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METODOLOGIA DAS CIENCIAS HUMANAS# {O conhecimento da coisa e o conhecimento do individuo. Cabe caracterizar os dois como limites: a pura coisa morta, dotada apenas de aparéncia, s6 existe para o outro e pode ser totalmente revelada por um ato unilateral do outro (0 cognoscente). Tal coisa, desprovida de interior proprio inaliendvel e nao utilizdvel, pode ser apenas objeto de interes- v * Este texto tem origem em um pequeno ensaio esbogado por Bakhtin entre fins dos anos 30 ¢ inicio dos anos 40, denominado “Os fundamentos filossfics das ciéncias humanas’, que deu origem ao texto final aqui publicado como “Metodologia das ciéncias humanas”. Antes, porém, o texto fora publicado como artigo em 1974 pela revista Kontekst com o ticulo “Para uma metodologia dos estudos literérios”, prepara- do por V. Kojinov com anuéncia de Bakhtin (menos 0 titulo) e, posteriormente in- cluido pela editora moscovita Iskisstvo em sua 1? edigio de Estetica da criago verbal (Estétika Slovitsnovo Tubrtchestva), de 1979, com 0 titulo “Para uma metodologia das ciéncias humanas”. O texto, porém, saiui com cortes. Mas as “Notas” da redacio para a mesma edicio incluem a maior parte suprimida, preparada por V. Kojinov também com cortes ¢ sem os wrés pardgrafos finais. A edigio anterior deste livo, publicads pela Martins Fontes, foi traduzida da ediclo francesa, baseada na referida edgto ds Iskisstvo mas sem as notas tio entiquecedorase com 0s referidos cores, « 0 capivlo se intitulava “Observagdes sobre a epistemologia das ciéncias humanas”. Nesa et So, restauramos o reulo original como “Metodologia das ciéncias humane) € 1 cluimos entre colchets a parte suprimida com base nas referidas nots de HO/O\ entre aspas em negrito, a parte suprimida pelo proprio Kojinov ¢ Ee =“ editora volume 5 das obras completas de Bakhtin, que vém sendo publicadas pe ‘moscovita Russkie Slovari. (N. do) Digitalizado com CamScanner se pratico. O segundo limite “é Deus F 0 didlogo, a interrogacio, a prece. A necessidade de ens Oo dilog ; cessidade da live Sao do individuo, Aqui hé um nicleo interior que nao pode io vido, consumido, em serva uma Sect any eet f cla €mM relacs a 6 & pr D desinteresse*; ao abrir-se para o outre mag ividuo sempre permanece também faz a perguntaa 1¢ sempre se © sivel 0 f és in. para si. Aqui 0 cognoscente ns, mesmo nem a um terceiro em presenca da coisa mor a mas a0 préprio cognosctvel. O significado da simpatia € do amo, Af critério nao é a exatidéo do conhecimento mas a profundidade d, penetragao. Ai o conhecimento est4 centrado no individual. E 9 cam. po das descobertas, das revelacées, das tomadas de conhecimento, das comunicagées. Ai sto importantes o segredo, a mentira (mas nio 9 erro). Ai sio importantes a indiscricao e a ofensa, etc. A coisa morta nao existe no limite, é um elemento abstrato (convencional); em certa medida, qualquer totalidade (a natureza ¢ todas as suas manifestagies relacionadas a totalidade) é pessoal. A complexidade do ato bilateral de conhecimento-penetracio. O ativismo do cognoscente ¢ 0 ativismo do que se abre (configuracio dialégica). A capacidade de conhecer ¢ a capacidade de exprimir a si mesmo. Aqui estamos diante da expresso ¢ do conhecimento (com- preensao) da expresso. A complexa dialética do interior ¢ do exterior. O individuo nao tem apenas meio ¢ ambiente, tem também horizonte préprio. A intera¢éo do horizonte do cognoscente com o horizonte do cognoscivel. Os elementos de expresso (0 corpo no como materialidade morta, 0 rosto, os olhos, etc.); neles se cruzam ¢ se combinam duas consciéncias (a do eu e a do outro); aqui eu existo para 0 outro com o auxilio do outro. A histéria da autoconsciéncia concreta ¢ 0 papel nela desempenhado pelo outro (amante). O reflexo de mim mesmo n° ou tro. A morte para mim ea morte para 0 OUtTO. Ameméria, i Os problemas concretos dos estudos da literatura ¢ da arte, vino : dos a inter-relagao do ambiente e do horizonte, do eu e do outa . questées das zonas; a expressiio teatral, A penetragao no sooth Be com ele) ea manutengao da distancia (do meu lugar), manure! gi v * Leia-se “auséncia de procedimento interesseiro, egotsta’. (N- do T.) Digitalizado com CamScanner ESTETICA DA CRIACAO VERNAL | 395 assegura 0 excedente de conhecimento. A expressio do sepressio cas cotetiviades, dos povos, das épocas, da prdpria hist us horizontes ¢ ambi tes. A autorrevelagio © as com se expresso dos povos, da historia, da natuteza, tc ( objeto das ciéncias humanas ¢ 0 ser expressiva ¢ falante. Esse ser munca coincide consigo mesmo e por isso ¢ inesgotivel em seu sentido ¢signficado. A méscara, a ribalta, 0 paleo, o espago ideal, et. como for mas reais de expressio da representatividade do ser (e nao da singulari- dade e da matetialidade) e da relagio desinteressada com ele. A exatidao, seu significado e seus limites. A exatido pressupoe a coincidéncia da coisa consigo mesma. A exatidao é necesséria para a assimilacéo prética. O ser que se aurorrevela nao pode ser forcado e tolhido. Ele é livre ¢ por essa razo no apresenta nenhuma garantia. Por isso o conhecimen- to aqui nao nos pode dar nada nem garantir, por exemplo, a imorta dade como fato estabelecido com preciséo e dotado de importancia prética para a nossa vida. “Acredita no que diz 0 coracio, nao hé ga- rantias do céu.”