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fretet =f reel saa tlw asl ll tl) Ss OCIOL OGIA ' PARA JOVENS DO SECULO Xx Luiz Fernandes.de Oliveira @ Ricardo Cesar Rocha da Costa MANUAL DO PROFESSOR SOCIOLOGIA ENSINO MEDIO: Antes de conversarmos sobre o titulo ‘Vejas6 como historia parece complicada. acima, precisamos verificar 0 que cada um de . “direitos”... c, ainda por cima, “‘civis e politicos” ‘nés entende quando se fala em cidadania. e relacionadas a0 “Estado”. Consultando a maioria dos dicionédrios, Para que possamos entender tudo isso, a palavra cidadania aparece definida como _ precisamos primeiro perceber como essas qualidade de cidadio, Cidadia? Pois ¢, esta ideias foram sendo construidas através da palavra, com certeza, vocé jé ouviu alguém Historia e como elas chegaram para nds no falar... Qual € mesmo o seu significado? mundo de hoje. Cidadio = aguele que esté no gozo dos direitos etvis e politicos de um Estado. ihares bso catlar laren nos Tages 0 sustnio Seroles cdadios? ave his cisiaelervie { responsabilizam pela coletividade, tendo 0 po- der de atribuir ¢ distribuir os postos ligados a adania tem uma “pré-histéria”. Na! fungées piblicas, envolvendo, por exemplo, a Grécia Antiga, “cidade” era o nome dado ao = justiga ¢ a politica. Portanto, os cidadios é que membro da “cidade”. Os cidadios gregos se: ‘cuidavam da administrago da cidade-estado Unidede 2 Tb Fla e Sociedade ‘grega, a pdlis. Dai é que vem o termo “politi- ca”, que significava exatamente essa intengio de se cuidar bem da pélis, da cidade. ‘Nao estamos aqui preocupados em discutir exatamente como era o funcionamento de uma cidade-estado grega ou de outros povos da Antiguidade. Inclusive porque essa ideia de “eidade-estado” difere em muito do que vém a ser as nossas cidades contemporéneas. Queremos ressaltar a origem dessas palayras, utilizadas até hoje, Mas quando falamos em “pré-histéria” da cidadania, existe um motivo para isso. Como chamamos a atengdo, 0 cidadio é aquele que possui ¢ goza de determinados direitos. Ter diteitos significa ter a capacidade ¢ a autonomia para usufruir determinados beneficios Iegais garantidos pelo Estado aos seus habitantes. Exemplos? Ser possuidor de documentos, tais como certidéo de naseimento, carteira de identidade, titulo de eleitor, carteira de motorista ete. Poder ter acesso a esses documentos sio direitos civis de cada pessoa. Civis € derivado do latim civitas, que também significa cidadao, ou o habitante da cidade. A certidao de nascimento é um direito adquirido logo ao nascer; jf a carteira de identidade, s6 posteriormente. A carteira de motorista, porém, Capitulo 18 de papel pra vale” Cage elos no updo no ral eonarpon somente pode ser obtida aos dezoito anos. & nesta idade que o individuo comeca a adquirir ‘© que chamamos de eidadania plena, ou seja, a capacidade legal de responder pelos seus proprios atos diante das autoridades pitblicas, Voltando ao que comentamos antes; na Grécia Antiga, poucos cram os individuos que tinham acesso a uma cidadania plena. Na verdade, somente aqueles que eram homens grogos, adultos e proprietdrios de tertas é que detinham o poder de decidir sobre os rumos da cidade. Estavam excluidos da cidadania grega as mulheres, os jovens, os pobres, os estrangeiros — ¢, claro, os escravos. Essa “cidadania restrita” também cra caracteristica dos primérdios da Roma Antiga, onde somente aqueles que eram considerados nobres — os patricios ~ acumulavam direitos, tais como a propriedade da terra e 0 usuftuto do poder politico. J4 os nao nobses ~ os plebeus provocaram diversas revoltas contra 0 poder constituido, para que tivessem acesso a alguns direitos. O que até conseguiram, mas sempre de maneira restrita (aqui voc€ pode recordar das suas aulas de Histéria...), Mas 86 0 fato dos plebeus terem conseguido 0 acesso a alguns direitos ja fz de Roma uma sociedade mais aberta do que a aristocratica Grécia Ser cidadio na Roma ‘Aga ora. uma siuergo moto cfereie compara ‘oma congo doco ro Bras atu? Na foo, as ruins 