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INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO:

teoria & prática

Uma Alternativa de Reversão de Quadros de


Exclusão Sócio-tecnológica através de um
Processo de Imersão Tecnológica

Adriano Canabarro Teixeira


SÈrgio Roberto Kieling Franco

An Alternative to Reverse the Social-


technological Exclusion Situation Through a
Technological Immersion Process
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INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO:
teoria & prática

Resumo: A possibilidade de conjugar as potencialidades


das novas tecnologias ao dia-a-dia escolar apresenta-
se como uma forma efetiva de inserÁ„o social e de de-
senvolvimento intelectual dos indivÌduos. O presente ar-
tigo relata a pesquisa realizada no sentido de capacitar
professores em formaÁ„o ‡ atuaÁ„o crÌtica e criativa atra-
vÈs das Tecnologias de InformaÁ„o e ComunicaÁ„o
(TICs), por meio de um processo de imers„o tecnolÛgica.
O estudo utilizou a estrutura da Universidade de Passo
Fundo, onde foram realizados encontros sistem·ticos que
possibilitassem a discuss„o e o desenvolvimento de
competÍncias na ·rea de inform·tica educativa, culmi-
nando com a proposta de pr·ticas pedagÛgicas que fi-
zessem uso criativo das TICs.

Palavras-chave: Novas tecnologias. CapacitaÁ„o


tecnolÛgica de professores.

Abstract: Introducing new technologies into the daily


practice of schools is presented as an effective way of
achieving social insertion and promoting intellectual
development of individuals. This article outlines research
into ways of equipping teachers to critically and creatively
incorporate Communication and Information
Technologies (CIT) into their teaching practices, through
a process of technological immersion. The study made
use of the structures of University of Passo Fundo. During
systematic meetings, discussion of new technologies and
their application to the educative informatics area, led
teacher trainees to propose new pedagogical practices
making creative use of CIT.

Keywords: New technologies. Teaching qualification.

TEIXEIRA, Adriano Canabarro; FRANCO, SÈrgio Roberto


Kieling. Uma Alternativa de Revers„o de Quadros de Ex-
clus„o SÛcio-tecnolÛgica atravÈs de um Processo de
Imers„o TecnolÛgica. Informática na Educação: teoria &
prática, Porto Alegre, v. 6, n. 1, p. 11-21, jan./jun. 2003.

