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238 Avangos ¢ diversidade na interface ate € teenologia: criatividade, inteligéncia e consciéncia Interagao humano-méquina 245 247 250 253 256 259 262 266 269 Os algoritmos de inteligéncia artificial esti afetando nossa capacidade de decisio? Estamos viciados em tecnologia ou apenas em transigdo para istingue a inteligéncia humana da inteligéncia de James Joyce ao smartphone smplexo, nem a transparéncia € consensual © paradoxo da solidao na sociedade hiperconectada: os robés inteligentes as novas familias Ancropomorfsmo na intligéncia artificial: equivocos na apropriagio da linguagem humana ido as previsdes de James Lovelock pars rede social ¢ fururo metaverso: sofistica- 1¢50 do usustio Pensando 0 futuro 278 282 286 290 294 299 305 307 31 s6 pela fect. Equipes inter cconstruir pontes Supervalorieagio demonizagio da inteligéncia artificial [Nem tudo ¢ tecnologia e seus efeitos nte da academia para o mundo real: esse protagonismo temporanea: drones autnomos letais linares: nao basta “juntar campos”, & preciso Maior ameaca Posficio | Davi Geiger Agradecimentos Glossitio Bibliografia Aeimporineos tém grau de acerto na deteccio de faces maior do que o Prefacio Fiébio Gagliard: Cozman! ymos a ter também sistemas comput ‘com grande grau de de acerto obtido por seres humanos, Ou seja, séo sistemas com hum. ‘A década de 2010 foi uma época de crescimento vertiginoso para a artificial, Em 2010, economista Kenneth Rogoff, ex-econo- do Fundo Monetétio Internacional e professor de Eco1 |, esereveu uma coluna no iy; professor ular da Politécnica lvze-docente USP, detor do Centro de Intligéncia Artificial (CAL) da USP/IBM/FAPESP. ‘o Bet Artificial Intelligence is About to Drive the Worlds Economy Forward” (“A IA pode impulsionar esta década: como ex-jogador de xadrez, estou pronto para apostar que a inteligéncia artificial esta prestes a impulsionar a economia mundial”).* Esse titulo parecia muito otimista até para os pesquisadores da drea, pois o hist6rico da area de inteligéncia artificial favorecia certa moderagéo mesmo para os pesquisadores mais confiantes. Com efeito, apés grandes promessas feitas por pesquisadores nas décadas de 1950 e 1960, a érea de inteligéncia artificial softeu um enorme refluxo de financiamento ¢ interesse na década de 1970, sobre- tudo por ter recebido criticas acerca da disparidade entre promessas € resultados. £ famoso o conjunto de predigdes feitas por Herbert Simon e Alllen Newell, dois dos maiores pesquisadores da histéria da inteligéncia antfical, em 1957: por exemplo, predigbes otimistas sobre computadores ‘como campedes de xadrez.e compositores de miisica em um periodo de 10 anos.* Um conhecido relatério produzido em 1972 para o conselho de pesquisa britinico (British Science Research Council), usualmente conhecido como Lighthill Report, apresenta a reacao a essas promessas, criticando a pesquisa em i nncia artificial ¢ especulando sea 4rea seria viével no longo prazo. OpiniGes negativas sobre inteligéncia artificial se acumularam durante a década de 1970, O entusiasmo retornou durante a década de 1980, com a chegada dos chamados sistemas especialistas, ‘que procuravam reproduzir regras usadas por especialistas em dominios praticos. E 0 entusiasmo refluiu de novo na década de 1990. Durante aquela década, da qual participei principalmente como estudante de mestrado na Universidade de Sio Paulo e estudante de doutorado na Universidade Carnegie Mellon (Estados Unidos), muitas novidades apa- teceram, mas boa parte delas tinha limitado efeito pritico. Até mesmo HARTLEY, Seow. O fiuezy ¢ 0 techie: por que ascincias humanas vo dominer 0 ‘mundo