* O ser da totalidade, o ser da alma humana, 0 qual se abre livremente ao nosso ato de conhecimento, nao pode estar tolhido por esse ato em nenhum momento substancial. Nao se pode transferir para eles as categorias do conhecimento material (0 erro da metafisi- ca).[...] “A alma nos fala livremente de sua imortalidade, porém nao podemos provd-la. As ciéncias procuram © que permanece imutével em todas as mudangas (as coisas ou as fungdes).” A formagao do ser é uma formagio livre. Nessa liberdade podemos comungar, no entanto nao a podemos tolher com um ato de conhecimento (material). As ques- toes concretas das diversas formas literdrias: as autobiografias, os mo- numentos (0 autorreflexo na consciéncia dos inimigos ¢ na conscién- cia dos descendentes), etc. [...] “A questo da meméria adquire uma posigao central na filosofia. Certo elementodelliberdade ¢ inerente a toda expressio. A expres- so absolutamente involuntéria deixa de sé-lo. No entanto, o ser da ex- Pressio é bilateral: s6 sé realiza na interagao de duas consciéncias (ado v * Citagéo do poema “Desejo” de V. A. Jukovski (1783-1852), traduzido de Schiller. (N. do) Digitalizado com CamScanner eu ea do outro) o campo de tro, do ponto de vista do outro). Seria posstvel contemplar © compreende, a propria imagem externa de um puro ponto de vista do ex-para-siz Nao se pode mudar o aspecto efetivamente material do passado, no entanto 0 aspecto de sentido, 0 aspecto expressivo, falante pode ser modificado, porquanto ¢ inacabdvel e nao coincide consigo mesmo (ou € livre). © papel da meméria nessa eterna transfiguracdo do passa. do. Conhecimento — compreensio do passado em sua indole inacabével (em sua nao coincidéncia consigo mesmo). O elemento de intrepidez no conhecimento. O temor e a intimidagao na expressao (seriedade), na autorrevelagao, na franqueza, na palavra. O momento correspondente de resignagao do cognoscente; a reveréncia [...] “O problema da compreensao. A compreensio como visio do sen- tido, nao uma visdo fenoménica e sim uma visao do sentido vivo da vi- véncia na expressiio, uma visio do fendmeno internamente compreen- dido, por assim dizer, autocompreendido.” A express4o como matéria compreendida ou sentido materializa- do, como elemento de liberdade que penetrou a necessidade. A carne interior ¢ exterior para a absolvicao. Os diferentes extratos da alma se pres- tam igualmente a exteriorizac4o. O nticleo artistico nao exteriorizavel da alma (0 eu para si). O ativismo responsivo do objeto cognoscivel. A filosofia da expresso. A expressio como campo de encontro de duas consciéncias. A configuragao dialégica da compreensio. O aspecto da alma carece de autovalor e estd entregue a piedade ¢ ao perdao do outro. O nticleo inefivel da almaisdypode ser refletido no espelho da simpatia absoluta do outro].{..] sles [0 problema da seriedade. Os elementos de expresso externa da setiedade: 0 cenho carregado, os olhos apavorantes, as rugas € PIB juntas pela tensio, etc., so elementos de pavor ou intimidagéo, de Preparativo para o ataque ou para a defesa, um chamamento a subor dinacéo , uma expressao de fatalidade, de necessidade férrea, de pe Digitalizado com CamScanner remproriedade, de indiscu acvitar o perigo. A necessi obstinago ¢ autopreservagio. Nao é uma forga tranquila e segura de s (esta sor Ds mas uma forga ameagada e por isso ameagadora, ou uma fra- queza suplicante. A natureza representada como totalidade onipotente onivitoriosa nao é séria mas indiferente ou sorri de modo franco (est radiante”) ¢ ri. A tiltima totalidade nao pode imaginar-se séria ~ porque fora dela nao existe inimigo -, ela ¢ indiferentemente alegre; todos os fins e sentidos n4o esto fora mas dentro dela. Para ela nao ha nada por vit, porque o porvindouro faz o sério. O riso suprime o peso do {futuro (do porvindouro), livra das preocupagées do futuro; 0 futuro deixa de ser uma ameaga. ‘A atracio, propria de todas as pessoas cultas, haverd de comungar na multidao, perder-se na multidao, dissolver-se na multidéo, fundir-se com a multidao; nao apenas com o povo mas com a multidio de po- pulares, com a multidéo na