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-°©@@@GE) CULTURA ESCOLAR: REVISANDO CONCEITOS SCHOOL CULTURE: REVIEWING CONCEPTS CULTURA ESCOLAR: REVISANDO CONCEPTOS Lindamir Cardoso Vieira Oliveira Doutora em Educacao pela Unimep. Professora do Mestrado em Educagdo da Universidade Metodista de Sao Paulo +Resumo Este texto é parte da discussao te6rica vinculada ao projeto de pesquisa intitulado Gestdo democratica e inovagdo da pritica pedagogica das escolas, financiado pelo FUNDAC/UMESP. Busca-se contribuir com as analises da organizacao escolar que vao além da racionalidade técnica de inspiragao funcionalista, constitu indo-se em uma racionalidade politico-cultural, como apontou Névoa. Tendo como ponto de partida o enten- dimento da cultura escolar como um sistema comum de significados, aceitos, com conteddos implicitos € explicitos e que s80, deliberadamente ou nao, aprendidos e participados pelos atores sociais implicados na construcdo cotidiana da vida de cada escola, pretende-se rever diferentes leituras sobre sua produgao, seus, movimentos ¢ suas diferenciacao, Num primeiro momento, so retomados diferentes autores que trataram da tematica, finalizando com um detalhamento de algumas contribuigdes cle Pérez Gomez. Palavras-chave: Gestao escolar. Organizacdo escolar. Politicas piblicas. + Abstract, This text is part of the theoretical discussion related to the research project called Democratic management and innovation of pedagogical practice in schools, funded by FUNDAC/UMESP. An attempt is made to contribute to analyse the school organisation, beyond the technical rationale of functionalist inspiration, turning into a political and cultural rationale, as pointed out by Névoa. Having as baseline the understanding of the school culture as a common system of meanings, accepted with implicit and explicit contents and that are, whether intentionally or not, learnt and played by the social players involved in the day-to-day construction of life in every school, we intend to review different approaches on its production, movements and differentiation. At first, different authors who have dealt with this theme are reviewed, and this text ends with a breakdown of some contributions made by Pérez Gomez, Keywords: School management. Schoo! organisation, Public relations. + Resumen te texto es parte de la discusi6n tedrica vinculada al proyecto de investigacién llamado Gestién democrd tica e innovacién de ta practica pedagégica de tas escuelas, financiacio por FUNDAC/UMESP. Se busca contri- buir con los anélisis de la organizacion escolar que van mas allé de la racionalidad técnica de inspiracién funcionalista, la que pasa a ser una racionalidad politico-cultural, como lo indica Novoa. Teniendo como punto de partida la idea de que la cultura escolar es un sistema comin de significados aceptados, con contenidos implicitos y explicitos y que deliberadamente son 0 no aprendidos y participados por parte de los actores sociales involucrados en la construccién cotidiana de ia vida de cada escuela, se pretence revisar las distintas interpretaciones sobre su produccion, sus movimientos y su diferenciacién. En un primer momento se retoman diferentes autores que trataron el tema, finalizando con una exposicién detallada de algunas contribuciones de Pérez Gomez Palabras-clave: Gesti6n escolar. Organizaci6n escolar, Politicas pablicas. Na antropologia, a cultura é vista como um sistema comum de significados, aceitos com conteddos implicitos e ex- plicitos, que sao, deliberadamente ou nao, aprendidos e participados pelos membros de um grupo social. Assim, é parte da cultura de um grupo tanto o que é instituido por meio de c6digos, normas, sistemas de aco, como 0 instituinte, ou seja, as diversas pressdes de mudangas ou acréscimos ao existente que ainda nao se institucionalizaram. Assim, a cultura vive um processo ativo, continuo, vivo, por meio do qual as pessoas criam e re- criam o mundo em que vivem. Sao muitos os estudos voltados para a administragdo geral que procuram compreender a cultura da organizacao escolar. Alguns procuram relacio- né-la com a dificuldade de implementar mudangas. Por isso, vale a pena enfocar al- gumas aproximacées da lite- ratura dispontvel, retoman- do revisées ja procedidas (Cf. OLIVEIRA, 2003), para aprofundarmos, subseqitente- mente, algumas das concepcoes de Pérez Gomez que nos interessam mais de perto. O conceito de cultura escolar foi tra- zido para a area da educacao no Brasil na década de 70. A principal contribui- ¢40 foi a possibilidade de uma andlise da organizacao escolar que va além da racio- nalidade técnica e da racionalidade orga- nizacional, constituindo-se em uma raci- onalidade politico-cultural, como apontou Névoa (1995). Rui Gomes (In: BARROSO, 1996, p. 87ss), nas suas teses para uma agenda de estudo da escola, é bastante critico na in- corporagao do planejamento estratégico empresarial, orientado por uma racionali- dade técnica e nao politico-cultural, para E parte da cultura de um