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Reflexoes Sobre A Sociabilidade Burguesa
Reflexoes Sobre A Sociabilidade Burguesa
REITOR
Angelo Roberto Antoniolli
VICE-REITORA
Iara Maria Campelo Lima
COORDENADORA GRÁFICA
Germana Gonçalves de Araújo
CONSELHO EDITORIAL
Antônio Martins de Oliveira Junior
Aurélia Santos Faroni
Fabiana Oliveira da Silva
Germana Gonçalves de Araujo
Luís Américo Bonfim
Mackely Ribeiro Borges
Maria Leônia Garcia Costa Carvalho
Martha Suzana Nunes
Péricles Morais de Andrade Júnior (Presidente)
Rodrigo Dornelas do Carmo
Samuel Barros de Medeiros Albuquerque
Sueli Maria da Silva Pereira
IMAGEM DE CAPA
Foto por Yolanda Sun, diposnível no site da Unsplash
Reflexões sobre a sociabilidade burguesa / Paulo Roberto Félix dos Santos, Everton Melo da
Silva, Laryssa Gabriella Gonçalves dos Santos, orgs. – São Cristóvão : Editora UFS, 2019.
R312r
220 p. ; il.
ISBN: 978-85-7822-649-7
CDU: 316.275:323.3-058.13
SUMÁRIO
EDUCAÇÃO E SERVIÇO SOCIAL
7 APRESENTAÇÃO
NA CENA CONTEMPORÂNEA
150 notas
SERVIÇO SOCIAL E EXERCÍCIO PROFISSIONAL NOS ANOS 1990
sobre a noção de competência na Lei de Regulamentação da Profissão
29 PROPRIEDADE PRIVADA E ESTADO NAS SOCIEDADES DE CLASSES
Everton Melo da Silva Laryssa Gabriella Gonçalves dos Santos e Maria Lúcia Machado Aranha
83 CRISE DO CAPITAL
Estado e sindicalismo no Brasil
Albany Mendonça Silva 202 retrocessos
CRUZANDO A TRAVESSIA
no Licenciamento Ambiental em tempos de Golpe no Brasil
Maria das Graças e Silva e Iris Pontes Soares
99 ÉTICA E ONTOLOGIA
elementos introdutórios para uma interpretação ontológica
materialista oposta à ética burguesa
Débora Rodrigues Santos
APRESENTAÇÃO
1 IASI, M.L. MetaAmorFases – coletânea de poemas. São Paulo: Expressão Popular, 2008.
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
INTRODUÇÃO
de natureza “voluntária”. A forma pela qual essa relação se realiza é por meio
do contrato,o que, no plano mais imediato, aparece como determinação de
relações jurídicas é, a rigor, uma relação econômica. Portanto.“O conteúdo
dessa relação jurídica ou volitiva é dado pela própria relação econômica”
(MARX, 2013, p.159, grifos nossos). Para a existência dessas relações eco-
nômicas e para que haja a possibilidade de aquisição da mercadoria força de
trabalho é fundamental ambiente propício para que isso ocorra sem maiores
constrangimentos, a esfera da circulação/produção e de onde se derivam
relações jurídicas que possam ratificar esse processo.
Estariam, assim, dados os pressupostos para a existência de dois su-
jeitos fundamentais no processo de produção de mercadorias. De um lado,
o capitalista, como possuidor dos meios de produção e comprador da força
de trabalho; do outro, o trabalhador, a quem, desprovido desses meios, resta
a força de trabalho, única propriedade que é levado a “voluntariamente” ven-
der. É nessa medida que alguns dos pilares fundamentais dos direitos, quais
sejam a liberdade, a igualdade e a propriedade – consagrados na Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) e da Declaração Universal dos
Direitos Humanos (1948) e recepcionados unanimemente nos dispostos nor-
mativos modernos – não se configuram como constrangimentos à circula-
ção mercantil. São, antes, os pressupostos nos quais ela se funda.
A nosso ver, desse processo, em que a ideologia jurídica exerce pa-
pel importante, decorre apreensão fetichizada e fetichizante da cidadania,
na medida em que esta é apreendida na ausência dos seus elementos de-
terminantes. Como já sinalizamos, desprovida de análise a partir de seus
fundamentos, a cidadania é vista como meio pelo qual, a partir das lutas
das classes sociais, se podem, em maior ou menor medida, construir, am-
pliar e consolidar direitos. Trata-se de uma forma parcial de apreensão de
seus fundamentos, na medida em que se obscurece nessa análise a relação
substantiva entre a forma mercantil e a formas jurídicas e as políticas que
lhe correspondem. Relação essa que demanda a existência de sujeitos livres,
proprietários e iguais (cidadãos), de modo a possibilitar os diferentes inter-
câmbios de mercadorias.
Entendemos, por outro lado, que as particularidades impressas pela
forma mercantil à forma jurídica não só conformam determinadas caracte-
20 rísticas às relações jurídicas a ela correspondentes, mas também conferem
peculiaridades aos indivíduos que se defrontam nesse processo, na qualida-
de de cidadãos, como expressão de sujeitos jurídicos ou sujeito de direitos.
Do mesmo modo, essas relações não se operam cindidas, mas alinhavadas
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pela forma política do capital (Estado), sem a qual seria impensável a estru-
turação dessas relações jurídicas e o desenvolvimento do estatuto de cida-
dania. É essa particularidade que abordaremos a seguir.
REFERÊNCIAS
28
PROPRIEDADE PRIVADA E ESTADO
NAS SOCIEDADES DE CLASSES
INTRODUÇÃO
Acabava de surgir [...] uma sociedade que, por força das condi-
ções econômicas gerais de sua existência, tivera que se dividir
em homens livres e escravos, em exploradores ricos e explora-
dores pobres; uma sociedade em que os referidos antagonismos
não só não podiam ser conciliados como ainda tinham que ser le-
vados a seus limites extremos. Uma sociedade desse gênero não
podia substituir senão em meio a uma luta aberta e incessante
das classes entre si, ou sob o domínio de um terceiro poder que,
situado aparentemente por cima das classes em luta, suprimisse
os conflitos abertos destas e só permitisse a luta de classes no
campo econômico, numa forma dita legal.
ser do Estado é esta: manter o domínio de uma classe sobre a outra através
do poder político da classe economicamente dominante. Ele surgiu a partir
da necessidade histórica de garantir a manutenção da ordem da exploração
do homem pelo homem, da manutenção da dominação de uma classe sobre
outra, garantindo as condições mínimas de produção e reprodução da socie-
dade com base na relação explorador/explorado.
Para proteger a propriedade privada das revoltas dos explorados, os ex-
ploradores criaram um exército que protegesse suas propriedades. Eles, cole-
tivamente, começaram a mantê-lo a sua disposição. Para contratar e manter
os soldados, os senhores pagavam impostos ao Estado (ENGELS, 2012). Atra-
vés dos impostos, foi criada força estatal a serviço da classe dominante para
regular e administrar os conflitos sociais em favor das classes dominantes.
Essa característica do Estado, como registra Engels (2012), perdura-
ria em todas as sociedades de classe,
5 As primeiras formas de trabalho escravo surgiram nas civilizações da antiguidade, como sumérios,
babilônios, assírios, egípcios, porém de forma residual e auxiliar.
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ção capitalista só pode ser datado a partir do século XVI (MARX, 1996). Se
na sociedade feudal a terra refletia a riqueza do homem, com a expansão do
comércio crescia a riqueza em dinheiro. Com esse cenário surge uma nova
classe forte economicamente, classe que vivia da compra e venda de produ-
tos, que mais à frente reivindicou a direção política da vida social através da
captura do Estado moderno.
