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CONCEPÇÕES DE GRAMÁTICA

Programa de Pós-graduação em Linguística Aplicada


UNITAU
Disciplina: Teorias Linguísticas
Profa. Dra. Maria Aparecida Garcia Lopes Rossi
Gramática: concepções e ensino
1 Apresentação do tema:
 Ensino de gramática em discussão a partir dos anos
80
 Utilidade desse ensino foi questionada pela forma

como ele era realizado


 Os PCN e autores que estudam modernamente esse

assunto assumem que a gramática tem seu lugar no


ensino de Língua Portuguesa
Prática de análise linguística

 É o termo usado pelos PCN em substituição


ao “ensino de gramática”

 Não é uma nova denominação para uma


velha prática; o termo reflete uma
mudança de concepção de ensino
Que papel tem a gramática no
desempenho linguístico?
 Citando Neves (2002, p. 225): “A boa
constituição dos textos passa pela gramática, e
não apenas porque as frases que compõem o
texto têm uma estrutura gramatical: na
produção linguística, com certeza, desemboca
todo o domínio que o falante tenha dos
processos de mapeamento conceptual e
amarramento textual, altamente dependentes
de uma ‘gramática’ organizatória.”
Continuando a partir de Neves (2002, p.
226):
“[...] daí a necessidade de, no nível fundamental e
médio, não se restringir o estudo sobre o
funcionamento dos diversos itens ao seu
funcionamento no nível oracional. [...] Basta lembrar
que saber expressar-se na língua não é
simplesmente dominar o modo de estruturação de
suas frases, mas é saber combinar essas unidades
sintáticas em peças comunicativas eficientes, o que
envolve a capacidade de adequar os enunciados às
situações [...]”
Conceitos de gramática
 Conjunto de regras a serem seguidas –
gramática normativa (prescritiva,
tradicional)
 Conjunto de regras que o falante da língua
domina – gramática internalizada
 Conjunto de regras que são usadas nos
diversos contextos sociais (variantes
linguísticas) – gramática descritiva
Gramática internalizada
 Conjunto de regras que o falante nativo da língua domina sem
necessidade de estudo formal sobre a língua. Conhecimento
que todo falante nativo de uma língua tem, mesmo que seja
analfabeto, sobre o que pertence ou não pertence à sua
língua. Os falantes nativos, inclusive as crianças pequenas, são
capazes de produzir frases e de interpretá-las sem qualquer
conhecimento formal de gramática normativa ou descritiva.
 Formulação teórica a partir da teoria da Gramática Universal
de Chomsky.
Gramática normativa e norma padrão
 Prescritiva, tradicional
 Normas sobre o “bom” uso da língua
 Estabelecida a partir de modelos de língua
escrita de clássicos da literatura
 Determina o “certo” X o “errado”
 Dominada por uma parcela da população que
ocupa posições de prestígio na sociedade, que
tem acesso à educação formal
A língua portuguesa
Norma padrão e norma culta
 norma padrão é o conjunto de regras impostas pela
gramática normativa, que tende a ser homogênea e
consensual, embora possa haver alguma divergência
entre os gramáticos.

 norma culta é o conjunto das práticas linguísticas e dos


modelos de uso encontrados em textos formais, que pode
variar de autor para autor e nem sempre encontra
respaldo na gramática normativa, embora seja bem aceita
entre os falantes escolarizados.
Dominar a norma padrão

 Não depende apenas de conhecimento de regras


gramaticais, mas de vocabulário e de competência
comunicativa amplos.
 É condição necessária para a conquista de melhores
oportunidades de empregos, aprovações em
concursos, relacionamentos sociais
 A “língua do povo” ou a “fala popular” não
corresponde, em grande parte, à norma padrão.
De onde vem a norma padrão?
Quem a determina?

Vejamos o que explica:

