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Tutorial – Módulo XIV/Problema 1

Sangramentos da segunda metade de gestação e cesárea


- A hemorragia obstétrica consiste em causa importante de morte materna, sendo a mais comum em países
desenvolvidos, como EUA, onde são responsáveis por 12% dos óbitos maternos, além de a maior razão para admissão
em UTI durante o ciclo grávido-puerperal, obrigando o rápido diagnóstico preciso, a fim de instituir tratamento
adequado e minimizar complicações.
- Além disso, tais condições estão associadas à mortalidade e morbidade perinatais significativas, por aumento da
incidência de prematuridade, baixo peso ao nascer, distúrbios respiratórios e óbitos perinatais.
1. Placenta prévia:
Conceito: Presença de tecido placentário total ou parcialmente inserido no segmento inferior do útero, após 28
semanas de gestação, podendo ser classificada em:
 Placenta prévia (centrototal ou centroparcial): a
placenta recobre total ou parcialmente o orifício interno do
colo uterino.
 Placenta de inserção baixa (marginal): a borda
placentária se insere no segmento inferior do útero, mas
não chega a atingir o orifício interno, se localizando em
um raio de 2 cm de distância dessa estrutura.
- Em algumas condições, a relação entre a placenta e o orifício
interno do colo pode modificar-se, de modo a uma placenta prévia, completada a dilatação, poder apresentar-se de
inserção baixa (migração fisiológica).
Epidemiologia:
 Incidência: varia de 0,26% a 1,0%, mas parece estar aumentando em consequência do maior número de
cesáreas nos últimos anos.
 Fatores de risco:
o Idade materna avançada: taxa é de 0,03% em nulíparas entre 20 e 29 anos versus 0,25% em
nulíparas com mais de 40 anos.
o Multiparidade: risco é de aproximadamente 0,2% em nulíparas e pode atingir até 5,0% em grandes
multíparas.
o Gestações múltiplas: a chance é cerca de 40% maior, quando comparado a gestações únicas.
o Número de cesáreas prévias: além de a probabilidade de persistência até o termo estar aumentada,
em paciente com duas cesáreas anteriores, o risco é em torno de 1,9%, aumentando para 4,1% nas
pacientes com antecedente de três ou mais cesáreas.
o Número de curetagens uterinas: confere maior risco, provavelmente devido à cicatriz no endométrio
proveniente do procedimento cirúrgico.
o História prévia: risco 8 vezes maior de novo episódio em futura gestação.
o Tabagismo: risco está duas vezes aumentado, o que parece ser secundário à hipoxemia induzida pelo
monóxido de carbono, que leva à hipertrofia placentária e à vascularização decidual deficiente.
 Morbimortalidade:
o Materna: placenta prévia aumenta o risco de hemorragia anteparto, intraparto e no período pós-parto,
fazendo com que essas mulheres estejam mais sujeitas a receber transfusões sanguíneas, assim como a
procedimentos cirúrgicos, como histerectomia, ligadura da artéria ilíaca interna ou embolização de
vasos pélvicos para controlar o sangramento.
o Neonatal: as principais causas compreendem prematuridade, anemia, hipóxia e restrição do
crescimento fetal.
- Com a administração de corticoide antenatal, postergação do parto quando possível e uso liberal da
cesárea, e nos cuidados neonatais, têm diminuído a ocorrência dessas complicações.
Fisiopatologia: Ela parece originar-se de uma anormalidade de implantação, o que geralmente ocorre com o
avanço da paridade, por exemplo, quando o endométrio pode estar danificado (deciduação deficiente) e o embrião,
como consequência, buscará outros locais para sua nutrição, implantando-se no segmento inferior do útero.
- Dessa forma, a placenta também procura alojar-se em local de maior vascularização (fundo uterino), fenômeno
denominado trofotropismo, enquanto a porção de trofoblasto que recobre áreas de menor vascularização (colo uterino)
costuma sofrer atrofia, o que permite, em alguns casos, que vasos fiquem em contato direto com as membranas, sem
tecido de sustentação placentário ou de cordão (vasa prévia).
 Migração: com o avanço da gestação, mais de 90% dessas placentas de inserção baixa identificadas no início
da gestação tornam-se altas, com aparente migração para regiões mais distantes do colo uterino e do segmento
inferior, o que se deve à diferença de crescimento entre os segmentos uterinos superior e inferior.
 Hemorragia: ocorre devido à separação coriodecidual, pela formação do segmento inferior do útero,
contrações uterinas e dilatação cervical, e persiste devido a ineficiência da contratilidade das fibras
miometriais presentes no local.
Diagnóstico: Qualquer gestante acima de 24 semanas com sangramento vaginal indolor deve levar à suspeita de
placenta prévia.
 Clínico: deve ser suspeitado diante de sangramento vaginal indolor de coloração vermelho vivo, imotivado,
de início súbito, reincidente, de gravidade progressiva, na segunda metade da gravidez, o que ocorre em 90%
dos casos (10% assintomáticas).
- O útero mostra consistência normal, mas contrações uterinas podem ser encontradas durante ou após o
episódio hemorrágico, contudo, o tônus uterino está normal nos seus intervalos.
 USG: o diagnóstico de placenta prévia é baseado na identificação de tecido placentário recobrindo ou muito
próximo ao orifício interno do colo uterino, por meio de exame de imagem, mais comumente o USG
transvaginal com o transdutor a 35º a cerca de 2cm do lábio anterior do colo, ao passo que visualiza bem,
mesmo em situações adversas (obesidade), o seguimento inferior do útero.
- Se a suspeita ocorrer antes de 28 semanas de gestação em paciente assintomática, uma nova ultrassonografia
deve ser realizada na 32ª semana, ao passo que, como supracitado, cerca de 90% das placentas prévias
diagnosticadas no segundo trimestre se resolverão até o termo.
- A chance de persistência do diagnóstico até o termo dependerá principalmente do fato de a placenta recobrir
ou não o orifício interno do colo, ou seja, uma placenta prévia que recobre o orifício persistirá até o termo em
26% das vezes, enquanto uma de inserção baixa ser encontrada no final da gestação apenas em 2,5% dos
casos.
 RMN: alternativa quando a USG transvaginal for inconclusiva, isso por gerar melhor visualização, não sofrer
interferência do polo cefálico fetal, e permitir melhor avaliação da relação
entre o tecido placentário e o colo uterino.
Tratamento: Depende da IG, da intensidade da hemorragia e da presença ou não
de trabalho de parto, e mesmo com boa parte dos casos se resolvendo no final da
gestação, as pacientes, orientamos essas gestantes, mesmo que assintomáticas, a
procurar o hospital diante de qualquer sinal de sangramento e a evitar atividade
física exagerada, assim como relações sexuais, principalmente após a 28ª semana.
- O seguimento deve incluir exames de USG transvaginal para a localização da placenta, e se a placenta prévia se
resolver durante esse seguimento, não mais será necessário continuar com a restrição de atividade e essa gestante pode
retornar ao pré-natal de risco habitual, caso não possua outras comorbidades.
 Sangramento: quando ocorre de forma controlada, recomenda-se internação imediata da gestante para
controle materno e de vitalidade fetal, bem como para realização de USG visando confirmar o diagnóstico.
o Deve-se obter acesso venoso calibroso para administrar cristaloides e manter a estabilidade
hemodinâmica e o débito urinário adequado.
o A PA e o pulso devem ser aferidos a intervalos que variam de 15 minutos a 1 hora, dependendo da
intensidade do sangramento.
o A avaliação laboratorial inicial inclui Hb e hematócrito, determinação do tipo sanguíneo e exames de
avaliação da função renal, além de se o sangramento for abundante ou houver outras complicações
dever-se avaliar o sistema de coagulação (fibrinogênio, plaquetas, TP e TTPA).
o Hemoderivados devem ser disponibilizados de acordo com a necessidade.
o A imunoglobulina anti-D deve ser administrada em gestantes com Rh negativo.
o Entre 25 e 34 semanas, na vigência de hemorragia, administram-se corticosteroides de forma
individualizada para o amadurecimento pulmonar fetal.
- Já quando o sangramento é incontrolável ou há sofrimento fetal, recomenda-se interrupção imediata por
cesárea.
 Expectante: adotada quando o sangramento materno não for intenso (ausência de alteração hemodinâmica)
em gestações com fetos pré-termo, principalmente por que 75% dos episódios de sangramento são
autolimitados, sem risco imediato para a mãe ou para o feto, e em 50% dos casos o parto pode ser postergado
por pelo menos quatro semanas.
- Recomenda-se repouso, suplementação de ferro elementar (60 mg por via oral, três ou quatro vezes ao dia), e
alguns autores indicam tocólise (inibição do parto) com sulfato de magnésio e a terbutalina nos casos de
contração uterina.
 Ativo: deve-se indicar imediata resolução da gestação (cesárea) diante de sangramento materno incontrolável
(alteração hemodinâmica), vitalidade fetal alterada, maturidade fetal comprovada ou idade gestacional acima
de 37 semanas.
- Em casos selecionados de placentas de inserção baixa, sem complicações e quando a distância entre a
placenta e o orifício interno do colo estiver entre 11 e 20 mm, pode-se permitir o parto por via vaginal.
 Parto: para o adequado planejamento cirúrgico, a USG transvaginal pré-operatória permite a localização da
placenta, de modo a o obstetra evitar incisar a placenta durante a histerotomia.
o Nas placentas posteriores e nas anteriores sem acretismo, deve ser realizada histerotomia transversa.
