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> (aan Pade INTERSECCIONALIDADE E PSICOLOGIA FEMINISTA CONCEIGAO NOGUEIRA Digitalizado com CamScanner 2017, Conceigao Nogueira Qualquer parte dessa obra pode ser reproduzida Jesde que ctada a fonte. Direitos para essa edicag cedidos a Editora Devires. Editor Capa Gilmaro Nogueira Taz Mota Revisdo Textual Diagramagao Clarissa Macedo Vivian Hernandez Alamo ‘TB Nose, Concise Intenso pcan feminist Conse Norse ~ Savor, Babin Eto Devi, oan. 0p ISNSTS$593616010 Enos oglu, 2 Feminine, 3. Kensidade dete 4 lnencesealidadeLNopucia, (ose Tl, cop 201412 50636 cou 30361) indice para catélogo sistemético: 1. Feminismo: 301.412 2. Identidade de género: 306.76 3. Estudos do género: 305(81) Editora Devires Av. Ruy Barbosa, 239, sala 104, Centro - Simées Filho - BA www-editoradevivres.com,br _—— Sumario Prefacio « 7 Introducao. .16 Os feminismos: ondas € epistemologias .. 21 ‘As ondas no movimento feminista... 23 Posicionamentos epistemoldgicos feministas. 44 Uma Psicologia Feminista? 53 Apsicologia (das mulheres) na primeira onda. 70 O género na segunda onda ... 77 O Género na crise da segunda onda 92 feminista Uma Psicologia (construcionista social) critica ...... 96 . 113 O feminismo negro... O género e a diversidade na terceira onda . 118 Digitalizado com CamScanner Uma Psicologia Feminista16? Desde os primérdios, a psicologia rapidamente estabeleceu o seu territério como o de uma ciéncia objetiva, quanti- tativa, empirica e livre de valores. O pes- quisador’’ é tomado como sendo um ob- servador n&o enviesado que conduz ex- perimentos laboratoriais cuidadosa- mente controlados e que se mantém dis- tanciado dos sujeitos em estudo. Apesar de muitos estudos iniciais terem sido conduzidos com animais, os objetivos da Pesquisa foram geralmente concebidos no sentido de compreender e prever o comportamento humano. Os resultados eram concebidos como verdades univer- sais ou leis que se poderiam aplicar a um ee * Serdo feitas referéncias especificas aos trabalhos re- alizados em contexto académico portugués, ”” Essencialmente do sexo masculino. 53 Digitalizado com CamScanner largo leque de individuos er situagdes e tempo. Face a este Panorama, é Compreg, vel imaginar como a luta por Uma psi, logia feminista, discordante dos prae postos da psicologia tradicional, Pode ee dificil de conceber. i Apesar de toda a “impossibilidade imaginada, pode-se assumir que a psico. logia feminista foi alimentada no solo do amplo movimento feminista. No entanto, a influéncia imediata deste movimento nao se fez sentir logo na ciéncia nem no seio da psicologia (Amancio, 2001)18. As mulheres tiveram que lutar para se tor- narem visiveis enquanto Pprofissionais na ciéncia; 4 medida que se tornavam um stupo maior, foram progressivamente m diferente, Nsi. ae ; dig totia tem sido, dentro das Ciéncias Socias, 2 le ‘mais resistente a teorizagéio feminista (Cole, 54 lutando por transformagées no seio da propria ciéncia. na altura, sobretudo experi- mental e de orientacao com- portamentalista, mantinha- se alheada das questées sus- citadas pelos novos movi- mentos sociais e ignorava as mulheres enquanto sujeitos e objetos de pesquisa”. (...) A necessidade de criar um es- paco de visibilidade e reco- nhecimento para o trabalho desta nova geracao de inves- tigadoras conduziu a emer- géncia da psychology of wo- men, que se institucionalizou com a criagao da Divisdo 35 (Psychology of Women Divi- sion) no seio da APA, em 55 Digitalizado com CamScanner 1974 e se afirmou, no seio q. comunidade cientifica, cons fundacao das revistas Seton les, em 1975 e Psychology gf Women Quarterly, em 1977" (Amancio, 2001, pp. 11,12). Desde essa época, e num breve peri- odo de tempo, as psicdlogas feministas tornaram a sua presen¢a conhecida atra- vés de miultiplos esforcos de rever e de reconstruir a disciplina’’. eT 38 Qs estudos feministas permearam areas substantr ves da pesquisa psicoldgica e do conhecimento. 