6o Forum Romano (ue era ur dos cents las da cidade Por falar em Historia, imagine-se viajando numa méquina do tempo! Vocé pode “visitar” diversos momentos da Historia da humanidade € tentar perceber como vivem aqueles que detém 0 poder politico, econémico ¢ religioso, em comparago com a maioria da populagao. Dé para entender, entio, quando falamos em direitos, ndo & ‘Vamos cstacionar a “nossa maquina do tempo” na Franca de 1789. A Revoligao que entio ocorreu foi um marco para a historia dos direitos e da cidadania. A Constituiga elaborada pelos revolucionérios, era intitulada Dectaragdio Universal dos Direitos do Homem e do Cidadao. Dizia, entre outras coisas, que todos nascem livres que todos sdo iguais perante a lei. Era a formagio de uma nova sociedade, em oposi¢ao ao “Antigo Regime”, ‘no qual nfo existiam “direitos”, mas somente 08 privilégios da nobreza ¢ do Clero, Muito bem! Que maravilha! A humanidade estava encontrando o seu caminho de tiberdade, igualdade e fraternidade—exatamente 0 lema da Revolugao Francesa. 0, i i : i i 3 i ‘A Revlugo Frenossa musu defntiament a concapgéo sobre 0s dete himatos na Euepa Tela de Eugene Dacre (1798-186) ‘A Uberdado guna 0 ovo (1830), O que é que nfo estava sendo dito, infeliz- mente? Que a Revolugdo nao era de todos, mas sim que se tratava de uma “revolugao burgue- sa”, na qual uma classe social em ascenséo, ja economicamente muito poderosa, comerava a adquirir também o poder politico, pasando a govemnar a Nagio francesa e, em consequén- cia, ter mais direitos do que 0 restante do povo trabalhador... Ndo é & toa que um dos mais im- portantes direitos do homem e do cidadao era 0 direito a propriedaie ~ que, € claro, poucos detinham. A histéria das etgpas da Revolugdo Francesa mostra 0 quanto a luta pelos direitos dos individuos foi uma luta que custou muitas vidas e onde correu muito sangue. Na maior parte do tempo, a alta burguesia fez valer a sua forga e exerceu o poder com mios de ferro, Um exemplo era. direito de eleger os governantes da Nago, em substituiglo & realeza: foi um direito universal praticado por muito pouco tempo, no periodo do Governo Jacobino ~ quase sempre, durante a Revoluglo, 0 voto era censitirio, ou seja, um direito de quem tinha determinada renda ¢ propriedades. De qualquer forma, a Revolugo Francesa, assim como aqueles que ocorteram antes, as revolugdes inglesas, no século XVII, e a americana, também no século XVII, forneceram os alicerces da cidadania das sociedades contemporineas. Ideias tais como 0 respeito aos direitos dos individuos, de liberdade e de igualdade entre todos puderam ser perseguidas com maior profundidade a partir dessas experiéncias coneretas desenvolvidas pelo homem. Essas revoluedes. foram verdadeiros “laboratérios” para as prineipais —ideias defendidas por pensadores de renome como Locke, Rousseau, Montesquieu e Tocqueville. AS obras destes filésofos serviram de referéncia para aquele momento da Historia e até hoje fornecem a base para as ideias que regem a sociedade em que vivemos. O grande obsticulo a uma igualdade de fato, como veremos seguir, foi o conjunto de interesses distintos e condlitantes existente entre os seres humanos, a partir da sua posigdo social na organizagao da sociedade capitalista ~ a forma de organizagio social e econémica que foi vitoriosa a partir das revolugdes citadas anteriormente, reitos civis, politicos e sociais Alguns pensadores entendem a historia a sociedade capitalista como uma historia marcada por uma evolugiio dos direitos do homem, de cardter imeversivel. Dentre esses autores, o mais citado nesse sentido tem sido 0 inglés T. H. Marshall Marshall estuda a formagio do Estado de Bem-estar Social — 0 Welfare State -, consi- derado, durante parte do século XX, como um ‘exemplo de que 0 capitalism —e niio 0 socia- lismo — era o sistema econdmico, politico ¢ so- cial ideal, o Unico capaz de garantir verdadeira- mente a prosperidade e uma vida segura, livre ¢ igualitéria para todos os seus cidadios. Real- mente, entre o fim da