You are on page 1of 56
21 Antimodernidade como resisténcia Como demonstra a experiencia diana, 0 término do dominio colonial, em si mesmo, pouco contribui para o fim do governo do conhecimento colonialista. — Ranajit Guha, A Rule of Property for Bengal Poder e resisténcia no interior da modernidade A modernidade é sempre duas. Antes de concebé-la em termos de razao, Iluminismo, rompimento com a tradi¢ao, secularismo e assim por diante, devemos entender a modernidade como uma relacao de poder: dominagao e resisténcia, soberania e lutas de libertacao.' Esta viséo vai de encontro a narrativa padrao de que a modernidade surgiu na Europa para confrontar o pré-moderno nas coldnias, fosse ele enten- dido como barbaro, religioso ou primitivo, “Nao existe modernidade sem colonialidade”, sustenta Walter Mignolo, “pois a colonialidade é Constitutiva da modernidade,”? Ela é constitutiva na medida em que #ponta a hierarquia no coragao da modernidade. A modernidade, assim, nao reside exclusivamente na Europa ou nas coldnias, mas na relagdo de poder que abarca entre si.? E, portanto, as forcas da antimodernida- de, como as resistencias A dominagao colonial, nao se encontram fora da modernidade, so perfeitamente interiores a ela, ou seja, estdo no interior da relaco de poder. Digitalizado com CamScanner BRM-ESTAR ZOM'JM « modernidade estar no interior da modernidade ¢ deaantime ¢ historiadores tém em mente ao in., i. parte aquilo que o: . 0 insist, os em f curopeia nas Américas, na Asia e na Africa N80 sj entendida como uma série de conquistas, mas aaa ncontros colonisn Oconceito de conquista de fatotema aoe Senfatizar a violénciag prutalidade da expansao curopeia, mas tendea apresentar os Colonizade, como passivos. Além disso, implica que a anterior civilizagao tenha sido varrida ¢ substituida pela do colonizador ou entéo que foi preservag, intacta como algo externo ao mundo colonial. Essa visio tradicional retrata a sociedade colonial indiana, por exemplo, como escreve Ranajt Guha, “como uma réplica da cultura liberal-burguesa da Gra-Bretanha do século XIX ou uma mera sobrevivéncia de uma cultura pré-capitalista anterior“ A modernidade fica entre os dois, por assim dizer — ou sea, na hierarquia que liga o dominante ¢ o subordinado —, e os dois lados sio trocados na relacéo. O conceito de encontro frisa o cardter dual da relacao de poder e os processos de mistura e transformagio resultantes da luta de dominago e resisténcia. Trabalhando do ponto de vista dos encontros coloniais, os historia dores documentam dois fatos importantes: as civilizacdes pré-coloniais €m muitos casos sio muito avancadas, ricas, complexas e sofisticadas as contribui¢ées dos colonizados 4 chamada civilizagdo moderna sio substanciais e em grande medida nao tém reconhecimento. Esta pers Pectiva de fato rompe as dicotomias habituais entre o tradicional ¢ moderno, o selvagem e o civilizado, Mais importante para nossa te Porém, é que os encontros da modernidade revelem constantes processts de transformacao mutua, Muito antes da che; plo, O fato men em que aexpansio ‘Bada dos espanhdis ao centro do México, por exe" pe ee (ou Seja, os habitantes do reino asteca que falam nabuat) Tulram cidades altamente desenvolvidas, chamadas altepeth ou me i, organia naa amano das Cidades-Estado mediterraneas. Uma altepetlé vada if 8 Ge acordo com uma légica celular ou modular em quess4!® Tentes parte oo brigeie “a t, cepa Correspondem a uma ordeira rotagio cilic# . abalho e pagamentos ao soberano, Depois da rendi#? a4 Digitalizado com CamScanner ANTIMODERNIDADE COMO RESISTENCIA. Cuauhtémoc a Cortés em 1521, a altepet! nao é simplesmente substituida por formas urbanas europeias através do longo processo hispanizagio, mas tampouco sobrevive intacta. Todos os primeiros assentamentos e formas de administragdo dos espanhdis — a encomienda, as paréquias rurais, as municipalidades ind{genas e as jurisdig6es administrativas — sio construidos sobre altepetls ja existentes e adaptados a sua forma.’ Se a civilizagdo nahua nao sobrevive tal como era, tampouco a espanhola. Em vez disso, paralelamente as estruturas urbanas e praticas administra- tivas, a musica, a lingua e outras formas culturais sdo progressivamente misturadas, fluindo por inimeros caminhos através do Atlantico em ambas as dire¢ées, transformando ambos os lados. Muito antes da formaco dos Estados Unidos, para dar um outro exem- plo, de cardter mais diretamente politico, os iroquois desenvolveram um sistema federalista para gerir as relagées entre seis nacées — os mohawk, os oneida, os onondaga, os cayuga, os tuscarora e os seneca — com freios econtrapesos, separacio entre autoridades militares e civis e outras carac- teristicas mais tarde adotadas na Constituicdo americana. O federalismo iroquois era amplamente debatido e admirado nos Estados Unidos do século XVIII por figuras como Benjamim Franklin e Thomas Jefferson. A ajuda material dos americanos nativos aos colonizadores europeus — como plantar as colheitas, sobreviver a invernos arduos e assim por diante — foi incorporada 4 mitologia nacional, mas as formas politicas americanas geralmente sao apresentadas como de origem puramente europeia.’ O objetivo desses exemplos é simplesmente demonstrar a mistura e mutua transformaco que caracteriza os encontros da modernidade. O problema com estes exemplos, contudo, é que nao enfatizam a vio- lencia ea desigual relacao de poder da modernidade, As forgas dominantes da modernidade nao encontram meras diferengas, mas resisténcias, O que ahistoriografia colonial basicamente realizou e que precisa ser contestado, como explica Ranajit Guha, “é um passe de magica para fazer a resistencia desaparecer da historia politica da India sob o dominio britanico”.’ Existe algo de psicético na ideia de que a modernidade é uma invengdo pura- mente europeia, j4 que esta ideia necesita negar constantemente o papel, 85 Digitalizado com CamScanner MIM-ESTAR COMUM trucdo ¢ funcionamento da modernidade, do Festo ¢, construga na wn Ne as partes subordinadas A dominagio euro cespecialme Minds, pce de repressto psiquica, talvez, fosse melhor uma espec 10 cia, Em ‘ Pensar, 05 ne : a ss negago como uum caso de forcluso no sentido Psicanalitico, p, “ ideia ou contetido reprimido, explicam os psicanalistas, mente recaleado, 0 forclufdo é expelido, para que o $0 Possa agir es sea ideia jamais lhe tivesse ocorrido, Desse modo, se 40 retornar agg: neurdtico o reprimido emerge do interior, 0 forcluido vivenciadg Psicdtico como uma ameaga externa. O elemento forcluido, Neste no s6 a histéria das contribuigdes dos povos e civilizagdes nag eu moderna cultura e sociedade, o que faz parecer que a Europa Gafontede toda inovagio moderna, mas também, e de maneira mais importante, a5 inumeras resisténcias no interior da modernidade e Contra ela, que consti. tuem o elemento primordial de ‘Perigo para sua autoconcep¢ao dominante, Nio obstante toda a furiosa energia despendida para jogar fora o outro “antimoderno”, a resisténcia Persiste no interior? Insistir em que existem forcas de antimodern| iodernidade, no terreno ralmente, que o mundo me assinalam que, tebricos contem Mo std profi dade no interior da comum do encontro, nio significa dizer, natu joderno é homogéneo. Com razao, os gedgrais apesar das constantes referéncias a0 espaco, os debates Porineos sobre a pés-colonialidadeea globalizagio gent ihenle apresentam espacos anémicos, desprovidos de reais diferengas"0 modelo cent F0-periferia é um arcabouco que efetivamente captura bet» £m lermos espaciais, a dualidade da relagio de poder da modernidads Qe 0 centro dominante ¢ ag Periferias subordinadas s6 existem CS a ea Teclproca, sendg 4 periferia sistematicamente “subdesenvolvida’ Pi ; ane, vd * de desenvolvimento do centro." Essas oes téca com aly, devemos langar um outro pra de Marx, pois cla nao apoia uniformemente g linha iH wee id le como indicamos anteriormente, Em seus dltimos ane : mow sera metade da década de 1870, depois de ter