digital. Sao Paulo: Bei, 2017, 20 get, cientista em IA radicado nos Estados Unidos 1D no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MI ne professor titular no Courant Institute of Mathematical Seiences, da ssidade de Nova York que se tornou meu mentor na tecnologia. ‘A cada encontro com o Davi cages si . Adquiti 0 suardar esses desenhos minha evolugéo no entendimento da um grande esforco, € matematica, num anteriores nao dao para mim, 0 desafio palatavel ao campo das teressados em geral. \daczo do proprio Davi, imeiro evento internacional de inteligencia artificial, a 1 Ethics of Artificial Intelligence,* organizada por David Chalmers e Ned Block, filésofos da Universidade de Nova York. Foram dois dias de debates intensos, com a participagio de 300 pesquisadores caninentes, palestrantes ou puiblico debatedor, num espectro amplo que Ju desde o flésofo inglés Nick Bostrom, livro Superintelligence, que abriu a conferéncia, até Yann LeCun, a época chefe de inreligéncia sutificial do Facebook, ¢ 0 Prémio Nobel Daniel Kahneman (com quem Aiyeahonra de tomar um café no Village, dois dias d otiginou o livro Ethics of Arificial Intelligence (20: ‘enisaios inéditos organizada pelo fil6sofo S. Marthew Liao, sobre o qual fix uma resenha para a revista TECCOGS, do Programa Tecnologias da Intcligéncia e Design Digical (TIDD), da PUC-SP” Sem diivida, foi uma excepcional boas-vindas ao campo da inteligéncia artificial. ‘Acesso em: 14 mar. 2022. © Disponivel em: 7 sta filbsofos, agrupados em quatro 70517 esos nits prods seg6es, abordam dilemas-chave para fs impactos da automagio inteligente no mercado de tabalh ; tados que perpecuam os preconceitos da sociedade; ica envolvida em apicagoes tomo earros auténomos, sistemas de vigilancia, armas auténomas; robés sexuais: iitetos e consciéncia da IA; ¢ status moral. Numa perspectivafurura, os ensaios da terceia seco rellcem sobre os riscos da “superinteligénca’. Ver LIAO, S. Matthew. a Os resultados positives dos modelos empiricos de IA ainda sio recentes, e 0 mercado editorial tem relativamente potcos titulos sobre isso, particularmente no Brasil, e menos ainda em linguagem acessivel ao Piiblico leigo. Este livro pretende preencher essa lacuna e transmitir os fundamentos ea logica da inteligéncia artificial por meio da associagao a ‘eméticas correntes. Trata-se de uma coletanea de artigos da minha colu- ‘na na revista Epoca Negocios, publicados entre junho de 2019 e abril de 2022, agrupados em 12 grandes temas: “Fundamentos ¢ logica da IA”, “lAe mercado de trabalho”, “Justica ética na IA”, “A TA e o problema do viés", “A Economia de Dados e 0 poder das big techs”, “Iniciativas regulatorias”, “IA e satide”, “IA no combate & covid-19", “AIA eo cli- ma’, “IA cultura’, “Interagio humano-maquina’ e“Pensando o futuro”. (Cada parte ¢ precedida de uma pequena apresentagio, As tecnologias nao sio todas iguais, algumas adicionam valor incre- mental 4 sociedade ¢ outras séo disruptivas. Ao reconfigurar a légica de funcionamento da economia ¢ aportar inéditos modelos de negécios, as disruptivas provocam periodos de reorganizacio no que Joseph Schum- peter denominou de “destruigao criativa”. As tecnologias de propésito geral (general purpose technologies, GPT) esto nesse tiltimo bloco. S40 tecnologias-chave, moldam toda uma era reorientam as inovagdes nos setores de aplicasdo, como a maquina a vapor, a eletricidade e 0 com- putador. A inteligéncia artificial & a tecnologia de propésito geral do século XI ¢ tende a impactar cada vex mais a vida em sociedade. Com a TA migramos de um mundo dominado por méquinas programadas Para um mundo de méquinas probabilisticas, implicando ligicas e ris- os distintos. O mundo da inteligéncia artificial é bem mais complexo, temos de aprender a habitar esse mundo para continuar sendo relevantes, profissional e socialmente. Ethics ofArtficial Intelligence. Oxford: Oxford University Press,2020; KAUFMAN, Ethies of Artificial Ineelligence, de Matthew Liao, Revita Cognivieas ~ TECCOGS, 0. 