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O QUE E INTERVENCAO PsiCcossociaL? Kathia Maria Costa Neiva Embora as necessidades psicossociais tenham sempre existido nos individuos, grupos e sociedades, 6 relativamente recente a constituicdo de uma area especifica da psicologia que dé suporte te6rico e metodolégico para a realizagéo de intervencdes psicossociais. Isso no significa que a psicologia nao tenha se preocupado com tais ne ides, nem buseado formas de solucioné-las. Ao contrario, o bem-estar psicossocial dos individuos, grupos e comunidades sempre foi foco de preocupacao dos psicélogos e até mesino de outros profissionais. Mas, o que é Intervencéo Psicossocial? As primeiras referéncias ao termo trazem as ideias de mu- danca, transformagdo, pesquisa e acdo. Pages (1976, p. 482) ao tentar definir a intervencao psicossociol6gica afirma que “tanto é uma metodologia prética de mudanga como uma metodologia de pesquisa”, considerando assim como caracte- ristica principal a possibilidade de unificar a pesquisa & pratica psicolgica. “A atividade de pesquisa confundir-se-6, ois, com o esforgo mai e mais determinado de transformagéo do grupo.” (PAGES, 1976, p. 433). A intervengéo psicossocial como 4rea de estudo surgiu na segunda metade do século XIX, na interface da Psicologia amma Mara Cosa News Clinica com a Psicologia Social. De um lado, ométodo psicana- ico conseguiu quebrar a compartimentacdo existente entre a pesquisa fundamental e a pesquisa aplicada e contribuir, assim, para uma pesquisa e pratica transformadoras. De ou- tro lado, 0 conceito de pesquisa ativa, introduzido por Lewin, reforgou a necessidade da complementaridade entre pesquisa e acao e a importancia de se pesquisar sobre as situaces da vida corrente, saindo dos laboratérios (PAGES, 1976). Lewin introduziu ainda o termo “dinamica de grupo”, em 1944, @ seus experimentos e de seus seguidores que realizaram intervenedes em grupos foram fundamentais para o desenvol- vimento da psicossociologia. As ideias de Moreno, fundador do psicodrama e da sociometria, foram também de grande contribuicao para o desenvolvimento da area. A sociometria, além de permitir o estudo das inter-relagdes no grupo, é uma técnica que facilita as mudangas sociais, unindo a pesquisa ea intervencdo (LAPASSADE, 1977). Além desses, outros autores contribuiram para compreender os processos grupais e propor formas de atuacao e desenvolvimento dos grupos, como Bion (1975) e Pichon-Rivigre (1988), sendo que a metodologia dos grupos operativos proposta por este tiltimo tem sido frequen- temente ineorporada As intervencdes psicossoi importante também salientar as contribuicées de Rogers, que introduziu 0 conceito de nao diretividade, ressaltando a capacidade do individuo de perceber seus problemas e de ser parte integrante na busca das solugGes (LAPASSADE, 1977), Vale ainda mencionar a influéncia de autores que se dedi- caram & psicologia institucional, facilitando a compreensio e anélise das instituigées e organizagées como Lapassade (1977), Bleger (1984) e Baremblitt (2002). Concorda-se, portanto, com Nasciutti (1996, p. 105), ao afirmar que “os fundamentos te6ricos da psicossociologia so multirreferenci No Brasil a érea da Psicossociologia sofreu grande influén- cia de autores franceses como M. Pages, J. Dubost, A. Lavy, B, Enriquez, G, Lapassade e outros, principalmente em Minas 4 au 180 Ponsa? Gerais, Sao Paulo e no Rio de Janeiro. Uma andlise histérica do desenvolvimento desta area no Brasil é minuciosamente apresentada por Machado (2004) e resumida por Barros (1994) Atualmente, existem alguns grupos fortes de pesquisa e atua- do nesta area, concentrados nas Universidades Federais de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Séo Jodo Del Rei, que tém contribufdo para a sistematizacao das ideias te6ricas e desenvolvimento de praticas psicossociais. Nao se pode descartar a influéneia dos movimentos politi- 0s e sociais ocorridos na realidade brasileira, principalmente a partir da década de 1970, que provocaram 0 aumento im- portante de pesquisas e discussées cientificas sobre o tema, a criacéo de ONGs, e a formagéo de iniimeras associagées visando o desenvolvimento comunitério e social (PEREIRA, 2001). Vale mencionar também a contribuigao dos trabalhos de conscientizacao e de pesquisa participante de Paulo Freire © 0s projetos desenvolvidos pelas Comunidades Belesiais de Base (BARROS, 1994; MACHADO, 2004). Para Machado e Roedel (1994, p. 7) a psicossociologia é uma vertente da Psicologia Social cujo campo “é dos gru- pos, das organizacdes e das comunidades, considerados como conjuntos coneretos que mediam a vida pessoal dos individuos € sao por ele criados, geridos e transformados”. A interven- do psicossociolégica surgiu a partir dos anos 1950, quando 0s psicossociélogos passaram a priorizar os problemas e se preocupar com as instncias de mudanga, respondendo as demandas e incorporando o papel de pesquisador-interven- tor. Dubost (1994) expde em detalhes a origem e evolucao da intervencéo psicossociolégica. Machado (2004, p. 15) define: A pesquisa-intervencéo psicossocial como um trabalho de produgio de conhecimentos sobre grupos, organizagées, instituigées, comunidades e movimentos sociais, fundado nas reflexdes te6ricas e descobertas da psicologia social e 1 Katia Mara Costs Neva da psicossociologia, e, simultaneamente, um conjunto de prétticas clinicas de consulta voltadas ao tratamento desses diferentes conjuntos sociais © meios abertos. De acordo com Sarriera e colaboradores (2000, objetivo principal da intervencéo psicossocial é “pos melhores condigdes humanas e de qualidade de vida”. A intervengéo psicossocial visa assim ao processo de interagio sujeito-meio social e pode abranger diferentes areas: satide mental, politica, economia, educacdo, ete. Considera-se, portanto, que a interveneao psicossocial tem um carater de pesquisa-acdo que visa facilitar o bem-estar psicossocial de individuos, grupos, instituicées, organizagoes e/ou comunidades. A seguir sero discutidas algumas caracteristicas basicas da interveneao psicossocial: 32), 0 1.1. Carter cientifico, unindo a pesquisa a agao Conforme mencionado anteriormente, a intervencéo psi- cossocial segue os parametros do método cientifico, unindo a pesquisa & aco. A pesquisa permeia todo o proceso, desde a andlise da demanda e 0 mapeamento das necessidades psicos- sociais até a etapa final de avaliacdo da intervengdo. E esse caréter cie 40, critica e reformulacéo. Como ressalta Lévy (1994a, p. 109): “A interveneao junto a um grupo deve ser vista, 20 mesmo tempo, como uma acéo e como um modo de desenvolvimento de novos conhecimentos.” O profissional que atua nessa drea assume assim um papel de pesquisador-interventor. Reforcando a importancia da relagdo entre pesquisa e acio, Bleger (1984, p. 32) assume que: L...] no hé possibilidade de nenhuma tarefa profissional correta em psicologia se nao é, ao mesmo tempo, uma in- ‘estigagio do que esté ocorrendo e do que esta se fazendo, 16 © gue. nerengia Pacosoca? ada ciéneia, mas estigacao cientifica ‘do tem lugar acima ou fora da pratiea, mas sim dentro do curso da mesma, 1.2. Preocupagao em gerar mudanga e desenvolvimento Provocar algum tipo de mudanga no sentido de desenvolv mento é o objetivo fundamental da intervengio psicossocial ‘Mas, mudanca alguma pode ocorrer sem que anecessidade de mudanca seja primeiramente pereebida e sentida pelo grupo. Ninguém muda sem ter consciéneia e desejo de mudar: Além disso, a resisténcia 4 mudanga 6 comum no ser humano, e ‘sao muitos os fatores que dificultam as mudancas, Carreteiro (1994, p. 100) retomando as ideias de Lévy ressalta que as ‘verdadeiras mudangas ocorrem a partir da elaboracao das dificuldades e da criacdo de novas modalidades de busca da verdade”, o que requer um genusno trabalho psiquico, Maison- neuve (1977) e Lévy (1994b) discutem o problema da mudanca ea contribuigéo da psicossociologia para compreender e lidar com as mudaneas grupais. Vale ainda pontuar a ressalva feita por Sarriera, Silva, Pizzinato, Zago e Meira (2000) sobre a necessidade de avaliar 08 valores e a ética adotados ao definir quais mudancas sio almejadas para o grupo alvo da intervengéo. 1.3. Foco em grupos, instituigdes € comunidades Apesar de gerar mudaneas intrapessoais, a intervengao psicossocial tem como alvo os grupos, instituigSes, organize- des € comunidades. O alcance da intervengao deve ser amplo e visar mudancas que vao, até mesmo, além dos grupos. Os v [a ata Mania Coot Naa problemas e necessidades dos grupos estéo sempre ligados 0s problemas e necessidades das instituicdes das quais cles sao parte integrante. Logo, “nao se pode tratar dos problemas dos grupos, sem tratar ao mesmo tempo dos problemas das organizagées e das instituigses” (LAPASSADE, 1977, p. 62). Alem disso, uma comunidade, organizacéo, instituiedo 6 for- mada por um conjunto de grupos, que se inter-relacionam e se interligam. Uma agéo em um dos grupos gera efeitos nos demais e, consequentemente, no conjunto como um todo. 1.4. Agdo sobre os problemas atuais da sociedade e necessidades psicossociais de grupos, instituigées efou comunidades Quando se pretende a promogao do bem-estar psicossot € necessério pensar em uma estrutura complexa, com miilti- plos fatores que podem causar o mal-estar: fatores de ordem econdmica, cultural, social e outros. Logo, as necessidades ides ou & promogéo necessdria para atendé-las (BLEGER, 1984). Bleger (1984, p.79) aponta diversas situagdes em que o psicélogo pode contribuir com intervengées visando & psico- higiene na comunidade: + Em diferentes instituicées: famflia, empresas, fabricas, escolas, clubes, prisées, ete. Em distintas etapas do desenvolvimento da personali- dade: infancia, adolescéncia, maturidade, velhice Em periodos de mudanca no desenvolvimento: nasci- mento, desmame, puberdade, ete. Em situagées significativas que requerem mudancas: casamento, gravidez, divéreio, adogao, reforma, luto, escalha profissional, desemprego, aposentadoria, ete. 18 O cue Inerengo Picossocar? + Em periodos criticos da vida que exigem o enfrentamen- tode problemas especificos: imigracao, doenga, desastres econémicos, acidentes, tragédias, ete, Carreteiro (1994) chama a atencéo para o fato de que as sociedades vém sofrendo rupturas e mudangas que geram mal-estar nos individuos e ressalta o papel importante dos pesquisadores-interventores na realizacao de intervencées que facilitem o enfrentamento e superacao das dificuldades. Alguns dos problemas observados na atualidade sao: 0 crescimento do individualismo, a busca ineessante de sucesso econémico & intoleréncia as diferencas, que tém acarretado disputas entre nagées, etnias, grupos religiosos e outros. Na medida om que a intervencéo psicossocial tem como objetivo geral melhorar a qualidade de vida e o bem-estar psicossocial dos individuos, 6 necessério, portanto, conhecer 8 fatores que interferem neste bem-estar. 