trabaly, : eee décadas no Capital ¢ merguiuso de cabeca no Projeta 4, criagio de uma Internacional comuniste, ar Passa a se interessar. Por formas pré-capitalistas ou no capitalistas de Propriedade, Passando ler alguns dos fi ‘undadores da moderna antropologia e sociologia, comp Lewis Morgan, Maksim Kovalevsky, John Phear, Henry Maine, John Lubbock e Georg Ludwig Maurer. Desenvolve uma hipétese de quea propriedade privada burguesa constitui apenas uma forma de Proprie. dade entre muitas outras que existem paralelamente, e de que as regras da propriedade capitalista s6 séo adquiridas através de um brutal: complexo treinamento disciplinar. Assim é que descarta completament: arigida teoria das “formas pré-capitalistas” que desenvolvera na década de 1850: ele questiona a alegaco de que as leis econémicas funcionam independentemente das circunstancias hist6ricas e sociais e estende sua Perspectiva algo além dos limites eurocéntricos de seus pontos de vist anteriores, subordinando a historia da Europa ao ponto de vista de toco © planeta, que contém diferencas radicais. A ruptura de Marx com seus anteriores pressupostos de “progress” Parece consolidar-se quando ele recebe no fim da década de 1870 ut Hes ee ¢ dois grupos de revoluciondrios russos: ae cisa ser desenvolyido . Proprio Mars insiste em que o capitalism? lo A na Russia para que s6 entdo tenha inicio a luta Pe” OmUnisMO;€0 outro ve na mira comuna camponesa russa, uma bis existente para o comunismo, M Y eau fee dificil, po embora Seus principais escrito: ms e ue numa post : amet tonomomento vai ag eri A primeira posleao, seat en dol lesta ultima. Marx tenta conciliat ® Por exemplo, no rascunho de uma carta# mesmo A nogdes de modernid Pontos de vista, alegando, 106 Digitalizado com CamScanner AMBIVALENCIAS DA MODERNIDADE Zasulich, que para contemplar a questo “precisamos descer da pura teoria paraa realidade russa”, A necessidade histérica da destruigao da proprie- dade comunal na Europa ocidental descrita por Marx no Capital nao é, segundo explica ele em outra carta desse perfodo, uma histéria universal que se aplique imediatamente 4 Russia ou a qualquer outro lugar. “E um equivoco metamorfosear meu esboco histérico da génese do capitalismo na Europa Ocidental numa teoria hist6rico-filoséfica do desenvolvimento geral, imposta pelo destino a todos os povos, quaisquer que sejam as cir- cunstancias histéricas em que se situem.”” Na Russia, com efeito, a tarefa da revolugao consiste em deter os desdobramentos “progressistas” do capital que ameagam a comuna russa. “Se a revolu¢ao vier no momento oportuno”, escreve Marx, “se concentrar todas as suas forcas de modo a conferir ampla margem de manobra 4 comuna rural, esta logo havera de se desenvolver como um elemento de regenera¢ao da sociedade russa e um elemento de superioridade sobre os paises escravizados pelo sistema capitalista." Acaso esta afirmagao das forgas da antimodernidadee aquilo que Etienne Balibar chama de sua hipétese “antievolucionista” revelam uma contradi¢éo em Marx? Se assim for, parece-nos uma contradi¢ao saudavel, que enriquece seu pensamento.* Um elemento importante que Marx parece intuir nessa troca mas no é capaz de articular ¢ que as formas revolucionarias de antimoder- nidade estao firmemente plantadas no comum. José Carlos Maridtegui encontra-se em posi¢do privilegiada para reconhecer este aspecto da re- sisténcia antimoderna tanto na Europa quanto fora dela. Depois de viajar Para a Europa na década de 1920 e estudar os movimentos socialistas e comunistas no continente, ele volta ao seu Peru natal e descobre que as comunidades indigenas andinas, os ayllus, repousam numa base paralela. As comunidades indigenas defendem e preservam 0 acesso comum ater- ra, formas comuns de trabalho e uma organiza¢ao social comunal — algo que se assemelha, no espirito de Mariategui, as comunidades camponesas Tussas pré-revoluciondrias que interessaram Marx, as mir. “O indigena”, @screve ele, “apesar de cem anos de legislacdo