157-163, janfjun. 2020, NQUGW},. Acesso em: 14 mar, 2022. Fundamentos e ldgica da IA R 105 de IA esto em toda parte, Numa sociedade hiperconectada, 10s cm ambientes técno-sociais sentes em que a sociabili- dade ¢ a comunicagio geram dados di ji dominao mercado de agées, compée miisica, produz arte, 105, escreve artigos de noticias, prognostica tratamentos médicos, decide sobre crédito ¢ contra- tagio, recomenda entretenimento, e tudo isso ainda em seus primérdios. Na tiltima década, a IA tornou-se a tecnologia de propésito geral do século XL A tendéncia é que aldgica da TA torne-se hegeménica na gera- ‘¢i0 de riqueza, criando um valor econémico sem precedentes. Estamos igrando, aceleradamente, para a Economia de Dados, ou Capitalismo “Dadocéntrico”, termos que expressam um_ ima estratégica sio os dados. , © as narrativas subsequentes, con- fundem a fronteira entre ficgio e realidade. A 1A hoje & “mera” fungio matemitica que, ao ser capaz de lidar com o big data, gradativamente, vem assumindo o protagonismo nas relagoes socioecondmicas. A subje- tividade humana, contudo, é decisiva em todas as etapas do desenvolvi- ‘mento e da interpretagio dos resultados. Sao os especialistas humanos que cconstroem os modelos, definem os parmetros, criam as bases de dados, selecionam o dominio da aplicagio; os preconceitos ¢ valores humanos estdo presentes em cada decisio de cada etapa do processo. ‘Como toda tecnologia, a IA é social e humana, seus efeitos depen- dem do que os seres humanos fazem com ela, como a percebem, como a experimentam e usam, como a inserem nos ambientes téenico-sociais. Cabe & sociedade humana deliberar, dentre intimeras quest6es, sobre se a IA deve ser aplicada em todos os dominios ¢ para executar todas as tarefas, ese 0 uso da IA em aplicagées de alto risco se justifica. O desafio é buscar o equilibrio entre mitigar (ou eliminar) 0s rscos e preservar 0 ambiente de inovacao, sem supervalorizar nem demonizar a IA. Este bloco contempla sete artigos que introduzem os fundamentos basicos da IA, desde as distingées entre redes neurais ¢ cérebro humano até elementos criticos como as limitagées intrinsecas a técnica e a rele- vncia da qualidade da base de dados O que éa inteligéncia artificial hoje? 28.6.2019 No filme Matrix (ly Lana Waco 1999) oak NES Oi ue mera simulagio de computador, « que as maquinas inte: i a ee oes No filme britinico er tbntiat {Alex Garland, 2015), um funcionério do buscador Bluebook se de a ‘bbs com inteligéncia artificial e rem com cles didlogos asusta Fim palestra em Séo Paulo, 0 fildsofo fms Edgar ye ma ade seus 97 anos, enfatizou que o papel das artes ¢ 5 ce _ 'No caso da inteligéncia artifical, coneudo, a sae vonfunde mais do que eucida: nao hd nenhum indicio clentiico dew bds subjugando os humanos. : Fa ee owa vida conan. Acewamo semaine genes para programaroiinerério com 0 Ware, psauiss no Kose eacber da Netflix ¢ do Spotty recomendagées de filmes ¢ mish, nossas preferéneias no fiuxode dados que colet Part ses com a plataforma. A Siri da Apple, ¢« Ales da tes pessoas digitais inteligentes que nos judam a com acesso por meio de voz. cligencia artificial mediam as interages nas redes sociais, como a selegio do que serd publicado no. feed de noicias tlo Facebook. Eles esto igualmente presentes nos diagn6sticos médico: incia, na prevengio a : ‘de