You are on page 1of 8

See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.

net/publication/280236101

Avaliação da dor e estresse em pacientes com fibromialgia

Article in Revista Brasileira de Reumatologia · March 2002

CITATIONS READS

40 5,377

5 authors, including:

Elizabeth Alves Gonçalves Ferreira Amélia Pasqual Marques


University of São Paulo University of São Paulo
25 PUBLICATIONS 894 CITATIONS 226 PUBLICATIONS 4,989 CITATIONS

SEE PROFILE SEE PROFILE

Luciana Akemi Matsutani Esdras Vasconcellos

26 PUBLICATIONS 1,542 CITATIONS


Instituto de Psicologia da USP
71 PUBLICATIONS 613 CITATIONS
SEE PROFILE
SEE PROFILE

Some of the authors of this publication are also working on these related projects:

Development of a mobile application to promote self-care in patients with fibromyalgia View project

Rede Brasileira de Pesquisa do Comportamento de Gêmeos (RBPCG) View project

All content following this page was uploaded by Amélia Pasqual Marques on 25 October 2018.

The user has requested enhancement of the downloaded file.


Ferreira et al.
ARTIGO ORIGINAL
ORIGINAL ARTICLE

Avaliação da dor e estresse


em pacientes com fibromialgia(*)
Assessment of pain and stress
in fibromyalgia patients
Elizabeth Alves Gonçalves Ferreira(1), Amélia Pasqual Marques(2),
Luciana Akemi Matsutani(3), Esdras G. Vasconcellos(4), Lais Lage Furtado de Mendonça(5)

RESUMO ABSTRACT
Objetivo: avaliar a dor, o nível de estresse e a incidência de even- Objective: evaluation of pain, stress level and the occur-
tos estressantes em pacientes com fibromialgia. Métodos: parti- rence of stressing events in fibromyalgia patients. Methods:
ciparam do estudo 63 indivíduos do sexo feminino, sendo 32 do 63 women participated in the study, 32 in the test group
grupo teste (pacientes com fibromialgia) e 31 do grupo controle (fibromyalgic patients) and 31 in the control group (non fi-
(indivíduos sem fibromialgia). O limiar de dor foi avaliado nos 18 bromyalgic individuals). The pain threshold was measured
tender points com auxílio de um algômetro. Também foi utili- on the 18 tender points with a algometer. The McGill Pain
zado o Questionário de dor da McGill. Para a avaliação do estresse Questionnaire was also utilized. For the stress assessment two
foram aplicados dois protocolos: Lista de Sintomas de Estresse e protocols were used: The Stress Symptoms List and The In-
Inventário de Eventos de Vida Estressantes. Os sujeitos foram ventory of Stressing Life Events. Each subject was assessed
avaliados individualmente em uma única entrevista. Foi utiliza- in one single individual interview. The Kruskal-Wallis test
do o teste de Kruskal-Wallis para avaliar a significância dos dados. was used to assess the significance of data. Results: regarding
Resultados: houve diferença estatisticamente significante entre pain, the two groups presented a statistically significant dif-
os grupos quanto à dor. A avaliação da dor pelo Questionário de ference. The McGill Pain Questionnaire revealed that the
dor da McGill demonstrou que o grupo controle (GC) selecionou control group selected descriptors only from the “affective”
somente descritores (palavras que qualificam a dor) das categorias and “sensorial” categories. The highest score descriptors were
sensorial e afetiva, sendo os de maior escore “latejante” (45,2%) “throbbing” (45.2%) and “pang” (45.2%), from the senso-
e “pontada” (45,2%), ambos da categoria sensorial. No grupo teste rial category. The test group presented a higher frequency
(GT) a freqüência das palavras selecionadas foi maior e foram es- and broader selection of the descriptors, which were select-
colhidos descritores em todas as categorias (sensorial, afetiva, ava- ed out of all listed categories (sensorial, affective, evaluative
liativa e mista). O escore mais alto do GT (81,3%) foi da palavra and mixed). The highest score in the group test was given
“cansativa” (categoria afetiva). A soma dos valores associados aos by the word “tiring” (81.3%), from the affective category.
descritores escolhidos em cada categoria do Questionário de dor The sum of the values associated to the selected descriptors,
da McGill demonstrou que os grupos teste e controle diferiram within each category, from the McGill Questionnaire,
nas categorias sensorial, afetiva, avaliativa e mista. Em relação à showed that the test and the control groups statistically dif-
sensibilidade dolorosa nos tender points também houve diferença fered in all four categories. Regarding to pain threshold on