republicana, nao se tornou um individualista’, pelo contrério resistindo em comunidades, com base 107 Digitalizado com CamScanner :AR COMUM BEM-E! qui certamente reconhece 0s elementos, Leocrdticg, ade inca tradicional, mas também encontra hela’ to no comum que serve de base a resistencia, Attany a5 nismo europe, cle vem a entender impop, I 4 Maridte nocomum: ied: despaticos da soc sdlido enraizamen . com o commu! de seu contato col ; sna : i a i as populagdes ind{genas e das formas Sociais tancia ° potencial di ‘ imanescent J *comunismo inca” — Ney é claro, como remanescen e mantido intacty da época pré-colombiana ou um deriva 8 sifine Politicny europeus, mas Como uma expressio din mica de resis\ nela NO interiog da sociedade moderna, Dentro da Buropae fora dela, aantimodernidade deve ser entendida sobretudo na expressio social do comum. Desenvolvimento socialista Enquantoa tradicao da teoria marxista tem uma rela¢3o ambivalentecom a modernidade, a pratica dos Estados socialistas esta vinculada a ela de maneira mais inequivoca. As trés grandes revolucées socialistas — na Russia, na China e em Cuba —, embora as lutas revolucionérias que leva- rama elas fossem perpassadas por poderosas forcas de antimodernidade, vieram todas a perseguir projetos decididamente modernizadores. Os paises capitalistas dominantes, como tém sustentado numerosos autores, Promovem e impéem ao longo do século XX ideologias e politicas eco- nomicas de desenvolvimento que, apesar de projetadas para beneficiara Capra eoknet eierargu globais da modernidade-colonildok paca a los monte, contudo, dedicant-oe galas figura ¢ as estruturas rea ya peau See Lees A critica doimperalismo, sees dos patses capitalistas a que se oP0® 0 » ue continua sendo um pilar ideoldgico ¢" dos Estados socialist; 8 Pds-revolucionarios, inhar demies dadas coma Promosdo de ios, é forgada a caminl Multoantesda vibriabolehevea on Pouca desenvolvimenti veios tebricos do i evista, como. dissemos anteriormente, 40 tanto como libertine otUciondtio encaram a meta do soci ttagdo mas como um desenvolvimento mais eleva! 108 Digitalizado com CamScanner AMBIVALENCIAS DA MODERNIDADE quese considera repetir ou mesmo aperfeigoar a modernizagao dos paises dominantes. A construgio de um povo nacional ¢ de um Estado socialista gio ambos elementos funcionais da ideologia desenvolvimentista, que clips qualquer desenvolvimento auténomo de necessidades alternativas Em certos momentos, 0 desenvolvimento econd- etradigdes indigenas mico ¢ apresentado como um purgatério que precisa ser atravessado para alcangar os pais proprio paraiso. C) iticar o desenvolvimento, naturalmente, néo implicauma rejeigao da prosperidade (pelo contrario!), assim como a critica da moderni- dade nao significa uma oposigao & racionalidade ou ao iluminismo. Antes requer, como dissemos anteriormente, que assumamos um ponto de vista diferente, reconhecendo que a continuacio da modernidade e dos progra- mas de desenvolvimento apenas reproduz as hierarquias que os definem.” ‘Aambivaléncia entre modernidade e desenvolvimentismo dos progra- mas econdmicos dos Estados socialistas ja pode ser identificada no estudo O desenvolvimento do capitalismo na Russia, escrito por Lenin em 1898. O moderno modelo de desenvolvimento econémico que ele afirma dire- tamente entra em conflito, nesse livro, com sua avaliagao do antagonismo “pré-moderno” — ou, na realidade, antimoderno — das classes subalternas. Ele tenta resolver a contradicao reconhecendo-a: 0 progresso econémico é necessdrio agora para permitir que as classes subalternas amadure¢am até serem capazes de efetivamente desafiar o dominio capitalista. Note-se, todavia, que sempre que Lenin tenta resolver uma contradico jogando-a para o futuro — notadamente em sua teoria do desaparecimento do Estado —,est4 meramente encobrindo um problema real. O processo de amadu- recimento ou transi¢do nunca chega ao fim, ¢ a contradigdo permanece intacta, Neste caso, Lenin nao carece do espirito de luta revolucionaria, mas de uma andlise suficiente da fungao mistificadora da ideologia capi- talistae de sua nogao de progresso.