Na sociabilidade feudal, a posse de terra determinava o poder de re-
ger a sociedade. Os sacerdotes e guerreiros, proprietários de terras, eram os
grupos dominantes tanto na economia quanto na política. Com a ascensão de
uma nova classe, o poder teve que ser partilhado. Essa nova classe que surgia
com a ascensão do comércio era os burgueses, “[...] cujo interesse não mais
se relacionava com a utilidade do que ela comprava ou vendia e, sim, com a
lucratividade do que comercializava” (LESSA; TONET, 2012, p. 22).
Com o surgimento do modo de produção capitalista, a vida do ho-
mem e a sociedade sofreram mudanças substanciais, principalmente entre
os séculos XV a XVIII, como aponta este trecho:
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Com o novo modo de produção, uma nova classe ascendeu e efetuou
transformação nas relações capitalistas. Se no feudalismo a produção era
para a subsistência, no capitalismo a produção se tornou sem limites. Se
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7 Laski (1973, p. 13) afirma que o liberalismo estabelecia uma antítese entre liberdade e igualdade,
pois “viu na primeira aquela ênfase sobre a ação individual, da qual o liberalismo sempre foi zeloso
defensor; viu na segunda o fruto da intervenção autoritária, cujo resultado final é, em seu ponto de
vista, uma restrição da personalidade individual”.
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8 Podemos compreender esse processo através do capítulo XXIV, A assim chamada acumulação
primitiva, da obra O Capital: crítica da economia política.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
10 Soboul (1981, p. 153-154) argumentaque essa carta foi “redigida pelos Constituintes, liberais
e proprietários, ela abunda em restrições, precauções e condições, que lhe limitam singularmente
o alcance”. Ela parecia um progresso substancial na história da humanidade, mas a opressão de
44 classe e a manutenção da propriedade foram mantidas. A título de exemplo, alguns direitos negados
para todos: os direitos políticos foram garantidos a apenas uma pequena parcela da população (SO-
BOUL, 1981); a constituinte só concedeu sufrágio universal aos proprietários; e os cidadãos foram
divididos em: ativos, passivos e eleitores. Dito de um modo mais direto: “o povo [protagonista da
Revolução] era eliminado da vida política” (SOBOUL, 1981, p. 156).
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REFERÊNCIAS
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ANDERSON, P. Passagens da antiguidade ao feudalismo. 3ª ed. São Paulo:
Brasiliense, 1991.
ENGELS, F. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. 3ª ed.
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FAST, H. Espártaco. São Paulo: Abril Cultural, 1976.
FOLLETT, K. Os pilares da terra. Volume único. São Paulo: Rocco, 2012.
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LESSA, S. Abaixo a família monogâmica. São Paulo: Instituto Lukács, 2012.
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MACPHERSON, C. B.La teoría política del individualismo posesivo: de Hobbes
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______. O Capital: crítica da economia política. V.1. 27ª ed. Rio de Janeiro:
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MARX, K.; FRIEDRICH, E. A ideologia alemã. São Paulo: Expressão popular, 2009.
NETTO, J. P; BRAZ, M.Economia Política: uma introdução crítica. 6ª ed. São
Paulo: Cortez, 2010.
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O ESTADO MODERNO
EM PERSPECTIVA
INTRODUÇÃO
Tendo em vista isso, fica fácil concluir que uma determinada forma
de Estado – no caso da nossa reflexão, a forma especificamente moderna,
capitalista – precisa ser qualificada historicamente e situada no bojo das
relações sociais que possibilitam sua correta apreensão.
Vale rememorar, logo à partida, que o projeto societário da burguesia
foi se gestando ainda nos interstícios do sistema feudal. É sob o feudalismo,
já no seio de sua crise, que se encontraram os elementos impulsionadores
da sociedade capitalista. Quanto mais se desmantelava a estrutura econômi-
ca da sociedade feudal, mais o capital encontrava as mediações necessárias
para sua expansão irrefreável e, ao mesmo tempo, se edificava o Estado a
ele correspondente. Desde que a acumulação primitiva do capital alcançou
certo grau de maturidade, iniciou-se a formação do Estado Moderno que se
consolidou com as revoluções burguesas ocorridas na Inglaterra e na França,
constituindo-se, doravante, cada vez mais como um “poder nacional do ca-
pital sobre o trabalho, de uma força pública organizada para a escravização
social, de uma máquina de despotismo de classe” (MARX, 1971, p. 63).
Em que pese os instrumentos utilizados pelo Estado absolutista2 te-
rem exercido papel intransferível no contexto da acumulação primitiva do
capital e sido favoráveis à classe burguesa, foram-no por período limitado.
O poder centralizado coadunou-se apenas com a fase em que se teve a pre-
dominância do capital mercantil. Quando surgiram novas forças produtivas
- a gestação das condições para a instauração do capital industrial - e novas
necessidades postas pelo capital na sua marcha à universalização, isto é, à
sua dominância totalitária, exigiu-se uma mudança corresponde na esfera
estatal de modo a dissipar por completo os entraves ainda existentes. O
absolutismo cumprira sua missão, precisava, pois, ser superado. E assim o
foi pela ação revolucionária da burguesia.
Trindade (2011, p. 41) afirma que, a certa altura, “uma palavra – que
frequentaria o vocabulário humano nos séculos seguintes – começou a pas-
sar, com insistência crescente, pela cabeça dos burgueses. Era esta a pa-
lavra: revolução!”. Tal era a situação que, concomitante às transformações
econômicas, a burguesia revolucionou também a esfera da política para
consolidar a sua dominação social em escala planetária. Além de instituir
54 4 O Primeiro Império foi instaurado na França, em novembro de 1799, a partir do golpe de Estado
de Napoleão. Com a meta traçada de rechaçar a ditadura revolucionária, por ter ciência do poder
que as massas possuíam, a burguesia entregou a França a Napoleão I, que ali instaurou uma dita-
dura militar. Tem-se assim o significado do golpe do 18 de Brumário, explicitando-se na subida de
Napoleão ao poder.
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5 No tocante a esse aspecto, Mészáros (2002, p. 119) faz uma importante ressalva para não se
cair em visões deturpadas: “Na qualidade de estrutura totalizadora de comando político do capital
[...], o Estado não pode ser reduzido ao status de superestrutura. Ou melhor, o Estado em si, como
estrutura de comando abrangente, tem sua própria superestrutura – a que Marx se referiu apro-
priadamente como ‘superestrutura legal e política’ – exatamente como as estruturas reprodutivas
materiais diretas têm suas próprias dimensões superestruturais”.
6 No livro I de O Capital, é-se, por parte de Marx, detalhada a expropriação dos trabalhadores que se
iniciou durante o movimento sanguinário da acumulação primitiva do capital ao serem arrancados
súbita e violentamente do seu modo costumeiro de vida. Todavia, a expropriação não se limitou a
57 terra. Escrita “nos Anais da humanidade com traços de sangue e fogo”, a expropriação do campe-
sinato europeu, que se estende do século XV ao século XVI, resultou, ainda, na separação entre os
trabalhadores e a propriedade das condições da realização do trabalho, lançando-os livremente,
por via da dissolução dos séquitos feudais, no mercado de trabalho como vendedores da única e
potencial mercadoria que dispõem: a força de trabalho.
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na vida de outrem que o demanda e também cria, ao ter sua força de trabalho
explorada, novo valor que é apropriado pelo dono do capital sem nenhuma
retribuição. Para chancelar a própria reprodução contínua do capitalismo, um
microscópico quadro de pessoal expropria os trabalhadores e detém a riqueza
concentradamente7 na forma de propriedade privada.
