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Abaporu Tropicalista: a busca pela brasilidade artística no século XX

Abaporu Tropicalista: the search for artistic brasility in the 20th century

RESUMO
Esse trabalho tem como objetivo buscar entender as influências da Semana de Arte
Moderna, principalmente com o Movimento Antropofágico de 1928 no Movimento
Tropicália de 1967. Em um espaço de quase 40 anos, esses grupos movidos pelas
insatisfações de suas épocas conversaram um com o outro, com a sociedade que estavam
inseridos no tocante aos discursos, e pela procura de uma brasilidade artística pautada na
mistura de influências internas e externas. Além disso, esse artigo pretende apresentar
modos de ver a cultura como passageira e mutável, guiada por leituras de livros e artigos
que tratam dos temas. Também, procura compreender que sociedade é essa dos anos 60 que
repete o conservadorismo, ao mesmo tempo que tenta se convencer de ser vanguardista e
revolucionária. Mostrando a importância dos movimentos para as mudanças dos modelos
de vida e da compreensão do próprio país e suas nuances de brasilidades, muitas vezes
ignoradas.
PALAVRAS-CHAVE: movimento antropofágico; movimento tropicália; brasilidade;
mutável; artística.

ABSTRACT
This work aims to try to understand the influences of the Modern Art Week, mainly with
the Anthropophagic Movement of 1928 in the 1967 Tropicália Movement. In a space of
almost 40 years, these groups moved by the dissatisfaction of their times talked to each
other, with society that were inserted in what concerns the speeches, and the search for an
artistic Brazilianness based on the mixture of internal and external influences. In addition,
this article intends to present ways of seeing culture as fleeting and changeable, guided by
readings of books and articles that deal with the themes. It also seeks to understand which
society is that of the 60s that repeats conservatism, while trying to convince itself to be
avant-garde and revolutionary.
KEY WORDS:anthropophagic movement; tropicália movement; Brazilianness;
changeable; artistic.
INTRODUÇÃO
Esse artigo tem como objetivo propor uma reflexão sobre a influência artística da
Semana de 22 no movimento tropicalista, e suas contribuições para se pensar o que poderia
ser brasileiro. No caso, não entrando na discursão entre o que poderia considerado uma
“arte brasileira”, se seria apenas a arte criada no país ou por alguém nascido nele, ou ainda
utilizando de elementos culturais da região. O Tropicalismo possui inspiração no Manifesto
Antropofágico de 1928, no que se refere às características de suas respectivas intenções.
Para começar, ambos foram malvistos em suas primeiras amostras. Até tomates foram
jogados nos palcos ao fundo, não muito doce, som de vaias. Foram movimentos artísticos
que tentaram trazer novas reflexões as suas épocas através de elementos de cunho artístico
como a literatura e a música.

O "devorar para não ser devorado", apareceu como um cochicho do universo em


seus ouvidos atiçando o ato de questionar. Tentaram buscar as respostas internas no exterior.
O de fora inspirava - por vezes ditava, mas não representava, então não tinha sentido em
reproduzir fielmente e fingir ser parte da cultura brasileira. Já que, era latente o pensamento
existencial. Ora, quem somos? Em tempos “sombrios” as artes são tão políticas quanto as
próprias. A partir do contexto histórico de cada época, é possível compreender essas
necessidades de mudanças.

Assim, se consegue compreender o que levou os “rebeldes com causas” ao


questionamento dos moldes conservadores, a valorização exacerbada pelo que vem de fora,
em conjunto com a quase exclusão do que era nacional feita por alguns grupos. Na década
de 1960, havia diversos grupos que possuíam outras ideias inversas a mistura de ambos,
sempre enaltecendo um Brasil – muitas vezes o país era musicalmente recortado e se
cantavam apenas algumas realidades e algumas deturpações dela; era uma valorização do
nacional e repulsa por tudo que vinha de fora. Contudo, existiam aqueles que não
entendiam os motivos de não se misturar, que mesclavam guitarra elétrica com baião, a fim
de criarem uma brasilidade jamais encontrada, talvez quase morta que, com esse grupo
conhecido como Tropicália, teve sua ressuscitação.
A pesquisa pra este trabalho foi feita a partir de livros e artigos que apresentassem a
relação de influências do movimento antropofágico no tropicalismo, a ideia surgiu através
da leitura de um livro chamado Movimentos Culturais de Juventude, escrito por dois
professores de história formados pela USP (Universidade de São Paulo), António Carlos
Brandão e Milton Fernandes Duarte. A partir de um capítulo desse livro, em que sugere a
relação da antropofagia no tropicalismo, buscou-se entender melhor os impactos de um
sobre o outro após quase 40 anos de diferença.

É importante saber um panorama do contexto histórico, social e cultural da época,


para que se possa compreender melhor quais as relações entre os dois movimentos. E
refletir sobre o que fez o Tropicalismo utilizar-se do discurso antropofágico dos anos 20
para embasar as suas letras das músicas, e em seus visuais. Para entender também, a
importância do que acontecia em todo o mundo na década de 60, com foco no Brasil em
seu tempo ditatorial.

