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VIDA, REALIDADE, INTERPRETACAO Gilvan Fogel |. Filosofia é, precisa ser compreensao radical, essencial. Isso quer dizer: compreensio de raizes, melhor, desde enraizamento ou fundagdo ¢ justo isso se entende sob esséncia, ou seja, ¢ isso que aponta ou acena para a propria dinamica de realiza¢ao de realidade ou de génese, a génese do real. Com isso, estabelece-se um vineulo insepardvel entre filosofia e realidade, isto ¢, entre filosofia e visio ou compreensao de realidade. Filosofia é um radical, um visceral compromisso com 0 real, no sentido de, por parte do homem, auto-impér-se a tarefa de compreendé-lo. E compreendé-lo ¢, serd sempre, transpor-se para a sua génese, para seu in statu nascendi, que € sua esséncia, seu tornar-se ou fazer-se. Fica assim dito ¢ subentendido que realidade e vida esto dizendo a mesma coisa, ou seja, apontando para uma tinica e mesma dindmica, forma ou estrutura. Digamos: para uma Unica e mesma fensdo, a qual constitui um ponto de incidén- cia ou de coincidéncia. Enfim, uma consanguinidade. A isto, a esta consanguini- dade, pois, chamou-se estrutura, dindmica, estrutura ou dinfmica de realizacao de Fealidade ow tensao. Esta tensdo, portanto, esté falando: instancia de geracao, de génese. Em suma: Vida, Dai que nos sintamos no direito de afirmar a correspondéncia ou a copertinéneia de vida e de realidade, ‘Nao que sejam duas coisas, uma mais outra, Nao. Sdo uma ea mesma ‘coisa uma tinica e mesma tensa. Aqui, porém, néio cabe entender vida no sentido cien- Lifcsta, biolbgico c, entio,ficar-se na expectativa de que a ciéacia, pela via da biologia ou da genética, p.ex., explicard ou defini vida. De imediato, é preciso entender-se vida no ‘etido limpo, cristal ¢ incisivo da formulagto grega para a psyché: movimento que, ® partir de si mesmo, move a si mesmo. Assim, vida ¢, entio, realidade, 6, sim, um aufo- Gere) © aqui, agora, vamos caracterizar este aufomével, que ¢ a implicacao de vida e Real € o que ha. E 0 que esta ai. £0 que se mostra, se da, aparece e Se tal como se da, se mostra, aparece e se impdc. Mas ai esté a questiio: € este tal como que faz do real este real que ai estd, aparece e se impbe? tros termos: como, desde onde, a partir de que é 0 que é, 0 que se dé ou apay Postas, as teses: 0 realismo, 0 objetivismo, 0 subjetivismo, ai incluindo-se criticismo transcendental e um idealismo absoluto. Ou ainda um sensualisr ou um fenomenalismo, ou um materialismo, ou um psicologismo, ou um an pomorfismo, ou... ou... Se observarmos bem, veremos que todas estas teses ou doutrinas (os ig mos) tém algo em comum, com variagdes de tom e de entonagao, a saber, lado o homem (alma, espirito, consciéncia, o dentro, 0 interno, 0 sujeito) outro © mundo (0 real, 0 externo, o fora, enfim, 0 objeto). Nao vamos estas teses. Seria enfadonho. Vamos tomar uma diregao, através da qual tentar explicar um modo de ver e de pensar o real, a realidade do real, e: da armadilha do escaninho ou do esquema sujeito x objeto, homem x mun suas aporias. 2 possivel que, a partir desta formulagao, se diga com dire azo que interpretagao funda realidade; que interpretacdo é a propria. a propria vida do real. E possivel, ainda, que se evidencie que interpret: interesse, perspectiva e valor, p. ex., estejam falando de uma mesma coisa, seja, de um mesmo fendmeno ou de uma mesma experiéncia (evidéncia) de: 3. Nietzsche escreve: “Uma ‘coisa em si’ é algo t8o absurdo quanto “sentido em si’, uma “significado em si’. Nao ha nenhum “fato em si’, mas, que um (estado de) fato possa haver, é preciso que um sentido primei sempre jd tenha sido introduzido” | © ponto de partida, a evidéncia, ¢ que nao ha, nao pode haver coisa er isto €, fora ou independente de toda e qualquer relagdo. E continua: para algo se dé, aconteca ou aparega é preciso que um sentido sempre ja e prin mente ae pe intro-duzido. Digamos: € preciso, para que algo acon so ee Co er panda ee ene tenha se inter-p pode-se, precisa-se dizer: a priori onto ne ee 7. No entanto, nfo nos apressemo: p apr , seme este previamente ou a priori num sentido kat ee intial S| le sujeito transcendental, no, isto é, como obra de METESCHE F KeWeqr.1982 Congr, 208 Sn pi OA Oe pe Te, NatcosSinésoPeraka Femandes. Rod NIETZSCHE E A INTERPRETAGAO = Habitualmente, desde a representagao e a vigéncia do senso comum, entende- «se relacdo a partir dos termos relacionados, dos polos ou dos relata. Nesta com- preensiio, os termos ou polos (re/ata) precedem a relacao como tal e a possibilitam. ‘Mas possivel imaginar que, assim pensando, se esta distorcendo, desvirtuando ¢ falsificando a relagao mesma ¢ enquanto tal. Trata-se, portanto, de entender, de ver a relagao mesma e enquanto tal. B, para tanto, € preciso entender ¢ ver aquele sempre jae primeiramente, isto é, aquele prévia ou antecipadamente, que marca 0 sentido possibilitador e instaurador de toda e qualquer coisa, E isso quer dizer: quando algo se da, aparece para um espectador ou sujeifo, o sentido, isto 6, a relacao instaurado- rae possibilitadora tanto de quem vé (0 sujeito) como do que € visto ou aparece (a coisa, 0 objeto) — esta relagao sempre jé se deu, sempre j aconteceu. Como ja visto ¢ dito, 0 jd, o sempre jd, quer dizer: primeiramente, por antecipagao e, por isso, este sentido ja introduzido ou interposto ¢ 0 fundador, a condigao de possibilidade tanto de quem vé (0 sujeito), quanto para 0 visto ou visualizado (a coisa, 0 objeto). Isso de modo tal que, tanto 0 sujeito que vé, quanto a coisa vista, ambos, ja so obra do sentido que sempre ja se deu, sempre jé aconteceu, ou seja, obra do sentido que, previamente ou por antecipagio, jé foi introduzido, ja se interpos. A propria expressao introduzido (ou interposio, intrometido, “hineingelegt”) leva também a este engano, induz a este desvio. Ela pode consolidar um erro, a saber, a perspectiva do senso comum, do habito, qual seja, ver o fendmeno a partir dos polos ou dos termos constituidos (sujeito-objeto, homem-mundo, expectador- -coisa vista) e, entéo, imaginar, representar estes termos ou polos jé feitos, dados ou constituidos e, ent&o, entre eles ser acrescentado ou somado um sentido. E, continuando com o habito, aqui, a tendéncia ¢ imediatamente imaginar este sen- tido como sendo obra, resultado ou produto do sujeito, uma projegao do sujeito- -homem, Assim, como produto ou projecdo do sujeito-homem, seria entendido 0 sentido introduzido ou interposto. Nao ¢ isso, porém, de modo algum, o que a citagfo esta pensando e querendo dizer. A dificuldade e, a0 mesmo tempo, o crucial da questo esté em ver, em re- almente visualizar este prévio ou por antecipagao (sim, 0 origindrio, 0 a priori), ‘que sempre ja se deu, que ¢, pois, anterior aos termos ou polos, ¢ que, na ver dade, é fonte (arché, fundagao) ou condigao de possibilidade disso que, tardia ou epigonalmente, vemos como termos, denominamos como polos ou relata. Ver-se-4, adiante, a interposic&io deste sentido, o intérprete (sujeito, homem) e a coisa interpretada (0 objeto), tudo isso, constitui um iinico e mesmo e simultdneo acontecimento ou ato. O sentido ja introduzido ou interposto é a dimensao arcai- a, fundadora ou origindria, na qual sempre jé se esté jogado (introduzido), quer dizer, nela se entra — melhor ainda, nela foi-se entrado ou caiu-se sob a forma de um salto. Portanto, e aqui estd algo decisivo, o sentido sempre ja introduzido ou interposto fala de salto. E salto fala de um modo de ser que é siibito ou i-mediato, u seja, nfio tem ¢ no é mediagdo ou intermediagao alguma, Nada paulatino, 8tadativo, pouco a pouco. Neste salto, neta subitaneidade ou imediatidade esté realmente ya erucial do problema, Simples, extremamente simples, porémy decisivy, eo salto define inseredo, isto 6, um ou o modo de ser caracterizado pene Meal na vida, no elemento ou na forca (sentido). Sempre ja desde denotem ma ha fora antes ou depois. Insergao esti, pois, falando de circulo, de-comegg ou do comego que nio comega, que nao pode comegar. E isto 9 camctersinga Proprio de arché ou de instauragfio, que assim se faz fundagio—o fundo sem fig @ fundo abissal, 0 comego sem comega, que, em sendo fundagao, petfazigget Circulo é uma imagem para dizer, para corporizar ou tornar plasticamente igi, um fendmeno, um acontecimento, isto é, um modo de ‘ser, que nao emo teming, gem, corpo ou plistica alguma, a saber, imediatidade e insergao, ag Esta situagdo de salto, de imediatidade, de circulo, de insereao — forma ou estrutura fala de um modo de ser ou de estar sempre ja tocado, sempre Ja tomado por, isto é, pelo sentido, que sempre ja se introduziu ou interpés. Assim sendo, esta situagio de insergio fala igualmente de afeto, isto €, do fato de a vids de imediato ou originariamente, ser afeto ou sob 0 modo do afeto. Afeto, como disse, no sentido de © homem jé estar sempre tocado, tomado, quer dizer, © apropriado pelo préprio, pelo modo priprio de ser do sentido, no qual se Se esta, © qual sempre jé se é. Este sentido, que se faz ou se dé como salto, ci insergao, afeto — enfim, este sentido constitui-se como uma forca, ou ej um interesse, uma perspectiva ou, digamos ainda, um mundo. E isso, este: Ser ou estrutura, justo 0 elemento, 0 meio ou medium que mostra, a partir do qu € como o qual o que & se mostra, se realiza ou se faz visivel tal como é, apa realiza, se mostra ou se faz visivel. 3 ‘ ‘Que sé ¢ to s6 a guisa de pergunta e de espanto se pergunte: que modo 1h estranhissimo de ser este do homem que, ndo sendo imediatamente nenhum eu, ne ‘ma alma, nem espirito, nem consciéncia, nem pessoa, ¢ igualmente nfo sendo imedlix tamente nada oposto a tudo isso, como, p. ex., corpo, materia, energia, fundo ow last) biofisiolégico, orgdnico — em suma, que modo estranho, estranhissimo de serée Thomem que no send seque ainda homem (!), pace ser tocado e tomado poral modo de ser, isto é, forca, sentido, afeto?! Que modo de ser estranho, homem € este de ser socdvel, tomdivel, afetavel, quer dizer, de ser tomado e i por um modo de ser (sentido, forea, interesse, perspectiva) que Ihe sobrevém ea pati -do qual, © somente a partir do qual, o homem, um homem se faz, se da, i cendéncia, no sentido de ser algo, i.e., uma dimensto ou um modo de ser, sobre q ‘ota respeito do qual o homem niio tem nenhum arbitrio, nenhum poder de devi de escolha, nenhuma vontade, Que modo de ser estranho, estranhissimo, &¢ t dizendo 0 fundo ou o lastro ontolégico da vida, é $6 e to sé “a realidade da li ‘como possibilidade para possibilidade” *— e coisa ou algo nenhum?