0 mapeamento e a andlise das necessidades psicossociais do grupo, instituicso, organizagao ou comunidade foco da intervenedo so fundamen- tais. Tais necessidades podem estar na drea de satide, educa- co, trabalho, economia ou outra; o importante é conhecé-las ¢ definir prioridades para decidir o(s) foco(s) da intervenes. Essa decisdo deve ser tomada com ou pelo grupo. Entretanto, vale ressaltar que as intervencdes psicosso- ciais nao se aplicam apenas as populac6es desfavorecidas. No Brasil, em funcdo dos problemas sociais, das desigualdades de renda, das condigées de vida, a maioria dos trabalhos na rea 6 desenvolvida com essa populacao. Mas, 0 conceito de intervencao psicossocial abrange todo tipo de grupo, institui- ao ou comunidade (NASCIUTTI, 1996), 1.5. Intervengao focada Aintervencdo nao consegue abranger todas as necessidades de um grupo, instituiedo, organiza¢do ou eomunidade. Portan- 19 De Katia aa Conta iva +o, importante definir quais as necessidades mais prementes e mais viéveis de intervengdo para que se possa estabelecer o(s) foco(s) da intervengao. Sem isso, corre-se o risco de ajudar a querer resolver tudo e ndo resolver nada, perdendo-se o rumo e eficdcia da intervengéo. Como enfatiza Bleger (1984, p. 45), com relacéo ao trabalho do psicélogo em instituigies, este 1ndo pode trabalhar com todos os integrantes ou todos os, organismos da instituigéo ao mesmo tempo nem tampouco isso 6a desejar; por isso deve-se examinar os pontos de ur- éncia sobre os quais intervir como objetivos imediatos, Deve-se definir, portanto, as prioridades, sendo possfvel até intervir em diferentes focos, desde que se planeje devidamente ‘como e quando trabalhé-los, 1.6. Carater predominantemente preventivo ‘Talvez parega incoerente atribuir a intervencdo psicossocial um caréter predominantemente preventivo, pois 0 foco das intervengaes sao as necessidades psicossociais, na maioria das vezes preexistentes. Mas, considerando que seu objetivo maior 6 0 bem-estar psicossocial e a qualidade de vida, ou seja, os aspectos de satide e nao de doenga, seu foco maior é, portanto, a prevengio, Segundo Casas (2005) a partir de 1960 houve um movimento de mudanga na légica da interveneao psicossocial que passou inicialmente a centrar-se na légica da prevencao priméria e em seguida na légica da promocéo da satide, do bem- estar, da qualidade de vida, da participagdo social, ete. Sendo assim, a intervenedo psicossocial pretende funda- mentalmente prevenir o mal-estar psicossocial, a m4 quali- dade de vida das pessoas, grupos, instituigées e comunidade: Prioriza, portanto, a atividade de psico-higiene, caracteristica fundamental da psicologia institucional (BLEGER, 1984), area da qual sofreu influéncia, De acordo com este autor, 20 CO que 6 Ierengto Palos A psico-higiene no gira ao redor da doenga e sim das condigées habituais da vida nas situagées reais em que clas se dio, tomando sous problemas e alternativas em si mesmas ¢ em fungéo dos seres humanos que intervém. em cada uma delas, (BLEGER, 1984, p. 80). ‘A psico-higiene est, portanto, relacionada a utilizagéo dos recursos psicol6gicos para enfrentar os problemas que surgem no desenvolvimento da vida dos grupos, das instituicdes e das comunidades. ‘Dessa forma, a intervencao psicossocial na qualidade de érea de atuagéo volta o seu olhar para as situagbes cotidianas, para asatividades e necessidades da vida corrente da populagéo, bus- cando prioritariamente a promoeao de bem-estar psicossocial 1.7. Leva em conta 0 contexto social e cultural Conforme Casas (2005) ndo se pode compreender realidade social alguma sem conheeer o contexto s6cio-histérico em que esta se desenvolve. Os grupos, instituicdes, organizagées & comunidades estado inseridos em diferentes contextos hist6- rieos, sociais e culturais, Da mesma forma, as necessidades psicossociais variam segundo o contexto social e cultural. Portanto, nao se pode analisar necessidades nem prioridades sem analisar conjuntamente a instituicdo e o contexto em que esté inserida, O que pode ser necessidade em um contexto pode néo ser em outro. Compreender o contexto social e cul- tural em que o grupo-alvo esta inserido é fundamental para 0 planejamento e desenvolvimento da intervencéo. 1.8. Inclui a diversidade do grupo, instituicéo e/ou comunidade Cada grupo, instituigao, comunidade tem suas caracteris- ticas préprias, necessidades, exigéncias e peculiaridades. A a Katia ra Costa Neve intervengéo deve levar em conta as especi cao e contemplar as adaptagdes necessérias, trabalhando até com o enquadre possivel. O local, o horério, a frequéncia dos encontros, a forma de participagio do grupo néo podem ser rigidos e devem, portanto, ser adaptados ao que for possivel para que a intervengdo ocorra e seja eficaz, processo de intervengéo psicossocial passa pelas seguin- tes fases: * Diagnéstica: fase em que ocorre a caracterizacao da institui¢do, a andlise das necessidades psicossociais ¢ a delimitagéo do(s) foco(s) da interveneao. Delineamento da intervenedo: fase de planejamento e elaboracao do projeto de intervene. Desenvolvimento da intervengdo: fase de aplicagio do planejamento de modo flexivel, sendo este passtvel de mudangas a partir das necessidades e dos feedbacks do grupo-alvo, Avaliagdo da intervenedo: fase em que se verifica se os objetivos propostos foram alcangados, se ocorreram mudangas, ou seja, avalia-se a eficdcia da intervengao. Devolucao e divulgacdo dos resultados: fase em que 03 resultados séo comunicados ao grupo, a instituigdo ou & comunidade, incluindo também a ‘pos divulgacao cientifica dos resultados para disseminacao da proposta interventiva. Lévy (1994a), ao analisar as perspectivas futuras da Psicos- sociologia, aponta a influéncia crescente da psicandlise e de trabalhos na area de inspiracéo psicanalitica ea contribuigao de certas correntes da Sociologia Clinica na compreensao das dimensées institucionais e culturais e a multiplicagao ivose im, “a necessidade de uma abordagem pluridisciplinar e a impossibilidade da psicossocio- 2 (que Inerengto Palcssoca? logia renovar-se sem contribuigées externas” (LEVY, 1994a, p. 112), apesar da dificuldade de tais articulagdes em funcdo de diferencas epistemologicas e de representacées de objeto. De outro modo, Bleger (1984, p. 72), ao discutir a impor- ‘tancia da psico-higiene, aponta a necessidade de os psicdlogos conhecerem mais sobre a psicologia das situagées e da vida cotidiana e elaborarem “teorias psicolégicas que nao partam especificamente da patologia”. : Finalmente, Machado (2004, p.24) conelui que “a pesquisa- intervengio psicossocial é uma forma privilegiada de producéo de conhecimento cientifico novo e inédito” : ‘Nao se pretende esgotar aqui as origens e caracteristicas da Intervengio Psicossocial, mas sim tragar algumas diretrizes basicas para o trabalho nesta area, facilitando assim a com- preensio dos aspectos metodolégicos que sero apresentados nos préximos capitulos. Referéncias bibliograficas BAREMBLITT, G. Compéndio de andilise “ional e outras ‘correntes: teoria e prética. 6. ed. Belo Horizonte: Instituto Felix Guattari, 2002. : BARROS, R. D. B. de Intervengio Psicossociol6gica. 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Porto Alegre: Sulina, 2000, p. 25-44 eto do desjo. In: LEVY, A. et eintervencio. Petropolis: Vazes, 19 4 CARACTERIZACAO INSTITUCIONAL E DIAGNOSTICO DAS NECESSIDADES PSICOSSOCIAIS Kathia Maria Costa Neiva interventor necesita primeiramente conhecer o grupo, instituigéo, organizagao ou comunidade, aproximar-se de seus componentes, ajudé-los a fazer um levantamento das neces- sidades psicossociais, para entao, junto com o grupo, decidir 0(8) foco(s) da intervencéo. Portanto, antes de planejar qualquer intervengéo, 6 pri- mordial conhecer se existe e qual é a demanda do grupo-alvo. “Uma intervengéo psicossocial ¢ desencadeada apenas se h4 uma demanda de algum grupo, organizacfo, insti ‘ou comunidade, 0 que néo exelui, da parte dos consultores, uma oferta de trabalho.” (MACHADO, 2004, p. 89). Ou seja, nem sempre a demanda de mudanga ou ajuda parte espon- taneamente do grupo; com frequéncia esta 6 desencadeada pela oferta do interventor. Da mesma forma, nem sempre a demanda é explicita, clara e até mesmo consciente. De acordo com Lévy (1994) faz parte do trabalho do psicossocidlogo fazer ‘emergir as demandas; nao s6 permitir uma expresso menos difusa delas, mas também permitir interpreté-las. “Fazer Katha Wana Costa Nava is no consiste em adotar uma atitude de (LEVY, 1994, p. 107) Quem fez a demanda inicial? A diregéo da instituigdo, um setor especifico, algum funcionério ou téenico? Partiu do quadro diretivo ou das bases? A demanda foi espontanea ou surgiu apés uma oferta do servico? & importante anal como surgi a demanda, se houve um encaminhamento, de quem partiu e como se deu. Além disso, segundo Bleger (1984, p. 42), para que uma instituigéo solicite e aceite a intervencéo é necessério um “certo grau de matu: de sua situaeao conflituosa, mas a funcéo do psicélogo conduz também a que se tome consciéneia de sua necessidade” Para Baremblitt (2002), 0 diagnéstico inicial 6 fundamental © portanto, deve ser estabelecido um eontrato com tal fim, implicando a criagdo e utilizagdo de dispositivos para ouvir todas as partes, além daquela que fez a demand: Iher os dados necessarios. Segundo este autor, “o diagnéstico J4 € uma operacdo de intervengéo” (BAREMBLITT, 2002, P. 102), por isso deve ser autorizado e legitimado, Toda instituigéo tem uma organizacéo prépria e objetivos especificos que devem ser devidamente conhecidos pelos interventores para que possam decidir sua tarefa profissio- nal na instituicao. A instituicéo possui objetivos explicitos ¢ itos, necessidades manifestas e latentes. Ao analisar ituicdo o psiedlogo deve nao s6 conhecer os aspectos explicitos, mas, principalmente, os implicitos para tomar decisdes e realizar assim sua tarefa de intervenedo. Quanto 0s objetivos, é necessario diferenciar os proprios objetivos da instituigao (explicitos e implicitos), dos objetivos para os quais a instituicdo solicita ou aceita a intervencao do psicélogo. Bo estudo diagnéstico que permite conhecer mais profundamente a instituigdo e suas necessidades (BLEGER, 1984), Sendo assim, a primeira etapa consiste em tramitar as devidas autorizagées e estabelecer 0 contrato para o levanta- 2 Ceratazago sudo e lgntnia des nacssdadespicossoiis mento diagnéstico. Em seguida, devem-se delinear os passos necessarios para a coleta das informacées que permitirao caracterizar a instituigao, organizagéo ou comunidade e diagnosticar as necessidades psicossociais. Diversos instrumentos podem ser utilizados nesta etapa para aeoleta de informagées e dados; os mais empregados si: entrevistas abertas, semiabertas e/ou fechadas, questiondrios, observagées, andlise histérica e documer diario de campo, fotos, filmes, gravagées e outros procedimentos comumente utilizados nas pesquisas-acéo e pesquisas participantes (MA- CHADO, 2004; SARRIERA et al., 2000; SARRIERA, 2008) Todos os contatos que o psicélogo estabelece com a ins- tituigdo/organizacéo ou comunidade fornecem material importante para o disgnéstieo. Logo, este deve estar atento a todo tipo de informagdo verbal ou nao verbal, positiva ou negativa, assim como as aliangas, defesas e resisténcias dos varios profissionais que atuam na instituigao. Por isso, convém ao psicélogo registrar minuciosamente suas contatos, observacées, entrevistas, nao poupando detalhes, pois so estes que muitas vezes fornecem pistas sobre as necessidades latentes. "Todos os primeiros contatosjé conduzem a uma impressio preliminar de varéter diagnéstico, para 0 qual se deve conhecer também a historia da instituigdo e — pelo me- nos ~ 08 grandes delineamentos de suas caracteristicas. (BLEGER, 1984, p. 51) As visitas institucionais e entrevistas devem ser previa- mente agendadas de acordo com a disponibilidade de ambas as partes: interventor ¢ instituigdo. E fundamental respeitar as caracteristicas da instituicao, sua rotina, suas normas e seu funcionamento. O interventor deve manter sempre uma atitude e de respeito para com a instituicdo, seus diri- gentes, seus funcionarios e sua clientela, ar eee Katia Mana Conte Neva Mas, o que é necessdrio saber sobre a instituicéo? 1b ne- cessario conhecer varios aspectos da realidade institucional. Para efeito didético, apresenta-se, no anexo 1, um roteiro para caracterizacéo da instituigéo e um levantamento das necessidades psicossociais. Algumas ideias para esse roteiro foram extraidas de Bleger (1984) e Sarriera (2008). O roteiro i quest6es relacionadas aos seguintes aspectos: a) Dados da instituigéo b) Historico da instituigdo ©) Servigosiclientela 4) Infraestrutura da Instituigao ©) Funcionérios/Profission 1) Necessidades psicossociais (relacionadas equipe téeni- ca e aos funcionérios; relacionadas a clientela) 8) Interesse e disponibilidade institucional para 0 desen- volvimento de um projeto de intervengéo psicossocial Evidentemente, esses dados sero coletados ao longo de uma série de visitas, entrevistas, observagées e deverao ser organizados em forma de relatério que permita extrair conclu- sdes e tracar um diagnéstico das necessidades psicossociais da instituigéo. B esse diagnéstico que norteara as decisdes com relagdo ao(s) foco(s) da intervengéo. Segundo Nasciutti (1996, p. 109-110), ao analisar a insti- tuigdo o psicossociélogo: C.