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| a Corr ©2018 Rae erg do Nass Copp ©2018 Edtor Mifones ne i Cin 38 en 1916006 Senta force Mtoroncme ‘toreedioramifontecom br Brad ahr Cte Brune Cet Nascimento on Sent ont rot Dr, Ane dest Avtar (UPL) Prof br arnldo Pinto fun OMTCANP) rol br Arar ina de Avi (UPR) Prof Or Crstno inca arate UFO) rot Dr Dogs du Sn oir USS) Pra Dr Eu it Game Dia Urdu ot) rote rb Frans (ONIFESY ‘rt Dr Hane Urich Gumbrect Sears Unversty) rab Dr Hens Mirands Ma (UFO?) Prof fovea Macha de lv (OPES) Pot Br is Sentivogie (UPS) Pret br radi lee UFRGS) ‘ro De Kane hein (UNESP Frans) rut Det Mari Beri Nade (UTES) rel by Mare de Melo Rangel UFOP) ols De Rebece Cot (UPRRD ro par ira ee UNESPARY ‘rl rth ime Nice ol Dr Vue Lope ae Ao FOP) Prot, Werbice Tonal (Unverdand Se Buen Ae) RaFAzt CeRQUEIRA DO NASCIMENTO A Narrativa Histérica da Superacao do Atraso Um desafio historiografico do Espirito Santo Epitona Mitrontes Capitulo IT O sentido da superacao do atraso. Rafael Cerqueira do Nascimento A proposta de um desafio historiogréfico do Espirito Santo busca elucidar a construcéo de modelos paradigméticos de compreensio do Espirito Santo capazes de orientar e fundamentar 0 discurso da superacio do atraso, no que tange a producio de narrativas histOricas, essenciais na formulagéo de um passado satisfatério a0 discurso politico. Dentro desse caminho esse capitulo tem um duplo objetivo: analisar a emergéncia de uma narrativa histérica da superagao do atraso do Espirito Santo a partir da década de 1960 que denominamos de narrativa histérica do progressivo desenvolvimento, e avaliar a emergéncia da narrativa da formagao econdmica do Espirito Santo, evidenciando como a narrativa da superagdo do atraso se apresentou em uma nova formatacio historiografica mas em consonincia com o discurso politico no inicio do século XI. Argumentamos que 0 discurso da superagéo do atraso foi instituido a partir da década de 1960 no Espirito Santo e foi constituido tanto por sua matriz politica quanto historiogréfica. Estamos considerando- como um discurso fundador, pois, em suas diferentes matrizes, instituiu um sentido para o Espirito Santo, ‘No que tange ao discurso politico, correspondeu ao processo de implantacio e legitimacio de um projeto politico-econémico de parte da elite politica espiritossantense, que estabeleceu o sentido do progresso local a partir do desenvolvimento via industrializagao. A sua matriz.historiogrifica, por sua vez, buscou produzir um sentido para a i .do Espirito Santo, fundando um passado em consonancia com as aspiragies e expectativas de sua época. Essa dupla emergéncia de formas de narrar o Espirito Santo ea relagao entre elas que analisamos a seguir. discurso da superacao do atraso e 0 projeto de desenvolvimento via industrializagao no Espirito Santo. ‘Quando definimos que o discurso da superacéo do atraso inaugurou uma discursividade para o Espirito Santo, estamos considerando que sua vertente politica configurou-se a partir da © ORLANDI, Eni P. Discurso Fundador...Op. cit. p. 18. ‘AnNarrativa histrca da superagdo doatraso orrespondendo ao processo de implantacto ¢ lnaee aa rele politico-econdmico que caracterizou 9 periodo. A industrializagto no Espirito Santo fol empreendida por vuma parcela da elite urbano-industral local que, ap6s derrubar 9 governador Francisco Lacerda de Aguiar em 1966, conduziu ag poder entre 1966 ¢ 1979, tts governadores denominados de bidnicos {respectvamente, Christiano Das Lopes Filho, Arthur Carlos Gehardt ‘efleio Alvares) responsivels pela inauguracdo € consolidagao desse projeto industralizante:® Segundo Zora, configurou-se, nese perfodo, um nileo de forgas politicas em torno do projeto de industrializacao acelerada ‘que ocorria a nivel nacional, Por meio da recém criada Federacio das Industras do Estado do Espirito Santo (FINDES), essas forgas articularam meios de dinamizar a economia local ea buscar formas de insriro Estado nas éreas consideradas mais desenvolvidas do pais Em meadosda déceda de 1960, uma das questées que envolviam o jogo de forcas politicas no Estado, segundo ela, era justamente o contraste entre 0 novo e o velho, o que permitiu a emergéncia do debate em tormo da questio do desenvolvimento versus subdesenvolvimento do Espirito Santo.” Nesse sentido, de acordo com Rocha e Morandi, a forma de conceber as desigualdades regionais no pais foi orientada pela ‘concep¢ao cepalina de desenvolvimento econdmico, a partir da lbgica centro e periferia, ¢entendendo a industralizaco como caminho de superagio do subdesenvolvimento.* Tal pensamento orientou 0 ‘65 OLIVEIRA, Ucber Jost de, Configuragio partidéria do estado eons as cs ee ts de ARENA e MDB (19641962), Tee (Doutorado em Hist). nde Sto Ca SoCo 2013, ye " LVA, Marta Zorzal. Espirito Santo: Estado, a ee NA nee poder, Disetato (Mando em Adminsraeo Piblia). Mesindo em Adminsaslo Publica, anda Geto Var Ro defunera 1966 past 8 Tae 5454 ROCHA Harldo Conta MO! re ANDI. Angela Maria Caeclturse Grande PST tsk no Epo Santo. 2 Vitra Epa Santo em Al, 2012 56 Rafael Cerqueira do Nascimento projeto de desenvolvimento das regides consideradas atrasadas em Flacio a0 desenvolvimento dos estados da regido Centro-Sul a partir da intervencio estatal mediante a criacéo de politicas econdmicas specficas.® A regiio Nordeste, por exemplo, passou a ser encarada como area prioritaria para a intervengo do Governo Federal. 0 Espirito Santo, por sua vez, continuou atrelado & regio Centro-Sul na redefinigdo da geografia econdmica do pais, o que nao o permitiu ter acesso a essas politicas.”” Desse modo, a preocupagdo com o lugar ocupado pelo Espirito Santo e a politica de desenvolvimento regionais no Brasil orientaram as estratégias das elites dirigentes locais voltadas para a iplementagao de um projeto de industrializagio do Estado. Os discursos governamentais sobre o desenvolvimento local foram construidos, principalmente, no conjunto de documentos oficiais elaborados nesse periodo.”' Neles, identificamos os diagnésticos do atraso e progndsticos de superagdo que moldaram as interpretages de Espirito Santo. Nesse sentido, definiram uma representagio do Estado apartir de sua especificidade no contexto econémico brasileiro: por um lado, demarcaram o Espirito Santo como marginalizado e ocupando 6 lugar do atraso; por outro, ao longo das décadas de 1960 ¢ 1970, instituiram o discurso da superagao do atraso, via industralizacéo. Tniciamos nossa andlise pelo diagndstico do atraso, elaborado em fungio da necessidade de insergio de um Estado que se encontrava & margem. @ ROCHA, Haroldo Cortés: MORANDI. Angela Maria Cafeiclturae Grande Insti. Op. cit, p. 53-54, 170 Ibid, p. 57. 71 0s documentos aqui citados foram: Espirito Santo (Estado). Governador, 1967-1971 (Dias Lopes). Diagnéstico para planejamento econbmico do Estado do Espirito Santo, Vitdria, 1966; Espirito Santo (Estado). Governador, 1967-1971 (Dias Lopes), Um Estado em marcha para o desenvolvimento. s1., 1969: BANDES. Aspectosfundamentais da politica econbmica do Espirito Santo, Vitis: MEC 191; Exptto Santo (Estado), Governador, 1967/1971 (Dias Lepes). Desafio © ‘espost: desenvolvimento do Estado do Espirito Santo, 1967/1970. Rio de Janeiro: Antenova, 1971; Espirito Santo (Estado)/Secretaia De Planejamento. Diagnéstico ¢ Peripectiva da economia do Espirito Santo. Vitis, 1975. 