| 2 ‘Ora que diigo, Le. funda, comanda, tudo que 6 @ ha (ct, Herb, fag. 64, Dies). _ 3 _ KIERKEGAARD, S. Concato de Angst § 5. (ta ossa) PRETACAO NIETZSCHE E A INTER 4, Quando algo se dé, um sentido sempre jé se interp6s. Mas 0 que é oque se entende ou se subentende sob sentido? O que, de imediato, nos chama a atengao é que sentido & 0 participio substantivado de sentir. Levando sentido para o dominio do sentir, sem divida, a compreensiio comega a ficar meio psicoldgica, subjetiva. ‘Mas como se costuma entender afeto também como algo no dominio do psicolé- gico, do subjetivo, pelo menos por esta via, comegamos a vislumbrar, a entrever ee ntido como sendo algo do dominio do afeto. Digamos, pois, que sentido ¢ afeto e, qcsim tem ou € toda a forma ou a estrutura de afeto, O que nos induz a afirmar en- faticamente que sentido é afeto, €0 fato de que este sentido sempre ja interposio s¢ faz ou se da desde ¢ como salto (siibito, imediato) e, assim sendo, sobrevém a0 ho- mem, 0 acossa, 0 toma, dele se apodera ou se apropria. Por isso é afeto, afecgao. E, veremos adiante,! isso, a saber, 0 afeto, 0 sentido, é o que realmente mostra, 0 que Tealmente faz aparecet ou toma visivel. Ele aparece, se concretiza, se realiza (tam- bbém se retrai ou se dissimula) em tudo quanto se realiza, se concretiza ou aparece. Mas, antes, procuremos formular melhor a compreensio, a subeompreensio que se tem de sentido. Quando se diz subcompreensao esté-se dizendo que sentido algo ou um modo de ser que € t4o dbvio, tio evidente, uma vez que nele ou nesse modo de ser (0 do sentido) sempre ja se esti; isso, de certo modo, sempre ji.se ¢ € ‘om isso ou com ele sempre ja se conta. Esta constituigao ou configuragdo ¢ prépria, tipica da estrutura circular ou de insergiio. A rigor, s6 pergunto “o que é, como € sentido?” porque ja se/ 0 que é e como € sentido. Se eu ja ndo soubesse, nfo poderia perguntar. E, mais ou menos, como perguntar: “O que é perguntar?”... Digo imediata e irrefietidamente de algo que isso, este algo. tem sentido para mim. © que quero entdo dizer? Talvez, Vagamente, subentendo que este algo € im- portante para mim, isto é que ele me diz. respeito importantemente, que ele me importa, ou seja, que ele, para mim, tem peso, densidade, valor — enfim, trata-se de algo que, para mim, tem miolo, tutano. Assim sendo, no fundo, quando digo de algo que cle rem sentido, de algum modo estou subdizendo que este algo realmente, para mim, aparece, se mostra, é Ele se mostra, aparece ou € nisso que ¢le realmente ¢~ ou vale. Isso, de imediato, quer dizer que sob sentido entendo ou subentendo ésso ou aquilo que faz. com que algo seja isso que ¢, que aparece ou se mostra assim como €e tal como 6, Assim sendo, sentido é isso ou aquilo em que eu me sustento ou a que me atenho como sendo a propria possibilidade de algo ser ou aparecer como este algo que aparece ou ¢—vale. Vejo algo, isto é, este algo se dé ou aparece como tal a medida que estou, que jd estou niisso que digo ser o sentido da coisa. Mas isso que digo ser o sentido da coisa e, no fundo, a prépria coisa, nao é nenhum algo, ne- nhuma coisa ou propriedade que se fixaria, que se aderiria ou se somaria & coisa, a0 algo. Isso que digo ser o sentido, ndo sendo um algo ou uma ‘coisa (res), € um modo de ser ou uma dimensao do proprio homem, melhor, da propria vida ou existéncia humana. Nietzsche diz também: uma forga. Por isso, pode-se dizer também vale, ois este algo ou esta coisa em questao (0 sentido) tem ou ¢ a textura, o teor de valor (forga). A coisa ¢ ao modo, & maneira, ao jeifo de valor (sentido, forga). 4 Chaba, §6. 40 sean pet J4, este ser sempre jé dentro ou inserido em reali do também lediato — isto ‘0u este modo de ser fala do homem, da vida como sendo sempre jé a projeeiio ou a antecipagdo deste sentido tanto, um modo de ser que € ser na € como ou desde 'bém uma pré-vistio ou pré-ocupagao. Por isso, sentido se moc, _| Como sendo, por exceléncia, antecipacio, pois a antecipagdo mesma é q me modo de ser deste sentido que sempre ja se é, no qual sempre jA se est. Noa) Paya como se fora uma fixagéio, uma pré-fixacao e, assim, controle, planejameny, Prévio asseguramento. Nao, Trata-se de antecipacdo 4 guisa de indicagao, mel insinuagao, aceno. Tal como a divindade que mora em Delfos, indica, pont ins nua, avena.* Isso € orientagdio. Sentido é orientagao. Em orientagao fala oriente, oriente nascente — nascedouro, génese. Sentido, isso que é nada, coisa enue, mas tao s6 este modo de ser proprio do homem, da vida ou da existéncia em sendo antecipagiio e esta se mostrando como orientagao, é aguilo que me poe, me sintoniza e me sincroniza como que em estado nascente com a prépria coisa, 0 sentido, pois, perfaz a génese da propria coisa (ele ¢ a coisa; mas, observemos, coisa nao €, porém vale ou é forga), na qual sou e estou e que me possibilita, participar da génese da coisa e, assim, co-fazé-la, co-nascer com ela e como que ser ‘testemunha | (martir!) do seu irromper-se, fazer-se, aparecer. £. quando realmente digo, posso dizer: ha, di-se, faz-se, aparece ~ ¢ (vale). i Sentido, sendo anteciparao e aceno, ja se disse, no é fixagdo ou pré-fixagao de meta ou de dado, mas a medida que se faz como orientagfo, é