* Ambulatório de Reumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Recebido em 20/12/2001. Aprovado, após
revisão, em 15/2/2002.
1. Prof. M. do curso de Fisioterapia da Universidade Metodista e Unifieo.
2. Prof. Dra. do curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
3. Fisioterapeuta; Mestranda em Ciências na área de Fisiopatologia experimental (FMUSP).
4. Prof. Dr. do curso de Psicologia da Universidade de São Paulo.
5. Assistente Dra. do Serviço de Reumatologia do Departamento de Clínica Médica do Hospital das Clínicas (FMUSP).
Endereço para correspondência: Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP),
Rua Cipotânia, 51, Cidade Universitária, CEP 05360-000, São Paulo, SP. E-mail: pasqual@usp.br

104 Rev Bras Reumatol – Vol. 42 – Nº 2 – Mar/Abr, 2002


Avaliação da dor e estresse em pacientes com fibromialgia

estatisticamente significante, sendo que o GT apresentou limiar de the tender points, the test group presented a statistically sig-
dor mais baixo que o GC. As pacientes com fibromialgia apresen- nificant lower threshold in comparison to the control group.
taram maior nível de estresse do que o grupo controle, porém, o The fibromyalgic patients also showed a higher stress level
número de eventos de vida estressantes não diferiu de forma sig- than the patients in the control group, but the number of
nificativa entre os dois grupos. Conclusões: as pacientes com fi- stressing life events did not differ between the two groups.
bromialgia apresentaram maior número de descritores escolhidos Conclusions: the fibromyalgic patients presented a lower
em todas as categorias do Questionário de dor da McGill e limiar pain threshold and a higher number of selected descriptors
de dor mais baixo em todos os tender points. Observou-se que, in all categories of the McGill Pain Questionnaire. The high
apesar das pacientes com fibromialgia apresentarem maior nível stress level of the fibromyalgic patients does not seem to be
de estresse, o número de eventos de vida estressantes não está sig- directly linked to the number of stressing life events. It sug-
nificativamente aumentado, sugerindo que o problema seja a for- gests that the way the patients cope with stress may be more
ma como esta paciente lida com o estresse e não a intensidade dos important than the intensity and frequency of stressing events
eventos que ela vivencia. they experience.

Palavras-chave: fibromialgia, dor, estresse. Key words: fibromyalgia, pain, stress.

INTRODUÇÃO Evidências clínicas sugerem que a ansiedade, tensão,


depressão, alteração do padrão de sono, fatores climáticos,
A fibromialgia é uma doença que acomete principalmente trabalho excessivo e determinadas atividades físicas alte-
mulheres (75 a 95%). Há relatos de casos de pacientes jo- ram o ciclo de dor-espasmo muscular-dor(8).
vens com 12 anos, mas a faixa etária mais comum de apa- LittleJohn salienta que a fibromialgia pode ser conside-
recimento da doença é entre 40 e 55 anos.(1, 2) rada como uma condição psicossomática, onde a alteração
De acordo com o critério proposto pelo Colégio Ame- em crenças associada com estresse, distúrbio do sono e ou-
ricano de Reumatologia a fibromialgia caracteriza-se por
tros eventos modulam a dor em termos de sistema nervo-
dor muscular intensa em diversas regiões do corpo (dor
so central e medula espinhal(9).
difusa), por no mínimo três meses de duração, associada à
A complexa sintomatologia da fibromialgia envolve prin-
maior sensibilidade dolorosa em pelo menos 11 dos 18
cipalmente três áreas: o sistema músculo-esquelético, o sis-
pontos dolorosos específicos, os denominados tender points.
tema neuroendócrino e o sistema psicológico(13).
Outros sintomas como fadiga, estresse e distúrbio do sono
Qualquer estímulo doloroso pode ativar o sistema ner-
também são valorizados, mas não constituem os critérios
de maior acuracidade para o diagnóstico.(3) voso simpático e o eixo hipotálamo-hipófise-suprarenal, o
A etiologia da fibromialgia ainda é desconhecida, o que qual constitui o eixo regulador da reação de estresse. As
dificulta determinar com convicção o que é sintoma e o reações desses sistemas estão intimamente relacionadas com
que é fator desencadeante do quadro clínico da doença.(4-9) a dimensão afetiva/emocional da dor, sendo que a respos-
A dor, principal característica da fibromialgia, é diferen- ta ao estímulo doloroso não é padronizada, variando entre
te de qualquer outra impressão sensorial porque caracteri- os indivíduos(14).
za-se não somente pela dimensão sensório-discriminativa O termo estresse é usado muitas vezes como sinônimo
que o indivíduo vivencia, mas também pelo importante de cansaço ou sobrecarga, sendo associado a um aconteci-
componente afetivo-emocional, que constitui a dimensão mento desagradável ou um fato isolado que ocorre na vida
afetivo-motivacional da dor(10). de uma pessoa.
A complexidade e a subjetividade da dor dificulta sua Estresse é um processo psicofisiológico desencadeado
avaliação precisa e justifica a utilização de técnicas como pelo contato com o agente estressor, é uma reação fisioló-
questionários verbais, escala de categoria numérica, escala gica do organismo buscando a homeostase(15). A dimensão
analógica visual e índices não-verbais para avaliar a dor(11). fisiológica do estresse compreende a reação de alarme, fase
As repercussões geradas pela dor podem ser inúmeras, de resistência, e exaustão através do eixo hipotálamo-hi-
inclusive do ponto de vista social. Em pacientes com fi- pófise-suprarenal(16). Na dimensão psicológica temos a ava-
bromialgia, a dor e a intolerância ao exercício físico po- liação primária, secundária e reavaliação, considerando
dem algumas vezes reprimir a habilidade para o trabalho e como o indivíduo interpreta e julga a situação externa e
para a execução de atividades funcionais(12). seus recursos para controlá-la(17). O julgamento de qualquer
Rev Bras Reumatol – Vol. 42 – Nº 2 – Mar/Abr, 2002 105
Ferreira et al.

