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Scanned with CamScanner Le TROT LSD therein Oana ay Paulo) So OO a ze eee aie (eaio) Isabel Cristina Gomes (Universidade de Sao A) ee scae end) SET SU TST ke Cina att Te aD Copyright 2019 © by Maria Livia Tourinho Moretto Se eRe C are PAT eerie een Re em Cote ue tea tt etree om oe Benen aye Patera Editor Perr Z1 0) eed Marta D. Claudino Se ted Bren RKenrte a tsa) eee eae Michelle Z. Freitas ‘CIP-BRASIL. Catalogacio na Publicagso Recreate ened Fee es ee eee nu Ou eS eS econ Seca pit ecco eM eeay econ eet ide satide - Aspects psicoldgicos. , Pacientes hospitalizados - Paton een ree Prey ee ee mis BCA (he rep Oe ravetarey Meri Gleice Rodrigues de Souza - Bibliotecdria CRB-7/6439 0] pet aL Rua Capital Federal, 860 - Perdizes OPE ra es ten ARPES ete eee ace Rete aed Scanned with CamScanner Na Vertente Clinica: A Abordagem Psicanalitica do Sofrimento nas Instituigdes de Saude este capitulo, a énfase tematica passa pela vertente clinica do trabalho do psicanalista na instituicéo de satide, em especial no que tange a abordagem do mal-estar e ao tratamento do sofrimento de pacientes e das equipes de saude. Iniciamos propondo uma reflexao psicanalitica a respeito do processo do adoecimento e do corpo em sofrimento, destacando a importante dife- tenca entre adoecimento enquanto acontecimento de corpo e adoecimento enquanto experiéncia singular. No item seguinte, abordamos a dimensao traumatica do adoecimento Para, entdo, discutirmos a respeito da experiéncia do cuidado em Psicana- lise eo Na sequéncia, apresentamos denciarem 0 modo de relagao qui indicam também os modos de aj clinica psicanalitica hoje. Por fim, apresentamos 0 que como “indicadores de risco” e que ae O que se espera é que os por emule pee ot: Tecam subsidios para o apri ea gee? tratamento e Para a construgao ¢ y eee ee naliticos) capazes de ofertar sacs cues eto de icas evidenciam a cent desafios “xptessao do sofrimento e q : “9S psicanalistas na conten Scanned with CamScanner Alerdiceniriicendlitics|do\sefrimente naslinsrituleice de Sadde 4.1. Adoecimento: Do Acontecimento de Corpo a Experiéncia Singular O adoecimento é um acontecimento na vida de uma pessoa que pode evocar para ela diversos sentidos ou pode parecer para ela algo sem sen. tido algum. Via de regra, é entendido por ela como um marco, no sentid daquilo que faz um corte no percurso de sua vida, produzindo um antes ¢ ‘um depois do acontecimento. Este acontecimento pode produzir uma série de consequéncias, entre clas a surpresa e/ou a experiéncia de impoténcia, o que exige um trabalhg psiquico importante de enfrentamento e elaboracao de lutos, sem o qual 9 paciente encontra dificuldades para lutar pelo que Ihe ¢ possivel, Ressalto, no paragrafo acima, a diferenga — aqui colocada de modo simples, mas ja por mim abordada em trabalho anterior (Moretto, 2006) - entre as nogées de acontecimento e experiéncia. Proponho que, neste con- texto, entenda-se por “acontecimento” aquilo que se refere ao fato. O ado- i i : \cia”, proponho que entenda-se itecimento de corpo (e nao apenas exige um esforco psiquico extra- ido de “acomodé-lo” em sua vida ia singular (Moretto, 2016b). 0 que considera 0 corpo como de, entende que o aconteci- que, a principio, dela mento, oalvo den esta: do aconte Scanned with CamScanner Maria Livia Tourinho Moretto um estatuto diferente do que nés chamamos de “relato do acontecimento” para uma pessoa. A clinica psicanalitica, entdo, é essa que proporciona a passagem do acontecimento para a experiéncia ou, dito de outro modo, essa que constr6i o caminho para a subjetivagao, que eleva o acontecimen- to, passivel de ser descrito, ao estatuto de experiéncia que produz saber singular (Moretto, 2006). Quer dizer que essa passagem, essa operacao de construgao da experiéncia, a qual se faz por meio da construcao de uma narrativa, ndo se faz por si s6. Ela se dé por meio da relagéo com um in- terlocutor qualificado que favoreca e testemunhe, necessariamente, essa passagem. Este interlocutor é 0 psicanalista. E nesse sentido que pode-se dizer que falar