É válido ressaltar que o tropicalismo surgiu, com maior impacto, entre 1967 e 1969.
Época de duras repressões e de fortes movimentos estudantis pelo mundo. Começam a
surgir ideias e ações que se contrapõem com os valores existentes em determinadas
sociedades, assim aparecem as manifestações de contracultura que é um “[...]conceito
surgido na imprensa norte-americana nos anos 1960 para designar os movimentos
alternativos de caráter eclético, místico-político” (SILVA; GONÇALVES, 2018, p. 2) 1 .
Tem-se como principal movimento da contracultura mundial o Movimento Hippie, com seu
lema “paz e amor", que por meio do visual e das atitudes, visava confrontar o governo dos
EUA juntamente os militares. Assim os hippies iam sempre de encontro aos padrões. Os
cabelos cortados e barbas feitas pelos soldados foram confrontados e substituídos pelos
cabelos longos, barbas compridas e desgrenhadas; as calças justas pelas “boca de sino” e
tons de cauflagem pelas outras cores.

Nota-se uma forte influência no tropicalismo com suas roupas extravagantes e fora
do usual; com suas aparências, com cabelos despenteados e longos que fugiram do padrão
militar como uma afronta a aquela situação, como um modo padronizado que estava sendo

1
SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
ditado pela sociedade na época. E o Brasil vai seguindo nessa linha, uma via hipócrita que
enquanto criticava “[...] à inocência de um país que se modernizava [...], ao mesmo tempo,
andava de braços dados com arcaicos padrões de comportamento” (BRANDÃO; DUARTE,
2004, p.79)2. Aqui cabe ressaltar a relação com um local de inferioridade que as minorias
ainda eram colocadas, mesmo que para os quatro cantos do mundo se gritavam “liberdade,
liberdade”.

Com todas as influências e questionamentos, ambos movimentos buscavam na arte


características que representassem o Brasil, de caráter ambicioso devido a pluralidade que
esse país carrega. Procuraram mostrar outras faces brasileiras, como sua linguagem, seus
ritmos musicais já existentes e os outros criados a partir de novas misturas, partindo do
pensamento da inexistencia pureza na cultura e que não precisava sobrepor a externa sobre
a interna. Adicionando o informal na norma dita culta, ou guitarras elétricas com triangulo.
Ambos os movimentos, de diferentes maneiras, foram devorando muitas formas de arte
como se essas fossem um verdadeiro self servisse cultural.

SE VEM DE FORA? ELA DEVORA3

Abaporu vem da língua tupi-guarani e significa o “homem que come gente” (canibal,
antropófago). Essa palavra Abaporu, é mais conhecida por intitular a obra da autora Tarsila
do Amaral, feita em 1928 como um presente para seu marido na época, o então escritor
Oswald de Andrade, que no mesmo ano realizou o Manifesto Antropofágico inspirado no
nome da pintura. O movimento modernista tinha como característica o experimentalismo
que entrelaçava a arte literária, as artes plásticas, entre outras como música e dança -
apresentadas na Semana de Arte Moderna ou Semana de 22, seguindo influências das
vanguardas europeias - como exemplo, tem-se o cubismo, o futurismo, o expressionismo, o
surrealismo e o dadaísmo que surgiram em diversos lugares da Europa no século XX,

2
BRANDÃO, Antonio Carlos; DUARTE, Milton Fernandes. Movimentos culturais de juventude. 2a ed.
Reform., 23a impressão, São Paulo, Moderna; Coleção polêmica, 2004.

3
Referência a música “Fome Come” (1998) da banda brasileira “Palavra Cantada”, composta pelos músicos
Sandra Peres e Paulo Tatit. Banda criada em meados dos anos 1980 em São Paulo. Disponível em:
http://enciclopedia.itaucultural.org.br/grupo636001/palavra-cantada. Acesso em: 19 de nov. 2019.
contudo, trazendo para o Brasil um esboço de arte nacional. Buscando através das cores e
temas, que remetessem a brasilidade, entregar para as pessoas uma arte quase que
genuinamente brasileira. Era o devorar para não ser devorado; consumindo a cultura de fora,
porém, misturando, mesclando e triturando com a de dentro, para que se formasse algo
brasileiro.

Esse movimento tinha como objetivos “[...] a busca do atual, o culto ao progresso, a
incorporação de novas formas artísticas, como o cinema e a afirmação de que a arte não é
uma cópia da realidade.” (MAGNOLO, 2016, p. 4) 4 . A arte podia representar, não
necessariamente ser algo condizente com o que acontecia no real, como um retrato fiel do
tempo. Tentando seguir por outros caminhos que iam de encontro aos clássicos, a Semana
de Arte Moderna tinha como proposta uma ruptura com os modelos artísticos
convencionais, queria explorar outras formas, principalmente, de escritas e de pinturas. Os
participantes que mais se destacaram no início do movimento foram: na literatura o Oswald
de Andrade, o Mário de Andrade, Manuel Bandeira e o Menotti Del Picchia; nas artes tem
como destaque a Tarsila do Amaral e a Anita Malfatti. O evento aconteceu em fevereiro de
1922, no Theatro Municipal em São Paulo, reunindo apresentações de diversas áreas
artísticas. Entretanto, não foi bem aceito, recebendo diversas vaias e críticas no dia seguinte,
inclusive, do autor Monteiro Lobato em relação a artista Anita Malfatti.

