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Brasil: 1530 - 1630

No período entre 1530 e 1630, o que viria a se tornar o Brasil mais tarde, era
chamado de “colônia”. Esse é um termo que teve diversas alterações em seu
significado prático ao longo da História, mas quando se trata do Brasil no
período colonial, é usado em sentido de “relação de exploração”. É importante
ressaltar que não é de todo correta a afirmação de que “o Brasil foi colonizado
pelos portugueses”, pois ele nem mesmo existia antes desse contato. O Brasil,
então, não foi descoberto, ele foi construído através de diversos processos
históricos desde o primeiro contato com o mundo europeu, muitos deles serão
mencionados aqui. Ao entendermos que o Brasil não existia naquele contexto,
é igualmente errôneo afirmar que os indígenas são os “primeiros brasileiros”,
pois estes não pertenciam ao mundo criado pelos portugueses, que só se
formou através da destruição desses povos, mas foram incorporados ao longo
dos séculos.

No contexto de 1530, os portugueses já tinham um desenho geoestratégico do


que viria a ser o Brasil e também do Oceano Índico, desenvolvido a partir da
viagem de Pedro Álvares Cabral, que possibilitou o primeiro contato dos
portugueses com a América. Em fins daquele mesmo ano, Martim Afonso de
Sousa foi enviado em expedição para resolver duas questões, sendo a primeira
em função da rivalidade entre os espanhóis e portugueses, no que dizia
respeito à divisão dos territórios explorados na América, e a segunda em
consequência dos franceses que se aventuravam cada vez mais em terras do
Novo Mundo, estabelecendo alianças com os povos nativos e levando embora
o pau-brasil. Essa expedição permitiu que a Coroa compreendesse o incentivo
ao povoamento de suas terras na América como estratégia de defesa. Logo,
para conduzir esse povoamento, instituíram o sistema de Capitanias
Hereditárias, que consistia em doação de terras a setores intermediários da
pirâmide social, que não correspondiam a plebe, mas também não integravam
a nobreza. Assim, o rei determinou a divisão de terras, uma em posse do
próprio Martim Afonso de Sousa, outra na de seu irmão Pero Lopes de Sousa e
as demais para outras pessoas que tinham por obrigação enviar, o mais rápido
possível, navios com pessoas até a costa americana. O sistema passou a ser
implementado ainda na década de 1530, tendo em vista que os instrumentos
legais, cartas de doação e forais datam de 1534 a 1536. Dessa forma, a Coroa
teve pouca participação, estando praticamente ausente, no início do processo
de colonização em seu período inicial, limitando-se à monopolização da
exploração do pau-brasil, cedendo somente uma pequena parcela dos lucros
aos donatários.

Para a subsistência da população que chegava à América Portuguesa, foi


necessária a criação de uma dinâmica econômica. Assim, para garantir o
direito a exploração das terras de capitanias, os donatários deveriam implantar
a infraestrutura de vilas e formar engenhos. Os senhores de engenho detinham
enormes extensões de terra e procuravam sustentar, através da exploração
dos produtos tropicais, um estilo de vida luxuoso, o que permitiu o
enraizamento da população abastada no território americano, já que esses só
eram análogos à nobreza portuguesa enquanto viviam na colônia, portanto, se
retornassem à Europa, perderiam muitas regalias e teriam seu status social
afetado. Um outro grupo que constituía a economia era o dos mercadores, que
eram enviados pela Coroa Portuguesa para manipular o comércio exterior a
favor da metrópole. Eles travavam uma competição sobretudo de viés
econômico com os senhores de engenho, apesar de alguns pontos de
confluência. Até então, a economia açucareira existente na América tinha como
objetivo sustentar as sociedades no território ultramarino até que o lucro se
tornou o principal objetivo, o que foi evidenciado através do decreto do
exclusivo metropolitano, sendo sua primeira lei datada de 1591, proibindo o
comércio exterior e restringindo o mercado da colônia ao português. Assim,
todo produto que saísse da América Portuguesa, deveria passar por Portugal
antes de ser enviado a qualquer outro lugar, centralizando o lucro da
exploração agrícola na metrópole. É importante ressaltar que todo o lucro
naquele período era obtido através da exportação de produtos agrícolas que
era sustentada inicialmente na exploração de mão-de-obra indígena, por
trabalho forçado, o que no começo foi problemático para os colonizadores pelo
modo de vida “selvagem” dos nativos.