0 ati- vismo feminista deu origem e promoveu novas esti: turas dentro das associaces da psicologia, um subs- tantivo aumento do numero de mulheres no poder e veto Na Associagdo Americana de Psicologi peesanen de 160,000 membros, a divisdo intitu- Genel wade para a psicologia das Mulheres” éatu- ie ore em termos de membros, num mulheres dentro da MPAWiea 2000). Os arupes izeram lobby para obteng® 56 anos 7! jo inicio dos moenv sstionara nhecimento PS refletir um mo- al acreditavam da realidade. ¢ uisadores, 2 am, eram ico, 0 IU delo masculino que muitos pes os sujeitos tes estudaval sencialmen " os topicos que eS tudavam, como dade e a agressao, pontaram m como sos de pesquisa, promover™ de recur: xemplo, 2 saude de: ticas cujo foco era, por & cou o bem-estar. No entanto, é import muitas das psicdlogas feminists ¢) Gas fundamentais na sua époce 2csarem PO algum tempo das suas carreiras estudos sobre as mulheres, onde 2 interdiscip dade é fundamental, e isso de certo modo Fo! imPOF tante para as suas teorias. Falo por exemplo de Sang Bem, que depois de the ter sido recusads 3 ©" Stanford, foi dirigir 0 Departamento de Won dies de Cornell por varios anos (de 1978 2 1985) (St wart & Dottolo, 2006). 57 Digitalizado com CamScanner masculinas, € que os resultados dag Pes, quisas baseadas em amostras m; asculing eram assumidos como se se aplicassom também as mulheres (Crawford & Mare. cek, 1989)". Estes estudos iniciais Provj. denciaram 0 impeto para a semente de um campo de pesquisa sobre as mulheres e sobre os mtltiplos significados do ge nero. ee ® Quando as mulheres eram objeto de estudo eram = & acordo com os standards masculinos de = a1 Petsonalidade assim como 0 comporta- eae, ete Sram vistos como desviantes ou Pegaso COMPataCEO. Por exemplo, nas ied a © focalizavam sobre as diferen- meses muheree ns que em comparagao com os , Menon sea menos motivadas para are- m Ratemdtieg fy menos competentes em 25 come exter tos Presumiveis deficién- dog ang tiPos para todas as mu- 2 orogreseys a5 mulheres a en 9 tray ional ‘©, em contextos e domi- ‘ente masculinos, Nos anos subsequentes, as psicdlo- gas feministas contribuiram com aborda- gens inovadoras no desenvolvimento de teoria, de medidas e de abordagens em diferentes areas, apesar da sua influéncia em termos de pesquisa, no geral, ser di- minuta. Para além disso, em muitas areas houve, e ainda hé, resisténcia a mu- danga?!, As barreiras mantém-se quando 0 termo “feminismo” define a compreen- sao ou 0 processo de pesquisa”. * Entre as mais resistentes, Worell (2000) refere a psi cologia forense, a psicologia social tradicional, a psico- logia da personalidade assim como a psicologia do de- senvolvimento. ” Apesar de, pela mesma época, certos artigos come- Sarem a ser publicados em revistas cientificas no es- Pecificas do dominio, esta situac3o no foi regra (ainda Nao o é) e continuam a ser as. revistas ligadas a tema- tica, o meio mais influente de Passagem de comunica- 40. Torna-se claro que o conhecimento psicolégico se mantém cauteloso sobre as Questées feministas e que €stas continuam nas margens, 59 Digitalizado com CamScanner A psicologia tradicional tende a ¢ cionar dentro da designada “torre a marfim”, isto 6, a pesquisa conduzida valorizada pelo seu valor intrinseg. como informagao basica acerca do oo portamento humano e da condi¢ao hu. mana. Pelo contrario, as psicdlogas fem). nistas promoveram 0 principio do ati. vismo social, da implicagéo com causas para os grupos