igualmente vol ta, retorno, repeticao ou re-tomada e, assim e por isso ou gracas a isso, insistenle sineronia e sintonia com génese, com 0 movimento-génese ou a propria vida 62 coisa, do algo que se'da, aparece, é ou vale. Vida, enquanto e como o dar-se ou fazer-se de sentido, ¢ a insistente revitalizacto, o insistente revigoramento de vida indo assim isso que ela ¢: movimento que, desde si mesmo, move a si mesmo. Salto. Sibito, Imediatidade. Abissalidade do fundo, do fundamento — da vida. Dom: Doagio. Graga, de graga. I-mediatidade da vida, do sentido. a Portanto, a0 se dizer que “quando algo se dé, um sentido sempre ja se ine pos”, estd-se dizendo que um tal modo de ser (a saber, o da antecipagtio, da orient 40 ¢, entilo, da sincronizacaio ¢ sintoniza¢o com génese, com o movimento- ‘ow instauragao-aparecimento da propria coisa) sempre ja se interpds, acon! se deu, de modo que, entdo, a coisa possa aparecer, dar-se, ser ou valer, E ass por isso que o sentido é realmente revelador, mostrador, ou seja, realmente toma ou faz visivel. Quando compreendo, quando vejo (percebo) a coisa, $e 4 c0-vejo, ou co-percebo 0 sentido nisso que aparece e porque aparece coisa que aparece € é, de modo que é impossivel sepatar, opor, isolar ou colo planos opostos © contrapostos coisa ¢ (+) sentido. A coisa é 0 sentido — ai sentido seja coisa nenhuma! O sentido, porém, desconcertantemente, s6 pode s&h coisa, entenda-se, aparecer, realizar-se ou concretizar-se como a propria coisa digamos, a coisa nela mesma. Cf HERACLITO og, 9, Dis, a NiETZSCHE E AINTERPRETAGAO 5, Um nome, um outro nome para dizer este sentido ¢ esclarecé-lo em sua strotura ou forma ¢ interesse. Pode-se pois dizer: quando algo se dé ou acon- tite. um interesse sempre j@ aconteceu ou se deu, isto é, sempre jé se inter-pds. Que se oua inier-ess 10 &, um ser (esse) entre (inter), um entre-ser, onde este entre pode e precisa ser visto também no sentido de em, intus, isto é, dentro, de iodo que se toma meio, medium, elemento, Inter-esse, ent, fala de um modo de cer, a saber, 0 do homem, da vida ou da existéncia humana, que é ser (esse) Sempre jé dentro e desde dentro (infer). Em outros termos, um modo de ser (0 do homem) que € ser sempre ja tomado, tocado ¢ atravessado por um modo possivel (necessirio!) de ser ou de vida, ou seja, por um interesse. Lembremos ue 0 sempre jd evoca salto, imediatidade e, ento, evoca ou lembra circulo, isto 6, insergdo. Insergao fala de um constitutive ¢ necessario pertencimento, quer dizer, participacdo. N&o hé vida, ndlo hé olhar ou ver (perceber, aparecer) que io seja interessado. Em outros termos ainda; interesse (insereaio, quer dizer, afeto, sentido ja posto ou interposto) € condigdo para que o que quer que seja, seja isso que € ou aparece tal como aparece €, fal como se mostra ou se faz visivel. Interesse é 0 nome para a relagao arcaico-originaria ou o fundo que, em se dando desde € como salto, é sem fundo, abissal. Interesse, 4 medida que mostra ou faz visivel, é igualmente perspectiva. Sen- tido arcaico-origindrio ou sempre ja interposto, interesse ¢ perspectiva stio no- mes para caracterizar e dizer (mostrar) um nico € mesmo fendmeno, um tinico € mesmo acontecimento — a saber, o de fundagdo ou instauracao de vida e de coisa, algo, realidade. Habitualmente se entende perspectiva como enfoque, foco, ponto de vista de um homem, de um sujeito. Diz-se também: € seu interesse. Assim sendo, perspec tiva ou interesse seriam obra, resultado ou consequéncia da subjetividade, mais, do subjetivismo humano. E, assim entendido, o homem seria ou se daria antes e fora da perspectiva ou do interesse e, por isso, seria sujeito, substincia ¢ causa do ponto de vista, do enfoque, isto ¢, do interesse ou da perspectiva. Teriamos entdo: 0 homem ja dado ou constituido, sub- ou pré-existindo & perspectiva (ou interesse), determinan- do, projetando, causando ou criando a perspectiva (ou o interesse). Isto, em sendo subjetivismo, define também o antropologismo ou antropomorfismo. Mas nao. E preciso ver, isto é, entender perspectiva (ou interesse, ou 0 sentido sempre ja interposto) de um modo in-habitual ou extra-ordindrio. Isso serd realmente ver, entender perspectiva desde € como salto. Por ser salto, em Questo esta um fendmeno cuja visualizagdo ndo segue uma l6giea, isto é, nao ne de uma explicitaglo pela via de uma exposigdo, de um desdobramento \ediativo, dedutivo, isto é, légico-dedutivo. E um salto, é siibito, de repente — entio, vé-se ou nao! ae per-spicere, é um ver através. Ver, aqui, insistimos, quer dizer: aie ce Se, ae visivel. O através (per) & 0 meio, 0 medium, 0 ele- sry epi oe nilo ¢ outra coisa senflo o proprio enire, © proprio ¢ do inter-posto. A fala de medium ou de elemento é imposi- a2 salto, ov soja, da situagao de circulo, de insergo &, ento, de que quer que seja ou apareca, jd Ou sempre jd aparece og (vale) no medium, no elemento, desde (a partir de) 0 medium ou elemento, que é senedo sempre ja interposto, ou 0 interesse, 0 a perspectiva. Assim, 0 elemento, n (o interesse, @ perspectiva, 0 sentido sempre ‘jd interposto) é que fag parecer, é 0 que mostra ou faz visivel. A coisa, as coisas, 0 que aparede Ollee «nto tem afeto (ou sentido) como um algo que & somado, acrescentado, colad) Ov