57 a Of ‘A Narrativa hist6rica da superagao do atraso Nos documentos, esse conjunto de informagdes acerca dos problemas do Espirito Santo definiu seu lugar em relacio aos estados considerados a época como desenvolvidos economicamente. Sua posigdo foi definida por meio da légica inser¢io-marginalizacto, 0 diagndstico de 1966 apontava “os meios para corrigit a relativa marginalizagéo a que o Estado se viu colocado, diante do principal centro dinamico do pais”? O objetivo, portanto, era tracado em fungio dessa necessidade de agregar o Espirito Santo a outras economias estaduais consideradas mais desenvolvidas. O Estado ‘passou a ser entendido como “Area atrasada, ou de fraco dinamismo” que melhoraria “sua posigéo relativa” se conseguisse ter suas atividades incorporadas “a setores de elevado dinamismo”” O desenvolvimento foi orientado dentro da perspectiva da superacio de uma marginalizacio em relacio a centralidade de outros Estados. Segundo o documento Diagnéstico para planejamento econdmico do Estado do Espirito Santo: nossa proposta no sentido de desenvolvimento, a longo prazo, ao Estado consiste, em iiltima andlise, na tentativa Ee quebrar de uma vea por todas seu relativoisolamento, integrando-o firmemente, na rea economicamente mais dinamica do pais” Demarcava-se um lugar de atraso do Espirito Santo. O critério de avaliagdo fundamentado na relacio desenvolvido versus subdesenvolvido foi apropriada para avaliar a condi¢ao do Estado. O discurso politico atribuiu ao Espirito Santo uma condigéo de atraso relativo, Residia nela, inclusive, a especifcidade local, justificativa para a adogio de um novo modelo de desenvolvimento, Existia, portanto, a necessidade de classific-l : t -lo em fungio dos estados considerados desenvolvidos. De acordo com © documento Um Estado em marcha para o desenvolvimento 0 72 ROCHA, Haroldo Cor Indah Hl Cort: MORANDI. Angel Maria, Cfeeltrae Grande 73 ide, 3 74 ESPIRITO SANTO (ESTAD Lopes si (ESTADO). Goverador, 1967-1971 (Dis. Lape) Toe eee Pea plancjamento econdmico do Estada do Espirito Santo. Vitor 58 ‘Rafael Cerqueira do Nascimento Espirito Santo era um Estado ilhado. Apresentava “uma economia preponderantemente embasada nos resultados da agricultura”, e ndo Conseguiu, segundo esse diagnéstico, “acompanhar, sequer de longe, ‘o desenvolvimento industrial do eixo Rio - So Paulo, registrado nos ‘ltimos quinquénios”.”* © atraso relative, na légica do desenvolvimento via industrializacio, definia a situagdo do Estado como “nitidamente desfavorivel” ”*Porisso,no documento Diagnéstico para planejamento ‘econdmico do Estado do Espirito Santo, de 1966, o objetivo era retirar 0 Estado “dessa situacio indefinida, integrando-o, de uma vez por todas, na rea geoeconémica de maior desenvolvimento do pais”.” A caracterizagao do diagndstico do atraso, evidenciando 1 especificidade do Espirito Santo, correspondia a justificativa ¢ & legitimacio de um determinado projeto de sociedade.” Segundo Ueber Oliveira, existiu uma confluéncia histérica entre os projetos de desenvolvimento do Espirito Santo, que buscava vantagens em esferas nacionais, € a politica econdmica dos militares, 0 que orientou a ago da parcela urbano industrial das elites regionais.” A industrializagéo passou pela agio do Estado que ganhou um papel preponderante na condugdo dese processo. Alinhando-se & politica de desenvolvimento do Governo Federal os dirigentes locais entendiam que essa correspondéncia com os objetivos da politica nacional possibilitaria a almejada insergéo econdmica do Espirito Santo no contexto econédmico brasileiro, por meio da viabilizacao dos investimentos privados estrangeiros direcionados para 0 Estado, ‘© que, por sua vez, foi concretizado ao longo da década de 1970 com 75 ESPIRITO SANTO (ESTADO). GOVERNADOR, 1967-1971 (Dias Lopes). ‘Um Estado em marcha para o desenvolvimento. s1., 1969, p. 193. 76 Ibidem,p. 8. 77 ESPIRITO SANTO (ESTADO). Governador, 1967-1971 (Dias Lopes). p.223, Para planejamento econdmico do Estado do Espirito Santo... Op. it, 78 CHARTIER, Roger. A Historia Cultural... city p- 19-21. 79 OLIVEIRA, Ucber José de. Configuragio poitico-partidaria do estado do Santo no contexto do regime militar... Op. cit. p.319. 59 ‘A Narrativa historia da superagio do atraso aimplantagéo dos Grandes Projetos Industriais.” Nesse proceso, a instituigio de um novo modelo de desenvolvimento local destituiu 2 economia agréria enquanto legitimou a via industrializante para o Espirito Santo. No conjunto de documentos que denominamos de diagnédsticas do atrasoe prognésticos da superagao, observamos que a industrializagéo como caminho de superacio do atraso foi identificada em oposigao ao setor agricola. No documento Um Estado em marcha para o desenvolvimento, ainduistria deveria impulsionar o desenvolvimento. ‘A condigio de atraso do Espirito Santo foi associada, sobretudo, & crise da economia cafeeira. A via industrializante foi ppossivel a partir do colapso da estrutura agréria local coma crise do café." Segundo o documento Aspectos fundamentais da politica econdmica do Espirito Santo, de 1971, a “andlise do comportamento da economia do Espirito Santo no periodo 1962/1969" revelava “o fraco desempenho do setor agricola” causado pelo “persistente declinio da lavoura de café”! ‘A ctise do café orientou a definicio da industrializagao como caminho de superagao do atraso, No entanto, como defende Raquel Daré, a ideia de crise tornou-se hegeménica nesse periodo. A construcio da nogio de crise constituiu o discurso desenvolvimentista vinculado ao projeto politico-econémico implantado a época e, consequentemente, compés a representacio do atraso do Espirito Santo.” Diante dessa dicotomia ‘atraso versus desenvolvimento, representado nos polos agricultura/ industrializagdo, instituiu-se as estratégias para a consolidacao desse projeto de Espirito Santo. TUREIRO, Kita. O processo de modernizagioautoritéria. eR tt Opec deme utr agian 537A (19671983). Disertato (Mestrado em Hist) Programa de Por radeccas fem Histéria Socal das Relagdes Politics, Universidade Feder x Hunt Soc ds al do Espirito Santo, {a1 OLIVEIRA, Usher José de. Configuriio politico-partidira aprto Santo no contexte do regime miltar-Op.ctapfsy toe o> made do 82 BANDES. Aspector fundamentals da politica Santo.. Op. cit, p-24. seondmica do Espirito 85 Cf DARE, Raquel. A “crise” do café ¢ a Sdelogia desem ‘eplrts Sant, Dissenardo (Mestado em Geograia). Presse nrolvimentista no rs Geografia, Universidade Federal do Espino Sant, Visia, apg oreGuagso 60 Rafael Cerqueira do Nascimento A implantagio da politica desenvolvimentista, segundo Rocha ¢ Morandi, indicava “o setor industrial como 0 unico capaz de soerguer a economia capixaba”, por meio, sobretudo, da “criagdo de um mercado de capitais cativo, ou seja, do sistema de incentivos fiscais”. De acordo com os autores, foi criada uma frente de aco pelo Governo estadual ¢ seus érgios para “transformar o Espirito Santo ‘em uma regido merecedora dos tio almejados incentivos fiscais”."> Seguindo essa estratégia politica, o Governoestadual criouas condicdes infraestruturais e passou a vender a imagem do Espirito Santo, em busca da atragéo desses investimentos." Essa politica permitiu que os diagnésticos do atraso passassem a dividir espaco com os prognésticos da superagao, associando a imagem do atraso a representagio do Espirito Santo em vias de superacao do atraso. Assim, o caminho para a insergao do Espirito Santo passava pela politica de incentivos fiscais, para o capital privado. De acordo com Bittencourt, tornou-se praticamente uma espécie de slogan local a ideia de que o Estado seria um Nordeste sem Sudene. Ela tornou-se argumento da elite politica espiritossantense em sua estratégia de sensibilizacio do Governo Federal afim de que ‘0 Espirito Santo fosse beneficiado com a politica federal de distorgdes tegionais a partir da criacdo de pélos industriais nessas regides consideradas atrasadas e compreendidas como sem condicées de impulsionar seu desenvolvimento de forma auténoma,” pois, como sugeria o documento de 1966, a capacidade do Estado “influenciar, por sis6, 0 desenvolvimento da sua érea revela-se, portanto, relativamente Pequena”." A estratégia em corresponder & politica engendrada pelo {4 ROCHA, Haroldo Corréa; MORANDI. Angela Maria. Cafeiculturae Grande Indistria...Op. cit, p. 67. 