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Resumo Narrativas da infancia: a escola no mundo urbano eno mundo rural” Maria da Conceigio Passeggi Gilcilene Lélia Souza do Nascimento Vanessa Cristina Oliveira da Silva Este artigo tem como abjetiva relets acerca do sentido da ceseala para eriangas de 6.4 12 anas de idade. A pesquisa foi realiada em dois cenirios: em uma escola da periferia urbana ‘¢ em uma escola da zona rural, recorrendo a um protacola ‘comum, Em cima rods de convers, as ertngas falam da escola para um pequeno alienigena que vem de um planeta que no tem escolas. As narrativas das eriangas da periferia urbana ‘evidenciam a escola como lugar de violéneia tio presente em suas vidas. As esiangas da zona cural narcam 2 sespeito da im: portineia da escola enuanto lugar de convince lkernativa pars mudangas de vida, Eseas nacentivas da infincia nos ajsdam 4 compreender as singularidades da escola em cada contexto, ressaltndo 0 sentido dese espagos de acolhimento ds infineia para as propriaseriancas Palavras-chave: Nacraivas da infincia; Pesquisa (auto)biogei fica com eriangas; Sentidos da escola, Narrativa da infancii ja escuela en el mundo urbano y rural Resumen Este artfeulo tiene coma objetivo seflexionar sobre Ia eseucla significado para los niios de 6 2 12 afos de edad, La encuesta © ange retuka do projeto de pesquisa "Natatvas da infinca: © que conta a8 csiaeas sobre a esola€ 0s pofessoressobte a infiacia", Goancande pelo MICT/ ‘ONPG ~ Ecital Universal = 14/2014, proceso a. 462119/2014-9, Eoucacdo &Lnoutcen + v.19 + x 2» 101-116 * s-cez 2016 ISSN lesso:1415-9902 + ISSN Euresvico: 2176-1043 101 se ealizé en dos escenarios: una escucla de la peiferia urbana yen una eseuels rural, uilizando un protocolo comin. Ea tun citeulo de conversacién, los niios parecen ser la escuela para el pequeto exttaterreste que viene de un planeta que no tiene eseuclas, Los relatos de los nifios de la periferia urbana _mestran la escuela como un lugar de tan presente en sos vidas Los nifios rurale nazran acerca de a importancia de la escuela ‘como un lugar de convivencia y alternativs a los cambios de Ja vida, Estos eelatos de la infancia nos ayudan a entender Ise singulaidades de la escuela en eada contexto, haciendo hineapié cenel significado de ests espacios de evidado infansl para los Palabras clave: Infancia Narrativa; Bisqueda (auojbiogrifiea con los nfios; Sentidos de Is esevela, Narratives of childhood: the school in the urban world and in the rural world Abstract ‘This article aims wo reflet on what school meas co children ages 6 to 12, "The research was condueved using the same pro- in two diferent contexts: at a peripheral, urban school, and 4 raral school, In conversation citcles, childzen spoke about their school to a emall extrs-tetestail that came from aa planet whete there ate no schools, The nattatives of the eildren from the urban school showed evidence of the school as being a place of violence ia theie lives. ‘The children from. the rural school narrate the importance of school as a place of ‘coexistence, and an slernative for changing their lives. These narratives by children help us understand the particulars of school in each context, highlighting the meaning these spaces that shelter childhood have for the children themselves Key-words: Nareatives by cldren; (Autobiographical research with children; Meanings of school Introdugao As novas configuragdes sociais, na modernidade tardia, tendem a diluir as distingées entre 0 mundo rural ¢ 0 mundo vurbano, mediante entrelagamentos de aspectos tradicionalmente 102 Eoucacho &Lncucen + v.19 +s, 2+ 101-176 * woe 2016 ISSN fvensso1415-9902 + ISSN EsreSucos 2176-1043 considerados como parte da vida de dois mundos distintos. Os processos de globalizacio e os avangos tecnoldgicos, especial- mente, das tecnologias da informacio, preseatificam no mundo rural, modos de viver, até muito recentemente, préprios da vida urbana: a internet, o celular, a intercomunicagio nacional ¢ internacional. Por sua vez, os fluxos migeatérios, no Brasil, da zona rural para o