-] vai dirigir seu olhar tanto para o que é de ordem a instit comunicagéo, funcionamento formal, divisao de papéis), assim como procuraré aprender o que é da ordem do sujeito e das relagdes interpessoais, E necessério, portanto, analisar diferentes niveis para compreender a complexidade da realidade institucional Py crac 9 dagrtsco das necessidades pcos Apés a coleta dos dados, estes devem ser analisados, 0 que pode ser feito por meio de diferentes técnicas. A escolha das ‘técnicas deve estar relacionada aos objetivos da andlise. Mui- tas vezes so utilizadas varias técnicas ao mesmo tempo. As téenieas devem abarcar aspectos qualitativos e quantitativos (SARRIERA, 2008). Podem ser usadas, portanto, anélises estatisticas, andlises de contetdo, andlises do discurso, ete. ‘Ao analisar as necessidades psicossociais € necessério defi- nir quais as prioridades e os pontos de urgéncia para entéo po- der planejar a intervencSo. O estabelecimento de prioridades depende de critérios diversos; nao s6 do tipo de problema e de sua urgéncia, mas também dos recursos humanos, econdmicos e téenicos. Além disso, “a planificago tem que contemplar néo 86 a urgéncia imediata como também objetivos de mais largo aleance” (BLEGER, 1984, p. 76). Alguns indices para avaliar as prioridades sdo apontados por esse autor como sugeridos por Molina e Adriasola: “gravidade do dano, possibilidade de evitar o dano, custo versus dano, rendimentos, atitude da comunidade.” (BLEGER, 1984, p. 76). Lévy (1994) aponta também trés pontos importantes para considerar a heterogeneidade da demanda; + situar a aco em uma perspectiva de pesquisa; * defini, desde o inicio da agéo, os objetos de pesquisa comuns aos interventores e solicitantes estabelecendo uma relagao de colaboracao. Aanilise das necessidades prioritérias deve, portanto, ser feita em conjunto com a equipe institucional, pois interventor ¢ instituigdo devem estar de acordo nas decisées que seréo tomadas com relago ao(s) foco(s) da intervengao. S86 entao poderé ser estabelecido um contrato definitivo que permitiré avangar para a etapa seguinte que consiste em planejar a intervengéo, definindo estratégias, téticas e técnicas e elabo- rando assim um projeto com o devido embasamento te6rico e metodol6gico. Esse tema serd objeto do préximo capitulo. Ey CR Katia Maia Costa Nee Referéncias bibliograficas BAREMBLITT, G. Compéndio de andlise institucional e outras correnies: teoria e pratica. 5. ed. 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Porto Alegre: Sulina, 2000. p. 25-44. 0 Caractteaptonsiticenaleeagnéstec das necessitates pseossociais Anexo 1- Roteiro de caracterizagao institucional e diagndstico de necessidades psicossociais T) Dados da instituicéo 1) Nome da instituigéo 2) Enderego completo 3) Telefone/fax/e-maillsite Responsével pela instituigdo: nome e cargo 5) Contato: nome e cargo ID) Hist6rico da instituigéo 1) Tipo de institui¢ao (escola, centro comunitario, ONG, ete.) 2) Quando foi fundada? Por quem? Esta vineulada a algum érgao? 1) Como e por quem é mantida a instituigao? 2) Qual é a missdo da instituigdo? Quais sdo suas fin des e seus objetivos? 3) Quais os prinefpios e valores da instituicdo? 4) Qual a contribuigdo social da instituicao? 5) Como se deu a evolugéo da instituigéo? Houve alguma mudanca importante na instituigéo durante o seu perio- do de funcionamento? Qual? Por qué? 6) Quais s4o as principais normas da instituicéo? TID) Servigos/clientela 1 Qual(is) o(s) servigo(s) oferecido(s) pela instituigao? 2) Como 6 feita a divulgagio dos servigos? 38) Qual a clientela a quem os servicos se destinam? 4) Quantas pessoas se beneficiam atualmente dos servigos? 5) Qual é 0 fluxograma dos servigos oferecidos? Como é 0 funcionamento da instituicéo? 6) Quais os dias e horérios de funcionamento? Eo Katie ava Costa Neva 7) Como a instituigéo avalia seus servicos? Quais foram os Ultimos resultados? IV) Infraestrutura da instituigdo 1) Em que tipo de im6vel esta instalada a instituicdo? O imével ¢ proprio, alugado, emprestado, arrendado...? 2) Existem salas especificas para o desenvolvimento das atividades/servicos oferecidos a clientela? 3) As instalagdes sdo adequadas para os servigos oferecidos? Quais instalacées sao adequadas © quais sio inadequa- das ou precérias? V) Funcionérios/profissionais 1) Namero de funcionarios e cargos 2) Organograma/nfveis hierarquicos 3) Quais os profissionais que desenvolvem os servicos ofe- recidos? Qual a situacéo profissional deles (contratados, prestadores de servico, estagiérios, voluntarios...) 4) Bxiste uma equipe multiprofissional? Quais os profis- sionais que compéem essa equipe? Essa equipe se retine com frequéncia? Qual a sistemética das reunies? Qual 0 objetivo destas reunides? 5) Como 6 o clima institucional? Como é 0 rel entre os funcionérios / técnicos/diretoria? (rio/competi- tivo/alegre/discreto/de confianga/de colaboragao, etc.) VI) Necessidades psicossociais As necessidades 0 podem estar vinculadas tanto & equipe de técnicos e funciondrios, quanto &clientela atendida. Logo, ao explorar e analisar tais neces- sidades deve-se ter em mente a instituigéo como um todo. Com relagao a equipe técnica e funcionérios: 1) Existe alguma demanda explicita ou implicita por parte do grupo de téenicos e funcionérios da instituigao? Caso 2 Crataraagsoietiusenale agnostca cas necosscadesrlcossciais exista, qual é esta demanda e como caracterizé-la em termos de necessidades psicossociais? 2) Estas necessidades, se existentes, comprometem os ser- vigos oferecidos pela instituicao? De que maneira? 3) Como a instituicéo lida com a resolucdo das necessidades psicossociais de seus técnicos e funciondrios? Com relagéo a clientela: 1) Quais sao as necessidades psicossociais da clientela atendida pela instituigao? 2) Quais as necessidades psicossociais que néo esto sendo atendidas pela instituig&o? Por qué? 3) Quais as dificuldades que enfrenta a instituicdo para atender a essas necessidades? 4) Quais dessas necessidades sao prioritarias de atendi- mento no presente momento? 5) Quais dessas necessidades seriam as mais vidveis de serem atendidas no presente momento? 6) Quais e quantas pessoas necessitariam ser atendidas? (descrever a clientela em termos de idade, sexo, nivel socioeconémico, escolaridade, limitagées. 7 Qual o interesse dessas pessoas em participar de grupos de intervencao? 8) Qual a disponibilidade dessas pessoas para participar de grupos de intervengao? (de horério, de vinda a insti- tuigao, de engajamento, de tempo...) VII) Interesse e disponibilidade institucional para o desenvol- vimento de projeto de interveneao psicossocial 1) Ha interesse e disponibilidade da instituigao para que seja desenvolvido algum projeto de intervenco psicos- social? De quem 6 o interesse? Direcdo, equipe técnica, clientela? 2) A instituigao tem condigdes de prover alguns recursos béisicos para o desenvolvimento da interveneso? Quais? 8 8) Existe um espaco adequado para o desenvolvimento da intervengao? Quantas pessoas comporta esse espaco? 4) Como a instituigéo se propde a colaborar para a divul- gacao e viabilizacdo da intervencdo? 5) Quais as dificuldades que a instituiedo prevé paraa rea- lizagdo da intervencao? VIII) Observacdes gerais sobre as visitas 1) De quem foi a demanda da intervengéo? Partiu espon- taneamente ou surgiu ap6s divulgagao do servigo? 2) Como foi o primeiro contato? Quem o atendeu pela pri- meira vez? Que impressdo essa pessoa lhe causou? 3) Nas demais visitas, sempre foi atendido pela mesma pes- soa? Foi encaminhado para outras? Quais? Por qué? 4) Como vocé percebeu 0 ambiente de trabalho? O relacio- namento dos funciondrios? O relacionamento entre funcionérios e clientela? 5) Como vocé pereebeu o interesse e a disponil instituigéo para uma intervengéo? O interesse é compar- tilhado por todas as instancias da instituicdo ou é apenas de um setor especifico? ELaBORACAO DO PROJETO DE INTERVENGAO PsIcossociAL Kathia Maria Costa Neiva Um projeto de interveneao psicossocial é um trabalho cientifico e, portanto, sua construgdo deve ser pautada nas normas cientificas em vigor. Sao muitas as obras dedicadas a metodologia cientifica e nao é objetivo deste livro retomar tais questées, entretanto sero abordados aspectos especificos relacionados a elaboragio de projetos na Area de intervencio psicossocial. Antes de iniciar a elaboragao do projeto de intervencdo deve-se ter uma resposta relativamente clara para cada uma das seguintes questoes: Qual 6 0 foco deste projeto (tema)? O que se pretende com este projeto (objetivo)? A quem se destina este projeto (populagao-alvo)? Por que e para que se pretende realizar este projeto Gustificativa)? Qual a importancia deste projeto para a instituigéo, comunidade, sociedade (relevincia)? Katha Mara Costa None As respostas as questées anteriores norteardo os aspectos te6ricos e metodolégicos do projeto. Entretanto, vale ressaltar que muitas decisdes devem ser tomadas conjuntamente coma equipe institucional, como o foco da interveng&o, os objetivos prioritérios, a populacdo-alvo, as condigdes da intervengao & outras. A participacdo da instituicao é fundamental para a viabilizagdo e 0 sucesso da intervengao. ‘A seguir serdo apresentadas as etapas de elaboracio de ‘um projeto de intervengao psicossocial. 3.1. Formulagao dos objetivos “A elaboragéo de um processo de intervencao depende dos objetivos que se propée atingir.” (SARRIERA et al., 2000, p. 82). Sendo assim, apés a delimitagéo do(s) foco(s) da in- tervencdo é fundamental definir seus objetivos. Os objetivos da intervencao devem ser discutidos e definidos em conjunto ‘com a equipe institucional. De acordo com Bleger (1984, p. 48): “A finalidade ou 0 obje- tivo que se deseja alcancar orienta a acéo, formando parte do enquadramento da tarefa.” Ao estabelecer 03 objetivos, 0 psicélogo deve ter claro: a) os objetivos gerais ou mediatos de sua tarefa; b) sua aceitagao ou nao dos objetivos da instituicao e dos meios que usa para aleangé-los e c) 0 diagnéstico dos objetivos particulares, imediatos ou especificos. Também nao deve confundir os objetivos institucionais com seus objetivos profissionais, 0 psieélogo deve ter consciéncia que seu obje- tivo maior é 0 de psico-higiene, ou seja, a promogéo de satide bem-estar dos integrantes da instituigéo e, portanto, em hipétese alguma deve renunciar a este objetivo. odo projeto tem um objetivo geral que ser4 a meta prin- cipal a ser aleangada e objetivos especificos que permitirao o aleance do objetivo geral. No inicio da elaboracao do projeto, quando a pesquisa bibliogréfica ainda nfo avangou, os obje- 96 ee eeeere er (oer =P tr PPP BE eee epee eee tee borage do projets de ntrvongao Picosscia tivos especificos podem ainda ndo estar claros. A medida que 0 conhecimento sobre 0 tema foco da intervengao vai se am- pliando, os objetivos especificos vo ficando mais evidentes. Durante toda a construgio do projeto nao se pode perder de vista o foco da intervencéo nem seus objetivos. Séo estes que ‘Alguns exemplos de objetivo geral: = Desenvolver a autoestima de jovens em situagao de vulnerabilidade social Facilitar a insergio profissional de egressos do sistema prisional. Fortalecer os vinculos familiares em lares sociais. ‘Vale ressaltar que os objetivos especificos devem ser cons- trufdos de forma simples e clara, evitando linguagens rebus- cadas e mais explicagées. Além disso, ao formulé-los deve-se ter em mente a possibilidade de serem efetivamente atingidos; nao cabem objetivos vagos, imprecisos ou ut6picos. Portanto, devem-se levar em conta os pontos de urgéncia sobre os quais, intervir como objetivos imediatos. 