85 Dbiders, p68 86 LOUREIRO, Kits, © processo de modernizagio autoritéria da agriculture ‘0 Espirito Santo...Op. cit, p. 43-44. & BITTENCOURT, Gabriel. A formagio econdmica do Espirito Santo: do ‘engenho as grandes industrias (1535-1980), Vit6ria: DEC, 1987, p. 205. 88 ESPIRITO SANTO (ESTADO). Governador, 1967-1971 (Dias Lopes) Tenéstico para planejamento econdmico do Estado do Espirito Santo. Vitoria, P-198, 61 A Narrativa historia da superagto do atraso governo federal permitiu a representacdo do Espirito Santo em busca pela superagio do atraso: estamos convencidos de que a continuidade dessa ‘campanha de esclarecimento e mais a luta titinica que se trava pela obtengio de uma politica de incentivos fiscais para o nosso Estado, esté podendo sensibilizar os homens de empresa no estabelecimento de indistrias no nosso Estado, que irdo oferecer 0 resultado com o qual acelerar- se-4 0 proceso desenvolvimentista do Espirito Santo.” Os enunciados acerca do Espirito Santo ganharam referencias que estabeleciam o sentido da superacdo. Analisando 0s documentos, identificamos, também, que, a partir da década de 1970, 0 Espirito Santo do atraso e da marginalizacdo passou a set Tepresentado a partir da expectativa de superacdo que, instituiu, por sua Vez, 0 processo de industrializacio em curso como um marco para © Estado, ou seja,o discurso da superagio do atraso definia-se como Um discurso fundador,instituindo um modo de dizer sobre o Espirito Santo assim como definia um lugar particular tanto para o Estado como para o projeto de industrializacio.* clonal. Op. itp. 1ba1) re? Fundador: formagio do pals ea Identidade 91 ROCHA, Hi; rd Indi Op deo: MORANDI, Angela Maria. Cafeclturae Grande 92 Ibidem, p, 136-142, 62 Rafael Cerqueira do Nascimento ectativas acerca do Espirito Santo, ou sej, segundo ee,“ sa perspectiva de desenvolvimento de pen ade" gorda . grandiosidade do futuro porque sente a grandeza do presente"? Os rognésticos de superacdo surgiram exatamente dessas perspectivas Fe eransformacio do Espirito Santo a partir do proceso de industrializagdo em curso adotado pelo Governo local. (Os Grandes Projetos foram apresentados como prognsticos da superacdo do atraso. A elaboracéo de uma imagem de Espirito Santo em vias de superagio do atraso passou a ser construida a partir das expectativas de consolidacio dos grandes empreendimentos industriais. A imagem elaborada em torno do processo de industrializagio em curso definia a transigdo de um Espirito Santo, até entio, “retardatario no processo de desenvolvimento econdmico nacional”.® Identificava-se um processo de mudanga para uma nova condigéo. O que o documento Diagnésticose perspectivas da economia do Espirito Santo (1975) apresentava como 0 advento dos Grandes Projetos modificava o status do Estado. Mais doque um diagndsticodo processo dedesenvolvimento do Espirito Santo, o documento apresentou o momento atravessado pelo Estado como um marco, uma vez que “os investimentos anuais representados pelos Grandes Projetos” suplantariam em “quase duas vezes 0 que seria esperado” para a década de 1970." O que, por sua veo, definia uma imagem de Espirito Santo associado a superagao do atraso: © desempenho da economia estadual dependerd da magnitude desses efeitos, mas obviamente ser maior do que aquele representado pela taxa historica de crescimento ‘bservada no periodo de 1968-1972. A formagio de capital ‘mais que triplicaré em relagdo ao nivel de investments esperado segundo 0 comportamento hist economia. Com a intensiene3o do dinamismo da ‘economia prevé-se, em espaco de tempo certamente Cur SB ESPIRITO SANTO (ESTADO). Governador, 1967/1971 (Dis Lopes. fe resposta...Op. cit. p.4. 4 Tbidem,p ‘95 Ibidem, p. 73. 63 A.Narrativa histériea da superagto do atraso a superagto do tradicional ¢ persistenteatraso relativo do Estado comparativamente aos niveis de desenvolvimento registrados para outras regides mais ricas do pas.” Constituia-se, assim, 0 discurso da superagdo do atraso, Emerg associado ao projeto de industrializacio efetivado nas décadas de 1960 e 1970, Nesse contexto,institui-se uma logica de interpretagéo fundamentada em binarismostais como: subdesenvolvido/desenvolvido, periferia/centro, atraso/desenvolvimento, marginalizagdo/insergdo; que caracterizaram as ideias desenvolvimentistas locais ¢ orientaram as interpretagdes sobre a condicio do Espirito Santo. Consideramos, portanto, que 0 discurso politico inaugurou tum modo de dizer e interpretar o Espirito Santo a partir da definigio de um novo status em seu desenvolvimento econdmico ¢ um novo lugar no cenério nacional, As expectativas de mudanga em torno da industralizagdo a definiram como um marco de mudanga e orientaram a representagio da superacio do atraso do Espirito Santo. Na composico dessa representagio, encontramos, ainda, uma caracteristica peculiar da definigdo do sentido da superagio, Tal como reconhecemos na contemporaneidade, a presenca dessa nogio esti associada a0 passado como lugar do atraso, como condicio histérica a ser modificada. Como sugeriu 0 documento de 1968, 0 Espirito Santo, foi “colocado a margem. das grandes oportunidades que, no curso da historia econdmica do Brasil, tem bafejado outras regides’, ou sea, circunstincias que decorreram de “conwveniéncias poliicas eranbes de Estado” responsiveis “pelas melhores coportunidades perdidas”” Condigdo que surge no discurso da superacéo do atraso com um roteiro definido. © passado do atraso colaborava na definicéo do lugar do projeto de industralizagéo que configurava uma nova realidade, distinta da trajetria histérica. No contexto de emergéncia desse discurso da superagdo do atraso podemos identificar, portanto, uma forma de se relacionar com o passado em funcdo das expectativas do desenvolvimento 96 ESPIRITO SANTO (ESTADO). Governador, 1967 jas Lopes Detafoe resposta...Op. ct, p. 75. dell oe oe 97 ESPIRITO SANTO (ESTADO). GOVERNADOR, 1967. . 1971 (Dias Lopes). ‘Um Estado em march pars. odevenvoivimento. Op plas. oP 64 Rafael Cerqueira do Nascimento ‘econdmico bem como do uso politico de uma determinada forma de apreender o passado. esse ponto, inserimos os seguintes questionamentos: em que se fundamenta ou se orienta essa leitura do passado inserida na construgio de uma imagem de Espirito Santo em vias de superacio o atraso? Quando o discurso politico apresenta um roteiro histérico de marginalizacio do Espirito Santo, qual a sua relagdo com o saber histérico produzido acerca do Estado? Direcionamos, assim, nossa anilise para a producio historiogrifica capaz de elucidar como a producio do conhecimento histérico, naquele contexto, estabeleceu ‘um determinado sentido ao passado em conformidade com o projeto de Espirito Santo em questio. 