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Copyright 2020 © Aline Pádua

1° edição – fevereiro 2020

Todo o enredo é de total domínio da autora, sendo todos os direitos

reservados. Proibida qualquer forma de reprodução total ou parcial da


obra, sem autorização prévia e expressa da autora.

Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

Ilustração: L.A Design

Revisão: Ana Paula Machado e Gabriela Ferraz


Nota da autora

Esse box contém os QUATRO livros da Série Sentimentos:

KLAUS: entre o amor e o dever

PAUL: entre a mentira e o desejo

TROIAN: entre a paixão e a liberdade

SPENCER: entre a atração e o poder

Com quatro epílogos exclusivos!

Boa leitura!
Sumário
Nota da autora

Sumário

Sinopse

Playlist

Prefácio

Prólogo

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13
Capítulo 14

Capítulo 15

Epílogo

Sinopse

Playlist

Prefácio

Prólogo

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15
Epílogo

Sinopse

Playlist

Prefácio

Prólogo

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

Epílogo

Sinopse
Playlist

Prefácio

Prólogo

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

Epílogo

Recadinho

Contatos da autora
Sinopse

Lia Harper – o nome do pecado que ele não podia cometer.

Prometida a seu irmão desde sempre com um trato firmado,

transformando o amor pela mulher de boca esperta, completamente


proibido.

Klaus Russel tinha o dever de manter tudo em ordem enquanto seu


irmão se tornava marido da mulher que sempre quisera.

Uma reviravolta mudará o destino de ambos.

Entre o amor e o dever... qual será sua escolha?


Playlist

Call Out My Name – The Weeknd

Crazy In Love – Beyonce

Dangerous Woman – Ariana Grande

Give Your Heart a Break – Demi Lovato

God Is A Woman – Ariana Grande

Shallow – Lady Gaga feat. Bradley Cooper

State Of Grace – Taylor Swift

Strip – Little Mix feat. Sharaya J

Taki Taki DJ Snake feat. Selena Gomez, Ozuna, Cardi B

Tell me you love me – Demi Lovato

Thank U, Next – Ariana Grande

Think About Us – Little Mix

Woman Like Me – Little Mix feat. Nicki Minaj


Prefácio

“Mesmo que você não queira ouvir, quero que você saiba que sempre será parte
de mim. E não importa o que o futuro traga, você sempre será meu amor verdadeiro, e

sei que minha vida é melhor por causa disso.”

Querido John, Nicholas Sparks


Prólogo

“É claro que os sentimentos mudam. As pessoas fazem com que isso aconteça.”[1]

Um tédio horroroso.

Apenas pensei em como fugir de meu próprio jantar de noivado. As


pessoas ao redor pareciam não notar algo errado ou ao menos fingiam
muito bem com sorrisos exageradamente brancos que a noite estava

maravilhosa.

Bom, ao menos, o clima estava bom. Após dias chuvosos, a noite


parecia de braços abertos para o meu novo status. As estrelas apareciam
tímidas no céu, em meio as luzes exacerbadas da grande cidade. Porém,
torcia para que se alguma delas resolvesse cair, que meu pedido se
realizasse. Que aquele momento não existisse.

Olhei para o meu dedo anelar direito e suspirei, sentindo-me


completamente contraditória. Um grande anel o emolduraria até o fim da
noite, ao menos, quando meu futuro marido resolvesse aparecer. Tomei

mais um gole de champanhe e voltei minha atenção para os arredores da

piscina.

Senti meu salto afundar de forma horrenda no gramado do jardim


da casa dos Russel, e odiei ainda mais o atraso. Avistei Diana na beirada

da piscina, e finalmente encontrei alguém com quem conversar de forma


aberta. Não aguentava mais ser felicitada por um casamento não almejado.
Era apenas um trato firmado, e após dois anos, seria desfeito.

Antes que pudesse chegar até Diana, notei uma das mulheres que
mais me enojavam, parar ao lado dela. Kaitlin tinha um sorriso no rosto, de
forma felina e cruel, e com seus um metro e setenta, intimidaria
facilmente, uma mulher tão pequena e com o olhar doce de Diana. A
diferença entre as aparências e a realidade, era que Kaitlin não tinha ideia

do que aquela mulher baixinha a sua frente era capaz.

Desacelerei meus passos, e notei Paul a alguns metros dali,


claramente procurando por algo ou alguém. Olhei entre as duas mulheres,
e no momento em que Kaitlin apontou o dedo no rosto de Diana, a mulher
não se conteve, pegou a loira estonteante e a jogou com força dentro da
piscina. O alvoroço foi geral, enquanto Kaitlin gritava maldições para
Diana, e alguém de sua família detestável adentrou a piscina para ajudá-la,
os convidados encararam tudo com sorrisos disfarçados e interrogações

claras em seus semblantes, fora a condenação no olhar dos mais velhos.

Aproximei-me de Diana, com a gargalhada presa na garganta, e


notei que ela esbanjava um sorriso vitorioso. Quando finalmente me viu,
foi no momento em que Paul enlaçou sua cintura.

— Pequena, eu...

— Ela já teve o que merecia. — Diana interrompe-o rapidamente, e


deu um leve beijo no namorado. A preocupação no semblante dele era
nítida. — Essas suas amiguinhas não me atingem, mas admito que foi bom
humilhá-la na frente de todos.

— Achei uma jogada espetacular. — comentei e ela piscou o olho


esquerdo, sorrindo. — Qual foi a merda dela?

— Disse que Paul a agarrou no banheiro e blá blá blá. — deu de


ombros e notei o espanto no olhar dele. — Isso não me atinge mais! O que

me deixou puta foi ela finalmente se mostrar como racista para mim.

— O que? — Paul e eu perguntamos ao mesmo tempo,


completamente alarmados.

— Nada do que já não ouvi antes. — deu de ombros. — Como


sempre, não deixei com que pensasse por um segundo que poderia me
fazer sentir inferior.
— Diana, eu...

Senti um leve aperto em minha cintura e no mesmo instante olhei

para o lado. Minha mãe me encarou com carinho e ao mesmo tempo, claro
desespero. Ela odiava o fato de meu pai ter colocado minha liberdade a
prêmio, ou melhor, meu futuro casamento. Porém, era daquela maneira que
as coisas funcionavam entre os Russel e Harper. Dentre as gerações, em

alguns momentos, os laços teriam que se estreitar, e a sortuda da vez era


eu. Geração da má sorte.

— Ele chegou.

Pisquei consternada e bufei, sentindo-me completamente furiosa.


Não que fosse demonstrar algo para ele, muito menos o que realmente
sentia naquele momento. Aprendi ao longo dos anos a forma como lidar
com Klaus Russel e todo ego que o rodeia – a indiferença.

Olhei na direção em que minha mãe indicou e caminhei a passos

decididos até ele – meu futuro marido. Era impossível não o analisar dali,
ainda mais por notar a forma imponente com que se portava, até mesmo no
jeito de andar. Porém, eu conhecia aquele homem, que mesmo com vinte e
oito anos, ainda era o mesmo para mim. Klaus não passava de uma sombra
de Paul, e não podia evitar sentir pena dele, ainda mais, por aceitar de
forma tão passiva aquilo.
Os cabelos castanho escuros estavam bagunçados e os óculos de
grau emolduravam seu belo rosto. O terno cinza chumbo sob medida um

pouco desalinhado em seu corpo, deixava claro que ele esquecera daquela
noite. Ao menos, devia estar no escritório trabalhando, a única coisa que
ele realmente parecia gostar de fazer. Klaus tinha um nome de imponência
tal qual sua postura, mas assim que me aproximei de seu corpo e forcei um

sorriso, em seus olhos azuis encontrei novamente um menino. Um menino


que sequer sabia o que fazia ali, mas que aguentava o fardo.

Sua mão direita tocou meu rosto, e ele depositou um leve beijo em
minha testa.

— Desculpe pelo atraso.

Sua voz rouca me atingiu e assenti, fingindo que não me abalava.


Entretanto, o correto seria ele se desculpar pelo que claramente não queria,
e melhor, éramos forçados. Desculpe por estar sendo obrigado a casar

com você. Em meu coração e mente, tinha certeza, aquela era a única frase
verdadeira que poderia sair de sua boca naquela noite.
Capítulo 1

“Sentia como se estivesse fracassando em praticamente todas as áreas da sua vida.


Ultimamente, a felicidade parecia tão distante e inalcançável para ele quanto uma

viagem pelo espaço sideral.”[2]

Meses antes...

Eu não queria estar ali.

— Não torne as coisas piores, Paul.

— E tem como isso piorar? — meu irmão alterou o tom de voz e


ficou de pé.

Assisti a cena acuado em minha cadeira, sem saber como agir. Era
a primeira vez que via Paul se descontrolar por algo que não fosse
negócios a frente de nosso pai. E ainda mais, descordando de forma tão
concisa com ele.

— Você teve a vida toda para se acostumar com isso. — nosso pai

rebateu, levantando da cadeira de presidente e segurando com as duas


mãos na borda da mesa. — Tem trinta anos e já é um homem. Aja como
um!

— Estou agindo. — meu irmão bradou, e passou as mãos pelos

cabelos, claramente alterado e a ponto de mandar tudo a merda.

Suspirei fundo e me levantei, indo até ele. Segurei em seu ombro


esquerdo e ele me encarou, dando-me um olhar tranquilo que não refletia
em nada sua atual situação.

— Melhor esfriar a cabeça, irmão. — sugeri, tentando acalmar os


nervos.

Não era necessariamente a melhor pessoa para aquele momento.


Porém, com tudo que aprendera durantes os anos de terapia, talvez tenha

me tornado um bom mediador.

— Eu não posso me casar. — insistiu naquele assunto e ignorou o


fato de querer tirá-lo dali.

Meu pai pareceu a ponto de pular sobre a mesa e quebrar a cara de


seu filho mais velho, mas agiu diplomaticamente, como sempre. Algo em
Paul o entregava. Era uma completa surpresa sua negação em relação ao
casamento arranjado, o qual nos foi informado quando ele completara
dezesseis anos. Ele nunca recuara em algo a respeito dos negócios, era uma

característica marcante dele. Por que fugiria de um acordo comercial que


exigia casar-se com uma mulher linda, autêntica, interessante, sedutora...

— Fale de uma vez! — a voz de nosso pai me tirou de pensamentos


nada adequados, ainda mais naquela situação. — Fale porquê de repente se

nega a casar com Lia!

Meu irmão suspirou profundamente e deu alguns passos para trás,


ficando de costas para nós.

— Tenho uma mulher.

O que?

Aquela informação caiu sobre o colo de meu pai como um peso de


trezentos quilos. Surpreendeu-me por completo, já que sempre fora tão
próximo de Paul. Sequer tinha noção daquela situação ou de algum

relacionamento duradouro dele. Por que meu irmão e melhor amigo não
me contaria a respeito? Nosso pai se sentou na cadeira, parecendo
completamente inerte.

— Fidelidade é uma questão crucial nesse contrato, Paul. —


lembrei-o de imediato e ele finalmente se virou para nós.

— Devo fidelidade a mulher que amo, não a quem estou sendo


imposto, e pior, está sendo imposta a mim. — retrucou com voracidade, e
me encarou com raiva. — Eu não vou abrir da minha felicidade, devia

aprender a fazer o mesmo. — acusou-me e respirei fundo, controlando-me.

— Chega! — a voz imponente de nosso pai soou por todos os


cantos, e não me dei ao trabalho de lhe dar uma resposta. — De onde essa
mulher surgiu? Por que nunca ouvimos falar sobre isso?

— Ela existe a muito tempo na minha vida... — meu irmão fez um


sinal com as mãos entre nós — Na nossa vida.

Fiquei inerte por alguns segundos, absorvendo tal informação. Em


uma casa com três homens praticamente por toda a vida, apenas existiam
duas mulheres que eram próximas. Nossa tia Elle e a filha de Robert, o
melhor amigo de meu pai, que acabara se tornando nossa melhor amiga –
Diana.

— Dia? — perguntei baixo, sem conseguir acreditar.

Nunca os vi em uma situação comprometedora ou algo mínimo que


demonstrasse um sentimento além de afeto. Como poderia ser ela?

— Ela é minha melhor amiga e... amante. — confessou


rapidamente.

— Meu Deus! — nosso pai levantou da cadeira e andou em direção


a bela vista do escritório, ele parecia transtornado.
Diana era como a filha que ele nunca teve, a protegida de nossa
casa, que iluminava nossos dias geralmente repletos por problemas de

negócios cansativos. Ela era arte, como a mesma dizia e adorava


relembrar.

— Paul, de onde isso surgiu? — perguntei confuso. — Dia é como


nossa...

— Juro que se terminar essa frase... — deu alguns passos para


perto, ficando a minha frente. — Eu quebro a sua cara!

Naquele momento, fiquei completamente perplexo.

— Eu só estou tentando entender. — defendi-me, sem saber mais o


que dizer.

Paul não baixou a guarda, assim como também não o fiz. Aquela
situação era catastrófica, e todos no recinto sabiam bem daquilo.

De repente a porta do escritório se abriu e soube, as coisas

alcançariam outro patamar. Apenas uma pessoa se atrevia a entrar no meio


de uma reunião considerada importante, e era justamente, a pauta em
questão.

— Pelo olhar assassino de Paul, a cara de assustado de Klaus e o


semblante perdido de Dom, a revelação já foi feita. — ela começou a dizer,
antes mesmo que alguém se impusesse. — Tio. — chamou nosso pai, que
pareceu estático ao vê-la ali. — Não me olhem como se julgassem! —
olhou entre nós, as duas pessoas completamente perdidas ali. — De todos

na vida eu posso esperar isso, menos de vocês.

— Princesa, eu só...

— Não sabe como resolver isso, não é? — ela tomou a frente e


chegou perto de meu pai. — Paul e eu não assumiríamos algo assim se não

fosse real, tampouco chegaríamos a falar sobre. Não posso simplesmente


aceitar que o homem que amo vai se casar com outra por simples negócios.
Por mais que não seja tão simples assim. — debochou.

— Dia, eu acho que...

— Klaus, eu te amo como um irmão. — veio até mim e tocou meu


rosto. — Mas amo ainda mais quando me escuta até o final.

— Tudo bem. — levantei as mãos em sinal de rendição.

Era seu momento de fala, não teria como aconselhar a respeito de

algo.

— Todo mundo pode se sentar, prometo ser breve. — se virou para


meu irmão, enquanto nos ajeitávamos nas poltronas distribuídas pela sala.
— Oi, querido. — sua voz suavizou e fiquei embasbacado, assim como
meu pai, que parecia ver um olho a mais na testa do casal a nossa frente.

A cena que se desenrolou me assustou, pela intensidade no olhar


que trocaram, e a forma como ela beijou levemente o rosto de meu irmão,
enquanto ele beijou sua testa. Eles tinham algo forte, que de alguma forma

nasceu e simplesmente, estavam lutando por aquilo.

Culpei-me mais ainda pelo que meu peito explodia para dizer, mas
que nunca tentara lutar. Sentia-me um completo covarde.

— Li todo o contrato. Existe uma cláusula específica, que permite a

troca de pessoas com mesmo sobrenome. — falou, e notei seu tom


empolgado. — Simples assim. — complementou, diante do silêncio
sepulcral.

— Não estou te acompanhando, querida. — meu pai pareceu ainda


mais perdido.

Eu acompanhei, e no mesmo instante, minha cabeça girou. Todas


as perguntas em meu peito com uma única resposta. Porém, a culpa me
assombrara por completo.

— O ponto alto de todo esse contrato ridículo, desculpe tio, mas é a


verdade. Enfim, é a união Harper-Russel, nada mais. Assim, qualquer
Russel e Harper devem se casar no ano planejado, mesmo não sendo o
filho prometido, melhor dizendo, o primogênito.

— Espera... — meu pai se calou de repente.

Assim, nada mais pareceu audível naquela sala. Analisei


profundamente o que Dia afirmara e a resposta era clara para toda aquela
questão: Eu. Klaus Russel era a forma de tudo se ajeitar. Senti-me

completamente sufocado diante de tal pressão.

Meu pai me encarou com a pergunta explícita em seu olhar, assim


como o casal a minha frente, que parecia suplicar por meu
pronunciamento. Lembrei-me de quando li o tal contrato e soube que podia

não ser tão simples. Nunca era.

— A outra parte do acordo precisa estar de acordo. — falei,


finalmente encontrando minha voz. — Lia Harper precisa aceitar.

— E você, irmão? — Paul perguntou, encarando-me determinado.


— Está de acordo com isso? Abriria mão da sua liberdade por nós?

Olhei mais uma vez entre ele e Dia. A resposta era clara, ainda
mais em minha mente. Se existia alguma possibilidade de contribuir para
que não ficassem separados, simplesmente aceitaria. O maior problema era

que teria que me acostumar com a nova realidade. Caso Lia me aceitasse
como seu noivo, o que era praticamente impossível. Mesmo assim, não
carregaria a culpa por impedir a felicidade das pessoas que tanto amava.

— Não tenho problema algum quanto a isso.

Dia soltou um gritinho de felicidade e tive que sorrir de sua


empolgação. Logo ela me abraçou e agradeceu, em sua forma típica e
acalorada. Porém, meus pensamentos voaram para longe dali, além

daquela sala. Começava a aceitar tal realidade, a qual consistia em ser

marido da mulher que me evitou por uma vida, mas a qual sempre foi dona
de meus sonhos mais secretos.
Capítulo 2

“E em um simples deslize, o ódio vira amor e vice-versa.”[3]

Gritei alto e girei pelo escritório. Peguei o celular com a foto dele e
a encarei com desdém. Joguei sobre a cama e comecei a dançar com a
música.

“Take off all my make-up 'cause I love what’s under it

Rub off all your words, don't give a uh, I'm over it

Jiggle all this weight, yeah, you know I love all of this

Finally love me naked, sexiest when I’m confident

You say I ain't pretty


Well, I say I'm beautiful, it's my committee

Say we too provocative

Still look at me, look at me, look at me, yeah”

“Come for my girls, you blind

Daily Mail ratin', mañana a la noche

I don't owe you nothin'

Nah, I don't give a, no, not anymore

(Ah-ooh)

If you got little boobs, love it, love it, love it, love it, love it

If you got a big ass, grab it, grab it grab it, grab it, grab it (ah-ooh)

If you got nothing, babe, rock it

It’s your life, go get it if you want it

Up in the mirror like: Aw, yeah

Lovin’ my figure like: Aw, yeah

When I'm slim or I’m thick, I'm like: Aw, yeah

Swear I'ma kill 'em like ah.”[4]


Em uma camisola branca curta e sem calcinha. Dançando feito uma

doida com a música que me define por completo. Levantei a barra da


mesma e passei a mão por minha barriga, apertei-a e gritei, sentindo-me
liberta.

Um som diferente invadiu o ambiente e dei uma última voltinha

sobre o tapete, antes de pegar meu celular e ir até o som, parando a música.
Respirei fundo, sentindo o suor percorrer todo meu corpo.

Atendi a ligação.

— Pode começar se desculpando por interromper meu momento.


— brinquei.

— Nem começa que o papo é sério. — Patrice praticamente gritou


e senti meu corpo endurecer. O que diabos estava acontecendo?

— Algo com Troian ou Bailey? — perguntei preocupada, já me

imaginando em um voo para o Canadá.

— Não! Por Deus, não! — despreocupou-me rapidamente. —


Apenas um nome, o qual não suporta ouvir.

— Han? — perguntei confusa.

Andei até a grande poltrona e me joguei, esperando alguma reposta


sensata de Patrice. Ela era minha melhor amiga de muitos anos. Uma das
poucas pessoas que sabia a fundo o quanto lutei contra meus próprios

demônios para me tornar quem sou. Pat conheceu Lia antes da realidade, e

Lia pós realidade. Ela sabia mais de mim do que qualquer pessoa.

— Desembucha. — insisti, diante de seu silêncio. — Parece que


sua felicidade diária é me deixar aflita.

Ela gargalhou alto e senti vontade de socar seu belo rosto. Sorte

que não estava por perto.

— Ok, desculpe. — sua voz soou sarcástica. — Mas acho que


deveria se lembrar de um cara que supostamente seria seu marido.

— O que Paul tem a ver com isso? E como assim supostamente?

Deus! Eu odiava dizer o nome dele. Não que ele tivesse me feito
algum mal, pelo contrário, sempre foi muito cortês. Nos conhecíamos há
anos, mas não éramos próximos. Entretanto, ele seria meu marido. E a
cada segundo que se aproximava do dia que revelaríamos o noivado, sentia

minha própria alma querer fugir. Se conseguisse, com toda certeza, já o


teria feito.

Casamento arranjado em pleno século XXI. A que ponto


chegamos? Suspirei fundo, não querendo mais uma vez entrar naquele
mérito e foquei na conversa com Pat.

— Bom, se entrar no instagram e olhar a última foto de Diana...


Nem lhe dei mais atenção e deixei a ligação em segundo plano,
rapidamente abrindo a rede social. No momento em que entrei no perfil de

Diana, senti meu coração falhar uma batida e uma felicidade descomunal
se apossou de meu corpo.

Soltei um grito de felicidade ao ler e reler a legenda da foto dela


com Paul. Gargalhei alto e gritei novamente. Só então lembrei de minha

amiga e coloquei o celular na orelha.

— Essa é a melhor notícia da minha vida! — exclamei animada.

— Percebi. — ela gargalhou. — Seus gritos valeram mais que mil


palavras, June.

— Cala boca. — irritei-me com o apelido desnecessário. — Eu


preciso muito sair pra comemorar! Estou livre, Pat! Livre!

Gritei novamente e me levantei da poltrona, sentindo-me


completamente leve. Novamente, seria a dona de meu destino. Estar livre

era uma sensação abrasadora.

De repente a porta do meu escritório se abriu e minha mãe me


encarou com cautela. Conhecia aquele olhar, e ela com certeza, não estava
ali por conta de meus gritos.

— Sweetheart[5]. — falou baixinho e senti meu corpo endurecer


novamente.
Por que não podia simplesmente curtir um pouco daquele
momento?

— Antes que jogue alguma bomba sobre mim... Já soube da


novidade? — perguntei-lhe animada e mostrei a foto de Diana com Paul.

Ela encarou a foto rapidamente e forçou um sorriso. Ok, aquele era


um péssimo sinal.

— Mamãe, eu estou livre. — tentei empolgá-la. — Por que parece


triste por me ver livre desse casamento?

Ela então suspirou fundo e entrou no ambiente. Pegou uma de


minhas mãos e apertou com as suas. Um gesto tão dela que me deixou
completamente desarmada.

Levei o celular rapidamente a orelha e me despedi de minha amiga.


Algo estava errado. De repente toda minha felicidade desapareceu. O olhar
perdido de minha mãe confidenciava algo, ainda não sabia dizer o que.

— O que foi? Alguma coisa sobre o roubo na empresa e...

— Não, sweetheart. — sorriu-me forçadamente. Eu odiava aquilo.


— A questão é que temos uma visita.

— Quem? — perguntei, colocando-me de prontidão. — Quem


inferno está te deixando assim, mãe?

Eu faria de tudo por aquela mulher, e ela sabia bem daquilo. Algo a
angustiava de forma dilaceradora. Era a mesma forma com a qual ficou no

dia em que me contou sobre casamento arranjado com Paul, quando

completei apenas quinze anos. Tal notícia, destruiu-me por completo na


época.

Não me contive mais e fui até minha mesa, pegando meu robe
preto, colocando-o rapidamente. Não esperei que ela me dissesse algo, e

desci as escadas rapidamente. Quando finalmente alcancei o último


degrau, senti meu corpo arrepiar, da forma que apenas uma pessoa
conseguia causar.

Não!

Encarei de forma abismada as costas do homem parado no meio de


minha sala de estar. Ele parecia ocupá-la por completo, e de repente, senti
que estava presa numa bolha. Ou quem sabe, num sonho desordenado.

— Klaus?

Seu nome saiu baixo e me odiei por deixá-lo me afetar. Logo ele.
Não, eu tinha que controlar aquela situação. Vamos, Lia!

— Klaus? — minha voz soou decidida e ele se virou lentamente.

Ele parecia estar tão bem consigo mesmo, que odiei o fato de ainda
me sentir tão exposta a ele. Passavam-se anos, e mesmo assim, ainda
conseguia me deixar paralisada. Merda atormentadora que não queria ir
embora. Um sentimento indecifrável.

Ele me encarou de forma séria, como sempre. Sem sequer

expressar alguma reação. Típico dele, e da maioria dos executivos que


tinha contato.

— O que faz na minha casa? — perguntei de uma vez e permaneci


no último degrau.

Estava descalça, e não senti que era uma boa ideia ficar a sua frente
em meu real tamanho. Klaus me intimidava. E não permitiria que sua
altura contribuísse para tal.

— Olá, Lia. — sua voz rouca soou e segurei um suspiro. Eu o


odiava, sim, era aquele puro sentimento. Há anos me convencia de tal
coisa. — Como vai?

A calma e serenidade em cada sílaba que saía de sua boca. A forma


como os olhos azuis pareciam me engolir viva e ao mesmo tempo

transpareciam algo que não conseguia entender. E pior, a postura altiva


como se fosse dono de si.

Segurei um grunhido e forcei um sorriso debochado.

— Sentindo-me livre. — dei de ombros e não desviei o olhar do


seu. — Agora, me diga logo o que faz aqui e por que minha mãe parece a
ponto de chorar. E assim, posso voltar a gritar feito louca.
— Bom, acho mais prudente que esteja sentada para ouvir o que
tenho a dizer.

— Estou bem aqui. — refutei. — Se quiser se sentar, fique à


vontade.

Ele assentiu e escolheu o sofá azul mais próximo de minha visão


para se acomodar. Porém, os segundos passaram e nada saiu de sua boca.

Ele parecia buscar algo em sua mente, talvez as palavras certas.

— Agora que está confortável. — forcei um sorriso, com a


curiosidade corroendo todo meu ser. — Pode me dizer o que está
acontecendo?

— Bom, talvez já saiba sobre Paul e Diana. — começou e abri um


sorriso gigante. Agora aquela conversa parecia atrativa.

Nem mesmo o fato de ter que encará-lo tão de perto, depois de anos
o evitando, pareceu desgastante.

— Aquela foto foi a melhor coisa que coloquei os olhos neste ano.
— confessei, sem disfarçar minha animação.

Tirando a visão dele, realmente, Paul e Diana aos beijos numa rede
social era a melhor foto da década. Por que diabos eu ainda me sentia tão
atraída? Bufei internamente, numa briga sem fim com minhas vontades.

— Bom, eles assumiram a poucos dias o namoro para a família.


Eles estão apaixonados. — confidenciou, e tentei entender onde aquela
conversa iria chegar.

— Klaus. — eu o odiava, mas pelos deuses, amava aquele nome.


— Se um deles te mandou para se desculpar ou algo do tipo...

— Eu escolhi estar aqui para ser honesto e conversamos


abertamente sobre o futuro.

— Futuro? — perguntei completamente perdida.

A conversa acabava de tomar um rumo que não esperava.

— Nosso... — arregalei os olhos e Klaus pareceu reticente,


complementando em seguida: — Nosso futuro.

— O que? — minha voz quase não saiu.

— Paul e Diana só puderam assumir o namoro, pelo fato de que


aceitei assumir todas as responsabilidades cabíveis.

O mundo paralisou diante de suas palavras, e tudo ficou mudo.


Conseguia ver que Klaus ainda falava, mas nada em meu cérebro fazia
sentido.

— Responsabilidades... — tentei me encontrar naquele momento.


— Não me diga que eu sou uma dessas...

— Um Russel tem que se casar com uma Harper. — esclareceu o


que já era nítido. Senti o peso do mundo nas costas, segurando-me no
corrimão da escada. — Eu sinto muito, Lia. Mas preciso vir aqui e lhe
perguntar se está de acordo com este novo arranjo. Nossos pais ainda

conversarão sobre o contrato, mas preferi que soubesse por mim.

Olhei-o com todo meu rancor. Não por ele, nem por mim, mas sim
pela situação. Era um contrato sendo posto a mesa. Mais um. E mesmo
querendo, eu não podia dizer não.

Klaus... Por que?

Segurei no fundo de minha alma tal pergunta, assim como todas


minhas inseguranças a respeito do passado.

— Quanto tempo até o casamento? — perguntei sem o encarar e me


senti fraca.

Não existia possibilidade de ficar estável naquele momento.

— O mesmo. — sua voz sequer oscilou. Ele parecia o dono da


situação, e ele realmente era. — Apenas serei eu no lugar de Paul.

— Não tem ninguém que ame? — perguntei em desespero e segurei


com força contra o corrimão, sentindo-me perdida. Não teria problema algum
jogar com todas as armas que conhecia, mesmo que fossem falíveis. — Diga-
me que tem alguém, que vai assumi-la e...

Ele piscou algumas vezes, claramente assimilando minhas perguntas.


Pela primeira vez, vi Klaus Russel desviar o olhar, parecendo perdido. Eu o
odiei ainda mais naquele instante.

— Diga-me que vai lutar por ela...

O choro ficou preso em minha garganta e tentei acreditar que aquilo


não passara de um pesadelo. E pensar que algum dia, aquilo seria um
verdadeiro sonho.

— Apenas preciso de sua resposta. — sua voz soou firme. O

verdadeiro Klaus estava de volta. Seguindo ordens, prontamente frio. — A


escolha é sua.

Não, nunca seria.

Ele não fazia ideia do por que não me recusava aquilo. Não existia
escolha. Respirei fundo e apenas assenti. Queria dar-lhe as costas, subir para
meu quarto e chorar. Porém me contive. Olhei-o com pesar e dei de ombros.

— O acordo permanece. — respondi em tom alto e claro.

Ele assentiu e como já imaginei, se levantou. Conseguira o que veio

buscar e era hora de levar aos demais envolvidos naquele contrato de


casamento.

— Eu sinto muito, Lia. — não, ele não sentia. — Resolverei todos os


problemas burocráticos e...

— Apenas me incomodem quando precisarem de minha assinatura. —


usei meu tom mais frio. — Nos vemos no noivado ou qualquer outra merda
que esteja programada.

Ele não se abalou com minha sinceridade e me olhou mais uma vez.

— Até mais, Lia. — despediu-se solenemente, e deu as costas.

Assim que a porta bateu, meu corpo cedeu na escada, e me sentei,


sentindo-me perdida. Acabava de me tornar a futura esposa de Klaus Russel.
Capítulo 3

“A primeira vez que a pessoa se apaixona muda a vida dela para sempre, e por mais que

você tente, o sentimento nunca desaparece.”[6]

Acertei com toda a força o saco de areia e tentei não me


desorientar. Um, dois, três, quatro... Dezenas de socos depois, e minha
concentração parecia reencontrada. Entretanto, no momento que fechei os

olhos e tentei focar em algo, a imagem dela ocupou toda minha mente. Dei
um último soco, depositando minha frustração, e em seguida me joguei
contra o chão, completamente perdido.

Senti meu corpo completamente inerte, e em meio ao momento pós


treino, dentro de minha própria academia, tentei me concentrar no fato de
que seria marido de uma mulher que claramente não me suportava. Só não
conseguia entender o porquê.
Ao contrário de Lia, sempre me senti completamente ligado a ela, a
ponto de mesmo após seu afastamento, segui-la por todas as festas as quais

costumava ir. Mesmo que fosse para sequer me divertir, e apenas observá-
la. Anos, nos quais, fiquei à sombra. Em muitas das vezes, a vi aos beijos
com outros caras, e aquilo me matava por dentro.

Mas o que eu podia fazer?

Ela aproveitava sua liberdade, enquanto podia, já que tinha data de


validade. Também não era nenhum santo, porém, o que queria era poder
exorcizar todo meus demônios junto a ela, numa cama, com nossos corpos
perdidos no prazer.

— Porra!

Xinguei alto e me sentei, levando as mãos à cabeça. A imagem dela


em um robe negro me atormentando. A todo custo tive que me manter
calmo a sua frente, sendo que na verdade, tomar seus lábios com os meus

era meu único desejo.

Ela apenas me passava sua frieza e altivez. Lia era a única mulher
que possuía tal poder sobre mim. Precisei recitar mentalmente o que
realmente fazia em sua casa, para não me perder diante da sua imponência.
Ela era o centro de tudo onde quer que estivesse. E ainda mais, estando
apenas nós dois em um cômodo, era como se ela me tomasse para si.
Queria abrir aquele robe, descobrir se usava algo por baixo ou não,
e de uma vez, desvendar todos os mistérios da mulher que parecia tão

inalcançável. Só conseguia pensar em como fazer que me notasse, de


forma que nenhum outro despertasse seu interesse.

Mas ela era livre. Assim como eu. Ao menos, pelos próximos três
meses.

Levantei-me, dando por vencida aquela batalha. Ela tinha me


ganhado de forma tão fácil, que por muito tempo cogitei apenas o fato de
ser uma mulher proibida. Porém, a cada novo encontro com ela, mesmo
que ínfimo, entendi que significava muito mais.

O destino parecia conspirar a favor de ser eu ao seu lado em um


altar. Mas a quem poderia enganar? Nosso casamento era um contrato
selado, nada mais. Não que fosse um homem crédulo em romances de
banca, mas nunca cogitei a possibilidade de obrigar uma mulher a ser

minha. Parecia errado e insano. Pois no fundo, ela não seria.

Segui para meu quarto e resolvi tomar um banho para espairecer a


cabeça. Assim que entrei debaixo da ducha fria, a voz doce e sensual
pareceu viva em minha mente. Era como se ela estivesse naquele
ambiente.

— Não tem ninguém que ame? — perguntou em claro desespero.


Senti como se uma faca atravessasse meu peito. — Diga-me que tem
alguém, que vai assumi-la e...

Pisquei perdido algumas vezes. A resposta era óbvia, mas não


poderia lhe dar. Se ela ao menos soubesse o tamanho de minha covardia.
Pois era ela, a mulher que queria. Mas pela qual, nunca lutei.

— Diga-me que vai lutar por ela...

Soquei com força os azulejos e tentei manter aqueles pensamentos


longe. Precisava sair e distrair minha mente. Lia tornara-se um fato. Uma
mulher que estaria em minha vida de qualquer forma dali para a frente.
Precisava aprender a lidar com sua frieza ou senão, sairia quebrado
daquele casamento.

Levei a dose de uísque a boca e encarei a parte de baixo da boate.

As pessoas dançavam de forma sedutora, diante da música latina que


estourava por todos os lados. Meus olhos varreram o local e pararam em
uma loira que parecia completamente deslocada. Vi um cara avançar sobre
ela e a mesma tentar desviar. As pessoas ao redor pareciam tão perdidas
em si que não notavam.

Virei-me rapidamente e desci as escadas da ala vip. Assim que


cheguei a pista de dança, avancei rapidamente pelas pessoas. Pela minha
altura, mesmo no caos, era fácil encontrá-la. O cara tentou forçar um beijo,

e quando finalmente passei pelas últimas pessoas, apenas vi alguém puxar


o cara pela camisa e lhe acertar uma joelhada fatal.

Mal tive tempo para raciocinar, e quando meus olhos pararam na


mulher que fizera aquilo, meu coração falhou uma batida. Lia tocou com

cuidado o braço da loira, que parecia estar em choque.

— Vadia!

O cara ainda de joelhos no chão gritou enquanto os seguranças o


levavam para longe. Respirei fundo, cerrando meus punhos. Calma, Klaus!
Lia apenas o ignorou e falou algo com a mulher. Pensei no que fazer, ao
mesmo tempo em que me controlava. Talvez, virar de costas e sair fosse a
melhor solução. Porém, logo ela se virou, e seus olhos pararam nos meus.

— Está de carro? — perguntou de repente, como se tivesse notado

minha presença há muito tempo.

Sua voz me tirando por completo daquele momento, e senti-me


relaxar.

— Sim. — respondi mecanicamente.

— Ela não quer denunciar o babaca. — explicou, claramente


contrariada. — Mas aceitou uma carona. Eu pegaria um táxi, mas...
— Tudo bem, Lia.

Ela assentiu, e resolvi fazer algo para ajudar, pois claramente a

loira estava desconfortável. Ela teve seu corpo tocado sem permissão. Tirei
o blazer que vestia e a olhei com cautela.

— Olá, meu nome é Klaus. — comecei a falar e notei o medo


estampado em sua face. Óbvio que encarar um homem minutos depois de

ser atacada por um, não deveria ser fácil. — Sou namorado de Lia. — fui
direto, e ela assentiu, parecendo menos incomodada. Pude sentir o olhar de
Lia queimar sobre todo meu corpo.

Entreguei-lhe meu blazer e rapidamente ela o vestiu, como se


estivesse se protegendo. Saímos rapidamente do local e o leve frio da noite
nos encontrou.

Levei-as até meu carro e Lia acomodou a loira ao seu lado, no


banco de trás. Ela permaneceu ao seu lado e falou algo baixo, que não

consegui escutar.

— Cinco quadras a frente, depois a esquerda. — Lia se manifestou


e assenti, saindo com o carro.

O silêncio se tornou algo sepulcral, e a cada semáforo, tentei pensar


em algo para dizer. Porém, temia falar algo errado.

— Obrigada.
A voz da loira saiu fraca e encarei-a pelo retrovisor, dando-lhe um
leve sorriso.

— Não precisa agradecer. — Lia tomou partido por nós. — O que


fiz foi pouco. Eu queria que ele levantasse e pudesse socá-lo como
merecia.

— Você é corajosa.

— Artes maciais e autodefesa. — Lia falou em tom brincalhão, e


fiquei completamente surpreso. Ela também gostava de lutar? —
Infelizmente é algo necessário em muitos casos.

— Mesmo assim, obrigada Lia.

Estacionei com o carro onde me passou e antes que pudesse dizer


algo, as duas saíram do carro. Fiz o mesmo e me surpreendi no momento
em que a loira me estendeu o blazer e me lançou um sorriso verdadeiro.

Ela parecia doce demais e completamente melhor do que antes.

— Obrigada, Klaus.

Assenti para ela e sorri, pegando o blazer de volta. Lia a abraçou


rapidamente e logo a loira desapareceu para dentro do prédio a nossa
frente.

Fiquei parado, sem conseguir raciocinar diante de todas as


coincidências de minha vida. Tantas voltas e ali estava eu, à frente da
mesma mulher. Virei-me para Lia e me surpreendi ao vê-la acender um

cigarro.

Ela tragou longamente e se encostou em meu carro. Claramente


tentando se acalmar com a nicotina. Ela então me ofereceu, e neguei com
cabeça. Não que não fumasse, mas era algo esporádico. Naquele
momento, não senti vontade.

Ela sorriu baixinho e fiquei completamente perdido.

— Previsível como sempre, Klaus. — soltou de repente e me


desarmou por completo.

Porém, não eram suas palavras, nem o seu tom debochado que me
acertaram. Apenas um momento que parei para observá-la de fato naquela
noite. Ela usava um vestido preto que marcava os seios cheios, de um
comprimento que me fazia babar por suas pernas, moldando seu corpo
perfeitamente. As meias arrastão deixaram-me aos seus pés, assim como a

bota de saltos altíssimos que completara minha perdição.

Seus cabelos longos e ondulados caíam como cascatas e fiquei por


um segundo apenas a admirando, e torcendo para que não reparasse no
meu olhar apreciador. Ela era linda!

Puxou de leve o casaco preto amarrado em sua cintura e colocou-o


sobre os ombros. Em seguida, jogou o cigarro no chão e pisou sobre o
mesmo. Um sorriso que não chegou aos seus olhos se abriu.

— Obrigada pela conversa, Klaus. — debochou.

Virou-se de repente e saiu andando, deixando-me completamente


perdido diante de sua petulância. Mesmo assim, não permiti que desse
mais de dois passos, e a alcancei. Toquei de leve em seu braço e a puxei
para perto. Aquela proximidade, depois de tantos anos, fez meu corpo

acordar e tentei pensar em qualquer outra coisa que não fosse a mulher
sexy como o inferno a minha frente. Porém, a forma como os lábios
carnudos se abrira e fechara em clara surpresa, me tiveram de joelhos.

— Onde vai? — perguntei, tentando desfocar de seus lábios. O que


parecia uma tarefa impossível.

— Voltar para a boate. — deu de ombros e sorriu de lado. —


Minha noite não acabou aqui, Klaus.

— Eu te levo. — segurei-me para não perguntar sobre o que ainda

faria. Na realidade, não queria a real reposta. Aquilo me quebraria. — A


minha também não acabou.

Na realidade, gostaria que acabasse ao seu lado.

Deu de ombros como se não fosse grande coisa e se afastou de meu


toque. Andou de volta até o carro. Destravei o veículo, e logo ela entrou,
sentando-se no banco do passageiro. Apenas pensei estar em um sonho
adolescente. A mulher que queria sentada no banco do passageiro de meu
carro.

— Posso ligar o som? — perguntou, assim que me sentei no banco


do motorista e coloquei o cinto. Apenas assenti, saindo com o carro.

O ar pareceu pesar e por um segundo imaginei que não era apenas


eu o único que sentia aquilo.

— Shallow? — praticamente gritou e sorri de sua surpresa.

Tomando coragem que sequer sabia ter, comecei a cantar junto a


música. Diana me obrigara a ir com ela no cinema, assistir à pré-estreia do
filme na qual a música era parte da trilha sonora. Felizmente, foi uma das
raras vezes que minha melhor amiga acertou na escolha de um filme.

“Tell me something, girl

Are you happy in this modern world?

Or do you need more?

Is there something else you’re searching for?

I’m falling

In all the good times


I find myself longing for change

And in the bad times I fear myself”[7]

Seus olhos me queimavam, porém, me segurei para não a encarar.


A segunda parte da música começou, e Lia basicamente me jogou na lona.

Sua voz era suave e ao mesmo tempo firme, completamente afinada. Senti-
me completamente preso aquele momento. Assim, ficou impossível não a
olhar. Permaneci atento ao trânsito e a ela.

Meu foco real era ela.

“I’m off the deep end, watch as I dive in

I’ll never meet the ground

Crash through the surface

Where they can’t hurt us

We’re far from the shallow now”[8]

Parei em um semáforo, e voltei toda minha atenção para ela. Então,


cantamos juntos, e senti por um milésimo de segundo que existia algo vivo
entre nós. Era como se finalmente ela voltasse a ser a Lia que conheci.
“In the shallow, shallow

In the shallow, shallow

In the shallow, shallow

We’re far from the shallow now”[9]

Tão rápido e surpreendente quanto começou, de repente, aquele


momento acabou. Estacionei o carro, e Lia simplesmente saiu do mesmo.
Saí em seguida, e a encontrei parada ao lado, e senti seu olhar inquisitivo.

— Acho que é a primeira vez que o vejo fazer algo por si só.

Suspirei fundo, tentando não absorver tais palavras.

— Deve pensar que me conhece bem, não é? — perguntei, sem


disfarçar a mágoa em minha voz.

Ela sorriu levemente e tocou meu ombro, o que levou uma descarga
elétrica por todo meu corpo.

— Não me leve a mal, Klaus. — deu de ombros. — Mas existem


dois Russel. Um que age impertinente e outro que sequer age. Você está na
segunda categoria.

— Não seja hipócrita, Lia.


As palavras saíram antes mesmo que pudesse raciocinar, porém,
era verdade. Estava cansado de ser comparado a meu irmão, e nunca

esperei aquilo dela. Principalmente, pela forma como ela reagia as pessoas
que a comparavam. Ao menos, era o que notei nas muitas discussões que a
vi tendo com alguns conhecidos em comum.

— Nada é o que parece. — pareceu escolher as palavras, e tentei

decifrá-las. Lia não parecia falar a respeito daquele momento. — Sobre


Paul, sempre soube o que esperar.

— Sou um bom homem. Ao menos, tento ser. — fui sincero, e


percebi que pela primeira vez em anos, tínhamos uma conversa além de
cordialidades.

Ela apenas sorriu e me deu um leve aceno, antes de se afastar e sair


andando em direção a boate. Respirei fundo algumas vezes e tentei não
pensar tanto a respeito de “nós”, e em seguida, fiz o mesmo caminho. De

todos os olhares que recebi, o único que realmente queria era o dela.
Porém, não seria naquela noite. Lia buscava sua liberdade, assim como eu.

Localizei-a, minutos depois, beijando um cara na pista de dança.


Bebi mais uma dose de uísque e olhei de relance para a morena sentada em
meu colo. Um dia, esperava que Lia fosse a mulher que dividiria tais
momentos. Mesmo que parecesse completamente impossível.
Capítulo 4

“O primeiro amor deixa marcas para a vida inteira.”[10]

Não quis levantar o olhar enquanto meu pai repassava todas as


datas. Minha mãe permanecia acuada numa cadeira, incrédula de que
aquilo realmente acontecia. Levei a garrafa de água a boca novamente e
sorri sem vontade. Era uma situação de merda.

Nenhum deles queria que eu passasse por aquilo. Infelizmente as


coisas tinham tomado proporções que não existiam escolhas. Meus pais
não tinham culpa no que realmente aconteceu. Eles foram enganados em
sua empresa e meu casamento era a forma de salvar o que restara, e assim,
reconstruir tudo.

Os papéis que meu pai assinou há muitos anos, antes mesmo que eu
nascesse e até mesmo conhecer minha mãe, era algo padrão entre os
Russel e Harper. Entretanto, nenhuma das duas famílias imaginou que
realmente seguiriam por aquele caminho. Foi algo obrigatório na época

para que tanto o pai de Klaus quanto o meu, pudessem continuar a


alavancar suas respectivas empresas. Foi algo imposto pelos pais deles na
época. Meus avós só podiam ter algum parafuso a menos, e nada que

realmente importasse para fazer.

Aos 25 anos, era obrigada a assumir um relacionamento sério. Algo


que na realidade sequer me imaginava tendo. Confiança era algo
imprescindível para mim. Klaus não era nem de perto a pessoa na qual
depositaria meus maiores sonhos e medos. Ele era parte de um passado
doloroso.

— Papai, é a quinta vez que lê a mesma coisa. — falei por fim, e


sorri para ele. — Mãe, pare de se culpar por essa merda! Eu aceitei e
pronto. Em dois anos, tudo acabará.

— Eu odeio ser a culpada por...

Meu pai me encarou com pesar, e ambos fomos até ela, a


abraçando. Ela sequer parecia a mulher forte que de fato era. Belinda
Oliveira Harper era minha heroína. Uma brasileira que se encontrou
perdida em meio a um intercâmbio e encontrou no vizinho da casa que
trabalhava para se manter, o amor de sua vida. A história deles era de se
inspirar. Enfrentaram um preconceito absurdo, tudo por minha mãe ser
latina e não ter o padrão de vida de meu pai. Porém, calaram a boca de

muitos quando seu amor prevaleceu por tanto tempo.

— Quando lhe contei sobre o acordo, prometi que te livraria dele.


— falou com pesar. — Eu falhei, Lia. Eu estou te condenando a uma vida
que...

— Não é como se Klaus fosse a pior pessoa do mundo. — dei de

ombros e encarei seus olhos castanhos, reflexos do meus. — Ele é um


tanto polido, mas é legal.

— Você o odeia, sweetheart.

Ela me conhecia muito bem, e fiquei paralisada diante de suas


palavras. Éramos muito claros sobre tudo em nossa casa. Meu pai sorriu de
lado, claramente a par da situação. Ele ria de minha falha tentativa de
livrar minha mãe de uma culpa que não lhe pertencia. Até porque, ele
quem assinara os papéis, sem sequer imaginar que teria filhos algum dia.

Acho que em sua mente, e pelo histórico cafajeste que minha mãe me
passara, com certeza não pretendia.

— Ok, eu chorei por ele uma vez. — confessei e meu pai me


encarou com a sobrancelha arqueada. — O que foi senhor James Harper?

— Apenas admirando que minha menina mesmo sendo tão forte


ainda é apenas minha menina... — seu sorriso debochado não me passou
despercebido. Parte de meu jeito era idêntico ao dele. — Ainda não

aprendeu a mentir, sweetheart.

Minha mãe sorriu verdadeiramente no mesmo instante. Eles


adoravam me azucrinar. Ao menos, o clima horrível no escritório dos dois
tinha melhorado. Sentia-me conectada a eles novamente.

— Ele não sabe a hora de parar. — mamãe o provocou e revirei os

olhos.

Eles iam começar a troca de farpas e assim que saísse, teria que
colocar um fone de ouvido. Coisas iam cair e eles iam se atracar. Se um
dia sonhasse com casamento, torcia para que fosse como eles.

— Falando sério. — comecei, e segurei a mão de ambos. — Meu


trabalho é em casa, tenho Patrice para visitar no Canadá ou vice-versa, as
ruas de Nova Iorque não são entediantes e nunca serão... Não vou sofrer ao
lado de Klaus. O que me fez chorar aos dezoito, me faria dar um soco na

cara dele hoje em dia.

Minha mãe gargalhou e se levantou, beijando com força meu rosto.

— Eu te amo, sweetheart. — tocou meu rosto com carinho. — Não


sabe como quero matar seu pai todos os dias por ter assinado esses papéis.

— Eu não pretendia ter filhos, belíssima. — os anos passavam, e


ele não perdia o apelido carinhoso sobre ela. — A culpa é sua! — acusou-a
e tive que gargalhar da cara espantada de minha mãe.

— Minha? — ela quase gritou e meu pai seguiu.

— Se não tivesse me enredado com esses encantamentos,


continuaria livre e sem filhos. — provocou arduamente e mamãe parecia a
ponto de voar em seu pescoço.

— Obrigada pela parte que me toca. — ironizei.

Mamãe pareceu pensar um pouco e logo um sorriso provocativo


surgiu em seus lábios. Agora meu pai estava ferrado.

— É livre para voltar para sua vida de antes, querido. — vi o rosto


de meu pai retorcer num sorriso. — E eu farei o mesmo. Tenho certeza que
Daniel ainda me espera.

De repente o rosto de meu pai assumiu um semblante furioso e


segurei o riso. Sem lhes dizer nada, apenas saí rapidamente do escritório.
Logo eles estariam se atracando no cômodo.

Subi as escadas e fui para meu quarto. Encarei por alguns


segundos o local repleto de espelhos e as lembranças inundaram minha
mente. Foram anos evitando meu reflexo, mas a cada dia, aprendia a me
amar. De certa forma, descobri que amor próprio tem que ser cultivado. Se
não cuidar de mim e do que amo, quem fará?

Flashes daquela noite no passado me atingiram e sentei-me no


chão. Passei as mãos por meus cabelos e tentei não pensar muito a
respeito. Coloquei uma música no celular e embalei naquele momento.

Meus olhos pesaram em alguns minutos, e apenas me permiti ir ao som de


Julia Michaels.

— Acho que devia ter cuidado, Klaus. — finalmente encontrei


minha voz.

Ele pareceu não se importar e tocou minha cintura. Seus olhos


azuis pareciam me decifrar, e senti-me perdida diante de sua imensidão. O
homem pelo qual era apaixonada finalmente me notou, e mesmo sabendo o
quão errado era, parecia querer lutar.

Klaus sorriu abertamente e tocou sua testa na minha. Ele era mais
velho, dois anos para ser exata. Em meus dezoito, jamais imaginei que
ainda cultivaria algo por ele. Mas Klaus era diferente dos outros, ele
sempre me tratava com carinho.

— Quero muito te beijar, Lia. — sua fala me pegou de surpresa.

Eu sequer sabia o que era um beijo. Não era do tipo de garota que
atraía os homens. Por algum motivo, ou pelos meus quilos a mais, talvez,
eles me repeliam.

Eu odiava lembrar que todos os dias era necessário recitar o


mantra de minha terapeuta para o espelho - Você é linda do seu jeito, não
aceite que ninguém te molde.

— Eu acho que...

Antes que algo saísse de minha boca, a dele me encontrou. Era o


meu primeiro beijo, e com o cara que sempre desejei. Correspondi como
pude. Porém, antes que pudesse me sentir viva diante daquilo, risadas
reverberaram ao nosso redor.

Klaus se afastou e encontramos Mike e sua turma de sempre perto


das escadas. Todos me olhando de cima abaixo. Eu odiava aqueles
momentos. Um dos grandes motivos para ter me mantido tanto tempo
dentro de casa.

— Klaus resolveu fazer caridade hoje.

Aquela não fora uma pergunta, e sim uma constatação. Abracei


meu próprio corpo e tentei buscar algo a dizer, mas me senti impotente.
Busquei em Klaus alguma resposta, porém, ele se calou. Prontamente, deu

as costas e saiu dali, deixando-me como se não fosse nada.

Mike sorriu amplamente, assim como todos junto a ele.

— Sinto muito, porquinha. — falou fingindo compreensão e segurei


as lágrimas.

Eu odiava aquele apelido. Ele me julgava por minha aparência


diferente, e mais, por estar acima do peso. Qual era o real problema?
Segurei o choro como pude e desci as escadas, tentando passar por
eles. Antes que pudesse o fazer, sua mão segurou meu braço. Seus olhos

negros me fuzilaram.

— Na verdade, não sinto.

Soltei-me em um forte puxão e corri para longe dali. Cerca de uma


hora depois, ainda estava inerte, no momento em que o táxi parou a frente

de minha casa. Passei as mãos pelo cabelo e paguei o senhor educado.

Silenciosamente, entrei em casa e subi para meu quarto. Meus pais


tinham saído, então, era uma noite solitária. Não imaginei que aquilo
aconteceria. Era para simplesmente ir para aquela festa e tentar algum
contato com meu futuro marido, que apenas assumiria o relacionamento,
quando eu completasse 25 anos.

Porém, seria bom ter uma conversa de mais de um minuto com


Paul. Ele não era do tipo que leva algo muito a sério, mas parecia ser

legal. Eu queria conhecê-lo para que de alguma forma parasse de pensar


em seu irmão mais novo. Ledo engano. Klaus fizera aquilo por si só.

Assim que me sentei sobre a cama, a primeira lágrima desceu.


Klaus tinha quebrado meu coração. Meu choro correu livremente e fui em
direção ao pequeno espelho que escondia ao lado de meu criado mudo, e
encarei minha pior inimiga – meu reflexo.
Nunca me sentira tão feia como naquele instante. Joguei o objeto
longe e o vi se despedaçar. Levei as mãos à cabeça e chorei,

amargamente, por ser quem era. Sem muito pensar, corri até os cacos e
desferi o primeiro corte no lugar que mais me atormentava – minha
barriga.

Uma culpa descomunal me atingiu, no momento em que vi o

sangue em minha pele. Afastei-me aqueles objetos como se queimassem.


Naquele instante, deitei sobre o tapete, e deixei que meu corpo cedesse a
dor.

Eu precisava extravasar.

Acordei sobressaltada e com o suor escorrendo por todo meu


corpo. Encarei o reflexo no grande espelho ao meu lado e deixei com que
uma lágrima descesse. Já faziam sete anos do dia em que o bullying me
levou a agir contra mim mesma de uma forma ainda mais severa. Aquele

momento foi o estopim, e quando finalmente percebi que aos poucos


estava me destruindo.

Remédios para emagrecer, dietas malucas, noites em claro pelo


choro, o medo de sair de casa... Uma grande bola de neve que se tornara
uma avalanche em minha vida.

Apertei novamente minha barriga e sorri para as pequenas


cicatrizes, quase imperceptíveis. Porém, eu as enxergava, e sabia bem o
que significavam. Hoje, eram apenas lembranças. Dolorosas marcas de

como as palavras podem machucar.

Por isso, sempre tentei escolher bem o que dizer e a quem dizer.
Mágoa não era algo que gostaria de causar a ninguém. Não aquela que
carreguei por tantos anos por aqueles que me marcaram.

Infelizmente, meus pensamentos voaram para Klaus. Ele não tinha


culpa por ter simplesmente se calado e não me defendido. Sabia bem,
naquele momento, que era o bastante para me defender sozinha. Porém,
Klaus tinha culpa por ser covarde. Por nunca ter lutado por nós.

Naquele momento, o odiei ainda mais. Porque em poucos meses


seríamos marido e mulher. Não da forma que sonhei quando me apaixonei
por ele a dez anos atrás.
Capítulo 5

“Não tenho certeza de que a vida de qualquer pessoa no mundo aconteça exatamente do
jeito que se imagina. O que podemos fazer é tentar sempre agir para que tudo aconteça

da melhor maneira possível. Mesmo quando tudo parece impossível. ”[11]

A porta de minha sala se abriu de repente e nem me atrevi a


levantar o olhar para conferir quem era. Paul me mandou uma mensagem
mais cedo dizendo que passaria em minha sala na empresa antes de levar

Diana para casa e ambos se arrumarem.

— Sua cara deveria estar melhor, irmão.

Jogou-se na cadeira a frente de minha mesa e suspirei fundo, sem


querer entrar naquele mérito. Tirei os óculos de grau e passei as mãos pelo
rosto. Aquela semana passara arrastada. Nada parecia me preparar para a
realidade que logo sucumbiria.
Era o dia do meu jantar de noivado.

— Não tenho muito pelo que sorrir no dia de hoje. — dei de

ombros e encostei-me na cadeira.

Notei um sorrisinho em seus lábios e era fato de que ele parecia


muito mais leve desde o momento em que assumiu o namoro. Ele parecia
feliz e completo, de uma forma que nunca o imaginei. Se pudesse aplicar a

fama de cafajeste a algum Russel, com certeza lhe pertenceria.

A princípio, aquilo me fez ficar reticente sobre seu namoro. Diana


era como uma irmã para mim, e não aceitaria que ninguém a magoasse.
Nem mesmo Paul. Como melhor amigo dela, era minha obrigação protegê-
la. Entretanto, desde que assumiram o relacionamento, apenas vi Diana em
seu belo sorriso habitual. Animada como sempre e me azucrinando sobre o
casamento.

Soube por cima que ela foi até a casa de Lia e teve uma conversa.

Isso, há cerca de dois meses, e pelo jeito, elas se tornaram amigas. Não
perguntei a fundo sobre o que falaram, mas agradeci internamente pelo
fato de Diana tentar trazer Lia para mais perto. Era como se ela finalmente
começasse a fazer parte da minha vida.

— Espero que largue um pouco desses papéis e fale com sua futura
esposa. — olhei para Paul com escárnio. — Sem farpas nos olhos, irmão.
— fez sinal de rendição com as mãos. — Mas acho que seria prudente ao
menos ligar para ela. Quanto tempo faz que não se falam?

— Meses. — respondi a contragosto. — Não sei por que comentei


com você a respeito da boate.

— Porque sou seu irmão mais velho. — deu de ombros e tive que
revirar os olhos. Paul conseguia ser irritante sem sequer se esforçar para tal

coisa.

— Ela está bem. — informei-o, mesmo não querendo tocar naquele


assunto. — Diana e ela ficaram próximas.

— Então realmente anda usando minha mulher para saber da sua?


— sorri de sua pergunta e assenti. Por um segundo, notei a surpresa de
meu irmão sobre algo, porém, não consegui entender sobre o que.

— Lia ainda me evita e nunca consegui entender o porquê. —


resolvi abrir parte do jogo.

— Klaus. — ele falou calmamente e se levantou. — Eu não era


muito esperto na época, até hoje não sou. Você herdou esse dom do papai.
Mas parece que sempre anda para trás, irmão.

— Como assim?

Paul se distanciou e mexeu no uísque que deixei sobre a mesinha


do pequeno bar. Os dias massacrados de burocracia, pediam uma dose de
álcool para manter a calma. Ele colocou uma boa quantidade no copo e
bebeu um pouco, logo se virando para mim.

— Você gostava dela. — não era uma pergunta, e também não


tinha porque mentir para meu irmão. — Arrisco dizer que até hoje se sente
atraído por ela.

Não lhe dei qualquer resposta e ele bebeu mais um pouco do

uísque.

— Ela era prometida a mim, mas nunca me olhou direito. — deu de


ombros, como se não importasse. — Lembra que Lia era afastada de
todos? No sentido de que mal a víamos em festas. Ela não era a mesma de
hoje.

— Onde quer chegar?

Para mim, ela poderia ter mudado fisicamente, mas o sentimento


permanecia o mesmo. Lia me enfeitiçara há muito tempo.

— Algo aconteceu com ela, Klaus. — arqueei a sobrancelha sem


acreditar que ele apenas me dizia o óbvio. Era claro que ela mudou por
alguma razão. — Soube que ela socou a cara daquele babaca do Mike
semanas atrás. E essa não foi a primeira vez, sabemos disso. Pelo que me
lembro, anos atrás ela sequer respondia as idiotices dele.

— Não estou entendendo nada, porra.


Meu irmão gargalhou e veio até a mesa, deixando o copo de uísque
a minha frente.

— Ela te olhava com admiração e você tentava agir como um


conhecido qualquer. No fundo, você queria a garota. — respirei fundo,
odiando ainda mais aquela conversa. — Lembro que de repente ela voltou
a frequentar as festas, e sequer chegava perto de você. Parecia que tinha

morrido para ela.

— Eu sei de toda essa merda. — soltei de uma vez, e afrouxei a


gravata. Sentia-me sufocado. — O que quer dizer com isso?

— Que algo aconteceu para ela ter mudado com você. — concluiu
e pisquei algumas vezes, sem conseguir acreditar naquela conversa. —
Algo específico. Você estava tão ocupado evitando o seu sentimento por
ela, que simplesmente...

— Já entendi! — cortei-o rapidamente, e peguei o copo, tomando o

resto de uísque. A bebida desceu queimando minha garganta. — O passado


está no lugar dele, Paul.

— Está mesmo? — meu irmão me encarou com ironia e senti ainda


mais raiva.

— Lia será minha esposa porque é obrigada a isso. — falei o óbvio.

— Isso porque aprendeu a se contentar com pouco e não se acha


digno das pessoas. — aquele era meu irmão mais velho me dando esporro.
Raramente ele o fazia. — Você estoura sacos de areia na luta, quebra a

cara de alguns caras nos treinos que tanto gosta... Devia aprender a lutar
pelo que realmente vale a pena.

Dito isso, ele simplesmente sorriu e piscou em minha direção.

— Se arrume logo e não se atrase. — assenti, sem encontrar uma

palavra para responder.

Assim que a porta de minha sala se fechou, encarei o cômodo vazio


com raiva e completamente perdido.

O que realmente aconteceu para Lia se afastar de mim?

Não éramos melhores amigos, porém, conversávamos


esporadicamente. Conversas que fazia valer a pena as noites em festas
tediosas ou conflituosas demais. Foi daquela maneira que acabei me
encantando por ela. Boa parte do tempo apenas tentei refrear meus

sentimentos, diante da realidade na qual nos encontrávamos. Ela se casaria


com meu irmão.

Mas naquele momento, não mais. Ela seria minha esposa.

Peguei meu celular e coloquei a música que permanecia em minha


mente há semanas. Todos meus pensamentos diretos naquele momento no
carro. Onde, pela primeira vez em anos, ela pareceu estar sendo aberta e a
vontade comigo.

“Tell me something, girl

Are you happy in this modern world?

Or do you need more?

Is there something else you're searching for?

I'm falling

In all the good times

I find myself longing for change

And in the bad times I fear myself

Tell me something, boy

Aren't you tired trying to fill that void?

Or do you need more?

Ain't it hard keeping it so hardcore?

I'm falling

In all the good times


I find myself longing for change

And in the bad times I fear myself

I'm off the deep end, watch as I dive in

I'll never meet the ground

Crash through the surface

Where they can't hurt us

We're far from the shallow now.”

Aquela música parecia falar tanto de nós, ao mesmo tempo que


“nós” não existia e não era definido. Passei as mãos por meus cabelos,
sabendo que aquela noite mudaria muitas coisas. Lia e eu teríamos que
começar a conviver. As pessoas ao redor teriam que acreditar em nossa

relação. Mais uma cláusula daquele maldito contrato.

Precisava falar com Lia e descobrir como seguiríamos com aquilo.


Não a queria há um palmo e muito menos a um braço de distância. A
realidade era que sempre a quis em meus braços. Descobriria como aquela
mulher realmente era. Para quem sabe, um dia, desnudar seu corpo, sua
alma e seu coração. Necessitava descobrir por onde começar.
Um tédio horroroso.

Apenas pensei em como fugir de meu próprio jantar de noivado. As


pessoas ao redor pareciam não notar algo errado ou ao menos fingiam
muito bem com sorrisos exageradamente brancos que a noite estava
maravilhosa.

Bom, ao menos, o clima estava bom. Após dias chuvosos, a noite


parecia de braços abertos para o meu novo status. As estrelas apareciam

tímidas no céu, em meio as luzes exacerbadas da grande cidade. Porém,


torcia para que se alguma delas resolvesse cair, que meu pedido se
realizasse. Que aquele momento não existisse.

Olhei para o meu dedo anelar direito e suspirei, sentindo-me


completamente contraditória. Um grande anel o emolduraria até o fim da
noite, ao menos, quando meu futuro marido resolvesse aparecer. Tomei
mais um gole de champanhe e voltei minha atenção para os arredores da
piscina.

Senti meu salto afundar de forma horrenda no gramado do jardim


da casa dos Russel, e odiei ainda mais o atraso. Avistei Diana na beirada
da piscina, e finalmente encontrei alguém com quem conversar de forma
aberta. Não aguentava mais ser felicitada por um casamento não almejado.

Era apenas um trato firmado, e após dois anos, seria desfeito.

Antes que pudesse chegar até Diana, notei uma das mulheres que
mais me enojavam, parar ao lado dela. Kaitlin tinha um sorriso no rosto, de
forma felina e cruel, e com seus um metro e setenta, intimidaria
facilmente, uma mulher tão pequena e com o olhar doce de Diana. A
diferença entre as aparências e a realidade, era que Kaitlin não tinha ideia
do que aquela mulher baixinha a sua frente era capaz.

Desacelerei meus passos, e notei Paul a alguns metros dali,

claramente procurando por algo ou alguém. Olhei entre as duas mulheres,


e no momento em que Kaitlin apontou o dedo no rosto de Diana, a mulher
não se conteve, pegou a loira estonteante e a jogou com força dentro da
piscina. O alvoroço foi geral, enquanto Kaitlin gritava maldições para
Diana, e alguém de sua família detestável adentrou a piscina para ajudá-la,
os convidados encararam tudo com sorrisos disfarçados e interrogações
claras em seus semblantes, fora a condenação no olhar dos mais velhos.
Aproximei-me de Diana, com a gargalhada presa na garganta, e
notei que ela esbanjava um sorriso vitorioso. Quando finalmente me viu,

foi no momento em que Paul enlaçou sua cintura.

— Pequena, eu...

— Ela já teve o que merecia. — Diana interrompe-o rapidamente, e


deu um leve beijo no namorado. A preocupação no semblante dele era

nítida. — Essas suas amiguinhas não me atingem, mas admito que foi bom
humilhá-la na frente de todos.

— Achei uma jogada espetacular. — comentei e ela piscou o olho


esquerdo, sorrindo. — Qual foi a merda dela?

— Disse que Paul a agarrou no banheiro e blá blá blá. — deu de


ombros e notei o espanto no olhar dele. — Isso não me atinge mais! O que
me deixou puta foi ela finalmente se mostrar como racista para mim.

— O que? — Paul e eu perguntamos ao mesmo tempo,

completamente alarmados.

— Nada do que já não ouvi antes. — deu de ombros. — Como


sempre, não deixei com que pensasse por um segundo que poderia me
fazer sentir inferior.

— Diana, eu...

Senti um leve aperto em minha cintura e no mesmo instante olhei


para o lado. Minha mãe me encarou com carinho e ao mesmo tempo, claro
desespero. Ela odiava o fato de meu pai ter colocado minha liberdade a

prêmio, ou melhor, meu futuro casamento. Porém, era daquela maneira que
as coisas funcionavam entre os Russel e Harper. Dentre as gerações, em
alguns momentos, os laços teriam que se estreitar, e a sortuda da vez era
eu. Geração da má sorte.

— Ele chegou.

Pisquei consternada e bufei, sentindo-me completamente furiosa.


Não que fosse demonstrar algo para ele, muito menos o que realmente
sentia naquele momento. Aprendi ao longo dos anos a forma como lidar
com Klaus Russel e todo ego que o rodeia – a indiferença.

Olhei na direção em que minha mãe indicou e caminhei a passos


decididos até ele – meu futuro marido. Era impossível não o analisar dali,
ainda mais por notar a forma imponente com que se portava, até mesmo no

jeito de andar. Porém, eu conhecia aquele homem, que mesmo com vinte e
oito anos, ainda era o mesmo para mim. Klaus não passava de uma sombra
de Paul, e não podia evitar sentir pena dele, ainda mais, por aceitar de
forma tão passiva aquilo.

Os cabelos castanho escuros estavam bagunçados e os óculos de


grau emolduravam seu belo rosto. O terno cinza chumbo sob medida um
pouco desalinhado em seu corpo, deixava claro que ele esquecera daquela
noite. Ao menos, devia estar no escritório trabalhando, a única coisa que

ele realmente parecia gostar de fazer. Klaus tinha um nome de imponência

tal qual sua postura, mas assim que me aproximei de seu corpo e forcei um
sorriso, em seus olhos azuis encontrei novamente um menino. Um menino
que sequer sabia o que fazia ali, mas que aguentava o fardo.

Sua mão direita tocou meu rosto, e ele depositou um leve beijo em

minha testa.

— Desculpe pelo atraso.

Sua voz rouca me atingiu e assenti, fingindo que não me abalava.


Entretanto, o correto seria ele se desculpar pelo que claramente não queria,
e melhor, éramos forçados. Desculpe por estar sendo obrigado a casar
com você. Em meu coração e mente, tinha certeza, aquela era a única frase
verdadeira que poderia sair de sua boca naquela noite.
Capítulo 6

“Você me irrita,

me excita.

Você me perde,

me ganha.

Você me tem,

mas não me cuida.”[12]

Sentamo-nos na mesa principal, e logo algumas pessoas vieram nos


cumprimentar. Klaus parecia tão acostumado com aquilo que sorria de
forma contida, mas ao mesmo tempo amistosa. Como ele fazia para ser
daquele jeito? Com toda certeza, o sorriso em meu rosto parecia
extremamente forçado e deixava claro que mal via a hora daquelas
formalidades acabarem.
Senti minha mão quente demais e só então percebi que desde o
momento em que Klaus chegou estávamos de mãos dadas. Delicadamente

me soltei da dele e chamei por Diana. Ela sorria de algo que algum dos
convidados falou, que parecia ser um amigo de longa data. Dei de ombros
para cena, sem querer me enturmar. Não era uma noite para fazer amigos.

A verdade consistia em que se não fosse Diana, que tinha se

tornado minha amiga de forma tão inesperada, não teria ninguém além de
minha família que poderia ficar à vontade. Klaus parecia querer me
confortar diante de tantos rostos que detestava. Porém, o fato era que a
maioria das pessoas ali não eram de todo más. Elas apenas pareciam julgar
tudo e todos com o olhar. Não era alguém que apreciava tal atitude, e
muito menos fazia questão de me aproximar de pessoas assim.

— Tudo bem? — Diana perguntou e assenti.

— Apenas vou ao banheiro. — dei de ombros, e ela entendeu.

— Vou com você.

Virei meu olhar para Klaus, e ele sorria abertamente para um


senhor de cabelos brancos que parecia claramente encantado conosco.
Como ele podia nos olhar com admiração? Éramos a maior mentira dos
últimos tempos dentre aquele círculo de pessoas.

— Ela é linda. — o senhor falou e abri um sorriso, estendendo-lhe


minha mão.

Ao contrário do que a maioria fez, ele não a apertou, levou até os

lábios como um verdadeiro cavalheiro e depositou um leve beijo.

— Você me lembra alguém, querida. — falou com carinho e tive


que sorrir, verdadeiramente, pela primeira vez na noite. — Minha Hailey
tinha um espírito livre como o seu, e um olhar preparado para quebrar

corações a sua volta.

Tanto eu quanto Klaus sorrimos de sua comparação, mas não


entramos no assunto a respeito da tal Hailey. Claramente, era alguém que
aquele homem amara. Não era certo tocar em um assunto que
desconhecíamos. Logo o senhor se afastou e o olhar de Klaus encontrou o
meu.

— Vou ao banheiro. — informei, e ele apenas assentiu.

Assim que fiquei de pé, Diana fez o mesmo. Andamos até o interior

da imponente casa, e agradeci por tê-la chamado. Já estive na casa dos


Russel antes, há muitos anos, e não me lembrava de praticamente nada.
Diana era completamente familiarizada, já que frequentou aquele lugar a
vida toda. Entramos no banheiro e enquanto comecei a passar um pouco de
água em meu pescoço, Diana se encostou contra a bancada, ficando apenas
me encarando, como se buscasse algo.
— O que foi? — perguntei, e peguei uma toalha de papel, passando
em meu pescoço molhado.

Em apenas uma hora daquele jantar, já me sentia exausta. Em breve


Klaus me entregaria a aliança, teríamos discursos e poderíamos seguir em
frente. O problema era que ali começava de fato a saga até o altar.
Tínhamos cerca de três meses até o casamento.

Odiava ter colocado em meu calendário como importante um


casamento. Ainda mais, meu casamento.

-— Vocês são lindos juntos.

Encarei Diana como se ela fosse louca e a mesma apenas sorriu,


dando de ombros. Joguei o papel na lixeira e encarei meu reflexo. Minha
maquiagem não cobria a infelicidade. Só queria que aquele momento não
existisse.

— Falo sério. — insistiu. — Não é porque Klaus é meu melhor

amigo...

— Claro que não. — debochei e ela gargalhou.

— Que horror, Lia. — contestou com seu típico sorriso aberto. —


Ele é um cara legal, meio fechado, confesso, mas tem muito por trás do
que Klaus deixa aparecer. Na realidade, ele se parece com você.

Encarei-a sem entender, e me escorei contra o balcão.


— Você não é um livro aberto, Lia. — olhou-me decidida, como se
estivesse falando algo óbvio.

Olhando por aquele lado, ela tinha razão. As pessoas viam aquilo
que permitia, nunca além. Klaus fazia o mesmo?

Desde o começo pude perceber como Diana torcia para que este
casamento desse certo. Porém, ela nunca forçou algo, nem fingiu ser

alguém. Ela era sincera. Aquilo me fez gostar dela.

— Acho melhor voltarmos. — falei, sem um pingo de animação.

Meu celular vibrou e olhei a mensagem. Pat deixava claro que


odiou não estar presente no jantar de noivado, porém, parecia querer tocar
em outros assuntos.

Remetente: Pat

“Olhei a última foto de Diana... Por Deus! Como Klaus ficou ainda mais
bonito? Desculpe, June. Mas vai se casar com um deus grego.”

obs: um bocó, mas um bocó com a cara de um deus.

Gargalhei alto da mensagem de minha amiga e Diana me encarou


curiosa.
— Parece que o mundo conspira a favor de Klaus. — resolvi entrar
na brincadeira e lhe mostrei a mensagem.

Saímos do banheiro sorrindo, porém, logo fomos barradas por um


corpo alto. Bufei diante da pessoa entrona, porém, logo entendi o que
acontecia ao ver o sorriso aberto no rosto de Mike.

O pior de tudo era que ele ainda insistia em estar ao redor. Mesmo

que tenha ganhado um olho roxo na última vez em que ousou me tocar ou
insultar.

— Olhe só. — sorriu abertamente. — A mulher mais linda da festa.

Olhei-o com desdém e apenas fiquei parada, sem fazer menção de


me mover. Tentaria me controlar por estar com tantas pessoas no jardim a
frente, e ainda mais, por estar na casa de outra pessoa.

— Ou melhor, as mulheres mais lindas. — olhou com cobiça para


Diana que fingiu uma ânsia.

Gargalhei da cara de besta dele e sorri para Dia.

— Já terminou o discursinho pré-ensaiado? Deve ter levando um


bom tempo, não é? — indaguei, segurando-me para não revirar os olhos.

— Ah, Lia. — suspirou fundo e deu um passo à frente.

Não me mexi e sequer me deixei intimidar. Ninguém tinha tal


poder sobre mim, de me deixar perdida. Ou melhor, apenas uma pessoa
ainda o fazia. Mas o caso era Mike, e ele, não significava absolutamente

nada. E mesmo quando me causava algo no passado, se resumia a asco.

Algumas coisas não mudavam.

— Senti sua falta nas festinhas.

Revirei os olhos e Diana parecia entediada olhando para o celular.


Também, quem pudera, a petulância de Mike acabava com a paciência de

qualquer um.

— Acho que devia superar esse fato. — sorri de lado. — Ia


naquelas festas para me distrair. Supere o fato de que não transei com você
e seus amigos babacas.

Ele sorriu amplamente e o encarei. Tudo o que queria era lhe


nocautear naquele momento.

— Não é isso que todos sabem.

— Não me importo com o que espalharam sobre mim. — dei de

ombros. Realmente, não era algo que me atingia. — Podem inventar o que
quiser, mas nenhum tocou meu corpo.

Mike fechou a cara, pois ele sabia que não conseguiria me atingir.
Desde que soquei a sua cara há algumas semanas, ele tem se empenhado
ainda mais em tentar me deixar para baixo. O problema era seu olhar
lascivo sobre meu corpo. Ele me desejava e tudo o que conseguia sentir a
respeito era repulsa.

Ele então fez um movimento para tentar tocar meu rosto, e no

segundo que fui impedi-lo, apenas o assisti sendo jogado contra a parede
com tanta força que um quadro caiu no chão.

— Jesus!

A voz de Diana soou alta, porém minha atenção permaneceu em

Klaus, que parecia a ponto de deixar Mike irreconhecível.

— Você fez essa merda?

Mike engoliu em seco diante da pergunta de Klaus e notei seu


medo. Porém, a pergunta que me veio em mente foi: Klaus falava
palavrão?

— Klaus.

Chamei-o e toquei seu braço. Ele sequer mexeu e bufei, revirando


os olhos.

— Solta ele, irmão.

A voz de Paul invadiu o ambiente, e então olhei para o lado e vi o


olhar assustado que ele e Diana trocaram. Não conseguia entender a
preocupação de todos, e simplesmente fiquei assistindo a cena.

— Klaus, amigo...

No mesmo instante que Mike falou, Klaus apertou ainda mais o


braço contra seu pescoço na parede. Aquilo começava a me assustar.

— Não somos amigos, Mike. — o tom de voz de Klaus era frio e

cortante. — Você e seus amigos espalharam boatos sobre Lia... Sim ou


não?

Klaus apenas se afastou o mínimo para que Mike respirasse e


admitisse um “sim” baixo e medroso. Nunca vira Mike tão acuado.

Sem que pudesse raciocinar, apenas vi o punho de Klaus encontrar


o estômago de Mike. Arregalei os olhos, no mesmo instante em que Paul
tentou segurar o irmão e afastá-lo. Diana tentou fazer o mesmo, mas Klaus
se libertou facilmente dos dois. Ele parecia perdido em seu próprio mundo.

Aproveitando um minuto em que Paul e Diana se encararam, como


se tentando pensar no que fazer, Klaus se abaixou para pegar Mike, que
permanecia caído no chão e gemia de dor. Sequer sabia o que fazer, mas
tinha que agir. Klaus não parecia estar raciocinando.

Segurei com força sua mão e chamei seu nome quase em um grito.
Sem que ele esperasse, no momento em que seus olhos azuis encontraram
os meus, agradeci pelos saltos altos e puxei seu rosto para o meu.

Não tinha ideia do que fazia, mas assim que nossos lábios se
tocaram, o mundo parou.
A raiva me queimava por dentro, e ao vê-lo confirmar tudo aquilo,
não imaginei mais nada, apenas queria feri-lo, da forma como ele tentava
fazer com ela. Meu controle se partiu. Tentei lutar contra a raiva em meu
interior, mas já era tarde demais. Não existia chance de parar, a não ser que
alguém me parasse.

Nem os braços de meu irmão, nem os gritos de Diana, nem mesmo


a voz de Lia... Porém, de repente, senti o gosto de lábios doces e decididos.

Sabia que eram dela, pelo seu cheiro, pelo seu toque em meu corpo.
Apenas ela me enfrentaria daquele jeito, e conseguiria me frear.

Pela primeira vez sentia seu gosto, e não pensei em mais nada.
Minhas mãos que antes estavam cerradas pelo ódio, de repente foram para
seu pescoço, e minha língua pediu passagem em seus lábios carnudos. O
primeiro toque fez meu corpo ferver, e não por raiva.
Parecia um sonho. Porém, as pequenas mãos presas com força ao
meu peitoral, as unhas sendo arrastadas por minha camisa... Era real. Cada

maldito segundo.

Ela correspondeu o beijo tão afoita quanto eu. Não existia espaço
para nada. Apenas ela me inundava. E quando senti seu corpo se afastar,
pela falta de ar, não queria permitir que acontecesse. Mas ao olhar para sua

boca carnuda vermelha e inchada pelo beijo, as pupilas dilatadas pelo


desejo, o cabelo bagunçado devido a intensidade... Tive certeza que nunca
estivera tão bela.

O olhar de Lia logo mudou e pareceu pensar em algo. Respirou


profundamente algumas vezes e olhou ao redor, e logo notou que não tinha
mais ninguém ali. Meu irmão e Diana tinham saído, assim como Mike.
Passei as mãos pelos cabelos, um pouco perdido em meio àquela situação.
Porém, foquei na mulher a minha frente, sem querer me lembrar de Mike.

— Algo precisava pará-lo. — sua voz soou um pouco sem jeito.


Ver Lia desconcertada não era algo habitual. Na realidade, nunca a vira de
tal forma. —Acontece sempre? — perguntou, olhando-me com
curiosidade.

— O que?

Minha voz soou rouca devido ao tesão que corria por todo meu
corpo. Bastava ela olhar um pouco mais a baixo e veria o que aquele
simples beijo, que não tinha nada de simples, me causara.

— Seu descontrole.

Respirei fundo, não querendo entrar naquele assunto. Na realidade,


queria poder puxá-la pela cintura e ter seus lábios novamente nos meus.
Meus excessos de raiva poderiam ficar para depois. “Nós” era um assunto

urgente.

— Depois.

Lia piscou algumas vezes, claramente sem entender o que queria


dizer e passou a mão pelo vestido bagunçado. Ela estava perfeita naquele
tom de cinza. Não queria pensar muito, porém, adoraria vê-la tentar se
recompor, apenas para poder bagunçar tudo mais uma vez.

Dei um passo à frente e segurei sua cintura. Lia me encarou


surpresa e assim que abriu a boca para dizer algo, logo a fechou. Ela

parecia travar uma batalha consigo mesma. Porém, mostraria a ela que
ambos poderíamos vencer.

— Klaus!

A voz de meu pai invadiu o ambiente, quebrando nosso momento.


Contrariado, mudei meu olhar para o mesmo e soube bem o que ele queria.
Sua preocupação era clara. Lia logo escapou de minhas mãos e passou por
ele, com um sorriso lindo no rosto.

— O que aconteceu? Seu irmão mandou uma mensagem dizendo

que carregou o filho dos Willians até um táxi, porque você o socou no
estômago.

Seu semblante era sério e apenas neguei com a cabeça.

— Agora não.

Cortei-o, não querendo falar sobre o assunto e tentei sair dali.


Porém, meu pai não estava satisfeito. Parou-me com a mão e seus olhos
me encararam destemidos.

— Acontece que aquele merda se meteu com a minha mulher. —


bradei. — E não vou permitir que o façam.

Saí de dentro de casa e fui para o jardim. Não permitiria que


ninguém difamasse Lia. Nunca mais.
Capítulo 7

“Me fazem perguntas como se eu soubesse as respostas: O que você está sentindo?, por

exemplo, eu nunca sei o que responder.”[13]

Andei meio perdida até reencontrar a mesa na qual estávamos.


Meus pais me encararam com o semblante claramente preocupado e fiz
questão de lhes dar um sorriso, como quem diz “Está tudo bem”. Na

realidade, não tinha nada ruim. Porém, a atitude que tomei diante do estado
de Klaus me assustara. Meus lábios ainda formigavam devido ao beijo, e
qualquer um que me encarasse teria a certeza que minutos atrás estivera
agarrada a alguém.

Fora apenas um beijo com Klaus. Precisava me convencer daquilo,


e rápido. Um beijo depois de muitos, após aquele primeiro. Mesmo assim,
senti-me completamente marcada. Sentei-me em meu lugar e peguei
rapidamente a taça com vinho tinto, bebendo um generoso gole. Torcia

para que ao menos o vinho tirasse o gosto dele de meus lábios.

Olhei ao redor e tudo seguia nos conformes. Os convidados


pareciam enturmados em suas conversas, com toda certeza, maçantes sobre
negócios e eventos. Por um momento me perguntei a respeito de Mike e
como ele teria sido removido do chão depois da pancada de Klaus. Mas

não parei muito para pensar sobre aquilo. Passei as mãos por meu pescoço
e senti-me queimar mais uma vez. Era como se ainda sentisse o toque de
Klaus.

O que diabos estava acontecendo comigo?

Foi apenas um beijo. Um beijo em um momento desesperado para


que ele não destruísse a cara de um imbecil.

Repetia internamente a mesma frase diversas vezes. Não foi nada


demais.

Senti algumas pessoas se aproximando e levantei o olhar. Diana se


sentou ao meu lado como antes, e Paul fez o caminho até a casa. De
relance, notei que Klaus andava em nossa direção, sendo apenas parado
pelo irmão, que lhe disse algo. Assisti a cena, tentando captar o que
acontecia, porém, nada me vinha em mente. A única coisa que minha
mente idiota parecia querer saber era do beijo roubado há alguns minutos.
— Desculpe por aquilo.

A voz de Diana soou baixa e apenas assenti, sem saber como entrar

naquele assunto. Queria entender o que acontecera para Klaus ficar de tal
forma. Ele parecia outra pessoa. Não aparentava o bom e velho Klaus
Russel, polido e cavalheiro. Senti então como se algo me queimasse,
espalhando-se por todo meu corpo. Logo ele se sentou ao meu lado na

mesa, e me encarou profundamente. Naquele momento as palavras de


Diana fizeram total sentido. Klaus agia como eu. O que víamos era apenas
o que ele queria mostrar.

— Sweetheart.

Desprendi-me dos olhos azuis profundos e encarei minha mãe.

— Precisamos fazer o anúncio do noivado. — falou com cautela, e


vi Dominic Russel, o pai de Klaus, chegar ao seu lado. — Tudo bem? —
assenti para ela, dando de ombros em seguida. Por um segundo, fiquei tão

imersa em meus pensamentos, que me esquecera por completo do


verdadeiro propósito daquela noite. — Klaus?

Olhei-o de relance e o vi acenar afirmativamente com a cabeça.


Dominic Russel falou algo com meu pai que lhe deu um leve tapa no
ombro. Os dois pareciam odiar a si mesmos naquela noite, como se a culpa
os corroesse. Tentei evitar tal pensamento e foquei no momento que viria.
Dominic chamou atenção de todos batendo em sua taça, e assisti atenta o
decorrer de sua fala.

— Primeiro, gostaria de agradecer a todos pela presença.

Logo, várias pessoas se amontoaram ao redor da mesa principal, e


revirei os olhos, não conseguindo disfarçar meu desagrado. A maioria que
estava dispersa pelo jardim, em segundos, se aproximaram apenas para

ouvir o anúncio de um noivado. Noivado o qual nenhum deles tinha


contato com os noivos. A sociedade era uma coisa bizarra.

— Como sabem, hoje é um dia especial tanto para os Russel quanto


para os Harper. — fechei os olhos por alguns instantes, para evitar dizer
algo sobre tal absurdo. Porém, todos estávamos num papel importante, e
Dominic, acabara de encarar o dele. — Meu filho mais novo, Klaus, e sua
amada Lia... — mordi a língua para não sorrir e virei meu olhar para
Klaus, que logo pegou minha mão com a sua, levando-o até a boca e

depositando um leve beijo.

Um arrepio percorreu todo meu corpo, fazendo-me lembrar de


como aqueles mesmos lábios encontraram os meus minutos antes. Klaus
deu um singelo sorriso e permaneceu com a sua mão na minha, enquanto
um “Ah” fora ouvido. As pessoas só poderiam estar sendo pagas para
fingir tal coisa, ou eram realmente iludidas por romances improváveis.
Klaus e eu éramos extremos declarados. Ele, um empresário de
sucesso no ramo da construção, seguindo os passos do pai. Eu, uma

escritora independente de livros, que seguia um caminho de descobertas.


Não precisava ser boa em matemática para entender que nossa conta não
fechava, de forma alguma. Ele ficara perfeito em um terno, enquanto meu
caimento perfeito do dia era em um top e shorts velhos, sem esquecer de

uma meia cano longo. Algo em nós não ornava. Mesmo assim, como em
vários romances que já tinha escrito, algo em protagonistas opostos, os
fazia se apaixonar. Porém, aquela era minha realidade, não um conto de
fadas. Klaus era apenas um cara normal com um nome de vilão. Eu, uma
mulher comum, com um nome abrasileirado.

— Decidiram ficar noivos neste dia. — tentei voltar minha atenção


para Dominic. — Acredito que falo por mim, James e Belinda, e todos que
amam Klaus e Lia... Que essa união seja especial e duradoura. Um brinde

aos noivos!

Ouvi o barulho de taças se encontrando e levantei a minha,


brindando com Klaus. Só assim, notei que naquele segundo de divagação,
algo tinha sido colocado em meu dedo anelar esquerdo. Encarei a aliança
delicada, com um diamante negro emoldurado no centro, que me
surpreendera por completo. Klaus me encarou ansioso, e logo senti os
olhares de todos sobre nós. Porém, era claro o pedido silencioso de
permissão para Klaus avançar.

Mais uma vez, decidira agir. Deixei a taça de lado e toquei seu

rosto com cuidado, sentindo minha mão implorar por mais daquele
contato. Klaus não esperou mais nada, tocou meu rosto com uma das mãos
e me puxou para um leve beijo. No meio segundo em que nossos lábios se
encontraram, todo meu corpo implorou para que não se afastasse.

Entretanto, nada era real. Éramos apenas nós, agindo segundo o


personagem. Todos ao redor bateram palmas após aquele breve momento.
Não poderia chamar aquilo de beijo, não depois de ser praticamente
devorada viva por aqueles mesmos lábios.

Olhei na direção de meus pais, que pareciam perplexos diante de


nossa atitude, e segurei a risada. Dominic parecia preso em seu próprio
mundo, enquanto Diana e Paul trocavam um sorriso aberto. Analisei-os
naquele momento, vendo claramente a paixão que transpassava seus olhos.

Não desejara aquilo tão cedo em minha vida, mas não podia negar... O
amor era um sentimento lindo.
Assim que os brindes passaram, senti Lia mais relaxada ao meu
lado. Uma etapa a menos de todo aquele teatro. Porém, minha mente

permanecia no momento de nosso beijo, e ainda mais na forma como


nossos corpos se tocaram.

Olhei para Lia, que sorria de algo que Diana falou, e suspirei
fundo. Não podia estar sentindo aquilo sozinho. Sempre soube que existia
algo nela que me cativava, mesmo sendo tão errado. Entretanto, naquele
instante, era como se sempre existisse algo entre nós.

— Pai. — chamei-o e o mesmo me encarou. — Algo mais? —


indaguei e ele negou com a cabeça, entendendo claramente minha

pergunta.

Podíamos encerrar a noite. Ao menos eu e Lia já tínhamos feito o


necessário. Os convidados se entreteriam entre si e a comida que começara
a ser servida.

— Lia. — seu nome soava tão bem em meus lábios, que poderia
repeti-lo por horas.

Ela me encarou, os olhos castanhos duvidosos.


— Podemos conversar?

Ela apenas assentiu para meu pedido. Estendi a mão para ela, que

felizmente, aceitou de bom grado. Pedimos licença a todos, e notei os


olhares surpresos, praticamente presos em nós.

Lia caminhou ao meu lado pelo jardim. Coloquei a mão na base de


sua coluna e a encaminhei em direção ao outro lado, a parte mais

escondida, que estava vazia.

Assim que paramos, observei que estávamos longe o suficiente de


todos, e tentei encontrar as palavras certas. Mas ao encarar sua boca
carnuda, todos meus pensamentos pareciam se dissipar.

— Confesso que me assustei com seu descontrole. — Lia


começou, enquanto mexia em algumas rosas. — Mas não precisa se
desculpar por aquilo. No fim, alguém acabaria socando Mike. Era só
questão de tempo. — deu de ombros, e sorriu de lado.

— Eu sei que exagerei, mas...

Não era o momento para falar com ela sobre aquilo. Não ainda.
Apenas queria poder beijá-la mais uma vez e esquecer tudo.

— Obrigado. — soltei de repente, e ela arqueou a sobrancelha


encarando-me.

— Pelo que? O beijo? — riu deliciosamente e acabei fazendo o


mesmo. — Estou mesmo impressionada com você, Klaus.

— Sério?

Minha pergunta saiu antes de poder ponderar as palavras. A


vontade era de acertar um tapa em minha testa. Parecia um completo
desesperado por sua atenção. De certa forma, o era.

— Sim. — sorriu amplamente. — Mas sobre o beijo, não foi nada

demais. — deu de ombros e franzi o cenho.

Lia gargalhou de sua fala e então pareceu notar o que tinha dito.

— Não estou dizendo que beija mal. — completou rapidamente.


—Mas não é como se nunca tivéssemos nos beijado. Faz o que? —
pareceu pensar a respeito e fiquei completamente perdido. — Eu tinha
dezoito e estou para fazer vinte e seis...

Ela parecia lindamente pedida na matemática. E mesmo sem


entender do que falava, vi-me respondendo.

— Oito anos.

— Isso! — bateu uma palma. — Não sou de exatas. — reclamou


baixinho.

Ela parecia querer deixar o assunto morrer ali, porém, aquilo me


intrigou.

— O que aconteceu há oito anos?


Lia piscou algumas vezes e pareceu incrédula.

— Um beijo nosso. — respondeu, claramente atenta a minhas

feições.

— O que? — minha voz praticamente não saiu.

— Não vai me dizer que não se lembra? — debochou e apenas


continuei encarando-a. — Ok, deve ter sido bem ruim.

Lia apenas deu de ombros diante de meu silêncio e passou as mãos


pelos cabelos em seguida. Deu um passo à frente e bateu em meu ombro
esquerdo. Claramente, se despedia. Porém, assim que ela deu um passo
para sair, segurei levemente seu braço, puxando-a para mim.

Encarou-me sem entender e resolvi tomar as rédeas da minha vida


e meu maior desejo naquele instante. Tinha esperado tempo demais.

— Acho que se confundiu a respeito do beijo, mas...

— O que está fazendo, Klaus? — perguntou e toquei seu rosto,

testando suas reações.

Ela não me afastou. O que já era um bom começo.

— Eu não posso ter te beijado antes... — procurei pelas palavras


certas, mas a verdade era única. — Se eu tivesse feito, não teria me
esquecido.

— Klaus...
— Seu gosto é único.

Pareceu sem reação por um segundo, mas não lhe dei tempo para

pensar, baixei meus lábios sobre os seus. Novamente, o simples toque fez
todo meu corpo ferver. Puxei-a pela cintura e senti as pequenas mãos
adentrarem meus cabelos, no instante em que nossas línguas se
encontraram. Porra! Ela era como um sonho. Nossos corpos estavam

praticamente colados e não resisti em descer minhas mãos para sua bunda.
Lia gemeu em minha boca, e soube que se ela pedisse para ser minha ali,
nada me pararia.

Porém, contra tudo o que imaginei, senti apenas suas mãos parando
em meu peito e ela me empurrou com força. O solavanco não fora forte,
porém aceitei o afastamento. Lia me encarou com escárnio e logo apontou
um dedo em minha cara.

— Onde pensa que vai com esses joguinhos? — riu com deboche.

— Não sou mais a porra da adolescente que aceita tudo, Klaus. Não se
esqueça disso!

Ela então tentou passar por mim, e a parei. Não fazia ideia do que
ela falava.

— Não faço a menor ideia do que está falando. — confessei e notei


seus olhos vacilarem.
— Isso apenas mostra o quanto não foi importante.

Soltou-se rapidamente de meu aperto, e saiu a passos rápidos.

Fiquei parado, confuso e perplexo, diante de tudo que ela me dissera.


Finalmente fazia sentido a forma com que mudou para comigo no passado.

Apenas uma pergunta passava por minha mente: O que realmente


acontecera?
Capítulo 8

“Mesmo que você não queira ouvir, quero que você saiba que sempre será parte de mim.
E não importa o que o futuro traga, você sempre será meu amor verdadeiro, e sei que

minha vida é melhor por causa disso.”[14]

Assim que adentrei a casa, certa nostalgia me bateu, e suspirei


fundo. Meu pensamento voou para o momento crucial que mudou meu

jeito de ser. Não era algo bonito, portanto, sempre evitei lembrar.

Subi as escadas e fui direto para meu antigo quarto. Acendi as luzes
e notei que tudo permanecia igual. Fechei a porta e a tranquei, apagando a
luz em seguida, e me jogando no colchão macio. Meu corpo agradeceu tal
contato, e felizmente, o momento de descanso.

Os dias na empresa estavam corridos, o que demandou ainda mais


de mim. Porém, não era aquilo que me causara tal desgaste. Já me
acostumei com os problemas burocráticos. Minha mente andava
bagunçada por conta do casamento, e ainda mais, por não conseguir pensar

em nada além de Lia.

Parecia que aquele feitiço que jogara sobre mim quando ela tinha
apenas dezesseis anos, se instalara novamente, tomando posse por
completo. Naquele momento, não existiam razões para refreá-lo.

Completamente sem jeito, comecei a retirar o terno e o joguei de


lado, assim como os sapatos. Afrouxei a gravata e fiz o mesmo. Abri os
botões da camisa social, e fiquei ali, olhando o teto pela fraca iluminação
que adentrava a janela. Passei as mãos pelo rosto e tentei me lembrar a
respeito do que Lia pontuou.

O que aconteceu no passado?

A simples desconfiança de que ela tenha passado a me afastar


devido a algo que sequer lembro me corrói. Precisava entender o que

aconteceu. Porém, ela parecia tão reticente quanto ao assunto que aceitei
seu espaço. Mas nada me impedia de tentar novamente. O que seria logo.

Apenas ela poderia sanar minhas dúvidas. E quem sabe, me perdoar


pelo que tenha feito. Fechei os olhos e coloquei uma música qualquer no
celular. De repente, percebi que tocava mais uma das músicas que Diana
tanto adorava. Acabei ignorando tal coisa e resolvi focar em meus
pensamentos, tentando tirar algo deles. Minha mente parecia vazia,
interligada diretamente ao beijo. O passado parecia não ter lugar ali. Mas

se era importante para ela, também seria para mim.

Não me perdoaria caso tenha provado seus lábios e não me


lembrasse.

Não saberia dizer como, mas simplesmente cheguei a saída da casa

dos Russel. Pedi um uber pelo celular e mandei uma mensagem para
minha mãe, para que pedisse desculpas em meu nome a Dominic por ter
saído sem me despedir. Klaus deixara claro minutos antes que estávamos
encerrando a noite, entretanto, senti-me na obrigação de ao menos me
explicar.

Minutos depois, o carro parou em frente à minha casa e saí


rapidamente. O motorista até tentara puxar algum assunto, mas os sorrisos

fracos em meu rosto e as falas monossilábicas deixaram claro que não

estava em um bom momento para conversa. Assim que adentrei a casa,


resolvi ir para a parte de trás. O jardim era meu local favorito.

Encarei as luzes espalhadas pelo gramado verde e sorri, ao menos,


reconhecendo um local que tanto me fez bem. Andei até onde o meu velho

balanço ficava posicionado, e me sentei no mesmo. Disquei o número de


minha melhor amiga, coloquei no viva-voz e apoiei o celular no balanço ao
lado. Em poucos segundos Patrice atendeu e sua voz não era nada boa.
Pelo jeito, ambas estávamos em uma noite complicada.

— Ei, June!

Ela realmente não parecia animada, mas como boa amiga, não me
deixaria sozinha.

— Pelo jeito tem algo errado com nós duas hoje. — caçoei e ouvi

sua risada alta.

— Apenas Troian pirando minha cabeça...

— Como sempre. — complementei e ouvi seu bufar. — Você


faltou ao jantar de noivado da sua melhor amiga. — acusei-a em tom de
brincadeira e ela gargalhou. — Estou falando sério, Pat!

— Ok! — ainda era possível ouvir sua risada. — O que Klaus fez
dessa vez?

— Como sabe que é sobre ele? — perguntei de relance.

— Porque apenas uma pessoa te faz me ligar com a voz tão


desesperada. — pareceu ler minha alma. — Você pode negar para
qualquer um, mas eu sei bem como se sente em relação ao ele.

— Que me culpo por me sentir atraída por um covarde? Que odeio

não ter conseguido tirá-lo da porra da minha mente? — perguntei com


raiva, e segurei as cordas do balanço, abaixando a cabeça. Senti o peso do
mundo nas minhas costas, mesmo que aquele problema fosse mínimo
diante de tantos outros.

O amor não devia ser um problema.

— Lia, se formos rebobinar tudo... — suspirou fundo. — Éramos


duas deslocadas no meio daquele bando de riquinho. O único que sempre
nos deu alguma moral foi Klaus, e não era nada forçado. — ficou em

silêncio por alguns segundos. — Só que ele sempre te olhou com interesse
claro, mesmo que nunca tenha me ouvido.

— A questão não é essa. — resolvi intervir.

— Qual é? — sua voz soou preocupada.

— Klaus disse que meu gosto é único. — fiz aspas no ar, como se
ela estivesse a minha frente. Deus! Parecia uma louca sentada no balanço
da adolescência, falando com a melhor amiga no viva-voz. — Que ele
nunca esqueceria e blá blá blá.

— Por que diabos ele disse isso?

— A gente se beijou. — comecei, sem muita vontade. O problema


era que me lembrava perfeitamente de seu gosto, de seu toque... Como se
estivesse o sentindo novamente. — Resumindo: Klaus ia quebrar a cara de

Mike porque ele estava agindo feito um babaca novamente, porém, vendo
o descontrole dele, o puxei para um beijo... Depois disso, e as coisas se
acalmarem, Klaus pediu para falar comigo. Pensei que era para se
desculpar, então debochei pelo fato de que não era nosso primeiro beijo.
Não existia razão para se desculpar.

— Mas ele não queria se desculpar, certo? — Patrice perguntou


praticamente gritando e respondi um simples “sim”. — Porra! O que ele
falou?

— Que eu estava me confundindo, porque ele nunca se esqueceria


de um beijo meu e enfim. — suspirei fundo, lembrando-me de seu olhar
lascivo. Ele me desejava, e infelizmente, era recíproco. — Dessa vez ele
quem me beijou e esqueci completamente porque o afastei no passado.
Mas minha razão bateu e...

— Fugiu dele. — não era uma pergunta. — June, você tem que
aprender a ouvir as pessoas. Ter medo do que Klaus realmente sente sobre
você, apenas o afastou. Nunca mais o vi, mas duvido muito que aquele

olhar babão na cara dele toda vez que te olhava tenha passado.

— Escolhi minha sanidade mental, Pat. — sentia-me ainda mais


confusa. Patrice nunca concordou com o fato de me afastar de Klaus, ela
sempre sentira que existia algo a mais. E de fato, existia.

— Tem algo que você não me contou. — ela era esperta, até
demais. — Klaus foi um babaca no primeiro beijo, ok! A Lia que conheço
superou isso, e ainda se pergunta se ele não estava drogado ou bêbado.

Aquela era uma grande verdade. Não entendia muito a respeito de


bebidas, a primeira vez que coloquei algo alcoólico na boca foram semanas
após aquele beijo. Não teria como identificar algo em seu hálito. Se ele
estivesse bêbado não saberia dizer, muito menos drogado. A questão não
era apenas aquela.