 Se a placenta ficar à mostra, ela deve ser descolada manualmente no sentido da menor área
placentária, para que se possa ter acesso à cavidade uterina, mas é possível que a incisão
tenha que ser transplacentária, com maior sangramento local.
o A incisão deve ser a segmentocorporal (vertical) nos casos de segmento inferior não formado ou
segmento inferior com vasos muito calibrosos.
o Quando a placenta for anterior, mas suspeitar-se de acretismo, também deve ser feita a incisão
segmentocorporal ou a histerotomia fúndica vertical.
- Quando houver sangramento do leito placentário pós dequitação, além do uso da ocitocina, pode ser feita a
compressão e, caso necessário, a aplicação de pontos hemostáticos (capitonagem), além de nos casos mais
graves, podermos realizar a ligadura das artérias uterinas ou hipogástricas e a histerectomia.
Complicações: Prematuridade, apresentação anômala (não cefálica), hemorragia pós-parto (restos e atonia),
infecção puerperal, acretismo.

2. Acretismo placentário:
Conceito: Consiste na aderência anormal da placenta no miométrio que apresenta ausência parcial ou total da
decídua basal e desenvolvimento anormal da camada fibrinoide.
 Classificação quanto à espessura do acretismo:
o Acreta: superficial no miométrio.
o Increta: invade profundamente o miométrio.
o Percreta: ultrapassa o miométrio, atingindo a serosa e, eventualmente, estruturas adjacentes como a
bexiga, ureter, intestino e omento.
 Classificação quanto à aderência dos cotilédones:
o Total: todos estão aderidos.
o Parcial: alguns estão aderidos.
o Focal: somente uma parte está aderida.
Epidemiologia: O ACOG (Congresso Americano de Obstetras e Ginecologistas) relatou, em 2012, que a
incidência de acretismo placentário aumenta no mundo todo em paralelo ao aumento de cesáreas, ocorrendo um caso
para cada 533 partos, com morbimortalidade materna de até 7%.
- A média estimada de perda sanguínea no parto com acretismo é de 2,5L, sendo associada a transfusão maciça de
hemocomponentes, histerectomia, lesão de bexiga e/ou ureter, intestino e pós-operatório em UTI.
Fatores de risco: Normalmente o trofoblasto invade o endométrio até atingir a camada esponjosa da decídua
(camada de Nitabuch), momento no qual o citotrofoblasto cessa a sua invasão e começa a se diferenciar em tecido
placentário.
- Nos casos de cicatriz uterina (cesárea anterior), pode haver um reparo inadequado do endométrio e/ou decídua basal,
e em uma gestação posterior, o citotrofoblasto invade o endométrio decidualizado, não encontra a camada esponjosa
que representa o limite para parar a invasão, prosseguindo em grau variado e anormal.
- Dessa forma, os principais fatores de risco são curetagem uterina, miomectomia, cirurgia vídeohisteroscópica, idade
materna > 35 anos, multiparidade, e a cesárea, que é o mais importante, ao passo que os riscos são de 3% para casos
sem cesárea anterior, de 11% nos casos com uma anterior, de 40% para duas, de 61% para três e de 67% para quatro
ou mais cesáreas realizadas.
Clínica: A hemorragia semelhante a placenta prévia pode ocorrer na presença de acretismo, em razão da formação
do segmento inferior do útero e da dilatação do orifício interno, que leva ao rompimento da área da placenta que
recobre o orifício interno, ocasionando o sangramento.
- Todavia, sempre que uma paciente apresentar placenta prévia e não sangrar, devemos suspeitar de acretismo.
Diagnóstico: Sempre que nos depararmos com placenta prévia e cesárea anterior, é importantíssimo avaliar a
possibilidade de acretismo, devendo-se solicitar um USG visando sua identificação.
 USG: os principais sinais de acretismo são a perda do espaço hipoecoico retroplacentário, o adelgaçamento do
miométrio subjacente, a irregularidade na interface útero e bexiga, uma protrusão da placenta para a bexiga,
lacunas irregulares, o aumento da vascularização e um fluxo turbulento ao Doppler.
 RNM: mais sensível e específica, é indicada quando o USG não for esclarecedor e nos casos de placenta
prévia com predomínio posterior.
- Os principais sinais de acretismo são a protrusão placentária, uma placenta heterogênea, com bandas escuras
intraplacentárias nas imagens ponderadas em T2 e interrupção focal da parede miometrial.
Conduta: Em geral, aceita-se que a histerectomia total abdominal seja o tratamento ideal para os casos de acretismo
placentário, devendo a placenta ser deixada in situ, já que tentativas de descolamento frequentemente resultam em
hemorragia intensa.
- Em alguns casos, entretanto, pode haver acretismo apenas focal, e a terapêutica não será tão agressiva, de modo a ser
possível um planejamento com mais calma, visando a cirurgia eletiva com 36 semanas de gestação, a qual pode
diminuir substancialmente o índice de complicações e de situações de urgência.
 Cuidados no parto:
o Quantidades adequadas de sangue e derivados (incluindo crioprecipitado) devem estar disponíveis no
momento da cirurgia.
o É importante que o procedimento seja executado por cirurgião experiente, com equipe treinada e
possibilidade de auxílio de outros especialistas, como cirurgião vascular e urologista em hospital
terciário.
o Em algumas situações, pode ser de grande auxílio o uso de sonda vesical de Foley de três vias e a
passagem de cateteres ureterais para a confirmação da integridade do trato urinário.
o Deve também estar disponível um leito na UTI para os cuidados pós-operatórios.
 Cateterização por balão: pode ser utilizada pelo radiologista intervencionista para ocluir temporariamente a
aorta ou as artérias ilíacas internas, a fim de prevenir a hemorragia durante o procedimento cirúrgico.
- Dessa forma, realiza-se, sob anestesia local ou peridural, a inserção de cateteres-balões, por via retrógrada,
pelas artérias femorais, guiando-os até as ilíacas internas, onde são inflados intermitentemente durante a
dissecção (especialmente do segmento inferior do útero), reduzindo acentuadamente a perda sanguínea,
conservando o campo seco e facilitando o uso de clampes e suturas.
 Conduta conservadora (acreta): visando preservar a fertilidade, vários autores relataram tentativas de
manter o útero e evitar a histerectomia, deixando a placenta em situ, sem tentativa de remoção, e combinando
procedimentos adicionais, como embolização de artérias uterinas seguida de conduta expectante, extração
manual da placenta após um período de tempo (2 meses), tratamento com metotrexato em doses variáveis,
ressecção do segmento uterino acometido, compressão uterina por meio de suturas e pontos hemostáticos no
leito placentário.
- Tal conduta impõe o risco de ter que lidar com hemorragia intensa após período imprevisível, em situação de
emergência, bem como um risco aumentado de infecção intrauterina, de modo a tais pacientes necessitarem de
antibioticoterapia e ocitocina, bem como de um tempo maior internadas.
 Conduta ativa (increta e percreta): cesariana com incisão de mediana infraumbilical deve ser planejada para
o fácil acesso ao feto e permitir um campo cirúrgico amplo para a histerectomia.
o Acretismo no fundo uterino:
 Acretismo total: está indicada a histerectomia total ou subtotal imediata.
 Acretismo parcial: o tratamento dependerá da extensão, do comprometimento do estado
geral e da experiência do obstetra.
- Indicam-se a extirpação da placenta e a remoção manual dos fragmentos placentários
aderentes (curagem ou curetagem uterina), mas em casos mais graves podemos realizar a
histerectomia ou outras condutas mais agressivas.
o Acretismo no segmento inferior:
 Incisão vertical no útero acima da placenta (histerotomia fugidia), evitando-se os vasos
calibrosos, e o feto deve ser extraído pelo fundo uterino.
 Após a extração fetal, faz-se tração suave do cordão e aguardam-se alguns minutos para
possível dequitação, a qual, se não ocorrer, indica deixarmos a placenta in situ e, com os
balões das artérias uterinas insuflados, realiza-se a histerectomia total.
o ATB: entre 30 e 60 minutos antes do início da cirurgia, institui-se antibioticoterapia profilática com
dose única de cefazolina IV ou clindamicina IV caso contraindicações à cefazolina.

3. Descolamento prematuro de placenta:


Conceito: Separação da placenta normalmente inserida, de forma parcial ou completa, antes do nascimento do feto,
que ocorre normalmente nas gestações com 20 ou mais semanas, se manifestando clinicamente por sangramento
vaginal e dor abdominal, muitas vezes acompanhados por contrações uterinas hipertônicas e um padrão de frequência
cardíaca fetal não tranquilizador.
 Grau I: assintomático ou apresenta sangramento genital discreto sem hipertonia uterina significativa, com
vitalidade fetal preservada, de modo a o diagnóstico ser realizado após o nascimento por presença de coágulo
retroplacentário.
 Grau II: sangramento genital moderado com hipertonia uterina.
- Há repercussões hemodinâmicas na mãe, com aumento de FA, alterações posturais da PA e queda do nível de
fibrinogênio, e o feto costuma estar vivo, porém com vitalidade prejudicada.
 Grau III: caracterizada por óbito fetal, hipotensão arterial materna e hipertonia uterina importante.
o IIIA: com coagulopatia instalada.
o IIIB: sem coagulopatia.
Epidemiologia: O DPP complica aproximadamente 1% das gestações, com dois terços classificados como graves
devido à mortalidade materna, neonatal e perinatal que gera, essa última que é aproximadamente 20 vezes maior em
relação às gestações sem DPP (12% versus 0,6%, respectivamente).
