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AS TEORIAS DA EDUCACAO E 0 PROBLEMA DA 1. O PROBLEMA: ‘Dee acordo com estimatives relativas a 1970, “‘cer- 2-de-50% dos alunos das escolas primériae-desortavam re a otencial na maioria dos paises da Amérios Latina" (Te- desco, 1981, pag. 67). Isto sem se levar em conta o con- tingente de’criangas em idade escolar que sequer tém acesso a escola e que, portanto, jé se encontram "a prio- ri" marginalizadas dela. simples dado cies indicado lence da iene “em noss0s rostos ¢ realidade da marginalidade relative: tment 20 fnomeno do eseoariatio. Como interpreter esse dado? Como explicé-lo? Como as teorias da educa- ‘Gao se posicionam diante dessa situagSo? Grosso modo, podemos dizer que, no que diz res- peito A questio da m: ce, as teorias educacionais podem ser classificadas em dois grupos. ‘Num primeiro grupo, temos aquelas teorias que en- tendem ser a educacdo um instrumento de equalizacdo social, portanto, de superagio da marginelidade. ‘Num segundo grupo, estdo as teorias que enten: dem ser a educagdo um instrumento de discriminagio social, logo, um fator de marginalizagéo. (Ora, percebe'se facilmente que ambos os grupos explicam @ questo de marginalidade a partir de determ nada maneira de entender as relages entre educacdo e sociedade. Assim, para o primeiro grupo a sociedade é cconcebids como essencialmente harmoniosa, tendendo & integragdo de seus membros. A marginalidade é, pois, um fendmeno acidental que afeta individualmente 2 um nd- ‘mero maior ou menor de seus membros o que, no entar: 10, constitui um desvio, uma distorgZ0 que nfo s6 pode como deve ser corrigida. A educaco emerge af, como tum instrumento de corrago destas distoredes. Constitu pois, uma forca homogeneizadora que tem por fun¢do reforgar os lagos sociais, promaver a coeséo e garantir a integragao de todos os individuos no corpo social. Sua fungG0 coincide, pois, no limite, com a superagio do fendmeno da marginalidade. Enquanto esta ainda existe, dover se intensificar os esforeos educativos; quando for superade, cumpre manter os servigas educativos num nf- vel pelo menos suficiente para impedir 0 reaparecimento ‘do problema da marginalidade. Como se vé, no que res- peita as relages entre educacgo e sociedade, concebe-se “Da Pontificia Universidade Catélica de Sio Paulo ~ BRASIL. 8 Dermeval Saviani” 12 educago com uma ampla margem de autonomia em face da sociedade. Tanto que Ihe cabe um pape! decisivo na conformacao da sociedade evitando sua desagregacio @, mais do que isso, garantindo a construdo de uma so- cciedade igualitria ‘Jé 0 segundo grupo de teorias concebe a sociedade ‘como sendo essencialmente marcada pela diviso entre grupos ou classes antagénicos que se relacionam a base da forca, a qual se manifesta fundamentalmente nas con- digdes ‘de produgo da vida material. Nesse quadro, @ marginalidade ¢ entendida como um fenomeno inerente 4 propria estrutura da sociedade. Isto porque 0 grupo ou classe que detém maior forca se converte em dominante ‘se apropriando dos resultados da produgSo social tenden- do, em conseqiiéncia, a relegar os demais & condi¢go de ‘marginalizados. Nesse contexto, a educacio & entendida ‘como inteiramente dependente da estrutura social gera- dora de marginalidade, cumprindo af a fungdo de refor- ‘gar a dominagdo e legitimar a marginalizagdo. Nesse sen- ido, a educacdo, longe de ser um instrumento de supera lo da marginalidade, se converte num fator de margina lizaglo jé que sua forma especifica de reproduzir a mar- ginalidade social é a produgéo da marginalidade cultural , especificamente, escolar. Tomando como critério de criticidade a percepcdo dos condicionantes objetivos, denominarei as teorias do primeiro grupo de “teorias ndo-erivicas"* jé que encaram sducagio como: : tir dela_mest empenham em co Preender_a.educacio.remetendo-a sempre_a seus.condi- cionantes objetivos, isto é, aos determinantes socias, vale dizer, a estrutura s6cio-econdmica que condiciona a for- ma de manifestaco do fenémeno educativo. Como, po- rém, entendem que a funcdo basica da educagdo é a re- produgio da sociedade, sero por mim denominadas de “tworiae-crftico-reprodutivistas”. 2. AS TEORIAS NAO.CRITICAS 2.1, A pedagogia tradicional A constituicso dos chamados “sistemas nacionais de ensino” data de inicios do século passado. Sua or- ‘ganiza¢o inspirou-se no prinefpio de que a educacio 6. direito de todas e dever do.Fstada. O direito de todos 3 ‘educagio decorria do tipo de sociedade correspondente 20s interesses da nova classe que se consolidara no poder: Cad. Pesq. So Paulo (42): 8-18, Agosto 1982 MARGINALIDADE NA AMERICA LATINA @ burguesia, Tratava-se, pois, de construir uma sociedade democrética, de consolidar a democracia burguesa. Para superar 0, prépria do “Anti -Aluos, era_necessério_vencer 9 barreira da ignortncia. S6 assim seria possivel transformar os stiditos em cidadgos, isto €, em individuos livres porque esclarecidos, ilustra- dos Como realizar essa tarefa? Através do ensino. A escola é erigida, pois, no grande instrumento para con- verter os siditos em cidados, “redimindo os homens de seu duplo pecado histérico: a ignorancia, miséria moral e ‘a opresséo, miséria politica” (Zanotti, 1972, pp. 22-23). Nesse-quiadro,- cause-de-marginalidade 6 identifi “doto a ignoréncia, logo, uum instrumento para equecionar ©. problema da marginalidade. Seu papel fundir a ins- tmugdo, transmitir os conhecimentos acumulados. pela hhumanidade e sistemetizados logicamente. ©. mestre- escola serd 0 artifice dessa grande obra, escola se org _niza, pois, como uma agéncia-centrada-no-professor,-o cultural aos-alungs. A estes cabe eisimilar ot conheci tmentos que thes sBo transmitides. A teoria pedagégica acima indicada correspondia determinada mat de organizar a escola. Como as ini- ciativas cablam a0 profesor, o essencal ere contar com tum professor razoavelmente bem preparado, Assim, a5 tescolaseram organizadas na forma de classes, coda uma contando com um professor que expunha as ligdes que o alunos seguiam atentamente e aplicava os exercicios que os. alunce “deveriam realizar” discilinadamente {Ao entuslasma dos. primeiros tempos susitado pelo tipo de escola acima desrito de forma simpliicad, sucedeu progressivamente uma crescente decepeio. Are to de universaliza m i - mo-o2- que ingrosavom nem-sempro-cram-bomsucedidet) ainda teve de curvarse ante 0 fato de que nem todos os. bem sucedidos se ajustavam ao tipo de sociedade que se queria consolidar. Comecaram, entéo, a se avolumar as criticas a essa teoria da educacdo e a essa escola que passa a ser chamada de escola tradicional. 2.2. A pedagogia nova AS criticas & pedagogia tradicional formuladas a partir do final do século passado foram, aos poucos, dando origem a uma outra teoria da educagio. Esta teorla mantinha a crenga no poder da escola e em sua fungo de equalizacao social. 