** De maneira semelhante, as ideologias desenvolvimentistas e as politicas econdmicas dos Estados socialistas nao trem as forcas e teorias revoluciondrias que levaram a eles; mais do que isso, revelam sua ambivaléncia ao enfatizar a face do progresso moderno €climinar os elementos de antimodernidade. pitalistas, mas com maior frequéncia é visto como 0 109 Digitalizado com CamScanner BEM-ESTAR COMUM ples coincidéncia que nas ultimas décadas do sécu oxy wsrande esperanga” de que realmente existisse o SOCialis, jo a “gran as trés grandes experiéncias socialistas se mM nvolvidas numa crise comum, No caso da Unido ie. qual eriann odelo de desenvolvimento, uma miragem de libertacao tradusi, ento capitalista? Tal modelo contemplaya ung omica através de estdgios de desenvolvimeny, mediante a canhestra absorgao ¢ transfiguragao da modernidade apitalg na retorica do socialismo. O marxismo foi simplificado numa teoria evoly, cionista do progresso, da qual todos os elementos da antimodernidade tran excluidos como atrasados e subdesenvolvidos. A crise soviética envolyey todos os aspectos do desenvolvimento social, juntamente com o staty, democratico das estruturas politicas, os mecanismos de gestao da elit burocratica e a situac4o geopolitica da expansdo quase colonial soviética Na China, a crise nao levou ao colapso, mas a uma evolucao do sistema que refinou a gestao politica fortemente centralizada do desenvolvimento, pelos vetores da organizacao capitalista do trabalho. Isto pode ser dire- cionado por meios socialistas, burocraticos e centralizados ou de uma forma mais socialmente descentralizada, dando espaco e apoio as forsas de mercado no contexto de um mercado global unificado que oferece lucros e uma vantagem competitiva em relacdo as desigualdades salarias eacondi¢ées de trabalho mediocres. A via chinesa para o neoliberalism™ é diferente da adotada nos Paises capitalistas — com privatizacao Limits da, continuidade do controle estatal, criagdo de novas divisdes de class anaes entre dreas urbanas € rurais ¢ assim pre caz, Retrospectivamente, o atual regime ne” ral da Chi j identi. ; China nos ajuda a identificar com mais clareza como a id! des. i i ervimentista era forte durante o regime socialista. uba, finalmente, conse, | a cig as SUPT - ‘guiu até agora distancia as 5 mas consequéncias da crit eae eee — 0 tert ransformando. 4 -alista Perdeu seus compo) Spécie de reserva da ideologia socal nentes originai 2 ise, tO Originais. A enorme pressao da crise!" continua a ter efej efeitos Profundos. E Cuba precisa constantementé evil no | Digitalizado com CamScanner Nao é sim| quand ; resvala para a desilusio, seu m ; na lingua do desenvolvim saida da dependéncia econ' ise, mas ao prego de se congelar 1! -se Numa e AMBIVALENCIAS DA MODERNIDADE as duas alternativas ameagadoras que parecem prefigurar seu futuro: o fim catastrofico da experiéncia sovidtica ou a evolugdo neoliberal da experiéncia chinesa, Esta mesma idcologia socialista também. viajou por varias décadas através dos chamados paises subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, da {ndia ¢ do leste asidtico A América Latina, passando pela Africa. Também aqui verificou-se uma forte continuidade entre as teorias capitalistas do desenvolvimento ¢ as teorias socialistas da dependéncia.” O projeto de modernidade e modernizag4o tornou-se um elemento-chave do controle ce repressio das forgas da antimodernidade que emergiam nas lutas revo- luciondrias, As nogées de “desenvolvimento nacional” e “Estado de todo © povo”, que constantemente ofereciam uma promessa iluséria de futuro mas serviam apenas para legitimar as hierarquias globais existentes, cons- tituiram uma das regurgitagdes mais danosas da ideologia socialista. Em nome da “unidade de todo 0 povo”, com efeito, organizavam-se operagdes politicas que supostamente transcenderiam os conflitos de