aaregado (hoje fala-se muito em agregar valor, sempre que se quer cliamar stengao sobre alguma bugiganga que se queira vender ou impingir) ow projetado: sobre ela ou elas, mas so 0 que s&o e tal como silo porque em si e por si sao afeta, E 0 afeto (sentido, elemento, interesse, perspectiva) € s6 0 afeto que mostra, faz visivel, faz ser 0 que é e tal como é. Fora disso é, ha —nada, isto é, coisa nenhuma: Neste elemento ou medium (0 cfrculo) faz-se ou dé-se, claro, o préprio elemento cou medium (0 interesse, a perspectiva), a coisa, 0 algo ou 0 objeto, assim como, também o proprio homem (0 intérprete), 0 sujeito ou o espectador. Aliés, niss6 ¢ por isso, num sentido estrito e rigoroso, ex-pectador € o que nfo ha, nflo pode: haver, pois nao ha, nao € possivel haver ver (aparecer, mostrar-se, instaurar-se) dé fora (cx), em-si, des-interessado ou des-perspectivado. Dito de outro modo, Alo ha, no pode haver seja @ coisa, 0 algo, 0 objeto, seja o homem, 0 sujeito, de fora, desinteressadamente. Formulemos isso melhor. ie 6, Numa outra anotagdo de Nietzsche, lé-se: “Nao se tem o direito de per guntar Quem interpreta?, mas préprio interpretar, enquanto forma da vontade de poder, tem existéncia (néo como um ser, mas como proceso, como devir) ‘como um afeto”.® i quem? evoca, claro, o intérprete, isto é, 0 sujeito (autor, agente, causa) da interpretagao. Assim perguntando, porém, estar-se-ia sub-pondo este intérprete-st jeito sub- ou pré-existente interpretagdo e, de fora, j4 dado ou constituido, seria, & ‘maneira de causa eficiente, o agente, a causa ou o autor da interpretagao. Isso parece Sbvio e assim costuma-se ver, imaginar, pensar. ‘Mas isso, justamente isso, est dizendo o texto citado, nao se tem 0 direito, quer dizer, razdo ou fundamento, de se supor ou pressupor. Quer dizer, nfo se tem 0 direito de ver ou compreender o fenémeno ou a estrutura da interpretagdio ness? ‘esquema ou bitola, sob pena de deformar, de falsificar todo o problema, melhoh © proprio fendmeno ou a sua estrutura, sua configuracao ou forma. E isso porque, diz ainda 0 texto, “o proprio interpretar, enquanto forma da vontade de poder, tem existéncia (hat Dasein)”. Vontade de poder fala do modo proprio de ser de vida, Ques dissemos, € movimento que, desde si mesmo, move a si mesmo. Assim, como mo vimento que move e pro-move a si mesmo, é que vida se faz dindmica de vir lu de iluminar-se ou parecer. Isso, este movimento, é vontade de poder ~entenda-Se espontineo movimento de irrupgdo, de vir a luz (= vontade) ¢ isso, j 0 vir & luz, mostrar-se ¢ assim impor-se, é poder, o poder, Vontade de poder ( pois, movimento livre de irrupgio, aparecimento, vir A luz ou fazer-se Vii gio, necessidade do afero, Tem-se pois 0 me NIETZSCHE, F KGW @1).138,2(181h:ou A vntad de pode. Ris de enero: Conrapon, 2008, n 56, proprié do suje interpr forga, ativida interp¢ unico ¢ tocot aac \ ou esse como ¢ esclare da vide falam < neces: Nesta trado, ou inte se6 co serou i-medi usado, digam 88 cos, Atexty d ainda y Suntar causa) on Compr tituem metho, isto &. fazeng NIETZSCHE E AINTERPRETAGAO “3 ‘enfim, aparecer. Pois esta estrutura ou dinamica dé-se ou faz-se como interpretagao, melhor, como interpretar, que € verbo, aco, atividade. E neste sentido ou diregao que ¢ dito: “o préprio interpretar tem existéncia [hat Dasein]”, isto é, ele assim vige, se faz, impera e impde-se. No entanto, ¢ grifado, néio como um “ser”. E isso, aqui, quer dizer: no como um algo sub- ou pré-existente (isso quer dizer a palavra ser, gscandida pelas aspas ou pelo itélieo) e que ¢ somado ou acrescentado a vida e & propria coisa interpretada; nao igualmente como uma propriedade ou um atributo do sujeito, do intérprete. Nao. A vida € isso, a saber, o proprio interpretar fazendo-se interpretar, inferpretando. Ela ¢ isso e s6 isso. O sentido que se inter-pde, em sendo forea, em sendo vida se coneretizando, se realizando, aparecendo, é aco, atividade. ‘Agio on atividade de auto-exposigdo. E isso, este inter, 6 a propria agao, a propria atividade da interpretagdo ou é isso que ¢ propriamente a interpretagao. O sentido interposto ¢ a ago que € a interpretacao — isso é um tinico e mesmo fendmeno, um tinico e mesmo movimento ou ato. Dito de outro modo; o inter do sentido inter-pos- to. 0 inter da inter-pretacdo so um € 0 mesmo fate, um e o mesmo acontecimento = aacio do viver, do existir. Vida é vida, é 0 que ée tal como é, tal como aparece e se faz, porque € constitutiva ‘ou essencialmente interpretar. Por dizer isso, 0 texto fala do interpretar como processo, ‘como devir. Este proceso, este devir, ento, toda a dinamica ou estrutura do interpretar, se esclarece melhor em se esclarecendo afeto, pois é dito que esta estrufura, enquanto forma da vida, se da ou se faz como afeto, éafeto. Afeto € processo, isto é, devir. Proceso ¢ devir falam de génese (entiio, sentido, orientagiio), de movimento-génese, no qual esta incluido, necessariamente, volta, retomo, isto é, retomada e, assim, revitalizago, revigoramento. ‘Nesta génese, a qual perfaz sentido e orientagao, se € siibita ou abruptamente jogado, en- irado, intro-duzido. Entrando, introduzindo-se ou interpondo-se sentido, entra, introduz-se ou interpde-se génese, a génese ou a vida do real, a qual éo