3.2. Embasamento tedrico Com relagéo ao embasamento tedrico, o primeiro passo & dclimitar os temas de estudo que permitiréo a compreenséo do(s) foco(s) da intervengao. Campos (2004) sugere elaborar um rol de palavras ou termos que se relacionem diretamente como tema para que possam ser utilizados na pesquisa biblio- gréfica. E importante selecionar devidamente o material de pesquisa e leitura, evitando ir além do foco, ou negligenciando materiais importantes. Com o advento da internet, esta bem mais fécil e gil rea- lizar uma pesquisa bibliografica. Entretanto, encontra-se também muito material nao cientifico na internet, o que re- a Coeta Neve quer uma boa triagem. O mais adequado ¢ realizar a pesquisa em bancos de dados cientificos, tais como: BYS-Psi, PePSIC, SciELO, Lilaes, Medline, Portal Capes, Redalye. Além da delimitagao dos temas a serem pesquisados, é importante definir a perspectiva sob a qual os temas sero tratados, A perspectiva sob a qual se estuda o tema é que determinaré o desenvolvimento da intervengéo (SEVERINO, 2000). Por exemplo, ao decidir-se por estudar o tema sob a perspectiva da psicandlise, essa mesma perspectiva deveré nortear os aspectos metodol6gicos e o desenvolvimento da intervengdo. F importante haver uma coeréncia entre o em- basamento tedrico e as decisées metodolégicas. se pretende, analisando seus resultados, seus limites, suas criticas e suas sugestées, Esses trabalhos poderao servir de modelo ou gerar ideias interessantes. Nas referéncias bil gréficas desses trabalhos também se pode encontrar material importante de ser pesquisado, O embasamento te6rico sobre o tema foco da intervencéo permite compreender melhor a problemética e facilita a to- mada de uma posicéo sobre a perspectiva em que se pretende desenvolver a intervengao. Além disso, 6 a partir daf que se consegue aprimorar a formulagso dos objetivos especificos e ter mais claras a justificativa e relevancia da intervengao. 3.3. Metodologia O cuidado com os aspectos metodolégicos é fundamental. Sao eles que norteardo todo o desenvolvimento do projeto, logo devem ser decididos com muito eritério, A seguir apresentare- mos cada um dos aspectos metodolégicos a serem definidos. aero do proto de iano Pskossol Populacao-alvo A definiedo da populacdo que serd alvo da intervencao é uma das primeiras questées a serem decididas. A compreensio dessa populacdo e suas caracterfsticas fara uma diferenca no dese ‘imento da intervengao. A intervencdo visaré um grupo especiiico, varios grupos de uma instituigéo, toda uma comunidade? # importante delimitar dentro dessa populagao qual ser o grupo-alvo. Os procedimentos metodoldgicos devem tomar em conta a composi¢ao e caracterfsticas do grupo-alvo. Algumas perguntas: * Quais as caracteristicas sociodemogréficas do grupo- alvo (sexo, idade, escolaridade, situagao socioeconémica, ete)? + De quantas pessoas ser composto o grupo-alvo? * O grupo-alvo é um grupo homogéneo ou heterogéneo? Instrumentos ‘A escolha dos instrumentos que sero utilizados depende diretamente do referencial tedrico, dos objetivos ¢ dos pro- cedimentos a serem adotados na intervencdo, Os psicélogos, contam com varios materiais psicol6gicos que podem vir a ser utilizados como: testes, técnicas, jogos e atividades psi- copedagégicas, dindmicas de grupo e outros. A decisdo dos instrumentos que serdo utilizados deve estar diretamente relacionada aos objetivos formulados. Sendo assim, essa es- colha deve ser muito criteriosa. 0 projeto deve prever um Termo de Autorizacéo para a participacdo na intervengSo, sobretudo se 0 grupo-alvo for composto de menores. Nesse caso a autorizagao deve ser dada pelos pais ou respons4veis, Katha Mara Cota Neve Deve-se utilizar também algum tipo de instrumento ou procedimento que permita avaliar a eficécia da intervencdo, ou seja, se seus objetivos foram ou ndo aleancados. Sugere-se, ada uma avaliagao prévia (pré-teste) e outra avaliagio ap6s a intervengao (pés-teste). Dessa forma, é pos- sfyel avaliar mais fidedignamente as possfveis mudancas. No préximo capitulo essa questdo seré discutida com maior profundidade. Duracdo, periodicidade e local E importante prever o tempo de duracdo da intervencao, a periodicidade e duragéo dos encontros, assim como 0 local em que estes sero realizados. Entretanto, ao longo da interven- cao essas condigGes podem ser revistas e mudancas no contra- to sdo possiveis. Uma intervencéo pode durar algumas horas ou até anos, mas ao elaborar o projeto deve-se ter uma ideia estimada do tempo necessério para 0 alcance dos objetivos propostos. Mudancas no contrato devem ser discutidas entre interventor e grupo-alvo, ¢ as decisées devem ser tomadas conjuntamente, em alguns easos envolvendo também outras instancias da instituicao. Quando se lida com instituigdes, nem sempre 6 possfvel estabelecer contratos rigidos, pois muitas varidveis intervenientes podem levar a mudangas, por exemplo, no hordrio de inicio ou término de um encontro, no local previsto para as reuniées, na presenca ou auséncia dos participates, etc. O interventor deve saber como lidar com esas situacdes e encontrar a solugéo mais adequada ou possivel para a continuidade da intervencéo, A previsdo da duracéo total da intervencéo esta relacio- nada aos objetivos que se pretende aleancar e as estratégias e procedimentos que serdo utilizados. Quanto & duracéo dos encontros grupais, em geral esses encontros séo semanais labora do prjta de IntrvengoPaeoesecial ‘com duragéo de 90 a 120 minutos. Mas tudo depende da dispo- nibilidade do grupo-alvo. Pode ocorrer que o grupo disponha apenas de 60 minutos por semana e nesse caso o planejamento de cada encontro deve ser adequado a esse tempo. E possivel também planejar encontros mais longos ou até mesmo uma intervencao compactada em um final de semana. Quanto ao local onde sera realizada a intervencio, este deverd ser discutido com a instituigéo que, em geral, se res- ponsabiliza por disponibilizar o espago. Esse local, nem sem- pre é 0 mais adequado, mas ds vezes é 0 tinico que permite a viabilizacéo da intervengfo. O ideal seria poder contar com uma sala com instalagées adequadas, mas pode ocorrer que o tinico local disponivel seja um patio ou até mesmo uma praca. ao ar livre. Conforme Machado (2004, p. 45-46): 0 ritmo da intervengio ¢ instavel, pois estabelecido pela inter-relagdo que se cria ao longo do trabalho entre pesqui- sador-consultor e pesquisado-cliente, pelos eonsentimen- os reefprocos (ineluindo o contrato entre as duas partes), pelas decis6es tomadas sempre em discusséo. Procedimentos nivel de detalhamento dos procedimentos pode variar, mas o importante 6 que o interventor tenha relativamente claro sua proposta de trabalho passo a passo. Em algumas situacées, o primeiro procedimento é divulgar ‘a proposta de intervencdo com a populacéo-alvo, verificando assim os possiveis interessados para, a partir dai, constituir © grupo-alvo, Por exemplo, foi decidido junto com a equipe diretiva de uma ONG que promove ac6es sociceducativas, oferecer aos adolescentes uma intervencéo com 0 objetivo de preparé-los para uma primeira insercéo profissional. E neces- “a Kata Maria Cosa Neva sdrio planejar como isso serd divulgado com os adolescentes e os pais. Por meio de uma palestra, de uma carta-convite, de uma reunio, de um cartaz? Em seguida, deve-se prever como serio feitas as inscrigdes para participar do trabalho e tramitadas as autorizagdes dos pais ou responsaveis, no caso de menores. Constitufdo o grupo-alvo, 6 necessério planejar os encon- tros. Pode-se considerar que toda intervencéo em grupo passa por trés momentos, com caracteristicas bem especificas: I Apresentacao e integracao do grupo Este 6 0 momento inicial no qual se facilita a apresentagéo € integragéo dos participantes incluindo os interventores, apresentam-se os objetivos da intervengao e estabelece-se 0 contrato de trabalho. Nessa fase inicial, exploram-se também as expectativas do grupo com relacso a intervencao e realiza-se uma avaliagéo prévia (pré-teste) da condigao dos participantes com relacéo ao aspecto que ser4 foco da intervencéo. Il. Desenvolvimento Essa fase é composta de todos os encontros que visam tra- balhar os objetivos especificos, estimulando o que for previsto para que as mudancas objetivadas possam se processar. 20 e despedida do grupo Este é 0 momento final, quando se avaliam a intervengéo as possiveis mudaneas do grupo. Nessa etapa reavalia-se a condicao dos participantes com rela¢o ao aspecto focado na intervencao (pés-teste). Além disso, promove-se a despedida do grupo e discute-se sobre a continuidade das agées pés- intervengao. errr rete eet eet Elaboragda do projet de ntrvengdo Picosocial ‘Ao planejar cada um dos encontros, deve-se definir: + objetivos do encontro; instrumentos que serao utilizados; + procedimentos que sero realizados; + recursos necessarios. Parao planejamento de cada encontro 6 necessério ter sem- pre em mente a duracéo do encontro, evitando assim planejar mais do que seré possivel realizar. Por isso, a0 descrever cada um dos procedimentos que sero realizados (por exemplo, apresentacéo dos membros do grupo, aplicagao da dinémica X ou da técnica Y, discussdo do tema Z), deve-se estar atento & duracéo de cada atividade. Assim, podem-se distribuir melhor 18 atividades no encontro e assegurar-se de que seré possivel ‘cumprir o planejamento, Vale ressaltar, que ao longo do desenvolvimento da inter- vencéo, o planejamento realizado é passivel de adaptacies © mudangas; pois, com frequéncia, outras situagies so trazi- das pelos participantes do grupo que merecem a atencio necessitam ser trabalhadas. Entretanto, néo se pode perder 0 foco geral do trabalho, pois, do contrério, seré muito dificil aleangar os objetivos previstos. Recursos Nao se pode esquecer de incluir a previséo dos recursos necessdrios para o desenvolvimento da intervengao. Os re- cursos podem ser: + Humanos: Deve-se prever quais e quantos profissionais serdo necessérios para a realizagéo da intervengao. Materiais: {5 necessério prever todo o material que serd necessério, desde 0 material psicolégico (testes, Katie Wer Costs Neva técnicas), até o material de escrit6rio (papel sulfite, caneta, lousa, giz, cartolina, ete.) e também o mol (sala com carteiras, colchonetes, ete.). Em geral, esse material é disponibilizado pela instituicao. ‘Em alguns casos é necessério fazer uma previséo de custo e um cronograma de atividades. E comum as instituigées solicitarem tais informagées. Foram apresentados anteriormente os aspectos principais para a elaboragéo de um projeto. Com relagdo a sua redacéo, ¢ importante seguir as normas de redacéo de trabalhos cien- tificos que podem ser encontradas nos livros de metodologia ntifica. Sugere-se 0 livro Metodologia do trabalho cientifico (SEVERINO, 2000), bastante completo e de leitura fac Finalmente, é necessério cuidar da apresentacdo do projeto, ‘que geralmente ¢ entregue a instituiedo para que seja submeti- do a apreciacdo. O projeto deve constar das seguintes partes: * Capa na qual deve constar 0 titulo, o nome dos autores eoano. + Sumério no qual sao relacionadas todas as partes do trabalho e suas respectivas paginas. Resumo no qual deve constar de forma breve (100 a 300 palavras), os elementos prineipais do projeto: tema, Justificativa, objetivo e metodologia Introdugdo que ¢ iniciada com uma apresentagdo de como surgitt a ideia do projeto, resumindo as etapas de caracterizagéo da instituicao e levantamento de necessidades psicossociais. Em seguida passa-se a0 em- basamento te6rico que deve conter uma revisdo teérica do{s) tema(s) ou problema(s) sobre o(8) qual( vird, enfatizando qual referencial teérico seré uti no projeto de intervengao. E importante desenvolver Elavrapso do projeta de ntervengs Paeosscial ‘um raciveinio légico e coerente e nao perder de vista os ‘objetivos do trabalho. Finaliza-se com a justificativa e relevancia social do projeto de intervencéo. Objetivos gerais e especificos, que podem ser apresen- tados em t6picos. ‘Metodologia que deve incluir todos os aspectos ante- riormente mencionados: populacdo-alvo, instrumentos, duragéo, procedimentos. Recursos que englobam os recursos humanos e mate- riais. Anexos que devem ser devidamente apresentados numerados no texto, sendo compostos de cartas, fichas, termos, técnicas e atividades, ete. Neste item, deve-se colocar uma capa para cada anexo, constando seu ni- mero e titulo, Referéncias bibliogréficas, compostas de todas as obras mencionadas ao longo do texto, devidamente referen- ciadas de acordo com as normas cientificas, ‘Apés a elaboragi do projeto e aprovacéo dele pela insti- tuigso, passa-se ao desenvolvimento da intervencéo propria- mente dita, assunto que ser tratado no préximo capi Referéncias bibliograficas BLEGER, J. Psico-higiene e psicologia institucional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1984 CAMPOS, L. FL. Métodos e téenicas de pesquisa em psicologia. 