Na leitura de Mészáros (2002), o capital é uma “forma incontrolável
de controle sociometabólico” que escapa forçosamente de um grau signifi-
cativo de controle humano. Essa incontrolabilidade8, inerente a sua dinâmica
reprodutiva e expansionista, sinaliza que esse sistema “[...] é, na verdade, o
primeiro na história que se constitui como totalizador irrecusável e irresis-
tível, não importa quão repressiva tenha de ser a imposição de sua função
totalizadora em qualquer momento e em qualquer lugar em que encontre
resistência” (MÉSZÁROS, 2002, p. 97). Ter assumido essa característica de
“totalizador irrecusável e irresistível” possibilita um dinamismo ao sistema
do capital, tornando-o o “mais competente extrator de trabalho excedente”,
antes inimaginável na história quando comparado aos modos de controle
sociometabólico que lhe antecederam no movimento da reprodução social.
Em que pese o capital ser um sistema mais dinâmico, Mészáros
(2002) chama atenção para o fato de que, paradoxalmente, o “preço a ser
pago” é a inevitável “perda de controle sobre os processos de tomada de
decisão” (MÉSZÁROS, 2002, p. 97, grifos do autor).
A perda de controle é uma “deficiência fatídica” do sistema do capi-
tal; é consequência direta da separação que se consolidou entre as funções
relacionadas à produção e o controle do processo de trabalho9. Dessa per-
da, acarretando uma “ausência de unidade”, emanam os defeitos estruturais
do capital, base constitutiva da reprodução contraditória do seu modo de
controle particular. Diante da “‘falta’ de uma coesão” dos microcosmos so-
10 Essa indústria oferece fabulosos lucros. A título de ilustração, Netto e Braz (2009, p. 184)
anotam que “nos anos setenta do século passado, nos Estados Unidos, enquanto a taxa geral de
lucro na indústria de transformação era de cerca de 20%, monopólios da indústria bélica auferiam
lucros que variavam de 50 a 2.000%”. Sobre a indústria bélica estadunidense e sua relação com o
mercado no pós-11 de setembro de 2001, Cf. Klein (2008).
11 Bizerra (2016, p. 181) assevera que “o Estado, através de gigantescos recursos, financiou,
61 desde a Segunda Guerra Mundial, diversas pesquisas que contribuíram para o surgimento de um
complexo industrial militar. Não é à toa que vários centros de estudos nucleares, como o Bell
Laboratories, receberam financiamento do governo americano no tempo da [Segunda] guerra e
foram supervisionados por órgãos públicos como o Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento
Científico, sob direção de Vannevar Bush”.
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do consenso ou, ainda, recursando a essas duas estratégias quando for con-
veniente, o que está em jogo na sua intervenção é a defesa da propriedade
privada em sua feição genuinamente capitalista e a dominação exercida pelo
capital sobre o trabalho. Dentro do campo dos limites e possibilidades obje-
tivamente posto para que o Estado se mova e intervenha, tanto do ponto de
vista econômico quanto político e social, ele se adapta às mudanças proces-
sadas e recorre aos mecanismos mais adequados para cumprir, com êxito, a
função de ser o poder político da classe capitalista.
REFERÊNCIAS
65
ESTADO, REPRODUÇÃO DO CAPITAL
E A CONSTRUÇÃO DE BARRAGENS
NO BRASIL 1
Milena Barroso2
Yanne Angelim3
INTRODUÇÃO
dos elementos da natureza pelo homem, para satisfação das suas neces-
sidades, processo que, mesmo tempo, produz transformações no próprio
homem. Nesses termos, pode concordar com Lukács (2013) e Marx (2010)
em que o trabalho possibilita o processo de humanização. O modo de pro-
dução e reprodução da vida, que caracteriza cada momento histórico e
ordem societária, traz, portanto, determinações à relação entre homem e
natureza e, ainda, às relações dos homens entre si.
Com a emergência da sociedade capitalista, marcada essencialmen-
te pela propriedade privada dos meios de produção, compra e venda da for-
ça de trabalho e acumulação privada da riqueza socialmente produzida, o
trabalho assumiu o caráter de trabalho alienado, sendo seu produto alheio
ao seu produtor e voltado a suprir necessidades de outros homens por meio
da compra e venda de mercadorias. Nesse sentido, o trabalho na sociedade
capitalista, ao assumir a produção de mercadorias como fim, passa a pro-
duzir desumanização e efeitos deletérios sobre a natureza.
O caráter destrutivo que a relação homem-natureza assumiu a partir
da produção mercantil e que se vem enraizando, em escala planetária, na
cena contemporânea na esteira do aumento da produção e do incentivo ao
consumo exacerbado, põe em xeque a própria continuidade da vida humana
(MÉSZÁROS, 2007, 2011; SILVA, 2010). A necessidade permanente do capi-
tal de garantir acumulação alargou o âmbito a velocidade de extração dos
elementos naturais, gerando descompasso entre o ritmo dessa extração e a
possibilidade de sua recomposição pela natureza, o que tem exigido do ca-
pital, e de seus representantes, elaborar estratégias que assegurem a rotati-
vidade do sistema4. Ao mesmo tempo, aprofunda-se o processo de apropria-
ção capitalista do solo (pela via do agronegócio, da especulação imobiliária
e do turismo); despontam os novos mercados de “créditos de carbono” e de
energias eólica e solar e a mercantilização e privatização da água (forta-
lecimento do hidronegócio), como importantes estratégias de acumulação
capitalista. Esses mecanismos de acumulação, de alcance mundial, obvia-
mente têm expressões particulares nos diferentes países, considerando sua
posição na divisão internacional do trabalho e suas características naturais.
O Brasil, considerado de economia dependente em relação aos países
capitalistas centrais, 5º maior país do planeta e detentor do maior conjunto
67 4 Ressaltam-se aqui a perspectiva do “desenvolvimento sustentável” e as estratégias apresentadas
pelos organismos internacionais, como a proposta de “economia verde”, que pressupõe a valorização
do “capital natural”, composto por bens naturais (florestas, lagos e bacias fluviais). Essa proposta,
incentivada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), refere-se essencial-
mente à conversão dos elementos naturais em mercadoria.
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5 Cabe ainda destacar que a relação entre mercado e Estado também é cruzada pela chamada
“polarização geográfica”, que ocorre interna (entre as regiões e fronteiras internas) e externamente
(na relação que se estabelece com os oligopólios) em cada país. Conforme aponta Chesnais (1996),
esse processo ocorre “aprofundando brutalmente a distância entre os países situados no âmago do
oligopólio mundial e os países da periferia”, reforçando a “tendência à marginalização dos países
71 em desenvolvimento” (p. 39), inclusive nas “estratégias de mundialização dos grupos” (p.117) e nos
“fatores que modelam os sistemas de intercâmbio” (p.212, 213), em que podemos pensar o Brasil,
a partir do seu papel histórico de fornecedor de matérias-primas. Para esse autor, a formação eco-
nômica e política de cada país, como no caso brasileiro, a partir de uma dominação colonial, “ainda
está inscrita nas relações economias internacionais contemporâneas” (p. 213).
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6 Segundo Harvey (2013), a acumulação por espoliação indica o ressurgimento, com modificações,
no mundo contemporâneo, da acumulação primitiva tratada por Marx, cuja expansão alcança, in-
clusive, países em que o capitalismo já se consolidou, o que implica a espoliação de direitos e o
72 controle capitalista de formas de propriedade coletiva (águas, conhecimento, entre outros) e, desse
modo, potencializa sua acumulação. De acordo com esse autor, tem-se uma reatualização do roubo
para assegurar a continuidade do processo de acumulação capitalista.