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teoria & prática

1 Introdução a esta ainda est„o presentes e demandam


soluÁ„o, È um tanto incoerente; entretanto,
Um dos fenÙmenos sociais de grande um canal entre populaÁ„o e TICs est· aberto
import‚ncia na sociedade atual È, sem d˙vida e demanda igualmente reflexıes e resultados
alguma, a presenÁa maciÁa e conseq¸ente in- urgentes. Tratam-se das escolas, que grada-
fluÍncia das Tecnologias de InformaÁ„o e Co- tivamente s„o submetidas a um processo de
municaÁ„o (TICs) nas mais variadas ·reas do informatizaÁ„o e, de uma forma ou outra, for-
conhecimento e da atividade humana. Nesse necem a possibilidade de minimizaÁ„o da dis-
novo contexto e em raz„o dessa presenÁa cres- t‚ncia existente entre a populaÁ„o sem aces-
cente das tecnologias na vida dos indivÌduos, so e as tecnologias.
o recurso estratÈgico passa a ser a informa-
Á„o. Conseq¸entemente, pessoas que n„o tÍm PorÈm, para que as tecnologias possam
acesso ‡ informaÁ„o estar„o ‡ margem dessa assumir seu papel social no ambiente escolar,
nova sociedade, instituindo-se, assim, uma È preciso que os educadores estejam capaci-
nova modalidade de exclus„o social para o tados a utiliz·-las crÌtica e criativamente em
sÈculo XXI, referida por muitos teÛricos como suas pr·ticas pedagÛgicas. Entretanto, em que
ìdivis„o digitalî, ou seja, uma divis„o entre medida a formaÁ„o acadÍmica possibilita esse
aqueles indivÌduos que tÍm e os que n„o tÍm domÌnio? E de que forma se d· a apropriaÁ„o
acesso ‡ informaÁ„o. de tais tecnologias no fazer pedagÛgico dos
envolvidos?
A fim de n„o ocorrer um simplismo ex-
tremado na adoÁ„o e conceituaÁ„o do termo, A partir do estudo de caso feito durante
È possÌvel explicitar a base teÛrica que sus- a realizaÁ„o de pesquisas anteriores, pÙde-se
tenta a idÈia de ìdivis„o digitalî neste trabalho. verificar o potencial das tecnologias de infor-
Nesse sentido, Moran (1997) apresenta alguns maÁ„o e comunicaÁ„o na tarefa de minimizar
elementos que, uma vez relacionados, forne- a relaÁ„o de exclus„o entre sujeitos e conhe-
cem uma vis„o mais aproximada do que seja cimento. Entretanto, para que isso fosse pos-
essa nova modalidade de divis„o. Dentre es- sÌvel, foi necess·rio desenvolver metodologias
tes elementos, o autor destaca: ìfatores como especÌficas de interaÁ„o entre indivÌduos e
a dist‚ncia econÙmica entre ricos e pobres, [...] tecnologia, conforme È possÌvel verificar em
a dist‚ncia cultural, entre aqueles que tÍm a Teixeira (2002).
possibilidade de uma educaÁ„o continuada, [...]
Para o presente estudo, parte-se do
a dist‚ncia ideolÛgica que consiste em diferen-
princÌpio de que a grande maioria dos educa-
tes formas de pensar e de sentir, [...] a dist‚n-
dores n„o tem o domÌnio das tecnologias e,
cia tecnolÛgica, referente ao acesso e domÌ-
desta forma, n„o possui condiÁıes de utiliz·-
nio ou n„o das tecnologiasî. Partindo desta pre-
la em todo o seu potencial libertador. Para que
missa, È possÌvel perceber o importante papel
as TICs possam proporcionar ‡s camadas ex-
dos avanÁos tecnolÛgicos na vida e no desen-
cluÌdas da sociedade uma forma real de eman-
volvimento dos indivÌduos.
cipaÁ„o e de superaÁ„o das situaÁıes de
Pensar uma sociedade na qual todas seletividade a que est„o submetidas, È primor-
as pessoas tenham acesso a tais recursos, dial que os educadores dominem tais
quando necessidades b·sicas e anteriores tecnologias, a fim de tambÈm proporciona-