sub-representados. Nesta perspectiva, a pesquisa que é socialmente relevante para a vida das mulheres e das familias é altamente valorizada, em parte Porque é mais provavel que se traduza €m politicas que beneficiem as mulheres e 0s homens) e que remedeiem as injus- ticas sociais, 4 pesquisa psicologica socialmente relevante tem sido eficaz no advogar de M0 0 direito ao aborto (Oliveira, 2 luta contra a violencia de género a“ [ (Azambuja é& Nogueira, 2008a; Azam- buja, & Nogueira, 2008b; Azambuja é& Nogueira 2007; Neves & Nogueira 2004; Neves, 2008), aos direitos de pessoas lés- bicas, gays, bissexuais ¢ transgénero (No- gucira & Oliveira, 2010; Oliveira, Pena & Nogueira,2010), as iniciativas para apoio a sadde das mulheres (Azambuja é& No- gucira, 2010 ; Strey, Nogueira & Azam- buja, 2010), as questées da sexualidade feminina (Costa, Nogueira, & Lopez, 2009; Saavedra, Nogueira & Magalhies, 2010), as questGes associadas a5 masculi- nidades (Ribeiro, Paul & Nogueira, 2007; Neto, & Nogueira, 2009) ¢ muitas outras quest6es que afetam o bem-estar das mu- Iheres ¢ dos homens e que sio de impor- tancia fulcral. Neste papel de defensora de causas, atuando como ativismo cientifico (Han- kivsky et al, 2010), a psicologia feminista 61 Digitalizado com CamScanner tem sido influente no deslocar q logia tradicional face a uma posi 8 Psicg, ativista, no sentido da transforma cial. SAO go, Apesar da hostilidade ou ambj léncia da "disciplina-mae", a Petkolon gia feminista teve, e foi influente em algu. mas esferas. Entre elas podem-se salien. tar os seguintes aspectos (Worell, 2000): 1) a criagéo de novas areas de pesquisa, novos assuntos e (re)nomear de proble- mas, sendo o melhor exemplo a questdo da violéncia contra as mulheres, e a vio- léncia de género; 2) o questionar de mé- todos de pesquisa e de prioridades, por exemplo, a incluséo de métodos qualita- tivos preocupacdo com investiga¢ao as- sociada as desigualdades e as discrimina- 3) novas abordagens a pratica cli- © terapéutica, onde se pode atual- 62 mente situar 0 campo das terapias femi- nistas®; e finalmente, 4) a integracao da problematica da diversidade chamando a atencdo para as diferencas entre as mu- Iheres. Apesar de existirem um conjunto de pressupostos que caracterizam a psicolo- gia feminista, apresentados anterior- mente, este dominio nao esta isento de conflitos ideologicos e desacordos inter- nos. Dentro da psicologia feminista, pelo menos trés areas promovem o diéd- Seer seeaeaeseeeesee eee | 23 As terapeutas feministas tipicamente e frequente- mente, assumem que os sintomas das mulheres como as suas tentativas de “coping” com situagdes patologi: cas, mais do que refletindo patologias dentro das pro: prias mulheres, resultam de fontes externas associa- das a um sistema assimétrico de poder. Esta perspec tiva posiciona a patologia das mulheres num contexto social e politico. 63 Digitalizado com CamScanner I colha da i" | logo/debate continuo, mas vergéncias™. Sao elas: a) aes, signacao de Psicologia feminista Pers Psicologia de mulheres; bho assumir g essencialismo versus Construcionismo so. | cal; ec) assumir o género versus divers. dade na opressio das mulheres, | Face a estas Posicdes ou divergén. | Clas, neste texto apenas um dos Polos das divergencias sera assumido, A designa. | tambén, Ms a i fundamentais com as quais a fe ese Confrontar no presente, i 7 S80 distintas (do ponto de temol6gico) da juelas que se ° 0 prépri famed prio feminismo de uma f 64 discussdo porque inicia 0 debate sobre a teoria da interseccionalidade, ponto cen- tral deste texto, Se se assumir que a Psicologia femi- nista foi tendo diferentes posicionamen. tos em diferentes épocas, alias como ve- remos no ponto adiante