3. ed, Campinas: Ed. Alinea, 2004. MACHADO, M. N, Prétioas psicossociais; pesquisando e intervindo. Belo Horizonte: Hdigbes Campo Social, 2004 “6 NN ee ee eee eee enn nee | Kathie Wasa Coste Neva SARRIERA, J. C. et al. Intervencéo psicossocial e algumas questoes éticas e téenicas. In: SARRIERA J. C. (Coord.) Psicologia 4 comunitéria: estudos atuais. Porto Alegre: Sulina, 2000, p, 25-44. SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalho cientif a Paulo: Cortez, 2000. ae ea DESENVOLVIMENTO DA INTERVENGCAO PsICOssociAL Kathia Maria Costa Neiva | Uma vez o projeto pronto e aprovado, se da inicio & inter- vengao propriamente dita, cujo desenvolvimento seré pautado nos procedimentos e nas estratégias definidos. Entretanto, durante a implantacao e o desenvolvimento da intervencao “6 possivel realizar modificagées e corregoes através do feedback avaliativo da comunidade” (SARRIERA, et al., 2000, p. 34), ‘Nessa etapa ocorre o contato direto entre interventor e gru- po-alvo e se estabelecem as relagies entre os participantes do grupo. E aberto um espago para mudancas, transformacdes e desenvolvimento que visa, em tiltima insténcia, contribuir para o bem-estar psicossocial dos individuos, alvos da inter- sero apresentados alguns aspectos que merecem uma andlise mais detalhada. O enquadre No inicio de qualquer intervencdo é necessério estabelecer o enquadre que, segundo Bleger (1984, p. 46): 48 eet rE errr PEPER rE ELE RRRe eee eH tee 1 acc Katia Moria Costa Neva Pode-se definir como um conjunto das condigbes nas quais se realiza a observagéo e constitui uma fixagio de varis- vyeis ou uma limitagéo das mesmas, ou a fixagio de um conjunto de constantes, que tanto nos serve como meio de padronizacéo como sistema de referéncia do observado, O enquadre permite, portanto, que o trabalho se realize dentro de certos limites que do seguranca a todos os envol- ‘vidos e funciona como esquema referencial. Ele compreende o esclarecimento do grupo sobre: a duragéo dos encontros ¢ da intervengao como um todo, o hordrio, os dias ¢ o local dos encontros, 0 custo (se houver), os objetivos, a tarefa que seré realizada, os papéis do interventor e dos participantes, 0 sigilo profissional e outras situagées que sejam pertinentes, por exemplo, a questao das faltas eventuai leger (1984) discute ‘em detalhes algumas regras a serem observadas no enquadra- mento do trabalho do psicélogo clinico em instituigoes. Como ja foi mencionado anteriormente, na intervencéo psicossocial algumas varidveis que compdem 0 enquadre s4o passfveis de alteragdo como local, dias do encontro, horério e duragio, em fungéo de situagées institucionais. Quando se lida com instituig6es, organizagves e comunidades, é necessirio ter certa flexibilidade e capacidade de adaptar o enquadre planejamento em prol da prépria continuidade da intervengio. O importante é que as alteragées e/ou adaptagées sejam devi- damente discutidas com o grupo-alvo e esclarecidas, ou seja, que nesse caso o enquadre seja revisto ¢ aceito por todos. O papel do interventor psicélogo que atua em intervengéo psicossocial tem dois papéis: de pratico e pesquisador. Como pritico, seu papel funda- mental é de facilitador da tarefa foco da intervengao. Durante todo o processo ele deve “estar em sintonia com as necessidades Desenvohineria da ntrvengoPstoseil ce expectativas da populagéo-alvo, respeitando e solieitando a participacéo desta” (SARRIERA et al., 2000, p- 42). ‘Esse profissional deve estar ciente de que sua participacio ‘em um grupo, instituicéo, organizagéo ou comunidade pro- move ansiedades, resisténcias, contradigées, ambiguidades, traneferéneias e contratransferéncias e que o manejo destas far parte de sua tarefa (BLEGER, 1984). Nesse sentido, é importante que qualquer situagéo de tensao seja devidamente itada e trabalhada no grupo e com 0 grupo. disso, 0 interventor possui também um papel de pesquisador e, portanto, deve utilizar-se dos métodos e das téenicas de pesquisa que sejam pertinentes ao trabalho que realizaré, Sua capacidade de observagéo, escuta e anélise deverd estar em constante uso, durante todas as etapas da intervengéo. Esses dois papéis néo esto dissociados, sendo, a0 contrério, complementares, jA que a propria esséncia da intervengao psicossocial é unir a pesquisa e a agdo. Conforme Machado (2004, p. 65): (© pesquisador-prético, por sua presenca, suscita certos problemas, permite que um novo tipo de discurso seia fenunciado, que outras condutas se revelem, influencia diretamente a vida do grupo com o qual trabalha, ¢ dbjeto de amor e édio, simbolo de autoridade ou pedo a ‘ser manipulado, foco de projecdes, de identifieagies e de contraidentificagées. ‘Besa autora considera ainda que o papel do interventor néo seja conduzir ou induzix, mas favorecer a andlise e facilitar a emergéncia de um sentido, de uma nova perspectiva. Sao ‘assim pesquisadores preocupados em aprender a hist funcionamento ea vida do grupo social, mas também praticos, que trazem conhecimentos tedricos sobre 0 funcionamento dos grupos, instituicées e comunidades, além de conheeimen- ry Kebie or tos elinicos (de escuta, anélise, interpretagio), sociol6gicos e psicolégicos sobre os individuos. ‘Ainda de acordo com essa autora, a relagdo estabelecida entre pesquisadores-interventores e pesquisados-clientes é de colaboragio, de forma que os primeiros respondem a de- manda de ajuda dos segundos, escutam suas manifestagoes, analisam, interpretam e refletem sobre elas e fazem a devo- luge do material. J4 os segundos, apesar de demandarem a intervencéo, participam também ativamente dela, analisando os problemas, buscando junto com 0 interventor encontrar solugdes e implementar mudaneas. Machado (2004) faz também a observagéo de que o psicé- logo, ao trabalhar com as camadas menos favorecidas da po- pulagio, deve ter o cuidado de no se colocar como o salvador, capaz de solucionar o desamparo, correndo o risco assim de transformar a sua atividade profissional em uma atividade caritativa. Por isso, considera essencial “a anélise da impli- cago do psicélogo em sua pratica” (MACHADO, 2004, p. 96) que deve ser feita a partir de uma reflexdo tedrica. Vale lembrar ainda que Bleger (1984, p. 43) ressalta que 0 psiedlogo deve ter sempre claro que ele “ndo é 0 profissional da alienagao nem da explorago, nem da submissio ou coercéo, nem da desumanizaao” e que suia misséo é sempre promover a saiide, integragdo e plenitude do ser humano. A intervengao propriamente dita Em todos os momentos do processo de intervencio, 0 pro- fissional deve ter em mente os principios que embasam tal atividade e os objetivos da intervengdo, assim como ter claro seu papel como interventor. O interventor deve buscar uma relagao cooperativa do grupo-alvo, fazendo-o participar das atividades, técnicas e dindmicas que forem realizadas, con- tribuindo assim para o desenvolvimento do processo. B com 50 ‘Desenvohimento da Interven Paccesoil o grupo também que ele deveré avaliar sistematicamente a intervengdo e decidir modificar o que: considere necessario. O38 partieipantes do grupo devem ter a liberdade para expressar seus sentimentos, suas opiniGes e suas expectativas, em um clima de respeito e confianga. Cabe ao interventor ajudar a construir este climaee facilitar a expressio e 0 relacionamento dos membros do grupo (SARRIERA et al., 2000). Enriquez (1994) aponta que o direito e a liberdade de expresséo séo fundamentais para o desenvolvimento da intervengao. 0 interventor deve, portanto, estimular a ex- pressdo de todos os participantes, fazendo emergir 0 nao falado, o implicito. A intervencao deve proporcionar uma ‘maior autonomia e conscientizacéo das pessoas e uma nova significagéo para as vivéncias. As formas de pensamento linguagem do grupo, com frequéncia rigidas, também devern ser questionadas permitindo emergir um pensamento mais imaginativo e associativo. ‘Ao longo de toda a intervencéo, o profissional deve estar atento aos processos grupais incluindo a integracao, a comu- nicagéo, as liderangas, 0 interjogo de papéis e os emergentes (a partir das express6es trazidas pelos porta-vozes sobre as ansiedades do grupo). A dinamica grupal deve ser sempre analisada e compreendida em conjunto, pelo interventor € pelos integrantes do grupo-alvo. A avaliacao da intervencao ‘Vale lembrar que uma das caracteristicas da intervengao psicossocial é seu cardter investigativo. Logo, a avaliagio deve estar presente em todas as etapas da intervengio: desde a fase diagnéstica, quando se processam a avaliagéo da instituigio suas necessidades psicossociais, pasando pela fase de elabo- ago do projeto, quando se avaliam prioridades e decidem as estratégias, a fase da intervengao propriamente dita, quando st dee Kathie Mara Costa Neva a preocupaao recai em avaliar os resultados da intervencéo, as mudaneas ocorridas e finalmente a eficacia do programa de intervencao. A avaliagao dessa tiltima etapa sera objeto de uma discusséo mais detalhada. A avaliagao de programas de intervengéo nem sempre 6 uma tarefa de facil realizagdo. Em primeiro lugar, 6 necessé- rio avaliar a intervencéo constantemente. Deve-se reservar um tempo, ao final de cada encontro, para que o grupo possa avaliar 0 encontro, as estratégias utilizadas visando ao alean- ce dos objetivos propostos, ao andamento da intervengao, as relagées no grupo. O feedback do grupo é fundamental para a revisdo e reorganizacdo do planejamento inicial. Nesse momento, a avaliacdo pode ser feita em forma de discusstio grupal, que permita aos participantes manifestarem suas opiniGes, criticas e sugestoes Entretanto, 6 necessério prever alguma forma de avaliar a intervengéo como um todo, verificando a existéncia de mu- dancas e a satisfacéo do grupo Para verificar se existiram mudangas com relagao a situagéo foco da interveneao, sugere-se a utilizacdo de algum instrumen- to psicolégico especifico: teste ou escala psicolégica, entrevista estruturada, ete. Vale a pena utilizar algum instrumento jé padronizado e validado, mas caso no se enconttre jé publicado um instrumento adequado ao propésito, possivel construt-lo. Para a construcéo de instrumentos, sugere-se consultar aobra de Bunchaft e Cavas (2002), cuja leitura ¢ facil e bastante di- dtica. O mais adequado é que esse instrumento seja aplicado no inicio da interveneao (pré-teste) e reaplicado ao final da intervengao (pés-teste). A comparacéo dos resultados obtidos no pré-teste e pos-teste permitiré avaliar criteriosamente a evolucéo do grupo a partir da interveneio, a ocorréncia de mudancas ¢ consequentemente a eficdcia da intervencéo. Entretanto, é necessério também fazer o grupo