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rem ambientes favor·veis ao crescimento e a utilizaÁ„o das TICs em suas pr·ticas do-
‡ construÁ„o conjunta de conhecimento. centes foi extremamente importante na ta-
refa de identificar elementos que impedem
Na reflex„o sobre essa possibilidade, a apropriaÁ„o das tecnologias por parte dos
algumas questıes devem ser consideradas, professores, possibilitando o desenvolvimen-
como, por exemplo: Qual o nÌvel de analfa- to de uma metodologia com vistas ‡ capa-
betismo tecnolÛgico a que os professores citaÁ„o crÌtica e criativa dos envolvidos para
est„o submetidos? Como se d· a apropria- a atuaÁ„o com as TICs.
Á„o das TICs por parte dos professores de
diferentes cursos? De que forma a apropria- Outros pontos foram devidamente
Á„o dessas tecnologias pode propiciar o analisados:
desenvolvimento de novas pr·ticas pedagÛ- ∑ os nÌveis de analfabetismo tecnolÛgico a
gicas? Intui-se que a resposta a estas e a que os professores est„o submetidos;
outras questıes, bem como o surgimento de ∑ a efic·cia da formaÁ„o tecnolÛgica obtida
outras, possa ser obtida atravÈs de um tra- em seus cursos de graduaÁ„o;
balho de imers„o tecnolÛgica desses sujei- ∑ o modo de apropriaÁ„o das tecnologias por
tos, bem como a partir do acompanhamento parte dos educadores.
do trajeto percorrido pelos professores com o
3 O processo de desenvolvimento
objetivo de domÌnio dessas tecnologias.
da idéia
Dessa forma, o desenvolvimento da
J· h· algum tempo, o conceito de So-
pesquisa foi motivado pela necessidade de
ciedade da InformaÁ„o, propulsor de uma das
propor um modelo de imers„o tÈcnico-edu-
mais importantes obras liter·rias do sÈculo
cacional, que capacite educadores ‡ criaÁ„o
passado, a trilogia do sociÛlogo catal„o Ma-
de novas pr·ticas docentes que considerem
nuel Castels, Sociedade em Rede, tem sido
a utilizaÁ„o das TICs, a fim de que possam
repensado com relaÁ„o ‡ sua concepÁ„o.
utilizar tais recursos para a qualificaÁ„o do
processo educacional. Alguns autores apresentam uma lei-
tura alternativa para a atual realidade social.
2 Expectativas da pesquisa
Teresinha FrÛes (2000) propıe o termo So-
Inicialmente, esperava-se propor uma ciedade da Aprendizagem. Para compreen-
metodologia de capacitaÁ„o de professores der a sua idÈia, basta um breve exercÌcio
ao domÌnio criativo das TICs, a fim de fo- lÛgico. A informação em si, amplamente dis-
mentar o desenvolvimento de novas pr·ti- ponibilizada pelas tecnologias, contempor‚-
cas docentes apoiadas pelas tecnologias. neas ou n„o, n„o acarreta obrigatoriamente
o desenvolvimento intelectual; j· o conheci-
Buscou-se, ent„o, possibilitar aos en- mento, para ser percebido como tal, decorre
volvidos a superaÁ„o da situaÁ„o de divis„o da sistematizaÁ„o das informações disponÌ-
digital a que est„o submetidos, a fim de que veis. … exatamente esse o caminho necess·-
possam, tambÈm eles, propiciar essa mu- rio para que as informaÁıes transformem-se
danÁa de postura a seus alunos. A detecÁ„o em conhecimento, e deve ser preenchido pela
da concepÁ„o inicial dos professores sobre capacidade de aprendizagem.

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Para dar continuidade ao raciocÌnio OrÁamento Participativo, que, no Rio Gran-


iniciado, dois elementos figuram como fun- de do Sul, informatizou as escolas estadu-
damentais para a inserÁ„o dos indivÌduos ais. Embora algumas das iniciativas estejam
nessa nova realidade: o advento das novas aquÈm da proposta original, s„o representa-
tecnologias e a crescente import‚ncia do tivas e merecem citaÁ„o, na medida em que
ambientes educacionais, formais ou n„o, e, respondem ‡ idÈia de que as TICs est„o fora
principalmente, a import‚ncia do imbrica- das possibilidades das escolas.
mento destes na sociedade da aprendizagem.
Embora a grande maioria dos avan-
As novas tecnologias da informaÁ„o Áos tecnolÛgicos contempor‚neos n„o tenha
e da comunicaÁ„o apresentam-se como pro- sido desenvolvida especificamente para o
pulsoras dessa nova sociedade, na medida ambiente educacional, È possÌvel que suas
em que podem ampliar enormemente a ca- potencialidades sejam revertidas em prol de
pacidade intelectual do ser humano. Entre- uma educaÁ„o de melhor qualidade, possi-
tanto, È necess·rio que se reconheÁa que a bilitando aos indivÌduos o pleno exercÌcio de
sua distribuiÁ„o no Brasil ainda È extrema- sua cidadania. Entretanto, para que as
mente desigual, apontando para uma esta- tecnologias possam fornecer um incremen-
tÌstica que reflete as tradicionais formas de to significativo ao processo educacional,
exclus„o social. Isto se torna evidente quan- outros aspectos, alÈm da inserÁ„o propria-
do se constata, entre outros elementos, que mente dita, devem ser considerados.
72% dos usu·rios da internet no Brasil s„o
Dentre eles, o livro Sociedade da In-
das classes A e B (IBOPE INTERACT, 2000).
formação no Brasil, organizado por Tadao
No que se refere aos ambientes edu- Takahashi (2000, p. 6), alerta para a neces-
cacionais, È possÌvel supor que, se vivemos sidade de ìcapacitaÁ„o pedagÛgica e
um momento em que a aprendizagem È vi- tecnolÛgica dos educadoresî com a finalida-
tal para o desenvolvimento do indivÌduo e de de erradicar o que muitos autores deno-
para sua participaÁ„o ativa e crÌtica na soci- minam ìanalfabetismo eletrÙnicoî ou, sim-
edade, ambientes que a viabilizam ganham plesmente, ìe-analfabetismoî. Na sociedade
valor crescente. atual, preocupa perceber que mÈdicos, ad-
vogados, administradores de empresas, eco-
A possibilidade de conjugar as poten- nomistas e, sobretudo, professores deixam
cialidades das novas tecnologias ao dia-a-
as universidades analfabetos em termos de
dia escolar apresenta-se como uma forma tecnologia e, o que È mais preocupante, per-
efetiva de inserÁ„o social e de desenvolvi- manecem nessa condiÁ„o. … importante que
mento intelectual. Neste sentido, v·rias ini-
os professores e profissionais de todas as
ciativas concorrem para que as escolas te- ·reas tenham a capacidade de interagir
nham acesso ‡s tecnologias e apontam para ampla e versatilmente com as tecnologias;
uma realidade de informatizaÁ„o crescente
porÈm, como sugere Chaves (2000), ìcom
desses ambientes. Dentre elas pode-se des- os pÈs plantados em sua ·rea de atuaÁ„oî.
tacar o Programa Nacional de Inform·tica na
EducaÁ„o (Proinfo), o Fundo de Universa- A interaÁ„o dos professores com as
lizaÁ„o de ServiÁos de Telefonia (Fust) e o novas tecnologias est· intimamente relacio-

