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<° MENT Arg» Por outro lado, psicanilise nio é Panaceig reconhecer quando encontramos situagSes-limite 7 emg atuagdes e encaminhd-las para os colegas Psiquie No, psicoterapeutas que permitam algum tipo de conforto ¢ alii aqueles que estao imersos em profundos sofrimentos,* ou ‘ara Pretendo, neste artigo, ressaltar a diferenca na abordagem, en apreensao de delirios e de panico a Partir do vértice Psicanalitico, cn que vivéncias aparentemente “absurdas” Possam encontrar um sentido real.’ Aproveito igualmente para fazer algumas Teflexdes sobre a experiéncia de Percepcio da des-continuidade e de manobras para evita-la. O delirio de citimes Certa vez, ouvi de uma Pessoa conhecida que sua maneira de abordar um delirio de citimes em seu consultério foi a de convidar © marido de uma paciente que se sentia traida, desconsiderada e desprezada por ele. Colocou-o diante da Paciente e indagou se ele a trafa ou nao gostava mais dela. O marido fez juras de amor a companheira e a colega considerou que 0 caso estava resolvido sem nenhuma dessas complicagées “inventadas” pelos psicanalistas. Do meu ponto de vista, a abordagem feita é bastante ingénua, a despeito das boas intengées da colega. Ela nao leva em conta a realidade psiquica e toma como correspondente aos fatos aquilo que é referido, quer pela paciente, quer pelo marido, Numa abordagem nio psicanalitica 6 cc tumeiro Considerar 0 delirio uma perturbagio em que toda reagdo emocional e es ® Ver Castelo Filho (2004). ° Cabe ressaltar que essa qualidade de apreensao sé é possivel no atendimento de Pacientes capazes de tolerar uma experiéncia psicanalitica. _ . “HO 13] comportamental é desencadeada a partir de jnteiramente pela mente do individuo que os vin indepe ndentes” que nao possuem qualquer rela atuagdo nesses Casos, sobretudo em abordagene muitas psicoterapias, seria a de procurar conve; falsidade e do absurdo de suas vivéncias medicamentos, fazer desaparecer a perturbacao doenga que seria 0 delirio. ‘ entos produzidos cs Sao “Producées #0 com 0S fatos. A Psiquiatricas e em Ncer O paciente da oe por meio de Busca-se acurada O vértice psicanalitico sobre um delirio de citimes Trago, a seguir, uma situacao clinica de minha experiéncia em que outra percepcao pdde ser alcancada sobre uma situacio similar. Uma paciente muito angustiada nao encontra elementos em sua experiéncia, mas fica procurando algo que evidencie que seu marido tem casos com outras mulheres, tem uma amante ou mesmo muitas aventuras extraconjugais. Diz que nao consegue tirar isso de aver nada realmente consistente que a sua cabeca, apesar de nao hi 4o, contudo, a atormenta dia e noite. leve a pensar assim. Essa fixa¢ conduta dessa cliente em meu consultorio € ceitavel. Devia ser uma outra pessoas nio s que vive O que observo na que ela se considera ina devia sentir e experimen’ quando na minha presenga. tar os sentimentos € emocoe! 11 Nao devia perceber 0 que seus orgdos catpy, de Eret O17/1978) & Ver “Lecture XVI - Psycho-analysis and Poychiatry’, de Freud (1ST fi “Medeci >, de Bion (1970/1977, PP- 6-25). cay - edecine as Moder’ de Bin poraneencontat que est lies de fins semana. que fica contente , que sofre durante da pelo atendimento, Pols uer sentir medo de me 11 Nao suporta verificar a as separa que sente falta de nossos encontros: Irrita-se quando se vé beneficia 9 da minha pessoa, € ela nao qi isso leva a uma perder. Considera valorizaga 132 O PANICO, O DELIRIO, E OUTRAS “PERTURBACORs ME NTAIS» dos sentidos lhe informam. Sua experiéncia a atrapatha que os fatos correspondessem as suas €xpectativas, Bla ; deveria corresponder as suas expectativas, Durante as Proprig procura apresentar-se, para o mesma e para mim, conforme or que “deveria” ser. Tudo aquilo que percebe em si, a personagem valorizado, é rejeitado. Sua convice: igualmente, prefiro 0 personagem que ela procui Aquilo que seria ela mesma. OStarig do é de que ey Ta Me apresentar