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CAPITULO 4 O PRIMEIRO ANO DE VIDA. VIDA UTERINA, TRANSIGAO POS-NATAL € ATIVIDADE DE COMUNICAGAO EMOCIONAL DIRETA COM O ADULTO SIMONE CHEROGLU" GISELLE MODE MAGALHAES* ante dos objetivos do presente livro, este capitulo tem por finalidade contribuir para a compreensio do processo de desenvolvimento psiquico, irando os estudos acerca do processo de desenvolvimento humano e sua jodizagio, produzidos no Ambito da psicologia historico-cultural. Trataremos |, especificamente, dos periodos iniciais de vida: do prénatal ao primeiro: de le. Para compreender o desenvolvimento do bebg, convidamos o leitor a tomar 10 eixo de seu taciocinio a unidade dialeticamente contraditoria entre natu- cultura. Tal convite reflete a compreensio do desenvolvimento humano além das simplificagdes naturalistas, infelimente ainda tao vigentes na cia atual. Nesse sentido, amparamos nossos estudos fundamentalmente em Vigotski, Leontiev e Elkonin, autores que atestam a formagio da humanidade logicamente guiado, ‘0 desenvolvimento social, cultural historicamente orientado, tendo, este imo, papel central nessa formagio, Esse entrelagamento se expressa por meio 1m processo ativo, que resulta na unidade natureza-cultura, transformando, im esséncia as condlgdes externas e internas do desenvolvimento social de cada set humano. 94 LGIAM. MARTINS, ANGELO A. ABRANTES & MARILDAG. D. FAGGI (ORG) As condigdes sociais, para os autores da psicologia historico-cultural, no siio mero amparo a fim de que o biologico cresca, mas sim condigses para a vida humana, sem a qual nio hé desenvolvimento. Portanto, entrelagadas com o de senvolvimento evolutivo jé desde o feto estio as condigdes de desenvolvimento impostas pela sociedade: o desenvolvimento do bebé sofre influéncia direta das condigdes de vida da gestante. Ao longo do capitulo, como o proprio titulo elucida, trataremos de trésfases {que compéem o processo de desenvolvimento no primeiro ano de vida, quais, sejam, 0 periodo uterino, o period posnatal eo periodo de relativa estabilidade na formagio cultural do bebé, cuja énfase sera dada & atividade de comunicacao, ‘emocional direta, atividadeguia no primeiro ano de vida, VIDA UTERINA E comum nos depararmos com perguntas relacionadas ao desenvolvimento, do bebé ainda em gestacio. Seri que o bebé em gestacio sente o mesmo que 4 mie? Sera que ele clabora pensamentos? O bebé vai ouvir tudo que disserem ao redor da mae? Sao perguntas frequentes, ¢ respondé-as nio é tarefa simples, pois exige a compreensio da contradicio naturezacultura presente no desenvol vimento humano desde a gestacio. ‘Sendo assim, partimos inicialmente de um consenso na psicologia do desen- volvimento que ¢afirmar a vida uterina como o periodo em que se dia formaglo de pré-condigses para sistemas funcionais complexos, ou seja, ¢ dentro do utero da mae que a crianga inicia o seu desenvolvimento fisiolégico e, consequentemente, as condigdes para a formagio do seu psiquismo. O sistema orginico esti sendo formado, e desde o inicio o seu funcionamento esti submetido as condigdes sociais da gestante, expressdo do movimento dialético entre organismo e cultura, ‘ow entre o feto e as condigdes de vida da mae E o sistema nervoso eo sistema circulat6rio que sero primeiramente forma- dos no periodo embrionstio, ea literatura indica que com trés semanas de vida intrauterina o feto ja apresenta hatimentos cardiacos, ¢ com oito semanas notase atividade reflexa no embrido. Em decorréncia da formagao do sistema nervoso da atividade reflexa, o embrido passa a reagir ao toque na barriga da mie e, paulatinamente, vai mostrando atividade