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nada ao que Sampaio (1999, p.11) chama zaÁ„o do mundo atual e na capacidade do
professor em lidar com as diversas
de ìalfabetizaÁ„o tecnolÛgica do professorî, tecnologias, interpretando sua linguagem e
da qual depender· a escolha entre ìinserirî criando novas formas de express„o, alÈm
a tecnologia na escola e ìsofrerî seus im- de distinguir como, quando e por que s„o
importantes e devem ser utilizadas no pro-
pactos ou possibilitar a ìinteraÁ„oî com e cesso educativo. (SAMPAIO, 1999, p. 75).
atravÈs da tecnologia na escola e suas im-
plicaÁıes, possibilitando a professores e alu- A necessidade da alfabetizaÁ„o tec-
nos a descoberta, a compreens„o e a nolÛgica do professor, que poder· ocorrer
interaÁ„o, contribuindo para a modificaÁ„o de formas diferentes em funÁ„o das realida-
do mundo que os cerca. des socioeconÙmico-culturais de cada um,
tem por base fatores relevantes. Destes, um
A exemplo do processo de alfabetiza- diz respeito ‡ necessidade de que esteja
Á„o, que transcende a idÈia de consumidor atento aos avanÁos tecnolÛgicos para que,
de textos, na medida em que fornece ao uma vez dominados e ìassimilados social-
homem a possibilidade de construir novos menteî, possam ser imbricados ‡ formaÁ„o
conhecimentos atravÈs de uma nova leitura dos alunos enquanto ìcidad„os capazes de
do mundo no qual est· inserido, superando lidar com os avanÁos tecnolÛgicos, partici-
situaÁıes de passividade diante da socie- pando deles e de suas conseq¸Ínciasî
dade, a alfabetizaÁ„o tecnolÛgica pode, e (p.15). Se as tecnologias, nas suas mais
deve, ir alÈm do domÌnio instrumental da variadas formas, fazem parte da vida dos
m·quina, dissociando-se de uma concepÁ„o alunos fora da escola, parece natural que
tecnicista, centrada na utilizaÁ„o da tecno- faÁam parte, tambÈm, de suas vidas escola-
logia como mera ferramenta a ser manipu- res, o que implica o desenvolvimento de no-
lada, passando a ser concebida como no- vas competÍncias por parte dos professores.
vas possibilidades de comunicaÁ„o, de inte-
raÁ„o e de construÁ„o do conhecimento. Ao se referir ‡s ìnovasî habilidades do
professor na sociedade da informaÁ„o, Sampaio
O termo alfabetização È tomado como (1999, p.18) destaca a capacidade de ìcap-
base do conceito de alfabetizaÁ„o tecno-
tar, entender e utilizar na educaÁ„o as novas
lÛgica do professor por alguns motivos.
linguagens dos meios de comunicaÁ„o ele-
Sampaio (1999, p.60) afirma que ambas
trÙnica e das tecnologiasî. A autora afirma que
ìconjugam a decodificaÁ„o de signos e sua
interpretaÁ„o ou atribuiÁ„o de sentido; [...] o professor precisar·
contribuem para a interaÁ„o do homem com utilizar as tecnologias e suas diferentes lin-
o mundo de maneiras mais efetiva, partici- guagens com o objetivo de atingir o aluno e
pativa e crÌtica; [...] necessitam de aperfei- transform·-lo (sic!) em um cidad„o tambÈm
capaz de entender criticamente as mensa-
Áoamento constanteî, e declara que È preci-
gens dos meios de comunicaÁ„o a que È
so compreendÍ-la exposto, alÈm de saber lidar, no dia-a-dia,
com os outros avanÁos tecnolÛgicos que o
[...]como um conceito que envolve o domÌ- rodeiam. (idem, 1999, p.19).
nio contÌnuo e crescente das tecnologias
que est„o na escola e na sociedade, me- Sabe-se que aspectos relacionados ‡
diante o relacionamento crÌtico com elas.
Este domÌnio se traduz em uma percepÁ„o inserÁ„o de novos recursos no processo
global do papel das tecnologias na organi- ensino-aprendizagem demandam, alÈm de