STAUB, A. Perguntas e afirmações que devem ser


analisadas. In: KIRST, M.; CLEMENTE, E. (Org.).
Lingüistica Aplicada ao Ensino de Português. Porto
Alegre: Mercado Aberto, 1987. p. 18-31.
Em 1987:
 Desentendimentos e mal entendidos sobre
fala e escrita; correção e erro; norma e
variações linguísticas
 Pouca compreensão sobre o conceito de
aceitabilidade
Aceitação ou rejeição linguística
 Não depende do mérito intrínseco da forma
linguística
 Não é determinada pela razão ou a lógica
 Depende de uma atitude emocional em
relação à forma
 O “correto” corresponde às formas aceitas
pela classe dominante da sociedade, não
apenas no Brasil
Um pouco de história
 Na Idade Média, as unidades políticas eram os
ducados, as províncias, as cidades-estado
 Os dialetos dessas unidades políticas
apresentavam maior unidade linguística
 Surgiram países e reinos unificados, sendo o
dialeto da região que liderou a unificação o
mais prestigiado
De onde vem o italiano padrão?
 A partir do séc. XIV, da língua usada pelos
escritores Dante, Petrarca e Bocaccio
 Eram da região de Florença (dialeto
florentino)
De onde vem o Espanhol padrão?
 O castelhano, o aragonês, o lionês, o galego, o
catalão eram os dialetos principais da Península
Ibérica da idade média
 O reino de Castela conquistou a supremacia política
em relação aos outros reinos especialmente pela
luta contra os árabes que dominavam parte da
Península
 O castelhano ganhou a posição de língua nacional
E o francês? E o inglês?
 Por razões políticas, econômicas e
culturais, o frâncico (da região onde hoje é
Paris) tornou-se a base do francês; o
dialeto de Londres, do inglês
E o português padrão?
 A região onde hoje é Portugal pertencia ao
reino de Leão e Castela e o que se falava
naquela região era um dialeto
 Com a independência do Condado
Portucalense (em 1143) o falar daquela
região passou a ganhar importância e a se
distinguir do galego (os textos dessa época
são em galaico-português)
E o alemão padrão?
 Diante de uma miscelânea de dialetos falados na
região onde hoje é a Alemanha, Lutero escolheu o
falar dos príncipes e reis para traduzir a Bíblia (até
então só escrita em latim)
 A Bíblia de Lutero tornou-se a base da língua
impressa e escrita do norte da Alemanha e,
posteriormente, a base do alemão padrão
O surgimento da língua padrão
 Não depende de características intrínsecas
de um dialeto
 Depende de uma apreciação social positiva
de algum dialeto, por razões políticas,
econômicas, culturais
 Os falantes de outros dialetos menos
prestigiados passam a usar o dialeto de
prestígio
Por que o “certo” X o “errado”?
 Herança de um período pós renascimento –
racionalismo – em que se buscavam regras
para as formas linguísticas inspiradas no latim
 Surgiram em vários lugares academias de
línguas, dicionários, gramáticas normativas
Alguns exemplos:
 Em 1546, na Itália, Academia della Crusca para
purificar, estabelecer e fixar a língua italiana
 Em 1635, na França, Academie Française;
Grammaire Genérale et Raisonée
 Em 1713, na Espanha, Real Academia Española
 Séc. XVIII, na Inglaterra, dicionário e gramática
Desejo de uma língua pura e estável
 Dominou a mentalidade de habitantes de
várias partes do mundo
 Outro exemplo é o livro de regras
gramaticais do árabe, elaborado a partir da
língua do Corão, livro sagrado tido como
exemplo de correção e estilo. Nesse caso,
prevaleceu o poder religioso.
De onde vêm as nossas gramáticas?
 A partir do séc. XV, gramáticos europeus
tentaram descrever as línguas vernáculas de
acordo com padrões do latim
 Daí surgiram muitas dificuldades
Defeitos das gramáticas tradicionais, de
acordo com Staub (1987, p. 23):
 Falta de pesquisa, cópias umas das outras
 Base na modalidade literária da língua
 Definições imprecisas ou falhas
 Tópicos inúteis
 Capítulos que não têm a ver com gramática
 Falta de consideração sobre o uso da língua;
desconsideração de dados concretos
Os escritores são autoridades absolutas
em questões de linguagem ?

 Não
 São de épocas diferentes
 O uso artístico da linguagem permite o uso
de inúmeras variedades linguísticas
Norma padrão
 Descrita nas gramáticas normativas
 Associada aos conceitos de correção,
beleza, prestígio social
 Regida por regras já bem descritas
Norma não padrão
 Representa as muitas variações populares
 Pouco prestígio social
 Pouco pesquisada
 Reflete muito rapidamente as mudanças e
inovações linguísticas, típicas de qualquer
língua viva
A ampliação do ensino público
 A partir dos anos 60, trouxe para a escola
uma camada da população falante de
variantes populares muito diferentes da
norma padrão
 Houve um choque cultural e linguístico
 A escola era um agente elitizador; hoje
espera-se que seja um agente socializador
A NORMA PADRÃO DEVE SER ENSINADA

 Não há dúvida sobre isso


 Há muitos argumentos em favor

disso
Para ensinar a norma padrão, é
preciso:
 Conhecer a situação linguística dos alunos
 Entender os fatos linguísticos de uma
perspectiva sociolinguística

(fim dos comentários a respeito do texto de Staub, 1987)


Gramática descritiva
 Vem de uma perspectiva sociolinguística
 Conjunto de regras que são seguidas pelos falantes, em
situações formais e informais. Uma gramática descritiva
considera todos os dados da língua, todas as formas
possíveis no uso da língua por todas as classes sociais. Ela
não está preocupada em apontar erros ou determinar as
melhores formas a serem usadas. Seu objetivo é constatar
e descrever o que é possível na língua.
Gramática descritiva
 Considera as variações linguísticas existentes
 Procura entender suas regras, sua gramática,
sua lógica
 Procura entender o funcionamento das
formas populares na dinâmica social:
motivação, apreciação, situações de uso
É preciso agora
 Entender os fundamentos dos estudos
sociolinguísticos para trabalhar melhor com
os três conceitos de gramática no ensino de
línguas.

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