A construção do Brasil se deu através da destruição da população indígena,


mas devemos superar a interpretação de que os indígenas eram vítimas
passivas. Existiram grupos que desde o começo se aliaram aos portugueses e
outros que os repeliam por conflitos étnicos entre as próprias tribos, que
passavam a usar os europeus contra seus próprios inimigos, assim como
também existia a possibilidade de mudança de ideia e de divergências
pessoais. Como se sabe, o primeiro ciclo econômico importante que ocorreu a
partir do povoamento da América Portuguesa teve como produto central o
açúcar fabricado nos engenhos. A prosperidade da economia açucareira só foi
possível a partir da exploração da mão-de-obra indígena, de início, os
colonizadores tentaram impor o trabalho indígena com assalariamento por
escambo de produtos falsificados, o que não foi bem aceito pelos indígenas, a
partir daí, começaram a se rebelar, recusando o trabalho, implicando uma
guerra aberta na qual os nativos por vezes contavam com apoio de franceses.
Chegaram perto, inclusive, de eliminar os portugueses da região entre
Pernambuco e São Vicente, o que levou a Coroa a buscar uma solução
administrativa que por fim se definiu na criação de um governo-geral.

A Coroa enviou Tomé de Souza como governador-geral, transformando a


Bahia numa capitania real. A Bahia era, aos olhos portugueses da época, a
região mais conveniente para iniciar o povoamento, pois tinha em disposição o
porto, rios próximos e fertilidade da terra. De início, o governo-geral não
extinguiu o sistema de capitanias, mas atuou em concomitância. No entanto,
com o passar do tempo, a Coroa foi adquirindo capitanias em seu nome,
fazendo com que as hereditárias perdessem, aos poucos, sua importância.
Junto do governador-geral, vieram à América os primeiros grupos jesuítas e
escravos africanos.

Os jesuítas foram responsáveis pela domesticação dos selvagens, facilitando a


exploração da mão-de-obra e de recursos naturais através da reconfiguração
das populações nativas ao modelo católico-europeu, implicada pela
evangelização em massa. Os padres jesuítas estabeleceram uma relação de
confiança com os indígenas e promoviam um discurso de “proteção aos
indígenas” que se limitava a nível físico, mas não envolvia a proteção à
integridade, cultura e liberdade religiosa. A proteção aos indígenas foi um
mecanismo que apresentou mais vantagens aos europeus do que aos próprios
nativos e ainda assim não impediu que os povos originários fossem dizimados
em larga escala.

A alta mortalidade indígena forçou a adoção de um novo sistema escravista e


por isso se introduziu o tráfico negreiro no contexto. A transição do escravismo
indígena para o africano resultou em vantagens econômicas para a Coroa, mas
isso não foi planejado e nem mesmo constituiu objetivo inicial. A montagem da
economia açucareira é um processo simultâneo à formação da elite colonial,
estratos sociais na colônia e exploração escravista.

Através do ciclo do açúcar, configura-se a sociedade colonial com o modelo de


família patriarcal presente sobretudo na elite constituída pelos senhores de
engenho e portugueses com cargos administrativos, mas que não se aplicava
de forma tão expressiva nas camadas mais pobres da sociedade, compostas
por indígenas catequizados, africanos escravizados e mestiços.

Através de todos os processos e fatores aqui mencionados, constitui-se a


colonização da América Portuguesa que não foi planejada e implementada
instantaneamente. A noção da vigência de um sistema colonial teve ocorrência
tardia, em consequência desses processos históricos, sobretudo a
promulgação do exclusivo metropolitano, que hoje é entendido como o
elemento chave para a configuração do sistema colonial.

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