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O Partido Republicano Paulista e o Partido Constitucionalista nas eleições ao

governo Constitucional de São Paulo em 1934: a disputa pelo uso e a interpretação


da memória da Revolução de 1932
Carolina Soares Sousa1

Resumo
Em 1934, com as eleições para a Assembléia Estadual Constituinte de São Paulo, inicia-se
uma guerra político-ideológica entre o Partido Republicano Paulista e o grupo do interventor
Armando de Salles Oliveira, representado pelo Partido Constitucionalista, travada dentro dos
seus principais órgãos de imprensa, os jornais Correio Paulistano e O Estado de S. Paulo. A
memória da experiência revolucionária de 1932, associada com as redefinições das alianças
políticas por parte do PRP e do PC, torna-se o principal assunto da campanha eleitoral que
tem como palco os jornais da imprensa paulista. Pretende-se discutir aqui as diferentes
leituras e usos da memória da revolução de 1932 por parte destes partidos políticos,
marcados pelo quadro de reconstitucionalização do país.

Palavras-chave
Imprensa paulista, revolução de 1932, memória

Résumé

En 1934, avec les élections pour l´Assemblée Constitutive D'état de São Paulo, une guerre
politique-idéologique commence entre lê Parti Républicain Paulista et lê groupe d´intervenor
Armando de Salles Oliveira, ont représenté pour lê Parti Constitucionalista, fermé à
l´intérieur de leurs publications de nouvelles principales, les journaux Correio Paulistano et O
Estado de São Paulo. La mémoire de l´expérience révolutionnaire de 1932, associe aux
redéfinitions des alliances politique de la parte de PRP et de PC, elle devient lê sujet principal
de la campagne électorale qui a comme organisent les jornaux de la presse paulista. Il a
l´intention de discuter les lectures différentes et les utilisations de la mémoire de la
révolution de 1932 ici de la part de ces partis politiques, marqués par lê tableau de
reconstitucionalização du pays.

Mots-clé
Presse paulista, révolution de 1932, mémoire

Este trabalho apresenta uma leitura do debate travado entre o Partido


Constitucionalista e o Partido Republicano Paulista, por meio dos seus principais órgãos
de imprensa, os jornais O Estado de S. Paulo e Correio Paulistano, respectivamente.
Por meio destes periódicos acompanhei a disputada campanha eleitoral para as eleições
de 14 de outubro de 1934, momento de escolha dos representantes da Assembléia
Estadual Constituinte de São Paulo. Nesta campanha, um elemento instigante são os
usos da memória da revolução de 1932. 1932 foi ponto de encontro das elites políticas
paulistas e de desencontro com o chefe do Governo Provisório, Getúlio Vargas. O