Para fazer os comentarios que finalmente lhe ofereco e relato a seguir, também levo em conta suas associa¢ées, apesar de considerar que nem sempre isso é essencial. A prépria observagio dos fatos na sessao pode ser bem mais reveladora do que as supostas associacoes livres. Muitas vezes, as associagdes livres sao apenas pseudoassociagdes com a funcao de distrair a atengao do analistae do analisando para histérias que os seduzem e que, por sua vez, evitam 0 contato com as vivéncias e atuagées do momento do encontro analitico. Tendo isso em mente, frequentemente o que Parecem ser associagoes livres séo apenas atuagoes — agdes que visam impedir que os pensamentos Possam ser pensados (Bion, 1970/1977) (coluna 2 da grade Proposta por Bion [1963/1977]. Nas associagdes da paciente ela diz que passa o tempo todo Procurando corresponder acriatura que, segundo ela, o marido quer ou diz querer que ela seja. A paciente refere ter pavor de que ele Possa vé-la como, de fato, Pensa ser. Procura evitar ao maximo que ele saiba o que cla Pensa, quais Tejeitada caso aparecesse assemelhar o companheiro”, © suas opinides. Considera que seria com suas prdopri mais que pode a ideias e gostos, Busca se Personagem “desejada pelo Se que todas essas vivencias sao fraquez, superioridade; dessa maneira, Ela deveria ser um mo: numento de gelo e acredita que nao sofreria, \ que percebo que ela vive lhe apresentando, a: 5 uma outra mulher, ou muitas outras mulheres, Para ele t ° oo le ter 3 Ela mesma oferece as mulheres que considera que cle Telacdes, 80staria de é sempre uma outra que, segundo Seus critérios, é 5 i interessante € atraente. Considero, co; > oem mais encontrar. Nunca é ela propria quem se apr esenta para os €ncontros; s, COM sua com as mulheres que ela “produz” para ele. Mesmo quando aparentemente esté na cama com ele, nao é com ela que ele “transa”, mas com a(s) outra(s) que ela lhe apresenta, A paciente sofre um impacto e se emociona, Algum tempo depois, os delirios de citimes arrefecem e ela sente que nao consegue mais operar por esse esquema: ele nao mais encontra substancia para manter esse tormento.”” Ressalto que isso nao consiste em uma “cura”, mas na colocagio do conflito em sua dimensio real. Considero que vale destacar que © mais significativo disso tudo sao as relagées da paciente com ela mesma. Sua fantasia de ser outra que nao ela mesma esta radicada 2 Nao considero, todavia, que sua ideia de que o marido pudesse ter uma amante fosse completamente descabida. Uma mulher que nao fiz resistencia ao mar ido, que Se apresenta como uma sombra dele ¢ que existe apenas pars See imagina que ele deseja, acaba se tornando “sem existéncia”, Unis pessoa p esisténcia, Como UMA MIO so uma companhia precisa ter alguém que Ihe faa resistencia, como encontra ao! h . a rel Aoutra, Se o marido nio ra se houver resisténcia d 7 . ~ implica ser do contra), encontra uma parceira real, que Ihe faga oposigae ( que nao une is™ 7 poder se “encontrar” de fato com pode acabar procurando outra, ou outras, para P ncont alguém, para ter uma parceira de fato, mesmo que eventual: ee 134 0 PANICO, O DELIRIO, E OUTRAS “PERTURBACORS MENTArs» na crenga de que sua vida é cited por ela ser quem 6, A Vida de one pessoa seria muito mais acl que a sua. Caso nao Sentisse x emocées, dores, tristezas e angtistias que ie sdo Raturais, tudo setig uma maravilha. Dessa maneira, rejelta sua prépria experiencia : procura substitui-la por outra que seria melhor, es Seja, por Outrag vivéncias que, de fato, nao tem, aa Imagina."” Na imaginagao, qualquer vida é sempre mais a que a rosa. A rejeicio que experimenta como vindo de fora é a des ocamento do préprig édio que tem de si mesma. Isso ped significa que tenha sido maldotada pela vida e pela natureza - é uma pessoal com aparéncia agradavel e de inteligéncia acima da média -; significa que ela acredita possuir uma natureza desgragada e que outra seria melhor. Procura substituir sua propria existéncia