— Ele é um covarde, Pat. — aquela era uma palavra que odiei


empregar para com ele, mas era a mais pura verdade. — Ele simplesmente
acata tudo e não luta pelo que quer.

Fechei os olhos por alguns segundos e senti minha mente vagar


para anos atrás. Por mais que tenha me surpreendido no dia de hoje, Klaus
não passava de uma sombra do irmão mais velho. Aquilo me deixava com
ainda mais raiva de mim mesma. Por que diabos ainda insista em querer
um homem como ele?

— Por que não tem uma conversa franca com ele, June? — a voz
de Patrice me chamou para a realidade. — Por que não conta a respeito
de como se sentiu no passado, e enfim, deixe que isso morra. Viver de
passado não é algo saudável. E digo mais, vocês vão se casar. Quer

mesmo fingir todos os dias que não deseja seu próprio homem, e pior, não
se permitir amar o cara pelo qual se apaixonou há tanto tempo?

— Eu não o amo, Pat. — corrigi-a rapidamente.

Em meu coração, era a verdade. Mesmo que Klaus despertasse todo


meu corpo, fizesse-me repassar o passado, e ainda fosse o único a me
desestabilizar. Não era amor. Não podia ser.

— Não sou nenhuma especialista em amor, sabe bem disso. Mas


você o evitou por muito tempo, e isso trouxe consequências. — seu suspiro

soou alto e me senti culpada por levá-la para aquilo comigo. — É como
ver Paul com Diana, isso quebra meu coração. Mesmo aquele imbecil
nunca me notando, pensei que um dia sossegaria e que seria comigo.
Deus, eu moro em outro país e ainda sonhava com ele. — ouvi sua risada
alta. — Acredite, eu sou especialista em ilusões! Você e Klaus não são
uma!
— Desculpe por isso, Pat. — comecei, sentindo-me
completamente culpada. — Fiquei tão eufórica com Paul estando com

alguém e agora, vivo trazendo o irmão dele para o tópico de nossas


conversas.

— Ah, por favor! — pude imaginá-la revirando os olhos. — Você


já viveu muito tempo se culpando porque casaria com o homem que eu

gosto. Não tem o poder de fazer Paul me olhar, e muito menos, de parar
de olhar para Klaus como sempre o fez. Vai à luta, mulher!

— Agora tudo parece muito fácil. — confessei, e encarei os céus,


buscando alguma resposta.

No passado, tudo era mais complicado, porém, lutei por nós. Da


minha maneira, tentei fazer com que Klaus me visse. Era um plano
perfeitamente arquitetado. Sequer tinha noção sobre a cláusula no contrato,
apenas lutaria para que pudéssemos ficar juntos. Entretanto, ele não estava

disposto aquilo.

— Ao meu ver, tudo é muito simples. A maioria das coisas na vida


são, a verdade é essa! — fechei os olhos, e resolvi acreditar nas palavras
de Pat. — As pessoas tornam tudo complicado. O caso é o seguinte: você
vai abrir essa boca e conversar com Klaus, colocar tudo em pratos limpos,
e aí sim, decidir o que fazer. Qual é?! Lia Harper come homens como
Klaus no café da manhã. — gargalhei de sua fala. — Vá e acabe com isso,
June!

— Obrigada, Pat. — sorri, sentindo ainda mais a sua falta. — Você

é a melhor!

— Eu sei.

— E mais modesta. — complementei e ela gargalhou.

— Vá descansar e não se esqueça de marcar algo com Klaus!

— Ok! — respondi rapidamente, diante de seu tom imperativo. —


Te amo, Pat.

— Te amo, June. — sua voz soou mais branda. — Agora vou voltar
minha atenção para Troian, que deve estar botando um ovo por fazê-lo
esperar.

Gargalhei alto de sua analogia. Lembrando-me que Patrice era


brasileira, e mantinha vários trejeitos e modos de falar de sua terra natal.
Seu nome real era Patrícia, mas depois de me ouvir falando de forma tão

esquisita, ela resolveu encurtar. Pat sendo Pat.

— Beijos.

A ligação foi desfeita e por alguns minutos, apenas encarei o nada.


A realidade era que o sentimento por Klaus sempre me assustou, por
sobreviver depois de tanto tempo. Não era amor. Ao menos, não era pra
ser. Mas parecia querer. Suspirei fundo, e peguei o celular.
Selecionei seu contato e digitei rapidamente, sem pensar antes de
enviar. Que os deuses da ortografia me perdoassem caso algo saísse

errado. Duas confirmações, e ele recebera a mensagem. Como uma


adolescente, só que com quase vinte e seis anos, encarei o celular por
alguns minutos, aguardando sua resposta. Ela não veio, e resolvi que
precisava parar de pirar. Em algum momento ele responderia, e assim, o

que ficou pendente, seria resolvido.


Capítulo 9

“Não quero que fique comigo por obrigação e também não quero ser uma. Não quero
que fique ao meu lado só porque tem alguma coisa que te prende a mim. Não quero

que fique porque não encontrou ninguém melhor. Não quero que fique porque eu te
pedi pra ficar. Eu quero que fique, porque você se sente bem ao meu lado. Quero que
você fique pra não ter que sentir saudades. Eu quero que você fique, só se você quiser

ficar.”[15]

Senti algo vibrar e abri os olhos, só assim percebi que cochilei.


Pisquei um pouco perdido diante da escuridão e encontrei meu celular
caído ao lado, com a tela acesa. Rapidamente desbloqueei e vi uma
mensagem. Engoli em seco no mesmo instante, diante da frase direta, que
me surpreendera por completo.
Remetente: Desconhecido.

Ei, é a Lia. Precisamos conversar.

Encarei a mensagem por alguns segundos e notei que completavam

cerca de dez minutos que ela enviara. Olhei para as horas e passavam das
onze da noite. Respirei fundo e comecei a digitar uma resposta plausível.
Digitei e apaguei tantas vezes, que logo se passaram quinze minutos e nada
de mensagem respondida. Bufei, sentando-me na cama e encarei o celular
por alguns segundos.

Numa coragem que nem sabia que tinha, toquei em seu número e o
adicionei, discando em seguida. Um toque e meu coração começou a bater
freneticamente. Passei as mãos por meus cabelos, completamente nervoso.
Deus! Lia Harper não fazia ideia do quanto me dominava. Mais um toque e

respirei fundo, tentando encontrar as palavras certas para dizer. De fato,


talvez ela sequer atendesse.

Um som ao fundo, fez meu coração falhar uma batida e prendi uma
respiração.

— Klaus?

— Oi, Lia. Sou eu.


Repreendi-me mentalmente no mesmo instante. Claro que era eu.
Quem mais seria? Ela quem me mandou a mensagem, ou seja, tinha meu

número. Era apenas um idiota de vinte e oito anos, agindo feito


adolescente.

— Bom... — limpei a garganta rapidamente. — Liguei para falar


sobre sua mensagem.

Acabei de piorar toda aquela situação.

— Ah sim. — ouvi seu suspirar profundo. — Podemos nos


encontrar amanhã?

Não pode ser hoje? Agora? – segurei-me para não parecer afoito, e
tentei não a assustar.

— Claro. — respondi, tentando disfarçar meu tom de decepção. —


É algo sério, Lia?

— Depende. — ouvi alguns barulhos ao fundo, e tentei imaginar o

que ela estaria fazendo. — É uma conversa que demorou tempo demais.

— Eu não sei o que dizer.

Realmente, eu não sabia.

— Tudo bem. Amanhã podemos deixar tudo em pratos limpos.

Senti o tom de sua voz mudar, e a desconfiança de que algo


acontecera no passado tornara-se certeza.
— Por que não hoje? — arrisquei, com medo de estar pedindo
demais.

Ela claramente sabia mais sobre nós, antes mesmo de considerar


“nós” como algo. Talvez, o passado me ajudasse a entender o que
aconteceu conosco. Mesmo que a distância clara, tivesse um motivo óbvio.
Ela era prometida a meu irmão.

— Preciso ser sincero. — comecei, sabendo que ela merecia aquilo.


— Nunca imaginei, mas hoje parece claro que algo aconteceu no passado.
Nós éramos próximos, Lia. De repente... Enfim, não vou conseguir dormir
se não te ver hoje e conversar.

— Admiro sua honestidade. — suas palavras me surpreenderam.


— No seu apartamento? Não quero enfrentar ambientes públicos hoje.

— Claro. — respondi rapidamente, sem conseguir esconder minha


felicidade. — Está em casa?

— Sim.

— Eu...

— Vou dirigindo, não se preocupe. — ela parecia querer manter o


controle da situação. E mesmo querendo muito tê-la em meu carro mais
uma vez, acatei seu pedido sem insistir. — Me passa o endereço por
mensagem?
— Claro... E Lia?

— Sim?

Suspirei fundo, tentando controlar meus sentimentos. Nunca estive


tão à beira de confessar tudo como naquele instante. Precisava me
controlar.

— Desde agora, mesmo não sabendo o que aconteceu... Eu sinto

muito.

— Vamos apenas conversar, Klaus. — fez-se um silêncio sepulcral,


e até imaginei que tivesse desligado. — Até já!

— Até!

Ela desfez a ligação e fiquei apenas encarando o celular, como um


verdadeiro imbecil. Foram necessários alguns segundos para que minha
ficha caísse. Levantei-me rapidamente e peguei meu terno e sapatos, assim
como a gravata. Desci as escadas da casa de meu pai, sem sequer pensar

duas vezes. Assustei-me ao chegar à sala, e encontrar Diana e Paul se


beijando. Ainda era estranho vê-los daquela forma. Porém, seria grato
eternamente pelo que sentiam.

Deixei com que o destino tomasse as rédeas de tudo, e este, poderia


ser cruel. Onde veria a mulher que tanto quis, sendo a esposa de meu
irmão. Não deixaria na mão de mais ninguém o meu destino. Pois naquele
momento tive certeza. Meu destino era ela.

Minutos depois, já estava dentro de meu apartamento. Olhei ao

redor, tentando ver se tudo estava arrumado. Ao menos, a visão de um


apartamento jovem ela não teria, o problema, era quando me encarasse, e
visse, a completa bagunça que me tornara por sua causa. Era como se
todos os sentimentos resguardados por tantos anos, finalmente estivessem
à flor da pele.

Deixei o terno de lado e permaneci apenas com a camisa branca.


Retirei os sapatos e meias, deixando-os em um canto. Ao menos, pareceria
à vontade em meu próprio apartamento, o que não era uma realidade.
Aquela noite era o mais perto que cheguei de poder ter Lia ao meu redor

sem pensar em mais nada. A realidade era aquela, nada me importava,


nada além de sua presença ali. Mesmo que as informações que trouxesse
fossem capazes de me atingir.

Deixara Lia liberada na portaria assim que cheguei. Assim, a


campainha soou e suspirei fundo, tentando me controlar. Você tem vinte e
oito anos, porra! — gritei internamente, encarando-me rapidamente no
espelho ao lado da porta.

Sem sequer encarar o olho mágico, abri a porta. De repente, aquele

espaço pareceu pequeno demais, porém, nunca me pareceu tão certo.

— Boa noite, Lia.

— Oi, Klaus.

Dei-lhe espaço para entrar, e a postura bem decidida dela, deixou-


me completamente no chão. Lia parecia dominar tudo ao seu redor, o que
me incluía. Assim que fechei a porta, e voltei meu olhar para ela, parada
no meio de minha sala, analisando o ambiente, senti que mais nada faltara.
Eu, ela, finalmente, a sós. Os anos poderiam ter passado, mas jamais me
esqueceria da forma como caí perdidamente por aquela mulher.

A subida de elevador tornara-se sufocante. Não me surpreendendo,


Klaus morava na cobertura do prédio. Pedir seu endereço foi mais como
um disfarce para não lhe revelar a verdade. Tinha seu número há tempos,

assim como seu endereço. Era parte de um plano juvenil idiota, e que
agora, poderia ser despejado no colo dele. Suspirei fundo, sem querer
pensar muito a respeito do caminho que nossa conversa tomaria.
Entretanto, precisava deixar claro o passado, para ao menos, conseguir ou

tentar controlar o nosso presente.

Não bastaria simplesmente fingir que Klaus não existia, já que


teríamos que agir feito um casal por dois anos inteiros. A presença dele era
atormentadora, e em algum momento, estouraria a respeito de tudo. Ainda
mais, por finalmente acreditar na forma como ele me encarava. Merecia
mais que a parte de um homem. Assim como ele merecia mais que a casca
de uma mulher. Porém, como aquele casamento se tornou uma
condenação, nada mais justo, do que tentar aliviar tal pena.

Eu estava a ponto de pirar!

O elevador parou e assim que as portas se abriram, me encaminhei


para a única porta do andar. Não queria me lembrar do fato de quando
mais jovem, ter sonhado em estar naquele mesmo ambiente que ele. Que
espécie de boba apaixonada pensa assim? A resposta era óbvia – eu.

Toquei a campainha e passei a pesar em minha mente todos os prós


e contras daquela noite. Agir por impulso não era algo recomendado por
ninguém, mas acabara se tornando um hábito. Nem um minuto se passou, e

a porta se abriu. Meus olhos recaíram diretamente no homem a minha

frente, e mordi a língua para não deixar nenhum comentário desnecessário


sair.

A beleza de Klaus me assustava.

Encarei-o rapidamente e tentei não enlouquecer diante daquele

homem descalço, com a camisa social praticamente aberta, e ainda usando


uma calça na cor preta. Ele parecia tão certo de si, com um sorriso no
canto da boca, que me fez simplesmente odiar o fato de ter vindo como
estava para seu apartamento. Não que me arrumaria para tal ocasião, mas
diante do seu olhar, senti-me completamente despreparada para o que
viesse. Estar usando uma calça de moletom branca e um top preto de
academia, com uma simples jaqueta amarrada na cintura, não ajudava
muito. Era a minha roupa de vagar a noite diante da tela de um

computador, porém, sua ligação mudara o destino das coisas.

— Boa noite, Lia.

— Oi, Klaus.

Até minha forma de cumprimentá-lo soou idiota. Balancei a


cabeça, tentando me reencontrar, enquanto ele abriu espaço para adentrar o
ambiente. Olhei ao redor, sem conseguir me focar em nada. Perguntei-me
internamente se aquela era uma ideia sensata. A minutos atrás, fez algum
sentido. Ali, diante dele, após fechar a porta, e estarmos apenas nós no

mesmo ambiente, não poderia afirmar o mesmo.

— Quer tomar algo? — ofereceu, e não pude negar.

— O que tiver de mais forte, por favor.

Klaus não fez mais perguntas, e o vi se dirigir até um minibar,

localizado ao lado de um dos sofás. Não me importei a respeito da


decoração, realmente, não aguçou minha curiosidade. Tudo se resumia em
começar tal assunto sobre o passado, mas não sabia ao certo quais as
palavras usar.

Ele colocou dois copos sobre o bar, e o vi servir duas doses de


uísque. Assim que terminou de colocar as pedrinhas de gelo, ele se virou, e
finalmente, parei de babar feito uma besta a sua frente. Nossos dedos se
encostaram no momento em que me ofereceu o copo, e era fato de que

qualquer conversa parecia menos importante do que aquele momento.

Nossos corpos pareciam implorar. Ao menos o meu parecia


completamente entregue, que se Klaus me beijasse, entregar-me-ia ali
mesmo.

O quão errado seria?

Simplesmente deixar tudo de lado e ir para cama com ele não me


parecia uma má ideia. Tirando o fato de que no momento após, poderia me
sentir uma completa imbecil. Às vezes na vida, sentir-se imbecil valia a

pena.

— Obrigada.

Tomei um generoso gole e permaneci com meus olhos nos seus.


Klaus parecia absorto no momento.

— Quer se sentar?

Assenti, e segui para uma das poltronas, sentando-me. Tentei ficar


confortável, porém, o olhar dele me queimava. Era como se todo o
discurso que guardei por anos caísse por terra. E pior, sequer me
lembrasse. As coisas mudaram, admiti a mim mesma.

— Uma festa, na casa de Mike... — comecei, e cruzei minhas


pernas, deixando o copo em cima de uma, enquanto passava a ponta dos
dedos sobre a borda. — Você me beijou, sem se importar se alguém

estivesse olhando. Aquilo significou o mundo para mim, Klaus. —


confessei, e tentei me manter no controle das emoções. — Mas durou
apenas alguns segundos, já que Mike me humilhou quando nos viu, como
sempre fazia... E você saiu, sem dizer nada.

— Lia...

— Olha... — o encarei, notando o horror claro em seus olhos. —


Eu tinha dezoito anos, e esperava por aquele beijo desde os quinze. — o vi
abrir a boca surpreso e me encarar completamente perdido. — Hoje eu sei

que não precisava que me defendesse dele, eu poderia fazer isso. Mas
naquela época, era apenas a jovem garota perseguida por um bando de
babacas. Eu tinha medo deles... Bom, até aquela noite.

— Eu não me lembro. — Klaus se pronunciou, e o encarei,

buscando a verdade. — Eu realmente não sei dizer o que houve. — passou


as mãos pelos cabelos, claramente se sentido culpado. — Se eu soubesse
desse beijo, eu...

— Não teria mudado nada, Klaus. — cortei-o, e notei seu olhar


mudar. — A partir daquela noite, resolvi que ia mudar. Todos temos
nossos demônios. Pelo pouco que vi e que sei sobre você, o descontrole
pode ser um deles. — ele assentiu um pouco sem graça e resolvi continuar.
— O meu era a balança e por muito tempo permaneceu. Cheguei ao fundo

do poço, mas estava decidida a ser quem realmente era. E, portanto, lutaria
pelo cara que era apaixonada.

O silêncio recaiu entre nós, e engoli em seco. Os olhos azuis de


Klaus pareciam me absorver.

— Eu? — perguntou, claramente incrédulo.

Dei de ombros e sorri.


— Você foi o único cara que tentou ser meu amigo e que me dava
atenção. — tentei explicar tal sentimento, porém, algo dentro de mim

sempre acusou que era algo mais. — Enfim, eu sabia sobre Paul e o quanto
me envolver com você daria problemas... Mas ia lutar. Porque na minha
ingênua cabeça, nós conversaríamos sobre aquele beijo e você admitiria
que era apaixonado por mim. Namoro, casamento e todo o blá blá blá. Eu

era muito louca, eu sei. — sorri de mim mesma, e Klaus parecia


embasbacado. — Assim, cerca de uma semana depois daquele episódio,
encontrei você e Paul numa festa, acho que era da Kaitlin, não me lembro
ao certo. Bom, era o dia perfeito para pôr em prática meus planos de
sedução. — peguei o copo e tomei o resto da dose, aquilo era
completamente vergonhoso. — Eu te vi, discutindo com Paul a respeito
das coisas... Onde você deixava claro que gostava de mim, mas que nunca
iria contra algo pré-determinado. Você me deixou livre para seu irmão

naquela noite, como se não fosse nada.

— Lia, eu não...

— Eu ouvi tudo, Klaus. — suspirei fundo. — Aquelas palavras, o


beijo, enfim, a amizade que tivemos... Nada disso me incomodava mais,
até o momento em que apareceu em minha casa e me falou a respeito do
casamento. Nosso casamento. — tracei com o dedo uma linha imaginária
entre nós dois.
Levantei-me e deixei o copo sobre a mesinha de centro. Passei as
mãos por meus cabelos e os deixei num coque, no alto da cabeça. Klaus

apenas me analisava, como se ponderasse tudo que dissera.

— Não sou conhecida por mentir, Klaus. Os anos negligenciando a


mim mesma, e todas as maldades alheias que sofri, me tornaram quem sou.
E por isso, não quero embarcar nesse casamento, sem antes deixar tudo

muito claro. — suspirei fundo e sorri para ele.

Deus! Eu sequer conseguia odiá-lo. Meses atrás, quando o vi na


sala de estar de minha casa, tudo o que podia pensar, era que poderia
esganá-lo. Porém, olhando-o tão perdido, senti-me ainda mais ligada a ele.
O que diabos estava acontecendo?

— Você quebrou meu coração um dia, e por isso reagi desta forma
diante de nosso beijo. — bufei diante de minhas loucuras. — Por isso,
queria deixar claro, antes que continuemos a atuar e... Bom, o casamento.

Eu sou forte, Klaus. Mas ainda assim sou humana. Poderia mentir e dizer
que não senti nada com o beijo. Porém, me recordou o quanto te odiei
naquela época e porque me afastei.

— Você me acha um covarde. — pontuou e apenas continuei o


encarando. Era a verdade. — Não posso simplesmente fingir que não sou.

— As coisas mudaram agora, o caminho está livre, eu sei... Os


boatos que espalharam sobre mim não são muito amigáveis, mas não quero
jogar baixo com você. Em respeito a Lia do passado que era encantada por

você, e pela mulher que sou hoje, e também, por quem você é, achei
necessário lhe dizer tudo isso. — soltei de uma vez, e Klaus se levantou,
ficando apenas a mesinha de centro entre nós.

Mesmo descalço, minha cabeça ainda batia em seu ombro. Senti-

me acuada não diante de sua posição, mas sim, de como despejei tudo o
que me atormentou um dia. Nunca imaginei que aquela conversa de fato
existiria. Porém, era necessário. Para continuar e seguir em frente. Assim
como Mike se tornou apenas um babaca quando quebrei a cara dele pela
primeira vez. Encarar Klaus e lhe contar sobre o quanto aquilo me doeu no
passado, era como deixar lá aquela Lia perdida, mesmo que ainda fizesse
parte de mim.

— Nunca me senti tão culpado quanto agora, Lia.

Sua voz me acertou em cheio, e notei os olhos cobertos por raiva.

— Nunca pensei que gostaria de quebrar minha própria cara. —


sorriu sem vontade. — Não da forma como quero nesse instante.

— Acho que precisa absorver tudo isso, antes de realmente pensar


a respeito. — sorri para ele, e prendi a jaqueta que já se soltava de minha
cintura. — Eu preciso ir, mas...
— Fica!

Uma palavra e pisquei completamente perdida. A surpresa óbvia

em meu semblante. Apenas uma mesinha nos separava e Klaus logo a


contornou, parando a minha frente.

— Fica e eu vou te mostrar que vale a pena me dar essa chance.

— Do que está falando, Klaus? — minha voz quase não saiu.

— Eu te amo, Lia.

Minha cabeça girou, meu coração afundou e minha visão nublou. O


que?

— Eu me encantei contigo quando você tinha dezesseis anos, e


passei todos os dias morrendo um pouco por não poder te ter como
realmente queria. — uma de suas mãos encontrou a minha, e ele a tocou
com carinho. — Não me lembro do nosso primeiro beijo, não faço ideia
em que estado me encontrava... Algo aconteceu naquela noite para que

simplesmente me esquecesse. — suspirou, encarando-me profundamente.


— Porque depois de provar seu gosto hoje, o qual ainda tenho vivo em
meus lábios, eu não desejo mais nada.

— Klaus, você não sabe do que está falando. — minha voz falhou,
diante dos olhos azuis transparecendo sentimentos.

— Eu sei. — suas mãos subiram para meu rosto, num gesto tão
delicado e ao mesmo tempo certo, que me assustei com tamanha
intensidade. — Sei que passei praticamente uma década da minha vida,

perdido por uma única mulher. Buscando em outras a conexão que sempre
senti apenas com você. Apenas por te olhar.

— Eu realmente preciso ir. — soltei de uma vez, buscando por


minha sensatez. Mal conseguia respirar.

Afastei-me de seu toque e passei a mão pelo pescoço. Não parecia


em minha total razão, pois meu corpo gritava pelo dele, e suas palavras,
transformavam-me no que ele quisesse. Não sabia o que fazer. Nem
mesmo o objetivo daquela conversa.

Klaus me amava?

— Eu sei que tudo parece confuso e... Não sou bom com palavras,
Lia.

Estava de costas para ele, com meu olhar preso a porta. Tinha duas

opções claras, e não sabia por onde seguir.

— Fica e vamos simplesmente conversar sobre tudo. — sua voz me


atingiu em cheio, e senti seu corpo mais próximo do meu. — Preciso que
conheça o meu lado da história, e que saia desse apartamento com uma
certeza.

— Qual? — perguntei, sabendo que sua resposta seria a


responsável por minha escolha.

— Que eu te amo e que terá o direito de escolher.

Virei-me para ele no mesmo instante, e tentei compreender suas


palavras.

— Quero uma chance, Lia. — sorriu brevemente. — Uma chance


para lhe provar meu amor e para que possa lutar pelo seu.

— E se não lhe der?

Ele passou as mãos pelos cabelos, e me encarou com pesar.

— Está livre. — encarei-o sem entender. — Se não quiser me dar


essa chance e não tiver o seu amor no futuro, está livre do casamento. Mas
isso não significa que não lutarei por você.

Suas palavras me atingiram em cheio.

— Fui covarde uma vez, não mais. — falou decidido e tentei

encontrar as palavras certas para lhe dizer o quanto aquilo era uma
loucura. — Vou lutar por você e mostrar que vale a pena me ter como seu
homem.

— E o contrato?

— Nenhum dever será maior que meu amor por você. Não mais.
Capítulo 10

“As vezes a gente ouve tantas vozes em nossas cabeças. Algumas nos dizem pra desistir,
enquanto outras nos faz acreditar que ainda vale a pena insistir. O problema é que a

gente quase nunca sabe qual voz seguir.”[16]

— Acho que preciso de um cigarro. — falei, sentindo-me um


pouco sufocada e me virei para ele.

Klaus não disfarçou um bonito sorriso no rosto. Só então, notei a


camisa um pouco mais entreaberta e uma grande tatuagem cobria o lado
esquerdo de seu tórax. O que tanto mais aquele homem escondia?

Ele andou até o bar, e abriu uma gaveta, tirando de lá um maço de


cigarros. Não pude disfarçar minha surpresa. Klaus realmente não era nada
do que aparentava. Ao menos, não tudo.

— Nicotina me ajuda em momentos de muito estresse. —


comentou, percebendo meu olhar interrogativo. Ele então pegou um

isqueiro, e fez sinal com a cabeça, para que o acompanhasse.

Um pouco receosa, e com todas as dúvidas do mundo sobre minha


mente, o segui. Ele ia acendendo as luzes, e logo identifiquei que
estávamos em um quarto. Não precisei perguntar, pois os tons em negro
espalhados pelas paredes, e uma cama com os lençóis na cor cinza, me

confirmaram: era o quarto dele.

Quantas vezes no passado sonhara com aquilo?

Quantas vezes o imaginei se declarando para mim?

O que realmente aconteceu em nossas vidas para tantos


desencontros?

Ele então destrancou uma grande porta de vidro, e a correu para o


lado. O ar da noite tocou minha pele, e me senti um pouco melhor pela sua
ideia. Klaus me encarou nesse exato instante, e estendeu a mão. Mesmo

sem entender direito, lhe dei a minha, e senti aquele mesmo arrepio
percorrer todo meu corpo. Sempre com ele. Apenas com ele. Por que?

Aquela noite parecia me entregar mais dúvidas do que respostas.

Klaus me auxiliou ao subir no pequeno deck, e levantei meu olhar


para o quão belo era o horizonte daquele lugar. As luzes da cidade se
misturando com as estrelas. Klaus morava em um lugar admirável,
privilegiado por uma vista de perder o fôlego. Senti um leve aperto na
mão, e o encarei. Ele sorria, feito um menino, mas não no mal sentido.

Klaus parecia feliz.

De alguma forma, algo em mim parecia daquela mesma maneira.

Olhei ao redor do amplo espaço e vi uma piscina, que pareceu


completamente convidativa, porém, não era o momento para aquilo. Ao

redor de todo piso de madeira, encontrei cadeiras, dois sofás e alguns poofs
espalhados. Além de mesas e uma pequena área coberta. Seria o lugar ideal
para uma festa.

— Como nunca fez uma festa aqui? — perguntei, completamente


curiosa. — Ou melhor, você fez e não me convidou? — brinquei e Klaus
explodiu numa gargalhada.

O som de sua risada, fez-me disfarçar um suspiro. Soltei-me de sua


mão e tirei meus tênis e as meias; sem resistir, passei os pés levemente

pela água, que estava numa temperatura perfeita. De relance, vi que Klaus
me analisava. Se ele tivesse uma mínima ideia do que se passava em minha
mente, com toda certeza, não teríamos uma simples conversa.

— Aqui.

Entregou-me o maço de cigarro e o isqueiro. Agradeci e tirei meus


pés da piscina, andando até o sofá mais próximo, acomodando-me. Era
estranho me sentir tão à vontade naquele lugar, e ainda mais, na sua

presença.

Acendi o cigarro e traguei longamente. Precisava de algo que me


distraísse da beleza de Klaus e mais, de suas palavras bonitas. Mesmo
sabendo que elas despertaram meu coração, o receio era um aspecto
constante em minha vida. Não tinha ideia de onde estava pisando com ele.

Valorizava o fato de ter certeza nas coisas.

— Andei pensando a respeito do nosso beijo, no passado... — ele


suspirou fundo. — Não consigo me lembrar de nada daquela noite, mas me
lembro bem que fiquei apagado por quase um dia após aquela festa.

Franzi o cenho, sem ter muita certeza de onde ele queria chegar.

— Uma vez Paul me falou sobre as drogas que rolavam nas festas
de Mike, mas que eram apenas alguns boatos. — arregalei os olhos, pois
aquela informação era completamente nova.

— Pelo pouco que sei, as pessoas se drogavam durante a festa, mas


tinham consciência do que faziam. — comentei.

— O problema é que Paul passou pelo mesmo que eu. Ficou


apagado durante quase um dia pós uma festa de Mike. Isso nos intrigou na
época, e pensamos o óbvio: droga nos drinks.

— Puta merda! — soltei, sem conseguir me conter.


— Isso me faz acreditar que mesmo sem saber, fomos drogados em
algum momento. — deu de ombros. — Me sinto um merda por não ter

sido mais cauteloso e...

— Ei. — deixei o cigarro de lado, numa mesinha, e levei a mão até


o braço dele. Klaus estava sentado ao meu lado, porém, numa distância
claramente segura. Com o braço direito depositado na parte de trás do

assento. — Não tem culpa sobre isso.

— Mas tenho por não me lembrar de nós. — fechou os olhos, e


pude notar, o quanto aquilo o atormentou. — Sobre a discussão com Paul...
— os lindos olhos azuis se encontraram com os meus. — Sei bem o que
disse, Lia. E me sinto um verdadeiro covarde por te deixar para ele.
Sempre fui acostumado a acatar ordens, é algo que faço para me manter no
controle.

— Como assim?

Por algum motivo, nem mesmo a discussão com Paul me


atormentava. Era uma parte do passado, a qual assisti e ouvi tudo. Porém,
o descontrole de Klaus era algo completamente novo.

— Quando mais jovem, cerca de doze anos de idade, eu era muito


ativo. Adorava estar em todas as brincadeiras, e tinha vários amigos na
escola. Mas sempre existiu uma comparação entre Paul e eu, o que
acarretou para ele, uma certa perseguição na época. Um dia, um dos
garotos que se dizia meu amigo, encurralou meu irmão, e bateu nele. Só

soube disso porque Paul tinha um olho roxo, pois meu irmão nunca me
contaria, pela vergonha. Eu lembro que foi minha primeira crise, e sem
pensar duas vezes, bati no outro garoto. Mas não foi uma simples briga.
Ele estava no chão, caído, sangrando e... Eu não conseguia parar. Não

queria. — ele respirou fundo, claramente atormentado. — Depois desse


episódio, meu pai me mostrou as artes marciais, sugestão da minha
terapeuta na época, para canalizar a raiva. As pessoas passaram a ter medo
de mim depois daquilo e me fechei para todas elas. Mas, na faculdade,
muitas coisas se sucederam. Defendi uma garota de um cara e... Bom, as
coisas ficaram horríveis. Assim como quando ultrapassaram limites com
Diana. Existe algo em mim a respeito de proteção com as outras pessoas,
que não sei explicar. Os vários terapeutas que passei, apenas deram laudos

completamente diferentes, o que não ajudou muito. O último episódio que


tive foi aos vinte e dois, mas hoje... Quando vi Mike rindo daquelas
merdas sobre você, algo em mim se partiu.

— Seu controle? — indaguei e ele assentiu.

— Sei que é um exagero sem tamanho, e possa estar com medo. —


confessou, e seus olhos pareciam perdidos. — Mas eu sou assim, Lia.
Tenho trabalhado esse meu lado a vida toda, e nunca machuquei alguém
que amava. — suas palavras saíram um pouco desesperadas. — Nunca te
machucaria.

Assim, entendi por completo seu tormento. Klaus estava


claramente apavorado por meu causar medo. Porém, não era algo que
sentia em relação a ele. Toda aquela situação de fato me assustou, porque
não o reconhecera. Mas ao saber de seu passado, eu conseguia entender.

Ao menos, em partes.

— Eu sei. — minha voz saiu num leve sussurro. — O que


realmente me apavorou foi sua declaração.

Klaus piscou algumas vezes e balançou a cabeça sorrindo.

— Guardei isso por tempo demais, Lia. — passou a mão pela barba
perfeitamente desenhada. — Um tempo o qual poderia ter tentado te
conquistar.

— O que passou... — respirei fundo, deixando aquilo para trás. —

passou, Klaus. — concluí.

Algo que entendia perfeitamente eram suas resistência e culpa.


Senti-me assim por tanto tempo comigo, que era como ver uma versão
nova a frente.

— E o agora? — perguntou, encarando-me com interesse. — Não


quero que pense no casamento, no que deve fazer ou não... Apenas seja
sincera comigo.

— Sobre?

— Existe a remota chance de me deixar te conhecer, e assim, me


conhecer?

Como ele podia usar palavras rebuscadas e lindas em uma mesma


frase? Klaus tinha algo jovial sobre ele, algo que não conseguia explicar.

— Uma chance, certo? — perguntei, e ele assentiu.

Pensei em todo caminho que nos levara até ali. Encarei-o, vendo
aqueles olhos azuis vivos, diante da imensidão de sentimentos que ele
emanava. Sempre existiu algo sobre ele que me encantava. Algo que me
fazia suspirar. E ainda existia. Por isso sua presença me atormentava tanto,
e seu toque, me desestabilizava.

Sem querer pensar em mais nada, inclinei meu corpo sobre o seu. O
olhar dele nublou e palavras se tornaram desnecessárias. Assim que me

encaixei sobre seu corpo, ele abriu a boca para dizer algo, porém, toquei
seus lábios com os dedos. Não era preciso, ele entenderia. Assim, desci
meus lábios para os seus. Mais uma vez, o mundo parou e nada ao redor
importava.

Éramos nós.

Klaus acabara de ter sua resposta.


Capítulo 11

“É a possibilidade que me faz continuar, não a certeza, uma espécie de aposta da minha
parte. E embora você possa me chamar de sonhador, de tolo ou de qualquer outra

coisa, acredito que tudo é possível.”[17]

— Eu não acredito nisso. — Diana praticamente gritou do outro


lado da linha e tive que rir. Porém, em um tom mais baixo.

— Sim, nós enchemos a cara e nos beijamos por toda noite. —

confessei, com meu coração mais leve. Finalmente livre para amar quem
queria.

— Daria tudo para ver sua carinha de feliz. — suspirou. — Mas


enfim, liguei para te perguntar se os planos daquela viagem para o Brasil
ainda estão de pé.

— Viagem? — perguntei, sentindo-me perdido.


— Não precisa se preocupar com isso. — tentou me acalmar. —
Lembra daquelas férias que tanto te obriguei a aceitar? Pois então, faltam

três semanas.

— Merda! — reclamei, já que sequer me lembrei daquilo. — Não


tem como...

— Iríamos nós dois, certo? Porque não trocar o meu lugar dessa

vez? — perguntou, com toda certeza já tendo uma ideia em mente. — Lia
comentou comigo que o novo livro tem como protagonista uma brasileira,
já que a melhor amiga dela é. Acho que ir para o Brasil, seria como
mergulhar de cabeça, não acha?

— Eu...

Perdi minha fala, no instante em que Lia surgiu em meu campo de


visão. Ela usava apenas uma camisa minha como pijama, e os cabelos
ondulados formando uma grande bagunça num coque alto. Encarou-me

com um sorriso preguiçoso, e por Deus, teve-me de joelhos.

— Klaus?

A voz de Dia me fez acordar e limpei a garganta.

— Podemos falar disso depois?

Lia deu alguns passos e parou a minha frente. Sua mão tocou meu
peito, e só então me toquei de fato da diferença de nossas alturas. Ela
traçou a tatuagem em meu peito, e sem ao menos esperar a despedida de
Diana, desfiz a ligação.

— Bom dia. — falou, e ficou na ponta dos pés.

Sorri para ela, e não resisti aquele beijo. Acreditei que era algo
inocente, mas assim que nossos corpos se chocaram, notei que estávamos à
beira de explodir. As pequenas mãos de Lia seguraram meus cabelos e as

minhas desceram para sua bunda. Sentíamos livres, como velhos amantes.
Porém nada acontecera. Ao menos, ainda não.

Afastei-me sem muita vontade e toquei seu rosto.

— Dormiu bem? — perguntei e ela assentiu.

— Foi uma boa ideia passar a noite aqui. — pontuou. — Já posso


começar a riscar no meu velho diário.

— Como assim? — indaguei confuso, e ela sorriu envergonhada.

— Eu tinha um caderno com o passo a passo de como te

conquistar. — arregalei os olhos, completamente surpreso. — Sou


virginiana, o que posso dizer?

— Por que perdemos tanto tempo? — perguntei, sentindo-me ainda


mais culpado.

Apenas conseguia pensar que se ficasse ao seu lado no passado e


lutado, já estaríamos juntos. Não teria passado anos me recriminando por
tal sentimento e muito menos por imaginá-la ao lado de outro.

— Os porquês podem ser muitos ou nenhum. — respondeu

lindamente e tive que lhe dar um leve beijo. — O objetivo de conversar a


noite toda não foi cumprido. — provocou, e continuei com as mãos em sua
cintura, depositando um leve beijo em seu pescoço.

— Você me faz sentir como um adolescente. — confessei e Lia

gargalhou, passando as mãos por meu peito.

— Te olhando assim, tenho certeza que não estou à frente de um


adolescente.

Ela mordeu o lábio inferior e logo se afastou.

— Provocadora! — falei, sentindo-me completamente à vontade.


— Sem dores de cabeça?

— Nenhuma. — sentou-se no sofá e cruzou as pernas, deixando-me


ainda mais louco por ela. — Bebi bastante, mas nada que me fizesse ter

uma boa ressaca.

— Você é forte para bebidas. — comentei, e me sentei ao seu lado,


puxando seus pés para meu colo.

Lia sorriu e passou as mãos pelos cabelos.

— É tão esquisito quanto gratificante ter essa intimidade com você.

— Vou me ater ao elogio. — brinquei.


— É sério! — sorriu e se acomodou melhor no estofado. — Eu
queria quebrar sua cara poucos meses atrás, e agora...

Calou-se de repente e pareceu pensativa.

— Agora? — questionei e subi minhas mãos para seu calcanhar.

— Estou me segurando para não me jogar sobre você.

Seu comentário me pegou desprevenido, porém, toda aura sexual


entre nós era perceptível. Passar a noite ao seu lado, beijando-a como
sempre quis, fora incrível. Porém, tocar seu corpo como sempre desejei,
seria meu nirvana. Lia, claramente sabia sobre meu interesse, mas não
deixaria nada imposto. A queria livremente, que viesse a mim com todo
seu desejo e sem nenhuma amarra.

Queria Lia por inteira.

— E por que não o faz? — perguntei, e ela puxou suas pernas,


sentando-se sobre elas.

As mãos de Lia encontraram meu rosto e me deu um leve beijo.

— Desejei isso por muito tempo. — confessou e ficou a um fio de


cabelo de distância. — Nunca fui de suprimir minhas vontades, mas aqui,
com você, é diferente, Klaus.

— Por que? — perguntei, tocando levemente suas costas, e fazendo


um leve carinho.
— Porque me faz sentir exposta e confortável ao extremo. Tenho
vontade de me jogar em seu colo, ao mesmo tempo que quero saber tudo o

que sentiu por mim, e como realmente se sente a respeito do casamento. —


deu um leve sorriso. — Nunca me senti assim com ninguém, e confesso,
isso me assusta.

— Essa intensidade? — perguntei, e levei minha mão até sua coxa.

— Eu sinto o mesmo, Lia. E quando estiver sobre ou sob meu corpo, quero
que tenha certeza de que não há outro lugar no mundo que queira estar.
Quero que estejamos em sintonia. Porque isso vai além de atração. Sempre
foi mais que isso.

— Deus do céu! — ela praticamente pulou em meu colo, e sorri,


segurando-a. — Onde esse Klaus se escondeu por todos esses anos? —
tocou meu rosto, como se me inspecionasse, e gargalhei. — Tenho que
encontrar algum defeito! — parecia se desafiar. — Você é lindo, gostoso,

tem tatuagens, fala como um cavalheiro sexy... Você saiu de algum livro!
O que tem de errado em você Klaus Russel? — indagou, provocativa.

— Bom, eu ainda não tenho a mulher que amo como minha. —


argumentei e seu olhar amoleceu. — Mas estou providenciando isso.

— É mesmo? — sorriu, mordendo o lábio inferior.

Aquela mania dos infernos era completamente pecaminosa.


Sem serem necessárias palavras, apenas a puxei para mais perto.
Beijar aquela mulher era como tocar o céu e o inferno ao mesmo tempo.

Lia era meu sonho particular, que aos poucos, tornava-se uma realidade.

Destinatário: Pat

“Sim, eu estou no apartamento dele.

Ele não cozinha, ao menos encontrei algum defeito. Aliás, não sei se posso
contar como um. Posso?

E não, pela milésima vez! Não transamos! SE CONTROLE, PATRÍCIA!

Aliás, que história é essa de vir para Nova Iorque? Por que tive que saber
por Troian?

obs: eu acho que me apaixonei em uma noite, existe isso?”


Senti braços ao meu redor e deixei o celular de lado. O cheiro

característico de Klaus me atingiu e sorri. De onde aquela intimidade


surgiu? Nenhum de nós saberia dizer, porém, só aceitávamos que era
deliciosa.

Depositou um leve beijo em meu pescoço, fazendo todo meu corpo

se arrepiar. Ele sabia bem o que fazer, e a cada minuto, estava mais perto
de jogar tudo para o alto e puxar seu corpo para o meu.

— Já te servi. — comentou, sua boca bem próxima a meu pescoço.

Afastou-se de repente e senti falta de seu calor no mesmo instante.

— Desculpe. — falei, indicando o celular.

Finalmente notei o prato feito a minha frente. Klaus pediu uma


massa, que segundo ele, era a melhor que já comera. Houve um tempo em
que carboidratos foram meus maiores inimigos. Felizmente, aquela época

ficara para trás. Meu peso não era mais meu inimigo, tal como, a comida.

— Tudo bem. — sorriu, sentando-se a minha frente.

A mesa de jantar de seu apartamento era enorme, por isso,


comíamos na área de fora, com a visão de Nova Iorque. Aquele lugar era
realmente lindo. Porém, não tanto quanto o homem a minha frente, sem
camisa, mostrando todas suas tatuagens bem distribuídas, com uma calça
de moletom, e os cabelos bagunçados. Por que ele não podia ser feio?

Suspirei fundo e tentei me concentrar na comida.

— Parece em qualquer lugar, menos aqui. — Klaus falou, logo


após beber um gole de seu vinho tinto, e dei de ombros.

Poderia confessar que era porque sua beleza me deixava babando?

Porém, preferi tocar em outro assunto. Um que sempre evitei com


todas as pessoas. Mas Klaus parecia tão aberto sobre tudo, que merecia
conhecer uma pequena e importante parte de mim.

— Se há alguns anos me oferecesse essa mesma refeição, eu


negaria e pediria uma salada. — comentei, deixando as palavras soltas no
ar.

Passei o garfo sobre o fettuccine à bolonhesa de cheiro magnífico.


Podia sorrir, pois, venci aquela batalha. Mesmo que psicologicamente,
fosse uma luta diária.

— Seu peso te incomodava? — Klaus perguntou, parecendo


escolher as palavras, e agradeci internamente por seu cuidado.

— Ele incomodava as outras pessoas. — aquele era o real ponto. —


Infelizmente, pessoas como Mike e sua turminha eram presentes na minha
vida... Colégio, festas, clubes, viagens... Até mesmo as pessoas que achei
que eram minhas amigas. Não era algo exclusivo dos declarados babacas.
Pessoas sabem dissimular bem.

— Nunca imaginei que sofreu tanto. — foi sincero.

— Nunca deixei transparecer. — dei de ombros. — Você sempre


foi legal comigo, Klaus. Nos conhecemos desde crianças, certo? — ele
assentiu. — Lembro bem de quando eu tinha quinze, e você veio falar
comigo numa festa. Eu quase tive um treco. — confessei, e gargalhei em

seguida. — Eu ficava me perguntando: Por que um cara como ele está


falando comigo?

— Eu me apaixonei por você pouco tempo depois. — foi sua


confissão. — Como já te disse, quando você fez dezesseis. No seu
aniversário, um garoto te chamou para dançar. Me senti tão acuado que
finalmente caiu minha ficha. Não queria ser apenas seu amigo.

— Isso é tão fofo! — tomei um gole de meu refrigerante e Klaus


sorriu, e notei suas bochechas um pouco avermelhadas. Ele corou! —

Você é fofo!

— Não, Lia! — negou veemente. — Ok, pode me martirizar.

Gargalhei alto e bebi mais um pouco.

— Bom, fiz algumas coisas que não me orgulho com o corpo. Eu


me odiava. — confessei, tentando tirar aquela bola da garganta. — Depois
de muita terapia consegui começar a entender que o problema não estava
em meu corpo, muito menos na forma como me sentia... Mas em como as
pessoas me faziam sentir. Por isso, mudei radicalmente. Me encontrei, e vi

como queria me vestir e sentir. Mandei a merda todos que um dia me


humilharam!

Levantei meu refrigerante para Klaus, que logo entendeu, e brindou


com sua taça de vinho.

— Um brinde as merdas que ficaram no passado! — declarei.

— Um brinde ao presente.

Brindamos mais uma vez e foi impossível não sorrir para ele.

Klaus me tinha em suas mãos em tão pouco tempo, que mal saberia
dizer o que aconteceria quando saísse daquele apartamento. Porém, o
presente valia pena. Para uma romântica incurável, era como encontrar o
homem de meus livros. E naquele momento, ele me pertencia.
Capítulo 12

“Eu adoraria dizer que tudo vai dar certo para nós, e prometo fazer tudo que eu puder

para que isso aconteça.”[18]

Alguns dias depois...

— Desce logo desse avião. — resmunguei e ouvi a leve risada de

Klaus a minhas costas.

Aquela intimidade tão gostosa perdurou durante os dias pós aquele


momento apenas nosso no apartamento. Nos víamos praticamente todos os
dias, e Klaus insistiu em me acompanhar no aeroporto para receber minha
melhor amiga maluca. Aquilo tudo era parte do plano de Klaus de
conquista, tinha certeza. Mal sabia ele que me tinha enrolada em seu dedo
mindinho. Ao menos, apenas tentava disfarçar o que aquilo me causava.
Klaus me contara por cima sobre a conversa que tivera com o pai, a
respeito do casamento. Pela forma que deixou claro, Dominic entendera

perfeitamente, e até mesmo, apoiou a decisão do filho. Previamente, ele


conseguira adiantar a tal data do casamento, para dali seis meses, em vez
de três como era previamente planejado. Mesmo assim, Klaus insistia em
me dizer para esquecer tal coisa. Que o tempo não era um problema, pois

já lutava pela quebra de contato.

Aquela decisão fez-me cair ainda mais por ele.

— Sempre tão impaciente? — brincou em meu pescoço e apenas


me limitei a olhá-lo de relance.

— Devia discutir isso com meus pais, que estão me deixando


louca. — comentei e ele franziu o cenho. — Bom, depois que contei sobre
nós, eles estão a ponto de me enlouquecer para que vá lá em casa jantar.

— Eles não pareciam ser típicos dessa maneira.

— E não são. — concordei, já angustiada com a insistência deles.


— Eles apenas são preocupados demais, e existe todo um porquê por conta
do casamento.

— Eu sei que as coisas, financeiramente falando, não estão boas na


empresa deles. — Klaus comentou, surpreendendo-me. — Jamais te
julguei por concordar com a ideia do casamento, até mesmo, quando Paul
era o escolhido. Sempre imaginei que algo a obrigava, de forma indireta.

— Bom, deve saber mais das finanças de meus pais do que eu. Não

consigo entender nada daqueles números. — dei de ombros. — Mas é real,


meus pais sofreram um golpe de dentro e bom... O casamento era a
solução. Minha mãe queria quebrar o contrato, mas não tínhamos...

— Ei! — Klaus tocou meus lábios. — Esqueça isso! É passado,

certo?

Suspirei fundo. Ele estava completamente certo.

— Sim, apenas estou me apavorando um pouco. — revirei os


olhos. — Meus pais acham que estou nessa para tranquilizá-los e por isso
te querem lá em casa. Não sei porque diabos ainda moro com eles. —
murmurei, e Klaus gargalhou.

— Porque os ama, e imagino que fique inspirada lá.

Klaus era tão fofo que poderia quebrar sua cara por isso.

— June!

Um grito fez meus pensamentos se dissiparem, e olhei para frente.


Patrice corria feito uma doida com sua mala de rodinhas cor de rosa. Tão
típico dela. Uma Barbie confusa com suas roupas da mesma cor. Ela era
tão autêntica que sorri para seu jeito meio perdido.

— Ela parece uma Barbie.


O comentário de Klaus me fez gargalhar e dei um passo à frente,
abrindo os braços para minha amiga maluca. Patrice praticamente se jogou

em meu colo e se não fosse Klaus como uma parede atrás, estaríamos no
chão.

— Que saudade! — praticamente gritou e segurou meu rosto com


as duas mãos, como se me analisasse.

Patrice era apenas um ano mais velha, porém agia como se tivesse
dez. Ela então me deu um beijo estalado na boca e se virou para Klaus, que
assistia a cena sorrindo.

— Ele é ainda mais bonito quando sorri. — Pat comentou num


sussurro, que não soou tão baixo assim.

— Obrigado. — Klaus falou, e ela ficou completamente vermelha.


Gargalhei da cena.

Ele lhe estendeu a mão, porém Pat, como uma boa mulher

intimidativa o puxou para um abraço e dois beijos no rosto.

— Sou Patrícia, mas pode me chamar de Patrice como todo mundo.


— apresentou-se.

— Eu me lembro de você. — Pat sorriu abertamente para ele e


piscou um olho para mim. — Mas é um prazer revê-la.

— Ah, um cavalheiro. — suspirou alto.


— Deixe ao menos o namorado da sua amiga em paz.

A voz de Troian acertou a todos como um trovão e Pat fechou a

cara. Encarei seu primo e sorri da cara emburrada. Troian claramente se


incomodou com a forma que Pat cumprimentou Klaus, o que não era uma
surpresa. Ele odiava qualquer contato que Pat tinha com outros homens.
Ela afirmava que ele era apenas superprotetor, assim como sua irmã

Bailey, porém, suspeitava da real razão. Os sentimentos de Troian por


Patrice não eram nada fraternais.

— Não seja um pé no saco, garoto. — impliquei, e ele parou a


minha frente com um lindo sorriso, abraçando-me.

Ele era dois anos mais novo que eu, mesmo assim, sua altura, o
cabelo loiro comprido e barba por fazer, contribuíam para parecer mais
velho.

— Ele ainda é um bebê. — Patrice provocou, e gargalhei,

afastando-me de Troian.

— Como você aguenta essa senhora? — Troian perguntou, porém


logo seu olhar encontrou o de Klaus, que assistia a cena com um leve
sorriso. — E aí, cara? Klaus, certo?

— Sim. — Klaus estendeu-lhe a mão e apertou a dele. — Troian,


não é?
— É. — deu seu sorriso meio perdido e se virou para mim. —
Patrice não cansou de me dizer o quanto estava feliz por você. Agora me

conta, desde quando está namorando?

Olhei para Klaus no mesmo instante e ele acenou com a cabeça,


com aquele lindo sorriso que alcançava seus olhos azuis. Sequer tínhamos
nos rotulado, era algo que realmente não importava. Além de que

completavam apenas cinco dias desde aquela noite no apartamento.

— Para de importunar os dois, bebê. — Patrice se pronunciou e


segurei a risada da cara mortal que Troian fez para ela. — Eu estou com
fome, June.

Klaus a encarou um pouco perdido, com toda certeza tentando


entender o apelido.

— Você pode ser o Johnny, quem sabe? — ela deixou a pergunta


no ar e deu de ombros, pegando a mala de rodinhas. — Vamos?

Apenas assenti e fui até Klaus, que logo enlaçou minha cintura. De
relance notei que Pat discutia algo com Troian, sobre o que comeriam. Os
dois não tinham jeito.

— Ela é tão animada quanto me contou. — Klaus falou, e sorri


para ele, assentindo. — Ficarei feliz em passar no teste de ser o seu Johnny
Cash.
Encarei-o por um segundo e fiquei sem palavras. Klaus parecia
conseguir pegar tudo no ar. Em momento algum comentei a respeito do

apelido que minha amiga costumava me chamar. Porém, em poucos


minutos perto, ele entendeu. Cada dia, uma nova surpresa.

— Ai, o amor é lindo! — Patrice praticamente gritou, tirando-nos


de nossa bolha. — Mas vou roubar minha amiga um pouquinho.

Ela então me puxou pelo braço e praticamente me obrigou a seguir


seu ritmo.

— Pode começar abrindo essa boca grande. — falou, e a encarei


com um ar de mistério. — Nem vem com essa cara. Quero saber todos os
detalhes!

Enlacei o braço de minha amiga e segui ao seu lado até o carro de


Klaus, que fizera questão de me trazer. Durante o caminho até ele, comecei
a contar os últimos dias para minha amiga, que mesmo já tendo uma

grande noção, suspirou feito uma adolescente. Naquele instante,


finalmente notei que o amor sorria para mim. De algum jeito, torcia para
que ele permanecesse. E que Patrice encontrasse o seu.
— Sério que não vai convidá-la para o Brasil? — Paul perguntou,
enquanto tentava me acertar.

Meu irmão até podia tentar, mas era péssimo no boxe. Desviei com
facilidade do golpe e lhe dei um cruzado. Paul reclamou e logo caiu de
joelhos. Sorri da cena e fui até a garrafinha de água, bebendo um longo
gole.

— A melhor amiga dela chegou na cidade, e pelo que sei, faz muito
tempo que Patrice não tem férias. — comentei, e bebi mais um pouco.

Paul se estirou no tatame e ficou ali parado, olhando para o teto.


Estávamos encharcados pelo suor.

— Acho que me lembro dessa Patrice. — ficou em silêncio por


alguns segundos. — Não sei o que Diana fará com as passagens no fim. —
comentou.

— Por que vocês não vão? — sugeri, e o olhar de meu irmão


encontrou o meu.

Ele suspirou fundo e pareceu pensar em algo. Senti naquele


instante que Paul me escondia algo. Eu o conhecia por toda vida, não tinha
como me enganar.

— Digamos que as coisas entre Diana e eu não estão indo bem. —


confessou e me senti mal por ele. Ao contrário deles, as coisas com Lia
estavam melhores do que nunca. — Relacionamentos são complicados,
irmão. E com Diana, tem sido minha primeira vez na maioria das coisas.

Ou seja, tenho me ferrado. Mas não vamos falar sobre os meus


problemas... — o encarei contrariado. — Não hoje! — pontuou, e assenti.
Cada um tem seu tempo para conseguir falar. — Papai me chamou na sala
dele esses dias, perguntou minha opinião sobre sua decisão no casamento.

— Sabia que ele o faria. — sentei-me no tatame, ainda com a


garrafa d’água em mãos. — Ele não consegue se conter. — comentei com
pesar.

— Ele está preocupado, Klaus. O valor da rescisão do contrato é

alto, basicamente o seu apartamento e mais alguns imóveis. — assenti,


pois já estava familiarizado com tudo aquilo.

— Na pior das hipóteses, meu quarto na casa dele continua lá. —


forcei um sorriso, e Paul me encarou preocupado. — E digo mais, não é
como se estivesse perdendo tudo. Já vou dar a entrada num novo
apartamento, com um preço menor, para poder me estabilizar.
— Você sempre pensa a frente. — Paul elogiou e fiquei feliz por
receber aquilo de meu irmão. — Sempre preferiu sua independência.

Lembro bem quando nosso pai quis nos dar um apartamento, e você negou.
Até hoje ele é meu! — gargalhou alto e tive que sorrir.

Nunca condenei meu irmão por sua forma de levar a vida. Paul
trabalhava muito e sempre se esforçou bastante para ser um ótimo

administrador na empresa. Ele fizera faculdade daquilo apenas para poder


agradar nosso pai, o contrário de mim. Paul sucumbiu seus próprios
sonhos, pela união de nossa família.

— Somos diferentes, irmão.

— Aliás, encontrei algumas coisas sobre a mamãe esses dias. —


Paul e sua forma não sútil de tocar nos assuntos e mudá-los. — Fico
imaginando o quanto ela bateria na gente por sermos péssimos com as
mulheres.

— Diga por você. — provoquei e ele se sentou, encarando-me com


desdém. — Fui um idiota com Lia, mas estou me redimindo. Você foi um
babaca com todas as mulheres que esteve, Paul.

— Eu sou um anjo. — refutou, e tive que revirar os olhos. Meu


irmão poderia ser comediante. — Mas é sério, as vezes paro e fico me
perguntando sobre ela.
E ali estava o real motivo de meu irmão querer treinar naquela
noite. Algo o atormentava. Paul geralmente não tocava no assunto, ainda

mais, pela forma como perdemos nossa mãe. Eu sequer me lembrava, pois
tinha apenas dois anos quando ela faleceu. Porém, Paul claramente sentia
falta daquela ligação com ela, e era como se precisasse de sua permissão
para algo. O câncer a tirou de nós, e infelizmente, mesmo após tantos anos,

a saudade ainda nos rodeava. Principalmente a ele.

— Ela foi uma guerreira, irmão. Não me lembro de quase nada,


mas sempre que vejo fotos dela, sinto algo que não sei explicar.

De repente, Paul se levantou e passou as mãos sobre os olhos. Ele


parecia atormentado, mas não só por conta de nossa mãe. Algo dentro dele
parecia uma bagunça.

— Quer conversar? — ofereci-me e ele negou veemente.

— Só precisava falar dela para alguém. — deu de ombros. —

Preciso ir. — lá estava Paul, fugindo de seus sentimentos. — Vou


conversar com nosso pai e tentar deixá-lo mais tranquilo.

— Não se incomode com isso. — pedi, e me levantei, indo atrás


dele.

Estávamos na sala de treinos de meu apartamento, onde geralmente


treinava. Não era muito fã de academias, devido a forma como depositava
toda minha raiva durante treinos. Porém, ao menos uma vez na semana,

frequentava um clube na cidade, onde treinava com caras durões, e os

quais, me colocava em um novo desafio. Aquilo fazia qualquer raiva se


dissipar.

— Até mais, irmão! — Paul falou, pegando sua bolsa jogada em


meu sofá, e abrindo a porta do apartamento.

Ele sequer me deu tempo para impedi-lo.

— Ei, cunhada! — a voz de Paul suavizou, e encarei a porta


intrigado. — Te daria um beijo no rosto, porém, estou todo suado. Prometo
compensar na próxima vez!

Logo ele passou por quem estava a sua frente, e meu coração
disparou. Um sorriso idiota se abriu em meu rosto sem que pudesse evitar.
Lia sorria para meu irmão, e deu um leve aceno para o mesmo. Ela deu um
passo à frente e sorriu em minha direção. Aquilo me desmontou.

— Ah. — voltei meu olhar para a voz de meu irmão. — Divirtam-


se com proteção! — Paul gritou e puxou a porta.

Sorri de sua fala e Lia gargalhou, vindo até mim.

— Ei, baby.

O sorriso em meu rosto apenas aumentou diante do carinho em sua


voz e o doce apelido.
— Estou todo suado. — avisei, porém suas pequenas mãos tocaram
meu peito.

Senti meu corpo todo corresponder ao seu simples toque. A


adrenalina voltando a percorrer cada extremo. Lia me tinha em suas mãos.

— Não me importo.

Surpreendendo-me seus lábios encontraram os meus. Não entendi

ao certo o que ela fazia ali, porém, aceitei de bom grado. Senti que em seu
toque, algo estava diferente. Quando ela se afastou, notei seus olhos
dilatados. Aquele desejo tão aparente já me acertou antes, durante todos os
momentos que compartilhamos. Porém, ela decidira algo, conseguia sentir,
apenas por olhá-la. Cinco dias ao seu lado, que pareciam como cinco anos,
ao mesmo tempo como cinco segundos.

Eu era completamente louco por aquela mulher.


Capítulo 13

“Amor… Amizade… Confusão… Nós.”[19]

— Como assim vocês ainda não transaram? — Patrice pareceu


incrédula.

— Nem todo mundo transa com qualquer cara que lhe sorri. —

Troian provocou, e vi o rosto de Patrice se transformar. Ela não aceitou


como uma brincadeira, pois ninguém em sã consciência aceitaria. — Pat,
eu...

— Sou muito feliz transando com quem eu quero, obrigada por


ressaltar isso. — ela rebateu, e Troian simplesmente se calou, saindo em
seguida do apartamento. — Ele parece ter quinze anos.
— E está apaixonado por você. — constatei o óbvio e Patrice
engasgou com o refrigerante. — O que? Não me diz que não notou?

Ela se acalmou e revirou os olhos em seguida.

— Nem vem querendo mudar de assunto. — falou decidida. — O


que anda te impedindo de ceder ao desejo que sente por ele?

— Insegurança, talvez? — questionei alto, porém, era uma

conversa mais interna.

Nem eu mesma sabia porque ainda fugia de Klaus. Não que de fato
fosse uma fuga, porém, a rapidez de tudo entre nós me assustou. Era como
se fossemos destinados aquilo. Entretanto, temia que minha mente de
autora estivesse sonhando demais.

— Quis transar com ele desde o momento que ele apareceu no


meio da minha sala de estar. — confessei. — Mas não sei como
simplesmente me apaixonei em tão pouco tempo e...

— Você nunca deixou de gostar dele. — Pat retrucou. — Por mais


que tentasse odiá-lo, você nunca conseguiu. Agora que me contou sobre o
que realmente te atingiu, a conversa dele com Paul. E mais, o fato de ele
sequer lembrar daquele primeiro beijo... Lia, o que realmente tem te
parado?

— Ser virgem aos vinte e cinco anos não é algo muito comum. —
comentei, e Pat assentiu. — Por que, dentre tantos caras que me agarrei
durante todos esses anos, justamente Klaus é o que me faz querer seguir

em frente?

— Porque mesmo sendo uma mulher independente, linda e cheia


de si, você ainda tem um coração mole que bate nem que for um
pouquinho por ele... E mais, todo seu corpo o reconhece. Quer algo mais

perfeito do que ter sua primeira vez com o cara que ama?

— Eu não o...

— Ah, nem vem! — cortou-me rapidamente. — Nem vem com


essa de que amor é uma coisa e atração é outra. No caso seu e de Klaus tá
tudo junto e misturado!

— Nessas horas tenho certeza de que você devia escrever, não eu.
— encostei a cabeça contra o sofá, em meio a um sorriso.

— Deus me livre! — fez o sinal da cruz e tive que gargalhar. —

Estou muito bem como empresária, obrigada!

— Ok, senhora das exatas. — provoquei e ela bufou. — Mas agora


que chegou aqui, quero passar um tempo com você e...

— Que tempo o que, mulher? — Pat revirou os olhos, e se


levantou. — O que realmente quer fazer essa noite, June?

Pensei um pouco a respeito e me lembrei de como cada dia ao lado


de Klaus se transformava. E mais, como cada vez mais ele parecia ter
cuidado ao me tocar. Queria despertar algo nele, algo como ele fazia por

mim. Mas como? Eu o desejava, e o queria como meu. Por completo.

— Dar para o homem, eu sei! — arregalei os olhos e gargalhei de


Patrice. Ela não tinha papas na língua. — Olha aqui, podemos dizer que
quer “fazer amor” com ele. Por que diabos não vai lá e faz?

— Simples assim? — perguntei e ela assentiu.

— Ao menos, quando se envolve algum sentimento... Sexo é


conexão, June. — analisei-a, e vi que divagou para algum lugar longe dali.
— Se esperou tanto tempo por alguém e finalmente o encontrou, por que
não dar o primeiro passo? Não quero te pressionar sobre nada. — avisou
pausadamente. — Mas eu vi a forma como olhou para ele, e como ele te
olha. Sexo apenas trará mais a relação de vocês.

— Parece até que estamos discutindo algum problema sério. —

brinquei e ela me encarou carrancuda. — Desculpe, eu só estou reticente


porquê...

— Tem andando ouvindo muito Dua Lipa.[20] — a encarei sem

entender. — As novas regras... — fez um três com as mãos. — “Se você

estiver debaixo dele, você não vai superá-lo!” [21].

Gargalhei alto diante dos pensamentos de minha amiga. Por


aquelas e outras, Patrice era a melhor.

— Eu te amo, Pat!

Levantei e a puxei para um abraço, o qual ela adorou. Não era


muito de demonstrações de carinho, mas Pat conseguia despertar aquele
lado meu.

— Eu sei disso. — afastou-se e tocou meu rosto. — E o que vai

fazer hoje? — perguntou, claramente interessada.

— Noite das meninas?

— Que nada! — murmurou. — Eu vou descansar dessa viagem,


pois mereço. E a senhorita pode tratar de ir até o apartamento do seu
homem, passar um tempo com ele e...

— Foder?

Foi a vez de Patrice arregalar os olhos e gargalhar. Ela me deu um


tapa no ombro e sorriu em seguida. Aquela amizade era única. Era bom ter

Pat por perto.

Horas mais tarde, depois de Patrice praticamente me escorraçar de


seu apartamento, encontrei-me com uma grande bolsa no braço, de frente
ao apartamento de Klaus. Quando me visse, ele sequer saberia o que
realmente planejava sobre aquela noite. E mais, ele sequer sabia que viria.

Seria uma pequena surpresa e quem sabe, algo mais.

Quando mais nova, imaginei por muitas vezes como seria minha

primeira vez. Lembrava-me bem de como Klaus permaneceu no topo da

lista de desejados por um longo tempo. Claro, que quando conheci Sam

Hunt[22] as coisas mudaram um pouco, mas não perdurou. Naquele

instante, nem mesmo se Hunt aparecesse a minha frente cantando Take

Our Time[23], eu cederia. Klaus Russel era o homem que me despertava.

Assim que fui tocar a campainha, a porta se abriu. Arregalei os


olhos diante de Paul, que estava completamente suado e com uma mochila
em mãos. Arqueei a sobrancelha e ele sorriu em minha direção.

— Ei, cunhada! Te daria um beijo no rosto, porém, estou todo


suado. Prometo compensar na próxima vez!

Sorri de sua fala e logo ele passou por mim, e acabei lhe dando um
leve aceno. Voltei meu olhar para o interior do apartamento e um sorriso
bobo tomou forma em meu rosto. Se existia alguma dúvida a respeito de
querê-lo, morrera naquele instante. Comecei a andar em sua direção, sem
sequer me importar com algo.

— Ah. Divirtam-se com proteção! — Paul gritou e encarei

rapidamente seu semblante, que logo foi substituído pela porta.

Gargalhei dele e dei mais alguns passos, até alcançar o homem que
me encantara.

— Ei, baby.

O sorriso em seu rosto parecia um reflexo do meu, tinha certeza.


Analisei-o por completo e o ar me faltou. Pois não era algo apenas de pele,
era ele. Não era o fato do corpo musculoso e bem distribuído, nem mesmo
qualquer atributo físico. Não era apenas atração. Era o sorriso lindo que
emoldurava o seu rosto, que contrastava com todo resto que ele mostrava.
Klaus poderia parecer e ser um grande empresário de sucesso, destemido e
imponente para o mundo lá fora. Para mim, ele era apenas um homem
lindo com os olhos azuis tão transparentes, quanto suas palavras.

Eu o amava.

— Estou todo suado. — avisou, porém não me importei.

Coloquei minhas mãos sobre seu peito e senti aquela energia


gostosa percorrer todo meu corpo. Era eletrizante e satisfatório. Só podia
me imaginar como seria quando finalmente tivesse seu corpo no meu.

— Não me importo.
Dei-lhe um ultimato e puxei seu pescoço para o meu. Nossos lábios
se uniram, e aquele beijo me marcara. Era como se finalmente estivesse

entregue para o passo que viria. Meu ideal daquela noite não era chegar e
levá-lo para cama. Era testar meus limites para com ele. Naquele instante
eu tive certeza. Não sairia dali antes de ter cada pecadinho de seu corpo.

Afastei-me dele sem vontade e notei o quanto me analisava. Klaus

parecia me ler claramente. Ao menos, se o fizesse corretamente, saberia


que estávamos na mesma página.

— Vou tomar um banho e volto pra você. — deu-me um leve beijo


e se afastou, indo em direção ao quarto.

Assim que desapareceu de minha vista fui até o banheiro social e


me tranquei. Coloquei a grande bolsa sobre a bancada e encarei a lingerie
que separei para aquele momento. Era uma mulher corajosa, ao menos até
alguns momentos atrás. Tirei toda minha roupa e vesti a lingerie na cor

branca. Encarei-me no espelho e após completar com o salto, senti-me


completamente sexy. Era uma virgem, mas queria seduzi-lo. A lingerie
branca de renda moldara todo meu corpo, deixando grande parte exposta.
Sorri, lembrando da cena de um dos meus livros, onde a protagonista
seduziu o mocinho não tão mocinho assim com uma dança.

Aquela era a ideia da noite.


Coloquei o robe branco de cetim e o amarrei levemente, deixando
uma grande parte de meu lado esquerdo à mostra, o que claramente queria

que ele visse. Respirei fundo algumas vezes e saí do banheiro. Andar de
salto nunca pareceu tão complicado como naquele instante. Selecionei a
playlist que me interessava e coloquei na caixa de som em seu quarto. O
lugar era amplo o suficiente para que pudesse fazer o que imaginei.

Olhei para a sua cama, com os lençóis bagunçados e imaginei o que


aconteceria depois. Aquela expectativa estava a ponto de me matar. A
música soou alto e resolvi esperá-lo em pé ao lado da cama. Ele teria uma
visão e tanto quando saísse do banheiro. Minutos se passaram, e quando
imaginei que ele sairia, já que não ouvira mais o barulho do chuveiro.
Apenas a sua reclamação alta me deixou em alerta, fazendo meu coração
disparar não pela ansiedade, mas sim, pela preocupação.

— Porra! — ouvi seu grito e arregalei os olhos.

Sem pensar muito fui até o banheiro rapidamente a abri a porta.


Meus olhos encontraram os seus e Klaus pareceu perder a fala. Ele
segurava algo na mão direita, o que logo notei ser um barbeador elétrico, e
o tirei rapidamente dali.

— Está tudo bem? — perguntei preocupada e ele não falou nada,


apenas me encarou. — Klaus!? Ei!
— Eu acho que estou sonhando. — falou, engolindo em seco e me
olhando de cima abaixo.

Só então me lembrei de como entrara no banheiro e mais, a música


que cercava todo o ambiente. Klaus tinha apenas uma toalha enrolada em
seu quadril, e gotas de água escorriam por seu peito desnudo. Naquele
instante, ao olhá-lo com maior atenção e pela forma como a toalha

emoldurava seu corpo, notei o quanto ele estava excitado. Apenas de me


olhar. Sem sequer me tocar.

Não era preciso seduzi-lo com alguma dança ou algo qualquer.


Aquele olhar lascivo me ganhara e não pensei em mais nada, o beijei.

Klaus correspondeu na mesma fome, e logo minhas costas bateram


contra a parede do banheiro. Senti o contraste gritante de seu corpo quente
e o azulejo frio. Porém, não durou muito tempo. As mãos de Klaus
desceram para minha bunda, levantando-me. Logo, estava com as pernas

cruzadas em suas costas, e era devorada da forma mais perversa por sua
boca. Jurava que morreria caso ele se afastasse.

Senti que nos movemos, e logo meu corpo caiu sobre algo macio.
O corpo de Klaus pairou sobre o meu, e notei seus olhos azuis num tom
mais escuro. Nunca o vira mais sexy como naquele instante. Puxei-o para
meu corpo e ele veio de bom grado. Nossas línguas se encontraram e senti
aquele arrepio gostoso percorrer todo meu corpo, assim como suas mãos o
faziam.

As mãos de Klaus exploravam cada pedacinho de meu corpo, assim

como as minhas passeavam por todo o seu. Não saberia o que dizer, as
palavras pareciam presas em minha garganta. Apenas gemidos saíam por
entre meus lábios sendo abafados pelos beijos mais indecentes.

— Você não tem ideia do que me causa, Lia.

Sua voz rouca me atingiu em cheio, e no mesmo instante em que


parou para me olhar, levei minhas mãos até a toalha em seu quadril,
tirando-a. Vê-lo nu e a forma como o deixava, fez todo meu corpo
implorar ainda mais por aquele momento. Entendi, finalmente, porque
nenhum outro homem me causara tal vontade. Porque era ele, o qual
realmente necessitava.

— Você tem certeza? — perguntou, e suas mãos habilidosas me


ajudaram a retirar o robe, assim como, os saltos.

— Claro que sim. — respondi, e me sentei a sua frente, levando as


mãos até os laços da lingerie, fazendo-a cair sobre meu corpo, deixando-
me praticamente nua.

Klaus me encarou admirado e a meia luz do quarto não atrapalhou


em nada a visão de nossos corpos. A música a fundo atiçou ainda mais

cada pequeno nervo de meu corpo. Crazy In Love[24] emoldurava aquele


momento. Afastei-me o suficiente para retirar por completo a lingerie e

Klaus soltou praticamente um rosnado, como se aprovasse por completo

meu corpo.

Não era perfeita, nem de longe. Minhas cicatrizes eram visíveis na


barriga, assim como em meus pulsos. Parte da história de uma garota
perdida diante das maldades do mundo. Porém, Klaus nunca me olhara de

forma diferente. Gorda ou magra, alta ou baixa, ele apenas me via.


Naquele instante, reafirmei tal coisa.

Deitei-me novamente na cama e o puxei. O breve contato de nossos


corpos, fez-me derreter ainda mais. A boca de Klaus encontrou meu
pescoço, e ao mesmo tempo em que a música no tom sensual dizia
“Quando você vai embora, te imploro para ficar”, Klaus se afastou,
fazendo-me choramingar. Sem perder muito tempo, e entendendo meu
desespero, sua boca traçou beijos por todo meu corpo, fazendo-me suspirar

a cada toque.

Quando ele finalmente alcançou seu objetivo, senti um gemido


rouco escapar de sua garganta, como se aprovasse toda minha excitação.
Porém, ele queria mais. Seu toque era perfeito, assim como o encontro de
sua língua nos lugares certos, na pressão que me levara as alturas. Segurei
com força em seu cabelo, e nossos olhares se conectaram. Não tinha mais
como fugir, ele me faria ver estrelas. E ele fez. Sem aguentar mais, rendi-
me ao êxtase, chamando seu nome como um pedido claro de “mais”.

Klaus subiu por meu corpo, espalhando os beijos por todo caminho,

com uma atenção especial em meus seios. Arqueei-me por completa,


mesmo já tendo chegado ao ápice, sentia-me ainda mais necessitada por
ele. Por seu corpo no meu. Sua boca encontrou a minha e ao sentir meu
gosto em seus lábios, soube que nada entre nós poderia ser mais

pecaminoso. Senti como ele se segurava, ao notar os braços prostrados ao


meu lado, que tremiam levemente.

Sorri de lado e me inclinei para beijá-lo.

— Preciso te confessar algo. — falei, sentindo seu toque sobre meu


rosto, e sua atenção por completa em mim.

— O que, meu amor?

Aquele tom. Aquelas palavrinhas. Klaus era o protagonista perfeito


de qualquer livro de romance. Felizmente, para mim, ele era real. A parte

mais bonita daquela realidade.

— Sou sua. — confessei, sem saber ao certo como dizer de outra


forma.

Klaus me encarou por alguns instantes e logo encostou nossas


testas.

— Sou seu, amor. — olhou-me nos olhos. — Apenas seu.


Assim, ele se posicionou em minha entrada, e aos poucos começara
a tomar conta de meu corpo. Como ele mesmo disse, quando estivesse com

ele, nada além de nós importaria. Era exatamente o que acontecia. Ele
entrelaçou nossos dedos e me analisou com cuidado, forçando um pouco
mais.

— Me perdoe. — falou, e um segundo depois senti meu corpo

retesar, ao mesmo tempo em que me entregava por completo a ele.

A dor me atingiu e senti meus olhos encherem de lágrimas. Klaus


parou no mesmo instante e então uma de suas mãos tocou meu rosto com
carinho. Seus lábios desceram para os meus e aos poucos, senti meu corpo
aceitar a invasão, assim como, o prazer começar a se construir.

De repente, senti-me imersa em tal plenitude que não sabia


explicar. O corpo de Klaus encontrava o meu de tal forma que parecia
querer me tomar por completo. E ele o fazia. Soltei de suas mãos e

arranhei por completo suas costas, sentindo que aquilo o estimulou ainda
mais. O ritmo lento fora substituído por algo rápido e colossal, a cada
encontro de nossos corpos, sentia-me mais perto de cair.

— Porra!

Suas palavras me atiçavam, mesmo que ele mal conseguisse falar,


assim como eu, que parecia apenas me perder em seu corpo. Porém, queria
tudo dele. Tudo o que aquele momento poderia me proporcionar.

— Eu te amo. — confessou, encarando-me com afinco.

Nossas testas estavam juntas, e nossos corpos desconheciam os


limites. Senti meu corpo inteiro se arrepiar e tentei corresponder a seus
sentimentos. Porém, assim que o êxtase me encontrou, pela segunda vez
naquela noite, de forma ainda mais transcendental, permiti-me cair por

completo por aquele homem. Meu grito foi alto, assim como a forma que
Klaus confessou seu amor novamente, derramando-se dentro de mim.

Minha respiração estava irregular e a todo custo, tentei me


reencontrar. Se me perguntassem em que planeta vivia, não saberia
responder. Os lábios de Klaus encontraram os meus, no mesmo instante
em que o senti sair de dentro de mim. Assim que se afastou, nossos olhares
se conectaram e um sorriso lindo e preguiçoso emoldurou seu belo rosto.

— Eu te amo, Lia. — confessou mais uma vez, mas não me deu

tempo de resposta, beijando-me novamente.

Não existiam mais dúvidas, nada que pudesse interferir. Klaus era
meu, assim como eu era completamente dele.
Senti um leve movimento ao meu lado, e acabei abrindo os olhos.

Devagar, acostumei-me com a luz que adentrava o quarto, e tocava parte


do corpo da mulher que dormia serenamente. Com todo cuidado, toquei de
leve seus cabelos, e a aconcheguei mais a meu peito. Lia me abraçava
como se fosse um grande travesseiro, e não tinha do que reclamar.

Fechei os olhos novamente e divaguei a respeito do que aconteceu


em minha cama. Sorri abertamente, porque ter Lia como minha, por
completo, era algo que desejara há muitos anos. Não poderia mentir que
me surpreendi pelo fato de ser o seu primeiro, Lia era uma mulher

completamente sexy e destemida, a vi em várias festas agarrada a outros


caras, porém, nunca a condenaria por nada daquilo. Porém, a partir do
momento que ela se entregara, a única coisa que realmente me importava
era ser seu último homem.

— Espero que esse sorriso tenha nome e sobrenome. — sua voz um


pouco enrolada por causa do sono me atingiu e abri os olhos. — Lia
Harper.
— Possessiva? — perguntei, baixando levemente meus lábios para
seu pescoço.

— Tirando que todas as mulheres te encaram como se pudessem te


comer vivo, sou apenas cuidadosa. — reclamou e abriu um sorriso de
menina em seguida. — Bom dia, baby.

— Bom dia, amor. — me deu um leve beijo nos lábios e sorriu

diante de sua aprovação para forma que a chamei.

— Sinto como se um trem tivesse passado por cima de mim. —


espreguiçou-se longamente. — Isso é ser bem fodida?

Gargalhei de sua pergunta e a puxei de volta para meus braços.

— Se quiser chamar assim. — toquei levemente seu rosto. — Só


tenha certeza que nunca será apenas uma foda pra mim, Lia. — ressaltei,
deixando todo meu ser a sua disposição.

— Eu quis tanto te odiar por todos esses anos, mas aí você abre

essa linda boca e me faz apaixonar. — mordeu de leve meu queixo,


deixando-me estático. — O que faço com você?

Puxei-a com cuidado para cima de meu corpo, a qual se escorou


com o braço sobre meu peito.

— Me ame?

Os olhos de Lia amoleceram e ela se esgueirou sobre meu rosto,


deixando um leve beijo onde mordeu.

— Acho que te surpreendi. — comentou e assenti, pois não queria

nenhuma mentira entre nós. — Ainda mais com todos aqueles boatos sobre
mim rodando por aí, e até mesmo, meu jeito sexy.

— Nunca dei crédito a nada que ouvi. A realidade seria mais sobre
me sentir um imbecil por não poder te tocar. — ela sorriu genuinamente e

assentiu. — E não mudaria nada nesse seu jeito. É único e completamente


seu, Lia.

— É por isso que me apaixonei por você, Klaus. — tocou meu


rosto, e depositou a outra mão sobre meu peito, onde meu coração batia
freneticamente. — Nunca me olhou como se me julgasse. Hoje vejo que
existia muito mais sobre o cara pelo qual me apaixonei aos quinze anos. E
pior, ele me fez cair novamente.

Puxei uma de suas mãos até meus lábios e dei um leve beijo. Lia

acompanhou todos meus movimentos e parecia completamente relaxada.

— Ninguém nunca me fez sentir como você faz. — confessou e me


senti o cara mais sortudo do planeta.

A mulher que amava sobre meu corpo, após uma noite inesquecível
onde se entregou para mim, declarava seu amor sem medo ou pudor. O que
mais eu podia querer?
— E você, sempre foi e sempre será única para mim. — puxei seu
rosto para o meu, ficando a mínima distância. — Eu te amo, Lia.

Nos beijamos e permanecemos naquele momento apenas nosso. O


mundo fora daquele apartamento esquecido e todos os problemas deixados
de lado. Depois de tanto tempo, finalmente reencontrei o amor que perdi.
Capítulo 14

“Então, não vai ser fácil. Vai ser muito difícil; nós vamos ter que trabalhar isso todos os
dias, mas eu quero fazer isso porque eu quero você. Eu quero tudo de você, para

sempre, todos os dias. Você e eu … todos os dias.”[25]

— Ele tocou no assunto do Brasil? — Diana perguntou e neguei


com a cabeça, sentando-me no sofá, com uma taça de vinho em mãos.

— Brasil?

— Bom, obriguei Klaus a marcar essa viagem comigo. É apenas


uma semana fora do país, mas seria para ele desocupar a cabeça. —
comentou e notei que ela me escondia algo. — Não me olhe assim! —
revirei os olhos, pois ela era realmente esperta. — Enfim, íamos nós dois.
Mas sugeri que ele te convidasse, para passarem esse tempo juntos.

— Ah, ele comentou bem por cima. — falei, minha memória


finalmente dando sinal de vida, e tentei pensar se esqueci algo mais a
respeito. — Mas com Patrice na cidade, achamos melhor deixar a viagem

para outro momento.

Ele era atencioso e me entendia por completo.

— O que acredito ser uma pena. Já que o seu novo best-seller terá
com uma protagonista de lá. — sorri de sua positividade.

A realidade era que cada lançamento era uma verdadeira caixinha


de surpresas. Não poderia reclamar de meu retorno financeiro, dos leitores
incríveis e da felicidade de poder viver do que realmente amava.
Entretanto, as crises de ansiedade antes dos lançamentos sempre me
encontravam. Felizmente, ainda faltavam alguns meses até o próximo livro
ser lançado.

Bebi mais um pouco do vinho e encarei Diana, que bufou diante de


uma mensagem no celular.

— Paul. — declarou, e revirou os olhos. — Quer me encontrar


agora. Acredita?

— Qual o problema? — perguntei, um pouco perdida.

Diana andava um pouco estranha, e era algo que comentara com


Klaus. Ele também desconfiava de algo errado entre ela e Paul.

— O problema é que quero passar um tempo longe de problemas...


— fechou a boca rapidamente, como se dissesse algo que não deveria. —
Enfim, problemas são boa parte do repertório de Paul.

Assenti, completamente desconfiada.

— Vou encontrá-lo no restaurante aqui perto. — anunciou,


claramente a contragosto.

Estava em minha casa, e combinei de passar um tempo com Diana,

simplesmente fazendo nada. Patrice foi convidada, mas algum incidente


com Troian a impediu de aparecer. Seria bom juntar esse laço de amizade.

— Vai logo. — provoquei e ela bufou.

— Ok, volto em dez... quer dizer, vinte minutinhos no máximo. —


declarou e assenti.

Levantei-me e fui até a porta, abrindo para ela. Assim que Diana
saiu com um sorriso forçado no rosto, algo dentro de mim acusou. O que
ela poderia estar escondendo? Algo parecia não se encaixar.

Suspirei fundo e tentei não entrar em alguma paranoia. Voltei até


minha posição original, e me sentei no sofá, com o celular e a taça de
vinho em mãos. Comecei a ler as últimas mensagens de Klaus e meu
coração bateu freneticamente. Ele parecia tão certo, que as vezes, sentia
que algo daria errado. Em algum momento do percurso.

Bebi o resto de meu vinho, e fui até a cozinha. Deixei a taça sobre a
pia e lavei minhas mãos rapidamente. Diana e eu tínhamos pedido comida.
Olhei rapidamente para o balcão a frente, e notei um grande molho de

chaves, com chaveiros de vários personagens diferentes de Star Wars.


Franzi o cenho e o peguei em mãos, lembrando-me de Diana na hora.

Peguei o molho em mãos e segui para a sala. Com o celular já em


mãos disquei seu número, mas foi direto para caixa-postal. Encarei o

aparelho por alguns segundos e bufei. Ela voltaria? Dissera que sim.
Porém, minha vontade por doce era grande. Assim, uma pequena desculpa
a mais para sair de casa me forçaria a realmente andar. Depois de uma
noite sem dormir encarando o computador, e digitando toma minha
inspiração, meu corpo gritava por um pouco de açúcar.

Assim, peguei o molho de chaves, calcei meu tênis perto da porta, e


joguei a bolsa de sempre de lado. Saindo de casa em seguida. O caminho
até o restaurante mais próximo era de cinco minutos, basicamente. E já que

me imaginei comendo o maravilhoso Petit gâteau deles. Aproveitei o meio


tempo para responder à mensagem que Klaus mandara.

Remetente: Klaus

“Nos vemos amanhã, então?


Já sinto sua falta.”

Suspirei profundamente, pagando minha língua a respeito de como


teria um relacionamento. Sempre achei exagero demais a saudade que os
casais dividiam, entretanto, com Klaus, começara a aprender que parte de
mim ficava com ele toda vez que o deixava. Completavam-se mais de duas

semanas desde nossa conversa franca, e desde lá, as coisas apenas


melhoraram. Ainda mais, por não conseguir manter minhas mãos longe
dele, e vice-versa. Cada pequena parte minha implorava por ele, em todas
as questões.

Passei os dias dividida entre ele e Patrice, porém, dei prioridade


para minha amiga nos últimos, devido ao fato de que ela não ficaria por
muito tempo na cidade. Assim, ficar longe de seus braços ao dormir, fazia-
me sentir desesperada a ponto de não entender tal sentimento. Aquela coisa

boa que desperta a alma, e toca o coração durante uma breve conversa por
mensagem. Klaus me causava.

Destinatário: Klaus

“Amanhã =)
obs: sinto sua falta também”

Adentrei o restaurante sentindo-me brega e guardei o celular na


bolsa. Busquei com o olhar Diana e Paul, porém, não os encontrei no
térreo. Assim, decidi subir para o primeiro andar, um espaço mais
tranquilo do lugar. A cada degrau, minha cabeça viajava a respeito de

como as coisas seriam com Klaus. Encarei rapidamente a aliança em meu


dedo anelar direito, que Klaus pedira para que tirasse, que não era obrigada
a usar, mas que por algum motivo, apenas deixei ali. O que estava
fazendo?

Assim que pisei no piso superior, observei de longe Diana e Paul


numa mesa afastada. A passos rápidos cheguei até eles, digitando
rapidamente algumas mensagens de parceiros de meus livros. Porém,
quando dei um passo para mais perto, sem que eles me vissem, paralisei. A

frase que saíra da boca de Paul, deixando-me congelada no tempo.

— O combinado não era esse. — sua voz soou categórica. —


Somos apenas uma farsa para que Klaus não me visse casar com a mulher
que ele ama.

— Não estou pedindo seu amor, porra. — Diana rebateu. — Mas


enquanto acreditarem que somos um casal, não aceito que transe com
outras.

Busquei ar com força e engoli em seco. O que?

Minha boca secou e não conseguia sequer olhá-los, e ambos


continuaram sua discussão, como se perdidos em si mesmos. Não me
notaram ali, a cerca de três meses de distância, sentindo a ânsia tomar
conta de meu corpo. Minhas mãos suaram, e me virei, não querendo mais

ouvir. Era o suficiente.

— Ele e ela estão realmente juntos agora. — a voz de Paul soou


mais branda. — Por que estamos discutindo sobre isso?

Era real.

Refiz meu caminho de volta, e apenas respirei fundo quando


cheguei a calçada. Senti meu mundo girar e não sabia mais onde pararia.
Toda a incerteza a respeito de Klaus batendo em cheio. Não fora o destino,
muito menos alguma coincidência... Fora o ato de duas pessoas que

queriam sua felicidade. Duas pessoas mentiram por completo a respeito do


que sentiam e queriam, para que Klaus me tivesse. E ele tinha. O quão
burra me tornei?

Voltei para minha casa e deixei as chaves de Diana num local fácil
de visualização, caso aparecesse. Mandei uma mensagem para Patrice,
avisando que tinha um assunto a resolver e que teria que furar com ela.
Pedi um uber e tentei colocar minha mente no lugar. Nada fazia sentido.

Precisava encarar Klaus e entender. Entender como deixamos aquilo

passar.

As mesmas inseguranças me bateram, quando usei a chave que me


dera de seu apartamento, e adentrei o local. Encarei cada pequeno canto, e
todos pareciam uma parte de nossa história. Por que doía tanto saber sobre

Diana e Paul, e sua armação?

Talvez porque eles fizeram mais do que o próprio homem que


deveria se interessar?

Talvez porque a coragem deles era maior do que qualquer um dos


dois realmente envolvidos em sentimentos?

Ele continua um covarde! – minha mente acusou, e andei até o


minibar, pegando uma taça de vinho e me servindo.

Fui em direção ao deck e assim que me sentei num poof, imagens

de nós, dias atrás, nos entregando por completo naquele lugar me


atingiram. Por que? Era a única pergunta que girava por toda minha
mente. Talvez, nunca entendesse. Sentia-me um estorvo na vida dos
demais, e pior, a facilitação de Klaus. Bastou ele mostrar que me queria,
que me coloquei de prontidão. Por que sentir doía? Por que só naquele
momento encarei a realidade?
Estaria ainda destinada a Paul, se ele e Diana não intervissem.
Foram os dois, que contribuíram para tudo aquilo. Nem eu, muito menos

Klaus. Ele sequer saíra de sua zona de conforto. Por que não podia
simplesmente arrancar aquele sentimento do peito? Por um instante, era
tudo o que queria.

— Eu estou decidido. — refutei a proposta de meu pai. — Não vou

obriga-la a se casar comigo.

Meu pai me encarou com pesar, já claramente desistindo da


negociação. Na realidade, não estava aberto a tal coisa.

— Mas vocês estão juntos. — passou as mãos pelos cabelos,


claramente sem entender. — Por que simplesmente não...

— Lia não vai ser obrigada a nada. — bradei, e me levantei da cadeira.


— Passei anos aceitando tudo apenas para me controlar, para não me sentir
um merda como antes. Mas isso acaba hoje, pai! Lia não vai ser presa a mim

por causa de dinheiro e poder!

— Mas e se ela...

— Não! — balancei a cabeça, pegando meu celular em mãos. — Já


estou levando os papéis para casa, e lá, assinarei todos. Está feito, pai! Sou

adulto suficiente para lidar com isso.

Sem lhe dar mais ouvidos, saí da imponente sala. Fui direto para minha
sala, peguei os papéis empilhados, e sem me importar com pasta, apenas fui
para o elevador, na clara intenção de ir embora. Minutos depois, finalmente
estacionei meu carro na vaga. Suspirei fundo, ainda com a adrenalina
percorrendo meu corpo. Discussões como aquela, tinham-me alterado pelo
simples motivo de não me deixarem ter próprias escolhas. Lia era a minha.
Não desistiria.

Abri a porta de meu apartamento com um certo malabarismo para


carregar tudo, e fechei-a com o pé. Fui até o escritório e depositei a pilha de
papéis, sentindo-me ainda mais cansado apenas por olhá-la. Teria que ler e
assinar muita coisa, o mais rápido possível. E tudo o que realmente precisava
era de uma cama.

Joguei os sapatos de lado, e fui me livrando da roupa pelo caminho.


Quando retiraria minha calça, uma voz doce e decidida invadiu o ambiente,
surpreendendo-me.

— Você sabia?

Vacilei um pouco diante de seu olhar intimidador. O que aconteceu?


Lia parecia muito diferente da última vez que a vira, e mais parecia com uma
mágoa nítida no olhar.

— O que aconteceu, amor?

Ela sorrira sem vontade e deu mais alguns passos para perto, parando a
minha frente, mas sem a intenção de me tocar. Deixou a taça de vinho que
carregava sobre uma bancada e me encarou.

— Talvez Paul e Diana tenham essa resposta clara. — encarou-me de


forma fria. — Já que por amor a você, decidiram deixar o caminho livre até
mim.

O que?

Lia se afastou, e logo foi até a bancada da cozinha, segurando com as


duas mãos na mesma.

— Essa intensidade entre nós pareceu me cegar. — começou e senti


meu coração afundar. — A verdade é que sempre fiquei reticente sobre as
coisas, por conta de que te ouvi claramente no passado, deixando-me livre
para seu irmão. E mais, nunca sequer insistiu em estar perto. Você aceitou o
fato de me casaria com seu irmão! — virou-se, encarando-me com raiva. —
Parei de pensar a respeito quando tentei entender que o destino nos queria

juntos, de alguma forma maluca. Mas olhe só pra isso! — fez um sinal
imaginário entre nossos corpos. — Agimos como um casal, sendo que dias
atrás, sequer conversávamos. — explodiu, e pude sentir em cada palavra, a
confusão que sua mente se tornou. — O que faria, Klaus? — perguntou de

repente, encarando meu semblante magoado. Suas palavras me cortando. —


O que faria se Paul e Diana não tivessem abdicado da própria liberdade
durante todo esse tempo para que pudesse ser a porra do seu nome no
contrato!? Você teria lutado por mim? Teria se aproximado?

Paralisei diante de sua fala. Minha cabeça girou até Paul e Diana, o
quanto tudo entre eles se sucedeu de forma estranha e rápida. A forma
cuidadosa com que Paul falava, e ainda mais, as coisas simples que Diana
parou de compartilhar para comigo. Tudo finalmente se encaixou em minha

mente. Suspirei, voltando meu olhar para a mulher que tinha meu coração em
mãos, e com toda certeza, o jogaria fora em alguns segundos.

— Seu silêncio é minha reposta. — concluiu e a encarei incrédulo.

Ela então deu alguns passos à frente, na clara intenção de passar por
mim e sair. Não permiti. Segurei seu braço e a puxei delicadamente contra
meu corpo, olhando-a profundamente.

— Eu não sei o que eles realmente fizeram. — comecei, sentindo seu


olhar queimar sob o meu. — Não sei porque agiram dessa forma, mas eu os

entendo. Assim, como te entendo, Lia. Por isso, passo cada segundo do meu

dia pensando em como te mostrar que sou um bom homem. Porque errei no
passado, e não foi algo simples. Porque errei ainda mais no presente, por
sequer bater de frente com todas aquelas malditas cláusulas. Mas pensei ser
tantas coisas, menos um sentimento correspondido. Fui covarde, um dia, mas

hoje, sou essa pessoa que vê! Serei grato por toda eternidade por eles terem
agido assim, e que agora te tenha em meus braços. O que eu teria feito ao vê-
la de branco no altar, e sendo o padrinho? Eu realmente não sei. — evidenciei
cada palavra, com meu coração sangrando. — Mas de algo tenho certeza, de
que parte de mim morreria se a visse com ele, ou qualquer outro. Sei que está
confusa, e que esperava um homem que...

— Não esperasse a vida ajeitar tudo. — complementou, e fechei os


olhos, sentindo-me quebrar. — Você me desestabiliza, Klaus! E olhe só para

nós, somos apenas fruto de uma mentira. Somos duas pessoas que...

— Eu te amo, porra!

Lia piscou algumas vezes, absorta diante de minha explosão. Mas era a
verdade.

— Nada me importa, Lia. — confessei. — Paul e Diana terem armado,


o que aconteceu no passado... Porque tenho tudo a minha frente, e sei o
quanto não sou merecedor.
Dei-lhe as costas e encarei o nada. Por que meus sentimentos não
bastavam, por que de repente “nós” não bastava. Não conseguia entender.

Logo senti dois braços me envolverem e suspirei, diante de seu toque sobre
meu corpo.

— Acho que estou pirando. — confessou baixo, contra minhas costas.


— Tudo que estamos fazendo me assusta, devido a toda intensidade. Ao ver

Paul e Diana falando sobre essa armação, me senti diminuída, Klaus.

Virei-me rapidamente para ela e puxei seus braços para meu corpo.

— Eles agiram por te amar, e querer sua felicidade. — sentenciou. —


Mas me dói saber que poderia ter sido diferente, que poderíamos ter lutado
juntos pelo que sentíamos e... Precisamos que algo de fora acontecesse para
estarmos assim hoje.

— Mas estamos, Lia. — toquei seu rosto, e uma lágrima desceu.

Ali estava a Lia que ela tanto buscava esconder. Uma mulher que sofria

como todo ser humano. Uma mulher que não aceitava metades, e que
desconfiava de cada passo dado. Lia era frágil, e me doía saber que meus
sentimentos ainda não permitiam que confiassem em mim. Porém, não
pararia de lutar.

— Isso que temos é único. — beijei suas mãos. — Não está aqui
comigo por nenhum contrato, não mais. Posso não ter lutado no passado, mas
luto por nós, agora. Por favor, tente...

Lia colocou dois dedos sobre minha boca e sorriu, suas lágrimas ainda

molhadas no rosto, junto a outras secas. Uma bagunça linda, o que ela
realmente era. A dor em seu olhar era nítida, assim como sua insegurança.

— A insegurança me cega, muitas vezes. — confessou. — Sinto-me


impotente e... Por favor, me faz esquecer isso! — praticamente implorou e

tocou meu rosto. — Me faz esquecer que poderia não estar aqui, em seus
braços. Eu quero tanto me libertar dessa angústia, dessa dor no peito e...

Sem que ela precisasse terminar, baixei meus lábios para o seu. Melhor
do que ninguém, eu a entendia. Muitas vezes, nossa mente se apodera de
decisões que sequer pensamos em tomar. É como ser obrigado a explodir
diante da situação, para só depois analisa-la com cuidado. Aquilo acontecera
com Lia. E nada melhor, do que provar, da forma mais carnal e real possível,
que o que realmente valia a pena, éramos nós.

— Me faz esquecer. — implorou mais uma vez, e puxou a camiseta que


vestia.

Ali, peguei-a em meu colo e nos encostei na primeira parede. O


desespero tomando conta de cada célula de meu ser. O desespero de perder a
mulher que amava por ter sido um covarde. Não mais, recitei mentalmente,
enquanto a fazia minha ali mesmo. Nossos corpos implorando cada vez mais
um pelo outro. Entrelacei uma de nossas mãos e coloquei sobre sua cabeça,
assistindo Lia se desmanchar no prazer mais absoluto, envolta apenas por

nós. Por nossos corpos. Encostei nossas testas, ouvindo seus pedidos e
gemidos, sentindo-me finalmente completo naquele instante. Éramos um.
Mostraria a ela que o passado me sentenciou como um covarde, mas que no
presente e no futuro, seria o homem da sua vida. Passaria o resto de meus

dias trabalhando para aquilo.


Capítulo 15

“É por isso que eu não conto às pessoas sobre nós. Elas não entenderiam e eu não sinto
necessidade de explicar, simplesmente porque o meu coração sabe o quanto foi real.

Quando penso em você, não posso evitar um sorriso, sabendo que você me completou

de alguma forma.”[26]

Senti meu corpo dolorido e me estiquei, até sentir um corpo quente


me envolver. Sorri em meio ao sono, e acomodei-me melhor a ele. Klaus

conseguira. Tornou-se meu porto seguro. Abri os olhos, e notei que ainda
dormia tranquilamente, mas que seu corpo, involuntariamente buscava o
meu. Analisei seu semblante calmo e tranquilo, e a culpa me invadiu, por
ter agido de forma tão rude com ele.

Klaus era quem claramente que tinha problemas com controle, mas
no fim, eu quem me descontrolava.
Todas aquelas informações fizeram uma bagunça tão grande em
minha mente que de repente, estar perto dele parecia errado. Era como se

fossemos um erro ou algo pior. O que deixou a beira de uma crise, que me
atingiu por completo. Era toda ferrada, no sentido de não conseguir lutar
contra minha mente em muitos casos. E naquele em especial, acontecera.

A insegurança era um mal diário, uma luta interna de anos, mas que

ainda me assombrava. Naquele momento, pós toda a discussão e


finalmente consciência, agradeci de todo meu coração aos céus, por ter
encontrado naquele homem, alguém que não me julgasse pelo que
realmente era. Alguém que beijou cada pequena cicatriz em meu corpo,
sem precisar perguntar absolutamente nada. Alguém que todos os dias me
mostrava nos gestos mais simples, o que realmente significava o tal
companheirismo que tanto pregava em meus livros.

Mal sabia, mas tornou-se minha inspiração. Klaus Russel era,

literalmente, o homem dos meus livros. Afastei-me com cuidado de seu


corpo, sentindo minha garganta seca. Peguei o celular no caminho até a
cozinha, e me assustei com a quantidade de chamadas perdidas de meu pai.

Peguei uma garrafa d’água na geladeira e me sentei numa banqueta


alta ao lado do balcão. Bebi aos poucos, enquanto ligava para meu pai. A
chamava fora direto para a caixa-postal, e assim, encarei o horário. Com
certeza, ele já dormia. Não deveria ser algo sério, já que suas últimas
mensagens foram após as ligações perdida, e o mesmo, desejou-me boa

noite. Família esquisita, considerei e sorri.

Bebi mais um pouco de água e logo meus olhos se prenderam no


diamante negro em meu dedo anelar direito. Klaus deixara claro mais uma
vez que o contrato não me nos mantinha juntos, éramos apenas nós. Os
trâmites burocráticos ainda seguiam, mas não os assimilei muito bem,

deixando tudo por sua conta. Mas eu sabia, quando olhava no fundo de
seus olhos, que aquilo não importava. Papel algum nos transformaria em
“nós”, porque já nos pertencíamos.

