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MINAS E O NORDESTE: PERSPECTIVAS MIGRATORIAS DOS DOIS GRANDES RESERVATORIOS DE FORCA DE TRABALHO Fausto Brito Este artigo tém como objetivo analisar as tendéncias migratérias dos dois grandes reservatérios de forga de trabalho no Brasil: Minas Gerais ¢ 0 Nordeste brasileiro. Para que este estudo tenha éxito, em primeiro Sugar, serd feita uma andlise histérica, procurando explicar a formagao destes reservatéri- (05 ¢ 0 seu verdadeiro significado para as migragdes iatemas no Brasil. Em se- ‘gundo lugar, sera discutido como Minas e o Nordeste cumpriram, plenamente, 1 fungdo de reservatdrios de forga de trabalho dentro da dinamica da economia dz sociedade brasileira. E, concluindo, sera desenvolvida uma andlise mos- trando a inviabilidade da permanéneia dos dois “reservatorios de forga de tra- balho”, com as suas fungdes migratérias cléssicas, dentro do contexto atual da dinamica da economia e da sociedade brasileira. MINAS GERAIS: A SUA FORMACAO HISTORICA. COMO RESERVATORIO DE FORGA DE TRABALHO [Nao foram poucas as adversidades encontradas pelos portugueses na ‘ccupagéo do tertitério de Minas Gerais. A propria natureza, uma densa flo- resta tropical e a insinuante serra da Mantiqueira, era um obstéculo muitas ve- zes intransponivel. Mas, apesar do éxito da exportagdo colonial do agicar nor- destino, a época era do Mercantilismo, ¢ as metrépoles mediam suas riquezas pelos metais nobres que acumulavam. Essa obsessio histérica fez com que as Bandeiras, provenientes de So Paulo, ultrapassassem seu mero objetivo de conquista e escravizagao dos indios, para se transformarem em desbravadioras do territério mineiro na busca de metais precioses. Com a descoberta da primeiras minas, no inicio do século XVII, 0 objetivo prioritétio da politica colonial comegou a ser alcangado e iniciow-se, assim, a ocupagdo do territério mineiro. Os Atraiais foram surgindo, alimen- tados por uma intensa e desordenacla migracao, e jé em 1711 eram ctiadas as Vilas do Ribeirdo do Carmo(Mariana ) ¢ Vila Rica (Ouro Preto) e, em 1714, a Vila do Principe (Serro). Estima-se que, neste periodo, a populagao era de 30.000 habitantes e, com um crescimento to vertiginoso, que em 1720 ja al- A 109 cangava os 200,000, entre os quais apenas 50,000 eram escravos. Neste con- texto de grande e desordenada expansio, econémica e demogrifica, foi criada 4 Capitania de Minas com 0 objetivo de garantit © controle metropolitano do comércio do ouro ¢ diamantes extraidas, isto é, 0 monopélio ou 0 “exclusive comercial” da Coroa Portuguesa A populacio, que crescia ¢ se movimentava pela Capitania, alimen- tando 0 complexo sistema urbano que emergia, em 1776, jd aleancava quase 320,000 habitantes. Os homens livres da ordem escravocrata, que eram a ‘grande tnaioria na regido das minas, além dos senhores, com seus escravos, se movimentavam pelo tertitério mineiro, entre as diferentes Comarcas. Acom- Panhavam a expansio da mineragio e das diferentes atividades que a ela se articulavam, como a agricultura, a pecuitia ¢ as diversas mawsfaturas. QUADRO DOS HABITANTES DE MINAS GERAIS POPULAGAO TOTAL (HOMENS B MULHERES) Comarca, a6 tai [Tara decrewimento ‘Vile tien Tare 78573 008 Rio das Moves e781 23617 23 Sabari 99.576 19320 oat Serr do Fo sa.794 3026 ow Parca am TOTAL, 319.169 514.108 1.06 Foote: Tabos dos habianies da Capital do Minas Gers, 1776 apa, Mi ‘A comparagio entre os dados de 1776 e 1821, quando a populagao estimada era de mais de 514.000 habitantes, confirma 0 intenso movimento populzcional, Houve unia mudanca significativa na distribuigdo espacial da populagdo em fungi da decadéncia da produgao aurifera de Vila Rica, que implicou numa redugdo, em termos absolutos, de sua populacdo e, também, devido a grande expanséo da Comarca de Rio Das Mortes, que crescia a uma taxa média anual de 2,13% a0 ano, quase triplicando a sua populagio neste periodo. Como menciona Maxwell, esta migragao da populago para 0 sul da Capitania refletia 0 declinio da mincragéo ¢ 0 aumento da importancia das ati- vidades agricoles ¢ pastoris, Entretanto, estas mudangas “eram graduais, ¢ a tansformagio de uma economia predominantemente mineira em uma de su- premacia agricola, nao significava que qualquer uma delas tivesse sido exclu- ‘dente em relagéo a outra”. De fato, 0 mais notivel, era a grande diversificagdo alcangada pela economia regional, detetminada nao s6 pelo exuberante siste- 190 1 Encontro Nacignal sobre Migragio ma de cidades que emergiu com a mineragdo, e se constituia numa demanda urbana a ser satisfeita, mas, também, pelas caracteristicas econdmicas da sua da sua “plantation”, que satisfazia a esta demanda. Continuava Maxwell: “a fazenda de Minas, muitas vezes, combinava 0 engenho de agicar com a mina, ou esta tiltima com a pecudria, Muitos latifindios de Minas tinham lavra aurffera, gran- de lavoura e engenhos de agticar e de farinha, além de te- cidos, cachaga, doces, queijos de minas, banhas,aves... A economia regional, com suas propriedades rurais hori- zontalmente