por uma outra natureza que acredita ser superior e que, por sua vez, a pouparia a todoe qualquer sofrimento, em uma vida de permanente éxtase e satisfagéo. Como consequéncia, néo somente estd Privada das satisfagdes de sua “vida” imaginada/alucinada, Pois na pratica é apenas um produto seu sem consisténcia real, como também da vida que realmente teria para viver. Nao podendo ter um contato real consigo mesma, também nao tem acesso as suas Percep¢ées, ou, pelo menos, delas nao pode se valer. Dessa maneira, tampouco é provavel que jamais tenha feito um contato mais realista com seu marido ou com qualquer pessoa de suas relagdes, da mesma forma que seu contato comigo é, na verdade, com alguém produzido por atividade imaginativa - eu servindo apenas de estimulo sensorial Para a construgéo de uma figura que tem uma série de expectativas a seu respeito e que nao tolera que ela po: com quem se encontra, é uma produg: realidade na maior parte do tempo, 1a. frustré-la, Esse anal ay, 4a da qual esta convicta da Contudo, nao corresponde a Pessoa que de fato sou, que a tem recebido por um tempo considerdvel e que percebe e verifica que el — *® Para ser mais preciso, ela alucina la em nada corresponde “ x CLAUDIO CASTELO FILHO, 135 aqueles personagens que representa. Suponho algum lugar, nos rec6nditos de sua Mente, deve haver al percepsio, ainda que remota, dessa discrepancia entre aquele tee acredita que eu sou € aqucle que ela efetivamente ae la permite que ela retorne aos nossos coldéquios e que a — “ prossiga. Esse contexto também remete a problemas de aceita a“ minha existéncia (e a dela mesma) enquanto entidade —— “ suas produgdes mentais. le Porém, que em Questées referentes d continuidade e a descontinuidade Valho-me do préximo material clinico para refletir sobre questdes ligadas 4 percepco da des-continuidade. £ uma situacao delicada, penso que para ser abordada e suportada o analisando precisa sentir que se encontra em um ambiente benigno capaz de conté-lo. A abordagem desse problema pode desencadear reacoes de defesa por parte do analisando com caracteristicas que frequentemente sio vistas de maneira pejorativa e que tendem a ser usadas para denegri- lo porque “nao colabora” com a anilise. Um determinado modo de operar é percebido como deletério para o cliente, e, partindo desse pressuposto, podem surgir pressGes para que 0 abandone e passe a abragar métodos “mais realistas” ou supostamente ; mais desenvolvidos - costumeiramente percebidos como “supetiores - Nem sempre é levado em conta 0 sofrimento temido pelo oma ou efetivamente vivido por ele quando da realizagao ce jonais, E preciso, segundo minha determinadas experiéncias emocionas, E preciso, seg oe experiéncia, que o paciente se sinta efetivamente ac a , é contar © na genul respeitado pelo analista, além de contar com uma 8 imil a eriéncias capacidade deste ultimo para assimilar tanto as exp See COES MENTAIS” Linid, F OUTRAS “PERTURBAG TAIS”, (© DELIRIOy 136 0 PANICO> como as suas proprias, para gue um analisando an; ser gerado em que ag Sementes cionais do emocionais vel pos! ontexto emocional favorave F Jesenvolvidas. Esse acolhi CO jantadas ¢ des Mento analiticas possam ser pl -espeito. a um analista caricaturalmeng, de que falo nio diz a condigio de absorver as experiéncia, bonzinho. Cai pela condigéo humana podem ji : i ae pessoal do analista associada desenvolvidas na ° io & algo que caracteristicas de personalidade dele, Nao es - me = impostado ow falsificado com éxito. Essa con he ° analista ¢ manifestada e captada pré-verbalmente. Quando} ‘4 uma impostura, o analista estereotipado vai produzir uma anilise estereotipada e analisandos padronizados (quando nao totalmente aterrorizados, mesmo que nao se deem conta disso). Havendo verdadeiro respeito ecompaixdo humana, a conversa pode ser bastante franca, sem que, em geral, haja maiores danos. O analista, por sua vez, pode perceber a dor de determinadas vivéncias e o terror desenvolvido