para um psicanalista néo é 0 mesmo que descrever um acontecimento. Falar para um psicanalista é contar-se. Oadoecimento é, ento, como mencionamos, o acontecimento impre visto que afasta o paciente de seus ideais exigindo dele um esforco psi- quico, no sentido de “acomodar” esse fato em sua vida psiquica. Assim, 6 habitual que esse esforco para lidar com a doenga se dé, inicialmente, por meio da tentativa (nem sen i Aquilo que, talvez, seja sem s Essa tentativa se expressa, traduzem 0 impacto do a que significa isso?”, “qual o E frequente também acao de sofrimento inédito (“ também as palavras, Sem proprio, é justamente ai, quan nificantes para circunscrever' que transborda em seu co e de estranhamento (Freud, 191 intervalo de vida esvaziado. Ainda a respeito dessa tiéncia do adoecimento a constatagao de que se ter exatamente nem ao que se p ta-se, mais ainda, que esse € finito, e lhe apresenta, da precariedade da vida, Ali onde os ideais po éa prova viva da mana em sua finit mente recalcadail a Scanned with CamScanner tituigdes de Sadde pimento nas Inecituls Abordagem Psicandlitica do Sof moe Na medida em que escutamos © acontecimento de oop 5 x 2 experi- oa uéncia, cin éncia singular no caso a caso, notames 14°, com requir aoe at é i iéncia de perda: € a 6, para muitos, uma experiéncia de perc ; to con & ara al cl corpo, & uma experiencia que deixa mart © Fata delas parece ser a constatagéo de que morrer ¢ possivel 20136) O que se perde é a ilusdo de imortalidade e, a prove ae oad uma experiéncia que funciona como uma marca na Un a pee la vida de uma pessoa. Ha um antes e um depois do adoecimento como marca de eS oiact dessa lembranga se faz notar em outra pergunta frequente, que quase sempre é uma das primeiras associaco®s do paciente em atendi- trento: “Por que comigo?”. Esta é uma pergunta importantissima especial mente porque, a rigor, é uma pergunta sem resposta imediata. A resposta, se houver, tera que ser construida. : ‘ A clinica psicanalitica nos Stet portanto, ee uma experiéncia na qual, no psiquismo do sujeito, a mor F cam ee cate Dena nota-se com facilidade em muitos casos, quando a morte passa a ser possivel para o sujeito que passa vel também uma espécie de valorizacao da prépria vida, a ‘um forte investimento psiquico na luta por ela. Um paci impactado pelo diagnéstico de sua doenga,, dizia em seu pr mento: “Doutora, agora eu quero viver”. A questo. o que fez ele da vida, até entao? i De todo modo, a luta pela vida, do nosso ponto de desvinculada do processo de elabo' (idealizada?). Aqui vale ressaltar dicdo de lutar pela vida d se 0 processo de luto fosse cond condigées inéditas, sem nenht auge do processo de elaboragao d decide lutar pela vida que the é pe Eé, entao, no ponto onde esta que convém que estejamos ate renga entre as ideias de impos muitissimo quando estamos relaciona com 0 desafio de enfi A situagao clinica que p do sua doenga como prova d se dar conta disso, sua ex de luta. Ou vice-versa: ha sil irrepardveis, impoe limitag peracdo das condicdes perdi Scanned with CamScanner Maria Livia Tourinho Moretto Real como signo de sua prépria impoténcia, sem se dar conta de que res- ponder ao impossivel como se fosse sua impoténcia pode ser uma forma de negé-lo. E preciso cuidar bem dessas diferencas porque, na abordagem clinica do sofrimento, ao escutar o nosso paciente, nao podemos autenticar 0 pe- dido de reconhecimento de sua impoténcia quando o que esté em questo e deve ser tratada ¢ a relacao do sujeito com 0 impossivel. Em tese, frente ao impossivel, cabe 0 luto, frente ao possivel, cabe a Tata (Moretto, 2013b). Mas o fato é que, em franco sofrimento psiquico, os pacientes, em situagGes limite, ficam entre o luto e a luta, muitas vezes sem saber que direcdo tomar, na tentativa de resolucio de seus conflitos. Fren- te ao possivel da cura, cabe o luto pela perda de uma condigio desejada, idealizada, o luto de um projeto futuro, e desse processo de luto emerge a decisio de lutar pela vida possivel. E nesse sentido que entendemos que, diante da angiistia da condigao inédita provocada pelo adoecimento, falta