litoral ou as capitais dos Estados, conferem uma dindmica de interconexio que ruralizam 0 urbano, No entanto, ainda esti longe um proceso de homogencizacio ¢ de uniformizagio desses dois universos constituidos de diversidades prépsias, notadamente, no contexto de um pais de dimensio continental, com especificidades climaticas, geogritficas, culturais, diversidades étnicas ¢ econdmicas especificas de cada uma de suas cinco regides. Sabendo que os processos educativos estio implicados ¢ imbrineados nas experiéneias cotidianas vividas em diversos tempos ¢ lugares, importa-nos interrogar como a erianca vivencia sua infincia numa escola inserida em um desses dois mundos € como elas se inserem nos contextos que perpassam suas vi- vvéncias na escola. Sendo a escola um lugar de socializagio ¢ de subjetivagio, que sentido a crianga atribui 4 escola como lugar de aprendizagem e de formacio? Neste artigo, trazemos uma reflexdo a respeito da infin- cia, focalizando o sentido que criangas de 6 @ 12 anos de idade atribuem a uma escola da zona rural e a uma escola de periferia urbana, no Nordeste do Brasil. O estudo se apoia na legitimi- dade da palavra da ctianga como fonte de pesquisa ¢ de sua importincia para a compreensio de suas vivéncias no espago escolar nesses dois universos. Iniciamos o texto com algumas reflexdes em torno da pesquisa (auto)biogrifica com criancas € da metodologia utilizada para a construgio das fontes da pes- quisa. Em seguida, comentamos 0 que emerge das narrativas produvidas pelas criangas nos dois cenarios em que realizamos as pesquisas. Finalmente, tecemos consideragées em torno dos resultados alcangados, focalizando 0 sentido desses espagos de acolhimento da inféncia para as préprias eriangas. Eoucacdo &Lncucen + v.19 +n 2 101-116 a-cez 2016 03 ISSN hresso:1415-9902 + ISSN Eurmsvico: 2176-1043 Rodas de conversa na pesquisa (auto) biografica com criangas Um dos desafios da pesquisa (autobiografica com criancas € encontrar maneitas de escutar o que elas tém a dizer sobre elas -mesmas ¢ suas proprias experiéncias, respeitando-as como seres capares de reflexdo, Requisitos que legitimam o seu reconheci- mento como participantes da pesquisa. Retomamos de Barbier (1988, p. 187), a nogio de escuta sensivel, que vai ao encontro de nossas preocupacdes com a ética da pesquisa, uma vez que propae o respeito ¢ © cuidado diante da pessoa que fala, em nosso caso a crianca, “em sua qualidade de pessoa complexa, dotada de liberdade e de imaginagao criadora”. Essa nogio representa uma abertura holistica necessaria para que se entre numa relagio com a crianca, considerando-a em sua existéncia dinimica, participativa ¢ criadora, Conforme ja diseutimos em textos anteriores (PASSE- GGl et al., 2014), a metodologia de recotha das narrativas fundamenta-se num protocolo comum utilizado nos cenarios da pesquisa.’ O protocolo compreendia rodas de conversa, das quais participaram entre trés ¢ cinco erianeas, de 6 a 12 anos de idade, numa situagio de faz de conta? Na conversa, as criangas contam para um pequeno extraterrestre, chamado Alien, 0 que clas vivenciam na escola. A situagao de faz de conta explora uma das principais earacteristicas do universo cultural da inflincia, a Iudicidade, com tudo que ela desperta no imaginario e na espon- tancidade da crianga, permitindo atrair a sua atengio ¢ interesse para a interacZo com a pesquisadora ¢ 0 pequeno alienfgena, A escolha das rodas de conversa e nio de entrevistas, por exemplo, como artefatos para a pesquisa deveu-se ao fato de que elas permitem a construcio de um discurso coletivo, com momentos de escuta ¢ de falas, alimentados pela interacio entre 1 Projton de penqua em andamente: "Nena de infil 0 que cota clang (CNP q/ Fetal Universal — sobre a exeoa eos prfertoes anbre a infinca” (MC 14/204, proceso n°. 