classe (embora simplesmente os reprimissem), assim confundindo os significados politicos dedireita e esquerda, assim como os de fascismo e comunismo. Esse projeto reacionario da modernidade (por trés de uma méscara de socialismo) surge mais fortemente em momentos de crise econdmica: foi parte da horrivel experiencia da década de 1930 soviética, e sob certos aspectos repete-se novamente hoje, nao em nome da “unidade de todo 0 povo”, mas na en- louquecida corrida de forcas politicas eleitas de esquerda e de direita em diregao ao “centrismo” parlamentar e populista, para criar 0 que Etienne Balibar chama de “extremismo do centro”. © “ponto de vista equivocado” das trés grandes experiéncias so- _ dialistas, para retomar de maneira irénica uma antiga expresso dos burocratas soviéticos, ndo se deve tanto ao fato de as normas progres- sistas do desenvolvimento capitalista terem sido internalizadas na consciéncia das classes dominantes do “socialismo real”, mas ao fato de que, paradoxalmente, essas normas haviam sido internalizadas de | maneita muito débil, Embora essas experiéncias de socialismo tives- sem fracassado, o desenvolvimento capitalista na Russia e na China m1 Digitalizado com CamScanner ig de crises relativamente breves, esseg nio fracassou- Depo’ sito mais ricos € poderosos do que = italisme m o desenvolvimento capita), voltaram nte romperam CO dquina d Pitalis uando s » revelou-se uma poderosa mq le acumules j ssocialismo real vvimento econdmico. Entre outras inovagies primitiva ¢ desenvolv yolvimento ele inventou instrumentos (como ; condigdes de subdesen xemplo) que oS Estados capitalistas s6 Adotavan, ismo, Cae ag; e antecipou ¢ normalizou as ferramen,, controle da excegdo que (como veremos na Par na atual ordem global. Considerando.se , io do desenvolvimento capitalista global hoje, as crises do "sy. oe Sais uma aguda relevancia contemporanea. De asso at a historia é na realidade sobre voct. Seria equivocado, contudo, esquecer ou bubba 1s © quanto as vitoriosas revolugées socialistas na Russia, na China e em Cuba gju- daram e inspiraram os movimentos de libertag4o anticapitalistase anti-imperialistasem todo o mundo. Devemos tomar cuidado para que nossa critica delas nao sirva simplesmente para reforgar as vulgares ten- tativas da ideologia dominante de cancela-las de nossa memédria. Cada uma dessas revolugées deu inicio a ciclos de lutas que se disseminaram pelo mundo uma espécie de contaminagao viral, transmitindo suas esperancas e sonhos a outros movimentos. Seria util, com efeito, nest ponto da histéria, poder avaliar de maneira realista em que medidaa crise definitiva dos Estados socialistas comprometeu ou na verdade Secs mre ein mn ca fim entre Pequim e Baia ° a + ae seve ase a ee que a esperancaeo Ste i, Ee an signifies oe ° i que teve inicio um outro rae 0 semana terminou, mas oe como as forcas da antimodernidade oraremos algumas das me a Processos de Blobalizacag capitalista pearance sees uma ‘ae contra eles e descobriremos rota de fuga da j jaula da ideologi Fi . ra apanhados os Estados roan desenvolvimentista em que © do keynesian em fases de crises de governanga para c 4) continuam a ser usadas ne Digitalizado com CamScanner AMBIVALENCIAS DA MODERNIDADE 1m fato que surge claramente dessa hist6ria é que as lutas Jo jd ndo podem ser concebidas em termos de modernizagio e s de desenvolvimento. A forga da antimodernidade, que nao se con- socialistas e ‘as lutas de independéncia nacional, NO, intacta, em nossa época. Che e fato nos tltimos anos de vida, ao tentar romper rutural ¢ a linearidade histérica da doutrina so- ‘onhe vem mais uma vez 0 primeiro f Guevara parece intuir com o determinismo e: cialista, os quais ia cle, meramente reproduzem as caracterfsticas pisicas da modernidade capitalista, “Perseguir a quimera da concretizagao do socialismo com ajuda das armas grosseiras que nos foram deixadas pelo capitalismo”, escreve ele, leva a um beco sem safda. “Para construir 0 co- munismo, é necessirio