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Gisley Romanzini Lazzarotto Janete Schaeffer Rossi e Neuza Guareschi Rejane Czermak ‘ -Rosane Azevedo Neves da Silva Pedrinho A. Guareschi (Cocrdenador) COMUNICACAO E CONTROLE SOCIAL CAPITULO I nn A realidade da comunicagiio — visio geral do fenémeno Pedrinho A. Guareschi Dr. PhD. em Sociologia e Comunicagdo na University of Wisconsin Madison, Estados Unidos. Mestre em Psi- cologia Social na Marquette University, Milwaukee, tam- bém nos Estados Unidos. Professor, escritor ¢ * pesquisador nos cursos de mestrado de Psicologia, So- ciologia ¢ Filosofia da PUCRS, Sacerdote redertorista, desenvolve trabalho pastoral nas vilas periféricas de Por- to Alegre, como assessor-animadar das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). * J4setornou lugar-comum dizer que a comunicag4o ¢ 0 quarto poder, Esta afirmagao — parece-nos—s6 seria falsa nao pelo fato de acomunicacdo nao ser um poder, mas pelo fato de que ela néo seria o quarto, mas sim o primeiro e o mais forte dos poderes. . A medida em que se pesquisa e reflete sobre o tema da comunicagdo, vamos nos dando conta da realidade “misteriosa”, presente ness¢ fendmeno. Nao entendemos aqui “misterioso” no sentido de sobrenatural ou religioso, mas no sentido de desafio-de algo. que se constitui na propria esséncia da coisa, essa realidade filtima que € sempre invis{vel, intoc4vel, inefavel. Percebemos o quanto ainda precisamos pesquisar ¢ discutir essa realidade para podermos compreender um pouco mais de sua significacdo ¢ de sua importdncia, Somente assim ela deixaré de ser “misteriosa” ~e por isso mesmo poderosa e escravizadora, qual esfinge que devora os incautos € os, despreparados —e podera ser decifrada, libertada, colocadaa servico da democracia e do bem-estar de toda a popula- cao. 1. Comunicacio e construgio da realidade Nao seria exagero dizer que a comunicagao constr6i a reali- dade. Num mundo todo permeado de comunicagao— um mundo de sinais ~ num mundo todo teleinformatizado, a tinica realidade passa aser a representacAo da realidade—um_ mundo simbélico, imaterial. Isso & tio verdade, que na linguagem do dia-a-dia ja se podem ouvir frases como estas: “J4 acabou a greye?” E se alguém pergunta por que, a resposta 6: “Deve ter acabado, pois 0 jornal nao diz mais nada...”, ou: “A televisfo nfo mostrou mais nada...” A conclusio a que chegamos é a de que uma coisa existe, ou deixa de existir, 2 medida em que 6 comunicada, veiculada. B por isso, conseqiiente- mente, que a comunicagdo 6 duplamente poderosa: tanto porque pode criar realidades, comio porque pode deixar que existam pelo fato de serem silenciadas. Um exemplo claro de como a comunicacio constr6i a realida- de foi o que Mattelart (1973) chamou de “maior exercicio de marketing internacional do Brasil”, a catnpanha feita pelo governo brasileiro, no infcio da década de 70, para a criagdo do que se chamou de “milagre brasileiro”. Ao prego de meio milhao de déla- res, o governo brasileiro reuniu, num cons6rcio, as quatro maiores agéncias publicitdrias do pafs (todas elas penetradas de capital norte-americano) e planejou a campanha da “criago” do “milagre brasileiro”, com antincios redigidos em cinco linguas ¢ enviados aos maiores didrios ¢ revistas dos patses do bloco capitalista. Com isso, ogoverno encheu o baldo do “milagre” que viria a se esvaziar pouco tempo depois, misteriosamente... Bacomunicacao que constr6i “a imagem” das pessoas. Vejam esta not{fcia dum jornal: “Presidénte X viajar4 4 Europa por oito dias, Visitar4 alguns pafses ¢ tentar& mostrar que 6 um homem