- A maioria das mortes perinatais (até 77%) ocorre intraútero, e a prematuridade é a principal causa de mortalidade
pós-natal.
Fisiopatologia: A causa imediata do DPP é a ruptura dos vasos maternos na decídua basal, predispondo o acúmulo
de sangue na zona de clivagem decíduo-placentária, de modo a levar a uma separação completa ou quase completa da
placenta, ou ser pequeno e autolimitado, não gerando maiores complicações.
- A porção descolada da placenta é incapaz de permutar gases e nutrientes, e quando a unidade fetoplacentária restante
é incapaz de compensar essa perda de função, o feto é comprometido.
Etiopatogenia: A etiologia do sangramento na decídua basal continua a ser especulativa na maioria dos casos,
apesar da extensa pesquisa clínica e epidemiológica.
 Eventos mecânicos: traumatismo abdominal ou descompressão uterina rápida, que causam a tração da
placenta inelástica devida ao alongamento ou contração súbita da parede uterina subjacente, são mecanismos
comuns em uma pequena proporção de DPP, aumentando o risco em 6 vezes.
 Anormalidades uterinas: útero bicorno, sinequias uterinas e leiomioma são locais impróprios mecânica e
biologicamente para a implantação placentária, de modo a o descolamento ocorrer devido a uma
decidualização inadequada.
 Uso de cocaína: 10% das usuárias de cocaína desenvolverão DPP no terceiro trimestre, ao passo que tal droga
pode estar relacionado à vasoconstrição, levando a isquemia, vasodilatação reflexa e comprometimento da
integridade vascular.
 Tabagismo: acredita-se que os efeitos vasoconstritores do tabagismo causam hipoperfusão placentária, o que
pode resultar em isquemia, necrose e hemorragia, levando a DPP prematuro.
- Todavia, além dessas causas, a maioria dos descolamentos parece estar relacionada a um processo patológico
placentário crônico, no qual anormalidades no desenvolvimento precoce das artérias espiraladas levariam a necrose
decidual, inflamação placentária e, possivelmente, infarto e, finalmente, disrupção vascular e sangramento.
Clínica: Dor abdominal, taquissitolia e hipertonia uterina (elevada atividade uterina por irritação e trombina),
sofrimento fetal agudo, hêmoamnio e sangramento escuro (20% têm sangramento oculto).
 Hemorragia arterial: com alta pressão na área central da placenta, leva ao desenvolvimento rápido de
manifestações clínicas potencialmente fatais de descolamento, como sangramento grave, CIVD materna e
anormalidades da frequência cardíaca fetal.
 Hemorragia venosa: de baixa pressão, tipicamente na periferia da placenta (descolamento marginal), é mais
provável que resulte em manifestações clínicas que ocorrem ao longo do tempo, como hemorragia
intermitente leve, oligoidrâmnio e CIUR associada à redistribuição do fluxo sanguíneo cerebral.
 Trombina: sua produção resultante tanto do sangramento decidual, quanto da hipóxia tecidual, pode levar a
hipertonia uterina, produção de fatores inflamatórios capazes de levar a rotura prematura das membranas,
distúrbio de coagulação e deficiência da ação da progesterona, resultando no desencadeamento da atividade
uterina.
Tipos:
 Descolamento subaminiótico: é pré-placentário, de modo a não ser considerado um verdadeiro DPP, além de
ser irrelevante clinicamente.
 Descolamento marginal: subcoriônico.
 Descolamento retroplacentário com sangramento exteriorizado .
 Descolamento retroplacentário com sangramento oculto .

Fatores de risco:
 Síndromes hipertensivas: condição clínica mais frequentemente associada ao DPP, ao passo que as mulheres
hipertensas têm risco cinco vezes maior de DPP grave em comparação com mulheres normotensas.
 - A terapia anti-hipertensiva não parece reduzir o risco de descolamento placentário entre mulheres com
hipertensão crônica.
 História prévia: fator de risco mais importante para o descolamento, com riscos de recorrência 10 a 15 vezes
maiores.
 Cesárea prévia: cicatriz uterina próxima da implantação da placenta na parede anterior do útero poderia
ocasionar perfusão sanguínea deficiente com inadequado fluxo de sangue para os espaços intervilosos,
predispondo ao descolamento prematuro de placenta.
 Rotura prematura de membranas ovulares: DPP ocorre em 2 a 5% das gestações que em seu decorrer
apresentam RPMO pré-termo, com risco aumentando em até 9 vezes nas mulheres com infecção intrauterina
ou oligoâmnio associados.
 Trombofilias hereditárias: sua participação é contraditória, mas hipóteses sugerem que a trombofilia pode
causar insuficiência placentária decorrente de trombose vascular placentária.
 História familiar: irmãs das mulheres que tiveram um DPP parecem estar em maior risco de ter quadro
semelhante.
 Idade materna e paridade: o aumento de ambas eleva o risco de DPP, o que se acredita decorrer de
alterações endometriais, decidualização anormal e vasos uterinos anômalos.
 Gestação múltipla: DPP ocorre com frequência três vezes maior em gestações gemelares, quando
comparadas a gestações únicas.
 Tabagismo: é um dos poucos fatores de risco modificáveis, e está associado a um risco aumentado de 2,5
vezes de descolamento suficientemente grave para resultar em morte fetal, e o risco aumenta em 40% para
cada maço de cigarro fumado por dia.
- Sua combinação com a HAS tem efeito sinérgico.
- Outros possíveis fatores de risco descritos são o alcoolismo, baixo peso materno, hipotireoidismo, asma, anticorpos
antitireoperoxidase elevados, e até picadas de cobras que cursam com IRA e hipercoagulabilidade.
Diagnóstico: É eminentemente clínico, mas em casos
selecionados, os achados de estudos de imagem, laboratório e pós-
parto podem ser utilizados para apoiar o diagnóstico clínico.
 Sintomática: mulheres com DPP agudo classicamente
apresentam-se com sangramento vaginal leve a
moderado e dor abdominal e/ou dor nas costas,
acompanhados de contrações uterinas.
- Em pacientes com sintomas clássicos, anormalidades da
frequência cardíaca fetal ou ausência de batimentos e/ou
CIVD apoiam fortemente o diagnóstico clínico e
indicam DPP extenso.
 USG: é útil para identificar um hematoma
retroplacentário e para excluir outros distúrbios associados com sangramento vaginal e dor abdominal, em
mulher com sintomatologia vaga e dúvidas quanto ao diagnóstico clínico.
- Embora os piores resultados pareçam ocorrer quando há evidência ecográfica de um hematoma
retroplacentário, a ausência de hematoma não exclui a possibilidade de descolamento grave, porque ele pode
ainda não ter se organizado.
 Achados laboratoriais: o grau de hemorragia materna correlaciona-se com o grau de anormalidade
hematológica, e os níveis de fibrinogênio apresentam a melhor correlação com a gravidade do sangramento, a
CIVD e a necessidade de transfusão de múltiplos produtos sanguíneos.
- Assim, níveis de fibrinogênio ≤ 200 mg/dL têm valor preditivo positivo de 100% para hemorragia pós-parto
grave, enquanto níveis de ≥ 400 mg/dL têm valor preditivo negativo de 79%.
 CIVD: DPP grave pode levar à CIVD, e em 10% a 20% dos casos leva a óbito fetal.
- É diagnosticada pela demonstração de aumento da geração de trombina (diminuição do fibrinogênio) e
aumento da fibrinólise (produtos elevados de degradação de fibrina e D-dímero).
Conduta: Deve ser individualizada e depende da extensão e da classificação do DPP, do comprometimento materno
e fetal e da idade gestacional, mas em geral todas as gestantes devem ser monitoradas avaliando-se o estado
hemodinâmico (pressão arterial, pulso e diurese) e a vitalidade fetal.
 Medidas gerais:
o Avaliação laboratorial incluindo tipagem sanguínea, hemograma completo e coagulograma.
o Um teste simples, de baixo custo e com resultado rápido pode ser realizado para avaliar o estado de
coagulação da gestante, pode ser realizado rapidamente com a coleta de 10 mL de sangue em tubo de
ensaio seco, que deve ser mantido em temperatura ambiente e observado após 7 a 10 minutos, quando
deverá haver a formação de um coágulo firme, o que, se não ocorrer, indique que a coagulopatia está
instalada.
o A ultrassonografia pode ser útil nos casos duvidosos, já que o diagnóstico é eminentemente clínico.
o A qualquer sinal de hipotensão ou instabilidade hemodinâmica, devem-se instituir dois acessos
venosos calibrosos com infusão de 1.000 mL de solução cristaloide, com velocidade de infusão de
500 mL nos primeiros 10 minutos e manutenção com 250 mL por hora, mantendo-se débito urinário >
30 mL por hora.
o Monitorização cardíaca fetal contínua desde que o feto esteja em risco de hipoxemia ou de
desenvolver acidose.
 Feto vivo: devemos sempre avaliar a cardiotocografia (CTG), e quando o parto vaginal não for iminente, a via
de parto preferida deve ser a abdominal por cesárea de emergência.
o CTG categoria I: a via de parto dependerá da estabilidade hemodinâmica materna e da idade
gestacional.
o CTG categoria II: a via de parto dependerá da idade gestacional, da dilatação cervical e se existe
instabilidade fetal ou materna.
o CTG categoria III: se o parto vaginal for iminente (próximos 20 minutos), pode-se optar pelo parto
vaginal espontâneo ou instrumental, e se não for iminente, deve-se indicar a cesárea.