62119/2014). [As conversa foram gravadas em Audio e video, respeitando-se 0 limite méximo ae uma hora de conversa de acordo com o parecer do Comité de cicada pesguita (aimero 198.818) 104 Eoucagho & Lncucen + v.19 +s, 2# 101-116 * soe, 2016 ISSN inensso-1415-9902 + ISSN EureSrco 2176-1043 pares, Na roda, clas podem discordar ou concordar com a fala do outro, complementar o que dizem, simplesmente silenciar ou refletis. A discussio se organiza, nessa situagio lidica, em tomo de trés momentos: a abertura (momento da apresentagio do Alien, que vem de um planeta que nao tem escola, ¢ esta curioso para saber o que é a escola); a conversa (didlogo entre as criangas, 0 Alien € a pesquisadora); € 0 fechamento (momento do retorno do Alien ao seu planeta) A escolha do protocolo utilizado deriva, portanto, das pre~ ocupagdes € cuidados que petmearam a tealizagio da pesquisa, com base numa metodologia coerente com os principios da ética em pesquisa ¢ os principios cpistemologicos da pesquisa (auto) biogrifica com eriancas em Educagio. As transcrigdes das rodas de conversa confirmam a sua importincia para uma dinamica participativa que nfo sé assegura os direitos ¢ bem-estar da crianga, mas se apresenta também propfeia 4 escuta sensfvel € 4 construgio narrativa pela crianca que fala sobre o seu meio social, a respeito dela mesma e acerca da escola, As anélises das rodas de conversa, por sua vez, permiti- ram depreender das falas das criancas duas tematicas centrais, «que seriam, supostamente, para clas no momento da pesquisa, que caracterizaria os contextos escolares estudados. No ce- nario da escola rural, as narrativas enfatizam a importancia da escola como lugar de convivéncia ¢, especialmente, como porta de entrada indispensavel para mudangas em suas vidas, uma mobilidade social ascendente, No contexto da escola urbana, as narrativas trazem como principal tema de referencia pata as criangas a violéncia presente na escola, seja como refiexo da violéncia existente na comunidade, em que duas gangs disputam © poder, seja como rotina de brigas ¢ agressdes entre alunos, seja como marca institucional de uma violéncia simbolica exercida pela prépria escola sobre a crianca Para as analises, consideramos a concepgio minimalista de narrativa de Daniel Bertaux (2010), escothida em fungio de as criangas se expressarem na roda de conversa com frases custas € breves, porém densas de sentido, sobre suas experiéncias na escola. A leitura das transcrigéis revela que esses pequenos frag- Eoucacdo BLncucen + v.19 4% 2 101-116 s-cez 2016 105 ISSN hresso:1415-9902 + ISSN Ezresvico: 2176-1043 mentos se encadeiam no fio da conversa e criam narrativas que vio sendo construidas coletivamente, pois a fala de uma erianga vai complementande a fala de outra, ¢ clas vito ganhando sentido na medida em que a conversa avanga. No processo de transcri- io, para preservar a identidade das erianeas, escolhemos nomes aleatérios para identificé-las como autoras de suas narrativas A escola no mundo rural: mudanga de vida para um futuro melhor As discussdes sobre a escola no meio rural no se limi- tam 4 configuragio pedagégica da escola, elas também levam em conta © papel desempenhado por essa institui¢io social tanto do ponto de vista do desenvolvimento cultural quanto econémieo. No cenério da escola da zona rural pesquisada, as narrativas das criangas enfatizam a importancia da escola como lugar de convivéncia e como uma porta de entrada indispensivel para mudangas esperadas em suas vidas. Pensar a escola rural a partir do sentido que as criancas atribuem as suas experiéncias escolares requer que situemos esse sentido no contexto desse universo social, histérico e cultural em que elas estéo inseridas. De maneira geral, a zona rural tem sido historicamente caracterizada pela crise e pelas precirias condigdes de trabalho na agricultura, pelas desigualdades e situagGes de vulnerabili- dade socioccondmicas vividas pelos sujcitos desse territério, © que leva a deserenga na possibilidade de desenvolvimento e de perspectivas de futuro melhor, colocando-os numa situagio de fatalismo, de estigma ¢ na condigio de migrantes. Nesse senti- do, tudo o que se refere, tradicionalmente, 20 rural é sindnimo de atraso ¢ de fracasso. Contudo, a presenga da escola na zona rural, as politicas sociais efetivadas nos sltimos anos no Brasil, com o objetivo