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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE ALAGOAS – UNEAL

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A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA:


REFLEXÕES SOBRE O PRECONCEITO LINGUÍSTICO

Kledson Willames Alves Fausto


Moisés Santos Souza

Resumo
Este artigo aborda a relação entre língua, linguagem e fala, e discute a variação
linguística e o preconceito associado a ela na sociedade. A língua é entendida como
um conjunto de códigos usados por um grupo de pessoas de forma padronizada, en-
quanto a linguagem refere-se à capacidade de comunicação entre os seres humanos.
A fala é a manifestação prática da linguagem, expondo os diferentes usos da língua
que muitas vezes causam surpresa. A variação linguística é explicada como outras
formas de expressar o mesmo conteúdo em diferentes contextos, influenciada por fa-
tores como gênero, região e nível socioeconômico. Embora a variação não seja um
erro, algumas pessoas a consideram errada devido à existência de uma norma padrão
imposta pela gramática. No entanto, a norma padrão não deve ser abandonada, pois
cada contexto requer uma forma específica de linguagem. O artigo também aborda o
preconceito linguístico, que envolve a reprovação das variedades linguísticas utiliza-
das pelas camadas sociais de menor prestígio. A escola e os professores desempe-
nham um papel importante na conscientização sobre a variedade linguística e na pro-
moção de uma abordagem mais inclusiva. É necessário um trabalho reflexivo para
que os alunos compreendam que ser diferente não significa estar errado, e que a
escolha da linguagem depende do contexto. A reflexão sobre o uso da língua deve
ultrapassar os limites da escola e alcançar outros setores da sociedade para uma
compreensão mais ampla do tema.

Palavras-chave: Língua, Linguagem, Variação linguística, Preconceito linguístico.


Abstract
This article discusses the relationship between language, linguistics, and spe-
ech, and explores linguistic variation and the prejudice associated with it in society.
Language is understood as a set of codes used by a group of people in a standardized
manner, while linguistics refers to the capacity for communication among human
beings. Speech is the practical manifestation of language, revealing the different uses
of language that often cause surprise. Linguistic variation is explained as alternative
ways of expressing the same content in different contexts, influenced by factors such
as gender, region, and socioeconomic status. While variation is not considered an er-
ror, some individuals perceive it as incorrect due to the existence of a standard norm
imposed by grammar. However, the standard norm should not be abandoned, as each
context requires a specific form of language. The article also addresses linguistic pre-
judice, which involves the disapproval of linguistic varieties used by socially marginali-
zed groups. Schools and teachers play an important role in raising awareness about
linguistic variation and promoting a more inclusive approach. Reflective work is neces-
sary for students to understand that being different does not mean being wrong, and
that the choice of language depends on the context. Reflection on language use should
extend beyond the confines of schools and reach other sectors of society for a broader
understanding of the topic.

Keywords: Language, Linguistics, Linguistic variation, Linguistic prejudic

Introdução

A relação entre língua, linguagem e fala é um tema de grande relevância e


complexidade no estudo da comunicação humana. Enquanto a língua representa um
conjunto de códigos padronizados utilizados por um grupo de indivíduos, a linguagem
é a capacidade inata de comunicação presente em todos os seres humanos. A fala,
por sua vez, é a manifestação prática dessa capacidade linguística, evidenciando as
diferentes formas de uso da língua que podem surpreender e gerar desconforto em
muitas pessoas.

No entanto, a existência da variação linguística, que se refere às diferentes for-


mas de expressão dentro de um mesmo idioma, tem sido motivo de controvérsia e
preconceito na sociedade. A questão que surge é: por que a variação linguística é
muitas vezes taxada como errada ou inferior?

Essa problemática ganha relevância quando consideramos a existência de uma


norma padrão imposta pela gramática, que estabelece o uso "correto" da língua e é
muitas vezes associada a determinados grupos sociais privilegiados. As variedades
linguísticas utilizadas por grupos marginalizados são frequentemente desvalorizadas
e consideradas erradas, o que resulta em preconceito linguístico e exclusão social.