ao sujeito um saber que orga- © campo de (in)certezas que se abre para ele. E fundamental que o sicanalista possibilite ao paciente a construcao de uma narrativa na con- io de autor de sua histéria, e nado como coadjuvante de um cenario entificado ao objeto de cuidados médicos. Esté posta, entdo, a importdncia que o psicanalista confere 4 oferta de um dispositivo de fala para o paciente angustiado, o que é bem diferen- te de o profissional de satide responder ao chamado do paciente falando ara/por ele. chon E assim que, muitas vezes, com re a nocdo de sofrimento e 0 « Scanned with CamScanner ofrimento nas Instituicdes de natitica do Soft $5e5 de sag, Abordagem Pie cecimento enquanto acontecimento de corpo, naa. wz meio de estudos © Pesquisas, sobre a ep “mnento 6 sabe dela quem por ela passa. Vimos, Por meio g cig do adoecimento vo de narrativa, que muitas vezes 0 disposi Ea “ondicao de invisibilidade tie um paciente o deixa vulneréve] rondo 28 que os profisionais da sade ificaca jmento, 0 que se esper Tronificacao do sofrimento, 0.6 ad gies Press fap confundam comperencia teenie com indiferen¢a, quel visto o potencial iatrogénico da indiferenga no campo da satide (Akimoto Janior e Moretto, 2016). 4.3. Das Relagdes do Doente com sua Doenga: As Narrativas de Sofrimento freudiana de satide, sustentada pelo con- ceito de pulsio - conceito-limite entre psiquico e 0 somatico (Freud, $918a/1974) ~ ao integrar corpo e psiquismo, distancia-se da classica opo- sigdo savide-doenga e de qualquer perspectiva normativa para a definicao das mesmas. Remete-nos, para isso, necessariamente, as dimensées socio- ulturais da existéncia, priorizando 0 modo singular pelo qual uma pessoa sctabelece relacées como sendo o elemento essencial para a caracterizagio de sua satide. Essa concepgio, ao permitir uma visdo integrada entre satide e cultu- ra, permite também que yelhos problemas recebam tratamento inovador ao serem repensados, expandindo e enriquecendo as areas de interface, servindo de base para o trabalho interdisciplinar (Figueiredo, 2014). Em Psicandlise, 0 processo de constituigao da subjetividade coincide com 0 processo de constituigao da corporeidade, que se da no campo da 0 6 um principio tedrico basico sem o qual ubjetividade e cultura nao se sustentaria: /corporeidade se da no campo da Como vimos, a concep¢ao Scanned with CamScanner Maria Livia Tourinho Moretto jetividades e a ordem social vigente ou, dito de outro modo, a relagao en- tre as mudangas da ordem social, econémica e politica de um tempo e a maneira pela qual sofrem os sujeitos que compdem esse cenario. E certo que muitos dos desafios encontrados pela clinica na atualidade esto rela- cionados as transformagées ocorridas nas tiltimas décadas nos modos de exercicio do poder e seus efeitos na subjetividade das pessoas. Vale notar que ao analisar a relacao entre inconsciente e cultura, Freud o fez a partir de uma posicao inequivoca: ele era um critico da cul- tura. Afirmagao que se pode constatar nos textos nos quais ele aborda diretamente esse problema, tais como “Mal-estar na civilizacao” (Freud, 1930/1974), “Psicologia das massas e andlise do eu” (Freud, 1921/1974), “Futuro de uma ilusdo” (Freud, 1927/1974), dentre outros. E nisso que La- can (1953/1998, p. 322) se inspira para dizer “que antes renuncie a isso [a clinica psicanalitica], portanto, quem nao conseguir alcancar em seu hori- zonte a subjetividade de sua época”. E nés? Por meio das narrativas de sofrimentos que nos sao apresenta- na clinica hoje, qual critica fazemos nés da cultura que testemunhamos da qual participamos? E necessdrio que examinemos de modo critico a cdo do sujeito com os ideais de sucesso (tais como os ideais de satide, a, autonomia, riqueza etc.) e com o imperativo de felicidade que ca- izam a cultura de nossa época. E evidente para nés que os ideais tem um lugar de muita impor- icia na vida das pessoas. Eles funcionaram sempre, e provavelmente tinuam funcionando, como uma espécie de norte - aquilo que norteia rienta as decisdes importantes tomadas pelas pessoas quando se en- regam de tragar, elas