You are on page 1of 45
ADRIAN SGARBI INTRODUGAO A TEORIA DO DIREITO Marcial Pons IMADRI | BARCELONA | BUENOS AIRES | SAOPAULO 2013 28 ADRIAN SCARD 1. Funcionames 2. Acti GEO wae 3. Estabilidade 1. Conexio justficaiva, conexto idemtificade 2, eDistinguir» e eseparams Para seguir estudande on. 36 GLOSSARIO........ 362 BIBLIOGRAFIA... a CAPITULO I ‘ODIREITO __ Commo seri visto neste Capitulo, 0 vocdbulo «Direlto» se presta a usos importantes dessa possi ue possa ser foi, segundo a extica especializada, ‘um dos melhores goleiros da hist6ria do futebol brasil © conjunto de sentidos que a palavra manga comportou, exprimiy os significados de «manga; 0 emprego 2), b), c) ou d), singularmente conside- rados so 0s seus sentidos, seus usos conerstos. Herbert L.A. Hat umn importante professor de teoria dk de Oxford, no ano de 1961, tendo como base muitas dessas quests, fem destaque, em The C Hart? Tendo em vista a importineia do pomto, ‘que produzem esta instabilidade e o como est 1a pode ser enfrent 24 Vagueza A primeira das causas é a «vagueza». > Har, 1994: 12. 32 ADRIAN SGARDI Expresses vagas sto aquelas que originam casos de frontera.* Assim, €caracteristica do fendmeno da vagueza haver a) uma «aplicagao definidan, "uma b) «zona de nifo-aplicagio»,¢ €) uma «zona de divida» no uso do terme Continuamente relerida pelos juristas como «zona de penumbra») Quer dizer, nesses casos, hi incerteza sobre a aplicagio da expressio. Exempla ‘comurm de vagueza é representado pelo voedbulo «calvo» (mas também: «Jovem», «adulton, «anciton, «culpa graven, «petigo iminente>, «velocidade excessivay ce.) Parque ainda que seja correo que calvo designa waquele que ‘io tem cabelo» sempre é possivel perguntar se aqucle que tem um pouco de ‘cabelo pode ser chamado de calvo ou no; ¢, se assim for, quanto de eabelo & necessério possuir para nio ser calvo* 2.2 Ambiguidade A segunda causa é a wambiguidade». (© problema da ambiguidade ¢ de «equivocidade» no uso da palavra, ou Sela, hd dois ou mais sentidos fixos pensaveis a partir do enunciado formu lado." Por exemplo: «vela» pode significar tanto: 1) «pano largo que se estende ao longo dos mastros para receber a ago do vento»; 2) «dispositive dos motores de explosio, destinado a produair centelha elétrica para inflamar ‘a mistura combustivel no campo de combustao dos cilindros»: como, também, 3) «citindro de cera com um pavio no centro que, quando aceso, serve para ituminar», Como situacao linguistica, a ambiguidade pode surgir de maneiras muito distintas.! ‘A primeira 6 a gorada por aquestées fonéticas». Esta ambiguidade, portanto, decorre dos sons ou tnidades aciisticas, com o que no se sabe 20 ete" A origem dessasinfntase inevtsveis disputas encontra-se nas diferentes concepgbes «qe informam os (eéricos na reconsigio do conecito- ‘Com base em Galle, firmam os professores Jost Juan Moreso, Pablo E. ‘Navarzo e Maria Cristina Redondo que um conceito€ essencialmente cont vertido se:'" 2) «& vatorativo, no sentido de que atribui acs casos de apl conecito a posse de alguma coisa valiosa/desvaliosa: ) «A estrutura do conceita € internamente complexa de maneira que permite ritrios distintos que reconstroem seu significado e que competem enire eles; «) «Apresentam casos, reais ou hipotéicos, que sio paradigms de apli- capao do conceit. 24 Emotividade ‘A quarta causa & a «emotividaden. © Gnuie, 1956: 167-168, Gaus, 1936: 171, Mores; Navateo; Revowo, 2000-143, 34 ADRIAN SOARDI Emotividade porque toda linguagem é representagio de um mundo, seja este mundo 0 mundo extemo ou o interno, social ou individual.” O que é dito ‘por meio da linguagem carga consigo uma carga ideolSgica representative {eum sujeito coletivo. Como disse Emi Orlandi, “As palavrs no sio s6 nossas. Elas signilicam pela histria, pela lingua (..