You are on page 1of 18
‘SOLEGAO O NOVO PROCESSO CIVIL OrAvio VERDI MoTTA JUSTIFICAGAO DA DECISAO JUDICIAL A Elaboracao da Motivagao e a Formagao de Precedente LUIZ GUILHERME MARINONI Diretor SERGIO CRUZ ARENHART DANIELMITIDIERO © Coordenadores Digitalizada com CamScanner 182. | yustiFicAcAo DA DECISAO JUDICIAL i minar quais julgamentos f, 0. i 0 Codigo deter 8 for. ireito, Significa dizer que nao basta eee'tho hot uimente deve ser considerados como precedente. S houver adequada tidos em conside: justificagio, apta a identificarsuficientementé os Le eae deractorag o julgamento eo caminho interpretativo Pee hia da sobiesoslea te lo normativo, ndo havera formagao de Pee me ae ae : : 7 i ital 7 alitativa do precedente a quantita” , fies A afirmar que, di nao houvera precisa identificacao das razbes de fatoe da interpretagio normativa, ainda que inclufda no rol previsto pelo art. 927 do 23 CPC/2015, nao havera formagao de precedente. 3.3.3 Dimensao objetiva: a identificagao do precedente. Ratio decidendi e obiter dictum A dimensao objetiva do precedente possui especial importancia, pois se rela. ciona coma determinacao do que efetivamente évinculante: numa decisao judicial, ao que se atribui a eficdcia de precedente." Chega-se aqui a ponto fundamental da compreensao do precedente e das raz6es generalizdveis por meio das quais havera vinculacdo. Nesse sentido, indica-se que a tunica parte que € vinculante na decisao de um caso pretérito ¢ a chamada ratio decidendi®* (ou holding, no direito estadunidense). “Itis the ratioand only the ratio that is capable of being binding”, afirma a doutrina.” Ja a ideia de obiter dictum é obtida por meio de um conceito negativo,!”” tomado por exclusdo: tudo aquilo que nao constituir a ratio decidendi sera considerado como obiter dictum e, portanto, nao vinculante.!* 123. “Os precedentes, porém, ndo sdo exclusivamente formais e quantitativos — inclusive muitas vezes sequer S40 quantitativos. S40 também materiais e qualitativos. Por essa Tazio, por exemplo, acaso um julgamento de recursos repetitivos nao contenha razbes determinantes e suficientes claramente identificaveis, nao formaré precedente, nada obstante oriundo da forma indicada pelo novo Cédigo. O mesmo vale para as stimulas € para os julgamentos mediante incidente de assungao de competéncia.” (Luiz Guilherme Marinoni; Sérgio Arenhart; Daniel Mitidiero. Op. cit., p. 611.) 124, Michele Taruffo, Dimensioni del precedente giudiziario... cit., p. 419. 125. “(...) the only part of a previous case which is binding is the ratio decidendi (reason for deciding).” (Rupert Cross; J. W. Harris. Op. cit., p. 39.) 126. Michael Zander. The law-making process. 6. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2004. p. 268. Pierluigi Chiassoni, The philosophy of precedent: conceptual analysis and rational reconstruction. In: Thomas Bustamante; Carlos Bernal Pulido (org,). On the philosophy of precedent. Proceedings of the 24 World Congress of the International Association for Philosophy of Law and Social Philosophy, Beijing, 200! f ner, 2012. p22. Ying, 2009. vol. 3. Stuttgart: Franz Stein 128. Frederick Schauer. Thinking like a lawy obiter dictum significa, em Latim, “algo di 127. 8 vyer.. cit., p. 55-56. Conforme refere Schauer, ito de passagem” ou “dito no meio do caminho”. Digitalizada com CamScanner ODISCURSO DOPRECEDENTE A PARTIR DAJUSTIFICACAO | 183 Conforme refere MacCormick, no entanto, a maior di antendimentoarespeito de qualquer omeng es dificuldade para um cla- yalidade controversa da ratio decidendi. Sao a vse aot en dealgum forma existe algo como uma ratio deena Meee, set trada autoritativamentena fundamentagio da decistoou ee soonest ratio somente una proposicao normativa que uma corte ‘utiliza com oft ee joparajustificar a decisao posterior.” Para Goodhart, a expresso ratiod ide mi (etmost misleading expression in english law” Segundo Chiasconi, aparente- mente nos deparamos, nesse quesito, com uma “triste verdade”, dado at ne pos sécullos de estudos e investigacdes, ainda se procura um conceito adequado deratio decidendi.