1
Mestranda em História pelo Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade de
Brasília. Linha de Pesquisa: Sociedade, Instituições e Poder. Bolsista CAPES – Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
2
passado revolucionário, outrora de vanglória, será retomado com certo cuidado, entre
lembrar e esquecer, de acordo com o que fosse conveniente, revelando distintos projetos
políticos por parte das elites políticas paulistas. O uso do passado revolucionário como
estratégia de campanha política por parte do PC e do PRP nos leva a retomar o diálogo
entre tais elites e Vargas.
O periódico O Estado de S. Paulo sempre se apresentou como um órgão
apartidário, sob a presidência de Julio de Mesquita que, mesmo como membro do
Partido Republicano Paulista, se recusava a tornar o jornal órgão oficial de partidos
políticos, acreditando que era a imprensa o único meio de fiscalizar e conter governos
abusivos. Adeptos do liberalismo, os membros de O Estado de S. Paulo faziam
oposição ao governo vigente, viam na oposição bem organizada a possibilidade de
assegurar os ideais da democracia. (BORGES, 1979) Entretanto, em 1927, Armando de
Salles Oliveira assumiu a presidência do jornal, após a morte de Julio de Mesquita e – a
partir de sua ascensão à interventoria de São Paulo, fundação do Partido
Constitucionalista e chamada da Assembléia Estadual Constituinte, O Estado de São
Paulo torna perceptível em suas páginas sua posição política. O grupo do Partido
Constitucionalista assume uma guerra política e ideológica, que ocorrerá via imprensa,
desembocando nas urnas das eleições para a Assembléia Estadual Constituinte, em
outubro de 1934.
Armando de Salles Oliveira nasceu na capital paulista em 1887, formou-se na
Escola Politécnica e, entre os anos de 1923 e 1928, estudou na Sorbonne em Paris, onde
se especializou em eletrificação de estradas de ferro, tornando-se empresário no ramo de
construção e direção de empreendimentos em serviços públicos. Casou-se com Raquel
Mesquita, filha de Júlio Mesquita, presidente da Sociedade Anônima O Estado de S.
Paulo, tornando-se responsável pela edição do jornal. Apoiou a Revolução de 1930 e
participou ativamente do movimento de 1932. Em agosto de 1933, Armando de Salles
Oliveira é indicado à interventoria de São Paulo, o que causou constrangimento tanto
para o grupo paulista como para o governo Federal. Um de seus importantes feitos
enquanto interventor foi a fundação do Partido Constitucionalista, que ele almejava ser
um partido nacional (SILVA, 1980). O grupo dO Estado de S. Paulo saia da condição
de vencido para assumir o comando político do Estado. Com ascensão de Armando de
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Salles Oliveira à interventoria de São Paulo, o periódico, que antes estava na condição
de oposicionista, passaria a ser o órgão representante da situação. O passado
revolucionário passou a ser um objeto de disputa entre o Partido Constitucionalista e o
Partido Republicano Paulista. Armando de Salles Oliveira, ao fundar o novo partido,
assumiu um compromisso com o futuro.
A fundação do Partido Constitucionalista indica atenção de Armando de Salles
Oliveira à necessidade de redefinições político-partidárias, provocadas pelo quadro de
reconstitucionalização do país, que anunciava as futuras eleições para a Assembléia
Estadual Constituinte. Mas as antigas lideranças perrepistas não vão se acomodar diante
da ascensão do novo partido. O grupo perrepista lançará forte ofensiva política
buscando recuperar seu espaço perdido.
Segundo a legislação, 90 dias após a promulgação da Constituinte Federal, era
necessário convocar as eleições para Assembléia Constituinte Estadual. Seriam eleitos
deputados federais e estaduais, para representar a população na Assembléia Constituinte
