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Afrânio Mendes Catani


Maria Alice Nogueira
. Ana Paula Hey e
Cristina Carta Cardoso de Medeiros
(Orgs.)

Vocabulário

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B R IE
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autêntica
Copyright© 2017 Os Organizadores
Copyright© 2017 Autêntica Editora

Todosos direitos reservadospela Autêntica Editora. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida,seja por
meios mecânicos,eletrônicos,seja via cópia xerográfica,sem a autorizaçãoprévia da Editora. SUMÁRIO
Todosos esforçosforam feitos no sentido de encontrar os detentoresdos direitos autorais das obras que constam deste
livro. Pedimosdesculpaspor eventuaisomissõesinvoluntáriase nos comprometemosa inseriros devidoscréditose corrigir
possíveisfalhas em ediçõessubsequentes.

EDITORA
RESPONSÁVEL DIAGRAMAÇÃO
RejaneDias LarissaCarvalhoMazzoni
EDITORA
ASSISTENTE WaldêniaAlvarenga
CecíliaMartins CONFECÇÃODOSINDICES
REVISÃO Os organizadores
LúciaAssumpção CarlaNeves
RenataSilveira
CAPA
Alberto Bittencourt
(sobreimagem de fotógrafo desconhecido)

Verbetes 7
A~t~~~~····························································
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro) Ab.~Í~d·;·~··~·~·i~~·ct·~··t~~~~~·~~t~·~···········
··························································································· ····························
VocabulárioBourdieu/ Afrânio MendesCatani... [et ai.]. (Orgs.).-- 1. ed. --
BeloHorizonte: AutênticaEditora,2017. Glossário deobrase textosde PierreBourd.i.~~
. ........................................................................... . ............................... }.~
Outros organizadores:Maria Alice Nogueira,Ana Paula Hey, Cristina
Carta Cardosode Medeiros. VocabulárioBourdieu 23
·······················································································································
ISBN978-85-513-0229-3
Índiceonomástico 370
1. Bourdieu, Pierre, 1930-2002 - Glossários, vocabulários, etc. ·························································································· ·····························
2. Bourdieu,Pierre,1930-2002- Linguagem3. Sociologia1.Catani,Afrânio índiceremissivo 376
Mendes.li. Nogueira,Maria Alice. Ili. Hey,Ana Paula.IV. Medeiros,Cristina
Carta Cardosode.
ó'b~~i·ci~·ri~·~~~·á;~~di~~·
··························································································
17-05006 CDD-301 ObrasdePierreBourdieupublicadas
noBrasil .................... }~9.
··························································································
Índice para catálogo sistemático:
1. Vocabuláriode Bourdieu : Sociologia301 Outrasreferências
de PierreBourdieuutilizadas ·····························392
··························································································
Cronologiade PierreBourdieu }~?.
..................................

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GRUPO AUTÊNTICA
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~~: :?.~~:~~li~~:?.~i~:::
Tradutores
:::
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::::....................
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., 398
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RuaCarlosTurner,420 RuaDebret, 23, sala401 Av. Paulista,2.073,
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São Paulo. SP
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www.grupoautentica.com.br
VERBETES
··································································································································

A Campo intelectual 83
Campo jurídico 86
Ação 23
Actes de la Rechercheen SciencesSociales Campo literário 88
25
Campo político 90
Agente 26
Campo religioso 93
Algérie 60: structures économiqueset
Campo universitário 95
structures temporelles 28
Canguilhem, Georges 98
Amorfati 28
Capital 101
Amor pela arte (O): os museus de arte na
Capital cultural 103
Europa e seu público (Làmour de làrt: les
Capital econômico 107
musées d'art européenset leur public) 28
Capital simbólico 109
Análise de correspondências múltiplas 31
Capital social 113
Antropologia reflexiva 33
Categorias de pensamento 117
Arbitrário cultural 36
Causalidade do provável 118
Argélia 38
Ciência 118
Art moyen (Un): essaisur les usages
Classe social 118
sociaux de la photographie 42
Classificação (lutas de) 123
Ascetismo 42
Coisas ditas (Chosesdites) 123
Ativismo 42
College de France 124
Autonomia e homologia dos campos 45
Conatus 125
Condição de classe 126
B Conhecimento praxiológico 126
Bachelard, Gaston 49 Construtivismo 128
Bal des célibataires(Le):crise de la société Contrafogos: táticàs para enfrentar a invasão
paysanne en Béarn 51 neoliberal (Contre-feux:propospour servir à
Béarn 52 la résistancecontrel'invasionnéo-libérale) 130
Bens simbólicos (economia dos) 55 Contrafogos 2: por um movimento
Boa vontade cultural 58 social europeu (Contre-feux 2: pour un
Bourdieu editor 61 mouvement social européen) 131
Burguesia 63 Corpo 132
Crença 134
e Cultura 135
137
Cultura popular
Cabília 64 .,
Campo 64
Campo artístico 66 D
Campo científico 68 Denegação 140
Campo cultural 71 Déracinement (Le): la crise de làgriculture
Campo da alta costura 73 traditionnelleen Algérie 141
Campo do poder 75 Desencantamento do mundo (O): estruturas
Campo econ_ômico 77 econômicas e estruturas temporais 141
Campo esportivo 79 Destino 142
Campo filosófico 81 Determinismo 143