Casar-me com Klaus não seria um sacrifício. Não mais. Sorri,


imaginando que talvez fosse um pouco louca por pensar de tal maneira.
Porém, era realidade.

Meu celular tocou e o atendi prontamente. Uma ligação de meu pai


naquele horário não era comum.

— Ei, sweetheart.

— Oi, papai. Aconteceu alguma coisa?

— Bom... — limpou a garganta, claramente tentando escolher as


palavras. Eu o conhecia bem. — Klaus está por perto?

— Não, por que? — aquela conversa acabava de ficar estranha.

— Ele conseguiu a quebra de contrato. Digo, apenas falta a minha


assinatura. — comunicou.

— Ele me disse que faria. — comentei. — Algum problema com

isso?

— Sei que não é muito inteirada nesse meio, sweetheart. Mas


Klaus terá que pagar milhões de dólares por conta disso. — engoli em
seco, pois nunca imaginei que seria tanto. — Pelo que conversei com

Dominic, praticamente todos os imóveis de Klaus estão à venda. Ele


assumiu tudo.

— Deus do céu!

Minha cabeça girou e a frase que me dissera no primeiro dia ali,


dentro do apartamento, pareceu viva em cada ambiente: nenhum dever será
maior que meu amor por você. Suspirei fundo e me levantei, sentindo-me
completamente perdida.

— Ele travou uma batalha jurídica na empresa por conta disso e

até mesmo vai vender ações. — meu pai complementou. — Sei que estão
juntos agora, de verdade. Mas acho que deveria saber, porque não
acredito que ele tenha te contado.

— Não mesmo. — confirmei.

— Só vou assinar os papéis se você concordar, sweetheart. —


confidenciou e passei as mãos por meu rosto. — Mal pude dormir
imaginando que Klaus decidira tudo por vocês, e que sequer saiba o que
aconteceu a volta. Sei o quanto valoriza honestidade.

E amor.

Guardei tal complemento, sentindo meu coração pular ainda mais


frenético no peito. Encarei mais uma vez a aliança no dedo e sorri,
sentindo que ela não pesava em nada. Muito menos, seria um

arrependimento. Eu e Klaus éramos destinados, seja pela ação de alguém


ou não. Porém, a partir dali, seria uma escolha minha, a qual ele teria
apenas duas respostas a dizer “sim” ou “não”.

— A mesma boate? — perguntei e arqueei a sobrancelha, logo


estacionando.

Lia deu de ombros, e sorriu.


— Disse uma vez que gostaria de criar memórias num lugar onde
antes apenas me olhava. — sorri verdadeiramente, admirando sua

preocupação para comigo. — Portanto, aqui estamos.

Era um sábado tranquilo após um dos momentos que mais me


atormentaram. O momento onde Lia pareceu querer correr para longe de
me deixar ali, para trás. Porém, após passar o dia com Patrice, ela

simplesmente me surpreendera a respeito de querer sair e extravasar nossa


felicidade. Além de termos tido uma conversa franca a respeito de Paul e
Diana, e que não contaríamos o que descobrimos.

Algo neles parecia real, e não no sentido ruim. Além de que, eles
sequer precisariam ficar juntos por mais tempo após o anúncio do noivado.
Algo acontecia, e Lia e eu, aguardávamos pelo momento certo de termos
uma conversa franca com eles. O que não era o momento. Mesmo que meu
coração fosse eternamente grato pelo que fizeram.

— Vem!

Lia me puxou para pista de dança e as luzes passeavam por cada


cantinho de seu corpo. Sorri, finalmente podendo chamar aquela mulher de
minha. Puxei-a para perto e a segui durante a música, mesmo não sendo
um bom dançarino. Por ela, passaria tal vergonha.

A mesma música que tocou no dia em que a visualizei aos beijos


com outro, enquanto outra mulher estava sobre meu colo, tocou. Senti meu
mundo girar e guardei mentalmente a forma como cada curva de Lia

acompanhava a batida. Ela sorria, parecendo livre, com aquele mistério


nítido em seus olhos castanhos. Eu a amava, por completo.

Lia me cercou com seus braços e dançou sensualmente, enquanto


cantava a música com sua voz doce, deixando-me completamente pronto

para ela, e sentindo-me imerso naquele momento.

“I always say what I’m feeling

I was born without a zip on my mouth

Sometimes I don't even mean it

It takes a little while to figure me out

I like my coffee with two sugars in it

High heels and my jewellery dripping

Drink and I get all fired up, hey, hey, hey

Insecure, but I’m working with it

Many things that I could get rid of

Ain’t about to give it up


I made a few mistakes, I regret it nightly

I broke a couple hearts that I wear on my sleeve

My momma always said: Girl, you’re trouble, and

And now I wonder, could you fall for a woman like me?

And every time we touch, boy, you make me feel weak

I can tell you’re shy and I think you’re so sweet

Spending every night under covers and

Still I wonder, could you fall for a woman like me?”[27]

Sorri diante de sua desinibição e a puxei para um beijo, que marcou


por completo todo o domínio que tinha sobre mim. Ela seria o que

quisesse, e lutaria com o mundo se fosse preciso.

De repente ela parou, passou as mãos por meu rosto e me beijou


delicadamente. Logo, me puxou pela mão e fez-me subir com ela até a ala
vip. Ela então abriu a porta e estranhei por não ter ninguém ali em cima, já
que geralmente era repleto de pessoas.

— Tudo bem? — perguntou, e apenas assenti, ainda um pouco


perdido.

Sentei-me um banco e Lia logo se ajeitou em me colo, levando-me

diretamente para o contraste com aquele lugar, meses antes. Naquele


segundo, agradeci internamente por ter tal sonho realizado. Era a mulher
que amava em meu colo, que de alguma maneira desconhecida, amava-me
também.

— O que tanto passa nessa cabecinha? — perguntou, um sorriso


preguiçoso se abriu em meu rosto.

— Que estou feliz. — toquei seu rosto com carinho. — Que nunca
imaginei que realmente a teria. E hoje, te ter, é como tocar os céus.

— Fofo! — beijou-me com carinho. — Como pode, Klaus Russel?


Ser sexy como o inferno e me conquistar com suas belas palavras, feito um
poeta?

— Você quem domina as palavras, senhorita Harper. — pisquei

para ela e toquei sua cintura.

— Senhora... — corrigiu, e franzi o cenho sem entender. — Sua


senhora, se me permitir.

Sorri de sua brincadeira, porém, Lia se levantou abruptamente, e a


vi mexer em algo no celular. Shallow começou a tocar, e o mundo inteiro
pareceu silenciar. O que estava acontecendo?
— Paul e Diana esconderam coisas de nós, e decidimos que ficaria
na mão deles o seu próprio destino. — assenti, completamente perdido,

diante da mulher perfeitamente vestido de preto, que me encarava como se


fosse seu mundo. — Você tem escondido coisas de mim, Klaus.

Aquela informação me atingiu em cheio e abri a boca para me


explicar. Mas não queria que tal assunto a importunasse.

— Seu pai? — arrisquei e ela assentiu. — Me desculpe, é que


queria apenas resolver tudo para estarmos livres. Livres para nos escolher.

— Admiro isso em você, baby. — sua voz soou embargada. —


Admiro muito mais. E o quanto me provou, durante meu pequeno surto,
que não vai desistir de nós. Eu vejo você, Klaus. Da forma que nunca
imaginei enxergar alguém. Um dia, Diana me disse que éramos parecidos.
Eu duvidei. Hoje, tenho certeza. Você é uma parte de mim, acho que desde
o momento que me apaixonei aos quinze anos. — suas palavras me

acertaram em cheio. Ainda mais por que nunca vi Lia falar tão abertamente
de sentimentos. — Não somos um casal convencional, nem mesmo quero
que sejamos. E por isso, insisto para que me chame de senhora. Sua
senhora.

— Do que está falando, Lia?

Ela então sorriu e mexeu em na pequena bolsa que carregava. Ela


tirou de dentro uma pequena caixinha de veludo e fez-me paralisar. O que?

— Sua uma romântica incurável. Escrever sobre amor sempre foi

muito mais fácil do que falar... Mas você, você me faz querer falar, pensar,
escrever, e principalmente, viver. — ela então se acomodou novamente em
meu colo, e continuei, completamente paralisado. — Eu te amo, Klaus
Russel! Aceita ser meu, por nossa escolha e vontade próprias... pelo amor

que sentimos e pelos dias no futuro que nos pertencerão?

Abri a boca, completamente embasbacado, e tentei buscar palavras


para refutar seu pedido. Deixar claro que não poderia aceitar diante do
momento. Diante do que ela deveria estar pensando sobre a quebra de
contrato. Mas Lia era decidida, e naquele momento soube, conhecia cada
pequena parte dela. E mesmo assim, precisava de mais. Muito mais da
mulher que o dia me fora proibida. Pois eu a amava, sem chance de dar
volta.

Ela me dava escolha. Mesmo sabendo que ela sempre seria a


minha. Aquilo me fez amá-la ainda mais.

Sem conseguir encontrar a resposta em palavras, puxei-a com


carinho para um beijo. Mais uma vez, selando nosso momento. Senti algo
ser colocado em meu dedo anelar direito, e me afastei aos poucos, notando
o brilho claro em seus olhos, um reflexo dos meus. Não eram necessárias
palavras, mas Lia as dominava. E como sempre, o fez, da melhor maneira.
— Você é meu, baby. Por amor, tenha certeza disso. — tocou meu
rosto. — Apenas por amor.

Encostou nossas testas e beijou-me novamente. Naquele instante


nada poderia me abalar. Lia era a melhor escolha de minha vida. E mesmo
que não me julgasse merecedor de seu amor, ela me escolheu. Ela se
tornara meu mundo, da mesma forma que o fizera, a dez anos atrás, no

momento em que me apaixonei. Um amor além do tempo, de deveres e de


passado... Um amor apenas nosso.
Epílogo

“And all at once

You're all I want

I'll never let you go

King of my heart, body and soul, ooh whoa.”[28]

Existia algo em Klaus que Lia nunca entenderia de fato. Talvez o


fato de ele sempre parecer tão confiante para o mundo, mas quando o
enxergava sem qualquer máscara de mágoa do passado, encontrava-se
apenas um homem comum. Klaus Russel poderia ser definido de várias
maneiras, mas uma das mais consistentes seria: comum.

Contudo, ainda existiam mais coisas que Lia nunca entenderia.


Existia o fato de ele olhá-la e o coração acelerar de forma que pudesse
senti-lo querendo saltar pela boca. Existia o fato de que sua presença a
deixava tão imersa, que não conseguia pensar em outra coisa que não fosse
estar novamente em seus braços. Existia o fato de que seus beijos pareciam
ter pertencido apenas a ela, assim como seu corpo. Não que ela quisesse se
sentir dona de algo ou alguém. Principalmente, não de quem amava. Mas
ainda assim, uma parte sua gritava que aquele corpo era dela, o tanto

quanto ela pertencia a ele.

Pequenas partes que ela não conseguia explicar, e já simplesmente


desistira. O jeito mais fácil de deixar as coisas seguirem seu fluxo natural
era aceitar. E ela o fizera. Sorriu ali, encarando o olhar coberto por
lágrimas do homem que fizera seu coração pertencente de uma história de

amor que nunca imaginou de fato que escreveria. A sua própria história.

Naquelas lágrimas Lia encontrou a mesma fragilidade do homem


que admitiu amá-la, sem querer cometer os mesmos erros do passado.
Naquele momento ela estava vestida de noiva, com as mãos dadas com ele,
sentindo seu coração saltar, e não conseguia parar de sorrir. Ali, ela
passara a entender porque a maioria das noivas não choravam no
casamento, ao menos, não após a entrada. Ela estava em êxtase.
Simplesmente por encontrar o que sempre procurou. Por encontrar o que

nem sabia que poderia.

Klaus Russel era a resposta para muitas de suas perguntas. Ainda


assim, a junção de muitas outras perguntas sem resposta. A respeito do que
sentia, de como se sentia. Contudo, sabia que era amor. Como uma
romântica incurável, aquele amor lhe era válido. Um amor que
simplesmente surgiu no primeiro olhar e permaneceu para ser renascido
anos depois. Em um relacionamento balanceado, saudável e apaixonante.
Longe de qualquer papel ou algo que lhe obrigasse. E perto daquilo que

queria, desejava e amava. Que eles amavam.

Lia Harper sempre fora a única incógnita na vida de Klaus. Para


um homem centrado e certo de que deveria seguir apenas os detalhes
premeditados, ali estava ela. A sua frente, vestida de branco, com um
sorriso que o fizera chorar ainda mais. Não apenas pela beleza, mas pela

forma como ela parecia feliz em estar se casando com ele. E pela forma
como ele se sentia por poder estar realizando o sonho de começar um
relacionamento a frente de todos que amavam, amando a mulher ao seu
lado. Completamente.

Ele apenas ouviu o que o padre dizia, mas seus olhos fugiam a todo
momento para os dela. Não existia algo que o tiraria a atenção, pois ela
permanecia ali. Lia era fora da curva. Lia era como uma incógnita. Lia era
como um sonho impossível. Entretanto, com sua mão esquerda tremendo,

ele estava preso a ela, que parecia tão dona de si, que o deixava
completamente perdido em como aquela mulher de fato se apaixonara por
ele.

O que muitas pessoas não sabiam sobre Klaus era que ele e Lia
compartilhavam muito do passado. A baixo autoestima e fragilidade fora
algo que ambos lutaram por anos. Klaus, lutara de fato, socando sacos de
boxes e colocando em mente que era o seu melhor. Ali, encarando-a
sorrindo para ele, sabia que nunca desistiria de tentar ser o seu melhor. Por

mais que não compreendesse como aquilo acontecera em sua vida, dentre

tantas reviravoltas forjadas ou não pelo destino, ela se apaixonou pelo o


que ele era. Simples assim.

Ele era o bastante.

Ela era o bastante.

Aquilo bastava para ser feliz.

Lia sorriu, ao pegar o envelope em mãos e seu olhar brilhou


diretamente no de Klaus, como o espelho um do outro. Fora naquele
momento que ele percebeu que ela também tremia, que estavam tão
conectados no que acontecia, que uma lágrima descera pelo rosto dela, e
ele não conseguiu evitar, e limpá-la gentilmente com um dos dedos.

— Não era para chorar agora. — ela comentou, e todos


gargalharam. Sorriu novamente, e focou no homem que a encarava com

certa preocupação, como se quisesse protegê-la do mundo para que não a


ferisse. Contudo, Lia sabia que era uma luta de um para um. Eles se
protegiam e lutavam – juntos. Era uma relação de gigantes, e nada menos
que aquilo. — Mas como já chorei, acho que tenho a obrigação de fazer o
noivo chorar... de novo! — piscou um olho e ouviu a melhor amiga gritar
um “essa é a minha garota” ao lado.
Lia puxou a carta de dentro do envelope e suspirou profundamente,
enquanto segurava o microfone com a outra mão. Deixou o envelope preso

abaixo de seus dedos, e focou no olhar castanho que lhe transmitia o


mundo inteiro. Como se fosse possível marcá-la como dele, mais uma vez.

— Eu não imaginei que estaria aqui um dia. — começou, e deu de


ombros. — Não que nunca me imaginasse casando, ou muito menos, que

não me visse casando com você. — piscou para ele novamente e sorriu. —
Eu me vi, tantas e tantas vezes... Deitada na minha cama, sentada no
jardim, durante uma festa... Casar com Klaus Russel era um sonho
constante em minha adolescência. Porém, pensei que seria apenas aquilo...
Um belo sonho. O que não nos contam antes da vida adulta é que os
sonhos não se vão de repente, muitas vezes, eles apenas adormecem. No
meu caso, meu amor por você ficou adormecido. — Klaus já chorava, e
não existia alguém naquela igreja que não estivesse emocionado, ainda

mais, pelas pessoas que realmente conheciam a relação dos dois. — Mas
com um vulcão, esse amor acordou. Não sei ao certo se dentro daquela
balada, ou cantando shallow no seu carro, ou até mesmo, quando tomou a
sala inteira da minha casa... Só tenho certeza de que acordou. Tão mais
vivo, tão mais intenso... Tão mais real. — ela suspirou profundamente e
uma lágrima desceu, meio a um sorriso que não lhe fugia. — E a realidade
é bem mais bonita do que o sonho. Eu estou aqui hoje, a sua frente, prestes
a nos tornarmos marido e mulher. A realidade desse sentimento me fez te

pedir em casamento numa balada, um local que por anos nos vimos, mas

nunca de fato nos encontramos. Mas a gente se encontrou, Klaus Russel. A


gente finalmente se entendeu e percebeu que a realidade desse amor era o
bastante para querermos ficar juntos para sempre. Esses dias estava
escrevendo, pensando em nós, e de repente, uma música tocou na playlist,

e não pude deixar de pensar em como me senti na primeira vez que te vi. E
como sei hoje, que você se sentiu também. A letra é assim: “Eu te amei em
segredo. À primeira vista, é, nós amamos sem razão.” Hoje eu sei que não
foi sem razão. A razão era simples, que quando uma escolha lhe fosse
dada, você saberia o que dizer. Assim como, eu saberia. Que entre os
amores e os deveres dessa vida, a gente apenas se encontra no amor.
Porque é disso que somos feitos e é por isso que estamos juntos.

Fim
Sinopse

Paul Russel abriu mão de seus sonhos para manter sua família

unida. Quando a felicidade de seu irmão se encontra em suas mãos, ele não
pensa duas vezes no que acredita ser a escolha certa. Assim, ele e sua
melhor amiga, Diana, decidem fingir um relacionamento. O plano era
simples. Klaus, seu irmão, ficaria com a mulher amada, enquanto Diana e
ele, atuavam para todos. Porém, no meio do caminho, sentimentos até
então desconhecidos para ele surgem. Paul não sabe como chegou a tal
situação, porém, entende que se apaixonar está fora de cogitação. Ou não?

Entre a mentira e o desejo, qual será sua escolha?


Playlist

Apaga a Luz – Glória Groove

Coisa Boa – Glória Groove

Deixe-me ir – 1Kilo

Delicate – Taylor Swift

Dona de Mim – Iza

End Game – Taylor Swift

Girls Like You – Maroon 5 feat. Cardi B.

Gorgeous – Taylor Swift

IDGF – Dua Lipa

Love On The Brain – Rihanna

Malibu – Miley Cyrus

Never Be The Same – Camila Cabello

Nothing Breaks Like a Heart – Mark Ronson feat. Miley Cyrus

Send My Love – Adele

Take Me To Church – Hozier

Thank u, Next – Ariana Grande

Vai Malandra – Anitta


Veneno – Anitta

Wish You Were Here – Avril Lavigne


Prefácio

“'Cause I got issues, but you got 'em too

So give 'em all to me and I'll give mine to you

Bask in the glory, of all our problems

'Cause we got the kind of love it takes to solve 'em

Yeah, I got issues

And one of them is how bad I need you.”

Issues, Julia Michaels


Prólogo

“Quem me dera ao menos uma vez

Explicar o que ninguém consegue entender

Que o que aconteceu ainda está por vir

E o futuro não é mais como era antigamente.”[29]

— Ele a ama. — Diana enfatizou, andando a passos lentos até o

sofá, sentando-se, jogando a bolsa no chão. — Odeio, com todas as forças,


essa merda de contrato.

— Sinto o mesmo, Dia.

Levantei-me da cadeira e arregacei as mangas, pegando o copo de


uísque sobre a mesa.

— E o meu plano? — perguntei, e Dia bufou, encarando o teto.


— É o pior plano, Paul. — rebateu, e finalmente me encarou,
cruzando as pernas. — Quem vai ser louco o suficiente para acreditar que

estamos juntos em algo romântico? — revirou os olhos, fazendo-me rir. —


Não temos química alguma, e pior, não somos bons atores. Ao menos, eu
não. — alfinetou e andei até ela.

Sentei-me ao seu lado, e puxei suas pernas para meu colo. Diana se

escorou com o braço no estofado e me encarou com carinho. Sabia bem,


nunca passaríamos de tal estágio. Éramos amigos e ponto. Nenhuma linha
clara, para ambos, seria ultrapassada.

— Precisamos convencer meu pai e Klaus, ninguém mais. —


comentei e ela me encarou tediosa. — É isso ou me caso com Lia.

Diana fez uma careta, claramente odiando a ideia. De forma


alguma, estava empolgado para tal coisa.

— Eu amo Klaus, como um irmão. Assim como você, Paul. Mas

por que me dão tanto trabalho, sendo que temos basicamente a mesma
idade? — reclamou, fazendo-me gargalhar.

Diana era uma das poucas pessoas no mundo que conseguiam tal
feito. Fazer-me rir verdadeiramente. Ela tinha razão, ao meu acusar de bom
ator. Eu era, na maior parte do tempo, uma simples projeção de mim
mesmo. Nada mais. Acostumei-me a sorrir e acenar desde muito novo.
Desde o momento em que perdi minha mãe e todas as esperanças a
respeito de ser feliz plenamente.

— Você se preocupa demais. — acusei-a e ela encolheu os ombros.


— Em que momento do dia para simplesmente para pensar sobre você?

— Eu tenho uma equipe de marketing inteira para comandar, um


pai disposto a namorar a primeira mulher que aparecer, dois irmãos

postiços fechados, um tio postiço que necessita seguir na vida, e ainda acha
que tenho tempo para me preocupar com meus problemas? — refutou, e
deu um sorriso cansado. — Sabe melhor do que ninguém, Paul.

— Como assim?

— Que as vezes, os problemas dos outros são muito mais fáceis de


resolver do que os próprios. — pegou o copo de uísque de minha mão e
levou a boca, tomando um gole. — Odeio admitir que fujo de meus
problemas, mas é real.

— Assim como aquele cara problema na boate em que fomos há


alguns dias? — tentei melhorar seu humor e ela revirou os olhos. — Ele
parecia apaixonado.

— Ele é apenas um pé no saco. — devolveu-me o copo. — Não


está acostumado a ter um “não” como reposta e agora acha que insistindo
vai me levar para cama.
— Temos uma regra clara, não é? — debochei e ela bateu em meu
peito.

— Você tem essa regra ridícula. Eu transo com quem quiser pelo
tempo que quiser. Se a pessoa for boa de cama, por que dispensar
rapidamente? — jogou a pergunta no ar e deu de ombros.

— Porque ela pode se apaixonar e complicar as coisas. —

expliquei, pela milésima vez o óbvio.

— Não sou tão presunçosa como você. — piscou um olho,


fazendo-me sorrir. — Não acredito que seja capaz de fazer um homem se
apaixonar, ou mesmo, uma mulher. — deu de ombros. — Sou uma pessoa
prática, e isso, pode muitas vezes afastar as pessoas.

— Não te acho prática. — apresentei-lhe meu ponto de vista. Seus


olhos castanhos me encararam atentos. — Você é decidida.

— Isso assusta as pessoas. — comentou, e mesmo não querendo,

tive que concordar. — Mas então, sobre Klaus e Lia... — suspirou


profundamente. Tomei um gole da bebida, sabendo que aquela conversa
seria uma merda. — Se formos entrar nessa, teremos que fazer coisas que
geralmente não são um padrão.

— Tipo transar? — provoquei e ela fez uma cara de horror, dando-


me tapas no braço.
Não saberia dizer o que sua reação me causava, mas apenas
consegui rir naquele momento.

— Beijar, seu imbecil. — fechou os olhos por alguns instantes. —


Deus, isso é tão estranho!

— O que, mulher?

— Imaginei por um segundo como seria te beijar, e foi torturante.

— provocou e gargalhei. — Sério, Paul! Como vamos convencer assim?


— perguntou, e notei seu olhar preocupado. — Klaus basicamente admitiu
que ama Lia.

— Vamos fingir esse relacionamento. — comentei, dando de


ombros. — Damos alguns selinhos a frente dos que importam e seremos
discretos sobre nossas vidas particulares.

Diana arregalou os olhos e bufou.

— Não serei chamada de corna por aí. — colocou um dedo sobre

meu peito. — Pode aproveitar os dias que lhe restam, porque o celibato vai
começar.

— Mas Dia...

— Nem pensar! — rebateu, e tirou as pernas de meu colo. — Já


pensou se uma de nossas fodas dão com a língua nos dentes e todos
descobrem? Seria um caos! Klaus pode parecer imerso em si mesmo, mas
sabe muito bem o que acontece ao redor.

— Merda! — soltei, e Diana se levantou, começando a andar de um

lado para o outro.

— Temos alguns dias até realmente fazermos algo. — comentou.


— Vamos aproveitar esse tempo e depois... Vamos sofrer um pouquinho
por um bem maior. Trato?

Sorri de sua expressão e sequer ponderei os prós e contras. Não


impediria a felicidade de meu irmão, nunca carregaria tal culpa. Estendi-
lhe a mão e Diana apertou, num gesto clássico de nossa infância.

— Feito! — respondi e ela sorriu.

— Ótimo! — sentou-se novamente ao meu lado, e escorou a cabeça


em meu ombro. — Isso vai ser uma mentira e tanto. — reconheceu e sorri,
sentindo seus carinhos em meu braço.

— Sim, pequena. — passei as mãos sobre seus cachos,

massageando-os. — Será o nosso grande espetáculo.

Bebi mais um gole do uísque e fechei os olhos, aproveitando aquele


momento. Dali por diante, as coisas seriam uma grande bola de neve.
Meses depois...

— Eu odeio isso. — reclamei alto, enquanto Lia sorria, bebendo


seu café. — É sério! Não sei como conseguem beber essa porcaria escura.

— Isso se chama café! — refutou e tomou mais um pouco do seu.


— Nem pode dizer nada sobre porcaria escura, já que ama coca-cola.

Levei a mão a meu peito e fingi estar aborrecida. O sorriso no rosto


de Lia permanecia e depois de um bom tempo, parecíamos como amigas.
Ao menos, em meio a todas as pessoas ao nosso redor, ter me arriscado e

conversado com ela, rendera algo bom. Meu melhor amigo e seu futuro
marido, Klaus, era o motivo daquilo. Aproximei-me de Lia para tentar
trazê-la para perto, para que se sentisse mais confortável com aquela
situação. Ela estava sendo obrigada a casar com um homem devido a um
contrato. Existia algo mais arcaico?

— Ok, fez seu ponto! — tomei um pouco de minha coca-cola. —


Mas me diga, como vão as coisas com Klaus?

Pelo que ele me contara, eles tinham dormido juntos e passado dias

ótimos juntos. Entretanto, a visão dele poderia ser completamente diferente


da dela. Lia era como ele, uma caixinha de surpresas, portanto, gostaria de
saber se Klaus não andava fantasiando demais em relação a proximidade
deles.

— Estão bem. — falou, com um sorriso de lado. — Você tinha


razão quando disse que Klaus era como eu. — sorri presunçosa, pois como
sempre, estava certa. Por que era tão fácil analisar as pessoas e não fazer o
mesmo comigo?

— Então, estão realmente se vendo? Digo, mais do que amigos? —


ela se encostou contra a cadeira e deu de ombros.

— Ele é um cara incrível e isso tem me assustado, mas ao mesmo


tempo, não consigo ficar longe.

— Certo. — não conseguia esconder o sorriso aberto em meu rosto.


— Quando sua amiga chega? — perguntei.

— Pat chega amanhã. — assenti. — Faz muito tempo que ela não
vem a cidade.

— Lembro dela, e sei quem é pelas redes sociais. A acho linda,


para ser sincera. — pisquei e Lia sorriu.
— Como uma Barbie, não é?

— Como sabe? — perguntei, sem entender.

— Patrice sempre amou rosa, e a carinha de fofa dela nos leva a


considerar tal semelhança. Mas não se engane, ela é completamente louca.

Gargalhei de seu aviso e assenti.

— Não somos de amizades, e tenho certeza, que se gosta dela,


também vou gostar. — fui sincera

— Apenas tenha paciência ou não se surpreenda muito com a


loucura de Pat.

— Sem problemas. — pisquei e voltei para minha lata de coca.

Horas mais tarde virei a chave do apartamento de Paul. Assim que

a porta se abriu, bufei ao encontrar uma calcinha jogada sobre o sofá.


Olhei para a bagunça de roupas e fiz uma cara de nojo. Realmente, não
tinha paciência para tal coisa. Mais uma vez, teria a mesma discussão com
Paul. Aquela nossa encenação toda não teria futuro se ele continuasse
transando com todas as mulheres ao redor.

Assim, fui até a geladeira e bebi um pouco de água. Encostei-me


contra a bancada e esperei a cena de sempre. Fiquei de costas para não ter
que ser alvo de mais uma mulher com raiva de Paul, ou até mesmo,
inconformada com as palavras dele. Tínhamos a mesma natureza, ou seja,

tal coisa não me surpreendia.

— Parece entediada.

Virei-me diante da voz dele e o encarei com desdém. Bebi mais um


pouco de água e encarei o nada.

— Não me diga que temos mais uma vítima sua aí? — revirei os
olhos. — Precisamos conversar, Paul.

— Eu sei que prometi que não ia mais... — levantei a mão no


mesmo instante e deixei o copo de lado.

— Sabe muito bem que promessas para mim são importantes. Se


não é real não prometa! — falei séria, e o vi engolir em seco.

Paul tinha uma toalha enrolada na cintura, porém, não era sua
nudez que me incomodava. Era o fato de não ter como confiar realmente

nele.

— Não quero mais brigar, Paul. — segurei-me contra a bancada. —


Mas temos que fazer isso até Klaus e Lia se acertarem... Realmente se
acertarem! — dei ênfase e ele assentiu.

—Você sabe o que o sexo realmente significa para mim. — assenti


sem vontade, pois o conhecia bem. — Sei que prometi que não transaria
com mais ninguém essas semanas, mas...

— Mas como sempre, não cumpriu sua palavra. — rebati, e ele

ficou em silêncio. — Não sou uma mulher apaixonada por você, Paul. —
ele desviou o olhar e se sentiu claramente incomodado, o que não fazia
sentido. — Mas, tenho certeza, que quando encontrar essa mulher, ela não
vai perdoá-lo como o faço. Sua palavra tem que valer mais do que isso!

As pessoas têm limites, lembre-se disso.

Saí de trás do balcão e me sentei numa das banquetas. Logo uma


mulher surgiu do corredor em direção a cozinha e seu sorriso morreu
quando me viu. Olhei para o outro lado, ao mesmo tempo que agradeci por
não ser nenhuma conhecida nossa.

— Tudo bem, querido?

Prendi a risada no mesmo instante. Paul odiava que pessoas não


próximas o chamasse de tal forma, e infelizmente, a mulher não sabia.

— Oi, Cat!

— É Camile! — ela o corrigiu rapidamente e fechei os olhos,


tentando não rir da situação. A realidade, é que me doía ver a forma como
Paul usava aquelas mulheres apenas para o prazer. Pois muitas delas, viam
nele, muito mais.

— Desculpe. — falou rapidamente. — Eu sinto muito, mas...


— O que? — virei-me para ver a mulher se aproximar de seu peito
e apontar o dedo. — Vai me expulsar do seu apartamento?

Paul passou as mãos pelos cabelos, claramente nervoso e sem


graça. Assisti a cena se desenrolar e já até imaginava o fim. A mulher
vestia apenas uma camisa dele, e parecia estar mais a vontade no
apartamento do que ele mesmo.

— Eu sinto muito por te pedir pra sair, mas é que tenho um assunto
para resolver. — ele me encarou rapidamente, e voltou-se para ela. — Não
quero que se sinta mal, mas...

A mulher recuou alguns passos e me encarou, claramente com


ódio. Arqueei a sobrancelha, sem entender onde ela chegaria. O que eu
poderia fazer se era amiga daquele cafajeste? E pior a namorada de mentira
dele?

— A sua namoradinha? — encarou-me com desdém e esperei por

suas palavras.

— Como sabe que tenho uma namorada? — a voz de Paul soou


preocupada apenas bufei alto.

— Redes sociais, baby. — respondi rapidamente.

— Era claro que o mais velho dos Russel podia até assumir um
relacionamento, mas nunca seria fiel.
Ela me encarou com um falso sorriso e tentei entender onde ela
poderia querer chegar. Talvez em sua mente, as ações de Paul me

machucavam. Porém, não era aquele o motivo. Magoava-me o fato de ele


ter prometido ir a diante com o namoro falso por conta de Klaus, e que
manteria o pau nas calças para que não saíssem suspeitando que era
mentira. Até porque, a nossa mentira permitiu a mudança de um contrato

de milhões de dólares. Magoava-me sua falta de honestidade com nossa


amizade.

— Pode, por favor, vestir suas roupas e sair?

A voz de Paul soou como um trovão, mesmo que sua falsa calma
pudesse ser sentida.

— Eu ainda acho que...

— Ah, cale a boca! — falei, exausta daquele momento. — Dormiu


com ele, já entendi! O que mais quer? Que ele diga que vai me deixar pra

ficar com você? — ri sem vontade e notei seus olhos modificarem. —


Estou sentada, quieta, esperando que se resolvam, para poder conversar
com esse imbecil... — apontei para Paul que parecia inerte diante de minha
fala. — Será que pode ter um pouco de amor próprio e sair?

Ela me encarou com raiva, porém, pareceu acordar para a vida. Em


menos de cinco minutos a vi colocar as roupas espalhadas e sair do
apartamento, sem dizer nada.

Voltei meu olhar para Paul, que permaneceu parado no mesmo

lugar, me encarando com um claro pedido de desculpas.

— Estou cansada disso! — falei de uma vez, e fui até ele. — Será
que pode agir como a porra de um adulto e parar de usar sexo como escape
para seus medos? — seus olhos azuis me encararam perdidos e bati em seu

peito de leve, tentando puxá-lo para realidade. — Transar com várias


mulheres não vai fazer com que Ruby volte!

Paul deu um passo para trás no mesmo instante e passou as mãos


por seus cabelos. Era a única pessoa que sabia daquele episódio em sua
vida, nem mesmo com Klaus, seu irmão, ele tinha dividido.

— Quero ficar sozinho.

Como sempre, ele fugia.

O olhei por mais alguns segundos e me arrependeria de toda aquela

mentira se não fosse o fato de Klaus e Lia serem claramente loucos um


pelo outro. Paul e eu, nosso falso namoro, fora a forma fácil de juntá-los. O
problema, é que estava perdendo um de meus melhores amigos no meio
daquilo. Paul e eu, que apenas sorríamos juntos há alguns meses, no agora,
a cada duas conversas, uma se tornava discussão. Aquilo ia longe demais.

— Um dia, espero que encontre alguém que cure esse vazio. — dei
um passo para perto e toquei seu braço. Felizmente, ele aceitou meu toque.
— Mas enquanto isso não acontece, vamos apenas fingir isso e deixar

Klaus ser feliz.

Seu olhar encontrou o meu, e me puxou para um abraço forte. Logo


senti um beijo em minha testa e sorri. Ele era um imbecil, mas o amava,
por completo. Era uma parte de mim, e torcia, todos os dias, para que

encontrasse a pessoa capaz de tirá-lo de sua escuridão.

— Pizza? — perguntou e bati em seu ombro.

Aquele era, um claro pedido de desculpas com comida boa e bebida


cara. Mesmo magoada, assenti. Paul era humano, assim como eu. Amigos
perdoavam, e era aquilo que fazia naquele momento.
Capítulo 1

“Got me like, ah, ah, ah, oh

I’m tired of being played like a violin

What do I gotta do to get in your motherfuckin’ heart?”[30]

Andei pelas pessoas e finalmente encontrei um bom lugar para me


sentar e tomar uma bebida. Olhei rapidamente em meu celular e notei

algumas mensagens de Diana, a respeito das promessas que fizemos. Ela


estava certa em me cobrar, e ainda mais, por estar desapontada. Prometi
que me manteria longe das mulheres enquanto protagonizamos um
relacionamento falso, porém, parecia nunca o suficiente. Sempre
quebrando minha palavra.

Respirei fundo, e pedi uma dose do melhor uísque. Respondi Diana


rapidamente e tentei colocar em mente o que deveria me parar: sexo não
era solução de nada. Assim que o copo parou a minha frente, bebi um
pouco. Pensei a respeito do passado, e mais, no que fazia no presente. Meu

irmão parecia decidido em quebrar tal contrato, que obrigava ele e Lia
Harper a se casarem. Aquele velho contrato me prendeu a ela por muito
tempo, ao menos, era algo posto em nossas mentes. Mas quando percebi
que realmente teria que me casar com ela, lembrei-me de como Klaus já se
sentiu a respeito dela, e mais, o como ele era metódico em tudo em sua

vida. Por isso, fingir um relacionamento com Diana, levou-o diretamente


para os braços de Lia, e parecia fazê-lo acordar para o quanto perdeu por

ter reprimido seus sentimentos.

Um contrato não era nada perto de sua felicidade. Muito menos


perto da felicidade de sua amada. Ri amargurado de meu pensamento. Era
como se pudesse ouvir Ruby se declarando. Por que as pessoas têm a
mania de fazer escolhas erradas?

— As outras pessoas eu não sei, mas com toda certeza, sou uma
das quais vive em problemas. Será que por escolhas erradas?

Virei meu rosto para o lado e uma mulher de cabelos loiro escuros
me encarou. Ela sorria abertamente e parecia entretida com sua bebida,
olhando-me de canto de olho. Só poderia ter deixado aquele pensamento
fugir e falado em voz alta. Analisei-a rapidamente e tive a impressão que
conhecia aqueles traços de algum lugar.
— Não sei. — resolvi responder sua pergunta e bebi o resto de meu
uísque. — Dois dedos do mesmo! — pedi ao barman.

— Dia de afogar as mágoas? — a loira perguntou, e a encarei


novamente, sem muita vontade.

Ela tinha um sorriso gigante no rosto, que não fazia ideia de onde
vinha ou porque o mantinha. Sorrir demais lembrava a mim mesmo e o

quanto fingia bem aquilo. Não queria alguém como eu por perto. Não
naquela ocasião.

— Dia de ficar sozinho. — minha voz soou curta e grossa.

Ela pareceu não se importar, dando de ombros, e se virando para


frente, tomando a bebida cor de rosa. Balancei a cabeça e foquei em meu
uísque. Uma música eletrônica bombardeava o local, e apenas me lembrei
do quanto noites como aquela apenas me levavam para mulheres
diferentes. Nenhuma delas fora capaz de me fazer sentir inteiro, o que

parecia um castigo pelas más escolhas.

— Sim!

Ouvi o grito da mulher ao lado e notei que a música mudara. Ela


deixou a bebida ali, e mandou um beijo para o barman, que parecia
encantado pela mesma. A vi correr para a pista de dança, enquanto a
música em uma língua que poucas vezes arrisquei falar, o português,
preenchia o lugar. Era uma batida diferente e sorri, diante da forma que a

loira pareceu não se importar com ninguém e começou a rebolar.

Voltei minha atenção para o bar, e tentei esquecer a maluca que


antes se sentava ao meu lado. Senti uma mão tocar meu ombro e me virei.
Diana me encarou com um sorriso contido, mas o semblante sério.

— Se divertindo? — neguei com a cabeça. — O que veio fazer?

Levantei o copo de uísque e lhe mostrei, dando espaço para se


sentar no banco ao meu lado.

— Só isso? — insistiu e assenti. Não tinha sequer passado da


segunda dose de uísque, porém, ela não precisava saber sobre. — Vamos
lá!

— O que? — perguntei sem entender, e Dia apenas pegou minha


mão, puxando-me.

Sem me dar tempo para raciocinar, logo chegamos a pista de dança

e ela me abraçou, dançando ao mesmo tempo, no ritmo eletrizante da


música. Sorri de seu objetivo, claramente, fora por acaso que nos
encontramos, mas ela queria me animar. Diana me conhecia bem o
suficiente para saber que não ficaria por muito tempo no bar. Do jeito que
podia, ela me ajudava a espairecer de outras maneiras.

— Eu adoro essa música.


O grito em inglês fora mais alto que a música e tanto eu quanto
Diana nos viramos. A mesma loira de minutos atrás dançava animada, e

logo senti o corpo de Dia se afastando do meu. Ela parecia conhecer a


maluca.

Permaneci parado, vendo-a abraçar a mulher. Não saberia dizer


quem era, mas pelo fato de Diana a conhecer e ter me familiarizado com

ela não era por acaso. Diana então trouxe a loira para mais perto e a parou
na minha frente.

— Essa é Patrícia Oliveira. — falou perto de meu ouvido,


praticamente gritando.

— Mas podem me chamar de Pat ou Patrice. — a loira gritou e


assenti, enquanto estendia minha mão para ela. — Facilita a vida. —
concluiu, e piscou, apertando minha mão com a sua.

— Ela é a melhor amiga de Lia, lembra dela? — Diana perguntou,

enquanto nos puxava para um lugar um pouco afastado do meio das


pessoas que dançavam.

A alguns passos, a música parecia um pouco menos ensurdecedora,


e finalmente resolvi falar.

— Sou Paul Russel.

— Sei disso. — Patrice respondeu, e assenti para ela. — Quando


falei com você no bar, já sabia que era meu futuro cunhado.

Sorri de sua fala e notei que Diana assistia a tudo muito animada.

— Então, lembra dela? — insistiu na pergunta de minutos atrás.

— Quando a vi no bar, imaginei que já a conhecia. — constatei. —


Só não sou bom de memória.

— Faz muitos anos. — Patrice complementou e assenti. — Ah meu


Deus! — gritou ainda mais animada. — Preciso voltar para a pista de
dança!

Diana e eu trocamos um olhar, sem entender ao certo o porquê de


ela estar tão animada.

— É “Vai malandra”! — levou as mãos aos cabelos e os jogou para


trás, enquanto eu tentava entender ao certo o que as palavras em português
diziam. — Bom, é um sucesso de uma cantora pop funk do Brasil. —
explicou rapidamente. — Se me dão licença.

Ela praticamente correu de nós, e logo a vi se misturar aos demais,


perdida na música. Parecia leve e descomplicada. Notei a forma como o
corpo balançava diante da batida de forma perfeita. Os movimentos que ela
fazia com cada pequena parte acabaram me deixando hipnotizado.

Senti uma mão batendo em minha boca, como se para fechá-la, e


finalmente voltei a realidade. Os olhos castanhos de Diana me encararam
divertidos.

— Quer um lenço ou quem sabe um balde? — debochou e tive que

sorrir.

— Só estou surpreso pela forma como ela parece ser... — linda e


sexy. — Leve. — complementei, tentando deixar os pensamentos de lado.
Não poderia ir para cama com aquela mulher, ainda mais por ela ser

próxima de nós ao extremo. Seria um erro.

— Bom, olhando daqui, ela me parece gostosa... Mas leve também.


— Diana sorriu ácida, sabendo que a tal Patrice mexeu com meu corpo. —
Mas sabe que ela está fora dos limites, não é?

— Sei. — respondi, e a palavra soou muito mais lamentável do que


queria.

— Isso vai acabar em breve. — Dia piscou para mim, e mexeu em


minha camisa. — Enquanto isso, nada te impede de dançar comigo a noite

inteira.

— Isso é um convite? — perguntei, tentando desfocar da mulher na


pista de dança, que parecia prender os olhares de qualquer pessoa ao redor.

— Uma intimação.

Diana me puxou com ela para a pista e assim, fez com que meus
pensamentos voassem para longe dos problemas. Entretanto, a cada
momento que reparava ao redor, encontrava o olhar verde da loira que
parecia querer fugir do meu. Entretanto, em algum momento, poderia dizer

que estava tão interessada quanto eu em “mais”. Um “mais” que teria que
esperar, infelizmente. E que em minha mente, parecia completamente fora
de alcance. Já que possivelmente, Klaus e Lia ficariam juntos, o que faria a
tal Patrice ser presente na vida de meu irmão. Não poderia magoar alguém

próximo. Não mais.

Abri a porta do apartamento e logo a tranquei. Tirei os sapatos de


salto e joguei em qualquer lugar. Sentei-me com tudo no sofá e fiquei por
alguns segundos encarando o teto. Não queria pensar muito a respeito,
mas, pareceu-me impossível. O meu sonho de consumo se encontrou a
poucos passos, e não pude fazer absolutamente nada. Nada.

— Merda! — reclamei, levando as mãos à cabeça.


Odiei o fato de olhar para Paul Russel, depois de tantos anos, e
ainda sentir as pernas bambas. Odiei o fato de que ele parecia tão

interessado em mim, mesmo com a namorada nos braços. Odiei ainda mais
saber que ele não valia nada, e que pelo jeito, nunca seria o cara certo.

O problema em si era não querer o cara certo, e sim, uma noite


completamente errada. Mordi a língua, tentando desviar meus

pensamentos. Depois de tantos anos, era uma das poucas vezes que voltava
de uma noite na balada sem alguém. O fato de que meu corpo apenas
reagiu a Paul era uma das variáveis responsáveis, porém, a presença de
Troian sob o mesmo teto, me incomodava. Não queria que meu primo, que
considerava um irmão, tivesse mais motivos para me encher com sua
superproteção.

Peguei meu celular e entrei no instagram. Encarar aquela rede


social e stalkear Paul era algo de praxe. Porém, ao olhar para a primeira

foto, senti-me culpada. Diana fora um amor comigo, por saber que era a
melhor amiga de Lia. Joguei o celular de lado, implorando para que aquele
desejo pelo homem proibido passasse. Levei as mãos ao rosto e gritei,
querendo tirar tal coisa de meu corpo.

— Por que? — perguntei para o nada, sem entender minhas


próprias vontades.

Peguei o controle da televisão e a liguei. Coloquei rapidamente um


de meus clipes favoritos e tentei concentrar na música, não querendo

lembrar dos olhos azuis daquele me atraía, a barba por fazer e o cabelo

grande desalinhado na cor castanho, ou até mesmo, o sorriso contido, mas


presente em seus lábios. Ele era a perfeição. Para uma mulher que teve
bons momentos com homens lindos, era uma constatação a ser levada a
sério.

— Esquece essa merda, Patrícia!

Falei em português, nervosa por estar tão afetada com


simplesmente alguns olhares.

— Alguma merda aconteceu! — a voz de Troian chegou a meus


ouvidos. Ele arranhava no português, mas era melhor do que muitos
gringos que via por aí. — Quer conversar?

O encarei e neguei com a cabeça. Troian pegou uma cerveja na


geladeira e com um aceno de cabeça, seguiu para o seu quarto. Felizmente,

ele não era um cara de insistir em algo. Voltei minha atenção para a
televisão e coloquei outro clipe, algo mais dramático. Como diria meu

muso inspirador: Não é drama e nem exagero. Sou eu[31]. A música


começou e me levantei, usando o controle como um microfone.

“Menina, me dá sua mão, pense bem antes de agir


Se não for agora, te espero lá fora, então deixe-me ir

Um dia te encontro nessas suas voltas

Minha mente é mó confusão

Solta a minha mão, que eu sei que cê volta

O tempo mostra nossa direção

Se eu soubesse que era assim, eu nem vinha

Tô bebendo champanhe e catando latinha

Mas tive que perder pra aprender dar valor

Pra você entender seu amor, mas não quer ser mais minha

Então diz que não me quer por perto

Mas diz olhando nos meus olhos

Desculpe se eu não fui sincero

Mas a vida que eu levo, erros lógicos.”[32]

Continuei com a música, tentando esquecer tudo que me cercava.


Mas ao mesmo tempo que cantava, percebi que Paul parecia ainda mais
presente em meus pensamentos. Por um minuto, permiti-me fingir que
cantava para ele, mesmo que ele nunca entendesse nada. Era um erro,
sempre seria. Ele era apaixonado por outra, e eu, a louca por uma noite

com ele. O quão absurdo aquilo se tornaria?


Capítulo 2

“I'm a pagan of the good times

My lover's the sunlight

To keep the goddess on my side

She demands a sacrifice.”[33]

Despertei com o som de meu celular, e mesmo com os olhos

fechados, tateei o outro lado da cama em busca dele. Assim que encontrei,
o levei ao ouvido.

— Fala!

— E aí, gatinho! — abri os olhos no mesmo instante, perdido


diante da voz do outro lado da linha. — Como vão as coisas?

— Ruby? — perguntei, sentando-me rapidamente.


Há quanto tempo não ouvia sua voz?

— Existe mais alguém que te chama assim? — perguntou, e notei a

forma como sua doce voz mudou.

— Não. — apressei-me na resposta. — Apenas você.

— Faz um bom tempo, eu sei. — pareceu se explicar. — Mas acho


que muitas coisas ficaram para trás diante daquele infeliz momento.

Principalmente, o que poderíamos ter sido. Resguardei tais palavras


e respirei fundo. Precisava dizer a coisa certa.

— Está de volta? — perguntei, sentindo-me completamente


ansioso.

— Por um tempo. — sua voz soou baixa. — As coisas mudaram, eu


sei. Vi as suas fotos e de Diana nas redes sociais...

— Ruby, eu posso explicar.

— Você sempre pode, Paul. — fechei os olhos, sendo carregado


para o outro momento em que proferi as mesmas palavras. Merda!

— Podemos nos ver? — perguntei, parecendo um completo


desesperado. Eu era. Ainda mais por ter a chance de consertar meus erros.

— Por isso estou ligando. — sua afirmação me pegou de surpresa.


— Tenho tentado seguir em frente durante o último ano, mas as coisas
estão meio fora do controle e...Bom, pensei que dando o fim certo para o
que ficou para trás, poderia seguir em frente.

Aquelas palavras me acertaram em cheio. Ela queria dar um fim.

Mais uma vez, a perderia. Não poderia simplesmente aceitar tal coisa.
Mesmo que ela não soubesse ainda, tê-la perto, apenas me faria querer
lutar. Eu queria seu amor, sentia que precisava dele.

— Eu sei que as coisas terminaram de forma complicada, mas... —

suspirei fundo. — Que tal nos vermos hoje?

— Tenho que resolver algumas coisas, mas a noite, estou livre. —


comentou, e me segurei para não gritar de felicidade. — No restaurante de
sempre?

— Sim, perfeito.

O mesmo lugar que a conheci, seria perfeito para trazer lembranças


boas de nós à tona.

— Te vejo mais tarde então.

— Até mais, Ruby.

Ela desfez a ligação e encarei o celular por alguns segundos sem


conseguir dizer nada. Era surreal. Parecia estar dentro de um sonho e que a
qualquer momento acordaria para realidade. Olhei novamente em meu
celular, e vi seu nome gravado na ligação. Era mesmo ela, depois de tanto
tempo. Praticamente um ano e meio.
Encarei as horas e pensei rapidamente no que fazer. Mandei uma
mensagem para Diana, pois ela me orientaria diante daquele momento.

Não poderia dizer a Ruby que nosso relacionamento era algo real, sendo
que queria reconquistá-la. Teria que abrir o jogo com ela, e assim, investir
em nós.

Destinatário: Diana

“Precisamos conversar.

Vou encontrar Ruby hoje, preciso dizer a verdade pra ela.”

Corri para o banheiro e liguei a ducha, tomando um rápido banho.


Precisava encontrar Dia e decidir a respeito do que fazer. Infelizmente, não
era algo que poderia resolver sozinho. Minutos depois, enquanto me

secava, olhei sua resposta.

Remetente: Diana

“Ok, me encontre em no restaurante perto da casa de Lia.”


Mandei-lhe apenas um “ok” e fui me vestir no closet. Encarei meu

reflexo no espelho e não pude evitar o sorriso enorme que emoldurou meu
rosto. Mesmo diante de tantos problemas, Ruby aparecera, como sempre,
trazendo-me paz. Se não tivesse ferrado tudo no passado, com toda certeza,
estaríamos juntos. Aquela era uma parte minha que simplesmente odiava.

— E então? Ela simplesmente ligou e você vai vê-la? — Diana


indagou, sentando-se na cadeira a minha frente, com os olhos fixos nos
meus.

— Ela está de volta na cidade, por um tempo... Foi o que disse. É a


minha chance, Dia! — falei, tentando segurar a ansiedade que me atingia.

— Só você pode ficar tão feliz por tal “chance”. — fez aspas com
os dedos. — Ela disse o que queria?

— Que quer dar um fim ao que tivemos, para então poder seguir
em frente... — levei as mãos ao rosto, sentindo-me sufocar por alguns
segundos. — Ela se sente como eu, tenho certeza. Mesmo que o erro tenha
sido meu e...
— Ok, não vamos entrar no assunto sobre quem traiu quem
novamente. — refutou e fiquei em silêncio. Diana tinha tal poder de

chamar atenção, que muitas vezes, apenas me calava. Ela sabia o que fazia.
— Mas me diz, vai mesmo arriscar tudo por conta dela? — o desdém em
sua voz não me passou despercebido.

— É Ruby, não qualquer outra. — senti-me completamente

cansado daquilo.

Completavam mais de três meses que vivíamos tal farsa. Atuando


diante de todos como casal, e rindo dos beijos sem química alguma que
tivemos que trocar. Era cansativo devido ao fato de ter que esconder a
respeito das noites com outras mulheres, e ainda mais, a lembrança assídua
de Diana a respeito do que aconteceria caso todos descobrissem que a
“traía”. Meu pai e Klaus, assim como seu pai, iriam me matar caso
chegasse a eles. E ainda mais, prometi que pararia com tal coisa. Mas me

pedir para ficar longe de Ruby, era demais.

— O combinado não era esse. — continuei. — Somos apenas uma


farsa para que Klaus não me visse casar com a mulher que ele ama.

— Não estou pedindo seu amor, porra. — soou categórica. — Mas


enquanto acreditarem que somos um casal, não aceito que transe com
outras.
— Mas é a Ruby! — enfatizei e Diana bufou, surpreendendo-me.

— Me poupe disso, Paul. — fez um sinal de desdém com as mãos.

— Se estamos fazendo isso é por seu irmão, e agora também, por Lia, que
se tornou uma grande amiga. Não me venha querer ferrar tudo só porque
quer reviver alguns momentos de merda com essa mulher!

— O que tem contra Ruby? — perguntei com raiva, e Diana não

recuou em sua posição. Parecia decidida em sua fala. — Meu irmão e Lia
estão realmente juntos agora. — tentei amenizar a situação, mostrando-lhe
o óbvio. — Por que estamos discutindo sobre isso?

— Por que? — sua pergunta soou retórica. — Porque desde que


teve que dar banho no seu irmão por ele beber demais, depois que o peguei
praticamente apagado na balada, sabíamos que tinha algo muito errado
com ele. Ainda mais pelo fato de ele sussurrar o nome Lia bêbado. Eu
coloquei Klaus contra a parede, e recebi a confirmação de que tinha

sentimentos por ela, e assim, decidimos dar um jeito nessa merda!

— Mas não são minhas merdas, porra! — rebati, e me arrependi no


segundo seguinte da fala. Diana me encarou completamente magoada.

— Eu te conheço bem, Paul Russel. — balançou a cabeça de um


lado para o outro. — Sei que abriu mão de muitas coisas para que sua
família não se afastasse. Hoje vejo que não posso pedir mais para você!
— Dia...

— Espero mesmo que Ruby valha a pena. — continuou, ignorando-

me por completo. — Porque, logo mais, darei um jeito em tudo. Só adie a


merda da verdade para ela! — praticamente ordenou.

— Dia, eu...

— Estou tão exausta quanto você dessa mentira. É horrível ter que

fingir por aí tantas coisas, trocar beijos em momentos que Klaus aparece,
para que ele engula isso. Me machuca enganar um dos meus melhores
amigos. Vocês são meus irmãos da vida, porra! — esclareceu, e senti-me
ainda mais culpado. Diana parecia conseguir carregar as dores de todos em
suas costas. — Não posso pedir para que fique longe de uma mulher que te
deixou, mas ao menos, espere que eu acabe com tudo, e poderá desfilar por
aí com ela.

— Ela pode não me querer. — constatei o óbvio.

Diana sorriu sem vontade, e se levantou em seguida.

— Ela sempre quis, Paul. — revirou os olhos. — Tem coisas que se


não aprendeu de primeira na dor, com certeza, doerá muito mais na
segunda tentativa.

Virou-se para sair e segurei seu braço rapidamente, levantando-me.

— Eu sinto muito por...


— Não. — afastou-se. — Devia sentir muito por si mesmo.

Ela então saiu, deixando-me completamente perdido. Diana parecia

saber mais sobre algo que sequer desconfiava. Porém, ela daria um jeito, e
com toda certeza, teríamos um fim adequado. Assim, poderia seguir em
frente.
Capítulo 3

“Saw you walk inside a bar

He said something to make you laugh

I saw that both your smiles were twice as wide as ours

Yeah, you look happier, you do.”[34]

Andei de um lado para o outro à frente do restaurante, tentando

diminuir a ansiedade que me consumia. Mandei uma mensagem para Ruby


avisando-lhe sobre o horário e até ofereci a possibilidade de buscá-la,
porém, ela negou veemente. Levei as mãos aos cabelos e parei
rapidamente. Em seguida, levantei o celular e encarei meu reflexo, vendo
se não estava completamente desordenado. Queria estar perfeito para ela.

O celular marcou oito horas da noite em ponto, e finalmente,


resolvi entrar. Ruby ainda não tinha chegado. Porém, esperar do lado de
fora se tornara cansativo. Entrei no restaurante e conferi a reserva, sendo

levado até a mesa. Sentei-me, e encarei mais uma vez a tela do celular,

buscando alguma mensagem dela. Ruby não era do tipo de pessoa que se

atrasava.

Meu celular tocou de repente. Vi o seu nome e suspirei fundo,


atendendo rapidamente.

— Ei!

— Oi, gatinho! — sua voz soou amena. — Desculpe ligar em cima


da hora, mas é que tive um problema na empresa de meus pais e... Bom,
não vou poder ir hoje.

Foi como levar um soco no estômago. Passei as mãos por meus


cabelos, sentindo-me completamente perdido.

— Não quer passar no apartamento mais tarde ou...

— Realmente, acho que essa reunião não tem hora para acabar e...

Bom, vou estar tão cansada que não vamos conseguir conversar direito.

— Certo. — respondi sem muita empolgação. — Amanhã então?

— Sim, eu te mando mensagem.

— Ok. — não sabia mais o que dizer.

— Até mais, Paul!

Ela desfez a ligação e me segurei para não jogar o celular contra a


parede. Em minha mente, a noite estava toda programada. Teríamos uma
conversa franca e lhe pediria uma nova chance. Uma chance para mostrar

que não era o Paul de cerca de um ano e meio atrás. Que sua partida me
deixou tão perdido, que finalmente entendera que queria de fato ser amado.

Encarei o celular mais uma vez e respondi uma mensagem de


Diana, que perguntava se estava tudo bem. Não, nunca estaria. Não

enquanto soubesse que Ruby estava tão perto e ao mesmo tempo tão longe
de mim. Menti na resposta para minha amiga, dizendo que as coisas
corriam perfeitamente bem. Deixei o celular sobre a mesa, e logo fiz meu
pedido, uma garrafa do melhor vinho. Ao menos apreciaria o resto da noite
de alguma forma.

Olhei o cardápio sem muita vontade e acabei optando por uma


massa. Assim que o garçom se afastou, notei uma mulher andando meio
perdida entre as mesas. Ela claramente buscava alguém ou se perdera por

ali. Com mais atenção, pude finalmente reconhecê-la, e mais uma vez, sua
beleza me impactou.

Se na luz fraca de uma balada ela era bonita, ali, no ambiente


iluminado, ela se tornava fascinante. Existia algo nela, além dos cabelos
loiros bem cuidados, a forma graciosa de andar no salto, o olhar verde
atento, e o corpo pequeno, que me encantavam. Quando ela finalmente deu
alguns passos e se aproximou, levantando o rosto, finalmente me notara.
Um sorriso sincero se abriu em seu rosto e fora impossível não retribuir.

Algo nela, fazia com que o lado que tanto guardava, aparecesse.

— Ei, como vai? — perguntou, aproximando-se.

Levantei-me para cumprimentá-la, e ela me deu dois beijos no


rosto, surpreendendo-me por completo. Pelo seu olhar divertido, notara
minha surpresa.

— Desculpe, passei um bom tempo no Brasil antes de vir para cá.


— deu de ombros. — Às vezes me esqueço que somos um pouco mais
calorosos que os americanos. — sorriu e apenas assenti.

Ela era brasileira, aquilo explicava seu sotaque diferente.

— Como vai, Patrice?

— Bem... — suspirou fundo. — Um pouco perdida, para ser


sincera. Era para ser um jantar de negócios, mas as coisas saíram do
controle. — explicou rapidamente.

— Quer se sentar e conversar? — ofereci.

Ela arregalou os olhos, porém, não questionou. Apenas se sentou à


minha frente e parecia mais aliviada.

— Fingi estar procurando o banheiro — levantou uma mão,


claramente em sinal de rendição. — O cara do jantar de negócios era um
babaca, que ficou mais tempo dando em cima de mim do que realmente
conversando. Ele queria me levar em casa... — ela riu baixinho, deixando

claro que as intenções dele eram outras. — Pensei em simplesmente sair

antes dele e pegar um uber, mas, a ideia de dizer que ia ao banheiro e


nunca mais voltar soou mais divertida.

Sorri amplamente de sua decisão e ela piscou em minha direção.

— E você, qual sua história divertida da noite? — perguntou e

neguei com a cabeça.

Infelizmente, não era nem um pouco nos padrões da dela.

— Apenas jantando, sozinho. — dei de ombros e ela assentiu,


fechando seu semblante. — Algo errado?

— Comer sozinho é algo tão... triste. — suspirou, parecendo se


perder nos próprios pensamentos. — É algo que prezo muito, comer com
companhia. Acho que um dos melhores momentos do dia tem que ser
compartilhado.

— Isso é algo de brasileiro também? — perguntei, e ela negou.

— Bom, acredito que é mais meu. — deu de ombros. — Então,


quer companhia? — perguntou, e sorri de sua falta de sutileza.

Aquela bela mulher parecia ser decidida a respeito do que fazer.


Gostei daquilo nela. Não conseguia explicar como de repente tudo parecia
bom ao tê-la a minha frente. Nem mesmo o motivo o qual me levara a estar
sozinho naquela mesa de restaurante.

— Sim, por que não? — pisquei e ela sorriu, recostando-se melhor

na cadeira. — Já comeu, não é?

— Sim, foi o único momento bom da noite. — sorriu baixinho. —


Mas isso não me impede de aproveitar esse Château Haut-Brion.

Surpreendi-me por seu entendimento do vinho e chamei o garçom,

pedindo mais uma taça.

— Uma amante de vinhos? — perguntei, fazendo questão de servi-


la.

Ela sorriu, pegando a taça em mãos assim que terminei.

— Esse é um dos melhores vinhos do mundo. — constatou o que


eu já sabia. — E como diria um dos meus filmes favoritos: “Anos, amantes

e taças de vinho. São coisas que nunca devem ser contadas.”[35] — piscou
em minha direção e logo se deliciou com o vinho.

Sorri, e logo meu pedido chegou. Encarei Patrice rapidamente, e


ela pareceu completamente alheia ao fato de que em algum lugar daquele
restaurante uma pessoa realmente lhe esperava com intenções nada
honrosas.

— Senti falta disso. — comentou, e a encarei atentamente,


enquanto degustava um ótimo farfalle.
— Do que exatamente? — perguntei em seguida, e ela me encarou,
claramente feliz por estar tendo atenção. Ela parecia realmente apreciar

estar acompanhada.

— Nova Iorque. — olhou ao redor. — A forma como esse lugar


parece unir todos os mundos e ao mesmo tempo separá-los. — deu de
ombros. — O Canadá não é assim, e nem de perto o Brasil. Por mais que

ame meu país de origem, ainda assim, é difícil dizer o quão complicada as
coisas são por lá.

— Por que não mora em Nova Iorque? — perguntei, e ela bebeu


mais um pouco do vinho antes de responder.

— Já ouviu falar sobre o nosso coração estar onde as pessoas que


amamos estão? — perguntou e assenti. Algo nela parecia sempre
relacioná-la a frases temáticas. Na maioria das vezes, aquilo me angustiaria
ou me cansaria. Porém, com ela, parecia algo natural. — Pois bem, minha

família está separada entre esses dois países desde que meus pais
morreram. Aí, venho para cá apenas a negócios, mesmo que pudesse
passar a vida toda apenas sorrindo para os telões da Times Square. — sorri
de sua fala, e continuei comendo. Notei que se acomodou melhor, e
colocou um cotovelo sobre a mesa. — E você, Paul Russel? O que te
prende a essa cidade?

— Eu? — perguntei, e tomei um pouco de vinho. — Nasci e cresci


aqui. É algo prático e também, onde minha família está. — pisquei para

ela, que entendeu a referência. — Nunca almejei morar fora.

— Que tédio. — comentou, surpreendendo-me. Em alguns minutos


daquela noite, ela conseguira me surpreender mais do que a maioria das
pessoas o fazia durante anos. — Digo, parece não ter um plano maior para
sua vida.

De alguma forma, ela parecia ter me lido. Era real, não existia um
grande sonho em meu ser. Tornei-me um homem prático e nada mais.

— Sou um pouco chato, para ser sincero. — confessei. — Mas


quem sabe um dia não tenha vontade de viajar o mundo e não ter hora para
voltar? — perguntei e ela sorriu amplamente.

— Parece uma ideia interessante. — bateu os dedos na mesa,


claramente pensando em algo. — Fiz isso uma vez, ao completar dezoito
anos. — arregalei os olhos, completamente surpreso. — Eu e uma mochila

por longos meses. — confessou e sorriu, parecendo se lembrar do


momento. — Mas confesso que ter para onde voltar era o que realmente
importava no fim do dia.

— Quando te vi no bar, ontem, não imaginei que fosse uma mulher


tão complexa.

Ela revirou os olhos e permaneceu atenta em mim.


— A maioria das pessoas me acha doida diante da minha
espontaneidade. — deu de ombros, claramente despreocupada. — Sou

assim, o que posso fazer?

— Encarar como uma qualidade? — indaguei e levantei a taça. —


Que tal um brinde ao que citou mais cedo? — perguntei e ela me encarou
sem entender por um momento. — Anos, vinhos e...

— Ah, claro. — sorriu baixinho. — Anos, vinhos e amantes. —


levantou sua taça e brindamos. — Isso foi espontâneo! — admitiu, após
beber um longo gole.

— Tenho uma nova ótima mentora a respeito.

Ela sorriu novamente, e por um momento, agi como ela. Comparei-


a, neste caso, a uma música. O sorriso dela, parecia conseguir iluminar
uma cidade inteira. Encontrávamos em Nova Iorque, portanto Patrice
poderia iluminar qualquer outro lugar do mundo.
Capítulo 4

“You should take it as a compliment

That I got drunk and made fun of the way you talk

You should think about the consequence

Of your magnetic field being a little too strong. ”[36]

Respirei fundo e sorri em meio ao sonho, no momento em que


meus braços se enroscaram a um pequeno corpo quente. Cheirei seus
cabelos e o aroma de baunilha me atingiu. Desci o nariz para seu pescoço e
inspirei, o cheiro de morango transpassando por todo meu corpo. Senti-me
acordar naquele instante. Abri os olhos e a assim que encarei a bagunça de
cabelos loiros, paralisei. Pisquei algumas vezes e fechei os olhos, pensando
estar preso em algum sonho. Abri os olhos mais uma vez, e nada mudou,
ainda estava ali. Em minha cama, com a mulher que me acompanhou no

jantar noite passada, e ela não era Ruby.

— Merda! — praguejei baixinho, e me afastei com cuidado de seu


corpo.

Ela se virou, puxando o lençol sobre suas pernas e sorriu em seu


sono. Passei as mãos por minha cabeça e tentei me lembrar de algo da

noite passada. Mas nada, absolutamente nada me vinha em mente. Encarei-


a mais uma vez e me senti um canalha por sequer me lembrar da noite que
passamos juntos. E pior, como olharia para ela quando acordasse. O que
diria?

— Patrice! — chamei-a e respirei fundo, tentando soar casual.

Felizmente ela se remexeu na cama e em poucos segundos seus


olhos verdes pararam nos meus. Um sorriso sonolento estampou seu rosto
e ela se espreguiçou, claramente a vontade. Merda duas vezes!

— Precisamos...

O som da campainha me parou e fiquei dividido entre falar com


ela, e ver quem chegara. Não poderia ser Diana, já que a mesma tinha a
chave. O que me levava diretamente a Klaus, que poderia muito bem, estar
precisando de algo. Porém, não poderia ver a melhor amiga da sua futura
noiva ali. Ele me esganaria.
— Espera aqui, ok? — perguntei, claramente implorando e ela
assentiu.

Acomodou-se melhor na cama e fechou os olhos. Ótimo! Ela ainda


estava com sono.

Saí do quarto rapidamente e segui para a porta apenas de cueca.


Meus pensamentos voltaram-se para a noite que parecia um simples breu

em minha mente. Abri a porta sem sequer encarar o olho mágico. Só


poderia ser Klaus.

— E aí, irm...

Parei de falar e minha boca secou. Encarei a mulher de cabelos


pretos a minha frente e tentei dizer algo, mas as palavras sumiram. Um ano
e meio sem uma notícia e ela estava ali, mais uma vez. Em sua mão dois
cafés, que claramente seriam para nós e um pequeno sorriso no rosto. O
que ela fazia ali àquela hora? Como ela tinha subido?

— Ei, gatinho!

Fiquei estático, sem saber como agir. Ter Ruby tão perto assim era
como um choque, ainda mais, por ser completamente inesperado.

— Surpresa! — falou um pouco sem graça e finalmente voltei a


minha realidade.

Sua boca carnuda me chamava, assim como os olhos negros. Ela


estava como me lembrava, e todo meu corpo pareceu anestesiado. Porém,
algo dentro de mim não reagiu da forma que esperava. Não deveria estar

absurdamente feliz?

— Desculpe, entra. — falei rapidamente, e ela passou por mim.

Encarei ao redor com pavor, como se algo pudesse estar fora do


lugar. Ruby sorriu em minha direção e parou no meio da sala, um pouco

acuada. Finalmente me toquei do que acontecia e dei um passo à frente, na


intenção de lhe cumprimentar da forma correta.

— Puta merda!

Um grito feminino fez com que eu e Ruby nos virássemos. Encarei


Patrice com espanto e só então me toquei de que a deixei em minha cama.
Ruby arregalou os olhos e não me encarou. Senti a culpa me invadir e ali,
percebi que a perdia pela segunda vez.

— Ruby, eu....

— O café. — Ruby falou e o deixou sobre a mesinha de centro.

Ela então tentou passar por mim, mas segurei seu braço, tentando
pará-la.

— Por favor, me escuta.

A porta da frente se abriu e a sobrancelha de Diana se ergueu. Ela


assistiu à cena na sala de meu apartamento, claramente espantada. Nesse
meio tempo, Ruby se soltou de meu braço, e Diana lhe deu espaço para

passar pela porta.

— Ruby! — gritei e tentei correr até ela, só então me lembrei que


estava apenas de cueca. — Merda!

Passei as mãos por meus cabelos e encarei Diana, que olhava entre
mim e Patrice que parecia completamente perdida. Corri até meu quarto e

peguei uma calça e uma camisa, vestindo-as rapidamente.

— Por que não a impediu de sair? — perguntei, claramente


transtornado e Diana deu de ombros, como se não significasse nada.

— Se vire com a mulher da sua vida. — debochou com um sorriso


de lado, e resolvi não lhe dar atenção.

Saí correndo dali, torcendo para que encontrasse Ruby na frente do


prédio, e mais, para que quando voltasse, Diana e Patrice tivessem
desaparecido de meu apartamento. Precisava consertar as coisas.
Olhei rapidamente para minha roupa e me certifiquei de que

realmente estava com o vestido que saí de casa. Felizmente, pelo breve
olhar, notei que tudo permanecia em seu devido lugar. Levantei meu olhar
para Diana, que simplesmente me encarou com uma sobrancelha arqueada.

Não, era nada aquilo que ela estava pensando!

— Calma! — fiz um sinal com as mãos e as passei pelos cabelos


em seguida, tentando alinhá-los. — Não é nada disso que...

— Eu estou pensando? — perguntou e se sentou no sofá,


claramente confortável. — Então me diga, o que devo estar pensando? —
indagou.

Abri a boca várias vezes e não consegui falar nada. Sentia-me


culpada por ter sentado naquela mesa com Paul na noite passada, e pior, ter
bebido até cair com ele pelo resto da mesma.

— Sério, não aconteceu nada... Absolutamente nada! —


praticamente gritei e Diana permaneceu plena, encarando-me como se
aquilo não representasse nada. — Encontrei Paul por acaso num
restaurante e fiz companhia a ele em algumas taças de vinho, as taças
passaram para doses de uísque num bar e... Droga! Ele passou mal e me
senti responsável. Estava bêbada, mas ainda assim, melhor do que ele. —
esclareci, sentindo o quanto aquela foi uma péssima ideia. — O trouxe

para casa e o coloquei na cama... Estava cansada e devo ter apagado em

seguida... — respirei fundo e encarei o chão, sentindo-me envergonhada.


— Não transamos! — soltei por fim, e já pensei em sair dali sem olhar
para trás.

Merda!

De repente, a gargalhada de Diana reverberou por todo ambiente e


arregalei os olhos, completamente surpresa.

— Está na cara que não transaram. — acusou e pisquei algumas


vezes, sem saber como reagir. — Algo me diz que se tivessem chegado a
algo mais na noite, o imbecil do Paul não estaria correndo atrás da vaca.

— O que? — minha voz praticamente não saiu.

— Olha só. — Diana se levantou e deu passos em minha direção,


parando de repente. — Paul não é do tipo de cara que aceita apenas beber a

noite toda com uma mulher... E, confia tão facilmente nas pessoas.

— Como assim? — perguntei, completamente perdida.

— Relaxa. — segurou meus ombros e respirou fundo, sem entender


bem, fiz o mesmo. — Que tal eu te pagar um café e conversarmos?

— Mas, Diana...

— Nada de “mas”. — cortou-me rapidamente. — Preciso desabafar


com alguém e você Patrice se tornou a pessoa perfeita.

Assenti algumas vezes e sem saber muito o que fazer, voltei

rapidamente para o quarto onde acordei um pouco perdida, acreditando


estar vivendo um sonho, e calcei meus sapatos. Peguei minha bolsa jogada
sobre o chão e segui Diana em direção a porta. Minha cabeça girava,
amaldiçoando-me por ter bebido tanto e mais, pela confusão que me meti.

Alguns dias em Nova Iorque e a minha vida parecia uma boa novela das
nove. Naquele momento, quando entrei no elevador, fiz mais uma vez em
voz alta uma falsa promessa.

— Nunca mais vou beber. — proferi e Diana riu baixinho.

Assim como eu, ela sabia. Com toda certeza, não beberia até o

próximo momento que sentisse vontade. Encarei meu reflexo no grande

espelho do retângulo de metal e sorri por estar ao menos apresentável. Se

uma noite de bebedeira com minha paixonite adolescente que resultou em

acordar em sua cama, e em seguida, encontrar uma mulher desconhecida

e sua atual namorada no meio de seu apartamento, não me deixou


completamente devastada, poderia ao menos, enfrentar um café com

Diana. Notei seu sorriso em minha direção pelo reflexo do espelho e

minhas ideias morreram. Como diria minha velha avó: tinha caroço

naquele angu.
Capítulo 5

“I always thought I would sink

So I never swam

I never went boatin'

Don't get how they are floatin'

And sometimes I get so scared

Of what I can't understand.”[37]

Diana andou a minha frente e logo estávamos dentro de uma


cafeteria localizada a uma quadra do prédio de Paul. Sentei-me
rapidamente e levei as mãos à cabeça, aquela dor chata me incomodando.
Ressaca!

— Já volto! — Diana falou e de relance a vi ir em direção a um


balcão.

Respirei fundo e tentei acordar daquele sonho doido. Porém, o

cheiro delicioso de café por todo ambiente deixava claro – era real. Olhei
ao redor e a bela cidade parecia mais acordada do que nunca, menos as
pessoas ali dentro, que assim como eu, imploravam por café com o olhar.

— Aqui. — Diana apareceu de repente, depositando um copo a

minha frente. — Expresso duplo. — avisou e quase ergui as mãos aos céus
em agradecimento.

— Obrigada. — tomei um bom gole, enquanto Diana se sentava a


minha frente.

Ela bebeu um pouco de sua coca-cola e passou as mãos pelos


cachos soltos. Logo seu olhar castanho encontrou o meu e me senti ainda
mais sem graça. Não conseguia entender o que de fato acontecia.

— Paul, Klaus e eu sempre fomos amigos, melhores amigos

mesmo. Aqueles dois sempre foram como dois bobões nas minhas mãos e
sempre fiz de tudo para que fossem felizes. Tudo que estivesse ao meu
alcance. — depositou a bebida na mesa, e esticou os braços em seguida,
respirando profundamente. — Klaus sempre foi apaixonado por Lia, o que
nunca escondeu de mim, mas tentou evitar ao máximo... Ele tem seus
motivos para não ter lutado por ela no passado. — explicou-se rapidamente
e naquele momento, tinha uma pequena noção sobre tudo, ao menos, pelo
que Lia me contara. — Faltavam poucos meses para que Paul e Lia se

encontrassem para decidir algumas coisas a respeito do casamento, e


notamos uma mudança radical em Klaus. Ele faz artes marciais, mas nesse
tempo, basicamente triplicou as horas na academia e praticamente não
dormia. Além de beber até cair. — arregalei os olhos, completamente

surpresa. — Isso fez Paul e eu voltarmos ao passado, e acabei colocando


Klaus contra a parede. Ele me confessou que ainda tinha sentimentos por
Lia.

— Deus! Todo esse tempo amando a mulher “proibida” ... —


deixei as palavras no ar, e fiz aspas com as mãos, sentindo-me péssima
com tal constatação.

Sempre desconfiei a respeito dos olhares de Klaus para Lia no


passado, porém, não era minha história, e minha amiga resolveu apenas

seguir em frente.

— Pois é. — Diana concordou sem muita empolgação. — Paul e eu


pensamos em todas as possibilidades, até mesmo na quebra do contrato...
Mas acabamos optando pelo que pensamos ser o melhor, o que
aproximaria Klaus e Lia.

— Como assim? — perguntei, completamente perdida.


— Paul teve uma ideia estúpida há um tempo, sobre Klaus o
substituir no contrato, caso ele namorasse. — revirou os olhos. — Mas o

problema era que ninguém acreditaria em algum caso repentino de Paul,


principalmente, seu pai, Dominic. E Dom não deixaria que Paul
interferisse dessa forma na vida de Klaus.

— Meu Deus!

Levei as mãos a boca, completamente embasbacada. A forma como


Diana pareceu completamente calma ao me ver no apartamento de Paul,
seu convite para um café e aquela história maluca... Apenas me levavam a
uma conclusão ainda mais desvairada.

— Não pode ser. — falei baixinho e ouvi a risada de Diana.

— Paul e eu fingindo um relacionamento? — indagou e senti meu


rosto esquentar, pois aquela hipótese não poderia ser real. — Pura
realidade, Pat.

— Mas... Vocês pareciam tão perfeitos nas fotos e... Lia disse que
viu os beijos e... — praticamente gaguejei, tamanho meu espanto.

— Primeiro de tudo, somos bons atores. Quer dizer, descobri que


sou uma boa atriz nesse meio tempo. — piscou e escorou os cotovelos na
mesa. — Segundo, fotos são minha especialidade... — sorriu amplamente.
Lembrei-me naquele momento que ela era a responsável por todo
marketing da empresa dos Russel. Não poderia negar, todas as

propagandas eram impecáveis. — Terceiro e último, fotos em redes sociais

são em sua maioria, mentirosas. — complementou e deu de ombros.

— Mas os beijos...

— Nem me lembre! — seu semblante se transformou, parecendo


tomado pelo asco. — Beijar Paul era como beijar uma parede. — sorriu

com escárnio. — Somos como irmãos, acredite em mim.

— Puta merda! — soltei de uma vez, e não pude evitar usar o bom
e velho português. Diana abriu um grande sorriso, mas pareceu não
entender por completo. — Desculpe, quando fico muito surpresa, ou muito
feliz, ou muito animada... acabo falando em português.

— Pelo jeito, foi um palavrão. — assenti e ela sorriu ainda mais. —


Certo! Agora você me pergunta: Por que está me contando tudo isso?

— Sim! — segurei o grito e ri de mim mesma. Parecia dentro de

uma novela das nove. Vovó adoraria saber daquilo. — Então... Por que
está me contando tudo isso? — perguntei decidida e Diana sorriu
amplamente. Ela parecia adorar minha falta de jeito.

— Porque acabei de anotar no meu planner como será o trágico


término com meu namorado dos sonhos - Paul Russel. Com data marcada
para alguns dias. — comentou ironicamente e pareceu um tanto aliviada.
— Acredito que em breve Lia e Klaus vão estar se amando ainda mais...

Pelo que ele me conta, não demorará muito.

— Lia está nas nuvens. — comentei. — Mas não sei como ela vai
reagir ao saber disso.

— Espero que bem. — suspirou fundo, e notei seu semblante


mudar, com um pouco de preocupação. — Mas enfim, agora é sua vez!

— Minha vez? — perguntei, e poderia afirmar que gaguejei


novamente. Diana era intimidadora com seu olhar altivo. — Eu encontrei
Paul por acaso em um restaurante, enquanto fugia de um cara babaca que
acabava de ter uma reunião de negócios. Enfim, fiz companhia para ele,
bebemos muito vinho e depois migramos para doses de uísque num
barzinho. — expliquei, encarando seus olhos. Não queria que ela
duvidasse em momento algum do que lhe falava. — Paul falava coisas sem
nexo, e parecia completamente perdido em outras... Ficamos bêbados e no

fim, insisti para pegarmos um uber. Trouxe-o com segurança até o


apartamento, e o deixei sobre a cama como estava. Paul gargalhou um
pouco, e só me lembro de deitar um pouco e minha cabeça pesar. Pelo jeito
dormi feito pedra. — terminei de forma concisa e Diana pareceu pensar
sobre algo.

— Ao menos, tive a felicidade de te encontrar no apartamento de


Paul, e ambas acabarmos com a festinha de Ruby. — comentou e me
lembrei da mulher de cabelos negros a frente de Paul no apartamento.

— Ela é tão ruim assim? — perguntei, sem saber se poderia

realmente tocar no assunto. Porém, o semblante furioso de Diana parecia


dizer tudo.

— Lembra que disse que faço tudo para que os meninos sejam
felizes? — assenti rapidamente e tomei mais um gole de meu café. — Pois

é, tolerar Ruby e não enforcar Paul por ser um imbecil, está no pacote.

— Ela deve ser ruim. — constatei, sem ao menos entender a fundo


o que acontecia.

— Acredito que verá por si mesma. — deu de ombros e pisquei


sem entender. Porém, não entrei em tal mérito. Resolvi focar no café
quentinho que me fazia acordar. — Então, Pat... Lia e eu conversamos um
pouco e falamos sobre primeiros amores. Ela me contou bem por cima,
mas parece que você teve uma paixão por Paul no passado, não é?

Quase cuspi todo o líquido e tentei entender onde Diana queria


chegar. Paul? O que poderia dizer sobre ele? Mal nos conhecemos no
passado e mesmo assim, a aparência e trejeitos dele me encantaram. Era só
uma menina que sabia basicamente nada da vida. Os tempos mudaram, e
felizmente, os sonhos a respeito dele permaneceram onde deveriam –
como uma ilusão romântica.
— Paixonite de adolescente. — assumi, dando de ombros. — Paul
era um bad boy, acho que a maioria das meninas da época babavam por

ele. — complementei, fazendo pouco caso daquela situação.

— E hoje? — indagou, totalmente decidida. — Paul não lhe


desperta nada?

Pensei um pouco e resolvi não mentir. Não gostaria de começar a

amizade com alguém agindo de forma falsa.

— Atração. — aquela não era uma mentira. — É o objeto de desejo


da minha adolescência. — sorri forçadamente, e tentei não pensar no fato
de que Paul sempre estivera presente em meus sonhos mais malucos sobre
o futuro.

Nunca saberia dizer, mas era como se mesmo com aquele pouco
contato no passado, ele tivesse se enraizado em mim. O que tinha certeza,
aconteceu com outras pessoas. Sempre tentei controlar meus sentimentos a

respeito de tudo, e isso incluía, não pensar sobre como me sentia a respeito
de Paul que era destinado a casar com a minha melhor amiga, mas sempre
falhei miseravelmente naquela empreitada.

— Entendi. — Diana respondeu simplesmente e me senti aliviada


por insistir.

Ela parecia saber sobre tudo o que acontecia ao redor, como a


verdadeira dona da situação.

— Agora estamos as claras. — assenti, sentindo-me mais leve. —

Preciso falar com Klaus e conversar a respeito do que Paul e eu fizemos, e


mais, deixar Lia a par do assunto.

— Isso pode ser complicado. Lia não tende a reagir da maneira que
esperamos. — confessei, pois conhecia muito bem a amiga que tinha. —

Não posso falar com ela a respeito pois não é minha história.

— Bom, vou dar um jeito nisso. — piscou e bebeu mais um pouco


de sua bebida.

Olhou rapidamente para seu relógio e bufou, parecendo se lembrar


de algo. Senti a presença de alguém ao meu lado, e logo o olhar de Diana
mudou de entediado para interessado. Mudei meu olhar de direção e tentei
entender como de todos os cafés do mundo, meu primo, Troian, apareceu
justo no que estávamos.

— O que faz aqui, bebê? — perguntei rapidamente e Troian bufou.


Ele odiava tal apelido, porém, combinava perfeitamente com o fato de ser
mais novo e um completo resmungão.

Encarei Diana e ela arqueou uma sobrancelha, claramente


interessada no homem loiro ao nosso lado. Troian sempre seria como um
irmão mais novo, porém, seria mentira dizer que ele não era um homem
lindo, e com toda certeza, muitas mulheres o olhavam como Diana fazia

naquele instante.

— Vim tomar algo. — comentou. — A noite foi cheia.

— Entendi. — fiz uma leve careta, lembrando-me de como a minha


tinha sido. — Ah, desculpe. Dia, esse é Troian Messina, meu primo. Bebê,
essa é Diana Carter, uma amiga.

Troian como sempre não se esforçou para cumprimentá-la, o que


pareceu não incomodar Diana de forma alguma. Ela sorriu e apertou a mão
parada de meu primo, que parecia um homem sem qualquer educação. Ele
e sua falta de tato e vontade de conhecer pessoas. Revirei os olhos, sem
conseguir me conter.

— Prazer, Troian. — Diana comentou e ele assentiu.

Logo o olhar dele se voltou para o meu e fiquei sem entender o que
queria.

— Estou indo para casa. Quer carona? — perguntou sem muita


vontade.

Diana digitava algo rapidamente em seu celular e pelo seu


semblante parecia atrasada para algo. Terminei meu café e assenti para
meu primo, que simplesmente me deu as costas e foi em direção a saída.

— Não leve Troian a mal, ele apenas é... — Diana me encarou,


claramente esperando uma explicação plausível. Porém, ela era inexistente.
— Não tenho desculpa, ele é assim mesmo. — confessei.

Surpreendendo-me, Diana sorriu e deu de ombros, parecendo não


se incomodar.

— Preciso ir resolver um problema na empresa. — falou,


claramente não satisfeita.

— Hoje eu preciso apenas deitar um pouco e fingir que nunca mais


vou beber. Felizmente não tenho nenhuma reunião.

Diana gargalhou e balançou a cabeça em negativo. Levantamo-nos


rapidamente e a segui até a saída.

Encontrei Troian encostado em seu carro, parecendo aleatório em


relação ao mundo. Suspirei profundamente, pensando em como chamar
atenção daquele marmanjo para a vida. Como faria tal coisa?

— Então, precisamos marcar de tomar algo sem todo esse clima

pesado. — Diana comentou e tive que sorrir.

— Eu realmente sinto muito. — confessei. — Parece que acabei


fazendo uma bagunça na vida de Paul.

— Ele vai superar. — deu de ombros. — Ao menos, espero que


dessa vez o faça.

— Quer uma carona? — ofereci, e Diana me encarou rapidamente.


— Troian não vai se importar de...

— Não, estou de carro. — cortou-me rapidamente. — Agradeço e

tenho certeza que seriam ótimas companhias. — sugeriu e Troian sequer a


encarou.

Como ele podia estar rejeitando uma mulher linda como ela?
Precisava urgentemente bater com algo em sua cabeça. Ele só podia estar

fora da razão.

— Ok, então. — despedi-me dela com um beijo no rosto. —


Obrigada pelo café.

— Sempre as ordens. — piscou em minha direção.

Sem que esperasse, Diana deu passos e parou a frente de Troian,


que finalmente levantou o olhar para a mesma. Aquilo parecia um embate
de gigantes. Internamente, soltei um grito. Finalmente, alguém além de
mim batia de frente com Troian. E no caso de Diana, claramente, o

incomodava.

— Até mais, T.

Sem sequer lhe dar tempo para resposta, Diana sorriu em minha
direção e saiu desfilando em seus saltos altos, como se estivéssemos no
desfile anual da Victoria’s Secret. Levei a mão a boca e assim que voltei a
realidade, notei que Troian entrou no carro. Fiz o mesmo, rapidamente me
sentando no banco do carona. Abri a boca para falar algo, porém, Troian
ligou o som no último.

Aquele era ele basicamente gritando: “Nenhuma palavra sobre


isso”. Por fim, apenas gargalhei. A noite anterior e o dia seguinte não
foram tão ruins como imaginei. Entretanto, assim que encostei a cabeça
contra o vidro do carro, os olhos azuis de Paul me atingiram. Era um fato:

precisava me desintoxicar dele.


Capítulo 6

“I get angry, baby, believe me

I could love you just like that

I could leave you just this fast.”[38]

— Eu já disse para não se preocupar, irmão. — falei pela segunda


vez e Klaus me encarou ainda preocupado. — Diana lhe falou toda a

verdade. Nunca aconteceu nada além dos beijos encenados a frente de


vocês.

— Mas Paul, os sentimentos de vocês...

— Deus! — exclamei e levantei as mãos para cima, deixando os


papéis de lado. — Não sei se odeio ou gosto do seu novo jeito, Klaus!

Klaus estava sentado à minha frente, claramente impaciente.


Completavam alguns dias em que Diana falara para ele e Lia a respeito de
nosso relacionamento falso, assim como, ambos conversamos com meu pai

e sua família, para que não estranhassem o término repentino. Meu irmão
parecia mais surpreso pelo término do que por toda armação, porém,
resolvi não insistir naquele assunto. Existiam outros problemas em minha

mente.

— Eu amo Diana, assim como você. — tentei explicar e ser o mais


claro possível. — Nunca a enxerguei com desejo, e os beijos foram
horríveis, é como se... — peguei uma borracha e um apontador de lápis
jogados sobre a mesa e tentei encaixar os objetos. — Não encaixássemos,
irmão! — complementei. — Diana é uma mulher linda, sabemos disso,
mas sempre será como uma irmãzinha para mim.

— Ainda estou tentando assimilar que realmente se separaram. —


comentou, parecendo sem jeito. — Pareciam tão apaixonados.

— Somos bons atores. — dei de ombros, e encarei o teto por um


instante. — Fique tranquilo, e diga o mesmo para Lia. Diana e eu sempre
seremos como irmãos, nada mudou entre nós.

— Por que ela anda tão brava com você, então? — perguntou sem
qualquer sutileza e bufei alto.

— Ela é superprotetora, sabe bem. — escorei-me contra a mesa de


vidro. — E não podemos esquecer que controladora ao extremo.

— E? — insistiu.

— Tem uma mulher... — o rosto de Ruby me veio em mente no


mesmo instante, e lembrei-me de como as coisas se sucederam. —
Tivemos um caso no passado e não terminou muito bem.

— Ainda não assimilei o que Diana tem a ver.

— Ela é a única que sabe a história toda, irmão. — falei sem muita
vontade e Klaus me encarou com pesar. — Desculpe por não ter te
incluído nessa. É um assunto que me atormentou por muito tempo, e Diana
apenas sabe porque é, ou ao menos era, próxima de Ruby.

— Prima de Spencer? — perguntou de relance e assenti. Não fazia


ideia de que Klaus a conhecia. — A encontrei na noite em que Lia me
pediu em casamento.

— O que? — minha voz quase não saiu e tentei me localizar no

calendário. — Lia não te pediu em casamento numa boate? — perguntei e


Klaus assentiu, claramente não entendendo nada. — Foi lá que a viu?

— Sim. — respondeu baixo, parecendo escolher suas palavras. —


Lia a empurrou na pista de dança... — Klaus limpou a garganta a
rapidamente, parecendo incomodado. — Merda!

— O que foi, irmão? — perguntei, sentindo-me completamente


enganado.

A noite em que Klaus fora pedido em casamento era a mesma em

que Ruby cancelou nosso jantar, dizendo que trabalharia até tarde. Respirei
fundo e me desfiz da gravata no mesmo instante, sentindo-me sufocado.

— Eu não conhecia essa mulher. Ela me parou na pista de dança e


tocou meu peito... Antes que pudesse responder, Lia simplesmente a

empurrou e parou a minha frente. — fechei os olhos no mesmo instante,


sentindo-me sendo levado diretamente para o passado. As coisas pareciam
não ter mudado. — Lia comentou depois que aquela era Ruby, prima do
Spencer. — complementou, e simplesmente assenti, sem saber o que fazer.
— O que tem de errado, Paul?

— Ela mentiu para mim, só não consigo entender o porquê.

— Devia ligar para ela. — sugeriu, em sua comum calma. —


Talvez seja apenas uma confusão.

— Acredito que sim. — passei as mãos por meu rosto, tentando


sair daquele momento perdido. — Enfim, logo isso passa! — sorri
amplamente, atuando como sempre soube fazer. — Mais calmo em relação
a Diana? — perguntei, fugindo completamente do assunto.

Klaus piscou algumas vezes, e em seu semblante, soube que não


estava satisfeito com minhas respostas vagas, porém, não insistiu. Aquele
era meu jeito de me calar, e ele sabia.

— Ok, por enquanto. — frisou a última palavra e continuei

sorrindo, tentando acalmá-lo. — Vou voltar para minha sala!

— Agradeço, porque não é à toa que ganha seu salário, não é? —


provoquei e Klaus se levantou, ignorando-me por completo. Ele era um
porre! — Te amo, maninho! — gritei, assim que ele abriu a porta e fechou

com um estrondo.

Klaus e seu temperamento adorável.

Ouvi duas batidas na porta e logo minha secretária entrou, com um


sorriso contido e claramente cansada do trabalho. Assim que ela abriu a
boca para falar, notei Klaus atravessar a porta mais uma vez, e abri-la um
pouco mais para que alguém passasse. Pisquei algumas vezes, sem
acreditar no que via. De alguma forma, fiquei preso a imagem da mulher a
seu lado.

— Não precisa anunciá-la, Yule. — Klaus falou com minha


secretária, que apenas assentiu e pediu licença. — Essa é Patrícia Oliveira,
irmão. Lembra-se dela? Das festas quando mais novos? — perguntou e deu
passos à frente, assim como ela.

Olhei-a de cima abaixo, sem conseguir disfarçar ou entender o que


me prendia ao sorriso direcionado a meu irmão.
— Esse é Paul Russel, meu irmão mais velho. — Klaus falou em
sua inocência, sem ter a mínima ideia do que acontecera há cerca de cinco

dias.

— Ele me conhece, Johnny. — falou para Klaus, e fiquei


completamente perdido diante do apelido, e apreensivo sobre o que ela
falaria. — Paul e eu nos esbarramos por aí.

Ela então me encarou, estendendo-me a mão. Levantei-me, e sem


saber como reagir, aceitei aquele leve, mas firme aperto.

— Negócios com os Russel? — perguntei, finalmente encontrando


minha voz.

Patrice assentiu.

— Represento a Conference. — surpreendi-me por completo.


Aquela era a mais conhecida e aclamada empresa de tecnologia da américa
na última década.

— Por favor, sente-se. — indiquei a cadeira a frente de minha


mesa.

Patrice assentiu e foi até Klaus, dando-lhe um abraço e um beijo no


rosto.

— Até mais, Johnny!

— Até, Pat!
Logo ela se virou, e se sentou à minha frente. Seu semblante
mudou e logo assumiu uma postura profissional impecável. Em minha

mente, apenas conseguia imaginar como estive com aquela mulher sob ou
sobre meu corpo, e não conseguia me lembrar de nada a respeito daquela
noite.

Cerca de duas horas depois, Patrice e eu finalizávamos a discussão


a respeito de negócios. Ela era uma das poucas pessoas que em tão pouco
tempo ganhava minha admiração, pela forma leve e séria como tratava os
negócios. Em todo o caos do meio imobiliário, encontrar alguém que não

lhe estressasse durante uma tórrida reunião, era algo raro.

— É isso. — falou, apertando os dedos. — Preciso apenas contatar


os acionistas, repassar tudo e... Bom, acredito que teremos um acordo. —
sorriu abertamente, e naquele momento, tornou-se impossível não fazer o
mesmo.

Estendeu-me a mão e a aceitei, porém, não pude evitar levá-la até


os lábios e depositar um leve beijo. Assim que a encarei, notei o rubor em
sua face, e finalmente, a soltei. O que tinha de errado comigo, afinal?

Nunca fui de agir de tal forma, não no meio do trabalho.

— Bom, acho que sua agenda deve estar cheia, assim como a
minha...

— Uma boa desculpa, mas não. — resolvi abrir o jogo. Indiquei

com o dedo o relógio sobre a mesa. — O expediente aqui está para acabar.

— Olha, Paul... — respirou fundo, claramente tentando encontrar o


que dizer. — Sobre aquela noite, acho que não precisamos falar a respeito.

— Penso o oposto. — fui sincero. — Sei que não fui um cara legal
no dia seguinte e quero me desculpar por isso.

— Tudo bem. — sorriu de lado, e agradeci internamente por ela


parecer estar sendo sincera. — Diana e eu tomamos café, e ela me explicou
sobre a relação inventada por vocês.

— O que? — praticamente gritei.

Patrice gargalhou e fiquei abismado pelo fato de gostar tanto assim


de sua felicidade clara.

— Fiquei com medo de que ela entendesse algo errado e expliquei


rapidamente que nada aconteceu entre a gente naquela noite e....

— Como assim? — cortei-a rapidamente. Patrice se recostou contra


o encosto e me encarou sem entender a pergunta. — Como assim “nada”?

— dei ênfase na última palavra e fiz aspas com os dedos. Minha mente

girou por completo.

— Te levei até sua cama, e você apagou. Logo em seguida, acabei


fazendo o mesmo.

Meus olhos se arregalaram, e tenho certeza que minha surpresa era

nítida.

— Eu pensei que... Nossa! — levei as mãos aos cabelos,


completamente surpreso. — Não transamos. — constatei o óbvio e ela
assentiu.

Aquilo era para me deixar aliviado por dois grandes motivos,


porém, não me senti de tal forma. Primeiro de todos, não tinha ido para
cama com outra por conta do bolo de Ruby, e seria um motivo a menos
para discutirmos quando nos encontrássemos. Segundo de tudo, não tinha

ido para cama com Patrice e apagado tudo da memória. Por que não me
sentia satisfeito com aquela revelação?

— Parece decepcionado. — o comentário de Patrice me tirou de


divagações e sorri, sem saber o que dizer. — Bom, tenho mesmo que ir.

Ela se levantou e acabei fazendo mesmo. A acompanharia até a


porta, e depois teria uma conversa séria com Diana sobre por que de não
me contar a respeito daquilo. Passei dias pensando sobre o que aconteceu

naquela noite, e mais, sem coragem de falar com Ruby por conta daquilo.

Andei atrás de Patrice e por um segundo, recriminei-me por me


sentir tão bem em sua presença. Ouvi-la falar, tanto naquela noite no
restaurante quanto durante nossa reunião, fora completamente inebriante.
O que aquela mulher loira, de claramente vinte centímetros a menos do

que eu, tinha de tão especial?

Você já tem Ruby na sua vida! – minha mente gritou.

Patrice se desequilibrou e a segurei rapidamente pela cintura. Ela


então se segurou contra meu ombro e assim que nossos olhos se
encontraram, esqueci completamente o que Ruby representava. A boca de
Patrice se abriu, e não pude evitar tocar levemente seu rosto, enquanto ela
se colocava ereta novamente. Ela fechou os olhos diante de meu toque e
engoli em seco. Que diabos de sensação era aquela?

Por um momento, esqueci-me por completo do que acontecia fora,


e simplesmente toquei seu rosto com ambas as mãos. Patrice abriu os olhos
e piscou duas vezes firmemente, dando um passo atrás, afastando-se. Sem
saber porque, e guiado apenas por meus instintos, dei um passo à frente.
Patrice me encarou surpresa, e em seus olhos, vi o reflexo dos meus –
desejo.
Há muito tempo não me sentia de tal forma por uma mulher. Era
apenas sexo por sexo, tesão na hora que a mulher tirava toda roupa. Mas

apenas o olhar lascivo dela, deixara-me pronto. O que ela tinha? Precisava
descobrir.

Sem saber ao certo quem deu o próximo passo, apenas senti seus
lábios doces nos meus, e nada mais poderia me parar. Segurei com força

sua cintura e uni nossos corpos de forma que não pudesse se afastar. Todo
meu corpo clamou por mais no momento em que nossas línguas se
encontraram. Patrice gemeu, enviando o um por cento que restava de
minha consciência para a merda.

Encostei-a contra a parede e desci beijos para seu pescoço. Suas


mãos entraram em meus cabelos e a forma como ela se entregou, deixou-
me inebriado. Voltei meu olhar para o seu e com as mãos alcancei seus
seios sobre a blusa fina. Patrice sorriu em meio a um gemido, o que me fez

beijá-la novamente e sequer me lembrar que estávamos em meu escritório.

Uma batida na porta chamou minha atenção, mas resolvi ignorar.


Depois de tanto tempo, sentia-me vivo, nada me tiraria dali. Minha
secretária sabia o momento de recuar, seja do que que fosse.

— Paul! — ela gemeu e puxei suas pernas para minha cintura,


levando-a até a mesa.
De repente a porta se abriu e senti o corpo de Patrice endurecer.
Bufei, e não deixei que saísse de cima da mesa. Quem fosse já teria visto a

cena por completo. Apenas teria que lidar com os danos colaterais.

— Você não muda, Paul! — o grito feminino me fez paralisar, mas


ao mesmo tempo, relembrei o que Klaus me contara.

Virei-me lentamente e deixei o corpo de Patrice escondido atrás do

meu. Ruby estava vermelha e claramente segurando o choro. Mas de


alguma forma aquilo não me tocou, não dá forma que deveria ou que
esperava que fizesse.

— O que faz aqui, Ruby? — perguntei, num tom profissional.

— Eu... Vim te ver. Mas claramente já encontrou uma distração.

A gargalhada de Patrice preencheu o ambiente e me virei para ela.


Ela passava as mãos pelos cabelos loiros que desordenei por completo. E
naquele momento em que sequer me importei com a presença de Ruby,

soube que não era amor. Não poderia ser. Não poderia ter sido. Patrice,
uma mulher que mal conhecia, em alguns momentos juntos fez com que
me esquecesse por completo da existência de Ruby. Se a amasse, não teria
outra mulher em minha mesa. E mais, não sorriria verdadeiramente para
outra.

Patrice saiu da mesa e prendeu os cabelos num coque alto.


— Pelo jeito vocês tem algo a discutir. — Patrice falou e me
encarou. — Depois conversamos, Paul.

