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Sociologia A € oestudo cientifico da vida humana, de grupos sociais, de sociedades inteiras e do mundo humano. f uma atividade fascinante e instigante, pois seu tema de estudo & 0 nosso proprio comportamento como seres sociais. O Ambito da sociologia é extremamente amplo, variando da andlise de encontros passageiros entre individuos nas ruas a investiga- 40 de relagdes internacionaise formas globais de terrorismo, ‘A maior parte das pessoas entende o mundo em fungio das caracteristcas que nos resulta familiares em nossa propria vida ~ familia, amizades e trabalho. Porém, a sociologia de rmonstra a necessidade de adotar uma visio muito mais ampla de nossas vidas para explicar por que agimos como agimos. Ela nos ensina que aquilo que consideramos natura, inevité- vel, bom ou verdadeiro pode nio ser, e ue as coisas que con- sideramos como normais sio profundamente influenciadas por fatos histories e processos socias. Entender as maneiras sutis, porém complexas e profundas, em que nossas vidas in dividuais rfletem os contextos de nossa experiéncia social & bisico para a perspectiva sociologica Aprender a pensar de maneira socioldgica ~olhar, em outras palavras, o quadro mais amplo ~ significa cultivar a nossa imaginagio. Estudar sociologia nao ¢ apenas um proceso rotineiro de adquirir conhecimento. Um socidlogo é alguém que consegue se ibertar da imediatez das circunstancias pes- soais e colocar as coisas em um contexto mais amplo. O tra balho sociolégico depende daquilo que o autor americano C. Wright Mills, em uma expressio famosa, chamou de (Mills 1970) ‘A imaginagio sociol6gica exige que, acima de tudo, “nos afastemos em nosso pensamento” das rotinas familiares de nossas vidas cotidianas para enxergé-las como algo novo. Considere o simples ato de tomar uma xicara de café. O que poderiamos observar para falar, do ponto de vista sociol6gi- co, sobre esse comportamento aparentemente desinteressan: te? Uma quantidade enorme de coisas. Podemos apontar, antes de mais nada, que 0 café nio é apenas uma bebida. Ele tem valor simbélico como parte de nossas atividades sociais cotidianas. Muitas vezes, o ritual as- sociado a tomar café é muito mais importante que o simples ato de consumir a bebida. Para muitos ocidentais, a xicara ratinal de café esté no centro de uma rotina pessoal. Ela é 0 primeiro passo essencial para comecar o dia. O café da ma mha costuma ser seguido, mais adiante no dia, por um cafe- inho com outras pessoas ~ a base de um ritual social, ¢ néo apenas individual. Duas pessoas que marcam de se encontrar para tomar um café provavelmente estio mais interessadas em se reunir e conversar do que naquilo que iro beber de verdade. Em todas as sociedades, beber e comer proporcio- nam ocasiées para interagio social e a encenagao de rituais ‘que oferecem um tema rico para estudo sociolégico. Em segundo lugar, o café é uma droga que contém ca- feina, que tem um efeito estimulante sobre o cérebro. Muitas pessoas tomam café pelo “impulso extra” que le proporciona. Longos dias no escritério ou madrugadas estudando tornan se toleréveis com intervalos regulares para um café. O café é uma substancia que leva a0 habito, mas os vieiados em café geralmente nio sio considerados pela maioria das pessoas em culturas ocidentais como “usurios de drogas Como o alcool, o café é uma droga socialmente aceitivel, ao passo que a ma conha, por exemplo, néo ¢. Anda assim, existem sociedades que toleram o consumo de maconha, ou mesmo de cocaina, ‘mas desaprovam 0 café eo alcool. Os socislogos se interessam nas razbes para essas diferengas ¢ em como vieram a ocorrer. Thoontrar amigos para um café fa parte de um 19 i € mais que apenas uma bebida agradvel para exes Em terceiro lugar, um individuo que toma uma xicara de café se encontra em meio a um complicado