0 Espirito Santo colonial e a narrativa da origem do atraso. A interpretagio da experitncia temporal, a partir de determinadas categorias de anilise, de critérios de avaliagio € qualificagio do passado local, efetivou-se por meio de narrativas histéricas que também se orientaram pelo paradigma da superacio do atraso. No que diz respeito 20 contexto apresentado acerca do Espirito Santo ¢ a instaura¢io do discurso da superacio do atraso, consideramos, de acordo com Koselleck, que expectativas, esperangas € prognésticos foram trazidos & superficie da linguagem, abrindo possibilidade de compreendermos como a dimensio temporal do ppassado foi apreendida no Espirito Santo™ ‘A historiografia, portanto, como forma concreta do saber histérico.” tornou-se objeto de nossa reflexio, Recorremos ao proprio saber histérico produzido acerca do Espirito Santo para avaliarmos ‘partir de que e como se orientou a interpretacio do pasado nesse contexto. Desse modo, buscamos compreender a partir das proprias ‘arrativas a relacio entre a escrita da historia eas questdes de seu ‘tempo. Para isso, analisamos como 0s proprios autores avaliaram 0 ‘98 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado...Op. cit, p. 15:33. 99 Inde, p. 36-37. ‘A Narrativahistrca da superagdo do atraso periodo contemporaneo do Estado, sua época, qual a percepcio sobre 0 momento vivido e suas expectativas, capazes de evidenciar alogica interpretativa eo sentido atribuido ao passado que constituiram o que ‘estamos denominando de narrativa histérica da superagao do atraso, No que tange a cronologia, a estrutura narrativa das obras Histbria do Estado do Espirito Santo de José Teixeira de Oliveira, Histéria do Espirito Santo de Maria Stella de Novaes e O Espirito Santo E assim de Neida Liicia Borge Moraes, sio caracterizadas por uma divisio temporal tradicional ¢ linear. Por isso, partem da expansio ‘maritimo-comercial portuguesa até 0 periodo contemporineo das obras, entre as décadas de 1960 e 1970, Dentro da ordem cronolégica 0s trés grandes periodos - 0 colonial, o imperial e o republicano -, aparecem bem definidos, ainda que divididos por subitens que, por ‘sua vez, nao abandonaram a cronologia. Os autores construiram a trajetoria do progressivo desenvolvimento do Espirito Santo, eaboraram uma hierarquia para ‘0s diferentes periodoshistéricos,o que nos possibilitou compreendera forma como constituiram um conjunto de ideiase imagens associadas A nogio de atraso e sua supera¢io. A estrutura temporal da narrativa bem como os eventos e circunstincias eleitos para compor essa trajetéria colaboraram na composigao dessa imagem de Espirito Santo. Por isso, em nossa anilise, seguimos a cronologia e os marcos temporais estabelecidos pelos autores. Sendo assim, na construgio desse enredo por meio da selegao € ordenagio dos fatos, da qualificagéo de periodos, acontecimentos € sujeitos, que tornam o passado significativo, entendemos que as ‘narrativas construiram imagens de um passado marcado pelo atraso, elegendo elementos identificadores de tal condicio e atribuindo um significado, sobretudo, ao periodo colonial. Tal imagem conferida a0 assado se constituiu por meio da demarcacio de valores e lugares atribuidos a determinados periodos e eventos, € que, por sta Ved foram definidos em fungéo do significado que apresentaram para & trajetéria do Espirito Santo. 66 Rafael Cenqueina do Nascimento Opassado colonial foi interpretado como sendo a origem do atraso. Eles avaliaram € qualificaram 0 periodo colonial considerando ‘oque foio Espirito Santo nos séculos XVI, XVII e XVIII. Associado a tessa qualificagio atribuida a cada periodo, foi possivel identificarmos ‘os elementos considerados prejudiciais para o desenvolvimento espiritossantense € 0s marcos temporais significativos para essa trajetdria apresentada pelas narrativas hist6ricas, As origens do Espirito Santo nos séculos XVI E XVII: obstéculos, dificuldades e a imagem do fracasso inicial da colonizagao. Uma representacio do Espirito Santo que foi construida, carregando consigo nogées de excluséo, auséncias ¢ impedimentos ‘que caracterizaram sua trajet6ria, teve no perfodo colonial o momento inaugural da constituicéo do atraso. Se por um lado, o Espirito Santo republicano foi interpretado como o tempo do avango, do progress zo qual se realizaria a superacéo de uma condicao de marginalizaca ‘© passado colonial foi a origem do atraso. Os obstdculos para 0 progresso surgiram ao longo da trajetéria percorrida pelo Espirito Santo. O momento inicial da capitania, que se inaugura, na narrativa dos autores, com a chegada dos colonizadores e a busca por fixagdo aos moldes estabelecidos pela Coroa, foi avaliado a partir das dificuldades que apresentou para a colonizacéo. Um dos fatores responsaveis pela dificuldade de Prosperidade do Espirito Santo apontado nas obras diz respeito ao elemento humano. De acordo com José Teixeira de Oliveira, ao definir os “fatores do descalabro”, argumenta que o Espirito Santo era 0 ‘exemplo entre as donatarias cujo progresso foi embargado pela turbuléncia dos seus habitantes”. O perfil dos colonizadores ¢ os indigenas surgem como os primeiros obstéculos ao progresso da Capitania."® Tal imagem foi associada, sobretudo, a insuficiéncia de seus colonizadores em efetivar a obra colonizadora. José Teixeira de > 100 Sobre a imagem de Vasco Fernandes Coutinho bem como a dos indigenas, Y"préximo capitulo, 67 ‘A Narrativa histérica da superagao do atraso Oliveira, ao caracterizar as “exigéncias e deficiéncias” do inicio da colonizacio, destaca as dificuldades causadas pela fraca presenca dos elementos colonizadores diante dos desafios: a magnitude da tarefa estava exigindo mimero muito Superior de colonizadores. Aquele grupinho de brancos, assentado na orla do pais, impossibilitado de se fazer temido e respeitado pelo gentio - origem de todas as atribulagdes e prejuizos ~ era um convite és suas incursbes devastadoras.'Nio fora, de certo, para viver encurralado zum arrail, a guerrear com os flecheiros das selvas, que © donatirio do Espirito Santo se desterrara para a sua barbara capitania brasil José Teixeira de Oliveira reforca os colonos como elementos prejudiciais & formagio do Espirito Santo, uma vez que 08 “aventureiros, degredados, criminosos formavam a massa no seio da qual fermentavam e explodiam as rudes paixdes daquelas mentalidades primarias”.' As nogées de impedimento e dificuldade tornaram-se as referéncias para se definir o Espirito Santo. Maria Stella de Novaes em alusio & primeira viagem de Vasco Fernandes Coutinho a Europa, acrescenta questéo dos obstéculos para o progresso, a chegada de colonizadores incapazes de conduzir a Capitania, que “vieram juntar-se aos péssimos elementos, é hominizados no Espirito Santo”. O Espirito Santo foi lassficado como uma das capitanias que nao prosperaram, tendo em vista o estabelecimento do elemento colonizador. Na representagio do periodo inicial, os autores recorreram as avaliagbes do governo-geral para evidenciar as condigdes do Espirito Santo, Seguindo uma interpretacio tradicional que afirmava @ nio prosperidade das capitanias hereditirias na Colénia ¢, consequentemente, a introdusio por parte da Coroa portuguesa dos Bovernos-gerais, as obras destacam 0s diagnésticos realizados pelos representantes oficiais, 7 PVR, José Teixeira de. Histéria do Estado do Espirito Santo... Op. 102 Tbidem,p. 52. 