situação baseia-se no repertório de vivências, idéias e con- que qualificam a dor), organizados em quatro categorias
ceitos do indivíduo, de modo que o contexto social e psi- (sensorial, afetiva, avaliativa e mista) e 20 subcategorias.
cológico influenciam na interpretação dos eventos. Pede-se para a paciente escolher uma palavra de cada sub-
Turk e Flor ressaltam a possibilidade de variáveis psico- categoria, permitindo ao sujeito a opção de não escolher
lógicas iniciarem o desenvolvimento de sintomas físicos, nenhuma. A análise é feita por categorias; através da soma
como no caso de uma tensão muscular resultante de uma dos valores associados às palavras escolhidas e a partir das
resposta mal adaptada ao estresse psicológico(18). palavras selecionadas por mais de 30% da população pes-
Outra possibilidade viável seria considerar a dor como quisada(19, 20). A tradução deste instrumento para a língua
um fator gerador de estresse; um agente estressor. portuguesa foi realizada pelos profissionais do Ambulató-
Aparentemente a melhor compreensão da dor e do es- rio de Dor da Clínica Neurológica do HC-FMUSP(21).
tresse da paciente fibromiálgica pode contribuir na elabo- A Lista de Sintomas de Estresse (LSS) refere-se a uma
ração de tratamentos mais eficientes. A preocupação deste lista de 59 sintomas psicofisiológicos e psicossociais de
trabalho não foi avaliar se o estresse pode ser a causa da stress. O sujeito deve associar para cada sintoma umas das
fibromialgia ou se a fibromialgia causa maior estresse; o
quatro respostas: nunca (0), poucas vezes (1), freqüente-
mais importante foi observar como comportam-se as va-
mente (2) ou sempre (3). Os escores obtidos nas respos-
riáveis dor e estresse.
tas serão somados e fornecerão o nível de estresse do in-
O presente estudo teve como objetivo avaliar a inci-
divíduo. Este instrumento é resultado da associação entre
dência de eventos estressantes e os níveis de estresse e dor
em pacientes com fibromialgia. uma lista elaborada e validada no Max Plank Institut da
Alemanha(22) e o Questionário de Estresse do Psicólogo
no Exercício Profissional(23).
PACIENTES E MÉTODOS O Inventário de Eventos de Vida Estressantes (Life Events
Participaram deste estudo 63 mulheres, 32 do grupo teste Units – LEU) é um questionário composto por 43 itens
(GT) com diagnóstico de fibromialgia segundo critérios do que se referem a eventos que podem gerar alterações sig-
Colégio Americano de Reumatologia (1990) e média de nificativas na rotina de vida(24). Cada indivíduo atribui no-
idade 54,6 anos (desvio padrão 13,1) e 31 do grupo con- tas de 1 a 100 a cada evento, de acordo com sua avaliação,
trole (GC), composto por indivíduos sem sintomas de fi- independente do evento ter sido positivo ou negativo. O
bromialgia ou qualquer outra doença reumatológica, e escore total é obtido através da soma dos valores atribuídos
média de idade de 47,7 anos (desvio padrão 12,6). No GT a cada item.
as avaliações foram realizadas em uma sala no Ambulatório Para a avaliação dos tender points (TP) primeiramente
de Reumatologia do Hospital das Clínicas da Universida- foram marcados os 18 TP com lápis dermatográfico. Em
de de São Paulo, enquanto no GC os indivíduos foram cada TP o algômetro era posicionado perpendicularmente
avaliados numa clínica particular de fisioterapia. e o pesquisador aumentava a pressão colocada progressiva-
Na coleta de dados foi utilizado um algômetro modelo
mente, preocupando-se em manter o instrumento numa
Fischer PTM (Pressure Threshold Meter), o Questionário de
velocidade constante de 1 Kg/min sem bruscas variações.
dor da McGill, a Lista de Sintomas de Estresse (LSS), o Inven-
O indivíduo era orientado a relatar o início da sensação
tário de eventos de vida estressantes (Life Events Units – LEU)
dolorosa e neste momento a pressão era interrompida e o
e um protocolo de dados pessoais. Após aprovação pela
valor observado anotado. A seqüência dos TP pesquisados
Comissão de Ética do Hospital das Clínicas a avaliação foi
realizada para ambos os grupos sob a forma de entrevista era sempre a mesma, começando pelo occipital e finali-
individual. Todos os protocolos foram aplicados verbal- zando no joelho.
mente e as respostas anotadas pelo entrevistador. A análise estatística foi feita comparando-se os grupos
O protocolo de dados pessoais teve como objetivo co- teste e controle em relação com as variáveis qualitativas e
letar informações sobre as variáveis demográficas que fo- quantitativas. As variáveis qualitativas foram comparadas
ram utilizadas somente para caracterizar as amostras e ga- pelo teste de associação (qui-quadrado X2) e as variáveis
rantir a similaridade entre os grupos. quantitativas foram analisadas a partir da média e desvio-
O Questionário de dor da McGill é um instrumento para padrão. No caso das variáveis não-paramétricas foi utiliza-
avaliação da dor, constituído por 78 descritores (palavras do o teste de Kruskal-Wallis.
106 Rev Bras Reumatol – Vol. 42 – Nº 2 – Mar/Abr, 2002
Avaliação da dor e estresse em pacientes com fibromialgia