praca; haverd de entrar na esfera da comu- nicagio familiar especifica, fora de quaisquer distancias, hierarquias normas, de comungar no grande corpo. O “tu” intimo na mascarada; a mascara € extra-hierdrquica. As cenas da mascarada ¢ do carnaval (em parte as cenas dos bailes — festas — teatro) nos dramas e romances (em Liérmontoy, em Tolstdi, em A montanha encantada®, etc.) Os te- mas das Novelas de Biélkin** como essencialmente prosaicos: istifica- Ges, profanagées, acasos, desvios da norma. Rabelais lanca luz também sobre questoes muito profundas da otigem, da histdria e da teoria da prosa de ficgao. Aqui destacamos de Passagem essas questdes € podemos apresentar para elas uma formula prévia: apelido, profanagio , linha demarcatéria das Uinguas, etc, Pre- tendemos elaborar essas questées de modo sistemsitico © a base de um vasto material em outra oportunidade]. v 4 eraduzida com esse tfeulo (N. do.) * Talver se trate de. montanha mégica de Thomas Mann» _, PaFLO russo& época em que Bakhtin esereveu este 0 * Coletanea de contos e novelas de Puichkin. (N. do) Digitalizado com CamScanner 398 | MIKHAIL BAKIETIN Psicofisiologs. ca do signo fisico (palavra, cor, forma espacial). 2) Seu reconhecimeny (como conhecido ou desconhecido). A compreensao de seu significad, reprodutivel (geral) na Iingua. 3) A compreensio de seu significado em dado contexto (mais prdximo e mais distante). 4) A compreensio a vo-dialégica (discussao-concordncia). A inserga0 no contexto dialégica O elemento valorativo na compreensio ¢ seu grau de profundidade ¢ de universalidade. A conversio da imagem em simbolo a reveste de profundidade se- méntica ~ a perspectiva semantica. Correlagio dialética entre identidade e nfo identidade. A imagem deve ser compreendida como 0 que ela é € como o que significa. Através dos encadeamentos semanticos media- tizados, 0 contetido do simbolo auténtico esté correlacionado com a ideia de totalidade mundial, com a plenitude do universo césmico ¢ humano. O mundo tem um sentido. “A imagem do mundo manifes- tada na palavra” (Pasternak”). Todo fendmeno particular esté imerso no elemento dos primérdios do ser. A diferenga do mito, existe af a cons- cientizacéo da sua nao coincidéncia com seu préprio sentido. No simbolo, hé “o calor do mistério que se torna coeso” (Aviérint- siev). Momento de contraposi¢ao do meu ao do outro. O calor do amor 0 ftio da alienagao, Contraposigéo e confronto. Toda interpretagio do simbolo permanece ela mesma simbolo, s6 que um tanto racionalizado, isto é um tanto aproximado do conceito. Definigao de sentido em toda a profundidade ¢ complexidade de sua esséncia. A interpretagéo como descoberta da presenga por meio da percep¢ao visual (contemplacao) e da adjungao por elaboragio ctit- dora. Antecipagao do contexto em expansio subsequente, sua relagio com 0 todo acabado e com o contexto inacabado. Tal sentido (no com" texto inacabado) nao é tranquilo nem cdmodo (nele nao se pode Ficat tranquilo nem morrer). Digitalizado com CamScanner PSTETICA DAC AGAO VERBAL | 399 significado ¢ sentido. As Lembrangas a serem preenchidate Jes antecipadas (a interpr levamos em conta até os acontecimentos posteri asteriore $ pos. Nas s (no Glo eM contextos dist sado), out seja, percebemos ¢ interpretamos o les ontexto de um passado inacabado. Em que forma o todo ¢ noc na consciéncia? (Platao ¢ Husser.) Fm que medida é possivel descobrir e comentar 0 sentido (da im nbolo)? Sé mediante outro sentido (isomorfo), do sim- agem? E imposstvel di gem ou do bolo ou da Iver o sentido em conceitos. O | do comentario. Pode haver uma rac papel zagio relativa do senti to (a andlise cientifica habitual), ou um aprofundamento do sentido com 0 auxilio de outros sentidos (a interpretagao artistico-filoséfica) 0 aprofundamento mediante a ampliagao do contexto distante”. ‘A interpretacio das estrucuras simbdlicas tem de entranhar-se na in- finitude dos sentidos simbélicos, raz4o por que nao pode vir a ser cien- tifica na acepcéo de indole cientifica das ciéncias exatas. ‘A interpretagao dos sentidos nao pode ser cientifica, mas é profun- damente cognitiva. Pode servir diretamente pritica vinculada as coisas. “Cumpre seconhecer a simbologia no como forma nao cientifica mas como forma heterocientifica do saber, dotada de suas préprias leis e critérios internos de exatidao” (Aviérintsiev)”*. O autor de uma obra sé estd presente no todo da obra, nio se en- contra em nenhum elemento destacado desse todo, ¢ menos ainda no contetido separado do todo. O autor se encontra naquele momento in- separdvel em que o contetido ¢ a forma se fundem intimamente, ¢ é na forma onde mais percebemos a sua presenga. A critica costuma procu- ré-lo no contetide destacado do todo, que permite