muscular involuntaria, caracteristica marcante da vida uterina (ViCENTINI, STEFANINE, VICENTINI, 2009). ‘O desenvolvimento do sistema neurol6gico permite também que, pai PERIODIZAGRO HISTORICO-CULTURAL DO DESENVOLVIMENTO PSIQUICO 95 rulhos ao seu redor. Entre os principais sons presentes desde o agdo esti o ritmo cardiaco da mie, o qual, segundo Glozman (2014), éfator lc conforto e seguranca para o bebe em gestagio quando constante. A partir inte e quatro semanas, a mesma autora aponta que as reagdes aos barulhos res vio tornandose frequentes. Esse momento em que o bebé comeca a reagir aos sons externos fazse inte- ressante, pois, embora ele escute o que esti sendo dito ao redor, a sua atividade rvosa & reflexa, ou seja, ele reage 20s sons, mas no compreende, de forma ima, 0 significado das palavras que esto sendo ditas. Nesse sentido, cabe teflexdo sobre a qualidade dos sons que a gestante se expe, os quais podem alterar ritmo cardiaco dela e também o do bebe. ‘Apés a formagao do sistema nervoso ¢ circulatério, as reagdes aos estimulos sensoriais vao intensificando-se cada vez mais e, como defendido pela psicologia cultural e corroborado por Vicentini, Stefanini e Vicentini (2009), 0 ato biol6gico configurase ao longo do desenvolvimento do individuo subju- ‘condigées sociais nas quais se processa. E nessa dirego que afirmamos as condigdes postas a0 feto sio determinadas pelas condigées de vida da periodo gestacional cra, inevitavelmente, um vinculo de dependencia re 0 bebé em formagao ¢ a gestante, vinculo esse que leva Glozman (2014) firmar que mudancas de humor, ansiedade e estresse nia gravidez afetam 0 é em formagio, Desse modo, jé no periodo embrionitio temse o inicio de jostas emocionais de vinculo, as quais estio diretamente relacionadas com 0 \do emocional da mic ~ ambiente de desenvolvimento do feto ~ e aos fatores 1uimicos que o sustentam. ‘No entanto, é preciso atencio na continuidade desse vinculo apés o nas cimento, pois ele sofre mudangas qualitativas radicais, podendo manterse iretamente com a mae biolégica ou formarse novamente com outro adulto lador. Destaquese que o bebé nio sobrevive sem a presenga do adulto, sendo impossivel afirmar que esse adulto deva ser necessariamente a mie que o gestou, ima vez que tal afirmagio incorreria em claro equivoco, com a nat ipel da mae € a desconsideragio da natureza social do desenvolvimento mano. Segundo Vicentini, Stefanini ¢ Vicentini (2009), o .e de forma reflexa aos estimulos, mas rapidamente, apés © nascimento, 0 ismo passa a agire orientarse pelo ambiente social que o circunda, Nas pa- Js autores: “As conexdes nervosas se produzem niio na unilateralidade das cortex anda et maturc contado, ess condo no significa sua . i relata que é possivel observar na crianga recém- i Vi de que mant#m rag com os eas PalqUeDS simples. Nao obstante, € preciso excluir anifestagio de fendsmenos propriamente aque se apresenta ainda a auséncia PERIODO POS-NATAL © periodo pésnatal é denominado por Vigotski (Vrcorskt, 1996) de periado de passividade, uma vez que o bebé nesse periodo da vida apresenta | peculiaridades que colocam em condigdes de dependéncia absoluta do adulto’. Embora ocorra a separacio fisca da mae, o bebé permanece sendo biologicamente dependente em suas fungies vitais, como na alimentagio, posto que mesmo sem a conexio fisica 0 bebé continua alimentandose da mae. processos biisicos vita “bes, instintos e afetos m: Sa semen ar ne eer ea Outra caracteristica marcante do recém-nascido € a pouca diferenciacio en- hui compreensio dos objetos, nem aspiragdes copacicnnen. tre sono e vigilia. Os recém-nascidos, de acordo com Vigotski (idem), dormem citenta por cento do tempo, de forma inquieta, ligeira ¢ descontinua, fazem. movimentos impulsivos, alimentam-se dormindo, dormem com olhos semiaber- tos ¢ permanecem com olhos fechados em estado de vigilia. O bebé que se esta adaptando a0 novo mundo, segundo o autor, reage com 0s mesmos movimentos a todo estimulo inesperado e brusco. Trata-se da reagdio de Moro, que consiste no. teflexo dos bragos em cruz, ou seja, os bragos se separam simetricamente e logo voltam a se juntar em forma circular. Destacamos ds pales de Vigo (dem su referencia rnogden pot E a atividade reflexa que marca o inicio da vida humana, tanto no periodo essay sim, ji estdo presentes no bebé desde os primeiros eee ee embrionario como no pésmnatal. Nessa dregdo & que Vigotsk (idem) cescreve a “mcm pra dsesonet Seam estado emosonnis eras passividade do reeémnascidlo, mostrando que néo hé elementos em stia conduta, co desagradives,¢ posstvel percebélos na expressio do Fonts ena ‘ou em sua conseigneia, que demonstrem uma vivéncia social ativa. Apesar disso, jer apna qu no prio mes devi lo expo pésnatal representa um marco no desenvolvimento da vida psiquica foc sea es 1 partir do nascimento que se produs ap choro ete. Vigots bebe diferencias entre pessons oi diversos, apresentase ao bebé como um estado st ; ao longo dos anos e por meio da vida social, de uma consciéncia individual e ee tes ida pega Sor en ss =a ual seja: a supremacia de vivéncias nao fracionadas, a ranean a ews e sensagho. Ese estado também nio permite gi subjetivo tinico. Assim sendo, essa nascido apresentada pelo autor, ‘uma fusio de atragio, bebé separe a sua existéncia, as suas vivéncias, da percepgao das coisas objetivas, tanto ele como o seu entorno fazem parte de uma percepgao tinica. O bebe tecémmnascido, seundo Martins (2009), ver ao mundo dotado de lum aparato sensorial desenvolvido, de modo que possa possi de cheiros e sabores (doce, salgado e amargo), além da acuidade titi e auditiva Apenas a visio encontrase pouco desenvolvida nos primeitos meses de vida. Assim, o mundo, ou a cultura historicamente constituida, adentra a vida do individuo pelas vias sensitivas e formar, dia apés dia, o seu psiquismo. Exse periodo de passividade tem duracio de aproximadamente quarenta ¢ cinco dias, e a nova formagio central apresentada pelo bebé nese momento, segundo Vigotski (Vycorski, 1996), é a formagdo da atividade nervosa superior aliada & maturacio co iodo pésnatal. A atividade nervosa superior constituise conforme a vida © social do bebe, Piciando o surgimento de uma importante reagio social: 0 sortiso. © sortiso, junto com o choro, tornam-se as formas centrais de comunicagio com 0 adulto. Ao final do periodo pés-natal, entre o segundo e terceiro més de vida, a pas- sividade do recém-nascido transforma-se gradativamente em interesse. Vigotski (idem) aponta que tal interesse ¢ expresso pelas novas manifestagdes da atividade receptoraem estado de visila, pela manifestacio da atengio a estimulos sensoriais, a0s préprios movimentos, aos proprios sons, aos sons em geral e a presenga de utra pessoa, Esse perfodo marca le modo importante o desenvolvimento das sensagdes e, consequentemente, da atividade sensério-motora. Se no inicio desse periodo a motricidade do recém-nascido apresentase fusionada com os processos sensoriais e de percepeao, ao final dele o mundo exterior desponta para o bebé e comecam a predominar as impressbes visuais ¢ sonoras, ainda que sejam os sons que ele mesma produz © bebé tenta segurar ‘08 objetos, toca-os com as méos, leva-os 4 boca para o contato com os labios, a lingua, ou seja, essas sio atitudes manuais que tém importancia