103, NOVAES, Maria Stella de, Histéria do Espirito Santo,..Op. cit p.21 68 Rafael Cerqueira do Nascimento Maria Stella de Novaes, 20 comentar o ano de 1560, ressalta eo Governador Geral “observou o desanimo geral” e ouviu o desejo Ars habitantes de tomar “a terra para a Coroa, em vista da rentincia de ‘Vasco Fernandes Coutinho”.' Dentre os autores, foi José Teixeira de Oliveira quem mais enfatizou as dificuldades vivenciadas pelo Espirito Santo em sua origem. Baseando-se nas avaliacGes de Mem de S& sobre ‘a Capitania e Vasco Fernandes Coutinho, o autor retoma a ideia da necessidade de soerguimento e superacio das dificuldades. José Teixeira de Oliveira enfatiza o vinculo entre as dificuldades do Espirito Santo com as enfrentadas pelo primeiro donatirio. A necessidade de ajuda e intervencéo eram evidéncias da condicdo negativa da Capitania, Precariedade, decadéncia, € impedimentos foram atribuigdes que passaram a constituir o Espirito ‘Santo em sua trajetéria inicial. O Espirito Santo surgia, assim, com ‘uma condigéo adversa que seria, de acordo com o autor, 0 seu diferencial, Caberia ao Espirito Santo um lugar de no prosperidade ‘que perduraria ao longo do periodo colonial. Somando-se as dificuldades e & precariedade da Capitania, 0s autores identificaram, também, outro elemento que pode ser abordado como fator do atraso: o Espirito Santo experimentou uma circunstincia politico-administrativa que criou obstéculos ao seu desenvolvimento. Apés 0 fracassado inicio da colonizagio, os séculos XVII e XVIII seriam assinalados pela auséncia de donatarios ¢ bons {governantes, mais especificamente, marcados por administragoes de ‘apities-mores e também pelo pertencimento do Espirito Santo @ Coroa portuguesa, o que segundo eles, determinava uma condi¢ao de sujeigdo e marginalizacéo da Capitania, submetida & auséncia de uma politica de incentivo ao progresso, prejudicando sua trajet6ria.'* Esse aspecto politico-administrativo negativo indicado Pelos autores foi associado a duas circunstincias experimentadas elo Espirito Santo, Primeiramente, ainda em 1577, a Capitania foi submetida ao Governo Geral da Bahia, posteriormente, jé no inicio — 1O1 NOVABS Mara Sta de Hit do Epi Santo Op. a 105 Para essa questio da governanca ver: RIBEIRO, Luiz Cléudio M. Modos de "5 (1534-1643). Op. cit p. 172-174 69 A Narrativa histérica da superar do atraso do século XVIII, no ano de 1718, 0 Espirito Santo nao pertencia mais a particulares, mas a Coroa portuguesa. José Teixeira de Oliveira e Maria Stella de Novaes nio trazem uma anilise especifica sobre esses fatos, mas, ao longo da narrativa linear que abarca esse periodo, teceram consideracdes a respeito dessa condigao, sendo possivel, por sua ver, categorizé-la como um dos elementos do atraso do Espirito Santo reconhecidos pelos autores. No entanto, fosse a sujei¢ao & Bahia, fosse o pertencimentoa Coroa, tas circunstancias foram permeadas, como indica José Teixeira de Oliveira, por uma caracteristica que marcou negativamente ‘© Espirito Santo: a auséncia de administracées eficientes, que possibilitassem o progresso da Capitania. Maria Stella de Novaes, comentando a respeito do século XVII, evidenciava que “raros foram 0s acontecimentos extraordinérios registrados na capitania, durante muitos anos, salvo a mudana constante dos Capities-mores”.™ José Teixeira explica essa indicagio da autora evidenciando, devido a falta de donatarios, o prejuizo dessa politica para o Espirito Santo: tomou-se praxe atribuir a atonia do Espirito Santo, durante a primeira fase do periodo colonial, a0 descaso dos donatirios que, em maioria, administravam por intermédio de terceiros - os capitaes-mores [..]. A demonstracio de que procede a arguigdo esta nos documentos da época. Regra geral, a presenca dos donatérios no senhorio coincide com promissor alento de todas as atividades ‘humanas. Constroem-se novos engenhos, movimentam- ‘se expedigdes em busca das minas, 0 comércio se anima. Governada a terra pelos capitaes-mores, surgem as rusgas, tréfico decai, o marasmo domina a tudo e a todos.” Segundo Teixeira, existiu uma ma condugio da Capitania. Ja Neida Liicia de Moraes resume o “triste resultado” do século XVII exatamente 20 isolamento do Espirito Santo: mas 0 mais triste resultado da luta néo seria o ataque armado|..] Foi o abandono, por parte da metrépole, ‘ocupada com a guerra acesa em todo o nordeste e com & 106 NOVAES, Maria Stella de, Histria do Espirito Santo. Op. cit, p.69- 107 Ibidem p.151. 70 Rafael Cerqueira do Nascimento defesa da costa sul, que deixou sem assistencia por todo 0 periodo do dominio espanhol a imensa costa de Salvador a0 Rio de Janeiro. [..] Excetuados os dias de Francisco Gil de Aratjo, todo o século XVII foi de resultados insignificantes. Nao se fez mais do que manter a faina de praia conquistada pelos pioneiros." Sea autora evidenciou que nao ocorreram “acontecimentos extraordindrios registrados na Capitania, durante muitos anos”, José Teixeira de Oliveira denominou de “angustiosa conjuntura” a culdade do Espirito Santo em efetuar o pagamento de suas despesas, condigio que “perdurou por varios anos”. Infeliz, acanhado, tornara-se 0 Espirito Santo, segundo o autor, foram “excessivamente mofinos” os “resultados do trabalho de cem anos”: Foi essa a imagem do Espirito Santo elaborada pelos autores em sua trajetéria durante o século XVII. O perfil dos colonizadores, a auséncia de condutores para suprir 0 deficit do Espirito Santo e a falta de uma atengao por parte da Coroa foram indicados como elementos que impossibilitaram 0 progresso. Nessa construgio de uma representacio de Espirito Santo colonial vinculado ao fracasso, a narrativa histérica do atraso que marcou a sua trajetéria guardou mais um obstéculo com consequéncias negativas: o papel exercido pela capitania no século XVIII, periodo da atividade aurifera na regio de Minas Gerais. Opapel de defesa e o Espirito Santo como a barreira para as minas. Quando observamos as representacdes de Espirito Santo €06 usos do passado no presente identificamos que as referéncias a ‘88 passado carregam sentimentos de auséncia, marginalizagio ou ainda, por meio dessa apropriagdo, justificam o discurso de mudanca 000 de superacio de algo que no passado fora negado ao Espirito Santo. Dentre os elementos presentes nesse roteiro, as dificuldades —"* 108 MORAES, Neida Liicia Borges. O Espirito Santo ¢ assim... Op. cit, p.30 me PisQUVEIRA, José Teixeira de. Historia do Estado do Espirito Santo... Op. 10 Ibidem, p. 166, a ‘A Narrativa histérica da superado do atraso originadas com a descoberta do ouro na regido das minas aparece como o principal fator do atraso que marcou o papel desempenhado pela capitania no século XVIII. No que diz respeito ao capitulo da mineragao na hist6ria local, a colaboracdo do Espirito Santo para a histéria do Brasil ganha tum sentido negativo para sua trajetéria, O papel de defesa, que em relagio as invasdes sofridas pela coldnia foram qualificados em termos de exaltar a participagéo do Espirito Santo ao longo da hist6ria do Brasil, no caso do periodo da mineragao na regido das Minas esse papel foi interpretado em fungdo dos prejuizos acarretados para 0 desenvolvimento da Capitania. ‘Tal papel surge na narrativa como um momento associado a impedimentos, marginalizacio, estagnacio e excluséo. Enquanto a mineragdo era acompanhada da ideia de riqueza, de progresso para a histéria do Brasil, para o Espirito Santo ela significou o atraso, o principal obstéculo da trajetéria capixaba. A propria énfase direcionada a mineracio, associando-a a um periodo de esplendor das ‘Minas Gerais, contrasta e reforca, por sua vez, a nocéo de marasmo do Espirito Santo, que diferentemente do restante da colénia, ndo se contaminou, ficando isolado. Com José Teixeira de Oliveira, Maria Stella de Novaes ¢ Neida Licia, esse periodo de impedimento ‘e marginalizagdo ganhou o status de marco histérico negativo. O século XVIII encerrava, segundo a interpretacio dos autores, 0 passado colonial caracterizado pelo fracasso e, depois dele, a marca da trajet6ria do Espirito Santo seria a busca por superar essa condicéo ao qual fora submetido. Na perspectiva de anilise adotada pelos autores, percebemos que