RESULTADOS do Questionário de dor da McGill. Em todas as categorias


houve diferença estatisticamente significante entre os gru-
DOR pos teste e controle.
A TABELA 1 refere-se aos descritores selecionados no Ques- TABELA 2
tionário de dor da McGill por mais de 30% da população MÉDIA, DESVIO PADRÃO E TESTE DE KRUSKAL-WALLIS
pesquisada. No grupo controle somente descritores das PARA AS CATEGORIAS SENSORIAL, AFETIVA, AVALIATIVA
categorias sensorial e afetiva foram selecionados, enquanto E MISTA DO QUESTIONÁRIO DE DOR DA MCGILL
no grupo teste foram escolhidos descritores em todas as
categorias, em especial na sensorial e afetiva. A porcenta- McGill Teste (N = 32) Controle (N = 31) (Kruskal-Wallis)
gem das palavras selecionadas foi maior no grupo teste. Na média +- DP média +- DP p
categoria sensorial o grupo teste teve nove dos 42 descri- Sensorial 18,2 +- 6,2 10,1 +- 8,0 0,000
tores selecionados acima de 30%, enquanto o grupo con- Afetiva 6,7 +- 3,1 3,5 +- 3,6 0,000
trole teve quatro. Na categoria afetiva observa-se que no Avaliativa 2,4 +- 1,5 1,7 +- 1,7 0,054
grupo teste foram escolhidos cinco dos 14 descritores dis- Mista 6,3 +- 3,1 2,5 +- 2,7 0,000
poníveis e no grupo controle dois. O descritor “cansativa”
(categoria afetiva) foi o que obteve maior escore no grupo
teste (81,3%); já no grupo controle os descritores de esco- A TABELA 3 mostra o resultado da dolorimetria realizada
re mais elevado foram “latejante” (45,2%) e pontada em cada tender point (TP). Observa-se que o grupo teste
(45,2%), ambos da categoria sensorial. apresentou menor limiar de dor que o grupo controle em
todos os TP, demonstrando que os indivíduos com fibro-
TABELA 1 mialgia referem dor mesmo quando expostos à menor
AVALIAÇÃO DA DOR ATRAVÉS DO QUESTIONÁRIO DE DOR pressão nos tender points.
DA MCGILL. APRESENTAÇÃO PORCENTUAL DOS DESCRITORES
SELECIONADOS POR MAIS DE 30% DA AMOSTRA PESQUISADA TABELA 3
MÉDIA, DESVIO PADRÃO E TESTE DE KRUSKAL-WALLIS
Categoria Teste (N = 32) Controle (N = 31) PARA O LIMIAR DE DOR NOS 18 “TENDER POINTS”