grupo as diversas pressées de mudangas ou acréscimos a0 existente Lindamir Cardoso Vieira Oliveira projetos educativos. Na sua visdo, a pers- pectiva empresarial realiza quatro grandes separacées do trabalho, que comprome- tem a qualidade dos projetos educativos: 0 pensamento é separado da aco enquan- to forma de ultrapassar a incapacidade da escola de pensar seu trabalho; o estratégico separado do operacional; os pensadores se- parados dos concretizadores; os estrategas separados das estratégias. Teixeira realizou um dos poucos tra- balhos nacionais que fogem da idéia de co- nhecer a cultura de uma organizacao para poder manipulé-la em direcao a uma maior produtividade, tendo sefundamentado nos principios da gestao democratica. Procura estudar as mudancas impostas pelo gover- no estadual ao ensino basico de Minas Gerais ¢ nos diz que: A cultura, nao importa qual seja, delineia o caréiter da organiza- do, mais que isso, as organi- zacées podem ser considera- das, na sua esséncia, como realidades socialmente cons- truidas que se constituem mais na cabeca e nas mentes de seus membros, do que em conjuntos de regras e regulamentos (ANPED, 1998). Lembra a autora que, se considera- mos apenas os aspectos racionais da or- ganizagao, deixamos de lado sua vida profunda, espontanea, resultante da in- tegracdo de seus membros. Para ela, a cultura organizacional é constituida na sua base por um conjunto de valores, crengas e pressupostos que define os modos pe- los quais a organizagao conduz seus ne- gocios, Esse niicleo de crengas e pressu- postos bdsicos esta expresso nas estruturas, sistemas, simbolos, mitos e padrées de re- compensa dentro da organizagao. Esta nao nasce como cultura, mas se transforma em cultura ao longo de sua hist6ria (...) 292 RBPAE v.19, 7.2, jul.idez. 2003 Apartir de autores como Morgan (1996), Torres (1997), Schein (1991), Sarmento (1994), dentre outros, aponta que A fancdo basica da cultura da organiza- ¢do é resolver os problemas fundamentais do grupo, assegurando sua sobrevivéncia e adaptacdo ao ambiente externo e a inte- graciio de seus processos internos, para preservar a capacidade de continuidade e sobrevivéncia do mesmo. Ao fazer isso, a cultura reduz os nitveis de ansiedade no interior da organizacdo, proporcionando maior seguranca aos atores em acao. essa seguranca que se vé ameagada dian- te de propostas inovadoras. Por isso, 0 pro- cesso de mudanga cultural requer tempo para @ construgao compartithada de valo- res e crencas novos. (SARMENTO, 1994) Os estudos sobre a cultura organiza- cional de instituig6es diversas apontam que ela é tecida na trama das relagées in- ternas e externas da organizac4o e a mu- danca, mesmo que motivada, nao se faz por imposigao. Assim é que somente mo- delos compativeis com o modo de ser da cultura organizacional sao aceitos e absor- vidos como propostas de modificacdes. Sobre a possibilidade e o processo de mudanga cultural, Teixeira aponta que esta apenas acontece quando os membros de um grupo cultural sentem-se insatisfeitos de fato com aquela vivenciada. Assim: Isso significa que as mudancas tém que se basear em razdes intrins valores e crencas para o que é necessario. que as pessoas sejam levadas a perceber 0 valor daquilo que esta sendo proposto e a sentir que seus pressupostos jd ndo es- tdo mais sendo confirmados pela realida- de, O sentimento de ansiedade, perda de autoconfianga que isso provoca gera a motivagdo interna necessdria para a ado- ¢do de um novo comportamento e a cons- "as, em novos trugdo de uma nova cultura, (...) A resis téncia depende da relacdo entre a cultura da escola e a proposta de mudanga, Ou seja, a mudanga é recebida com suspeigao e relut€ncia quando a expectativa de com- portamento contida na nova proposta ndo coincide com a concepgao existente no modo de vida adotado na escola, Essas concepgées variam de intensidade com a qual so sustentadas, Algumas, embora enraizadas, podem ser alteradas, enquan- fo outras sao quase “sagradas”, tornando a mudanga praticamente inconcebtvel. Li- gadas inseparavelmente & razdo de ser da instituicdo e a identidade profissional dos professores, essas normas, crencas e valo: res constituem a cultura escolar, esse modo de fazer as coisas na escola, por meio do qual se processa a reapropriagdo e a reinterpretacdo de normas, regras ¢ esta- tutos gerados e impostos pelos sistemas de ensino, que sao relativizados e adaptados a realidade de cada escola, Esse é um pro- cesso dindmico e permanente de aprendi- zagem coletiva que se dd no ambito da or- ganizacao escolar. (ANPED, 1998, s/p) Embora a citacao seja longa, as pala- vras de Teixeira deixam entrever a com- plexidade de mudar uma cultura escolar ou de inovar a pratica pedagégica e ad- ministrativa. Em um trabalho posterior, Teixeira (2002) reforca os limites do uso dos referenciais oriundos da drea da adminis- tracdo de empresas no contexto educacio- nal na teméatica cultura organizacional. Observa que esses trabalhos orientam-se no sentido de conhecer a cultura organi- zacional para manipuléa em direcao de melhorar a produtividade, eficdcia, eficién- cia das empresas. Com esse objetivo em algumas abordagens sao escamoteadas as contradigdes e os conilitos sociais, omite- RBPAE v.19, 1.2, juldez. 