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f PERSPECTIVAS DO HOMEM (scum 4 omen) pros ruavicnnos eeupseeee oeepreseseeree A consTRUCHO DO MUNGO. de. or a ‘s powotes bo Pans, hae age ‘Nrarworo\oGta EON. par aon nero 0 HOD ce oper ane SttnowsunciCENEA Bus SOCDADESPRMEMIVAY, 6 Cp Ton {atacASUPOLTRCAS BN ANTROROLOGIA Cpe ‘Staaro f'n rataonn s rcnece # LNG A Cnn Sich Dated tea tu La Crt ‘Glcrstoe a rALAvnA Tra MEMORIA £98 TIDE, 6 Are cent evens — ‘Os cagaones bn nsastOn xt ort hoe IIMMRONACRE SDIDOUEA, 2 Cabr cn OS CACADORES DA PRE-HISTORIA AIDADE DA RENA EE durante a segunda parte da glaciaeo de Wirm que 0 homo sapiens sapiens, isto &, 0 nosso semelhante, aparece na Europa, fonde vai descnvolver a civilizagéo da idade da rena. Os specialists situam 0 comeso deste acontecimento cerca de (quareata mil anos antes da nossa era, Desde hé alguns anos, foram feitos grandes progressos na cronologia deste perfodo Medindo a radiosctividade dos carvies e dos ossos descobertos fas camadas, foi possivel fixar datas relativamente previsas (metodo do carbone 14 ou 14 C). Descobre-se que 0 Muste- Fiense entra no seu limo perfodo cerca de 50 000 antes da nose era. A transigio para o Pecigordiano dura até cerca de 30 000. O surignacense cortesponde mais ou menos aessa data © Solutrense situa-se por volta de 18 000 © o Magdalenense estende-se de 15 000 até cerca de 9000 antes da nossa era Gragas a este método cientifco, a austncia de escrita twornou-se menos enue! € quase s© pode dizer que os limites dos tempos histricos recuaram de einguenta mil anos. Ba primeira data certa de toda a histéria da humanidade, significando que a idade da rena durou pelo menos trinta mil ‘anos ¢ que mais dez mil anos decorreram ene 0 seu final © @ Epoca actual, Depois do period de fro hvimido que afligi 0 homem de Neandertal, 0 clima tora-se provisoriamente mais ameno; na segunda parte da glaciagéo de Wilrm, toma-se seco e muito fro. Encontrase a casa dos periodos procedentes, cavalos e bois tot selvagens; mas as renas, desta vez, tém clara prodominéncia. Existem também os bigontes, os mamuies, os rinocerontes lanos0s, 08 cabritos monteses e, no sudoeste de Franca, 0 ‘cusioso anilopesaiga, animal das estepes frias da Buropa e Asia ‘Central. Abundam 05 predadores, sobretudo © lobo, compa- ‘hoiro vulgare interessado das manadas de renas A paisagem, durante 0s periodos de fio extremo, parecia-se com a da Sibéria actual, com um aspecto éretico devido & presenga dos gigantescosglaciares que cobriam os Alpes ¢ os Piringus. Zonas de tundra de liquenes alternavam com uma tiga ppantanosa, semeada do bétwlas e de pisheiros. Os ventos continentaisestendiam o dominio da estepe a regions afastadas os glaciares; a loresta devia conservar-se a0 longo dos cursos 4e gua, nos Tocais abrigados. Um tal contexto natural favorece 1 muliplicagio da eaga grossa ¢ os cursos do gua de regime inregular, alimentados pelo degeto dos glaclares, sto propicios an desenvolvimento de salmées e tutas, de modo que, longe de incomodar 2 instalacao do homem,o clima da éltima pere da laciagdo de Wirm devia proporcionar abundantes recursos em aga e pesca. [Nas nossas regides, todos os vestigios humanos anteriores & {dade da ena sio 0s dos paleantropianos, paricularmente os dos homens de Neandertal. O que nio significa que, enquanto os paleantropianos ainda povoavam a Europe ocidental, homens semelhantes aos actuals no tenham vivido noutras pontos do lobo; mas o frio himido e a floresta densa talvez os mantves- sem afastados. Na realidade, @ floresta luxuriante nio 0 habitat favorito do cagador, pois aia densidade da capa € fraca ‘Quando 0 tempo arrefeceu de nove, apés um perfodo ameno pessageiro, tomando-se, simultaneamente,s6°0, pode-se adm {ir que 0s paleantropianos que ainda viviam nas nossas regiGes assistiram & chegada das grandes manadas de renas © dos cagadores de um tipo humano mais evoluido que os seguiam, [Nao sabemos quais foram os primeiros contactos entre hbumanidade antiga ¢ 2 nova. O certo € que, a partir desse momento, 6 homem de Neandertal desaparece definitivamente. 102 (© home sapiens sapiens (Os recém-chegados, apesar de muito diferentes dos palean tropianos, nfo eram, no entanto, todos semelhantes entre si. ‘Desde principio da idade da rena, viveram em Franga homens como aquele cujo erinio foi descoberto na gruta de Cro-Magnon, em Eyzies (Dordogne). Fram de grande estatura {cerca de 1,80 m), de crnio alongado e face curta. Dois ou tts fulros exemplares desta «raga de Cro-Magnons foram desco- bertos na Dordogne e perto de Ménaco Datando da mesma época, descobriram-se uma dezena de seres muito semelhantes a0 homem de Cro-Magnon, mas, no ‘ntanto, diferentes, Uns slo grandes, 0s outros médios; alguns tem um erinio menos comprido, outros a face mais curta, Isto nostra qve o homem de Cro-Magnon néo viviaem toda a parte e jue, tal como na actualidade, os tipos humanos jévatiavam de ‘uma regito pare outa ’Ao todo, descobriraz-se na Europa os resos de uma centena de homens de idade da rena (on Paleoiitico superior); 0s do Chatelperronense (35 000), ainda mal conbecidos, parecendo ter ainda caracteriticas neandentalianas (Arey, Saint-Césaire) depois os do Aurignacense (30 000) e dos perfodos seguintes a ‘0 fim do Paleolitice superior, no Magdalenense final (8000). No decurso destes milénios sucederam-se diferentes tipos hu- manos. O mais conhecido 6 0 de Cro-Magnon, que difere radicalmente de todas as formas que 0 precederam: calota craniana elevada, estreto reborto orbitel, Srbitas quadrangula- res, nariz relativamente esteto, fossa canina (salincias da face) bem mateadas, queixo bem desenvolvido.& dif aplicar 08 homens fosilizados uma definiio relativemente & «cor» Desde quando distinguimos os «negros», dos «amarelos» e dos brancoss? A taica:via de investgacdo reside na andlise das Caracteristicas eranianas, Os individvos mais antigos parecem ter jd alguma semelhanga de forma com os individuos actuais. A dlistingao entre os afticanos, os amarelos e os brancos podria recuar de bastantes milénios. O mesmo poderia acontecer com ‘0s amerindios, dos quais se conhecem ja vérios, individuos que viveram hé mais de 10 000 anos. A distingao dos homens através da forma do crinio possivel para grupos bem earacteri- Zzados, mas 08 individuos da Paleolitico supetior sio raros & ws frequentemente ambiguos. No entanto, a maioria dos exemplos permite supor que cada uma das grandes massas racisis domtina lum continent. E diffil dizer se 08 arqueuntropiar3s (homo erectus) j6 apresentavam diferencas de coloragio dos tegumen tos. A presenca de vestigios de homo erectus em todo o mundo antigo © 35 muitas variagdes de pormenor dos pitecantropos, sinantropos, lantropos....parecem permitir pelo menos formulagio da hipstes, Em resumo: durante todo o paleolitico superior a Europe, com particular, a Franga foi povoada por homens wm poco diferentes uns dos outros, um pouco diferentes também das ragas actuais, mas jé to proximos de née que podemos considerar que, com eles, comeca verdadeiramente a humani- dade actual. 