no questionamento do modus operandi do analisando. Pode ajudar 0 paciente a se dar conta das dificuldades produzidas por suas organiza¢6es neuréticas ou psicéticas sem, no entanto, achar que ele pode ou deva abandoné-las antes de encontrar ou desenvolver outros modos, supostamente mais Propicios aos seus (do paciente) interesses, emociona ; O material clinico destaca quest6es relativas 4 separacao, ou Seja, a percepcao da des-continuidade entre uma existéncia e outra. A percepcao de algo que se Poderia chamar eu nao seria possivel sem tal experiéncia, By nao é reconhecivel sem o ndo eu. witosanos em anilise Se no diva e Permanece um longo periodo em t Mas nao se manifesta, Entao, apds um suspiro CVAUPIO CASTELO sting diz: “Ai, Claudio!”, como que desalentada algum jeito em seu sofrimento, que se tratava, nem tampouco, 137 © esperando sem, no entanto, j conforme 0 meu p ato com aquilo que a faz softer, Digo que parecia que ela estaya es} minha parte. Ela retruca, mesma entrar em cont » com algum humor. 7 fe » que podia até ser um despropdsito, mas ela nao se permitia sequer examinar a minha observasio. Jé a tinha descart: ea mim também, que sé dizia sandices, a via se expressar. “[I]Magina! Eu nao de escarnio. Mais uma vez, digo, ‘ado sumariamente Segundo o modo em que eu Penso nada disso!” O tom é eu teria falado outra besteira, pois a nova proposi¢ao tinha sido rechagada e ridicularizada sem que houvesse um minimo de tempo habil para ser avaliada: simplesmente nao valia a pena consideré-la. Mais uma vez, ela logo rebate e ridiculariza esse novo comentario. Também faz Ppouco caso de mim por té-lo dito. Nao entro no mérito do contetido de sua fala nem da minha. Comento que podia ser verdade que minha percepcao era absurda - apesar de nao ser muito sensato ela contratar os servicos de um profissional cuja opiniao nao pode levar em conta -, mas, uma vez ela estando ali, era o minimo que podia fazer em consideracao por si propria. Contudo, prossigo, 0 relevante seria ela verificar que nao pode suportar outro ponto de vista que no o seu. Naquele momento, 0 mais importante nio era saber se minha observagdo tinha ou nao pertinéncia quanto ao teor, mas verificar que lhe parecia ser impossivel tolerar a existencla de uma c a versio ou rejeigio, Porta-se como um “ Todavia, sua violéncia nao me desperta w vctem diferentemente 5 “amigos” se compo! amiga malcriada que nao suporta que os “amigos” se ¢ ae ‘hd uma postura de de suas expectativas, logo ralhando com eles. Obviam as ectante sedutora. superioridade e uma espera de subserviéncia, Ela é uma Pe pritnr0, FE OUTRAS “PERTURBAGOES MENT ay. nico, © DEL 138 0 PA jo coincidisse com a sua. Em tltima ings. Jo que nao coincidisse a Istanci percep¢é rercepeao da minha existéncia, A Paciente Tetry a aA shia t P a dizendo ser 6bvio que me percebia, Fy prove, ao para mostrar que, naquele mes, 761 ai: Mo frio que abando de fazer, mais uma Yer a mink comentario 4 ae siderada ida la “ reao nao podia ser considerada, contida Por ela, Seu observagao 14 1 is e ” ie calasse, sumisse e ; movimento era para que cum NAO mais g era toleravel irritada esarcistica © a situ mais uma vez estava se com algo que revelaria a falta de continuidade entre ely incomoda: ; ; mim. O que a desconcertava e a enfurecia era minha fala Tevelar emim. que eu nao fazia parte de suas produgdes mentais £ Pensamentos, meu pensamento, evidenciado por mas falas, nao coincidia com o dela, e isso revelava minha existéncia e uma des-continuidade entre a minha pessoa e a dela. Ao atacar-me com Sarcasmo procurava silenciar-me, fazendo-me desaparecer, ou forcar-me a coincidir meu ponto de vista com o seu, eliminando a des- continuidade. Deprimida, a paciente reconhece o sentido do que lhe digo, mas comenta nao saber o que fazer com isso. Digo que o significativo era ela poder ficar com algo para pensar — eu nao estava ocupado em fazé-la mudar ou tampouco achava que isso, naquele contexto, era possivel. Facoa