2003 293 se a questo do poder, intrinseca aos sis- temas simbélicos, deixando de incorporar adimensao politica inerente ao fendmeno educacional. Aponta para a necessidade de “politizar o conceito de cultura organi- zacional, para que sua capacidade explica- tiva possa abranger os comportamentos, as decisdes, os processos eas relagdes que constituem a dinamica organizacional” CTEIXEIRA, 2002, p. 34). Paula e Silva (2001) analisa as con- cepgées de autoridade, hierarquia e par- ticipagao enquanto componentes da cul- tura escolar. Mostra que as concepgdes que os diferentes segmentos das escolas tém da autoridade, da hierarquia e da par- ticipagdo vao criar culturas diferenciadas em cada estabelecimento de ensino em termos de organizacao. O tecido das relag6es cotidianas ¢ mar- cado pelo embate ¢ pelane- gocia¢ao constante, pela legitimagdo ou supressio da autoridade. A relacéo de desigualdade, que esta embutida no conceito de au- toridade, é um dos elementos desse embate. Nas organizagoes escolares, 0 que se observa é uma legitimacdo da autoridade baseada no cargo ocupado. No caso do professor, tem sido o diploma do qual ele é portador a habilita-lo para ser detentor de um saber e, no caso do diretor, sio o cargo e a responsabilidade legal que 0 acompa- nham que legitimam a autoridade. H4 cada vez maior resisténcia nas escolas hoje no reconhecimento das autoridades escolares. Quando a legitimagao da auto- ridade se da meramente pelo cargo buro- crtico ocupado, ocorre uma centraliza- ¢ao das decisées formais nas maos da diregao escolar e um individualismo exa- cerbado nas praticas ocorridas na sala de aula, que sio compartilhadas pelo grupo O tecido das relagées cotidianas 6 marcado pelo embate e pela negociacao constante, pela legitimacao ou supressao da autoridade Lindamir Cardoso Vieira Oliveira como um todo por receio de represilias. No que se refere ao reconhecimento da au- toridade do professor pelo aluno, a auto- ra apontaa necessidade de construgao de projetos comuns que favoregam a modifi- cacao da realidade e novos parametros na subjetividade dos envolvidos, seu efetivo envolvimento e sentimento de pertenca. Afirma a importancia de a escola pensar sua cultura de relacoes e das concepcoes de autoridade e hierarquia que estao sen- do compartilhadas. Candau (2000) contribui com a nossa reflexao ao sintetizar outros estudos exis- tentes sobre a cultura escolar. Lembra que as andlises da organizacao escolar tendem adesprezar 0 estudo da cultura organizacio- nal por vé-lo sempre sob o viés da possi- bilidade de manipular e controlar ideologicamente o coletivo es- colar e por ela ser usada lar- gamente como estratégia ad- ministrativa escapando a natureza peculiar do fend- meno educativo. Entendemos, como lem- bra Candau (2000), que nao po- dem ser negadas as inter-relacoes entre cultura, politica, ideologia e econo- mia, e € equivocado “reduzir o componente cultural aum mero subproduto ou reflexo da estrutura social vigente na nossa sociedade .) a dimensio cultural é configuradora do humano, em niveis profundos, em nivel pes- soal e coletivo” (2000, p. 62). A expressao ‘cultura da escola’ é en- tendida por alguns autores de forma dife- renciada de ‘cultura escolar’. Forquin (1993) explicita que cultura escolar refe- re-se aos conhecimentos, saberes, mate- riais culturais (cognitivos, simbélicos) que uma comunidade define como objetos de estudos, de ensino, para seus membros, num determinado momento histérico e social. Esta, portanto, ligada 234 RAPAE v.19, n.2, jul.dez. 2003 Cultura escolar: revisando conceitos aos conhecimentos trabalhados na sala de aula, selecionados, organizados, rotinizados, didatizados. Além disso, des- ses saberes que sao, geralmente, incor- porados pelo individuo na forma de es- quemas operatérios ou habitus, existem outros, diferenciados destes, que se pren- dem ao aprendizado do “mundo social”. Como diz 0 autor em pauta: Aescola é também um mundo social, que tem suas caracteristicas e vida proprias, seus ritmos e seus ritos, sua linguagem, seu imagindrio, seus modos préprios de regu- lagdo e transgressdo, seu regime proprio de producdo e de gestéo de simbolos. esta “cultura da escola" ( no sentido em que se pode falar da “cultura da oficina" ou da “cultura da priséo") ndo deve ser confundida tampouco com 0 que se enten- de por cultura escolar..." (FORQUIN, 1993, p. 167, apud CANDAU, 2000, p. 67). A*“cultura escolar” ea “cultura da esco- la” na vida cotidiana da organizacao escolar estao interpenetradas tendo momentos de tensao, conflitos e rupturas. E essas cultu- ras vivem as mesmas e complexas relacdes com a “cultura social de referéncia” dos in- dividuos que integram a vida escolar. Para que se possa compreender tais relacées, nos reportamos politica