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PARTICULARIDADES DO CAPITALISMO
E DO ESTADO NO BRASIL E A ESTRATÉGIA
DE CONSTRUÇÃO DE BARRAGENS
7 De acordo Fontes (2010), o processo de expropriação apontado por Marx ao destacar a acumulação
primitiva não se restringiu apenas ao período prévio ao pleno capitalismo, mas tem alcance atual, sua
permanência na cena contemporânea ocorre sob a forma de expropriações primárias e secundárias,
impulsionadas pela concentração de capitais sob a forma monetária. Para a autora, o capitalismo não
pode ser reduzido ao movimento de expropriação, mas as expropriações, além de permanentes, pos-
sibilitam não só a constituição da base social capitalista, mas também sua expansão. A expropriação
73 primária se vincula ao processo violento de expulsão de grandes massas campesinas ou agrárias de
suas terras e dos seus meios de produção. As expropriações secundárias têm incidência sobre os
direitos dos trabalhadores urbanizados que, em sua maioria, já não dispõem da propriedade de meios
de produção e, com seus direitos cada vez mais reduzidos, tornam-se ainda disponíveis à imposição
de novas estratégias de exploração da sua força de trabalho, de extração de mais-valor.
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8 Para Coutinho (2010, p. 32), “existe hegemonia da pequena política quando a política deixa de ser
pensada como arena de luta por diferentes propostas de sociedade e passa, portanto, a ser vista
como um terreno alheio à vida cotidiana dos indivíduos, como simples administração do existente.
A apatia torna-se assim não só um fenômeno de massa, mas é também teorizada como um fator
positivo para a conservação da ‘democracia’ pelos teóricos que condenam o ‘excesso de demandas’
75 como gerador de desequilíbrio fiscal e, consequentemente, de instabilidade social”.
9 Em 2007, o Governo Federal criou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com o ob-
jetivo de promover a retomada do planejamento e da execução de grandes obras de infraestrutura
social, urbana, logística e energética do País, além do estímulo ao investimento privado e à redução
das desigualdades regionais (BRASIL, 2014).
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
social, a barragem de Belo Monte vai atingir e desalojar mais de cinco mil fa-
mílias (mais ou menos 20 mil pessoas) moradoras dos chamados “baixões”
da cidade de Altamira, áreas alagadas onde predominam casas de palafita.
Além desses prejuízos no que refere a moradia, as populações das
regiões impactadas pelos grandes empreendimentos sofrem com as demais
consequências desse processo que envolve sua reprodução física e cultural,
o que passa pela extinção de condições essenciais de reprodução material
da vida nos termos tradicionais (pesca, agricultura familiar), desemprego,
violência, mercantilização dos corpos das mulheres, levando-os a compor a
massa de “trabalhadores disponíveis ao capital e necessitados de mercados”
(FONTES, 2010). Soma-se a isso o caráter deletério desses projetos sobre os
elementos naturais, num processo de aprofundamento sem limites, assumin-
do feições catastróficas, como recente rompimento de barragem em Mariana/
Minas Gerais, unidade sob responsabilidade da mineradora Samarco11.
Com o rompimento da barragem, populações foram soterradas12.
Além de muitos mortos, milhares de pessoas perderam suas casas e fontes
de trabalho, a lama tóxica de rejeitos de mineração atingiu ainda animais,
plantas, o Rio Doce e alcançou o litoral do Espírito Santo. Os danos consta-
tados em caráter imediato certamente assumirão proporções inimagináveis
no médio e longo prazo. Esse acontecimento assumiu visibilidade e reper-
cussão na mídia, caracterizado comumente como um “desastre ambiental”.
No entanto, é necessário se ater aos nexos entre o que ocorreu em Mariana/
MG e o próprio movimento de acumulação do capital no enfrentamento de
sua crise estrutural, quando amplia os níveis de exploração dos recursos
naturais – articulada a exploração do trabalho – de forma extremamente
destrutiva. Nesses termos, o caráter criminoso que marca o rompimento da
11 Segundo Rosa (2006), data dos anos 1970 o surgimento da mineradora Samarco no Brasil, com
a fusão entre as empresas Samitri (do grupo Belgo Mineira na época) e a Marcona Corporation (em-
presa norteamericana), cujo complexo foi inaugurado pelo então Presidente da República, General
Ernesto Geisel (ROSA, 2006). Essa empresa iniciou sua operação com a produção industrial de pe-
lotas de minério. Sua composição estruturava-se em duas unidades, uma de exploração do minério
em Mariana – MG, e uma usina de peletização e um porto em Anchieta - ES, além de dispor de um
mineroduto ligando esses dois Municípios e cortando outras 22 cidades nos dois Estados. A Samarco
aparece no cenário nacional como importante projeto no processo de industrialização local, inserida
de forma estratégia, portanto, na política econômica nacional e com a perspectiva de destacar o
77 Brasil no comércio externo com a exportação de minério de ferro. As atividades da empresa, cujas
acionistas atualmente são as empresas BHP Billiton (anglo-australiana) e Vale S.A. (brasileira), como
quando do seu surgimento, segue fundamentalmente o objetivo de produzir para exportação.
12 O distrito de Bento Rodrigues foi destruído. A lama alcançou outras localidades no Estado de MG:
Águas Claras, Ponte do Gama, Paracatu, Barra Longa.
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
CONSIDERAÇÕES FINAIS
13 Importante destacar que a classe trabalhadora não é homogênea, mas, estruturada por outras
relações sociais que se consubstanciam e se estendem ao capitalismo, como o patriarcado e o
78 racismo. Isso nos leva a afirmar que mulheres, negros, indígenas, estão expostos a expropriações,
a exploração e a diversas violências sob condições particulares. Nessa direção, dados preliminares
de pesquisa doutoral realizada por Barroso (2015) e manifestações públicas do MAB, apontam a
mercantilização do corpo das mulheres como funcional a reprodução do capital por ocasião da
construção de grandes obras no Brasil, entre as quais as barragens.
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REFERÊNCIAS
82
CRISE DO CAPITAL
Estado e sindicalismo no Brasil1
INTRODUÇÃO
EM DEBATE:
Estado e Política no Capitalismo
3 Essa reflexão demarca o entendimento de que existiam formas de organização política, mas, o
entendimento do ESTADO enquanto ordenamento político tem marco histórico a idade moderna.
Isto é uma força exterior, como enunciava HEGEL.
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4 Conhecido como ordenamento jurídico. Regido pelas leis, o que institui o princípio da legalidade,
como atributo e requisito essencial para o cumprimento do poder. Sendo regido pela ideologia do
liberalismo. “o Estado de Direito caracteriza-se por uma constituição meramente formal, rígida,
restrita à organização e funcionamento do Estado, instituída fundamentalmente por oposição ao
poder absoluto, de antagonismo da sociedade civil com o poder do Estado” (SIMÕES, 2013, p.283).
Entretanto, cabe sinalizar que a lei vai no sentido de afirmar os interesses da classe dominante.
5 Concebido como complexa organização social. É no contexto histórico do século XX, especial-
mente, com a intensificação do processo de pauperização e Revolução Industrial, que se modifica
o papel do Estado, que passa a assumir um caráter regulador e intervencionista, com o rótulo do
Estado de Bem-Estar Social, conhecido como Welfare State. “O Estado Capitalista regulador ou
claramente intervencionista que, no século XX, receberia o rótulo de Estado de Bem-Estar (Welfare
State) ou Estado Social, o qual viu-se cada vez mais envolvido com a garantia, a administração e o
financiamento do seguro social e de atividades afins [...]” (PEREIRA, 2002, p.31).
6 É importante frisar que os pensadores contratualistas-jusnaturalistas constroem a base do pen-
samento liberal, ao defenderem o direito natural da propriedade privada, concebida como direito
inalienável, o qual será mantido por meio do Estado Soberano. Dentre os contratualistas, Hobbes
adquire representatividade na sociedade moderna, ao defender o Estado Absoluto, reafirmando que,
85 por meio do contrato, a multidão confere o consentimento para representá-la e tomar as decisões.
7 Essa visão de exteriorização será mais bem desenvolvida nas análises de Marx, ao conceber
que essa força exterior tem recorte determinado de poder. Nessa direção, Hegel concebe o Estado
como sujeito real que ordena, funda e materializa a universalização dos interesses jus naturalistas
e particularistas da sociedade civil.
