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AUTO DA COMPADECIDA 9° Ano
AUTO DA COMPADECIDA 9° Ano
Hoje, em Taperoá, não percam um grande clássico do cinema brasileiro. Auto da compadecida, uma história que
retrata um pouco do nordeste e a força de sua gente. Vamos acompanhar as aventuras de Chicó e João Grilo, que
cansados de vagar por aí, resolvem se empregar na padaria de Eurico e Dorinha, que eram péssimos patrões.
Padre
A cachorra de Dorinha estava muito doente e ela queria que o padre benzesse o animal. João Grilo foi à igreja tentar
convencer o padre.
DORINHA: Quer dizer que se fosse o cachorro do Major Antonio Moraes o senhor benzia.
JOÃO GRILO: É padre. Isso é muita coisa! Pra mim já é motivo pra benzer o cachorro.
DORINHA (revoltada): Mas quando era pra benzer a cachorra do major Antonio Moraes não tinha essa complicação.
Pois o meu marido é presidente da irmandade das almas. Vou pedir hoje mesmo a demissão dele.
DORINHA: E olhe que os pães que veem pra aqui são de graça.
DORINHA: Que é isso? É a voz da verdade. Agora o senhor vai ver quem é a mulher do padeiro.
DORINHA: A vaca que mandei pra o vigário tem que ser devolvida hoje mesmo.
Aparece Chicó
DORINHA: Ô cabra desmandado! Eu não mandei você ficar olhando a cachorra? (preocupada)
JOÃO GRILO: Por que você foi sair de perto da cachorra, chicó?
CHICÓ: Mas se eu tivesse ficado com a defunta quem iria avisar que ela morreu?
ENCERRA O ATO I
ATO II – O TESTAMENTO DA CACHORRA
O padeiro Eurico e sua esposa Dorinha usam a esperteza de João Grilo para conseguir que o padre fizesse o enterro
da cachorra. Assim, o astuto João Grilo inventa que a cachorra tinha deixado um testamento.
JOÃO GRILO: Pois é, onde já se viu? Fazer um enterro da cachorra que deixa 3 contos pra o padre e 5 conto para o
bispo.
PADRE: Pois é senhor bispo, invenção de sua dona. A cadelinha deixou três contos para a igreja e 5 para a diocese.
BISPO: Ah, por isso que eu sempre digo, os animais também são filhos de Deus. Que animalzinho inteligente, que
sentimento nobre
ENCERRA O ATO II
Chico e João Grilo saem da padaria de Eurico depois de inventarem muita mentira e se meterem em um monte de
confusão. João Grilo passa a trabalhar na fazenda de Major Antônio Moraes. A filha do major Antônio Moraes chega
da cidade grande para passar uns dias na fazenda do pai.
MÚSICA
CHICÓ E ROSINHA ANDAM DISTRAIDAMENTE EM FRENTE À IGREJA, APRECIANDO OS FOGOS NO CÉU. QUANDO DE
REPENTE AO VIRAR-SE SEUS OLHOS SE ENCONTRAM.
JOÃO GRILO: Oxente, Chicó! Eita cabra safado. Aproveitando a festa e eu aqui trabalhando!
CHICÓ: É o que?
JOÃO GRILO: Nada não! A missa já vai começar (fala arrastando rosinha)
JOÃO GRILO: Não sei não. É só chamar Chicó que ele vem.
ROSINHA: Me deu uma vontade de comprar um confeito. Ande João, vá ali comprar.
JOÃO SAI
ROSINHA: Eu adivinhei.
Em nome do amor de Rosinha, Chicó promete botar pra correr os valentões da cidade. Medroso do jeito que é,
consegue a ajuda de João Grilo para expulsar os valentões. Assim, João Grilo arma mais um de seus planos: Chicó
fingir que é corajoso e enfrentar os valentões Cabo 70 e Vicentão. Será que Chicó vai sair vivo desse plano perigoso?
CHICÓ ORANDO NA IGREJA, PEDINDO A DEUS PARA O PLANO DE DE JOÃO GRILO DAR CERTO.
ENTRA ROSINHA
CHICÓ: Não deixa de ser, rezei pra não morrer desse mal.
JOÃO GRILO: Chicó não contou pra senhora? Que ele vai botar aqueles dois pra correr?!