7 5. Sea escola ngo vinha cumprindo essa funcéo, tal fato se de- via @ que 0 tipo de escola implantado — a escola tradi cionat — se revelara inadequado. Toma corpo, entéo, urn amplo movimento de reforma cuja expressio mais tipica tu conhecida sob o-nome de “escolanovismo”, Tal movimento tom somo ponte-de partida a ercols tradicio- ‘na teoria da eduea¢go que ficou conhecida como peda: gogia tradicional. A pedagogia nova comers, pois, por efetuar a critica da pedagogia tradicional, esbogando ‘uma nova maneira de interpretar a educacdo e ensaiando implantéla, primeiro, através de experiéncias restritas; depois, advogando sua generalized no 4mbito dos sis- temas escolares. Segue vt.nqe teoia,« marina ica ser-vista predominantemente s00 0 Angulo da ignorancia, conheci inaliza- i ‘ignorante, mas o rei esti. integrado jo, mas ‘quando se sente aceito pelo grupo e, através dele, pela sociedade em seu conjunto. E interessante notar que al- ‘guns dos principais representantes da pedagogia nova se converteram & pedagogia a partir da preocupacao com os “anormais” (ver, por exemplo, Decroly e Montessori). A partir das experiéncias levadas a efeito com criangas “anormais” & que se pretendeu generalizar procedi- As teorias da educacao e o problema da marginalidade na América Latina 9 mentos pedagégicos pera o conjunto do sistema escolar. Notase. entdo, uma_espécie de bio-psicologizacdo_da -tociedade, da educacio.e da_escola. Ao conceito de “anormalidade biolégica” construido a partir da consta- tacdo de deficiéncias neuro-fisiologicas se acrescenta 0 conceito de “anormalidade psiquica” detectada através dos tres de ineignca, oe partonaticede, ete. aut no se repetem; cada indi - Portanto, a mar inalidade no pode ser explicada pelas diferencas entre (5 homens, quaisquer que elas sejam: nfo apenas diferen- 625 de cor, de raca, de credo ou de classe, o que ja era defendido pela pedagogia tradicional; mas também dife- rengas no dominio do conhecimento, na participaco do saber, no desempenho cognitivo. Marginalizados so os “anormais™, isto 6, 0s dessjustados e desadaptedos de todos os matizes. Mas a “anormalidade” no é algo, em si, negativo; ela 6, simplesmente, uma diferenca. Portan- +0, podemos concluir, ainda que isto soe paradoxal, que 2 anormalidade 6 um fendmeno normal. No 6, pois, su- ficiente para caracterizar a marginalidade. Esta esté mar- cada pela desadaptacdo ou desajustamento, fendmenos associados a0 sentimento de rejei¢do.-A_educarin, en- _mento de correcdo da-marginalidade.na-medids-om que cumprir a funedo-de ajustar, de adaptar.os individuos. 8 -sociedade,ineutindo nelee 0 sentimento-de aceitaro dor. -demais.e pelos demais, Portanto, a educagdo serd um ins trumento de corrego da marginalidade na medida em ‘que contribuir para a constituigdo de uma sociedade cu- jos membros, ngo importam as diferencas de quaisquer tipos, se aceitem mutuamente e se respeitern ne sua indi vidualidade especifica Compreende-se, entdo, que essa maneira de enten- der a educagio, por referéncia & pedagogia tradicional | tenha deslocado 0 eixo da questo pedagogice do intelec: | to para o sentimento; do aspecto léaico para o psicol6- ‘ico; dos conteiidos cognitivos para os métodos ou pro: cessos pedagégicos; do professor para o aluno; do estor- 60 para o interesse: da disciplina para a espontaneidad: do dirctivismo para o nfo-diretivismo; da quantidade para a qualidade; de uma pedagogta de inspiraco filoso fica centrads na ciéncia da légica para uma pedagogia de inspirago experimental baseada principalmente nas con- ‘cibuigdes da biologia e da psicologia. Em suma, trata-se de uma teorla pedagdgica que considera que o importa te ndo é aprender, mas aprender a aprender. Para funcionar de acordo com a concepeéo acima exposta, obviamente a organizagdo escolar teria que ppassar por uma sensivel reformulagdo. Assim, em lugar de classes confiadas @ professores que dominavam as ‘grandes éreas do conhecimento revelando-se capazes de ‘colocar os alunos em contato com os grandes textos que eram tomados como modelos a serem imitados ¢ pro- ‘ressivamente assimitados pelos alunos, a escola deve agrupar 0s alunos segundo areas de interesses decorrentes de sua atividade livre. O.profercor agiria. como.uum esti- smilador-c-orientador_da_aprendizagenr euja-inicativa 10 .,slasse dominante’ seria uma decorréncia espontinea do ambiente estimu- lante e da relago viva que se estabeleceria entre os alu- ‘os e entre estes e o professor. Para tanto, cada professor teria de trabalhar com pequenos grupos de alunos, sem (© que a relagéo inter-pessoal, esséncia da atividade edu: cativa, ficaria dificultada; e num ambiente estimulante, Portanto, dotado de materiais didéticos ricos, biblioteca de classe, etc. Em suma, a fei¢do das escolas mudaria seu aspecto sombrio, disciplinado, silencioso © de paredes ‘opacas, assumindo um ar alegre, movimentado, baruthen- to @ multicolorido. © tipo de escola acima descrito nd conseguiu, ‘entretanto, alterar signiticativamente 0 panorama orga- nizacional ‘dos sistemas escolares. Isto porque, além de outras raz6es, implicava em custos bem mais elevados do que a escola tradicional. Com isto, a “Escola Nova" orga nizouse basicamente na forma de escoles experimentais, ‘ou como nicleos raros, muito bem equipados e circuns- ‘eritos a pequenos grupos de elite. No entanto, 0 idedrio escolanovista, tendo sido amplamente difundido, pene- ‘trou nas cabegas dos educadores acabando por gerar con- seqiiéncias também nas amplas tedes escolares oficiai organizadas na forma tradicional. Cumpre assinalar que tais conseqaéncias foram mais negativas que positivas ‘uma vez que, provocando 0 afrouxamentagda disci fe a despreocupacio com a transmisséo .conhecimen- tos, acabou por rebaixer o nivel do ensino ‘destinado as camadas populares as quais muito freqdentemente tém ‘na escola 0 Gnico meio de acesso ao conhecimento elabo- rado. Em contrapartide, a “Escola Nova” aprimorou a qualidade do ensino destinados as elites. \Véeee, pois, que paradoxalmente, em_lugar-dere- solver o problema da m: Nova'' © “agravou. Com efeito, a0 enfetizar a "qualidade do ens 10”, ela deslocou o eixo de preocupacdo do émbito po- litico (relativo & sociedade em seu conjunto) para o Ambito técnico-pedagégico (relativo ao interior da esco: la), cumprindo 20 mesmo tempo uma dupla fungdo: man- ter a expansio de escola em limites suportéveis pelos in- teresses dominantes e deserwolver um tipo de ensino ade quado a esses interesses. E a esse fendmeno que denomi- nei de “mecanismo de recomposigéo da hegemonia da (Saviani, 1980) ¢ que explicitet me Ihor em outro texto (Saviani, 1981). jnalar Lda “E: 2 “ma descrito_se-manifestou mais nitidsmente-ro-caso-de ‘América Latina, Em verdade, na maioria dos paises dessa regido os sistemas de ensino comegaram a assumir feigdo ‘mais nitida jé no século atual, quando o escolanovismo estava largamente dissominado na Europa e principal mente nos Estados Unidos, no deixando, em conseqiién- cia, de influenciar o pensamento pedagégico latino-am: ricano. Portanto, a disseminacdo das escolas efetuada se- sgundo 0s moldes tradicionais néo deixou de