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uma profunda reestruturaÁ„o na atual con- (1) encontros semanais, cujo objetivo era o
cepÁ„o de educaÁ„o escolar e n„o escolar conhecimento e o posterior domÌnio das
e da prÛpria idÈia de inform·tica na educa- tecnologias por parte dos participantes;
Á„o, o domÌnio da tecnologia por parte do (2) encontros mensais, que se destinaram ‡
professor. Assim, È preciso que se iniciem discuss„o e ao aprofundamento de temas
reflexıes no sentido de vislumbrar algumas referentes ‡ inform·tica na educaÁ„o e
possibilidades de mudanÁa de condiÁ„o da- (3) um momento final, destinado ‡ criaÁ„o
queles que s„o submetidos a uma ìeduca- de pr·ticas pedagÛgicas que considerassem
Á„oî para a ìdomesticaÁ„oî, e n„o para a a utilizaÁ„o criativa, crÌtica e segura das
libertaÁ„o, como sugere Freire (1983, p.36). tecnologias.

Dessa forma, uma possibilidade de Nos encontros semanais, realizados


transformaÁ„o dessas concepÁıes e de efe- no LaboratÛrio Central de Inform·tica e no
tivo domÌnio dos recursos tecnolÛgicos deve Mundo da Leitura, os envolvidos tiveram a
necessariamente estar vinculada ‡ capaci- possibilidade de desenvolver competÍncias
taÁ„o tÈcnico-educacional dos professores. referentes ao domÌnio dessas tecnologias.
Salienta-se que a concepÁ„o de domÌnio da Por outro lado, os encontros mensais pos-
tecnologia extrapola o conceito de simples suÌam um car·ter de aprofundamento teÛri-
utilizaÁ„o, no sentido de que quem domina co, proporcionado por constantes trocas en-
È capaz de partir do que est· posto, do que tre as reflexıes propostas e as experiÍncias
È senso comum e criar novas utilizaÁıes para dos professores em suas escolas.
aquilo que domina. Portanto, investir na
A fim de detalhar esses mÛdulos, fo-
capacitaÁ„o tecnolÛgica daqueles que ter„o
‡ sua disposiÁ„o os recursos existentes na ram propostas as seguintes etapas:
sociedade parece ser o caminho mais curto Etapa 1:
nesse processo.
Destinada ‡ definiÁ„o dos sujeitos da
Nesse sentido, propÙs-se o projeto pesquisa. Em funÁ„o da existÍncia da disci-
Imers„o TecnolÛgica de professores junto ao
plina de Pr·tica de Ensino e do n˙mero de
Centro de ReferÍncia em Literatura e
alunos, definiu-se como perfil b·sico dos
Multimeios da UPF,1 comumente chamado
sujeitos: alunos de cursos de Licenciatura da
Mundo da Leitura,2 cujo objetivo principal È
Universidade de Passo Fundo que atuam em
capacitar professores ao domÌnio das
escolas da regi„o e que cursam as discipli-
tecnologias, a fim de poder integr·-las a di-
nas de Matem·tica, Pedagogia e Letras.
ferentes projetos pedagÛgicos e realidades
educacionais. Para a constituiÁ„o do grupo de estu-
do foram realizadas visitas ‡s turmas de Pr·-
4 Metodologia do desenvolvimento
tica de Ensino I dos cursos eleitos, nas quais
da pesquisa
foi realizada uma explanaÁ„o do projeto. A
O projeto foi desenvolvido em trÍs partir desse momento, os alunos, em con-
mÛdulos: senso com o professor respons·vel, optari-