fundamental para todo o desenvolvimento psiquico posterior, visto que a integragio da visio aos demais sentidos desenvolve a acuidade perceptiva da crianga, corroborando a formacio da sensomotricidade e modificando significativamente a relagdo com. tar a distincio , marcando o final do ATIVIDADE DE COMUNICACAO EMOCIONAL DIRETA. ‘Ao longo do periodo pés-natal, o bebé desenvolve as propriedades psicofisicas necessarrias para engajarse na primeira atividadeguia do seu desenvolvimento: idade de comunicacgdo emocional diveta. Em destaque esto as transformagoes Jem nos processos sensorinis, motores e de percepsto. Esse processo de ormagio revela o alcance das ages do adulto tanto no ingresso do bebé ‘ira, lade dominante como na organizacaio das condighes nas estar ativo. A vivéncia da referida atividade esta diretamente vinculada lidade das relagdes interpessoais oportunizadas e promotoras. do desenvol- to global do bebé. Para que se compreenda a atividadeguia em pauita, comegaremos por eX: 1r 0 conceito de comunicacio, tal qual definido por Lisina (1987). Para a 0 objeto da atividade de comunicagio é sempre e, necessariamente, outro {duo na qualidade também de sujeito da atividade. Nessa directo, para que lade comunicativa aconteca sio necessirios pelo menos dois individuos, tim deles se revezando nos papeis de sujeito e objeto da comunicagio. antes de tudo, por cen qualidade de s tragos esteururais da Desdobrase da definigio referida que, para que a comunicacio ocorra, € necessério que cada um dos individuos envolvidos perceba-se distinto do outro, para assim poder desempenhar os papéis que Ihe cabem. Nas palavras de Lisina ‘Uma vez explicitado 0 conceito de comunicagio que sustenta a proposicio histérico-cultural da atividade-guia do beba, urge destacar a qualidade dos processos psiquicos em desenvolvimento nele ~ parti de sensacio, motricidade e percep¢io , objetivando explicitar a dinamica por 100 LUGIAW. MARTINS, ANGELO A. ABRANTES & MARILDA G. D. FACCI (ORG) ‘meio da qual o bebe ingressa na atividade de comunicagio emocional diteta e, gualmente, suas principais caracteristicas. E notivel que, ao nascer, o behé nao possui as propriedades necessérias & sua participagio na atividade comunicativa. Na percepgio do recém-nascido, as coisas do mundo nko possuem forma definida, a percepeo de objetos e sujeitos com caracteristicas distintas entre si € uma propriedade a ser culturalmente formad: “Cremos que no primeino més de vida no existe para o bebé nada de nada, todos os estimulos e seu entorno sio para ele um estado unicamente subjetivo” (Vyoorskt, 1996, p. 282). Conforme indicamos, a0 nascer, bebé nao se diferencia do meio, perceben- do asi, aos demais eaos objetos que o citcundam como uma totalidade indistinta, Igualmente, os processos sensoriais ¢ motores encontramse fusionados. Para 0 recémvnascido, perceber éagir, de modo que o agir realizase por meio de um ato continuo, tinico e integral com a percepsio, Em meio ao amalgama formado pelos processos sensoriais e motores, a per- cepcio do recémrnascido esta imediatamente vinculada aos seus estados emocio- nais, nos quais a sensagao desempenha papel central, Na estrutura geral formada pelos processos de sensacio, motricidade e percepgio, o afeto desponta como elemento fundamental as reagbes do bebé, © que determina aclarar o significado do afeto nesse contexto formativo. O afeto diz respeito as afeccdes produzidas pelas coisas do mundo sobre o bebé, coisas essas que, nesse ‘periodo, produzirio sensagdes agradaveis ¢/ou desagradiveis, de “bemestat” e/ou “mal-estar”. Sua percepgio, emocionalmente matizada, produzse sobre a base dessas sensagbes