorrendo ainda a esse autor, Dunker (2011) vai Comentar que no discurso médico diagnosticar exigia uma ‘lassificacdio exaustiva e uma descrigao objetivante do Quadro e que Freud introduz uma homogeneidade entre syemento e diagnéstico e que se antes 0 sujeito do ee ivo era o discurso médico, representado pelo clinico € Rtiente em seu corpo era seu objeto, a psicanalise Hee Ma inversao, pois é o paciente que sera colocado com sy iagnésti agtito € 0 analista seu objeto. Desse modo, 0 eon ‘sq, ¢POF transformar a propria ideia de psicopatolog®. 1° ° diagnéstico é a leitura das articulagdes en! . “SMeanies sintomas e sua reatualizacao, a psicopatologia Digitalizado com CamScanner Rosa Maria Marini Mariotto 298 nao exprime apenas um quadro fixo, mas formas mai menos regulares de transferéncia. Portanto, estamos ‘4 ce ou do sujeito transtornado ¢ nao do transtorno. ‘aay Do que até aqui podemos concluir € que para se oper, um diagnéstico em psicandlise € preciso que 0 laco eats o psicanalista e aquele que o procura se estabeleca, es medida em que o analista esteja numa posic¢ao de escuta : 0 outro no lugar da fala. Aqui, damos destaque ao fato de que em nossa pratica clinica e em nossas pesquisas, observa-se claramente que os pais que consultam um médico especialista, invariavel. mente revelaram ter ouvido do médico o diagnéstico do filho e nenhum se referiu a ter sido escutado pelo doutor. Retomamos novamente Dunker (2011) que propée entao diferentes ordens de diagnéstico em fungao de diferentes ordens de questées implicadas na nocdo de transferéncia: a) O tipo de relagao de fala — 0 modo especifico como a mensagem retorna de forma invertida para 0 sujeito b) O tipo de relagao ao saber — atribuido, suposto ou exposto ¢) O tipo de completamento do sintoma pela demanda — no Outro, do Outro d) O tipo de aparelhamento de gozo — histérico, universi- tario, de mestre e) O tipo de relagdo com a falta — recalque, forclusao, recusa Nao pretendemos neste momento nos ocupar de analisar cada um destes elementos que compéem para este et oe dlseneuce. Até porque sao consideragées ae ar as fora do setting especifico do trabalho com trabalho diagnéetio entie sock nearer Ce oe Sen fleantss perieueres on a sera sempre o de “isolar 0S sient singular para cada paci fu aparecem em sua articulaca' ele adulto ou no, D que noe ponter 2011, p. 457): on cantes que se ae paras: leva 4 questo dos sign presentar essa crianca na ordem iar, no discurso e: i 7 Particular posigao ai, scolar € do especialista, indicando sua Digitalizado com CamScanner —_—— lagns, 'Sstico © tralamento de erlangas em t ‘as em tempos de. 20 S oO} endo assim, nos i r + Nos inte: da crianga n nteressa aqui justamente escutar ide, deal g 0 (eal dos pais luc se refere ao dese on (Oda, alien S-© de que modo ela Sree pall ada, cm separtene se situa nessa histéria Soe ‘aedo ou separada a que ess; A a Ponta Petri (290g) PTEPOSI¢aO coincide com 0 que nos (...) os in: istru clinica com eee de leitura que dispéc o analista, na cas, para a realizagéo de uma hipétese diagnésti ica sa aaa Dee ad Portanto, além da transferéncia, por meio rear a relacdo da crianca com 0 Outro, a escuta do d; permitam real cantes familiares Tundamentais que_ configuragao Te Sg ae ae Pesposia da erianga a essa gonliguragao. (p. 96) Portanto, observamos uma logica diagnéstica em acao: Transferéncia — Escuta — Hipétese — Direcéo De Trabalho ‘Transferéncia com o Outro Parental, com a Crianca e com os Outros sociais (escola, profissionais). A imperativa escuta de todos eles para a partir dai a possibilidade de uma construgao hipotética de uma compreensao a respeito do fins ao estabelecimento caso, sempre ‘em confirmagao’, com de uma direcao de trabalho, isto é, 0 que se pretende com esta andlise. Ora, na clinica médica € psicologica, a escuta € a hip6tese nado sao operadores clinicos que antecedem a direedo de tratamento. Esta ja esta dada por um saber r um saber cientifico ou por um ora do laco clinico, ou po saber capitalista. Nos servicos publicos de savide mental da ‘tlanca, nado raro as maes saem com 0 diagnostico, prognos- eee rescricao do filho debaixo do bra¢o sem sequel ie que do o filho para a consulta. Destacamos aqui 0 So & hem o médico vern a ocupar 0 lugar de saber, na ™ ee " oe sua fungdo é apenas a de adequar © medicine S i s ret ara o transtorno certo. Via de regra. ate eee ve ; vim, Para atualizar a receita do medicame io de | $ 0s médicos aconselhar os pais em seu M Digitalizado com CamScanner 300 Rosa Maria Marini Mariotto lidar com as dificuldades do filho. A tinica coisa due pedem é que sigam corretamente a administragéo do remédio e, em caso de diivida, consulte 0 dr. Google. : ‘e Lebrun (2004), ja citada E esta a aposta funesta qu r anteriormente, realiza ao langar @ hipotese de que o desen- volvimento da ciéncia moderna impés um novo lago social que substitui a relagao mestre-sujeito, para uma relacao saber (acéfalo)-sujeito, em que.o_mestre sai de cena e da_ Jugar_ao tecnocrata — lugar esse OCU ado _pelos es) ecia- listas —, como agente de transmissao de conhecimento. Essa é a implicagao da ciéncla quanto a funcao do pai, posto que exclui o seu lugar singular na transmissao € propée um discurso pronto que nao tem interesse pela questao do sujeito. E a medicacao — enquanto gadget — que ocupa 0 lugar de mestre. Ora, nao é jus' discutir sobre 0 discurso produzir a substituicgéo do discurs: discurso do capitalista? Todos esses elementos se encontram reunidos quando os pais procuram um analista para seu filho. A este prati- cante cabe a tarefa de dar lugar a cada um dos pontos que tecem o discurso para poder localizar com mais precisao 0 lugar legitimo da crianga-sujelto. Bernardino (2004) situa o desejo do analista como operador conceitual. Em sua dificuldade de enuncia¢ao, a crianga acaba sendo sustentada por um adulto préximo significativo. Qs pais, médicos e professores que falam em nome da crianga e pela crianca. Assim, é preciso que 0 analista se coloque no lugar de vazio, um para que a crian¢a tenha a oportunidade de se posicionar em nome préprio. __ 0 vazio produzido pelo analista enquanto dispositivo eae introduz algo inédito: a crianga se coloca diante jutro sem carregar 0 peso de ser 0 go: + Outro que nada quer dela. goz0 paresis vi tamente isso que Lacan apontou ao do capitalista? E 0 risco de se 0 do mestre para 0 eh eae: 0 desejo do analista enquanto apresentagao eae enede em relagdo a ela vai confronta-la com seta poss dade de um nao desejo da parte do Outro, festado por uma nado demanda, ou Seja, um Outro nao Digitalizado com CamScanner Diagnéstico e tratamento de erlancas em tempos de... 301 ‘ar. Ao poder, entao, 40 a0 nao desejo susten. INCAO “desejo" € desdo- Acompa cio nesta trajet6ria um parceiror ¢ analista que a Panha. (Bernardino, 2004, p. 64) Ope nb Referéncias BERNARDINO, L.M.F.O desejo do psicanalistae a crianga. In: BERNARDI- NO, L.M.F. (Org.). 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