Os modernistas da primeira fase (ou fase heroica) também queriam as artes plásticas
e a literatura como ferramentas de reflexão, e não apenas para contemplar e distrair. Era
uma revolução estética a fim de quebrar esses padrões europeus, trazendo uma
independência cultural para o Brasil. Talvez uma tentativa de reafirmar a brasilidade
cultural. Em 1928, Oswald de Andrade apresenta o Manifesto Antropófago que tem a
célebre frase “tupi or not tupi that is the question", refletindo sobre a representação do
indígena. Nessa, Oswald talvez tenha usado numa intenção mais geral para poder obter uma
reflexão mais clara. Portanto, há de se notar também que este movimento possui muitas
referências que remetem ao D. Pedro I como imperador, “A nossa independência ainda não
foi proclamada. Frase típica de D. João VI: - Meu filho, põe essa coroa na tua cabeça, antes

4
MAGNOLO, Talita Souza. O Resgate do movimento antropofágico pelos tropicalistas no festival de 67.
Intercom- Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares de Comunicação. Curitiba, 2016.
que algum aventureiro o faça” (ANDRADE, 1928, p. 6) 5 . Então, satirizando a
"independência dependente" que o Brasil teve, e que no ano de 1922 faria seu centenário.

Com muitas alusões à época da coroa e da independência, Oswald de Andrade


(1928, p. 4) 6 , apresenta um universo em que o Brasil foi construído, numa falsa
independência, em que “[...] D. Pedro rompe definitivamente com a antiga pátria-mãe,
sagrando-se imperador [...] no mesmo ano.” (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010, p.118)7.
Além das críticas políticas, há as religiosas, que ao decorrer do manifesto, ele cita a
influência da igreja e o que alguns representantes aclamados deixaram de herança, Andrade
(1928, p. 4) , diz que “Contra o Padre Vieira [...] O rei-analfabeto dissera-lhe: ponha isso no
papel, mas sem muita lábia. Fez-se o empréstimo [...] Vieira deixou o dinheiro em Portugal
e nos trouxe a lábia”8. Como se apresentasse a chegada à nossa herança no que se aproxima
da expressão atual “jeitinho brasileiro de conseguir as coisas".

De maneira sutil, talvez tanto pela lírica quanto por uma possível repressão, por
meio dessas referências o manifesto vai se armando para a hora de devorar o outro. Uma
antropofagia cultural, se assim for possível sua existência, como o ser humano e a cultura
não existem sem o outro, devorando o ser humano seria devorar a sua cultura também. Para
além da sua carne, numa linha mais metafórica, também o seu jeito de ser, falar, se
comportar, vestir, pintar, escrever, cantar e se representar. A antropofagia dos modernistas
desejava que sua sociedade se deleite com um banquete cultural com o que de mais fresco
pode ser oferecido pelo seu país.

5
ANDRADE, Oswald de. O manifesto antropófago. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e
modernismo brasileiro: apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas. 3ª ed. Brasília,
Petrópolis: Vozes.

6
ANDRADE, Oswald de. O manifesto antropófago. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e
modernismo brasileiro: apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas. 3ª ed. Brasília,
Petrópolis: Vozes.

7
DEL PRIORE, Mary; VENANCIO, Renato. Uma breve história do Brasil. São Paulo, Planeta do Brasil,
2010.

8
ANDRADE, Oswald de. O manifesto antropófago. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e
modernismo brasileiro: apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas. 3ª ed. Brasília,
Petrópolis: Vozes.
A Semana de 22 também funcionou como uma crítica a Exposição do Centenário,
que tinha o intuito de comemorar os cem anos da independência do país, apresentando uma
versão europeizada do brasileiro, foi organizado pelo, então presidente da época o Epitácio
Pessoa. Esse teve em seu governo marcado por intensas agitações políticas. Para além dessa
exposição que durou onze meses, existia a insatisfação com o governo. Com o
descontentamento “no meio civil [...] não faltavam denúncias contra o sistema político da
República Velha.” (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010, p. 178) 9. A insatisfação era tanta
que “[...] o mesmo ocorrendo entre intelectuais veiculados à Semana de Arte Moderna de
1922” (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010, p.198)10.

Vale ressaltar outros acontecimentos, como a criação do Partido Comunista


Brasileiro (PCB) no ano de 1922. Esse, por sua vez, lembrando da presença no país do
movimento operário com ideais socialistas disseminados por algumas pessoas da elite, que
ao retornarem para o Brasil, traziam nas bagagens divergências da atmosfera política na
época. Além também dos resquícios dos movimentos tenentistas no mesmo ano na Revolta
dos 18 do Forte de Copacabana. Considerando que esses pensamentos contribuíram para
“[...] a eclosão de um movimento protagonizado por oficiais de nível médio, contrários às
oligarquias e ao liberalismo, que propunham a centralização do poder.” (MAGNOLO, 2016,
p. 3)11.