integradas, era particularmente capaz de ab- sorver 0 choque das transformacées ue vieram apés a exaustdo do ouro aluvial" (Maxwell, 1977) ‘Ao contririo da estagnagio, ou regressio econdmica e demografica, ‘que poderia ser esperada devido a decadéncia da mineragao aluvial de ouro, o ‘que se observou durante a maior parte do século XIX, foi um notavel cresci- mento demogréfico e um dinamismo inusitado da economia. A populagio da Capitania que havia crescido, entre 1776 € 1821,apenas 1,06% 20 ano, entre 1808 © 1872, passou a crescer a 2,79%, bem acima da média nacional que era de 2,25%, Nesses 64 anos, a populagdo de Minas aumentou seis vezes, pas- sando de 350.000 para 2.039.733 habitantes, cerca de um quinto do total da populagdo do pais em 1872, Esse enorme contingente demogrifico, continha a ‘maior populagao escrava entre todos as Provincias, 386.645, que foi alimenta- da, depois do término do trafico internacional, por 46,0% de todas as transfe- réncias inter-provinciais tiquidas. (Martins, 1993) O alto crescimento demogrifico ¢ a grande importagio de escravos 86 poderiam refletit um grande dinamismo da economia provincial, como con- firma Libby: “Se o desenvolvimento extensivo de um setor agropecud- rio voltado simultaneamente para 0 autoconsumo € 0 ‘mercado foi capaz de fixar e sustentar 0 crescimento de uma considerdvel populagdo, ao mesmo tempo que pos- suéa 0 dinamismo suficiente para reforcar 0 regime es- cravista, a industria mineira dos oitocentos constituiu 0 sew camplemento perfeito.” (Libby, 1982) Na verdade, Minas assistiu, no século XIX, uma expansio manufa- tureira, alimentada pela sua propria demanda intema € pelo comércio inter- provincial, onde se destacavam a indiistria téxtil doméstica, numa primeira A im etapa ¢ fabril, numa segunda; a siderurgia comercial de pequenas fundigSes © os engenhos de agicar. Além do mais, Minas ingressou no chamado “segundo ciclo do ouro*, movido pelas companhias inglesas de mineragdo, e no novo ciclo da exploragao de diamantes, determinado pela fragilizagao do monopélio estatal, que se iniciou nos anos 30 € se prolongou por mais tés décadas, (Martins, 1984). E, finalmente, a partic dos anos 30, a economia cafeeira teve um ‘grande impulso em Minas, principalmente, na Zona da Mata, na fronteira com a Capitania do Rio de Janeiro. Na metade do século XIX, o café jé representa- va mais de 50,0% das exportages mineiras € 0 no final da década de 80 al- cangava quase 90.0%. “A expansao do café ¢ 0 grande crescimento da popula- edo da Zona da Mara, que passou de 20.000 habitantes em 1822 para 254.000 em 1872, foram favorecidas pela grande disponibilidade de mao de obra escrava e livre. ‘Nao foi preciso, portanto, importar escravos de outras Provincias € nem incentivar a imigracdo internacional, pois o grande latifindio foi dividido para ser explorado ela parceria, incorporando grande parte dos homens li- vres que viviam d margem da ordem escravocrata.” (Iglé- sias, 1985). Minas ainda se manteve, até 1920, com uma taxa média de cresci- ‘mento demografico de 2,23% a0 ano, um pouco inferior & do Brasil que era de 2,35. Mas, mesmo assim, durante todo este periodo, posterior a0 Censo de 1872, continuou a manter dentro de suas fronteiras, aproximadamente, um quinto da populacdo brasileira, o que the garantia © primeiro lugar entre os estados mais populosos, com 5.888.174 habitantes em 1920. Porém, algumas das caracteristicas da dinimica da sua prépria economia € sociedade, acaba- ram por Ihe conferir, também, sérios problemas, a partir do momento em que economia nacional se transforma com a forte hegemonia paulista, tanto na economia cafeeira como na industria emergente. ‘Vale a pena sublinhar trés fatores que estavam entre os principais responsiveis pelo declinio da supreendente virtuosidade da economia que Minas exibiu durante grande parte do século XIX. Em primeiro lugar, a eco- rnomia do café em Minas tinha alcancado, ja em 1903, mais de 64,0% do valor das exportagdes do estado, deixando para tras os tradicionais produtos minei- 10s derivados da pecudria. O seu dinamismo foi suficiente para transferir re- cursos para a expansfo industrial de Juiz de Fora, a maior cidade da Zona da 2 11 Encontro Nacional sobre Migragéo ‘Mata, que se transformou no grande polo industrial de Minas ¢ onde emergiu ‘© embrido do sistema financeiro mineiro, com a ctiagio do Banco Crédito Real de Minas Gerais (Lima, 1981) . Entretanto, segundo Diniz, “a cafeicultora mineira foi gradualmente perdendo em competitividade para a paulista. E a principal razdo foi a inexisténcia de um complexo mercantil-financeiro expor- tador que garantisse um maior dinamismo e diversifica- {¢do ao processo de acumulagéo, tal como ocorreu em So Paulo. Como o setor exportador ficava no Rio de Janeiro, Minas de fato transferia para a capital do pais uma parte fundamental do eixo dindmico de sua economia, impassi- bilitando que a sua regido cafeeira garantisse, pela diver- sidade, uma maior continuidade do seu crescimento, ape- sar do dectinio da