real. Nisso, disso se participa, se é consanguineo. E tal génese s6 se da, s6 se instaura desde © como salto, Por isso, por ser ou se dar como e desde salto, é afeto. Ou seja, é afeto 4 medida que assim, sibita ou i-mediatamente, nos sobrevém e entao se € tomado, apoderado, apropriado — vai-se ser usado pelo sentido, pelo afeto. Isto, a saber, devir, génese, 0 dar-se e fazer-se de sentido, digamos em paréntese, é outro nome ou outro modo de se dizer histaria. O homem, o real, 88coisas, nao tem substdncia, mas histéria. Ou, se se quer, a substancia, a esséncia (ousia), @textura da vida, de toda e qualquer realidade, é histéria. Mas em dizendo o que se esta a dizer na tentativa de elucidar a citagaio de Nietzsche, ainda no se esclareceu bem porque nio se tem direito (ie. raz0, fundamento) de per ‘Suntar pelo quem da interpretagdio, o qual seria, igualmente, a pergunta pelo quem (sujeito, Causa) das coisas. Ou seja, ainda nao se viu porque e como nfo se tem direito de sub-pér © intérprete como sub- e pré-existente a interpretagao, melhor, ao interpretar. A ideia ou a Compreensio aqui em questiio é que a interpretacdo, o intérprete ¢ o interpretado cons- fituem um iinico e mesmo movimento, um iinico e mesmo acontecimento ou instante ~ melhor: um tinico e mesmo ato. O ato, o verbo que é interpretar no e como interpretando, ‘sto é, sempre no geriindio, nascendo, A propria realidade se realizando, a propria vida vida. O verbo interpretar, o interpretar-verbo na conjugagao do viver, do existir. Mas chega de exposigdo. Tentemos dizer, mostrar como isso realmente se: 7. Tenho diante de mim um texto de filosofia, p. ex., um texto de Ni um fragmento, que fala de fato, de coisa-em-si, de sentido interposto ede taco. Comego a ocupar-me com 0 texto, a defrontar-me com ele—eu, 14! —com 0 intuito de entendé-lo, de entrar nele. Parece, inicialmente, ser que a coisa se faz do seguinte modo: eu, 0 sujeito, 0 intérprete, aqui, deste. texto, o objeto, o interpretado, ali, 14, do outro lado; 0 discurso, a fala, a exp que é a interpretaedo, resultando da ago minha de ler, comentar, interpretar: jogando sobre ele o que sei, o meu saber. E isso que constitui, que € 0 suje sou. Assim, a interpretagio é, evidentemente, produto, obra minha, don mento e saber, Eu, 0 intérprete, ¢ 0 texto, o interpretado, somos evident coisas, dois niveis ou estratos evidentemente ai, isto ¢, dados, pré-existentes; um, do lado de c4; outro, do lado de 4. Tudo jé feito dad vamente, substancialmente, Mas se, despojada e desarmadamente (sem pré-conceitos), obs nese, o movimento de geragiio do fendmeno, a saber, da interpretagio, ver-se a coisa funciona diferentemente. O texto ¢ de filosofia, ou seja, ele se faz ou se mostra ou se faz visivel, pois, desde este estranho modo de ser do vida, que é uma possibilidade e, entio, esforgo, empenho para entrar na di realizagio da realidade e, assim, disso participar — ser congénere ou cong com 0 real. Isso 6 filosofia, filosofar. A principio, com todo rigor, somenté jd disso, isto é, deste modo de ser, ¢ que 0 texto realmente se faz texto, Ent&o desde esta instincia ou dimensio o texto ¢ legivel, inteligivel, interpre dizer, legivel, interpretivel com justica ou indo ao encontro da prépria coisa, dal Jo mesmo que est em questio. Isso, portanto, para ser comedido com a co comela. Na verdade, este, a saber, a filosofia, o modo-de-ser-filosofia, non especifico escolhido & guisa de exemplo ~ este & 0 sentido sempre ja interp qual precisa sempre jé ter-se intro-duzido, a partir do qual algo (i,e., todo: algo filoséfico, toda e qualquer compreensao e determinagiio filoséfica) Aqui, agora, a filosofia, sé a filosofia, pode ser medida. A medida e 0 isso, a saber, no interesse ou na perspectiva filosofica, eu (0 in Por #sso eu ja preciso estar tocado ou ton esiar € disso ou nisso participar, 440), para que leitura, a compreensto se faa, se ilumine, quer dizer, se iluminar ou tomar-se visivel. E, 4 medida que tal leitura ou comp NIETZSCHE E AINTERPRETACAO 45 {eitura, quer dizer, na interpretagdo e desde a interpretacao. Ent&o, sempre ja desde um sentido ja interposto. Fora disso ¢ nada, isto ¢, coisa nenhuma, sequer coisa. Portanto, também ele, 0 texto, igualmente vai se revelando, se mostrando na sua génese ou na sua poética, isto €, no seu dizer © mostrar, nisso ¢ s6 nisso, a saber, ho seu periencimento 20 movimento do interpretar. O interpretar, que tem ou ¢ a forma, a estrutura da vida, que ¢ expor-se, auto-expor-se, fazendo-se verbo e carne, expondo-se ou auto-expondo-se, pois, vai mostrando ser ele 0 autor, o criador ou “acausa seja de mim, o intérprete, seja do texto, o interpretado. E, claro, s6 desde 0 intérprete, assim como do texto, pode haver, dar-se, fazer-se e aparecer ou tornar-se visivel 0 proprio interpretar. O que ha, portanto, é um elemento, um medium, uma insergao, o circulo (e causa nenhuma; sujeito ou objeto algum), que é lugar e hora, "sibita ou i-mediatamente irrompidos, de toda instauragao, de toda realizado — de toda e qualquer realidade possivel. Sim, nao ha como perguntar quem interpreta?. Isso é uma futilidade, uma leviandade, um descuido, uma distragao. 