0 sflex em kaminas Os pré-historiadores distinguer, na idade da rena ou Paleol- tico superior, varias correntes culturss, ‘© Chatelpesronense, de que jé falémos. Constitui uma verda- deiratransigao entre o Musteriense (De Moustier, Dordogne) eo Paleolftco superior e, tal como se verificn nos periodos de ‘mutacZo cultural, as principsis pesas do equipamento téenico so adoptadas das duas culturas: ponta de Chatelperron © ppequeno raspador de fragmento, © Aurignacense (Aurignac, Haute-Garonne), ~30 000. Am- plamente espaliado na Europa ocidental. Corresponde 10s homens de Cro-Magnon. Comego da arte Figurativa abstract 0 Gravettiano (La Gravette, Dordogne), =25 000. Faz parte do conjunto Perigordiano, 0 Solutrense (Soluteé, Sabne-et-Loire), ~18 000. Caracteri- ‘zado pelas pontas de silex em forma de Tolha de loureiro, (© Magdslenense (La Madoleinse, Dordogne), ~15 000, 9000, Uma fase do Paleoitico superior. Desapatigio do rmamute, do rinoceronte, da rena, © Bpipateolitco marca a trnsigéo pars o Mesoltco. Examinaremos primeirsmente o fundo comum a estas diver- sas culturas e, em seguida, as earacteristicns particulares que levaram a classifi ‘Talvez se lembrem que, no capitulo VI tinhamos fcado com tum nécleo de silex na mio direta, preparado para uma série de oastes no sentido do comprimento. Retomemos agora o pesto inacabado: batamos de novo no micleo para obter fragientos ‘muito mais compridos do que largos, aio jé ponteagudos mas ‘com os bordos paralelos. Estes fragmentos sao liminas c, a partir do dia em que foram produzidas, as condigtes “de existéncia dos cagadares mudaram profundamente, Com um quilo de matéria-prima, os cortadores de sflex rmusterienses obsinham dois metros de Go, endimento ja hon oso que permitia 20 cagador ausentar-e durante longos meses sem Gr que voltar as pedreras de sflex. Com o fabrico em lamina, os homens da idade da rena dio um salto considerdvel seis a oito metros por quilo de laminas grossas, até vinte ou Vine e cinco metos de Minas fina ¢lamelas. A isto preciso Jumtar as aparas, 05 fragmentos de preparagio, ss lminas {quebradas no decurso da sua utilizapio, que ainda vio servie, consoante a sua forma, para uma quantidade de utenstios cspecializados. A libertgdo relativamente 2s fontes do silex {oma-se praticamente total; os cagadores podem obter directa- ‘mente ou por toca, a quantidade minima de matria-prima que, oravante, Ihes basta para fabricar armas e utensilos. Para ilustar a importincia desta revolucio ténica, recueinos uum pouco. Nos tempos da indistria acheuliana, © homem ppermanece apegado as repides onde encontrasilex ou uma boa rmatéria de substituiglo; a eata onde os pré-istoriadores ass naam a localizagio de objectos acheulenses esté praticamente vazia nas regides onde no se encontra pedra para fabricar Uutensiios. Na época da indGstria mustero-levalloisiana, a difu- so estende-se, 0s utensilios de silex excedem, na carta, as regides em que se encontra a pedra; mas ainda subsistem extensos vazios e, muitas vezes, nas regis afestadas do silex, ‘apenas as armas mais importantes so talhadas nessa matéria preciosa, Sendo o resto fabricado com rochas de segunda ‘categoria. Na idade da rena, os vazios sio preenchidos: 0 homem circula agora por toda a parte € abancona utensilios de bom silex jf usados. Devemos coneluir que o corte em laminas foi descaberto pelo ‘homo sapiens? Na realidad trata-se apenas de um desenvolvie 105 POR QUILOGRAMA De SILEX. (© ABBVELLIANO OBTEM 10 CENTIMETAOS DE FIO UTIL | x | ( ane! | ‘ ACHEULENSE oeTeM COMUSTERENSE ooTEM evernos ‘OMAGOALENENSE O8TEN mM A primera etna econsmicas da histia humana mostra gue, desde a origem da téencas, a matériarprina e 08 impertivos do transporte dominaram 9 fabrico ee Ube @ a 20 METRO 106 ‘mento longinguo das téenicas anteriores © & possivel que o primeiro operisio que praticou tal core ainéa tenha sido um paleantropiano. Mas foi certamente o homo sapiens quera mais parece ter difundido @ nova indGstria; onde se encontram liminas, pode-se frequentemente dizer que quem as fez foram homens semelhantes 20s actusis. A caracteristica essencial da inddstria daidade da rena &a ulizagio generatizada de minas de silex como ponto de partida de um grande nimero de Utensils. AS Itminas so etocadas, aparethadas para servirem quer como facas, quer como raspadores,pingas ou burs. Cada periodo desenvolveu 05 seus tipos de utensilio, como veremos mais adiante. Mas dois dles so comuns toda dade de Amira ‘As peles de usos ¢ de hienas também deviam servir de tapete ‘ou de coberior. Nos solos habitados na idade da rena, encontra- ‘mos falanges ¢ garras desses animais, partidos numa ponta e a ‘mareadios pelo sex; deviam Scar agarradas& pee, depois dese ter esfolado 0 animal, coma nos nossos actuais tapetes. de uarto. Metais,olaria © metal nfo € ainde utilizado como tal na idede da rena, ‘Quando muito, poderemos citar as toneladas de oere vermeho ‘(que & um mineral defer) empregues para decorar as habita- g6es e as sepulturas. Poe vezes, encontram-se, também, blocos 4e ferro natural que devern ter sido apanhades como objectos curiosos, devido a sua densidade. Encontrmos mesmo por duas vezes, no Perigordiano antigo, fragmentos de galena grandes ‘como nozes, que terio provavelmente sido reolhidos por causa dos seus cristas cintlantes NNenhuim fragmento de olaria foi idenifeado com exactiio ‘os milhares de tos pesquisados. Alguns pedagos de teracota encontrados foram produzidos pelo calor des lareiras, que cozia o solo 4 sua volta. Estes homens que viviam sobre argila das _prutas nio parecem ter sabido utiliggta para fabricar recipien- tes. Conhecemos, alls, virios povos recente que ignoraram 0 uso da olara (os némadas da Asia, os Indios da América, os Occanianos) e mesmo outros que, depois de aterem possuido, = perderam por razies diversas (como 05 Ainos © 08 Exquims do norte do oceano Pacifico, AAs correntes culturais: © Chatelperronense ou Perigordiano antigo (Os homens da idade da ena pertenciam, como vim, a tipos lhumanos diversos. A sua civilizagio tambérnnio foi uniforme; ‘orentes culturais diversas desenvolveram-se sobre wm fundo ‘comum consoante as épocas ¢ as regies. A comente a que chamamos Perigontiana (porgue muitas escobertas que a ela respeitam foram ites nas grutas, do Peérigont) apareceu imediatamente apés © periodo intermédio {que linha sucedido & eivilizagao musteriense. Ao longo deste periodo intermeédio, o¢ homens ainda no tinham substituido os fragmentos de silex por ldminas, mas j@ fabricavam buris, raspadores © facas. As facas eram feltas com fragmentos 112 eee 0 2em Pontes de Chatelperron. E uma «lina de bordo abatdos que caracteriza 0 Perigordiano antigo. No borde encurvado véem se os Yetoques abraptos que fasem dela uma faca de fo dirclto¢ costes embotadas. (iangulares @ que se abatia um bordo com retoques abruptos a fim de o abaular, como sucede nos nossos canivetes. Logo no Prineipio do Perigordiano aparecem facas, obtidas mio de fragmentos, mas de lminas. Chamamos-thes «pontas de Chi- telperrons. Estes utensilios conservaram o bordo anqueado das facas de fragmentos. A sua tradi va-se manter 20 longo de toda a idade ds rena, mas afinar-se-fo progressivamente, 0 bbondo endirita-se-, a ponto de se omar dieito, ¢ serio mais pequenos. No comeso do Perigondiano, a ponta de Chutelperron e os buris cram quase 0$ tnicos sinais da aparigéo de uma nova inddstria; depois, vemos aparecer outros instrumentos com retogues abruptos sobre um bordo. Ao mesmo tempo, desapare- ‘cem os dltimos vestigios da indisria musteriense ea nflutncia da comente aurignacense (de que adiante falaremos) trz novos ‘uteasilios como 0 raspador carenado, 113 Raspadorcarenado. B wn raspador muito espeso que se enconira nas camadassurignacenss, No Perigordiano antigo, os objectos de osso siorelativamente pouco abundantes, mas jé se encontram furadores € pontas de ‘zagaias curtase plantas ou cilindrias, Estas itimas alongam-se progressivamente; no Magdalenease, tomar-se-t0 hastes por vezes com 30 em de comprimento e frequentemente muito decoradas © Aurignacense (© Aurignscense caracteriza-se por um método muito dife- rene de tabalharo sex. Pequenos retoques longos finos alinhados em série sobre pecas grossas (raspador carenado ¢ burilconvexo) e sobre longas laminas de dots fos, Em certas regises, estes dois tipos de objectos encontram-se no Magdale- ‘A indstria do oss0 produziu sobretudo zapaias; curt, schatadas, mais ov menos em forma de losango e abertas na base. (0 Perigordiano e o Aurignacense sio, em parte, contempor neos, de modo que, conforms as regis, encontramt-e todas as combinagdes possiveis entre 0s seus utensils caractristicos: ponlas de Chatelperton ¢ raxpadores carenados por exemplo. ils Isso prova bem que as nossas categories, como Perigordiano & ‘Aurignacense, correspondem a correntes tenicas, mais do que & ‘grupos de populasées com tradigtes diferentes © Gravetiano ou Perigordiano recente Caracteriza-se por lamelas de bordo abatido rectilineo de alguns centimetres ¢ por burs planos. As gravuras & a pintura ‘comegam a deixar testemunhos convincentes, 0 Solutrense ‘A comrente solurense esté presente no sul da Franga indo buscar 0 seu nome a Solutié (SaOne-et-Loire). No tempo, inerpoe-se entre © Aurignacense © 9 Magdalenense. A sua caracteristica é a «ponta em folha de loureims, que € o mais belo objecto de silex de idade da rena. Esta ponta ¢talhada por retoquos planos nas duss faces, tal como os pequenosbifsces do fim da indGstia musteriense e cers pontas do principio do Perigordiano; ela representa certamente o seguimento de uma velba tradigio que os artesios solutrenses ouxeram de regiges onde a mesma no desaparecera ‘As pontas em folha de loureiro sto demasiado finas para terem guamecido a extremidade de chucos empunhados pela ‘mio; nio eriam resistido as flexdes softidas porta arma, Nio podliam atingir efiewzmente 0 seu cbjectvo, caso mio fossem animadas de uma velocidade tio grande como aguela que se imprime as zagaias ou 8s flechas. Nao temos neahum testemv- iho sabre o uso do arco nessa época: os objectos de madeira no se conservaram ¢ nenhuma gravura ou pintura nos mostra um ‘arco, Mas no & impossivel que essa arma jé existe Em contrapartida, temos a certeza que, ns idade da rena, ‘exist ovtra arma de Langamento, que talvez tenha sido usada pelos cacadores soluurenses mas que o foi, certamente, pelos seus suoessores magdalenenses, E 0 propulsor, pequens tabua ‘ou haste em que uma extremidade termina num ressalto em que se apoia a base da zagaia. Um movimento répido do brago e do ppunho imprime & zagaia uma velocidade compardvel a de ura us Folha de lower © pona de entalhe solurenses. Estas pontas, Jongas © achatades, fitavam-se nas exremidades das zagatas(se- ‘guna Ph. Sm) fecha langada por um arco. Conhece-se esta arma em diferentes regides do mundo sctal, entre os Esquimés, 05 Australianos, 0s NNeo-Guineenses, os Indios do Peru, do México, da California, Os outros objectos da industria solutrense nem sempre se ‘istinguem com facilidade do Aurignacense revente ou do Magdalenense médio, a ndo ser pelo facto de a forma e certos utensils se ressentir do hsbito dos retoques achatados, pr6prio das folhas de loureiro. Constiwiriam os solutrenses um povo, propriamente dito? ‘Teriam vindo do sul ou do lesteinfliando-se no meio dos srupos aurignacenses? Ou as zaguias de folha de loureiro representam simplesmente uma corrente industrial que passava ‘de uma trbo para outra ao sabor dos encontros? AS duas hipoteses ni se excluem. E possivel que uma populagto que 6 praticasse a téenica solutrensetenha vindo do exterior e se tenha fixado durante vicios séculos em cestos pontos do sudoeste da Franga ¢ cm diree¢ao a Sabne © que, s seu exemplo, algumas clas populagdes jf instaladas tenham adoptado a moda das zagaias maravilhosase friges, (0 Magdalenense [Nos seus primérdios, a indistria do silex do perfodo magdale- nense pouco fre das indstrias do Aurignacense e do Perigor- iano, a8 quais sucede directamente nas regides onde no hé Solutrense. Em seguida, evolui para pecas de dimensdes muito ‘pequenas, que concuzem progressivamente &tindstriatipica do se , ro Urensilagem magdalenense. Os utenti de siex diminiram de tamanho e& maior pare dels 9 consagrados a rabalhos delicados sobre marfim ou oss ¢provavelmente também sobre madelra, casea e (ira. Da esquerda para a dietae de cma para bai véem se: dos ‘rps em corn de rena, um raspadorfeto da pon de wna la, {om burl diedro com os resto da sua fabricagd, dois microperfura- ores e, no centro, uma lanela de bordo abut, 7 Cacete magdalenenseperfurao. Tambim se chama a este objcto basta de comanalon. 0 gue fortece una bmagers, mas nao significa rovnvelmente nada. E mats plausivel que estes ~batdes» de corm de ‘ena tenkam sido alavances pare endiretar ao calor as pontas das ‘ngaiat que devia tender a refomar progressvamenie a forma raturatmente encurvada do corna de rend no qua eram talhadas. A indstria do osso ¢ do como de rena prolonga assim a dos petiodas precedentes, mas desenvolve-se com uma original dade muito mareaéa, produzindo, em especial, propulsores & cetes perfurados. Estes dtimos sio peas em chifte de rena, faradas numa extremidade com um buraco do didmetro de wn polegar. Estes objects, que por vezes se chamam «bastdes de comandor, deviam servi para endieitar a quents as pontas de zagaias, Com efeito, as zagaias talhadas em Iamelas de chitte de rena tomavam a curvatura das hastes do animal; podiam ser endireitadas aquecendo-as, servindo-se dos cacetes perfurados ‘como alavancas. Quando se encontram estas zagui, no decor- rer de excavagdes, elas refomaram, na maior parte dos casos, ‘a antiga curvatura © no poderiam sor usadas na caga. Em certas regides, a0 lado das inimeras zagaias magdalenenses encontram-se também arpées com uma ou dua filas de dentes, ‘que serviam provavelmente para apanhar peixes grandes ‘Com 0 desenvolvimento da indistria do osso ¢ de chifte de rena, também o desenvolvimento da arte carateriza desde 0 principio 0 periodo magdalenense, Alias, para o conjunto da ‘dado da rena, a caracterstica mais impressionante & a aparigho da arte © da rligiio, ‘Tinhamos de facto suposto que, ene 08 ulimos neanderta fianos, existia um rudimento de sentido artstico ov religioso, devido a presenga de abjectos de coleego © de um pouco de ere nas suas habitagdes. Mas Isso mo & comparivel aos testemunhos que nos legou o homo sapiens da idade da rona. A 8 sctvidade anistiea comegou a desenvolver-se desde meados do ‘A.urignacense; 0 Solutrease também deixou algumas elas obras «no decorter do perfodo que vai do fim do Aurignacense ao fim ‘do Magdalenense, atsstimos a uma vordadsiaapoteose de arte pré-historica. Ba grande época das placas gravadas com animais @ figuras humanas, das centenas de dbjectos decorados, das dezenas de cavernas de paredes recobertas com pinturas de ‘animals e sinais, das sepultras com objectos funeririos e acre No final do Magdalenense, a arte tansforma-se rapidamente [As paredes das grutasjé ni recebem novas figuras, pintadas ou ‘gravadas; a decoracio dos objectos evolul para formas cada vez mais simples, Depois, no momento em que termina a glaci {de Wim, o floreseimento anistco extingue-se completamente 0 do homem actual nas nossas regies correspondeu a0 desenvolvimento de una civiizag0 que tina sem divida grandes rafzes no passado musteriense, mas cujo sentido é muito mais aeessvel o nosso pensamento- Quando se descobre suavemente a atiga superficie do solo em que viviam ‘os eagadores da idade da rena, encoatramos as pedrasplanas que eles assentaram para nivelar os buracos, vemos uma agulha pperdida entre duas pedras, aquela zagaia que ainda tem as ‘marcas do burl que a moldon, aquela limpada de pedra onde, sobre 0 bordo caleinado, ainda aparece o vestigio da mecha ‘esaparecida,entio esses homens perdidos éesde hé quinze ou ‘inte mil anos surgem-nos como muito préximos de n6s. Mas qual era a sua existéneia quotidian? 