RE, na gestio de investimenco, na indstria vento automatizado (chatbot); bem como nas estratépias de marketing, nas pesquisas, na tradugéo de idiomas, no eae stutomatizado, nos carros aurbniomos, no comércio fisic « views TOS “le obras, nas perfuragoes de petrleo, na previsio de epidemias: Tams naera da personalizago, viabilzada pela extacio das infos bes contidas nos dads que geramos er nossas movimentasis am ine. 25 ‘A maioria dos avangos observados na iltima década provém do, modelo chamado de deep learning (aprendizado profu i shine learning (aprendizado de méquina), subé ficial, que consiste em técnicas estatisticas que pet “aprendam’ com os dados (e nio sejam program: Na década de 1980, um grupo resttito de pesquisadores — Geoffrey Hincon, Yoshua Bengio e Yann LeCun -, inspirado no funcionamento do cérebro biolégico, propés o caminho das redes neurais para o aprendizado cde méquina, obtendo reconhecimento definitivo em 2012, a0 vencer a competicéo ImageNet. Nos anos seguintes, elas se tornaram onipresen- tes, recebendo expressivos investimentos das gigantes de tecnologia que incorporaram a inteligéncia artificial em seus modelos de negécio. Cerca de 100 servigos do Google, por exemplo, usam LA. Deep learning é um modelo estatistico de previsio de cendtios fururos a probabilidade de eles se realizarem e quando; a denominacéo provém dda profundidade das camadas que formam a arquitecura das redes neurais. Correlacionando grandes quantidades de dados, os algoritmos de IA sio capazes de estimar com mais ascertvidade a probabilidade de um tumor serde um determinado tipo de cincer, ou probabilidade de uma imagem ser de um cachorro, ou.a previsio de quando um equipamento necessitaré de , ou 0 candidato apropriado para determinada funcao, ou o tipo de servigo ou produto adequado aos desejos do consumidor. [No estigio atual da IA, nao se trata de ensinar as maquinas a pensar, 1 probabilidade de os eventos ocorrerem, por meio grandes quantidades de dados. Esses sistemas der o significado. Apesar de todos os esforgos, houve pouco progresso em prover a IA de senso intuitivo, de capacidade de formar conceitos abstratos ¢ de fazer analogias e generalizacoes. ‘Conccitos bisicos sobre 0 mundo — tridimensionalidade, movi- mentagao ¢ permanéncia dos objetos, gravidade, inércia e ri aprendidos pelos seres humanos essencialment cobrir como incorporar esse aprendizado as maqi pprogresso da inteligéncia artificial, ou seja, as méquinas serem capazes de aprender como 0 mundo funciona assistindo a um video do YouTube. A tecnologia avanca aceleradamente, mas ainda distante da condicao humana 31.10.2019 portant cidade portuéria no norte da Alemanha, Jhamada pelos vizinhos porque a Alexa, assistente 1 dando uma festa com o som altissimo”. O 1 Haberstroh, que na ocasiao estava beben- voltar para casa encontrow uma nova fechadura; Ihe entregaram as novas chaves e uma facura. A so, alegou que a Alexa foi ativada Tamente, ¢ 0 volume aumentou através do aplicativo de streaming Tosca mével de cerceicos, mas mesmo assim ofereceu pagar 0 custo Ancldente. As duas hi ae remota ~ nao configuram auronomi Jum dos atributos que caracterizam os seres humanos. © Atlas é um humanoide | édotada de expressividade, estétia, inte jem dezenas de computadores acoplados que permitem completa de expresses faciais,rastrear 0 rosto do interlocu car as expressbes fi ras pessoas. OA\ ia simula o sistema cogs ara aprender como aprender. Es rnbgice sendo concebidas para, com base render” por meio de processos no ‘senvolvedores dessas méquinas nio ar sabem exatamente como elas aprendem para desempenhar as tarefas (a chamada “caixa-preta’, que nao deve ser