1 Maiores informaÁıes em: http://www.upf.br


2 Maiores informaÁıes em: http://www.upf.tche.br/mundodaleitura/

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am por tomar parte do estudo, estando au- as experiÍncias pr·ticas dos alunos, esta-
tomaticamente liberados para, uma aula por belecendo relaÁıes e detectando contradi-
mÍs, participar dos encontros de discuss„o Áıes entre teoria e pr·tica.
teÛrica realizados no Mundo da Leitura e dos
encontros semanais em hor·rios alternati- Etapa 4:
vos e realizar o trabalho final da disciplina, Relacionada com a imers„o tecno-
de acordo com os objetivos do projeto. lÛgica propriamente dita dos envolvidos,
Etapa 2: esta etapa ocorreu concorrentemente com
a anterior, sendo, inicialmente, proporcio-
ObtenÁ„o de informaÁıes referentes nados momentos de familiarizaÁ„o e utili-
‡ concepÁ„o atual dos professores sobre o zaÁ„o das tecnologias, visando um poste-
papel das TICs na sociedade atual e, mais rior e conseq¸ente domÌnio desses recur-
especificamente, no processo educacional sos. Os encontros foram realizados sema-
como um todo. Tais informaÁıes foram cap- nalmente, em hor·rios previamente esta-
tadas atravÈs das discussıes mensais, as belecidos, sendo desenvolvidos nas de-
quais tinham como base um texto especÌfi- pendÍncias da Universidade de Passo
co da ·rea e os coment·rios surgidos infor- Fundo, com o envolvimento do pesquisa-
malmente durante os encontros semanais. dor, da equipe do Mundo da Leitura, de
Utilizou-se tambÈm o recurso de entrevistas volunt·rios do curso de CiÍncia da Com-
e question·rios. putaÁ„o 3 e os sujeitos da pesquisa.

Etapa 3: Esses encontros foram divididos da


seguinte forma:
Discuss„o de temas relacionados ao
papel das TICs na sociedade atual e na es- De marÁo a maio de 2002
cola, a relaÁ„o educaÁ„o-tecnologia, a pos- ∑ Atividades relacionadas ‡ utilizaÁ„o do
tura do professor frente ao novo contexto computador, da Internet e de suas ferramen-
tecnolÛgico, os mitos criados em torno das tas e an·lise de softwares educacionais de-
tecnologias, a inclus„o digital e o analfabe- senvolvidas no LaboratÛrio Central de
tismo tecnolÛgico. Inform·tica da UPF.