Estadual. O interventor Armando de Salles Oliveira se consolida como principal
candidato ao governo de São Paulo, que seria indicado durante o debate constitucional
estadual. É a partir de Armando de Salles Oliveira que a política paulista ganha novos
rumos. (GOMES; LOBO; COELHO. 1980).
O clima de concordância entre os membros do Partido Republicano Paulista e os
membros do recém criado Partido Constitucionalista, começa a estremecer desde os
tempos do Partido Democrático, no momento em que o chefe do Governo Provisório
passa a cogitar possíveis nomes para ocupar o lugar do então interventor Waldomiro
Lima. O “histórico” líder do Partido Republicano Paulista, Ataliba Leonel2, recém
chegado do exílio, representante do que se costumava chamar de “velho e tradicional
Perrepê”, marca o início de uma cisão dentro do partido, que ainda era composto pela

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Ataliba Leonel era membro da Comissão Diretora do PRP e senador de São Paulo em 1930, até quando
a revolução de outubro venceu e os políticos da velha ordem foram destituídos de seus cargos. Em 1932
Ataliba Leonel foi um dos articuladores da revolta Constitucionalista, após a derrota, o membro do PRP é
exilado juntamente com outros revoltosos. Antes da instalação da Assembléia Constituinte, Getúlio
Vargas decreta anistia aos exilados de 1932, Ataliba Leonel volta ao Brasil e novamente irá compor o
quadro da Comissão Diretora do PRP, fortalecendo o tradicionalismo do velho partido. (GOMES; LOBO;
COELHO. 1980).
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ala moça, conhecida como Ação Nacional.3 O retorno de Ataliba Leonel significava o
ressurgimento do P.R.P. conservador.
Na ocasião da escolha do interventor paulista, predominava a opção por um
membro do Partido Democrático, que tinha apoio da Ação Nacional. Assim, o conflito
dentro do PRP eclode devido às posições tomadas frente à escolha do novo interventor,
pois, de acordo com Ataliba Leonel, a ala moça era “fazedora de fusões com os
democráticos”. Ataliba Leonel afirma que o PRP não indica e nem veta candidatos e
que não interessa ao velho partido, alterações no estado atual da interventoria, o que
significa um apoio ao governo de Waldomiro Lima. Tal declaração mostra que o
“tradicional” perrepê, novamente sob o comando de Ataliba Leonel, era completamente
contrário a indicação de Armando de Salles Oliveira à interventoria, deixando clara sua
total insatisfação quando o democrático assume o governo do Estado. (OESP,
01/09/1934).
Poucos meses após sua posse, Armando de Salles Oliveira funda o Partido
Constitucionalista, que nasceu composto pela Ação Nacional, a Federação dos
Voluntários e o Partido Democrático. O partido congregava elementos da antiga
situação (o PRP), e os “pioneiros” do voto secreto (PD). A esse núcleo imediatamente
se aliaram grandes forças da sociedade paulista que antes não se envolviam em
competições políticas. (OESP, 16/09/1934). Ao se fundir ao novo partido, a Ação
Nacional termina por efetivar a cisão dentro do PRP O “velho partido” perde o prestígio
que passa a ser conferido ao Partido Constitucionalista, pois atuava na ala moça,
políticos de expressão como Alcântara Machado e Abelardo Vergueiro César. A volta
de Ataliba Leonel à condução do PRP, a indicação de Armando de Salles Oliveira à
interventoria de São Paulo, a fundação do Partido Constitucionalista e as eleições para o
governo constitucional, recuperam e criam novas tensões entre os membros do velho e
tradicional partido e o grupo do novo interventor.
No momento em que Armando de Salles Oliveira inicia suas viagens pelo
interior do Estado de São Paulo, marcadas por discursos políticos, fica clara sua