criar, juntamente com os novos alicerces materiais, ohomem novo.” Che certamente conhece em primeira mao as limitacées do desenvolvimentismo socialista. Nos anos posteriores 4 revolugao, atua como presidente do Banco Nacional ministro das Industrias. Mas em 1965 desaparece misteriosamente da vida publica, partindo para se integrar as Jutas revolucionarias, primeiro no Congo e depois na Bolivia, onde vem a ser morto. H4 quem veja nessa decisao de deixar Cuba e seus cargos governa- mentais um sinal de uma inquietagao romantica pela aventura ou uma falta dedisposigao de arregacar as mangas e encarar a drdua tarefa de construgao de uma economia nacional. Preferimos interpretd-la como uma recusa da camisa de forca burocratica e econdmica do Estado socialista, uma recusa de obedecer aos ditames da ideologia do desenvolvimento. O novo homem que ele busca para construir 0 comunismo jamais sera encontrado ali. Sua fuga para a selva é na verdade uma tentativa desesperada de redescobrir as forcas de antimodernidade que ele conheceu na luta de libertagao. Hoje fica ainda mais claro que na ¢poca de Che s6 os movimentos de baixo para cima, s6 as subjetividades na base dos processos produtivos e politicos tem apossibilidade de construir uma consciéncia de renovagao e transformagao. Essa consciéncia ja ndio descende dos setores intelectuais que so orginicos 0 que se designava outrora por ciéncia socialista, emergindo, isto sim, das classes trabalhadoras e das multidées que propoem de maneira aut6noma €criativa esperangas e sonhos antimodernos ¢ anticapitalistas. 13, Digitalizado com CamScanner peM-BSTAR COMUM Caliban se liberta da dialética nidade, nao raro paralelamente 08 mais radi jonalismo ¢ iluminismo, ore nuam a surgir monst, Rabelais a Diderot ¢ de Shakespeare a Mary Shelley, figuras de sublime desproporgao e aterradoe fe como se os limites da racionalidade moderna fossem Por demai, 1 seus extraordindrios poderes criativos. Fora ta forgas de antimodernidade sao configuradas, come monstros para controlar seu poder € legitimar sua dominagio, Historias de sacrificio humano entre os amerindios servem de prova de sua crue. dade, violéncia e loucura para os espanhdis do século XVI, assim comp ‘oconceito de canibalismo funciona para os colonizadores africanos em periodo posterior. As cagas as bruxas, 0 sacrificio na fogueira e os julga. mentos que se disseminam pela Europa e as Américas nos séculos XVI XVII sio outros exemplos das forcas da antimodernidade apresentadas como irracionalidade e supersti¢ao, traindo a razao e a religiao. As cacas as bruxas com frequéncia se manifestam, na verdade, em regides onde ‘ocorreram recentemente intensas rebelides camponesas, nao raro lide- radas por mulheres, resistindo a colonialidade, ao dominio capitalista € 4 dominacao patriarcal.* Mas a modernidade encontra dificuldade para lidar com seus monstros e tenta descartd-los como ilusdes, fabulas derivadas de uma imaginacao hiperexcitada, “Perseu usava um chapel magico, para que os monstros que cagava no o vissem”, escreve Mars “Nés preferimos encobrir os olhos e os ouvidos com o chapéu mégic? Para negar que haja monstros,”® Os monstros, contudo, sio reais, 4 Max Horkheimere'Theod sda antimodernidade — o ia arene hanes ee — trazendo-os a uma telagdo d fe ae ‘ conn Sie temos diivida’,escrevem, “de que alibe: ‘ a one hai do pe samento iluminista, Julgamos 1 wena eee ¢ inseparive david» ler percebido com igual clareza, 10 Ao longo da moder projetos de rac Na Europa, de monstros apresentam cess0, © estreitos para conte! Europa, igualmente, 44 Digitalizado com CamScanner AMBIVALENCIAS DA MODERNIDADE queo proprio conceito desse pensamento, assim como as formas histéri- casconcretas, as institui¢des de sociedade com as quais esté entrelagado, jacontém o germe da regressio [sua reversio] que hoje ocorre em toda parte.” Eles veem a modernidade inextricavelmente apanhada numa relacdo intima com seu oposto, levando inevitavelmente a sua autodes- truicao. Horkheimer e