conjunto de relagGes sociais e econémicas que se estende pelo mundo. O café 6 um produto que conecta pessoas em algumas das par- tes mais ricas e mais pobres do planeta: ele é consumido em grandes quantidades em paises ricos, mas ¢ cultivade prin. cipalmente em paises pobres. Juntamente com o petréleo, 0 café éa mercadoria mais valiosa no comércio internacional; cle éa maior fonte de moeda estrangeira para muitos paises. A produgio, o transporte e a distribuigio de café exigem transagdes continuas entre pessoas a milhas de distancia da quele que bebe o café. Estudar essas transagdes globai tarefa importante da sociologia, pois muitos aspectos de nos sas vidas hoje sio afetados por influéncias sociais e comuni: cages de Ambito mundial Em quarto lugar, oato de bebericar um cafezinho pressu: pe um longo processo de desenvolvimento social e econdmi- co. Juntamente com outros elementos conhecidos das dietas, Ocidentais ~ como o cha, bananas, batatas e agticar refinado =o café somente passou a ser consumido amplamentea partir do final do século XIX, mesmo que jé fosse considerado cle: gante entre a elite antes disso, Embora a bebida seja originria do Oriente Médio, seu consumo em massa data do perfodo da expansio Ocidental, ha aproximadamente dois séculos. Pra. ticamente todo o café que bebemos atualmente ver de dreas alhadores, ces vide ependem da planta di como a América do Sul ea Africa, que foram colonizadas por curopeus; de mancira alguma, ele 6 uma parte “natural” da dicta Ocidental. O legado colonial teve um impacto enorme no desenvolvimento do comércio global de café Em quinto lugar, o café é um produto que estd no co: racio dos debates contemporineos sobre a globalizacio, 0 é:cio internacional justo, os direitos humanos e a des- truigio do meio ambiente. A medida que o café cresceu em popularidade, ele foi sendo “marcado” e politizado: as dlecisdes que os consumidores tomam sobre o tipo de café que beberio e onde compri-lo se tornaram estlos de vida As pessoas podem decidir tomar apenas café orginico, café descafeinado ou café que tenha sido “negociado de forma justa” por meio de esquemas que pagam o prego total de mercado para pequenos produtores em paises em desen: volvimento. Podem preferir ser fregueses de cafés “inde pendentes’, em ver de redes de cafés como a Starbucks, € podem decidir boicotar o café de paises com um perfil negativo de direitos humanos ¢ ambiental. Os socidlogos estdo interessados em entender como a globalizacao au: rmenta a consciéncia das pessoas sobre questées que ocor- rem em cantos distantes do planeta e a leva a agir em suas préprias vidas com base nesse novo conhecimento, Para 03 socidlogos, o ato aparentemente trivial de tomar café dif cilmente poderia ser mais interessante ca para ‘do secilo XVI eram oontros de fofoca e mitiga polit 8 olites soca britanicas Estudando as pessoas e a sociedade ‘A imaginagZo sociolégica nos permite ver que muitos fatos que parecem dizer respeito apenas ao individuo na verda- de refletem questées mais amplas. O divércio, por exemplo, pode ser um processo muito dificil para alguém que passa por um - 0 que Mills chama de um “problema pessoal’ Po: rém,o divércio também € uma “questio piiblica” importante «em muitas sociedades a0 redor do mundo, Na Gra-Bretanha, mais de um tergo de todos os casamentos acaba em divéreio dentro de 10 anos. O desemprego, para usar mais um exem- plo, pode ser uma tragédia pessoal para alguém que perde o emprego e nio consegue encontrar outro. Ainda assim, ele vai muito além da questio do desespero privado quando mi hoes de pessoas em uma sociedade se encontram na mesma situagio: € uma questao publica que expressa grandes ten: dencias sociais. Tente aplicar a imaginagao sociolégica a sua prépria vida. Nao é necessério pensar apenas em fatos perturbadores. Considere, por exemplo, por que vocé