} Quando naicemos os discursos jéestio em processo e és & que entramos esse processo. Ees se originam em nde.” Em sfntese, tentar defnir «Direto» sem qualquer consideragdo de contexto na qual o discurso possa scr minimamente delimitado € exercer esforgo de abragar semanticamente um campo tio Vasto de significages que © empreendimento apenas pode ser insaiisfario. Por essa razio, quando se pergunta «o que é o Direto?» a unica resposta sensataé devalver a pergunta 4uestionando «em que contexio?». Porque, em situago outra, a) ou bem a pergunta¢irrespondivel; ou b) a resposta ser instisfatéria; ou c) j4se sabe © contexto e, assim, a resposta estar limitada a este contexto sabido e tio somente ele, Il, NORMAS, SOCIEDADE, INTERAGAO -. Portanto, nlo € uma impropriedade adje- tivar 0 voedbulo «sociedade> para estes seres bem peculiares em sua form de se organizarem, Mas, considerando-se apenas as sociedades shumanasn, que se quer dizer com «viverem sociedade»’? « que o afasta das pessoas, As tclagdes sociais» se realizam de varias maneiras. Elas podem ser ««intensas», «superficiaisy, «egovsticas», «altruistas», de , aorigem do dirwto, de modo que haveria umn drcito «por natureza ou natural» Em que pesem consideragdes que serdo feitas mais 8 frente, ao que tudo wics, as discuss6es sobre a origem natural do direito ou sua razio de ser &m sido, nos dias atuais, Fortemente equacionadas pela nogio de «necessidades ‘minimas» do homem. Com isso, aquilo que se estima ser «natural» nada mais expressa do que aquilo que se exige como um minimo normative para a exis- tncia humana ser possivel e accitivel. E claro que, sendo assim, a discussio passaa ser que «minimo existencial este», por um lado, e, por outro, como «viablizar este minimo existencial», Dessa forma, a vulnerabilidade humana ‘que nos deixa a mercé de violéncias fisicas (até 0 mais forte precisa dormir), anecessidade de nos alimentatmos, de termos abrigo etc. si0 rotineirae rete sradamente objetos de apreciagGo e defesateéricae prética. A propésito, dois autores, de ‘suas consideragdes esses aspectos. Herbert L.A. Hart, no ja citado O conceita de direito, Capitulo IX, dedica algurras paginas para explicar 0 que entende ser «0 conteto minimo do Aiteito natural», mesmo que esteja a fazer referéncia ao que é empiricamente ‘conststvel em grupos sociais distintos.® Por sua vez, John Finnis, em seu livro Natural Law and Natural Rights Cireuo natural e leis narurais) defende determinados «direitos bésicos» \¢i0 tedrica bem mareada, raduzem cm Capitulo Vit, «A avaliag cico-poltica do dteto», item VI ‘Mxaton, 2011: 60-3, ‘avenge: poli do dicts ite 1994: 185-212. eeee 38 ADRIAN SGARDI como d-conéncia da prOpria «razSo pritiea», de modo cue seriam, assim, mpositivs caso se queira tomar possivel a prosperidade humana * ‘Apesar dessas distinias formulagSes, © que parece estar claro & que existem determinados propésitos humanos que dependem de regulagao e de alguma nstincia que zele pelo seu cumprimento. Alm diss3, nd resta divida de que rormas semelhantes podem aparecer em sociedades que se avizinham culturalmente, como a punigao de assassinao, roubo, aresponsabilizag0 por tos que venham a prejudicar alguém ete. De todo modo, soa demasiado forte afirmar que para além da coinci- dncia histérica exista mais que contingéncia, pois mesmo em paises de uma ‘mesma tradigio juridica, alguns admitem pena de morte enquanta outros nio, alguns punem quando constatada a maturidade psicol6gica do agente enguuanto ‘outros a vinculam a certa faixa etiri. Portanto, o aspecto «normativer que existe em sociedade ~ seja este aspecto jurdico ou no ~ envolve, a0 menos, dois pontos: 1) a necessidade de se pivilegiar determinadas situagdes impondo-as come regularidades; 2) ‘aexistéacia de um «outro» além de Um eu» que justfiquea relevancia dessa regulatidade como ‘fo palavras equivalentes. Entretanio, embora Se possa empregar existenle © real como equivalentes sem maiores problemas, analisar as conolagbes de «tealn€ sireal» no contexto institucional nos faz refer um outro aspecto: as cengas compartthadas. 