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Box Destruttore - Ivani Godoy
Box Destruttore - Ivani Godoy
1ª Edição
Alessandro
homem — ordenou.
Achei que fosse um treino de luta com os punhos tal qual via
deitado.
em meu corpo. Lutei, mas fui acertado novamente, dessa vez nas
fracote.
Fúria. Era isso que eu estava sentindo cada vez que ele me
Mas minha fascinação mudou quando tive idade para treinar; achei
fazer isso, mas também por maltratar sua esposa, a minha mãe.
Muitas vezes sentia uma raiva que não podia controlar. Mas fomos
criados para respeitar os pais, e, além disso, ele era o capo e podia
agir como quisesse. Eu tinha de obedecê-lo calado.
lutava como um louco, era forte em relação a isso. Mas havia uma
coisa que me deixava hesitante: matar. Por isso meu pai estava
furioso.
razão, já que não tinha nada que fosse proibido ali. O problema dele
longe daqui. Seja lá o que o pai programou para mim, não será
bonito. Posso estar enganado, mas acho melhor prevenir — pedi e
repulsa.
Gritei e corri para a minha mãe, mas antes que chegasse nela
senti um chute contra meu peito que me jogou longe e tirou o meu
oxigênio. Tive de respirar algumas vezes para tentar recuperar o
fôlego.
— Não toque no meu menino! — Mamãe estava deitada na
boca.
— Sou o seu capo nos treinos! Agora você decide: lutar até a
morte, ou esses homens vão fazer uma festinha com a sua mãe —
não me bata!
Gelei por dentro, então corri e entrei na frente dela, levando o
ligando que me achasse fraco. Por ela e meus irmãos eu era capaz
de tudo.
— Vá logo, tenho mais o que fazer. — Encaminhou-se para
perto da porta, talvez para impedir que eu saísse correndo (o que eu
Ignorei sua voz irritante, senão a minha caça seria ele, e não o
cara à minha frente. Um dia, eu mataria o meu pai, bastava esperar.
chorar, contudo, não consegui fazer o mesmo; sentia que algo fora
Não ligava para o meu pai, Afrim, que por sinal era um monstro
acabar com esse homem. Ela achou que viveria um conto de fadas,
mas tudo não passou de um engano, pois nossas vidas eram o
Carina até aceitou fugir após saber que ele me daria ao seu
chefe mesmo contra a vontade dela. Mamãe estava com um
Afrim, ela era uma enfermeira, mas depois que se casou virou dona
furioso querendo me levar para o seu chefe. Acho que ele temia o
cara, no entanto, isto não justificava o fato de me mandar para
minha mãe, fazendo com que ela caísse no chão. Gritei e postei-me
à sua frente, para protegê-la.
— Fique longe, seu monstro! Você não vale nada, sei tudo o
que faz nessa máfia maldita. Todos são asquerosos, quero que
queimem no inferno — sibilei encarando-o, não ficaria com medo
— Você é uma putinha, igual à sua mãe. Ela chorou para não ir
para a cama de Skender, mas no final acabou gostando de ser
fodida por ele e todos os seus homens — disse com a voz fervendo,
não por ter dado minha mãe como gado, mas por estarmos ali
desobedecendo-o.
cometidas por esses assassinos mafiosos, mas ele dar minha mãe,
esquartejá-lo.
— Está pensando que não sei o que fazem? Vocês estupram
Antes que eu pudesse dizer que nem fodendo faria isso, ele
me deu um tapa na cara tão forte que caí longe da minha mãe.
Ignorei a dor, porque o medo tomou conta de mim quando o vi
minha mãe! Hoje será o seu fim. — Ignorei as lágrimas que desciam
pelo meu rosto.
Riu, zombeteiro.
testa. Devia ter sentido algo ao tirar sua vida, mas não me comovi.
Não sei se era o choque ou por tudo acontecer muito rápido.
Concentrei-me em minha mãe, deixei para surtar depois, agora só
— Talvez eu consiga…
Ela me cortou:
— Não, Mia, a partir de hoje o seu nome será Madson.
Graziela será a sua filha. Peça a Bianco para fazer documentos que
comprovem isso. Agora você precisa ir.
Tinha tanto sangue no chão que me fez estremecer.
sentir impotente.
— Precisa ir, Mia, antes de eles chegarem aqui. Alguém deve
ter ouvido o som de tiros, então ande logo, pegue sua irmã e vá
entendia como ela ainda não havia desmaiado. Dizem que mães
têm uma resiliência sobre-humana em se tratando da proteção dos
filhos; Carina comprovava tal teoria. Então começou a tossir e mais
sangue saiu. — Precisa atender meu pedido, pois se ficar aqui eles
farão coisas… — Estremeceu não pela dor, mas pelo seu passado.
— Se ficar, não só você será entregue ao capo, mas sua irmãzinha
também. Encontre Bianco e parta.
O aperto em meu coração foi forte ao imaginar a minha
minha mãe.
— Adeus, mamãe. Eu vou cuidar de Graziela como se fosse a
minha filha e amá-la por nós duas. Irei protegê-la com a minha vida,
Alessandro
remorso ou amar.
Entretanto, uma coisa que ele nunca conseguiu tirar de mim foi
a minha lealdade aos meus irmãos. Nossa ligação era inquebrável,
acabar com tudo, com a frieza de Marco que nunca ligou para ela
de matar como ele gostaria, todavia, agora não usava mais a minha
principalmente dele.
Por elas, eu me tornei impiedoso, brutal e letal. Todos diziam
minha expressão fria, mas isso não era verdade. Eu sentia tudo,
não seria um alvo. Embora não sentisse pena dos homens que
matava, pois nenhum deles era bom.
Inclusive esses que estavam na minha frente. Os Rodins
Jade, com toda a sua força, protetora. Luna, com sua doçura e
tão esperançosa de que um dia o nosso mundo pudesse ser melhor.
deixaríamos que nada lhe acontecesse, mas ela insistiu tanto que
arranjei tudo, assim ela não fugiria e meu pai não a machucaria ao
descobrir.
felina.
Jade era como Stefano, não conseguia apenas ouvir e relevar,
tinha que responder à altura. A criação do meu irmão foi difícil, pois
ele sempre odiou receber ordens. Eu o protegi o quanto pude, mas
chegou uma hora em que ele precisou fazer o que era mandado
pelo capo. Ele se tornou uma máquina, parecia ter prazer em matar.
Luna, por outro lado, puxou mais ao Rafaelle, que aceitava
tudo calado — do nosso pai, claro; mesmo não concordando, ele
cumpria as ordens do capo. Fora nomeado há alguns anos como
com a voz dura. Então Luna nos mirou com aqueles olhinhos azuis
temerosos e confiantes. — Porra, não podemos deixar que toquem
nela, nem em Jade.
Relaxei; Sage era um dos meus. Mesmo meu pai sendo capo,
homens que não temiam nada. Meu pai era um deles, ele estava no
cara.
Luna arregalou os olhos, tremendo, e me fitou em busca de
aposto que imaginando tudo que faria a ela. Isso só aconteceria por
Ela estava indo até Luna, porém, meu pai abriu sua boca,
aborrecimento.
Jade não chorou ou gemeu com isso, mas ela nunca o fez.
deixaria que ele levasse a melhor, por isso era castigada direto. Até
tentei conversar com ela uma vez, mas a garota disse que não
saberia.
— Cansei de vocês duas, não devia ter tido filha mulher —
desdenhou.
Rafaelle e eu. Sua raiva era palpável, como uma mina em uma
superfície rasa.
— Fechei uma aliança com Chavez a respeito da encomenda
informou.
Precisou muito de mim para manter o controle, mas minha
de puro gelo.
foi difícil para ela fazer isso, Jade não era de se desculpar ou
implorar por algo, mas vi o medo em seus olhos ao virar para Luna.
Sim, tinha que ter sido por alguém. Às vezes queria enfiar em sua
— Sorriu, desumano.
cabeça. Era a hora de me tornar capo e livrar o meu povo desse ser
inescrupuloso, meu pai.
começar.
após Jade escapar com Luna para uma sala dos fundos. Truper foi
atrás delas.
o gatilho, atirando entre os olhos dos seus servos, uma coisa que eu
fazia sempre para não correr o risco de ter sobreviventes.
Papai se espantou diante da descoberta de que seu inimigo
era eu.
— Maldito! Eu lhe dei tudo, e você provoca essa rebelião! —
cuspiu.
Jude, o outro verme dos Rodins, tinha fugido ou tentado, mas
Rafaelle atirou em suas pernas, levando-o ao chão. Ele já ia atirar
da hora de se casar.
— Não é decisão sua arrumar pretendentes a elas. Todos que
arranjou, eu eliminei um por um. Mas hoje você chegou longe
com frieza.
Como se eu tivesse medo de cara feia ou de sua fúria. Um dia
para o inferno.
Ele riu.
— Você também irá para lá, não se esqueça de tudo o que já
precisava fazer para o bem do meu povo. Não dava a mínima para
como morreria ou aonde minha alma escura iria. Não ligava se
queimaria ali ou no inferno, contanto que o meu povo e os meus
Tentei controlar a porra da dor que assolou meu peito. Não pensaria
nas meninas agora, precisava focar no momento e acabar com esse
verme maldito.
engolindo suas palavras, que foram piores que tiros no meu peito.
Seus gritos eram altos na igreja, mas ninguém viria ao seu socorro,
assim como ninguém foi até elas.
contrário dos outros, eu sabia ler o meu irmão muito bem, e ele a
mim, era o único que fazia isso.
— Teve sorte de morrer rápido, embora dolorosamente — falou
Veneza.
— Estamos ao seu dispor, mestre — disse um.
Tratavam meu pai assim, mas eu não era ele e não queria ser.
irmãos.
Antes de entrar no cômodo, eu ouvi a voz de Jade. Era como
se ela estivesse com medo.
Jade veio correndo e pulou nos meus braços. Era bom senti-la
assim, saber que estava segura e que mais ninguém levantaria as
mãos para ela. Mirei seu rosto, verificando o local em que ele lhe
Jade foi até Stefano e o abraçou, acho que ela entendia o meu
irmão, porque ele ficou tenso ao notar que ela presenciou tudo o
que fez.
Madson
Estar em uma cidade nova não era uma coisa diferente para
mim, não após minha fuga da Albânia para escapar da máfia. Não
podia ficar muito tempo em um lugar só, e isto era uma coisa de que
não gostava.
Trabalhar e ser mãe solteira era difícil, ainda mais para uma
menina de dezessete anos na época. Há sete, eu vivia fugindo de
frente.
roubo qualquer, mas segui andando com o carro e não parei, pois
minha filha com ela. A garota era uma doçura de bondade, uma
retomaremos a conversa.
Eu atendia mesas na lanchonete vizinha à faculdade onde ela
Luna, notei isso antes de ela sair. A menina tinha dezenove anos, e
o cara, uns trinta, eu acho. O que fazia com uma garota tão novinha
assim?
Quando Luna falou que amava um rapaz, achei que fosse um
jovem, mas ali estava um homem com quase o dobro da idade dela.
O que não gostei foi como ele impunha uma ordem. Não ouvi a
conversa, mas os gestos que ele fazia pareciam pertencer a uma
pessoa autoritária.
Fui até ele e fiquei na sua frente. Franziu a testa ante a minha
aproximação.
— Não é velho demais para uma menina como a Luna? — fui
seu dedo para conferir sinal de aliança, mas não vi nenhum. Peguei
uma faca na mesa diante dele e fingi fitar a lâmina. Depois voltei
mim. Era uma ameaça vazia. Só me deu raiva vê-lo discutindo com
ela.
— O que está acontecendo? — sondou Luna, se aproximando.
Endireitei-me, trocando a expressão de raiva por uma
inocente.
— Nada. Eu só adverti o seu namorado no caso de ele ousar
brigar com você de novo. Avisei que faria serventia desta faca. —
Levantei-a discretamente.
meninas novas, ainda mais se for uma como você. — Sorri para ela.
— Esse é Alessandro, o meu irmão. Ele é protetor até demais.
— Fez um muxoxo de desaprovação.
mesma língua.
Fiquei grata por não ter mencionado Miguel. Luna não queria
não conhecia.
cuidado, Luna.
— Terei, não fique tão preocupado ou envelhecerá antes do
Sacudi a cabeça.
Fez careta.
— Alessandro é um cara bom, mas se tornou bastante protetor
Franzi a testa.
faria isso!
Tinha muita coisa em mente, mas dinheiro era a última delas.
pessoa real que gosta de mim pelo que sou, uma garota normal de
dezenove anos, e não a filha de pais ricos com irmãos mais ricos
ainda.
Pisquei.
horrorizada.
— Algumas sim, mas vamos deixar isso pra lá, o que posso
demais.
— Então doe. Não irei sem ajudar com algo, não vou me
aproveitar de você como muitos fizeram. — Olhei ao redor. —
Preciso atender as mesas. Que horas posso me mudar? Quero
entregar o lugar até amanhã para não pagar outro mês de aluguel.
juntas.
Sabia que devia ficar longe, mas negar algo a essa menina era
que tudo corresse bem e que ninguém tivesse me seguido até ali.
pois ele me fazia lembrar dela. Entretanto, achei que podia recorrer
a ele nessa cidade — melhor do que Mia, meu verdadeiro nome, já
frente de casa. Devia ser o homem que levaria meus pertences. Não
era muito, apenas roupas e a cama da Barbie de Graziela.
um suspiro. — Me desculpe não ter dito mais cedo, espero que não
fique brava.
Mirando aqueles olhinhos azuis parecidos com os de
— Não estou, mas seu irmão devia ter falado comigo antes de
mandar cancelar algo que eu pedi, e não ele. — Dela, pelo menos,
quem chegou?
— Não, são Rafaelle e Stefano. Alessandro estava ocupado.
pessoas que tentavam usá-la para chegar à sua família. Não sabia
nada sobre eles, apenas que eram donos de várias boates no local.
Sacudi a cabeça.
— Obrigada por vir me ajudar. — Fui passar por ele, que se
colocou na frente.
Ergui as sobrancelhas.
— Quando sairá comigo? — perguntou, usando um tom
encantador. Acredito que faria inúmeras mulheres caírem submissas
Ele fez careta, mas liberou um espaço pelo qual passei, indo
até a sala. Ouvi-o atrás de mim:
— Nunca levei um fora na vida — murmurou, acho que para
por mim. — Peguei uma caixa e levei até uma caminhonete preta.
Estávamos quase terminando quando Rafaelle se aproximou
de mim. Esperei sentir um pouco do que senti por Alessandro, mas
nada. Além de ele ser lindo, o resto não me tocou. Isso era loucura?
Por que um homem frio como Alessandro me fez vivenciar emoções
inéditas?
declaração.
— Sim… — Endireitei meu corpo e o fitei de frente. Depois o
os gatinhos. Eu tive que abrir um gatil só para não ter mil bichanos
na minha sala.
Ri mais uma vez.
Dei de ombros.
— Ele estava discutindo com ela, além do mais, era mais
velho, e eu desconhecia sua identidade até Luna dizer. — Franzi a
Neguei.
— Por que vocês levam as coisas para esse lado sempre? —
Diga que sim ou vai partir o meu coração. — Stefano soou triste e
colocou a mão no peito em um gesto dramático.
Graziela foi até ele, amável; não podia ver ninguém triste.
beijou no rosto.
Pude ver que ele engoliu em seco, emocionado.
Alessandro
ver que eles estavam com medo. Queria dizer que tudo daria certo,
mas conhecendo meu pai, não tinha certeza.
Não sabia qual sua razão para me punir, pois fazia tudo o que
o velho asqueroso queria. Ele não podia me ver agindo diferente
círculo social — começou ele vindo até mim e lançando um soco tão
Não gemi ou emiti som algum; a dor era algo que fazia parte
de mim. Contudo, nesse momento estava tenso por vê-los ali, além
de Rafaelle escorado na parede de braços cruzados; ele fez
menção de vir na minha direção assim que fui nocauteado.
muitos dentro dela, sabia quem estava a meu favor, e não ao dele.
Um dia teria todos do meu lado, e as coisas mudariam de vez.
não era humano, acho que foi por isso que me aproximei deles, para
tentar mudar essa característica.
— algo que meu pai odiava, por sinal; ele não suportava ouvir isso.
Meu pai rosnou com fúria. Eu sabia que eles morreriam, e tudo
irmãs.
conseguiria.
natureza.
dois anos. Meu “pai” também tinha culpa pelo que minha irmã Jade
passou, mas quando soube, o verme já havia morrido.
Protegi-a tanto; enfrentei muitos para que ficasse segura, e, no
final, ainda acabou sendo ferida da pior forma possível. Ele a
tocou…
— Eu… — ele queria dizer que sentia muito por ter matado
aqueles garotos, mas isso não era necessário.
tanta certeza, mas ele não precisava saber. — Embora isso não seja
— Sim — respondi.
aqui esta noite. — Ele parecia animado, mas com um tom diferente,
que eu não consegui ler.
nós, então apareceu essa mulher, tão perfeita. Mas não foi isso que
como eu, mas me mantive longe. Resistir a ela toda vez que a via
bom não pegar as amigas de Luna, pois tem muitas mulheres por aí.
Devia ter dito a Stefano que acreditava que ele não teria chances:
pelo menos todas as vezes que reparei, ela deu um fora nele.
soou na porta.
— É ela.
A porta se abriu e por ali entrou uma loira de cabelos anelados
nas costas, olhos grandes e azuis com tons de verde, como o céu
refletido no mar, e um corpo fabuloso que me fazia ter alguns
seios — barriga de fora era o uniforme dali. Sim, muito sexy. Isso
sem contar com sua boca carnuda e avermelhada, duvido que fosse
batom.
tinha várias aos seus pés. Mas, com Madson, ele não teria nenhuma
chance. Até detectei que ele não investia de verdade nela.
Significaria que sabia como eu reagia à garota? Qual era seu ponto
com isso?
Ela sacudiu a cabeça e fez o que pediu. Pude notar que estava
sabia que eu estava a fim dela e não tomara uma atitude. Esse era
divertir”, como se diz hoje em dia. Tenho mais o que fazer, inclusive
trabalhar. — Suspirou, parecendo frustrada. — Respeito que seja
irmão da Luna, mas não tem nada rolando entre a gente, então
da orelha, nervosa com nosso silêncio. Virou-se para sair, mas uma
verdade.
tornou de raiva.
— Só vim trabalhar aqui hoje, mas os homens deste lugar
acham que sou uma vadia qualquer e não aceitam um não bem-
dado na cara. — Passou a mão no rosto, cansada. — Por isso evito
trabalhar em boates.
Ela assentiu.
— Mostre quem.
acreditei que vocês fossem bandidos, Luna alega que anda com
segurança por terem uma fortuna ou coisa assim.
Ela não sabia quem éramos, este era outro motivo para me
manter longe. Luna não contou, porque não queria que as pessoas
se aproximassem dela atrás de algo, ou que se afastassem por
medo.
— Lidar? — Tinha algo ali que não entendi muito. Eu era bom
em ler as pessoas, mas com essa mulher era diferente. Às vezes,
ela deixava escapar, como o desejo que vi em seus olhos instantes
longe.
dúvida, ela era, mas não foi por isso, e sim pelo fato de ter uma filha
e trabalhar duro para educá-la. A forma como as duas agiam uma
com a outra… elas se amavam muito. Como podia me envolver com
Uma garota assim não era para homens iguais a mim; eu tinha
uma nação nas costas e responsabilidades, incluindo os Rodins,
que estavam quietos, mas não por muito tempo, pois sabia que logo
entrariam em ação, e eu tinha de estar preparado. Focaria somente
nisso no momento.
Capítulo 5
Madson
direto, um vidro que dava para uma sala, da qual, com certeza, o
um amor.
embora não fosse trabalhar ali de novo, ainda mais depois que um
cara tentou me tocar por não aceitar a palavra “não” como resposta.
elegantes.
homem que se prenderia a uma mulher, e isto o fazia não ser certo
para mim.
garçonete do lugar.
— Oh, eu desejo…
exalando de si.
agora ouço que vai fugir de Milão. — Sua expressão não mudou,
embora o tom parecesse confuso, além de algo mais que não
hora.
ele.
sorriso.
primeira que fazia isso. Tentei deixar minha expressão longe do que
realmente me preocupava.
chocada.
Dirigi meu carro até uma lanchonete que ficava aberta vinte e
quatro horas. Precisava comer, mas também checar se não estava
sendo seguida; não podia levá-los até minha filha e Luna. Isso não
ia acontecer.
lágrimas na hora; minha mãe amaria estar ali conosco. Parei nesse
ele não repararia que eu estava de olho nele. Olhei para minha
bolsa, onde tinha uma arma; esperava nunca mais ter de usá-la.
direção. O medo nos faz temer tudo, e inclusive ver coisas onde não
existe nada. Até quando conseguiria viver assim?
Meu Deus, a minha filha! Fui à sua procura, rezando para que
nada tivesse acontecido a ela e à Luna.
de lá.
vir da frente.
— Como podia dar uma notícia assim? — Diga que a casa de sua
irmã Luna está em chamas e que os guardas que a vigiavam foram
mortos.
de cima inteiro.
favor, não.
Não podia ter perdido a minha bebê! Não conseguiria lidar com
isso. Se eu não tivesse passado naquela lanchonete, estaria ali
sequestradas?
Minha filha! Meu bebê não morreu? Mas então ela foi levada?
Pisquei.
Respirou fundo.
minha volta.
já vou.
Eu não reclamaria que estava com pressa, acho que ele
precisava falar com os bombeiros. O estranho foi que não vi a
polícia no local. Ainda não haviam chegado?
frente.
Cortei-o:
Ele ficou tanto tempo sem responder que eu achei que não
obteria uma explicação.
explodir.
bom.
Não podia concordar. Não tinha como não ser por minha
causa, pois atacaram o lugar onde eu estava morando, colocando
em risco não só a vida dela, mas da minha filha também.
apenas coincidência, ele devia estar atrás de mim. Não entendia por
que não me levou logo, talvez quisesse que eu soubesse do
incêndio, no qual as coisas poderiam muito bem ter saído piores.
Seria a felicidade do maldito Skender.
Madson
suspirei aliviada.
Em seu sono, ela parecia serena, tão bela como uma flor do
incêndio.
Seus olhos vagaram pelo meu corpo, e vi calor refletido neles,
Segui seu olhar e notei que eu usava uma camisola fina, que
poderia fornecer às pessoas uma boa ideia das minhas curvas.
como o pecado.
Tremi ante seu tom. Foco, Mia! Você não pode se deixar cair
por esse homem lindo e tentador, entoei a mim mesma como um
— Olha, eu lamento que isso tenha atingido sua irmã, mas não
é da sua conta — tentei falar de modo educado, afinal, era grata por
seu auxílio.
— Hoje irei embora da Itália para algum outro país. Não terá
mais com o que se preocupar. — Respirei fundo. — Sua irmã vai
ficar bem e livre de qualquer perigo.
— Isso não mudaria nada, porque seja quem for que está atrás
de você, pensará que continua aqui e poderá atacar de novo. —
Agora me avaliava.
Ri com amargura.
de outra forma.
perto da minha. Senti seu hálito quente banhar meu rosto. Minhas
beije.
O canto da sua boca se levantou. Seria um sorriso? Lembrava-
está você me implorando para não a beijar. Por quê? Posso ver que
deseja o mesmo, a fome está em seus olhos. — Sua voz me fazia
embora dali logo ou seria capaz de fazer uma besteira. Um dia meu
príncipe encantado chegaria e nos casaríamos, apenas assim seria
dele.
copo que tinha ali e enchi de água. Joguei em seu rosto, ao que deu
um passo para trás, chocado.
Deveria ser um crime ter pessoas como ele andando por aí.
obrigaria a fazer…
Seja o que for que sinto, vai passar quando for embora hoje.
pensei ter imaginado tudo, mas não. Rindo, era tão lindo que me
— Não irá embora até que me diga quem está atrás de vocês
Havia muitas mães solteiras por aí, e isto não significava que
fossem vadias só por não casarem. Eu não devia pensar o mesmo.
sonhar que um dia teria o futuro que tanto almejei: ser uma
verdadeira esposa, gerar filhos. Algo me dizia que esse homem ali
na minha frente não era assim, ele parecia ser daqueles que só
buscavam prazer e, no momento seguinte, esquecia as mulheres.
Pode ter grana, mas isso não é suficiente para lutar com escória
— Posso ajudá-la…
olhos.
minha filha. Monstros não fazem isso, pelo contrário, eles devastam
tudo e todos. — Estremeci, pensando no que ouvi dos albaneses.
Ele puxou meu braço são. Bati em seu peito duro, enquanto
porque implorou por isso. — A sua boca foi para a minha orelha, me
arrepiando. — E Madson, quando esse dia chegar, eu terei mais do
porta.
mim.
rosnei.
— Por favor… — Corri até ele, pegando seu braço antes que
saísse, mas fui rodopiada e escorada na parede com seu corpo
agora ele também, pela segunda vez? Esse homem escavaria fundo
para procurar saber o que eu não dizia.
— Alessandro…
Evitei olhar para onde não devia, isso era errado, muito
cama.
— Você faz balé? — Tinha algo na voz dele que não entendi.
Franzi a testa.
lembrar dela.
sabia o perigo que sua família corria com minha presença ali.
— Grazi, meu amor, sei que deseja ficar nesta cidade, mas as
coisas se complicaram. Não quero preocupar a sua cabecinha linda,
em um lugar só?
— Vou fazer de tudo para que acabe logo, meu anjo. Agora,
por que não vai tomar um banho enquanto vejo se consigo algumas
roupas? — Esperava mesmo poder cumprir essa promessa.
Madson
chegou e me pediu para ficar com aquele seu jeito todo meigo. A
menina se culpava, e isto acabava comigo. Esperava que tudo se
resolvesse logo.
dinheiro.
encontrava. — O que faz aqui? Garanto que não veio pela comida.
— Fale para seu chefe que não preciso dos homens dele
mais impressionado.
— Chefe…
fez estremecer.
arrepiaram.
Pisquei.
Cerrei os dentes.
aceitar sua ajuda, mas isso incluía muitos perigos para ele e sua
família.
e eu iria esganá-lo.
sua conta.
porque ela estava com uma mão à sua volta e, a outra, em seu
peito. Já Alessandro tinha a dele em sua testa… O momento
Sacudi a cabeça.
transparecer a irritação.
Não havia apenas os dois ali, como também mais homens que
— Roubei?
lápis, ele pegou minhas mãos e trouxe os meus olhos para perto
dos seus.
ponto de me machucar.
Fulminei-o.
seu capacho, não preciso da sua segurança. Por que não me deixa
pouco. Poderia muito bem contar a verdade, pois somente assim ele
me deixaria ir. Afinal, por mais que ele tivesse seguranças, ninguém
curioso.
me deixando tonta.
contração.
Forcei um sorriso.
— Não se preocupe, pois não há só lápis aqui no caso de eu
desejar fazer de você uma peneira. — Passei por ele e pela garota
ainda.
Franzi a testa, notando que ele escondia algo. Seja como for,
Não seria louca para sair com um homem que aposto que não leva
as mulheres a sério. — Era verdade. Eu duvidava estar enganada
— Não deve ser tão esperta, afinal, teve uma filha com
dezessete anos — apontou o barbudo cheio de tatuagens, o mesmo
a ele.
Luna foi por sua culpa? E por que anda armada e com documentos
falsos? Fora aquele valor exorbitante. Se tem tanto dinheiro, por que
trabalha em uma lanchonete? — emendou uma pergunta após a
outra, intenso.
— Certo, eu vou revelar, mas saiba que agradeço pelo que fez
por mim e pela minha filha. Assim que eu sair, não precisará de
— Claro que não, garoto, isso faria você sair correndo para as
montanhas — expirei.
surpreenda, Estrela-do-mar.
Sacudi a cabeça.
Alessandro.
Arregalei os olhos.
— Como você…
bochecha.
— Mas mamãe…
volte, ok? Não quero que vá, você é a primeira amiga que tenho em
muito tempo — pediu Luna.
Fiquei curiosa.
Alessandro
dela? Por que senti essa coisa estranha em meu peito quando
escutei sua raiva direcionada à máfia?
lugar, mas não foram eles, e sim os Rodins que, por sua vez, sabem
dela e da criança.
Ele tinha razão, mas dei minha palavra e não costumava voltar
atrás. Pela primeira vez não liguei para o que eu dissera; não podia
deixá-la ir.
— O que eles fizeram contra ela para que odeie todos nós? —
meu amigo.
Quando estávamos entre nós, família, não recorríamos a
formalidades.
a tocou, mas poderia ter optado por não revelar seus segredos na
frente dos outros, ou na minha. A partir do momento em que eu a
também.
Stefano bufou.
Então pensei que pudéssemos dizer uma verdade. Depois que ela
notei. Ele jamais faria uma investida sem me alertar antes; Miguel
queria que o que meu pai fez com Jairo e Amisteg se repetisse,
mesmo tendo sido Rafaelle a puxar o gatilho no intuito de me
Meu pai ficou longe, sabendo do seu poder, e isto foi bom.
perigos, mas, para isso, elas precisam ficar aqui. — Olhou de mim
para o Miguel.
Madson.
Graziela, a filha dela. Vou apresentar vocês, pois faz alguns dias
que ela deseja conhecê-lo. Assim talvez aceite sua ajuda. — Ela
parecia esperançosa.
Uma vez Jade me disse que Luna tinha uma queda por Sage,
um dos seguranças dela. Como ele tinha levado um tiro alguns dias
que não podia dar permissão para namorarem se minha irmã não
desejasse. Luna não aceitou o pedido dele. Ali, vendo a forma como
pegava a mão de Miguel para suplicar por sua ajuda, notei onde
fique…
megera. Além disso, ela parece ter uma queda pelo meu irmão. —
— Não sei o que ela viu nele que não tenha visto em mim, sou
procurar.
Sorriu para mim. — Mas falando sério, ela é difícil de ler, a única
coisa que peguei foi o desejo mútuo.
Ele sorriu.
para ela.
Graziela olhou para sua mãe que, por sua vez, estava com a
testa franzida em minha direção.
eu ter detectado raiva. Não fui o único a notar isso ali na sala.
— Luna?
— Por que devo acreditar que ele é poderoso para lutar contra
uma máfia? — Então arregalou os olhos, dando passos até chegar
próximo a mim. Não sabia se ela tinha notado o gesto. Sua atenção
estava em Miguel. — Por acaso você é um mafioso?
Luna suspirou.
importância dela para mim. — Seu tom era tão decidido que, por um
breve segundo, até eu acreditei.
instintos para não a trazer de volta. Teria feito isso se soubesse que
minha irmã não sentia o mesmo por ele. Mas se fosse para escolher
um homem, que ao menos ele tivesse coragem o suficiente para
pele.
seguro continuar aqui. Sei que não quer que nada aconteça a ela, e
ser vigiada é ruim, mas é necessário, pelo menos até pegarmos os
homens — disse Miguel.
Miguel sorriu.
agradecimento pelos dois terem salvado a sua filha. Por isso ignorei
a minha aversão, embora não houvesse sido fácil vê-la abraçada
Alessandro
Era tudo uma farsa. Ela achava que estava segura comigo,
essa sensação estranha? Não por fazer o que fazia, pois disso não
do Gael, quando mais nova; não conseguir salvar a minha mãe das
garras do meu pai; não salvar aquelas garotas; não demorar na
tortura do meu pai como gostaria.
confuso por não apreciar mentir para ela. A mulher pensava que
contasse.
sabia o que lhe foi contado. Mas a máfia era diferente, pois ela
Não podia dizer a ela que não sentia tristeza porque não havia
nada em mim.
mãe sempre diz que, quando a beijo, eu a deixo feliz. Posso fazer
Como manteria tudo trancado? Não havia nada ali dentro que fosse
bom para resgatar ou tentar me redimir. Mesmo se eu quisesse ou
carta. Nossa mãe escreveu cinco delas, uma para cada um de nós,
seus filhos, antes de morrer, e guardou em seu porta-joias. Jade as
pensamentos?
Eu me levantei. Talvez encontrasse o Rafaelle ali, mas
duvidava. Ele estava no mercado checando os negócios, junto a
Stefano. Então só me restava o saco de pancada.
ou melhor, lutar.
na minha sala, o beijo em minha irmã, mas não queria estragar tudo
entre eles. Apenas o alertei que se a machucasse, eu iria castrá-lo,
sendo amigo ou não.
coisa.
— Ele? Nada, mas você? Tudo — rosnei, socando com tanta
força que quase saiu do encaixe.
Sacudi a cabeça.
— Graziela mencionou que ela lhe deu uma flor, pois você
perto de labaredas.
fodê-la até não andar mais em linha reta — rosnei, virando para ela.
— Não sou uma puta — sibilou, magoada.
— Não disse que era. Estar louco para possuir o seu corpo
corpinho divino.
— Não posso…
acontecer. Aposto que está molhada para mim. — Forcei meu tom
virou e ia correr, mas a alcancei. Segurei-a por trás, com uma mão
Meu pau ficou tão duro que achei que estouraria meu short de
ginástica. Mas esse momento não era sobre mim, e sim por ela;
Levei meus dedos por baixo do vestido e toquei seu centro por
circulava seu ponto pulsante. Achei que ela tiraria dali, mas só se
— Oh!
língua em sua veia e trouxe sua boca para a minha. Meu desejo era
grito.
Não entendia sua aversão ao beijo. Ela queria o mesmo, então
meu peito apertou, uma emoção que nunca senti antes. Queria
penetrá-la sim, possuir cada parte dela, mas também queria
sempre… Como poderia almejar mais que uma transa? Não era um
correndo.
oferecer o que ela ansiava, não era esse tipo de homem — poderia
até ser, mas não havia nada em mim que ela apreciaria se soubesse
a verdade.
fraco.
Outro soluço.
instintos para não ir matar quem a fez ficar assim. Foi arrebatador
vê-la quebrada… O pior era saber que não foi nenhum estranho que
como um soco.
Pisquei.
— Mia? — sondei, desligando a água, sem tirar minha atenção
dela.
encolhida.
— Sim, eu sei disso, mas faz semanas que está aqui. Por que
não me contou? — Franzi a testa, não gostando da sensação de ter
emoção. Claro que eu não tinha muita emoção também, mas não
era um tirano igual a ele. Eu dispunha de princípios e os associava
ao meu poder. Mulheres e crianças estavam fora de cogitação.
essa promessa feita a mim mesma desde que era uma garota.
Sacudiu a cabeça.
ela.
mar de rosas que achava que iria viver lá não aconteceu. Meu pai
mostrou o verdadeiro monstro que era, pois a colocou para deitar-se
com o chefe dele. Conforme ia crescendo e me encorpando, eu
naquela noite, mas houve uma briga, ele atirou nela… o sangue…
Sua dor cortou algo em meu coração que achei estar morto.
Quis estraçalhar o seu maldito pai e fazê-lo sangrar.
até tentei ficar longe de Luna, mas a garota é doce demais para
isso. — Afastou-se, e um sorriso se formou em seus lábios. Tocou
meu rosto. — Então conheci você e, de repente, não quis mais
partir.
eu sentia.
há nada em mim que seja bom para oferecer a você. Muito menos o
que deseja.
tarde; uma casa com cerca branca e flores. Eu não represento isso.
— Queria esconder a verdade para protegê-la, mas às vezes
algumas coisas era preciso dizer. — Tudo o que há em mim é
escuro demais.
emoções confusas.
Alguns anos atrás, logo que matei o meu pai, eu tive que lidar
com vários traidores que não me aceitaram no poder, então se
aliaram aos Rodins. Pensei que tivesse pegado todos eles.
Alessandro
Rafaelle propôs.
Mia.
pessoa que ele deve matar. Preciso que El Diablo não faça nada até
eu chegar — falei.
Estreitei os olhos.
— Acho que vou cuidar desse padre falso para Miguel. Preciso
de uma ação. — Olhei para um casal andando de mãos dadas no
lugar, não em mim ou em Mia. Por culpa dela, estava nessa porra
de confusão. Tudo ia bem antes de conhecê-la naquela lanchonete
e dela me ameaçar com uma faca. Gostei de sua fibra e garra; era
raro me deparar com pessoas que não tinham medo de mim.
Embora ela não soubesse quem eu era, eu acreditava que, mesmo
sentimentos inúteis.
Mas tudo queria sair ou, de repente, até saíra, já que eu estava
a porra de uma bagunça. Canalizei unicamente a raiva para fazer
— Não quero que ele os mate; todos são meus — rosnei, indo
na direção da igreja.
— Não sei, mas eu não entraria na sua frente. Meu irmão está
costas. Ele era alto, de cabelos loiros até o queixo barbudo, presos
em um rabo de cavalo. E olhos escuros como a noite, mortos. Ficou
dessa forma depois que toda a sua família foi massacrada pelo
Cartel del Cali. Vingou-se deles, claro, então trabalhou algum tempo
para a máfia espanhola, mas há quase sete anos abrira sua própria
agência de assassinos de aluguel. Tornou-se famoso no submundo.
Uma pena que a vingança não mudava o que perdeu.
Do mesmo modo, Marco foi morto, mas as coisas que ele tirou
Diablo: morto.
— ordenei ao Rafaelle.
Dei de ombros.
me fazendo sorrir.
abaixo desses bancos, uma mera faísca e tudo irá pelos ares. —
Sorriu El Diablo.
El Diablo e meu irmão. — Eles não vão lutar contra os traidores dos
meus homens. Eu vou. — Gesticulei para os outros. — Somos três
Dei mais alguns passos na igreja vendo cada homem ali, louco
caras ali. — Vocês são ratos imundos, e eu vou matar cada um.
Um deles inflou o peito.
— Você não serve para ser líder, seu pai sempre disse isso e,
— Você matou o Gael por ter tocado em sua irmã, quando foi
respondeu.
— Sim. Agora você leva uma puta com uma filha para a sua
fúria. Ninguém falava mal de minha irmã e Mia; ela não era uma
vadia, a garota nem chegou a ser beijada, muito menos a fazer
sexo.
Olhei para baixo: havia um homem ali, mas sua cabeça estava
forma.
sonhava.
— Alessandro…
rumo.
ir para casa cheio de sangue, já que isso a afastaria. Mas então por
que estava hesitando em revelar a verdade? Sim, eu não queria que
controlado aquela fúria que sentia mais cedo. Logo teria de dar
Jamais estaria.
Podia notar que Luna hesitava, pois não negaria nada a ela.
— Deixe que a levo — anunciei antes de trazer as palavras de
volta.
certeza?
Não tinha, mas queria ir, não podia deixar a criança sem
— Cuide-se, boneca.
— Sim, princesa?
Arregalei os olhos.
de usar algo rosa. Isso seria muito estimulante para meus homens.
gosta de você.
— Eba! — Sorriu.
las de volta.
Nos despedimos.
— Agora vamos para casa ensaiar? — Eu a peguei em meus
Mia
Logo depois a culpa veio, não culpa, porém, jurei que nunca
ficaria com uma pessoa que não fosse o meu marido. Passei tantos
deixava em pânico.
Poderia dizer que ia esperar o Alessandro, mas ele mesmo
falou que não era homem para mim. Além disso, eu vi o abismo em
em anos só para ficar com ele? Afinal, ele falou que nunca casaria
ou teria filhos.
Na hora que foi dito que Miguel era do cartel, eu só quis fugir
dali com minha filha, mas depois de vê-lo junto com Luna e saber
que foi ele que salvou tanto Graziela como a sua namorada,
ordenou.
legais.
Franzi a testa.
— Então o que é?
lugar.
Suspirou.
pergunta.
— Claro que estou! Por favor, me diga que ele está bem. —
Peguei seu braço.
em seu tom.
pensamentos desagradáveis.
Sacudiu a cabeça.
chorando.
confiar nele igualmente, entretanto, ele disse que os dois não tinham
após ter me tocado, então contei sobre a promessa que fiz a mim
mesma de ficar apenas com meu marido um dia, e também sobre
Graziela e sua origem. Depois as últimas palavras do seu irmão
afastar.
palavras foram diretas quando afirmou não ser homem para casar
pai, e pensa que não merece alguém como você e sua irmã…
bastante para ser abençoado com você e sua filha. A forma que
olha para as duas… Eu sinto que Alessandro as quer, mas luta
muito.
pensar sobre o assunto, pois a dor que mamãe sentiu deve ter sido
muita.
sobre a apresentação.
fizeram para o Dia dos Pais. Sua filha parece animada por isso —
informou a professora de dança. — Ela é uma menina tão doce e
Graziela.
reclamou disso antes, mas não era tão controlada quanto ele.
A mulher sorriu, não notando a minha tensão.
aqui para pegar. Eles saíram há pouco tempo. — Sorriu para mim e
Rafaelle. — Você se parece com ele, moço, com toda a certeza
meu peito. Se ele não queria filhos, por que a tratava tão bem?
pessoalmente.
transparecer — sussurrei.
Sua voz era tão macia como nunca tinha ouvido antes.
Meu coração balançou por dentro com esse gesto dela, apesar
de ter notado que tinha algo no balé que trazia dor ao Alessandro.
Acho que sua mãe era bailarina ou queria ter sido.
— Sim, é o Dia dos Pais. Como não tenho um, eu escrevi para
colocando Graziela no chão. Ela correu para mim com toda a sua
alegria.
alma.
Os olhos dele foram de mim para o seu irmão, depois para a
Rafaelle riu.
assim!
Sacudi a cabeça e me virei para Alessandro, que estava ali
olhando a escada também, mas logo se voltou a mim.
deixá-lo me afastar.
Certo. Eu sabia que ele achava que não teria redenção, como
o pai dele. Mas Alessandro não era assim; esse homem era
excepcional, me protegeu e ainda o fazia.
— Alessandro…
Mia
para descer.
venha para cá e nem que saiba que estou vivendo nesta cidade.
Vou ter que ir…
Ela me cortou:
ajudar você a ficar livre e fazer o que sonha. Aliás, o que mais
deseja?
— Talvez se case com o meu irmão. Ele tem aquele jeito frio,
conversar — murmurei.
— Como sabe sobre isso? Não era para estar dormindo a essa
Ela se encolheu.
— Não chegou a fazer nada, mas o medo era tão grande que
nem consegui gritar. Então Miguel apareceu… — Respirou fundo. —
Enquanto ele lidava com o cara, eu corri e peguei a Graziela. Ela
acordou confusa, e eu só disse que a casa estava em chamas.
por Luna ter passado por isso. — Lamento pelo que houve, sempre
que não conseguir dormir pode ir para o meu quarto.
Ela concordou.
Arregalei os olhos.
— Não vou, mas não conte nada a nenhum dos meus irmãos.
— Adoro ser sua amiga, mas vou gostar mais se for a minha
— Não conte muito com isso. Para lidar com o seu irmão, é
imenso.
parecia alterado.
acumulava destroços.
— Alessandro, não é…
socou o chão tão forte que fiquei em dúvida se seus dedos não
haviam quebrado.
esforço.
Saí do meu transe e fui até ele.
seu irmão?
Voltei-me a Rafaelle.
problema?
— Alessandro, não é…
para transar, mas anda querendo ir para a cama com o meu irmão,
porra! — esbravejou, me fazendo dar um passo para trás, pela
alguém.
Logo quando pensei que poderia dar uma chance a nós. Por
ele, até considerei desistir de algo com que tanto sonhava.
ninguém.
Dei um safanão em suas mãos e saí do seu domínio. Acredito
que só consegui porque ele permitiu, não teria força para lidar com
um homem do seu porte físico.
— Por mim, que transe com todas. Estou indo embora agora e
não o verei nunca mais — bradei.
É tarde para isso, pensei. Contudo, não fiquei para saber sua
opinião; fui pegar minha filha para sair dali logo, o quanto antes
melhor. Quem ele achava que era para me ofender?
Graziela.
mortal.
Capítulo 13
Mia
decidida a focar em minha filha. Sempre fomos só nós duas, por que
— Mamãe, por que Alessandro não vem aqui? Ele disse que
responderia a isso?
Até esqueci o que eu sentia, porque sabia que ele estava com
recado em seu telefone: “Sei que você não quer saber de mim, mas
venha ver a Graziela, pois ela sente sua falta. Eu juro que se não
aparecer aqui amanhã, eu irei para os Estados Unidos com o
Miguel. Não vou permitir que minha filha se apegue mais a você se
Miguel suspirou.
Arregalei os olhos.
lá. Queria sua ajuda para entrar no cartel, mas ele me afastava
sempre que o procurava.
Pisquei.
conseguia. Mas isso não significava que não sentia muito… Como o
que fez com você.
Suspirei, triste.
— Luna disse que ele não expressa o que sente como uma
fez.
sua neutralidade.
mim.
farei o que deseja, vou preparar tudo. Como disse: se desistir dele,
então nunca foi a mulher certa. Não era para eu contar, mas agora
que planejava sumir… Ele vem toda noite depois que você dorme, e
Saí do quarto em silêncio para não acordar minha filha e fui ver
tom baixo.
Rafaelle bufou.
— Claro que é, mas agora não está agindo como tal, está
dias.
Suspirou.
mas depois seu tom saiu sombrio. — Ele disse que eu seria com
minha esposa como ele era com nossa mãe. E tudo o que me
obrigou a fazer, eu repetiria com meu filho…
A dor em sua voz quase me fez chorar. Como um pai era
Mia? Por isso está tão hesitante em aceitá-la como sua mulher? —
nosso pai nos fez. Pensa em você fazendo o mesmo com Mia ou a
nossa princesinha?
Céus! O que o pai deles fez com esses irmãos para deixá-los
nesse estado?
isso é bom, pois não mereço alguém como ela. — Virou-se para
entrar em um quarto de hóspedes. — Miguel, se as garotas
que ela fosse minha esposa para não termos segredos? Isso é
impossível! Não sou bom. Eu não tenho a porra de um coração. —
Era para ser um grito, mas saiu em um sussurro abatido. — Mia
deseja alguém que eu não sou; alguém que nunca serei ou quero
ser. Se eu mostrasse o que está dentro de mim e o que faço, ela
fugiria sem olhar para trás.
Ele tinha me dito isso antes, mas na hora achei que estivesse
querer seu irmão, saiu para foder outras mulheres, não apareceu
por dois dias para se desculpar e agora chega aqui dizendo que me
quer, mas não vai fazer nada em relação a isso? — Cerrei meus
vezes, mas ele tinha escondido melhor a reação. Suas íris verdes se
escureceram, letais.
— Oh, eu gostaria que alguém tentasse colocar as mãos em
Merda! Será que cutuquei a onça com vara curta? Meu instinto
me mandava correr, mas não o faria, não enquanto ele não me
mostrasse sua verdadeira natureza.
presa.
me fez prometer não sair correndo por mais que visse o seu pior —
como Alessandro achava que eu faria. Seria forte para aguentar o
que o homem escondia de mim?
Mia
— Fiz tudo o que ele mandou, mas hesitei em algo, algo que
não queria. Porém, ele me forçou até chegar a um ponto no qual
não tive escolha. Nesse dia, tudo foi levado de mim, não restando
Assombrada, percebi que fugi de uma máfia apenas para ser levada
à outra.
visto coisas horríveis na máfia albanesa, nós não somos iguais. Sim,
quem eu sou. Fui treinado para ser um bom chefe. No entanto, não
Pisquei.
sair correndo. Talvez pelo que ouvi dos seus irmãos minutos antes.
— …bandidos. Mas ainda são seres humanos, não é? Apenas
Forjado como uma espada e treinado como uma arma. Foi isso
que o pai dele fez? Se aquele velho estivesse vivo, eu acabaria com
o desgraçado.
— Você pode…
pesadelos por matar homens que deveriam ser mortos, faz parte de
mim. Eu aceitei meu destino. Só me considero um monstro pelo que
nada disso.
ficou furioso. Ele não sabia quem interferira em seus negócios, mas
suspeitava. Então me mandou a um contêiner para que eu fizesse
um acordo com mercadores.
O meu peito queria explodir com a dor causada por sua triste
trajetória.
por isso fiz um dos meus homens atirar aqui. — Ele se virou para
mim e abriu os botões da camisa que usava, indicando um ponto
perto do peito.
nosso mundo.
— E não foi tudo: antes disso, ele tinha mandado seus homens
as violentarem. Mesmo ferido, eu matei alguns e teria acabado com
muitos mais, entretanto, meu pai usou a minha fraqueza contra mim
do meu pai; ele não começara a treinar ainda, então não entendi na
hora o que fazia ali. Escutei Marco dizer: “Você é um fraco, foi
desobediência também”.
Fechara os olhos enquanto dizia essa última parte. Entendi o
Rafaelle. Aceitei quieto cada soco, chute e paulada. Meu irmão era
pequeno, se fosse espancado como fui teria morrido. Depois,
vez, serão suas irmãs nas mãos dos meus homens”, jurou.
todas elas.
tentei argumentar.
vivas. No fundo, eu acho que devia ter feito algo mais, não sei… —
queimasse vivo.
— Você fez tudo o que pôde para ajudá-las. Não foi sua culpa,
— Não é só isso, Mia. Não tente ver algo bom em mim, porque
— Isso não é verdade. Seus irmãos estão aqui com você, não
é? Além disso, o seu pai morreu, então o único perigo que estou
feroz.
a verdade sobre mim, eu não vou impedir. Mas peço que pense
bem, pois lá fora vocês duas correriam perigo.
Ele mudou muita coisa depois da morte do seu pai. Céus! Ele
contra mim. Veja o que as fotos em que você aparece com meu
mirei seu rosto. — Não fiquei com ninguém desde que conheci você.
cheiro de sangue. Como a roupa era escura, eu não pude ver nada.
— Você estava…
hoje. — Afastou-se. — Vou lidar com isso, Mia, não quero que se
rumo tomar.
— Pode estar certo, não acho que meu futuro marido gostaria
Sorri.
Alessandro suspirou.
— Eu não a tocarei…
deixaria louco.
Fechei a cara.
— Nem todos têm a sua experiência no departamento sexual
— rosnei.
Bufei.
Pisquei, ofegante.
Ao sonhar com meu primeiro beijo, pensei que seria bom, mas
esse com ele fora arrebatador. A fome tamanha com que nossas
devorar.
última vez.
Ele não respondeu, mas deixei quieto. Levaria tempo para que
na internet.
rosto esquentar.
— Essa cor fica linda em você. — Corei ainda mais diante de
preciso me limpar.
acreditava que fosse seu, afinal, viera tomar banho por isso, e eu
não vi nenhum corte nele.
mas certamente não era boa o bastante para esconder algo dele.
Alessandro
Depois de ver aquelas fotos da Mia com meu irmão, eu fiquei tão
Claro que me arrependi, algo novo, aliás. Mas desde que ela
gosto. Queria ter ido até ela para revelar a verdade, mas não pude,
apesar de não ter ficado longe: ia toda noite na casa de Miguel para
vê-la dormir. Tão serena, com tantos sonhos, e eu impedindo que os
seguisse.
minha casa. Durante três dias, dormimos juntos; ela deitava comigo
dos fotógrafos que clicou Mia com o meu irmão, como se eles
relógio, por pouco não perdi a cabeça contra o meu irmão… Por
Não temi ser espancado pelo meu pai. O mais perto que
cheguei do medo foi quando ele usou minhas irmãs e meus irmãos
para me obrigar a algo. Agora, esse pavor de perder a Mia? Era um
não estivesse pronta. Mas isso? Eu sabia que ela ia gostar. Puxei
sua calcinha e passei a língua em seu Monte de Vênus depilado.
Nunca vi nada mais lindo.
nervo rosado. Sabia que ela estava acordada, então retirei minha
boca por um segundo e levantei meus olhos para ela.
Mia me encarava com aqueles dois globos azuis, como o céu
refletido no mar.
Minha língua entrou em seu buraco; um dia, seria meu pau ali,
mas no momento me contentaria em degustar essa boceta que eu já
gemeu. O dormitório não era à prova de som, mas ela não precisava
saber disso. Eu só queria ouvi-la.
— Bom dia.
Sorriu, sonolenta.
— Acho que vou adorar ser acordada assim todos os dias por
você.
forcei.
beira do orgasmo.
dela com a boca cheia do meu pau era fenomenal; não havia nada
quarto.
entrar.
levando-a para longe de mim. Na hora, andei sem rumo até que
parei na casa de Miguel, decidido a trazê-las de volta. No dia
descido as escadas.
quarto, mas não precisava ficar com vergonha por causa disso.
meu nunca ligou para seus filhos; não passávamos de objetos a seu
precisasse.
casal agora?
Tentava entender suas emoções. Notei o seu medo de me
deixar tocá-la sendo que no final não iríamos nos casar. Bom, ela
devia pensar isso. Mas desde que coloquei meus olhos em Mia,
soube que seria minha. Antes, nós nos tocávamos, mas nada tão
íntimo; cada vez foi ficando mais. Acreditava que era por isso seu
temor.
o meu convite?
disse.
cérebro.
Ela arfou.
— Mesmo assim está agradecendo? Ficou louco? Além do
mais, eu não tive nada com isso ou com aquelas fotos. — Parecia
ninguém há quase doze anos. Nós vemos algumas coisas aqui e ali,
mas nada na proporção desses últimos meses com você aqui. Claro
que não somos dados a sentimentalismo, somos duros e letais
irritado.
— Sim, oh, senhor! Seu pai era um monstro. Como foi capaz
de tamanha brutalidade?
respondeu Rafaelle.
Ficou vermelha, a cor que passei a achar linda nela. Não era
Rafaelle bufou.
nisso.
no início.
Mia suspirou.
acontecendo.
meu pai?
passo que não estava dando certo. Foquei em meu objetivo, como
me ensinou. Olha. — Ela se me mexeu para descer, então a
o seguisse.
Stefano.
Mia reparou.
— Querida, por que não vai desligar o som?
Graziela assentiu.
A mulher me fuzilou.
Cortei-a:
Ela ofegou.
proteção. Ele não ousaria entrar na minha casa. Luna e Jade estão
vindo para cá também, como as esposas de alguns capos. —
Suspirei. — Acabarei a tempo da apresentação. Stefano vigiará
Ri, negando.
Não somos diferentes. — Nikolai era letal, assim como Matteo, Luca
e Alexei, mas nenhum se envolvia com tráfico de mulheres e
crianças.
ela falou que Graziela era filha de Skender. E se ele exigir o seu
direito de pai…
tentar algo contra nós. — Sorriu Stefano. — Estou louco por uma
ação, mas não posso reclamar de ficar tomando conta das
mulheres.
sabemos como tudo vai se desenrolar, mas espero que bem. Nós
estamos em maior número, e na minha cidade. Prometo a você:
ninguém levará a princesa. Ninguém. — Pegaria os traidores e o
morreria tentando.
Capítulo 16
Alessandro
nessa noite.
e Alexei.
da raça deles.
— Não é essa a nossa intenção. Não nos tornaríamos aliados
— objetou Rafaelle.
da criança… — começou Alexei. Pude ver que ele tentava não rir. —
Ele era alto e loiro, de olhos azuis, assim como seu irmão
Nikolai.
Graziela eu fosse ficar como Stefano, mas ali estava eu, calmo, frio
e preparado.
Alexei riu.
você apaixonado.
capaz de amar?
— Acho que o aviso que deu da outra vez não foi claro o
suficiente, porque ainda restam alguns — apontou Nikolai.
assegurou Rafaelle.
só neste mês.
veículos se aproximarem.
— Seis carros. Provável que com quatro homens em cada,
nós.
como um rei com uma capa escura. Ele era alto, com cabelos
— Estiloso, não?
A sua fala foi cortada quando lancei minha faca e acertei entre
os seus olhos.
gélido a meu ver. Então quer dizer que minha sobrinha o tem em
direito.
capazes. Se fosse sobrinha dele, por que Mia não me contou? Ela
mentiu de propósito? Não achava possível.
Mia nunca mentiu. A mulher era fiel aos seus. Ela certamente
ia gostar de saber que seu pai era outro, e não o maldito verme que
acabou matando.
— Sim, portanto, a garota é minha sobrinha. Eu tenho direitos
mãe, e fugiu com a bebê que tirou da barriga de Carina. Seu castigo
atirou nela grávida da filha dele — joguei esse final para descobrir
se ele realmente sabia que Graziela era sua. — Para salvar a bebê,
com o maldito.
Salvatore.
— Tentei ser civilizado, mas acho que não vai funcionar com
você.
Skender gargalhou.
Cortou-me:
— Não saio daqui sem elas. Mas sei onde estão e, neste
momento, há homens meus lá.
Sorriu.
— Tarde demais! O estúdio de dança está lotado. Achou que
me enganaria? Logo, logo terei as duas comigo. Farei a Mia pagar
comendo aquela boceta e, depois, a darei para cada um dos meus
uma delas; precisava acabar com isso e ir atrás das minhas garotas.
Podia ver que todos pensavam o mesmo.
mas os pneus haviam sido furados. O merda correu para trás de seu
carro. Quem estava no helicóptero começou a soltar fogo sobre nós.
Temos que andar logo enquanto ainda temos visão, porque depois
que escurecer ficaremos cegos. — Sinalizei para Luca. — Me cubra.
cuidar para não ser baleado de cima. Cadê Rafaelle que ainda não
derrubou essa merda?
— Você teve uma oportunidade para aceitar isso sem lutar.
arma.
Graziela.
Mia
chefes de máfias.
Ela sorriu.
— Não ligo. Um dia, ele foi um pai, mas isso mudou com suas
Wendy.
ele só queria encontrar a minha mãe que tinha sido vendida pelo
meu tio — comentou Rayssa. A garota era uma mulher muito doce e
— Luca faz o mesmo. Sei que eles não são santos, longe
disso, mas todos morreriam por nós — assegurou Jade, olhando
Stefano, que conversava com Miguel. — Meus irmãos também.
estremeceu.
estar namorando.
— Vocês se amam? Não consigo imaginar aquele homem
sentindo isso. — Irina falou em tom baixo. — Mas Matteo também
era frio quando o conheci, só não tanto quanto esse capo.
grande história de amor para narrar. Não sabia o que sentia. Claro
que Alessandro me atraía, adorava estar com ele, e nós
Suspirei.
Irina riu.
vermelho.
resumi.
sexual de vocês.
— Não acho que seja ruim. Ele só me tirou daquilo que sempre
acredito nisso!
Dessa vez, Stefano saiu do seu lugar e veio até nós, sendo
estreitos.
aquela atenção.
parem de histeria. Não sei o que vai acontecer, deixarei para pensar
para Miguel.
Luna fez careta, mas não respondeu. O que será que estava
acontecendo ali? Depois procuraria saber a respeito do que a
incomodava.
no tal encontro.
seria dela.
os de Miguel e Stefano.
as escadas.
— O quê?
prometeu a ela?
chefes da máfia.
falava sério.
— Se comporte, Stefano — Jade ralhou, levantando-se. —
Preciso me arrumar, não quero perder a apresentação de Graziela.
— Acho isso errado, devíamos ficar todos aqui, e não sair para
nenhum espetáculo — Miguel reclamou, seus olhos fixos em Luna.
— Somos irmãos, ele não pode ter feito algo assim — Luna
sussurrou de olhos arregalados.
Acredito que tudo está confuso dentro dele agora pelos sentimentos
novos, mas meu amigo vai se dar conta disso.
conta do resto.
Alessandro
outro carro.
porque mesmo comigo dando pontos, ainda vai faltar muito a ser
feito — rosnou.
por meu irmão, e uma ideia se formou em minha cabeça. Não era
das melhores, porque faria as pessoas próximas a mim sofrerem,
que conhece o que meu pai fazia. Eu poderia torturar todos e buscar
essa informação, mas não levaria a nada, só me tomaria tempo. E é
inquiriu Luca.
Rafaelle suspirou.
minha barriga.
— Não, eles não vão, portanto, você terá que provar, fazendo
o que eles gostam mas nós proibimos. Com isso, os traidores sairão
das sombras, e quem não aprova tentará esconder o seu
as palavras seguintes:
garganta.
Sorri frio.
— Não, porque ela é minha. — Só de imaginar alguém
encostando naquele corpinho, onde só eu tive o prazer de tocar,
sentia vontade de derrubar todos, incluindo o meu irmão. Mas isso
elas.
Luca tremeu.
— Jade vai embora com Luca para Chicago. Luna vai para
Rafaelle.
acreditar…
Cortei Luca:
fazer mal para o bebê, e eu não quero que ela tenha complicações
na gestação.
problemas na gestação.
— Tudo bem. Como Jade está grávida, nós podemos dizer que
coisa pior. Jade está segura com você. — Olhei para Luca através
entramos na cidade.
— Acho que para a encenação ideal, você precisa pedir a mão
todos acharão que sou duro o suficiente para obrigar uma mulher a
Senti-o estremecendo.
de cada coisa que acontecer aqui fora, como dentro de nossa casa
— frisei, fazendo Rafaelle rir, mas não parecia ofendido.
Rodins sozinho. Não quero que nada saia de errado, muito menos
Luca riu.
— Tome cuidado para que não haja nenhuma arma no local,
Nisso ele tinha razão. Mia contava com um gênio forte, mas
estreitou os olhos.
isso que eu faria caso estivesse buscando provas do novo capo ser
apresentação, já que não vai para o hospital onde devia estar indo.
que ela sofra. Posso contar com você em relação a isso, não é?
Rafaelle assentiu.
apresentação.
irmão.
momento, eu desejei matar o meu pai só para que ela fosse livre,
mas mamãe não deixou, dizendo que ele era a minha família e que
eu deveria respeitá-lo. Às vezes, odiava as nossas tradições.
colaboradores.
ferimentos.
Depois lido com ele. E como anda tudo aqui? — Olhei para as
pessoas. — Checou todos?
entranhas se retorcerem.
— Ela pensa que não apareceu — Rafaelle disse com a voz
baixa. — Porra! Ainda bem que veio, ou isso a faria sofrer. Agora vá
lá antes que ela comece a chorar.
— Amo a minha mãe com todo o meu coração, mas fiquei tão
pelo que minha princesa disse sobre ela estar apaixonada por mim.
Não sabia se seria possível corresponder ao sentimento, não tinha
certeza se era capaz de amar. Mas a sensação de confirmar que
Pais, eu agradeço por ele ter aceitado ser o meu. Esta dança será
para você, papai — declarou com fervor. — Amo você para sempre.
Tinha que ter em mente que eles ficarem juntos como casal
seria apenas fingimento, logo voltaria para as duas e conseguiria a
minha vingança: matar quem ousou me trair.
continuava ali.
rosa, então me abaixei. Logo ela estava ali, com um impacto que
roubou metade do oxigênio dos meus pulmões, mas não liguei.
— Pensei que não viesse — sussurrou no meu ouvido com
— Por mais que eu esteja longe e pense que não vou voltar,
acredite que sempre retornarei para você, minha princesa linda —
dificuldade.
antes troquei um olhar com Rafaelle que dizia que partiria para o
plano, um que eu não estava nada confortável em executar.
Olhei para Mia, que estava muito feliz. Seu sorriso era radiante ao
ver a filha seguindo o seu sonho.
mim. Pude ver que ela queria, mas havia indecisão ali.
sabia se me sentia contente com isso, porque gostaria que ela fosse
minha da maneira certa, ou indignado por ela me rejeitar mesmo
tendo dito sim. — Depois vamos conversar sobre esse pedido de
casamento. Não sei o que há, mas pedir a mão de uma mulher em
público não parece ser uma atitude comum para você — falou baixo
no meu ouvido. — Isso faz parte de algum plano?
meu corpo.
Capítulo 19
Mia
Graziela antes de minha filha ler o que escreveu a ele. Na hora, meu
pensar; não era isso que esperava, além de achar que estava indo
rápido demais.
uma cadeira e pegou minha mão. A mesma que estava com o anel.
— Era de nossa mãe, Alessandro passou a carregar sempre
consigo depois de sua morte. Se meu irmão lhe entregou isso,
— Não entendo…
tranquilizei depois que o doutor afirmou que não era grave, pois não
atingiu nenhum órgão vital.
— Então teve um motivo para pedir a minha mão ali? Não era
por que queria? — Não fiquei com raiva; se ele o fez, tinha algo a
O homem foi à luta por mim, levou uma facada só para tentar
negociar com um criminoso e me manter longe dele.
Sua mão pegou a minha cabeça e puxou para ele, até seus
lábios estarem perto dos meus. Beijou-me por alguns segundos.
falando.
breve.
— Não vai adiantar você partir, pelo contrário, só fará as coisas
ficarem piores. Eu preciso que fique aqui e não tente fugir por nada
neste mundo, tremo ao imaginá-los colocando as mãos em você. —
minha família. Eu não sei em quem confiar, além dos meus irmãos,
Viper, Rabel, Sage e Luigi. Todos os outros são suspeitos, e como
insistiu.
Sabia que quando ele dizia “lidar”, na verdade, significava
matar. Mas eu não temia por Skender: ele era cruel, e eu vi as
coisas que fez. Assisti aos vídeos daquele pen drive; senti asco pela
meu cabelo.
— Acho que tenho algo que pode ajudar você nesse plano
secreto. Talvez consiga usar como arma para arrancar algo dos
albaneses.
perguntou.
Parei na porta.
— Não, mas acho que tenho a coisa certa para pegar todos os
— O que…
carro.
posição era esquisita. — Por que em vez de observar o que não lhe
dessa vez.
Suspirei e apontei.
uma faca.
algo e se virou para mim com o cenho franzido. — Tudo isso por
uma caixa?
Sorriu, descarado.
Rafaelle bufou.
— Por que não se cala antes de perder a cabeça? —
Alessandro alertou.
ele parecia calmo. Deduzi que o ciúme que sentia antes passou,
suspiro duro.
antes porque não achei que ninguém fosse forte o bastante para
lutar contra eles. Não fui à polícia, pois tinham muitos em sua folha
de pagamento, até aqui na Itália. Talvez vocês possam usar algo
longo tempo.
como se fosse para me manter ali para sempre. — Será bom saber
onde estamos nos metendo e bolar um plano em cima do que já
temos.
Fiquei de pé.
para lá também assim que soube que o irmão estava bom, mas eu
graças aos céus. Ela teria ficado louca com ele machucado.
que seria melhor devolver, mas, no meu íntimo, o queria para mim.
fachada mesmo…
poderá sentir, eu não posso aceitar me casar com você — falei com
um sorriso triste. — Guarde-o e se um dia realmente sentir que me
ama ou que pode amar, eu aceitarei ser sua de todas as formas
possíveis.
machucá-lo.
pertence. Fui muitas vezes à casa onde Luna morava para tentar
dizer que a queria e a desejava. Nunca precisei ir atrás de uma
mulher como fiz com você. Sabia que era diferente de todas que vi
— O que mudou?
andaria no fogo por vocês, mataria e morreria. Uma vida sem você e
Graziela não tem significado.
declaração.
— Mia, eu lhe daria o mundo se ele me pertencesse, mas
posso prometer que serei o marido com que você sempre sonhou.
Não sei se meu coração é capaz de amar, mas meu corpo e cérebro
pertencem a você. E se me aceitar assim, eu serei todo seu. — Seu
possível, que estaria ao meu lado e me faria feliz. Mesmo com toda
essa bagunça, eu me sentia feliz por estar ao lado dele.
Alessandro
Beijei seu pescoço, e gemeu baixo; até poderia fazer mais que
amava, embora pudesse ver isso em seus olhos; não tinha como
esconder. Por que razão ela não me falou? Seria por eu não ter dito
preciso ir.
meu povo, não posso deixar que se espalhe. — Era algo que devia
— Está ferido…
Ele sorriu.
Mas como o teimoso que é, sei que não ia fazer nada, então dei um
empurrãozinho.
las.
por uma mulher mais do que para algumas horas de prazer. — Virei-
me, evitando aquelas emoções.
Rafaelle sorriu.
ante suas palavras. — Não precisa ficar todo enciumado. Você sabe
que não a tocaria, gosto dela como minha irmã. Ela é família. —
Tocou meu peito. — Mia é a sua mulher e sempre será. Logo terá
tudo o que deseja.
Stefano.
ferido… isso que não sabe que não vou voltar tão cedo. O meu
coração parece sangrar por dentro.
Rafaelle riu.
coração doía como um novo corte por fazer quem eu amava sofrer.
Jade saberia da verdade, mas Luna e Mia? Elas sofreriam, e eu não
estava junto. Manteria meu amigo de fora, pois ficaria com Luna,
com a própria vida se fosse preciso. Outra pessoa, além dos meus
possível.
por sinal seria controlado por esse homem. El Diablo tinha todos os
dados do pen drive, ou seja, Skender obedeceria. Aceitei o plano
cuidados de El Diablo.
em nossas mãos era melhor que isso. Foi bom, por um lado; não
Era egoísta por não contar à Mia, mas estava agindo como um
morte.
aturar nada.
Rafaelle bufou.
houvesse uma luta entre eles, o que não ia acontecer. Esse homem
perigo.
Eles ficaram em silêncio, o que foi bom. Era hora de lutar para
gemeu.
— Ele não, mas eu sim. Vamos apenas dizer que o meu irmão
sofreu um acidente de carro e morreu carbonizado. Agora eu sou o
Skender riu.
Assim que saísse dali, eu iria até Luigi para forjar a minha
morte. Virei-me para El Diablo.
— Eu também não…
Deixei minha casa jurando para mim mesmo que voltaria para
Mia, mas o que era para ser apenas uma armadilha forjada se
tornou real. O que seria da minha família?
Mia
Ele era muito teimoso. Por que ia trabalhar sendo que estava
ferido ainda? Poderia ter deixado os irmãos tomarem conta por uns
apresentação, porque logo fui para a tia Jade, mas papai tinha me
prometido que assistiríamos aos vídeos da mãe dele de novo. — Ela
dança.
Pisquei.
Sorriu.
— Sim, ela é muito linda, como o meu pai. Tinha a minha idade
Foi assim com sua avó, até hoje a perda me dói — expliquei. —
Para Alessandro também.
com firmeza. — Nem minhas tias Luna e Jade e meus tios Stefano e
Rafaelle.
mostravam desolados.
Sentira desde cedo que algo não ia bem. Mas vendo todos
como se estivessem em um enterro…
dança, ou seja, era com ele mesmo… não! Alessandro tinha que
estar bem, o médico dissera que aquele corte não o ameaçava de
nenhuma maneira.
mim.
— Não, por favor, me diga que ele está bem — sussurrei com
as mãos tremendo.
minha própria dor. Senti o chão se abrir sob meus pés e caí de
joelhos com o coração sangrando.
Nunca pensei que o amor fosse doer tanto; que fosse ter uma
minha filha sobre perdas, até jurei a ela que não perderia nós dois.
Era algo que eu não poderia ter prometido, porque a decisão não
cabia a mim.
anterior após se abrir comigo. Eu poderia ter feito algo… não ter
completo.
estando destruída ?
Achei que tivesse que trabalhar mais para chegar em seu
entretanto, tudo virou pó. Tudo se foi. Ele sumiu para um lugar ao
qual eu não o seguiria, pois não podia abandonar Graziela.
Não era só pelo perigo, mas porque quanto mais gente entra na
minha vida, mais gente parte. Minha mãe foi uma delas, eu a
Não cheguei a dizer a ele que eu o amava. Queria ter dito, mas… —
então por que me incomodei pelo fato de ele não falar um simples
teriam vindo atrás da sua máfia. Porém, eu insisti em ficar com sua
família. — Mordi o lábio, olhando para Stefano. — Por quê? Devia
Grazi me daria forças para passar por isso, mesmo que não visse
uma luz no final do túnel e me sentisse sem chão e com o coração
partido.
nesse estado.
Via tudo cinza lá fora, percebendo como mudou tanto de mais cedo
resposta.
— Meu irmão está tentando descobrir quem foi o mandante.
Assenti.
— Foram os albaneses?
— Não. Mas você não pode fazer nada, afinal, está lidando
com sua própria dor, mesmo que não esteja chorando. — Cada um
— Não choro há uns dez anos, desde que minha mãe morreu
— falava tão baixo que quase não ouvi direito. — No seu velório,
mais como um pai do que como irmão mais velho. Devo tanto a ele.
demais.
sujeitados, era para terem se tornado piores que o pai. Mas os três
irmãos Morelli tinham coração. Alessandro me ajudou e me
protegeu, até aceitou uma guerra que poderia ser a causa de sua
morte.
fizeram eu me encolher.
levou, mas o doutor disse que ele ficaria bem. Então por que vieram
esses assassinos para matá-lo? O carro, o fogo, o penhasco… —
Luna se encolheu.
Lembrava-me de Alessandro dizendo que morreria por mim.
De fato, o fez… Partiu para um mundo distante como o Sol. No
mais cedo naquele dia, depois que partiu, ainda ferido, para
trabalhar.
expressão dele quando falei que você partiria para Dallas se ele não
fosse atrás das duas na casa de Miguel. Teve medo de perdê-las,
nunca o vi assim. — Ela me olhou com dor. — Desde o começo, eu
quis que ficassem juntos, pois achei que formariam um casal lindo.
Então o chamei para ir à lanchonete e vi a forma que se olharam,
até depois quando ele visitava nossa casa. Então viemos para cá e,
nesses meses, confirmei que tinha amor ali.
tristeza.
que um dia superaria essa perda. Não superar, mas aprender a lidar
com ela, assim como fiz com a partida da minha mãe. Eu não
estava sentindo ou vendo nenhum ponto de apoio, mas precisava
seus carinhos… tudo que podíamos ter tido foi interrompido e tirado
de mim.
Precisava ser forte pelos irmãos Morelli e por minha filha. Não
Mia
achei que ficaria um pouco melhor, mas só o que consegui foi chorar
mais ao sentir seu cheiro nos lençóis.
Poderia ter ido e ficado com ele, mesmo que não estivesse mais
conosco. Mas Stefano disse que era norma da máfia: o líder morreu,
então só abriria as portas da igreja no dia seguinte. Eu queria ir lá e
direitos.
quando Graziela perguntou sobre o pai. Eu não mentia para ela, não
com algo tão sério assim, mas disse que Alessandro tinha ido viajar.
Depois, ela quis conversar com ele pelo telefone para dar boa-noite.
Na hora, eu chorei; não me aguentei.
mulher chamada Zaira, uma segunda mãe para Luca. Como Jade
vez que o veria, não “ver” de fato, porque o caixão fora lacrado
naquela manhã. Logo, poderiam ser alguns desses que estavam ali.
e assassinos.
Luna tirou Jade da igreja, porque ela chorava muito. Havia
uma coisa que não pude deixar de notar: Luca não andava sozinho,
sempre tinha seguranças com ele, até quando foi embora com sua
mulher. Isso me fez lembrar que toda vez que Alessandro saía de
casa, ele estava com dois dos seus homens, Luigi e Rabel. Só
andava sem seguranças na companhia de seus irmãos. Então por
eventos desconcertantes. Mas essa noite sem dormir fez com que
eu considerasse muitas coisas, e essa era uma delas. Talvez não
fossem pensamentos fúteis.
plano dele e colocado fim em sua vida. Isso queria dizer que
Rafaelle e Stefano corriam perigo? Precisava alertá-los e pedir para
sangrando.
seu irmão.
nojentas.
ouvia.
— Sou paciente, não ajo por impulso como muitos. Era uma
um título?
— Quem é você para dizer algo? Meu irmão jamais deveria ter
se envolvido com gente do seu tipo. Uma mulher que não serve
para nada, a não ser voltar para o lugar de onde não deveria ter
saído. — Acenou para alguém atrás de mim.
Todos os capos não andam sem seguranças, mas nesse dia ele
estava sozinho, aposto que por confiar em você.
Uma pessoa em especial estava ali, uma que me fazia querer matar
e morrer ao imaginar perto da minha filha.
apostar.
vocês me devem respeito. Quem não está do meu lado, está contra
mim.
Tremi.
aproximou de mim.
foram contra ele. Senti-me doente, porque sabia que só sairiam das
que o mataria, mas não deve ter tido tempo, pois foi apunhalado nas
não podia ser parente desse homem. Graziela era sua filha, mas
mandei matar. Depois de tudo isso, eu dei sua mãe ao Afrim como
A fúria corria por minhas veias, mas não fiz nada, já que
Rafaelle nem piscou. Eu, sim. Não podia voltar para a Albânia,
seria morta lá, isso se não acontecesse algo pior… não. Precisava
sair dali, mas como? Cadê Luna e Jade? Não as via há algum
tempo, nem Miguel ou Luca. Esperava que estivessem bem.
capaz de dizer isso, sendo que há não muito tempo eu era do irmão
com nada.
e olhos sombrios.
— Nós vamos sair daqui. Espero que o capo não faça nada ou
terão mais corpos a serem velados, pode acreditar. — Não parecia
um pedido.
Não sabia quem era, mas estava grata, pois por causa dele
Skender não me tocou, e esperava que não me levasse com ele, já
que precisava pegar minha filha e ir embora dessa cidade. O que
— Não vou com vocês, estou indo embora desta maldita máfia
— arrisquei falar, sem fôlego. Eles farejavam medo à distância, mas
presa.
Oh, Deus, o que seria de mim? Não ia chorar ali. Precisava ser
forte para enfrentar esses homens.
de mafiosos ali.
Corri, mas não fui longe, pois um braço me pegou por trás.
Lutei contra.
servirá.
porque não sabia esse idioma. Ele me levaria para algum lugar onde
seria quebrada de maneira irreversível. Precisava lutar, mas como?
— Odeio você, Rafaelle! Não importa o que faça, darei um jeito
de destruí-lo. — Lágrimas desciam pelo meu rosto. — Vai pagar
Mia
comigo.
Acreditava que estivesse segura com Jade; ela não era como
Rafaelle.
tremendamente difícil.
que me usaria.
— Sim, portanto, está segura. E se tivesse veneno na comida,
eu não a comeria.
eu a eliminarei. — Suspirou.
— Estamos em Milão?
Negou.
Fechei a cara.
— Não vou dormir com você, não sou uma puta. — Tentei
pudesse consertá-lo.
os homens naquela igreja? Todos adorariam ter sua vez com você.
— Ele veio na minha direção, mas segurei o instinto de correr. Se El
na minha frente. — Sua filha está bem, deixe-a lá. Aqui ela correrá
muito perigo, os albaneses invadiram Milão e estão querendo o
Arregalei os olhos.
— Preciso vê-la, falar com ela. Você disse que faz dois dias
— Sonífero — destacou.
parecia cansado.
— Rafaelle pode…
alianças. Por que Rafaelle agiu assim? Confiava tanto nele, mas
isso já não importava mais. Tudo o que sentia era uma imensa raiva
Aliás, deve ter sido sempre assim. Talvez tudo que Rafaelle me
disse sobre salvar Alessandro tenha sido mentira, para fazer o irmão
fosse você, não iria a lugar algum; pode ser morta antes de ter sua
Não sabia o que foi dito a ela, então tomaria cuidado. Não
filha então. Com certeza, de forma nada legal, pensei. Eles eram
mafiosos e podiam tudo.
Ela suspirou.
razão. Ela disse que era por saudades suas e dele. — Fungou.
O meu coração rachou e, os meus olhos, umedeceram.
de dor.
Ela suspirou.
— Por que não pude ficar com você e o papai? Onde estão?
Posso falar com ele? — Sua animação fez eu me encolher.
mas ignorei isso — não havia nada para sentir, o único que me dava
arrepios era Alessandro. Ele arqueou as sobrancelhas assim que
cheguei perto, sem falar nada de início. Abafei o telefone para que
— Não…
Coloquei no viva-voz.
uma criança.
doçura?
ternura ali.
que ser meu pai é o maior privilégio do mundo. — Sua voz saiu
baixa. — Vocês dois vão voltar para me buscar, certo? Quero ficar
com os meus pais.
retornaria.
mais empolgada por falar com ele. Notei que isso estava se
tornando demais para o trauma do passado de El Diablo. Não
precisava ser uma especialista em ler mentes para me dar conta.
Ele ia saindo pela porta, mas parou com as costas tensas, sem
se voltar a mim.
— Pelo que perdeu. Pela dor que está sentindo. Por eu ter
provocado essa reação. Poderia dizer que um dia vai passar, mas
isso é conversa-fiada. A única forma de sobrevivermos é pensando
— Oi, meu amor, estava ocupada aqui. Seu pai foi dormir um
pouco. — Conversei com ela por mais alguns minutos e prometi que
bagunça, tudo bem? — Se fosse por mim, falaria com ela por dias,
sem me cansar.
mais aliviada por ter escutado a voz dela, mas ainda precisava
resolver o meu problema; não podia ficar ali para sempre. Deveria
solucionar esse negócio dos albaneses, afinal, não estavam atrás
Alessandro
houve.
sonho?
minha mão e algo no meu nariz. Pelo jeito, não foi pesadelo, e sim
real.
— Acho melhor permanecer deitado. Vou chamar o médico —
disse uma voz masculina.
uma faixa em meu ombro. O corte de faca que tinha recebido antes
para dizer que era você. — Rumou a uma cadeira e mandou uma
mensagem, certamente avisando a alguém que acordei. — Está
Estava armando uma mentira, mas a morte veio antes. Não era a
hora: precisava ter um futuro com Mia e minha pequena graça.
tem um plano oculto e não diz nada a ninguém, nem para nós —
respondeu Flame. Depois complementou: — Devia chamar um
doutor. Apesar de que, lhe conhecendo, achará que não é
necessário.
mortais.
ter ficado dez dias apagado nesta cama, sem andar. Agora quero
saber o que está acontecendo. — Olhei para ele. — Tenho algumas
roupas aqui?
mas não faria nada até falar com Rafaelle e sondar como iam as
coisas.
— Flame!
eu precisava saber.
Trinquei os dentes.
— Desembuche! Aonde pensa que ela foi? Se alguém a tocar,
eu vou esfolar o seu chefe. — Mia era inteligente, por que saiu de
um local seguro?
pessoa que a garota odeia mais do que tudo (pelo menos, foi isso
que meu chefe comentou). Sua menina quer vingar a sua morte, por
assim dizer.
com a Mia…
Minha cabeça foi na sua direção tão rápido que certamente
antes de dormir, fica com aquele olhar vazio. Sua única alegria é
falar com a filha — disse Flame, fazendo-me arquear as
isso direito.
Rafaelle?
inteligente, essa que você tem. Ela encaixou as peças, e assim que
Por sorte estamos mais perto. Vou contatar El Diablo para buscá-la
— disse o cara assim que checou.
porque eram bons no que faziam, e depois limpavam tudo. Mas não
Porsche que sabia ser dele. Olhei para Flame. — Você dirige?
Não estava saudável para andar sozinho. Perderia em uma
luta, mas poderia usar uma arma com tranquilidade. Embora não
encaminhava.
Bastava um minuto com Mia e Graziela para você cair aos pés
— Gosta? — objetei.
ele conversasse com a filha fingindo ser você. Acredito que não
queria contar de sua morte com a garotinha longe dela. — Suspirou.
em seu rosto…
El Diablo perdeu sua família, mulher e filha, então certamente
foi difícil para ele. Agradeci mentalmente por Mia ter mantido sigilo
da minha suposta morte de Graziela; não gostaria que minha
pequena sofresse.
— Ela ficou em dúvida, mas achou que fosse uma gripe. Pediu
que a mãe tratasse você, ou melhor, ele, porque o amava… —
eu.
Vê-la cortou o meu coração, pois sabia que ainda não podia
me aproximar. Precisava lidar com o perigo primeiro.
ali.
Gelei. Não podia deixar que acontecesse nada daquilo que ela
pretendia.
— Porra!
machucaria.
estava.
ficasse segura.
Não achei que conseguiria carregar Mia, não sem foder de vez as
minhas costelas. — Pode colocá-la na cama?
Flame obedeceu e foi embora para ajudar El Diablo contra os
albaneses.
mundo, mas ali estava ela, forte, decidida e lutando por aquilo que
desejava. Ela foi feita para mim.
Toquei sua mão: ela ainda usava a aliança que lhe dei; não
Mia
gritar com ele, mas só voltei a fechar os meus olhos, querendo que
essa dor fosse embora.
dias ele me ajudaria a ir até a minha filha. Por um tempo, segui suas
Não era idiota para não saber o que ele faria lá; não vi nenhum
soube que o dono do lugar cometeu alguns delitos contra ele, mas
Escutei passos, mas não abri meus olhos. Meus dias ali foram
silêncio.
nunca estaria pronta, não para isso. Tudo que me importa era
Alessandro.
— Está ferido!
Parei para pensar. Fiquei inebriada e feliz por ele estar vivo,
Se ele fez ou disse algo, foi preciso, fazia parte do plano desde o
início. — Ele me avaliava. — Lembra do plano que mencionei?
— Sim, mas o que isso tem a ver com o seu irmão tomando o
era capaz disso? Não só comigo, mas com suas irmãs também…
— Não acredito nisso. — Soltei suas mãos, porém, ele tentou
me segurar de volta.
— Mia…
mesma medida, feliz por ele estar bem e furiosa pelas mentiras.
para ele.
Dei as costas para ele, pois não queria lidar com isso ou seria
os olhos molhados.
meu rosto.
— Sabia que estava lutando uma luta que nunca venceria, mas
culpada por não ter dito que o amava naquela manhã que saiu e
não voltou. Sabia que nunca poderia dizer. — Olhei o chão e depois
para ele, paralisado. — Pensei: por que não falei? Se você me
que sei que nunca sairá da sua boca. Quem ama não deixa
ninguém passar pelo que eu passei nesses dez dias. Sei que estava
isso.
mulher que lhe daria um motivo para viver ou uma filha que
iluminaria seus dias. E minhas irmãs também são tudo para mim,
assim como você e Graziela. Comando uma nação composta por
hoje cedo que Bernard, um dos chefes do Havaí, teve sua filha
levada por um dos nossos, pois supôs que poderia confiar neles.
chefe, o capo que tinha que ajudar a todos. Isso não ameniza como
— Pode ficar com raiva por eu ter planejado algo assim sem
me abrir com você, mas nunca duvide dos meus sentimentos, Mia.
Com toda a maldita certeza, você não só entrou em meu coração
morto, como ele passou a ser seu. — Apontou para o peito e depois
mais bonita que recebi, aliás, a única em toda a minha vida, algo
explodiu.
bem?
que ele tinha tantas. — Eu não queria ser inimiga desse cara…
Arqueei as sobrancelhas.
me manter no escuro, isso não mudava o amor que sentia por ele.
assim como a saudade de ser tocada por ele, mas então pensava
duro.
demais por isso nos últimos dias. Se não estivesse ferido, iria chutar
seu traseiro. — Fui pegar outra arma, não querendo pensar na dor
tempo.
Você fica escondida perto da cama, porque ninguém tem visão para
ela pelas janelas. Se estiverem nos atacando, o El Diablo deve
estava muito pior do que estou agora. Além disso, fiquei furioso por
tentarem me matar. Estou louco para colocar minhas mãos nesses
distância?
porque era difícil para ele. Acho que Graziela ficaria feliz em ouvir
sua voz — sugeri.
cadeira, por mais que quisesse ficar ao seu lado. Não conseguiria
lidar agora com o que fez, só desejava que os ataques acabassem
logo e encontrasse minha filha de novo.
com tristeza.
calmo.
forma desigual.
Suspirei.
acontecer nada com você, mas após Rafaelle dizer aquelas coisas,
você queria atacá-lo… — Sacudiu a cabeça. — Isso sem contar os
ataques dos albaneses em Milão. Meu irmão não teve opção a não
verdade de você.
era fácil. Estava bem magoada, torcia para que passasse logo. Eu o
amava e enxergava em seus olhos que era recíproco.
Ele falou com nossa menina animada. Agradeci aos céus por
me darem mais uma chance ao lado de Alessandro, por o trazerem
de volta para mim, inteiro e vivo, mesmo que nesse momento meu
coração estivesse aflito por ser enganada.
Capítulo 26
Alessandro
fomos para uma casa em Verona. Não podia ir para nenhuma das
não havia nada que almejasse mais. O problema é que Mia falava
comigo e até tomava conta dos meus ferimentos, mas assim que eu
me aproximava ela se distanciava. Via dor nos olhos dela por saber
que não a incluí no que pretendia fazer.
em coma.
vezes passar pela dor de ter todos os meus ossos quebrados a isso.
seria capaz de magoá-la mais uma vez ou esconder algo sério dela.
cortou fundo. Esse medo dela me dizer que estava tudo acabado…
E, no fundo, se ela escolhesse isso, eu a deixaria ir? Não conseguia
suas ações, entendo seu lado mafioso, mas algo dessa magnitude
sempre precisará compartilhar comigo. Do contrário, quebrará
Sol?
— Com cada respiração que solto e cada pulsação de meu
coração, prometo que jamais a farei sofrer dessa forma. Juro pelo
que mais amo neste mundo, por você e Graziela, que não repetirei
custar.
volta.
lindo.
Senti suas mãos puxando meu short para baixo, logo depois,
algo quente em mim, me fazendo flutuar.
com Mia, só o oral já valia a pena. Mas claro, estava ansioso para
adentrá-la e tê-la todinha para mim.
meu pau, o desejo foi mais forte e explodi em sua boca. Não havia
nome.
quadril.
fazendo-a gemer.
Comecei a chupá-los com força, deixando-a enlouquecida,
casar antes de dar esse passo… Não quero que se sinta obrigada a
fazer algo assim no calor do momento. — Beijei sua bochecha. —
Rosnou, séria.
pertencer a ele dessa forma. Mas após achar que perdi você… —
Tocou meu coração, que batia por essa mulher. — Notei que estava
Sorriu e me beijou.
uso daquela faca; acho que posso pegar uma cega e cortar o seu
brinquedo fora.
cada vez em uma parte nova do meu coração? Até parece que eu
tudo bem? — Olhei para ela, que assentiu. Não acho que
conseguiria falar.
menti para ela, mas jamais repetiria isso. Restauraria por completo
segundo dedo.
ficara com uma garota virgem, mas porra! Eu adorava isso, pelo
menos com a Mia. Era delicioso saber que ninguém além de mim
caminho.
ciumento.
logo se acostumasse.
mim.
traço de dor, mas não vi nada. Então acelerei, fazendo com que ela
me apertasse mais. — Merda! Suas paredes estão espremendo o
meu pau.
rosnei.
— Delicado, hein? Espero que não diga isso por aí, ou terei de
entre suas pernas. Comecei a beijá-la de novo, pois não havia tido o
suficiente.
Uma batida na porta do quarto me trouxe ao presente. Até
esqueci que meus irmãos viriam para fecharmos a armadilha dessa
Ela assentiu.
Franzi a testa.
matado o Rafaelle.
na sua direção antes que meu irmão pudesse reagir. Socou o seu
peito, fazendo-o se encolher. Eu confiava que ele não a tocaria.
— Ei, cunhada…
— Nada. Mas acredito que seja por estar ferido, isso amenizou
sua fúria. — Não desejava pensar na dor que sentiu e na distância
obtida como resposta durante a semana. Não a deixaria fora de algo
Alessandro
esmagá-los logo.
grande dívida com ele, mas valeria à pena. Não queria nenhum
perigo ameaçando Mia e Graziela. Assim que isso tudo acabasse,
Era para estar mais protegido, mas infiltramos alguns dos nossos
entrarem em ação.
ali, não por medo, mas para observar de perto o que eles fariam.
joelhos no palco.
— Está falando de traidores? Você é o maior deles! Fez muitos
dos nossos nos atacarem e ainda me acusa? — falou meu irmão de
modo frio.
Chavez riu.
todos que você não merecia o título de capo, pois está sujeito a
quebrar as próprias regras. Como pode aceitar uma mulher que não
deixar claro o que acontecerá com quem tenta. O que houve com
Gael será fichinha perto do que farei com você.
permiti.
arma e atirei entre os olhos de Kaian. Não precisava dele ali, minha
palco.
que eram mais mortais. — Fui até Renan e tirei minha faca dele. Em
seguida, enfiei-a na barriga de Chavez.
Podia ouvir gritos ao meu redor. Luca, Nikolai e Alexei
sua língua por ter falado da Mia e feito o meu povo me trair.
minhas costas, isto será fichinha perto do que farei com vocês.
Sempre o aceitamos.
meu irmão.
— Sim, capo, eu farei isso. — Cortou a transmissão.
Torcia para que sim. O bom era que eu ainda tinha muitos que
Alexei riu.
Olhou ao redor.
famílias, amparadas.
— Eu também — disse Stefano, todo vermelho de um sangue
que não era seu. — E acho que preciso foder agora. — Virou-se
para mim. — Ainda necessita da minha ajuda?
Sacudi a cabeça.
parecido.
— Samuel e Miguel as trouxeram, devem aparecer na parte da
manhã. — Olhou para o céu; estava perto de raiar o dia.
apagado.
batalha não seria vencida com lutas, mas por meio do diálogo.
Esperava que ela aceitasse o sacrifício que tive de fazer para o bem
de todos.
Mia
sentei. Fiquei até tarde esperando Alessandro, mas como ele não
prometeu que tudo ia dar certo, que nada aconteceria com ele, nem
com ninguém.
— Mamãe! A tia Luna está brigando com meu pai e meus tios.
Ela assentiu.
— Vou cuidar disso, mas não deve ser nada — menti e a beijei
que isso acontecia. Um lar não seria um lar se isso ocorresse direto.
todos sabiam que você estava vivo — rugiu. — E o pior: que antes
planejava fazer isso.
Jade fungou.
chorar.
você e a tinha como uma irmã. Mas mentiu para mim! Não me
revelou e me deixou sofrendo.
Não omitiria mais nada dela, por mais que isso a magoasse.
Luna merecia a verdade, assim como eu. Essa merda foi ruim para
todos.
Ela o fuzilou.
local onde sabia que ele estava. Tudo em mim gritava para que eu
puxasse o gatilho; não compreende a vontade que tive de fazer isso.
Ele tinha mandado minha filha embora, enquanto fui levada por
alguém que não conhecia, sozinha, desolada por achar que quem
eu mais amava estava morto, assassinado por seu próprio irmão.
Mas continuei:
— Estou furiosa com os três, sim, por terem mentido para mim,
mas entendi algumas coisas. Alessandro não é só o seu irmão,
Não queria dizer essa verdade, mas era algo de que não
espécie. Pense no que eles podiam ter feito com você e Graziela
quando invadiram a nossa casa e botaram fogo? Se um deles
E até mesmo eu? Seu irmão quase morreu para limpar o seu povo
de gente assim. Aceito que esteja com raiva agora, entretanto,
Ela se encolheu.
o que contei.
— Preciso…
Sacudi a cabeça.
passou. Dê um tempo a ela para que possa digerir tudo o que foi
— Vou ficar com minha filha agora. Nem tive tempo com ela
depois de tudo isso. — Estava subindo as escadas quando fui
falar. — Seu olhar seguiu para além de nós, como se mirasse a irmã
e retribuiu.
Estendi minha mão para Alessandro, que logo veio até mim. —
Gargalhei.
Assentiu.
— Tenho uma ligação com alguns dos chefes das cidades,
mas assim que terminar, eu vou até vocês duas — disse. — Antes,
eu tentarei conversar com a Luna.
conferi.
Stefano sorriu.
Fiquei feliz por saber que me levariam. Não possuía família ali,
exceto a da minha mãe. Depois procuraria saber se algum dos
— Luna, querida, eu sei que não deseja falar comigo agora por
estar magoada. Mas corta o meu coração vê-la dessa forma. Espero
Fungou, mas não disse nada. Não esperei que o fizesse, pois
eu sabia que ela precisava de tempo para digerir tudo e nos perdoar
Quando me viu, ela correu até mim. Minha filha sempre foi uma
ficava.
Um mês depois.
Mia
casa, exceto para visitar a Graziela. Minha filha era a única com
quem conversava.
teve êxito.
muito. E ainda mais nesse dia, que queria que ela passasse comigo,
minha preocupação.
mas com uma traça feita em forma de tiara. Tinha vários clipes
adornando a cabeça.
— Tenho uma coisa para isso que vai funcionar — disse uma
voz na porta.
Sinto muito por ter me afastado, mas precisava muito desse tempo
sozinha. Só lamento por magoar você.
limpou o meu rosto. — Acho que me lembro de ter ouvido que você
gostaria que eu fosse a sua dama de honra, não é?
da Graziela.
mais — esquivou-se.
Poderia ter insistido, mas eu não queria levá-la para longe de
novo.
— E Miguel?
— Luna…
melancólico.
— Lamento pelo que fizemos e pelo que você passou. Mas foi
mim. — Mas não é hora para isso, hoje é o seu dia. O dia em que se
Sorri.
Preparei-me.
soltos com uma tiara de flores. Linda. Ela era a nossa felicidade.
Seu olhar estava frio para todos, como sempre. Mas vi o calor
muito lindo.
aceitávamos um ao outro.
não só eu, mas nossa filha também. Quero dizer que amo cada
parte sua, tanto a luz como as trevas, e que sempre estarei do seu
lado. Serei sua esposa, mãe de seus filhos, e prometo amá-lo e
lugar, tocou minha testa. Para muitos, esse gesto não era nada, mas
colocá-la no meu.
Pisquei, pois não o tinha visto desde o dia do ataque. Depois disso
não tive oportunidade para conversar com ele sobre o fato de ter me
protegido e agradecê-lo.
reação de Alessandro.
— Era verdade.
ombros.
— Não por tudo. — Olhei para Graziela, que correu até nós
crianças não podem ir. Mas amanhã bem cedo tomaremos café
não disse o apelido para não assustá-la. Esperava que um dia ele
se curasse dessa dor que o queimava vivo.
— Hora de ir para a tia Jade. — Beijei seu rosto, pois não
queria que ela estranhasse a reação de El Diablo.
mim é seu. — Ele me colocou no chão com um olhar que fez o meu
sangue ferver, mas de uma maneira boa.
com o fio dental e o espartilho, mas seria para ele. Pus sua camisa,
pois queria me cobrir até a hora certa.
Franzi a testa.
Eu sei que sua jornada é árdua e que terá um fardo pesado para
carregar sozinho como o novo capo, um com o que ninguém poderá
ajudar, muito menos eu.
Rezo para que Deus envie uma mulher forte, valente e que o
entenda; que esteja do seu lado em todos os momentos da sua
vida, nas trevas, na dor e na alegria. Uma mulher que compreenda o
seu sangue. Acredito que não preciso pedir para nunca levantar um
dedo para ela, porque eu o conheço e sei que, mesmo envolto de
trevas, jamais faria algo assim.
— O que…
Sorri amarelo.
— A surpresa. — Fiquei de pé na sua frente e desabotoei sua
camisa bem devagar. Mas então suas mãos apareceram e, em
me arrepiou.
— Alessandro…
firme nos lençóis com cada intrusão da língua e dos seus dedos.
de cada estocada.
Sorrimos.
se arquearam em um meio-sorriso.
Ele ficou em silêncio por um segundo. Até achei que não fosse
comentar nada.
— Kélia era linda, tão viva e vibrante. Mesmo com tudo o que
— Alessandro…
também. Ela queria ver as meninas, mas Marco não permitiu. Então
discuti com ele e isso o levou a quebrar o meu nariz. Não ligava
para a dor física, mas a minha mãe sofria por causa dele.
— Naquela noite, depois da sua morte, ele foi ficar com sua
Sim, não havia nada mais perfeito que esse momento… estar
ao lado dele, ser dele. Eu tinha pessoas que amava do fundo do
Mia
tinha certeza de que ela estaria feliz pela família que conquistei e
que ela viva cercada de mentiras. Olhe o que isso fez com a Luna?
Ela nos afastou por um bom tempo. Não quero correr o risco de
Graziela fazer o mesmo só por eu não ter dito a verdade. Quero que
agindo assim.
sofá no canto.
Franzi a testa.
— O que é isso?
a sua avó, a mãe da sua mãe. Não tinha irmãos, não vivos pelo que
soube. Mas essa senhora não merece que você a visite, nem a
malandro, ela a colocou para fora de casa. Então o seu pai a levou
para a Albânia. Ele não era santo, mas amava a sua mãe. De resto,
você já sabe o que houve — contou.
Sim, Skender matou o meu pai e deu a minha mãe para outro
mesmo que houvesse vivido o seu amor com meu pai, o verdadeiro.
vez que não pôde velar a sua mãe depois que fugiu. Então quando
janela.
poderia não ser nada, mas para mim era tudo. Um local onde eu
daria adeus à minha mãe.
esposa.
Arqueei as sobrancelhas.
de mim.
reação estranha, porque minha filha sempre foi solta com o pai dela.
fiquei com o Benny. Mas o tio Stefano disse que só vou poder
Stefano passou medo nele, agora ele vai dançar com a Milan.
conversar com eles? Não posso ficar sozinha — pediu com aqueles
olhos esperançosos.
olhar doce de nossa filha para derreter até o mais duro dos
corações.
— Venha aqui. — Estendeu a mão para ela. Graziela foi até
Pelo seu tom, parecia que Graziela não dançaria com meninos
também. Oh, queria só ver como ele se sairia nessa promessa.
algum plano.
Natal.
careta. — Também amo o tio Stefano, mas ele é muito protetor. Tia
Luna disse que ele era assim com ela, e que vai passar.
Morelli mudaria. Eles apenas tinham mais uma pessoa para incluir
na lista. E isso que nem chegara o tempo de ela namorar.
talentosa que ama o que faz. — Trisquei seu nariz, fazendo-a sorrir.
Embora acreditasse que Alessandro impediria, mas sem magoar os
dela.
— Mamãe era magnífica. Sei que o que vou dizer agora vai
deixá-la confusa no começo, mas a verdade é sempre o melhor
baixa.
também.
rosto lindo. — Saiba que amo você e adoro ser a sua mãe. Mas
também quero que você ame a nossa mãe como tal, ela era uma
mulher maravilhosa.
cedo, talvez houvesse sido melhor esperá-la ficar mais velha. Mas a
mentira tem pernas curtas, e eu não quis que descobrisse por outra
pessoa.
— Eu entendo, mamãe. Posso continuar a chamando assim?
Eu a considero dessa forma. Vamos ficar sempre juntas, não é? —
perguntou, temerosa. — Não quero nunca me afastar de nenhum de
vocês dois como da outra vez, quando fui para a casa da tia Jade.
época em que estive longe dela. Jurei que isso nunca mais iria
acontecer.
afirmei.
— Oh, meu amor, eu não estou triste, mas feliz, porque tenho
as duas pessoas que mais amo na vida aqui comigo. — Abracei ela
e Alessandro. — Não podia pedir mais nada.
Bufou.
razões. — Fez cócegas nela, ao que riram juntos. — Agora, por que
não me mostra aquele passo novo? Rafaelle está na sala
esperando.
Sabia que ele nunca machucaria ninguém, não inocentes,
crianças e mulheres. Todos ali morreriam por minha filha e por mim.
baixo.
estava tudo bem. Meu doce bebê não conhecia o pai protetor que
arrumou. Eu ficava feliz pelo seu cuidado, pois isso significava que
ele amava a minha filhota.
alma.
onde estávamos.
Céu.
a senhora olha por nós duas e meu papai — disse ela. — Amo os
pais que me deu.
Como eu podia amar ainda mais uma criatura tão linda e
que franziu a testa. — Sei que não crê nisso, mas as duas eram
maravilhosas e estão no Céu agora olhando por mim, por você e por
nossa filha.
— Seja quem for que as enviou para mim, eu agradeço,
porque são as coisas mais preciosas da minha vida — afirmou,
voltando-se a mim e à Graziela. — Não fiz nada para merecê-las,
1ª Edição
Miguel
irregular, tão rápido que nem sequer sabia como me levantaria após
tantos socos. Porém, eu precisava aturar todos eles para fazer parte
desta organização e chegar mais perto da minha meta: recuperar o
mim e da minha família. Meu pai deveria ter ajudado, afinal, tinha
muito dinheiro, mas não moveu um dedo.
Ódio. Eu repudiava meu pai, e, um dia, o faria pagar por tudo que
não fez.
com as regras, mas não se metia, pois estava fora de sua jurisdição.
Hector, líder dos Lobos Solitários. Todos pararam. Eu senti alívio por
o mato.
Luna
Mamãe estava doente havia algum tempo. Até fiz um chá para ela,
pensando que fosse melhorar. Preparei antes de meu pai chegar,
lembrava das palavras dele quando entrava lá. Não só das palavras,
de seu cinto de couro também, com o qual apanhei muitas vezes.
Suas ordens eram bem claras: “Não entre no meu quarto, ou será
castigada”.
sua dor seria o meu pai, caso a levasse em um hospital. Mas ele
Quando a via assim, eu sentia certo desprazer por papai; sabia que
era errado, por ser o meu pai e o capo, mas ele deveria ajudá-la,
― Tudo bem, meu amor, não fique triste com a minha situação ―
sussurrou, abatida.
ajudariam.
― Eu sei, meu bem. ― Sua voz saiu tão baixa e falha que quase
não ouvi.
dificuldade.
por ela. Não sabia que estava em casa, achei que tivesse saído.
ficando perto de mim, mas ele também não podia fazer muita coisa.
A dor estampava as feições de nós três. ― Mãe? ― Ele a ajudou a
se apoiar direito nos travesseiros e colocou a cabeça dela de lado
sua filha.
recebendo o soco desta vez. Tentei impedir; meu irmão não aceitou,
apertando o meu braço, enfatizando para que eu ficasse quieta.
― Não vou…
mim.
Um segundo depois, ouvi um cinto estalar, e Rafaelle gemer. O
mesmo método usado em mim e na Jade.
minhas lágrimas.
― Vá para o seu quarto e não saia de lá, nem diga nada do que
houve aqui à Jade ou ao Stefano. As coisas podem tomar outro
rumo.
― A mamãe… veja como ela está e diga a Rafaelle que lamento por
― Direi, mas não fique assim, nós somos fortes, treinados para
aguentar.
quando.
na minha cara.
Viver e ser criada na máfia era horrível; se não fosse pelos meus
irmãos, eu já teria fugido, embora não tivesse para onde ir, com a
minha idade. O mundo fora daquela casa também seria cruel.
Stefano entrou. Ele era quatro anos mais velho que eu, porém, um
homem formado, parecia ter mais de dezessete anos, e não doze.
suspiro duro.
demais…
gostaria disso.
Mal consegui escutar o que ele dizia; a dor me consumia. Quando
Não entendia como alguém podia ser cruel a ponto de privar seus
meus irmãos.
― Espere! ― Tentei segurar o seu braço, mas minha irmã foi mais
ele.
impedir.
Marco desferiu uma bofetada tão forte no rosto dela que cortou o
seu lábio.
de Jade.
― Eu sei, pequena. Sinto muito por não poder fazer nada. Ele
― Entendemos… ― Abracei-o.
tocará em vocês.
― É claro ― garantiu.
Luna
Faz oito anos desde que perdi a minha mãe. No aniversário de sua
morte, eu ia ao cemitério situado em nossa vasta propriedade; nele,
da sua lápide, olhando a linda foto dela. ― Sinto tanto sua falta.
gostaria disso, mas é tão difícil olhar para ele todos os dias, com
para ele, mas não consegui atirar. Não sabe o que senti: a
fundo, foi por minha causa também, matar não é da minha natureza.
Mesmo antes de você ter feito Jade e eu jurarmos nunca ir por esse
caminho, já sabia que não seria meu destino. Mas é tão difícil olhar
Sim, meus irmãos seguiam esta linha, mas o meu pai era
seu alcance.
Me sinto fraca…
― Você não é fraca ― respondeu alguém à minha frente.
Supus que estivesse distante para não me causar medo, afinal, ele
Franzi a testa.
de tempo.
em jogo, que eu também precisava dela, mas não teve jeito. A cada
dia, seu quadro se agravava. Só queria dormir, não ligava se era dia
irmãos.
Riu.
― O juiz Ávila não liga para ninguém. Quando minha irmã foi
levada, ele não moveu uma agulha para encontrá-la, tudo para não
sair na mídia. Apenas nos falou que ela morreu, após algum tempo.
― Oh, meu Deus! ― Estreitei os olhos. ― Mas seu pai não era
Sacudiu a cabeça.
― Não sou da máfia. Bem, não nessa época. Meu pai é só um juiz
com influência de quem está do lado errado da lei. Como eu era
novo demais para enfrentá-lo, jurei que assim que crescesse fugiria
irmãos.
― E seu pai, que fim levou? Liderando o cartel, acabou com ele? ―
Miguel podia, ao contrário de mim.
Não quero ser uma assassina, como Marco. E você, o que o impede
― Minha vingança será lenta. Quero vê-lo sofrer, perder toda sua
Virei para a lápide mais uma vez. Conversar com Miguel me ajudou
viver minha vida. Um dia, seria livre do meu pai, então faria o que
para sair.
Sorriu.
diariamente.
― Ela está bem? ― Esperava que sim. Miguel era muito legal, a
uma deveria ter o direito de ficar com vários homens somente por
― Não é culpa sua, você se tornou algo que não queria para
Ele olhou para a minha mão em seu bíceps e depois para mim.
Forçou um sorriso.
mãe, mas sei que logo ela ia… ― Estremeci. ― Naquela noite, fui
vê-la, estava tão abatida, o coração parecia falhar. Eu só queria
― Não foi sua culpa, Luna, não se atormente com isso ― pediu. ―
existia um homem como ele, tão afetuoso. Outro cara nem teria me
escutado ou se aberto comigo. A maioria dos seguranças nunca se
doloroso.
Luna
Certo tempo atrás, meu pai fez um dos seus homens estuprar a
minha irmã com os dedos. Eu não achava que ele chegaria a esse
ponto. Um pai deveria proteger seus filhos. A cada dia, o nojo por
Marco aumentava.
Por sorte, meu pai não estava mais conosco. Suas atitudes
Faz seis meses. Desde então, Jade andava assim, vazia. Ficou pior
― Não acredito! Gael tentou falar com você? Devia ter contado ao
ser só dele.
Jade ainda esperava por Luca, não o esquecera após todo esse
tempo. Minha irmã era daquelas que, quando ama, o faz para
sempre.
― Torço para que ele volte, e vocês sejam felizes. ― Acariciei sua
Aquiesceu.
maravilhoso.
Sage não disse mais nada acerca do assunto. Ele era assim, um
amigo leal.
silêncio.
Eu não queria pensar que sofreria caso Miguel não reciprocasse
meus sentimentos, então não dei continuidade à conversa.
ficava comigo vinte e quatro horas por dia, além de ser muito
observador.
Desci para o andar de baixo, onde Miguel nos esperava. Jade ficou
lá em cima, ajeitando algo. Aproveitei para falar com Miguel a sós.
― Cachinhos…
― Miguel, estou bem. Livre dele, posso fazer o que eu desejar neste
e esquiar na neve. Viver coisas que não fazia com meu pai.
― Sim, soube que Jade quer ir à China, acho bom você ir junto. ―
Sorri.
ainda gozava de grande saúde por aí, pois nossos irmãos não
Miguel tocou meu rosto, e minha pele formigou. Seu olhar intenso
olhos. Havia muito tempo queria beijá-lo, sentir seus lábios nos
meus. ― Luna…
Miguel
gostar dela, não como amiga, mas de outra forma. Queria passar os
Foi por essa razão que me dirigi à casa dela. Nesses últimos meses
causa.
Alessandro me pediu que as acompanhasse em seu passeio. Como
estava melhor.
quis eliminar o velho. Contudo, não tiraria isso de meu amigo e seus
Marco tinha reunido todos na igreja para oferecer Luna e Jade aos
Após, Luna começou a ter pesadelos. Para uma menina como ela,
era difícil presenciar tudo aquilo. Uma garota tão meiga e doce não
deveria ter nascido na máfia, e sim lá fora, em um mundo ao qual
um dia pertenci.
sua vida.
como se quisesse me beijar. Isso era tão errado que torceu minhas
entranhas. Estava a ponto de me afastar dela quando disse:
― Não, isso não pode acontecer. ― Minha voz saiu um pouco alta
ali na cozinha.
Porra! Como fui capaz de aceitar a amizade dela? Podia ter
A mágoa em seu rosto foi pior do que a tortura que passei para
― Por quê? Você não sente nada por mim? Vejo a forma que me
Não sabia que ela tinha notado. O desejo era intenso, mas não
princípios e valores.
horrível.
― Luna, você está livre do seu pai. Pode viajar, estudar, conhecer o
homem certo, de preferência alguém da sua idade, e não um cara
tão velho quanto o seu irmão. ― A dor me assolava. ― Lamento por
sua face e beijei sua testa. Ela permaneceu parada, como se não
conseguisse se mexer. ― Lamento por fazê-la sofrer, me sinto o pior
homem do mundo, mas é o certo. Um dia, verá que lhe fiz um favor.
Por Luna, faria tudo, inclusive me ausentar e torcer para que fosse
feliz com alguém que a protegesse e a amasse.
Luna
amor.
Fiquei braba, furiosa por ele partir meu coração. Ainda mais quando
ouvi Stefano comentar que Miguel e ele saíam para “pegar” várias
garotas.
Decidi não ser como Jade. Não pensaria o tempo todo naquele…
mulherengo.
crueldade.
Resolvi ficar com ele por enquanto, em vez de o levar para o abrigo
Não contei à Jade sobre o que houve com Miguel. Ela estava
Suspirou.
― Meu pai quer que eu me case… ― Soou amargo.
Pisquei.
Ele riu.
― Porque eles são quem são. Os outros são forçados por seus
pais. ― Respirou fundo e chegou mais perto. ― O que vou revelar
não pode sair daqui.
Assentiu.
― Eu sou gay ― murmurou, observando meu rosto surpreso. ―
Sacudi a cabeça.
Aparentou alívio.
― Luna, fui criado pelo meu pai para esconder o que sinto. Ele é
― Então quer que eu finja que estou a fim de você? Não posso
namorar quem não amo. ― No meu coração, havia somente Miguel.