1.
.:, ..
,..,:•-"
.
t-

Diploma 145 H Miséria do mundo (A) (La miseredu monde) 271 Reprodução (A): elementos para
Disposição 146 Mobilidade social 271 . uma teoria do sistema de ensino (La
Habitus 213
Distinção 146 Mundialização/Internacionalização 272 reproduction:élémentspour une théorie du
Heidegger, Martin 217
Distinção (A): crítica social do julgamento Mundo social 274 systeme d'enseignement) 316
Herança cultural 217
(La distinction:critiquesocialedu jugement) 148 Rito (de instituição) 318
Herdeiros (Os): os estudantes e a cultura N
Dom (ideologia do) 151
(Leshéritiers:les étudiants et la culture) 219
Dominação
Dominação masculina (A) (La domination
151
Hexis corporal 222 Neoliberalismo
Noblessed'État (La): GrandesÉcoleset
275 s
História 222 Sartre, Jean-Paul 321
masculine) 155 esprit de corps 277
Homo academicus 225 Sciencede la scienceet réflexivité.Cours du
Doxa 157 Nobreza 281
Honra (Sentido da) 228 Collegede France(2000-2001) 323
Durkheim, Émile 159 Nomos 281
Hysteresis 228 Senso prático (O) (Le senspratique) 324
E I
o Sistema de ensino 327
Sobre a televisão (Surla télévision,suivi de
École Normale Supérieure 162 Ontologia política de Martin Heidegger (A)
Ideologia 230 L'emprisedujournalisme) 329
Economia das trocas linguísticas (A): o (L'Ontologiepolitique de Martin Heidegger) 282
Illusio 231 Sobre o Estado. Cursos no College de France
que falar quer dizer (Ce que parler veut Opinião pública/sondagem 283
Ilusão biográfica 233 (SurEÉtat.Coursau Collegede France) 330
dire:l'êconomiedes échangeslinguistiques) 162 Sociedade 332
Inconsciente 233 p
Economia das trocas simbólicas (A) 164 332
Incorporação 234 Socioanálise
Educação 165 Passeron, Jean-Claude 286
Inculcação 234 Sociodiceia 335
Elias, Norbert 165 Patronato 288
Indivíduo - sociedade 234 Sociologia 335
Elites 167 Pedagogia racional 288
Intelectuais 236 Sociologia da sociologia 341
Emprego 169 288
Interesse 239 Pensamento relacional Sociologia e reflexividade 342
Epistemologia 169
Interventions, 1961-2001:sciencessociales Pequena burguesia 290 Sociologiede rAlgérie 345
Esboço de auto-análise (Esquissepour une Sociologieest un sport de combat (La) 345
et actionpolitique 239 PicturingAlgeria 290
auto-analyse) 173 Structuressocialesde l'êconomie(Les) 346
Investimento 240 Pierre Bourdieu. Sociologia 292
Escola 176 348
Poder simbólico 292 Sujeito
Escritos de Educação 176
Espaço social
J Poder simbólico (O) 295
177
Esprit de corps Jogo (Sentido do) 241 Política 296 T
179
Jornalismo 243 Posição de classe 296 Taxionomia 349
Esquissed'une théoriede lapratique,précédé
Juventude 243 Prática (Teoria da) 296 Televisão 349
de Traisétudesd'ethnologiekabyle 181
Profissão de sociólogo (A): preliminares Tempo 350
Esquissesalgériennes 184
Estado 184 L epistemológicas (Le métier de sociologue: Teoria 352
Estilo de escrita de Bourdieu Legitimidade/legitimação 245 préalablesépistémologiques) 298 Trabalho 352
186
Estilos de vida 187 Lévi-Strauss, Claude 246 Projeto 301 Trajetória 354
Estratégia/Estratégias de reprodução 189 Lições da aula (Leçonsur la leçon) 249 Propossur le champpolitique 301 Trocas simbólicas 356
Estrutura (social e mental) 191 Linguagem 250
Q
Estruturalismo 192 Linguístico (Capital; Mercado) 250
Questões de sociologia (Questions de
u
Ethos 194 Livre-troca: diálogos entre ciência e arte Usos sociais da ciência: por uma sociologia
(Libre-échange) sociologie) 302
255 clínica do campo científico (Os) (Les
F R usagessociaux de la science:pour une
Familia 195 M sociologiecliniquedu champ scientifique) 357
Razões práticas: sobre a teoria da ação
Fenomenologia 197 Manet. Une révolutionsymbolique 257 (Raisonspratiques:sur la théoriede l'action) 303 .,
Filosofia 199 Marx, Karl 259 Reconversão de capitais 304 V
Fotografia 201 Mauss, Marcel 262 Veredicto escolar 359
Reflexividade 305
Foucault, Michel 201 Meditações pascalianas (Méditations Violência simbólica 359
Regra 308
pascaliennes) 265 Regras da Arte (As): gênese e estrutura do Visão e divisão, Princípios de 361
G Mercado linguístico 267 campo literário (Les reglesde lart: geneseet
Goffrnan, Erving 205 Mercado simbólico 267 structure du champ littéraire) 309 w
Gosto 208 Merleau-Ponty, Maurice 267 Réponses:pour une anthropologie 365
Weber,Max
GrandesÉcoles 210 Metodologia 268 réjlexive 311 367
Wittgenstein, Ludwig
Grupos dominantes 212 Mídia 268 Reprodução 313