sua produtividade em relagdo é pau- lista.” (Diniz, 1982) Um segundo fator, de grande importincia, foi a destruigo de boa parte da manufatura mineira, articulada 4 unidade agropecuaria, pela concor- réncia da indistria emergente em So Paulo ¢ no Rio de Janeiro, mum mo- ‘mento da economia brasileira, final do século dezenove ¢ principio do século XX, quando se intensificavam as articulagées mercantis entre as diferentes regides do pais. A expansio industrial de Minas, na soa regido central, para ‘onde a capital havia sido transferida no final do século, ¢ mesmo na regio de Juiz de Fora, no conseguiu superar, do ponto de vista das necessidades da acumulagao, as limitagOes da sua pequena industria concentrada no setor téxtil de laticinios. A prépria agricultura mineira, acabou regredindo para a produ- ‘sao de alimentos e para uma forte especializagéo na pecuétia, e derivados, ‘com uma baixissima produtividade, (Diniz,1982) Em terceiro lugar, Minas era um mosaico de regides desarticuladas e a sua propria geografia contribuia para isso. As suas grandes bacias hidrogré- ficas - Sio Franeisco, Rio Doce, Rio Grande, Paraiba, Jequitinhonha e Mucuri ~ so desconexas e correm para outras regides brasileiras. As cadeias de mon- tanhas eram verdadeiras barteiras naturais: se delineando do norte ao sul, 0 Espinhago isolava 0 nordeste e 0 alto Vale do Rio Doce do oeste do Sao Fran- cisco; a serra da Canastra delimitava, naturalmente, o Sul e a zona da Mata; © a Mata Atlantica tomava, nesta época, praticamente inacessivel boa parte da regio das Bacias do Rio Doce, Jequitinhonha e Mucuri, (Wirth,1982 ) 173 Mas, no eram s6 as barteiras geogrificas que faziam de Minas um ‘mosaico de regides, cada uma delas se desenvolvia articulada ao impulso ou a dinimica de outra regido exterior ao Estado. O Sul, o Sudoeste, 0 Oeste € 0 ‘Tridngulo estavam econotuicamente e socialmente ligados a So Paulo, sendo ‘que a regiéo Oeste esteve formatmente vinculada a ele até 1816. O Vale do Sao Francisco integrava 0 sertdo brasileiro que se estendia até 0 nordeste, tanto que parte do norte de Minas foi administrada por Salvador até 1750. 0 Noroeste era parte da fronteira colonial do gado, que se expandia até Goids & Bahia. E a Zona da Mata, principalmente, depois de 1830, com a economia cafveira, estava totalmente voltada para 0 Rio de Janeiro, (Wirth,1982 ) Minas, de fato, era a regio central, formada historicamente pela mineragdo e onde se localizava o seu governo central, que se viu contestado, diversas vezes, por movimentos separatistas durante o século XIX. O Norte ‘teve a pretensio, estimuladas pelo Imperador, de se constituir numa nova Pro- vincia que se estenderia pelo Vale do Sio Francisco, de Montes Claros até 0 ‘sul de Pernambuco. O Sul sonhou em ser Minas do Sul, anexada ao norte de Sio Paulo, assim como o Triangulo. Estas pretensGes Separatistas eram a ex- pressio da dispersio econdmica ¢ social de Minas. (Wirth,1982) Durante a Reptblica Velha, entre 1889 até 1930, as oligarquias re- sionais asseguravam com mio de ferro a unidade politica estadual em torno do Partido Republicano Mineiro. O atraso econémico no qual muitas regiGes estavam mergulhadas e o rigido controle politico € social, garantiam a reserva politica necesséria para a sua sustentagio. Esta “unidade politica”, porém, nio tinha como contrapartida uma base material que garantisse sua unidade eco- nomiica. Este foi o “paradoxo” imposto a Minas pelo desenvolvimento alta- mente desequilibrado da economia brasileira. (Brito,1998) A dispersio econdmica de Minas significava uma intensa polariza- ¢io de suas regides por outros estados: o Sul e o Triangulo eram polarizadas por Sao Paulo e a Zona da Mata pelo Rio de Janeiro. Na regiéo Noroeste, ain- da wm grande vazio demografico, predominava uma economia, fundamental- ‘mente pecuitia ¢ articulada a regidio Centro-Oeste. O Norte, onde, também, predominava a pecuitia, juntamente com o Nordeste, combinavam a sua po- breza com a do sul da Bahia. Em tomo de Belo Horizonte, centro politico do Estado, s6 gravitava um espago econdmico e demogréfico que continha as re~ sides Metalirgicas e Campo das Vertentes, e que se abria em dirego as regi- es mais pobres do estado, o norte ¢ 0 nordeste. © que os outros estados polarizavam,principalmente, era a popula- ‘go de Minas, este enorme “reservatorio de forga de trabalho”, consolidado durante todo 0 século XIX, e onde, até 1920, residiam quase um quinto da po- m4 LH Encontro Nacional sobre Migrogdo pulagao brasileira, A perda do dinamismo, ¢ a disperséo da economia mineira, comecava a dar nitidos sinais de que nao tinha condigdes de absorvé-la. No final do século passado Minas apresentava um saido migratério negativo e, no inicio do século XX, ja se destacava como 0 maior fornecedor de emigrantes para outros estados. Entre 1900 e 1940, segundo estimativas, a sua perda po- pulacional liquida foi da ordem de 838.552 habitantes, o equivalente a 26,0% do seu inctemento populacional no periodo. (Graham, 1984) Vale sublintar que as migragdes