19 capo 1X COMO SE VIVIA NA IDADE DA RENA A vida ¢ 05 costumes dos homens da idade da rena sio-nos ‘muito mals conbecidos que os dos seus predecessores paleantro: pianos. Quando tentivamos ressuscitar Augustine, tinhamos {que contentar-nos com breves instantineos sem grande ligagto entre si. Pelo contriio, estamos aptos a representar-nos de modo cosrente vida do homo sapiens na idade da rena. A-caga e a pesea [As armas mais utlizadas parecem ter sido os chugos, as zagaias ¢ 0s arpées. Pelo menos, temos provas ceras da sua existénca, pois o slex e os ossos conservaramn-se. E possivel {que tambsm existssem armas inteiramente em madeira, como rmocas ou paus de arremesso, do tipo boomerang: mas os objects de madeira desaparcceram. Em qualquer caso, eram ‘ouco utlizéveis conta a caga grossa. Como em quase todos os ppovos cacadores, antes du invencio da espingarda, usava-se sobretudo a zagaia, Assim era também entre nés na Idade Mela. ‘As zagaias exam muito provavelmente langadas com um propulsor, excepto entre os solutenses, a ponta nio era em silex, mas de marfim ou de corno de rena. Os arpies aparecem bastante tarde no Magdalenense;sio zagaias euja ponta se pode soltar no corpo do animal; esti fixa @ uma conreia, que se pode deixar correr para evitar que pata, e que permite puxar a presa 121 Limina com chanfradura curignacina. Utada para aplanar hasten de sso cabos de cagala. SS, Te a 2 A esquerda, arpdo mogdalenense. Os arpies, ew cabeca desact vel estan presa ao cabo por una correla, so uma arma de pesca e ‘quando ai encontramos uma estacdo isso lesa a supor que of Magdalenenses 0 usavam para capturersalmaes grandes vatas. A direia,propulsor para langar eaglas. im tal como com uma linha de pesea. E uma arma que sé serve na ‘gua, para os poixes grandes ou os mamiferos aguiticos: em terra, @ corteia parir-seia inevitavelmente caso fosse puxada ‘Por um animal um pouco mais frte,Talvez também se fixassem vérias pontas de zagaia num feixe na ponta de um cabo, de ‘modo a fazer um arpeu ou um tridente para a pesca E quase coro que 0s homens ds idade da rena sabiam montar sarmacilhas. Tal como certos indios © 08 Lapoes, deviam cerear 8s manadas de renas ou de cavalos,espantando-os em direcso a uma ravina onde os snimais se precipitavam. Ou entio, mais simplesmento, empurravam-nos para desfiladeios para os aba ter em massa, Conheciam, certamente, o Jago, mas néo temos prova disso, Supds.se que certos desenos das caverns repre Sentavam fossos e armadilhas, montades com troneas desi dos & captura de mamutes ou bisontes. Na reaidade, tratam-se de sinais geométrioos abstracts. A ulilizacko de troncos de frvore exige um material importante de madeireiro e, como indiedmos no capitulo anterior, nenkuma escavago permitix encontrar vestigios de tal material na idade da rena Em resumo, 0 que sabemos com certeza € que 0s homens ‘desta época cagavam com zagaias. Isso chegava, als, para Ihes oxnecer a caga mais variada. Mas podemos perguntar-nos como que eles se aranjavam para dominar mamutes ¢ rinocerontes: ‘2 zageia (mesmo quando se sabe envenend-la) 6 uma arma demasiado ligeira para a epiderme desses gigantes. Tal como o trabalho da madeira grossa, existe equi um problema pré-ist6- rico por resolver. Tamibém se capturavam muitos pissaros. No sabemos ara ‘vés de que meios, mas podemos pensar que eram variados © semeltantes aos dos Esquimés: a mio, com zagaia, & pedrada, talvez com lagos, A recoleegiio ‘A apanha de frutos, de gros, de ebentos, de rafzes desem- ppenhow certamente um papel importante na actvidade dos homens da idade da rena, Mesmo entre os Esquimds actuais, {que vivem em condigaes muito mais desfavoriveis, a alimenta- ‘980 vegetal conserva uma cert importneia. ns Nao nos ficou nenhum testemunho, mesmo indirect, sobre a alimentagdo vegetal do homem na idade da rena. Mas contece ‘mos as plantas de que dispunha, gragas aos pélenesfossilizados 4a époce. Fram as da tundra-pargue setentrional: muitas bagas {como 0 murtinho), cogumelos, a casea inerior dos pinbetos e das bétlas, nos Iccais onde se manteve a floresta, algumas plantas com tubérculos ou bolbos, como os lies selvagens, os rebentos verdes das plantas herbiceas, folhas novas de bétulas [Nenbuma planta podia fomecer amplas provisdes para o in- ‘verno; proporcionavam apenas um complerento interessante no veri. Antes da aparigao da cultura, as nossas regibes so conheciam um némero diminuto das espécies alimentares ac- tuais. £ muito depois da idade da rena que aparecerio os cereais,vindos do suestee do lest; sera preciso esperar muitos séculos de adaptacao progressva de raizes comestivels como & cenoura ou 0 nabo, ainds muito mais para coahecero feijio e a Datata Poxiemos, portato, imaginar os homens da idade da rena rebuscando os vegetas, mais do que colhendo-os e armazena. ddo-os. Sem cage © sem pesca, nao teriam podido subsisir, felizmente para eles, esses dois ecursos exam abundantes. (Os comegos da criagio de gado e da agricultura (Os homens da idade da rena criavam gado? Alguns pré-histo- adores julgam que o cavalo jé estava domesticado, 0 que io esté provado. Os povos que, num passado recent, tiveram um sistema econémico comparivel 20 da idade da rena, nfo conheciam nem a criagio de gado nem a agriculture, ‘Quando muito, pederemos imaginar que alguns grupos hu- ‘manos se ligavam, em ceitos momentos do ano, a manadas de renas selvagens que seguiam nas suas deslocagdes ¢ das quais retiravam a slimentasto, Esta associagio unilateral pode tet consitido uma forma inteemédia entre a caga pura ¢ a criag0 propriamente dita: conhecer as locaizagSes sucessivas de um rebanbo onde se vai procuraro aprovisionamento é j uma etapa para a domesticagio, No que respeita a agrcultura, a questio & ainda mais evidente. Nao somente 4 organizagio de uma sociedade agraria 6 cexige formas econémicas impossiveis na idade da rena, mas sbém, como scubimos de ver, nio existia, de facto, nas nossas fegides, nenhuma planta cuja cultura tivesse podido fomecer uma base alimentar constante. O maximo que se pode imaginar 6 0 cuidado sumério de éreas em que se desenvolvem natarslmente vegetais elementares, nas quais se mondavam as plantas parastas. Em certas regides, a agricultura poderd tex ‘omegado pela monda da vegetasso espontanes, A exploragio dos minerals Nas regides onde o silex abunda, 0 fornecimento ni levan- tava problemas graves. Ainda assim, era preciso aleangar as ccumadas de terreno favordveis e escalher os seixos que no tinham sofrido da geada. Basta ter alguma vez procurado bons silices para talharp para se compreender as dificuldades apre- sentadas por este tipo de prospeegto. No entanto,dispomos hoje cde camadas de terreno postas a descoberto, nas pedreiras e nas Vemos aqui une concha com wm sulco de suspensdo, wom plngene talhadovem oss uma court proventenes de diferentes nits do Paleolicd vupetio, do Chapperronense ao Gravetiao. As conchas ‘marinas foram muito procuraes no paleolice superior e as gras Droxinar da beire.mar fornecem grandes quantidades, perfuradas bora fazer colores, pingenies, colfs. F mulio cwioso ver que, em ‘rey, arias centonas de quilameiros do mar, se enconram as imeamas conchas,perfuradas# endidas, que os homens da idade da ‘Tena arranjavar, ha direcamente, mas procurando ere as conchas seis, nas areas do mar eriéro que ocupava, muio antes deles, @ ‘regia parisien ns {ibricas de joo; descoberta devera ser muito mais dificil sob f floresta ou sob o manto de ervas da estepe, locais onde, ‘cavando, se encontraia 0 silex. Os bons locas eram, decerto, ‘onhecisos por tradigdo;cuidava-se das pedreiras de geragio em sgeragio. Em alguras regibes, as jazidas de sex flor do solo estio literalmente coberts de fragmentos e de utenslios de todas as épocas, desde o Acheulense até & idade do Broaze. Vimos que, na idade da rena, o rendimento em fio wtil por quilo de matcia sumentou consideravelmente e que, em conse- Aquéncia, 08 sitios habitados se encontram, por Yezes, muito Tonge de qualquer jazida de silex.O facto leva-nos a pensar que se empreendiam periodicamente longas caminhadas para pro curar &s quantidades de matéria-prima indispensdveis & vida do grupo; existia, decerto, um verdadeiro comércio. Tentou-se estudar a estrutura microsc6pica dos silex de algumas extagdes argueoligicas para determinar a suaorigem geogrifca, mas esta investgasio sinda néo fornecew resultados docisives, Ovttos achados, informam-nos, porém, acerca do transporte de objectos a grandes distincias. Os homens da idade da rena coleccionavam conchas; perfuravam-nas para fazerem coilas © colares. Algumas dessas conchas provinham da beira-mar; on, enconirimo-tes por vezes 2 centenas de