8 9
i

AUTORES

Afrânio Mendes Catani


UNIVERSIDADE
DESÃOPAULO- BRASIL
Ana Maria de OliveiraGalvão
UNIVERSIDADE
FEDERALDEMINASGERAIS- BRASIL
Ana Maria Fonsecade Almeida
UNIVERSIDADE
ESTADUALDE CAMPINAS- BRASIL
Ana Paula Hey -
UNIVERSIDADE
DESÃOPAULO- BRASIL
Ana Paula Simioni
UNIVERSIDADE
DE SÃOPAULO- BRASIL
Ana TeresaMartínez
UNIVERSIDADNACIONALDE SANTIAGODELESTERO- ARGENTINA
Andréa Aguiar
UNIVERSIDADE
FEDERALDEMINASGERAIS- BRASIL
AngelaXavierde Brito
UNIVERSITÊRENÊDESCARTES
- PARISV - FRANÇA
Anne-Catherine Wagner
UNIVERSITÊPARIS1 - PANTHÊON- SORBONNE- FRANÇA
Antônio Augusto GomesBatista
CENTRODEESTUDOSE PESQUISA
EMEDUCAÇÃO,
CULTURAE AÇÃOCOMUNITÁRIA-BRASIL
Bernard Lahire
ÊCOLENORMALESUPÊRIEUREDELYON- FRANÇA
BrasilioSallum Junior
UNIVERSIDADE
DESÃOPAULO- BRASIL
Carlos BeneditoMartins
UNIVERSIDADE
DE BRASÍLIA- BRASIL

11
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(

Christophe Chade José Carlos GarciaDurand


UNIVERSITÊPARIS1 - PANTHÊON- SORBONNE- FRANÇA UNIVERSIDADEDE SÃOPAULO- BRASIL
ClariceEhlers Peixoto JoséLuís Moreno Pestana
UNIVERSIDADEDOESTADODO RIODE JANEIRO- BRASIL UNIVERSIDADDE CÁDIZ-:-ESPANHA
CláudioMarques Martins Nogueira JoséSérgioLeiteLopes
UNIVERSIDADEFEDERALDEMINASGERAIS- BRASIL UNIVERSIDADEFEDERALDO RIODEJANEIRO- BRASIL
Cristina Carta Cardosode Medeiros Julien Duval
UNIVERSIDADEFEDERALDO PARANÁ- BRASIL ÊCOLEDESHAUTESÊTUDESEN SCIENCESSOCIALES- FRANÇA
Denis Baranger Juliana Ferreira de Melo
UNIVERSIDADNACIONALDE MISIONES- ARGENTINA UNIVERSIDADEFEDERALDE MINASGERAIS- BRASIL
Edison Ricardo Bertoncelo Kátia Maria Penido Bueno
UNIVERSIDADE
DE SÃOPAULO- BRASIL UNIVERSIDADEFEDERALDE MINASGERAIS- BRASIL
Elisa Klüger LetíciaBicalhoCanêdo
UNIVERSIDADEDE SÃOPAULO- BRASIL UNIVERSIDADEESTADUALDE CAMPINAS- BRASIL
Enio Passiani Loi'cWacquant
UNIVERSIDADEFEDERALDO RIO GRANDEDO SUL- BRASIL UNIVERSITYOF CALIFORNIA-:-
ESTADOSUNIDOS
Enrique Martín Criado Louis Pinto
UNIVERSIDADPABLODE OLAVIDE- ESPANHA ÊCOLEDESHAUTES-ÊTUDES
EN SCIENCESSOCIALES- FRANÇA
Ernesto Seidl Magda BeckerSoares
UNIVERSIDADEFEDERALDE SANTACATARINA- BRASIL UNIVERSIDADEFEDERALDE MINASGERAIS- BRASIL
Fernando Antonio Pinheiro Filho Marcos César Alvarez
UNIVERSIDADEDE SÃOPAULO- BRASIL UNIVERSIDADEDE SÃOPAULO- BRASIL
François de Singly Maria AliceNogueira
UNIVERSITÊRENÊDESCARTES- PARISV - FRANÇA UNIVERSIDADEFEDERALDE MINASGERAIS- BRASIL
FrançoisDenord Maria Amália de Almeida Cunha
ÊCOLEDESHAUTESÊTUDESEN SCIENCESSOCIALES- FRANÇA UNIVERSIDADEFEDERALDE MINASGERAIS- BRASIL
FrédéricLebaron Maria Andréa Loyola
ÊCOLENORMALESUPÊRIEUREPARIS- SACLAY- FRANÇA UNIVERSIDADEDOESTADODORIODE JANEIRO- BRASIL
GeraldoRomanelli Maria Arminda do NascimentoArruda
UNIVERSIDADEDE SÃOPAULO- BRASIL UNIVERSIDADEDE SÃOPAULO- BRASIL
Gérard Mauger Maria da GraçaJacintho Setton
ÊCOLEDESHAUTESÊTUDESEN SCIENCESSOCIALES- FRANÇA UNIVERSIDADEDE SÃOPAULO- BRASIL
GilsonRicardo de MedeirosPereira Maria José BragaViana
UNIVERSIDADEDOESTADODO RIOGRANDEDO NORTE- BRASIL UNIVERSIDADEFEDERALDE MINASGERAIS- BRASIL
GiseleSapiro Marília Pontes Sposito
ÊCOLEDESHAUTESÊTUDESEN SCIENCESSOCIALES- FRANÇA UNIVERSIDADEDE SÃOPAULO- BRASIL
Igor Gastai Grill MichelDaccache
UNIVERSIDADEFEDERALDO MARANHÃO- BRASIL ÊCOLEDESHAUTESÊTUDESEN SCIENCESSOCIALES- FRANÇA