34 foi advertido que 0 wdireito» ¢ resultado de atividade humana, Suas normas sio construgdes antificiais cujo objetivo elementar ¢ regular comports- ‘mentos também humanos. Como construcao artificial, o dircito no descreve, ‘mas atua estabelecendo 0 que ¢ devido. O mundo juridica difere, portanto, ddo mundo natural. Por essa razio ndo ha nenhuma descrigio fisico-quimica ue sirva para definir «dinheiro», «jurisdigio» e «contralo». Estes no si0 fendmenos fisico-naturais, mas humano-sociais. Sua realidade 6 distinta da realidade do mundo da natureza. ‘Manx, 1971: 62-63 ‘eases, 1957: 231 ess, Hen, 1955: 38-39, Star Tek 1V~ The Voyage Home (Paramount Pictures). 40 ADRIAN SARA © mundo juridico opera ampsrado por insttuigdes.2? Uma instituigio & uma rede de atividades centralizada em certos interesses2 Significa dizer, elas esultam de deliberagbes em atencio a fungses. Por exemplo, as insitui- ‘gOes econdmicas si0 caracterizadas pela produgio de bens, escoamento da roducio, consumo ¢ valoracdo do dinheiro; a instiuigso do casamento pode Ser traduzida em apoio recfproco do casa, relagio sexual, criagio de filhos e heranga; institu religiosa em ritos, elevacdo espirtuale paz interior. (Qualqucr instituigio envolve pessoas. Essas pessoas possuem um situs individual. Este siarus individual equivale & posigSo social em relagdo a0s ‘outros membros da sociedade. Todo starus individaal envolve estereotipagem « expectativa dos individuos. Isso significa que um starus individual 6 tradu- ido na comunidade em papéis sociais. E esses papéis sociais podem importar ‘em maior ou menor prestigio. Portanto, hi estreito vinculo entre a posigao do status © prestigio daquele que possui certo stan" © stats que um individuo possui pode ser obtido de maneiras distitas. Certo stamus pode ser conscguido com 0 nascimento, com competicdes ou, mesmo, através de nomeagdes, dependendo do como o grupo esti organi 2ado. Em sociedades abertas & possivel ascender por motivo de habilidades [pessoais; em sociedades muito fechadas, apenas através de lagos familiares ‘ou em razio de caracteristicas bioldgieas, como sexo, aspecto fisico e ontras tantas peculiaridades sejam clas voluntarias ou involuntirias, mas a partir das quais se obtém destaque sociale respeitabilidade. Estes so apenas alguns dos critérios adotados pelas estruturas sociais humanas, Em apreciagio no muito distinta, John Searle, em The Construction of Social Reality (Construgaa da realidade social), no ano de 1995, anaisou 8 peculinridade de determinadas ocorténcias humanas. Segundo Scare, hi coisas que existem apenas porque eremos que elas existem. Porque a Fiza de ser da exisincia delas esta retacionada 3 intencionalidade coletiva, vale izer, a aecitagio de um mimero relevante dos membros de determinada comunidade. Saber que coisas decorrem de formulagao hutmana ou no {nformayao que se pole ubter através de experimento relativamente simples: basta eliminar mentalmente a presenga do homem no processo de existéncia da coisa, Entende Searle que essa relagio criadora do homem do mundo que © cerea pode ser reduzida a seguinte fOrmula: «X conta como Y». Pense- -se aqui no «dinheiron. Caso no howvesse um énico ser humano no planeta haveria dinheito ¢ 0 seu valor? Maccomaacr, 2008: 21-26. Horwen Fees, 2005; 147. em, 2008: 180-151 ‘Star, 1997: Idem 1997: 128-137, t-opirerto 4a Um dos importantes