quilémetros para 0 imerior. Outras eram conchas fésseis, pequenas amonies ou trilobites como © que, perfurado como pingente, deu o nome ‘uma das grutas de Arcy-su-Cure. Entre as conchas de Arey, ‘muitas cram certamente provenientes das areias da regiio parisiense, a uma centena de quilémetros. Encontramos também seixos trazidos de longe por causa do seu bilo, cristais, Provavelmente, atrbuia-se um valor mégico a esses objectos. A sua presenga nas escavasses mostra que os homens da idade da rena efectuavam por vezes grandes deslocagies, A cozinha Tudo © que sabemos acerea das técnicas culiniias € que ‘existiam muitas laeiras. Mas no conhecemos neahum reci- piente, nenhuma concha ou calher. Talvez tenham existia recipientes de casca ou de pele, colheres de madeira ou de ‘coro, mas nada sabemos a esse respeito, 16 ‘Talver os homens da idade da rena comossom os alimentos sem 05 cozinharem, como alguns Esquimss que, por falta de ‘combustivel, comem a came ¢ © peixe crus ¢, por veves, congelados. Talves fiessem como ceros indi que, descone- cendo a olaria, colocam nas suas marmilas de casen pedees previamente aquecidas e confeccionam assim excelentes caldos Talver, enfim, como os Australianos, grelhassem e cozinhas- sem directamente sobre as brasas. Nada se opée a que tivessem combinado os ts sistemas. © vestuario Os utensilios de costure que foram descobertos permitem pensar que os homens da idade da rena confeccionavam vestué- fio de pele. Quanto a namareza ¢ forma desse vestuitio, os {estemunhios que a producto artistica da Spoca nos deixaram sio tum pouco desconcertantes Possuimos um bom nimero de estatuetas, de baixos-elevos, «e pravuras, que representam homens ou mulheres. As mulheres ‘nfo tem nenhum vestudrio. Nao se deve concur que clas andavam forsosamente assim. Ou entio os faturos cientistas {qbe, dentro de dez mil anos, descobrirem um dos nostos sales de arte contemporinea podergo, também eles, enganar-se gra- vemente acerca da moda ferinina do sée. XX Quanto s figuras maculinas, passa-se 0 mesmo: 0s tagos do rosto sio muito estcados para a frente, numa espécie de focinko, com a pare de cima do nariz horizontal. Vérias figuras rmasculinas tm comos ou hastes. Seriam xamas ou eagadores isfarpados de animal para enganar a caga? Seriam entidades sobrenaturis, herGis mitoldgicos, como o personagem da gruta de Trois-Frtres (Aribge), composigio de partes do corpo de animais: hastes e orelhas de rena, face de mocho das neves, ios fumanas (2), corpo de cavalo, pemas ¢ pés humanos, ceautda de cavalo, sexo hamano (2), Pavco importa que se trate ‘de um deus com corpo de homem, de rena e de cavalo ‘combinados, ov da figuragdo de um homem disfarado de deus sragas aos aributos de tr8s animais. 137 Esa estameta de marfim de mamue & a mais estraordiniia das ‘estanuetaspaleotiicas. Ver da grade Lespugue em Haute-Garone E extremamenteesiizada eas formas ni correspondem, provarel ‘mente, dda mulher paeottiea mats do qu cerasescuuras moder- ‘nas corresponden go tipo médio ds francesa contempordneas, Acasa Como os melhores sitios foram descabertos nas grutas, supde-se por vezes, sem razio, que os homens da pré-historia excothiam sistematicamente este tipo de habitagdo. Na reali- dade, as habitagdes ao ar livre deviam see muito mais namerosas 18 {um grupo de presas de mamate, tl como apareceu uma vee posto a dace, Ves ung enor pese demo, um pedo deca {grande prea e, cruzada uma preva defemea, mals peguenae dire Exes vestigioe, de que foi enconrada grande quantitate nas camadas ‘chuielperronenses de Ary, seriam, provavelmente, para edifiear as consrgaen. (Fate A. Leroi Gourhar) ‘do que as habitagdes em gruta, Nas regides em que as encontra- mos, grt no ram desea, por por qe fxs a sua exposigio ¢ a qualidade da sua proteccéo contra 0s elementos ¢ as fers. Desce hi alguns anos, comecimos a aperceber-n0s, {ue a caverna ou a anfractuosidade rochosa podiam desempe- ‘har um papel de duplo tecto para habitacbes do tipo 20 ar live, construidas no dtrio ou sob a saigncia da gruta. Estes vestigios e habitagio podem estar melhor conservacios que os dear live 19 «© proporcionar precisdes sobre o nivel aleangado pelos const tores. E assim que, em Arcy-sur-Cure, 20 abrigo de uma saligacia da grota da Rena, os chatelpesronenses edificaram € reconstrirars, durante pelo menos S000 anos, cabanas circula- res de 6s motros de difmetro, com o solo evestde de placas de peda sumarlamenteajustadas, Presas de mamute enterradas ex Dburacos faziam parte da estrtura dessas coastrusies, caja cobertura poderia ser feta com peles,placas de casca ou forbes de torra. Estas habitagdes sio diferentes das da Réssia © da ordnia, verdadeiras casamatas cujaconstrugio exigia partes do exqueleto de cerca de 150 mamutes! As mandibulas eram empilladas em citeulo e serviam de slicerce a crinios empina- 4s sem presas. Estas eram utilizadas para sustentar a cobertara {que incluia tarsbém omoplatas © bacias. Estamos ainda longe de conhecer os diferentes tipos de construgio que se sucederam a0 longo dos 300 000 anos do Paleoltico superior. Devem ter exist casas molto variadas ras S6 ha poucos anos é que se procuram sistematicamente vestigios de palhotas, tendas ou cabanas ¢ novos métodos de ‘eseavaedo permitem trae partido de sitios considerados outron sem relevincia, Sabemos agora que, em condigdes favoraveis, & conservacdo das habitagdes pode ser extrardinaria. Eo que sconteceu em Pincevent (Seine-et-Mame) onde, desde 1964, 0 autor deste livo estudou 0s restos de um grupo de cagadores de renas que af voltavam regularmente. Os restos do acampamento so constituidos por supesficies que earrespondem, cada uma, a uma unidade de habitagdo. A repetigao das estraturas de uma unidade a outra permite estabelecer um modelo colectivo, de tama tenda eénica ligeiramente oval com uma lareita pero da entrada. O cre forma um tapste centrado na lareira. Atrés da lareiraestende-se, em semi-citculo, a zona de trabalho, com 0 solo vermelho pejade de utenslios novos ou usados, correspon ddendo o espago restante & zona de ropouso, Os detitosalimen- tares © domésticos estendem-se para fora. O arranjo da habita- co traduzia-se em montes onde se misturwvam residuos do trabalho do silex, restos de oss0s da caga (995 da rena), produtos da fragmentacdo das pedras aquecidas nas lareiras io 6 raro encontrar loess de habtasio encostados a uma falésia ou «abrigos sob rocha», eneimados por uma saliéncia, 0 (90000 anos) Ae pedrasachatadasenvolvem wn espago central de ferra compacta tinglda de vermelho, Ua parte dos maverials desta Iabiva era recuperada plas geragaes segnnies para reconstrulr Iabages semeThantes. (Foto M. Sauter, Sto sitios bem protegidos e, muitas vouss, mais conforveis do ‘que as gras Finalmente (mas spenas em dltimo lugar), bavia grutas que ceram arranjadas o melhor possivel. O solo era geralmente Pn Reconsituigdo de wna tnd do Mapdalenense recente em Pine vent (Seinest-Mare) (cerca de ~10-a 12 000 anos). As varas Yecomstuem a exrutra de wa tenda da qual s exstem restos no Chao. A entrada, vé-se a lareiva chela de pedras que serra, Dprovavebnente, para fins culindros:conhece-se wm metodo de cox ‘tha que consite em mergulhar at pedvas no liguldo que se quer (gutter. Aire da laeira, ese wna drea quose via que, na epoca, ‘teva estar abrigoda pela ena Os devrtos da combust. 