proprias, a trajetéria que pretendem seguir em vidas. Essa relacao entre os ideais e os planos de vida é evidente e nao nos ser problemdtica, em yblema se constitui quando i 10 do sujeito, o status de ‘ele passa a interpretar: relacdo aos impera- por outro nos para a (des) Scanned with CamScanner sicanativica do Sofrimento nas IMEtItuisbey gy abordage™ ? esas xperiéncia de adoecimento é interpretada s. 5 fase 2) a : de impoteci e fracasso pessoal (Moret, ae ais adian' como Gees + clinica psicanalitica como UM espaco que reitg tura (Femandes, 2012), tem-se Te as demandes enderecadas aos pet nalistas trazem consigo, por meio beenicr. co sofrimento, Oe 4 das questoes que envolvem nao apenas 0 sujeito e o seu mundo, iy. envolvem o sujeito NO mundo contemporaneo. que Digamos que 0 psicanalista consegue fazer uma espécie ¢, mento das queixas € das demandas a partir da escuta das narratiy, mee p daquees que a ele se enderecam, seja nos consultiig wet has diferentes instituigdes nas quais os analistas marcam sua preg reco nos remete, evidentemente, & discussdo a respeito do modg qual o psicanalsta trata das demandas que a ele s20 enderecadas neg situacao. © sofrimento hoje ndo est, portanto, desvinculado dos mocos q exercicio do poder que regulam uma sociedade que controla, de mod imperative, as condigées de vida dos sujeitos,dificultando a ciagio de movos singulares de existencia, produzindo silos de vida em mass sem tritica, Neste sentido, todo sofrimento do sujeito, a despeito de sua radical sngulaidade est associado ao modo pelo qual este sujeito se situa no lago soci Nesse ambito, a despeito de reconhecermos a importancia do debate que poe em relevo a hipétese da emergéncia de “novos sintomas” e/ou de patologias contemporaneas como resposta as transformagoes do laco so- cial (Recalcati, 2004; Tarrab, 2006; Lustoza, Cardoso e Calazans, 2014), do nosso ponto de vista, muitas “patologias novas” ja foram descritas antes. clinicos que se apresentam como importan- contemporaneidade, especialmente por diagnéstica que ndo se resolve de acot- enta a psicopatologia psicanalitica, estruturais de neurose, psicose a além de uma revisio denos- 40 dos dispositivos clinicos de cia na condugao do tral e Hoffmann, 2017). cul © Mapea. Scanned with CamScanner Maria Livia Tourinho Moretto com sua doenga e 0 modo pelo qual isso é tratado no contexto clinico-ins- titucional. A pergunta é: com quais narrativas os sujeitos apresentam 0 seu corpo em sofrimento na clinica psicanalitica hoje? O que a experiéncia clinica nos permite afirmar é que nos encontramos, com uma frequéncia digna de nota, diante de pessoas que nos apresentam seus corpos em sofrimen- to, por meio de uma narrativa predominantemente focada na informagao (diferente da queixa), associando, muitas vezes com ressentimento, o ado- ecimento do corpo sobre o qual informam com a experiéncia de fracasso pessoal. Sendo assim, ali onde Freud antes encontrou um sujeito da queixa, com frequéncia, 0 que chega a clinica hoje é um individuo que, neste con- texto, passo a chamar aqui de informante e que, ainda que apresente-se por meio de seus sintomas, nao estabelece com eles uma relagao de inti- midade — trata os seus sintomas como se no fossem seus, e sim de quem os escuta. _ Como entender isso? Como tratamos disso? A andlise dessas narrativas de sofrimento nos parece ser de funda- tal importancia, especialmente porque esta dimensio subjetiva de fra- 0, nés sabemos bem, nao fica sem consequéncias nem para o doente n para o seu tratamento, e deve ser levada em conta pelos profissionais lide que empregam seus esforcos na oferta de cuidados com vistas ao so terapéutico. ‘amos dar destaque, de modo esquemitico, quase caricato, a quatro tivas de sofrimento, que nao se excluem mutuamente: a narrativa de nento do informante; a narrativa de sofrimento do fracassado; a nar- e sofrimento do ressentido; a narrativa de sofrimento do adoecido, e em todas elas 0 sujeito expressa seu sofrimento por meio do imento do corpo. de modo detalhado, Scanned with CamScanner Abordagem Psicanslitic 4 do Sofrimento nas