ser de algu- ma forma perturbada pela propagacio do idedrio da pedagogia nova, jé que esse ideério ao mesmo tempo que procurava evidenciar as “deficiéncias” da escola tradicio- nal, dava forga 8 idéia segundo a qual é melhor uma boa escola para poucos do que uma escola deficiente para muitos. Cad. Pesq. (42) Agosto 1982 2.3. A pedagogia tecnicista Ao findar a primeira metade do século atual, 0 es- colanovismo apresentava sinais visiveis de exausto. As esperancas depositadas na reforma da escola resultaram frustradas. Um sentimento de desilusio comecava a se alastrar nos meios educacionais. A pedagogia nova, tnehne Tempo que se tomas dotaneste ements so ‘capeio.tedrica-2-tal ponto que se tornou senso eomuno tendimento 2 nove é dora nenhum vicio, ‘que_a_pedagogia-tradicianal é portadora de todos os-vi- 1m virtude, 1 estdo nalidade, Assim, de um lado surgiam tentativas de deserwolver uma espécie de "Esco: la Nova Popular”, cujos exemplos mais significativos so 5 pedagosias de Freinet © de Paulo Freire: de outro lado, radicalizava-se a preocupacao com os métodos pe- dagigicos presente no escolanavismo que acabe por de sembocar na eficiéncia instrumental. Articula-se aqui um uma nova teoria educscional: a pedagogia tecnicista, ‘A partir do pressuposto da neutralidade cienttfica € inspirada nos prineipios ée racionalidade, eficiéncia e rodutividade, essa pedagogia advoge 2 reordenacio do rocesso educstivo de maneira a torné-lo objetivo © ope: racional. De modo semelhante ao que ocorreu ro traba- Iho fabril, pretende-se a objetivacdo do trabalho pedagd- gico. Com efeito, se no artesanato o trabalho era subjeti- Vo, isto 6, 08 instrumentos de trabalho eram dispostos fem funeS0 do trabalhador e este dispunha deles segundo seus desfgnios, na produezo fabril essa relapSo ¢ invert- da, Aqui 60 trabalhador que deve se edaptar a0 processo Ge trabalho, jé que este foi objetivado e orgenizado na forma parcelade. Nessas condi¢Ses, 0 trabalhador ocupa s0u posto na linha de montagem e executa determinada parcela do trabalho necessério para produzir determina- dos objetos. 0 produto 6, pois, uma decorréncia da forma como € organizado 0 processo. concurso das agGes de diferentes sujeitos produz assim um resultado com © qual nenhum dos sujeitos se identifica e que, a0 contrério, Ihes¢ estranho. 0 fendmeno acima mencionado nos ajuda a enten der a tendéncia que £0 esbogou com o advento dan ‘que estou chamando de “pedagogia tecnicsta”. Buscou- se planejar a educacéo de modo a dotéla de uma orga gio racional capaz de minimizar as interferéncies subjtivas que pudessem por em risco sua eficiénc’ Para tanto, era mister operacionalizar 08 objetivos e, pelo menos em certos aspectos, mecanizar 0 processo. Dai, a proliferac3o de propostas pedagdgicas tais como o enfo- ue sistémico, © micro-ensino, o tele-ensino, 9 instrueo programada, as méquinas de ensinar, etc.. Daf, também, © parcelamento do trabalho pedagdgico com a especial. ago de funcdes, postulando-se a introdugdo no sistema de ensino de técnicos dos mais diferentes matizes. Dai, enfim, a padronizagio do sitema de ensino a partir de esquemas de planejamento previamente formulados aos ‘uals devem se ajustar as diferentes modalidades de dis- ciplinas e praticas pedagbgicas. ‘Se na pedagogia tradicional a iniciativa cabia 20 professor que era, a0 mesmo tempo, o sujeito do proces- 0, 0 elemento decisiva e decisério; se na pedagogia nova 4 iniciativa desloca-se para o aluno, situando-se o nervo da ago educativa na relacéo professor aluno, portanto, relagdo inter-pessoal, inter-subjetiva — na pedagogia tec- nicista, o elemento principal passa a ser a organizacéo racional dos meios, ocupando professor e aluno posico secundaria, relegados que so 4 condicdo de executores de um processo cuja concep¢io, planejamento, coorde- nagdo e controle ficam a cargo de especialistas suposta- mente habilitados, neutros, objetivos, imparciais. A orga- nizacdo do processo converte-se na garantia da eficiéncia, compensando e corrigindo as deticitncias do professor e maximizando of efeitos de sua intervengo. ‘Cumpre notar que, embora @ pedagogia nova tam- bém dé grande importéncia aos meios, hd, porém, uma diferenga fundamental: enquanto na pedagogia nove os eios s80 dispostos ¢ estéo 4 disposigdo de relacéo pro- fessor-aluno, estando, pois, a servigo dessa relacdo, na pedagogia tecnicista ‘a situagéo se inverte. Enquanto na pedagosia nova so 0s professores¢ alunos que deci ddem se utilizam ou no determinados meios, bem como quando e como o fare, ja tecnicists dirseia m im quan Compreende-e, entéo, ave para a pedagogia tecni- -cista_a marginalidade no seré identificada com a igno- ‘jeigdo. Marginalizado-seré-o incompetente (no sentido ‘técnico da palavra), isto 6, 9 ineficiente.e improdutive, A. educaggo ester contribuindo para superar o problema da marginalidade na. medida em que formar individuos eficientes, portanto, capazes de darem sua parcela de contribuiggo para o aumento da produtividade da so- ciedade, Assim, estard ela cumprindo sua funcéo de equalizagio social, Neste contexto teérico, @ equalize: éo social é identiticada com 0 equilfbrio do sistema (no sentido do enfoque sistémico). A_marginalidade. isto 6, 2 inoficiéncia.¢improdutividade se constitu numa-amea 98-4 estabilidade do sistema. Como o sistema comporta miltiplas fungSes, as quais correspondem determinadas ocupagées; como essas diferentes fungdes so interde- Pendentes, de tal modo que a ineficiéncia no desempe- nho de uma delas afeta as demais e, em conseqiiéncia, todo o sistema — cabe 4 educagdo proporcionar um efi- ciente treinamento para a execueéo das multiples tarefas demandadas continuamente pelo sistema social, A edu: cagdo seré concebida, pois, como um sub-sistema, cujo funcionamento eficiente é essencial 20 equilfbrio do sis ‘tema social de que faz parte. Sua base de sustentacdo tebrica desloca-se para a psicolagia behaviorista, a enge- nharia comportamental, a ergonomia, informétice,ciber- nética, que tém em comum a inspiragio filos6tica neo positivsta e © método funcionalista. Do ponto de vista edagégico conclui-se, pois, que se para pedagogia tra- icional a.quest#o central 6 aprender e para a pedagogia for, para a que importa é aprender e fazer. A tworia pedagdgica acima exposta corresponde ‘uma reorganizaglo das escolas que passam por um cres- conte processo de burocratizagio. Com efeito, acredita va-te que o processo se racionalizava na medida em que se agise planificadamente. Para tanto, era mister baixar instrugBes minuciosas de como proveder com vistas @ As teorias da educagéo e 0 problema da marginalidade na América Latina " que 06 diferentes agentes cumprissem cada qual as tare- ‘fas especiicas acometidas a cada um no amplo espectro ‘em que se fragmentou 0 ato pedagégico. O controle seri feito basicamente através do preenchimento de formulé- -gativas. Na verdade, a pedagosia tecnicista, 20 ensaiar ‘transpor para a escola a forma de funcionamento do sis- tema fabril, perdou de visto @ especificidade da educacdo, Jgnorando que a articulago entre escola ¢ processo pro- dlutivo se dé de modo indireto e através de complexes tmediagdes. Além do mais, na prética educativa, a orien taco tecnicista se cruzou com as condicées tradicionais predominantes nas escolas bem como com 2 influtneia dda pedagogia nova que exerceu poderoso atrativo sobre os educadores, Necsas condigSes, 2-pedagogia tecnicista acabou_por_contribuir para aumentar 0 ca0s no campo _ educative gerando tal nivel de descontinuidade, de hete- “rogeneidadee de fragmentara, quo-praticamente inva: -biliza~o~trabaitro-pedagégico. Com isto o problema da marginalidade s6 tendeu a se agravar: 0 conteddo do en: sino tornousse ainda mais rarefeitoe a relativa ampliacéo, {das vagas se tornou irvelevante em face dos altos indices de evasdo e repeténcia. ‘A situagio acim descrita afetou partioularmente 9 ‘América Latina jd que desviou das atividedes-tim para as, atvidades-meio parcela considerdvel dos recursos sabida- mente escassos destinados & educacéo. Por outro lado sa bbe-se que boa parte dos programas internacionais de im- plantacio de tecnolagias de ensino nesses paises tinham por detrés outros interesses como, por exemplo, a vende de artefatos tecnolégicos obsoletos aos paises sub-desen- volvidos (CF. Mattelart, 1976 e s/d.). 3. AS TEORIAS CRITICO-REPRODUTIVISTAS Como ja assinalei, o primeiro grupo de teorias con- cebe a marginalidede como um desvio, tendo a educapo Por funcdo a correcdo desse desvio. A marginalidade ¢_ -ratio,capacitada_a_intervir_eficazmente_na sociedade, formando’, tornando-a 7 ~justigas; em suma, promovendo a equalizacéo social. Essas teorias consideram, pois, apenas a ago da educa: co sobre a sociedade. Porque desconhecem as deter nagdes sociais do fendmeno educativo eu es denominei de “teorias nfo-criticas”. Inversamente, 28 teorias do se- undo grupo — que passerei a examinar ~ so criticas, ‘uma vez que postulam nio ser possivel compreender a / educagdo sendo a partir dos seus condicionantes sociais. “HG, pois, nessas teorias uma cabal percep¢do da depen-~ déncia da educa¢do em relacdo a sociedade. Entretanto, como na andlise que desenvolvem chegam invarivel- mente & conclusdo de que a fungio propria da educacdo consiste na reproducdo da sociedade em que ela se inse- te, bem merecem a denominag3o de “teorias critico-re- produtivista”. Tais teorias contam com um razodvel ni- mero de representantes e se manifestam em diferentes versdes. Hé, por exomplo, os chamados “radicais ameri canos” cujos principais representantes sdo Bowles e Gin- 12 tis, através do livro “Schooling in Capitalist Americ (1976) que podem ser classificados nesse grupo de teo- rias. Tais autores consideram que a escola tinha, nas ori “Sle se tomna-cade-vor mals dcriminadora'e Tepes” Em que pesem as diferentes manifestacdes, consi- dero que, no ambito desse grupo, as teorias que maior repercussio tiveram e que alcangaram um maior nivel de boracdo so as sequintes: ©) “teoria da escola dualista”. A seguir comentarei brevemente cada uma delas 3.1, Teoria do sistema de ensino enquanto violéncia simbética Esta teoria esté desenvolvida na obra “A Reprodu- io: elementos para uma teoria do sistema de ensino”, de P. Bourdieu e J.C. Passeron (1975). A obra é consti- tuida de dois livros. No Livro I, fundamentos de uma teoria_da_violéncia simbélica, a teoria é sistematizada num corpo de proposicdes logicamente articuladas segundo um esquema analitico-dedutivo. O Livro Il ex Ge os resultados de uma pesquisa empirica levads a ca- bo pelos autores no sistema escolar francés em um de seus segmentos, qual seja, @ Faculdade de Letras. Como as anélises do Livro IN podem ser consideradas como apli- cages a um caso historicamente determinado dos princ: pias gerais enunciados no Livro I, ainda que tenham ser- vido, a0 mesmo tempo, como ponto de partida para a construgio dos principios do Livro 1, minha exposigao se limitaré a0 contedido do Livro |. arcabouco do Livro | constitui, mais do que uma sociologia da educacio, uma sécio-légica da educagdo. Isto porque no se trata de uma andlise da educacio ‘como fato social, mas da explicitagao das condigées logi- cas de possibilidade de toda e qualquer educaglo para Yoda e qualquer sociedade de toda e qualquer época ou lugar. Trata-se de uma teoria axiomdtica que se desdobra dedutivamente dos principios universais para os enunt dos analiticos de suas conseqiiéncias particulares. Por isso, cada grupo de proposigées comeca sempre por um enunciado universal (todo poder de violéncia simbéli- a.., toda aco pedagégica..., etc.) ¢ termina por uma aplicaggo particular, expressa através da formula “uma formaeao social determinada...”. Por outro lado, no in- tuito de preservar a validade universal da teoria, 0s auto- res tém 0 cuidado de utilizar sempre a expresso “grupos ou classes", jamais se referindo apenas as classes simples- mente; 0 que indica que a validade da teoria nio preten- de se circunscrever apenas as sociedades de clases mas se estende também as sociedades sem classes que porventu- ra tenham existido ou venham a existir. Em suma, 0 axioma fundamental (proposi¢go zero}, que enunci Cad. Pesq. (42) Agosto 1982 teoria geral da violéncia simbélica, se aplice ao sistema de ensino que & definido, pois, como uma modalidade specifica de violéncia simbilica (proposigses de grau 4) através de proposigdes intermediérias que tratam, suces- mente, da ago pedagdgica (proposi¢des de grau 1), da autoridade pedagégica (proposicies de grau 2) e do trabalho pedagégico {proposigaes de grau 3). violencia simbél wtores tor to de partida que toda e qual -estrutura-se como um sistema de relacies de forca mate- —tial entre grupos ou. classes. Sobre a base da forca mate- ges de forca simbélica cujo papel ¢ reforcar, por dss 0, a8 relactes def ‘tral contida_no_axinma fundamental da-teoria- Sendo -vejamas. seu-snunciado: “Todo poder de violéncia simbélice, isto é, todo poder que chega @ impor significacdes e a imp@-las como legltimas, dissimulando as relacdes de forca que estdo nna base de sua forea, acrescenta sua propria forca, isto 6, propriamente simbélica, a essa relagSes de forca” [Bour- diew-Passeron, 1975, pig. 19) Ve-se, pois, que o reforcamento da violéncia mate rial se dé pela sua convers8o ao plano simbélico onde se Produz e rearoduz o reconhecimento da dominacio e de sua legitimidade pelo desconhecimento (dissimulacéo) de seu cardter de violéncia explicita, Assim. a violéncia jal (dominardo econd 08 ou classes dominantes sobre_os grupos ou classes-doming- ral, -A violencia simbolica se manifesta de miitiplas format: formato de opinio ilica nants a sei _giosa:.a_atividade artistica e litecéria; a propaganda e a ‘madi a ecuearn familiar, etc_No entanto, na obra em questéo, 0 objetivo de Bourdieu e Passeron ¢ a aco edagégica institucionalizada, isto 6, 0 sistema escolar Dai, 0 subtitulo da obra: “elementos para uma teoria do sistema de ensino". Para isso, partindo, como jé disse, da teoria geral da violéncia