de garantit 0 acesso e a permanéncia das erian- gas na escola, como 0 caso do Programa Bolsa Familia, tém amenizado, nos dltimos anos, essas representagdes, assim como a migracio das familias para a cidade. ‘A escola em que a pesquisa foi realizada se insere numa regio beneficiada por uma politica de expansio ¢ interiorizagio do ensino superior, tornando a entrada na universidade uma pos- 106 Eoucacho &Lncucen + v.19 + 6, 2+ 101-176 * soe, 2016 ISSN ivensso1415-9902 + ISSN Euresrcos 2176-1043 sibilidade cada vez mais préxima da populagio, Estimamos que, no cotidiano da maior parte das criangas dessa escola, eireulam discursos sobre o ensino superior, quando familiares ¢ amigos da comunidade ingressam na universidade, sem a necessidade de deslocamento para grandes centzos urbanos. A multiplicagzo das escolas ¢ a possibilidade de continuidade dos estudos fazem, portanto, parte das novas configuragdes sociais que diluiriam as fronteiras entre mundo urbano € 0 tradicional mundo rural Convém, contudo, lembrar duas especificidades da escola pes- quisada, Em primeito lugar, ela se situa numa regio semiarida, com forte presenga da seca, em que a sobrevivéncia por meio da agricultura torna-se ainda mais dificil pelas condiges climaticas desfavoriveis. Ainda como especificidade dessa escola, destaca-se 1 existéncia em seus arredores de uma comunidade reconhecida pela Fundagio Palmares como remanescente de quilombo. A escola acolhe, portanto, um piblieo diversifieado com eriangas que vivem na cidade e criangas dessa comunidade encravada no alto de uma serra ¢ de dificil acesso. As eriangas dessa escola tém a oportunidade de vivenciar relagdes sociais marcadas pela diversidade, o que faz da escola um mundo diferente daquele com o qual estio familiarizadas. Ressalta-se em suas narrativas 0 sentido da escola como lugar de convivéncia ¢ de aprendizagem das relagées sociais. A escola serve portanto: (Vivi) Pra fager novor amiga; Pra aprender a dividr as coisas; (Hel) Pra aprender a respeitar; (Vaind) Os amigos da escola so Jegais! (Valécia) Porque ajudam nas atividades! © interesse da escola passa assim por essa possibilidade de configuracto provocada pela experiéneia de viver numa organizagio social com normas ¢ procedimentos de condutas distintos do seu contexto familiar € da comunidade em que vivem, Conversando com as criangas sobre 0 que fazem quando nao estio na escola, emerge uma narrativa reveladora da per- manéneia de modos de vida enraizados em atividades tipicas da zona rural, tais como plantar, cuidar dos animais, fazer cerca, “buscar lenha”, Lssas tarefas que fazem parte de seu cotidiano sio consideradas por essas eriangas de 8 a 12 anos de idade como uma forma de ajudar seus pais ¢ avés na agricultura, Eoucagao &Lncucen + v.19 +m 2» 107-116 + ace, 2016 107 ISSN iesso:1415-9902 + ISSN Ecresvico: 2176-1043 quando nio estio na escola, € nao como uma obrigagio. (Carlos) Ex trabalho fazendo cerca, limpando mato, plantande; (EAvardo) Ew judo 4 plantar tambént (Sandro) Meu pai planta leva une companbeiro pra qjndar. Ex planto milbo, nao planto feito; (Marcio) Quando é no domingo, eu vou tirar o leit. Fu gosto de ajudar; (Jean) Quando mew (pai sai de casa ee dix pra en botar 0 resiéuo de molke; (Masta) Quando ‘minha mie té ma rua, en bolo a comida e dgua pras galinbas Nas narrativas dessas eriangas, observamos a valorizagio © 0 reconhecimento do que aprendem na escola, em oposigio a0 que vivem no contexto familiar, ¢ ela surge como alternativa para sair de um futuro incerto. Esse é um dos sentidos da escola aque se Ié nas narrativas das criangas, podendo ser resultante de ‘uma transmissdo intergeracional, dos avés para os pais, dos pais para os filhos, no contexto da vida na zona rural ‘Numa situagio hipotética, criada durante as rodas de con- versa, sobre como seria @ vida sem escola, essas eriangas entre 7 € 11 anos de idade, ressaltam o papel da escola em suas vidas, vislumbrando 0 futuro ¢ a vida profissional: O gue a gente gprende nna escola vai servir para nosso futuro, Pra trabathar (Lula e Heney); Seria muito ruin. A