* A questa, portanto, € controvertida, nao existindo sinal de scordo a respeito de uma definicao de ratio decidendi ou de um método capaz de permitir sua identificacao,!” 0 que jé levou estudiosos, céticos em relacao a ratio gecidendi, a classificd-la como uma categoria de referencia ilusoria, dada a sua in- determinabilidade.” Algumas propostas, no entanto, em face da sua relevancia parao desenvolvimento da questao,'** devem ser referidas e enfrentadas a fim de verificar se, ao final, é possivel identificar alguma que se possa compreender mais. adequada, considerando-se a adogao de uma linha argumentativa do direito ado- tada na presente obra. “Alem dessa traducao, ha doutrina que também refere que significaria “algo dito para morrer” (Francisco Rosito. Op. cit., p. 102). 129. “The greatest difficulty in the way of a clear understanding of any doctrine of pre- cedent and thus of any kinf of case-law is the controversial quality of the ratio deciden- di, Itis.a disputed question wheter there is any such a thing as a or the ratio in a given case; itis disputed whether or not there is a ratio to be found authoritatively within a .d ratio is simply some preposition of law which be to an earlier decision as the ground some later decision - perhaps the granting of the given later given opinion, or whether the so-calle latter court or courts find it expedient to ascril of that decision which may then be used to help justify even under the guise of its being that which necessitates decision.” (Neil MacCormick. Why cases have rationes.. cit., p- 157.) 150. Arthur L. Goodhart, Determining the ratio decidendi of a case. Yale Law Journal, vol. 40. p. 162. 1930. 131. Pierluigi Chiassoni. The philosophy of precedent... cit. P- 17. 132. Luiz Guilherme Marinoni. Precedentes obrigatérios cit., p. 223; Michele Taruffo. Dimension’ del precedente giudiziaro... cit. p. 414. Robert G. Scofield identifica, no entanto, basicamente duas vertentes: a teoria classica, vinculada com a doutrina de ayy, Cros Hants, ea teoria de Goodhart (Op. cit., p: 312). ee 3. “The ill “any supposed compulsions of logical consisten ; eee Sanat Mec sate in ems of indeterminacy of he win of rai decidendi itself.” (Julius Stone. Legal system ‘and lawyers’ reasonings. London: Stevens gq, Bd Sons, 1964. p. 267-268.) *. Conforme registra Pierluigi Chiassoni. The philosophy of precedent... cit. p. 25. Digitalizada com CamScanner 184 | JUSTIFICAGAO DA DECISAO JUDICIAL 3.3.3.1 A proposta de Wambaugh do enfrenta o tema, a doutrina costuma iniciar pela tese (ou pelo teste) 135 partindo da premissa de que a ratio decidendi é uma Tegra geral : do decidido de forma diversa, Wambaugh propos un rminar se uma determinada proposicao se constitu numa ratio.®Nessa proposta, deve-seantes de tudo formularasuposta Proposicag reito, inserindo-se, logo em seguida, uma palavra que inverta o seu significa. = ede perguntar se, caso a corte tivesse admitidoa nova Proposicag ee em conta no seu raciocinio, a decisao teria sido a mesma, Sea a ta for positiva, entdo a proposi¢ao nao é uma ratio decidendi.'” Nessa pers. ate : {dica que nao se configura como ratio decidendi Seria ectiva, uma proposicao juri ‘ Uhassificada como obiter dictum.”* A doutrina do common law, no entanto, aponta como falha a proposta de Wambaugh,”” ja que a decisao pode basear-se em dois, fundamentos que, separadamente, podem levar 4 mesma conclusao. Nessa hi- potese, invertendo-se o sentido de apenas uma das proposicoes, o resultado do julgamento nao é alterado."