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- que futuro?
Maria Joào Estorninho*
Para poder tomar partido nesta questão, vale a pena analisar a evo
lução do Direito Comunitário em matéria de concessões e, muito em
especial, de concessões de serviço público475.
Tem-se dito que, pelo menos aparentemente, existe uma tradicional
«indiferença comunitária»6 em relação às concessões de serviço
desse regime ao recurso de actos dirigidos à celebração de quaisquer outros contratos,
dcsignadamente os contratos de concessão de obras públicas. V., por exemplo, os
Acórdãos de 6/4/2000 (proc. n°45 987) e de 19/2/2003 (proc. n°48 104). V. MARIA
JOÃO ESTORNINHO. A Propósito do Decreto-Lei n°134/98, de 15 de Maio, e das
Alterações Introduzidas ao Regime de Contencioso dos Contratos da Administração
Pública, in Cadernos de Justiça Administrativa, CEJUR, n°l 1, 1998. pp.3 e ss.; BER
NARDO AYALA. A Tutela Contenciosa dos Particulares em Procedimentos de
Formação de Contratos da Administração Pública: Reflexões sobre o Decreto-Lei
n°134/98, de 15 de Maio, in Cadernos de Justiça Administrativa, CEJUR, n°14, 1999,
pp.3 e ss.: ALEXANDRA LEITÃO, A Protecção Judicial dos Terceiros nos Contratos
da Administração Pública, Almedina, Coimbra, 2002. pp.311 e ss. e PEDRO GON
ÇALVES, Contencioso administrativo pré-contratual, in Cadernos de Justiça
Administrativa. n°44, 2004, pp.3 e ss..
4 V. FAUSTO DE QUADROS, Serviço Público e Direito Comunitário, in Estudos
em Homenagem ao Professor Doutor Manuel Gomes da Silva, Ed. FDL, Coimbra
Editora, 2001, pp.641 e ss.; SANTIAGO GONZÁLEZ-VARAS IBÁNEZ, El Derecho
Administrativo Europeu, 2"ed., Instituto Andaluz de Administración Pública, Sevilla,
2002, pp. 105 e ss..
5 A este propósito, vale a pena lembrar, de forma sucinta, alguns traços do regime
legal das concessões de serviços públicos, em Portugal. O Código do Procedimento
Administrativo qualifica, no Artigo 178°, a concessão de serviço público como contrato
administrativo e, assim, sujeita, como regra geral, a celebração de tais contratos à reali
zação de concurso público (nos termos do Artigo 183°. o qual, no entanto, admite previ
são em contrário, o que explica a proliferação de casos de concessões de serviço público
realizadas mediante ajuste directo). Por outro lado, as concessões de serviço público
estão sujeitas ao contencioso administrativo. No que toca às concessões municipais, nos
termos do Artigo 53°, n°2, al.q). da Lei n°l 69/99, de 18 de Setembro (Lei das competên
cias e regime de funcionamento dos órgãos dos Municípios e das Freguesias), compete
à Assembleia Municipal, sob proposta da Câmara Municipal, «Autorizar, nos termos da
lei. a câmara municipal, a concessionar, por concurso público, a exploração de obras e
serviços públicos, fixando as respectivas condições gerais». V. PEDRO GONÇALVES,
A Concessão de Serviços Públicos, Almedina, Coimbra, 1999, max.pp.203 e ss..,
RAQUEL CARVALHO. As concessionárias dos sistemas multimunicipais, separata de
Direito e Justiça. vol.XI, 1997. pp.221 e ss., max. pp.235 e ss.; PEDRO GONÇALVES
e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA. As Concessões Municipais de Distribuição de
Electricidade. Coimbra Editora, Coimbra, 2001, max. pp.37 e ss..
6 RUI MEDEIROS, A Contratação Pública nos Sectores com Regime Especial -
Água, Energia, Transportes e Telecomunicações, in La contratación pública en el hori
zonte de la integración europea, V Congreso Luso-Hispano de profesores de Derecho
Administrativo, INAP. Madrid, 2004, pp. 137 e ss., p. 152.
I
CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS - QUE FUTURO? 25
finance and operate). Estas novas realidades colocam questões muito interessantes a
propósito da aplicabilidade das normas comunitárias cm matéria de procedimentos pré-
contratuais. obrigando a procurar soluções que, admitindo alguma flexibilidade relati
vamente às exigências tradicionais das Directivas Comunitárias, ainda assim obriguem
à adopção de esquemas de adjudicação que garantam a transparência e concorrência.
Neste sentido, v. BERNARDO AYALA, O Método de Escolha do Co-Contratante...,
cit., p.19, onde dá exemplos de alguns critérios de adjudicação vulgarmente adoptados
nestes esquemas de PFI, cuja compatibilidade com as Directivas Comunitárias é discu
tível: «perspectiva de boas relações de colaboração do co-contratante privado com a
entidade pública e com os utentes do serviço»; «capacidade de apreensão e compreen
são dos assuntos envolvidos»; «empenho de membros seniores do co-contratante pri
vado na execução do contraio».
27 BERNARDO AYALA, O Método de Escolha do Co-Contratante..., cit.. p.22,
onde pondera a possibilidade de se avançar para um sistema comunitário de contrata
ção pública totalmente flexível e baseado apenas em princípios, acabando por concluir
pela negativa, reconhecendo que os próprios Estados membros não estariam prepara
dos, tal sistema geraria mais incertezas, diminuição do controlo jurisdicional e seria
inadequado às regras de comércio internacional na matéria.
28 In Jornal Oficial da União Europeia de 30/4/2004, n°L 134/114.
32 DIREITO E JUSTIÇA
33 ARNAUD CABANES. Livre vert sur les PPP: une “couche" supplémentaire au
tnillefeuille des contrais publics. in Contrais Publics - Pacrualité de la comniande et
des contrais publics. n°34. Junho de 2004. Lc Monileur. Paris, pp.68 e ss„ pp.72 e 73,
onde afirma que o referido Livro Verde deixou «perplexos» os juristas franceses. Na
verdade, é preciso não esquecer que houve duas reformas do Code des Marches
Publics no espaço de 3 anos. Em simultâneo, vários têm sido os diplomas prevendo
esquemas de PPP: Lai d’orientation et de programtnation pour la sécurité intérieure
n°2202-1094. de 29 Agosto 2002. Loi d 'orientalion et de prograntmation pour la jus
tice. de 9 de Setembro de 2002, Ordonnance du 4 Septetnbre 2003 portam sitnplifica-
tton de Porganisation et du fonctionnetnent du systènte de samé. Décret n"2004-!8 de
6 Janvier 2004 pris pour Popplication de l'article L.34-3-1 du Code du dotnaine de
1’Étal. CABANES. ob.cit., p.68, alerta para os riscos inerentes a esta sobreposição de
regras a nível comunitário c nacional, acrescentando «camadas suplementares ao mil-
folhas dos contratos públicos», tanto mais que, para além do facto de a terminologia
ser. por vezes, idêntica, apesar de os significados serem diferentes, haver ainda casos
de soluções verdadeiramente contraditórias (por exemplo, a referida legislação francesa
parece apontar para a criação de uma nova categoria contratual, com regime jurídico
específico, distinta das concessões e das delegações de serviço público e também dis
tinta dos PPP. ao passo que o Livro Verde engloba as concessões nos PPP e sujeita os
PPP contratuais ao regime dos contratos públicos, quando a tal legislação francesa
parece abrir as portas a procedimentos simplificados).
34 DIREITO E JUSTIÇA