aspectos dessa construgio da realidade social s0 os atos de reconhecimento de cada atividace social. Pierre Bourdicu designou 38 reconhecimento de poder simbélico do campo. «Poder simbslico» (2) €0 poder que aguce que the ests sujcito Us Aquee que oexeres, um enédito com que ele o eredita, uma fides, uma anctoritas, que ele The contia pond nele a sua confianga, E um poder que existe porque aquele que Ihe esti sujitocré que ele existe» Alf Ross, e, em geral, parte consideravel dos realistas escandinavos, relaciona essa existéncia juridica a fatores psicolégicos, de maneira que esté afastada qualquer explicagao que transcenda o homem na explicagio da ‘normatividade. Portanto, quando digo que «X conta como agente com 0 papel social de fazer leis» no apenas fatores linguisticos estio a atuar ou, mesmo, apenas fatores psicoldgicos, mas certa coadigio social de produgao ¢ repro- dogo discursiva que os integra. Nos Estados contemporineos essa condigio social € apoiada por um aparato burocriico, Sua tarefa é realizar oque se encontra estabelecido pelas normas juriicas. Estas realizagées, sintticamente, idenificam-se com as fungées do Estado. Sob 0 aspecto sociolégico, 0 nome «Estado», por assim dizer, se refere ‘uma particular forma histérica de organizagio do poder politico que exerce © monop6lio da forgafisica em um deterrinado terrivério valendo-se de um aparato buroeritico." ‘Sob o aspecta jurfdico, «Estado» significa ponto convergente (ou simpu: tagdo centrale, para usar temminologia de Kelsen) de um eonjuntode normas, de ‘modo que seus funcionsrios sto agentes deprevisoes normativas.” Portanto, 0 Estado possui funcdes; «fungdes expressim atividades: estas atividades sio «alos»; «alos juridicasm; e so «atos juridieos» porque normas os reconhecem como «alos suficientes para a produgio deefeites no mundo do direito». Os atos do Estado sio tradicionalmente enunciados em és grupos de fungoes. Essas ts fungies decorrem da necessidade de haver um sistema de pesos ¢ contrapesos (checks and balances), conforme as observagbes de ‘Montesquieu, tendo em vista que, quando unidas, o homem tende a abusar do poder nelas implicado.” Estas as fungoes: % Bours, 1991: 192, % Ross, 2008: 70-28. % Wents, 2008: 156, 2% Kersey, 1945: 191-192. Para mais detaes: Capitulo IV, «Léxica, Os cones jurgioos thaamertee tem 7 a2 ADRIAN SGARBI 1) A xfunedo legislativa» consiste na atividade em que 0 Estado produz. ‘nuteriais jaridicos atendendo as especificagdes do ordenarrento juridico;, 2) A sfungio executiva» ¢ aquela em que o Estado desenvolve uma ativi dade conereta em vista de seus fins imediatos estabelecidos pelas normas do ordenamerto juridico; 3) A fungi jurisdicional» trata-se da atividade em que o Estado desen volve a defesa do ordenamento juridico declaranda e resolvend conilitos AS notas anteriores se servem de uma caracteristicr muito cara aos Estados modemos: a «soberaniay. Entendendo-se por «soberania» como certa Posi¢lo de «superioridaden. Portanto, «soberania» importe em comparagto, ‘Ou seja, seé soberano em relaglo a algo. Nesse sentido, a nagao de soberania Possui, por assim dizer, dois aspectos de importincia: um si wexiemo>, © aspecto «interno» da soberania diz respeito a um «poder supremo de ‘comando» exercido em um «territériow que de tio expressivo «ndo reconhece enhum outro dentro de seu dominion. O aspecto «externa», na «indepene «déncian do Estado em relagio aos demais Estados soberanos, Considerados os aspectos «memo» © wextemo», vé-se que hé uma ~condigiojuridica» e uma «condiglo fitica» para haver soberani A condigiio sjuridice» € afeta a independéncia normativa de sua «orcem juridica» em sclagio a ostras «ordens juridicas». A condigio «fética» & que esta wordem Juridica» seja concretamente