ROSINHA: Se for por isso Chicó você está dispensado desse compromisso.
JOÃO GRILO: Não, não, não dona Rosinha, amigo meu não fica desmoralizado.
JOÃO GRILO: A senhora vai ver uma coisa. Esse aí é todo calmo, mas quando se espaia o negócio fede.
CHICÓ: Sinhora.
VINCENTÃO: Pois trate de ir fazendo seu último pedido, porque tô doidinho pra te botar pra rezar no céu. (fala
pegando chico pela gola da camisa)
CABO: Oxente, homi. Esse amarelo foi quem marcou comigo, esse aqui já tem dono.
ROSINHA: duelo?
CHICÓ: Marcaste foi com os dois. Mas foi só pra dar um recado de dona Rosinha. Ela mandou dizer que adorou as
joias que os senhores mandaram pra ela e que vai usar o presente daquele que sair vencedor de um duelo.
CABO: Oxente, cabra. Com medo o que? Tu já viste autoridade ter medo? (fala com voz de medo)
CHICÓ: Que é isso? Ela tá doida pra ver alguém botar os bofe pra fora.
CHICÓ: E é dois...
OS DOIS VALENTÕES SAEM CORRENDO COM MEDO, SE BENZENDO E CHAMANDO POR PADRE CÍCERO.
CHICÓ: Tô dizendo...uns mequetrefe desse metido a valente pra meu lado. Pronto. Os dois vão sumir no oco do
mundo.
ROSINHA: Pode se preparar pra pagar a promessa pra Nossa Senhora que seu pedido de amor foi atendido.
ENCERRA O ATO IV
Após botar os valentões pra correr da cidade, Chicó ganhou a fama de corajoso e foi pedir a mão de Rosinha a
Antonio Moraes fingindo ser um rico fazendeiro. O Major Antonio Moraes prometeu dar uma porca cheinha de
dinheiro após o casamento. Para adiantar a reforma da igreja para o casamento, Antonio Moraes empresta 10.000 a
Chicó. Se ele não pagasse a dívida, o major cortaria uma tira do couro de Chicó. Para livrar Chicó dessa enrascada,
João Grilo arma mais um de seus planos. Se passar pelo temido cangaceiro Severino de Aracaju e forjar a morte de
Chicó.
JOÃO: Você vai botar essa bexiga que enchi de sangue embaixo da camisa e vai fingir que morreu, mas deixe que
você vai fugir pra bem longe. Aí Rosinha finge que ficou doida de tristeza e então vai lhe encontrar.
JOÃO: Dessa vez cê vai morrer de morte matada na frente da igreja e de todo mundo que é pra ninguém duvidar.
JOÃO: Confie em mim, pode sair por aí arrotando valentia que você vai enfrentar o rei do cangaço!
O plano era João Grilo se passar por Severino de Aracaju e Chicó fingir que morreu enfrentando o cangaceiro, mas
João Grilo e Chicó não contavam com o verdadeiro Severino invadindo a cidade e a igreja.
CHICÓ: Seja quem foi o corno que invadiu essa igreja, venha cá pra fora que eu vou aparar os chifre. Vai conhecer o
que é um macho.
SEVERINO: Tá aí duas coisas que eu não sabia. Uma que eu era corno, outra que defunto falava.
SEVERINO: Responda, ao invés de ficar perguntando. Falou comigo ou não falou? (puxa Chicó pela camisa e levanta)
SEVERINO: Se fosse comigo eu ia lhe deixar viver pela coragem, mas como foi engano vai morrer com os outro.
PADEIRO, ESPOSA, PADRE, BISPO, CHICÓ. TODOS SENTADOS, SEVERINO APONTANDO A ARMA.
SEVERINO: Isso é o que a gente vai saber agora. Quem é esse topo de amarrar jegue?
JOÃO: Qual?
SEVERINO: Você mesmo que acabou de chegar dizendo que sou eu.
JOÃO: Isso é apenas uma visão. Vocês estão vendo dois, mas na verdade só tem um, ele. Com licença.
JOÃO: É que já tá ficando tarde e eu tenho muito o que fazer. A vocês até logo e muito boa viagem pra todos.
SEVERINO: Nada disso! Volte aqui e venha pra morrer com os outros.