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8 Weber considera o Estado como monopólio legal da violência, ou seja, Estado representa a
manifestação do direito à violência.
9 Para Durkheim, o Estado resultaria da divisão do trabalho e teria a função de estabelecer as
normas jurídicas no âmbito das relações sociais, impondo um conjunto de normas morais que
implicam diretamente a aceitação voluntária de “funções e recompensas desiguais”.
86 10 Para Gramsci, amplia o conceito de Estado, destacando a análise sobre hegemonia e a in-
fluência no processo de controle do Estado na manutenção da ordem burguesa, com os aparelhos
privados de hegemonia que garantem o consenso entre as classes, não por meio da violência, mas
pelo caráter ideológico.
11 Termo utilizado por Mandel.
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e suas contradições, o que nos remete a pensar que o Estado, mesmo com
corte de classe definido, possibilita, contraditoriamente, a abertura e a im-
plantação de medidas que possam beneficiar a classe proletária, a exemplo
do Estado Social, sem que elas interfiram na ordem estabelecida,o que tem
tensionado o processo de luta de classes e a reconfiguração do capitalismo
monopolista. Coloca-se em pauta o debate sobre a perspectiva da defesa das
reformas no próprio capitalismo, na direção de se construir a revolução.
Acontecimentos históricos podem contribuir para o entendimento, no
cenário atual de crise do capital, da crise do sindicalismo e, consequentemen-
te, de sua defesa por um sindicalismo propositivo, mais próximo da tendência
da perspectiva da social democracia13, com modificação do campo de atuação
de uma perspectiva combativa, para luta pautada em processo de negociação
sem horizonte de luta por revolução, especialmente no palco dos sindicatos.
88
13 Para Rosa Luxemburgo, Social Democracia atuou numa perspectiva de refutar a luta de classes,
isto é, “negou a base de sua própria existência”. Portanto, a perspectiva desses partidos é defender
a reforma e, consequentemente, a ordem vigente.
14 Termo utilizado por Mandel.
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15 “Em alguns casos, como Brasil, Venezuela, Chile e Argentina, a reestruturação significou desindus-
trialização (o chamado ‘choque competitivo’, que internacionalizou a propriedade do capital e reduziu a
89 participação da indústria tanto no PIB quanto na criação de empregos), com aumento do desemprego
industrial, da informalidade e da precariedade dos vínculos empregatícios, com impactos importantes
sobre o poder sindical. Em outros casos, como México e Bolívia, houve mudanças da estrutura fabril ou
sua transferência para outras regiões do país, com crescimento do nível de emprego desse setor em
particular (inclusive como proporção do emprego global)” (CARDOSO; GINDIN, 2008, p.19).
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16 A discussão sobre Emancipação Humana é uma temática complexa e central, que requer maior
aprofundamento, que não daremos conta no limite deste trabalho. Sinalizar essa discussão, torna-se
essencial, no sentido de compreender que a emancipação humana, na perspectiva marxista, vai além
90 do horizonte da emancipação política, conquistada pela burguesia, no processo de luta, na formação
do Estado, requer a superação da ordem burguesa. Como registra Mauro Iasi, “(...) podemos voltar
a afirmar que a possibilidade da emancipação humana, de restituir o mundo e as relações humanas
aos seres humanos, passa pela superação das mediações criadas por esses mesmos seres em sua
ação sobre o mundo. Passa pela superação da mercadoria, do capital e do Estado” (2011, p.73).
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17 Novo sindicalismo significou um movimento político do movimento sindical, que teve a liderança
política do então metalúrgico, Luiz Inácio Lula da Silva, na defesa das condições de trabalho e lutas
salariais. Esse movimento teve um papel fundamental na construção do PT (1980) e da CUT (1983),
cuja proposta era a extinção dos sindicatos por classe para fortalecer a perspectiva dos sindicatos
por ramo de profissão.
18 Especialmente, considerando que a crise capitalista pós 1970 colocou em xeque “os anos
dourados do capitalismo”, isto é, a fase áurea de crescimento do capitalismo e de redistribuição
significativa de parte dos ganhos para a classe trabalhadora, momento áureo também para a orga-
nização dessa classe.. Dentre os traços mais evidentes para o quadro de crise se destacam: queda
91 da taxa de lucro; esgotamento do padrão de acumulação taylorista/fordista de produção; hiper-
trofia da esfera financeira; maior concentração de capitais associadas as fusões dos capitalistas
monopolistas e oligopolistas; incremento acentuado de privatizações, desregulamentações das
relações e dos vínculos trabalhistas. Essas questões provocaram declínio do movimento operário
e ofensiva política e econômica do capital no processo de desmonte do Estado Social.
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19 É importante sinalizar que nesse momento histórico tramita no congresso emenda 4330, que
coloca a regulamentação da terceirização, isto é, sua expansão e ampliação em todas as esferas,
desregulamentando ainda mais o mercado de trabalho.
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20 E importante destacar, segundo Alves (2006, p.467), que “[...] as centrais sindicais (CUT, CGT e
Força Sindical) passam a apropriar-se dos recursos do fundo público–estatais, como o Fundo do
Amparo ao Trabalhador (FAT), por meio da elaboração de projetos de qualificação profissional de
acordo com a lógica do toyotismo sistêmico”. Reforçando, assim, a lógica simplista que o problema
93 da empregabilidade reside na qualificação e, portanto, o esforço deve ser na capacitação do traba-
lhador para o trabalho, distanciando-o, assim, da direção política de contestador para uma direção
“neocorporativista de participação” (LARA, 2010, p. 94).
21 Segundo Braz (2012a). esse caráter particularista tem sido marca do processo de desenvolvimento
capitalista atual.
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ração do trabalho, e, por outro, pela passivização das lutas sociais que histori-
camente foram mantidas sob o controle do Estado e das classes dominantes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
98
ÉTICA E ONTOLOGIA
elementos introdutórios para uma
interpretação ontológica materialista
oposta à ética burguesa
INTRODUÇÃO
A ÉTICA BURGUESA
ser social” (Ibidem, p. 44-5). Daí se entende que o trabalho, como exposto
por Lukács, adquire concreção na reprodução enquanto desenvolvimento
humano-genérico.
Lukács também entende o trabalho como o “[...] único ponto onde
se pode demonstrar ontologicamente um pôr teleológico como momento
real da realidade material” (Ibidem, p. 51). No trabalho, o ser social realiza
o ato teleológico que promove uma transformação material e concreta da
realidade. Salientamos que a ruptura com o nível de ser anterior e puramente
natural se dá no processo contínuo de “realização de posições teleológicas”,
exclusivas do homem e, portanto, baseadas no trabalho.
O trabalho é uma posição teleológica primária, pois é através dele que
se realiza, “no âmbito do ser material, um pôr teleológico enquanto surgimen-
to de uma nova objetividade” (Ibidem, p. 47). Ao gerar novas objetivações, o
trabalho promove objetivamente nova situação social típica de nova forma
de ser. Essa posição teleológica somente se realiza mediante a interação de
duas categorias essenciais: a teleologia e a causalidade.
A partir das conexões ontológicas entre esses dois polos, surge a
causalidade ontologicamente posta (o ser social):
2 Aqui e agora.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
ato consciente repleto de concretude motivada pela finalidade que deve ser
objetivada. As alternativas são orientadas pelas finalidades pretendidas e me-
deiam as escolhas para transformar a realidade. Nessa perspectiva ontológica
materialista, entendemos a gênese ontológica dos valores a partir do processo
de avaliação valorativa que embasa o ser social no processo de escolha e de-
cisões mediante a cadeia de alternativas para satisfazer suas necessidades.
Assim, a base para o ser social escolher e decidir entre as alternativas é o valor,
pois a alternativa é a base da gênese ontológica do valor e, consequentemente,
da Ética. Lembramos que é no trabalho que se encontra o solo ontológico do
valor e também da Ética enquanto complexo valorativo. O ponto de partida de
nosso estudo foi o trabalho como fundamento essencial da Ética.