Diante disso, é fundamental compreender a natureza da variação linguística e


suas implicações sociais. Como a escola e os professores podem desempenhar um
papel relevante na conscientização sobre a diversidade linguística e na promoção de
uma abordagem mais inclusiva? Como podemos superar o preconceito linguístico e
valorizar todas as formas de expressão dentro de um mesmo idioma?

Neste artigo, exploraremos a relação entre língua, linguagem e fala, discutindo


a variação linguística e o preconceito associado a ela na sociedade. Buscaremos com-
preender a importância de uma abordagem mais inclusiva na educação e refletiremos
sobre como superar os estereótipos e valorizar todas as formas de expressão linguís-
tica, reconhecendo que ser diferente não implica estar errado.

Língua, linguagem e fala

Antes mesmo de falar do preconceito existente sobre a variação linguística pre-


sente na sociedade, devemos buscar compreender e entender o fragmento que ba-
seia toda essa discussão: a língua. Ela, por sua vez, refere-se a um conjunto de códi-
gos que são usados por um grupo de pessoas de forma padronizada, ou seja, todo
esse grupo estabelece uma comunicação através desse compilado de códigos. Mas,
mesmo dentro de grupo, cada indivíduo irá ter um uso diferente para esses códigos,
pois o ser humano não é padronizado. É importante frisar que quando falamos em
códigos, estamos falando sobre as letras e os números presentes em todos os tipos
de conjuntos de códigos espalhados pelo globo, pois cada região terá o seu conjunto.
Por exemplo, temos o conjunto de códigos da língua portuguesa, da inglesa, da espa-
nhola e muitos outros de poderiam ser citados. Porém, assim como o comportamento
humano em sociedade deve ser pautado em regras bem estabelecidas, esses
conjuntos de códigos também seguem algumas determinações, isso damos o nome
de gramática, pois é ela que irá estabelecer o uso correto ou errado dos códigos e em
quais situações determinadas códigos devem ser evitados e quais devem ser usados.
Sintetizando, é a língua que faz acontecer a interação social entre as pessoas, como
salienta Saussure (2006):

[...] ela não se confunde com a linguagem; é somente uma parte determinada,
essencial dela, indubitavelmente. É, ao mesmo tempo, um produto social [...]
e um conjunto de convenções necessárias, adotada pelo corpo social. (SAU-
SSURE, 2006, p.15)

Essa conexão entre as pessoas é gerada, de forma prática, pela fala de cada
pessoa, é por ela que os diferentes usos da língua são expostos e que muitas vezes
causam um espanto em muitas pessoas. Já a linguagem, é entendida como a capa-
cidade de comunicação existente entre os seres, seja falada, escrita, gestual etc. Ou
seja, língua é um fruto da linguagem que foi desenvolvido pelos humanos para que
fosse possível existir uma comunicação em que todos pudessem compreender o que
o outro estava querendo dizer. Isso é presente pois cada um tem o seu jeito de se
exprimir, que já vem de todo o contexto de vida em que esse ser está inserido. Cada
definição posta em seu lugar, vamos focar a nossa atenção especificamente na língua
e seu uso prático.