12 13
Monique de Saint Martin ABRINDO
A CAIXADEFERRAMENTAS
ÉCOLEDESHAUTESÉTUDESEN SCIENCESSOCIALES- FRANÇA
Pascal Ragouet
UNIVERSITÉDEBORDEAUX
- FRANÇA
Pascale Casanova
DUKEUNIVERSITY- ESTADOSUNIDOS
Patrick Champagne
INSTITUTNATIONALDELARECHERCHEAGRONOMIQUE
- FRANÇA
Paula Montero
UNIVERSIDADE
DESÃOPAULO- BRASIL
RemiLenoir
ÉCOLEDESHAUTESÉTUDESEN SCIENCESSOCIALES- FRANÇA
A elaboração de um vocabulário dedicado a Pierre Bourdieu (1930-2002)não é tarefa das
Roberto Grün mais fáceis,sobretudoquando consideramoso quanto antibourdieusianoé apresentarnoções,
UNIVERSIDADE
FEDERALDE SÃOCARLOS- BRASIL constructos, definiçõesdescoladosdaquilo que caracteriza de modo preciso e original seu tra-
SergioMiceli balho científico,qual seja,fornecerinstrumentos de construção da análise sociológicaque não
UNIVERSIDADE
DESÃOPAULO- BRASIL se constituam em meros conceitosdescritivos,mas que envolvamuma epistemologiaprática.
SylviaGemignani Garcia Bourdieu foi um dos grandes pensadores de nosso tempo, tendo dado, já em fins dos anos
UNIVERSIDADE
DESÃOPAULO- BRASIL
1950,uma contribuiçãoessencialpara afirmar a sociologiacomo disciplinacientíficana Euro-
pa. Dotado de rigorosa acuidade intelectual,provenienteda formação filosóficadesenvolvida
Tânia de Freitas Resende nos setores mais consagrados da academia francesa, propiciou uma visão analítica refinada
UNIVERSIDADE
FEDERALDEMINASGERAIS- BRASIL
de objetos complexos e diversos que compõem o mundo social em que vivemos. Alçado à
Vincent Bontems posição de cientista imprescindível a quem se envolvecom a ciência social contemporânea,
LABORATOIRE
DESRECHERCHES
SURLESSCIENCESDELAMATIÊRE- FRANÇA tornou-se autor de uso frequente em campos disciplinaresos mais variados, como sociologia,
WanderleyMarchi Júnior antropologia, educação, história, economia e psicologia.Sua obra abrangeu desde sensível
UNIVERSIDADE
FEDERALDO PARANÁ- BRASIL etnologia do mundo tradicional dos cabilas, na Argélia, envolveua crise da reprodução das
sociedades tradicionais francesas, desvendouas funções sociais do sistem~de ensino de seu
YvesWinkin
país, descreveu práticas culturais distintivas alinhadas à constituição e classificação das
CONSERVATOIRE
NATIONALDESARTSET MÉTIERS- FRANÇA
classes sociais, explorou as peculiaridades de seu próprio universo intelectual, desvelou os
Zaia Brandão confrontos no interior de distintos campos de produção simbólica, expôs formas dissimu-
PONTIFÍCIAUNIVERSIDADE
CATÓLICADO RIO DEJANEIRO- BRASIL ladas de dominação e de exercícioconsentido do poder, além de refletir e polemizar sobre
problemas sociais emergentes com seu enérgico ativismo político. A construção de todo um
aparato conceitua! estabelecidoao longo e a partir de incursões em terrenos empíricos bas-
tante diversificadosresultou na elaboração de potentes noções operacionais que permitem,
por sua vez, perscrutar os mais variados domínios do mundo social.
Nesse sentido, apresentamosao leitor a possibilidadede interagir com a grande multiplici-
dade de elementosconstitutivosda teoria de Bourdieu,exibidosde modo singular pelosautores
dos diferentesverbetes,mas que, em seu conjunto, ensejam uma visão global da contribuição
de suas análises sociológicas.Com isso afirmamos que nossa motivação foi a de apresentar
uma sistematização, dotada de valor pedagógico, daquilo que constitui o pensamento e a
prática científica de sua sociologia,centrada no tripé teoria-história-empiria, como auxílio
à leitura e compreensão de seus textos e direcionado a um público amplo.

15
14

1.
. B~urd~;use ~~cus~a_carac~erizaro INRApela oposição entre a lógica da invençãodos
c1entist_as~uros e a log1cada movaçãoeconômicados pesquisadores"aplicados",uma vez
~ueno mstituto prevalecemambas. Essa instituição pública,investidade vocaçãouniversal
liberada da pressão direta do mercado,em que coexistemduas concepçõesde pesquisa,autô~
~ornas~co~p~tíveise~tre ~i,gozada necessáriaautonomiarelativaque conferelegitimidade
~ atuaçao publicad~s c1ent1st~s.De_staca,
com ênfase,que a autonomiaé a condiçãodo enga-
Jamento.Sendo_ass1~: o cam1~homdicado por Bourdieupara o INRAresidiria num longo
trabalho de soc10analisecoletiva- por meio da qual se fortalece a comunicaçãoracional -,
representando a busca de uma vida científicamais eficaze menos infeliz, algo que nenhum
diagnósticode comitês de especialistasseria capaz de deflagrar.