cultu- ral mais abrangente, assumindo um olhar possivel sobre esta, por situar-se num pla- no macro, constituindo-se quase um pano de fundo onde se interpenetram as cultu- ras dias diversas organizagdes sociais. Apple (2000) estuda uma determinada politica cultural emergente, com forca noto- ria, no final dos anos 80 e inicio dos anos 90, em diversos paises e estreitamente vincula- da as formas de reproducao do capital, a ideologia neoliberal e aos novos processos de reestruturacgao produtiva, que se fun- damentam em inovagées tecnolégicas e in- cluem a globalizacao da economia e dos ROPAE v.19, n.2, jul.idez. 2003 mercados. Embora este autor nao se refira especificamente a cultura organizacional es- colar, suas colocagdes configuram um pano de fundo cultural que tem implicagdes ime- diatas e diretas na cultura escolar de nos sas escolas, Para esse autor, a partir desta politica cultural foi criada uma agenda ideo- légica norteadora do que ele intitula ‘res- taura¢do conservadora’ ou nova alianga hegeménica das classes politica e econo- micamente dominantes. Tal agenda néo se limita a remover as escolas do controle burocratico e do Esta- do, com incentivo a privatizacao das esco- las, a flexibilizacao dos processos de traba- Tho, mas quer fazer valer um verdadeiro “guarda-chuva ideol6gico” na leitura ¢ nas solugdes vislumbradas para os problemas educacionais. O eixo de reflexao do autor é a politica cultural norte-americana, muito embora faca algumas incursdes por outros paises. 0 autor insiste em dizer que as es- truturas opressivas existem e que o poder opera de forma complexa na cultura, na po- litica ena economia, assumindo, por vezes, ares renovadores, mas que a andlise mais acurada evidencia um caréter conservador e discriminatério. Aproblematica da implementagao de gestdes democraticas nas escolas, como parte de politica publica estatal instituida (endo num movimento inverso, das bases para as secretarias estaduais ou munici- pais de educacao) parece poder ser enten- dida nesse pano de fundo. Aponta o autor quea retracao dos recursos do Estado nas escolas nao significa desinteresse pelos ca- minhos destas. E uma mudan¢a estratégi- ca que orienta para um controle mais pro- fundo por meio da fixacdo de curriculos nacionais e das avaliagdes nacionais. Endo se trata apenas de fixacdo de contetidos escolares, como diz 0 autor: Para que possamos entendé-las (finalida- des de um curriculo e de uma avaliagdo 235 nacionais), contudo, devemos pensar re- lacionalmente e conectar estas finalidades ao programa mais amplo da restauracdo conservadora. (APPLE, 2000, p. 62) Acrescenta que quatro tendéncias tém caracterizado a restaura¢do conser- vadora nos EUA e na Gra-Bretanha: priva- tizagdo, centralizacao, profissionalizacao e diferenciagao. Nessa perspectiva, 0 Es- tado em uma sociedade democratica e efi- ciente é fraco, a mao invisivel do merca- do deve guiar as formas de interacao social. Uma vertente neodireitista quer um Estado forte em algumas areas como aquelas que envolvem relagées raciais, especificagao dos conhecimentos que de- vem ser transmitidos as futuras gera- goes. De um lado estaria, portan- to, a hierarquia de classes do mercado e, de outro, a hie- rarquia do conhecimento e seus suportes de classe. Essa divergéncia cria uma contradi¢éo no movimento direitista. Essas contradicdes sdo resolvidas na moderniza- ¢do conservadora, politica esta que procura fortalecer um tipo de esco- Ja para as criangas de melhor nivel eco- ndmico, crescentemente privatizadas e pouco regulamentadas. Para a maioria da populacao, uma escola pobre e bastante controlada. As escolas sao hierarquizadas segundo sua aproximacao com 0 curricu- lo minimo nacional. Essa classificacao apenas expde publicamente as diferencas sociais, de género, de racas e a distancia da cultura marginalizada em relacao aque- A escola ¢ um espaco de cruzamento de culturas Lindamir Cardoso Vieira Oliveira la cleita como valida. Ha uma limitagao estrutural do sistema para vencer estes problemas. Ha até um sucesso e um fra- casso aceitaveis. A escola tem de ser discriminat6ria. Seu fracasso muitas ve- zes é uma forma de sucesso. A énfase neoliberal nas iniciativas de mercado ena privatizagao, em reduzir questdes politi- cas & economia, ao principio de merca- do, transforma o mundo, segundo o au- tor, “num vasto supermercado”. E, em assim sendo, fica atrofiada a idéia de uma educagao como parte de uma esfera politi- ca piiblica que deve ter seus meios e fins publicamente debatidos. Pode aqui ser estabelecida uma conexéo fundamental com os problemas da eleigao dos direto- res nas escolas. Essa politica cultural, apro- priadamente analisada por Apple, perpassa a cultura es- colar, desagua e se alimenta nela ¢ pode transformar me- canismos importantes de im- plementagao da gestao demo- cratica, como o processo eletivo adotado hoje por muitos Estados, numa disputa mercadol6- gica e pela hegemonia, escamoteando a dimensao politica e pablica da acao educativa, que esta subjacente ao processo. A suposigao que fazemos é a de que ao lado da politica cultural a organizacao burocrética estatal é também estruturado- rae participante da construcao da cultura daescolae tem grandes contribuigdes no sentido de minar as possibilidades de im- plantacao da gestao democratica, seja nas escolas estaduais, seja municipais. CULTURA ESCOLAR: AS CONTRIBUICOES DE PEREZ GOMEZ Talvez seja Pérez Gomez (1990, 1991, 1992, 1994a, 994b, 1995, 1998, 2001) quem mais detidamente tenha estudado a ques- 296 téo da cultura escolar numa vertente so- ciocultural. 