expressar sua apreciacdo e satisfacao com relagéo a intervengao. Pode-se 2 IB Se Desonvlmente ds ntrvengie Pecossoci utilizar para essa finalidade uma ficha de avaliagéo de satis- fagao, uma dindmica de grupo ou ainda solicitar a apreciagéo verbal do grupo, suas criticas e sugestoes. Deve-se incluir uma avaliagao da pertinéncia das técnicas ¢ estratégias utilizadas e da evolucao do relacionamento grupal. No anexo 1 apresenta- se um modelo de ficha de avaliagéo em forma de questionario com questées abertas ¢ no anexo 2, um segundo modelo em forma de questiondrio com questées fechadas a serem respon- didas em uma escala de tipo Likert. Ambas as fichas podem ser adaptadas ao propésito e realidade da intervencso. A devolucdo e divulgacao dos resultados De acordo com Machado (2004, p. 46): ‘A dovolugio a0 eonjunto social das observagoes feitas, dos ‘dados e informagtes levantados, das imagens ~ fotografias, filmagens ~realizadas, das hipéteses ereflextes suscitadas pela intervencao é dispositive comumente usado neste tipo de trabalho. A devolugdo desencadeia novos discursos, novas anilises, elaboragGes. Portanto, os resultados devem ser devolvidos ao proprio grupo-alvo, para que ele tome posse também das mudancas processadas. & importante pensar que o grupo-alyo 6 um agente de mudancas e poder funcionar como multiplicador. Nesse sentido, deve-se fazer um prognéstico e decidir sobre a continuidade ou nao de novas intervencées, implantando, se for 0 caso, dispositivos para que o grupo dé seguimento ao trabalho, fazendo de forma permanente um processo de auto- anélise e autogestdo, ainda que com algum acompanhamento ou intervengées eventuais (BAREMBLITT, 2002). Com relacao a divulgacso dos resultados a outras instancias da instituigdo e & comunidade cientifiea, isso deve ser feito com ‘ase em prineipios éticos. Por isso, é necessério deixar esse 53 Katha Mara Costa Nove Ponto claro ao estabelecer o contrato e tramitar, com participan- tes do grupo-alvo, um termo de autorizacdo para divulgacéo dos resultados. E comum a institui¢éo solicitar um relatorio sobre a intervengio e este relatério deve ser construfdo de forma ética, protegendo a identidade dos participantes, Os resultados devem ser apresentados e analisados tomando como referencia © grupo € nao os participantes individualmente. Omesmo vale para a divulgacao nos meios cientificos, que de suma import4ncia, pois permitiré que a intervencao possa ser replicada em outros grupos com a mesma problematiea ou adaptada a outros meios e situagies. Algumas questées éticas Uma questo ética importante diz respeito a aceitagao, por parte do profissional, dos objetivos da instituicdo, organizacéo ou comunidade na qual se propée a intervir. Segundo Bleger (1984), 0 psieblogo nao deve accitar realizar um trabalho em uma institui¢do que rejeite ou cujos objetivos ou meios para alcangé-los nao esteja de acordo. Para ele “em Psicol gia, a ética coincide com a técnica” (BLEGER, 1984, p. 44), Além disso, o psicélogo nao deve aceitar uma tarefa profissional se est demasiadamente envolvido na instituigéo ou no seu movimento ideolégico, a menos que ele tenha condigdes de estabelecer certa distancia operativa e instrumental que per- mita que atue profissionalmente como psicélogo. O profissional deve ainda estar atento a seus proprios va- lores, que nem sempre so semelhantes aos do grupo-alvo ou dain: ‘o. Além disso, mesmo sendo um cientista na drea social, ele é contaminado pelos valores que regem a sociedade ea cultura na qual esta inserido. Logo, é fundamental que avalie seus préprios valores e a ética que adota, ao definir quais mudangas busca quando ingressa em um grupo-alvo (SARRIERA et al., 2000). Decenvohimanto da ntarveng Pacceocial ‘Vale também lembrar todas as questdes éticas relaciona~ das ao sigilo e a confidencialidade dos contetidos emergentes, durante a intervenedo. Portanto, caso 0 profissional pretenda divulgar nos meios cientificos a experiéncia de intervencio € seus resultados, é necessério tramitar 0 Termo de Autorizacéo para esta finalidade Como ressalta Sarriera, (2000, p. 28), ilva, Pizzinato, Zago e Meira Quando intervimos na realidade alheia ou quando desven: damos um conhecimento, somos responsaveis pelas vidas ‘ali’ presentes, bem como pelos préximos conhecimentos ‘que iro surgir e até pelo andamento das tendéneias da cigneia, da cultura e das sociedades. mal que atua na area de intervencéio los conhecimentos tedricos e ‘metodolégicos, atitude profissional eética, além deum grande ‘compromisso e responsabilidade para com a sociedade. Referéncias bibliograficas BAREMBLITT, G. Compéndio de andlise institucional e outras correntes: teoria e pritiea. 5. ed. Belo Horizonte: Instituto Felix Guattari, 2002. BLEGER, J. Psico-higiene e psicologia institucional. Porto Alegre Artes Médicas, 1984 BUNCHAFT, G,; CAVAS, C. 8. T. Sob medida: um guia sobre a claboracio de medidas do comportamento e suas aplicagées. S80 Paulo: Vetor, 2002. . O papel do sujeito humano na dindmica social ER LAVY,& et a. Prartlogta nde sole intervenes. Petrépolis: Vozes, 1994. p. 24-40 : HADO, M. N. M. Praticas psicossociais: pesquisando e Mier, Belo Horizonte Bdiges Campo Social, 2004 53 Katia Mana Costa Nea Desenvolvmenta da niervencso Pscosocil da intervencao ‘Nome: (opeional), Idade: Instituigao: 7. Aatividade menos produtiva fol Criticas e sugestbes: Katia Marla Costa Neva Anexo 2 — Modelo de ficha de avaliacgao da intervengao Ficha de avaliagao da interveng3o ‘Nome: (opconal ce: ‘So! Instituigdo: Data:__j_7. Pra cada questo, creule resposta que sobre 0 assunto. thor exorasse va opine ou sentmento 1. Considero que a intervene da qual participel ft 1.Mukoruim — 2.Ruim —3.Razoavel 4. Boa 5. Muite boa 2. Com relagao 20s abjtvos propostos, considero que foram alcangados: 4.Nenhum 2. Poueas 3. Alguns 4Amaiora 5. Todos 3, Considero que as da lntervengao foram: 4. Desinteressantes idades reaizadas 4. estan interassanles 4. Considero que as 1. improdutivas| 4. Bastante produtvas 5 Muito produthvas 5. Considero que a ileragio grupal durante interven fol 3.Razoavel —4.Boa 5, Muito boa feo que 2 comunicaglo grupal durante a interveng fl: 2.Ruin —3.Razodvel ~—4.Boa.=—_«8. Mult boa 7.Considero que a atuagdo dol) intervent Muito wim — 2.Ruim — 3.Razoavel 4. Bos. 5. Muto boa 8. Considero que as condigBes em que a Intervengao ocorreu foram: ‘Muito ine 2-Ruine 3. Razoavele 4,008. Multo boas. 9. Meu sentimento gora sabre @ nterveng0 que patcpal é: 1. Dotestel 2, Nao gostei 3. Sou nferente 4. Gostel 5, Gostel muito 10. Mau sentimento geral sobre meu aproveltamento na interven¢lo & 1. No aproveite 2.Aprovelte pouca «3. Aproveielosufcente 4 Aprovelte| bastante 5. Apreveitelo maximo que pude ‘1, Considero que os resukados ds 3, Satistatoros 4, Bastante 12, Comparando meu bemestar psicossocial antes e apés a interven¢do, agore considero que estou 1.Bomplor —2.Pior 3. gual 4.Mehor 5. Multo melhor 58 Parte Il ExpERIENCIAS DE INTERVENCAO PsicossociAL ORIENTAGAO DE JOVENS PARA A INSERCAO | NO MUNDO DE TRABALHO Kathia Maria Coste Neiva Fernando Augusto Caires Thais Mendes de Souza Introdugéo 0 trabalho tem importéncia fundamental na vida das pessoas, pois permite que estas assumam um papel produ- tivo na sociedade e sejam reconhecidas por isso. O trabalho durante a adolescéncia tem sido objeto de estudo e discussio por parte de psicélogos, sociélogos, politicos, educadores © outros profissionais. De acordo com 0 Estatuto da Crianga e do Adolescente (EC: n? 8,069 de 13 de julho de 1990, art. 60 (BRASIL, | 1990): “E proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na condigao de aprendiz.” Esse estatuto regulamenta, entre outras coisas, as condigdes em que os adolescentes podem trabalhar, considerando que o horario de trabalho deve ser condizente com a possi tar a escola e que as atividades sejam compativeis com 0 seu desenvolvimento, vedando 0 trabalho em horério noturno, em atividades perigosas, penosas ou insalubres ou que com- prometam o desenvolvimento fisico, psiquico ou moral. Além SSSI i in Katha Maia Cost Neha - Fernando Auguste Coes“ Thels Mendes de Souza disso, 0 art, 69 aponta duas condigSes para a profissionalizacéo e protecéo do adolescente no trabalho: I - respeite & condigéo peculiar de pessoa em desenvolvimento e II - capacitacéo profissional adequada ao mercado de trabalho. ‘Nas familias de classes socioeconémicas menos favoreci- das, é comum o ingresso precoce dos filhos adolescentes no mercado de trabalho, ingresso este que se dé por volta dos 15 anos, no final do ensino fundamental e infcio do ensino médio (GUIMARAES; ROMANELLI, 2002). Essa realidade se deve principalmente A necessidade de arcar com os proprios gastos pessoais, de ampliar os rendimentos familiares e as- sim garantir melhor a sobrevivéncia da familia (DAUSTER, 1992; SARRIERA; SA; TEIXEIRA, 1997). Algumas vezes, @ contribuiggo ao orcamento doméstico pode ocorrer por meio de salérios indiretos como cesta bésica ou vale alimentagéo (GUIMARAES; ROMANELLI, 2002). Além disso, o trabalho evita que 0 adolescente fique ocioso e corra o risco de envol- ver-se em situagées de marginalidade como: drogas, roubos, gangues, ete. (DAUSTER, 1992; GOMES, 1998). Entretanto, outras motivagdes podem contribuir para que o adolescente ingresse precocemente no mundo do trabalho. Por meio do trabalho o adolescente pode alcangar sua satisfagéo pessoal e participagdo na vida econdmica, social e politica. Nessas familias, os filhos mais novos tém como exemplo os irmaos mais velhos que jé trabalham e acabam seguindo esse ‘caminho como algo natural e vendo um significado positivo nessa situacdo. Além disso, a condicao de trabalhar nao resul- ta apenas da situacdo de pobreza, mas a busca por emprego na adolescéncia est associada ao desejo de conquistar auto- nomia e liberdade, aliado ao consumo de bens que os pais nem sempre podem propiciar (GUIMARAES; ROMANELLI, 2002; DAUSTER, 1992). O trabalho pode, assim, favorecer 0 ama- durecimento psicol6gico e intelectual de jovens e atuar como forma de socializacéo, completando assim a agéo da escola (DAUSTER, 1992; GUIMARAES; ROMANELLI, 2002). 62 vinta da oven para a sero no mundo e abet Ble é um meio através do qual os jovens se relacionam com asociedade e contribuem, mediante a prestagio de bens & servigos, & manutengio desta. Este vinculo pessoa-soci dade possibilita um sentido de partieipacdo e utilidade. (GARRIERA et al, 1996b, p. 92). Sarriera, Berlim, Verdin e Camara (2000a), em estudo realizado com 563 jovens porto-alegrenses, constataram que cado prioritdrio do trabalho est relacionado a auto- inanceira. Esses jovens consideram também que “ter ” e “formagdo profissional” s4o os fatores que mais, determinam a obtengao de emprego. Entretanto, a {nsergdo laboral é uma tarefa complexa para os jovens, visto que eles esto diante de varias modificagdes com tas quais tém que lidar, al6m das modificag6es evolutivas fe de um mercado de trabalho exigente e competitive. (SARRIERA et al., 20008, p. 60) 0 ingresso para o mundo do trabalho esté cada vez mais dificil, principalmente para os jovens (CAMARA; SARRIERA, 2001; SARRIERA; CAMARA; BERLIM, 2006). Antigamente bastava uma indicagdo para que @ pessoa conseguisse um emprego. Hoje, com a diminuigao dos postos de trabalho, os requisitos para a obtengao de emprego se modificaram e as exigéncias do mercado aumentaram consideravelmente. O mercado de trabalho passou a busear pessoas com uma boa formacao e experiéncia profissional, dificultando assim a in- sergao de jovens de camadas sociais menos favorecidas, que muitas vezes passaram por uma escolarizacao precéria e tem dificuldade em adquirir alguma experiéncia. Osjovens percebem a escola ¢ 0 mercado de trabalho como mundos dissociados. Consideram que os anos de estudo nao garantem a insergéo profissional e que nao desenvolveram habilidades exigidas hoje no mundo do trabalho. O ensino é ‘visto como insuficiente e ineficiente para qualifica-los para 0 6 Katie Maria Costa Neva» Femands Augusto Cas» Thal Mendes de Souza ‘mereado de trabalho (SARRIERA; VERDIN, 19964; DAUSTER, 1992). De acordo com Sarriora e Verdin (1996a, p. 60): “O Periodo de transigéo escola-trabalho é considerado eritico no desenvolvimento juvenil.” © jovem que nao estiver devida, mente preparado para fazer essa transigéo pode apresentar sentimentos de impoténcia, inseguranca, apatia e desorga. nizagdo e vir a desenvolver comportamentos antissociais, de fuga da realidade e até adoecer. Outro fator a ser eonsiderado é 0 fenémeno da globalizacéo, ue trouxe inovagées e implantagio de novas teenologias, mas desconsiderou questées relaci a jonadas & mao disponivel: alent Os trabalhadores podem vir a perder sous empregos por desconhecimento ou desadaptacéo frente oe teenoogis ou ainda por nto possulrem quslifesia se fcente para acompanhar desenvolvimento tecnclogce (SARRIERA; CAMARA, BERLIN. 