intemacionais tiveram um impacto demogrifico muito pequeno sobre Minas, apesar do esforgo desenvolvido pelo seu govern. Os estrangeiros registrados nos Censos entre 1872 ¢ 1920, o auge do periodo da imigragao internacional, ndo ultrapassaram 2,5% da populagao total, cifra extremamente inferior a de outros estados receptores, como Sao Paulo, onde ela alcangou 21,0%. (Wirth, 1982 ) ‘© NORDESTE BRASILEIRO: A SUA FORMACAO HISTORICA. COMO RESERVATORIO DE FORCA DE TRABALHO © Nordeste brasileiro, no inicio da colonizagao, se incorporou a ‘economia colonial através da exploragao do pau-brasil, no seu litoral sul, nas Capitanias da Bahia, Théus ¢ Porto Seguro. Ele era fartamente encontrado na densa mata-atlintica que cobria todo seu litoral. Mas, a sua insergéo definitiva no Sistema Colonial s6 veio a ocorrer no século XVII, com a produgao aguc reira, Na verdade, 0s primeiros engenhos de agiicar comegaram a ser construi- dos na Capitania de Pernambuco na metade do século XVI. As primeiras mu- das da cana foram trazidas das col6nias portuguesas, na Aftica, e encontraram solo fértil na zona da mata nordestina. Os primeiros eagenhos, ainda eram pe- ‘quenos, usavam tragdo animal, mio de obra indigena escravizada e 0s recursos ‘humanos especializados eram importados. A produtividade era relativamente baixa e 0 seu mercado se encerrava nos timites da propria col6nia. A economia acucareira, totalmente voltada para 0 mercado intemna- cional, € que teve seu auge no século XVII, usufruiu da farta disponibilidade de terras férteis no litoral nordestino onde se expandiram as extensas planta- ‘goes de cana de agiicar. O seu intenso crescimento, e sua alta produtividade, foram uma conseqiiéncia da combinacao de grandes investimentos tecnolégi- cos em equipamentos importados da Holanda - muitas vezes por ela financia- dos, em fungio dos seus grandes interesses no comércio internacional - e de ‘uma maciga importagao de escravos africanos. A economia acucateira nordes- A 175 tina foi soberana até que 9 agiicar das Antilhas derrubasse a sua posigao privi- legiada no comércio internacional. A desaceleragao gradativa da economia nordestina, teve também, & ‘grande contribuigao da Metrépole Portuguesa, cujos interesses se deslocaram totalmente pata a regido Sudeste, onde havia sido alcangado 0 grande alvo da sua politica colonial: a descoberta do ouro ¢ de diamantes. ‘A economia acucareira se expandiu, principalmente, peta faixa lito- ranea ¢ os {luxos de renda nela gerados eram quase totalmente desviados par 0 exterior. Entretanto a agroindiistria se associava com a agricultura de subsis- {éncia e, principalmente, a partir do século XVI, com a pecudria extensiva, 0 que viabilizou a ocupagao populacional do agreste e do sertao nordestino ¢ 0 inicio da integragao territorial com o Sudeste através do Vale do Séo Francis- co. A dindmica deste “complexo nordestino”, como assim chamou Furtado, ‘era uma fungao do comportamento dos pregos do agticar no mercado interna- ional, (Furtado, 1961) Mas, a ocupagao demogréfica da regio do semi-irido nordestino, s6 foi plenamente efetivada no final do século XVII e no século ¥IX, com a cultura do elgodao. Ela se expandiu em todo o Nordeste, principalimente, “no Maranhio onde os cultivos se interiorizaram ds mar- gens da Itapicuru; no Ceard, na Bacia do Joguaribe; nos estados do Nordeste Oriental, se difundira, notadamente nna faixa intermedidria do Agreste; na Bahia, no seu inte- rior semi-drido” (Guimardes Neto, 1989) © algodéo operou uma verdadeira revolugio agréria no Nordeste, ‘com fortes conseqiiéncias sobre a demografia da regio, segundo Guimaraes ‘Neto, em fungdo das “ relagGes sociais de produedo que 0 algoddo estabeleceu na regido, inclusive por incorporar no sd grandes pro- rietérios, como os pequenos, os foreiras € moradores, bem como pelo fato de induzir 0 desenvolvimento do be- neficiamento e da industrializagdo barata, que dinamizou alguns centros urbanos regionais, oferecendo suporte ao surgimento de vilas, cidades povoagdes:” rid I Encontro Nacional sobre Migrordo Prossegue, ainda, Guimaraes Neto: “O algodao ao se implantar nesta estrutura, de tipo colo- nial, articula e torna mais intensa 0 conjunto de relagées desenvolvides pelos agentes sociais e econdmicos €, ao ‘mesmo tempo, reforca a grande capacidade que o Nord- este teve em absorver a forca de trabalho se constituindo num grande reservatério de forga de trabalho. Deste se valeriam, mais tarde, as demais regiGes brasileiras na ex- pansdo de suas exportacdes ou, posteriormente, na in- dustrializacdo e urbanizacdo." (Guimardes Neto, 1989) No inicio do século XIX, em 1808, residiam no Nordeste um pouco mais de $0,0% da populagao brasileira, que era estimada em 2.424.463 habi- tantes, proporgéo que caiu para 47,0% em 1872, quando jé tesidiam no Brasil 9.930.478 habitantes. Apesar das suas taxas de crescimento demogréfico fica- zem abaixo da média nacional até 1872, a sua contribuigdo para 0 crescimento absoluto da populagdo brasileira, no periodo 1808 a 1872, foi de 