Foram utilizados recursos em diver- De junho a julho de 2002


sas mÌdias: textos, imagens, m˙sicas, vÌdeos ∑ Atividades relacionadas ‡s m˙ltiplas lingua-
e chats com pessoas que discutem as ques- gens/tecnologias: m˙sica, vÌdeo, ìcontaÁ„oî
tıes. Esses encontros, realizados junto ‡ de histÛrias e leitura em diversos suportes,
estrutura do Centro de ReferÍncia em Lite- desenvolvidas no Mundo da Leitura pela
ratura e Multimeios da UPF, tiveram a perio- equipe multidisciplinar do Centro.
dicidade mensal e envolveram o grupo e o
Etapa 5:
pesquisador. Um dos objetivos dessas dis-
cussıes foi o de propiciar o contraponto en- Realizada no perÌodo de agosto a
tre o que era apresentado pela literatura e dezembro, propunha o desenvolvimento e a

3 Maiores informaÁıes em http://inf.upf.tche.br

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aplicaÁ„o de uma proposta educacional, em conciliar as atividades realizadas pelos alu-


um ambiente formal ou n„o de ensino, que nos no projeto com as propostas das disci-
considerasse a utilizaÁ„o das TICs. Nessa plinas, que, em tese e segundo o que foi
atividade, mais importante do que o domÌ- acordado com os professores respons·veis,
nio propriamente da tecnologia era a ofereceriam o suporte pedagÛgico necess·-
visualizaÁ„o, por parte dos participantes, das rio para que o processo educacional forma-
suas potencialidades educacionais, no sen- lizado em pr·ticas de ensino pudesse ser
tido de propor e aplicar novas formas de pr·- qualificado pela apropriaÁ„o e utilizaÁ„o das
tica educacional. As pr·ticas propostas fo- tecnologias por parte dos envolvidos.
ram realizadas junto ‡ clientela do Centro
em hor·rios prÈ-determinados, sempre obe- Tal situaÁ„o acarretou aos sujeitos da
pesquisa uma carga de trabalho adicional,
decendo a uma das modalidades:
uma vez que a grande maioria teve de de-
∑a mesma proposta para clientelas diferen- senvolver, alÈm das atividades pertinentes
tes com periodicidade semanal; ao projeto, as atividades tradicionais previs-
∑o mesmo trabalho com a mesma clientela tas nas disciplinas. Dessa forma, faz-se ne-
com periodicidade mensal; cess·ria uma maior autonomia das discipli-
∑o mesmo trabalho com a mesma clientela nas para a prÛxima ediÁ„o do projeto.
de agosto a novembro.
Da mesma forma, merece destaque
Para o encerramento desta etapa, pro- a coexistÍncia de problemas de formaÁ„o
pÙs-se a confecÁ„o de um material multi- pedagÛgica dos alunos, anteriores e inde-
mÌdia contendo os resultados obtidos junto pendentes do projeto, que acabam por com-
aos alunos, que deve ser disponibilizado no prometer as atividades propostas, na medi-
Mundo da Leitura para consultas posteriores. da em que, para a utilizaÁ„o das novas
tecnologias no processo educacional, faz-se
5 Apresentação e análise dos necess·rio domin·-lo de antem„o, o que n„o
resultados se configurou como realidade a todos os
Ao tÈrmino das atividades previstas no envolvidos.
projeto de imers„o tecnolÛgica, detectou-se
Detectou-se que embora alguns dos
a necessidade de proceder algumas altera-
cursos representados no projeto prevejam
Áıes em sua estrutura, ‡s quais dever„o ser
em seus currÌculos disciplinas relacionadas
efetuadas a partir de sua reediÁ„o. Dentre
‡ inform·tica, estas s„o insuficientes, na
elas, podem ser citadas:
medida em que n„o possibilitaram aos alu-
A idÈia inicial do projeto foi o trabalho nos suporte para a mera utilizaÁ„o dos re-
conjunto com as disciplinas de Pr·tica de cursos tecnolÛgicos, o que n„o È suficiente
Ensino I e II, para que, ao tÈrmino das eta- para profissionais da ·rea educacional nem
pas, os alunos pudessem realizar suas pr·- t„o pouco possibilita a discuss„o de elemen-
ticas de ensino segundo uma nova concep- tos de fundo da inform·tica educativa, como,
Á„o, que considerasse a utilizaÁ„o das TICs. por exemplo, o papel do docente em uma
Entretanto, tratando-se de uma nova propos- escola informatizada, as mudanÁas deman-
ta de capacitaÁ„o docente, tornou-se difÌcil dadas, as possibilidades advindas da pre-