A Ética está relacionada a esse processo de valoração mediante as
alternativas existentes. É preciso ter condições materiais para que as obje-
tivações éticas existam, pois “ou a ética é uma ‘determinação da existência’
ou, rigorosamente, não é nada” (LESSA, 2007, p. 26). Segundo esse autor,
para a plena realização da Ética, portanto, é necessário ter condições obje-
tivas na realidade. Entendemos que existem alguns questionamentos sobre
esse aspecto no debate teórico do pensamento ético na atualidade, que
justificam a necessidade de novas pesquisas no que diz respeito à reflexão
crítica da gênese ontológica da Ética.
Concluímos que a Ética se configura como processo de reflexão que
exige decisão e escolha através do processo de valoração mediante as al-
ternativas existentes. Considerando o exercício profissional do/a assistente
social, nos deparamos com situações que exigem respostas a partir da nos-
sa reflexão e análise à luz das diretrizes, das dimensões, dos princípios e
dos valores da profissão. Não é tão fácil fazer escolhas diante dos dilemas
éticos com que nos deparamos e com as condições materiais a que somos
submetidos enquanto profissionais na sociedade burguesa. Mas é preciso
decidir e escolher entre as alternativas existentes, materializando nossos va-
lores, princípios, dimensões e diretrizes que fundamentam o Serviço Social
no contexto contemporâneo.
113
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REFERÊNCIAS
114
EDUCAÇÃO
E SERVIÇO SOCIAL NA CENA
CONTEMPORÂNEA
115
A EDUCAÇÃO ENQUANTO
POLÍTICA SOCIAL NO CAPITALISMO
reflexões sobre a educação para o trabalho
no contexto brasileiro
INTRODUÇÃO
Este artigo tem por objetivo contribuir para a análise da educação en-
quanto política social que tem contribuído com a reprodução do capital por
meio da socialização e disseminação de ideias, princípios e diretrizes geradas
no interior do capitalismo. Discute, também, alguns elementos da educação
no Brasil, com foco no trabalho, em consonância com os ditames do capital.
1 Assistente Social do Instituto Federal de Sergipe; Mestre em Serviço Social pela Universidade Fe-
116 deral de Sergipe; Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas da Educação Profissional e Tecnológica.
2 Professora associada da Universidade Federal de Sergipe; Mestre em Sociologia pela Universidade
Federal de Sergipe; Doutora em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo;
Membro do Grupo de Pesquisa Fundamentos, Formação em Serviço Social e Políticas Sociais.
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do Estado, sem referência aos pressupostos que explicam como essas polí-
ticas estão vinculadas a uma forma de regulação social, fundamental para a
acumulação do capital. Há ainda aqueles que as entendem como resultante,
exclusivamente, da luta de classes. Nesse sentido, o Estado aparece como
instância provida de neutralidade, quando na verdade há todo um conjunto
de relações que, por meio dele [do Estado], se estabelece, no sentido de se
promoverem formas de proteção social que contribuam com a lógica da acu-
mulação do sistema e atendam a determinadas parcelas da sociedade, de
forma a camuflar e escamotear, muitas vezes, situações de exploração e de
desigualdade social. Reforçando essa assertiva, Behring (2007) informa que
mais conciliador à relação capital x trabalho, na qual o Estado vai ter papel
fundamental de regulação e intervenção.
O desemprego, a fome, as doenças, a forte desigualdade social, re-
sultantes da exploração do capital e percebidos por segmentos da classe
trabalhadora, expressas em suas manifestações, eram preocupações ima-
nentes e precisavam ser tratadas para manter a ordem na sociedade.
Era preciso enfrentar as expressões do que se denominou questão
social, que se origina justamente das contradições inerentes ao processo
de exploração estabelecido na relação capital x trabalho. Essas expressões
são indissociáveis “do processo de acumulação e dos efeitos que produz
sobre o conjunto das classes trabalhadoras, [...]. é [são] tributária[s] das
formas assumidas pelo trabalho e pelo Estado na sociedade burguesa e não
um fenômeno recente” (IAMAMOTO, 2006. p.11).
Enfrentar os efeitos e as consequências das expressões da questão
social era fundamental, sem, contudo, mexer na lógica e estrutura do capi-
talismo. Como afirma Netto (2001, p. 44), “o enfrentamento de suas mani-
festações deve ser função de um programa de reformas que preserve, antes
de tudo, a propriedade privada dos meios de produção”. Até se reconhecem
os seus agravos, mas a questão social é vista como culpa do homem e
não do sistema que se apresenta com formas desiguais. Netto (Ibidem)
prossegue, afirmando que “o cuidado com as manifestações da ‘ques-
tão social’ é expressamente desvinculado de qualquer medida tendente
a problematizar a ordem econômico-social estabelecida; trata-se de
combater as manifestações da ‘questão social’ sem tocar nos fundamentos
da sociedade burguesa”.
Atenuar as manifestações da questão social é, portanto, uma das
tarefas das políticas sociais. Fomentadas pelo Estado, essas políticas as-
sumiam papel regulador. Como destaca Pereira (2012),
Esse autor destaca que, sob a ótica capitalista, cabe aos indivíduos
a responsabilidade de contribuir com a reprodução desse sistema, interna-
123 lizando como naturais as posições que ocupam na sociedade, as chances
que lhes foram concedidas para o sucesso ou insucesso de sua trajetória
pessoal e profissional. Diz ele:
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125 3 Durante o período colonial brasileiro, o modelo econômico agroexportador sustentava a econo-
mia e as ocupações de caráter manual eram desenvolvidas pelos negros escravos. Era, portanto,
necessário mantê-los na condição de escravos e sem acesso a qualquer tipo de educação que lhes
permitisse o aprendizado e o exercício de atividades diferenciadas das que, costumeiramente, exer-
ciam. Em contraponto, aos homens livres cabia o aprendizado das profissões - ensino dos ofícios.
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4 “Neste período [...] o pensamento era a articulação econômica entre a agricultura e a indústria
para fortalecer o projeto de industrialização no Brasil com o apoio das oligarquias rurais. Tal projeto
de caráter político-econômico tem continuidade com Getúlio Vargas” (CANALI, s/d, p.8).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
133
SERVIÇO SOCIAL E EDUCAÇÃO
elementos para o debate sobre o exercício
profissional de assistente social1
INTRODUÇÃO
1 O presente artigo tem como base a dissertação de mestrado intitulada: “O exercício profissional
do assistente social na política de educação em Aracaju/SE: um estudo de demandas e respostas
134 socioprofissionais”, apresentada em 2014 ao Programa de Pós-Graduação em Serviço Social e
Política Social da Universidade Federal de Sergipe.
2 Assistente Social do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Sergipe – IFS (cam-
pus Aracaju); Mestre em Serviço Social pela Universidade Federal de Sergipe; Doutoranda em
Serviço Social/UFRJ.
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4 Ibidem.
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6 Ibid.
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
7 Ibid.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
149
SERVIÇO SOCIAL E EXERCÍCIO
PROFISSIONAL NOS ANOS 1990
notas sobre a noção de competência
na Lei de Regulamentação da Profissão
INTRODUÇÃO
151 3 “A questão social não é senão expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe
operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como
classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da
contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção,
mais além da caridade e repressão.” (IAMAMOTO; CARVALHO, 2003, p. 74).
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
4 “Cabe ainda assinalar que, nesse momento, a ‘questão social’ é vista a partir do pensamento
social da Igreja, como questão moral, como um conjunto de problemas sob a responsabilidade
individual dos sujeitos que os vivenciam embora situados dentro de relações capitalistas. Trata‐se
de um enfoque conservador, individualista, psicologizante e moralizador da questão, que necessita
para seu enfrentamento de uma pedagogia psicossocial, que encontrará no Serviço Social efetivas
152 possibilidades de desenvolvimento.” (YAZBEK, 2009, p. 131).