46,0%. So- ‘mente o Nordeste Central contribuiu com 25,0% . Em sintese, no Nordeste, no século XIX, residia o maior contingente da populagdo brasileira e era ele 0 que mais contribuia para o crescimento demogrifico do pais. © auge das exportagdes de algodio teve um folego curto, acompa- nhando a Guerra de Secessio Norte - Americana, na segunda metade do sé- culo XIX. No final deste século, elas jé eram inexpressivas, porém, a produgio de ambos 0s produtos persistiu cada vez. mais voltada para 0 mercado interno. ‘Sem levar em consideragao as atividades de beneficiamento, descarogamento ¢ enfardamento, dispersas pelo interior da regido, proximas as Areas de produ- ‘go, em 1915 existiam, no Nordeste, sem considerar 0 Maranhio, 47 fabricas de tecidos € fiagao de algodio, que ocupavam 22,200 operitios. (Guimaraes Neto, 1989) ‘Também, na segunda metade do século XIX, houve uma recupera- gio das exportagées do agticar devido as condigdes favordveis do comércio internacional, que possibilitaram grandes modificagdes tecnol6gicas na produ- do acucareira, principalmente, em Pernambuco, onde passou a coexistir com as atividades dos engenhos mais antigos. J4 no final do sculo, as exportagdes de agiicar, como as de algodio, comegaram a declinar. Ao mesmo tempo, também, como no caso do algodao, se intensificam as vendas de acticar para o ‘mercado intemo, principalmente para o Sudeste, O Nordeste, de fato, deixava fa sua fase de isolamento relativo e iniciava uma nova etapa - a integracio A 1m mercantil - dentro da economia nacional, particularmente com 0 Sudeste. (Guimaraes Neto, 1989 ) Nao pode deixar de ser wencionada, concluindo as mudangas ocor- ridas na economia nordestina no final do séeulo XIX e no inicio do XX, 0 crescimento da produsio de cacau no sul da Bahia, que se transformou na maior fonte de riqueza do Estado ¢ em fator de grande atragdo populacional. A ampliagao das articulagdes mercantis entre. Nordeste e 0 Sudeste significava, de fato, uma grande expansio do mercado intemo nacional, em grande parte, comandada pelo grande erescimento da eeauomia cafeeira ~ com todos 0s seus desdobramentos comerciais e financeiros - e pela emergéncia da primeira etapa da industrializacao brasileira. A dindmica demogréfica do Nordeste, neste periodo delimitado en- tte 1872 e 1940, foi marcada por um crescimento populacional expressivo e pelo inicio da aceleragdo das emigragdes. A populagao passou de 4.638.560 para 14,434,080 habitantes, com uma taxa média de crescimento anual de 1,6%, abaixo da média nacional que foi de 2,1%. Mesmo assim, tal era a di- mensio do “grande reservatério de mic de obra” nordestino, jé consolidado, ‘que ele foi responsivel por quase um tergo do incremento absolute do total da populagao brasileira entre 1872 ¢ 1940. No inicio deste periodo, entre 1872/1890, apesar do Nordeste ter contribuido com mais de 30,0% para 0 inctemento absoluto da populagao bra- sileira, a sua taxa de crescimento foi a mais baixa de todo o pais, apenas 1.44%. Ainda que tenha havido uma relativa recuperagao da produgao agiicar € do algoddo, mencionadas anteriormente, a economia e a sociedade do agreste ¢ do sertio foram fortemente afetadas pela grande seca do final dos ‘anos setenta. A regio demonstrou uma grande fragilidade, potencializada pela sua alta densidade demografica, pela grande predominancia da agricultura de subsistencia e pela pequena propriedade, aniiculada aos grandes latftindios, com baixissima produtividade Os Estados do Nordeste Central foram 0s mais atingidos, principal- ‘mente 0 Ceard. As estimativas do saldo migratorio para 1872/1890, indicam que 0 Nordeste teve uma perda migratéria de 346.207 habitantes, dos quais 275,846 sairam da sua Tegiao central ¢ destes, 135.725, quase 40,0%, somente do Ceard. (Graham,3984 ) Na década seguinte, a tiltima do século, 0 Nordeste, com as mais baixas taxas de crescimento demografico do Brasil, refletia as conseqiiéncias 8 11 Encontro Nacional sobre Migrasdo da perda migratoria, no periodo anterior, de 6,0% da sua populagao e, em par- ticular, de 9,0% da populacio do Nordeste Central, sua regio mais populosa. ‘Mas, a capacidade de retengao da mao de obra da economia nordes- tina conseguiu transformar 0 seu saldo migratério em positivo, ainda que pe- queno. Os dados sugerem que 0 crescimento da economia do cacau, na Bahia, foi o maior responsivel por esta revers4o, pois 0 saldo do Nordeste Central ainda permaneceu negativo. No século XX, até 1940, 0 Nordeste, no inicio, recuperou as suas taxas de crescimento, ¢ se manteve responsivel por mais de 30,0% do incre~ mento da populagio brasileira. Entretanto, 0 grande reservatdrio de mao de ‘obra comegot a vazar populagao, sistematicamente, para as outras regides bra~ sileiras. O mesmo fendmeno aconteceu em Minas Gerais, 0 outa grande re- servatorio de mao de obra, e com uma intensidade ainda maior, Em Minas ¢ no Nordeste residiram, durante 9 século XIX, entre 60.0 e 67,0% da populagao brasileira e, os dois, em conjunto, até 1890, foram responséveis, no minimo por 57,0% do