― Não peço isso. Apenas diga que gosta de mim, mas eu não dou
bola, devido à sua idade. Basta eu falar ao meu pai que estou de
olho em você para ele sair do meu pé. Entraria em êxtase. E papai
não iria até seu irmão marcar um noivado, como faria caso se
tratasse de outra pessoa, pois sabe que Alessandro escolherá seu
garantiu.
considerar estranho você não ligar para mim na frente dos outros?
― Não, ele entende que é menor. Direi a ele que, quando ficar mais
velha, nos casaremos, e que só não posso tornar público agora pois
Arfei. Não era possível. Tantos meses esperando por ele… Miguel ia
à Itália, mas nunca em nossa casa.
Antes que comentasse algo, uma voz retumbou do meu lado direito:
Sage suspirou.
fugir dali. Ao mesmo tempo, queria e não queria falar com Miguel.
saudoso.
Sua barba parecia maior, não aparava havia dias. Evitei focar no
seu sorriso lindo.
anos para quando saía com o meu pai. Aquela distante, de quem
não liga muito para a pessoa à sua frente. Ao menos é isso que
― Preciso ter uma conversa com ele, Luna. ― Stefano estava sério.
Gelei.
um tempo.
cidade de Luca.
― Não. Enquanto falo com Sage, diga a ela. ― Lançou-me um olhar
Odiei largar Sage com os dois, mas não podia desrespeitar meu
irmão em público.
leve, ok?
― Denunciou todos?
― Digamos apenas que nenhum deles nunca mais fará mal a uma
Arregalei os olhos.
― Você os… matou? ― Não lidava bem com a morte. A meu ver,
somente Deus tinha tal direito. Porém, amava meus irmãos, então
ignorava essa parte. Afinal, éramos da máfia, um lado ruim sempre
Stefano suspirou.
― Luna, eles não machucaram só o Burnt, feriram até crianças. ―
calado. Não pude ler sua expressão para avaliar como se sentia.
de compostura.
Poderia retrucar, mas não contaria o que Miguel fez, partindo sem
olhar para trás. Agora vem querendo ser meu protetor? Convenceria
Alessandro a não envolver Miguel em minha segurança. Contudo,
Meu pai era tradicional para casas. Pretendia espiar pela porta da
cozinha para ver se Stefano não iria machucar Sage, mas Jade
Jade piscou.
Arregalou os olhos.
Tentei animá-la.
― Será? ― Ela teve tanta esperança após Luca sumir, mas, com o
Miguel
Um mês depois
melhor amigo.
Desde que a conheci, dois anos antes, eu notei algo de diferente
frente daquele imbecil. Claro, por Luna ser menor de idade, Sage
não a tocaria, assim como eu. A diferença era que, por ela, eu faria
qualquer coisa, inclusive dar a minha vida. Já Sage só a protegia
por obrigação.
Não deixaria outro cobiçar o que seria meu dentro de seis meses,
dois dias e cinco horas. Sim, eu contava cada segundo. Desejava
fachada.
estreitos. Fuzilei Sage. ― Por que não vaza? ― rosnei. Se ele não
Sage suspirou.
Agora saia!
― Você não manda aqui. ― Ela entrou na minha frente.
Luna. O que ela via nele? Sage não se importava, a tinha como um
trabalho e nada mais. Estranho, pois assegurou que se Luna o
quisesse quando fosse mais velha, ficariam juntos. Foi o que disse
ao Stefano. Na hora, quis esfolar esse fedelho. Só aconteceria por
cima do meu cadáver.
piscar.
costas da sua irmã, não pensei duas vezes. Se não voltasse a vê-la,
definharia.
meteria nisso.
― Se ele a amasse, não teria fodido duas putas ontem e outras nos
dias anteriores.
parecia ferida.
Nem pude responder, pois correu escada acima e bateu uma porta
com força. Queria ter dito que não ficava com ninguém havia mais
duas.
― Resolveu as coisas?
Suspirou.
― Sei que não. ― Sentou-se no sofá. ― Mas não posso aceitar a
sugestão da Jade.
Franzi a testa.
Todos nós, em algum momento, nos afastamos de algo bom por não
nos julgarmos merecedores. ― Era o que eu sentia em relação à
dos seus sonhos transou com outra. Talvez ela apenas o visse como
um cara legal e, por serem tão amigos, imaginasse que os
― Seja como for, Jade só sairá daqui quando Luca vier pedir a sua
mão. Não a usarei por uma aliança.
sua confiança.
Para ela, era difícil ver o que poderia dar errado na reunião que
mão dele. ― Só pense nisso, não posso mais viver sem Luca.
A expressão neutra de Alessandro desmoronou um pouco devido às
discussão envolvia as duas, ele não tinha controle dos seus atos.
Jade suspirou.
dará certo.
pessoas. Ele não conseguia dizer o que sentia, por isso, usava
gestos.
tão grande. Eu mesmo tentei e, agora, ali estava, a cada dia mais
apaixonado.
Luna
minha vida!
Daqueles que só vemos nos livros. Um que minha mãe não teve ao
duas vezes antes de partir sem ao menos ligar para me dizer como
que o viram, mas ele nunca foi me procurar. Não o deixaria invadir a
minha vida para depois me deixar. Não mesmo.
Na boate, estava Emília, sua irmã, pois ela era casada com
aparência de surfista.
Jade assoviou para o meu visual: uma saia justa e um top que
― Você pode beber, Jade, foi liberada pelos seus irmãos, mas a
Luna não ― falou de modo decisivo.
mim. Odiava suas ordens. Ele agia como se eu fosse a sua irmã
caçula.
Sorriu de modo sexy, deixando-me de pernas bambas por um
Depois disso, Jade iniciou uma conversa intensa sobre Luca, que a
espiava do andar de cima. Parece que uma das meninas ali, Sloane,
era amiga dele. Não acreditava que Luca houvesse ficado com ela,
mandão.
Era errado desejar a morte dos outros, mas o meu pai mereceu.
Marco levou tudo de mim. Mamãe morreu por sua culpa, sem
tão ferido que mal andava e, mesmo assim, meu pai não recorria a
abraçava: Miguel
― Por que não vão ciscar em outro lugar? ― rosnou aos caras. ―
Agora!
e fui me afastar, mas ele não permitiu. Sua mão em minha barriga
provocava sensações agradáveis em cada parte de mim, incluindo
Trinquei os dentes.
Seu dedo trilhou minha barriga nua. Eu me segurei para não gemer
encostassem.
― Você é doido? ― Ofeguei.
Sorriu.
Notei que Sage estava perto da minha irmã, mas não olhava para
nós, e sim para uma menina dançando na frente dele. Com certeza,
fingia para ninguém descobrir que era gay. Mas bem que poderia
― Você merece mais do que isso, Luna. Não foi feita para ser
isso, se deixar.
por partir ou por ser líder de um cartel. Qual garantia eu tinha de que
Sage, só fico muito puto vendo você desperdiçar tempo com alguém
que não a quer. ― Apontou para o salão. ― Sage nem se importou
― Eu imploro, escolha alguém que a ame. Pode não ser eu. Mas
não fique com um cara que a deixaria em casa para foder uma
esquerda.
gesto frustrado. ― Lamento por sua angústia. Jurava que você seria
feliz sem mim e seguiria seus sonhos.
mentir. Para algumas pessoas, seria natural, mas eu não era uma
delas.
― Na verdade, cansei de lutar contra o que sinto. Já pensava em
daquele moleque. Agora temo que não reste mais nada para mim aí
dentro. ― Indicou meu coração. ― Que, indo embora, tenha perdido
Havia dor em sua voz, o que amenizou a minha fúria. Estava ferida
por tudo que passei em sua ausência. Adoraria confirmar que não
― Por que lhe daria uma chance, se deixou claro que nunca me
― A diferença é que ele não lhe toca por temer o seu irmão. Quanto
a mim, não o faço por você ser menor de idade. Se me der uma
assimilar tudo.
― É só o que peço, Cachinhos. Vou lutar para que confie em mim
sua boca, e, por um segundo, voltei a imaginar como seria seu beijo.
― Miguel, eu…
me causava.
confusa e ressentida.
poderia dizer que não amava Sage, mas não quebraria a confiança
depositada em mim. Precisava discutir com meu amigo o que
faríamos.
Sorriu.
um cavalheiro.
mão.
― Espero que Alessandro não veja esta cena, ou você ficará sem
as mãos ― disse Luca para Miguel.
Luna
― Vocês ainda vão acabar juntos. Fico feliz por você, Miguel é um
― E quanto ao seu pai? Se ele souber que não estou a fim de você
― Não desista da sua felicidade por mim. Além disso, meu pai está
na Espanha, ficará distante por alguns meses. Até lá decidirei o que
noivos.
Franzi a testa.
segurança.
― Você parece gostar dele, mas saiba que, neste momento, não é a
rosnou antes:
dará certo.
Alguns de seus homens não aceitaram meu irmão como capo. Isso
seu amigo.
Ainda bem que, ultimamente, Miguel e eu estávamos nos dando
Igual aos meus irmãos. Eu sabia o que eles faziam, não era tão
boba como muitos imaginavam. Só decidi não ligar, por entender
que nunca tiveram escolha. Eu os amava e amaria para sempre.
Eu senti tanta falta dessa risada. Tão linda quanto você. ― Ouvia
adoração em sua voz.
de angústia:
― Não foi sua culpa, Miguel. Você era muito novo, não conseguiria
impedir. ― Assim como eu não pude proteger a minha mãe do meu
pai.
exaltaria.
Peguei a sua mão livre e apertei-a delicadamente. Era grossa e
calejada pelas lutas.
sua irmã. Por culpa dele, você entrou para esta vida de máfias e
cartéis ― rosnei. Miguel deveria estar lá fora, trabalhando em um
ramo seguro.
importassem comigo pelo que eu era, e não por minha família. Por
isso, estava adorando os Estados Unidos. As meninas do MC Fênix
― Luna, eu sei que pisei na bola por me afastar. Acreditei que era o
― Você não consegue mentir, Cachinhos. Sei que sente algo por
meus sentidos.
pracinha, perguntando:
minha?
― Miguel, aconteceu algo? ― Petrificado, ele encarava o nada, sem
A dor em seus olhos me deixou sem ar. Não, nada poderia ter
para casa.
― Meus irmãos…
― Emília e Emma…
Afastou-se bem na hora que uma batida soou na porta do meu lado.
concentrada em Miguel.
Sage: ― Leve-a…
auxiliou.
Sage suspirou.
Sorri.
magnetismo.
― Então me beijar seria assim tão ruim? ― Reconhecia que não era
Piscou, rindo.
meu irmão; ele chegou a levar um tiro por mim. Faria o mesmo por
ele, se pudesse.
Luna
policiais no bolso.
sondei, preocupada.
Miguel não pôde responder, pois um cara de cabelo ruivo se
aproximou, furioso.
aparecido aqui.
pedra. Estava acostumada com isso quanto aos meus irmãos, mas
frio.
― Não, você não vai se meter nisso, este caso é nosso ― rosnou o
― Sim, chefe.
cá.
Ele tentava controlar a ira contra quem matou seu amigo. Eu sabia
que essa pessoa logo teria o seu último dia na Terra. Evitei pensar
nisso.
concordava.
― Miguel…
aconteceu.
Era loira, de olhos negros, muito bonita. Não parecia ter chorado,
então o Tadeu não deveria ser nada dela.
O meu coração bateu forte no peito, assim que ela o tocou. Miguel
Ele a encarou com frieza e puxou sua mão de volta, sem cerimônia.
Em seguida, veio até mim e pegou a minha. Claro que Miguel não
era virgem e imaculado, com certeza ficou com várias garotas, mas
ver uma cena dessas apertava o meu coração.
― Está tudo bem? ― Não era só por isso que tudo doía, mas
também pelas recordações da perda de mamãe.
― Preciso ir, mas retorno para o velório. Juro que quem fez isso
pagará caro.
a Luna em casa e mais tarde volto para passar a noite com vocês
na igreja.
faria nada, mas não mudava a minha angústia. Ademais, não queria
abandoná-lo em seu período de luto.
Miguel.
linda.
Tara não disse nada, só franziu a testa para nós dois. Achei bom, a
pedir a ele para deixar a polícia cuidar disso, mas eu sabia que não
aceitaria.
Ficamos até quase uma da manhã na igreja, então ele avisou que
me levaria para dormir.
Antes que ele comentasse algo, nós fomos alvejados por tiros. Dois
veículos pararam diante de nós, me fazendo arfar de choque e
Miguel riu, letal, e pegou uma pistola. Sage também estava cercado.
chame reforços.
Ele sorriu.
juro.
Luna.
minha cabeça.
― Tenho que falar com eles, mas será rápido. Depois, eu a levarei
também.
― Depois lidarei com ele para descobrir quem está por trás desse
ataque.
Após se despedir dos seus amigos, Miguel me levou para uma casa
mais protegida que Fort Knox.
― Duvido, o erro foi dele, pois devia ter me alertado da chegada dos
continuar respirando.
Aquiesci.
mudar de ideia.
― Não mentirei para você, por mais que saiba o que quer ouvir. ―
uma cama de casal. Não vi outro cômodo, concluí que esse era o
único dormitório.
era tão fina e transparente que fiquei sem jeito de me imaginar nela
com Miguel ali comigo.
Pisquei, pigarreando.
― Miguel…
Saiu do quarto, parecendo temer suas ações, caso ficasse. Fui para
embaixo da água fria; carecia disso para que a minha pele parasse
de queimar.
Fiz o que pediu. Ele pôs uma mão em meu rosto e a outra no meu
quadril.
Era um gesto simples, mas o suficiente para deixar meu corpo todo
elétrico. ― Durma, querida. ― Abaixou-se e beijou a minha
Sorriu.
― Ficar longe de você foi a escolha mais difícil que já fiz. Nunca
Miguel
Tadeu foi o Death, meu inimigo mortal, o mesmo que queria ocupar
o meu lugar no cartel. Ele era irmão do antigo chefe, morto há
alguns anos.
Eu vinha adiando essa luta. Mas não teria mais como protelar o
fora.
― Sim, senhor.
Axel era filho de Barry (ex-chefe do MC Fênix), que foi morto por
governante.
Quase oito anos atrás, Axel era casado. Nesta união, teve um filho.
primeiro.
Pisquei.
― Rodins?
cerrados.
cartel de drogas.
― Vou com você ― Axel disse. Seguimos para o carro. ― Sei que
não é a melhor hora, mas tenho que saber o que queria me contar…
― começou.
Axel suspirou.
Sorri.
Conto com vocês para isso. Elas são um prato cheio para os
inimigos.
Hadassa o de Axel.
― Chefe…
nem piedade.
caminho.
ajudar?
― Eles pensam que estou na minha mãe. Não quero arranjar mais
forçar uma aliança com os Salvatores, mas não deu certo. No final,
Requeria cuidados.
― Vamos pegar esse miserável. Farei com que pague por tudo o
Eu devia ter ficado longe quando tive a chance. Nessa vida, ao nos
aproximarmos de pessoas, corríamos o risco de perdê-las. Agora eu
― Vou ficar aqui fora, caso ele passe por vocês. Não fugirá ― disse
Axel.
local.
dois tombaram.
homens.
Ele o examinou.
desgraçado.
Deixei Axel na clínica depois de saber que ficaria bem e fui para a
boate na qual o maldito estava.
alguns ferimentos.
Sorri também.
um brinde ao além. ― Enfim, ele pagou por tudo. Odeio não poder
trazer você de volta, mas tomarei conta de seu filho ― jurei.
Capítulo 10
Luna
Aproveitei esse tempo com meus irmãos focados nos seus inimigos
Pensar em perder Miguel era uma tortura. Sempre sonhei com esse
homem e, por um milagre, ele me queria também.
perto.
amigo na mão.
Mais cedo, Jade fora almoçar com o Luca. O namoro deles estava
Por meio de meu cunhado, soube que Miguel passaria ali para falar
com o Alessandro. Com meus irmãos ao redor, ficaria difícil de
matar as saudades.
Corri nos últimos degraus, sem ligar que estava com saltos, o que
foi um erro, pois pisei em falso e caí para a frente. Braços fortes me
pegaram.
fôlego.
Miguel.
Sage me segurou.
― Por que está vermelha, Luna? ― Escutei o meu irmão não muito
longe de mim.
― Desde quando são tão próximos? ― Dos meus irmãos, ele era o
mais protetor.
Alessandro se irritou.
quisessem.
― Nem você, por quem ela tem uma queda? ― Stefano o fuzilava.
― Queda?
tenho.
― Sobre o quê?
― Não gostei de a ouvir dizer que não tem um namorado. Claro,
não falaria na frente dos seus irmãos, mas quero esclarecer o que
somos.
Arfei.
Fiquei embasbacada.
― Vai ficar com elas? Não gosto de gente infiel, meu pai era.
tortura não poder beijá-la e gritar aos quatro cantos que é toda
Miguel
Luna
Luna
Luna
Era para termos ido à casa da irmã do Miguel na noite anterior, mas
resolvemos ficar ali no clube de motoqueiros mesmo. Entendi que
ele não queria correr o risco de alguém me levar.
Mais tarde, nós iríamos para a casa do capo Salvatore. Eu nem
acreditava que os problemas com os homens que traíram meus
irmãos estivessem passando.
Senti um braço à minha volta, um toque que eu conhecia muito bem.
Miguel dormira comigo. Admirei o seu belo rosto com barba por
fazer; os lábios que, algumas horas antes, eu havia provado. Foi a
melhor noite da minha vida.
Miguel era tudo com que sonhei. Fazia tempo que não me sentia tão
feliz. Fui idiota por suspeitar de uma traição. Ao menos eu não
exagerei tanto. Se fosse Jade, teria massacrado o infeliz.
Ele nunca me enganaria. Mas nosso relacionamento ainda era novo,
tínhamos muitas coisas para descobrir um sobre o outro ― da
minha parte, principalmente a história do Sage. Não gostava de
guardar segredos do meu namorado. Se exigia sinceridade dele,
então eu precisava fazer o mesmo.
Admirei a sua face serena enquanto dormia. Nem parecia um cara
capaz de matar, um chefe de uma organização perigosa.
― Acho que amo você ― sussurrei. Poderia lhe dizer quando
acordasse, mas queria que ele falasse primeiro.
Alessandro dizia que nunca ia namorar, pois seria incapaz de amar.
Seria o Miguel assim também? Esperava que não.
Ele me disse que eu era tudo para ele e que morreria por mim. Isso
deveria significar alguma coisa, não é? Ouvir essas palavras me
encheria de felicidade.
Respirei fundo e me levantei, pois precisava falar com o Sage antes
que Miguel acordasse. Tínhamos de resolver o nosso assunto
pendente.
Eu o encontrei na cozinha, tomando café. Estava calmo ali, diferente
do fervo da noite passada, embora ainda pudesse ver alguns copos
sujos na pia. Não enxerguei mais ninguém; decerto o pessoal do
Miguel estava lá fora e, os motoqueiros, dormindo.
Sorriu, tão logo entrei.
― Oi. Eu fiz café. ― Foi até um armário, pegou uma xícara e a
entregou para mim. ― Resolveram tudo ontem?
Notei Sage com um curativo no queixo.
― O que foi isso? ― Eu me servi e tomei um gole. Em seguida,
indiquei o lugar do machucado. Então pisquei. ― Miguel!
Ele riu.
― Sim, mas eu mereci por ter falado demais, devia ter deixado
quieto. ― Sentou-se na cadeira, meio torto. ― Fiquei com raiva
quando vi e não pensei muito bem. Relaxe, Luna. Miguel fez o certo.
Eu não posso me meter no relacionamento de vocês dois. ― Havia
algo sombrio em seus olhos, diferente de antes. ― Eu o alertei de
que, da próxima vez, haverá retorno.
― Lamento… Espero que não esteja com muitas dores. Vou
conversar com Miguel, ele não pode sair por aí machucando meus
amigos.
Sorriu.
― Eu sei que gosta de mim, mas fique tranquila… ― Tomou mais
um gole do café.
― Claro que gosto ― afirmei e me sentei na cadeira diante dele.
Ouvi passos de alguém se aproximando. Miguel entrou, veio até
mim e tocou meu rosto por um segundo, como se estivesse
decidindo algo.
― Por que bateu em Sage? Como pôde? ― Acusei, agora em pé.
― Ele mereceu por se meter no que não era da sua conta ―
rosnou, se afastando de mim.
― Sage só se preocupa comigo.
Isso o deixou mais furioso.
― Luna, conversaremos depois. Preciso ir.
Já saía da cozinha, mas peguei sua mão, e Miguel estremeceu.
― Aconteceu algo sério?
― Nada com que se preocupar, só trabalho. ― Beijou minha
bochecha e fuzilou Sage. ― Knife está chegando com Flame.
Proteja Luna; do contrário, mato os três.
― Miguel…
― Ligarei assim que puder. ― Acariciou meu rosto mais uma vez e
saiu.
Fiquei parada, sem saber o que houve. Ele parecia estranho.
― Não esquente a cabeça, Luna. Seu namorado é um chefe, terá
muitos trabalhos para os quais precisará sair às pressas.
Afastei os pensamentos ruins e mudei de assunto:
― Queria falar com você… ― comecei, sem saber o que dizer.
Ele suspirou e encostou-se na cadeira com um olhar distante e
triste.
― Sei o que vai falar ― murmurou. ― Não pode esconder o meu
segredo dele.
Encolhi os ombros.
― Miguel acha que precisa lutar um pouco mais para ser o único em
meu coração, que já é só dele…
― Você é boa. Miguel tem sorte. ― Soou sincero. ― Mas eu não
posso revelar a ele sobre mim… Miguel é o melhor amigo do
Alessandro, chefe meu e de papai. Se a informação vazar…
― Não vai. ― Precisava acreditar nisso. ― Posso revelar que eu
nunca estive apaixonada por você e falei aquilo só para provocá-lo,
não sei. Mas aí tem o seu pai.
― Como eu disse, ele está viajando a negócios, ficará lá por um
tempo. Essa é uma ótima ideia, assim não esconderá nada de
Miguel, exceto um segredo que não é seu. ― Depositou a caneca
na mesa. ― Agradeço por me ajudar, Luna.
Sorri de modo gentil.
― Amigos servem para isso. ― Estava contente com a perspectiva
de contar ao Miguel uma parte do segredo. Odiava que pensasse
que eu ainda nutria sentimentos por Sage.
― Devia dizer a ele o que realmente sente. ― Levantou-se e foi
lavar a sua caneca.
Aquiesci.
― Farei isso, assim que voltar. Mas não antes de retomar a briga
por ele ter batido em você. ― Caminhei até ele e toquei o seu
ombro, fazendo-o se encolher. Tirei a minha mão. ― Desculpe.
― Tudo ficará bem, Luna.
Rumei ao andar de cima e entrei no quarto onde passei a noite com
Miguel. Estava a ponto de ligar para Jade, no entanto, ouvi um bipe
de mensagem: “Luna, esqueci de mencionar, não sei quando
retornarei. Você ficará com a minha irmã até lá. Posso estar fora de
área, por isso talvez não atenda caso ligue”.
Tentei falar com ele para entender melhor essa história, porém, não
atendeu.
Se fosse um problema envolvendo a Jade e os meus irmãos, Sage
e Miguel teriam dito. Pretendia ligar para ela, mas o meu telefone
tocou de novo.
― Alô? ― Não conferi quem era, torcendo para ser o Miguel.
― Oi, Luna, sou eu, a Emília. Meu irmão me avisou que você
passará uns dias comigo.
― Aconteceu alguma coisa? Ele saiu rápido, sem explicar nada.
― Há um problema no México. Eu só sei que não é com a sua
família, então pode ficar tranquila. Logo aparecerei aí. Todo mundo
no clube é legal, ok? Não se preocupe.
― Certo. Vou esperar por você ― respondi e desliguei, ansiosa.
Enviei a Miguel: “Por favor, me ligue quando puder, estou
preocupada”.
Ele respondeu de imediato: “Estou bem, Cachinhos, são só
negócios. Fique calma. Não posso perder a única luz em meio à
minha escuridão”.
A saudade seria ruim demais. Torci para que resolvesse o tal
problema que o deixou tão desnorteado e voltasse logo.
Como não queria ficar sozinha ali, eu desci a escada. O lugar já não
estava vazio como antes, e sim lotado de homens tatuados. Alguns
jogando sinuca, outros sentados conversando, e uns em um bar
bebendo. Não vi nenhuma mulher.
Não tive medo, pois Miguel jamais me deixaria se imaginasse que
eu correria perigo. Os caras só eram fortes e meio assustadores,
mas também bonitos. Entretanto, só uma pessoa me tocava fundo:
Miguel.
Parei perto da escada, sem conseguir ir adiante. Um homem alto e
de olhos claros sorriu assim que me notou.
― Olá, beleza rara.
Acho que tinha a minha idade ou no máximo vinte e poucos anos.
― Desencane, Tripper, essa está fora dos limites ― disse um cara
de olhos verdes. Virou-se para mim com um sorriso amigável. ―
Sinta-se em casa.
Um barbudo me fitou. Havia algo em seus olhos claros, um abismo
que tentava esconder, contudo, eu era boa em identificar esse tipo
de coisa, convivendo com meus irmãos.
― Sou Knife. Eu e um amigo meu ficaremos responsáveis por você
até o Miguel voltar. ― Brincou: ― Ele não disse que era tão linda.
― Sim, porque não é da sua conta ― respondeu uma voz grossa do
meu lado direito, me fazendo pular. Vinha de um homem careca e
cheio de tatuagens. ― Sou Flame, não precisa nos temer. Eu estou
aqui para protegê-la, assim como Knife ― disse, sério. Então saiu
da sala, mas o seu amigo ficou.
Sentia-me nervosa com tantos caras letais ao meu redor, mesmo
que parecessem relaxados.
― Quem você acha mais mortal: o capo Destruttore ou o Miguel? ―
perguntou Tripper com um sorriso meigo, diferente do que me deu
antes; certamente temia meu namorado ou Alessandro. ― Fiz uma
aposta com um amigo meu. Ele garantiu que você votaria no Miguel,
mas estou em dúvida. Os dois são excelentes em torturar pessoas
e…
Ele gemeu com um barbudo socando a sua barriga.
― Pare de falar besteira, Tripper! A garota está prestes a vomitar!
Olhe a cor dela, parece verde.
Eu estava mesmo enjoada, visualizando meus irmãos e meu amado
matando pessoas.
Um homem alto falou para outro do seu lado:
― Por que ela se importaria? É irmã do capo ghiaccio, do executor
e de Stefano, que também não fica para trás. E agora tem o
Miguel…
Queria sair dali. Eu sabia o que meus irmãos eram, mas odiava
pensar nisso. De qualquer maneira, eu os amava.
― Somos melhores do que eles ― falou um dos MCs com um
sorriso que me lembrava tubarões.
― Sério? ― Outro sacudiu a cabeça; este tinha cabelos castanhos.
― Não ouviu o que fizeram com o Gael, um dos ratos entre seus
homens? O cara sofreu por uma noite inteira, sendo desmembrando
parte por parte. E o obrigaram a comer o próprio pau e as bolas.
Desconheço o motivo, mas a coisa foi sinistra até para mim.
O som que saiu da minha garganta fez com que olhassem para
mim. Pareciam ter se esquecido da minha presença. Obriguei os
meus pés a se moverem e corri à porta da frente. Mal cheguei à
grama, vomitei o café que tomei cedo.
Ouvir cada detalhe da morte de Gael me deu arrepios. Sim, ele
merecia um péssimo final, entretanto, eu temia pela sanidade dos
meus irmãos. Isso tudo era culpa do meu pai. Mamãe sofreu com o
que eles se tornariam, mas ela não pôde fazer nada. Ninguém
podia. A vida era injusta demais.
― Luna? O que foi? ― Sage perguntou.
Não levantei a cabeça, porque fiquei com medo de vomitar de novo.
― Merda! Eu sinto muito, garota, estou acostumado a falar dessas
coisas, não pensei que acharia ruim.
― Que porra você disse? ― rosnou Sage.
Conforme Miguel me falou certa vez, meu segurança era sombrio
quando precisava ser. Nunca o vira assim. A voz de Emília me
trouxe ao presente:
― Idiotas! Eu não acredito que contaram bobagens à Luna. ― Senti
seus braços à minha volta. ― Ignoraram o recado do meu irmão?
Que recado seria esse? Miguel teve uma noite cheia, depois de eu
dormir.
― Não deveria ter dito nada. Desculpe-me, Luna ― o cara frisou
novamente. ― Sou Max. Não foi minha intenção assustá-la.
― Venha comigo. ― Emília me puxou para o quarto que ocupei com
Miguel. Falava consigo mesma: ― Esses estúpidos acham que todo
mundo da máfia é igual. Ninguém é obrigado a ter o estômago forte.
Lavei a minha face.
― Preciso limpar a sujeira que fiz no pátio ― sussurrei, enxugando
o rosto.
― Max e os outros cuidarão disso.
― Eu…
― Não se preocupe, Luna, é perfeitamente normal ser sensível ―
disse, sentando na cama. ― Mas algumas pessoas merecem a
morte ou coisa pior.
― Sabe o que o Gael fez? ― sondei.
― Edward me contou brevemente. ― Emília estava distante, com o
pensamento longe, com certeza focado em sua história.
Não toquei no assunto, afinal, odiaria lhe trazer lembranças ruins.
Um dia, se quisesse se abrir comigo, ela o faria.
― Eu sei…
― Não sinta dó, não de gente assim. Não se entristeça pelas
atitudes de seus irmãos. ― Tocou minha mão.
― Entendo, mas me culpo por concordar que gente assim mereça o
pior. Mamãe sempre dizia que não devemos pagar o mal com o mal.
― Olhei para baixo enquanto falava. ― Ela não queria isso para
nós.
― Sua mãe parece ter sido uma pessoa muito boa ― disse. ― A
minha verdadeira também era; me amava tanto que adoeceu depois
que eu fui roubada. Queria tê-la conhecido.
― Miguel a ama muito, vejo a dor quando fala sobre isso. ― Cerrei
os punhos. ― Seu pai é um monstro por não ter feito nada para
encontrar você.
― É… Miguel lidará com ele. Não sei como e, no fundo, não dou a
mínima. ― Suspirou.
― Não tenho o direito de dizer isso, mas tente conversar com o
Miguel. Ele se sente culpado por demorar a encontrá-la. ― Fiquei
de pé. ― Não gosto que ele sofra.
Piscou.
― Culpado? Mas isso não é culpa dele, e sim do meu pai e de
quem me machucou. Vou falar com meu irmão. ― Ergueu-se
também. ― Já melhorou? Podemos descer e tomar café da manhã.
Assenti, embora não estivesse com fome.
― Só vou ligar para Jade primeiro, preciso saber como ela está.
Não nos falamos direito desde a festa.
Ela concordou e ia saindo, mas eu a chamei.
― Sim? ― Virou a cabeça em minha direção.
― Obrigada pela ajuda.
― Seremos uma família em breve, ao que tudo indica, então não
precisa agradecer. ― Sorriu e fechou a porta.
Antes de ligar para a Jade, mandei uma mensagem ao Miguel: “Já
estou sentindo a sua falta, não vejo a hora de voltar”. Cliquei em
“enviar”, não sabendo quando ele poderia ler; esperava que logo.
― Oi. Como está? Pretendia ligar, mas meu telefone ficou no hotel
ontem. O pessoal do Luca acabou de trazê-lo para mim ― começou
assim que atendeu.
― Bem, e você? Não fui até aí, pois achei que precisava de espaço
com o seu noivo. Soube do ataque e que estava bem, mas como se
sente realmente? Resolveu os problemas?
Ela riu.
― Sim, estou mais do que bem. ― Parecia vibrante. ― Eu me sinto
nas nuvens.
― Ficaram… juntos? ― Espantei-me. Meus irmãos surtariam se
descobrissem.
― Não chegou a isso, mas fizemos coisas ― revelou, em júbilo.
Conversamos por quase meia hora. Jade estava feliz com o Luca.
Eu desejei falar sobre o Miguel, mas ele me pedira segredo por
enquanto, até o casamento dela.
Capítulo 15
Miguel
Alguns dias atrás, acordara em êxtase por ter dormido com a Luna;
mesmo sem fazermos nada, foi a melhor noite de todos os tempos.
Após não tê-la visto no quarto na manhã seguinte, eu fui procurá-la
e ouvi as palavras que me atormentavam desde então: ela dizendo
que gostava do Sage. Pensar nisso corroía tudo em mim.
Jurei que estávamos indo bem, até nos beijamos, em um momento
perfeito. Supus que ela nutrisse o mesmo sentimento que eu…
Obviamente não fiz o suficiente para assegurar que somente eu
permanecesse no seu coração.
Para não pensar nisso, eu foquei na minha descoberta recente.
Logo após acordar naquele dia, eu recebi uma ligação de um
presidiário do México que conhecia Barry, o pai do Axel. Segundo o
homem, o maldito do Barry tinha um lance com a ex de Axel. E esse
cara dispunha de mais informações. Eu poderia consegui-las sem a
ajuda de meu amigo, mas se não o envolvesse, ele não me
perdoaria.
Antes disso, eu mandara o meu infiltrado encontrar um dos homens
do Death e eliminá-lo, pois, o verme andava desconfiado; após,
deveria levá-lo ao local combinado. Death tinha gente na polícia,
então eu seria preso. Resolveria dois problemas de uma só vez:
meu inimigo acharia que fui eu quem assassinou seu homem e não
suspeitaria do meu espião; além disso, na cadeia, Axel poderia
conversar com meu mais novo informante, aquele que sabia algo de
Barry e, provavelmente, do filho de Axel também.
Tudo ocorreu conforme o plano. O policial mancomunado com
Death nos levou à delegacia, achando que a captura fora bem-
sucedida. Mas o juiz Thompson, nosso aliado, nos tirou de lá após
Axel falar com o preso.
O sujeito revelou tudo: Maitê era, de fato, uma prostituta contratada
por Barry; ele pretendia motivar meu amigo a desistir de colocá-lo
na cadeia (Axel trabalhava como policial, na época). Mas ela acabou
se apaixonando pelo Axel, logo, se negou a ter futuras relações com
seu chefe. Isso aconteceu naquela fatídica noite. Após, a criança foi
roubada da mãe. Foi esse tal presidiário quem sequestrou o bebê,
que Barry pensava ser seu próprio filho. Infelizmente, sim, agora
havia esse risco: o garoto podia ser irmão de Axel. Entretanto, ele o
amava e continuaria amando. Sofria por não saber onde o menino
de quase oito anos estava.
Ah, e Maitê não se matou: foi assassinada por Barry. Isso explicava
a razão de todos os envolvidos no “acidente” terem sido mortos.
Fazia quatro dias que procurávamos pelo menino em internatos. Era
como achar uma agulha no palheiro. Mas, graças à porra do Céu,
ele estava vivo. Isso bastava.
Sabia bem o que passei na época em que tentava encontrar a
minha irmã; cada pista frustrada arrancava um pedaço de mim. O
desânimo, a dor, o medo… Agora ela estava feliz com o seu marido
e a Emma.
Convenci Axel de que seguir assim, sem um rumo, seria inútil. Era
melhor colocarmos as pessoas certas nisso. Então ele foi embora
para o clube do MC Fênix em Chicago, cidade aonde a sua
namorada tinha ido para ficar com o tio. Isso o deixou louco.
Hadassa teve sua família inteira dizimada por culpa do pai dela. A
menina, por muito tempo, desenvolveu mutismo seletivo; não falava
com ninguém além da avó, que morrera recentemente em um
ataque dos homens de Escobar, bem no período em que Axel foi
esfaqueado. E esse tio de Hadassa era outro egoísta, interessado
apenas em dinheiro, por isso insistia à sobrinha que vivesse com
ele. Um político ganancioso e, por coincidência, pai de Nasx, do MC
Fênix, e Vlad, um assassino de aluguel. Axel desconhecia essa
ligação ao se envolver com a menina.
Esperava que tudo se resolvesse para o meu amigo, e eu ia ajudá-
lo. Mas, naquele instante, eu precisava focar em uma ruiva que
assombrou os meus dias durante todo esse tempo em que me
mantive longe.
Era para eu ter voltado no dia seguinte à nossa saída da cadeia,
mas não consegui deixar o Axel sozinho, sentindo uma dor
imensurável.
E a distância de Luna me ajudou a controlar a raiva de Sage por ter
descoberto que ela ainda gostava do segurança. A menina
precisava decidir com quem realmente desejava ficar. Ao menos
Sage servia para protegê-la, junto a Knife e Flame.
Eu estava chegando à propriedade da minha irmã para rever as
mulheres que tanto amava. O meu telefone tocou. Até pensei que
fosse Luna, porém, ela costumava mandar mensagens. Toda vez
que eu as lia, sentia-me prestes a receber uma sentença, como se
fosse revelar por ali seu amor em relação a Sage. Preferia mil vezes
enfrentar vários bandidos mano a mano. No final, as mensagens
sempre traziam uma mensagem carinhosa, indicando que Luna
sentia saudade. Queria entendê-la… Conversávamos com
frequência, mas nunca sobre o que me atormentava.
― Miguel… ― Alessandro ficou em silêncio um segundo, parecia
estar se locomovendo. Franzi a testa, preocupado pelo seu tom de
voz. ― Eu não quero que perca a Luna de suas vistas. ― Não havia
lhe contado que estava no México. ― Ontem à noite, Jade foi
atacada aqui em Dallas.
― Atacada? ― Gelei.
― Os malditos Rodins estão fechando o cerco, atingindo as duas.
― Precisa acabar com isso, Alessandro ― falei. ― Tomarei conta
dela.
Seria difícil ficar ao lado de Luna se ela gostasse mesmo daquele
moleque. Mas eu aguentaria firme.
― Resolverei logo a situação. ― Desligou.
Subi de dois em dois os degraus na entrada da casa da minha irmã.
Daemon abriu a porta.
― Aconteceu algo? Parece cansado ― observou, avaliando o meu
rosto.
Não podia contar sobre o Axel, era algo íntimo dele. O cara não
deixava muitas pessoas entrarem, mas era um homem fiel aos seus.
Merecia tudo de bom.
― Não, só as coisas de sempre, os malditos Rodins. ― Suspirei.
― Se precisar, estamos aqui. Todos os irmãos.
― Eu sei, obrigado. E você, aonde vai?
Passei por ele, abri um dos armários e peguei um copo para tomar
suco. Não comi muito bem nos últimos dias. Não tinha nada a ver
com a falta de tempo, e sim com a ruivinha linda no andar de cima.
Sage desceu a escada, me avaliando, sem falar nada. Pensei que
fosse me dedurar ao Alessandro, contar que não levei Luna à
mansão do Matteo e, ainda por cima, fiquei uns dias fora, mas não
aconteceu.
Não queria ver esse cara. Dada a raiva em meu peito, sentia
vontade de matá-lo, mas jamais tocaria em algo que Luna amasse.
Os socos que dei nele não foram o suficiente. Entendi o porquê de
Sage revelar a ela que me viu com outra: queria que nos
separássemos, assim teria o caminho livre.
A forma como me beijou mostrava que Luna gostava de mim
também. Então ela amava nós dois? Almejava ocupar o seu coração
completamente, não suportava a ideia de mais alguém experimentar
seu gosto de pêssego.
― O pai do Nasx está levando Hadassa ao clube. Vou para lá ―
Daemon falou antes que eu fizesse uma besteira.
Ele saiu. Em seguida, eu rumei à escada. Sage avisou:
― Ela não anda comendo bem, está triste. Eu pude ver em seus
olhos que sentiu a sua falta.
Virei-me para o cara e assenti. Era o melhor que conseguiria fazer
naquele momento. Depois, continuei subindo.
Por que ela ficaria triste, se o Sage estava ali? Porra! Eu enfrentei a
morte, a dor, a tortura e tudo que foi me dado, então por qual motivo
temia uma simples frase de Luna?
Encarei a cama onde ela estava adormecida com os cabelos
espalhados nos lençóis. Tão linda e serena, uma obra de arte
esculpida pelos anjos.
Deixei o telefone na mesinha e tirei a minha camisa e o meu cinto.
Deitei na cama ao seu lado, esgotado pelas noites sem dormir.
Enrolei um de seus cachinhos em meu dedo, inalando o aroma que
tanto amava. Sim, eu amava essa mulher perdidamente, não podia
ficar longe dela.
Toquei em seu coração, antes calmo, mas que, de repente,
acelerou.
― Queria ser o único morador daqui. ― Mirei o seu rosto agora
acordado. Encarou-me com alívio e alguma confusão. Decidi
esclarecer as coisas, escorando-me na cama enquanto ela se
sentava. ― Naquela manhã, eu despertei e vi que você não estava
no quarto. Encontrei-a na cozinha, dizendo que gosta de Sage… ―
Minha voz saiu mais dura do que eu planejava. ― Fiquei furioso,
admito. Preferi me ausentar naquele momento ou correria o risco de
machucá-lo.
Ela piscou, chocada.
― Você deveria ter me dito o que se passava ― apontou, tocando
na minha perna. ― Nos falamos ao telefone e por mensagem, mas
nenhuma vez mencionou algo assim.
― Eu sei. Amo uma garota mais nova, a qual tem sentimentos pelo
segurança que, por sinal, é da sua idade ― murmurei. ― Eu me
sinto à beira de um precipício. O amor é um porre quando não é
mútuo. ― Coloquei os meus cotovelos nos joelhos e escondi o rosto
nas mãos. ― Quando a vejo triste, me dá vontade de assassinar
todos, eu incluso. Não posso continuar assim, preciso saber o que
sente por mim ou enlouquecerei. Eu quero ser o único em seu
coração…
― Quem disse que não o amo? Amei-o desde a primeira vez que o
vi na casa do meu pai. Você usava jeans e jaqueta, estava
cabeludo, até perguntei “Por que não corta?”. Alguns dias depois, eu
voltei a vê-lo, e seu cabelo estava curto. ― Tirou minhas mãos do
meu rosto, delicada.
― Seu sorriso lindo e meigo me motivou a cortar.
Piscou e suspirou.
― Se tivesse me dito tudo, eu haveria lhe falado o que eu sinto por
você antes da sua viagem. ― Mordeu os lábios. ― Preciso lhe
contar uma coisa, espero que entenda e aceite.
Franzi a testa.
― O que é…? ― Estaquei. ― Por favor, me diga que não o deixou
tocá-la.
Luna fez uma careta e se levantou.
― Acha mesmo que eu aceitaria isso? ― Sacudiu a cabeça. ―
Enfim, deixei essa história ir longe demais. Falei que estava
apaixonada pelo Sage apenas para que você visse que eu podia
seguir em frente, que já não o amava da forma que afirmei um dia.
― Olhou-me de lado, corando. Tinha algo na sua expressão que
não pude ler.
― Então nunca se interessou por ele? ― Ri. ― Cachinhos, eu não
sabia dessa sua habilidade. Morri mil mortes pensando que você
amava outro.
― Desculpe. Não há mais ninguém em meu coração e na minha
mente.
― Lamento por sumir de repente. Se ficasse, Sage estaria a sete
palmos do chão. Não fiz nada por respeito a você, pois nutre
sentimentos por ele…
― …como amigo ― completou, convicta.
― Eu sei agora. ― Sorri. ― Também foi por respeito ao Alessandro.
Afinal, é um dos seus ali.
― O que precisou resolver de tão urgente?
― Recebi uma notícia sobre o filho de Axel e tive que ir checá-la.
― O menino está vivo? ― inquiriu, esperançosa.
― Sim, mas não sabemos aonde. ― Suspirei. ― Espero que Axel o
encontre…
― Ele vai. ― Avaliou-me. ― Você parece prestes a desmaiar.
― Sem você, perco o sono. ― Estendi a mão para ela. ― Pretende
me perdoar por pisar na bola? Posso me ajoelhar, se for necessário.
Revirou os olhos, risonha.
― Não precisa. Eu também sou culpada por não contar a verdade.
― Aproximou-se.
― Luna… ― O hálito estonteante banhou a minha face.
Seu mero toque me arrebatava. Não se assemelhava ao que tive
com qualquer outra.
― Shhh. ― Beijou as minhas bochechas, sem tirar os olhos dos
meus. ― Apenas por um segundo… ― Sempre tive forças para sair
de situações indesejadas e lutar pelo que acreditava, mas Luna me
dominava com facilidade. ― Amo você, Miguel ― declarou,
depositando um beijo de leve nos meus lábios.
Peguei-a pela cintura e a deitei na cama, pairando em cima do seu
corpo frágil.
― Tão tentadora, cada parte de mim grita para eu prosseguir. ―
Trilhei um caminho de beijos em sua face corada. ― Eu me sinto o
homem mais feliz do universo com você na minha vida.
― Podemos sim continuar, você mais do que tem meu
consentimento…
Mesmo sem desejar, me afastei, desviando do assunto.
― Sejamos sinceros de agora em diante. Não esconderei nada de
você, e espero que faça o mesmo.
Ela suspirou.
― Miguel…
― Luna, querida, aos poucos chegaremos lá. ― Dei um selinho
nela. ― E eu preciso que ligue para a sua irmã enquanto tomo um
banho. Depois, quero me deitar com você em meus braços. ―
Desejava sentir o seu cheiro maravilhoso.
― Jade? Liguei ontem para ela…
― Os Rodins atacaram a casa em que ela estava em Dallas…
Luna ofegou.
― Oh, meu Deus! ― Sua voz subiu duas oitavas. ― Por que não
me avisaram?
Fui em direção ao banheiro.
― Ela está bem, mas eu não sairei do seu lado. Os Rodins
conhecem a fraqueza do seu irmão. Não vou deixar que coloquem
as mãos em você, assim como Luca fará com a Jade.
Ela pegou seu celular.
― Jade? Soube do que aconteceu, por que não me disse?
Deixei que conversassem a sós.
Fraqueza é uma coisa perigosa. As irmãs Morellis representavam o
calcanhar de Aquiles do capo Destruttore, e Luna, em especial, o
meu. Esperava que ninguém nunca soubesse disso, ou eu estaria
ferrado.
Capítulo 16
Luna
Luna
Meses depois
Luna
Luna
Eu me sentia nas nuvens com Miguel. Isso quando o meu irmão não
nos atrapalhava. Queria dizer aos outros, mas a proteção triplicaria.
Andava focada em meus estudos e em fazer amizades, então quase
me esqueci dos meus problemas. No entanto, não demorou para um
deles estourar em minhas mãos.
― Oi. ― Chequei a sala. Sage estava de pé, e Alessandro se
sentava em sua cadeira.
― Aconteceu alguma coisa? ― Franzi a testa, evitando demonstrar
nervosismo.
― Sente-se ― disse meu irmão.
Obedeci.
― Sage veio aqui para pedir a sua mão em namoro ― Alessandro
foi direto ao ponto.
Engasguei.
― O quê? ― quase gritei. Olhei para o Sage, tentando assimilar o
que acabara de ouvir. Talvez dispusesse de um plano na manga,
mas não teve tempo de me dizer.
Fingir uma queda por ele era uma coisa, mas ser sua namorada?
Isso foi longe demais. Eu precisava consertar a situação.
― Não posso aceitar ― falei a verdade, virando para o meu irmão.
― Você disse que eu poderia escolher com quem quisesse namorar
e me casar, e esta pessoa não é o Sage.
Alessandro assentiu, dirigindo-se ao meu segurança.
― Não forçaria Luna a fazer algo que não queira.
Sage não retrucou.
― Entendo, chefe.
Alessandro o avaliou. Em seguida, se levantou, de frente para Sage.
O meu amigo ficou tenso, mas não se afastou.
― Caras rejeitados fazem besteiras, às vezes. Você não parece ser
esse tipo de pessoa, mas se ao menos sonhar em tocar na minha
irmã, o que houve com Gael será fichinha perto do que acontecerá
com você.
― Luna e eu somos amigos. Independentemente do que sinto, eu a
protegerei, como venho fazendo esses anos todos. Sua segurança é
minha prioridade ― assegurou.
― Ótimo. Agora nos deixe a sós. ― Alessandro voltou a se sentar.
― Sim, senhor. ― Sage saiu, enquanto eu me virava para o capo.
― Soube que anda vendo muito o Miguel… ― começou.
Pisquei com a súbita mudança de assunto.
― Sim, ele vem me visitar, de vez em quando ― confessei. Após,
soltei a notícia: ― Na verdade, eu gosto dele.
― O que está acontecendo entre vocês? ― Estreitou os olhos.
― Miguel me respeita. ― Não era mentira; transarmos antes do
casamento não mudava este fato.
― Tudo bem. Conversarei com ele, assim que chegar.
Suspirei. Miguel estava no México. Aparecia duas vezes por
semana. Sabia que era cansativo, falamos sobre isso, mas não se
queixou. “Você vale qualquer sacrifício”, insistiu.
Eu iria até ele, se pudesse, mas os meus irmãos não permitiriam,
nem o Miguel. Havia um inimigo seu que não deveria descobrir
nosso namoro.
Teria que ligar para ele e avisar o que ouviria do meu irmão.
― Não seja duro. ― Fui até Alessandro e o abracei.
― Miguel e eu somos família. ― Franziu a testa. ― Está certa
quanto a isso? Ele é mais velho que você.
― Não ligo, eu o amo há muito tempo, e ele sente o mesmo.
Sorriu.
― Fico contente pelos dois. ― Tocou o meu coração.
― Eu amo você. ― Beijei o seu rosto. ― Preciso ir, tenho aula hoje.
Assim que saí, procurei Sage, que estava na varanda.
― O que foi aquilo?
Ele suspirou.
― Meu pai chegou à conclusão de que nosso “assunto” ―
gesticulou entre nós dois ― está demorando muito. ― Trincou os
dentes.
― Eu não posso mais guardar esse segredo, é grande demais,
Sage. Conte ao seu pai… ― Minha voz falhou.
― Se ele souber, eu estarei ferrado. Meu pai abomina isso… ―
Parecia distante e enraivecido.
― Não há nada de abominável em ser gay. Seu pai é um idiota. Se
ele fizer algo, conte ao meu irmão.
― Não posso revelar ao capo… ― Sage se interrompeu, olhando
para alguém atrás de mim.
― Do que vocês estão falando? ― Era Miguel. ― Que segredo
guardam de Alessandro? ― Continuamos em silêncio. ― Preciso
perguntar de novo?
Sage permanecia em transe.
― Miguel… ― tentei acalmá-lo, mas não sabia o que fazer ou dizer.
― Luna, eu quero a verdade. Se não me contarem, terei de levar
isso aos ouvidos de Alessandro. ― As palavras seguintes foram
dirigidas ao Sage: ― Ele é o seu capo, precisa obedecê-lo.
Mirei Sage, angustiada. Eu não diria uma vírgula sem a sua
autorização.
― Eu sou gay ― revelou. Não aparentava se envergonhar, e sim
temer a represália de seu pai.
A informação pegou Miguel de surpresa. Acho que esperava algo
horrendo e, na realidade, não era nada demais.
― Já vi você com mulheres ― duvidou.
― Eram prostitutas que eu paguei para fingir ― respondeu. ― Não
queria que ninguém soubesse, meu pai não aceitaria algo assim
vindo do único filho dele. Quer me usar para subir no seu posto
atual dentro dos Destruttores.
― Com todo esse preconceito, ele não subirá posto nenhum ―
argumentou Miguel. ― Não com Alessandro no poder.
Sage o encarou.
― Vai revelar ao meu pai?
― Esse segredo não é meu. Mas você devia contar ao seu chefe,
ou a coisa sairá do seu controle. Seu pai é servo dele. Imagine se
houver outras pessoas como você dentro da máfia, e seu pai
resolver castigá-las por esse motivo tão estúpido? Alessandro o
mataria, acredite.
Pela primeira vez na vida, notei os olhos de Sage se encherem de
lágrimas.
― Fez com um amigo meu, Bianco, um civil. Meu pai nos viu
conversando sobre o assunto, então mandou que o espancassem.
Bianco passou um tempo na UTI. ― Sage respirou fundo,
controlando sua raiva. ― Se não fosse traição, teria matado o velho.
― Meu Deus! ― O homem me enojava, e eu nem o conhecia.
― Alessandro deve saber o que um dos seus fez sem a sua ordem.
Lembre-se de onde reside sua lealdade, Sage. E não inclua a Luna
em suas mentiras. Alessandro me contou que pediu a mão dela em
namoro… Sei que o seu pai quer obrigá-lo a casar…
Sage o interrompeu:
― Era uma farsa. Só precisava que meu pai soubesse que tentei,
para ganhar um tempo. Mas Luna e você estão certos, eu não
posso mais esconder isso. Direi ao meu pai hoje à noite. Depois,
falarei com o chefe. Jurei lealdade ao capo e confio em sua
bondade.
― Alessandro nunca o castigaria por uma razão dessas… ―
garanti.
― Talvez não por isso, mas por não ter contado imediatamente o
que meu pai fez com Bianco. Só não falei porque minha mãe
sofreria ― explicou-se. Eu o abracei forte. ― Obrigado, Miguel e
Luna, resolverei isso. Lamento por ter ido ao seu irmão sem falar
com você antes.
Sage saiu, me deixando com o peito apertado.
― Ele está certo. Alessandro não suporta traidores e pessoas que
agem pelas suas costas ― disse Miguel.
― Espero que tudo se ajeite para ele. Como foi conosco. ― Virei-
me para Miguel, perdidamente apaixonada.
― Morri de saudade. Mas devo admitir, Luna, não esperava que
escondesse um segredo tão grande…
― Ele é…
― Sei o que o Sage é, mas isso não muda nada. ― Afastou-se. ―
Devia confiar em mim.
― Miguel… ― Peguei o seu braço, ao que se esquivou, magoado.
― O segredo pertence ao Sage. Você mesmo disse…
― Sim, mas você não confiou o suficiente no meu bom-senso. Acha
que diria algo assim para Alessandro? Ele é meu melhor amigo,
porém, nunca colocaria a vida de um homem leal em risco, seja a de
Sage ou de qualquer outro.
― Eu não tinha como adivinhar! Alessandro é praticamente seu
irmão.
― Luna…
― O que está acontecendo? ― Rafaelle apareceu na varanda.
― Nada, preciso ir para a faculdade. ― Beijei o rosto dele e saí da
mansão, sem virar para trás.
Estava grilada por me acusar, quando, na verdade, Miguel
seguidamente escondia coisas de mim.
Sage me levou ao campus.
― Eu trouxe problemas para você, não é? ― Seu tom era triste. ―
Sinto muito.
Não queria preocupá-lo ainda mais com o que teria de lidar.
― Fique tranquilo. ― Miguel eventualmente entenderia o meu lado.
Ele não caiu nessa, me conhecia e sabia que eu não estava bem,
mas me concentrei em ir à aula e esquecer meus problemas por
enquanto. Acabei não prestando atenção na matéria.
Entrei na lanchonete após o término da aula e avistei Madson, uma
garçonete que conheci há duas semanas mais ou menos. Ela era
uma loira linda de olhos azuis, mãe de uma menina de sete anos,
uma criança muito fofa.
― Oi, Luna, querida. O que foi? ― Ela veio até mim. ― Por que
está assim?
Sentei num lugar mais afastado de todos, embora tivesse pouco
movimento.
― Escondi algo do meu namorado. Agora, ele está magoado, mas
Miguel omite coisas de mim também ― sussurrei. ― Esse segredo
não é meu, por que ele não vê isso?
Ela olhou ao redor, checando se havia clientes chegando, depois
tirou o avental.
― Já deu a minha hora, então podemos falar. Se quiser se abrir, eu
estou aqui. ― Sentou-se à minha frente. ― É só desabafar.
― É complicado. Um amigo meu é gay ― falei baixo.
Franziu a testa.
― Seu namorado é preconceituoso?
― Não, não é isso. Sage, meu amigo, me pediu para fingir gostar
dele, assim o seu pai não o obrigaria a se casar com uma mulher
qualquer. E Miguel descobriu.
― Você é boa, Luna, nunca negaria ajuda a ninguém. Se esse cara
não admira sua personalidade, então não merece você ― disse com
convicção. ― Pode dormir na minha casa, se precisar de distração.
Dormira lá na noite anterior, pois odiava ficar sozinha. Claro que isso
me levou a ter de explicar à Madson o motivo para os seguranças.
Falei que os meus irmãos eram donos de muitas boates espalhadas
pelo mundo, portanto, eu precisava ser protegida.
― Obrigada por me ouvir. Eu não quero perdê-lo, e sim que veja
que está errado. ― Inspirei fundo. ― Se ele guardasse um segredo
assim, eu entenderia.
Levantou-se e me abraçou.
― Preciso ir pegar a Graziela. ― Suspirou. ― Eu realmente gostaria
de morar perto daqui.
Pisquei, tendo uma ideia.
― Você pode vir viver comigo, assim teríamos a companhia uma da
outra. ― Segurei a sua mão. ― Com a princesinha junto, óbvio.
Ela riu.
― Viu? Boa demais. Eu não posso aceitar.
― Por quê? ― falei, amuada.
― Pensarei no assunto, ok? ― prometeu, e eu sorri.
― Esperarei ansiosa pela resposta. ― Amaria ficar com alguém. A
parte mais difícil seria convencer meus irmãos.
Madson foi embora, e eu permaneci ali.
― Deseja algo? ― Outra garçonete inquiriu.
― Tem alguma bebida forte? ― Não costumava beber, aliás, provei
álcool poucas vezes.
― Bebida? Temos champanhe…
― Pode nos trazer um refrigerante. ― Ergui a cabeça e me deparei
com Miguel. ― Mais um sanduíche de peru para mim e, para a
minha namorada linda aqui, um de presunto e queijo. Obrigado.
― Sim, trarei. ― Ela saiu.
Estreitei os olhos.
― Sou maior de dezoito, já posso beber ― retruquei.
― Claro que pode, não me importo, só não vai encher a cara e
enfrentar uma ressaca daquelas apenas por estar com raiva de
mim. ― Entristecido, puxou uma cadeira para perto da minha. ―
Luna, sou um idiota por acusá-la. Ele é seu amigo. Se Sage lhe
pediu segredo, você jamais quebraria sua confiança, eu a conheço
bem. É uma das razões para eu amá-la tanto.
― Escondi porque não achei correto contar ― falei.
― Eu sei, perdoe a minha estupidez. ― Tocou meu rosto. ―
Lamento por tê-la feito chorar.
― Eu amo você. ― Pulei nos seus braços e o beijei.
Ele riu.
― Estava sentindo a sua falta, e em vez de aproveitar nosso tempo,
briguei por algo sem fundamento…
A menina trouxe a nossa comida.
― Eu também quase morri de saudade ― afirmei, enquanto ele
trilhava um caminho de beijos no meu ombro e pescoço; em
seguida, foi para os meus lábios.
― Poderia sair de cima da minha irmã? ― rosnou um Stefano
recém-chegado.
Afastei-me depressa e o encarei, irada.
― As suas interrupções estão passando dos limites. Você não tem
festas para ir? Ou mulheres com quem ficar?
Sorriu, nada abalado.
― E deixar que vocês se agarrem assim? Não mesmo! ― Fechou a
cara por um segundo, mas sorriu ao chamar a garçonete: ― Oi,
belíssima, um sanduíche de presunto e queijo, por favor.
A moça riu como se tivesse ganhado na loteria.
― Pegue leve, Stefano. Não vejo o Miguel há dias; semanas, para
ser exata. Quero ficar com ele e me divertir. ― Bebi meu
refrigerante. ― Por que não enche o saco da Jade também?
― Ela é casada ― frisou.
Arqueei as sobrancelhas.
― Então terei que me casar para que saia do meu pé? ― Coloquei
a mão no queixo, virando-me para Miguel. ― Está livre hoje? ―
brinquei.
Meu namorado riu. Falei sobre casamento para provocar o meu
irmão, porém, me deu muito no que pensar.
Stefano rosnou.
― Jurou que ia se formar antes ― acusou-me.
Fechei a cara.
― Você não está ajudando muito. ― Eu me aproximei dele. ―
Confie em mim. Quero viver um pouco. Faça o mesmo, encontrando
uma menina bacana.
Ficou em silêncio. Enfim, pondo-se de pé, beijou a minha testa.
― Tudo bem, eu pegarei leve. E para constar: tenho muitas
namoradas. Por que as trocaria por uma única mulher?
Bufei.
― Entenderá no dia em que achar a pessoa certa. Seu mundo
ganhará cor e brilho. Nada fará sentido sem ela ― disse Miguel.
Emocionei-me com suas palavras. Esse homem magnífico era a luz
da minha vida.
Capítulo 20
Miguel
Horas antes
Luna
Luna
Um mês depois
A recuperação do Miguel foi boa. Não deixei que viajasse até que
estivesse curado ― ou ao menos tentei. Havia uma semana,
retornara a Dallas. Desde então, eu o enlouquecia ligando
diariamente.
― Luna, deixe de ser nervosa. O Miguel ficará bem ― disse Jade.
Estávamos nos falando pelo telefone fazia alguns minutos.
― Eu sei, é que essa sensação de perda mexe comigo. Eu não
sobreviveria a outra ― sussurrei.
― Chega de falar disso. Eu tenho uma notícia maravilhosa. ―
Parecia ansiosa.
― Tia, eu acabei ― ouvi Graziela me dizer.
Virei-me. Sua mãe a deixara comigo, pois foi trabalhar na boate do
meu irmão. Eu esperava que ela e Alessandro se entendessem.
― Só um segundo, Jade. ― Sugeri à Graziela: ― Por que não
escova os dentes para ir dormir?
Ela sorriu
― Sim, tia. ― Subiu as escadas.
― É a filha da garota que mora com você? ― perguntou Jade.
― Sim, ela é uma graça. Assim que chegar de Chicago, nós
podemos sair e ter uma noite de meninas. ― Sorri.
― Gosto da ideia, mas sem bebidas…
― Ué, você adora beb… ― Arregalei os olhos. ― Está grávida?
― Sim! ― Emocionou-se, e eu também. ― Sinto que o meu
coração vai explodir. Não foi planejado, mas é uma sensação
maravilhosa!
― Nossa, Jade! Eu estou tão contente! Não vejo a hora de você
voltar.
Conversamos por mais uma hora, combinando de comprar
roupinhas de bebê juntas. Eu seria titia! Já me sentia deste modo
em relação à Graziela, então obviamente amaria um filho da Jade.
Após encerrar a ligação, fui para a cama. Tentei falar com o Miguel,
mas o seu telefone estava fora de área. “Amo você, saudades de
montão”, escrevi e enviei.
Telefonei para o Sage. Ele fora afastado do cargo temporariamente
por ter se ferido em um trabalho feito para o meu irmão.
― Não consegue dormir? ― sondou. ― Já é tarde.
― Nada de sono. Queria saber se você está bem. ― Durante a
última semana, eu igualmente não o deixara em paz, temendo
perdê-lo.
― Estou, sim ― jurou, mudando de assunto: ― Amanhã vou revelar
ao capo tudo sobre o meu pai e suas atitudes.
― Meu irmão entenderá o porquê de você não dizer nada antes. E
sua mãe sabe que fará isso?
Sage já tinha contado ao pai dele seu segredo. O maldito parou de
falar com meu amigo. A despeito de tal situação, Sage ainda não
encontrara coragem para dizer ao meu irmão acerca das regras que
seu pai quebrou, batendo em um garoto somente pelo fato de ser
gay.
― Ela chorou e me pediu para não contar ― murmurou.
― Quer que eu vá com você?
― Luna, é um problema meu, não vou envolvê-la. Preciso
confessar. Eu me acovardei esse tempo todo pensando na minha
mãe, mas não posso mais adiar.
Mesmo assim, eu estaria com ele no dia seguinte; se precisasse
implorar, eu o faria. Não deixaria Alessandro o ferir por conta disso.
― Tudo ficará bem. Descanse para se curar logo. ― Desliguei eu fui
deitar; passava de uma da manhã.
A ansiedade me tirava o sono. Dentro de poucas horas, teria de
acordar para ir à aula.
Eventualmente cochilei, despertando com o meu telefone tocando
sem parar. Era o Miguel. O medo me apossou; se estava ligando tão
cedo, não devia ser uma notícia boa.
Tremi, atendendo. Bem na hora, eu vi um clarão do lado de fora da
porta ― estava entreaberta, pois eu queria saber quando Madson
chegasse.
― Alô? ― sussurrei com a voz falhando.
Saí do quarto e ofeguei ao ver fogo vindo da sala.
― Luna? Pegue a criança e fuja. Vocês serão atacadas ― Miguel
falou, exasperado.
Senti braços puxando os meus, gritei e derrubei o telefone. Ao virar,
dei de cara com um bandido. Tentei me afastar, mas ele sorria como
um demônio vindo direto Inferno.
― Então é por você que o Miguel tem passado tanto tempo em
Milão? ― Tinha uma cruz tatuada na bochecha.
Temia por mim, sim, mas muito mais pela Graziela, que ainda
dormia. Naquele momento, o perigo era duplo: o fogo e o homem
com um sorriso cruel. Seria um inimigo dos meus irmãos ou do
Miguel?
Obriguei-me a sair do transe e corri na direção do quarto da Grazi.
Porém, o cara me agarrou e me jogou no chão, provocando arrepios
na minha espinha ao se colocar sobre mim.
― Me solte!
Ele riu.
― Oh, vamos ver se é mesmo tão doce. Só assim para ele cruzar o
Atlântico atrás de você.
Consumido pelo terror, meu corpo inteiro doía. Devia implorar, mas
não conseguia reagir.
Sua boca se aproximou da minha. Quando virei o rosto, chorando,
as mãos grosseiras foram parar entre as minhas pernas. Sabia o
que ia fazer, e isto me destruiria.
Onde estavam todos? Os seguranças, meus irmãos, Miguel?
Naquele instante, entendi o que Jade sentiu ao ser tocada por Gael.
Eu precisava ao menos lutar. Preparava-me para isto no momento
em que o sujeito foi arrancado de cima de mim.
― Luna? Vá pegar a Graziela. O incêndio está se alastrando. ―
Miguel soava letal. Prendeu o monstro no chão, com os joelhos em
sua garganta.
Grazi! Recobrei os sentidos e suspirei aliviada por Miguel ter
aparecido. Se esse homem me assassinasse, o que seria da
garotinha? Não queria nem pensar nisso.
― Não pode me matar, sou irmão do Death. Acredite, ele retaliará
atacando quem você ama.
Miguel apertou sua garganta.
― Veremos. ― Voltou-se a mim. ― Luna, rápido!
Corri até o quarto da Graziela, não ligando para o que o Miguel faria
com o cara.
― Anjinho? ― Sacudi a menina para acordá-la.
A pequena piscou.
― Tia? A mamãe chegou?
Por sorte, Madson não tinha retornado.
― Não, mas nós precisamos ir. A casa está pegando fogo ― falei
com a voz estranha, então pigarreei.
Saímos pelo corredor, e eu cobri os olhos da criança para que não
visse nada.
Miguel veio em minha direção. Mal notei o sangue em suas roupas,
pois ele usava preto. O cadáver do meu pretenso abusador estava
no chão, desmembrado, com a calça abaixada… Lembrei-me de um
dos membros do MC Fênix comentando que meus irmãos obrigaram
Gael a comer as próprias bolas.
Havia mais dois homens com meu namorado, Alfred e outro
ligeiramente familiar, vestido como um cowboy.
― Depressa, Miguel ― disse o segundo.
― Tia, já posso abrir os olhos? ― sondou Graziela. ― Parece
quente aqui.
Desviei da cena horrenda.
― Não. Fique assim só mais um pouco ― pedi.
Miguel pegou Graziela no colo.
― Desculpe acordar você, pequena, mas precisamos ir ― falou,
calmo, embora eu sentisse a raiva fervilhando por trás.
Recorremos à escada de incêndio; a sala estava em chamas.
Começamos a tossir com a fumaça que subia para o andar de cima.
― Leve as duas, Miguel. Eu lido com tudo ― falou o cowboy.
Rumamos a um beco nos fundos da faculdade. Miguel parecia
aliviado, mas enraivecido. Não falou nada, só nos conduziu a um
carro. Seguimos para a casa dos meus irmãos.
Graziela, quieta, olhava para fora. Perguntara algumas vezes sobre
a sua mãe, mas eu garanti que Madson estava bem.
― Miguel? ― Cheguei mais perto dele, querendo o seu cheiro para
escapar do odor daquele monstro, que parecia impregnado em
minha pele.
― Sim, Cachinhos? ― Tentou me tocar, mas eu me encolhi
― Desculpe, foi um reflexo. ― Coloquei a cabeça em seu ombro. ―
Sei que nunca me machucaria, Miguel, você me protege sempre.
Por favor, só não conte aos meus irmãos o que quase aconteceu.
Ele me avaliou. Compreensivo, assentiu.
― Tudo bem, se prefere. ― Passou o braço à minha volta. ―
Lamento tanto, querida.
― Você me salvou, meu amor, agradecerei pelo resto da minha
vida. ― Eu o encarei. ― E quanto a você, está bem?
Riu, amargo.
― Acabou de ser atacada e quase… ― Sacudiu a cabeça para
afugentar os pensamentos ruins. ― Mas pergunta se eu estou bem?
― Suspirou. ― Na verdade, eu estou furioso.
― Eu me refiro à sua ferida. ― Toquei o seu peito.
― Já me curei, dói apenas um pouco, porque a bala atravessou o
osso ― respondeu.
Chegamos à casa. Rafaelle e Stefano vieram correndo me abraçar,
pedindo desculpas por não estarem por perto para me proteger.
Rafa parecia especialmente pesaroso. Não tínhamos conversado
depois do incidente em seu quarto. Dado tudo o que aconteceu com
o Miguel, eu acabei esquecendo. Esperava que, um dia, ele se
curasse do que o atormentava. Assim como eu, depois do susto de
hoje. Mesmo com a violação não tendo se concretizado, eu sentia
como se algo houvesse sido roubado de mim.
Capítulo 23
Miguel
Luna
Miguel
Miguel
Miguel
Miguel
Luna
Um mês depois
Luna
Miguel
Miguel
Levei todo esse tempo para me recuperar, tive que fazer a maldita
fisioterapia todos os dias na perna direita e no braço esquerdo, os
membros mais afetados. Cheguei a achar que não recobraria a
minha agilidade, mas Luna estava lá comigo. Sua energia e seu
entusiasmo me motivaram a vencer os obstáculos.
Hoje, estava cem por cento curado. Lutar me ajudou a retomar
meus músculos. Era o que fazia naquele momento.
Estávamos no galpão onde deixava os inimigos que capturava.
Finalmente, me vingaria dos traidores em meu cartel.
― Se não queriam continuar nos Lobos Solitários, deveriam ter me
dito.
China bufou.
― Como se fosse nos deixar ir. E outra, não queríamos sair, só não
desejávamos você como chefe. Alguém tão fraco, dominado pela
prostituta Morelli… ― Considerei absolvê-lo, mas após estas
palavras, não mais.
― Solte-o ― ordenei a Alfred.
Ao menos eu não tinha tantos ratos quanto os Destruttores. Alguns
Alfred eliminou, deixando esses dois para mim, por serem os
responsáveis pelas regiões de Illinois e do Texas. Foram eles que
pegaram Emma e minha irmã.
Alfred tirou as algemas de ambos.
― Depois de meses me recuperando, estou louco para amenizar
minha fúria. Nada melhor que uma boa luta. ― A minha raiva estava
no auge.
Soquei a boca de China e chutei o segundo. Eles estavam feridos
pela surra que levaram dos meus homens.
― Éramos melhores antes, sem você. O capo Destruttore tinha que
se meter, né? Por isso é mais leal a ele do que a nós ― disse
Eliseu.
― Vocês dois só não estão gostando porque cortei a prostituição
infantil! Miseráveis. ― Desembainhei uma faca e sorri de modo frio.
― Vou lhes ensinar o verdadeiro Inferno na Terra. A diferença entre
nós será que implorarão no final.
Soltei a ira há muito tempo guardada e aproveitei ao máximo. China
grunhia, cuspindo sangue. Finalizei desmembrando os caras. Era o
que mereciam, após atingirem minha família.
Encarei meus homens, um a um. Todos me olhavam com respeito.
― Se alguém deseja se desvincular do cartel ou se opor à minha
liderança, agora é a hora ― anunciei.
― Todos aqui o respeitam, você é um bom chefe ― disse Buster.
― Estaremos aqui para servir ― assegurou Alfred.
Assim fizeram os encarregados de cada estado do México e dos
outros países.
― Ótimo. Com esse problema resolvido, vamos para o próximo. ―
Acenei para um dos meus homens. Ele me trouxe meu pai.
O juiz Ávila entrou arregalando os olhos para os mortos no chão.
― Eu lhe dou o que você quiser, apenas me deixe ir ― suplicou.
Quase ri. Pedi para todos saírem; a conversa seria entre nós dois.
Emília tinha razão, era a hora de encerrar as coisas. Precisava
seguir em frente com minha esposa e minhas filhas.
― O que você quer? ― perguntou, tremendo.
Eu o fulminava.
― Não reconhece o próprio filho?
Ele tinha perdido tudo; apostava o que sobrou em cassinos. O cara
devia mais de cinquenta mil só em meus estabelecimentos, uma
dívida somada ao longo de apenas seis meses.
Piscou, enfim me identificando. Eu era um adolescente quando parti,
mas não mudei tanto assim. Um pai de verdade me reconheceria.
― Miguel? ― Olhou ao redor, focando no defunto. ― Você é um
assassino… No que se transformou?
― Não me venha com lição de moral. Mato quem merece e não
transo com crianças.
― Elas eram prostitutas ― falou na defensiva.
― Não dou a mínima ― rosnei. ― Você devia denunciar, e não se
aproveitar da situação delas. Diga-me uma coisa: alguma vez
pensou em minha irmã?
― Sua irmã desapareceu, não foi encontrada em lugar nenhum. ―
Suspirou. ― O que estou fazendo aqui?
― Sua frieza me enoja ― cuspi. ― Não deu a mínima para Emília.
Eu tive que enfrentar tudo sozinho, um adolescente. Entrei neste
cartel, fiz coisas com que nunca sonhei, tudo para tê-la de volta. Eu
a encontrei, porra! ― Chutei uma cadeira na sua direção. ― Sente-
se ― sibilei. Ele hesitou. ― Mandei você sentar!
Obedeceu.
― Encontrou onde? ― Não parecia muito interessado no assunto,
ele somente tentava maneirar minha fúria.
― Se você tivesse achado Emília, o verme do padrasto dela não a
teria violentado. Consegue imaginar o que minha irmã passou?
Exatamente o mesmo que você, mais tarde, fez com outras
crianças! Ela engravidou de um monstro! Pensou nisso alguma vez?
― Cerrei meus punhos. ― Responda!
Estremeceu.
― Não, não pensei.
Sacudi a cabeça.
― Pois deveria. Como pôde abusar de meninas também?
Estreitou os olhos.
― Vocês são diferentes? Pelo amor de Deus, você é chefe de um
cartel, já deve ter comido todo tipo de boceta jovem…
Vi tudo em vermelho. Eu o soquei, fazendo-o voar longe, com o ar
fugindo de seus pulmões.
― Não sou desumano. Mato e torturo, sim, mas nunca encostaria
numa criança ― sibilei, indo até ele. ― Por anos busquei minha
vingança contra quem a feriu. Pagará por não dar a mínima para
ela, nem para a minha mãe, que morreu sozinha.
― Sua mãe era uma fraca, devia ter seguido em frente. Desde o
começo falei que não queria filhos, nosso casamento era só um
arranjo, nada mais, mas veja aonde seu sonho idiota de ser mãe me
levou. Você não pode matar seu pai…
― Não tenho pai. ― Puxei a arma e apontei para ele.
― Por favor, não… ― Foi cortado com um tiro na testa. Um peso
saiu dos meus ombros.
Deixei o passado para trás; iria em busca do meu futuro, minha
garota e minhas filhas.
Buster cuidaria do Texas, e Ivan de Illinois. Com homens fiéis, os
lugares estariam protegidos.
Saí de Monterrey, aonde fui lidar com esses assuntos, e retornei a
Cancún. Entrei em minha casa de praia e acenei para os guardas.
Avistei Sage na sala, assim como Knife, Viper e Zaquel, um dos
meus homens. Esses seguranças ficavam sempre perto de Luna,
mas havia mais lá fora.
― Onde ela está? ― perguntei.
― No quarto ― disse Sage. ― Bem inquieta, andando de um lado
para o outro. Até perguntei o motivo; só falou que está ansiosa pela
chegada dos bebês.
Assenti. Eu também estava ávido demais para conhecer minhas
meninas.
― Resolveu o que tinha de fazer? ― sondei.
Ele revelara a verdade ao Alessandro, que o incumbira de eliminar o
próprio pai.
Uma sombra atravessou seu rosto.
― Sim ― respondeu, pontual.
― E sua mãe? ― Eu o avaliei, mas não detectei nada.
― Vai superar. Ela soube o que ele tentou fazer comigo, isto
amenizou o baque de perdê-lo. ― Deu de ombros, indiferente.
Notei que não queria falar sobre isso, então mudei de assunto.
― Cadê Stefano? ― Chequei ao redor, mas não o vi.
― Foi dar um mergulho ― respondeu Viper.
Ouvi um grito de dor vindo do quarto. O medo se apossou de mim
pensando que, de algum modo, alguém poderia ter entrado e ido até
Luna. Peguei a arma e corri rumo ao dormitório, pronto para eliminar
qualquer ameaça.
Travei na porta, sentindo outros à minha volta.
― Oh, meu Deus! ― Luna, de pé, com a mão na barriga e uma
expressão de dor, assustou-se com os revólveres. ― Acho que a
bolsa estourou ― disse, corando. Havia uma poça de água no chão.
Fiquei paralisado por um segundo. ― Miguel! ― exclamou,
exasperada. Pediu ao Sage: ― Ligue para Jade.
Jade estava no México também, em outra propriedade minha.
Recusou-se a deixar a irmã ter o filho sozinha.
― Consegue andar? ― Guardei a arma, indo até ela.
― Não, as contrações estão piorando, uma atrás da outra. ― Sua
voz saiu baixa e trêmula.
Tomei-a nos braços.
― Miguel, estou pesada, e você ainda está se recuperando. ―
Respirava de modo irregular. ― Talvez um deles possa…
― Não é necessário. ― Saí com ela do quarto. ― Viper, você,
Zaquel e Knife nos darão cobertura no hospital. Nada suspeito
sequer se aproximará.
Antes que eu entrasse no carro, Stefano chegou correndo. Vestia
um calção de surfe, exibindo parte de seu corpo cheio de tatuagens,
como o meu.
― Luna! ― Tocou o rosto dela. ― Está tudo bem?
― Sim… ― interrompeu-se, arfando e segurando a barriga imensa.
Linda.
― Vamos para o hospital ― falei com urgência.
Ele assentiu.
― Irei logo atrás de vocês ― me disse.
Botei Luna no carro. Sage dirigia. Dez minutos depois, chegamos.
Eu a levei para o quarto que a enfermeira de plantão indicou.
Ficamos lá, esperando as contrações e a dilatação aumentarem.
A cada minuto, sua situação piorava. Aquilo doía em mim.
― Tem como fazer a dor parar? ― perguntei.
Luna não quis uma cesárea, desejava um parto normal. Eu respeitei
sua vontade e me limitei a ajudá-la como podia, com muito apoio.
Foram horas de agonia. Finalmente, avançamos para a sala de
parto. A cada grito seu, eu me encolhia, mas não deixava de
segurar sua mão. Matei e torturei tantos homens, sem nunca me
importar com suas súplicas e seu choro. Mas com Luna? Foi
péssimo.
O parto pareceu durar uma eternidade. Suor escorria pelo seu rosto,
já pálido pelo esforço. A despeito de tudo, ela estava radiante.
O barulho das gêmeas ao nascer me arrebatou. Pela primeira vez
em anos, eu chorei. A médica colocou as duas nos braços de Luna.
Olhando para o rostinho lindo de minhas garotas, eu me senti o
homem mais realizado do mundo, grato por essas três
preciosidades na minha vida.
Meu coração pulava forte, em um turbilhão de emoções.
― São tão lindas as minhas filhas. ― Pigarreei, me abaixando para
beijar as suas testas. ― Assim como a mãe delas. ― Toquei suas
bochechinhas fofas, com a garganta arranhada.
― Serão muito amadas. ― Luna beijou as duas.
Enquanto falávamos, a médica cuidava dela.
― Quais nomes lhes daremos? ― Pesquisamos alguns, mas a
escolha final seria de Luna.
― Os nomes das mulheres que nos oportunizaram viver tudo isto.
Kélia, a minha mãe ― me olhou ―, e Carmen, a sua. Elas nos
amaram incondicionalmente, tal qual faremos com nossas garotas.
Nunca me senti tão apaixonado por minha noiva quanto naquele
instante.
Epílogo
Luna
Rafaelle
1ª Edição
Ele só não contava que teria o seu destino cruzado por... ela.
Mália González tinha um único desejo que ardia em seu
âmago: destruir a pessoa que tirou tudo dela. Só não contava que a
de um protetor.
Dois corações destroçados, mas que, juntos, encontrarão o
estômago.
Cada palavra que dizia era seguida por socos e chutes dele.
Toda minha carne se deteriorava, mas não gritei; não lhe daria esse
gostinho.
o odeio!
minha mãe.
cima.
― Não toque nela! ― Tentei ir até eles, mas meus músculos
sobre uma das mesas de tortura que tinha ali e desabotoou suas
calças.
pretendia fazer com minha mãe, mas, antes que eu suplicasse mais,
um chute seu me fez ver estrelas, e a escuridão me assolou. Se
mandaria.
Alessandro me ligou informando que eu tinha que vir; ele me
mais. O meu pai estava furioso, porque, da outra vez em que foi
preciso eliminar um alvo, meu irmão se atravessou na frente e o fez
por mim.
acabar com sua alma. Marco sempre usava as nossas irmãs para
meu temor.
― Nada. Mas o pai dele nos deve. Então vamos deixar uma
mensagem a quem não me paga ― falou de modo frio.
na faca.
― Você vai fazer ― rosnou meu pai com uma fúria a que eu já
estava acostumado.
Antes que eu insistisse que não podia fazer aquilo com um
para presenciar tal barbaridade? Isso seria demais para uma criança
da idade dela.
16 anos.
Alguns dos homens do meu pai o temiam. Por isso o cara se
isso, ele feriria a Luna. Ela ainda fungava nos braços de Alessandro,
mas parou de chorar com o rosto escondido no pescoço dele. Ali
Jade também.
Perdi-me devido à raiva que sentia dele e fiz o que queria que
eu fizesse. Nada podia acontecer a elas. Não sei dizer quanto
tempo demorou para que o garoto morresse.
também estava.
― É assim que faz um verdadeiro assassino. É assim que
precisa ser ― falou Marco, contente.
la nele só para não ouvir mais sua voz. O desejo era tanto que não
conseguiria controlar esse instinto de eliminar o meu inimigo. Meu
pai.
sua chance de ser capo um dia e, com isso, nos livrar do nosso pai.
Esse homem tinha que morrer.
esmagaria. Claro que eu sabia que na máfia tínhamos que ser fortes
e fazer coisas assim, mas com quem nos devesse de verdade, não
com inocentes. Minha alma tinha sido manchada com três vidas que
Não olhei para o garoto que teve a sua vida interrompida por
mim. Com certeza tinha sonhos, e eu tirara isso dele.
protegeu até quando pôde, mas já não podia fazer mais nada para
mudar isso.
preocupá-lo.
Encarei o sangue escorrendo pelo ralo, levando o indício da
crueldade que fiz. Porém, e quanto à minha alma? Ela nunca seria
limpa. E, conhecendo meu pai, sabia que tudo aquilo só iria piorar.
sono dela estava agitado. Toquei o seu rostinho lindo, revoltado por
ela ter sido exposta a uma parte daquela crueldade. Esperava que
caminho ― falei por fim. ― Jade e Luna não podem ser tocadas por
esse nosso mundo.
duas.
― Vou falar com meu pai para, quando ele for fazer o que fez
hoje, que coloque gente da pior espécie. Isso nos ajuda a lidar com
irmãos.
meu estado, não quando isso os faria sofrer. Não sei quanto tempo
tem luz aqui. ― Jade olhou para a lâmpada ligada, que eu tinha me
ela não podia vir até mim devido ao meu pai estar na casa,
úmidos.
Não devia chorar, não com a minha idade, mas o fardo estava
pesado demais.
cabelos escuros e olhos cor de jade, por isso o seu nome. Elas
olhinhos lindos.
Sorri e beijei sua testa.
― Oh, meu amor, eu queria tirar essa dor que está sentindo ―
ouvi minha mãe dizer.
molhados.
Sentei-me sem acordar as meninas e a abracei.
― Não quero que sofra por mim ― pedi, respirando seu cheiro
que eu tanto adorava.
que eu amava.
havia outra que necessitava de mim: minha mãe e meus irmãos. Por
Ouvi barulho e fui olhar o que era. Na última vez, escutei papai
mim.
ainda me fitava.
Sorriu.
― Claro, meu amor. Murilo é tudo na minha vida, o homem
júbilo.
voz.
Fui para o meu quarto, mas não ia dormir, pois precisava saber
não podia contar o que estava acontecendo a ele, então falaria com
o meu irmão. Tentei ligar algumas vezes para ele, mas não atendeu.
o local.
Liguei de novo para meu irmão, e dessa vez ele atendeu:
― Não devia estar na cama?
o Abadias?
― Não tem nenhum segurança na casa, o único que vi foi o
Rony, que seguiu a nossa mãe. ― Peguei um atalho para o píer, um
da cabine, inquirindo:
― Mamãe, está aí...? ― Gritei ao vê-la na cama ao lado de
muito longe.
detectei. Não era o papai, mas o meu tio Ulisses, irmão da minha
mãe. Tinham mais pessoas ali.
a mamãe de volta, pois sabia que ela tinha partido para sempre.
― Quem será que fez isso? ― Outra voz parecia falar consigo
mesma.
Mália
se passado dez anos após ela ter partido, não com aquele povo
mas todos tinham minha mãe como uma traidora e desonrada, não
só por ter sido encontrada na cama com outro, mas também porque
tentei uma vez levar o caso para meu tio Tomaso, irmão do meu pai,
minhas suspeitas com meu irmão assim que cheguei a uma certa
meu pai estava sendo frio, mas enfim entendia que ele não me
mas eu conhecia minha mãe. Ela não era uma traidora como todos
podia ver dele naquela noite. A Lua brilhava no céu, dando-me uma
boa visão dele. O cheiro salgado do mar, a brisa leve e suave
beijaram o meu rosto.
Recordava-me que nós duas, mamãe e eu, ficávamos naquele
eliminara fez isso para que ela não falasse nada. Não obstante, eu
não acreditava que ela tinha descoberto alguma coisa contra o
papai; devia ser contra outra pessoa que estava traindo a máfia.
Porém quem seria esse traidor?
chefe.
O terceiro lugar era Ulisses, chefe dos capitães, o homem
familiares.
A cena de mamãe na cama com outro homem foi armada, eu
após ela ter jurado que nunca trairia o papai. Eu acreditava nela,
sabia que jamais nos enganaria. Mamãe nos amava.
Fui criada ouvindo sobre a mamãe ser uma traidora e infiel.
falavam quando meu pai e Mariano não estavam por perto. Talvez
pensassem que eu fosse abrir o bico, mas lidava com todos do meu
jeito.
Não contava nem ao meu pai nem ao meu irmão sobre isso,
sabia lidar com todos eles. Quando ousavam dizer algo sobre minha
ouvi de repente e virei minha face. Odiava aquele homem com todas
as minhas forças.
bastardo de uma figa. Ele era alto e tinha uma cicatriz na boca
resultado de uma facada ou algo assim. Era aterrorizante, não por
deixaria hematomas.
― O que vai fazer? Me bater? Faça se for homem. Estou farta
― Há muito tempo...
soou injuriado.
― Não disse nada porque não queria preocupá-lo. ― Suspirei.
como era com a sua mãe. Com ela, não pude, mas farei isso com
Por suas palavras, notei que ele se culpava pelo que aconteceu à
minha mãe. Isso queria dizer que confiava em mim quando eu dizia
que ela não o havia enganado? Queria perguntar-lhe, mas achei
mim como fazia antes. Eu lido com isso. ― Ele pegou meu braço
onde estava vermelho pelo aperto do cafajeste ali perto, depois
isso ainda é por minha filha estar aqui. Assim que ela se for, eu o
― Nunca a toquei...
claro que ela estava fora dos limites para todos vocês, ou não ouviu
― Papai...
― Ratinha, faça o que mandei. ― Seu tom deixou claro que eu
não deveria lhe desobedecer, ainda mais na frente dos seus
homens.
atacando o negócio do seu pai. Acredito que teremos que ter uma
― O que seu pai mandou você fazer? ― indagou meu tio com
a expressão como a do meu pai, dura como rocha.
― Me disse para ficar com o Mariano...
― Lamento não ter dito aos dois, mas não queria preocupá-los
― sussurrei.
― Pois deveria. Somos uma família e juramos sempre ficar
um sorriso, querendo tirar aquela mágoa dele. Fui idiota em não ter
dito. ― Tive um ótimo professor. Embora Wilson não tenha tentado
me tocar, só deu em cima de mim. E, quando não aconteceu nada,
cara, mas estava pronta para me defender quando papai nos viu.
― Ninguém nunca mais vai humilhá-la ou encostar um dedo
em você. ― Era uma promessa, sem sombra de dúvida.
Têm homens querendo chegar a você para obter mais poder, e não
vou permitir isso.
acham que investir em você seria uma boa ideia. Acabei com uns,
mas acho que existem mais por aí. ― Sua voz saiu baixa e letal. ―
Vou acabar com todos eles.
contrário do papai, que morreria pela sua vida, assim como eu. É
uma pena que eu não tenha provas contra ele.
Estremeci.
― Ei, não sou mais uma criança para você fazer isso ― avisei,
ajeitando meu cabelo.
― Para mim, sempre será a minha maninha querida. ― Beijou
minha testa.
Revirei os olhos.
― E você, meu irmão...
De repente fomos interrompidos pelo som de tiros do lado de
fora e explosões como se tivessem jogado granadas.
ácida.
― Não pode ir lá. ― Os sons de tiros pararam, mas foi porque
estava atirando.
― Porra! Nós estamos cercados de ratos! Ninguém sabia
deste lugar a não ser nossos tios e o papai! E, como sei que nosso
pai nunca abriria o bico, deve ter sido um dos dois, Ulisses ou
Tomaso.
Era demais presenciar tudo aquilo... os tiros, o sangue no chão
Mália
― Mariano? ― chamei.
Não obtive resposta. Havia pessoas atirando em nós quando
mesma roupa que tinha colocado na noite anterior. Não havia sinal
de que tinha sido tocada, nem estava presa com correntes. Isso era
bom. Fiquei aliviada, embora com medo.
mas com a esperança de que Mariano estivesse ali, que tivesse sido
uma floresta. Entrei na mata e corri. Era melhor ali do que no campo
aberto. Se tivesse alguma propriedade, eu poderia procurar ajuda,
Sabia que seria uma luta em vão, mas tentei mesmo assim.
Continuei correndo e fugindo de quem me perseguia. Precisava me
livrar daquele homem. Podia pensar em muitos motivos para ser
como o meu sequestrador. Lutei com ele, mas era uma luta vã.
― Maldição! Pare de lutar ― ordenou com sua voz grossa.
não muito longe. ― Agora por que não sai de cima dela?
O homem pareceu controlar sua fúria e saiu de cima de mim.
pessoas.
― Mariano! ― Fui até ele e o abracei por um minuto. Em
o seu rosto estava duro como pedra. ― Mas não posso levar você
até ele agora. Preciso deixá-la em segurança primeiro.
Franzi a testa.
― Achei que tivesse sido sequestrada por esse... ― Olhei para
o homem parado ali, de braços cruzados, depois me virei para meu
irmão. ― Onde você foi para deixá-lo tomando conta de mim em vez
de um dos seus homens?
supliquei.
― Fomos atacados ontem. Agora preciso voltar e descobrir
quem fez isso. Mataram muitos dos nossos, inclusive mulheres dos
Fiquei aliviada por papai estar bem, mas triste por ter
uma delas? Papai, Mariano? Era grata por eles estarem bem.
― Como sabe sobre isso? ― Franziu a testa.
para caminharmos.
― Não é perigoso para o papai estar lá? E quem foi que
revelou sobre aquele túnel para sermos atacados? Qual dos nossos
tios é o traidor?
buscar provas. Agora não vamos falar sobre isso. Depois a gente
Assentiu.
Chegamos à praia.
― O que é? ― Tentei imaginar do que se tratava, mas não
minha expressão. ― Ele não foi ferido ainda, embora seria, mas
Valentino pediu que eu não o fizesse. Isso vai nos beneficiar hoje.
― “Ainda” ― repeti, não sabendo o que pensar. ― Por que
em uma luta. Aquilo não era uma luta propriamente dita, mas não
deixava de ser uma, afinal o homem tinha sido preso e era mantido
em cativeiro.
― Não sei, mas espero que sim. É a única forma que encontrei
Preciso ir até lá e negociar. Eu sei de algo que ele quer, posso fazer
isso caso nos ajude. Só precisava falar com você antes.
em quem confiasse mais do que ele. ― A que horas vai falar com
esse rapaz?
― Eu o levei para uma ilha perto dessa aqui, por isso
― Como sabe que vou ficar segura com ele? ― quis saber
que matou o pai para ocupar seu lugar. ― Olhou o imenso oceano
após achar que o seu irmão estava morto. Não sei o que houve,
Rafaelle
achei que seria trazido para aquele lugar, mas sim para o território
espanhola.
Após umas horas pensando melhor e colocando minha cabeça
ter sido planejado, mas, assim que eu soube do que aconteceu com
minha família, o que não teria adiantado, pois eu não revelaria nada.
Talvez estejam se preparando para hoje, pensei. Eu preferia morrer
com Paolo para saber a verdade.... mas o infeliz não mostrou sua
cara ali.
destroçado.
Ele tinha vindo até mim havia pouco oferecendo uma aliança.
isso.
mãos nele. Não sabia como descobriu isso, mas eu não soltaria
nada.
― Acha que temo uma surra? Não é a primeira vez que passo
por isso. ― Fuzilei-o.
para protegê-la.
Protegê-la? Ele se referia a uma mulher. Eu apostava que era
Eles tinham perdido a sua mãe havia dez anos. Isso devia ter
trazido uma dor profunda àquela menina, pois ouvi dizer que ela
presenciou o ato. Devia ser por isso o olhar vazio. Uma perda assim
deixa marcas profundas.
― Não dou a mínima! O que me importa é que irei ao inferno
Notei que tinha mais ali, mas, ao que parecia, ele não queria
abrir a boca. Eu lamentava sobre a garota, mas não podia fazer
vai acontecer a ela, eu juro, nem que para isso eu morra tentando.
Ele parecia sincero, mas eu não me importava com isso. É
claro que sentia que devia ajudar, mas como, se tinha minha
vingança em mente? Como faria isso e cuidaria daquela garota?
me ferir, o que não teria adiantado, pois eu não fazia nada à base de
ameaças. Sentia pela garota, mas seu irmão iria conseguir uma
Razor a enviara ali? Não, ela devia ter vindo sem ele saber. O
cara a protegia demais para deixá-la descer ali sozinha, embora ele
quisesse minha ajuda, ou seja, devia confiar que eu não a
mulheres e crianças.
garota não tinha maldade, parecia muito frágil, mas gostei que não
se deixou fraquejar.
que ele não queria trazer mais tormento à vida daquela menina.
de mim.
Mália
derrotado.
― Não teve êxito? Pelas suas vozes alteradas, suponho que
não.
isso acontecesse.
cadeira com as mãos para trás. Não disse nada e só olhei para ele
ali, preso por correntes e algemas. Estava machucado e
grave.
Como Mariano queria que ele nos ajudasse, se o deixou todo
frieza. Mesmo com essa expressão sombria, ele ainda era lindo,
barbudo e musculoso.
demonstravam nada.
ele estava.
Meu coração doeu por alguém tê-lo machucado. Suas feridas
antes. Olhei ao redor, não achando nada que pudesse usar para
peguei na cozinha.
Assim que desci de novo, os seus olhos estavam em mim.
Estreitou os olhos.
― Foi meu irmão que fez isso com você? ― No fundo eu sabia
do que Mariano era forjado. Era a sina de todo filho homem que
nascia na máfia. Se um dia eu engravidasse, gostaria de ter só
meninas, porque seria mais fácil.
Esses ferimentos são da luta que tive ao ser pego, e muito desse
sangue nem é meu, mas dos homens dele que matei.
eu não era uma delas. Fiquei chocada, sim, mas já vira coisas
piores no nosso mundo.
Seus olhos me deixavam hipnotizada de tão belos, porém não
para algo assim, mas você é humano, a não ser que tenha poderes
indestrutíveis, algo que não vejo. ― Virei as costas. ― De qualquer
jeito, eu vou trazer.
Com isso, ele riu, mas gemeu baixo. Então o olhei, chocada
por ouvir sua risada com timbre rouco, mas também preocupada.
― Você está bem? ― Era uma pergunta idiota. Quem ficaria
― Não tem sinal onde ele está. Mas tudo ficará bem. Agora só
precisamos dele. ― Encarou na direção da escada abaixo.
Meu irmão precisava da ajuda do Rafaelle, e eu não tinha feito
muito para convencê-lo, mas não queria que ele me protegesse por
obrigação, por desejar continuar vivo e são.
― Onde ele estava quando o capturou? ― perguntei.
isso, seja ele quem for. Ou esse homem é tão ruim a ponto de o filho
o odiar?
para buscá-la. Mas não vou conversar sobre isso agora; quanto
menos você souber do meu plano, melhor. ― Abraçou-me
rapidamente. ― Agora vamos. A deixarei em uma cabana do outro
lado da ilha. Depois nos encontraremos para sair daqui.
Assenti, mesmo não querendo ficar longe dele. Esperava que
tudo se ajeitasse.
― Mariano? ― chamei-o assim que começamos a andar por
uma trilha.
você. E, se ele não quiser nos ajudar, não o torture por isso, tá?
Apenas o liberte e, por favor, arrume um analgésico para eu dar ao
Rafaelle. Ele está com dor. Como quer que aceite seu pedido,
desceu lá!
― Desculpe, precisava fazer algo para nos ajudar a convencê-
lo, porém me comovi com a forma como ele está ― murmurei.
― Não devia ter ido lá, mas, como sei que tem um coração de
ouro, entendo seu pedido. Porém, que isso não se repita. Eu
também te amo, querida. ― Beijou meu rosto. ― E, quanto ao
Mália
Poderia ter insistido, mas não queria forçá-lo. Esperava que sim. Em
máfia. Seu pai tinha morrido havia alguns anos, agora ele tomava
conta de sua mãe. Era muito falador. Não sei se fazia isso por eu
falar.
Os homens na máfia iam para a lida cedo demais. Mal
um soldado. Ter um chefe como Razor é legal. Ele é fiel aos seus e
Razor... Esse apelido era bem esquisito. Não eram todos que
fosse.
estava com a mente muito carregada com tudo que tinha acontecido
lá fora.
― Fujam!
Túlio arregalou os olhos e veio até mim. Na mesma hora, um
irem atrás de mim naquele lugar? Parecia ter algo mais que meu
irmão não queria dizer.
do leste, e vocês vão para o outro lado. Se alguém passar por mim
e chegar a vocês, mate-os.
sapatilhas, por isso sentia minha pele sendo arranhada pelos galhos
das árvores. Também não contava que fosse ser atacada naquele
lugar.
O medo de ser pega por aqueles homens me consumia, mas
comprido.
― Eles saberiam onde estamos ― respondeu de volta. ― Só
mais um pouco, senhorita.
Ele devia ter pensado que eu estava cansada, mas não era
possuía trilha.
Um homem gritou mandando-nos parar. Virei o rosto na
direção do som bem a tempo de vê-lo apontando uma arma na
minha direção.
― Não quero machucá-la ainda, mas se for preciso o farei ―
― Oh, meu Deus, você está ferido! ― Fui em sua direção, mas
Túlio puxou meu braço para seguirmos.
sua arma, eliminando o sujeito, mas não antes que ele atirasse em
nós.
― Vamos. ― Rebocou-me de onde eu estava paralisada
nisso!
Foi quando notei que seus passos ficaram mais lentos e ele
― O que foi?
Ele suava frio e não parecia ter nada a ver com nossa corrida
desenfreada.
― Fui baleado, senhorita. Irei atrasá-la. Precisa ir na frente,
vou retardá-los.
Arregalei os olhos.
― Não vou deixar você aqui! ― Coloquei o braço à sua volta.
― Senhorita!
Túlio gemeu.
é tarde demais.
sangue.
camisa.
― O que está fazendo? Devia ir.
Eu queria poder ajudá-lo mais, mas não podia fazer nada. Esperava
para mim, longe de onde Túlio estava. Para algumas pessoas, isso
seria idiotice, mas eu não podia deixá-los colocar as mãos nele.
Além disso, Túlio disse que já estávamos perto de onde meu irmão
frente.
― Mariano! ― gritei.
manhã, isso era de grande ajuda, mesmo que ali houvesse árvores
como obstáculos.
ele ouvir, então uma luz vermelha brilhou na escuridão acima das
árvores. Eu não sabia de quem o sinalizador era, mas vinha da
a matar. Queremos o seu irmão, não você ― rosnou uma voz atrás
― Túlio?
Mariano praguejou.
― Vou cuidar disso, pequena. ― Alisou meu cabelo e pegou a
urgência.
meu irmão.
Rafaelle
agiria por impulso. Porém, no fundo, não era por isso que eu o
ajudaria.
diferentes, e não era fingida a garota que tinha ido ali mais cedo,
mão.
expressão.
Arqueei as sobrancelhas.
― Por que faria isso? ― retruquei, forçando-me a respirar
dos homens me trouxe remédio, mas não quis tomá-lo. Esse gesto
Estava furioso por seus homens terem me deixado assim, mas sob
controle.
que é meu, mas para isso não posso temer a segurança de Mália.
― Encarou meus olhos. Os dele não refletiam nada. ― Preciso dela
segura para limpar a sujeira.
Era claro que eu tinha decidido topar sua oferta, mas não
facilitaria para ele.
― Não preciso que esteja ao lado dela 24 horas por dia. Sua
parte no plano é deixar que ela viva como uma civil em seu território,
derramamento de sangue?
Paolo Castilho era o chefe da máfia Pacheco, o homem que eu
pode ser mais tarde ou amanhã cedo, mas virão, a não ser que me
mate agora, porém não vai fazer isso, porque precisa de mim. ― El
meu.
― Não. Preciso de algo mais promissor. Ouvi falar de você,
Razor, um homem que calcula tudo, focado em negócios e
estratégias, por isso armou o que fará hoje. Você quer sua irmã
Notei que ele não queria isso, mas, como estávamos sem
frieza.
― Por que confia que não matarei sua irmã? ― Estava curioso
com isso. Eu não deixaria minhas irmãs com quem não conhecia.
― Já faz algum tempo que pesquiso sobre vocês três, Morellis.
favor. Sei tudo sobre a forma como levam sua organização. Mália
― Preciso falar com meu irmão antes, mas acredito que sim.
Eu pegaria meu telefone, mas alguém deu fim nele ― acusei.
segundos.
― Porra! ― praguejei, segurando o local. ― Sorte sua eu não
estar bem, ou fritaria sua cara por ter me dado uma coronhada.
anterior.
― Aceito. Agora pegue isso e fale com seu irmão. Não temos
de Alessandro.
então até lá você estaria morto. ― Deu de ombros. ― Por que não
sido capturado.
Ele não sabia que eu havia sido sequestrado? Provavelmente
eu estaria morto caso minha vida não fosse importante para Razor.
Houve silêncio.
acordo com meu raptor para ser solto, por isso liguei para saber se
você concorda.
― Quem está com você? E o que querem para soltá-lo? Algum
uma cabana.
muito tempo.
― Sim, foi ele que me trouxe para o lugar onde estou. ― Olhei
― indagou desconfiado.
mansão de Murilo. Seu enterro será amanhã. Com isso, creio que
― Não, mas talvez a merda vá explodir para nós. Foi por isso
que liguei, não podia negociar sem falar com você, além de lhe dizer
que estou bem. ― Passei a mão no rosto. A exaustão me tomava.
― O que acha?
― Não tem nenhuma forma de você sair daí por conta própria?
― checou.
― Não. ― Eu não precisava dizer que não queria que a garota
mais após saber de tudo, mas preciso acertar as contas com Paolo,
por isso conto com você comigo. Não posso focar nisso se você
estiver por aí, correndo riscos. ― Sua voz saiu baixa e repreensiva.
― Entendo. Isso não irá se repetir. Então posso fechar aqui?
Razor assentiu.
― Ótimo. Garantirei o cumprimento da minha parte do acordo
também.
― Ela sabe que você não vem junto? ― Pela forma como ela
falou, não parecia saber.
― Não, pensa que logo me juntarei a ela, mas Mália vai
trabalhar lá. Tudo já foi ajeitado. Ela se aperfeiçoou nos cursos que
fez. ― Recomeçou a andar.
― Alguém seu a vigiará? Ela viveu sozinha em algum
Porra!
Capítulo 8
Rafaelle
Mália, com medo de que alguém conseguisse chegar até ela antes
de Razor.
estava sozinho ali. Razor era aliado deles. Eu não sabia por que não
Além disso, minha mãe pediu, na carta que deixou para Luna,
que eu não procurasse os filhos de Paolo. Minhas contas a acertar
― Sei por que o quer, pois descobriu o caso que meu pai e
sua mãe tiveram. O nosso pai nos contou, mas, seja o que for que
esteja pensando, não foi dessa forma. Seu pai a deu ao nosso como
gado ― falou Valentino com tom sombrio. ― Estou contente que ele
esteja morto.
― Rafaelle... ― Benjamin começou, mas ouvi gritos histéricos
à distância.
está vivo...
Ela não parecia estar ouvindo, era como se estivesse em
segurando-a firme.
― Pode cuidar de Túlio? ― Encarou Benjamin. ― Na cabana
causa dela você não foi morto ainda pelos ataques às nossas
instalações. ― Seus olhos demonstravam fúria. ― Sugiro que pare,
encarou e veio até mim, colocando uma das mãos no meu ombro,
ao que me afastei. ― Sou grato a você e ao Alessandro por terem
― Não me faça rir. Com certeza ainda deve estar lá, e, quando
frente.
― Não pode...
por um tempo.
irmã para chegar até mim. Quem fez isso irá pagar caro.
Paolo Castilho.
― Ei, vamos. Depois vocês resolvem o que têm para resolver
― repetiu Razor.
― Pelo visto, seja quem for que está atrás de você, quer usá-
mais cedo?
― Sim, eu sei, por isso a quero longe, enquanto resolvo
assim, por isso ela vai ser uma civil, longe do seu mundo.
― Isso é fodido. ― Encarei a garota.
pescoço dela. ― Diga-lhe que tudo que precisa está aqui. A senha é
a data da nossa destruição. Ela saberá que dia é. O local onde tudo
Milão?
― Um submarino ficará fora de vista por enquanto. A Austrália
eu perdi os dois, tanto ela como meu pai. Assim ficará fora do radar
esconder isso dela, eu sei, mas ela vai sofrer quando souber, e eu
não vou estar lá para ela. ― Respirou fundo. ― Vá, tome conta
lindo rosto inconsciente, tão sereno, mas que eu sabia que era
consertá-lo.
Capítulo 9
Mália
Teria que ter uma palavrinha com meu irmão sobre parar de
me dopar. Eu sabia que tinha surtado, mas não carecia ser dopada.
Rafaelle. O que ele fazia naquele lugar? Então recordei que ele iria
tomar conta de mim, mas achei que meu irmão estaria conosco ao
agora. Não sei seus planos, mas parece que vai atrás do... dos
da destruição de vocês dois e que o local onde está tudo que você
quiser é o lugar no qual você mais ama estar. ― Virou-se para voltar
à cozinha enquanto falava, mas parou e me olhou de lado. ― Ele
vai entrar em contato eventualmente, só primeiro terá que lidar com
tudo.
Tremi, temendo ficar muito tempo longe do meu irmão.
― Olha, seu irmão sabe o que faz. Agora você poderá ter uma
vida lá fora como uma pessoa normal até que ele resolva seus
problemas.
Rafaelle não parecia estar mentindo, embora os assassinos
fizessem isso com facilidade. Eu devia estar com medo de ficarmos
dor de uma mãe enterrar um filho deve ser mil vezes pior.
― Onde estamos? Parece que não têm habitantes aqui. ― O
lugar era lindo, cheio de palmeiras.
lugar?
― Por uma ou duas semanas, então um barco virá até nós
para nos levar daqui.
Arregalei os olhos.
― Cada dia fico com mais raiva. Queria eu mesma acabar com
coisa dele?
Seu olhar no meu rosto estava distante, parecia triste.
― Não vá por esse caminho. Tirar uma vida traz
pela forma como ele disse. Seu olhar era distante. ― Se não quiser
temia que eu surtasse por falar da minha mãe? De fato, ter visto
aquele homem me dava esperança de chegar a ele mais rápido e
Ele era careca e tinha tatuagens na cabeça. Sei que isso não é
muito, mas cada gangue ou máfia tem suas marcas. Talvez essa
seja uma. ― Virei-me para ele. ― Conhece alguém assim?
― Mália ― seu tom de voz estava baixo ―, nada disso é sua culpa.
Olhei para ele, mas o vi embaçado por causa das lágrimas.
restava Rafaelle.
― É, sim. Greg morreu, e Túlio...
Sacudi a cabeça.
sacudindo a cabeça.
Ele colocou os braços em volta de mim e trouxe meu rosto
― Você sente...
Tentei me afastar para ver seu rosto, mas ele não permitiu.
― Para mim, mas, para uma pessoa como você, que entrou na
mata só para salvar um soldado e até chorou, não, isso nunca iria
molhado.
e tabloides.
grata.
― Não tem problema. ― Deu de ombros.
Arregalei os olhos.
― Jura? ― Ri sacudindo a cabeça. ― Queria ver a cara de
o meu corpo ganhou vida. Sua boca sexy me deixou tonta, bem
como seu hálito quente banhando meu rosto, tanto quanto os olhos
dele, que me deixavam sem fôlego. Ele nem sabia disso, só estava
tentando me ajudar.
Eu não disse nada, porque ele tinha razão. Eu não estava ali
quis aquele amor que via nos livros e entre meus pais, mesmo com
de prioridades.
enquanto ficava de pé. Foi quando notei que não estava com o
vestido de ontem. Esse era mais longo e mais justo e não estava
rasgado.
― Onde está a roupa com que eu estava?
Rafaelle suspirou.
que não faz isso agora e vem comer antes que os alimentos
esfriem? ― sugeriu, entrando na casa.
― Como vim parar na cama? Foi meu irmão que me trouxe?
― Sim, pois seu irmão não estava aqui. ― Foi para a cozinha
e indicou o quarto. ― Vá tomar banho.
depois.
Tomei banho, livrando-me de todo aquele resto de sangue,
suor e poeira. Após terminar, voltei para a cozinha, e o vi ao redor
do fogão, fritando ovos mexidos.
prato.
Suspirei e olhei para a janela aberta da cozinha.
― Às vezes falar alivia o fardo ― comentei, então o encarei. ―
Obrigada por não ter me deixado surtar hoje. Ao menos não corri
dessa vez.
― Dessa vez? ― Franziu a testa.
― Quando acordei na ilha e não vi meu irmão, mas Valentino,
logo fôssemos embora. A única coisa que eu podia fazer era rezar
para meu irmão ficar bem, que nada viesse a acontecer a ele e ao
Rafaelle
deixado cair durante o sono? Era estranho, pois isso nunca havia
acontecido.
Precisava deixar claro que ela não podia chegar perto de mim
enquanto eu dormia; isso seria perigoso. Ainda me recordava da vez
que quase matei minha irmã. Não podia deixar que acontecesse de
novo. Estava aliviado por ela não ter se aproximado de mim durante
o meu sono.
Não a vi no corredor.
― Mália, está aí dentro? ― Bati à porta do seu dormitório. ―
colocado lá, por isso não toquei nela. ― Deu de ombros e arqueou
quando meu pai não estava em casa. Eu ficava muito com ela, por
isso aprendi e gostava.
linda demais para o meu gosto, mas não era isso que estava
tocando no fundo do meu coração negro, era seu sorriso
Ela fez o que mandei. Fui até ela e fiquei às suas costas.
― Seus pés devem estar abertos na largura dos ombros, com
o pé oposto à mão dominante um passo à frente do outro pé. ― Ela
um tiro.
― Foco, Mália ― pedi com a respiração irregular. Essa
mensagem também era para mim. Ficar tão próximo dela me fazia
ter ideias que não deveria.
alvos.
― Faça o que ensinei ― ordenei, ignorando os batimentos
arma na mão.
― Acertei! ― Sua vibração era contagiante, ela parecia uma
exultante.
manhã ― prometi.
Uma coisa que notei em Mália foi que ela adorava fazer coisas
que nunca tinha feito e, quando tinha êxito, ficava em êxtase. Podia
merda, aquela mulher era fascinante. Doce, gentil e, por mais que já
tinha passado, ainda era viva e vibrante. Tinha olhos brilhantes e
Nunca tinha permitido algo assim, não seria agora. Eu sentia que,
se me deixasse levar, não seria apenas sexo. Um sentimento
desconhecido me tomava.
esquecer-se da arma.
fundo. Aliás, tudo que a deixava contente fazia meu coração negro
querer explodir.