Adorno, escrevendo do exilio nos Estados Unidos no inicio da década de 1940, tentam entender a ascensao do nazismo na Alemanha e a mistura de racionalidade e barbarie do regime. Mas os nazistas ndo sao anémalos em sua visio, e sim um sintoma da natureza da propria modernidade. Também os proletarios, sustentam eles, esto sujeitos a essa mesma dialética, de tal maneira que seus projetos de liberdade e organizacao social racional sio inevitavelmente funcionais a criagéo de uma sociedade total, administrada. Horkheimer e Adorno nio veem qualquer momento de subsun¢do ou resolugao dessa dialética, mas apenas uma constante frustracao dos ideais da modernidade e mes- mo uma degradagao progressiva em diregdo ao oposto, de tal maneira que, em vez de afinal realizar uma condi¢4o verdadeiramente humana, estamos mergulhando numa nova espécie de barbirie. ‘A tese de Horkheimer e Adorno ¢ extraordinariamente importante por se afastar decisivamente da linha modernizadora teleolégica do pensamento marxista, mas do nosso ponto de vista, ao construir a re- lacdo entre modernidade e antimodernidade como uma dialética, eles cometem dois erros. Primeiro, a formulago tende a homogeneizar as forcas da antimodernidade. Certas antimodernidades, como 0 nazismo, de fato constituem terriveis inimigos que escravizam a popula¢do, mas outras desafiam as estruturas de hierarquia € soberania com figuras de incontavel liberdade. Em segundo lugar, ao enfeixar essa relagio numa dialética, Horkheimer e Adorno limitam as antimodernidades a se adigéo com a modernidade. Em Posicionar em oposi¢éo e mesmo contri portanto, a dialética conduz a vez de ser um principio de movimento, relagdo a um impasse. Isto explica o fato de Horkheimer € Adorno no | enxergarem uma saida, deixando a humanidade fadada ao eterno jogo dos opostos. Parte do problema, assim, €a incapacidade de reconhecer us Digitalizado com CamScanner BEM-ESTAR COMS™ s de antimodernidade, pois as mais : s interessarao, nao se Posicionay, °% tiva com a modernidade, em vez, disso, Tne jo se opondo simplesmente atudo queg ' any ented novas racionalidades e novas form” fal ‘ ag, « sair do circulo vicioso estabelecido pel, diay ss is rel jiago! umaatitude diage s noe racional, ma jo, Precisamo: . Ibert Pi re Adorno, reconhecendo de que maneira os mo) met de Horkheir A Mistry jutivos da antimodernidade, os monstros da liber e . inacd nidade e apont, es a dominagio da moder Pontam nadie, positivos € pro sempre superam tiva. a oO mand essa dialética é examina ; . Uma maneira de romper com — do ponto de vista dos monstros da modernidadt art ‘ tempestay et Shakespeare, por exemplo, o selvagem e deformado Caliban é um Poder, so simbolo do nativo colonizado como monstro terrivel e ameacado, 0 proprio nome Caliban poderia ser considerado um anagrama de: caniby, ao mesmo tempo que evoca os caribenhos, a populagao nativa das ith do Caribe exterminada no periodo colonial.) Préspero, o Mago cont; que tentou se aproximar e educar o monstro, mas, tendo ele ameacady sua filha, Miranda, ndo teve outra escolha sendo conter o brutamontes, aprisionando-o numa drvore. A monstruosidade e selvageria do nativo, segundo o script classico, legitima o dominio do europeu em nome d: modernidade. Caliban, contudo, nao pode simplesmente ser morto ot descartado, “Nao podemos perdé-lo”, explica Prospero a Miranda. Ee acende a fogueira para nés / junta a lenha e Presta servicos / que 0% 40 valiosoe "85 ‘ sao valiosos. O trabalho do monstro é necessdrio, ¢ assim ele deve st mantido na sociedade insular, _ Afigura de Caliban também tem sido usada como simbolo de re téncia das lutas anticol tus cide pn soni is do século XX no Caribe. A imagem a persconter ape nizadores € reavaliada do outro ponto dev P 'stria do sofrimento dos colonizados e de suas lutss Onizadores, “Prospero invadiu as ilhas’s Caliban e the ensinoy ‘amar, “matou Rossos antepassados, eset” "Sua lingua para fazer-se entendido, Que m** Digitalizado com CamScanner

You might also like