sensato... Visitar4 o Papa...” Isso foi feito exatamente ap6s uma série de erros ¢ gafes do referido Presidente. Os homens, encarregados desua “figura”, tentam mudar essaimagem através da comunica¢ao. 2. Comunicacio e poder Como conseqiiéncia légica do que se viu, podemos também afirmar que quem detém a comunicacao, detém o poder. Se € a 14 comunicagdo que constréi a realidade, quem detém a construcao dessa realidade detém também 0. poder sobrea existéncia das coisas, sobre a difusao das idéias, sobre a criagdo da opiniao paiblica. Mas no € s6 isso. Os que detém a comunicacao chegam até adefinir os outros, definir determinados grupos sociais como sendo melhores ou piores, confidveis ou nfo-confidveis, tudo de acordo com os interesses dos detentores do poder. Quem tem a palavra constréi identidades pessoais ou sociais. J4 foram feitos estudos interessantes sobre 0 que determinados povos pensam de outros povos. Essa opinido esté baseada, principalmente, nas informagées que as pessoas.recebem. Em estudos e pesquisas realizados no campo da comunicacio, verificou-se que a opinido piiblica é prepa- tada com informagées sobre determinadas populagoes de tal modo que isso pode chegar a justificar até mesmo uma invasdo de um pafs advers4rio. A pesquisa.de Hester (1976) mostrou que, de cada 100 notfcias enviadas do bureau da Associated Press de Buenos Aires para o,quartel central dos Estados Unidos, apenas 8 eram aprovei- tadas, Mas o mais sério’era que das 8 aproveitadas, 4 eram notfcias que falavam de violéncia e de criminalidade - quando das 100 originais, apenas 10 eram sobre 0 assunto. Com isso, os pafses informados por essas agéncias vio formando opinido, construindo imagens sobre determinados povos, identificando-os como crimino- sos € violentos. Nao é dificil, posteriormente, legitimar uma invasdo ou retaliagdes sobre populacées que, para a grande maioria, so criminosas ¢ violentas... Estudos mais recentes revelam surpresas no que se refere & importancia da comunicagao no campo das eleigées. Verificou-se _ que a maioria absoluta dos candidatos que trabalhavam em algum meio de comunicagio, principalmente televisao e r4dio, se elegeu. Enquanto apenas 5 a 10% dos candidatos nao-comunicadores se elegiam, entre 80 a 90% dos candidatos comunicadores se elegiam. Buscaram-se explicagdes para o fendmeno. Algumas conclu- sOes parecem comegar a se delinear: numa sociedade silenciosa como a nossa, onde apenas alguns tém voz ¢ vez, o simples fato de ter um nome conhecido jé é critério suficiente para que a pessoa merega fé ¢ se torne merecedora de voto. Numa sociedade autori- téria € elitista como a nossa, sio pouqufssimos os que podem participar desse servico - a comunicagdo - que deveria estar a disposigao de todo o grupo organizado. Numa sociedade assim, onde um mfnimo de pessoas pode falar e se fazer conhecido, a voz que desponta e a imagem que aparece é a de alguém que passa a existir, que emerge do profundo anonimato ¢ da massificacdo gene- 15 ralizada, onde vive a maioria-do povo brasileiro. Ter seu retrato na felevisdo, poder dizer a palavra pelo rédio, passa a ser privilégio de poucos, que passam, por isso mesmo, a ser os bons, os confidveis, os que existem, Eno momento de escolher alguém, escolhem-se os que existem... sejam bons ou ruins, de direita ou de esquerda. Isso € a pura verdade, pois aqueles que se elegcram, pelo fato de serem comunicadores, vio desde os mais progressistas até os mais reacio- narios, politicamente falando. 