que, contudo, carecem de significados simbslicos. Em consequéncia da qualidade de sua percepsio, o bebe, a principio, percebe ese afeta, fundamentalmente, com o aspecto expressivo do adulto que com ele se relaciona. Dai a importancia do cuidado com as expressdes afetivas dirigidas esse contexto, promovese a modelacio de suas primeiras reagces ‘PERIODIZAGAO HISTORICO-CULTURAL DO DESENVOLVIMENTO PSIQUICO 101 importante notar que o afeto estar presente em todos os perfodos do -avolvimento, transformandose medida que o conjunto dos processos pst- icos se altera\Das atragbes e necessidades mais primitivas e imediatas sentidas bebe (relacionadas & alimentacao, sono, posigao do corpo), ao desenvolver- cle passa a sentir novas atragdes ¢ necessidades, diretamente vinculadas & transformagio do conjunto de processos psiquicos do substrato afetivo que sustentam suas reagoes surpreendid a do bebe idem, p. 299] Una ver destacadas as particularidades dos processos psiquicos em desen- volvimento no periodo em anilise, é fundamental notarmos que, além de no possuir as propriedades necessirias para a participagio ativa na agio comunica- tiva, o bebé tampouco sente a necessidade de se comunicar: a produgio dessa necessidade realizase por meio de dois elementos fundamentais, ambos de natureza social (Liswna, 1987) O primeiro referese & contradiio essencial que se expressa na total e con creta dependéncia do bebé em relagio ao adulto: todas as mudangas de postura, Jlocamento no espaco, sua alimentacio, seus periodos de sono e de higiene, tudo que diz respeito a sua vida acontece em condigies organi o adulto, ¢ em condigdes nas quais o hebé nao possui o princi io com o adulto: a linguagem humana. Nas palavras de © promovidas pal meio de Vigotski (roots, 1996, p, 284), 0 bebe “é muito mais objeto que s As primeiras expressdes do recém-nascido - caretas, gritos, movimentos massivos que abarcam todo 0 seu corpo ~ indicam satisfagio ou desconforto: fome, sono, dor etc., sendo, antes de mais nada, reagdes it rivas que no se dirigem a algo ou alguém, mas que expressam os estados de caréncia do bebe. Em consequéncia as reagdes primérias do bebé, o adulto que o cuida aprende rapidamente a identificaras necessidades que tais reagdes expressam, atendendo- vas, Ao atender as reagdes primarias do recém-nascido como se essas fossem reacbes sociais, ou seja, reagdes dirigidas a alguém, o adulto o inclui na atividade ‘comunicativa antecipandose a ela e promovendo-a. A atividade antecipadora do adulto ¢ fundamental para que o bebé ingresse na atividade comunicativa: sio as ages do adulto em resposta as manifestagSes do recémmnascido que modelam sua expresso, introduzindoo numa atividade conjunta, compartilhada por ambos. iegio, a atividade antecipadora do adulto é considerada 0 segundo elemento gerador da necessidade de comunicagio no bebé. © adulto “comega a comunicarse com o bebé quando este niio é capaz de realizar uma atividade comunicativa e, precisamente gragas a isto, ele vai tomando parte em dita atividade” (idem, p. 281). Todo 0 contato do bebé com as coisas do mundo acontece, nesse periodo, sob a ditegio do adulto: 0 aparecimento e a retirada dos objetos no espago, a locomogio do bebé no ambiente, as mudangas de postura, sua alimentagio, as ‘condigdes nas quais se acomoda nos periodos de atividade etc. Em outras palavtas, a vida do bebe realiza-se por meio das condigdes organizadas pelo adulto, que se interpoe entre ele ¢ 0s objetos sociais, cumprindo com a fungio de contetido central de sua atividade. Na qualidade de contetido central da atividade de comunicagio emocional direta, 0 adulto introduz 0 bebé numa agio