simbolica, buscam explicitar a apdo pedagdgica (AP) como imposicio arbitraria de cultura {também arbitréria) dos grupos ou classes domi nantes aos grupos ou classes dominados. Essa imposicf0, ara se exercer, implica necessariamente a autoridade Pedagdgica (AUP), isto &, um “poder arbitrério de impo: sigdo que, 86 pelo fato de ser desconhecido como tal, se fencontra ‘objetivamente reconhecido como autoridade legitima” (Ibidem, Proposic&o 2.1., pag. 27). A referida cdo pedagégica (AP) que se exerce através da autorida dde podagéaica (AuP) se realiza através do Trabalho Peda 96g/c0 (TP) entendido “como trabalho de ineuleagio ‘que deve durar 0 bastante para produzir uma formago duravel; isto é, um habitus como produto da interiori- aco dos princfpios de um arbitrério cultural capaz de Perpetuar-se aps a cessacdo da aco pedagdgica (AP) e Por isso de perpetuar nas préticas os principios do ar trério interiorizado" (Ibidem, Proposicio 3, pag. 44). Para a compreensio do sistema de ensino é de fun- damental impor ico (TP) primério (educaeso familiar) ¢ trabalho peda- ‘gogico secundério, cuja forma institucionalizada ¢ 0 trabalho escolar (TE). Como os autores indicam no colio” da proposicéo 1 (cdg. 20), “reservou'se a seu mo: mento légico (proposicées de grau 4) a especiticago des formas e dos efeitos de uma Acéo Pedagogica (AP) que se exerce no quadro de uma instituigéo escolar; é so- mente 1a Gltima proposicgo (4.3.) que se encontra carac- terizade expressamente 9 AP escolar que reproduz a cul ‘ura dominante, contribuindo desse modo para reprodu- Zir a estrutura das relagdes de forca, numa formario social onde o sistema de ensino dominante tende a asse- Gurer-se do monopélio da violéncia simbélica legitima’” (Ibidem, pp. 20-21). A proposigéo 4.3. sintetiza, pois, de modo exaustivo, 0 conjunto de teoria do sistema de ens- no enquanto violencia simbdlica. Vale @ pena, entéo, apesar de sua extensdo, transcrevéla integralmente: “"Numa formagdo social determinada, © SE domi- rnante pode constituir 0 TP dominante como TE sem que (8 que 0 exercem como os que a ele se submetem cessem de desconhecer sua dependéncia relativa as relagBes de forca constitutivas da formaeio social em que ele se exorce, porque (1) ele produz e reproduz, pelos meios proprios da instituigdo, as condi¢ées necessérias ao exer- Cicio de sua fungdo interna de inculcagdo, que sf 20 ‘mesmo tempo as condides suficientes da realizario de sua fungio externa de reprodugéo da cultura legitima e de sua contribuicdo correlativa a reproducso das relagtes, de forea; © porque (2), $5 pelo fato de que existe e sub- siste como instituigdo, ele implica as condigées institu cionais do desconhecimento da violéncia simbdlica que exerce, isto €, porque os meios institucionais dos quais dispde enquanto instituigso relativamente auténoma, detentora do monopélio do exercicio legitimo da vio- léncia simbdlica, estdo predispostos a servir também, sob a aparéncie da neutralidade, os grupos ou classes dos uals ele reproduz o arbitrério cultural (dependéncia pela independéncia)”(Ibidem, pég. 78). Portanto, a teoria no deixa margem a dtvidas. A fungdo da educagéo & a de reproducio das desigualdades, sociais. Pela reproducdo cultural, ela contribui especifice mente para a reproducdo social Como interpretar, nesse quadro, o fenémeno da rmarginalidade? mara soci sorque no possuem forca material (capital econdmici ‘© marginaliza suem for- ‘ca simbolica (capital cultural), E a educacio, longe-de ser _um_fator de supera¢io.de-marginalidede,-constitut unr -alamento reforcador.da.mesme, Eis a fungio logicamente necesséria da educacéo. Nao hd, pois, outra alternativa, Toda tentativa de utilizé- la como instrumento de superagdo da marginalidade no apenas uma ilusdo. E a forma através da qual ela dissi- mula, por isso cumpre eficazmente, a sua fungi de marginalizacio. Todos os esforcos, ainda que oriundos dos grupos ou classes dominados, reverte sempre no re- forgamento dos interesses dominantes. “E pela mediagao dese efeito de dominacdo da AP dominante que as dife- rentes AP que se exercem nos diferentes grupos ou classes colaboram obje- vamente @ indiretamente na dominago das classes dominantes (inculeagio elas AP dominadas de conhecimentos ou de maneiras, dos As teorias da educagéo e 0 problema da marginalidade na América Latina 13 quais a AP dominante define o valor sobre o mercado econémico ou simbdlico)” (Ibidem, pag. 22). Eis porque, Snyders resumiu sua critica a essa teoria na seguinte frase: “Bourdieu-Passeron ou a luta de classes impossi- vel” (Snyders, 197, pag. 287). 3.2, Teoria da escola enquanto aparetho ideologico de Estado (AIE) ‘Ao analisar a reprodugo das condigées de produ- $0 que implica a reproducio das forcas produtivas & das relagdes de producdo existentes, Althusser é levado a distinguir no Estado, os Aparelhos Repressivos de Es- tado (0 Governo, 2 Administracdo, o Exército, a Poll it 3 PrisGes, etc.) e os Aparethos Ideol6- sgicos de Estado (AIE) que ele enumera, provisoriamente, da seguinte forma: “= 0 AIE religioso (o sistema das diferentes igre = lar (0 sistema das diferentes e pilblicas ¢ particulares), =OAIE familiar, = OAIE juridico, = iti (o sisterna politico de que parte os diferentes partidos), —OAIE sindical, =0 AIE da informacao {imprensa, rédio-televisio, 8c, las Artes, des =.0_AIE cultural (Letras, Relas Artes, desportot,~ etc)" (Althusser, s/d., pp. 434 fe arn retho Repressivo _pela violéncia e secundariamente pola ideologis-enquanto~ que, inversamente, os Aparelhos Ideol funcionam_massivamente . ‘mente pela repressio (Cf. pp-46-47). O conceito “Apa- relho Ideoldgico de Estado” deriva da tese segundo a qual “a ideologia tem uma existéncia material” (Ibidem, pig. 83). Isto significa dizer que a ideologia existe sempre radicada em préticas materials reguladas por +i tuais materiais definidos por instituigées materiais (Cf. pp. 88-89). Em suma, a ideologia se materializa em apa: relhos: 0s aparelhos ideolégicos de Estado. , yentos conceituais, Al 4 avanca @ tese sequni "4 ji “Fstade.que fol-colocado-em posiciio dominante nas for- \, 0 | Ideolégico e-Estado-dominante, &.0-\parelhe-tdeotégi- co Escolar" (Ihidem, pig. 60). Como AIE dominante, vale dizer que 2 escola cconstitui o instrumento mais acabado de reprodugio das relacdes de producio de tipo capitalista. Para isso ela to- ima a si todas as criancas de todas as classes sociais ¢ hes inculea durante anos a fio de audiéncia obrigatoria “'se- bres préticos” envolvidos na ideologia dominante (Cr. pag. 64). Uma grande parte (operérios e camponeses) cumpre a escolaridade bésica e é introduzida no processo produtivo. Outros avancam no processo de escolar 0 mas acabam por 14 (08 quadros_médios, os “pequeno-burgueses de toda espécie” (Cf. pag. 65). Uma pequena parte, enfim, atinge © vértice da pirdmide escolar. Estes vlo ocupar os postos réprios dos “agentes da explorago” (no sistema produ vo), dos “agentes da repressdo” (nos Aparelhos Repres- sivos de Estado) e dos “‘profissionais da ideologia”” (nos Aparelhos Ideolégicos de Estado) (Cr. pég. 65). Em to: os 0 casos, tata.se ce reprodu a lan de oxpo- _racdo.cavitalista. Nas palavras de Althusser: "6 através da aprendizagem de alguns saberes préticos (savoir-faire) en- _wolvidos.na inculcaefo massiva.da ideologia da classe do- minante, que séo em grande parte reproduzidas as rel2- J duce formacio social capitalista, isto 6, as relagées de explorados com exploradores e de ‘exploradores com explorados” (Ibidem, pig. 66). Nesse contexto, como se coloca o problema da ‘marginalidade? © fenémeno da marginalizacio se inscre- ve no proprio seio das relacdes de producéo capitalista que se funda na expropriaedo dos trabalhadores pelos ca- pitalistas. Marginalizado é, pois, a classe trabalhadora. O AIE escolar, em lugar de instrumento de equalizagdo social constitui um mecanismo construfdo pela burguesia ara garantir e perpetuar seus interesses. Se as teorias do rimeiro grupo (por isso elas bem merecem ser chama- das de ndo-criticas) desconhecem esses determinagées objetivas e imaginam que a escola possa cumprir 0 papel de correcio da marginalidade, isso se deve simplesmente 0 fato de que aquelas teorias sZ0 ideolégicas, isto 6, dis- simulam, para reproduz(-las, as condigées de margina- lidade em que vivem as camadas trabalhadoras. No entanto, diferentemente de Bourdieu-Passeron, Althusser no nega a luta de classes. Ao contrério, chega ‘mesmo a afirmar que “os AIE podem ser nfo s6 0 a/vo mas também o local da luta de classes e por vezes de formas renhidas da luta de classes" (Ibidem, pig. 49) Entretanto, quando descreve 0 funcionamento do AIE escolar, a luta de classes fica praticamente dilutda, tal (© peso que adquire af a dominacZo burguesa. Eu diria, entdo, que a luta de classes resulta nesse caso herdica, ‘mas ingl6ria, {8 que sem nenhuma chance de éxito. Opa fo um tanto | damenta essa concluslo: "Peco desculpa aos professores que, em condicdes terriveis, tentam voltar contra a ideologia, contra o siste- mae contra as préticas em que este os encerra, as armas que podem encontrar na historia € no saber que ‘ensi- ‘nam’. Em certa medida so herbis. Mas so raros, e quan- tos (a maioria) ndo tém sequer um vislumbre de davida quanto 20 ‘trabalho’ que o sistema (que 05 ultrapassa ¢ esmaga) 0s obriga a fazer, pior, dedicam-se inteiramente e-em toda a consciéncia & realizacSo desse trabalho (os famosos métodos novos!). Tém téo poucas diwvidas, que contribuem até pelo seu devotamento a manter e a ali mentar a representac&o ideolégica da Escola que a torna hoje téo ‘natural’, indispensavel-itil e até benfazeja aos Rossos contemporaneos, quanto a Igreja era ‘natural’, indispensével @ generosa para os nossos antepassados de ha séculos” (Ibidem, pp. 67-68). 3.3. Teoria da escola dualista Essa teoria foi elaborada por C. Baudelot e R. Es- Cad. Pesq. (42) Agosto 1982 tablet e exposta no livro L“école capitaliste en France (1971). “seoria da escol mostrar que a escola, em que parénciaunitéria e uni ee iia am dus e-nfo mal do ue cums) Sra rece, ef duas classes fundamentals: a hurguesia o proletaria- do. Os autores procedem de modo didético, enuncian- do preliminarmente as teses bésicas que sucessivamente ppassam a demonstrar. Assim, na primeira parte, ap6s dis sipar 25 “ilus6es da unidade de escola” formulam seis proposi¢des fundamentais que passardo a demonstrar ao longo da obra: “"1, Existe uma rede de escolarizaro que chama remos rede secund: superior (rede S.S.). scolarizacio que chamare mos rede priméria-profissional (rede P.f 3. Nao existe terceira rede. 4, Estas duas redes constituem, pelas relacSes que as definem, o aparelho escolar capitalista. Este aparelho 6 um aparelho ideolégico do Estado cay 5. Enquanto tal, este aparelho contribu/, pela parte que the cabe, a reproduzir as relacies de produglo capi- talistas, quer dizer em defi 0 da sociodade «em classes, em proveito da classe dominante. _que explica em tiltima instancia nfo somente 2 existéncia das duas-redes,-mas-ainds (0 que a define como tais) os _mecanismos-de-seu-funcionamento,-suas-causas-eSeus efeitos”. (Baudelot-Establet, 1971, pég. 42). Através de minuciosa andlise estat/stica os autores, s@ empenham em demonstrar, na segunda parte, as trés primeiras proposig&es, isto é, a existéncia de apenas duas redes de escolarizagao: as redes PP e SS. A quarta propo- Sigdo € objeto das terceira e quarta partes; na terceira arte se procura por em ia que “é a mesma ideo: logia dominante que ¢ imposta a todos os alunos sob formas necessariamente incompativeis” (Ibidem, pég. 47); na quarta parte se demonstra que a divisio em duas redes atravessa 0 aparelho escolar em seu conjunto, por- tanto, desde a escola priméria, contrariamente as aparén- cias de unidade da escola priméria. Mais do que isso, afir- ‘mam os autores que “é na escola priméria que o essencial de tudo 0 que concerne ao aparelho escolar capitalista se realize” (Ibidem, pig. 47). Finalmente, a quinta parte 6 dedicada a demonstracdo das duas altimas proposi ges evidenciando, entdo, que “o aparetho escolar, com suas _duas redes opostas, contribui para reproduzir as relagdes sociais de producdo capitalista” (Ibidem, pég. 47) Importa reter que, nesta teoria, é retomado 0 con- ceito de Althusser (“Aparelho Ideolégico de Estado”) Gefinindo-se © aperelho escolar como “unidade contradi- toria de duas redes de escolarizagio" (Ct. ibidem, pag. 281). Enquanto-aparelho ideoldgico, 2-escala cumpre -duas funeSes hésiesercontribul para 2 formago de forca de_trabalhove para’ incuicaggo_da_ideologia burguesa, Cumpre assinalar, porém, que néo se trata de duas fun- Bes separadas. Pelo mecanismo das préticas escolares, a formaco da forca de trabalho se dé no préprio processo de inculcacao ideolégica. Mais do que isso: todas as pré- As teorias de educagéo e 0 problema da marginalidade na América Latina ticas escolares, ainda que contenham elementos que im- pplicam um saber objetivo (e no poderia deixar de con: ter, j8 que sem isso a escola néo contribuiria para a re- producéo das relacdes de producdo) so préticas de in- ‘culcacdo ideolégica. A escola &, pois, um aparelho ideo: lagico, isto é, o aspecto ideolégica é dominante e coman- dda 0 funcionamento do aparelho escolar em seu conjun- to. Conseaiientemente, a fungio precipua da escola 6 -Inculespso~d-tdzologla-burguesa, Isto 6 Teta oo wGas formas concomitantes: em primeiro lugar, a inculcago explicita da ideologia burguesa; em segundo luger, 0 recalcamento, a sujei¢do ¢ o disfarce da ideologia prole- tiria Vé-s0, pois, a especificidade dessa teoria. Ela adm te a existéncia da ideologia do proletariado. Considera, orém, que tal ideologia tem origem e existéncie fore da escola, isto 6, nas massas operérias e em suas organiza ‘gGes. As escola é um aparelho ideoldgico da burguesiae a eresses. O pardgrafo abaixo transerito € exiremamente esclarecedor a respeito: “A controdieso principal existe brutalmente fora dda escola sob a forma de uma luta que opée a burgues a0 