Ela deu um passo para sair, e mais uma vez, em menos de uma
semana, tinha uma escolha a fazer. Não precisei pensar duas vezes para
simplesmente segurar o braço de Patrice e não a deixar ir.

— Fica. — pedi e Patrice arregalou os olhos, claramente surpresa.

— Ruby, vamos marcar e conversar em outro lugar. — falei sério,


encarando a mulher que mal reconheci naquele instante. Ela assentiu,
claramente sem saber o que fazer.

Ela então saiu pela porta ainda aberta e suspirei fundo, de alívio.
Sequer entendendo o que tinha me feito deixá-la ir. Talvez suas mentiras?
Talvez por que ela fazer aquilo apenas lembrou de que ela transava com
outros no passado e que não fora apenas eu o culpado de algo? Talvez por
que nunca a amei?

— Paul, eu realmente posso ir. Não vou me importar se quiser falar


a sós com sua amiga. — Patrice comentou e tive a certeza que fiz a escolha
certa.

— Não se preocupe com isso. — falei simplesmente. — E me


desculpe por ela aparecer dessa forma.

— Sem problema. — passou as mãos por sua nuca. — Já vou indo,


ainda preciso fazer compras hoje.

— Que tal um jantar? — perguntei e Patrice arqueou a sobrancelha.

— Como da última vez, mas sem a parte de apagarmos pela bebida.

Patrice riu levemente.

— Acho que tem coisas para resolver. — refletiu, e infelizmente,


ela tinha toda razão. — Depois disso, podemos sair para jantar. — piscou e

veio até mim, dando um leve beijo em meu rosto, bem próximo de minha
boca.

Acompanhei Patrice até a porta e não pude evitar ficar parado


apenas a olhando entrar no elevador, até as portas de metal se fecharem.

— Está tudo bem, senhor Russel?

A voz de minha secretária soou de repente, e ela pareceu realmente


preocupada.

— Está sim. — respondi simplesmente e voltei para dentro de

minha sala. Porém, aquela era apenas uma mentira. Sequer sabia o que
estava acontecendo comigo. Entretanto, sorri levemente. Patrice parecia ter
me despertado para a vida e não me arrependeria tão cedo daquele beijo.
Capítulo 7

“We can't make

Any promises now, can we, babe?

But you can make me a drink (...)

Oh, damn, never seen that color blue

Just think of the fun things we could do”[39]

— Me conta isso direito, Patrícia! — Lia praticamente gritou e


aumentei o som da televisão. Pelo jeito, ela estava brava, por usar meu
nome real.

Precisava ouvir uma música e espairecer. Meu corpo parecia ainda


sentir o toque de Paul, e mais, o gosto de seu beijo me inebriava. Lia
continuou estática me encarando, claramente curiosa sobre o que
aconteceu entre mim e seu cunhado. Tanto que ela saiu do apartamento de
seu atual noivo, Klaus, após uma simples mensagem minha, sobre o beijo
com Paul.

Levantei-me e comecei a dançar de acordo com a batida suave,


como um bom e velho jazz. Só que na minha tão amada língua natal, a
qual parecia me deixar ainda mais imersiva nas músicas. Ainda mais, com
uma cantora tão incrível como aquela.

“Já me perdi tentando me encontrar

Já fui embora querendo nem voltar

Penso duas vezes antes de falar

Porque a vida é louca, mano, a vida é louca

Sempre fiquei quieta, agora vou falar

Se você tem boca, aprende a usar

Sei do meu valor, e a cotação é dólar

Porque a vida é louca, mano, a vida é louca

Me perdi pelo caminho

Mas não paro, não


Já chorei mares e rios

Mas não afogo, não

Sempre dou o meu jeitinho

É bruto, mas é com carinho

Porque Deus me fez assim

Dona de mim

Deixo a minha fé guiar

Sei que um dia chego lá

Porque Deus me fez assim

Dona de mim.”

Lia felizmente entendia boa parte do que se falava, e arriscou seu


português junto comigo. O que facilitou e muito nossa aproximação no
passado, fora o fato de que sua mãe era brasileira. Minha amiga se
levantou assim como eu e pareceu imersa naquele momento. Ambas
amávamos dançar e cantar.
“Já não me importa a sua opinião

O seu conceito não altera minha visão

Foi tanto sim, que agora digo não

Porque a vida é louca, mano, a vida é louca

Quero saber só do que me faz bem

Papo furado não me entretém

Não me limite que eu quero ir além

Porque a vida é louca, mano, a vida é louca.”[40]

De repente Lia girou e pegou o controle sobre a mesinha de centro,


desligando a televisão. Encarei-a em choque, e a mesma, apenas cruzou os
braços, claramente esperando explicações. Ok, era hora de falar a respeito

do tal beijo com Paul. Que no fim, sabia bem, não era nada demais. Ao
menos, não deveria ser.

— Não acredito que deixou seu noivo lindo sozinho só para vir
ouvir uma historinha curta e chata sobre como foi beijar Paul Russel, meu
grande desejo da adolescência. — revirei os olhos de mim mesma, e fui até
a cozinha, em busca de água.
Abri a geladeira e tirei uma garrafa. Enquanto bebia, Lia se sentou
numa das banquetas e se escorou no balcão que dividia a cozinha da sala

de estar.

— Digamos que a vida deu uma volta meio louca nos últimos
tempos. Agora, estou noiva do homem que sempre amei, e você, beijou o
irmão dele... o que devo dizer que não me surpreendeu. — comentou e a

encarei sem entender.

— Por que não está surpresa? — indaguei, fechando a garrafa e lhe


oferecendo. Lia negou com a cabeça e passou as mãos pelos cabelos
castanhos.

— Porque sou uma romântica e sabia que Paul não resistiria a você
quando te visse. — falou simplesmente, como se fosse óbvio. — Pode não
se achar linda e ter até receio do que a maioria das pessoas pensam a
respeito do seu jeito, Pat. Mas isso, não impede de que se sintam atraídos

pela Barbie mais linda que conheço.

Sorri diante de suas palavras e agradeci internamente a Lia. Ela era


minha melhor amiga desde a adolescência, e sempre seria grata por tudo
que aprendemos juntas sobre autoestima e o respeito com outras pessoas.

— Ok, vamos lá! — falei sem muita vontade. — Tinha uma


reunião na Russel hoje, e foi com ninguém menos que seu cunhadinho. —
Lia sorriu e pareceu se interessar pela história. Uma nova inspiração para a
trilogia que ela lançaria. — Aí, após a reunião o assunto sobre aquela noite

veio à tona, e Paul ficou surpreso ao saber que não transamos. — Lia
arregalou os olhos e gargalhou. — Então, quando fui sair, acabei
tropeçando, acho que pela proximidade dele... Enfim, a minha atração por
ele me colocou nessa enrascada. Ele me segurou e quando vi, estávamos

sobre sua mesa e nos pegando feito loucos.

— Uau! — Lia exclamou feliz e bateu palmas. — Já estou com isso


em mente para o livro de vocês, que terei o maior prazer de escrever.

— Cale a boca, June! — reclamei. — Aí, a porta do escritório se


abriu e a tal Ruby apareceu, a qual Diana me falou, e pelo jeito, é um amor
do passado de Paul.

— Nunca gostei dela. — Lia fez cara de tédio. — Além do mais, te


contei sobre ela tocando em Klaus no meio da pista de dança. — seu

semblante fechou. — Pelo jeito, ela não quer apenas um Russel.

— Não sei, mas, tentei sair de lá o mais rápido possível. Deus me


livre passar por mais uma ceninha entre aqueles dois! — fiz o sinal da cruz
e pedi proteção no mesmo instante. — Enfim, ele me segurou e pediu para
ficar. E simplesmente dispensou a tal Ruby.

— O que? — gritou abertamente, quase me deixando surda.


— Porra, Lia! — meu português soou, e ela gritou ainda mais,
completamente animada.

— Ele tá tão na sua, porra! — falou também em minha língua natal


e se levantou, parecendo uma adolescente ao pular para todos os lados.

— Não adianta citar “todo mundo odeia o Chris”. — refutei. — E


para de me olhar como se essa atitude de Paul fosse algo tão esplêndido.

Somos do mesmo tipo, tenho certeza.

Lia revirou os olhos e se sentou.

— Do tipo que quer transar loucamente e depois nunca mais se


falar? — indagou e assenti.

Era a mais pura verdade. Não andava em busca de um


relacionamento. Paul era apenas um cara para se perder numa noite, não
nos apaixonaríamos. Lia e sua mente mirabolante de escritora.

— Depois que transar com ele, tenho certeza que as coisas vão

passar feito pó. — confessei, pois realmente acreditava naquilo.

— Você não tem jeito, Patrice!

A voz de Troian reverberou pelo ambiente e dei de ombros. Sentia


muito por ser daquela forma, ou nem tanto assim. Era uma mulher
decidida, independente, e já aguentava julgamentos demais, para deixar
com meu primo me tratasse como uma adolescente inconsequente.
— Tenho 27 anos, Troian. — falei, e o encarei irritada. — Transo
com quem quiser, e o cunhado da Lia é o próximo da lista. — ele me

encarou entediado e foi até Lia, dando um beijo em seu rosto.

— Como vão as coisas, Lia? — perguntou, e naquele momento,


notei a diferença com que tratava as pessoas próximas. A forma como
tratou Diana fora completamente fria, simplesmente por não a conhecer.

— Bem, bebê. — provocou e ele bufou. — Diana comentou sobre


você.

— Ah é? — perguntei, gostando do caminho que aquele assunto


tomava. — O que ela disse? Que Troian parece uma pedra de gelo? —
provoquei.

— Que queria o número dele. — Lia falou e piscou para ele,


fazendo-me rir abertamente. — O que me diz? Posso passar?

— Não. — ele respondeu rapidamente e o encarei espantada.

— Ela é uma mulher linda. Para de ser louco, Troian! — reclamei e


ele deu de ombros.

Deu as costas para nós e simplesmente foi em direção a porta,


saindo do apartamento em seguida.

— Idiota. — reclamei e Lia sorriu. — O que foi?

— Diana já tem o número dele. — revelou e arregalei os olhos. —


Digamos que Klaus sem querer mandou de meu celular para o dela. Eles

são melhores amigos, e depois de tudo que ela fez por nós, nada mais

justo.

— Johnny é mesmo incrível. — exclamei feliz, e Lia suspirou,


claramente se lembrando do noivo.

Chamá-lo como o par perfeito de Lia, com o apelido que tanto

combinava com o June que sempre lhe dei, fazia todo sentido. Eles eram
perfeitos um para o outro. Parei para pensar por alguns segundos,
imaginando como era se sentir daquela forma, completamente entregue.
Um sentimento que te leva a imaginar uma vida ao lado da outra pessoa.
Construir uma vida com outro alguém. Os olhos de Paul surgiram em
minha mente, e tratei logo de mandar para longe aquela imensidão azul.
Ficar perto de Lia e seus devaneios de romancista começava a me afetar.
— Eu ainda não entendi porque não me disse a verdade sobre
Patrice. — falei, e abocanhei metade do pedaço de pizza em minha mão.

Diana revirou os olhos e pegou um pedaço na pizza na caixa de


papelão disposta na mesa de centro.

— Parece muito interessado nessa conversa. — debochou e a


encarei decidido.

— Qual é, Dia? — perguntei irritado. — Somos amigos a vida toda


e resolveu se abrir para uma mulher que mal conhece, e além de tudo, não
me contou que não transei com ela. Fiquei me culpando por isso, sabe
bem.

— Culpando-se por transar com uma mulher espetacular e não


lembrar? — questionou com a sobrancelha arqueada e se ajeitou na
poltrona a minha frente. Abri a boca para responder, mas ela fez um gesto
com a mão, de claro pouco caso. — Se for dizer que se culpou por Ruby,

me poupe. Acorda para a vida, Paul! Você sequer chegou a gostar dela,
quem dirá ela é a mulher da sua vida.

— Dia...

— Vamos ser honestos aqui, ok? — perguntou e deixou a pizza na


caixa. —Naquela época, Ruby pediu dinheiro para você e pela primeira
vez não levou tão a sério. Aí, um dia depois, ela te pega transando com
outra no apartamento, e diz que ia se declarar e blá blá blá. — falou com

descaso, e fiquei completamente inerte. Onde Diana queria chegar

desenterrando tal história? — Antes da ceninha, ela apareceu no meu


apartamento e se fez de coitada, como sempre. Alegando que era a mulher
que mais durou na cama de Paul Russel, mas que você não a valorizava
mais. — confessou, deixando-me paralisado.

— Que merda está falando? — perguntei irritado, já com nada em


mente.

— Acorda, Paul! Você nunca suportou levar um “não” e por isso,


ficou tão louco por Ruby. Ela nunca foi uma amiga e te avisei um milhão
de vezes. Você não quis me ouvir! Ficou completamente obcecado por ela,
ou melhor, pelo sexo com ela. Mas não foi o suficiente, então, transou com
outra. Aí ela fez a ceninha, porque o pegou no flagra e você se culpa.
Esquecendo o fato de que ela transava com outros caras. Na sua cabeça,

depois que ela te deixou, se tornou mulher certa. Então começou a sair
com todo mundo, buscando sei lá o que Ruby te dava.

— Por que diabos parece estar me analisando? — levantei-me,


completamente enfurecido. Diana permaneceu sentada e me encarou com
falsa calma. — Como assim ela te pediu dinheiro?

— Ela pediu e não conseguiu. — deu de ombros. — Aí, ela


simplesmente desapareceu depois da ceninha que viu. Mágica, não é?
— O que está insinuando, Dia?

— Nada. — levantou-se e veio até mim, apontando o dedo em meu

peito. — Estou afirmando. Você parou de dar dinheiro para ela, então, ela
precisou pular para o próximo otário. Ainda deixando um tolo iludido para
trás.

— Por que estamos discutindo isso? — questionei, sem ainda

conseguir assimilar suas palavras.

— Porque eu vejo a forma como olhou para Patrice e como ela se


tornou recorrente nos nossos assuntos. De repente, você não parou de falar
de uma mulher que mal conhece. — touché. — Faz quantos dias que a
conhece e acaba de me contar que se agarraram no escritório? Você nunca,
mesmo sendo um libertino, perdeu a cabeça durante o trabalho!

— O que Ruby e Patrice tem a ver? Ruby é uma mulher que agora
nem sei mais o que pensar, não depois do que Klaus me contou, e agora

mais essa merda de teoria sua. Patrice é só uma mulher que mal conheço e
que tenho tesão, porra.

— Ah, Paul. Me poupa da sua lerdeza! — falou com desdém. —


Com quantas mulheres transou nos últimos dias?

— Nenhuma, mas...

— Então vamos aos fatos. Você sempre está transando com


alguém, e vi na sua cara que queria transar com Patrice quando a viu
naquela noite. Mas não o fez, porque de alguma forma começou se

controlar. E isso foi antes de Ruby te ligar pedindo para te ver.

— Não entendo onde quer chegar! — reclamei, já exausto. Só


queria poder ter a noite da pizza com minha melhor amiga e esquecer
problemas, não discutir.

— Que Ruby não é solução para problema nenhum, e que sei que
Patrice mexeu com você. Ela é diferente do bando de mulheres que
conhece e por isso me pediu o telefone dela, mas ficou se sentindo culpado
porque Ruby surgiu do inferno!

Não me aguentei e comecei a gargalhar.

— Do que está rindo, imbecil? — perguntou com raiva.

— Da sua torcida para que eu transe e no fim me case com uma


desconhecida. — falei, sem conseguir me aguentar. — Só porque Patrice e

eu vamos transar em algum futuro próximo, não quer dizer que vou
colocar uma aliança no dedo.

— Ri mesmo, com muita vontade. Porque logo vai cruzar com ela,
seja por bem ou por mal. E aí, vai cair de quatro por aquela mulher! —
proferiu e me encarou decidida.

— Vamos comer a pizza e beber, Diana. — pedi, voltando para o


sofá e me jogando. — Deixe que a vida se encarregue disso. Preciso
entender o que diabos aconteceu comigo em relação a Ruby e porque não

saí correndo atrás dela quando apareceu na minha sala.

— O que? — Diana praticamente gritou.

Droga! Não lhe contei aquela parte.

— Ruby apareceu na empresa. — contei rapidamente. — Só que a

mandei embora e insisti que Patrice ficasse.

— Você está apaixonado! — apontou em minha direção e


gargalhou alto. — Está completamente ferrado, imbecil.

— Isso é coisa da sua cabeça. — falei com desdém, sem sequer


cogitar tal possibilidade. — Não tem como se apaixonar por alguém que
mal conhece.

— A atração meu caro, é o primeiro passo. Depois, vem o contato


físico e de repente, você dorme com ela todos os dias... Pelo jeito, já pulou

essa parte, porque simplesmente dormiu ao lado de uma mulher sem


transar com ela. — provocou e lhe joguei uma almofada.

— Se não fosse minha melhor amiga estaria na rua agora mesmo.


— brinquei e ela deu de ombros.

— Não vive sem mim e meus conselhos. — sentou-se novamente


na poltrona. — Mas como você mesmo disse, vamos deixar a vida se
encarregar. Porém, preciso te parabenizar, fez a escolha certa.

— Como assim?

— Colocou Ruby em seu devido lugar. — bateu uma palma e


sorriu. — Logo as coisas vão mudar, meu querido imbecil. — apostou e
apenas revirei os olhos.

Não adiantava discutir, quando Diana enfiava algo em sua

cabeça, não saía tão cedo. Em breve, ela entenderia que Patrice e eu

claramente buscávamos uma única coisa – prazer. Não estava apaixonado,

apenas encantado com aquela mulher. Diana estava certa sobre uma coisa,

ela era diferente de todas as mulheres que conhecia. Algo sobre ela era

bom demais para ser deixado de lado, na realidade, não deixaria passar.

Ela me fizera sentir vivo, e aproveitaria todo o tempo que pudesse passar

junto ao seu corpo. Bastava, ter a chance.


Capítulo 8

“Que quede claro

Si tú te portas bien, yo te lo voy a dar

Como nunca te lo han dado

No te equivoques.”[41]

Uma noite em claro, pensando e repensando tudo em relação a

Ruby. O passado me acertou em cheio e tentei encontrar o mesmo que


Diana desconfiava. Ruby não passava de uma interesseira? Então, por que,
de todas as mulheres com as quais me envolvi, justo ela, parecia ter ficado
gravada em mim?

Por que depois de tanto tempo, de repente, a deixei ir sem mais


nem menos, e optei em ficar com alguém que mal conhecia ao lado?
Talvez porque o que sentia por Ruby não passasse de culpa, por ela ter me

pego na cama com outra? Suspirei profundamente, sentindo-me sujo com

aquilo. A culpa me cercava, mesmo que exclusividade nunca fora algo


decretado com Ruby. Ela mesma, saía com outros homens estando comigo.
Por que diabos me importei tanto com ela? A ponto, de ficar tão feliz

quando me ligou?

Carência? Vontade de retomar a tranquilidade que ela me dera


naquela época? Dívida por ter sido um completo babaca? Passei as mãos
pelo rosto e segui em direção a sala, jogando-me sobre o sofá. Minha
cabeça pesava, e olhando para o relógio sobre a mesinha de centro, já se
passavam das três da manhã. Por que aquelas perguntas me atormentavam?
Por que parecia completamente perdido?

Com trinta anos, ao menos, imaginei que sentimentos se tornariam


algo fácil, não que ficaria feito um adolescente me remoendo pelo passado

e presente. As palavras de Diana a respeito de tudo me atormentavam,


pois, infelizmente, minha melhor amiga tinha uma boa percepção das
coisas ao redor. Ao menos, o que Diana não resolvia em sua vida
particular, o fazia tanto comigo quanto com Klaus.

— Merda! — reclamei para o silêncio e fechei os olhos.

Os olhos verdes de Patrice me atormentavam, e lembrei-me por


completo da loira de boca esperta e completamente sensual. Ela despertara
em meu corpo, algo, que mesmo estando com muitas mulheres, parecia ter

se perdido. Era um desejo que fazia meu corpo querê-la além de qualquer

coisa. Lembrei-me de seu toque, de seu beijo... Patrice estava tão entregue
quanto eu.

— Acho que tem coisas para resolver.

Sua voz doce atingiu minha mente e aquela frase parecia ainda

viva. Precisava me resolver, e entender o que acontecera de fato entre eu e


Ruby, assim, iria atrás de Patrice. Sorri para nada, ao lembrar de como ela
completara sua fala.

— Depois disso, podemos sair para jantar.

Há muito tempo não levava uma mulher para jantar, mas algo me
dizia, que não me arrependeria nem por um segundo ao fazer aquilo com
Patrice. Ela me lembrava alguém, a pessoa que fora mais importante em
minha vida, e poderia dizer, que era uma das poucas pessoas que parecia

sorrir verdadeiramente como ela. Como Cereza Russel, minha mãe, que
sempre sorria para o mundo, mesmo ele sendo cruel. Patrice me recordava
dela.

Respirei fundo, passando as mãos por meu rosto. Precisava resolver


estas questões e tomar as rédeas de minha vida. Não acreditava em amor,
não do tipo que aparece de repente e se torna o centro de seu universo. Não
existia possibilidade de estar apaixonado. Patrice parecia um bálsamo,
colocada no momento certo em minha vida. Acreditava em destino, e

aquilo, fazia todo sentido. Só precisa descobrir o que representava para ela.
Assim, me perderia em seu corpo, como ambos desejássemos.

— Eu estou saindo. — Troian avisou, passando pela sala de estar, e


sem me dar sequer tempo de indagar sobre onde ele iria.

Algo estava acontecendo com ele, e começava a me preocupar.

Desde que chegamos a Nova Iorque, Troian parecia imerso em seu próprio
mundo. Sequer fizemos o que geralmente costumávamos, assistir filmes
pela madrugada toda, ou maratonar alguma série.

Suspirei fundo e foquei nos papéis a minha frente, tentando


entender o contrato que meus tios haviam me passado por e-mail. Eles
eram os donos da Conference, a empresa a qual representava, entretanto,
nunca facilitaram para mim. Na realidade, eles sempre imaginaram, assim
como eu, que Troian tomaria a dianteira de tudo. Porém, ele nunca levara

jeito para tal coisa.

Desde muito cedo, quando deixou a faculdade e foi tocar com uma
banda pelo país, eles viram que ficar preso dentro de um escritório não era
para o filho. Felizmente, eles respeitaram, e com o tempo, Troian

descobriu o que realmente amava fazer – ensinar.

Ao contrário dele, sempre me vi fã de números e discussões, e com


o tempo, tornei-me a primeira da lista para assumir o lugar de seus pais.
Todavia, não era algo que tinha em mente. Eles criaram um império de
tecnologia no Canadá, e por mais que amasse solucionar problemas, nunca
me vi como líder da empresa. Aos 27 anos, ainda era muito cedo para
pensar a respeito.

No final, eles quem decidiriam. Eram como pais para mim, mas

nunca deixaram que o parentesco interferisse em cada passo que dei dentro
da empresa. Com muito trabalho, puxadas de orelha e atenção, cheguei
onde tanto almejava.

Naquele momento, olhando para as pastas empilhadas sobre a mesa


de centro da sala, assim como alguns papéis jogados pelos sofás, pensei a
respeito de meus pais. O que eles pensariam sobre mim? O que achariam
de sua única filha? Eles se orgulhariam? Peguei o celular em mãos e
respondi a mensagem de Lia sobre sairmos no dia seguinte. Olhei para o

contato de minha tia e não pude evitar, disquei seu número. Como sempre,

ela atendera rapidamente.

— Ei, estrelinha. — seu português me fez sorrir, e era gratificante


falar com alguém na língua que tanto amava. — O que houve?

— Como sabe que aconteceu alguma coisa? — indaguei,

suspirando fundo, e me levantando do sofá. — Posso estar apenas com


saudades, tata.

— Você sempre está com saudade, estrelinha. — aquilo era


verdade, e ela me conhecia bem. — Agora me diga, o que está
acontecendo?

Andei até a varanda e abri a porta de vidro, deixando o ar do fim da


tarde da cidade que nunca dorme, bater em meu rosto.

— Estava me perguntando se papai e mamãe teriam orgulho de

mim. — confessei, e ouvi seu suspirar profundo do outro lado.

Encarei os últimos raios de sol e tentei não pensar muito a respeito.


Mesmo depois de tantos anos, era difícil imaginar que a vida seguia sem
eles. De um jeito mais difícil, mas simplesmente, seguia.

— Você é o maior orgulho deles, estrelinha. Onde eles estiverem,


tenho certeza, que sempre sorriem ao ver a mulher forte que se tornou. —
suas palavras me atingiram em cheio, e não pude impedir uma lágrima de
descer.

— Eu os queria aqui. — respirei fundo, tentando não desabar. —


Por que ainda é tão difícil, tata? — perguntei, mesmo que ela não pudesse
ter a resposta certa.

— Porque quando a gente ama, de verdade, o para sempre é pouco

tempo, estrelinha. — foi impossível não sorrir diante de suas palavras. —


Um dia, vai encontrar alguém que fará o mundo um lugar mais seguro
novamente para você. Como te disse e sempre repetirei, ninguém pode ser
responsável pela sua felicidade, porque ela é exclusivamente sua. Mas ter
alguém para quem sorrir, sempre fará o momento ainda mais belo.

Sorri, e senti meu coração aquecer. Era por aquilo que ligava para
ela, para poder voltar a sorrir da forma que tanto ela, quanto meus pais me
ensinaram.

Sorria, pequena. A vida é curta demais para não sermos felizes.


Guardaria a frase de minha mãe para sempre, e levava como mantra e
marcada em minha pele.

— Eu te amo, tata. — falei, sentindo vontade de lhe abraçar


naquele instante.

O som da campainha soou e pensei rapidamente em quem poderia


ser, mas nada se passou em minha mente.

— Eu também te amo, estrelinha.

Andei até a porta rapidamente, e encarei o olho mágico. Engoli em


seco no mesmo instante, sem entender o que acontecera.

— Tata, eu preciso desligar. — comentei rapidamente, abrindo a


porta. Ao encarar o homem parado, com um sorriso perdido no rosto,

fiquei completamente sem reação. — Te ligo depois, tudo bem?

— Ok, estrelinha. Até mais!

Minha tia desfez a ligação e coloquei o celular no bolso de trás dos


shorts jeans gasto que usava. Não conseguia entender o que estava
acontecendo, e por que Paul Russel estava parado a minha porta.

— Paul? — perguntei, e ele pareceu apreensivo diante de minha


surpresa. — O que faz aqui?

Ele fechou a expressão e pareceu cair em alguma realidade,

sorrindo levemente. Ele era ainda mais bonito quando sorria, devia o fazer
mais vezes.

— Diana me disse que jantaríamos juntos hoje. — comentou,


fazendo-me arregalar os olhos. — E isso incluía Klaus e Lia.

Abri a boca para dizer algo, mas não consegui raciocinar.

— Entra, por favor.


Dei-lhe espaço e o mesmo adentrou meu apartamento, claramente
desconfortável.

— Vou ligar para ela e tentar entender o que está acontecendo. —


informei, e peguei o celular nas mãos, discando seu número.

Paul olhou ao redor do apartamento e logo seus olhos azuis


encontraram os meus. A ligação tocou até cair, e resolvi mandar uma

mensagem para Diana. O que estava acontecendo? Lia me falou que sairia
com Klaus para comemorar alguma data inventada entre eles, e Diana,
sequer me informara algo.

— Ela não atende. — falei, após a ligação ir direto para caixa-


postal.

Paul piscou algumas vezes e notei seu olhar mudar. Ele depositou o
vinho que carregava sobre uma das poltronas e deu alguns passos até mim,
parando, perigosamente muito próximo.

— Eu acho que entendi o que ela fez. — comentou, e o encarei


como se estivesse delirando. — Ela quer nos aproximar.

Engoli em seco e dei um passo atrás, dando a volta na sala, e indo


em direção ao balcão da cozinha. Parei ali, encostada contra o tampo de
granito, e tentei não imaginar que Paul dominara basicamente todo
ambiente. Algo nele, parecia dominar meu próprio corpo. O que Diana
estava pensando?

— Liguei para Diana mais cedo e contei que resolvi um problema

do passado. Aquele que você viu e disse que eu poderia te chamar para
jantar quando resolvesse. — jogou de repente, sem qualquer sutileza.

Senti meu rosto queimar e passei as mãos pelos cabelos presos num
coque alto na cabeça. Olhei para Paul, e permiti-me analisá-lo por um

instante. Ele vestia um terno sob medida na cor cinza chumbo, que
ressaltava cada músculo dele quando se movimentava levemente. O
problema era que ainda não entendia o que aquele verdadeiro sonho de
homem de terno fazia no meio da minha sala de estar. Em que sonho
bizarro estava?

— Ela acha que estou apaixonado por você. — falou, e deu alguns
passos em minha direção, claramente cauteloso. — E acredito que pensa
ser recíproco.

Paralisei, sem conseguir interpretar sua fala. Ele estava falando


sério?

— Nós mal nos conhecemos, Paul. — constatei a realidade, e ele


assentiu, parando a minha frente.

Sentia-me intimidada pela sua imponência, mas ao mesmo tempo,


o olhar lascivo dele, demonstrava que dois poderiam jogar tal jogo. Passara
a noite anterior remoendo o beijo dado em seu escritório, pensando em

como meu corpo reagiu tão perfeitamente ao dele. Colocara em mente que

iria para uma balada e tentaria tirar o feitiço que jogara sobre mim. Só que
naquele momento, ele parecia querer me hipnotizar por completo.

— Hoje descobri que nunca amei a mulher que um dia vi como


minha salvação. — comentou e o encarei ainda mais perdida. — Tenho

trinta anos, Patrice. Não sou um homem de brincar ou fingir algo. Quando
quero algo, eu simplesmente falo.

— O que realmente quer aqui, Paul? — perguntei num fio de voz, e


uma de suas mãos alcançou meu rosto.

Um arrepio percorreu todo meu corpo e suspirei baixinho,


mordendo o lábio diante da excitação em minha pele.

— Não sei. — sua honestidade me assustara. — Mas ao olhar para


você, não consigo pensar em outro lugar do mundo que poderia estar

agora.

— Paul...

— Eu te quero, Patrice. — confessou, e meu coração traiçoeiro


batia freneticamente, como se em sintonia com meu corpo que o desejava
sofregamente. — Te quero e não me importo se nos conhecemos pouco.

— É tesão. — falei, tentando nos tirar daquela atmosfera que ia


além da sedução.

Paul segurou uma de minhas mãos e colocou sobre seu peito, e

logo, fez o mesmo com sua, pairando sobre meu coração. Arregalei os
olhos, surpresa por completo diante de seu gesto. O coração dele parecia
bater tão rápido quanto o meu, de forma sincronizada. Naquele momento,
tive a certeza, estávamos em sintonia.

— Não sei o que diabos é isso. — confessou e fez um leve carinho


em minha bochecha esquerda. — Mas eu quero, seja o que for.

— O que está acontecendo? — perguntei, sem esperar por resposta,


já que nem ele mesmo sabia.

Porém, Paul não me deixara sem a mesma. Olhando-me com


atenção, encarou meus lábios e logo meus olhos, claramente pedindo
permissão. Éramos nós, frente a frente, de uma forma que sequer imaginei.
Sem saber o que dizer, simplesmente fiquei na ponta dos pés e puxei seu

rosto para o meu, nossos lábios se encontraram novamente, e uma frase


que nunca pudera relacionar a outro homem, explodira em minha mente,
assim como seu gosto em minha boca. “Quando seus lábios encontraram
os meus, eu sabia que eu poderia viver até os cem anos e visitar todos os
países do mundo, mas nada se compara ao que momento único quando eu

beijei o homem dos meus sonhos.”[42]


Minha mão se emaranhou em seus cabelos, e logo senti meu corpo
ser levantado e depositado sobre a bancada. Nenhuma racionalidade era

necessária. Nem mesmo, o que acontecera para nos levar até aquele
momento. Eu o queria, ele me queria. Sentimentos poderiam ou não
existir. Apenas nós, bastava, naquele momento.
Capítulo 9

“Something must've gone wrong in my brain

Got your chemicals all in my veins

Feeling all the highs, feel all the pain

Let go on the wheel, it’s the bullet lane

Now I'm seeing red, not thinking straight

Blurring all the lines, you intoxicate me.”[43]

As mãos de Paul subiram para meus cabelos e seus lábios para meu
pescoço. Suspirei, soltando um leve gemido, sem conseguir acreditar que o
dono de meus sonhos mais luxuriosos, estava em minhas mãos. Desci os
dedos para o seu paletó, e o tirei pelos ombros. Toquei seu peito por cima
da camisa fina, e senti a dureza de cada um de seus músculos. Olhei-o em
aprovação e Paul pareceu entender que palavras não eram necessárias.
Sua boca voltou para a minha, e seus braços me puxaram para seu
colo. A passos um pouco incertos, ele se sentou no sofá, e senti meu corpo

corresponder por completo ao seu. Sentada, sobre ele, encarando os olhos


azuis que pareciam entregar muito além do corpo, senti meu coração
completamente em perigo. O que estava acontecendo?

— Você se sente assim como eu? — perguntou e uma de suas mãos

subiu para meu pescoço, acariciando-o. — Como se não entendesse o que


acontece mas quisesse isso mais que tudo.

— Sim. — respondi, perdida diante de sua intensidade.

Não era como se pudesse mentir, não era aquele tipo de pessoa.
Porém, minha insegurança parecia gritar sobre o que aquilo parecia. Há
alguns dias ele estava atrás de outra mulher, deixando-me parada em seu
apartamento, achando que tínhamos transado durante a noite. Essa mesma
mulher, que entendia ser parte importante de seu passado, reapareceu, e

nos encontrou de forma constrangedora, só que ele fizera uma escolha


diferente da que imaginara. Ele me escolhera.

Aquilo poderia significar nada. Ou tudo.

Entretanto, todas as perguntas vasculhando minha mente, não


permitiam que meu corpo se entregasse da forma como tanto queria.
Encarei-o e notei que não existiam dúvidas a respeito do que ele queria.
Seus lábios encontraram os meus mais uma vez, e era como em um passe
de mágica, tudo se dissipasse. Talvez, fosse mesmo como nos livros.

Quando se encontrava o cara certo, por mais errado que parecesse, nada
mais importava, a não ser, estar em seus braços.

Não deixei que nenhum pensamento voltasse e deixei meu corpo


falar. Beijei-o tão afoita como o mesmo, e logo meu corpo foi sendo

deitado contra o estofado. Minhas mãos o ajudaram a se livrar da camisa, e


as suas mãos subiram por minha barriga, enquanto seu olhar parecia me
encarar com adoração. Minha regata branca logo saiu e o olhar de Paul
ficara ainda mais escuro, ao notar que não usava sutiã. Meus shorts teve o
mesmo destino, e logo nossos peitos nus se tocaram.

Minha pele se arrepiou por completo, e não pude evitar morder


com força seu queixo, como se aprovasse a forma como me tocava e nos
descobríamos. Tratei de tirar sua calça e, por fim, a cueca, deixando-o

completamente nu a meu bel prazer. Paul abriu um sorriso lascivo, e


aproveitei o momento para me livrar da última peça. Escapei de seu corpo
e me levantei, tirando lentamente a pequena calcinha. Paul me encarou
estático por alguns segundos, claramente, apreciando o showzinho
particular.

— Vem! — chamei-o e ele se levantou, sem pudor algum por estar


nu, beijando-me com fome.
Ele parecia perfeito demais para ser verdade, pois além de ter um
corpo que faria um santo pecar, claramente, não importava com regra

alguma na hora do sexo. Entre quatro paredes eu só almejava o prazer.


Assim, quando seu corpo me chocou contra uma das paredes do corredor,
tive que usar o último fio de autocontrole para conseguirmos chegar a
minha cama.

Entre beijos, gemidos e palavras sacanas, consegui adentrar o


quarto, e o joguei contra a cama. Paul sorriu, e logo pairei sobre ele. Nus, e
completamente entregues. Não pensei duas vezes e comecei a beijar sua
pele, saboreando aquele que um dia tanto desejei, que no passado, foi o
alvo de meus sonhos mais pecaminosos. Se naquela época ele era bonito,
naquele momento, gemendo sensualmente e me hipnotizando com seu
olhar de predador, ele se tornara a perfeição.

Cheguei com minha língua até seu pescoço e ali, deixei minha

marca, sem ter noção porque o desejava tanto. Paul subiu as mãos por meu
corpo e tocou cada pequeno pedacinho, deixando-me sem ar por alguns
segundos. Levei a mão até o criado mudo e ali, peguei uma camisinha, sem
poder mais suportar as carícias. Eu o desejava desesperadamente, e por seu
olhar, era recíproco. Não pude resistir e o levei em minha boca, fazendo-o
rosnar alto. Sorri por saber o quanto o atingia, e entender que aquele desejo
era realmente mútuo. Coloquei a camisinha, e assim que meu corpo voltou
para o seu, ele não esperou duas vezes e puxou-me para um beijo faminto,
ao mesmo tempo, em que se posicionava em meu corpo.

Senti-o me invadir e toda minha mente girou, e meu corpo entrou


em pleno colapso. Ainda, nos beijando, me movimentei sobre ele,
sentindo-o me preencher no limite. No limite não só carnal, mas de todo
meu ser. Existia algo naquele ato que ultrapassava qualquer linha de

consciência. Algo além parecia nos unir.

Nos afastamos por falta de ar, e as mãos de Paul se entrelaçaram


com as minhas, deixando claro que me dava todo controle de nosso ritmo e
prazer. Não me fiz de rogada e aceitei seu pedido sem pensar duas vezes.
A cada encontro de nossos corpos, algo dentro de mim parecia próximo do
próprio nirvana. Paul soltava palavras desconexas e aos poucos, parecia se
render ao prazer completo como eu. Nossos olhos se encontraram, e
naquela pequena troca de olhares, ficara claro que não seria apenas um

momento.

Como sempre pensara e reafirmava: entre quatro paredes eu só


almejava o prazer. Porém, naquele momento, em que olhei para o corpo
daquele homem sob o meu, enquanto nossos corpos mostravam uma
conexão única, tive a certeza mais assustadora de minha vida. Não era só
uma paixonite adolescente, muito menos, um tesão desenfreado. Existia
algo em Paul Russel que me atraía sempre para perto, que mesmo com o
passar dos anos, parecia me trazer para ele.

E naquele momento, não me importei. Entreguei-me por completo

a ele.

Patrice se remexeu na cama, e a encarei com carinho, sem saber ao


certo o que sentia, mas sem preocupação alguma de sentir. Algo nela,
especificamente a sua clara felicidade, mexia comigo. Notei o quanto
estava cansada, quando depois da segunda vez que fizemos amor, caíra em

um bom sono. Encarei-a mais uma vez, e afastei algumas mechas dos
cabelos loiros que grudaram em seu belo rosto. Não poderia, nem se
quisesse, me arrepender do que fizemos.

Amor... Desde quando fazia amor? Desde quando via o sexo de tal
forma? Não saberia dizer, mas com Patrice, fora diferente. Existiu uma
conexão que nunca poderia explicar em palavras. Afastei-me com cuidado
de seu corpo e me levantei da cama. Sorri rapidamente, lembrando-me que
dias atrás, estávamos na mesma situação, só que parecia completamente

cego pelo passado, e mais, não estivemos juntos de fato.

Patrice era a primeira em muitas coisas em minha vida, e um dia,


faria questão de lhe contar. Saí do quarto e fui até a sala de estar,
encontrando minha cueca jogada sobre o tapete. Coloquei-a e encarei a

pequena bagunça que fizemos como algo completamente positivo do caos.


Nós nos completávamos e não poderia estar mais satisfeito por aquilo.
Aquela latina tinha algo que me encantava, e iria até o fim, sem medo.

Lembrei-me de Ruby e a forma como não conseguiu mais me


enganar, não daquela vez, e comecei a entender o porquê de ter ficado
obcecado por ela. Ruby fora a primeira menina que gostei, na época do
colégio, mas que sempre pareceu inatingível. Sua negativa sempre me fez
querê-la mais, como um desafio a ser vencido. No final, mesmo após anos,

venci, tendo-a em minha cama por longos meses e suprindo tudo o que um
dia desejara. Porém, um acúmulo de coisas me fizera sentir que existia
algo mais entre nós.

Há um ano e meio, completou-se mais de duas décadas da morte de


minha mãe e no mesmo dia, acabara brigando de forma terrível com meu
pai e irmão, aquilo me destruiu por completo. Sentia-me só, e meu orgulho
falou mais alto, e acabei buscando refúgio em que estava mais próxima –
Ruby. Era só sexo, e poucas conversas, mas um dia, vi-me transando com

ela para esquecer. Esquecer a forma miserável com que me sentia.

Funcionara, por um longo tempo, até que o sexo fora se tornando mais do
mesmo. Quando comecei a perceber que éramos apenas amigos de foda,
nada mais. Porém, encontrá-la parada no meio de minha sala, enquanto
fodia outra mulher, fez com que a culpa me acusasse de forma

atormentadora.

Meus sentimentos se perderam ali, e hoje sabia, que confundi culpa


com amor. Ruby foi embora, deixando-me ao dizer que me amava. Eu
queria aquele amor, desejava desesperadamente, porque não me sobrara
nada. Por isso, aguardara seu retorno, buscando em outras mulheres, algo
que apenas ela podia me dar, ou que acreditei poder – amor. Porém, nossa
conversa mais cedo fora esclarecedora. Ruby nunca me quis, fora apenas
mais um em seu ciclo perfeito de homens ricos para bancarem a vida que

ela tanto desejava.

— Diana é uma surtada. — falou despreocupada e se fazendo de


ofendida. Sentia a raiva subir por todo meu corpo e respirei fundo.

— Não ouse falar assim de minha melhor amiga. — usei meu tom
mais frio e ela arregalou os olhos, completamente surpresa. — Diz de uma
vez, Ruby! Sabe agora que não vou mais te dar nenhum centavo. —
enfatizei e ela engoliu em seco, parecendo absorver minhas palavras. —
Foi por que não te dei dinheiro que armou aquela ceninha no dia seguinte

em meu apartamento? — perguntei pela segunda vez e ela bufou,

revirando os olhos.

— O que quer saber de fato, Paul? — refutou. — Se te amei? Isso?


Se amei um homem com o qual mal trocava cinco palavras? Fodíamos e
você pagava minhas extravagâncias. As coisas sempre foram claras para

mim. Se criou um caso sobre, não tenho culpa.

— Por que aquela ceninha? — perguntei, mesmo já desconfiando


da resposta.

Completava uma hora em que pressionava Ruby sobre a verdade,


deixando claro que não lhe daria nada de meu dinheiro. Aquilo pareceu
funcionar, pois, finalmente, ela parecia começar a confessar a verdade.

— Porque poderia precisar de mais dinheiro no futuro e os Russel


tem uma boa quantia, certo? — piscou e a fachada de mulher doce

morrera ali. — Nunca amei ninguém além de mim e claro, o dinheiro.

— Entendo. — respondi, e não soube dizer porque aquilo sequer


me incomodava. Na realidade, sentia-me livre, como se um peso saísse de
minhas costas. Não existia mais culpa. Nunca existira amor.

Ruby não passava de uma mentira, e nunca a escolheria. Não mais.

Deixei algumas notas sobre a mesa e me levantei. Ruby fez o


mesmo e me encarou surpresa.

— Onde vai? — perguntou, claramente perdida.

— Buscar novos ares e esquecer que um dia acreditei que me


amou. — falei baixo, mas o suficiente para que ouvisse.

Sua reação não me importava, nem um pouco. Passei cerca de um


ano culpando-me por uma mentira. Achando que tinha quebrado a única

mulher que poderia me amar. Porém, ao pisar fora daquele restaurante, e


olhar para o lado, vendo uma mulher loira vestida de sobretudo rosa,
sorrindo abertamente, minha mente voou para o que o destino queria
gritar – Patrice. Sentia-me livre não só para o passado, mas para ela.

Poderia e teria aquela mulher, algum dia.

Sorri, encarando seu belo apartamento. A tive, diante de uma


armação de minha melhor amiga, mas que não poderia ter acertado em
melhor momento.

— Paul?

Sua voz doce reverberou pelo ambiente e me virei, encarando por


completo seus trejeitos. Ela surgiu no fim do corredor, com um lençol cor
de rosa enrolado no corpo, que notara ser sua cor favorita e uma identidade
única. Ela coçou os olhos levemente, tentando segurar o tecido ao mesmo
tempo. Seus cabelos loiros estavam bagunçados, porém, pareceu não se
importar.

Andei até ela, e enlacei sua cintura. Patrice me encarou um pouco

surpresa, mas ao mesmo tempo, não negou meu toque. Aquele era um bom
primeiro passo. O qual, sabia, me levaria direto para o que sentia por ela.
Algo que não denominaria, não naquele momento, mas que fazia meu
coração bater freneticamente.
Capítulo 10

“Stay right there, get away

I need space, I told you yesterday

Slow the pace down

But then I see your face

Can we do that tomorrow?”[44]

Senti meu corpo inerte e não conseguia basicamente me mexer. O


corpo masculino estava ao redor do meu, e sua mão fazia carinhos em
meus cabelos. Fechei os olhos, e no fundo, mesmo querendo negar, pedi
silenciosamente que aquele momento fosse congelado. Poderia ficar ali
para sempre. Uma música me veio em mente, e foi impossível não a cantar
baixinho.
“Menina, me dá sua mão, pense bem antes de agir

Se não for agora, te espero lá fora, então deixe-me ir

Um dia te encontro nessas suas voltas

Minha mente é mó confusão

Solta a minha mão, que eu sei que cê volta

O tempo mostra nossa direção.”[45]

Senti o corpo de Paul se remexer e uma de suas mãos tocou a


minha, entrelaçando-as. Não tínhamos conversado ainda, e temia por
aquele momento. O mundo parecia tão mais belo, perdida sobre ele, sem
pensar ou recriminar qualquer coisa. Por que era preciso acordar para
realidade?

A realidade era que aqueles olhos azuis não liam minha alma, eles

apenas me viam como a mulher do momento. A realidade doía por ser tão
honesta a ponto de que quando ele levantasse daquela cama, nunca mais
teria a chance de provar seus lábios. A realidade era que transar com um
homem sabendo que as coisas não estavam explicadas por completo não
era algo coerente. A realidade era que Paul Russel me encarava como se
fosse uma joia rara, e aquilo, parecia ser apenas uma loucura de minha
mente e coração tolos. Desde quando gostava tanto de ser olhada?
— Em português? — sorri para sua pergunta, e deixei minhas
indagações de lado.

— Quer ouvir? — perguntei e ele assentiu.

Fiz menção de sair de seu aperto e Paul me puxou de volta,


surpreendendo-me com sua atitude.

— Preciso pegar o celular. — falei o óbvio e seu rosto tomou um

leve rubor, mostrando claramente sua vergonha. Comecei a rir, sem me


aguentar e muito menos, segurar minha língua. — Preciso urgentemente do
meu celular para uma foto, isso sim.

— Por que? — indagou, claramente perdido.

— Não é todo dia que se tem Paul Russel envergonhado numa


cama. — provoquei e ele levou um dos braços aos olhos, cobrindo-os,
claramente se escondendo. Porém, um sorriso leve e verdadeiro emoldurou
seu rosto.

— Prefiro que o celular seja para a música. — comentou, e


permaneceu na mesma posição.

Sem conseguir me aguentar, fui até ele, e depositei um leve beijo


em seus lábios. Saí dali, antes que me esquecesse do que ia fazer. Andei
até a cozinha e comecei a procurar por ali o celular. Achei-o jogado sobre
uma banqueta e não saberia dizer como este chegou ali.
Ouvi barulho da porta da frente e logo Troian entrou, olhando-me
de cima abaixo. Felizmente não estava mais apenas com o lençol, mas

vestia a camisa cinza de Paul, o que deixava claro que algo acontecera. Por
um segundo me odiei por ter esquecido que dividia temporariamente
aquele apartamento em Nova Iorque com ele.

— A noite está sendo boa pelo jeito. — sua voz saiu fraca e senti-

me culpada no mesmo instante.

Troian não usava seu diário tom de repreensão, ele apenas parecia
magoado. As palavras de minha melhor amiga me atingiram, sobre Troian
sentir algo além do fraternal por mim. Notei seu olhar e tentei abrir a boca
para dizer algo, mas não tinha ideia do que. Se Lia estivesse certa e o
tratamento de Troian não fosse apenas por preocupação, não saberia como
lidar. Eu o amava, mas como um irmão. Nada além.

— Não vou atrapalhar. — avisou, ao levantar a calça masculina

jogada sobre o sofá. Senti-me afundar no mesmo instante. — Só peço para


que seja mais discreta e use o seu quarto, Patrícia.

Fechei os olhos, absorvendo suas palavras e levando mentalmente


um soco na cara. Acabava de magoar uma das pessoas que mais amava no
mundo. Como poderia consertar aquilo?

— Eu sinto muito, Troian. — falei, sendo o mais honesta possível.


Ele deu de ombros e antes que pudesse falar mais alguma coisa,
simplesmente saiu pela porta novamente. Culpa me atingira, e não sabia o

que fazer. Ele não podia me amar de forma diferente, ou poderia? Nunca
reparei em algo além de seu jeito ciumento a respeito dos homens, e claro,
a forma que me protegia.

— Patrice?

Pisquei algumas vezes e olhei para Paul, que parecia notar minha
mudança repentina.

— Aconteceu alguma coisa? — perguntou e deu passos incertos


para perto de mim.

Suas mãos tocaram minha cintura e senti-me mal, porque nunca


percebera de fato como Troian me olhava, mas com Paul, parecia
conseguir vê-lo por completo.

— A vida se complicando. — tentei ser evasiva e suspirei fundo.

— Que tal a música? — perguntei, tentando fugir daquele assunto e Paul


assentiu, não muito satisfeito com a resposta. Porém, seria tudo o que teria
naquele momento.

Precisava conversar com Troian e entender como as coisas


chegaram naquele ponto. Não queria magoá-lo, nunca fora minha intenção.

Desvencilhe-me de Paul o suficiente para pegar o celular,


conectando-o a televisão no mesmo instante. Paul assistia cada passo meu
sem dizer nada, mas parecia encantando com algo, o que não saberia dizer

o que era. Em poucos segundos a música começou a soar por todo o


ambiente e Paul se concentrou em ouvir.

Puxei-o pela mão e o levei até os sofás, para que me ficasse mais
confortável.

— Vou traduzindo para o inglês, que tal? — perguntei, e parei a


frente de onde ele se sentara.

Surpreendendo-me mais uma vez, Paul me puxou para seu corpo,


deixando-me sobre seu colo.

— Assim. — pediu e sorri diante de seu gesto. — Quer me dizer


algo com essa música? — perguntou e apenas dei de ombros, deixando a
concentração toda na tradução de cada palavra.

Os minutos se passaram, e notei que atenção de Paul não fugira de

minha boca, atento a cada palavra e expressão que lhe dava.

“Esse papo de que se tu não existisse eu te inventaria é tão clichê

Mas cai tão bem quando se trata de você

Só vem comigo, cê não vai se arrepender

Só vem comigo, cê não vai se arrepender


Noites em claro, tentando não me envolver

Seja o que Deus quiser

Noites em claro, tentando não me envolver

Seja o que Deus quiser, deixe-me ir

Não vou me despedir porque dói

Não vou brigar pra ficar

Quero estar contigo e sentir, ser seu e só

Sem ter que justificar o tempo em que eu sumi

Seja o que Deus quiser, deixe-me ir.”[46]

A música acabara e Paul sorriu em meu pescoço, dando em

seguida, um leve beijo. Ele parecia satisfeito com alguém e naquele


momento comecei a indagar como aquela intimidade entre nós existia.
Quando, de repente, tudo parecia tão fácil e leve? Quando chegamos ao
patamar de me sentar em seu colo e cantar uma música que parecia tão
significativa?

— Acho que músicas podem falar mais do que as pessoas. —


comentou, tocando meu rosto.

Sorri, pois concordava cem por cento com tal consideração.

— Acho que sou feita de frases, músicas e momentos. —


confidenciei. — Por isso, sempre gosto de correlacionar tudo.

— Você faz isso muito bem.

Dei-lhe um leve beijo e tentei me afastar, mas parecia impossível.


Algo em Paul, prendia-me a ele. Que me fazia perder a sanidade. Algo que
não sabia explicar. Ao menos, não ainda.

— Que tal realmente termos aquele jantar? — perguntou no


momento em que me afastei para respirar profundamente.

Pensei nos prós e contra, mas nada me veio em mente. O melhor


seria sair do apartamento e manter Paul longe dali, assim como qualquer
outro homem. Independentemente do que Troian sentisse, o melhor era
respeitá-lo, e aguardar por uma conversa franca.

O problema consistia em não conseguir me afastar de Paul ali. O


certo não era simplesmente ele ir embora depois de fodermos? Minha
mente girou e tentei enquadrá-lo a mais um de meus casos esporádicos.
Porém, estar em seu colo, depois de tudo, parecia tão certo, que acabei, de
forma irracional, aceitando o convite. Eu queria mais, mesmo sem saber o
que “mais” significava naquele momento para nós.
O que era estranho, já que “nós” não existia. Não de fato.

— Acho que quero um lanche enorme com tudo que tenho direito.

— comentei, saindo do colo de Paul e tentando entender como ficar perto


dele se tornou algo tão fácil de repente.

Desde quando ficava tão à vontade perto de alguém que acabara de


transar? E mais, saía para jantar? Era como se meus dias e noites

libertinos não tivessem valido de nada. Paul parecia estar quebrando todas
as regras e barreiras que existiam, sem sequer saber que existiam.

Andei em direção ao quarto e senti o olhar de Paul sobre meu


corpo. Entrei rapidamente no closet, e escolhi um vestido longo na cor rosa
bebê, e sapatos nudes de plataforma. Algo simples, bonito e confortável.
Deixei-os separados, e fui até gaveta de lingeries escolhendo uma na cor
branca. Olhei em direção ao quarto e notei que Paul me encarava, mesmo
que vestindo suas roupas de forma lenta.

— Não quer tomar um banho? — perguntei, saindo do closet com a


lingerie em mãos.

— Seria ótimo... — engoliu em seco, encarando meu corpo apenas


coberto com sua camisa. Em seguida sorriu cafajeste, deixando claras suas
intenções. — Mas acho que não sairíamos tão cedo do apartamento.

— Eu vou primeiro... — deixei a frase solta no ar e fui em direção


ao meu banheiro. — E trancarei a porta por precaução. — complementei

brincando, e sorri para ele, que sorria da mesma forma descontraída.

Assim que parei a frente da porta do banheiro, pensei em como


marcar Paul da forma como me sentia. Sentia-me agindo de forma louca e
inconsequente, por não entender o que de fato fazíamos. Virei-me para ele,
que assistia cada passo meu atentamente. Abri botão por botão da camisa

sob seu olhar, e Paul respirava pesadamente, mas não se mexeu.

— Mais tarde. — joguei a promessa no ar.

Paul não disse nada. Porém, o que sua boca não dizia, seu corpo
entregava.

Joguei a camisa fora e nua, me virei para entrar no banheiro.


Fechei-a e tranquei, sorrindo de minha provocação ao encarar o espelho.
Com toda certeza, deixaria Paul Russel marcado. De alguma forma, no
futuro, ele ainda se lembraria de mim. Nem que fosse apenas como a moça

doida que transara. Faria com que aquele momento fosse inesquecível para
ele, assim como, tornara-se para mim.
Capítulo 11

“Qualquer lugar contigo

Eu faço de abrigo

Bem do jeitinho que a gente entende

É meu porto seguro

Tô te querendo, eu juro

Que é no escuro que você me acende.”[47]

— Acho que precisamos conversar. — Lia falou, jogando algumas


sacolas sobre a bancada da cozinha e me encarando sério. — Como você
pôde se envolver com Paul e não me contar? — arregalei os olhos e mordi
o lábio, sem saber o que responder. — Imagina a minha cara de idiota
quando Paul respondeu sem pestanejar que estava conhecendo alguém
quando Klaus perguntou, e no fim, o seu nome surgiu na conversa. —
apontou o dedo em meu peito, claramente magoada. — Agora,
desembucha!

— June, eu...

— Nada de “June”! — refutou e me empurrou com o quadril,


pedindo licença da cozinha.

Saí de trás do balcão e me prostrei a frente, tentando entender

minha própria mente. Desde quando escondia algo de minha melhor


amiga? Mesmo morando longe, nos falávamos todos os dias e nos
entendíamos muito bem. Vir para Nova Iorque sempre se tornara algo
ainda mais especial por ter Lia ali.

— As coisas simplesmente aconteceram. — comecei a dizer, e Lia


estava concentrada desembalando algumas frutas e verduras para o jantar
da noite. — Paul apareceu no meu apartamento há uma semana, foi meio
que uma armação de Diana. — Lia me encarou, sem esconder a surpresa

em seu rosto. — Ela inventou um jantar de todos nós e Paul caiu feito um
patinho, aparecendo lá.

— Mas ninguém interfonou para avisar que Paul queria subir? —


perguntou e aquela foi uma questão que ficara em minha mente depois de
todo momento com ele.

— Paul tem um amigo no prédio, que coincidentemente encontrou


lá embaixo. — comentei e Lia sorriu de lado. Ele me contara aquilo

quando lhe fiz a mesma pergunta. — O que?

— Parece que de um jeito ou de outro, Paul ia te surpreender.

— Pois é. — abaixei os ombros e voltei a meu raciocínio. — Ele


chegou lá e comecei a ligar para Diana, tentando entender de que jantar ela
falou. No fim, não conseguimos falar com ela, e de repente, estava nos

braços dele, jurando coisas que nem imaginei. — confessei rapidamente,


sentindo-me uma completa tola.

— Por que essa cara? — a voz de minha melhor amiga soou


cautelosa. — Você nunca escondeu nenhum cara de mim, Pat.

— Paul tem sido diferente. — confessei, e foi como tirar uma carga
de toneladas das costas. Aquilo me sufocava há dias. — Ele simplesmente
apareceu e quando vi, estávamos nos vendo toda noite. Conversamos
muito, jantamos em seu apartamento e assistimos filmes ruins.

— Como namorados. — Lia constatou o que tanto temia e assenti


sem jeito. — Por que esse medo claro no rosto?

— Por que? — perguntei para o nada, levando as mãos ao rosto. —


Porque até alguns dias atrás, Paul saiu correndo atrás de outra, a qual
soube por cima, ser uma mulher importante para ele. O que eu sou, Lia? A
foda da vez, nada mais.
— Mas vejo que não é isso te incomoda.

Ela me conhecia muito bem, pois ser apenas a transa de um cara

não era o fim do mundo. O problema é que aquele cara em questão parecia
querer mais, algo que não sabia ao certo como oferecer, ou se realmente
queria lhe dar.

— Paul parece decidido a algo mais. — comentei, e Lia me

analisara. — Ele sempre me liga, manda mensagens, tenta me encontrar...


Não sei ao certo, mas ele parece estar querendo algo de mim.

— Patrice. — Lia deixou as sacolas de lado e veio até mim,


tocando meus ombros. — Não é Paul que tem te deixado assim, não as
ações dele. Está tentando se enganar, mas acredite, ninguém assiste filme
ruim, conversa sobre tudo e janta no apartamento do outro sozinho. Você
tem gostado disso, e aposto, que está assustada. Suas ações estão se
assustando!

Suspirei fundo, assentindo, mesmo que contrariada. Lia parecia


poder me ler, e temia, que Paul fizesse o mesmo.

— Nunca me senti assim com alguém, Lia. Penso às vezes que é


apenas minha mente brincando com o fato de ter sido apaixonada por ele
na adolescência. Mas a vida mudou tanto desde então que... Nunca me
imaginei, de fato, tendo algo com ele.
— Bom, como sua melhor amiga, tenho o dever e direito de falar.
— apertou meus ombros, com um sorrisinho no canto da boca. — Você

está apaixonada por ele, e isso, é o que mais te assusta.

— Não, eu não...

— Pat, somos adultas, responsáveis, independentes... Qual o


problema de nos apaixonarmos? — indagou e me afastei, não querendo

discutir tal coisa, porém, era necessário.

— Porque paixão leva ao amor, e não é algo que imaginei ter com
um homem que pouco conheço.

— Olha para mim e Klaus! — falou de repente, chamando minha


atenção. — Acha mesmo que meses atrás me imaginava pedindo aquele
homem em casamento? — indagou seriamente, e neguei com a cabeça. —
Mas as coisas aconteceram, Patrice, e não tem como mudá-las. Aceitei,
mesmo que pareça loucura, que amo aquele homem e que quero passar o

resto da vida com ele. Aos poucos, tenho descoberto que amar é muito
mais que simplesmente sentir ou querer, é uma junção dos dois.

Minha mente viajou e acabei numa frase de um dos meus autores


favoritos: “Mas acabei entendendo que amar é mais do que resmungar
três palavrinhas antes de dormir. O amor é sustentado por ações, pela

constante dedicação às coisas que um faz pelo outro diariamente.”[48]


Suspirei fundo, sentindo-me completamente perdida.

— Eu mal o conheço. — insisti e Lia revirou os olhos.

— Você está o conhecendo e aos poucos, gostando um pouco mais


a cada dia... Pode ser, que descubra algo que te faça odiá-lo. Porém, se
sobreviveu uma semana ao lado dele, e não pirou. Acredito que finalmente,
a barbie foi fisgada. — provocou e foi minha vez de revirar os olhos.

— Me leva a sério, por favor. — pedi, fazendo carinha de dó, e Lia


pegou uma faca sobre a bancada, apontando em minha direção.

— Estou te levando, mas ainda não entendo porque não fui a


primeira a saber que estão juntos. — insistiu no assunto, e a faca em suas
mãos, apenas representava o quanto ficara magoada por saber daquilo
através de Paul.

— Porque não estamos. — aquela era a verdade.

— Se você diz. — deu de ombros. — Por que não soube que

transaram? — perguntou de uma vez e fiz um sinal de rendição com as


mãos, sem saber o que dizer.

— Parecia mais fácil se ninguém soubesse. — confessei. — Pensei


que íamos transar e ponto, mas uma noite se estendeu para duas, duas para
três e agora...

— Agora, vamos cozinhar e fazer o jantar de despedida para Diana.


— colocou a faca de volta no balcão. — Klaus disse que o dia no escritório
está corrido hoje, e, portanto, os três ainda vão demorar para chegar.

— Paul vem? — perguntei alarmada, praticamente enxergando um


monstro em sua face.

Lia me encarou com escárnio, levantando uma sobrancelha.

— Ele é um dos melhores amigos dela, e mais, meu cunhado. —

jogou na cara, ainda magoada por ter escondido o que acontecia.

— Eu sinto muito, June. — falei, sentindo-me péssima. — As


coisas foram acontecendo e quando fui ver...

— Se apaixonou perdidamente pelo seu primeiro amor. —


provocou, suspirando fundo em seguida. Lia era uma romântica incurável.
— Aliás, como chegamos a esse patamar?

Ela pegou um vinho e abriu, servindo duas taças.

— Estou basicamente morando com Klaus, pois até meu notebook

está aqui, só falta montar um escritório. Todo momento, mensagens sobre


o cerimonial chegam, e tento não surtar por estar organizando um
casamento.

— Ainda falta um ano, Lia. — lembrei-a, pois ela era a ansiedade


em pessoa.

— Eu sei disso. — respirou fundo, um pouco sem graça. — Mas


logo vamos assinar os papéis do casamento, por conta do contrato sabe? —

assenti, odiando que mesmo após se escolherem, não conseguiram adiar a

data do casamento para que o cerimonial ficasse pronto ao tempo


determinado por aqueles papéis. — É estranho, mesmo amando Klaus, que
esteja me tornando a esposa dele.

— É estranho por ser real. — analisei e senti que as palavras

serviram tanto para mim quanto para ela.

— Mas você, senhorita Oliveira... — sorri da forma que falou meu


sobrenome. — Está no mesmo barco de paixão, agora, só nos falta Diana.

— Não sei porque, mas falar dela, me lembra de Troian. —


comentei, e Lia me encarou sem entender, pegando a taça de vinho. Fiz o
mesmo, tomando praticamente tudo. Odiava tocar naquele assunto. — Ele
anda distante, e sequer temos nos falado.

— Acha que ele vai sumir de novo? — perguntou, claramente

preocupada.

— Não sei. — fui sincera. — Quando ele saiu da casa dos pais e
resolveu tocar por aí, ao menos, falou comigo antes de ir. Agora, mesmo
morando juntos, e ficando em casa basicamente o dia todo, nunca o vejo.

— Ele pode ter conhecido alguém. — considerou e no fundo, torcia


para que fosse aquilo.
— Lembra quando disse que ele sentia algo por mim além de
amizade? — perguntei e Lia assentiu.

Levou alguns minutos, mas logo seu semblante mudou.

— Ele viu Paul no apartamento ou algo assim? — indagou e


assenti, sentindo-me terrível.

— Não chegou a esbarrar em Paul, mas encontrou algumas peças

de roupas jogadas na sala de estar, e me viu apenas com uma camisa


masculina. — confessei e levei as mãos ao rosto. — Ele sempre soube que
era uma mulher livre, que não tenho pudor a respeito de sexo, mas o olhar
que ele me deu ao pegar a calça de Paul no chão da sala... Lia, eu soube ali
que não era apenas preocupação de irmão.

— Você quebrou o coração dele, Pat. — Lia soltou de uma vez e


prendi a respiração, sem saber o que responder. — Acho que Troian te
conhece muito bem, tanto que percebeu que se levou um cara para dentro

do apartamento de vocês, não era só mais um... Ainda mais, ele pode estar
cansado de esconder o que sente.

— Eu o vejo como um irmão, sempre foi assim. — confessei e Lia


me encarou perdida.

— Acho que precisam conversar e talvez, Troian apenas esteja


confundindo as coisas. — considerou e tentei me apegar aquilo, pois
assim, não seria a pessoa a ferir o irmão que a vida me dera.

Troian sempre fora mais que um primo para mim, dividimos

momentos incríveis e inesquecíveis juntos. Não queria ter que ficar longe
dele por não corresponder os seus sentimentos.

— Ok. — depositei a taça sobre a bancada e bati palmas. — Vamos


espantar essa preocupação e cozinhar! — declarei. — Vou colocar uma

música animada, e enquanto você corta os legumes, vou arrumando a mesa


de jantar. Aliás, quando esse apartamento cinza de Klaus vai começar a ter
fotos de vocês espalhadas? — provoquei e Lia me encarou com deboche.

— Posso ser clichê em amar, mas não cafona. — mostrou-me a


língua e deixou a taça de lado. — Vou te mostrar onde estão os jogos de
jantar.

Assim, segui minha melhor amiga, e comecei a analisar como


deixar o ambiente ainda mais bonito. Por um segundo, notei a forma como

Lia se sentia à vontade naquela cozinha, mesmo que ainda não fosse de
fato sua casa. A realidade, era que se tornara seu lar. Ela tinha o mundo
para descobrir, mas ao vê-la tão feliz ali, soube que para aquele lugar, ela
sempre voltaria.
Capítulo 12

“Spent 24 hours, I need more hours with you

You spent the weekend getting even, ooh

We spent the late nights making things right between us

But now it's all good, babe

Roll that Backwood, babe

And play me close.”[49]

— E aí, barbie! — Klaus falou e me deu um leve beijo no rosto, fiz


o mesmo com ele, que logo se afastou. — Oi amor.

Sorri ao vê-lo chamar minha melhor amiga, que sorriu abertamente


para o noivo. Ele circundou sua cintura e deu um beijo em seu pescoço. Os
dois pareciam em tanta sincronia, que soube que mesmo que fosse difícil
estar sob o mesmo o teto, eles tirariam de letra.
— Unicórnios. — fingi um espirro e Lia me acertou com um pano
de prato. Gargalhei, e me levantei com a taça de vinho, ao mesmo tempo

que a campainha soou.

Virei-me para os dois, mas resolvi não atrapalhar. Eles se beijavam,


como se não se vissem há semanas. Revirei os olhos, pois estiveram juntos
pela manhã, além de ter dormido juntos.

— Eu atendo. — debochei e andei até a porta.

Abri-a rapidamente e de repente, minha ficha caiu. Era apenas um


jantar de despedida para Diana e suas férias, porém, nunca mais seria
apenas um jantar. Não quando Paul estivesse presente. E pela minha má ou
boa sorte, era ele, em pessoa, a minha frente.

— Oi, Paul. — falei um pouco tensa e sorri, tentando disfarçar o


que me causava.

O semblante dele mudou, assim como morrera o sorriso estampado

em seu rosto. Permaneci com o meu, tentando ser cordial. Não costumava
fingir algo para as pessoas, porém, era necessário.

— Tudo bem, estrela? — perguntou e me recostei contra a porta,


dando-lhe espaço para entrar. Não poderia começar uma discussão ali.
Porém, ao mesmo tempo que adorava a forma que passara a me chamar, a
odiava por completo. Odiava por ele ter ouvido uma conversa minha e de
minha tata, e ainda mais, por gostar tanto de sua voz me chamando daquela

maneira.

— Entra. — ele pareceu receoso, e assim que passou por mim,


parou a minha frente, enquanto fechava a porta. — Paul, podemos só agir
normalmente? — indaguei e seu cenho franziu.

— O que tem de errado? — perguntou, claramente não entendendo.

— Estou agindo como todos os dias...O que tem de errado em querer te


beijar agora?

— Nada, mas eu...

Sem me dar tempo para continuar, apenas senti seus lábios nos
meus e por um segundo, perdi completamente o poder sobre a situação. Ele
me embriagava, me seduzia e me tinha... Temia, que em breve, me
perdesse. Afastei-o com cuidado, sem querer armar uma cena, e mais uma
vez, forcei um sorriso.

— Conversamos depois. — declarou e apenas assenti, sem me


mover do lugar.

Ele então se virou e o vi seguir até o casal apaixonado na cozinha.

— Como está a minha cunhada preferida no mundo todo? — sua


voz rouca soou, e ouvi a risada de Lia.

Tudo ali parecia se encaixar perfeitamente, apenas eu, parecia estar


fora de contexto. Aquilo, simplesmente, porque me sentia perdida diante
da intensidade que tudo acontecia. Não sabia ao certo definir o que

tínhamos, muito menos, o que sentia. Desde quando precisava rotular


algo? Minha mente brigava constantemente com meu coração. Aquilo, me
exauria.

— Pat, vem provar isso! — a voz de Lia me despertou, ao mesmo

tempo que a campainha soou novamente.

Parei e dei de ombros para minha amiga. Abri a porta e uma Diana
sorridente me abraçou no mesmo instante. Não entendi ao certo sua
felicidade, mas retribuí da mesma maneira. Algo nela parecia brilhar,
como sempre. Assim que meu olhar voltou para seu lado esquerdo, engoli
em seco, sem entender o que acontecia.

— Troian? — perguntei, e Diana se afastou de mim, com um


sorriso sacana no rosto.

Arregalei os olhos, e olhei para dentro do apartamento, ao mesmo


tempo que lhes dava espaço para entrar.

— O encontrei perdido no Central Park. — Diana falou, e aquela


mentira não convenceu ninguém ali, porém, ninguém a refutou.

Enquanto ela adentrava com intimidade o apartamento, virei-me


para Troian, após fechar a porta.
— Precisamos conversar, bebê. — falei, sentindo que Diana
poderia ser a explicação de algumas mudanças de Troian, assim como o

porquê dele não parar no apartamento. Porém, ainda existia o fato que
precisava de sua sinceridade acerca de sentimentos.

— Eu sei disso. — falou, e segurou meus ombros, surpreendendo-


me com um abraço. — Desculpe a distância que impus.

Senti-me mais leve, e retribuí o abraço. Troian era como uma parte
de mim, e ficava feliz por saber que no fim, poderia estar apenas
confundindo tudo. Afastamo-nos e ele beijou minha testa, do gesto tão
antigo que sempre fizera com ele. Só que depois de muitos anos, ele ficara
mais alto, o que impossibilitava.

— Vem! — puxei-o pela mão e o levei até onde todos estavam.

Antes que pudesse apresentá-lo, Diana se adiantou. Soltei a mão de


Troian, e me encostei em Lia, que terminava de arrumar algo na mesa de

jantar. Bati em seu ombro e ela arregalou os olhos, encarando-me,


claramente surpresa.

— Acho que o único que não conhece é Paul.

Virei meu olhar para o homem que parecia ter pegado meu coração
e guardado para si. Paul encarou Troian de cima abaixo e consegui ver
claramente o sorriso forçado em seu rosto.
— Paul esse é Troian Messina, um amigo. — Diana falou, e os dois
trocaram um aperto de mãos.

Nada fora dito e resolvi intervir. Sentia um clima pesado no ar, que
apenas Diana parecia ignorar, e até mesmo Klaus, que cumprimentou
Troian com um sorriso e completamente despreocupado. Olhei para Lia e a
mesma deu de ombros, como se não soubesse o que fazer. Bom, nem eu

sabia.

— Que tal escolhermos uma música, Dia? — perguntei, e ela


sorriu, vindo até mim. — Algo brasileiro, para te preparar para as férias.
Que tal? — indaguei e ela pensou um pouco, pegando o celular em mãos.

Mostrei-lhe as opções e após ouvir algumas batidas, ela finalmente


escolhera. Enquanto ela tentava cantar junto a Lia, Apaga a Luz da Glória
Groove, a letra da música me mandou diretamente para o homem de olhos
azuis que não fugiam de mim. Dei passos incertos para perto dele, que se

virou, indo em direção ao que Lia me mostrou como a varanda do


apartamento de Klaus.

Paul estava recostado contra um pilar e bebia uma cerveja. Seus


olhos azuis eram a única coisa possível de se ver em meio a meia luz do
ambiente. Senti-me acuada, mas ao mesmo tempo, tudo pareceu
desaparecer.
Fechei a porta da varanda atrás de mim, e me virei para ele. Paul
me encarou com aquele olhar que me tinha por inteira. A música de fundo,

parecia conseguir tornar aquele momento apenas nosso. Como se ninguém


mais estivesse naquele apartamento, como se fossemos entregues um ao
outro.

“Oh, yeah

Então fica comigo, baby

Sabe, eu posso te amar pra sempre

Sei cada resposta pra cada pergunta

Que você faria em um dia sobre pertencer

Olha só o meu plano agora

Te levo pra ver o mundo lá fora

Férias de verão em Bora Bora

Ou até roubar um banco, bora?”[50]

Parei a sua frente, e Paul tocou meu rosto, num gesto tão nosso, que
me assustei, mais uma vez com sua intensidade. Levantei o rosto e nossos
lábios se encontraram, num beijo leve. Não soube dizer como, mas parecia
que aquilo significava muito mais do que apenas um beijo. Como um

compromisso, o qual fugi a vida toda. Por medo do amor, por medo da dor

que possa causar. Mesmo assim, permiti-me agir com o coração daquela
vez. Afastei-me dele, e sorri, deixando claro que depois teríamos uma
conversa.

Seus olhos não fugiram de meu corpo, pois podia sentir como se

algo me queimasse. Ele me seguia, mesmo longe, mesmo parecendo ter


algo errado ao seu redor. Voltei para dentro, e felizmente, fora apenas algo
em torno de dois minutos, sem tempo para que alguém desconfiasse da
demora. Lia e Diana sorriam de algo no celular, mostrando para Klaus, que
permanecia com uma mão na cintura da noiva. Troian, que imaginei estar
deslocado, parecia confortavelmente encostado contra a bancada, tomando
uma cerveja.

Naquele momento, desejei desesperadamente, que as coisas

permanecessem assim. Como se todos ali, que pareciam em sincronia,


fossem felizes e completos. Para que assim, pudesse sentir a tal felicidade
que mamãe tanto falava. Sorria, Patrice! Pude ouvir sua doce voz em
minha mente. Naquele momento, sorri para o nada, sabendo que o nada
passara a ter mais um motivo e até mesmo um nome muito bonito. Meu
novo motivo para sorrir tinha olhos azuis sedutores, um andar altivo, e uma
voz rouca dominante. Era Paul Russel, e tinha que admitir, finalmente, que
estava completamente apaixonada por ele.

Ele olhava para ela com uma paixão clara no olhar. Porque no fim
daquela uma semana ao seu lado, era a forma como eu a olhava. Suspirei
fundo, tentando disfarçar com mais um sorriso, a indigestão que aquele
homem no mesmo recinto que ela me causava.

Levei mais um pouco do macarrão a boca e dei um longo gole no


vinho tinto. Diana falava sobre algo com Klaus, que sorria em sua direção.

Porém, logo notei o olhar de Diana mudar ao encarar o tal Troian. Sabia
quem ele era, Patrice não se importava de expor em redes sociais sua
família, e ele era parte dela – seu primo. Suspirei fundo, tentando afastar
aqueles pensamentos.

Ele estava ali por conta de Diana, o que me enfurecia ainda mais.
Além de desejar minha mulher, parecia estar brincando com minha melhor
amiga. Minha vontade, naquele instante, era de quebrar sua cara. Babaca!

— Paul? — a pergunta veio de Lia, que se sentava na ponta da

mesa.

Seu cotovelo estava sobre esta, e uma mão no rosto, esperando a


resposta para algo que não dei atenção.

— Desculpe, me distraí. — falei rapidamente.

— Percebi. — sorriu de lado. — Perguntei sobre o que acha de ir


ao Brasil, conhecer belos lugares e belas brasileiras. — o sorriso se
estendeu por toda sua boca, e depositei a taça sobre a mesa, sabendo onde
Lia querer chegar. Ela, claramente, provocava Patrice.

— Já fui lá, uma vez, a negócios. — contei por cima, dando de


ombros. — Não tive tempo para nada a não ser reuniões, mas confesso que
adoraria voltar. — olhei em direção a Patrice, que escutava a tudo
atentamente, porém, parecendo um tanto interessada na taça de vinho em

mãos. — Belos lugares, com toda certeza. Agora sobre belas brasileiras,
acredito que já encontrei a minha e que ela possa me mostrar cada um
deles. — joguei de repente, e levei a taça a boca, ainda encarando Patrice,
que corou por completo.

Lia não se aguentou e gargalhou, assim como Diana, que parecia


mais feliz do que o de costume. Olhei para Klaus, e assim como eu, ele
olhou para a taça que Diana enchia mais uma vez. Ela não era do tipo de

beber muito, porém, poderia chutar que era sua quinta taça.

— Você não presta, Paul. — Diana me acusou, e bebeu mais um


pouco do vinho. Klaus me encarou novamente, e assim como ele, fiquei
preocupado. Algo estava errado, mesmo ela estando mais leve.

— Nunca disse o contrário. — refutei e pisquei um olho para ela.

Voltei atenção para Patrice que sussurrava algo baixinho para seu
primo. Ele então tocou uma de suas mãos sobre a mesa, e tive que me
segurar, porque algo me deixava claro que era sua intenção me provocar.

Logo que todos terminamos de comer, Diana foi a primeira a se


levantar, levando junto a ela, Patrice e Lia.

— Que tal uma balada? — perguntou animada, e olhei para meu


irmão, que parecia ainda tão preocupado quanto eu. Diana não estava em
um bom dia, era claro. — Vamos lá! Ficarão sem me ver até a semana do

casamento, eu mereço um pouco de atenção.

— Por mim. — falei, dando de ombros, e Klaus fez o mesmo. O tal


Troian permaneceu calado, e as mulheres concordaram com ela.

Seguimos todas até a saída, e na hora de nos separarmos em carros,


o melhor jeito, já que Diana claramente não podia dirigir, fora levá-la junto
comigo. O que acabou trazendo o tal Troian a tiracolo. Patrice se sentou no
banco do carona, e Diana ao lado de Troian, sem sequer tocá-lo, no banco
de trás. O clima no carro era terrível, porém, tentei amenizá-lo com alguma

música. Mesmo assim, foram minutos torturantes até chegarmos a boate


que Diana tanto queria.

— Vou pegar uma dose, vocês vêm? — Diana ofereceu, e assenti,


indo até ela, e enlaçando sua cintura.

— O que houve, Dia? — perguntei baixinho em seu ouvido, e ela


me encarou sem mostrar qualquer reação. — Vamos lá! Nada de fingir.
Não para mim!

— Nem para mim! — Klaus falou, parando do seu outro lado, e


Diana bufou, sabendo que estava cercada por nós. Conosco, ela não podia
mentir ou inventar algo. A conhecíamos bem.

— Só quero beber para esquecer. — revelou. — Já os vi fazendo


muito isso. Será que posso? — debochou e a encarei ainda mais

preocupado.

— Quem te machucou? — perguntei de relance, e ela ignorou.

— Três uísques. — pediu ao barman e nos indicou. — O melhor.

— Dia... — Klaus a chamou. — Tem a ver com o fato do primo de


Patrice aparecer no jantar? — perguntou e ela recuou os ombros.

Ela pegou um dos copos dispostos pelo barman, e se virou,


encostando-se contra ao balcão do bar.

— Olhem! — indicou a mesa na qual escolhemos ficar, enquanto

não dançávamos. — Olhem com atenção e me digam porque Troian


aceitou ir jantar conosco hoje. — pediu, e foi então que meu olhar parou na
cena que me fez estremecer.

Troian sorriu para Patrice, com uma das mãos sobre seu ombro,

como se deixando claro que ela lhe pertencia.

— Ele gosta dela. — Klaus se pronunciou. — Pelo jeito, mais do


que deveria.

— Ela não o vê assim, mas pelo jeito, ele está tentando forçar algo
já que se sente em perigo. — Diana falou e virou a dose, deixando o copo
sobre o balcão. — Às vezes sou muito burra em relação a sentimentos. —
confessou e segurei seu braço, tentando acalmá-la. — É verdade, Paul! Eu
simplesmente acreditei que ele me escolheria, mesmo depois de tanto

tempo e agora, com a mulher que gosta ao lado... No fim, sou só uma
imbecil.

— O imbecil aqui sou eu. — provoquei e Diana me deu um soco


no peito, sorrindo.

— Amo vocês, meus imbecis mais lindos. — falou de repente,


fazendo-me sorrir, mesmo que o momento não fosse o melhor para ela.
Olhei para Klaus, e assim como eu, ele entendera. Era o momento
do nosso abraço de urso na irmãzinha mais implicante que existia. Diana

tentou impedir, mas logo se encontrou entre nós, que gargalhamos em


meio a seus resmungos.

— Te amamos muito também, Dia. Nunca se esqueça disso. —


enfatizei e ela piscou.

Antes que pudesse falar mais alguma coisa, ela saiu, indo em
direção a mesa. Klaus e eu pegamos os outros copos de uísque, e bebemos
um pouco, enquanto assistíamos, Diana simplesmente chegar a mesa e tirar
tanto Lia quanto Patrice do lugar. Elas foram para a pista de dança
rapidamente.

— Acho que ele gosta dela, realmente. — Klaus falou, e o encarei.


— Mas os olhos dela, irmão, não saíram de você.

— Eu sei. — confessei. — O que me faz querer esganá-lo. Só que

tenho coisa muito melhor para passar o tempo.

— Como o que?

— Dançar e beijar a mulher pela qual estou apaixonado. — declarei


e Klaus arregalou os olhos, sorrindo em seguida.

— Um brinde. — ergueu o copo de uísque em minha direção. —


Aos Russel enfeitiçados por duas mulheres estonteantes.
Brindei com ele e ri de seu vocabulário. Klaus sendo Klaus.

Deixei o copo sobre o balcão e fui direto para pista de dança. Sem

me conter, abracei Patrice por trás, puxando seu corpo para o meu. Não
temia mais nada, nem iria temer. Eu estava apaixonado, por completo.
Diferente do que acontecera com Ruby, não precisava implorar por algo, e
não necessitava cegamente por seu amor. Patrice era claramente livre, e

nunca iria impor nada. Apenas, estaria ali, todos os dias, tentando mostrar
que valia a pena.

Valia a pena me ter ao seu lado. Valia a pena me olhar como seu.
Valia a pena um dia se apaixonar por mim. O faria valer, em algum
momento. Virei-a em minha direção e nossos olhos se encontraram, aquela
conexão única me arrematou. Nunca foi Ruby, tive certeza. Encontrei o
amor no momento em que aparecera uma loira falante sentada ao meu lado
no balcão de uma boate, querendo falar mais do que queria ouvir.

Encontrei amor, no momento certo e felizmente, com a pessoa certa. Como


minha mãe dizia: o destino é a nossa obra, nada além disso. Porque no
final, somos nós que decidimos o que e quem permanece.

Patrice se tornara parte permanente de meu ser.


Capítulo 13

“We got all night to fall in love

But just like that we fall apart

We're broken

We're broken.”[51]

— Acho que bebi demais. — Patrice falou completamente

embolada e tive que sorrir, soltando de leve seu corpo, para poder fechar a
porta.

— Bebeu demais, estrela. — falei, acendendo a luz, para que ela


pudesse se locomover melhor pelo apartamento. — Acho que precisa
apenas se deitar e dormir. — sugeri, vendo-a gargalhar sobre e para o nada.

— Não! — reclamou e tentou chegar até mim, trocando seus pés


nos saltos. Apressei-me e parei a sua frente, segurando-a para não cair. —
Acho que mereço um pouco mais de atenção, não só dormir.

Sorri de seu tom bêbado e desejoso. Patrice entrou na onda de

Diana, e acabaram as duas em rodadas de tequila. Peguei-a no colo no


mesmo instante e ela soltou um gritinho. Carreguei-a até o quarto e com
cuidado a coloquei sobre a cama.

Sentei-me e comecei a tirar os saltos, que não fazia ideia de como

conseguia usar por tanto tempo. Devia ser doloroso.

— Isso mesmo, me deixa nua. — falou sugestiva, e gargalhei.


Patrice bêbada era tão engraçada quanto sóbria.

Tirei o sapato de seus pés, e massageei um pouco. Patrice falou


mais algumas coisas sem sentido e logo vi seu corpo se virar contra o
travesseiro. Lembrei-me do que não gostaria naquele instante, enquanto ela
se deixava levar pelo sono. Suspirei profundamente, levantando-me da
cama, e indo até seu lado, depositando um leve beijo em sua testa.

Fora a bebida ou apenas ela falando no momento em que enfrentou


Ruby em frente à boate?

— Não tem como ele me trair, já que não temos nada sério. — sua
resposta me pegou desprevenido, fazendo meu coração afundar no peito.

Ruby sorriu abertamente, mudando sua postura diante de Patrice,


saindo logo em seguida. Naquele momento, senti-me quebrar por inteiro.
Não saberia dizer, porém, queria muito tal resposta. Olhei mais
uma vez para seu rosto com a maquiagem um pouco borrada, e me lembrei

de algumas coisas que Diana deixava entulhada em meu banheiro. Fui até
lá, e peguei o tal lenço demaquilante, mandando uma mensagem para Lia,
perguntando se estava certo usar aquilo. Já que Diana, pelo estado que a
deixara em casa, não acordaria tão cedo.

Remetente: Cunhada

“Ela desmaiou na cama, né?

Pode usar sim. Acredite, a pele dela agradece.

Boa noite, cunhado. Obrigada por cuidar de minha melhor amiga.

Obs: precisamos conversar mais sobre isso.”

Sorri de sua mensagem e respondi rapidamente.

Destinatário: Cunhada

“Quando quiser, cunhada preferida do mundo. E sobre sua pergunta, sim,


ela sequer mexe em seu sono. Não me agradeça, faço isso de coração.”

Deixei o celular de lado e fui até Patrice, virando seu rosto para
cima, e passando levemente o lenço. Não saberia dizer se estava fazendo
da forma correta, porém, a quantidade de produto que tornava o lenço
branco em outras cores, parecia me mostrar que estava progredindo.

Patrice mexeu um pouco, mas não acordou. Parei, minutos depois, após
usar cinco lenços. Seu rosto aparecia claramente para mim, sem
maquiagem alguma. Ela ficava ainda mais linda.

Lembrei-me dos momentos juntos em frente à televisão, da forma


como nossos corpos se completavam, assim como nossas conversas
fluíam. Depois de tanto tempo me enganando e implorando por um amor
de mentira, finalmente, encontrara algo real. Um desejo, que me levara
para perto da mulher mais cativante que conhecera. De alguma forma, o

brilho de Patrice aplacava, sem ela ao menos perceber, a escuridão que


tanto me rodeou. A saudade de minha mãe, a falta que ela fazia no dia a
dia, que mesmo sendo tão novo, era gigantesca, apenas pelas poucas
lembranças que tivera. Patrice me fazia ver a vida de outro ângulo, ainda
mais, por conseguir me entender melhor do que ninguém.

Toquei seu rosto mais uma vez e fui até o closet, livrando-me da
roupa social, e colocando apenas uma calça de moletom cinza. Precisava
me deitar e tentar entender o que levara Patrice a responder tal coisa. Não

falamos a respeito de amor, nem de relacionamento. Porém, mesmo que

não quisesse insistir para termos algo. Será que ela não sentia nada por
mim? Nada que a fizesse pensar que nunca a trairia? Que ela, era a única.
Que ela, era suficiente para mim. Ninguém mais, ninguém menos. Apenas
ela.

Voltei para o quarto e me deitei ao seu lado, puxando o lençol


sobre nós. Acomodei-me melhor e a encarei, temendo que meu sentimento
não fosse recíproco. Porém, não desistiria. Conquistar Patrice se tornaria
minha grande meta dali por diante. Ouvir de sua boca que me quer o
quanto a quero era tudo o que precisava.

A noite chegava ao fim, e tentei me manter de pé, perto dos lábios


de Paul. Sentia-me livre, permitindo-me sentir um pouco mais através da
bebida. Porém, o álcool nunca seria resposta ou desculpa para algo.

— Vem aqui. — a voz de Paul soou e o encarei, sentindo-me

completamente inerte.

O poder que ele parecia exercer sobre mim, deveria me fazer temê-
lo mais do que ninguém. Porém, pelo contrário, parecia cada vez mais
próxima a ele.

— Acho que bebi demais. — confessei, e ele sorriu de lado,


claramente concordando.

— Olha só quem resolveu dar as caras.

Senti o corpo de Paul retesar, e logo fui colocada para trás do


mesmo.

— Acha mesmo que pode sumir para sempre?

Passei por Paul, sem deixar com que me impedisse de ver quem
era. O álcool não me impediu de ver perfeitamente a mesma mulher que

encontrara em seu apartamento e no escritório... Ruby. A tal mulher do


passado de Paul, que pensara estar neste. Olhei-o rapidamente, e notei,
que parecia não entender nada.

— Posso ajudar? — perguntei, sem deixar o tom de deboche de


lado.

Poderia estar bêbada, mas reconheceria o olhar venenoso de


qualquer pessoa de longe.

— Acho que eu posso te ajudar. — refutou e deu alguns passos à

frente, parando bem perto de mim.

Paul colocou a mão entre nós, claramente nos separando. Por


algum motivo, ele queria me manter longe de Ruby. A história começara a
ficar interessante.

— O que você quer, Ruby? — Paul perguntou seriamente, e notei o


tom frio que usava. — Pensei ter deixado tudo claro entre nós.

— O meu papo é com ela. — falou, sem sequer encará-lo. — Não


confie nele! — sua voz soou ácida.

— Ruby...

— Ele não é o homem de uma mulher só. Ele gosta de novidade, e


um dia, estive no seu lugar. Ele durou, por algum tempo, mas acredite, tem
validade. — notei naquele instante que existia algo entre eles que

desconhecia. Algo que precisava saber, urgentemente. — Ele vai te trair,


assim como fez comigo. Depois disso, não vai sobrar nada.

— Chega, Ruby!

A voz de Lia surgiu, e ela tentou afastar Ruby, porém, respondi


antes que o fizesse. Sentindo que as palavras cruéis que ela proferira,
pudessem apenas mostrar a realidade. Então, dei-lhe a minha realidade.
— Não tem como ele me trair, já que não temos nada sério. — falei
de uma vez, e vi um sorriso surgir no rosto da mulher que mal conhecia,

mas que apenas queria distância.

Ela então saiu, e logo senti uma das mãos de Paul em minha
cintura, levando-me dali. Olhei-o rapidamente, porém, apenas decidi
ignorar tal coisa. Queria voltar para dentro da boate e beber, e não seria

impedida. Beber para esquecer que me sentira como Taylor Swift ao


escrever End Game, uma completa louca por um homem que partia
corações no café da manhã. No fim, seria apenas mais uma.

— Quero mais uma dose. — declarei, e Paul me encarou


desacreditado. — Diana ainda está lá dentro, vou voltar.

— Estrela, vamos para casa, por favor. — pediu, mas me neguei,


saindo de seu aperto.

Ao contrário do que pensei, Paul me seguiu, e voltamos para a

boate. Encontrei Diana no mesmo lugar, dançando junto a um homem que


reconhecera brevemente, já que tínhamos sido apresentados naquela
noite. Se não me engano, aquele era Spencer, primo da tal Ruby.

— Um minuto. — pedi, e a afastei dele. — Que tal mais uma


rodada de tequila? — perguntei e os olhos de Diana brilharam.

— Agora! — praticamente gritou por conta da música, e seguimos


para o bar.

Cinco tequilas para dentro, e senti meu corpo ainda mais leve, e

minha cabeça girar. Os braços fortes de Paul me seguraram, trazendo-me


para realidade. No fim, bebi apenas para esquecer que me apaixonei por
um homem que nunca me olharia além de uma transa.

De repente, pareci viver a mesma discussão com Ruby, mas a

história se tornara outra. Quando pisquei, encontrei-a aos beijos com Paul
dentro da boate, como se nada mais importasse. Como se minha presença
não importasse. Gritei alto, sem me conter. Meu coração se partiu em mil
pedaços e fechei os olhos, não querendo mais vê-lo com outra. Não
tínhamos nada. Tentei convencer minha mente. Então, por que doía tanto?

— Não! — gritei mais uma vez e me virei, tentando sair de perto.


Porém, algo me puxava para o mesmo momento. — Não!

Levei as mãos aos olhos e tentei tirar aquilo de minha mente, de

minha frente, de meu coração. De repente, senti uma mão quente tocar a
minha e uma voz grossa chamar meu nome. De algum jeito inexplicável,
senti meu corpo se sacudir, e de repente, abri os olhos.

A primeira coisa que enxerguei foi o azul dos olhos de Paul. Ele me
encarou, claramente assustado, e não soube expressar de outra maneira o
alívio que me tomava por aquela cena final ser apenas um pesadelo.
Joguei-me em seus braços, abraçando-o sem esconder de forma alguma,
meus sentimentos. Toquei suas costas, e subi até seus cabelos, sentindo a

maciez, constatando que estava mesmo ali.

— Um pesadelo, minha estrela?

Sua pergunta me pegou desprevenida. Era muito mais que o


pronome possessivo, ou o apelido que se tornara ainda mais especial. Era

“mais” porque ele quem pronunciava. Era “mais” porque ele me escolhera
para estar ali.

— Precisamos conversar. — falei baixinho, e me afastei um pouco,


apenas para olhá-lo.

Notei que uma fraca luz entrava pela fresta da persiana que ele
deixara aberta. Olhei rapidamente para o relógio no criado mudo e
constatei que já se passavam das seis da manhã.

— Só que não agora, apenas me abraça e vamos dormir. — pedi, e

um sorriso preguiçoso tomou conta de seu belo rosto, assim como um


brilho sem igual em seus olhos.

Ele não dissera nada, apenas assentiu, e assim que me deitei, senti
seu corpo contornar o meu. Puxei-o para mim, como se minha vida
dependesse daquilo. Aquele pesadelo me assustara, porque de alguma
forma, temia que a bolha em que nos encontrávamos estourasse, e que
assim, Paul não me enxergasse. Que no fim, não fosse sua jogada final.

Fechei os olhos, recitando mentalmente a música que ficara em

minha mente, a qual traduzia tudo o que sentia. De alguma forma, torcendo
para que um dia, ele me olhasse como nunca olhou para mais ninguém.

“I don't wanna touch you, I don't wanna be

Just another ex-love, you don’t wanna see

I don’t wanna miss you (I don't wanna miss you)

Like the other girls do

I don’t wanna hurt you, I just wanna be

Drinking on a beach with you all over me

I know what they all say (I know what they all say)

But I ain't tryna play.”[52]


Capítulo 14

“I love the way you are

It's who I am, don't have to try hard

We always say, say it like it is

And the truth is that a really miss.”[53]

Ela estava sob meu peito, ressonando baixinho.

Sorri, porque nunca imaginei que me sentiria de tal forma por


alguém. Porém, ela o fazia. Uma paz que até então desconhecia se
instalava em meu peito, sempre que o sorriso dela encontrava o meu. Ela
era uma luz, em meio a toda escuridão que me cercava. O amor me atingia,
e mesmo não entendendo como, estava entregue. Patrice se tornara minha
estrela, e não existia apelido melhor para representá-la.

Levantei-me com cuidado e antes de sair do quarto, olhei mais uma


vez para aquela que tinha meu coração em mãos. Ela se mexeu no sono, e
agarrou o travesseiro ao seu lado, como se em busca de meu corpo. Saí do

quarto e segui rapidamente para a cozinha, em busca de algo para comer.

Os dias passavam, e os sentimentos aumentaram e se


transformaram. Num segundo, conformei-me que a vida era fadada a
negócios e beber até cair nos fins de semana, assim como, ter a cada noite,

uma mulher diferente em minha cama. Mas duas mulheres me mostraram o


contrário. Entre elas, a qual seria eternamente grato. A que me fez perceber
os erros que cometia, enquanto a felicidade desfilava a minha frente.

Diana era arte, como ela mesmo afirmava. Minha melhor amiga e
parceira de crime desde jovens. Ela sempre seria minha irmã da vida, por
nunca ter me abandonado, mesmo nos piores momentos. Mas ela não era a
mulher da minha vida, que me mostrou que mesmo sendo quebrados,
nossos pequenos cacos, poderiam se juntar. Patrice me mostrou no tempo

juntos, que sexo não era tudo, mas também, se transformava em outra
coisa quando estávamos os dois entregues.

Abri a geladeira e peguei um dos bolos de chocolate que Patrice


comprou um dia antes para tomarmos café da manhã, que segundo ela, era
algo comum no Brasil. Sorri, cortando um pedaço e pegando o pedaço com
as mãos. Saboreei o bolo e por um minuto apenas torci para que as coisas
estivessem perfeitas entre nós, porém, não era bem daquela forma. A fala
de Patrice ainda passava por minha mente, e tentei entender como fazê-la

ver que não a via de tal forma. Ela não era só mais uma para mim.

Terminei de comer e voltei a geladeira, pegando uma garrafa de


água gelada. Bebi praticamente inteira, sabendo que mesmo sendo forte
para bebidas, precisava me reidratar. Deixei a garrafa vazia sobre a pia, e
comecei a procurar a maleta de medicamentos que deixava em uma das

grandes portas dos armários. Nunca fui um poço de organização, mas


naqueles últimos dias, sequer prestei atenção na arrumação de meu
apartamento.

Achei-a e peguei uma cartela de comprimidos para dor de cabeça,


com toda certeza, Patrice acordaria de ressaca.

— Não precisa. — sua voz doce soou e me virei, vendo um sorriso


fraco em seu rosto. — Minha cabeça não está doendo, por incrível que
pareça. — avisou.

Dei de ombros e coloquei a cartela de remédios de volta no lugar.


Patrice encostou-se contra a parede do corredor, e assim que guardei a
caixa, apenas parei para olhá-la. Ela me encarava parecendo absorta em
seus próprios pensamentos. Analisei-a por completo, desde o sorriso
perdido no rosto até os pés descalços no chão.

— Podemos conversar? — perguntou, e notei que se sentia um


pouco sem jeito a minha frente.

Parei, e pensei sobre o que poderia ser. Automaticamente pensei

em Ruby e no que ela falou para Patrice. O mais correto seria lhe explicar
o que realmente aconteceu entre eu e Ruby no passado.

— Se senta, por favor. — pedi, vendo que de repente, a intimidade


que tanto compartilhamos parecia ter se perdido.

Patrice assentiu e foi em direção ao sofá, encolhendo-se no maior


deles. Fui até ela, e me sentei na poltrona a frente, dando-lhe o espaço
necessário para absorver as informações.

— O que a tal Ruby disse ou deixou de dizer não me interessa, na


verdade. — declarou, praticamente lendo meus pensamentos. — O que
realmente me importa é o que está acontecendo entre a gente, Paul.

— Mesmo assim, acho importante te falar sobre Ruby. — comecei,


e a encarei com pesar. — Tudo bem? — perguntei um pouco receoso, e

felizmente, Patrice assentiu.

Nada melhor do que começar algo, deixando tudo claro. Patrice


merecia saber a verdade.

— Eu achei que amava Ruby, na realidade me culpei por muito


tempo por perdê-la. — confessei, e levei as mãos à cabeça, sentindo-me
um completo imbecil. — A realidade é que busquei nela algo que sentia
faltar em mim. Ela foi a mulher que me negou quando mais novo, e se
tornou um desafio. Mesmo assim, não tínhamos um relacionamento. —

declarei, lembrando-me da frase de Patrice, sentindo-me afundar. —


Enfim, ela transava com outros caras, mas isso não me importava. Um dia,
ela chegou no meu apartamento e me pegou com outra. — revelei, e olhei
para Patrice, com medo de seu julgamento. — Ruby chorou e disse que me

amava, e depois disso foi embora. Me apeguei aquele sentimento, porque


sempre desejei ser amado por alguém, e quando consegui, a fiz me deixar.
— sorri sem graça. — Parece um absurdo, eu sei. Ela voltou por agora, e
aí, senti que teria uma segunda chance... Mas no meio disso tudo, você
apareceu. — confessei, e os olhos verdes dela me encararam atentos. — Eu
te desejei de um jeito que não sei explicar, e até agora, não sei ao certo. —
falei sinceramente, e sorri de lado. — E aquele dia no escritório, fugi
completamente do meu habitual. Eu nunca desfoquei do trabalho, mas

você, me fez esquecer por completo onde estava. Aí, vi que precisava
entender o que diabos aconteceu com Ruby e eu, e mais, o que sentia. Na
conversa com Ruby descobri que nunca de fato a amei, era apenas a
negação, o medo de nunca mais ser amado. Ainda mais, descobri que Ruby
apenas fez tudo aquilo porque não lhe dei mais dinheiro. — sorri sem
vontade. — Terminamos aquele assunto, e depois, recebi uma mensagem
de Diana, sobre o jantar... — finalizei, e Patrice pareceu se perder diante de
minhas palavras. — Isso é basicamente tudo o que aconteceu entre mim e
Ruby. Nunca passou de uma ilusão. Uma mentira.

— E eu sou o que, Paul? — sua pergunta me pegou de surpresa. —


Uma atração? Um desejo? — indagou, e notei sua fragilidade no mesmo
instante.

Levantei-me, e me ajoelhei a sua frente, tocando de leve sua perna.

— Eu pensei que fosse só um desejo, até o momento em que não


consegui me afastar de você. Quando de repente, nenhuma outra mulher
me chamou atenção. Porque o seu sorriso me teve desde o começo, estrela.
Você é sinceridade, em meio a tudo que mais resguardo. — seus olhos
verdes me encaram emocionados. — Não esperava amor, porque nunca me
senti merecedor disso. Mas você mudou qualquer conceito que tivesse.
Estou apaixonado por você, estrela.

— Paul, eu...

— Não precisa dizer nada, só quero que me dê a chance de te


conquistar. Quero que seja apenas minha, e eu serei, apenas seu. — pedi,
deixando meu coração em suas mãos, entregando-lhe tudo o que mais temi
durante tantos anos.