2006, 30) No cenério atual, sao os jovens que mais enfrentam dif: culdades para a insergéo laboral, De acordo com 0 Mapa de Mercado de Trabalho no Brasil 1992-1997 (2001), realizado elo IBGE, a taxa de ocupacio (proporcdo de pessoas ocupadas na populacdo economicamente ativa) é sempre menor nos srupos compreendidos entre 15 © 24 anos, os Valores mals altos de taxas de desocupagio se concentram em grupos en, te 15 6 19 anos, atingindo cerca de 40% da PEA nas regices metropolitanas (QUADROS, 2003) A falta de emprego pode provocar consequéncias impor- tantes para o bem-estar psiquico dos ovens deixando-os mais Propensos a depressio, ansiedade, apatia e insatisfacao para consigo mesmo ea desenvolverem atitudes de rsco, tais como isolamento, uso de substéncias psicoativas como drogas el. cool e, até mesmo, suicdio (SARRIERA; CAMARA; BERLIM, 2006). Em pesquisa realizada com jovens de Porto Alegre, foi es Centacb de overs pare irsero no mundo de tabaho constatado que o preditor mais forte do bem-estar psicol6gi- co desses jovens 6 0 conjunto de suas atitudes com relagao ao trabalho, construfdo a partir de experiéncias escolares ¢ laborais (SARRIERA et al., 1996b). ‘Analisando as dificuldades enfrentadas pelos jovens na transigdo escola-trabalho, em especial nas familias de baixo nivel socioecondmico, & necessirio que se pense em estra- tégias e agdes que preparem esses jovens para lidar com as ansiedades e os obstdculos existentes nessa fase. Preparar os jovens para uma insergao ocupacional bem-sucedida implica trabalhar a atitude dos jovens ante a si mesmos, ao trabalho e A sociedade. Para isso 6 necessrio desenvolver a autoes- tima ¢ a motivacéo, facilitar a construgao do autoconceito eda identidade, ampliar os conhecimentos, modificando crengas e concepgdes cristalizadas, analisar o significado do trabalho para si mesmo e para a sociedade e delinear um projeto profissional e de vida. A insergéo no mercado laboral contribui, assim, para o estabelecimento de relacées soc 10 da identidade, o reconhecimento de pertinéncia a uma sociedade e o desenvolvimento humano e bem-estar psicolégico (SARRIERA et al., 1996B). Em contrapartida, é importante ajudar os jovens a com- preender as exigéncias do mundo do trabalho ea se preparar para enfrenté-las. A pesquisa realizada por Camara e Sarriera (2001) com empregadores de jovens de Porto Alegre, mostra a importdncia atribufda A postura do candidato na entrevista de selecéo, a necessidade e ao interesse que ele demonstra por aquele emprego e a clareza deste quanto a seus objetivos naquela empresa e ocupagéo. Além disso, alguns critérios importantes para os empregadores sao: higiene e limpeza, estabilidade emocional, bom comportamento, agilidade desenvoltura social Nesse sentido, idealizou-se o presente projeto, cujo objetivo foi preparar jovens para a insergéo no mundo do trabalho, 65 ‘ama Mara Cota Neia + Fornando Augusto Cas -Thals Mendes de Souza ampliando seus conhecimentos e desenvolvendo atitudes im- portantes para a vida profissional. A importdncia de projetos desse tipo tem sido assinalada em algumas pesquisas e inter- vengées (SARRIERA; CAMARA; BERLIM, 2000b, 2006). Além disso, esse tipo de intervencdo tem carter preventi- vo e contribui para a formagao de trabalhadores mais ativos € produtivos, com maior facilidade de adaptar-se ao mundo do trabalho e certamente mais satisfeitos com relagéo a vida profissional, Objetivos Objetivo geral * Preparar jovens para a insereéio no mundo do traba- tho. Obj ivos especificos Conscientizar sobre a importancia eo valor do trabalho na sociedade. Conscientizar sobre os direitos e deveres do trabatha- lor Ampliar 0 autoconhecimento. Preparar para participagao em processos sel Desenvolver a atitude profissional e a empregabilidade, Método Populacao-alvo Este projeto foi realizado em uma associagao beneficente que desenvolve projetos educacionais, sociais, culturais, espor- tivose de satide, e possui um centro de estudos e pesquisas. A associagdo tem varias unidades e atende diferentes segmentos 68 i Ere eee Ctentacto de jovens pra anserio no mundo de wabaho da populacdo: crianeas, adolescentes, adultos, idosos, mora- dores de rua, portadores de necessidades especiais e jovens aprendizes. O projeto foi desenvolvido em uma das unidades, localizada na zona sul da cidade de Sao Paulo, que atende adolescentes de 15 a 17 anose 11 meses, de ambos os sexos, cursando 0 en- sino médio, oriundos de familias residentes em setores de alta vulnerabilidade. A instituigao oferece, a esses adolescentes, protecdo social basica por meio de atividades socioeducativas, assegurando assim um espaco de referéncia para relagées de afetividade, que garanta o desenvolvimento de potencialidades ea convivéncia comunitéria. A instituigdo propée atividades so- cioeducativas sob a forma de cursos profissionalizantes, como: Montagem e manuteneao de microcomputadores, Informatica, Servicos administrativos, Telemarketing ou sob a forma de atividades de recreagao, como: Jogos légicos, Atividade Fisica, Comunidade, Desenvolvimento socioeducativa, Participago publica, Apés algumas visitas a instituicdo, diagnosticou-se a ne- cessidade de preparar psicologicamente esses jovens para 0 ingresso na vida profissional. Apesar de estarem cursando co ensino médio e cursos profissionalizantes, eles se mostravam bastante imaturos ¢ inseguros para ingressarem no mundo do trabalho. Os jovens mostravam-se ansiosos para as entre- vistas de emprego, com dificuldades de comunicacéo, tinham diividas quanto & forma de se vestirem e se apresentarem & entrevista, néo sabiam reconhecer suas habilidades e seus interesses, ete. O projeto foi desenvolvido com um grupo composto inicial- mente de 16 jovens, 10 do sexo masculino e 6 do sexo femi- nino, com idades entre 15 e 17 anos, cursando a primeira ou segunda série do ensino médio. Todos moravam com suas familias, O projeto finalizou com 11 participantes, cinco mogas e seis rapazes. er See eee eee ne ns Kathie Masia Costa Neiva Femendo Aygusto Caras Thais Mondos de Souze Os participantes foram indicados pela coordenagao da instituigdo e passaram por uma entrevista de triagem, com 0 objetivo de coletar alguns dados pessoais, verificar o interesse em participar do projeto e a existéncia de algum distiirbio psicolégico que pudesse comprometer o andamento e apro- veitamento do trabalho. Instrumentos O programa desenvolvido teve como base as ideias de Sar- Tiera, Camara e Berlim (2000b, 2006) de onde foram extraidas varias das técnicas utilizadas. ;ou-se também para avaliar a intervengéo 0 questio- nario Inseredo no Mundo do Trabalho (NEIVA, 2008), que foi aplicado no inicio e no final da intervencao. Esse questionério (Anexo 1) é composto de 20 afirmagées/situagées que o sujeito deve avaliar em uma escala de tipo Likert variando de 1 a5, sendo que 1 = pouco e 5 = muito. A pontuagéo total poderia assim variar de 20 a 100 pontos. Como o projeto foi desenvolvido com menores, foi solicitado que os pais ou responsdveis preenchessem e assinassem uma ficha de autorizagio para participaao nesse projeto, assim ‘como uma ficha de autorizaedo para utilizagéo das informa- ges do prontuério para fins de pesquisa, Duracao desenvolvimento da intervengdo iniciou-se com uma entrevista individual de triagem com duracéo de 30 minutos. Em seguida foram realizados oito encontros de 1h45 cada, um Por semana, no mesmo dia e horério. Ao final, foi r uma entrevista individual de aproximadamente 30 minutos com o objetivo de avaliar o trabalho e dar uma devolutiva sobre a evolugao de cada participante. 68 ‘rime de ovens para a serene mundo de rath ‘As entrevistas e encontros foram realizados em uma sala disponibilizada pela instituicao. Desenvolvimento dos encontros A intervengéo foi desenvolvida por dois estudantes do Ultimo semestre do curso de Psicologia, no ambito de estagio curricular e sob a supervisao da professora responsdvel, que orientou e acompanhou as atividades. Entrevista individual de triagem Conforme mencionado, foi realizada uma entrevista in- dividual de triagem com cada participante. Essa entrevista permitiu conhecer algumas caracteristicas ¢ expectativas dos participantes do grupo e verificar se todos os interessados podiam participar da intervengéo. A partir dos dados coletados nessa entrevista constatou-se que metade dos adolescentes nunca trabalhou e os restantes trabalharam como voluntarios e em pequenos servicos por pouco tempo. As profissées mais sonhadas por eles durante a infancia foram: Dentista (1), Veterinario (1), Arquedlogo (2), Bidlogo (1), Professor (2), Médico (2), Engenheiro (1). Jé as profissdes mencionadas como possibilidades para o futuro foram: Nutricionista (1) Dentista (1), Veterinério (1), Enge- mheiro (1) Filésofo (1), Te6sofo (1), Informatica (2), Professor de Portugués (1), Administrador de Empresa (1). Alguns néo souberam expressar uma profisséo de maior preferéncia. As disciplinas mencionadas como sendo as de maior interesse foram: Matemética (4), Portugués Filosofia (3), Geografia (2), Inglés (2), Historia (1 Educagao Fisica (1). Os alunos se mostraram interessados em participar do projeto; varios meneionaram que gostariam de aprender com- cy Katia Mara Cota Neva Femnendo Augusto Cares - Thala Mand de Souza portamentos e melhorar os conhecimentos para realizarem entrevistas de trabalho, pois necessitam trabalhar. Nao se observaram nos participantes conflitos maiores ou psicopatologias, o que permitiu a participacio de todos eles no grupo. O grupo formado foi bastante homogéneo em termos de idade e série escolar. 1° Encontro Objetivos * Estabelecer o enquadre + Promover o conhecimento e a integragao do grupo. * Avaliar a preparacdo dos jovens para a insercéo no mundo do trabalho, Desenvolvimento ‘Todos os 16 participantes comparecerem 20 primeiro en- contro que teve inicio com a apresentacéo dos coordenadores do grupo, a explicagso dos objetivos do projeto e o estabele- cimento do enquadre. Em seguida, aplicou-se a Téenica do Barbante (ANDRADE, 1999) para a apresentacao dos partici- pantes do grupo, durante a qual os jovens se mostraram par- ticipativos. Perecbeu-se que apesar de frequentarem a mesma instituicdo muitos nem sabiam o nome dos companheiros. Em seguida foi aplicado o questionério de “Preparacéo para a insergdo no mundo do trabalho” (NEIVA, 2008), que foi respondido em cerca de 20 minutos. Foi esclarecido que esse questionério seria reaplicado ao final da intervencéo para analisar a evoluedo do grupo. A pontuacao média do grupo foi 71,9 indicando que o grupo ainda necessita se preparar melhor para se inserir no mundo do trabalho e em especial dois dos participantes, cuja pontuagao foi inferior a 50 pontos. 