8. Interpretar, todo interpretar ¢ sempre apropriar. Apropriar, porém, nao deve ‘ser entendido no sentido subjetivista, que habitual e imediatamente nos é sugerido. Ou seja, interpretar, 4 medida que é apropriar, nao é, por parte de algum sujeito-intérprete (eu), impor, imprimir ao interpretado, a0 objeto, a sua yontade, isto ¢, a formagao, os " conhecimentos, os desejos, valores, caprichos e idiossincrasias de seu interior, de sua subjetividade, modelando assim o interpretado, 0 objeto, a sua imagem e semelhanga , assim, tudo nivelando, achatando, igualando ao seu eu, a sua vontade, Interpretar ¢ apropriar 4 medida que se tem ou se ¢ 0 direito de apropriar. Aqui, de novo, é preciso uma correglo, uma retificagdo ou esclarecimento. Direito no é, aqui, direito divino ou natural. Nao é fala e imposigao ou coereao a partir de algum privilégio concedido e recebido por/desde algum fora ou além sobrenatural, p. €x., Deus ou Natureza! Portanto, direito, aqui, ndo esti falando de nenhum dom recebi- do ou concedido por alguém a titulo de regalia ou de privilégio pela via de alguma estranha entidade, autoridade constituida, institui¢ao, corporacao.... Na Em primeiro lugar, quando se fala que interpretar € sempre apropriar, esté-se dizendo que toda interpretagao, todo exercicio do interpretar, se faz desde ¢ como @atividade e a realizagao de um proprio — de uma identidade. Assim, interpretar, enquanto e como apropriar, é trazer sempre 0 interpretado para junto deste proprio (desta identidade) e, desde ou a partir deste proprio (identidade), tomar, fazer vi- ssivel, ou seja, mostrar ou fazer aparecer isso que assim se mostra ou aparece ¢ tal ‘como assim se mostra ou aparece — a-propriar, ad-proprius. Trazer ou deixar vir Para junto de um proprio e, assim, fazer com que este proprio seja lugar e hora de instauraco, de realizagao Mas que proprio este? Em questiio esti o sentido interposto; o sentido que, 1a interpretagdo ou na aparigdo (realizagdo) do que quer que seja, sempre ja se ‘nterpés, se intro-duziu ou intro-meteu. Este sentido ¢, sim, um intrometido! Em. “questo esta, pois, o sentido, a partir do qual ¢ como o qual faz-se ou acontece, ao tempo e num tinico e mesmo ato (jogo!), a interpretagiio, 0 intérprete © 0 pretado. Interpretar, enquanto e como apropriar; apropriar, enquanto © como le um proprio ou oe one (deixar) oni esea, i Sprio (0 sentido apropriador e sempre jé interpo pe ae a oie oat interposto, ou seja, que se re ane o interesse ou a perspectiva, desde o(a) qual vida se cumpre, Be ou aparece 4 ea imleqnret enquanto como apropriar, 6 agdo, 0 exereieio do dir do, de um (ou ao) proprio. Este direito, no entanto, como ja dito, no é u or regalia ou um mero privilégio por concessto sabe-se la como e por qual de fora. Nao. Como tudo que € nobre, este direito ¢ uma conquista. Conqui se faz desde e como busca (querer, vontade!). Busca, esforgo ¢ entrega ou abai 4 busca, 20 esforco e, entdo, a propria coisa, a saber, o sentido interposto, 0 oua perspectiva. Aqui, agora, seria preciso desctever € caracterizar como’ medida este direito do ou ao sentido proprio, que é a conquista do interes perspectiva que se impGe para que uma coisa yenha a ser ela mesma ¢ dé partir dela mesma (pois coisa, toda ¢ qualquer, é esta perspectiva, este este sentido ja interposto) — enfim, aqui, agora, seria preciso de: € zar como isso se faz enquanto © como escuta, uma vez que é desde e com que se faz busca e entrega a prépria busca ou A coisa mesma. E caberii € mostrar como esta escuta é obediéncia € como assim se configura e se corpo. Com esta conquista, desde € como escuta e corpo, precisa igualt transposigdo, isto é, salto para a dimensio, para 0 sentido, que perfaz a perspectiva © que fem ou é a estrutura do afeto, Enfim e em suma, refa descrever em detalhes, e assim caracterizar genealogicamente (uma. fenomenologia), em que medida 0 direito & interpretacio ou ao ii ‘conquista que se da desde busca ¢ entrega e isso desde e como escuta ¢ tran ou salto para a prépria coisa, isto é, o sentido, o interesse, a perspectivs guragtio define o que se pode denominar participagdo vital, inseredo (0 medium), que é 0 lugar e a hora de toda ¢ qualquer possivel gio — ou seja, aparig&io, mostragao. ji 9. Foi dito acima, em 8; “A medida que se tem ou se ¢ 0 direito de Preciso perguntar: e quem tem ou € este direito ~ esta razto ou fundamento interpretar? A resposta jé foi dada: este quem & aquele que conquista. E. adquirido por, desde conquista. Entio, este direito é, sim, um dom, un trazer para junto d Melhor: um dom 4 medida que ¢ um auténtico privilégio, ou seja, calm Prépria ¢ particular (privus-lex). Este particular, porém, 0 é desde e como. Assim, & pergunta “quem tem ou ¢ este dieito?”, responde-se: aquele aquele que faz, que realiza, que conquista o percurso de E isso, é importante que se diga, nao é coisa de erudito, H coma idiossincrasia do tempo, da época, dizemos: é NIETZSCHE E A INTERPRETACAO. a7 esquisador. E isso 4 medida que o pesquisador é 0 tipo da cobiga, da ansia, ide Gnsia ¢ cobi¢a, o tipo da acumulagao, da enumeragao exaustiva e, a ida que ele é isso ou este modo de ser, fica so no dado, s6 no fato, s6 no ja trado ¢ sempre siderado, obcecado no ¢ pelo rigor, melhor, no e pelo rigo- jo do objetivo ¢ isso entendido como o preciso, o exato ¢, na precistio e na itidiio do