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A Ação Nacional era uma ala do Partido Republicano Paulista, composta pelos membros mais jovens do
partido. De acordo com a Página de Propaganda do PC, a ala moça do PRP acabou por apoiar a indicação
de Armando de Salles Oliveira á interventoria de São Paulo, o que provocou uma cisão no interior do
PRP.
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intenção de permanecer no poder por meio do pleito de 14 de outubro. A insatisfação do
PRP crescia ao ver a atual interventoria nas mãos de um “democrático-peceísta”. A
recuperação do seu principal órgão de imprensa, o Correio Paulistano,4 empastelado
após a revolução de 1930, demarcava o início da reação contra o Partido
Constitucionalista.
O jornal Correio Paulistano, cujo primeiro exemplar surgiu em 1854, seguindo
uma linha liberal, de acordo com Vavy Pacheco Borges, também teve uma atuação
republicana e abolicionista. Mas, ao contrário de “OESP”, sempre se assumiu como
órgão partidário, orientando-se pelo P.R.P. Em 1873 o P.R.P. inicia suas atividades e,
desde então, o Correio Paulistano torna-se seu órgão “oficial e oficioso”. Por ocasião
da revolução de 1930, o jornal é atacado por populares e empastelado, tendo seu acervo
e seu maquinário confiscado pelo Governo Provisório. Somente em 27 de julho de 1934
que o Correio Paulistano volta a circular, mesmo que a censura à imprensa tenha sido
anulada antes da promulgação da Constituição. (BORGES, 1979). Com a proximidade
do pleito de 14 de outubro, o periódico assume o campo de oposição ao governo
vigente. Em sua pregação política, o Correio Paulistano defendia a autonomia de São
Paulo e o retorno à prática democrática, mas a tônica do seu discurso de oposição
voltava-se fundamentalmente contra o interventor Armando de Salles Oliveira,
candidato declarado ao governo constitucional pelo PC. As notícias de capa do Correio
Paulistano não guardavam semelhança com o que ocorria no “OESP”, pois interessava
aquele órgão de imprensa criticar, com veemência, o interventor Armando de Salles e
Getúlio Vargas. O jornal era imprenso em um formato menor e reservava regularmente
a página 5 para a propaganda política do PRP e ataques ao partido situacionista, o PC.
Atentei-me para a análise dos meses de setembro e outubro dos periódicos
indicados acima, momento em que a campanha para a eleição ao governo constitucional
4
De acordo com Nelson Werneck Sodré, o movimento de outubro de 1930 praticamente liquidara a
imprensa que apoiava a situação anterior. Alguns jornais haviam sido completamente destruídos, outros
não puderam voltar a circular normalmente por algum tempo. Em São Paulo, empastelados, os jornais
governistas demoraram a retornar. O Correio Paulistano, órgão oficial do Partido Republicano Paulista,
perdeu seus bens, que ficaram a cargo de um depositário. O novo governo do Estado desapropriou o
periódico perrepista, anexando suas oficinas à Imprensa Oficial. (SODRÉ, Nelson Werneck. História da
Imprensa no Brasil. 3. ed. – São Paulo: Martins Fontes, 1983). Somente em julho de 1934 o Correio
Paulistano volta a circular, momento propício, pois a campanha eleitoral às eleições de outubro de 1934
estava por ganhar maior intensidade. Concluímos que o órgão perrepista retorna exatamente para travar
ferrenha oposição a possibilidade da eleição de Armando de Salles Oliveira e dos demais membros do
Partido Constitucionalista.
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ganha maior intensidade. A guerra na imprensa5 entre Partido Republicano Paulista e
Partido Constitucionalista será permeada pelos acontecimentos passados: as revoluções
de 1930 e 1932. O Correio Paulistano acusará o Partido Constitucionalista de traidor do
movimento de 1932, que se fez contra o ditador Getúlio Vargas, enquanto os peceístas
acusam os perrepistas de causarem o movimento revolucionário de 1930, que, de acordo
com o periódico dos constitucionalistas, se fez necessário somente pela insistência do
velho partido em manter a vitória de Júlio Prestes. A tentativa de encontrar um culpado
para tais acontecimentos movia os longos artigos publicados num e noutro jornal. Nem
mesmo a revolução de 1932, motivo de vanglória de ambos os partidos, servia como
ponto de união, mas sim de discórdia no momento em que era usada para a campanha
política. Partido Republicano Paulista e Partido Constitucionalista já não se entendiam
pelo passado e, ambos queriam traçar o futuro de São Paulo a partir do pleito de 14 de
outubro.
Se o P.R.P. conseguisse maioria de representantes na Assembléia Estadual
Constituinte, conseguiria eleger o governador constitucional do Estado. Não seria
somente a volta do partido que governou por 40 anos, mas a revanche por 1930 e 1932.
Seria Getúlio Vargas fora de São Paulo. Se o Partido Constitucionalista conseguisse tal
façanha, o passado não voltaria, surgiria a possibilidade de esquecê-lo e, de agora em
diante, executar os novos planos para o Estado. Manter-se no governo era essencial para
dar continuidade ao projeto dos democráticos paulistas.
A aproximação de Armando de Salles Oliveira com o ex-ditador Getúlio Vargas,
por meio da interventoria do Estado, se tornou carro-chefe das acusações proferidas
pelo matutino oposicionista. No inicio do mês de agosto o Correio Paulistano publica
uma foto de Armando de Salles Oliveira e Getúlio Vargas, entre sorrisos e trocando um
aperto de mão, sob o seguinte título: “Um sorriso ditatorial e um sorriso civil e
paulista”. A necessidade de um interventor civil e paulista para São Paulo foi uma das
principais bandeiras erguidas pelo grupo do Partido Constitucionalista, que se gabava
por ter conseguido tal feito, bem como a reconstitucionalização do país. Entretanto, a
oposição considerava Armando de Salles Oliveira, além de paulista e civil, um