respeitada pelos demais Estades, Apoitndo, por sua vez, a nogio de «soberania do Estado», trés teorias buscam explicar este posicionamento histérico: a) a teoia da soberania da ‘pessoa juridica do Estado»; b) a teoria da soberania da «naedo»; ec) a teoria {4a soberanin «popular " 2) A teoria da soberania da «pessoa juridica do Estado» consigna que é 0 proprio Estado 0 verdadciro titular e sujeito de direito soborano. Esta doutrina esicve em voga, sobreiudo no final do século XIX e inicio do século XX na ‘Alemanha ena iulia;, A teria da soberani da nigd0» € mito caso pesameto consti sacional fants do culo XVII eet consagras no ar 22th Decent dos Diets do Homem ¢ do Cidadt: Le principe de toute Soserabene "side esetilement dans ta Nation Nl cops, i dil ne pom oven, amore given inane expresienn™ © pp detae aeril seninctenoNeun «om, run inv pote execer anor quc ace a care ec 1-opeerro 43 ©) A teoria da soberania «popular» € tributiria, expressivamente, da formulacdo de Jean-Jacques Rousseau, quem defendia a identificagao entre a soberania e a «vontade gerabs A esse respeito, cabe desiacar que a Constituigio da Republica Fede- rativa do Brasil consagra a «soberania popular» como um dos pilares funda- ‘mentais do Estado brasileiro logo no parigrafo tinico do art", nestes termos: « ~ sempre conforinc Maine ~ seria uma condigao caracteristca das sociedades rogressivas e complexas. Nessas sociedad, os individuos formam pare de Associagdes Yoluntérias nas quais podem ocupar livremente a sua posigio e determinaras suas préprias relagées:® Passo importante para a percepeio de ro serem as sociedades «primi- tivas» um tipo simples de sociedade, sem maiores determinagGes de orga. nizagfo social, foi dada por Bronislaw Malinowski com a obra Crinte an Custom in Savage Society (Crime e castigo na sociedade selvagem). Neste trabalho, ulizando a metodologia por ele criaa chamada «antropologia part Cipante», e opondo-se assim a «antropologia de gabinete», Malinowski refuta, partir de sua insergio no campo observado,afirmagdes pré-concebidas de , «promiscuidade» © outras tantas ‘muito comuns até entéo para afrmaro funcionamento legal dessas sociedades ‘com base na reciprocidade,publicidade e ambigao* Considerando a fragilidade da tese evolucionista do Estado ¢ seu etno- centrismo, estudos foram realizados com 0 abjetive de entender 05 aspectos -«funcionais» da organiza politica e suas formas de expresso. Ao invés de Se tentar encontrar lampejos de uma estrutura em «evolugio», quer-se agora ‘entender a forma do pensamento que rege uma dala sociedade considerada, e ‘do transportar para ela valores e referencias que Ihes seriam estranhas. Em vista disso, voesbulos tais como «governo» e «politica» deveriam assar a ser distinguidos no que propriamente os diferencia. Porque se « (xcanalizagio reventiva>); ©) «Constituir estruturas de poder reconhecidas»; e 4d) «Assegurar metas comuns» («direcionamento comum»).. No ano de 1949, no trabalho «Law and the Social Sciences ~ Especially Sociology» («Lei eas cincias sociais -Em especial asociologia»), Llewellyn ‘eafirmard centralmente este entendimento, dizendo que a funcao principal do governo e da ei € «.. manutengio do caréter grupal do grupo».