203. VEREDICTO
ESCOLAR

Ver: Sistema de ensino

204. VIOLÊNCIASIMBÓLICA
GérardMauger

Comocompreenderque"a ordemestabelecida,comsuasrelaçõesde dominação,seusdireitos


e seus tratamentos de exceção,seus privilégiose suas injustiças,consigaperpetuar-se [...] tão
facilmente,com exceçãode alguns acidenteshistóricos,e que as mais intoleráveiscondiçõesde
vida possam aparecer,com frequência,como aceitáveise, até mesmo,naturais?"(DM).
Uma primeira resposta a essa questão reside no uso que fazem os dominantes da força
física, simples ou armada para impedir ou derrubar qualquer revolta. Assim, segundo
Weber,"o Estado é uma comunidade humana que reivindica com sucesso o monopólio do
uso legítimo da violênciafísica em determinado território". Uma segunda resposta encon-
tra-se na coerçãoeconômicae, mais precisamente,na separaçãoentre os meios de produção
e a força de trabalho que, no modo de produção capitalista, obriga os proletários a vender
"livremente"sua força de trabalho. No entanto é inevitávelconstatar que, se na maior parte
dos casos,os dominadosnão se revoltamcontra a dominaçãoque os subjuga,não é - ou não é
somente- por terem receioda repressão(policial,militar, parental, marital etc.).Além disso,
se os explorados não se revoltam contra a exploraçãode que são vítimas, não é - ou não é
somente - sob a égide da necessidade,mas também porque tendem a aceitar sua situação
como inelutável,a percebê-lacomoinscrita "na ordem das coisas".Comoexplicartal adesão?
Marx e Engels(emA ideologia alemã), Weber (emEconomia e sociedade), Durkheim
e Mauss (no estudo das "formas primitivas de classificação")propuseram diversasrespostas
para essa questão.Bourdieunão é, portanto, nem o primeironem o único a sublinhar a adesão
ou a contribuição dos dominados para a sua própria submissão.A novidade,no conceitode
"violênciasimbólica",reside na explicaçãoproposta. Oxímoro que embaralha as fronteiras
entre o material e o intelectual,a forçae o direito, o corpo e a mente, o conceitode "violência
358
USOS SOCIAISD~ CIÊNCIA(OS): PORUMASOCIOLOGIA CLÍNICADO CAMPOCIENTIFICO VIOLÊNCIASIMBÓLICA 359
(Les usages soc,aux de la sc,ence: pour une socio/ogie clinique du champ scientifique)
simbólica" aplica-sea todas as formas "brandas" de dominação que conseguem ganhar a quala interiorizaçãodas "formasprimitivasde classificação''(inculcadaspelosistemade ensino)
adesão dos dominados. "Brandas" em relação às formas brutais baseadas na força físicaou é o fundamentodo "conformismológico"e do "conformismomoral" na origemda experiência
armada (mesmo que a violênciafísica seja sempre também simbólica)."Violência"porque, do mundo enquanto"mundode sensocomum".É nessaperspectivaque a definiçãoweberiana
por mais "brandas" que elas possam ser, tais formas de dominação não deixam de exercer do Estado é ampliada por Bourdieu(SE):além do "monopólioda violênciafísicalegítima",o
uma verdadeira violência sobre aqueles que a sofrem, engendrando a vergonha de si e dos Estado detém o da violênciasimbólica.
seus, o autodescrédito,a autocensura ou a autoexclusão."Simbólica",pelo fato de se exercer Seria então lícito considerar que na obra de Bourdieu a versão do conceitode violência
na esfera das significaçõesou, mais precisamente, do sentido que os dominados conferem simbólica assumiria dois aspectos, o que privilegia a pedagogiaexplícitae a aprendizagem
ao mundo social e a seu lugar nesse mundo (TERRAY, 1996). consciente,enquanto outro enfatiza a pedagogiaimplícita e o conhecimentopelo corpo ou,
Na história das sucessivasdefiniçõesde "violênciasimbólica"propostas por Bourdieu, em outros termos, uma versão para o erudito e outra para o político?De fato conviria, sem
algumas são oriundas dos estudos sobre o sistema de ensino (LR;NE),enquanto outras apa- dúvida, encarar essas duas versões como uma soluçãoconceitual (e também um programa
recem nos trabalhos sobre a etnologiacabila que haviam servido de base para a análise da de pesquisa) para dar conta da inércia da ordem social e, outra, para explicarseu questiona-
dominação masculina (MP;DM),traduzindo uma inflexão - a priori paradoxal - de Marx mento. Oparadoxo - aparente - é que a versãomais desencantadatenha sido contemporânea
em direção a Durkheim. da intensificaçãodos esforçosempreendidospara que a sociologiase tornasse "um esporte
Em sua forma inicial, a "violênciasimbólica"é uma violênciaoculta, que opera priori- de combate"e para disseminar as armas da crítica sociológica.