Variação linguística

Como já explicamos, cada indivíduo é particular, ou seja, não existe nenhum


ser humano com o mesmo comportamento do outro. Esse fato acaba permitindo que
muitas diferenças aconteçam na comunicação, por mais que sempre estejamos fa-
lando português, o seu uso é diferente. Então, a variação não é nada mais do que
outras formas de dizer a mesma coisa num mesmo contexto. As formas dependem de
muitos fatores, seja o gênero: de uma forma geral, o homem apresenta uma lingua-
gem diferente da mulher; a região: cada parte pertencente a um todo terá a sua parti-
cularidade, basta observar as diferentes regiões do Brasil; o social: dependendo no
nível de instrução ou financeiro, a forma de se comunicar será diferente, basta olhar
a fala de um caipira e de alguém do meio urbano onde teve oportunidade de completar
os estudos.
Uma pergunta sempre surge quando essa discussão é posta: variação não é
um erro? A resposta é definitivamente não! Como já dissemos, são outras formas e
possiblidades de dizer algo dentro do mesmo contexto. Mas essa resposta não parece
ser completa, pois ela caba gerando outra pergunta: por que a variação é taxada como
errada por algumas pessoas? Isso existe por causa da existência de uma norma pa-
drão que se apresenta como a forma plena de uso da língua portuguesa, e que todos
os falantes devem seguir. Ela não mostra abertura para o “erro” e nem para a lingua-
gem coloquial usada no dia a dia, que não é presa a nenhuma amarra da gramática,
ou seja, lá é possível errar nas conjugações verbais, na regência ou até mesmo na
concordância, pois o que importa é a comunicação e se a mensagem foi passada e
compreendida pelo outro. É claro que essa norma padrão não deve ser abandona e
sair por aí, em qualquer contexto, falar da forma que quiser baseado no fato de ser
variação, ou seja, não existe erro. Abraçar essa ideia é ser conivente com o caos, pois
se não existe erro, não há sentido em estudar. Na verdade, tudo é questão de con-
texto. A variação não é um erro, visto que apresenta lógica e a mensagem é passada,
como afirma Marcos Bagno (2001):

Simplesmente não existe erro em língua. Existem, sim, formas de uso de lín-
guas diferentes daquelas que são impostas pela tradição gramatical. No en-
tanto, essas formas diferentes, quando analisadas com critérios, revelam-se
perfeitamente lógicas e coerentes. (BAGNO, 2001, p.25-26).

Contudo, cada uso deve estar presente em um contexto específico e próprio.


Por exemplo, em conversa na rua, é notória a presença de expressões que, segundo
a norma padrão, estão erradas e devem ser evitas. Mas o que devemos entender é
que para aquele contexto de conversa é válido, pois os interlocutores estão se enten-
dendo. Provavelmente aquele linguajar não se encaixaria em um contexto de entre-
vista de emprego, pois é um momento em que a norma padrão deve ser invocada e
usada do começo ao fim, ou seja, esse contexto mais formal pediu uma linguagem
mais formal.

Preconceito linguístico

Com as diferentes formas de uso da língua, também vêm uma coisa que não é
muito boa: o preconceito, nesse caso, linguístico. Aqueles que fazem uso efetivamente
da norma padrão, seja em qualquer ambiente e contexto, contestam o uso de uma
linguagem mais informal que não se prende à gramática, ou seja, o falante não vai se
importar caso erre a concordância ou a regência, para ele o mais importante é a co-
municação. Sobre essa marginalização contra às variedades linguísticas, Marcos
Bagno (2009) afirma que:

O preconceito linguístico caracteriza-se como um sentimento de reprovação


ou desrespeito às variedades linguísticas utilizadas mais frequentemente pe-
las camadas sociais de menor prestígio, justamente pelo fato de não terem
acesso a uma educação formal de melhor qualidade (BAGNO, 2009).

Essa discussão é presente em todos os eixos da sociedade, porque qualquer


que seja o contexto ou ambiente, sempre haverá comunicação. Mas nada é melhor
do que trazer essa discussão para o ambiente que molda as pessoas, ora na posição
daquele que usa e abusa da variedade linguística, ora daquele que crítica, pois ambos
passaram pelo mesmo caminho: a escola. Essa instituição tem um papel fundamental
nessa discussão e possui as melhores ferramentas para resolver esse problema co-
meçando da base. É nesse ambiente onde a discussão pode ser iniciada para um
público que talvez nem conheça o assunto, ou já praticou e não saiba. Para o papel
de apresentar essas novas ideias, temos a figura do professor, personagem em que
o aluno tem como exemplo de pessoa que NUNCA erra ou não deveria errar quando
for se expressar, principalmente o professor de língua portuguesa.