todos registraram as tentativas de exploragdo aurifera no Espirito Santo, evidenciando as agdes e os esforcos dispensados por diferentes ‘ujeitos, valorizados na narrativae, inclusive, alguns foram destacados pela resisténcia que exerceram as ordenacbes oficiais de impedimento de interiorizagao no Espirito Santo nesse periodo." Tir Ch NOVAES, Maria Stella de, Hist6rla do Espirito Santo... Op. cit. p. 67 49; OLIVEIRA, José Teixeira de. Histdria do Estado do Espirito Santo... OP. cits P 46-115. ” Rafael Cerqueira do Nascimento ‘A busca pelo ouro ressaltada pelos autores evidencia que a capitania ndo estava avessa a este propésito da Coroa portuguesa parasua col6nia. No entanto, para eles, a percepcio foi a de perda. De acordo com Neida Liicia de Moraes, era 0 comego do ciclo do ouro do qual o Espirito Santo deveria permanecer afastado, ¢ em virtude do qual iria ser isolado do resto do Brasil por cem anos, no decurso de todo 0 século XVIIL"* Nessa perspectiva, a Capitania perdeu a oportunidade, jé {que se reservou a ela outro papel nesse contexto da histéria do Brasil. Segundo José Teixeira: © século XVII, que se distinguiu pelo numero de ‘bandeiras, pela busca desesperada as brenhas promissoras, ainda assistiu @ revelagdo do ouro no territério que passaria a denominar-se das minas gerais. As lavras mais Ficas estavam localizadas, justamente, na faixa de terra compreendida pelos limites tracados, na carta de doagio, a capitania de Vasco Fernandes Coutinho. Entretanto, rndo ocorreria a ninguém reclamar 0 direito de senhorio sobre a regido - tao distante do litoral. A impossbilidade dos donatérios de levarem sua autoridade até os confins do quinhao que el-rei lhes doara conspirou com o tempo, modificando o direito primitivamente estabelecido."” Dada a impossibilidade de assumir 0 protagonismo da exploracio aurifera, Maria Stella apresenta a condicio de barreira que assava a caracterizar o Espirito Santo no cendrio da colonizagio do Brasil: surgiu, depois, o receio das visitas indesejaveis, em busca das riquezas naturais do interior do Brasil. Vieram, por isso, ordens rigorosas da Bahia, para que se recolhessem a Vit6ria todos os que se encontrassem nas lavras. O Espinto Santo era jd trincheira, para a defesa das Minas Gerais!..E, dal, resultou igualmente a proibigdo de se abrirem estradas Para o este. E, assim, a Capitania viu-se impedida de >—— ‘12. MORAES, Neida Licia Borges. © Espirito Santo ¢assim...Op cit. p30. ci pe OUVEIRA, Jud Tener de, Hlstéria do Estado do Espirito Santo. Op. PAM, 73 ‘A Narrativa hst6rica da superagao do atraso comhecer e defender seu proprio territério, que se reduzia pequena faixa litoranea, em desacordo com a Carta- Régia de doagio a Vasco Fernandes Coutinho, baseado no Tratado de Tordesilhas!" O papel de “barreira verde” definia um lugar paraa capitania no contexto da histéria do Brasil, porém, segundo José Teixeira de Oliveira, para o “Espirito Santo, particularmente, a vizinhanga das ‘minas viria constituir empecilho & penetragio e ao desenvolvimento das suas atividades para o interior”."* Os impedimentos direcionados a0 Espirito Santo nesse periodo da exploragao aurifera do século XVIII passaram, portanto, a definir a dindmica da colonizagao local e a caracterizar sua marginalizagdo, Os autores passaram a representar 0 lugar da Capitania ea apontar as causas e implicagdes dessa condigao. Para Neida Licia: 2 capitania se encontrava em lugar que necessitava de vigilincia minuciosa e ativa para evitar 0 contrabando 0 ouro. {..] Era necesséria 4 fazenda real a manutengio da inviolabilidade da ‘barreira verde’ que vedava 0 acess0 as jazidas auriferas. Eis como era bem assegurada a impermeabilizagio do tecido de proibigoes. Em 1716, 0 ‘Marqués de Angeja recomendava ao seu enviado, o mestre de campo Domingos Teixeira, que observasse a “proibicéo de que ninguém passe a fazer descobertas de ouro no Espirito Santo por ser ordem de El-Rei, que nao se facam estas enquanto ndo se fortifica primeiro a Capitania."" Assim também os demais autores evidenciaram os impedimentos que sujeitavam o Espirito Santo ao papel de trincheira. Segundo José Teixeira, foi essa a destinacio atribuida por parte da Coroa portuguesa, “qualquer ataque estrangeiro” teria “o Espirito Santo como base de desembarque”, o que implicou na “proibicio de se fazerem estradas que ligassem a capitania & sua vizinha do oeste” !” 114 NOVAES, Maria Stella de. Historia do Espirito Santo...Op. cit, p.80. cit, ppp IVEIRA José Tetra de, Histéria do Estado do Espirito Santo..Op 116 MORAES, Neida Lica Borges. O Espirito Santo éassim...Op. cit, p31- 7 pve, José Teixeira de. Histéria do Estado do Espirito Santo...OP- 74 ) Rafael Corqueira do Nascimento Seria essa a condiglo da Capitania, na qual a politica do ovemo gra era ade ameagar “de severos casigos os tanygresnores $1 ordem del-Rei’,"* situagto que dificultava o desenvolvimento cepintossantense. Diante do impedimento de interiorizgio ¢, Sonsequentemente, de participacdo na economia aurifera, o Hapirit Santo se encontrava com a preocupaglo de defesa, canali cjforgas nesse sentido. Exclusio € marginalizagio, impedimentos ¢ falta de avtonomia caracterizavam a Capitania nesse contexto. Se os dols imeiros séculos da experiéncia colonizadora foram marcados pela avséncia de progresso, a avaliagio dos autores acerca do século XVIII manteve tal perspectiva de anilise atribuindo-Ihe as ordenagbes da Coroa portuguesa. A ideia de conquistas eas expectativas abertas com a mineragio aparecem em contraste com a condiglo local, Segundo ‘Neida Licia: enquanto isso, a capitania nfo podia pagar os impostos devidos & Coroa, nao havia vida social, um noticias sobre comércio, atividades industriais ou artesanals, ou sobre fundagio e desenvolvimento de povoados. A vida pobre ¢ sem estimulos era ainda travada pela legislaglo ‘que impedia o contato com as minas.° Segundo Maria Stella de Novaes: entre 1728 e 1730, a Vila da Vitéria atravessava situagho econdmica dificil, ‘por falta de negécios’, Seus moradores ‘eram pobres’. Com setecentos fogos ¢ [..] seus dizimos, ‘em muitas ocasides, néo davam para cobrir os filhos da folha™ A influéncia da regiéo das minas é portanto, enfatizada contrastando com a condigao que passava a se encontrar Espirito ——__ i ‘OLIVEIRA, José Teixeira de, Histéria do Bstado do Espirito Santo. Op. P.181, 119. NOVAES, Maria Stella de Histéria do Espirito Santo. Op. cts P. 66:87, 120 MORAES, Nelda Lica Borges. © Espirito Santo ¢ assim. Op ls P- 31+ 121 NOVAES, Maria Stella de. Hist6rla do Espirito Sento...Op its p87. 