Instituisses de Saad tomatica de acontecimentos. Elas conseguem relatar uma hist. tia, mas parecem ter dificuldade de reconhecer-se em sua préprig historia, O curioso é que nosso informante, nao bastasse a relagiy distante que ele estabelece com relagao aos seus sintomas, Buarda também uma certa distancia com relagao ao proprio softimenty permitindo-nos construir a hipdtese, em certas situacdes, de que essa posicéo de exterioridade pode ser entendida como uma po. sicdo de indiferenga, tanto com relacao aos seus sintomas, quanto com relagao ao seu sofrimento. Assim, a demanda que ele dirige A equipe de satide parece ser a de pertencimento a uma categoria diagnéstica, sustentada pelo desejo de se “igualar” e de ser reco. nhecido como parte de um grupo que se identifica pela presenca de sintomas comuns por ele informados. ‘Narratioa de sofrimento do fracassado: é alguém que se apresenta por meio de uma narrativa focada no fracasso pessoal, indicando-nos que estabelece com os ideais da cultura uma relagao de aliena- cdo e submissdo, tomando-os nao como referéncias, mas como imperativos superegoicos. Sao casos nos quais 0 préprio sujeito, ao nao conseguir corresponder a esses ideais, interpreta esta nao correspondéncia como fracasso. As vezes, acompanhado de culpa e vergonha, apresenta a demanda de ajuda na diregao de melhor se adaptar aos ideais, demonstrando pouca disposicao para assu- igo critica ou mais analitica com relagao ao proprio s mos que o problema do fracassado nao se ido: 6 alguém que atribui a um Ou- Pelo seu sofrimento. Esse Outro, no entan- famente aquele que nao atendeu 20s sentido se diferencia do fracassad0 ido, renuncia ao seu proprio dese- te — e por nao poder se reco” Outro a quem ele atribui do, o Outro é aquele Scanned with CamScanner Maria Livia Tourinho Moretto demandante e, por isso, a insisténcia em colocar 0 desejo sempre do lado do Outro. Aqui me refiro a uma posigao subjetiva que enfatiza o desejo de reconhecimento, mas se distancia da Pposigao que lhe permitiria 0 reconhecimento do prdprio desejo (Dunker, 2015a). * Narrativa de sofrimento do adoecido: esta é uma narrativa que nao deixa margem a diivida com relagio a sua gravidade e evidencia a centralidade do corpo como meio privilegiado de expressao do sofrimento, indicando, ao que parece, que as subjetividades em questo nao encontram meios de representagao do excesso pela via da linguagem, restando a alternativa de inscrigio no registro corporal. Sao casos nos quais nota-se que o adoecimento, por pior que seja, produz o estabelecimento de lacos sociais e afetivos esta- bilizadores, conferindo ao sujeito uma existéncia que ele nao teria sem ele, produzindo um efeito apaziguador por meio da iden- tificagao com a doenga, trazendo ganhos secundérios (Castellani © Moretto, 2016). Entre as posigdes subjetivas “ter uma doenga” e “ser uma doenca” (Szpirko, 2000), estamos diante da segunda, pois é por meio da identificagao com 0 objeto da Medicina que alguém demanda tratamento, o que nao é a mesma coisa de dizer que este alguém deseje 0 que demanda, e a consideracao desse ponto é valiosa para os estudiosos do complexo problema dos al- tos indices de nao adesao aos tratamentos prescritos, como vere- mos mais adiante. Convém lembrarmos que as narrati discursivas aqui propostas - 0 informant adoecido — nao apenas nao se excluem. se sobrepor. A exemplo disso, © nosso informante apresenta 0 $ corpo, que por seu turno o faz perter diagnéstico; 0 nosso fracassado (que subjetiva desde bem antes de ad ‘0 a justificava consciente para nao ¢ quais escolheu se submeter, pois fracasso pessoal; e o nosso ressent 2es intimeras para responsabilizat No sentido freudiano do termo, que o assiste. Se, como vimos, nao hd exper da pelas relagdes do sujeito tura onde as subjetividades se Scanned with CamScanner sniica do Sofrimento nae tmeetsses de Saggy Abordagem Ol vos de felicidade, 2 experiéncia do adoecimento Darece edos pera * esibilidade logica inerente a transitoriedade da yj dera eee A ee pessoas, 0 estatuto de fracasso pessoal, como se elas ganha, para al rativos de sucesso