Mas era ela, tive certeza. Patrice iluminava meus dias, e faria de
tudo, para que permanecesse como minha, caso me aceitasse.
Surpreendendo-me, pulou sobre mim, fazendo-me cair contra o
tapete da sala, e senti beijos sendo depositados por todo meu rosto.

— Eu também estou completamente e irrevogavelmente


apaixonada por você. — suas palavras me pegaram de surpresa. — Meu
tom de azul favorito. — sorri de sua fala, e a puxei para um beijo.

Um beijo que me prendeu a ela como o primeiro. Um beijo que nos

fez pertencer um ao outro, como devia ser, desde o princípio. Reafirmei


naquele instante que fizera a escolha certa. Com ela, seguiria, até o fim.
Capítulo 15

“Cause I don't wanna lose you now

I'm lookin' right at the other half of me

The vacancy that sat in my heart

Is a space that now you hold.”[54]

Olhei para Lia com pesar, assim que Diana deu um leve tchau e

seguiu para embarcar. A todo momento, tentei parecer forte e fingir que
nada me acontecera, porém, minha mente girava em torno do que não
entendia. Troian simplesmente saiu do apartamento e não deixou nenhuma
pista para onde iria. Falei com meus tios, e tentei a todo custo fazer contato
com ele, mas nada. Nada além de uma mensagem curta e grossa. Ele fugira
de mim no dia após o jantar para Diana. Já completava praticamente uma
semana. Algo está errado.
— Ele deve estar bem, estrela. — a voz de Paul soou em meu
ouvido e assenti, sem acreditar muito naquilo. — Ei, olha para mim!

Virei-me para ele, e mais uma vez, sua imensidão azul me atingiu.

— Ele já é um homem, e sabe se cuidar. A mensagem que ele te


mandou deixou isso claro.

— Ele pediu para que não o incomodasse. — soltei exausta. —

Quando virei um incomodo para ele? Ele é como um irmão para mim,
Paul!

— Eu sei. — puxou-me para seus braços, nos quais, tentei evitar o


mundo. — Me sinto da mesma forma ao ver Diana ir viajar sozinha,
mesmo sabendo para onde vai. Imagino que deve doer demais, estrela.

— Ei, barbie. — Lia me chamou e a encarei, com claro pesar. — A


gente sabe que tem um porquê de ele ter ido embora, mesmo que não tenha
admitido. E mais, talvez, o que Troian precise é de tempo. Tempo para se

acostumar que existe outra pessoa na sua vida.

Suspirei fundo, sentindo-me culpada. Mesmo sabendo que nunca


dei indício algum para Troian sobre um relacionamento amoroso, culpava-
me por ele sentir algo “mais”. Mesmo que como minha melhor amiga
falara, não admitira.

— Acho que precisamos descansar um pouco e quem sabe, jantar


mais tarde. — Lia ofereceu.

— Eu só preciso de um tempo para digerir isso. Desculpem! —

falei para eles e encarei Paul, que mantinha um leve sorriso no rosto.

Segui-os até o carro, e logo me despedi de Klaus e Lia. Entrei no


carro com Paul, e me senti um pouco constrangida. Talvez ele pudesse
estar interpretando minhas ações de forma errônea.

— Ei! — falei, após colocar o cinto, e Paul sair com o carro. —


Sabe que só estou preocupada com Troian, não é? Que ele é como um
irmão para mim.

— Eu sei, estrela. — sua voz rouca me atingiu, e notei que ele não
mentia.

Depositou a mão direita minha coxa, e assim que paramos num


sinal, ele me encarou.

— Também sei que não saberia o que fazer caso não fosse

recíproco o que sinto por você. — confessou e suas palavras me atingiram


em cheio. — Me sinto um homem de sorte só por te ter ao meu lado.

Absorvi suas palavras e tentei me manter inteira. Paul conseguia


me juntar e despedaçar ao mesmo tempo. Nunca esperei, nem em mil
vidas, que ele seria um homem romântico. Na realidade, teria que admitir,
que ouvi-lo falar daquela maneira, me recordava em como o imaginava me
abordando em alguma festa, quando jovens.

— Eu sonhava com isso, confesso. — falei, sem medo algum de

admitir tal coisa. — Você era o cara bonitão das festas, o que todas as
meninas desejavam como par. Quer dizer, todas menos as do fã clube de
Klaus. — sorri de lado, lembrando-me daquilo. — O cara mais velho, com
um ar de bad boy... Imaginei que eu seria a garota a transformar você em

um príncipe.

Paul gargalhou junto a mim, e lembrei-me por completo de um


velho diário, onde falava a respeito de como ele era bonito e o que faria no
nosso primeiro beijo. Mal sabia eu, que só aconteceria, muitos anos depois.

— Acho que demorou um pouco mais do que imaginou. — falou,


claramente despreocupado. — Mas acredite em mim, estrela, nunca fui um
homem romântico.

— Então existe outro nome para o que tem sido comigo. —

provoquei, pois era a mais pura verdade. — Você tirou a minha


maquiagem, Paul! Tem noção o quanto isso foi fofo?

— Só queria te deixar confortável. — falou com seu ar de menino.

— Isso, torna sua atitude, ainda mais bonita. Nunca esperei


romantismo de ninguém, a não ser, claro, em livros. — confessei. — Você
tem me trazido para experimentar uma verdadeira obra de romance.
— Não me coloque em tão alto patamar. — seu tom de deboche me
fez sorrir. — Apenas quero te fazer feliz.

— Eu sei. E a cada dia, me apaixono um pouco mais por isso.

Paul sorriu, e me encarou rapidamente, aumentando o aperto em


minha coxa. Com ele, os problemas pareciam se tornar apenas uma parte,
pois de algum jeito, o mundo ficava em segundo plano quando estava ao

seu lado. O difícil, era acordar daquela realidade que construímos juntos.

— Eu não faço ideia do que esteja acontecendo, June. — falei

nervosa, descendo carro, e enfrentando uma chuvinha chata que caía. — O


barman simplesmente me ligou do celular de Paul, e disse que era urgente.
Só consigo pensar que ele está caído no meio da boate!

— Ei, ei! — Lia tentou chamar minha atenção.

Enquanto isso, estava tentando entrar naquela bendita boate.

— Klaus e eu estamos indo para aí, ok? — sua voz soou


preocupada. — Tenho certeza que Paul não faria qualquer besteira.
— Como vamos saber? De repente, ele disse que ia resolver algo
com Klaus, e agora, um barman me liga! — acusei, completamente

furiosa. Finalmente, conseguia entrar naquele lugar. — Paul está me


fazendo de idiota! Eu disse que não podia me apaixonar! Sabia que seria
uma furada!

— Calma! — Lia gritou do outro lado da linha. — Falou tudo em

português e muito rápido!

— É claro que estou falando rápido e em português. — refutei,


buscando chegar o mais rápido ao bar, que estava lotado de pessoas. — Eu
sabia que isso não daria certo, June. Como me deixou fazer isso? Eu moro
em outro país, e agora, estou apaixonada há poucos dias, e tenho que vir
buscar o cara numa boate?! — falei, completamente inconformada.

Finalmente consegui localizar um dos barmen e tentei me infiltrar


entre as pessoas. Felizmente, uma mulher ruiva sentada no banco próximo,

se levantou, e rapidamente, por ser pequena, consegui passar, e sentar no


lugar.

— Por Deus, calma! — Lia insistiu. — Onde você está?

— Sentada na frente do bar dessa boate, esperando algum barman


me dar atenção. — resmunguei. — Onde diabos Paul se meteu? Parece que
só me meto em problemas. — reclamei.
— Dia de afogar as mágoas?

A voz rouca me atingiu em cheio, e olhei para o lado. Arregalei os

olhos, ao finalmente reconhecer Paul, e fiquei inerte por alguns segundos.

— Que tipo de brincadeira é essa? — perguntei, e ele sorriu de


lado.

— Com certeza, hoje não é o dia de ficar sozinho.

Paralisei diante de suas palavras, ao mesmo tempo em que ouvia a


gargalhada de Lia do outro lado da linha.

— Seja feliz, barbie.

A ligação foi desfeita, e deixei o celular no bolso, ainda encarando


Paul incrédula. Por que ele estava repetindo o que conversamos no nosso
primeiro encontro ali... Espera! Olhei ao redor, e finalmente me localizei.
Era a boate na qual nos vimos, e mais, o mesmo banco no qual ele se
sentou e eu também.

— Mas...

— Um dia, uma moça de boca esperta tentou falar comigo. —


começou, e prendi a respiração sem saber o que fazer. — Fui um idiota,
mas logo, quando a vi dançar, fiquei encantado. Depois daquela noite, ela
não saiu da minha mente.

— O que está fazendo, Paul? — perguntei, sem entender nada.


— Essa mesma moça, ou melhor, mulher. — corrigiu rapidamente,
se levantando. — Acabou tomando meu coração para si.

Ele parou ao meu lado e tocou meu rosto com carinho, do mesmo
jeito que sempre o fazia, deixando-me perdida com seu toque.

— Só que existe uma pergunta, a qual tem me atormentado um


pouco, ainda mais, por saber que essa mulher, tem o lar tão longe de mim.

— Qual? — indaguei, sem saber o que esperar.

— O que temos tem pouco tempo, estrela. Eu sei que é tudo muito
intenso e possa estar assustada. Mas eu não quero que volte para o Canadá
sem a certeza de que é permanente em minha vida.

— Paul...

Ele sorriu de lado, tirando do bolso de trás da calça uma caixinha


de veludo. Levei as mãos a boca, completamente chocada.

— Queria te fazer lembrar desse mesmo lugar sempre, já que foi

aqui, que chamou toda minha atenção para si. — começou, e se ajoelhou
de repente, fazendo com que aquele momento parasse. Ao menos, em
minha mente. — Minha estrela... — respirou fundo e notei seu nervosismo.
— Sei que o seu lugar é onde seu coração está, e com você, descobri que o
meu te pertence... Quero que tenha direito a escolher, mas seja o que for,
estarei por perto. Brasil, Canadá, Estados Unidos... Eu vou para onde você
estiver. — arregalei os olhos, completamente surpresa. — Patrícia
Oliveira, aceita ser minha namorada?

Lágrimas correram sobre minha face e não pude me conter, gritei


um sonoro “sim” em português, sem sequer me importar com as pessoas
ao redor. Paul se levantou e me puxou para seus braços, colocando a
aliança com um pequeno solitário na cor rosa em meu dedo anelar direito.

Sem querer mais pensar, o beijei, com todo amor que sentia, e sabendo,
que aquele, era apenas o começo de nossa história.
Epílogo

“We were crazy to think

Crazy to think that this could work

Remember how I said I'd die for you?

We were stupid to jump

In the ocean separating us

Remember how I'd fly to you?”

As pessoas deram-lhes milhares de avisos.

As pessoas tentaram dissuadi-los do quanto era difícil.

Algumas até mesmo disseram que namoros a distância vem com a

placa de perigo em neon.

A questão real era que não eram aquelas pessoas. E nem todas elas,
foram tão negativas sobre um amor ser dividido geograficamente. Paul
Russel encarou a janela, ao mesmo tempo que prestava atenção nas
pequenas gotas chuvas que escorriam. Seus pensamentos estavam tão
longe, ao mesmo tempo, tão perto. Mais uma vez, Patrice viajaria a
trabalho, para longe de seu alcance, e ainda mais, longe de seu amor.
Ambos tentavam conciliar suas datas, mas em determinado
momento, elas sempre divergiam. Eles tinham trabalhos diferentes e

empresas diferentes para gerir. O peso em suas costas não era demais, o
problema, era que parte de si se perdia por ter que ficar meses longe da
mulher que lhe trouxe algo a mais para sorrir.

Patrice era a luz em meio a toda descrença que rondara a vida de

Paul Russel. E ele, era o achado mais perdido de toda a vida dela. Nunca
imaginou que de fato amaria seu primeiro amor. Paul era uma parte do
passado de Pat, nada que a marcaria para sempre. Contudo, ele o fizera.
Depois de muito tempo sem poder estar a sombra de seus olhos, quando
ela esteve, ela quis ficar. E queria mais do que ficar por um curto período
de tempo.

Patrice suspirou profundamente, ajeitando-se melhor aos


travesseiros, e notou que Paul estava mais uma vez encarando a janela,

como se buscando alguma solução para a distância que os dividiria. A


saudade era massacrante em alguns dias, e eles sabiam. Mesmo com
agendas atribuladas e vidas corridas, eles sempre queriam voltar um para o
outro. Em dias não muito bons, tudo o que Patrice queria era poder ter os
longos braços ao redor de seu corpo.

— Sabe que a janela não tem respostas, não é? — ela indagou alto,
e o viu abaixar a cabeça, claramente perdido.
Levantou-se envolta de um lençol e caminhou até ele, parando as
suas costas. Ali, tocou-a e sentiu seu corpo reconhecer no mesmo instante

o homem que tornara sua cama um lugar sagrado. Não era apenas pelo
sexo, pela paixão e pela forma como tinham química. Era pelo fato de
simplesmente poderem passar a noite simplesmente conversando sobre um
filme, política, livros... Era sobre as pequenas coisas que descobriram

juntos, em um relacionamento tão leve quanto o amor deveria ser, e tão


atormentador quanto a saudade que bate a sua porta, e ao abrir, não há
ninguém.

— Queria que pudéssemos construir algo nosso. — ele falou baixo,


e se virou para ela. Aquele olhar era o mais bonito que vira em toda sua
vida. Nunca se esqueceria do momento em que brilhara para ela.

— Já estamos nessa há três anos, Paul. — Patrice comentou com


uma leve careta, e ele sorriu baixo, puxando-a para ele. A cabeça dela se

encostou no peito dele. As respirações estavam devagar, e os batimentos


cardíacos sincronizados. — Sei que nunca te disse sim, mas...

— Não precisamos casar para construir algo, estrela. — ele tocou o


queixo dela e a encarou com carinho. Com todo o amor que sentia. —
Estamos construindo algo juntos desde que nos atacamos na minha sala. —
foi a vez de ela sorrir, pois ele tinha toda razão.

— Ainda não podemos conciliar nossas agendas ao ponto de


termos uma casa e nos vermos sempre. — a razão dela falou mais alto e

Paul sorriu de lado, como se escondesse muito ali. — O que foi?

A última vez que o vira fazer a mesma coisa, ele a pedira em


casamento. Nunca entenderia ao certo como aquele homem a entendia, a
ponto de não se magoar pelo fato de ainda não estar pronta para dar aquele
passo. O importante era que ele entendia, e parecia até mesmo saber que

não receberia uma resposta positiva dois anos atrás. Não daquela vez.

O que mais fizera Patrice negar o pedido não fora por não estar
pronta. Ela estava. Contudo, a vida deles era tão separada, que não queria
simplesmente assinar um papel, ter uma festa e fugir para uma lua de mel
no Caribe, se após uma semana, não poderia encontrar o homem que
amava. Aquilo não lhe fazia sentido. Ela queria mais. E Paul sabia muito
bem daquilo.

— Passamos mais tempo longe um do outro do que perto. — ela

assentiu para o óbvio, mas ainda não entendia onde ele queria chegar. — O
ponto é que resolvi seguir meus sonhos, estrela.

— Como assim? — indagou de repente, sem entender ao certo.

— Klaus está mais do que pronto para assumir a empresa e eu... Eu


quero conhecer o mundo, Pat. E posso muito bem começar pela nova filial
da Russel no Canadá. Já assinei os contratos e...
— Mas Paul, eu...

— Olha, sei que é algo que não esperava, mas eu...

— Eu acabei de assinar um contrato de permanência em Nova


Iorque! — ela praticamente gritou e ele se calou. Ela também permanecera
muda, e os dois apenas se encararam incrédulos. Aquilo os consumia há
meses, já que estavam tentando surpreender um ao outro, com a notícia de

poderem estar mais próximos do que nunca. A questão era que fizeram ao
mesmo tempo.

— Puta merda! — Paul falou e levou uma mão aos cabelos,


passando-a com força. — Então ambos mudamos de cidade pelo outro e...

— E nos desencontramos de novo? — Patrice indagou,


gargalhando em seguida, e sendo acompanhada da risada rouca de Paul.

— O que faço com a gente, estrela? — ele perguntou e beijou-a


levemente, sorrindo amplamente. — Como conseguimos nos desencontrar

tanto?

— Acho que só queríamos surpreender e... — deu de ombros. —


Olha que surpresa! — gargalhou ainda mais alto, abraçando-o pelo
pescoço, e sem conseguir parar de sorrir. — Acho que precisamos de um
novo meio termo.

— Sem surpresas dessa vez?


Ambos sorriram da pergunta de Paul e se beijaram
apaixonadamente. Aquela era a prova de que estavam de fato alinhados.

Aquela era a prova de que ambos estavam prontos para dar mais um passo
naquela relação. Aquela era a prova de que se existia destino, eles estavam
um no outro.

Fim
Sinopse

Troian Messina nunca quis se apegar a nada, a não ser, seu bom e

velho violão. Ele era um homem de espírito livre, que sempre se permitiu
viver de acordo com o que acreditava. O destino lhe coloca a frente de uma
mulher que o encantara ao mesmo tempo que o assustara no passado –
Diana. A mulher de olhar determinado e postura imponente, não era como
as outras. Ela o enfrentava, ao mesmo tempo, em que lhe atraía
perdidamente. Suas vontades divergem, principalmente, as do coração.

Entre a paixão e a liberdade, qual será sua escolha?


Playlist

...Ready For It? – Taylor Swift

2002 – Anne-Marie

7 Rings – Ariana Grande

Anxiety – Julia Michaels feat. Selena Gomez

Call It What You Want – Anne-Marie

Coisa Linda – Tiago Iorc

Consequences – Camila Cabello

Dancing With Hands Tied – Taylor Swift

Dress – Taylor Swift

End Game – Taylor Swift feat. Ed Sheeran and Future

João de Barro – Maria Gadú part. Leandro Léo

Me espera – Sandy part. Tiago Iorc

Mulher Maravilha – Zé Neto e Cristiano

No Matter What – Callum Scott

Perfect To Me – Anne-Marie
Quem De Nós Dois – Ana Carolina

Ready For It – Taylor Swift

Say My Name – David Guetta feat. Bebe Rexha and J. Balvin

Say You Won’t Let Go – James Arthur

So It Goes... – Taylor Swift

Sozinho – Caetano Veloso

Then – Anne-Marie
Prefácio

“Mesmo quando me descuido

Me desloco

Me deslumbro

Perco o foco

Perco o chão

Eu perco o ar

Me reconheço em teu olhar

Que é o fio pra me guiar

De volta.”

Me espera – Sandy part. Tiago Iorc


Prólogo

“I, I loved you in secret

First sight, yeah, we love without reason

Oh, twenty-five years old

Oh, how were you to know?”[55]

— Eu estou bem, pai. — repeti pela milésima vez, durante uma

ligação. — Eu apenas quero saber se as coisas vão bem na empresa, mas


parece que...

— Todos estão proibidos de te passar algo! — bradou e revirei os


olhos, odiando seu tom. Parecia me tratar como uma criança de cinco
anos de idade. — Filha, por favor, apenas dê esse tempo para si! Saia, se
divirta um pouco! Você tem apenas vinte e quatro anos! Precisa viver o
seu momento!
— Já estou formada e sei muito bem o que quero. — rebati. —
Quero estar à frente do que sempre amei fazer. Desde quando tio Dom e o

senhor concordaram de me deixar acompanhá-los nos trabalhos da Russel


aos quinze anos.

— Arte, eu sei. — comentou, e podia ver o seu olhar de


preocupação. — Apenas curta essas duas semanas, por favor. Klaus e

Paul estão pela Europa, se quiser...

— Eu estou bem em solo canadense, pai. — tranquilizei-o.

Andei mais um pouco pelo quarto de hotel. Olhei ao redor e tentei


fazer o que tanto meus pais e meus melhores amigos praticamente queriam
me obrigar – relaxar. Era difícil, pois nunca me senti parte de algo além da
publicidade. Eu amava criar e fazer as pessoas se sentirem conectadas.
Portanto, viver em função do meu trabalho nunca fora um sacrifício, era
meu oásis particular. O que quase ou basicamente ninguém entendia. Eu

era feliz de tal forma.

— Eu prometo tentar relaxar, pai.

— Eu te amo, filha. Saiba que apenas quero o melhor para você. —


confessou, naquele tom amoroso que sempre demonstrou. Ele era o
melhor.

— Eu também te amo. — sorri, ao encarar a grande banheira, já me


imaginando por onde começar os momentos longe do trabalho. — Agora

vou ter que desligar, estou de férias! — provoquei e ouvi sua gargalhada

do outro lado da linha.

— Sua mãe está me xingando aqui, por não te deixar em paz. —


comentou, e pude até visualizar a cena de mamãe parada a sua frente,
com os braços cruzados e basicamente o obrigando a relaxar.

Ele poderia negar, mas era como eu. Preocupado e dedicado demais
a tudo. Como mamãe sempre insistia em dizer: eu era ingrata. Ela me
carregou por nove meses para que sequer tivéssemos os mesmos gostos
musicais.

— Diga que a amo muito e que vou usar aquele vestido lindo e
exagerado que ela me deu de aniversário. — mal terminei de falar e ouvi o
grito histérico de Elle Carter. Tão minha mãe e sua essência.

— Deve ter ouvido. — papai falou, e ouvi sua risada. — Agora,

vou te deixar descansar. Mas já aviso, nada de ameaçar estagiários para


informações sobre a campanha desse mês. Eles foram avisados sobre
você!

— Ok. — acabei por desistir. — Te ligo amanhã, tudo bem?

— Até, filha.

Desfiz a ligação e deixei o celular de lado, ignorando a milésima


mensagem de Paul, onde ele basicamente mandava fotos variadas de Klaus
dormindo com a boca aberta. Ele era terrível. Mal parecia um homem de

vinte e sete anos.

— Ok, Diana. É hora de tentar agir como qualquer pessoa normal.


— zombei de mim mesma.

Saí do banheiro e caminhei até minhas malas. Tirei de dentro da

mala o belo vestido preto completamente decotado nas costas, de seda, e


com a marca que o fazia custar muito mais alto que a maioria. Mamãe
amava moda, assim como, sempre viveu nesse meio. Uma modelo de
sucesso e amada por praticamente todos. Ela sempre quis que seguisse seus
passos, mas logo, percebeu que não demonstrei interesse algum.

Nunca me vi no mundo do glamour, ainda mais, sabendo o quanto


a carreira de modelo era complexa. Não nasci para aquilo. Por isso, usar
um vestido que normalmente sequer compraria, era algo que a fez gritar.

Tiraria uma foto e lhe mandaria antes de sair. Ela amava me ver, nem que
um por cento do tempo, perto de seu mundo.

Separei mais algumas peças, e peguei meu nécessaire. Voltei ao


banheiro e liguei a torneira da banheira. Deixaria tudo o mais calmo
possível e selecionei uma música no celular, para tentar me distrair,
enquanto a banheira não enchia. Fui até o presente de boas-vindas do hotel,
ao som de Rihanna, e resolvi tomar um pouco do champanhe. Eram três da
tarde, em Vancouver, a cidade que mamãe a papai decidiram me mandar

durante as férias surpresas.

Eles se lembraram de como amei passar um período neste mesmo


lugar, e assim, praticamente me enfiaram no avião. Mais estranho do que
estar sendo obrigada a relaxar, era estar tomando um dos melhores
champanhes em um quarto magnífico de hotel, que mais parecia um

apartamento. Porém, tive que admitir que não existiam quaisquer motivos
para reclamações no momento em que olhei para a vista impecável da
sacada.

Começava a relaxar naquele momento.

Horas depois, encontrei-me em frente a um pub que sempre amei


vir durante a época que passei por aqui. A cidade parecia a mesma de
quatro anos atrás, mas algo me indicava mudança, não saberia dizer ao
certo do que se tratava. Se o dia não tão frio, ou até mesmo, o sorriso das
pessoas que encontrei. Tudo parecia indicar que algo era novo no ar.
Simplesmente, poderia ser minha mente vagando a respeito de encontrar
arte e conexão em pessoas.

Adentrei o pub e olhei ao redor, aprovando mentalmente a reforma


que fora feita. O lugar parecia ainda mais aconchegante do que antes.
Sentei-me numa mesa próxima ao palco, onde deveria ter música ao vivo.
Pedi uma cerveja e encarei o restante do cardápio, tentando decidir se

comeria algo naquele momento. O lugar estava bastante cheio e era


possível ouvir um pouco das conversas alheias, mesmo com a música de
fundo.

Em minha segunda cerveja e o primeiro pedido de fritas, uma voz


rouca soou no microfone. Apenas o timbre fez com que meu corpo, de
alguma forma inexplicável, reagisse. Levantei o olhar e paralisei, ao
encarar o homem de barba loira e espessa, na mesma cor dos cabelos
compridos. Ele falava algo, o que sequer consegui compreender, devido ao

fato de sua beleza me atingir de forma absurda.

Levei a cerveja a boca e dei um longo gole, tentando me tirar


daquela conexão sem nexo. Porém, ele virou o rosto que antes estava
apenas de perfil, presenteando-me com olhos verdes tão claros que
pareceram transmitir o mesmo que me causara.

O que diabos estava acontecendo?


Ele abriu um sorriso de lado, ao encarar meu rosto de forma
minuciosa. Deixei o copo de cerveja sobre a mesa, e me ajeitei melhor na

cadeira, tentando voltar a quem realmente era. Era a dona de minha própria
vida, o que incluía, meu corpo. Levei as mãos aos cachos um pouco
rebeldes naquela noite e os coloquei atrás da orelha, ainda sentindo o olhar
fixo do homem. De repente sua voz inundou todo o local, e entendi que

não seria fácil me livrar de tal sensação.

Ele cantaria naquela noite, e o som rouco de sua voz, fazia-me


desejar ardentemente seus lábios que se moviam de forma suave a cada
verso. Seus olhos fugiam e voltavam aos meus, em cada momento e frase
cantada. Sorri, entregando de vez que aquilo me afetava. Meu objetivo era
relaxar, e nada melhor, naquele momento, do que imaginar aquela boca
sussurrando em meu ouvido frases indecentes, enquanto desbravámos
nossos corpos. Aquele poderia ser o ponto alto de minha primeira noite de

férias.

Levantei meu copo de cerveja, no momento em que seu olhar


encontrou o meu, como quem iniciava um brinde. Em meu interior,
brindava gloriosamente. Um brinde a uma noite com um homem
desconhecido e que de alguma maneira parecia desejar o fim daquela noite
na mesma proporção que eu.
Depois de algumas cervejas e olhares nada apropriados, as horas

passaram tão rápido que sequer percebi. Resolvi me levantar e fui em


direção ao banheiro, sentindo-me um pouco perdida diante de tanta
intensidade. Talvez fosse aquilo que o sentimento diferente diante da
cidade de Vancouver me trouxera. Não era a cidade que mudara, era eu.

Deixei a bolsa e o celular sobre o balcão de granito e passei as


mãos pelo rosto, sentindo-me um tanto quanto impactada. Passei as mãos
pelos cabelos e os joguei para trás, deixando o pescoço livre para passar
água. Parecia estar sufocada com algo que sequer tinha explicação. Assim
que fechei a torneira, escorei-me no balcão, e em seguida, resolvi

responder meus melhores amigos. Abri as mensagens de Paul e foi


impossível não rir. Klaus o mataria tão cedo descobrisse aquelas fotos.

Sorrir daquelas palhaçadas me livrou da carga exótica que me


atingia. Era como se finalmente me livrasse do feitiço que o cara loiro me
jogara. Talvez, nem ele mesmo esperasse uma mulher na mesa bem ao
lado do palco, secando-o como uma verdadeira perseguidora. Porém,
nunca fora o tipo de pessoa que esconde o que sente. Prometi a mim

mesma que nunca mudaria minha essência, pois era o que realmente me

fazia sentir diferente.

No mundo, as pessoas buscam muitas coisas, em sua maioria,


acreditava que as mesmas. Assim como buscam tentar rebaixar os outros,
seja por classe, raça, gênero, e outros mais. Prometi também, que nunca

deixaria alguém sequer tentar atingir por ser quem sou. Eu me amava,
aquilo era o suficiente. Ao menos, para me reafirmar em qualquer situação.

Escutei batidas na porta do banheiro e franzi o cenho, estranhando


por completo. Tranquei a porta sem perceber? Aquele era o banheiro de
um pub, portanto, uma porta principal separava o interior com várias
cabines e a pia, do ambiente externo. Andei até a porta, e a abri.

Meus olhos se arregalaram no instante em que o verde daquele


homem me atingiu. Ele me encarou de forma devastadora, e pude jurar,

que nos agarraríamos ali mesmo. Que química era aquela? Nem mesmo
com Spencer, que era um homem incrível na cama, senti-me daquela
forma.

— Eu sou Travis. — sua voz soou decidida, e o admirei por aquilo.


Ele não iria inventar algum motivo para ter batido a porta. Ponto para ele.
Entretanto, algo em suas palavras não me convencia.
— Diana. — respondi de relance e o encarei da forma que tanto
queria, analisando-o ainda melhor sob a luz mais forte. — Me viu sair da

mesa e resolveu se apresentar? — indaguei.

Ele sorriu de lado, claramente, aprovando minha afronta. Não era


uma mulher de meias palavras. Se eu queria o mundo, simplesmente
queria. Se que queria um homem, era o mesmo processo.

— Direta e sincera admiro isso. — falou, e deu um passo à frente,


ficando muito próximo. — Que tal bebermos algo? — sugeriu.

Olhei-o com um sorriso contido, e pensei nos prós e contras.


Realmente, não existiam contras. Pensei na banheira que quase adormeci
mais cedo, e na maneira que me serviria com um homem como aquele a
tiracolo.

— Acho que mais uma cerveja, T.

Ele sorriu, aprovando o apelido, e senti-o mais leve. Passei por ele,

propositalmente esbarrando em seu corpo, e um arrepio percorreu todo


meu. Algo me dizia, que não adormeceria na banheira. Não naquela noite.
Capítulo 1

“O meu desafio é andar sozinho

Esperar no tempo os nossos destinos

Não olhar pra trás, esperar a paz

O que me traz

A ausência do seu olhar”[56]

Anos depois...

Acordei um pouco perdido e notei o silêncio completo no


apartamento. Com toda certeza Patrice não estava. Senão, os barulhos de
seu café da manhã, soariam por todos os lados. Sentei-me e joguei os
lençóis de lado, esticando-me de forma, que finalmente conseguisse
acordar. Passei as mãos pelo rosto, e fiz um coque com o cabelo, que
nunca estivera tão longo antes.

Levantei-me e segui em direção ao banheiro, ainda, no modo

zumbi, sem querer de fato acreditar que tinha despertado tão cedo. Porém,
aquele era um dia importante, teria uma conversa com um velho amigo, a
respeito de cairmos na estrada mais uma vez. Não era meu objetivo no
momento, porém, nunca conseguira dizer não a música. Além de tudo,

éramos um dos porquês de estar em Nova Iorque.

Fui direto para a ducha fria e amaldiçoei o frio, mesmo sabendo ser
necessário para finalmente despertar. Depois do primeiro contato, tomei
um banho tranquilo, cantando uma das músicas que adorava e que com
toda certeza, ensinaria a meus alunos de canto, quando as aulas voltassem.

Ser professor de canto e violão nunca fora um objetivo de vida,


mas depois de tanto me imaginar em empregos diferentes e até mesmo,
experimentar a maioria, nada pareceu tão interessante e emocionante,

quanto ver o brilho no olhar e sorriso, daqueles que amavam música como
eu. Compartilhar esse amor, transformou-se em uma de minhas razões.

Ter cursado música em uma das melhores faculdades era um ponto


alto em meu currículo, porém, nunca fora o mais importante. Sempre quis
entender o ramo por todos os lados. Com fama ou sem fama, cantar era
minha arte e verdadeiro amor. Ter uma guitarra no colo, enquanto deixava
a voz falar pelo coração, era algo sem explicação. Portanto, sempre
buscava o mesmo em meus alunos.

Aqueles que claramente não amavam o que faziam, logo desistiam.

Ao longo dos anos música se tornara um show, negócios e contratos.


Aquele era o caminho para quem buscava milhões de fãs, discos de platina
e rios de dinheiro. Ao menos, tentava fazê-los enxergar a música como
algo único, sendo com uma plateia de uma ou de dez mil pessoas

Fechei o registro e peguei a toalha pendurada no box. Sequei-me


rapidamente, e parei a frente do espelho. Ele me mostrava muito além do
que realmente era. Aparentava ser um homem bem mais velho, talvez
devido a barba espessa e cabelos cumpridos. Porém, pessoas próximas
sabiam que há pouco tempo completara vinte e cinco anos. Havia uma
bagagem de histórias em minha mala, devido a uma época na estrada,
mesmo assim, minha idade nunca entregara o que realmente era.

Escovei os dentes e logo saí de dentro do banheiro, buscando

qualquer roupa dentro das malas ainda não desfeitas. Vir para Nova Iorque
nunca seria uma decisão apenas minha, porém, aproveitei o fato de que
Patrice faria o mesmo, para poder reencontrar alguns amigos e quem sabe,
decidir uma próxima viagem antes das aulas voltarem.

Com uma camisa na cor cinza, calça jeans escura e o cabelo ainda
molhado, mas jogado para trás, de forma que não pudesse ficar tão rebelde,
saí do apartamento. Resolvi dirigir, e assim, admirar a manhã nova
iorquina, de forma que pararia para tomar um café antes de encontrar

Charlie. Dirigi sem rumo certo por entre a cidade, e admirei a beleza do

lugar, que com toda certeza, era um dos preferidos de minhas irmãs.

Olhei pela janela e avistei um café que frequentava durante a época


que passei em Nova Iorque com a banda. Estacionei ao lado, e logo
estranhei, quando uma pessoa passou ao meu lado e abriu um sorriso

desejando bom dia. Não era uma pessoa matinal, e muito menos,
simpática. Segundo minha família, apenas era simpático com
desconhecidos quando cantava a frente deles. Ao contrário, não faria nada.

Adentrei o café, e tamanha foi minha surpresa quando avistei


Patrice em uma das mesas. Um certo arrepio atravessou meu corpo e
pisquei algumas vezes, até perceber o que aquilo significava. Minha mente
viajou até o momento em que uma mulher me fez sentir de tal forma, anos
atrás. Quando ela simplesmente me teve em suas mãos, que infelizmente,

escolheu não permanecer. Subi meu olhar e me deparei com cachos


negros, e um sorriso de menina no rosto dela. Era ela. O quanto o destino
poderia ser traiçoeiro?

Sem conseguir entender minha própria reação depois de tanto


tempo sem sequer vê-la, e com as lembranças daquelas duas semanas no
passado, resolvi seguir até o balcão. Ela não me viu, ao menos, parecia
muito concentrada na conversa com Patrice. Pedi um café puro e forte, e
praticamente o tomei num gole. Algo em meu interior não aceitava tal

reação, ainda mais, depois da forma que nos afastamos. Porém, ela podia

simplesmente não me reconhecer. Ou fingir.

Com isso em mente, paguei pelo café e segui até a mesa em que
estavam sentadas. Parei ao lado de Patrice, tentando não chamar atenção
da mulher negra a sua frente. Sem sequer conseguir entender por que não

saía daquele café sem parar ali. Algo dentro de mim parecia querer estar
perto dela, ao menos, mais uma vez. Logo senti seu olhar me queimar, e
antes mesmo de Patrice perceber minha presença, ela o fez.

Nossos olhares se cruzaram e nada poderia soar mais como uma


comédia romântica clichê, o ar pareceu escasso e se tornou difícil respirar.
O que aquela mulher tinha?

— O que faz aqui, bebê? — Patrice perguntou, e quebrei a conexão


estabelecida com Diana.

Seu nome ainda parecia vivo em minha mente, e senti-me um


babaca por sequer ter dito o meu verdadeiro para ela. Meu olhar voltou
para Diana, e sua sobrancelha esquerda estava arqueada, como se me
desafiando a algo. Aquela mesma essência, a que me fez gostar tanto
daquela mulher a ponto de querê-la em minha vida de forma permanente.
— Vim tomar algo. — comentei. — A noite foi cheia.
Era verdade, passara toda ela estudando músicas novas e outras
abordagens para com meus alunos. Amava o que fazia, e nada mais justo,

do que aperfeiçoar.

— Entendi. — fez uma leve careta e não entendi a razão. — Ah,


desculpe. Dia, esse é Troian Messina, meu primo. Bebê, essa é Diana
Carter, uma amiga.

Respirei fundo diante da apresentação e tentei buscar algo no olhar


de Diana, que parecia muito à vontade em sua própria pele. Tentei parecer
neutro e não demonstrar nada demais. O que poderia fazer? Aquela mulher
me teve e simplesmente fugiu no passado. As coisas foram assim, e nada
mais justo, do que termos nos tornado desconhecidos. Mesmo conhecendo
por completo cada parte de seu belo corpo.

Ela então sorriu e pareceu não se importar com meu descaso. O que
me fez lembrar o que de fato me encantou nela. Ela não mudava seu jeito

diante de ninguém. Diana era uma mulher sem meias palavras ou sutileza.
Porém, pareceu entrar no jogo, e apertamos as mãos. O arrepio que sentira
quando entrara no restaurante, percorreu todo meu corpo mais uma vez, de
forma ainda mais prevalente. Efeito Diana. Suspirei, sem conseguir
acreditar que ela ainda me afetava daquele jeito.

— Prazer, Troian. — Diana falou e apenas assenti, sem saber o que


dizer. Ficara completamente perdido diante de seu olhar castanho e ainda
mais, por ela entrar naquele joguinho. Precisava sair dali.

— Estou indo para casa. Quer carona? — perguntei para Patrice,

mesmo sabendo que aquele não era meu real destino. Porém, era preciso
fugir, ao menos, naquele momento.

De canto de olho notei que Diana digitava algo rapidamente em seu


celular e pelo seu semblante parecia preocupada com algo. Patrice

terminou seu café e assentiu para minha proposta. Sem saber mais o que
dizer ou fazer, sem entender aquela intensidade, dei as costas e resolvi sair
de lá.

Encostei-me contra o carro e esperei a saída de Patrice, sem


conseguir imaginar como finalmente, depois de tantos anos, fora colocado
à frente de Diana. O que mais me intrigava era o nosso passado e o que
realmente passou por sua mente naquela época. Quem diria que os círculos
de amizade de Patrice chegariam a ela?

— Então, precisamos marcar de tomar algo sem todo esse clima


pesado. — ouvi sua voz doce e decidida, que me deixava completamente
de joelhos e tentei me manter são a sua frente.

— Eu realmente sinto muito. — não entendi ao certo o pedido de


Patrice para com ela. — Parece que acabei fazendo uma bagunça na vida
de Paul.
Algo não estava certo, e pelo tom de voz de Patrice, ela estava
envolvida. Porém, em minha mente, apenas uma pergunta permanecia:

Quem era Paul?

— Ele vai superar. — olhei de relance para Diana e a vi dar de


ombros. — Ao menos, espero que dessa vez o faça.

— Quer uma carona? — Patrice ofereceu e prendi uma respiração.

Ficar tão perto de Diana depois de tanto tempo, ainda mais, ela sabendo
que menti sobre meu próprio nome não me parecia algo com final bonito.
Não naquele momento. — Troian não vai se importar de...

— Não, estou de carro. — a voz de Diana soou decidida. —


Agradeço e tenho certeza que seriam ótimas companhias. — segurei um
sorriso de canto, pois sabia que ela me analisava.

Ela se lembrava de mim, não era possível não o ter feito. O que
vivemos não era algo comum, que qualquer pessoa fazia sentir. Nunca, em

momento algum, senti com outra pessoa o que apenas ela foi capaz.

As duas se despediram, e como sempre, Diana me surpreendeu. Ela


deu alguns passos e senti aquela antiga vibração diante de sua proximidade
me atingir. Ela parou a minha frente e senti seu olhar queimar por todo
meu corpo. Era a minha Diana, da forma como me lembrava em sonhos.
Se as coisas tivessem sido diferentes, internamente, indaguei-me como
estaríamos hoje.

— Até mais, T.

Ela se lembrava.

Sem me dar tempo para resposta ou lhe encarar, Diana se virou e


saiu andando, como se mais uma vez, levasse todo meu fôlego com ela.
Entrei rapidamente no carro, sentindo-me como um adolescente diante de

uma mulher inatingível. Ninguém além de nós conhecia aquela história.


Era uma parte apenas nossa, que no momento, fez-me querer ter lutado
ainda mais.

Coloquei o som no último, no momento em que Patrice abriu a


boca para falar algo. Não queria suas palavras, nem de ninguém. Queria
era poder estar à frente de Diana mais uma vez, e dizer que não me
arrependia, e que entendi, depois de um longo tempo, que aquela escolha
fora necessária.

A música a ponto de estourar nossos ouvidos parecia me definir e


odiei o fato de sempre a relacionar com cada uma das músicas que
escutava, e até mesmo, cantava. Diana era minha perdição, e parecia, que
sempre seria.

“And now all this time


Is passing by

But I still can't seem to tell you why

It hurts me every time I see you

Realize how much I need you.”[57]


Capítulo 2

“If you’re really being honest

If you really want this, woah

Why you acting like a stranger?

What’s with your behavior?”[58]

Era ele.

Meu coração parecia querer sair pela boca.

Entrei em meu carro e segurei no volante com força, tentando


controlar minha respiração. Levei a mão direita ao peito e notei que meu
coração batia freneticamente. Era o efeito de T sobre mim. No passado,
fora da mesma forma, e naquele momento, parecia ter sido teletransportada
para cinco anos atrás. O olhar quase glacial, com o qual lhe apelidei,
permanecia o mesmo. Porém, senti saudade daquela intimidade criada em
tão pouco tempo, que naquele exato instante, parecia completamente
perdida.

Os cabelos loiros mais longos do que me lembrava, assim como a


barba ainda mais espessa. Contudo, ele permanecia como em minha
memória – o meu pecado. Bufei sozinha ao pensar sobre a forma casual
com que resolveu me tratar, como se sequer nos conhecêssemos. Porém,

mesmo distante seu olhar era transparente, assim como sua forma de agir.
Ele se sentia, como antes, intimidado. Encará-lo frente a frente, mesmo
não recebendo a troca de olhares que tanto me marcou no passado, fez com
que deixasse claro, que sim, eu me lembrava dele... de nós. Que mesmo
depois de tanto tempo, ele permanecia enraizado em mim.

Não o chamaria de Troian, assim como nunca o chamei de Travis.


T era o suficiente para mim, como se fosse apenas a pessoa que
pronunciava tal apelido. Ainda mais, quando descobri seu verdadeiro nome

no passado. Suspirei profundamente, sem conseguir sair com o carro. Os


pensamentos me rodearam, assim como, lembranças de um tempo que,
infelizmente, não voltaria. Não da mesma forma.

Estávamos na segunda cerveja, e T falava a respeito da vida na


estrada com tanta inocência, que minha mente começou a girar em torno
de sua idade. Ele aparentava vinte e cinco anos, mas, ao estar ao seu lado,
bem próximo de seu rosto e ouvindo a forma como levava e encarava a
vida, parecia ter muito menos.

— Não me imagino com fama e nada além, só quero tocar e poder

me apresentar por um tempo. — falou, e bebeu um longo gole de sua


cerveja.

Assenti e acabei divagando a respeito da forma que nos


tratávamos. Era estranho, mas ao mesmo tempo, aconchegante. Ambos

estávamos atraídos, e com toda certeza, a noite terminaria com meu corpo
sob ou sobre o dele. Portanto, por que perdíamos tempo conversando a
respeito da vida? Não seria mais fácil, simplesmente, irmos para o quarto
de hotel mais próximo? Ou até mesmo, o meu quarto?

Contudo, a facilidade com que a conversa fluía e a forma


admirada com que me encarava, parecia nos manter dentro daquele pub.
Ambos sabíamos o que queríamos, mas nenhum parecia querer ou
precisar correr contra o tempo.

— O que tanto pensa? — sua voz soou baixa e rouca,


perigosamente, perto de minha orelha.

Ele sabia seduzir, era claro. Mesmo assim, sentia-me ainda mais
corajosa em sua presença. Dois poderiam jogar aquele jogo.

— No porquê estou aqui ainda. — falei, frisando a última palavra.


— Sabe... — aproximei-me de seu rosto, e levei uma mão até o lado
esquerdo, acariciando levemente. T não pareceu se importar, porém, seus

olhos verdes mudaram de cor. Eles demonstravam desejo puro. —

Poderíamos estar em um quarto, ou até mesmo, num banheiro... Mas não


sei por que, gosto de conversar com você. — confessei.

— Talvez a espera seja um afrodisíaco. — comentou, e segurou


minha mão, dando um leve beijo em meu pulso. Um forte arrepio se

espalhou por todo meu corpo, como se fôssemos apenas eu e ele naquele
lugar. Nada mais importava. — Não precisamos ter pressa. —
complementou e assenti.

— Gosto de como isso começa. — escorei-me com o braço na


mesa, e sorri em sua direção. — Gosto de te olhar. — ele sorriu de lado, e
notei que aquele era um gesto costumeiro. Ele parecia fazer sempre que
aprovava algo. Ele me aprovava naquele instante. — Gosto de tentar
descobrir que cor são seus olhos.

Ele deu uma leve risada e bebeu mais um pouco da cerveja.

— Dizem que são duas pedras de gelo, assim como meu coração.
— falou, o que me fez gargalhar.

— Posso imaginar quantos corações já foram despedaçados por


um rockstar desapegado, e com um olhar glacial. — provoquei e ele
gargalhou alto, deixando-me completamente atônita por um segundo.
Porém, no segundo seguinte, soube que ele me contagiou, e acabei,
gargalhando também.

O som de meu celular me despertou, e pisquei algumas vezes,


ainda atordoada com aquelas lembranças. Atendi rapidamente e falei com
um dos meus parceiros na Russel. Era a chefe do departamento de
marketing da empresa, o que sempre fora meu objetivo. Como sempre,

algum imprevisto aparecia, mesmo que lutássemos arduamente para que


nada fugisse do planejado. Entretanto, o trabalho poderia me manter
ocupada. A distração que sempre fizera parte de minha vida, deveria ficar
de lado. Ao menos, naquele momento.

Sorri para Spencer, que me abraçou com força. Ele logo se afastou
e tocou meu rosto, com a vontade clara em sua face. Porém, não poderia
fazer aquilo com ele. Sentia-me uma completa idiota, por não conseguir
retribuir seus sentimentos, ainda mais, por saber que combinávamos tanto.
Mas naquela noite, existiam muito mais empecilhos. Apenas por saber que
T estava em Nova Iorque, minha única vontade era confrontá-lo e ter uma
conversa sobre o passado. Talvez fosse a única a querer tal coisa. Porém,

nunca fui de desistir do que realmente queria.

Afastei-me do corpo de Spencer com cuidado, e notei seu


semblante confuso.

— Desculpa, não posso fazer isso. — falei, abraçando-me e o

encarando com pesar. — Não depois de tudo que me confessou.

— Eu sei que fui precipitado em me declarar e dizer a verdade, mas


eu... Eu não quero que as coisas terminem entre nós. — senti meu coração
doer, e pensei em quão tolo era.

Por que não poderia simplesmente me apaixonar por aquele


homem maravilhoso? Spencer era um amigo de foda, fora aquilo por um
longo tempo. Até que começou um namoro e nos afastamos, ao menos,
intimamente. Porém, após seu término, ele me procurou e não existiam

motivos para negar um sexo despreocupado e gostoso. O problema fora a


declaração de amor que ele fizera, assim que lhe falei sobre meu namoro
com Paul. Além da declaração, ele se arriscou a dizer que se casaria
comigo. Eu não retribuía tal sentimento, infelizmente. Não era por Paul, e
logo todos saberiam daquilo. Entretanto, não poderia voltar a ficar com
Spencer. Não sabendo o que realmente sentia.
Era um acordo meu e de Paul, e apenas nós sabíamos da verdade
em torno do namoro falso que declaramos. Ao menos, até aquele

momento. Logo, por questões de as coisas finalmente estarem entrando nos


eixos, Paul e eu não teríamos que atuar como casal. Fora apenas a forma
mais fácil de fazer Klaus enfrentar o medo do amor e se declarar para a
mulher que amava, e que por sorte ou destino, parecia amá-lo também.

Entretanto, aquilo era conversa para outra história. Precisava focar no


presente. No homem de semblante preocupado a minha frente.

— As coisas mudaram, Spencer. — falei, me odiando por completo


naquele instante. — Não sou a mulher certa para você e não posso fingir
que não me importo com seu bem-estar.

— Eu não quero ficar longe, Dia. — sua sinceridade me assustava,


assim como sua intensidade. Porém, não era a forma que me tinha em
mãos. Eu o via como um homem atraente e um grande amigo. Nada mais.

— Eu sinto muito. — levei as mãos aos cabelos e respirei fundo. —


Somos adultos e sabemos lidar com muita coisa. Mas não posso fazer isso
com você. Não me sentiria bem.

— Eu... — sua voz falhou e logo senti seus passos se aproximando.


Ele tocou meu rosto com carinho, forçando-me a encará-lo. Um sorriso
fraco se abriu em seu rosto, e senti meu coração afundar. Não queria
machucá-lo. Nunca fora meu objetivo. — Eu queria ser o homem certo
para você, e sinto, que um dia, serei. — fechei os olhos, não querendo

entrar naquele assunto. — Eu adorei nosso jantar como amigos, mas

sempre vou querer mais com você, Dia. É como respirar. Sinto muito por
te amar.

Ele então beijou minha testa e sem me dar tempo para dizer algo,
foi em direção a porta de saída de meu apartamento, fechando-a atrás de si.

Sentei-me no chão, completamente perdida diante daquele momento. Eu


queria amá-lo, de todas as formas. Mas nunca consegui tal proeza. O amor
não era algo imposto, e entendi da pior maneira. Naquele momento,
perdendo Spencer.

Era para ser apenas um jantar de amigos, onde, o assunto sobre sua
declaração seria enterrado. Porém, as intenções dele foram claras, e não
poderia seguir em frente. Soube no momento em que seus olhos não
encaravam meus, mas sim, minha boca. Tentei não me sentir mal por

afastá-lo daquela forma, porém, ele era importante para mim. Sempre
seria. Entretanto, tinha certeza, que mesmo com sua confiança, ele nunca
seria o homem certo.

Não era ele.

Suspirei, deitando-me no chão da sala, e me sentindo uma imbecil.


Parecia tanto com Klaus e Paul naquele instante, que minha vontade era
ligar para ambos e contar o que aconteceu. Mas ainda assim, não o fiz.
Nem era de meu feitio. Nunca fui o tipo de pessoa que se abre para os

outros, mesmo para os mais próximos. Felizmente ou infelizmente,

permaneci assim.

Fechei os olhos, e uma música que tanto marcara meu passado


viera em mente. Com a força e atração que apenas um homem me fizera
sentir. Troian Messina, era seu nome. Que apenas T resumia, e assim, me

marcara por completo. Os olhos glaciais me atingiram de forma


significativa. Naquele momento, tive a certeza de que teria aquele homem
mais uma vez. Para aí sim, conseguir seguir em frente.
Capítulo 3

“In a minute, but I think about it sometimes

Even though I know it's not so distant

Oh, no, I still wanna reminisce it.”[59]

Foi inevitável buscar mais uma vez seu nome em redes sociais.
Mas como no passado, não obtive nenhum resultado que fosse ele. Dias

após aquele reencontro e nada a respeito. Nem mesmo nas redes sociais
que Patrice colocava fotos com ele. Parei muitas vezes apenas para admirá-
lo, e tentar entender, por que não nos esbarramos durante os anos que se
passaram.

T parecia ser avesso a tecnologia, ou até mesmo, poderia fazer uso


de um nome falso em redes sociais. Infelizmente, minhas buscas
resultaram em nada. Mais um dia se iniciara, e basicamente acordei e vim
para a empresa. Precisava dar uma atenção maior para o final da nova

campanha, já que em breve, teria que me afastar.

Uma semana fora de meu cotidiano, como há cinco anos. Sorri de


minha comparação, ao imaginar que pudesse reencontrar T naquela
viagem. Porém, de alguma forma não explicada, ele aparecera a minha
frente bem antes de embarcar para o Brasil. Minha mente rodou, e fechei a

tela do notebook. Suspirei fundo, lembrando-me de sua reação e da forma


como pareceu distante.

Por que aquilo não me surpreendia?

Talvez pelo simples fato de que foi uma minha escolha que nos
afastou. Deixá-lo fora a coisa mais difícil que fiz. Porém, fora necessário.
Ele era jovem demais e com ideais completamente diferentes dos meus.
Mesmo sendo o único homem que me fez querer mais, existiam mais
motivos para ir do que para poder ficar.

Em minha mente, tudo o que buscava era poder reencontrá-lo e


conversar. Saber o que se passou depois de tanto tempo. Que rumo sua
vida seguiu, e ainda mais, falar a respeito de mim. Da forma como fiquei, e
agora, como me senti, ao vê-lo novamente. Troian era parte do passado,
mas nunca deixou de estar presente em minha mente, e poderia afirmar,
que em meu coração.
Peguei meu celular e digitei uma mensagem para Klaus, com o
intuito de que aparecesse em minha sala. Em poucos minutos, ouvi batidas

na porta, e logo, meu melhor amigo entrou. Com seu sorriso discreto e
olhar perdido, que mostrava muito pouco sobre quem ele realmente era.
Porém, seu semblante demonstrava que algo de bom acontecera em seu
dia.

— Acho que alguém está feliz. — acusei, levantando-me e indo até


ele.

Abracei-o com carinho e recebi um beijo na testa. Existia algo nos


irmãos Russel, que nunca a mudou forma carinhosa com que sempre me
trataram. Não éramos irmãos de sangue, porém, biologia nenhuma era
mais importante do que os sentimentos de nossos corações. Escolhi Paul e
Klaus como meus irmãos, assim como eles o fizeram comigo. Não existia
chance de algo ser mais forte. Nem mesmo o sangue em nossas veias.

— Parece ser algo importante. — falou e me encarou com atenção.


— O que houve, Dia?

— Você parece desconfiado. — ele piscou algumas vezes,


demonstrando não entender minha abordagem. — Mas sim, existe algo
para conversamos. Algo sério.

— Isso tem a ver com o mau humor de Paul? — perguntou e


assenti, sorrindo.

Não aprovava as escolhas de Paul, porém, não poderia levar aquela

mentira a diante. Klaus e Lia se tornaram um casal, oficialmente. Ele me


ligou, horas depois do acontecido, contando o quanto estava apaixonado e
mais, que fora pedido em casamento por ela. De alguma forma, soube que
não poderia continuar com armação alguma, pois ele estava feliz. Foi pela

sua felicidade que Paul e eu entramos nessa, inventamos um namoro e


atuamos. Agora, que ela se concretizava, não existiam motivos plausíveis
para continuarmos.

— Podemos marcar um jantar e conversar hoje? Aliás, preciso de


Lia presente. — pedi, e ele me encarou de maneira estranha, mas assentiu.

— Não quer mesmo conversar sobre algo? — indagou, e entendi


que não se tratava do assunto principal do jantar.

Klaus era perspicaz, e com toda certeza, notara a tensão em meu

corpo. Em alguns momentos, principalmente, nos mais frágeis, não era boa
em fingir sentimentos. T permanecia em minha mente, mesmo que
existissem problemas sérios a resolver. Ele continuava como foco
indevido.

— Não. — me esquivei, e dei de ombros. — Não precisa me olhar


como se fosse meu protetor.
— Você sempre ajuda todos nós, Dia. — falou, e se aproximou,
tocando meus braços. — Sabe que sempre estou aqui, não é?

— Eu sei. — e era a mais pura verdade. O problema não era não ter
alguém para desabafar, era por nunca ter conseguido me abrir de tal forma.
— Mas agora, quero que foque em amar loucamente sua noiva. —
provoquei, e um brilho diferente passou por seu olhar. Com toda certeza,

ele pensara em Lia.

— Estou focado nisso, mas isso não impede de me preocupar com


o seu bem-estar. — falou decidido.

— Você é o Russel fofo. — provoquei e apertei seu nariz, o que o


fez sorrir. — Mas agora, vamos trabalhar e deixar a conversa para mais
tarde.

— Tudo bem. — assentiu. — Mas, qualquer coisa, me chame.

Beijei seu rosto e Klaus deu as costas, saindo de minha sala. Voltei

até minha cadeira e praticamente me joguei. Minha mente girava na forma


de contar toda a verdade para Klaus e Lia, sobre o falso namoro com Paul.
E mais, como seria contar para nossas famílias. As coisas poderiam soar
um pouco invasivas, ainda mais, pela decisão que tínhamos tomado.
Entretanto, sempre soube que aquele momento chegaria. Nunca fora fã de
mentiras e omissões.
Lia sorriu um pouco de lado e não demonstrou nenhuma surpresa.
Klaus até tentou abrir a boca para fingir, mas não foi bem-sucedido. Eu o
conhecia bem demais. Os seus trejeitos eram óbvios.

— Algo me diz que já sabiam disso. — acusei-os e aí sim,


demonstraram genuína surpresa. Pegos no flagra! — Como souberam a
respeito? Patrice disse algo?

Lia me encarou ainda mais surpresa.

— Patrice não comentou a respeito de nada. — ela falou,

claramente, tentando buscar algo em sua memória. — Mas, estou ansiosa


pra entender como ela soube disso antes. A não ser que isso tenha a ver
com o fato de ela beber demais e acabar capotando na cama de Paul. —
instigou-me a falar.

— Isso é uma história apenas dela. — rebati rapidamente. Não


poderia entrar naquele assunto com Lia. Era algo que Patrice deveria
contar. — Bom, acho que já colocamos tudo a limpo. Mas ainda quero
entender como descobriram.

— Digamos que fui atrás de você no restaurante perto de casa, e

acabei escutando parte da sua conversa com Paul. — Lia confessou, e a


encarei completamente surpresa. — No fim, Klaus e eu tivemos uma
discussão, mas acabamos ficando ainda mais unidos. — sorri, pensando
que ao menos aquela revelação veio em um bom momento.

Temia que a revelação a respeito de minha armação com Paul


fizesse com que Lia e Klaus se separassem. Porém, eles estavam noivos.
Ficara ainda mais feliz por eles, ao saber que Lia o pediu em casamento,
mesmo já sabendo de toda verdade.

— Aliás, precisamos comemorar de forma mais animada esse


futuro casamento. — sugeri e Klaus fez uma leve careta. Ele não era a
pessoa mais chegada em festas e confraternizações. — Se bem que
acredito que estão comemorando bastante, em particular. — provoquei e

Klaus veio até mim, bagunçando meu cabelo. — Imbecil! — reclamei, mas
sorri em seguida, batendo em seu braço.

— Pensamos em algo mais informal, só que na casa dos meus pais.


Foi meio que um baque para Dominic Russel quando contamos que pedi
Klaus em casamento. — Lia falou, com um sorriso nos lábios.

— Papai quase teve um infarto. — Klaus interviu, e segurei a


gargalhada.

— Acho que essa será a minha função e de Paul. — levei as mãos

ao rosto, sentindo-me uma adolescente preste a ser pega na mentira. —


Vamos contar a ele e para os meus pais a verdade sobre o que houve. —
desabafei, e respirei fundo em seguida. Não seria fácil ouvir, aos vinte e
nove anos, sermão.

— Prepare-se para um longo discurso. — Klaus acusou, e apenas


assenti, pois era a mais pura verdade.

Peguei a taça de vinho sobre o balcão de granito e tomei mais um


longo gole. Klaus e Lia estavam abraçados, sentados em meu sofá, como
um verdadeiro casal apaixonado. Aquela cena, me remetera ao passado,
em que me senti tão à vontade com alguém, a ponto de passar a noite toda
apenas conversando. A ponto de um sexo não ser necessário enquanto
estávamos sozinhos.

— Está divagando. — a conclusão de Klaus me fez despertar, e


tentei empurrar a imagem de T em minha mente para longe.

— Um pouco perdida, confesso. — forcei um sorriso, e Lia me


analisou, claramente não aceitando minha resposta.

— Acho que seus pensamentos não estão aqui, e arrisco dizer, o


seu coração também não.
Sorri diante de sua frase de romântica incurável, e reafirmei o
porquê Lia escrevia tantos livros de romance. Ela claramente nascera com

dom de encontrar beleza onde sequer imaginávamos e deixar o momento


poético.

— Digamos que pode me ajudar com algo. — falei de uma vez,


sem querer pensar muito a respeito.

Naquela tarde, ficara pensando em como chegar até Troian. Patrice


era a opção número um, porém, a mais óbvia. Ela poderia soltar para ele
que logo teria uma ligação, e assim, estragar o momento. Que diabos de
momento eu esperava? Nem saberia explicar.

Porém, queria ter contato com T com sua guarda baixa, sem nada
que pudesse nos afastar repentinamente. De certa forma, temia por sua
reação. Quebrara seu coração no passado, e mesmo sabendo que fora o
correto, ainda me doía aquela decisão. Tentar retomar algo deixado a

cinco anos era muita prepotência? Teria que tentar e ao menos descobrir o
que fomos, e mais, o que poderíamos ter sido. Por mais que as
possibilidades me assustassem de forma esmagadora.

— Diga. — Lia respondeu sem sequer imaginar do que se tratava.

— Conhece Troian Messina, certo? — perguntei e Lia assentiu,


franzindo o cenho. — Patrice deve ter lhe contado, mas após aquela
bebedeira com Paul, ela tomou café comigo no dia seguinte.

— Sim, ela contou bem rapidamente sobre, e acho que estou

começando a entender o porquê. — sorri de sua afirmação. Tanto ela


quanto eu, acreditávamos que existia algo mais em Paul e Patrice.

— Então, o primo dela apareceu nesse mesmo café. — comentei.


— Para você ver como Nova Iorque se torna pequena de repente.

— E agora...

— Quero o número dele. — confessei, temendo parecer um tanto


desesperada.

Lia pareceu absorver tal afirmação, e logo passou seu celular para
Klaus. Meu amigo sorriu em sua direção e digitou alguma coisa. Logo
senti meu telefone vibrar e o olhei, sem entender ao certo como tudo
parecia sincronizado. Pensar a respeito de T deixava-me menos perspicaz.

— Talvez Klaus tenha pegado meu celular e mandado uma

mensagem importante para você.

Sorri amplamente, sem me conter, no momento que abri a


mensagem de Lia, e vi o contato dele.

— Digamos que Troian é um tanto sistemático, então, prefiro


culpar Klaus caso seja acusada de algo. — comentou, e piscou em minha
direção.
— Obrigada. — falei, e respirei fundo, olhando mais uma vez para
o contato.

Cinco anos depois, e finalmente, existia algo concreto a seu


respeito. Não teria como fugir. Não mais. Precisávamos e merecíamos
aquela conversa. Passara muito tempo, mas ainda assim, não o suficiente
para que esquecesse a forma como aquele homem chegou até meu corpo, e

principalmente, meu coração.

Horas depois, após tomar um banho quente, e me encontrar sozinha


dentro do apartamento, deitei-me na cama e encarei o teto. Mais uma vez,

olhei para meu celular e tentei escrever uma mensagem, algo que pudesse
ser o suficiente para falar com T. Porém, nada me viera em mente. Nada
que parecesse o suficiente. Uma simples mensagem não era capaz de
demonstrar o que queria, e ainda mais, o que quis um dia.

Joguei o aparelho longe e encarei o nada, pensando em


absolutamente tudo. Fechei os olhos, e fora como, encontrar seu olhar
glacial mais uma vez sobre os meus. Pensava em seu toque como se ainda
pudesse queimar sobre minha pele. Pensava a respeito de seu cheiro, como

se ainda pudesse senti-lo me impregnar. Pensava sobre sua voz, como se


ainda pudesse ouvi-la sussurrando as palavras que tanto temia, quanto
desejava desesperadamente. Pensava em seu coração, mesmo que existisse
a possibilidade de nunca ter realmente me pertencido.

Ainda assim, adormeci. Mergulhada em minha covardia. Pensando


nele.
Capítulo 4

“I, I loved you in secret

First sight, yeah, we love without reason

Oh, twenty-five years old

Oh, how were you to know? ”[60]

— Cara, vai ser foda!

Charlie falou animado, bebendo um logo gole de uísque. Passou a


mão pelo cabelo ralo, e notei a nova tatuagem que emoldurava seu
pescoço. O tempo realmente passou, e com ele, praticamente não tive
contato com os velhos amigos. E até mesmo, a velha banda. Há quanto
tempo não parava em um bar, com a iluminação ruim, e discutia a respeito
de cair na estrada?

— Não parece tão animado, irmão. — Charlie comentou,


claramente notando meu desinteresse.

Olhar para meu amigo, naquele momento, apenas me fazia viajar

para a época onde conheci Diana. Ela se tornara importante para mim,
assim como, conhecera toda a banda, e até mesmo, tornou-se amiga de
alguns dos caras.

— Diana apareceu. — contei de uma vez, e Charlie cuspiu o uísque

que acabara de colocar na boca. Sorri da cena, e ele tentou se recompor.


Ele fora um dos caras que mais gostou dela na época, e até mesmo,
brigamos por aquilo.

— Aquela Diana? — perguntou, e deixou o copo de uísque de lado.


Assenti e ele arregalou os olhos, absorvendo tal informação. — Como?
Vocês simplesmente se esbarraram?

— Por mais incrível que pareça, assim como no passado... Nós nos
encontramos por acaso, só que em um café. — comentei, e levei as mãos

aos cabelos, fazendo um coque. Falar a respeito dela, parecia me sufocar.


Talvez, fosse o tempo longo demais sem tê-la ao meu lado.

— Tem certeza? Diana, aquela gata mais velha, que dançava


sensualmente e cantava da forma mais horrível? — perguntou, ainda sem
acreditar.

Gargalhei, ao me lembrar de tal fato.


— É ela, cara. — reafirmei, e me lembrei de algo que descobrira há
alguns dias ao pesquisar seu nome nas redes sociais. — Ela está

namorando e parece ser algo sério. — as palavras saíram forçadas de


minha boca.

Saber daquele fato, quebrou-me por inteiro. Mesmo sabendo que


poderia não representar nada para ela. Ou melhor, poderia nunca ter

representado. O que deveria esperar? Um abraço e um beijo de saudade?


Diana foi a única que chegou até meu coração, assustando-me de forma
devastadora. Assim como, a única a pisoteá-lo.

— Porra! — Charlie esbravejou e virou o resto de uísque em seu


copo. — Você parece estar na merda, cara. Agora entendo o porquê.

— Nem eu entendo. — rebati, sem saber ao certo porque entramos


em tal assunto.

Talvez pelo fato de que ninguém além da banda sabia sobre ela, e

Charlie em questão, fosse o único a realmente entender porque ela ainda


parecia mexer tanto comigo.

— Mas como Dan e Rox estão? — perguntei, e ele franziu o cenho.

— Nem tente mudar de assunto, garoto. — odiava quando usavam


tal apelido, ainda mais, porque era assim que ela me chamava. Charlie
sabia como me provocar. — Não pode simplesmente jogar que Diana
reapareceu, e fingir que não vamos falar sobre isso.

— Que porra de conversa de comadre é essa. — reclamei, e ele

gargalhou.

— Você socou a minha cara por essa mulher, Troian. Não tem
como fingir que ela não foi importante, e pelo jeito, ainda é. — constatou e
o encarei sem muita vontade, mesmo sabendo que tinha razão. — O que

falou com ela?

Respirei fundo, lembrando-me daquele dia, e tentando entender


porque agi como um tremendo covarde. Talvez pelo fato de não saber o
que esperar dela? Talvez pelo medo da confirmação de ter sido apenas
mais um?

— Não conversamos. — Charlie me encarou estupefato. — Ela


estava com Pat, e não soube como agir. — confessei minha covardia. —
Ela até pediu meu número para Lia, amiga de Pat, lembra? — Charlie

assentiu. — Mas preferi, simplesmente.... — sequer sabia explicar minhas


ações. — Diana sempre foi algo...

— Por que ainda não foi atrás dela, porra? — indagou e me calei,
sem saber o que responder.

Não existiam razões, a não ser o fato de que ela parecia


completamente apaixonada pelo tal namorado. Encarar aquelas fotos, após
finalmente criar uma rede social apenas para saber mais dela, fez-me

querer nunca as ter visto. Ver o sorriso em seu rosto, nos braços de outro,

quebrou-me por inteiro. Tal constatação me aterrorizou, pois apenas


significava uma coisa: Diana nunca se tornou uma parte do passado. Ela
permanecera enraizada em mim.

A pergunta de meu amigo passou mais uma vez por minha mente, e

não conseguia simplesmente responder que era por ela estar num
relacionamento, e claramente, feliz. Era muito além. O medo de ser
desprezado e deixado mais uma vez. O medo de nunca ter sido o que ela
tanto parecia querer. O medo de não saber como agir diante dela depois de
tantos anos.

— Vai logo, Troian! — Charlie praticamente ordenou. — Patrice


deve ter o contato dela, não pode simplesmente aceitar que essa mulher
apareceu por acaso no café, assim como, ela não apareceu por acaso a sua

frente naquele pub. Não cometa os mesmos erros que eu!

Suspirei fundo e apenas assenti, sem saber o que lhe responder.


Charlie quase nunca falava sobre si, mas sabia sobre sua dor. Sabia bem
que a bebida, música e a estrada eram como calmantes para seu corpo.
Para esquecer o que perdera um dia e que infelizmente, não teve a chance
de reconquistar.

Tirei algumas notas do bolso e coloquei sobre o balcão. Fui até


meu amigo e bati em suas costas, agradecendo o conselho mais sábio que

poderia receber naquele dia. Saí do bar, e assim que a luz do final da tarde

em Nova Iorque me atingiu, demorei alguns segundos para me acostumar.


Saquei meu celular e entrei no perfil de Diana, e felizmente, o tal
instagram era mais simples do que pensava para mexer.

Suspirei fundo e cliquei em “Mensagem”. Pensei no que digitar por

alguns segundos e fiquei apenas paralisado, no meio da calçada, sem saber


o que dizer. Meu celular vibrou e a ligação de um desconhecido, fez-me
soltar o ar que nem sabia que segurava. Como diria minha avó: Salvo pelo
gongo!

Aceitei a ligação, mesmo sem saber quem era. De toda forma,


precisava falar com alguém, mesmo que fosse apenas engano. Uma forma
sensata de adiar o que logo se tornaria inadiável.

— Messina. — falei simplesmente, já esperando a pessoa do outro

lado desligar. Entretanto, nada me preparara para o que viria a seguir.

— Oi, T.

Suspirei profundamente, e levei a mão livre até a testa, tentando me


acalmar. Sua voz não era confundível. Estaria ficando louco?

— T?

— Diana? — perguntei, sem ainda acreditar que era realmente ela


do outro lado da linha.

— Fico feliz que não tenha esquecido minha voz. — comentou, e

ouvi seu suspirar profundo. — Eu sei que não deveria, na verdade, nem sei
o que devo fazer. Vou ser direta, nunca fui boa em enrolar. — riu
baixinho, e o som de sua risada fez meu coração acelerar ainda mais.
Como senti saudade daquilo! — Preciso te ver, T.

— Dia...

— Eu sei que a forma como as coisas terminaram... Eu sei que


pode me odiar, mas não aceito esse sentimento. — sua voz determinada,
como sempre, teve-me de joelhos.

Eu precisava olhar em seus olhos e ter a certeza de que ainda


éramos os mesmos. Mesmo com todos os anos e os rumos diferentes que a
vida de ambos tomou.

— Podemos nos ver hoje? — perguntei, afoito, sem conseguir

disfarçar minha real vontade.

— Pode vir até meu apartamento? — seu pedido soou muito mais
atrativo do que deveria.

Ela era comprometida – recriminei-me. Diana era uma mulher


íntegra, por mais que a desejasse, ela jamais trairia alguém. Conheci-a
bem. Entretanto, não precisei pensar muito para dar a resposta, e ter a
certeza de que iria até seu apartamento.

— Sim. — respirei fundo e tentei não parecer tão desesperado

quanto realmente estava. — Que horas?

— Pode ser agora, T. — engoli em seco, e tentei não gostar além


do que deveria daquele apelido.

Não soube o que dizer, nem mesmo como reagir. Ficamos ali, em

silêncio, por alguns segundos. Era fim de tarde, e de repente, não consegui
entender por que a vida nos colocava frente a frente mais uma vez. Falaria
com ela, mas de alguma forma misteriosa, Diana se antecipara. Naquele
momento, não poderia ser menos grato.

— Me passa o endereço por mensagem. — pedi, ainda pensando


muito antes de dizer algo. — Estou indo para aí.

— Não posso mentir, estou ansiosa por isso.

Assim, ela desfez a ligação. Senti meu celular vibrar e sua

mensagem chegou, com o endereço em detalhes. Salvei seu número e sorri


ao nomeá-la como “Baby”. Sem pensar muito, parei um táxi que passava e
lhe passei o endereço. Seria um reencontro real depois de cinco anos.
Depois de cinco anos desejando que aquela mulher nunca tivesse saído de
minha vida. Cinco anos pensando que talvez não tivesse passado de um
sonho, o melhor deles.
O interfone tocou e meu coração falhou uma batida. Respondi um
simples “sim” para o porteiro, liberando a entrada de Troian Messina.
Aquele nome me perseguira desde o momento em que descobri que mentia
a respeito. Não fora um grande choque, de imediato. Já havia feito o
mesmo em algum momento. O problema, era o que nossa relação se
tornou, e o quanto tempo tal mentira perdurara.

Parei a frente do grande espelho da sala de estar e passei a mão

pelo vestido longo na cor branca. O tecido era leve, mas ainda assim, não
parecia tanto quanto deveria. Algo em meu semblante, denotava
claramente: eu estava em pânico. Suspirei profundamente e joguei os
cachos para trás, fazendo um coque no alto da cabeça, tentando parecer a
mais despojada possível. Encarei meu rosto com a leve maquiagem, e
senti-me uma verdadeira adolescente. Aos vinte e nove anos, arrumava-me
para simplesmente encarar o homem que abandonei, como se fosse algo
casual. O quão maluco parecia?

A campainha soou e quase dei um pulo para trás. De alguma forma,

ainda me sentia dentro de um sonho. Depois de tanto tempo, ter T em


minha porta, era como realizar um de meus desejos mais secretos. Quantas
noites imaginei que era ele? Quantas vezes me arrependi por deixá-lo para
trás?

Virei-me, andando até a porta, como se a cada passo, parte de meu


coração estivesse a ponto de se separar. Suspirei profundamente, mais uma
vez, tentando buscar a calma interior, que sequer busquei em tantos anos.
Era o poder que aquele homem exercia sobre mim. O qual fora tão
arrebatador quanto assustador no passado.

Abri a porta, e no primeiro momento, não consegui sustentar seu


olhar. Entretanto, não tinha como, simplesmente, ficar encarando meus
próprios pés. Levantei meu olhar aos poucos, analisando-o desde os tênis

de marca casual, até a jaqueta preta de couro. Tão ele, que parecia gritar
que aquele era o meu garoto.

Nossos olhares se chocaram, e diferente do que acontecera no café,


ele pareceu não esconder nada. Em seu olhar glacial, encontrei tudo aquilo
que tanto esperei. Pois, mesmo inconsciente, o fiz. Busquei em muitos
outros corpos, camas e desejos, o que apenas aquele olhar me delatara.
Portanto, senti, que desde o momento que lhe disse adeus, nunca fora
definitivo. Que esperei, ardentemente, para poder lhe ter a minha frente

mais uma vez.

Para ser sua.

Abri a boca para dizer algo, mas as palavras pareceram presas em


minha garganta, assim como, em minha alma. O que poderia dizer? O quão
absurdo, despois de tanto tempo, seria me sentir de tal forma?

Sem saber como aconteceu, sem ao menos entender, apenas senti


meu corpo se encontrar com o seu. Meu corpo fora empurrado para dentro,
e logo, a porta se fechara. Troian não falou nada, apenas me olhou, como
se quisesse entender o que aquilo significava. Eu também! – era tudo o que
queria dizer.

Suas mãos tocaram meu rosto, e fechei os olhos, não acreditando


que mais uma vez estava ali, a sua mercê. Senti um leve carinho em minha
bochecha esquerda, e subi minhas mãos de suas costas até seu pescoço.

Toquei os cabelos loiros, tão macios quanto me lembrara, e ainda mais


sedutores do que antes. Sorri, sentindo-me inebriada por sua presença.

Seu nariz desceu até o meu, seduzindo-me para ele. Senti-me


fraquejar, e me segurei com força contra seu corpo. Porém, T parecia
buscar algo. Que ainda não entendia bem o que era.

— Me diz. — sua voz soou rouca, encarando-me profundamente.


— Diz que não é dele.

Sorri, aliviada por não notar nenhuma mágoa em sua voz. Ao

mesmo tempo, tendo a certeza, de que assim como eu, ele buscara saber
mais sobre mim. Imaginei o quanto me ver com outro lhe machucara. Teria
sido tão importante a ponto de lhe causar algo ao me ver com outro?
Mesmo que não fosse real?

— Não. — toquei seu rosto, sentindo a barba sob minha palma. O


quanto senti falta daquilo? Mais do que poderia dizer, e até mesmo,
demonstrar. — Nunca fui dele.

Sem me responder, T demonstrou. Seus lábios encontraram os

meus, tão rápido quanto meu coração disparou mais uma vez. Meu corpo

foi levantado, e colocado contra a porta. Ali, como dois amantes com

saudades. Ali, como duas almas que se necessitam. Ali, como partes de um

amor que nunca fora vivido. Ali, como se ainda estivéssemos naquele

quarto de hotel. Ali, como se fôssemos feitos para durar.


Capítulo 5

“We can't make

Any promises now, can we, babe?

But you can make me a drink.”[61]

Nos afastamos pela falta de ar e a encarei sem saber ao certo para


onde suas palavras me levariam. Estávamos a sós, em seu apartamento,

frente a frente. Nossas bocas se reconheceram, tão prontamente, quanto


nossos corpos. Não conseguia sequer raciocinar diante dela.

— Me desculpe. — falei, sem saber por onde começar. — Não


devia agir com...

— Saudades? — indagou e sorriu abertamente, mas pude notar


certa fragilidade em seu semblante.
Diana era tão transparente, que chegara a me assustar. Ela não
parecia querer esconder seus sentimentos, ao menos, não de mim.

— Não precisa se desculpar por algo que ambos quisemos. —


continuou e passou levemente a mão por meu peito.

Soltei seu corpo, e ela se endireitou em pé, sem quebrar o olhar em


momento algum.

— Seus cabelos e barba estão maiores. — comentou, como em


aprovação. Senti-me um completo idiota, por não saber como agir a sua
frente. — Cinco anos, T. — complementou e assenti, sentindo na boca o
gosto amargo daquele tempo que passamos afastados. — No entanto, hoje
parece que voltamos ao nosso primeiro beijo no quarto de hotel.

Sorri, tocando seu rosto com carinho, sem conseguir explicar como
nossa intimidade não se perdera por completo com o passar do tempo.
Suas palavras, no dia em que foi embora me atingiram em cheio. A forma

como me declarei, e a forma como tal sentimento fora rechaçado. Eu a


queria, tão loucamente, aos vinte anos de idade.

— Estou apaixonado por você, Diana. — declarei, no momento em


que ela insistiu em fechar a grande mala de cor preta. Meu coração doía
de forma devastadora. Eu a queria, estava certo daquilo. Nada mais
importava. — Eu não quero que vá.
Ela se virou e me encarou com carinho, tocando meu rosto, uma
lágrima solitária escorreu pelo seu.

— Ainda é novo, T. Novo demais para entender o quanto essas


palavras significam. — tentei argumentar, mas seus dedos tocaram minha
boca, calando-me. — Eu não queria ir, mas é o certo. Temos vidas opostas
e queremos coisas completamente diferentes. Algo que estou aprendendo

na dor, que amar muitas vezes não é o suficiente.

— É o bastante para nós. — falei, deixando o desespero tomar


conta de meu ser.

Diana sorriu, e notei o quanto forçou tal feito. Sem conseguir me


conter e entendendo que não conseguiria convencê-la, ao menos, não
naquele instante, puxei-a para mim. Nos abraçamos, e naquele instante
tive ainda mais certeza que a queria. Perdidamente.

— Hoje sou um homem, Diana. — falei, finalmente encontrando

minha voz. — Os anos passaram, mas eu me lembro bem do dia em que


me deixou. — soltei de uma vez, e Diana respirou profundamente.

Suas mãos se afastaram e ela deu passos para o lado, para longe de
me alcance.

— Doeu demais agir daquela maneira, mas foi o certo. — falou,


encarando-me com tristeza. — Pensei que um dia, se fosse real, nos
encontraríamos.

— E aqui estamos. — complementei. — Isso muda algo? —

indaguei, sentindo-me um pouco perdido.

O que tanto queríamos ao nos reencontrar? Reviver aquelas duas


semanas de paixão? Ter a certeza de que o passado faz parte de seu próprio
tempo?

— Quando te vi, no café, soube que as coisas entre nós nunca


foram completamente esclarecidas. Nem mesmo seu próprio nome, Troian.
— ouvi-la me chamar pelo nome era completamente estarrecedor.
Culpava-me amargamente por ter mentido aquele fato. — O que confirma,
que fiz o certo ao ir embora. Você era jovem, tinha uma estrada para
desbravar, e mesmo quando se declarou, não admitiu o nome real.

— Eu... Eu realmente sinto muito. — falei, e felizmente, notei que


não existia mágoa em seu olhar. — Eu tentei te odiar todos os dias após

encontrar o quarto de hotel vazio, e apenas um bilhete sobre o travesseiro.


— anos se passaram e nunca falara daquilo com alguém. As palavras
saíram de forma esmagadora de minha boca, como se a realidade fosse
colocada em jogo. Diana me deixara no passado. — Mas nunca obtive
êxito. Sempre que me lembrava de você, de nós... Lembrei de todos os
momentos em que me fez sorrir.
— Eu também. — sua voz doce me atingiu, e notei uma lágrima
percorrer seu rosto. — Eu sabia o seu nome, mesmo assim, optei por nunca

o usar. — confessou de repente, e a encarei estático.

— Como assim?

— Um dia, você deixou sua carteira cair no chão, e fui colocá-la


em algum lugar. Vi sua carteira de motorista. — contou e fiquei

completamente estupefato. — Foi perto do dia em que iria embora. Mas


saiba, que iria de qualquer maneira. Você me contar seu nome ou não, não
mudaria tal decisão.

E ali estava, Diana Carter, determinada ao extremo. Era uma das


características que mais admirava nela, mesmo que para muitos pudesse
ser irritante. Diana não media palavras diante da reação alheia. Ao
contrário de mim, ela simplesmente falava. Era o tipo de pessoa reservada
e que conversava estritamente o necessário com quem não conhecia de

fato. Éramos opostos.

— Eu nem sei o que dizer. — fui sincero.

— Acho que merecemos uma boa comida e um vinho para


conversar... O que acha? — sugeriu e assenti, perdido diante da bela
mulher a minha frente.

Se Diana soubesse, o quanto ainda mexia com meu corpo e alma...


Entretanto, naquele momento, deixaria a vida acontecer. Não
poderia simplesmente reafirmar o que sentia no passado. Em minha mente,

merecia uma segunda chance com ela. Para assim, nos conhecermos
novamente, e quem sabe, chegarmos a deixar os sentimentos falarem por
si.

Por enquanto, apenas viveria o momento.

Segui-a até onde notei ser sua sala de estar, e ela logo me pediu
para ficar à vontade. Não sabia bem o que fazer ou como fingir estar
confortável naquele lugar. Era o seu lugar, seu lar... Sentia-me como um
intruso, na realidade. Mesmo a contragosto, sentei-me no sofá e observei
os quadros espalhados pela parede ao lado da televisão. Era nítido, ali, o
quanto amava os tais irmãos Russel. Em sua maioria, eram fotos com eles.

Mudei meu foco, sem querer pensar muito sobre aquilo, mesmo
sabendo que se tornaria alguma pauta de conversa naquela noite. Observei

o caminhar de Diana até a cozinha, e suspirei profundamente, sentindo-me


ainda mais atraído por ela. Existia algo nela que me atraía de forma
assustadora e nunca soube decifrar, nem mesmo questionei. Na realidade,
era todo o conjunto. Desde os cabelos cacheados e rebeldes; a pele negra e
macia; o olhar castanho claro, sedutor e determinado; o caminhar
imponente; o sorriso que entregava toda sua dor ou felicidade.

A frase de Charlie me veio em mente, na primeira vez em que lhes


apresentei. Ela é um verdadeiro mistério. Não faço ideia do que essa

mulher está achando do lugar.

O lugar em questão era o bar onde regularmente tocávamos e quase


sempre, a dona, nos deixava ensaiar. Porém, o que fez tal frase ficar em
minha mente, foi pelo fato de que ele traduziu Diana de uma forma que
nunca a vi. Ela parecia ser transparente para mim, parecia se entregar por

completo. O que mais me doeu no passado, quando me deixou, foi não


entender os sinais e os porquês. Sempre pensei que o amor que sentia fosse
correspondido. Ledo engano.

— Dizem que quando astros do rock pensam demais, estão


compondo músicas. — sua voz me trouxe para realidade, e sorri, ao me
virar e encontrá-la com uma cerveja em mãos, e outra em minha direção.
— Da sala até a cozinha, me lembrei de que não somos pessoas de vinho.

— Acho que nunca serei. — compactuei com sua certeza do

passado, e ela sorriu de lado. — Mas não sou um astro do rock, Diana. —
pisquei em sua direção, e ela me surpreendeu, sentando-se no tapete, a
minha frente, para em seguida, encarar-me profundamente.

— Bom, sempre te olhei como um. — confessou e não poderia

mentir que meu coração disparou naquele momento. Existiam poucas


pessoas que realmente acreditavam nos sonhos alheios, e Diana, parecia
ser uma delas. Mesmo que ser um astro não fosse meu objetivo de vida,
saber que ela acreditava em mim, bastava. — Acho que te considerei meu

astro favorito de rock por um longo tempo.

— Não deve ter conhecido muitos então. — caçoei de mim mesmo


e ela sorriu, tomando mais um gole de sua cerveja.

— Na realidade, conheci Nick Miles em uma de minhas viagens a


negócios. — segurei-me para não engasgar com a cerveja, que desceu de

forma obrigada por minha garganta. Nick Miles, não era nada menos que o
melhor guitarrista da década, e fazia parte da banda de rock mais bem-
sucedida de todos os tempos – a 93 million miles.

— E? — perguntei, quando notei seu silêncio. Diana deu de


ombros, como se não fosse uma lembrança ou momento importante.

— Conversamos e foi legal. — sorriu abertamente, como se me

analisasse. — Não me diga que tem ciúmes de mim, T. — provocou e


passou a mão pelo rosto olhando-me, como se buscasse alguma resposta

em meu semblante. — Sua pergunta sobre Paul não me surpreendeu, mas


ciúmes de Nick Miles... Isso me pegou desprevenida.

— Tão modesta. — rebati e Diana gargalhou, deixando sua cerveja


de lado. — Não tenho como ter ciúme do que não é meu, Diana. Ou
melhor, do que nunca foi. — soltei de uma vez, e me arrependi no segundo
seguinte.
Diana fez uma leve careta e mexeu no cabelo, soltando-o do coque
antes no alto da cabeça. Como ela conseguia ficar ainda mais linda a cada

segundo?

— Não quero discutir sobre o se passou, mas sei que precisamos.


— falou, e notei sua voz um pouco diferente. — Mas pode só não ser hoje?
— indagou e entendi o que queria dizer. — Acho que... Quer dizer, tenho

certeza que só quero ficar aqui, olhando para você.

Sorri de sua fala, e não pude concordar menos. O passado podia


esperar algumas horas, assim como, alguns esclarecimentos. Confiava na
palavra de Diana, assim como o fiz no passado. Ela nunca traiu tal coisa, e
algo me dizia, não o faria naquele momento.

— Vem aqui. — pedi, e aquela frase de apenas duas palavras,


significaram muito mais do que seria para a maioria das pessoas. Para nós,
sempre fora como um convite para simplesmente estarmos juntos.

Em duas semanas no passado, tive aquela mulher como minha. Eu


pedia, ela vinha. Ela pedia, eu ia. Hoje, nos encontrávamos na mesma
situação. O quão esperto era o destino? Para nos encontrarmos em um
momento em que todos os sentimentos pareciam apenas prontos para
acordar. Ao menos, comigo.

Diana veio. Sentou-se em meu colo, e buscou rapidamente minha


boca, dando um leve beijo. Deixei a garrafa de cerveja de lado, e a abracei
em meu colo, levando uma de minhas mãos até seu rosto, analisando-o

como sempre amei fazer. Olhar para ela me despertava sensações de


plenitude e felicidade. Diana me trazia algo que nunca imaginei ter, não
naquela intensidade.

— Senti tanto a sua falta. — confessei, sem medo.

Encostei minha cabeça em seu peito, e senti seus braços ao redor de


meu corpo. Éramos um emaranhado, nossos corpos se tocavam em busca
de aplacar a saudade. Ao menos, a minha, ainda não se foi. Precisava de
mais, um mais que não saberia até quanto duraria. E temia por completo
um prazo de validade.

— Eu senti mais, garoto.

Sorri e pela primeira vez, em cinco anos, senti-me confortável


diante de tal apelido. Assim como, não precisava implorar para a outra

pessoa parar de chamar de tal forma, porque me lembrava ela. Naquele


momento, era ela me chamando como sempre o fez. Garoto ou T, sempre
foram suas marcas registradas em minha memória. Esperava que um dia,
ela me enxergasse além daquilo.
Capítulo 6

“All of this silence and patience

Pining and desperately waiting

My hands are shaking from all this.”[62]

Não conseguia dormir, não sabendo que Troian estava deitado ao


meu lado. Sua respiração era baixa e controlada, assim como, as batidas de

seu coração. Não conseguia me afastar, mesmo que não quisesse perturbar
seu sono. Troian era como uma droga, trazia o melhor e pior de mim ao
mesmo tempo.

Ele era quatro anos mais novo, mas idade nunca me pareceu um
problema. Não até o momento em que se declarou e me pediu para ficar.
Eu precisava ir, assim como ele precisava seguir com sua vida. Nunca
escolheria algo que pudesse prejudicá-lo. Ficarmos juntos, naquela época,
o faria. Mesmo não podendo saber ao certo o que ocorreria.

Ele tinha apenas vinte anos, e pelo que sabia, logo voltaria para a

faculdade de música, enquanto isso, rodaria o Canadá cantando em bares,


restaurantes e onde mais pudesse. Ele era livre. Eu tinha vinte e quatro
anos, lutando a todo custo para me tornar a chefe do departamento de
marketing da empresa dos Russel. Eu tinha amarras fortes.

Passei a mão por seu cabelo loiro e suspirei, sentindo-me apaixonar


mais uma vez. Como se fosse instantâneo, como naquela noite que o vi
pela primeira vez. Nunca acreditei em amor à primeira vista, diga-se de
passagem. Entretanto, olhar para ele me fazia tão bem, que comecei a
cogitar tal possibilidade, a qual, escondi no âmago de minha alma. Escondi
o que sentia, ao menos, as palavras que confirmariam.

T sempre pareceu me ler, o que ninguém mais conseguia. Portanto,


meus sentimentos gritavam em gestos, mas não em palavras. Como duas

semanas com aquele homem significaram tanto? Passei um longo tempo


indagando sobre. Muitas vezes, ouvi meus pais falarem sobre o amor, e
como começaram tudo. O deles nasceu da raiva que sentiam um do outro,
que de repente, em um final de semana, se transformou em uma paixão
desenfreada, que acarretou o amor. T e eu seríamos o mesmo caso? Ou
melhor, os meus sentimentos por T seriam assim?

— Dizem que quando uma mulher de humanas te olha muito, ela


deve estar criando sobre. — sua voz rouca e baixa me pegou de surpresa.

Levei a mão ao peito, um pouco assustada por estar acordado.

Como imaginei, ele me lia muito bem. Mesmo de olhos fechados, parecia
saber que precisava me deixar observá-lo.

— Eu sou arte, e sempre serei. — confessei, e seus lindos olhos


verdes se abriram. Eu amava a cor sem definição. — Desde quando está

acordado? — perguntei, e T pareceu pensar um pouco.

Convidei-o para ficar, sem segundas intenções. O sexo ainda


parecia algo distante para nós, como se tal conexão significasse mais.
Entretanto, se fosse apenas daquela maneira que soubéssemos amar?

— Desde que senti que era observado. — comentou.

— Acho que faz um bom tempo, então. — confessei, e ele franziu


o cenho.

— Não consegue dormir? — perguntou, e neguei com a cabeça. —

Por que?

— Acho que estar na mesma cama com você depois de tanto


tempo, me faz querer apenas olhar, pra saber que é real. — falei de uma
vez, o que tanto me sufocava ao vê-lo tão à vontade ao meu lado.

Suas mãos tocaram as minhas, levando-as até sua boca, onde


depositou carinhosos beijos. Seus beijos subiram até meu antebraço, e
surpreendendo-me, T chegou até meu pescoço, ajeitando-se melhor na
cama. Foi impossível impedir as sensações que me causava. Meu corpo era

desperto pelo seu, até mesmo, sob o menor toque.

— Estamos agindo como estranhos que se conhecem


ocasionalmente. — sua voz rouca me atingiu, e logo senti seus lábios em
minha orelha. — Nunca fomos fãs de sutileza ou fingir algo, Diana. O que

aconteceu com a gente? — perguntou, e seu rosto voltou para o meu,


encarando-me profundamente.

Aproveitei da forma que estava meio inclinado sobre a cama, e


passei uma de minhas pernas sobre sua cintura, sentando-me sobre seu
corpo, prendendo-o sobre o meu. O olhar de T se transformou, tornando-se
escuro. A escuridão mais linda que já pude encontrar diante de onde se
encontrara minha cor favorita do mundo – seus olhos.

— Eu não sei porquê, mas você me tem feito pensar mais do que

faço normalmente. Até mesmo, mais do que deveria. — confessei, e desci


meu rosto para o seu.

— Nunca precisou fingir nada para mim, Diana. Não precisamos


disso agora. — assenti, diante de minha maior perdição.

Quantas vezes sonhei com aquela exata cena? Troian Messina,


deitado em minha cama, sob meu corpo, olhando-me como se
representasse tudo aquilo que realmente desejava.

— Tudo foi rápido no passado, eu sei... — calou-se, parecendo

buscar as palavras certas. T sendo T.

Sorri, finalmente, minha mente encontrando o caminho certo.


Lembrando-me do que realmente acreditava significar algo para nós.

— Talvez essa seja à nossa maneira de amar, T. — falei, e uma de

suas mãos subiu até meus cabelos, levando-me para mais perto dele. Um
fio de cabelo de distância de sua boca. — Talvez essa seja à nossa maneira
de dizer o que somos e o quanto significamos.

— Mas o jeito que você me tem na cama, baby... — sua voz,


carregada pelo desejo, fez-me ficar completamente entregue em suas mãos.
— Nunca foi rápida.

— Me tenha, T. — falei, em seus lábios, e não fora preciso mais


nada.

Uma de suas mãos se apossou de minhas costas, enquanto a outra


se infiltrou sobre meus cabelos. Nossos lábios se chocaram e não pude
evitar gemer em sua boca. Era aquilo que tirara meu sono. Saber que
estava ao lado do homem que despertava o lado mais libertino de meu ser,
e não poder lhe tocar.

Nossos corpos se reconheceram de forma devastadora, e em poucos


segundos, encontrei-me nua sobre ele, que retirava afoitamente a última
peça que lhe sobrara. Roupas fora, e de repente, a pressa acabou. Nossas

peles se tocavam, e T não parecia decidido a simplesmente me ter. Ele


queria mais, assim como eu.

Meu corpo foi virado contra a cama, e logo seus toques se


espalharam por cada pedaço. Suas mãos percorriam minha pele, como se

extasiado, e seus olhos, me encaravam a cada instante. Logo seus lábios


buscaram os meus, como se para confirmar que era real. Fiz o mesmo,
reconhecendo-o como meu. Mesmo que não fosse. Mesmo que no dia
seguinte nada mais existisse. Naquele momento, T era meu, mais uma vez.

Nos desbravamos como se em busca de algo que apenas o prazer


um do outro poderia nos presentear. Seu corpo pairou sobre o meu, assim
como, implorando para que me tomasse. Existia muitas coisas que tomava
as rédeas em minha vida, mas naquele momento, queria apenas que T me

levasse para o prazer. Não queria pensar, determinar ou pedir nada. Queria
que ele me entendesse, apenas com nossos corpos. E ele o fazia, assim
como, o fez.

Sua boca subiu sobre meus seios e senti o hálito quente em meu
mamilo esquerdo, fazendo com que o desejo inflamasse ainda mais. Troian
me analisava, e assim que o puxei para um beijo profundo, ele uniu nossos
corpos. Como o bater de asas de uma borboleta pode causar um tsunami do
outro lado mundo, T me entregara o nirvana que desde que o deixei, nunca

mais sentira. Não daquela forma.

Contudo, ele queria mais, assim como eu. Sua boca ficou a
centímetros da minha, assim como, seus olhos não quebraram nossa
ligação. Levei as mãos a suas costas e cravei minhas unhas, sentindo todo
o nosso desejo inflamar. A cada encontro de nossos corpos, senti-me mais

perto do limite. Mais perto de lhe entregar o que tanto guardei. Assim
como a canção que cantou para mim, e depois traduziu por completo.

Meu corpo se entregou, no momento em que o seu fez o mesmo.


Éramos um, mais uma vez. E pude afirmar, que era a nossa forma de amar,
mesmo que errada aos olhares alheios. Nossos corpos se acalmaram, e
assim que nossos lábios se encontram mais uma vez, segurei-me para não
deixar com que os sentimentos voassem de minha boca. Parecia tão claro,
que o medo, o qual ele sentira no passado me atingiu. Não queria perdê-lo.

Não daquela vez.

O que sentia ainda vivera, mesmo depois de cinco anos. Porque


para ele, guardara todo o amor que nunca soube dar. A música se passara
por minha mente, como se confirmando o furacão de emoções que me
atingiu.
“Eu e você,

não é assim tão complicado, não é difícil perceber

Quem de nós dois

Vai dizer que é impossível, o amor acontecer

Se eu disser que já nem sinto nada

Que a estrada sem você é mais segura

Eu sei, você vai rir da minha cara

Eu já conheço o teu sorriso,

Leio o teu olhar

Teu sorriso é só disfarce

E eu já nem preciso.”[63]
Capítulo 7

“My name is whatever you decide

And I'm just gonna call you mine

I'm insane, but I'm your baby

Echoes of your name inside my mind.”[64]

O momento perfeito de repente pareceu se dissolver. O medo do

dia seguinte fez todo sentido, quando acordei sozinha em minha cama, sem
qualquer sinal dele pelo apartamento. Ele simplesmente sumiu, mandando
uma mensagem na noite daquele dia, dizendo que queria muito estar ao
meu lado quando acordasse. Pelo jeito querer, realmente, não era poder.

Sei que de repente todas as minhas muralhas subiram mais uma


vez, e não pude deixar de sentir ainda mais medo. Porque o T do passado
parecia estar no presente, porém, além das características boas, as ruins
ainda permaneciam. Assim como escondera seu verdadeiro nome no

passado e até mesmo tentou mentir sua idade certa vez, ele escondia algo

mais. Algo que nos mantinha afastados.

Tentei simplesmente esquecer o que houve e o ignorar pelo tempo


que conseguisse. Infelizmente ou não, o tempo durou cerca de algumas
horas e resolvi responder sua mensagem. Sentia-me em risco constante,

sem saber ao certo como agir ou o que dizer. Não teria como obrigá-lo a
me contar o que acontecia, e mais, minha própria vida necessitava de
atenção.

Desviei o olhar da tela do computador, que me mostrava os


rascunhos feitos por estagiários de meu departamento. Não conseguia
sequer me concentrar e escolher qual deles captara de forma melhor a ideia
principal da campanha. Sentia-me frustrada. Não tinha cabeça para nada,
mal conseguia pensar sobre o trabalho.

Apenas uma vez na vida me senti de tal forma, e fora quando


rompera com T. Demorei cerca de um mês para voltar à ativa. Desta vez,
sentia-me esgotada. Como uma noite com ele pudera me acarretar tantos
questionamentos e medos? Por que não pulava a página e seguia em
frente?

Porque era ele.


Suspirei, desabando sobre a mesa, com as mãos esticadas. Escutei
dois toques na porta e não fiz questão de mudar de posição. Só poderia ser

minha assistente, e com toda certeza, não se surpreenderia com aquela


cena.

— Senhorita Carter.

— Sim. — respondi, ainda sem levantar o rosto e Tasha soltou uma

risadinha. — Sem zombar da chefe, em. — provoquei, ainda de cabeça


baixa.

— Bom... — limpou a garganta antes de continuar. — Chegou a


passagem para o Brasil, além dos dados de sua hospedagem e muito mais.
Consegui estender sua estadia lá, como pediu.

O que?

Levantei-me no mesmo instante, quase pulando da cadeira. O


desempenho de meu corpo não conseguiu acompanhar minha mente, e

meu joelho foi de encontro com o tampo de vidro.

— Puta merda! — xinguei, e fiz uma careta de dor, sentindo-o


latejar.

Tasha me encarou perplexa, talvez pelo fato de raramente me ouvir


xingar. Ela trabalhava como minha assistente há mais de três anos, e quase
nunca me via em dias ruins. Não que fosse isenta deles, eram até muitos
para minha sobrecarga emocional. Entretanto, o diferencial daquela cena,
era um dos raros, mas existentes dias, em que demonstrava o que

realmente sentia.

— Tudo bem, senhorita Carter? — perguntou e deu dois passos à


frente, olhando-me preocupada.

— Pode me chamar de Diana, sabe disso, não é? — indaguei e ela

assentiu.

Tasha era boa no que fazia, e parecia gostar um tanto quanto de me


tratar com formalidades. Talvez porque muitas pessoas na empresa
achavam desrespeitoso chamar o chefe pelo primeiro nome, mesmo que
não existissem regras a respeito. Cada qual com sua escolha.

Andei meio sem jeito para mais perto e peguei a pasta transparente
que me ofereceu. Olhei para os papéis ainda um pouco perdida, enquanto
meu joelho latejava de forma estrondosa.

— Quer um pouco de gelo? — perguntou e neguei com a cabeça.

— Tá tudo bem. — respondi e fiz uma careta ao me mover em


direção a mesa. Pensei mais uma vez, e desisti, indo até a poltrona perto
das grandes janelas de vidro. Não correria o risco de entrar numa luta não
planejada com o tampo novamente. — Obrigada, Tasha.

— Com licença, senhorita. — pediu e silenciosamente saiu de


minha sala.

Folheando os papéis, notei as datas a respeito das tão esperadas

férias que teria. Finalmente, lembrando-me, que pedira a Tasha para


estender o prazo de uma semana para um mês no Brasil. Aquela viagem
estava planejada há tempos, uma forma de obrigar tanto a mim quanto
Klaus a descansar. Entretanto, o presente nos surpreendeu o bastante, e no

fim, o certo fora cancelar a sua passagem.

Segurando aqueles papéis, comecei a ponderar sobre o que fazer. A


viagem seria para dali uma semana, tudo milimetricamente calculado por
Tasha. Pensei a respeito de como seria, passar o próximo mês em um país
que há muito tempo não visitava. Ainda mais, porque o objetivo era buscar
ficar quieta e descansar. Como faria isso depois de reencontrar T e não
conseguir tirá-lo de minha mente? O tanto que ele parecia ter voltado para
minha vida, naquele instante, parecia estar fora da mesma.