A escola, apoiada na figura do professor, deve apresentar as variedades pre-


sentes na sociedade, sobretudo na sala de aula, local onde o preconceito com a fala
do outro é muito presente, principalmente no nível fundamental. Essa iniciativa possi-
bilitaria que os alunos desenvolvessem seus conhecimentos dos recursos linguísticos
utilizados nas diversas variedades, permitindo que façam uso da língua com liberdade
e responsabilidade. Para tornar essa iniciativa em um sucesso, é preciso que um tra-
balho profundo e reflexivo seja realizado com os alunos sobre os usos da língua e
sobre os recursos comunicativos presentes na sociedade.

Todo esse trabalhado permitirá que o aluno saia do ambiente escolar com uma
mente mais aberta e mais crítica, compreendendo que ser diferente não significa ser
errado, é só diferente. Percebendo conforme o contexto que uma variedade pode ser
mais propícia do que outra, pois colocada no lugar errado, será criticada e vista como
errada. Na verdade, não só o linguístico, mas qualquer tipo de preconceito, passa
muito pela posição assumido do praticante, pois sendo ele uma pessoa com uma
mente totalmente fechada e que só enxerga que a norma padrão deve estar presente
em qualquer tipo de contexto, não somente pelo fato de tentar se ajustar ao que a
gramática pede, mas pelo simples fato de criticar a forma de comunicação de alguma
determinada pessoa ou um determinado grupo. Portanto, quando olhamos todo o con-
texto social atualmente, percebemos que o exercício de reflexão sobre os usos da
língua deve superar os muros da escola, visto que muitos outros eixos sociais preci-
sam compreender melhor o assunto.

Conclusão

Diante da problemática da variação linguística e do preconceito associado a


ela, é necessário buscar soluções práticas que promovam uma abordagem mais in-
clusiva e valorizem todas as formas de expressão dentro de um mesmo idioma.

Uma solução prática é a conscientização por meio da educação. A escola e os


professores desempenham um papel fundamental na promoção da diversidade lin-
guística e na desconstrução do preconceito. Ao apresentar aos alunos as diferentes
variedades linguísticas presentes na sociedade e explicar que não há uma forma cor-
reta ou incorreta de falar, mas sim formas adequadas a diferentes contextos, é possí-
vel fomentar uma compreensão mais ampla e inclusiva da linguagem.

Além disso, é importante promover a reflexão sobre o uso da língua não apenas
dentro da escola, mas em outros setores da sociedade. Incentivar debates, campa-
nhas de conscientização e ações que valorizem a diversidade linguística podem con-
tribuir para uma maior compreensão e aceitação das diferentes formas de expressão.

É fundamental que os alunos compreendam que ser diferente não significa es-
tar errado, e que a escolha da linguagem depende do contexto. Através desse trabalho
reflexivo, é possível combater o preconceito linguístico e criar um ambiente mais in-
clusivo e respeitoso, onde todas as formas de expressão sejam valorizadas.

Em suma, a solução prática para lidar com a problemática da variação linguís-


tica e do preconceito associado a ela passa pela conscientização, educação e promo-
ção da diversidade linguística. Somente através de uma abordagem mais inclusiva e
reflexiva será possível superar estereótipos, valorizar todas as formas de expressão
e alcançar uma compreensão mais ampla do tema, contribuindo para uma sociedade
mais justa e igualitária em relação à linguagem.

Referências

SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 2006.


CHAVES, J. H; COSTA, M. da G. Variação linguística e ensino: caderno do profes-
sor. Belo Horizonte: Ceale, 2006.

BRAGA, Luciana Souto e. Preconceito linguístico na sala de aula: investigando


suas ocorrências e trabalhando por sua eliminação. 2021. Monografia (título de es-
pecialista) - Curso de Especialização em Gramática e Ensino: Tradição Gramatical e
Abordagens Contemporâneas da Faculdade de Letras da UFMG, Belo Horizonte,
2021.

BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 52. ed. São Paulo:
Loyola, 2009.

BAGNO, Marcos; STUBBS, Michael; GAGNÉ, Gilles. Língua materna: letramento,


variação e ensino. São Paulo: Parábola, 2002.

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