e de ao adoecerem, esobederesen Oe pido evité-lo, pois é nessa con ser culpabilizadas ee nvocada, de responsdveis pelo seu adoecimenig) Oa dates, Borat), que elas se apresentam em sofrimeng, va eee. que a proposta aqui apresentada por meig das aa de sofrimento nao tem ‘aad eee nem deca. tegorizacao de tipos clinicos neste contexto. la ae Pa le um artificio didatico que sé se sustenta se nos mantivermos atentos _ singularidade do caso a caso, pois éa experiéncia clinica de escutar cent fenas de Pacien- tes que nos comprova a importéncia da singularidade do sofrimento em, cada caso. re Elas sdo elementos que nos dao pistas da importancia do trabalho de apuragao das demandas contidas nessas narrativas de sofrimento para a revisio e atualizacdo dos dispositivos clinicos (nao apenas psicanaliticos) no acolhimento e tratamento desses casos, especialmente se estivermos de acordo com a ideia de que o que deve nortear as intervengdes em satide é a aposta no protagonismo do sujeito. Pretende-se deixar claro que o modo pelo qual o doente se relaciona com sua doenga se repete no modo pelo qual o doente estabelece relagies ! com a equipe de satide e que o tratamento da posicao subjetiva que sus- tenta essas relagdes tem sido uma contribuicao importante no aprimora- mento das praticas em satide as consideram que o tratamento de ento que faz parte de uma relacdo Per. dae (Moretto, 2013a). Melhor seria, neste mendacao de um a ser s de decisées compartilha modo que, mais do que valoi nais de satide dessem prov a consequéncia possivel Joosten et al, 2008), de tal 0 do sujeito, os profissio- que se estabelece com , mento da doenga possa Quando o nosso de com o sof Scanned with CamScanner Maria Livia Tourinho Moretto escuta que fundamentaria a clinica psicanalitica, io cientifica. Nessa oferta do corpo para estudo, as vezes portando-se como se 0 corpo nao fosse seu, essa posi¢ao de indiferenca para com o seu sofrimento se repete, com clareza, no estabelecimento da relacdo com 0 profissional de satide a quem procura, pois a ele parece importar muito pouco, pelo menos inicialmente, o tipo de relagdo que ele vai estabelecer com quem o atende, focando a expectativa muito mais no servico prestado. E, provavelmente, em fungao dessa indiferenca a essa figura de al- teridade, que o informante responde sem reclamagées a frequente troca de profissionais de satide oriunda da rotatividade tipica das contingén- cias institucionais, deixando transparecer que, de fato, o Outro, para ele, “tanto faz”. mas para uma investiga- Quando nos interessamos pela vida afetiva do nosso informante, nos deparamos novamente — e nao por acaso ~ com a narrativa pouco refle- xiva de si, mas, ao mesmo tempo, narcisica, que nos indica que nesse campo afetivo o Outro também “tanto faz”, inclusive no tocante ao seu nome, seu género e sua histéria, 0 que parece justificar uma espécie de empobrecimento da qualidade afetiva das relacdes, de tal modo que o elemento por meio do qual as pessoas se “tocam”, muitas vezes prescin- dindo de palavras, é 0 corpo “objeto”, esse que, agora se nos apresenta adoecido. Ironicamente, em alguns servicos de satide, o informante é muito “bem-vindo", pois ele é percebido pelos demais profissionais de satide, em um primeiro momento, como um paciente “facil” (sic) e colaborador, pois informam — claro! -, com objetividade, os elementos que alimentam 0s bancos de dados informatizados para fins de diagnéstico e de coleta de informagdes que viabilizam, com agilidade, a pesquisa dita cientifica. Desse Outro “cientista”, a quem ele oferece seu corpo como um objeto ecido como objeto de sua inte da expectativa de queixa). lesse cendrio, ele nao se ida como sendo o que ¢ ia proceder ao trabalho de e ). Por isso, pergunta- 10 teve 0 desejo de n Scanned with CamScanner n Abordagem PS! le jet, como & possivel proceder 20 trabalho de gg, ha perda de ol Heer Enesse sentido que chama atencao a verte racy de lutos nesses ra: 0 objeto est presente, “o objeto soy gM me femanda: célica da di ho de elaboragio de lutos nq

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