0 que se pretende aqui reto- mar algumas das suas consideracoes, sem RBPAE v.19, n.2, julidez. 2003 Custura escolar: revisando conceitas apretensao de expor todos os pontos cen- trais levantados ou de resenhar suas obras sobre a tematica O autor parte da escola e do sistema educativo como “instancias de mediagao entre os significados, os sentimentos ¢ as condutas da comunidade social e do de- senvolvimento particular das novas gera- des” (1998, p. 11). Ressalta a importancia de ampliar a interpretacao culturalista para a compreensao da vida da escola e seu cotidiano. Para o autor, nao se pode separar cultura, politica e economia. Para entender os fendmenos culturais, é preci- so situélos dentro do conflito das relagdes sociais nas quais adquirem significacao. Cultura e poder encontram-se casados de forma indissoltivel na vida cotidiana. Sus- tenta, portanto, a partir de Geertz (1993), que existem relagdes de interdependéncia e de autonomia entre a cultura (tecido de significados que os homens dao as suas ages) e a estrutura social (rede de rela- ges sociais). Se a cultura é um tecido de significados, expectativas e comportamen- tos, discrepantes ou convergentes, com- partilhados por um grupo, € preciso com- preender o caréter flexivel e plastico do seu contetido e véla como um “texto am- biguo, inacabado, metaforico, que requer constante interpretacao” (1998, p. 15). Essa rede de significados constitui-se em mar- co Util e presente nos processos de comu- nicacdo. Os significados se objetivam em comportamentos, rituais, artefatos e “for- mam a pele do contexto institucional que 6 previamente assumido pelos agentes es- colares” (Ibidem, p. 16). A scola é um espaco de cruzamento de culturas cuja responsabilidade especifi- ca “é a mediacao reflexiva daqueles influ- xos plurais que as diferentes culturas exer- cem de forma permanente sobre as novas gerac6es para facilitar seu desenvolvimen- to educativo” (Ibidem, p. 17) O autor propde-se analisar aspectos das diferentes culturas que interagem no espaco escolar e cujo conhecimento pode clarear 0 que intitulamos curriculo oculto ou os influxos latentes que constituem uma rede simbélica da vida escolar de for- ma subterranea, tacita, imperceptivel. Di- ferencia, entao, as culturas que perpas- sam a vida escolar como: eritica, social, institucional, experiencial e académica. Nosso objetivo é apenas retomar alguns topicos da exaustiva andlise de cada cul- tura feita pelo autor. Cultura critica, para ele, designa a ra- cionalidade que se modifica continuamen- te ese aloja nas disciplinas cientificas, nas produgées artisticas e literdrias, na espe- culagao filoséfica, na narracao historica, como um dos eixos da vida da escola. Esta se transforma e é diferente para os dife- rentes grupos humanos. Vivendo um mo- mento de transi¢ao paradigmatica -do mo- derno para 0 p6s-moderno -, podemos perceber que © exagero unilateral da ra zo instrumental, que supde a submissao e a dependéncia do homem a uma verda- de universal, com a busca critica dos seus limites e das contradigdes, vem esmore- cendo diante das diferentes razes que sustentam interesses diferentes e freqiien- temente contraditorios entre si. Na racio- nalidade que se constrdi, a existéncia de rupturas e de descontinuidades, nao si nifica, na visao do autor, a negacdo do nos- so legado histérico, mas a possibilidade de sua utilizacao de maneira irreverente e heterodoxa. Vivemos num momento onde nos movemos num fluxo permanente en- tre a negacdo e a afirmagdo do sentido e da funcionalidade das construgdes sociais. O autor percebe e discute, pois, os vazios eas contradicdes do pensamento pos-mo- derno que tem soprado fortemente nas ar- ticulagdes tedricas das diferentes ciéncias. Sustenta que a perda dos fundamentos RBPAE v.19, n.2, julidez. 