0 Festos ‘do trabalho do sex eos e308 de proveniéncia cullnéia ram “euados para fora. Tudo o que era de madeira ou de pele desapare- ‘cen, deizande malgns casos una marca vaia no chi. Os recipientes ‘iste neste deserho, bam: como as vara eas pele para dormir ao nda ta tender #50 reconslgoes. aivelado, para evitar & humidade, estendiase uma eamada de ‘ravilha, que chegava a constituir por vezes uma espécie de ‘empedrado, Foi sobre essa superficie que, pouco a pouco, se amontoaram pequenos restos, como os utensils quebrados ou usados, os pingentes eujo fio se parti, os resos de refeigdes fesquecidos ao varrer. A term trazida pelos pés dos habitantes zecobria progressivamente esses vestigos, que formam agora ‘inas camads classificadas por ondem eronol6gica. 1m A Vida concentrava-se & entrada da gruta; a parte habitada raramente se estendia a mais de tinta metros da entcada. Era ‘nesta zona que eram instaladas as lreiras. O combustivel devia ser Taro, pois encontramos poucas cinzas vegetais © grande ‘quantidade de ossos de rena calcinados. Despojados da came, partidos eliberos do ruta, alimentavam 0 fogo. Poupava-te 0 combustivel até altima: encontramos cinzas espalhadas as ‘vezes por alguns metros quadrados, mas a larera em si mesmo ‘io excede, na maior parte dos casos, a drea de uma toalha de mesa. Por vezes, esté um pouco enterrada no solo, outras & rodeada por pedrss. Serva simultaneamiente, como todo o fogo abero, para cozinhar, iluminar © aquecer. Para aquecimento, descobriram-se em virios sitios vestigios de um dispositive bastante engenhoso: quando as brasas ainda estavam vivas, recobria-se a lareira com um monte de seixos e calhaus que ‘armazenavam o calor e consttufam um verdadeiro calrifero. Este sistema faz lembrar os aquecedores de certs regides ftias a Europa e o «sauna» dos finlandeses, onde se tomam banhos se vapor despejando agua sobre pedras aquevidas, Nao era apenas a lareira que assezurava a iluminacto. Conhecem-se muitas lampatinas magdslenenses, muito seme- Thantes as de alguns Esquimés. Eram pedras mais ov menos cescavadas, besuntadas de gordura onde ardia um pavio. Os hhabitantes das grotas serviam-se também de ‘ochas, especial- mente tochas de junipero, que deixaram marcas nos sitios em ‘que s esfregaram nas paredes para as espevitar ou apagar. Esto ‘material de iluminagdo seria para as eaminhadas a a0 fundo ‘das prtas, aos lugares recOndlitos onde os artistas executavam ‘08 seus frescos. Aaarte e a religiio Se 6 certo que os homens daidade da rena tveram um sistema de erengas religiosa, ficarfamos, no entanto, muito embaraca- dos se tivéssemos que descrever, Poderiamos imaginar 0 cristianismo através do testemunho exclusive dos crucifixes e ‘das imagens das igrejas? [Neste caso 0s nosso testemunhos, so todos os objectos que saem da simples uslidade pritica, sem gue consigamos distin- guir sempre neles parte da mitologia e a da arte: 133 Os dentes cam uma ranhura de suspensio foram, por ordem, de lobe, de bisonte, de raposa polar « de rena. € aifellseparar 0 seu ‘papel decorari do finblicn, tendo ido provavelente ox dos ‘oo2te vermelho, porgue 0 encontramos em quase todas as sepulturas,néo sendo minimamente necessério para imumar um cadaver; — as gravuras nos arpies, por que um espio no decorado ‘mata igualmente um salmio; as conchas © os dente perfurudes ou com uma ranhura de suspenséo pois pode-se viver confortavelmente sem colares de conchas — as estauetas de mulheres, 2s pinturas e as gravuras no fundo das grutas, que em nada melhoram a vida ea subsistencia, ‘Quando se invenariou todo este museu, damuo-nos conta que as preocupagbes do omem da idade da rena ultrapassam claramente o estito tnimo material, Distinguir, em seguida, aquilo que pertence 3 are, 8 roligiio, ou & magia, levantaria Aifceis problemas filoséficos. Comtentemo-nos simplesmente em descrever todos esses abjectos. De hé alguns anos a esta parte, foram fetos progresios importantes nos estudos sobre a ate e as roigides, O aspecto mais impressionante do pensamento dos cagadores paleoliticos & © desenvolvimento das manifestagbes ligadas & arte © 20 fendmeno religioso: as célebres pinturas da grata de Lascaux sf0 frequentemente comparadas as obras-primas da idade clissiee, ‘os cavalos de Angles-surI'Anglin as do Parénon, as cavernas 4 0 tcto pintado da grata de Altamira contén cerca de vnte bisontes ovientados, na sua maior parte, para a exqueria. Na perieta da Imanaca,estdo aqui assnalados« pete, da exuerda para a diet, (hugs gacelas, ino das quis etd ncldda nd cavalo, une grande ‘aega de cavlo-e um aval decoradas a templos. As obras mais recentes foram criadas hi 10-000 anos, isto é, a uma distincia no tempo quatro vezes superior & que nos separa dos primérdios da are grega. E certo {que 0s homens do Paleolitico superior tiveram um sistema de crengas muito desenvolvido, que s© expressava através des imagens simbolicasretradas do mundo da caga, Durante muito tempo supds-se que os animaisrepresentavam, indiscriminada ¢ individualmente, ume determinada presa de que se matava a cfgie €, consequentemente, por encantamento, 0 proprio ani- mal. O estudo pormenorizado de centenas de grutas decoradas| fem Franga e em Espanha revelou que, se as grutas pareciam fugir ds regas da composicio © da’perspectiva modemas, cestavam, porém, longe de albergar imagens cuje posiggo apenas {osse explicada pelo acaso. ‘A configuragio da cavidade mostin muitas veres que a colocagio das figuras tem uma intengiosignificatva. A escalha da melhor superficie para uma composigéo monumental», ‘como os grandes tecios de Altamira, de Rouffignac, de Ekain, {que estio cobertos de figuras de animais, entre os quais existem relagdes que mio podem ser explicadas pelo acaso. A natureza e ‘© ndmero dos animais representados, respondendo a prneipios {que no podem ser expresso sendo pelo seu aspecto numérico © topogrific. 135 {Pain (Boat, 08 cavalo ocrpam proportes eras das de Altamira A sequincia numérica. 0 nimero de cavalos ou de cabritos relativamente & totaidade dos animais representados fornece uma primeira indicagio: as espécies mais representadas 80 0 cavalo (A) (presenga absoluta) (30%) e o8 grandes bovinos (B) (Bisonte ou auroque, 305), que parecem consiuir a parte indamental das composigdes, em terceiro lugar, ocervo (C)e {gaze (11%), depois o mamute (9%), 0 cabrito (89%) ¢ arena G,5%). © quarto grupo (D) respeite aos animais perigosos, claramente minortrios: ursos,felinos,rinoceroates (cerea de 1% cada). A organizacio espacial da gruta coresponde a um cesquema A-B C:D. A composigio € constituida por um tema central (AB) (cavalo-bisonte) que, como em Altamira, pode inclu mais 20 bisontes, na peiferia dos quais dois cavalos so acompanhados por duas gazelas. Na margem, uma grande gazela ocupe uma posipio solitiria. O mesmo acontece na outra extremidade do texto, onde 0 javali cup uma posigao D, isto 6 a de um animal petigoso. Em Ekain (Guipuzcos, a situagio invert-se. Sob o grande tect, a drea central 6 ccupada por uma ddezena de cavalos (A), um dos quas virado para a direta, Trés 136 0 «mamute de tromba tevantadas & uma das deaoito gravuras da sgriia do Casal, em Arey. Estas gravuras form exéeutdas em agrapo, em duas sala snadas a cem metros da enraa, ao fund de lim corredor de acesso mao dif. A maior parte delas apravetan relevo das paredes, como esta cabeca de mamate, onde 0 olho ¢ 0s Delos, feito «burl, acentuam as formas natura de una concavidade a parede bisontes (B), um dos quais virado pare a esquerda, ocupam o centro alto, vrados em sentido contrério 80 dos eavalos, [Na margem clreita, enconta-se uma grande gezela (C'); ao alto, encontra-se um éabrito (C3), um peise (tema rato) ocupe tums posigdo na margem esquerda. Una drea de tecto ou de parede grande permite desenvolver as poses respectivas dos animais. Pode-se ver, como na gruta dos Trois-Fréres ov em LLascaux, a hierarquie dos grandes animais A e B radeados por animais C e D (ou apenas C). Quando a fea uilizével € longa e estets, as figuras sucedem-se e os elementos C e D podem sair 4o paine] central e ocupar uma posigdo excéntrica, Os cervos © 2s cabritos esto colocados num recanto separado ou num expago claramente delimitado. Hé muitos exemiplos em que um pat de eabritos machos enquadra um bovino (Niaux) ow um ccervino (Las Monedas, Santander). So ainda muitos 0s pro- Dlemas por resolver para compreender’ a mancita como se ‘organizava 0 mundo subterrineo, mas comegamos a adivinhar ‘quais as quest6es que devem ser colocadas para obter uma 1 resposta. A