— Diana, Diana... — falei para o nada, e fiquei repensando o que


fazer.

Não queria viajar sem saber como seguiríamos dali por diante.
Porém, não obtivera resposta alguma de T a respeito de nos vermos.
Levantei-me e fui até a mesa, pegando meu celular. A mensagem
permanecia sem resposta, e não soube como encarar tal fato. Sentia-me
refém daquele sentimento, sem sequer conseguir determiná-lo. Precisava
me acalmar, ou simplesmente piraria. T tinha razões, com toda certeza,

para estar longe. Talvez não quer olhar para você – minha racionalidade

me repreendeu.

Ele não me pertencia, assim como ele não era meu dono. O que
diabos estava acontecendo comigo?

Resolvi digitar uma mensagem e tomei minha decisão. Precisava

esvaziar minha mente e quem sabe, encontrar o que tanto me agonizava.


Não era uma pessoa paciente, mas me sentia consumida por não saber
sobre ele. Ansiedade. Aquela era a palavra que se passava em minha
mente.

Balancei a cabeça tentando fugir de meus próprios demônios.


Sentindo a ansiedade que sempre permanecia em meu ser, que sempre
parecia me consumir, voltar com força. Respirei profundamente e mandei
uma mensagem para meus amigos, e em seguida para T. Iria viajar, era

minha decisão final. Precisava cuidar de minha mente, assim com


planejara. O ano estava sendo exaustivo assim como todas as
responsabilidades.

Sempre fora a pessoa a estender a mão para o outro, e naquele


momento, vendo-me ser a segunda opção de alguém, senti-me
completamente abandonada. Ainda mais, no momento em que meus
melhores amigos viviam seu próprio conto de fadas. Lembrei-me de Tiana,
a princesa da Disney que tinha um nome quase idêntico ao meu, assim

como, batalhou arduamente pelo que queria. Ela nunca esquecera do que

realmente importava, e eu me encontrava a ponto de começar a esquecer...


Relacionando minha realidade a um filme que até então deveria passar
ensinamentos para crianças.

Suspirei, sentindo o ar faltar, sabendo que estava a ponto de voltar

para o que jurei lutar contra, para sempre. Segurei-me contra o tampo da
mesa, encarando-a como minha aliada. Meu celular vibrou e o ignorei por
alguns segundos, sem conseguir me concentrar em mais nada que não
fosse minha respiração. Segundos depois, consegui respirar normalmente.

Encarei o aparelho e li as mensagens de meus amigos, confirmando


o jantar de naquela noite. Lia me intimou para que fosse no apartamento de
Klaus, que logo dividiriam. Sorri, diante de tanto carinho. Era aquilo que
precisava, na maioria das vezes. Sentia-me só, não por não estar em

relacionamento. Era o tipo de solidão que lhe acomete mesmo em meio a


um milhão de pessoas, e com um amante em sua cama. Era o tipo que a
maioria indicava remédios como cura, mesmo que eles não fossem a
solução completa. Eram parte.

A resposta de T não veio, assim como, nenhuma ligação. Notei que


ele sequer recebera a mensagem. Levei as mãos à cabeça, pensando em
como me sentia em relação a ele. O amor que me fizera transbordar no
passado, mesmo que não pudéssemos ficar juntos. Não naquele momento.

Não poderia eu, estragar tudo por ter partes a cicatrizar. Partes de minha

alma.

Uma reviravolta de sentimentos. Sentia-me em meio a uma

avalanche, sendo levada ao extremo. Não era apenas ele, jamais seria. O

reencontro de T vinha juntamente com a leva de maior caos de minha vida.

Naquele momento, soube que precisava me resolver. Precisava me

entender, para poder estar ao lado de T, se este fosse o nosso destino.


Capítulo 8

“Knew he was a killer first time that I saw him

Wondered how many girls he had loved and left haunted

But if he's a ghost, then I can be a phantom

Holding him for ransom.”[65]

Olhei mais uma vez para o reflexo no espelho e deixei a música de


uma de minhas cantoras favoritas invadir o ambiente. Ela parecia me
descrever naquele momento, ao falar tão abertamente sobre ansiedade.

“Feel like I'm always apologizing for feeling

Like I'm out of my mind when I'm doing just fine

And my exes all say that I'm hard to deal with


And I admit it, yeah”[66]

Cantei junto a música, enquanto aplicava mais um pouco de rímel.

Julia Michaels[67] apenas mostrava o quanto ter ansiedade era uma imersão
em emoções sem controle. Sentia-me em um momento de extremos. O

trabalho começara a me sufocar, mesmo que tentasse a todo custo esconder


tal sentimento em meu interior. Estava esgotada por trabalhar mais do que
realmente deveria. Sempre fui o tipo de pessoa workaholic, onde o
trabalho vem em primeiro lugar, sem conseguir pensar em outra coisa
como prioridade. Nem mesmo minha própria saúde. Sorri tristemente para
meu reflexo, e notei o quanto apenas me deixei levar.

Minha família era próxima e sempre me deram todo suporte, assim


como, me pediam para ir com calma. Já perdi as contas de quantas vezes
me pediram para diminuir o ritmo, e tentar focar em outras áreas de minha

vida. Eu o fazia, tentando ajudar a quem amava. Olhando ao redor, sabia


que obtive êxito na maior parte. Klaus e Paul estavam felizes e meus pais
pareciam em eterna lua de mel. Tio Dom era mais complicado de se
ajudar, por conta de ser ainda mais fechado do que os filhos, mas poderia
jurar que estava feliz.

Finalmente, após passar todas as áreas, chegava a mim. Onde não


fazia ideia do que fazer ou como me ajudar. Os sintomas que tanto tentei

me acostumar e lutar contra, voltavam a me atormentar, de forma

devastadora. A volta de T a minha vida foi como um bálsamo, mas ao


mesmo tempo, reviveu várias inseguranças, que desencadeiam tudo aquilo
que não queria admitir.

Para o mundo, eu era forte e imponente, resolvia problemas sérios

em meu café da manhã. Nem as pessoas mais próximas conseguiam me ler


se não permitisse. Era a rocha deles, como papai dizia. Porém, a frente de
T sentia-me uma pluma. Para ele, não importava querer ou não demonstrar,
ele me lia. Assim como o fez no passado. Ele não pedia permissão, ele
simplesmente me tinha. Tal sentimento me assustava, porque muitas vezes,
acreditei que aquelas duas semanas no passado com o cara mais novo,
foram superestimados em minha mente. Não foram. De maneira alguma.

Estar perto de T era como me abrir de forma silenciosa, dando-lhe

o aval para me conhecer. Assustava-me por não saber até onde me levaria
tal sentimento. Sempre fora controladora e centrada, e ele me fazia perder
qualquer noção das duas coisas. Dentro de um grande caldeirão de meus
maiores medos, encontrava-me naquele exato momento. Sentindo meu
corpo lutar para permanecer feliz, enquanto por dentro, parecia
desmoronar.
“But all my friends, they don't know what it's like, what it's like

They don't understand why I can't sleep through the night

I've been told that I could take something to fix it

Damn, I wish it, I wish it was that simple, ah”[68]

Suspirei profundamente, após cantar junto a música. Percebia que a


idade ajudara um pouco, mas não era a solução para superar tais
problemas. As doenças psicológicas simplesmente vieram, e tudo o que
pude fazer foi lutar contra, e buscar equilíbrio. O que não era possível
sozinho, infelizmente. Mesmo que o primeiro passo tenha que ser meu.
Desde os dezoito, sabia bem daquilo. Teria que admitir, a terapia me fazia
falta.

Limpei algumas lágrimas que desceram e tentei ajeitar a


maquiagem. Precisava me apressar e ir ao apartamento de Klaus. Seria

uma noite para me despedir e ao mesmo tempo comemorar a viagem para


o Brasil. Ainda faltava uma semana, mas queria começar a me cuidar neste
meio tempo. O som da campainha me pegou de surpresa e me levantei.

Andei até a porta, e ao encarar o olho mágico, meu coração


simplesmente disparou. Destranquei-a e abri, sendo presenteada com a
figura de T, que consigo, trazia um buquê de rosas brancas. Sorri, sem
conseguir me conter. Mesmo que estivesse desmoronando, receber aquele
gesto de carinho, era como a vida jogando na cara o tamanho da sorte que

tinha.

Agradeci internamente, ao mesmo tempo em que tentava chutar


minha ansiedade junto ao pânico para algum abismo dentro de mim.

— Ei! — sua voz rouca me atingiu, e ele me entregou as flores.

Peguei-as e sorri, agradecendo-lhe.

— Desculpe ter sumido assim, eu... — ele pareceu pensar um


pouco, e o encarei desconfiada. T me escondia algo, era claro. Temia pelo
que fosse.

— Tudo bem. — falei, tentando jogar minhas inseguranças para


longe.

Ele estava ali por mim, não era? Porque pensar que existia alguém
em sua vida? Ele não precisava voltar, mas o fez.

— Tive um problema com o celular e não consegui te responder ou


ligar. — esclareceu, e comecei a entender porque minhas mensagens
depois de um tempo pararam de chegar. — A propósito, está linda.

— Obrigada. — falei, encarando meu vestido na cor preta, que


delineava perfeitamente meu corpo, assim como as botas na mesma cor de
cano alto. — Que tal entrar? — ofereci-lhe espaço, mas ele não se mexeu.
— Parece de saída, acho que...

— Sim, um jantar no apê de Klaus. — esclareci. — Te convidei,

mas acho que sequer viu essa mensagem.

Seu cenho franzido se desfez e ele assentiu, como se entendesse o


que acontecia.

— Que tal ir comigo? — convidei, temendo um pouco por sua

resposta. Conhecer meus amigos era como encarar parte de minha família.
Estava me precipitando?

— Por que não? — perguntou e sorriu de lado. — Já está pronta?

— Sim, só preciso pegar minha carteira. — avisei e me virei para ir


até onde me lembrava de ter deixado.

Entretanto, fui puxada por sua mão, e logo meu peito bateu contra o
seu. As rosas ficaram amassadas entre nós. Ele sorriu, tocando meu rosto
com carinho. Parecia querer me dizer algo, mas como antes, não deixou

palavras saírem. Seus lábios encontraram os meus, como se para me


marcar mais uma vez. E ele o fez. Beijei-o com a saudade que sequer
conseguia determinar, e o desespero de quem parecia entender que existia
prazo de validade.
Minutos depois chegamos a porta de Klaus, e uma Patrice
sorridente nos recebeu. Abracei-a com carinho e ela fez o mesmo. Assim
que nos afastamos, notei o olhar surpreso em seu rosto ao encontrar T do

meu lado esquerdo. Patrice engoliu em seco e fiquei ainda mais intrigada.

— Troian? — chamou por ele, e resolvi me afastar.

Não sabia como lhe explicar o que éramos. Troian e eu tínhamos


um passado, e no momento, estávamos tentando algo que sequer saberia
denominar. Não existiam explicações, não ali.

— O encontrei perdido no Central Park. — menti descaradamente,


e sorri em seguida, tentando parecer convincente. Não era nem um pouco
boa em tal coisa.

Adentrei o apartamento, em busca de meus amigos. Os


questionamentos e interrogatório sobre T e eu ficariam para outro dia.
Cheguei primeiro até Paul e lhe dei um abraço. Notei seu corpo enrijecer
assim que nos afastamos, e antes de ir até Lia, virei-me na direção que Paul
sequer desviava o olhar.

Troian e Patrice se abraçavam, e algo parecia um tanto estranho no


ar. Não saberia dizer se pelo fato de Patrice e Paul estarem tendo algo, ou
ainda mais, por não saber como me sentir diante daquilo. Ainda mais por

não ter esclarecido por completo para T sobre o meu namoro falso com
Paul. Olhei de relance para Lia, que observava tudo com um olhar perdido,
como se também desconfiasse de algo. O que estava acontecendo ali?

Assim que se afastaram, Patrice o trouxe para mais perto e fiz

questão de me adiantar, e tentar entender o porquê todos, menos Klaus e


eu, pareciam estar tão desconfiados. Até mesmo Patrice mostrava um
semblante tenso.

— Acho que o único que não conhece é Paul. — falei, instigando


os dois a se cumprimentarem, e torcendo para que aquela tensão fosse
apenas impressão. — Paul esse é Troian Messina... — pensei em como
apresentá-lo, mesmo soasse estranho denomina-lo de tal forma: — Um
amigo. — complementei, e eles trocaram um cumprimento.

Tentei ignorar o clima pesado, ao notar o olhar intimidante que os


homens a minha frente trocaram. O que T queria transmitir agindo de tal
forma? Patrice pareceu ainda mais incomodada do que a maioria, e sua voz
foi a que me fez acordar diante daquele momento.

— Que tal escolhermos uma música, Dia? — perguntou, e sorri,


indo até ela. — Algo brasileiro, para te preparar para as férias. Que tal? —
indagou, e pensei um pouco, lembrando-me de uma artista que conhecera
recentemente, e peguei o celular dentro da bolsa.

Patrice me mostrou algumas playlists, e assim que encontrei o

nome da cantora, selecionei a música. Coloquei a letra e me arrisquei no


português com Lia, por mais horrível que pudesse parecer. Queria apenas
me livrar um pouco daquela situação constrangedora que parecíamos estar,
sem qualquer motivo aparente. Patrice e Paul sumiram por alguns minutos,

e apenas consegui estudar a reação de T.

Seu olhar não demonstrava muito, a não ser clara preocupação. Ele
olhava ao redor, enquanto conversava com Klaus. Algo o incomodava,
mas não saberia dizer o que.

— Olha isso! — Lia falou, me mostrando em seu celular um vídeo


de gatinhos sendo atrapalhados.

Klaus estava ao nosso lado, com a mão em sua cintura, claramente,


confortável em estar ali. Olhei para o vídeo novamente e forcei um sorriso,

sentindo-me um pouco perdida. Como seria assumir a todos, e


principalmente, para T, o que ele me fazia sentir? Nem sabia denominar,
mesmo assim, tinha a certeza de que algo nele era único. Ao menos, único
para mim.

T pegou uma cerveja colocado ao seu lado, e tomava, mas nossos


olhares não se cruzaram. Senti que ele me afastava, mesmo vindo ali por
minha causa. Minha cabeça girou, e claramente, vi o mundo gargalhar de
minha face. Ele poderia não estar ali por mim. Talvez o ciúme de Paul

tivesse algum fundamento, e a tensão por todos nós, começara a se tornar


insuportável e mostrar sua real razão.

O jantar passou, e com ele, minha desconfiança apenas aumentou.


O vinho se tornou um bom amigo, e de uma taça, que geralmente bebia,
passei a mais de quatro. O álcool poderia aplacar um pouco dos
sentimentos que tanto me atormentavam. Terminei mais uma taça, e notei
que todos já pareciam satisfeitos. Minha noite não poderia acabar por ali.

Precisava extravasar um pouco, mesmo que a decepção por ver T daquela


maneira me deixasse confusa.

— Que tal uma balada? — perguntei animada. Notei os olhares


trocados entre Klaus e Paul, e entendi a preocupação que demonstraram.
Eles me conheciam bem. Até demais. — Vamos lá! Ficarão sem me ver
até a semana do casamento, eu mereço um pouco de atenção. — declarei, e
notei o olhar de T me queimar.

Ele não havia perguntado sobre o porquê do jantar, e até o

momento, não encontrara a forma correta de lhe contar. Havia feito na


mensagem que ele nunca recebeu. Sentia-me como uma fugitiva, ao
mesmo tempo, que lhe confidenciava o que faria. Todavia, naquele
instante, não imaginei que pudesse ser importante. Não para ele.

— Por mim. — Paul declarou dando de ombros, e Klaus fez o


mesmo.

T permaneceu em silêncio, enquanto Patrice e Lia concordavam.


Virei-me e peguei a bolsa, e percebi a proximidade de T. Ele parecia
querer me dizer algo, e quando adentramos o elevador, mesmo com os
outros ao redor, era como se apenas nós estivéssemos ali... Seus olhos
queriam me contar algo, mas sua boca permanecia calada.

Minutos depois, resolvemos ir junto a Paul, e assim que me sentei

no banco de trás, T fez o mesmo. Senti o quente de sua mão sobre a minha,
e apenas me esquivei. Era aquilo? No escuro de um carro, poderíamos agir
como se ainda fossemos os mesmos? Eu passava. O clima no carro não
poderia estar pior, e então, minha mente apenas girou pelo que não queria
crer: Troian sentia algo por Patrice.

Respirei profundamente, tentando acreditar que aquele algo não


fosse além de fraternal, mesmo que suas atitudes começassem a provar o
contrário. Finalmente estacionamos, e pude soltar o ar que nem sabia que

segurava.

— Diana. — sua voz me atingiu e me virei, assim que descemos do


carro.

— Oi. — falei, e o encarei, sentindo-me completamente

intimidada. Eu mal me entendia, quem diria ele.

— Está tudo bem? — sua pergunta não me surpreendeu, mas


resolvi apenas assentir. O que poderia dizer?

Encontramos Klaus e Lia, e logo entramos na boate.

— Vou pegar uma dose, vocês vêm? — ofereci, enquanto Patrice e


Lia se sentavam na mesa que escolhemos.

Klaus e Paul assentiram, e logo senti o braço de Paul enlaçar minha


cintura.

— O que houve, Dia? — perguntou baixinho em meu ouvido, e o


encarei sem mostrar qualquer reação. Sabia que em algum momento os
dois me colocariam contra a parede. — Vamos lá! Nada de fingir. Não
para mim!

Estávamos a frente do bar da boate, e não sabia como entrar em tal


assunto ali. Como me sentia diante da descoberta de que T poderia sim,
estar apaixonado por outra mulher. E que naquela questão, acabara de se
tornar uma grande amiga e a mulher de meu melhor amigo.

— Nem para mim! — Klaus falou, parando de meu outro lado.


Bufei, por odiar ser cercada de tal forma.

— Só quero beber para esquecer. — revelei parte da verdade. — Já


os vi fazendo muito isso. Será que posso? — debochei e os dois me

encararam ainda mais preocupados.

— Quem te machucou? — Paul perguntou de relance, e resolvi


ignorar. Era tão óbvio que sequer merecia resposta.

— Três uísques. — pedi ao barman e indiquei os homens ao meu


lado. — O melhor.

— Dia... — Klaus chamou. — Tem a ver com o fato do primo de


Patrice aparecer no jantar? — perguntou e recuei os ombros, sem saber
como mentir ou até mesmo omitir algo para eles.

O barman deixou as bebidas sobre o balcão, e peguei um dos copos


dispostos. Virei-me contra o balcão e os encarei, em seguida, olhei para
onde Patrice, T e Lia estavam sentados. Mas especificamente, a forma
como T se prostrava ao lado de Pat.

— Olhem! — indiquei a mesa na qual escolhemos ficar, enquanto


não dançávamos. — Olhem com atenção e me digam porquê Troian
aceitou ir jantar conosco hoje. — pedi, e tentei não desabar diante da cena.
T sorriu para Patrice, com uma das mãos sobre seu ombro, uma atitude tão

simples, mas que dizia muito.

— Ele gosta dela. — Klaus se pronunciou. — Pelo jeito, mais do


que deveria.

Tal constatação de Klaus me atingiu de forma devastadora.

— Ela não o vê assim, mas pelo jeito, ele está tentando forçar algo
já que se sente em perigo. — analisei o que tanto se passou por minha
mente diante de suas atitudes. Virei a dose de uma vez, e senti o líquido
descer queimando em minha garganta, deixando o copo sobre o balcão. —
Às vezes sou muito burra em relação a sentimentos. — confessei e senti o
toque de Paul em meu braço. — É verdade, Paul! Eu simplesmente
acreditei que ele me escolheria, mesmo depois de tanto tempo e agora, com
a mulher que gosta ao lado...no fim, sou só uma imbecil. — doeu admitir

tal coisa, ainda mais, por finalmente cair minha ficha.

Não me animava tanto para dançar, não naquela noite. Mas trazer
todos ali e analisar T era o ponto alto da noite. Queria entender se estava
enxergando algo onde não existia. Mas que se existisse, poderia ser a sua
escolha, mesmo diante de outra mulher que claramente não o quer.

— O imbecil aqui sou eu. — Paul provocou, e lhe dei um soco no


peito, sorrindo.

— Amo vocês, meus imbecis mais lindos. — falei de repente, e

notei os sorrisos sinceros nos rostos de meus melhores amigos.

Os dois se entreolharam, e fiquei em alerta. Tentei impedi-los, mas


logo eles me cercaram, dando um abraço de urso com a clara intenção de
me deixar sem ar. Os dois gargalharam diante de meus resmungos, mesmo

que adorasse tais demonstrações de carinho.

— Te amamos muito também, Dia. Nunca se esqueça disso. —


Paul enfatizou e pisquei para eles, pois compreendia por completo a forma
como construímos tal amor.

Saí rapidamente dali, sem lhes dar chance para continuar tentando
me aconselhar. Talvez, meus sentimentos fossem confusos demais, e os de
T poderiam ser apenas um reflexo. Ele passava por algo, mas não me
contava. Assim como, iria viajar, simplesmente para me reencontrar. T e

eu, mais uma vez, nos encontrávamos em momentos diferentes da vida.


Infelizmente, aquilo era determinante. Tão quanto, o que ele parecia sentir
pela prima.

Cheguei até a mesa, e o ignorando, puxei Patrice e Lia pelas mãos,


para irmos para a pista de dança. Não poderia deixar aquela noite piorar,
então, apenas iria dançar. A música foi minha salvação em vários
momentos. Lembrava-me bem, de uma frase que me marcara tanto, assim
como, meu corpo. Senti o olhar de T sobre meu o mesmo, mas resolvi não

levar mais nada em consideração.

Precisava me distrair e nada melhor, que apenas deixar a noite me


embalar.
Capítulo 9

“Some boys are trying too hard, he don't try at all, though

Younger than my exes but he act like such a man, so

I see nothing better, I keep him forever

Like a vendetta-ta.”[69]

O jantar fora mais tranquilo do que imaginei, entretanto, entendi o

quanto era deslocado da realidade de Diana. Suspirei, tentando me manter


com um rosto impassível. Notava a felicidade no olhar de Patrice, que
sempre fora como uma irmã para mim, mesmo que implicante ao extremo.
Bailey, a mais nova, sempre me contou, que Patrice era nossa irmã
justamente por aquilo.

O que me remetia à cena que encontrei ao entrar na casa de meus


pais, a qual, quebrou meu coração, assim como, minha alma. Passei as
mãos pela calça jeans, tentando me acalmar. Não poderia relacionar o tal

Paul ao que aconteceu com Bailey, entretanto, era meu lado protetor

falando mais alto. Não permitiria que Patrice passasse pelo mesmo, e nem

mesmo Bailey. Nunca mais.

Fiquei sentado na mesa, enquanto assistia a todos comemorando.


Cada qual com seu par, e notei a forma como Diana se movia, como se

fosse a dona da situação, mesmo que sozinha. Mais uma vez, senti-me
perdido diante de sua imensidão. Eu não era o bastante para ela, nunca me
sentiria de tal forma. Ainda mais, naquele momento de minha vida.

Como as coisas podiam parecer perfeitas em um dia e no seguinte


simplesmente desmoronarem? Levantei-me da mesa, sem tirar meus olhos
de Diana, que notei que bebia um pouco além. Pedi uma cerveja ao chegar
no bar e o barman me encarou um pouco intrigado, talvez por perceber a
mulher que olhava.

— Acho melhor tirar o olho, garoto. — encarei-o com fúria nítida


em meu rosto. Apenas ela tinha o direito de me chamar de tal forma.

— O que quer dizer com isso? — perguntei, mesmo não querendo


a real resposta para aquilo.

— É a mulher do patrão. — o encarei completamente incrédulo. O


que? — Dizem que ele a pediu em casamento. — falou, e olhou para os
lados, como se fosse algum tipo de segredo. Com toda certeza, já havia
espalhado para todos que frequentavam a boate.

Bufei, não conseguindo absorver tal informação. Diana era a


minha, ao menos, senti que era, no momento em que nos beijamos em seu
apartamento. Senti firmeza ao me dizer que nunca pertencera a Paul, o qual
acreditei ser seu namorado. Aquela história me atormentava, e precisava

entender como todos conviviam com o fato de que Paul e Patrice estavam
juntos. O que me remetia a ele ser um canalha, tal como Robert.

— Merda! — reclamei alto, e peguei a cerveja, bebendo um longo


gole.

Não poderia julgar ninguém, muito menos um homem que acabara


de conhecer. Ainda assim, tudo parecia se voltar para o fato de que aquele
homem fora namorado da mulher que sempre desejei, e naquele instante,
estava envolvido com minha irmã. Como de repente, poderia confiar

naquele sujeito? Não existiam motivos plausíveis.

Entretanto, por Diana, aceitei o convite para a noite. Porque queria


estar perto dela, e ainda mais, poder lhe explicar o porquê passamos dias
afastados. Eu queria, mais do que tudo, acordar ao seu lado após fazermos
amor, porém, se tornara impossível ficar no apartamento. Não saberia
como lhe contar e muito menos fingir que estava tudo bem quando acordei
com aquela ligação.
Além de tudo, precisávamos colocar todos os pingos nos “is”. O
que não fora feito naquela noite, já que simplesmente, resolvemos apenas

ficar juntos. Como se o mundo lá fora não existisse. Porém, ele existe.
Assim como, acabei longe dela, horas depois de sentir meu coração quase
explodir no peito sob seu mais simples toque.

Bebi o resto da cerveja, e encarei a pista de dança, voltando o olhar

para a mulher que tinha meu coração em mãos. Porém, ela merecia mais,
tinha a certeza daquilo. Saber que ela simplesmente viajaria, e mais, que
aquele era o motivo do jantar, fez-me ver que não significava grande coisa
para ela. Talvez ficar com o garoto mais novo fosse uma aventura. Além
de tudo, não sabia como me chutar de sua vida e resolver ser cordial.
Talvez fosse apenas um reencontro casual, e ela não esperasse nada
demais.

Eu esperava mais. Sempre esperei.

— Acha mesmo que podemos ficar para sempre aqui? — perguntou


com um sorriso sapeca no rosto. Fiz o mesmo, passando a mão por suas
costas, como se pudesse marcá-la com meu toque. Queria fazê-la lembrar
para sempre daquele momento.

Era jovem, tinha que admitir. Porém, minha vida sexual começou
aos quinze anos. Por ter o estilo de astro de rock, a maioria das garotas
apreciavam. Porém, mesmo depois de estar com tantas, nada se
comparava com simplesmente estar ao lado da mulher sob meu corpo.

Diana tinha algo que me encantava, me deixava alucinado. Não era só

sexo, e começava a entender.

— Acho que posso cantar para você, o que me diz? — indaguei, e


ela me encarou, assentindo.

Levantei-me da cama, e fui até o violão deixado ao lado de uma

poltrona. Vestia apenas uma cueca, e Diana, não estava tão diferente,
apenas de calcinha. Era uma intimidade inusitada, já que nos
conhecíamos há poucos dias.. Sentei-me a beira da cama, e me ajeitei.
Diana puxou o lençol branco sobre seu corpo, e apenas me olhou,
passando as mãos pelos cabelos.

— Não sei se entende bem a língua, mas aprendi desde muito novo
o português brasileiro. Além de tudo, as músicas brasileiras. — comentei,
sem saber como lhe contar a respeito de parte de minha família que era de

lá. Talvez, fosse demais, abrir-me de tal forma. — Essa música se chama
“Para você guardei o amor”. — falei e ela assentiu.

Comecei a cantar, e de repente, notei quantas verdades aquela


música trazia à tona. Talvez já fosse tarde demais para esquecer a mulher
que deveria ser apenas mais uma em minha cama.

— Tudo bem, cara?


Pisquei algumas vezes e saí de minhas divagações. Encarei um
homem alto e bem vestido a minha frente, que parecia ser algum tipo de

empresário ou até mesmo advogado.

— Sim. — respondi por simples e pura educação, voltando meu


olhar para Diana, que ainda dançava completamente animada.

Olhá-la era como me perder, e temia a forma como me perdia de

mim mesmo. Poderia ter sido apenas um sonho juvenil, uma mulher mais
velha interessada e duas semanas de puro sexo. Mas não fora, não com ela.

Saí do bar e fui em direção a pista de dança, parando a sua frente, e


a puxei com delicadeza pela cintura. Diana não me olhou e simplesmente
parou de dançar. Tal movimento fizera meu coração falhar uma batida. O
que estava acontecendo? Não teria como fingir, ela estava diferente desde
o momento em que abriu a porta do apartamento mais cedo.

— O que está acontecendo, baby? — perguntei em seu ouvido, e

suas mãos pararam a frente de meu peito, como se para me afastar.

— Agora se lembrou de mim? — indagou. — Ou melhor, de que


me chamava desse jeito? — indagou e a encarei, completamente perplexo.

Precisávamos conversar, tornara-se algo urgente, mas naquela noite


poderia se tornar algo desastroso. Diana parecia um pouco fora de si,
talvez pela bebida ou até mesmo, por estar a sua frente.
— Preciso de outra bebida. — falou, e se afastou bruscamente, indo
em direção ao bar.

Encarei-a de longe e iria até ela, para tentar evitar que tudo
terminasse daquela forma tão sem explicação. Dei passos para perto e
paralisei, ao ver a cena se desenrolar a minha frente. O homem de terno
que antes me chamava, a abraçava, e ambos pareciam se conhecer. Ela o

olhava de forma encantada, e notei que não repeliu seu toque. O que ficara
claro, o problema era eu.

Mesmo assim, precisava falar com ela e entender o que de fato


acontecia. Forcei meu corpo a se mover e ir em sua direção, porém, senti o
celular vibrar em meu bolso traseiro. Paralisei, e o peguei. Apenas duas
pessoas tinham meu número novo, o qual comprei assim que cheguei a
Nova Iorque naquele dia. Atendi-o rapidamente e corri em direção aos
banheiros, que deveriam ser um lugar menos barulhento.

— Oi, pai. — falei rapidamente, e ouvi um suspiro do outro lado da


linha. — O que houve?

— Calma, filho. Apenas se acalma, ok? — pediu e fiquei em


silêncio, respirando várias vezes. — Bailey está bem, já até tentou fazer o
próprio café da manhã. — sorri, um pouco aliviado. Ter minha irmã
mandando em tudo a sua volta era um clássico, e tão a cara dela, que
parecia que as coisas estavam bem, mesmo não estando. — É sobre o
emprego, filho.

— Pai, eu não posso...

— Eu sei que as coisas estão difíceis, filho. — fiquei calado, não


teria como mentir para meu velho. — Mas saiba que estamos aqui e
conseguimos uma entrevista na escola de música que você frequentou
quando mais novo.

— Pai...

— Nunca aceitou nada por conta de seu sobrenome, nem mesmo o


usa, filho. Permita apenas uma vez, seus velhos fazerem algo.

— Obrigado. — falei, sem saber como realmente agradecer. — Eu


te amo, pai.

— Eu também, filho. Agora me diga, Patrice desconfia de algo?

— Ela não faz ideia, não nos falamos muito e acho que Bailey me
mataria se contasse. — confidenciei. — É uma escolha de Bailey, não

posso...

— Eu sei, mas não gosto de esconder nada da nossa estrela e...


Bom, vou te mandar tudo o que precisa para vir para entrevista. Será
amanhã e já te enviei a passagem de vinda para cá no e-mail. O voo será
bem cedo. Tudo bem? — perguntou, e pensei nos prós e contras.

Com toda certeza precisava de mais tempo na cidade para poder ter
uma conversa franca com Diana, porém, a vida parecia querer me levar

para longe naquele momento, e não podia de forma alguma recusar. Era

necessário, ainda mais, ao me ver tão perdido diante da realidade.

— Tudo bem. Obrigado, pai.

— De nada, filho. Até amanhã! —despediu-se e logo desfez a


ligação.

Coloquei o celular no bolso e tentei pensar em como me preparar


para simplesmente voltar para outro país, sentindo que Diana e eu nos
encontrávamos em um fio delicado. Meu celular tocou mais uma vez e
atendi prontamente ao ver o número de Bailey na tela.

O tempo passou voando enquanto falava com Bailey e não podia,


mesmo que quisesse, fugir daquela conversa. Ela precisava de mim, ainda
mais, naquele momento. Assim, minutos depois, voltei para onde vi Diana
pela última vez, e me assustei, ao finalmente, avistá-la, e vê-la dançar junto
com o homem de terno. Não era um cara ciumento, nunca fiz tal tipo.
Porém, vê-la à vontade com outro e me repelindo, acertou-me como um

soco na cara.

Notei uma mulher de cabelo curto e preto parar a frente dos dois e
afastá-la do homem. Dei passos rápidos para perto e parei ao lado de
Diana, que parecia completamente bêbada. Olhei ao redor e busquei os
amigos que deveriam estar com ela, mas não encontrei ninguém. Eles a

deixaram com ele, portanto, deveriam confiar que estava bem cuidada.

— Paul me pediu pra cuidar dela. Não se meta, Ruby! — o homem


bradou para a mulher à frente de Diana, que sequer pareceu se atingir.

— Ela está bêbada, completamente. E em vez de levá-la para casa


como combinou, está aqui dançando. Olhe só para merda que está fazendo,
Spencer! — ela revidou. — Ser apaixonado por ela não lhe dá o direito de
ficar ao redor dessa forma.

— Eu jamais abusaria de uma mulher, Ruby. — ele pareceu

completamente transtornado com o que a tal Ruby falou.

— Um abusador diria isso. — retrucou e por fim notou minha


presença, já que segurava a cintura de Diana. — Você é? — perguntou e a
encarei um pouco perplexo com a atitude. Poucas pessoas se importavam
realmente com o bem-estar das outras.

— Sou Troian Messina. — falei, e ela franziu o cenho. — Conheço


Diana há anos, e estava no jantar que fez para os amigos. Pode ligar para

algum deles e confirmar. Eu a levarei para o apartamento.

— Não, eu prefiro falar com ela. — Ruby se pronunciou e parou a


frente de Diana, que mesmo bêbada tinha sua completa atenção. — Diana,
quem é ele? — perguntou e me mostrou.

— Meu garoto. — falou e sorriu de lado, segurando-se contra meu

corpo. — Me leva para casa, T? — pediu e me olhou profundamente. Ela


não parecia nada bem.

— Ela parece te conhecer...

— Você me afasta dela e agora vai deixar que um estranho a leve


para casa? — o tal Spencer indagou e resolvi agir, aquela conversa poderia
durar horas, e não tínhamos como ficar ali, com Diana quase desabando de
bêbada.

— Ruby, certo? — perguntei e a morena assentiu. — Vou levá-la

de táxi, e pode nos acompanhar para ter certeza. — olhei para o homem,
que parecia completamente incrédulo. — Você também pode ir. Diana
ficará sã e salva em sua cama, e ficarei com ela. Sou o garoto dela, como
ela disse. — falei, como se tirasse um peso das costas ao pronunciar tais
palavras.

Eu era dela, tanto quanto ela era minha. Apenas precisávamos ter o
nosso momento. Um momento não aplacado pela saudade, muito menos

pelos contratempos. Um momento para podermos ser honestos acerca de

tudo. Principalmente, um com o outro.


Capítulo 10

“And faith is pulling you miles away

And out of a reach from me

But you're here in my heart

So who can stop me if I decide

That you're my destiny?”[70]

Minha cabeça ia explodir!

Levei as mãos a ela, e finalmente, tentei abrir os olhos. A luz que


invadia o quarto, já entregava que era dia, ao menos, acreditava ser de
manhã. Sentei-me, ainda com as mãos na cabeça, e sentindo meu corpo
duplamente pesado.

Levantei-me um pouco desorientada, e me segurando contra a


parede, cheguei ao banheiro do quarto. Parei em frente a pia, e abri a
torneira. Nunca pensei que teria tal coisa, mas jogar água gelada no rosto
naquele momento, trouxera uma ótima sensação. Depois de conseguir abrir

os olhos por completo e ver com clareza meu reflexo, fechei a torneira, e

peguei a toalha pendurada ao lado do espelho.

Encarei-me por alguns segundos e só então a realidade me bateu.


Estava com uma camisola branca e sequer me lembrava de tê-la colocado.

Flashes da noite me atingiram, porém, nada com tanta clareza. Não até o
momento em que simplesmente considerei que T gostava realmente de
Patrice.

— Merda! — reclamei e segurei com as duas mãos no balcão.

Sentia algo errado em mim, ainda mais por me embebedar daquela


maneira. Anos que não ficava tão bêbada, a ponto de simplesmente não
conseguir me lembrar da forma que cheguei em casa, e pior, quem me
trouxera. Lembrei-me de Spencer, e em minha mente, tinha a certeza que

dançamos em algum momento. Teria sido ele?

Andei de volta para o quarto e resolvi olhar pelo o apartamento.


Talvez a pessoa que me trouxe ainda estivesse por ali, ainda mais, se fosse
realmente Spencer. Chequei todos os cômodos, e por fim, encontrei-me
novamente no quarto. Se a pessoa estivesse ali, só poderia estar escondida,
o que não faria sentido algum
Bufei, e foquei do lado direito da cama, onde os lençóis estavam
bagunçados e com toda certeza alguém dormira no travesseiro. Aproximei-

me e olhei com atenção. Poderia ter sido eu, mexendo durante a noite,
porém, não era uma característica que me pertencia. Sentei-me e passei as
mãos sobre o travesseiro, como se tentando entender na bagunça que me
metera.

Assim que virei o olhar, uma folha branca, debaixo de meu kindle,
deixou-me intrigada. Não era uma pessoa bagunceira, na realidade, bem
longe daquilo. Peguei com cuidado a folha e a desdobrei, para me deparar
com uma letra claramente masculina, e que me fez paralisar.

Baby,

Eu nunca me imaginei tendo que escrever algo, não assim. Porém,


ao ver o seu estado ontem e a forma como me tratou, senti-me na

obrigação de me explicar. Não sei ao certo o que se passa em sua cabeça,


acho que nunca terei tão poder. Todavia, eu sempre li muito bem os
sentimentos em seu olhar, ao menos, acreditei tê-lo feito.

Quando me deixou há cinco anos, imaginei que nunca mais teria


volta. Na realidade, tentei me convencer que não passara de um caso de
paixão avassaladora. Foi assim e por isso, que me joguei ainda mais na
música. Foi a forma que encontrei de poder pensar em você sem
simplesmente pirar e me odiar por não ter conseguido te impedir de ir.

Mas era preciso. Você entendeu muito melhor que eu, naquela época.

Éramos mundos diferentes que colidiram. Colisões causam danos,


e no meu caso, foi e é permanente. Porque ainda sinto que somos de
mundos diferentes, mas não acredito que isso seja algo ruim. Não mais.

Não capaz de nos separar. Te ver novamente foi como voltar para casa.
Foi como olhar para o lar que nunca considerei ter. Eu tinha vinte anos e
me declarei. Hoje, tenho vinte e cinco e não posso mentir sobre o que
sinto.

Ainda mexe comigo, baby. Mexe além do que posso dizer e sinto
muito se não souber demonstrar. Minha vida anda uma bagunça. Ao
mesmo tempo que reencontrei uma de minhas razões – você – algo
aconteceu, e o mundo se tornou um lugar ainda mais escuro. Sinto não ter

estado ao seu lado quando acordou após fazermos amor. Era tudo o que
queria, mas não tive escolha.

Não quero lhe contar nada por meio dessa simples carta. Podemos
denominar assim? Então, eu só peço que me espere. Não para sempre, só
por um momento. Tive que fazer uma viagem para o Canadá, estive por lá
esse tempo todo, e claro, voltei para Nova Iorque em alguns momentos. Os
problemas, infelizmente, não seguem barreiras nacionais.
Me perdoe se lhe deixei pensar que não sinto nada. Baby, eu sinto
tudo. Tudo o que for possível um homem sentir por uma mulher. E além

disso. Voltarei para você, em breve. É uma promessa.

Com amor, T

Obs: Meu novo número está no verso. Pensei em te ligar ou


mandar uma mensagem, mas prefiro ser um romântico para minha
mulher.

Levei a carta ao peito e deixei com que as lágrimas descessem.


Minha ansiedade e inseguranças não me permitiram ver. Não daquela vez.
Não com ele. Troian não demonstrou querer estar longe, desde o princípio
imaginei que existisse algum motivo para ter se afastado. E o que fiz? Bebi

loucamente e deixei chegar a um estado que não me orgulhava.

Dobrei a carta e coloquei no mesmo lugar, enquanto ponderava o


que fazer. Faltava apenas decidir qual seria a imagem dentre os estagiários
para a campanha, e mais nada. O que poderia fazer tranquilamente fora da
empresa. Ainda me restava uma semana em Nova Iorque, antes da viagem.
O que poderia acontecer se simplesmente aparecesse atrás de Troian?
Uma ideia me veio e coloquei minha mente para funcionar. Troian
sempre se apresentava com o sobrenome Messina, mas desde que vi sua

carteira de motorista há alguns anos, sabia que tinha outro sobrenome –


Michaels. Nem ele nem Patrice usavam tal sobrenome, e tinha um chute
quase certeiro sobre o motivo.

Fui até o notebook sobre a poltrona do lado da janela, e o peguei,

sentando-me em seguida. Coloquei o sobrenome no google, associado a


empresas. Não me surpreendi por completo ao localizar com facilidade
uma das empresas de tecnologia mais conhecidas e aclamadas da América
na última década – Conference.

Assim que a pesquisa deu resultados, algumas imagens de Troian


ainda criança apareceram, ao lado dos pais. Quanto mais pesquisava, mais
descobria a respeito do desinteresse claro dele por trabalhar no ramo. Não

existiam fotos dele mais velho, nem mesmo adolescente com os pais à
frente da empresa. Talvez aquilo justificasse o porquê não encontrei nada
sobre ele no passado, nem mesmo procurando com os dois sobrenomes.
Era uma pesquisa mais refinada, a qual, não me propus a fazer na época.
Nem mesmo, adiantaria.

Parei, ao ampliar a foto em que ele aparecia sorrindo, ainda tão


pequeno ao lado de toda a família. Patrice aparecia na mesma foto, e era

claro, que eles na realidade, pareciam como irmãos. Algo mudara? Era a

pergunta que ainda, infelizmente, se passava por minha mente.

Pesquisei mais um pouco até encontrar a sede principal da


Conference, em Ottawa no Canadá. Tentei ir mais a fundo, e quem sabe,
descobrir o endereço da família Michaels, porém, não fora possível. Talvez

como Dominic Russel, eles prezassem pela segurança de forma impecável,


devido a império que construíram.

Pensei e repensei mais uma vez, como boa ariana. Olhei, dali da
poltrona, em direção a carta que Troian deixara, com vários
questionamentos em mente. Poderia simplesmente ligar e lhe perguntar o
que acontecia, ou até mesmo, pedir seu endereço. Entretanto, algo em
minha mente, insistia para que aquele momento fosse especial. Algo que
merecesse ser lembrado no futuro. Uma boa ariana com ascendente em

touro. Sequer sabia o que aconteceria, mas tinha certeza que não iria ser de
qualquer forma.

Decidi-me, minutos depois, depois de entender que de nada


adiantava encher minha mente sem resposta alguma. Liguei para minha
assistente e pedi para passar os desenhos por e-mail. Assim como, comprei
a primeira passagem para Ottawa. Ninguém saberia, não naquele
momento.
Buscava certezas, e esperava encontrá-las, em algumas horas, ao
finalmente descobrir onde T tinha se metido. Mesmo sem ser convidada,

sentia-me a vontade de ir. A vontade de buscar o homem que mesmo


depois de tanto tempo, ainda tinha meu coração em mãos.

Felizmente não era inverno, e assim que pisei na calçada que


parecia tomada por vidros da Conference, senti-me um pouco
familiarizada. Parecia e muito com a Russel, e aquilo não seria tão difícil.
Ao menos, esperava que não. Adentrei pela grande porta de vidro e assim
que olhei ao redor, busquei a recepção. Puxando uma mala de mão na cor

rosa pink, nada parecia chamar menos atenção dos vários executivos de
ternos caros e chiques que passavam ao meu lado.

Optei por um vestido longo na cor rosa claro e uma jaqueta de


couro por cima, e nos pés tênis um pouco mais altos que o normal, na cor
branca. Nada tão casual quanto o meu cabelo solto e selvagem contra o
vento. Sentia-me confortável e aquilo que realmente importava. Era pouco
mais de uma hora de voo, no entanto, odiava viajar desconfortável. E não
iria usar terno para tentar descobrir o endereço dos donos da empresa,

talvez, tivesse sido uma ótima ideia.

Outras perguntas se passavam por minha mente, enquanto


caminhava até o grande balcão da recepção. E se T não morasse com os
pais? E se simplesmente não conseguisse encontra-lo? No fim das contas,

talvez, teria que ligar e dizer. “Ei, T! Estou no Canadá!” Pior seria, se ele
estivesse em outra cidade do país, já que não fora nem um pouco
específico sobre onde realmente estava. Entretanto, segui meu instinto. De
alguma forma, sentia estar no caminho certo.

Parei a frente do balcão e um rapaz sorriu em minha direção, o qual


olhei o nome no crachá e sua função. Ao menos, tudo corria bem até ali.
Também, como poderia errar? Tinha letras enormes na cor cinza sobre
aquele balcão.

— Boa tarde, eu estou... — pensei um pouco sobre o que dizer e


me calei. Como poderia perguntar tal coisa? Talvez, valesse a tática que
pensei durante o voo. — Tenho um horário marcado com Troian Michaels.
— falei de uma vez, e o recepcionista me encarou surpreso.

— Boa tarde, senhorita...

— Carter. — falei, sentindo-me uma completa idiota. Talvez não


estivesse agindo da forma mais inteligente.

— O senhor Michaels não tem horários marcados para hoje. —

falou com cuidado, o que foi como um balde de água fria. — Talvez esteja
confundindo com seu pai, o senhor Liam Michaels?

— É claro, deve ser isso. — falei sem graça. — Um minuto. —


pedi, e coloquei minha bolsa a frente.

Comecei a procurar meu celular que parecia ter se perdido no meio


da bagunça ou até mesmo nas divisórias. De repente, parecia que os
segundos duravam mais do que o normal, sentindo-me uma completa
perdida diante do recepcionista com sorriso no rosto. Finalmente, debaixo
de minha agenda, que nunca ficava sem, encontrei meu celular.

— Achei! — falei animada, o que fez o recepcionista sorrir


amplamente, como se também estivesse na torcida por mim.

— Diana?

Meu corpo travou e pisquei algumas vezes, antes de realmente me


virar. Lentamente, o fiz, e quando meus olhos recaíram no homem a minha
frente, sequer soube o que dizer. Troian Messina era o pecado completo
usando suas roupas de rockeiro selvagem, e sempre seria a forma mais
bonita dele, porém, ao vê-lo de terno, algo dentro de mim se remexeu. Ele
personificava o sonho de qualquer mulher.
— T. — falei, completamente incrédula. — Acho que estou
delirando. — conversei comigo mesma e continuei o encarando.

Ele então deu passos até mim, e me surpreendendo, enlaçou minha


cintura com tamanha intimidade, que meu coração se derreteu. Os cabelos
loiros compridos geralmente soltos e com vida, estavam presos num rabo
de cavalo, que por Deus, o deixara ainda mais sexy. Foco, Diana! Gritei

internamente, tentando me conter, mesmo que seu toque me deixasse


completamente perdida.

— O que faz aqui, baby? — perguntou e tocou meu rosto.

Olhei-o ainda sem acreditar e entendi que aquele olhar era meu,
apenas meu. Por mais que acreditei por algum momento que ele pudesse
olhar para outra daquela forma, não era real. Soube, no momento em que o
encarei profundamente. Ele era meu, uma certeza que se firmava em meu
peito, mesmo sem saber se ele queria me pertencer.

— Eu precisava de te ver. — falei, e sorri de lado, sem conseguir


me conter. — Acho que meu horário aconteceu de um jeito ou de outro. —
comentei, olhando em direção ao recepcionista que sorriu ao me encarar,
mas mudou completamente de semblante ao encarar T.

Notei que apenas eu parecia entender por completo suas


expressões. Ele não era de sorrisos à toa, e muito menos de distribui-los
por aí. Não era por mal, apena seu jeito. Para mim, apenas conseguia
enxergar paixão em seus olhos glaciais. Assim como, saber o quanto era

bem-vinda ali, mesmo sem ter sido convidada.

— Podemos ir a algum restaurante ou até minha casa, o que


prefere? — perguntou solícito, e pensei um pouco antes de responder.

Minha mala de mão era de rodinhas e não atrapalharia em nada

irmos até um local para comer. Além de tudo, estava morta de fome. Não
conseguira comer nada de manhã devido a ressaca.

— Acho que prefiro um restaurante. — falei e notei uma ponta de


decepção em seu olhar. — Não que não queira conhecer sua casa, garoto.
— encarou-me, mudando o semblante. — Estou com fome. A noite foi
agitada demais e pelo jeito você sabe mais do que eu sobre o que
aconteceu. — comentei e ele assentiu, sorrindo um pouco sem graça. —
Vamos?

Ele então circulou minha cintura e saímos daquela forma, lado a


lado da sede da empresa de sua família. Assim que o ar ameno tocou meu
rosto, senti-me ainda mais feliz por estar ao seu lado. O dia, a luz, as horas,
o mundo pareciam contribuir para que nos encontrássemos. Não poderia
dizer porque, mas de algum jeito, éramos jogados um para outro. Ao
menos, naquela época. No passado, sequer nos cruzamos e aquilo partira
meu coração, acreditando que não era para ser. Pelo jeito, era.
Ao olhar para meu lado, enquanto caminhávamos, e T parecia saber
para onde nos levar, entendi que não poderia ter feito escolha melhor.

Porque no final das contas não fizera escolha alguma. Ele apareceu e me
entregou seu amor, e só esperava, que tivesse a chance de ser a dona seu
coração mais uma vez. Daquela vez, para sempre
Capítulo 11

“Eu que tanto me perdi

Em sãs desilusões ideais de mim

Não me esqueci

De quem eu sou

E o quanto devo a você.”[71]

— Acho que preciso começar... — Diana falou, assim que nos


sentamos na mesa de um dos restaurantes favoritos de minha infância. Ele
era casual, como a maioria dos lugares que gostava de frequentar, e ficava
a poucas quadras da empresa.

Passei as mãos por meu cabelo, sentindo-me um tanto quanto


incomodado por estar vestido daquela forma sua frente. Nunca lhe
mostrara aquele lado, nem mesmo lhe contei sobre minha família. A
realidade era que nunca me relacionei diretamente com aquele mundo.
Apenas nos momentos extremamente necessários.

— Quando eu te conheci, nunca imaginei que passaríamos de uma


noite... — surpreendi-me com sua fala. Não esperava que começaria por
ali, nem mesmo que tocaria no passado tão rapidamente. Em minha mente,
falaríamos dos problemas do presente. O que tanto parecia nos afastar,

mesmo sem entender de fato o que era. — Mas eu me apaixonei, T. Me


apaixonei perdidamente por você. — sua voz embargou e engoli em seco,
completamente surpreso com sua honestidade.

Diana nunca dissera de fato o que sentia. Nem mesmo no momento


em que lhe confessei meu amor. No passado, fui colocado contra a parede
a respeito da banda e o que deveria escolher. Existia um código raramente
mencionado, sobre os caras terem que ser exclusivamente solteiros. Nunca
me preocupei com tal coisa, já que não me imaginava amarrado a alguém

tão cedo. Não aos vinte.

Então, ela apareceu. A mulher, que estava a minha frente,


claramente buscando as palavras corretas para usar. Ela me mostrou que a
vida acontecia nos pequenos momentos, que sequer esperávamos. Por ela,
escolhi entre a liberdade de uma vida na estrada, sem amarras, e a uma
paixão devastadora que vivemos. Talvez paixão nunca pudesse ter sido
usado como denominação para o que fato senti. Ainda sinto.
— Lembro bem, de como tudo foi intenso e como não queria que
acabasse... Mas tive que nos colocar em perspectiva. — encarou-me

intensamente, e notei seus olhos marejados. — Percebi que poderia ser um


atraso ou até mesmo uma pressão em sua vida. Tinha e sempre tive
objetivos claros, T. Você vivia intensamente o que sonhava, eu respirava a
minha carreira. Longe daquele quarto de hotel e nossos momentos, nunca

daríamos certo.

— Dia...

— Não naquela época. — surpreendi-me, mais uma vez. Como ela


conseguia dominar as palavras daquela forma? — Hoje, as coisas são
diferentes, ao menos, acredito que sim. Então, quando te vi de novo, não
imaginei que fosse querer se aproximar. Não depois de ter te deixado. Mas
você o fez, e mais, confiou em mim sem sequer saber sobre algo. Por isso,
quero te pedir desculpas.

— Por que? — indaguei, completamente perdido.

— Por ter enchido a cara e considerado viajar para outro país sem
colocarmos as cartas na mesa. Não dá pra fingir que esse reencontro
depois de tanto tempo não mexeu com a gente. Vi isso no seu rosto,
quando fugiu de mim naquele café. Porém, pessoalmente falando, ando em
um momento da vida onde sinto as coisas em maior intensidade.
— Você parece cansada psicologicamente, baby. — interrompi-a.
Era claro, ao notar o quanto ela parecia se segurar para não desabar a

minha frente. — Por isso me afastou no jantar e...

— Pensei que gostasse de outra. — encarei-a incrédulo. — Patrice,


para ser mais exata. — arregalei os olhos, sem conseguir considerar tal
coisa. Não em infinitas vidas. Diana riu, claramente sem graça e parecendo

entender o quão absurdo aquilo soava. — Por que dizer em voz alta, para
você, torna isso ainda mais sem noção?

— Ela é como minha irmã mais velha, Diana. — falei sem hesitar.
De forma, que nunca mais, Diana pensasse tal sandice. — Não sei se o
meu jeito protetor com Pat possa ter te feito desconfiar disso... — passei as
mãos pelo rosto, tentando lembrar da forma como Patrice parecia assustada
comigo. — Merda! Acho que até ela considerou isso... Não duvido muito
que seus amigos. — Diana assentiu, fazendo-me contorcer o rosto. Aquele

pensamento era completamente absurdo. — Eu só... Só queria deixar claro


para o tal Paul que Patrice tinha alguém ao lado, que ele não poderia
machucá-la.

Diana me encarou, como se analisasse minhas palavras. Ambos


parecíamos ter colocados em um tabuleiro de xadrez, entretanto, nenhum
buscava a vitória. Estávamos, ao mesmo tempo, em cheque.

— Acho que existe um mas para ter agido de tal forma, assim
como, por ter sumido por esses dias. — falou, e assenti, sabendo que me

explicaria. Não era algo imposto, porém, queria me explicar para com ela.

Para que entendesse que não saía de minha mente, de forma alguma. —
Mas antes de chegarmos em mais um dos tópicos... — sorriu baixinho, e
acabei fazendo o mesmo. — Quero que me desculpe por ter sido infantil.

— Baby, não precisa...

— Eu preciso. — rebateu rapidamente, e notei a fragilidade em seu


olhar, ao mesmo tempo, que parecia determinada em conseguir meu
perdão. — Preciso porque não sou esse tipo de pessoa, T. Não sou alguém
que simplesmente aceita algo sem ao menos conversar. Apenas precisei de
um pouco mais de tempo para perceber que não existia possibilidade de te
deixar sair da minha vida. Não dessa vez. Não por minha escolha.

Suspirei, diante da forma como cada palavra soara. Nosso


reencontro se tornara ainda mais emblemático do que antes. Era como se

estivéssemos lutando pela mesma coisa, sem ao menos ter a plena noção
do que o outro sentia. Se os sentimos fossem postos a mesa, tinha certeza,
não existiria chance de nos separarmos. Entretanto, ainda precisava lhe
falar o que acontecera, e mais, como minha vida andava. Diana merecia
mais do que poderia lhe oferecer, mas não a deixaria ir sem lutar. Não ao
vê-la lutando por mim, sem ao menos ser merecedor.

— Eu te desculpo, baby. — falei, e toquei sua mão com a minha.


Senti o calor de seu corpo que me trouxe um bem sem tamanho. Ela fora

feita na medida certa para mim. — Não que ache isso necessário.

— T! — reclamou e apenas sorri de lado, com nossas mãos


conectadas sobre o tampo da mesa.

— Bom, por onde posso devo começar? — suspirei


profundamente. — Quando passamos a noite juntos, recebi uma ligação,

pouco antes de amanhecer. Era meu pai, e... Ele apenas me pediu para ir
para casa. Que ele precisava de mim. — falei, e tentei ser o mais claro
possível. — Ele nunca o faz. Ele nunca pede ajuda. Por isso, eu
simplesmente saí do apartamento e não lhe disse um simples tchau. Sabia
que algo muito ruim tinha acontecido. No caminho do elevador até pegar
um táxi para o aeroporto, soube que minha irmã estava no hospital. —
Diana me encarou perplexa, e aumentou o aperto de sua mão. — Ele não
quis ser claro sobre o que aconteceu e quase pirei, imaginando que poderia

não chegar a tempo ao hospital. Finalmente, cheguei e foi uma das poucas
vezes na vida, que vi meus pais chorando. Os dois estavam abraçados, em
claro desespero. Mal conseguiam explicar o que aconteceu. O médico
apareceu, e felizmente, disse como minha irmã estava. Ela... estava
inconsciente. — engoli em seco, não conseguindo falar sem reviver o
momento em minha mente. — Bailey foi espancada pelo namorado. —
Diana arregalou os olhos, como se não conseguisse acreditar. Nem eu
conseguia. — Meus pais a encontraram desacordada em seu apartamento
na cidade. Robert quase a espancou até a morte. Só não o fez, porque...

Porque a pessoa que cuida da limpeza do apê apareceu.

— Meu Deus!

— Naquele momento, soube porque meu pai não queria me contar.


Não pelo telefone. Mas isso não adiantou, porque eu conhecia Robert, ele

estudou comigo e frequentava nossa casa desde quando éramos crianças.


Ele era meu amigo, baby. — falei, sentindo a culpa me atingir. Tudo que
se passara por minha mente, era que se não tivesse o deixado se aproximar,
Bailey não teria o conhecido. — Assim que soube que o quadro de Bailey
era estável, fui atrás de Robert. Não foi muito difícil encontrá-lo, e quando
o fiz, sabia que não ia parar até o ver caído no chão sem respirar. —
assumi, sentindo-me um pouco mais leve ao falar sobre. — Mas ele sabia
que eu iria, e além de tudo, tem uma família tão influente quanto a nossa....

Não consegui acertar as contas, não até agora. Isso me consome a dias,
Diana. Ver minha irmã se recuperar aos poucos e ao mesmo tempo, não
poder quebrar a cara daquele desgraçado.

— A polícia? — Diana perguntou e tentei não estourar diante


daquilo.

— Ele fugiu e até agora, mesmo depois da denúncia de Bailey, não


o encontraram...
— Eu... Eu sinto muito, T. Eu nem consigo imaginar como é isso.
— Diana falou baixo, como se em uma de tentativa de me acalmar. Sua

sinceridade era nítida, porém, meu ódio por Robert também deveria estar
transparecendo.

— Bailey melhorou e já está em casa. — contei-lhe, e Diana soltou


uma respiração profunda, como de alívio. — Passei os dias com ela, e

tentando seguir à risca o que me pediu. Ela não quis que Patrice soubesse
de algo. Ela sabe que Pat largaria tudo para vir pra cá, mas praticamente
implorou para ninguém contar. As duas tiveram alguns desentendimentos,
que sequer entendi ao certo, mas... Enfim, respeitei o pedido de Bailey. Por
isso, Pat não pegou o primeiro voo para o Canadá como eu.

— Eu... Sabia que algo tinha acontecido quando acordei sem você
ao meu lado, mas nunca imaginei que... Eu sinto muito mesmo, T. —
falou, e notei lágrimas descendo por seu rosto. — Não sei o que pensar a

respeito do que sua irmã passou. Isso me causa...

— Frustração e desespero. — complementei, e Diana assentiu.

— Por isso viajou às pressas para cá de novo? Bailey...

— Não, nada com ela. Ela está na casa dos meus pais, e pelo que vi
hoje, as marcas finalmente começaram a sumir. Bailey tenta fingir que está
tudo bem, nos convencer disso, mas é claro que não está. — respirei fundo,
tentando não pensar tanto a respeito. Não ali. — Desta vez, voltei porque
no meio de toda essa turbulência, fui demitido. — Diana não conseguiu

disfarçar a surpresa em seu olhar. Sorri completamente sem graça,


tentando aliviar o clima. — Vim para uma entrevista de emprego mais
cedo, e agora, meu pai pediu para que acompanhasse uma reunião. Ele não
consegue ficar longe de Bailey. Assim, teve que contar com o filho que

mal entende sobre ações.

— T... Por que parece se desmerecer tanto? — indagou, e suspirei.


Ninguém nunca pareceu notar aquele meu lado. — Você contou sobre sua
irmã de uma forma muito clara, como se desabafasse sobre. Sinto-me
muito grata pela confiança. Mas ao falar sobre a demissão, parece querer
fugir do assunto.

— Eu vi como sua vida é, baby. Vi os lugares que frequenta, seu


apartamento, o que seus amigos têm e o padrão de vida que se enquadra.

Agora parece saber muito bem de onde venho e quem é minha família.
Nunca usei o sobrenome Michaels pelas portas que se abrem apenas por
dizê-lo. Eu não te contei sobre, mas me formei na Julliard e assim, depois
de trabalhar em dezenas de lugares, me encontrei como professor. Eu amo
o que faço, amo música... Hoje, fiz uma entrevista de emprego, e estou
esperando retorno. Tenho um bom dinheiro no banco, mas nada
comparado com o que deve ter, baby. Eu sei que nunca...
— O que está tentando dizer ou me convencer? — indagou, e notei
a determinação em seu olhar. — Que me importo com o quanto ganha, ou

que vamos comparar nossos salários? Olha bem pra mim, T. Diz que em
algum momento realmente acreditou que me importo se trabalha como
executivo ou como professor?

— Dia, eu não quero te decepcionar.

— Acredite, quando digo, que nunca o fez. — rebateu, e um sorriso


lindo emoldurou seu rosto. — Mas acho que além de tudo, parecemos a
claras sobre você. O que me falta contar a respeito de Paul. — falou
cuidadosamente, claramente não querendo permanecer no assunto sobre
meu trabalho. Ela parecia realmente não se importar com o fato de mesmo
tendo um sobrenome importante, não o usar para ter uma vida melhor. —
Mas antes... Eu te admiro, T. Admiro a coragem que sempre pareceu ter
para enfrentar o mundo. Nunca cairia na estrada, minha metódica não

deixaria. Você escolheu viver do seu jeito, seguindo sua vontade... A


maioria das pessoas não o faz. Eu vi isso em amigos próximos, na
realidade, em meus melhores amigos. Às vezes, optar por ser quem
realmente é, se torna muito mais difícil do que parece. Te admiro pelo que
foi no passado e ainda é para mim. Não me importo se vai a reuniões, lava
pratos, faz cirurgias, canta numa banda... O que sempre me importou foi
você. Tive a sorte de me olhar naquela noite e me entregar seu coração.
— Dia...

— Calma, eu preciso falar. — olhou-me, como se pedindo

permissão. Assenti, dando-lhe toda minha atenção. — Não sou boa nisso,
acho que não lembro a última vez que desabafei com alguém, mas... Com
você, sempre pareceu simples. Você me descomplica ao simplesmente me
olhar, T. Nunca acreditei em amor à primeira vista, mas depois de cinco

anos, e ainda sentir essa sintonia com você... meu coração a ponto de sair
pela boca. Acredite, passei a crer em conto de fadas. Por isso, quero
começar o meu. — fiquei pasmo, tentando digerir suas palavras. — Paul,
Klaus e eu sempre fomos melhores amigos, e sempre faço o que posso por
quem amo. Por isso, Paul e eu fingimos um namoro... — foi a minha vez
de arregalar os olhos. — Existia um contrato sobre a união Russel-
Harper...

— Lia? — indaguei, começando a me situar.

— Ela e Paul deviam se casar... Desde jovens sabem disso. —


comentou e me encarou claramente odiando o assunto. Não me
surpreendera muito tal fato. Meus pais contavam várias histórias sobre
fusões de empresas através de casamentos. — Paul e eu notamos uma
diferença drástica em Klaus quando a data de anúncio do noivado se
aproximava. Sempre desconfiamos que ele gostasse de Lia, e esse foi o
ponto chave para assumirmos um namoro. Klaus tem seus motivos para ser
assim, mas ele raramente age pelo que quer. Então, basicamente, estando

namorando, ele assumiu o lugar de Paul.

— Lia aceitou isso sem discordar ou...

— Ela e Klaus praticamente não se olhavam, ao menos, por conta


de algo no passado. No fim, acho que fizeram como nós, colocaram as
cartas na mesa e... Ela o pediu em casamento por amor. — contou e

suspirou, como se aprovasse o desfecho daquele casal. — Eles são


perfeitos um para o outro.

— Você é linda! — declarei e Diana sorriu, claramente não


esperando meu elogio. — Como pode ser tão perfeita? — indaguei.

— Acredite, estou longe disso... mas sei que estamos no caminho


certo, T. Cartas na mesa e admiração mútua. O que pode dar errado entre
nós? — perguntou, e não pude evitar sorrir. Tudo parecia, finalmente se
descomplicar. — Eu te quero, T. Uma chance para vivermos o que tanto

quisemos no passado.

— Baby, eu nos dou até um milhão delas. — peguei sua mão e


levei até minha boca, depositando um leve beijo. — Eu nunca quis nada
além disso... Apenas me aceite como seu.

— Eu já sou sua. — falou e sorri, querendo que aquela mesa não


estivesse entre nós. Para poder beijá-la da forma que necessitava.
— Gostariam de pedir?

A voz do garçom nos chamou para a realidade, e só então me

lembrei que os minutos passaram e ainda estávamos na água que


trouxeram. Diana sorriu, e não respondeu rapidamente, encarou-me de
forma sedutora, como se deixasse claro o que realmente queria. Se ela
soubesse... Meu único pedido era ter aquela mulher incrível como minha.

Naquela noite, na próxima e em todas as demais. Nunca teria o


suficiente dela, tinha certeza. Porque apenas por olhá-la, o mundo se
tornava um lugar mais iluminado. Diana trouxera luz para minha vida.
Aceitava-me como era. Nada nem ninguém se comparava. Ela era única.
Ao menos, para mim. Torcia que apenas aquilo importante, e significasse o
mesmo para ela.
Capítulo 12

“Sometimes I wake up late and don't even brush my teeth

Just wanna stuff my face with leftover mac and cheese

You know I get depressed, are you impressed with my honesty?

Still I wear what I wanna, 'cause I'm cool with what's underneath.”[72]

— Eu vou ficar bem. — falei mais uma vez para minha mãe, que

parecia um tanto desconfiada. — O que foi? — perguntei, e me afastei de


seu abraço.

— Sinto que não parece tão certo sobre seu destino. — comentou, e
suspirei, sem conseguir disfarçar. — Ah meu Deus! Existe um cara. Por
favor, me diz que não é armação dessa vez!

— Mãe! — reclamei sorrindo, e ela apenas continuou me


encarando, como se fosse aconselhar sua filha de dezesseis anos sobre o
príncipe encantado. — Eu o deixei ontem, quer dizer, combinamos que
seria bom passar um tempo longe, curtir a viagem no Brasil e...

— Diana, minha princesa, você sabe muito bem o que sempre lhe
ensinei. Ninguém amo o outro, caso não ame a si. — tocou em meu peito,
sobre meu coração. — Você sempre foi forte, independente e se ama. Sou
muito orgulhosa por isso. Mas vejo que em outras áreas da sua vida... —

suspirou, como se pensando em como abordar o assunto. — Podemos ser


felizes sozinhos, essa não é a questão. Entretanto, você pode escolher estar
com alguém. Alguém que some.

— De que livro veio toda essa inspiração e psicologia barata? —


indaguei, provocando-a. Mesmo tendo noção completa de que ela tinha
toda a razão. Mamãe me conhecia muito bem. Poderia julgar, que melhor
que mim mesma. — Eu sei que está certa, mas... T e eu somos um caso
diferente. Acredita em amor à primeira vista, mãe?

— Acredito em raiva, para ser sincera. — falou e sorriu


amplamente, como se lembrasse de algo. — Seu pai foi raiva no mesmo
instante, mas eu nunca soube denominar corretamente. Por que ele me
incomodava tanto? — ela claramente tinha a resposta. — Só percebi o que
realmente era quando nos beijamos. Talvez tenha mais sorte, por já
perceber que se apaixonou ao vê-lo.

— Sorte? — indaguei.
— Filha, acha mesmo que todo mundo consegue amar e ser
amado? — lembrei-me de Spencer no mesmo instante. — Eu acredito que

existe muito além de um olhar, toque ou beijo... Porém, o coração sabe o


que quer, quando vê aquilo que realmente deseja. Se esse tal T vale a pena,
por que passar tanto tempo longe dele? — perguntou e a encarei um pouco
sem graça, lembrando-me da conversa que tivemos.

— Poderia ficar aqui para sempre. — falei, sentada a sua frente,


na banheira de seu apartamento.

— Então fique. — pediu, e deitei a cabeça em seu ombro.

Suas mãos estavam sobre meus seios, e não podia evitar aprová-lo
por ser feito na medida certa. T não conseguia manter suas mãos
afastadas de mim, assim como eu não conseguia me afastar de seu toque.
Mesmo depois de nos amarmos, não parecia o suficiente. Talvez porque
fosse ele. Talvez ele fosse o cara que minha mãe sempre jurou que

conheceria e faria minhas muralhas cederem. Se ela ao menos soubesse...

— Sabe que posso ficar mal-acostumada. — provoquei, e senti seu


sorriso em minha pele, em seguida, uma mordida no ombro.

Nunca fora uma mulher religiosa, mas se o paraíso existisse,


imaginava-o naqueles mínimos detalhes. Troian a minhas costas, seu
toque em meu corpo, a água quente embalando nossos corpos e uma
música que parecia transbordar os sentimentos. Nada além.

— Então fique. — pediu novamente e minha mente rodou. Abri os

olhos e encarei os seus. T me olhava com carinho, ao mesmo tempo,


notava que queria dizer muito além através daquelas duas palavras.

Ele não sabia, mas mesmo depois de nos decidirmos que seria bom
um tempo separados, para entendermos como funcionaria nossas vidas

dali por diante, ainda me encontrava em um mar de indecisões. Ele não


me forçaria a algo, muito menos a ficar. Talvez, o medo maior, fosse não
nos vermos mais, de forma definitiva. Eu o deixara uma vez, por que não o
faria novamente? Entendia por completo sua insegurança.

— Eu quero ficar, T. — suspirei, beijando seu pescoço. — Queria


que fosse mais simples.

— Eu também, baby.

Nossos lábios se chocaram, e naquele beijo lento e sensual, soube

que não poderia escolher estar longe, mesmo que fosse o correto para
minha alma naquele momento. De alguma forma, que não sabia explicar,
meus medos e insegurança pareciam voar para longe. Bastava seu toque.
Por isso, eles se tornavam ainda maiores ao pensar sobre. Por apenas
pensar que alguém pudesse ser o dono de minha sanidade mental. Não
poderia. Eu deveria ter controle.
— Lembra da crise de pânico que tive, há cerca de dois anos? —
indaguei e minha mãe assentiu, claramente sem saber onde queria chegar.

— Comecei a ter crises de ansiedade nos últimos meses, mãe. E temi que
chegasse ao pânico. Por isso, estendi o tempo da viagem. Para colocar
minha cabeça no lugar.

— Por que não pode colocar sua cabeça no lugar ao lado do

homem que claramente quer? — perguntou e suspirei profundamente.

— Porque não quero depender de alguém emocionalmente. —


confessei. — Temo me tornar alguém que deposita sua felicidade em
outra. Sabe que sou controladora, superprotetora, metódica e...

— Eu te vejo e te admiro, por ser uma mulher incrível. — cortou-


me rapidamente. — Você precisa entender que amar alguém é diferente de
dependência. Teve alguma crise desde quando estão juntos? — indagou.

— Os últimos dias com ele foram incríveis, não tive sintoma

algum. — revelei, sentindo-me um tanto quanto inconstante. — É como se


T fosse meu porto seguro e...

— Não a nada mal em ter alguém como porto seguro. Um dia, nós
fomos o seu, Diana. Por que esse tal “T” não pode se tornar parte? —
indagou e fiquei sem respostas. — Acho que tem medo de se entregar.
Sempre teve. Mas com ele é diferente, vejo pela forma que fala sobre. O
começo sempre é mais leve, filha. Ter um relacionamento feliz não condiz
com ser sempre feliz. Eu tenho meus momentos, de simplesmente deitar na

cama e ficar olhando para o teto... Problemas psicológicos existem e


lutamos contra eles, todos os dias. É uma guerra sem fim, mas o que conta
é vencermos as batalhas.

— Acha que possa estar tendo mais medo de amar do que

simplesmente depender dele? — perguntei e ela assentiu, puxando-me


novamente para seu abraço.

— Acho que está na hora de me dar netos. — sussurrou em meu


ouvido, fazendo-me pular para trás.

— Mãe! — reclamei e ela gargalhou alto. — Mal tenho um


relacionamento e...

— E nada! Já pode me dar um netinho ou dois... Sabe que temos


casos de gêmeos na família. — falou animada e a encarei incrédula. —

Mas sério, se quer ficar com ele, aproveita... Vai e simplesmente fica.

— Simples assim? — indaguei.

— A vida é simples, a gente que complica. — piscou em minha


direção e sorri, sabendo que nada no mundo parava mamãe e sua
psicologia barata.

Ela poderia não ser formada na área, mas praticamente engolia


livros a respeito. Era sua maneira de encontrar razões para coisas que não
conseguia compreender. Eu a amava, por sempre ter algo certo para dizer

no melhor momento. Elle Carter era minha heroína.

Dei tchau para meus amigos, em meio a abraços e sorrisos abertos.


Notei claramente a preocupação no semblante de Patrice, e senti-me mal
por não poder dizer nada. Não poder lhe dizer que T estava bem e que na
realidade, ele se mantinha afastado por outros “n” motivos. Ainda mais,
por não conseguir mentir para ela, caso perguntasse se algo acontecera.
Existia algo entre Bailey e Patrice, que ainda não conseguira entender. Mas

sentia que a própria Patrice sequer desconfiava.

Puxei minha grande mala e andei em direção ao embarque. Parei na


fila e comecei a procurar meu celular dentro da bolsa, que mais uma vez,
parecia um buraco negro. Não conseguia localizar nada quando estava
apressada. Achei-o, minutos depois, dentro de um bolso na lateral, que
sequer me lembrava da existência. Peguei-o e percebi um papel cair do
mesmo. Acreditei ser alguma nota fiscal perdida, que parecia colecionar
dentro da bolsa, e já a amassaria. Porém, de algum jeito, acabei lendo o

que era. Não saberia dizer porquê, mas tinha a mania de querer lembrar
onde acabara meu dinheiro.

Meu coração falhou uma batida, ao virar o papel e ver sua letra ali.
Era realmente uma nota fiscal, mas em seu verso, T escrevera. Sorri, sem

saber ao certo o que pensar e muito menos o que fazer.

Acho que escrever para você se tornou uma de minhas coisas favoritas no
mundo... Até breve, baby. Já sinto sua falta.

Levei o papel ao peito, e notei que era minha vez de mostrar o


cartão de embarque. Paralisei e olhei ao redor. O que estava fazendo?
Não... Não poderia fazer aquilo. Não naquele momento. Que meus medos

e incertezas se enterrassem sozinhos. Eu queria e podia ficar ao lado de T.


Por que não? Minha sanidade me pertencia. As palavras de minha mãe
vieram em mente. Simples assim.
Horas depois, após um voo tranquilo até Ottawa, estava parada a
frente do apartamento de T. Olhei para meu celular, que marcava cerca de

quinze horas. Senti meu estômago reclamar, e lembrei que não comera
nada o dia todo, a não ser um iogurte. Precisava me atentar aquilo, a falta
de fome andava me assustando. Parei a frente de sua porta e mexi em
minha bolsa, até encontrar a chave.

Ele me dera a chave do apartamento, no momento em que me


deixou no aeroporto a cerca de um dia.

— Posso considerar como a chave de seu coração, garoto? —


indaguei, e ele sorriu, puxando-me para mais um beijo.

Última chamada para o voo...

— Pode considerar o que quiser, baby. O que quiser de mim, já é


seu. — derreti-me e o puxei para mais um beijo.

Saí de minhas divagações ao ouvir o barulho da porta do lado.. Seu

vizinho saiu e me cumprimentou com um leve aceno de cabeça. Encarei


aquela chave, imersa em lembranças sobre nós. Não queria deixá-lo há um
dia. Então... Por que o fiz? As palavras que tanto queria dizer, ficaram
travadas em minha garganta. Temia por ser precipitada, e ainda mais, por
não ter controle sobre meus sentimentos.

Entretanto, como controlar o que se sente? Se o pudesse, já o teria


feito a muito tempo. A realidade era que me assustava não estar no

controle e mesmo assim, sentir-me em nirvana ao seu lado. Como correr

daquilo que tanto desejou, em cinco anos? Estar novamente nos braços e
poder tocar o homem que fez parte de meus sonhos, como um fantasma.
Como o único.

Abri a porta do apartamento e entrei, deixando a grande mala ao

lado direito da porta. Fechei-a e encarei o local que em tão pouco tempo
me fez sentir em casa. Naquela carta, a qual guardara por completo em
minha mente, assim como, carregava para onde ia, T afirmou que era o lar
que ele nunca imaginou ter. Ele se tornara o meu.

Fui em direção a cozinha, e o silêncio por todo o apartamento


declarava que ele não estava. T não era a pessoa mais silenciosa do mundo,
longe daquilo. Peguei uma garrafa de água na geladeira e tomei um longo
gole. Parei, encostando-me contra o balcão e senti meu corpo amolecer.

Minha vista embaçou e tentei me manter em pé. Merda de pressão baixa!

Andei em direção a sala, escorando-me na parede, e tentei chegar


ao sofá e me sentar. Senti-me ainda mais fraca e a visão nublou por
completo. Parecia ouvir algo, mas não soube detectar o que era. Senti-me
ainda mais leve e de repente tudo se tornou escuro e inaudível.
Capítulo 13

“É, e só de pensar

Sei que já vou estar

Morrendo de amor

De amor.”[73]

— Está gostando das aulas, professor?

Fechei a capa de meu violão e levantei o olhar. Olhei para a mulher


ruiva parada a minha frente e tentei me lembrar de onde a conhecia.

— Não me diga que não se lembra de mim. — falou e entrou na


ampla sala. Conhecia aquele tipo de olhar, e não estava nem um pouco
interessado em joguinhos. Não mais. — Ensino médio, Messina.

Passei as mãos em meu jeans e me levantei, colocando o violão nas


costas. Encarei-a mais uma vez e tentei descobrir quem era, para então,
encurtar a conversa. Não era adepto a conhecer pessoas, nunca fora. Ainda

mais, num dia em que minha mente estava em qualquer local, menos
conectada a música. Teria que admitir, que estar longe de Diana, trazia-me

um medo incomum. O medo da perda.

— Sinto muito, senhorita. — falei, tentando parecer formal.

Ela deu mais alguns passos à frente e parou, encostando-se em uma


grande mesa de madeira. Não poderia negar que era uma bela mulher,
entretanto, não teria como olhá-la de outra forma. Lembrava-me bem,
mesmo depois de anos longe de Diana e sem perspectiva alguma de aquilo
fora mesmo real, a comparação que fazia nas mulheres que passaram em
minha cama com ela. Era como torná-la minha musa. Naquele momento,
sabia que sempre estive certo. Era ela.

— Bom... — abriu um sorriso largo, o qual não me cativou. —

Alex, ex-namorada de um de seus melhores amigos.

Pisquei algumas vezes e um estalo se deu em minha mente. Quais


as probabilidades de estar à frente da mulher que Charlie perdera no
passado?

— Sim, ex do Charlie. — revirou os olhos. — Continua o mesmo


Messina, caladão e misterioso.
— Sinto por decepcioná-la, Alexandra. — não, eu não sentia. —
Preciso ir! — anunciei e forcei um sorriso, passando por ela.

Saí da sala de aula de violão e entrei no longo corredor da nova


escola de música que conseguira o emprego. Mesmo, depois de uma vida
inteira fugindo de meu sobrenome, encontrava-me ali, contratado por
apresentar Michaels na carteira de motorista.

Cheguei ao estacionamento e abri a porta do carro, colocando meu


violão no banco de trás. Entrei no carro em seguida, com a dúvida do que
Alex fazia dentro da escola de música. Se conhecia alguém que não
apoiava tal hobby ou profissão, era ela. Liguei o som e saí dali. Assim que
o primeiro verso da música soou, sorri, sem conseguir me conter, mesmo
que minha preocupação fosse maior que felicidade. Diana partia naquele
dia. Talvez tocar aquela música a noite se tornaria um hábito pelas
próximas semanas afastados.

“Às vezes, no silêncio da noite

Eu fico imaginando nós dois

Eu fico ali sonhando acordado

Juntando o antes, o agora e o depois


Por que você me deixa tão solto?

Por que você não cola em mim?

Tô me sentindo muito sozinho

Não sou nem quero ser o seu dono

É que um carinho, às vezes, cai bem

Eu tenho os meus desejos e planos secretos

Só abro pra você, mais ninguém.”[74]

Teria que melhorar meu português, o que remetia a parte de minha


família que vivia no Brasil. Sorri, imaginando que se os acasos da vida não
acontecessem, poderia estar viajando ao lado dela. Entretanto, se os acasos
não ocorressem, não a teria encontrado novamente. Seria grato ao destino,

eternamente. Por colocá-la a minha frente.

Suspirei, pensando em como os últimos dias tinham sido e a forma


como soube que aquele sentimento nunca morrera. Eu a amava, sem
dúvida alguma. Sabia o que sentia e o que tinha para lhe dizer. Contudo,
ficara claro que Diana precisava de espaço. Ao menos, naquele momento.
Não a forçaria a ficar, nunca. Era sua decisão, assim como sua promessa de
que voltaria.
Ainda não tínhamos ideia alguma de como seria o futuro, mesmo
assim, depois de muito tempo parei de teme-lo. Algo em meu interior

idealizava muitas coisas, em todas, ela estava inclusa. Era como se


soubesse, em meu âmago, que éramos feitos um para o outro. O clichê
mais bonito para se admitir. Admitir que estávamos destinados.

Minutos depois cheguei ao meu prédio, sentindo um cansaço sem


explicação. Assim que desliguei o carro, peguei o celular no bolso, abrindo
diretamente em seu contato. Nenhuma mensagem. Olhei as horas e
sosseguei, já sabendo que ela estava no voo. Voando para longe. Poderia

ser um homem frio para muitas coisas, mas não conseguia disfarçar o
quanto temia nunca mais vê-la. Os versos de Caetano passando por minha
mente.

“Por que você me esquece e some?

E se eu me interessar por alguém?


E se ela, de repente, me ganha?”

— Relaxa, Troian! — recriminei-me e bloqueei a tela do aparelho.

Tirei meu violão do banco traseiro e saí do carro, ligando o alarme.


Assim que adentrei o elevador, encostei-me contra o metal frio e comecei a
repensar o que fazer. Não era adepto a nenhuma arte marcial que pudesse

extravasar o medo que me atingia. Talvez, fosse um sinal para começar.


Caso cantar não fosse o suficiente. Era complicado entender que estava tão
longe fisicamente, mas ao mesmo tempo, tão perto emocionalmente dela.

O elevador finalmente parou, e um tanto quanto desanimado, andei


em direção a meu apartamento. Abri a porta e suspirei, ainda pensando na
mulher que levara com ela, grande parte da luz que se fizera em minha
vida. Entendia suas razões, assim como, as minhas. Diana prezava por se
reencontrar, e eu estaria ali, para quando se sentisse completa mais uma

vez.

Fechei a porta e desci o violão das costas, deixando-o de lado. Virei


meu olhar e paralisei ao ver uma mala grande na cor rosa. O que? Senti
uma angústia sem precedentes tomar conta de meu ser e olhei para frente.
Meu mundo parou e fiquei pasmo por um milésimo de segundo.

— Baby! — falei, e em três passos cheguei a ela, que estava caída


no meio da sala de estar.

Levei os dedos ao seu pulso, enquanto esperava alguma reação. Ao

sentir sua pulsação, soltei o ar, e a peguei no colo. Toquei seu rosto e senti
sua leve respiração. Meu coração parecia querer explodir no peito, e pela
primeira vez, não era algo bom. Não sabia ao certo o que fazer, e apenas
saí do apartamento, na intenção de levá-la diretamente para o hospital.

Sem conseguir raciocinar, a coloquei com cuidado no banco do passageiro


e saí do prédio. Dividi-me entre o trânsito e sua respiração, enquanto
tentava não pirar. Naquele momento, entendi o quanto a vida não valia de
nada. O quanto a minha vida era nada se ela não estivesse ali.

— Baby, acorda. — pedi, mesmo sabendo que seria em vão. Ela


estava completamente desacordada.

Saquei o celular e disquei para minha mãe, esquecendo-me por


completo de qualquer orgulho besta. Deixei-o no viva-voz e pedi que me

ajudasse. Que me dissesse como me acalmar diante da mulher que amava


completamente desmaiada ao meu lado. Em meu interior, sentia-me como
um menino de cinco anos de idade novamente, assustado diante do escuro.
Naquele momento, meu medo era perder uma de minhas maiores razões.
Diana tomara meu coração. Ela tinha que acordar e ouvir as palavras. Que
uma vez foram dela e que sempre lhe pertenceram.
Capítulo 14

“Loving you was young, and wild, and free

Loving you was cool, and hot, and sweet

Loving you was sunshine, safe and sound

A steady place to let down my defenses

But loving you had consequences.”[75]

Sentia-me muito fraca e abrir os olhos nunca fora tão difícil.


Mesmo assim, o fiz. Talvez de forma mais lenta que o costumeiro.

Pisquei algumas vezes, tentando ampliar meu campo de visão e não


compreendi o que acontecia, quando encarei T, que matinha um semblante
claramente desesperado e percebi que estava em seu colo.

— T. — falei, e notei o quão baixa minha voz soou.

— Baby. — ele parou, e me encarou, tocando meu rosto levemente.


— Onde estamos? — perguntei, tentando olhar ao redor, porém, na
posição que estava, não me saí bem-sucedida.

— No hospital. — comentou e voltou a andar. — Te encontrei


desmaiada no chão da sala e não soube o que fazer.

— T, eu estou bem. — falei, tentando sair de seu colo, porém, ele


não permitiu. — T! — tentei soar mais alto, o que foi em vão. T não parou

até chegarmos a uma recepção e pedir para que fosse atendida por um
médico chamado Louis. — T! — tentei sair de seu colo novamente, sem
sucesso. — Troian! — falei firmemente e seu olhar glacial encontrou o
meu. Notei o temor por todo seu rosto e comecei a entender o que
acontecia. — Eu posso ficar em pé agora, garoto.

— Eu posso te segurar até que o médico chame. — falou decidido e


sorri, tocando seu rosto.

— Eu sei, T. Mas se não me deixar sair de seu colo... — notei os

olhares de alguns funcionários e pessoas que aguardavam. Com toda


certeza éramos um show atrativo. — Não vou falar com médico algum. —
complementei e ele me encarou perplexo.

— Baby...

— Estou falando sério, T.

— Ok. — falou, mesmo que a contragosto.


Com todo cuidado, ele parou a frente de uma cadeira e me sentou,
como se fosse quebrar a qualquer instante. Eu o admirava, e naquele

momento, o fiz com mais afinco. T cuidava daqueles que se importava, e


entendia, que não existia maior declaração de amor que aquela. Toquei seu
rosto, no momento em que me sentei, e o puxei para o meu, dando um leve
beijo.

— Oi, garoto. — falei, tentando amenizar o clima ao nosso redor. T


me encarou, e se sentou ao lado, claramente tão preocupado que sequer se
perguntou o que eu fazia ali. Já que deveria estar no voo para o Brasil.

Antes que ele pudesse me responder algo ou pudesse falar, uma voz
desconhecida o chamou.

— Troian.

Olhei para o lado, e notei uma mulher de cabelos loiros no mesmo


tom que o dele, só que em um corte chanel. O olhar que tanto admirava era

idêntico, e ela trazia um sorriso preocupado no rosto. Da cabeça aos pés,


ficou claro, aquela era sua mãe. Por que de repente desmaiar se tornou
uma ótima opção?

— Oi, mãe. — levantou-se e a abraçou, e apreciei aquele gesto de


carinho. — Obrigado por vir.

— Filho, você usou mulher da minha vida e desmaio na mesma


frase... Como poderia não vir? — ela claramente o provocava, e não

consegui conter um sorriso. Ainda mais, por ter sido chamada de mulher

de sua vida. — Então, essa é ela? — indagou, encarando-me, e tentei me


levantar para cumprimentá-la, o que foi em vão.

T parou a minha frente e impediu tal feito.

— Baby, acho melhor ficar sentada. Logo o médico vai te chamar e

veremos...

Bufei e notei o semblante admirado que sua mãe nos olhava. Ela
então se aproximou e sentou-se do meu lado esquerdo.

— Sou Gabriela Michaels, mãe do desesperado ao seu lado.

— Mãe! — tentou repreende-la, o que não fez qualquer efeito.

— Qual o seu nome, querida? — perguntou, e me encarou, como se


analisasse cada trejeito. Comecei a imaginar como seria intimidador
quando T conhecesse meus pais, principalmente, minha mãe. Ela não era

muito boa da cabeça.

— Sou Diana Carter. — falei e sorri em sua direção. — Mulher do


desesperado ao lado. — pisquei para ela, que sorriu abertamente.

— Acho que demorou, mas você acertou, meu menino. — fiquei


admirada diante da forma carinhosa que ela o tratava.

— Eu sei, mãe. — ele falou firmemente e uma voz soou, chamando


meu nome. Sequer entendia como T conseguira agilizar tudo tão rápido. —

Eu entro com você, baby. — continuou e apenas assenti.

— É um prazer em conhecê-la, mesmo nessa situação. — falei para


sua mãe e trocamos um beijo no rosto.

— O prazer é todo meu. Tenho certeza que não será nada demais.

— Eu também. — falei e sorri para ela, levantando-me da cadeira e

basicamente sendo escorada por T, mesmo sem necessidade, até o


consultório do médico.

Adentrei a sala branca e sabia de cara qual seria o resultado


daquilo. Apenas não me dei o próprio diagnóstico por notar a preocupação
em T. Ele merecia ter uma opinião médica para entender que me ver
desmaiada não era algo raro. Tinha a pressão baixa e pelo conjunto de
coisas atuais, como não estar comendo bem, foi a somatória perfeita para
um desmaio.

Os poucos minutos que pensei que passaríamos no consultório se


tornaram horas. O tal médico que T chamara, era conhecido de sua família,
e me fez o todo tipo de pergunta. O que resultou em estar naquele instante,

em uma cama de hospital, recebendo soro. T permanecera ao meu lado,


sentado numa poltrona lateral, sem me tirar de seu campo de visão.

Esperávamos alguns resultados de exames de sangue, os quais, o


médico afirmou serem imprescindíveis. Ele parecia não querer me tirar

dali enquanto não me desse um diagnóstico certeiro e sem hesitação.


Acomodei-me melhor contra o travesseiro macio, e entendi o que T quis
dizer com as portas abertas por ter seu sobrenome. Com toda certeza, o
sobrenome não pagava aquele quarto de hospital, mas o dinheiro que
tinham, o fez.

Amava Troian por tantos motivos, que não saberia listá-los por
completo. Mas dentre eles, tinha a plena certeza, que amava um homem
que não se importava com dinheiro e status, mesmo sendo de uma família

influente. Aquilo era mais do que importante para mim, pois cresci no
meio, e sempre condenei aqueles que viviam em função de tais ideais.

Até o momento, ele apenas me olhava, como se fosse um cristal


precioso. Tentei falar com ele a respeito de estar ali, mas T parecia tão
nervoso e preocupado, que claramente não raciocinava a respeito do que eu
fazia em seu apartamento. Ele apenas focou na parte de estar desmaiada. O
que não desmerecia sua preocupação.
— T... — chamei-o.

Batidas na porta chamaram nossa atenção e logo o médico entrou.

Ele era um senhor de idade, que parecia saber o que tinha apenas sob o
olhar avaliativo. Não saberia dizer o que realmente senti quando me
encarou. Ele era aquele tipo de médico com tanta experiência, que podia
jurar, já sabia de tudo antes mesmo dos resultados dos exames.

— Já saíram os resultados, doutor? — T perguntou, levantando-se e


parando ao meu lado.

— Calma, calma, menino. — falou e com toda certeza, o conhecera


há muito tempo. — Estou com os resultados aqui. — bateu na prancheta
que carregava. — Acredite, a vida dos dois não será mais a mesma.

— O que? — indaguei, e logo senti a mão de T apertar a minha.


Ele parecia a ponto de um ataque de nervos ali dentro.

Senti-me acuada, porque não esperava por nada muito elaborado.

Apenas a pressão baixa e má alimentação, e com toda certeza, teria falta de


nutrientes no papel que olhava. Não soube o que pensar. O que poderia
mudar radicalmente nossas vidas?

— Bom, vamos ao ponto, não é? — perguntou e parou ao meu


lado. — Parabéns senhorita Carter, você está grávida.

Arregalei os olhos e tentei encontrar algum resquício de brincadeira


na fala do médico. Porém, ela não existia. O aperto de T em minha mão
aumentou e senti-me estado de choque. O que?

— O senhor pode repetir, por favor. — pedi, e ele sorriu


abertamente.

— Claro que sim. — mexeu nos papéis que trazia. — Os seus


sintomas são clássicos de começo de gestação. Está com cerca de duas

semanas.

Paralisei e minha mente girou. Levando-me diretamente para a


primeira noite com T. Não fazia sentido algum. Tudo bem que não
tínhamos usado camisinha, mas eu me prevenia. Tomava regularmente,
como um ritual, o anticoncepcional. Aquele noventa e nove por cento de
eficácia me veio em mente, como dando a resposta.

— Vou lhes dar licença para conversar. — o médico falou,


sentindo que a notícia me chocara.

Assim que a porta se fechou, levantei meu olhar e procurei o de T.


Foi como levar um tapa na cara diante de minha paralisia, ao notar que
lágrimas desciam por seu rosto. Ele não as escondeu, muito menos pareceu
em choque diante da notícia. Nós seríamos pais.

Levei minha mão livre até a barriga plana e tentei imaginar como
seria dali alguns meses. Logo suas mãos cobriram as minhas e ele me
encarou, com lágrimas.

— Eu pensei tantas coisas, baby. — falou, fazendo-me ficar

emocionada. — Pensei que poderia te perder e...

— Eu estou aqui. — cortei-o. — Mesmo que não tenha perguntado


ou juntado as peças por estar preocupado comigo. Eu estou aqui para ficar.
Porque escolhi ficar com você, garoto.

T arregalou os olhos e pareceu finalmente notar o que se passava.


Segundos depois um lindo sorriso se abriu em sua boca, presenteando-me
com o homem que amava.

— Nós vamos ter um filho. — falei, e ele assentiu, tocando minha


barriga. — Um bebê nosso, T.

— Eu nem sei o que pensar, a não ser, que sou um puta sortudo,
baby. — gargalhei, e senti lágrimas descerem por meu rosto. — Só quero
que esteja feliz.

— Eu estou... Mais do que um dia pensei poder estar.

Sem me dar chance para continuar falando, seus lábios encontraram


os meus. Era como estar em casa. Ele estava certo naquela carta, sobre
como se sentia a respeito de mim. E eu, sabia muito bem como me sentir
diante dele, a partir daquele momento. T também se tornara meu lar.
Teríamos mais um pedacinho da gente para somar e multiplicar o que
sentíamos.

Não me imaginava como mãe, não naquele instante. Entretanto, as

coisas pareciam ter um motivo e não o indagaria. De alguma forma, era


como se fosse a hora certa. Sempre fui uma pessoa controladora e dona de
mim mesma, ali, senti que a vida realmente acontecia nos pequenos
momentos. E aquele, se tornara um dos favoritos da minha.

Eu, T e nosso pedacinho de gente.


Capítulo 15

“Now we're under the covers

Fast forward to eighteen

We are more than lovers

Yeah, we are all we need.”[76]

Olhar para ela se tornara uma de minhas coisas favoritas. Talvez


um dia, colocasse-as no papel, para que Diana soubesse que tudo me

encantava. Abri a porta do apartamento e sorri, ao ouvir sua cantoria. Após


mais um dia de trabalho, saber que a encontraria ali, dera-me um novo
sentido. Não era mais meu apartamento, tornara-se meu lar. Um lugar para
voltar.

Ela dançava no meio da sala, com as mãos na barriga, como se


perdida em si mesma. Sorri e fechei a porta cuidadosamente, mesmo que o
alto volume do som não permitisse que notasse minha presença. Encostei-

me contra a mesma, e senti-me em um camarote. Mesmo depois de anos na

estrada e assistindo os mais diversos shows, podia afirmar que aquele se


tornara meu preferido. Minha mulher, com as mãos na barriga, onde o

fruto de nosso amor crescia. Sorri, inebriado pela luz que ela emanava.

Sua voz continuava horrível, assim como me lembrava no

passado. Diana não fazia questão e muito menos deixava de cantar por
aquilo. Entretanto, parecia balancear completamente nossa relação. Ela era
arte, como sempre afirmou. Eu era música, o que me mantinha são. Arte
era música, e vice-versa. Talvez fossemos mais complexos do que
imaginávamos.

O que nosso pedacinho seria? Era algo que se passava em minha


mente. Diana gritou junto com o agudo da música e segurei uma
gargalhada. Ela parecia completamente imersa no momento e não seria eu

a estragá-lo. Fiquei ali, parado, assistindo. Imerso com sua presença e em


lembranças. A melhor delas, de quatro dias atrás, quando escolheu ficar
comigo. Ao menos durante suas férias, tudo se tornava mais fácil. Depois,
teríamos novas escolhas a fazer. Entretanto, uma delas era certa, não nos
separaríamos.

— Não acho que seja uma boa ideia lhe dar trabalho. —
comentou e continuei levando-a em meu colo até o quarto. — Sério, posso
me acostumar com isso e nunca mais te deixar em paz quando estivermos

aqui.

— Não preciso de paz, baby. — revelei, ao deitá-la com cuidado


na cama. — Eu tenho você.

Ela sorriu lindamente e me puxou para seu encontro. Com todo


cuidado, deitei-me sobre seu corpo, sem colocar peso. Ela acabara de sair

do hospital e ainda mais, carregava nosso filho. Não existia a chance de


deixar com que se machucasse.

— Eu sei o que está fazendo, garoto. — falou e tocou meu rosto.


Encarei-a com a intenção de memorizar cada pedacinho de sua expressão.

— O que é? — desafiei-a.

— Me fazendo te amar. — encarei-a surpreso, como sempre. Ela


parecia saber colocar tudo às claras. Como se soubesse o momento certo.

— E está funcionando? — perguntei, sem conseguir me conter.

Quantos anos aguardei para ter uma resposta diferente do


silêncio ou a confirmação de que ela me deixaria? Cinco... Cinco longos
anos.

— Bom... eu sempre tive medo de me entregar, mas você fez isso


parecer tão fácil. — suspirou e me deu um leve beijo. — Tão simples.

— Baby...
— Te amar é tão simples. — fiquei paralisado diante de sua
declaração. — Eu te amo, garoto.

Nunca, nem em mil anos, saberia explicar o choque que tais


palavras tiveram em minha alma e coração. Era como se finalmente,
estivéssemos em sintonia. Amar e ser amado era algo que nunca desejei.
Até ela aparecer e virar meu mundo do avesso.

— Eu te amo mais, baby. — falei e passei a mão direita por seu


rosto. — Não sabe o quanto queria dizer isso.

— Bom... Espero poder ouvir essas palavras todos os dias a


partir de agora. — decretou, fazendo-me sorrir. Diana sendo Diana.

— Pelo resto de nossas vidas e as outras que vierem.

Sua cantoria me trouxe de volta a seu momento triunfante, onde


cantava uma das músicas de quem acabei descobrindo ser sua cantora
favorita.

“In the middle of the night, in my dreams

You should see the things we do, baby, hm

In the middle of the night, in my dreams

I know I'm gonna be with you, so I take my time

Are you ready for it?[77]


— Eu estou pronto, baby! — falei e ela sequer escutara.

Deu um giro na sala e finalmente seus olhos me encontraram. Ela


parou por um instante e sorriu. Deu alguns passos em minha direção e me
puxou para si, levando-me até o centro da sala, que parecia ter se tornado
um palco.

— Já cantou comigo, garoto. Mas dançar... — sussurrou em meu


ouvido e lhe girei, logo trazendo-a de volta para meu corpo.

Diana sorriu abertamente, aprovando meu passo mais elaborado de


dança. O qual aprendera com minha mãe quando criança. Era o máximo
que poderia ir naquele quesito. Outra música começou e tudo se tornou
mais lento. Ela deitou a cabeça em meu ombro e perguntou como foi meu
dia. Com a música de fundo, comecei a lhe contar sobre os novos alunos e
como o novo emprego ia.

De repente, ela começara a cantar a música, como se descrevesse


seus sentimentos. Diana era tão transparente, que poderia ter certeza, era
exatamente o que queria dizer. Combinava conosco. Com nossa história. O
que nós tornávamos únicos.

“Then you smiled over your shoulder


For a minute, I was stone cold sober

I pulled you closer to my chest

And you asked me to stay over

I said, I already told ya

I think that you should get some rest

I knew I loved you then

But you'd never know

Cause I played it cool when I was scared of letting go

I know I needed you

But I never showed

But I wanna stay with you

Until we're grey and old

Just say you won't let go.”[78]

Ela então parou de dançar e me encarou, tocando meu rosto com


carinho. Tais gestos, jogavam-me na lona. Diana tinha o poder de me
desmontar por completo.

— Apenas me diga que não vai embora. — falou, como um claro


pedido.

Nunca imaginei que os papéis se interveriam. Não depois de

estarmos tão certos do que sentíamos. Porém, Diana era como eu. Ao
menos, naquilo. Gostávamos de afirmações, e que estas, fossem
comprovadas com ações. Palavras também entravam na lista.

— Nunca, baby.

Girei-a e deixei que suas costas se encontrassem com meu peito.


Desci as mãos até sua cintura, em seguida para sua barriga. Diana cantava,
e senti-me completo. Um pedacinho nosso crescia ali. Um pedaço de uma
história que nunca poderia ter ficado no passado. Por que nós... éramos
destinados. Éramos amantes. Éramos improváveis. Éramos um, pois a
música nos unira. Naquela noite, em que fui cantar por amor. E ela estava
lá, para ouvir e se tornar minha razão. A música permanecia ali, tocando...
imortal, como o que sentíamos um pelo outro.

Aproveitei-me do conhecimento da canção que nos embalava, e


assumindo o papel principal, cantei para ela. Assim como naquela noite, há
cinco anos. Assim como faria para sempre.