*! Isso levaria 4 conclusao, nesse caso, de que as pro- posicdes sempre fossem obiter dicta, ja que nenhum dos fundamentos seria neces- sario para a decisao.? Quan de Wambaugh tind sem a qual o caso teria Si teste de inversao para detet 3.3.3.2 O método de Goodhart: Os material facts e a deciséo Goodhart também se propés a enfrentar o tema da definicao da ratio deciden- di, lancando-se a tarefa, apés referir-se as propostas de Salmond e Gray, de deter. minar critérios para a sua individualizacao.'” Goodhart inicia seu classico ensaio Determining the'ratio decidendi, dando exemplos de julgamentos em queasrazoes expostas pelos juizes nao deixam claras quais seriam as respectivas rationes deci- dendi. O autor segue sua andlise partindo da premissa de que a regra jurfdica apli- 135. Por exemplo: Rupert Cross; J. W. Harris. Op. cit., p. 52; Neil Duxbury. The nature and authority of precedent. New York: Cambridge University Press, 2008. p. 76; Luiz Guilher- ‘me Marinoni. Precedentes obrigatorios cit., p. 224: Francisco Rosito, Op. cit., p. 110. 136. Rupert Cross; J. W. Harris, Op. cit., p. 52. 137. Luiz Guilherme Marinoni, Precedentes obrigat6rios cit. p. 224: 138. Rupert Cross; J. W. Harris. Op. cit,, p. 52. 139, Neil Duxbury afirma que é “certamente equivocado” definir a ratio decidendi como apreposicto do julgamento cua inversio de sentido levaraajulgamento diverso (OP. cit, p. 76). 140. Luiz Guilherme Marinoni. Precedentes obrigatorios cit, p. 224, 141. Neil Duxbury. Op. cit., p. 77. 142. Idem, ibidem; Luiz Guilherme Marinoni. Preced: mI i lentes obrigatorios cit., p. 224. 143. Goodhart critica ambas as doutrinas por considerar que apenas explicaram que € necessério encontrar a ratio decidendi s eM, NO entanto, est itérii tanto (Arthur L. Goodhart. Determining the ratio decidendi ei 1625163). a Digitalizada com CamScanner r ODISCURSO ‘DO PRECEDENTE A PARTIR DA. JUSTIFICAGAO | 185 inciple) nao € necessari vel (the prin sariamente encont necessari trada nem jacorte, nem na Proposicdo juridica aplicada."" Goodhart fauna re sallastio if - re eat deque er significa que se possa ignorar completamente as azdes oferecidas P ea ‘car apenas nos fatos e na decisdo aplicada, fazendo, pss poton uma sic os autores do Realsme urdic Americano especie aa nt. , Goodhart afr jn meon bite montmento realist, que residiria na circumstanciade super ave oc Blas ein tancia de supor i yo Oviana chrey que os fatos seriam uma constante € que a decisao do juiz seria baseada numa premissa fixa de fatos rovados.'*° Segue 0 jurista, concluindo, que o crucial é compreender que os fé F orelativos e que é necessario avaliar os material facts nos quis ° jute se aseou para chegar 4 sua conclusio, isto é, nos fatos do modo como 0 inks os vé.7 Com 5550, Goodhart conclui que a tarefa reside nao em buscar os fatos e as conclusoes, masem estabelecer os material facts do modo como vistos pelo juizeasua conclu- io baseada neles.!"8 Nesse contexto, afirma o jurista americano que € necessério saber 0 que 0 juiz disse a respeito dos fatos que escolheu como materiais, pois que ele faz 56 tem sentido em relacdo com o que ele disse." Goodhart, entéo, [saa discorrer sobre forma de encontrar osmaterial facts, sendo, parands, mais importante compreender que, na teoria de Goodhart, esse é 0 primeiro e mais importante passo para determinar a ratio decidendi de um caso.'® Para Goodhart, portanto, a ratio decidendi deveria ser extraida da conjugacdo dos fatos materiais edadecisao.!>" 44. “Since, therefore, the principle of the case is not necessarily found in either the re- asoning of the court or in the proposition of law set forth, we must seek some other method of determining it.” (Idem, p. 168.) 145. “Does this mean that we can ignore the opinion entirely and work out the principle for ourselves from the facts of the case and the judgment reached on those facts? This seems to be the view of a certain American school of legal thought represented by Pro- fessor Oliphant.” (Idem; ibidem.) 146. Idem, p. 169. 147. “We do not have to be philosophers to realize that facts are not constant but rela- tive. The crucial question is ‘What facts are we talking about?’ The same set of facts may look entirely different to two different persons. The judge founds his conclusions upon a group of facts, some of which might seem significant toa layman, but which, to lawyer, are irrelevant. The judge, therefore, reaches a conclusion upon the facts as estes them, It is on these facts that he bases his judgment, and not on any others.” (Idem, ibidem.) 148. “It follows that our task in analyzing sion, but to state the material facts as seen them, Itis by his choice of the material facts M49. Idem, ibidem. 150. Idem, ibidem. 151. Em interessante artigo, Robert Scofield de! certa medida, uma concessao aos realistas. No st ‘a case is not to state the facts and the conclu- by the judge and his conclusion based on that the judge creates law.” (Idem, ibidem.) fende que a teoria de Goodhart é, em ‘ut artigo, afirma Scofield que Goodhart Digitalizada com CamScanner CIAL 186 | sustiFICAcAO DA pECISAO JUD! odhart foi criticada em artigos Publicado, a de GO! osteriormente, uma polémica com g ue gerou, Peiros autores referiram-se a tese - an Determining the os decidendj Of gee + iz faz para decidir poderia sree etament ine Cae ge ese cat os gerou uma (a nosso ver justifica a) revolta de rado. A publicacdo desses ar gos eo eeu Te ati teenies a Se I ed ue nao admite que 0 yaciocinio do juiz Possa ser com. artigo, Goodhart esclarece q! isso pode constituir um passo essencial para deter. pletamente ignorado, porque is 5 See pelo juz. minar quais s4o 0s fatos materiais com Vale referir que a proposti por Montrose e Simpson, oq ec éprio Goodhart. Em linhas ger is Goodhart como se este tivesse dito, sail 4ncia da razao juridica Rupert Cross: a importancia 3.3.3.3. A formula de Rup' ee como passo necessario para Conforme relata Duxbury, houve autores que, embora nao adotando a teoria de Wambaugh, entenderama ratio decidendi como algo necessadrio paraadecisio," Rupert Cross faz parte dessa vertente. mantinha um didlogo constante com os realistas americanos (principalmente Francis ¢ Oliphant), que negavam a categoria de ratio decidendi, tendo Francis inclusive cha- mado Goodhart de “conceitualista”. Para esses realistas, como pudemos ver na Parte , 6 que importa € estudar a resposta das cortes aos estimulos de fato (ou seja, analisar fatos e decisao), sendo absolutamente irrelevante a opinion do juiz ou pesquisar uma regra (ratio decidendi) de um caso anterior, até porque os realistas séo rule skeptics Segundo a tese de Scofield, portanto, o fato de Goodhart ter debatido com realistas, vivido no mesmo periodo e escrito no mesmo ambiente fez com que a sua tese dos material facts represente 0 que Scofield chamou de uma “concessao” ao realismo juri- dico americano, porque, embora dando énfase aos fatos e a decisdo, nao tornou como inrelevante a opinion, ou seja, 0 que o juiz justificou a respeito dos fatos e da decisio (Robert Scofield. Op. cit., p. 311-328). Duxbury, no entanto, entende que nao tenba erido io oe conceal assim: afirma que, na aula inaugural em Oxford, em 1932, tee defendeu fotemente a doutrina do precedente contra a acusagao realista de i ? ~ A influéncia de Francis, nada obstante, é notéria e também admi- tida por Neil Duxbury (Op. cit., p. 82). 152. an inte ratio decidendi of a case. The Modern Law Review. vol. 22- . Fate attigo a critica mais pesada € dirigida a Simpson, a que™ Goodhart chama de “Mr. Simpson” Simpson” (ao “professor Montrose"). Goodhartafiems que Passo que se refere a Montrose como “Prof 153, Digitalizada com CamScanner eo opis ‘CURSO DO PRECEDENTE A PARTIR DAJUSTIFICACAO | 187 ert Cross analisou o arti; 7 Rupert 108s igo de Goodhart para firmar sua definicdo de _qdecidendi. Salientaoautor queérealmentei alo rque teimportanteaafirmacode Goodhart ndo a qual nao se poderia simplesmente i i ws eae ignorar as razées oferecidas pelo ra determinar a decisdo, em especial no fi ; eae evr de eu al no que se refere na sua peculiar im- ortancia de ser He fe Para determinar quais os fatos o juiz considerou ni sic is, materials © ant : rou imateriais.'