― Sei que sim, sou bom professor. ― Toquei seu nariz e fui
sexual, mas com Mália eu sentia que seria mais do que isso.
― Rafaelle, o que acha que vai acontecer? ― Ouvi sua voz
atrás de mim.
― O quê?
― O que vai acontecer? Estamos aqui há uma semana, e
ninguém aparece. Você acha que meu irmão vai conseguir realizar o
que tanto quer? ― Suspirou. ― Ele deveria revelar seus planos.
não lhe contar a verdade. Esse era um sentimento raro para mim
Quando falar com meu irmão, irei perguntar o que está acontecendo
pois toda noite falo com ele, mas não me diz nada. ― Ela parecia
frustrada.
― Somos de máfias diferentes. Por mais que confie que não
irei machucá-la, ele não irá me revelar seus planos. Mas vou dar um
jeito de descobrir.
Ela sorriu.
com ela. Nem parecia que eu estava em uma missão. Ser capo por
15 dias e ter que limpar nosso povo dos vermes que estavam nos
compradores; esses, sim, iriam fazer uso delas. Como não podia
deixar que isso acontecesse, eu as comprava dizendo que iria
Sacudi a cabeça.
― Não, vamos terminar aqui e andar um pouco. ― Recuperei-
me e indiquei seu prato. ― Agora volte a comer para irmos.
curioso.
― Estava a ponto de fazer faculdade. Queria uma nos Estados
Unidos, mas meu pai não deixou; disse que não me manteria longe
― Não, ainda bem, mas me sinto culpado por tê-la deixado lá.
Eu deveria ter tido pulso mais firme e conseguido dizer não. ― Isso
me corroía.
― Não é sua culpa, Rafaelle, e sim desse desgraçado que ia
machucá-la. ― Rosnou com os punhos cerrados: ― É por isso que
quero aprender a atirar; assim, ninguém nunca mais tocará em mim.
Um frio desceu por minha espinha.
― Alguém a tocou? ― Meu peito se apertou, querendo
que já lhe contei isso. Mas penso que ele teria feito pior se papai
não chegasse a tempo. É claro que eu teria lutado, mas ele era
forte, eu não venceria. Wilson sempre dava em cima de mim, mas a
serpente venenosa.
Antes que eu comentasse algo, chegamos ao local que falei a
ela. Era um vasto pasto verdejante com um penhasco logo à frente.
― Uau! ― Embasbacou-se. ― Aqui é mágico, tão lindo! Dá
vontade de morar em algum lugar assim.
Mália correu na direção do penhasco e se virou para mim com
podiam acontecer.
― Claro. ― Checou ao redor. ― Mas não tem nada aqui que
sirva de alvo.
família.
Não vou negar que eu amava o que fazia, era assim, fui
forjado para ser um assassino. Nunca almejei mais que isso, não
era digno de nada mais além de um dia ser morto com meu coração
sendo arrancado ou coisa pior. Uma vida assim era demais para
Sorri por deixá-la assim, por meu toque fazê-la ficar sem
fôlego, mas me sentia da mesma forma. Coloquei minhas mãos em
sua cintura e a puxei para mim, fazendo-a arfar.
ajudá-la.
― Vai, atira. ― Eu a distraía fazendo círculos em sua barriga.
mundo.
― Saber atirar é uma coisa, matar é outra. Não aprenda
pensando nisso, mas em se defender caso um dia precise. Vai dar
certo. Não deixarei que nada aconteça a você, ok? ― Essa era uma
promessa que eu podia fazer.
Mália virou a cabeça para mim, com aqueles olhos
encantadores e esperançosos.
― Obrigada por tudo, por fazer esse momento ser especial. ―
Abraçou-me, respirando fundo.
adorava sua presença, seu riso solto e sua alegria a cada coisa
nova que fazia. Seu sorriso era capaz de derreter até mesmo o
invólucro de gelo que havia em volta do meu coração.
Mália
me a atirar e até a surfar, algo em que não me dei bem, caía direto
noite.
Acordei na primeira noite com seus gemidos de dor. Os sons
privacidade invadida.
não era isso, mas o fato de ele dormir com uma faca na mão, como
se precisasse se proteger de alguém. Mesmo em seu
ele segurou minha mão como se eu fosse o cabo da faca. Notei que
Ficava lá todas as noites, acordada até mais tarde vendo seu belo
rosto, tão sereno, mas perturbado com alguma coisa que aconteceu
em seu passado.
O que lhe teria acontecido? Devia ter sido algo grave. Isso me
arma e saí do cômodo. Sabia que tinha me visto. Tive que inventar
uma desculpa para minha presença no quarto. Ainda bem que ele
surfar. Ele o fazia muito bem, como se fosse natural e fizesse isso
não tem sinal. Me deixa terminar o que preciso fazer, então você o
verá e falará com ele ― assegurou.
Senti-me mais aliviada com suas palavras.
― Tudo bem. Assim que o vir, diga que o amo demais e que
estou louca para abraçá-lo. ― Estava mesmo contando os minutos
vontade de dizer o que queria dele, mas temia uma rejeição, embora
notasse como ele me olhava frequentemente.
que eu estava pensando. Devia ter ficado claro por minha expressão
de cobiça, mas que mulher não o desejaria? Aquele deus grego me
tentando todo santo dia era demais.
ele.
― Sim, farei, querida. Agora me deixa falar com Rafaelle sobre
algumas coisas. ― Tinha algo suspeito em sua voz, mas eu não
virassem gelatina.
Minha respiração acelerou. Levantei meus olhos para os dele e
coloquei minha mão em seu peito nu para me apoiar, mas acho que
foi a coisa errada a se fazer. Meu coração bateu forte demais, mais
do que ao presenciá-lo surfando. Sua boca próxima à minha me
faço do meu jeito, saio daqui por mim mesmo, usando meus
contatos. ― Sua voz soou dura.
Tentei ao máximo não ligar para como meu coração disparava assim
nos braços, na cabeça e até nas minhas bochechas. Cada toque era
ninguém na minha vida. Com Rafaelle tinha algo mais, e notei que,
no decorrer da convivência, estava aumentando. Cada conversa,
cada mergulho no oceano, cada almoço que fazíamos juntos trazia
pouco dele. ― Não sabe nada sobre mim. ― Blefei: ― É claro que
beijei alguns garotos.
lábios tão próximos dos meus. Engoli em seco, ansiando por sua
boca. Esse era um dos meus desejos, beijar aquele homem.
homem era um dos mais controlados que já conheci, pois eu via que
ele me queria também.
do céu.
Antes que ele dissesse algo, pulei na água, não querendo
preferida na escola.
de nadar, encarando-o.
― O que você... ― Fui cortada por sua boca na minha,
devorando-me, possuindo-me.
de minha boca me fazia gemer e querer mais dele, mas, antes que
sussurrou.
meu rosto.
― Não resista. Vamos viver isso, aproveitar...
― Isso vale para mim. Posso não estar viva no final de tudo
jurou.
― O que quero dizer é que, embora eu tema a morte, o pior é
na beira da piscina.
― Rafaelle, o que...
olhos.
Foi como um soco. Eu estava tão animada e contente por ter
princípio, magoada logo após, mas depois com raiva. Quem ele
achava que eu era?
mesmo. ― Não deixaria que ele exercesse poder sobre mim. Era
mais forte que isso. Foi só um beijo. Eu iria esquecer que
cima de mim.
― Não, não vou deixá-la, pois quero que saiba que beijá-la foi
a coisa mais perfeita que já fiz. ― Abaixou o rosto até o meu sem
não posso permitir que pense que o que aconteceu não significou
machucar.
― Confio em você. Agora só vamos viver isso, seja lá o que
for, e pare de querer me afastar. ― Toquei sua barba, aproximando-
Mália
Eu queria dizer-lhe que estava pronta, mas foi bom termos aquela
semana para nos conhecermos melhor.
Aprendi muitas coisas que ele me ensinou, mas não era isso
estarmos juntos.
Rafaelle seria um namorado perfeito, mas ainda teríamos
― Não achei que seriam tão perfeitos os dias aqui, neste lugar
altura.
rosto.
Sacudiu a cabeça.
Ele era perfeito, não só sua beleza, mas tudo que fazia, a
forma que me tratava, como se eu fosse especial, a ternura... Meu
coração balançava.
Sua boca saiu dos meus lábios e veio para o meu pescoço,
para meu quadril e minha coxa e seguindo até entre minhas pernas,
onde pulsava.
assentindo.
― Com os dedos ou algo mais? ― sondou, beijando meu
insistiu:
― Preciso ouvir. ― Sua voz, assim como seu toque, fez minha
respiração acelerar ainda mais.
tremi, mas pela força do seu olhar e do seu toque, que fazia meu
corpo inteiro se incendiar como um canavial.
abocanhou meu seio e traçou sua língua por ele. Quase desfaleci ali
de tanto prazer.
Uma de suas mãos afastou a calcinha e triscou meu nervo
entre nós.
Eu estava prestes a sondar o que ele estava falando, quando
Rafaelle começou a roçar em mim.
Eu tinha gozado fazia alguns segundo com seus dedos, foi
mágico, mas nada que se comparasse àquilo. Era esplêndido senti-
lo daquela forma. Minhas mãos foram para suas costas, e o apertei,
coração especialmente.
Dei um beijo leve nele e sorri.
peito, enquanto ele alisava minhas costas. Estava calado desde que
saímos da água. Notei-o tenso com a pergunta.
disse que tinha muitos, e acho que pode se abrir quanto aqueles
pelos quais estou curiosa ― pedi, na tentativa de que falasse algo.
com o outro...
― Mália...
lhe fazem mal, e contá-las pode aliviar seu fardo. Vamos fazer isso
aos poucos. Não vou obrigá-lo jamais a dizer algo que não esteja
pronto para contar, mas acho que não tem problema quanto aos que
insônias, mas ele não estava preparado. Então preferi focar em algo
primeira vez que a vi. Sempre estive tentada a lhe perguntar o seu
preocupasse de verdade.
que aquela tatuagem tinha para ele. Esperava que um dia ele me
dissesse.
curiosa, tentando entender essa sua raiva por ele. ― Essa pergunta
parecia ser mais fácil que as outras.
desenrolar.
que Paolo não violaria uma mulher. Eu não achava certo falar sobre
― Mália...
seu braço.
― Ei, não fique bravo. Não os conheço, mas algo horrível
dizia que, como era território de outras máfias, isso não podia
acontecer. A Sicília é um lugar ao qual sonho em ir, particularmente
para conhecer pessoalmente o vulcão Etna.
era lindo.
― Estou ansiosa para conhecer seu país. Só queria que minha
Sorri.
― Linda, bondosa e amorosa, forte e destemida. ― Tentei
colocar em palavras o que eu sentia por minha mãe, mas não
consegui. ― Fazíamos trilhas, patinávamos no gelo juntas. Foi ela
que me ensinou. Era seu sonho se tornar uma patinadora, mas isso
foi interrompido quando ela... se foi.
tenho esse amor como a minha mãe tinha. Quero ser profissional
um dia. Ela não teve a chance.
― Assim que todos os problemas passarem, pode continuar.
― Estou contando com isso, agora que sei que minha família
está bem. Só desejo que o assassino de mamãe seja capturado.
Quero que pague caro por tê-la levado de mim.
― Seu irmão vai conseguir. Sem você para ser usada como
um alvo, ele vai pegar o maldito e fazê-lo pagar. ― Ele parecia
seguro disso.
― Tomaso?
― Não, o irmão da minha mãe, Ulisses. Ele é ambicioso e me
dá arrepios ― sussurrei.
mas talvez fosse o melhor. ― O pior para mim foi que, além de
matá-la, ele fez parecer que ela estava na cama com outro homem,
mas foi uma armação. Minha mãe adorava meu pai, o venerava.
Os tiros... O sangue...
Mãos suaves tocaram meu rosto.
lembranças ruins.
― Minha mãe morreu quando eu era adolescente. Foi difícil
lidar ― sussurrou tão baixo que pensei ter ouvido. ― Kélia tinha o
sonho de ser bailarina. Sua mãe teve sorte de casar-se com quem
ela amava, mas a minha não. Ela foi prometida ao monstro do meu
pai.
Ficou em silêncio alguns minutos. Esperei. Com ele era assim,
às vezes eu poderia pensar que estava sozinha, se não fosse por
peito, respirando fundo. ― Não sei o que faria se perdesse meu pai
agora, que só tenho a ele e meu irmão. Não quero nem pensar
nessa hipótese.
Rafaelle
não por Razor, por Paolo, o que não aconteceu. Se não fosse por eu
não podia mais, era mais forte do que eu. Não sabia quando tinha
sido feliz dessa forma; acreditava que nunca.
anos. Como eu não podia levá-la para jantar fora, por estarmos
presos ali, organizei uma mesinha de jantar na piscina. Era uma
mais.
Mália saiu do banheiro perguntando como estava sua
feia.
era suficiente, sempre queria mais dela, mas não daria esse passo,
não até ser totalmente sincero com ela. Eu já havia frisado isso ao
seu irmão: ou ele lhe contava sobre o seu pai ou eu o faria, e não
éramos um para o outro, mas para mim ela já era minha e ninguém
mais a tocaria.
uma ilha, e pensava que não havia muitas coisas para se fazer em
uma, mas agora vejo que têm, sim. ― Com os braços em volta do
meu pescoço, fitou meus olhos. ― Todo esse tempo aqui foi mágico,
falamos disso...
― Ei, estamos juntos aqui e vamos continuar lá fora, Mália.
Não tenha medo de que eu a magoe, não vou fazer isso. ― Iria
cumprir essa promessa.
pudesse fazer algo assim, ser assim. ― Puxei a cadeira para ela e
me sentei à sua frente. ― Só queria fazer uma surpresa.
danço. Acho que foi nos casamentos das minhas duas irmãs e
apenas com elas.
dançarino.
― Sou uma ótima professora. ― Sua voz era suave.
Esbocei um sorriso.
a a arfar.
Seus braços envolveram meu pescoço. Eu era mais alto que
ela uma cabeça. Mália elevou seus olhos para os meus. Juro que,
nesse momento, parecia que o lugar ao nosso redor tinha
desaparecido, que só restávamos nós dois no tempo e no espaço.
― Perfeita.
parecendo em êxtase.
― Que bom. Fico contente com isso. ― Puxei-a para a mesa.
italiano.
― O meu ― menti.
Ela assentiu e ficou de pé.
Virei-me e a vi ao telefone.
Razor suspirou.
é seu aniversário.
― Eu sei. Por que você mesmo não diz o que esse homem
encarei o homem.
estava atrás de Mália para usá-la contra seu irmão podia muito bem
estar monitorando o espaço aéreo. Ninguém podia saber que Mália
Estreitei os olhos.
― Certo. Vou pegar esse navio, mas, se algo der errado, vou
assim.
Chequei Mália, como sempre fazia direto. Minha garota ainda
sorriso, assentindo. Não entendi nem dei a mínima para o que ele
lhe dado seu prazo. Não podia continuar a esconder aquilo dela.
Mália piscou e estremeceu.
sua volta.
― Mália, você é minha. Não pretendo esconder o que temos,
seu pescoço.
― Rafaelle...
coxas.
― Rafaelle, eu estou...
― Vou cuidar de você, linda. ― Passei a língua em sua coxa,
lambendo-a.
Adorava vê-la se remexer assim, clamar por mais. Era como
uma música adorável.
― Onde quer minha boca, Mália? Aqui? ― Trilhei a língua de
que eu não ficava com ninguém. Após saber da minha mãe, apenas
foquei em descobrir onde Paolo estava e colocar minhas mãos nele.
Então apareceu Mália, arrebatando meu ser.
parte, pelo menos. Esperaria até sairmos dali para dar esse passo,
mas não conseguia resistir à vontade de tocá-la nem que fosse
daquela maneira.
leves ali até que ela parasse de tremer em seu orgasmo. Depois me
elevei sobre ela, descobrindo seu rosto.
― Você é tão linda, ainda mais gozando. ― Possuí sua boca
braços.
― Quando chegarmos a Milão, abrirei o jogo. Não irei
esconder nada de você. ― E torceria para que me perdoasse no
final.
Além do segredo sobre a morte do seu pai, que seria
devastador para ela, eu ainda iria lhe falar sobre mim. Não era tanto
Mália
Franzi a testa.
― O que foi? Está muito atento a tudo nesses dois dias no
mar, mal dorme. ― Nem tinha a ver com os seus pesadelos, ele só
ficava alerta a qualquer movimento no corredor do navio de pesca
Rafaelle, pois podia não ser nada, embora acreditasse que ele
Apenas uma ilha ao sul daqui divide nossa fronteira. Acredito que
ele não escondeu a estrela porque achou que só teriam civis aqui,
muito tempo. Ou isso ou ele é louco a ponto de não ligar. ― Sua voz
era fria como o Alasca.
matamos quem não nos paga ou nos rouba, mas não cometemos
não têm regras. São mais uma gangue do que uma máfia, embora
Ele foi até debaixo da cama e pegou uma mochila com armas,
assim como uma arma grande, colocando ambas nas costas.
― Rafaelle, quem é...
― Como sabe?
― Sou treinado para reconhecer um sinal de qualquer
organização, máfias, MCs, carteis. ― Pegou minha mão para
sairmos dali.
― O que ele fez que te alertou? ― Estava curiosa.
você disse que, se ele fizesse de novo o que lhe fez, iria retalhá-lo
com sua própria arma.
nessa região. Acho que já deve saber que estão de olho em você.
― Eu sei. Faz um tempo que estamos atrás deles, porque
interferem em nossas entregas de metanfetaminas nessa rota que
vem da Austrália.
tripulantes.
― Estamos sendo atacados! Se escondam e deixem que
levem a mercadoria! ― gritou alguém.
Ele foi checar quem tinha matado, depois veio até mim e me
ajudou a ficar de pé para continuarmos a correr.
navio.
de tarde.
Apontou. ― Tem uma ilha não muito longe daqui. Eu cuido de tirar a
bala.
― Me deixa...
Franzi a testa.
homens.
alguém próximo morrer. Foi o que aconteceu com Túlio, pois pensei
que ele estava morto.
que me preocupou.
― Merda, não posso desmaiar agora ― falou baixo,
praguejando.
impotente.
após limpar seu ferimento e cobri-lo para que seu sangue não
continuasse a esvair. Mesmo que ele não pudesse me ouvir, eu
inferno.
Foquei no que Rafaelle me ensinou sobre atirar, assim não
meus olhos logo após atirar. Quando os abri, estava ofegante como
se tivesse participado de uma maratona.
sempre.
cruel assim. Ele queria Rafaelle. Tranquei meu medo, minha dor e
culpa, fechei minhas emoções, assim conseguiria ir em busca de
salvar meu namorado, que precisava de mim. Depois lidaria com
aquilo e surtaria, mas por enquanto não podia me dar esse luxo.
Liguei a lancha e fui embora para a ilha que Rafaelle tinha me
indicado, sem olhar para trás, para onde tinha ficado um pedaço de
mim que nunca voltaria. Contudo, não era hora de sucumbir.
Naveguei por mais alguns minutos e avistei a ilha. Isso me
deixou aliviada. Só precisava encontrar alguém que o ajudasse.
por algo assim. Isso era triste. Uma pessoa devia estar preparada
para coisas boas, não ruins.
― O que foi, moça? ― sondou ele, prestativo e temeroso.
para cá. Estou com medo. Ele vai ficar bem? ― sussurrei.
O senhor o examinou.
― Acredito que sim, me deixa examiná-lo. ― Virou a cabeça
sangue.
O senhor, que se chamava Finn, examinou-o, dizendo que ele
ficaria bem, só precisava de sangue e descanso para se recuperar.
Sacudi a cabeça.
― Não sei. ― O medo se apossou de mim ainda mais. ― Isso
mão.
― Tudo ficará bem, minha jovem ― disse a mulher. ― Me
chame de Matilda.
saindo do quarto.
Naquele momento, minha roupa era a última coisa em que eu
A morte era algo que eu entendia. Sabia que todos passam por
ela, embora viesse mais cedo e mais rápido para algumas pessoas
Assenti.
― Rafaelle vai realmente ficar bom, né? ― Minha voz tremia.
― Sim, ele vai, moça. A bala não atingiu nenhum órgão vital.
― Sorriu de modo gentil. ― Matilda fez o jantar. Por que não toma
um banho, troca essa roupa manchada de sangue e vai comer?
Sacudi a cabeça.
― Não estou com fome, mas obrigada. Não sei o que seria
dele se eu não encontrasse vocês ― sussurrei. Estava mesmo
agradecida.
fiquei ali, com minha mãe unida à sua, como fazia na ilha e no navio
para aquietar seus sonhos ruins.
― Fica bom logo ― pedi, trazendo a mão dele para mais perto
queria isso.
Meu irmão estava sumido, e eu estava ali, indo para um lugar
desconhecido a fim de ter um novo futuro, e aquele homem que
levara uma bala para me proteger estava ajudando para que isso
acontecesse.
Alisei sua testa e barba. Era tão sereno enquanto dormia, nem
― Não me deixe...
O sofrimento estava em sua voz ao chamar aquele nome
feminino e me fez sentir um outro tipo de dor. Quem seria ela?
― Isso, fique bom e volte para quem ama, para sua família.
Eles precisam de você. ― Seu peito era coberto de tatuagens.
como por saber que Rafaelle talvez amasse outra pessoa. Sacudi a
cabeça, não querendo pensar nisso, só pressionei o rosto no
colchão e chorei.
Creio em Deus que irá sobreviver.
Capítulo 15
Rafaelle
recordei que o navio em que estava com Mália foi atacado pela
apoiado no colchão.
daquela menina.
Tentei tocar seu rosto sereno e lindo, mas ela segurava firme
porta do quarto.
Chequei ao redor em busca de alguma arma, mas não vi
cômodo com um sorriso, mas não entendi por que estava alegre.
depois suspirou. ― Ficou dois dias apagado. Achei que não iria
acordar...
dor maior.
custo.
― Morri de medo ao vê-lo sangrando e desacordado... ― Ela
na sua voz.
― O que aconteceu?
me levar e me torturar, ele faria coisa pior com você. Vi a forma que
te olhava. Só não se aproximou porque sabia quem eu era e o que
aconteceria com ele. Seu nome era Saulo, era conhecido por
desmembrar as meninas com quem ficava, e até meninos. Para ele,
qualquer buraco servia.
olhos.
― Seu coração não é negro ― retrucou, colocando a mão
ferimento.
Nem sempre foi assim, pensei. Teve uma época em que tirei
― Mália...
assassino da minha mãe, mas acho que você tem razão. Matar não
é minha natureza, como é para você e meu irmão.
fazer isso. Vou descobrir quem matou sua mãe e matá-lo, e você
nunca mais terá que puxar o gatilho na vida. ― Era uma promessa
tentativa de levar sua cabeça para outro rumo, assim não pensava
agradecendo a Deus por Mália estar bem e feliz por ela ter matado o
nessa possibilidade.
Ela parou o que estava fazendo e me olhou.
― Machuquei você?
Sorri para tranquilizá-la.
me ver ferido.
― Vou ficar bem, linda. Já passei por algo pior e ainda estou
mim ou o quê?
Olhou-me e sorriu.
― Não seria normal ter medo dele, pois logo espero descobrir
seus segredos e chegar à segunda fase. ― Abaixou minhas calças
e a cueca.
Seu olhar no meu pau me deixou duro como uma rocha.
― Ele está...
Vamos dizer que não tive uma boa criação. Fui obrigado a matar
logo cedo. Eu sabia que teria que fazê-lo, por ter nascido na máfia,
Rafaelle!
― Foi uma época conturbada, admito. Não tinha nem uma
Marco usou nossas irmãs, como sempre fazia. ― Isso era o que eu
mais odiava, tanto que lamentava não o ter matado mais cedo.
― Sim. Você sofreu tanto, sofre até hoje... É por isso que não
Meu corpo ficou tenso, pois sabia que logo teríamos que falar
sobre aquilo, mas eu não achei que teria energia para tal ato
naquele momento.
― Mália...
doutor Finn chegou. Vá até ele para que o examine enquanto tomo
banho e troco de roupa.
Acreditava nela, não mentiria caso fosse algo sério. Se algum
problema tivesse acontecido, ela teria me contado. Ao menos eu
Rafaelle
faca.
― Um paraíso, não é? ― inquiriu a voz de um homem. ― Me
meus ferimentos.
Assenti.
― Mália disse que tem um avião que sai daqui toda manhã.
Conhece alguém que possa nos levar hoje, apenas nós dois? ―
Não podia arriscar a presença de outros passageiros. Além disso,
caro...
― Dinheiro não é problema, só precisamos sair daqui logo ―
interrompi-o.
Ele me avaliava, mas assentiu.
― Vou falar com ele. ― Pegou um telefone e ligou, então foi
emprestar um minuto?
― Claro, mas não quer que eu o examine agora? ― Entregou-
me o aparelho.
― Depois, me deixa falar com quem preciso antes. ― Forcei
um sorriso e menti: ― Estou quase sem dor.
que pensa que está fazendo? Precisa cuidar de sua ferida ― ralhou
ela.
que fez. Eu não sabia o que fazer para ajudá-la a vencer seu
trauma.
fim de beijá-la, mas ela virou o rosto. Franzi a testa. ― O que foi?
― Nada. Vou dar um mergulho antes de irmos embora. O
senhor Finn disse que você fretou outro avião. ― Não encontrou
meus olhos.
― Sim. Mália...
― Vou aproveitar este lugar antes de irmos, então ―
― Rafaelle!
Tinha me esquecido de que estava conversando com o meu
irmão.
― Não sei ao certo, mas não vou deixar ninguém tocar nela.
Mália é minha. ― Foquei na conversa com Alessandro.
Ele ficou em silêncio, mas eu não estava com disposição para
traseiro.
― Não sabemos onde. Você poderia nos levar até lá? ― ouvi
um deles perguntar.
em torno de sua cintura nua. Ela estava prestes a gritar, pela tensão
em seu corpo, mas relaxou assim que viu que era eu. Seu sorriso
para mim era tão brilhante quanto as estrelas ou o Sol sobre nossas
cabeças.
Não a entendia. Em alguns momentos, ela parecia querer
para os homens, que tinham ido na direção que ela havia apontado,
então tornou a me fitar com um sorriso, o que aliviou a minha fúria.
mas também não pensei que iria querer ficar com uma mulher mais
de uma vez, assim como acontecia com Mália. Ela me fazia querer
mais e mais.
Ele suspirou.
Você a tocou?
― De certa forma, sim. ― Observei-a na água. ― Mas não
souber...
― Não ligo para ele, dou conta de Razor. Não vou desistir de
em seguida ele a abaixou: ― Isso vai se voltar contra nós logo, você
vai ver.
― Não vai, ficarei em Sydney até abaixar a poeira. Se Sultão
Nenhum inimigo podia saber que quem matou Saulo havia sido
Mália. Se isso vazasse, seria perigoso para ela. ― E não fui eu
― A garota?
― Não vou lutar contra. Seja o que for que acontecer a mais
alguém...
seguraria caso essa pessoa aparecesse. Pois bem, agora que tinha
recebido a graça de ter Mália em minha vida, não a deixaria
escapar. E ai daqueles que se metessem em meu caminho.
Mália
por conhecê-la. Sabia que não ficaríamos ali por muito tempo, mas
Após ele acordar do desmaio, fiquei muito feliz. Temia que não
despertasse, mesmo com o médico dizendo que Rafaelle se
pois ele a havia chamado de Kélia. Não achei foto alguma dele com
Rafaelle tinha esse poder. A prova disso foi como meu peito doeu ao
ouvi-lo chamar outra pessoa. Isso não era bom. Como eu podia
gostar tanto de alguém em um espaço tão curto de tempo? Além
acontecido, foi então que notei que falava do homem que matei.
sentia culpada.
de uma reunião.
― Não deveria repousar? Afinal está machucado. ― Ajeitei-me
no banco assim que o carro parou em frente a um imenso edifício.
― Estou acostumado com isso, foi só um tiro. ― Respirou
fundo.
― Pessoas normais estariam em um hospital, convalescendo.
para a cidade.
― Uau! ― murmurei maravilhada.
― Você não fez nada. ― No fundo, era verdade. Ele não tinha
culpa.
― Mália, isso tem a ver com o que aconteceu com você...
irregular.
Olhei para ele, então meu coração se partiu com tamanha dor
com aquela pessoa o destruíra de tal forma que ele não conseguiria
se recuperar um dia? Ele arfava como se tivesse corrido.
estivessem longe.
Atendeu o telefone.
decisiva.
cabeça.
comigo.
menos.
― Obrigado. Assim que eu voltar, conversamos ― me disse e
se afastou.
assim que chegasse, eu iria terminar tudo entre nós. Era só uma
conjectura, embora eu não conseguisse pensar em outra coisa.
pela sacada.
― Mália...
sozinha.
deixado algo para mim no lugar que essa chave em meu cordão
abre.
― Sim, tenho. Há lojas de roupas no prédio. ― Foi até uma
que queria, mas como? Rafaelle não me deixava entrar. Disse que
dois desejos.
Sacudi a cabeça, parando de pensar nisso e fui comprar
como Rafaelle.
― Preciso de sapatilhas ― respondi em sua língua, inglês.
tempo todo, até comentou que trabalhava ali havia dois anos.
chão.
― A propósito, sou Theo ― me disse com um sorriso educado.
Estou indo.
Assenti. Não temi que o rapaz faria algo contra mim, afinal
trabalhava ali. Além disso, eu sabia me defender.
me a carregar as compras.
― Na cobertura.
voz que revelasse que ele sabia quem Rafaelle era de fato.
― Não, só amiga de um deles. ― Devia ter dito que namorava
que caia, branco, no meio das coxas, com várias tiras até os
joelhos, onde terminavam as botas de cano longo. Meus cabelos
estavam soltos nas costas. Finalizei o look passando um batom
sabor morango.
Não sofreria naquele dia por Rafaelle. Minha vontade era de
entrar debaixo da coberta e chorar, mas não faria isso. Eu era forte
que sim, por isso não me preocupei tanto, mas ainda assim é difícil
estar longe... ― Respirei aliviada. Queria contar-lhe o que
aconteceu comigo quando fugimos do navio, mas não iria preocupá-
lo. Essa era outra dor que me assolava e me atormentaria para
sempre.
― Não se preocupe, tudo está conforme os planos. Vai dar
ele, avistei Rafaelle sentado a uma mesa. Não estava sozinho, tinha
uma mulher de cabelos escuros com ele, que sorriu de algo que ela
disse.
não podia, era adulta, não uma adolescente que corria atrás dele,
embora, naquele momento, quisesse correr para o mais distante
possível.
Era claro que ele não iria atender; não queria interromper seu
encontro.
Com minhas palavras, ele pareceu se recuperar do choque e
me encarou. Pelo menos, pareceu gostar de como eu estava
vestida. Onde seu olhar tocava, eu sentia como se uma fornalha se
de modelo.
― Está tudo bem? ― o rapaz sondou, colocando uma mecha
de cabelo atrás da minha orelha.
― Sim. Mal posso esperar para conhecer lugares fantásticos.
― Afastei-me de seu toque, não querendo dar-lhe ideias. Ele seria
só o meu guia.
Recomeçamos a andar.
― Aqui têm muitos, devo dizer ― comentou enquanto saíamos
do prédio.
Eu tinha pedido um carro alugado. Não sabia se Rafaelle tinha
outro. Era bem provável, mas eu não queria abusar de sua
porta.
― Entra ― praticamente cuspiu.
Estreitei os olhos.
― Não vou a lugar algum com você ― contestei, saindo de
perto dele.
― Então não posso sair com um homem, mas você pode sair
com mulheres? ― rosnei, desafiando a frieza em seus olhos, o
mesmo olhar de quando o conheci, do assassino frio que era.
Passado
Rafaelle
ela sempre.
a sua casa. Eu não gostava disso, por essa razão não podia me
O que acha?
molhados.
― Fecha os olhos ― pedi a ela, escondendo meu desprazer e
pior.
― Se cubra, Violetta, e me espere lá fora ― pedi calmamente.
― Irá pagar por tocá-la. ― Minha voz estava fria e letal. Fui até
ele, que tentou lutar, mas o chutei, derrubando-o de novo, montando
nele e enfiando a faca em sua barriga.
Ele me arranhou na defensiva, mas não liguei, apenas puxei a
faca cheia de sangue.
― Quem porra é você? ― Engasgou-se, segurando a barriga.
mãe não passava de uma vadia, diferente da minha, que era tudo
para mim.
A menina não sofreria com aquela perda – ao menos eu
dado para eles a criarem. Enfim eu entendia por que não tinha feito
isso. A maldita viciada pensava em usá-la como moeda de troca
ainda pior. O que importava era que aqueles dois tiveram o que
mereciam. No começo, foi difícil tirar uma vida, mas, com os passar
dos meses, eu não sentia mais nada. Finalmente matava homens
Por sorte, estava com roupas escuras, assim ela não veria as
gotas de sangue que pingaram em mim. No começo, ao fazer um
Presente
culpa me consumia vivo, tudo por eu não ter ficado longe dela.
meiga que já conheci, com sonhos que foram tirados dela por minha
causa.
― Droga, Rafaelle! É melhor se controlar, ou isso vai ficar feio
acontecido.
Theodore me ligou justamente quando Mália perguntou de
― Maldição! Isso não era para acontecer, era para ela ficar
fora do radar. Como vou alcançar meu objetivo quando você fez
mim.
― Agora vou ter que achar outro lugar para ela ficar.
Interrompi Stefano.
minha raiva.
palavra.
― Mália não sairá do nosso território, e, se alguém entrar para
buscá-la, irá voltar para você aos pedaços. ― Era uma maldita
machucada.
― Parece que alguém tirou uma foto dela e sua no navio. Além
disso, pelo que eu soube, Saulo ligou ao irmão e revelou quem
estava lá. ― Ele levantou seu celular, e vi Mália sorrindo para mim.
― Seja como for, só a quero no escuro, longe de tudo que possa
atingi-la. Sua função é cuidar disso, Rafaelle.
olho nele. ― O veneno na sua voz era como o de uma naja, letal. ―
Desconfio que o mandante da morte da minha mãe é o mesmo do
Valentino um segundo.
― Quem é essa pessoa? ― perguntei.
― Porra, não acredito nisso! ― Sacudiu a cabeça parecendo
furioso.
― Razor! ― gritei.
Ele me encarou.
a dor física, mas no fundo ela era boa, fazia-me esquecer a dor
espiritual que me consumia todos os dias.
― Vou deixar vocês a sós ― disse Theodore e olhou para
Cortou-me:
― Sem essa de estar bem. Sei o motivo de querer sentir dor.
que eu estava sentindo por ela era forte a esse ponto. Fosse como
fosse, eu lhe diria toda a verdade, mesmo correndo o risco de ela
não me perdoar.
Sorri.
― Será o próximo. E espero que a menina o faça correr atrás
dela para fazê-lo pagar essa sua língua ― provoquei-o.
Ele riu.
― Não corro atrás de ninguém. Elas que o fazem ― falou com
convicção.
sorriso morreu.
― Está acontecendo algo. O que é, Rafaelle? ― Alessandro
era sempre observador.
― Terei que dizer a verdade a ela. Isso irá levá-la para longe
de mim. ― Senti-me como se tivesse levado um soco apenas com a
ideia. Essa dor era pior que a ferida.
― Está se referindo à morte do pai dela? ― meu irmão
Mália
e mentido.
― Eu deveria matá-lo.
― Tudo bem, ele foi estúpido por mentir, mas você não precisa
― Tudo bem. Não quero falar sobre isso agora. ― Peguei meu
endereço.
― Ou você vai comigo ao hospital fazer um check-up agora,
Ele suspirou.
― Estou bem...
embora.
Um grunhido saiu do peito de Rafaelle.
― Pode prosseguir para o hospital, Frank. ― Sua voz saiu
baixa.
― Não fique com raiva, é para o seu próprio bem. Só vamos lá
meio a chamas. Eu queria ajudá-lo, mas não sabia o que fazer. Por
ora, só o ajudaria a se recuperar até chegarmos a Milão e
avenida.
Observei os olhos de Rafaelle por um segundo e me ajeitei no
banco.
deixasse bêbada, senti cheiro de sangue. Olhei para baixo e não via
nada, mas sua roupa era escura.
― Está sangrando! ― Toquei o local devagar e o senti úmido.
Saí dos seus braços e abri a porta, depois me virei para ele.
― Vamos cuidar dessa ferida. Não quero que sinta mais dor.
― Não gostava que ele sofresse, doía em mim.
branca dele assim que adormecia, a menos que ele fizesse menção
parecendo frustrado.
você não cuidasse disso. Não quero que a ferida infeccione por
de minhas palavras.
― Não dessa forma que está pensando. ― Corei.
palavras sugaram.
Merda, por que meu coração acelerava sempre que ele me
Vamos entrar?
Ele me avaliava com um esboço de um sorriso.
Sabia que ele quis dizer que era o próprio Mal, mas eu sabia que
isso não era verdade. ― E você não é o diabo. Seu pai, sim, por ter
sorriso educado.
cumprir.
Assim que abriu os olhos, foi embora, disse que não podia ficar ali.
conhece?
aproximou de nós.
irmãs.
Bem, elas não estavam ali, mas eu, sim, e ele iria me ouvir.
Posso vê-lo?
feliz, mesmo que sem mim. Eu não sabia o que tinha acontecido
com a tal Violetta, mas foi tão terrível que Rafaelle almejava sentir
dor carnal para não ser devorado vivo por outro tipo de dor.
Desejo que um dia esse sofrimento passe, pensei, colocando a
mão em seu coração e ignorando o ciúme que me consumia ao
Rafaelle
Acordei com dores por todo o corpo. Não achei que fosse
amargo.
― A bela adormecida acordou? ― inquiriu uma voz nada
possível.
― Onde está Mália? ― Procurei-a com os olhos, mas não a
encontrei.
Suspirei.
― Manda ver. ― Não o temia, e não custava nada dizer a
verdade.
penumbra. A única luz ali era a que vinha de fora, que adentrava
através da janela.
― Se a estiver usando...
― Não estou. Faria tudo por ela, inclusive entrar na frente de
uma bala, o que já fiz. Acha que eu teria feito isso por um maldito
― Precisava falar com você, mas minha irmã não pode saber
― Foi meu tio que matou minha mãe e meu pai ― revelou,
parecendo devastado.
Franzi a testa.
apagado.
Arfei.
tempo ali.
expressão.
― Isso é fodido.
Porra!
― Ulisses queria me ajudar, e no final eu o matei! ― Ele não
dela para saber se levo Mália comigo agora; assim sairemos de sua
vida.
O meu peito se apertou com essa ideia. Não podia nem pensar
nisso.
― Acho que tenho minha resposta ― disse ele, lendo minha
visível em sua voz. ― Mas não podemos lhe contar tudo. Se ela
souber que foi Tomaso, Mália irá até ele para matá-lo...
verdade, não raciocinará, irá procurá-lo. Isso seria sua morte. Não
plano formado. Vou fazer com que ele pague caro ― falou em tom
baixo e agoniado. ― Sabe? No fundo eu estava contando que
acontecesse algo entre você e Mália. Sabia, pela forma como trata
Fiquei chocado com essa admissão, mas grato por ele a ter
confiado a mim.
do seu pai. ― Mália parecia uma menina durona, mas no fundo era
sensível.
― Farei tudo para voltar logo, mas, até lá, ela não pode saber
Mália ― informou.
Franzi a testa.
― Garoto?
― Aquele que trabalhava em seu hotel, Theo Wesling. Ele foi
inventado ter uma avó doente, quando nem sequer tinha uma. ―
Para quem iria levá-la? Não pode ter sido para Sultão, a menos que
ele tenha descoberto que estamos aqui.
― Não, para o meu tio. Tomaso lhe pagou para levá-la, então
acredito que logo pode ter mais pessoas indo atrás dela. Por isso a
quero longe disso tudo. Alguém vai vigiá-la de longe, e, se ela correr
mim. Então, mesmo eu não estando com ela, Mália ficará segura.
Vocês dois cuidarão de sua segurança. ― Ele parecia confiar nisso.
minhas noites.
Senti o cheiro de Mália ao meu lado. Ele recendia por todo o
rápido possível.
Tentei beijar seus lábios, mas ela virou o rosto, então minha
pensava.
― É disso que estou falando. Pela forma como age, essa
pessoa morreu. No fundo entendo uma dor assim, de perder quem
se ama. Queria ser forte para deixar com que você a esquecesse...
― Sacudiu a cabeça, parecendo tomada pela dor. ― Mas não
consigo...
Eu estava chocado demais com suas palavras, porque, mesmo
naquela época, quando eu tinha 14 anos, não pensei em nada
disso. Porra, só em imaginar algo assim, eu me enojava. Tinha
fodido mulheres mais velhas que eu, mas nunca uma mais nova,
ainda mais uma criança. Matara o homem que ousou tocá-la e os
outros que a assassinaram.
Mália
Era para termos voado para Milão havia dois dias, mas
possível. Insisti que ficasse, mas não tive êxito. O pior era que ele
queria sair para fazer negócios. Não deixei que acontecesse. Tive
vidro.
estivesse me esmagando.
― Suspirou.
demais em seu sono. Comigo ao seu lado, ele ficava mais calmo,
não veio. Isso doeu demais, porém eu não ia ficar chorando à sua
frente, pois não queria que se sentisse culpado por não gostar de
nada.
Ele tinha aceitado as coisas que eu disse, porque não tentou
dor era visível em seus olhos. Não havia como ele mentir a respeito
ao menos lutasse por mim, por nós, que mostrasse que o que
tivemos foi real.
O que eu sentia por ele estava ficando mais forte. Cada vez
que chegava perto dele sentia-me como se fosse o próprio Sol de
tão quente. Entretanto, sabia que tinha que me manter longe.
― Pode não ser, mas você gosta de senti-la para apagar a que
realmente sente, essa que não o deixa dormir direito. ― Postei-me à
Depois que formos embora e cada um seguir seu caminho, por mim
pode dar até malditas cambalhotas!
Estava cansada demais para discutir com ele, que não sabia o
que eu passava toda noite ficando ao seu lado, sem conseguir
dormir direito só para ele ter algumas horas de sono tranquilo. Não
me arrependia, faria de novo, não reclamava quanto a isso, mas de
ele não se esforçar para se curar.
Rafaelle piscou diante de minha explosão, mas não fiquei ali,
não queria ouvir suas desculpas, então fui para a cozinha preparar
alguma refeição. Eram três coisas que eu gostava de fazer quando
hora, só queria poder enfiar minhas mãos em seu peito e tirar seu
sofrimento, mas não podia fazer aquilo nem com o meu.
claro que eu sabia que ele nunca tocaria em uma criança, mas a
idade de ambos me deixou chocada.
tinha acontecido com Violetta, mas não queria lhe causar mais dor.
― Jamais faria isso. Não se deve obrigar ninguém a falar algo
outra.
― Eu não queria fazer isso, quis te contar, mas então você
continuou: ― Preciso te contar uma coisa. Sei que falou sobre ter
uma vida normal longe de mim e da máfia.
― Eu disse aquilo em uma tentativa de afastá-lo. Foi difícil
pensar que era apaixonado por outra. Não podia disputá-lo com
alguém que nem aqui estava.
descobriu que seu irmão foi morto e soube que nós estávamos lá,
pois, antes de atacar o navio, Saulo o alertou. Agora nós somos
procurados por ele. ― Sua voz estava estranha. Parecia que tinha
com tudo...
Ri amarga.
― Dessa forma? ― Indiquei a ferida. ― Quer ser baleado ou
coisa pior?
recuperar cem por cento, terei que viajar à procura de Sultão. Não
você. ― Ele parecia chateado por ter que ficar longe durante esse
tempo.
meu corpo vibrar mais que o beijo. Puxei sua cabeça e capturei
seus lábios, apertando mais nossos corpos, que ansiavam por se
fundirem em um só.
intenso.
terno e suave.
meu corpo.
― Gostaria disso. Estou sonhando com a minha vitamina. Faz
dias que não a provo. ― Sua voz arrastada e sexy fez minhas
pernas ficarem bambas.
― Estou falando de comida, e você está muito ferido para se
começando a levantá-la.
― Por isso vai tirar minha camisa? ― provocou com um
esboço de sorriso.
ferida. Assim que a tirei, notei que estava seca. Isso era bom. ―
Como está realmente? Sem essa de dizer que está bem quando
não está.
Ele segurou minha cabeça e me beijou rapidamente antes de
responder:
― Rafaelle...
Ele andou até mim e me lascou um beijo que me deixou sem
fôlego. Senti o colchão sob minhas costas, enquanto seu corpo
nada.
Fiquei preocupada. Forcei meu cérebro a deixar meu desejo
Ele me olhou.
― Não consegui evitar. Vê-la assim me deixa doido de desejo.
― Triscou o bico de um dos meus peitos. Evitei estremecer, mas
eles ficaram duros com seu toque.
antes.
Arfei, os olhos arregalados. Quando ele disse isso mais cedo,
não acreditei, achei que ele estivesse brincando.
― Rafaelle...
― Não vai me machucar, prometo, só vou mexer minha boca.
― Deu-me aquele sorriso que balançava meu coração.
Respirei fundo.
― Tudo bem, mas, se você se mexer, eu paro. ― Subi em seu
rosto, evitando corar por ficar assim exposta para ele, mas seus
olhos quentes quase me fizeram gozar.
― A visão mais perfeita que já tive. ― Inspirou. ― O perfume
dos deuses. Adoro.
Suas mãos foram para minha bunda, então olhei para ele, que
me fitava com desejo e algo mais que não consegui compreender.
saboreando o gosto.
― Merda! ― ele exclamou.
Não era ruim, mas ficou melhor quando ele gemeu e percebi
cama.
― Parado, ou eu paro ― ameacei, abocanhando uma de suas
bolas, depois a outra.
dentes?
Ele riu e me beijou, saboreando cada canto da minha boca,
então se afastou.
Mália
sem fôlego pelo beijo. Então fiquei séria. ― Está realmente bem
para sair? Se passar mal, vou deixar você trancado, mas na clínica.
Ele riu e beijou meu rosto.
saímos.
― Duas vezes que desmaio e deixo você sozinha para lidar
― Não vou deixar que aconteça mais, não quando tenho que
protegê-la. Eu lhe prometi que não a deixaria matar mais ninguém e
aquilo de novo. Por ele e por minha família, eu seria capaz de tudo.
― O que foi?
seu lado.
Entrei no carro antes que ele tivesse chance de abrir a porta.
que eu lhe perguntasse o que tinha acontecido para ele ficar assim,
o carro parou.
Entramos no restaurante.
― Posso levá-los a uma mesa? ― A hostess nos encaminhou
a um canto no meio do salão.
do meu irmão. Era algo que mexia comigo. Sentia medo por
Mariano e Rafaelle, inseridos naquele ramo de “negócios”.
recuperar.
plano. ― Não consegui identificar nada em sua voz, mas ele estava
Ele piscou.
enganada.
― Eles foram executados por nos ajudar. ― Sua voz fervia de
fúria.
assim.
Nem notei que meus olhos estavam molhados.
restaurante.
Os homens de Rafaelle gritaram algo, mas eu estava tão
para ele.
rosto.
― Ei, está tudo bem... ― Ele devia ter-me visto tremendo, pois
― Eu quase...
veículo, mas por sorte ele era blindado. Um homem que eu não
Alasca.
O homem no volante suspirou.
Ele achava que eu estava assim por temer minha vida? Não
negaria, mas temia mais que ele fosse baleado de novo ou coisa
pior. Minha mente estava a mil por hora, com tudo que tinha
desgraçados!
― Estou bem...
― Se você disser que está bem mais uma vez, vou surtar aqui!
― grunhi com raiva, não dele, mas de tantos atentados. Antes,
― Ei, isso não foi por sua culpa, mas daqueles malditos que
machucado...
Meus olhos encontraram os seus. Eu tinha temido perdê-lo,
enquanto ele fazia o mesmo.
demorar aqui.
― Confio em você. Quero lhe contar algo. Já era para ter dito,
mas, com tudo que vem acontecendo...
tudo isso acabe logo, que essas pessoas que nos querem sejam
pegas e que eu possa estar com você e papai de novo.
Não queria desmoronar naquela hora para que meu irmão não
meio àquela série de ataques, uma parte de mim estava feliz, pois
ele estava ao meu lado. Em sua presença, eu teria forças para
passar por tudo.
Capítulo 23
Mália
tinha dormido nas últimas noites que tinha passado com Rafaelle. O
melhor.
O jatinho particular de Rafaelle pousou em uma área que com
em Sydney.
― Deixa que eu levo, ainda está machucado ― falei,
teimoso.
diferença era que esse garoto tinha olhos e cabelos escuros, mais
por ele, se não tivesse namorada. Isso me fez pensar que eu não
família de Rafaelle.
Fui pegar a mala para colocá-la no porta-malas do carro, mas
― Tenho negócios...
― Juro, Rafaelle, se você me provocar e sair nesse estado,
coloco malditas correntes em você ― avisei em tom sério. E o faria
Suspirei.
― Não sou explosiva, só com o seu irmão, que é teimoso feito
uma mula. ― Recordei-me de quando íamos à fazenda dos meus
pais. Lá tinha uma tinhosa que só.
mas o ignorou e piscou para mim. ― Acho que vamos nos dar bem.
Rafaelle apertou minha mão, como se confirmasse o que o
irmão disse.
desafio e soube que Razor era um bom lutador, por isso quer
enfrentá-lo. ― Revirou os olhos. ― Um dia achará alguém à altura e
quebrará a crista.
Stefano riu disso.
adentrávamos.
Rafaelle estreitou os olhos para os carros estacionados ali
brincava num canto junto a uma menina loira de olhos azuis na faixa
de 8 a 10 anos.
vejo nada.
piscou.
como pedra.
Encolhi-me, pois ele estava falando do sequestro organizado
por meu irmão. Isso me fez querer correr dali, mas estava presa; a
eles.
― Não minto para Luna ― disse o de barba, levantando a
negros.
Rafaelle parecia não ter gostado do que seus cunhados
Fechei a cara.
Ele fez uma careta. Ouvi risadas, mas não liguei. Estava
frustrada com Rafaelle. Como ele ousava ficar quase 24 horas com
dor só porque temia que eu me machucasse?
juro que vou fazer o que disse antes ― exasperei-me sem alterar a
voz para não chamar a atenção das crianças. ― Você vai fazer 27
anos, não é uma criança que precisa ter alguém em cima para
tomar remédio.
― Sim. ― Sorri.
― Eu disse que queria conhecer sua namorada, mas ele falou
que não tinha. ― Colocou a mão no queixo.
meu tio. Só quando meu tio não vai me levar à escola que dividimos
o lanche e brincamos juntos.
Notei que ela era muito tagarela, mal me deixava falar. Olhei
estreitos.
Graziela parou de sorrir. Parecia nervosa, embora não com
medo. Achei que ela não queria contar ao Stefano para que ele não
pegasse no seu pé ainda mais.
― Papo de mulher ― falei, indo na direção de Rafaelle com os
comprimidos.
Stefano me avaliou, mas não demonstrei nada.
― Era sobre mim. O que era?
Fuzilei-o.
amar ― comentei.
― Minha mãe não dança ― informou ainda olhando o celular.
― Cada um nasce com um dom. Alguns escrevem livros,
outros cozinham bem e assim vai. ― Sorri. ― Agora que tal eu levar
seu tio para descansar?
Ela olhou para Rafaelle.
Sacudi a cabeça.
― Sabia que você é muito curioso e insistente? Eu estava
falando a ela que o próximo a namorar será você ― falei um pouco
para ele.
― Tenho negócios com meu irmão... ― ele se interrompeu
diante de minha expressão.
intervim.
― E você vai ficar com ele? ― sondou Luna.
― Até ele dormir e descansar, porque, senão, ele vai sair para
Assim que o fiz, beijei seu peito, agradecendo a Deus por ele
estar vivo e bem. Fosse qual fosse meu futuro naquela casa, eu
estaria contente, pois tinha Rafaelle comigo.
Capítulo 24
Rafaelle
― Ela faz bem a você ― ouvi uma voz que conhecia muito
bem. ― Fico contente com isso.
que meu peito foi preenchido com algo que eu nem sabia que
faltava.
― Sinto-me da mesma forma com Mia e Graziela. Elas me
essa maldita ferida não sarar logo, vou enlouquecer preso aqui.
sua recuperação. Eu lhe disse que temos cozinheira, mas ela falou
que adorava cozinhar. ― Meneou a cabeça de lado. ― Sua comida
é bem saborosa.
Sorri.
muito com meus irmãos. O recado de Mália para todos era que, se
fato de Alessandro ser capo, tratava-o como meu irmão nessa hora.
tudo a ela.
Sorri. ― Nem sabia quem eu era direito, mas ainda assim foi cuidar
dos meus machucados, que adquiri ao matar alguns dos meus
seus negócios, mas não foi só por isso que você aceitou no começo,
né?
― Na verdade, foi por sua bondade e gentileza. ― Pensei
estraçalhar qualquer um. O que me fazia sentir aliviado era que ali
ninguém iria tocá-la. Isso, eu podia jurar.
menina.
― Não, mas Razor de qualquer forma nos daria o que foi
saber a minha opinião, não, não quero aceitar. Não quero que Mália
sinta que tomei conta dela só por isso, porque não foi. ― Fiquei de
tocou meu ombro, encontrando meus olhos. ― Vai dar certo. Agora
só precisamos pegar Sultão.
Trinquei os dentes.
― Tem notícias dele depois que nos atacou na Austrália?
― Alguns da sua organização atacaram as instalações do
atual líder da máfia espanhola, o Razor, mas parece que ele não
estava no local. Os seguranças os destruíram, embora os invasores
levaram muitos com eles, pois explodiram uma bomba no local. Isso
foi gente de dentro. Pelo que me disseram, foi pessoal de Tomaso,
saber.
Eu esperava que não aparecesse tão cedo.
no quarto.
― Não vamos deixar com que saia ― assegurou Luna.
― Gostei da ideia de Mália, podemos algemá-lo ― interveio
Jade.
Gemi, sentando-me na cama.
― Agora o trio de mulheres se reuniu para me prender? ―
Sacudi a cabeça.
― Será que um dia será o seu filho correndo por aí? ― Mália
esboçou um sorriso.
Notei que, no decorrer daqueles dias, ela se soltou mais com a
― Não penso em fazer isso por uns dez anos ou mais. ― Seu
morrendo...
Arfei, e não fui o único. Morrendo? Seria por isso que estava
sumido já havia algum tempo?
― Posso saber como descobriu isso? Se Valentino entrou em
lo.
que ele fosse amigo do meu irmão. Corri na mata com Valentino
atrás de mim. Ele me pegou, e caímos, então eu disse que não
posso deixar com que ele parta sem realizar seu desejo.
― Marquei com Valentino para nos reunirmos após tudo se
Ela assentiu.
perguntou.
exaltou-se, exasperada.
― Farei o meu melhor para saber a verdade. Se ele não a
Franzi a testa.
Stefano.
Luna franziu a testa.
estava confusa.
― Sage é um infiltrado ― disse Stefano encarando minha
irmã. ― De Paolo.
Ela arregalou os olhos.
― Não, ele não faria isso com a gente. Somos amigos ―
sussurrou.
nossos traidores, e Sage teve que matá-lo, por isso inventou que o
homem o queria morto. ― Miguel cerrou os punhos.
sobrancelhas.
― Ele enviou uma carta explicando por que fez isso e pedindo
desculpas...
ficar de olho nela e que lamenta ter mentido para ― Miguel se virou
para Luna ― você. Disse que tudo que viveram juntos foi real, não
fazia parte de uma missão.
tinham uma grande amizade. Ela até fingiu que gostava dele para o
suposto pai, que discriminava sua sexualidade. Isso me fazia
Fechei a cara.
― Você também é da família ― afirmei, beijando seu rosto. ―
A cada dia se solta mais com eles.
Rafaelle
cuidados comigo, mas isso me enchia de culpa, pois ainda não tinha
contado a verdade a ela sobre seu pai. No fundo, temia que não me
perdoasse, embora não fosse por isso que não abri o jogo com ela
antes, mas sim em razão do seu sofrimento e da perda daquele
fosse uma vez. Só a tinha visto por vídeo. Aquela era sua paixão, e,
sobre mim; depois lhe contaria acerca do seu pai. Era egoísta, eu
sabia disso, mas a queria feliz nem que fosse mais um dia.
Liguei para o irmão dela mais cedo naquela manhã e lhe avisei
mas eu não permitiria, nem que ficasse de olho nela o tempo todo.
menos, bem como duas meninas, que vestiam a mesma roupa que
também.
incluindo o garoto Ryder. Queria que eles soubessem que ela tinha
dono e que eu também era dela.
Notei as meninas observando-me, mas desviei meu olhar, pois
meu foco era apenas Mália e seu imenso sorriso. Como sempre, ela
estava alheia às pessoas ao seu redor cobiçando-a.
carro.
― Estava perfeita, sempre é. Adorei.
longe.
Ela riu.
― Não acredito que meu irmão deixou para mim esses patins.
― Era para ela ter vindo ao rinque antes, mas seu foco era que eu
ficasse bom logo.
Sempre seria grato por ela ter ficado ao meu lado aquele
tempo todo.
― Ele acerta de vez em quando. ― Escondi meu desprazer
pelo que seu irmão fazia. Tinha dado a ele até o dia seguinte para
lhe revelar a verdade, ou eu abriria o jogo.
pronto.
Não fui para casa, levei-a para o loft que eu tinha no Centro.
Precisava conversar com ela sem ninguém por perto, pois não sabia
qual seria o meu estado depois.
― Por que não vamos falar em sua casa? ― questionou
curiosa.
― Rafaelle, talvez...
― É preciso... ― Beijei sua testa. ― Só me deixa falar, tudo
bem?
no seguinte, a verdade sobre o seu pai. Queria estar bem para ela,
ela.
Passado
mas algo não me permitiu. Não sei se foi sua fragilidade, pois estava
sozinha no mundo. A vadia da sua mãe não a protegia dos seus
Após saber como ela era tratada, dei-lhe um telefone para ela
forma que podia. Uma vez um dos homens de sua mãe machucou o
braço dela. Assim que eu soube, o fiz pagar. Alertei a maldita mãe
casa de seus avós. Outra vez, era para eu ter ficado longe dela,
mas fiz amizade com os Lombardis, os seus avós. Eles não tinham
eu estava me sentindo.
Kélia apareceu ali com o rosto molhado. Era tão linda para
minhas irmãs.
― Não sinta, estou bem. ― Tentei tranquilizá-la, mas não teve
Pisquei, surpreso.
― Não pode. Ele irá machucá-la. Não permitirei que isso
aconteça.
algemas.
acreditava que ele tinha tido uma crise de bondade, apostava que
queria algo em troca. “Maldito seja!”
Não disse nada à minha mãe, ela não precisava ter mais
conhecimento do que tinha das coisas que aquele traste imundo nos
fazia.
estava sentindo.
Antes que eu chegasse ao meu quarto com ela ao meu lado,
tempo. Ele era leal ao capo, mas nossa amizade vinha em primeiro
está bem?
― Tenho de avisar que seu pai decidiu que você merece pagar
minutos.
Tentei correr, mas minha mãe segurou meu braço. Enfim eu
Olhei-a.
isso, ela não estaria viva hoje. ― Tocou meu rosto. ― Continue com
esse bom coração, meu menino.
e sua família.
Porra, eu não deveria ter frequentado sua casa, aliás, nem
deveria tê-la conhecido, mas o que poderia ter feito? Ela estava
atrasado.
― Eu avisei, Rafaelle, sem laços. ― Deu-me um soco na
boca. ― Da próxima vez que me desrespeitar de novo, vou fazê-lo
se rebelar.
― Se não parar com isso, vou fazer com suas irmãs o que
aconteceu com aquela menina! ― esbravejou Marco, deixando-me
paralisado.
De repente senti uma pancada na cabeça, e a inconsciência se
apossou de mim.
Naquele dia, vi o inferno, mas o pior era que não contava que
viveria nele por anos. Porque, mesmo com Marco sendo o
estômago.
― Seu moleque, não devia me desobedecer... ― rosnou
furioso. ― Com isso, farei com que nunca mais me enfrente.
Cada palavra que dizia era seguida por socos e chutes dele.
Toda minha carne se deteriorava, mas não gritei, não lhe daria esse
gostinho.
cima.
― Não toque nela! ― Tentei ir até eles, mas meus músculos
estavam travados devido à surra. Minhas costelas e outras partes
sobre uma das mesas de tortura que tinha ali e desabotoou suas
calças.
― Não, por favor, não a toque! ― Chorei.
Ele se enfureceu e veio até mim, segurando minha garganta e
a apertando com tanta força que o meu oxigênio se esvaiu.
― Homens não choram! Eles fazem outras pessoas chorarem!
Mália
que ele pudesse ter sofrido tanto assim. Sua dor cortava fundo o
meu peito.
sua desolação, mas sem poder fazer nada. A única coisa que podia
fazer era confortá-lo e desejar que um dia a culpa que o corroía
para longe. Queria ter esse poder, mas só o que pude fazer foi dar-
Rafaelle... Ele não o viu tocando-a, mas, pela forma como ela
mais tempo.
Tentei convencê-lo de que não era sua culpa, mas não teve
Observei a faca em sua mão. Fazia dias que ele dormia sem
volta. Eu queria tirá-la dele, mas não consegui e preferi não insistir
dormia com ele, não como faz todo casal normal; sempre ficava
minhas lágrimas.
que o irmão. ― Ele falou com você sobre o que aconteceu naquele
dia?
sentimento ― continuou.
― Ele matou uma criança! Por Deus, como pode existir um ser
dessa espécie?! E não bastava isso, ainda machucou Rafaelle a
Não sei qual foi seu fim, mas esse homem merecia ter sido
estripado com uma pá enferrujada.
Sei que juramos proteger um ao outro, mas somos uma família, nos
apoiamos e até morremos pelos nossos.
certeza Rafaelle não disse nada aos seus irmãos porque não queria
― Queria ter estado lá por ele e minha mãe, mas fui enviado
para outra cidade. Agora, pensando com clareza, aposto que Marco
fez isso para eu não me meter, pois sabia que eu não a deixaria
disse que só não fez porque não podia enfrentá-lo na época, afinal,
necessitava que você fosse capo um dia para livrar todos daquela
tudo que ia fazer com a mãe de vocês era culpa de Rafaelle, por ter
desobedecido a ele.
Por causa disso ele estava ali, naquela situação, tomado de
contou tudo.
Encarei-o.
mãe pediu que ele não fosse até ela, ou seria ainda mais
machucado por Marco. Mesmo assim, ele foi, e, de fato, foi muito
ferido. Sua mãe teve que interferir, ou seu pai o mataria. ― Limpei
Sua mãe ainda lhe agradeceu o modo como ele era, pois não podia
ver ninguém sofrendo, que queria ajudar, assim como fez com
naquele dia.
― Ele carregou isso durante todo esse tempo? ― A voz de
com ele.
― Já faz muito por ele. Vejo que fica até tarde com Rafaelle,
mas, assim que meu irmão está prestes a acordar, você volta ao seu
quarto para ele não notar que esteve lá, não é? ― Avaliava-me.
o serenasse. ― Por isso eu ficava com ele todas as noites sem que
soubesse.
Rafaelle, afinal lhe havia prometido que não entraria no seu quarto
verdade um ao outro.
― Direi amanhã sem falta ― assegurei. ― Obrigada por tudo
A lealdade entre eles era muito bonita. Era raro ter isso no
nosso mundo, ainda mais com o tipo de pai que tiveram. Mesmo
difícil para você aceitar, mas peço que o perdoe. Rafaelle faz tudo
pois Rafaelle não era assim, além disso eu estava ao seu lado todo
Coisa grave não devia ser, pois eu tinha falado ainda naquele
dia com meu irmão, e ele me garantiu que estava tudo bem com
todos, inclusive com meu pai e o garoto que se feriu para me
proteger.
― Só peço que deixe sua mente aberta para o que ele vai
revelar. ― Aproximou-se e tocou meus ombros. ― Se você se
lidar com o que está sentindo após reviver essas lembranças que o
atormentaram por anos. ― Olhou-me. ― Agora preciso ir checar
esboço de sorriso apareceu em sua face, mas depois ele ficou sério.
― Você ama Rafaelle?
todos.
― Com todo meu coração e alma ― afirmei.
Ele sorriu satisfeito.
― Não quebre o coração dele. Você viu que já foi quebrado de
várias maneiras, mas acredito que, se você o fizer, as
consequências serão devastadoras. ― Dito isso, entrou em seu
sentia.
Sacudi a cabeça, meio zonza, e fui tomar meu banho. Iria
jantar depois, mas perdi a fome; a dor de Rafaelle e a conversa com
mão como sempre fazia todas as noites. Senti-me culpada por tê-lo
deixado revelar aquela horrível memória, pois isso lhe trouxe
pesadelos pavorosos, diante da forma como ele se mexia.
pescoço e inspirando.
Achei que fosse acordar, mas logo sua respiração estava
normal.
Temi me mexer e acordá-lo, então só fiquei ali, confortando-o e
Rafaelle
parecia estranha.
Virei a cabeça, sentando-me na cama. Mália estava sentada
― Não sei qual seu motivo para dormir com isso, mas precisa
ferimento.
tentei tirar sua faca, mas você segurou minha mão, então, a partir
lado. Seja quem for o demônio de seus pesadelos, não tem mais
poder sobre você. Acredito que devemos dormir juntos igual fizemos
essa noite.
Arregalei os olhos.
que tinha dormido a noite toda com ela. Por isso eu me sentia leve,
― Vou tentar, ok? Não quero machucar você. Não sei o que
todas.
― Sobre mim? O que é?
― Se lembra do ataque à festa em sua casa? Aquele em que
Razor fugiu com você, mas seu pai ficou? Sei que o que vou dizer
vai machucá-la. Queria evitar isso a todo custo, mas não há como.
você, seu pai levou um tiro e morreu, mas não descobriram quem
fez isso na hora do tiroteio. É claro que alguém armou isso, não foi
Isso cortou meu coração negro. Queria poder enfiar a mão em seu
peito e tirar a sua dor.
― Não queria ver essa dor que estou vendo em seus olhos ―
sussurrei.
― Não acredito nisso... Como pôde me deixar ser feliz todo
Razor não queria isso, e eu também não, mas não revelei por saber
que sofreria. ― Dei um passo até ela, mas se afastou de mim,
gemeu.
Sua raiva a cegou, mas eu não podia deixar que se
machucasse por querer vingança. Eu sabia o quanto um gesto
aumentasse.
dormia. Seu corte recebeu cinco pontos. Minha faca era bastante
feriu.
Tocou meu ombro. ― Não quero que se consuma por isso. Ela está
bem, a lâmina não atingiu nenhum órgão vital, e logo acordará e vai
precisar de você...
Sacudi a cabeça.
executar o fim do seu tio e não fez nada; dessa vez, eu o faria.
― Não foi suficiente ter sido pego pelo Razor? Se fosse outra
Ele nunca tinha usado seu tom de chefe comigo, não era
preciso. Aquela era a primeira vez. Eu entendia meu irmão, sabia
posso ficar aqui. Preciso limpar toda a sujeira para que nada
respingue sobre Mália. Não deixarei com que ela seja machucada
― Rafaelle!
Virei-me para Alessandro.
― Voltei a olhar aquele rosto, que passou a ser tudo para mim. Por
criados pelo Marco, mas não podemos deixar que ele vença e nos
buracos.
― Eu a vi dormindo em seu quarto. A princípio achei que
estavam juntos, mas então percebi que ela saía antes que você
acordasse ― Alessandro me disse parecendo controlado. ― Teve
uma vez que seus pesadelos estavam agitados demais. Quando fui
eu ainda ficava pasmo por tê-la tido tão perto todo aquele tempo.
― Ela não dormia com você, na cama, mas no chão,
para Razor vir buscá-la. Tomaso não está mais lá. De qualquer
forma, El Diablo está de olho nela. Ele é um amigo em quem confio
e é amigo do irmão dela também. Depois que resolver esses
assuntos, irei até Mália. Isso amenizará sua raiva por eu ter
Mália
italiano. Isso queria dizer que eu não estava mais na Itália? Aonde
estávamos indo?
― Ela terá repouso ― assegurou meu irmão. ― Tomarei conta
dela.
O homem saiu, deixando-me a sós com meu irmão.
― Estamos indo para onde? É mesmo um avião? ― sondei de
novo, pois não respondeu antes. Acusei-o: ― Meu pai foi morto, e
fôlego.
casa. E lamento você ter descoberto assim sobre nosso pai. Queria
uma armação, que eu descobriria que ele estava vivo, mas isso só
acontece em filmes e livros que têm final feliz. Essas palavras iriam
morte.
fazia com que eu me sentisse sem chão. ― Rafaelle disse que foi
estava morto. Não sabíamos quem tinha feito isso, só que eram
invasores que tinham entrado no nosso território. Foi como no caso
assim de mim.
― Lamento ter escondido tudo de você, mas precisava contar
quando pudesse ficar ao seu lado. Não queria revelar algo sério
maneiras pelas duas pessoas que mais amava na vida de uma vez
só.
― Como puderam fazer isso comigo? ― Queria gritar, mas
mim.
― Mália... logo ele estará morto ― ele prometeu, recostando-
se na cadeira, parecendo tão cansado e devastado. ― Suspeitei do
fosse Ulisses.
― Aquele maldito me fez acreditar que Ulisses era o culpado,
mas no final não era ele. Eu o espanquei tanto devido à fúria que
com Rafaelle.
― O rato imundo me enganou. Parece que nossa mãe estava
desconfiada dele e se juntou a um dos nossos homens para
― Então ele matou nossa mãe por ela descobrir sua traição ao
papai. Como pôde fazer isso com o próprio irmão?!
me levar para longe? Não sou mesmo importante para ele? Só fui
uma moeda de troca? Ele ficou com o território do meu irmão e, de
bônus, resolveu se aproveitar de mim por um tempo?
meu pequeno.
Sacudi a cabeça, não acreditando que tinha sido enganada
daquela forma.
Mesmo me sentindo magoada e ressentida, não queria que ele
minha, pois corri com uma faca. Precisava aliviar seu fardo, não
podia deixá-lo mais atormentado do que já era. Isso acabaria com
ele. Toda dor que ele sentia, eu também sofria. Ele tinha essa mania
furiosa.
― Isso é culpa minha. Não devia ter enviado você para outra
estivesse se controlando.
― Preciso vê-lo...
― Não! ― Seu tom foi decisivo. ― Além do mais, ele não quer
mais vê-la.
Estreitou os olhos.
― Foi ele que ligou?
Confiava que Rafaelle me ouviria. Quem devia estar furiosa era eu,
que tinha sido enganada por ele a respeito da morte do meu pai.
sentimento que você ― falou Mariano com olhar triste. ― Sorte dele
eu não ter atirado em seus miolos. Ainda estou com vontade.
que nós.
― Mariano, o pai dele era horrível, o maltratava a ponto de
quebrar seus ossos, abusar da sua mãe na frente dele e matar uma
garotinha de 8 anos só porque Rafaelle decidiu salvá-la de um
mas ele não. Só a sua mãe tinha carinho pelos filhos, mas não tinha
poder para lutar contra Marco. Quando fez isso, pagou caro. ―
Suspirei. ― Isso deixou marcas naqueles irmãos, principalmente em
Rafaelle
“Estou partindo não porque não amo você, mas sim para
protegê-la. Se lhe contar onde estou, sei que não mediria esforços
para me encontrar, e não quero isso. Não posso aceitar que seja
navio de pesca.
Tínhamos conseguido um disfarce para pegar o pessoal de
drogas, e deixei que essa notícia vazasse nas ilhas ao redor. Por
interessava.
Ele riu.
― É pouco tempo para conhecer alguém tanto assim. ―
Sacudiu a cabeça.
apaixonasse por alguém, o que parecia não ser o caso dele, afinal
abominava o amor.
fez capaz de fazer tudo por ela, inclusive evitar que cometa algo que
a atormentará para sempre. ― Encarei o navio, onde nossos
uma pousada que tinha perto do cais, onde nossa armadilha estava
― Faz tempo que não entro em ação. Só espero que não demore
para os localizarmos.
― Eu sei. ― Contava as horas para ir atrás de Mália, mas lhe
forma, seu coração acabou partido. Não queria ter deixado seu
irmão levá-la embora, foi difícil para mim, mas era preciso. Eu não
não rolar nesta ilha, teremos que ir para outra, e assim por diante,
até encontrarmos aqueles filhos da puta.
por estar alerta, mas também por não parar de pensar em Mália.
― Sim, vamos fazer isso ― ratificou Stefano. Tínhamos
devia ter vindo, não está cem por cento recuperado. ― Sentou-se
na cama de casal no quarto em que entramos e olhou ao redor. ―
Por que não escolheu um quarto com duas camas?
ferida.
― Não acho...
ser...
Ele respirou fundo.
― Sei que estou pedindo muito a você, afinal posso machucá-
lo...
mesmo que soubesse que ele estava brincando sobre isso; podia
ouvir em seu tom.
boca, a raiva, a fúria por querer ir até ele. Entretanto, nunca consigo
impedi-lo e matá-lo. ― Passei a mão nos cabelos, tentando aliviar
os pensamentos perturbados.
― Todos temos demônios, como eu já disse antes, mas uns
são piores que outros. ― Sua voz saiu num tom duro conforme
porque morrer queimado é uma das piores mortes, mas não tanto
quando era criança, mas eu sabia que às vezes não era o bastante
falei. ― Lamento pelo que Marco deve ter feito a você. Mesmo que
não nos diga, sei que não deve ter sido fácil.
atacados.
mar. Ainda assim, isso não significava que não estivessem de olho.
― Esperava que isso não acontecesse, mas, por via das dúvidas,
dela. É uma mulher valente e o ama, percebi isso, assim como noto
se trancar. Recordei que foi difícil para ele, aliás, para todos nós,
a forma como ele ficava cada vez que saía do seu quarto. Ele era
pequeno na época, mas eu sabia que se recordava de tudo. Eu
me tocou fundo ao ver a cena, então ele sorriu para mim com sua
crueldade desumana.
Tentei chegar lá, mas não conseguia, nunca...
depois ficou sério. ― Vai melhorar com o tempo, mas pode me dizer
com o que sonhou dessa vez? Ouvi o pavor em sua voz.
― Marco tinha matado todos que eu amo. ― Respirei fundo,
pulamos da cama.
― Me dá cobertura ― pedi.
irmãos.
― Sim ― respondeu.
Assenti e fui para onde estava se desenvolvendo o confronto,
Sultão e Tomaso.
― Cadê os vivos? ― perguntei a Luigi ao chegar ao píer onde
o piloto.
― Logo estará com sua mulher ― comentou meu irmão ao
meu lado, encarando o oceano à nossa frente.
Rafaelle
que aprisionamos.
para matar, afinal queria minha chance com ele. Atingi sua perna,
fizessem barulho.
Sultão tentou atirar assim que nos viu, mas o fiz primeiro,
Não tinha sido eu, mas ele não precisava saber disso. Não o
queria perto de Mália. Não gostava de pensar nisso, pois queria ter
― Amarre-o.
Virei-me para Stefano bem a tempo de ver um cara apontando
a arma para ele. O gelo tomou conta de mim, temendo o pior, mas
agi.
gatilho.
Meu irmão me olhou com pavor e levantou sua arma para o
assecla de Sultão, atirando, mas não antes de eu ser atingido e cair
― Seu ombro...
― Quebrou quando caí. ― Eu sentia o local latejando de dor,
Ele olhou para os lados, vendo seu pessoal morto, mas não
pareceu ligar. Sua fúria estava em mim.
― Seu verme imundo... Você vai pagar caro por isso ―
rosnou.
― Não devia ter roubado o que era nosso ou ter nos procurado
nem se aliado ao Tomaso. ― Peguei um tição da fogueira com a
roubadas de nós?
então toquei seu peito com o fogo, fazendo-o rugir e pular em mim,
mas Viper o segurou, mantendo-o no lugar.
― Não sei...
Coloquei a tocha em sua barriga. Ele gritou de novo.
costurar a ferida.
de Tomaso.
enquanto me costurava.
― Você teria feito o mesmo por mim ― afirmei, afinal não tinha
dúvidas sobre isso.
Esboçou um sorriso.
dor que estava sentindo, tanto carnal como em meu coração por ter
de ficar um pouco mais de tempo longe de Mália.
com a dor.
― Isso pode demorar. Não acha melhor arrumar uma forma de
Embora eu preferisse estar com ela, Tomaso está por aí. Vou
colocar minhas mãos nele antes que Mália ouse sair de seu luto e
Doía ficar longe dela e era ainda pior pensar na dor que estava
sofrendo naquele momento. A desolação pela perda de um ente
― Tudo bem, mas por hoje descanse; vai precisar para o que
vamos fazer. ― Stefano achou uma faixa nas coisas do médico,
acompanhar nessa...
― Bobagem. ― Fez um gesto de pouco caso com a mão e
assunto.
― Não é mais só nós contra tudo e todos ― comentou ele
como se tivesse lido minha mente. ― Você tem Mália, nossas irmãs,
quase o matou? Sei que deve ser doloroso pensar nisso, mas
preciso saber.
Ele fitava a imensa fogueira ainda ardendo, enquanto sua
mente parecia estar longe. Pensar nisso doía, sim, mas achei que
meu irmão precisava saber daquilo.
― Ela pediu que eu não dissesse nada do que Marco lhe fez
Ele piscou.
Arregalei os olhos.
― Ela ficou ao meu lado? Marco deixou? ― Era uma pergunta
nada naquele momento, só deixar que ele tivesse seu tempo para
assimilar as coisas.
― Chefe, o que devemos fazer com os corpos? ― perguntou
um dos soldados.
― Faça uma pira com os defuntos na beira d’água, assim,
quando a maré subir, levará os restos que o fogo não consumir ―
respondi com um suspiro.
ele quem deve lidar com o tio. A sua vingança que tanto quer vai
terminar. ― Encarei o oceano imenso e azul. ― No fundo, teríamos
adorado ficar com Marco mais tempo para fazê-lo pagar. Ainda
assim, quando o matamos, tivemos algum alívio, mais do que se
outra pessoa o tivesse feito. Entendo que Razor precisa disso. Esse
ilha sobre nossa mãe, tinha algo de diferente em Stefano, mais letal.
Ele sempre foi impulsivo e letal, mas, após saber sobre o que Gael
fez com Jade, ficou pior, e imaginar o que Marco fez à nossa mãe
estava, mas algo nos seus olhos mudou, e ele sorriu, deixando a
escuridão no fundo. No entanto, eu ainda a via.
― Como está a ferida? ― questionou antes que eu abrisse a
boca.
Olhei para baixo. A cicatriz estava meio rosada. Eu tinha tirado
os pontos havia uns dias.
algumas semanas.
― Que bom. Espero que acabemos logo com isso. Estou louco
para pisar em terra firme e ter uma mulher na cama comigo. Estou
acreditava que o tinha ao meu dispor. Isso significava que logo veria
Mália. Foram semanas turbulentas sem ela. Eu sabia que minha
garota estava bem fisicamente, pois El Diablo me contou, mas isso
Viper.
― Sim, chefe ― aquiesceu e foi falar ao telefone com o piloto
do jatinho. Tínhamos deixado a aeronave em uma ilha específica
dos meus pais, igual Razor quer fazer com você. Isso se chama
honra, mas não entende o significado disso, afinal matou a cunhada
e o irmão para ter mais poder.
expectativa.
Saí da sala com Stefano ao meu lado, e ignoramos os insultos
de Tomaso em sua tentativa de antecipar sua morte.
― Por que não deu uma lição nele você mesmo? ― perguntou
Stefano. ― Ou eu...
Ergui as sobrancelhas.
― Você? Não há nenhum homem que torture e permaneça
vivo, então isso está fora de questão. ― Sacudi a cabeça,
pedir para que Mália se casasse comigo, isso depois de fazer com
que me perdoasse por tudo. Eu tinha a vida toda para recompensá-
la e lhe mostrar o quanto não sabia viver sem ela e o que significava
para mim, até mais que o ar que eu respirava. Fui agraciado por ter
sobrevivido mais uma vez e não desperdiçaria isso. Aproveitaria
cada segundo ao lado da mulher que eu amava.
Capítulo 31
Mália
Após ser trazida de Milão, voltei à mansão dos meus pais, mas
nenhum dos dois estava mais lá. O lugar era imenso demais e
vazio. Não consegui ficar ali, então fui morar em um loft que
pertencia à minha família.
tentei falar com Rafaelle, mas, como nunca fui atendida nem tive
resposta, deixei de telefonar. Não iria mais correr atrás de alguém
dentro.
― Não pode sair, ainda está ferida ― ele continuou.
O corte ainda estava dolorido. Os pontos tinham sido tirados,
mas ficou uma cicatriz rosada. Meu irmão até sugeriu que eu fizesse
porque eu era mulher não podia ter uma? Mariano aceitou, mas me
pareceu preocupado.
Não respondi a Túlio, pois não queria revelar meus planos a
do apartamento.
Todos estamos.
Mariano tentou falar comigo sobre isso, mas não o ouvi. Não o
desculpei por mentir para mim. Isso ainda cortava fundo, não só as
mentiras dele, como também as de Rafaelle. Algo se partiu em meu
irmão!
Eu soube que Mariano tinha pegado nosso tio. Não o tinha
eliminado ainda, parecia que estava torturando-o a cada hora.
Despedi-me dos meus pais com o peito vazio, exceto pela dor
que cortava fundo. Segui Túlio para o carro.
― Vai voltar para casa? Precisa tirar essas roupas molhadas.
ele.
― Agora tenho. Diga que eu ameacei atirar se não me
levasse.
Túlio não queria, mas assentiu e olhou para o outro carro que
agora ou nunca.
― Que porra acha que está fazendo trazendo-a aqui?! ―
rosnou ao Túlio.
Suspirei e peguei minha bolsa, colocando-a no ombro,
entrar, teria que fazer aquilo, a não ser que decidisse realmente usar
minha arma contra os caras, o que não era o caso.
― Oi ― atendi.
deixe entrar.
― Não...
o que queria dizer, que ele estava todo estourado. ― Isso não me
incomoda mais.
Com tanta coisa para me preocupar, iria surtar por causa de
sangue? Eu era mais forte do que ele imaginava e lhe provaria isso.
matar Tomaso com uma bala. Isso aliviaria seu fardo; ele merecer
sofrer.
Assim que meu irmão liberou o caminho, entrei, seguida pelos
homens dele. Não reparei no entorno, meu foco estava em ficar cara
a cara com o desgraçado. Tinha levado muito tempo para esse dia
respirar fundo.
Por que iríamos fazer isso, quando o que você precisa sentir é dor?
Tomaso estava em correntes, pendurado com as mãos para
e me encarou.
Afastei-me dos seguranças um pouco e levantei minha arma
para ambos.
― Quero os dois fora agora ― ordenei.
― Falei para saírem. Quero uns minutos a sós com esse lixo
cada centímetro dele. Ela não era tão grande quanto eu gostaria,
mas serviria.
Sentei-me em um banquinho que tinha ali e puxei um isqueiro,
encarando-o.
frieza. ― Agora vamos ao que interessa. Por que traiu meu pai?
Ele respirou fundo.
consequências...
― Sei sobre elas. O que você não sabe é que fui eu que matei
Saulo, o irmão de Sultão. Rafaelle apenas assumiu a culpa para o
perigo não recair sobre mim. ― Olhei-o com frieza. ― Uma coisa
Lizandra. Eu não podia deixar que isso vasasse, tinha que fazer
alguma coisa. ― Sua voz não parecia conter arrependimento. ― A
culpa tinha que cair sobre alguém, e, como todos tinham o pé atrás
anos. Estava tudo planejado, Murilo sairia de cena, assim como seu
― Sua maldita!
― Você fez com que todos pensassem que ela tinha traído
meu pai, mas isso nunca aconteceu! Minha mãe o amava! ― Fiquei
escolha”?!
― Lizandra sabia demais, eu não podia deixar que vivesse. Foi
por culpa dela que fiz isso e tive que atrasar meus planos de ser o
Mas Murilo não queria ir para esse lado, estava afundando a máfia.
Oh, Céus, esse homem é um demônio, não é um ser humano!
aquilo. Podia não sentir nada no momento, mas não era tola; o que
acabava de fazer iria me assombrar, mas eu pagaria o preço que
Rafaelle
Tomaso, até que o achei em uma nos arredores do Taiti. Queria tê-lo
matado, mas daria essa honra ao Razor, afinal era o assassino dos
pais dele. Se fosse ao contrário, eu iria querer minha vingança.
Queria ter ligado para Mália, mas, como tinha perdido meu
demais.
aconteceu.
Queria garantir à minha irmã que sim, tudo daria certo, mas
não tinha certeza disso. O que podia jurar era que nada aconteceria
a nenhuma delas.
― Vai, sim, Luna ― assegurou Jade assim que nem eu, nem
Stefano, nem Alessandro respondemos, enquanto Miguel lhe
segurava a mão.
― Só vamos ouvi-lo antes de qualquer coisa. Ele nem podia
fazer essa viagem devido à sua situação, mas fez mesmo assim, só
mesmo. Depois se virou para a menina, que eu sabia que era sua
cabeça.
Notei que meu irmão estava prestes a retrucar, então fui mais
sua irmã que tinha sido assassinada. Isso com certeza lhe trazia
lembranças dolorosas.
Alessandro.
Valentino assentiu.
― Por aqui. ― Seguiu na frente com a garota Belinda. Passou
Hoje espero que façamos uma aliança aqui, não quero um banho de
sangue só porque você não consegue se controlar. Além disso,
quero voltar viva para meu filho e Luca.
irmãs.
Troquei um olhar com Alessandro. Não sabia se seria possível
fazer uma aliança com a máfia Pacheco, dependeria muito das
restante dos filhos de Paolo, menos Fabrizio, que devia estar com o
pai.
Valentino nos levou a uma das suítes no último andar. O lugar
se parecia com o seu pai biológico não apenas nos cabelos. Seus
iria fazê-lo.
― Nossa mãe deixou uma carta dizendo que eu era sua filha e
― Sei do que você fez para chegar até mim, pensando no pior,
mas o que está aí vai esclarecer tudo ― informou-me o velho.
mas meus filhos vêm em primeiro lugar. Não posso deixá-los aqui,
Desejo que seja feliz, e obrigada por tudo que me fez, por
restante.
― Ela amava você, assim como disse na minha carta ―
sussurrou Luna.
― Tem algo que ela disse que não entendi. Certo, ela se
apaixonou, mas como aconteceu de fato? Nossa mãe menciona que
você a chamou para fugir, mas ela não foi por nossa causa. O que
― Vou esfolá-lo vivo, seu imbecil! Como ousa acusar meu pai
entendia; uma vez fomos nós naquela mesma situação, mas com
nossa mãe. O pior era que nem podíamos ficar ao lado dela; Marco
não deixava.
― Estou bem ― ele as tranquilizou, depois encarou a todos
doente ainda mais por não ter conseguido me vingar dele como
gostaria.
mercadoria.
mercê, quis ter matado Marco. Depois vi que teria duas opções: a
primeira, dizer a todos que peguei aquilo que tinha sido me dado e
― Percebi a doçura que sua mãe era e soube que Marco não
aqueles encontros com o aval de Marco, mas ele não queria ceder
mais. O preço que pedia era demasiadamente alto para que eu
com Kélia, comentei isso, mas sabia a minha escolha e a dela. Nós
não chegaríamos tão baixo. Foi quando a chamei para fugir comigo.
Se ela viesse para o meu território, eu a protegeria. Marco descobriu
isso e nos encurralou, colocando a escolha nas mãos dela.
― Minha mãe teve uma escolha? ― Jade fungou.
― Marco disse que ela estava livre para viver comigo, mas
podia levar só você. ― Abriu os olhos e encarou Jade, depois
Alessandro, Stefano e a mim. ― Mas de vocês, ele não abriria mão,
boca, iria fazer com que Kélia e você, Luna, saíssem machucadas.
― Aquele maldito! Que apodreça no inferno! ― sibilou Jade.
e cuidar de Luna.
― Sage? ― Luna olhou ao redor como se esperasse vê-lo. ―
Onde ele está?
sua esposa, embora ainda estivesse furioso por ter nos enganado a
seu respeito.
― Não foi culpa dele. Era uma missão, mas Sage se apegou a
Luna, e ficaram amigos. Isso não foi uma ordem nossa. ― Paolo
sorriu, meio cansado. ― Acho que você brilha onde passa.
― Acabamos? Porque ele precisa descansar um pouco ―
disse Serena.
Tínhamos vindo atrás de respostas e conseguimos. Foi bom
saber que nossa mãe foi feliz ao lado dele ao menos por um tempo.
Ele suspirou.
― Quero que veja algo. Depois você decide se vai ignorar isso
ou não ― disse, estendendo o telefone a mim.
Rafaelle
saída da cidade.
Assim que meu carro parou, armas foram apontadas na minha
mais homens ali, mas não notei, porque outro carro parou cantando
pneus.
Razor saiu dele parecendo apressado, mas me viu e estreitou
sabia a quem pertencia. Razor correu para dentro do local com sua
arma. Corri atrás dele, mas fui detido na porta por um homem.
corredor e praguejar.
isso?
um dos caras disse. ― Acho que ela veio preparada para fazer isso,
final meu esforço foi inútil. O que ela fez, carregaria para sempre.
de tempo após ter escondido tudo sobre o seu pai, não tinha noção
de que pensava que eu...
Tentei suspendê-la, mas meu ombro ferido protestou. Razor
semanas foram difíceis para ela. Eu temia dizer o que você estava
fazendo e ela resolver ir aonde você estivesse.
dela.
Razor foi para o volante e deu partida no carro.
cabeça.
Eu não queria sangue em suas mãos, mas nada mais podia
ser feito. A única coisa que eu podia fazer era tentar não deixar que
aquilo a atormentasse. Estaria sempre ao seu lado.
perdoe por ter escondido sobre seu pai e ter ficado longe. ― Alisei
seus cabelos.
Razor ficou calado.
― Você realmente a ama, não é? ― Não parecia uma
pergunta. ― Mália merece o melhor, é uma garota forte, decidida e
faz tudo pelos seus. Nesses dias, pude ver que estava sofrendo, até
minha garota.
― E se eu te oferecesse todo o meu território da Espanha? ―
sondou, avaliando-me.
― Nem se me desse seu reinado todo, eu abriria mão dela, e
seria uma pena raptá-la e levá-la para longe do irmão, ou eu poderia
sobrinhos um dia.
Ele ainda me avaliava, depois sorriu parecendo satisfeito com
a minha resposta.
― Sabe? Na escola, alguns homens deram em cima dela, e,
embora ela nunca tenha ligado para nenhum deles, ofereci dinheiro
para se afastarem. Todos aceitaram. Fiquei furioso, então acabei
com eles. Quem pensavam que ela era para aceitarem dinheiro ao
invés de cortejá-la? ― Cerrou os punhos. ― Os homens da minha
família a tinham como uma mancha. Sabe aquela que paga pelos
erros dos pais? Embora minha mãe não tenha feito nada. Agora
estou limpando algumas imundícies do meu povo, então acho bom
mato ― avisei.
Sorriu.
― Terá meu consentimento para fazê-lo. Todos que tentaram
tocá-la morreram, e isso não vai mudar mesmo com ela se casando
com você. Como eu já lhe disse, no fundo torcia para dar certo entre
vocês. Mália precisava de uma pessoa que a protegesse não
direito.
― Sim, acabei de vir de lá, e nada era como pensei que fosse.
― Suspirei.
― Paolo é um líder muito bom, ou o quão bom podemos ser
acabou com ele. Fabrizio será um bom líder no lugar do pai. Vocês
fizeram uma aliança agora que tudo se resolveu?
Mália
Acordei com o som de ondas não muito longe. Lembrei-me do
que fiz, e meu coração doeu, mas Tomaso merecia pelas coisas
repulsivas que pensava em fazer com adolescentes, fora o que fez
porque meu irmão não sabia fritar nem sequer um ovo. Quem fazia
janela pela qual dava para enxergar o oceano não muito longe. A
sentir o cheiro de dar água na boca. Estava com fome; eu não tinha
não queria que ele sofresse. Se estivesse em seu lugar, era bem
acho que nós dois sabemos que isso não vai acontecer, não
cozinhando, ao menos ― disse uma voz que não achei que ouviria
mais.
tom amargo em sua voz ao falar o nome do verme que se dizia meu
tio.
― Não foi sua culpa, além disso, ele merecia ser morto...
Interrompeu-me.
importava se era ou não sua culpa. Explodi. Estava com muita coisa
entalada na garganta.
― Não venha sentir culpa por algo que não fez! Devia sentir
de que você estava ao meu lado, mas não estava! Você devia ter
ficado comigo...
Cortou-me.
depois que seu irmão a levou que eu fui atrás dos homens que
queriam você, inclusive o seu tio. ― Suspirou. ― Se eu não fizesse
cabeça parecendo com raiva. ― Depois diz que sou eu que quero
morrer.
Fechei a cara.
encolhida.
me deixaram atônita.
― Se você me amasse, não teria me deixado ― retorqui após
me recuperar, não querendo manter a esperança de que ele
achei em uma no meio do oceano. Foi por isso que não respondi
seus telefonemas; em certa ocasião, perdi meu telefone. Além
disso, o sinal era péssimo e não quis te preocupar. ― Deu um
Fechei a cara. É claro que ele estava certo por um lado, mas, pelo
outro... ― Fiquei semanas me sentindo culpada por ter me
machucado e, assim, achar que você estava se culpando. ― Ri com
― Sua segurança é tudo para mim, Mália. Nada como isso irá
acontecer de novo. ― Indicou a cicatriz na minha barriga, visível
através da blusa curta.
destruir todos eles. ― Sua voz saiu baixa. ― Pensava que minha
ida atrás deles duraria dias, mas fiquei quase um mês no Pacífico
revirar cada ilha que tinha qualquer pista dele; em uma delas, iria
achá-lo, mas isso demorou mais do que eu gostaria. ― Olhou-me
com intensidade. ― Mas juro que, se eu soubesse que você estava
seu lado todo esse tempo? Não sentiu nos meus beijos? Como
pôde duvidar que eu não a amava? Sou completamente apaixonado
por você.
Pisquei, tonta com tudo que ouvi dele. A sua declaração me
comoveu e aqueceu meu coração.
sem você.
Não sabia o que pensar. Fiquei semanas imaginando que ele
queria perdê-lo, mas estava muito confusa e de luto pelo meu pai.
Já tinha passado um mês desde que eu soube da verdade, mas
pouco tempo desde que obtive justiça.
falei e suspirei. ― Tem mais alguma coisa que preciso saber? Algo
mais que aconteceu nessa viagem?
― Tipo o quê? ― Arqueou as sobrancelhas.
Ele riu.
― Acha que eu iria pensar nisso querendo matar os homens
que a perseguiam e com você machucada? ― Sacudiu a cabeça. ―
dia? Estive treinando esse tempo todo para não correr o risco de
machucá-la, inclusive dormindo sem a faca. ― Suspirou. ― No
começo foi estranho.
Ele piscou.
― Não estive... ― Então arregalou os olhos com a realização
e ficou de pé. ― Merda, não é isso! Não dormi com nenhuma
testosterona pura. Torço para ele arrumar uma namorada com fibra
que o coloque na linha. ― Sentia falta dele e dos outros.
Mia, Jade e Luna me ligaram algumas vezes, mas não atendi a
― Queria lhe dizer que haverá uma próxima vez, mas não
acho que eu iria convencê-lo de novo. ― Fitou meus olhos. ―
Espero que dê certo entre nós dormindo assim, pois adoro seu
cheiro, sua voz, seu sorriso e até sua expressão quando fica com
raiva. Amo tudo em você. Aliás, amo você.
― Também o amo com cada fibra do meu ser e não quero
eu nem saberia.
Ele me puxou para o seu lado bom e beijou minha cabeça.
Mália
ter um pesadelo com meu tio pegando fogo. Rafaelle estava sempre
ou pegava minha mão nas trilhas que fazíamos. O que eu sentia por
ele estava ainda mais forte, e sabia que estava pronta para dar o
passo adiante. Na verdade, sempre estive, mas ele não queria que
não tinha lingerie sexy ali, afinal foi Túlio que arrumou minhas
daquele homem.
abdome estavam curados. Dei graças a Deus por esse tiro ter sido
repouso.
quartos no passado?
Ele abriu a porta e entrou, mas travou, arregalando os olhos.
ajeitá-la, mas você tem várias, e não ligo para nenhuma. Por isso
achei que também não se incomodaria com a minha...
como eu a ele.
― Que bom. Não ligo, não sou uma boneca de porcelana com
a pele perfeita, sou alguém que quer estar à sua altura e ao seu
lado agora e sempre. ― Toquei seu peito na altura da cicatriz e me
esteja pronta...
Eu ri.
― Juro, se eu dormir mais uma noite perto disso ― indiquei o
Ele riu, beijando meu rosto. Juro que o senti em cada parte do
meu corpo. Tudo ganhou vida.
curioso.
― A vida na máfia é um tanto pesada, bem como a sina dos
dia.
― Eu protegerei qualquer filho nosso, assim como faço com
risada e seu amor que não consigo vê-la mis sem você ― sussurrou
na minha pele.
meus, que ansiavam por mais dos dele. ― Só peço que feche os
olhos para não estragar a surpresa.
que pediu.
― Sim, é algo que não pode esperar. Agora peço que não os
Não demorou muito para ele voltar, ouvi seus passos no piso.
― Pode abrir os olhos agora ― pediu parecendo nervoso.
segurando um anel.
e adorá-la e nunca lhe esconder nada. Juro que passarei a vida toda
tentando fazê-la feliz.
sonhando.
me apaixonasse.
meu dedo. ― Estava pensando em pedir sua mão após lhe revelar
tudo. Confiava que me perdoasse por eu não lhe ter dito nada.
Eu não queria pensar nisso naquele momento, só no futuro
Voltou a devorar meus seios com tanto vigor que gritei. Um dos
seus dedos entrou em mim, deixando-me desconfortável, mas ele
prazer.
novo.
flutuar estava ali. Não era nossa primeira vez com sexo oral, mas eu
não soube se era porque fazia tempo que não fazíamos, a minha
boca. Sua mão veio para minha cabeça, mas não me obrigou a
quadril contra quadril. Pude sentir sua ereção, que vibrava contra o
tenso.
A dor tinha se evaporado, ele era tão carinhoso que ela logo
passou, e fui arrebatada pelo prazer.
amor. Nesse momento agradeci aos Céus por tê-lo conhecido e por
ele fazer parte da minha vida.
Nunca tinha me sentido mais realizada do que naquele
Sorri.
― Já o fizemos. Acho que teremos muitas coisas a contar a
nossos filhos um dia.
Eu ri.
― Ainda bem que cuidei delas, não é?
Mália
comigo.
Virei a cabeça na direção onde ele se encontrava, e seu
sorriso era lindo. Aquele homem me fazia amá-lo a cada dia mais. O
apoio que me dava para seguir meu sonho me fazia querer beijá-lo
ali mesmo. Era uma pena que tivesse uma multidão entre nós.
e disse algo, mas Rafaelle não pareceu ligar; sua atenção estava
em mim.
cada uma das meninas e as crianças. Graziela era uma luz brilhante
cheguei.
― Vamos começar com Amália González, uma brilhante
patinadora. ― A voz do locutor do evento esportivo soou pelo alto-
mesma coisa.
Sentia que meus pais ficariam felizes por eu ter chegado até ali
e ter capacidade de ir mais além. O meu sonho de fazer o que eu
dia.
Após minha apresentação, houve muitas outras. Ao final, saiu
todos.
Um garotinho veio me entregar um buquê, e, após isso, fui até
minha família.
redor, eu me sentia vibrante. Não achei que pudesse ser feliz dessa
forma.
Após me trocar, despedi-me de todos e fui embora com
boca.
― Não pode ser depois? Agora desejo outra coisa. ― Sua voz
estava rouca.
mim. Elas não queriam, porque era algo muito pessoal, mas o
fizeram por mim. Agradecia a elas.
primeira vez que desceu a boca em mim, eu sabia que ele gostava
para mim.
― Acha que nosso casamento perderia a graça se não
fizéssemos isso?
com cada fibra do meu ser. ― Fiquei na ponta dos pés. ― Agora
vamos ver o quanto você é bom com um chicote.
Ele riu.
― Ao contrário do que imagina, nunca fiz isso antes, mas vou
só de sutiã e calcinha.
― Gostei de saber disso. ― Ofeguei quando ele me empurrou
peso.
seus lábios pela minha barriga, virilha e sobre minha calcinha. Por
instinto, abri minhas pernas.
que antes.
― Não era você que queria assim? Agora vamos jogar, minha
um pouco.
Sacudiu a cabeça.
Confia em mim?
meus seios.
Senti sua língua em meu peito, que ele mordiscou, fazendo-me
Fazer amor com Rafaelle era perfeito, mas foder também era.
minha boceta.
― Oh, merda! ― gritei, arqueando o corpo. Logo estaria
forma que meu corpo reagiu a sexo daquele tipo. Tinha ouvido falar
que era bom, mas não imaginava que fosse tanto.
lábios de sua boceta, posso dizer que nunca presenciei coisa mais
linda que isso. É um desperdício deixar cair no lençol, é melhor eu
me ao desvario.
― Porra, isso é saboroso demais! ― Sua língua dançava em
Rafaelle
de ter Mália comigo na mansão. Como agora ela era minha noiva,
do irmão dela. Não a levei para minha casa para não haver fofocas
sobre nós e eu ter que matar alguém tão próximo ao nosso
casamento.
Ainda não li. Vou ver se faço isso depois. Confesso que estou
temeroso de ler e descobrir algo mais.
― Stefano...
Ele me fitou. Vi em sua expressão o tormento vivo que o
consumia.
― Onde quer que vá, isso que o está destruindo não vai
por Marco ter machucado nossa mãe por minha causa ― informou e
saiu porta afora.
― Porra! ― praguejei.
descobriu que ela o protegeu como fez comigo. Stefano achava que
ela tinha ficado doente, ainda era pequeno na época, mas agora
juntou as peças, após saber o que aconteceu comigo. Acho que foi
Ouvi dizer que todos que lutavam com ele não sobreviviam.
Isso estava passando dos limites. Ele escolhia os lutadores com
caráter da pior espécie para disputar, sabendo que sua morte não
faria falta a ninguém.
― Stefano tinha nossa mãe como algo intocado, mesmo
sabendo do que Marco fazia com ela. Acho que a ideia de que ela
foi machucada por causa dele o está matando. ― Sacudi a cabeça.
Stefano e Belinda.
― Vai contar ao Stefano? ― perguntei.
besteira e sumir. Tenho outra ideia. Melhor assim, ainda mais depois
de ver seu humor recente. ― Deu um suspiro duro. ― Vou mandá-lo
ficar um tempo com os Castilhos usando como desculpa que quero
checar se devo ou não continuar com a aliança com a máfia
Pacheco.
― O que isso beneficiaria a ele e a garota? Se Stefano tentar
a obrigar a se casar sem que ela queira, o que é correto, então vou
colocar Stefano lá, perto dela, afinal ele ficou encantado na última
vez que a viu. Sei que ele não a tocará se a menina não quiser, e,
pelo pouco que sei dela, não parece cair aos pés dele. ― Meu irmão
bufou. ― Talvez, com a convivência, eles acabem gostando um do
outro.
― Quando teve essa ideia?
― Na verdade, Fabrizio a teve, algumas semanas atrás.
Apenas fiquei de pensar, mas acho que ele tem razão. O que acha?
― Eles parecem ter o mesmo gênio, não acho que vão dar o
seu casamento, Stefano vai ficar com eles por um tempo, mas
nosso irmão não pode saber de nada do plano.
esqueceu algo que tem que levar ao hotel. ― Meu irmão foi ao seu
escritório, enquanto subi as escadas à procura dela.
bem.
― Minha mãe deixou essa carta para eu abri-la no dia do meu
casamento. Te falei sobre ela ― comentei, fechando a porta e me
escorando nela.
Olhou-me.
um livro aberto para você. ― Era verdade, não escondia mais nada
dela. Fui até Mália e a beijei nos lábios de leve.
― Sente curiosidade para saber o que está escrito? ―
sondou, entregando-me a carta.
algo que...
deixou. Pode ser uma coisa simples, como essa carta, mas é tudo
escrito aí, são coisas importantes, para ela ter deixado cartas a
encolheu por saber que éramos a causa de ela não ter sido feliz
quando teve a chance.
― Vai dar certo, estarei aqui ao seu lado para sempre, meu
lermos.
Você é meu menino que faz o que pode e até o que não está
ao seu alcance por todos. A forma como protege os seus me faz
sentir uma mãe orgulhosa. Amo isso em você, mas precisa viver um
Eu queria ter impedido muitas coisas que seu pai fez, inclusive
tirar a culpa que você sente por aquela noite. Meu menino precioso,
isso, já que eu não pude. É isso que pais descentes fazem, eles
protegem os filhos e os amam verdadeiramente até seu último
fôlego de vida.
Sinto-me tão impotente por não conseguir lutar mais por vocês,
por partir antes que realmente fossem livres do seu pai. Desejo que
que deixá-los com ele. Isso me mata. Rezo para que vocês sejam
Creio que continuarão sendo quem são, homens leais e fiéis ao seu
propósito e irmãos unidos que fazem tudo um pelos outros.
Estou partindo feliz por uma parte, porque vejo que tudo que
lhes ensinei sobre o amor funcionou com vocês. Percebi que você e
seus irmãos ainda são humanos, diferente do pai de vocês. Tenho
Por isso, Rafaelle, meu menino calado, entendo seu lado por
ter ajudado aquela garotinha. Senti-me feliz por ter tentado protegê-
la. Senti-me culpada e com raiva de mim mesma por pedir que não
mas pude ver que o que seu pai me fez e fez à menina o
mágica, você foi seu herói. Porém não haveria como ter feito mais
era isso que eu sempre quis que você fosse, alguém empático, que
ajuda e protege os outros, até mesmo um estranho, em vez de os
ferir.
Diga à sua esposa que ela tem a sorte grande por ter chegado
Siga sua vida ao lado de sua amada. Sei que nunca se casaria
por obrigação, mesmo por ordem de Marco. Ou ao menos desejo
que não.
simplesmente amava.
Mália passou a mão em meu ombro. Senti que queria que eu
eu o farei.
minha esposa.
― Sou sua há muito tempo ― afirmou com convicção.
palavras, sabendo que ela estaria feliz caso pudesse ver como eu
estava atualmente.
braços.
― Não sei como sou capaz de amá-lo mais a cada dia! ―
falou nos meus lábios. ― Mas amo, amo você por me fazer sentir
realizada!
― Também a amo e estou muito feliz que se sinta assim
sonho que eu realizava. Apesar disso, meu coração doía por meu
pai não estar ali, levando-me ao altar, bem como por não ter minha
mãe comigo no dia mais importante da minha vida.
meu irmão.
― Virei, sim. Agora vamos entrar, acho que chegou a hora ―
acreditar que aquele homem era meu. Tanto a minha mãe como a
dele teriam adorado ver aonde chegamos com nossas vidas juntos,
por nos encontrarmos e nos apaixonarmos.
― Obrigada.
― Vamos celebrar o matrimônio entre Rafaelle Morelli e
Amália González ― ministrou o padre.
fazer um avanço.
Pisquei.
― Ele não queria. Foi eu que pedi que ele dissesse isso só
para sondar em que patamar estava sua relação com a minha irmã
― confessou Mariano. ― No fundo foi bom; você voltou correndo
para ela.
mentira, sorri. ― Soube que vai ficar uns dias na casa dos
Castilhos.
Rafaelle suspirou.
― Sim para os dois. ― Pegou o envelope no bolso do terno e
o entregou ao irmão. ― Aqui está, mas deveria ir providenciando as
― O que você...
― Dança comigo? ― convidou-me.
― Com o maior prazer, esposo. ― Sorri, colocando os braços
em seu pescoço.
― Ainda custo a acreditar que você é minha. ― Sorriu
também.
coração.
FIM
Copyright © 2021 – Ivani Godoy
1ª Edição
foi uma mentira. Com seu passado batendo à porta, percebeu que
não era como se ela tivesse uma escolha. Seu coração clamava por
respostas, sua mente lhe implorava para ir. Como abafar essas
vozes?
propósito.
Após saber que meu pai não era Marco, me senti feliz, pois
parte, devo dizer, aquela que faz com que matem pessoas sem
sentir remorso ―, mas ele era um monstro sem coração e alma que
mãe, embora por pouco tempo, foi feliz ao lado de Paolo. Mas por
amor aos meus irmãos, não pôde viver esse romance com o homem
que amava. No fundo, eles se culpam por isso, eu podia ver, ainda
mais após saber que nossa mãe só não partiu porque Marco não
desabado aos seus pés. A dor cortou fundo meu peito, pois nenhum
casa de Paolo, eles quase tiveram uma síncope, mas insisti que não
o deixaria nesse estado. Eu não podia partir como se nada tivesse
acontecido.
Mesmo assim, Miguel não me deixou sozinha. Claro, ele ainda não
até me deixava a sós com meu pai. Enquanto isso, ele cuidava de
afinal.
pai, suas irmãs e suas filhas, Serena e Lorena. Lorena foi violentada
crueldade, ao descobrir.
buraco nunca seria preenchido. Pais e filhos são únicos. Uma mãe
pode ter mil filhos, mas se perder um, nenhum substituirá o outro.
dela em sua filha foi um lindo gesto. ― Seu olhar estava vago, como
se preso em pensamentos.
isso. Ela amaria ser avó; amaria as meninas tal qual, um dia, nos
amou.
partir…
sua alma era boa demais. Sei onde homens como eu acabam; estou
preparado.
castigo pelas coisas ruins que fiz. Aceito isso. Só espero deixar
― Estou feliz por você ter se dado bem, que seus irmãos a tenham
sempre foi meu sonho; faltava pouco para realizá-lo. ― Adoro o que
faço.
― Soube que Miguel teve que abrir mais gatis e canis onde
mora ― comentou com um sorriso fraco. ― Ele disse que você não
partida me causaria.
― Verdade, mas quem conseguiria? Eles são tão fofos,
Ele inspirou.
fazer.
Por mais que vivessem na escuridão da máfia, sua luz lhes permitia
nos amar e nos proteger. Iriam ao Inferno por nós.
enxerguei nele.
tivesse esta doença, sinto que estou morto por dentro desde o dia
em que a perdi.
minhas filhas? São tudo para mim, a minha razão de viver. Sem
Não disse nada; nunca sabia o que falar em situações assim. Só lhe
dei o tão necessitado apoio. Palavras não bastariam nessa hora.
quase o perdi. Dei graças aos Céus que as meninas não foram
feridas.
Descanse um pouco. Não posso fazer nada para curá-lo, mas posso
Por fim, virou-se na minha direção: ― Apenas não desejo que meus
cada dia.
― Vamos parar de falar em morte. Terá mais tempo com a
Forcei um sorriso.
― Luna…
― Sinto-me aliviada por ele não ser meu pai. Marco era um
monstro, quis dar suas filhas para os outros como gado. ― E não
que aconteceu com sua filha. Marco, por outro lado, nem ligaria.
Ele anuiu.
que não gostasse dele. ― Ouvi uma voz do meu lado, me fazendo
concordou.
― Sim. Com Paolo, porém, sinto uma conexão real. Não falei
Pisquei.
homem era meu amigo. Contudo, apesar de ter feito tudo isso, eu
conversaríamos.
― Somente fotos em que estava alegre, com sua família e
seus amigos. ― Voltou sua atenção a mim. ― Sei que tem coisas a
falar ao Sage, e ele se sente mal por ter saído daquele jeito, mas foi
preciso.
minha causa ou, talvez, do Miguel, Sage não aparecia na casa dos
nós.
― Luna pediu para ver Sage, mas acho que a decisão cabe a
muito boa, que gostava de mim e das meninas. Nossa relação não
amizade fora real em algum nível. Achava que sim. Não só com ele,
deixou arrasada.
Bem que notei a forma como ficou após Carlos falecer. Não parecia
México, comigo.
reunião.
Franzi a testa.
― Reunião?
nossa aliança.
no território de Paolo.
se com um deles.
no meu pai.
capo. E Rafaelle tem Mália, não a largaria por outra. Meu irmão está
apaixonado.
Seja como for, dará certo. ― Beijou meus lábios de leve. ― Por que
encolhida.
Sacudi a cabeça.
fazer nada.
nos amasse; que não nos vendesse como gado. ― Inspirei fundo.
― Mesmo na máfia, sabia que era possível, mas nada de bom vinha
amava. Um que faria de tudo por mim, e eu por ele. Restam apenas
cabelos.
meu íntimo, sabia que isso não aconteceria, tal qual não houve
esperamos.
Miguel
Olhar para Luna dormindo cortava meu peito, mas não tinha
despertas.
descer.
dormitório de Paolo.
para descer.
em sua boca.
amigo, Fabrizio se derretia pela família. Eu não era igual aos dois,
talvez por não ter sido criado neste mundo; só fui integrá-lo mais
tarde.
duro.
Belinda usava uma calça justa com ligas nas coxas. Em uma,
chegaram. Não confio nessa gente perto do meu pai. ― Sorriu para
― Belinda…
direção.
grupo.
retribuíram, inocentes.
matem.
desejar estrangulá-lo.
Belinda gargalhou.
dureza.