proletariado: ela se trava nas relagdes de producio, ‘que so relagdes de exploracdo. Como aparelho ideolégi co de Estado, a escola é um instrumento da luta de clas- ses ideolégicas do Estado burgués, onde o Estado bur aués persegue objetivos exteriores a escola (ela no & senZo um instrumento destinado a esses fins). A luta ideolégica conduzida pelo Estado burgués na escola visa 8 ideologia proletéria que existe fora da escola nas mas- sas operdrias e suas organizagées. A ideologia proletér no esté presente em pessoa na escola, mas apenas Sob a forma de alguns de sous efeitos que se apresentam como resistencias: entretanto, inclusive por meio dessas resis: téncias, é ela propria que ¢ visada no horizonte pelas préticas de inculeaeéo ideolégica burguesa e pequeno- burguesa"' (Ibidem, pg. 280-grifos no original). da-escola Na0 @, ent3o, 0 de simplesmente reforcare ie- gitimar_2-marginalidade-que-é-produzida-socialmente. Considerando-se que 0 proletariado dispde de uma forca an yuas pro: ~autbooma,e-forja.na-pritica da-luta de-clases suas prod nizada_pela_burguesia_como_um_aparetho separado da praduupfo, Conseqlentemente, néo cabe dizer que a eso la qualifica diferentemente o trabalho intelectual e o tra balho manual. Cabe, isto sim, dizer que ela qualifica 0 trabalho intelectual e desqualifica 0 trabalho manual, ando 0 proletariado & ideologia burguese sob um disferce pequeno-burgués. Assim, pode-se coneluir que a escola 6 20 mesmo tempo um fator de marginalizacdo relativamente & cultura burgueta assim como em relagGo 8 cultura proletaria. Em face da cultura burguesa, pelo fato de inculcar 3 massa de operdrios que tem acesso & rede PP apenas os sub-produtos da propria cultura bur: guesa, Em relagdo & cultura proletéria, pelo fato de recal- él, forgando os operdrios a representarem sua condi- ‘go nas categorias da ideologia burguesa. Conseqilente- mente, a escola, longe de ser um instrumento de equal zagGo social ¢ duplamente um fator de mar converte of trabalhadores em marginais, no apenas por referéncia & cultura burguesa, mas também em relagio, 20 proprio movimento proletério, buscands arrancar do seio desse movimento (colocar & margem dele) todos aqueles que ingressam no sistema de ensino, Pode-se, pois, concluir que, se Baudelot e Establet s2 empenham em compreender a escola no quadro da luta de classes, eles néo a encaram, porém, como palco e alvo da luta de classes. Com efeito, entendem qu 7 in enquantaaparsiho.igol560-a-intumonto do burquesia_na luta ideologica contra o proletariado. A possibilidade de que a escola se constitua num instru: mento de luta do proletariado fica descartada, Uma vez que a ideologia proletéria adquire sua forma acabada no 1eio das massas e organizacdes operdrias, ndo se c utilizar a escola como meio de elaborar e difundir a refe rida ideologia. Se o proletariado se revela capaz de elabo: rar, independentemente da escola, sua prépria ideologia de um modo téo consistente quanto 0 faz a burguesia com 0 auxilio da escola, entéo, por referéncia a0 apare- lho escolar, a luta de classes revelase indtil, Eis porque Snyders (1977, 111 Parte, Cap. V, pp. 338-344) resume sua critica & teoria da escola dualista com a expresséo: "Baudelot-Establet ou a luta de classes intl”. ‘Ao terminar esse répidoresbooo relative as teorias ‘ais teoriae-ndo. doixorann-de-exercer-influéncie-na Amé mentado 20 tngo ° ere deena, Se tls estas te ‘e meio de edvcgio smas-de ensino com os esforcos de su racdo d ‘plama da marginalidade nos paises da re 4, PARA UMA TEORIA CRITICA DA EDUCACAO O leitor teré notado que, quando me referi&s teo- rias néo-criticas, apés expor brevemente o contatido de cada uma, procurei mostrar a forma de organizacio @ ‘uncionamento da escola decorrente da proposta pedago- ica veiculada pela teoria..!4 em relacdo as teorias criti- -cowreprodutivistasisto_no. foi feito..Na verdad estas {eories_nfo_contém_uma_proposta_pedao6oica. Flas se funcianamento-do.escole-tal.como.est constituids. Em ‘outros termos, pelo seu caréter reprodutivsta, estas teo- rigs consideram que a escola ndo poderia ser diferente do {que &. Empenhamse, pois, em mostrar a necessidade 16 ica, sociale histérica da escola existente na sociedade capitalista, ponda em evidéneia aquilo que ela desconhe ce @ mascara: seus determinantes materais. Em relagdo & questo da marginalidade ficamos, pois, com o seguinte resultado: enquanto as teorias no. eriticas pretendem ingenuamente resolver 0 problema dda marginalidade através da escola sem jamais conseguir axito, as teorias eritico-reprodutivistas explicam a razo 16 do suposto fracasso. Segundo a concepeio critico-repro- utivista 0 aparente fracasso é, na verdade, 0 éxito da @scola; aquilo que se julga ser uma disfuncdo 6, antes, a fincSo prépria da escola, Com efeito, sendo um instru: miento de reproduedo das relacées de produgio a escola nna sociedade capitalista necessariamente reproduz a do- minago explorag&o. Daf, sou carster segregador e mar- ginalizador. Dai, sua natureza seletiva. A impresso que nos fica é que se passou de um poder ilusério para a im- oténcia. Em ambos os casos, a Historia é sacrificada. No rimeiro caso, sacrifica-se a Historia na idéia em cuja har- ‘monia se pretende anular as contradi¢des do real. No se gundo caso, a Histéria é sacrificada na reificago da es trutura social em que as contradig6es ficam aprisionadas. © problema permanece, pois, em aberto. E pode ser recolocado nos seguintes termos: & possivel encarar a escola como uma realidade hist6rica, isto 6, suscetivel de ser transformada intencionalmente pela ago humana? Evitemios de escorregar para uma posigéo idealista ¢ vo- luntarista. Retenhamos da concepedo critico-reproduti- ) ‘importante ligdo que nos trouxe: a escola 6 deter- minada socialmente; a sociedade em que vivemos, funda- da no modo de producdo capitalista, é dividida em clas- ses com interesses opostos; portanto, a escola sofre a determinago do contflito de interesses que caracteriza a sociedade. Considerando-se que a classe dominante no tem interesse na transformacio histérica da escola (ela esté empenhada na preservacio de seu dom{nio, portan- 10 apenas acionaré mecanismos de adaptago que evitem a transformagio) segue'se que uma teoria erftica (que ‘do seja reprodutivista) 86 poderé ser formulada do pon- 10 de vista dos interestes dominados..0 nosso problema ‘ode, enor enuncado da epsnte msi? poe vel articular a escola com os interesses dominades? Da perspectiva do tema deste artigo a questo recebe a se- Quinte formula¢So: 6 possivel_uma_teoria da educacao “ue capte criticamente a escola como um instrumento- capaz de contribuir para a superacéo “arginalidada? (Limito-me aqui a afirmar a possibilidade dessa teoria, j& que escapa aos objetivos desse artigo, 0 desenvolvimento da mesma). Uma teoria do tipo acima anunciado se impde 2 tarefa de superar tanto 0 poder ilusério (que caracteriza as teorias ngo-criticas) como a impoténcia (decorrente dos tworias eritico-reprodutivistas) colocando nas méos 0s