pessoa ndo aprenderia a ler, estudar. Bs assim, se nao _fose pra escola, a gente naa ia arrumar um trabalho também (Kely; Gas- ‘pat). Assim, a escola apresenta-se como alternativa mais assertiva para sairem de um futuro incerto na zona rural e, sobretudo, das condigdes precitias da vida na roga, Se nio tivesse escola: Seria horviell Tinba que trabalbar na roca. Nao ia conseguir arrumar emprego (Henry); O que estariam fazendo? (Marta) Trabalhandos (lean) Estaria na roga, metendo a foice pra cima. Flas reforgam em suas narrativas que sem escolas Thes restaria apenas o trabalho pesado na roca, Nao é, portanto, surpreendente quando dizem por que € para que vém 4 escola. Elas reforcam 0 papel da escola no seu processo de mobilidade social: Pra estudar! Pra aprender a ler! Pra quando ficar grande, arranjar um emprego! Pra ser um dou tos! Pra tirar nota boa! Pra ser um professor! Pra se formar pro- fessoral Conseguir entrar na faculdade ¢ ter um futuro melhor. De acordo com Lahire (1997), a relagio entre as configu- ragéies familiares ¢ a vida escolar é um aspecto importante a se 108 Eoucacho &Lncucen + v.19 + 6, 2# 101-176 * soe, 2016 ISSN ivensso-1415-9902 + ISSN Esresrco 2176-1043 considerar na construcio do sentido da escola para a crianga ¢ na motivacio para estudar. A familia exerce esse papel funda- mental de despertar interesse pelos estudos, principalmente na zona rural, em que os pais temem um futuro incerto para 0s filhos. A visio adultocéntrica da escola transmitida para a crianca faz da escola esse lugar de passagem obrigatéria para 0 futuro, minimizando a sua importincia para o presente na vida da crianga, momento que elas recuperam em suas narrativas ressaltando a importincia da escola como lugar de convivéncia, de fazer amigos, de interagio social € de aprendizagens para a vida na comunidade, Essa fungio social da escola é o que a justifica em qualquer contexto, como insiste Delory-Momberger (2008, p. 121), 20 se referir & escola na Franca: “O que se faz na escola nio tem sentido em si mesmo, a escola s6 é ‘itil’ na perspectiva de uma profissio, de um futuro ao qual daria acesso” ‘A escola apresenta-se aos olhos das criancas da zona rural como alternativa que proporcionaré mudangas de vida no futuro, Considerando 0s processos de formagio da erianga, a reflexo gue cabe é encontrar na escola modos de fazer que permitam as criangas contarem outra histéria sobre sua vida na escola que considere sua infancia como fase da vida que deve ser vivida em sua plenitude. A escola no mundo urbano: a violéncia no cotidiano escolar No cenério da escola da periferia urbana, as criangas falam espontaneamente da violéncia que elas vivenciam na escola € fora da escola, Esta foi a tematica mais recorrente em todas as todas de conversa com criangas de 8 2 12 anos de idade, Nao constitui uma novidade a violéncia na escola, © que causa estranhamento é que essa violencia seja praticada por criangas cada vez mais jovens. © conceito de violéncia escolar é miiltiplo abrangente, por envolver diversos fatores em sua dinamicidade. Depreendem -se das narrativas dessas criancas trés tipos de violencia, classifi- cados por Charlot (2002) como: violéacia na escola, violéncia & Eoucacdo BLncucen + v.19 + x 2 101-116 au-cez 2016 109 ISSN lesso:1415-9902 + ISSN Eurmdvico: 2176-1043 escola ¢ violencia da escola. Para Charlot (2002, p. 434, grifo do autor), “A violencia na escola é aquela que se reproduz dentro do espaco escolar, sem estar ligada & naturcza ¢ as atividades da instituigao escolar”, Essa € também aquela que as criangas contam para o Alien em suas narrativas. Cenas de brigas e desen- tendimentos entre clas ¢ entre amigos sio as mais frequentes. O que conta Max (8 anos de idade) € representative desse tipo de violéncia: Um menino do 4°, ano foi a0 banheito e arranjou uma briga lé. Deu um bofete no olho do menino, ¢ o menino caiu, ficou li, Ele era do 1°, ano, Na narrativa de Max, fica evidente 2 agressio fisica do menino mais velho como meio de assegurar 1 sua superioridade contra uma erianga mais jovem do que ele. Base relato de