― B… ― Carmen começou
― Que tal pararem de falar isso antes que ensinem o que minhas
discutir.
está dormindo, não vou acordá-la. Mas sem dizer besteiras na frente
falei antes:
nenhum dos dois vai chegar perto delas de novo. ― Talvez assim
travesso.
Stefano bufou.
Fabrizio em seguida.
― Juízo ― recomendei.
Aceitam?
funcionar?
Franzi a testa.
Arregalei os olhos.
desses.
escola e na faculdade.
irmã não quis. Como nosso pai, deixamos que se casasse quando
se apaixonasse. Só piorou o cenário, porque Belinda não vai fazer
― Acho que pode rolar. Mas contaremos a ele? Porque sua opinião
um do outro.
questionei.
― Não. Meu pai mudou algumas, desde meu avô e bisavô,
Por isso busco essa nova oportunidade. Stefano será bom para a
Alessandro.
Pisquei.
Eu ri.
facas, espadas…
gostem. Química há. Quem sabe daí não venha o amor, não é?
Espero que sim. Mas, se não der certo, adianto que não vou obrigá-
outro homem apto a lidar com minha irmã. Veremos como a história
nele com minha mulher e minhas filhas, apenas para enganar todos
Sage devido ao que fez, mas Luna gosta dele e sente sua falta. A
decisão, porém, cabe aos dois. Só vou autorizar que Sage venha se
estiverem de acordo.
Morellis.
verdade.
espionou seus negócios, não foi enviado por essa razão, e sim para
Alessandro.
esposa é minha…
Alessandro.
― Nossa, não se esqueça disso ― lembrou Fabrizio, mais
sereno.
naqueles dois…
sorrindo.
por tê-las.
Nós estávamos ensinando-as a andar, mas Luna não
concordava.
de mim.
Suas filhas resgataram a felicidade dela, por isso sou grato. Elas
quem somos.
Paolo.
como eu.
mas saber que ela foi feliz ao menos um pouquinho ajudou a aliviar
― Mas nem sempre podemos evitar. Com sua mãe deve ter sido
assim também.
cartas para nós. Escreveu uma para cada um de seus filhos e pediu
será aberta, afinal, diz que não se casará. ― Eu esperava que sua
gênio, tenha agido assim para insistir que ele entregue seu coração
a alguém. Meu irmão parece não entender que amar não é sinônimo
Suspirei.
está aqui, a carta veio junto. ― Franzi a testa. ― Por que o pedido?
interessado nela. Minha filha tem isso, não permite que ninguém
― Sua voz saía cada vez mais fraca. ― Eu adoraria ver essa carta
para conferir o que sua mãe pensava sobre a futura noiva do filho.
também.
Sim, mamãe adoraria uma nora como Belinda,
importava.
proteger.
quem me deu.
devaneios.
mas mamãe poderia nos dizer a verdade… Ela não teria escondido
dela ― murmurei.
segundo.
Ouvi que Marco mal as deixava ficar com sua mãe. Queria ter ido
até ela… ― Sua voz falhou. Notei seus olhos molhados, mas não
consumia.
seu peito, que já quase não batia. ― Parte meu coração vê-lo desse
jeito.
olhar.
porque quis!
― Nas outras ocasiões eu também fiz por vontade própria. ―
preocupa comigo.
energias.
― Jura?
― Sim, papai.
nunca foi um pai de verdade, nem comigo, nem com seus filhos
Por culpa dele, fui privada de estar com minha mãe em seus
Eu pedira a ele para deixar Paolo ler a carta que minha mãe
escreveu.
entrar no quarto. “Mas vou conversar com ele para saber o motivo
do lado de fora, impaciente. Poderia espiar, mas não era tão curiosa
colocava sua carta no bolso. Ele nunca se afastava dela, nem por
um segundo.
― Você leu?
Sacudiu a cabeça.
― Não vamos falar sobre isso, Luna. Por que não entra?
às suas costas.
ninguém.
esperava que sim, embora nenhum dos dois desse o braço a torcer.
Peguei sua mão e segurei firme, desejando ter forças para passar
por isso. A vida é tão injusta, poderíamos ter tido mais tempo. Cada
da porta.
olhos molhados.
que não buscou sua cura porque acha que merece sofrer. A culpa o
corrói.
Serena dizia.
perda, e agora vem isso com meu pai. ― Tocou seus cabelos. ― O
que vou fazer sem ele? Papai é tudo em minha vida, meu amigo e
por saudade de Lorena. Digo a ele que não é sua culpa, e sim
o encontrara.
que a machucaram.
fosse por minha causa, ela não teria saído aquele dia.
Não sabia do que estava falando, mas não disse nada, só
buscando forças.
Acarinhei seus cabelos ruivos, tão similares aos meus, exceto pelo
fato dos dela serem lisos, e não cacheados. Puxei ao meu pai.
conhecê-la.
― Tínhamos os mesmos gostos para tudo. E isso inclui o
perplexa.
Sacudiu a cabeça.
real e, minha irmã, só pelo apelido. Por isso não nos demos conta. E
ele não sabia que minha irmã estava interessada. Eu não via Lorena
há meses, só nos falávamos por telefone. Embora eu o tenha
negócios juntos. Foi assim que ela passou a gostar dele. ― Limpou
com o garoto que Lorena amava. Eu não sabia que era Mariano!
sussurrei.
― Eu sei, mas Lorena não me esperou explicar. Até eu achei
dor dela era a minha também. A suposta mentira dele foi demais…
era bom com todos, talvez por isso minha irmã gostasse dele. Quem
não o amaria?
sincero. Se ele tivesse notado, teria contado sobre mim, sobre nós.
― Lamento, querida…
― Se nada disso tivesse ocorrido, ela ainda estaria com a
Soluçava. ― Foi a última vez que a vi, furiosa comigo por achar que
também. ― Não queria nem pensar nessa ideia. ― Nosso pai não
daqueles malditos.
momentos preciosos com meu pai; poderia ter ficado mais ao seu
― Não foque nisso, tá? Não vale a pena sofrer antes da hora.
Precisamos ser fortes por ele, ou papai se sentirá mal. É difícil, mas
lutaremos juntos. Não passei pelo que viveu com Lorena, mas
entendo, em parte, sua dor. Reforço que todos aqui amam você,
tensão.
Adorei saber que tenho mais uma. Fiquei animada quando papai me
disse.
Foi por gostar dele que minha irmã saiu daquele jeito e nunca mais
voltou para mim. Não o vejo há muito tempo. A última vez foi no
da dor. Mariano lutaria por você. ― Era o que eu faria por Miguel.
― Não… Eu o acusei, sendo que ele não fez nada. ― Em pé,
morreu com o ataque à sua família, no qual seu pai faleceu. O medo
momento. Tentei ligar, mas não atendeu. Ali, entendi que tudo, de
fato, acabou. Hoje em dia, ele é mais Razor (seu apelido na máfia,
Mariano.
irmão!
então me contive.
Não queria ficar longe do meu pai. Pai! Palavra que, agora, aquecia
manteria ambas sob suas vistas. Sua confiança nessa nova família
cama.
volta.
― Tirei a sorte grande ao me casar com um homem como
que amava.
por me aturar.
braços.
disse de Valentino não olhar muito para ela, devido a ser gêmea
idêntica da irmã.
Pelo pouco que conhecia de Valentino, sabia que sofria por Lorena,
mas não significava que não conseguia ver Serena sem magoar-se.
entrasse.
em que foi preso e torturado? O que ele deve ter sentido, não só
― Luna? ― chamou.
Até Miguel tinha muitas. Eu não ligava para as marcas, e sim para
― Luna, você tem algo a dizer, posso ver. Não tenha medo.
imaginá-los brigando.
― Então o que é?
o.
― Como assim?
estando longe.
irmã.
Deu um passo para trás, como se tivesse levado um soco.
afastou.
igual, se Marco tivesse dado Jade a Gael. O verme “só” lhe tocou e,
acusasse por não ter feito nada ― sussurrou tão baixo que pensei
mirei seus olhos, um poço de dor. ― Não passei por algo assim,
mas entendo.
sérios.
Sorri.
verdade.
Pisquei.
Valentino riu.
prosseguiu:
nos braços.
nossas bebês.
Vendo pelo lado bom, parece que não aconteceu nada mais sério,
de formular nada.
com ele.
Não enxerguei Fabrizio ali, devia estar com nosso pai. Eu
cenário.
casa.
― reclamei.
Fabrizio me fitou.
para casa. Ele não é só meu pai, é meu chefe também ― contrapôs.
Busquei uma saída alternativa, mas não havia nada.
as lágrimas.
aguda.
sozinha.
Queria ter mais tempo, fazer coisas que nunca fiz… Tantas
chances perdidas.
conhecido, assim, não sofreria com sua morte. Afastei essa ideia
― Luna…
― Luna, querida…
Não era só sua doença que lhe causava agonia, então me
Queria ter ficado ao lado dela até o fim, mas Marco… Marco não
não tenha ficado com ela. Sei disso porque sinto o mesmo. ― Suas
Marco nem a teria deixado ficar no hospital, tudo por causa das
Paolo não ligava para isso, só queria passar seus momentos finais
tudo que eu podia ter, que assim fosse. Minutos com Paolo valiam
com o pai para que aceitasse a internação. Por que ele me ouviria?,
bem que era ela quem o acompanhava na ocasião, e não sua irmã.
morreu. ― Suspirou.
repetisse.
tive que omitir uma série de coisas dela, uma vez que eu precisava
estava no Inferno.
― Fiquei puto da vida com El Diablo por não ter dito nada ―
culpá-lo por suas ações (ou pela falta delas). ― Quero lhe pedir
uma coisa.
melhor não dizer. Não escondo mais nada dela ― avisei. Jamais
Ele sorriu.
e depois para mim. ― Agradeço por ter aparecido na vida dela e por
coração de Luna.
como eu? Você teve uma pequena amostra quando foi machucado.
Ver minha família triste, sem poder fazer nada para impedir…
sair.
Hoje Sage nos fará uma visita. Luna quer vê-lo. ― Em pé, olhei para
― Sempre protetor.
parta, diga que tê-la aqui foi o melhor acontecimento da minha vida;
por ela como por minhas netas. ― Sorriu fraco. ― São tão lindas…
esse golpe. Comentei, rindo: ― Ela pediu que eu falasse com você
filhos. Adoraria realizar esse último desejo deles, mas não posso.
mesmo.
― Vou ficar com papai enquanto vocês falam com Sage. Ele
Sage, mas era bobagem: Luna me amava. O fato dele ser casado
também me tranquilizava.
Eu não sabia que Sage levaria a filha. Talvez fosse sua forma
considerava atacá-lo.
calado.
― Vamos descer?
eu tinha que ser forte pelo meu pai, mesmo que o medo me
fazê-la feliz. Como não posso aliviar sua dor e seu medo, pensei
― Notei uma raiva contida ali, mas ele não machucaria meu amigo.
Miguel assentiu.
Chegamos à sala, onde alguns dos Castilhos já estavam,
anos.
impedir meu irmão, caso fizesse algo. Mas eu não aceitaria que
perto.
Ele passou muitos anos comigo. Deve ter sido difícil viver
longe de sua família para cumprir seu dever. Até achei que
mão de Sage.
Era para eu ter tido isso: segurar a mão do meu pai, ir com
eles aos lugares. Ser uma filha amada, como fui pela minha mãe.
A menina o avaliou.
a testa franzida.
frio.
controlasse. ― Não é?
Stefano olhou para mim por um segundo, então colocou um
lanços sanguíneos.
doce.
para ela.
― Posso?
― Obrigada.
longe de mim.
― Querida, por que não vai ver meu pai? Ele mencionou que
― Sorri.
Tão logo a menina saiu, Stefano se pôs de pé, dando um
passo até Sage, que permaneceu quieto, mas tenso. Peguei seu
― Por que vocês não saem e nos deixam a sós? ― pedi com
um suspiro frustrado.
cintura.
― Ah, por Deus! ― Exasperada, fuzilei os dois. ― Se não
não vai me ferir, Fabrizio já disse. Vocês dois estão sendo ridículos.
Apenas ele poderia impedir uma possível luta. Porém, antes que se
braço.
significado.
parecia preocupada.
― Não vou tocar nela. ― A voz fervia de raiva. ― Só quero
cochichando:
delas.
Stefano continuou:
entendia.
irmão. Dizer que eu gostava de você me salvou até certo ponto. Mas
apaixonada por ele no intuito de ganhar tempo com seu pai, que
― Não entendo uma coisa: você alegou que o seu pai era
desse preconceito. Mas você não é gay! E mais: ele nem era seu
nosso povo, indo aliar-se com os Rodins. Eu não tive escolha. Como
olhou para Belinda. ― Repito: ainda bem que não é como ela, ou
Fabrizio que, por sua vez, estava petrificado no lugar. Ela correu
― Papai!
queria ir até lá, por que não saía do lugar? Recordações invadiram
pessoa. O carinho que meu pai me deu nesse curto período foi
impossível não amá-lo, não desejar passar uma vida inteira na sua
companhia.
hospital.
Por que isso tinha de acontecer? Tanta gente ruim por aí, que
homens do meu pai. Era um chefe querido por todos. Alegrei-me por
comigo.
bebê. Rafaelle também não foi, mas mandou seus pêsames por
encontrava ali.
bem, em particular por alguém que não está vivo, mas eu sentia isso
por Marco.
Olhando a sepultura e aquele caixão descendo, meu coração
ali mesmo. Ele era meu porto seguro nesse momento difícil. Se não
uma perda que não cicatriza: sempre haverá uma ferida exposta.
amava em demasia.
para sempre.
Miguel me puxou para seus braços, enquanto eu chorava
pelo luto.
assassinada brutalmente.
lado.
ali.
ajuda.
que ele iria para o Céu. Talvez fosse tola por pensar isto de um
Ele fez muitas coisas que não agradariam a Deus, mas papai era
prometeu Belinda.
estraçalhado.
Miguel
dele.
nesse cenário difícil. Também estaria com Luna, se ela não tivesse
adormecido.
à sala.
mesmo dia.
― É a regra, meu pai quis assim. Deixou tudo arranjado. ―
perto de Alessandro.
Stefano.
Sacudi a cabeça.
nossa frente.
Assenti. Ele apenas seguiria a regra imposta por seu pai.
cansaço.
dormir.
tempo ali.
segurava um capacete.
― Ela quer sair, mas não acho uma boa ideia ― explicou
Santiago.
frustração.
lugar.
― Vou com ela. ― Stefano se colocou de pé. ― Eu a
protegerei.
explosivo ajudando alguém que não sua família, sem esperar nada
dela.
avisando:
hoje. Ainda bem que são novas e não entendem o que é perder uma
parte sua e ter que continuar a viver sem ela. Espero que nunca
da casa.
princípio.
― Porra! ― Valentino praguejou baixo, de repente, e encarou
Belinda passara.
duas.
joias, não podia ver uma que ficava mexendo. Já Kélia não
apreciava muito.
O anel usado por meu amigo fora comprado por ele junto à
Castilhos.
enquanto conversávamos.
― Entendo. Mia vai ter seu bebê, e Luna deseja estar lá para
ajudá-la.
erguendo-se.
sobrinha.
Lamento por sua perda, cara. Não disse isso antes, mas só queria
que soubesse. Eu vou cumprir a promessa que fiz ao seu pai. Foi
interior, que sempre esteve lá, oculto. Mas há ainda gente boa, que
luta pela segurança dos seus. Nós cuidamos dos nossos. Fico feliz
Agora preciso cumprir o desejo do meu pai. Vou liderar esse império
a seu exemplo.
Carmen, em despedida.
partido.
a perna ontem, por isso não vieram ao enterro. Rafaelle queria vir,
braço só e atendi.
― Alfred…
imitou.
― O que houve?
― Só um minuto, já retorno.
― Sim, senhor.
identificaram.
preocupe. ― Desligou.
alertar, mas vai cuidar do problema. ― Ele era meu braço direito.
Foi difícil ir embora da casa do meu pai, mas sabia que ele
não estaria mais lá. O bom era que teria meus irmãos quando
na Espanha.
minha cunhada.
acalmar.
por Miguel.
mais sabidas!
Meu coração se aqueceu ao olhar as duas sorrindo.
estourou uma hérnia. Ela estava brincando, claro, o que achei bom:
praticamente rosnou.
Mia riu.
dentes.
proteção…
amarem.
palma da mão.
eu sentia.
exceto em Stefano.
― Luca entrou na sala, seguido por Jade, que sentou do meu outro
lado. Seu marido ficou à nossa frente, perto de Alessandro. ―
Não só pelo Miguel, mas por mim: eu me curtia do jeito que era,
que altere tudo em você, não vale a pena continuar ao lado dessa
pessoa.
máscara.
sei, mas ter algo mais sério por trás? ― duvidou minha irmã.
― Algo deve ter acontecido. Concordo com Miguel. Até pedi
Marco levou muito de nós cinco, mas sinto que tem algo a mais
pai de verdade ― Jade cuspiu. ― Marco não merecia ter filhos. Que
apodreça no Inferno.
mamãe e Paolo?
que Marco fez com nossa mãe e Rafaelle. Tem lutado mais, mal
para em casa. Por isso acho melhor que fique um tempo com os
irmão, por que o faria com membros de outra máfia? ― refletiu Mia.
contra aquilo que achamos não merecer ― disse Luca. ― Ele pode
valorizá-la.
Miguel
A dor de Luna era recente. Essa ferida levaria anos para ser
amenizada.
Era para eu ter lhe dito, só não lhe contei justamente porque minha
dessa sensação.
curiosa.
Acabáramos de colocar as meninas para dormir, e ela se
o pior pelo pai, foram puxados. Minha amada ainda não voltara a
escondia sua dor para não me fazer sofrer ― uma tolice, pois eu
bebês.
aconteceu?
para ela era horrível, mas não a preocuparia com meus problemas.
Quase ri pensando que, segundos antes, eu reclamava de
tranquilamente.
dentes faltando.
coisa do gênero?
frustrado e furioso.
Luna?
― Qual é o alvo?
certo?
entendo por que não faz algo mais sério… Se fosse um inimigo
Pisquei, aturdido.
pensamentos.
problema.
Uma pessoa apaixonada agiria bem antes. Quem sabe até atacaria
de algo que fiz contra algum parente seu? Isso sim pode acontecer,
um local isolado.
Mudei de assunto:
desse infeliz.
colocando-o na mesa.
Respirei fundo.
― Nada…
― Atacando como…?
machucaram.
― Ainda não…
Suspirei.
― Sim. Não sei quanto tempo demorarei. Fique aqui até que
dela e das minhas filhas seria difícil, ainda mais para procurar
marido.
braços.
ido para a de Alessandro pois achei melhor Luna ficar com sua
família.
convencendo minha mente de que aquele não era o lugar ideal para
Stefano parou, decerto pois a palavra que lhe veio à mente era
Até sua raiva me divertia. Não via essa emoção nela com
esperançosa.
pensamento.
Sorri.
Então me despi, louco para entrar nela. Contudo, iria com calma, a
necessitada.
com as mãos. ― Isso, fale meu nome… ― Pus dois dedos nela e
justas em meus dedos. Luna logo gozaria, por isso, tirei minha mão
minha esposa.
apaixonado.
incentivar.
você.
preço.
Miguel
Apesar de Luna querer ficar com seus irmãos, ela era uma
de Mia e Alessandro.
logo mais.
Alfred.
objetei.
da máfia, seria mil vezes pior. Fora o fato de que dariam o tal recado
noite.
Ainda bem que Daemon está vindo; tomará conta das garotas, junto
garantiu Vlad.
não é?
Sorri.
família?
― Christian, você sobreviveu. Não experienciei algo similar,
mas entendo, em parte, sua dor. Desejo que seja feliz. ― Caminhei
Rumei à porta.
― Miguel?
― Sim?
sua decisão, fico a seu dispor. Peço que tente, só isso. Participe
familiares indo para a tumba. Pelo que eu sabia, ele tinha uma
nenhum dos dois. Devo minha vida a eles, ou o que sobrou dela. E
quem amamos dói, mas é melhor que vê-los sofrer. Enfrente seus
fantasmas.
― Ainda ouço os gritos delas. ― Fechou seus olhos,
atormentado.
― Eu queria poder acabar com sua aflição. Por que não visita
seu irmão em Nebraska? A família tem esse poder de nos dar forças
importantíssimo.
― Verdade. ― Riu enquanto seguíamos para o salão do
desvencilhar desta vida. Ainda bem que sua família sabe quem você
argumentei.
a testa.
naquela ocasião.
― E você o ajudou?
ajudar com o caso de Tadeu, cuja família se mudou para lá. Então vi
Anuí.
preparado.
acusação.
pesaroso.
Aquiesci.
dois. Prometi que, quando tivesse um tempo livre, após tudo isso
Miguel até me pedira para ficar em casa, devido aos ataques, mas o
alguns minutos.
― A mesma que tomava conta das meninas? O que ela
queria?
― Estranha como?
reação de Miguel.
pode fazer isso sem a autorização do chefe. Será que seu novo
irmão permitiu que viesse?
coisa ― declarou.
vocês?
Já havia checado todos os meus animais e retornava ao meu
“tia”. ― Riu.
Eliací?
visita…
― No galpão…
sala.
terminava aí: carregava uma lata quase vazia. Derramou pelo chão
Miguel
comentei.
Ergui as sobrancelhas.
― Uma armadilha…? ― ponderei. ― Isso não explica os
Arregalei os olhos.
para falar com ela, mas Fabrizio ligou na mesma hora. ― Fabrizio?
― atendi.
Desliguei.
deseja vingança.
eu mais amava.
eu já sabia.
você.
ajudá-la.
― Não! ― Lançou-se na minha direção, derrubando o celular.
atingi-las.
responsável?
adiantou. Então repeti com mais garotas. Tinha algum dinheiro que
como se fosse algo banal. ― Esse dinheiro Fabrizio não tomou, pois
homem conseguiu.
salvar.
machucando inocentes.
em outra máfia, eu me recusei, mas Carlos disse que era uma boa
forma de crescermos.
Carlos morto. Como não posso chegar aos homens que desejo
em Luna.
gasolina.
se destinasse a mim.
Meu escritório não tinha janelas; Miguel não quis facilitar para
desse um presente.
la… ― Insistia para que visse a razão, mas não havia escapatória.
perder o homem que ama. Mas isso que você pretende fazer é
errado!
pelas câmeras.
com a situação.
temi tê-la matado. Por favor, que esteja bem, pensei como um
mantra.
apavorava mais que tudo. Apenas desejava sair dali e pegar minhas
filhas no colo.
Abriram a porta.
Miguel
Minutos antes
Cheguei ao local onde Luna estava sendo mantida refém da
― Eliací…
― Lamento, ela não sobreviveu ― disse Christian,
contido, felizmente.
tudo.
― Luna…
camiseta.
preocupada! Quis ir lá, mas Edward não deixou. Ele disse que seria
longe.
― Estou, sim. E minhas filhas? ― Afastou-se um pouco. ―
de cima. Eu a segui.
possível.
― Ela passou por muita merda, agora vem mais essa? Luna
Suspirei.
― Alessandro…
nossas meninas.
quero sentir isto nunca mais. ― Pondo-me de pé, puxei-a para mim
e a beijei. ― É tão bom sentir seu cheiro, saber que está segura em
meus braços.
Ela assentiu.
do tipo.
Meus negócios corriam perfeitamente. Como tudo neste
que eu amava.
minhas costas.
experiência fácil.
― Mais que preparado. Passei para dizer que está tudo certo
mas não podia, afinal, minha esposa optara por um parto natural.
esforço.
pessoal.
aguardavam notícias.
aproximei.
Paolo.
vontade de esganá-la.
que as garotas.
rostinho delicado.
leve. ― A pessoa que me deu tudo: amor e uma família pela qual
meus filhos. Sou feliz por tê-lo conhecido, Miguel. Obrigada por
anos. Paolo já somava três. Todos os dias, agradecia por Eliací não
Morrer daquela forma não era bom. Mas agora eu não pensava
entrando na cozinha.
Pisquei, chocada.
Miguel.
― Sua mãe fez uma pergunta: por que o chutou? Ele é seu
seu cabelo e você chorou, fui eu quem socou o infeliz para defendê-
la.
― Mas…
Miguel suspirou.
escadas, amuada.
― Será que ela vai ficar braba comigo por muito tempo? ―
falei.
cozinha.
que vai acontecer se fizer algo assim de novo ― Jade dizia à Mália.
Também notei.
confessou.
entregando Paolo.
Ela virou uma mocinha linda. Bem, sempre foi. Ademais, era
adormecera.
escada abaixo.
mesmo nos momentos em que deveria ser mais duro com elas.
Ele sorriu.
cedo?
nossos filhos.
merecemos.
sentidos.
destino.
1ª edição
2021
Copyright © 2021 Ivani Godoy
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É PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL E PARCIAL DESTA OBRA, DE QUALQUER
FORMA OU POR QUALQUER MEIO ELETRÔNICO, MECÂNICO, INCLUSIVE POR MEIO
DE PROCESSOS XEROGRÁFICOS, INCLUINDO AINDA O USO DA INTERNET, SEM A
PERMISSÃO EXPRESSA DA AUTORA (LEI 9.610 DE 19/02/1998).
ESTA É UMA OBRA DE FICÇÃO. NOMES, PERSONAGENS, LUGARES E
ACONTECIMENTOS DESCRITOS SÃO PRODUTOS DA IMAGINAÇÃO DA AUTORA.
QUALQUER SEMELHANÇA COM ACONTECIMENTOS REAIS É MERA COINCIDÊNCIA.
TODOS OS DIREITOS DESTA EDIÇÃO RESERVADOS PELA AUTORA.
Stefano Morelli quando criança foi forjado um assassino frio
da pior maneira possível. Sob o jugo de um pai que mais parecia um
monstro, cresceu sabendo que nunca seria feliz, pois isso foi tirado
dele há anos. Marco queria quebrá-lo e domá-lo, porém Stefano não
lhe deu esse prazer, embora, no fundo, o pai tenha levado dele algo
que nunca terá de volta, não importa quanto deseje isso ou quanto
sangue derrame para esquecer.
Stefano acredita que está além da redenção e no fundo não a
deseja. Ele sabe que o inferno o aguarda e aceita sua sina. O que
ele não aceita é que seu passado de tormento e tortura recaia sobre
a única mulher que faz com que se sinta vivo como não esteve em
anos. Por ela, irá ao inferno aonde nunca pensou que voltaria.
Eles querem ver o monstro que foi forjado? Que assim seja!
E, quando Stefano terminar, não sobrará nada além de sangue,
ruína e mortes.
Belinda Castilho é uma mulher capaz e decidida, que está se
curando da perda do pai, determinada a ser forte pela sua família e
amigos. Entretanto, Stefano parece enxergar sua alma. Ele vê
através da fachada e está disposto a ajudá-la, até que é tarde
demais... para os dois.
O que Stefano fará para proteger quem ama? E Belinda
aceitará o destino que foi imposto a ela?
Estávamos na estrada algumas horas após Marco e eu
sairmos do avião assim que pousamos em Bangkok. O lugar parecia
distante do aeroporto.
Ele não me contou por que tínhamos ido ali. Estranhei, pois,
sempre que íamos para um país diferente, meus irmãos estavam
juntos. No entanto, daquela vez eu estava sozinho em um lugar
desconhecido.
Não tinha medo. Na máfia, descobrimos logo cedo que
devemos ser fortes e encarar as coisas com a cabeça erguida,
nunca desistir. Foi isso o que Alessandro me ensinou. Ele me
treinava do seu jeito, evitando que meu pai levasse o meu treino a
um novo patamar, embora nós dois soubéssemos que meus irmãos
não poderiam me proteger para sempre. Logo eu teria que fazer o
que tanto abominava.
Meu pai achava que nossa aversão a matar, tanto minha
como dos meus irmãos, era uma fraqueza que ele repudiava e que
tínhamos herdado da nossa mãe.
Minha mãe era tudo para mim. Eu a adorava com cada fibra
do meu ser e não me importava de ter herdado a tal “fraqueza” dela.
O que me incomodava era o fato de o meu pai a usar
frequentemente para que meus irmãos fizessem o que ele queria.
Eu esperava que isso nunca acontecesse comigo.
― Aonde estamos indo? ― perguntei a Marco após
andarmos alguns quilômetros.
Ele não respondeu, e não insisti; sabia que seria pior caso o
fizesse.
Andamos mais meia hora, saindo de Bangkok, e entramos
em uma estrada de terra em um campo aberto. Nele tinha um
helicóptero com vários homens tailandeses.
Eu não estava gostando disso, mas controlei o que estava
sentindo, por mais que quisesse desaparecer da vida de Marco.
Poderia fugir, mas não o faria; eu não era um covarde que se
esconde dos outros, lutava de cabeça erguida. Era claro que sentia
medo, como qualquer ser humano, mas nunca deixava meu pai
saber, ou ele usaria isso contra mim.
Nas últimas semanas, Marco estava me testando, colocando-
me para cobrar dívidas de seus devedores junto a Rafaelle. Meu
irmão fazia o trabalho duro, e eu ficava lá apenas olhando, com o
coração doendo. Não gostava de ver aquela crueldade sendo feita a
nenhum ser humano, não importando se aqueles homens eram
bandidos.
Por ter nascido na máfia, eu deveria ser como meu pai, mas
agradecia aos Céus por não ser; já tinha visto coisas que me
enojavam, principalmente a forma como seus inferiores e
comparsas se aproveitavam de garotas novas. Quando eu via isso,
tinha vontade de colocar uma bala na cabeça deles. Nessa hora, eu
sentia que era capaz de matar, ou talvez fosse a natureza humana,
e eu evitava seguir esse instinto.
Parei de pensar nisso e foquei no presente; assim saberia
aonde estávamos indo.
A viagem de helicóptero durou mais uma hora, então olhei
para baixo e vi um lugar que parecia um presídio, com cercas
elétricas e cercado por guardas.
Por que ele me trouxe aqui?, pensei. O que quer que fosse,
não devia ser algo bom; nada que vinha de meu pai era.
― Aqui é onde farei de você um homem de verdade ― disse
Marco. ― Bem-vindo à Arena da Morte.
Arena da morte? Ele pensa em me colocar para lutar com
alguém?
Meu corpo inteiro tremeu diante disso, e o medo começou a
se apossar de mim, mas me controlei. Não sabia nada sobre aquele
lugar, mas só o nome dizia tudo que eu precisava saber.
Após aterrissarmos e entrarmos na propriedade, passamos
por celas onde havia vários garotos da minha idade presos. Seus
olhos pareciam mortos. Essa última palavra descrevia tudo. Eu só
podia imaginar o que tinham visto naquele lugar para se mostrar
assim, sem um pingo de alma.
Meu pai lidava com tráfico humano, algo que eu abominava e
me enojava, mas eu sabia que não podia fazer nada para mudar
isso. Esperava que um dia Alessandro fizesse a diferença e
mandasse Marco ao inferno, onde ele tinha um lugar à sua espera.
Naquele dia, descobri que meu pai lidava com lutas
clandestinas também. O que me chocou foi ver que ele não usava
homens, e sim crianças.
Alessandro não vai gostar disso, pensei. E quem gostaria?
Não alguém que tivesse um coração. Meu pai não sabia o
significado dessa palavra.
Contive a raiva e o medo, embora tudo em mim gritasse para
eu sair logo dali. Contudo, era-me impossível fazer isso.
Os garotos nos seguiam com o olhar, e percebi neles um
brilho de ódio direcionado a Marco. Bem-vindos ao clube!, pensei,
pois eu também sentia a mesma coisa.
Entramos em uma arena imensa que mais parecia um
estádio de futebol, com arquibancadas onde, ao seu redor, uma
multidão aplaudia garotos lutando em uma gaiola. Essa gaiola tinha
o tamanho de um ringue de luta normal, mas era completamente
envolvida por grades para evitar que os garotos saíssem. O chão
estava coberto de sangue.
Meu estômago se embrulhou ante o que eu estava vendo,
porém me mantive no controle. Esperava que continuasse assim.
A forma como os garotos lutavam me chamou a atenção;
eram rápidos e letais a cada golpe de suas armas brancas. Um
deles parecia mais brutal com seu cutelo; o outro possuía uma faca.
Não havia dúvidas sobre quem ganharia ali. Um dos competidores
me olhou com nada além de vazio e fúria por um breve segundo e,
no momento seguinte, voltou à luta.
Meu estômago se embrulhava a cada soco que eles davam e
a cada rasgo que as lâminas faziam em seus corpos. Meu coração
estava acelerado e angustiado. Era aquilo que Marco queria que eu
fizesse?
― Como anda tudo aqui? ― perguntou meu pai a um dos
homens que controlavam o local.
― As coisas estão indo bem, chefe, os garotos estão
ganhando muito dinheiro. ― O maldito sorriu.
Cerrei meus dentes, querendo socar todos ali, mas me
contive; não seria páreo para eles. Meu pai provavelmente me
deixaria apanhar e assistiria a isso sorrindo.
Bastardo fodido!, pensei com amargura. Repudiava toda
aquela escória.
― Que bom. Agora quero que treine meu filho como os
melhores lutadores que temos aqui ― ordenou Marco.
Encarei-o de olhos arregalados.
― Você só pode estar brincando! ― exclamei furioso.
Eu tinha um temperamento explosivo, algo que meu pai
odiava. Fuzilou-me.
― Basta, Stefano. Você vai fazer o que eu digo ― rosnou
com os olhos ardendo de fúria, depois encarou o homem barbudo.
― Leve-o e treine-o, não importa que tenha que quebrá-lo para que
isso aconteça.
Eu o odiava cada vez mais. Mesmo com o medo me
controlando, não conseguia implorar para ele não me deixar com os
lutadores. Eu treinava luta com Alessandro e Rafaelle, mas naquela
arena as lutas eram mortais e brutais, algo que eu nunca tinha feito.
Olhei para o homem que se dizia meu pai, porém
desconhecia tal palavra; nunca fora presente em nossas vidas,
minha e dos meus irmãos. Não sabia fazer nada além de nos
obrigar a fazer coisas que não queríamos.
Estava na ponta da minha língua mandá-lo para o inferno,
quando a plateia rugiu em aplausos.
Olhei para a arena, e o garoto que havia me encarado
minutos antes agora retalhava seu oponente, não ligando para o
sangue que respingava em seu rosto, deixando-o todo vermelho.
― O Número 10 ganhou! ― Uma voz soou num alto-falante.
― Ninguém é páreo para ele!
Aquela porra ficava cada vez pior. Então os desgraçados
fodidos não davam nomes a eles? Era como se não merecessem,
como se fossem apenas mercadoria.
― Vocês são todos fodidos! ― cuspi.
O crápula ao lado do meu pai riu como se eu fosse uma mera
mosca que ele desejava massacrar. Eu sabia ler as pessoas muito
bem para perceber aquilo.
Marco pegou meu braço em um aperto insuportável, fazendo
com que eu me encolhesse, mas não emiti som algum; não daria
esse gostinho a nenhum deles.
― Estou farto da sua boca malcriada, Stefano! Vamos ver até
quando vai continuar assim! ― grunhiu no meu rosto e me empurrou
para o cara. O seu fantoche pegou o meu braço no mesmo local que
Marco tinha apertado antes. Eu apostava que teria marcas, embora
isso fosse fichinha perto do que aconteceria comigo naquele lugar.
― Leve-o da minha frente ― ordenou Marco. ― Kanon, faça
o que precisar para devolvê-lo dócil e obediente.
O filho da puta sorriu com expectativa.
― Posso fazer com ele tudo que faço com os outros? ―
sondou com entusiasmo. O sujeito parecia um sádico fodido.
Meu intestino se retorceu de pavor com suas palavras, mas
escondi isso deles. Se ele achava que iria me tocar, eu provaria
para todos que o inferno congelaria antes.
Marco o fuzilou.
― Em relação às lutas, sim, mas, se ousar tocar nele de
outra forma, tanto você como qualquer outro, irão se arrepender. ―
Sua voz saiu letal, dita sem poder de recusa.
O gelo se apossou de minha alma. Eles estavam falando de
abuso sexual? Então todos ali eram malditos pedófilos? Isso me
amedrontou. Embora o aviso do meu pai me deixasse um pouco
aliviado, eu tinha certeza de que ele não tinha feito isso por seu
maldito coração negro ter alguma emoção paterna. Não, eu
apostava que ele não queria manchar seu nome ao ter um filho
molestado. Eu o conhecia e sabia o quanto era preconceituoso, mas
ele não impedia seus homens de fazerem aquilo com outros que
não seus filhos.
Só em pensar nisso, eu ficava ainda mais puto, não só com
Marco, mas com todos que tinham ido ali presenciar aquela porra
toda.
Kanon ficou branco, mas assentiu.
― Sim, chefe. Vou prepará-lo como deseja ― garantiu,
embora sua voz tremesse, mesmo tentando esconder.
― Ótimo. Agora leve-o para ficar com os prisioneiros nas
celas ― disparou, com um gesto da mão.
― Você me enoja como pai ― desdenhei.
Kanon pigarreou antes de Marco dizer ou fazer algo, tomado
pela fúria.
― Senhor, o que acha de o colocarmos na jaula? Isso iria
quebrar sua petulância de menino marrento. ― Ele parecia eufórico
por isso ou para que eu morresse na arena.
Marco olhou para mim como se quisesse me esfolar vivo. Eu
não entendia por que nunca o tinha feito. Ele encarou a arena um
segundo e depois a mim com um sorriso.
Eu não queria lutar com aqueles garotos que tiveram a
infelicidade de entrar no caminho de Marco. Poderia implorar para
ele não fazer aquilo e dizer que o respeitaria e seria obediente, mas
o orgulho falou mais alto; eu não conseguia me rebaixar. Não sabia
se era só o meu gênio ou se eu era um completo estúpido. Acho
que os dois, pensei com um suspiro baixo.
― Leve-o, mas mande que seus cães não o matem ― avisou
Marco.
Como ele podia chamar aqueles garotos assim? Jurei a mim
mesmo que, no dia em que saísse dali, iria arrumar um jeito de
ajudá-los de alguma forma. Mas como? Eu era só uma criança a
caminho da adolescência. Talvez Alessandro tivesse alguma ideia e
me ajudasse, porém eu não queria pensar naquilo no momento;
primeiro precisava sobreviver àquele lugar.
― Meus animais só fazem o que eu mando. ― O verme
parecia orgulhoso desse fato.
Ele me puxou para a arena, aonde um garoto loiro de cerca
de uns 15 anos foi levado após a luta do Número 10, que tinha ido
embora sem que eu visse. Esse era o Número 16, estava cravado
na sua pele como marca de gado.
O rapaz sorriu de forma tão sinistra que me provocou um
arrepio na espinha. Segurava facas e me olhava enquanto eu
entrava.
― Você aprenderá a fazer o que eu digo e me obedecerá
como um cãozinho ― disse Kanon.
― Você não passa de um capacho e cão do meu pai ― sibilei
com um sorriso sarcástico.
Kanon trincou os dentes e cerrou os punhos. Percebi que
queria me socar. Aquele lixo provavelmente não ouvia “não” todo
dia, não sem devolver o troco.
― Vou adorar domesticá-lo. ― Sorriu frio e me empurrou
para dentro da gaiola, acenando para o garoto ali parado, ainda sem
se mover, como se fosse uma máquina assassina. ― Lute com tudo
de si, só não o mate, ou irá para o inferno logo atrás dele.
O garoto me encarava sorrindo de um modo que parecia um
louco que tinha acabado de sair do hospício, embora não houvesse
emoção alguma em seu sorriso. O que eles faziam com aqueles
meninos? Pareciam zumbis assassinos sanguinários.
― Dê uma faca a ele! ― gritou Marco do lado de fora da
jaula.
― Senhoras e senhores, hoje temos um novo integrante que
irá lutar com o 16! ― ouvi o locutor dizer. ― Quem sobreviverá?
Eu vou fazer de tudo para sair deste lugar, não lhes darei o
prazer de fazer o que eles querem!
Foram-me entregues duas lâminas, mas permaneci parado
no lugar. Respirei fundo, segurando as facas com força, uma em
cada mão. A minha vontade era matar outro adversário, não aquele
em minha frente.
Eu sabia lutar bem, mas como sobreviveria sem dar o que
Marco queria? Se eu lutasse e matasse alguém, o único beneficiado
seria ele. Poderiam me chamar de tolo, mas eu não queria e não
faria aquilo.
― Não precisa lutar... ― comecei a falar, mas me calei; se
ele não fizesse aquilo, com certeza seria castigado. Eu não queria
isso.
Ele não respondeu, só sorria como se eu não tivesse falado
nada ou não se incomodasse em abrir a boca.
― Essa luta não é mortal ― disse o locutor. ― Que vença o
melhor!
Provavelmente não serei eu.
Então a luta começou. Eu só me esquivava dos ataques de
meu oponente, não revidava. Sua lâmina atingiu meu braço,
fazendo um corte grande. Encolhi-me, mas não gritei. Não queria
dar esse prazer aos animais que assistiam à luta, incluindo o pior
deles.
Fui jogado no chão de costas, o que roubou meu oxigênio por
um momento.
― Lute, Stefano! ― gritou Marco.
Olhei para ele e sorri. Se o bastardo achava que me
domesticaria a ponto de eu ser o cão de alguém, estava
redondamente enganado. Eu podia lhe obedecer por ser o chefe,
mas ser o seu capacho e aceitar tudo calado? Isso jamais
aconteceria.
Outro golpe me acertou, fazendo-me cerrar os dentes, mas
permaneci quieto. Ninguém sabia o quanto isso me custava, meu
instinto era revidar, tanto que meus ossos doíam com essa vontade,
mas, se eu cedesse, Marco venceria. Se eu vencesse e fizesse tudo
que ele tinha mandado, tinha certeza de que me submeteria àquilo
novamente.
A cada golpe, eu sentia como se meus ossos estivessem
prestes a se quebrar.
― Não vai lutar? ― O garoto aproximou seu rosto do meu.
Seu olhar não revelava nada além de loucura.
― Ao contrário de você, não serei o cão de ninguém ―
rosnei. ― Prefiro morrer.
A fúria tomou seus olhos, e ele levantou a faca para me
golpear, mas não me desviei por nenhum segundo, sabendo o que
aconteceria. Algumas pessoas pensavam que não tinha honra na
morte, mas eu discordava; dependia da forma que se morria.
Mesmo se eu me rendesse naquela luta, ainda iria partir de cabeça
erguida.
― Se quer acertar, faça agora, pois será a sua única chance
― avisei.
Eu tinha checado seus movimentos enquanto lutávamos e
sabia que podia lidar com ele. Eu treinara muito para enfrentar
adversários à altura, gostava de competir e era bom no que fazia,
mas Marco não sabia disso, e, se dependesse de mim, nunca
saberia. Para ele, eu era mais um garoto fraco que precisava ser
consertado. Não acreditava que venceria o lutador Número 10, pois
ele era ainda mais brutal, nada de humanidade fora deixada nele,
mas era capaz de dar conta do Número 16.
Antes que o garoto fizesse mais um movimento, foi afastado
de mim e jogado longe com um baque.
O rosto do homem que eu mais odiava no mundo surgiu em
minha frente.
― Lute, porra, ou pagará o preço! ― Sorriu frio. ― Ou ela
fará por você.
Uma sensação gelada desceu por meu corpo com suas
palavras. Segui seu olhar, e meu corpo se sacudiu como se tivesse
levado um choque. Com certeza eu preferiria isso à cena diante de
mim.
Sabia que tudo estava muito fácil; nada envolvendo aquele
homem era assim. Marco sabia que eu não seria domado tão
rápido, mesmo me trazendo àquele lugar. Por isso o maldito
resolveu usar a minha fraqueza contra mim. Eu estava à mercê
dele, pois faria qualquer coisa por aqueles que amava.
Já havia sido espancado ao ponto de ter costelas fraturadas,
apanhara com chicotes e até com cabos, tudo porque ele não
conseguia me controlar de fato. Eu não era daqueles que via
injustiças e simplesmente ficava quieto. Jade, uma de minhas irmãs,
era igual a mim nesse quesito.
Alessandro e Rafaelle escondiam melhor o que sentiam, mas
eu tinha vontade de explodir Marco. Não me importava com ele ou
com o que fizesse comigo, não seria domesticado como um cão.
Entretanto, ali estava eu, de mãos atadas, vendo aquele
monstro usar minha mãe contra mim.
A sala acima da arquibancada era envidraçada, e, atrás do
vidro, estava minha mãe com um homem segurando-a por trás com
a mão em sua garganta como se fosse para mantê-la imóvel. Outro
apontava a arma para a cabeça dela, que chorava olhando para
mim com impotência, a mesma que eu sentia naquele instante.
― Não a machuque! ― Não me incomodei por suplicar a ele.
Naquele momento meu orgulho era o menor dos problemas.
― Infelizmente, você não merece que eu faça isso. ― A voz
dele saiu letal. ― Agora se levante e lute, ou sua mãe vai arcar com
as consequências.
Eu não me importava em ser ameaçado, mas não ela, não a
minha mãe, a quem eu adorava mais que a vida.
― Vou lutar, mas não a machuque, por favor... ― Odiava
implorar qualquer coisa a ele, era pior que beber veneno e morrer
aos poucos ou andar sobre brasas.
Ele assentiu, entregando-me uma das facas; a outra,
colocou-a em minha garganta, mas nem pisquei, não desviando
meus olhos do seu olhar assassino.
Qualquer garoto da minha idade, ao se deparar com algo
assim, sairia correndo e chorando, mas a morte me visitara mais
vezes, todas através daquele homem que se dizia meu pai. Eu
acreditava que aquela não seria a última, mas era a pior delas até o
momento.
Enfim percebi que eu não me importava em matar alguém,
como achava antes. Eu não era como meus irmãos, embora nunca
tivesse matado, mas lutei, bati e até cheguei a torturar pessoas que
não mereciam respirar na Terra. O que me incomodava de verdade
era eliminar alguém quando Marco ordenava. Ele era o capo, e eu
devia respeitá-lo, mas o desgraçado não fazia jus a qualquer
esforço de minha parte nesse sentido.
― Por que sempre ousa ir pelo caminho mais difícil, Stefano?
Seus irmãos aceitaram quem são, mas você sempre arruma um
jeito de retrucar tudo que eu mando fazer. Fique aqui e aprenda
como ser um homem obediente, ou tiro tudo com que você se
importa, sua mãezinha e seus irmãos.
Não havia mentiras em suas palavras. Eu sabia que Marco
era capaz disso e de muito mais. Ele não dizia palavras vazias, tudo
que prometia, cumpria. Obviamente o verme não era um homem
honesto, longe disso; tudo de ruim aquele cara asqueroso fazia.
Eu queria dizer que nunca mais retrucaria suas ordens, mas
estaria mentindo, pois jamais seria como aqueles garotos ali, um
fantoche daqueles abutres. Não pensaria mais nisso agora; só faria
o que ele me ordenou para minha mãe não ser ferida.
― Vou fazer o que quer, mas não a machuque ― pedi de
novo.
Seus olhos se estreitaram.
― Pede pela vida dela ― apertou a faca ainda mais em meu
pescoço ―, mas não pela sua? Eu podia matá-lo agora.
Não respondi, pois sabia que ele tinha esse poder sobre mim,
mas não dava a mínima para o que pensava ou não.
― Essa fraqueza que você e seus irmãos têm me enoja! ―
cuspiu como se tivesse ingerido veneno.
Ele saiu de cima de mim, então fiquei de pé, ignorando as
dores em meu corpo.
― Porém, vou ensinar você a quebrar esse laço agora ―
Marco continuou, parecendo exultante.
O medo se instalou em minha alma. Todo o meu corpo
tremeu de pavor de que minha mãe fosse ferida.
Antes que eu pudesse implorar, pois sabia que ele ia fazer
algo, só não sabia o quê, Marco estalou os dedos na direção da
minha mãe.
― Você será o assassino perfeito que precisa ser. Se para
isso eu precisar quebrar esse laço, que assim seja.
O homem que a segurava assentiu e bateu em minha mãe,
fazendo com que ela caísse no chão. Eu não conseguia mais vê-la
direito, mas o outro cara lhe apontou a arma.
― Não! ― gritei, correndo e agarrando as grades da gaiola.
De qualquer modo, mesmo que eu conseguisse sair dali, não
poderia ir até aquela sala antes de o maldito puxar o gatilho.
― Mamãe! ― chamei, sacudindo as grades, não me
incomodando se machucasse minhas mãos.
Fui em direção à saída, mas o garoto entrou na minha frente.
― Saia do meu caminho, porra! ― Não queria perder tempo;
o pavor me consumia por dentro, pior do que já sentira algum dia.
Minha mãe caiu de joelhos e depois desabou no chão.
― Ela morreu, Stefano! ― falou Marco, parecendo gostar do
meu desespero.
Depois disso, eu me perdi. Não soube o que aconteceu, mas,
quando voltei a mim, estava no chão tomado de dor, uma dor carnal
que aliviava a outra que eu sentia.
Ao meu lado, o garoto jazia sem vida em uma bagunça
sangrenta, morto. Essa palavra era o eco do tormento que eu estava
sentindo.
Se Marco queria me quebrar, conseguiu, pensei em meio ao
torpor. Ouvia vozes, mas pareciam distantes. Da escuridão em que
eu me encontrava, não havia ninguém que pudesse me trazer de
volta.
― O que faço com ele? ― alguém perguntou.
― Tudo que quiser ― respondeu o homem que me levou
tudo.
Por que não fiz o que me mandou logo? Assim ele não teria
feito aquilo, pensei em lamento. A culpa me corroía profundamente,
pior do que meu coração sangrando.
Eu deveria sentir pavor por estar prestes a entrar no inferno,
mas nem liguei, pois quem eu mais amava no mundo se fora para
sempre.
As vozes ficavam cada vez mais distantes. Quem dera no
final fosse só um pesadelo, mas eu iria aceitar o que estivesse
preparado para mim, pois no fundo era pouco pelo que eu tinha feito
à minha mãe. Por minha culpa ela havia morrido.
No final, a escuridão me levou para um abismo de dor e
tormento.
A dor perfurava meu peito como um corte feito por uma
navalha cega. Eu estava esperando por isso e, no decorrer dos
meses que se passaram, tentei lidar com o fato de que perderia meu
pai. No entanto, ele levou um pedaço de mim consigo. Fazia algum
tempo que tínhamos descoberto sobre a sua doença, e fiz de tudo
para ser forte, mas não sabia mais se conseguiria ser.
Diante daquele túmulo ainda fresco, de joelhos eu chorava
sem ligar para a pessoa que tinha vindo comigo. Fraqueza era uma
coisa que fui ensinada a não demonstrar, ainda mais após tudo que
me aconteceu. Então me sentir devastada assim na frente de
alguém que não fosse da família era terrível, mas não dei a mínima,
pois a dor me consumia dos pés à cabeça, principalmente meu
peito, que latejava como uma ferida aberta.
Fiquei chocada quando Stefano se ofereceu para me
acompanhar. Os meus irmãos estavam fazendo a acessão de
Fabrizio a chefe, então nenhum deles podia estar comigo.
Eu não era contra seguir as regras da nossa família, era um
desejo do papai. O ruim era fazer isso no dia do enterro dele,
embora, para cumprir as vontades do nosso pai, Fabrizio era capaz
de tudo.
Eu sabia da responsabilidade que ele tinha agora, e meu
irmão se sairia bem, por esse motivo quis ficar sozinha sem que
eles me vissem daquela forma, por isso aceitei a proposta de
Stefano de me levar ao cemitério. Meus irmãos ficavam pior ao me
ver triste assim, então decidi sair. Estava ali havia horas, sabia que
devia ir embora para casa, tinha tentado me levantar algumas
vezes, mas sempre voltava a ficar no mesmo lugar.
― Papai, é tão difícil suportar sua partida. Sei que preciso ser
forte como pediu, mas como? ― Minha voz falhou.
Suspirei, não querendo sair dali, porém precisava retornar. Já
era bem tarde, e Stefano devia ter outras coisas para fazer em vez
de agir como minha babá.
― Sei que preciso ir, mas estou sem forças para sair daqui ―
sussurrei, inspirando fundo, mas doía ao fazê-lo.
― Me deixe ser sua força hoje. Um dia Alessandro e meus
irmãos foram a minha. ― Ele estendeu a mão para mim. ― Vou
fazer você se distrair para não chorar.
Pisquei, estreitando os olhos em seguida.
― Não precisa me olhar assim, não é bebedeira, ou sexo, ou
algo assim ― disse como se lesse minha mente. Stefano parecia
enxergar dentro de minha alma. Eu não gostava disso, talvez fosse
por isso que brigássemos tanto. O único dia em que não brigamos
era aquele, provavelmente devido às circunstâncias.
Olhei mais uma vez para o túmulo e sabia que precisava ir,
afinal tinha certeza de que papai não iria me querer ali sofrendo.
Seu pedido tinha sido que eu fosse forte, e eu seria.
― Te amo demais. Estou indo agora, mas saiba que jamais
vou esquecê-lo ― prometi e aceitei a mão de Stefano, que estava
estendida em minha direção. ― Vou ser forte por aqueles que
precisam de mim.
Eu me sentia tão pesada como chumbo a cada passo que
Stefano me levava para longe dali.
― Vou ajudá-la assim como Alessandro fez comigo ― ele
falou, apertando minha mão.
― Você o ama muito. ― Não era uma pergunta, mas uma
declaração.
― Somos uma família tão unida e forte como a sua ―
assentiu.
Stefano não era de mostrar e falar de sentimentos, muito
menos os dele. Eu podia aceitar isso, também era dessas que não
se abre muito, só com Santiago, um dos meus irmãos. Com ele eu
tinha até segredos que meus outros irmãos desconheciam. Santiago
me ajudava a esconder alguns. Não era nada tão sério, ou ele
jamais os guardaria.
Eu percebia que Stefano amava os irmãos, assim como eu
fazia com os meus. Foi bom termos isso em nossa vida na máfia. Eu
gostava de pertencer à minha família, não a trocaria por nada no
mundo.
Stefano tinha ficado todo aquele tempo ao meu lado sem
dizer nada, apenas me deixando despedir-me do meu pai.
Normalmente, homens como ele não acreditavam nisso, achariam
bobagem ir até ali em plena madrugada ver alguém que não estava
mais entre os vivos.
― Ele era minha força. Não sei se consigo lidar com isso.
Sua mão apertou a minha delicadamente. Eu estava tão
entorpecida que quase não notei.
― Você é uma das mulheres mais fortes que conheço,
Belinda, obstinada e valente. ― Mesmo ao meu lado, a sua voz
parecia distante.
― Eu pensava isso antes, mas agora? Me sinto oca, exceto
pela dor em meu peito. ― Coloquei a mão livre sobre o coração,
querendo arrancar o que estava sentindo. ― Não parece que vai ter
fim tão cedo.
Sabia que era recente, afinal ele tinha sido enterrado naquele
mesmo dia... mesmo assim era insuportável sentir tudo aquilo.
― A dor nunca passa, só precisamos conviver com ela. Um
dia fica suportável ― ele comentou, embora, pelo seu tom, não
parecia realmente ter superado o que quer que tivesse sofrido.
― Jura? Não é o que parece pela sua voz ― apontei. ― Seja
sincero, não preciso que minta só para me fazer bem. O que sente
com a partida de sua mãe?
Seu olhar estava distante, embora eu pudesse ver um brilho
ácido nele através da pouca claridade das lâmpadas dos postes que
margeavam as alamedas dentro do cemitério.
― A verdade? ― inquiriu.
― Sim, por favor ― assenti.
Quando perdi minha mãe, eu era pequena. Não me
recordava muito dela, então não doeu tanto como a perda de Lorena
e a de papai. Era uma dor insuportável, porque sempre fui apegada
ao meu pai.
― Não fui ao velório da minha mãe, só a vi morrer em sua
cama, algo parecido com o que aconteceu com seu pai. Marco me
expulsou do quarto logo depois ― sussurrou. ― Quando eu o
xinguei por não me deixar perto dela, me levou para o calabouço
que tinha em nossa antiga casa em Veneza, onde morávamos antes
de nos mudar para Milão recentemente.
― Não o deixou se despedir de sua mãe? ― indaguei de
forma dúbia.
Nada do que eu ouvia falar de Marco me surpreendia.
― Não, para Marco não existia despedida. Se fosse por ele,
não teríamos laços. Isso era uma fraqueza que ele repudiava.
― Deve ter sido difícil lidar com tudo sendo uma criança na
época. ― Mesmo eu tendo sido criada na máfia, fui cercada com
bastante amor.
― Faz mais de 13 anos, e ainda sinto a perda ― sussurrou.
― Não pude ir ao seu enterro, pois, como disse, Marco me deixou
preso por um tempo. Eu estava tão furioso que socava as grades do
lugar e nem ligava para o fato de minhas mãos estarem em carne
viva.
Ele ficou em silêncio um momento.
― Só parei quando Alessandro entrou e me impediu de
continuar. A dor era excruciante. Isso ajudou um pouco a aliviar a
outra dor que eu sentia no momento, a emocional.
― É por isso que toda vez que você entra em um ringue se
deixa ser abatido primeiro, mas depois revida e vence? Sei que
daria conta e venceria de boa, mesmo assim deixa seus adversários
socá-lo no começo. É por isso? ― Franzi a testa. Será que isso
ajudaria a aliviar essa dor que estou sentindo?
― Não! Não vá por esse caminho. Posso ver as engrenagens
girando em sua mente ― ele se apressou a dizer.
― Por quê? Acha que só você pode fazer isso? ― No fundo,
eu não pensava em me ferir. Era assistente social e gostava da
minha profissão, de ajudar, principalmente os meus meninos do
orfanato. Muitos chegavam lá sofrendo, e eu os ajudava a encontrar
lares estáveis em que fossem bem tratados.
― Não é isso. É que é um caminho sem volta; ao menos não
teve uma para mim. ― Sua respiração ficou aguda no final. ― Não
foi só o que aconteceu com minha mãe que desencadeou isso.
― O que aconteceu? ― Ali estava o verdadeiro Stefano, sem
as camadas que ele usava para tentar se esconder de todos.
Seus olhos se fecharam por um momento. Eu não sabia se
não queria pensar no que aconteceu ou se queria evitar que eu
lesse a agonia neles. Mesmo assim, eu a vi antes que os fechasse.
― Não posso dizer ― finalmente falou após ficar em silêncio
por vários minutos. ― É fodido demais...
Fosse o que fosse que tinha acontecido com ele, deixara
marcas profundas. Ele era incapaz de permitir alguém ultrapassar
as barreiras que tinha construído, talvez com o tempo, mas, para
isso, precisava deixar alguém entrar.
― Você teve sorte de ter tido um pai como o seu ―
finalmente disse, mas não me olhou; encarava a penumbra ao redor.
Ouvi a dor em sua voz, como se ele vivesse em tormento. O
que será que aconteceu? Fiquei tentada a perguntar, mas não
queria aprofundar o assunto e gerar mais sofrimento.
― Paolo não era só meu pai, era um amigo, confidente, que
esteve ao meu lado sempre, embora soubesse ser duro quando
precisava. ― Suspirei, encolhida com as lembranças que, mesmo
felizes, ainda doíam demais.
― É bom ter isso nessa nossa vida. Eu já não posso dizer o
mesmo de mim. O meu pai era um demônio que destruía tudo que
tocava. Sei que sou um monstro e aceito isso, mas ele... ― Sacudiu
a cabeça como se quisesse expulsar os pensamentos ruins. ― Sei
do que sou capaz e do que qualquer homem criado na máfia é...
Eu sabia que ele estava se abrindo mais do que era preciso
só para eu não enlouquecer com meus sentimentos. Era grata a
isso. Pude ver que havia muito mais por trás de sua personalidade
do que ele mostrava a todos. Stefano era provocador quando lhe
convinha, e algumas vezes me fez sentir tanta raiva que quis matá-
lo.
Passei a conhecê-lo um pouco após esses meses que ele
ficou em minha casa. Ele podia esconder de todos, mas eu via por
trás daqueles olhos mortos. O único que eu conhecia assim era El
Diablo, que teve uma perda imensurável que o destruiu.
Eu sabia que Stefano tinha perdido a mãe e que essa perda
levou um pedaço dele. Sabia disso porque sentia o mesmo agora,
mas, assim como ele apontou, não foi só isso que o levou a agir da
forma que o fazia. O que seria pior do que perder alguém que
amávamos? Para mim, nada, pois essa dor que estava em meu
peito era mais forte que tudo que já tinha sentido, tanto que eu não
sabia como lidar.
Seria pior se Stefano não estivesse ali comigo. Eu sabia que
nos enfrentávamos muito, acreditava que agir daquele jeito fosse
nossa armadura. Talvez no fundo eu o havia deixado ficar porque
sabia que ele era honrado – ou o quanto honrado um homem
pudesse ser na máfia.
Papai nos ensinou a ver através das pessoas, a ler o
semblante de alguém, dessa forma saberíamos se estávamos
sendo enganados ou não, assim como fui enganada uma vez por
um cara que dizia se importar comigo.
O desgraçado queria me usar para chegar ao papai, mas
meu pai descobriu e o matou. Por isso o irmão de Gazo sequestrou
minha irmã, estuprou-a e a assassinou. Foi por vingança por papai
ter matado o irmão dele.
Por anos me senti culpada por ter gostado de Gazo, por ter
sido cega e não visto quem ele era a tempo. Amava-o, era nova e
iludida, tanto que me entreguei a ele antes de me casar, algo
proibido em nossa família, pois, nela, a mulher foi feita para se
casar, era criada pensando assim desde criança. Ao menos o verme
estava no inferno, tanto ele como seu maldito irmão, que me tirou
uma pessoa que eu amava.
No final, Gazo foi morto, e perdi minha irmã Lorena. Valentino
foi ferido por minha causa. A culpa me corroía, mas papai me
ensinou a ser forte e a não me culpar.
Depois disso, não me aproximei mais dos homens nem lhes
dei meu coração. Para que fazer isso? Só para ele ser esmagado
como carne moída ou jogado em um triturador? Então, se
dependesse de mim, não iria me casar tão cedo. Sabia que a lei da
nossa família mandava que as mulheres se casassem antes dos 25
anos, ou seja, eu estava quase lá. Precisava arrumar um jeito de
evitar isso.
Às vezes pensava que deveria ter deixado Gazo me usar;
assim ele nunca teria ido até minha irmã. No final, papai teria sofrido
de qualquer jeito.
― Ele nunca me julgou, sabe? ― Já tinha revelado tudo ao
Stefano sobre o que aconteceu comigo e o que Gazo fez.
― Não foi sua culpa, então não havia nada para perdoar. Seu
pai sabia disso. ― Trincou os dentes. ― Os culpados foram os filhos
da puta que fizeram isso. Espero que estejam no inferno.
― Meu pai os mandou para lá, e foram tarde. ― Respirei
fundo. ― Nada muda o que eles nos tiraram.
― Penso da mesma forma. Quando eliminamos Marco foi
prazeroso, mas não mudou nada do que ele nos fez ou nos tirou.
Isso, jamais teremos de volta. ― Sua voz soou letal no final. ― Por
isso deve ficar feliz e agradecer por ter um pai que a amou e a
protegeu.
Ele tinha razão. Meu pai tinha sido meu protetor desde
sempre. Assenti.
― Papai lutou até o fim por nós e por nossa felicidade. ―
Limpei os olhos. ― Embora, nesse momento, ser feliz parece quase
impossível.
― Queria ser a pessoa que diz “tudo passa”, mas não é bem
assim. O que sinto ainda está vivo e cru dentro de mim.
― Tenho que ser forte, meus irmãos precisam que eu seja. ―
Eu sabia que era recente e que aquela dor ainda era muito crua,
como disse Stefano. ― Obrigada por ter ficado comigo.
― Deve estar doendo dizer isso. ― Piscou, sorrindo para
aliviar o clima.
Entendi o que ele quis dizer com sua provocação. Na
verdade, eu não era muito de pedir desculpas, não a pessoas de
fora da minha família.
― Sinceramente, prefiro você aqui a meus irmãos. Eles iriam
sofrer mais por meu estado, e você nem tanto. ― Não queria dizer
com isso que ele não se sentiria mal, porque qualquer um com
emoções teria o mínimo de empatia, e com Stefano não era
diferente.
― Na verdade, não me traz sentimentos bons estar aqui ―
comentou em voz baixa. ― Não venho a um cemitério desde que
minha mãe morreu.
Pisquei, pensando ter ouvido errado.
― O quê? ― Franzi a testa. ― Se não gosta, por que veio
então?
― Não é que eu não goste, porque creio que ninguém o faça,
é só que, na última vez que estive em um, não guardei lembranças
boas. Quando saí do castigo, fui ao túmulo de minha mãe e fiquei lá
por quase dois dias. Se não fosse por Marco ter ido me buscar à
força, não teria saído tão cedo. ― Sua voz parecia distante como as
estrelas, embora elas brilhassem, e os olhos dele pareciam um
vácuo de escuridão. ― Ele me deu umas porradas e me quebrou
algumas costelas quando eu não quis ir. Se não fosse por
Alessandro, acredito que eu o teria deixado me matar naquele
momento.
― Seu pai era um escroto. ― Eu soube que Alessandro
matou o pai deles porque Marco queria dar as filhas, Jade e Luna, a
um grupo de malditos assassinos estupradores. Meus irmãos iriam
tentar resgatar minha meia-irmã, Luna, mas Alessandro foi mais
rápido e eliminou a escória.
― Essa palavra não descreve nem um pouco do que ele era,
mas não vamos perder tempo falando em alguém que não merece
que gastemos saliva momento algum.
Durante todo aquele tempo ali, notei que ele estava alerta ao
nosso redor. Antes de chegarmos ao nosso carro, senti um arrepio,
o que me fez olhar cada canto do cemitério à procura de uma
ameaça, mas não vi ninguém.
― O que foi? ― Seguiu meu olhar, e o notei ainda mais
alerta.
― Não sei. Sabe aquela sensação de que alguém está nos
observando? Senti isso agora há pouco. ― Sacudi a cabeça. ―
Devo estar louca ou me tornando uma.
Stefano levou a mão ao coldre, mas não tirou a arma, só
varreu os olhos minuciosamente por cada canto e me puxou mais
rápido para o carro. Não havia outros seguranças, por isso sua
preocupação.
Chequei ao redor de novo, mas não vi nada além de túmulos.
― Não deve ser nada, devo só estar imaginando coisas ―
comentei, embora papai tivesse nos ensinado muito bem a lidar com
situações como aquela.
― Seja como for, vamos para um lugar mais seguro. Se
quiser retornar aqui amanhã, traremos mais seguranças. ― Ele
parecia realmente preocupado.
― Stefano... ― comecei, mas ele parou subitamente a alguns
passos do nosso carro, e trombei nele.
― Desculpe. ― Tentei passar por ele, mas não permitiu,
como se me cobrisse com seu corpo. ― O que foi?
― Entre no carro ― pediu baixo, fuzilando algo que estava
atrás do veículo.
Tentei olhar o que ele tanto encarava e descobrir o motivo de
o seu corpo ter ficado tenso daquela forma. Porém Stefano frisou
com mais urgência só para mim:
― Belinda...
Na mesma hora, os faróis de um automóvel se acenderam, e
não pensei duas vezes. Aprendi que, quando se diz respeito a
segurança, é bom seguir ordens, mesmo eu não gostando disso.
Entrei no carro blindado e olhei para o veículo a alguns
metros atrás do nosso. Os faróis ainda estavam acesos, mas ele
não tinha dado a partida.
Stefano entrou no carro e o ligou, mas notei seus olhos a
cada segundo no retrovisor.
― Pode não ser ninguém interessado em nós, talvez esteja
esperando alguém ― sugeri.
― Pode ser, mas, por via das dúvidas, pegue. ― Entregou-
me sua arma. ― Sei que sabe usar uma, afinal é a melhor aluna de
tiro ao alvo.
Lembrei-me de ter dito isso a ele havia algum tempo, quando
pensei que ele quisesse machucar meu pai. Eu disse que fritaria
suas bolas caso ele tentasse.
― Acha que vai nos seguir? ― Destravei a arma,
preparando-me para atirar.
― Só há uma maneira de saber. ― Saiu da rua do cemitério.
― Coloque o cinto. Vou precisar correr e despistá-lo caso ele nos
siga.
― Devo ligar para meus irmãos? ― Eu não gostava de ser
seguida e não podia nem pensar em ser levada. Minha família não
aguentaria outra perda.
― Não, parece que não vai nos seguir. ― Suspirou aliviado.
― Merda, eu não devia ter baixado minha guarda.
― Ei, você permaneceu alerta o tempo todo. Notei isso. ―
Toquei sua perna, e seus olhos seguiram o gesto, então percebi o
que estava fazendo e retirei a mão.
Antes de chegarmos a outra rua do Centro, um veículo
apareceu atrás do nosso cantando pneus. Não era o mesmo que
estava no cemitério, esse era uma van branca.
― Porra! ― rosnou Stefano, virando uma esquina de uma
vez e fazendo com que nossos corpos balançassem. ― Segure
firme, esse maldito não vai nos pegar!
― Acho melhor irmos logo para casa. ― Eu estava com raiva
por não poder ir visitar o túmulo do meu pai sem ser atacada.
Deviam ao menos respeitar esse momento. Quase ri. Como se um
bandido fosse ligar para algo assim. Provavelmente se aproveitaram
para nos atacar pensando que estávamos vulneráveis.
Eu estava com medo de ser sequestrada, mas não podia
deixar esse sentimento me dominar naquele instante. Stefano
precisava que eu estivesse alerta e focada em ajudá-lo para sairmos
daquela situação.
― Não vamos para a sua casa, iremos ao meu apartamento.
― Olhou pelo retrovisor; o condutor do veículo que nos perseguia
tentava se aproximar do nosso a todo custo.
― Por que não a minha casa? ― sondei. Não deviam ter
homens do meu irmão lá, deviam estar na acessão, mas a casa era
segura.
― Porque, seja quem for que esteja atrás de nós, eu os
quero longe de Luna, das gêmeas e de Vincenzo. ― Suspirou. ―
Pegue meu telefone no meu bolso da frente e ligue para Alessandro;
ele deve estar na mansão.
Eu ia colocar a mão em seu bolso, mas na hora fizemos outra
curva, então fui empurrada para ele, e minha mão caiu em suas
calças, melhor dizendo, em seu pau.
Notei a sua respiração desigual quando isso aconteceu, ou
talvez fosse pela nossa fuga do nosso perseguidor.
Não olhei para ele quando peguei o seu celular o mais rápido
possível, temendo tocar outra parte de novo.
― Não precisa temer, ele não morde ― brincou para aliviar a
tensão em que estávamos. Acho que tensão era eufemismo.
― Não, mas o dono dele sem dúvida o faz. Aliás, dá um bote
como uma serpente ― falei enquanto procurava o contato do seu
irmão. ― Por que não ligar para os meus irmãos?
Suspirou.
― Eles estão ocupados na reunião ― respondeu com tom
estranho. Antes que eu comentasse algo, Alessandro atendeu.
― Stefano...
― Sou eu. ― Não disse meu nome, achei que reconheceria
minha voz, mas por via das dúvidas resolvi acrescentar, mas ele
falou antes de mim:
― Belinda? ― No começo, seu tom saiu confuso, depois,
preocupado. ― Meu irmão está bem? Vocês saíram juntos, e agora
você está com o celular dele.
― Hummm... ― Olhei para o carro ainda atrás de nós. Seria
ele comparsa do outro no cemitério? Ou era só coincidência? ―
Tem um carro nos seguindo.
Coloquei no viva-voz.
― Atrás de vocês? Onde estão agora? ― Parecia que ele
estava se locomovendo.
― Indo para Vergana ― respondeu Stefano. ― Mas ele não
atacou nem nada, só está nos seguindo.
― Alguém de Fabrizio? ― sondou Alessandro com tom nada
amigável.
― Não, não é nenhum dos carros dele, além disso está muito
veloz. ― Então Stefano lhe contou sobre o sujeito no cemitério.
― Estou a caminho, só se mantenha com o foco em seu
destino. ― Ele parecia furioso. Eu tinha até pena do coitado que se
deparasse com aquela fúria.
― Não avise a Miguel, não quero que Luna saiba. Miguel não
guarda nenhum segredo dela. ― Stefano suspirou.
― Pode não ser nada... ― tentei dizer, embora não
acreditasse muito nisso.
― O cara ainda está seguindo vocês? ― Seu tom saiu duro
como uma rocha.
― Sim, mas...
Interrompeu-me:
― Então não é nada. Estou a caminho ― repetiu ele e
desligou.
― Receptivo ele, né? ― Sacudi a cabeça e ajeitei a arma na
mão. ― Não entendo por que só nos seguir nessa velocidade e não
nos atacar.
― Suspeito que esteja querendo que a gente saia do Centro,
assim não chamaria tanta atenção, mas nos segue, pois não quer
nos perder de vista.
― Como sabe disso?
― Simples. Se eu quisesse encurralar alguém, era o que
teria feito. Mas não vou facilitar para ele. ― Virou a esquina, indo
para a via mais movimentada.
― Isso não faz sentido. Estávamos em um cemitério. O que
pode ser mais isolado que isso? Por que não fez nada lá?
― Acredito que quem estava naquele carro não tinha nada a
ver com esse, talvez fosse só coincidência mesmo, mas esse aqui
não é. Essa pessoa que nos segue quer nos pegar ou...
― Nos matar ― terminei a frase por ele.
Antes de chegarmos à avenida, o perseguidor cansou de nos
seguir e começou a bater na traseira do nosso veículo, querendo
nos fazer capotar.
― Acho que ele resolveu partir para a ação ― disse Stefano
com um rosnado. ― Segure firme.
Sentia-me dentro de um carro de corrida, mas não por
diversão, por querer a adrenalina; lutávamos pelas nossas vidas, e
eu faria isso até o fim. Desistir não existia no meu vocabulário.
O carro mais uma vez tentou nos tirar da estrada, mas não
teve êxito. Por enquanto. Stefano era melhor ao manobrar contra
suas investidas.
Peguei meu celular.
― Para quem está ligando? ― perguntou.
Antes que eu respondesse, vimos um carro parado em frente
ao nosso, e, encostado nele, estava um homem com uma arma
apontando para nós.
― Aquilo é uma RPG? ― indaguei com a voz alterada. ―
Puta merda, vamos morrer!
O que essa nova perda causaria à minha família? Não, eu
não podia aceitar isso! No entanto, o que eu podia fazer? Apenas
rezar para não sermos mortos.
Stefano não disse nada, só diminuiu a velocidade do carro, o
que me fez olhar para ele.
― Stefano... ― Seus olhos pareciam estar vendo um
fantasma, tanto que ele não me ouviu chamá-lo algumas vezes, até
eu gritar seu nome de novo.
Piscou, parecendo sair de um transe. Ele conhecia o homem
que estava a ponto de nos explodir com uma arma tão potente como
aquela? Se sim, deveriam ser inimigos.
Stefano não disse nada, encarando o homem da frente, com
a arma, e o de trás, que nos seguia, mas nosso perseguidor parecia
querer fugir, pois virou o carro, entrando em um parque. Porém,
Stefano parou o nosso.
Antes que eu reclamasse por não tentarmos fugir dali, o cara
com a arma mudou seu alvo, direcionando a arma ao que fugia e
disparou. Tudo se dissolveu em luz na escuridão, fazendo o carro
do perseguidor explodir.
― Vamos fugir enquanto ele está atacando o outro carro! ―
sugeri a Stefano.
Ele não pareceu me ouvir, só ficou ali, parado como uma
estátua.
― Mas que porra! Se não vai agir, me deixa dirigir e nos tirar
daqui! ― rosnei.
Stefano suspirou.
― Não dá. Não podemos fugir caso ele queira nos matar
agora. ― Sua voz parecia letal e um tanto assombrada. Não me
parecia ser com sua morte.
― Você o conhece? É seu inimigo? ― Se for, estamos
mortos, pensei amarga.
― Sim para a primeira pergunta e não sei quanto à última.
Até hoje achava que ele estivesse morto.
Morto? Seria então atrás de vingança que o homem tinha
vindo? O que acontecera entre aqueles dois? Fosse o que fosse,
não era o momento de tentar saber; eu só queria viver e faria
qualquer coisa por isso.
― O que vamos fazer?
O homem se virou para nós ainda com sua arma e a apontou
para nós.
Fechei os olhos um segundo, pensando que nunca mais veria
a minha família de novo. Seria assim que minha irmã havia se
sentido quando estava prestes a morrer? Era claro que o que
aconteceu com ela foi pior do que morrer explodida. Eu preferia
assim. Só lamentava pelas pessoas que eu amava terem de sofrer
com minha partida.
Adeus, pensei.
Porra! O que vou fazer? Estou como naquele ditado, “se
correr o bicho pega e se ficar o bicho come”! De qualquer jeito, seria
o fim se assim ele quisesse.
Eu podia ver Belinda de olhos fechados, como se estivesse
se despedindo. A família dela tinha acabado de perder o pai e não
merecia aquilo. Além disso, eu não gostava da ideia de algo
acontecer a ela. Alguma coisa parecia apertar em meu peito.
Poderia culpá-la por estarmos naquelas condições, afinal
banquei o bom samaritano e a levei ao cemitério no meio da noite
sem nenhuma proteção, só a minha. Devia ter sido mais esperto e
alerta, afinal alguém poderia querer usá-la para chegar aos seus
irmãos por alguma represália. No nosso mundo, o que mais
tínhamos eram inimigos.
― Não vou deixar que nada aconteça a você. ― Peguei sua
mão e a apertei delicadamente. Essa promessa, eu faria qualquer
coisa para mantê-la. Já tinha feito promessas antes e fiz de tudo
para cumpri-las, só teve uma que não pude, e eu me arrependia
amargamente, mas ao menos tentei. Apenas não fui rápido o
bastante. Agora cumpriria minha promessa.
Ela abriu os olhos com medo e suspirou, dando um aperto
em minha mão também.
― Se eu morrer, meus irmãos... ― Ela mordeu o lábio, não
conseguindo terminar.
Percebi que o seu medo era que os irmãos sofressem com
sua partida. Ela não pensava no que algum monstro poderia lhe
fazer?
Peguei seu rosto entre minhas mãos e olhei nas profundezas
de seus lindos olhos cor de chocolate. Aquela não seria a última vez
que eu os veria.
― Juro que você vai ficar bem.
Naquele dia vi uma parte de Belinda que ela não mostrava
muito a ninguém, a parte vulnerável. Ela era sempre forte, ajudava a
todos, mas me revelou quem era de fato.
Belinda assentiu. Meu peito se aqueceu com algo
desconhecido por ela confiar em mim. Esperava não a decepcionar
e cumprir o que tinha prometido.
― O que vai fazer? Ele vai... ― foi interrompida com meus
lábios nos dela. Aproveitei sua boca aberta e mergulhei minha
língua, desfrutando do beijo, algo que eu estava com vontade de
fazer havia meses.
Uma de minhas mãos foi até seus cabelos macios e sedosos,
e com a outra a puxei contra mim. Se eu fosse morrer naquele dia,
que ao menos realizasse aquele desejo. Fazia meses queria beijá-
la, não naquelas condições, mas poderia não ter outra chance.
O problema era que, quanto mais a beijava, mais não
desejava parar, ficou impossível de resistir após ouvi-la gemer
baixo. Isso me deixou com vontade de matar quem agora me queria
levar consigo ou me matar.
Ouvi barulho de carro, o que me fez afastar dela sem querer
a fim de tentar salvá-la de algum modo. Fosse o que fosse, Lyn
queria a mim, e não a ela. Belinda ficaria segura e logo voltaria à
sua família.
Lyn... Eu tinha prometido salvá-lo do lugar onde estávamos
presos, quando ele era conhecido apenas como o Número 10, mas
Marco me fez crer que ele estava morto. Quando tive a chance,
voltei ao local para salvar os demais garotos, mas o lugar tinha sido
detonado junto a todos os meninos dentro dele. Seria por isso que
ele queria me matar? Então por que não tinha vindo antes? Haviam
se passado quase 14 anos, e eu não soube nada dele, não até
aparecer ali do nada. Devia ter uma razão para isso.
Belinda piscou, encarando minha boca, mas, antes de eu
poder avaliar qual sua reação ao que fiz, notei a quem pertencia o
carro que acabava de parar cantando pneus.
― Maldição! ― rosnei e me virei para ela. ― Não saia do
carro por nada! Te fiz uma promessa e vou cumprir.
Ela arregalou os olhos.
― Pensa em ir lá fora? Esse cara vai matá-lo... ― Sua voz
falhou no final.
― Pode ser, mas vou dar um jeito de deixar você fora disso.
― Dei de ombros e me virei para sair.
Ela pegou meu braço. Voltei-me para ela e encarei aqueles
olhos lindos. Belinda começou a abrir a boca, mas eu não podia
perder mais tempo. Se demorasse um segundo, meu irmão e meu
melhor amigo iriam se matar, e eu não queria isso.
― Seja o que quiser falar, espere caso eu sobreviva. ― Com
certeza ela iria me xingar por tê-la beijado, embora eu pudesse ver
que ela gostou tanto que ficou embriagada.
Eu poderia ter rido com essa vitória, porque nunca conheci
uma mulher tão difícil quanto aquela. Todavia, naquele dia, após ela
se abrir, pude ver qual a razão para se distanciar de todos. Eu
deveria ter ficado longe e não a ter beijado.
Saí do carro, não querendo pensar nisso, e sim focar no que
estava acontecendo. Esperava convencer Lyn a não machucar
ninguém ali. Ele estava de arma abaixada, mas a levantou quando
meu irmão saiu do carro com sua pistola apontada para ele. Com
sua arma mais potente, Lyn fritaria todos nós em segundos.
― Não! ― Entrei na frente do meu irmão, segurei sua mão da
arma e a abaixei.
― Stefano, que porra! ― rosnou Alessandro. ― O que acha
que está fazendo?!
Olhei para Lyn, que me encarava com aqueles mesmos olhos
vazios e mortos. No passado, eu ainda conseguia ver certo lampejo
de luz ali, mínimo, mas atualmente eu não via nada além de um
abismo.
― Se quer matar alguém, é a mim, não a eles. ― Suspirei,
tentando convencê-lo. ― Faço o que você quiser, só os deixe vivos.
Vou para onde você quiser.
Usei essas palavras uma vez com Marco, e o que aconteceu
depois levou um pedaço de mim que não podia ser trazido de volta.
Era uma coisa que eu gostaria de esquecer. Era uma pena não ser
possível arrancá-la do meu cérebro.
Foquei no presente e não no passado, ou sucumbiria ali.
Precisava manter meu rosto neutro.
― Stefano! ― Podia ouvir a ordem de Alessandro, que agia
naquele momento como chefe, mas não era hora para isso. Eu
precisava manter tanto a ele como Belinda vivos, e se para isso
tivesse que ir com Lyn, que assim fosse.
― Preciso resolver isso ― disse ao meu irmão e depois voltei
a olhar para Lyn, que não disse uma palavra. ― Vamos conversar.
Ele estreitou seus olhos, avaliando-me, depois ao meu irmão,
que segurou meu braço quando dei um passo para ir até Lyn, então
olhou para Belinda, que tinha saído do carro e apontava a arma
para ele. Mas que maldição! Por que ela não faz o que a gente pede
só uma vez?
Ele abaixou sua arma, não parecendo se preocupar com a
garota.
― Chamei meus irmãos. Todos estão a caminho agora, e eu
poderia desejar que eles o matassem, mas Stefano se importa com
você, então tem dez minutos para nos matar ou ir embora ― disse
ela.
É claro que ela não podia ficar de fora, pensei amargo. Se
ficasse, não seria a Belinda.
― Eu poderia fazer as duas coisas e ainda matar seus
irmãos ― Lyn finalmente respondeu com um sorriso frio.
Essa era a coisa errada a se dizer. Ele podia brigar e até
discutir com ela, mas não envolvesse seus irmãos, pois a mulher
virava uma leoa a ponto de atacar. Belinda era capaz disso, embora
pudesse provocar a morte de todos ali. Eu sabia que, se ela abrisse
a boca, tudo estaria acabado, porque eu não podia deixar que ele a
machucasse. Estaria eu preparado para matar um amigo?
― Você quer me matar? Se quiser, o faça ― falei, cansado
de tudo aquilo.
Seus olhos ficaram gelados.
― Ao contrário de você, eu cumpro minhas promessas ―
praticamente cuspiu e deu as costas, não porque confiava que não
fôssemos atirar, mas porque não temia a nada, muito menos a
morte. Aquela era a vida que levávamos, ela levava cada pedaço
nosso, não restando nada. Eu havia me apegado aos meus irmãos,
e mesmo assim muita coisa foi tirada de mim.
Suas palavras foram como um soco no estômago, tanto que
tive dificuldade de respirar por um momento.
― Ao sair daquele maldito lugar, ele realmente achou que
você tivesse sido morto. Voltou depois para ajudar os outros, mas só
encontrou cinzas ― respondeu Alessandro. Acho que ele notou que
eu não podia respirar direito.
Meus irmãos sabiam que eu tinha sido levado para a arena,
só não de fato tudo o que acontecia lá dentro. Eu nunca havia
contado a ninguém. Era algo que pretendia levar para o túmulo.
Lyn me avaliou de novo por um momento. Tentei esconder
minha expressão, mas acho que não fui rápido o suficiente.
― Não devia abaixar sua guarda nunca. Esqueceu a lição
que aprendeu? E outra coisa, não vim matar você. Se o quisesse
morto, teria feito isso há anos ― me informou, colocando a arma no
carro. Foi quando notei que era o mesmo do cemitério.
― Quem estava querendo me matar e como você soube do
ataque? ― sondei.
― Não é da sua conta e já foi resolvido. ― Entrou no carro,
dirigiu até próximo a mim e parou rapidamente. ― Devia limpar os
quatro corpos no cemitério que deixei lá. E vigie sua retaguarda.
Depois disso, Lyn partiu, e fiquei ali tentando pensar em
quem queria me matar e em como ele sobreviveu à explosão no
lugar onde tinha estado preso. Por que resolvera aparecer? Eram
muitas perguntas que só ele podia responder.
― Porra! ― Coloquei as mãos nos cabelos em um gesto
exasperado. ― Preciso encontrá-lo! ― Virei-me para meu irmão. ―
Você pode tomar conta de Belinda e levá-la para casa?
― Você não vai a lugar nenhum, Stefano. Hoje mesmo
vamos voltar para Milão ― ordenou categoricamente. ― Não ouse ir
contra mim.
― Stefano, ouça seu irmão. Se for atrás dele, pode ser que
repense e o mate. Ao que parece, tem rancor contra você ― disse
Belinda com um suspiro.
― Ele não vai me matar. Se quisesse, teria feito no cemitério,
mas ele tem razão quanto a uma coisa. ― Eu não gostava de
admitir, mas tinha pisado na bola.
― O quê? ― indagou ela, chegando mais perto de onde eu
estava, e me entregou a minha arma.
― Não posso baixar a guarda como fiz hoje. ― Não só ao
meu redor, mas também em relação aos meus sentimentos, como
quando beijei Belinda. Era melhor me manter longe dela para sua
própria segurança.
― Não vou embora com seu irmão! ― contestou Belinda,
pondo-se ao meu lado. ― Vou ficar com você. Nem ouse dizer o
contrário.
Notei que ela não iria fazer isso mesmo. Ainda não confiava
em Alessandro. Isso queria dizer que em mim confiava? Pois bem,
eu a deixaria em casa e depois resolveria aquele problema.
― Stefano, falo sério. Você não vai procurar esse cara ―
frisou Alessandro.
Ele tinha razão. Se Lyn conseguiu ficar no escuro todo aquele
tempo, então não seria fácil achá-lo. De qualquer modo eu tentaria,
só não podia ir contra Alessandro, ainda mais na frente dos outros.
― Ele nos salvou. Era ele que estava no cemitério ―
comentou Belinda. ― Não entendo. Por que não veio até nós
naquela hora?
Lyn ao menos deveria ter nos alertado do perigo que
estávamos correndo, principalmente pela minha dificuldade em
proteger Belinda. Ele disse que havia corpos no cemitério. Isso
significava que o inimigo tinha chegado perto de nós. Isso serviria
como referência futura, para eu prestar mais atenção ao meu
entorno.
― Sim, era ele. Não o vi lá porque o farol atrapalhava. Seus
irmãos estão chegando? Acho que devem entrar em contato com os
tiras na folha de pagamento deles para esconder isso. ― Indiquei o
carro que Lyn explodiu para nos salvar, que ainda pegava fogo.
Ele também havia me salvado no cemitério. Eu poderia jurar
que não tinha notado ninguém se aproximando, talvez devido aos
momentos em que revivi lembranças dolorosas.
― Não os chamei. Você pediu que eu não o fizesse, e eu não
queria preocupá-los, embora, depois disso, não acho que possamos
esconder deles. ― Ela deu um suspiro baixo.
Antes que eu comentasse sobre sua mentira para Lyn, ato
que eu lhe agradecia, embora não achasse que fosse isso que o
fizera ir embora, carros vieram em nossa direção. Antes que eu
ficasse tenso pensando ser mais inimigos, reconheci os veículos
dos irmãos de Belinda.
Fabrizio saiu do carro seguido por Valentino, Santiago e
Benjamin. Todos vieram na direção da irmã.
Santiago a abraçou forte.
― Você está bem? ― ouvi a preocupação na voz dele, assim
como vi na expressão dos irmãos.
Em seu lugar, eu estaria da mesma forma caso fosse com
minhas irmãs. Dava graças aos Céus por tanto Luna como Jade
estarem seguras na mansão dos Castilhos.
― Eles não chegaram perto de você? ― Benjamin checou
cada centímetro de Belinda.
Valentino estava parado meio em choque. Aquilo devia
trazer-lhes várias lembranças do que aconteceu a ele e sua irmã
Lorena.
― Sim, estou. ― Ela foi até cada um, abraçou-os e os
tranquilizou. Valentino foi o último. ― Estou bem, nada aconteceu
comigo nem vai.
Ele assentiu, beijando sua testa, e inspirou como se tentasse
se controlar e expulsar lembranças ruins.
― Não nos mate do coração assim de novo. ― Sua voz
estava grave, então ele pigarreou.
― Não vou fazer isso ― ela prometeu e depois suspirou. ―
Como sabia do que aconteceu se não ligamos para vocês?
― Sabemos tudo que acontece em nosso território ―
informou Benjamin.
― Nada fica escondido aqui por muito tempo ― Santiago
assentiu com o rosto duro.
Claro que sabiam, pensei. Não havia nenhum segredo acerca
da perseguição, eu só não os queria em cima de Lyn, pois ele nos
salvou, e isso devia contar alguma coisa.
― O que aconteceu? ― perguntou Fabrizio avaliando o lugar
e o carro pegando fogo.
Belinda ficou em silêncio por um momento e me olhou,
dando-me a chance de explicar. Seria por não ter certeza de que eu
não gostaria que eles soubessem de Lyn? Fosse como fosse, eu
era grato a ela por isso.
― Fomos atacados quando vínhamos...
― De um passeio, e na volta fomos abordados. ―
Interrompeu-me Belinda.
Ela não queria que soubessem que tínhamos estado no
cemitério? Seria difícil esconder deles os corpos que estavam lá,
mas percebi pelo olhar dela que me pedia segredo. Se Belinda não
queria revelar o local aonde tinha ido, eu que não o faria.
― Como aquele carro explodiu? ― sondou Fabrizio, indo até
perto do veículo.
― Foram vocês? ― indagou Benjamin parecendo
impressionado.
― Não fomos nós, alguém nos salvou ― respondi. Não iria
mentir quanto a isso, só não queria dizer o nome do nosso salvador.
De qualquer forma, descobririam logo.
Fabrizio arqueou as sobrancelhas.
― Alguém? Quem foi? ― indagou, voltando sua atenção
para mim.
― Alguém do meu passado que achei que estivesse morto.
― Não queria falar muito sobre Lyn. Na verdade, não havia muito a
dizer sem que as lembranças me atormentassem e me fizessem
sucumbir.
― Esse alguém tem nome? ― inquiriu com os olhos
estreitos. ― Essa ameaça foi do seu passado também? Se for,
preciso saber.
― Não sei sobre isso. ― Todos do meu passado que
mereciam morrer estavam no inferno, eu não conseguia pensar em
ninguém. ― A pessoa que nos salvou não quis dizer. Talvez não
tenha sido por vingança. Preciso falar com ele antes.
Ouvi sirenes ao longe, então era a nossa deixa para sairmos.
Eu deixaria Fabrizio tomar conta de tudo ali, pois tinha mais coisas
para fazer.
― Vai dizer o nome da pessoa que o salvou? ― frisou
Fabrizio.
Merda! Esse homem não desiste! O seu jeito me lembrava
muito Alessandro, sem rodeios e sem aceitar ficar sem respostas.
Por um segundo, imaginei o que ele faria se eu dissesse que não ia
contar nada. Apostava que não gostaria disso e que teria
repercussões, algo que eu não queria.
― Lyn. ― Esse era seu apelido, que significava raio, pois ele
era muito veloz nas lutas na gaiola.
― Lyn? ― indagou Valentino, piscando. ― Tem certeza de
que é esse nome?
Fechei a cara.
― Acho que tenho, afinal o conheço há quase 14 anos,
embora achasse que estivesse morto. ― Suspirei. ― Por quê? Você
o conhece?
― O cara é uma lenda. Ninguém sabe seu nome real, só El
Diablo, que descobriu, pois está querendo recrutá-lo. É conhecido
como o Fantasma no submundo ― respondeu Valentino um pouco
impressionado.
― Fantasma? ― indaguei, pois tinha ouvido falar sobre um
dos assassinos mais letais rondando por aí, embora não soubesse
que se tratava de Lyn.
― Ouviu falar sobre ele? ― sondou Fabrizio e continuou
assim que assenti: ― Se ele os salvou, é porque se importa com
vocês. Pelo que descobri, o homem não se importa com nada ou
ninguém, só faz seus trabalhos, e ninguém sabe quem é ele, só
conhecem a assinatura que deixa em seus assassinatos.
Eu tinha ouvido isso acerca do Fantasma também, e não era
de fato mentira; Lyn não se importava com nada, os únicos que o
faziam sentir alguma emoção era eu e Jet, talvez porque nos viu
agir de modo diferente naquele inferno. No fundo, Lyn sentira
alguma emoção ao me salvar. Eu apostava que tinha feito isso para
cumprir a promessa que fez a mim e ao nosso amigo.
Como assinatura em suas mortes, o Fantasma deixava um
origami. Por que não juntei as peças antes? Devia ter ao menos
suspeitado o que significava aquela assinatura, embora não
houvesse como, pois tive provas de sua morte. O que eu podia
fazer?
― El Diablo quer recrutá-lo? ― indaguei de olhos
arregalados.
― Sim, mas não está com muita sorte. O Fantasma gosta de
trabalhar sozinho e, por sinal, faz o trabalho bem-feito, sem deixar
rastros. Nunca mostra de fato seu rosto quando mata ― confirmou
Valentino.
― Vou apurar os fatos e entrar em contato com El Diablo ―
Fabrizio me informou. ― O que ele usou no carro para explodi-lo
dessa forma?
― Um lançador de foguetes portátil especializado em abater
tanques ― respondeu Belinda.
Ela entendia muito de armas, ao que parecia.
― Puta merda! ― Benjamin piscou. ― Não é de me
surpreender vindo dele.
― Depois vemos isso. Agora, Santiago e Benjamin, levem
Belinda para casa enquanto resolvemos as coisas com os tiras ―
ordenou Fabrizio.
Assim que eles partiram, fui em direção ao meu carro, mas
Fabrizio me chamou:
― Stefano?
― Sim? ― Parei onde estava e o fitei. Esperava que não
perguntasse mais sobre Lyn. As lembranças em minha cabeça me
atormentavam, e eu não estava a fim de discutir com ele.
― Onde vocês estavam quando foram perseguidos?
― Por que acha que não foi como Belinda disse? ― Franzi a
testa.
― Conheço minha irmã. ― Deu um suspiro duro. ― E, por
mais que seja boa em esconder as coisas, sei que está mentindo.
Dei de ombros. Não admitiria nada se Belinda não queria que
eu falasse.
― Terá que perguntar a ela ― falei e abri a porta do meu
carro.
― Estavam no cemitério, não é? ― Não parecia uma
pergunta.
Maneei a cabeça em sua direção.
― Você que está dizendo.
― Aonde está indo? ― sondou Valentino vindo na minha
direção.
― Vou limpar o lixo que Lyn deixou para trás.
― Vou com você ― informou, abrindo a porta do carro,
depois olhou para seu irmão. ― Mande a limpeza enquanto checo
se alguém viu algo.
― Stefano, lembra do que conversamos? ― interveio
Alessandro, alertando-me.
Assenti. Jamais o desrespeitaria. Eu só encontraria outra
forma de achar Lyn.
― Manterei em mente. ― Entrei no carro e parti. Era uma
pena que não estava sozinho, mas ao menos Valentino não era
daqueles que conversam muito.
Chegamos ao cemitério, onde provavelmente os quatro
corpos estavam.
― Ela veio aqui, então? ― finalmente Valentino falou,
checando ao redor com o olhar vazio.
― Sim. Acho que Belinda se sente mais perto do seu pai
neste lugar. ― Sabia que o Céu existia, assim como o inferno, para
onde eu iria um dia.
― Obrigado por protegê-la hoje e por ficar com ela ―
agradeceu-me quando achamos os corpos atrás de uma moita. ―
Eles chegaram muito perto. ― Seus olhos fitaram o local onde seu
pai foi enterrado.
― Fiquei um pouco de guarda baixa na tentativa de fazê-la
esquecer aquela dor, e por pouco isso não nos matou. ― Trinquei
os dentes. ― Teria acontecido se não fosse...
― Lyn ― concordou, parecendo tão grato quanto eu. ― Vai
tentar achá-lo? Se o encontrar, diga que temos uma dívida com ele.
Qualquer coisa que quiser, é só dizer.
― Preciso encontrá-lo. Tenho algumas coisas que quero que
ele saiba, e assim resolveremos o nosso assunto pendente.
Escondemos os corpos. Todos tinham recebido um tiro
certeiro na testa ou na nuca.
― Deixe que eu passo o recado, embora seja mais fácil ele
entrar em contato com você do que comigo.
― Se precisar de mim, estarei aqui ― Valentino me disse. ―
Não só eu, mas meus irmãos também.
― Valeu.
Gostei do fato de ele não ter me perguntado nada, mesmo
estando claramente curioso por eu conhecer Lyn. Imaginei que ele
agia daquela forma por ter sido sequestrado e torturado, e sabe-se
lá o que mais foi feito a ele. Eu percebia que isso levou um pedaço
dele, assim como o que passei levou algo de mim que eu nunca
teria de volta.
Abaixei-me perto dos corpos, checando cada um deles,
puxando suas roupas.
― O que está procurando? ― Ele ficou ao meu lado,
agachando-se também.
― Algum sinal de quem sejam eles. ― Muitas organizações
eram conhecidas por suas marcas, símbolos que mostravam quem
eram, outras não; essas eram mais difíceis de ser reconhecidas.
― Usam ternos caros, então o que fazem é lucrativo, mas
parece que não têm tatuagem... ― ele se interrompeu assim que
rasguei a camiseta e paletó de um deles e achei o que procurava.
Em sua pele tinha o número 15.
― Que porra é isso? ― Piscou, parecendo chocado, e
checou os outros. A mesma marca estava ali, uma que eu conhecia
muito bem. ― São marcados como gado. Quem aceita isso em seus
corpos? É fodido até para nós.
― Eles não aceitam, apenas não tiveram escolha, não foi
dada a nenhum deles. ― Trinquei os dentes, furioso com quem os
tornara daquela forma.
― Conhece essa organização? ― Sua cabeça se ergueu na
minha direção. Parecia aturdido.
― Lyn era de uma parecida. ― Não falei sobre mim, não
queria pensar nisso agora.
― Isso não explica por que vieram atrás de você.
― Essa é a resposta que pretendo descobrir. ― No entanto,
para isso precisava encontrar meu amigo.
Eu só conhecia uma pessoa que também estava atrás de Lyn
e que podia me ajudar a encontrá-lo. El Diablo.
Já estava havia uma semana enjaulado como um animal,
mas não me importava muito. Nada era pior do que ter visto minha
mãe sendo morta na minha frente. Eu poderia ter lutado mais, mas
por que, se minha mãe não estava mais presente?
A dor ainda era profunda e sempre seria. Eu não acreditava
que passaria algum dia. Além da dor espiritual, meu corpo também
doía, pois eu tinha acabado de ser torturado no ringue. Digo
torturado porque me recusava a lutar. Minha mãe se fora, então por
que eu devia viver?
O maldito Kanon me jogara na jaula para lutar nos últimos
dias, disse que era treinamento. Eu não dava a mínima para isso ou
para a forma como meu físico era maltratado. Era isso que dizia a
mim mesmo, mas meu corpo protestava, pois não aguentava mais
tantas pancadas e cortes das lâminas dos meus oponentes.
Havia muitos garotos ali que eu me recusava a matar. Kanon
não podia tirar minha vida, mas queria que eu o fizesse com outros
meninos. Marco deveria ter deixado minha mãe viva, assim eu teria
feito o que ele mandasse, mas agora eu não tinha mais motivos
para lhe obedecer.
― Você precisa resistir, ou não vai durar mais um dia ― disse
o garoto da cela do lado esquerdo, o Número 8. O Número 10
estava na do outro lado. Nunca tinha dito uma palavra desde que
cheguei ali.
Eu estava encolhido no chão frio, com vários ferimentos,
tanto por fora quanto por dentro. O lugar possuía um médico só para
não deixar os lutadores melhores morrerem, afinal dependia deles
para ganhar dinheiro. Porém não fui medicado como castigo por não
ter feito o que o infeliz queria.
― Não dou a mínima para isso. ― Estremeci ao ajeitar o
corpo em outra posição, mesmo assim não era boa.
― Por que resiste tanto? Todos que são trazidos aqui
resistem no máximo um dia, logo estão fazendo o que são
mandados, mas resistir por uma semana? Sorte sua ainda estar
vivo. ― Suspirou o garoto sardento. Era melhor chamá-lo assim do
que por um número. Todos tinham nomes, mas eram proibidos de
mencioná-los. Embora não tivesse ninguém ali nos vigiando, ainda
assim obedeciam.
― Se me matassem, seria um alívio. ― Era verdade. Sem
minha mãe, viver para mim não tinha sentido. A cada dor que me
tomava, eu sentia que a merecia, por ser o responsável pela morte
dela.
― Queria pensar assim, mas quero viver para sair deste
lugar um dia. Não quero morrer aqui sendo uma putinha desses
vermes imundos. ― Sua voz saiu amarga como fel.
Outra coisa que me enojava ali era o fato de, duas vezes na
semana, os responsáveis pelo local fazerem festas e convidarem
homens pedófilos para violentarem os garotos, que não tinham
poder para evitar isso nem podiam dizer uma palavra sequer.
O único que não tinha sido levado a essas festas naquela
semana, na quarta-feira e no sábado, foi o Número 10, o garoto de
olhos mortos. O Sarda me explicou que, quando um dos garotos era
campeão, não era obrigado a fazer nada, só lutar.
― Quero matar todos eles. ― O ódio estava presente em
cada palavra do ruivo.
― Te ajudaria com isso com o maior prazer, jogando todos
em uma coivara de fogo ― anunciei.
― Incluindo seu pai, que o trouxe aqui?
― Seria o primeiro, e vou fazer isso assim que tiver uma
chance. Se ele acha que vou me rebaixar e deixar me domarem
como um animal, está enganado. Prefiro morrer. ― Fechei os olhos,
ignorando as dores. Parecia que, a cada movimento que eu fazia,
elas me cercavam por todos os lados.
― Se sabia do que ele era capaz, por que nunca o matou? ―
Ele parecia curioso.
Aquele garoto estava no lugar errado. Era legal demais para
ser um assassino treinado de 15 anos. Todos ali não mereciam estar
naquele lugar, fazendo coisas que não gostavam só porque Marco
queria ganhar dinheiro.
― Por meus irmãos e... ― respirei fundo ― minha mãe, que
o miserável matou.
Não o matei antes porque tinha um propósito, mas agora isso
não importava mais. Assim que eu o visse de novo, eu o eliminaria
de uma vez por todas.
― Eles gostam desse monstro? ― indagou, incrédulo.
― Não, todos o odeiam. O problema é que, se um de nós o
matar, meu irmão mais velho, que será o capo no futuro, perderá o
direito, pois nenhum dos sujeitos seguidores de Marco irá se
submeter a Alessandro. Tínhamos um plano, buscar aliados para o
nosso lado, e, quando a hora certa chegasse, iríamos mandá-lo
para o inferno, mas...
― Você vai matá-lo por ter assassinado sua mãe. ― Não era
uma pergunta.
― Pode apostar. Assim que eu sair daqui, ele já era, o farei
se arrepender amargamente. ― Era uma promessa que eu
cumpriria.
Ele suspirou.
― No começo, achei que você tinha aversão a matar. Muitos
de nós temos no início, por isso não fazemos amigos, pois, na
próxima luta, podemos ter de matá-los. ― Sua voz soou triste no
final.
Era uma vida deplorável, uma que eu achava muito injusta, e
tudo por culpa daquele demônio. Marco precisava morrer.
― Aversão a matar? Até pouco mais de uma semana, eu
achava que tinha, mas descobri que não ligo de fazer isso se a
pessoa merece estar morta. Mas tirar a vida de inocentes? Isso não
é para mim, e é ainda pior ser obrigado a fazer isso, especialmente
por meu pai. Não vou dar esse gostinho a ele, não mesmo. ―
Coloquei a mão no peito, tentando me livrar da dor que me
esmagava a cada respiração.
― Você é um idiota ― rosnou uma voz grave vinda da
parede de grade ao lado.
Pisquei, pois não podia acreditar que Olhos Mortos estivesse
falando comigo.
― Você é patético se permitindo ficar nesse estado. ― Olhos
Mortos se sentou. Antes estava deitado em um colchonete. Eu
também tinha um, mas, como xinguei Kanon, o fodido o havia tirado
de mim.
― Como se eu tivesse pedido sua opinião... E tão certo como
a merda que não me importo com ela. ― Ignorei-o.
― Precisa entrar em cena se quiser eliminar seu pai. Ficar
parado aqui deixando que o arrebentem não irá ajudar ― rosnou,
fuzilando-me. ― Lute, porra! Ou seja um covarde. Aqui. ― Jogou-
me uma faca pela grade da cela. ― Pegue e corte seus pulsos,
ninguém chamará ajuda.
Peguei a faca no chão, e tudo em mim queria enfiar a lâmina
em meu coração, mas então pensei em meus irmãos. Todos
sofreriam. Jade e Luna..., pensei, com uma nova dor só com a ideia
de não as ver mais. Já bastavam ter perdido nossa mãe. Eu não
podia fazer isso com eles.
― Não faça isso! ― O Sarda fuzilou o Olhos Mortos e depois
a mim, que hesitava com a faca na mão. ― Seja o que for que o
esteja impedindo de fazer tal coisa, se apegue a isso e deixe essa
faca. Não vale a pena. Temos que sobreviver, é isso que importa.
Penso nisso todo momento quando aqueles homens estão me
violentando.
Pisquei, pois eu estava sendo realmente um covarde. Eles
passaram por coisa pior e ainda estavam de pé. Eu não podia me
sujeitar a me deixar levar assim. Eu ainda tinha os meus irmãos.
Precisava arrumar um jeito de sair dali por eles e para ajudar todos
aqueles meninos. Não sabia o que iria fazer, mas tentaria salvá-los
de alguma forma.
Deixei a faca cair no chão e me sentei com a mão na barriga,
ignorando as fisgadas de dor.
― Vou lutar e juro que vou arrumar um jeito de tirar vocês
daqui assim que eu sair. ― Não sabia como conseguiria, mas meus
irmãos poderiam me ajudar se eu pedisse a eles.
Quando eu lhes contasse sobre aquele antro, garantia que se
enojariam assim como eu. Ninguém merecia uma vida daquelas,
ainda mais garotos tão jovens.
― Pode fazer isso? Realmente vai nos ajudar? ― O ruivo
parecia esperançoso.
Se eu dissesse que sim e depois não conseguisse fazer
nada, iria me sentir culpado.
― Farei tudo que eu puder para isso acontecer. ― Era só o
que podia prometer. ― Quero esses filhos da puta mortos, de
preferência, com muita dor.
― Isso se o seu pai não o matar antes ― disse o garoto
sombrio.
― Se fosse por ele, eu nunca sairia deste inferno, mas, se
me deixasse aqui por muito tempo, meus irmãos revidariam, e as
coisas ficariam feias demais. Marco não quer isso, seu objetivo é
ganhar, e precisa que o meu irmão seja o chefe que ele acha que
vai ser um dia.
― Esse seu irmão devia matar o seu pai logo e esquecer
essa coisa de líder. ― O Sarda suspirou. ― Aquele ser desprezível
mantém este lugar ganhando dinheiro à nossa custa.
― Acredito que, quando ele souber do que Marco fez com
nossa mãe, as coisas mudem, e quero que isso aconteça, quero
eliminar aquele maldito demônio de uma vez por todas.
Rafaelle e Alessandro tinham ido para a América por dois
meses. Eu me encolhia só em imaginar ficar naquele inferno todo
esse tempo.
― Vamos focar em sua melhora logo, pois terão mais lutas, e
dessa vez você precisa esconder essa fraqueza que tem, a recusa a
matar um dos garotos daqui. Somos assassinos frios. A partir do dia
em que fomos trazidos para cá, nossa humanidade ficou lá fora.
Precisa deixar a sua também se quiser um dia sair daqui vivo e ter
sua vingança ― Olhos Mortos me disse sem qualquer emoção.
― Se lembram de algo da vida de vocês? ― Era melhor falar
sobre isso a pensar em não sair daquele lugar infernal e na dor que
eu estava sentindo.
Aqueles monstros não queriam que os meninos falassem
sobre quem eram, mas nenhum estava ali no momento para nos
ouvir e nos castigar.
― Lembro que eu estava num orfanato, na Austrália, em
Sidney... Sabe o que é mais estúpido? Eu reclamava por estar preso
lá após perder meus pais e ficar sem família. Queria sair sem
destino, sem ter ninguém me dando ordens. Eu achava que
conseguiria ao vir para cá...
Arfei, mas me controlei para não chamar a atenção dos
guardas do lado de fora.
― Vocês sabiam que vinham para cá? ― indaguei, não
acreditando que isso fosse possível.
― Não tecnicamente aqui. Apareceram uns caras no orfanato
disfarçados de guardas que nos disseram que tínhamos uma saída
para sair de lá e ganhar muito dinheiro. Isso foi há quatro anos. ―
Riu baixo e amargo. ― Nada indicava que era um lugar como este.
O pior é que eles continuam fazendo isso lá fora com garotos como
nós. Acho que pensam que, como não temos família, ninguém vai
ligar para o que aconteça com a gente no final.
― Isso não chama a atenção de ninguém, ao contrário do
que aconteceria se sequestrassem garotos por aí. ― Faziam esse
tipo de coisa também com garotas, enganando-as, inventando que
as transformariam em modelos, mas transformando-as em
prostitutas, até que ficavam em dívida com a máfia, o que era como
fazer um pacto com o diabo. Ao menos com Marco era assim.
― No dia em que chegamos aqui, eu e mais dois colegas
meus, Radir e Said... ― O ruivo fechou os olhos como se quisesse
tirar os pensamentos ruins da cabeça.
― O que aconteceu com eles? ― Pela sua expressão de dor,
eu imaginava que não tinham resistido.
― Radir não conseguiu lidar quando aqueles monstros... ―
Sacudiu a cabeça. ― Ficou tão arrasado, sabe? Tirou a própria vida.
Na verdade, se deixou ser morto, pois queria se livrar deste lugar.
― E Said?
― Um dos caras que o violentava o matou na hora... ― Sua
voz soou mortal. ― Um dia quero sair deste lugar e o matar, tanto
esse cara como todos que nos forçam a fazer essa porra nojenta.
O garoto de olhos mortos estava calado, enquanto o ruivo,
que era o mais conversador ali, falava. Gostei de ver a sua
esperança de sair daquele lugar. Eu também tinha, embora, se
fosse pela vontade de Marco, iria apodrecer ali.
― Quem são eles? Me diz, que, assim que eu sair daqui, vou
dar um jeito neles. ― Eu sabia que ainda era um garoto, mas
também sabia o que era. Crianças no meu mundo se tornavam
adultas rápido, e eu era uma delas, já não tinha mais inocência,
ainda mais naquele lugar. Se eu ainda tinha alguma ingenuidade
antes, ali tinha ido pelos ares. Esperava que, no final, me tornasse
humano de novo ou ao menos não me perdesse como o Sarda.
Nele tinha alguma luz que eu não via no Olhos Mortos e em outros
garotos ali.
Ele me falou os nomes dos caras, e pisquei ao saber de
alguns que eram casados, mas gostavam de garotos. Eu conhecia
alguns deles, outros, iria descobrir onde moravam e dar-lhes o fim
que mereciam. Mostraria para Marco o monstro em que me
transformei assim que enfiasse a minha faca em seu coração e o
arrancasse do seu peito.
― E você? ― indaguei, olhando o garoto de olhos frios. ―
Aliás, quais seus nomes verdadeiros?
― O meu é Jet ― respondeu o ruivo. ― Mas aqui não somos
nada além de objetos para esses fodidos.