observacao de que o importante era ela ter visto esses movimentos, 0 que jd ampliava, de algum modo, sua percepgio de si mesma e dos fatos, Tessignificando-os, Fica mais um tempo em siléncio e finalmente o interrompe para fazer um comentario, a primeira vista, disparatado e sem conexio Com 0 que estavamog conversando, Fal c i ila de um conhecido seu que ha muitos anos teria me encaminhado para anilise, Rss duas entrevistas e nao m: 4 pessoa teria vindo a apenas uma ou acordo com a ‘ais retornado, segundo seu rato tanto que “Poimento, era um mentiroso contumaz. Me que acreditava Nas préprias fabulacées. Também era uma c AUPIO CASTELO Fino pessoa que — ainda conforme a Paciente comportamento de continuas falsificagdes “> POF conta desse Ninguém suportava ficar junto dele a era dificil aguentar. atualmente, esta em uma situacio muito ae Diz. que ele, arrumar emprego e teve de adiar fae conta desse contexto. Toda vez que é entrevist: Projetos de vida por stac . do par: =. . au nao é escolhido. Comenta que ele nao fez analise, ma: in trabalho, » Mas acabou desse jeito. Sua fala contém um julgamento moral, 139 nao 9 consegue Digo a paciente, levando em conta os seus relat conhecido procura evitar a dor de perceber o ue . a a Protege-se dessa maneira. Nega 0 que o machuca como nate sobrevivéncia. Falsifica para evitar dor. Todavia, a propria forma ‘ se proteger acaba levando-o a sofrer consequéncias dramaticas Surge um impasse. Se entra em contato com o que o atormenta, considera que sofrera algo intoleravel. Se nao o faz, compromete toda sua existéncia. Indago-a se ela saberia qual a relagao que haveria entre esse seu comentario e 0 que estavamos conversando - considerando que exista uma. Ela diz que havia ficado, no inicio da sessao, fazendo de conta que eu nao existia e depois procurando anular tudo 0 que eu dizia junto com a percepgao da minha existéncia, falsificando tudo. Parece estar muito sofrida ao fazer essa observagio, dilacerada. Digo-lhe que se defendia da percep¢io da minha existéncia & falo dos movimentos que ela que fazia para anuli-la (minha 4-la a todo custo, pordues para ela, existéncia), procurando evit a fora de seus pensamentos com ente violenta, verificar-me fora de sua cabega, existéncia separada da sua, era um man eee pois nao era simplesmente perceber-me existindo re Mle uma lugar. Sua experiéncia era de eu ser rasgado dela, a as partes S40 maneira equivalente a uma folha de papelao qua! a vivéncia extr Mo 0 PANICO, 0 DFLIRIO, F OUTRAS “PERTURBAGOES MENT AIS, despregam e esfolam uma parte dg separadas com rasgos que ont a, Nao se tratava de uma Situagao em a, que Era como ser esfolada viv: ; a dela, mas que ela passava a P me ver fora eu ja estaria existindo for: como consequéncia de ter sido dilacerada - eu surgia a daquilo que Ihe fora arrancado. Por isso, segundo 0 que ey estava pensando, atacava-me, desfazia-se do que eu dizia e da Propria percepgio da minha presenga. Ouvir-me e ver-me fora de seus pensamentos era sentido como algo dilacerante e Precisava ser rechagado com vigor. Todavia, cabia ressaltar que essa sua vivéncia nao correspondia efetivamente aos fatos. Eu nao tinha sido arrancado de dentro dela e de seus pensamentos, eu sempre estivera fora dela e de sua cabe¢a. Podia, contudo, compreender sua dor, a despeito de ser produzida por um engano. A conversa prossegue de modo um pouco mais amistoso e um pouco deprimido e, entao, encerro a sessao. Comentario Caso houvesse uma tentativa de minha parte de atacar moralmente ° eae de operar da paciente, com o intuito de demové-la de funcionar da maneira que faz, considero que, simplesmente, seria criada uma Situagao desesperadora. Para ela, esse é um método de sobrevivenca, de protecao de sua mente. Ficar privada disso é ficar seats ve ceemament apavorada e ameagada. Mostrar-lhe a parts deca nan Ja bastante dificil). Outra possibilidade é a de. ela possa ee Pao, desenvolverem-se novos recursos de que ae a lidar com seus