Descritor % Descritor %
Tender point Teste (N = 32) Controle (N = 31) (Kruskal-Wallis)
Sensorial Latejante 65,5 Latejante 45,2
média +- DP média +- DP p
Agulhada 62,5 Pontada 45,2
Occipital D* 1,7 +- 0,9 2,3 +- 0,7 0,004
Formigamento 62,5 Agulhada 41,9
Occipital E** 1,8 +- 1,0 2,3 +- 0,7 0,019
Pontada 53,1 Sensível 35,4
Cervical D 1,8 +- 1,1 2,7 +- 0,7 0,000
Fina 53,1 ——
Cervical E 1,8 +- 1,2 2,6 +- 0,8 0,001
Fisgada 53,1 ——
Trapézio D 1,8 +- 0,8 2,8 +- 0,8 0,000
Queimação 50,0 ——
Trapézio E 1,8 +- 1,1 2,9 +- 0,8 0,000
Sensível 40,6 ——
Supraespinhal D 1,8 +- 0,9 3,1 +- 0,9 0,000
Dolorida 37,5 ——
Supraespinhal E 1,7 +- 1,0 3,1 +- 1,1 0,000
Afetiva Cansativa 81,3 Enjoada 38,7
Condrocostal D 1,2 +- 0,9 2,1 +- 0,8 0,000
Atormentada 56,3 Cansativa 35,5
Condrocostal E 1,2 +- 0,9 2,2 +- 0,8 0,000
Enjoada 50,0 ——
Epicôndilo D 1,6 +- 0,9 2,3 +- 0,8 0,000
Enlouquecedora 40,6 ——
Epicôndilo E 1,3 +- 0,8 2,5 +- 0,7 0,000
Sufocante 31,3 ——
Glúteo D 2,2 +- 1,3 3,5 +- 1,1 0,000
Avaliativa Que incomoda 31,3 ——
Glúteo E 2,0 +- 1,2 3,7 +- 1,3 0,000
Mista Espalha 40,6 ——
Trocânter D 2,1 +- 1,3 3,4 +- 1,2 0,000
Adormece 40,6 ——
Trocânter E 2,0 +- 1,0 3,5 +- 1,3 0,000
Aborrecida 37,5 ——
Joelho D 1,8 +- 1,4 2,7 +- 0,9 0,000
Joelho E 1,7 +- 1,3 2,6 +- 0,9 0,000
A TABELA 2 apresenta a soma dos valores associados aos * D: direito.
descritores escolhidos em cada uma das categorias de dor ** E: esquerdo.

Rev Bras Reumatol – Vol. 42 – Nº 2 – Mar/Abr, 2002 107


Ferreira et al.