tariamente na e pela linguagem e, mais geralmente,na e pela representação,pressupondoo
irreconhecimentoda violênciaque a engendroue o reconhecimentodos princípiosem nome Referências
dos quais é exercida.Ela impõe uma tripla arbitrariedade (a do poder imposto, a da cultura DURKHEIM,E.; MAUSS,M. De quelquesformesprimitivesde classification:contributionà
inculcadae a do modo de imposição),violênciadisfarçada,ela se exercenão só pela linguagem, l' étude des représentationscollectives.L'Année Sociologique,v. 6, 1903.
mas também pelos gestose pelas coisas;auxiliar das relaçõesde força,ela adicionaa própria MAUGER,G. Sur la violencesymbolique.ln: MÜLLER,H.~P.;SINTOMER,Y. (Orgs.).Pierre
forçaa essasrelações.Desseponto de vista, o reconhecimentoatribuído pelos dominadosaos Bourdieu: théorie et pratique. Paris: La Découverte,2006. p. 84-100.
dominantesé duplo:reconhecimentoda pertinência das justificativas"religiosas","naturais", TERRAY, E. Réflexions sur la violencesymbolique.
Actuel Marx: autour de PierreBourdieu, n. 20,
"eruditas" etc., a respeito dessa dominação; e reconhecimento suscitado pelas "vantagens" p. 11-25, 1996.
ou pelos "benefíciossecundários" que ela lhes concede.De modo que a violênciasimbólica
só pode ser exercida na medida em que suas vítimas "se privam da possibilidade de uma
liberdade baseada na tomada de consciência"(NE). 20s. VISÃOE DIVISÃO, PRINCÍPIOS DE .
·······················································································································
Essaversãosofreuma importanteinflexãonos trabalhossobrea etnologiacabila.EmMedi- GérardMauger
taçõespascalianas(1997)e A dominação masculina (1998)a violênciasimbólicatornou-se"a
coerçãoque se institui unicamentepor intermédioda adesãoque o dominadonão pode deixar Nos esquemasincorporadosdo habitus estãoimplicadosos princípiosmais fundamentais
de dar ao dominante (portanto,à dominação)quando,para pensá-lo- ou, melhor ainda, para da construção e da avaliaçãodo mundo social. Geradoresde atos de construção do mundo
pensar sua relaçãocomele-, o dominadodispõeapenasde instrumentosde conhecimentoque social - "atos classificáveis"e "atos de classificaçãoque, por sua vez, são classificados'.'(LD,
tem em comumcomo dominante,os quais,limitando-sea ser a formaincorporadada estrutura 544) -, elesestão na origem do conhecimentoprático do mundo social e do sentido da orien-
da relaçãode dominação,fazemcom que essa relaçãopareça natural; ou, em outras palavras, tação social (senseof one'splace) que funcionamaquém da consciência.Mas comodescrever
quandoos esquemasqueeleimplementapara sepercebere se apreciaroupara percebere apreciar a gênesesocial desse sentido das possibilidadese das impossibilidades,das proximidades e
osdominantes(alto/baixo,masculino/feminino, branco/pretoetc.)sãoo resultadoda incorporação das distâncias que sustenta a visão do mundo social?O programa do que poderia ser uma
das classificações,assimnaturalizadas,de que seu ser socialé o produto".Enquantoa primeira sociologiagenéticadas estruturas mentais e das classificações(alto/baixo,forte/fraco,rico/
concepçãoprivilegiavaa pedagogiaexplícitana sociogênesedo habitus, a segunda enfatizaa pobre etc.) conduz a estabeleceruma distinção entre as "sociedadestradicionais integradas"
pedagogiaimplícitae a incorporaçãodas disposições,colocando-asassim fora do alcanceda e as "sociedadesmodernas diferenciadas"(ver,a respeito,MARTÍNCRIADO, 2010,p. 40-47).
consciênciae tendendoa excluira possibilidade,senão de se livrar da dominação,pelo menos Às "sociedadespoucodiferenciadas"correspondeuma aprendizagemprática "por simples
de colocá-laem suspenso.Essaoutra versão- ou, melhor,essa inflexão- da teoria da violência familiarização":"o que se imita não são 'modelos',mas as açõesdos outros" (ETP,285).Além
simbólica,ao registrar o fato de que a dominaçãopode ser exercidaindependentementedas disso, "é através de toda a organização espacial e temporal da vida social e, mais especial-
consciênc~as e vontades(e de quenão bastatomar consciênciapara selivrar dela),vai inscrevê-la mente, através dos ritos de instituição [...] que se instituem nas mentes (ou nos corpos),esses
nos corpos,fora do alcanceda consciência.Dessemodo, além de se desvinculardos conceitos princípios de visão e divisão comuns" (BouRDIEU, 1983,p. 59).No decorrer dessa familia-
marxistas de ideologiae de alienação,ela se aproximada concepçãodurkheimianasegundoa rização, o aprendiz adquire de forma insensívele inconscienteas estruturas cognitivas,as