5 Para adensar o debate sobre o contexto de 1930 e a institucionalização do Serviço Social, ver
Iamamoto e Carvalho (2003).
6 A filosofia neotomista tem como fundamento as leis divinas. Deus é o princípio de tudo.
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7 Essa ruptura foi caracterizada por Netto como intenção de ruptura, “esta possui como substrato
nuclear uma crítica sistemática ao desempenho ‘tradicional’ e aos suportes teóricos, metodológicos
154 e ideológicos. Com efeito, ela se manifesta a pretensão de romper quer com a herança teórico-me-
todológica do pensamento conservador (a tradição positivista), quer com os seus paradigmas de
intervenção social (o reformismo conservador)” (NETTO, 2004, p. 159).
8 Aproximação a um marxismo sem Marx, que se deu por meio de leituras de segunda mão, em que
a fonte original, os escritos marxianos, foi ignorada (NETTO, 2004).
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12 “Trata-se de uma reunião sem caráter deliberativo, realizada no ano de 1989, entre acadêmicos
e políticos norte-americanos e latino-americanos para buscar soluções que findassem com a estag-
nação reinante por mais de vinte anos na América Latina” (CARINHATO, 2008, p. 40).
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
13 “O Plano Real descende mais ou menos diretamente do Plano Cruzado. Os seus principais
teóricos – André Lara Rezende e Pérsio Arida – tiveram papel de destaque na formulação de
159 ambos. O modelo formulado por eles era o duma estabilização obtida mediante a indexação geral
e uniforme de todos os valores de modo a neutralizar os efeitos distributivos da inflação. Eles
supunham que, quando a inflação deixasse de beneficiar e de prejudicar uns ou outros, seria fácil
e indolor eliminá-la mediante a substituição do padrão de valor, ou seja, através duma simples
reforma monetária” (SINGER, 1999, p. 25).
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
subsídio legal para enfrentar as múltiplas tarefas que lhe são demandadas no
cotidiano institucional de trabalho, protegendo-o de possíveis desvios de fun-
ção. Anteriormente à Lei nº 8.662/1993, vigorava a Lei nº 3.252/57, que so-
freu mudanças, em razão das transformações societárias que influenciaram
no processo de renovação do Serviço Social, através da atualização da lei.
15 Além das competências, a Lei 8,662 dispõe sobre as atribuições privativas: “Art. 5º. Constituem
atribuições privativas do Assistente Social: I - coordenar, elaborar, executar, supervisionar e avaliar
estudos, pesquisas, planos, programas e projetos na área de Serviço Social; II - planejar, organizar
e administrar programas e projetos em Unidade de Serviço Social; III - assessoria e consultoria a
órgãos da administração pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades, em matéria
de Serviço Social; IV - realizar vistorias, perícias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres
sobre matéria de Serviço Social; V- assumir no magistério de Serviço Social tanto ao nível de gradua-
ção como pós-graduação, disciplinas e funções que exijam conhecimentos próprios e adquiridos
em curso de formação regular; VI - treinamento, avaliação e supervisão direta de estagiários de
Serviço Social; VII - dirigir e coordenar Unidades de Ensino e Cursos de Serviço Social de graduação
e pós-graduação; VIII - dirigir e coordenar associações, núcleos, centros de estudos e de pesquisa
em Serviço Social; IX - elaborar provas, presidir e compor bancas de exames e comissões julgadoras
de concursos ou outras formas de seleção para Assistentes Sociais, ou onde sejam aferidos conhe-
cimentos inerentes ao Serviço Social; X -coordenar seminários, encontros, congressos e eventos
assemelhados sobre assuntos de Serviço Social; XI - fiscalizar o exercício profissional através dos
163 Conselhos Federal e Regionais; XII - dirigir serviços técnicos de Serviço Social em entidades públi-
cas ou privadas. XIII - ocupar cargos ou funções de direção e fiscalização da gestão financeira em
órgãos e entidades representativas da categoria profissional” (BRASIL, 1993, p. 34-35).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
168
DIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO E
CONSTRUÇÃO DAS IDENTIDADES
E ESCOLHAS PROFISSIONAIS
DAS JUVENTUDES DO IFS 1
INTRODUÇÃO
1 Esse artigo foi elaborado a partir de resultado de pesquisa bibliográfica e coleta de dados parciais
no âmbito do doutorado em Educação, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal de Sergipe, Brasil, como parte da fundamentação teórica e análise preliminar
da tese de doutoramento em fase de elaboração, sob a orientação da Professora Drª. Maria Helena
Santana Cruz. A versão do texto da tese, avaliada e aprovada no Exame de Qualificação, em 22 de
março de 2017, foi intitulada: “JUVENTUDES EM CENA: EDUCAÇÃO, TRABALHO E RELAÇÕES DE GÊ-
NERO NO COTIDIANO DO INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SERGIPE”.
Cabe assinalar que o aprofundamento da pesquisa e sistematização final da tese se dará ao longo
do processo de doutoramento, cujo prazo de defesa é março de 2019.
2 Assistente Social do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Sergipe; Mestra em
Serviço Social pela Universidade Federal de Sergipe; Doutoranda em Educação pela Universidade
Federal de Sergipe; Participa do Grupo de Pesquisa: “Educação, Formação, Processo de Trabalho e
Relações de Gênero” (UFS).
169 3 Professora Emérita da Universidade Federal de Sergipe; Professora dos Programas de Pós-
-Graduação em Educação e Serviço Social da Universidade Federal de Sergipe; Mestra e Doutora
em Educação pela Universidade Federal da Bahia; Pós-Doutora em Sociologia da Educação pela
Universidade Federal de Sergipe; Coordenadora do Grupo de Pesquisa do CNPq: “Educação, For-
mação, Processo de Trabalho e Relações de Gênero” (UFS).
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
171
Apesar de a divisão sexual do trabalho ter sido objeto de trabalhos
precursores em vários países, tem-se a França em destaque, como país em
que, no início dos anos 1970, surgiu onda de trabalhos que ligeiramente
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
relações sociais entre os sexos; mais do que isso, é um fator prioritário para
a sobrevivência da relação social entre os sexos” (HIRATA; KERGOAT, 2007,
p.599). Enfatizamos que “essa forma é modulada histórica e socialmente”4,
tendo como traços característicos a “designação prioritária dos homens à
esfera produtiva e das mulheres à esfera reprodutiva e, simultaneamente, a
apropriação pelos homens das funções com maior valor social adicionado
(políticos, religiosos, militares etc.)”5.
Hirata e Kergoat (2007) referem que praticamente todo mundo ou
quase todo mundo está de acordo com a definição conceitual que apresen-
tam sobre divisão sexual do trabalho; todavia, ponderam que, na perspectiva
de análise delas, era necessário ir mais longe no plano conceitual. Foi justa-
mente em virtude disso que propuseram distinguir claramente os princípios
da divisão sexual do trabalho e suas modalidades.
4 Ibid., p. 599.
5 Ibid., p. 599.
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
6 Os cursos que o IFS oferta em sua estrutura curricular foram distribuídos por áreas de acordo
com a divisão estabelecida no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos de 2016, disponibilizado pelo
Ministério da Educação (MEC). (BRASIL, 2016).
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
7 Ibid., p.53.
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
no qual ela vive”8, a escola então desenvolve através de seu trabalho peda-
gógico uma representação que culmina na interiorização de papéis sociais
sexuados na medida em que transmite ensinamentos e aprendizados acer-
ca “[...] dos brinquedos mais apropriados aos meninos e às meninas, das
profissões mais apropriadas para ambos os gêneros, e dos papéis sociais
vistos como adequados para homens e mulheres”9, constituindo-se aí o pro-
cesso de construção social dos papéis de gênero que repercute também
na construção das identidades profissionais como espécie de doutrinação.