incremento demogréfico do Brasil, isto em 1872/1890, € no maximo por 75,11%, em 1854/1872. Esta porcentagem iminuiu entre 1890/1910 em fungao do auge das migracdes internacionais, que ocorreu neste periodo e elevou a contribuigdo de Sao Paulo para 30.07%. ‘4 nas duas primeiras décadas do século XX, os dois grandes reservatorios de mao de obra, voltatam a contribuir com mais de $0,0% do crescimento da po- pulagao brasileira. Dai para frente, os grandes fluxos migratorios, que vao in- tensificar a evasio populacional, passaram a transferir para outras regides 0 grande excedente demogrifico gerado em Minas Gerais e no Nordeste. MINAS E NORDESTE: O AUGE E 0 DECLINIO DOS DOIS GRANDES RESERVATORIOS DE FORCA DE TRABALHO inicialmente, seria interessante analisar as migragdes entre 1940 € 1960, porém, a disponibilidade de dados é limitada. Nos Censos Demogréfi- cos de 1950 € 1960 a tinica informagao disponivel sobre as migragdes eta 0 lugar de nascimemo, isto ¢, os censos indicavam os que eram naturais, do Es- tado ou da tegido, € 0s que nao eram, com os respectivos Estados de nasci- ‘mento, As limitagdes metodologicas destes dados sio evidentes: ndo se sabe 0 ano de chegada do imigrante ¢ nem se ele cumpriu mais de uma etapa migra- Iria, Porém, a informagdo do estoque de imigrantes ¢ da sua variago entre os dois periodos, podem ser valiosos indicadores da contribui¢do relativa de cada 179 estado ou regiao para as migragées e, principalmente, da diregéo dos fluxos migratétios, A andlise da contribuigao relativa dos Estados ¢ regides para 0 in- cremento total da emigragéo e imigracdo acumulada no Brasil, entre 1940 € 1960, revela a grande importancia dos dois grandes reservatotios de forga de trabalho que haviam se consolidado ha mais de um século: 0 Nordeste ¢ Minas Gerais Brito, 1997), BRASIL CONTRIBUIGAO RELATIVA PARA O CRECIMENTO DA EMIGRAGAO ACUMULADA - 1940/1960 1540150 50160 one oat 093 Nordeste Setentrenal 26 333 Noxdete Cena 1622 sos [Nordeste Merion Ba ass NORDESTE a0 a9 Minas Gerais sT88 2203 NE*MG ast ost spit Santo 62 33 Riode andro 032 13 ‘io Paste 2009 Bao esp 2062 1543 Paton 053 130 CeneaOene 136 123 PR+cO a» 20s su 5a 196 RU+SP+PR+CO nsi tas BRASIL. 100,00 100,00 ‘one: FIBGE, Cans demoprifca de 1950 1960, Entre 1940 ¢ 1950 Minas, sozinha, foi responsivel por 38.0% do in- ‘cremento da emigrago, proporgo maior que a de todos as estados do Nord- este, juntos. Na década seguinte, os nordestinos superaram os mineiros, certa- ‘mente em fungdo da grande seca que assolou o Nordeste e da melhoria signifi- cativa do sistema de transpatte, principalmente, com inauguragzo da Rodovia Rio-Bahia. Nesta década, 0s dois juntos, deram conta d 70,0% do aumento telativo do estoque acurnulado de imigrantes. Se consideramos 0 destino des- tes emigrantes, observamos que os dois grandes reservatdrios de forga de tra- 180 11 Encontro Nacional sobre Migrasdo batho, justificando assim a sua denominago, forneceram a grande maioria dos cemiigramtes para Sao Paulo, a mais importante regio de expansio industrial: 90,30% em 1940/50 ¢ 88,0% em 1950/60, O mesmo fendmeno podia ser ob- servado para 0 Rio de Janeiro, outro Estado que combinou, até o final dos ‘anos 60, a industrializago com a sede do governo federal e de toda a sua bu- rocracia. Compreendendo as migracées como um processo social indispensé- vel para a dinémica da economia e da sociedade, niio resta divida que estes fluxos migratorios entre Minas e 0 Nordeste e 2s regides de maior crescimento industrial, foram fundamentais para esta dinamica. Estes dois reservatorios tiveram, também, grande importancia como fomecedores de emigrantes para as regides de expansio da fronteira agricola, principalmente, para a Centro Oeste. Brito,1997) SAO PAULO E RIO DE JANEIRO REGIOES DE EXPANSAO INDUSTRIAL ORIGEM DOS IMIGRANTES (%) - 1940/1960 HO RAULO — | RODE TANRIRD arcioes Tago [0 | 0 [90 aw va 068 Ba Neve Sac! = 8D dat Cota 338383) malt NmtsteMerdond 15372423 NowDEsre an a138 5050 sa0 Nas 43758 Make Nea ean aoe tase tap saa oa oss tags aT Rod jecie iat te Sere Heseeeee eee eee ara 4a Eereno sd 308k amos Cano oust noe et Tora a Too oan asoutTo 57805 —Fer0 Har iba Fonte: Cansos Demogriices de 1940, 1950 1960. Entre 1940 ¢ 1960 foi grande @ expansio da economia brasileira, entretanto este erescimento s6 aumentou 0 atraso relativo de Minas e do Nord- este em relagao as regides onde se concentravam a maior parte das atividades ‘econdmicas. A preocupasao com estes desequilibrios regionais foi objeto de A 131 um grande debate entre téenicos ¢ politicos, a partir do final dos anos 50, quando se defendia que somente a intervengéo do Estado poderia comrigir 0 Processo de concentragdo econdmica. Destas discussdes, resultou a criago da SUDENE (Superintendéncia do Desenvolvimento do Nordeste), em 1959. Em ‘Minas Gerais, a preocupagio com o seu “atraso relativo”, também, gerou um ‘grande debate, consubstanciado no “Diagnéstico da Economia Mineira”, ela- borado pelo Banco de Deseavolvimento do Estado de Minas Gerais, em me~ dos da década