2003 297 classicos da racionalidade modemista nos deixa sem orientadores das praticas sociais. Ao discutir as interpenetragées entre 0 relativismo cultural, 0 etnocentrismo e a universalidade, aponta para uma alianca entre a razo e a ética como possibilida- de de se encontrar caminhos para uma nova racionalidade da representagao e da ago. Analisa a pluralidade de posigdes éticas e a possibilidade de uma ética pro- cedimental que estimule o consenso argu- mentado e, por dltimo, o dilema liberda- de-igualdade, como expoentes das opcdes de valor que percorrem a vida dos indivi- duos e dos grupos humanos. De suas reflexdes exaustivas sobre a cultura critica, que sao de ordem filos6fi- ca, epistemolgica, parece interessan- te evidenciar que a crise paradig- matica provoca uma situagao de perplexidade e de senti- mento proveniente da falta de fundamentos teéricos mais precisos por parte dos docentes para orientar suas praticas cotidianas. No curso de suas reflexdes mais relevantes, o autor em foco questiona quais valores e conhecimentos da cultura critica atual merecem ser traba- Ihados na escola, como se identificam ¢ quem os definem. Isto porque, na sua vi- so, os docentes ea instituicdo escolar en- contram-se diante do desafio de construir outro marco intercultural mais amplo e fle- xivel, ndo se limitando a um Gnico modo de pensar as realidades naturais e sociais, a verdade, o bem ea beleza. Um outro marco que permita a integracdo de valores, idéias, tradigées, costumes e aspiragées e que assu- ma a diversidade, a pluralidade, a reflexéo critica e a tolerdincia (2001, p. 77). Accultura social refere-se a ideologia co- tidiana que perpassa e se instala no cotidia- no da escola e corresponde as condigdes 298 Quais valores e conhecimentos da cultura critica atual merecem ser trabalhados na escola? Lindamir Cardoso Vieira Oliveira econdmicas, politicas ¢ sociais da pos-mo- dernidade. Diferencia-se da cultura critica porque os significados que se cruzam nao sofreram um tratamento sistematico, criti- co e reflexivo, ao contrario, sao difundidos, assimilados muito mais por via da seducao, da persuasio ou da imposicao. Define as ba- ses da sociedade pés-moderna como: o li- vre mercado, enquanto regulador da produ- 40, da distribuicao e do consumo, a busca de democracias formais reguladas por cons- tituicdes ¢ estados de direito; a onipresenca dos meios de comunicagao de massa. A par- tir daf analisa temdticas das dimensdes eco- nomicas, politicas e ideolégicas focando com atengao as teméticas da democracia, da par- ticipagao e do influxo dos meios de comuni- cago na socializacao e na construgao de esquemas de referéncia nos cida- dios. Diferenciae discorre sobre os valores eas tendéncias que, de maneira sutil, ambigua e andnima, derivam desse mar- co socioeconémico ¢ politico que se impée nos processos de socializagao das novas ge- rages, quais sejam:o ecletismo acritico e amoral que fundamenta © vale-tudo (desde que sirva ao objetivo da rentabilidade pessoal, grupal ou nacio- nal); a importancia da informagao como fon- te de riqueza e poder que conduz a uma sa- turacao de informacdes fragmentadas, que nao se estruturam em esquemas de pensa- mento para os sujeitos que as recebem; a promogdo do.individualismo exacerbado e do conformismo social; a obsessao pela efi- ciéncia; a concepgao ahistérica da realida- de; a primazia da cultura da aparéncia; 0 império do efémero no paraiso da mudan- ¢a;,a mitificacao do prazer e da pulsao; culto do corpo e a mitificagdo da juventude; a emergéncia e consolidagao dos movimentos alternativos. Para o autor essa “complexa, sutil e onipresente cultura social penetra tan- RBPAE v.19, n.2, jul fdez. 2003 Cultura escolar: revisando conceitos to os ritos e os costumes grupais como os interesses, as expectativas, os rendimentos eas formas de comportamento dos indivi duos que interagem na escola” (Ibidem, p. 126-127). E identificando suas influéncias que podemos facilitar o desenvolvimento autdnomo dos sujeitos que interagem no cotidiano escolar. Sobre a cultura institucional autor analisa as politicas educativas dos anos 90 voltadas para a educacdo escolar, aspec- tos da organizacdo da instituicdo escolar ea cultura dos docentes e o seu desenvol- vimento profissional. Ao refletir sobre a es- cola, como organizagao social, desnuda as fragilidades das propostas das instituigdes consideradas e divulgadas nos anos 80 como eficazes, eficientes e modelos a se- rem seguidos pela racionalidade que orien- ta essas avaliacoes. Relativiza as ma- croavaliacdes que permeiam e angustiam a cultura escolar hoje. Argumenta que: A incidéncia real dos fatores identificados como requisitos do funcionamento eficaz da escola somente pode ser determinada e compreendida na anilise de sua espect- fica interven¢do em cada contexto singu- lar, em cada cenério particular de intera- Go entre os individuos, as estruturas organizativas, as expectativas coletivas 0s propésitos educativos e curriculares combinados. (Ibidem, p. 154-155) Os resultados pontuais das avaliacdes escolares internas e externas devem ser dis- cutidos e entendidos enquanto elementos parciais e provis6rios de um longo proces- so. O valor do produto pontual tem sentido se consideramos as caracteristicas, a natu- reza ea qualidade dos processos de ensino- aprendizagem ocorridos. No seu entend mento a organizacao escolar deve caminhar de uma racionalidade instrumental para uma racionalidade que se orienta para o desen- volvimento sociocultural. As equipes escola- res concebem a fungao, a estrutura ea vida da escola, como ela deve funcionar de uma forma peculiar, propria, e sao esses signifi cados que