estévirando as paginas deste ivro ~ por que decidiu estudar sociologia? Talvez voct seja um estudante de sociologia relutante, que esté cursando a disciplina apenas para satisfazer um requisite para uma car reira futura. Ou pode estar entusiasmado para conhecer mais sobre a sua sociedade e a disciplina da sociologia. Seja qual for sua motivasao, é provivel que vocé tenha muita coisa em comum, sem necessariamente saber, com outras pessoas que também estudam sociologia, Sua decsio privada refletea sua posicdo dentro da sociedade. Seri que as caracteristicas seguintes se aplicam a vocé? Voce é jovem? Branco? ‘em de um nivel prfissional Jé fez, ou ainda faz, algum trabalho esporidico para complementar sua renda? Vocé quer encontrar um bom emprego quando concluir sua formagio, mas nao se dedica especialmente a estudar? Vocé no sabe exatamente o que é sociologia, mas pensa que tema ver com a maneira como as pessoas ager em. grupos? Mais de trés quartos das pessoas responderda “sim” a todas essas questoes. Os estudantes universtérios nao so tipicos da populagio como um todo, mas tendem a ter ori- gens sociais mais privilegiadas. E suas posturas geralmente refletem aquelas de seus amigos e conhecidos. Nossas bases sociaistém muito a ver com o tipo de decisio que considera- mos apropriada Nenhuma ou poucas caracteristicas se aplicam a vocé? Talver vocé tena vindo de um grupo de minoria ou em si- tuagio de pobreza. Talver vocé seja de meia-idade ou idoso Da mesma forma, outras conclusées provavelmente se apli cam. F provivel que voc® tenha tio que batalhar para chegar conde ests, talvez voeé tenha tido que superar reagbes hosts dde amigos e outras pessoas quando disse a eles que pretendia estudar na faculdade ou talvez vocé esteja combinando 0 en- sino superior com a maternidade em horito integral Embora sejamos todos influenciados pelos contextos so ciais onde nos encontramos, nenhum de nés € determinado totalmente por esses contextos em nosso comportamento, Possuimos, ecriamos, nossa prépria individualidade. £ tra balho da sociologia investigar as conexées entre o que a so ciedade faz de nds eo que fazemos de nds mesmos eda socie dade. Nossas atividades estruturam. 0 mundo social que nos rodeia e, a0 mesmo tempo, sio estruturadas por esse mundo social. 0 conceito de estrutura social é um conceito impor- tante em Sociologia. le se refere ao fato de que os contextos sociais de nossas vidas néo consistem em variedades aleat6 rias de flos ou atos; eles sdo esteuturados, ou padronizados, de maneiras distintas. Existem regularidades na maneira como agimos enas relagies que temas ns com os outros. “Todavia, a estrutura social nio é como uma estrutura fisica, como um prédio, que existe independentemente das, aces humanas. As sociedades humanas estio sempre em processo de estruturacao, Seus componentes bisicos ~seres hhumanos como vocé e eu ~ as reconstroem a cada momen: to, Considere novamente 0 caso do café. Uma xicara de café rio chega em suas mios de forma automatica. Vocé decide ira um café especificoe escolhe se vai tomar um latte ou um expresso. A medida que toma essas decisbes, juntamente com. milhées de outras pessoas, vocé molda o mercado do café e afeta as vidas dos produtores de café que vivem talver & mi Ihares de milhas de distineia, no outro lado do rmundo. 