 Feto morto: quando a mãe está hemodinamicamente estável, deve-se optar pelo parto vaginal.
o A amniotomia se faz necessária para reduzir hemorragia materna e passagem de tromboplastina para a
corrente sanguínea da mãe.
o A ocitocina pode ser administrada se houver necessidade de induzir o parto.
o O parto deverá ocorrer dentro de 4 a 6 horas e o quadro clínico deverá ser reavaliado a cada hora.
Recorrência: As mulheres com DPP têm risco maior de descolamento em uma gravidez subsequente (3% a 15%
em comparação com 0,4% a 1,3% na população geral), além de esse risco aumentar conforme o maior número de
descolamentos (20% a 25% após 2 descolamentos).
- Além disso, o risco de recorrência é maior após um DPP grave do que após um leve.
Descolamento crônico: As gestantes com esse quadro apresentam hemorragia leve, crônica e intermitente e
manifestações clínicas de doença placentária isquêmica que se desenvolvem ao longo do tempo, como oligoidrâmnio,
restrição de crescimento fetal e pré-eclâmpsia, gerando anoxia fetal e paralisia cerebral.
 Achados: os estudos de coagulação geralmente são normais, mas o USG pode identificar hematoma
placentário (retromembranoso, marginal ou central), e o exame seriado pode revelar restrição de crescimento
fetal e/ou oligoidrâmnio.
 Exame histológico da placenta: pode mostrar lesões crônicas, como deciduíte crônica, necrose decidual,
vilite, vasculopatia decidual, infarto placentário, trombose intervilositária e deposição de hemossiderina.
Complicações: Há risco elevado de coagulopatia (CIVD), atonia uterina, útero de couvelaire (apoplexia
uteroplacentaria), que é quando sangue entra no miométrio impedindo as fibras de contraírem.
- Quando atonia se faz massagem e ocitocina IV em alta dose e se não der certo, sutura de b-lynch, ligaduras
hipogástrico ou uterina, ou ainda histerectomia.
4. Rotura de vasa prévia:
Conceito: Condição muito séria, que ocorre quando vasos desprotegidos do cordão umbilical estão entre a cabeça e
o colo, o que geralmente decorre de inserção velamentosa do cordão (parte dos vasos que saem do cordão).
Clínica: Sangramento vivo e indolor após amniorrexe (rompimento da bolsa) gerando sofrimento fetal agudo em
minutos com altíssimo risco de morte ao passo que é um sangramento fetal.
Conduta: Cesariana o mais rápido possível.

5. Rotura uterina:
Conceito: É a abrupta solução de continuidade da parede uterina, envolvendo todas as suas camadas, inclusive a
serosa superficial, acarretando significativas alterações das condições maternas e/ou fetais, de modo a levar à
morbidade materna grave, com choque hemorrágico materno, lacerações de bexiga e histerectomia, e à morbidade e
mortalidade perinatal, com hipóxia intrauterina.
- Quando a lesão é clinicamente oculta, a chamamos de subclínica, incompleta ou deiscência uterina, e esta geralmente
decorre de uma solução de continuidade de mucosa (endométrio) e de parede muscular (miométrio), mantendo a
integridade da serosa uterina (peritônio visceral), de modo a não gerar consequências materna ou neonatal graves, e
ser muitas vezes descoberta acidentalmente no momento da cesariana.
Epidemiologia:
 Quanto à renda do país:
o A maioria dos casos de rotura uterina em países de alta renda está associada à prova de trabalho de
parto em mulheres com cesarianas prévias ou em mulheres anteriormente submetidas a qualquer tipo
de cirurgia transmiometrial.
o Já em países de baixa renda, muitas roturas uterinas estão relacionadas ao trabalho de parto obstruído
e à falta de acesso ao nascimento emergencial por via cirúrgica ou instrumental.
 Quanto à paridade:
o A incidência da rotura uterina em mulheres com cicatriz de cesariana prévia é de 325 casos a cada
100.000 nascimentos.
o A rotura uterina em primigestas é rara, com incidência variando entre 1 caso em 5.700 gestações, até
1 caso a cada 20.000 gestações.
Fatores de risco: Os maiores fatores de risco para a ocorrência de uma rotura uterina são o antecedente pessoal
de uma rotura em uma gestação anterior e a presença de uma incisão miometrial prévia.
 Incisão uterina prévia: a incidência de rotura é maior (até 12%) em mulheres que foram submetidas
previamente a uma histerotomia com incisão vertical, especialmente fúndica (histerotomia cesariana clássica).
 Indução do parto: mulheres com cesariana anterior submetidas à indução do trabalho de parto tem 1,5% de
chance da complicação, contra 0,8% de risco durante indução de parto em mulheres sem cicatriz uterina
prévia, mas tal risco é variável, seja pela heterogeneidade das indicações de indução do trabalho de parto,
pelas diferenças nos protocolos de indução utilizado, ou qual agente e dose de escolha.
o Drogas uterotônicas: rotura do útero é descrita mesmo em casos de indução/condução com doses
baixas de uterotônicos, fazendo com que seja imprescindível que haja um claro benefício da indicação
do uso de ocitocina ou prostaglandinas durante a assistência ao trabalho de parto, sob o risco de
aumentar chances de complicação em gestantes saudáveis.
- O risco do uso de prostaglandinas é de cerca de 2,45%, mais que o dobro do risco associado a
ocitocina, que é de 1,1%.
 Rotura sem cicatriz prévia: pode ser causada por traumatismo (manobras obstétricas e acidentes
automobilísticos) ou fraqueza congênita (síndrome de Ehlers-Danlos tipo IV) ou adquirida (trabalho de parto
prolongado e uso de drogas uterotônicas) da parede muscular uterina.
- Outros possíveis fatores para a complicação são a multiparidade (> 3), idade materna avançada, distocias de
progressão e descida, acretismo placentário, intervalo interpartal menor de 18 meses e mais de uma cesariana prévia
anterior.
- Durante o trabalho de parto, parecem associar-se a maior risco um escore de Bishop baixo à admissão hospitalar, a
dilatação cervical lenta no primeiro período do trabalho de parto, distocias de progressão e rotação após 7 cm de
dilatação, e segundo período prolongado.
Fisiopatologia:
 Fisiologia: o miométrio compõe-se de fibras musculares lisas que se distribuem de forma distinta nas
diferentes regiões do órgão.
o Regiões fúndica e corporal apresentam disposição longitudinal, formando uma massa espessa e forte,
que auxilia a propagação da força contrátil do tríplice gradiente descendente.
o Segmento inferior uterino tem as fibras musculares em disposição oblíqua até a região cervical,
formando uma porção anatomicamente mais afilada.
o Entre as porções superior e inferior do útero, forma-se um anel fisiológico de constrição,
perfeitamente identificável durante o trabalho de parto, através de inspeção ou palpação.
- A força contrátil originada nas porções cornuais uterinas e rapidamente propagadas através da forte
musculatura do corpo e do fundo do órgão permite que o concepto seja empurrado para baixo, em direção à
pelve materna.
 Mecanismo de rotura: em condições de fragilidade da parede muscular uterina, seja através de cicatrizes
cirúrgicas ou mais raramente devido a alterações intrínsecas, como malformações uterinas ou doenças do
colágeno, a associação com outro fator estressante (polidramnia, gestação múltipla, macrossomia fetal) pode
levar à distensão do segmento uterino inferior, mais suscetível à pressão excessiva.
- Assim, o segmento inferior aumenta em comprimento e largura, afilando ainda mais a parede muscular, com
seu possível subsequente rompimento, que gerar um anel de constrição patológico (anel de Brandl), entre as
porções uterinas superior e inferior.
Clínica:
 Rotura subclínica: é assintomática, sendo diagnosticada no intraoperatório de uma cesariana, quando se
observa descontinuidade das fibras musculares miometriais na região do segmento uterino, com manutenção
da parede uterina através da integridade da camada serosa (peritônio visceral).
 Rotura uterina aguda:
o Alteração da vitalidade fetal: primeiro sinal suspeito de que uma rotura uterina aguda está em curso,
sendo caracterizada por bradicardia fetal (BCF < 110).
o Síndrome de Bandl-Frommel: decorre de uma distensão segmentar do útero, que pode ocorrer na
iminência da rotura uterina, embora muitos casos aconteçam abruptamente e sem identificação de
sintomas ou sinais precursores.
- Ela se caracteriza por aumento da intensidade das dores relacionadas à contração uterina,
especialmente no segmento inferior do útero, nítida separação entre fundo uterino e a região inferior
do órgão, que ficam divididos por um anel de constrição (sinal de Bandl), e por ansiedade e agito
materno.
- Os ligamentos redondos do útero podem ser
palpados e encontram-se desviados para a face
ventral do órgão (sinal de Frommel).
- Se o rompimento da parede uterina acontecer, ocorrem
tipicamente interrupção das contrações de trabalho de parto
e uma aparente melhora do sintoma de dor, até então de
intensidade crescente, e rapidamente a parturiente
apresentará volta da dor (sangue no peritônio) e sinais de
choque hemorrágico.
o Choque hemorrágico: é caracterizado por sintomas de mal-estar súbito, aumento da FC e queda da
PAS.
 A ausculta fetal passará de bradicárdica a ausente.
 A hemorragia peritoneal pode levar ao aparecimento de dor escapular (sinal de Laffont) e
hematoma periumbilical (sinal de Cullen).