E é nesse cenário que uma outra parte da elite, conhecida como "Elite intelectual", a
qual os modernistas faziam parte, eram em grande escala um grupo padronizado, sem
representatividade, se olharmos no tocante as minorias. Eram de maioria homens e brancos.
As pessoas que foram ao teatro assistir também eram desse nicho. Talvez, o que os
diferenciassem era a consciência de si mesmo, de seu lugar, ou mesmo uma força interna
clamando por mudanças específicas.

9
DEL PRIORE, Mary; VENANCIO, Renato. Uma breve história do Brasil. São Paulo, Planeta do Brasil,
2010.

10
DEL PRIORE, Mary; VENANCIO, Renato. Uma breve história do Brasil. São Paulo, Planeta do Brasil,
2010.
11
MAGNOLO, Talita Souza. O Resgate do movimento antropofágico pelos tropicalistas no festival de 67.
Intercom- Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares de Comunicação. Curitiba, 2016.
MINHA LIBERDADE TERMINA ONDE COMEÇA A DO MILITAR

Em 1964 ocorre o Golpe Militar, com uma promessa de colocar o Brasil nos eixos,
os militares tomaram o poder do país com viés ditatorial e armados contra o “fantasma do
comunismo” que tanto assombrava o mundo da logística capitalista da Guerra Fria,
principalmente o “lado” dos EUA. A influência desse país era muito forte dentro de
algumas sociedades latino-americanas e o “[...] Brasil tinha-se caracterizado [...] dentre os
países grandes do continente, como o mais fiel aliado das iniciativas da política norte-
americana para com a América Latina” (HOLANDA, 2007, p. 75) 12. Essa atuação do “Tio
Sam” no país veio para os civis discretamente através das artes e mídias como, por exemplo,
o cinema. Os EUA já possuíam uma forte posição na produção de filmes e exportação deles,
ultrapassando a Europa que se recuperava dos prejuízos das guerras. Em relação ao tête-à-
tête entre governos acontecia por muitas cobertas até hoje desconhecidas totalmente.

Havia muita pressão externa e interna para que o Brasil, que já tinha uma relação
assimétrica de submissão com os EUA, cedesse aos ideais estadunidense e aos “[...]
argumentos maniqueístas da Guerra Fria” (HOLANDA, 2007, p. 125)13 entre os atropelos
dos governos anteriores e mais ainda os dos próximos pós-golpe. Assim a “situação política
interna do Brasil após o final de 1962 deteriorar-se-ia rapidamente...” (HOLANDA, 2007, p.
125)14. Tudo isso contribuindo para a crise de 1964.

Não que tenha sido uma ação surpresa surgida de algum lugar do nada, há indícios
de que desde os anos quarenta tinham a ideia de um possível golpe militar. Às vezes, tem-
se a sensação de que as coisas acontecem por acaso sem nenhum plano por trás, pensando
de maneira não conspiratória, contudo, de forma estratégica para conduzir o país para o
caminho que achavam que o colocaria no rumo ao desenvolvimento e mais próximo dos
EUA. A ditadura pode ter sido planejada meticulosamente, mas talvez tenha sido guiada

12
HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil republicano. Economia e cultura (1930 – 1964). In: História geral
da civilização brasileira; t. 3, v. 11. 4ªed. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2007.

13
HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil republicano. Economia e cultura (1930 – 1964). In: História geral
da civilização brasileira; t. 3, v. 11. 4ªed. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2007.

14
HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil republicano. Economia e cultura (1930 – 1964). In: História geral
da civilização brasileira; t. 3, v. 11. 4ªed. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2007.
por complôs ilusórios, quase que fantasmagóricos, de forças comunistas entre outras
ameaçadoras dos, tão defendidos, bons costumes e afins.

Havia muito, tal intervenção era discutida em instituições, como a Escola


Superior de Guerra (ESG), criada em 1948, ou o Instituto de Pesquisa e
Estudos Sociais (Ipes), fundado em 1962 por lideranças empresariais.
Outro indício de que o golpe vinha sendo tramado havia tempos ficou
registrado nos documentos da operação “Brother Sam”, através da qual se
prevê, caso houvesse resistência, que o governo norte-americano “doaria”
110 toneladas de armas e munições ao Exército brasileiro (DEL PRIORE;
VENANCIO, 2010, p. 201)15.
Para além da economia, algumas outras áreas foram afetadas durante o golpe. A
mais abalada foi a liberdade. Com a instauração da ditadura no país, logo uma série de
medidas e atos foram instalados na região.