Segunda Guerra Mundial € 0 inicio de 1970, os paises capitalistas mais avangados, chamados de “Primeiro Mundo”, conheceram niveis de progresso ¢ de riqueza nunca vistos antes. E 0 Estado era 0 principal responsdvel em prover a subsisténcia digna dos seus cidadaos, garantindo para todos educagio ¢ satide pliblicas de qualidade, saneamento, transporte, rede de energia elétrica e, depois de tudo, uma aposentadoria tranquila. Esse Esta- do Providéncia, portanto, tinha como objetivo a garantia de pleno emprego, altos saldrios e acesso a direitos para todos os individuos. Ao lado dessas politicas sociais de cardter geral ¢ universalizantes, havia também a preocupagao politica no sentido de que a populagio acom- panhasse de alguma forma a gestéo piblica, através do aprofundamento da democraci ‘como regime de governo, com partidos politi- cos representativos, inclusive organizados por trabalhadores vinculados a sindieatos ~ como se apresentavam os partidos identificados com o Estado de Bem-estar, defensores da social de- mocracia e do trabalhismo. Assistiu-se também explosio de manifestagées culturais de massa, nas artes © na literatura, com a expansdo das transmissbes deridioe da TV, com destaques para a indastria do cinema © para a misica, principalmente © rock. Seu simbolo méximo como sinal de prosperidade e sucesso individual era 0 automével. Capo 18-"E do pape oud ra vale” Cidadani Mas 0 Estado de Bem-estar Social durou ‘apenas cerca de trinta anos! Por este motivo, estes foram chamados depois de os “Trinta ‘Anos Gloriosos” do capitalismo. TODO BRASILEIRO TEA DREITOAMORADA.. AGORA LE ARUELE Pois bem: Marshall apresentava esse Estado como uma consequéncia natural do rogresso capitalista, Um progresso que teria acontecido aos poucos na Histétia, a partir da evolugao da organizaglo das sociedades que realizaram a Revolucdo Industrial Tomando a Inglaterra como modelo, ‘Marshall (1967) procurou mostrar que, desde século XVIII, teria acontecido uma “ampliagSo progressiva” da cidadania, Primeiro, no século XVIIL, teriam se constituide os direitos civis, relacionados a liberdade individual e as relagdes de trabalho. Depois, no século XIX, a cidadania passou a compreender os direitos politicos, ou seja, os trabalhadores passaram a toro direito de participar no exercicio do poder politico, Por fim, jf no século XX, 0 Estado de Bem-estar inglés significou a conquista dos direitos sociais, com os quais todos passaram ater acesso A distribuigio da riqueza produzida no pais, através da elaboragao de politicas sociais universais cieos ne und ee Brest onteroo en Neste século XXI alguns teéricos do Direito emtendem que a classificago citada acima, elaborada por Marshall na. década de 1960 do século passado, ndo atenderia mais as necessidades dos cidadios em relagio as suas demandas por direitos humanos. Assim, seguronca e & propriedade. de manipulagio genético Pelo que foi exposto, em fungio dessas definigées, podemos coneluir que a Teoria das Geragdes dos Direitos Fundamentais trata- se de um debate em aberto, ainda em curso neste século. Deixamos aqui este resumo, de qualquer forma, para que voce comece a pensar um pouco a respeito desse tema ‘Vamos voltar um pouco & Revolugéo Fran- Unidad 2 Taba, Pte Soca defendem ume nova classificago, que ordenaria os direitos em cinco geragbes diferentes. Esta novaclassificagio foi denominadacomoa Teoria das Geragées dos Dircitos Fundamentais. Essas geragdes corresponderiam aos direitos apontados a seguir, Direitos de primeira geracao: seriam aqueles relacionados as Iutas histéricas da humonidade, corespondendo, como resultado, cos direitos civis e politicos. Os teéricos liberais defendem que e808 direitos sG0 relacionados @ liberdade do individuo, citando como exemplos os direitos & vido, & Diretos de segunda geragéo: corresponderiam aos direitos sociais ¢ coletivos, relacionados & defesa da iqualdade e vinculodos diretomente ao periodo histérico de surgimento do Estado de Bem- estar Sociol, Podemos citar como exemplos os direitos & educacio, a saide e 20 trabalho. Ditetos de terceira geracGo: seriam aqueles direitos voltados para a humanidade como um todo. Um bom exemplo € a defesa do meio ambiente, pois sua degradacéo afetc o ploneta inteiro. Fodem ser incluidas também come direitos de terceira geragSo as leis de protagio de criangas e adolescentes € de preservogio de tudo que pode ser considerado como patriménio hisiérico cultural da humanidade —mesmo que pertencom & hisléria de determinade povo ou nacio especfica Folo-se também em direitos de quarta e de quinta geracées. Estes, no entanto, soo mais polémicos ce carecem de definigdes mais precisos por parte dos teéricos voltados para esse tema. Enire os de quarto gerog6o, por exemplo, s60 arrolados 08 direitos & informacdo e & democracia. Outros relacionam o {quarto geragio de direitos com os questées élicas que envolver, por exemplo, a uflizacéo de técnicas Por fim, 08 direitos de quinta geracéo seriam aqueles voltades para a realidade “virtual”, sendo ligedos oo avanco tecnolégico proporcionado pela informitica e pela cibernética e as questbes éticas enwolvides com 0 circulacéo de informacées e imagens nos redes sociais. Nesse sentido, enquanto direito, por exempla, nenhum individve poderia sofrer exposigio péblica da sua imagem sem a sua prévia autorizagio expresso. Trato-se de um direto individual, porianio—e of alvez estejamos retornando a definigtio da primeira geracSo, apontada acima, Por outro lado, em um campo totalmente oposio, o juriste Paulo Bonavides, de grande reconhecimento na érea do Direito, defende como sendo de quinta geracio “o direito da humanidade & poz” — neste caso, ele esté propondo o redefinicao de um direito que, nessa classficagio, & considerado como de tercsira geracao. (ct BONAMIDES, 2008) cesa. Babeuf (1760-1797), um dos revolucio- ndrios, liderou a proposta de uma nova revo- lugdo durante 0 proceso iniciado em 1789. Como ela foi delatada, Babeuf foi guilhoti- nado. Chamada de Conspiracio dos Iguais, cle previa a extingdo do direito a propriedade privada da terra; mais do que isso, 0 direito a propriedade teria que ser sempre limitado pelo interesse de toda a sociedade. Parecia socialis- mo, no é mesmo? Karl Marx e Friedrich Engels, os principais, teéricos do socialismo cientifico, mostraram, em diversos trabalhos, que capitalismo era ‘um sistema baseado numa injustiga estrutural, Ja que ele era movido por uma brutal exploragao da mao de obra dos trabalhadores. Assim, portanto, uma verdadeira cidadania somente seria possivel se 0 proletariado superasse 0 capitalismo, através da revolugdo socialista Mais adiante, no comunismo, o pleno exercicio da cidadania seria estendido a todos os seres humanos. A experiéncia socialista, levada a cabo no século XX, a partirda Revolugaio Russa de 1917, nao deu certo, Mas o socialismo seri, sempre, apenas uma utopia, um desejo inalcangavel?! ‘Uma coisa fica evidente: a Historia mostrou que 6 capitalismo, de fato, nunca tera como garantir direitos plenos de cidadanic. Mas na década de 1960 — durante, portanto, 0 “periodo glorioso” do capitalismo ~a aspiragdo a cidadania plena foi o motor de diversos movimentos socialistas ¢ libertirios, quepassaram acxigir dos governantes igualdade de direitos para as mulheres, para os jovens & para as “minorias”, como eram chamados os homossextiais, os negros e indigenas nos BUA. Maio de 1968 foi a data-simbolo de exploséo desses movimentos, marcados pela liberagdo sexual ¢ pelo consumo de drogas, embalados pelo som dos Beatles, Rolling Stones, Yardbirds, Beach Boys e outros. Ea = io de 1968 os jovensteniaram mudaro mundo. Em Pai, ‘estudnis langam podras na psi Reafirmamos que o capitalismo ¢ estrutu- -ralmente um sistema baseado na desigualdade social e na exclusio dos seus beneficios da gran- de maioria da populagao. Estamos falando de um sistema de cariter global. Assim, podemos dizer que as sociedades capitalistas mais avan- cgadas socialmente — como a Tnglaterra citada por Marshall para exemplificar 0 Estado de Bem-es- tar