 Ao toque vaginal, não será mais possível palpar a apresentação fetal no canal de parto, mesmo
em casos em que a descida já se encontrava adiantada, isso porque o concepto é projetado
parcial ou completamente para fora do útero, dentro da cavidade abdominal.
o Descolamento de placenta: acrescenta-se ao quadro, inicialmente parcial, porém rapidamente se
tornando completo, culminando com o mau desfecho neonatal associado (síndrome hipóxico-
isquêmica ou óbito).
o Outros sinais: Sinal de Clark (enfisema subcutâneo → ar entra pela vagina e vai para o abdômen) e
sinal de Reasens (criança sobe na De Lee → +2 pra -3).
- Fácil palpação do feto (fica solto no abdômen).
- Assim, a suspeita pode ser levantada quando mulheres com antecedente de cesariana prévia em trabalho de parto
apresentam frequência cardíaca fetal não tranquilizadora, com categoria II ou III à cardiotocografia, instabilidade
hemodinâmica, dor abdominal repentina, diminuição da atividade uterina, apresentação fetal não mais detectável ao
toque vaginal, hemorragia vaginal, ou hematúria (quando possível de ser avaliada).
Manejo clínico: A abordagem para tratamento do quadro de suspeita de rotura uterina deve ter como objetivos
principais a estabilização hemodinâmica materna e a correção cirúrgica da lesão que levou à instabilidade
cardiocirculatória, tudo isso realizado o mais rápido possível para melhorar as chances de sobrevida materno-fetal.
- Uma mulher em trabalho de parto que apresenta padrão cardiotocográfico não tranquilizador, instabilidade
hemodinâmica e dor abdominal severa deve ser submetida à interrupção emergencial da gestação, através da via de
nascimento mais rápida, independentemente do estabelecimento preciso da etiologia do quadro, mas antes devemos
estabilizá-la, com as medidas do ABCDE.
 Garantir vias aéreas com máscara facial de O2 a 15 L/min.
 Estabelecer dois acessos venosos periféricos em membros superiores através de cateteres calibrosos (16G ou
18G) e elevação de membros inferiores para melhora do retorno venoso.
 Realizar sondagem vesical de demora.
 Avaliar de nível de consciência e reflexos osteotendinosos.
 Estabilização com fluidos e transfusão de hemoderivados, de acordo com o grau de choque hemorrágico
observado.
 Preparação para cesariana de emergência, quando o nascimento vaginal não é iminente.
- Após todas as medidas iniciais descritas, que devem ser realizadas rapidamente, a paciente deve ser submetida a
cesariana de emergência, a não ser em casos extremamente incomuns em que o nascimento vaginal esteja iminente,
nos quais o uso de fórceps é indicado para facilitar.
Manejo cirúrgico:
 Anestesia: escolha por anestesia de bloqueio regional ou anestesia geral é baseada na estabilidade clínica da
paciente e na urgência da resolução do quadro.
- Bloqueios regionais podem levar à necessidade de mais tempo entre início da anestesia e procedimento
cirúrgico, além de não serem apropriados em caso de hemorragia com CIVD.
 Incisão: é baseada no principal diagnóstico e nos diagnósticos diferenciais possíveis.
o Uma incisão transversal (Pfannenstiel) proporciona boa exposição do segmento inferior do útero e da
pelve, porém não do abdome superior.
o Uma incisão mediana permite ampla exposição para exploração da cavidade abdominal, incluindo
fundo do uterino e regiões dos hipocôndrios.
 Confirmação do diagnóstico: é facilmente confirmado através de visualização de hemoperitônio, presença de
líquido amniótico e frequentemente mecônio em cavidade peritoneal, além da visualização do feto completa
ou parcialmente extruso do útero.
 Reparo uterino: após a retirada do feto e da placenta, o obstetra deve rapidamente avaliar condições possíveis
para o reparo do útero.
o Agressivo: histerectomia está indicada quando a lesão uterina é irreparável, ou na condição de
hemorragia materna incontrolável.
o Conservador: em casos em que a hemorragia está sob controle, a decisão de realizar histerectomia
deve levar em consideração uma combinação de fatores, incluindo futuros planos reprodutivos da
paciente, a extensão do dano uterino, a estabilidade hemodinâmica e anestésica intraoperatória da
mulher.
- Aqui, o fechamento uterino deve ser realizado através de sutura em camada dupla ou única com fios
de absorção lenta.
Desfecho e prognóstico:
 Mulher: as principais complicações são a necessidade de transfusão e histerectomia, mas podemos ter
internações prolongadas (> 5 dias), internação em UTI, lesões do trato urinário (bexiga, ureteres), infecção
secundária do sítio cirúrgico e, muito raramente, óbito materno.
 Neonato: a estimativa de mortalidade perinatal e a incidência de encefalopatia hipóxico-isquêmica neonatal
associadas à rotura uterina é de até 6%, com taxas que crescem diretamente com o aumento no tempo desde a
rotura até o nascimento.
- A recepção neonatal por equipe treinada e experimentada em reanimação, bem como acesso à UTI, pode
melhorar o prognóstico perinatal.
Diagnóstico no puerpério: Raramente a rotura uterina pode ser percebida apenas no período pós-parto, e
provavelmente a lesão ocorreu com a apresentação fetal já em processo adiantado de descida na pelve, muito
provavelmente já tendo ultrapassado seu estreito médio, gerando um quadro de manifestação tardia.
- Suspeita-se de rotura uterina no puerpério em mulheres com cesariana anterior que apresentam dor abdominal
persistente após o nascimento da criança, além de hemorragia pós-
parto sem melhora após medidas farmacológicas para atonia uterina.
- Com identificação da rotura uterina em laparotomia exploradora no
puerpério, o manejo cirúrgico será similar ao adotado para as roturas
agudas antes do nascimento.
Futuro reprodutivo: O risco de recorrência parece ser maior
quando a rotura prévia foi fúndica uterina, ou longitudinal no corpo
do útero, podendo inclusive ocorrer rotura espontânea do útero fora
do trabalho de parto, a partir do segundo trimestre da gestação,
provavelmente associada à distensão da parede miometrial e às
modificações do organismo gravídico.
- As deiscências da parede uterina, ou roturas subclínicas, que são
apenas identificadas no momento da cesariana, parecem também
conferir maior risco de recorrência em gestações futuras.
- Dessa forma, devida à alta recorrência e grande morbimortalidade
associadas ao quadro, a maioria dos protocolos de conduta indica
interrupção de gestação por cesariana eletiva com cerca de 37 semanas de IG em mulheres com antecedente de rotura
uterina aguda ou subclínica em uma gestação prévia.

6. Distocias:
Conceito: Anormalidade no desenrolar do trabalho de parto, sendo apontada nos EUA como a indicação mais
comum de cesárea em primigestas.
ANORMALIDADES NA FORÇA CONTRÁTIL
Funcionais: Presença de anormalidade do fator contrátil durante o trabalho de parto, o que influencia diretamente a
progressão da dilatação cervical, sendo as mais frequentes, principalmente nas nulíparas (até 37% de incidência), e
usualmente corrigíveis.
 Por hipoatividade: consiste na parada na progressão do trabalho de parto derivada da falta de contrações,
tanto por falta de tônus como de frequência.
- Dessa forma, uma vez que a fase ativa do trabalho de parto esteja estabelecida, as contrações, durante a fase
de dilatação cervical, devem ocorrer em um crescente, e caso uma parada na progressão dele aconteça,
derivada da diminuição da frequência ou intensidade das contrações, o tratamento é válido.
- Tal correção é feita com a utilização de ocitocina intravenosa ou
amniotomia (a depender da altura da apresentação fetal).
 Por hiperatividade: aquela que cursa com atividade uterina exagerada,
com aumento na frequência e intensidade das contrações, geralmente
decorrente de algum processo obstrutivo à progressão do trabalho de
parto (tumor prévio ou
desproporção), de modo a
indicarmos a cesárea para correção.
 Por hipertonia: é aquela promovida pelo aumento na frequência
das contrações uterinas levando ao aumento no tônus uterino basal,
e diminuindo o intervalo entre as contrações, de modo a gerar uma
diminuição do fluxo sanguíneo placentário e, consequentemente, à
hipóxia fetal.
- É frequente em pacientes utilizando ocitocina, o que, quando
identificado, indica o cessar da droga, de modo a corrigir sua superdosagem, podendo inclusive somarmos
medidas como hidratação venosa e analgesia de parto.
 Distocia de dilatação: é definida pela não progressão na dilatação do
colo uterino em paciente em fase ativa do trabalho de parto, a despeito
da presença de contrações uterinas em intensidade e frequência
adequadas para o momento, sem causas obstrutivas aparentes.
- Classicamente deriva de alguma incoordenação no tríplice gradiente
descendente das contrações uterinas, que faria com que a contração
ocorresse sem um sentido direcional, o que levaria à não progressão do
trabalho de parto.
- A proposta de tratamento para esses casos é inicialmente a realização de analgesia de parto, e caso não
obtenha resposta, a amniotomia e a ocitocina podem ser utilizadas.
ANORMALIDADES DE TRAJETO
- As distocias de trajeto decorrem da presença de anormalidades ósseas ou de partes moles, que levam a um
estreitamento do canal de parto, dificultando ou até impedindo a evolução fisiológica do trabalho de parto e a
passagem normal do feto.
Ósseas: Os vícios pélvicos consistem na presença de anormalidade, isolada ou simultânea, na forma, nas dimensões
ou, ainda, na inclinação da pelve que dificultem a progressão ou a ultimação do parto.