Max, na roda de conversa, nfo se configura uma narrativa isolada na escola pesquisada. Desde cedo, a relagio centre agressor ¢ vitima se estabelece como algo corriqueiro na escola, O que causa estranhamento para Max é que a erianga menor “ficou 14”, supostamente, sem reagio € sem socorro. Abramovay © Rus (2002) afirmam que essa modalidade de violencia, t20 frequente na escola, abrange condutas brutais «que podem se iniciar como brincadcira ¢ terminar em agressbes. Os motivos das brigas sio de tal forma variados, imprevisiveis, ‘ou mesmo injustificiveis, que sio omitidos nas narrativas: “ele foi no banheiro ¢ arranjou uma briga la”. As agdies se sucedem como parte de um encadeamento que jé faz parte do enredo: “foi ao banheito”, “arranjou briga”, “dew um bofete”, “o menino fica claro que esse tipo de agressio acontece, quase sempre, fora da sala de aula, na hora do intervalo, ‘As brigas no ocorrem apenas entre meninos, as meninas também fazem uso da forsa fisica ou ameagam as colegas para demonstrat seu poder contra as mais “fracas”. Ana (9 anos de idade) afirma o seguinte: Para comeco de hist6ria as meninas vie- ram me falar que Helena tinha dito que iria me bater e eu, como sou fraea, comecei a chorat, Ana deixa evidente © medo que sente diante da situagio de violéncia anunciada pelas amigas. O que chama atencio no seu relato é a forma como ela se reconhece diante da sua reacio: “como sou fraca, eomecei a chorar”. No ‘querer, ou no poder rcagir usando de sua forga fisica contra a caiu ¢ ficou le” 10 Eoucacho &Lncucen + v.19 +6. 2+ 101-176 * soe, 2016 ISSN tvensso-1415-9902 + ISSN EureSrco: 2176-1043 colega € supostamente interpretado por ela € pelo grupo como sinal de “fraqueza”, e de sua imagem como ‘“medrosa” Essa narrativa de Ana estava escrita no “Livro de inter cimbio” da escola pesquisada, utilizado pela ditegio da escola como um modo de levar as eriangas a registrarem situagdes de conflitos. O registro cra, portanto, feito pelos préprios alunos, que deveriam escrever sobre sua patticipagio em atos de vio- lncia, ou de indiseiplina, © que certamente os ajudava a tomar consciéncia da razo pela qual tinham sc envolvido na histéria que estavam narrando. Fim nossa pesquisa a leitura dessas na rativas eseritas permitiu complementar o que diziam as eriangas sobre a violéncia nas rodas de conversa. Para Abramovay € Rua (2002, p. 232), a primeita modalida- de de violéncia contra a pessoa, em pesquisas realizadas por elas para a UNESCO, consistia em ameacas: “promessas explicitas de provoear danos ou de violar a integridade fisica ou moral, a liberdade ou os bens de outrem”. As ameacas anunciam a violéncia fisica, ¢ isso gera entre as criancas um clima de ten- sio cotidiana, provocando sentimentos de inseguranca e medo. Abramovay et al. (2006, p. 146) afirmam que objetivo desse tipo de ameaca é sempre o de “amedrontar, intimidar, criar uma situagio de inseguranga, sublinhar superioridade” Emesgiu também das anilises das narrativas, o que Charlot (2002, p. 434) chama de violencia a escola “que esta ligada 4 natureza ¢ is atividades da instituigio escolar”. Ou seja, so atos praticados pelos alunos contra a escola. Abramovay, Avancini ¢ Oliveira (2002) afitmam que, na década de 1980, observou-se ‘um aumento considerével de depredagées, e pichagées contra patriménio. E, atualmente, esse é um tipo de violencia comum contra a escola. Para esses autores (op. cit, p. 45), “é necessétio tentar desvendar as mensagens escondidas por tras desses atos de violéncia contra o patriménio das escolas”, pois esses atos podem revelar, por parte do(a) aluna(a), tanto a necessidade de chamar a atengio para si, como traduzir sentimentos de revolta ou rebeldia. Lim suas narrativas, esse tipo de violéncia é geralmente praticado por erianeas maiores, mas so as eriangas menores que contam as histérias, como esta narrada por Heitor (8 anos de Eoucacdo BLncucen + v.19 + % 2 107-116 acez 2016 m ISSN hesso:1415-9902 + ISSN Euresvico: 2176-1043 dade): Bles bagungam. Eles tinham quebrado essa janela aqui, da propria sala, Os meninos maiores quebram