* Nestes termos, 0 que esté a dizer Llewellyn & que © direito deve: a) resolver confitos; b) plaificar comportamentos; c) reprimir os comporta- nnentos aversivos; d) regular a distribuigéo de bens e servigos;e) le poder. Por su vez, nos idos de 1971, Robert S. Summers, inspirado no texto i referido de Keisen, publica o artigo «The Technique Element in Law («O elemento téenico na lev), Neste trabalho, Summers desiaca ~ ainda que diga «que seu esforco se resume a um esbogo sem qualquer pretensio de ser defini- tivo, mas sim sugestivo ~ alguns aspectos os quais apartam suas impresses de algumas das de Kelsen. Escreve Summers que nao se deve confundir a «técnica juridica empre- gada» com a «fungao social desempenhada», como parece ter feito Kelsen. Forque se a técnica empregada pode ser mais bem compreendida quando se faz referencia 8 constrigao fisica, & determinagdo de pagamento ou a repre- 8 Keusey, 1957: 1 ess. © Hoes, 1967: 356, deny, 1967: 357 30 ADRIAN SGARDI ‘ensZo oral (uma admoestag0), a fungdo social consiste nos fins 208 quais se ‘desejaatender, Dessa maneira, refere-se Summers aos sepuintes objetivos:® 4) Reforgo dos lagos familiares + Promogio da satide humana e do meio ambiente; ©) Manter em paz 2 comunidade; 4) Facilitar 05 relacionamentos de troca; «) Preservaras liberdades basics £) Protegera privacidade. A par das observagies feitas por Summers, ¢ depois de detida andlise da teoria de Kelsen, Norberto Bobbio faz referéncia a dois modelos de Estado relacionando-os a nots caracteristicas funcionais, 0 que coloca a discussi0 ‘em wm plano bem mais abrangente. Lembra Bobbio que os Estados liberais possuem como nota caracte- ristica a fungio elementar de «garantin» direitos individuais. Por seu mo, Estados «p6s-liberais» apresentam caracteristica «promocionab» de direitos, portanto, de alentamento:* Em suma, as fungdes sociais destacadas apontam para dois direciona- ‘mentos muito fortes: 1) uma «fungdo de estruturagio da sociedade»; ¢ 2) uma ««fungao facilitadora da vida social individual, Assim, 0 Direito, concebide como técnica social para a realizagiio de objetivos sociais que se impéem com o apoio de aparato buracritico varia de sociedade para sociedad. E, pois, produto da vontade humana, esta sempre contingente, Para seguir estudando: Genaro R. Carts, Notas sobre derecho y Lenguaje, Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2006. Hans Kexsex, What is Justice?, Los Angeles: Universit of California Press, 1957 (Ha ‘radugao para o portgués publicada pela Mariins Fontes: O que éaJustica?, Sio Paulo: Manns Fontes, 2000), Max Weuen, Economy and Society, California: University of California Press, 1978 (H6 traduedo para 0 portugu2s publicada pela Editora UnB: Economia © Socie- dae, Brasil: UnB, 2009), 2 Sonos, 1971: 133, 3 Bona, 1980-2 7. 1-opiResto st Noel Smuciusen, Direio ¢ linguagem: Uma andlise da testura aberta da Tinguagem, Ri de Janeiro: Renovar, 2002. Norberto Boosie, Sito, govemo, soviet, Torino: Einaudi, 2006 (Hi tradugio para © portugués publicada pela Paz e Terms: Estado, Governo, Sociedade, Busia Euitora Paze Terra, 1995), CAPITULO ORDENAMENTO JURIDICO Emexpressdes como «0 Dircito brasileiro», o wDircito inglés», «o Direito intersacionab» etc., 0 voedbulo «Direito» est claramente sendo utilizado no sentido de «ordenamento juridico». Todavia, essa sinonimia, sinonfmia entre «Diteito» e «ordenamenton, nem sempre apresenta significado convergente. Falase assim em sordenamento juridico» como: (1) «ordem normativan; © ‘como (2) «sistema normativo».! (1) «Ordom normativan: expressio com a qual se diz tanto que o diteito, por um lado, «ordenam; como, por outro, que & 6 resultado de algo que «pBe> ‘ou «coloca» em sordem. Como algo que «ordena>, designa «comando», «prescrigion, «conduta regulada, legislagio»; como resultado de algo que -«pcem ordem, expressa «organizagio sociaby; {2) «Sistema normativoy: expressio com a qual se procura indicar que Corderamento jurfdco € um «conjunto normativo» dotado das seguintes carac- teristicas: a) «unidade» de seus elementos; b) «pleno» na previsio ¢ solugio dle quesides juridicas; © c) acoerente» ao estabelecer deveres, Neste caso, orderamento jurfdco traduz a nogao de certo «ideal» de conjunto normative. 