Representações do século XX: o espaço da cidade, o tempo histórico e os acontecimentos políticos Em 1936, assiste-se a uma Europa politicamente conturbada entre as ditaduras de índole fascista e os movimentos de esquerda que tentavam triunfar. Foi o que aconteceu em França e em Espanha. Neste último caso, a eleição de um governo republicano democrático de esquerda, em coligação com o Partido Socialista (e com aliança com comunistas e anarquis- tas), conduziu a um golpe de Estado levado a cabo pelas forças nacionalistas (falangistas) e encabeçado pelo general Franco, culminando numa sangrenta guerra civil. A Alemanha e a Itália afirmavam-se, em contrapartida, como grandes potências económicas e tentavam alargar o seu domínio territorial: ocupando a Renânia (no caso alemão) e anexando a Etiópia (no caso italiano). A tudo isto assistia indiferente a Sociedade das Nações, e a Inglaterra, que, ao mesmo tempo que se escusava a tomar uma posição sancionatória em relação à Alemanha e à Itália, reivindicava a redistribuição de colónias portuguesas.
Em Portugal, vivia-se um regime ditatorial, liderado por Salazar,
fortemente enraizado através de uma intensa propaganda política, que pretendia fomentar a ideia da prosperidade e da grandeza do império, da conivência da Igreja, assente na visão de Salazar como o salvador da moralidade cristã, e da criação de movimentos, como o da Mocidade Portuguesa, que desde cedo incutiam na população os valores e a ideologia do regime. A censura, a repres- são policial, a tortura ou a prisão eram as armas usadas contra quem se opunha à ordem vigente, tendo sido para o efeito criada a Polícia de Vigilância e Defesa do Estado. De uma forma geral, o povo vivia na miséria e o país estava mergulhado num estado de estagnação. É para estas realidades que o narrador, velada e indiretamente, pretende chamar a aten- ção. A cidade de Lisboa, palco da ação, apresenta-se como um labirinto, monótona, pobre, sombria, silenciosa, chuvosa, de águas turvas, metáforas que contribuem para evidenciar a opressão e a repressão exercidas pelo regime sobre o povo. Desta forma se percebe a afirmação final: a terra aguarda pela mudança.
Deambulação geográfica e viagem literária
Ao fim de dezasseis anos, Ricardo Reis regressa à pátria e revisita a cidade de Lisboa, constatando que pouco mudou – sinal da estagnação do país. No entanto, o percurso pelas ruas (desde a rua do Comércio ao Terreiro do Paço, do Chiado à praça da Figueira ou da rua do Alecrim ao Alto de Santa Catarina) permite deambulações de natureza literária. Assiste- se, assim, a pretexto do que Reis vai observando e captando da realidade, à evocação de diversos textos, entre os quais a Bíblia, e de autores como Fernando Pessoa, Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos, Camões, Eça de Queirós, Cesário Verde, Almeida Garrett, Jorge Luís Borges, Dante, Cervantes ou Virgílio.
Representações do amor
Intertextualidade: José Saramago, leitor de Camões, Cesário
Verde e Fernando Pessoa Linguagem, estilo e estrutura REPRODUÇÃO DO DISCURSO NO DISCURSO