lista dos anima epresentadosé mais cura pars ax figuras das pacdes do que para as da ate nas matéias Gxt. CCavalo-Bisonte+C? ¢ a composigio mais fuente eaval-bi- sone cabito. Cava bisonte(auroque)constituem a frmula fundamental, mas so r8°8 of c4s08 em que & formula se resume esas diss especies. Num dos casos, a8 dua figuras sto face a face numa das paedes (Marcenae, Lot). O animal C nem sempre &0 mesmo e,consounts 0 cas, pod ser duplo ‘mesmo triple: EXbou (Ardtche). A grata em a forma cavalo, B auroque, C° cabrito, mas os cervos C' esto presentes em todas as composigées'e © (C2) esti no primeir grupe de gravuas. Os animais mais perigosos, uro, grande flino 08 oceronte,t8m também uma posi marginal, na perfri des superfcies gravadas (Les Troi- Frees), ba composigio mais afastada da entrada (Lascaux) ou, simplesmente, no fim da composicao (Labastide). As obras das gta decoradas no si0 ‘quadios. de caga, mas exprimem as elas dan fungées rotafisics dos simbolos que Ihes servem de base, comespon dem ao esquleo de uma mitologa. Esta impressio¢reforsada pelo estudo dos simbolos (0 simbolos: As figuras animais nio slo as Unicas que se enconiram nas paredes. Existem também sins geométrcos de formas muito varadss. Esse sfmbolos io aiiram muito a stenclo dos pr€historiodoes que se contetaram com vag0s ‘elacionamentos com as formas de armadihas, de palhotas, de boomerang, de fridas;relacionamentos Sem outro Tundamento pam além das coineidécias de imagens dspares © que, als, exclvem a maior parte Jos stmbolos. Estes Uhimos so de rs ‘ordens: os simbolos finos (rags, ganchos, linha quebrada..), 0s simbolos cheios (uiangulo, ovals, quadrlers),simbotos pontuados (posts em linha, em fgua..). Os simboiosfinos& {0s chzios oo cubminargeometrico de simbolos da eprodugso «ue, principio, eram realists e que evoluiram ao longo dos tempos até se tomnarem completamente incompreensiveis. Os simbolos choios tém varlanes regionsis mallo mazcadas Pertuniamo-nos se nao se-omaram os sibolos de diferentes Populagdes. Compreender seis entso muito bem porque € que & cavema, considerada em todas 0s povos como simbolo da maternidace, guardaria, no sou searedo, os simbolos do grupo. 138 Sinbolas acoplados. On. 1 (E!Casil conserva a recordagio do seu simbolismo fering. O n.* 2 (Samimamine) est redid a (quadrlzer (sinal cheto) ecompanhado por dois. traces (sinbolo Fino). 0'n! 3 Casio) éconstinddo por um quater acompa ‘hado por linkas pontwaas. 3 simbolos fins acompazham os cheios de modo disereto © festdo frequentemente associados com acidentes das paredes (cavidades ovsis eujo interior ¢ pintado com ocre vermelho, slimbolo de linha quebrada pero de ur ponto estreito...). AS relagdes entre os sfmbolos e as figuras animais no foram objecto de investigacio. Tais relagées podem ser de intima ligasio, inserindo-se os diferentes simbolos no espago animali- ado, como em Lascaux, onde os simbolos se integram na decoracio das diferentes partes da grata. ‘As pontuagées em linha tém um papel marginal, encontramo- -laseem séries, de alguns pontos até vérias dezenas, no principio no fim das ComposigSes. Encontramo-las em Pech Merle, na perifriae no interior dos cavalos «malhados» ¢ em duas grutas de Aritge, feitas com 0 polegar, formando contoros sinuos0s na erila Estas poucas piginas sobre os simbolos mostram a complexi- dade do probloma da are paleolitice. Vemos que as questées levantadas esto longe de possuir respostas. Nio ha davida de que os Paleoliticos possuiram um instrumento de expressto de grande qualidade. O que nos resta & 0 esqueletoiconogrifico de tum mito 139 Oocre © oor fermuginoso € relativamente comum, particularmente nas regides de solo calcirio onde se encontram as grutas. Os ‘limos musteienses comegavam a servirse dele; desde © principio do Perigordiano ou do Aurignacense que é de uso Corrente. A sua tonalidade varia do amarelo ao vermelho © a0 castanho, consoante o mineral e 9 seu uso, cru ou caleinado. & uma das cores de base que serviram 0s pintores de gruts. Tinka, certamente, outrasutlizagdes que conhecemos ml Encontramos frequentemente fragmentos de ocre talhado ers pponta como um lipis, ou pedagos raspados com objectos facetados, ov calhaus chatos sobre os quais s©triturou o corante Isso deixa supor que, além dos desenhos do fundo das gruis, muita outras coisas eram pintadas de vermelho, Talvez os homens pintassem a cara, & maneira dos Austalianas ou dos Indios; talveztingissem as armas, como os Esquimés do Alasca; talvez desentassem em peles ou caseas de devores, como muitos povos recente. Num certo ndmero de sepulturas da idsde da rena, encon- tra-se 0 esqueleio mergulhado numa cemada de cere e forte- ‘mente tingido de vermelho. Seria 0 cere o simbolo do sanguc e da Vida, um luxo, simultaneamente, um meio de se proteger da morte, uma satisfacao que se Ibe dava pare pdr os vivos a0 abrigo da sua vinganga? Em qualquer caso, trata-se evidente- mente de um rto com significado religioso. Encontramos enfim ocre espalhado pelo chio das habita- e0es. Em certos locas, ficamos impressionados com a intensi- dade desse coloragio vermelha. Vilas camadas de Arcy-sur- Cure slo assim separadas. A que corresponde ao Aurignacense médio presenta um aspecto. verdadeiramento extraordinéio: sobre o empedrado bem nitido do espago habitado, i uma ccamada de dez 2 vinte contimetros de espessura’ de oere vermelho-violeta quase puro, misturado com restos da vida quotiiana. Este ocre foi trazido, a8 centenas de quilos, de um local situado a cerea de um quilémetro, do outro lado do rio, teria sido espathado de uma s6 vez, para fazer uma espécie de tapete na casa, ou renovar-se-ia este tltima de vez em quando cestendendo alguns quilos de ocre novo? Que significava este 140 Adesperdicio de comme? possfvel que 0 vermelho, imagem do sangue, (enha representado para estes cagadores um simbolo régico ¢, simultaneamente, um sinal de rigueza. Pode igual- ‘mente ter desempenhado um papel téenico, especialmente na preparacio das pees. Os mortos Encontraram-se na Europa véras dezenas de sepulturas da idade da rena. O morto ora esta dobrado, ora estendido, por veres algumas pedras protegem-Ihe a cabega e hé sempre uma cova. Na maior parte das vezes, 0 corpo foi enterrado com os seus enfeites: rendifhado de conchas na cabeca, colares, alguns bjectos de 0880 ou ¢e silex. Dinar no cadaver objectos pessoais usados em vida pressu- poe temer-se a contaminagto pela morte, ou uma vinganga do ‘efunto, ot ainda, que se Ihe fornece um equipamento para um ‘outro mundo. A contaminasie mégica pelos objecios io implica forgosamente uma sobrevivéneia, mas reveste-e, 0 fentanto, de um cardcter religioso. As ovtras duas hipéteses implicam a erenga numa outea vida. A protecgio dada & cabega patece indicar que nio se considera o cadiver definitivamente privado das feculdades do ser vivo. [Em todos estes acts, os homens da idade da rena parecem- nos muito préximos do homem actual; no conhecemos em ppormenor as suas crengas religiosas, mas tems acerteza de que existam, 0s objectos decorados. Enoontramos as centenas zagaias, arpdes, propulsores, bas- toes perfurados, pungdes gravados © esclpidas com figuras que representam, na maior parte das vezes, animals. E possfvel que ‘uma intengdo mégica tenha presidido a tis obras: uma zagala ‘omada com renas podia ser considerada como mais capaz do ‘gue outra pare atingr a caga, Mas também 6 admissivel que 0 ‘artista trabalhasse por prazer, que a arte tenha extravazado da Vida religiosa para a vida Corrente, sem existir uma clara demarcagio, 141 (0s clementos decorados dividem-se em duas grandes catego. las: os objectos © as placas. Os objectos subdividem-se em objectos de uso prolongado e objectos de uso precatio. A categoria dos objectos de uso precirio € constiuida pelos objectos frigeis e de curta duragio, as pontas de zagaia em particular, que frequentemente se parem no corpo do animal ou de encontro a uma