Os primeiros meses pós-golpe ficaram marcados pela detenção de


aproximadamente 50 mil pessoas. Os militares realizaram uma ‘operação
pente-fino": de rua em rua, de casa em casa, procuravam suspéitos, livros,
documentos, qualquer coisa que ligasse os acusados ao governo anterior
ou à ‘subversão’[...] o interrogatório era acompanhado de espancamento,
que endurecia conforme a ‘perigulosidade’ da vítima (CHIAVENATO,
1994, p.123)16.
A ditadura silencia seu povo, de modo que apenas quem está no poder tem voz. É
um silêncio que se engasga. A ditadura brasileira tirou do seu povo o direito livre de
manifestarem suas insatisfações, desejos, criatividade, ou qualquer coisa que o ser humano
produzisse com algum teor contrário ao vigente ditatorial.

São mantidas a Constituição de 24 de janeiro de 1967 e as Constituições


Estaduais; O Presidente da República poderá decretar a intervenção nos
estados e municípios, sem as limitações previstas na Constituição,
suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10
anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais, e dá
outras providências. (BRASIL, 1968)17.

15
DEL PRIORE, Mary; VENANCIO, Renato. Uma breve história do Brasil. São Paulo, Planeta do Brasil,
2010.

16
CHIAVENATO, Júlio José. O Golpe de 64 e a Ditadura Militar. 6ª ed. São Paulo, Moderna; Coleção
Polêmica, 1994.

17
BRASIL, Constituição (1967), Ato Institucional nº 5, 1968. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ait/ait-05-68.htm. Acesso em: 22 de nov. 2019.
As ações contra a liberdade de expressão, de livre transito dos civis brasileiros
piorou com a implementação do Ato Institucional 5, vulgo AI-5, no dia 13 de dezembro de
1968. Com esse ato as pessoas foram impedidas de frequentar certos locais, de realizar
qualquer atividade com teor político, além da proibição do voto e do direito ao habeas
corpus. Assim entre esse período “[...] a ditadura destruiu a economia, institucionalizou a
corrupção e fez da tortura uma prática pólitica. Envileceu a nação e abalou o caráter brasileiro.”
(CHIAVENATO, 1994, p.5)18

No meio da confusão da década de 60 qualquer um se perdia fácil, estavam todos


fracos e sensíveis a qualquer discurso. Talvez, buscar algo que fosse nosso poderia ser uma
maneira de encontro e até de entendimento do que estava acontecendo. A arte foi um meio
de expressão e por consequência de repressão também.

O ANO QUE NUNCA ACABOU, VULGO 1968

Os jovens na França deixavam clara a mensagem em seus muros “Il est interdit
d'interdire!” Tal frase vingou no Brasil com a canção É proibido, proibir! cantada pelo
Caetano Veloso, que é a tradução literal da citação. O fim dos anos 60 foram marcados por
manifestações em diversos lugares do mundo, movida principalmente pela juventude e por
trabalhadores. Esses estavam cansados da velha política, das velhas promessas que
percebiam serem falsas.

O ano de 1968 foi marcado por fortes ebulições, transformando aspectos políticos
e culturais, tanto no Brasil quanto mundo a fora. Na Europa, mais
especificamente na França, é de grande relevância uma série de manifestações
promovidas por jovens estudantes e intelectuais que ficou conhecido como ‘Maio
de 1968’. (SILVA; GONÇALVES, 2018, p. 2) 19.

Tal movimento teve uma enorme força na França, apesar de existir divergencias de
motivações entre esses dois grupos, tanto alunos quanto trabalhodores franceses se uniram -
para em uma das maiores greves da França, para exigir melhorias econômicas, culturais e

18
CHIAVENATO, Júlio José. O Golpe de 64 e a Ditadura Militar. 6ª ed. São Paulo, Moderna; Coleção
Polêmica, 1994.

19
SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
sociais. A movimentação começou em março na Universidade de Nanterre com
manifestações por parte dos estudantes contra a guerra no Vietnã. Após diversas
manifestações as aulas foram suspensas e a faculdade de letras foi fechada, assim os
estudantes deixaram Nanterre e começaram a ocupar a Sorbonne – edificio histórico que
abriga a universidade mais antiga de Paris, sendo um ponto estratégico para iniciar as
revindicações. A conclusão se deu com diversos feridos por conta do confronto com os
policiais e o fechamento da Soubonne. Assim se seguiu com barricadas e protestos por
partes dos participantes.

Houveram diversas greves marcando uma abertura abrupta da cultura francesa ao


diálogo com a sociedade e com as mídias. Sendo um evento considerado importante para a
concientização e questionamento da sociedade moderna, para se refletir não só o que estava
acontecendo, mas também o que estava se perdendo.

O Maio de 1968 francês reverberou no mundo chegando no Brasil e influenciando


os jovens e trabalhadores a questionarem o quanto já estavam perdendo o pouco que tinham.
Foi nesse ano que o AI-5 surgiu repreendendo de diversas formas a liberdade de expressão,
já que “os militares tentavam refrear ideias e ações dos militantes de esquerda, em geral
oriundos de movimentos sociais na época, especialmente os estudantes.” (SILVA;
GONÇALVES, 2018, p. 5)20. Ao cantar finalizar a apresentação da canção “É proibido, proibir!”
acusando o público de não estarem entendendo o que estava acontecendo ao redos, Caetano
confronta não apenas os militares, mas também a população.