de 60. (Brito, 1997) © petiodo entre 1940 ¢ 0 final dos anos 70 pode ser considerado ‘come 0 auge da expanséo das migragdes internas no Brasil. Ja foi observado ‘que, no Seu inicio, entre 1940 e 1960, ja podia ser notada a importincia dus trajet6rias migratérias que articulavam 0s dois grandes reservatorios de forga de trabalho ~ Minas e o Nordeste - cont os centros de expanséo industrial e as regides de expansio da fronteira agricola, dentro de um contexto de profundos desequilibrios regionais. pss 1960, estas trajetdrias se tomaram ainda mais notaveis ¢ foram fortemente alimentadas pela intensificagao da migragdo rural-urbana e, conse- quentemente, pela aceleragio do proceso de urbaniza¢ao e metropolizacao. MINAS GERAIS INDICADOES MIGRATORIOS - 1960-1996 Beato | tmigagto | Wnigrato | _Sutor — [TOMR) 70 699 zeit sie spr ene ats sate 0091 m3) joys 207m a8 wae sam ans torso. = 7 ise uisass__ sone ase os Fonte: FIBGE, Censcs Denoprifcn de 1970, 19801991 e Comagen de Fopelagto > awnox chao de “ald”, o estado dat wom liquide gmt. Minas, nos anos 60, foi o Estado que mais perdeu populagao, 0 set volume de emigrantes ultrapassou os 2 milhdes, levando a um enorme saldo negativo, equivalente a 13,2% da sua populagdo em 1970, que era de quase 11,5 milhées. ‘Uma grande perda populacional que the garantiu uma taxa de emi- gragdo de mais de 15,0% ! O mais interessante é que, na década seguinte, Mi- nas Teduziu em 2,5 vezes a sua emigraggo e a sua taxa liquida passou para - 4,7%, bastante inferior a0 dos anos 60, Tudo indica que o grande dinamismo ‘da economia mineira, neste periodo, depois de uma grande fase de letargia, 182 1 Encontro Nacional sobre possibilitou uma maior capacidade de retengao da populagio, nao s6 na Regi- Go Metropolitana, como também em cidades médias da regido Sul do Estado e do Triangulo mineiro. (Brito,1997 ) Na década de 80, Minas continuou a reduzir, em mais de um tergo, 0 seu saldo migratério. Houve uma dimisuigao das emigragées, ainda que elas, permanecessem muito altas, mais de 1 milhao de emigrantes, mas as imigra~ ‘ses aumentaram, alimentadas, em mais de 60,0% pela imigtacdo de retomo. (Brito et all,1998) ‘Comparando os dois quinguénios, 1986/91 ¢ 1991/96, as informa- es sugerem uma reversio do quadro migratério: o saldo estimado persiste como negativo, mas as suas dimensdes so inexpressivas: a taxa liquida ‘sou de -0,77 para 0,16%. Um outro bom indicador destas mudanga migratdrias 0 indice de reposigao populacional, nos anos 60, para cada habitante que saia de Minas entrava apenas 0,26, em 1996 jé entrava 0,93, isto é, a migragéo ja cestava quase igualando a emigragao. NORDESTE INDICADORES MIGRTORIOS - 1960/1996 Periodo | tnigregio | Yimigrasio [| Saldo | 1UM(@) | __LR- wero 262152218797 1952502 “695 0.12 twr0(80 530022299766 1.768.674 $0 023 iseu91 warros 2650289 1 ssa.ais 61 ow ise691 STD ssh T6548 236 035 1991196 397725156380 —_-ass.633 203 032 onte:Censs Derogrfics de 1970,1980,191 ¢ Conlagem da Pops de 1996, AA situago do Nordeste tem uma grande particularidade: as emigra- (ges, em termos absohutos, permaneceram altas © crescentes até 1991. E os dados qilingtienais ndo indicam que esteja havendo uma diminuigéo expressi- ‘va dos fluxos smigratérios para outras regides. Os saldos tém sido decrescente ‘em fungdo do notével aumento das imigragdes, principalmente as de retomo e, ‘consequentemente, também, as taxas \iquidas t€m sido menores. Porém, as informagdes referentes aos periodos 1986/1991 e 1991/1996, sugerem que as imigragées estéo bem menores, em telagao aos anos 80, ¢ as emigragdes no estavam dando sinais muito nitidos de uma ten- déncia decrescente. O indice de reposigao mostra, sem divida, uma melhora has trocas migratétias do Nordeste, mas ainda estava muito baixo: em 1996, para cada emigrante que saia do nordeste, entrava apenas 0,32, A 12 A aniilise sugere, num primeiro momento, que Minas jé ndo é mais fo grande exponador de populagao, como o foi durante quase todo 0 século XX, Enlretanto, o Nordeste, ainda que esteja diminuindo as seus saldos e as suas taxas liquidas, ainda permanece com um nivel de emigraco muito alto. Evidentemente, no podemos tratar Minas € nem o Nordeste, como homogéneos. Somente quatro, das 12 meso regides minciras, tém saldos mi- gratérios positivos: a Regio Metropolitana de Belo Horizonte; 0 Oeste minei- 10; a Regiio do Triangulo ¢ Alto Paranaiba e 0 Sul de Minas. A regio Metro- politana ¢ o Oeste tém sido alimentadas, principalmente, pelos imigrantes do interior do préprio Estado e as outras duas pelos imigrantes interestaduais. Isto mostra duas realidades marcantes. A primeira é que algumras das regides de Minas tém tido um desempenho econémico significativo e articulado & expan- so de outros estados e regides do pais. E 0 caso do Tridngulo ¢ do Alto Para- nafba, que fazem parte da grande expansio da agro-indiistria do Centro-Oeste brasileiro ¢ de Sio Paulo. © Sul de Minas tem a sua agricultura e inctstria, também, muito articulada ao Estado de Sao Paulo, A relevancia das migragoes