3, Comunicagio e cultura ‘Talvez seja no campo da cultura onde se percebe mais clara- mente a importéncia fundamental dos Meios de Comunicagio. Entendemos aqui por cultura, seguindo Azevedo (1988:38 ¢ 1986:312-352), como “o conjunto de sentidos ¢ significagdes, de valores ¢ padrées, incorporados e subjacentes aos fenémenos per- ceptiveis da aco e comunicacao de um grupo humano concreto”. Esse conjunto de sentidos ¢ significag6es ¢ vivido e assumido pelo grupo como a propria expressio de sua realidade humano-social; passa de geracdo a geracao, sendo actescido ¢ transformado, con- forme as circunstincias ou necessidades, Os Meios de Comunicagao esto sempre presentes ¢ sao fator indispensdvel tanto na criagéo como na transmissio, mudanga, legitimagio ¢ reprodugio de determinada cultura. Em cada filme, novela, propaganda, etc. hé um pano de fundo, um background cultural, sobre o qual se passa o fato: um determinado tipo de moradia, determinada decoracao, determinada maneira de comer, de se véstir, de se relacionar, de se movimentar, de se divertir, de falar etc, Esse pano de fundo cultural permancce e s¢ fixa na mente © nos coragSes-das pessoas que véem esses produtos da comuni- cago; ¢ isso as leva a fixar ou transformar determinada cultura. Um exemplo decisivo e incontestavel da passagem sub-reptt- cia dessa comunicagdo est4 no fendmeno que se conyencionou chamar de merchandising. Como uma comunicacio indireta, isto ¢, como uma propaganda que ndo tem como finalidade primeira ser propaganda (determinada artista fazendo seguro emi determinado banco, o gala da novela usando tal tipo de carro ou de cigarro etc.). O merchandising € tao eficiente que o seu prego € 80% mais caro que o comercial comum, yeiculado no momento especifico da pro- paganda. Produtos langados como merchandising em certas novelas produziam tanto sucesso, que as fabricas nao venciam as encomen- ~ 16 das. V4rios roteiros de novelas foram modificados, por exigéncias dos canais de televisio, para incorporar situagdes, onde se pudes- sem langar determinados produtos. O livro de Ramos (1986) se constitui como excelente exemplo e 6timo estudo desse fendmeno. Mas se 0 merchandising € uma realidade que funciona, con- cretamente, e se seus efeitos sio indiscutfveis, extremamente com- plexa € a compreensao desses fendmenos. Os varios capitulos desse vosso estudo vao tentar penetrar nos mecanismos ocultos e profun- dos que podem trazer luz sobre essa realidade, Os Meios de Comunicagao, agindo através da transformagao ¢ descaracterizacdo cultural, so, em grande parte, responsdyeis pela dependéncia econdmica. E Furtado (1974:95-109) quem mostra como a implantagio do modelo brasileiro em seus trés passos relacionados; a) concentragdo de renda numa pequena parte da populagao; b) marginalizacdo conseqiiente de grande parte do povo; ¢) incentivo exportacdo somente foi possfvel gragas aos Meios de Comunicacio Social. O estilo de vida das nacoes desen- volvidas ¢ ricas tornou-se conhecido através dos filmes, revistas, publicidades, folhetos etc., que sio importados ¢ introduzidos “li- yremente” pelos paises dependentes, no que se chamou de “livre fluxo”, mas de mio finica.., (Guareschi, 1984). A busca desenfreada do lucro ¢ uso dos Meios de Comuni- cago para apoiar tal pratica chegam até o limite criminoso de matar ou destruir populacées intciras. Veja-se, como exemplo, o caso da multinacional Nestlé, criadora do leité “que substitui 0 leite mater- _no”, Esta empresa fez uma intensa propaganda de seu produto.por todo o mundo subdesenvolvido. Inicialmente, fornecia brindes gra- tuitos do leite. Com isso, as maes ¢ criangas se acostumavam a0 novo produto ¢ deixavam de amamentar. Mas