tudo. terccieo tipo de violencia é sem dividas o mais sutil, mas talvez. um dos mais marcantes para as criangas, Trata-se, confor- me Chatlot (2002, p. 435), da “violéneia da escola: uma violencia institucional, simbélica, que os préprios jovens suportam através da mancira como a instituigfo e seus agentes os tratam’”. Esse tipo de violencia contra a erianea que se manifesta subrepticiamente deriva das relagdes de poder, ¢ nao necessita do uso da forga para se propagar € provocar danos, dificilmente narrados durante © processo de escolarizagio. Eles reaparecem muitos anos mais tarde, inclusive nas narrativas de professores como um ajustes de contas contra a escola. E evidente que tal condigio de poder que se atribui a instituigdo escolar vai progressivamente direcionando ‘0 modo como as criancas se percebem, ¢ elas vio construindo representagées de si como aluno(a)s dentro da instituigao, em fangao dos modos como se sentem tratadas por uma percepcio adultocéntrica da escola, da crianga, de seus modos de ser ¢ de ver © mundo, F. nao é raro que essas eriangas manifestem sua tejeigio a escola por se sentizem “injustigadas” ‘A escola pode também apresentar-se como espago de vio- léncia simbélica, na medida em que suas regras e normas no derivam de negociagées democriticas. A violéncia da escola pode se manifestar, disfargadamente, no que Barroso (2015) concebe como saberes priticos que constituem a cultura escolar a cultura de escola, ¢ que surgem nas narrativas das criangas como condi¢ao “para ser alguém na vida”. No contexto de vio- léncia em que se encontram as eriangas da escola da periferia pesquisada, essa condi¢io ecoa mais como uma ameaga de nao reconhecimento de si como “alguém na vida” do que como uma promessa de um futuro melhor. Assim, em suas narrativas elas insistem sobre a finalidade da escola ¢ de estudar: Para apren- der, ¢ ser alguém na vida quando eu crescer, Para aprender, € para ter um trabalho melhor quando for maior. Porque, senio, quando cu crescer, no vou ter um futuro. Para nao ser burro! Para estudlar, erescer ¢ ser alguém na vida (Lata e Clara, 9 anos de idades Léo ¢ Bruno, 10 anos). nz Eoucacho &Lncucen + v.19 +s, 2 + 101-176 * soe, 2016 ISSN ivensso-1415-9902 + ISSN EureSrcos 2176-1043 Nas narrativas das criangas, esse tipo de violencia ainda se faz sentir quando se referem ao “bom comportamento”, pela escolha da expressio “Tom que ...”. Elas dizem para o Alien, que na escola: ‘Tem que ficar quietinho no seu canto, nio pode bagunear. Nao ser mal edueado, Ser um bom aluno. Voeé tem que cuidar da sua escola. Tem que ficar atento na hora do re~ creio, voce tem que ajudar 2 diretora, Na escola no pode brigat porque senio ninguém vai ser amigo (Gui e Heitor, 8 anos de idade). Para Passeggi (2014, p. 143), “a crianga vai construindo uma identidade de aluno mediante formulas prontas, blocos de palavras fornecidas pela cultura escolar, que fomentam a sua agio no mundo”, como um dever, uma imposi¢io que escapa a0 seu entendimento. No entanto, € importante ressaltar que apesar de convi- verem diariamente com a violéncia, seja ela na forma fisica ow simbélica, as criangas apontam caminhos para se pensar em outra escola, Na mensagem de despedida do Alien, Rita (11 anos de idade) Ihe diz como deve ser a escola em seu planeta: Alien, na sua escola tem que ter muitos amigos e muitas eriancas pra brincar, no pode ter briga ¢ na sua rua no pode ter bala, nem bandido. Para essa crianga, a escola que ela deseja se opie a escola que ela conhece e & realidade de uma comunidade que sofre com o problema da violéncia urbana. Os diferentes tipos de violencia sofridos e/ou praticados a escola e que ressurgem em todas as rodas de conversa nas nar- rativas das crianeas da periferia urbana permitem nos interrogar acerca das condigdes da crianga no cotiando escolar. Podemos aqui retomar a pergunta que fizemos a respeito da escola no mundo rural, Como fazer para que as criancas possam contar outra histéria sobre sua vida na escola que considere a sua in- fancia como fase da vida que deve ser vivida em sua plenitude? Considerag6es