― E você? ― insisti com o outro garoto, que não queria me
responder e só me olhava. ― Não precisa dizer se não quiser.
Seus olhos não mostravam nada além de um vácuo que
absorvia tudo.
― Você deve ser mais duro aqui, ou não vai aguentar mais
um dia. Não somos amigos para contarmos histórias sombrias uns
aos outros. Foque em ficar vivo ― disse, deitando-se e encarando o
teto.
― Lyn é duro, mas ele tem seus motivos, embora esteja
certo. Se você continuar evitando lutar, jamais sairá daqui. Agora
pegue isso e mastigue. ― Jogou algo para mim. Foi quando notei
serem comprimidos.
― O que é isso? ― Não queria me drogar naquele lugar. Se
algo acontecesse, eu precisava estar totalmente consciente.
― Para não deixar essas feridas infecionarem ― falou
baixinho. ― Nem todos neste lugar são filhos da puta loucos e
pedófilos.
Era bom saber disso. Talvez, com a ajuda dessas pessoas,
eu conseguisse resgatar todos os garotos presos ali depois.
― Valeu. ― Enfiei o remédio na boca e o mastiguei. Estava
com sede, mas ninguém ali me daria água, então nem pedi.
Ouvimos passos e ficamos em silêncio fingindo estar
dormindo. Naquele lugar não se dormia; cada passo dado ali me
tirava o sono.
Contei os passos da pessoa que caminhava no corredor. Da
porta do pavilhão onde estávamos até ali eram 20 passos de dois
guardas e 25 de Kanon por ser baixo. Agora eram os seus passos,
mas não parecia estar sozinho.
Nunca mostrei meu medo quando ouvia alguém andando no
corredor; agora não seria diferente. Isso acontecia direto, sempre
levavam garotos, mas poucos deles retornavam, e os que voltavam
estavam sempre cobertos de sangue.
A porta da minha cela foi aberta, e abri meus olhos,
encarando um homem de pé me olhando e sorrindo de modo cruel e
perverso.
Ainda bem que eu ainda estava com a faca que Lyn me
entregara antes. Se aquele cara tentasse algo comigo, eu iria fazer
boa serventia dela.
― Ele é todo seu. Pode brincar essa noite, e nossa dívida
será paga ― disse Kanon.
O homem mexeu o pescoço como se estivesse se
preparando para iniciar um trabalho.
― Vão para o inferno! ― rugi, sentando-me e ignorando os
protestos do meu corpo.
Não deixei o pavor me dominar. Tinha chegado a hora de eu
lutar e o faria com quem precisava ser extirpado desse mundo e
mandado ao inferno com passagem só de ida.
― Vou saborear cada segundo. Gosto de garotos que lutam
comigo. ― Ele olhou para a cela do Jet, que estava de costas
fingindo dormir, mas percebi que estava tenso. ― Assim como o
Número 8. Foi preciso muito para amansar essa putinha.
Cada vez que ele falava me fazia ficar mais irado. Então
aquele ser desprezível abusava de Jet? Como prometi que
eliminaria todos que o machucaram, era melhor começar com
aquele.
O sujeito veio para cima de mim, empurrando-me de costas
no chão e montando em meu corpo. Eu sabia que, se o deixasse
pegar meus braços, estaria dominado, e preferia morrer a deixar
que aquele verme fizesse qualquer coisa comigo. Enfiei minha mão
embaixo de mim e relaxei meu corpo. Se ele curtia garotos que
lutavam, veríamos como reagiria àquilo.
― Oh, achei que fosse lutar, pelo que eu soube de você, mas
já está se rendendo? ― Sua voz me enchia de fúria, ainda mais
com Kanon assistindo. Esse era outro em cujo coração eu amaria
enfiar minha faca.
Seu hálito quente e desprezível banhou meu rosto, e virei a
cabeça, fazendo sua boca tocar minha garganta. Segurei minha
ânsia de vomitar ali mesmo.
― Isso, manso como um cordeiro também é bom ― disse
contra meu pescoço.
Apertei a faca e a levei direto até sua garganta, fazendo-o
arfar.
― Que sua alma apodreça no inferno! ― Cuspi o sangue
dele, que respingou sobre meu rosto.
Seus olhos focaram em mim, e suas mãos tentaram conter o
sangue que saía pelo buraco que minha lâmina tinha feito. Dei
graças aos Céus por tê-la, ou eu estaria ferrado. Até poderia lutar,
mas estava muito ferido e com certeza perderia.
Daquele dia em diante, eu não me deixaria ser ferido de
novo. Precisava me manter forte, reerguer-me e eliminar todos que
tentassem me derrubar.
Empurrei-o para sair de cima de mim, e o cara caiu de
costas. Montei nele e enfiei a lâmina em seu coração, girando-a,
não desviando o olhar um segundo de seus olhos.
― Isso é por todos os garotos que abusou. ― Puxei a faca e
a desferi de novo e de novo, até seu peito ficar mole e parecendo
uma peneira.
Minha respiração estava aguda com o esforço. Sentia fúria e
nojo de seu cheiro repugnante em meu corpo.
Olhei para Kanon, que me olhava parecendo feliz com o
resultado que causei.
― Sempre vi potencial em você. Agora isso se provou certo,
mas não explica onde conseguiu essa faca. ― Apontou para o
objeto em minha mão.
― Um dia será você assim, e, quando a hora chegar, irei
dançar em cima de sua carcaça desprezível ― prometi, limpando a
lâmina em um pedaço de roupa sem sangue do homem sob mim. O
chão da minha cela estava coberto pelo sangue do cadáver.
― Pela desobediência ao me responder e por ter escondido a
faca, irá para a solitária. ― Indicou que seus homens viessem me
pegar. Eu poderia ter lutado, mas estava tão machucado das lutas
anteriores que sabia que não iria conseguir. ― Onde conseguiu a
faca? Se me disser, posso pensar em deixar você ficar aqui.
Jamais iria dedurar Lyn. Ele poderia ser castigado, e eu não
queria isso.
― Acha que ligo de ir para a solitária? ― Marco tinha me
deixado mais vezes do que eu podia contar em masmorras que ele
só criava para nos castigar. Não seria nada diferente.
― Vai ligar de ir para essa.
Os seus guardas me pegaram pelo braço e levaram dali
praticamente arrastado, pois eu mal conseguia andar.
Não olhei para Jet ou Lyn, assim nenhum deles seria
castigado comigo.
Quando achei que estava no inferno, percebi que aquilo que
eu tinha passado até o momento era fichinha perto do que estava
por vir, quando minha alma seria levada de vez.
Acordei suando e com meu coração pulsando forte, mesmo
estando em um clima frio.
Os pesadelos com aquele lugar nunca me deixariam? Queria
ao menos esquecer aquilo por um segundo. Os únicos momentos
em que eu o fazia era quando lutava e quando estava perto de
Belinda. Tinha algo nela que não me deixava voltar ao passado. Eu
não sabia se era porque, quando estava ao seu lado, focava em não
a deixar cair, primeiro em razão do seu sofrimento com a doença de
seu pai e agora com sua perda recente, ou se era apenas por sua
presença, da qual passei a gostar.
Após o reaparecimento de Lyn, fiquei um pouco longe de
Belinda, pois não queria que os caras que nos atacaram se
aproximassem dela, mas me reaproximaria, pois teria que voltar à
casa dos Castilhos para descobrir se lá era seguro ou não, como
Alessandro pediu.
Eu ajudava Belinda a lidar com sua perda não por ser um
homem bom, porque, convenhamos, eu não era assim, nunca seria
nem queria ser. Eu o fazia porque entendia aquela dor, a havia
sentido um dia e, no fundo, ainda a sentia tão crua quanto antes.
Meus irmãos me apoiaram, assim como eu sabia que os dela
também o fariam, mas a menina era muito cabeça-dura, fingia-se de
forte na frente deles. Contudo, eu sabia o quanto doía tudo aquilo.
Naquelas duas semanas, não falamos sobre o beijo que
trocamos. Fazia três dias que eu havia voltado a Milão para resolver
minha estada definitiva ao menos por mais um mês na Espanha
com os Castilhos.
Não comentei sobre o beijo porque não queria que ela tivesse
esperança de algo que eu nunca poderia lhe dar, não o que ela
merecia, mas não precisei explicar que foi um erro fazer aquilo, pois
a garota reagiu como se não tivesse gostado nem gasto um minuto
do seu dia pensando no assunto. Suas atitudes mostravam isso, o
que foi um golpe na minha autoestima, pois sempre tive qualquer
mulher que queria. A única que não consegui foi ela, pois era lisa
como uma cobra.
Uma parte minha queria deixar assim, mas outra queria
conquistá-la e provar que eu podia tê-la. Estava forçando-me a
continuar com a primeira opção, principalmente se minha presença
pudesse trazer algum perigo a ela.
Então foquei em localizar Lyn para perguntar quem tentara
nos matar, mas não tive sorte. Era como se tivesse desaparecido do
mapa. Até El Diablo não conseguiu achá-lo, e esse homem sabia de
tudo, tinha olhos em todo canto.
El Diablo disse que Lyn não queria ser encontrado e que ele
era bom em se manter no escuro. Ao menos, depois daquela
perseguição, não houve outros ataques. Enquanto eu estivesse em
Milão, Serena e Belinda ficariam trancadas, afinal ninguém sabia o
motivo da investida que quase levou à nossa morte, se não fosse
por meu ex-colega de cela.
Parei de pensar nisso, não queria voltar ao passado e me
assombrar ainda mais do que acontecia com os pesadelos que eu
tinha diariamente.
Passos suaves como uma pluma estavam chegando à porta
do meu quarto. Eu sabia de quem eram, conhecia todos os passos
das pessoas ali.
Sentei-me na cama, sabendo que não conseguiria dormir.
Não tinha ideia de quando tinha tido uma noite de sono decente.
Isso só acontecia quando eu estava no meu apartamento em
Barcelona, onde ficava sozinho no meu andar. Na casa de
Alessandro sempre ouvia passos no corredor que me impediam de
dormir.
Passei a mão no rosto, querendo tirar todas aquelas imagens
fodidas da minha cabeça.
Ouvi uma batida na porta, e um segundo depois, a maçaneta
foi aberta. Meu anjinho dourado entrou no quarto.
― Tio Stefano, teve outro pesadelo? Ouvi você gritando do
corredor. ― Não era a primeira vez que Graziela aparecia em meu
quarto quando eu gritava.
Recordei-me de Rafaelle. Ele tinha o mesmo problema, e foi
resolvido por Mália. O meu também só seria resolvido se eu
conseguisse uma mulher? Se fosse assim, eu estava ferrado.
Graziela veio até mim e se sentou ao meu lado, pegando
minha mão. Seus olhos estavam tristes por me ver daquela forma.
Cortou meu peito ver sua expressão, então coloquei minha
fachada, que usava como uma máscara, assim ninguém descobriria
o que havia por trás dela.
No fundo, Marco teve o que sempre quis. Era um monstro frio
e sem alma, incapaz de amar. Era uma pena que não pude fazer o
que imaginava assim que saísse daquele inferno na Terra. Por mais
que meu coração negro pulsasse, eu podia sentir que não havia
nada ali para ninguém além da minha família e a princesinha do tio.
Graziela, com sua graça, trouxe um novo colorido para a minha
vida, que antes era só trevas. Enfim eu podia ver uns frangalhos de
luz em razão dela e de minhas irmãs.
― Estou bem, anjinho ― menti e depois acrescentei: ―
Nenhum desses pesadelos pode me machucar mais.
Não fisicamente, pelo menos, apenas na minha cabeça,
pensei.
Odiava que aquele filho da puta tivesse esse poder sobre
mim mesmo depois de anos, quando ele estava apodrecendo no
inferno.
― Estou com você. ― Beijou meu rosto e colocou os braços
à minha volta. ― Te amo muito, tio Stefano.
Meu peito morto se aqueceu um pouco.
― Oh, minha princesa, eu lhe agradeço por me amar. ―
Beijei a cabeça dela.
Graziela afastava um pouco a minha escuridão. Antes
apenas minhas irmãs tinham esse poder, mas agora elas tinham
suas vidas e filhos, então eu só tinha minha boneca e... ela...
Belinda. Eu devia continuar ao seu lado só para ter um pouco de
paz?
Provavelmente por isso aquela garotinha me conquistou logo
que chegou àquela casa. Sua doçura tocou fundo algo que pensei
estar morto havia muito tempo.
― Agora que tal ir dormir? Está um pouco tarde para andar
por aí. ― Olhei o horário no despertador. Era quase 1h da manhã.
― O que faz acordada a essa hora?
― Também não consegui dormir ― sussurrou ela com as
mãos no colo e olhando para baixo.
Franzi a testa.
― Por quê? ― Fiquei curioso por ela perder o sono, não era
natural. ― Pode me contar, que resolvo qualquer coisa.
Ela parecia nervosa mexendo no pijama da Barbie com suas
mãos.
― Querida... ― Eu estava começando a ficar preocupado.
Respirou fundo.
― Acha que meu pai ainda vai me amar quando o bebê
nascer? ― finalmente disse.
Pisquei meio aturdido.
― Por que dia... ― interrompi-me e respirei fundo, pois
percebi que ela temia a resposta. ― É claro que ele sempre irá
amá-la. De onde saiu essa dúvida?
Alessandro adorava Graziela, tanto que a assumiu como sua
filha, então seu medo não tinha fundamento.
― É que não tenho o sangue dele, mas o bebê que vai
nascer, sim ― murmurou. ― Aconteceu isso com minha coleguinha.
Ela não era filha do marido da mãe dela, e, quando o bebê chegou,
o homem começou a desprezá-la e deixá-la de lado. Até a mãe dela
não ligava muito para ela.
Os pais daquela menina eram uns idiotas por fazer essa
merda. O que a criança não estaria passando?
― Acha que Alessandro e Mia fariam isso com você? ―
inquiri e continuei antes que respondesse: ― Eles adoram o chão
que você pisa e a amam de verdade.
― Sei que Mia é minha irmã, mas a amo como uma mãe... É
só que fiquei com medo de ela... não sei, gostar mais do bebê do
que de mim, igual fizeram com a Lainy. Não sou egoísta e não quero
a atenção deles só para mim, mas queria ficar em seus corações
como agora. ― Respirou fundo.
― Acha que a chegada de Enrico vai mudar algo? Se fosse
assim, minha mãe amaria mais a Luna por ter sido filha do único
homem que ela amou na vida, mas para ela não teve diferença, nos
amou igual...
― Mas todos vocês eram filhos dela. ― Graziela estava
realmente insegura em relação a isso. Alessandro e Mia deveriam
tem uma conversa com ela sobre aquele assunto.
― Está bem, deixa eu te contar algo. ― Ao falar sobre isso,
eu sentia como se estivesse comendo sal. ― Uma vez tive dois
amigos. Um tinha o sonho de ser jogador de futebol, sabe? Ele até
pensou em fazer mil origamis para alcançar esse desejo. É da
cultura japonesa acreditar que os origamis realizam desejos. ―
Embora onde estávamos não tínhamos direito a isso. Era
possivelmente por isso que Lyn usava origamis como assinatura em
seus assassinatos, como uma homenagem ao Jet. Seria alguma
promessa que ele tinha feito a si mesmo após a morte de nosso
amigo, que não conseguiu alcançar seus sonhos?
― Origamis realizam desejos? ― Ela piscou.
― É cultura do Japão. Não podemos desmerecer suas
crenças, mas eu não acredito nisso. Vai de pessoa para pessoa. ―
Eu não queria que ela acreditasse naquilo e resolvesse fazer a
promessa para pedir algo que já acontecia, que o meu irmão a
amasse como filha.
― O outro era fechado, não era de se abrir muito, mas
fizemos um pacto de que, quando saíssemos de onde estávamos,
iríamos nos tornar irmãos. Nós éramos ali, mas eles sabiam dos
meus irmãos de sangue. Jet temia que nossa aliança não fosse
suficiente, por isso juramos continuar irmãos. ― Respirei fundo para
me controlar. Pensar no passado arrancava lascas do meu peito. ―
O que eu quero dizer é que não importa o sangue, mas o que
sentimos uns pelos outros.
Eu não queria abrir muito o jogo sobre como fomos criados.
Ainda não era hora disso. Eu sabia que um dia ela precisaria saber,
mas caberia a Alessandro e a Mia contar-lhe a verdade.
― O que temos aqui ― apontei para seu coração ― é o que
importa. Nenhum de nós três tinha o mesmo sangue, mas eu os
considero irmãos e sempre será assim.
Nós juramos proteger um aos outros, e no final não consegui
cumprir essa promessa, mas minha princesa não precisava saber
dessa parte sombria da minha vida.
― E mesmo que você não tenha nosso sangue, iremos amá-
la para sempre. ― Dizer isso para ela era fácil, mas para outras
pessoas era difícil mostrar meus sentimentos. Seria por medo de me
machucar no final? ― Você é a baixinha mais importante para mim.
Fiquei de pé e estendi minha mão para ela.
― Vem, me deixa te mostrar uma coisa. ― Assim que peguei
sua mão, levei-a até a sacada do meu quarto.
― O que vamos fazer, tio? ― Ela estremeceu com o vento
gelado assim que abri a porta que dava para a sacada. Peguei a
coberta e cobri seus ombros.
― Olha para o céu agora. ― Essa foi a frase que minha mãe
usou comigo uma vez, quando pensei que tinha perdido tudo. ― O
que está vendo?
― Vejo milhares de estrelas brilhantes.
Segurei a dor que as lembranças me trouxeram, aliás, duas
delas, essa e a do Jet...
― Isso. Você é assim para Mia e Alessandro e para cada um
de nós. Uma estrela que ilumina nossas vidas. Sem você há apenas
escuridão. ― Eu sabia que todos pensavam a mesma coisa.
Ela ficou em silêncio um momento admirando as estrelas e
depois se virou para mim, abrindo aquele sorriso que eu amava.
― Obrigada, tio Stefano, você também faz minha vida brilhar.
― Abraçou-me pela cintura. ― Te amo muito.
― Oh, querida, também te amo. ― Respirei de modo mais
tranquilo, com meu peito se sentindo um pouco melhor. ― Agora
vamos para dentro para você não correr o risco de ficar doente.
Entramos, e fechei a porta.
― Posso dormir com você? ― ela pediu assim que me sentei
na cama.
Por mais que eu estivesse esgotado pelas últimas noites sem
dormir direito, não pretendia voltar a me deitar, pois estava longe de
pregar os olhos.
Precisava socar alguma coisa, só assim conseguiria relaxar
após tantas lembranças que me atormentavam. Além dos
pesadelos, ainda tive que me abrir com Graziela para fazê-la
entender que seu medo não existia. Lutar seria bom, assim eu
soltaria tudo que estava ameaçando explodir dentro de mim.
― Claro que pode, mas por que não vai aos seus pais? Ainda
pensa que eles não se importarão com você depois que Enrico
nascer? ― Olhei para ela.
Graziela sacudiu a cabeça.
― Não, acredito que os dois vão sempre me amar, assim
como você faz com seus amigos. E, por falar nisso, onde eles estão
agora? ― Ela se sentou na cama.
Eu não esperava essa pergunta. Era algo de que eu não
queria falar, ainda mais agora, que as janelas das lembranças
tinham sido abertas.
― Um deles morreu. O outro, eu achava que também estava
morto, mas acabei de saber que está vivo ― finalmente respondi
após expirar fundo.
― Oh, esse que morreu está com minha mãe então. ― A
mãe de Graziela e Mia morreu quando deu à luz a pequena após
Mia fazer o parto, mas não foi isso que a matou, mas sim o tiro que
levou do traste do marido dela.
Eu não achava que Jet estivesse no Céu, não após tantas
mortes que cometeu, mesmo não querendo. Talvez tivesse
conseguido ser absolvido no final devido ao seu coração generoso.
― Pode ser ― menti.
― Posso conhecer o que está vivo? Ele ainda é seu irmão,
não é? ― Aqueles olhos azuis brilhantes me suplicavam. Era
impossível negar algo a ela.
― Vou ver o que posso fazer. ― Não sabia o que tinha
acontecido com Lyn em todos aqueles anos e, até ter certeza, não o
queria perto de Graziela. Ainda esperava que fôssemos irmãos,
afinal ele salvou minha vida.
Uma vez juramos sempre estar juntos, e no final essa
promessa foi quebrada por mim, mas achei que estivesse morto, por
isso nunca fui atrás dele.
― Mas me diz, por que não vai para seus pais? ― voltei a
perguntar.
― Mamãe passou mal antes de dormir, então não quero
acordá-la agora, que a dor passou ― sussurrou. ― Coisa de
grávida, como ela diz.
Sorri, porque ela tentou imitar a voz de Mia.
― Vão passar logo esses enjoos. ― Eu não entendia muito
do assunto, mas achava que isso só acontecia no começo da
gestação.
― Sim. ― Ela parecia distraída. ― Não quero acordá-la nem
ao meu pai. Achei que pudesse ficar aqui.
Escorei-me na cabeceira da cama e bati ao meu lado.
― Pode ficar, sim. Deita aqui e dorme um pouco, ou, se
quiser, ligo a TV. ― Meu quarto era grande, uma TV imensa
ocupava parte da parede da frente.
― Não, eu vou dormir. ― Bocejou, fazendo-me rir. ―
Amanhã tenho treino.
Ela ficava cada dia melhor no balé, um sonho que minha mãe
também tinha, mas não pôde realizar.
Graziela se deitou, e puxei a coberta sobre seu corpinho,
afinal era uma época fria. Ajustei o ar quente para deixá-la
aquecida. Não demorou muito para minha princesinha adormecer.
Eu estava longe de pregar os olhos, então sairia do quarto
esperando encontrar uma luta e expulsar tudo que estava me
consumindo.
Lutar fazia parte da minha vida havia muito tempo. No
começo, era um esporte que eu até adorava, mas, quando fui
aprisionado naquele lugar e obrigado a lutar com garotos, passou a
não me agradar. Aliás, eu repudiava, embora as surras que levei me
ajudavam a lidar com a dor emocional que me impedia de ser
completo.
Quando Belinda pensou em fazer a mesma coisa, não a
incentivei a isso, afinal, para mim talvez aquele sofrimento não
tivesse retorno, mas para ela, sim. Além disso, uma parte minha não
queria vê-la ferida. Não era porque eu atuava assim que queria que
outras pessoas agissem da mesma forma.
Talvez se eu saísse me ajudasse a não pensar. Eu sabia que
nenhum daqueles vermes estava mais vivo, mesmo assim isso não
mudava as cenas vívidas na minha cabeça.
Porra! O que eu devia fazer? Estava tão cansado disso que
buscava formas de poder ao menos palear o tormento em meu
interior.
Graziela estava dormindo, então só me restava outra pessoa,
afinal eu não queria incomodar minhas irmãs.
Fui para a academia enquanto discava o número do telefone
dela, da outra pessoa que não me deixava pensar muito nos meus
problemas. Percebi o horário e acreditei que ela devia estar
dormindo, mas, antes que eu desligasse, Belinda atendeu.
― Stefano? ― Ouvi confusão em sua voz, afinal eu não era
de ligar para ninguém, muito menos uma mulher.
Quando queria sexo, eu o buscava, e isso aliviava a minha
tensão, embora, quando eu estava atormentado daquela forma,
preferia não me aproximar de ninguém. Aconteceu isso com Luca
uma vez. O meu cunhado quase matou uma mulher, e eu não queria
arriscar fazer o mesmo. Então meu caminho era lutar e liberar
aquela batalha que havia dentro de mim.
Ouvi uma voz do outro lado da linha, ao fundo. Era de um
homem, mas não dos irmãos dela. Quem Belinda estava vendo
àquela hora da noite?
― Quem é que está aí com você? ― A pergunta saiu antes
que eu pudesse trazê-la de volta.
Por que me incomodava com quem ela estivesse? Não era
da minha conta. Mesmo eu dizendo isso a mim mesmo, um desejo
furioso de mutilar o indivíduo, fosse quem fosse, me acometeu.
― Por que se importa? ― indagou ela com tom estranho. ―
Por que me ligou?
Boa pergunta, disse a mim mesmo. Eu não devia me
incomodar com ela ou com quem estivesse.
― Não me importo, e não era nada, pode continuar seja lá o
que esteja fazendo. ― Encerrei a ligação, com raiva de mim mesmo
por me importar.
Pediria ao Alessandro que mandasse outra pessoa investigar
os Castilhos, assim eu não precisaria vê-la mais.
Subi no ringue, ignorando meu telefone, que começou a
tocar. Sabia que era ela, mas não queria pensar nisso, já tinha
muitas coisas na cabeça para me preocupar com essa merda.
Ouvi passos, e só podia ser Alessandro. Rafaelle tinha
passos suaves, eu quase nem podia ouvi-los, além disso, ele não
estava ali naquele momento.
― Não vai atender? ― indagou meu irmão entrando no
cômodo. ― Não está tarde para treinar?
Sacudi a cabeça.
― Não para as duas perguntas ― respondi, socando o saco
de pancadas, mas percebi que isso não ajudaria naquele dia. Pela
forma como eu estava, precisaria de algo mais, como uma luta de
verdade.
Alessandro deu um suspiro ao ver quem ligava na tela do
celular, que estava no chão.
― Ela é o motivo para você estar assim? ― Apontou para
mim.
Quem dera fosse isso... No fundo, eu preferia que fosse, mas
não era. Eu não acreditava que tivesse solução para o que me
acometia.
― Não. ― Eu não queria muito conversar naquele instante,
então mudei de assunto para um que não me causasse dor. ― O
que faz acordado a essa hora?
Não parecia que ele sairia a serviço, pois usava short de
dormir e camisa.
Deu um suspiro duro. Devia ter notado que eu não ia falar.
― Estou procurando Graziela. A Mia me pediu que desse
uma olhada nela, mas não a encontrei em seu quarto. Estava indo à
sala de estar para ver se ela está lá, dançando ― respondeu por
fim.
Toda vez que Mia acordava, mandava-o ver Graziela, quando
ela mesma não ia. Devia ser difícil parar com o costume que tinha
antes de conhecer meu irmão. Foram anos lutando para sobreviver
sozinha junto à irmã caçula.
― Ela veio até meu quarto me pedindo para ficar comigo,
pois não conseguia dormir. ― Suspirei, parando de lutar e olhando
para ele.
Franziu a testa.
― Não conseguia dormir? ― Deve ter pensado o mesmo que
eu. O que faria uma criança da idade dela perder o sono? Em casa
não corria perigo algum, todos os seguranças eram confiáveis e
protegeriam nossa menina com a vida deles se fosse preciso.
― Acho que você e Mia deviam conversar com ela. Acredito
que anda pensando que, após o nascimento de Enrico, vocês não
vão amá-la como filha, não como o fazem agora, por ela não ser
filha de verdade dos dois.
Ele piscou parecendo chocado. Eu também fiquei na hora
com essa ideia estúpida.
― Parece que aconteceu isso com uma coleguinha da
escola, mas o medo dela é por não ser filha de sangue de vocês.
― Preciso falar com ela. ― Fez menção de sair dali, mas o
detive.
― Agora ela está dormindo, mas a fiz entender que isso não
seria possível. Porém acho que depois vocês dois devem frisar só
no caso de ela ainda ter alguma pontada de dúvida. Acho que ela
gostaria de ouvir isso de vocês. Pode deixá-la dormir no meu quarto,
não conseguirei adormecer de qualquer forma. Provavelmente
ficarei aqui até o amanhecer.
― Notei que sua insônia tem piorado nos últimos meses. O
que está acontecendo com você? ― sondou, avaliando-me.
Alessandro era bom em descobrir as coisas, por isso eu me
esforçava ao máximo para ninguém saber do que estava
acontecendo comigo. Ninguém precisava saber dos meus
demônios.
― Nada com que precise se preocupar. Vou ficar bem ―
menti.
Ele não caiu nessa.
― Besteira. Tem algo que vem te atormentando há anos, e
agora, com a descoberta do que nossa mãe passou, ficou pior. ―
Ele sacudiu a cabeça.
Falar sobre isso doía ainda mais, como se meu coração fosse
apunhalado com uma lâmina cega. Eu só queria esquecer, mas
como?
Antes da Mia e da Graziela aparecerem na vida do meu
irmão, Alessandro também não dormia bem. Eu percebia o quanto
ela o tinha ajudado. Outro também que tinha noites péssimas antes
da Mália entrar em sua vida era Rafaelle. Finalmente meus irmãos
pareciam o próprio sol de tão iluminados.
Além da insônia, eu não conseguia fazer sexo sem que as
garotas estivessem amarradas, assim elas não tocariam onde não
deviam. Só em pensar no que aconteceu, eu sentia repulsa de mim
mesmo.
Fazia poucos meses que eu havia ajudado Rafaelle a lidar
com seu problema em dormir ao lado de outra pessoa, assim ele
não machucaria Mália, principalmente pelo fato de que ele dormia
armado. Durante nossa viagem em busca de Sultão e Tomaso,
passei a dormir ao seu lado. Às vezes ele acordava me dando
socos, e eu retribua, cada um com seus demônios para enfrentar.
Era tão bom o fato de que meu irmão enfim estava lidando com
seus traumas. Quanto a mim, não podia dizer o mesmo. Não achava
que conseguiria lidar com aquela porra.
― Algum dia você precisará se abrir com alguém. Antes eu
não achava que isso ajudasse, mas, com a chegada de Mia, vi outro
fundamento nisso. Pode ajudar, Stefano. Não precisa ser comigo,
pode ser com ela. ― Indicou o celular, para o qual Belinda vinha
ligando até pouco tempo. ― Alivia o fardo que carregamos.
Ele me avaliava de forma cuidadosa. Por isso passei a
esconder tudo que sentia. No fundo, não queria preocupá-lo, mesmo
sabendo que estive no inferno. Meus irmãos não tinham
conhecimento do que passei na arena. Eu sabia que, se ouvissem a
verdade, iriam se culpar, e nada do que aconteceu era culpa deles.
Se eu tivesse aberto minha boca, Alessandro teria esquartejado
Marco no mesmo instante e não teria alcançado sua posição atual
na hierarquia, como o capo que foi destinado a ser, leal e fiel ao seu
povo. Apenas eu precisava lidar com minhas merdas.
Sorri, não querendo me aprofundar nas minhas lembranças
pavorosas.
― Não tenho uma Mia em minha vida ― provoquei-o.
Ele subiu no ringue e veio na minha direção. Meu corpo ficou
tenso, mas não demonstrei. Sabia o que aconteceria. Era outra
coisa que tinha mudado nele: antes, Alessandro não era de
demonstrar o que sentia, mas agora não parecia ter esse problema.
Eu poderia chegar àquele patamar algum dia?
― Mas tem a mim e Rafaelle e nossas irmãs. Sabe que pode
abrir o jogo conosco, que tentaremos resolver. ― Tocou meu ombro,
fazendo meu corpo inteiro sacudir, mas não reagi. Essa porra de
toque me fazia imaginar toques que eu repudiava, por isso deixava
as mulheres presas durante o ato sexual, assim eu não surtaria e as
machucaria.
Eu sabia o que ele estava dizendo, mas não gostava de
pensar nisso. Já bastavam os pesadelos que eu tinha à noite. Era
como no filme Freddy versus Jason; se estivesse dormindo,
morreria, e acordado também, embora no meu caso não fosse a
morte literal, mas da minha alma em razão dos pesadelos e
pensamentos atormentados.
― Eu sei, mas agora vá cuidar de sua filha e sua mulher. ―
Fugi do assunto. ― Vou precisar sair agora e conseguir participar de
uma luta em algum lugar.
O treino não estava me ajudando em nada, eu necessitava
de algo mais forte. Sangue e porrada, era isso que eu desejava
naquele momento.
― Não está treinando aqui? ― Arqueou as sobrancelhas.
― Sim, mas preciso de algo mais pesado do que socar esse
saco. ― Os sacos não revidam os golpes do jeito que preciso agora,
pensei. ― Estão acontecendo algumas lutas de rua no submundo
de Milão. Vou entrar em uma delas.
Seus olhos se estreitaram.
― Acho que está lutando muito esses últimos meses, ainda
mais após saber sobre o que nossa mãe passou ― comentou
cruzando os braços.
Esse era outro assunto do qual eu não queria falar, ou ficaria
mais puto do que já estava. Sabia que ela tinha sido feliz com Paolo,
embora por pouco tempo. O pior era saber que, por nossa causa,
nossa mãe não foi feliz pelo tempo que lhe restou. Eu preferia mil
vezes enfrentar o inferno que vivi a deixá-la infeliz e longe do
homem que amava, tudo por culpa de Marco.
Quando eu pensava naquele ser horrendo – porque nem
podia chamá-lo de homem –, sentia a ira me dominar. Eu até podia
lidar com o que ele me fez, mas descobrir sobre o que ele tentou
fazer com Jade, mandando um dos seus homens tocá-la, assim
como a bomba sobre Luna não ser filha dele e minha mãe amar
outro cara e só não ter sido feliz por culpa nossa era demais, e para
piorar soube que Marco a machucou e a violentou por ela ter
ajudado Rafaelle.
Tudo isso estava me consumindo por dentro, a ponto de eu
parecer uma bomba-relógio que a qualquer momento explodiria. O
que ele fez comigo me repugnava, mas com minha mãe e minhas
irmãs era pior. A impotência acabava comigo. Pensar no passado
era um desperdício, eu sabia, mas não mudava a forma como me
sentia.
― Preciso descarregar minha raiva em algo, e não me vejo
fazendo isso em um saco de pancadas. ― Matar foi o que fui criado
para fazer. Não me arrependia disso, era o que eu era, um
assassino, mas apenas porque fui obrigado a fazer, ou seja, não foi
minha escolha. O sentimento de culpa tinha ido embora havia muito
tempo.
― Você lutou mais cedo e matou seu oponente ―
Alessandro enfatizou.
― Ele era escória, não passava de lixo que não podia
continuar respirando nesse mundo. ― Todos os oponentes com
quem eu lutava, escolhia-os conforme seu passado. Quanto mais
fodido o adversário era, mais prazeroso era para mim sua
passagem para o inferno. Alguns eram assassinos de mulheres e
crianças, outros eram pedófilos. Esses últimos morriam lentamente.
― Eu sei. O que quero dizer é que, se você for lutar da forma
como está acostumado, matará o opositor, e a luta de hoje não
envolve mortes no final. ― Afastou-se de mim um pouco e indicou o
ringue. ― Vamos, vou lutar com você.
― Não acho uma boa ideia. ― Da maneira como eu me
sentia, era capaz de ele ver o verdadeiro monstro que eu não
revelava muito. Além disso, temia machucá-lo. Sabia que podia
encontrar um inimigo e eliminá-lo, mas jamais faria algo pelas
costas do meu irmão. Ele não queria me ver perdendo o controle
direto ao matar meus oponentes.
Alessandro esboçou um sorriso, tirando a camisa.
― O quê? Está com medo? ― provocou-me. ― Acha que
não pode lidar comigo?
Bufei, revirando os olhos. Uma coisa que eu nunca fazia era
não cumprir um desafio, ainda mais se insinuassem que eu era
fraco; se alguém me lançasse, eu sempre o aceitava. Meu irmão
sabia disso.
― Vamos começar. ― Pôs-se em minha frente. ― Solte tudo
que está preso.
Eu não podia fazer isso, mas lutaria para aliviar aquele
redemoinho que estava sentindo e me deixando louco. Ataquei-o, e
ele me bloqueou, acertando-me do lado direito, porém não foi forte,
não tão forte como eu sabia do que era capaz. Se tivesse me
atingido da forma como normalmente fazia com seus adversários,
eu teria uma costela quebrada.
― Se vai lutar, lute para valer, não se segure. Não preciso
disso! ― rosnei. Não estava com paciência para lutas suaves,
queria era sentir dor e muita dela.
Ele estreitou os olhos, mas fez o que pedi. Dessa vez o soco
foi forte, mas ainda não com toda a sua potência.
― Que porra de soco foi esse?! ― Querendo que ele
reagisse, acertei seus rins tão forte que ele chegou a se encolher,
mas teve o efeito contrário, pois Alessandro parou de lutar.
― Sei o que está fazendo. Se quiser lutar para espairecer e
limpar a cabeça, estou aqui, mas não vou enchê-lo de pancada só
para você sentir dor. ― Suspirou, parecendo frustrado. ― Porra,
Stefano, isso precisa parar! A dor física não o fará esquecer o que
tanto te atormenta e que está te comendo vivo.
Não, essa dor carnal ajuda a enfraquecer a outra, que
consome minha alma. É disso que preciso, pensei.
― Não quero falar, mas lutar! ― Respirei com dificuldade. ―
Se não vai lutar comigo, vou sair.
― Não vai! Da forma como você está, vai acabar matando
alguém.
― Desde quando se importa com essa porra?! Pelo que sei,
você é um assassino como eu, e nada vai mudar isso! ― Voltei ao
saco e comecei a esmurrá-lo. Pelo visto, era só o que eu teria.
― Não, não vai mudar, mas não é por isso que vou sair por aí
liberando meu ódio sobre todos! ― Aproximou-se de mim.
Bufei.
― Não mato quem não precisa e sem seu consentimento ―
retruquei.
― Jura? Quem mandou matar Elvian? Não me lembro de ter
dado essa ordem a você! ― Fulminou-me.
― Você me mandou ir aos mercados fazer a coleta. O
bastardo pegou uma criança e a fez de escudo. ― Eu falava
enquanto socava. ― Teria feito diferente?
― Não, mas o problema é que você perde o controle rápido
como uma bomba-relógio ― afirmou com um suspiro duro. ―
Precisa manter o controle, ou tudo estará perdido.
Parei de socar o saco e o fitei com o cenho franzido.
― Por que não para de rodeios e vai ao que interessa? ―
Conhecia meu irmão muito bem e até tinha uma suspeita de qual
era o seu medo.
― Daqui a dois dias irá ficar com os Pachecos e, se continuar
assim, irá fazer algo estúpido.
Ergui as sobrancelhas.
― Acha que vou matar algum deles? ― Voltei ao meu treino.
― Eu não faria isso com Luna. Ela ainda se recupera da morte de
Paolo.
Ela passou todo o resto do tempo em que ele esteve vivo ao
lado dele, e fiquei lá também, assim como Miguel, para caso algo
lhe acontecesse. Eu jamais os machucaria, pois minha irmã sofreria,
além de Belinda.
― Não é só isso. Tem a garota esquentada. ― Alessandro
pegou meu telefone, cuja tela mostrava notificações de mensagens
dela, e me entregou. ― Aposto que são dela por você não atender
suas ligações.
Sorri, abrindo as mensagens.
― Belinda... ― A garota tinha algo que me fazia sorrir de
verdade e não só fingir. Havia vários recados dela me xingando e
dizendo que eu era um idiota, estúpido e outras denominações. Se
eu fosse outro tipo de cara, ficaria irritado, mas sabia do seu gênio e
gostava dele.
― É disso que estou falando. Você diz o nome dela como se
fosse algo saboroso. ― Alessandro parecia irritado com alguma
coisa.
― E não é? Aquela mulher tem um dos corpos mais perfeitos
que já vi. ― Preferi não falar que a havia beijado. Isso o deixaria
mais puto.
Toda vez que eu estava ao lado dela, tinha que lutar com
minha ereção como um adolescente na puberdade. Nenhuma
mulher me chamara a atenção como aquela. Tudo que é proibido é
mais gostoso, ao menos é esse o ditado. Além disso, eu gostava de
um desafio, e essa menina era um.
― Um corpo que você não irá tocar a não ser que esteja
apaixonado por ela ― avisou, segurando o saco, que eu ainda
socava. ― Estou falando sério, Stefano. Não estou a fim de arrumar
guerra com os irmãos dela só por você ter tocado na irmã deles.
― Relaxa, não vou tocar nela. ― Eu teria que continuar
recitando mentalmente um mantra fodido só para manter o controle.
Só não pude me conter quando a beijei com a desculpa de achar
que morreríamos, mas na verdade não foi por isso.
― Bom. ― Virou as costas para sair e olhou por cima do
ombro. ― Não acho que preciso dizer, afinal ela não caiu em suas
garras. Acho que realmente tem cérebro.
― Isso é um desafio? ― Sorri provocante.
Ele fechou a cara.
― Não, justamente o contrário. Não a toque se não a amar ―
avisou.
― Então pode ficar tranquilo, pois sou incapaz de amar
alguém. ― Minha vida era escura demais para tal ato. O amor era
algo que eu não era capaz de sentir... nem queria.
― Lembra que eu dizia a mesma coisa? E hoje estou aqui,
casado com uma mulher maravilhosa e pai de dois filhos, o homem
mais feliz e realizado desse mundo.
Assenti. Estava feliz por meus irmãos terem encontrado
alguém. Seria eu capaz disso? Ajudaria com tudo que eu estava
sentindo?
Meu irmão saiu quando eu não disse nada. Eu não queria
mais pensar nisso, então olhei novamente as mensagens de
Belinda.
“Me liga e agora não atende?”
“Quer saber? Vá se foder!”
“Não me ligue mais, seu idiota!”
Sacudi a cabeça, sorrindo. Só essa mulher era capaz disso.
Ao menos aquele peso em meu peito ficou menor.
“Você estava ocupada, eu não queria atrapalhar”, enviei. Na
verdade, queria esmagar o cara cuja voz ouvi. Sorte dele que eu
estava em outro país. Era bom, assim eu tinha tempo de pensar
antes de agir. Pelo menos eu sabia que Belinda não era dessas que
fodiam por aí, por mais durona que parecesse. Eu sabia que tinha
um motivo para ter ouvido a voz masculina no outro lado da linha.
Como estava furioso na hora, isso me impediu de enxergar a
verdade.
Não achei que ela fosse responder minha mensagem, aliás,
pensei que, por ser tão tarde, ela estivesse dormindo, mas logo o
celular voltou a vibrar.
“O que eu falei sobre não me ligar?”. Se ela estivesse
falando, teria rosnado. Eu a conhecia bem o bastante para saber
disso.
“Ainda bem que não estou ligando, e sim mandando uma
mensagem”. Isso era algo que eu nunca tinha feito.
Deitei-me no tatame e escrevi antes dela.
“Sobre foder, prefiro fazer isso com você”. Suspirei, depois
sacudi a cabeça. O que eu estava fazendo? Era para fugir de
qualquer aproximação com Belinda, assim como prometi ao meu
irmão.
“Vai sonhando, Foguete. Sabe quando isso vai acontecer?
Quando o inferno congelar.”
Bufei com uma risada.
“Posso resolver isso”, provoquei. “Senti no nosso beijo que
me queria também.”
Ela mandou uma bonequinha gargalhando com a mão na
barriga.
“Essa sou eu rindo por você achar que gostei daquele beijo.
É melhor esquecermos que isso aconteceu”. Ela mandou a
mensagem e se desconectou.
Franzi a testa e tentei ligar para a Diabinha, mas foi a vez de
ela não atender. Era para eu estar com raiva, mas no fundo isso foi
bom, mesmo sendo um golpe no meu ego.
Era melhor focar só em descobrir se os meios-irmãos da
Luna eram confiáveis e depois voltar para casa como se nada disso
nunca tivesse acontecido. Tudo voltaria ao normal, exceto pela
escuridão que sempre habitaria em mim.
Era difícil de lidar com todo esse tempo longe do meu pai.
Tive que focar no trabalho e nos treinos que fazia na academia e no
clube de luta, assim não pensaria muito.
Lutar também liberava minha raiva de um certo arrogante que
uma vez me beijou e depois fingiu que não aconteceu. Isso me
deixou furiosa. Se Stefano não tocaria no assunto, eu que não o
faria, ainda mais se fosse para ele dizer que não tinha significado
nada.
Na noite em que ele me ligou, eu estava treinando com um
dos alunos da academia. Por um instante, achei que fosse tocar no
assunto do beijo, mas ele ficou furioso com alguma coisa que não
me contou. Quando telefonei para perguntar, o idiota me ignorou,
então desisti. Não vou cair aos seus pés como as outras mulheres,
pensei amarga.
Nas mensagens, ele falou do beijo, mas então saí por cima.
Sabia, pelo pouco que conhecia Stefano, que ele ia dizer que nada
tinha acontecido. Pelo visto, era o que ele realmente pensava, pois,
depois que eu sugeri que não havia gostado, o infeliz não ligou mais
nem mandou mensagens. Isso já fazia quatro dias. Não que eu
estivesse contando.
Soube que ele tinha voltado para a Espanha havia dois dias,
mas ainda não o tinha visto. Achei que andava me evitando. Fosse
como fosse, eu não dava a mínima.
Peguei meu oponente no rinque da academia e o derrubei no
tatame como fui treinada por Santiago.
― Precisa colocar um pouco de raiva no treino, ou seus
socos não serão tão bons ― disse uma voz conhecida.
Ergui meus olhos do meu adversário, encontrando os de
Stefano, que entrou no ringue. Ignorei a reação que sua presença
causou em meu corpo, que parecia estar perto de uma fornalha.
― O que foi? Nunca viu uma mulher derrotando um homem?
― Dei um sorriso torto. ― Posso chutar sua bunda em dois
segundos e nem preciso estar com raiva.
Stefano riu.
― Faço isso com vocês dois em meio segundo. ― Olhou de
mim para meu colega no chão, onde o derrubei. ― Mas o que
ganho com isso?
Estreitei meus olhos. Fazia tempo que queria lutar com ele,
via a sua forma de lutar nos ringues, era feroz e determinado,
embora eu percebesse a sua brutalidade em algumas das lutas.
Ele se aproximou de mim sem tirar os olhos dos meus.
― Você quer lutar comigo, posso ver que adora um desafio e
me acha um. Porém não luto com garotas. Você não devia estar
aqui, mas fazendo as unhas ou qualquer coisa que as mulheres
fazem para passar o dia ― falou como se eu fosse uma menina sem
cérebro, o que me deu vontade de chutar suas bolas.
Não que eu pensasse que mulheres que preferiam cuidar de
sua aparência fossem burras. Aquilo só não era a minha praia. Foi o
modo como ele me disse.
― Quer saber? Foda-se, imbecil! ― Cerrei os punhos e me
lancei contra ele preparada para quebrar seus dentes.
― Podemos fazer isso depois que eu derrotá-la.
Aquele seu sorriso metido me fez ficar mais puta da vida.
― Quando eu terminar com você, suas bolas não vão prestar
para nada ― grunhi, preparando-me. ― Vou te mostrar do que sou
capaz, Foguete.
Ele sorriu quando o acertei na boca e o sangue escorreu pelo
canto dos lábios.
― Vai ficar apanhando feito um covarde? ― zombei. ― Achei
que os Morellis tivessem bolas, mas acho que isso entre suas
pernas não serve para nada além de foder.
― Sabe como se caça uma raposa? Jogando uma isca... ―
Antes que eu pensasse sobre o que ele disse, lançou-se para mim,
jogando-me no chão, mas amorteceu minha queda com o braço.
Montou em mim, segurando minhas mãos acima da minha cabeça.
― Saia do meu aperto. ― Abaixou o rosto próximo ao meu.
Por um segundo, foquei em respirar, porque fui tomada de
surpresa. O cara parecia uma lebre. Deixou-me furiosa só para me
desconcentrar e me atacar.
Pensei em minhas chances. Minhas mãos estavam presas,
impossibilitando-me de usá-las para me soltar. O que restava eram
minhas pernas. Levantei uma delas para acertar suas bolas, mas
ele bloqueou o ato com facilidade.
― Livre-se dele, Belinda ― ouvi Santiago perto do ringue.
Não o tinha visto antes, devia ter chegado naquele instante. ― Você
consegue. Se lembre do que treinamos.
Sim, eu havia treinado para sair de situações assim, mas
tudo que eu tentava, Stefano bloqueava.
― Você é fraca para lutar com alguém como eu ― zombou,
depois alertou: ― Sempre tem que estar preparada, pois agora eu
poderia fazer qualquer coisa que quisesse e ainda matá-la.
Eu não gostava de saber que ele estava certo e não lhe daria
esse prazer. O homem era convencido demais para o meu gosto.
Então só me restava uma coisa.
Olhei bem dentro dos seus olhos e sorri doce e sexy, o que o
fez estreitar os olhos, mas não pensei muito no que fazia, ou me
arrependeria depois. Eu não me importava com a luta, só não
deixaria que ele saísse por cima. De qualquer modo, eu venceria.
Mordi o lábio inferior e relaxei meu corpo, o que o fez sorrir,
talvez sabendo o que eu estava fazendo. Como meu rosto estava
próximo ao dele, beijei-o, mergulhando minha língua em sua boca,
mas não fechei os olhos. Ele também não o fez. A princípio, não
achei que ele fosse retribuir, e sim me enxotar. Porém fiquei
surpresa quando se apossou de minha boca, devorando-a como se
estivesse faminto. Seu gosto de menta me inebriou, não me
deixando pensar com clareza. A forma como tomou minha boca,
como se conhecesse cada canto dela, fez-me fechar os olhos e
retribuir com um gemido baixo.
Por um segundo, esqueci-me do lugar em que estávamos e
de quem nos assistia, mas foquei minha mente turva a voltar a
raciocinar. Não me deixaria levar por gostar dos beijos dele, do seu
calor e de sua fome.
De repente seu corpo relaxou e desprendeu seu domínio
sobre mim. Ele também devia ter se esquecido do lugar em que se
encontrava ou não se importava. Eu também não; só o que me
importava era vencer, e foquei nisso assim que minha mente se
iluminou.
Girei a minha língua em sua boca ao mesmo tempo em que
levantei meu joelho direito. Dessa vez, acertei suas bolas, fazendo-o
gemer. Abri meus olhos, encontrando os seus. Algo perigoso piscou
ali, mas foi breve.
Mesmo recebendo uma joelhada na virilha, ele não me
soltou. Senti-o apenas retesado.
― Boa escolha, embora eu tenha uma dúvida. Vai beijar
todos os seus sequestradores para se soltar? ― Sorriu com
dificuldade e ficou de pé ainda encolhido.
Mesmo com certeza sentindo dor, seu rosto não
demonstrava. Ele também não gritou. Stefano soube controlar sua
raiva. Tinha algo perigoso por trás de sua aparente tranquilidade
que ele não deixou sair. Por um segundo, achei que fosse me matar.
Seria aquilo que eu tinha visto em suas lutas anteriores? Como se
ele tivesse um monstro adormecido dentro de si?
Minha respiração estava arfante com o seu toque e seus
beijos. Fiquei assim também na outra vez que ele me beijou.
Maldição, por que sinto isso justamente por ele? Merda! O que achei
estranho foi o fato de eu não ter gostado de machucá-lo. Por que
seria?
― É isso aí, Belinda, chutou a bunda do Morelli! ― gritou um
dos recrutas que eu achava que logo estaria pronto para entrar em
ação.
Stefano o fuzilou, e aquele olhar perigoso cintilou novamente,
agora mil vezes pior. Percebi o que ele ia fazer e pulei de pé na
frente dele assim que deu um passo na direção do garoto.
― Se controla, macho alfa ― pedi, colocando a mão em seu
peito e o impedindo de prosseguir. Seu corpo inteiro se sacudiu com
o toque, mas não me afastei, ou ele faria uma besteira. ― Ele não
disse por mal, só fala demais.
― Por que não vai procurar o que fazer? ― Santiago sugeriu
ao Barcelo, que estava paralisado no lugar, encarando um Stefano
ameaçador. ― Um aviso para o futuro: fique fora das vistas dele.
O garoto de 17 anos foi para os vestiários enquanto Stefano
o seguia com os olhos como se fosse um predador que estava
deixando a presa escapar.
Notei que meu irmão estava tenso como se temesse ter que
parar Stefano, mas não por medo dele. Para Santiago, seria difícil
lutar contra ele. A única que sairia machucada seria Luna, e nenhum
dos dois queria isso.
― Acho que eu não beijaria todos que tentassem me pegar,
ainda mais se fossem feios ― falei para distrair Stefano e expulsar
aquela expressão assassina de seu rosto.
Não deixaria que ele chegasse mais perto de mim. Eu tinha
consciência de que era uma mulher e que não conseguiria vencer
alguns homens, como Stefano, meus irmãos e outros do mesmo
porte deles. Eu aceitava isso. O que não aceitava era me rebaixar
sem lutar, por isso não reclamava da segurança que meus irmãos
me impunham.
― Embora, se eu tivesse a chance, fritaria as bolas dos meus
oponentes, adicionaria pimenta e os faria comê-las ― continuei a
tentar acalmá-lo.
Eu tinha certeza de que não havia sido só o comentário do
garoto que o deixara assim, mas também a forma como bati nele.
Ou teria algo mais que eu não sabia capaz de deixá-lo a ponto da
ruptura?
Seus olhos deixaram o seu alvo e pousaram em mim, mas eu
não o temia, embora pudesse sentir meu irmão ainda tenso nos
observando. Por alguma razão, ele e os outros confiavam em
Stefano. No fundo, eu também confiava. Uma pessoa que matava
só assassinos de crianças e mulheres nunca poderia tocar em uma.
― Ou os estriparia com uma pá ― continuei, porque notei
que ele estava se acalmando. Sua respiração estava voltando ao
normal. ― Poderia tratá-los com seu próprio remédio.
Com isso, ele sorriu. Soltei um suspiro aliviado e me afastei,
também querendo normalizar minha respiração. O seu sorriso tanto
me deixava de pernas bambas como às vezes me irritava bastante,
a ponto de ter vontade de socá-lo.
― Gostaria de ver algo assim, embora eu ache bom você
ficar longe de homens dessa natureza. Nem sempre a defesa contra
eles é a mesma que você está acostumada. Podem ter outros tipos
de arma.
― Também acho bom. Mas não gostei daquele beijo. ―
Santiago fez uma careta.
Se fosse outro homem que tivesse me beijado, estaria morto
no chão. O que tornava Stefano diferente para meus irmãos a ponto
de me deixarem sair com ele? Depois eu perguntaria a todos se
havia um motivo por trás dessa liberação. Ou talvez fosse algo da
minha cabeça, e eles tivessem apenas aceitado que eu me tornara
adulta.
― O que queria que eu fizesse? ― Pulei para fora do ringue.
― Não deixaria o Foguete ganhar nem que para isso tivesse de
usar qualquer arma que eu tivesse.
― Espero que não se torne um hábito, ou terei que matar
alguém ― Santiago avisou sombrio.
Ri sacudindo a cabeça. Por um momento, ali, esqueci minha
própria dor. Senti-me mal por esquecer papai, mas voltei a sorrir,
ficando alegre mesmo que fosse por algo tão banal.
― Vou tentar. Agora preciso tomar um banho e ir trabalhar.
Saí logo, não querendo que ninguém visse minha expressão.
Papai iria gostar disso, não? Ele mesmo me pediu para
continuar a viver. Eu só não queria esquecê-lo.
― Juro, papai, que isso nunca vai acontecer ― prometi,
apertando a correntinha com a foto dele e da minha mãe no
pingente.
Após tomar banho e enxugar meu corpo, enrolei-me na
toalha e saí do boxe do banheiro. Quando eu estava no vestiário,
nenhum dos homens entrava. Ninguém era louco a esse ponto, por
isso não me preocupei que alguém abrisse a porta.
Fui pegar minha roupa na bolsa. Foi quando senti um arrepio,
o mesmo do cemitério. Então olhei para o lado e encontrei os olhos
frios do amigo de Stefano.
― Não grite, não quero matar ninguém, mas farei isso se
alguém aparecer ― alertou com uma arma na mão, mas estava
abaixada, embora isso não deixasse as coisas menos
ameaçadoras.
Apertei mais minha toalha contra o corpo, temendo o pior.
Provavelmente não escondi o terror que estava sentindo, pois ele
falou:
― Não vou violentá-la, pode ficar tranquila, não é meu estilo.
Eu poderia gritar, mas não queria que ninguém saísse
machucado, muito menos aquele rapaz, com quem Stefano se
importava.
― O que você quer? ― Respirei mais aliviada, mas nem
tanto.
― Fique longe dela ― rosnou Stefano da porta, entrando em
dois segundos, sem tirar os olhos do amigo. Eu não sabia se ainda
mantinham a amizade, mas esperava que sim.
Lyn estava à minha direita, e Stefano, à esquerda, e eu no
meio dos dois, mais perto de Lyn do que gostaria.
― Venha para mim, Belinda ― Stefano me estendeu a mão,
mas não me movi, apenas olhei para o amigo dele. Temia ir, e, em
represália, Lyn matar Stefano e as pessoas fora do vestiário.
O homem elevou o queixo, uma rápida emoção cruzando seu
rosto ao encarar Stefano com os olhos vazios.
Não pensei duas vezes, aproximei-me mais de Stefano e
peguei sua mão, apertando-a, agradecendo-lhe por estar comigo. O
gesto não passou despercebido ao intruso, ainda mais quando
Stefano colocou o braço em minha cintura.
Eu sabia que jamais venceria em uma luta com aquele cara.
Não era louca para enfrentar alguém que não temia a nada, nem a
morte.
― Eu não ia machucá-la ― disse ele sem mostrar um pingo
de emoção.
Stefano estreitou os olhos.
― Não é o que parece, afinal a encurralou sozinha neste
lugar ― contradisse Stefano.
― Só vim alertá-la de que corre perigo ― avisou e foi até um
cômodo que tinha no vestiário onde ficavam materiais de limpeza.
Em todas as nossas propriedades tínhamos um túnel secreto
para o caso de o lugar ser atacado e termos de sair às pressas.
Entretanto, a entrada deles geralmente ficava no escritório, não no
vestiário. Como Lyn tinha entrado? Teria sido pelo duto de ar? Lá
cabia uma pessoa tranquilamente. Era a única explicação para ele
entrar sem ser visto.
― Perigo? Que tipo de perigo Belinda corre? É por minha
causa? ― indagou Stefano, colocando-me atrás de si e dando um
passo até seu amigo.
Eu estava mais confusa que ele. Alguém queria me usar para
atacar meus irmãos? Se fosse, eu não permitiria, não de novo. Não
perderia mais ninguém por minha causa.
― Não tem nada a ver com você, mas com ela, que não
consegue manter o nariz fora dos assuntos dos outros ― informou o
cara.
Franzi a testa. Tinha a ver comigo?
― Mas não me lembro de ninguém cuja vida andei
bisbilhotado ― sussurrei mais para mim mesma.
― Não é o que parece. ― Fuzilou-me com nada além de
vazio em seu olhar e depois se voltou para o Stefano. ― Se você se
importa com ela, a mantenha segura e fique esperto. Há muitos nas
sombras.
Ele entrou no cômodo antes que pudéssemos dizer algo.
― Lyn! ― Stefano foi atrás dele, mas o lugar estava vazio.
Encarou o duto de ar aberto. ― Mas que porra!
Pisquei de olhos arregalados.
― Será que ele machucou alguém quando entrou?
― Não creio. Ele não quer confusão com seus irmãos. Talvez
tenha apagado alguém. Era o que eu teria feito.
― Meus irmãos vão vê-lo pela câmera, não há como
esconder isso.
― Não. Lyn tem um hacker muito bom, pois tentei localizá-lo
esses dias, mas não o encontrei. Até El Diablo não conseguiu. Ele
disse que seja quem for que o mantém no escuro é bom demais até
para a hacker dele. ― Deu um suspiro duro e se virou para mim. ―
Você está bem? Ele... ― Sua voz tinha um tom amargo.
― Não acho que ele me machucaria, só veio me alertar, mas
não entendo. Quem estou cutucando a ponto de querer minha
morte? ― Tentei procurar na minha cabeça, mas não consegui
pensar em nada ou ninguém.
― Seja quem for, vamos descobrir antes que essa merda
exploda. ― Trincou os dentes e depois respirou fundo. Pôs-se em
minha frente, colocando a mão em meu rosto. ― Você ficará segura.
Cuidarei disso.
Aproximei-me mais, como se não conseguisse controlar meu
corpo. Era como se ele tivesse vida própria e quisesse aquele
homem. No fundo, eu queria mais de sua boca. Já havia beijado
antes, mas o beijo de Stefano era viciante, como um beijo da morte.
Eu poderia rir dessa analogia, mas não o fiz, só o beijei e tentei
colocar minhas mãos à sua volta, mas ele me rodou e me encostou
na parede, erguendo minhas mãos e as prendendo com uma das
suas.
Ofeguei, encarando seus olhos e sua boca.
― Não sabe no que está se metendo ― anunciou ele,
aproximando-se tanto que eu senti seu hálito quente banhar meu
rosto.
― Sei que quero a sua boca. Seu beijo é viciante ―
finalmente confessei.
Ele sorriu, e agora notei suas covinhas sexy.
― Você estava sozinha em uma sala com um assassino e
ainda pensa nisso? A maioria das mulheres teria gritado e estaria
histérica.
― Precisa mais do que isso para me abalar. Outra coisa, seu
amigo não é mau. Se me quisesse morta, o teria feito naquela noite,
e hoje veio me alertar sobre o perigo que estou correndo. ― Dei um
suspiro. ― Se não estiver a fim, me solte, que vou vestir minhas
roupas.
Devia estar mesmo louca por querer os beijos daquele cara.
Tudo nele gritava para eu me afastar, mas então por que eu não
conseguia fazer isso?
Tentei me soltar, mas ele só prensou ainda mais seu corpo
contra o meu e beijou de leve o canto da minha boca.
― Impaciente... Não sabe o quanto estou faminto por você.
― Então se apossou da minha boca, degustando cada canto dela.
Derreti-me, devolvendo com tamanho vigor que sentia a
pulsação entre minhas pernas. Gemi quando ele as abriu e tocou
com o joelho bem onde latejava. Levantei uma das pernas para me
expor mais, não me incomodando com qualquer pudor. Só queria
que aquele desejo fosse apagado, que o fogo que me consumia
fosse extinto.
― Esse gemido é um dos sons mais lindos que ouvi. ―
Levou uma de suas mãos até entre minhas pernas e circulou meu
clitóris, fazendo-me gritar, mas abafou o som com um beijo. A outra
ainda segurava minhas mãos juntas. ― Tão sensível.
Nada disso era como meus vibradores. O toque dele era o
nirvana e me fazia flutuar no Espaço Sideral com cada esfregão e
puxão em meu nervo sensível.
Eu tinha feito sexo uma vez, quando perdi a virgindade com o
traste do Gazo, mas mesmo com ele não sentia essas sensações, e
eu o amava na época. Eu não sabia o porquê daquilo, mas nada era
como o que eu estava sentindo agora. Gazo só ficou comigo por um
jogo de poder e se vangloriou aos meus irmãos por ter me
desonrado, quando foi morto. Depois disso, fechei-me e não quis
mais ninguém daquela forma.
Stefano era diferente, não temia me tocar, jamais diria algo
ou se vangloriaria por isso, sem contar a sensação que exercia em
meu corpo e meu peito. Só em olhar para ele me fazia sentir sem
fôlego, acelerava o meu coração.
― Isso, se desmancha em meus braços, Diabinha. Tão
perfeita ― arrulhou, tirando-me dos meus delírios.
Abri meus olhos, encontrando os dele quentes e cheio de
luxúria, mas tinha algo mais ali que eu não queria decifrar. Apenas
me deleitei com esse momento.
Ele rodou meu nervo, e minha boca se abriu em um “oh”
silencioso. Fechei os olhos de novo.
― Abra os olhos. Quero vê-los quando gozar em meus dedos
― ordenou.
Eu não sabia se conseguiria mantê-los abertos, mas tentei.
Queria encontrar a liberação que só ele podia me dar naquele
instante.
― Isso, goza para mim! ― Rodou meu clitóris mais rápido e
deu um puxão, não para doer, e sim para o meu prazer. E o êxtase
veio com tanta força que eu gritaria, mas seus lábios me impediram.
Nossos olhos estavam conectados como ferro e imã. Eu me
sentia incapaz de me mover enquanto meu corpo tremia com o
orgasmo. Juro que poderia mergulhar naqueles olhos castanhos.
Observando-os de longe, eu jurava serem negros, mas via de perto
que eram castanhos.
Ele me beijou até eu parar de tremer e ficar mole contra a
parede. Minha toalha tinha caído em algum momento, mas nem
percebi. Minha mente estava em outro lugar.
Sorri.
― Isso foi espetacular, melhor do que meu vibrador ―
informei, tentando normalizar a respiração.
― Usa um vibrador? Eu não podia esperar outra coisa de
você. ― Ele deu uma risada.
― Não é porque não sou virgem que eu saio por aí fodendo
adoidado. Fiz sexo apenas uma vez e foi o maior erro da minha
vida. Por sorte o desgraçado está queimando no inferno agora, ou
eu mesma o mandaria para lá. ― Tentei me afastar do seu toque,
mas Stefano não deixou.
Achei que ele não acreditaria em mim por eu ser daquela
forma, espontânea e sem papas na língua, mas por que me
importava com sua opinião?
― Isso faz de mim um sortudo por me deixar tocá-la. ―
Beijou de leve meus lábios. Foi casto, nada sexual.
― Sorte sua que seu toque é melhor do que todos os
vibradores que tenho ― falei, suspirando. Ele nunca reagia da forma
que eu imaginava, sempre fazia o contrário.
― Que bom que gosta do meu toque. Saiba que não fizemos
nem um terço do que quero fazer com você. ― Ele soltou meus
pulsos, que tinham marcas vermelhas, e acariciou minha pele. ―
Está doendo?
― Não. Minha pele é branca, fico marcada com facilidade. ―
Olhei para sua calça e o vi duro. ― Posso cuidar disso para você.
Riu parecendo deliciado.
― Vai me dar sua boca ou vamos foder? Seja qual for das
duas coisas, aceito. ― Seu tom era provocante.
― Nenhum dos dois, mas posso lhe dar minha mão ―
informei, abaixando-me e pegando a toalha.
Não achava que estava pronta para transar ainda. Não tinha
uma boa recordação da última vez que eu tinha feito sexo, mas só
precisava de tempo. Enquanto isso, podíamos curtir um ao outro.
― Nossa, não lembro quando recebi uma punheta de
alguém. Acho que foi quando eu era novo. ― Ele parecia falar
consigo mesmo.
Ergui as sobrancelhas.
― Talvez devesse procurar alguma mulher lá fora. Acredito
que tenham bocas experientes, capazes de dar o que você quer. ―
Eu poderia me insultar com isso, mas não era do tipo ciumenta. E
ter ciúmes de alguém como Stefano seria desperdiçar energia; o
homem trocava de mulher mais do que trocava de roupas. Eu não
seria uma delas.
Seu humor foi embora. Ele estreitou os olhos sobre mim,
avaliando-me. Fazia muito isso. Todavia, não o deixei ver nada.
Também era boa em esconder o que sentia.
― Vou ficar com a sua mão ― informou e a pegou, não antes
de dar uma olhada em todo o meu corpo. ― Fabuloso! Eu queria
mais do que isso, mas não posso. Já estou quebrando a promessa
que fiz ao meu irmão tocando-a dessa forma.
― Podemos continuar, não precisa contar a ninguém o que
estamos fazendo. ― Eu devia estar louca por lhe propor algo assim,
mas adorei ser tocada intimamente por ele. ― Afinal não vou me
casar agora.
Precisava arrumar um jeito de burlar as ordens dos anciões.
Não queria me casar, não por ora. Ainda não tinha encontrado o
amor, não de verdade. O único homem nos últimos tempos por
quem cheguei perto de sentir algo foi Stefano, e não acreditava que
ele um dia se casaria.
Algo perigoso cruzou suas feições, mas foi breve e incapaz
de ser decifrado.
― Tem certeza de que você quer só minha mão?
Eu ainda era inexperiente com sexo oral e queria aprender
mais com filmes e vídeos para lhe dar o mesmo prazer que ele me
proporcionou, pois tinha certeza de que Stefano devia ter tido muitas
mulheres experientes, e eu não ficaria atrás delas.
― Sim. Depois podemos fazer outras coisas, mas Alessandro
não pode saber, e acredito que os seus irmãos também não, ou
sairei daqui direto para o necrotério, isso se fizerem o favor de me
levar até lá. ― Ele me puxou para si e me deu um beijo delicioso.
Sorri.
― Que bom, será nosso segredo sujo. ― Mordi o lábio. Sabia
da enrascada em que estava me metendo. O que eu devia fazer era
fugir para longe.
― Vou adorar sujar você ― disse malicioso.
Deixei a toalha de lado e desabotoei sua calça, puxando para
baixo tanto ela como sua boxer. Então dei de cara com um pau duro
e grosso. Nele tinha um apadravya. Não fiquei surpresa; era a cara
do Stefano ter um piercing.
― Surpresa? ― Sua voz estava rouca.
― Foguete, já vi pênis antes, mas não estou surpresa sobre
o piercing. ― Peguei seu pau, alisando a sua crista, de onde saía
pré-sêmen.
― Isso é algo que não preciso saber ― comentou em um tom
amargo ao pronunciar as palavras.
Levantei as sobrancelhas para ele.
― Ciúmes não combinam com você. Nós temos um acordo.
― Voltei à minha tarefa, não querendo pensar em Gazo, embora eu
não tenha reparado muito no corpo dele. Quando transamos no
acampamento, era noite, então não vi quase nada.
O corpo de Stefano se sacudiu com uma risada.
― Para sua informação, não tenho ciúmes.
― Que bom que somos parecidos. Também não tenho. ―
Circulei a coroa do seu pênis. ― Achei que tivesse uma tatuagem
nele.
― Não ia tatuar meu pau. ― Fez uma careta.
― Bom, pretendo fazer uma na minha boceta. ― Estava
pensando nisso havia algum tempo.
― Vai ficar linda. ― Seu olhar vagou para lá. ― O que
pretende fazer?
― Não sei dizer ainda. ― Comecei a fazer uma punheta nele,
o que me deixou quente de novo. Levei minha mão até entre as
minhas pernas.
― Está com tesão de novo? ― Assenti, e ele me puxou para
um banco, deitando-me de costas. ― Vou cuidar de nós dois.
Minhas pernas se abriram. Meu corpo começou a latejar
ansiando pelo toque dele, que se posicionou entre minhas coxas.
Por um segundo, desejei seguir em frente, mas não faria isso agora.
Precisava de mais um pouco de tempo.
― Relaxa, não vou entrar, prometo ― informou-me com a
cabeça de seu pênis roçando entre minhas pernas. ― Jamais faria
algo para o qual você não esteja pronta.
Encontrei seus olhos, sentindo-me aliviada e grata por ele
entender.
― Confio em você. ― E no fundo confiava mesmo. Sabia que
não devia deixar rolar aquilo entre nós, mas eu gostava de
descobertas e adorava aquelas sensações quando estava com ele.
Quando Stefano começou a esfregar meu clitóris com sua
coroa, achei que estivesse flutuando. Era mil vezes melhor do que
com seus dedos. Mantive minhas mãos para baixo, mesmo
querendo tocá-lo. Parecia que, quando ele era tocado, sofria. Isso
também acontecia com Valentino. O que será que houve...
Meus pensamentos sumiram quando o piercing tocou meu
clitóris. Tudo em mim vibrou, e meu corpo se sacudiu, arqueando-
se.
― Merda, isso é muito bom! ― consegui dizer meio sem
fôlego.
Ele sorriu com os olhos quentes e capturou meus lábios.
― Estou feliz por satisfazê-la. ― Sua voz saiu baixa e
ofegante.
Meus olhos se fecharam, e deixei aquele turbilhão de
sensações se apossar de mim. Fosse o que fosse que aquela
escolha me trouxesse, esperava estar pronta para as
consequências. Porém não pensaria nisso no momento, só queria
desfrutar daquele êxtase transbordante, quando vi milhares de
estrelas mesmo sendo de dia.
Olhei seu rosto, que se encontrava com os olhos fechados.
Seu corpo estava tenso. Eu sabia que ele estava gozando. Tinha
algo no modo como ele se deleitava em seu orgasmo que o fazia
sexy e muito lindo.
Caiu em cima de mim com a respiração desigual.
― Obrigado ― disse-me em voz baixa. Pelo seu tom, parecia
que não estava agradecendo-me só pelo orgasmo. Talvez também
fosse por eu não o ter tocado quando estávamos juntos.
― Você me proporcionou dois orgasmos impressionantes,
tanto que estou atrasada para o trabalho. ― Empurrei-o um pouco
para sair de cima de mim.
Podia sentir seus olhos me sondando. Não sabia o que ele
pensava e no fundo não queria saber.
― Belinda, o que aconteceu...
Fui até a cabine para tomar banho. Precisava de outro após
tudo aquilo.
― Stefano, estou ciente sobre tudo que aconteceu aqui. Sei
que é só diversão. Se está preocupado que irei me ajoelhar em sua
frente e pedir você em casamento, pode ficar aliviado. Só estamos
nos divertindo. E, se não quiser fazer de novo, é só dizer. Não vou
implorar, isso não é da minha natureza. ― Olhei para ele, que
estava levantando as calças, mas parou diante de minha
indiferença.
O que ele tinha achado? Que eu seria como as outras e
rastejaria aos seus pés?
Antes que ele respondesse, meu irmão me chamou da porta:
― Belinda, você está bem?
― Estou, por quê?
Eu deveria ter pensado em se alguém resolvesse ignorar as
regras e entrar ali, mas o único que quebrou essa regra foi Stefano.
Eu não podia esperar outra coisa dele.
― Têm dois guardas meus apagados. Preciso checar o que
está acontecendo. Pode ficar aqui até eu ver isso? Javier e Alonso
vão ficar do lado de fora, bem como mais alguns dos meus homens
― respondeu com um suspiro duro.
― Tudo bem, eu fico.
Então Lyn realmente não havia machucado nenhum dos
guardas. No fundo, eu sabia que ele não faria isso.
― Você viu Stefano? ― sondou Santiago.
― Não, deve estar fodendo alguém por aí. ― O que não era
mentira. Meu irmão só não sabia que era eu a foda do momento.
Ele bufou.
― Vou procurá-lo, preciso dele ― informou-me, e ouvi seus
passos ao longe.
― Que bom que estamos na mesma sintonia então ―
comentou Stefano parecendo ter comido limão. Antes que eu
dissesse algo, saiu porta afora com uma fúria capaz de derrubar
uma cidade inteira.
Franzi a testa. Por que ele estava reagindo daquele modo?
Foi ele que disse para não contarmos a ninguém, ou seja, eu seria o
seu segredo sujo. Seria melhor acabar com tudo antes mesmo de
começar? Merda, estou fodida de toda forma, pensei amarga. Mas é
bom não sentir dor ao menos por um tempo.
Eu estava mais preocupada com quem estava querendo me
eliminar. Precisava contar aquilo aos meus irmãos. Iria focar nisso e
não em meus desejos carnais.
Fazia dois dias que eu não via Stefano. Poderia ligar para
ele, mas, por mais que eu pegasse o telefone para fazê-lo, não
conseguia prosseguir. Eu era teimosa, e ele também, então ficaria
difícil um dar o braço a torcer. Por isso, foquei no meu trabalho.
Eu tinha ido checar três garotos que foram adotados havia
alguns meses. Era para os pais adotivos manterem contato, e não o
faziam já havia um mês, por isso fiquei encarregada de ir conferir se
existia algum problema.
Rolander e Alonso, os meus seguranças, vieram comigo,
assim eu não ficaria desprotegida caso houvesse um ataque. Era
para eu ter dito aos meus irmãos sobre o fato de que alguém queria
me matar, mas, se o fizesse, eles não me deixariam trabalhar, eu
acabaria confinada em casa. Isso não podia acontecer, eu
enlouqueceria sem ter nada para fazer.
― Senhorita, não devia entrar antes de checarmos o lugar ―
rosnou Alonso.
Não liguei muito para ele e Rolander. Sabia que nenhum dos
dois gostava de ficar de guarda, mas eles não tinham escolha, pois
seguiam à risca as ordens antes do papai... agora do Fabrizio.
― São pessoas normais...
― Está nos chamando de anormais? ― indagou Rolander
com os dentes cerrados.
― Se a carapuça serviu. ― Dei de ombros.
Eu não gostava de, quando fazia meu trabalho, que eu
amava, alguém ficar ao meu lado de mau-humor.
― Por que não ficam no carro e me deixam cuidar de tudo?
Não se preocupem, não direi aos meus irmãos que não estão
fazendo seu trabalho direito. ― Toquei a campainha, ignorando seus
rosnados. Se eles continuassem assim, eu iria chutar suas bundas.
― Já te disseram que você tem a capacidade de fazer o
sangue de qualquer pessoa ferver? Até da pessoa mais calma que
existe. ― Ouvi a voz de Stefano atrás de mim.
Virei a cabeça em sua direção e o vi parado perto da
marquise da casa, de braços cruzados e esboçando um sorriso. Seu
humor havia demorado dois dias para mudar? Logo após sair do
vestiário naquele dia, ele foi lutar num ringue clandestino, e, pelo
que eu soube, a coisa não foi bonita. Santiago relatou que Stefano
parecia puto, para não dizer outra palavra. Achei que ele precisava
se acalmar para conversarmos melhor e eu entender sua reação.
Talvez não fosse só por mim, mas pelo seu amigo também, que não
queria falar com ele.
― Quem disse que você é calmo? ― bufei com escárnio,
voltando a tocar a campainha, mas ninguém atendeu. ― Você
parece um vulcão prestes a explodir, não há um segundo em que
não perca o controle. Aposto que não fica um dia sem querer
estrangular alguém.
Não vou sair daqui sem que eles me recebam!, pensei. Podia
jurar que estavam lá dentro, mas não queriam me receber.
― Não tem ninguém aí ― informou Alonso. ― Fizemos o
nosso trabalho vindo aqui.
― Você é tapado? Devia ser melhor vigilante, ou vai morrer
logo ― avisei, fulminando-o. ― Tem gente espionando lá dentro, vi
uma sombra. Só não quer abrir.
― O que vai fazer? Não pode entrar sem uma ordem judicial
― disse Stefano.
Sorri com as sobrancelhas levantadas.
― Não achei que fosse cumpridor da Lei ― provoquei-o. ―
Talvez devesse deixar de ser um mafioso e se tornar policial.
― Estou bem onde estou. ― Deu de ombros com um sorriso
desafiador.
Revirei os olhos e peguei um grampo de cabelo, curvando-
me para abrir a porta. Sabia que ninguém chamaria a polícia, isso
era certo. Vamos ver se não vão nos receber.
Ouvi o som de um soco, e logo depois alguém gemeu atrás
de mim. Endireitei-me; não queria brigas, muito menos naquele
momento.
― Mas que porra! ― praguejou Alonso tentando recuperar o
ar.
Franzi a testa e olhei para Stefano, que o fuzilava como se o
segurança fosse um inseto que ele queria esmagar.
― Procure outro lugar para olhar ― sibilou, vindo até mim e
pegando o grampo da minha mão. ― Deixe-me fazer isso, é melhor
do que você se curvar e esses idiotas comerem sua bunda com os
olhos.
Eu poderia ter rido disso, mas Stefano já havia aberto a porta
e entrado. Perguntei-me se ele estava com ciúmes, mas o cara não
era disso, não devia nem saber o que a palavra significava. Eu
podia estar sendo arrogante ao julgá-lo, mas não acreditava que ele
sentisse ciúmes, ao menos não de mim.
― Não podem invadir minha casa! ― O senhor Ramoni veio
em minha direção furioso. ― Vou processar você e todos no lugar
em que trabalha!
Antes que ele chegasse a mim, Stefano entrou na frente.
― Acho melhor controlar sua fúria, porque, se encostar nela,
esse chão estará manchado de vermelho sangue em dois segundos
― avisou.
― Foram emitidas várias intimações para o senhor
comparecer ao Conselho Tutelar, mas não apareceu. Agora, quando
precisei vir, estava aqui dentro e não queria abrir a porta. Preciso
verificar Yago, Neto e Paco. ― Os três irmãos estavam sob a
guarda provisória daquele homem e da senhora Ramoni, e eu era a
assistente social que os monitorava.
― Eles não estão ― respondeu o homem. Foi então que
notei o cheiro de álcool.
Fechei a cara.
― Vá buscá-los, pois sei que estão aqui. Deve estar com
medo desse seu bafo de gamba! ― cuspi.
Ele se lançou em minha direção.
― Olha aqui, sua vadia... ― foi interrompido quando Stefano
deu um soco em seu rosto, quebrando seu nariz. ― Vou processá-
los por invasão de propriedade e agressão!
― Falei para ficar longe dela ― grunhiu Stefano.
― Segure as pontas aqui, herói. ― Dei um tapinha em seu
peito. ― Vou procurar os meninos. A vizinha disse que não viu
nenhum dos três sair há dias para brincar.
― Vou com você. Suas sentinelas cuidam desse idiota ―
avisou Stefano.
― Vamos ver se achamos a senhora Ramoni.
Subi a escada com ele. Procuramos em todos os quartos,
que estavam organizados demais.
― Está notando o mesmo que eu? ― sondei ao Stefano.
― Parece como se não tivesse ninguém aqui há muitos dias.
Assenti. Continuamos a checar todos os cômodos, tanto do
térreo quanto do andar de cima, e realmente ali não tinha nada,
nenhum sinal dos meninos.
― Onde alguém poderia esconder o que não quer que
ninguém veja? ― falei comigo mesma, temendo o pior.
Pisquei ao mesmo tempo em que Stefano exclamou:
― O porão! Tudo de ruim pode acontecer em um.
Perguntei-me se estava se referindo a si mesmo, se tinha
sofrido em um. Não duvidava.
― Como alguém que parecia tão simpático se transforma
nesse tipo de pessoa? ― Quando os Ramonis foram adotar as
crianças, mostraram-se pessoas decentes que precisavam de uma
família grande e que adoravam crianças.
― Muitos fazem isso, não querem filhos, os adotam só para
maltratá-los... ― ele se interrompeu assim que comecei a correr
temendo que os meninos estivessem feridos. ― Espera, maldição!
― chamou-me, praguejando atrás de mim.
Ignorei-o, correndo escada abaixo com meus saltos,
esperando não cair.
― Falei que eles não estão aqui! A puta da Grenda os levou
com ela ― disse o homem do sofá.
Algo me dizia que aquilo não tinha acontecido. A vizinha dos
Ramonis disse que fazia dias que as crianças e a esposa não
saíam, e ela não os vira indo embora. Era o tipo de vizinha que
monitora a vida dos outros.
― Onde fica o porão? ― perguntou Stefano.
O homem ficou branco e tentou fugir, mas Alonso o empurrou
no lugar, mantendo-o quieto.
― Fique onde está e responda à pergunta dele. É melhor,
porque, se ele tiver de perguntar de novo, será doloroso para você
― avisou Rolander.
O homem engoliu em seco enquanto Stefano levantava a
camisa e pegava uma faca. Eu sabia que, ante aquele ato, o homem
tinha visto sua arma.
― No corredor à direita ― respondeu por fim, com a voz
tremendo.
Fui na direção indicada, e, no final do corredor, tinha uma
porta, mas estava trancada.
― Deixa que resolvo isso. ― Stefano saiu, talvez indo à
procura da chave.
― Meninos, estão aí? Sou eu, Bella, a assistente social, e
vim saber se vocês estão bem ― falei, tentando ouvir algum som
vindo lá de dentro. Bati. ― Tem alguém aí? Só quero protegê-los, se
estiverem com problemas.
Ser assistente social era o que eu amava fazer, mesmo
disfarçando-me ao trabalhar no orfanato, pois não queria que meus
colegas e empregadores soubessem que eu pertencia à máfia, ou
não me aceitariam. Talvez eu estivesse errada, mas não queria
pagar para ver e acabar tendo de abandonar algo que eu tanto
gostava.
― Neto está machucado... ― Ouvi uma voz fraquinha do
outro lado.
Os pais dos três morreram em um acidente de carro, e eles
não tinham outros familiares, por isso acabaram no sistema.
― Oi, meu amor. Estou aqui para levá-lo ao médico e tomar
conta de vocês. ― Meu coração doía pelos garotos.
― Cheguei. ― Stefano portava a chave. Notei sangue em
sua roupa. Acho que sei como ele a conseguiu...
― Meu bem, se afaste da porta, que vamos abri-la, tá?
Ouvi passinhos lá dentro.
Yago tinha 15 anos, Neto, 10, e Paco, 5. Os irmãos foram
jogados no mundo muito cedo.
Stefano abriu a porta, e senti o odor pútrido do lugar.
Paco estava ajoelhado ao lado de Neto, mas eu não via Yago
em lugar nenhum. O chão tinha sangue por todo o lugar.
― Oi, Neto... ― Abaixei-me para checar seus danos. Pelo
visto, tinha levado uma pancada na cabeça, mas aquela hemorragia
toda não parecia ser dele. Então de quem era? Virei a cabeça e vi a
senhora Ramoni caída em meio ao sangue.
― Porcaria! Será que ela... ― Stefano se interrompeu,
olhando para o garotinho, que estava com os olhos vermelhos de
tanto chorar. Foi checar a pulsação de Neto, mas Paco começou a
gritar de medo dele.
― Ei, querido, ele não vai machucar seu irmãozinho. Stefano
só quer ajudá-lo ― falei com doçura. ― Já o chequei. Está com
pulso, mas acho que ele precisa de um médico. Chame a polícia
também.
― Preferia não fazer isso, pois, quando a polícia chegar, não
vai ter sobrado nada do verme que está lá em cima. ― A voz dele
soou dura.
Paco gemeu baixinho.
― Ei. Paco, certo? ― Stefano se abaixou para ficar da
mesma altura do garotinho. O menino assentiu. ― Só queremos
ajudar seu irmão. Agora, que ele está doente, você é o homem forte
da casa. Precisa ser corajoso, está bem? Pode deixar a gente ver
se tem mais machucados nele?
O menino fitou Stefano um pouco mais e assentiu,
levantando-se. Estava descalço e com os pés manchados de
sangue, assim como a sua roupinha. Aquele garotinho teria muito
com o que lidar. Era desumano o que tinha aturado logo cedo.
Stefano checou Neto, e parecia que ele realmente tinha
sofrido uma pancada na cabeça, mas também estava com algumas
costelas fraturadas.
― Anjinho, onde Yago está? ― perguntei ao Paco.
― O homem mau o levou ― sussurrou, chorando. ― A
senhora Ramoni também está machucada.
― Vamos cuidar dela também ― prometi.
Tentei tirar Paco dali, mas o garotinho não queria sair. Fui até
Stefano, que tinha acabado de checar a mulher.
― Não sobreviveu ― disse baixo para o garotinho não ouvir.
― Os policiais estão chegando. Chamei os que estão na folha de
pagamento do seu irmão, embora minha vontade seja matar aquele
verme.
― A minha também, mas preciso detalhar tudo ao meu chefe.
Não posso simplesmente jogar o que aconteceu debaixo do tapete,
pois os meninos têm que voltar para o orfanato. ― Eu estava furiosa
com tudo aquilo. ― Pode descobrir onde Yago está? Quem é esse
homem que o levou?
― Vamos conseguir localizar o garoto. Vou tirar a informação
do cara antes que a polícia chegue.
― Os outros policiais não podem vê-lo todo estourado
depois. ― Eu desejava o contrário, mas naquele momento teria que
seguir a Lei ou ao menos parte dela, assim não traria problemas
para o meu chefe.
― Tem tortura que não deixa sequelas visíveis, fique
tranquila. ― Ele parecia animado com isso.
Quinze minutos depois, a ambulância chegou e levou Neto e
Paco para o hospital. A polícia prendeu o infeliz do Ramoni. Eu
esperava que ele apodrecesse na cadeia, mas duvidava muito. Só
havia um caminho a se seguir, mas depois eu resolveria isso.
Informei ao meu chefe o acontecido e onde Yago poderia
estar. Stefano tinha feito um bom trabalho com o verme.
Nessas horas, meu trabalho era difícil, porque eu queria
ajudar, mas quase nunca nada podia fazer. Meu peito se apertou,
sensibilizando-se com aqueles garotos. Muitos dos meninos que
estavam sob minha responsabilidade no orfanato passavam por
situações de maus-tratos como aquela.
Após a prisão de Ron Ramoni, fomos ao hospital atrás de
notícias dos meninos. Os policiais pegariam o depoimento deles no
dia seguinte, e eu teria que estar junto, pois eram menores.
― Como eles estão, doutor? ― perguntei assim que o
médico veio até nós.
― Paco está desnutrido, mas não tem ferimentos graves, já
Neto tem algumas fraturas. Acordou agora há pouco, mas não corre
risco de vida.
Assim que o pediatra liberou, fui vê-lo. Estava ansiosa
demais. Stefano me acompanhava. Ele não me deixou nenhum
segundo e não reclamava, como faziam os homens do meu irmão. A
cada dia eu percebia algo em Stefano que me fazia entendê-lo mais
e gostar do que descobria. Ele era muito diferente de sua fachada
arrogante e provocadora.
Entramos no quarto, e avistei Neto deitado na cama e
encolhido. Ao seu lado, Paco dormia.
― Foi a senhorita que nos achou? ― sondou ele.
― Sim. Como está se sentindo? ― Era uma pergunta tola,
mas eu queria ouvir dele.
― Eles me deram remédios, então estou sem dor.
Paco se mexeu e apertou o braço do irmão como se não
quisesse soltá-lo nunca mais.
― Agora eu quero saber o que aconteceu e o que houve com
Yago ― pedi, sentando-me em uma cadeira.
Queria conferir se a versão batia com a de Ron Ramoni só
para conferir se ele tinha mentido, embora achasse difícil mediante
a tortura que Stefano lhe administrou.
― Estava tudo indo bem após a adoção, a senhora Ramoni
era boa e gostava de nós, mas o marido dela jogava muito, sempre
ouvíamos os dois discutindo, mas hoje foi pior. O senhor Ramoni
chegou com dois homens para nos levar como forma de pagamento
de uma dívida, mas, quando souberam que tenho asma, não me
quiseram, e Paco era pequeno demais, então... ― Ele respirou
fundo, tentando controlar a dor na voz.
― Só restou Yago ― terminei a frase por ele. ― Sabe para
onde o levaram?
Ron Ramoni não sabia o local exato, só disse que os
empregados do cassino para o qual devia falaram que a dívida seria
paga se os homens fossem à casa deles para pegar os garotos.
― Enquanto eu estava caído, eles acharam que eu estava
inconsciente e disseram algo sobre um barco zarpar às 8h da noite.
― Piscou, contendo as lágrimas. ― Vão levar meu irmão com eles?
― Vamos trazer Yago de volta ― prometeu Stefano antes de
mim.
Meu coração balançou ante isso. Lancei-lhe um olhar
agradecido por ele estar comigo.
― Sim. ― Eu esperava realmente que sim. ― Agora preciso
ir, mas descanse. Volto para vê-los depois.
― Obrigado por aparecer lá e nos salvar, senhorita ―
agradeceu-me.
Toquei seus cabelos negros e depois os de Paco.
― Faria qualquer coisa por vocês. ― Era verdade. ― Assim
como vou fazer tudo para ajudar Yago a voltar para o seu lado.
Saímos do quarto para deixá-los descansar após tudo que
sofreram. Eu queria ficar com eles, mas precisava encontrar Yago.
Os policiais ainda não tinham ido à procura dele, e eu não sabia por
qual razão.
Só sei de alguém que pode me ajudar a achá-lo e fazer com
que todos os envolvidos paguem caro por ousarem tocar no meu
garoto, pensei amarga.
― Belinda, vamos. Vou levá-la para casa... ― disse Stefano.
― Os policiais não foram checar o porto ainda. Isso significa
que seja quem for que pegou Yago pagaram a eles, né? ― Eu
estava puta da vida com aqueles seres desprezíveis.
― Acredito que sim. Acho que seus irmãos precisam saber
disso caso alguém esteja fazendo negócios em seu território. ―
Puxou-me para o carro.
Ele tinha razão. Como eu mesma não podia ir salvá-lo, meus
irmãos fariam o serviço.
― Vai dar certo ― Stefano me garantiu assim que entramos
no carro e saímos do hospital.
― Faltam menos de duas horas para as 8h da noite! ―
exclamei impaciente. Não podia deixar que levassem Yago para
qualquer lugar que fosse. Peguei meu telefone.
― Para quem está ligando? ― Stefano deu partida no carro.
― Meu irmão. Você está certo, ele precisa saber de tudo e
me ajudar. Não posso ficar aqui parada sem fazer nada.
Fabrizio atendeu no segundo toque.
― Belinda...
― Preciso de sua ajuda. Um dos meninos que cuido foi
sequestrado e vai ser levado em um navio que sai hoje do porto! ―
Minha voz soou alterada. ― Por favor, me ajuda...
Meus olhos estavam molhados. Temia chegar tarde para
impedir que Yago fosse levado para longe dos seus irmãos.
Cumpriria a promessa que fiz a Neto.
Recordei-me do meu pai. Era para ele que eu normalmente
pedia ajuda, embora nada dessa magnitude. Uma vez ele me
auxiliou com o caso de um casal que resolveu usar a criança
adotada como saco de pancadas, como em outros casos parecidos.
Papai sempre lidava com tudo.
― Belinda, respira fundo e me diz tudo que aconteceu. ―
Relatei o acontecimento a ele nos mínimos detalhe. ― Vou cuidar
disso. Agora volte para casa...
― Mas, Fabrizio, eu...
― Você vai ficar de fora e deixar que eu resolva isso ―
ordenou. ― Com quem está?
― Stefano ― murmurei. Queria ajudar, mas, se eu fosse com
eles, poderia atrapalhar meus irmãos quando agissem.
― Me deixe falar com ele ― pediu.
― Ele está dirigindo, mas vou colocar no viva-voz.
― Pode falar ― disse Stefano.
― Mantenha Belinda segura e, por tudo de mais sagrado, a
faça ficar longe dos píeres. Vou encontrar seja quem tenha levado o
garoto.
Eu acreditava em meu irmão cegamente, então me
tranquilizaria.
― Vou tomar conta dela ― Stefano prometeu.
― Faça-os pagar ― pedi. Minha vontade era estar junto
deles, mas ficaria e esperaria.
― Ah, eles vão pagar ― assegurou e desligou.
E se tivessem matado Yago? O garoto era tão gentil,
ajudava-me várias vezes quando eu levava muitos papéis para o
orfanato. Nas festas que tínhamos lá, ele e seus irmãos sempre me
ajudavam a organizar as coisas.
― Ei, vai ficar tudo bem. Eles vão conseguir pegar o garoto.
― Stefano colocou a mão na minha perna, que se mexia
impacientemente. ― Vamos esperar.
Eu esperava que sim, ou Paco e Neto iriam ficar destruídos
por perder alguém que amavam. Eu bem sabia o quanto isso era
difícil, a dor nos seguiria para sempre.
― Estava pensando... E se o que Lyn disse tiver
envolvimento com o que você faz? Ao trabalhar como assistente
social, talvez esteja mexendo em um ninho de vespas e não sabe.
― Stefano me olhou de lado um segundo. ― Quem mais você está
checando? Há algum caso suspeito em que esteja trabalhando?
― Esse eu nem suspeitava. Como não notei? Sou bem
perspicaz nesses casos ― sussurrei.
― Faz quanto tempo que foram adotados? ― questionou ao
virar uma esquina.
― Logo depois que meu pai ficou doente ― murmurei.
― Por isso não prestou atenção, sua cabeça não estava boa,
Belinda, e com razão. Você amava seu pai e queria ficar ao lado
dele. Então nada disso é culpa sua. ― Pegou minha mão com uma
das suas enquanto dirigia com a outra.
Ele tinha razão quanto àquilo. Eu estava de licença para ficar
com meu pai. Mesmo assim, sentia-me culpada por aqueles
meninos terem sofrido tanto.
― Conseguiu falar com Lyn? Se o achasse, poderíamos
perguntar a que perigo ele se referia. ― Por mais que eu pensasse,
não conseguia lembrar-me de nenhum caso que envolvesse alguém
perigoso, que pudesse querer me matar.
― Não, desapareceu de novo. ― Deu um suspiro duro. ―
Procurei-o esses dias, mas não consegui localizá-lo.
― Achei que você estivesse me evitando. ― Olhei para ele.
― A última vez que nos vimos não acabou bem. Você parecia com
raiva.
― Raiva? ― Franziu os lábios, meio desgostoso. ― Acho
que é eufemismo. Não estou acostumado com garotas me dizendo
o que você me disse.
Levantei as sobrancelhas.
― Ficou com raiva daquilo? Stefano, você esmagou um
homem no ringue logo depois. Não creio que fosse só isso, deve ter
tido algo mais. Foi por minha causa? ― O rapaz era uma explosão.
― A minha vida não gira em torno de você ― rosnou, tirando
a mão da minha e apertando o volante.
Um aperto em meu peito me impediu de respirar um
segundo. Estava a ponto de responder, quando meu telefone tocou,
e respirei fundo.
― Bella, pode dar uma passada aqui? ― pediu Jared Calixto,
o meu chefe.
― Aconteceu alguma coisa? ― indaguei preocupada, mas,
se tivesse acontecido algo com Yago, meus irmãos teriam dito.
― Não, mas você precisa assinar alguns papéis sobre o caso
dos filhos adotivos dos Ramonis.
― Estou a caminho ― garanti e desliguei. Depois pedi a
Stefano: ― Pode passar no orfanato?
― Acho que devemos ir para casa...
― Não ligo para o que você acha, só me deixa lá ― rosnei,
perdendo a paciência.
Ele parou o carro bruscamente. Ainda bem que eu estava
usando cinto de segurança.
― Ficou louco? ― grunhi, recuperando o fôlego.
Fuzilou-me.
― Eu, louco? Não, estou puto da vida! ― Enfiou uma das
mãos em meu cabelo e me puxou para si, apossando-se da minha
boca com tamanho vigor que eu apostava que ficaria inchada
depois.
Lutei, empurrando-o a princípio, mas depois desfrutei de seus
beijos, porque era algo que eu estava querendo também desde a
última vez. Eu poderia ficar ali desfrutando por mais tempo daquilo,
mas estávamos no meio da rua, além disso eu estava preocupada
com Yago.
― Stefano ― sussurrei em sua boca ―, não é bom a gente
ficar aqui.
Ele me deu mais um beijo casto nos lábios.
― Sim, vamos para sua casa...
Interrompi-o:
― Meu chefe...
Cortou-me também:
― Cuido disso. ― Pegou meu telefone e discou, mas o tirei
da sua mão e mandei uma mensagem a Calixto dizendo que eu
assinaria os papéis no dia seguinte. Ele respondeu concordando.
― Resolvido. Satisfeito? ― provoquei-o.
― Sim. ― Deu-me outro beijo de leve e voltou a dirigir. ―
Combinaremos uma coisa. Vamos deixar rolar isso entre nós, mas
será sem compromisso. Não posso me envolver com alguém e não
quero magoar você.
Uma parte de mim ficou triste com suas palavras, mas era o
certo a se fazer. Stefano não era um homem com quem eu pudesse
me estabilizar, e, de toda forma, eu não queria sossegar com um
cara só, embora tivesse que fazer aquilo por causa da regra de
nossa família. Eu só tinha um ano para me decidir e escolher um
noivo, ou meu irmão faria isso por mim.
― Tudo bem. Vamos nos ver às escondidas, pois não quero
que meus irmãos saibam e o obriguem a se casar comigo. Eu
mesma quero escolher meu noivo daqui um ano. ― Suspirei. ―
Acha que El Diablo daria um bom marido? Ele é um gato.
Suas mãos apertaram mais o volante. Fiquei surpresa de não
ter quebrado o objeto.
― Vamos deixar uma coisa clara aqui: enquanto estivermos
juntos, você não deve se referir a outro homem dessa forma. ―
Trincou os dentes.
Franzi a testa.
― Stefano, eu não perguntei com quantas meninas você
transou depois que me tocou naquele dia. No fundo, não me importo
com quem foda. ― Dei de ombros, indiferente.
Contudo, era mentira. Eu não gostava de pensar nele
tocando outras mulheres, mas não deixaria que soubesse. Afinal,
ele não era meu.
― Então não fica incomodada que eu diga que fodi uma
mulher ontem? ― Avaliou-me.
Fiz de tudo para manter meu rosto neutro.
― Não, mas vou fazer um ponto e igualar o placar com você.
Se ficou com alguém, agora é minha vez de ficar com outra pessoa
e empatar, não acha? ― Coloquei a mão no queixo, pensativa. ―
Hummm... quem vou escolher...? El Diablo é um deus sarado...
― Mas que porra! ― rosnou parecendo um leão assassino.
― Não fodi ninguém, então pare de escolher homens com quem
foder!
Aproximei minha boca da dele.
― Não sou ciumenta, Stefano, mas você é. Vejo isso toda
vez que menciono outro homem. Noto a fúria que nasce em seu
peito, a ponto de ficar louco para esquartejar alguém.
― Não gosto de pensar em outra pessoa tocando você ―
sibilou. ― Muito menos El Diablo. Só de pensar nele... ― Sacudiu a
cabeça como se não quisesse pensar nisso. ― Sinto vontade de
matá-lo.
― Então vamos fazer assim: enquanto estivermos nos vendo,
não vamos ver outras pessoas, e, se você quebrar essa promessa,
terá o troco que merece, porque sou daquelas que acredita no
ditado “aqui se faz, aqui se paga” e com juros. ― Sorri, recostando-
me no banco.
― Vingativa, né? ― Ele riu, parecendo deliciado com isso. ―
Certo, não quebrarei minha promessa. Nunca faço isso.
Suas palavras chamaram minha atenção. Parecia que ele
realmente cumpria o que prometia. Seria por que tinha quebrado
alguma promessa antes e isso o machucava? Uma vez quebrei a
minha com Lorena, por isso fazia de tudo para cumprir o que jurava.
― Combinado ― assenti.
Meu telefone tocou quando o carro estava chegando em
casa, e atendi, porque era meu irmão.
― Fabrizio! E aí, conseguiram encontrar Yago? ― Estava
impaciente no banco.
― Achamos o garoto. Ele está bem, não houve danos. O
levamos ao hospital para ficar com os seus irmãos.
Franzi a testa.
― Tem mais alguma coisa? ― Sua voz estava estranha, para
não dizer letal.
― Tinham mais garotos no local, entre 10 e 15 anos. Nós os
libertamos também. ― Ele estava furioso.
― Essas pessoas os queriam para quê? ― Se fossem
garotas, provavelmente seria para vendê-las. Ainda bem que minha
família não lidava com isso, aliás, todos nós repudiávamos
prostituição infantil e escravidão sexual. Eu sabia que tínhamos
prostitutas trabalhando nos clubes de nossa família, mas elas eram
maiores e não eram forçadas.
― Não sei. Vou descobrir e fazer pagar quem ousou entrar
em meu território e pensar em cometer tal ato.
Eu confiava que assim seria feito.
― Os outros garotos vão ser levados para suas famílias? ―
sondei.
― São todos de orfanatos. Acredito ser uma rede de
corrupção que os tenha pegado. ― A fúria estava em cada palavra
sua. ― Vou precisar ir para confirmar essa suspeita. Depois nos
falamos.
Desligou, mas fiquei encarando o telefone.
― O que aconteceu? O que Fabrizio disse?
― Encontraram Yago. Ele não estava ferido e agora está com
os irmãos.
― Então por que você está assim? Não era para ficar feliz?
― Franziu a testa.
― Foram encontrados mais garotos no local. Meu irmão vai
buscar saber mais sobre o assunto. O que me incomodou foi saber
que são residentes de orfanatos. ― Quem faria algo tão terrível?
Para que os queriam? O que os obrigariam a fazer?
Stefano ficou paralisado, mudo, e tive de sacudi-lo até ele
sair do seu transe.
― O que foi? ― sondei.
Ele tentou disfarçar, mas percebi que algo naquela história o
atingia, pois eu jamais tinha visto o mesmo terror em seus olhos. Ele
parecia estar consumindo-se em chamas.
Todo o meu corpo tremeu ao saber que os garotos eram de
orfanatos. Isso me lembrava dos meninos que estavam presos
naquele inferno havia tantos anos. Todos eram órfãos e não tinham
ninguém a favor deles, por isso aquela quadrilha cometia aquela
atrocidade. Achei que tivessem encerrado a porra toda, mas, pelo
visto, não, era como um câncer criando ramificações.
― Stefano, o que está acontecendo? ― sondou Belinda ao
meu lado.
Eu tinha estacionado em frente à casa dela havia alguns
minutos, mas não saí do carro. Precisava checar como andavam as
coisas e ir ao cativeiro onde os bandidos provavelmente estavam
presos. Certamente Fabrizio deixara uns vivos para descobrir a
verdade. Eu precisava estar lá agora para descobrir quem estava
por trás disso. Lyn devia saber, mas ele tinha sumido. Isso me
deixava ainda mais furioso. Poderia ao menos me revelar a verdade.
― Você devia entrar. ― Indiquei a casa, mas Belinda não
saiu do lugar, só cruzou os braços. Isso era bem típico dela, a
tenacidade, algo que eu adorava, mas agora, nem tanto.
― Me diz o que está havendo! ― exigiu. ― Não saio daqui
antes de saber.
Eu não queria revelar tudo sobre mim, mas precisava ao
menos lhe dizer algo para fazê-la me deixar ir.
― Não gosto de nenhum tipo de rapto envolvendo crianças.
Isso me deixa irado. Quero participar da tortura que seus irmãos
certamente estão fazendo neste momento ― anunciei, revelando
um pouco da verdade.
Meus pensamentos turbulentos me incomodavam um pouco.
Não queria ficar longe dela, pois era a única que aquietava um
pouco o que eu sentia.
― Então dê meia-volta, pois vou com você. E nem adianta
me dizer o contrário ― frisou decidida.
― Belinda...
― Chega de papo! Se você for lá, vou junto. Quero ver os
malditos que ousaram pegar meus garotos! ― rosnou. ― Se meus
irmãos deixarem, quero ter minha vez com eles.
― Seus garotos? ― Ri. Só ela me faria rir da forma como eu
estava me sentindo.
Liguei o carro e saí da propriedade. Sabia para onde eles
levavam os miseráveis que deviam ser torturados.
― Cuido deles há algum tempo. É minha função encontrar
um lar em que sejam bem-cuidados e amados. ― Suspirou triste. ―
Só me descuidei com os meninos Laions, mas não vou fazer isso de
novo.
Respirei fundo.
― Não é sua função cuidar de tudo. Você é só uma
assistente social, Belinda, embora uma diferente, que abre a porta
de uma família com um grampo de cabelo para salvar meninos
maltratados. ― Olhei-a de lado, admirado pelas suas qualidades. ―
Ou que pede para os irmãos resolverem quando os garotos do seu
orfanato sofrem com maus tratos.
Aquela agonia em meu peito estava passando pouco a pouco
enquanto conversávamos.
― Meus superiores não podem saber disso. Eles nem sabem
quem sou realmente, e vamos deixar assim. Sempre procuro
pesquisar o passado dos candidatos à adoção, só vacilei, como
sabe, com esses meninos devido a tudo que passei. ― Olhou para
as mãos no colo, triste.
― Eles vão ficar bem, vamos fazer de tudo para que fiquem.
― Eu cumpriria essa promessa.
― Sim, nós iremos, mas estou preocupada com os outros
garotos. Por que sequestram meninos? Será tráfico humano?
Sexual, não acho provável, acredito que seja mais para venda de
órgãos. É um mercado muito lucrativo.
Muitas máfias faziam esse tipo de “negócio”. Ainda bem que
a da minha família, bem como a máfia Pacheco, não concordavam
com aquilo. Eu não queria responder afirmativamente ao comentário
de Belinda, pensava a mesma coisa, embora não tiraria a parte
sexual da coisa toda. A prostituição infantil não envolvia apenas
meninas. Se o que estava acontecendo fosse o que eu acreditava,
abusos sexuais podiam estar acontecendo, então precisávamos
cortar o mal pela raiz.
― Vamos esperar que não seja isso. ― Peguei sua mão. ―
Seus irmãos não vão gostar de vê-la lá.
― Como se você ligasse para o que eles pensam. ― Revirou
os olhos.
― Você tem razão. ― Conversar com ela aliviava minha
tensão.
― É bom ter ao meu lado alguém que não borra nas calças
com medo dos meus irmãos.
― O que a faz pensar que não tenho? ― De fato, eu não
temia ninguém, só tinha medo de algumas situações, como perder
pessoas com as quais me importava.
― Stefano, estamos tendo um caso. Sabe qual dos homens
do meu irmão faria isso? Nem Javier me quis por temer perder a
cabeça! ― Ela riu com isso.
― Javier? ― Ele era o executor da máfia Pacheco, assim
como Valentino. Belinda teve algo com aquele homem? Por que
será que não gostei? Bem, isso faz parte de seu passado, pensei.
― Sim. Eu tinha uma queda por ele, mas o tapado falou que
não ia me tocar se eu não me casasse com ele. ― Bufou,
parecendo tão linda. ― Se fosse por mim, nem existiriam
casamentos, só curtição, mas os anciões e suas regras estúpidas...
De qualquer forma, foi ele que perdeu.
― Com certeza perdeu. Azar para ele, sorte para mim. ― Eu
o entendia. Para tocar naquela mulher, precisaria ter muitos colhões,
e mesmo um executor teria de seguir as ordens do líder. Ainda bem
que Fabrizio não era meu chefe. Quanto ao meu irmão, ele podia
ficar puto comigo, mas jamais me mataria, como Fabrizio faria com
Javier. Se ele soubesse que eu a havia tocado e que pretendia fazer
com ela mais ainda do que já tinha feito, com certeza eu estaria
morto, assim como o desgraçado do “ex” dela.
― Talvez eu aceite sua mão no final. ― Ela parecia triste com
essa ideia.
― Não deve se casar com quem não quer, Belinda. ― Eu
achava isso uma merda. Ninguém deveria ser forçado a fazer coisa
alguma. Aqueles estúpidos! Bem que os irmãos dela poderiam fazer
alguma coisa e mudar aquela lei.
― Vou seguir as regras da minha família, jamais irei contra
elas, mas vou aproveitar esse tempo de solteira que me resta. ―
Sorriu para mim, colocando a mão em minha calça e dando uma
leve apertada. ― Adorei tudo que fizemos.
Porra, ela era tão sexy e tentadora como o pecado, como
uma deusa encantadora que enfeitiça os homens. Uma sereia. Isso,
Belinda tinha o encanto de uma sereia. Graziela me obrigou a ler
para ela um livro com esses seres míticos. Aquela mulher ao meu
lado no carro tinha o mesmo poder das sereias, pois enfeitiçava
qualquer um.
Eu não gostava de pensar nela com outros homens, fossem
quais fossem, mesmo seu futuro e hipotético noivo. Ainda assim,
quando terminasse o que tinha ido fazer na Espanha, iria embora, e
tudo que vivíamos seria uma mera lembrança. Eu não podia ficar
com ela, então desejava que o homem com quem ela se casasse a
fizesse feliz.
Merda, então por que meu intestino está torcido? Era como
se algo estivesse dando nós dentro de mim.
― Belinda... ― Ela acariciava meu pau por cima do jeans,
fazendo-me gemer.
― Se concentra na estrada, que eu cuido de você. ― Abriu
meu zíper antes que eu pudesse pensar direito. ― Nunca chupei um
pau. Estou curiosa para saber qual é o sabor.
― O que você... ― Meus pensamentos fritaram assim que a
Diabinha abaixou a cabeça e abocanhou meu pau, sua boca macia
e quente levando-me à loucura.
O carro dançou na estrada. Tive que lembrar que estava
dirigindo para manter a mente sã. Merda, mas era difícil. Como eu
manteria o controle, quando seus lábios agarraram a coroa e a
sugaram firme, da forma que eu gostava?
― Porra! ― praguejei, dirigindo para uma rua mais deserta,
não muito longe do local onde os irmãos dela estavam. Mesmo com
os vidros escuros, não queria que ninguém a visse daquela forma.
Era uma visão somente para mim.
Estacionei e segurei seus cabelos, mas não a forcei a ir mais
fundo.
― Isso, aperta e chupa mais ― rosnei, levantando meus
quadris para lhe dar mais acesso.
Eu já havia tido muitos boquetes desde que era novo, meu
pai mandou prostitutas até mim, dizendo que eu precisava virar
homem. Tentei evitar esses pensamentos, porque não queria
estragar aquele momento. Entretanto, era impossível a comparação
com as outras mulheres, porque o boquete de Belinda, a forma
sedutora como ela fazia, seus sons, tudo era tão perfeito.
Sua língua triscou no meu apadravya, e fechei os olhos,
tomado de desejo.
― Se não quiser que eu goze em sua boca, precisa tirar. ―
Merda, essa era a última coisa que eu queria, mas não desejava
que ela fizesse nada para o qual não estivesse pronta.
Belinda não só não tirou meu pau de sua boca, como
também acelerou mais os movimentos de sua língua e seus lábios,
fazendo justamente como eu disse para ela fazer antes. Parecia
uma profissional, embora eu soubesse que nunca tinha feito aquilo,
e eu lhe agradecia isso, porra!
Nunca gozei tão forte e rápido como naquele instante, e não
era só por não ter ficado com ninguém fazia algum tempo, essa
minha atração por Belinda me tornava cada vez mais louco por ela.
Eu a queria para mim. Não podia, mas era egoísta demais para me
afastar depois que a havia tocado. Parecia que, quanto mais a
tocava, mais desejava.
Ela afastou a boca com um sorriso sensual.
― Está satisfeito? ― provocou, lambendo os lábios. ―
Assisti a muitos vídeos ontem para aprender.
Eu ri.
― Excepcional. Merda, nunca gozei tão rápido. ― Coloquei a
mão em seu cabelo e a puxei para mim, tomando conta de seus
lábios. Eu nunca me cansaria de beijá-los.
Ela gemeu em minha boca.
― Chupar meu pau te deixou com tesão? ― perguntei,
mordiscando seu lábio inferior.