22 [Anthony Giddens Quando comecam a estudar sociologia, muitos estudantes ficam. surpresos com a diversidade de abordagens que encontram. A sociologia nunca foi uma disciplina em que existe um corpo de ideias que todos aceitam como vilidas, embora haja ocasiges «em que certas teorias sio mais aceitas que outras. Os socidlogos uitas vezes discutem sobre como estudar © comportamento umano e a melhor maneira de interpretar os resultados das, pesquisas. Por que isso ocorre? Por que os socilogos néo che- gam a.um consenso mais consistente, como os cientistas natu- rais parecem conseguir fazer? A resposta esti ligada & propria natureza do nosso tema de estudo, A sociologia diz respeito as nossas préprias vidas e nosso comportamento, ¢ estudar nés ‘mesmos € coisa mais dificil e complexa que podemos fazer. Tentar entender algo tio complexo quanto o impacto da in. dustrializagio sobre as sociedades, por exemplo, aumenta a importincia da teoria para a sociologia. As pesquisas factu- ais mostram como as coisas ocorrem; porém, a sociologia nio consiste apenas em coletar fatos, por mais importantes e inte ressantes que possam ser. Por exemplo, ¢fato que eu compre uma xicara de café hoje pela mand, que ela custou uma cer- ta quantidade de dinheiro e que os grios de café usados para faé-a foram cultivados na América Central. Contudo, em s0- ciologia, também queremos saber por que as coisas acontecem «, para fazé-lo, temos de aprender a construir teorias explica- tivas. Por exemplo, sabemos que a industrializagéo teve uma grande influéncia na emergéncia das sociedades modernas, ‘mas quais sio as origens e precondigdes para a industrializa- «40? Por que encontramos diferengas entre sociedades em seus processos de industrializagdo? Por que a industralizagio esta associada a mudangas em formas de punigio criminal ow em estruturas familiares e sistemas matrimoniais? Para responder essas questdes, temos de desenvolver um pensamento teérico. {As teorias implicam a elaboragio de interpretagies que podem ser usadas para explicar uma ampla variedade de si- tuagées empiricas ou “factuais. Uma teoria sobre a indus trializagio, por exemplo, deveria se preocupar em identificar We vista, a pintura p pintura mostra mais Drecisarn da teoria como um o pintura de | neghel fe um grande numero de pesso 100 sentido. Todavia, s je 100 provérbios que exam ontexto para ajudé-los a tira tulo, Provérbios holandeses, ajuda s quando ela foi pintada no século XVI ontido de suas envol oxph observagae: as principais caracteristicas que os processos de desenvolvi- ‘mento industrial tgm em comum e tentaria mostrar quais deles sio importantes para explicar este desenvoivimento. E claro, a pesquisa factual e as teorias jamais podem ser total- ‘mente separadas. Somente podemos desenvolver explicagbes tedricas vilidas se formos capazes de testé-las por meio de pesquisas factuais. Precisamos de teorias para nos ajudar a conferir sentido dos muitos fatos que observamos. Ao contrério da afirmagio popular, 0s fatos nao falam por si mesmos. Muitos socidlogos trabalham principalmente com pesquisas factuais, mas, a me- nos que sejam orientados por algum conhecimento tedrico, & improvavel que su trabalho consiga explicar a complexidade das sociedades, Iso se aplica mesmo a pesquisasrealizadas ten: do-se como objetivo apenas o diagnéstico priticos em mente. Muitas “pessoas pritias” tendem a suspeitar de tebricos gostam de se considerar "pé no chao” demais para prestar atengio em ideias mais abstratas. Ainda assim, todas as deci- sées praticas tm alguma premissa tedrica por tris delas. O gerente de uma empresa, por exemplo, pode ter pouca con: sideragio por “teorias” Porém, toda abordagem & atividade empresarial envolve pressupostos teéricos, mesmo que sejam técitos. Desse modo, o gerente pode pressupor que os empre gados sio motivados para trabalhar principalmente por cau: sa do dinheiro - o nivel dos salarios que recebem. Essa é uma interpretagio tedrica subjacente do comportamento humano, ainda que seja equivocada, como as pesquisas em sociologia industrial tendem a demonstrar. Sem uma abordagem teérica, nio saberiamos o que procu: rarao comerar@ estudar ou ao interpretar nossos resultados a0 final da pesquisa. Todavia, a explicagao de evidéncias factuais no € a nica razio para a importante posicio da teoria na so:

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