- Historicamente diversos métodos diagnósticos já foram tentados, como a pelvimetria manual, a radiopelvimetria, e a
ressonância magnética, mas salvo em casos de estenose pélvica muito severas, o
diagnóstico definitivo da distocia óssea se dará durante o trabalho de parto, pela
avaliação dos diâmetros.
 Estreito superior (entrada da bacia): é a conjugata vera (CV).
o Determinação da conjugata diagonalis (CD): realiza-se o
toque vaginal com o objetivo de palpar o promontório com a
ponta do dedo estendido, através do fundo de saco posterior da
vagina, e quando esse é atingido, marca-se o limite proximal do
dedo que tangencia a sínfise púbica.
o Determinação da CV: subtrai-se 1,5 cm do valor da CD.
- Valores de CD < 11,5 e de CV < 10 cm indicam a presença de vício de estreito superior.
 Estreito médio: suas anormalidades são muito valorizadas, pois associam-se com frequência a partos
prolongados, nos quais, apesar de o polo cefálico estar insinuado, permanece encravado no estreito médio, em
que pesem a boa contratilidade uterina e os acentuados fenômenos plásticos.
- Destaca-se na sua avaliação a medida do diâmetro transverso (biisquiático), que pode ser inferida
indiretamente pela medida do diâmetro bituberoso, já que quase sempre são coincidentes, com uma fita
métrica tangenciando a borda superior do ânus, indo de uma tuberosidade a outra.
- Medidas inferiores a 10 cm constituem um indício de distocia do estreito médio.
 Estreito inferior: a progressiva valorização do estreito médio reduziu a importância prognóstica do estreito
inferior, uma vez que raramente essa distocia ocorre de forma isolada.
- São raríssimas as bacias afuniladas, nas quais são normais as medidas dos estreitos superior e médio e a
distocia se localiza no estreito inferior, e nesses casos a conjugata exitus (diâmetro subpúbicocóccix) é menor
que 8,5 cm e o bituberoso é igual ou inferior a 8,0 cm, além de se encontrar um ângulo subpúbico com valor
menor que 90º.
 Vícios pélvicos raros: são as bacias atípicas.
 Avaliação da bacia óssea e via de parto: mesmo que a avaliação da pelve óssea leve ao diagnóstico do vício
pélvico, faz-se necessária a avaliação de outros fatores, como o volume do polo cefálico, a variedade de
posição, o grau de flexão da cabeça e a presença de contrações uterinas.
Partes moles:
 Colo:
o Edema: é de origem mecânica, durante o parto, resultando da compressão entre a apresentação e o
rebordo ósseo da bacia, de modo a reduzir o retorno venoso e linfático, gerando-o principalmente no
lábio anterior.
- A redução digital é muitas vezes solução viável e inócua, mas nos casos de edemas rígidos e de
maior magnitude, a cesariana se impõe.
o Hipertrofia: presença de um grande alongamento hipertrófico, e
apesar de alguma elevação do colo no trabalho de parto, resta na
vagina, à frente da apresentação, uma porção edemaciada,
dificultando a sua dilatação.
- É manobra possível, durante a contração, forçar a dilatação digital
ao mesmo tempo deslocando-o para atrás da apresentação, mas
quando impossível essa manobra, a cesariana é a única opção viável.
o Estenose cervical: pode ser de origem anatômica e, principalmente,
patológica como sequela de infecções, cauterizações, cerclagens, amputações ou, ainda, cicatrizes
secundárias a lacerações em partos anteriores.
 Vagina: presença de septos é a principal causa, podendo ser:
o Transversais: geralmente impedem o parto vaginal.
o Longitudinais: a vagina é dupla, e caso não se desloquem com a passagem do feto, podem ser
secionados.
- A abordagem desse tipo de anomalia genital antes da gestação é a ideal, pode facilitar o parto vaginal e inclui
a pesquisa de malformações uterinas associadas.
 Vulva e períneo: destacam-se as varizes, o edema, as bartholinites agudas, o condiloma acuminado, a
hipoplasia e a rigidez.
- Geralmente essas situações não levam a distocias graves, que inviabilizem o parto vaginal, mas quando
assumem proporções consideráveis, a avaliação do obstetra, caso a caso, é que poderá definir se a tentativa do
parto vaginal é segura ou se deve optar imediatamente pela cesariana.
 Tumores prévios: tumores de órgãos, genitais ou não, que se colocam à frente da apresentação dificultando
ou impedindo a progressão fetal.
- Dentre os mais comuns, destacam-se os miomas, os carcinomas de colo e os tumores de ovário e, mais
raramente, os tumores de parede vaginal, do reto, os rins pélvicos e os fecalomas.
ANORMALIDADES DO OBJETO
Tamanho fetal: Pode impedir a progressão normal do trabalho de parto tanto em situações de peso fetal acima de
4.000 g como nos casos em que, mesmo com peso fetal inferior ao descrito, ocorre desproporção entre o objeto (feto)
e o trajeto (pelve), constituindo a desproporção cefalopélvica.
 Determinação do tamanho fetal elevado: a medida da altura uterina acima do percentil 95 para determinada
IG, a estimativa do peso fetal pelo USG, a presença de edema de MMII e edema suprapúbico e polo cefálico
móvel, com dificuldade de insinuação.
 Determinação da proporcionalidade cefalopélvica:
o Manobra de Pinard: a cabeça fetal é abaixada em direção à escavação pélvica por meio da palpação
abdominal, e com a outra mão, palpa-se o púbis e o parietal anterior, verificando-se se o polo cefálico
conseguiu adentrar o estreito superior.
o Manobra de Müller: consiste em forçar a entrada do polo cefálico no estreito superior da pelve e, por
avaliação simultânea da via vaginal, observar a descida do polo e suas relações com a pelve.
Distocia de biacromial: Se dá quando a apresentação é cefálica e o polo cefálico já se desprendeu, mas os
ombros não se soltam e não se observam quaisquer outras dificuldades.
- Ocorrem em 1% dos partos e geralmente é associada a obesidade materna, ao pós-datismo e ao DMG.
 Riscos maternos: lacerações do canal de parto, atonia uterina com hemorragia, disjunção da sínfise púbica e,
eventualmente, rotura uterina.
 Riscos fetais: lesões de plexo braquial e fratura de clavícula e úmero, podendo evoluir para óbito intraparto ou
neonatal.
 Assistência: realizamos inúmeras manobras para tentar posicionar o feto de modo a permitir sua passagem,
porém se nada der certo, procedemos com cesárea.
Anormalidades de situação e apresentação:
 Situação transversa: aquela em que o maior eixo fetal é perpendicular ao maior eixo do útero, ou ainda
quando o feto se situa obliquamente ao eixo uterino, sendo facilmente presumida pela palpação abdominal
(manobra de Leopold), ao passo que não se palpa nenhum polo no fundo uterino, porém, é fácil identificar o
polo cefálico em uma das fossas ilíacas e o polo pélvico na outra.
- A progressão do trabalho de parto dificulta muito a extração fetal, mesmo quando se opta pela cesárea,
havendo maior frequência de hemorragia e infecção materna, de modo a, uma vez iniciado o trabalho de parto
e diagnosticada a situação transversa, deve-se recomendar cesárea a fim de prevenir complicações maternas e
fetais.
- O diagnóstico pode ser confirmado por USG.
 Apresentação pélvica: ocorre em aproximadamente 3 a 4% das gestações e na maioria dos casos indica
cesárea.
- Nas pacientes que querem parto vaginal e as condições materno-fetais corroboram, podemos tentar a versão
externa cefálica, um procedimento no qual a apresentação fetal pélvica é modificada para apresentação
cefálica por meio de rotação fetal guiada por manipulação do abdome materno.
- Manobra de mourrisou
 Apresentação de face: representa o grau máximo de deflexão do polo cefálico, e nela se observa que o
occipício está em contato com o dorso fetal e o mento é a parte que se apresenta.
o O parto é possível quando a variedade de posição é a mentoanterior, e nesse caso, o trabalho de parto
geralmente é mais prolongado, mas o progresso é contínuo.
o Quando o mento se encontra voltado para o sacro (variedade de posição mentoposterior), o parto
vaginal só é possível se durante a evolução do trabalho de parto ocorrer rotação e a variedade de
posição mudar de mentoposterior para mentoanterior.
 Apresentação de fronte: apresentação de fronte ou cefálica defletida de 2° grau tem o naso como ponto de
referência, e não permite a insinuação e, portanto, o parto vaginal.
- Frequentemente, durante o trabalho de parto em apresentações desse tipo, a cabeça se flete para apresentação
cefálica fletida ou se deflete totalmente, tornando-se uma apresentação de face, sendo possível a progressão
para o parto vaginal, de modo a não ser incorreto realizar uma prova de trabalho de parto.
 Apresentação composta: é aquela em que um ou mais membros entram
simultaneamente com o polo cefálico ou com o polo pélvico na pelve
materna (principal é cabeça + mãos) e está associada a maior risco de
prolapso de cordão.
- Durante o trabalho de parto, deve-se suspeitar se a evolução se mostrar
prolongada e não ocorrer insinuação, ou a cabeça fetal permanecer alta,
devendo-se realizar o toque vaginal, que permite o diagnóstico pela
percepção da presença do membro procidente ou prolapsado.
- Muitas vezes, com o progresso do trabalho de parto, a parte apresentada avança pela pelve e o membro que
se encontra em procidência tende a regredir para fora da pelve, permitindo a evolução para o parto vaginal,
além de haver a possibilidade de se tentar a redução manual da parte prolapsada.