Estresse aplicada na área. Para que esta medida seja confiável é muito
Os dados obtidos com os Questionários Lista de Sintomas importante que as instruções dadas ao sujeito avaliado se-
de Estresse (LSS) e Life Events Units (LEU) estão apresen- jam claras. Na pesquisa de limiar de dor o indivíduo deve
tados na TABELA 4. A variável estresse demonstrou ter com- ser orientado a relatar exatamente quando ocorre o início
portamento diferente nos grupos quanto aos sintomas de da dor. Pequenas alterações nas instruções, expectativas ou
estresse, estando no grupo teste os maiores escores. Em fatores situacionais pode influenciar o relato de dor(25). Neste
relação com os eventos de vida estressantes relatados no contexto, podemos afirmar que a algometria é um recurso
LEU, as amostras pesquisadas não diferiram entre si. importante para a pesquisa em fibromialgia, pois é um
método adequado e objetivo na pesquisa do limiar de dor
TABELA 4 nos TP, o que reflete a sensibilidade dolorosa da paciente
MÉDIA, DESVIO PADRÃO E TESTE DE KRUSKAL-WALLIS com fibromialgia de maneira geral(4).
PARA A AVALIAÇÃO DE ESTRESSE COM OS PROTOCOLOS Rollman(11) examinou a dor em fibromialgia conside-
LISTA DE SINTOMAS DE ESTRESSE (LSS) rando a severidade e o rigor de avaliação e concluiu que
E INVENTÁRIO DE EVENTOS DE VIDA ESTRESSANTES (LEU) o Questionário de dor da McGill e a escala visual analó-
gica verificam de maneira global o desconforto sentido
LSS/LEU Teste (N = 32) Controle (N = 31) (Kruskal-Wallis)
pelas pacientes, enquanto o algômetro demonstra a sen-
média +- DP média +- DP p sibilidade em múltiplos pontos do corpo. LittleJohn(26)
LSS 80,5 +- 26,8 48,7 +- 23,8 0,000 também refere-se ao Questionário de dor da McGill e
LEU 887,2 +- 416,8 789,4 +- 520,7 0,187 ao algômetro como formas adequadas de pesquisa da dor
em fibromialgia.
Neste estudo o Questionário de dor da McGill demons-
DISCUSSÃO trou ser um instrumento útil para avaliar a qualidade e
intensidade da dor, o que confere com outros trabalhos
A principal característica da fibromialgia é a dor. O caráter
que se referem ao Questionário de dor da McGill como
subjetivo da dor dificulta sua avaliação precisa. As pacien-
um instrumento eficaz e confiável que pode ser usado em
tes com fibromialgia normalmente relatam sentir dor in-
diversas situações clínicas(11, 27).
tensa e constante. A algometria utilizada para medir o li-
No Questionário de dor da McGill o grupo teste apre-
miar de dor demonstrou que estas pacientes realmente
sentou maior índice de dor e maior número de descritores
apresentam um limiar para dor mais baixo do que o grupo
controle. Apesar da discussão dos dados ser direcionada escolhidos nas quatro categorias, em especial nas catego-
pela comparação das médias dos valores, é interessante rias sensorial e afetiva, enquanto no grupo controle so-
salientar que o valor mínimo de limiar de dor do grupo mente descritores das categorias sensorial e afetiva foram
teste foi 0,6 kg/cm2 enquanto no grupo controle foi 1,3 selecionados. A porcentagem das palavras selecionadas foi
kg/cm2, ou seja, o mínimo de pressão suportada para refe- maior no grupo teste. As pacientes com fibromialgia de-
rir dor no grupo controle é mais do que o dobro do míni- monstraram utilizar mais palavras para descrever a sua dor,
mo de pressão suportada pelo grupo teste. Os dados obti- sendo que no grupo teste o descritor que obteve maior
dos neste presente estudo encontram suporte na literatura escore foi “cansativa” (categoria afetiva) com 81,3% de
em trabalhos que afirmam que o limiar de dor nos TP é freqüência. Já no grupo controle os descritores de escore
realmente baixo em pacientes com fibromialgia(11, 31, 25). mais elevado foram “latejante” (45,2%) e pontada (45,2%),
Okifuji et al.(25) ressaltam que a pesquisa em fibromialgia ambos da categoria sensorial. Parece que a dimensão afeti-
é caracterizada por variações metodológicas e resultados va da dor é mais evidente no grupo de pacientes com fi-
inconsistentes, o que aponta para a necessidade de utiliza- bromialgia, enquanto no grupo controle a dimensão sen-
ção de um protocolo para exame dos TP. Os autores suge- sorial é predominante. Este dado confere com a literatura
rem um protocolo manual para avaliação dos TP e enfati- que descreve que pacientes com fibromialgia geralmente
zam que o mais importante é uma metodologia correta caracterizam sua dor como qualitativamente mais signifi-
durante a avaliação dos TP. cante usando um grande número de palavras do Questio-
A avaliação manual dos TP é eficiente, porém, a grande nário McGill e indicando dores dispersas sobre um grande
vantagem da algometria é permitir a quantificação da pressão número de superfícies corporais(27, 28).
108 Rev Bras Reumatol – Vol. 42 – Nº 2 – Mar/Abr, 2002
Avaliação da dor e estresse em pacientes com fibromialgia