identifici-o facil mente com 0 autor-homem de uma determinada época, que tem uma determinada biografia e uma determinada visio de mundo. Af a ima- gem do autor quase se funde com a imagem do homem real. : O verdadeiro autor néo pode tornar-se imagem, o's € 0 criador de toda imagem, de todo o sistema de imagens da obra. E por esta " a que a chamada imagem de autor nao pode ser uma das imagens de dada obra ( verdade que ¢ uma imagem de tipo especial). O pintor cole senta frequentemente a si mesmo no quadro (num canto deste), tam Digitalizado com CamScanner 400 | MIKHAIL BAKHTIN bém faz seu autorretrato, Toda como tal (nao se pode vé-lo) qualquer outra obra do auto; dros desse autor. O autor- ele prop rata-se da natura naturans* ¢ naturata***. Vemos 0 criadot ape € 0 criador, Ntelecty UM sujeito, le $6 se con. lo o homem) © cognoscente (contemplador) ¢ falante (enunc dor). A el trapoe a coisa muda, Qualquer objeto do saber (incluind pode ser percebido e conhecido como coisa. Mas o Sujeito como tal nao pode ser percebido ¢ estudado como coisa Porque, como sujeito ¢ permanecendo sujeito, nao pode tornar-se mudo; consequentemente, © conhecimento que se tem dele s6 pode ser dialdgico. Dilthey eo pro- blema da interpretagio”. As diversas modalidades de ativismo da atv, dade cognitiva. O ativismo do cognoscente da coisa muda e o ativismo do outro sujeito cognoscente, isto é, 0 ativismo dialégico do cognos- cente. O ativismo dialégico do sujeito cognoscivel e seus graus. A coisa € 0 individuo (0 sujeito) como limites do conhecimento. Os graus de materialidade e pessoalidade. A indole de acontecimento do conheci- mento dialdgico. O encontro. A avaliagao como momento indispensé- vel do conhecimento dialdgico. Ciéncias humanas — ciéncias do espirito — ciéncias filolégicas (0 discurso € parte e ao mesmo tempo comum a todas elas). Historicidade. Imanéncia. Fechamento da andlise (do conhecimento ¢ da interpretac4o) em um dado texto. A questo dos limites do texto € do contexto. Cada palavra (cada signo) do texto leva para além dos seus limites. Toda interpretaco € 0 correlacionamento de dado texto com ou" tros textos. O comentirio. A indole dialdgica desse correlacionamento. O lugar da filosofia, Ela comega onde termina a cientificidade oa € comega a heterocientificidade. Pode ser definida como eel gem de todas as ciéncias (e de todas as modalidades de conhecimen e consciéncia). v * Natureza geradora (latim). (N. da ed. russa.) “* Natureza gerada (latim). (N. da ed. russa.) Digitalizado com CamScanner ESTETICA DA CRIAGAO VERBAL | 401 A interpretagio como correlacionamento com outros textos er : ca oem um novo contexto (no meu, no atua preciagi texto antec pass (4 do lug)» Etapas do movimento dislogico da interpreta, Prono de partda ~ um dado texto, o movimento retrospectva no futuro). O con- ‘stou dando um novo pavel do futuro: a sensagio de que con- s do passado, movimento prospectivo — antecipagio (ci io) do texto: futuro contexto. ‘Adialética nasceu do didlogo para retornar ao didlogo em um ni- vel superior (0 didlogo de indivéduos). (© monologismo de A filosofia do espirito de Hegel. O monologismo no inteiramente superado de Dilthey. Pensamento sobre o mundo e pensamento no mundo. © pensamen- to que procura abarcar o mundo, ¢ o pensamento que sente a si mes- mo no mundo (como parte deste). O acontecimento no mundo e a participagao nele. O mundo como acontecimento (e nao como ser em prontidéo). O texto s6 tem vida contatando com outro texto (contexto). $6 no ponto desse contato de textos eclode a luz. que ilumina retrospectiva € prospectivamente, iniciando dado texto no didlogo. Salientemos que esse contato € um contato dialdgico entre textos (enunciados) e nao um contato mecanico de “oposigio”, s6 possivel no Ambito de um tex- to (mas ndo do texto e dos contextos) entre os elementos abstratos (os signos no interior do texto) e necessdrio apenas na primeira etapa da interpretacdo (da interpretagao do significado ¢ nao do sentido). Por trds desse contato estd 0 contato entre individuos e nao entre coisas (no limite). Se transformarmos o didlogo em um texto continuo, isto é, se apagarmos as divisdes das vozes (a alternancia de sujeitos falantes), 0 que é extremamente posstvel (a dialética monolégica de Hegel), 0 sen- tido profundo (infinito) desaparecerd (bateremos contra 0 fundo, po- tTemos um ponto morto). F A coisificagio completa, extrema levaria fatalmente ao desapareci- mento da infinitude e da insondabilidade do sentido (de qualquer sen- tido). O pensamento que, como um peixe no aquario, fundo ¢ as paredes, nao pode ir além e mais fundo. dogmético, choca-se com 0 O pensamento Digitalizado com CamScanner 402 | MIKHAIL BAKHTIN O pensamento s6 coi to apaga