E foi assim que as greves pelo mundo se apresentavam. Confrontando à todos


inclusive o próprio papel de cada um no meio em que viviam, já que a alienação era bem
vinda por parte da política ditatorial. O ano de 1968 se tornou “eterno” pelo impacto que
ele teve ecoando por todo o mundo não apenas naquele período, mas também atualmente, já
que diversos assuntos continuam sendo pautas recorrentes em manifestações ao redor do
mundo

ORGANIZO O MOVIMENTO: TROPICÁLIA


20SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
Mesmo com toda essa proibição do exercício de liberdade alguns grupos não se
acomodaram, e um deles foi o da arte. Arte é o campo mais rechaçado em ditaduras, porque
ela incomoda mesmo no abstrato. Os artistas da época usaram carnes apodrecidas,
denúncias em forma de poesia, as pinturas saiam das telas. Nesse período as obras de arte
passam a significar além de uma única ideia de uma pessoa, ela é o conjunto, a interação
com o público – sem isso não há obra. Para além disso, tem as influências externas, ainda
clandestinas, que eram trazidas pela juventude da elite que estudava fora do país.

Essa mistura permitia se obter o conhecimento do que era produzido e pensado lá


fora, já que dentro do país a circulação de qualquer manifestação ou atividade contra o
ideário ditatorial não era permitido, logo censurado. As artes foram alvo, porém não foram
extintas. O grupo artístico de destaque para o presente artigo é o Movimento Tropicália.
Formado na década de 1960, porém, com o auge em 1968 após o lançamento do disco
Tropicália, tendo como principais integrantes os nordestinos Caetano Veloso, Gal Costa,
Gilberto Gil, Tom Zé, Torquato Neto, Capinam, o grupo paulista Os Mutantes, ainda
contava com Nara Leão, Rogério Duprat e entre outras pessoas, que contribuíam nos
quesitos como a arte da capa do disco e imagem do grupo. Esse grupo de jovens “[...]
acreditavam qua a música poderia ser melhor, ou pelo menos muito diferente, do que aquilo
que já estava sendo feito, sem desprezar o que já existia” (SILVA; GONÇALVES, 2018, p.
4)21. Afinal esse movimento tinha a metáfora da antropofagia como um guia, assim como a Semana
de 22, porque, para eles a busca pela brasilidade está em devorar a si e as culturas.

O nome do movimento/albúm apareceu primeiro como título de uma música composta por
Caetanop Velono em 1967, tal designação foi uma “[...] sugestação do fotógrafo Luís Carlos
Barreto, em referência à obra de Hélio Oiticica22.” (SILVA; GONÇALVES, 2018, p. 7)23.

O movimento mostrava uma influência através da incorporação de “[...] dados


modernos e atuais à ‘geléia geral brasileira’, realçando a mistura do arcaísmo e

21
SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
22
Hélio Oiticica (1937 – 1980) “ havia elaborado uma instalação constituída por um labirinto de madeira
forrado com areia e pedras, que, ao ser pecorrido pelo escpectador, colocava-o em contato sensorial com
diversos elementos naturais e culturai do Brasil...” (SILVA; GONÇALVES, 2018, p. 7). Assim, vendo
semelhanças entre as propostas o nome do grupo foi inspirado na instalação, ficando então conhecido como
Tropicália.
23
SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
modernização...” (BRANDÃO; DUARTE, 2004, p. 82) 24 . Incorporando misturas de
elementos, não apenas nacionais como internacionais. Não era do movimento militante de
esquerda que apenas trazia músicas de protesto, entretanto não nadava na onda
comercialista, considerada na época por alguns como canções alienadas, representadas pela
Jovem Guarda com o Tremendão, o Rei e a Ternurinha. É como se o tropicalismo
trabalhasse “[...] a política e a estética num mesmo plano, mostrando as contradições da
nossa modernização subdesenvolvida a partir de outra forma de arte” (BRANDÃO;
DUARTE, 2004, p. 83)25.

Como se esse grupo não se encaixasse em nenhum dos outros, como se


questionassem essas posições encontradas nos extremos. Um grupo indo na linha de
patriotismo exacerbado e outro carregando um “complexo de vira-lata” cego pela ilusão da
grama do vizinho parecer ser mais verde. O movimento tropicália misturava tudo numa
antropofagia do seu próprio passado já devorado, influenciado pelos modernistas da fase
heroica, e do seu povo com seus sons próprios, como exemplos o samba e o baião. Era uma
“neo-antopofagia” novamente mastigada. Uma ruminação da cultura, ideias e estilos que
para além do seu também devorava o que vinha do outro, com intuito de descobrir algo,
mesmo sem entender o que se estava buscando. Se cantava uma história em um domingo no
parque 26 na Ribeira em Salvador ao som de guitarras elétricas estrangeiras tocadas por
brasileiros em um concurso musical exibido na televisão.

