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ALINE CARVALHO
CRISTINA MENEGUELLO
Organização

Dicionário temático
/
de patrimônio
Debates contemporâneos

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UNtCAMP

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Reitor
MARCELO KNOBEL

Coordenadora Geral da Universidade


TERESA DIB ZAMBON ATVARS

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Conselho Editorial

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Bibliotecária: Maria Lúcia Nery Dutra de Castro CRB-&!' / 1724

D549 Dicionário temático de patrimônio: debates contemporâneos 1 organização: Aline


Carvalho e Cristina Meneguello. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2020.

L PatrimÔnio cultural - Brasil- Dicionários. I. Carvalho, Aline Vieira de. 11. Mene­
guello, Cristina.

ISBN 978-65-86253-27-6 C!)!) - 363.69098103

Copyright @ Aline Carvalho


Cristina Meneguello
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TeL: (19) 3521·7718/7728
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A
PATRIMONIO CULTURAL LGBT

Camila A. de Moraes Wichers


.Tony Boita

o termo patrimônio cultural LGBT é comumente utilizado nas ciências


sociais aplicadas, em especial na museologia, para enfatizar tombamentos,
registros e manifestações socioculturais produzidos ou relacionados a
pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros,
bem como para questionar a heterocisnormatividade que marca os bens
patrimoniais. As discussões acadêmicas e políticas em torno do patrimônio
cultural LGBT encontram pontos de diálogo com os estudos feministas e
com a produção sobre gênero [ver "Mulheres e patrimônio"]. Durante a
década de 1970, um contingente variado de acadêmicas passou a estudar
as condições de vida das mulheres no intuito de explicar sua subordinação.
Por seu turno, o movimento homossexual também se fortaleceu no
período, acompanhado de discussões acadêmicas. Foi durante essa busca
. que surgiu e se expandiu o conceito de gênero, compreendido como uma
estrutura social, uma dimensão central da nossa vida, envolvendo as formas
como os corpos sexuados são praticados, percebidos e categorizados. Se,
nos primeiros anos, os debates se restringiram ao conceito de gênero,
com o tempo ficou evidente que outros marcadores sociais da diferença
deveriam ser considerados nas análises sociais e na luta política. Foram
as feministas negras que iniciaram essas criticas, resultando no conceito
de interseccionalidade, que busca compreender as dinâmicas da interação
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'Dicionário temático de patrimônio 'Patrimônio cultural LGBT

entre dois ou mais eixos de subordinação. l A partir de então, marcadores


como gênero, sexualidade, raça, classe, entre outros, deveriam ser
lugares são representativos para a comunidade LGBT. Alguns deles slo:
(i) o concurso Miss Brasil Gay, realizado pela primeira vez há 43 anos, em Juiz
~
,