78 ‘A Narrativa histbrica da superagao do atraso Santo, “no mais deploravel estado que se pode considerar’,* imagem, que de acordo com a autora, definiu o que ele chamou de uma “vida social fraca”, pois a de festas, convivio entre escravos e senhores, nh dads ‘industriais, desenvolvimento das ovoagées, relagSes com os silvicolas ete. Os grandes Penhores, que passeiam suas riquezas ou titulos de nobreza pelas paginas das crénicas de outras capitanias, Ho ignorados no Espirito Santo. Nada que se destague Ga mesmice de uma vida paupérrima, manietada pela bsurda legislagio que impedia 0 contato tonificante com as minas." ‘A marca dessa insergio do Espirito Santo na historia do Brasil era, portanto, a da excluséo e pobreza num momento interpretado como de opuléncia, trazida pela mineragéo. A imagem construida sobre o inicio do século XIX foi, consequentemente, a da decadéncia, resultado dos séculos anteriores. Interessante notar que 6 final do perfodo colonial aparece nas obras como um momento de possibilidades e mudangas, ainda assim, mesmo evidenciando a presenca de governos que representariam essa mudanca na trajetéria do Espirito Santo, 0 inicio do século XIX foi exposto pelos autores seguindo este contraste, pois anunciava possibilidades de modificacio, ‘mas ainda registrava, em decorréncia do atraso histérico, a imagem que caracterizara o perfodo colonial na Capitania. José Teixeira de Oliveira considerou que no inicio do século XIX, “quadros bem sugestivos a capitania de Vasco Coutinho oferecia a um observador dos derradeiros tempos coloniais”. Segundo o autor, a0 retratar o Espirito Santo nesse momento, considerava que o territério se encontrava “reduzido e, sobretudo, a mata, a indiada e, mais que tudo, as ordens del-rei sojigavam os capixabas na estreita € indeterminada faixa litoranea”. A divisio administrativa evidenciava aauséncia de cidade, “nem a sede da capitania” e parte dos distritos da Vila de Vitoria “néo passava de mintisculo povoado, mas oficialmente hes davam aquele predicamento”. Segundo 0 autor, a populacéo era 122 NOVAES, Maria Stella de. Histéria do Espirito Santo... Op cit, p. 202. 123 Ibidem, p.187. 76 Rafael Cerqueira do Nascimento reduaida se comparada ds outras capitanias naquela época, Em termos Ge governanga, a capitania permanecia sob o dominio da Coroae “nos ‘iumos tempos do perfodo colonial, os cargos da administracio civil, ho Espirito Santo, eram bem reduzidos’, dficultandoa administracio, Possuia um aparelho de justica deficiente que “correspondiaaauséncia «quase total da justica d'el-rei”.™" Com Neida Liicia de Moraes, 0 diagnéstico negativo da situagio local evidenciava-se na ocupacio de seu territério: acabamos de enumerar os obstéculos opostos a nossa penetracio. Todo 0 século XVIII foi preenchido com © estabelecimento e a manutengio da. ‘barreira verde, encobrindo as minas.’ Segundo’ assinala Saint Hilare, ao raiar 0 século XIX, em trezentos anos de sacrificios, de incompreensio, de submissio forgada a interesses estranhos & Capitania, a faixa povoada nio ultrapassava a média de 4 léguas a partir do mar, assim mesmo dividida em duas partes, distantes 80 km entre si, que tal é menor a distancia que vai do Rio Doce 20 Rio Séo Mateus, em linha reta. A verdade ¢ que as circunstancias no nos deixaram iralém.™ Diante desse quadro, José Teixeira de Oliveira chama a atengio para a carta de D. Joao em 1800, preocupado em “reanimar a quase extinta Capitania do Espirito Santo”. Maria Stella de Novaes também ressalta esse momento € o interesse da Coroa frente 20 Espirito Santo, o que evidenciava a necessidade de superagao de uma condigéo de dificuldade que identificava a capitania: diante da situagio de real decadéncia da Capitania, o Principe Regente Dom Joao VI escreveu ao governador da Bahia, Francisco Cunha Menezes, sobre ‘um particular ‘cuidado em reanimé-la’, porque estivera ‘confiada, até ‘agora a ignorantes e poucos zelosos capities-mores. ‘Nomeou, por isso, um Governador particular, ‘umhomem 124 OLIVEIRA, José Teixeira de. Histéria do Estado do Espirito Santo... Op. sit, p.282-238, 125 MORAES, Neida Lucia Borges. O Espirito Santo ¢assim...Op. cit p. 33 126 OLIVEIRA, José Teixeira de, Histdria do Estado do Espirito Santo.. OP. it p.217, 7 ‘A Narrativa histbrica da superagdo do atraso de conhecidas luzes e préstimos’. Recomendava ainda a ‘cooperacio com o mesmo Governador, para que realizasse grandes planos de que fora encarregado.'” Maria Stella de Novaes também caracteriza o final do periodo colonial evidenciando as imitagées encontradas pelo Espirito Santo, definindo a imagem de uma capitania deficitéria: - Era entio precaria a situacdo financeira da provincia. Em oficio de 2 de janeiro [1823], a junta Proviséria pedira ao Governo na Corte uma Bandeira nacional, porque nio podia fazé-la na Vitoria, pela ‘extrema falta de meios Seriam enormes 0s prejuizos decorrentes das dificuldades financeiras da Provincia, principalmente quanto @ civilizagio dos indios, pois, abandonados, atacariam as lavouras, os nicleos do povoamento, etc. E a defesa militar cexigia sempre novos gastos. Dizia mais:-"E preciso queS.M. Imperial estejacabalmente ciente de que esta Provincia ¢ ‘a mais miserivel do Império: - néo tem agricultura nem ‘comércio; seus habitantes séo paupérrimos’ Dessa forma, 0 perfodo colonial foi constituido pelo conjunto de referéncias atribuidas a ele e definidora de sua condigéo. [A partir da légica atraso versus progresso, contrastando com o periodo republicano, 0s autores determinaram 0 significado do passado colonial como o fundador do atraso, 0 que possibilitou atribuir um sentido de superacao progressivo aos séculos seguintes. Em suma, encontramos um conjunto de referéncias a0 periodo inicial do Espirito Santo como um lugar de “sombras ¢ ruinas”,! com caracteristica de “Villa devastada” eem “decadéncia”.” O século XIX ea narrativa da superagio do atraso. A chegada do século XIX foi representado de forma distinta 127 NOVAES, Maria Stella de. Histéria do Espirito Santo... Op. cit, p- 105: 128 Tide, p. 147-148. 0 YOUVE Jot Tet de Histéria do Estado do Espirito Santo... ps7. 130 NOVAES, Maria Stella de. Hist6ria do Espirito Santo... Op. cit. p.29- 78 y Aafiel Cerqut do Nascimento jos anteriores na narrative do progressivo desenvolvimento, os os autores tenam caracterlzadoo Espirito Santo no final Aalto bet como no nico do imperll, mated pos sees do slo anerores peers una manga paleato € 90 significado dese momento para a histéria do oa qui spite Santo. Segundo Neida Lila, o século XIX inqugurou um novo seo do Esplrito Santo em elagto ds expecatvas de seu Meemelvimento econdimice, Para et, ert necssirio “examinar dea ences of demas prejulos eaustdos ports stculos de cates que hoje mal podernoscompreender” 0 que po sua vez frienciava como o Estado conseguit “recuperar em 100 anos oatraso {os300 que pagamos caro o progresso das outras capitanias”.* Nesta iva, a légica atraso/progresso na interpretagio do passado Mn a difeenciagio entre o que veio antes e depos do século XIX, efabelecendo-se assim, um marco temporal que, por sua vez, defini Snovo sentido a traetoria do Espirito Santo nessa narratives De acordo com o sentido dado ao passado, no qual sumiam o presente como marco temporal, 0 século XIX foi dkinido dentro da trajetéria do progress. como o do infcio do process de superagio do atraso, Se esta realizar-se-ia no presente, fomo j analisamos, 0 Espirito Santo em sua fase provincia fot canacterizado pela libertacio dos impedimentos que caracterizaram a periodo colonial, ou seja, no qual possibilidades ¢ horizontes se apresentavam a Provincia para inaugurar a marcha de progresso rumo ao Espirito Santo republicano. A visio sobre o século XIX se constituiu em consonancis com 0s critérios de avaliagdo estabelecidos pelos autores, 0 que implicounna defnigdo do que elecarregava de novidade ecolaboracéo Para o progresso do Espirito Santo, ¢ este foi apresentado nas Tarrativas por meio de um conjunto de circunstancias, eventos € ‘governamentais, que, de maneira geral,compuseram um ee 1B MORAES, Neida Licia Borges. O Exptito Santo € assim... Op. its P35. 