É indispensável assinalar que “a posição de subordinação da mulher na
família é refletida na posição de inferioridade feminina também no mercado de
trabalho” (CHIES, 2010, p.513), pois mesmo quando “[...] ocupam um espaço
em profissões tidas como masculinas, não apenas pela sua construção
histórica”10, mas, sobretudo, “[...] pela demarcação de pré-requisitos tidos
como masculinos (força, resistência e liderança), a força de trabalho dessas
mulheres é concebida como inferior”11. Sobre essa discussão, Sorj (2004,
p.144) elucida que “[...] a posição diferencial de homens e mulheres no espaço
doméstico é um elemento central da determinação das chances de cada um no
mercado das carreiras, dos postos de trabalho e dos salários”.
Assim, salientamos que a situação diferencial de homens e mulheres
ditos masculinos, que, por sua vez, são ocupações de hegemonia masculi-
na. Convém ressaltar que há também o processo reverso, ocupações ditas
femininas apresentam-se como espaço profissional em que há relutância na
ocupação por parte daqueles que constituem o universo masculino, devido
às construções sociais de gênero que estão presentes nas mentalidades e
práticas sociais cotidianas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por fim, registramos que, ao nos depararmos com os dados das ocu-
pações dos cursos do IFS relacionados às escolhas profissionais das juven-
tudes, percebemos que a análise dos papéis sociais sexuados atribuídos às
mulheres e aos homens nas diversas instâncias da sociedade capitalista
implica a necessidade de atentarmos para as ocupações sexuadas e nos
darmos conta de relações marcadas por subordinação e dominação. As-
sim, avaliamos que as escolhas profissionais apresentam relações com a
interiorização dos papéis sociais sexuados, ou seja, estão associadas às
construções sociais de gênero, o que pôde ser evidenciado pela empiria dos
dados coletados, analisados e expostos neste trabalho.
REFERÊNCIAS
183
O CAMPO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL
E ALGUNS DESAFIOS AO
SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO
INTRODUÇÃO
6 Idem,p52.
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7 Idem, Ibidem.
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
190
8 Idem, Ibidem
9 Idem, Ibidem, p. 109.
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
Dessa forma, abre-se demanda ímpar para o Serviço Social que, se-
gundo Netto (2009, p.16, grifos do autor), tem na dimensão política do seu
projeto profissional direcionamento
196 10 No caso dos programas de educação ambiental realizados no âmbito do licenciamento, a norma-
tização instituiu o espaço consultivo das audiências públicas (SERRÃO, 2012).
11 Ilustra bem essa dificuldade, a extinção da Coordenação Geral de Educação Ambiental-CGEAM
da estrutura organizacional do IBAMA, implementada pela Medida Provisória nº 366/07 e da lacuna
mantida até hoje na estrutura administrativa desse órgão (SERRÃO, 2012).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
12 “[...] o exercício profissional sob a órbita do Estado, das empresas capitalistas e de entidades
privadas não lucrativas tem efeitos e significados distintos no processo de reprodução das relações
sociais, porque o trabalho se realiza na relação com sujeitos específicos” (IAMAMOTO, 2008, p.425).
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REFERÊNCIAS
201
CRUZANDO A TRAVESSIA
retrocessos no Licenciamento Ambiental
em tempos de Golpe no Brasil
INTRODUÇÃO
5 De acordo com a Resolução 237, as licenças são concedidas de acordo com a etapa do empreendi-
mento. Assim, existe a Licença Prévia (LP) que é a autorização de que é possível a existência daquele
empreendimento, no entanto, ela não aprova o início das obras, função essa pertencente à Licença
de Instalação (LI) que garante a execução de todas as instalações do projeto e por último é garantida
a Licença de Operação (LO) para que o empreendimento possa começar a funcionar. No entanto, é
necessário que exista a Renovação da Licença de Operação (RLO), que ocorre sempre entre 4 a 10
anos de funcionamento do empreendimento, para garantir o cumprimento das recomendações feitas
204 durante todo o processo do licenciamento.
6 No atual padrão institucional, a sociedade tem assegurado o acesso à discussão sobre a con-
cessão ou não de dada licença, bem como sobre os condicionantes do licenciamento – exigências
feitas pelo órgão ambiental ao empreendimento - através de audiências públicas, realizadas antes
da primeira licença ser concedida e durante a operacionalização da obra (BRASIL, 2009).
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8 Conforme nos lembra Harvey “Em toda parte os ricos estão cada vez mais ricos. Os cem maiores
bilionários do mundo juntaram US$ 240 bilhões a mais em seus cofres só em 2012 (o suficiente
calcula a Oxfam, para acabar com a pobreza mundial da noite para o dia” (2016, p. 11).
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9 O relatório “Global Material Flows And Resource Productivity” (PNUMA, julho de 2016) aponta
que, enquanto a população mundial duplicou de tamanho, a extração de recursos naturais globais
aumentou três vezes nos últimos 40 anos. A quantidade de matérias-primas arrancadas do seio da
207 natureza triplicou, com os países mais ricos consumindo duas vezes mais do que a média mundial.
Só os EUA representam 30% do consumo mundial, enquanto a África consome 5% com 3 vezes mais
a população norteamericana.
10 Assentada em três pilares: redução das emissões de carbono, uso eficiente dos recursos naturais
e inclusão social.
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LICENCIAMENTO AMBIENTAL
NA CONJUNTURA NEODESENVOLVIMENTISTA
de Conservação - UCs na Amazônia para construção de barragens nos rios Madeira e Tapajós.
Certamente, o caso de maior repercussão foi votação e homologação do novo Código Florestal.
Assentado no argumento da caducidade da legislação anterior, ele se prestou, efetivamente, a en-
cobrir a drástica redução das Áreas de Proteção Permanentes (APPs) – essenciais para a proteção
dos mananciais - o contrabando de milhões de imóveis rurais sob a alegada solidariedade aos “pe-
quenos produtores” e a anistia dos desmatadores (anteriores a 2008), além da transferência aos
Estados da competência para definir o que são atividades de utilidade pública e de interesse social,
“estabelecendo concessões, permissões, flexibilizações na legislação para facilitar a vida dos seus
211 produtores rurais, padronizando por baixo a questão ambiental” (LIMA, 2011, p. 1)
16 Mais informações disponíveis em: Apesar das críticas, licenciamento ambiental bate recorde
em 2006. Disponível em: http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Meio-Ambiente/Apesar-das-cri-
ticas-licenciamento-ambiental-bate-recorde-em-2006/3/12767;. Acessado em 3/de julho de 2017.
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
O LICENCIAMENTO AMBIENTAL
NA CONJUNTURA BRASILEIRA PÓS-GOLPE
E o autor conclui:
20 Outros retrocessos estão previstos: Venda de terras para estrangeiros (PL 4059/2012), redução
das áreas protegidas e de UCs (MP 756/2016), liberação de agrotóxicos (PL 6299/2002 - PL do Vene-
no e PL 34/2015 - Rotulagem de Transgênicos), facilitação da grilagem de terras, ocupação de terras
públicas de alto valor ambiental e fim do conceito de função social da terra (MP 759/2016). Ataque
216 a direitos trabalhistas de trabalhadores do campo (PL 6422/2016 - Regula normas do trabalho rural,
PEC 287/2016 - Reforma previdenciária e PLS 432/2013 - Altera o conceito de trabalho escravo),
ataque a direitos de populações ribeirinhas e quilombolas. (MP 759/2016 e PL 3.729/2004), além da
flexibilização das regras de Mineração (PL 37/2011 - Código de Mineração) (INESC, 2017).
PAULO ROBERTO FÉLIX DOS SANTOS EVERTON MELO DA SILVA LARYSSA GABRIELLA GONÇALVES DOS SANTOS
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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