Social europeu—s6 puderam garantir aqueles “trinta anos gloriosos”, exatamente porque se tratava de uma situago conjuntural: além da ne- cessidade de se construir um modelo que pudes- se se contrapor & atrago exercida pelo progres- so econdmico da URSS, o desenvolvimento do Primeiro Mundo estava diretamente relacionado 4 intensa exploragdo das riquezas naturais ¢ da ‘mio de obra barata do Terceiro Mundo (América Latina, Africa ¢ Asia) pelas multinacionais ame- ricanas, japonesas e europeias. Sempre foi, portanto, um sistema global caracterizado pela exclusto. A partir dos anos 1970, um fato veio mudar os rumos da Hist6ria: o conflito armado entre Israel ¢ os paises arabes fez explodir uma crise econémica sem preceden- tes, colocando em risco o modelo de desenvolvi- mento existente, todo cle baseado teenologica- mente na exploragio industrial do petroleo como combustivel. Os tedricos capitalistas que, desde a Segunda Grande Guerra, sempre criticaram 0 Estado de Bem-estar como extremamente dis- pendioso ¢ contririo as leis naturais da econo- ‘mia, viram nessa nova conjuntura a chance de colocar em pratica suas ideias. foi exatamente 0 que aconteceu: inspirados e assessorados por pensadores ultraliberais, como Friedrich Hayek e Milton Friedman, novos govemantes foram eleitos prometendo reformas econémicas que afastassem os paises ais ricos da crise. Assim, em 1979, a Inglaterra escolhe Margareth Thatcher como primeira- -ministta e, em 1980, os Estados Unidos elegem Ronald Reagan como presidente. Inaugurava- -se uma nova eva, na qual as conquistas sociais e trabalhistas do Welfare State comegaram a ser Cnt 13-"E papa cu @ pra vl Cidadanise dretcs ro mancoe no Bas cotemporéneo totalmente desmontadas. Iniciamos, desde entiio, a viver sob a hegemonia do neoliberalismo. A. luta pela cidadania plena sofreu, ento, um duro golpe, do qual até hoje ainda nao se recuperou. Um bom exemple disso foram os imimeros distirbios que abalaram os subirbios da Franga em 2006 e que se repetiu em outros anos, ‘Nergaret Thatcher primaire mins 6 Inger (19791990), ‘naugurou a chamada ore nesters’, ra qual comegarem a ser desmontanas as conquists soci etrabisias do Wetare Slae a de ol Podemos dizer que a cidadania no Brasil cumpriu um longo e tortuoso caminho, desde a sua independéncia de Portugal, em 1822, até os dias de hoje. Durante o regime monérquico brasileiro, no século XIX, praticamente no se pode falar em direitos. O voto, por exemplo, tinha um carater censitério, onde somente os latifundidrios — adultos homens — participavam do poder politico. Mas a manutengtio da escravidio era a face mais cruel de uma sociedade marcada pela extrema desigualdade. Unidad 2 Tati, Plt e Seria © fim da escravidgo, em 1888, © a proclamagio da Repiiblica, no ano seguinte, nfio provocaram qualquer tipo de alteragao nessa realidade. A proibigo do voto do analfabeto manteve a maior parcela da populagdo pobre excluida de direitos politicos. J 0 poder politico local continuow nas mos dos grandes proprietérios de terras. Eram esses “caciques” locais, os “coronéis”, que controlavam, além do Voto, 0 acesso aos cargos piblicos existentes «, juntamente com os governadores, acabavam também elegendo o presidente da Replica. Os imimeros problemas sociais eram tratados com a repressfio policial, como foi 0 caso de Canudos, da Revolta da Vacina ¢ das greves operirias que pararam as cidades do Rio de Janeiro ¢ de Sao Paulo na década de 1910. “Mesto o fim oficial da escravidlio nao impediu que os marinheiros de baixa patente, pobres e negros, continuassem sendo punidos com castigos fisicos, como ficou claro na Revolta da Chibata, liderada por Jofio Candido, em 1910. Podemos afirmar, portanto, que continuava inexistindo no Brasil qualquer indicio do que chamamos de cidadania, sob todos os aspectos. A Repiiblica Oligirquica foi derubada pela Revolugiio de 1930, omganizada e comandada por setores dissidentes dessa propria elite. Um primeiro avango, porém, deve ser registrado: 0 voto feminino, a partir de 1934, Mas 