pedra, tém uma decoragio geométrica, fmuitas vezes muito simples, enquanto que os objectos de uso prolongado, bastdes perfurados, propulsores, paus semi-cite lares, objecios alongados com uma superficie dorsal abaulads © decorada e uma superficie ventral plana c estrada para facilitar a colagem (uso ainda desconhecido), tém muitas vezes uma decoragio cuidada em baixo relevo. ‘A repartigao dos objectos em duas categorias fundamentadas no uso levou os paleoliticos a criar dois modos de expressio, um fem que as formas animais sio elaboradas e levadas ao porme- nor, outro em que a simplificagio € levads ao extrem, & ponto de culminar em formas que se assemelhan) aos caracieres pictogritcos ou hieroglificos da mais antiga eserita chines ou a eserita cuneiforme do Oriente, Mas os palealticas io possuiram uma verdadeira escrta. Uma escrita puramente plctogrfica desenvolveu-se como uma banda desenhade através de uma sucessio de imagens articuladas uma & outra pelo seu posicionamento numa construsio de sintaxe {As placas sao todos os suportes minerais ou 6sseos que foram _gravados ou pintados. O seu reportrio € 0 das obras das paredes ‘estamos ainda pouco seguros do seu significado, As cavernas-santuirios As sgrutas decoradas: so, até 20 presente, cerca de 150. Todas (excepto uma, a gruta Kapova, no sopé do Ural) situam-se em Franca, em Espanha ¢ algumas em tila, As grutas, pela forma e pela dimensio, <0 muito variadas. O home tirou partido dos abrigos sob as rochas, expostos 8 luz do dia, bem como das grutas pouco profundas’ Nunca sabere ‘mos quantas obras-primas foram destrutdas por causas nacuais [As grutas cujo fundo no exté muito afsstado da entrada, 1 ‘earantem um pouco mais de soguranga 3s obras. © ponto mai Sfasiado em que a luz natural 6 ainda visivel & importante, Porque & 1é que, em muitos casos, comecam as gravuras ou pinturss. E um facto que nto esté necessariamente ligado a pensamentos metafsicos, mas provavelmente & precaugio de poder sar em caso de falta de luz, Na origem, no Aurignacense {no Perigordiano superior (30 000 a 22 000), as paredes das ‘cevidades pouco profundas podem ter conservado obras muito antigas (Pair-non Pair, Gironde). Na maior parte dos casos, os ‘obras tém um acesso relativamente fécil, mas certas cavernas mmostram que 0s Magéalenenses nfo sacrficavam uma situsp0 espectacular ao risco de um trajecto perigoso. Certas grutas feram tineis rasejantes que ficaram no seu estado original (Pergouset, Arey-sur-Cure) ou cujo solo fei abaixado nos nossos ias até 2 altura médin de um tursta. As grutascorredor de ‘comprimento médio sé oferecem um certo perigo em caso de falta da iluminagio, no acontecendo 0 mesmo com a8 que constitiem labirintos, como La Pasiega (Santander) e, sobre tudo, em vastas cavernas, muito ramificadas, como Niaux ou ‘Montespan (Aritge), Psch-Merle (Lot) ou Routfignac (Dor dogne). A introdugio da cavema no dominio religioso do homem & um facto que parece ser particular aos paleoliticos & aque se desenvolveu progressivamente: com efeito, as obras Atisticas na sua evolusio estiistica no chegam as grandes profundidades sento no Magdalenense mésio (Niawx) ¢ regres fam 2 entrada no Magdalenense superior. Os vestigios de frequéncia ou mesmo de simples passagem sto raros nas grutas| ‘que apresentam dificuldades. Do Magdalenense ao séc. XVII, reinum nessas cavernas dez mil anos de silencio 3 Cepia X (© FIM DOS TEMPOS IMEMORIAIS |A éltima geende glaciagéo chegou a0 fim. Por volta do ano 8000 antes da nossa era, as sltimas renas pastizam definitive mente para o norte. Ao cla continental fri sucedeu-se oclima idntico emperado que coecemos. A estepe © a alga, cheias ie cavalose renas, cedem o lugar i mata de nogueies, 2 floresta ecarvalhos ¢ falas, peteorrida apenas por pequenos bandos de eados, cabritos javalis, Doravante, a caga jd nfo desempe- hard na alimentagio sendo um papel de complemento, ti fino, no entanio, em ceros grupos, cerca de 30% da came fonsumida, Toda a longa época estudada neste Tivo ~- desde os comegos ‘otwcuros da humenidade até a0 fim da idade da rena — € ‘esignada polos pré-historiadores sob o nome de Paleolitco, isto €, santigaidade da pedra». Comogard, a seguit, o Neotitico, to enova idade da pedra-,idade também dos primeiros metas Entre ambas, situa-se uma «idade médias, o Mesoitc. ‘© Mesoitico deixou em Franga muito menos vesigios do que fo Musteriense ou do que & idade da rena, A humanidade reeaira att, nas nsses regis, num nivel econémico e cultural muito inferior, Na idade da rena, a Europa ocidental constitira uma, tas grandes 2onas de civilizacio, como testemuniham as caver- fnavsontuario. de Franga e de Espanta, No Mesolitico, 05 frandes asontecimentos passamtse algures: 20 nore, Para 08 udos do Balico, onde as condigbes climatrias s8o agora a8 ry rmesmas da Franga da paca anterior, e, sobretudo, mais para o sul, no Mediterraneo oriental, onde j'se prepara a civilizagio dos tempos histéricos. Estamos muito perto do momento em aque, nessasregises, vio aparecer, sucessivamente, a agricultura ‘ea criagao de gado, a motlurgiae aescrita. Entre nés, durante ‘esse tempo, grupos humanos resrtos esto instalaios & beira dds rigs ou no Hitora, vivendo ainda da pesca e da recoleegio. Nos Pirinéus e na Provenga, alguns grupos dio uma certa Jmportincia & apanha de caracbis © mariscos. Corea do ano 3000 antes da nossa.era, acvilizasao nealitic, baseada na agricutura ena criagio de gado, chegaré 4 Europa ‘ocidental. Entre 2500 ¢ 2000, aparecerio em Franga os primei- ros abjectos de cobre, seguidos pouco depois pelos de bronze. ‘Mas aqui, pré-hstoriadorcomesa a dar lugar ao historiador e 6s, neste livro, nio quisémos senso esbosar 0 desencadear do Paleolitico. © Paleoliico representou, de facto, toda uma época da hhumanidade. Desde os arqueantropianes, tlhando choppers, i ao homo sapiens sapiens, eobrindo de frescos as paredes da ‘ruta de Lascaux, seguimas a mesma corrente através das rmudangas de horiens © de climas. Este mundo durou pelo ‘menos cem yezes mais do que o nosso e agora surge-nos como parecendo ter existido noutro planeta: morrew ao mesmo tempo ‘que 08 seus monstros, 08 mamutes e 08 Finacerontes lanosos Depois dele, toda a ‘ivilizagio se reconstruré sobre bases diferentes: © grin reclamaté 6 celeiro, o coleito exigiré uma ‘mura para 0 proteger e um exéreito para defender a muralha, tum escriba para contar os sacos de trigo, fixar os impostos ¢ ceserever a historia. Se o homo sapiens tivesse sparecido 80 ‘mesmo tempo gue 0 grdo, pensariamas que estes dois mundos teriam pertencido a humanidades diferentes, nada tendo a ver um como outro, Mas agora sabemos que, antes de desempenhar © primero acto dos tempos actus, o homo sapiens, nosto semelhante,tinha desempenhado primer o ultimo acto da pesa anterior, ito é, dos tempos paleolitcos. ‘Sem ‘a citncia pré-historica, escapar-nos-ia 0 lado mais ‘maravithoso © também © mais misteriaso do nosso destino, Os tempos historicos apenas representam alguns minutos na longa jomad da humanidade; 0 seu conhecimento exclusive equiva- 46 ern gnorara ta sina gv o homer teva ne procure da son aia Sr o nentgnores dis gras no vesem cao pave [Adgutn,erfanos nea fase sobre infin do Boman ‘Aide Augustine no. devia saber muito de osola ou do ‘Since, mas conbetia temo taalos dasa Space. Tevez Gheme o cero dem cringe de i noe nam grande corpo finda pouco esq, mas ser que uma elanga des anos mio tem deforma obscura, a uaidades furs do ado? arr pr histva para exer. cloudade sob um tsiebag doch oon qobracs seria uma ocipesz0 ini os plseros que canta eos ashos que conte sto mss fants Mas aprovelar 0 que sibemos sobre os tempos pussados pare melhor comprender 0 que €o bomen, édecero Proster omenagen aos bles de seres qe tomer tans Endo sos spurs o sere do fain do bia, a so di tm qo os ses soesores deka im poco apessadamentc he se ar tomato omens bios usr

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