finais ‘As analises evidenciam que as criangas da zona rural en- facizam a importineia da escola como uma porta de entrada indispensivel para mudangas de vida e lugar de convivéncia. As criangas da escola da petiferia urbana apontam mais esponta Eoucacdo BLncucen + v.19 + % 2 107-116 acez 2016 ns ISSN hesso:1415-9902 + ISSN Euresvico: 2176-1043 neamente para as situacdes de violéncia na escola, Se, por um lado, tendem a banalizar a violéncia na escola e contra a escola, por outro lado, cristalizam em suas narrativas a violéncia da escola, As anilises das narrativas produzidas nos dois contextos de realizagio das rodas de conversa trazem resultados comuns no que se refere a organizacio pedagégica c 4 cultural escolar, (0 que teforga o argumento de que a escola desenvolve priticas pedagégicas homogeneizadoras. Apesar disso, os contextos em que a escola atua dio um contorno peculiar as relagdes que as criangas estabelecem com esse espaco institucional. Observamos, por exemplo, que a referéncia a0 tema da violéncia, tio presente nas narrativas das criangas da periferia urbana, s6 aparece nas narrativas das criangas da zona rural quando questionadas sobre a preferéncia entre morar na cidade ‘ou morar no sitio, A maioria das criangas expressa preferéncia pelo sitio, e quando perguntadas por que ndo querem morar na Cidade, respondem: Deus me livre! O siti € muito melbor, a gente pode brincar,€ tem mais seguranga. E: mais sossegade, HA os que dizem que 1 cidade é mais divertida que 0 sitio, mas, ld na cidade, matam muita gente, ronbam, & muito perigoso morar lé Nos dois cenarios da pesquisa, as criangas disseram que estavam na escola para estudar, aprender, creseer e ser alguém ‘na vida, sendo um discurso comum tanto as narrativas das criangas da escola urbana, quanto no das criangas da escola ru- ral, Para Passeggi, Abrahdo e Delory-Momberger (2012, p. 12), “a esiangal justifica a sua ida a escola com o discurso herdado do projeto de si: ‘para ser alguém na vida”. A cultura escolar desconsidera todas as experiéncias extracurriculares que as criangas trazem consigo ¢ torna homogénea a ideia de estudar numa perspectiva de futuro, anulando a ideia de infincia no presente: “porque senio quando eu crescer, nio vou ter um futuro”. Nessas afirmativas as criangas nfo compreendem 0 sentido da escola numa perspectiva presente, porém como um meio de chegarem a um futuro prometido quando elas poderio ser ento reconhecidas como “alguém na vida”, Essas narrativas da infineia nos ajudam a compreender 0 sentido da escola para as criangas ¢ as singularidades de cada na Eoucacho &Lncucen + v.19 + 6, 2+ 101-176 * soe, 2016 ISSN ivensso-1415-9902 + ISSN EureSrcc 2176-1043 contexto, 0 que nos leva a finalizar esta reflexio pela mesma pergunta: Como fazer para que as eriancas possam contar outra historia sobre seu processo de escolarizacio numa escola que considere a sua infincia como fase da vida que precisa ser vivida em sua plenitude? Referéncias ABRAMOVAY, Miriam et al. Cotidiano das escolas: entre violéncias. Ob- servatésio da violéncia. Ministéio da Edueagio, Braslia: UNESCO, 2006, ABRAMOVAY, Miriam, AVANCINI, Masia, OLIVEIRA, Helena. O bé 4 bi Gs intolerincia da discriminasao. Violéneia nas escolas, UNESCO, 2002. 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Nascimento, Email lelianascimento@ufersa.cdu.br Doutorsnda do Programa de Pés graduagio em Edueagio Universidade Federal do Rio Grande do Norte Vanests Cristina Oliveira da Silva, Email: Vanvan_cristina@yshoo.com.br Mestre em Edueagio pelo Programa de Pés-graduacio em Educagio Universidade Federal do Rio Grande do Norte (© arcigo resulta do projeto de pesquisa “Nascativas da infincia: © que comtam 25 criancas sobre 2 escola ¢ os professores sobse a infincia”, Gnanclando pelo MICT/CNPg - Edital Universal -14/2014, Processo ao, 462119/2014-9 Antigo recebido em 16/11/2016, Aprovade para publicagdo em 18/11/2016 6 Eoucacho &Lncucen + v.19 + 6, 2+ 101-176 * soe, 2016 ISSN ivensso-1415-9902 + ISSN EureSrco: 2176-1043

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