confundida com autonomia), © cientista da computagio Davi Geiger alerta que aqui reside, talver, a éncia artificial, o fato de nao sabermos 0 que transmite a informagio cisio: a sinapse refere-se & interrupgao que ocorre entre as duas camadas de neurénios). Cada neurdnio tem uma espécie de antena, chamada de dendrito, que é 0 canal da informagio. Os modelos de redes nneurais reproduzem essa lgica (no séo concebidos para executar tarcfas a partir de equagoes predefinidas, a programagio tradicional), eo nome deep learning (aprendizado profundo) vem clo fato de que possuem varias camadas de processamento compostas de neurénios a ‘camada aperfeicoa uima parte da informaca0). Segundo o neu Roberto Lent, “mesmo as alternativas oferecidas pela in ficial, que podem propiciar reto aprendizes, no atingiram ainda riquera de possbilidades centre humanos”.' (© ponto a ressaltar € que mesmo os sistemas mais sofisticados, ‘como o da Sophia, nao chegam nem a tangenciar a complexidade do fancionamento do eérebro biolégico. © aprendizado humano depende de um grande niimero de neurbnios que, por sua ver, formam circuitos complexos responsiveis pela nossa estrutura cognitiva ¢ comportamen- tal, Roberto Lent, em seu livro O cérebro aprendis, apresenta-nos alguns nniimeros ilustrativos dessa complexidade: cada ser humano tem 86 bilhdes de neurénios, e cada neurénio recebe cerca de 100 mil sinapses (ordem de grandeza total na casa do quatrilhéo); a partir da décima T LENT, Robero, O eérebreaprendi: neuroplcidade eedueno. Sto Palos Athe- neu, 2018. semana de gestagdo, a produce de novos neurbnios na crebrohurang vin desenvolvimento atinge aproximadament & velocidade de 2 veya eflulas por minuto; as recnologias aruais nao permits ° edgeoro humano em nivel ico, levando os cientstas a ecorrerem Jv animais: o tempo de computacao ¢ anilise utilizado por pesquisadores: thineses para estudar as conex6es de 135 mil neurOnio® de uma mosea {oi de 10 anos, estimando-se em 17 ibis de anos 0 tempo necessitio ig procedimento no cérebro humane.’ fe eae aifiial hoje éfundamentalmente modelos statisticos que baseados em dados, cleulam a probabilidade de eventos ocorte seen: Fase pequeno avango tem sido responsivel Por transformagdes na teonomia, nas relagbes pessoas, na sociedade em ageral, mas estamos a Jguas de disténcia da chamada genera AI (ou strong ALOU. fallads Oe supostamente, seria uma inteligencia artificial dotada de capacidades ‘nivel humano. pare TLENT, O eirebro aprendis. Sao as maquinas inteligentes? 7.2,2020 Maquinas “pensantes” e auténomas de seus criadores povoam a literatura e a ciéncia hd muito tempo. Em 1818, a escritora inglesa Mary Shelley publicou Frankenstein ou 0 Prometeu moderna, considerado a pri- ieira obra de fiegio cientifica. O romance relata a histéria do estudante de ciéncias naturais Victor Frankenstein, que, noempenho em descobrir (5 mistérios da criacdo, dedica-se a conceber um ser humano gigantesco, O monstro foge do laboratério e refugia-se numa floresta, onde aprende a sobreviver. Frankenstein tem inteligéncia propria, autonomia ¢ até mesmo. sentimentos, semelhantemente aos robés dos filmes de ficséo cientifica. Para citar outro romance, em 1872, o escritor britanico Samuel Butler publicou Erewhon, considerado a primeira especulagio sobre a possi de de méquinas conscientes.' Na ficticia cidade de Erewhon no existem ‘méquinas,fruto da percep¢ao amplamente compartilhada pelos erewonia- nos de que elas sio potencialmente perigosas. Num conflito antigo entre (05 cidadaos pré-miquinas e os antimsquinas, os tltimos foram vitoriosos: “Veja, essas mAquinas estio ficando cada vez mais sofsticadas e capazes e nos langario