relativos ao sexo/género nas diferentes ondas do fe- minismo, nao deixa de ser importante re- ferir, como salientam Stewart e Dottolo (2006), que a maioria dos trabalhos da nova geracdo de Psic6logas feministas sao em temas como corpo, sexualidade, estudos transgéneros, intersexo, t6picos que sao familiares aos estudos interdisci- 8ados aos trabalhos de orientacao pos- moderna. Muitos destes trabalhos, al- Suns deles Publicados nas Tevistas mais mainstream da Psicologia, derivam de te- Orias e de discursos Particularmente nao 65 Digitalizado com CamScanner familiares aos Psicélo gia, como é exemplo o Foucault, agora muito Dottolo, 2006). Em con ¢ao anterior, Principal onda, as/os jovens Pesquisadoy, métodos que sao familiares na sie de forma muito flexivel, ve forma muito pouco Pesquisadoras/es par das em algumas ta conduzem uma inve: ane se baseia em trabalho de fe- tram argumenteg pape eeeeram, encon- Pesquisa mis = Para justificar métodos apd Stos ou mesmo alternativos, nova gerncey interdisciplinaridade. Esta intogrseee Parece criar novas fuses € que acabam Por ser diferen- SOS/as e APs trabalho d 1COlo, traste co mente da Segund, Usam : Ologia as vezes de ortodoxa. Estas/es ecem estar envolvi- refas importantes; stigacdo que de al- 66 Citado (Ste Ache tes do trabalho gerado na geracdo ante- rior?5. Pode-se afirmar que apesar da exis- téncia de conflitos internos, e de debates continuos, a psicologia feminista conti- nua a crescer e a mostrar-se frutifera no Jevantar de problemas e solucGes alterna- tivas construtivas assim como aborda- gens inovadoras. As/os psic6logas/os feministas aspiram a promocao de uma disciplina aberta 4 mudanca, que valo- rize e promova a igualdade e a justica so- cial entre grupos e individuos e que seja ativa na insisténcia para o bem-estar quer 25 Serdo estas jovens psicdlogas/os feministas adeptos da "agenda feminista geracional" ja referida tras? Se- gundo as informagdes que as autoras Stewart e Dolloto (2006) referem, estas cientistas parecem admitir ele- mentos que as distanciam dessa vertente geracional mais radical. No entanto, serd importante seguir estes desenvolvimentos e ir questionando as suas conse- quéncias tedricas, mas também politicas. 67 Digitalizado com CamScanner de homens quer de mulheres de todo, grupos. at) Concluindo, pode-se dizer que a ps; cologia, como o feminismo, nao é unit, ria, mas representa uma variedade de pontos de vista, métodos e areas de es. tudo (Phoenix, 1990). A pesquisa condy. zida pelas feministas tem muito a dar 4 disciplina da psicologia, muito embora nao exista uma metodologia feminista que todas as feministas subscrevam (Do- micio & Nogueira, 2009; Neves, & No- gueira, 2004; Neves, & Nogueira, 2005; Nogueira, Saavedra, & Neves, 2006). Pe ere de perspectivas in- aan feos que elas escolhem fa- Os que usam, existindo, no sntanto, grandes temas com uais 38/08 feministas a (Phoenix 199, i Pparecem concordar tormalments a en 1986) e que Critica do Processo da. ae han a € pesquisa em SI! mesmo. Penso como Kitzinger (1990), que ser feminista significa ser responsavel face a outras feministas pela psicologia que se faz, e como psicéloga, ser responsavel face a psicologia pelo feminismo. Apesar da etiqueta de psicologia feminista poder ser considerada uma contradicao nos ter- mos (no sentido de uma ciéncia positi- vista, logo neutra e objetiva), assumo esse posicionamento e essa responsabili- dade. Adiante, no ponto relativo 4 rela- cao do género com as posicées da crise da segunda onda, assumirei claramente as bases tedrico-epistemolégicas e politicas desta posigéo: uma psicologia feminista critica. 69 Digitalizado com CamScanner

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