comum, compartilhada, promo- vendo as condigdes para que ele, pouco a pouco, perceba a ele e a si mesmo como sujeitos distintos. No processo de formagio da atividade de comunicagao pring ‘oncentragio no adulto, 0 sorriso, as exclamagies e uma excitagio lem, p. 287). iplexo de animagio ocorre por volta do final do segundo més de im de ser considerado um marco significativo no desenvolvimento icagao no bebé, expressa mudangas fundamentais nos processos motores e de percepeio, sinalizando transformagoes também em seu nto afetivo. E vilido notar que o complexo de animagio é produto adulto com o bebe e, ao que pesem as reagoes que determinados os atrativos possam provocar, é por meio da relacio com 0 out que ‘se complexo mimico-somtico manifesta-se mais pronta e intensamente (LIINA, 987; Euxowy, 2009). se pode notar, a atividade do bebe esta estritamente condicionada & jo adulto com ele, havendo entre ambos uma comuenidade psicoldgica que va concreta e materialmente em razio dessa dependéncia. Nas palavras otski (V¥ooTSKI, 1996, p. 285): "Essa dependéncia confere um carter amente peculiar para a relacio da crianga com a realidade (e consigo ); sio relagées que se realizam por intermédio de outros e se refratam através do prisma das relagSes com outra pessoa”. Nesse periodo, o bebe percebe tio somente aquilo que esteja presente em de visio, de maneira imediata e concreta, eainda difusa. A percep¢io wciada de objetos e individuos presentes numa situagio é uma conquista magio cultural do bebe. Tendo o adulto como conteiido central de sua le e atuando em comunidade psicolégica com ele, 0 bebé se ditigira 20 na presenga do adulto como se esse fizesse parte de si para, a0 longo de .erwolvimento, diferenciarse e atuar diretamente com 0s objetos. Por ess presenca do adulto no campo de visio do bebé é fundamental para que ido pelos objetos expastos e com eles opere. A principio, os movimentos do bebé sio pouco coordenaveis € casi wia, 08 processos sensorinis ¢ de percepeao sio passiveis le serem dirigidos da orientagdo da atencio do bebé pelo adulto. O adulto, a0 deslocarse mentar objetos em diversas diregdes no campo de visio do bebe, promove senvolvimento dos sistemas sensoriais que se colocam como premissa para so das agdes com objetos. Acconcentragto no obj to em diferentes di _movimentos na direeio do obj _movimentos aparegam, yuedo, para que se pro [Exxonty, 2009, p. 208} ‘Obebé tende a ser direta ¢ emocionalmente afetado pelas agdes que o adulto dirige a ele, de modo que o carater ea diversidade das agdes realizadas pelo adulto tendem a lhe provocar diferentes reagdes, Imerso na atividade conjunta, no bebé tais reagGes promovem gradualmente uma complexificagdo no desenvolvimento da coordenagio viso-motora (olho-mao), importante elemento na formagio do ato de preensio e de sujeicio de objetos, dde uma crianga ‘no comple ‘ios da erianga ete {As ages conjuntas ampliam o rol de possibilidades de operagdes do beb& colocando-o em relacio com mediagSes jé internalizadas pelo adulto. A exem- plo das ages descritas anteriormente, em brincadeira compartilhada, o adulto promove de forma liidica o desenvolvimento da propriedade de se deslocar no espaco ¢ dirigit seus proprios movimentos, complexificando os processos sen soriais, de percepgio € motores do bebé, necessirios 4 formacio paulatina da percepcio tridimensional dos objetos. A importancia das agdes compartilhadas ce mediadas pela apresentacio de objetos na requalificagao da percepgio resulta do fato de que, “durante esse processo, se constituem as ligagdes entre a imagem jeto e suas verdadeiras dimenstes, forma, distancia. Desse modo belecem as bases