sofrimentos, Atacar 0 set leva a6 meen onan se fosse uma doenga a ser extirpada nos Panico sem que se possa ich, Procura “curar” delirios e crises ¢ slumbrar qual a fungao que possuem. SVAUDIO castIL6 pay 0 A abordagem de uma vivenci vértice psicanalitico 141 a Aunt de Panico Sob 9 Normalmente, ao ouvirmos uma situacao em que estd sofrendo de panico, com medo de q atividades rotineiras sem ter uma crise, seria a de considerar 0 panico 9 sint eliminada. O panico caracterizaria uma | que uma Pessoa diz Sair na rua ou de fazer a abordagem mais habitual ‘oma de uma doenca a ser Perturbacao mental, Proponho, a seguir, uma aproximacao Psicanalitica par. caso especifico. Trata-se do atendimento de w rues ° : ‘ mM paciente que se queixa de estar vivendo crises de medo e Panico, Na sessao a que ora me refiro, observei que ele estava em visivel desconforto, deitado no diva. Havia um evidente mal-estar. Contudo, permanecia em um longo siléncio, Ao ser indagado sobre 0 que estaria se passando, respondeu, laconicamente, que nada tinha a dizer, que nada estava acontecendo e que nao estava pensando em nada. Comentei que percebia um visivel e consideravel desconforto que ele estaria experimentando. O paciente retrucou, com certa irritagao, que nao havia nada de significativo no que estaria se passando. Varios minutos se sucederam naquele contexto em que o seu sofrimento me parecia escancarado, mas ele permanecia em uma atitude de ignorar aquilo que eu verificava. Indaguei ao paciente se o desconforto que eu lhe comunicava, ¢ ele i que pareceu ignorar-me e ficou calado, Comentei, com bom humor, q ja (e também, de certo modo, ele estaria partindo para a ignorancia (¢ tap neio de lidar convidando-me a partir para a ignordncia) come 0 | realmente nao percebia i cago 5 A finalidade desse tipo de estimulo aera doe sestabelecesse ume — wa ia” isso fosse bem- : : fancdo (“partindo para a ignorancia”). Caso is Oa ente produrido eid ‘como funs rixa com o paciente, 0 falso conflito, art 142. 0 PANICO, O DELIRIO, E OUTRAS “PERTURBACOES MENTAIS® ma situagao dificil e desconfortavel para ele. 4 mentalig com a “q que se ignora nao existe”. Todavia, Parecia haver ade ea pois aquele método de alivio a ave, a meu ver, el reer nto estava sendo eficaz, pois 0 seu mal-estar era Patente, 80 meng para mim. Um tanto irritado, respondew que estava irado Por estar na sessdo perceber que o que ele experimentava, o que ele sentia, nao era o que gostaria de estar percebendo nem sentindo, Veri heave que os pensamentos que ocupavam sua mente nao eram OS que ele gostaria de ter e realmente nao queria saber das coisas que Ihe passavam pela cabega, pois elas 0 contrariavam. Comentei que partir para a ignorancia parecia ser o sey Método de “resolver” as dificuldades. Quando partir para a ignorancia nao era suficiente, parecia que se esforgava para destruir sua Percepcao, que era a “culpada” por fazé-lo dar-se conta daquilo que pretendia ignorar, da mesma maneira que um rei pode mandar matar o mensageiro que lhe traz uma ma noticia, como se, com esse expediente, pudesse eliminar nao apenas 0 mensageiro, mas também © fato que ele reporta."* O paciente, com muita relutancia, inconformismo e édio, reconheceu que aquele, de fato, parecia ser seu modo de proceder. Comuniquei-he que seu panico, que ele considerava uma doenga a ser eliminada, extirpada, era, a meu ver, uma manifestagio de sanidade de sua parte. Se sua maneira de lidar com 0 que 0 desagradava eo angustiava era negar a realidade de suas percepgdes pauls ainda ~ quando isso nao era suficiente para fazer desaparecet 0 incOmodo ~ S¢ recorria ao recurso de “furar” os olhos e os ouvidos & iis iereeptivos) que revelavam os fatos que reeltv® Vrar-se de seus tormentos, ao_perceber-s ‘gnorincia dos reais conflitos que o trouxeram a anise 92, pp. 133-134), eS SASTELO FILHO 143, mente NO eScuro, C&O ¢ surdo diante dos fatos . s considerar, € muito menos pensar a respeito v ue) s natural do que sentir-se em