essas maes precisavam, depois, continuar a comprar Ieite ¢ nao possufam recursos suficien- tes, pois seu prego era demasiado alto, Compravam somente a metade, ou dilufam o leite em mais 4gua. Na maioria dos casos, nao era posstvel ter os cuidados necessdrios de higiene ¢ esterilizagao das mamadeiras como so exigidos. Devido a isso, milhdes de criancas morreram. A Nestlé foi convicta-da morte de mais ou menos 9 milhées de criancas devido a essa pratica. Em alguns pafses onde,.antes da Nestlé, 90% das maes amamentavam até os seis mieses, depois da entrada da multinacional a proporgao baixou para 15a 20%. Este 6.apenas um exemplo tragico da mudanga indiscri- minada de padrées culturais impostos através dos Meios de Comu- nicagdo Social, Para mais exemplos desse tipo, pode-se ver Cala (1978) ¢ Guareschi (1984, 1985 e 1989). v7 Os Meios de Comunicagdo se tornam o meio € o espago privilegiado onde a cultura € criada, fortificada, reproduzida ¢ retransmitida, dum lado; ‘como podem se tornar paradoxalmente o espago ¢ o meio onde essa cultura € negada, descaracterizada, transformada e dominada para servir a outros interesses que nao so os do préprio povo. Tornam-se novos “cavalos de Tréia”, dados como presentes, mas carregando dentro de si o veneno que conta- minar4 as mentes e os coracoes de indmeras populagées, sem defesa e sem resisténcia. Os enlatados Made in Hollywood induzem a nocessidades sofisticadas, ctladas. Todo um pafs passa a reorientar a sua economia a partir da implantagdo de prdticas que levam a uma “modernizacao simb6lica” (Galbraith, 1964:4), imitando pafses centrais, criando modernas e improdutivas burocracias e ndo menos caros ¢ faustosos estabeleci- mentos militares, com armas sofisticadas (Bar4n, 1957:228). Ivan Illich (1969:15-174), NO soll interessante.estudo “A pobreza plane jada: o resultado final da assisténcia técnica”, d4 excelentes exem- plos de como um pais, devido a nao-vigilancia sobre priticas elitistas e suntudrias, provocadas pelos Meios de Comunicaco, chega a absurdos de fazer com que em alguns lugares se fagam transplantes de coragio, onde mais de mil criangas morrem de fome por dia, como é 0 caso do Brasil. Chega-se assim ao que Mordecai Gorelic (Em: Schiller, 1967:66) chama de “homogeneizacio cultural”: “A era da comunicag4o mecanizada ¢ centralizada via imprensa, r4dio, filmes ¢ televisdo, criou uma ’Gleichshaltung’ (nivelamento) sem recedentes na hist6ria”. Desaparecem os valores particulares ¢ individuais das v4rias culturas. Tudo se nivela, Uma “Lei Gres- cham” cultural toma conta dum pafs e dos pafses. Kato (Em: Schramm, 1976:254), ao discutir a importancia da cultura popular, diz que “um dos efeitos mais visfveis e chocantes da comunicagao global é 0 fato de que o material comunicativo, ao qual as pessoas estdo expostas, 6 demasiadamente igual”, Chega-se assim a um imperialismo cultural, fruto da invas4o cultural, que,’ conforme Somavia, “...sem pressGes politicas ou econémicas aparentes, leva os pafses dependentes a agir no interesse do sistema transnacional por sua ‘prépria ¢ livre vontade’ através da penetracao cultural que Ihes oferece estilos de vida que os transformarao em ’povos desen- volvidos’. (...) Para essa operagdo funcionar corretamente, é essen- cial que se controlem os instrumentos de Comunicac§o Social. (...) Nesse contexto, os Meios de Comunicacio € os seus apéndices locais tornaram-se, praticamente, ‘cavalos de Tr6ia’ para os padroes de consumo transnacionais” (1976:16). 