considerados de forma integrada. Assim, quando falamos em patrimônio de Fora, registrado como patrimônio imaterial desse município em 2007;
LGBT, devemos estar atentos às interseccionalidades que perpassam essa (ii) a festa das Filhas da Chiquita, em que pessoas LG~T de todo o estado
sigla, utilizada no movimento social e. nas políticas públicas, no Brasil, do Pará participam, em Belém, como devotos aguardando a santa passar
desde a Conferência Nacional GLBT de 2008 - quando o "L" passa a vir _ em seguida à passagem, inicia-se uma das maiores festas profanas do
na frente do "G" para dar maior visibilidade às lésbicas. Historicamente, Círio. Essa manifestação imaterial completará, em 2019, 4 1 anos de história.
outras siglas foram utilizadas, como MHB (Movimento Homossexual Merecem atenção, ainda, os bens culturais musealizados preservados
Brasileiro), MGL (Movimento de Gays e Lésbicas) e GLT (Gays, Lésbicas e em museus e espaços exclúsivos da memória LGBT, como, por exemplo:
Travestis). Cabe apontar que, em outras partes do mundo, ou mesmo em (i) o Museu da Sexualidade, criado em 1998 pelo Grupo Gay da Bahia.
segmentos do movimento brasileiro, siglas diversas são utilizadas, como, em Salvador. Seu acervo é voltado para a sexualidade, em especial para a
por exemplo, LGBTQ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Queer), prevenção e os cuidados com a saúde sexual; (ii) o Museu da Diversidade
empregada pelo National Park Service (NPS), nos Estados Unidos, que _ Centro de Cultura, Memória e Estudos da Diversidade Sexual do
tem um programa especialmente voltado à preservação do patrimônio Estado de São Paulo. a única instituição no Brasil vinculada a um poder
de grupos LGBTQ.2 Assim, o trabalho com o patrimônio cultural LGBT executivo; (iH) a revista Memória LGBT - RMLGBT. um periódico digital
deve considerar as diferenças entre os vários componentes da sigla, a colaborativo que tem como premissas a salvaguarda e a comunicação
fluidez dessas classificações e a integração com outros marcadores sociais. da memória LGBT. Tal iniciativa atende a uma demanda pelo direito à
Contudo, o patrimônio cultural LGBT é negligenciado pelas políticas memória desses grupos. dada a ausência do protagonismo LGBT em museus
públicas e pelos governos federal, estadual e municipal, reforçando o e espaços de memória; (iv) o Acervo Bajubá, construído coletivamente,
preconceito e a violência. Essa negação ao direito à memória, à cultura e digitalizado e disponibilizado em seu website. A iniciativa também realiza
ao patrimônio soma-se a tantas outras, como cidadania, segurança, saúde percursos em espaços LGBT na cidade de São Paulo; (v) o Instituto de
e educação. Cabe, então, cartografarmos alguns patrimônios materiais Arte e Cultura LGBT, iniciativa comunitária que desenvolve exposições.
tombados e ocupados pelas memórias de pessoas LGBT no Brasil, a saber: oficinas, cursos e formações voltados para a preservação das memórias
(i) o Cabaret Casa Nova, inaugurado em 1938 na Lapa (RJ), é a mais
LGBT no Distrito Federal.
antiga casa noturna do gênero no Brasil, tendo sido fechada em 2013; Oi)
o Cine Ideal, um dos primeiros cinemas cariocas, atualmente é a boate
mais popular entre os jovens gays. Ambos estão relacionados a complexos PARA SABER MAIS
arquitetônicos tombados no Rio de Janeiro. Destacam-se, também, os bens
imateriais registrados, cujos saberes, celebrações, formas de expressão e BAPTISTA, J. T. &' BOITA, T. "Museologia e Comunidades LGBT: Mapeamento
de ações de superação das fobias à diversidade em museus e iniciativas
comunitárias do globo". Cadernos de Sociomuseologia, voL 54, n. 10. Lisboa.
juL 2017, pp. 29-56. Disponível em <https:llrevistas.ulusofona.pt/index.php/
1 Crenshaw, 2002.
cadernosociomuleologia/article/view/5948>. Acesso em 2/9/2018.
2 NPS, 2019 <https:lfwww.nps.gov/orgS/1207/whatwedo.htm>.
'Dicionário temático de património

~
BOITA, T. W. Cartografia etnográfica de memórias desobedientes. Dissertação de
mestrado. Goiânia, Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social­
-UFG,2018.
11
CONNEL, R. Gênero em termos reais. São Paulo, Versus, 2016.
CRENSHAW, KimberIe. "Documento para o encontro de especialistas em PATRIMÔNIO DA DITADURA
aspectos da discriminação racial relativos ao gênero". Revista de Estudos
Feministas, voI. 7, n. 12,2002, pp. 171-188. Deborah Regina Leal Neves
DE BARBIERI, T. "Sobre la categoría género: Una introducción teÓrico­
-metodológica". Debates en Sociologia, n. 18, 1993, pp. 145-169.
FACCHINI, R. "Entre compassos e descompassos: Um olhar para o 'campo' e
para a 'arena' do movimento LGBT brasileiro". Bagoas, n. 4, 2009, pp. 131-158.

A preocupação com edifícios, entendidos como referências culturais para


grupos da sociedade, originou a prática de preservação e o reconhecimento
desses locais como patrimônio após a Revolução Francesa. No entanto,
foi com o fim da Segunda Guerra Mundial que a preservação de lugares
considerados portadores de memórias difíceis teve início. A destruição
sem precedentes promovida nas batalhas da Segunda Guerra despertou
I
preocupação com a preservação de edifícios e paisagens referenciais.
Houve também o cuidado em preservar alguns espaços relacionados
a fatos ocorridos durante a guerra, como campos de concentração [ver
"Patrimônios difíceis (sombriosrJ. Nesse contexto, duas iniciativas de
preservação se destacam no final dos anos 1970: o reconhecimento do campo
de concentração de Auscbwitz e do centro de Varsóvia, ambos na Polônia,
como patrimônios da humanidade. No primeiro caso, a Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) definiu
como patrimônio o local construído para prender, forçar trabalho e matar,
principalmente, judeus, entre diversos grupos considerados inimigos do
regime nazista; no segundo, consideroú-se como patrimônio cultural da
humanidade a reconstrução dos edifícios que compunham Varsóvia e que
foram destruídos por tropas nazistas após resistência da população da cidade.
Trata-se de reconhecimentos com características inéditas e pioneiras na
forma de perceber o patrimônio cultural. O historiador francês Dominique

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