5
O uso da expressão “guerra na imprensa” decorre do grau de violência verbal utilizado tanto pelo
Correio Paulistano como pelo O Estado de S. Paulo, entre setembro e outubro de 1934, quando se
digladiavam na campanha política com o uso de um vocabulário beligerante.
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“getulista”. Para legitimar tal afirmação, “já que as palavras não eram suficientes”,
publicaram a fotografia do interventor e do chefe do Governo Provisório, “de mãos
cerradas, sorriso na boca, numa saudação cordial”. (Correio Paulistano - 02/08/1934). A
fotografia, quando não era novamente publicada nas paginas da oposição, era
comentada, na tentativa de chamar a atenção dos eleitores para as mãos de quem o
governo de São Paulo iria caso o PC tivesse maioria de votos nas eleições.
Os perrepistas alertavam o povo para o fato de que o Partido Constitucionalista
nada mais era que um partido político organizado pelo próprio Getúlio Vargas para
combater o PRP e não havia coerência em qualquer explicação que tentasse justificar
sua atitude de apoiar o “inimigo de ontem”. Com qualquer argumento queriam os
adversários peceístas explicar o seu “camaleonismo” político, que vinha merecendo
críticas, tão severas como procedentes, daqueles que “não se esqueciam facilmente das
misérias e humilhações infringidas a São Paulo pelo mesmo homem que recebia os
aplausos do partido do interventor.” O periódico oposicionista previa: era indubitável
que Armando de Salles Oliveira estava firmemente disposto a conservar-se no governo
do Estado e, posteriormente, “abocanhar” a presidência da República. Toda a atividade
do interventor voltava-se para a propaganda da sua própria candidatura, com pleno
assentimento dos seus companheiros de partido. (Correio Paulistano - 07/09/1934).
Armando de Salles Oliveira, para conseguir fortalecer seu governo e sua
presença política no cenário nacional, se mantinha sob efeito da afirmativa de que a
política era mesmo a arte de esquecer. Esquecer, neste caso, tinha o claro sentido do
organizar a memória retirando dela o ressentimento que poderia impedir o
restabelecimento de um projeto político para São Paulo. Nessa direção, Armando de
Salles justifica sua aliança com o homem que venceu e humilhou São Paulo. Entretanto,
para os perrepistas, a aliança com Getúlio Vargas era causadora principal da cisão entre
os paulistas que, antes, unidos na Frente Única, pareciam partilhar um destino comum
nas eleições para Assembléia Nacional Constituinte em 03 de maio de 1934. Mas,
pouco tempo depois, em fevereiro de 1934, Armando de Salles Oliveira funda o Partido
Constitucionalista, carregando consigo membros do PRP. Doravante, a divisão impera.
A criação do Partido Constitucionalista foi o divisor de águas: ao incorporar o
PD e avançar sobre as bases perrepistas, o novo partido sepultava a frágil união ocorrida
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com a Frente Única, em meio ao debate constitucional. Para os perrepistas a criação do
partido abriu uma ferida no campo político. Diante da força do novo partido restava ao
PRP se apegar ao passado como forma de sobrevivência política. Para tanto, seria
necessário revisar os acontecimentos selecionando o que deveria ser lembrado ou
esquecido. Cindido e buscando uma maneira de se fortalecer no cenário político
estadual, o PRP assume para si um projeto que tem por objetivo retornar, como fonte de
orientação, aos princípios federalistas de 1891. O apego ao passado, entretanto, deveria
ceder terreno para o presente, portanto a atualização das demandas políticas do partido
diante do novo quadro político era uma necessidade premente. Há, neste sentido, uma
clara valorização do passado por meio do PRP, na medida em que este evoca o regime
pré-1930 como modelo de política para governar o país. Mas, apesar de idealizador do
passado, o PRP sabia que não conseguiria ganhar as eleições somente por ele.
Necessitava de uma vestimenta política nova, ou mesmo uma maquiagem que
disfarçasse o velho rosto oligárquico. Diante da ascensão do Partido Constitucionalista e
da possibilidade de voltar ao poder no pleito de 14 de outubro, o PRP muda
essencialmente sua maneira de fazer política. Evocava o retorno do pré-1930, mas
atualizando-o por meio da adesão de práticas que condenara e combatera durante seus
quarenta anos de governo, como a incorporação do voto secreto e aliança política com
partidos de fora de São Paulo.
O PC atribuía, de maneira negativa, uma identidade “passadista” ao PRP. Na
verdade, tanto o PRP como o PC eram atormentados pelo passado, pois a conquista do
poder exigia a formação de alianças com os inimigos de ontem. Ambos os partidos eram
guiados pela vontade de executar seus projetos políticos e a eleição para a Assembléia
Constituinte Estadual seria decisiva para tal propósito, afinal, por meio de seu resultado,
o governador de São Paulo seria escolhido. Mas o PRP e o PC tinham projetos políticos
orientados de maneira distinta. Enquanto o Partido Constitucionalista mantinha um
compromisso com o futuro e o passado tornava-se em certa medida um problema, o
PRP se via aprisionado entre o pré-1930 e 1932.
Assim, em outubro dois grupos se enfrentariam nas urnas, o dos perrepistas e
dos anti-perrepistas. Os primeiros eram representados pela “mentalidade para a qual
todos os meios são bons: quando os fins convêm aos políticos.” Em política o
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perrepismo era a eleição em que os eleitores saiam do cemitério para votar, com atas
falsas, pressão policial e cabos eleitorais “sórdidos que envergonhariam gângsteres
americanos”. Próximo do pleito de 14 de outubro, o jornal situacionista deixa seu apelo:
“em outubro, paulista por nascimento ou pelo coração, – Você vai votar no Partido
Constitucionalista, porque você sempre foi bom, sempre foi justo e sempre foi
inteligente.” (OESP, 07/09/1934). Firmava-se assim uma separação entre passado e
presente, condenando o PRP a permanecer em algum lugar do passado. Parecia que o
PRP teria sucumbido ao peso do seu passadismo, mas as eleições presidenciais
marcadas para 1938 moveram a roda da história e as cartas da política paulista foram,
novamente, embaralhadas.

CORPUS DOCUMENTAL:
Jornal O Estado de S. Paulo, disponível em forma de microfilme para consulta no
Arquivo Estadual de São Paulo. São Paulo/SP. Foram consultados os meses de agosto a
outubro de 1934.
Jornal Correio Paulistano, disponível em forma de microfilme para consulta no
Arquivo Estadual de São Paulo. São Paulo/ SP. Foram consultados os meses de agosto a
outubro de 1934.
SÍTIOS DA INTERNET:
Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro. FGV/CPDOC.
Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/comum/htm/

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