todos os pontos sem nomes””*), A interpretagao auté: estudos literdrios sempre é histérica e personalizada. O lugar € as fron. teiras dos chamados realis. Coisas prenhes de ‘palavra. A unidade do monélogo ea unidade peculiar do didlogo, A epopeia pura ¢ a lirica pura desconhecem ressalvas, O discurso com ressalvas s6 aparece no romance. A influéncia da realidade extratextual sobre a formacio da visio artistica e do pensamento artfstico do escritor (e de outros ctiadores de cultura). As influéncias extratextuais tém um significado particularmente im- portance nas tapas primétias de evolugao do homem, Tais influéncias esto plasmadas nas palavras (ou em outros signos), € essas Palavras sio palavras de outras pessoas, antes de tudo palavras da mie Depois, essas “palavras alheias” sao reelaboradas dialogicamente em “minhas-alheias palavras” com o auxilio de outras “palavras alheias” (no ouvidas ante- riormente) e em seguida [nas] minhas palavras (por assim dizer, coma perda das aspas), jé de indole criadora. O papel dos encontros, das visoes, das “iluminagées”, das “revelagdes”, etc. Reflexo desse processo no 10- mance de educacao ou de formacao, nas autobiografias, nos didrios, nas confiss6es, etc, Veja-se, a propésito: Alieksiéi Remizoy, Por olhas tos- quiados. Livro das tramas e dos meandros da meméria®. Aqui o desenho desempenha o papel de signos para a autoexpressio. Desse ponto de vista € interessante o Klim Samguin*(o homem como sistema de frases). O ineftvel, sua indole especial e seu papel. As fases primérias da toma- da de consciéncia da palavra. O “inconsciente” pode vir a ser um fator ctiativo apenas no limiar da consciéncia e da palavra (a consciéncia se miverbalizada-meio-semiética). De que modo as impressdes da natu- v “A vida de Klim Samguin, romance de Maksim Gorki. (N. do T.) Digitalizado com CamScanner TICA DA CRIAGAO VERBAL | 403 ha consciénci J eneram no contexto dat palavra, de palavra em potenct 1.0 po sieia reguladora” (1 in (© processo de esquecimento paulatino dos autores, deposits das outro. A palavra do outro se torna andnima, apropriam-se : - Elas sao prenhes de favel” como limite fluuante, ntido kantiano) da consciéncia ¢ rez: palavras do fica (numa forma reclaborada, é claro); a consciéncia se monologiza. Esquecem-se também as relagdes dialégicas iniciais com a palavra do outro: é como se elas fossem absorvidas, se infiltrassem nas palavras as- similadas do outro (tendo passado pela fase das “palavras préprias- v lheias’). Ao monologizar-se, a consciéncia criadora é completada com palavras anénimas. Esse processo de monologizaséo ¢ muito impor- tante, Depois, a consciéncia monologizada entra como um todo tinico e singular em um novo dilogo (j4 com novas vores externas do outto). ‘Aconsciéncia criadora monologizada une e personifica frequentemen- te as palavras do outro, tornadas vozes alheias andnimas, em simbolos especiais: “voz da prépria vida’, “voz da natureza”, “voz do povo”, “voz de Deus’, etc, Papel desempenhado nesse processo pela palavra dotada de autoridade, que habitualmente nao perde seu portador, nao se torna anénima. O empenho de coisificar os contextos anénimos extraverbalizados (cercar-se de uma vida no verbal). Sé eu me manifesto como indivi- duo criador falante, tudo o mais s4o apenas condic6es materiais situa- das fora de mim como causas, que suscitam e determinam minha palavra. Nao converso com elas — eu respondo a elas mecanicamente, como uma coisa responde a estimulos externos. Fenédmenos de discurso como ordens, exigéncias, mandamentos, proibigdes, promessas (prometimentos), ameagas, clogios, censuras, constituem uma parte muito impor- Todos eles estdo vinculados a uma capaz de deslocar-se (estender-st) de significado direto de ofensas, maldigdes, béngaos, etc., tante da realidade extracontextual. entonagéo acentuadamente expressa, 4 quaisquer palavras ¢ expressoes desprovidas ordens, ameacas, etc. : _ Oque importa é 0 tom, separado dos elementos fonicos ticos da palavra (e de outros signos). Estes determinam a comp 9 nalidade da nossa consciéncia, tonalidade que setve de contexto axiol6- gico-emocional na nossa interpretagao (plena ¢ centrada nos sentidos) e seman- iplexa to- Digitalizado com CamScanner 404 | MiKHHANL paKitTiN al séria e profunda, aut lirica pura®, etc. Entre os escritores, Dostoiéyski foi quem atingir a maior profundidade nessa transformagio da coisa €M sentido ao desvelar os atos ¢ os pensamentos de suas Personagens py rincipais. 