[...] o Tropicalismo criou uma estética antropofágica contemporânea, que


procurava deglutir os movimentos de vanguardas vindos de fora no ‘primitivismo’
da cultura popular brasileira, a partir da relação de contraste entre o moderno e o
arcaico, o místico e o industrializado, o primitivo e a tecnologia. (BRANDÃO;
DUARTE, 2004, p. 83)27.

24
BRANDÃO, Antonio Carlos; DUARTE, Milton Fernandes. Movimentos culturais de juventude. 2a ed.
Reform., 23a impressão, São Paulo, Moderna; Coleção polêmica, 2004.

25
BRANDÃO, Antonio Carlos; DUARTE, Milton Fernandes. Movimentos culturais de juventude. 2a ed.
Reform., 23a impressão, São Paulo, Moderna; Coleção polêmica, 2004.

26
Nota nossa: Música Domingo do Parque do cantor Gilberto Gil, apresentada no III Festival de Música
popular, na TV Record, no ano de 1967. Foi acompanhada pela guitarra elétrica da banda Mutantes.

27
BRANDÃO, Antonio Carlos; DUARTE, Milton Fernandes. Movimentos culturais de juventude. 2a ed.
Reform., 23a impressão, São Paulo, Moderna; Coleção polêmica, 2004.
Trazendo à tona o visual como forma de chamar atenção para o que eles queriam
dizer, com a intenção de “[...] desconstruir tudo, desorganizar para então organizar o seu
próprio movimento.” (SILVA; GONÇALVES, 2018, p. 9)28. Se apresentavam nos festivais de
músicas na televisão e por chamarem atenção até tiveram um programa - Divino
Maravilhoso na TV Tupi, apresentado por Caetano Veloso e Gilberto Gil. Incluindo uma
apresentação de Veloso cantando uma música de Natal chamada Boas Festas do cantor
Assis Valente com uma arma apontada para a cabeça. Simbolizando que apesar da canção
ser conhecida e ter sucesso, ninguém conhecia, nem creditava o autor dela; ele se suicidou
com um tiro na cabeça aos 46 anos. Essa apresentação mesclava a beleza da música com a
dureza de uma vida desconhecida e vítima de uma sociedade racista e tóxica. Dois dias
após o programa, Veloso e Gil foram presos e exilados. O AI-5 estava instalado com
brechas e mais brechas que nada dizia sobre o que poderia acontecer com aqueles que
nadassem contra a maré. Uns fugiam, outros eram exilados, outros torturados, outros
assassinados, mas a maioria era calada de tal forma que mesmo no século XXI ainda há
familiares que procuram membros desaparecidos.

Foram ouvidos, porém, muito mal compreendidos em sua época, tanto pela direita
quanto pela esquerda, o tropicalismo “[...] tentou traduzir a realidade brasileira com
irreverência e humor ‘digerindo’ a realidade nacional por meio de uma arte renovada e
antropófaga [...]”. (MAGNOLO, 2016, p. 9) 29 . O movimento tinha como proposta
evidenciar algumas ações da sociedade brasileira que perpetuavam o conservadorismo, para
além de cantar sobre o Golpe de 64. Principalmente, criticavam alguns elementos, como a
igreja, a família e o Estado que insistiam em sustentar uma moral e uns costumes unilaterais
que não abarcavam a diversidade que existiam no país.

A crítica proposta nas músicas vai além daquela endereçada às forças repressoras
do Estado-militar, e abrangem as posturas conservadoras no âmbito musical,
estático, comportamental e sexual. Lançado no ano de 1968 o disco-manifesto
coletivo Tropicália ou panis et circencis, representa um novo momento na canção

28
SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
29
MAGNOLO, Talita Souza. O Resgate do movimento antropofágico pelos tropicalistas no festival de 67.
Intercom- Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares de Comunicação. Curitiba, 2016.
brasileira: a abertura explícita aos diálogos culturais. (SILVA; GONÇALVES,
2018, p.1)30.

O alvo não era apenas a situação do governo, mas também o papel de cada
individuo e como os considerados elementos pilares de sustentação do Brasil funcionavam,
como controlavam e manipulavam. As músicas também eram uma chamada de atenção
para a sociedade quem sabe acordar e entender o que estava acontecendo no país.Além
disso, criticavam a forma de fazer música, já que a maioria das canções do albúm possuem
distorção e uma grande mistura de elementos, talvez sendo “como uma maneira de romper
com a estética hamônica...” (SILVA; GONÇALVES, 2018, p.11)31.

Apesar de serem, assim como os modernistas de 1922, um grupo elitista que


conversa entre ruídos para o povo que, talvez desconhecesse o movimento, mesmo esse
trazendo suas músicas raízes e tradicionais desconheciam seu poder de serem influências de
movimentos, anos depois, aclamados, cultuados e copiados pelo mundo. É provável que
esse povo extra elite ainda desconheça a sua força cultural.