360 VIOL~NCIA SIMBÓLICA VISÃO E DIVISÃO, PRINCIPIOS DE 361


"formas simbólicas"(comodiz Cassirer),as "formas de classificação"(comodiz Durkheim)
os princípios de visão e divisão que criam "o senso comum". ' comum")e as disposiçõesinteriorizadasno decorrer da experiênciaimplícitada condiçãode
classe(o"habitus de classe"),ou seja,simultaneamentesobreos efeitosprópriossejadas incul-
Nas sociedadesdiferenciadas,a pedagogiaimplícita exercidapela experiênciaprática do
caçõesconscientese das incorporaçõesinconscientes,ou da experiênciatanto prática quanto
mundo socialcoexistecom uma pedagogiaexplícita,"inculcação,metodicamenteorganizada
virtual. Segundo Bourdieu, "assim como o que é transmitido por meio da hereditariedade
como tal, de princípios formulados e, até mesmo, formalizados"(LR,62). ''Adquiridospelas
apren~i~agensmeto~icamente organizadas da escola e, portanto, quase sempre explícitos biológica,é, sem dúvida,mais estáveldo que o que é transmitido por roei~~a heredi~ar!ed~d:
e explicitamenteensmados, os esquemas que organizam o pensamento dos homens culti- cultural, assim também o inconscientede classe inculcado pelas cond1çoesde ex1stenciae
vados das sociedades'escolarizadas"'desempenham uma função semelhante àquela que é um princípio de produção de julgamentos e de opiniões mais estável do que os princípios
executadapelas "formasprimitivas de classificação"das sociedadestradicionais (BOURDIEU, políticosconstituídosde maneira explícitapeloprópriofatode ser relativamenteindependente
da consciência"(LD,529).De maneira geral, a hipótese de Bourdieuprivilegia,portanto, os
1967,p. 368). O Estado - em condiçõesde impor e inculcar, na escala de todo um território,
efeitosda pedagogiaimplícitaem relaçãoaos das pedagogiasexplícitas.Bourdieumenciona,
estruturas cognitivase avaliadorasidênticas ou semelhantes- "exercede forma permanente
igualmente,"o privilégioantropológicoconferidoao presentee, ao mesmotempo, ao espaço
uma ação formadora de disposiçõesduradouras [...] impõe e inculca todos os princípios de
visível e sensível dos objetos e dos agentes copresentes"(MM, 165),e concorda com o fato
classificaçãofundamentais, de acordo com o sexo,a idade, a competênciaetc. [...] cria [deste
de que, "mant.idasinvariáveisas demais condições,existe sempre uma espéciede privilégio
modo] as condiçõesde uma espéciede orquestraçãoimediata do habitus que, por sua vez, é
prático daquilo que é diretamente percebido" (MP, 162).Ora, na medida em que, por um
o fundamento de uma espéciede consensosobreesse conjuntode evidênciascompartilhadas
que são constitutivasdo senso comum" (BOURDIEU, 1983,p. 58-59). lado, enquanto corpos (e indivíduosbiológicos),os sereshumanos estão,à semelhançado que
ocorre com as coisas,situados em um lugar (MM,160)e em que, por outro, nada garante que
Mas a aquisição escolar desse "senso comum" duplica-se com a interiorização das dis-
posiçõesassociadasà experiênciade uma condiçãode classe.Às "estruturas características o espaço social local em que "elestêm lugar" seja um modelo reduzido do espaço na~ional.
"Salvoexceção,os membros das classespopulares 'não têm ideia' do que pode ~er o s1ste~a
de c~ndiçõesde existênciarelativas a determinada classe" (ETP,177-178),correspondeum
das necessidadesdas classes privilegiadas,tampouco de seus recursos a respeito dos quais
habitus de classe.O habitus individual é uma variante estrutural do habitus de classe,em
elestêm também um conhecimentobastante abstrato e sem nenhuma correspondênciacom
que se exprime a singularidade da posição ocupada no interior da classe e a da trajetória. O
0 real" (LD,437). Enfim, na medida em que a experiênciareal prevaleceem relação à expe-
desenvolvimentoulterior da teoria dos campos levouBourdieu a associar,da mesma forma,
riênciavirtual associadaà pedagogiaescolarou àquelada mídia, convémse questionar sobre
um "habitus específico"a cada campo. O conjunto das aprendizagens- implícitase explíci-
a congruênciaou as discordâncias,nas "sociedadesdiferenciadas",entre" habitus nacional"
tas, associadasà vida cotidiana de uma classe,a suas possibilidades/impossibilidades,a suas
liberdades/necessidades,a suas facilidades/proibições-, a percepção reiterada de "indícios (associadoa um conhecimentoabstrato) e "habitus de classe"(associadoà experi~n~iaco~-
creta). Nada garante, com efeito,que a incorporação insensíveldas estruturas sociaislocais
concretosdo acessívele do inacessível,do 'é para nós' e do 'não é para nós"' (SP,107),engen-
no decorrer de uma experiênciaconcreta, prolongada,além de repetida indefinidamente,e
dram expectativassubjetivas ajustadas às probabilidades objetivas que levam a "recusar o
"queconfereum lugar importante à afetividade"(MP,168-169),correspondanecessariamente
recusado"e a "desejar o inevitável"(SP,90).De tal modo que todo habitus de classese dis-
tingue de outro não só por gostos e aversões,-mastambém por tomadas de posiçãopráticas àquelas do espaço social nacional (e, a fortiori, mundial). .
A interrogação sobre esse tipo de tensões aparece bem cedo na obra de Bourd1eu.A
ou explícitasem relação ao mundo social e, mais especificamente,por disposiçõesrelativas
ao futuro, um "sensodo possível"e·um "senso dos limites". passagem acelerada de uma sociedadetradicional ("pouco diferenciada'')~ ,u~a soci~~a~e
moderna ("diferenciada'')tem uma duplaconsequência:por um lado, a expenenciada d1V1sa~
Nas sociedadesdiferenciadas,pedagogia implícita e pedagogia explícita coexistem.De
interior [dédoublement] entre o habitus interiorizadona sociedadetradicionale aqueleque e
modo que o mesmo aprendizado, como o da língua que se diz "materna",é objeto de uma
pedagogiasimultaneamenteimplícita- que está na origemda interiorizaçãode um" habitus imposto pela sociedademoderna (DR,161-177);por outro, o retorno reflexivosobreo ~a-bitus
imposto por sua inadequaçãoà nova situaçãoa ser enfrentada (ETP,300). Essa reflex1V1~a~e
linguístico"- e explícitaque se dá no decorrer da aprendizagemescolarda "língua legítima".
Esse aprendizado escolar é tanto mais fácil ou mais difícil quanto maior ou menor for sua forçada e essa divisão interior, provocadaspela mudança acelerad~das _estrutura,ssociais,
podem ser associadasa outros casosespecíficos:em particular, as m1graçoesgeograficase as
~roximidade da "com~etê~cialinguística" inicial. Bourdieu escreve a respeito o seguinte:
Aprendemosa falar nao so escutando falar certa maneira de falar, mas também falando [...] migraçõessociais,onde as disposiçõesadquiridas,no plano nacion~lou ~oc_ial, encontram-s~
em posição falseadana nova situaçãolocal ou social.A configuraçaopropna desse~~asosfm
nas_trocas ocor~idasno seio de uma família que ocupa uma posição particular no espaço
sociale que, por isso mesmo,propõe à mimesis prática[ ...] modelose sançõesmais ou menos generalizada por Bernard Lahire, que radicaliza a distância entre campos da pratica'.mas
afastados do uso legítimo" (PVD,14). também entre instituiçõesou situações(LAHIRE, 1988,p. 35),de modo que a heterogeneidade
e a incoerência dos esquemas do habitus se tornam a regra, enquanto a coerênciase trans-
Podemos,então,nos interrogar sobre a congruênciaou as discordânciasentre as disposi-
çõesadquiridas explicitamenteno âmbito escolar(o "habitus nacional" na origemdo "senso forma em exceção.Além disso, segundo ele, a defasagementre os esquemasincorporados e
as condiçõesde sua aplicaçãotorna-se sistemática.
362 VISÃO E DIVISÃO, PRINCÍPIOS DE
VISÃO E DIVISÃO, PRINCÍPIOS DE 363
Seé ve~dadequ:, ~e maneira genérica,"as divisõessociaisse tornam princípiosde divisão
q~e org~mzam a _v1sao~o mundo social" (LD,549) por intermédio dos condicionamentos
diferencia~ose.d1~erenciadoresque esíão associadosàs diversas condiçõesde existência,
0
estudo d~ mfluenc1aexercidasobre esses esquemasclassificatóriospelas divisõesda ordem
estabelec1dae pelas modalidadessocialmentediferenciadasde sua interiorizaçãodefineum
programa de pesquisas empíricas,por enquanto apenas esboçado.