* Mas, entende o autor, ndo é apenas gob esse func amie lo queas razoes proferidas pelo juiz possuem importancia."> aduz queemal ee circunstancias nao € possivel estabelecer a ratio decidendi ) 188., Idem, ibidem. 189. Daniel Mitidiero, Cortes Superiores it, p. 67. Digitalizada com CamScanner ODISCURSO, DO PRECEDENTE A PARTIR DAJUSTIFICACAO | 195 grin pelo transcurso do prazo de dois anos; (b) a inépcia da ini stepdad deauizamento de aio resists cont Cecade rotten we provacdo da violacao literal dispositivo delei. O autorda: acao re ae is cet nainstancia de origem. Chegando © caso a julgamento shits a eal a reread perdedor dase recs fo proferdo Tongo edetalhadovoro, ara da Min, Nancy Andrigh.O voto Canalo eesaturado cm a es sendo quea parte I ésubdividida em duas partes (os dispositivos: aca juais peencia dest referem-sea0 Codigo de Proceso Civil de 1973): ie i) Daalegada violacdo 20 art. 535 do CPC; 11) Do cabimento de acdo rescisoria contra a decisao que se pretende ver res- ale gao20 de violacH0 aos arts, 485 ¢ 162, 82*, do CPC. ta) Andlise do acordao recorrido. II-b) Do cabimento excepcional de acao rescisoria em face de decisdo inter- Jocutdria. Ill) Do respeito ao prazo decadencial de dois anos; 1v) Daalegada preclusdo da matéria decidida; Todo o arrazoado proferido pela corte teve como tema central um ponto ju- ridico discutido no processo € de alta controvérsia: considerando que o texto da ei entao vigente (art. 485 do CPC/1973) referia que era cabivel acao rescis6ria contra “sentenca de mérito” ,afinal, caberiaacdo rescis6ria contra decisao que, em scio de execucao, rejeita a alegacio de impenhorabilidade de um bem (decisao interlocutoria)? Isto é: esta decisdo interlocutoria estaria abrangida pelo conceito danorma? Houve um amplo estudo € arrazoado a respeito da interpretacdo dos arts, 485 e 162, § 2.°, do CPC/1973, chegando, 0 STJ, conclusio de que era ad- missivel a acdo resciséria, com a seguinte conclusa “A decisao —interlocutoria =que, no curso da execucao, analisa a impenhorabilidade de determinado bem, nifestada pelo devedor, Portanto, é uma decisdo a respeito de uma pretensao mai adquire contornos de definitividade, assumindo, assim, caracteristicas de julga- mento de mérito”, A decisdo a respeito dessa questao juridica era favordvel ao re- corrido, Essa nao foi, no entanto, a decisio do caso. Iss0 pordues depois desse arrazo- ado, a Turma decidiu que, no final das contas, © Praz0 decadencial para proposi- turadaagao resciséria havia sido ultrapassado e, assim, ulgon ein favor dorecor- Tete, desprovendo o recurso, para decretar a ocorréncia da decadéncia: “Em 0 de decisao interlocu- "sumo, portanto, embora seja possivel admitir-se a rescisa' 7 \otia que decide questao relativa a impenhorabilidade de bem de familia, verifica- “Se que, na presente hipstese, a decisao vescindenda apenas reiterou o contetido decisio anterior. A presente acao rescisoria, portanto, deveria ter por alvo a Digitalizada com CamScanner 196 | justiFIcAcAo DA DECISAO JUDICIAL m tais razoes, conheco e dou provi jo de 30.10.1995 6) Ts acordao recortido, indeferir a pen do prazo previsto para a propositura da acao”, roferida no julgamento do caso segundo o decisao interlocut6ria que, no curso do Processy [ execugdo, rejeita aalegacdo de impenhorabilidade ie um bem, nao era necesine paraa conclusao do caso, qual seja, a decretacdo a dceadencia Poderia acon’ simplesmente, ter enfrentado a questao preliminar da decadencia esimplesmente em nenhuma palavra sequer a respeito da admissibilidage ter provido o recurso sé ila 1 ; isori isdo i u seja, sem enfrentar : da rescisoria contra decisdo interlocutoria (ou sej ainterpretage de “sentenca de mérito”). Segundo as teorias minimalistas € centradas no resultado, essa discussig juridicaem torno de um ponto controvertido da. interpretacao do direito que entio era importante para todaa. sociedade brasileira representaria apenas. obiter dictum, ja que vinculadas tao somente a questao decidida necessaria para resolver 0 caso, Nessa hipotese, entender dessa forma significa dizer que qualquer tribunal do Pais estaria autorizado a decidir de qualquer forma uma questao idéntica (nao haverig qualquer vinculacao de razGes), contribuindo para a inseguranga e aplicacao nao uniforme do direito. De nossa parte, entendemos que a compreensao da ratio decidendi deve ser vista do ponto de vista da funcdo das cortes supremas, que tomam como pretexto 0 julgamento do caso para estabelecer a interpretacdo a respeito de um ponto j ridico relevante.'