4, Melos de Comunicacio e controle social Conhecer é poder. A comunicagao, inserida no proceso atual dos Meios de Comunicagio Social, implica uma relagdo com o tipo de sociedade existente. Em uma sociedade como a nossa, perpassa- da pelos conflitos de classes sociais em constante confronto para a promogio, defesa ¢ manutencdo de interesses, 6 ingenuidade pensar numa verdade abstrata ou numa informaco objetiva que obedecam as regras da verdade moral. O que existe é uma verdade parcial, alicercada em evidéncias e interesses partiddrios e classistas. Como conseqiiéncia, a comunicago e a informagao que se recebem so expressées desta relacao de poder (Cf. Pegoraro, 1989:17-20). A comunicago e a informacdo passam a ser alavancas pode- rosas para expressar € universalizar a prépria vontade e os préprios interesses dos que detém os Meios de Comunicagio. O monopélio da propriedade privada da terra, os latiffindios, se prolongam no monop6lio do poder polftico como dominag4o e passam a abranger, logicamente, 0 monopélio dos Meios de Comunicacdo Social, a servicgo da dominagdo ideolégica. A posse da comunicagio @ a informacdo tornam-se instru- mento privilegiado de dominac4o, pois criam a possibilidade de dominar a partir da interioridade da consciéncia do outro, criando evidéncias ¢ adesées, que interiorizam e introjetam nos grupos destitufdos a verdade e a evidéncia do mundo do dominador, con- denando ¢ estigmatizando a pratica ¢ a verdade do oprimido como pratica anti-social. Essa sociedade de dominagao, por nao poder ser questionada e contestada, se fortifica e se solidifica, passando,a exercer a hegemonia numa determinada sociedade; hegemonia no sentido mais exato de Gramsci: '0 poder que possui um grupo dominante de definir uma situag4o ou uma alternativa como a tinica valida e possfvel. O crescimento ¢ a abrangéncia dos Meios de Comunicagao e a informacao esto, clatamente, desbancando e relativizando o controle exercido por outras instituigdes, como a escola, as igrejas, a famflia etc, A comunicagao est4 forjando os novos professores, os novos. sfbios, os novos mestres da verdade e.da moralidade. As pesquisas sempre mais confirmam a forca moral e politica desses meios que nfo agem tanto pela competéncia, mas pela empatia. Pegoraro (1989:18) pergunta: “Qual o peso social na formagao da consciéncia coletiva que existe entre um famoso apresentador de TV € o peso social na formagao da consciéncia coletiva do mais renomado pesquisador?” ‘A conclusao a que se chega € que cada vez mais, hoje em dia, averdade e os valores (ou‘desvalores) éticos passam pela mediagao dacomunicagao. Sua tarefa principal ser4 universalizar os interesses das classes hegem6nicas, de forma sutil, cativante, cotidiana, impl{- cita, através da sugestéo, auto-sugestdo, persuasdo, pressdo moral, . imitagdo ou mesmo através da percepgao subliminar. Talvez j4 seja tempo de deixar de falar em Meio de Comunicagao Social para falar em meios de informagio, a servigo do controle social, Mas é justa- mente isso que queremos discutir ¢ analisar nos capitulos poste- riores. 5. Aaldela global Nao h4 como negar a evidéncia de que os meios de Comuni- cagdo passam, hoje, a envolver os seres humanos num novo espago acistico, que McLuhan (1962, 1969, 1967) chama de “mundo retri- balizado”, onde eles passam a ser bombardeados, instantancamen- te, por varladissimas ¢ Intimeras informacies de todas as partes do mundo, Vivemos um ritmo de tempo e de vida extremamente rapi- do, acelerado. Numa cidade regular, uma pessoa recebe, hoje, de 2 a3 mil informagoes por dia; nas grandes megal6poles, esse ndmero chega a mais de 10 mil informagoes didrias. Quem visita um shop- ping center, depara-se