da percepgao tridimensional dos abjetos” (idem, p. 209). staquese que, ao longo do processo de desenvolvimento na primeira rividade comunicativa permanecera entremesclada com as demais da crianga, A diferenga & que a atividade de comunicagio emocional case na base do desenvolvimento do bebe, orientandose a formar Jades de agao com a produgio do novo no comportamento infan- ‘A medida que o nove se produs, pouco a pouco, o bebe avanea em dinegho sagio da atividade de comunicagio emocional direta, na qualidade de corporandoa e avangando em seu desenvolvimento. de avangos promovidos no interior da atividade de comunicagio onal direta, Vigotski (Vycorskl, 1996, p. 287) aponta para uma mudanga de operagdes e comportamentos do bebé por volta do quinto ou sexto inés de vida e, entre elas, destaca: rimeiros movimentos preci uma preensio mais firme, los por alum movimento imeiros rompantes de ale A manifestagao do novo no comportamento infantil, tal qual explicitado no excerto, indica asuperagao do estado de passividade no qual o bebe se encontrava petiodo anterior (pésnatal), com a transposicao objetiva do interesse passivo 110 intetesse ativo pelos objetos e sujeitos que compsem seu entorno social. A partir desse ponto, ressaltamos 0 cariter processual ¢ revolucionario dessas idangas esinalizamos o significado de tais conquistas para a formacio paulatina acdes com objetos a se realizarem no interior da atividade de comunicacio wocional direta. ‘Uma vez formado o ato de preensio no bebé, em meio ao contexto de renovado interesse pelo entorno, seus movimentos ¢ agoes adquirem novas qua lidades. A partir de entio, evidenciase 0 surgimento de variados movimentos reiterativos ¢, simultaneamente, cadeias de movimentos em série com objetos. Dos movimentos em série podem participar toclos aqueles que a crianca aprende separadamente. Tais movimentos desenvolvemse inicialmente por meio de pak madas no objeto ¢; 8 MEdida em que o bebé os realiza, tornam-se mais diversos: de mi objet©, Pao de uma mao a outta, faz movimentos para que ele coscile repetidas vezes, S e3t§ pendurado acima dele, golpeia-o com outro objeto see OO) téPendurado acima dele, glpse i A execucio de movimentos rirerativos e concatenados com objetos realiza: -se mediante a contemPlacao aeiva, revelando 0 vinculo fundamental entre 0 desenvolvimento dos Processoy serworiai, em especial a visio, e os processos ‘motores, Nas palovtas de Elkonin (idem, p. 211), “0 exame do objeto é por na tureza também um MOVimenta reiterativo dos olhos andlogo A sua apalpagio. Assim, tanto os movimento. rigerativos quanto os encadeados transcortem, de uum modo geral, no Moments de gxarainar o objeto” Em consequéncia do cariger exploratério das ages inicais com objetos, exidenciase o significado dq gscotha adequada e da maneira como os adultos iro disponibiliztlos 2 bebe om sua atividade conjunta. O bebé tende a pre- ferir objetos que aprescntem caracteristicas novas € diversificadas, ¢ essa prefe- bre pode ser obserda por volta do quinto més de vida, segundo Elkonin idem). A cxecusio de o¥tF0s moyimentos, como apertar, estender, encaixar ou de- sencaixar objet0s, POT Volta dos 7-8 meses de vida, é compreendida por Vigotski (Vrcorsky, 1996) com0 © surgimentoinicil da capacidade de transforma obj sinalizando o desenvolvimengy previo ao uso de ferramentas ¢ sua vinculagdo com a formacio do Pensaments instrumental, ou motor vivido. Evidenciase que, Por meio da atividade de comunicagaio imets0 na atividade eonjunta e organizada pelo adulto, o bebe tende fiat 0 comitines de processos psiquicos que ampara a roalidade de sua formagio. CoM a mediscéo dos abjetos sociais