panico, Peony ova ou pr para conseguir alivio ol “iso resultante, na pratica, deixd-lo em uma situacio aind: como assustadora € desconfortavel. Estar na vida podendo conta la mais percepcao ja nao é uma tarefa facil. Estar na vida on “om a considerar 0 que se percebe, ou, ainda pior, sem ter — - perceber, é realmente algo assustador. O panico, portanto, completa! odia mai de ser mai! e yulneravel. para totalmente justificado e realista. Tendo em vista essa dtica, tomar remédios ou qualquer outra providéncia para eliminar 0 panico seria algo muito questionavel pois a vivéncia do panico era 0 que havia de saudavel Peet individuo nesse contexto.”” O panico estava associado a uma percepgao residual do perigo e da vulnerabilidade em que se colocava ao negar as percep¢6es e procurar destrogar 0 equipamento perceptivo, considerado “culpado” pela existéncia dos fatos que repelia. Ao destrocar 0 equipamento perceptivo, era também destrocado 0 equipamento para pensar, a mente, que podia considerar e refletir sobre a realidade rejeitada. Essa percepgdo residual é que traz o paciente para a andlise, pois ele intui que algo em seu funcionamento precisa de evolugio. a de “viver” em um mundo A tentativa do paciente seria idade seria conforme suas produzido alucinadamente, em que a reali Jo por longo tempo para combater © ao permanecen inalterada dentro de a sentir medo de suicidar- e ora fago, 1 Bese chi sse cliente é um daqueles que foi med a Panico e que percebe que a estrutura da situ si. Apé p6s algum tempo sob o efeito da medicagao passou mo evidenciado na descrigdo qu resento, privé-lo de seu medo € mpletamente desvalido. se. A ve i igia, c meu ver, aquilo que o afligia, con Permaneci: do o vértice que ap! < ranecia em curso e, segun’ ti i Priva-lo ealidade, deixando de contato com a realidade, deixando-o co sO een nnn nnn nnn ee OS 144 0 PANICO, O DELIR. e desejos. O problema com on tipo de Producsg u defeito para existir. A realidade (seja elao Que fy srio, por mais que seja negada, permanece existindo, Apesar ao contri do em alucinagao, nao estou me Teferindo a a eects eequzataico - nao se diferencia da maioria das Pessoas oF ce do que se costuma considerar. Muita gente Pensa ques casada, que tem mulher, marido, aioe) etc., € aa Pratica, do ponto de vista mental, nao 0 é e nao os tem, pois os relacionamentogs se dag com os maridos, mulheres, filhos, amigos que sao Produzidos no mundo mental. As pessoas reais servem apenas para dar suporte, sustentar as produgées mentais. Os desencontros sao a tonica, pois as pessoas reais nunca correspondem aquelas que deviam ter conforme o que se produz na mente. As vivéncias experimentadas expectativas mental é 0 se e de nossos cotidianos. Esses estados sio Muito mais sdo as de que o companheiro ou companheira, amigo etc. funcionam de maneira divergente daquela como “deveriam” por maldade. Nao ocorre, a quem estd funcionando desse modo, a possibilidade de que simplesmente as pessoas, que de fato existem, pouco ou nada correspondam ao que lhes é atribuido. Quando o desencontro é muito grande e nao ha tolerancia a depressio que seria vivida na Percepcao do engano feito, ataques ao aparelho perceptivo podem ser deslanchados para evitar a experiéncia de dor mental. Dor mental e depressao (no sentido atribuido por Melanie Klein [1946/1950] a esse termo, nao no psiquidtrico) precisam ser toleradas para haver contato com a realidade interna e externa. Quando nao Suportadas, métodos de defesa contra essas vivencias podem ser desencadeados na procura de alivio. O alivio conseguido, an como decorrer do tempo, Paes ee mais co ane se evitou, Uma Populacao que se sinta acuada po tein afirmou de mo, Sin mundo externo independent, naturais” (apud Mill « m do muito eloquente, em 1931, que: “A crenga & aes © do sujeito que o percebe é a base de todas ciéne er, 1996, p. 122), CL, *YPIO Caster Py ., i algum tipo de invasor ou inimi refugiar em uma cidadela, Contudo, Se es5¢ igo} muito