Ela sorriu.
― Não faz ideia ― declarou, abrindo suas pernas. ― Quer
conferir? Tão molhada que estou toda encharcada.
― Com o maior prazer. ― Levei minha mão até entre suas
pernas, mas, antes que eu a tocasse, uma buzina nos fez pular. ―
Maldição! Vou matar seja quem for por atrapalhar esse momento.
Olhei para o retrovisor buscando qualquer perigo, mas não vi
nenhum. Mesmo durante nossos “amassos”, eu checava cada
canto, mas, pelo visto, fiquei inebriado demais durante o orgasmo.
Só aquela mulher tinha esse poder sobre mim.
Havia atrás de nós um Porsche vermelho que eu conhecia
bem. Isso não me ajudou em nada. Abotoei rápido a minha calça,
enquanto Belinda ajeitava o seu cabelo, que eu tinha amassado.
― Acho que a parte de matar vai ter que deixar para outro dia
― ela brincou. ― Deixa que eu invento uma desculpa para
estarmos parados aqui, assim ele não pensará que estávamos
ficando um com o outro.
No fundo, queria que ele soubesse, mas então me recordei
do que prometi ao Alessandro, uma promessa que estava
quebrando, e não gostava de quebrar nenhuma. Entretanto, era
incapaz de ficar longe daquela mulher, ainda mais após tocá-la.
― Pode tentar, mas duvido que ele vá acreditar. Valentino é
muito perspicaz. ― Suspirei e abri a janela assim que ele se
aproximou com a expressão tão sombria como a noite.
― Posso saber por que estão parados aqui? ― indagou de
forma letal, fuzilando a mim e depois à irmã. ― E você não devia
estar em casa?
Belinda saiu do carro e ficou na frente do irmão.
― Posso falar a sós com você? ― perguntou e o puxou antes
que ele respondesse.
Franzi a testa. Por que ela não podia falar na minha frente?
Que tipo de desculpas inventaria?
Ela disse algo e apontou na minha direção, então Valentino
me olhou por um segundo e depois assentiu. Qualquer coisa que ela
falou, pareceu acreditar nela. O que aquela Diabinha estava
aprontando? Nada vindo dela era bom. Eu não duvidava nada que
estivesse falando algo de mim que eu não gostaria.
Belinda entrou no carro de Valentino, e ele indicou que eu
prosseguisse sozinho. Não parecia furioso ou querendo arrancar
meu pescoço. Eu não acreditava que o venceria em uma luta, acho
que empataríamos. O homem era muito bom, assim como Razor, o
irmão de Mália.
Não discuti, mas estava curioso com o que ela disse para ele.
Depois descobriria.
Respirei fundo, sentindo o cheiro dela, que ficou no carro. A
menina me deu um boquete excepcional, e eu nem pude retribuir.
Percebi o quanto ela estava com tesão. O idiota do irmão dela
estragou o clima.
Agora eu focaria em fazer aqueles malditos pagarem caro.
Depois iria para ela, Belinda, a única que me fazia sentir como se
estivesse perto do Sol.
Chegamos a um clube de stripper chamado Fuego. Um dos
locais para os quais os Pachecos levavam os inimigos para serem
torturados era o porão daquele clube, o mais perto do píer. Ali,
aqueles monstros iriam se arrepender do que fizeram.
Saí do carro e fui até Valentino e Belinda, que já estavam me
esperando para entrarmos no local.
― Belinda não deveria estar aqui ― recriminou-me ele.
― Você deve dizer isso a ela. ― Suspirei. ― Sua irmã é
muito teimosa.
― Eu estou aqui, pessoal, não falem como se não estivesse
― ela rosnou. ― Se não quer que eu participe da tortura, posso
ficar me divertindo na pista de dança.
Olhei seu corpo. A mulher faria um sucesso com aquela
roupa rosa justa, uma saia e um top, um estilo diferente para uma
assistente social em trabalho de campo.
― Você vai ficar com Santiago em uma das salas VIP. Não
queremos que presencie algumas coisas lá embaixo ― falou
Valentino decidido.
― Sabe que nada do que eu visse lá me faria mal. Aliás,
quero que eles paguem por ter sequestrado Yago e os outros
garotos. ― Ela foi sincera.
Isso foi o que mais me chamou atenção nela desde o
começo. Belinda era uma mulher que não temia nada, não se sentia
mal quando via sangue. Se fosse qualquer outra garota, estaria em
casa chorando traumatizada. Já ela decidiu ir ali participar da tortura
dos miseráveis sequestradores e, de bônus, ainda me deu um
boquete impressionante no caminho, um que me deixou até o
momento de pernas bambas.
― Farei o que você “pediu”, ficarei na sala VIP, embora
quisesse ir para lá. ― Ela entrou mal-humorada no lugar agitado.
Valentino deu um suspiro duro e a seguiu. Fiz o mesmo, com
minha atenção no local, checando a minha retaguarda. Enfim meu
cérebro estava funcionando.
Senti como se fosse observado, então olhei ao redor
acuradamente, mas não vi nada. Não era a primeira vez que eu
sentia isso. Aconteceu o mesmo no cemitério, mas ignorei a
sensação e, por isso, quase fui morto e levei Belinda comigo.
Eu sabia que ela não queria que ninguém soubesse do que
Lyn nos avisou, mas eu precisava revelar tudo aos seus irmãos. Não
era seguro guardar deles aquele tipo de informação, embora eu não
quisesse quebrar sua confiança em mim revelando tudo sem que
ela permitisse.
Depois eu iria conversar com ela e Alessandro sobre o
assunto. Poderia ter feito isso durante os dias em que fiquei com
raiva de Belinda após sua indiferença, mas estava irado demais
para tal ato durante aquele tempo.
Belinda foi até onde Santiago e Benjamin estavam.
― Sabia que ela o dobraria para trazê-la aqui. ― Santiago
sacudiu a cabeça, desgostoso.
― Se não fizesse, não seria a Belinda. ― Benjamin deu um
suspiro cansado.
Ele tinha razão, embora a Diabinha não tenha me dobrado,
não de certa forma. Eu quis trazê-la após ela insistir, sua presença
me fazia bem.
― Vocês me conhecem. ― Sorriu travessa, entrando na área
VIP com seu irmão.
Deixei isso de lado enquanto seguia Valentino pelo corredor,
indo para os fundos do estabelecimento. Depois entramos em um
elevador e descemos.
Meu telefone tocou, fazendo-me franzir a testa, pois não
reconheci o número.
― Alô?
Valentino ergueu as sobrancelhas, mas não disse nada,
embora eu soubesse que estava alerta.
― Vocês estão com os homens que sequestraram os garotos
e os levaram ao porto. ― Não era uma pergunta feita com a voz que
eu reconheceria em qualquer lugar, mas uma declaração.
― Sim. O que sabe sobre isso? ― sondei, com meus pelos
eriçando-se.
― Não precisa saber os detalhes agora. O que importa é que
necessito que extraia uma informação deles para mim. Eu mesmo
poderia invadir o local e descobrir, mas você se importa com essa
família, então deixarei que faça o serviço. ― Lyn parecia um pouco
tenso, o que era estranho da parte dele, pois não mostrava suas
emoções para ninguém.
Eu poderia retrucar por ele não me revelar muito, mas estava
curioso sobre o que ele queria saber.
― O que é?
― Pergunte quantas Prometheus existem e onde ficam.
Extraia essa informação como foi criado para fazer. Sabe que eles
não vão falar facilmente, pois não se importam se vão viver ou
morrer. Só há uma maneira de fazê-los falar qualquer coisa.
― Eu... ― Executar um animal daqueles não me
incomodava, mas extrair informações da forma como ele pediu? Eu
seria capaz de fazer aquilo sem que as lembranças me
consumissem? Esperava que sim, mas e se não... Não queria
pensar naquilo no momento, precisava confiar que tudo daria certo.
― Você consegue. Esses lugares para o qual estão levando
os garotos são iguais àquele em que fomos treinados como
assassinos. Preciso saber onde eles ficam para poder resgatar mais
meninos que foram levados para lá. ― Soltou um suspiro.
― É isso que esteve fazendo todo esse tempo? ― sondei,
querendo que me dissesse mais.
Eu também sempre procurava algo do tipo para poder
desarmar a merda toda. Os que encontrei não eram iguais, não tão
pavorosos, até achei um parecido, mas que já tinha sido desativado,
mas, pelo que percebi, não pesquisei fundo o suficiente.
― Sim. Esse é o motivo para eu não ter ido até você antes,
mas depois nos falamos. Agora você precisa conseguir essa
informação deles.
― Vou fazer isso ― finalmente prometi e desliguei com um
suspiro frustrado.
― Quem era? ― perguntou Valentino.
― Lyn. ― Não achei necessário mentir. Além disso,
estávamos perto, ele devia ter ouvido algo.
― O que ele queria?
― Me pediu para extrair informações que os crápulas aqui
têm.
― O que você poderia fazer que nós não podemos? ― Bufou
com escárnio.
― Não é só torturar com pancadas e outros métodos
conhecidos. Precisa ir mais fundo que isso e saber perguntar as
coisas certas. Deixa comigo, que sei como fazê-los falar. ― Saí do
elevador assim que ele parou no porão.
O lugar fedia a sangue e alvejante, embora isso em breve
pudesse mudar um pouco, pois eu teria que deixar o monstro em
mim sair para executar o que precisava ser feito.
Havia dois dos caras ainda vivos. Os outros estavam mortos.
Alguém tinha começado a tortura antes que chegássemos.
Fabrizio estava enrolando as mangas da camisa. Eu podia
ver o sangue nelas.
― O que descobriu? ― indagou Valentino.
O chefe dos Pachecos me olhou com os olhos estreitos.
― Nada ainda, mas vamos ver o quão bons eles são em ficar
mudos ― disse a ele e depois a mim. ― Não era para a minha irmã
estar em casa agora?
― Não vou forçá-la a fazer o que não quer e nem sei se
consigo. Sabe a irmã que tem. ― Indiquei os caras. ― Posso ter um
deles? Estou precisando me exercitar após toda essa merda.
Fabrizio assentiu. Não falou mais sobre Belinda. Ele a
conhecia, embora soubesse que, se o irmão desse a ordem, ela
teria ficado. A única coisa que ele ordenou para ela foi que não
ficasse longe de mim.
― É todo seu, pode escolher.
Chequei os dois e fui ao da direita, no qual notei um pouco de
medo, embora ele se esforçasse para não demonstrar.
― Valentino, pegue-o e o coloque de bruços sobre a mesa ―
pedi enquanto ia até os objetos de tortura pegar o que eu precisava.
O cara arregalou os olhos. Alguém já devia ter feito aquilo
com ele; Valentino, no entanto, não demonstrou nada, só fez o que
eu pedi.
― Prenda as mãos dele para cima. ― Peguei uma barra de
aço parecida com um taco de golfe, mas essa tinha vários grampos
como se fossem dentes de tigre metálicos.
― O que você pensa que vai fazer... ― o cara começou a
falar, mas o ignorei.
― Prenda as pernas dele e rasgue suas roupas de baixo. ―
Fiquei na frente do homem enquanto Valentino fazia o que eu pedia
sem reclamar ou perguntar os motivos.
― Mas que droga acha que vai fazer?! ― gritou o infeliz ao
ver o que eu tinha na mão.
― Se recorda disso? ― Levantei o objeto. ― Isso vai ser
colocado atrás de você caso não me diga o que eu quero saber. Seu
dono deve ter feito essa mesma coisa, não é?
Não com um objeto com aqueles dentes de aço, ou eles não
teriam sobrevivido para estar ali.
― Não tenho dono! ― Cuspiu sangue.
Sorri frio.
― Não? Esse número em seu peito comprova o contrário ―
indiquei. Era o número 8. Esse número me trouxe lembranças que
eu não queria no momento.
Foquei no agora, pois eles eram bons em ler as pessoas, e
eu não queria que tivessem vantagem sobre mim.
― Como sabe sobre isso? ― questionou o outro homem
encolhido. Alguém certamente tinha “brincado” com eles.
Os monstros daqueles lugares eram doentes e muito
perspicazes em inventar coisas que matavam o interior dos garotos
aos poucos, até não restar nada além de um corpo ambulante.
― Fiquei dois meses em uma prisão parecida com a sua e
acredito que passou mais coisas do que passei e presenciei, mas
aprendi muito lá, incluindo os medos dos garotos. ― Fui para trás
dele. ― Sei o que todos mais temem em um inferno como aquele.
Eu não gostava de pensar em fazer aquilo. Sentia-me tão
sujo como aqueles malditos.
― Valentino e Fabrizio, façam a mesma coisa que eu fizer
com o outro ― mandei, focado no presente e expulsando as
lembranças atormentadas.
Os dois indivíduos começaram a se apavorar.
― Só há uma chance de não fazermos isso, que é nos dar o
que queremos ― rosnei.
― O que é?! ― gritou assim que abri suas pernas com um
chute entre as canelas.
― Quantas Prometheus são e onde ficam? ― Pedi
mentalmente que me dissesse, assim eu não faria o que Lyn pediu.
Naquele inferno, ninguém temia a morte, mas sim ser
abusado. Todos queriam ficar no topo nas lutas, assim não seriam
obrigados a sofrer aquela atrocidade.
― Não vão escolher? Bom, então não me resta outra opção.
― Respirei fundo, preparando-me.
Tinha que haver outra forma de extrair informações deles,
mas qual? Se não fizéssemos aquilo, jamais saberíamos onde mais
garotos estavam sendo mantidos presos e torturados.
― Vocês não sabem com quem estão lidando! ― o cara que
estava com Valentino disse após ser dobrado sobre outra mesa.
― Vocês é que não sabem do que somos capazes, mas
vamos estripá-los, aí terão uma dose de seu próprio remédio ―
rosnou Fabrizio.
― Não tenho uma barra de ferro, mas acho que isso vai
servir. ― Valentino pegou um taco de beisebol com arame farpado
na ponta.
Os olhos dos miseráveis se arregalaram. Eu poderia me
solidarizar com eles por terem tido uma vida ruim, mas no final
temos escolhas a fazer, o lado certo ou o errado. Pelo visto, eles
foram para o errado, sequestrando mais meninos inocentes como
um dia eles próprios foram para levá-los para um inferno da mesma
proporção daquele em que viveram.
― O que vai ser? ― inquiri, colocando a arma em suas
costas e o deixando ainda mais tenso. ― Dez segundos. Assim que
eu descer esse ferro, ele não sairá mais, embora eu deva te mostrar
a proeza dele, o estrago que faz.
Apertei o botão do objeto, então ele gritou após receber um
choque.
― Pouquíssima voltagem, mas, lá dentro, será no limite.
Então vão querer que façamos isso ou morrer com honra como em
uma batalha? ― Precisava que tomassem a decisão certa. Não era
só chegar socando, mas induzi-los a fazer o que os honrariam em
sua morte, não agirem mais de modo fraco como foram criados até
se tornarem o que eram.
― Onde ficam as Prometheus? ― repeti a pergunta algumas
vezes. Sabia que não podia demorar mais, ou ele acharia que eu
não conseguiria fazer aquilo. Porém Valentino não parecia tão
avesso a prosseguir.
Alguns minutos depois, estávamos com o nome de um dos
locais, pois os caras só sabiam na hora, quando fossem levar os
garotos ao lugar.
― Celulares? ― Virei-me para Fabrizio.
― Criptografados. É incapaz de nós os rastrearmos ―
respondeu com a expressão sombria.
― Deviam ter escolhido outro caminho, mas, ao invés disso,
vocês levam garotos para terem o mesmo destino que o seu. ―
Minha fúria ultrapassava o auge.
― Não temos escolha! Você passou um tempo no inferno,
como disse, mas esse é pior! Não levam só nossa humanidade, mas
também nos deixam como zumbis. Agora têm o que querem, então
façam o que têm de fazer. A morte é mais prazerosa do que o
castigo naquele inferno. ― Essas palavras foram ditas pelo Jet
havia muitos anos, antes de ser morto...
Agora têm o que querem, então façam o que têm de fazer. A
morte é mais prazerosa do que o castigo naquele inferno, entoei em
minha mente.
Meu sangue fervia e meus ossos doíam. Tudo se tornou
nebuloso. Eu ouvia vozes, mas achava que a escuridão era demais
para ser arrastado de volta. Não havia ninguém que conseguisse...
As lembranças me sufocavam. Eu sentia como se o ar
estivesse me faltando.
― Stefano... ― Aquela voz calma e tranquila... Seria ela
capaz de me trazer daquele tormento sem fim?
Algo como calor me tocou, depois a escuridão me levou para
um caminho sem pesadelos, mas e quanto à luz? Iria conseguir me
alcançar algum dia?
Tinham se passado alguns dias após o episódio no porão dos
meus irmãos. Eu estava com Santiago e Benjamin, mas os convenci
a me deixar ir lá embaixo.
Não esperava a cena que vi. Corpos mutilados, sim, mas não
Stefano preso no chão por Fabrizio e Valentino e alguns dos
homens que os estavam ajudando. O lugar estava destruído, como
se um furacão tivesse passado por lá. Um furacão chamado
Stefano.
Seus gritos eram tão torturantes e enervantes que rasgaram
um pedaço de mim. Na hora corri até ele, ignorando o alerta dos
meus irmãos.
Tentei chamá-lo e tirá-lo do tormento que estava vivendo,
mas não consegui, então Santiago injetou um remédio em seu braço
que o fez apagar.
Depois disso, não o vi mais. Soube então que tinha uma luta
reservada para ele no clube de meus irmãos mais tarde. Tentei ligar,
mas não recebeu minhas ligações, então achei que precisasse de
tempo.
Ninguém falou da sua crise depois. Eu nem sabia se ele se
lembrava de algo, pois não conversamos. Fiquei preocupada, mas
meus irmãos disseram que ele estava bem.
Eu queria arrumar uma forma de ajudá-lo, mas como? Para
fazer isso, era preciso ele me deixar entrar, o que não parecia ser a
sua intenção. Além disso, eu queria mesmo me envolver com ele
mais do que já estávamos? Seria capaz de lhe dar meu coração só
para ele quebrá-lo no final?
Respirei fundo e olhei para o ringue de lutas clandestinas no
submundo de Barcelona. Ali era onde todos faziam apostas altas
por um vencedor. Auxiliar minha família ali, cuidando para que as
regras fossem cumpridas, ajudava-me a manter a mente ocupada.
Trabalhar evitava que eu pensasse tanto na perda do papai, que
ainda me machucava como uma navalha cortando meu peito, como
em Stefano, pelo que ele devia ter passado. Eu não sabia o que
aconteceu com ele para ter aquela crise, mas a coisa não devia ter
sido bonita.
Nesse momento, Stefano e outro cara estavam no ringue. Ele
tinha vencido algumas lutas na noite passada e na anterior, mas não
vi essas porque estava no trabalho no orfanato.
― Se continuar assim, vamos ficar sem lutadores ―
praguejou Gideon, trazendo-me dos meus pensamentos.
Ele era o homem que organizava as lutas.
― O que aconteceu? ― Encarei o ringue, onde Stefano
estava detonando um dos lutadores.
― Toda vez que ele entra no ringue, o seu oponente sai
morto, embora eu não ligue, pois ele só escolhe lutar com seres da
pior espécie, mas existem lutas que não são mortais. Logo ninguém
vai querer enfrentá-lo de verdade. Ele ao menos devia deixar alguns
vivos, quebrados, mas vivos.
― Por que não o impede que mate mais? ― indaguei com
um suspiro.
Sacudiu a cabeça.
― Valorizo minha vida ― respondeu, dando as costas e
saindo para checar os próximos lutadores.
Inspirei e fui até Santiago, que estava de braços cruzados
encarando Stefano, imóvel e sem dizer nada para impedir que ele
esmagasse o seu oponente. Eu sabia que não era por medo. Às
vezes sentia que meus irmãos me escondiam algo, eu só não tinha
ideia do que era. Algo me dizia que era sobre Stefano, por isso ele
fazia o que bem queria e ninguém dizia nada.
Não acreditava que fosse pelo surto de Stefano, afinal sentia
que me escondiam algo antes disso. Depois iria apurar o assunto e
descobrir se era só coisa da minha cabeça.
― Vai ficar aí só olhando, vendo-o eliminar todos os
lutadores? ― indaguei irritada. ― Ele não pode matar o seu
oponente se as lutas não forem mortais.
― Os espectadores estão gostando, e estamos ganhando
muito dinheiro com isso. ― Olhou-me de lado com um meio-sorriso.
― Se isso for demais para você, pode ficar no vestiário ou no
escritório.
Não era porque eu sabia o que acontecia na máfia e o que
faziam que eu gostava de presenciar mortes. Sempre que havia
lutas mortais, não assistia a elas, embora não saísse do local. Não
queria que as pessoas me achassem dócil demais, porque eu não
era.
Com Stefano no ringue, podia se esperar tudo. O homem
parecia um vulcão prestes a entrar em erupção.
― Não vou sair. ― Cruzei os braços, encarando a cena.
Stefano era veloz, brutal, encarando seu oponente, que tinha
um corte na boca e estava meio torto. Seu olhar era provocativo,
mas tinha algo neles que parecia vazio, morto. Eu via esse olhar
direto em Valentino. Seria por isso que Stefano tinha ficado louco
naquele dia? Não, não era loucura. Ele estava tomado de dor e
tormento.
Ele estava ali naquela noite para descontar nos seus
oponentes tudo que sentia, isso era um fato, mas percebi que, no
início das lutas, deixava-se levar algumas porradas. Eu o conhecia e
sabia que podia se defender, mas não o fazia. Isso me fez lembrar
do que ele me disse no cemitério sobre gostar de sentir dor. O que
ele estava sentindo era assim tão ruim a ponto de querer sentir dor
para aliviar? O meu coração doeu querendo ajudá-lo de alguma
forma, mas como, se ele não me deixava entrar? Eu não permitiria
que Stefano se deixasse ser abatido só para sentir dor.
― São sempre assim as lutas dele esses dias. Ele bate um
pouco, se deixa apanhar e depois vai com tudo, eliminando o
adversário como se esmaga uma barata. ― A voz de meu irmão
soou sombria.
― Vou acabar com essa palhaçada! ― rosnei para ele.
― Se alguém pode fazer alguma coisa, é você. Acredito que
seja a única nesse momento capaz de lidar com ele sem que
Stefano faça alguma coisa.
― Não achei que você tivesse medo dele. ― Pisquei,
chocada com isso.
Santiago sorriu.
― Não é medo, só o respeito por não deixar sua cara ser
esmagada no ringue. Ainda por cima, tem a Luna. Se eu lutasse
com Stefano nesse estado não iria ser bom. Além disso, Fabrizio
mandou que eu o deixasse libertar seja o que for que esteja
sentindo. ― Deu de ombros. ― Se lembra de Valentino? Eles se
parecem nisso. Só agora que nosso irmão deu uma folga nas lutas.
Acho que é uma válvula de escape.
― Sentir dor não é escape. ― Sacudi a cabeça, revoltada,
não com Stefano, mas com o monstro do pai dele, que o tornou
assim. ― Vou impedi-lo que se deixe ser machucado só para sentir
dor e impedi-lo de matar seu oponente no ringue quando não é
preciso. Se ele quebrar as regras de novo, quem vai chutar a bunda
dele com esses saltos serei eu.
― Belinda, não se aproxime muito do ringue ― disse
Santiago a meia-voz com um sorriso. ― Mas, se for chutá-lo, me
avise, que quero presenciar esse fenômeno.
Nós dois sabíamos quem ganharia caso eu enfrentasse
Stefano. Lutava disfarçada com o meu pseudônimo, o Mascarado.
Só Santiago e Benjamin sabiam, eles me ajudavam a encobrir de
Valentino e Fabrizio. Esses dois eram mais rigorosos e não
deixariam que eu competisse. Fazia tempo que eu não entrava no
ringue. Era boa nisso, tive os melhores professores, meus dois
irmãos caçulas.
Quando eu queria lutar, Santiago lutava primeiro com os
oponentes a fim de saber se eu conseguiria vencê-los, então,
dependendo do resultado, eu competia. Se eles percebessem que
eu não conseguiria vencer, não me deixavam lutar. Foi a regra para
permitirem que eu subisse ao ringue. Não reclamei, pois sabia que
existiam homens fortes que eu nunca derrotaria no mano a mano. E
eu sabia que, num combate contra Stefano, não conseguiria vencer.
O homem era uma máquina.
Santiago só me provocou porque sabia que ele nunca iria
lutar comigo da forma como fazia com os seus oponentes. Naquele
dia na academia, durante o treinamento, tive um pequeno exemplo.
Ele só me jogou no chão e não deixou que eu me libertasse.
Lutar era maravilhoso. A adrenalina consumindo meu corpo e
o sangue bombeando nas minhas veias era de outro mundo,
embora eu lutasse poucas vezes. Não era fácil esconder dos meus
irmãos mais velhos e dos meus colegas de profissão as manchas
roxas. Eu usava base e corretivo, mas nem sempre ajudava.
Enfrentar Stefano não era só lutar contra sua força física,
mas com sua mente sombria, pois era como se ele combatesse
vendo no oponente quem o machucara. Só assim para explicar
tanta raiva. Mesmo assim, eu daria tudo para lutar com ele nem que
fosse uma vez. Talvez, se eu usasse meu disfarce, Stefano não
saberia quem eu era.
― Nem pense nisso ― disse Santiago, perdendo o sorriso.
Eu não sabia que tinha dito aquilo em voz alta e que ele
ainda estava perto de mim.
― Foi só uma ideia. ― Pisquei de modo inocente para
tranquilizá-lo. ― E você me viu lutar com ele antes.
Sacudiu a cabeça, chegando mais perto de mim.
― Não, Stefano não estava lutando, e você sabe disso. Ele
estava só provocando-a. ― Suspirou. ― Estou falando sério.
Quando luta, Stefano é um predador cujo foco é só um, sua caça
sendo abatida. Ele destrói seu oponente e faz isso sorrindo, como
você mesma viu algumas vezes.
Sim, eu me recordava do porão. O que ele fez lá foi bem
sinistro, faria qualquer mulher correr para as montanhas, mas eu
não era uma delas.
― Se você lutasse daquela forma com ele, as coisas
poderiam seguir por outro rumo, ir por um caminho no qual você
acabaria machucada, e ele, morto, pois matamos qualquer um que a
toque. Isso resultaria em uma guerra entre os Pachecos e os
Destruttores, pois os irmãos deles não deixariam barato ― alertou-
me sério. ― Papai não ia querer isso, não quando a Luna sairia
ferida no processo.
― Eu sei. ― Pigarreei, não querendo pensar na ausência de
papai. Isso me faria sofrer mais. ― Não vou fazer nada, prometo.
Assentiu, parecendo relaxado.
― Ótimo.
Aproximei-me do ringue, onde Stefano dava um gancho de
direita, fazendo seu adversário cair contra as cordas e se agarrar
para se apoiar.
― Stefano, olhe as regras! ― gritei para ele, pois os
espectadores pareciam apoiar aquele nocaute e berravam.
Ele ainda não tinha feito nada, só se deixara apanhar um
pouco, mas eu sabia como aquilo terminaria e não queria que se
machucasse nem que saísse por aí matando a torto e a direito.
Minha função naquele trabalho era fazer com que todos seguissem
as regras, incluindo Stefano. Se ele queria matar alguém, que o
fizesse em outro lugar, menos no meu ringue.
Ele estava indo até o homem como um leão prestes a dar um
bote em sua presa, mas parou e olhou para mim.
Por um segundo, vi a escuridão ali. Eram órbitas negras que
absorviam tudo. Tão breve a expressão surgiu ali, no segundo
seguinte desapareceu como um relâmpago.
― Siga as malditas regras! ― repeti, caso ele ainda não
tivesse ouvido.
Antes que Stefano falasse algo, porque ele era desses, não
deixava nada barato, a multidão gritou para que a luta prosseguisse,
mas não me importei. Meu foco estava nele e no seu oponente, que
me fuzilava.
― Cale-se, vadia! Não se meta! ― rosnou o infeliz,
endireitando-se e fuzilando Stefano. ― Ninguém se mete nesta luta!
Vou matar esse bastardo!
Agora era eu que queria quebrar sua cara estúpida.
― Estou salvando sua vida, babaca! ― grunhi com os dentes
cerrados.
Stefano o encarava como se não tivesse um homem ali, mas
um inseto repugnante.
― Eu pedi? Mulheres como você só servem para chupar
paus! Espere, que depois que eu acabar com esse fedelho podemos
fazer isso. ― Sorriu, mostrando os dentes cheios de sangue.
O homem era um idiota. Poderia eu mesma resolver isso,
mas atrapalharia no prosseguimento da luta. Não queria trazer
problemas para meus irmãos e fazê-los perder dinheiro.
― Nem se eu estivesse bêbada ou drogada colocaria a boca
em seu pau mole cheio de herpes ― sibilei e olhei para Stefano. ―
Faça o que tem que fazer. Foda-se esse imbecil.
― Sua luta é comigo, não com ela ― ouvi a voz de Stefano.
Eu tinha dado um passo para sair, então me virei e vi que o infeliz
estava furioso como se quisesse me matar e tinha se aproximando
mais do limite do ringue. ― Estaria morto antes que a tocasse de
qualquer modo.
Ao mesmo tempo, Santiago veio para o meu lado com o rosto
duro como rocha. Eu não sabia se, em sua última frase, Stefano
estava se referindo a si mesmo ou ao meu irmão. Pelo visto, aquele
homem morreria naquela noite, ou pelo Stefano ou por Santiago. De
qualquer forma, seu destino foi selado assim que abriu a boca para
me insultar.
― Vamos. ― Santiago me puxou dali enquanto a luta
continuava. ― Você está bem? ― Ele estava tomado de fúria.
― Sim, não é nada que eu não tenha ouvido antes, sabe
disso. ― Alguns caras que não sabiam quem eu era muitas vezes
me diziam palavras ofensivas, mas se davam mal, porque eu
revidava com vigor, e, quando não dava conta, Santiago fazia o
serviço.
Nunca apareciam imagens minhas e de Serena nas
manchetes das colunas sociais. Papai determinou isso para
ninguém ficar de olho em nós, igual aconteceu com Lorena, então
muitas pessoas não sabiam quem éramos e a que família
pertencíamos.
― Eu poderia dizer que adoraria ter minha vez com o infeliz,
mas, conhecendo Stefano, duvido que sobre algo dele. ― Santiago
respirou fundo, tentando se controlar.
― Eu sei. Ainda tentei ajudar, mas ele foi estúpido demais
para notar ou se importar. Arrogante! ― Dei um suspiro frustrado.
― Sua arrogância vai ser sua morte ― concordou meu irmão,
de olho na luta.
Eu também ia tornar a olhar Stefano, mas meu telefone
tocou.
― Já volto, preciso atender.
― Quem ligaria a essa hora? ― sondou com o cenho
franzido.
― Jared. ― Fiquei preocupada por ele ligar naquele horário.
Teria acontecido algo com os garotos? Paco, Neto e Yago estavam
bem, eu tinha ido visitá-los no dia anterior. Acreditava que em
alguns dias estariam de volta ao orfanato.
Santiago fez uma careta.
― Esse homem está a fim de você ― indicou.
― Não acredito. O cara gosta de mulheres elegantes, não
como pareço em meu disfarce lá. ― Usava roupas folgadas e
óculos com lentes transparentes, mas sem grau. ― Ele é meu
chefe, nada mais.
― Conheço os homens, irmã, para saber que ele arrasta um
caminhão por você. ― Sorriu.
O único homem naquele momento que me fazia sentir algo
era Stefano, mas ele não daria o braço a torcer. O cara me
procurava, e ficávamos juntos, então acontecia algo que o fazia
surtar e depois ele sumia, não ligando ou recebendo mensagens. Eu
poderia buscar uma explicação, mas não estávamos em um
relacionamento para eu cobrar nada do que ele andava fazendo ou
com quem tinha estado durante esses dias.
― Não estou à procura de namorados, além disso não
conheço homens com bolas suficientes para enfrentar meus irmãos.
O único que me namorou foi Gazo, mas só fez isso para
humilhar minha família. Eu não gostava de pensar nesse assunto,
pois me sentia suja por tê-lo deixado me tocar.
Depois teve uma época da minha vida em que eu quis sentir
algo diferente, fazer sexo sem estar apaixonada. O único que eu
quis foi Javier, mas ele não quis tocar-me sem que nos casássemos
por respeito ao meu pai e aos meus irmãos, afinal era melhor amigo
de Santiago. Então deixei quieto.
No entanto, apareceu Stefano como um furacão em minha
vida. Não sei o que me chamou atenção nele, provavelmente sua
tenacidade, sua coragem ou o fato de ele não ter medo de nada ou
ninguém. Talvez fosse a escuridão que havia nele, que eu tinha
vontade de iluminar, mesmo não podendo fazê-lo.
Santiago riu.
― Se esse homem escolhido não conseguir lidar com nós
quatro, como vai lidar com você? Porque você, minha irmã, é osso
duro de roer.
Revirei os olhos enquanto o telefone continuava a tocar.
― Me deixa atender, pode ser importante. ― Fui para o
escritório, onde só era permitido entrar a mim e meus irmãos. Lá era
sossegado e eu não ouviria o barulho da multidão de espectadores.
O lugar não era grande, tinha uma porta à direita onde ficava
um banheiro privativo. Meu irmão o fez para eu não usar o
masculino.
Assim que entrei, peguei um copo de água, fui para a sacada
do lugar e me sentei em um banquinho, olhando a Lua no céu. Ela
estava brilhante.
― Oi, Jared ― finalmente atendi. ― Desculpe, estava longe
do celular.
― Oi. Vou precisar fazer uma viagem para a Rússia e
gostaria que você ficasse tomando conta do orfanato por uma
semana. Sei que não faz parte de suas atribulações, mas confio em
você. Além disso, os garotos que foram adotados pelos Ramonis
vão voltar, e eu gostaria que você ficasse de olho neles, em seu
estado após tudo que sofreram.
― É claro! ― Estava lisonjeada com o convite. De repente
pensei no que Santiago disse sobre Jared ter uma queda por mim.
― Mas por que eu? Maitê é mais especializada no assunto.
― Ninguém gosta mais desses garotos do que você, por isso
a escolhi. Ficarei um dia para auxiliá-la antes de viajar. ― Ele
parecia aliviado por eu ter aceitado.
― Não tem problema, adoro os meninos.
Ele ficou de 10 a 15 minutos conversando sobre o que eu
teria de fazer.
― Explicarei mais amanhã ― avisou e parecia que ia dizer
algo, mas um gemido sensual veio de trás de mim, fazendo-me
pular.
Pisquei, dando de cara com Stefano sorrindo travesso à porta
do banheiro do escritório e de banho tomado. Vestia só uma toalha,
que cobria seus quadris perfeitos. Como eu não o tinha visto entrar
ou ouvido o barulho do chuveiro? Devia ter ficado entretida demais
com o pedido de Jared para notar algo mais.
Stefano tinha seis gominhos no abdômen que o deixavam
mais lindo e sexy e me davam água na boca. Eu tinha vontade de
lambê-lo todo.
Ele chegou bem próximo de mim, que podia sentir seu cheiro
de sabonete. Meus olhos foram atraídos para aquele espetáculo de
homem. Uma gota de água escorria por sua barriga, indo rumo ao V
perfeito e tatuado dele. Meu corpo foi tomado por uma sensação
abrasadora, como se eu estivesse perto de um vulcão.
Eu tinha sentido sua falta naqueles dias em que ele esteve
longe, mas não queria demonstrar isso, pois podia afetar o que
tínhamos. Stefano era daqueles que corria quando a situação
pendia para o lado sentimental. Era como se eu o conhecesse havia
anos e não só alguns meses, ou no fundo era parecida com ele.
O calor entre minhas pernas aumentava, deixando-me
pulsante, incômoda, louca para saciar aquele desejo.
Ele gemeu de novo, caprichando, como se estivesse fazendo
sexo. E meus olhos se desviaram de sua anatomia perfeita para seu
rosto provocativo e pervertido.
― Bella, o que está fazendo? ― Tinha algo na voz de Jared
que não consegui identificar, aliás, tinha me esquecido de que ele
estava na linha. Meus pensamentos fritaram com a presença de
Stefano ali quase nu.
― Deixa esse telefone e vamos continuar de onde paramos.
Estou faminto por saborear seu corpo de novo. Adoro seu gosto.
Pelos deuses, esse homem sabia ser tentador demais! Era
capaz de fritar cada pensamento meu.
― Bella...
Cortei Jared:
― Amanhã a gente se vê. ― Encerrei a ligação e entrei no
escritório depois, fuzilando Stefano, que tinha me seguido. ― O que
acha que está fazendo?
Embora seu sorriso travesso deixasse claro. Ainda bem que
sua expressão sombria tinha sumido.
― Apenas batendo a real para aquele engomadinho. Agora
ele sabe que você tem um homem. ― Deu de ombros.
Ri, sentando-me no sofá e colocando o telefone de lado,
depois peguei a toalha dele, jogando-a longe. Mordi o lábio
pensando no dia em que fiz um boquete nele. Adorei chupá-lo e quis
fazer mais depois, mas ele desapareceu. No fundo, eu não buscava
explicação desse sumiço, pois o entendia.
― O que sente, Diabinha? Posso ver a fome estampada em
seu rosto. Quer me provar de novo? Pode fazer, sou todinho seu. ―
Sua voz saiu rouca. ― Ele necessita de você.
― Por que acha isso? Com certeza deve ter sido cuidado por
alguma mulher por aí. ― Levei meus olhos aos seus.
Ele esboçou um sorriso.
― Está com ciúmes? ― provocou.
― Não me faça rir. Tudo que você tem, qualquer homem tem.
― Indiquei seu pênis duro. ― Se você ficar com outra, posso fazer o
mesmo...
― Acha que aquele engomadinho é melhor do que eu?
Posso fazer você gozar várias vezes em uma noite e juro que não
pensará em nada a não ser no meu pau em sua boceta. Não andará
em linha reta por semanas ― gabou-se.
Bufei e me levantei.
― Quem disse que vou deixar seu pau entrar em minha
boceta? Posso deixar isso para o meu futuro marido. ― Queria rir
do ciúme dele por mim e Jared.
Sua respiração ficou pesada com minhas palavras, mas o
que tínhamos era bom do jeito que estava. Essa coisa de ciúmes
estava me deixando nervosa, não só os dele, mas os meus também
ao pensar nele com outra.
Stefano deu as costas para mim a fim de se recuperar –
supus – de minhas palavras. Não foram ditas para magoá-lo, só
para deixá-lo avisado sobre o que tínhamos. No fundo, eu só queria
que transássemos sem nada de sentimentos no meio.
Pisquei diante de sua tatuagem, ainda mais impressionada
com ela do que com sua bunda perfeita. A tatoo tomava suas costas
inteiras, toda em vermelho vivo e azul-marinho. Era formada por
uma corrente em forma de círculo, tendo em seu interior, na parte de
baixo, dois revólveres apontando para fora em direções opostas, e,
na parte de cima, três balas, sendo a do meio maior. Na parte
externa do círculo, em ambos os lados, havia uma asa aberta, como
se saísse da própria corrente, e, na parte inferior, duas adagas com
os cabos cruzados, tendo, ao lado da lâmina de ambas, um raio.
Além disso tudo, a tatuagem também era composta por quatro
estrelas, todas na parte exterior da corrente. Era duas de tamanho
mediano, cada uma entre o cabo de um dos revólveres e uma das
balas menores, uma pequena entre as lâminas das adagas e uma
grande entre os cabos cruzados delas.
O que será que a tatuagem significava? Fiquei tentada a
sondar, mas não queria trazer-lhe dor caso fosse algo significativo.
Podia não ser, mas e se fosse?
― O que temos é bom, Stefano. Não vamos deixar os
sentimentos entrarem, pois no final sairemos machucados. Eu não
quero isso e aposto que nem você ― finalmente disse o que
precisava ser dito. ― Você mesmo falou isso, lembra?
Ele estava prestes a se virar para me encarar, quando me
aproximei pelas suas costas e coloquei minha boca em seu ouvido.
― Podemos satisfazer um ao outro enquanto meu prazo não
termina... ― interrompi-me pela sacudida que seu corpo deu, como
se tivesse levado um choque. A princípio pensei que fosse pelas
minhas palavras, mas logo percebi que foi a minha aproximação do
seu ouvido. Seria ele traumatizado com aquilo, assim como era com
o toque? A sua respiração estava aguda, dando a entender que sim,
e, antes que eu pensasse sobre o assunto, fui prensada na parede
com minhas mãos para cima.
Estava a ponto de sorrir pelo movimento, mas algo em seu
rosto me disse que ele não estava bem. Lembrei-me da noite no
porão. Sua expressão era parecida com a de agora. O tormento
estava em cada linha da sua face. Minhas palavras e meu toque
tinham sido o gatilho? Eu não tinha feito por mal.
― Stefano ― chamei-o assim como fiz no porão. Lá não
consegui alcançá-lo, tanto que meu irmão precisou dopá-lo. Seria
capaz de conseguir agora?
Meus instintos me diziam para fugir, mas eu não queria
alertar ninguém lá fora. Stefano não iria querer que o vissem assim
de novo, parecendo frágil, um menino perdido, embora ainda letal e
perigoso. Se alguém podia ser as duas coisas ao mesmo tempo, era
ele.
― Stefano, sou eu ― tentei de novo. Parecia que ele estava
preso em um pesadelo.
Eu podia me defender dele, mas temia que sua escuridão
fosse demais e ele me machucasse sem querer. Isso provocaria a
ira dos meus irmãos, e Stefano se sentiria culpado.
Tentei conversar sobre temas banais do dia a dia só para ver
se ele voltava a reagir, mas não teve nenhum efeito. Então
aprofundei os assuntos, contando-lhe mais sobre alguns segredos
meus.
― Teve uma vez na escola em que eu estava em dúvida
sobre a minha sexualidade, então beijei uma garota e notei que não
gostei. Não era minha praia. Aí beijei um garoto que estudava
comigo e adorei. Foi uma pena que Santiago atrapalhou ― grunhi a
última frase.
Na hora, fiquei furiosa por meu irmão ter chutado a bunda do
coitado do garoto. Talvez, se eu tivesse ficado com ele, não teria
conhecido Gazo... Bem, não queria pensar naquele imundo filho da
puta agora.
― Uma vez fiquei curiosa em saber a sensação de dar a
parte de trás e tentei usar um vibrador, pois os homens perto de
mim correm dos meus irmãos, além disso eu não sentia nenhuma
química com eles, e Javier não me quis. Por isso não tinha ninguém
que me ajudasse a saciar essa curiosidade. Depois pensei que
podia fazer sozinha, sem precisar de um homem, mas, após colocar
o vibrador um pouco, não gostei. ― Dei de ombros. ― Não sei,
pareceu sem graça. Desde então uso apenas na frente todas as
noites.
Continuei a procurar fazê-lo voltar à realidade.
― Se um dia um cara enfrentar todos os meus irmãos e
ganhar, saberei que ele tem bolas. Eu poderia passar a vida toda
satisfazendo-o tanto na cama como fora dela.
O brilho nos olhos dele estava voltando, então continuei a
divagar:
― Uma vez tentei seduzir Javier. Você sabe que eu tinha
uma queda por ele, o achava lindo, e ele é mesmo. Mas ele não
quis, disse que gostava de respirar e que o que podia fazer era se
casar comigo. ― Bufei, encarando o teto. ― Casamento é só um
pedaço de papel, não simboliza fidelidade ou comprometimento.
Não tem muito isso em nosso mundo. Todos os homens que
pediram minha mão traíram suas ex-namoradas, por que comigo
seria diferente? Por que eu iria querer alguém infiel? Para no final
eu mesma ter que cortar o pau dele e fazer o maldito comer? Por
isso rejeitei todos os candidatos. Deve ter alguém fiel em algum
lugar para quem eu seja o bastante, só o que preciso fazer é
esperar.
Embora estivesse sem tempo, mas arrumaria alguma coisa
para burlar as ordens dos anciões, só não sabia exatamente o que
ainda. No fundo, queria me apaixonar, mas para isso não precisava
envolver casamento. Ao menos eu queria escolher se desejava isso,
não queria que fosse imposto pelos outros.
― Queria foder sem sentido um cara sem ter precisão de
carregar um anel dele. ― Dei um suspiro duro.
― Gosto da parte do foder sem sentido ― Stefano finalmente
disse.
Meus olhos foram para seu rosto, que agora esboçava um
sorriso maroto. Embora a escuridão ainda vincasse sua face,
parecia que ele estava se controlando.
― Podemos resolver esse problema se você não temer
morrer nas mãos dos meus irmãos. ― Eu estava aliviada por ele
estar melhor.
Stefano me soltou, e me sentei no lugar em que estava antes.
Queria sair dali antes que ele me fizesse perguntas sobre tudo o
que revelei, mas o infeliz não deixou.
― Então tentou fazer anal sem precisar de um homem? ―
Pelo seu sorriso, ele parecia divertido.
Droga! Pelo visto, ele não deixaria aquilo barato. Eu não
devia ter dito nada, na hora só queria distraí-lo. Por que ele não
podia ser uma pessoa normal, que podia se entreter falando sobre
música, dança ou saltar de paraquedas? Stefano não era normal ou
só estava querendo me provocar.
― Por que precisaria de um homem se os vibradores fazem
um trabalho melhor que eles? ― Ao menos eu pensava assim antes
de ser tocada pelo Stefano.
― Acha que enfiar um pau de silicone te satisfaria mais do
que o de um homem? ― Dessa vez ele riu. ― E quanto à sensação
de ter sua boceta lambida e seus seios chupados? Por acaso um
vibrador faz isso?
― Não posso dizer nada, afinal minha boceta não foi
chupada ainda. ― Mordi o lábio inferior, varrendo os olhos sobre
sua nudez perfeita. Seu pau ficou ereto com o peso do meu olhar.
― Podemos resolver isso agora. ― Veio até mim com um
olhar faminto.
Ao menos um vibrador não faz o que um homem é capaz,
partir o coração feminino em milhões de pedaços... Era isso que eu
temia envolvendo-me com Stefano, mas como ficaria longe dele?
Adorava o seu toque.
― O que está esperando, Foguete? ― Eu não sabia se ele
estava pronto para isso, mas não disse nada, deixando-o decidir
sozinho, pois, se eu falasse algo, poderia levá-lo para aquela
escuridão de novo.
Peguei sua mão e o levei para o banheiro. Enquanto isso,
tirava as minhas roupas. Logo estávamos ambos nus, e ele
capturou minha boca, deixando-me inebriada. O cara conseguia
fazer isso só com um beijo, imagina se fizéssemos sexo? Eu queria
experimentar a sensação de tê-lo dentro de mim. Apostava que iria
adorar.
O chuveiro foi ligado ao nosso lado, assim o som abafaria os
sons caso alguém viesse ali, mas eu duvidava.
Stefano me escorou na parede e levantou minhas mãos.
― Segure nesse ferro e não solte ― ordenou.
Nesse momento, eu não me incomodei em receber ordens
dele, pois faria qualquer coisa só para ter sua boca em meu corpo e
matar a necessidade que eu estava sentindo.
― Vou te mostrar a sensação de ter seus seios chupados. ―
Abocanhou um enquanto amassava o outro.
Meus olhos se fecharam com o turbilhão de sensações ainda
melhor do que quando me tocou antes. Cada toque seu era uma
descoberta maravilhosa. Eu temia me viciar e não saber ficar sem.
― Estou amando tanto que minha boceta está pingando e
não tem nada a ver com a água. ― Gemi com um chupão que deu
em meu seio direito.
― Vamos ver, então. ― Caiu de joelhos no chão em frente a
mim e colocou uma perna minha em seu ombro, abrindo-me para
ele. ― Cheiro maravilhoso.
A água caía ao lado, mas não em nós dois. Era só para
abafar os sons que estávamos soltando.
― Agora irei prová-la, algo que eu devia ter feito há alguns
dias, antes de o seu irmão nos interromper no carro. ― Triscou a
língua em meu clitóris.
― Vamos ver se é tão bom como você diz. ― Olhei para ele,
com o rosto enterrado em meu centro.
― Vou estragar você para todos os homens. Você vai querer
só o meu toque após eu terminar de saborear minha sobremesa. ―
Antes que eu lhe desse um comentário esperto, sua boca me
possuiu. Juro que eu me sentia vibrando como se usasse um
vibrador potente.
Sua língua girou em meu nervo pulsante, e me senti
perdendo as forças. Suas mãos apertaram minha bunda, e um dos
seus dedos circulava ao redor do meu ânus.
― Um dia quero possuir aqui e provar a você o quanto é
prazeroso, tanto que não vai mais querer ficar sem. ― Analisou o
meu buraco enrugado, depois seguiu para a frente. ― Por agora
ficarei com essa boceta cremosa. Você será todinha minha, cada
centímetro desse corpo.
Eu estava inebriada demais e muito fascinada com as
sensações maravilhosas para discordar dele. Não era virgem, mas
fiz uma promessa a mim mesma de não fazer mais nada por
impulso. Era claro que, na primeira vez, estava apaixonada, e agora
não. O estranho era que o que eu tinha com Stefano era mil vezes
melhor do que tive com Gazo. Estaria eu errada ao seguir aquele
desejo? Poderia aproveitar e não deixar os sentimentos tomarem
conta? Esperava não me arrepender depois, pois, após fazer sexo
com ele, seria tarde demais.
― Vamos foder agora, depois posso pensar sobre o anal,
embora meu futuro marido não vai... ― interrompi-me quando seus
dentes puxaram meu clitóris, fazendo-me gritar, então cerrei a boca.
― Não fale de outro homem quando estou comendo essa
boceta deliciosa ― praticamente rosnou, circulando mais rápido
com a língua meu nervo pulsante.
Eu faria qualquer coisa que ele dissesse naquele momento
só para que não parasse de usar sua língua. Sentia-me flutuando
em algum lugar do espaço. Era tudo tão intenso e arrebatador que
me segurei estoicamente para não deixar o grito de desejo sair
conforme queria.
― Isso, goza para eu engolir tudo e não deixar nada! ― Sua
voz foi o que bastou para o êxtase transbordar quando tudo em mim
se dissolveu em prazer.
Minhas forças se acabaram, e, se não fosse ele ali, eu teria
caído no chão. Minha respiração estava acelerada, meu coração
trovejava.
― Puta merda! Realmente os vibradores não chegam nem
perto disso ― finalmente comentei após poder respirar de modo
normal de novo.
Sorriu endiabrado e me beijou.
― Prova a si mesma e me diz se não tem um gosto bom. ―
Realmente era um sabor diferente, não era ruim. ― O melhor que já
provei.
― Não posso dizer o mesmo, já que não provei nenhuma
boceta para comparar os sabores. Quem sabe um dia eu prove ―
provoquei-o.
― Espero estar junto. Não há nada mais prazeroso do que
ver duas meninas fodendo. ― Piscou, parecendo realmente querer
ver algo assim.
Peguei seu pênis duro, fazendo-o gemer.
― Chegou a minha vez de brincar.
― Ele está sentindo falta dessa sua boca. Porra, só de
imaginar, fico mais duro ― rosnou.
Ajoelhei-me em sua frente, pegando seu membro. Estava
muito ereto, pronto para mim. De sua coroa escorria o pré-sêmen,
mas não o deixei cair, tracei minha língua, degustando seu sabor.
― Seu gosto é tão bom... Também senti falta dele. ― Apertei
seu pau, fazendo Stefano soltar um assovio por entre os dentes. ―
Vamos ver se vai pensar em ficar com outra pessoa depois de mim,
e, se ficar, vai se lembrar de mim.
Não queria imaginá-lo fazendo aquilo com outras. Outra vez
as emoções interferindo. Expulsei esses pensamentos, só pensei
em aproveitar e ajudá-lo a se livrar de todo o estresse que devia ter
sentido nos últimos dias. Tomei-o em minha boca e o suguei. O que
não coube, segurei com uma das mãos, enquanto a outra acariciava
suas bolas.
― Porra! ― Fechou os olhos tamanho o êxtase.
Queria vê-lo domado e mole, assim como ele me deixou. A
cada avanço que eu fazia, saíam mais sons de sua boca, e eu
jurava que esses gracejos iriam ficar comigo por muito tempo
quando tudo aquilo acabasse.
Ignorei o aperto em meu peito com essa ideia. Não queria
pensar nisso, só aproveitaria qualquer segundo, pois estava
adorando cada carícia tanto dele em mim como as que eu fazia
nele.
Tirei a boca de seu pênis e chupei suas bolas enquanto batia
punheta.
― Puta que pariu! ― O cara perdeu o fôlego, como eu
queria. Voltei a colocá-lo em minha boca. ― Merda, você me deixa
louco!
Quanto a mim, nem se fala! Eu só sabia que estava amando
cada segundo daquilo.
― Eu vou gozar! ― Sua mão pegou meu cabelo, mas não
me forçou a tomar mais dele. Aproveitei para deixá-lo mais louco do
que já estava.
― Goze em minha boca. Quero engolir tudo que sair de você.
― Levei-o mais profundamente em minha garganta, até que senti
seu aperto em meus cabelos, mas não me machucou. Então senti
quando ele gozou. Só parei de chupá-lo quando não restava mais
uma gota.
Levantei-me, vendo-o mole escorado na parede, olhando-me,
mas não consegui ler sua expressão e, nesse momento, não achei
que gostaria de saber.
Stefano me puxou para seus braços, beijando-me e nos
levando para debaixo do chuveiro.
― Você é perfeita, gostosa demais... Eu poderia fodê-la aqui,
mas quero que façamos isso em um lugar diferente, onde seus
irmãos não possam entrar e querer cortar meu pau.
Ri.
― Você não fica atrás, Foguete ― provoquei-o com um
sorriso. ― Mas agora vamos nos vestir, antes que... ― olhei para
ele pelado ― você acabe perdendo seu brinquedo. Seria bem ruim,
porque gosto dele.
Stefano deu uma risada divertida. Por um segundo, ela me
distraiu, deixando-me de boca aberta e com o meu peito quente.
Não, isso não pode acontecer! O que temos é só sexo e será
só isso!, pensei como um mantra.
Após nos vestirmos, estávamos prontos para sair, quando
Stefano me chamou.
― Sim? ― Olhei para ele, que agora estava sério.
Eu tinha certa sensação do que ele queria falar comigo, mas
deixei que tomasse seu tempo. Se quisesse se abrir, eu estava
pronta para ouvir.
― Você não me perguntou sobre o que aconteceu comigo, o
transe em que fiquei. ― Observava-me com o cenho franzido.
Suspirei.
― Não é assunto meu para discutir. Se você quisesse me
dizer, teria dito.
Eu entendia um pouco sobre traumas. Às vezes encarar o
que se sente é bom. Conversar ajuda muito, mas eu não queria que
ele fizesse isso se não estivesse pronto.
― Sim, mas você ajudou conversando comigo. ― Sua voz
soou baixa.
― Não sei o que aconteceu, mas deve ter sido sério, pois vi a
forma como você ficou tanto no porão como aqui. São sintomas de
trauma. Seja o que você tenha passado, deixou uma cicatriz
profunda. ― Olhei para ele. ― Não precisa falar comigo, mas devia
se abrir com um psicólogo. Isso ajuda.
― Psicólogo? Não preciso disso. ― Sacudiu a cabeça. ― Se
eu abrisse o jogo com um, aposto que ele vomitaria as tripas, isso
para não dizer outra coisa.
― É função deles aceitar e ouvir seja o quer for. Não precisa
decidir agora, só pense no assunto. Te ajudaria a dormir à noite e a
evitar ter crises iguais às que vem tendo. ― Queria de alguma forma
ajudá-lo. ― Os traumas psicológicos acontecem quando alguém
vivencia uma situação ou experiência negativa, como dissemos,
mas não consegue esquecer ou trabalhar as emoções despertadas
no evento. A lembrança do fato é angustiante para a pessoa.
― Ao pensar no meu passado, me sinto como se estivesse
queimando vivo. Não dá. ― Respirou com dificuldade. ― Muito
menos falar do assunto com um estranho.
― Hummm... ― Franzi os lábios. ― Acho que conheço
alguém com quem você pode se abrir sem medo.
― Belinda...
― Só vai lá. Se não quiser, não precisa dizer nada até estar
pronto ― pedi, aproximando-me dele e pegando sua mão. ―
Lorrany é reservada, assim como todos os psicólogos, mas, como
somos da máfia, além de manter tudo entre paciente e especialista,
ela não distingue quem quer que seja por suas ações.
Lorrany era minha avó, mãe da minha mãe, e morava a
poucos quilômetros do orfanato, perto da praia. Eu ia para lá quase
todo final de semana. Ela não pertencia à máfia, assim como minha
mãe não o fazia quando se casou com meu pai. Era uma psicóloga
brilhante, boa no que fazia. Por sua causa, eu queria ser psicóloga,
ia muito com ela a orfanatos quando era nova e gostaria de ser uma
quando crescesse. No final, optei pela Assistência Social, um ramo
que eu amava.
― É uma mulher? ― indagou de forma dúbia. ― Não acho
que isso daria certo, a maioria das mulheres são frágeis e...
― Valentino foi até ela, que o ajudou. Ao menos ele parou de
lutar da forma insana que fazia. ― Dei-lhe um sorriso para aliviar a
tensão. Se ele pensava que vovó era dócil, teria uma surpresa. A
mulher era pior do que eu. Tive a quem puxar, porém houve uma
época em que eu não era assim. As dores me fizeram crescer e
fortalecer.
― E você não faz o tipo dela, pode ficar tranquilo. ― Pisquei.
Ele me encarou um segundo parecendo em choque.
― Leve seu tempo. ― Dei mais um aperto em sua mão e me
virei para sair, quando um estrondo fez tremer o chão, como se uma
bomba tivesse sido jogada.
Stefano correu até mim e segurou meu braço, puxando-me
para o fundo do escritório.
― Maldição! Esqueci minha arma no vestiário antes da luta
― praguejou.
Antes que eu respondesse, meu telefone tocou. Atendi ao
meu irmão.
― Santiago... ― comecei a sondar o que estava havendo,
mas fui interrompida por ele:
― Onde você está?! ― inquiriu com preocupação, então ouvi
tiros.
― Estou no escritório ― sussurrei. ― Você e Benjamin estão
bem?
O telefone sumiu da minha mão antes que ele me
respondesse. Quis chutar Stefano, mas me controlei. Primeiro
precisava saber se todos estavam bem.
― O que está acontecendo? Estou sem uma arma aqui ―
perguntou Stefano. ― Tomarei conta dela ― prometeu e fez uma
pausa para ouvir. ― Sim, acho que sei. Vou fazer isso. Pode
detonar esses malditos.
Ele me entregou o celular e correu até um quadro que tinha
na parede. Ali tinha um cofre cuja senha ele tinha, pois o abriu. Meu
irmão devia ter-lhe dado. Dentro do cofre havia várias armas.
― Santiago, o que está acontecendo? ― perguntei com o
pânico crescendo, especialmente por temer pela vida de meus
irmãos. ― Benjamin e você estão...
― Estamos bem. Agora fique com Stefano e faça tudo que
ele disser. Logo vejo você. Ele sabe aonde levá-la. ― Parecia
furioso. ― Me deixa resolver aqui. Depois Stefano lhe conta o que
está acontecendo.
― Fiquem seguros. Amo vocês dois demais ― declarei antes
de desligar. Estava aliviada por meus irmãos estarem bem. Eu
confiava que tudo daria certo, e não queria atrapalhar a luta deles
com quem estava invadindo o nosso estabelecimento. Fui até
Stefano, que colocava uma arma no coldre e outra na bota e ficou
com uma em sua mão.
― Aqui, pegue. ― Entregou-me uma pistola. ― Só no caso
de precisão.
― Stefano, sabe quem está atacando?
― Não faço ideia. Vamos descobrir depois. ― Ele parecia
com raiva enquanto colocava um pacote de C4 na porta do
escritório enquanto ainda estávamos dentro do cômodo.
Pisquei.
― O que pensa que está fazendo? Vai nos explodir aqui?
― Não, vamos sair pela saída secreta. Se alguém abrir a
porta pelo lado de fora, vai ser explodida ― falou, abrindo uma porta
muito bem disfarçada. ― Seu pai foi esperto ao fazer um túnel, e
temos sorte por estarmos aqui na hora do ataque. ― Ele pegou meu
braço, e entramos no elevador por trás da porta. Ele ia dar no
subterrâneo, onde havia um túnel secreto.
Saímos do elevador, e Stefano abriu um alçapão.
― Eu vou pular, você vem logo atrás ― orientou-me, olhando
para o elevador, talvez com medo de virarmos carvão caso um dos
inimigos entrasse lá em cima. Pulou e estendeu os braços para
mim. ― Pula, que seguro você.
Bufei com um revirar de olhos.
― Sei pular, não sou uma criança que precisa ser amparada
― rosnei e saltei, mas o bastardo me pegou mesmo assim.
― Você é uma coisinha linda, sabia disso? ― Antes que eu
pudesse retrucar, deu-me um selinho. Foi suave e nada sexual.
Afastei-me, não querendo proximidade.
― Eu sei que você não é uma criança, posso ver muito bem
isso. ― Stefano piscou para mim para aliviar a tensão. ― Ainda
mais com essa bunda perfeita que tem.
― Só você para me fazer rir a essa hora. ― Ri sacudindo a
cabeça. ― Espero que não ande por aí pegando mulheres que
pulem em seus braços.
― Na verdade, faço isso de vez em quando. ― Ele começou
a andar. Segui-o enquanto meu peito se apertava e o sorriso sumia.
Estava ali de novo a sensação. Eu quis grunhir, não para ele,
mas para mim mesma por me importar.
― Fiz uma casa na árvore para Graziela, então, quando vou
lá, ela pula nos meus braços para eu colocá-la lá em cima. Está
inacabada, ainda precisando de escadas. Assim que tiver tempo,
vou construí-la.
Graziela era a filha de Alessandro e Mia. Eu ainda não a
havia conhecido, mas, pela forma como Stefano falava, parecia
adorar a criança, sua sobrinha, embora não de sangue.
Por que será que meu peito se aliviou após saber disso? Na
verdade, eu sabia, mas era algo em que não queria pensar.
― Você parece gostar muito dela. ― Mesmo sem o vínculo
genético, ele a amava como se ela fosse de sua família, e era isso o
que contava.
― Graziela é especial ― começou a dizer enquanto
andávamos pelo corredor do túnel iluminado. Provavelmente
Stefano tinha ligado as luzes ao abrir o alçapão, eu apenas não
notei. ― Ela entrou em nossas vidas como um sol, resplandecendo
tudo.
― Me senti assim com a chegada de Carmen e Kélia. Até
pedi a Luna que me desse as meninas ― sussurrei. Sentia uma
falta danada das minhas fadinhas.
Ele riu.
― Miguel deve ter adorado isso. ― Revirou os olhos, por
certo pensando na reação do nosso cunhado, que não foi nada boa.
Eu estava brincando sobre adotar as crianças, mas, se tivessem
permitido, era claro que eu não teria dito não.
― Achei que fosse pular no meu pescoço. ― Sorri, pensando
naquele dia. ― Espero ver minhas bonequinhas em breve. Sinto
muita falta delas e de Luna.
― Me fala quando, que apareço lá e a protejo de Miguel. ―
Piscou provocativo.
Bufei.
― Não preciso de sua proteção, sou capaz de lidar com meu
cunhado.
Andamos por mais algum tempo, o equivalente a dois ou três
quarteirões, então encontramos uma escada, que levava ao lugar
secreto. Subimos e entramos em um cômodo. Parecia um quarto ou
sala, eu não saberia dizer. Não tinha janela, só uma porta.
― Puta merda! ― arrulhou Stefano.
Pisquei chocada, pois havia uma parede lotada de armas
brancas e de fogo de todo tipo, incluindo um RPG igual ao que Lyn
usou.
Fui até ela, peguei uma faca e a prendi na faixa em minha
bota.
― Seus irmãos são preparados ― comentou ele um tanto
impressionado.
― Vocês não são? ― retruquei com as sobrancelhas
erguidas. ― Ouvi muitas coisas dos Morellis. Se for tudo mentira,
ficarei desapontada.
― Nós somos. O que aconteceu hoje aqui não aconteceria
em nosso território. ― Ele parecia orgulhoso ao dizer isso. Em
seguida recebeu uma mensagem e suspirou de modo sombrio após
ler. ― Conseguiram controlar a situação no clube de luta.
― Santiago disse o que aconteceu? Ouvi tiros, mas não
entendo como entraram. E aquela explosão? ― Sacudi a cabeça. ―
Como entraram com armas lá dentro?
― Parece que alguém entrou carregando uma bomba. O lado
direito da arquibancada foi destruído, assim como as pessoas que
se encontravam no local. Outros aproveitaram para entrar armados.
― Sua voz soou letal.
― Pessoas morreram? ― indaguei com o peito apertado. Eu
temia só em pensar que Santiago e Benjamin poderiam ter sido
feridos também. Graças a Deus que não foram. ― Acha que esse
ataque está relacionado ao perigo que Lyn nos disse que estou
correndo? ― Tinha chegado a hora de contar à minha família. ― Eu
deveria ter contado aos meus irmãos. E se eu não ter falado foi o
motivo da morte daquelas pessoas?
Stefano tocou meu rosto.
― Não é sua culpa nada disso. Se entraram no ringue
armados, foi porque alguém os deixou passar. ― Sua voz saiu
sombria.
― Acha que temos algum infiltrado? ― Arquejei, não
querendo pensar no que houve na última vez que tivemos um em
nossa família. Ele nos levou alguém de cuja perda fomos incapazes
de nos recuperar direito.
A porta foi aberta antes que alguém comentasse algo mais, e
Stefano levantou a arma na direção dela. Javier levantou a dele.
― Gente, estamos do mesmo lado. ― Tentei acalmar os
ânimos.
― Será? Ninguém ousaria nos atacar assim, a não ser
alguém que conheça o nosso local ― acusou Javier, fuzilando
Stefano. ― Só conheço alguém que está em nosso meio e que
poderia fazer tal coisa e fingir que não foi ele.
― Se está me acusando, é melhor ser homem e dizer na
cara. ― Stefano deu um passo até ele, mas segurei seu braço e o
firmei no lugar.
― Stefano, se controla ― pedi e olhei para Javier. ― E você
fique na sua. Confio nele.
― Jura? Não é só porque vocês andam fodendo... ― Suas
palavras foram cortadas pelo punho de Stefano em sua boca. O
sangue escorreu.
― Controle sua maldita boca antes de dizer merda sobre
Belinda, ou juro que nenhuma plástica vai consertar seu rosto, isso
se eu não o mandar para o inferno. ― Eu percebia que Stefano
estava tentando controlar sua fúria e não colocar suas palavras em
prática. ― Você teve uma chance com ela e a desperdiçou, agora
aceite isso, ou vamos ter um grande problema.
Pisquei. Achei que eles estavam se desentendendo porque
um não confiava no outro a respeito de traição e não porque Javier
estava com despeito. Como disse Stefano, ele teve sua chance e
não a aproveitou.
― Escuta aqui, seu idiota, se eu estivesse fodendo com
Stefano ou algum outro, não seria da sua conta. O que faço da
minha vida é problema meu, não seu. ― Cerrei os punhos para não
socar sua cara estúpida.
Javier me fuzilou.
― Ele vai quebrar seu coração em milhões de pedaços ―
rosnou.
Sorri de modo frio.
― Se isso acontecer, não será para você que vou chorar,
pode ficar tranquilo. Posso afogar a dor em qualquer braço ou cama,
menos com você, não depois do que acabou de dizer ― sibilei,
virando-me para sair.
― Belinda... ― Ele segurou meu braço, o que foi a coisa
errada a se fazer, pois Stefano se lançou sobre ele, colocando uma
faca em sua garganta. Javier ia revidar, mas peguei o braço de
Stefano.
― Parem com isso, ou vou chutar a bunda dos dois ―
grunhi, meus olhos relampejando. ― Vamos embora daqui. Ou
deixo vocês se matarem e vou sozinha.
Dois machos alfas se encarando, assassino versus
assassino. Os dois eram letais. Eu não sabia quem venceria, mas
provavelmente seria Stefano. Havia muita fúria reprimida dentro
dele.
Não esperei que respondessem, só virei as costas e saí do
cômodo cheio de armas. Eles que tomassem a decisão de vir
comigo ou se matar. Há coisas mais preocupantes no momento do
que dois homens brigando para ver quem tinha o pau maior, pensei
amarga. Entretanto, embora eu não quisesse admitir, as palavras de
Javier sobre Stefano quebrar meu coração estavam arrulhando em
meu cérebro.
Seria possível? Eu devia terminar tudo antes que fosse tarde
demais? Por que meu coração ficava tão apertado com a mera
menção dessa ideia?
No íntimo, eu acreditava que era tarde demais para me
afastar dele.
Tudo em mim fervia, pois fiquei vulnerável na frente de
Belinda por um momento. Impressionou-me o fato de ela ter me
ajudado a voltar a mim.
Os pensamentos me atormentaram assim que ela me tocou.
Não consegui trancá-los em meu inconsciente. Tudo era fodido
demais, por isso oscilei com a sua sugestão de eu me consultar com
uma psicóloga de seu conhecimento.
Fiquei de pensar sobre o assunto, mas fomos atacados por
alguém que explodiu quase todo o estabelecimento da máfia
Pacheco. Seria realmente alguém atrás de Belinda? No entanto,
isso não fazia sentido. Os homens que nos perseguiram no dia em
que fomos ao cemitério eram assassinos profissionais, não do tipo
que usavam atentados a bomba e feriam pessoas que nada tinham
a ver com o alvo.
Para mim, parecia que aquilo tinha o dedo de algum infiltrado
ou inimigo dos Castilhos. Se Belinda não estivesse comigo, poderia
ter sido uma das vítimas. Eu temia só em pensar nisso.
Essa merda não podia ficar mais fodida, ainda mais quando
Javier apareceu. Eu não gostava dele nem um pouco, ainda mais
após perceber que ele gostava de Belinda. Poderia matar o infeliz,
mas a segurança de Belinda era mais importante.
No momento, estávamos em um apartamento dos Castilhos
sobre o qual poucos tinham conhecimento, apenas os mais
próximos deles.
Belinda tinha ido para o quarto falar com a sua irmã e depois
tomar um banho. Eu queria estar com ela naquele instante e sentir
seu cheiro, pelo qual estava viciado.
Na sala, estavam Benjamin, Santiago, Valentino e Javier,
menos Fabrizio, que estava para chegar.
― O que descobriram? ― questionei. Não estava gostando
de ficar parado, sem fazer nada. Apreciava ação, mas não deixaria
Belinda sozinha com Javier ou qualquer outro homem. Todos,
exceto seus irmãos, podiam ser traidores em potencial.
― Não sabemos quem foram os responsáveis pelo ataque.
Os envolvidos foram mortos. Seja quem for, a sua intenção foi fazer
um belo estrago. Um deles tinha a bomba no corpo, enquanto o
outro atirava contra nós. ― Valentino se serviu de uma dose de
uísque e tomou um gole generoso.
Franzi a testa.
― Isso é estranho. Quem atacaria suas instalações só com
dois homens, sendo um deles suicida? ― Sentei-me no sofá. ―
Não faz sentido. E como conseguiram passar armados pelos
seguranças?
― Acredito que não estejam relacionados a nós. ― Olhou-
me. ― Não nos atacaram diretamente.
― Pareceu aleatório ― disse Santiago com o cenho franzido.
― O que me lembra dos guardas inconscientes na academia.
Nenhum foi morto. Não descobri nada nas câmeras naquele dia.
Lyn não faria aquilo, não era seu estilo. Eu podia estar havia
muitos anos sem saber dele, mas o cara jamais explodiria um monte
de gente “inocente”. Ele era do tipo que preferia um único tiro na
testa ou tortura dependendo de sua intenção.
― Descobriu alguma coisa nas câmeras hoje? ― Elas
deviam ter gravado algo. Se alguém tinha mandado aqueles dois
atacarem o local, estaria de olho em tudo.
― Não descobri nada. As imagens pareciam normais, mas,
após avaliar bem, notei que foram mexidas. Quem fez isso, é bom
demais ― destacou Benjamin. ― Tem gente nossa tentando
localizar a fonte das alterações.
Não era mesmo coisa de Lyn, disso eu tinha certeza. Ele não
nos avisaria do perigo que Belinda estava correndo e depois nos
atacaria. Além disso, sua assinatura não estava nas mortes. Se um
origami tivesse sido encontrado, Valentino e os outros saberiam.
― O que não se explica é porque atacaram e sumiram com
as imagens e depois simplesmente não fizeram mais nada, apenas
se deixaram ser mortos. Se fosse um ataque de uma gangue rival,
mais homens teriam participado ― destacou Santiago, sentando-se
também.
― Positivo ― assenti. ― Talvez tenha sido apenas para
checar os seus negócios. Mas ainda penso que não tem
fundamento eles terem conseguido entrar armados.
― O segurança da porta de entrada foi morto a alguns
quarteirões do clube ― disse Fabrizio, entrando com Sage, que
varreu os olhos em todos, focando por último em mim.
― Stefano. ― Curvou a cabeça em um cumprimento.
Eu não gostava dele. Se fosse por mim, estaria morto por ter
nos enganado. Tínhamos confiado no filho da puta, e ele nos traíra.
― Controle esse olhar assassino, Foguete ― disse Belinda
também adentrando na sala. Usava um robe e tinha os cabelos
úmidos, tão sexy e perfeita como sempre.
― Também não gosto desse olhar ― Santiago rosnou.
Ela se sentou ao meu lado. Seu cheiro recendeu em minhas
narinas, impedindo-me de focar no assunto que eu estava tratando
com os irmãos dela. Foquei em prestar atenção na conversa e
ignorar a tentação que era aquela mulher.
― Por que não veste uma roupa? ― Benjamin estreitou os
olhos.
Eu concordava com ele, embora não achasse que minha
opinião importasse.
― Não tem nada aqui para eu vestir. ― Ela suspirou. ―
Agora chega de falar da forma que estou vestida. Pegaram quem
atacou o clube?
Olhei para Belinda, querendo dizer-lhe que precisávamos
falar com seus irmãos sobre o perigo que corria, mencionado por
Lyn. Esperava que ela entendesse meu olhar. Não queria ser mais
claro, ou seus irmãos desconfiariam, e eu não queria falar sem que
ela concordasse.
― Não descobrimos nada ainda. ― Então Fabrizio relatou
sua busca por pistas, enquanto pegava uma bebida. ― Por ora,
você e Serena vão ficar na mansão até descobrirmos o mandante.
Razor está trazendo-a.
― Não posso ficar presa dentro de casa! ― Levantou-se em
um salto. ― Fui convidada para tomar conta do orfanato por uma
semana no lugar de Jared, que precisa viajar. Não posso deixar
passar essa oportunidade.
― Isso está fora de questão. Não sei quem é o responsável
por esse ataque e vou precisar de todos em quem confio realmente.
Não vou deixá-la desprotegida no orfanato ― Fabrizio frisou,
encontrando os olhos dela.
― Precisamos ficar de olho em vocês duas. Não gosto da
ideia de inimigos as tocando... ― Valentino colocou as mãos nos
cabelos em um gesto tenso.
Belinda pegou sua mão e se sentou ao meu lado de novo,
puxando o irmão para se sentar no outro lado.
― Ficarei bem. O orfanato tem guardas, acho que podem dar
conta do recado ― insistiu ela. ― E ninguém lá sabe quem sou
realmente.
― Belinda...
― Ah, vamos lá, gente! Alonso e Rolander vão estar comigo!
― começou a suplicar.
Eu não gostava da ideia de ela ser vigiada por outras
pessoas, não confiava em nenhuma delas, apenas nos irmãos, que
se importavam com Belinda e a amavam a ponto inclusive de dar
sua vida por ela. Eu sabia disso porque faria o mesmo pelas minhas
irmãs.
― Vou precisar deles. Como disse, só vou deixar os que mais
confio com vocês duas. Alonso e Rolander vigiarão Serena, e por
isso quero você lá junto a ela. ― Fabrizio tinha a expressão
sombria.
― Preciso me manter ocupada. ― Seus lábios tremeram. ―
Ou ficarei louca.
Contive o instinto de confortá-la. Isso estava passando do
limite. Eu não podia me envolver. Então por que não conseguia ficar
longe?
― Tudo bem ― concordou Fabrizio por fim.
― Fabrizio... ― começou Valentino, não concordando.
No fundo eu estava de acordo com ele, não queria que
Belinda fosse, mas a conhecia e sabia que ela não ficaria presa em
casa, sua mente precisava de distração.
― Stefano vai tomar conta de mim e me manter segura, e
posso ficar naquela casa que tem próxima ao orfanato. Com o meu
disfarce, ninguém que esteja atrás de nós me seguiria e atingiria
quem está no orfanato. ― Belinda levantou as sobrancelhas,
desafiando-me a dizer o contrário na frente dos seus irmãos.
― Eu... ― comecei a falar que não ia fazer aquilo, mas me
detive, porque, se ela fosse, eu a seguiria. Não ficaria bem sabendo
que ela podia correr perigo.
― Ele vai fazer isso. ― Belinda sorriu para todos e depois
para mim. ― Você me deve, Foguete, ou os Morellis não têm
palavra?
Aquela Diabinha me levaria à loucura. Sabia que, ao dizer a
última frase, ela estava apenas me provocando e não cobrando
realmente uma dívida. Belinda nunca cobraria por ter me ajudado
em meu surto.
― O que ele fez para dever algo a você? ― inquiriu Santiago
com os olhos estreitos.
Fiquei tenso imaginando o que ela diria, mas era uma reação
exagerada, pois Belinda jamais diria nada que não devesse, embora
eles tivessem me visto em um momento difícil, quando surtei em
seu porão. Eu lhes agradecia por ninguém ter tocado no assunto.
― Me impediu de esmagar o oponente com quem ele estava
lutando quando o cara sugeriu que eu chupasse o pau dele ― ela
respondeu com um grunhido. Sorriu para mim, levantando o copo
que tinha pegado da mão de Valentino como se estivesse
brindando. ― Por isso me deve. Além disso, você não tem muito o
que fazer aqui. Lá terá mais coisas interessantes para fazer.
Imaginei as coisas boas que podíamos fazer juntos. Uma
delas envolvia comê-la todinha. Expulsei esse pensamento; ficar
duro ali com os irmãos dela presentes não seria sábio.
― Espera. Um dos lutadores a tratou com desrespeito? ―
indagou Fabrizio. Olhou para Santiago e Benjamin. ― Não estavam
de olho nela?
― O cara estava no ringue com Stefano, então teve o que
mereceu. ― Santiago suspirou, falando: ― Pena não ter sido eu a
fazer o serviço.
Matar o bastardo foi muito prazeroso. Ele tinha a língua muito
afiada e falava muita besteira, principalmente o que disse que ia
fazer com Belinda. Isso me deixou puto. O verme não merecia
respirar o mesmo ar que ela. Escolhi lutar com ele porque o maldito
tinha batido em sua “ex” a ponto de deixá-la em coma havia alguns
anos e saído ileso. O destino dele estava selado antes mesmo que
abrisse a boca para insultar Belinda.
― Ótimo ― assentiu Fabrizio para mim. Vi respeito em sua
expressão e outra emoção que não identifiquei, não rápido o
bastante antes que a fachada voltasse ao seu rosto. ― Vai tomar
conta dela enquanto estiver no orfanato? Acho que deve levar mais
duas pessoas. Sage e Javier irão com vocês dois, caso aceite.
Eu acreditava que Alessandro não se oporia, mesmo que
preferisse que eu ficasse perto dos irmãos para saber se eles eram
confiáveis. Eu acreditava que eram, afinal, se não fossem, jamais
aceitariam deixar uma de suas irmãs sob a minha proteção.
― Sage precisa tomar conta de sua esposa e de sua filha ―
interveio Belinda antes que eu respondesse. ― Por que tanta
hesitação, Foguete? Está com medo de ficar sozinho comigo? ―
Pelo tom de sua última frase, ela estava com raiva. ― Se Stefano
não quiser ir, Fabrizio ― virou-se para ele, e percebi que eu não
gostaria do que ela diria ―, se estiver com medo, você pode chamar
El Diablo. Ele é lindo, e posso acabar me apaixonando...
Meus punhos se cerraram tão forte que não sei como as
juntas não se quebraram na época. Levantei-me, saindo de perto
dela, uma vez que não queria que visse minha reação. Eu tinha lhe
pedido que não falasse de nenhum cara enquanto estivéssemos nos
vendo. Só a mera ideia de aquele idiota tocando-a acabava comigo,
ou melhor, deixava-me louco para acabar com o verme.
― Ele não é para você, Belinda. ― A voz de Fabrizio soou
alta e dura. ― Há demônios demais nele, incapazes de você lidar.
Demônios... eu também tinha muitos, tanto que não sabia se
um dia seria feliz ou se poderia fazer alguém feliz. Se os irmãos de
Belinda achavam que ela não podia lidar com El Diablo, então não
gostariam que ficasse com alguém como eu.
― Preciso consultar Alessandro. ― Não queria ser o guarda-
costas de Belinda, pois não poderia sair de perto dela caso eu
surtasse novamente. Quando meus demônios me comiam vivo, eu
sumia por uns dias, mas, no orfanato, estaria com ela 24 horas por
dia.
Bem que Alessandro poderia me livrar daquilo e me mandar
voltar. Chega de ficar de olho nos Castilhos e lidar com uma
Diabinha que me faz ao mesmo tempo querer tomá-la e nunca mais
vê-la!
― Stefano... ― começou ela.
― Falei que vou conversar com Alessandro! ― Saiu
praticamente um rosnado.
Saí antes que ela pudesse me chamar de volta. Não estava
com humor para aturar mais de suas gracinhas. Fui à sacada a fim
de ligar para o meu irmão.
Vi notificações de mensagens, mas as ignorei. Não estava
com humor para ver nada naquele instante.
― Stefano? Aconteceu alguma coisa para ligar a essa hora?
― sondou Alessandro assim que atendeu.
― Houve um ataque no clube de luta dos Castilhos.
Explodiram metade do lugar ― informei.
― Ataque? De quem? ― Ouvi-o dizendo algo e depois uma
porta batendo.
― Não sabemos.
Contei-lhe tudo que aconteceu.
― Então não sabem quem fez?
― Não, Fabrizio vai investigar. ― Suspirei. ― De qualquer
forma, fui encarregado de proteger Belinda. Ela vai tomar conta do
orfanato onde trabalha essa semana.
Ele ficou em silêncio um segundo.
― Deve ir fazer o que lhe foi pedido ― disse por fim.
Encarei a escuridão da noite.
― O quê? Achei que não fosse aceitar por preferir que eu
ficasse aqui observando todos.
― Não, Rafaelle vai para aí, assim como Razor. Os dois
podem resolver isso junto aos irmãos Castilhos. Só tome conta da
garota.
Franzi a testa.
― Acho que eles são confiáveis e confiam em nós, afinal vão
me deixar cuidar de sua irmã, então posso encerrar aqui e ir
embora. Todos são sinceros e realmente adoram a Luna. ― Notei
isso durante o tempo que passei com eles e gostei.
― Não, fique aí por mais um tempinho, afinal pode ter
traidores, e preciso saber disso. ― O tom soou estranho para
Alessandro.
Por que a insistência em que eu ficasse ali e ainda tomasse
conta daquela Diabinha que fazia meu sangue ferver?
― Tem algo que está me escondendo? ― perguntei. ―
Algum outro motivo para eu estar aqui?
― Não, só faça isso, mas se lembre: não faça nenhuma
besteira ― advertiu.
― Isso não vai acontecer. ― Eu poderia ter-lhe dito que a
havia tocado, assim ele me chamaria de volta para casa, mas não
era de desistir de uma luta. Se aquela Diabinha gostava de mexer
com fogo, eu a faria se queimar debaixo de mim.
― Ótimo. Só foque em protegê-la ― pediu e desligou.
Não detectei mais nada ali, mas ele era bom em esconder as
coisas. Meu instinto me dizia que algo não cheirava bem naquela
história. Percebia isso desde que tinha chegado ali.
Estava a ponto de voltar para a sala, não querendo mais
pensar nas minhas dúvidas sobre aquilo tudo e mais controlado em
relação a Belinda, embora não menos furioso, mas notificações
sonoras de mensagens começaram a vir uma atrás da outra.
Resolvi checar o celular.
“Lamento... Só disse aquilo sobre El Diablo porque Santiago
estava desconfiado de algo”. Essa foi a primeira mensagem de
Belinda, antes de eu ligar para meu irmão.
Pisquei e olhei através da porta de vidro para a sala, onde a
vi sentada no mesmo lugar. Seus olhos se voltaram em minha
direção, e vi que ela estava sendo sincera.
Saber disso tirou um peso que nem notei que estava em meu
peito.
Li as outras mensagens:
“Por que não me respondeu?”
“Não devia ser ciumento assim. Quem falou que não tinha
ciúmes?”
“Se prometi que não tocaria no nome de outro enquanto
estávamos juntos, então devia acreditar em mim e não ficar puto da
vida e me ignorar.”
Era uma mensagem atrás da outra, e eu sentia que a cada
uma ela ficava mais irritada.
“Quer saber? Vai à merda! Se não acredita em mim, que
assim seja!”
Depois disso ela passou um tempo sem mandar outra
mensagem, até a última, um minuto atrás.
“Você é um idiota, estúpido, tapado e teimoso como uma
mula!”
Dessa vez eu ri com tantas palavras sinônimas. Ela estava
mesmo furiosa.
“Você mencionou outro cara. O que queria que eu fizesse?
Lesse sua mente? Sou algum telepata?”, escrevi e enviei.
Notei que ela estava respondendo, mas enviei outra
mensagem antes:
“Você me faz querer dobrá-la em meus joelhos e encher essa
sua linda bunda de palmadas.”
Observei sua reação através do vidro e a vi se remexer no
sofá como se estivesse se sentindo incômoda.
“O quê? Minha mensagem fez essa sua linda boceta pulsar?
Está molhada para mim? Estou faminto para comê-la, contando as
horas para ficarmos sozinhos e provar desse mel que se tornou meu
vício”, mandei.
Eu poderia tê-la fodido mais cedo, mas vi hesitação em seus
olhos. Ela tentou esconder, mas não conseguiu. Além disso, eu não
queria ter de ser rápido. Quando possuísse aquele corpo delicioso,
planejava passar horas desfrutando dele.
― De quem são essas mensagens? ― sondou Santiago.
Eu quis rir quando sua cabeça voou na direção dele. Foi tão
rápido que não sei como não teve um torcicolo.
Entrei na sala de olho nela, que estava com a respiração
desigual.
― Serena ― mentiu, recuperando-se.
Santiago franziu a testa. Antes que ele comentasse algo,
chamei a atenção dos Castilhos informando que já tinha minha
resposta. Assim Belinda não precisaria mentir mais, embora eu
adoraria ouvir o que diria.
― Então? ― sondou Fabrizio.
― Tudo certo, mas vou tomar providências quanto à
segurança de Belinda. Não confio em seus homens até ter certeza
de que não estão envolvidos no ataque. O guarda do clube de luta
com certeza foi comprado antes de ser morto, só assim para deixar
que eles entrassem armados, então pode haver mais traidores. ―
Olhei para Sage e Javier.
Esse último se eriçou.
― Está nos acusando? ― rosnou. ― Poderia ser você.
Sorri de modo frio.
― Se fosse eu, não explodiria o local, matando pessoas que
não conheço ― falei com um sorriso sombrio para Sage. ― Eu iria
atrás daqueles que quero e os torturaria por horas, demorando para
mandá-los ao inferno.
Sage sorriu com ironia.
― Como você quer fazer comigo? Estou aqui. Por que não
faz? ― inquiriu, mas no final parecia mais curioso que provocativo.
― Ele estaria morto antes que tentasse algo ― disse
Benjamin.
― Mas teríamos que explicar o sumiço dele a Luna ―
interveio Santiago, parecendo falar consigo mesmo.
― Não tenho medo da morte. ― Ignorei os dois, continuando
a fitar Sage. ― Só há uma razão para eu não ter dado fim à sua
vida: porque, de algum modo, Luna tem amizade por você e sofreria
com isso.
Sage não disse nada, mas não parecia com medo.
― Chega de tanto querer matar um ao outro. ― Belinda se
pôs de pé e ficou entre mim e Sage. Eu não o atacaria, embora
vontade não me faltasse. ― Se a reunião acabou, acho melhor
irmos dormir. Amanhã terei que acordar cedo.
Dormir... Eu não sabia quando havia tido uma noite de sono
decente. Poderia sair para espairecer, mas não adiantaria; naquele
momento, só queria ficar ao lado de Belinda.
Após ela ir se deitar, fiquei na sala mais um pouco a fim de
resolver tudo antes da sua estada no orfanato.
― Quem vai chamar para ajudar você a protegê-la? ―
sondou Fabrizio.
Só estávamos nós dois ali, os outros tinham saído para
checar alguns dos negócios após a reunião.
― Viper e Lyn. ― Ao menos eu esperava conseguir a ajuda
dele.
― Lyn? O assassino fantasma? ― sondou. ― Achei que ele
não quisesse vê-lo.
― Sim. Tem algo que preciso dizer, mas Belinda não pode
saber que contei. Ela pediu segredo, porém a sua segurança vem
em primeiro lugar. ― Eu não me sentia mal por não cumprir a
promessa. O irmão dela tinha que saber.
A expressão de Fabrizio se fechou, parecendo não gostar do
que estava ouvindo.
― O que Belinda esconde de mim? Falei com ela tem pouco
tempo, e não disse nada. ― Sua voz soou dura.
― Aqueles homens não foram ao cemitério por mim. Eles
queriam a Belinda ― informei.
Ele se levantou parecendo o que era realmente, um
assassino cruel.
― O quê?! Ela não pensa em me dizer? ― Sacudiu a cabeça
― Por que...
― Porque, se fizesse, você não a deixaria trabalhar mais, e
Belinda precisa disso. ― Suspirei. ― Ela esconde a dor que sente
de todos. Às vezes a vejo rir, mas por dentro isso a consome aos
poucos.
― Porra! ― exasperou-se.
Era difícil ver aquele homem calmo e frio perder o controle.
― Lyn apareceu há algumas semanas para alertar sobre
isso. Disse que ela estava metendo o bico onde não era chamada.
No começo, não achei nada que a relacionasse a quem quer que
fosse, mas...
― Após o que aconteceu com os meninos do orfanato, acha
que tem a ver com a profissão dela?
― Suspeito que ela descobriu algo, mas não sabe, e a
consideram uma ponta solta.
Ele suspirou.
― Você acha que vou deixá-la ir para aquele lugar depois
disso? ― Cerrou os punhos.
― Ela precisa focar no trabalho, e vamos protegê-la, vou me
certificar disso ― prometi. ― Além disso, pode não ser nada
relacionado ao instituto, mas às crianças que ela vai verificar após
as adoções, já que faz o acompanhamento dos casos. Talvez
apenas tenha relação com os meninos sequestrados, e, como os
libertaram, ninguém tenha mais nada contra ela.
Arqueou as sobrancelhas.
― Acredita mesmo nisso?
― Não, mas Belinda tem que trabalhar. Ficar parada em casa
vai consumi-la. Deixa que eu tomo conta da segurança dela. Ficarei
ao seu lado 24 horas por dia. Viper nos seguirá fora do
estabelecimento, e, se eu conseguir ajuda de Lyn, ele pode nos
vigar de longe.
― Ficará sob sua responsabilidade a segurança dela, e, se
acontecer algo à minha irmã, você estará morto. Está ciente disso?
― Não era uma ameaça vazia. Eu sabia que ele faria exatamente
isso.
― Fechado ― falei com tranquilidade. Nem parecia que
estávamos falando da minha morte. Em uma época de minha vida,
eu temia isso, mas fazia muitos anos que não mais. ― Se eu não
conseguir a ajuda de Lyn, estava pensando em chamar El Diablo.
― Você não parece gostar dele ― observou, checando-me.
Dei de ombros. Tinha certa antipatia por ele, ainda mais após
saber que Belinda o achava um deus grego ou fosse lá o que fosse
essa merda.
― El Diablo é profissional. Sei que sua linha de trabalho são
assassinatos, mas ele é bom com proteção também. Fez isso com a
Mia e deu muito certo. Pode funcionar com Belinda,
independentemente do que eu sinta em relação a ele. ― Asco,
pensei.
Ele assentiu.
― Acha que o ataque no clube tem relação a Belinda? ―
Serviu-se uma bebida.
― Não creio. Quem fez isso parecia querer espionar alguma
coisa, ao contrário daquele dia em que tentaram nos matar. Aqueles
homens são treinados em um lugar que leva tudo de você e não
deixa nada. Acredito que seja para um lugar desses que iam levar o
garoto que Belinda toma conta. ― Levantei-me, querendo sair logo
dali.
― Prometheus?
― Sim. Não sei bem sobre isso, mas parece ser uma rede de
corrupção de lutas clandestinas. As crianças são forçadas a isso e a
coisas muito piores. ― Eu não estava me sentindo muito bem
falando sobre o assunto.
Por um momento, achei que ele fosse perguntar como eu
sabia disso, mas não o fez. Agradeci-lhe mentalmente.
― Tem gente minha procurando informação sobre esse nome
― informou-me.
Assenti.
― Vou tomar conta dela, e você encontre também quem
explodiu o seu estabelecimento. ― Virei-me para sair, mas ele me
chamou. Voltei-me em sua direção. ― Sim?
― Mãos para si enquanto estiver com Belinda ― avisou,
letal. ― Ela não é algo que você pode pegar e descartar em
seguida. Minha irmã tem um futuro com alguém que morreria por
ela, que daria sua vida para salvá-la. Se você não vai ser esse
homem, não a toque.
― Certo. ― Saí, porque não queria falar do que eu estava
sentindo por Belinda. Na verdade, queria não sentir nada, mas não
achava possível evitar.
Belinda tinha a capacidade de conquistar qualquer um. Ao
mesmo tempo em que era valente, era altruísta, adorava ajudar os
outros, como aqueles meninos sem pais e família.
Eu faria qualquer coisa para ajudá-los a se livrar dos malditos
sequestradores. Não sabia se havia mais, mas, se aparecessem,
impediria que os levassem.
Como não conseguia dormir e não ia mandar mensagem
para Belinda, pois devia estar dormindo, resolvi ir até ela. Só
Fabrizio estava no apartamento. Os guardas se encontravam do
lado de fora.
Entrei no quarto dela sem que ninguém me visse e me sentei
no sofá ao lado da cama. Ela dormia tranquilamente, então não a
acordei. Ficar ali, perto dela, ajudava a afastar aquela ansiedade do
meu peito.
Queria me deitar ao seu lado, mas temia machucá-la caso eu
acordasse de um dos meus pesadelos, então me contentei em vê-la
dormir, pois, pelo visto, era só isso que eu seria capaz aquela noite.
Peguei sua mão e a segurei sem que acordasse. Respirei
fundo seu aroma no quarto. Pensei nas palavras de Fabrizio e no
que Belinda merecia. Estaria eu estragando sua vida? Poderia ir
embora agora... mas só pensar nessa ideia retorcia meu intestino.
― Não vou deixar ninguém tocar em você. ― Essa era uma
promessa que eu cumpriria custasse o que custasse. Moveria o Céu
e o Inferno para mantê-la.
Estávamos no carro a caminho do orfanato após deixar
nossas coisas na casa em que ficaríamos por aqueles dias. Passei
a noite observando Belinda dormir. Sempre que fazia isso, sentia-
me muito bem, até pegava no sono. Só acordei pela manhã, ainda
cedo, com ela despertando-me antes que seus irmãos me vissem
no quarto dela.
Fiquei chocado ao perceber quanto dormi. Não tinha uma
noite assim havia muitos anos. O que mais me impressionou foi não
ter notado a hora em que ela me cobriu com um cobertor, pois a
qualquer mero toque, eu acordava assustado e fora de mim. Nem
sequer ouvi seus passos. Seria Belinda a causa disso? Eu não
sabia, mas descobriria durante aquele tempo em que ficaríamos
juntos.
A sensação de dormir sem interrupções foi maravilhosa. Eu
esperava que acontecesse de novo. Muitas pessoas com insônia
como eu se entupiam de remédios, álcool e drogas, mas eu não era
fraco a esse ponto. Um homem entorpecido pelas drogas fica
impotente, e eu jamais estaria assim novamente.
― Obrigada por ter vindo comigo ― agradeceu Belinda assim
que virei à direita na rodovia.
― Não foi nada. Não confio muito nos homens dos seus
irmãos nesse momento.
Não queria deixá-la sozinha, por isso estava ali e prepararia
tudo para sua segurança. Viper já tinha ido para o local e me
esperava lá, porém não consegui localizar Lyn, portanto tive que
chamar El Diablo mesmo.
― Por isso não aceitou nenhum deles aqui? ― indagou ela
com o cenho franzido.
― Não posso focar em sua segurança se não confio neles,
não é? Além disso, seus irmãos não sabem que aqueles caras no
cemitério queriam você e não a mim ou a eles ― menti. ― Vamos
checar cada um no orfanato, pois acredito que tenha um infiltrado
nesse lugar. Só assim para saberem dos garotos adotados. ― Tirei
uma das mãos do volante e peguei a dela.
― O maldito do Ramoni deu os meninos para pagar uma
dívida de jogo. O que isso tem a ver com o orfanato?
― Neto disse que as coisas estavam indo bem, mas então
Ramoni começou a jogar. Pelo que descobri naquele dia, ele
recebeu um telefonema dizendo que seria morto se não fosse ao
cassino, e ali começou a perder e ficou em débito com o
estabelecimento. O idiota foi um frouxo por amar mais a vida dele do
que a mulher. ― Era cada tipo de homem que não devia existir... O
bom era que agora ele estava no inferno. Consegui que ele saísse
da cadeia, eliminei-o e tive muito prazer com isso.
― Então você está pensando que tem alguém dentro do
orfanato que informa onde os meninos estão para que sejam
sequestrados? ― Ela trincou os dentes.
― Tem outra forma de levar garotos. ― Contei a ela sobre o
que vi no cemitério.
― Numeram os meninos como gado? ― Sua voz se elevou
duas oitavas.
― Sim. Havia números nos corpos dos indivíduos no
cemitério e até nos dos que estavam no cativeiro dos seus irmãos.
Essas pessoas têm o intuito de convencer as crianças e
adolescentes a ir com elas, falam de coisas que os meninos
querem, e então eles são surpreendidos com o inferno que
encontram no lugar para o qual são levados. É isso que vou checar
aqui também. ― Tinha um gosto amargo em minha boca.
― Não acredito que meus garotos queiram ir embora para
algum lugar ― sussurrou ela.
Belinda não perguntou como eu sabia tanto sobre esse
assunto. Poderia imaginar que descobri na tortura dos caras, mas,
pelo seu olhar, eu sabia que não acreditava nisso. Ela sabia que
tinha algo que eu não estava contando, mas, como sempre, não
perguntou nada, mesmo que estivesse curiosa.
― Belinda, eles vivem em um orfanato. Com certeza querem
ser livres e, quando têm uma proposta tentadora, caem em cima.
Conheço isso. Presenciei coisas assim, e no final, quando caem no
inferno, é tarde demais. ― Sacudi a cabeça, com a mente nebulosa.
― Não faz sentido. O sumiço de uma criança em um orfanato
teria que chamar a atenção de assistentes sociais e vários outros
profissionais, além da polícia.
― Verdade. Isso me faz pensar que existe uma rede de
corrupção de menores, envolvendo pessoas que trabalham no setor,
e não devem ser poucas. Tem que ter muita gente envolvida. ―
Quando colocasse minhas mãos nelas, eu as faria pagar caro.
― Stefano, se a gente se deparar com algo assim, você
conseguirá lidar? Se for demais para você, é melhor deixar só com
Viper e El...
― Não, vou lidar com qualquer coisa que esteja lá dentro. Só
o que você tem que fazer é ficar diante das minhas vistas. Eu te
protejo de perto, enquanto Viper e El Diablo defendem nossa
retaguarda caso surja algum perigo.
― Obrigada mesmo por estar aqui. ― Apertou minha mão. ―
Lorrany vai ao orfanato três vezes por semana, caso queira vê-la.
Meu coração acelerava toda vez que pensava em contar a
alguém não só o que passei naquele lugar, mas o que presenciei,
enquanto não podia fazer nada.
― Eu...
― Como eu disse, tome seu tempo, mas precisa ir a um
profissional nem que seja para não dizer nada ao menos no início.
Depois acredito que vai ter força para se abrir. ― Aproximou-se de
mim, beijando meu rosto. ― Estarei com você sempre que precisar.
Esse gesto tocou fundo meu peito. Nós nos beijávamos, mas
num contexto diferente. Belinda não aceitava muito carícias fora dos
nossos momentos íntimos. Isso me pegou de surpresa, aliviando a
sensação enervante em meu peito.
Como eu não disse nada, ela se afastou. Não foi porque eu
não queria, simplesmente não conseguia verbalizar as palavras;
ficaram entaladas em minha garganta.
Estar próximo a alguém daquela forma era algo novo. Seria
daquela maneira que meus irmãos se sentiram? Se sim, era certo
deixar aquele sentimento fluir? Não, nada que havia em mim
permitiria a aproximação de alguém, não daquele jeito. Estávamos
nos divertindo, mas eu esperava que não passasse disso.
― Então o que vamos fazer quando chegar lá? ― perguntou
ela com tom estranho, como se se sentisse desconfortável após
suas palavras e gesto.
Uma parte de mim queria que ela sondasse o que eu estava
pensando, mas eu teria dito? Não acreditava nisso, porque não
sabia o que estava rolando de verdade entre nós. Só me sentia
confuso e desejava aquela mulher a cada dia mais.
― Aja normalmente enquanto a sigo como seu novo
segurança para não levantar suspeitas, assim vai ficar mais fácil
pegar os infelizes. ― E, quando isso acontecesse, eu lhes ensinaria
o que era bom. Eu os faria pagar caro.
― Estou ansiosa por essa semana, não só porque será bom
para minha carreira, mas porque quero que os meninos se sintam
bem no orfanato, que não queiram fugir de lá. ― Ela suspirou
parecendo triste, mas se alegrou de repente. ― Vou fazer alguma
coisa para deixá-los animados!
Nunca Belinda ficava para baixo por muito tempo.
― Vamos focar em descobrir se há perigo lá, depois
resolveremos isso. ― Era melhor assim. Eu não estava muito com
humor para festas.
Parei o carro no estacionamento do edifício imenso, que
parecia uma escola.
― Vou observar todos os funcionários, assim teremos certeza
de quem está envolvido e quem não está, embora saiba de uma
coisa: nada acontece em um lugar desses sem que o diretor saiba.
― Desde a primeira vez que vi Jared, não fui com sua cara, e isso
não tinha nada a ver com o fato de ele ter uma queda por Belinda.
― Jared? Não, isso...
― Não é possível? ― zombei com escárnio. ― Deve checar
com quem anda, Diabinha, mas isso só vai aprender com a vida.
Sua expressão se fechou.
― Já aprendi. ― Tinha um toque de dor em sua voz. Ela
tentou esconder, mas eu percebi.
Pensei em minhas palavras e no que ela deu a entender,
então me lembrei do ex-namorado que a enganou e, por causa
disso, ela acabou perdendo a sua irmã.
― Não foi isso que eu quis dizer ― apressei-me em explicar.
Não me dava bem com lágrimas, além disso não queria que ela se
culpasse, pois era isso que fazia.
― É o que é ― sussurrou.
Virei-me para ela.
― Belinda, o que aconteceu não foi sua culpa. Nunca
acredite nisso, tá? Agora pare de pensar no passado. Lá dentro, não
deixarei que fuja das minhas vistas.
― Não acho que meu chefe vai concordar com isso...
― Não dou a mínima para o que pensam. A única coisa que
farei será protegê-la ― destaquei, interrompendo-a.
Ela esboçou um sorriso.
― A única coisa que fará? Achei que teríamos momentos
juntos.
Eu ri.
― Também estou ansioso por isso, mas será à noite. ―
Estava mesmo louco para me apossar do seu corpinho lindo, só não
podia me distrair do que tinha que fazer ali.
Saímos do carro, e senti alguns olhares em nós. Só podiam
ser El Diablo e Viper, que estavam em algum lugar nos vigiando.
Não ousei procurá-los.
― O bom é que eles não sabem quem sou. Todos pensam
que sou assim ― ela apontou para seu corpo. ― Só sabem que
pertenço a uma família rica e poderosa, mas nem imaginam que
mafiosa.
Belinda vestia um vestido largo de vovó e usava óculos, que
ficaram bonitos sobre seu nariz arrebitado.
― Mesmo vestida assim, continua sexy ― comentei com um
sorriso.
― Se comporte! ― ralhou, dando-me um tapinha.
Olhei para a marquise, sob a qual avistei o diretor do lugar
sorrindo. Esse homem me fazia querer apagar aquele sorriso idiota
de sua cara.
― O engomadinho parece feliz em te ver ― grunhi com os
punhos cerrados.
― Somos amigos, e espero continuarmos sendo se ele não
for um dos desgraçados que estão atrás dos meus garotos. ― Ela
não parecia acreditar que aquele cara de cabelo lambido fosse um
criminoso.
― Veja por esse lado: se ele for, vou adorar esculpir o sorriso
do Coringa nele. ― Respirei fundo, ficando ao lado dela.
― Relaxa. Jared nunca tentou nada comigo, além disso ele
vai para a Rússia a negócios. É por isso que estou ocupando o lugar
dele.
Eu ligaria para Nikolai Dragon, o chefe da máfia russa. Ele
era casado com a prima do meu cunhado. Pediria algumas
informações sobre o que aquele homem faria de fato lá. Eu era bom
em ler as pessoas e sabia que ele não era flor que se cheirasse. Por
trás daquele sorriso de menino meigo e doce, carregava algo
escuro. Eu só precisava descobrir o que era.
― Sei justamente por que ele fez isso ― resmunguei com
tom amargo.
Ela me fuzilou.
― Acha que não sou boa no que faço para merecer ocupar o
cargo de diretora substituta?
― Justamente o contrário. Você ama o que faz, e ele está se
aproveitando, mas veja por esse lado: o idiota pode querer algo que
não consegue ter, e por isso lhe deu essa responsabilidade, para
ganhar pontos, mas mostre o quanto é boa no que faz e que jamais
dará uma chance ele.
Sua expressão relaxou.
― Não estou me vendendo, não é? ― Olhou para o idiota e
depois a mim. ― Não penso em ficar com ele, jamais me rebaixaria
a esse ponto. Quero conquistar as coisas por mim mesma.
― Está aproveitando uma oportunidade, que vai assumir e se
sair bem. ― Aproximei-me mais dela.
― Obrigada. Não achei que você fosse assim tão bom em
dar conselhos, achei que fosse dizer para eu paquerar o cara e
estava prestes a aceitar a dica. ― Apressou-se em dizer assim que
fechei a cara e sorriu travessa: ― Relaxa, estou brincando. Nesse
momento só quero você.
Dei um sorriso após relaxar e me aproximei, falando em seu
ouvido:
― O único que estará com a boca entre suas pernas e o pau
em sua boceta serei eu, não esse trouxa nem qualquer outro cara.
― Afastei-me quando sua respiração ficou pesada.
Jared saiu do seu lugar e veio em nossa direção com uma
expressão fechada a princípio, mas logo deu aquele seu sorriso
falso.
― Se comporte, Foguete ― arrulhou ela assim que rosnei
baixo.
Nenhum chefe viria buscar uma funcionária no
estacionamento. Aquele cara estava louco para entrar em sua
calcinha, algo que não aconteceria. Eu suspeitava que ele estava
aprontando alguma coisa, só não sabia o que ainda, mas iria
descobrir.
― Oi, Bella, que bom que veio! ― Aproximou-se como se
fosse beijá-la no rosto, mas a puxei para longe dele, o que o fez me
olhar com o cenho franzido. ― Outro segurança?
― Sim, o outro está doente ― mentiu ela. ― Esse é...
― Stefano. ― Não sabia se meu sobrenome tinha poder em
Barcelona, por isso achei melhor não o dizer, assim ele não nos
ligaria à máfia. Esperava que baixasse a guarda ao imaginar que eu
fosse um mero segurança. E resolvi acrescentar: ― E sou
namorado da Bella.
Como suspeitei, detectei uma surpresa nítida em seu olhar. O
que ele achava? Que ela não teria um namorado? Vi fotos dele com
mulheres que não pareciam nada com a Belinda naquele disfarce.
Então o que ele queria dela se não estava interessado?
― Sou Jared, o diretor do orfanato ― apresentou-se,
parecendo orgulhoso disso.
Quase ri de sua pompa. Como se eu me importasse com
quem ele era ou o que fazia....
― Não é novo demais para exercer esse cargo? ― Eu o
avaliava.
Acreditava que tinha quase a mesma idade de Belinda. Devia
ser só um pouco mais velho, quase da minha idade.
― Meu pai se aposentou e me deixou o cargo. Esse legado
passou de geração para geração ― respondeu ele e se virou para
ela. ― Seu namorado ― ele forçou as palavras a sair, notei isso ―
pode se acomodar no refeitório enquanto mostro a você tudo que
precisa fazer em minha ausência.
Notei que o infeliz queria ficar sozinho com ela e não gostei
disso.
― Na verdade, vou ficar com Bella, se não se importa ―
emendei esse final por causa do olhar aguçado de Belinda, embora
eu não desse a mínima para o que aquele engomadinho pensasse
ou deixasse de pensar. Não ia pedir autorização a ninguém, muito
menos àquele imprestável.
Fui ao carro pegar minha mochila, sem a qual eu não ficava,
ainda mais se houvesse a necessidade de usar o que estava em
seu interior.
O cara puxou Belinda para trás de uma árvore,
provavelmente para eu não ouvir, mas escutei suas palavras,
mesmo aos cochichos.
― Bella, ele não pode seguir você o tempo todo ― comentou
o maldito. O engomadinho estava de costas para mim, então não
me viu aproximando-me. ― Esse é um ambiente de trabalho.
― Eu sei, mas vou fazer o meu trabalho, e ele, o dele. ― Ela
suspirou falsamente. ― Não quero que ele perca o seu trabalho.
Ah, esse infeliz vai acabar morto com um tiro na testa! É isso
que vai acontecer se não tirar a mão do braço dela.
Belinda me lançou um olhar que ordenava que eu ficasse
quieto. Essa mulher parecia me enxergar por dentro e por fora. Isso
não era bom.
― Vamos fingir que ele não está aqui ― pediu ela com um
sorriso, desvencilhando-se do toque dele.
Oh, Diabinha, vamos ver se vai mesmo ser capaz disso. Eu
poderia dizer uma resposta espertinha, mas estávamos em seu
trabalho, e eu devia respeitá-lo.
― Ele precisa estar comigo, ordens dos meus pais. Stefano
gosta de fazer o trabalho bem feito.
― Imagino ― ele resmungou baixo, quase inaudível, depois
falou alto para Belinda: ― Eu vou na frente e encontro você lá.
Ela assentiu enquanto ele entrava no orfanato.
― Acha que ele está...
― Querendo entrar em sua calcinha? ― Sabia que ela não ia
perguntar isso, mas resolvi brincar. Não queria que Belinda
pensasse nos problemas, ou as coisas podiam ir de mal a pior,
afinal ela podia querer investigar, e o infeliz resolver machucá-la.
Bufou.
― Pode querer isso, mas não chegará perto de lá. ― Fez
uma careta.
Coloquei a mochila nas costas e a puxei para trás da árvore,
assim, se alguém olhasse da casa, não conseguiria nos ver. Beijei
sua boca.
― Stefano, eu tenho que...
― Eu sei que precisa ir, mas se lembre, quando estiver lá
com o engomadinho, de que o único a ter essa boceta e todo seu
corpo serei eu ― falei em seus lábios.
Ela riu deliciada.
― Ficarei atenta a isso. ― Sacudiu a cabeça e se afastou. ―
Não precisa ficar todo tempo comigo aqui, sou capaz de lidar com
alguém que queira me fazer mal. Enquanto isso, tome esse tempo
para checar ao redor, ir aonde os garotos estão e tentar descobrir
algo.
― Farei isso. ― Sabia que Viper e El Diablo estavam de olho
nas câmeras que tinham instalado do lado de fora do orfanato.
Dentro, eu tomaria conta. Se houvesse um problema, eles me
diriam. Seria bom se tivéssemos câmeras dentro do local, mas não
queríamos estragar o disfarce.
― Esses meninos tiveram uma vida sofrida, passaram por
coisas terríveis que os deixaram sem esperança. Não será fácil se
enturmar com eles, mas conheço você, Stefano, sei que pode fazer
qualquer coisa. ― Ela parecia ter tanta confiança nisso...
― Sou fácil de fazer as pessoas me amarem ― brinquei com
um sorriso jocoso.
― E quanto a você? É fácil amar alguém? ― sondou
parecendo curiosa.
― Só há quatro mulheres pelas quais daria a minha vida ―
disse a verdade, embora acreditasse que estava entrando uma
quinta pessoa na equação. Contudo, não lhe disse isso, porque
aquele sentimento me fazia temer. Eu não queria amar mais
ninguém. Quanto mais uma pessoa entrasse em minha vida, maior
era o risco de perdê-la.
Achei que Belinda iria perguntar quem eram as mulheres,
mas, como sempre, não fazia nada do que eu pensava que faria.
Embora eu achasse que ela tinha uma noção após nossa conversa
pelo túnel.
― Sorte delas então. ― Não parecia se importar ou
escondeu bem, depois entrou no prédio antes que eu pudesse dizer
algo.