ENCERRA O ATO V
João Grilo passou a vida usando da esperteza e de mentiras para se safar das situações difíceis, mas parece que dessa
vez o nordestino mais sabido dessa história não vai se dar bem.
SEVERINO: Qual é?
SEVERINO: Uma gaita? Pra que que eu quero uma gaita? Deixe de conversa.
JOÃO: Essa gaita foi benzida por meu padrinho padre Cícero antes dele morrer.
SEVERINO: Olhe lá!!! Aponte o rifle pra esse amarelo que é desse povo que tenho medo! E agora?
JOÃO: Homi, deixe de moleza Chicó. Depois eu toco na gaita e você vive de novo. A bexiga (fala baixo).
CHICÓ: Então vamos fazer o seguinte. Eu toco a gaita e você toma a punhalada.
JOÃO: Homi, quer saber do que mais. Vamo deixar de conversa. Tome lá! A bexiga, a bexiga! (fala baixo). Morra
desgraçado!!! (fala um pouco alto)
CHICÓ CAI SE FINGINDO DE MORTO, JOÃO TOCA A GAITA. CHICÓ AOS POUCOS VAI SE MEXENDO E POR FIM LEVANTA
DANÇANDO AO SOM DA GAITA.
SEVERINO: Valha Nossa Senhora, só mesmo tendo sido abençoada por meu padrinho padre Ciço.
FINALIZA A MÚSICA
CHICÓ: Nadinha.
SEVERINO: E antes?
SEVERINO: Meu Deus! Só pode ter sido mesmo meu padinho padre Ciço. João, me dê essa gaita.
JOÃO: Mas pode conhecer agora. O seu cabra te dá um tiro. O senhor vai visitá-lo. Aí eu toco na gaita e o sinhô volta.
JOÃO: Tá vendo que eu não faço uma miséria dessa? Garanto que eu toco.
CHICÓ: Vê demais! Tá lá vestido de azul com uma porção de anjinho ao redor. Ele disse assim oh. Diga a severino que
eu quero vê-lo.
CANGACEIRO: Não gosto de matar chefe não, mas já que tem que matar.
O CANGACEIRO SAI ATIRANDO. JOÃO TENTA PEGAR O DINHEIRO. E ATIRA EM JOÃO QUE CAI MORTO. CHICÓ CHORA E
RECITA OS VERSOS.
ENCERRA O ATO VI
Pobre de João grilo. Cumpriu sua sentença e encontrou-se com o único mal irremediável. Após morrer, encontra o
padeiro, sua esposa Dora, o padre e o bispo.
DIABO: O que é? Por que essas caras de espanto? Por acaso eu sou algum monstro?
BISPO: Não! Que é isso? Estamos impressionados com a sua elegância. Com a sua finura.
JOÃO: Pois eu tô em ponto de ter um ataque com esse fedor. Eu no lugar dele tomava um banho pra ver se diminui
essa inhaca.
O DIABO SE IRRITA E TENTA LEVAR A TODOS PRA O INFERNO. TODOS TENTAM SE SEGURAR.
JOÃO: Que raio de tribunal é esse que não tem apelação. Eu sempre ouvi dizer que uma pessoa antes de ser
condenada ela tem que ser ouvida.
JOÃO: Besteira ou maluquice eu apelo pra quem pode mais. Valei-me meu nosso senhor, jesus cristo
JESUS: Sim, Emanuel! O leão de judá. Filho de Davi. Venham todos, pois vão ser julgados.
JOÃO: Eu não quero faltar com respeito a uma pessoa tão importante, mas se não me engano aquele sujeito acaba
de chamar o senhor de Emanuel.
JESUS: Foi isso mesmo João. Esse é um dos meus nomes, mas você pode me chamar de Jesus, de Senhor, de Deus.
JOÃO: Não é lhe faltando com o respeito não, mas eu pensava que o senhor era muito menos queimado.
BISPO: Cale-se!
JESUS: Cale-se você! Você estava mais espantando que ele e só escondeu sua admiração por prudência mundana. O
tempo da mentira já passou.
JOÃO: Muito bem. A cor pode não ser das melhores, mas o senhor fala bem que faz gosto.
JESUS: Muito obrigado, João. Mas você também é cheio de preconceito de raça. Eu vim hoje assim de propósito
porque eu sabia que isso ia despertar comentários. E você, vire-se de frente. (dirigindo-se ao diabo)