“I'm so in love with you

And I hope you know


Darling, your love is more than worth its weight in gold

We've come so far my dear

Look how we've grown

And I wanna stay with you

Until we're grey and old

Just say you won't let go

Just say you won't let go.”[79]


Epílogo

“Eu gosto tanto desse doce lado

O lado que tu me faz entender

Se Deus do céu me permitiu o amor

Eu que não posso mais dele correr”[80]

A estrada permitiu que Troian conhecesse muito de tudo. Muito de


tudo que o mundo lhe poderia oferecer, e tudo do que poderia continuar a
buscar. A estrada e a música lhe apresentaram a mulher que desestabilizou
todas suas convicções, e o fez rever cada passo em quanto amargava na
bebida a saudade que sentia. Todo santo dia longe dela, a princípio, fora

como e com o uísque queimando sua garganta. Mas assim como um raio
que caíra em sua vida uma vez, ela caíra novamente. Contra todas as
apostas e azares do mundo. Diana Carter estava mais uma vez a sua frente
e lhe olhava como se fosse a primeira. Nada parecia ter mudado.

Ele sabia bem que queria fugir, o tanto quanto queria ficar e
questionar. O medo maior era ter a resposta que fora apenas mais um em
sua vida. Parecia o óbvio e claro, após ser deixado para trás. Contudo, algo
dentro de si temia tanto o quanto necessitava saber da verdade. Saber que
não fora apenas uma paixão passageira por um cara mais novo que cantava

rock.

Não o era.

Diana sorriu, deixando com que mais lágrimas descessem,


enquanto olhava para o cômodo a sua frente. Contra todas as suas escolhas

mais centradas, ali estava ele. Com seu cabelo longo preso no alto da
cabeça, a barba por fazer, e um sorriso contido, como se aguardando sua
aprovação. Troian Messina sempre lhe pareceu algo tão genuíno e único,
que ela não sabia explicar. Nunca saberia colocar em palavras o quanto
aquele homem lhe significava.

Deu os passos mais longos que conseguia, indo até ele, e o


abraçando da forma que era capaz. Existia algo mais entre eles. Algo que
fora construído em meio a anos de uma paixão deixada no passado, e de

segundos para reencontrar o amor que nunca se foi de verdade. Existia


uma vida que criaram juntos, e que os transformou de forma assustadora.
Não saberia dizer o que lhe era mais surpreendente. Discutir sobre nomes e
sempre terminar com mais dúvidas ou discutir sobre o fato de que ela
permaneceria no Canadá com ele, e não o deixaria entrar novamente
naquela questão.

Era um ciclo infinito. Troian tentando fazê-la pensar em si. Ela


pensando por si, e em como estar ali com ele lhe fazia feliz. Pela primeira

vez em anos, Diana focara em si. Focara em como se sentia e no que

realmente queria. Seu trabalho permanecia o mesmo, apenas mudara de


país.

Diana era certa sobre muitas coisas, e uma das principais, era
Troian. Só bastava ele simplesmente aceitar. Finalmente, depois de meses,

ele parecia fazê-lo.

Ela acabara de completar seis meses de gravidez, e finalmente,


tinha noção de que ele fugira sobre o quarto do bebê, não porque não a
queria ali, ou que voltaria a mesma discussão sobre ela ter mudado sua
vida para o Canadá. Mas sim, porque ele preparava algo deles. Algo para
eles e o pedacinho de gente em sua barriga. Que dali alguns meses seria
ainda mais real.

Olhando as cores combinando, em um tom bege, alaranjado e azul

claro, ela permaneceu nos braços dele. O quarto era perfeito, assim como a
pessoa que o preparara. Ela não saberia dizer como não desconfiou do que
ele fazia naquele cômodo esquecido do apartamento. Sempre imaginou que
o usava para compor ou algo parecido, ou simplesmente para cantar. Mas
não, ele estava pensando neles.

— Eu pensei que teria que bater com sua cabeça nas minhas malas
espalhadas pelo apartamento. — comentou sorrindo, enquanto sentia um
leve beijo em sua testa. — O que faço com você, T? — indagou,

suspirando profundamente, sentindo-se imersa em cada pequeno detalhe

do caminho que lhes trouxera até ali.

— Ter paciência comigo? — ele questionou baixo, meio que


sorrindo de lado. Ainda existia certo medo em si, não de que ela fugisse,
mas de que não fosse o suficiente.

— Sabe que seu apartamento é enorme e que temos anos para


pensar em algo maior que aqui. — ela falou, sorrindo levemente. — Sei a
visão que tem de mim, da minha vida, ainda mais por agora saber quem
realmente é sua família. Você sabe como é viver com o melhor que o
dinheiro pode comprar, mas nem por isso, foi o que te feliz, certo? — ele
assentiu, e ela tocou levemente seu rosto, notando a fragilidade em seu
olhar. — Nenhum dinheiro do mundo compra o que a gente tem, T.
Nenhum.

— Eu só... — ele suspirou fundo e segurou a barriga já grande, que


anunciava o que lhes esperara dali alguns meses. — Eu só quero o melhor
para vocês. O melhor que posso fazer e dar e...

— Seja você e será o melhor! — tocou seu rosto com as duas mãos
e sentiu um leve chute na barriga, como se sua filha concordasse
claramente com aquilo. — Temos uma garotinha aqui que concorda.
— Eu soube no momento que te vi pela primeira vez. — comentou,
puxando-a para si levemente, e rodando com ela sobre o tapete de cor

clara. — Soube que era minha amada.

— T...

Diana nunca fora tão emotiva. Mas a junção do homem que amava
ser um romântico e estar grávida, levava-a a lágrimas em segundos.

— Como você canta por aí... — sorriu abertamente, e a virou de


costas para si ainda dançando. — Você é minha amada, sempre.

— E tudo está bem no fim, se o fim for com você.

Ela encostou-se contra seu peito e sorriu, pois ele a entendia como
ninguém. Até porque ele era único e certo para ele. Ele era seu amado.

Fim
Sinopse

Spencer Donovan era um jogador, e Ruby sabia bem daquilo.

Portanto, poderia obrigá-lo a tocar conforme sua música. Ela reconhecia


seu semelhante, e entendia que Spencer apenas mostrava o que queria para
as pessoas. Sua parte real, sempre fora um mistério. E ela, queria
desvendá-lo, assim como, usá-lo a seu favor. O dinheiro sempre foi o
ponto alto para Ruby. Nada mais lhe importava. Restara-lhe, conseguir o
quanto podia de Spencer, e assim, voltar a sua vida. Porém, nada era tão
simples. Uma atração irrefreável surge no meio do caminho.

Duas pessoas com objetivos bem claros.

Ceder a atração poderia ser uma distração desnecessária... ou


inevitável.

Entre a atração e o poder, qual será sua escolha?


Playlist

7 rings – Ariana Grande

Afterglow – Taylor Swift

break up with your girlfriend, i’m bored – Ariana Grande

Codinome – Maria

Cornelia Street – Taylor Swift

Cruel Summer – Taylor Swift

Daylight – Taylor Swift

Death By Thousand Cuts – Taylor Swift

Deep – Julia Michaels

Heaven – Julia Michaels

idontwannabeyouanymore Billie Eilish

In My Blood – Shawn Mendes

Issues – Julia Michaels

Kintsugi – Gabrielle Aplin

Lover – Taylor Swift


Motivation – Normani

Nightmare – Halsey

Paper Rings – Taylor Swift

Priest – Julia Michaels

Señorita – Shawn Mendes feat. Camila Cabello

I Think He Knows – Taylor Swift


Prefácio

“Mas dá um frio na barriga, um tremor, um medo de depender de alguém, de sofrer, de


escolher errado, de lutar por algo que não vale a pena. Porque o coração nem sempre

é mocinho. Foi por isso que corri, tentei fugir, mas quando tem que ser, não adianta,
será.”

Caio Fernando Abreu


Prólogo

“If teardrops could be bottled

There'd be swimming pools filled by models

Told a tight dress is what makes you a whore”[81]

“Sente como uma mocinha”

Revirei os olhos, ao ouvir um cara dizer isso para a acompanhante.


Recordava-me bem de tais palavras. Abri ainda mais as pernas, e encostei
o cotovelo sobre o joelho, com uma boa dose de uísque nas mãos. Vestida
em um terno feito sob medida, na cor azul escura. Não era o look habitual
para uma balada, mas era como tinha que fingir ser perto da minha nova
conquista. Que logo mais, se tornaria apenas mais uma.

Senti um olhar me queimar, e queria negar que meu corpo poderia


percebê-lo antes mesmo de minha visão o capturar. Levei o copo a boca e

virei um longo gole. Cole deveria estar no banheiro ou algo assim. Na

realidade, não me importava. Sem desculpas ou explicações. O sexo era até


que bom, ao menos, não me decepcionara naquele quesito. Ele era atraente
também, tinha que admitir. O problema era a monotonia de tudo aquilo. O

que já denunciava que era hora de colocar um ponto final.

— De todas as baladas do mundo... E venho justamente na que


está.

A voz forte irrompeu ao redor, mesmo com o som alto que vinha da
pista de dança. Na área vip não era tão ensurdecedor, entretanto, parecia
ter sido colocado no mudo. A última pessoa que queria ver, e com certeza,
que queria ter que conversar. Apenas levantei meu copo em sua direção, e
neguei-me a olhá-lo. Não me permitiria cair em joguinhos. Não os seus. Eu
mandava, todos obedeciam. Mas aquilo não era com ele. Portanto, era

carta fora do trabalho.

— Sabe que não pode fingir que não me conhece para sempre.

Dei de ombros e continuei com o olhar fixo, sem fazer questão de


me virar. Ultimamente, tudo parecia beirar o caos. De repente, era como se
as coisas pudessem fazer menos sentido ainda. O dinheiro já me
proporcionara mais do que poderia imaginar e estava contente com aquilo.
O que me atormentara era o fato de que não conseguia simplesmente
apagar de minha mente o que o homem a poucos metros um dia me fez

sentir. Não falaria sobre aquilo, nem mesmo cogitaria tal coisa. Spencer

Donovan era parte do meu passado e tentaria deixá-lo naquele exato local.
Sem a intenção de desenterrá-lo. Ao menos, era o que fielmente acreditava.
Capítulo 1

“I'ma break you off, let me be your motivation

To stay and give it tonight

And‚ baby‚ turn around‚ let me give you innovation

Hey, 'cause I do it so right”[82]

Anos depois...

Entediante.

O resumo perfeito para aquela noite. Forcei um sorriso para


Lauren, que parecia inebriada com as luzes do lugar, assim como, com
algumas pessoas. Ela era uma boa pessoa, que raramente conhecia,
portanto, era um sacrifício válido. Em meus dias tranquilos, preferia mil

vezes estar em uma banheira com uma taça de vinho na mão. Ao menos,

tinha uma taça na mão.

— Porra.

Franzi o cenho, pois ela quase nunca falava palavrão. Lauren era
certinha demais e aquela era a primeira vez que saía para a noite sem os

irmãos mais velhos no encalço. Um dos lados bons de transar com o mais
velho deles, era conseguir liberá-la para aquilo. Uma família possessiva
demais, para uma mulher esperta demais. E ali estávamos.

— O que foi? Algo mais interessante que a música? — indaguei, e


sorri levemente.

Ela permaneceu apenas parada à frente do vidro que encobria toda


a ala vip. Até mesmo seus movimentos estranhos cessaram. Fez um gesto
com a cabeça e sequer me encarou. Levantei-me do sofá confortável e

andei até ela. Escorei-me na barra diante do vidro e procurei o que ela
parecia ter se encantado.

Paralisei no momento em que movimentos leves como de um felino


prestes a abater sua presa foram reconhecidos. Virei o resto do vinho e dei
as costas, fugindo de qualquer embate que viria. Encarar Spencer não era
um requisito que necessitava. Não na paz que encontrei longe de todo
tumulto de Nova Iorque. O que ele fazia em Londres era uma boa
pergunta, contudo, me contentaria com a falta de resposta. Sabia que cedo

ou tarde iria reencontrá-lo, contudo, não esperava que ele viesse ao meu
encontro. Não poderia ser apenas uma simples coincidência.

A curiosidade sobre ele já me levara longe demais. Sabia demais


sobre o mesmo, assim como, poderia jogar seu jogo. Obrigá-lo a fazer o

que eu queria. Mas ainda não era o momento certo, mesmo que faltasse
bem pouco.

— Ele é muito gostoso! — Lauren suspirou em seguida e acabei


revirando os olhos. — Olha aquele queixo! — praticamente gritou, como
se esquecesse da existência de outras pessoas ao redor. Felizmente, a
música era alta o bastante para nos ignorarem.

— O que tem demais no queixo dele? — perguntei sem vontade e


os olhos azuis de Lauren me fuzilaram. Acabei sorrindo por sua

repreensão.

— É quadrado e simétrico. Perfeito mocinho bad boy!

Gargalhei de sua cara e neguei com a cabeça. Ela era péssima em


enxergar por trás das pessoas, e Spencer, era um exímio mentiroso. Até
mesmo seus modos mais simples pareciam calculados. Eu o conhecia
pouco, mas ainda assim, o bastante para saber que era parecido comigo. A
grande diferença, era a mudança que encontrara nele durante as vezes que
nos esbarramos ao decorrer dos anos. Spencer parecia ter se tornado uma

casca simpática e fingida, claramente, em busca de aprovação dos outros.


O que nunca entenderia e considerava patético.

— Primeiro de tudo, queixo quadrado é do bob esponja. — Lauren


me encarou inconformada. — Segundo, ninguém tem rosto simétrico.

Terceiro, Spencer não tem nada de mocinho. Nem sonhe em tentar uma
noite com ele.

— Por que? — sua voz mudou de repente. — Acha que eu... —


travou e quis bater-me mentalmente por não saber ser sutil e dar margem
as inseguranças de Lauren. — Ele é bonito demais, tem razão. Nunca se
interessaria...

— Ei ei, vamos calar a boca e repetir o que te ensinei: Você é


especial! Você é amada! — falei rapidamente e toquei seu ombro,

encarando-a. — Estou te avisando sobre porque o conheço e sei que


passaria uma noite contigo, mas é só isso. E sei que sexo para você, vai
além.

— Eu... — sorriu levemente, como se caindo em si. — Desculpe


por ser tão insegura. Nem percebi que realmente o conhece.

— Spencer é parte daquilo que deveria chamar de parente. —


pisquei um olho e sorri. — Sem desculpas pela insegurança. Lute contra e
dance muito essa noite!

— Fico tão feliz por Theo ter você. — abraçou-me levemente e


queria poder ser honesta com ela, assim como, era com seu irmão.

Theo não passava de mais um cara. Bonito para se tornar atraente, e


rico para se tornar interessante. Logo eu passaria para a próxima aventura.

Simples e descomplicado. Não existiam sentimentos envolvidos e mal


saberia traduzir se em algum momento os tive por outro alguém.

— Ora ora.

Afastei-me levemente de Lauren, e senti seu corpo tenso. Levantei


o olhar e o castanho escuro de Spencer me varreu. Não sorri, porque não
existiam motivos para o fazer. Depois da última vez que nos vimos, o fio
de cumplicidade que existia entre nós se rompeu. Spencer e distância era o
que realmente queria. Contudo, sabia que não poderia evitá-lo.

— Vítima internacional? — indagou ácido e poderia jurar que


estava bêbado, se não parecesse tão bem consigo mesmo.

— Desistiu de tentar dar o golpe em Diana? — rebati e ele sorriu


de lado, como se previsse tal fala. — Sem tempo para isso, Spencer.

— Por que não posso parar e falar com minha prima? Ainda mais,
não vai me apresentar sua linda amiga? Carlisle, não é? — olhou
diretamente para Lauren e tive que bufar.

— Não pense que a deixaria ser levada pelo seu papo, para casar

com ela e ter uma fusão milionária com as empresas de famílias. — seu
rosto endureceu e ele pareceu perceber que não iria me calar sobre nada.
— Uma ligação e Theo Carlisle saberá disso, o que acha?

Ele ficou sério e rapidamente, virei-me para Lauren, que sussurrou

que iria ao banheiro. Era uma boa noite e Spencer acabava de estragá-la.

— Theo é o babaca da vez? — perguntou e sorriu de leve. —


Esperta, Ru.

Odiava aquele apelido e ainda mais, a forma arrogante como soava


de seus lábios.

— Ele sabe onde pisa.

— Mas nem todos sabem. — deu um passo à frente e nos


encaramos.

Nossa altura era praticamente a mesma ali, mesmo com meus saltos
baixos. Meus um metro e setenta e cinco, estavam a meu favor.

— Jogo como quero e ganho da mesma maneira. — dei de ombros.


— Por que não finge que não me viu? O que veio fazer aqui? Saudades?

— Da nossa última noite, com certeza. — seu hálito tocou meu


rosto e aquela sensação hipnótica que ele deixava sobre meu corpo,
envolveu-me.

Queria acreditar que aquela era apenas parte de sua encenação, mas

quando busquei mentira em seu olhar, não a encontrei. De duas uma: ou eu


não sabia lê-lo; ou ele estava sendo franco. Com certeza, a primeira
alternativa era a única aceitável.

— Um beijo com raiva, sério? Pensei que precisasse de mais que

isso. — debochei. — Direto ao ponto! O que quer?

Ele não desviou o olhar e sequer piscou.

— Você.

Franzi o cenho e senti a intensidade da simples palavra. Contudo,


existia muito mais por trás. Ele sequer precisava detalhar suas razões de
estar ali, pois eu as conhecia bem. A principal delas, com toda certeza,
vinha com nosso sobrenome a tiracolo. Mais uma vez, os Donovan
apareciam para querer me moldar e jogar. Mal sabiam eles que nem

mesmo Spencer poderia interferir em algo. Eu já estava mais do que


formada e naquele jogo sairia como vencedora. Como sempre.
Capítulo 2

“You got me some type of way (hmm)

Ain't used to feelin' this way (hmm, hmm)

I do not know what to say (yeah, yeah)

But I know I shouldn't think about it”[83]

— Sabe que isso pode me custar um surto dos seus irmãos, certo?
— indaguei para Lauren e ela abriu um sorriso sem dentes, como se
implorando para que me entendesse ao menos com Theo.

— Por favor, Ruby.

— O que tem demais na menina passar a noite fora? — a voz de


Spencer preencheu o local e revirei os olhos.
Ele não tinha ido ao bar ou circular pelo lugar? Como poderia estar
de volta tão rápido?

Encarei-o sobre o ombro, dando-lhe uma clara repreensão com o


olhar. Voltei-me para Lauren, e ela parecia genuinamente animada.
Conhecia por cima a fama do cara pelo qual ela era apaixonada, e ele cair
naquela balada justamente na noite que saímos, era uma oportunidade

imperdível, segundo a mesma. Pelo jeito, ele já a tinha notado e aparecia


vez ou outra onde estávamos.

— Ok, se diverte. — ela praticamente deu um pulo e me abraçou


rapidamente. Gargalhei, estranhando o contato, mas felizmente, não a
repeli. Ela era uma boa pessoa, raramente encontrava e me sentia bem com
alguém como ela. — Mas por favor, toma cuidado. Qualquer coisa me liga
ou até mesmo para os seus irmãos! — avisei e ela assentiu algumas vezes.

— Então já podemos ir?

A voz irritante de Spencer era como um carma, e antes que


estapeasse seu belo rosto ali mesmo, apenas assenti, sem lhe encarar.

— Ele foi buscar bebidas, certo? — indaguei, e ela assentiu,


deixando clara a apreensão em seu rosto. — Apenas seja você mesma.

— Obrigada, Ruby. Você é a melhor!

Sorri para ela, mesmo sabendo que não o era. Dei-lhe um beijo no
rosto, e logo me virei para sair. Bati com o corpo de Spencer e tive que
revirar os olhos. Aquela proximidade era o que sempre evitei. O jeito que

aquela velha atração por ele ainda me sondava era insuportável. O melhor
era fingir que não me afetava.

— Vamos. — encarei-o, e seu olhar parecia me deixar nua ali


mesmo. Empurrei-o levemente, e Spencer pareceu acordar de seu

momento estagnado. — Sei que sou linda de se olhar, mas... Vamos de


uma vez.

Ele não disse nada, e apenas deu um leve aceno para Lauren, que
parecia a ponto de surtar. Logo vi o tal Jason se aproximar, e o sorriso que
ele lhe entregou era tão brilhante quanto o dela. Algo me dizia que aqueles
dois estavam sendo privados a tempo demais de se verem longe das asas
dos irmãos superprotetores.

Quando finalmente chegamos à rua, esperei Spencer se aproximar,

já que parecia ter ficado interessado em algo dentro da boate. Senti sua
presença antes mesmo de lhe encarar. Era algo que me acometia desde
muito nova. Sempre soube quando ele estava por perto.

Senti algo sendo depositado em minhas costas e franzi o cenho.


Virei-me para Spencer e no mesmo instante em que ele tentou deixar a
jaqueta sobre meus ombros, a retirei, e lhe entreguei de volta.
— Sem fingimento romântico comigo. — sentenciei. — Vamos
para o seu quarto de hotel e lá conversamos.

— Por que parece tão certa sobre o que vou dizer? — indagou,
andando a minha frente, e em menos de cinco passos estávamos à frente do
que possivelmente era um carro que alugara. Não me atentaria a tal
detalhes, muito menos me importava.

Adentrei o veículo e joguei os cabelos curtos para trás, e coloquei o


cinto de segurança em seguida. Senti o olhar de Spencer sobre meu corpo,
mais uma vez, enquanto ele fazia o mesmo processo.

— Sei exatamente do que se trata sua vinda. — dei de ombros,


mexendo no som, e acertei de primeira em uma boa música. — Mas no
momento, prefiro te ignorar. Pode ser?

Ele sabia que o faria mesmo se respondesse não, e ouvi sua risada
baixa, ao mesmo tempo que saía com o carro.

— Sempre as ordens, Ru.

Ignorei-o, assim como o apelido ridículo. Ninguém me chamava


daquela forma, muito menos alguém que parecia dominado pelo próprio
sobrenome. Não pude evitar olhá-lo de perfil, e fui obrigada a segurar um
suspiro profundo. Já conhecera e me envolvera com homens lindos,
beirando a perfeição física, mas Spencer... Existia uma aura dominadora
sobre ele que me atraía e repelia profundamente.

Poderiam ser os cabelos castanhos sempre despenteados de forma

proposital, a barba de mesma cor que cobria o rosto que marcara o meu da
última vez que nos encontramos, a pele de um bronzeado que entregava o
fato de ele ainda deveria amar correr de dia, e até mesmo... Talvez fosse o
conjunto completo, com músculos perfeitamente distribuídos, o olhar de

homem mau e sua atitude.

Virei meu olhar para a janela e foquei em qualquer coisa que não
fosse a sua beleza instigante. Spencer não passava de uma casca bonita, e
apenas me prenderia aquela definição superficial. Era hora de usá-lo para
algo a meu favor, já que ele estava ali para fazer o mesmo comigo.

Se Ruby sentia o mesmo, ela sabia disfarçar como ninguém.


Encostei-me contra o metal do elevador, cruzando os braços em seguida.
Ela estava do meu lado direito, dois passos à frente, e mexia em seu

cabelo, como se tentando ajustá-lo. O pior de tudo era que nunca


conseguira ser imune a sua beleza e perspicácia. Para evitar me sentir desta
forma, sempre deixei claro para mim mesmo uma coisa: Ruby era como
um campo minado.

Analisando-o ali, em um vestido curto de cor preta, e saltos da


mesma cor, sabia que ela ficara ainda mais linda como tempo. Os cabelos
longos se tornaram curtos, acima dos ombros, e delineavam perfeitamente
o rosto coberto pela maquiagem. Os olhos negros e penetrantes, que
pareciam ler almas, e de alguma forma, pisoteavam corações. Ruby era
uma jogadora nata, e nunca deixava de ganhar. O que fazia ali era tentar,
de alguma maneira, fazê-la concordar com o que ela mais parecia evitar –
nossa família.

O elevador finalmente chegou, e ela se adiantou, ficando à minha


espera no corredor. Segui-a e indiquei com a cabeça para que fizesse o
mesmo. Assim que abri a porta do quarto, dei-lhe espaço para entrar, e fora
um pequeno erro. Não que o espaço fosse minúsculo, contudo, ela parecia
propositalmente, querer passar a alguns centímetros de meu corpo.

Aquela vibração em meu corpo por sua presença, lembrava-me da


última vez que nos vimos. Quando fogo com gasolina resultaram no
inevitável: uma explosão.

— Acho que perdeu a sua mente. — acusou-me e parou furiosa,

como se a ponto de cravar as unhas em meu peito. — Eu jamais agiria


contra Diana. Ela estava bêbada e eu queria ajudar! Nada além disso!

— Desde quando não tem interesse algum por trás de algo? —


seus olhos brilharam, e sabia que não era de raiva.

— Não fui eu que pedi alguém em casamento apenas para poder


herdar algo. — acusou-me e fiquei perplexo.

— Como sabe sobre isso? — indaguei, e ela deu de ombros, dando


um passo à frente, e tocando meu peito. — Ruby!

— Eu sou melhor do que você nisso tudo, Spencer. — deu uma leve
batida em meu ombro. — Deixe o jogo para quem sabe jogar.

— Assim como fez com Paul? — debochei e ela pareceu sequer se


importar. Ruby era uma mulher indecifrável em alguns momentos. Como

se nada a abalasse.

— Ao menos não jurei amor eterno por um casamento. — riu sem


vontade e passou as mãos por meu pescoço.

Ela estava próxima demais, e tentei pensar em qualquer outra


coisa que não fossem os lábios marcados de vermelho, e o olhar negro que
pareciam me implorar para tomá-la.
— O que foi? — perguntou a um fio de cabelo de distância, e

gargalhou em seguida.

Afastou-se rapidamente, e me deu as costas.

— O que tanto quer de mim, Ruby? — indaguei, e ela se virou


novamente, encarando-me com deboche.

— Nada. — confidenciou. — Sou indiferente a tudo que envolva os

Donovan, o que inclui você.

Ela se virou para sair, e não soube dizer porque, apenas não
permiti. Segurei levemente seu pulso, e seu corpo veio em direção ao meu.

— Indiferente a mim? — indaguei, deixando-nos tão próximos que


podia sentir seu hálito de menta. — Por que nunca provou isso?

— Não preciso...

Sem conseguir me conter, não deixei que terminasse. Desci meus

lábios para os seus, e apenas me permiti perder o controle naquele


instante. Ela me recebera por completo, e cravou as unhas em meu peito,
como se me castigando por querer-me loucamente, assim como, eu a
queria.

— Acho que podemos começar a falar, ou... Quer ficar divagando


sobre nada? — sua voz arisca me chamou para a realidade, e balancei a
cabeça, deixando aquele momento para trás. Exatamente onde deveria
ficar.

— Quer me dizer por que parece tão confiante sobre o que vim

fazer aqui? — indaguei, e me sentei na cama, ao mesmo tempo que ela se


acomodou em uma poltrona a frente.

— Sei do testamento, da fusão de empresas, e ainda mais, que


precisam da minha assinatura. — jogou de repente, sem o sorriso cínico no

rosto. Pela primeira vez, Ruby parecia séria sobre algo. — Não preciso
entrar nos detalhes sobre, já deve saber todos eles.

— Sim. — resolvi ser evasivo. — Imagino então que alguém tem


lhe passado tudo, certo?

— Não tenho ninguém que me ame nessa família, Spencer. —


revirou os olhos. — O único que quase cheguei perto de gostar foi nosso
avô. E sabemos que a verdade é clara, todos contaram os dias para a
abertura do testamento dele. — foi franca, e aquela era a primeira vez que

notara algo diferente a respeito de nossa família por Ruby. — Vovô foi
cordial comigo, porque depois que ficou doente passou a perceber coisas
além do dinheiro – palavras dele. — fez aspas com as mãos. — Ele me
contou previamente tudo o que precisava saber, assim como, acabei
decidindo o que você vai ter que fazer para ter a minha assinatura.

— O que quer dizer com isso? — indaguei, passando as mãos pelos


cabelos. — Qual o seu plano?

— É bem simples... Eu vou concordar com os termos de que cada

herdeiro tenha sua parte dos bens deixados. — falou simplesmente, mas
tinha certeza que viria mais.

— O que ganha com isso? — rebati e ela sorriu amplamente. Como


se perto de realizar um sonho.

— Com isso, nada além do que é meu por direito... Mas tenho uma
condição clara para o fazer.

— Qual o seu jogo, Ruby? — perguntei, sabendo que ela poderia ir


longe demais, e eu estava ali, justamente, para fazer o melhor em prol dos
Donovan.

— Dinheiro... Se ficarem no caminho, ninguém ganha. — sorriu de


lado, encarando-me profundamente.

— Ruby, está muito enganada se acha que vou aceitar qualquer

termo que faça nossa família perder o que é deles por direito.

— Eu sei que vai. — passou a língua pelos lábios e sentou-se


confortavelmente, encarando-me. — Vai porque é o menino que faz tudo
em prol das pessoas que apenas o veem como um bastardo qualquer.

— Chega! — cortei-a e me levantei, dando-lhe as costas. — Diz de


uma vez o que diabos quer!
— Não se trata do que eu quero, se trata do que vou fazer. — sua
voz se tornou mais próxima, e logo a senti a minhas costas. — Vou me

casar com você.


Capítulo 3

“Come on, little lady, give us a smile

No, I ain't got nothin' to smile about

I got no one to smile for, I waited a while for

A moment to say I don't owe you a goddamn thing.”[84]

Segurei-me para não gargalhar do silêncio de Spencer, assim como,


a forma como seu corpo ficou completamente tenso. Afastei-me de suas
costas e dei a volta, parando a sua frente, cruzando os braços. Em seu
olhar, encontrei o embate que imaginava. Mas sabia, que no final, era
inevitável. Ele não tinha outra escolha que não fosse aceitar minha
proposta. Na realidade, tudo parecia conspirar para que não tivesse.

— Você está maluca? — indagou baixo e de forma cortante.


Spencer não era o tipo de pessoa que alterava sua voz, ao menos,
não para o grito. Dei de ombros, sorrindo de lado.

— Acho que tenho 90% de maluquice em meu DNA, cortesia feliz


de meus pais. — passei as mãos pelos cabelos. — Apenas estou dizendo o
que vai acontecer. Vamos nos casar e vai se portar como o marido mais
apaixonado do mundo. Porque claro, além do dinheiro, quero poder me

divertir um pouco à frente dos Donovan.

— Puta merda, Ruby!

Ele se virou e o vi ir em direção ao frigobar, retirando de dentro o


que reconheci como cerveja.

— Talvez devesse beber um uísque enquanto acertamos tudo...

— Acha mesmo que vou concordar com essa insanidade de cara?


— perguntou e seu tom era arrasado. Acabei sorrindo e ele bebeu um
longo gole do que tinha em mãos. — Não pode simplesmente afirmar algo

assim.

— Bom, se não se casar comigo e esfregarmos cada detalhe do


nosso amor para os queridos parentes... Esqueça a herança de todos. Não
vou assinar os papéis.

Ele se calou e notei que parou com a garrafa em direção a boca.

— Não faria isso. — pareceu incrédulo.


— Eu faria bem pior se pudesse. — fui franca. — O que pode fazer
é aceitar ou aceitar.... Sei que como bom filhinho vai aceitar tudo o que te

disser, para que sua família tenha algum direito.

— Por que os odeia tanto?

Revirei os olhos, sem a mínima vontade de entrar em tal questão.


Era completamente diferente de ódio, estava mais para completa

indiferença. Algo que Spencer nunca pareceu entender. Talvez porque


aquilo nunca funcionara de fato com ele. Eu era a ovelha negra declarada
da família, e ele, o favorito por ser o herdeiro perfeito para todos.

— Se vou entrar nessa preciso saber de algo...

Neguei com a cabeça e fui até ele, tocando levemente sua barba.
Ele estava com o maxilar cerrado, o que tornava sua expressão ainda mais
assustadora. Contudo, pelo pouco que o conhecia – Spencer era inofensivo
contra pessoas mais espertas que ele. Felizmente, eu o era.

— Amanhã vamos nos encontrar em um café, e te dou mais


detalhes do contrato... Do futuro casamento. Não se iluda muito, Spencer.
Tenho tudo designado, e vai acabar gostando da proposta. Estou sendo
generosa. — pisquei um olho, debochando do mesmo.

Ele segurou minha mão, quando ameacei subir mais um pouco, e


tive que sorrir da forma aterrorizada com que me encarava.
— O que você se tornou? — indagou, como se incrédulo.

— Com certeza, um alguém muito parecido com você. — encarei-o

profundamente. — A diferença é que me aceito da forma como sou.

— Como pode ir contra seu próprio sangue?

Afastei-me de seu toque e levei minha mão até meu peito, sobre
meu coração.

— Minha família está morta, Spencer. Parece que se esqueceu


desse mero detalhe. — acusei, e ele pareceu vacilar. — E os parentes que
sobraram... Sangue não é nada, nunca vai ser. Devia ter essa certeza já que
não tem sabe sobre o próprio sangue que corre por suas veias. — acabei
não me contendo, e me arrependi no segundo seguinte. Não deveria entrar
naquele mérito.

— Como pode acusar isso até hoje? — perguntou, e notei a forma


como parecia atormentado.

— Eu sei o que ouvi e o que vi. — bati levemente em meu peito. —


Tenho apenas alguém para amar e sou eu. Devia aprender isso, a ter um
pouco de amor próprio.

— Vá embora, Ruby.

— Claro que sim. — fiz uma reverência para provocá-lo. — Até


amanhã, príncipe.
Dei-lhe as costas e segui para a porta. Assim que saí, fechei-a atrás
de mim, e foquei para que meus pés se movessem em direção ao elevador.

Quando me encontrei sozinha e de frente para meu reflexo, soltei o ar que


segurava. Estava feliz porque conquistaria o que sempre desejei e da forma
mais simples possível. O grande porém, era que o simples fato de
reencontrar Spencer parecia acusar que estava prestes a tornar tudo

complicado. Ele não era mais o mesmo, muito menos eu. Tinha que pensar
daquela forma, e esquecer que um dia, considerei-me apaixonada por ele.

Assim que cheguei a meu apartamento na cidade, corri para a

cozinha e peguei uma garrafa de vinho. Servi-me de uma taça e sorri para
o nada. Era uma noite feliz, de forma que não imaginava que terminaria.
Levei a taça a boca e quase virei todo o líquido. Fui em direção a meu
quarto e me livrei do vestido, colocando apenas um camisão enorme
estampado de personagens da Disney. Poderia parecer sem coração, mas
amava perder algumas horas assistindo novamente meus filmes favoritos –
como Mulan.

Deixei a maquiagem da forma que estava e liguei o som,

agradecendo pelo fato de poder gritar à vontade, já que morava na


cobertura e não atrapalharia absolutamente ninguém. Fechei os olhos,
deixando as batidas me levarem e cantei junto a música, deixando a taça de
lado em seguida, e pegando a garrafa de vinho em mãos. Aquela música

me definia de várias formas, e finalmente poderia afirmar: eu quero, eu


tenho.

Era a melhor coisa saber que pude deixar tudo como queria. Minha
mente se virou para o passado, assim que encarei o porta-retratos sobre a
rack. A única e rara foto de meus pais, que sequer chegara a conhecer de
fato. Tinha vagas lembranças e nenhuma era de fato concreta. Eles
faleceram quando completei dois anos, em um acidente de carro. O veneno
que escorria de Dana Donovan a irmã mais velha de minha mãe, e a mãe

de Spencer, atormentou-me com partes de uma família que segundo ela


nunca me desejara.

Aquilo me magoou quando criança, mas depois, percebi que não


poderia usar o que ela dizia para fazer jus aos pais que mal me lembrava.
Se eles foram bons ou ruins, não os julgava. Sequer poderia o fazer, e
nunca cheguei a entender como poderia amar o que não recordava. Era um
sentimento de ternura ao encarar a foto, nada mais. A vida tinha um
propósito, e pelo jeito, não era o de tê-los presentes. Felizmente, levava tal

fato de forma tranquila.

No entanto, parte de mim odiou Dana por um longo tempo, ainda


mais, por ela ter se tornado minha tutora e ter que morar com ela desde que
fiquei órfã. O fato de ela tentar me moldar, apenas me mostrou o quanto
ela era infeliz. Morar sob o mesmo teto que ela me favoreceu para

descobrir o quanto ela era uma ótima mentirosa. Ao menos, eu sabia com
quem lidava, pois para comigo, ela nunca pareceu querer fingir ser uma
boa pessoa.

— Eles vão surtar, um a um... — falei para o nada, e sorri


verdadeiramente, ao me lembrar de meu avô – Kirian Donovan fora o
único que chegara perto de meu coração. Havíamos nos aproximado nos
últimos anos, por insistência do mesmo, que parecia fazer questão de me
ver. Ele estava seriamente doente e senti que poderia fazer o mínimo –

tentar. Mesmo de longe e em visitas esporádicas, comecei a perceber que


ele se importava.

Lembrava-me do último momento juntos, meses atrás. O motivo de


sempre para eu retornar aos Estados Unidos, simplesmente, para vê-lo.

— A minha menina cada vez mais linda. — sorri levemente,


tentando afastar as lágrimas. Ele estava de cama, e com várias coisas
ligadas a seu corpo.
— Como estamos hoje? — indaguei, sabendo que tudo parecia ter
piorado desde a última semana que apareci.

— Ótimo. — ele falou, mas sabia que mentia. Seu semblante não
fazia jus as palavras.

— Gabriella. — encarei a mulher ao seu lado, que já se tornara


uma constante na casa e na vida do mesmo, já que cuidara dele há muitos

anos. Ela me respondeu com um simples balançar em negativo com a


cabeça. — Quanto tempo? — indaguei, enquanto tocava a mão de meu
avô, que parecia ainda mais leve do que antes.

— Pouco. — fora a única coisa que saíra de sua boca e soltei o ar,
tentando não desabar.

Meu avô apertou minha mão, e sentir o quente de seu toque, fez-me
perceber que logo não o teria mais. Nunca a morte me doeu, mas ali, antes
mesmo de acontecer, já parecia difícil demais.

— Que tal falarmos sobre o que tanto gosta? — indaguei, e ele


sorriu levemente. — Quem tem vindo te ver e contado fofocas?

Ele sorriu mais abertamente.

— O menino Spencer. — toquei seu rosto com carinho, percebendo


a forma como ele parecia feliz em poder compartilhar o assunto. — Sei
que odeia a todos, Ruby. Mas...
— Não os odeio, sou apenas indiferente. E o senhor... Sabe muito
bem que não estaria aqui se o odiasse. — beijei levemente sua testa. —

Agora me conta, o que tanto conversou com Spencer?

— Sobre tudo, sobre nada... Ele é um bom homem.

Daquilo eu discordava, mas com toda certeza, não tentaria mudar


a ideia de meu avô. Não naquele momento.

— Ele foi o único a vir? — perguntei, tentando disfarçar a


incredulidade.

— Sabe como todos são... Ocupados demais para o velho e


preocupados demais com o momento que o testamento será lido.

— Não fale assim! — falei de imediato, por mais que soubesse que
era a realidade. — Nunca pense assim!

— Um dia, perdi minha filha e meu mundo acabou, ao mesmo


tempo que essa doença apareceu... Mas eu ainda tinha você, Ruby.

Demorei para perceber o quanto era especial, querida. Mas saiba que
tenho orgulho de quem é e da mulher que se tornou. Candice sentiria o
mesmo, tenho certeza.

Eu não tinha tanta certeza, contudo, aceitei suas palavras. Era


bom ouvir algo sobre minha mãe que não fosse o ódio emanado por Dana
há muitos anos.
— Obrigada. — passei a mão levemente por seu rosto. — Mas
agora, que tal eu te contar uma bela história? — indaguei, e peguei o livro

que estava sobre a mesa de cabeceira. — Ótima escolha! Adoro Jane


Austen.

Ele sorriu, assentindo.

Sentei-me na poltrona a seu lado, com as mãos unidas. Continuara

o livro de onde parara, e a todo momento, o encarava com carinho. Sabia


que ele era o pouco do que conhecia sobre ter uma família.

O toque de meu celular me fez dar um pulo no lugar, e por pouco


não derrubei a garrafa de vinho no chão. Limpei uma lágrima que descia
pelo rosto e fui em direção ao aparelho. Assim que encarei o visor, sorri
para a mensagem de Lauren, pedindo-me para acobertá-la sobre dormir
fora. Eu já o faria, mas ela não tinha ideia. Aquilo era tão adolescente que
achava absurdo, contudo, conhecia bem seus irmãos e sabia o barraco que

poderia ser formado a partir de algo tão simples – uma mulher adulta
dormindo fora de casa. Respondi-lhe apenas para que focasse em se
divertir e não esperei resposta. Ela com certeza, deveria o estar fazendo.

Outra mensagem brilhou em minha tela, e levei a garrafa de vinho


a boca, bebendo um leve gole. Com certeza, aquilo melhorava a noite.
Remetente: Spencer Donovan

Não consigo dormir pensando nisso tudo.

Tive que gargalhar da mensagem e apenas lhe respondi com o


horário e local que nos encontraríamos para resolver tudo. Passara boa

parte de minha vida sem conseguir dormir porque tinha que aguentar todos
os desmandos e mandos de sua família. Por mais que não fosse sua culpa,
Spencer que aguentasse a consequência de apenas uma.
Capítulo 4

“Saw you there and I thought

Oh, my God, look at that face!

You look like my next mistake

Love’s a game, wanna play?”[85]

— Eu sei de tudo isso, mãe. — falei pela milésima vez. — Já


encontrei Ruby e vamos conversar hoje. — mordi a língua para não contar
o que de fato acontecia. Tinha caído como um patinho em todo aquele
jogo. — Preciso sair agora e conversamos depois, ok?

— Precisa focar em conseguir a maldita assinatura, Spencer. —


alterou a voz e odiava tais momentos.
— Ok. — falei por fim e desfiz a ligação, sem querer ouvir mais
nada.

Bati com força contra o volante e soltei um profundo suspiro. Não


sabia ao certo como simplesmente digerir tudo aquilo. De todas as dez
mensagens que mandara para Ruby, apenas a primeira fora respondida. Ela
me ignorara de propósito e sabia que não seria muito diferente dali por

diante. O pior de tudo era que tinha que descer do carro e ouvir cada
detalhe de seu plano.

Suspirei fundo e abri a porta, trazendo meu casaco a tiracolo. O dia


parecia mais cinzento do que de costume, ou talvez, fosse meu humor nada
agradável. Assim que alcancei a calçada senti meu corpo ser empurrado,
com o leve solavanco de alguém. Assustei-me pela intensidade que me
percorrera com o simples toque. Espontaneamente, minhas mãos pararam
os ombros da pessoa que o fizera, e assim que os olhos negros encontraram

os meus, entendi por completo o que me ocasionava aquilo – até mesmo


esbarrar com Ruby era um martírio.

— Vejo que os anjos cantam a meu favor. — sorriu, colocando-se


ereta e afastando-se de meu toque.

Queria, de alguma maneira, entender o que existia de fato por trás


daquele sorriso. Eu era um jogador nato e sabia ler pessoas. Contudo, com
Ruby, tudo sempre pareceu muito diferente, e até mesmo, difícil. Suspirei
fundo, deixando os pensamentos de lado. Precisava focar no agora, e que

consistia em lhe ouvir e tentar dar a volta naquela ideia absurda sobre

casamento.

— Bom dia, Ru.

Ela revirou os olhos para o apelido e bateu levemente em meu


ombro.

— Estou de ótimo humor, e nem mesmo esse apelido ridículo vai


conseguir me azucrinar. — passou por mim, e fez um meneio com a
cabeça.

Segui-a e tentei apenas não pensar muito sobre os porquês de me


sentir tão atraído por ela. Sempre sentira aquilo, e naquele instante, não
fora diferente. Talvez fosse o fato de esperar, que anos depois, aquela
atração tivesse se dissipado. Contudo, nem mesmo os muitos anos longe
pareceram o bastante.

Assim que me sentei a sua frente, Ruby fez o pedido para a


atendente e percebi que também fizera o meu. Não me atentei ao que
pedira, já que estava ansioso para ouvir o que ela realmente pretendia.

— Então... Pode me dizer suas dúvidas. — comentou


despreocupadamente, encarando-me profundamente. Não conseguia
enxergar tom de deboche algum em sua fala. — Não temos o dia todo,
Spencer.

— O que realmente vai fazer? — perguntei sem mais delongas e

ela piscou longamente, abrindo um sorriso de lado, evidenciando a covinha


na bochecha esquerda. Ela parecia como uma personagem dos livros
clássicos que me aventurava, ainda mais, quando seu olhar brilhava de
uma forma tão clara. Eu só poderia estar perdendo minha mente.

— Vou ser direta e peço para que não me interrompa agora, tudo
bem? — assenti e ela levou as mãos ao queixo, deixando os cotovelos
escorados na mesa. — Nosso avô me contou sobre o testamento, e que
todos deveriam assinar para que cada um receba uma parte igual. Segundo
ele, foi a forma que encontrou de fazer a família concordar em algo, ao
menos, uma vez. Ele também mencionou sobre o fato do casamento que
agregaria para o herdeiro da família, que no caso, se refere a você.
Sabemos que poderiam tentar usar qualquer outro Donovan, até mesmo os

primos distantes, mas nosso avô foi bem certeiro em colocar cada detalhe
para que chegasse a você. — apontou-me com o dedo e fiz uma leve
careta. — Claro que não concordaria com o que ele disse, mas jamais iria
contra sua vontade. Ele não pedia minha opinião, apenas contou o que
faria. Juntando o que ele me disse, pensei no óbvio... que sou a noiva
perfeita. O que os Donovan mais prezam do que o próprio dinheiro? —
indagou de repente, e franzi o cenho, sem saber o que responder. —
Vamos lá, Spencer! Não é tão difícil assim.

— Poder? — rebati e ela negou com a cabeça.

— Às vezes parece só um homem ingênuo em meio as falcatruas


todas... — pareceu divagar e voltou ao semblante sério. — A honra! Tudo
o que eles tanto trabalham para que o sobrenome seja o ápice. Imagine só,
ver a Donovan desgarrada que nunca sequer viveu nos mesmos círculos de

amizade, casada com o menino perfeito que criaram? Isso soa divertido
para mim!

Foi ali que me toquei do que Ruby realmente queria. Ela ia muito
além do que eu imaginava. Poderia ter me envolvido com pessoas apenas
em nome do que ela chamara de honra e eu, de poder. Contudo, era
completamente diferente. Nunca se baseava apenas em meu próprio
interesse, ainda mais, pessoal. Sempre me deixei levar pelo o que a família
via como objetivo. Aprendi a valorizar dinheiro e poder acima de tudo,

porém, por eles.

— Então quer se casar comigo apenas para atingi-los? — perguntei


com escárnio. — Isso não vai ser nada demais.

— Isso é colocar o dedo na ferida, Spencer. — sorriu de lado. —


Vai ser um casamento por negócios, mas você vai demonstrar a cada
mísero segundo o quanto me ama e o quanto sou perfeita à frente da nossa
querida família.

— O que? — minha voz quase não saiu.

— Vou assinar os papéis que querem, e além disso, anunciar o


nosso casamento, para que você possa herdar a empresa da família por
direito, como o testamento manda. Olha como estou sendo caridosa... —
debochou.

— E o que ganha em troca é simplesmente alguns dias de diversão?


— indaguei, sem conseguir entendê-la.

— Você realmente não está em um bom dia de raciocínio. —


provocou, dando de ombros. — Nosso casamento terá um contrato sigiloso
e nenhuma cláusula pode ser quebrada. Ao fim dele, que olhe só, já até
coloquei uma data... Eu vou herdar metade da empresa.

— Isso é inconcebível, Ruby! Essa empresa é de todos e...

— Será metade minha e o resto vocês farão o que quiser, no caso,

você fará. — riu friamente e me indicou com a cabeça. — Não me


importo com o que vai fazer com a sua parte.

— Está sendo vil.

— Estou fazendo dinheiro. — deu de ombros. — O meu dinheiro.


Vocês que se matem pela outra parte da empresa. Ou assina os papéis e
acorda com tudo, ou simplesmente, nunca vão conseguir herdar o que foi
deixado, e nem mesmo, a empresa. Tudo vai para um leilão, como o
testamento diz. Sabe quanto tempo tem, então, não vou me alongar.

A atendente chegou e colocou os copos térmicos a nossa frente.


Ruby agradeceu e pegou o seu em mãos, colocando em seguida algo a
minha frente.

— Esse é o cartão do meu advogado, é com ele que vai resolver

tudo. — foi enfática. — Sei que em uma semana vamos nos encontrar na
sua bela cobertura em Nova Iorque. Prepare-se até lá, porque vai ter que se
fazer do homem mais apaixonado do mundo.

— Eu não te conheço mais. — fui franco e ela se levantou, parando


a meu lado.

— Nunca me conheceu, Spencer. — tocou meu rosto, e fiquei ali,


completamente embasbacado com toda situação. — Você já fez muito por
essa família e jogou com pessoas. Talvez essa seja hora de aprender que o

jogo vira, e que você, se tornou apenas uma peça.

Afastou-se e a vi sair pelas portas. Balancei a cabeça,

encarando o nada a minha frente. As coisas pareciam ter mudado de tantas

formas que sequer sabia por onde começar. Não era mais apenas um
simples embate por sua assinatura, era simplesmente, aceitar o que Ruby

queria. Pelo jeito, ela queria tudo.


Capítulo 5

“Yeah, breakfast at Tiffany's and bottles of bubbles

Girls with tattoos who like getting in trouble

Lashes and diamonds, ATM machines

Buy myself all of my favorite things (yeah).”[86]

Algumas pessoas diziam que devíamos nos vestir de felicidade.


Naquele exato momento, assim que finalizei o batom de cor nude, e abri
um sorriso para meu reflexo, tive certeza de que tal pessoa tinha razão.
Nunca me sentira tão bonita quanto naquele exato instante. Minha playlist
de sempre estourando pelo meu novo lar, e tive que sorrir, por notar que
Spencer deixara tudo da forma que fora exigido. Não conversamos mais, e
sequer nos vimos.

Uma semana se passara e eu estava em Nova Iorque, pronta para

assinar os papéis que a família tanto queria, e claro, para fazer cada um
deles, principalmente Dana, destilar seu ódio sobre mim com ainda mais
vontade. Dei uma voltinha e encarei a bela cobertura. Não havia sinal de
Spencer e tinha quase certeza de que não dormira no imóvel nos últimos

dias, já que tudo parecia intocado. Talvez ele evitasse o fato de que em
algum momento, eu também moraria ali. Ele era a falha, até mesmo, o
ponto fraco dos Donovan. E assim como pensei era fácil usá-lo. Ele
aceitava tudo em nome da boa família – mal sabia ele o que realmente
representava para todos, ou ao menos, fingia não saber.

Coloquei meus saltos e tinha que concordar com Ariana Grande,


que se tornara uma grande constante em minha vida musical – “a
felicidade tem o mesmo preço de um Louboutin”. Olhei mais uma vez no

grande espelho e peguei os óculos de grau sobre o aparador. Era parte do


disfarce de falsa inocência. A historinha que Spencer tivera que contar era
simples: eu concordei em assinar os papéis. Nenhum deles faria mais
perguntas, já que aquilo bastava.

Assim que os assinasse, Spencer teria que se casar em pelo menos


quatro semanas para assumir a presidência da Donovan Design. Eles até
mesmo tentaram aquilo antes, Spencer tentara se casar com Diana Carter.
Para minha sorte, ela negara, assim como, já parecia mais do que feliz com

outro cara. A sorte e destino pareciam estar ao meu favor, para puro azar

de cada uma das pessoas que me esperavam chegar à empresa.

Meu celular vibrou e sorri para a simples mensagem de Spencer.

Remetente: Spencer Donovan

Todos já chegaram.

Destinatário: Spencer Donovan

Diga a eles que o diabo está chegando.

ass: sua futura esposa perfeita.

Não precisava de sua resposta e nem esperava uma. Saí da


cobertura e pensei em quanto aquilo era importante para cada um deles.
Sorri, pois sabia que ainda demoraria para que entendessem que eu seria a
dona de metade da empresa, e aquilo, seria o tiro de misericórdia. Na
realidade, não me importava com o que eles sentiriam.
— Ruby Willians Donovan.

Odiava usar aquele nome completo, mas era necessário para poder
chegar onde realmente queria. Na realidade, aquele sobrenome já me
ajudara em vários momentos. Com o tempo entendi o quanto as pessoas
poderiam ser influenciáveis por uma simples palavra. Apresentei
documentos para a comprovação. Talvez fizessem cerca de dez anos que
não pisava naquele prédio e sabia que as coisas mudariam a partir dali.

Assim que fui liberada, a pessoa a minha frente sorriu, instruindo-


me até o elevador privativo. Aceitei sua ajuda, e fiquei ainda mais surpresa

por nem mesmo a decoração ter de fato se modificado. Revirei os olhos


para o conservadorismo e poderia ouvir meu avô afirmando que aquilo era
no mínimo – retrocesso – ficar preso ao tempo passado. Depois de alguns
minutos, finalmente chegara ao último andar, o que não me surpreendia.
Com toda certeza, estavam tentando me intimidar. Mal sabiam eles que
conheci pessoas com influência superior a tudo aquilo, que atravessava
continentes. Nada do que tentassem fazer para me impressionar ou
intimidar teria valia.

Apenas o barulho dos meus saltos era ouvido no piso, e não pude
evitar andar o mais lentamente possível. Ao fim, teria que dar minha
entrada, e não pude evitar um sorriso assim que abri uma grande porta de
madeira e pude localizar cada um dos principais interessados naquele

testamento na sala. Uma grande mesa de vidro dividia a família


representada por cinco pessoas, além de claro, Spencer. Ele estava sentado
ao lado de sua mãe, e sua pose de empresário com um terno de perfeito
caimento fez-me pensar o quão prazerosa poderia ser aquela empreitada.
Contudo, precisava de foco, e ir para cama com Spencer não era uma
opção. Era maluca, mas não a ponto de ceder a um desejo infundado.

— Um ótimo dia a todos. — falei, e me virei para fechar a porta.

Aproveite para ir até Louis, o advogado de meu avô, e que

conhecia há muitos anos. Ele já era idoso, e sabia o quanto considerava


meu avô como de sua família. Daquela sala repleta de serpentes, ele era o
único que poderia pensar que não tinha algum veneno.

— Tudo pronto, Louis? — indaguei, e ele assentiu, estendendo-me


a mão.

— A educação sempre lhe foi falha, não é?


A indagação não poderia vir da pessoa mais detestável do local –
Dana Donovan, mais conhecida como víbora em meu vocabulário. Ela era

a mãe de Spencer, e apenas ele parecia enxergá-la de tal forma. Nunca vi


aquela mulher demonstrar um pingo de amor por alguém, muito menos,
para o homem que sabia que fora um erro em sua vida. Mas era um assunto
para depois, caso o depois chegasse.

— Sabe o que dizem, não é Dana? — dei de ombros, e sentei-me


na ponta da mesa, de pernas bem abertas. Contra todo o protocolo babaca
que ela acreditava, assim como o machismo que imperava na sociedade. —
Educação é algo que se usa com quem merece.

— Acho melhor começarmos. — a voz de Spencer se sobressaiu e


pisquei em sua direção. O mesmo parecia tenso e mal poderia esperar para
fazer tudo que se passara em minha mente.

— Mal posso esperar.

— Bom, todos já assinaram, senhorita Ruby. — Louis se


pronunciou e abriu os papéis a minha frente. Já os havia lido e relido
centenas de vezes, mas não perderia a chance de fazer mais uma vez. —
Fique à vontade para reler e tomar sua decisão.

— Pensei que a decisão já tivesse sido tomada. — Dana exclamou


e poderia sentir todos os olhares sobre meu corpo.
Não os encarei e peguei a caneta depositada ao meu lado,
mexendo-a em meus dedos, enquanto relia todo o papel. Duraria uns bons

trinta minutos, porém, seria bom para mexer com a impaciência de todos.
Assim que finalizei, levei a caneta ao papel. Quando comecei a riscá-lo, a
voz de Dana reverberou por todos os lados.

— Não passa de uma menina assustada, Ruby. Assim como sua

mãe foi. — finalizei um traço e não disfarcei meu desinteresse de seu


ataque desnecessário, encarando-a com plenitude. — No fim, faz tudo o
que eu quero. — sua voz me causava asco, e terminei minha assinatura,
dando um olhar para Louis. Segurando-me para não revirar os olhos
daquela frase de vilã de quinta categoria de novela mexicana.

A partir dali, ele quem cuidaria de todo processo, e logo, cada um


teria a porcentagem correta da herança deixada, além da empresa que
ficara para Spencer. Mas todos sabiam que ele a dividiria e estavam

contando absolutamente com aquilo. Sorri internamente apenas de


imaginar o que viria a seguir. Dana falava algo e meu cérebro parecia em
êxtase, porque ali tudo tomava a forma que eu queria.

— O que disse, Dana? — indaguei, levantando-me, e me firmando


perfeitamente nos saltos.

— Que Spencer é especial e que logo vai encontrar a mulher certa


para poder assumir a empresa.
Segurei a risada e não pude evitar dar alguns passos para longe da
mesa, até chegar bem perto dela, e parar a sua frente.

— Acho que é a primeira vez que concordamos em algo. — dei-lhe


meu melhor sorriso e assim que parei do outro lado da cadeira, onde
Spencer estava sentado, seu olhar encontrou o meu. — Não posso pensar
em uma palavra que não seja especial.

Sabia que os olhos de todos recaíam sobre mim, e fora ali que dei a
primeira facada em seus egos. Sentei-me sobre o colo de Spencer, e passei
as mãos por seu pescoço, acariciando-o.

— Mas o que...

— Agora não, mãe. — Spencer declarou, agindo da forma como


fora designado. O que ele não sabia era do próximo passo. — Oi, Ru.

— Oi, baby. — passei a mão por seu rosto e aproximei-me ainda


mais, atuando como se estivesse pronta para ganhar o papel de atriz

principal. — Senti sua falta.

— Eu também.

Sem lhe dar tempo para fazer ou falar algo, sentindo sua mão em
minha cintura, uni nossos lábios. Um toque sutil que deveria permanecer
apenas daquela forma, mas não consegui controlar. Parecia existir mesmo
algo especial nele, e realmente, tinha concordado com Dana.
Imaginei que seria puxada do colo de Spencer ou algum tipo de
grito, mas o silêncio pareceu se formar ao redor. Concentrei-me apenas nos

lábios decididos e na barba que marcava meu rosto inteiro. Beijá-lo era
como o verdadeiro pecado.

Assim que nos afastamos, entendi que a magia acabava. Sua mãe
estava no chão, e sobre ela, alguns dos familiares que tanto repudiava.

Spencer pensou em sair do lugar, mas não permiti que o fizesse, negando
com a cabeça. Aquele era o real pecado – a ira. O que realmente sentia ao
parar para analisar aquele momento.

Levantei-me em seguida, dando um leve aceno para os que ainda


me encaravam, e cumprimentei Louis. Assim que cheguei perto à porta,
segurei-me para não gargalhar da cena, onde Dana parecia estar acordando
e ao mesmo tempo, não querendo o fazer. Porém, assim que os olhos
verdes da mesma bateram no negro dos meus, dei-lhe o sorriso debochado

que esperei muito para poder usar contra ela. Era uma clara declaração de
guerra, e ela sabia que já tinha perdido, contudo, era uma péssima
perdedora.

— Te vejo mais tarde, príncipe. — soltei em alto e bom som,


jogando um beijo em direção a Spencer. Dana ainda me encarava com a
incredulidade em sua face. Era o meu ultimato para a mesma.

Em quatro semanas, eu seria a esposa de Spencer.


Que os jogos comecem!
Capítulo 6

“'Cause you know it's been a long time coming

Don't ya let me fall

Oh, when your lips undress me, hooked on your tongue

Oh, love, your kiss is deadly, don't stop.”[87]

Assim que Ruby saiu, levantei-me para tentar ajudar minha mãe.
Os olhos claros, diferente dos meus, encararam-me decepcionados, ao
mesmo tempo que parecia pronta para voar no pescoço de alguém.

— O que ela fez com você? — sua pergunta foi cortante, e lhe dei
minha mão, a qual ela negara de imediato. Meu pai permaneceu em
silêncio, ao seu lado, ajudando-a levantar. — Como pode concordar com
isso? — seu grito poderia ser ouvido a metros dali, tinha certeza.

Soltei uma respiração profunda e apenas dei um passo atrás. Não

poderia falar sobre nada a respeito e muito menos contar a verdade.

— Eu... Eu me apaixonei. — falei, tentando fingir qualquer


honestidade.

O olhar de minha mãe se transformou e ela parecia realmente

crédula daquilo. Como ela não conseguia duvidar em momento algum de


que tinha concordado com tudo apenas porque fora obrigado?

— Fraco. — acusou-me e apontou um dedo contra meu peito. —


Fraco como sempre imaginei.

— Chega, Dana!

A voz de meu pai se sobressaiu e todos do ambiente pareceram


chocados, assim como eu. Em meus trinta e cinco anos, nunca o vira tratá-
la daquela forma. Dei-lhes as costas e resolvi que o melhor era sair dali. O

tempo que pudesse passar longe de outras pessoas, principalmente de


minha família, ainda mais, diante de tal mentira, era o que faria. Era bom
em atuar, mas não conseguia entender nada daquele maldito jogo.

Talvez por ser uma maldita peça.

Assim que atravessei a porta, caminhei em direção a minha sala. A


surpresa não poderia ser maior, quando adentrei o ambiente e dei de cara
com Ruby, sentada sobre minha mesa, completamente confortável.

— Olá, príncipe.

Seu olhar de deboche, assim como sua voz provocativa não me


passavam desapercebidos. Frustrado e cansado de tudo aquilo, mesmo que
acabasse de começar, fui até o bar que mantinha ali e me servi de uma dose
de uísque. O líquido queimou minha garganta, mas não além da raiva que

me martirizava por dentro.

— Por que parece a ponto de explodir? — sua voz doce poderia


enganar a qualquer um, mas acabara de aprender que sequer conhecia a
mulher a minha frente.

Virei-me, para encontrá-la sentada na cadeira, como se fosse dona


de tudo ao seu redor. De certa forma, ela o era.

— Por que ainda está aqui? — perguntei baixo e cauteloso, sem a


mínima vontade de perder a cabeça. — Já não foi o suficiente para o seu

dia?

— Confesso que não esperava o desmaio. — sorriu baixinho e


fiquei ainda mais incrédulo. — Acho que vai ser mais divertido do que
pensei.

Ao vê-la dizer tal coisa, as palavras de minha mãe bateram em


minha mente – Fraco!
— Preciso de espaço, Ruby. — pedi, e ela arqueou a sobrancelha,
como se não entendesse. — Preciso respirar longe disso.

— Acho que esse dia está me surpreendendo... de verdade. —


levantou-se da cadeira, e a passos certos, parou a minha frente.

Pude notar mais claramente a forma que se vestia. Um blazer rosa


com decote profundo, que deixava pouco a imaginação de seu belo corpo,

mas dava toda a imponência e sedução que fazia-lhe jus. A calça seguia o
mesmo tom, e os saltos altos a deixavam praticamente da minha altura. Ela
tinha realmente se preparado para pisar em quem fosse naquele dia.

— Pode tirar uma foto se preferir. — provocou e assim que deu


mais um passo à frente, levei o copo a boca, sorvendo o restante da bebida.
— Adoro essa cara de mau, meio mafioso com CEO gostoso. —
debochou e me afastei.

Sua aproximação me tirava a sanidade, por aquilo precisava de ao

menos algumas horas longe de tudo. Longe de Ruby. Sabia que ela já
estava em meu apartamento e que ficaria por lá pelo menos as próximas
quatro semanas antes do casamento, e o tempo estipulado pós aquela data.
Nunca dividira meu lugar com alguém, ainda mais, com alguém que mal
conhecia. Tudo seria diferente se Diana tivesse aceitado meu pedido de
casamento – pensei internamente.
— Mas no fundo é um menino perdido. — fora a primeira vez que
não notei o olhar de superioridade em seu rosto, e sua voz não parecia

cínica. — Nos vemos a noite, na cobertura... Até lá, tente ao menos pensar
que isso vai te trazer algo bom.

— Metade da empresa? — perguntei com escárnio. — Ao custo de


ser odiado por toda minha família?

— Entenda como quiser.

Sem dizer mais nada, ela deu as costas e saiu, tão certa de si, como
entrara na outra sala. Sem conseguir me conter, joguei o copo direto na
parede e os pedaços de vidro voaram. Prezava por tudo que construíra, por
tudo que batalhara, pela família que tinha... Ruby conseguira controlar
tudo aquilo em poucos dias. Era aquilo que me deixava ainda mais
frustrado – sentir-me preso em seu jogo. Tudo o que já fizera estava ciente
e de acordo, não aquilo.
Já passavam das duas da manhã. Encarei a bela vista, dos vidros

que iam do chão ao teto e pareciam abençoar a bela noite. Bebi mais um
pouco de água e cantei com a música que invadia o ambiente. Era um belo
apartamento – deduzi ao analisá-lo mais a fundo durante a tarde.
Combinava com Spencer, cores simples como preto, cinza e branco, e as
vezes, um tom azul escuro.

Vestia meu roupão de seda na cor dourada, os pés descalços sobre


o tapete felpudo da cor preta que recobria parte da grande sala de estar. A
música ainda percorria todo o ambiente, vinda da televisão de polegadas

exageradas a minha frente. Fechei os olhos por um instante e sorri para o


nada, feliz por entender que o gosto daquele casamento falso era além de
doce – era bom.

Soltei a voz, sorrindo para a canção que poderia me resumir


perfeitamente, usando a garrafa de água como meu microfone fictício.
“Sometimes I got a smile on my face

Sometimes I guess that I've gotta fake it

'Cause honesty is so out of place

And everyone's afraid to be naked

I don't know how much more I can take

Yeah, I'm broken into so many pieces

Would be easy just to throw them away

But I don't wanna give up on feeling”[88]

Senti que já não estava mais sozinha, simplesmente pela energia


que parecia irradiar em minha direção. Abri os olhos, ao mesmo tempo que
os olhos castanhos de Spencer inundaram toda minha visão. Não conseguia
vê-lo claramente, além das luzes da cidade que entravam pelas janelas, e

da televisão ligada à nossa frente. Ele parecia perigoso, mas não do jeito
que repelia. Da maneira mais perversa de atração e conexão que poderia
sentir. Gostava de me queimar, e ele parecia a própria gasolina implorando
para que acendesse um fósforo.

— Onde estava? — indaguei, e não pude evitar o gemido que


escapou de minha garganta, no segundo que ele me virou de costas e
puxou-me firmemente para seu corpo. Senti cada parte minha correspondê-
lo e tentei pensar em algo que pudesse me tirar dali. A sanidade tinha se
perdido assim que ele se mostrara daquela forma.

— A pergunta certa não é essa. — sua voz soou áspera em minha


orelha, e seus lábios desceram para meu pescoço. Pensei que seria um
beijo, mas enquanto suas mãos prendiam minha cintura contra si, os dentes
puxaram minha pele, fazendo-me arquejar, e quase implorar para que

continuasse.

Onde aquela versão de Spencer tinha se escondido?

O que diabos tinha acontecido para que ele agisse daquela


maneira?

Subi uma de minhas mãos para seus cabelos, ainda de costas.


Fiquei na ponta dos pés e me virei o bastante para que meus lábios
pudessem roçar os dele. Não poderia dizer quem começara, mas senti que
iria pirar se não o sentisse naquele exato instante. Lambi levemente sua

boca, atiçando-o. Spencer soltou quase que um rosnado baixo, do fundo da


garanta, como se me aprovasse.

— Ajoelha. — fora uma ordem e por um segundo, cogitei obedecê-


la. Já tinha estado com dominadores antes, homens e mulheres que
pareciam terem sido criados para submeter as outras pessoas, mas nunca
senti a aura tão forte de obediência imediata como ali.
— O que realmente quer? — indaguei, virando-me por completo, e
encarando seus olhos. Existia algo mais por trás de todo seu ar austero, era

como se enxergasse em Spencer exatamente aquilo que escondia sobre


mim – o medo de ser controlada. — Spencer...

Ele piscou algumas vezes, e deu um passo atrás, como se caindo


em si. Não falei nada e poderia jurar que seu tormento parecia ainda maior

por se revelar tão profundamente para mim. Ele gostava de dominar e


claramente não queria ter me mostrado tal lado.

— Está tudo bem. — falei, sem ao menos entender porque a forma


impaciente que ele se encontrava, ou como os nós de seus dedos pareciam
brancos pela força que ele cerrara as mãos.

Por que eu devia me importar com aquilo?

Por que estava me importando com aquela merda?

Aproximei-me e toquei sua mão, na vã tentativa de tentar acalmá-

lo.

— Não vai se repetir. — sua voz soou calma e baixa, como de


costume. Quando levantou o olhar, parecia que parte de si queria gritar que
me desejava, e outra, queria apenas deixar-me a margem. Mesmo não
tendo certeza sobre o que realmente se passava por sua mente, poderia
jurar que ele lutava para não escolher a segunda opção. — Com licença.
Afastou-se e pude sentir o quanto aquilo me atormentara, quando
me encontrei sozinha novamente. Ouvi o barulho de portas sendo abertas e

fechadas, e permaneci parada sobre o tapete. Senti meu pé molhado e


finalmente pareci notar que havia derrubado a garrafa de água ali. Respirei
fundo uma, duas e poderia jurar que chegara à casa das dezenas. Queria
não sentir absolutamente nada por ele. Mas de tudo que conhecia sobre os

Donovan, ele era o único que apenas sentia algo até o momento, ainda
mais, por ser o ponto frágil deles, e assim, ter que usá-lo. Mal sabia eu que
pena não era a única coisa que me remetia a ele. Desejo lascivo percorria
minhas veias naquele exato segundo, e tudo o que conseguia pensar era em
me perder no corpo do homem que me tomara para si há poucos segundos.

— Puta merda! — falei para o nada, levando as mãos aos cabelos.

Precisava focar no que fazia e entender que ir para a cama com


Spencer poderia ser um risco. O qual não estava disposta a correr. Ou

estava?
Capítulo 7

“Yeah, there are liars, but then there's you

Their retrospect, that's what brought me to you

Guess I thought I could change you to the truth

I don't know, I don't know what I was thinking.”[89]

Acordei como sempre por volta das sete da manhã. Talvez tivesse
se tornado um hábito com o decorrer dos anos. Gostava de assistir o dia, a
calmaria se tornar uma bagunça aos poucos. O que era difícil de se
diferenciar estando em Nova Iorque. Mesmo assim, sentia um pouco de
falta da cidade. Nunca me encontrara de fato ali, e tinha quase certeza de
que era de minha natureza – não ter um lar. Gostava da ideologia de
pertencer ao mundo, sendo ele o qual desejara ou quisera.
Tomei um pouco de chá, e me sentei novamente à frente das
grandes janelas de vidro. Deixei o copo com cuidado sobre o chão, e me

sentei em seguida, alongando-me. Gostava daquela sensação de paz que


começar o dia de tal forma me trazia. Às vezes, quando o estresse parecia
não ter fim ou a ansiedade parecia querer quebrar tudo ao redor, ia
diretamente para a academia mais próxima, socar algo que não minha

consciência.

Cantei baixinho uma canção, fechando os olhos. Aquele simples


gesto que era costumeiro, fez-me ficar em alerta. Lembrava-me da noite
passada e de tudo que se sucedera após fazer o mesmo movimento.
Suspirei profundamente, tentando evitar os pensamentos, mas meu corpo
parecia negar. Abri os olhos, e encarei os raios de sol que me tocavam.
Peguei a xícara de chá e tentei focar em qualquer outra coisa que não
fossem pensamentos libidinosos.

Não se escutava um ruído pelo apartamento e aquela solidão me


fazia pensar em como chegara até ali. Desde o momento que fora colocada
para fora de casa e passei a entender como a vida funcionaria de fato.
Lembrava-me exatamente do momento em que Dana Donovan conversara
abertamente com um homem de aproximadamente trinta anos, pelo o que
meus olhos julgaram na época. Ela negociava o silêncio dele sobre algo, o
que depois de um tempo, conseguira finalmente entender. Contudo, apenas
eu parecia saber ou ter a coragem de acusar a realidade.

— Bom dia.

A voz baixa era com um bálsamo para me tirar de todas aquelas


lembranças necessárias para me manter sã. Virei-me levemente e encarei o
homem que dali poucos dias se tornaria meu marido, oficialmente. Spencer
já havia assinado todos os papéis acordando com o contrato pré-nupcial.

— Bom dia. — falei, e analisei seus movimentos.

Ele não me parecia alguém da manhã, ou poderia estar em um


péssimo dia. Não o culparia por sequer disfarçar. Ao menos, não precisava
o fazer ali. Ele usava apenas uma calça moletom na cor preta, e andou de
forma macia até a geladeira, da qual retirou pelo que deduzi da cor, um
suco de laranja. Ele colocara o líquido dentro de um copo e se sentara à
frente do balcão que dividia a cozinha da sala onde me encontrava.

Analisando-o dali, parecia até mesmo um dia comum com um cara

qualquer. Já tivera tais momentos com alguns homens, mas nada que me
fizesse sentir tão exposta. Talvez fosse o fato de que Spencer era uma
incógnita. Por mais que conseguisse lê-lo em alguns momentos, ali,
quando se fechava em si, era praticamente impossível. Não saberia dizer se
ele me odiava ou se fingia tal coisa, ou se até mesmo nunca chegou a tal
sentimento. Talvez fosse indiferença após aceitar que teria que viver
aquela mentira comigo.

— Sabe que não precisava aceitar nada, não é? — indaguei de

repente, e seus olhos permaneceram distantes dos meus. — Era


simplesmente deixar que todos ficassem sem a herança.

Ele permaneceu em silêncio e entendi que realmente não era um


bom dia. Bebi o restante de meu chá, e me virei para a bela vista em

seguida. Pedir para o universo que me trouxesse sorte seria piada, andava
em uma maré boa ultimamente. Entretanto, agradecer nunca parecia
demais.

— Sei que não quer conversar e parece preferir fingir que não
existo... Mas não esqueça que temos um evento hoje. — falei alto e não
esperei resposta. Levantei-me e peguei a xícara em mãos, indo em direção
do balcão, no qual Spencer permanecia escorado. — Pode fingir que nada
aconteceu ou tentar se fazer de indiferente, faça como quiser. Mas não se

esqueça de que temos um compromisso.

— Não sou conhecido por atrasos.

Sorri para o mesmo e depositei a xícara a sua frente.

— Ao menos tente usar seus melhores falsos sorrisos hoje à noite.


— praticamente ordenei e lhe dei as costas.

Andei em direção ao quarto que ocupara na noite anterior, e me


joguei contra a cama macia, pegando o celular no segundo seguinte. Assim
que abri o instagram, fora presenteada com uma foto sorridente de Diana

Carter e seu atual namorado, o tal Troian Messina.

Lembrava-me dele, de meses atrás, quando nos esbarramos em uma


boate e ela parecia mais bêbada do que todos do local. Era por ele que
Diana havia deixado Spencer. Não precisava de muito para juntar um mais

um. Talvez o motivo do mau humor de Spencer tivesse nome e sobrenome.


Não conseguia entender porque tal desconfiança me trazia desconforto. No
fundo, poderia jurar que a ideia de Spencer sofrer por alguém que tentou
casar por conveniência de um testamento, sem ao menos lhe informar, era
algo gratificante. Contudo, aquilo não me trazia felicidade. Nem de perto.
Estava mais para um gosto amargo na boca.

Bufei sozinha, imersa em lembranças que não deveriam ser parte


de mim, mas o eram. Um dia, há muitos anos já fora apaixonada por

alguém que nunca correspondeu ao sentimento. De uma forma torta eu


poderia entender o que Spencer sentia, por mais tempo que já tivesse se
passado. Talvez fosse uma simples e única verdade sobre romances – o
primeiro amor marcava a vida das pessoas. No meu caso, sentia-o mais
como uma bomba que nunca permiti que fosse detonada.
Arrumei mais uma vez a gravata borboleta e encarei-me pelo
grande espelho da sala. As horas se arrastaram durante todo aquele dia. Na
realidade, desde o momento em que deixei Ruby no meio da sala de estar e
fugi diretamente para meu quarto, trancando-me no mesmo. Sabia que seu
corpo, dançando levemente em meu tapete, de olhos fechados, era como
uma placa neon escrito perigo. Deveria me afastar e não mais tocá-la.
Porém, fora em vão ter tais pensamentos, que dissiparam por completo
quando me vi com a pele sobre a sua. Ela era como uma maldita droga, e

não conseguia explicar de onde surgira tamanha intensidade.

Não pensei no que poderia resultar, ou na bagunça que nos


tornaríamos. Tínhamos quatro semanas para seguir à risca tudo sobre o que
ela armara sobre o casamento. Não pensei sobre meus pais e a reação de
ambos, nem mesmo em como era conivente com os planos de Ruby apenas
para que eles tivessem direito de sua herança. A realidade era que pouco
me fodia para todo aquele dinheiro. Tive tamanha certeza quando a única
coisa que me fez perder o raciocínio foi vê-la tão entregue e perdida em

meus braços.

Nunca fomos próximos, nem mesmo quando dividimos o mesmo


teto. Ruby sempre pareceu longe demais para ser alcançada e eu vivia em
torno de estudos para conseguir me formar como o melhor. Fora a forma
que me ensinaram a agir desde sempre, e pela primeira vez, indagava-me

de como acabaram ensinando-a. Não tinha ideia se ela havia se formado


em algo ou se estudava. Ainda menos, qual era seu gosto musical. Pelo
pouco que pude perceber no tempo que ela aparecera, era que sempre
estava cantando algo.

Pisquei algumas vezes, tentando afastar tais pensamentos de minha


mente. Não deveria me interessar sobre o que ela fazia ou o que gostava.
Era para ser frio e agir da forma mais indiferente possível. O complicado
de toda aquela situação era não conseguir controlar o que meu corpo

gritava. Nas poucas vezes que nos esbarramos ao decorrer dos anos, Ruby
sempre estava com alguém mesmo que não fosse sério. Por mais que a
desejasse, nunca fora um jogo aberto para ambos. Ali, a realidade mudara.
Deveria ser indiferente e apenas seguir com aquelas semanas até o
casamento formal. Contudo, ficara claro para mim que seria o verdadeiro
inferno dividir um teto com ela. Ainda mais, pela forma como minha pele
gritava pela sua.
Uma visão dela me apareceu, pelo reflexo do espelho. Ruby usava
um vestido longo na cor vermelha, que destacava ainda mais os olhos da

cor negra. Os cabelos estavam enrolados de forma que pareciam ainda


mais selvagens, e tudo que poderia imaginar era em como ficariam
perfeitos em torno de meus dedos.

Foco, Spencer!

— Está pronto? — perguntou, mexendo em um bracelete.

Apenas me virei e fui até ela, dando-lhe meu braço. Ela sorriu
levemente, presenteando-me com os lábios na mesma cor do vestido,
abrindo um leve sorriso.

— Parece pronto para mim. — sua frase não parecia ter um único
sentido, e não poderia concordar menos. Ela também parecia pronta para
simplesmente se livrar daquele vestido e cairmos um sobre o outro. —
Dessa vez me lembrei... — abriu a pequena bolsa que carregava e me

entregou uma caixinha de veludo na cor preta.

— O que é isso? — indaguei, no mesmo momento que ela unia


nossos braços, deixando-nos mais próximos.

— É o seu pedido romântico de casamento. — confidenciou,


enquanto andávamos em direção a saída do apartamento.

Não ousei parar ou discutir, sabendo que teria que suprir tais
caprichos. Não poderia voltar atrás da ideia de me casar oficialmente com
ela, ainda mais, porque consistia em ter a empresa em meu nome após

dizermos “sim”. Havia feito uma promessa além do que a própria família
usurparia do dinheiro. Uma promessa que consistia em não desistir do
sonho que Kirian tinha para aquele lugar. No fundo, dentre os tios e tias
que poderiam sonhar com a presidência, sabia que nenhum deles realmente

a queria. Odiavam o trabalho e apenas buscavam o fruto do mesmo.

Aquele lugar era um sonho particular que por muitos anos pude
dividir com meu avô, e sabia que mesmo que pudesse me arrepender
depois, valeria a pena passar por cada estágio do que Ruby exigia. Não
podia cogitar a ideia de ela desistir do casamento, não após tudo ser
anunciado tão fielmente a nossa família. Negar que aquilo era real seria
pior, fora o que compreendi após ver os olhares de repulsa que me foram
lançados após admitir que era apaixonado por ela.

— Não vai ser contrário à minha ideia?

Ruby perguntou assim que adentramos o elevador e neguei com a


cabeça, dando-lhe meu braço esquerdo. Ela o aceitou de bom grado e podia
sentir seus olhos quentes sobre nossa imagem refletida.

— Formamos um casal sexy. — comentou e apenas optei pelo


silêncio.
De todas as mentiras que teria de contar naquela noite, não gostaria
de começar uma ali, discordando do que ela dizia apenas pelo prazer de

tentar tirá-la de seu pedestal. Na realidade, gostava da forma que ela se


portava, por mais que não a compreendesse. O olhar decidido dava-me
além do que ela realmente queria, dava-me a vaga ideia do que ela
necessitava. Aquilo me atraía de uma forma assustadora.

— Pode me contar, como exatamente devo fazer o pedido? —


indaguei, fingindo tranquilidade, e ela assentiu, enquanto ainda estávamos
presos no elevador que parecia mais lento do que nunca.

Sentia a tensão sobre nós apenas aumentar, como se a qualquer


momento pudesse tocar de fato o que emanava por nossos corpos –
química.

— É um evento em que todos da família estarão, já que adoram


fingir que gostam de artes... — divagou em seguida, sorrindo de lado. — A

artista é uma conhecida e tem uma sessão especial sobre amor. Quando eu
parar a frente do quadro denominado “o para sempre que desejei” você vai
se ajoelhar a minhas costas, e bom... Invente o que precisar assim que eu
me virar e fingir surpresa.

— Como pensou tudo isso? — perguntei, assim que o elevador


parou, e ela acabou se soltando de meu braço, parando a minha frente.
— Eu penso por nós, fique tranquilo. — bateu levemente em meu
peito e voltou para a posição inicial.

Suspirei profundamente e cumprimentei Joe, meu motorista há


muitos anos, que já estava a nossa espera. Assim que adentrei o carro, tive
a surpresa de ver Ruby conversar docemente com o homem que parecia
cordialmente empolgado.

— Realmente não acredito que está há tantos anos trabalhando para


os Donovan... — Ruby falou e sorriu, e no segundo seguinte, percebi seu
olhar mudar, assim como, ela franziu o cenho. Um silêncio esquisito se
apoderou do ambiente e tive que apertar levemente sua mão para que ela
parecesse despertar. — Mas é bom revê-lo, Joe.

— Digo o mesmo, senhorita Dono...

— Não me xingue, por favor. — ela o cortou rapidamente e sorriu


levemente. — Ruby, ou menina Ruby, como me chamava na época de

escola.

O olhar de Joe encontrou o meu, através do retrovisor e acabei


assentindo para o mesmo. Sabia que ele me pedia permissão para fazer tal
coisa, e mesmo com toda intimidade que construímos ao longo dos anos, a
ponto de vê-lo como um bom amigo, ele ainda me respeitava como seu
chefe. Encarei Ruby, que pareceu pensar sobre tudo, ao encarar a janela ao
seu lado.

Não me atrevi a perguntar e apenas me recostei contra o

banco. Guardei a caixinha de veludo no bolso interior do blazer e torci para

que aquele momento fosse rápido e indolor. Nunca me imaginei pedindo

alguém em casamento de forma tão pública. Contudo, a volta de Ruby para

minha vida começava a quebrar cada um de meus paradigmas, um a um.


Capítulo 8

“eu gosto de você em qualquer roupa

ainda mais quando são fáceis de tirar...

com a boca te devoro

doma essa loba, eu imploro

de joelhos e você adora

segurar o meu cabelo quando tô de costas.”[90]

Sentia a tensão que emanava do corpo de Spencer e resolvi pará-lo


antes de entrarmos no prédio da galeria. Por mais que aquilo tudo não
passasse de um jogo em que sairia vencedora, existia uma parte de mim
que ainda se negava a acreditar que o homem ao meu lado era tão baixo
quanto o resto de nossa família. Ele poderia ter aparentado ser, mas em
menos de quarenta e oito horas, tudo que conseguia notar era seu medo de

desapontar alguém.

— Ei. — falei, e o puxei levemente, fazendo-o parar a minha


frente.

Passei a mão levemente pelo belo rosto e tentei não focar no quanto

ele mexia comigo. Era estranho ter ignorado aquele sentimento por uma
vida, e ali, em pouco tempo, vê-lo renascer como se nunca tivesse sido
domado e abandonado. Já fora apaixonada por Spencer Donovan, em um
passado longínquo onde ele jamais me olharia. Sequer me olharia se não
tivesse o emaranhado em minha rede. Não por algo em particular, mas
porque nunca me pareceu de fato interessado. Ali tão perto, tudo parecia
diferente.

Além de tudo, sabia que não era o seu tipo de mulher. Era livre

demais para o padrão que Spencer me parecia preso. Era uma má


influência não na totalidade de que poderiam discursar, mas a ponto de não
me importar com a opinião alheia. Vivia minha vida de acordo com o que
queria e como queria. Longe de tudo que me impuseram ou pensassem em
impor. Por aquilo, sabia que mesmo parecendo meu reflexo em alguns
momentos, Spencer poderia se tornar um oposto.

Desci minha mão para o blazer e o ajeitei levemente, subindo-a


para a gravata borboleta. A cada mísero toque contra ele, sentia que seu

corpo correspondia em um simples estremecer. Talvez não fosse eu a única

pirando e cogitando simplesmente jogar toda a razão pela janela. Aliás,


desde quando a razão total regia minha vida?

— Tudo bem? — indagou e nossos olhos se conectaram, naquela


ardência que gritava para que esquecesse todo o plano e saísse com ele

dali, direto para um local em que pudéssemos estar a sós.

Abri a boca para responder e tentar argumentar que as coisas


poderiam melhorar, mas a odiosa voz de Dana invadiu o breve momento.
Fiz questão de me aproximar ainda mais de Spencer e deitar minha cabeça
em seu pescoço, encarando a mulher que acabara chegar.

— Como pode se prestar a esse papel ridículo? Ainda mais com


uma mulher tão sem classe? — indagou de repente, e encarou o filho.

Senti o corpo de Spencer tensionar ainda mais se possível. Ele

permaneceu quieto e controlado, acreditava que da forma que sempre o


fez. Onde Spencer aprendeu a se portar para fingir ser amado ou acreditar
em um falso amor, eu aprendi a ser eu mesma e aceitar que nenhum
sentimento bom nasceria.

— Como será trair e mentir sobre isso? — soltei a pergunta, e notei


o olhar de Harry, marido de Dana, tornando-se apagado e sendo desviado
em seguida. Dana pareceu paralisar e demorou para dar um passo à frente,
como se fosse para me arrancar dos braços do filho.

Spencer me surpreendeu e se colocou entre nós.

— Cuidado com o escândalo, Dana. — avisei, e encarei-a sobre o


ombro de Spencer, que permanecia com uma mão na cintura do que
chamava de mãe. — Não quer que um dos seus segredinhos sejam ditos

aqui, certo? Ou quer? — indaguei, e notei-a engolir em seco. Eu tinha


crescido e aprendi a não ter medo daquele olhar, muito menos, do que
vinha pós ele. — Eu e Spencer queremos uma noite em paz, será que pode
ao menos fingir que é uma boa mãe, por algumas horas?

Puxei Spencer levemente, e ele se soltou da mãe, acompanhando-


me. Assim que adentramos o prédio, ele colocou uma de suas mãos na
base de minha coluna e me guiou.

— Não vai me perguntar nada? — indaguei, assim que paramos à

frente do primeiro quadro.

— Não pretendo discutir sobre minha família com você, Ruby. É


apenas um jogo e sou uma peça. Não preciso levantar essas questões. —
sua voz soou como um sussurro e assenti.

— A ignorância pode ser uma dádiva em alguns momentos. —


soltei baixo, como se para mim mesma.
Caminhamos um pouco mais, e cumprimentamos algumas pessoas.
Spencer era um homem reconhecido por muitas das quais estavam ali, e

sabia que seria praticamente impossível que não fosse elogiado. Contudo,
notei um olhar diferente, de uma loira que se encontrava a cerca de cinco
passos de nós. Spencer conversava com um empresário, o qual não me
atentei sobre o nome, e apenas notei o olhar cativo da loira sobre minha

mão em seu peito.

— Vou ao quadro do amor. — comuniquei em sua orelha e me


afastei, andando pelas pessoas e procurando a sessão que Lindsay havia me
contado.

Era uma velha conhecida e talvez o mais próximo de amizade que


cheguei a ter. Parei à frente do quadro que ela me contara e fora impossível
não sorrir para o mesmo. Era o desenho de uma mulher segurando algo que
não parecia claro e, em minha concepção, nem mesmo poderia ser definido

— Arte. — comentei alto e sorri, sentindo-me imersa. O que


poderia sugerir sobre? Que aquele era o amor que a mulher escolhera, sem
forma ou explicação. Era dela e apenas ela o entendia. O que me remetia a
mim mesma e no que acreditava ser o verdadeiro sentimento – sem nexo.
— Realidade.

Virei o olhar levemente, e não fora surpresa ao encontrar Spencer


sobre seus joelhos, estendendo-me a caixinha. O que me surpreendera fora
sentir um embrulhar no estômago, mostrando-me que não era o que

esperava para mim mesma – nem em outras vidas. Brincar de amor não era

algo que desejava. Porém, tinha seus prós. Olhei ao redor levemente,
fingindo surpresa em meu semblante, encontrei o olhar dos pais de Spencer
e alguns tios cravados em nós, assim como, todos que participavam do
evento.

— Spencer...

— Eu não sou muito bom com palavras... — ele limpou a garganta


e era nítido seu nervosismo. O que ajudava ainda mais em toda aquela
farsa. Spencer não era como qualquer outro de nossa família. Ele não era
frio ou calculista, como imaginei, ele era quieto, simplesmente. Ali, vendo-
o tão claro com sua insegurança, entendi que não era um jogador. Era
apenas ele. Ou apenas minha tola mente o pintando da maneira que queria
que ele fosse. — Queria poder dizer coisas bonitas, coisas que vão te tocar

e perceber que sou o cara certo. Mas não sou o cara certo... — os olhos
castanhos estavam cravados nos meus e senti que poderia jogar-me sobre
ele no mesmo instante. — Mas quero ser seu. Ruby... Ru, aceita se casar
comigo?

Quando lhe estendi a mão e senti a aliança escorregar por meu


dedo, senti que cometera o maior erro ao envolver Spencer em meio
aquilo. A diversão acabara de se tornar um grande problema. Senti a
atração fluir por nossos corpos e ele se levantou, puxando-me para si,

dando-me o beijo que necessitava. Sorri em meio ao mesmo, esquecendo-

me de tudo ao redor. Sabia o que realmente queria naquela noite, e que


aquele beijo não era o suficiente. Queria aquele homem para chamar de
meu por pelo menos algumas horas.

O silêncio de Spencer poderia me matar, mas eu sabia que faria de


tudo para tirar dele o mesmo olhar que ganhara quando cedeu ao desejo na
noite passada. Assim que saímos do carro, dei um leve aceno para Joe, e
sabia que precisava falar com ele o mais rápido possível. Contudo aquilo

poderia esperar. Aliás, tudo o que envolvia algo fora de nós, naquele exato
instante poderia.

Adentramos o elevador e me encostei contra o mesmo, analisando-


nos como antes. Spencer já se desfazia da gravata, e seu cabelo parecia
ainda mais bagunçado do que propositalmente ficava. O olhar mau
emoldurava o belo rosto e tive que sorrir da forma que ele parecia
compenetrado em ignorar minha presença. Quando o elevador finalmente
parou, ele se adiantou a sair, nos passos lentos e calculados que parecia

usar como escudo do mundo. Segui-o e diferente do mesmo, praticamente


atropelei-o ao passar pela porta.

Retirei meus saltos e os joguei para o lado. Virei-me e encontrei


Spencer de costas, fechando a porta.

— O que mais te incomoda sobre mim? — indaguei, e fui até ele,


tocando levemente suas costas, logo depois descendo minhas mãos e as
passando para frente de seu corpo. — Te incomoda que goste do meu
toque?

Sua respiração mudou e sabia que também estava afetado.

— Você não me incomoda, Ruby. — a voz soou rouca e perigosa,


como eu necessitava.

— Tem certeza? — insisti e logo senti suas mãos sobre as minhas.

Assim que depositei um leve beijo sobre suas costas, ainda sobre o
blazer, apenas fora surpreendida por sua selvageria. Minhas mãos que
estavam em seu peito foram parar no alto, presas por uma única mão,
contra a parede ao lado. Os olhos castanhos abraçaram os meus e pareciam
apenas focados em não ceder.

— Tenho. — não tinha certeza sobre o que ele realmente falava.


Nossas bocas se encontraram e não pude negar aquele beijo que
tanto desejava. O corpo de Spencer parecia estar em todos os lugares

possíveis e ainda permanecia vestido de mais para minha pele que gritava
pela sua. Ele parecia gostar de dominar, mas encontrara alguém a sua
altura naquele momento. Lambi seu queixo assim que se afastou para
buscarmos o ar, e o encarei profundamente. Ele olhava para meu vestido

como se a ponto de querer rasgá-lo, mas algo parecia pará-lo.

— Rasga. — falei, e seus olhos ficaram ainda mais escuros, como


se o desejo se aflorasse. — Sabemos bem que quer isso.

A mão que segurava as minhas no alto permaneceu no local,


enquanto ele descia a outra lentamente pelo centro de meu corpo, como se
traçando um limite assimétrico imaginário. Seus olhos seguiram o mesmo
caminho e parecia a ponto de explodir pela forma como o desejava. Ele
refez o caminho, chegando a meu rosto, tocando meus lábios levemente, o

que me fez morder o dedo colocado ali, como se para provocá-lo mais.

— Tira para mim. — afastou-se, deixando-me livre de seu toque e


deu alguns passos para trás.

Perigosamente, vi-me sendo analisada e mais desejada do que um


dia imaginei. Gostava de deixar claro o que queria e até onde iria, mas
Spencer parecia me ler tão perfeitamente, que ali, em meio ao caos que
toda aquela luxúria nos inundava, não pensara em mais nada.
Virei-me de costas, e levei a mão ao lado direito do vestido,
descendo o único zíper da peça. Olhava-o sobre o ombro, e assim que

desci levemente o tecido e ele pareceu notar que não usava nada na parte
de cima, e uma minúscula calcinha na parte debaixo, notei sua respiração
ficar ainda mais pesada.

— Você é...

Ele era falante e nunca admirava tal coisa na hora do sexo, mas sua
voz parecia ter sido feita para aquilo. Não me virei e apenas toquei as mãos
contra a parede, incitando-a me tomar. Rapidamente senti suas mãos
esmagarem meus seios e a boca castigar meu pescoço.

— Você é perfeita. — falou, e me virou o bastante para que nossas


bocas se conectassem novamente.

Sequer saberia dizer como aconteceu, mas de repente, apenas senti


meu corpo ser levantado e me segurei firmemente a seu cabelo, não

querendo perder tal conexão. Praticamente nua em seu colo, mas nem de
longe me sentia intimidada. Spencer trazia consigo um ar austero que me
atraía, ao mesmo tempo que, a delicadeza dos movimentos certos.

Senti meu corpo ser colocado delicadamente sobre algo macio e


sorri, ao notar que era o mesmo tapete preto no qual tínhamos parado pela
primeira vez negada. Lentamente, infiltrei minhas mãos por sua camisa e a
puxei para fora, com o mesmo destino que o cinto, meias e calças tiveram.
Apenas duas peças nos separavam de fato, e não parecíamos com pressa,

mesmo que quisesse derreter a cada mordida ou toque que ele me


entregava.

— Vem. — falou, e me surpreendeu, virando meu corpo sobre o


seu.

Assim que parei sobre o mesmo, a admiração com que me


encarava, fez-me perceber que se fosse um jogo, com certeza seríamos
dois vencedores. Lentamente me levantei, deixando-o deitado e desci a
calcinha, sem perder nenhuma reação.

Spencer não se fez de rogado e sua mão desceu pelo corpo


esculpido para o pecado. Se tocou, encarando-me como se fosse a mim que
desejasse bem ali, e foi minha vez de comandar o momento. Em meio a
toques, beijos e maldições proferidas, sequer conseguiria descrever como

ele ficara sobre meu corpo mais uma vez, e lentamente, me tomara. Nossos
olhos se conectaram, e tentei fugir daquilo, sentindo-me tão imersa do que
sequer saberia ressignificar.

Beijei-o, para fugir dos olhos castanhos profundos que pareciam


tocar além de meu corpo. Tudo o que esperava era que fosse rápido e
explosivo, mas pelo contrário, pele contra a pele, finalmente estando livre
para não pensar em nada além do que queríamos, fora além...
Fora lento, libidinoso e surpreendente. Nunca descrevera um
momento como tal. Mas exatamente ali, exausta sobre o tapete preto,

coberta pelo corpo masculino, que distribuía beijos por minhas costas,
como se me marcando como sua rainha, sabia que não poderia esquecer
aquele momento. Spencer deveria ser só mais um, mas ainda assim, era um
próprio deus da luxúria para mim. Ou melhor, da própria perdição.
Capítulo 9

“Killing me slow, out the window

I'm always waiting for you to be waiting below

Devils roll the dice, angels roll their eyes

What doesn't kill me makes me want you more.”[91]

— No que pensa tanto?

A pergunta de Ruby não precisara pesar sobre mim, mas o fazia.


Suspirei fundo e deixei-a com o silêncio. Não queria entender o que de fato
acontecera conosco e apenas considerar que fora uma noite de foda e boa
parte da manhã também. Caminhei até a cozinha e abri a geladeira, na
busca de algo que não sabia. Talvez da minha própria sanidade. Tentava
não pensar muito e fingir que fora só mais uma mulher em minha cama, e

nada mais. Contudo, mesmo com tudo que acontecia ao redor, não era

simples pensar em quanto aquilo fora intenso.

Nunca me sentira de tal forma com alguém, nem de longe. O olhar,


o toque, as palavras, o modo de se mover... Tudo em Ruby parecia
precisamente feito para me deixar de quatro por ela. E eu estava. Fechei a

geladeira, tentando não a bater, recriminando-me por me sentir de tal


forma. Ruby apenas me usava e deixara aquilo claro. Não a culpava, por
mais que não a entendesse. Ela deveria ter motivos para jogar com nossa
família, e eu não tinha o direito de os cobrar. Não significava nada para
ela.

Escorei-me contra o eletrodoméstico e encarei o teto por alguns


instantes, tentando não pensar na mulher sobre minha cama, por mais que
ela fosse a única coisa em minha mente. Via em seu olhar o que busquei

por tanto tempo – verdade. Mas sabia que era tudo o que menos
encontraria com ela. Não a conhecia e mal poderia entender como tinha
aquela admiração por si. Na realidade, o passado fora longínquo entre nós,
e mesmo tendo praticamente a mesma idade, Ruby sempre fora distante.
Nunca entendera se fora o meu foco nos estudos ou as horas que ela
preferia estar a só. Talvez a forma como encarávamos as coisas e
lidávamos com tudo.
Ela tinha sua carga e eu conhecia bem pouco sobre. Na realidade,
poderia saber tudo o que ela fizera nos últimos anos, mas me negava

daquilo. Investigar a vida de pessoas e ler sobre aquilo era algo que nunca
quisera. Era algo que meus pais faziam desde que souberam que eu era o
herdeiro de direito e precisava de uma esposa. Ainda mais, quando
descobriram que para tal, precisavam da assinatura de Ruby. Tudo sobre

ela estava em alguma gaveta de meu escritório, lacrado.

Talvez parte de mim ainda torcesse para encontrar doçura em seu


olhar, longe dos encontros esporádicos e explosivos ao decorrer dos anos.
Ruby era um mistério o pouco que sabia sobre ela, baseava-me no que
nosso avô sempre contara. Segundo ele, ela era a pessoa mais adorável que
ele conhecia, por mais que fosse ambiciosa ao extremo. Perto das pessoas
que conheci ao decorrer dos anos, ambição era quase sempre uma parte da
própria descrição. Aquele não era meu problema para com ela.

Meu problema era ter transado loucamente com aquela mulher e


sentir-me ceder de forma que nunca fiz com ninguém. Por mais que fora
tudo calculado por ela, até ali... Até estarmos nus sobre o tapete,
esquecendo tudo ao redor. Nada daquilo parecia ter sido feito de propósito.
Negava-me em acreditar, ainda mais, pela forma que ela pareceu fugir.
Talvez eu gostasse de me enganar que não era só mais uma peça para ela.
De forma que também tentava colocar em mente que ela não era
importante. Mesmo sabendo que estava apenas tentando enganar a mim
mesmo.

Fiquei deitada na cama, sem querer me mover dentre os lençóis de


cor negra. Spencer se levantou ainda nu e caminhou para fora do quarto,
sem me responder absolutamente nada. Começara a pensar que gostaria de
entender seu silêncio. Levei as mãos ao rosto e balancei a cabeça. Meu

corpo se sentia satisfeito e não conseguira definir o que meu coração


entendia sobre aquilo. Faziam muitos anos que não me sentia próxima de
alguém daquela maneira, a ponto de não pensar em nada. Na realidade,
nunca fora tão intenso.

Levantei-me lentamente e adentrei o belo closet. Acendi as luzes e


encarei os ternos pendurados perfeitamente, assim como, alguns relógios
distribuídos. Era algo comum de se ver em pessoas da condição financeira
de Spencer, mas algo sobre ele gritava que não se resumia naquilo.

Mais ao fundo do closet que estava mais para uma extensão do


quarto, encontrei suas camisetas. Sorri ao notar uma que ele usara quando
éramos mais novos. Lembrava-me de vê-lo a usando quando estudava na
parte da fora de sua casa, que na época, também era a minha. Uma banda

estampava a camiseta, e sorri, cantando baixinho uma das músicas que


amava sobre eles.

“Maybe someday I'll be just like you and

Step on people like you do

Run away, all the people I thought I knew

I remember back then who you were

You used to be calm

Used to be strong, used to be generous

You should've known

That you wear out your welcome and now you see

How quiet it is all alone”[92]


Puxei a camiseta e a vesti, virando-me para o espelho, ainda
cantando a música. Era um dos gostos que compartilhávamos, mas que de

fato nunca falamos sobre. Na realidade, lembrava-me vagamente de


quantas palavras trocamos durante os dezesseis anos que vivemos sobre o
mesmo teto. Suspirei fundo, pensando em como aquilo não deveria
significar nada, e de repente, fazia-me repensar o caminho que tomei até

ali. Precisava colocar a cabeça no lugar e focar no que realmente


importava – a realidade. Spencer não passava de uma nuvem de luxúria, ao
menos, não deveria.

Retirei a camiseta e fiquei nua mais uma vez, e paralisei no


momento em que os olhos castanhos encontraram os meus pelo reflexo.
Não estava acostumada a me sentir intimidada, raras vezes em que aquilo
realmente acontecia. Contudo, olhar para ele, depois do que tinha
acontecido e fingir que não fora nada demais seria pura hipocrisia. Eu

sabia mentir e muito bem, mas não sabia explicar o porquê de


simplesmente não jogar a camiseta no chão e sair dali sem dizer nada. O
recado seria dado e não tocaríamos em assunto algum.