de surpresa no cativeiro, Nés nos tornaremos subservientes is maquinas ¢, eventualmente, seremos descartados”, O debate permeia igualmente a ci bordado por virios cien- tistas ¢ historiadores nos iltimos dois séculos. O matematico inglés Alan Turing, no texto de 1951 “Can Digital Computers Think?” (“Os computadores digitais podem pensar?"), pondera sobre os argumentos racionais a favor e contra a ideia de que as maquinas possam ser leva- das a pensar, e sobre a analogia entre méquina e cérebro.? Segundo ele, © BUTLER, Samuel. Brewhon [1872]. London: Penguin, 1970. * TURING, Alan. Can Digital Computers Think? In: COPELAND, B. Jack (Ed), ‘The Essential Taring. New York: Oxford University Pres, 2004, 30 que ambos scjam anélogos envolveria assumir também que as as sejam dotadas de livre-arbitrio, o que nao faz sentido no caso tal programado (ele mesmo, contudo, questiona jipdtese de que o sentimento deve ser confundida com a aleatoriedade, potencialmente responsével pela ‘capacidade das mquinas de nos surpreender ao entregarem resultados Deus: uma breve historia do. ee linhado com a visio de: aye “cons- éncia” é um atributo humano, advoga que o advento das mé gerando dois tipos de géncia nao conscience. to progresso da IA: as méquit consciéncia, nunca ical intensificou o debate sobre quais, sho 0s limites das méquinas, tanto na fiego quanto na ciéncia. Deixando de lado o fururo da TA, mantendo © foco nos modelos estatisticos de de (modelos de machine learning « deep learning), que sio is de IA, Stuart Russell, um dos mais sm seu livro Human Compatible: Artificial b 2021, Inteligéncia Artificial a Nosso Favor: como manter 0 controle sobre * propée pensar sobre o que significa “perder 0 controle” sobre as maquinas. Para Russell, a crenga de que estarfamos na eventualidade de perder o controle sobre as “méquinas inteligentes” baseia-se em um erro inicial fia definicao de IA. Para comegar, as miquinas nio sio yentido dado pelos seres humanos — ser capaz de agir para atingir objetivos priprios -, pelo contririo, elas ndo tém objerivos, so os seres humanos FTARARL, Yval Noah. Homo Dens: wma breve historia do amanba (2015). Trad. 5, 2016. Intelligence and the Problem of Gonrol, New York: Viking; Penguin, 2019. 3 Redes neurais artificiais © a complexidade do cérebro humano tes encontrem solugées melhores do que os seres humanos, o que Ts realidade com as tecnologias de IA. : Russell pi inas i favor de “mquinas benéficas”, na medida em que se espera que si es atinjam os objetivos dos seres humanos, melhorando a vida sociedade. “O que temos hoje é uma relagio bindria, uma propriedade do sistema composto pela maquina ¢ pelos sercs humanos, com resul- ‘Alan Turing, Em seu artigo seminal de 1950 “Computing tados superiores aos obtidos lualmente. As méquinas funcionam ‘Maquinaria computacional ¢ inteligén- como uma espécie de metade de um sistema combinado com os seres fc propde um teste para a pergunta se uma mquina pode humanos”, argumenta. ideia de produzir um programa que, em vez de ‘A autodenominagio “Homo sapiens” (homem sébio) ule a mente de uma crianca. Evoluindo ccrenga dos seres humanos de que sua superioridade es serem 0s tinicos seres vivos dotados de inteligéncia. Nao apenas satisfeitos. ‘com essa aparente buscamos entender como funciona 0 cérebro humano, 0 que é consciéncia, quais os mecanismos produtores: ‘A leia de usara légica de aprendizagem em uma méquina remete, igo do tempo, ele a ch: O campo da inceligencia “yori, em 1956, com a premissa de qt sm ou qualquer outra caracreristica da rnas de ao menos parte desses atributos. Se algum dia as mSquinas sero

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