Queria entender o que ela pensava e o que estava sentindo
em relação a mim. Às vezes sentia que ela pensava em nós mais do
que como um simples caso, mas então, em outros momentos, a
sentia tão fria. Seria esse o jeito dela ou realmente não tinha
nenhum sentimento por mim?
A pergunta que não queria calar era: por que eu me
importava com isso? Era melhor focar no trabalho a pensar naquilo
agora, porque logo tudo passaria, assim que eu fosse embora.
No começo, achei que seria fácil me enturmar com os
garotos, porém se provou o contrário. Eu sentia a tensão neles
sempre que um dos guardas passava perto.
Notei dois deles, um alto e outro mais baixo. Eles lançavam
olhares de alerta aos meninos sempre que alguma das funcionárias
do local se aproximava.
Peguei meu telefone, tirei uma foto de ambos discretamente
e mandei por mensagem para El Diablo investigá-los.
“Cheque esses dois homens para mim. Pela forma como
estão agindo, são suspeitos.”
“Farei”, foi a mensagem que veio de volta.
Assim que ele o fizesse, me mandaria o resultado. Era
melhor saber com quem estava me metendo. Eu não estava
gostando do medo nos olhos daquelas crianças. Já tinha visto isso
antes, algo que não achei que presenciaria de novo, ainda mais em
um lugar como aquele.
Enquanto o que pedi não viesse, iria colocar em prática o
meu plano. Fui até uma das mesas no refeitório na hora do café da
manhã. Nela havia quatro garotos cuja faixa etária variava de 10 a
15 anos. Pela forma como reagiram, sabiam o que estava
acontecendo e estavam envolvidos.
― Posso me sentar com vocês? ― Enrolei as mangas da
minha jaqueta, mostrando algumas tatuagens. Isso geralmente
chamava a atenção dos garotos. Esperava que daqueles também.
Foi assim comigo no passado, quando vi meus irmãos com suas
tatuagens.
Quatro pares de olhos se voltaram na minha direção, alguns
com expressão dura, outros, curiosa. Havia várias outras crianças e
adolescentes às mesas pelo salão.
― Claro ― disse um dos meninos, que tinha uns 12 anos.
Notei, do outro lado, um dos guardas ficar tenso com minha
aproximação dos garotos, embora não veio ao local onde eu estava.
Bom para ele.
Elevei meu queixo em sua direção, um cumprimento para
mostrar que eu não tinha medo dele e de seu comparsa.
― O que significa? ― um dos garotos, o mesmo que me
permitiu sentar-me à mesa, questionou. Indicava uma das minhas
tatuagens, no braço esquerdo, um espaço em preto com um pião
girando no cento.
Eu não queria dizer o significado, mas, se não o fizesse,
demorariam para se abrir comigo.
― Durante um tempo, estive em um buraco-negro, era pião
nas mãos dos outros ― respondi finalmente. ― Até que dei um
basta e lutei pelo meu próprio caminho.
Após dizer isso, me arrependi. Queria que os garotos
ficassem ali, não que saíssem por aí atrás de seu destino, então me
apressei em explicar o significado para que entendessem.
― Embora eu tivesse tudo e pessoas que se preocupavam
comigo, queria viver aventuras pelo mundo, e onde achei que
encontraria o paraíso, me tornei isso. ― Apontei para o pião. Na
verdade, tornei-me coisa pior, mas eles não precisavam saber
daquilo.
Uma parte do que eu disse era verdade, sobre ter pessoas
que se importavam comigo, minha família – ao menos parte dela.
Todavia, não era verdade que eu quis fugir e viver coisas novas.
Jamais teria deixado meus irmãos e minha mãe.
Os meninos não disseram nada, mas percebi que minhas
palavras mexeram com alguns deles. Outros continuaram a comer
desconfiados, principalmente um deles, o de cabelos ruivos, cuja
expressão era a mais dura e parecia ser o líder do pequeno grupo.
O curioso foi que o menor deles calou a boca após perguntar
sobre a tatuagem depois do olhar de advertência do suposto líder.
― Podem me dizer o nome de vocês? ― inquiri olhando cada
um com meu sorriso divertido.
― Por que quer saber? ― indagou um deles com a testa
franzida.
Pelo visto eu precisaria de mais do que meros sorrisos
amigáveis para fazer aqueles garotos se abrirem. Era claro que
levaria tempo.
Dei de ombros enquanto comia.
― Me chamo Collen ― disse o menor, que parecia mais
conversador. Ele me lembrava muito o Jet.
Parei nesse pensamento, ou não conseguiria continuar
falando com os meninos. A minha função era descobrir a verdade
por trás daquele lugar.
Os outros disseram seus nomes. O único que não o fez foi o
líder deles.
― Antônio ― informou Collen, indicando o de cara fechada.
Podia sentir olhos em mim, não só os dos dois guardas.
Devia haver mais ali, mas só liguei para um olhar, o de Belinda. Ela
estava perto do refeitório falando com outra mulher.
Sorri, pegando meu copo de café e o levantando em um
cumprimento, encontrando seus olhos. Ela retribuiu e disse algo à
sua companhia.
― É namorado da senhorita Bella? ― perguntou Collen ao
seguir meu olhar.
Notei que os outros meninos estavam curiosos com isso, mas
não verbalizaram nada.
Namorado? Não, mas tínhamos um lance que eu não queria
que acabasse tão cedo. Eu disse aquilo ao chefe de Belinda porque
não queria que o infeliz arrastasse asa para ela.
― Sou segurança dela ― informei.
― Ela é muito boa. Vou sentir falta dela... ― interrompeu-se
como se falar aquilo lhe trouxesse dor.
Percebi o garoto Antônio chutando-o por debaixo da mesa,
mas fingi não notar, embora isso tenha me dado o que pensar. Ou
ele seria adotado, o que eu duvidava muito, ou eles estavam
pensando em sair. Seria por isso que os guardas estavam tão
tensos? Eu podia checar alguma coisa com eles, mas isso geraria a
suspeita de todos ali. Precisava ir com calma, afinal não podia
torturá-los por respostas, mas podia fazê-lo com um dos guardas.
― Sim, Bella é perfeita. ― Mesmo com aquela roupa feia ela
era sexy. ― Obrigado, garotos, por me deixarem ficar aqui e fazer
companhia a vocês. ― Fiquei de pé. ― Agora vou falar com Bella. A
gente se ver por aí.
Saí antes que dissessem algo, deixando claro que eu não
queria saber de nada que não estivessem prontos para contar. Iria
ter minhas respostas de outro jeito, um no qual eu era bom.
Cheguei ao local em que Belinda estava com sua colega.
― Oi, moças ― cumprimentei-as sorrindo.
― Stefano, meu novo segurança ― disse ela à mulher,
depois a mim: ― Essa é Sully, uma das cuidadoras daqui.
A loira olhou para Belinda e depois para mim com um sorriso.
― Esse segurança é mais agradável que o outro ―
comentou.
Realmente Javier não era de sorrir muito. Até eu podia ver
por que a mulher disse aquilo.
― Posso falar com você? ― pedi a Belinda.
― Claro ― assentiu.
A mulher saiu, deixando-nos a sós. Ela se aproximou mais de
mim.
― Descobriu...
― Em casa conversamos ― cortei-a, só no caso de alguém
estar ouvindo. ― Mas esse processo é lento. Não posso ir direto,
ainda mais com olhos sobre mim.
Ela suspirou, checando o salão.
― O que foi? ― sondei, notando-a estranha.
― Tem algo que Jared disse que está me incomodando ―
sussurrou.
― O quê? ― questionei. Talvez eu descobrisse algo com sua
resposta e associasse ao que já tinha visto e ouvido. Acreditava que
a maioria era paga para manter a boca fechada, pois tinham garotos
tensos com a aproximação dos guardas, outros com os punhos
machucados, como se tivessem socado algo, ou seja, podiam ter
sido testados ou estar treinando. O estranho era que não havia
como fazerem isso sem ser notados.
― Me perguntou se conheço alguém que pertence à máfia.
― Olhou-me. ― Acha que ele desconfia de quem eu seja?
― Não creio. Mesmo com aquela fachada de bom moço, ele
teria tentado eliminá-la. Acho mais provável que saiba que a máfia
interceptou a entrega dos garotos, e eles devem estar se
perguntando como integrantes da máfia sabiam disso. Ao menos eu
ficaria curioso se estivesse em seu lugar. Vamos ficar de olho.
― Certo, vou ficar mais atenta, afinal você não pode estar
comigo 24 horas.
― Falei que ia ficar de olho em você e vou manter essa
promessa ― disse com firmeza. ― Assim que chegarmos em casa,
quero conversar sobre algo que descobri.
Não queria falar ali. Varri meus olhos pelas proximidades e
notei Antônio indo até um dos guardas que me observaram quando
eu estava à mesa dos garotos.
Eu não sabia o quê, mas algo estava rolando ali. Só
precisava descobrir o que era.
― Vamos esperar que não seja o que estamos pensando. ―
Ela tinha esperança, isso porque não sabia o que eu havia
presenciado.
Depois disso, Belinda voltou ao trabalho, e fiquei de olho
tanto nela como no orfanato.
Era bom que ali havia muitas formas de os meninos se
divertirem, como basquete, natação e outros esportes. Mesmo
assim, eles queriam fugir. O garoto Antônio tinha saído após eu vê-
lo mais cedo no refeitório.
No final da tarde, Belinda se aproximou de mim com sua
maleta e um sorriso imenso.
― Posso saber a razão desse sorriso lindo? ― Queria puxá-
la para mim e me apossar de sua boca, mas estávamos em público
e no trabalho dela.
Por que eu tinha esse desejo? Era algo mais do que sexual, e
eu não estava pronto para isso. Queria só terminar o que tinha ido
fazer na Espanha e partir.
― Você está bem? ― indagou ela quando chegamos ao
carro. ― Não é ruim se sentir mal se essa porcaria tiver infestado
este lugar.
Mudei minha expressão, porque ela parecia enxergar através
de mim.
― Esses garotos passaram por tanta coisa para chegar aqui,
onde deveria ter algo para eles, mas o que encontraram? Toda essa
corrupção. ― A fúria que me tomava era enorme. Era melhor
descobrir quem eram aqueles malditos do que ficar pensando no
que eu não podia ter.
― Verdade, mas vou fazer tudo que puder para ajudá-los. ―
Eu gostava do modo confiante dela; se algo estava errado, Belinda
sempre dava um jeito de conseguir remediar.
― Eu sei que vai. ― Sorri enquanto entrava no carro. ―
Então qual o motivo de sua felicidade antes de pensar no problema
que temos aqui?
Ela se sentou no banco do carona e se virou para mim
animada.
― Yago e Paco foram visitar o Neto junto a outra assistente
social daqui, a Pam, e a psicóloga. Ele está bem e amanhã ou
depois vai ser trazido para cá. ― Belinda estava eufórica.
― Por que não foi você que os acompanhou? ― sondei
curioso.
― Jared me queria aqui para me mostrar o que devo fazer
em sua ausência. ― Ela deu um suspiro.
― Logo você vai estar com eles. ― Parti com o carro, mas
antes, por instinto, dei mais uma olhada no orfanato. Antônio estava
escorado na parede com seus amigos, mas encontrou meus olhos
por um segundo. ― O que sabe sobre ele?
Aquele garoto parecia mais maduro do que era de fato, seus
olhos duros mostravam que ele tinha visto coisas terríveis na vida.
Eu conhecia esse sentimento.
Ela seguiu meu olhar e sorriu para Antônio, acenando com a
mão. Ele desviou os olhos de mim e a observou, mas sua expressão
não mudou, depois focou nos seus colegas.
― Ele é muito fechado, chegou aqui alguns meses atrás após
perder sua avó, que tomava conta dele. Não tem familiares, então o
caminho foi entrar no sistema. ― Perdeu seu sorriso lindo. ― Tentei
me aproximar, mas...
― O quê? ― Belinda teria notado algo nele, assim como eu?
― Não sei, não queria forçá-lo. ― Franziu a testa, encarando
a janela.
― Tem algo que a preocupa sobre ele?
― Sabe aquela sensação de que ele passou por mais do que
ter sido criado por uma avó amorosa? Embora eu saiba que uma
perda pode fazer alguém sentir como se tivesse sido privado da
alma. ― Ela levou a mão ao peito como se quisesse tirar sua dor.
― Ei. ― Coloquei a mão em sua perna para distraí-la. ―
Senti a mesma coisa acerca de Antônio. A forma como nos olha é
diferente, é igual... ― Pisei no freio, fazendo nós dois irmos para
frente. Por sorte, estávamos com cinto de segurança.
― Stefano!
― Puta que pariu! ― Não, isso não pode estar acontecendo!
Mas só pode ser isso! Não há outra explicação para essa merda
fodida...
O dia foi promissor. Tudo caminhou bem, e fiquei atenta a
tudo, mas não consegui descobrir muita coisa. Apesar disso, estava
feliz por Yago, Paco e Neto estarem se recuperando.
De repente, o carro sacolejou e fui lançada para frente.
Praguejei, assim como Stefano, mas provavelmente não foi pelo
mesmo motivo.
― Puta que pariu! ― Seus olhos estavam arregalados, e por
um breve segundo pensei que ele fosse surtar novamente.
― Stefano ― chamei-o. ― O que está acontecendo?
Estávamos falando de Antônio, um dos garotos que tinha
chegado havia algum tempo no orfanato. Eu adorava meus
meninos, tanto os antigos quanto os novos, mas aquele adolescente
tinha algo em seu olhar e comportamento que eu não conseguia
entender. A forma como agia era como se ele fosse um robô ou
tivesse treinado muito para não mostrar seus sentimentos. O que
isso significava? Pela sua postura, parecia que Stefano sabia a
resposta.
― Posso estar errado, mas agora sei como eles convencem
os garotos a cooperarem a fugir. ― Ele ainda parecia aturdido, mas
depois uma sombra cruzou suas feições. ― Como não suspeitei
antes?
― Stefano, dá para dizer o que há em sua cabeça? O que
descobriu? Porque está me deixando louca ― frisei, tentando me
controlar.
― Sabe aquele menino Antônio? Não é um garoto qualquer.
Acredito que infiltraram nos orfanatos meninos que foram treinados
em arenas Prometheus. Isso explica o olhar de Antônio. Não é o de
alguém que sofreu vendo um pouco do inferno, é de quem viveu em
um. ― Olhou para trás, para o estabelecimento.
Stefano estacionou na margem da rua. Tínhamos avançado
poucos quilômetros.
― Está dizendo que aquele garoto de 15 anos é um
assassino profissional? ― indaguei de forma dúbia.
Eu só podia estar ouvindo errado. Não podia ter um
assassino entre os meninos que eu cuidava.
― Posso estar errado, mas tudo indica que não estou. ― Sua
expressão se tornou sombria. ― É um plano perfeito para eles. O
diretor e os guardas cuidam para não ser acionada uma
investigação, enquanto esse infiltrado entre os garotos os convence
a fugir.
A fúria cresceu dentro de mim após saber disso. Deu-me
vontade de ir até lá pegar aquele fedelho, mas, se ele tinha sido
criado igual a Lyn, era perigoso. Podia atacar as outras crianças e
machucá-las. Eu não deixaria que isso acontecesse!
― O que vamos fazer? Não podemos deixá-lo lá! ― Virei-me
para Stefano.
― Vou checar. Um dia desses, faça com que todos vão à
piscina. Diga que é uma competição entre eles ou que estão
comemorando a volta de Neto ou a recuperação dele, qualquer
coisa, mas preciso ver Antônio sem camisa para conferir. ― Deu um
suspiro duro. ― Embora ele deve ter coberto a tatuagem. Ao menos
eu teria feito isso.
― Está dizendo que ele foi numerado igual os homens do
cemitério? ― Eu estava puta da vida com aqueles vermes que
faziam algo assim com crianças.
― Sim. ― Voltou a dirigir. ― Se ele for quem acredito que
seja, vai ter uma tatuagem ou uma cicatriz de remoção no lugar em
que ela deveria estar.
Sacudi a cabeça.
― Esses malditos vermes imundos! ― Cerrei meus punhos.
― Minha vontade é ir lá acabar com aquele fedelho.
― Não podemos mostrar que suspeitamos de algo. É preciso
ter certeza. Vou dar um jeito nisso.
Arqueei as sobrancelhas.
― Vai matar um garoto? Mesmo sendo ele quem é? ―
indaguei curiosa.
Ele não respondeu, o que já era uma resposta. Stefano era
contra maus tratos de crianças, assim como eu, mas tinha algo a
mais nele. Casos assim pareciam trazer-lhe memórias de algo que
viveu.
Marco não era um pai amoroso. O monstro fez coisas
terríveis com ele e seus irmãos. Eu recordava de nossa conversa no
cemitério e da dor que ouvi em sua voz.
― Não tenho a menor ideia. O pior é que, no fundo, não é
culpa deles serem assim. Foram treinados para não se importar, só
seguir ordens. ― Trincou os dentes. ― Quero mesmo é quem está
por trás dessa escória maldita. Seu chefe é um deles.
Escorei-me no banco, encarando a estrada.
― Custo a acreditar que Jared esteja envolvido. É sua função
proteger todos aqueles garotos. ― Queria eu mesma esganar o
desgraçado. Só não havia chutado sua bunda ainda porque
precisava focar no plano.
― Não tem como ele não estar envolvido. Sem sua ajuda, já
teriam descoberto a tempos essa quadrilha. Não é só ele, mas
juízes e outros que trabalham no ramo. ― Semicerrou os olhos. ―
Isso me diz que todos devem participar de Prometheus.
A sua fúria ultrapassava o auge. Eu teria até pena dessas
pessoas caso Stefano as descobrisse e resolvesse fazer justiça.
― O que acontece de fato nesses lugares? ― Temia a
resposta, mas, pela forma como Stefano agia, ele tinha ficado em
algum lugar parecido ou presenciara alguma atrocidade. Só assim
para ter essa veemência, esse ódio que sentia. O que me levava a
crer que era uma das razões de ele não suportar ser tocado em
algumas áreas de seu corpo, como pescoço e orelha, ou ser
abraçado por trás.
Meu estômago se embrulhou com a suspeita de que alguém
o tocara ou tinha chegado perto de fazer isso. Eu não queria
perguntar, afinal, se estivesse pronto para falar, ele o faria.
Com minha questão, a dor tomou suas feições belas. Como
eu não queria trazer-lhe lembranças ruins, mudei de assunto. Já
tinha uma ideia do que acontecia no inferno que deviam ser as
arenas Prometheus.
― Será que Lyn sabe sobre isso? ― Após verbalizar, tive
certeza de que ele sabia, afinal me alertou que eu estava me
metendo em algo que não era da minha conta.
Stefano me fitou com perguntas em seus olhos, mas não fez
nenhuma, embora eu tenha visto gratidão em sua expressão por eu
ter mudado de assunto.
― Acredito que sim. Só queria uma forma de falar com ele.
― Encarou a estrada, mas percebi sua respiração ofegante.
Ficamos em silêncio um momento, ele com seus
pensamentos longe, e eu querendo arrumar uma forma de ajudá-lo
a superar seus traumas. Além disso, estava preocupada com os
meninos do orfanato. Focaria nisso. Depois conversaria com
Stefano.
Quase ri. Por que iríamos conversar, se o que tínhamos não
passava de um caso? No começo, achei que isso fosse bom, mas
não sabia mais... pois todo passatempo tem um fim, e o nosso podia
acabar a qualquer momento.
Pensar nisso fez algo se retorcer dentro de mim. Seria mais
prudente terminar tudo então?
― Terminar o quê? ― indagou ele, trazendo-me dos meus
pensamentos.
Nem tinha notado que disse isso em voz alta. Recuperei a
compostura, não querendo falar sobre aquele assunto naquele
instante. Aproveitaria enquanto eu o tinha.
― Nada. ― Olhei ao redor, notando que já estávamos na
casa que era minha fachada, a casa de Bella Stewart.
Stefano não disse nada, e eu não soube se acreditou, o que
eu duvidava. Ele às vezes parecia me conhecer mais do que eu
mesma. Talvez apenas também não quisesse conversar sobre
aquilo. Fugia quando o assunto se voltava para o lado emocional,
assim como eu. No final, teríamos que conversar sobre o que havia
entre nós, se daríamos um nome à relação ou se seria só sexo
casual.
― Belinda, o que está te incomodando? ― perguntou ele
assim que entramos na casa. ― Temos de resolver essa merda
antes que seja jogada no ventilador.
O imóvel não era grande como uma mansão, mas era
gostoso ficar ali. Eu já tinha permanecido algumas vezes no local,
afinal a casa da minha avó na cidade não era longe da propriedade.
― Eu sei que temos. ― Precisava de um tempo sozinha para
pensar no que devia fazer em relação a nós, e ficar perto dele não
me deixava pensar com coerência.
― Preciso conversar com El Diablo, Fabrizio e Alessandro. ―
Stefano me puxou para seus braços e beijou minha testa.
― Enquanto isso, vou tomar banho. ― Quando ele me
tocava, eu perdia todas as minhas forças.
Ele sorriu.
― Minhas ligações serão rápidas. Logo me junto a você. ―
Eu ouvia sua fome em cada palavra.
Subi as escadas assim que ele foi dar o resumo do que
aconteceu no dia aos nossos irmãos e El Diablo. Um arrepio tomou
meu corpo. Adorava a ideia de tomar banho com Stefano. Por que
eu não podia ficar longe dele? Sabia a resposta para essa pergunta,
mas não queria aceitar. Nosso relacionamento, que antes era só
sexual, vinha se tornando algo mais forte, tanto que a mera ideia de
tudo acabar fazia meu interior se retorcer.
Tomei banho e fiquei sentada na cama encarando a janela
sem nada ver realmente.
― Belinda, o lugar está pegando fogo ― ouvi Stefano dizer e
o vi na minha frente, estalando os dedos.
― O quê?! ― Levantei-me em um salto, olhando para os
lados, buscando o perigo. Foi quando notei que ainda estava
enrolada na toalha e que não havia perigo algum.
Stefano suspirou.
― Estou te chamando há uns dez minutos. ― Sentou-se ao
meu lado e pegou minha mão. ― O que está acontecendo? Sei que
não é só sobre os garotos. Se fosse apenas isso, você estaria
furiosa e não pensativa assim.
Olhei para ele e fiquei tentada a contar o que eu realmente
sentia, mas, conhecendo Stefano, isso o faria correr para longe, e
eu não podia perdê-lo, não agora. Precisava dele comigo. Queria
dizer que era só para me ajudar, mas não era. Sendo realista, queria
mais tempo com ele. Talvez até começasse a gostar de mim
também.
Não respondi, não queria falar sobre aquilo, só aproveitar o
momento. Beijei-o, tomando sua boca e o montei, fazendo o
possível para não tocar em nenhum lugar, exceto seus braços.
― Belinda... ― sussurrou na minha boca.
― Não quero conversar, só vamos transar. ― Se eu
conversasse naquele momento, iria me perder, ou melhor, iria
perdê-lo, porque ele me deixaria, eu tinha certeza disso.
Stefano me observou, mas mudei minha expressão, não
querendo que ele soubesse o que eu andava pensando.
― O que foi, Foguete? Não queria que ficássemos a sós para
a gente aproveitar? ― provoquei-o, tentando afastar sua
desconfiança sobre os meus pensamentos.
Ele retribuiu alguns segundos depois, e me perdi em seus
braços. Colocou-me na cama, pairando sobre mim, não deixando de
me beijar, enquanto eu desfrutava de um turbilhão de sensações.
Nós já havíamos nos tocado antes, mas naquele instante o que eu
estava sentindo era mais profundo.
Fitei seus olhos, que estavam abertos me observando, e não
conseguia desviar o olhar. Podia um dia ter amado Gazo, mas, com
Stefano, era diferente de tudo que eu já tinha sentido. Meu coração
estava acelerado como nunca.
― Quer que eu tire sua roupa ou você mesmo tira? ― Merda,
por que minha voz está estranha? Pigarreei.
― Belinda, o que está havendo? ― Afastou a boca da minha,
seus olhos estreitos.
― Nada ― menti.
― Besteira. ― Afastou-se, deixando-me nua na cama. ―
Tem algo em sua cabeça, sinto isso. Vamos falar sobre o assunto e
depois fazemos o que você quiser.
Ficou sentado aos pés da cama, encarando-me. Eu sabia
que ele não ia fazer nada se eu abrisse o jogo, por isso não
contaria, não agora. Só queria aproveitar e esquecer que cometi a
mancada de deixar acontecer o que jurei nunca fazer novamente.
― Tudo bem, eu resolvo meu problema sozinha. ― Abri
minhas pernas, e, de onde ele estava, tinha uma bela visão.
Levei meus dedos à minha boceta e trisquei meu clitóris.
Enquanto isso, levei a outra mão aos meus seios com um gemido.
― Vai ficar só olhando ao me ver fodendo sozinha? ― Não
me desviei de seu olhar um segundo.
― Belinda... ― Sua voz soou rouca.
― Gosto de me tocar, mas preferia sua boca em mim. A
sensação dela chupando meu nervo pulsante é de outro mundo... ―
Puxei o bico do seio, dando-me mais prazer. Abri mais minhas
pernas, deslizando os dedos pelos lábios íntimos, e enfiei o
indicador dentro de mim profundamente, depois o tirei molhado e o
levei à minha boca, gemendo novamente.
Seus olhos estavam abrasadores e famintos.
― Quero sentir seu pau entrando todinho em minha boceta...
― Chorei de necessidade.
Ele tirou suas roupas com rapidez nada elegante e as jogou
longe, sentando-se em frente a mim. Peguei seu pau e o atraí para
a minha boca.
― Me deixa saboreá-lo... ― Estava ereto e pronto. ― Não
acho que eu posso viver sem isso. Acho que estou apaixonada pelo
seu pau ― provoquei. O cara era realmente gostoso (ou apenas
gostei de chupá-lo).
Stefano riu deliciado enquanto eu o levava à minha boca e
fechava os olhos. Circulei meu clitóris, mas então minha mão foi
afastada, e a sua tomou o lugar dela. Só o mero toque dele fazia
meu corpo quase entrar em combustão.
― Muito melhor sua mão do que a minha, Foguete. ― Sorri e
voltei a chupá-lo com toda a fome que eu estava sentindo.
― Porra, você é linda demais! ― Arfou. ― Também acho que
adoro sua boceta.
Ele enfiou um dedo em mim e circulou meu clitóris, enquanto
seu quadril empurrava para frente em minha boca, mas não me
forçou a ir mais fundo, nem quando sua outra mão agarrou meus
cabelos.
Suas palavras sujas estimulavam ainda mais o meu prazer.
Na verdade, Stefano em si me provocava uma combustão. Apertei
mais sua coroa com os lábios, a língua triscando o apadravya,
fazendo-o rosnar.
― Por mais que eu ame sua boca, não quero gozar nela, não
hoje. ― Puxou seu pau para fora e abaixou o rosto até o meu
centro. ― Quero sentir seu gosto, que amo, antes de me enterrar
em você.
Meu coração martelou com essa palavra, “amor”. Era tão
simples, mas podia trazer um grande estrago. Era desse estrago
que eu não sabia se iria me recuperar algum dia, assim que tudo
findasse.
― Está esperando o quê, Foguete? Minha boceta também
está louca para ter sua boca. ― Era melhor falar a pensar.
Ele soprou meu centro, deixando-me mais eufórica por suas
carícias, e logo me devorou de forma faminta.
Isso! Essa sensação era melhor que a outra. Com a luxúria,
com o prazer, eu podia lidar, mas com o amor? Estaria pronta para
dar esse passo? Poderia até estar, mas Stefano não poderia ser
aquele a quem eu entregaria meu coração. Como fui me deixar cair
assim?
Ele parou o que estava fazendo e pairou em cima de mim.
― Belinda, o que está acontecendo? Se não estiver pronta,
podemos esperar. ― Ali estava ele, deixando a decisão em minhas
mãos. Tão diferente de Gazo, que me disse que, se eu o amasse,
teria de ficar com ele, e no fundo fiquei para provar isso. Como eu
era ingênua e estúpida! Era isso que o amor fazia, deixava as
pessoas vulneráveis e tolas. Ao menos eu me tornei assim. Achei
que tinha aprendido a lição, mas, pelo visto, não tinha.
Eu confiava em Stefano a respeito do sexo e estava pronta
para dar aquele passo por mim mesma, sem ser na base da
coerção. Não era isso que me incomodava, mas deixaria que ele
pensasse que sim. Era melhor do que a verdade.
― Estou pronta, quero isso ― assegurei com firmeza. ―
Quero você dentro de mim.
Ele me avaliou um segundo.
― Stefano, se eu não estivesse, não estaríamos aqui, pode
ter certeza disso. ― Deixei o rosto o mais tranquilo que pude, assim
não estragaria o momento.
Então ele me beijou, e coloquei minhas pernas à sua volta.
Senti-o pronto e necessitado por mim, logo estava me preenchendo.
A sensação foi maravilhosa, de total prazer e plenitude.
― Merda, sinto suas paredes apertarem meu pau... ― rosnou
em meus lábios enquanto começava a se mover.
― Isso, me fode com força, Foguete! ― Fechei meus olhos,
balançando meu corpo conforme a intrusão.
Cada estocada dele me levava ao limite do prazer. Essa
sensação prazerosa era tão diferente da outra experiência que tive.
Antes, para mim, sexo devia ser tudo igual, mas enfim percebia que
não. Ao menos com Stefano não se comparava a nada, a não ser o
nirvana.
Nossos olhares se conectaram assim como nossos corpos já
estavam coesos. Com a forma como ele me fitava, parecia enxergar
minha alma, assim como eu a dele. Esse sentimento tomou posse
de mim como mágica. Resplandecia como o sol. Eu me sentia
flutuando não só de prazer, mas com algo em meu peito que tomava
conta e a cada dia ficava mais forte.
Fechei minhas pálpebras, rompendo o contato, pois era um
sentimento que eu não queria sentir naquele instante; só queria
desfrutar do prazer e da luxúria.
― Você é gostosa demais! ― Apossou-se da minha boca
enquanto batia fundo em mim.
Ele não ficava atrás enquanto me fodia duro. Digo duro
porque ouvíamos nossos corpos batendo em sincronia perfeita,
como se fôssemos feitos para nos encaixar assim.
Não, isso é só foda e mais nada!, entoei ao meu cérebro,
assim não correria o risco de cair ainda mais profundamente
naquele espiral de emoções e sair com o coração partido. Algo me
dizia que seria uma queda pior do que a de um arranha-céu.
Minhas mãos apertaram o lençol forte, querendo tocá-lo, mas
me segurei. Não queria estragar o momento e, pior, levá-lo a sentir
aquele tormento que já tinha visto antes em seu rosto.
Uma de suas mãos foi parar entre minhas pernas, circulando
meu clitóris.
― Abra os olhos. Quero vê-los quando você gozar em meu
pau. ― Sua voz crua me enchia ainda mais de tesão.
A sensação era boa demais para eu sequer abrir os olhos.
Além disso, queria evitar pensar na turbulência em meu peito.
― Belinda. ― Parou de se mover, fazendo-me gemer de
frustração, pois estava chegando perto... ― Eu sei o que está
fazendo.
Finalmente encontrei os olhos dele.
― Se sabe, deveria querer o mesmo, Foguete. Agora se
mexa, ou terei que fazer sozinha? ― provoquei, não querendo tocar
no assunto, não agora.
Ele me avaliou por um instante, mas, após suspirar, voltou a
me beijar e a se movimentar. Era melhor dessa forma, assim
ninguém sairia machucado.
Cada impulso que ele dava me levava à porta do paraíso, o
que eu estava amando. Os movimentos de seus dedos em meu
clitóris aceleraram, o que me fez gritar, mas sua boca abafou o som,
engolindo meu orgasmo alucinante. Juro que eu via um turbilhão de
luz através das minhas pálpebras fechadas.
― Isso, goza em meu pau! O quero branco com meu
orgasmo e o seu! ― Logo em seguida, apertou-se contra mim com
força. Eu sabia que ele estava gozando. Seu corpo ficou tenso e
deu mais duas estocadas, então se deteve com um gemido sexy.
Ficamos ali, parados, até nossas respirações se
restabelecerem, então o que ele disse me veio à mente, e pisquei,
empurrando-o.
― Mas que porra! Você não usou camisinha! ― Tentei sair
dos seus braços, mas ele não deixou.
― Relaxa...
― Relaxa? ― grunhi, empurrando-o de novo. Enfim me
deixou ir, e me levantei, fuzilando-o. Tive que me firmar, pois minhas
pernas estavam bambas.
― Você usa pílula ― declarou. Não era uma pergunta.
Estreitei os olhos.
― Como sabe? ― Eu usava anticoncepcionais para controlar
meu período. ― E isso não me impede de pegar alguma doença,
afinal sei de sua fama, maior que a torcida do Barcelona.
― Nunca transei sem camisinha ― afirmou sério.
― Por que quis fazer comigo? E como sabe que uso controle
de natalidade? ― perguntei novamente, mentindo, pois não era
esse o propósito das pílulas.
― Vamos dizer que entrei no seu quarto quando fiquei na sua
casa. ― Não parecia arrependido.
― O que foi fazer lá?
― Não conseguia dormir e, como Luna estava dormindo na
época e, quando fico assim, converso com ela, Jade ou Graziela, fui
ao seu quarto para conversar, mas você estava dormindo
profundamente. Seu telefone tocou na gaveta do criado-mudo. Foi lá
que vi a cartela. ― Deu de ombros, sentando-se na cama.
― Você saiu logo depois? ― pela forma como ele falou, eu
tinha certeza que não, mas achei melhor checar.
― Não, me sentei no sofá e fiquei lá por horas. ― Ele olhava
para seus pés. Não parecia arrependido, só confuso, como se não
entendesse por que tinha estado lá. Talvez fosse por isso que tinha
ido novamente ao meu quarto na noite anterior.
Eu poderia ficar puta, mas sabia sobre sua insônia devido
aos pesadelos. Ouvi-o gritar uma vez, mas ninguém pareceu ouvir.
Acho que todos estavam focados na doença de papai. Só escutei
porque passava em frente ao quarto de hóspedes na hora. Bati com
força na porta para acordá-lo e me escondi atrás do grande vaso
com uma planta no corredor. Vi-o sair e procurar o responsável no
corredor. Sua expressão me fez sentir mal por ele por semanas. A
dor vincava sua expressão como se ele estivesse andando sobre
brasas.
― Não vou chutar sua bunda por ter feito isso ― provoquei,
não querendo que ele se voltasse de novo para sua mente repleta
de dor.
Stefano me olhou um momento, talvez tentando ver se eu
estava com raiva, mas realmente não estava.
― Aposto que eu venceria, embora seja ruim, afinal você tem
uma bela bunda sexy ― continuei, sorrindo.
― A sua que é completamente sexy.
Ele me puxou para seus braços, beijando-me. Quando
percebi, era tarde demais para fugir daquele sentimento, ele já
estava ali, em meu peito. Não havia nada que eu pudesse fazer
para mudar isso. Estava completamente apaixonada por Stefano.
Eu sentia que Belinda andava estranha desde a nossa
primeira transa. No começo, achei que tivesse se arrependido, mas
não foi isso, não após termos transado três vezes.
Suspeitava que fosse o mesmo problema que eu tinha, o fato
de não conseguir parar de pensar nela nenhum segundo, a vontade
de ficar sempre ao seu lado, algo que não era possível. Não quando
eu não podia fazê-la feliz.
Olhei para a vasta piscina, onde os garotos do orfanato
estavam reunidos. Neto era o único que não se encontrava lá, pois
ainda se recuperava em um dos quartos. Após tudo que aconteceu
com os três irmãos, deixei alguém tomando conta dele enquanto
estava hospitalizado, no caso de as pessoas que o queriam
voltarem.
Na borda da piscina, Belinda estava falando com Yago e
Paco. Chamava minha atenção com sua elegância e carisma, pois
ela era assim, amigável com todos naquele lugar. Algumas pessoas
realmente gostavam dela, mas outras não eram tão simpáticas. Não
a tratavam mal, porém a olhavam de modo desgostoso. Essas com
certeza eram os miseráveis que estavam fazendo daquele
estabelecimento um abatedouro ao levar os garotos embora.
Após falar com El Diablo, confirmamos que realmente não
existia nenhum Antônio Hardy. A informação estava tão bem
escondida que, se a hacker que ele usou não fosse boa, não a teria
conseguido. Aquele garoto não era quem dizia ser. Era para termos
agido antes, mas achamos melhor esperar o momento certo para o
desmascarar.
Desde que entrei no orfanato naquela manhã, não tirei meu
foco dele. Queria saber o que realmente fazia ali. Se seu objetivo
fosse machucar os meninos, teria eu coragem de matá-lo? Seria
capaz de matar qualquer um, mas um garoto, ainda mais quando
ele viveu tantas atrocidades, assim como eu um dia?
Antônio encontrou meus olhos, e vi quem realmente era. A
fachada caiu, talvez quisesse que eu visse. Em um segundo, era um
simples garoto, e no outro, um assassino sem qualquer emoção.
Indicou com o queixo a direção do vestiário. Foi tão sutil que
quase não notei, mas eu era bom observador. Segui-o. Tinha
chegado a hora de descobrir a verdade sobre ele.
No começo, achei que aquele rapaz queria levar todos os
meninos, mas, após observá-lo naquele dia, notei que Antônio, ou
fosse qual fosse seu nome, não trabalhava para os malditos. Ele
tinha ido para o orfanato com a intenção de espionar ou proteger as
crianças. Em certo momento, enquanto observava todos se
divertindo, percebi saudade em seu olhar. Isso me deu muito o que
pensar. Entretanto, uma coisa era certa: ele era um assassino.
Cheguei ao vestiário e o encarei do outro lado do cômodo. A
princípio, minha intenção era desmascará-lo, mas já tinha visto a
sua verdadeira face, o que realmente fazia. Só não sabia o motivo
de ele estar ali.
― Você tem um segundo para dizer quem é antes que eu
derrame seu sangue nesse chão. ― Apontei a arma para ele.
Suas mãos estavam relaxadas ao lado do corpo e não
pegaram nenhuma arma.
Antes que ele respondesse, um telefone no banco próximo a
mim tocou.
― É para você ― disse o garoto, indicando com o queixo o
celular.
Estreitei os olhos, mas peguei o aparelho e o comprimi na
orelha sem desviar a atenção do meu alvo.
― Fique parado, ou estouro seus miolos. ― Esperava
realmente não ter de fazer aquilo.
Ele não retrucou, ficou ali parado, de olho em mim.
― Quem é? ― perguntei direto, assim que atendi. ― É
melhor ter uma boa explicação, ou seu amiguinho aqui vai voltar
para você aos pedaços.
― Pelo que eu soube, você não mata crianças, mesmo
sendo uma delas uma assassina ― disse a voz da pessoa que eu
estava à procura havia um bom tempo.
― Lyn. ― Suspirei. ― Por que mandar um garoto vir aqui
disfarçado de órfão?
Tinha uma vaga suspeita, mas queria uma resposta para
confirmar.
― É minha função encontrar esses vermes, e a maneira mais
fácil que achei foi infiltrando nos orfanatos garotos que resgato. É
uma quadrilha bem articulada, então preciso ser cauteloso, pois são
muitos espertos, embora eu seja mais ― me disse com aço na voz.
― Você, no entanto, indo parar aí foi uma surpresa com que eu não
estava contando.
― Desde quando sabe sobre este lugar?
― Alguns meses atrás, logo quando enviei Jacob para se
infiltrar aí. Foi quando eu soube de sua garota. Até consegui mantê-
la no escuro por um tempo, e a sua ausência devido à doença do
pai ajudou, mas as coisas se complicaram com a adoção dos irmãos
Laions. O perigo começou a cercá-la logo que retornou ao trabalho,
e foi quando vi vocês dois juntos.
― Desde quando sabe quem ela é? Porque aqui todos a
conhecem como Bella.
― Já há algum tempo, mas não ligo para seu disfarce. O que
quero saber é qual o seu plano, já que tem El Diablo e outro cara de
olho no lugar.
― Conhece El Diablo? ― A pergunta deveria ser se ele já
tinha ouvido falar de El Diablo, porque eu acreditava que não tinham
se conhecido pessoalmente. ― Ele tentou localizá-lo. Acho que quer
você trabalhando em sua agência.
― Quem não o conhece? ― Bufou. ― Trabalho sozinho, não
preciso de uma agência. Agora me diga, o que fazem aí?
Como sempre sem enrolação. Ele sempre era assim, ia direto
ao ponto.
― Achávamos que seu garoto convencia os meninos a
fugirem daqui, e os guardas acobertavam, assim como o diretor do
local.
― Eles não são tão inteligentes para bolar esse plano. Sorte
para mim. ― Suspirou.
― O que vai acontecer agora?
― Preciso saber os nomes dos locais onde mais Prometheus
estão instaladas, por isso coloquei Jacob aí. Os guardas são pagos
para conseguir garotos e treiná-los para, quando forem
supostamente adotados, já terem serventia ao ser levados para a
arena, como ia acontecer com o garoto Laion. ― Veneno escoava
de sua voz.
― Se sabe quem são os guardas, por que ainda estão vivos?
― Nessa semana, eu pensava em pegar um deles e torturá-lo, mas,
como suspeitei do garoto infiltrado, sabia que havia um plano ali,
então precisava descobrir antes de tomar uma decisão. Só não
contava que quem estava por trás dele fosse Lyn.
― Porque eles não sabem onde as arenas ficam, só são
pagos para fazer o serviço, além disso, não quero só uma
localização, como você descobriu com aqueles caras que torturou.
Quero mais localizações, e o cara que dá ordens ao diretor do
orfanato sabe onde estão. ― Ele estava puto da vida.
― Sabe quem é ele, mas não o pegou ainda? Quem é?
― Como disse, não quero uma ou duas localizações, quero
todas. O cara é convidado para as lutas e já foi a algumas em várias
Prometheus. E, antes que pergunte por que não o torturei para
descobrir as outras localizações, Jair Calixto só sabe os locais em
cima da hora, e, nos últimos meses, já foi a sete dessas arenas ―
falou com um suspiro duro.
― O juiz da suprema corte? ― Ele era tio de Jared Calixto.
Os dois estavam envolvidos naquela organização maldita.
― Sim, esse mesmo, mas não faça nada. Quero saber de
mais localizações, e amanhã vou saber onde fica outra Prometheus.
― Como sabe os dias das lutas, mas não tem conhecimento
dos locais em que acontecem?
― Ele vai sempre às quintas e sábados ― informou-me. ―
Então, seja o que estiver planejando, peço que espere um pouco
mais.
Não era pedir muito, afinal eu queria que aqueles malditos
pagassem com juros por tudo que faziam.
― Vou deixar como está por enquanto, mas, se respingar em
Belinda, vou massacrar todos. E quero estar junto quando você for
acabar com os malditos. ― Não podia ficar de fora daquilo, estava
contando com a possibilidade de fazê-los pagar.
― Fechado. Só preciso localizar o cabeça dessa
organização, não os peões...
Fomos interrompidos por tiros lá fora. Corri com o telefone na
orelha e a arma pronta para atirar.
― Vocês estão sendo atacados! ― ouvi-o dizer. ― Controle a
situação. Vou ver o que posso fazer.
Encerrei a chamada. Meu foco era Belinda, ela não podia sair
machucada. Meu intestino se retorcia só em imaginar essa hipótese.
Corri para a piscina, mas não a avistei, assim como Paco e
Yago. Havia outras crianças no local, mas não eles. Meu coração
estava acelerado, o que piorou quando não a vi.
― Bella, onde ela está?! ― perguntei a uma mulher
escondida num canto tomando conta de um grupo de garotos
pequenos.
― Ela foi com Yago e Paco para o quarto de Neto. Falei para
não irem, pois chamei a polícia, mas Bella não me ouviu. Disse que
não podia deixar Yago ir sozinho à procura do irmão.
Tinha que ser a Belinda! Ela não podia ser aquela que se
esconde em algum lugar até o perigo passar, mas sim a que vai
para a batalha enfrentar a todos. Porra! Aquela mulher me deixaria
de cabelos brancos ainda jovem.
Fui até Jacob, o verdadeiro nome de Antônio.
― Mantenha as crianças protegidas, leve-as a algum lugar
seguro. Não confie em ninguém aqui, atire antes e pergunte depois
se a pessoa parecer suspeita ― falei com urgência. Não o vi com
alguma arma, mas devia ter uma em algum lugar e, mesmo se não
tivesse, saberia lidar. ― Vou tomar conta de Belinda e dos irmãos
Laions. Esse ataque não foi aleatório.
― Aposto que querem aparar as pontas soltas ― disse e foi
até o grupo de crianças que a mulher estava mandando ficar
abaixado.
Mais tiros soaram na parte externa. Eu apostava que El
Diablo e Viper estavam revidando. Corri enquanto ligava para El
Diablo.
― Estou ocupado aqui, se não percebeu! ― foi seu
cumprimento.
― Quantos são? ― ignorei seu tom irritado.
― Uns 12 homens. Abatemos cinco, mas alguns passaram
por nós. Vai ter que cuidar deles você mesmo.
Praguejei baixo ao desligar e corri para o andar de cima.
Sabia onde ficava cada quarto. O dos irmãos era no final do
corredor à esquerda.
Ouvi um choro de criança e depois um grito. Esse era de
Belinda. Apressei meus passos, indo em direção a esses sons.
― Os deixe ir e fique comigo! ― ouvi a voz dela lá dentro.
Essas palavras significavam que um deles tinha passado e chegado
até eles. Alguém gemia de dor, o que significava que havia sido
ferido. ― Por favor, não os machuque mais! Faço qualquer coisa!
Belinda não suplicava por qualquer motivo. Isso mostrava
que estava sem opção.
Andei devagar e silenciosamente e cheguei à porta do quarto.
Vi Yago sangrando com um tiro que parecia ter sido no ombro, pois
o sangue minava daquela região. Ele e Belinda estavam na frente
de Neto e Paco, protegendo-os. Gostei daquele garoto e de sua
ligação com os seus irmãos. Tinha ido ali só para tomar conta de
Neto e foi sequestrado antes só para deixar os caçulas seguros.
Lembrava-me muito meus irmãos e a mim.
― Vamos matar os garotos, mas podemos nos aproveitar
dessa gostosa ― disse um cara. Não ouvi resposta, então supus
que estivesse falando por escuta.
O terror invadiu os olhos de Belinda, que ainda não tinha me
visto. A cada vez que o homem mencionava o que ia fazer, a fúria
tomava posse de mim a ponto de me deixar cego.
Ah, vou fazer esse verme pagar caro!
Em minha cabeça, imaginei tudo que faria a ele.
― E eu vou estripá-lo. ― Poderia dizer mais coisas que lhe
faria, mas Paco estava ali, chorando baixinho. Eu não queria
traumatizar ainda mais os garotos.
O infeliz se virou para me olhar, mas, antes que pudesse me
ver, atirei no seu ombro e me lancei sobre ele, derrubando-o no
chão. Não o queria morto agora, precisava obter informações. Além
disso, não queria que os meninos presenciassem.
― Poderia te matar agora, mas, por enquanto, isso vai servir.
― Nocauteei-o com a coronha da arma, fazendo-o apagar.
― Stefano! ― Belinda se colocou de pé e veio me abraçar,
colocando os braços em torno do meu pescoço. ― Não o encontrei
em lugar nenhum! Estava preocupada.
Meu corpo se sacudiu com o toque nessa região. Isso me
fazia ter lembranças que não queria.
― Desculpe... ― Afastou-se, talvez sentindo como meu
corpo ficou tenso.
Nós nunca conversáramos sobre isso, mas eu sabia que ela
desconfiava de que algo havia acontecido, só não tinha ideia da
atrocidade cometida.
― Estou bem. ― Não queria falar sobre isso agora nem
acerca do que descobri sobre o chefe dela. Quando fôssemos
embora, eu lhe contaria tudo, exceto a parte do que vivi. ― Temos
cobertura.
Olhei para os meninos. Ela se virou para eles também. Era
melhor isso a pensar no meu tormento vivo. Ademais, meu coração
estava na mão por ter temido chegar muito tarde até Belinda.
― Vocês estão bem? ― sondou, indo até os três irmãos.
― Sim, estamos bem ― disse Neto com a respiração difícil.
Fui até ele, peguei-o e o coloquei na cama. Ele ainda estava
ferido em suas costelas, devia ter se machucado mais durante a
invasão.
― Pode ficar aqui, ninguém mais vai entrar.
― Obrigado por nos salvar ― agradeceu Yago, levantando-
se. Ele tinha quase a minha altura. ― Acha que os outros meninos
estão bem?
― Creio que sim. Antônio e uma mulher de coque está com
eles.
― A senhorita Arminda. Ela é legal ― falou Neto enquanto
Paco se deitava na cama com ele.
― Precisa cuidar disso, Yago. Vamos ao banheiro para eu
dar uma olhada. ― Belinda o levou para o banheiro, que ficava não
muito longe.
― Enquanto isso, vou ficar na porta. Ninguém vai entrar aqui.
― Essa era uma promessa que eu não quebraria.
Levou alguns minutos para conseguirem neutralizar o ataque.
Eu queria ter participado da ação, mas não deixaria nem Belinda
nem aqueles garotos desprotegidos.
Como tudo foi empurrado para debaixo do tapete e saímos
como vítimas, ninguém suspeitou de quem éramos. A polícia se
desculpou pela demora em chegar informando que só souberam
tarde da invasão ao orfanato. A desconfiança deles era de que tinha
sido uma disputa entre gagues. Quase ri quando ouvi essa ladainha
vinda de um dos policiais ao explicar a morosidade aos funcionários
do estabelecimento.
― Bando de hipócritas... ― falei baixo para Belinda.
Nós estávamos mais afastados de todos, pois já tínhamos
dado o nosso depoimento.
― Esse com certeza trabalha para quem está envolvido
nesse ataque ― sussurrou de volta e suspirou ao olhar para Yago e
Neto, que estavam sendo levados por uma ambulância. Paco
chorava por não querer deixar os irmãos.
― Vou pegá-lo. ― Avisei a ela e fui até o menino, que
parecia perdido e assustado enquanto via seus irmãos serem
levados. Os dois estavam bem, era só rotina, afinal um levou um tiro
no ombro, e o outro já tinha fraturas antes de aquela merda
acontecer.
Belinda veio até mim e se abaixou na frente dele.
― Oi, homenzinho. Seus irmãos vão ficar bem, só precisam
ser hospitalizados, mas logo vão estar aqui ― ela disse tocando sua
cabeça.
― Queria ir com eles ― murmurou. ― Mas Yago pediu que
eu ficasse.
― Eu sei, meu anjinho. Que tal eu ficar aqui com você até
que eles voltem?
Franzi o cenho. Mesmo que ela tivesse ficado no lugar do
diretor, não podia fazer nada sem o miserável permitir.
O garotinho olhou para Belinda como se ela fosse seu anjo
da guarda.
― Vai me levar para ver Neto e Yago depois? ― perguntou
com os lábios tremendo.
― Sim, eu vou, mas amanhã, prometo. Hoje dormirei aqui, e
nada irá se aproximar de você.
― Bel...la ― Ia dizer o nome dela, quando me lembrei de
quem ela era ali. ― Acho que precisa de autorização para ficar aqui,
ou não?
― Falei com Jared quando relatei que o orfanato foi invadido.
Até lhe comuniquei que deveríamos levar as crianças para outro
lugar até sabermos mais sobre a invasão, mas ele disse que vai
enviar seguranças, então não preciso removê-las.
― Aposto que ele não gostou nada disso. ― Respirei fundo
para não grunhir.
Apesar de tudo, achei bom Belinda ficar; assim os meninos
não se sentiriam sozinhos. Esperava que Lyn tivesse descoberto a
outra arena para a qual o tio de Jared foi, pois eu estava louco para
matar o desgraçado.
Paco ficou olhando para Belinda.
― Vai ficar tudo bem, garotão. Vamos tomar conta de você ―
prometi.
Eu tinha certeza de que Jared tinha mandado gente para
matar Yago e seus irmãos. Tinha gente de El Diablo cuidando dos
outros garotos no hospital, nada chegaria até eles, enquanto
tomávamos conta de Paco, não só pela promessa que fiz a Yago de
manter o irmãozinho a salvo, mas também porque o menino parecia
perdido.
Belinda deu um sorriso radiante para o garotinho.
― Vai ficar mesmo comigo, senhorita? ― sondou ele com
esperança na voz.
― Sim, meu anjo. Vamos para um dos quartos, onde dormirei
ao seu lado. ― Pegou a sua mão e depois me olhou. ― Vai ficar
comigo?
Sacudi a cabeça aquiescendo.
― Não vai ficar fora da minha vista. ― Segui-a para dentro.
Meia hora depois, estabilizamos as coisas no orfanato, e os
seguranças que Jared disse que mandaria chegaram. Devia ter feito
isso para não parecer suspeito, mas eu não confiava em nenhum
deles. Mandei mensagem para El Diablo descobrir quem eram. Ele
disse que checaria e me informou que havia câmeras no orfanato
colocadas por Jacob. Com elas, eles estavam de olho em todos os
lugares.
Quando tudo estava resolvido, queria levar Belinda para
nossa casa... Nossa? Devia estar mesmo louco por pensar em ter
uma casa e uma mulher como ela, tão bondosa, fingindo-se de forte
na frente de todos.
O que aconteceu naquele dia provava que eu não estava
pronto para um relacionamento. O medo que senti de chegar tarde
demais não era normal. Não podia deixar ninguém entrar em meu
coração cheio de trevas.
Olhei-a colocando Paco para dormir. O menino não dormia
sozinho após tudo que presenciou na casa dos Ramonis, ficava
sempre com Neto ou Yago. Em sua situação, esse medo de estar só
era normal, afinal vinha passando por muita coisa desde que perdeu
seus pais.
Deixei os dois e fui ao fundo do corredor a fim de ligar para El
Diablo, que atendeu ao segundo toque.
― Stefano. ― Foi seu cumprimento.
― Sabe de Lyn? ― Precisava falar com ele. Não esperaria
mais para derrubar aquela maldita escória.
― Está comigo agora.
― Me deixe falar com ele.
― Vou passar. Mas antes quero que saiba que os meninos
estão protegidos. Arrow e Knife estão de olho neles. Nada os
alcançará. Vou passar para Lyn agora.
― Eles chegaram muito perto hoje. Encontrei um deles com
os garotos e Belinda. ― A raiva me consumia tão forte que fazia
minha boca amargar.
― Foi um erro. Achávamos que eles arrumariam um jeito de
tirar os garotos daí de outra forma, não imaginei que fossem atacar
para eliminar um alvo. ― Lyn suspirou. ― O bom é que isso prova
que eles não sabem sobre você e sua garota.
― Já deu essa merda toda. Espero que tudo seja resolvido
hoje, não vou deixar Belinda ficar nesse antro infestado de vespas.
― O juiz e seu sobrinho, o diretor do orfanato, vão a uma das
Prometheus que fica em uma ilha não muito longe daqui. Esse é um
novo local. Estou preparando meu pessoal para atacar as
instalações amanhã, assim que estiverem lá.
Eu sabia que o infeliz não estava na Rússia! Nikolai me ligara
no dia anterior avisando que Jared não tinha pisado lá.
― Deixe Jared vivo. Quero ter minha vez com aquele maldito,
assim como com o homem que quase matou os meninos. ―
Quando os policiais chegaram ao orfanato mais cedo, só se
depararam com os corpos do lado de fora. Não matei o que queria
eliminar os irmãos Laions. Esse, Jacob tinha levado consigo para
Lyn.
― Fechado. Depois dou um jeito de descobrir mais lugares.
― Ele deu um suspiro duro.
― Posso te ajudar com isso ― ofereci, querendo entrar
naquela guerra.
― Não está ocupado protegendo sua garota?
Minha garota... Por que meu coração balançava sempre que
ouvia isso? A sensação era boa, como se eu merecesse ter alguém
como ela, mas não merecia. Meu destino era ficar sozinho e pagar
por tudo que fiz.
― Se eu eliminar toda essa escória, ela ficará bem. ― Por
que parecia que meu peito tinha sido esmurrado?
― Tem certeza de que quer ir por esse caminho? Não vamos
terminar logo. Estou nisso há anos e nem cheguei perto de acabar.
O aperto em meu peito ficou insuportável após tomar minha
decisão.
― Sim. Limpe o orfanato, que depois vou com você ―
respondi e suspirei.
― Tudo bem ― concordou e depois ficou em silêncio por um
tempo. ― Stefano, se não estiver pronto para isso, você...
― Estou pronto ― garanti, querendo arranjar uma forma de
ajudar todos aqueles garotos que tiveram o mesmo caminho que
nós. Ninguém merecia aquela porra fodida.
― Ok, então vou resolver tudo essa noite. ― Desligou.
Respirei fundo, discando outro número que precisava ser
notificado sobre o ocorrido naquele dia.
― Stefano? Ligando a essa hora, suponho que tenha
acontecido algo ― disse Alessandro.
― Sim. ― Contei a ele tudo o que aconteceu no orfanato. ―
Essa merda é fodida.
― Sim, é. Ainda mais porque não descobrimos quem atacou
o clube de luta dos Castilhos. Pareciam ser membros de gangues
comuns, mas por que o suicídio? Tem algo aí que não faz sentido.
― Ele estava frustrado. ― Pergunte isso ao Lyn quando falar com
ele. Talvez saiba.
Eu tinha me esquecido de perguntar aquilo ao meu amigo,
mas, como ficaria com ele por um tempo, acreditava que saberia
caso ele tivesse conhecimento do caso.
Contei meus planos para Alessandro.
― Então vai deixar a menina Castilho? Achei que estivesse
se envolvendo com ela.
Eu conhecia meu irmão e sabia exatamente o que ele pensou
que iria acontecer.
― Eu só vim ficar com os Pachecos para espioná-los para
você, Alessandro...
Um ofego me fez virar e encontrar os olhos de Belinda
arregalados de dor e traição.
Porra, esse dia não podia ficar pior, pensei amago.
Eu tinha acabado de colocar Paco para dormir e de receber
uma ligação do hospital dizendo que os meninos estavam bem.
Estava feliz por todos termos saído vivos e, naquele momento, só
queria desfrutar dessa felicidade e alívio com Stefano, mas, após
ouvir suas palavras, meu corpo parecia que tinha recebido uma
descarga elétrica dos pés à cabeça. Não, aquilo não podia ter
acontecido de novo... Eu devia ter ouvido errado.
― Belinda... ― ele começou a dizer dando um passo até
mim, mas dei um para trás, não querendo seu toque naquele
instante.
― É verdade? Você se aproximou da minha família para
espioná-la? ― Que não seja isso, por favor!, pensei, mas a forma
como ele me olhava dizia que eu estava certa.
Stefano respirou fundo.
― Sim, eu...
― Seu desgraçado! Como pôde fazer essa merda?! ― Ri
com desdém. ― Como fui estúpida de cair nessa porra duas vezes?
Ser usada por canalhas!
Estava puta da vida com Stefano, porém mais comigo mesma
por ter caído em sua ladainha. Tanto que jurei que não cairia de
novo, e no final acabei traindo minha promessa.
― Não me compare com aquele lixo do seu “ex”. ― Uma
sombra atravessou sua expressão.
― Na verdade, vocês dois são iguais. Acharam que eu era
idiota e me usaram para chegar aos meus irmãos. ― Tentei
controlar a dor que estava sentindo.
― Belinda, eu não usei você... ― começou a falar, mas eu
não quis ouvir seus motivos.
― Quero que vá embora agora. ― Indiquei a porta. ― Te dou
duas horas para sair do território dos meus irmãos até contar a eles
que você é um espião de merda. Tanto que se enfureceu com Sage
por se infiltrar na sua família... Ao menos ele estava protegendo
Luna, ao contrário de você, que me usou para chegar aos
Pachecos.
Se eu contasse imediatamente, ele seria morto, e no fundo
eu não queria isso. Poderia desejar sua morte, afinal me usou, mas
não suportava a ideia de ele ser machucado. Outrossim, Luna
sofreria com aquilo.
― Belinda, me deixa explicar. Não usei você...
Fuzilei-o.
― Não acredito em nada que saia dessa sua boca. Você
mentiu para mim, me usou, me fez me apaixonar por você, tudo
porque queria algum tipo de informação dos meus irmãos ― sibilei.
Seu olhar ficou entre o pesar e o pavor. Algo em minhas
palavras o deixou assim, e eu sabia justamente o que era.
― Você não pode me amar...
Cortei-o, com dentes trincados:
― Não se preocupe, vou arrancá-lo do meu peito. Fiz isso
uma vez, faço de novo. ― Entretanto, dessa vez seria pior, porque o
que eu sentia por Stefano era tão forte que eu não sabia se um dia o
esqueceria.
― Sinto muito ― sussurrou.
― Não preciso de sua pena. Agora desapareça da minha
frente ― rosnei.
Estava contente comigo mesma, que não estava chorando
em sua frente, mesmo com aquela dor insuportável.
― Tem duas horas para sair de Barcelona, ou estará morto, e
você não quer ver Luna machucada, então sugiro que vá agora. ―
Indiquei novamente a porta.
― Não vou deixá-la sozinha aqui ― disse em voz baixa.
― Não se preocupe, estou correndo mais perigo ao lado de
alguém como você, um desgraçado fodido e manipulador de merda,
que usa as pessoas sem se importar com seus sentimentos. ―
Cerrei os punhos.
Ele não se moveu, então me lancei sobre ele, socando-o no
peito. Stefano não revidou. Foi quando me lembrei de que ele
gostava de sentir dor, então parei de atingi-lo.
― Só vá, Stefano ― pedi sem alterar a voz para não acordar
Paco e as outras crianças no andar de baixo. ― Por favor, se um dia
se importou comigo, vá embora. ― Não queria me sentir vulnerável
naquele momento. ― Mande El Diablo ficar aqui até meus irmãos
chegarem. Só não quero ver você de novo nunca mais.
Quando Gazo me usou para atingir meus irmãos, fiquei
neutra ao ver seu ódio, o que me impediu de suplicar por sua vida.
Com Stefano, eu o via perdido e atormentado. Ele não pensava em
me fazer mal; talvez à minha família.
Eu não podia pensar em alguém que queria destruir todos
que eu amava. Não entendia o motivo de os Destruttores terem feito
aquilo. No fundo, não dava a mínima; nada justificava ele me usar
da forma como fez.
Achei que Stefano fosse dizer alguma coisa, mas apenas
virou as costas e saiu. Entrei em um dos quartos vazios e caí de
joelhos no chão ao lado de uma cama.
O meu peito estava esmagado com aquela descoberta, que
não esperava. Estava contente com o que tínhamos e até temia ter
me apaixonado. Tive a certeza naquele dia, durante o ataque,
quando temi perdê-lo e soube que tinha ido mais fundo naquela
relação do que gostaria.
No fundo, achei que ele sentisse o mesmo, porque via a
forma como reagia a mim, mas me enganei. Quem se importa e
ama não mente e usa da forma como ele fez comigo.
Lembrei-me das palavras de Javier, que disse que Stefano
me quebraria. Eu estava despedaçada, mas não ficaria assim por
muito tempo. Sairia por cima, como já tinha feito uma vez. O pior
seria dizer aos meus irmãos que fui enganada novamente, e tudo
para alguém se aproximar deles.
Não soube quanto tempo fiquei ali, sentada e chorando, mas
devia ter sido muito, porque ouvi as vozes dos meus irmãos ao meu
redor.
― Ei, Belinda, o que foi? ― perguntou Santiago.
― Cadê Stefano? Não era para ele estar aqui com você? ―
sondou Benjamin.
Pisquei e levantei a cabeça, encontrando os olhos dos meus
irmãos.
― Belinda! ― Valentino me checou dos pés à cabeça. ―
Alguém a tocou?
Percebia o medo na sua voz, então me forcei a controlar-me
e guardar a dor por enquanto, embora não fosse fácil. É impossível,
pensei amarga.
Limpei os olhos e me sentei na cama.
― Não fui machucada. ― Não fisicamente, pelo menos, mas
a dor que eu sentia era pior. Preferia ter levado uma surra.
― Belinda ― ouvi a preocupação na voz de Fabrizio ―, onde
Stefano está? Não o vi quando chegamos aqui.
Olhei para o relógio no meu pulso. Naquela hora, ele já devia
ter partido, ou seja, meus irmãos não o machucariam por ter se
infiltrado em nossa família. Idiota era eu, sabia, ainda mais por me
importar.
Não respondi. Não conseguia dizer que tinha sido usada
novamente. Não queria ver a confiança que meus irmãos tinham em
mim desaparecer, bem como sua dor, afinal prometi a todos que não
me deixaria cair assim outra vez, que seria esperta e descobriria
qualquer intenção antes... o que não foi o caso. Se não ouvisse da
sua boca, ele jamais teria me contado a verdade.
― O que Stefano fez para deixá-la nesse estado? ― insistiu
Valentino.
Não conseguia encontrar seus olhos, só abaixei a cabeça.
― Não quero falar sobre isso. Vou lavar meus olhos. ― Fugi
para o banheiro antes que ele comentasse algo.
Não queria que Stefano estivesse ali naquele momento, ou
seria seu fim. Valentino era pior que Stefano em seus momentos
perturbados. Preferiria mil vezes sair machucada sozinha a dar esse
desgosto a meus irmãos. O que papai sentiria se estivesse vivo?
Era em seus braços que eu chorava sempre que algo assim
acontecia. O que eu faria agora? Sentia-me tão perdida.
Estava a ponto de voltar para o quarto e tentar estabilizar as
coisas, mas me detive ao ouvir a voz de meu irmão.
― Tínhamos um acordo, e você não honrou seu lado ―
sibilou Fabrizio. Não ouvi resposta, então ele devia estar falando
com alguém ao celular. ― Se eu pegar Stefano em meu território,
vou matá-lo ― rosnou ele. ― Não ligo para suas ameaças,
Alessandro. Ninguém usa minha irmã e fica por isso mesmo, ou vai
me dizer que não faria o mesmo pelas suas irmãs?
Fabrizio riu sombrio.
― Devia ter pensado nisso antes. Vou fazê-lo pagar caro se o
vir algum dia. ― Eu podia sentir a fúria do meu irmão. ― Não me
lembro de ter dado autorização para ele foder minha irmã. Você
quebrou sua palavra ao não controlar seu irmão. Era só para ele ter
ficado aqui e os dois começarem a gostar um do outro, não para ele
a tocar e a deixar logo depois... ― ele se interrompeu assim que
ofeguei de olhos arregalados.
Pisquei, chocada demais. Ele estava falando que foi tudo
armado entre eles para eu conhecer Stefano e me apaixonar por
ele? Como meus irmãos podiam ter feito isso comigo? Estava
entorpecida diante de sua discussão com o outro capo. O solavanco
que recebi com suas palavras foi pior que um tapa.
― Você e o irmão de Stefano o mandaram se aproximar de
mim para me conquistar? ― Não conseguia acreditar que tinha
ouvido isso.
― Stefano não sabe do plano. Era para ele ter ficado aqui
com a desculpa de nos espionar. Dessa forma, vocês se
envolveriam um com o outro. Confiei na palavra de Alessandro de
que seu irmão não a tocaria se não se importasse com você, mas
ele foi embora, não foi?
A dor em meu coração ficou pior com a traição dos meus
irmãos.
― Todos vocês sabiam desse plano? ― Seu silêncio disse
tudo. ― Não acredito que me usaram a esse ponto! Por que fizeram
isso? Não pensaram que eu poderia sair com o coração partido
dessa porra toda?
― Belinda, era preciso. Os anciões tinham dado um ultimato
ao papai. Ele só tinha mais um ano para esperar pelo seu
casamento e nos deixou com a missão de procurar um marido para
você. Como eu não queria obrigá-la a fazer isso, achei que você e
Stefano podiam acabar gostando um do outro. ― Respirou fundo. ―
Vi a forma que ele agia com você, parecia se importar...
Ri com desdém.
― Se importava mesmo, tanto que foi embora. Agora quero
que vocês também saiam daqui. ― Eu não conseguiria ouvir mais
nada naquele dia.
― Belinda... ― começou Fabrizio.
― O respeito como irmão e chefe, mas, agora, quero ficar
sozinha. Vocês mentiram para mim, me usaram assim como
Stefano. Ele pode não saber que era mentira seu papel de infiltrado,
mas pensava que era verdade, ou seja, não muda o fato de ter se
aproximado de mim com um motivo baixo. ― Apontei para cada um
dos meus irmãos, que me olhavam paralisados. ― Agora querem
fazê-lo pagar caso volte aqui? Vocês quatro e o irmão idiota dele
são responsáveis por isso. Nós dois não passamos de peões em
suas mãos.
― Não é assim. Só queríamos que escolhesse com quem
quer...
Cortei as palavras de Santiago:
― Com quem queria me casar? Bom, agora vou ter que
casar-me com um homem que vocês escolherem, embora esteja
apaixonada por outro. Quanta ironia, não é? Tentaram “ajudar” e só
atrapalharam. ― Limpei meus olhos. ― Preciso que saiam.
Nenhum se moveu do lugar, então saí do quarto e corri para
onde Paco ainda dormia. Tranquei a porta, escorando-me nela até
sentar-me no chão e cobri minha boca para os soluços do choro não
saírem. Naquele dia, meu coração foi partido de várias maneiras,
tanto por Stefano quanto por aqueles que eu pensava estarem
sempre do meu lado.
A dor me perfurava por todos os lados, deixando-me em
agonia. A minha respiração estava aguda e pesada demais, parecia
que tinha algo prensando meu peito.
A escuridão cercava o lugar nas masmorras para onde eu
havia sido trazido havia dias. Não poderia contar quantos, pois
desmaiei algumas vezes de sono e cansaço. Só saía dali para a
arena na hora de lutar e depois era trazido de volta. Eles jogavam
comida por debaixo da porta. Eu sentia um gosto de remédio na
comida, mas não era veneno, afinal eles nos queriam matar
lentamente. Certo dia vi um recado na vasilha, debaixo da comida,
explicando que tinham esmagado comprimidos e misturado ao
alimento. Isso ajudou na recuperação dos meus ferimentos.
Recordei de Jet dizer que nem todos ali eram maus.
No dia em que me trouxeram, torturaram-me para obter a
resposta de quem era a faca que eu tinha usado para matar aquele
pedófilo. Era claro que não o fizeram apenas pela resposta, mas
porque me recusei a contar. Isso era visto como desobediência e
desrespeito naquele lugar.
Que todos se fodessem. Eu não podia dedurar Lyn, não
quando ele já tinha passado por tanto sofrimento ali.
Apesar de tudo, a dor me mantinha vivo e são, porque ficar
preso naquele antro deixaria qualquer um louco. Até cheguei a ver
minha mãe sorrindo e pedindo para eu ser forte, que logo sairia dali.
Acreditei que estava delirando. Eu não podia enlouquecer, precisava
ver meus irmãos e irmãs. Só por eles e por Jet e Lyn eu ainda lutava
para divertir aquela corja.
Um dia, bem depois de eu ser trazido para lá, Jet e Lyn
também vieram. Jet se recusou a matar, e Lyn disse que a faca que
foi encontrada comigo era dele, então ambos foram castigados.
Eu até esperava isso de Jet, mas a atitude de Lyn me deixou
surpreso. Sabia o que fizeram, não queriam me deixar sozinho
naquele lugar. Eu tinha ganhado dois amigos naquele inferno na
Terra.
― Eles estão demorando muito ― sussurrei.
Jet e Lyn tinham sido levados havia algum tempo, e as lutas
já deviam ter acabado. Então por que a demora? Eu estava fora de
sintonia com o tempo. E se fosse sexta-feira? Teriam levado os dois
para os malditos que vinham abusar deles? Merda! Só em pensar
nisso, eu sentia ainda mais repúdio de todos ali.
De repente a porta da cela foi aberta, clareando subitamente
a escuridão em que eu estava imerso. Tive que piscar para firmar a
visão. Havia dois homens carregando um corpo mole e outro
cambaleante.
― Fique com essas putinhas como companhia ― disse um
deles sorrindo e jogando Jet sem roupas no chão. Ele estava
machucado e sangrando.
Depois o corpo inconsciente de Lyn, vestido, mas
ensanguentado, foi arremessado na cela.
Enquanto as portas eram fechadas, corri até eles e me
abaixei, mesmo com meu corpo protestando contra as dores
causadas pela luta anterior.
― Jet! ― Forcei a vista naquela escuridão e o vi com os
olhos fechados e gemendo de dor. ― Por favor, não morra! Fique
comigo!
O meu coração martelava só em imaginar o que fizeram com
eles para ficarem naquele estado. Tentei controlar meus nervos,
pois precisava ajudá-los.
― Stefano... ― finalmente ele sussurrou em uma voz
quebradiça. ― Preciso que faça algo por mim.
Respirei fundo.
― O que é, Jet? Que eu me vingue de todos? Vou fazer isso,
prometo! ― Meus olhos estavam molhados por vê-los naquela
situação sem poder fazer nada.
― Sim, eu sei que fará, mas agora quero que me mate.
Após ouvir suas palavras, ofeguei de pavor.
― O quê?! Não vou fazer isso, não posso! Vou tirar vocês
dois deste lugar, e iremos os três matar todos esses vermes! ―
Esperava cumprir essa promessa.
Tirei a camisa suja que usava e a coloquei sobre sua nudez.
Nem parecia aquele garoto cheio de esperança de quando eu havia
chegado ali.
― Stefano, não dá. Não posso voltar mais para lá e deixar
que eles...
― Não vai voltar, não vou deixar! ― No entanto, como eu
poderia cumprir essa promessa? ― O que aconteceu para você e
Lyn serem machucados dessa forma?
Quando essa brutalidade acontecia, era porque aparecia
alguém que gostava de provocar dor, mas Lyn era um vencedor,
então não devia ter sido abusado. Além disso, uma das punições da
arena era não tratar os ferimentos dos meninos.
― Eles queriam que eu fizesse com os novos recrutas a
mesma coisa que fazem comigo. Não pude, então fui castigado
com... ― Sua voz falhou.
Eu podia imaginar a crueldade que ele tinha vivido e que
ainda podia acontecer, tudo por culpa de Marco. Como podia existir
um verme como ele? Era fodido até para integrantes da máfia.
― Vamos sair desse inferno maldito. ― Eu tinha que manter
a esperança. Se ao menos meus irmãos chegassem mais cedo,
poderiam nos ajudar. ― E Lyn? Eles queriam que fizesse a mesma
coisa?
Nossa amizade durante aqueles dias ali tinha crescido
bastante. Podia ser pouco tempo, mas um dia naquele inferno era
como se fosse meses do lado de fora, durava a passar. Nossas
dores nos uniram, era a única coisa boa naquele lugar esquecido
por Deus.
― Um dos homens que assistia à luta gostou dele, e o
maldito verme do Kanon o deu ao cara, mas Lyn se defendeu na
hora, decepou o pau desse escroto e matou seus guardas. Kanon
não gostou e o castigou o açoitando. ― Suspirou. ― Suas costas
estão todas feridas.
― Me sinto tão impotente por não fazer nada por vocês ―
admiti com o coração doendo.
― Nada disso é culpa sua. Seu pai e esses malditos são os
únicos culpados ― me disse baixinho.
Sentei-me escorado na parede, coloquei a cabeça de Lyn em
um de minhas pernas e a de Jet na outra e fiquei ali, de mãos
atadas.
― Nenhum de vocês deveria ter vindo ficar comigo na
solitária ― sussurrei, limpando meus olhos marejados.
Lyn gemeu, virando-se de lado.
― Você se deixou vir para cá para não me entregar. Não
gosto de dever a ninguém.
Olhei para ele.
― Lamento por tudo ― murmurei. ― Queria que meus
irmãos soubessem o que está acontecendo aqui para nos tirar deste
lugar.
― Acho que isso ajuda. ― Lyn tirou um telefone do bolso e
me entregou.
― Onde você...
― O dono não vai se importar, está mais preocupado com o
pau dele no chão. ― Tinha um tom amargo em sua voz ao dizer
isso.
Meu coração se iluminou um pouco com a chance de sair
dali. Disquei o número de Alessandro.
― Alô? ― Ele parecia confuso ao atender.
― Sou eu, Stefano. ― Esclareci por que sussurrava: ―
Preciso de ajuda.
― S...
― Não diga meu nome, só ouça, não tenho muito tempo.
Papai mandou vocês para fora só para me trazer para a Indonésia,
a uma espécie de presídio. ― Expliquei o que acontecia naquele
lugar, as atrocidades cometidas, tudo que vi do aeroporto até ali.
― Filho da puta! ― ele rosnou. ― Vou dar um jeito de ir
resgatá-lo.
― Estou esperando. ― Minha garganta se fechou. ―
Obrigado. Não sabe o quanto é bom ouvir sua voz.
― Você está chorando?! ― Ele parecia louco.
Respirei fundo. Não queria contar como eu me sentia naquele
momento, ainda mais o que tinha acontecido com nossa mãe.
― Não, é só que... ― Minha garganta travou novamente. ―
Venham o mais rápido que puderem, tenho dois amigos feridos.
― Aguente firme, Stefano. Estaremos aí ao amanhecer.
― Valeu, irmão. ― Eu não queria desligar, mas não podia
correr o risco de os guardas lá fora me ouvirem e castigarem ainda
mais o Lyn. Eu não achava que ele sobreviveria.
― Vocês parecem se amar muito ― observou Jet com
saudade em seu tom de voz.
― Somos uma família, irmãos de verdade. Nós três podemos
ser isso lá fora, como irmãos postiços, se vocês não se importarem
de eu pertencer à máfia.
― Seu pai deixaria? ― indagou Lyn. ― Duvido muito. E, se
eu o vir, irei matá-lo.
― Não tiro sua razão. ― Suspirei. ― Me diz uma coisa: se
podia conseguir um celular, por que não pediu ajuda?
― Para quem iríamos ligar? Se chamássemos a polícia, não
resolveria. Sabe quantos policiais vêm aqui? Além disso, nem
sabíamos onde estávamos até você chegar aqui ― disse Jet. ―
Fomos trazidos desacordados.
― Não temos ninguém que se importe conosco e que viria
até nós ou que seria capaz de enfrentar esses malditos. ― Lyn
respirou com dificuldade.
― Coloque a mão aqui. ― Levantei a minha perto do rosto
dos dois. ― Vamos jurar ajudar um aos outros quando estivermos
em perigo e que seremos irmãos para sempre.
Jet levou a sua mão até a minha.
― Nunca tive um irmão, mas tinha amigos e gostava dessa
sensação. Acredito que com irmãos a ligação é mais forte, né? ―
Sorriu para mim. ― Tem certeza de que não vai mudar de ideia lá
fora, quando estiver com seus irmãos de verdade?
― Eles podem se tornar seus irmãos também. Acredito que
Rafaelle e Alessandro gostariam de vocês. ― Sorri também. ―
Então, Lyn, quer ser nosso irmão?
Ele me olhou um segundo com seu jeito sem expressão.
― O que eu estaria perdendo? ― Colocou a mão sobre as
nossas.
― Vou nos tirar daqui ― jurei com esperança, embora me
preocupasse com a forma como faríamos isso sem Marco saber.
― Você não mencionou ao seu irmão o que seu pai fez com
sua mãe ― observou Jet com a respiração aguda.
― Acha que eles sabem? ― sondou Lyn. A sua respiração
também estava difícil.
― Não. Se soubessem, Alessandro teria me dito, e com
certeza Marco estaria morto. ― Respirei fundo. ― Não queria
preocupá-los mais.
A dor me consumia, mas não deixei que tomasse conta de
mim, e sim o ódio e a ira. Eles me davam mais força para sair
daquele lugar. Lá fora, eu choraria por todo o sofrimento enrustido;
ali, lutaria e mataria todos aqueles vermes.
― Essa sensação é pior do que qualquer sentimento. Prefiro
aturar tudo que passei só para não pensar nessa perda ― disse Lyn
com a voz sombria.
Ele era fechado, não contava muito sobre o que acontecera
em sua vida.
― Quer nos dizer quem perdeu? Agora somos irmãos,
fizemos um pacto. ― Queria que ele se abrisse. Quem sabe assim
aliviaria o que o estava oprimindo.
Ele ficou em silêncio por um tempo.
― Meu pai era um bêbado fodido, chegava em casa e enchia
minha mãe e a mim de pancada. ― A dor estava em cada palavra.
― Nós morávamos à beira-mar em Skagen, na Dinamarca.
― Você tem sotaque de lá ― apontei.
― Acho que isso não se perde nem mesmo aqui ―
comentou e depois suspirou. ― Minha mãe ficou grávida de Ella, e,
ao passar dos anos, ele também queria bater nela, mas eu entrava
na frente e impedia que acontecesse.
― E sua mãe? ― A minha morreria por nós, o que, no fundo,
acabou acontecendo.
― Ela tentava impedir, mas apanhava junto. Isso durou anos.
― Sua voz agora soava baixa. ― Quando eu tinha 14 anos, e Ella
10, já tinha encorpado e lutava sozinho para dar conta delas e
defender minha mãe e minha irmã. Tínhamos um barco de pesca,
mas só eu trabalhava, afinal ele vivia mais bêbado que sóbrio.
Estava voltando da lida para casa, quando ouvi os gritos de Ella. Ao
chegar lá, minha mãe... estava morta no chão. E meu pai pelado,
tentando tirar as roupas de Ella. Perdi a cabeça e o matei ali
mesmo, manchando tanto ela como a mim de sangue. A bagunça foi
feia.
― Ele mereceu ser morto ― afirmou Jet.
― Sei que sim, mas não deveria ter feito isso na frente dela.
― Ajeitou-se no chão, buscando uma posição melhor, embora fosse
impossível naquela superfície dura e fria. ― Depois disso fui preso,
e ela foi levada para uma tia nossa nos Estados Unidos.
― Foi julgado? E sua tia não o ajudou a sair da cadeia? ―
inquiri.
― Não, ela sumiu com Ella, e eu fui trazido para este lugar.
Eles não procuram só órfãos, mas também garotos que foram
condenados ou estão para ser, como foi o meu caso.
― Sua tia devia ter procurado sua mãe, sei lá, tê-la ajudado
de alguma forma. ― Escorei a cabeça na parede, esgotado.
― Pode ser, mas ela não dava conta nem dela. É isso que
me deixa louco, não saber o que aconteceu com Ella enquanto
estou preso neste antro.
― Assim que sairmos, você pode ir ao encontro dela ―
assegurei.
― Ela me viu matando um homem, o nosso pai, na sua
frente. Sabe o que isso faz com uma criança? Ainda ouço seus
gritos. ― Estremeceu.
― Pode ser, mas ela vai entender que você a estava
protegendo do seu pai. ― Ao menos era o que eu esperava.
Ele não respondeu. Eu não sabia se tinha acreditado nisso ou
não, mas tinha esperança de que tudo daria certo. Precisava disso
após tanto sofrimento.
― Veja por esse lado, Lyn, ao menos vocês dois têm alguém.
Eu não tenho ninguém me esperando lá fora. ― Jet deu um suspiro
triste.
― Terá a nós dois. Lyn e eu estaremos com você ― jurei,
apertando sua mão.
― Obrigado, Stefano, por cuidar de nós ― sussurrou Jet.
― Descansem um pouco, vou tomar conta de vocês ―
prometi. ― Até o amanhecer, meus irmãos estarão aqui.
Não deixaria que mais nada acontecesse aos dois. Logo
estaríamos longe daquele inferno.
Sacudi a cabeça para expulsar as lembranças atormentadas
que não me deixavam em paz dormindo ou acordado.
― Elas nunca vão embora, não é? ― Lyn estava sentado em
frente a mim no helicóptero.
Nós estávamos indo para uma ilha vizinha ao local onde Jair
e Jared estavam. Os homens de El Diablo e os de Lyn estavam lá,
apenas nos esperando.
― Não. ― Ele tinha mais demônios do que eu, afinal fiquei
algumas semanas lá, enquanto Lyn permaneceu por quase dois
anos. Se eu me sentia atormentado, podia imaginar o que acontecia
em sua alma. ― É pior quando estou longe de Belinda.
Pensei no tempo em que estive com ela. Dormia a noite toda,
ainda que nem na mesma cama dormíssemos juntos. O dia passava
sem eu nem mesmo ter lembranças ruins. Só a sua presença me
trazia paz. Agora sentia a escuridão se alastrando em mim como
erva-daninha.
― Você está sendo um idiota por deixá-la ― disse El Diablo.
Ele estava sentado do outro lado.
Deixar Belinda foi a pior coisa que me aconteceu. Meu peito
estava vazio, exceto pelo aperto que sentia, a dor, melhor dizendo.
Pelo menos eu entraria em ação, o que me ajudaria a tentar não
pensar na dor nos olhos dela. Eu poderia ter voltado e dito que não
a havia usado, que não era como seu “ex”, aquele desgraçado
fodido. Porra, pensar nisso ainda me fazia querer voltar e explicar,
mas era melhor assim.
Esse não era eu. Precisava lutar para aplacar aquela agonia
por estar longe dela. O tal do amor não era para mim, pois fui
forjado para lutar e destruir, não amar. No entanto, como me manter
longe, quando só o que fazia era querer estar com ela, possuir todo
o seu corpo e também a sua alma? Precisava lutar para limpar
minha mente e lembrar quem eu era.
A partir daquele dia, eu iria por um caminho do qual não
sabia se voltaria inteiro, não só física, mas mentalmente. Sabia que
presenciaria coisas que me fariam perder a razão, embora
precisasse fazer isso. Queria ajudar os garotos que estavam
passando pelo que Lyn passou e eu presenciei e até vivi em alguns
momentos naquela época fodida.
― É o certo. Belinda merece alguém completo, que não
tenha tantos demônios. ― Olhei para o oceano banhado na
escuridão. A única luz era a da lua brilhante no céu. Tudo brilhava,
menos a minha vida.
Fabrizio estava certo ao afirmar que El Diablo não era
homem para ela em razão de tudo que ele carregava, e o mesmo se
estendia a mim.
― Acredito que ela não vá achar isso no mundo em que
nasceu. A família dela pertence à máfia, Stefano. Todos com quem
ela convive possuem demônios ― disse El Diablo.
― Logo ela vai me esquecer e seguirá em frente sem mim. ―
Enquanto eu continuaria naquele caminho tortuoso e escuro no qual
prosseguia havia tanto tempo.
― Bem, é bom que tenha dado adeus a ela, pois agora você
não poderá pisar no território dos Pachecos. ― Ergueu o telefone.
― Fabrizio colocou sua cabeça a prêmio caso pise aqui de novo.
Seu irmão está louco procurando você.
Amaldiçoei, pois deixei meu telefone no modo silencioso.
― Eles romperam a aliança? ― Assim que pousássemos, eu
ligaria para Alessandro. Ele devia estar puto da vida.
O que Belinda tinha falado aos seus irmãos? Que eu me
infiltrei para saber se eram confiáveis? Quem não gostaria da
quebra da aliança seria Luna.
Havia mais de vinte ligações perdidas dela, bem como várias
de Jade, Rafaelle e Alessandro, porém nenhuma de Belinda. Quase
ri. Ela não era mulher de correr atrás de alguém, e eu a machucara
profundamente, o que tornava ainda mais firme sua decisão.
Merda! Sorte minha que eu socaria muito naquela noite,
assim lidaria com tudo que estava dentro de mim, sufocando-me.
― Acho que não chegou a tanto, só que você é um homem
morto se andar por aqui. ― El Diablo suspirou. ― Devia ir embora
antes que saibam que ainda está em seu território e o matem.
Morrer nunca pareceu mais prazeroso, mas eu não permitiria
que isso acontecesse. Nem quando estava naquele inferno tive
vontade de fazê-lo. Minha mãe me fez jurar que, por mais que
estivesse em completa escuridão, nunca tiraria minha vida ou
sequer pensaria no assunto.
― Não vou partir até terminar o que viemos fazer. ― Não iria
a canto algum enquanto não eliminasse todos aqueles malditos.
Sentia-me como um animal que precisava ser alimentado com
sangue.
Ninguém respondeu. Era bom o fato de que nenhum deles
era daqueles que davam conselhos. Eu não queria nada além de
detonar toda aquela escória.
Assim que pousamos na ilha, mandei uma mensagem aos
meus irmãos dizendo que eu estava bem. Não ia ligar porque não
tinha tempo, mas depois conversaria com eles.
Pegamos uma lancha para rumar à ilha em que tinham
construído a arena; não queríamos chamar atenção ao chegar ao
local.
― Temos uma pessoa lá dentro que nos ajudará ― informou
Lyn.
― Achei que não soubesse quais eram os locais ― comentei.
― Nós seguimos Jair há um tempo. Se ele recebe uma
chamada ou mensagem para ir a algum local, sabemos também,
nosso infiltrado trabalha nisso todo o tempo. Existem outros de
quem suspeito também, mas Jair é o frequentador mais assíduo
desse ambiente.
O verme enriquecia à custa dos meninos levados a infernos
como aqueles. Quando colocasse minhas mãos nele, eu o faria
pagar caro.
Desligamos o motor da lancha alguns quilômetros antes da
costa e prosseguimos remando até perto do local, depois pulamos
no mar armados com automáticas à prova d’água. Nadamos até a
praia, onde avistamos alguns guardas, contra os quais abrimos fogo
com silenciadores, abatendo-os.
― Vamos nos dividir. Vou com Stefano. El Diablo pode ir com
os outros para o outro lado. Vamos limpar ao redor e cercar o local.
Não deixem que atirem para não chamar atenção ― orientou Lyn.
― Só vamos avançar quando eu der o sinal.
Prosseguimos pela esquerda, entrando na mata, enquanto El
Diablo foi para a direita.
― A coisa vai ficar feia lá dentro. Está preparado? ― sondou
Lyn ao meu lado.
― Para matar esses pedófilos imundos? Com certeza.
Fiquei imaginando como ele encarava tudo que tinha
acontecido consigo. Aquilo me fazia muito mal, tanto que devia
seguir o conselho de Belinda e procurar ajuda.
― Como lida com tudo que aconteceu? Às vezes sinto uma
raiva tão imensa que é capaz de explodir as coisas ao meu redor.
― Nossos sentimentos são iguais, mas por motivos
diferentes. Cada pessoa reage de uma forma. Meu foco é localizar
cada rede de tráfico infantil e resgatar os garotos, porque não há
ninguém por eles além de mim ― disse baixo. ― Sei o que é viver
naquele lugar sem esperança de resgate.
Respirei fundo, mas doeu.
― Lamento por não o ter salvado. Achei que estivesse morto,
senão eu teria voltado, aliás, nem teria saído de lá sem você ―
assegurei.
― Eu sei, Stefano, você não podia fazer muita coisa na
época. Ao menos seus irmãos vieram por você. ― Havia uma
tristeza latente por trás de sua frieza.
― A porra foi fodida demais. Eu só queria esquecer tudo,
mas é impossível. Quando fecho os olhos, vejo tudo. ― Minha
respiração ficou desigual.
― Stefano, queria ser aquele que diz coisas para melhorar,
mas, como disse, as pessoas são diferentes. A minha salvação
pode ser ajudar outras pessoas. Isso me mantém são. A sua pode
ser outra coisa.
Franzi a testa para a escuridão.
― Como pode saber? ― Minha garganta se fechou.
― Me diz uma coisa: como se sentia ao lado da sua garota?
Pense no que sentia quando estava com ela e no que sente agora.
― Sentou-se, escorando-se em uma árvore.
Quando eu estava com Belinda, tudo melhorava, tudo
ganhava um novo colorido em meu peito escuro, fazia-me sorrir de
verdade, sem a falsidade de sempre. Meu coração, que eu achava
estar morto, aquecia-se com o sorriso dela, sua risada, a forma
como protegia os outros, sua tenacidade. Tudo nela resplandecia
em meio à escuridão que tomava conta de minha alma.
― É isso que estou falando ― apontou após meu silêncio. ―
O que eu faço pode me ajudar a lidar com tudo. Em seu caso, talvez
seja ela a salvação.
― Não sou bom para ninguém, muito menos para Belinda. ―
Suspirei, encostando-me em outra árvore. ― O que posso dar a
ela? Nem dormir na mesma cama eu posso.
― Ao menos você consegue transar, ao contrário de mim,
que repudio sexo.
― Você não...
― No começo tentei, sabe? Mas não consegui. A um
pequeno toque, vomitava até as tripas e corria para tomar banho
depois, com as imagens sujas povoando minha mente, então deixei
quieto. Hoje tenho outro objetivo. ― Mirou além das árvores. ―
Resgatar meninos que passam pela mesma experiência que passei.
Senti-me egoísta por ter aqueles traumas, por me atormentar,
quando o que vivi não foi tão grave quanto o que ele suportou.
― O que acontece quando os liberta? ― sondei, porque os
garotos eram assassinos sem emoções. Eu me sentia assim quando
achei que tinha perdido tudo.
― Tenho um lugar onde os deixo até conseguirem lidar com
tudo e estarem preparados para sair sem querer derramar o sangue
de todo mundo. ― Olhou-me. ― Acho que sabe a sensação, não
sabe?
Sim. Quando fui resgatado do inferno em que vivia, mesmo
respirando, estava morto por dentro, não ligava para nada, embora
ainda visse os rostos das vítimas que eliminei, cada uma delas, bem
como de quem me fez mal. Eu não conseguia esquecer desses por
mais que tentasse.
― Se não fosse meus irmãos e minha mãe, não sei se eu
conseguiria ser trazido daquele lugar onde estava. ― Respirei
fundo. Não era só o lugar, minha mente estava imersa nas
lembranças.
― A família ajuda muito. Entendo a sensação. Senti esse
amparo com você e agora com esses garotos que resgato. ― A
verdade estava em cada palavra.
― E com sua irmã, não é? ― Ela morava na América, era
uma advogada.
― Agradeço por tomar conta dela enquanto pensava que eu
estava morto.
― Era o mínimo que eu podia fazer. ― Tinha dado uma bolsa
de estudos para ela, de forma anônima, claro. Nunca me aproximei
de Ella, para não a envolver em nosso mundo. ― Foi visitá-la?
― Não, ela está melhor sem mim, é uma advogada que
coloca criminosos na cadeia. O que acha que faria comigo? ―
Suspirou parecendo desolado. ― O bom é que ela está bem e feliz.
Ela poderia ficar melhor com ele, mas Lyn estava certo, não
era fácil uma pessoa de fora aceitar alguém do nosso mundo,
assassinos, traficantes. Mudei de assunto.
― Me diz uma coisa: como escapou daquele lugar? Fiquei
algumas semanas lá após perder Jet e não vi você em lugar
nenhum. Marco disse que você estava morto.
Antes que ele respondesse, seu telefone bipou uma
mensagem.
― Vamos ter que deixar essa conversa para outro dia.
Chegou a hora. ― Levantou-se.
Também me ergui, focado no que tinha vindo fazer ali. Depois
resolveria meus problemas com Belinda. Lyn tinha razão, ela podia
ser minha salvação, pois eu percebia a diferença entre o que sentia
ao estar com ela e o vazio que me tomava agora, fora a dor em meu
peito. Assim que aquela merda acabasse, iria até ela e diria como
eu me sentia. Agora focaria em massacrar aqueles malditos.
Entramos na mata escura, abatendo os guardas que
encontrávamos até chegar à porta da propriedade. Tínhamos dois
atiradores de elite, Knife e Cowboy, dando-nos cobertura.
Após limparmos a entrada, adentramos. Havia uma pessoa lá
dentro tomando conta das câmeras, mas um dos hackers de Lyn
tinha invadido o sistema e trocado as imagens ao vivo por gravadas.
Caminhamos pelo corredor, eliminando os que víamos em
nossa frente. Podíamos ouvir gritos na arena dos espectadores
vibrando com as lutas... ou algo mais.
Lyn pegou meu braço, detendo-me.
― Essa arena é diferente de onde ficamos. Aqui é pior. Se
não estiver preparado... Eu soube do surto que você teve naquele
dia ao torturar aqueles homens.
Franzi a testa.
― Estou preparado seja para o que for e vou matar todos ―
rosnei, dando um passo rumo à arena.
Travei, minha respiração aguda e imagens querendo entrar
em minha cabeça. O meu estômago estava tão embrulhado que, se
tivesse comido algo, teria vomitado até as tripas.
Havia meninos presos em correntes pelas mãos e pés, e os
malditos homens... tudo isso na frente de uma plateia aplaudindo
aquela atrocidade.
Perdi minha cabeça e me lancei contra todos com uma fúria
da força de um tornado. Não sei bem o que houve, só sentia meus
punhos socando algo até virar gelatina, molhando-se com algo que
certamente era sangue.
Fui consumido pela escuridão antes que pudesse ter
consciência do que fazia e queria: o sangue dos malditos derramado
e todos indo para o inferno.
Fiquei esperando meus irmãos a noite toda, não sabia havia
quantas horas, mas já devia estar amanhecendo.
A porta foi aberta subitamente por Kanon, que estava
enfurecido, ainda mais ao se deparar com os meninos inconscientes
e com a cabeça no meu colo.
― Seu desgraçado! Você foi deixado aqui para se tornar um
assassino frio, não um molenga sentimental! ― rosnou e acenou
para seus guardas. ― Leve o Número 10. Esse bastardo irá se
arrepender pelo que fez a um dos nossos clientes.
― Você não passa de lixo humano ― cuspi, cerrando os
punhos.
Lancei-me contra os guardas quando tentaram pegar Lyn
para machucá-lo.
― Vou ensiná-lo a não ser malcriado. Estou farto de sua
rebeldia. ― Kanon me empurrou com tanta força que caí, batendo a
cabeça no chão duro, o que embaçou minha visão por uns
segundos.
Os guardas pegaram Lyn. Tentei impedir de novo, ignorando
a dor na cabeça, mas Kanon me empurrou novamente,
aproveitando que eu estava meio desorientado. Segurou minha
cabeça e a bateu no chão. Dessa vez ofeguei de dor enquanto
tentava recuperar o fôlego.
― Seu pai me mandou não tocar em você, mas precisa disso
para saber quem é que manda. ― Ele me virou de bruços,
montando em mim e se curvando. Colocou a boca em minha orelha
e a mordeu, com certeza deixando uma marca.
― Seu desgraçado! ― gritei, lutando contra ele.
― Aprecio garotos que resistem a mim. ― Passou a língua
na lateral do meu pescoço, deixando-me enojado, depois levou suas
mãos nojentas até minha calça. Senti a lâmina de sua faca em
minhas costas.
Não podia deixar que ele me tocasse daquela forma, não
sem lutar, mas minha cabeça estava estourando de dor pela
pancada, a ponto de me deixar desorientado.
O medo me consumia, e não podia permitir que ele fizesse
aquela atrocidade comigo. Então outro empurrão me deixou mole e
sem fôlego por um instante. Queria lutar, mas estava fraco demais.
― Gosto de meninos que lutam enquanto os estou fodendo...
― A faca foi passada de leve em meu pescoço, cortando-o, logo
depois ele passou a boca pelo ferimento.
Por favor... Pensava em suplicar para ele não fazer o que
estava pensando, quando terminou de cortar minhas calças com a
faca, e então senti seu pau imundo em minha pele, o que fez meu
corpo gelar. Eu não podia me entregar! Se Lyn tinha lutado, eu
também tinha que fazê-lo!
Antes de aquele desgraçado conseguir me penetrar com seu
órgão imundo, ouvi um baque surdo, e Kanon saiu de cima de mim,
caindo de lado, meio mole com um chute na cabeça que Jet lhe deu.
Então meu amigo estava sobre ele.
Eu podia estar aliviado com o fato de aquele filho da puta não
ter concluído o ato, mas seu cheiro repugnante estava impregnado
em minha pele, deixando-me nauseado. Entretanto, não era hora de
surtar, e sim de fazê-lo pagar caro com a mesma moeda.
― Vou te matar por querer tocar em meu irmão! ― gritou Jet
enfurecido, socando Kanon.
Tentei me levantar, mas todo o meu corpo doía.
― Já que não me deixou ensinar uma lição a esse moleque,
vou ensiná-la a você! ― rosnou Kanon, subindo em Jet da mesma
forma como fez comigo.
― Stefano, a faca! ― meu amigo gritou, trazendo-me de volta
do meu pesadelo vivo.
Pisquei, olhando para a faca do maldito caída enquanto Jet
lutava com o infeliz, mas levou um soco que o deixou atordoado por
um momento.
― Vocês precisam ser mais exemplares e obedecer! Estou
farto de tanta rebeldia!
Só ouvir sua voz me enojava e me deixava enraivecido.
Puxei minhas calças enquanto voava para a lâmina,
ignorando as dores em meu corpo. Kanon tinha se abaixado para
beijar Jet ou mordê-lo, como fez comigo, deixando sua bunda fodida
nua voltada para a minha direção.
Apertei o cabo da faca firmemente e me lancei contra Kanon,
enfiando-a até o punho em sua bunda, fazendo-o gritar assim que a
puxei de volta, causando um grande estrago.
― Também gosto de enfiar facas em homens como você ―
cuspi.
Jet deu um rasteira nele, que caiu de bunda, gritando ainda
mais e chamando os guardas.
Não mesmo, esse miserável vai morrer hoje.
Fui até ele e peguei seu pau, cortando-o, depois subi em
cima dele, que ainda tentava lutar, mas Jet o segurava para mim.
― Gosto das minhas vítimas assim, sem forças para lutar.
Agora vou fazer você comer esse pau miserável que estuprou vários
garotos neste lugar. ― Coloquei-o em sua boca ao mesmo tempo
em que enfiei a faca em seu peito, atingindo seu coração maldito. ―
Você tentou roubar algo de mim hoje, então agora vou roubar sua
vida em troca. Espero que tenha valido a pena tentar me destruir
dessa forma e maltratar meus amigos.
Ele arregalou os olhos, encarando-me sem arrependimento.
Isso me deixou ainda mais furioso. Era uma pena que eu não podia
prolongar sua morte.
Ele estava prestes a morrer quando ouvi um tiro, deixando-
me petrificado por um segundo.
Meus dedos tremiam tanto pela fúria em razão do que quase
aconteceu como por medo ao ouvir aquele som.
Olhei para cima, quando me deparei com Marco com uma
arma na mão e dois dos seus homens ao seu lado. Contudo, o que
me fez paralisar foi ver Jet cair no chão com um tiro no tronco e
sangue por todos os lados.
A ira que eu sentia de Marco e Kanon ultrapassou o auge. A
dor perfurou meu peito, fazendo-me esquecer meu próprio amargor.
― Não! ― gritei, indo até Jet e caindo de joelhos ao seu lado.
― Por favor, não morra!
Saía sangue de sua boca.
― É melhor, sabe? Ele terá o que quer, então faça o que tem
de fazer. A morte é mais prazerosa do que o castigo que é viver
neste inferno. ― Respirou fundo. ― Viva por mim e faça tudo que
não pude fazer lá fora.
Sacudi a cabeça, chorando.
― Não! Viva comigo, e vamos sair deste lugar juntos! ― De
repente fui arrastado de perto dele por um dos guardas da arena,
não um do meu pai. Era o mesmo que trouxe Jet e Lyn mais cedo e
o chamou de “putinha”. Eu ensinaria a ele quem era uma puta logo,
logo. Seu toque repugnante me provocou um arrepio de terror e
raiva ao mesmo tempo.
― Você ainda é fraco por se importar com esses animais! ―
cuspiu Marco.
― O único animal aqui é você, que deixa seu filho neste lugar
para seu séquito tentar violentá-lo! ― Cuspi no chão, mostrando o
quanto ele me enojava, embora Marco não se importasse com isso
de qualquer modo.
Entretanto, não era hora de enfrentá-lo, de sequer lidar com a
dor do que quase fora tirado de mim, e sim focar em salvar Jet.
Marco apontou a arma para ele novamente, mas olhando
para mim, para o guarda que me segurava e para o corpo
ensanguentado de Kanon.
― Vocês colocaram a mão nele dessa forma, quando dei
ordens específicas para que não fizessem isso? ― sibilou.
Ele não se importava com o fato de eu ter sido abusado ou
não, e sim com sua ordem ter sido ignorada. Eu percebia isso,
conhecia-o muito bem para saber a verdade. Para ele, a minha vida
e minha segurança não tinham qualquer importância. Eu não sabia
por que não me matava de vez. Apostava que não o fazia por temer
a retaliação dos meus irmãos.
― Não, chefe... ― O guarda tremia atrás de mim.
― Mentiroso! Na minha cela, naquele dia, foi um teste para
saber se eu mataria o homem que enviou, para eu reagir e lutar ao
ser pego à força. ― Empurrei minha cabeça para trás, acertando
seu nariz e me desvencilhando de suas mãos. ― Mas hoje Kanon
só não o fez porque o matei antes. E você também tentou algumas
vezes.
O guarda grunhiu enfurecido.
― Ele está mentindo...
― Stefano pode ser tudo, menos um mentiroso. Aliás, ele é
verdadeiro até demais. ― Marco apontou sua arma, antes em Jet,
para o guarda. ― Dei uma ordem a vocês, e não cumpriram. ―
Seus olhos espelhavam pura frieza, assim como sua voz. Eu tinha
razão. Aquela era a razão de sua fúria, sua ordem ter sido
desobedecida. Era justamente por isso que eu estava naquele lugar
que tomou tudo de mim.
O infeliz do guarda teve a ousadia de me usar como escudo.
Eu tinha mentido ao dizer que ele tentara algo comigo, mas vi a
forma como agiu com Jet mais cedo. Era um cara que se
aproveitara do meu amigo, e eu o faria pagar.
― Acha que ele vai me poupar para não te matar? Não seja
estúpido. ― Eu poderia ter rido, se não estivesse com medo tanto
por Lyn, que foi levado para onde eu não tinha ideia, como por Jet,
ainda sangrando no chão. O tiro não devia ter atingido seu peito,
senão ele já teria... Não, ele ficaria bem. Eu só precisava arrumar
uma forma de sair daquele lugar. Se ao menos Alessandro e
Rafaelle chegassem, poderiam neutralizar as coisas.
― Stefano, ele é um dos que você me prometeu que mataria
por... ― sussurrou Jet olhando para o guarda.
Ah, eu teria prazer com sua morte.
― Quem te deu permissão para falar, animal? ― Marco o
fuzilou como se Jet fosse um inseto. Foi na direção dele para
terminar o serviço. Eu podia ver a intenção estampada em seu
rosto.
O medo tomou conta de mim, e corri para proteger Jet.
― Não o machuque mais ― pedi, controlando minha fúria.
Estava contando que Alessandro viesse a qualquer momento.
― Ficou aqui todo esse tempo, e não aprendeu nada. ― Ele
estava puto, mas eu também estava. ― Vou cuidar de você mais
tarde. Agora me diz como conseguiu o telefone para ligar para
Alessandro?
Eu não podia contar que tinha sido através de Lyn. Aliás, nem
queria que soubesse da minha amizade com ele, ou Marco o
machucaria da mesma forma que havia feito com Jet.
Então pisquei aturdido ao enfim perceber que ele sabia que
eu tinha me comunicado com meu irmão. Eles tinham sido
descobertos? Outro tipo de medo se instalou em meu peito, o de
que ele tivesse sido machucado.
― Onde Alessandro está? ― questionei com a voz trêmula.
Marco estreitou os olhos.
― Chegou a minha hora de quebrá-lo, Stefano. Se para isso
eu tiver que me livrar do laço entre você e seus irmãos, que assim
seja, pois a perda de sua mãe não foi suficiente ― desdenhou,
pondo-se na minha frente. ― Vou tirar tudo de você, incluindo esses
animais aqui, e acabar com o que resta de sentimento.
― Meus irmãos! Onde estão?! ― Lancei-me contra ele, mas
fui chutado para longe. Marco era um homem grande, forte, lutava
muito, ainda estava em forma para destilar crueldade por onde
passava. Eu sabia que não o venceria no mano a mano.
O pavor se instalou em mim, bem como a dor causada por
suas palavras acerca de minha mãe, deixando-me paralisado por
um momento. O meu peito estava acelerado, pois me sentia
impotente. Mesmo com ele estando tão perto, aquele homem
parecia intocável, porque o verme sabia usar seus jogos contra seu
adversário.
― Foram fazer companhia para sua mãe ― respondeu, indo
até Jet, puxando-o pelos cabelos e colocando uma faca em sua
garganta. ― Assim como seu amigo irá.
Tentei me levantar, mas mal respirava pelo impacto que levei.
Não podia deixar aquilo acabar assim! Por que não conseguia
pensar em uma saída naquele instante?
― Por favor, o deixe em paz, e faço qualquer coisa que você
quiser! ― Eu faria mesmo. Tanto por Jet e Lyn quanto por meus
irmãos, eu seria capaz de tudo.
― É essa sua fraqueza que me enoja, o modo como é capaz
de dar sua vida por esses vermes e pelos seus irmãos. ― Soou frio
como o Alasca. ― Vou lhe ensinar que minhas ordens devem ser
cumpridas.
― Está tudo bem, Stefano, é melhor assim. ― Jet manteve o
olhar em mim, entregando-se.
Ele era um lutador. Para sucumbir assim, devia ter cansado
de viver daquela forma. Eu não via mais um lampejo de esperança
em seu olhar. Queria dar-lhe isso, mas não sabia como.
― Por favor... ― Chorei. ― Sinto muito! Me perdoe...
Marco deslizou a lâmina na garganta de Jet antes que ele
pudesse comentar alguma coisa. O sangue escorreu
caudalosamente, e vi quando sua vida foi ceifada.
Antes que eu pudesse sair do transe ao vê-lo sem vida
caindo no chão, Marco disse de modo letal:
― Quem mais você precisa perder para se tornar o que é de
verdade? Perdeu sua mãe, seus amigos e seus irmãos. Quem mais
falta? Acha que eu não descobriria que Alessandro e Rafaelle
estavam se preparando para vir resgatá-lo?
O sangue fugiu do meu rosto. Não queria acreditar no que ele
tinha acabado de dizer.
― Isso mesmo, seus irmãos e irmãs estão mortos ― disse
sem um pingo de emoção. ― Inclusive aquele garoto que foi levado
daqui. Sem laços.
― Não acredito em você. ― Eu não podia ter perdido toda a
minha família. ― Luna e Jade...
― Se foram com seus irmãos. Como eu disse, sem laços. ―
Pegou seu celular e me mostrou um vídeo de uma casa pegando
fogo enquanto ao fundo se ouviam os gritos das meninas, depois
exibiu a manchete de um jornal revelando a morte dos meus irmãos,
de cada um deles, inclusive das minhas princesinhas.
O chão se abriu sob meus pés, fazendo-me cair de joelhos.
Era uma pena que ele não podia me engolir. A dor se apossou de
mim, pior do que tudo que eu já havia sentido antes, pois eu não
tinha perdido só uma pessoa que amava, mas todas, não me
restando nada além de dor e vazio.
Cerrei meus punhos e tentei socar Marco, só para ser
derrubado no chão com impacto, o que roubou meu ar e me encheu
ainda mais de dor, mas o sofrimento físico não era nada comparado
ao emocional.
― Estou farto de você tentar me atacar! ― rosnou Marco,
prensando-me no chão.
― Vou matar você. Então é bom que atire na minha cabeça
agora ― sibilei.
― Vamos fazer assim: você quer me matar, mas, se tentar de
novo, morrerá e não alcançará seu objetivo, mas, se ficar aqui e se
tornar quem eu quero que seja, no final vou lutar com você, e terá
sua chance de tirar minha vida. Passe algumas semanas aqui
fazendo o que eu preciso que faça, não apenas lutando; quero
sangue, mortes e frieza, Stefano, que se torne alguém sem emoção
alguma.
― Não vou ser abusado por seus malditos homens ― sibilei,
tentando me soltar.
― Ninguém tocará você dessa forma. Eles me obedecem ―
garantiu-me.
― Como se eu pudesse acreditar em sua palavra... Afinal
Kanon e seu guarda tentaram, e seguiam suas regras. ― Só disse
isso porque queria o animal morto.
Uma parte minha queria matar Marco, mas o desgraçado
tinha razão. Se eu tentasse agora, seria morto sozinho, enquanto
ele continuaria a gozar de saúde para destilar sua crueldade pelo
mundo. Se no final daquilo pudesse ter minha vez de levá-lo comigo
para o inferno, que assim fosse.
Por ora me contentaria com o guarda. Queria cumprir a última
promessa que fiz ao Jet. Olhei para ele ali, no chão, e a dor me
sufocou, mas a acorrentei dentro de mim. Não podia deixá-la
controlar-me, não quando eu tinha de fazer o que precisava naquele
lugar para ter uma chance de me vingar de Marco.
Como um homem podia estar tão perto de mim e ao mesmo
tempo tão longe? Seria tão fácil matá-lo, mas eu não conseguiria,
estaria morto antes de ao menos tentar. Precisava aprimorar minhas
habilidades em luta para vencer o maldito no final.
― Pode ter o guarda, como prova de que todos que
desobedecem às minhas ordens acabam mortos. ― Saiu de cima
de mim e foi até a porta, depois olhou para um dos seus homens. ―
Desarme Dray e entregue uma faca ao Stefano.
A que eu usava antes tinha ficado no peito de Kanon. Nem
tive tempo de pegá-la.
― Chefe, por favor...
― Não haverá clemência, assim como não houve para
nenhum desses meninos enquanto os violava ― rosnei para ele.
― Essa é a última emoção que deixarei que você sinta,
Stefano ― informou Marco e saiu do cômodo, mas seus guardas
ficaram.