dos quais os adultos sio portadores, nesse contexts formativo se produ, paulatinamente, a ativdade de manipulagao de objetos, seounda atividade-guia do desenvolvimento infantil a ser abordada no Proxim capitulo, CONSIDERAGOES FINAIS o de apresentar as caracteristicas do desenvolvimento humano jo de vida, discorremos, neste capitulo, acerca das marcos referencia, -tina, do periodo pés natal ¢ da atividade de comunicagio emocion gf 1 com o adulto, primeira atividadeguia do desenvolvimento infantil. op teoria apresentada, desvelase o papel fundante que a cultura exerce 4 10 dos processos psiquicos, negandose, dessa forma, o desenvolvimey eg, 9 como algo natural ¢ biologicamente determinado. As condigées concretas de vida e educagio constituem mediagdes socials j,.., ente determinantes do desenwolvimento individual desde a sua concepgs,, tras palavras, ha que se considerar o desenvolvimento infantil como jm, -es0 culturalmente mediaclo ¢ dependente das condigdes concretas nas Qiais re. A historia de vida de cada sujeito singular ocorre em condigdes Soxigi, iculares, que refletem 0 “lugar” ocupado por ele na sociedade. O acess0 agg 10s e bens culturais ea forma como esse acesso se realiza € um tragodistinyiy, formagao social de cada crianca, determinando o reconhecimento de que or” de seu desenvolvimento encontrase fora dela, sendorhe disponibilizg,, rio! A pereepsio do bebé, um dos processos psiquicos em destaque nesse pero, ilexificase medida que ele opera por meio dos lagos aetivos com o au), que engendra a formagio da primeira atividadeguia. Imerso na atividyje ‘omunicagio emocional dieeta com o adulto, 0 outro proporciona ao beh 4 reunidade de vivenciar eexperienciar suas primeiras relages Com © Ming 1mano, firmando-se como mediacio fundamental para o avango no deseyy,) 1ento do canjunto dos processos psiquicos. E nesse sentido que a psicologia hist6rico-cultural afirma o desenvolvimenes, mano como um processo em espiral, no qual cada periodo € gestado 0 ayeo. . Destarte, é por meio da atividade de comunicacio emocional direta ey to que as condligdes para as ages inicias com objetos vio descortinand. abrindo outras e novas formas de relacio do bebé com o entorno fisco € sia} ce decorrente complexificagio de seu psiquismo. REFERENCIAS: Ceroowy, S. Educigdo ¢ deenvolsimento de zero a trés anos de idade: contribu gq pslcologia hstéricocultural para a organizagio do ensino. Dissertasto (Mestad gy Edlueagio Escolar) - CAPITULO 5 “Jalio de Mesquita Idade de Ciencias e Letras da Universidade Estadual Pauli Araraquara, 2014. 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Consideragdes morfofuncionais 'ALGUMAS REFLEXOES INICIAIS resente texto tem por objetivo apresentar os entrelagamentos entre 0 desenwolvimento do psiquismo da erianga ~ 1 a 3 anos -, 0 processo de cio desse momento e a sua telagio com a educagao escolar. Nessa dire- rmavse a defesa de que as escolas de educagio infantil podem apresentarse ‘espagos de exceléncia para a educacio de criangas pequenas, o que equivale entar que a organizagio da rotina, ou seja, a organizagio do tempo e do stifiease para favorecer ou instrumentalizar intervengoes educativas de zeroatrés anos. Campinas: Editora Alinea, 2009.p. 123-131. ‘Voor, L. 8, Obras escogdas IV: psicologia infantil. Madri: Visor, 1996. 1s de promover a aprendizagem e o desenvolvimento dos escolares. Assim, s, patios, corredores, reas externas e outros espacos ocupados por adultos incas devem ser organizados e compostos com diversas cores, formas geo- as, letras, nimeros, ilustragdes advindas da arte, de autores e personagens

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