Por meio de referências bem rimadas e musicadas, o tropicalismo na sua confusão


dava pirueta no palco, ria do sério, chocava com pouco uma sociedade que se apegava ao
fútil e ilusório. Que no sonho utópico e louco entre armas, miséria e corrupções eram
regados no Panis et Circense divulgado nos programas de televisão e nos cinemas. As
músicas do albúm e a própria capa faziam referencias ao consumo, a cultura de massa e
afins. Inclusive a capa tinha como proposta “[...] fazer uma paródia das fotos de família que,
tradicionalmente, as classes abastadas brasileras costumavam fazer...” (SILVA;
GONÇALVES, 2018, p. 9)32.

Era uma época que o mundo se encontrava em uma bipolarização forçada e


desenfreada com sede de um poder acima de coisas como vidas. Opiniões se tornavam
verdades e conspirações moviam governos e deveres morais. A Tropicália tentava com suas
músicas e visuais se aproveitar da arte e da mídia como meios condutores de apresentar
possíveis reflexões e críticas que poderiam despertar as pessoas para o momento que

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SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
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SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
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SILVA, B.S.M.; GONÇALVES, J. Y. . Contracultura e Transgressão: uma análise do álbum “tropicalia
ou panis et circencis” (1968). CLIO. Recife, v.36, n. 1, 2018.
estavam. Talvez aproveitando tudo que estava ao alcance deles, mesmo se perdendo pelo
caminho, já que aquilo também era novidade para o grupo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Um dos fatores fundamentais da mudança cultural é a criatividade através de
invenções e descobertas.” (RIBEIRO, 1978, p. 128) 33. Essa frase do antropólogo Darcy
Ribeiro abre o presente capítulo pela descrição cabível que, de certa forma, apresenta o que
se encontra no modelo trazido pela mudança cultural. Com invenções e descobertas se
transforma a forma, desnuda a cultura de um lugar sem esquecer que essa é metamórfica,
ela se transforma com o tempo; é de algum modo muito semelhante ao seu produtor
humano efêmero, porém, essa tem um bônus de ser passageira em sua ilusão de perenidade.

Embora se possa dizer que a cultura de qualquer civilização do passado ou do


presente é também esta busca de autenticidade, a reconstituição dos modos pelos
quais ela é buscada e das vicissitudes em que incorremos em buscá-la é
indispensável para compreender nossa criatividade cultural. (RIBEIRO, 1978, p.
146)34.

Enquanto existir o ser humano existirá a cultura porquê “[...] o homem é produto e
produtor da cultura” (BRANDÃO; DUARTE, 2004, p.10) 35 . Sendo assim de caráter
mutável e transformador para demonstrar o modo de uma sociedade criar para refletir. Essa
forma de apresentar a cultura brasileira com uma noção de pertencimento de algo criado em
sua terra para os da sua terra no Brasil, demorou de acontecer por conta de uma “[...]
dependência e de atraso no plano econômico e social” (RIBEIRO, 1978, p. 147) 36 , e
também do plano ideológico sempre esperando a aprovação dos de fora para validar o que
existe dentro do país. Sendo que os próprio brasileiros, não apenas a política como também
os civis, não valorizam a sua cultura, pois há uma falta de pertêncimento. Pode-se eexistir,
na verdade, um estranhamento com o que é local, já que se tem uma maior valorização do
de fora num “complexo de vira-lata” enraízado no país.

33
RIBEIRO, Darcy. Os Brasileiros: Teoria do Brasil. 11a ed. ; Rio de Janeiro, Petrópolis: Vozes, 1978.

34
RIBEIRO, Darcy. Os Brasileiros: Teoria do Brasil. 11a ed. ; Rio de Janeiro, Petrópolis: Vozes, 1978.
35
BRANDÃO, Antonio Carlos; DUARTE, Milton Fernandes. Movimentos culturais de juventude. 2a ed.
Reform., 23a impressão, São Paulo, Moderna; Coleção polêmica, 2004.
36
RIBEIRO, Darcy. Os Brasileiros: Teoria do Brasil. 11a ed. ; Rio de Janeiro, Petrópolis: Vozes, 1978.
É provável que a busca por uma brasilidade seja eterna enquanto não se entender
como pertencenter ao seu país, não necessariamente indo para um patriotismo caótico, mas
compreendendo que o Brasil é heterogêneo e isso faz parte da sua cultura. É necessário o
consumo do plural, a antropofagia das culturas influenciadoras é importante, como já diz,
fazem parte da construção da cultura brasileira. Dessa forma, devorar, triturar e misturar
formando essa geléia geral que é o Brasil.

Através da transformação da palavra antropofagia para uma esfera metafórica, tanto


os modernistas quanto os tropicalistas puderam transformar o cenário cultural brasileiro
através de ações artísticas que criticavam o cenário político e outros modos de exercer as
artes, que ignoravam o que aconteciam parecendo se acomodarem em suas bolhas,
provavelmento como o parnasianismo para os modernistas e a Jovem Guarda para os
Tropicalistas. Refizeram os moldes do fazer artístico brasileiro para que pudessem caber
neles, já que não se encaixavam nos que existiam. Buscando a autenticidade que suas obras
teriam, além de contribuições inspiradoras para novas maneiras de pensar e agir a
brasilidade artística que se seguiriam após seus movimentos.

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