0s direitos politicos duraram pouco tempo, j& que, em 1937, Getilio Vargas implantou a ditadura do Estado Novo, inspirada nna onda fascista que tomava a Europa. Mas, paradoxalmente, foi no periodo Vangas, de 1930 a 1045, que se comegou a introduzir uma vasta legislagto social, que atingiu principalmente os centros urbanos: * em 1932, foi decretada, no comér- cio € na indéstria, o jornada de cito horas didrias de trabolho; + no ono seguinte, hove o regula- mentagéo do direito de férias; + 0 Constitvicao de 1934, além de estender 0 voto ds mulheres, determi- nou a criacéo de um salério minimo, calculado como copaz de satisfozer as necessidades basicas de uma fomi- Jia {mas ele somente foi adotado em 1940); * a previdéncio comegou a ser organi- zada em 1933, com a criagio de insti- jutos por categorias profissionais (ma- rflimos, bancérios, comerciarios etc.). © cientista social Wanderley Guilherme dos Santos (1979) formulou o termo cidadania regulada para se referit a esse periodo somente tinham acesto aos direitos sociais os twabalhadores urbanos vinculados a categorias reconhecidas pelo Estado que controlava 0s sindicatos, nomeando suas diregdes e garantindo-Ihe a sobrevivéncia econémica através de impostos obrigatérios. Assim, diferentemente da _ Inglaterra estudada por Marshall, no Brasil os direitos sociais foram implementados antes dos direitos civis, que continuavam totalmente precirios, e dos direitos politicos que praticamente deixaram de existir durante o regime autoritério, de 1937 2.1945. Ressalte-se que esses direitos sociais nfo se apresentaram como uma conquista | das Tutas dos trabalhadores — apesar de constar da pauta do forte movimento grevista dos anos 1920, mas, sim, como uma aga autoritéria, de cima para baixo. Como uma concessdo do chefe do Estado, autointitulado “pai dos pobres” Os direitos civis e politicos somente seriam inaugurados no Brasil, na sua primeira iéncia demoeritica,apartirdofimdoEstado Sovo, com a Repiiblica que se consolidaria com ituigdo de 1946. Esta manteve os direitos i ‘Coptic 19-"E de pap! ov re vale Caton dts na mundo no Bras contampdnes sociais do periodo anterior ~ mesino aqueles herdados da legislago autoritaria, como era 0 caso do direito de greve, que 86 poderia ser considerada legal se autorizada pela Tustiga do Trabalho. Além disso, da permanéncia dos ‘graves problemas sociais e do poder dos grandes proprietirios de tera, os direitos politicos sofreram séria restrigfo logo em 1947, quando © Partido Comunista teve 0 seu registro cassado, vitima da Guerra Fria do pés-Segunda Guerra Mundial (sobre este contexto internacional, cf. HOBSBAWN, 2003, p. 223-252) Em 1964, também no contexto da Guerra Fria, um novo golpe de Estado implantou 2 ditadura civil-militar, que durou até 1985. ‘Durante @ maior parte desse periodo, os direitos civis e politicos foram restringidos através da violéncia. Os direitos sociais também foram atingidos, j& que 0 salério minimo sofreu uma forte queda do seu poder de compra, em consequéncia do pequeno crescimento econémico (com uma breve excegdo entre 0 final dos anos 1960 ¢ inicio dos 1970, conhecido como 0 periodo do “milagre econdmico”) © da impossibilidade de organizagio sindical auténoma por parte dos trabalhadores. ontestagio de ectuderos brsloies duaniea diadre covbitar de 1984 © Estado militar constiraiu uma méquina repressiva poderosa, disposta a calar qualquer ‘voz. que se levantasse em oposigao. Foium tempo de prisdes arbitrérias, torturas, assassinatos € exilios politicos, atingindo diversos artistas, liderangas politicas pré-1964 e as liderangas estudantis que organizaram a luta armada contra ‘0 regime. Podemos nos referir & ditadura como “civilemilitar” porque essa méiquina de opressio conton com o apoio financeiro de grandes empresas capitalistas nacionaise multinacionais. Estas viam no regime ou no seu apoio expresso ao arrocho salarial ¢ 4s mudangas que esses empresérios impuseramna legislagao trabalhista = como o fim da estabilidade no emprego ~ a garantia de