132 Bidem,p. 32. ” ‘A Narrativa histérica da superacdo do, quadro em que o Espirito Santo figurou em melhores condigées dg que no perfodo colonial. Constatamos que a nogio de progresso foi representada por realizagdes governamentas, inovagdes € expansio territorial interpretadas como conquistas do Espirito Santo, de acordo com a perspectiva de seu progressivo desenvolvimento. Estilaque Ferreira dos Santos, argumenta que 0 governo de Silva Pontes (1800) inaugurou uma politica de revitalizacio da le comunicacao e representava, portanto, local tendo em vista o déficit dos séculos anteriores." Consideramos que os autores apresentaram €sse visio progressista que delineou a imagem de Espirito Santo construida Fabre o periodo, pois, segundo Enaile Carvalho os responsévels Por fais exames compartlhavam a visio de que o Espirito Santo ficara ttusente de participagdo no sistema colonial de produsdo que garantia a lucratividade para a Coroa, no mesmo sentido, observa que existiu ‘uma visio politica preocupada em buscar alternativas econdmicas frente & conjuntura do Estado Portugués." (Os autores se apropriaram dos diagnésticos realizados sobre o Espirito Santo desse periodo para caracterizé-lo. A partir da perspectiva da superagio, identificamos a prépria qualificagéo atribuida pelos autores a esse periodo e a determinados governos ‘observados como administracdes que buscaram superar as condicdes indicativas do atraso. A narrativa histérica analisada apresentou uma nova perspectiva que se abria a0 Espirito Santo no século XIX, correspondendo a chegada desses administradores que buscavam tender as orientagdes da Coroa. Na obra de Neida Luicia encontramos a “recuperagio do tempo perdido”: a recuperacio do tempo perdido comegou depois aCitdocjeimpordnet fot crscende coma tompa Na capitania por meio das vias de abusca pelo desenvolvimento! 735 SANTOS Enlague Fein dos, Viasde - ira /ias de comunicacSo, conquista territorial cloiarioesengeia ho Eat Santo dost. XIK. Opp. 17 say CARVALMO Ende aus ole conomiamerenti ns es do rte Snt (17904182) Dirck Mesto em Hist. Progama de Pi graduagio. téria, Universidade Federal do Espirito Santo, Vit6ria, 2008, p. 24 1 sal Rafael Cerqueira do Nascimento data da sua assinatura nao era mais qu ‘os ellos dese etabelceem reise dehravamnios respectvos, segundo as reais ordens do Principe Real 'Nosso Senhor,¢ a vantajosa comunicagio de correios para ‘0s povos do interior com regides maritimas’™ José Teixeira exaltou a expectativa de ligacio com Minas Gerais a partir de 1800: ‘a nova atitude da metrépole em relacio aos melos de omunicacdo entre o Espirito Santo e Minas Gerais tem merece 0 qualificaivo de revolucionaria. Repetidas vyezes temas citado as providéncias determinadas pelas Jaministragées coloniais proibindo as relagées entre os abitantes das duas capitanias.Providéncias, é bem de ver, oerentes com a linha adotada pela Coroa frente ao seu dominio sul-americano.(..] Ou porque fosse tarefa muito de seu agrado ou porque trouxera recomendagoes de dar pronta execucio 20 plano - parece que de inspiragio Fe Rodrigo de Sousa Coutinho, que passa por ter sido protetor do novo chefe do executivo espintossantenss - © Perro ¢ que Silva Pontes agi com prestezainustada/™ José Teixeira de Oliveira avalia as primeiras décadas d9 séeulo XIX qualificando o periodo como “inicio de uma nova en”, sre ado uma diferenciagzoem relacio épocs colonial. Ainda que ‘0 Santo, segundo o autor, modificava exposto’as dificuldades, o Espirit sua imagem: & impossivel negara evidincia da marcha ascension) da provincia apos o Sete de Setembro‘) Rasgarste se eradas, construiram-se pontes, abriram-se @ perspectiva do desequilibrio regional que marcou & trajet6ria ‘pirtssantense ao longo do século XX. A hegemonia da cafeicultura he BFTENGO cp BETENCOUR, Gabriel Histria Gerl conde do aco Sen = Biden» 64198 Gabriel FS € 0 titulo da dissertagéo de mestrado do autor: BITTENCOURT, Epc, Atgusto de Milo Esorgos industralzantes na Primeira Republics © 0 Sant i idea Sito 149-930, isertaga (Mestad em Hist) Insite de Cnet losofia, Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, 1979 107 oN “A Narratva histérica da superagdo do atraso io gerou as condigées necessérias para elevar © patamar 4 desenvolvimento local. A caracterizagdo do Espirito Santo no fing gt periodo imperial e no inicio do republicano evidenciam a per. fo autor acerca das possibilidades € limites do desenvolvimeny espiritossantense. Sobre os efeitos do café na Provincia: Espirito Santo, em que pese a dindmica da sua econom, Fspire, era reputado como um dos mals atrasados go , apresentando uma representacio nacion rine fraca. Embora inserido entre a8 princpay linidades politicas do Império, permanecia em grande Gesequilbrio regional, apresentando um quad GGrencial, onde sobressala a deficiéncia da viagdo public. para 0 eacoumento da producio cafeere,cuj slugo inuitos localizavam em uma politica econdmica mais Gescentralizada, que capacitasse a provincia prover suas proprias necessidades.™” ‘Assim, o Espirito Santo alcangava a Republica ainda sob 0 feito da heranca colonial: aqui apesar das similitudes aos estados da regio naqualse insere, sob o ponto de vista da economia agri, o Espirito Santo apresentava-se, ainda no inicio da fase republicana fem considerdvel plano secundério em relacfo iqueles estados. Em que ese a dinamica dacafeiculturanastitimas ddécadas da fase imperial, tal crescimento econdmico nio fora sufciente para superar a heranca colonial que tornara «regio defasada por longos periodos.”* ‘A cafeicultura, ainda que tenha permitido mudangas de infraestrutura e possibilitado a modernizacéo da capital Vitéria nao provocou uma dinamica suficiente para escoar a producio: nem formar um mercado consumidor, muito menos capaz de geréf acumulagdo de capitais para o investimento em outras atividades Mesmo ressaltando o primeiro projeto de desenvolvimento realizado Por Jer6nimo Monteiro," caracterizado pelo que ele denominou de 209 BETTENCOURT, Gabriel. Histéria Geral . Op.cit, p27 ‘Gabriel. Hi |e Econdmica do Espirito Sent0~ 210 idem, p 304, 211 TBidem, . 308, Rafael Cerqueira do Nascimento ecivws industrializantes a partir dos investimentos piblicos no setor Sou atracio de capitis privados,” Bitencourt argumenta que 0 Fesio também foi prejudicado pelo desequiltrio regional devido & veecorrencia com outras unidades federativas mais desenvolvidas De acordo como autor, evidenciava-se 0s limites estruturais, que determinavam o lugar secundirio ou peiférico do Espirito Santo, Para de, na década de 1920, 0 café “permanecia como a principal fone da acumulacio capitalista do Espirito Santo”, condigéo que @eGnia 0 problema estrutural do modelo agrério-exportador no Estado, incapaz de produzir uma indiistria competitiva pela auséncia é capital e de mercado consumidor: no confronto com o quadro nacional, as peculiaridades inerentes a nossa formacio industrial ¢ as especificidades da economia brasileira, criam dificuldades apreciéveis ‘a anilise e interpretagio dos esforcos regionais fo setor industrial, nos rumos tomados pela economia local. Retardatirio em um Pais de indiistria retardatéria, 4 decisivamente no Espirito Santo a inexisténcia Ge um mercado nacional integrado, coexistindo no Estado duas barreiras expressivas: a competigio com produtos importados € a competicio com produtos hacionais provenientes de outros centros, além de nio feqquecermos que a indiistria capixaba da 1* Republica objetivava transcender a0 mercado local demandando mercado mais amplo que aquele espiritossantense.(.] ‘A tentativa de implantagio de unidades industrials, de porte multizregional, préximo dos estados de Sio Paulo u Rio de Janeiro, fatalmente defrontaria com as maiores indistrias desses dois Estados."* Assim, o Espirito Santo por mais que superasse & condicao ™arasmo colonial inseria-se na l6gica capitalista a partir de sua Periférica na regio de economia mais dindmica do pals: eee 22 op 2 BETENOOUr, Gabriel. Misra Gea Boobies do apse Sno as 214 pom P-313-319. as mae P.326-327, & 109

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