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senÁa das tecnologias, as iniciativas existen- Mas, cabe salientar que apesar dos
tes na ·rea, dentre outras. aspectos expostos, que serviram de base
para a reestruturaÁ„o do projeto, os alunos
PorÈm, h· de se destacar que a inefi-
puderam desenvolver propostas, n„o t„o ino-
c·cia da capacitaÁ„o tecnolÛgica dos pro-
vadoras quanto o esperado, mas alternati-
fessores pÙde ser minimizada a partir das
vas e diferenciadas em relaÁ„o ‡queles que
atividades realizadas no projeto, nas quais
verificou-se a relaÁ„o do domÌnio da tecno- n„o participaram do projeto, utilizando, de
logia com a predisposiÁ„o proveniente de forma segura e eficiente, os recursos
uma motivaÁ„o adequada; motivaÁ„o que tecnolÛgicos disponÌveis. Algumas das pro-
passa pela discuss„o, reflex„o e conheci- postas e atividades ser„o disponibilizadas
mento do potencial das tecnologias ao pro- no site do projeto (http://vitoria.upf.tche.br/
cesso educacional. ~leitura/imersao/), t„o logo a etapa de
digitalizaÁ„o do material seja concluÌda.
Na mesma linha, pÙde-se detectar a
carÍncia das universidades no preparo dos 6 Considerações finais
professores para a atuaÁ„o com as TICs, o
que pode ser facilmente verificado a partir Foi possÌvel verificar a import‚ncia do
da an·lise dos currÌculos, que algumas ve- domÌnio das TICs por parte dos professores
zes n„o prevÍem disciplinas relacionadas, e a sua conseq¸ente utilizaÁ„o diferenciada
das ementas das disciplinas de inform·tica no processo educacional, visto que, na me-
educativa, da opini„o de alunos e do dida em que se reconhecem as potencia-
posicionamento da maioria dos professores, lidades e as possibilidades das TICs, È pos-
que, tendo o papel de proporcionar, ou ao sÌvel propor formas de utilizaÁ„o alternati-
menos apoiar, iniciativas semelhantes na vas, para alÈm da concepÁ„o atual de
·rea, acabam por dificult·-las. inform·tica educativa. Entretanto, para que
seja possÌvel aprofundar essas discussıes
N„o se trata, entretanto, de uma defi-
ciÍncia da Universidade de Passo Fundo, e traÁar um paralelo entre as duas experiÍn-
mas uma realidade na educaÁ„o superior cias, bem como aprimorar o processo de
brasileira. Da mesma forma, os alunos ain- imers„o proposto pelo projeto, torna-se fun-
da n„o reconhecem a import‚ncia de ativi- damental a sua continuidade em uma
dades que os coloquem em contato com tais perspectiva de contribuiÁ„o permanente, para
recursos, uma vez que de aproximadamente o desenvolvimento de competÍncias que pos-
60 alunos matriculados na disciplina de Pr·ti- sibilitem aos professores o domÌnio criativo e
ca de Ensino I, somente 29 se dispuseram a autÙnomo das tecnologias, buscando alterna-
participar e apenas 12 finalizaram o projeto. tivas para a minimizaÁ„o da exclus„o digital.

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INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO:
teoria & prática

ReferÍncias
BENAKOUCHE, T. Fatores Sociais e Culturais na Utilização Diferenciada de Redes Eletrônicas
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Exclusão Social. Passo Fundo: EDIUPF, 2002.

Aceito para publicaÁ„o em 2003/1

Adriano Canabarro Teixeira


Professor, mestre em EducaÁ„o (UPF) e doutorando em
Inform·tica na EducaÁ„o (UFRGS), professor no Curso
de CiÍncia da ComputaÁ„o (UPF).
E-mail: teixeira@upf.br
http://vitoria.upf.tche.br/~teixeira

SÈrgio Roberto Kieling Franco


Professor, mestre e doutor em EducaÁ„o (UFRGS), pro-
fessor no Departamento de Estudos Especializados
(DEE) da Faculdade de EducaÁ„o (UFRGS).
E-mail: franco@edu.ufrgs.br

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