educadores uma arma de luta capaz de permitirines © exercicio de um poder real, ainda que limitado. ‘No entante, o caminho é repleto de armada, jd que os mecanismos de adaptaao acionados periodica- mente a partir dos interesses dominantes podem ser con- fundidos com os anseios da classe dominada, Bara eviter, ‘esse risco & necessério avangar no sentido de captar a na- tureza especitica da educacSo 0 que nos levaré 8 com- preensio das complexas mediagdes pelas quais se dé sa insereSo contraditoria na sociedade capitalista. nes- sa diregdo que comeca a se desenvolver um promissor esforgo de elaboragdo teérica. Penso ter dado recente- mente uma pequena contribuicdo nesse sentido (Cf. Sa- viani, 1982). Do ponto de vista prético, tratase de retomar vigo- rosamente a luta contra a seletividade, a discriminacao e © rebaixamento do ensino das camedas populares. Lutar Cad. Pesq. (42) Agosto 1982 _s2 no esforgo para garantir 206 trebalhadores um ensino ~da_melhor qualidade poss{vel_nas_condicies_histéricas -atuais..O papel de uma teoria critica da educacdo é dar substincia concreta a essa bandeira de luta de modo 2 evitar que ela seja apropriada e articulada com os interes- ses dominantes. 5, POSTSCRIPTUM Os leitores certamente teréo estranhado que, a0 longo de um texto versando sobre as teorias da educacao 0 probleme da marginlidde, néo epereceu ume Pal vra sequer sobre a “teoria da educacdo compensataria’’. Tal estanheca parece procedente jé que, se héalguma proposta educativa intimamente ligada & questSo da mmarginalidade, esto € a chemada educaeSo compensaté ria. Com efeito, ndo ¢ exatamente a situacdo de margina- lida vivda pols asin chomades “rian earentes” due constitu e radio de er da educarSo compensator? Nao @ @ educacdo compensatéria a estratégia acionada pare supeer © problema de marginaidede na mee em que se propde a nivelar as pré-condigées de aprendiza- gem pela via da compensacdo das desvantagens das crian- ges arenes? “Entretanto, devo dizer que ndo considero 2 educa: cdo compensatoria uma teora educational sla o sent do de uma intopretaelo. do fendmeno educative que rminada propostapedagdgica (como ocorre “tom as tors nlo-en,sno seni de exter os mocaniarnoe quo rogem « orgenizegho « funcionaran to da educagdo explicance, em corcochdnele, a8 suas fungées (como no caso das teorias critico-reprodutivi tas) soja, ainda, no sentido de um esforco para equacio- nar, pela via da compreensdo tedrica, a questo pratica da contribuicSo espectfica da educacdo no processo de ‘transformagao estrutural da sociedade {como sera o caso. de uma teoria critica da educacao). ‘A meu ver, a educagio compensatéria configura uma resposta ndoeritice # dificuldades. edvcaionels posts om evidinca plas tevias criti reprodutivises, Assim, uma ver que se acumulavam at evidnelas de que @ fracasio escolar, Inckindo predominentemente sobre 0% alunos sécio-economicaments desfevorecs, devia a fatores extomos a0 funcionamento da excoa,tatavs se,entdo,deegir sobre estes fatores,Educapto compensa toria significa, pois, o seguinte: a funcao basica da edu- {ado continue Sendo interpretade er termes de equal edo socilEntrotantoy pore que teva compre ua —funcSo equalizadora-6-necessério compensat-as deficién- liza a efcécia da agdo perlgésics. Vise, o's, que no se formula uma nova interpretacdo da aco pedagégica. Esta continua send entngida em termos de pedegos tradicional, da pedtgogia nova ou da pedagogiatenicsta tncarades deforma iolada ou de forme, combinads, O carater de compensacdo de deficiéncias prévias to processo de excoarizesio nos permite compreender estreita ligagdo entre educacdo compensatéria e pré-es- cola. Daf porque a educasio compensatériacompreande tam conjunto de programas destinedos a companest def ciéncias de diferentes ordens: de satide nutricéo, fami- res, emotivas, cognitivas, motoras, lingiifsitcas, etc. ais programas acabam colocando sob a responsabilidade da educacio uma série de problemas que néo séo especi ficamente educacionais, 0 que significa, na verdade, a persisténcia da crenca ingénua no poder redentor da edu- aco em relacdo & sociedade. Assim, se a educagio se revelou incapaz de redimir 2 humanidade através de aco Pedagégica ndo se trata de reconhecer seus limites, mas de alargé-los: atribuise entio & educagdo um conjunto de papéis que no limite abarcam as diferentes modalidedes de politica social. A consequincia 6 a pulverizago de es- forcos e de recursos com resultados praticamente nulos do ponto de vista propriamente educacional Essas constatacdes me /evaram A conclusio.de.que a propria expressdo “ ria’ = isto 6, a ‘rece como substantivo deveria ser-o adjetivo e vice-versa, Portanto, se se quer compensar as caréncias que caracte- rizam a situacdo de marginalidade das criancas das cama- das populares, 6 preciso considerar que ha diferentes modalidades de compensacio: compensaggo alimentar, Ccompensacio sanitéria, compensacio afetiva, compensa: 0 familiar, etc. Neste quadro, constatada a existéncia de deficiéncias especificamente educacionais, caberia se -deficiBncia)_mas_em_compensario-educacional: E aqui fica, finalmente, evidenciada a ndo-autonomia tebrica da “educagdo compensatéria”, uma vez que a exigéncis de tratamento diferenciado, de respeito as diferengas indi- viduais e aos diferentes ritmos de aprendizagem bem ‘como a énfase na diversificago metodolagica e téonic , no sentido de suprir as caréncies dos educandos, séo preocupacdes préprias do tipo de teoria denominada neste texto de “ pedagogia nova". ‘No contexto da América Latina, a tendéncia atuat- mente em curso (freqientemente reforgada pelo patro- ccinio de organismos internacionais) de difusio da educa- ‘co compensatéria com a conseaiiente valorizagfo da préescola entendida como mecanismo de solugdo do problema do fracasso escolar das criangas das camadas As teorias da educacao e 0 problema da marginalidade na América Latina 17 trabalhadoras no ensino de primeiro grau deve, pois, ser submetida a critica. Com efeito, tal tendancia acaha por -se.configurar_numa_nova forma-de contornar 6 proble-— ma.em lugar de atacé:lo_de frente. Exemplo eloniiente— _lat_na_passagem da primeira para_a segunda série do pr Cumpre, pois, no tergiversar. N&o se tre s de ager importanis dor diferentes programas de 250 compensatoria. Considera-los, porém, como programas educativos implica um afastamento ainda maior, em lu- fda aproximardo que se far necsiie em dierdo 8 ‘compreensio da natureza especitica do fenémeno educa- tivo, Referéncias: ALTHUSSER, L., Ideologia e Aparethos Ideolégices do Estado. Lisboa, Editorial Presenca, s/d. BAUDELOT, C. & ESTABLET, R., L“école capitaliste en France. Paris, Francois Maspero, 1971, BOURDIEU, P. & PASSERON, J-C.,A Reprodugéo: Ele- ‘mentos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves Editora, 1978. BOWLES & GINTIS, Schooling in Capitalist America. N. York, Routledge & Kegan Paul, 1976. MATTELART, A., As Multinacionais da Cuftura. 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