Eu queria que ele ficasse ali, assim eu teria uma chance de
tentar enfiar em seu peito a lâmina que o guarda, Gael, me
entregou. Todavia, o bastardo não ia facilitar para mim. De qualquer
forma, eu teria minha vez com Marco um dia.
Respirei fundo e enfrentei Dray.
― Chegou sua vez de ir para o inferno ― grunhi.
― Acha que vou perder para um moleque como você? ―
Sorriu para mim. ― Te venço até desarmado.
Não me importei com suas palavras, só voei para cima dele,
que se defendeu, mas eu sabia lutar, e Dray era daqueles covardes
que gostavam de se aproveitar de indefesos, não tinha muita
habilidade como lutador.
Deixei minha fúria, minha dor e tudo mais que estava
sentindo ao lutar com aquele ser da pior espécie me dominar. Cada
soco, cada buraco que eu abria nele com minha lâmina era
prazeroso. Ele merecia aquilo por tudo que fez a cada um naquele
lugar, a cada garoto que maltratou, abusou e até matou.
Eu respirava com dificuldade quando acabei e olhei para a
poça sangrenta que estava sob meus pés.
― Jogue a faca para mim ― um dos guardas pediu da porta.
Apertei o cabo da faca e a joguei para ele. Foi rápido, incapaz
de ele se desviar, acertando entre seus olhos.
― Está aí, é só pegar.
Levantei-me, fui até Jet e me sentei ao lado de seu corpo.
Gael não disse nada, mas meu pai, que estava do lado de
fora sem que eu soubesse, sim. Entrou e checou o lugar todo
manchado de vermelho, dando-me um sorriso frio.
― Era disso que eu estava falando. Ele não será o último que
você matará.
― Você será o último cadáver que eu enviarei ao inferno ―
falei sem olhar para ele.
― Para isso você precisa eliminar esses seus sentimentos,
inclusive por esse cadáver aí no chão.
― Adeus, meu amigo. Obrigado por me salvar. ― Vou
cumprir a promessa que fiz a você. Matarei todos que um dia o
tocaram.
Naquele dia, perdi tudo que importava para mim, meus
amigos, minha família e minha honra, então a morte seria bem
acolhida, mas eu não iria para o inferno sozinho. Marco iria comigo.
O vazio se estendia em minha alma, não restando nada.
Amor, paz, remorso e felicidade passavam longe de mim. Quando
cheguei ali, sentia tudo isso, mas perdi tudo que tinha alguma
importância para mim.
Só via dor, sofrimento, escuridão, vazio e muito sangue, tanto
que podia encher uma piscina, derramado por mim. Cada rosto que
matei, cada expressão, cada último fôlego ficaria comigo para
sempre.
Uma parte minha dizia que eu tinha ficado sem emoções,
mas no fundo eu sentia algo, só que estava tão enraizado e
profundo que não conseguia puxar para a superfície.
Os dias passavam lentamente, como uma tortura. Eu não
sabia ao certo havia quanto tempo estava naquele lugar. Não
deviam ser nem dois meses, mas a sensação era de anos, como se
eu estivesse em um purgatório. No começo, foi difícil; agora, eu não
me importava mais. Só queria algo, minha vingança, e por ela faria
qualquer coisa. Com as lutas constantes, aprimorei-me ainda mais,
e finalmente tinha chegado o dia em que eu, com toda certeza,
venceria Marco. Logo me juntaria aos meus irmãos e amigos no
inferno. Era uma pena que não poderia ir para o Céu, onde estavam
minhas irmãs e minha mãe... Parei de pensar nelas, porque sentia
como se meu peito estivesse sendo rasgado.
As lembranças de Luna e Jade sorrindo, abraçando-me e
dizendo que me amavam acabavam comigo. Eram tão pequenas e
tiveram suas vidas ceifadas tão cedo.
Na solidão da masmorra, às vezes eu as ouvia me
chamando. Tinha ficado naquele lugar solitário e vazio como eu
estava por dentro. Essas alucinações deviam ser prova de que eu
estava enlouquecendo, mas eu não poderia me importar menos.
Precisava ficar são apenas para derrotar Marco.
Ele já estava ali, eu o vi quando havia lutado mais cedo e
notei o sorriso do maldito, o orgulho de ver o monstro que eu me
tornara. Eu iria esculpir um sorriso de Coringa nele com minha faca;
queria só ver se ainda teria vontade de sorrir.
Naquela hora fitei seus olhos, deixando estampado em meu
rosto o aviso: “logo será você”. Eu só vivia para cumprir essa
promessa, do contrário não estaria mais ali, não mesmo.
Ele não disse nada, mas notei que estava orgulhoso. Seu
sorriso estava diferente das outras vezes que me viu lutar. E, se não
fosse aquela maldita jaula, eu teria jogado meu machado em seu
pescoço e decepado sua cabeça.
Ignorei o alvoroço após a luta e fui direto para a cela na
masmorra, como fazia sempre, mas, antes que eu chegasse lá,
estanquei com a visão dos meus irmãos e minha mãe no corredor.
Era claro que eu sempre alucinava com eles, mas era um de
cada vez. No entanto, naquele momento os três faziam parte do
meu delírio. Eu os amava tanto antes de os perder, ou melhor, de
eles serem tirados de mim.
― Stefano ― disse Alessandro, observando-me.
Eu fazia o mesmo com todos. Estaria louco ao ponto até de
ouvir suas vozes?
― Oh, meu menino, o que fizeram com você? ― Minha mãe
chorava.
Suas lágrimas foram como um soco no meu estômago. Não
queria isso. Minha respiração ficou aguda, e aquelas emoções
queriam sair, mas por que eu não permitia? Seria por temer que
aquela miragem se dissipasse e eu descobrisse que eles não
estavam ali?
A alucinação estava diferente. Antes, só aconteciam à noite,
quando eu ficava tanto tempo na escuridão daquela cela ou quando
estava muito ferido. Na verdade, sabia que não era alucinação
alguma, mas então por que não conseguia me mover? Ou até abrir
a boca para dizer algo?
Mamãe deu um passo até mim, mas Rafaelle a segurou pelo
braço, como se a estivesse protegendo do que eu tinha me tornado.
Franzi o cenho e cerrei meus punhos, segurando meus
instintos de impedi-lo que evitasse a aproximação dela.
Seus olhos avaliavam cada movimento meu.
― Meu amor... ― Ela se afastou de Rafaelle e veio até mim,
abraçando-me enquanto chorava.
O solavanco em meu peito foi tão alto que juro que poderia
ser ouvido a quilômetros.
― Lamento tanto, meu menino, por tudo que passou... ―
gemia, apertando-me mais em seus braços.
Aquele sentimento enterrado estava ali em algum lugar. Eu
podia sentir sua dor, era como se fosse em mim.
― Mamãe! ― Coloquei meus braços à sua volta e respirei
seu cheiro, que eu tanto amava e que pensava nunca mais sentir de
novo. ― Está realmente aqui!
Quantos dias e noites chorei por achar que a tinha perdido
para sempre, e agora a via ali.
― Estou, sim, nunca o abandonei ― sussurrou, beijando meu
rosto.
― Mas eu vi você caída e depois eles... ― Não consegui
terminar de falar.
― Desmaiei na hora... Quando acordei, estava em casa sem
saber o que aconteceu com você. Quis fazer alguma coisa, mas...
― Sua voz falhou.
― Não foi sua culpa, mãe. ― Olhei para os meus irmãos. ―
Pelo visto, ele forjou a morte de todos. ― Minha voz se elevou: ―
Jade e Luna?
― Elas estão bem, estão em um hotel. Eu não as queria aqui.
― Minha mãe me tranquilizou.
Pensando bem na forma como tudo aconteceu, eu não a
havia visto morrendo, mas na hora não suspeitei que fosse uma
encenação, assim como não desconfiei das falsas mortes dos meus
irmãos. Deveria ter sido mais esperto e não ter caído nas mentiras
de Marco. Ele era manipulador e gostava de fazer jogos mentais.
Em minha defesa, naquele lugar qualquer pessoa não conseguiria
pensar com clareza.
Minha fúria por Marco aumentou exponencialmente.
― Teríamos vindo assim que você ligou, mas ficamos presos
até hoje cedo. ― Alessandro trincou os dentes. ― O bastardo
grampeou meu celular.
― Não queríamos que pensasse que nós o deixamos, mas,
quando chegamos aqui, soubemos que você pensava que nós
tínhamos... ― Rafaelle suspirou duro. ― Maldito Marco!
― Vou matá-lo ― afirmei. Estava ansioso para fazer isso. ―
Ele me prometeu que, se eu me tornasse o que ele queria, no final
lutaríamos até a morte.
― Não pode matá-lo ― murmurou Rafaelle, olhando
desconfiado para cada canto ao seu redor.
Fuzilei-o, controlando o instinto que me consumia. Ele é meu
irmão, não meu inimigo, entoei a mim mesmo.
― Além de me fazer pensar que perdi toda minha família, ele
matou dois amigos meus. Um deles morreu ao me proteger. ―
Evitei contar o que Kanon quase tinha feito comigo. Não queria
pensar naquele maldito. Por culpa dele, eu tinha pesadelos e sentia
nojo só em pensar no toque de qualquer pessoa.
― Se matá-lo agora, o Alessandro não vai poder ser capo um
dia ― Rafaelle se aproximou de mim e sussurrou. ― Conseguimos
o apoio de alguns, mas ainda é pouco para uma rebelião. Nesse
momento ele ainda tem muitos seguidores fiéis.
― Meu amor, sei o quanto sofreu neste lugar, mas vamos
embora. Depois você faz o que tem que fazer ― pediu minha mãe.
― Não quero perdê-lo de nenhuma forma.
Antes que eu respondesse, ouvi a voz do homem que mais
odiava na vida.
― Vejo que a reunião familiar acabou em choro. ― Fechou a
cara para minha mãe e depois para mim.
― Você mentiu sobre eles estarem mortos! ― cuspi com ódio
letal.
― Precisava que você alcançasse essa sua versão, um
assassino frio e sem alma ― rebateu e olhou para minha mãe. ―
Embora acredite que sempre terá uma fraqueza. Só acabaria com
ela realmente morta.
Queria mandá-lo ir para o inferno, mas o aperto da minha
mãe me impediu de fazê-lo.
― Acabaria, mas isso terminaria com o respeito dos seus
filhos, e, logicamente, teríamos que honrar a família a todo custo ―
disse Alessandro sem um pingo de emoção.
― Vou ficar bem, meus filhos ― mamãe nos disse, depois se
voltou para Marco: ― Podemos ir embora agora ou vai precisar
deles aqui?
Eu sabia que ela estava louca para me tirar de perto dele,
pois me encontrava a ponto de fazer algo, e minha mãe queria
evitar. Eu não queria ir contra sua vontade. Sempre tinha feito e faria
tudo por ela. No fundo, sabia que mamãe tinha razão, mas minha
vontade de acabar com ele era tanta que chegava a doer.
― Tenho que estar na Itália amanhã cedo para começar a
trabalhar e colocar Stefano para fazer algo também. ― Eu notava,
pela voz do meu irmão, que ele não queria ficar mais tempo naquele
lugar. Eu muito menos.
― Vão. Vou ficar para ver a próxima luta, podem ir embora
sem mim ― Marco disse e se virou para partir com seus
seguranças. Um deles era o mesmo que vi batendo em minha mãe
a ponto de deixá-la inconsciente.
Coloquei minha mão no coldre de Alessandro e peguei uma
faca. Percebi o alerta em seus olhos. Pedi, também com o olhar,
que confiasse em mim.
― Pai? ― chamei Marco, embora levasse tudo de mim para
chamá-lo assim, quando eu só queria fazê-lo sangrar como um
porco.
Ele se virou. Arregalou os olhos assim que joguei a adaga.
Pude ver que o bastardo fodido pensou que eu o mataria. Isso bem
que se passou em minha mente. Infelizmente, meu alvo agora era o
desgraçado que tinha machucado minha mãe.
Marco olhou de mim para o homem, que morreu com a adaga
enfiada em sua testa.
― Achei que fosse me atingir. ― Marco me avaliava. ― Já
está com o coração mole.
― Não tenho um coração. Você fez com que morresse tudo
que havia nele ― falei de modo frio.
― Nem tudo, ao que parece. ― Olhou para meus irmãos e
minha mãe e depois para mim. ― Vou deixar passar dessa vez o
fato de ter matado alguém sem que eu mandasse.
Eu queria rir de escárnio, mas não demonstrei sentimento
algum ao devolver seu olhar duro.
― Ele feriu minha mãe, então merecia morrer. E não pense
nem por um segundo que eu fraquejaria ao matá-lo, porque não o
faria. Aprendi uma coisa neste lugar, que meu destino é matar
qualquer que entre em meu caminho.
Uma sombra atravessou sua expressão. Sabia que ele queria
retalhar minha boca grande. Não que eu fosse mudar por causa
dele, mas não queria que ferisse alguém só para me atingir.
― Alessandro tem razão, devemos honrar nossa família,
incluindo você, pai. ― Porra, dizer isso estava me matando, mas eu
não queria que suspeitasse dos nossos planos para sua queda no
futuro.
Com isso, sua expressão sombria sumiu, e ele sorriu
parecendo orgulhoso.
― Ótimo, embora você devesse continuar aqui. ― Ainda me
avaliava.
Não revelei nada do que estava pensando.
― Já passei muito tempo aqui, quero ver como anda lá fora
― assegurei.
Ele assentiu.
― Não vai querer vingança por aqueles animais
desobedientes?
Todo o meu corpo tremeu, mas meu rosto ficou neutro. Nesse
momento, o aperto da minha mãe em meu braço ficou ainda mais
firme. Eu sabia que Marco estava me provocando para eu perder o
controle facilmente como antes. Na verdade, só me controlei por
causa da presença dela.
― Eles estão melhores onde estão agora. ― Foi minha
resposta.
Dizer isso me matou um pouco mais, embora no fundo fosse
verdade. Morrer era melhor do que permanecer naquele inferno. No
entanto, eu preferia os meus amigos vivos e saindo daquele lugar
comigo, como juramos fazer. Eu finalmente iria sair, mas sozinho.
― Devemos ir, as meninas estão sozinhas no hotel com os
seguranças. ― Mamãe puxou meu braço para sairmos dali.
Nem me incomodei em trocar a roupa cheia de sangue. Por
sorte, era preta.
Antes de entrar no carro, olhei mais uma vez para aquele
inferno e recordei tudo que tinha vivido lá. O pior foi tudo que tive de
fazer até estar naquela escuridão sem fim.
Sair daquele antro não teve o prazer que eu esperava ao
partir dali com Jet e Lyn. Eu estava indo embora sem os dois, e isso
me deixava com o peito despedaçado.
Eu não queria partir sem tirar todos aqueles garotos dali e
proteger cada um deles do que quase havia me acontecido e de
tudo que os meus amigos passaram e viveram lá.
― Vamos, filho ― chamou minha mãe, puxando-me para o
carro.
Assenti e entrei no veículo, sentindo-me esgotado, afinal
tinham sido muitas noites sem dormir direito, pois os pesadelos não
permitiam. A cada vez que eu fechava os olhos, lembrava-me da
voz asquerosa daquele ser desprezível. Isso deveria ter passado,
afinal Kanon estava morto, mas não, esse porra ainda fodia minha
cabeça.
Era noite, o céu estava estrelado, a lua, brilhante, mas eu
ainda me sentia na escuridão.
― Stefano...
Percebia que Alessandro queria falar algo, eu o conhecia
bem.
― Não precisa dizer nada. Sei que, se pudessem ter ido me
pegar antes, vocês teriam. ― Respirei fundo, não querendo pensar
no que tinha acontecido lá. ― A única coisa que está acabando
comigo é ter deixado Marco vivo após tudo que fez com meus
amigos.
E o fato de, por culpa dele, eu não ser mais o mesmo ao sair
daquele maldito inferno.
― Lamento por isso, meu amor. ― Minha mãe segurou
minha mão e a apertou, chorando. ― Me sinto tão impotente por
não poder proteger vocês dele.
― Não chore, mãe. Vamos reunir mais pessoas do nosso
lado, então o eliminaremos. ― Eu estava contando os dias para que
chegasse logo esse momento. Queria fazê-lo pagar por todo o
sofrimento que passei lá dentro, não só eu, mas cada criança,
muitas das quais ainda estavam presas, sem esperança de sair.
― O faremos pagar e seremos livres dele e de tudo que faz e
que abominamos ― disse Rafaelle sombriamente.
― Porra! Eu não sabia que ele mexia com coisas fodidas
como isso ― Alessandro rosnou.
― Prostituição infantil é tão ruim quanto isso, e faz parte dos
“negócios” dele. ― Rafaelle trincou os dentes.
― Vou resgatar esses garotos. Só preciso arrumar uma
forma de fazer isso sem Marco saber ― murmurei.
― Vou ajudá-lo com isso ― garantiu Alessandro.
Assenti e fiquei calado enquanto seguíamos para o hotel.
Assim que chegamos, fui para um dos quartos. Não queria que
minhas princesas me vissem todo sujo e coberto de sangue. Até
manchei a roupa da minha mãe, mas ela não pareceu se incomodar.
Entrei no banheiro e, debaixo do chuveiro, deixei que toda
aquela sujeira e o sangue de garotos inocentes escorressem. Era
uma pena não poder lavar minha alma também e deixá-la como
antes.
O remorso era um sentimento que eu tinha deixado enterrado
por um tempo em meu peito, mas agora se liberava de repente, com
força. Seria porque eu tinha o amor de minha família? Neles eu
enxergava bondade e respeito, uma força que nos ligava mais forte
do que a ira de Marco.
Sentei-me na cama e respirei fundo, com meu peito
sufocando por não ter salvado os outros meninos, por não ter
escapado antes de levarem uma parte de mim. Mesmo sendo tarde,
eu não sabia se conseguiria dormir.
Ouvi passos do lado de fora do quarto, depois uma leve
batida na porta.
― Posso entrar? ― Era minha mãe, cuja cabeça apareceu
no vão ao abrir de leve a porta.
― Claro, mãe. ― Eu podia ver a preocupação em seus olhos.
― Eu estou bem.
Ela entrou e se sentou ao meu lado.
― Nunca diga que está bem quando não é verdade. Sei que
está destruído por causa de seus amigos, se sente culpado por não
conseguir salvá-los.
Ela me conhecia bem, embora meu sofrimento não fosse só
por aquilo. Eu apenas não queria preocupá-la com meus demônios.
― Naquele lugar fiz coisas, mãe... ― Vivi coisas, pensei. ―
As imagens estão na minha cabeça. Não sei se um dia vou
conseguir esquecê-las. Havia só crianças presas lá, elas eram
obrigadas a matar umas às outras...
Mamãe me interrompeu:
― Você também foi obrigado a fazer isso. Foi mantido
naquele lugar contra sua vontade.
― Pode ser, mas tive chances de me matar lá... Não queria
ser como Marco. Cada vida que tirei... ― Fazer aquilo tinha levado
uma parte da minha alma, até não restar mais nada. Ainda assim,
algo me impedia de tentar o suicídio, como cortar os meus pulsos ou
simplesmente me deixar ser morto na arena.
Ela pegou meu rosto e capturou meu olhar com o seu
intensamente.
― Nunca pense em tirar sua vida, por mais que a escuridão
seja profunda ou os tormentos sejam demais. ― Senti a dor em sua
voz, tão potente como eu a via em seu rosto.
― Mãe... ― Eu preferiria sofrer a ela. Se pudesse resguardá-
la disso seria bom, mas não podia e precisava dela para lidar com
tudo.
― Somos uma família, e não vou deixar Marco quebrar
nenhum de vocês a esse ponto. Ele pode lhes ensinar toda a
maldade que faz, mas nenhum de vocês puxou a ele aqui. ―
Colocou a mão em meu peito. ― Seu coração é bom, Stefano, por
isso a culpa. Se você fosse igual ao seu pai, estaria se vangloriando
neste momento. No entanto, aqui está o meu menino, sofrendo.
― Estava perdido naquele lugar. Foi pouco tempo, mas um
dia lá é como um ano em um purgatório. ― Eu teria preferido isso,
um purgatório; ao menos sofreria sozinho e não levaria pessoas
comigo. ― O Jet... Ele tinha tanta esperança, mãe. ― Levantei-me,
sentindo minha garganta fechar, inquieto, louco, querendo explodir
algo. ― Ele queria tanto sair, mas sofreu ao ponto de acabar me
pedindo para matá-lo. Dá para imaginar alguém que fez tudo para
continuar vivo por anos, enfrentou toda aquela porcaria só para
desistir no final? O que isso lhe custou? ― O meu peito estava
esmagado.
― Teria gostado de conhecê-lo. Tanto a ele como ao seu
outro amigo.
― Eles estavam machucados demais após aqueles malditos
os torturarem. ― Encolhi-me com a lembrança deles no chão. ―
Quando liguei para Alessandro, pude ver a esperança surgindo
neles de novo. Fiquei tão feliz que juramos ser irmãos quando
saíssemos, que nossa amizade seria eterna.
― Meu bem... ― Seus olhos estavam molhados. ― Lamento
tanto, querido.
Os meus olhos também lacrimejavam, mas não derramavam
lágrimas. Devia ser pelo tanto que chorei naquele lugar abandonado
por Deus e pelo mundo.
― Então um dos homens do meu pai chegou para levar Lyn
― continuei. Contei o que aconteceu com os dois quando chegaram
machucados. ― Lutei com Kanon devido ao que fez, mas ele...
Não consegui contar o que quase me aconteceu. Não queria
que nem ela nem meus irmãos sofressem e se sentissem culpados.
Ninguém poderia ter feito nada, só Marco – que não fez, por sinal.
― Esse homem abusou de você? ― O terror estava em sua
voz e em seus olhos arregalados. ― Marco jurou que ninguém te
tocaria assim.
― Quase ― resolvi não revelar muito. Preferia sofrer sozinho
com os meus demônios a deixar que se culpassem por algo que não
estava em suas mãos. ― Se não fosse por Jet... Ele me salvou,
então Marco entrou e atirou nele. ― Sacudi a cabeça, não querendo
pensar em seus olhos sem vida.
― Querido...
― Os dois morreram sem eu poder fazer nada, e agora
aquele desgraçado ainda respira neste mundo. E, pior, se vangloria
do monstro que criou.
― Você não é um monstro. ― Ficou de pé e pegou minha
mão. ― Nunca pense isso.
― Fiz coisas imperdoáveis, mãe. ― Tirar uma vida nunca
tinha me incomodado tanto. Eu não gostava de ser obrigado a
matar, como acontecia na arena. Lá machuquei crianças; mesmo
sendo assassinas, ainda eram crianças.
― Venha comigo. Quero te mostrar o quanto você significa
para mim e seus irmãos.
Não discuti, só a segui para a varanda.
― Olhe para o céu agora. ― Apontou para cima. ― Me diga
o que vê.
Fiz o que pediu, mas sem entender. Comentei:
― As estrelas brilham na escuridão. ― Menos a minha vida.
Aliás, tudo em mim eram sombras e tormentos.
― Sim, são brilhantes e iluminam a escuridão. É assim você
em nossas vidas. Se um dia eu o perdesse, minha vida seria um
buraco-negro, porque, sem meus filhos, não teria nenhum sentido
viver. ― Virou-se para mim. ― Quero que me prometa que nunca
tirará sua vida nem sequer pensará em fazer tal coisa. Mesmo se
um dia eu não estiver mais entre vocês, sempre terá as meninas e
seus irmãos. Eles precisam de você.
Meu coração se apertou com a ideia de perdê-la. Eu não
podia passar por isso de novo. Só eu sabia o quanto foi doloroso
pensar que a havia perdido para sempre. Marco era perigoso, não
era normalmente o tipo de atirar antes e perguntar depois. O maldito
preferia acabar com a maior parte das pessoas primeiro
psicologicamente. Foi isso que fez comigo ao dizer que eu tinha
perdido tudo.
― Juro nunca mais pensar nisso. ― Cheguei a pensar lá,
mas não o fiz, pois queria vingança contra Marco, e no final não
consegui nem uma coisa nem outra. Bem, suicídio agora estava fora
de cogitação. Antes estava sozinho e cercado de sangue e morte;
agora tinha a minha família de volta.
― Obrigada, meu amor. Agora por que não vamos ver as
meninas? Elas sentiram falta de você durante sua ausência. ―
Mamãe apertou minha mão enquanto seguíamos para dentro do
quarto. ― Eu te amo muito, meu filho. Nunca se esqueça disso.
― Eu também, mãe, por isso foi doloroso pensar que jamais
a veria de novo. ― Era uma emoção que eu não queria sentir nunca
mais.
Fomos para o quarto ao lado. Antes de entrar, mudei minha
expressão para uma divertida. Não queria que as meninas me
vissem atormentado.
― Stefano! Estava com saudades! ― Luna correu para mim
e me abraçou.
Beijei sua cabeça.
― Também, pequena. ― Respirei fundo, adorando estar com
minha família.
― Me diz o que papai fez, que vou xingá-lo ― rosnou Jade
de braços cruzados.
Ela tinha oito anos e era muito valente. O que tinha Jade de
valentia, tinha a Luna de doçura.
― Jade, o que falei sobre não enfrentar Marco? Você vai
acabar sendo castigada ― disse minha mãe.
― Ele é um escroto filho da...
― Olha a boca! ― ralhou mamãe. ― É muito feio para uma
mocinha dizer palavrões.
Ela fez uma careta.
― Stefano diz o tempo todo.
Sorri de verdade e me senti estranho. Fazia tempo que não
me sentia dessa forma.
― Isso é porque sou homem, e não é tão feio quanto uma
garota xingando ― provoquei-a.
― Garotas podem chutar bundas tanto quanto homens ―
apontou ela, obstinada.
― Que tal parar de falar em chutar coisas? ― pediu mamãe.
― Encomendei pizza, ainda está quente.
Nossa... Eu não sabia havia quanto tempo não ingeria
comida de verdade.
― Vem aqui, sua danada. ― Puxei Jade para os meus
braços. Ela batia no meu peito.
― Também senti sua falta ― declarou. ― Ninguém me disse
onde estava.
― Em um lugar que não merece ser lembrado. ― Elas não
mereciam ter aquela imagem em suas cabecinhas.
Era bom estar em casa com minha família, com pessoas que
dariam tudo por mim, assim como eu faria por elas. Eu não sabia o
que seria dali para frente, mas desejava estar sempre com cada um
deles. Esperava que um dia eu pudesse esquecer tudo que fiz e vivi
e ter aquela luz que minha mãe disse que eu era para ela.
Voltei a mim e olhei para o chão ensanguentado da arena em
que tínhamos acabado de entrar e presenciar aquela
monstruosidade. Sentia minha respiração aguda, e minha raiva
ainda não tinha passado, nem depois de ter matado todos.
A plateia me olhava coberto de sangue, chocada com a cena
dos miseráveis desmembrados e sem vida.
Sorri de modo maníaco para os espectadores, segurando-me
para não acabar com todos.
― O que foi? Não queriam sangue, seus malditos vermes?
Como podem sentir prazer com essa porra fodida?! ― Olhei para
Lyn, que estava sem expressão. ― Alguém saiu enquanto eu estava
desmembrando esses insetos?
Era até um crime comparar um inseto com pessoas que
gostavam de participar e assistir àquela abominação.
― Não, o local está fechado. Ninguém sairá daqui.
Assenti e me virei para os garotos, uns dez mais ou menos,
mas eu sabia que havia mais nas celas. Aqueles eram os lutadores,
provavelmente os perdedores. Fosse como fosse, agora eu daria
uma diversão a mais a eles, uma de verdade.
― Querem entrar nessa festa? ― Fui até cada um, tirando
suas algemas. Ao se libertarem, puxaram suas calças para cima. ―
Todos precisam do mesmo remédio que deram a vocês.
Eles aquiesceram, fuzilando a multidão de homens e
mulheres.
― Vamos fazer essa arena estrondar com os gritos que
realmente merece ― falei, pulando do ringue na frente de Jared e
Jair, que em algum momento tinham sido imobilizados por Arrow. ―
Meninos, esses dois são meus e de Lyn. Vocês podem escolher
qualquer um na multidão.
Os garotos correram, pegando suas armas e atacando cada
um que aparecia na sua frente. Pela forma como agiam
descontroladamente, estavam muito putos da vida. Enfim eu
percebia por que Lyn deixava os jovens resgatados em algum lugar
até conseguirem controle sobre si mesmos, para que não
atacassem ninguém quando estivessem enfurecidos. E havia muita
fúria naqueles meninos. Lyn os ajudava a canalizá-la para quem
merecesse em vez de qualquer um. Eu entendia a sensação. Se
não fosse minha mãe e irmãos, eu não estaria ali, teria me tornado
um psicopata fodido.
Os olhos de Jared estavam arregalados enquanto viam os
garotos se divertindo.
― Não me mate... Te dou o que quiser, por favor... ― ele
começou a rogar.
Não me importei com suas súplicas nojentas.
― Ouviu quando alguns deles imploraram para que não os
tocassem? ― Aproximei-me mais dele e de seu tio.
― Pare de implorar e honre as bolas que tem ― rosnou Jair
para o sobrinho.
― Não se preocupe, logo Lyn te fará suplicar por
misericórdia. O bom é que não somos misericordiosos. ―
Movimentei minha faca entre as mãos. ― Você é, Lyn?
― Não. ― Foi sua resposta decidida.
― Vocês não passam de escória e não merecem respirar
nem mais um segundo.
― Bella sabe do que você faz ou está incluída nesse jogo?
Se aquela... ― Jared se interrompeu quando soquei sua boca,
fazendo o sangue escorrer.
Minha fúria estava me deixando um tanto cego, a ponto de
acabar terminando logo com aquilo, mas precisava manter meu
foco. Era melhor brincar com ele, pois eu precisava de uma luta.
― Não ouse dizer o nome dela com sua boca fodida ―
sibilei, socando-o de novo, dessa vez no estômago, o que o fez
ofegar. ― Nunca nem sequer pense nela.
― Quem, maldição, são vocês? ― grunhiu Jared, tentando
se afastar.
― Alguém que veio para destruir seu império maldito. ―
Manejei minhas facas.
Jared olhou para o lado, onde, na plateia, muitas pessoas
gritavam pelo ataque dos garotos.
― Não ligue. Eles estão recebendo o que lhes é cabível.
Tudo o que os meninos estão fazendo é pouco em vista do que já
fizeram a todos aqui e em outros lugares. ― Movimentei uma de
minhas facas rapidamente e abri um corte no peito do maldito, mas
não muito fundo, porque não queria que morresse logo.
Ele gritou.
― Maldito seja! ― Fuzilou-me. ― Podemos entrar em um
acordo! Quer dinheiro...
― Cale a boca, Jared. Eles são mafiosos, não precisam de
dinheiro ― disse Jair.
Pelo visto, Lyn teria um pouco de dificuldade para quebrá-lo.
― Isso, grite, pois é a única coisa que fará hoje. ― Sorri para
ele e depois para meu amigo e irmão. ― Lyn, fique com o tio
salafrário dele. Pode obter as informações que deseja.
― Ah, com certeza conseguirei. ― Ele ficou em frente a Jair.
― Principalmente quais as instalações Prometheus que você
conhece.
― Jared é todo meu. Vou adorar me divertir com ele, assim
como aposto que fazia com os garotos daqui. ― Só em pensar
nisso, eu ficava ainda mais enfurecido.
― Eu não os fodia, meu negócio é mulher! ― revelou,
parecendo esperançoso. ― Pode me deixar ir, não conto nada do
que vi aqui nem sobre vocês.
Ri zombeteiro.
― Não mexia com eles, mas os trazia para cá, alterava seus
documentos para que todos pensassem que foram adotados. Não
pensou no que eles passariam aqui, na dor que sofreriam neste
maldito lugar? ― rosnei. ― Era sua responsabilidade protegê-los, e
não jogá-los em um ninho de víboras!
Foquei em meu objetivo e deixei Lyn cuidar do dele.
Finalmente eu faria aquele filho da puta pagar caro.
― Não sei nada sobre onde ficam as... ― Grunhiu quando o
soquei. ― Você se aproveita só porque estou preso ― cuspiu,
tentando se soltar das mãos de Arrow. ― Não é homem para me
enfrentar no mano a mano!
Meneei a cabeça para os lados, pensando em sua
provocação. Estúpido de merda... Se ele soubesse o que eu tinha
preparado, iria desejar que eu o matasse naquele instante. Ele se
daria conta disso eventualmente.
― Bem, se está reclamando quanto a isso... ― Olhei para
Arrow e indiquei: ― Solte-o. Vamos ver o quanto ele é homem
lutando comigo.
O assassino não reclamou, só o soltou, dando um empurrão
nele em minha direção.
― É todo seu ― disse.
― Valeu! ― Se aquele babaca achava que podia me vencer,
eu lhe ensinaria o contrário. ― Olhe ao redor. ― Apontei para o
sangue e os corpos despedaçados na arena. ― Logo será o seu
sangue derramado aqui.
Lyn segurou Jair e o puxou para ficar fora do caminho da
minha luta. Eu poderia só matar Jared, mas precisava de mais; a
dor de receber alguns socos aliviaria o sofrimento que eu estava
sentindo naquele momento, um para o qual não havia cura. Apenas
uma pessoa podia aliviar aquele tormento vivo, mas, como eu era
idiota, a deixei escapar.
Foquei no presente para acabar logo com aquilo e ir até
Belinda, mesmo correndo o risco de ser morto pelos seus irmãos.
― Vamos acabar logo com isso ― Lyn declarou, indo fazer
seu trabalho com o tio daquele miserável.
― Você está armado, e eu não ― apontou Jared.
Nessa hora ri, porque, se fosse o contrário, ele teria me
matado, mas, como eu queria brincar um pouco e soltar aquela fúria
que me consumia, deixei que desse as cartas. Por enquanto. Logo
ele veria a verdade.
Joguei uma das minhas facas para ele, que a pegou com
habilidade, então imaginei que talvez ele fosse bom com lutas
armadas, mas não era páreo para mim.
― Agora estamos quites. ― Preparei-me. ― Chegou a hora
de brincar.
Ele se lançou para mim, acertando-me no braço e abrindo um
corte. Não me esquivei, o que trouxe um sorriso ao seu rosto. Deixei
que pensasse que tinha me acertado por ser um bom oponente.
A dor era meu refúgio havia anos, ela me fazia de certa forma
pagar por não ter conseguido salvar Jet e Lyn, quando eu achava
que Lyn estava morto. Naquele dia, queria senti-la por ter feito
Belinda sofrer.
A cada golpe que eu recebia, pensava em seu olhar triste.
Mesmo que ela não tivesse chorado na minha frente, eu sabia que o
faria após eu ter saído de lá, no dia anterior. Ela se manteve forte ao
menos até o momento em que fui embora, mesmo com o coração
partido.
― Porra, Stefano! Se você deixar ele te cortar mais uma vez,
eu mesmo vou terminar o serviço! ― ouvi Lyn grunhir em algum
lugar perto de mim.
― Deixar? ― Jared zombou. ― Ele não passa de um fracote
que não serviu nem para aquecer a cama da Bella. Não se
preocupe, vou cuidar disso quando eu foder todos os buracos dela,
e, acredite, ela vai gostar.
Meu sorriso sumiu. Fui tomado por uma fúria tão imensa que
senti meu rosto quente.
― Vou te mostrar quem é o fraco. E o único buraco que você
vai ter fica a sete palmos do chão ― cuspi e me lancei contra ele,
chutando-o após acertar suas costelas com a faca.
Jared caiu no chão, mas não lhe dei tempo para que se
levantasse antes de subir nele e enfiar a lâmina em seu peito. Ao
mesmo tempo, senti a dele no meu ombro.
― Você não devia ter falado em Belinda com sua boca
imunda ― rosnei, mexendo a faca, fazendo-o se engasgar com o
sangue que brotava em seus pulmões e subia à sua traqueia. ―
Agora vou te enviar para o inferno com uma passagem só de ida.
Ele cuspiu sangue.
― Você também vai... ― Tentou enfiar a lâmina novamente
em mim, mas segurei sua mão, não permitindo. Não podia deixá-lo
me ferir mais, precisava ir até Belinda. Estava irado demais para ter
me protegido e evitado o golpe.
― Não hoje. Um dia nos encontraremos lá. ― Puxei a faca
para baixo, rasgando sua barriga. ― Isso é pelos garotos que você
ajudou a colocar neste lugar com a ajuda de seu tio.
Não demorou muito para ele dar seu último suspiro. Era uma
pena eu não ter prolongado a situação e me divertido mais, mas
estava ansioso para ver Belinda.
― Maldição, por que não se defendeu antes de levar uma
facada? ― grunhiu Lyn, ajudando-me a ficar de pé após aquela
bagunça.
― Não vi o golpe, estava com muita fúria na hora.
― Sente-se aqui. ― Colocou-me na arena. ― Deixe-me ver o
estado disso.
Após conferir os danos causados, Lyn amaldiçoou.
― Precisamos de pontos, isso se não for necessária uma
cirurgia, dependendo do que foi destruído com a facada. Não foi só
o ombro. ― Apontou para o meu braço.
― Então dê os malditos pontos. Deve ter algum material
médico neste lugar. Não vou para o hospital. Preciso ir até Belinda.
― Devia ir a um médico, que sabe lidar melhor com esse tipo
de coisa.
― O helicóptero está aqui ao lado. Podemos levá-lo agora ―
informou El Diablo.
Após alguns minutos, entramos na aeronave, onde me
escorei no banco. Tinha colocado um pano para estacar o sangue
até alguém dar os pontos necessários.
― Só temos um problema. Estamos no território dos
Pachecos. Eles já devem estar cientes do que aconteceu e devem
estar a caminho. ― El Diablo estava ao meu lado direito, e Lyn, ao
esquerdo. ― Talvez devemos repensar em mantê-lo num dos
territórios deles.
― Acho que minha morte vai chegar antes disso ―
murmurei, sentindo que estava piorando. ― Mas não ligo se me
matarem, vou até a irmã deles.
― Stefano, você vai a um hospital ― Lyn frisou.
― Não vou. Só vou dar os pontos, depois quero ir para ela...
― Eu odiava hospitais, evitava-os a qualquer custo. Não ficaria
impotente a esse ponto.
Fechei os olhos, ansioso para estar ao lado de Belinda o
quanto antes e pedir que me desculpasse. Esperava que me
aceitasse e me perdoasse, porque eu não viveria sem ela.
De repente senti cheiro de clorofórmio, então abri os olhos,
encontrando os do meu amigo.
― Lamento. ― Foi tudo que ouvi, quando a inconsciência me
tomou.
Fazia alguns dias que eu tinha descoberto a traição dos meus
irmãos e Stefano. Dizem que o tempo cura, mas não, eu ainda
sentia o meu peito sangrando como no dia em que descobri. Tentei
me manter focada no trabalho para aquela dor não me derrubar,
mas não estava conseguindo.
Santiago vinha ao orfanato direto tentar falar comigo, mas eu
não queria ouvi-lo. Javier assumiu o posto de meu segurança, e as
coisas só pioraram, pois eu via a pena nos olhos dele. Talvez eu
estivesse vendo coisas, mas, de qualquer forma, precisava sair dali.
Por isso, fui para a casa da vovó e fiquei com ela durante
alguns dias. Só pude voltar ao orfanato após saber que Jared e seu
tio foram capturados por Lyn. Soube que Stefano estava com ele,
mas, quando meus irmãos chegaram à ilha, já tinha ido embora.
Fiquei aliviada por isso.
Era para aquele idiota ter partido do nosso território, mas
Stefano só podia ser um tapado que vivia em busca de adrenalina.
Foi bom que meus irmãos não o encontraram.
Não procurei saber o que mais tinha acontecido; a minha
cabeça não estava muito boa para nada.
Os irmãos Laions estavam de novo no orfanato, protegidos
enfim por uma pessoa que realmente se importava com eles e
tomava conta do local.
Entrei na sala da minha avó, que assistia ao noticiário sobre
uma chacina.
“Jared Calixto e Jair Calixto mantinham meninos presos na
ilha, onde os fazia lutar até a morte. Os dois foram encontrados
torturados e mortos. Acreditamos que o caso tenha a ver com o
atentado ao orfanato alguns dias atrás”, dizia a âncora.
O pai de Jared foi preso, após a polícia achar provas de que
fazia parte da quadrilha. Havia filmagens dos meninos lutando e
várias pessoas assistindo, políticos e muitas pessoas poderosas. Os
vídeos não vazaram na mídia; eu só soube deles porque obriguei
Javier a me mostrar.
Nunca tinha visto algo mais horrendo do que os garotos
algemados e os homens... Na hora corri para o banheiro e vomitei,
enojada com aqueles demônios malditos. Contudo, gostei do
massacre. Lyn e Stefano fizeram um belo estrago no local... Parei
de pensar nele, porque, toda vez que o fazia, sentia vontade de
chorar e muitas vezes sucumbia, só não na frente de alguém.
“As crianças prisioneiras não foram localizadas. Tudo indica
que, de algum modo, escaparam e massacraram todos que
assistiam às lutas. Agora esses meninos assassinos estão soltos. O
que esses adolescentes devem estar enfrentando aqui fora, quando
só o que sabem fazer é matar?”, voltou a dizer a apresentadora.
― Bando de hipócritas! Falam das crianças como se fossem
bichos perigosos que escaparam do zoológico ― ouvi minha avó
murmurar.
― Por um lado, eles estão certos, vó. Assisti ao vídeo deles
naquela arena lutando com correntes nos pés. Se fossem soltos,
com aquela fúria toda, não restaria nada, mas os meninos estão
bem. Tem alguém que toma conta deles até poderem voltar à
sociedade. ― Lyn cuidaria de todos e lhes ensinaria outras coisas
além de matar. Se Jacob tinha conseguido, os outros também
poderiam.
Por falar em Jacob, ele desapareceu no dia seguinte após o
massacre. Ninguém sabia dele. Possivelmente não precisavam mais
de sua presença no orfanato.
― Sabe para onde foram levados? Acredito que precisarão
de psicólogos, por tudo que viveram ― sondou.
― Não sei, mas estão sendo bem-cuidados, ou o quão bem-
cuidados podem ser no nosso mundo. ― Sentei-me no sofá ao seu
lado.
― Foram meus netos a massacrar aqueles crápulas? ― Ela
não pertencia à máfia, mas não se importava com o que meus
irmãos faziam. Amava-os o suficiente para ignorar isso.
― Não, foram outras pessoas ― sussurrei. ― Mas Stefano
estava lá. Com certeza fez um belo estrago. Ele não suporta que
crianças sejam maltratadas.
― Você sabe o que aconteceu com ele no passado? Ele lhe
contou alguma coisa sobre isso?
― Não, Stefano não se abre muito, mas presenciei algumas
atitudes dele. Ele tem trauma de ser tocado em algumas áreas do
corpo. Temo que, de algum modo, alguém tenha abusado dele ou
chegado perto disso. ― Quando eu pensava na possibilidade,
minha raiva por ele ter me usado diminuía um pouco, mas não tanto
para perdoá-lo. Ele não viera atrás de mim, sinal de que nada do
que tivemos havia significado para ele.
― Uma pessoa que passa por traumas profundos pode
desenvolver dois tipos de transtorno. Primeiro, Transtorno de
Personalidade Borderline. Esse é persistente e prejudica as
relações. A pessoa é instável e pode desenvolver automutilação por
não conseguir lidar com as emoções e se sentir “vazia”. E pode
adquirir Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Esse faz com que
a pessoa tenha um tipo de ansiedade em relação a situações que a
lembrem da situação traumática. A pessoa pode ter pensamentos
persistentes sobre isso e não consegue viver normalmente, tendo
pesadelos, insônia e crises de pânico.
― Ele não se automutila, mas se deixa apanhar no ringue
para sentir dor física. E às vezes surta em alguns momentos, como
com algumas cenas que acho que são parecidas com algo que
viveu ou viu. Também tem insônia e pesadelos. Até o aconselhei a
vir falar com você em busca de ajuda, mas então descobri seus
motivos para estar comigo, iguais aos de Gazo ― sussurrei,
encolhida por pensar que Stefano me usou e não se importou em
nenhum segundo com os meus sentimentos.
― Meu amor, durante tudo o que viveram, você não sentia
que ele a queria, mesmo não dizendo as palavras? Nem todos
sabem dizê-las, ainda mais alguém como ele, que se machucou
muito. ― Desligou a TV e se virou para mim. ― Quanto ao Gazo,
ele agia de modo perfeito demais. Ninguém é assim. Até cheguei a
comentar isso com você, mas estava apaixonada e não enxergava,
ou no fundo soubesse, só não queria aceitar.
― Fui idiota. Por isso perdemos Lorena. ― Meu peito
sangrava quando eu pensava na culpa que sentia.
― Não pense assim, meu amor. ― Aproximou-se mais de
mim. ― Aquilo foi uma fatalidade, não é culpa de ninguém além das
pessoas que fizeram isso com ela.
― Stefano disse a mesma coisa. ― Coloquei a mão no peito.
― Me sinto tão destroçada, vovó. Me apaixonei tanto por ele que
não sei se vou conseguir lidar com a perda. Tentei ser forte, mas me
sinto tão vazia, exceto por essa dor que me impede de dormir e
comer direito. Não me senti assim quando perdi Gazo.
― Isso, meu bem, é porque no fundo sabia o homem que ele
era. E Stefano não é assim, não é? Você deve saber disso, por isso
ainda o ama, só está magoada por ele não ter vindo se desculpar.
Com o que me contou sobre ele, sei que deve estar perdido e com
medo, por isso fugiu. Se ele realmente amá-la, vai voltar para você,
acredite.
― E se não me amar? ― Sentia que gostava de mim quando
ficávamos juntos, que não era fingimento, mas me enganei uma vez,
podia acontecer de novo, exceto que agora eu sabia ler melhor as
pessoas, não era mais uma menina ingênua, que acreditava em
tudo que me falavam.
― Então seguirá sua vida. Não será fácil, você é digna de
alguém que lhe dê tudo que merece e muito mais. ― Apertou minha
mão. ― Estou aqui para qualquer coisa.
― Eu sei que está. Agradeço por estar ao meu lado. ―
Abracei-a por um momento e me afastei quando ouvi o barulho de
um carro chegando. Levantei-me. ― Se for Santiago ou um dos
meus irmãos, não quero vê-los.
― Precisa desculpá-los, Belinda. Eles não fizeram por mal,
só queriam que escolhesse alguém por si mesma. ― Ergueu-se
também. ― Pense no que eles têm que fazer para seguir essas
regras, filha, no quanto se preocupam em ter que decidir com quem
você deve se casar.
― Estou muito chateada com eles ― murmurei.
― Eu sei. Só se coloque no lugar deles, vivendo sem opção
quanto a isso e outros assuntos da máfia. ― Vovó suspirou. ― Me
diz a verdade: se não fosse assim, você teria deixado alguém entrar
realmente em seu peito?
― Acho que não ― sussurrei.
― Não deixaria, pois o que aconteceu com você roubou sua
confiança nos homens, mas nem todos são como Gazo, querida.
Precisa se entregar às vezes, não tema amar alguém ou até se
decepcionar. É algo da vida.
― Não faça isso, ou vai acabar com o coração partido ―
disse Serena, entrando na sala com os olhos marejados.
Pisquei. Não era Santiago quem tinha chegado, mas minha
irmã.
― O que aconteceu? ― inquiri.
― Mariano é um estúpido! Disse que não pode ser nada além
de meu amigo. Como se eu quisesse ser amiga dele! Estou tão
cansada disso! Por anos sofri sozinha, me culpando por tudo, mas
papai estava certo, não posso viver assim, preciso seguir em frente.
Achei que ele fosse a pessoa que me ajudaria nisso, mas não. ―
Riu amarga e foi servir uma bebida para si. ― Não quero entrar na
zona da amizade.
Ela normalmente não era explosiva, sempre guardava o que
sentia. Isso me pegou de surpresa.
― Sabe o que podíamos fazer em vez de chorar por homens
idiotas que não nos querem? ― Fui até ela e peguei seu copo. Ela
era muito fraca para bebidas. Tomei um gole.
― O quê? ― questionou limpando as lágrimas.
― Belinda, não acho uma boa ideia...
― Vovó, só vamos nos divertir em uma boate qualquer.
Aposto que os seguranças vão estar conosco. ― Beijei seu rosto. ―
Jamais nos colocaríamos em perigo, só precisamos disso em vez de
ficar chorando pelos cantos.
― Bom, estou precisando disso, uma noite de irmãs. ―
Serena olhou para mim. ― Acho que precisa se arrumar.
Chequei meu pijama e o cabelo bagunçado.
― Acho que sim. Só um minuto. ― Assim que terminei, voltei
à sala. ― Estou pronta.
As duas piscaram.
― Nossa... Stefano é realmente um idiota por perder você. ―
Minha irmã sorriu.
Eu vestia uma calça de couro justa, um top deixando a
barriga de fora e botas de cano longo.
― Você deveria usar algumas de minhas roupas e deixar
esse vestido de lado. Vai ficar sexy. ― Nós tínhamos o mesmo
tamanho.
― Vou ficar bonita?
― Você é linda. Se Mariano não é capaz de ver isso, é um
estúpido, mas não vamos pensar nisso agora. ― Puxei-a para o
quarto e escolhi sua roupa. ― Vista.
Ela não reclamou, mas, assim que trocou de roupa, fez uma
careta.
― Não está curto demais?
― Nada que não devesse mostrar. ― A saia de couro que
separei não estava tão curta, e ficou ótima com um espartilho. ―
Está perfeita. ― Peguei o celular e a fotografei.
― O que está fazendo? ― sondou enquanto saíamos do
quarto.
― Mostrando a Mariano o que ele perdeu. ― Enviei a foto
para o imbecil. ― Agora vamos?
― Juízo, meninas. ― Vovó sorriu.
Fomos à varanda. Quando Alonso e Javier nos olharam,
abriram a boca. Estavam acostumados a me ver assim, mas não
Serena.
― Aonde pensam que vão? ― indagou Javier para mim.
― A alguma boate relaxar. ― Dei de ombros ao passar por
eles, mas Javier pegou meu braço.
― Não acho uma boa ideia...
― Não ligo para o que você acha. Só nos siga até lá. ― Sei
que fui rude, mas estava nervosa com cada olhar de pena dele. Eu
não precisava dessa merda. Mostraria a todos que sairia por cima e
não ficaria chorando pelos cantos por causa de um homem que me
usou e não me queria.
Chegamos à boate dos meus irmãos. Eu queria ter ido a
outra, mas não nos colocaria em perigo só para provocá-los, mesmo
estando chateada com eles. Alonso e Javier nos seguiam, um na
frente e outro atrás, observando cada canto.
Quando estacionei, avistei Santiago à porta nos olhando.
Estava sendo uma cadela por não falar com eles? Ainda me sentia
traída pelo que fizeram. Eu os amava demais e sabia que logo iria
perdoá-los, só precisava de tempo, pois sua traição me pegou
desprevenida.
O telefone de Serena não parava de tocar.
― Me dê isso! ― Peguei o aparelho de sua mão antes que
ela pudesse atendê-lo e o coloquei na orelha.
― Recebi a foto que Belinda me enviou. Onde vai vestida
assim, Serena? ― Razor praticamente rosnou.
― Oh, agora se preocupa com o que ela veste? ―
provoquei-o. ― Amigos não deveriam se importar.
― Belinda? ― cuspiu. ― Onde Serena está?
― Você é um idiota. Minha irmã passou anos apaixonada por
você, e agora vem dizer que só quer ser amigo dela? Sabe onde
enfiar essa amizade, não é? Hoje ela vai encontrar um homem de
verdade, um que queira fodê-la sem sentido...
O telefone sumiu da minha mão; Serena o tinha pegado e
encerrado a ligação.
― Por que disse isso? Não quero transar por aí ― sussurrou
vermelha.
― Ninguém está pedindo que faça isso. Nem tudo que
dizemos que faremos quer dizer que realmente iremos executar ―
tranquilizei-a. ― Só vamos nos divertir. E ele merecia ouvir algumas
verdades.
― Devo ligar para Stefano e dizer o mesmo? ― sondou
sorrindo.
― Na verdade, não precisa, falei tudo a ele quando foi
embora. Agora só quero esquecer que um dia o conheci. ―
Suspirei.
― Conversei com a Luna. Ela estava preocupada com você,
pois não recebeu nenhuma das ligações dela.
― Não queria ouvir nada sobre ele e sabia que ela acabaria
tocando no assunto ― sussurrei, depois emendei: ― Mas vou ligar
para ela amanhã.
― Que bom. Ainda custo a acreditar que temos outra irmã. ―
Suspirou feliz.
― Sinto falta dela e das minhas princesas. Podíamos ir visitá-
la, o que acha?
Seria bom sair da cidade por um tempo, embora o vazio e a
dor não passariam não importasse o lugar em que eu estivesse.
Não havia para onde fugir.
― Podemos marcar, sim. ― Pegou minha mão. ― Lamento
por tudo que aconteceu a você e Stefano.
― Eu também, mas não vamos ficar falando sobre isso,
vamos nos divertir. ― Sorri, mesmo que meu coração estivesse
destroçado.
Saímos do carro, e logo Javier e Alonso apareceram para nos
rebocar.
― Eles sentem sua falta. Devia lhes dar uma chance ― disse
Serena olhando nosso irmão em frente à boate nos esperando.
Antes que eu comentasse que iria falar com eles no dia
seguinte, a boate explodiu em chamas, e vi em câmera lenta
Santiago ser jogado pelo impacto da explosão, cair em cima de um
dos carros e depois no chão.
― Oh, meus Deus! ― gritei, dando um passo para ir até ele,
mas Javier me segurou. ― Os outros estavam...
Não podem estar lá! Benjamin, Valentino e Fabrizio... Oh,
Deus, não os deixe estar lá dentro!
― Não... ― Foi interrompido por carros parando não muito
longe e atirando em nós, acertando-o no peito.
― Oh, Senhor! ― Serena chorava agachada atrás de um
carro.
Corri e me abaixei ao seu lado, ignorando o sangue de Javier
em mim. Não podia surtar agora. Segurei sua mão; eu também
estava com medo.
― Fiquem aí! ― gritou Alonso.
Javier estava caído. Eu não sabia se estava morto, mas não
parecia estar respirando.
― Não devíamos ter vindo! ― Minha irmã chorou ainda mais.
― Nosso irmão! Ele...
― Precisamos ser fortes agora. Vamos acreditar que ele
esteja bem ― sussurrei, evitando transparecer meu medo, assim ela
não ficaria tão preocupada. Eu não podia pensar diferente, ou
entraria em pânico. Precisava arrumar uma forma de sairmos de lá.
― Deite-se debaixo do carro. Consegue entrar? ― pedi a ela.
Estávamos muito expostas ali.
― Sim, consigo, mas e você? ― sussurrou.
― Preciso checar Santiago...
― Você não pode ir lá...
― Sei lutar, e você não sabe ― eu lhe lembrei.
― Eles estão armados, não acho que terá uma luta ―
retrucou.
― Certo, não vou, então, mas preciso me esconder debaixo
de outro carro. Agora faça o que pedi. ― Não queria chorar de dor
pelo meu irmão, confiava que ele ficaria bem.
Alonso veio até nós e pegou nossos braços antes que Serena
fizesse o que pedi.
― Vamos correr assim que os seguranças atirarem nos
miseráveis... Vão nos dar cobertura para sair daqui.
― Íamos nos esconder debaixo de carros ― informou
Serena.
― Eles vão procurá-las. ― Sua voz soou amarga.
― Nós? ― indaguei. ― Achei que não éramos o alvo, afinal
foi a boate que explodiu.
Meu coração se apertou pensando nas pessoas lá dentro,
que tiveram suas vidas ceifadas. O atentado foi igual ao do clube de
luta. Achei que aquilo tudo tivesse acabado, então ri com amargura.
Como eu saberia, se não estava falando com meus irmãos?
Por culpa dessa escolha, Santiago podia... Não, eu não podia
pensar nisso, e tinha que arrumar um jeito de salvar a vida de
Serena e a minha.
― Parece que a casa da sua avó estava grampeada, por isso
sabiam onde vocês estariam. A explosão foi só uma distração para
poderem sequestrá-las ― respondeu Alonso.
Corremos rumo a um beco. Algo não cheirava bem. Como a
emboscada tinha acontecido, quando não fazia muito tempo que
decidimos sair? Mesmo que a casa estivesse grampeada, armar um
atentado daquele porte levaria horas, se não dias. Além disso, só
havíamos escolhido a boate durante o percurso, no carro. Não fazia
sentido, a não ser que alguém tivesse nos traído. Olhei para Alonso
à nossa frente, sem nenhum arranhão. Por que todos saíram
machucados, menos ele?
Fingi tropeçar, e Serena parou para me ajudar.
― Merda, esses saltos! ― rosnei.
― Vamos! Precisamos chegar ao beco logo, alguém vai nos
apanhar ― apressou-nos Alonso.
― Vou tirar os saltos para ficar melhor de andar ― falei para
ele, não demonstrando minha desconfiança.
Ele estava alguns metros à frente e não olhava nossa
retaguarda, o que só provava minha teoria. Se ele fosse mesmo um
dos nossos, estaria prestando atenção em tudo. Lembrei-me de
Stefano, da forma como ele agia quando saíamos.
― Preste atenção ― pedi baixinho a Serena. ― Não
demonstre reação ao que eu vou dizer. Assim que eu mandá-la
correr, faça, sentido à esquerda e não olhe para trás. Acho que ele é
um traidor. Vou lutar com ele enquanto você foge.
Ela arregalou os olhos e arfou, o que fez Alonso olhar para
nós.
― Vou tirar os sapatos também, preciso correr. ― Serena se
recuperou, dizendo aquilo a ele para que não desconfiasse de nada.
Alonso assentiu e ficou olhando para o beco, não muito longe
de nós. Se entrássemos lá, estaríamos ferradas.
― Preciso que corra não importa o que aconteça ―
sussurrei.
― Não vou deixar você ― lamentou.
― Posso vencê-lo, logo acompanho você ― menti. Tinha
treinado com Alonso e não sabia se poderia derrotá-lo, mas ao
menos salvaria minha irmã.
Tiramos nossos sapatos e os deixamos no chão. Olhei para
ela, assentindo, depois me lancei para Alonso, pegando-o
desprevenido com um chute nas costelas enquanto Serena corria,
mas parou e me olhou. Eu sabia que ela ia mudar de ideia!
― Corra! ― gritei. ― Agora!
Então finalmente fez o que pedi.
― Mas que porra! ― Alonso praguejou, fechando a cara para
mim e olhando para a direção onde Serena correu. ― Volte aqui!
― Seu traidor filho da puta! Como pôde fazer isso?! ―
rosnei, preparando-me para lutar.
Ele riu.
― Você é esperta, sabia que me daria problemas. Eu não
queria sua irmã mesmo, mas você.
Pisquei.
― Por quê? Meus irmãos...
― Eles não têm nada a ver com isso, e eu realmente não
queria envolvê-la, mas foi preciso.
― Não entendo. ― Estava confusa. Se eles haviam
explodido pessoas para chegar a mim, achei que fosse por vingança
contra os meus irmãos, como aconteceu com Lorena, mas...
― Stefano é o meu alvo, não meu, mas de uma pessoa que o
quer bastante ― declarou.
Minha respiração ficou aguda.
― Stefano? Mas não temos mais nada ― murmurei. ― Ele
não se importa comigo a ponto de ir me salvar ― menti, pois sabia
que, mesmo que não me amasse, ele se preocupava comigo.
― Então você vai se dar mal, pois a sua única forma de
continuar viva é se ele for ao seu encontro. ― Pegou meu braço em
um aperto de aço e me puxou para o beco.
Eu não iria sem lutar, não mesmo. Não queria Stefano perto
de quem quer que desejasse sua presença.
― Belinda, sabemos quem vai ganhar se lutarmos. Facilite as
coisas. Não quero machucá-la, mas eu vou se precisar. ― Deu um
aperto insuportável no meu braço.
― O que você é dessa pessoa? E o que Stefano fez para ela
querer tanto sua presença? ― Precisava saber onde estava me
metendo e não pensar no medo que estava sentindo. ― Quanto ela
pagou para você nos trair? ― Devia ser muito, afinal meus irmãos
pagavam bem.
― Por que não para de falar? Estou farto disso! ― grunhiu
sombrio.
― Me deixa ver... Não pode ser dinheiro. Talvez uma
chantagem ― chutei, mas, pela forma como Alonso ficou nervoso,
acertei.
― Cale a boca! ― sibilou.
― Espero que esse segredo valha sua vida, porque não a
terá mais quando meus irmãos o pegarem ― ameacei com uma
fúria homicida. ― Você machucou Santiago!
― Era preciso, e não foi eu quem colocou os explosivos. ―
Deu de ombros. ― Efeito colateral.
― Seu desgraçado! Não vou com você ― grasnei, chutando
o maldito. Não iria com ele sem lutar. Mesmo sabendo que não
conseguiria vencê-lo, atingi seu tórax com o cotovelo. Ele me
acertou na barriga, derrubando-me no chão.
― Eu não queria fazer isso, mas não me deixa escolha ―
gralhou.
Chutei suas bolas, fazendo-o cair e aproveitei para subir em
cima dele e socá-lo na boca e olhos. Tentei pegar sua arma no
coldre, mas ele me socou no peito, roubando metade do meu
oxigênio. Ao menos consegui pegar uma faca dele e fiquei de pé,
firmando-a na mão.
― Porra! ― praguejou, ainda com dificuldade de respirar.
― Vou fazê-lo se arrepender, seu cretino! ― Eu deveria ter
corrido, mas estava muito irada com o que ele fez com Santiago
para deixar por isso mesmo. Faria aquele desgraçado pagar caro.
― Você está pedindo por isso. ― Pegou uma faca em uma
capa na canela e se posicionou. ― Se quer dificultar as coisas, por
mim tudo bem.
Ele se lançou para mim, acertando meu braço, mas não fiquei
atrás. Dei um chute nele ao mesmo tempo em que lancei minha faca
à frente, atingindo seu peito e rasgando sua camiseta, mas eu
soube que cortou a pele, porque o ouvi rosnar.
Coloquei naquela luta tudo que aprendi com meus irmãos
durante todos aqueles anos. Não cairia sem o levar junto. Desistir
não estava no meu sangue.
― Maldição! ― ele grunhiu, colocando a mão na região do
corte.
Não lhe dei tempo para se recuperar, chutei suas costelas.
Ele estava a ponto de voar para cima de mim, quando senti uma
mão na minha boca e nariz, mas não era só isso. Senti um cheiro
estranho. Estava sendo dopada? Merda, por que não chequei minha
retaguarda antes?
― Idiota, apanhando de uma garota? ― zombou uma voz
que parecia familiar, mas não consegui distinguir de quem era
enquanto minha visão embaçava.
Antes que eu pudesse tentar lutar ou ver quem tinha me
pegado, a escuridão me tomou. O meu último pensamento foi para
minha família e Stefano, não sabendo se um dia voltaria a vê-los.
Acordei, deparando-me com um teto branco, então me
recordei do que aconteceu, a facada que Jared me deu antes de
morrer e a ida ao helicóptero, seguida por Lyn me dopando. Filho da
puta!
― Finalmente! ― ouvi uma voz ao lado da cama. Por mais
que eu adorasse essa voz, não era a que eu estava louco para
ouvir.
Virei-me, encontrando os olhos verdes do meu irmão. Aliás,
estavam todos ali, as meninas chorando ou com os olhos
vermelhos.
― Estou bem ― tranquilizei-as, mas olhei para Alessandro.
― Mas que porcaria! Não era para me apagarem!
― Você precisava, afinal odeia hospital ― disse Jade,
chegando mais perto de mim.
― Não teria ficado aqui um segundo, mesmo precisando por
causa desses cortes ― sussurrou Luna chorando.
Meu peito se encolheu com a dor delas.
― Lamento por isso, mas agora estou bem, foi só no ombro.
― Na verdade, eu sentia dor, mas nada com que não pudesse lidar.
― Eu sei, o médico só o deixou assim para se recuperar e
porque Alessandro pediu. Sabia que você não ia se deixar ser
curado ― ela me disse fungando.
Estreitei os olhos.
― Se sabia que eu ia ficar bem, então por que está
chorando?
Todos se entreolharam, deixando-me nervoso. Meu instinto
me dizia que eu não ia gostar da resposta.
― O que está acontecendo, droga?! ― Tentei me sentar,
ignorando a dor.
Luna segurou meu ombro bom para me manter no lugar. Eu
podia ver a dor em seus olhos. Os meus irmãos pareciam tristes, até
Jade, mas Luna estava arrasada.
― Luna ― pedi com a respiração aguda, pois minha intuição
me dizia que algo sério tinha sucedido. ― Aconteceu alguma coisa
com alguém?
Todos os meus irmãos estavam ali, não devia ser algo com
eles, mas com quem?
― Sim, aconteceu ― respondeu ela, chorando ainda mais, o
que fez Miguel abraçá-la.
Ele parecia estar sentido, mas não destruído, então as
minhas bonequinhas estavam bem.
Só havia algo que deixaria Luna destruída, mas não meus
outros irmãos. Por certo eles sentiriam, mas não como ela.
― Com quem? ― Meu peito estava acelerado, tanto que os
monitores apitavam freneticamente.
Belinda estava bem, não? Não podia ter acontecido nada
com ela. Eu estava indo até ela antes de apagar.
― Santiago está no hospital inconsciente ― respondeu
encolhida.
Suspirei de alívio por não ser Belinda, mas Luna não tinha
acabado de falar, pela forma como me olhava ainda chorosa.
― Aconteceu uma explosão na boate de meus irmãos.
Santiago estava esperando Belinda e Serena do lado de fora.
Quando elas chegaram, o lugar explodiu...
― Onde Belinda está? ― Sentei-me, logo arrancando os
cateteres e sensores do meu braço e peito.
― Stefano, você precisa se cuidar ― pediu Jade.
― O que preciso saber é se Belinda está bem ― retruquei,
respirando de modo irregular.
― Não sabemos! ― respondeu Luna, chorando.
Arregalei os olhos com o solavanco no meu peito.
― Como diabos não sabem?! ― esbravejei, colocando a mão
no tórax.
― Abaixe a voz ― rosnou Miguel.
― Não estou gritando com ela, mas enfurecido com os
idiotas dos irmãos dela por não a terem protegido! ― Fuzilei a
todos. ― O que aconteceu?
― O que sabemos é que Serena e Belinda fugiram na hora
do confronto. Javier morreu, e restou Alonso para protegê-las, o que
foi um erro, pois o cara era um rato. Belinda conseguiu que sua irmã
fugisse, prometendo que daria conta de Alonso, mas no final ela
desapareceu ― respondeu Alessandro.
Claro, tinha que ser a Belinda salvando todos! Ela sabia que
não podia vencer Alonso, eu já o tinha visto lutar, e o cara era forte.
Eu apostava que ela só disse aquilo para salvar a irmã.
― Quando tudo aconteceu? ― Levantei-me respirando com
dificuldade, não só pelo ferimento, mas por temer o pior.
― Por volta das 8h da noite passada. Agora é de manhã. ―
Rafaelle suspirou.
― Não mantiveram contato pedindo algo? ― Minha vontade
era socar alguma coisa e deixar aquela porra fodida sair do meu
peito.
Medo, eu já o sentira antes, mas nada daquela magnitude.
Por dentro, meu coração estava acelerado e temeroso, mas eu não
podia me deixar fraquejar, precisava encontrá-la.
― Não. Os irmãos dela estão tentando localizá-la, mas até
agora nada.
Saí porta afora, não me importando em estar sem camisa e
com pontos.
― Stefano, você está machucado! ― Jade veio atrás de mim,
assim como Luna.
― Os meus irmãos estão tentando achá-la ― disse Luna. ―
Então se recupere, ou os pontos podem abrir.
Virei-me para elas, que estavam preocupadas.
― Acham que ligo para o que acontecer comigo se ela não
voltar? ― Sacudi a cabeça, tentando manter o controle. ― Eu só
preciso achá-la.
Algumas pessoas passavam pelo corredor do hospital, mas
não dei atenção a elas, só me virei para sair logo dali e revirar o
mundo à procura de Belinda, mas Alessandro pegou meu braço.
― Stefano, você não pode ir ― ordenou meu irmão.
Desvencilhei-me do seu toque, prensando-o na parede com o
rosto próximo ao dele.
― Dessa vez não posso obedecer a você, porque, se
acontecer algo a ela, não haverá nenhum sentido em respirar nesse
mundo para mim ― falei com a garganta apertada. ― Aceitaria a
morte sorrindo.
― Oh, Céus! ― Jade exclamou chorando. ― Não posso
perder você!
Olhei para as minhas irmãs e respirei fundo, não querendo
preocupá-las mais.
― Não vai, mas preciso ir atrás de Belinda e encontrar quem
a levou nem que seja no inferno ― tentei acalmar as duas e depois
encarei Alessandro. ― Preciso encontrá-la.
Ele colocou sua mão em meu ombro.
― Vamos achá-la. Só não quero você no território dos
Pachecos. Eles ainda não mudaram de ideia sobre te proibir de
cruzar sua região sem matá-lo. ― Sua voz fervia, embora não
mostrasse, mas eu notei.
― Não me importo, e, seja o que for que queiram fazer
comigo, vocês não devem interferir ― pedi.
Seus olhos se estreitaram.
― Isso está fora de questão. Se você cruzar o território deles,
e o machucarem ou fizerem coisa pior, eu os destruirei. ― A
resolução estava em cada palavra.
― Alessandro! ― Eu percebia o medo na voz de Luna. Ela
amava todos nós, tanto os Morellis como os Castilhos, então era
uma situação difícil.
― Não haverá mortes. De qualquer modo, eu estava indo
falar com eles mesmo. ― Embora pensasse que a situação seria
diferente. ― Agora preciso de uma camisa e sair daqui.
Antes que alguém respondesse, ouvi uma voz suave.
― Tio Stefano? Meu irmãozinho nasceu! ― Minha princesa
estava animada.
Graziela se encontrava ao lado de Mia, e um pacotinho
embrulhado em tecido azul estava nos braços da minha cunhada.
― Quando nasceu? ― Fui até eles e olhei o rostinho de
porcelana de Enrico. Cabelos da cor dos de Mia, embora um pouco
mais escuros e os olhos do meu irmão.
― Ontem de manhã. Estávamos aqui quando a bolsa
estourou ― explicou ela tristonha. ― Como está? Soube de Belinda.
Sinto muito.
Assenti, tocando o rosto do bebê.
― Eu sei. Vou trazê-la de volta. ― Entretanto, preocupava-
me e temia a forma como ela voltaria. Não podia pensar naquilo, ou
ficaria louco antes da hora.
― Mas está ferido...
― Vou com ele ― respondeu Rafaelle. ― Não fui banido ou
rompemos a aliança.
― Meu irmão está lá, na cidade. Posso pedir que ajude a
controlar a situação ― ofereceu Mália ao lado dele.
Fiquei grato por estarem do meu lado, mas eu não queria
ficar muito tempo ali. Quanto mais tempo desperdiçasse, mais
Belinda poderia sofrer.
Despedi-me dos meus irmãos, exceto Rafaelle, que veio
comigo, e pegamos o jatinho para Barcelona. Quando pensei em
fazer esse trajeto antes, imaginava-me ansioso para ver minha
Diabinha raivosa. Agora me sentia tão oco por dentro, exceto pela
dor que me perfurava com uma navalha cega.
≈
A conversa à mesa se arrastou, mas não ouvi nada. A minha
mente estava um turbilhão.
Após o almoço, fui para o jardim e me sentei em um dos
banquinhos, vendo os meninos correrem pelo vasto espaço.
― Belinda, o que está acontecendo? ― Stefano se sentou ao
meu lado, pegando minha mão. ― Se não quiser se casar...
― Não é por isso. Ei, não devia pedir minha mão antes de
anunciar que vamos nos casar? ― Olhei para ele.
― Vou pedir a você depois, estou organizando umas coisas
para tornar o pedido perfeito.
Meu coração derreteu.
― Não quero deixar nada disso ― sussurrei, enfim falando o
que me incomodava.
― O quê? ― Ele parecia confuso. ― Está dizendo sua casa?
― Não a casa em si, mas a convivência com meus irmãos,
os meninos. ― Olhei para eles, brincando de bola não muito longe
dali. ― O orfanato, meu trabalho.
― Por que teria que deixar tudo isso? ― Franziu a testa.
― Você disse Milão...
Entendimento cruzou suas feições.
― Vem aqui. ― Abraçou-me de lado. ― Vamos resolver isso,
você não vai perder nada, eu juro.
Não era só isso. Em Barcelona vivi a minha vida toda, tinha
muitas memórias, ia sempre ao cemitério, e, caso me mudasse para
Milão, não poderia vir à minha cidade natal frequentemente.
Coloquei minha cabeça em seu ombro bom, inspirando seu
maravilhoso cheiro, que me confortava.
― Obrigada. ― Beijei seus lábios. ― Eu te amo.
Stefano aprofundou mais nossos beijos. Depois de sua
declaração no hospital, ao confessar o que sentia, eu não tinha
ouvido as palavras de novo. Embora eu soubesse o que ele sentia
por mim, era bom ouvir de vez em quando.
Deixei de pensar nisso e me derreti em seus braços.
Após conversar com Belinda na sua casa no dia do almoço
em família, havia algumas semanas, peguei-me a pensar no seu
medo de deixar tudo para ir a um lugar desconhecido.
Ela amava trabalhar, o que podia ser feito em Milão, mas
tinha o orfanato e as crianças, seus irmãos, suas visitas ao túmulo
de seu pai semanalmente. Eu percebia a sua necessidade de se
sentir nem que fosse um pouco mais próxima a Paulo.
Então só me restava uma opção, por isso estava na mansão
dos Castilhos, para falar com o irmão dela após tomar minha
decisão.
Entrei no escritório de Fabrizio.
― Quando vai pedir a mão de Belinda a ela? ― sondou
assim que me viu.
Eu já tinha pedido a ele e seus irmãos, só por formalidade,
afinal me casaria com Belinda de qualquer jeito, só se ela dissesse
não, o que eu tinha certeza de que não aconteceria.
Sentei-me em frente a ele.
― Tenho um problema quanto a isso. ― Um que eu faria de
tudo para resolver.
― Se vai desistir dela...
Cortei-o:
― Jamais faria algo assim! ― Suspirei. ― Após o
casamento, teremos que ir embora, mas acho que ela não quer ir.
Belinda ama demais o orfanato e tudo aqui, em Barcelona.
― Notei isso naquele dia, no almoço ― comentou. ― Estive
pensando, até falei com os anciões.
― Sim? ― incitei-o a continuar.
― Você tem duas opções. A primeira, ficar aqui...
― Não posso deixar os negócios da minha família. Meus
irmãos precisam de mim ― interrompi-o, preocupado.
― Foi o que pensei. ― Fabrizio assentiu. ― Então resta a
outra opção. Você ter um negócio aqui.
Franzi a testa.
― Está falando para eu trabalhar para você? Não sou um
desertor, jamais trairia minha família. ― Sair da máfia não era fácil,
e ainda pior era passar a fazer parte de outra, isso era considerado
traição. Havia uma grande diferença entre aliança e deserção.
― Não, honro a família e dou valor a quem valoriza os laços.
― Tinha respeito em seu tom de voz. ― O que eu ia sugerir era dar
metade de Barcelona a você para que traga negócios de sua
organização para cá.
― Está dando para mim um pedaço do seu território? ―
Fiquei um pouco chocado, mas no fundo entendia a sua razão. Eu
faria o mesmo pelas minhas irmãs.
― Sim, estou pensando em expandir meus negócios em
Praga e algumas partes da Alemanha, então perder parte de um
território não me fará mal algum. ― Olhou-me. ― É por Belinda.
Pela família, sou capaz de tudo. O que acha? Aceita?
― Tenho que falar com Alessandro, mas acho que vai dar
certo. ― Eu estava animado por ele ter oferecido aquela solução
para eu não ter de levar Belinda para longe.
― Então converse com ele. Qualquer coisa, marcamos uma
reunião para semana que vem.
― Sei que o que está fazendo é por Belinda, mas lhe
agradeço mesmo assim. ― Levantei-me, ansioso para informar a
Belinda sobre a decisão de seu irmão, algo que ela amaria.
Ele assentiu, bebendo um gole de seu uísque.
― Conseguiu o anel?
― Irei à procura de um hoje, com ela.
― Se não se incomodar com minha interferência, tenho a joia
certa para isso. ― Ele pegou algo em uma gaveta de sua mesa, e
logo percebi ser uma caixinha. ― Era da minha mãe. Ela me pediu
que eu o desse a quem das meninas se casasse primeiro. Acho que
Belinda vai gostar.
― Obrigado. ― Abri a caixa. Dentro dela tinha um anel com
dois diamantes corte princesa.
Após sair do escritório, antes de ir para o quarto de Belinda,
parei no corredor do andar de cima para ligar para Alessandro.
― Stefano. ― Ouvi gritos do outro lado da linha.
― Pode conversar agora? ― Alguém devia estar passando
por maus bocados.
― Sim ― respondeu, depois ouvi uma porta se fechando, e
enfim o silêncio.
― O que está acontecendo? ― sondei.
― Algumas pessoas que achavam que podiam me enganar
― rosnou. ― Nada sério. Foi resolvido. O que foi? Stefano, se você
desistiu de se casar, aí, sim, vamos ter um problema, pois...
Interrompi-o:
― Por que todos pensam isso? Primeiro Fabrizio, e agora
você?
Ele ficou em silêncio por um momento.
― Então qual é o problema? ― inquiriu.
― Belinda não quer morar aí, ela tem tudo que ama aqui. ―
Respirei fundo.
― Então o que você fará? Não vai se casar? ― perguntou
parecendo curioso.
― Claro que vou! ― declarei com firmeza. ― Mas vou morar
aqui com ela.
― Não pode fazer isso! Preciso de você aqui. Você fez um
juramento de lealdade a mim, o seu capo. Além disso, somos uma
família!
― Não vou desertar! ― grunhi. ― Não sou um traidor de
merda!
― Eu sei que não é, mas conheço agora o poder que o amor
tem. Ele nos faz capazes de desistir de tudo ― esclareceu.
― Desistiria do seu cargo de capo por amor? ― No fundo, eu
sabia a resposta.
― Espero nunca ter que fazer essa escolha ― finalmente
disse. ― Então o que você quis dizer?
Contei-lhe a minha conversa com Fabrizio.
― O que acha? ― Estava ansioso para que ele aceitasse.
― Bem, isso é bem generoso da parte dele. ― Ficou calado
por um tempo.
― Quer falar o que está pensando? Esse silêncio está me
deixando à flor da pele!
― Quando não esteve? ― Ouvi um sorriso em sua voz. ―
Acredito que podemos negociar e fazer funcionar.
Soltei um suspiro de alívio.
― Também acho, foi isso que Luca fez por Jade. ― Meu
cunhado veio para um dos nossos territórios em Milão após darmos
uma parte da cidade para os Salvatores.
― Agora os Castilhos estão fazendo o mesmo pela irmã
deles. Valorizo isso ― disse meu irmão. ― Vou organizar tudo com
Fabrizio.
Assim que desliguei, entrei no quarto de Belinda, que estava
terminando de fazer uma mala. Íamos passar o final de semana
juntos. Eu estava preparando uma surpresa para ela.
― Aonde vamos? ― Ela pegou a bolsa e a mala, mas as
peguei de sua mão.
― Surpresa.
Saímos da casa e entramos em meu carro, depois partimos
rumo ao lugar que eu tinha conseguido. Já estava tudo preparado.
Ainda bem que não precisei parar para comprar o anel.
Com a ajuda de Serena, descobri algo que Belinda gostava
de fazer junto às irmãs, até que Lorena foi morta. Depois disso, ela
não fez mais, nem sequer foi ao local. Eu só esperava que isso não
lhe trouxesse lembranças dolorosas demais.
― Ah, por favor, me diz aonde vamos! ― implorou no
caminho.
― Não vai demorar muito ― esquivei-me, saindo da cidade e
partindo na direção das montanhas.
Estava nervoso, tanto porque temia sua reação ao lugar
como por eu ter decidido lhe revelar acerca do meu passado. Não
podia pedir sua mão havendo segredos entre nós.
As minhas sessões com a sua avó me ajudaram um pouco,
eu só não me abria muito, pois queria fazer isso com Belinda
primeiro antes de dar aquele passo. Tinha me preparado a noite
toda, mas provavelmente nada seria capaz de me preparar para
uma revelação assim. Pensar no que aconteceu era uma coisa, mas
falar sobre o assunto era outra completamente diferente.
― O que foi? ― sondou ela, avaliando-me.
― Nada, só ansioso para ficarmos sozinhos. ― Não queria
contar-lhe o que estava pensando, não antes da hora.
Eu não sabia se ela tinha acreditado, mas não disse nada,
então ficou tensa assim que passei por uma curva, saindo da
rodovia.
― O que estamos fazendo aqui? ― indagou quando parei em
frente à mansão de férias dos Castilhos, que ficava em cima de uma
montanha. A neve caía ao redor em razão da estação do ano e da
altitude.
― Como você sabe, quero lhe contar o que aconteceu
comigo. Terei que enfrentar o passado e achei que você devia fazer
o mesmo, mas, se não quiser, podemos ir para outro lugar. ― Olhei
para ela e depois para fora da janela. ― Embora esteja nevando
muito para andarmos por aí. Você decide.
Belinda ficou em silêncio, encarando a casa, a mente cheia
de lembranças. Eu via isso em seu rosto.
― Quer saber? Vamos embora. ― Estendi a mão para ligar o
carro de volta, mas ela colocou a mão sobre a minha.
― Não. Se vai enfrentar o seu passado, vamos fazer isso
juntos ― anunciou com firmeza.
Assenti, e saímos do carro. Um vento gelado banhava meu
rosto.
― Vamos entrar antes que nossas bundas congelem. ―
Peguei sua mão e nossa bagagem, pendurando uma mochila em
um ombro e segurando a mala dela com a outra mão.
Corremos para dentro da mansão, que era muito
aconchegante.
― Onde fica seu quarto? ― sondei ao pé da escada. ― Vou
deixar as coisas lá. Enquanto isso pode acender a lareira para nos
aquecermos?
Ela me disse onde ficava a suíte, então subi e deixei a
bagagem no cômodo, depois desci à sua procura, encontrando-a
sentada no carpete de camurça diante do fogo, que começava a
crepitar, ainda fraco. Tinha uma garrafa de vinho no chão ao seu
lado.
― Achei que íamos precisar disso depois. ― Apontou para a
bebida.
Aquiesci e me sentei ao seu lado.
― Este lugar me traz muitas recordações. Ali ― indicou uma
mesa ― Lorena desenhava, enquanto Serena e eu brincávamos. Eu
vivia querendo levá-la para brincar na neve, mas ela quase não ia e,
quando o fazia, era para nos desenhar.
Peguei um caderno no chão, cheio de desenhos.
― Ela era brilhante ― declarei, colocando de lado o caderno
e a puxando para mais perto. ― Não trouxe você aqui para chorar,
senão vamos embora.
Ela fungou no meu peito.
― Não estou chorando ― contestou, fungando. Até naquele
momento difícil ela queria ser forte. ― E não quero ir embora,
vamos ficar. Não são recordações tristes, são alegres. Só sinto
saudades dela.
― Eu sei que sente, querida. ― Alisei seus ombros. ― Agora
quer ouvir o que aconteceu comigo?
― Se não estiver pronto, vou entender ― sussurrou.
― Tenho que estar. Não quero ter segredos entre nós quando
nos casarmos.
― Seja o que for, estarei ao seu lado para sempre. ―
Afastou-se e me fitou.
― Obrigado. Fico contente em ouvir isso. ― Respirei fundo.
― O que ouviu naquele dia em que falei com sua avó?
Eu sabia que ela tinha ouvido, mas não mencionou nada.
Acreditei que queria me dar o tempo que eu precisava.
― Que tinha dois amigos, Lyn e Jet, que foi morto, e que o
monstro do seu pai te deixou trancado em uma arena igual àquela
em que fiquei.
― Sim. Jet foi meu amigo até o seu último dia de vida. Me
salvou no final. ― Contei tudo a ela, que pensei que minha mãe
tinha morrido, os dias no cativeiro. Minha amizade com Lyn e Jet.
Nossas esperanças de sermos soltos. As atrocidades que
aconteciam naquele lugar. Ela não tinha visto nem metade de tudo
que acontecia naquele tipo de local.
― Alguém abusou de você? ― Sua voz falhou no final.
― Quase. ― Relatei o que aconteceu naquele dia com
Kanon, o que ele quase conseguiu fazer comigo, depois narrei o
assassinato de Jet por meu pai. ― No final, vendi minha alma ao
diabo só para ter uma chance de matar Marco. Estava louco por
pensar que tinha perdido tudo, meus irmãos, minha mãe, meus
amigos. Não me restava nenhuma luz naquela maldita arena.
Ao pensar naquilo, meu coração cortava fundo em meu peito.
― Matei muitos meninos só para chegar ao meu pai e
destruí-lo, e no final nem pude matar o infeliz.
― Odeio seu pai ainda mais! ― Belinda chorava ao final da
narrativa, com a cabeça em meu ombro.
Coloquei meu braço direito em cima de seu ombro e alisei
seus cabelos.
― Marco está queimando no inferno agora ― falei, mesmo
que no fundo quisesse que ele tivesse primeiro penado na Terra.
― Pode ser, mas deixou você com esse abismo de dor e
tormento com que lidar. ― Limpou seus olhos. ― Um pai não devia
permitir esse tipo de coisa.
― Eu sei. Deixei que ele me controlasse, fiz o que ele
desejava... ― Encarei as chamas da lareira. ― Não sinto
arrependimento quando mato, gosto de derramar sangue, ouvir os
gritos dos meus inimigos. Mas o que fiz com aqueles meninos me
consome por dentro. Podiam ser assassinos sem emoção, mas
eram garotos forçados àquele tipo de vida.
― Você também era, pensava que tinha perdido tudo. A dor o
absorveu, e só fez aquilo que achava ser o certo. Eu fiquei um dia
presa lá e quis matar todos aqueles vermes, imagina você, preso
por semanas ou meses com os homens do seu pai mexendo com
sua cabeça, a crueldade que havia lá... ― Ela sacudiu a cabeça
com raiva. ― Então não pense nisso, não foi sua culpa.
― Eu nunca tinha sentido uma dor daquela magnitude,
quando pensei que tinha perdido tudo de bom que havia em minha
vida. Foi desesperador. ― Respirei fundo. ― Em busca de
vingança, matei tantos... Seus rostos, ainda os vejo.
Fechei meus olhos, vendo cada um deles. No fundo, eu não
queria esquecê-los, pois precisava dessa dor; era pouco comparado
à vida que tirei deles.
Belinda segurou meu rosto entre suas mãos.
― Você era uma criança que foi deixada em um inferno.
Lutou lá dentro para sobreviver. ― Beijou meus lábios de leve. ―
Sei que levará um tempo para se curar, mas quero que saiba que
estarei sempre ao seu lado seja para o que precisar.
― O que preciso é do seu amor. Nada me fará mais feliz do
que isso. ― Fitei seus olhos lindos. ― Nunca pensei que fosse amar
alguém como amo você. Esse sentimento me faz ter forças para
lutar contra tudo.
― Eu também te amo muito ― declarou ela.
― Agradeço a quem quer que a tenha enviado para mim. ―
Estava mesmo grato.
― Acredito que foi nossa irmã, afinal, se ela não fosse de
ambas as nossas famílias, eu não teria conhecido aquele garoto
marrento e cheio de si. ― Ela sorriu.
Na verdade, eu achava mais provável que fosse o pai dela,
mas não queria tocar no assunto para evitar entristecê-la.
― Vamos agradecer a ela depois.
Deitei Belinda no carpete e pairei em cima dela, beijando-a
com fome, com aquela paixão avassaladora por aquela mulher, que
me consumia. Tirei suas roupas, deixando-a nua para o meu deleite
e prazer. A lareira nos aquecia, bem como o calor dos nossos
corpos.
― Eu estava faminto por você ― declarei, colocando um dos
seios em minha boca e o sugando.
― Merda, como isso é bom! ― Sua voz saiu falha.
Por causa de nossos machucados, ficamos um tempo sem
transar, só fazendo oral. Eu estava louco para possuí-la de todas as
formas que podia.
― Lembra de uma vez que eu disse que a tomaria de todas
as formas? ― Levei minha mão entre suas pernas, ao mesmo
tempo esfregando seu clitóris e a penetrando com um dedo.
Ela arfou, arqueando-se contra a minha mão.
― Sim, você disse que um dia faria sexo anal comigo e me
mostraria o quanto podia ser prazeroso. ― Ela ofegou, fechando os
olhos.
Sorri, mordiscando seu seio e acelerando mais os
movimentos dos dedos.
― Sim. Agora me diz, vai me dar essa parte sua? ― Estava
louco de tesão, mas só faria aquilo se ela quisesse. Não era todas
as mulheres que gostavam de anal.
― Eu sou sua, pode fazer o que quiser comigo! ― afirmou
apaixonada e gritou quando a liberação a atingiu.
Não parei, deixei seus seios e segui com uma trilha de beijos
até seu centro molhado. Inspirei o seu cheiro de sexo e prazer.
― Estava faminto para comer essa boceta saborosa. ― Abri
suas pernas, vendo-a tão exposta para mim, tão perfeita. Coloquei
minha boca sobre ela, tomando seu nervo pulsante entre os dentes,
mas não para ferir, só para gerar uma mistura explosiva de leve dor
e prazer.
Seus gemidos eram o som mais maravilhoso do mundo, que
passei a amar. Cada intrusão da minha língua a deixava mais louca,
até que ela gozou de novo, com um grito.
Afastei-me e tirei minha camiseta, olhando para ela ali, toda
mole e quente.
― Acho que é minha vez. ― Ela segurou o cós de minha
calça, mas segurei sua mão. ― O que foi?
Sorri de sua expressão, colocando a mão no bolso e pegando
a caixinha.
― Quero fodê-la como minha noiva. ― Entreguei-a a ela. ―
Veja se gosta.
Belinda deu uma risada.
― Nada de “aceita se casar comigo” ou “prometo que a
amarei para sempre”?
Sorri.
― Posso me pôr sobre um dos joelhos e pedir, mas sei que
vai aceitar de qualquer maneira. ― Ajoelhei-me entre seus quadris.
― Quer que eu faça?
― Não ligo para isso, contanto que seja meu, e eu seja sua.
― Ela abriu a caixa e arfou.
― Era de sua mãe. Fabrizio me deu para o entregar a você
― falei, pegando o anel de sua mão e o colocando em seu dedo. ―
Gostou dele?
― É lindo. Ele trouxe felicidade aos meus pais pelo tempo
que tiveram juntos, acredito que trará a nós dois também. ― Ela
sorriu. ― Agora sou sua noiva. Vai me foder ou ficar parado aí, me
olhando?
Aquela mulher era perfeita para mim! Mesmo eu não a
merecendo, eu a tinha ali, em meus braços.
― Ah, vou aproveitar cada segundo desse delicioso corpinho.
― Tirei minhas calças e sapatos, então me posicionei entre suas
pernas e a penetrei, enchendo-me de completo êxtase.
― Achei que quisesse minha bunda... ― ela falou, logo
jogando a cabeça para trás assim que bati fundo nela.
― A noite é uma criança. Podemos fazer mais tarde, ou
amanhã, ou depois. ― A cada palavra, eu a penetrava mais fundo,
até sentir minhas bolas batendo em sua bunda.
Seus gritos de prazer tomavam todo o lugar.
― Nesse momento, só quero comer essa boceta perfeita. ―
Tomei um dos seus seios em minha boca enquanto a estocava. ―
Isso, geme mais, grita, pois adoro quando faz isso!
A cada estocada, eu sentia que estava cada vez mais perto
da borda, mas não ia gozar sem que ela o fizesse antes. Coloquei a
mão entre nós e toquei seu clitóris, fazendo-a se desmanchar de
prazer contra o meu corpo.
― Goza, querida! ― Beijei-a enquanto ela gritava em êxtase
e alcancei o clímax logo depois dela, saboreando cada momento.
Fiquei em seu interior até que ela parasse de tremer em seu
orgasmo e a puxei para os meus braços.
― Agora, sim, é oficialmente minha noiva. Selamos a
promessa com sexo ― declarei, beijando o anel em seu dedo.
Belinda riu.
― Selada com sexo, hein? Gosto do som disso. ― Colocou o
queixo em meu peito e me olhou de modo sério. ― Sobre onde
morar...
― Vamos morar em Barcelona. ― Toquei seu rosto. ― Não
vou tirar você daqui.
― Mas sua vida está em Milão...
― Minha vida está onde você estiver! ― asseverei com
ferocidade.
― Seu irmão aceitou isso? ― Ela parecia aliviada.
― Sim, vamos abrir um negócio aqui. Fabrizio nos deu um
pedaço do seu território, então tomarei conta dos negócios da minha
família aqui. ― Beijei sua testa. ― Não precisará deixar nada, nem
os meninos.
Ela sorriu.
― Eu te amo demais! ― Abraçou-me, colocando o rosto em
meu pescoço, o que me deixou tenso. Afastou-se. ― Desculpe.
Minha respiração estava irregular. Todavia, não ia deixar
aquela merda me foder nunca mais.
― Tudo bem. Eu estava pensando... Em uma das sessões
que fiz com sua avó, cheguei à conclusão de que devo deixar que
você me toque aí. Não sei se vai ajudar, mas podemos tentar cada
dia um pouco, até que eu me cure desse trauma. ― Esquadrinhei
seu rosto. ― Quero que a gente seja um casal normal.
― Somos normais, ou o quanto podemos ser na máfia, mas
podemos tentar, assim como estamos fazendo ao dormir juntos. A
cada dia, uma descoberta, um avanço. ― Ela parecia tão
esperançosa.
― Não fiz nada bom para merecer você, mas lhe agradeço
por me amar. ― Beijei sua cabeça.
― Também lhe agradeço por você me amar dessa forma, por
ter se arriscado por mim, o que foi uma tolice, devo mencionar.
Graças a isso, estou viva e me tornei sua noiva, a mulher mais feliz
e realizada de todas.
― Não foi tolice. Se algo acontecesse com você, para mim
não teria nenhum sentido viver e respirar nesse mundo. Essa luz
que vejo agora, só a tenho com você ao meu lado. ― Jamais
deixaria que aquela luz se apagasse.
Belinda era a minha rocha, aquela que me fortalecia, que
fazia meu coração negro se aquecer como o sol, deixando-me feliz
e radiante.
Tinha chegado o grande dia, e, olhando para trás, eu via o
quanto a minha relação com Stefano havia melhorado. Durante
aqueles meses ao seu lado, eu o vinha ajudando a lidar com os
seus traumas. Sabia que levaria tempo. O bom era que finalmente
estávamos dormindo juntos na mesma cama. Tive que explicar aos
meus irmãos o motivo, ou Stefano ficaria sem o pescoço. Mesmo eu
não sendo mais virgem, meus irmãos não eram liberais a esse
ponto.
No começo, às vezes, ele acordava gritando e pulando da
cama, mas enfim estava evoluindo. Eu acreditava em Deus que um
dia ele conseguiria superar aquilo, embora jamais pudesse
esquecer. Vovó, assim como eu, estava ajudando-o.
O toque em seu corpo era outra situação com a qual ele
ainda não conseguia lidar bem, principalmente em algumas áreas,
mas o praticávamos todos os dias, mesmo sabendo que lhe trazia
lembranças ruins. No começo, foi difícil vê-lo sofrer, mas ele pedia
que eu continuasse, então eu o fazia. Para fazê-lo esquecer o
sofrimento nessa hora, eu o beijava suavemente e dizia palavras
tranquilizadoras, o quanto eu o amava e que, sem ele, não seria
feliz.
Como vovó dizia, tudo tinha de caminhar ao passo de um
bebê, e eu tinha fé que Stefano ficaria bom.
― Belinda, está quase na hora ― Fabrizio me chamou,
trazendo-me dos meus pensamentos.
Eu estava no corredor, indo ao encontro do meu noivo, em
breve marido. Era para meu pai me levar até o altar, mas ele não
estava mais entre nós, o que cortava fundo meu peito.
― Se não quer se casar...
Interrompi-o, arregalando os olhos por ele achar que eu
desistiria de Stefano, algo que jamais iria acontecer.
― Não é isso. Stefano é tudo que eu quero, eu o amo. ―
Esclareci: ― Só estava pensando em papai. Era ele que devia me
entregar ao meu noivo e dar sua benção...
― Eu sei o quanto sua ausência é difícil para todos. ― Pegou
um celular no bolso do paletó. ― Tenho um recado dele para você.
― Ele me deixou um vídeo? ― Meu coração acelerou.
― Sim. Disse para eu lhe dar no seu casamento. Enfim
chegou a hora.
Assenti, pegando o telefone, em cuja tela já estava o vídeo
que meu irmão tinha mencionado. Dei o play. O rosto do meu pai
apareceu. Tanto que eu sentia falta dele! Sua pele estava pálida, ele
se encontrava debilitado demais e respirava de modo irregular.
Acreditei que foi gravado no dia em que ele partiu, pois estava com
a mesma roupa.
“Minha princesa linda, se está vendo esse vídeo, é porque
resolveu se casar com Stefano. Ele é um menino que precisa muito
de você para ajudá-lo a lidar com tudo que aconteceu. É o tipo de
genro que eu sempre desejei para você e sua irmã”. Sua respiração
pesada não impediu que ele falasse.
O peso que eu sentia antes foi tirado de meus ombros
quando recebi a sua benção.
“Não fui honesto com vocês dois, mas era preciso para
ficarem juntos. Os dois são teimosos demais para se dar uma
chance. Pude ver a forma que um olhava para o outro, mesmo
assim não dariam o braço a torcer. Tenazes demais.” Ele deu uma
risada fraca que o fez tossir. “Acredito que vão lutar contra o que
sentem, mas confio que o amor prevalecerá.”
Eu queria pedir que ele parasse de falar, pois estava piorando
seu estado, mas não era possível.
“Se acontecer de você e Stefano ficarem juntos, desejo que
sejam felizes. Ele fará isso.”
Limpei minhas lágrimas, que desciam pelo meu rosto. Por
sorte a maquiagem era à prova d’agua.
“Quando li a carta que Kélia deixou para ele, tive certeza de
que, se Stefano a amasse, iria ao inferno só para fazê-la feliz. Esse
é o tipo de marido que quero para minhas filhas.” Ele estava cada
vez mais fraco, esforçando-se tanto para falar aquelas palavras.
“Não fique tão triste com minha partida, só viva e seja feliz ao
lado das pessoas que ama. Como presente de casamento, vou dar
metade do meu território em Barcelona para os Morellis, porque a
conheço, minha filha. Você não irá embora para qualquer outro
lugar; se fosse, seria para fazer Stefano feliz, mas no final você não
seria.”. Ele tentou respirar fundo. “Desde criança, foi a mais
apegada a mim e ao nosso mundo, enquanto Serena e Lorena
viajavam pelo planeta, antes de tudo acontecer. Você era a única
que preferia um ringue a viagens e passeios, preferia estar
envolvida nos negócios da família a qualquer outra coisa, ainda que
tivesse sua profissão à parte, por isso a conheço, sei que não seria
feliz longe de casa.”
― Oh, papai! ― Chorei ainda mais.
“Adeus, minha princesinha linda do pai. Te desejo toda a
felicidade do mundo, você merece. Te amo e sempre te amarei.”
O vídeo terminou.
― Oh, Deus! ― exclamei alto. ― Foi ideia dele dar o
território, então?
― Sim, foi o papai a decidir fazer isso ― Fabrizio afirmou
com a voz rouca. Ele estava tão emocionado como eu.
― Mas e se eu não estivesse com Stefano? ― sussurrei.
― Então não iria assistir a esse vídeo, mas no fundo ele
acreditava que vocês dois ficariam juntos. Eu também, até mesmo
quando Stefano foi embora. ― Limpou meu rosto molhado. ― Papai
tem razão, Stefano faria e fez tudo por você indo àquele lugar,
arriscando ser morto só para salvá-la.
― Não quero que ele faça nada parecido de novo. ―
Respirei fundo.
― Eu faria o mesmo por nossa família. ― Ele sorriu. ― E
você também, mas não é hora de falarmos disso, agora só seja feliz
neste grande dia e com a benção de nosso pai.
― Eu sou feliz. ― Entreguei o telefone a ele. ― Me envie o
vídeo depois.
Assentiu.
― Vamos, ou Stefano vai vir buscá-la. Aquele cara é
impaciente. ― Terminou de limpar meu rosto.
Seguimos e paramos em frente à porta da igreja. Eu estava
mais aliviada com as palavras do meu pai. Ele podia não estar ali
fisicamente presente, mas estava comigo em meu coração e aonde
quer que eu fosse.
Peguei o braço do meu irmão mais velho e respirei fundo
quando a Marcha Nupcial tocou. As portas se abriram, dando a
deixa para entrarmos. Como os meus costumes e os de Stefano
eram diferentes, pegamos um pouco de cada. Na Espanha, não era
necessário dama de honra, mas na Itália, sim, então permitimos.
Tantos os matrimônios italianos como os espanhóis costumavam ter
a troca de alianças, embora no mundo da máfia espanhola não
fosse preciso, pois os firmávamos com sangue, então decidi manter
os dois. Isso deixou Stefano louco, mas no final aceitou após eu
insistir que não tinha problemas com isso.
No corredor entre as fileiras de bancos, tinha uma guirlanda
de flores dos dois lados, e pétalas de rosas vermelhas no tapete.
Graziela, Tália e Paco estavam ali, as duas na frente de mãos
dadas, Graziela com um buquê de flores, e Tália com as alianças.
Paco estava logo atrás delas, segurando uma corrente, que era o
símbolo do elo de nossa organização.
Quando convidei Paco para esse papel, ele ficou muito feliz,
embora eu não achasse que ele entendesse o significado, mas o
menino gostava de ser incluso nas nossas famílias. Os três meninos
Laions faziam parte da minha família e da de Stefano.
De um lado, estavam convidados importantes do círculo
social da máfia Pacheco, e do outro, do círculo da máfia Destruttore.
As primeiras filas de bancos tanto de um lado quanto do outro foram
destinadas às nossas famílias.
Lyn e El Diablo se encontravam ali também, mas, quando
meus olhos pousaram em Stefano, todos as pessoas presentes
desapareceram, restando só aquele homem perfeito no altar, com
roupas escuras, tão elegante e sexy.
Meu coração se aqueceu quando, sorrindo, ele me olhou. Em
seu rosto vi todo o amor que sentia por mim.
Meu pai estava certo, Stefano faria qualquer coisa por mim,
assim como eu faria por ele.
Obrigada, papai, por me dar essa oportunidade. Stefano é
tudo que sempre desejei como marido, o homem que amo, pensei
enquanto seguia em direção a ele, esperando-me com toda sua
glória e perfeição.
Stefano
Eu estava ansioso esperando Belinda no altar. Andava de um
lado a outro.
― Devia relaxar, ela não vai fugir do casamento ― comentou
Valentino.
Fulminei-o, cerrando meus punhos.
― Socá-lo só vai estragar a cerimônia ― disse Alessandro ao
meu lado.
Ele tinha razão, bem como Valentino. Belinda não ia fugir e
me deixar. E, mesmo se o fizesse, eu iria encontrá-la nem que fosse
no fim do mundo.
― Sabe como funcionam os votos, né? ― Valentino me
olhou. ― Se declara o menos possível. Não queremos que alguém
a use para chegar a você, igual já aconteceu antes. Ávila vai
ministrar a união entre vocês dois.
Eu nem estava pensando em declarar amor a ela ali, não
conseguiria fazer isso na frente de todos. Belinda era a única
pessoa para quem eu conseguia falar de meus sentimentos.
Olhei para um senhor de cabelos brancos como a neve
ladeado por mais dois. Eles eram os anciões da organização
Pacheco.
De repente, o Hino Nupcial começou a tocar, e olhei para a
frente da igreja enquanto todos tomavam seus lugares.
Primeiro entraram as crianças, e minha princesinha Graziela
estava linda demais. Então Belinda adentrou no templo, com aquele
vestido branco todo rendado que delineava suas curvas como uma
luva. Ela não usava véu, mas uma mantilha de renda. Estava
deslumbrante, tanto que roubou meu ar.
Como eu podia ter tanta sorte por ter aquela perfeição de
mulher? Não falava só de sua beleza, que fazia a igreja
resplandecer, mas também de sua bondade e gentileza. Mesmo
com seu jeito de durona, eu podia ver através de sua fachada.
Notei seus olhos vermelhos, como se ela tivesse chorado.
Isso me fez lembrar-me do comentário do irmão dela. O que teria
acontecido?
Fabrizio me entregou sua mão, mas, antes, alertou-me:
― Cuide dela com a sua vida se for preciso. ― Era um
pedido, mas em seu tom havia uma ameaça.
Eu poderia retrucar que não obedecia às suas ordens, mas o
entendia. Fiz a mesma coisa com os meus cunhados.
― Sempre ― afirmei.
Ele assentiu e se afastou, e me aproximei de Belinda.
― O que foi? ― sondei baixo só para ela ouvir.
― Recebi a benção do meu pai. ― Sorriu feliz, então
esclareceu após perceber minha confusão: ― Ele deixou um vídeo
para esse dia desejando que fôssemos felizes.
― Seremos ― proclamei.
Ávila chamou nossa atenção para começar a ministrar a
cerimônia. Nós nos viramos para ele.
― Vamos forçar essa aliança entre Belinda Castilho e
Stefano Morelli.
Chamou Paco. O menino deu a corrente a ele.
― A partir de agora, como essa corrente, será a união de
vocês dois. ― Colocou a corrente sobre mim e Belinda. ― Forte e
firme como aço. Não haverá nada que a quebre. ― Ele pegou uma
agulha. ― Me deem suas mãos.
Na hora em que eu soube que isso aconteceria, fiquei furioso,
pois não queria que nada machucasse Belinda. Porém ela me
tranquilizou dizendo que era um pequeno furo, como fazer um
exame de diabetes, então permiti. Por isso, agora, mesmo não
gostando do ato, não interrompi o que o ancião fazia.
― Com sangue é selada essa união. ― Perfurou nossos
dedos, e unimos as feridas, compartilhando nosso sangue. ― Nada
nem ninguém romperá esse casamento, só a morte. Agora repitam
comigo.
Fitei os olhos dela assim que ele pronunciou as palavras.
― Com sangue derramado, selamos essa união, e só com
ele entornado, será cancelada. ― Eu não gostava desses votos,
jamais mataria minha esposa só para ficar livre ou permitiria que ela
me matasse. ― Prometo ser um marido que será leal e te dará uma
vida plena e realizada.
Nada naqueles votos envolvia amor, mas eu não precisava
dizer a todos o que sentia por Belinda. Ela saber já bastava.
Belinda disse seus votos, iguais aos meus, depois trocamos
as alianças.
― Eu vos declaro marido e mulher ― finalmente anunciou
Ávila. ― Pode beijar a noiva.
Finalmente ela é minha!, pensei, pegando seu rosto e
beijando seus lábios. Quis aprofundar mais o carinho, mas o lugar
se dissolveu em aplausos. Foi preciso muito esforço para eu me
afastar dela. Entretanto, era preciso dar atenção a todos.
― Parabéns ― disse Lyn, dando um tapinha no meu ombro e
pegando a mão de Belinda.
― Obrigada ― agradeceu ela, e assim eu também o fiz.
Após receber as felicitações de todos, fomos para o salão
onde aconteceria a festa. Na pista de dança, dancei com minhas
irmãs, Mia e Serena, enquanto Belinda dançava com seus irmãos e
os meus.
― Minha irmã está feliz, nunca a vi dessa forma ― afirmou
Serena. ― Vocês ficam bem juntos.
― Obrigado, cunhada. ― Dei um sorriso provocador. ― Sou
charmoso demais. Só assim para eu conseguir conquistá-la.
Ela jogou a cabeça para trás e riu.
― Minha irmã tem bom gosto. ― Recompôs-se um pouco. ―
E você também tem. Belinda é uma força da natureza.
Antes que eu pudesse comentar algo mais, Razor parou ao
nosso lado.
― Me deixa ter o prazer dessa dança? ― Tinha aço em seu
olhar ao me fuzilar, mas seus olhos ficaram calorosos quando ele
fitou Serena.
Ela parecia nervosa, mas assentiu. Eu sabia que eles tinham
um lance, só não tinha ideia de quando ficariam juntos, pois Razor
relutava contra o que estava sentindo.
― Eu vou procurar minha esposa. ― Saí, deixando os dois,
embora devesse tê-lo alertado que era impossível lutar, era uma
batalha perdida. Contudo, Razor descobriria isso por si mesmo.
Cheguei aonde Belinda tinha acabado de dançar com
Santiago.
― Posso ter minha esposa? ― Puxei-a para mim antes
mesmo que alguém dissesse algo.
― Sou toda sua ― declarou nos meus lábios, sorrindo.
― Vamos embora? ― Estava ansioso para ficar sozinho com
ela e para ler a carta da minha mãe.
Iríamos ficar na mansão dos Castilhos. A festa prosseguiria
até tarde.
Belinda jogou o buquê direto nas mãos de Serena, que sorriu
envergonhada.
Após nos despedirmos de nossos amigos e familiares,
partimos. Entramos no quarto, e a peguei nos braços, levando-a
para a cama. Eu a queria demais, mas estava muito ansioso para ler
minha carta.
― O que está acontecendo? ― Ela se levantou, olhando-me.
― Sinto que está inquieto.
Peguei a carta da minha mãe.
― Sabe quanto tempo esperei por isso? ― Tirei a missiva do
envelope. ― Não achei que um dia saberia o que minha mãe
escreveu para mim.
Ela sorriu.
― Porque pensava que nunca se casaria? ― Pegou minha
mão e se sentou ao meu lado.
Ri.
― Sim, mas aqui estou eu, casado e muito feliz. ― Suspirei e
abri a carta com meu coração acelerado.
― Estou aqui para você ― avisou.
Eu sabia que ela estava e lhe agradecia por isso. Passei a ler
as últimas palavras de minha mãe.
≈
Estavam todos reunidos no andar de baixo esperando pelo
jantar que eu tinha preparado para dar a grande notícia da gravidez,
mas primeiro diria ao Stefano.
― Vamos descer? ― ele perguntou. Morávamos em uma
casa que compramos perto da dos meus irmãos. Nossos quintais
eram vizinhos, até os abrimos para ter acesso à casa deles sem
precisar entrar pela frente.
― Tem uma coisa que eu quero te contar. ― Estendi o
exame para ele.
Tínhamos decidido que eu pararia de tomar anticoncepcional.
Durante aqueles sete anos, aproveitamos nossa vida de casados,
nossas profissões e Paco, que só tinha cinco anos na época. Então,
já que ele tinha completado 12 anos, achamos que seria um bom
momento para eu engravidar.
― Está grávida? ― Stefano arregalou os olhos e fitou minha
barriga como se quisesse enxergar através dela. Depois encontrou
meu olhar. A emoção dominava suas belas feições.
― Sim, de oito semanas ― respondi e dei um gritinho
quando ele me pegou nos braços e me rodopiou.
― Me fez o homem mais feliz desse mundo! ― Beijou meus
lábios.
― Pare de me girar, ou vou vomitar em você. ― Os enjoos
estavam acabando comigo.
― Não ligo para isso. ― Eu percebia sua euforia. Enfim ele
me colocou no chão e tocou meu rosto. ― Obrigado por me
proporcionar essa alegria.
Stefano adorava crianças, eu via a forma como ele ficava
com nossos sobrinhos e sobrinhas, até com Paco, então chegamos
à conclusão de que um filho seria uma benção.
― Você me proporcionou a mesma alegria ― afirmei. ―
Agora vamos contar à nossa família. Vovó vai surtar.
Ele riu enquanto descíamos para encontrar nossos familiares,
tanto os meus quanto os dele, que estavam na cidade. Quando
revelamos a notícia a eles, todos ficaram muito felizes e nos
parabenizaram.
Se, após eu ter perdido minha irmã e meu pai, alguém me
falasse que um dia eu estaria casada, feliz e realizada, não
acreditaria. Não via muito sentido na vida, mas, após Stefano e os
meninos Laions entrarem em meu caminho, aprendi de novo a ter
esperança. Eu era grata a Deus por tudo que me concedeu.
Construir Stefano foi desafiador. Uma história intensa, com
personagens marcantes, que conta um pouco mais sobre o que ele
passou e seus traumas, mas, com a ajuda de Belinda, conseguiu
lidar com o tormento que viveu.
Belinda é uma mulher forte, que não atura desaforo de
ninguém, mas que tem um coração enorme.
Amei fazer cada personagem deste livro e espero que vocês
tenham apreciado cada um deles.
Desejo que o casal tenha conquistado seu coração como
conquistou o meu.
Agradeço à Carol Miranda e à Ingridy Estefany, que betaram
este livro e fizeram análise crítica. Adoro vocês!
Também à psicóloga Jessika dos Santos Alves, que me
ajudou bastante com sua opinião profissional, assim como à
assistente social Fabiana da Conceição Silva, que me ensinou
algumas coisas sobre a profissão de Belinda.
Não posso deixar de fora minhas leitoras, que amo de paixão.
Um abraço especial às meninas do grupo Mafiosas da Ivani Godoy,
no WhatsApp, e às dos grupos do Facebook, Leitoras Ivani Godoy e
Romances Ivani Godoy.
Agradeço de coração aos meus amados leitores e amigos.
Amo cada um de vocês.
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