interestaduais para estas regides advém, justamente, destas historicas articula- Ges econdtnicas, hoje ainda mais intensas, que, como ja foi mencionado, nunca obedeceram aos limites politicas dos Estados. A Regio Metropolitana, faz parte de um grande “corredor da po- breza” que tem servido para o éxodo, intra ¢ interestadual, de emigrantes do Norte de Minas, dos Vale do Sequitinhonha, Mucuri ¢ Rio Doce. Nenhuma destas regides teve, entre 1981 e 1991, uma taxs liquida de migragdo inferior 3 7.0%, sendo que no Jequitinhonha ¢ no Mucuri elas chegaram a -10,8 ¢ - 15,3%, respectivamente. Vale realcar, que estas taxas foram superiores s dos Estados nordestinos, no mesmo periodo. Somente estes dados sio suficientes para mostrar que, apesar da tendéncia a reversio do histérico papel de Minas de “reservatério de forga de trabalho”, existem ainda algumas regides mineiras om alissimo potencial emigratério (Brito et all,1998) (© Nordeste, também, néo é homogéneo e ainda mantém um subs- tancial atraso econdmico em relagio a0 Sudeste. A sua economia, entretanto, tem dados sinais de um crescimento industrial importante, princfpalmente na ‘Bobia, ¢ a agricultura tem ampliado a sua produgdo de soja e de grio na sua regio do cerrado, que vai do oeste baiano até o Piaui ¢ 0 Maranhio. A mo- demnizagao agricola pode, tamibém, ser observada nas tireas de irrigagao do Vale do Sao Francisco e no Vale do Agu, no Rio Grande do Norte. Em sintese, © Nordeste tém se modificado economicamente, mas néo o suficiente par re verter os seus graves € histéricos problemas. O seu PIB per capita, na metade 184 11 Encontro Nacional sobre Migragéo os anos 90, ainda era de U$1.500,00, bem abaixo do brasileiro, U$2.615,00, € do mineiro, US2.894,00. Brito,1977 ) Os dados sobre as migragdes wotdestina refletem esta realidade, Apesar de alguns estados, como Rio Grande do Norte e Sergipe, que redi ram muito as suas taxas migratérias, o restante ainda tem gerado um grande niimero de emigrantes, dos quais, entre 1991-96, somente 21,0% ficavam dentro do préprio Nordeste. (Brito, 1999 ) Na verdade, tanto Minas quanto 0 Notdeste, muito mais este iltimo, ‘ainda tém um grande potencial emigratécio. Porém, ambos, 0 Nordeste em particular, ainda ndo deixaram de ser, plenamente, os “grandes reservatorios de forga de trabalho”, Mas, @ questio mais importante é outra: nao ha nenhum, centro industrial, ou regio de expansio da fronteira agricola, que necessite de “grandes reservatdrios de forga de trabalho”, ou seja, nao ha geragao de em- prego suficiente, em nenhuma regigo ou estado do pais, que requeira enormes transferéncias mio de obra. Pelo contrério, © que tem se tomado notavel é a ‘migragao de retorno; ov a de curta distincia 04 de curto prazo ou a temporaria E claro que os mineiros ou os nordestinos estéo continuam indo, ainda que numa proporgo menor, para Séo Paulo ou para regido Centro-Oeste ou Norte. As condigdes econdmicas e sociais necessérias pata gerar emigran- tes persistem tanto em Minas quanto no Nordeste. Mas nao ha mais possibili- dades estruturais de que Sio Paulo, ou outra regio, tenha a capacidade de ab- sotver 0 excedente populacional gerado em outras regides, como ocorria até 1980. O desafio, entéo, para Minas e o Nordeste, dado a impossibilidade es- trutural de se transferir para outras regides, ou estados, os seus excedentes po- Pulacionais, é ter que absorve-los, na sua grande maioria, dentro dos seus pro- ptios limites, Em sintese, a questao da absorgao do excedente demografico tende a tomar-se, cada vez mais, uma questio tegional e no mais uma ques tio nacional. E, nesta perspectiva, tendem a desaparecer as condigoes histéri- cas que fizeram de Minas e do Nordeste os dois grandes reservatorios de forca de trabalho, BIBLIOGRAFIA BRITO, Fausto, et all, Minas Gerais, uma Nova Regido de Atragio Populaci: ‘onal?, VIM Semingsia sobre a Economia Mineira, Anais, vol. II, Diamantina, 1998, Populagio, Espago e Economia numa Perspectiva Histérica: 0 caso Bra- sileiro, CEDEPLAR, Tese de Doutorado, 1997 ----+ Relatério de Pesquisa, CEDEPLAR, 1999. DINIZ, Clétio Campolina, Estado e Capit Mineira, UFMG? PROED, 1982. Estrangeiro na Industializagdo FURTADO, Celso, Formagio Econémica do Brasil, Editora Fundo de Cultu- a, 1961. GUIMARAES NETO, Introdugao 4 Formagdo Econdmica do Nordeste, Pun- dagdo Joaquim Nabuco, 1989, IGLESIAS, Francisco, Agricultura em Minas Gerais na Repiiblica Velha, Es- tudos Econémicos, Sao Paulo, vol. 15, 9.22, 1985. LIBBY, D.C,, Transformagao e Trabalho em uma Economia Escravista, Edi- tora Brasiliense, 1988 LIMA, Joao Heraldo, Café ¢ Industria em Minas Gerais, Editora Vozes, 1981 MARTINS, R. Borges, Minas ¢ 0 Trifico de Escraves no Século XIX, Outra ‘Vez. CEDEPLAR, Texto para Discussao, n? 70, Maio de 1984, MAXWELL, Kenneth, A Devassa da Devassa, Editora Paz e Terra, 1977. WIRTH, Joha D., Minas Gerais na Federagio Brasileira, 1889-1937, O Fiel da Balanga, Editora Paz e Terra, 1982. 158, 1 Bncontro Nacional sobre Migros.

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