Contudo, eu não era uma megera sem sentimentos, por mais que
por muito tempo me sentira de tal forma. O que Spencer me trazia era algo
que nunca fugira abertamente, mas sempre quis ter. Por que tinha que ser
justamente para com ele?
— Há quanto tempo está aí? — indaguei, já que parecia ter me
perdido nos pensamentos para não o ver chegando.

Ele deu de ombros e caminhou para mais perto, encarando-me


profundamente.

— Tempo suficiente para ver você combinando com a minha


camiseta favorita.

Sorri de lado e senti-me dentro de um dos livros espalhados pela


imensa biblioteca que meu avô mantinha, e que sabia, se tornara
oficialmente minha há pouco tempo.

— Clichê não combina com você, Spencer.

Ele deu mais um passo e suas mãos pairaram ao lado de meu corpo,
há pouco mais de um centímetro de poder me tocar, mas ele não fez o
movimento.

— Comecei a perceber que nem mesmo eu sei com o que realmente

combino.

Poderia ser a intensidade do olhar ou as palavras que senti tão


sinceras, a ponto de fazer meu raciocínio ir a merda e apenas meu coração
tomar conta da situação. Virei-me para ele e deixei a camiseta cair no
chão. Levei minha mão até seu rosto e a barba por fazer me causou um
leve arrepio.
— Me beija. — pedi, sem querer fingir nada.

Um lindo sorriso fora me dado de presente, o qual não vira em seu

rosto até o momento. Se sério ele era um pecado, sorrindo se tornava ainda
mais irresistível. Nossas bocas se encontraram e não parei mais para
ponderar nada. Que tudo esperasse ou que se explodisse. Não sabia mais o
que de fato estava em jogo, se aquilo poderia ser considerado um. De toda

forma, meu coração entrara em jogo e estava a ponto de perdê-lo. Tão fácil
quanto respirar, era me entregar novamente para Spencer. Aquilo sim,
assustava-me imensamente.
Capítulo 10

“I'm jealous, I'm overzealous

When I'm down, I get real down

When I'm high, I don't come down

I get angry, baby, believe me

I could love you just like that

I could leave you just this fast.”[93]

— Acha mesmo que isso pode funcionar?

— Sim, senhor Donovan. — Parker falou e me estendeu o copo de


café. — Precisa de mais alguma coisa? — indagou e encarei rapidamente o
horário. Já passara do horário da saída de todos, e não era justo deixá-lo
preso ali.
— Não, está tudo tranquilo. — menti pela centésima vez naquele
mesmo dia. — Pode ir para casa. Obrigado pelo café, Parker.

— Até amanhã, senhor Donovan.

Meu assistente deu-me um leve aceno e se afastou. Assim que a


porta fechara atrás de si, acabei soltando o ar que mal sabia que mantinha.
Encostei a cabeça contra a cadeira e respirei profundamente. Peguei o café

e o levei a boca mais uma vez. Os últimos dias tinham se arrastado daquela
forma. Tentava ficar o quanto podia na empresa, completamente atolado de
trabalho para simplesmente não ter que voltar para casa. Voltar para casa
significava voltar para Ruby. Tal pensamento me deixava insone. No caso,
ela começara a me tomar pensamentos, momentos e principalmente, meus
sonhos.

Desde que cedemos um ao outro e acabamos transando, as coisas


simplesmente ficaram estranhas demais para se lidar. Apenas o seu olhar

me deixava a ponto de querer ir até ela e beijá-la. De querer agir como algo
que sequer éramos. De algo que deveríamos fingir fora daquele
apartamento. Suspirei fundo e abri os olhos, depositando o copo sobre a
mesa. Levantei-me e caminhei até a grande janela que me dava a vista
perfeita de prédios. Encostei uma mão ali e tentei encontrar a sanidade que
perdera no momento em que a reencontrei em Londres.

Era para ser uma simples assinatura de papéis, que acabou virando
minha vida de cabeça para baixo. Meus pais faziam um interrogatório novo

a cada dia, com certeza, para tentar descobrir algo. Eles desconfiavam

daquele relacionamento, e poderia jurar que a maioria das pessoas fazia o


mesmo. O difícil era sorrir e dizer que era apaixonado por Ruby, não por
ser uma simples mentira. Mas porque me vi dizendo aquilo e sentindo que
não era tão mentiroso quanto deveria.

Sentia-me burro por ser fraco. Ruby me usava e eu deveria apenas


ser indiferente. No fim, estava a ponto de surtar por saber que o casamento
aconteceria dali algumas semanas, perto do prazo final para que a empresa
fosse passada para o meu nome, e de acordo com o que assinei para com
ela, para o seu nome. Ruby sabia daquilo, e o usou perfeitamente.

Enquanto eu chegava em casa na madrugada por conta do trabalho,


as vezes sequer a encontrava no ambiente, o que deveria ser um alívio, e
que diferia do momento em que acordava e a encontrava chegando. Era um

sentimento estranho em meu peito e não queria aceitá-lo. A realidade era


que não poderia. Um dia, quando ainda éramos jovens e mal nos
falávamos, eu a via como um sonho proibido. Ela era linda e debochada,
diferente das pessoas de meu círculo. Existia uma selvageria em Ruby que
sempre me atraiu, mas nunca de fato cheguei a pensar que me causaria
algo além. O tempo passou e ela causara. Naquele exato momento.

Senti mãos passando por minha barriga e meu corpo a aceitou,


como se fosse a droga que tanto necessitava naquele exato segundo.

— Nunca o vi tão pensativo.

Meu corpo tensionou e repeli o toque de Hannah no mesmo


instante. Minha ex namorada e que chegara a ponto de cogitar ser a pessoa
certa para aquele casamento. Contudo, Hannah trazia consigo uma
dependência que nunca soube lidar. Ela dizia me amar, mas sabia que era

apenas através do meu sobrenome e dinheiro. O que descobri


perfeitamente ao encontra-la transando com outro. Aquilo não me doeu em
nada, e fora devastador entender que me casaria com alguém sem sentir o
mínimo de qualquer sentimento. Fora ali que dera um basta, e voltara para
Diana, a única mulher que cheguei a cogitar sentir algo de fato. Ela fora o
mais perto que cheguei de paixão e por um momento, imaginei que seria a
pessoa certa.

Baixei minhas mãos para as de Hannah e as segurei para tirá-las

dali de forma que não parecesse grosseiro.

— Que cena linda.

Aquela voz eu reconhecia e se não fosse o fato de estar perdido


pela dona da mesma, jamais teria deixado que Hannah chegasse tão perto.

— Deixa eu adivinhar... Ex? — a indagação de Ruby pareceu


feroz, e afastei Hannah no mesmo instante. Assim que me virei para ela,
notei que seus olhos negros pareciam a ponto de me crucificar ali mesmo,

por mais que usasse de sua falsa calma. — Não gosto de pesquisar a vida

alheia, mas... Eu vi o jeito que olhou para o meu noivo na galeria, e


agora...

— Estávamos só conversando. — Hannah falou, e meu foco


permaneceu em Ruby. Não sabia o que dizer, e claramente, não entendia

porque diabos queria me explicar. Não existia nada real entre nós. Era
apenas um jogo que ela vencera, e não passaria daquilo.

Tentava acreditar fielmente em meus pensamentos.

— Pena que eu não ouvi som algum. — Ruby deu alguns passos a
frente e me surpreendi por vê-la vestida em trajes de corrida. — Estava
passando por aqui e bom... Resolvi dar um olá. Podemos dar continuidade
a conversa. — falou e se sentou na cadeira a frente de minha mesa,
claramente não se importando com o que acontecera.

Eu era um imbecil.

A ponto de pensar que Ruby se incomodara com a cena que vira.


Era apenas uma atuação para ela, e ela seguia como queria.

— Na verdade, Hannah já está de saída. — comentei, finalmente


encontrando minha voz. Ruby me desestabilizava há dias, e sua presença
ali, era mais do que o bastante para me deixar perdido de vez.
— Spencer... — Hannah me encarou e notei o olhar triste. Contudo,
mesmo que não sentisse nada por ela, a sua traição apenas me mostrou que

jamais seria confiável. Aquilo era o bastante para simplesmente não a


querer ali.

— Sabe que já conversamos tudo o que tínhamos. — falei,


lembrando-me de quando ela quis voltar, meses atrás.

— Ok. — falou e se virou para Ruby, estendendo-lhe a mão. Ruby


a cumprimentou e notei que seu olhar mudara. — Sou Hannah, a
propósito. É um prazer.

— Ruby. — falou e se afastou do toque de Hannah.

Assim que a mulher loira deixou a sala, com a porta a suas costas,
Ruby revirou os olhos e se pôs de pé.

— Prazer é o cacete. — soltou de repente e notei seu rosto ficar


vermelho.

Não consegui segurar, vendo-a ali, completamente irritada. De


alguma forma, aquilo mostrara que Ruby estava incomodada e não era tão
imbecil assim. Acabei gargalhando da cena, enquanto ela pegava o café
sobre a mesa e levava a boca. Seu olhar foi fatal e sabia, que depois de
terminar o líquido, ela estava prestes a me matar.
— Qual a maldita graça, Spencer? — indaguei, segurando-me para
não lhe jogar o café que agora depositava sobre a mesa.

Coloquei minhas mãos sobre a mesma e o encarei friamente. Ele


gargalhou ainda mais, e sentia-me a ponto de socar sua cara. Tudo que
pensara era em quão iludida me tornara. Não estava correndo, sequer
deveria estar naquela região. Mas de repente, vi-me colocando a roupa,
como se para disfarçar o fato de que iria para a empresa naquele horário

justamente para encontrá-lo. Spencer fugia há dias, e pensei que nada


melhor para tentar conversar com ele, do que longe do seu apartamento.
Aquele lugar parecia gritar os momentos que passamos juntos, e tinha que
admitir, parecia sufocante.

Um: porque o homem que me tocara e me enlouquecera estava no


quarto ao lado.
Dois: porque eu o queria de novo e não sabia como poderíamos
conciliar aquilo.

Três: porque Spencer parecia fugir de mim como o diabo foge da


cruz.

Quarto: ali estava eu, prestando-me ao papel de besta do ano,


deixando-me levar pelo fato de que ele parecia tão atormentado quanto eu.

Seu espaço parecia gritar aquilo. Não poderia estar mais errada.

— Será que dá pra parar de rir e me encarar como um ser humano


normal? — indaguei já furiosa e peguei a primeira coisa que vi a frente,
uma caneta, e joguei sobre ele.

— Ruby, eu estou te olhando. — comentou, ainda sorrindo e tive


que respirar fundo para não o mandar a merda. — Qual o problema, afinal?

— Sério? — abri os braços, e os coloquei na cintura. — Sério


mesmo que está me fazendo essa pergunta?

— Queria entender o porquê de ainda estar agindo como uma noiva


ciumenta. — paralisei diante de suas palavras, como se minha ficha caísse
por completo. Tentei disfarçar o que aquilo me causara, mas no segundo
seguinte, se tornara impossível. — Se lembro, não existe cláusula de
fidelidade no que assinei.

Não sorri, e sequer esbocei reação. Ali entendi que realmente me


tornara patética pelo simples toque do homem a minha frente. Spencer
jogou comigo e sequer notei o quanto poderia me magoar profundamente.

Desconhecia aquele sentimento, até o momento de encontrá-lo nas mãos


de outra, da mesma forma que estivera nas minhas. Não era apenas ciúme
que existia ali, era mais. E naquele exato instante, odiei-me por me sentir
de tal forma.

— Sabe de uma coisa? — indaguei, e o encarei profundamente. —


Apenas vá para o inferno e permaneça lá.

Dei-lhe as costas e saí dali o mais rápido que pude. Minha cabeça
dava voltas e não sabia porque parecia tão certa de que acabara de sentir
meu coração trincar. Não era para sentir nada. Absolutamente. Mas ali
estava eu, adentrando o elevador da empresa da família, sentindo-me uma
adolescente renegada. Ali percebi que ninguém comanda o grande jogo da
vida, e que antes mesmo de perceber, permiti meu coração ser colocado em

xeque.

Encarei meu reflexo e neguei me sentir tão mal aquele ponto. Ao


ponto de agir de forma ciumenta por alguém, e aquilo, não ser apenas
atuação. Fora tão natural quanto pensar em Spencer por todo dia. Fora
natural quanto imaginar que de alguma maneira poderia fazer as coisas
boas para nós, mesmo que no fim, não fossemos ficar juntos. Fora tão
natural quanto gostava de passar meu tempo dançando para esquecer
qualquer problema.

Tinha um problema: Spencer. Tinha a solução: dançar. Com o

bônus de encher a cara e esquecer que por algum momento cogitei viver
um romance real de dias contados com aquele homem.
Capítulo 11

“I'm not a sinner

He wasn't the one

Had no idea what we would become

There's no regrets

I just thought it was fun.”[94]

A noite terminou bem mais cedo do que eu pretendia.

Suspirei pesado, sentindo-me cansada. Queria ter conseguido me


divertir e esquecer a raiva que sentia por Spencer. O problema de sentir tal
raiva era que ela fora desencadeada por ciúme. Um ciúme que eu não devia
sentir. No fim das contas, sentia-me presa em minha própria armadilha.
Spencer nunca ficara 100% no passado e eu sabia daquilo, pela forma
como parecíamos tão conectados no presente. Ao menos, de minha parte.
Deveria ter enterrado a Ruby impressionada por seu primeiro amor.

Contudo, nada era tão simples. No final, cogitei a possibilidade de que

fosse real para ambos no agora. Não o era.

Adentrei o apartamento e como de praxe, joguei meus saltos para


longe. Odiava ficar calçada dentro de casa. Como se pudesse chamar

aquele local daquilo. Caminhei em direção a cozinha e abri a geladeira,


retirando uma garrafa de água. Sentia-me imersa em pensamentos, como se
cogitando simplesmente não ficar mais ali. Contudo, seria como ceder à
pressão de Spencer, e não queria dar-lhe tal gostinho. Encostei-me contra o
balcão e quase bebi a garrafa toda. Nunca uma noitada terminara de forma
tão inusitada.

Deixei a garrafa vazia sobre o balcão e saí dali, passando pela sala
de estar. Quase dei um pulo para trás e o grito ficou preso em minha

garganta, assim que notei Spencer sentado em uma poltrona. Mesmo no


escuro era possível notar seus trejeitos, assim como, o peito exposto.

— O que diabos faz no escuro? — indaguei, recuperando-me do


susto.

— Te esperando. — encarei-o incrédula e já ia sair dali. —


Precisamos conversar.
— Sobre o que? — rebati, e cruzei os braços. — Se está a fim de
piorar minha noite, saiba que...

— Deve ter se divertido muito. — comentou, levantando-se e vindo


em minha direção.

Assim que parou a cerca de dois passos, queria apenas mentir que
tinha estado com alguém e até mesmo atingi-lo daquela maneira. Mas a

quem eu gostaria de enganar? Spencer não se importava.

— Menos do que eu realmente gostaria. — fui honesta, e ele deu


um passo a frente. Coloquei uma mão entre nós e toquei seu peito,
afastando-o. — Só me deixe em paz, Spencer.

— O que fiz de errado? — indagou e me afastei ainda mais, dando


passos em direção a janela.

— Não fez nada, a única idiota aqui sou eu. — falei e lhe dei as
costas, não tendo coragem de encará-lo. Não queria uma conversa como

aquela, mas ali estávamos. Por que eu mentiria? — E pode adicionar


iludida a lista.

— Do que está falando, Ruby? — sua voz soou baixa. — Sou o


único que tem sido usado aqui.

Virei-me no mesmo instante e o encarei ainda mais incrédula.

— Usado exatamente para o que? — minha voz se alterou, e sabia


que estava por um fio de gritar.

— Para tudo. — era impossível decifrar seu olhar, e no segundo

seguinte ele o desviou.

— A única coisa que usei você foi para o que sabe muito bem.
Sobre a empresa. Agora nós? — ri sem vontade, sabendo que sequer
existia tal denominação. — Transar foi algo que simplesmente aconteceu...

Acha o que? Que eu... Que eu ia te seduzir para usar isso contra você?

Ele não me encarou e sabia que sua resposta era positiva. Spencer
realmente pensava aquilo, e não entendia o porquê parecia preocupá-lo.

— Sabe o pior de tudo? É que como sempre sou a pessoa má na


situação. Gosto de ser, devo admitir. Mas... Mas vamos ser francos,
Spencer. A gente transou e foi algo intenso, mais do que realmente pensei
que seria. Eu tentei agir normalmente e você praticamente fugiu do seu
próprio apartamento, e não nos falávamos há dias. O que eu encontro

quando vou te ver para tentar conversar e melhorar as coisas? Você já está
fodendo outra! — falei, as palavras saindo amargas de minha boca. —
Então não banque o bom moço e pare de jogar comigo sobre isso.

Passei pelo mesmo e naquela noite, com certeza iria para o meu
apartamento. Não tinha a mínima vontade de ficar sob o mesmo teto que
ele, não após me expor daquela forma. Aquilo me matava por dentro. Me
matava por estar tão perdida por alguém e sequer saber o que ele sentia. A
não ser o fato de ser tão facilmente deixada de lado.

Ele me impediu de sair, segurando-me levemente e me puxando


para si. Indo contra meus pensamentos não me movi, presa ao seu peito.
Sabia que queria estar ali, por mais que não devesse.

— Eu estava apavorado. — sua confissão me tirou o chão e fiquei

paralisada. — Ainda estou, Ru. Eu não esperava a intensidade que foi, não
esperava me sentir de forma tão fácil em suas mãos. Pensei que ficou
comigo por outro motivo.

Fora ali que vira, pela primeira vez, toda a fragilidade daquele
homem. Recordando-me imediatamente ao menino pelo qual fora
apaixonada. Spencer parecia ter aprendido a guardar seus reais sentimentos
em algum lugar, mas ali... Ali ele perecia sem armadura.

— Eu não estou com Hannah, nem ninguém mais. — encarei-o, e

busquei qualquer mentira. — Eu não a vi chegar, e quando me tocou, até


pensei que fosse você, mas no segundo seguinte...

— O que realmente quer me dizer, Spencer? — indaguei e subi


uma mão ao seu rosto, deixando com que minha armadura fosse ao chão
também.

— Que me atormentou a ponto de não conseguir ficar sob o mesmo


tempo que você e fingir naturalidade. Porque eu não sei o que sinto e isso

me apavora. — fiquei estática, absorvendo suas palavras. — Nunca me

apaixonei por ninguém, Ru. Nunca senti tudo de uma forma tão

— Intensa. — complementei e encarei-o profundamente. — Por


que a gente só complica as coisas?

— Medo? — ele parecia buscar alguma explicação, assim como eu.

— A gente mal se conhece, Ru.

— Acho que nossos corpos pensam de forma diferente. — assumi e


um leve sorriso se abriu no belo rosto, como se aliviado por entender que
me sentia da mesma forma. — Podemos tentar, Spencer. Nada nos impede.

Ele encostou nossas testas e suspirei fundo, sentindo-me presa em


seu feitiço. Senti seus lábios nos meus e sorri, aceitando o beijo. Apenas
passara alguns dias sem o seu toque, mas ainda assim, era como se
tivessem se tornado décadas. Como das outras vezes, ele me tocava e

sentia que nada mais importava, e que era ali que deveria estar.

Fora ali que entendi de fato que estava me permitindo estar


apaixonada por aquele homem. Quando os olhos castanhos me encararam
sem restrições e pareceu me olhar como seu mundo. Naquele momento,
estava encarando de frente o que pudesse acontecer. Encarando de frente
tudo o que Spencer me fazia sentir.
— O que tanto olha? — indaguei enquanto Ruby estava deitada
sobre a cama, encarando a vista que tínhamos dali.

O corpo nu, envolto por um lençol abaixo do quadril. O cabelo


bagunçado, e que a poucos minutos estava entre os meus dedos. Olhando-a
dali, sabia que se ela fosse um pecado, eu pecaria sem medo.

— Gosto de olhar. — comentou baixinho, e seu olhar negro

encontrou o meu. — Mas tenho uma boa vista aqui também.

Sorri para ela e a puxei para perto. Ela colocou um cotovelo sobre
meu peito e me encarou. Nunca a sentira tão leve e parecendo tão
despreocupada como ali. Talvez porque eu me sentia daquela forma.

— Então me conta. — pediu e a encarei sem entender. — Hannah.


Por que não a levou para o altar? — indagou e sorri de lado, lembrando-me
de sua cena de ciúmes. — Não me olha assim! Sou tempestiva e me senti

uma idiota por...

— Eu gostei daquilo. — admiti, e dei-lhe um leve beijo nos lábios.


— Gostei porque mostrou que não era apenas eu a ponto de ficar louco.

— Gostou tanto que jogou na minha cara que não temos que ser
fiéis. — apontou e assenti.

— Joguei baixo. — admiti, e dei de ombros em seguida. — Acho


que apenas queria te causar um pouco do que faz comigo. Chegando aqui
na madrugada ou bem cedo do outro dia... Isso estava me matando aos
poucos, Ru.

— Sabe que eu odeio esse apelido, não é? — indagou e tive que


sorrir de sua careta. — Ninguém nunca me deu um, e você insiste nesse
horrível.

— Gosto como soa algo que sempre me lembrou você. — comentei

e ela assentiu, como se fizesse algum sentido.

— O que não faz dele menos do que horrível. — sorri, e ela fez o
mesmo. — É como te chamar de Spen... ou pior, Pen... — ela franziu o
cenho, e acabou gargalhando baixinho. — Seu nome não ajuda muito.

— Você me chamou de príncipe. — comentei e ela pareceu querer


dizer algo, mas abriu a boca e nada saiu. — Ruby?
— Queria poder dizer que foi apenas para provocar os Donovan,
mas... Enfim, essa é uma história para outro momento. — tocou meus

lábios com os dedos, antes que pudesse retrucar. — Não fuja do assunto
Hannah.

— O que posso resumir? — indaguei para o nada. — Conheci


Hannah em uma reunião e depois ela acabou indo até minha boate...

— A boate que você tem contra todos os ensinamentos dados pelos


pais. — provocou e tive que sorrir. Era a realidade. — Mas depois falamos
disso, me conte dela.

— Enfim, começamos a sair e o namoro aconteceu... Resumindo,


eu a peguei na cama com outro, e vi que não tinha como cogitar casar com
alguém que não me causou nada ao ver a traição, além de que, não
confiava mais nela.

— Uou! — os olhos negros se arregalaram. — Nunca imaginaria,

aquela cara de anjo... — pareceu pensar um pouco. — Se bem que ela


ainda quer você.

— Ela não gosta de perder, só isso. Hannah é acostumada a ter tudo


o que quer, e bom... Sou só mais uma coisa para ela.

— Por que eu sinto que se rebaixa? — sua pergunta me pegou


desprevenido e fiquei sem saber como responder. — Parece que está
mesmo acostumado a pessoas que estão com você, mas não por você. Isso

faz sentido?

Não precisava pensar para lhe responder, mas sabia da real


situação. Fora uma vida inteira sendo cercado pelo sobrenome e dinheiro
que tinha. Rara as vezes em que alguém estava comigo além daquilo. Ruby
não tinha ideia, mas vê-la ali, interessada em me conhecer me surpreendia.

Porque esperava que ela fosse como todos os outros, ainda mais por ser tão
ambiciosa. Ela quebrava mais um paradigma ali.

— Acho que de todas as pessoas que me envolvi, duas no máximo


ficaram comigo sem se importar com meu nome. — confessei e tentei
parecer inerte aquilo. Contudo, aquilo me atormentava um pouco. Ser
resumido apenas ao que tinha e não ao que realmente era.

— Diana Carter? — indagou e seu olhar pareceu mudar.

— Com certeza. — respondi sem delongas. — Dia é uma boa

pessoa e realmente pensei que poderia dar certo.

— Você não a amava? — indagou e aquilo levantava uma grande


questão. Sua acusação meses atrás, sobre eu usar Diana. — Ela me contou,
enquanto adentrava o apartamento dela naquela noite em que a
encontramos bêbada na balada. Ela é uma bêbada falante, e disse que você
era especial e que a amava, mas que ela não podia te amar como merecia
para se casarem. — Ruby parecia incomodada e mordeu o lábio inferior,
como se tensa por aquilo. — Por isso te acusei de dizer que a amava para

se casarem.

— Estava certa sobre isso. Achei que se mentisse que a amava,


Diana cederia. — fui honesto. — No fundo, foi o melhor ela não ter
correspondido um falso sentimento. E você com Paul?

Sabia que ela tivera algo mais duradouro do que o habitual com
Paul Russell, um dos melhores amigos de infância de Diana.

— Paul foi o mais perto que cheguei de namoro, mas nunca me fez
sentir algo diferente. — deu de ombros, e pareceu pensar a respeito. — Na
verdade, sempre joguei com ele e não me orgulho disso. Fico feliz que ele
encontrou alguém que o ame de verdade e que tenha deixado o que
tivemos para trás. Nunca fui a pessoa certa para ele.

— Soube da discussão que tiveram na boate, meses atrás... — soltei

o que acabara sabendo por alguns seguranças e ela assentiu, parecendo


envergonhada.

— Estava muito bêbada naquela noite, a ponto de falar todas as


porcarias que vinham em mente.... — admitiu, pareceu pensar sobre. — A
verdade é que a morte de Kirian me marcou muito, e tentei buscar apego a
quem um dia pareceu realmente se importar comigo. No final, percebi que
estava apenas sendo patética. E que poderia acabar destruindo o que sequer
me pertencia.

Ela então parou e pareceu me analisar, como se encontrasse algo


realmente bonito em minha face. Era além da admiração que recebia de
outras pessoas. Era a forma curiosa com que me encarava, até mesmo,
como se estivesse encantada.

— O que foi?

— Nada. — comentou e tocou meu rosto, traçando minha barba. —


Gosto de olhar para você.

Puxei-a mais para perto. Sobre meu corpo, memorizei cada


pequeno detalhe daquela mulher. Conhecia-a pouco, e queria saber muito
mais. O mais me assustava, mesmo assim, era a primeira vez que me sentia
embarcar em algo real. A realidade era bela enquanto Ruby estivesse em
meus braços.
Capítulo 12

“My love was as cruel as the cities I lived in

Everyone looked worse in the light

There are so many lines that I've crossed unforgiven

I'll tell you the truth, but never goodbye.”[95]

— Acho que seria interessante... — joguei no ar e o olhar de


Spencer encontrou o meu. Ele estava dando nó em sua gravata de cor
cinza. Combinava com ele e realçava os olhos castanhos. O mais estranho
de toda aquela situação, era o fato de gostar tanto dela.

— O que? — indagou, e fiquei de joelhos na cama.

O mais estranho era que aquela era apenas a sua cama há alguns
dias, mas ali estava eu, com a velha camiseta dele, em meio aos lençóis
negros, encarando-o, após passarmos mais uma noite juntos. Poderia ter

me perdido entre elas. Talvez completassem dois dias desde que acabamos
simplesmente parando de lutar contra a química que sentíamos. Aqueles
dias pareciam como duas décadas em alguns momentos, e se tornavam

apenas dois milésimos quando me via sentindo sua falta.

Era estranho sentir falta de alguém. Ainda mais, a pessoa sendo


Spencer. Ele sempre esteve lá em alguma zona cinzenta de minha vida, e
ali, finalmente, eu o enxergava. Aos poucos, eu o descobria e com toda
certeza, não estava preparada para aquilo. Contudo, perguntava-me quando
foi que não dei uma chance a pessoas? Sempre dava. Com ele, não seria
diferente. Ainda, pela forma como ele me fazia sentir.

— Bom, começar a frequentar mais a empresa. — comentei, e dei


de ombros. A surpresa em seu semblante era cômica. — Sou mestre em

finanças, Spencer. — sua boca praticamente caiu e tive que sorrir de lado.
— Sabe muito pouco sobre mim...

Deixei a frase morrer, e ele veio a passos certeiros em minha


direção, curvando-se. Recebi o leve beijo nos lábios e sorri no meio do
mesmo.

— Por isso quero saber mais, e muito mais... — comentou, dando-


me um leve carinho no rosto e mais um beijo. — Tem ações na empresa e
sempre pode estar lá... Por que nunca o fez?

— Acho que porque gosto de ser a parente odiada de todo mundo,

que leva o nome da família a lama. — dramatizei e fiz um gesto contra a


testa.

Spencer sorriu baixo, naquele tipo de risada que marca o momento.


Gostava daquela versão real, onde ele não parecia apenas compenetrado

em não mostrar tudo. O pouco do todo que conhecia parecia bem mais
bonito, e não pelo físico.

— Com certeza foi citada em alguns jantares de família. — soltou e


tive que rir.

— Todo mundo acha que vivo do dinheiro dos homens que me


envolvo, e bom, algumas mulheres também. Mas sempre existiu o dinheiro
que meus pais deixaram que voltei para os estudos, além de um ótimo
lugar para viver na cidade. — Spencer pareceu completamente

despreocupado com aquilo, o que me surpreendera. — Não nego que já me


envolvi por dinheiro, e não tenho vergonha de admitir, assim como, o fiz
para conseguir chegar a pessoas certas e sentir que era importante de
alguma forma. — dei de ombros. — Depois de um tempo percebi que era o
dinheiro e mais nada que me satisfazia em meio a todo glamour de pessoas
importantes e seus milhões... Acho que fiz mais porque gosto de jogar, ao
menos, gostava muito...
— E hoje? No agora? — perguntou, sentando-se na cama, e me
encarando profundamente. — Ainda joga?

— Acho difícil as pessoas entenderem e nem espero compreensão.


Mas eu gostava da adrenalina de fingir ser o que não era e seduzir quem
desejava, e ainda poder ter dinheiro com isso, mesmo que a pessoa sequer
percebesse que o fazia. Hoje em dia jogo de forma clara, ao menos.

— Theo Carlisle? — indagou, e notei a forma como seu maxilar


ficou rígido. Spencer ciumento era uma versão que sequer esperava.

— Uma aventura com data para acabar. — comentei, sem me


importar

O olhar de Spencer mudou e tentei desvendá-lo, porém, pareceu


impossível.

— Ei! — falei, e toquei seu rosto. — O que foi?

Nossos olhares se conectaram de forma intensa e esperei a resposta,

que infelizmente fora engolida pelo toque de seu celular. Spencer se


levantou e foi até o aparelho.

— Bom dia, Parker. — falou e ficou em silêncio em seguida. Notei


que respirou profundamente e pareceu incomodado com algo. — Peça para
que Drake espere aí, estou a caminho.

Ele desfez a ligação e seu olhar voltou ao meu. Veio até mim
rapidamente e me deu um leve beijo.

— Problemas? — indaguei, e ele fez que não.

— O de sempre, na verdade. — levantei-me e toquei seu peito, e o


vi ficar tenso. Não sabia ao certo o que o incomodava de fato, mas ficara
em alerta.

— Daqui algumas semanas vai me ter para resolvê-los. — pisquei

um olho e notei a forma como tentou sorrir, mas pareceu sem vida. —
Tenha um bom dia.

— Obrigado, Ruby.

Ele se afastou e fiquei ali, parada no meio do quarto, sem saber o


que pensar, sem imaginar o que realmente havia mudado em poucos
minutos.
Minha cabeça estava cheia, e em sua maioria de paranoias. Talvez
até fossem teorias válidas, mas não gostaria que alguma fosse de fato.

— Senhor Donovan?

A voz um pouco alterada de meu assistente fez com que saísse de


meu devaneio e o encarasse. Parker parecia ligeiramente surpreso por me
ver daquele jeito. A realidade era que Ruby mexia demais comigo, e aquilo

começava a me consumir, por não saber de fato como lidar. O que mais me
apavorava era que por mais sincera que ela parecesse e a sentisse daquela
maneira, poderia não sentir nem de perto o que eu carregava no peito.
Aquela intensidade me matava, mas poderia apenas incomodá-la a ponto
de me querer. O meu maior medo era ter a certeza de que Ruby era livre
demais para querer ficar apenas comigo, e que um dia, apenas a veria
partir.

— Sim, Parker? — perguntei, tentando me focar no que realmente

importava – o presente.

— Gostei do olhar de CEO perdido. — a voz que levava toda


minha sanidade me encontrou, como um alívio. Levantei o olhar e
encontrei os escuros de Ruby, como um reflexo de meu tormento. —
Ainda mais, estou admirada por ter um assistente tão bonito.

Minha visão se perdera da mulher vestida elegantemente em um


terno a minha frente, e pairou sobre Parker, que pareceu a ponto de sair
correndo dali. Ruby era intimidadora e algumas pessoas poderiam não

saber lidar com sua sinceridade. Naquele momento, vendo-a se apresentar


para meu assistente, mais novo e com certeza atraente, indaguei-me se de
fato sabia lidar com aquilo. Suspirei fundo e tentei forçar um sorriso, que
com toda certeza, não chegara aos olhos.

— Pode nos dar licença um instante, Parker? — indaguei e o


homem que estava em pé assentiu rapidamente, saindo da mesma forma de
minha sala.

Encostei-me contra a cadeira e fechei os olhos, negando-me sentir


toda a imensidão e a bagagem que vinham junto de Ruby. Era inegável que
pela primeira vez sentia-me completamente inseguro e até mesmo
ciumento, como se não soubesse de fato como lidar conosco.

— Acho que sempre gosta de aparecer de fininho. — comentei,

ainda de olhos fechados, e ouvi sua risada baixa, declarando que ela estava
próxima.

Senti seu corpo se acomodar sobre o meu e a recebi prontamente.


Era o poder que aquela mulher desenvolvera sobre mim – uma inegável
atração. Lembrava-me de que não adiantava lutar, já estava perdido.

— Acho que se tornou meu novo passatempo favorito... te


surpreender. — abri os olhos no mesmo instante, sendo pego realmente de
surpresa por sua resposta. — O que se passa nela linda cabeça?

Sorri verdadeiramente e ajeitei-a melhor sobre meu colo. Uma de


suas mãos fora em direção ao meu rosto e a outra permaneceu depositada
sobre meu peito.

— Alguns questionamentos. — confessei, sem querer dar alarde

para o que realmente me angustiava. Era ela, por inteira. Mas ali estava,
sobre meu corpo. Entendia que enquanto ela se propusesse a estar apenas
assim comigo, seria capaz de lidar. O fato maior era – viver a única coisa
que realmente existia – o presente. Nele, Ruby era minha para adorar, e
aquilo me bastava. De um jeito ou de outro.

— Eu tenho vários também. — comentou e acariciou minha barba.


— Resolvi algumas coisas do casamento e aproveitei para passar e
conhecer mais sobre a empresa... Caso não esteja muito ocupado, claro. —

apressou-se em explicar, e seu rosto ganhou um leve tom rosado.

Aquela versão sem jeito e sem máscara alguma era a qual ela me
presenteava, em momentos que sequer imaginei viver. O mundo poderia se
contentar com apenas a versão fatal ou polida da mulher sobre meu colo.
Mesmo que nos conhecêssemos por uma vida, no pouco tempo em que
realmente comecei a fazê-lo, percebi que recebia mais do que realmente
esperava. Sentia e via, mesmo que fosse uma invenção interior, a versão
completa de Ruby. E toda ela, me encantava.

— Eu posso a partir das três. — comentei, e encarei o relógio

rapidamente. Eram em torno de uma e quarenta e cinco. — Tenho uma


reunião importante agora, se quiser participar...

— Sério? — indagou, claramente surpresa e os olhos negros


levemente abertos.

— Sim. — dei-lhe um leve beijo, não resistindo a curta distância.


— Logo será ainda mais presente, quando for dona de metade de tudo isso.
— indiquei com um dedo ao redor, e ela assentiu, sorrindo.

— Nós dois, lado a lado, por vários dias da semana... Será que isso
vai dar certo? — perguntou, mordendo levemente meu lábio inferior. Ela
sabia exatamente onde me tocar para que esquecesse tudo. — Acho que
tenho alguns fetiches dentro da gaveta, que precisam ser vividos.

— Posso viver todos com você.

Ela não esperou mais e sua boca encontrou a minha. Pensei que o
beijo seguiria seu caminho pelo desespero, mas de repente, apenas senti as
mãos entrarem levemente por meus cabelos, assim como fiz com ela, e
nossas línguas se encontraram docemente, como se provando de um sabor
que nunca permitiriam que fosse perdido.

Era sabor do desconhecido.


Era sabor de verdade.

Era sabor do que queríamos.

Principalmente, do que sentíamos. Um gesto poderia falar mais que


mil palavras, e naquele momento, tive certeza. Estava irrevogavelmente
preso no feitiço dela. Eu estava apaixonado por Ruby.
Capítulo 13

“Help me

It's like the walls are caving in

Sometimes I feel like giving up

But I just can't

It isn't in my blood.”[96]

Terminei de prender o cabelo curto no alto e coloquei um grampo,


para que a franja não me atrapalhasse. Tinha um compromisso rápido com
uma fotógrafa do ensaio pré casamento e depois passaria na empresa para
encontrar Spencer. O dia a dia juntos parecia voar, e de repente, palavras
não eram necessárias.

A gente entendia um ao outro, mesmo que no silêncio ou falando


sobre tudo. Ainda não conversara com ele a respeito do que sabia do
passado e porque acusava Dana de diversas coisas, contudo, temia que

aquele assunto fosse além do que poderia abrir para ele. Por mais que não
me importasse com a maioria dos Donovan, eu me importava com

Spencer. Mais do que um dia imaginei, e até mesmo do que deveria.

Encarei a carteira de cor cinza sobre o aparador e sabia que não era

a minha. Abri levemente e vi a carteira de motorista de Spencer. Neguei


com a cabeça e deixei-a sobre o móvel, pegando meu celular em seguida
para discar seu número. Antes que desse o primeiro toque, a porta de
entrada do apartamento se abriu, e já imaginando-o ali, desfiz a ligação e
dei um sorriso na direção. No segundo seguinte, meu sorriso morreu.
Cruzei os braços, deixando o celular sobre o aparador, e encarei Dana
Donovan, que parecia transtornada.

Eu não a odiava, mas dizer que existia algum sentimento bom por

ela seria uma completa mentira. Ela era minha tia, ou até mesmo, deveria
ter sido algo parecido. Contudo, ser afetuosa nunca foi seu forte, ao menos,
não para comigo.

— Preciso admitir que até demorou mais do que eu esperava para


aparecer. — comentei, encostando-me contra o aparador e a encarando.

Ela então olhou ao redor, com a pose de madame intacta, como se


pudesse me enganar com seu olhar superior ou me fazer sentir inferior por
sua postura. Dana não tinha ideia do quanto me colocar para fora de casa

aos dezoito anos, mudou completamente a minha percepção de medo. Eu

não tinha medo de nada, muito menos, dela.

— Spencer já saiu para o trabalho. — falei, respondendo sua


pergunta silenciosa e ela parou de olhar ao redor, como se dando certeza
que era a ele que procurava. — O que quer aqui?

— Essa é a casa do meu filho, posso vir quando quiser. —


praticamente cuspiu, parando a alguns passos e acabei sorrindo de lado.

— Engraçado que não consigo te imaginar como mãe cuidadosa,


que honra pelo filho todos os domingos, ou que liga perguntando se está
tudo bem... — provoquei e seus olhos endureceram, como se fossem
capazes de me jogar farpas. — Direto ao ponto, Dana!

— Eu vim falar com você, Ruby. — dei de ombros e permaneci


parada no segundo seguinte. — Sei que armou para Spencer e que o está

usando para ficar com metade da empresa.

Não neguei e continuei a encará-la de forma passiva. Não me


surpreendia ela descobrir tal coisa.

— Vai dar um fim a isso. Agora! — praticamente ordenou e acabei


gargalhando alto, sem conseguir me conter. — Não estou brincando,
Ruby!
— E eu por acaso estou? — indaguei, e parei de sorrir. — O que
está feito não pode ser defeito... Spencer vai ser meu marido e poderão

herdar metade da empresa juntos. Ele é um bom homem e com certeza vai
repartir para todos vocês.

— Não tem o direito de simplesmente...

— Eu tenho! — dei um passo a frente, e parei a cerca de um dela.

Sua expressão mudou e nosso embate fora marcado. — Vovô me deu essa
oportunidade e não vou abrir mão... Essa empresa me pertence, assim
como a mansão que ele deixara para mim. O que te incomoda não é o fato
de que vou me casar com seu filho, mas sim, porque vou tirar boa parte das
ações de vocês! — acusei-a e ela sequer piscou. — Continua podre, Dana!
Tão podre que ainda mente para o próprio filho sobre a origem.

— Não se atreva a...

— O que eu tenho com Spencer é algo limpo e ele tem consciência

disso. Mas eu jamais serei a pessoa a contar o seu segredinho, ainda mais
agora que descobri que Joe é o pai dele...

— O que? — ela gritou, praticamente histérica. Notei sua mão


mexer e segurei seu braço a tempo de parar a poucos centímetros de meu
rosto. — Como ousa?

— Os olhos de Joe são como os dele... Isso é tudo o que sei. —


confessei e empurrei seu braço. — Mas pela sua reação, é claro que existe

um fundo de verdade.

— Spencer é meu filho e de Harry. — enfatizou cada palavra e


levantei as mãos em sinal de rendição.

— Não será por mim que ele descobrirá a verdade, e duvido que
por você... Me dói saber que ele teve que conviver com essa vida

mentirosa, tudo porque com certeza ele é o herdeiro perfeito que tanto
queria para a empresa.

— Spencer é especial. — acusou.

— Não duvido disso, a questão é que ele se torna especial para


você apenas por fazer todas suas vontades...

— Não é tão diferente de mim, Ruby. — acusou e me doeu saber


que ela realmente usava o próprio filho.

— Eu sou, Dana. — falei com pesar. — Sou porque fui clara com

ele que o usaria, e ele sabia sobre cada passo... Eu entendo que me colocou
para fora para que ninguém soubesse sobre o que eu descobri sem querer
no passado. Você chamava seu próprio filho de bastardo, pelas costas de
todos. — doeu dizer aquilo e minha mente girou. Eu realmente me
importava com Spencer.

— Vai voltar para o buraco de onde saiu, se não... — apontou o


dedo em minha direção, e antes que pudesse responder, uma voz cortante
invadiu o ambiente.

— Chega!

Paralisei por um segundo, e Dana começou a chorar, atuando


perfeitamente. Eu era bem parecida com ela em vários quesitos, pois sabia
manipular. A questão era que não entendia como ela conseguia fazer

aquilo com o próprio filho. Suspirei fundo e não pude olhar para Spencer.
Temia por encontrar a mágoa nele, sobre o que sequer me pertencia como
verdade. Temia por me sentir exposta demais diante daquele assunto.
Temia porque não queria vê-lo sofrer se tivesse ouvido toda aquela
conversa.

Não ousei olhá-lo e segui em direção a porta pela qual ele entrara.
Não fora impedida e não esperava tal atitude. Mas assim que adentrei o
elevador, encontrei em meu reflexo tudo aquilo que evitei por alguns dias

– medo. Eu não tinha medo de nada, mas de repente, vi-me com algo me
rondando, como se para me provar que era de fato humana. Tinha medo de
perder aquilo que ele me fazia sentir. Tinha medo de não saber lidar com
aquela imensidão de sentimentos. Tinha medo pelo um prazo de validade e
me matava por dentro.

Era aquilo.
Eu tinha medo de perder Spencer, mesmo nunca o tendo de fato.

— Ela armou tudo isso. — a voz de minha mãe chegou a meus


ouvidos, enquanto ainda a amparava em meus braços e ouvi a porta da
frente se fechar.

Soltei um suspirar profundo e deixei Dana sentada no sofá.


Permaneci em pé, sem saber como encará-la. Ouvir tudo aquilo de minha

própria mãe era como ser acertado por adagas. Sabia que era chamado de
bastardo quando mais novo, mas por pessoas em particular, que Dana
jurou serem contrárias ao fato de eu ser o herdeiro legítimo de Kirian
Donovan. Eu acreditava fielmente nela, até porque não existia algo para
duvidar. Ela era minha mãe e nunca pareceu mentir. Não até ouvir a
mesma não ir contra nada do que Ruby a acusara.
— O que ouvi é verdade? — indaguei, limpando a garganta em
seguida.

— Spencer... Filho... — as lágrimas em seu rosto pararam, e fiquei


anestesiado. Era como se a máscara caísse a minha frente. Nunca
conseguira entender porque Ruby não simpatizava com minha família, em
particular. Ainda mais, por terem sido deles quem a acolheram quando

perdeu os pais. Contudo, ali começara a entender. — Ruby armou para


nós...

— Ruby não está aqui para se defender, mãe. — cortei-a


rapidamente. — O foco não é ela. Ela muito menos tem culpa por ter
deixado minha carteira aqui e voltado para pegá-la.

O olhar de minha mãe se alargou e pensei que assumiria o que


fosse, contudo, ela parecia se negar.

— Ela deve ter deixado em um lugar para que não se lembrasse e...

Deus, Spencer! Ela tem jogado com todos nós. Quando descobri que ela
vai herdar metade da empresa com esse casamento...

— Como sabe disso? Foi por isso que veio? — indaguei, sem
querer acreditar.

— Mandei investigarem mais a fundo tudo acerca de Ruby, e


acabei chegando ao advogado dela... Um favor ali, outro aqui... Agora
entendo porque compactuou com tudo isso.

Assenti, sem saber como reagir.

— Por isso veio? Para tentar convencê-la a deixar isso de lado? —


perguntei.

— Ela me convidou. — olhei-a incrédulo. Mal sabia ela que estava


do outro lado da porta e ouvi a conversa desde o começo, ao menos, do

que parecia ser. — Ruby quer acabar conosco, Spencer.

— Ela a parte da empresa, mãe. — corrigi-a. — Ela não se importa


conosco. — falei com pesar, minhas próprias palavras me corroendo.

— Aí que se engana... Se ela não se importasse, por que te forçaria


a todo esse show? — indagou, e parecia completamente recomposta.

— Ela gosta da diversão que isso traz. — soltei as palavras e


percebi que a conversa fugira completamente do foco. — Quero que me
diga a verdade sobre tudo. — pedi e minha mãe desviou o olhar,

claramente incomodada.

Peguei meu celular no bolso da calça e mandei uma mensagem


para Joe, sentindo meu coração a ponto de sair pela boca. De repente, tudo
parecia ruir sobre mim mesmo e sobre o que conhecia de minha própria
família. Nunca imaginei que a verdade faltaria entre nós, não mesmo.

— Joe está subindo. — avisei e minha mãe se colocou de pé no


mesmo instante. — Por que isso te incomoda?

— Isso é passado, Spencer! — acusou e seu olhar parou no meu. —

É meu filho e de Harry, sabe muito bem disso.

— Se tem tanta certeza, por que o medo de que Joe apareça a sua
frente? — rebati e ela suspirou profundamente, e percebi que não iria
ceder. — Conte-me a verdade!

— Ruby te colocou contra todos nós! — praticamente gritou e


fiquei estático, sem saber o que responder.

Ela então me deu as costas e saiu rapidamente pela porta. Fiquei


parado na sala de estar, sem saber o que fazer ou para onde ir. Mas tinha
certeza de uma coisa: não ia fugir da verdade, qualquer uma que fosse.

Joe apareceu em minha porta cerca de dez minutos depois,


enquanto eu mandava mensagens e discava o número de Ruby sem parar.
Ele estava acostumado a subir ao apartamento, muitas vezes, para me
ajudar com algo. Contudo, assim que parou a soleira da porta, pareceu
entender que não era um dia corriqueiro. Aquela era a primeira vez que
reparava de fato nele, e então, notei a cor de seus olhos. Engoli em seco,

sem saber como iniciar uma conversa como aquela. Poderia ser tudo uma
grande coincidência ou confusão, porém, se o fosse, minha mãe não fugiria
daquela maneira.

— Pode entrar e ficar à vontade. — pedi, e ele forçou um sorriso,

adentrando o apartamento.

Meu coração se apertou e assim que ele parou a minha frente,


claramente sem jeito, percebi que me doeria ainda mais saber que aquele
homem que confiava tanto poderia ser de fato o meu pai.

— Dana te contou algo, não foi? — sua pergunta me pegou


desprevenido, e neguei com a cabeça. — Então desconfia de algo?

— Além dos murmurinhos e do que Ruby sempre pareceu saber...


— comentei por alto e tentei encará-lo. — Pode me dizer a verdade?

Os olhos do homem a minha frente se encheram de lágrimas e


fiquei estático, sem saber como agir.

— Eu não posso, Spencer. — engoliu em seco. — Assinei


documentos que me proíbem de dizer qualquer coisa a respeito.

— Por que? — indaguei, tendo a confirmação que precisava ali,


praticamente entregue. — Por que os assinou?
— Porque não queria te perder para sempre.

— Por favor, me conta. — praticamente implorei, e o homem a

minha frente assentiu, como se me deixando vencer a batalha imposta por


papéis.

Ele deu passos à frente e se sentou em uma poltrona, e baixou a


cabeça no instante em que começou a falar. Mal sabia eu que sabia muito

menos do que imaginava sobre minha própria existência.


Capítulo 14

“Fighting with a true love is boxing with no gloves

Chemistry 'til it blows up, 'til there’s no us

Why'd I have to break what I love so much?

It's on your face

And I'm to blame, I need to say.”[97]

Nunca pensei que conseguiria relacionar alguém a música. Mas ali


estava eu, odiando Taylor Swift por parecer ter lido meu coração e agora
colocá-lo em viva-voz. Dias ao lado de Spencer e me sentia tão exposta a
ponto de estar em meu velho apartamento, que fora deixado por meus pais,
que ainda mantinha a decoração antiga. Uma taça de vinho como amiga e
Cornelia Street estourando por todos os lados.
Eu sempre imaginei que o amor me deixaria daquela forma, e era o
que mais me assustava. Estar com Spencer não era premeditado para me

dar aquilo, e de repente, como em um acidente, parecia imersa em tudo que


ele me trazia. Se em poucos dias ele estava a ponto de me deixar morta de
medo, o que mais poderia acontecer se insistisse com vivermos sob o
mesmo teto?

Talvez aquele fosse o real problema. A proximidade a qual impus


entre nós. Os anos separados sempre me mantiveram sã a respeito de
sentimentos, e ali entendia que seria bom passar um tempo sozinha comigo
mesma. Ao menos uma semana antes do ensaio que marquei para nós, que
seria uma semana antes do real casamento. Era uma ótima decisão, ao
menos, sensata. Levei a taça de vinho a boca e fechei os olhos, girando
sobre o carpete. Como poderia ter medo de perder algo que sequer me
pertencia?

Sabia que pessoas eram diferentes de dinheiro ou o que o dinheiro


pudesse comprar, ao menos, pessoas que não tinham um preço. Sabia que
Spencer era diferente do que esperava ou imaginava ter quando resolvi
herdar metade da empresa. Mesmo que ele tivesse um preço, o que
duvidava, eu não queria comprá-lo. Nunca quis tal coisa. Parei e peguei
meu celular, abrindo a galeria em seguida. Encarei a foto que tiramos,
deitados na cama, perdidos um no outro. O seu sorriso no meu pescoço,
enquanto o meu parecia refletir o dele. Como alguém chegava e derrubava
tudo ao seu redor de forma tão rápida e consistente? Por mais que o

conhecesse desde sempre, era completamente diferente do agora.

Ele fora minha primeira paixão, quando ainda era adolescente. Até
o momento em que nunca tive a coragem de confessar e acabei sendo
expulsa da casa que odiava. No agora, também não o fizera, e sabia que

não o faria. Eu queria amor, mas eu tinha medo. Medo porque o amor que
sentia parecia querer se entregar para alguém que não me enxergaria além.

Por mais que ele fosse sincero, ele tinha suas convicções. Ficar
comigo, de verdade, com toda certeza não seria uma delas.

Deixei a taça de vinho sobre a mesa de centro e abri o velho diário


deixado sobre a mesma. Era o diário de minha mãe, que ficara intacto
durante todos aqueles anos. Era um hábito ler e reler aquelas palavras,
tentando me conectar com quem ela era. Contudo, nunca conseguira. Não

até aquele momento. Talvez fosse o fato de que nunca me senti tão
sentimental quanto ali.

Eu te amei desde sempre.

Nunca entendera de fato porque ela dera um título para o dia em


que entendeu seus sentimentos por meu pai, mas aceitei que porque tinham
sido destinados ou fosse o tipo de amor a primeira vista.
“Edward era o tipo de homem que eu deveria odiar. Não o tipo de
homem que se pensa como algo mais, ou até mesmo, para estar na cama.

Ele era perverso, assim como todo o complexo de seu rosto. Talvez fora
justamente por aquilo que eu tinha me encantado. Ele era diferente do que
conhecia, por mais parecido que pudesse tentar ser. Enxergava o brilho
além do azul de seus olhos e do sorriso cafajeste no rosto. Enxergava o

carinho com que encarava a família ao redor, e como seu cachorro


parecia adorá-lo. Enxergava o jeito educado de me desejar bom dia e
nada recatado de dar em cima de quem fosse. Ele era diferente. Talvez por
não usar máscara nenhuma. Talvez porque eu o amava antes mesmo de
saber definir tal sentimento.”

Fechei o diário e respirei fundo, a música acabara e outra ainda


mais emotiva se iniciara, deixando-me presa a linha tênue da razão e
coração. Eu finalmente entendia parte do que minha mãe tanto gostava de

escrever – amor. Guardei aquela frase, no fundo de minha alma, tentando


trancá-la junto com meus sentimentos. Precisava de espaço e pensar
melhor.

Pensar longe do toque e da presença dele.

Mesmo que minha mente, coração e alma já acusassem que era ele.
Ele que não queria de fato deixar ir. Que poderia ter amado desde sempre
sem sequer perceber.
Sentia-me covarde por tentar entender meus sentimentos antes de
admiti-los. Mas ali estava eu, abrindo a porta do apartamento de Spencer
mais uma vez. Respirei fundo, sentindo minha cabeça doer pela ressaca.
Poderia ser uma ressaca mais moral do que qualquer outra coisa. Não tinha
bebido o suficiente para estar mal daquela maneira. Contudo, ainda me
sentia assim por voltar ali e com medo de não saber o que dizer. Era difícil
admitir a alguém que ela me aterrorizava. Nunca precisei fazer tal coisa.

Assim que adentrei a sala de estar, não estranhei o completo


silêncio. Eram por volta das seis, e com toda certeza, Spencer deveria estar

dormindo. Adentrei o amplo corredor, e bati levemente na porta de seu


quarto. Como não obtive resposta, empurrei-a e sorri para a cena que me
aguardava. Spencer dormia serenamente sobre a cama. A forma como
parecia leve, deixava-me ainda mais presa a si. Ele era um homem bonito,
mas não era por aquilo que me sentia extasiada. Era pela forma que apenas
me senti com ele.
— Ei. — falei baixo, e toquei levemente seus cabelos.

Quando fui presenteada com os lindos olhos castanhos, soube que

precisava de fato fugir um pouco de nós. Em poucos dias ele tinha se


apoderado de meu mundo e me revirado do avesso, sem ao menos ter
noção. Se ele a tinha, não era claro sobre.

— Oi. — sua voz soou mais rouca que o natural, e ele limpou a

garganta levemente. — Chegou agora? — indagou, encarando rapidamente


o relógio no criado mudo, e vendo que passavam das seis.

Assenti, ainda presa em seu rosto, sem conseguir fugir do que


realmente precisava.

— Resolvi te dar um pouco de espaço com sua mãe. — comentei,


omitindo grande parte da verdade. Mal sabia ele que tinha corrido para o
meu apartamento e me escondido de meus próprios sentimentos. —
Desculpe não ter respondido suas mensagens e ligações. — admiti, e ele

assentiu levemente.

— Eu descobri sobre tudo, Ruby. — revelou e se recostou contra a


cabeceira da cama.

— O que tudo quer dizer exatamente? — indaguei, sem ainda


entender.

— Eu ouvi toda a conversa de você e minha... — ele pareceu se


perder e senti meu coração doer por vê-lo de tal forma. — Mãe... —
complementou com pesar.

— Ela te contou? — perguntei, sem conseguir acreditar que ela


teria feito ao menos aquilo.

Não sabia da totalidade, mas com certeza, tinha meus motivos para
desconfiar sobre a paternidade de Spencer. Se Dana sempre se sentiu tão

ameaçada por eu ouvir uma simples conversa aos dezoito anos, deveria
estar mesmo com medo de que alguém descobrisse ou me levasse a sério.

— Não. — encarou-me de repente, e notei a tristeza em seu olhar.


— Joe me contou. — arregalei os olhos, completamente espantada.

— Então ele é mesmo seu pai? — perguntei, sem conseguir me


conter.

— Não sabe? — perguntou e neguei com a cabeça. — Pensei que


soubesse de tudo e por isso... — levei meus dedos até seus lábios e o calei

levemente.

— Quando tinha dezoito, ouvi uma conversa de sua mãe com um


homem desconhecido. Ela falou sobre papéis e chantagens, e que o seu
verdadeiro pai não ia poder recorrer sobre nada. — comentei e soltei o ar
profundamente. Omiti a parte que ela chamara Spencer de bastardo, aquilo
poderia ser demais para ele. — Dana me pegou ouvindo a conversa, e foi
quando a acusei de mentir sobre você. Eu não gostava nem um pouco dela,

e ela muito menos de mim. Foi apenas o sopro que faltava para me mandar

para fora.

— Sequer sabia que não tinha saído de casa por sua vontade. —
comentou e assenti, já esperando tal coisa. — Joe me contou muito além
do que você sabe. Ele é meu pai, como já desconfiava...

— Os olhos dele são como reflexos dos seus. — assumi e Spencer


deu de ombros, concordando. — O que exatamente ele disse?

— Minha mãe tentou comprar o silêncio dele. — aquilo não me


surpreendia. — Como ela não conseguiu, ele foi praticamente obrigado a
assinar papéis abrindo mão da paternidade, se não, nunca mais me veria.

— Ele aceitou ser o seu motorista desde sempre para ficar


próximo? — indaguei, sentindo meu coração ainda mais apertado. — E
tem ainda mais por trás?

— Pelo que ele me disse, era basicamente isso. — comentou sem


muita vontade. — Não sei em quem acreditar, de verdade. Mas minha mãe
se negou a me explicar qualquer coisa, e não tenho porque duvidar de Joe.

— Se dê tempo para processar isso. — falei, passando levemente a


mão por seu rosto. — Não precisa entender tudo agora ou buscar todas as
respostas.
— Você sempre soube, mesmo que não fosse tudo. — seu olhar
encontrou o meu e não pareceu acusatório. — Talvez se eu tivesse dado

ouvidos ao que algumas pessoas disseram, ao que você disse...

— Aí sua vida seria regida por especulações alheias. — pisquei um


olho e sorri de lado, tentando aliviar o clima. — Não tem como duvidar de
tudo, Spencer. Eu faço isso, porque sou assim. Não tive uma família ao

redor ou alguém para confiar. Nunca. Você teve e ainda tem. — ele me
encarou, parecendo surpreso. — Eu sou indiferente a eles, mas você não.
Não quero te ver sofrendo por isso.

— Você é forte, Ruby. — comentou e acabei sorrindo novamente.

— Sou um pouco blindada a sentimentos, apenas isso. — tive que


usar a parte do pouco, porque o homem a minha frente, com toda certeza,
era quem quebrara minha proteção. — Isso não me faz forte, talvez um
pouco diferente.

— Agora entendo porque me chamou de menino perdido.

— Às vezes tenho o defeito de falar alto tudo o que penso. — falei


sem graça, e me senti pisando em ovos com ele. Não queria me sentir de
tal forma, ainda mais, porque sempre fora sincera quando conversávamos.
Contudo, sabia que estava sendo difícil para ele toda aquela situação. Não
seria eu a piorá-la. — Precisa pensar muito sobre isso.
— Obrigado por ser honesta comigo.

— O mesmo aqui. — levei sua mão até minha boca e depositei um

leve beijo. — Não preciso fingir ou mentir nada para você. — falei com
carinho e sorri em sua direção. — Preciso de um tempo disso. — assumi, e
seu olhar mudou completamente.

— Ruby...

— Não é porque Dana apareceu ou algo relacionado a isso... É que


quando saí daqui percebi o quanto tenho medo de te perder. — comentei,
sentindo minha garganta doer por aquela admissão. Nunca admitira meus
sentimentos para ninguém. Sempre fora um jogo e nada além. Com ele, eu
não jogava. Ao menos, não conseguia. — Não posso perder o que eu não
tenho, Spencer. Por isso preciso de um tempo para organizar minha cabeça
e...

— Eu estou apaixonado por você.

Sua declaração me pegou desprevenida e parei alguns segundos,


apenas o observando. Não esperava por aquilo, nem em mil anos. Diminuí
a distância entre nós e lhe dei um leve beijo, sentindo-me imersa.

— Só preciso de um tempo para que ambos tenhamos a certeza


sobre isso. — comentei com pesar, e sabia que aquilo me mataria por
dentro. Se não o fizesse, com certeza, estava apenas confundindo tudo. —
Nunca ninguém me fez sentir assim, tão vulnerável.

— O mesmo aqui. — acusou, e levou minha mão até sua boca,

repetindo meu gesto.

Um sorriso emoldurou o belo rosto e tive que fazer o mesmo.

— Isso começou como algo certo para herdar poder e dinheiro.


Nunca pensei que me sentiria assim no meio do caminho. — soltei de uma

vez. — Não quero confundir nada ou me iludir sobre algo. Não quero te
machucar também. — admiti.

— Você pode quebrar meu coração se quiser, Ruby. — sua fala me


fez engolir em seco. — Mas sua atitude agora apenas me mostra porque
me apaixonei por você. Nunca pensei nos prós e contras sobre nós, mesmo
tendo a certeza que vamos nos casar. Não quero a certeza de um casamento
já planejado. Quero a certeza de que quer ficar comigo, independente
disso.

— Obrigada por me entender. — beijei-o mais uma vez, sem saber


como me afastar. — Vou ficar no meu velho apartamento por essa
semana... A gente se vê para o ensaio fotográfico de casamento.

— Tudo bem. Eu te espero. — encarei seus olhos castanhos e sabia


que poderia morar nos mesmos.

Pela primeira vez na vida, enxergava alguém como meu lar. Sem
duvidar por um segundo sobre o que ele falava ou como o fazia. Spencer
se tornava um lar para mim, alguém para quem voltar. Só precisava ter a

certeza de que era aquilo que realmente queria.


Capítulo 15

“We were a fresh page on the desk

Filling in the blanks as we go

As if the street lights pointed in an arrow head

Leading us home.”[98]

Meu celular vibrou e senti meu coração chegar à boca. O aparelho


continuou a vibrar e tentei tomar coragem para encarar o visor, mas não
conseguia. Faltava apenas algumas horas para reencontrar Spencer, após
uma semana longe, e aquela ansiedade para o reencontro, apenas me
mostrava que era aquilo queria. Queria voltar para ele. Queria me sentir
dele. Queria que ele fosse meu.

Não tinha ideia de como pedir um tempo para pensar sobre como
me sentia poderia resultar em dias insones. Passei metade deles tentando

entender meus sentimentos, e a outra, tentando não os sentir. O que fora

praticamente impossível. Cornelia Street se tornou a trilha sonora dos


meus dias, e a cada vez que cantava aquela música, sentia-me mais perto

de jogar tudo para o alto e correr para ele.

Meu sorriso e nervosismo morreram assim que encarei a chamada

de vídeo de Lauren Carlisle. Contudo, fazia um bom tempo que não nos
falávamos. Aquele deveria ser o motivo da ligação repentina, ou até
mesmo, o fato de que ela tinha sido convidada para o meu casamento. O
casamento que seria realizado dali uma semana. Suspirei fundo, pensando
sobre aquilo e se realmente necessitava de toda a pompa que fora armada.

— Ei, Ruby!

O grito de Lauren preencheu minhas perguntas silenciosas, e


apenas foquei em lhe dar meu melhor sorriso.

— Estou sem acreditar que vai se casar! — gritou ainda mais, e


fora impossível não gargalhar de verdade. — Sabia que tinha algo entre
você e o tal Spencer. Estava na cara dos dois! — acusou, e acabei
assentindo, ainda sem saber o que dizer.

Será que era tão óbvio assim?

— Oi, Lauren. — sorri para ela. — Como vão as coisas por aí?
— Basicamente, Theo quis matar Jason, assim como Hugh e Yarley
o ameaçaram de morte. — riu baixinho e notei o rubor em suas

bochechas. — Mas Jason os enfrentou e me pediu em namoro.

Aquilo não me surpreendia, ainda mais, pela forma como ele a


olhou quando os vi juntos.

— Você me parece feliz. — comentei, e ela sorriu de primeiro, mas

logo seu olhar mudou e o sorriso se transformara. — Não está?

— Eu estou nas nuvens, Ruby. O que estou estranhando é o seu


olhar, parece...

— Perdida e confusa? — complementei e ela acabou assentindo. —


Pode achar estranho o fato de eu e seu irmão termos terminado e eu me
casar tão rápido, mas...

— Não precisa se explicar para mim, Ruby. — cortou-me


rapidamente, e agradeci internamente por ela ser uma pessoa tão sincera.

No fim, sabia que não era para ela que me explicava, mas sim, para
mim mesma. Na realidade, não era o casamento que me atormentara, mas
sim, o fato de estar apaixonada por Spencer. Era aquilo. Eu estava
irrevogavelmente perdida por ele. Porém, não sabia como seguiríamos a
partir dali.

Sua fala me veio em mente, e eu concordava por completo.


Não quero a certeza de um casamento já planejado. Quero a
certeza de que quer ficar comigo, independente disso.

Ambos precisávamos que aquele casamento acontecesse para


herdarmos a empresa, mas não era exatamente aquilo que se passava por
minha mente. Não no agora. Já era um ato consumado, e não me
preocupava. Aterrorizava-me o fato de querer me entregar a alguém, de

verdade. O medo de perdê-lo em poucos segundos ou um dia,


simplesmente vê-lo ir. Era um risco para qualquer relacionamento.
Todavia, nunca me vi por aquela perspectiva.

— Sei que não é de falar muito sobre si, Ruby. — a voz de Lauren
preencheu o ambiente, tirando-me de meus devaneios. — Mas sei que todo
mundo tem medo do amor. Do amor verdadeiro, sabe? — naquele
momento, ela ganhou minha total atenção. Como se fosse capaz de ler
minha mente no exato segundo. — Sou praticamente dez anos mais nova

que você e sei que não entendo muito sobre, mas...

— O que acha que se deve fazer por amor? — indaguei, sem


conseguir me conter.

— Esse é o grande porém, Ruby. Não se deve fazer nada, apenas


sentir.

— Mas... E o medo de se machucar, de machucar o outro... —


calei-me, sem saber como continuar. — Não quero estragar tudo, Lauren.

— Você não vai. Bom, espero que não por querer. Mas se nunca

tentar estar com quem ama, nunca vai saber se dará certo. Mesmo que
seja evitado, as pessoas se machucam em algum momento. O que muda, é
a forma como consertam e nunca mais repente o erro. Pelo menos, foi o
que aprendi vendo a vida acontecer ao meu redor.

— Obrigada, Lau. — falei com sinceridade. — Obrigada por ser


uma boa amiga mesmo eu não sendo o mesmo. — ela acabou sorrindo
junto a mim.

— Foi a única pessoa que me enxergou como alguém, sem se


importar com a proteção dos meus irmãos. Foi a pessoa que me fez ver
que minha insegurança não precisa ser parte de minha identidade. Além
disso, você me deu a chance de estar com o homem que eu amo, Ruby.
Quero poder te ver casando com o seu.

Sorri, e deixei que uma lágrima descesse, sem conseguir me conter.


A vida atuava de maneiras estranhas, mas nunca me sentira tão grata
quanto naquele momento. Fora ali que percebera que não estava de fato
sozinha, por mais que gostasse de minha própria companhia. A solidão não
me ajudou a entender meus próprios sentimentos, apenas os deixou a flor
da pele. Tinha a resposta naquele instante.
— Obrigada, Lau. Vou agora mesmo falar para o homem que eu
amo, que eu o amo... — sorri abertamente, finalmente admitindo aquilo em

voz, depois de sete dias na mais completa fossa. — Te conto tudo depois.

— Aproveita esse momento! — gritou, e ela mesma se adiantou ao


desfazer a chamada.

Assim que encarei o celular novamente, uma mensagem de Spencer

chegara. Era a primeira vez que nos falávamos após aqueles dias. Não
sabia o que acontecia ao seu redor e como tudo se sucedera sobre sua
família. Também não queria interferir, já que poderia acabar discutindo
ainda mais com Dana, ou pior, perder a noção sobre qualquer coisa.

Sorri para sua mensagem e meu coração pareceu o oposto de


minutos atrás. Acalmou-se, pois estava prestes a ser entregue a pessoa que
realmente desejava.

Remetente: Spencer Donovan

Contando os minutos.

Levei o celular ao peito e sorri, correndo em direção ao espelho,


para conferir o vestido branco curto de seda que usara. Resolvi ser o mais
básica possível, e entendi que poderia ser eu mesma com ele. Talvez
aquele fosse o segredo de nós dois. Em meio a tantas mentiras, éramos
verdadeiros um com o outro.

O ensaio seria na cobertura de um prédio, que a fotógrafa sugeriu


como cenário perfeito para um casal moderno. Não me atentei aos
detalhes, na realidade, não me importava muito. Quando o elevador se
abriu e encarei a bela vista que teríamos, não consegui imaginar outro
lugar para aquilo. Porém, assim que passei o olhar ao redor, encontrei o
que realmente buscava – ele.

Entre a atração e o poder, nada era tão relevante quanto o amor que

ele me fazia sentir. Sem pensar duas vezes, corri em sua direção, sem
ponderar o quão adolescente e inconsequente pareceria. Não precisava usar
uma máscara ou fingir ser outra pessoa. Não precisava me moldar para ser
dele. Porque eu já era, sem ter qualquer consciência daquilo. Como minha
mãe escrevera um dia para o homem que amava, era a forma como me
sentia naquele momento: eu o amava antes mesmo de saber definir tal
sentimento.

Spencer me puxou para si, levantando-me em seu colo. Nossas

testas se encontraram e sorri para o homem que parecia ter sido destinado
como meu. Não duvidada ou esperava o amor, mas ele realmente existia.
Soube pela forma como meu corpo se sentiu em casa com seu toque.
Mesmo com medo, entendi que não fugiria mais. Que fosse eterno

enquanto durasse. Que se Spencer não fosse o cara certo, com toda certeza,
desejava aquilo como verdade.

Senti seus lábios nos meus e esqueci de tudo ao redor. Como


sempre, estar com ele me tirava a sanidade. Nunca me importei de fato em
ter razão sobre nada, e ali, entreguei-a em uma bandeja.

— Senti falta de casais tão apaixonados.

Sorri ao me afastar da boca de Spencer, e senti meus pés voltarem


ao chão. Selena, a fotógrafa que contratara, estava a alguns passos de nós,

e sorriu amplamente. Fiz menção de sair de perto de Spencer e ir até ela,


para cumprimentá-la, porém, ela levantou a mão no mesmo instante.

— Nem pensem em fugir disso. — avisou, já pegando sua câmera


em mãos. — Apenas ajam normalmente.

Meu olhar subiu para o homem ao meu lado, encontrando o


castanho claro que amava. A gente se olhou e a gente sentiu. Acabei
sorrindo e ele fez o mesmo, como se em verdadeira sintonia. Era para ser

apenas um momento aleatório antes do casamento, mas senti-me viva em

seus braços. Assim como, em todas as outras vezes. A diferença era que
nem mesmo a câmera poderia capturar o que sentia. O que sentíamos. Ou
poderia?

Ele me virou de costas de repente, fazendo-me gargalhar, e senti

suas mãos nas alças do vestido e elas sendo levantadas, fazendo-me curvar
em sua direção. Era aquele momento que menos esperava. O momento em
que me encontraria tão vulnerável a ponto de não pensar em nada além do
que querê-lo. Eu o queria, profunda e inconfundivelmente.

Quando me virei, mais uma vez, e nossos olhares se encontraram,


soube que não ia mais correr. Nunca mais. Não dele.

— Eu te amo. — confessamos juntos.

Paralisei em seus braços, enquanto ignorava o que acontecia a

nossa volta. Toquei levemente seu belo rosto e tentei memorizar cada
pequeno detalhe. Nunca pensei que realizaria o sonho daquela adolescente
sonhadora, que vivia presa em romances e que queria ser notada por ele.
Queria poder dizer a Ruby do passado, que ele tinha se tornado ainda mais
do que ela esperava. E que dentre de toda a bagunça que a vida se
transformara, ele a amava também.
— Eu tenho medo, mas ele não é maior do que eu sinto. —
confessei e encostei-me contra seu peito. — Quero realmente tentar,

Spencer.

— Eu quero isso, Ru. — nossos olhos se conectaram, e notei o


sorriso seu rosto. — Quis por todos esses dias, que no fim, você quisesse o
mesmo.

— A gente? — indaguei e ele assentiu.

— Eu e você, nada mais importa.

Ali, soube que não precisava de mais nenhuma palavra. Quando


nossos lábios se encontraram, novamente, soube que ele era o par perfeito
de um amor que sequer sabia significar. Talvez amar fosse aquilo. Como o
quadro que vi há algumas semanas. Apenas entendido por nós mesmos.
Por quem sente.
Epílogo

“And I know I make the same mistakes every time

Bridges burn, I never learn

At least I did one thing right

I did one thing right”

Casamentos geralmente encerram histórias de amor.

Uma grande quantidade de filhos e o resumo perfeito de como tudo


é perfeito.

Ruby tinha uma ideia completamente diferente de final feliz para


sua história de amor. Na realidade, ela sequer conseguia imaginar um final.
O que era surpreendente, o tanto quanto, aterrorizante. Spencer Donovan

lhe ensinou a amar, assim como, ele aprendera com ela. Ambos
aprenderam como é ser amado e aceitaram o fato do quanto aquilo era
bom.

As vezes maluco, quando do nada a sala de estar se tornava a noite


do karaokê. As vezes simples, quando simplesmente se encaravam durante
o café das manhãs. As vezes pontual, quando ficavam presos no olhar do
outro. As vezes intenso, quando não conseguiam manter suas mãos longe

do outro.

As vezes apenas o era.

— Eu já disse que é a noiva mais linda de todo o universo? —


Lauren praticamente gritou a frente de Ruby, que negou com a cabeça, e
sorriu para a única amiga leal que tinha. Felizmente, Ruby sabia bem que

não precisava de muito. Lauren valia por mil pessoas em sua vida, e depois
de aceitar tal conexão com a mais jovem, soube como era ter seus
pequenos momentos presa a uma conversa que muda de direção a cada
dois segundos.

— Na verdade, a noiva mais linda está a minha frente. — Ruby


falou, e fez um sinal em direção ao enorme diamante no dedo anelar direito
de Lauren. Seu rosto ficou vermelho no mesmo segundo, e Ruby teve que
sorrir. Lauren tinha uma essência apenas dela, e nunca tentara lhe agradar

com nada além. Aquilo a fazia especial. Porque Lauren Carlisle não era
sua amiga por ser uma Carlisle, mas sim, por simplesmente escolher ser.

— Ok, ok! — ela bateu palmas, e Ruby girou com o vestido negro
de seda que lhe moldara. — Acha mesmo que Spencer não desconfia de
nada? — indagou, ainda curiosa, e Ruby assentiu de imediato.

— Ele está tão maluco com o trabalho, que sequer percebeu que
cortei o cabelo... — comentou sem muito drama, e sorriu novamente. —
Aliás, seu recente pedido de noivado foi a melhor coisa que me aconteceu.

Assim posso ser vista pelos Donovan malucos que colocam detetives atrás
de mim, e não desconfiarão de nada.

— Vai ter o que sempre quis, não é? — Lauren suspirou fundo,


claramente imaginando a cena linda que tinha em mente sobre o que Ruby

planejava. — Digo, algo que vale de fato para você e ele.

Ruby sorriu ao se lembrar do olhar do homem que lhe tinha por


inteira, e acabou suspirando como a melhor amiga. Encarou o diamante
negro em seu dedo anelar esquerdo e sorriu internamente. No momento em
que Spencer o colocara em seu dedo, a cerca de um ano, ela não pensara
mais em nada. Assim como ele.

Não pensaram no escândalo de seus parentes ao redor, ou em como


as coisas seriam atordoadas dali por diante. Apenas focaram no momento,

além de qualquer sobrenome ou dinheiro. Ruby estava realizando o que


sempre quis, contudo, ela recebia muito mais. Por mais que não chegaram
ao altar por um pedido de amor, eles sabiam que era amor. Em poucos dias
eles souberam. Por aquilo, a emoção fora tamanha, que Ruby apenas
conseguiu pensar que precisava marcar aquele momento como apenas
deles. No futuro.

Ali estava ela, pronta.


Spencer olhou para as malas ao lado da porta de entrada de seu
apartamento, que já não era apenas seu há anos. Buscou por Ruby e não a

encontrou por ali, assim, seguiu em direção ao quarto, enquanto tirava seu
terno e gravata. Assim que pisou no quarto, teve a visão do paraíso. Sua
mulher deitada em meio aos lençóis. Ruby estava totalmente vestida, e
com certeza, tinha se arrumado. Ele ainda não entendia o porquê das malas

ou porquê de ela ter adormecido no meio do caminho de aprontar algo.


Contudo, apenas foi até ela e deu-lhe um leve beijo. Era algo que sempre
fazia.

Os olhos dela se abriram devagar, enquanto se acostumava com a


claridade, ao mesmo tempo que era levada diretamente para o castanho dos
olhos de Spencer. Foi naquele momento que percebeu, que mais uma vez,
o sono a vencera por completo. Apenas conseguira arrumar uma mala para
cada um, e ali, estava.

— Eu apaguei de novo! — Ruby falou com descrença e já


praticamente pulou da cama. — Odeio me sentir assim, tão...

— Grávida?

Ela paralisou o corpo. A pergunta de Spencer era completamente


irreal, porém, a cabeça de Ruby girou e ela tentou se apoiar no nada.
Felizmente, Spencer estava ali para lhe segurar. Não sabia ao certo se fora
pelo susto ou pela probabilidade que existia de aquela pergunta ter uma
resposta positiva.

— Eu não posso estar grávida. — ela falou, como se para si,

enquanto Spencer se sentava com ela sobre seu colo na cama. — Eu não...

— Ru... — ele tocou levemente seu rosto e sorriu para ela. — Não
precisa ter medo disso.

— Mas como você sabe e eu não sei? — sua voz saiu em um fiapo,

e não soube definir o medo que tomou conta de seu corpo, assim como,
toda a euforia. Ruby sentia o turbilhão de emoções se aflorando e não tinha
como controlar. O que ela ainda não sabia, era que Spencer tinha notado
aquelas mudanças há certo tempo.

— Tem coisas diferentes em você. — argumentou, dando de


ombros. — Nunca foi de acordar tarde, e de repente, dorme até depois do
meio dia quando não temos que ir trabalhar. Sua obsessão por pipoca todos
os dias, e até mesmo, as misturas esquisitas com geleia e pimenta.

— Eu... — ela tentou argumentar algo, até mesmo, que com toda
certeza iria menstruar. Mas foi quando teve plena noção de que estava
atrasada há semanas, e sequer percebera. Sua mente estava tão ocupada
pensando em como se casar com Spencer em um lugar apenas deles, e que
tudo fosse uma surpresa incrível, que sequer percebeu o que acontecia
consigo. — Eu... Isso está tão fora do que planejei.
Ela se levantou de repente, e não percebeu a força que aquelas
palavras tomaram. Para ela, era como uma surpresa em meio a surpresa

que faria a Spencer, não que estragasse algo. Levou as mãos a barriga e
ficou presa naquele momento, sabendo que as probabilidades eram
altíssimas. Lembrando-se do que sua mãe escrevera no diário, de como
fora descobrir que esperava Ruby. Naquele momento, mesmo sem nenhum

teste, ela sentiu que estava grávida.

Lágrimas desceram por seu rosto, e ficou ali, apenas perdida em


um sentimento que não esperava ter. Não tão cedo. Mas ela o tinha e o
acolhia. Spencer não sabia o que fazer, enquanto olhava a mulher que
amava, completamente em lágrimas, e claramente, odiando o fato de estar
grávida. Para ele, aquele era um sonho se realizando. Ruby se tornou sua
família, e com ela, ele queria construir tudo. Tentou entender seu lado, e
por isso, se levantou. Com o coração machucado por ela não estar tão

animada quanto ele. Pobre homem, ele mal sabia dos porquês de sua
esposa.

E fora como em uma explosão, como no momento em que se


beijaram pela primeira vez e aquela história de amor se iniciou.

Ruby se virou e o encarou entre as lágrimas. Spencer paralisou com


os braços no ar, em direção de abraça-la.

— Eu planejei tudo, o nosso novo casamento... Ou melhor dizendo,


o nosso casamento. — ela soltou de uma vez, como se estivesse sufocando,

e as lágrimas desceram mais ainda. — Paris, nós dois, uma varanda linda,

e nosso casamento secreto para nós e mais ninguém. Eu até comprei um


vestido preto de seda para poder casar da minha cor favorita, Spencer. —
falou, como se aquele fosse o fim do mundo. — E agora estou tão
descontrolada que to contando tudo! Oh meu Deus! — gritou, sentindo-se

louca, ao mesmo tempo que as mãos permaneciam na barriga.

Fora ali que Spencer notou que ela não estava triste por estar
grávida, mas sim, porque sentia tanta coisa ao mesmo tempo que não sabia
como lidar. Ele também não sabia, mas era bem diferente. Ser pai era algo
que sempre quis e pretendeu, e ainda mais, com o amor de sua vida, era um
sonho se tornando realidade. Sorriu, sem conseguir se conter, e puxou-a
para seus braços, dando-lhe o que podia e que geralmente era o melhor
lugar de seu mundo: seu colo.

— Ei! — ele passou as mãos pelos cabelos negros curtos, e se


sentou com ela novamente sobre a cama. — Estou aqui com você e ainda
podemos nos casar em Paris, com seu vestido de seda e tudo o que quiser,
Ru.

— Quero isso. — os olhos negros encontraram o castanho dos dele,


e ela sorriu, com a mão na barriga e a dele sobre a dela. — Meu Deus! —
começou a gargalhar, e não conseguia parar. — A gente vai se casar e com
um bebê. — levou uma mão ao rosto dele, ainda rindo, e encostou suas

testas. — Eu...

— Eu também te amo, Ru. — beijou-a levemente, sorrindo


juntamente. — E eu aceito me casar com você. — ela bateu em seu peito,
ainda gargalhando. — Eu aceito isso todos os dias se quiser.

— Spencer... — ela suspirou profundamente, deixando a

gargalhada ir embora. — Eu te amo tanto que nem sei o que dizer agora.

— Apenas fica aqui comigo.

— A gente basta, não é? — ela indagou, apertando a outra mão


sobre a dele, e deixando uma lágrima descer.

— Só a gente.

Fim
Recadinho

A série Sentimentos foi e ainda é um divisor de águas na minha carreira


e não poderia estar mais feliz em lança-los todos juntos. Muito obrigada por

dar essa oportunidade para as histórias, e espero que de alguma forma,


tenham chegado a seu coração!
Não se esqueça de avaliar o livro, para que possa saber o que
pensou, sentiu e o que cada casal está passando. Isso ajuda com que
outros leitores também conheçam a história.
E caso queira conhecer algum outro romance meu, eles estão todos
disponíveis aqui: ebooks.

Muito obrigada e espero que até a próxima!

Com amor,
Contatos da autora

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Instagram: @alineapadua

Facebook: Aline Pádua

Meus outros livros: aqui.


[1] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[2] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[3] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[4] “Tiro toda a minha maquiagem porque eu amo o que está por baixo/Esfrego
todas as suas palavras, não dou a mínima, eu superei/(Agito todo esse peso, sim, você
sabe que eu amo tudo isso)/Finalmente me amo nua, mais sexy quando estou
confiante/Você diz que eu não sou bonita/Bem, eu digo que sou linda, é o meu
comitê/Dizem que somos muito provocativas/Ainda olha para mim, olha para mim, olha
para mim, sim/Venho para as minhas garotas, você cega/Daily Mail classificando, de
manhã à noite/Eu não te devo nada/Nah, eu não dou mais a mínima, não, não mais/(Ah,
ooh)/Se você tem peitos pequenos, ame-os, ame-os, ame-os, ame-os, ame-os/Se você
tem uma bunda grande, pegue, pegue, pegue, pegue, pegue (ah, ooh)/Se você não tem
nada, querida, balance/É a sua vida, vá pegar, se você quiser/No espelho tipo: É isso

aí!/Amando minha figura tipo: É isso aí!/Quando eu estou magra ou mais gordinha, eu
fico tipo: É isso aí!/Juro que vou matá-los tipo ah.” Trecho da canção Strip pertencente à
girl group pop britânico Little Mix feat. Sharaya J.

[5] É uma palavra em inglês cuja tradução literal para português é "coração doce"
e pode significar amado/a, amor. Sweetheart pode ser um substantivo ou adjetivo e
consiste em um elogio ou uma forma carinhosa de tratar alguém. Fonte: Significados

[6] Passagem do livro The Notebook (1996) escrito por Nicholas Sparks.
[7] “Me diga uma coisa, garota/Você está feliz neste mundo moderno?/Ou você

precisa de mais?/Existe algo mais que você está procurando?/Estou caindo/Em todos os
bons momentos/Eu me vejo almejando uma mudança/E nos momentos ruins, eu tenho
medo de mim mesmo.” Trecho da canção Shallow interpretada por Bradley Cooper feat.
Lady Gaga.

[8]
“Eu estou à beira do precipício, assista enquanto mergulho/Eu nunca vou tocar
o chão/Caio através da água/Onde eles não podem nos machucar/Estamos longe da
superfície agora.” Trecho da canção Shallow interpretada por Bradley Cooper feat. Lady
Gaga.

[9] “Na superfície, superfície/Na superfície, superfície/Na superfície,


superfície/Estamos longe da superfície agora.” Trecho da canção Shallow interpretada
por Bradley Cooper feat. Lady Gaga.

[10] Passagem do livro The Best of Me (2011) escrito por Nicholas Sparks.

[11] Passagem do livro Safe Haven (2010) escrito por Nicholas Sparks.

[12] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[13] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[14] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[15] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[16] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.
[17] Passagem do livro The Notebook (1996) escrito por Nicholas Sparks.

[18] Passagem do livro The Notebook (1996) escrito por Nicholas Sparks.

[19] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[20] Dua Lipa é uma cantora, compositora e modelo inglesa de origem albanesa.
Fonte: Wikipedia.

[21] Trecho da canção New Rules pertencente a cantora inglesa Dua Lipa.

[22] Sam Lowry Hunt é um cantor americano country, compositor e ex-jogador de


Futebol americano universitário.

[23] Canção pertencente ao cantor americano Sam Hunt, álbum Montevallo.

[24] Versão de 2015, remix para o filme Cinquenta Tons de Cinza. Crazy in Love
é uma canção da cantora americana Beyoncé. Fonte: Wikipedia.

[25] Passagem do livro The Notebook (1996) escrito por Nicholas Sparks.

[26] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[27] “Eu sempre digo o que eu penso/Eu nasci sem um zíper na minha boca/Às
vezes, eu nem quero dizer aquilo/É que demora um pouco pra eu me entender/Eu gosto
do meu café com duas colheres de açúcar/Saltos altos e joias brilhando/Quando bebo, eu
fico louca, ei, ei, ei/Insegura, mas estou trabalhando nisso/Há muitas coisas das quais eu
poderia me livrar/Não estou prestes a desistir/Eu cometi alguns erros, dos quais eu me

arrependo toda noite/Eu parti alguns corações, que eu levo na manga//Minha mãe

sempre diz: Garota, você é problema, e/E agora eu me pergunto, você se apaixonaria por
uma mulher como eu?/E toda vez que nos tocamos, garoto, você faz eu me sentir
fraca/Eu posso ver que você é tímido e te acho tão fofo/Passando todas as noites
debaixo das cobertas e/Ainda me pergunto, você se apaixonaria por uma mulher como
eu?” Trecho da canção Woman Like Me pertencente à girl group pop britânico Little

Mix feat. Nicki Minaj

[28] “E de uma só vez

Você é tudo o que eu quero

Eu nunca vou deixar você partir

Rei do meu coração, corpo e alma, ooh whoa.”

King Of My Heart – Taylor Swift

[29] Trecho da canção intitulada Índios parte do álbum Dois da banda brasileira
Legião Urbana.

[30] “Me pegou como, ah, ah, ah, oh

Estou cansada de ser tocada como um violino

O que eu tenho que fazer para entrar em seu maldito coração?”

Love On The Brain – Rihanna

[31] Passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas Sparks.

[32] Trecho da canção intitulada Deixe-me Ir do artista brasileiro 1Kilo.


[33] “Se sou um pagão dos bons tempos

Minha amante é a luz do sol

E para manter a deusa ao meu lado

Ela exige um sacrifício.”

Take Me To Church – Hozier

[34] “Vi você entrar em um bar

Ele disse algo que te fez rir

Eu vi que seus sorrisos eram duas vezes maiores que os nossos

Sim, você parece mais feliz, você parece.”

Happier – Ed Sheeran

[35] Frase pertentence ao filme de drama e fantasia com direção de Lee Toland
Krieger, .A Incrível História de Adaline.

[36] “Você devia tomar como um elogio

Que eu fiquei bêbada e debochei do seu jeito de falar

Você devia pensar na consequência

Do seu campo magnético ser um pouco forte demais.”

Gorgeous – Taylor Swift

[37] “Eu sempre pensei que afundaria

Então eu nunca nadei

Eu nunca andei de barco


Não entendo como eles seguem flutuando

E às vezes eu sinto tanto medo

Do que eu não entendo.”

Malibu – Miley Cyrus

[38] “Eu fico brava, amor acredite em mim

Eu poderia te amar fácil assim

Eu poderia te deixar tão rápido quanto.”

Issues – Julia Michaels

[39] “Nós não podemos fazer

Nenhuma promessa agora, podemos, querido?

Mas você pode me fazer uma bebida (...)

Ah, caramba, nunca vi esse tom de azul

Apenas imagine as coisas divertidas que podemos fazer.”

Delicate – Taylor Swift

[40]
Trecho da canção intitulada Dona de Mim pertencente ao álbum de mesmo
nome da artista brasileira Iza.

[41] “Que fique claro

Se você se comportar bem, eu vou fazer com você

Como nunca fizeram

Não se engane.”

Veneno – Anitta
[42] Adaptação da passagem do livro Dear John (2007) escrito por Nicholas
Sparks.

[43] “Algo deve ter dado errado no meu cérebro

Estou com toda a sua química nas minhas veias

Sentindo toda a alegria, sentindo toda a dor

Solte o volante, estamos na faixa de alta velocidade

Agora estou nervosa, não estou pensando direito

Ultrapassando todos os limites, você me intoxica.”

Never Be The Same – Camila Cabello

[44] “Fique aí mesmo, afaste-se

Eu preciso de espaço, eu te disse ontem

Diminua o ritmo

Mas então eu vejo seu rosto

Podemos fazer isso amanhã?”

Jump – Julia Michaels feat. Trippie Redd

[45] Trecho da canção intitulada Deixe-me Ir do artista brasileiro 1Kilo.

[46] Trecho da canção intitulada Deixe-me Ir do artista brasileiro 1Kilo.

[47] Trecho da canção intitulada Apaga a Luz da artista brasileira Glória Groove.

[48] Passagem do livro The Wedding (2003) escrito por Nicholas Sparks.

[49] “Passaram-se 24 horas, preciso de mais horas com você


Você passou o final de semana se vingando, ooh

Nós passamos as últimas noites tentando melhorar as coisas entre nós

Mas agora está tudo bem, querida

Enrole esse baseado, querida

E fique perto de mim.”

Girls like you – Maroon 5 feat. Cardi B.

[50] Trecho da canção intitulada Apaga a Luz da artista brasileira Glória Groove.

[51] “Nós temos a noite inteira para nos apaixonarmos

Mas, em um estalar de dedos, desmoronamos

Estamos quebrados

Estamos quebrados.”

Nothing Breaks Like a Heart – Miley Cyrus

[52] “Eu não quero te tocar, eu não quero ser/Apenas outro antigo amor que você
não quer ver/Eu não quero sentir sua falta (não quero sentir sua falta)/Como as outras
garotas sentem/Eu não quero te machucar, eu só quero estar/Bebendo em uma praia com

você o tempo todo comigo/Eu sei o que todos dizem (eu sei o que todos dizem)/Mas não
estou tentando te enganar”. Trecho da canção End Game pertencente à artista
americana Taylor Swift feat. Ed Sheeran & Future.

[53] “Amo o jeito que você é

É quem sou não preciso forçar

Nós sempre dizemos, dizemos isso como é

E a verdade, é que realmente sinto sua falta.”


Wish You Were Here – Avril Lavigne

[54] “Porque eu não quero perder você agora

Estou olhando bem para a minha outra metade

O vazio que se instalou em meu coração

É um espaço que agora você guarda.”

Mirrors – Justin Timberlake

[55] “Eu, eu te amei em segredo

À primeira vista, é, nós amamos sem razão

Oh, vinte e cinco anos

Oh, como você saberia?”

Dancing With Our Hands Tied – Taylor Swift

[56] Trecho da canção intitulada João de Barro versão do cantor brasileiro


Leandro Léo.

[57] “E agora todo esse tempo

Está passando

Mas eu não consigo dizer-lhe por que

Dói cada vez que eu te vejo

Percebo o quanto eu preciso de você.”

i hate u, i love u – Gnash feat. Olivia O'Brien

[58] “Se você está sendo realmente honesto

Se você realmente quer isso, woah


Por que você está agindo como um estranho?

O que há com o seu comportamento?”

Say My Name – David Guetta feat. Bebe Rexha & J Balvin

[59] “Em um minuto, mas penso nisso às vezes

Mesmo que eu saiba que não foi a tanto tempo assim

Oh, não, eu ainda quero relembrar.”

What a Time – Julia Michaels feat. Niall Horan

[60] “Eu, eu te amei em segredo

À primeira vista, é, nós amamos sem razão

Oh, vinte e cinco anos

Oh, como você saberia?”

Dancing With Our Hands Tied – Taylor Swift

[61] “Nós não podemos fazer

Nenhuma promessa agora, podemos, querido?

Mas você pode me fazer uma bebida.”

Delicate – Taylor Swift

[62] “Todo esse silêncio e paciência

Apreensão e espera desesperada

Minhas mãos estão tremendo por tudo isso.”

Dress – Taylor Swift


[63] Trecho da canção intitulada Quem De Nós Dois versão da cantora brasileira
Ana Carolina, álbum Ana Rita Joana Iracema e Carolina (2001).

[64] “Meu nome é o que você quiser que seja

E eu só vou te chamar de meu

Estou fora de mim, mas sou seu amor

Ecos do teu nome dentro da minha mente.”

Don’t Blame Me – Taylor Swift

[65] “Soube que ele era um assassino desde primeira vez em que o vi

Imaginei quantas garotas ele amou e deixou assombradas

Mas se ele é uma assombração, então posso ser um fantasma

Mantendo-o como refém.”

...Ready For It? – Taylor Swift

[66] “Parece que estou sempre me desculpando por sentir

Como se estivesse enlouquecendo quando estou simplesmente bem

E todos os meus ex dizem que sou difícil de lidar

E eu admito que sim, é.”

Anxiety – Julia Michaels feat. Selena Gomez

[67] Julia Carin Cavazos, mais conhecida por seu nome artístico Julia Michaels, é
uma cantora e compositora norte-americana.

[68] “Mas os meus amigos, eles não sabem como é, como é

Eles não entendem porque eu não consigo dormir a noite toda


Tenho ouvido que eu podia tomar algo pra resolver isso

Cara, eu queria, eu queria que fosse assim tão simples, ah.”

Anxiety – Julia Michaels feat. Selena Gomez

[69] “Alguns garotos tentam demais, ele nem sequer tenta

Mais novo do que meus ex-namorados, mas age como um homem feito, então

Não vejo nada melhor, manterei ele para sempre

Como uma vingança-ça.”

...Ready For It – Taylor Swift

[70] “E que o destino está te levando pra muito longe

E pra fora do meu alcance

Mas você está aqui no meu coração

Então, quem pode me parar se eu decidir que você é meu destino?”

Rewrite The Stars Anne-Marie feat. James Arthur

[71] Trecho da canção intitulada Me Espera da cantora brasileira Sandy com


participação de Tiago Iorc, Meu Canto (2016).

[72] “Às vezes eu acordo tarde da noite e nem escovo os dentes

Só quero me estufar com sobras de macarrão com queijo

Você sabe que eu fico depressiva, está impressionado com minha honestidade?

Mas eu vou vestir o que eu quero vestir,porque eu tô de boa com o que tem por
baixo.”
Perfect To Me – Anne-Marie

[73] Trecho da canção intitulada Coisa Linda do cantor brasileiro Tiago Iorc,

álbum Troco Likes (2015).

[74] Trecho da canção intitulada Sozinho do cantor brasileiro Caetano Veloso,


álbum Prenda Minha (1998).

[75] “Te amar foi juvenil, selvagem e livre

Te amar foi legal, quente e doce

Te amar foi luz do sol, foi estar sã e salva

Um lugar seguro para baixar minha guarda

Mas te amar teve consequências.”

Consequences – Camila Cabello

[76] “Agora estamos debaixo das cobertas

Avancemos para dezoito

Somos mais que amantes

Sim, somos todos que precisamos.”

2002 – Anne-Marie

[77] “No meio da noite, em meus sonhos

Você devia ver as coisas que fazemos, amor, hm

No meio da noite, em meus sonhos


Eu sei que estarei com você, então vou no meu tempo

Você está pronto para isso?”

... Ready For It? – Taylor Swift

[78] “Então você sorriu sobre seu ombro

Por um minuto, eu estava sóbrio como uma pedra

Eu te puxei para mais perto do meu peito

Então você me pediu, para ficar mais

E eu disse, eu já te disse

Eu acho que você deve descansar um pouco

Eu já sabia que te amava naquela época

Mas você nunca saberia

Porque eu me calei com medo de perder

Eu sei que eu precisava de você

Mas eu nunca demonstrei

Mas eu quero ficar com você

Até que nós fiquemos bem velhinhos

Apenas diga que você não vai embora

Apenas diga que você não vai embora.”

Say You Won’t Let Go – James Arthur

[79] “Eu sou tão apaixonado por você


E eu espero que você saiba

Querida, seu amor vale mais que todo ouro do mundo

Nós chegamos tão longe, meu bem

Veja como nós amadurecemos

E eu quero ficar com você

Até que fiquemos bem velhinhos

Apenas diga que você não vai embora

Apenas diga que você não vai embora.”

Say You Won’t Let Go – James Arthur

[80] Trecho da canção Pode Se Achegar dos cantores brasileiros Tiago Iorc e
Agne Nunes.

[81] “Se as lágrimas pudessem ser engarrafadas

Haveria piscinas enchidas por modelos

Disseram: Um vestido justo é o que te torna uma puta?”

idontwannabeyouanymore – Billie Eilish

[82] “Eu vou acabar com você, me deixe ser sua motivação

Pra ficar e dar tudo esta noite

E, meu bem, vire-se, me deixe te dar inovação

Ei, porque eu faço isso tão bem.”

Motivation – Normani

[83] “Você me deixa desconcertada


Não estou acostumada a me sentir assim

Eu não sei o que dizer (é, é)

Mas eu sei que não deveria pensar nisso”

break up with your girlfriend, i'm bored – Ariana Grande

[84] “Vamos lá, mocinha, dê um sorriso

Não, eu não tenho motivo nenhum pra sorrir

Eu não tenho ninguém pra quem sorrir, eu esperei um tempo por

Um momento pra dizer que eu não te devo porcaria nenhuma.”

Nightmare – Halsey

[85] “Te vi ali, e eu pensei

Ai meu Deus, olhe esse rosto!

Você parece o meu próximo erro

O amor é um jogo, quer brincar?”

Blank Space – Taylor Swift

[86] “Sim, café da manhã na Tiffany's e garrafas de espumante

Garotas com tatuagens que gostam de se meter em encrenca

Cílios postiços e diamantes, caixas eletrônicos

Eu mesma compro todas as minhas coisas favoritas (sim).”

7 rings – Ariana Grande

[87] “Porque você sabe que já faz muito tempo


Então não me deixe cair

Oh, quando seus lábios me despem, eu fico viciada em sua língua

Oh, amor, seu beijo é mortal, não pare.”

Señorita – Shawn Mendes feat. Camila Cabello

[88] “Às vezes eu tenho um sorriso no meu rosto/Às vezes acho que tenho que
fingir/Porque honestidade é tão fora de lugar/E todo mundo tem medo de ficar nu//Não

sei quanto mais posso aguentar/Sim, eu estou quebrado em tantos pedaços/Seria fácil
apenas jogá-los fora/Mas eu não quero desistir de sentir.” Kintsugi – Gabrielle Aplin

[89] “Sim, existem mentirosos, mas então há você

A retrospectiva deles foi o que me trouxe até você

Acho que pensei que poderia te converter à verdade

Eu não sei, eu não sei o que eu estava pensando”

Priest – Julia Michaels

[90] Trecho da canção intitulada Codinome, da cantora brasileira Maria.

[91] “Me matando devagar, do lado de fora da janela

Eu estou sempre esperando que você esteja esperando lá embaixo

Demônios jogam os dados, anjos reviram os olhos

O que não me mata me faz te querer mais.”

Cruel Summer – Taylor Swift

[92] “Talvez algum dia eu seja exatamente como você é/Pise nas pessoas como
você faz/Fuja de todas as pessoas que eu achava que conhecia/Lembro-me lá atrás, de

quem você era/Você costumava ser calmo/Costumava ser forte, costumava ser

generoso/Você deveria saber/Que abusou de sua estadia e agora vê/Quão quieto é estar
completamente sozinho.” A Place For My Head – Linkin Park

[93] “Sou ciumenta, sou muito zelosa

Quando estou triste, eu fico bem triste

Quando eu estou bem, eu não fico triste

Eu fico brava, amor acredite em mim

Eu poderia te amar fácil assim

Eu poderia te deixar tão rápido quanto.”

Issues – Julia Michaels

[94] “Eu não sou uma pecadora

Ele não era o cara certo

Não tinha ideia do que iríamos nos tornar

Não há arrependimentos

Eu só pensei que fosse ser divertido.”

Heaven – Julia Michaels

[95] “Meu amor era tão cruel quanto as cidades em que vivi

Todos pareciam piores à luz

Há tantas linhas que eu cruzei sem perdão


Eu vou te dizer a verdade, mas nunca adeus.”

Daylight – Taylor Swift

[96] “Me ajude

É como se as paredes estivessem desmoronando

Às vezes, sinto vontade de desistir

Mas eu não posso

Não está no meu sangue.”

In My Blood – Shawn Mendes

[97] “Lutar com um amor verdadeiro é como lutar boxe sem luvas

Química até explodir, até que não haja nenhum nós

Por que eu tive que quebrar o que eu tanto amo?

Está na sua cara

E eu sou a culpada, eu preciso dizer.”

Afterglow – Taylor Swift

[98] “Nós éramos uma página nova na mesa

Preenchendo os espaços em branco enquanto avançamos

Como se as luzes da rua apontassem para a ponta de uma flecha

Nos levando para casa.”

Cornelia Street – Taylor Swift

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