com 100 a 200 mil produtos diferentes. Os produtos habituais de consumo duma cidade moderna chegam a mais ou menos 50 mil e se renovam de 5 em 5 anos, A voz do radio eda televisio € ouvida pela tribo humana na “aldeia global”. Atese central de McLuhan é a idéia de que o préprio meio é amensagem, Em seu livro The medium is the message (1967), ele tenta mostrar como o meio é a mensagem, sim, mas é também, em grande parte, a massagem que plasma as pessoas. O que se percebe, entdo, é que o tipo de comunicagao tem a ver com a configuracao do ser humario, Nao 6 diffcil mostrar como n6s somos, em grande parte, o conjunto de relagdes que tivermos estabelecido. O ser humano se forma, historicamente, ¢ se estrutura a partir das relagdes que vai colocando, E a comunicagao é uma relagdo, hoje certamente uma das relages mais persuasivas e abran- gentes, Como todas as relagdes, essa comunicacio pode ajudar na construcdo dum ser humano auténomo, equilibrado, democritico, cooperador ou, de outra parte, dum ser humano dependente, sub- misso, massificado, robotizado. : & verdade que a relagio de comunicagio nao se reduz a comunicagdo massiva; h4, também, a comunicagao pessoal, de pe- quenos grupos. Mas cada vez mais a relagdo de comunicagao vai sé reduzindo & comunicago eletrénica, dos grandes meios. Cada vez mais, fica-se mais tempo diante da televisdo, vendo e escutando, mas falando menos. Os 6rgdos que mais se desenvolvem sio 0 ouyido e a vista; a fala vai silenciando. Num mundo bombardeado por milhares de comunicagées didrias,"h4, ainda, a possibilidade de as pessoas expressarem scu pensamento, ouvirem sua voz, dizerem sua palavra. Muito signifi- cativa, nesse contexto, 6 uma charge da revista Risk, de Genebra, que mostra dois pesquisadores, bem caracterizados, examinando os milhdes de dados despejados por um enorme computador, quase perdidos na imensidao da “comunicagio” produzida, Pelas tantas, um pesquisador volta-se para outro ¢ comenta: “Interessante: nés temos aqui todas as respostas, mas nés nao sabemos qual a pergun- tal” Os Meios de Comunicagao apresentam, hoje, de mancira sofis- ticada ¢ instantiinea, explicagées para todos os problemas, solugdes rApidas ¢ eficientes para todas as necessidades, respostas prontas para todos os questionamentos. Mas tem-se a impressdo de que isso vai levando, aos poucos, a uma apatia ¢ massificagfo, onde nao sao mais poss{veis iniciativas, onde nao se fazem mais perguntas, onde deixam de existir possibilidades, onde ndo se produz mais 0 “novo”. Todog consomem, todos trabalham, todos reagem do mesmo modo, todos respondem da mesma maneira aos estfmulos da propaganda ¢ publicidade, todos pensam do mesnio modo, conforme os donos das notfcias ¢ da comunicac4o os orientam. Estaria a comunicago configurando um novo tipo de ser humano? Estarfamos entrando num novo mundo cultural? Bibliografia AZEVEDO, Marcelo, Comunidades Eclesiais de Base e incultura- ¢do da fé. So Paulo, Loyola, 1986, - Evangelizacao, inculturagio ¢ vida religiosa Convergéncia. Rio de Jariciro, Jan. Em: 1988, p. 33-47, BARAN; Paul. The. political economy of growth. Nova Iorque, Monthly Review Press, 1957. a “ CALA (Comunity Action on Latin America), Newsletter, VI, Madi- son, Wisconsin, FURTADO, Celso. O mito do desenvolvimento econdmico. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1974. GALBRAITH, Kenneth. Econonic developmment. Cambrid- ge/Mass.,/ Harvard University Press, 1964. GUARESCHI Pedrinho. Comunicagdo e poder. Petrépolis, Vozes, 1984. —, Sociologia e critica. 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