0 primeiro grupo de sentidos jé foi trabalhado nos capitulos precedentes. Neste Capitulo seré examinado o segundo grupo, quer dizer, ordenamento ‘como «sistema normativa». 1. CONJUNTO NORMATIVO Dizer que um ordenamento juridico é um conjunto de normas parece ser algo evidente e que dispensa, inclusive, ser afirmado. De todo modo, a esse rrespeito, o que deve ser devidamente compreendido é que quando se faz uso * Avcrousnéx Bunvors, 19te: 395-398. 102 ADRIAN SCARE di expressio «ordenamento juridieo» como «conjunto de norms», indica-se tums «coletividade de coisas», no um «ente singular». Portanto, no se faz mmengio apenas a norma NI. ou apenas. norma N2, ou N3,ou Ns mas sim 20 CINE NI,N2,N3, Ny. ” Entrento, se por ordenamento juridico se entende um conjunto de rnormas deve haver algum critério que destague seus elementos dos outro: {que no pestencem a0 conjunto, Portanto, quando se diz «Este € um conjunto compesto por nimeros primos», «Aqui apenas hi abjetos amarelos», «No in poliedros nesta caixa, estése partindo de algum referencia ou de algums sidentidade. Signtica dizer: ser um «némero natural maior do que 1 div sivel somente por I e por si mesmo» é a identidade do conjunto dos nimeros primo cor sare iden do conju de objetosamarels ser um «s6tido delimitado por poligones» a exigéncia para pertencer conjunto dos poliedros " see es Perens se Normalmente,conjuntos so idemtificados pela simples «enumeragion de seus elementos. sso significa que a pani da enumeracdo de seus clementos © conjunto ¢ alterado toda vez que algum elemento ¢ suprimid, acrescentado a sbsiuido, pois de um conjunto de Nelemenios passe a um enue divero, Contudo, em que pese as modificagées nas normas de uma ordem jut dca, poucos juristas, apenas por isso, ousariam afirmar que a ordem juridiea Olt deixou de ser ela mesma passando-se paras ordem juridica OI2_A vise disso, ou bem o chamado conjunto normativo nfo é ui conjunto; ou bem falta alguma informagio ao quanto sc vem expondo. Cu sea, algo deve haver que ihe confere esse reconhecimento como «0 mesmo conjunto apesar de no sé-lo quando considerados seus elementos na soma de suas singularidades. I, UNITARIO. Por sunidade» do ordenamentojuridico se designa a possibilidade de se reconduzirem todas as suas normas juridicas a uma Gniea norma referencial? Sendo assim, a norma ou normas que promevem a unidade formam © ponto convergente do conjunto normativo. Com respeito a iso, algumas observa 56es vém a propssio. Em primeiro lugar, embora a unidade seja condigdo para um conjunto sormativo ser um «conjuntar, deve-se enfaizar no poder-se confundit «tnidade» com «uniformidade», pois como termo de diferen- ciago do conjunto normativo, logo se notars que hé certa «diversidade» de conjuntos. E que a par da ordem juridica interna, por exemplo, brasileira. hi ‘outrastantas ordens juridicas que compsem, também, unidades normativas,cais como 0 direito «inglés», «italiano», «espanhol», «japonés» ete. Essas ordens juridicas, quando agregadas, so conhecidas como «ordem internacionaly.* Em terceiro lugar, se ha unidade é porque existe relagdo entre as normas sobre a producdo juridica e 0 conjunto normativo. Ou seja, as normas de ‘produglo jurfdica regem a criagio dos materiais juridicas. Com efeito, dado © seu cariter institutivo dos poderes juridicos, a constituigi0, como norma de convergéncia do conjunto, postula adequacio das normas juridicas com (0s critérios de produgio normativa que institui. Dessa forma, a «exigéncia ‘da constitucionalidaden, entendida esta como exigéncia de adequagio com ‘o modelo constitucional estabelecido, participa da compreensao de unidade. ‘Tudo considerado, a imagem da «constituigio» como «norma» é bastante simplificada. Porque a constituigdo ndo constitei

You might also like