Nicassio et al.(29) avaliaram pacientes aflitos com o alto valores mais baixos de impacto na dimensão física, mas
nível de dor e constataram que em relação com o processo valores mais altos na dimensão psicossocial.
de busca de ajuda terapêutica, o número de palavras esco- O fato das pacientes com fibromialgia apresentarem
lhidas é menos importante do que a caracterização da dor. maior nível de estresse do que o grupo controle não signi-
O fato da experiência negativa de dor da paciente fibro- fica que esta seja a causa da fibromialgia, mas sim que tra-
miálgica ser vivenciada nas dimensões sensorial, afetiva e ta-se de um fator importante a ser considerado na com-
avaliativa faz com que sua atitude de busca de tratamentos preensão da doença e na formulação do tratamento. O
complementares seja mais intensa. fato de não haver diferença estatisticamente significante
Considerando o caráter subjetivo da dor, é impossível entre os grupos teste e controle em relação com o número
determinar qual doença gera um quadro álgico mais in- de eventos de vida estressantes sugere que é mais impor-
tenso, mas é interessante observar que o nível de descon- tante o modo como a paciente lida com o estresse do que
forto e sofrimento de um paciente pode estar mais associa- o número de eventos em si. Esta concepção pode reper-
do com as características daquela dor do que somente com cutir em propostas de tratamento que valorizem a relação
a sua intensidade. Talvez os tratamentos destinados a di- da paciente fibromiálgica com o estresse e, conseqüente-
minuir a intensidade da dor na fibromialgia possam ser mais mente, com aspectos do tratamento, como a utilização da
efetivos quando combinados com abordagens que respei- medicação e a realização de exercícios em casa.
tem a complexidade das várias dimensões da dor, princi- Urrows (33) investigou a relação entre os tender points e
palmente a afetiva. outras manifestações da fibromialgia e observou uma corre-
Durante a coleta de dados muitas pacientes do grupo teste lação significativa entre o número de tender points, de-
reclamaram do tipo de dor que a fibromialgia causa. Des- pressão, estresse diário, dor e qualidade do sono. Um fato
creviam a dor como algo insuportável, sendo que um dos interessante é que a associação entre depressão e TP foi
pontos mais enfatizados pelas fibromiálgicas é que, apesar atenuada quando a relação entre o estresse diário e os TP
da dor ser muito forte, elas não têm um exame laboratorial foi considerada. Este resultado demonstra que a experiên-
ou radiológico que comprove isso para a família, amigos e cia do estresse diário influencia a relação entre fibromial-
trabalho. Parece ser mais fácil reconhecer uma inabilidade gia e depressão, salientando que isto não significa ser o
ou diminuição do desempenho físico nos casos em que a estresse a causa da fibromialgia. Este estudo sugere que
doença é óbvia, notória, como na perda de um membro, alguns dos sintomas referidos pelas pacientes com fibro-
paralisia ou perda de movimento articular mensurável(30). mialgia, como o cansaço e o desânimo, estejam mais rela-
White et al .(30) refere que as pacientes com fibromialgia cionados com o estresse do que com a depressão.
parecem ter mais estresse na vida e relatam um nível maior Com base nos dados deste estudo, concluímos que as
de inabilidade funcional do que o detectado durante breve pacientes com fibromialgia apresentaram maior nível de
observação direta. estresse do que o grupo controle, porém, não apresenta-
O estresse psicossocial, medido através dos eventos de ram maior número de eventos estressantes de vida, suge-
vida ou pressões contínuas, tem sido valorizado como um rindo novos estudos que avaliem o modo como estas pa-
possível fator etiológico em doenças músculo-esqueléti- cientes gerenciam o estresse. Em relação com a dor, as
cas(31). Henrikson(32) comparou os resultados de mulheres pacientes com fibromialgia exibiram menor limiar de dor
com fibromialgia e com artrite reumatóide em relação com nos tender points e maior número de descritores utiliza-
a percepção de seus sintomas e conseqüências na vida diá- dos para caracterizar a dor, de acordo com o Questioná-
ria. Concluiu que as pacientes com fibromialgia tinham rio de dor da McGill.

03. Wolfe F, Smythe HA, Yunus MB, et al: The American College of
REFERÊNCIAS
Rheumatology 1990 criteria for the classification of fibromyalgia.
01. Felson DT: Epidemic research in fibromyalgia. J Rheumatol 19: 7- Arthritis and Rheum 33: 160-72, 1990.
11, 1989. 04. Kosek E, Ekholm J, Hansson P: Increased pressure pain sensibility
02. Martinez JE, Atra E, Ferraz MB, Silva PSB: Fibromialgia: aspectos in fibromyalgia patients in located deep to the skin but not restricted
clínicos e socioeconômicos. Rev Bras Reumatol 32: 225-30, 1992. to muscle tissue. Pain 63: 335-339, 1995.

Rev Bras Reumatol – Vol. 42 – Nº 2 – Mar/Abr, 2002 109


Ferreira et al.