® Com isso, concluimos que a proposta de Marinoni, conjugada coma de Eisenberg, seja a mais adequada ao carter argumentativo do direito. decisa curso especial, para, em face da decadéncia Como se vé, a decisao pl pivel a acdo rescisoria contra a. ee $40 iniciay Gal cg, E fundamental compreender, no entanto, que para que constitua ratio deci- dendi a questao juridica a ser decidida deve ter vinculagao direta com o caso em questao e deve ter sido objeto de debate no proceso. Ou seja, s6 formarao a ratio as questoes juridicas decididas relativas aos casos e aos argumentos das partes." A exigeéncia de vinculacao com o caso est4 em que o precedente nao pode ser com- preendido senao em fungao da situacao fatico-juridico concreta da causa.” A 190. Conforme Daniel Mitidiero, o recurso € apenas “um meio preordenado para a con- secucao da finalidade colimada a Corte Suprema: outorgar a adequada interpretagao do direito a fim de guiar a sua efetiva realizacao” (Cortes Superiores... cit., p. 67) 191. “We can take rationes for what they are — rulings on law stated as necessary parts of justifications of decisions relatively to the cases and the arguments put by given partes” (Neil MacCormick. Why cases have rationes... ct., p. 171) “(..) rimane chiaro che la struttura fondamentale del ragionamento che porta ad applicare il precedente al caso successivo é fondata suPanalisi dei fatti. Se questa anal si giustifica l'applicazione nel secondo caso della ratio decidendi applicata nel primo. precedente ¢efficace e pud determinare la decisione del secondo caso.” (Michele Tari 192. Digitalizada com CamScanner iii ODIScURSO DO PRECEDENTE A PARTIR DAJusTIFICAGAo | 197 __sncia de debate esta em que, i: ure Forma, mesmo que uma euesiae Aa da decisao se houver debate.!? 4 ireito sej ida e i 1 pallet deena sting prenscan ane eee tycom© caso em de ate endo tenha sido objeto de debate no proceso, esse pon- wo n0 constituira ratio decidendi, mas obiter dictum, Marinoni traz um ae NN sie enquadra-se perfeitamente nesse conceito. Explicando um julgamento a jo perante 0 ST) no qual se discutiu a necessidade de intimacao pessoal do de- yedor para cumprir a sentenga, nos termos do antigo art. 475-J do revogado cpcl1973, um dos ministros, para fundamentar que bastava a inuimnagae por i ravogado, discorreu sobre uma eventual responsabilidade do advogado que nao jnformasse seu cliente a respeito da necessidade de cumprir a sentenca.' A res- rrsbilidade do advogado, além de nao fazer parte do objeto da discussao (da Fruagio fatico-juridica concreta veiculadano recurso), naohaviasido em nenhum momento objeto de discussao das partes no processo."® Essa manifestacao, nesses rpnos, classifica-se como obiter dictum, i 3.3.3.6.2. Extragao da ratio em termos de premissa normativa da justificagdo interna Riccardo Guastini refere que a extracao da ratio decidendi deve dar-se em termos de premissa normativa da justificacao interna da decisto.'"