4 > P Prias coisas, para influir sobre os individuos ela deve revelar seu potencial, de sentidos, isto é, deve incorporar-se ao eventual contexto de palavras ¢ sentidos, Quando analisamos as tragédias de Shakespeare, também observa. mos a transformacao sucessiva de toda a realidade ~ que age sobre suas Personagens — em contexto semantico dos atos, pensamentos e vivéncias dessas personagens: ou verificamos diretamente as palavras (palavras das feiticeiras, do fantasma do pai, etc.) ou acontecimentos e circunstin- cias, traduzidos para a linguagem do discurso potencial que interpreta. Cumpre salientar que nao se trata de uma redugio pura e direta de tudo a um denominador comum: a coisa continua coisa, a palavra, pa- lavra, elas preservam sua esséncia e apenas se completam com o sentido". coisa, ao permanecer coisa, pode influenciar apenas as Prd Nao se deve esquecer que a coisa e 0 individuo sio limites e néo substéncia absoluta. O sentido nao quer (e nao pode) mudar 0s fend- menos fisicos, materiais e outros, ndo pode agir como forca material. Alids ele nem precisa disso: ele mesmo é mais forte que qualquer forca, muda o sentido total do acontecimento e da realidade sem Ihes mudar uma virgula na composicao real (do ser); tudo continua como antes mas adquire um sentido inteiramente distinto (a transfiguragao do ser ce” trada no sentido). Cada palavra do texto se transfigura em um nove contexto. Inclusio do ouvinte (do leitor, do contemplador) no sisema trutura) da obra. © autor (depositério das palavras) e 0 interprewt autor, ao criar sua obra, nao a destina ao critico literério nem te sup6e uma interpretacio literdria especifica, nao visa a criar um* Digitalizado com CamScanner ESTETICA DA CRIAGAO VERBAL | 405 estudiosos da literatura. Nao convi tividade de 8.08 est 4d mesa do seu banquete. atu Os estudiosos da literatura contempo: cos (em su: tas) costumam definir 0 ouvinte imanente a obr. estrucural como ou sare ideal que tudo compreende; precisamente esse tipo de ouvint ouvinte postula na obra, Esté claro que nio se trata do ouvinte empirico que se vem de uma concepsao psicoldgica, de uma imagem de ouvinte na alma do autor, Trata-se de uma formagio abstrata, ideal. A ela se con trapoe um autor ideal igualmente abstrato. Em semelhante concepgao, o ouvinte ideal é no fundo, um reflexo especular, uma dublagem do qutor. Ele nao pode introduzir nada de seu, nada de novo na obra in- rerpretada em termos ideais nem no plano idealmente completo do autor. Ele est4 no mesmo tempo ¢ espago que o prdéprio autor, ou me- hor, ele, como 0 autor, estd fora do tempo e do espaco (como qualquer formacdo abstrata ideal), por isso nao pode ser 0 outro (ou um estra- nho) para 0 autor, no pode ter nenhum excedente definivel pela alteri- dade. Entre 0 autor e tal ouvinte nao pode haver nenhuma interacao, nenhuma relac4o dramitica ativa, porquanto eles no séo vozes mas conceitos abstratos iguais a si mesmos ¢ entre si®. Ai sé sao possiveis abstragGes tautoldgicas vazias, mecanicistas ou matematizadas. Af nao hd um grao de personificacao. O contetido como novo, a forma como contetido velho (conhecido), estereotipado, estagnado, A forma serve de ponte necessiria para um contetido novo, ainda desconhecido. A forma era uma visio de mun- do velha, estagnada, conhecida ¢ universalmente compreendida, Nas épocas pré-capitalistas, a transicao entre a forma € 0 contetido era me- nos abrupta, mais suave; a forma era um contetido ainda néo endure- cido, nao inteiramente fixado, nao trivial; estava vinculada aos resulta- dos da criagdo coletiva comum, por ‘exemplo, aos sistemas aoe cos. A forma era uma espécie de contetido implicico; © conceido da obra desenvolvia um contetido jé alicergado na forma ¢ nad & eriava como algo novo, na ordem de uma iniciativa criadora-indvidual, Con- sequentemente, o contetido precedia a obra em certa medida. O Ber Rao inventava o contetido de sua obra, mas apenas desenvolvia 0 4 id estava alicercado na tradicao. Digitalizado com CamScanner 406 | MIKHAIL Bak Os simbolos so os elementos mais estaveis ¢ mais emocionais; referem-se a for ‘ma e nao O aspecto propriamente semantico dos seus elementos (primeira etapa da interp acessivel a qualquer consciéncia individual. Mas esse eh tico-axiolégico (inclusive os simbolos) 56 ¢ significative duos ligados por certas condigées comuns de vida (cf. palavra “simbolo”®), em suma, por lagos de faternidade vado. Af ocorre a comunhdo, em etapas superiores a o lor supremo (no limite absoluto). O significado das exclamagées axiolégico-emocionais na vida dy cursiva dos povos. Contudo, a expressio das relagées axiolégico-emo. cionais pode nao ser de indole explicito-verbal mas, por assim dizer de indole implicita na entonagéo. As entonagoes mais substanciais ¢ estdveis formam o fundo entonacional de um determinado grupo social (na. Go, classe social, grupo profissional, circulo, etc.). Em certa medida, pode-se falar por entonages tinicas, tornando a parte do discurso