devem ter canais de exposicao, discussao e amadurecimento em direcao ao cumprimento das fungdes da escola. A or- ganizacao institucional deve facilitar, condicionar, mediar os processos de comu- nicacdo e os compromissos experienciais dos seus membros. Uma instituicao organt- zada para o desenvolvimento sociocultural de seus integrantes estabelece relacoes de continuidade entre os diversos contextos onde ela esta inserida (tem canais flexiveis paraacomunidade, para o trabalho integra- do, para a associagao de alunos, para o tra- balho interdisciplinar, para as associacbes cientificas...), extraindo deles apoios e re- cursos materiais, pessoais e simbélicos para enriquecer as vivéncias escolares. Para o autor: A institui¢do escolar facilitaré melhor o in- tercdmbio cultural reflexive, aberto e plu- ral requerido se a estrutura e 0 funciona- mento de sua organizagdo dispuserem de uma quantidade de variedade interna (complexidade ou diversidade de op¢ées alternativas) que possa aceitar e incorpo- rar, n@o sem conllito, a quantidade de va- riedade e de complexidade que manifesta 0 contexto exterior. (Ibidem, p. 163) Ao tratar da cultura docente como a que est presente entre os professores en- quanto grupo social, como associagao profissional, distingue nesta os valores, as crengas, as atitudes, os habitos, os pressupostos de vida compartilhados e seus componentes ligados as formas como se dao as relacdes e interacdes na vida escolar. Para o autor, as caracteristi cas que definem de maneira prioritaria as relagdes dos docentes com seus colegas nao podem ser consideradas categorias fechadas, pois RBPAE 19, -2, julidez. 2003 239 Lindamit Cardoso Vieira Oliveira a vida dentro das escolas é complexa, con- fasa, indeterminada e freqiientemente con- tradit6ria, de modo que nem os professores, nem os alunos se comportam de forma con- sistente com as prioridades da instituigdo,a definigdo social do curriculo ou as expecta- tivas sociais majoritarias. Sempre existe uma margem de liberdade para expressar a au- tonomia, a resisténcia, a diversidade ea dis- crepancia. (Ibidem, p. 167) Com relago aos programas de desen- volvimento e formagao profissional dos do- centes, a partir de Zeichner (1993), obser- va que seus objetivos devem se orientar para reorientar o pensamento pratico co- tidiano, reconstruindo as situagdes em que se produz a ago, a si mesmos como docentes e os pressupostos do ensino aceito como basico (bidem, p. 194). Além de su- gerir a necessidade de pro- vocar a reconstrugao do pensamento pedagégico vulgar e empirico dos docen- tes (que predomina no dia-a- dia escolar), discute, a partir do conceito de profissionalidade, quais sdo os limites da chamada autono- mia dos docentes. De forma interessante argumenta que: A relativa autonomia profissional do do- cente e da escola, tal como aqui a enten- demos, faz parte deste fundamental e deli- cado equilibrio de poderes que constituem a forma democratica de convivéncia hu- mana...) A reflexdo individual é condi- ¢do necessdria mas ndo suficiente. O pro- fessor isoladamente considerado & uma vitima facil de suas pr6prias deformacées, insuficiéncias ¢ interesses, assim como das pressées institucionais e sociais, deforma- $6es que se mantém com facilidade, ali- mentadas pela prépria inércia da pressdo, institucional e grupal. (Ibidem, p. 196) Na cultura da escola, aqueles que a compéem tém uma plataforma particular de interpretacéo Essas questdes sao parte darede com- plexa de intercambios sociais en-contraveis naescola e onde tém lugar acordo ea dis- crepancia, a divergéncia de alternativas, 0 surgimento de conflitos, a tolerancia, a co- laboracdo convergente, presencas necessé- rias numa pratica cotidiana democratica. Trabalhar a capacidade de conviver com essa diversidade pode contribuir para que a profissao de docente deixe de ser vista no Ambito escolar como icone da posse in- dividual de uma determinada area ou disci- plina para situar-se como uma pratica pro- fissional marcada pela acao, pela reflexio individual e cooperativa, pela experimen- taco, pelos estudos, pelas diividas e pelos conflitos, mais condizentes estas caracte- risticas com os princfpios da gestao de- mocratica e com uma nova epistemologia das ciéncias. Com relagao a cultura experiencial, 0 autor analisao que denomina de plataforma cognitiva, afetiva e comporta- mental de onde partem os alu- nos para assentar as explica- ¢des que tém ao contatar os conhecimentos (fatos, conceitos, procedimentos, atitudes) sobre a vida na- tural e social no ambiente escolar. Procura entender, em grandes linhas, 0 processo de construgao de significados nos sujeitos, buscando captar a formagao da cultura experiencial dos individuos eapontando seu carter ambiguo, incerto, contraditorio. Res- salta, dentre outros topicos, a importancia, na vida escolar, de dar atencao n 0 cotidia- no da escola e da sala de aula, ao estilo se- mantico de cada aluno, tendo consciéncia da penetracao ideolégica que interfere na or- ganizagao semantica