* Guastini nao trabalha em termos de “descoberta” da ratio decidendi, mas refere que se trata de um processo de universalizacao que se faz conjecturalmente.'”” No mesmo sentido, Thomas de Bustamante refere que € importante que a ratio decidendi seja extraida em termos de regra que permita o posterior raciocinio Precedente e giurisprudenza cit., p. 14). Marinoni refere: “O precedente contém a justi- ficativa racional de op¢do ou decisao em favor de um sentido do direito. Porém, a ra- cionalidade da justificativa, enquanto elemento que permite a sua compreensio em face de determinada questao de direito, requer pautas formais, prévias ao desenvolvimento da justificativa. E preciso saber 0 que as raz0es visam a elucidar (0 ponto de divida), bem como o lugar a partir do qual elas so elaboradas, Ou seja, uma ratio decidendi s6 tem racionalidade externa, perante s;diversos casos € questbes juridicns, quando se sabe exatamente a situagdo concreta e a tese de direito de que fala ¢ se ‘conhece 0 ca- minho, inclusive valorativo, que a faz nascer” (O STJ enquanto Corte de Precedentes... cit, p. 197). 193, Daniel Mitidiero, Colaboracao no processo civil cit. p. 149 €ss. 194, Luiz Guilherme Marinini. O STJ enquanto Corte de Precedentes... it Ps 196. aa Idem, p, 196-197. i Riccardo Guastini. Op. cit., p: 264. 97. Idem, ibidem. Digitalizada com CamScanner 198 | sustiricacko DA DECISAO JUDICIAL estrutura de um silogismo. 198 ¥ claro que oraciocinio em termos ésimples por envolver, primeiro, que sejam. enfrentados Proble. ao, de provas, de qualificacao e de relevancia™ e, segundo, em roblematica a qualificacao juridica do fato2” mo consideracdo conclusiva, parece de fato relevante que por Guastini, extrair a ratio decidendi, embora de universalizacdo da premissa da justificacao ao caso futuro na’ desilogismo nao mas de interpretac razio de também ser P! Nada obstante, Col se busque nos termos propostos sempre. congetturalmente, em termos externa. 3.3.4. Dimensao de eficdcia (ou forga dos precedentes) A dimensio de eficacia ou a forca dos precedentes referem-se natureza e intensidade da influéncia que 0 precedente exerce sobre a decisao de um caso posterior.” A questao, a0 Jado da definicao de ratio decidendi, coloca-se comouma das mais intrincadas no ambito da common law e tem vinculacao direta com aja referida dimensdo institucional (por isso mesmo possuindo uma grande variagio dependendo do ordenamento juridico) e com as técnicas de aplicacao e utilizacao do precedente, que sero a seguir abordadas. Basicamente a discussao gira em torno da discussao se o precedente possui eficdcia vinculante ou persuasiva. Costuma-se dizer que se o precedente tem forca vinculante 0 juiz ou corte do caso posterior esta obrigado a decidir conforme o precedente,” mas se a forca for persuasiva, nao ter tal obrigacao.> 198. “A técnica do precedente apenas se torna relevante nos casos em que € possivel extrair uma ratio decidendi do tipo regra que seja capaz de elevar o grau de objetivacio do Direito. Sao 0s precedentes com uma estrutura hipotético-condicional, com uma estrutura de regra que cumprem sua funcao de produzir certeza e objetividade do Di- reito, Sem uma estrutura silogistica, a universalizabilidade e a igualdade de tratamento em face de um caso concreto deixam de ser atingiveis.” (Thomas da Rosa de Bustamante. Op. cit., p. 468.) 199. Neil MacCormick. Rhetoric and the rule of law... cit., p. 27. 200. Embora refira que 0 raciocinio do precedente deve-se dar por meio de um silogismo e reconheca os problemas a ele relativos, Thomas de Bustamante nao se propos 4 en ae “Como resolver esses problemas ¢ algo que deixarei de tratar aqui” (Op. it. p. 469). 201. Michele Taruffo, Dimensioni del precedente giudiziario... cit., p. 426. 202. “The prior case, being directly in point, is no longer one which may be used a5 # pattern; it is one which must be followed in the subsequent case. It is more than a m0- del; it has become a fixed and binding rule.” (Arthur. L. Goodhart. Precedent in english and continental law. London: Stevens and Sons, 1934. p. 9.) 203. 7 given iced may ve ‘binding’ on subsequent judges, or it may be only ‘pe™ ty, to use the terminology of common lawyers. Judges are obligated '0 follow binding precedents, but nor merely persuasi r 5 ee foowbinding ly persuasive ones.” (P S. Atiyah; Robert Summ Digitalizada com CamScanner

You might also like