- Nos casos em que não houver redução do membro, deve-se optar pela cesárea.
 Variedade de posição occipitoposterior ou occipitotransversa: quando ocorre a persistência da posição
occipitoposterior ou occipitotransversa a despeito da progressão da dilatação, e está relacionada ao período
expulsivo prolongado.
- Procede-se com:
o Rotação para a variedade de posição occipitopúbica (90% dos casos).
o Rotação inversa para a variedade de posição occipitossacra.
o Parada em variedade de posição occipitoposterior ou occipitotransversa.

7. Fórceps:
Conceito: Instrumento destinado a auxiliar a extração fetal por meio da preensão do polo cefálico, diminuindo a
duração do segundo período do parto.
- Sabe-se que o pH do sangue fetal tende a diminuir gradativamente no período expulsivo e que, decorridos os
primeiros 30 minutos deste, o feto desenvolve moderada acidose. Dessa forma, quando o feto apresenta desaceleração
tardia, sua PO2 apresenta-se em níveis baixos (< 18 mmHg), de modo a gerar um sofrimento fetal, que indica a
abreviação do período expulsivo por meio do uso de fórcipe.
- Diversos estudos comparando a utilização do fórceps com o parto normal já evidenciaram inúmeros benefícios na
realização do parto instrumentalizado, ao passo que diminui o sofrimento fetal agudo, reduzindo a possibilidade de
complicações no futuro.
Classificação: O fórcipe pode ser classificado quanto à aplicação de acordo com o nível de descida e à variedade
de posição da apresentação fetal.
 De alívio: empregado quando o polo cefálico era visível e tinha atingido o assoalho pélvico, sem contudo
entreabrir os grandes lábios, e quando a sutura sagital se encontrava no diâmetro anteroposterior da pelve,
com rotação que não deve exceder os 45º (plano +3 de De Lee).
 Baixo: aplicado após a insinuação (plano +2 de De Lee).
 Médio: o polo cefálico está insinuado, porém não atingiu o plano +2 de De Lee.
Tipos de fórceps: Não se pode precisar quantos modelos de fórceps foram construídos, centenas ou, talvez, mais
de um milhar. Poucos, entretanto, sobreviveram ao tempo e são hoje utilizados nas maternidades.
- De forma geral, o fórcipe apresenta uma colher (curvatura cefálica), um ramo (zona articular) e um cabo (onde o
tocólogo realiza a tração).
 Fórceps de Simpson: é o mais empregado nas maternidades
brasileiras, sendo composto de dois ramos cruzados.
- Apresenta articulação fixa por encaixe, as suas colheres são
fenestradas e têm curvatura pélvica acentuada (convexa) e uma
curvatura cefálica (côncava).
- Sua indicação limita-se às variedades oblíquas e pegas diretas
(púbica e sacra), e naqueles fetos com cabeças pequenas a
médias.
 Fórceps de Kielland: também de ramos cruzados, suas
colheres apresentam curvatura pélvica menor que as do fórcipe
de Simpson, possuindo articulação de deslize, do ramo direito
sobre o esquerdo, o que facilita a correção do assinditismo.
- Por essas características, a função de rotação (90º) é facilitada e
esse é o fórcipe ideal para as variedades transversas, e para fetos
com a cabeça longa e bem moldada.
 Fórceps de Piper: parto pélvico (cabeça derradeira).
Indicações: Cerca de 15% dos partos são terminados a fórceps nas
maternidades públicas do Brasil, e quando bem indicado e bem aplicado,
torna-se instrumento salvador e não malfeitor, como faz parecer a muitos
que o denigrem.
 Parada de progressão no final do segundo estágio: pode ocorrer por inércia uterina, mal posição do feto ou
configuração anormal do canal do parto, estando associados a inércia uterina, resistência de partes moles, falta
de prensa abdominal, que pode ser por excessiva anestesia de condução.
- A parada de progressão em posterior ou transversa pode se prolongar, principalmente por estar a cabeça
defletida, cuja correção tem que ser feita com o fórceps antes da rotação.
 Profilaxia: em pacientes portadoras de certas doenças cardíacas, pulmonares ou
neuromusculares, podemos utilizar o fórceps como forma profilática de evitar o
esforço materno e uma possível exacerbação da doença.
- O fórceps profilático foi proposto por De Lee para ser empregado mesmo sem
haver indicação materna ou fetal com o objetivo de proteger a ambos, o feto pelo
prolongado impacto da cabeça sobre o períneo e a mãe, não só pela exaustão, mas
pela distensão desnecessária do soalho pélvico e tecidos vizinhos.
- Também é considerado fórceps profilático a aplicação em cabeça derradeira, menos traumático que as
manobras convencionais para o parto pélvico.
 Sofrimento fetal: quando presente, desde que haja condições de praticabilidade, a indicação é soberana.
 Desproporções cefalopélvicas relativas:
o Se for por parada de rotação ou apresentação anômala, que quando corrigidas eliminam a
desproporção, a indicação é indiscutível.
o Se a capacidade pélvica é limítrofe, o parto evolui com dificuldade e a cabeça está grandemente
moldada, a melhor opção é a cesariana, mas pode-se fazer o fórceps de prova.
 Outras: prolapso de cordão com dilatação total e a morte súbita da paciente, o que pode ocorrer por embolia
amniótica.
Ações:
 Preensão: ocorre por mecanismo de compressão, e as colheres devem ser aplicadas em pontos diametralmente
opostos, sobre as regiões parietomalares, com as extremidades anteriores ultrapassando a arcada zigomática
nas apresentações fletidas, e as bossas parietais nas defletidas, pois caso não haja esse cuidado, elas podem
deslizar horizontalmente.
 Rotação: pode ser exercida anterior (púbica) ou posteriormente (sacra), podendo ser de 45º, 90º e 135 º.
o Circundação ampla dos cabos: indicada nos fórceps com curvatura pélvica acentuada, como os de
Simpson, devendo-se realizar amplo movimento dos cabos e pequeno movimento na ponta das
colheres, evitando traumas maternos, principalmente a rotura dos fundos de saco vaginais.
o Chave em fechadura: preconizada para ser utilizada nos fórcipes de pequena curvatura pélvica,
como o de Kielland.
- Esse procedimento seria executado em um polo cefálico muito pequeno e muito móvel dentro da
pelve materna, mas foi abandonado por haver aumento na frequência de traumatismos vaginais
graves, constituídos de lacerações bilaterais das paredes vaginais laterais, desde o fundo de saco
vaginal até a vulva.
o Abaixamento dos cabos: para se fugir do trauma descrito nas rotações tipo chave em fechadura,
utiliza-se simplesmente o abaixamento dos cabos contra o sacro materno, com consequente rotação
para a apresentação occipitopúbica.
 Tração: deve acompanhar o eixo da curvatura pélvica do fórceps, reproduzir o ritmo das contrações uterinas,
ser suave, e obedecer a linha de direção de Sellheim, ou seja, tração vertical do estreito superior para o médio,
tração oblíqua do estreito médio para o inferior e tração ascendente para completar.
Condições de praticabilidade: Como todo procedimento cirúrgico, a aplicação do fórceps possui pré-
requisitos que podem ser de natureza fetal, materna e relacionados ao atendimento.
 Condições fetais: tamanho, posição, atitude, altura da apresentação e grau de moldagem.
- Dessa forma, o concepto deve estar vivo, com a cabeça insinuada e possuir volume cefálico normal.
 Condições maternas: tamanho, configuração e capacidade da pelve óssea.
- Assim, o colo deve estar completamente dilatado, com bolsa das águas rota e estreitos médio e inferior
compatíveis com o volume cefálico, o reto e a bexiga devem estar vazios, e deve ser realizada analgesia
adequada.

8. Vácuo-extrator:
Conceito: O vácuo-extrator é uma bomba de vácuo com um capuz que é conectado ao crânio fetal e uma espécie de
alça acoplada ao capuz que é puxada para gerar tração, realizando uma sucção que pode ser obtida manualmente ou
por meio de aparelho elétrico.
Indicações e contraindicações: Segue as mesmas indicações do uso de fórceps, como prolongamento do
segundo estágio do parto, condição fetal não tranquilizadora e doença neurológica ou cardiológica da mãe.
- É contraindicado nos casos de gestação com menos de 34 semanas pelo risco de hemorragia intraventricular fetal,
distúrbios da hemocoagulação fetal (hemofilia, trombocitopenia autoimune), doenças fetais demineralizantes
(osteogenesis imperfecta), doenças do tecido conjuntivo (Síndrome de Ehlers-Danlos e Síndrome de Marfan), e
suspeita de desproporção cefalopélvica.
Lesões no recém-nascido: Existem efeitos sem significância clínica por serem transitórios, como marcas,
abrasão superficial e céfalo-hematoma, mas lesões significantes podem ocorrer, como hemorragia subgaleal e
hemorragia intracraniana.
Lesões na mãe: Podem ocorrer no assoalho pélvico ou no esfíncter anal, com urgência ou incontinência urinária
ou fecal.
 Episiotomia: não pode ser dispensada no parto operatório, seja por fórceps ou por vácuo, sendo preferível a
mediolateral, ao passo que a mediana pode sofrer prolongamentos danosos.

9. Cesárea:
Conceito e epidemiologia: A operação cesariana é, provavelmente, uma das cirurgias mais antigas na história
da medicina e representa, também, há longa data, o procedimento cirúrgico realizado na mulher com maior frequência
em todo o mundo.