ver. balmente expressa relativa e substituivel, quase indiferente. Com que frequéncia empregamos palavras que nos séo initeis pelo significado ou repetimos a mesma palavra ou frase apenas com o fito de termos um portador material para a entonagio de que necessitamos. O contexto axiolégico-entonacional extratextual pode ser realiza- do apenas parcialmente no processo de leitura (execugao) de um dado texto, porém em sua parte mais geral, particularmente em suas cama das mais substanciais e profundas, permanece fora de dado texto como fundo dialogizante de sua percepcao. A isso se reduz, até certo ponte, o problema do condicionamento social (extraverbal) da obra. . O texto — impresso, manuscrito ou oral = a gravado nao se ar raa toda a obra em seu conjunto (ou ao “objeto estético”). A obra é 2 tegrada também pelo seu necessdrio contexto extratextual. E we ‘i ela fosse envolvida pela musica do contexto acinligico eo : no qual é interpretada e avaliada (¢ claro que esse contextO ac A forme as épocas da percep¢ao, 0 que cria uma nova vibraga0 os, oF A compreensio reciproca entre os séculos e milénios, ie de ges ¢ culturas assegura a complexa unidade de toda a pe a todas as culturas humanas (a complexa unidade da cultura hu 'eMENtO seman, D para os ind © significado dg €m UM nivel ele. “omunhao no a. Digitalizado com CamScanner ESTETICA DA CRIAGAO VERWAL. | 407 complexa unidade da literatura da sociedade hum, co tanicamente no nivel do grande tempo. Cad ve radida eavaliada no nivel do grande tempo. A cinvalver-se No espaco estreito do pequeno tempo, isto é, da at edo passado imediaco ¢ do futuro representavel ~ desejado ou assag tador, As formas axiolégico-emocionais da antecipacéo do futuro na lingua-discurso (ordem, votos, adverténcia, exorcismo, etc), a relacio superficialmente humana com 0 futuro (votos, esperanga, pavor); nao existe compreensio da indeterminidade, do inesperado, pot assim dizer, do “surpreendente”, da novidade absoluta, do milagre, etc., todos axio. légicos. A indole especial da relacao profética com o futuro. A abstra- cao de si mesmo nas concepgbes sobre o futuro (o futuro sem mim). O tempo do espetaculo teatral e suas leis. A percepgao do espeté- culo na época da presenca e do dominio das formas religioso-cultuais cc estatal-cerimoniais. A etiqueta do cotidiano no teatro. A contraposigéo de natureza e homem. Os sofistas, Sécrates (“Nao ime interessam as drvores no bosque mas os homens nas cidades”™). Dois extremos do pensamento e da pritica: (0 ato) ou dois tipos de relacdo (a coisa e 0 individuo). Quanto mais profundo o individuo, isto é quanto mais préximo do objeto individual tanto mais inaplica- veis os métodos de generalizacao; a generalizagao ¢ a formalizagio obli- teram as fronteiras entre o génio e a mediocridade. Experimento e tratamento matemdatico. Formular uma pergunta ¢ receber uma resposta jé constitui uma interpretagao individual do co- nhecimento das ciéncias naturais e do seu sujeito (0 experimentador). Ahistéria do conhecimento em seus resultados ¢ a histéria dos indivi duos cognoscentes (cf. Marc Bloch”). ie O processo de coisificaco e 0 processo de personalizagao. Todavia, 4 petsonalizacio nao é, de maneira nenhuma, uma subjetivaga0. Oli- mite aqui nao é 0 eu, porém o ex em relagao de reciprocidade com ou- tos individuos, isto é, eu ¢ 0 outro, eu ¢ tu. . 36 Haverd correspondéncia com 0 “contexto” nas ciéncias nates!” contexto ¢ sempre personalista (0 didlogo sem fim, onde nao hi a FE meira nem a tiltima palavra); nas ciéncias naturais 0 sistema é objeti cado (sem sujeito). Digitalizado com CamScanner 408 | MIKHAIL naKiETINE Nossos atos respoi com a coisa ¢ as ri ‘agao sem nunca o atingir; outros tendem para o limite da sonificagao, sem o atingir plenamente. Pergunta e resposta nao séo relagbes (categorias) lbgicas; nig dem caber em uma s6 consciéncia (una e fechada em si mesma, Tesposta gera uma nova pergunta. Perguntas € respostas supdem uma di tincia reciproca, Se a resposta nfo gera uma nova pergunta, separa. do didlogo e entra no conhecimento sistémico, no fundo impessoal, Diferentes cronétopos de quem pergunta e de quem responde ¢ diferentes universos do sentido (eu ¢ 0 outro). A pergunta ea Fesposta do ponto de vista da terceira consciéncia e do seu mundo “neutro”, onde tudo & substitutvel e fatalmente se despersonifica, Per. Diferenca entre tolice (ambivalente) ¢ a obtusidade (univoca). As palavras do outro assimiladas (“minhas-alheias”) que tém eter namente, renovam-se ctiativamente em novos contextos, ¢ as palavras do outro inertes, mortas, “palavras-mimias”. O problema fundamental de Humboldt: a multiplicidade de lin- guas (premissa e fundamento da problemética: a unidade da espécie hu- mana)", Isso ocorre no campo das Ifnguas e das suas estruturas formais (fonéticas ¢ gramaticais). J4 no campo da fala (no ambito de uma ou de qualquer Ifngua) coloca-se 0 problema da minha palavra e da pala vra do outro. 