obtengaio de maiores taxas de Iuero a partir da exploragio da mais-valia dos trabalhadores, impedidos de se organizar, com 08 seus sindicatos totalmente controlados pelo aparato repressivo. Como falar em direitos ¢ em cidadania nessa ¢poca? ‘A partir de 1978, pressionados pelo estrangulamento econdmico, _trabalhadores ‘metaliigicose de outras categorias profissio comecaram ase organizat ¢a enfrentar o aparato repressive do Estado. Obteve-se a abertura politica, com a legalizagio de novos partidos, ‘fim da censura a imprensa, e a anistia a presos politicos e a exilados. Era a retomada da luta pelos direitos civis do povo. (exer sino dos metals do ABC pavisae expesierte da Repl, Lula, dscusendo em assembleia de melalurgeas, em 1979, quando exer preiobcia do indo de ‘Sa Berna do Campo, SP Em 1984, comicios com mais de um milhio de pessoas, como foi 0 caso do Rio de Janeiro e de ‘Sao Paulo, exigiram o retomo das eleigbes diretas para a presidéncia da Repiblica, Foi o movimento que ficou conhecido coma “Diretas Jal”. Unidas 2- Tata, Poles Sore Fhe Em 1988, € elaborada uma nova Constituigio, apelidada de “cidada” por tentar garantir, de formaextensa, algumas das principais reivindicagSes dos movimentos sociais que haviam eclodido no pais a partir de 1979. Em 1989, votamos para presidente da Repiiblica apés vinte ¢ nove anos, Mas o presidente eleito, Fernando Collor de Mello, além de promover o famoso “confisco da poupanga”, lesando as economias que milhares de trabalhadores conseguiram guardar durante anos, se encarregou da tarefa de dar inicio a0 “desmonte” da “Constituigdo Cidada”, elaborada apenas um ano antes! Esse verdadeiro ataque aos direitos sociais marcou @ entrada do Brasil, com dez anos de atraso em relago aos EUA ea Europa, na cra neoliberal © neoliberalismo foi completamente vi- torioso no Brasil apés # posse e 0 mandato de cito anos (1995-2002) do socidlogo Fernando Henrique Cardoso — vamos chamé-lo de FHC = na presidéncia da Repiiblica. Segundo José Paulo Netto, professor da Universidade Federal do Riv de Janeiro ~ UFRI -, 08 direitos sociais foram atacados de tal forma que os anos FHC passaram & Hist6ria, “desde os seus primeiros dias no Planalto, como um governo contra os interesses ¢ as aspiragdes da massa dos traba- Ihadores brasileiros” (NETO, 1999. p. 75). A principal tarefa cumprida pelo governo FHC foi exatamente a continuidade © 0 apro- fundamento do que havia sido apenas iniciado pelo governo Color ~ € que no teve prosse- guimento em razio do seu impeachment, em 1992: 0 desmonte dos direitos sociais contidos na Constituigao de 1988 (para uma visdo sobre esse periodo, ef. o livro de SILVEIRA, 1998). © que se pretendia, claramente, era a inseryiio do pais, de forma subaltema, no process de globalizagdo ou mundializagao financeira, se- gundo os grandes interesses do capitalismo in- ternacional. Para isso, era necessaria a redug30 do papel do Estado brasileiro na economia, que ‘ocorreu sob duas formas: * pela privatizagéo e enirega a mubi- nacionois de empresas pertencenies a setores econdmicos estratégicos, como bancos, estradas de ferro, mineradoras = cujo maior exemplo foi a riquissima Companhia Vale do Rio Doce —, ¢ em- presos presiadoras de servicos piblicos nas dreas de telefonia, eletricidade © fornecimento de égua potével; * pela reducdo dos investimentos publi- cos em dreas sociais fundomentais para © populacéo trabelhadora, como sau- de, educacée, saneamento, previdén- cia, transporte, habitagao e assisténcia social Ha mutas formas de e tar por dlose psa idan. "Na foo, ilegrants de scat fazem passeata em ‘So Paul (SP) contra a coup (2005) © principal pretexto que 0 governo utilizou para implementar essas _politicas seguiu totalmente 0 diagndstico e o receituério neoliberal, ou seja, de que viviamos em um pais endividado e gastador, um dispendioso Estado “protetor”. E a forma de superar a crise econdmica ¢ a faléncia desse Estado passava exatamente por esses passos: (1) a

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