Referências

BOURDIEU,P.Espri~d'État,:geneseet structure cÍuchamp bureaucratique.ARSS, n. 96-97,mars 198 .


3
BO~RDIEU,P. Systemesd enseignementet systemes de pensée. Revue International des Sciences
Sociales, v. XIX,n. 3, 1967.
LAHIR_E,
B. L'Homme pluriel: les ressorts de l'action. Paris: Nathan, 1998.
' · d p·
MARTINCRIADO, E· Les deux Al genes dº
e zerre Bour zeu. Broissieux:Croquant, 2010.p. 40-47.

206. WEBER,
MAX (1864-1920)
Remi Lenoir

Bourdieudizia que o que torna difícilpara um pesquisadorutilizar os trabalhos de Weber


é o fato de que aquilo que é transmitido nas exegesese nas vulgatasprofessoraisnão é tanto a
lógicade seu pensamento com seus fundamentos materiais e intelectuais, isto é, a operação
propriamente intelectual o opus operandi (a maneira de construir o objeto) -, mas sim
o resultado da pesquisa (as "teses"),o opus operatum, segundo a oposiçãoclássicaque ele
utiliza para dar conta de sua maneira de trabalhar e de ensinar. Eis o que Bourdieu tenta
fazer em seus dois artigos sobre a sociologiada religiãode Weber,nos quais procede não só
a uma reapropriaçãoverbal do procedimentoweberiano,mas a um verdadeiro trabalho de
reconstrução,analisando minuciosamentetrechosrelativosà sociologiada religião,extraídos
de Economia e sociedade,em função de seu próprio objetode pesquisa, ou seja,a elaboração
da noção de campo a respeito da qual sempre afirmou que ela se deve, senão a uma leitura
textual de Weber, ao menos a sua tentativa intelectual e, ao mesmo tempo, pedagógica de
apresentar sua eficáciaheurística.
A propósito do campo religioso,Bourdieuinterpreta as análises de Weber colocando-as
em perspectiva com as de Durkheim e de Marx. Ele vai reposicionar umas em relação às
outras, referindo-se às duas grandes tradições intelectuais que, em seu entender, dividem a
história da sociologia:a sociologiado poder e a sociologiado conhecimento.ElecolocaWeber
ao lado de Marx na sociologiado poder. Para este último, a religião é concebidaem termos
de ações, em termos de conflitosde atores. Durkheim, por sua vez, é situado por ele na so-
ciologiado conhecimentoe da linguagem - no caso dessepensador, a religiãoaparece como
taxinomia e ordenação do mundo. Assim, em sua análise da gênesee do funcionamento do
campo religioso,Bourdieu conjuga essas duas tradições cujos componenteshabitualmente
contribuem para separá-las (poder temporal e fenômenossimbólicos).Com efeito, em sua
opinião, é enquanto instrumento de conhecimentoque os fenômenossimbólicosse tornam
instrumentos de poder: atravésde um sistemade categoriasde percepçãodo mundo verifica-
se a efetivaimplicaçãode toda a estrutura da ordem social e de sua legitimação.
3 64 VISÃO E DIVISÃO, PRINCÍPIOS DE
WEBER, MAX (1864-1920) 365

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