1) Coisificagao ¢ personificagao. Diferenga entre a coisificacéo ¢2 “alienago”. Os dois limites do pensamento: aplicacao do principio de complementaridade. 2) A minha palavra e a do outro. A interpretagéo como transforma 40 do alheio no “meu-alheio”. O princ{pio da distancia. As complexss relacdes entre os sujeitos interpretados e 0 sujeito interpretador, -_ © cronétopo criado ¢ o interpretador criativamente renovador. A ‘a portancia de atingir, de aprofundar-se no miicleo criador do i ea (em seu miicleo criador o individuo continua a viver, ou seja, ¢imor 3) A preciso ea profundidade nas ciéncias humanas. O Ce preciso nas ciéncias naturais é a identidade (a = a). Nas ciénciss Digitalizado com CamScanner ESTETICA DA CRIAGAO VERBAL | 409 : trans- formagao no Pv uigdes de toda espécie, mode ‘> nao reconhecimento do alheio, etc.). manasa precisio €a superacio da alteridade do alhcio sem s amente meu (subs rni- aga, O estigio antigo da personificagao (a ingénua personificagao mi- ica). Epoca da coisificagao da natureza ¢ do homem. O estégio contemporineo da personificagio da natureza (e do homem), mas sem perda da coisificagdo. Ver a natureza em Prichvin segundo um artigo deV. V. Kojinov®. Nessa fase, a personificagao nfo tem indole de mi- tos, embora néo lhes seja hostil e frequentemente use a sua linguagem («ransformada em linguagem de simbolos). 4) Contextos da interpretacao. Problema dos contextos distantes. Renovacio intermindyel dos sentidos em todos os contextos novos. O pequeno tempo ~a atualidade, o passado imediato ¢ 0 futuro previsive [desejado] —¢ 0 grande tempo — o didlogo infinito ¢ inacabavel em que nenhum sentido morre. O vivo na natureza (0 organico). Todo o inor- ganico no processo de troca é atraido para a vida (s6 na abstrago eles podem ser contrapostos, se tomados isoladamente da vida). Minha posicdo em rela¢do ao formalismo: uma compreensio dife- rente da especificacao; o desconhecimento do contetido redunda na “es- tética material” (sua critica em meu artigo de 1924"); nao se trata do “fazer”* mas de criacZo (de material s6 se obtém um “produto”); uma incompreensao da historicidade e da alternancia (percep¢ao mecani- cista da alternncia). O significado positivo do formalismo: novos pro- blemas e novos aspectos da atte; 0 novo, nas etapas iniciais e mais cria~ tivas de sua evolugao, sempre assume formas unilaterais ¢ extremas. Minha posigdo em relacéo ao estruturalismo. E contra o fechamen- to no texto, As categorias mecanicistas de “oposigao” € “alternancia de cédigos” (a pluralidade de estilos em Jenguiéni Oniéguin, na interpreta- 40 de Lotman ¢ na minha interpretacio”). Formalizagao coerente ¢ despersonalizacio: todas as relagdes so de indole légica (no sentido lato do termo), Quanto a mim, em tudo eu ougo vozes € relagdes dia- ’ * Aqui Bakhtin polemiza com o famoso ensaio de Boris Eikhenbaum, “De como ¢ ‘0 O capote em Gogol”. (N. do T.) Digitalizado com CamScanner mbém interpreto dialogicamente o légicas entre elas. Eu cD ; complementaridade. Altas apreciagées do estruturalismo, Oo Problema da “exatidao” ¢ da “profundidade”. Profundidade da Penetragio no of, jeto (material) (coisificagao) ¢ profundidade de penetracao no Sijeing (personalismo). . No estruturalismo, existe apenas um sujeito: 0 préprio Pesquisador, ‘As coisas se transformam em conceitos (de um grau variado de abstracao); © sujeito nunca pode tornar-se conceito (ele mesmo fala e responde), 0 sentido é personalista; nele hd sempre uma pergunta, um apelo ¢ uma an- tecipacao da resposta, nele sempre ha dois (como m{nimo dialégico), Este personalismo nao é um fato psicolégico mas de sentido, Nao existe a primeira nem a ultima palavra, e nao hé limites para o contexto dialdgico (este se estende ao passado sem limites e ao futu- ro sem limites). Nem os sentidos do passado, isto é, nascidos no didlogo dos séculos passados, podem jamais ser estdveis (conclufdos, acabados de uma vez por todas): eles sempre irao mudar (renovando-se) no proces- so de desenvolvimento subsequente, futuro do didlogo. Em qualquer momento do desenvolvimento do didlogo existem massas imensas ¢ ili- mitadas de sentidos esquecidos, mas em determinados momentos do sucessivo desenvolvimento do didlogo, em seu curso, tais sentidos serio relembrados e reviverio em forma renovada (em novo contexto). Nao existe nada absolutamente morto: cada sentido terd sua festa de reno- vacao. Questo do grande tempo. Princip; de il Digitalizado com CamScanner

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