dado, do fato, do registrado, classificado ¢ catalogado como se isso oreal, a verdade. Hoje se diz ainda e melhor: tudo computado, digitalizado, isto ¢, numerado, e guardado, salvo como tal. O tipo que tem ou € 0 direito da interpretaco o ganha, 0 conquista, & medida A ousta de esforgo e busca—sim, de estudo (pesquisa?!), salta e assim transpoe- para o proprio sentido ¢ o seu fazer-se, alterar-se ou diferenciar-se. Entdo, ele icipa deste sentido ¢ nisso € por isso esta em condigdes de realizé-lo, de pro-mo- ?. Nesta promoyao do sentido est o movimento de alteragao, de diferenciagao transformagao do sentido, ou seja, a criagdo. Tal sentido persiste, perdura, se petua & medida ¢ sé A medida que se transforma, se altera, se diferencia — enfim, ese faz ou se toma criagio. A pesquisa, a pura e mera pesquisa, enquanto sé e tao sé registro, exaus- acumulagio, fixago e enumeracao de dados (isso ¢ 0 erudito), ndo da, ndo ieede este direito, esta conquista, ainda que, é preciso reconhecer, sem ela ou M 0 espirito de busca (vontade, querer, quaero) que deve marcar e pontuar toda pesquisa, tal conquista no acontece, no se dé, ndo pode se dar. A verdadeira conquista se dé por um salto, através de uma sibita ou i-mediata transposic&o (e, nto, nao através da media¢do infinita ¢ da busca do dado e do fato ou do feito ‘que ndo pode jamais ter ou deixar brecha, lacuna, a proverbial lacuna ou buraco na pesquisa) para a dimensio, isto é, para 0 sentido, 0 elemento, o medium, o qual é em si e por si mesmo fazer-se, alterar-se, transformar-se. Ele é vida. Um salto, ois, para a dimensdo (sentido) que ja se é, quer dizer, na(o) qual ja se esté, sem- J se esteve. Entao, na hora H, 0 que decide é este salto, no qual, desde o qual OU gracas (i.e., por graga, doa¢ao) ao qual, estranhamente, passa-se evidentemen- e para isso em que jA se esta, em que sempre ja se esteve; colocamo-nos nisso que Somos, ou seja, na forga, na dinamica, na vida (génese) deste préprio sentid. que, entilo, se faz auto-promociio, quer dizer, alteracao, auto-superagio, que, mais ma vez, € 0 nome e a forma da criag&io. Digamos entre parénteses, que o bom e auténtico intérprete, que no é, de modo algum, o erudito ou o pesquisador (0 es- ‘Pecialista!), é 0 criador, o apropriador, o qual também e sobretudo esquece, perde, abandona, larga, joga fora. No tempo certo se despede, perde, joga fora; no tempo Certo, na hora certa, que € a H, sabe o que larga, o que precisa largar, abandonar, squecer, perder, jogar fora, assim como 0 que € 0 quanto deve lembrar, re-tomar Te-cordando ¢ assim pro-mover. O criador, o verdadeiro intérprete (apropriador) sabe que hd bagaco, entulho, palha, joio. E isso ele joga fora, disso ele se desfaz _ Sem pruridos de culpa, de remorso, isto ¢, sem se preocupar com perdas e, igual- Mente, sem preocupagiio com reaproveitamento e reciclagem... © criador é farto, - Theio esbanjador, um pouco perduldrio, /eve. E isso é sua magnanimidade. Mas, 48 fechando paréntese e retomando, é estranho, muito estranho este destino, que 6, a cada passo, busca e conquista do que ja se , daquilo no qual estd e, assim, sempre ja se &, sempre se sera, se precisaré ser, vir a ser, a ser o que tu és. Destino, enquanto e como envio de criagao. 5 ‘Averdade é que 0 erudito, o especialista ou 0 pesquisador, nao faz. consegue, nao pode conseguir isso, a saber, esta passage, a ultra- dado e do feito, e a transposigao (salto) para 0 proprio sentido (a vida, a pois 0 seu espirito, a sua indole, quer dizer, 0 sentido ou 0 propésito que € que é busca ou a's6 busca do s6 dado, do sé feito, que ¢ o registrado, sificado, catalogado e, assim ¢ por isso, cristalizado e estereotipado como a verdade fiel, objetiva, auténtica, rigorosa, cientifica — enfim, este esp indole nao o permite, niio 0 deixa, melhor, nao Ihe concede, vetando-lhe, do-lhe um tal acesso, uma tal doacaio na conquista ¢ pela conquista. A si pesquisador € e sera sempre aquela mencionada por Descartes, com humor ¢ desprezo, em relagiio aos “aristotélicos” da época, isto €, 0s pesquisadores e especialistas da ocasitio, da hora, Segundo Descartes, so, como a hera que sobe pela rvore, pelo poste: enquanto tem at sobem; acabada a drvore, o poste, descem.’ O poste, a bengala, € de toque do pesquisador, do especialista... 10. Para encerrar, Plutarco pode nos servir de exemplo de como v interpretar. Ocasitio para isso encontramos em Vidas Paralelas, na Vidas de Alexandre e de César. O texto diz: ‘Tendo-se proposto escrever neste livro a vida de Alexandre ea de Cé ‘venceu Pompeu, pelo grande niimero de feitos de um de outro, € rogamos aos leitores uma s6 coisa, qual seja, que se no (08 feitos, nem sequer nos detemos com demasiada prolixidade en {dos mais celebrados, mas que cortamos, suprimimos uma grande Fos censurem @ nem reprovem por isso. Porque ndo ‘mas vidas; nem € nas ages mais ruidosas que se manifestam a vicio, mas muitas vezes o acontecimento de um momento, um d uma ninharia servem mais para pimar um cardter do que bata morrem milhares de homens, ou cercos a cidades, nos quais meron extra, Porta assin como 0s pintores, para retratar, emelhancas do rosto ¢ aquelas feigbes ‘mais © caniter, considerando mht SAGaOD HSB

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