70 oa eee ‘ening de jovens para a isoredo no mundo de rabaho Para ampliar o conhecimento e a integracéo grupal, foi realizada uma técnica de imaginacéo ativa. Apés um breve relaxamento, solicitou-se que cada um imaginasse um objeto que o representasse, visualizando sua forma, cor, textura e onde estava. Em seguida, os participantes desenharam o objeto em uma folha de papel. Na discusséo em grupo, os jovens apresentaram seus desenhos e justificaram a escolha do objeto, explicando por que este o representava. Alguns participantes se representaram por meio de varios objetos que fazem parte do cotidiano de cada um; os aparelhos de comunicacéo como TY, som e computador foram os mais uti- lizados para representacéo. Os livros foram utilizados para representar sabedoria. Objetos que representavam atividades esportivas e de danga também apareceram indicando interes- ses. Outros objetos que se destacaram foram acess6rios para cabelos, batom e pente representando a vaidade feminina. Objetos camo chave de porta, chave de fenda e bisturi foram associados & multifuncionalidade, o que pode significar a ideia de que uma pessoa pode exercer varias fungées. Apareceram representacdes ligadas a natureza como sol, nuvem, estrelas mar, indicando qualidades e tragos da personalidade. Enfim, os jovens puderam perceber a partir dessa atividade algumas de suas caracteristicas pessoais e interesses, além de conhecer melhor seus colegas de grupo. Observaram-se, em todas as atividades, um bom entrosamento e participagdo dos membros do grupo, assim como interesse pelo trabalho. 2° Encontro Objetivos * Conscientizar sobre a importéncia do trabalho. + Esclarecer sobre os direitos e deveres do trabalhador contidos no Bstatuto da Crianca e Adolescente (ECA) e na Consolidaco das Leis do Trabalho ( n E—e S'S Katia Maria Cota Neva“ Femendo Augusto Calis - Tha Mendes de Souza Desenvolvimento Participaram desse encontro 14 jovens (dois faltaram). Inicialmente, os coordenadores relembraram, com a ajuda dos participantes, as atividades que haviam sido realizadas ‘no encontro anterior. Em seguida, colocaram um cartaz e entregaram uma cépia da musica Fabrica, de Renato Russo, esolicitaram que cada participante lesse um verso da masica em voz alta. Em seguida, promoveram uma discussao sobre os contetidos da letra, Apareceram as seguintes ideias: desejo por um trabalho honesto, a questo do trabalho escravo que existe até hoje, as humilhag6es no ambiente de trabalho, 0 medo de ser demitido. Os jovens mostraram um bom nfvel de compreenséo da letra e desenvolveram uma discussio bastante produtiva. Dando continuidade, o grupo foi dividido em dois subgru- pos; foi entregue uma folha de cartolina a cada subgrupo e solicitado que escrevessem suas expectativas com relacéo ao mereado de trabalho. As expectativas mais frequentes foram: realizagdo no trabalho; ter emprego; ganhar dinheiro; ser re- conhecido, progredir, ter oportunidades, respeito, igualdade e ética, ete. Essa atividade permitiu discutir o valor do trabalho € as expectativas do grupo. Em seguida, foi discutido e explicado o que é “mercado de trabalho” e solicitado que colocassem em outra folha o que entendiam sobre “cidadania no trabalho”. Suas respostas foram: * 6 ter direitos de opinar e expor ideias, respeitar a em- presa e ser respeitado por ela; receber feedback; ter direitos e deveres, respeitar e ser respeitado; a empresa deve respeitar 0 meio ambiente e a cidade onde esté localizada. ‘Overtaggo de ovens para @isere20 no mundo de abo A partir daf, realizou-se uma discussdo sobre Direitos ¢ Deveres do Trabalhador e foram elencados alguns dos direitos, como: carteira de trabalho assinada, licenga maternidade, horas extras pagas e repouso semanal remunerado. Di tiu-se 0 que fazer em caso de nao cumprimento dos orientando-os a procurar o érgao responsdvel, ou seja, 0 Mi- nistério do Trabalho. Os deveres apontados foram: respeitar a empresa, nao ha- ver agressoes fisicas e verbais, nao haver relagées sexuais nem. caricias entre colegas de trabalho, nao trabalhar alcoolizado ou drogado. Ao final, os coordenadores do grupo entregaram uma folha com o nome de algumas instituigdes e seus respecti- vos enderegos, nas quais poderiam obter informagées sobre 0s direitos e deveres do trabalhador. Houve um étimo aproveitamento do encontro, uma vez que houve uma participacao ativa do grupo. Apesar da idade, nivel de escolaridade e condicéo sociocultural, os participan- tes mostraram um bom nivel de conhecimento das questoes relacionadas ao mercado de trabalho e direitos e deveres do trabalhador. 3° Encontro Objetivos + Ampliar o autoconhecimento. + Facilitar o reconhecimento das caracteristicas pos e negativas, Desenvolvimento Participaram desse encontro 15 jovens. O encontro iniciou- se com uma breve dinémica de descontragao Parede, telhado ¢ ferremoto, Em subgrupos de trés pessoas, duas delas deram as maos formando uma parede e um ficou entre os eolegas, 8 Kathie Mato Costa Neva = Fernando Augusto Caras Thas Mendes de Soua debaixo da “parede”, sendo o “telhado”. Cada vez que 0 coor denador dizia “parede” todos os que estavam formando uma Parede, tinham que trocar de lugar com os colegas que também eram “parede”. Quando 0 coordenador dizia “telhado” os que estavam nesta posicéo deviam trocar de lugar. Quando a ins- trugéo era “terremoto”, todos deviam mudar de lugar. Para a segunda atividade denominada Qualidades que achamos positivas e negativas, cada participante recebeu duas folhas. Em uma deveria desenhar sua mao direit sua mao esquerda. Dentro da mao direita foi fado que escrevessem stias qualidades positivas, e na mao esquerda foi solicitado que escrevessem as atribuigées que cada um nao gostava em si. Em seguida foi aberto espaco para discuss4o da atividade. A maioria do grupo teve facilidade para expor ‘seus aspectos positivos, tanto oralmente quanto por escrito. Segundo os participantes é mais facil falar bem de si, até mesmo porque escutam os elogios de outras pessoas, o que fe a identificacao dos aspectos positivos. Os participantes que acharam fécil descrever os aspectos positivos tiveram dificuldade para listar seus aspectos negativos, pois segundo eles: “apontar os defeitos dos outros é mais facil, agora se policiar é dificil”. A onipoténcia, de certa forma frequente na fase da adolescéncia, é retratada no comentario de um dos Jovens: “Eu sou sempre melhor que. outro.” A dificuldade em reconhecer as caracteristicas negativas também pode indicar falta de confianca dos participantes para com os colegas & coordenadores do grupo. Os aspectos positivos mais mencionados pelos jovens fo- Tam: sincero (60%), alegre (50%), amigo, legal, inteligente (83% cada). Os aspectos negativos que mais apareceram foram: timidex (55%), preguica e agressividade (20% cada) Na discusséo, os participantes concluiram que deve haver "um equilfbrio entre os aspectos positivos e os negativos e que algumas earacteristicas negativas podem também ser vistas como positivas. . fining de ovens pare a hserp na mundo de retsho Essa atividade mostrou-se bastante proveitosa, houve boa participacdo e envolvimento do grupo e permitiu o reconheci- mento das caracteristicas positivas e negativas ea ampliacéo do autoconhecimento. Para finalizar foi realizada uma avaliagdo dos trés primei- ros encontros. 0 feedback do grupo foi positivo, indicando que esto sendo atingidos os objetivos do projeto e também as expectativas dos participantes. 4° Encontro Objetivos * Ampliar 0 autoconhecimento. * Facilitar 0 reconhecimento das qualidades, interesses, habilidades e valores. Desenvolvimento Estiveram presentes a esse encontro 14 jovens, aos quais foi aplicada a Lista de qualidades, interesses e habilidades (SARRIERA; CAMARA; BERLIM, 2006, p. 30) Foi solicitado que cada participante escrevesse no maximo 10 itens referen- tes a cada aspecto, ndo podendo deixar nenhum em branco, Percebeu-se que alguns participantes tiveram um pouco de dificuldade em listar suas qualidades, mostrando assim pouco conhecimento de si mesmo. No momento da discusséo, cada participante escolheu uma qualidade, um interesse e uma habilidade para apresentar. As qualidades mais mencionadas foram: inteligente, responsdvel, amigo, comunicativo, Com relacdo as habilidades, as mais mencionadas foram: comunica- sao escrita, comunicagéo orale criatividade. Os interessos que mais apareceram foram: informatica, esportes e dinheiro. Em seguida foi aplicada a técnica Esclarecimento de valores (FRITZEN, 1981). Foram apresentadas trés frases 1s Katia Mara Cota Na» Femnendo Augusto Cates -Thas Mendes de Souza relacionadas a valores e cada um dos Pparticipantes deveria escolher a frase com a qual mais se identificava. As frases apresentadas foram: 1. Sempre estou atento a moda e a beleza. 2. Acho primordial gostar do que fago mais do que ganhar dinheiro. 3. $6 quero trabalhar se tiver um cargo alto. A frase mais escolhida foi a n® 2 (10 participantes). Foi rea- lizada uma discusséo sobre os valores us 0 mereado de trabalho ea vida profissional. O grupo que escolheu a frase n® 1 trouxe a importaneia da moda e da beleza no mercado de trabalho, apon- tando a relevancia da aparéncia na entrevista de emprego: “Para uma entrevista de emprego, a aparéncia é fundamental, para a ‘pessoa se destacar e conquistar apenas uma vaga entre muitos concorrenies, nao s6 a aparéneia conta, mas, é fundamental para. 43 pessoas terem uma boa impresséo a seu respeito, Portanto, a moda ea beleza contam um pouco a respeito da pessoa." O grupo que escolhew a frase de n®2 prosseguiu a diseusséo, enfatizando a importncia do interesse pela atividade e que este permitiré © alcance do éxito e do reconhecimento: “Fazer o que gosta re- almente qjudaré com que a pessoa seja reconhecida em algum ‘momento. E ao longo do tempo com o reconhecimento faré com que o profissional se especialize e futuramente ganhe mais.” A jovem que escolheu a frase n® 3 trouxe o valor do status e do dinheiro; “Ter um cargo alto, fard com que a pessoa tenha uma boa remuneragao, e assim como os meus pais fizeram de tudo para me dar as coisas eu quero fazer 0 mesmo por eles. Também porque pretendo ter bens materiais como casa, entre outras coisas. Penso que se eu néo gostar do trabalho, ‘mas tiver uma boa remuneragdo farei de tudo para gostar ¢ ser reconhecida.” Nesse encontro a participagdo dos jovens foi ativa e as atividades permitiram o alcance dos objetivos, ampliando o autoconhecimento e solidificando 0 autoconceito. 76 (: ceceeeceeeceeeeeeeeeeeceeec te eee aeeeceeec ‘rientagd de jovens para a inseredo ro mundo de wabaho Constatou-se que os jovens percebem que o mereado de trabalho estd muito competitivo e sabem quais habilidades sio idade: responsabilidad, inteligéncia, conhecimentos, criatividade, comunicaeao verbal endo verbal, relacionamento interpessoal e flexibilidade. Tém consciéncia também de que é necessArio aperfeigoar e desenvolver novas habilidades. A importancia do dinheiro aparece com frequén- cia, 0 que certamente esta relacionado as necessidades do grupo social a0 qual pertencem. 5° Encontro Objetivos * Preparar para participacdo em processos seletivos. + ‘Treinar a elaboragio de curriculo ¢ o preenchimento de fichas de emprego. Desenvolvimento Oencontro tevea participacdo de 14 jovens ese iniciou com uma atividade lidica com 0 objetivo de descontrair o grupo: O salto do canguru (LEITE; DOMINGUES JUNIOR, 2010). Em seguida foi solicitado que cada um elaborasse sem pré- prio curriculo, havendo uma discussio sobre o que deve constar em um curriculo. Depois, os participantes foram convidados a apresentar seus curriculos e, A medida que percebiam que alguns estavam mais completos que outros, foram acrescen- tando as informagées que faltavam. Varias di foram esclarecidas pelos coordenadores, como: colocar ou néo a foto, proceder com a documentacéo comprobatéria, enviar 0 curriculo, etc. Os coordenadores explicaram também sobre a apresentagéo do curriculo, que deve ser devidamente formatado e digitado em letra legivel, sem erros de redagao e que nao deve ser entregue nem amassado nem sujo. 7

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