tempo, as pessoas que assi: morrer de fome devido ao encontravam entre as muralhas ( Ms '80 (real i I ou Maginario) Pod, im “Mento perdur, oe se ar seot Protegeram odem come, Por 01 al Botamento dos Tecursog que . no comeco do cerco, se O paciente que funciona como o de meu exemplo i a i assi por acreditar nao dispor de Outro recurso Para lid. IM 0 faz 6 i " ar frustragdes impostas pela Tealidade ecom 0 ddio estimulad “om as en a 7 associada as frustragdes. Seu recurs Pela dor ‘©, como ja salientei, realidade odiada, ou, indo mais além, destruir 9 seu equ perceptivo e para pensar (cf. Bion, arcaicos de procurar algum conforto é Negar a ipamento 1992). Esses sao modos mais € protecao. O paciente que nos Procura espera encontrar, na relacéo que venha a ter com seu analista, outros recursos mais desenvolvidos e eficazes para enfrentar a realidade e poder usufruir daquilo quea vida realmente tem a oferecer. Seus recursos habituais, no entanto, 86 poderao ser deixados de lado como algo que é verificado obsoleto ou contraproducente a medida que venha a desenvolver e realmente dispor de algo mais favoravel e eficaz para sua vida. Uma psicanalise que procure forgar o abandono de modos de funcionar de um paciente, ou que procure a os equipamentos de que ele se vale por serem “anactonicoe “Dsicéticos” e “neurdticos”, sem levar em conta o desenvolvime! €a existé: e outros modos de funcionar le possa se valer, i odos di i de que ele p > i modos de fi ncia de outro: tho ido a desfazer-se dos seus conseguiu organizar (por lista ou a terceiros), a0 r nao pode levar o paciente ao desespero ou ao Paciente pode ficar moralmente constrang! recursos que, com grande esfor¢o € pena, mais precdrios que possam parecer ao ana desamparado po! mesmo tempo que se sente ee Pode acabar encontrar outras possibilidades para 1 SES MENT Aro» tornando-se uma imitacao grosseira de modelos que analista impée, ou fragmentar-se em um. Surto psicético a0 nao ser a condigaéo de funcionamento que lhe é Possivel, sem saber 4 recorrer. Um analista que funcione desse modo ndo estar4 fevengn algo muito diferente daquilo que a (OU O Presidente amer; lo George W. Bush ao querer, de modo violento, modernizar ° impondo ao povo daquele pais aquilo que chama de democr, modo mais antidemocratico possivel, tanto no Traque quai Estados Unidos). Nesse contexto, o analista coloca-se co, autoridade moral, uma criatura superior e “iluminada”, M le Ceito ng acia (dg nto Nos, MO uma Referéncias Bion, F. (ed.) (1992). Cogitations: Wilfred R. Bion, London: Karnac. Bion, W. R. (1958). On hallucination. Int, J. Psychoanal., 39, 341- 349. (Trabalho original Publicado em 1956.) Bion, W. R. (1966). Catastrophic change. Scientific Bulletin of the British Psychoanalytical Society, 5, 13-24, Bion, W. R. (1977). Seven servants, four works by Wilfred R. Bion: (1962) Learning from experience; (1963) Elements of Psychoanalysis; (1965) Transformations; (1970) Attention andl interpretation, New York: Jason Aronson. Bion, W. R, (1977). Two Papers: The grid and Caesura. Rio de Janeiro; Imago, smitar 2 19 7 | imitar © analisando, como em Certos grupos religiosos e igrejas, passa 4 ' “a, Observe" linguagem e os modos de seu analista, tornando-se membro de uma seita. O! se a estereotipia, 4010 castatg gy Bion, W. R. (1987). Turbuléncia a Psicandlise, 21(1), 1977.) Bion, W. R. (1988). Diferenciacio entre a . a personalidade nao Psicdtica. Ip Pi nalidade Psictica ¢ psicanaliticos revisados (Second thoughts) Ri ; Bion, Estudos (Trabalho original Publicado em 1967.) “NO de Janeiro; Imago, emoci Ct Sta Nal. Rey; 121-133, (Trabalho origina wes de I publicadg a Castelo Filho, C. (2004), Reflexées sobre atendimentos de Pacientes que Poderiam 5, borderlines ou limitrofes, Revista Br 605-620. @ experiéncia de er descritos como asileira de Psicandlise, 38(3), Freud, S. (1978). Formulations on the two principles of mental functioning. In S. 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