destes contetidos ena estrutura sintatica com a qual se expressam. Observa que, na cultura da escola, aqueles que a compéem tém uma plataforma parti- cular de interpretac4o, com graus diferen- 300 RBPAE v.19, n.2, jul.idez. 2003 uitura escolar: revisando conceitos tes de flexibilidade, descentracao e toleran- cia para as plataformas semanticas alheias. Por cultura académica, 0 autor enten- de a selecao de contetidos que sao traba- Ihados na escola. Sua preocupagaio maior é com a virtualidade destes contetidos para provocarem aprendizagens relevantes. Na sua perspectiva, a escola pode e deve cum- prir trés funcdes complementares: uma fun- cdo socializadora, uma fungao instrutiva e uma fun¢do educativa. Quando sao anali- sadas, emerge uma indagagao do o autor, cogitando se é possivel que todos os estu- dantes tenham acesso de forma relevante ao conhecimento disciplinar. Em trabalhos anteriores, Pérez Gomez (1992) procura entender a relacao entre o que considera aprendizagem relevante ea configuracao dos distintos contextos de pro- dugao, aplicagdo e reproducdo do conheci- mento. O autor discute (2001, p. 165ss) a diffcil articulagaéo ou conexao entre os con- textos de producao de conhecimentos para a vida social - e nao apenas para a escola- ‘como eles sao aplicados e reproduzidos na forma de tarefas académicas. Observa 0 autor ser lamentavel que as atividades das tarefas académicas acabem tendo um sen- tido, significado e intencionalidade s6 para avidaacadémica. Esta é uma questao com- plicada, porquea utilizacao cotidiana do co- nhecimento €, geralmente, movida por in- teresses e preocupagdes pragmaticas imediatas e, neste ambito, nao tem sentido contar com procedimentos de investiga: mais complexos e exaustivos. Isto certa- mente nao coincide com os objetivos da chamada cultura critica. O contexto pedagégico de reprodu- co do conhecimento, que configuraa pré- pria cultura académica, situa-se como um territorio intermedidrio, mediador e artificial, cujos propésitos implicitos e explicitos se confundem e mesclam em fun¢do dos inte- resses politicos, econdmicos, sociais de cada comunidade em cada €poca historica (idem, p. 271). Mesmo percebendo isto, © autor defende que a atividade académi- ca tem uma finalidade compensatoria im- portante com relacao as diferencas de ori- gem social, ao possibilitar contato com representacdes subjetivas mais elabora- das. Isto ocorre por permitir-se que a cul- tura experiencial se reproduza sem mais nem menos na escola, com 0 Gnico argu- mento de estar adaptada ao meio, 6 a me- Ihor estratégia para legitimar e perpetuar a reproducao da desigualdade (p. 272). Para que a escola se mantenha como espaco democratico de vivéncia cultural énecesséria a existéncia, de forma adequa- da, interdependente e com relativa auto- nomia, de dois subsistemas: uma estrutu- ra de tarefas académicas e uma estrutura social de participacao. Para o autor, aestrutura social de par- ticipa¢ao, por afetar a conduta e os sent mentos dos individuos e dos grupos, situa- se como um importante fator mediador das mensagens e os significados que intercambiam na aula. Ela pode ser anun- ciada por quatro dimensdes As formas de governo e as estratégias de poder que regem os intercambios na sala de aula; 0 clima psicossocial que se estabelece e que define as relagdes horizontais e verti- cais; os padrdes culturais que determinam os habitos, geralmente inconscientes, de con- duta; a defini¢do de papéis e esterestipos individuais e grupais, em torno dos quais se estabelecem as expectativas e os comporta- mentos pr6prios e alheios. (Ibidem, p. 279) Ao desenvolver uma tarefa educativa deve-se ter presente a existéncia de uma complexa rede de influxos que tanto na es- trutura das tarefas académicas como na estrutura de participacao social vao medi- ar, potenciar ou impedir a intencionalidade educativa proposta. RBPAE v.19, n.2, juil.dez. 2003 307 Lindamir Cardoso Vieira Oliveira OBSERVACOES FINAIS O nosso objetivo no presente es- tudo foi realizar uma aproximagao, em termos aprofundados, da questao da cultura escolar, a partir de um olhar para a escola enquanto organizagao social e na perspectiva sécio-cultural, no sentido de apontar possibilidades de anilise, destacar aspectos para es- tudos e pesquisas na linha de politica e gestao educacionais, facilitar a inda- gacdo e a compreensao da complexida- de da vida da escola, ao invés de bus- car ‘fechar questées’. ‘Temos clareza de que estas dimensdes do cotidiano escolar nao podem ser vistas como determinantes isolados e exclusivos das dificuldades de travessia das praticas clientelisticas, hoje predominantes, para uma gestao publica, participativa, cidada ou de avancos de gestdes democraticas na es- cola, mas, sem diivida, sdo estruturadoras destas gestdes de forma tal que, por inter- médio de sua andlise, podemos desvendar seu formato, em diferentes escolas, 0 que nos parece um desafio importante e passt- vel de enfrentamento. 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