- Na atualidade, o aumento nas taxas de cesáreas, a partir da década de 1970, vem alertando a comunidade científica, e
os motivos desse incremento têm sido seriamente investigados, pois representa maior ônus financeiro e um possível
aumento nas taxas de morbidade materna e perinatal consequentes ao procedimento.
- No ano de 1985, um grupo de especialistas convocado pela OMS, com base nas evidências disponíveis na época,
concluíram que não há justificativa para qualquer região ter uma taxa de cesárea superior a 10-15%, número que é
bem distante do atual, ao passo que o Brasil tem a segunda maior taxa de cesárias do mundo, chegando a 86%.
Cesárea de emergência:
 Anormalidades cardiotocográficas:
o Desacelerações tardias (DIP II): constituem a anormalidade cardiotocográfica que mais comumente
aparece quando há hipoxemia e refletem melhor a queda da reserva fetal de oxigênio, durante o
trabalho de parto.
- Quando se avalia o pH do sangue fetal (padrão-ouro do diagnóstico de sofrimento fetal) durante a
evolução do parto, verifica-se a existência de altas taxas de resultados falso-positivos dos traçados
com desacelerações tardias, de modo a muitas vezes a cesárea ser feita sem necessidade.
o Desacelerações variáveis graves: surgem como consequência da compressão do funículo, tendo
como principal fator predisponente o oligoâmnio, cuja etiologia é, sobretudo, a hipoxemia fetal
oriunda de insuficiência placentária crônica, de modo a costumarem estar associadas com acidemia.
o Bradicardias prolongadas: constituem uma das anormalidades cardiotocográficas mais graves
durante o período intraparto, de modo a representarem um importante sinal para a indicação de
cesárea emergencial, com tolerância mínima para o início do ato operatório.
 Síndromes hemorrágicas agudas: descolamento prematuro de placenta, placenta prévia com sangramento
extenso e qualquer trauma materno que curse com grande volume de hemorragia, indicam cesárea urgente.
 Iminência de rotura uterina: sempre que diagnosticarmos pelo anel de Brandl alto e a clínica de
instabilidade hemodinâmica, indica cesárea.
 Cesárea post mortem: quando há morte materna sob vigilância médica, o feto pode ser salvo se a intervenção
operatória ocorrer até 20 minutos após o óbito.
 Prolapso do cordão umbilical: ocorre durante o trabalho de parto após a rotura de membranas, espontânea ou
artificial, indicando o parto por via rápida nas apresentações cefálicas e nas pélvicas, e permitir o parto vaginal
quando as condições forem as ideais para essa via de parto.
 Distocia funcional incorrigível: se todas as medidas adotadas falharem (amniotomia, infusão de ocitocina,
sedação e analgesia), a indicação da operação cesariana toma-se imperiosa.
 Acidentes de punção: embora acidentes na realização de amniocentese e cordocentese sejam raros, se
gerarem comprometimento da vitalidade fetal, indica-se cesárea.
 Insuficiência plaquetária crônica: demonstradas por meio da ocorrência de diástole zero ou reversa na
dopplervelocimetria das artérias umbilicais, indica hipoxemia fetal grave, devendo-se realizar cesárea por se
tratar de prematuridade extrema, com fetos de baixíssimo peso, na maioria dos casos.
Cesárea eletiva:
 Malformações fetais: gêmeos unidos (xifópagos), ventriculomegalia, espinha bífida, onfalocele, e gastroquise
são malformações que impedem na maioria dos casos o parto vaginal, de modo a cesárea ser determinante.
 Apresentações anômalas: devemos operar nos casos de apresentação pélvica, córmica e cefálica defletida de
2º grau.
 Macrossomia fetal: fratura de clavícula diagnosticada no período neonatal está muito mais associada a
recém-nascidos macrossômicos com 4.000 g ou mais de peso do que quando há distocia de ombros ou de
biacromial, de modo a indicarmos cesárea.
 Gestações múltiplas: as várias complicações nas gestações gemelares no que concerne ao nascimento,
mormente no que se refere ao segundo gemelar, tornam-se uma tendência à indicação da via abdominal para o
parto.
 Aloimunização fetomarterna: nos fetos submetidos a transfusão sanguínea intrauterina devido a
comprometimento anêmico fetal, o parto, via de regra, é programado e se realiza por via abdominal.
 Placenta prévia e acretismo: parto cirúrgico é mandatário em ambas as situações, independentemente da
intensidade do sangramento genital.
 Fatores obstrutivos e tumores prévios: atresia vaginal, condiloma acuminado volumoso, varizes
vulvovaginais extensas e volumosas, estenose cicatricial do colo uterino, carcinoma invasivo e tumores
uterinos ou ovarianos são as principais causas de obstrução da via de parto vaginal.
 Intercorrências gestacionais graves: situações como síndrome e HELLP com fetos na prematuridade
extrema e na viabilidade, indicações maternas de resolução da gestação com fetos de peso estimado inferior a
1.500 g, e iminência de eclâmpsia vão indicar cesárea, mas essa deve ser aguardada até estabilização materna
e maturidade fetal.
 Cardiopatias maternas: gestantes com cardiopatias graves como a coartação da aorta e a síndrome de
Marfan com aorta dilatada não suportam o trabalho de parto e, por isso, devem ser submetidas à cesárea
eletiva, quando todas as condições clínicas e anestésicas puderem ser plenamente controladas e a maturidade
fetal garantida.
 Infecções:
o HIV: nessas pacientes, a escolha da via de parto depende de aspectos obstétricos, mas pesquisas têm
demonstrado que a transmissão vertical do HIV é significativamente menor quando se realiza cesárea
eletiva antes do início do trabalho de parto, com membranas íntegras, efetuando-se a profilaxia com a
administração de zidovudina.
o Herpes genital: quando existem lesões ativas do herpes genital por ocasião do parto, a cesárea eletiva
é a via recomendada para evitar transmissão vertical.
 Cicatriz uterina prévia: além das cicatrizes uterinas decorrentes de cesáreas anteriores, a miomectomia e
outras intervenções uterinas (miometrectomia) que promovem enfraquecimento de segmentos miometriais são
motivo de impedimento ao parto vaginal devido ao risco de rotura uterina.
 Cesáreas prévias: está bastante enraizado na população obstétrica brasileira a indicação de cesárea em
gestantes que realizaram previamente duas ou mais cesáreas.
 Cesárea clássica anterior: na cesárea clássica, a incisão uterina é corporal e realizada excepcionalmente nas
situações que dificultam a incisão na região segmentar, como placenta prévia, miomas segmentares,
prematuridade extrema etc.
- Em razão de nessa incisão as fibras miometriais serem seccionadas no sentido longitudinal, ocorre
enfraquecimento de todo o miométrio, que se torna inadequado para suportar o processo de trabalho de parto.
 Correção de incontinência anal, urinária ou fístulas: mulheres que sofreram correção de incontinência
fecal decorrente de parto prévio com lesão do esfíncter anal, se submetidas a novo parto vaginal, apresentam
riscos de incontinência anal definitiva.
Complicações:
 Infecciosas: endometrite ocorre em cerca de 6% das cesarianas fora de trabalho de parto e em 11% das
cesarianas realizadas durante o trabalho de parto, além de infecção da ferida operatória ocorrer em 1% a 2%
dos casos.
- Situações mais graves, como a fasceíte necrotizante, tromboflebite séptica pélvica e a sepse, são mais raras.
 Hemorragia: atonia uterina, acretismo placentário, trauma uterino extenso e lesão de vasos uterinos.
 Lesões de órgãos adjacentes ao útero: hematoma do ligamento largo, lesão vesical, lesão intestinal e lesão
ureteral ocorrem em 0,2% a 0,5% das cirurgias e o risco aumenta em pacientes com cirurgias abdominais
prévias.
 Laceração fetal: são geralmente causadas por bisturi, pinças ou fórceps utilizados durante a cesariana,
principalmente na cabeça do feto e no dorso.
 Eventos tromboembólicos: trombose venosa, acidente vascular encefálico, IAM e embolia por líquido
amniótico.
 Pseudo-obstrução intestinal: íleo adinâmico ocorre em 10% a 20% das pacientes.
 Inserção anômala da placenta: a cesariana aumenta o risco de inserção anormal da placenta em gestações
futuras, e o risco aumenta proporcionalmente ao número de cesarianas realizadas.
 Ruptura uterina em gestação subsequente.
 Gestação em cicatriz de cesariana.
 Alterações psicológicas.
Cesariana a pedido: É aquela realizada sem indicação médica, por solicitação da paciente, devido conveniência
do nascimento programado, medo da dor ou das complicações do parto vaginal, experiências negativas pessoais ou de
conhecidos com o parto, preocupação com lesões do assoalho pélvico, medo de necessitar parto instrumental ou
cesariana de emergência e sensação de maior controle sobre a situação.
- Essas pacientes devem ser avaliadas por equipe multiprofissional que inclua atendimento psicológico e deve-se
tentar identificar os motivos que levaram à solicitação, orientando a paciente sobre os riscos do procedimento que
incluem principalmente uma maior estadia no hospital e um maior risco de alterações respiratórias neonatais e de
complicações em gestações futuras (acretismo placentário e rotura uterina).
- Caso, mesmo após os esclarecimentos, a paciente opte por cesariana, o procedimento pode ser realizado sempre após
as 39 semanas de gestação caso não haja nenhuma intercorrência antes.

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