05. Mengshoel AM, Forseth KO, Haugen M, Walle-Hansen R, Forre 21. Pimenta CAM: Avaliação da experiência dolorosa. Revista Medici-
O: Multidisciplinary approach to fibromyalgia: a pilot study: Clin na: 74: 69-75, 1995.
Rheumatol 14: 165-170, 1995. 22. Vasconcellos EG: Stress Coping und Soziale Kompetens bei Kar-
06. Alfici S: Primary fibromyalgia syndrome: a variant of depressive disor- diovaskularen Erkrankungen. Munchen. Tese de Doutorado. Lud-
der? Psychother Psychosom 51: 156-161, 1989. wig Maximmilians Universitat, 1984.
07. Bennett RM: Beyond fibromyalgia: ideas on etiology and treat- 23. Covolan MA: O stress ocupacional do psicólogo clínico: seus sinto-
ment. J Rheumatol 19: 185-192, 1989. mas, suas fontes e as estratégias utilizadas para controlá-lo. Campi-
08. Yunus M, Masi AT, Calabro JJ, Shah IK: Primary fibromyalgia. nas. Dissertação de Mestrado, 1989.
AFP 25: 115-121, 1982. 24. Holmes TH, Rahe RH: The social readjustment rating scale. J Psy-
09. Littlejohn G: Medicolegal aspects of fibrositis syndrome. J Rheu- chosom Res 11, 1967.
matol 19: 169-173, 1989.
25. Okifuji A, Turk DC, Sinclair JD, Starz TW, Marcus DA: A Stan-
10. Henry JL: Concepts of pain sensation and its modulation. J Rheu- dardized manual tender point survey: I. Development and deter-
matol 16: 104-112, 1989. mination of a threshold point for the identification of a positive
11. Rollman GB: Measurement of pain in fibromyalgia in the clinic and tender points in fibromyalgia syndrome. J Rheumatol 24: 377-
laboratory. J Rheumatol 19: 113-119, 1989. 383, 1997.
12. Jacobsen S, Petersen IS, Danneskiold-Samsoe B: Clinical features in 26. Littlejohn G: A database for fibromyalgia. Rheum Dis Clin North
patients with chronic muscle pain – with special reference to fibro- Am 21: 527-541, 1995.
myalgia. Scand J Rheumatol 22: 69-76, 1993.
27. Marques, AP, Rhoden L, Siqueira JO, João SMA: Pain evaluation
13. Neeck G, Riedel W: Neuromediator and hormonal perturbations
of patients with fibromyalgia, osteoarthritis, and low back pain. Rev
in fibromyalgia syndrome: results of chronic stress? Baillieres Clin
Hosp Clin Fac Med S Paulo 56: 5-10, 2001.
Rheumatol 8: 763-773, 1994.
28. McCain GA, Cameron R, Kennedy J: The problem of longterm
14. Crofford L J, Casey KL: Central modulation of pain perception.
Rheum Dis Clin North Am 25: 1-13, 1999. disability payments and litigation in primary fibromyalgia: the Ca-
nadian perspective. J Rheumatol 19: 174-176, 1989
15. Vasconcellos EG: Modelo psiconeuroendocrinológico de stress. In:
Seger L. Psicologia e Odontologia: uma abordagem integrada. Ed. 29. Nicassio PM, Schuman C, Kim J, Cordova A, Weiman MH: Psy-
Santos, SP, 1992. chosocial factors associated with complementary treatment use in
16. Selye H: The stress of life. McGraw-Hill Book Company Inc. fibromyalgia. J Rheumatol 24: 2008-2013, 1997.
NY, 1956. 30. White, KP, Harth M, Teasell R: Work disability evaluation and the
17. Lazarus RS, Folkman S: Cognitive appraisal processes. In: Stress, Apprai- fibromyalgia syndrome. Semin Arthritis Rheum 24: 371-381, 1995.
sal and Coping. New York Springer Publishing Company, 1984. 31. Leino P: Symptoms of stress predict musculoskeletal disorders.
18. Turk D, Flor H: Primary fibromyalgia is greater than tender points: J Epidemiol Comm Health 43: 293-300, 1989.
toward a multiaxial taxonomy. J Rheumatol 19: 80-86, 1989. 32. Henriksson CM: Longterm effects of fibromyalgia on everyday life.
19. Melzack R: The McGill Pain Questionnaire: major properties and Scand J Rheumatol 23: 36-41, 1994.
scorring methods. Pain 1: 277-299, 1975. 33. Urrows S, Affleck G, Tennen H, Higgins P: Unique clinical and
20. Graham C, Bond SS, Gerkovich MM, Cook MR: Use of the McGill psychological correlates of fibromyalgia tender points and joint
Pain Questionnaire in the Assessment of cancer pain: replicability tenderness in rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 37: 1513-
and consistency. Pain 8: 377-387, 1980. 1520, 1994.

110 Rev Bras Reumatol – Vol. 42 – Nº 2 – Mar/Abr, 2002

View publication stats

You might also like