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A lógica do significante [síntese e leitura do texto de Miller]

Leonardo Goldberg

(Chave de leitura: Lieutnant, lugar-tenente segundo a tradução do texto.. No antigo regime


francês, os lieutnant general eram aqueles que representavam os reis nas províncias. Lugar-
tenente (ou locotenente) quer dizer aquele que ocupa o lugar do outro em sua ausência..).

Miller quer restabelecer, portanto organizar, extraindo do conjunto da obra lacaniana, a ideia
de uma “logica do significante”. A logica do significante é efeito do campo analítico e está em
diálogo, no texto, com a “lógica da origem da lógica” (a lógica-lógica): o que quer dizer que a
“lógica do significante”, apesar de emergir da outra, e aparecer na esteira da “história da lógica”,
não segue suas leis. Portanto, ao não seguir suas leis, também não compete e não responde à
sua jurisdição.

Ponto importante: a sutura – o sujeito figura como o elemento que falta, em relação a cadeia
do seu discurso – sob a forma de um lugar-tenente (aquele que desempenha as funções de
outro). Isso quer dizer a relação da ausência (e da falta) com a estrutura da qual ela é elemento.
Mais para frente, entenderemos que o zero-número - quando escrevemos a ausência – isso
determina toda a sequência numérica e portanto a lógica do significante.

Miller avança afirmando que o logico, o linguista e qualquer um que diz “Eu”, realiza a sutura, e
se refere a axiomática de Peano e a Frege.

O que é a axiomática de Peano:

1- Zero é um número
2- O sucessor imediato de um número é um número
3- Zero não é sucessor imediato de um número.
4- Não há dois números que tenham o mesmo sucessor imediato.
5- Qualquer propriedade pertencente a zero e também ao sucessor imediato de cada
número que tenha tal propriedade pertence a todos os números.

Dialogando com Frege:

O que está em jogo é que há duas dimensões do 0 – o 0 enquanto número e enquanto


representação da ausência.Portanto, é necessário escrever um 0 aonde falta o objeto – figurar
um espaço vazio e tornar visível a ausência – “do zero número ao zero ausência conceptualiza-
se o não conceptualizavel”.

Se o número 0 é o primeiro número e só dele se pode pensar no conceito, o conceito inclui


(como ausência, o 0), e o número que se atribui é o número 1.

O sistema de sequência numérica, ao incluir o 0, determina que 0 se conte como 1. Então a


contagem do 0 como um vira o suporte de toda sequência numérica possível. Traduzindo o
exemplo de Miller:

Na ordem da realidade o 3 inclui três objetos: livro, cadeira, mesa.


Na ordem numérica (instancia da verdade), ao incluirmos o 0, que se conta por 1, há um
deslocamento: como há três números antes do número 3, o 3 passa a ser o quarto (4) número
na sequência numérica. Isso é consequência de um regime de verdade que grafe, escreva, a
ausência (0). Ou seja, o que na realidade seria ausência pura, na escritura numérica do 0, há um
deslocamento n+1.

Isso, de acordo com o Miller, põe em xeque a lógica-lógica: o zero-número é propriamente o


lugar tenente (aquele que desempenha a função do outro) suturante da ausência...

O movimento é o seguinte e que define toda a sequencia numérica – o 0 se representa como 1,


e em seguida é incluído como sentido em cada um dos seguintes números da cadeia, que Miller
chama de metonímica. Aí entra a questão da exclusão do sujeito que o discurso da lógica tenta
excluir:

“O objecto imposslvel, que o discurso da lógica convoca como o não idêntico a si (O 0 ausência
representado pelo 1, ou seja, não idêntico à si, aspas minhas)e rejeita como o negativo puro,
que ele convoca e rejeita para se constituir como o que ele é, que ele convoca e rejeita sem
querer saber dele para nada, chamamos-lhe nós, na medida em que ele funciona como o
excesso operante na sequência dos números, o sujeito. A sua exclusão para fora do discurso
que interiormente ele produz é: sutura”

Bem, resumidamente, na logica do significante: se pensarmos o traço como significante, e


quando se transforma em número como significado, tal logica, a do significante, é determinada
pelo jogo da ausência, sua inclusão escrita na sequência numérica, que ressoa em cada número
(nome), como um “excesso” operante... nessa cadeia significante, o sujeito é “diluído” e
“expulso de seu campo”... e assim Miller define o sujeito como “a possibilidade de um
significante a mais”: “A inserção do sujeito na cadeia é representação necessariamente
correlativa de uma exclusão que é uma diluição” (p. 224). Miller define então a estrutura do
sujeito como “percurssão em eclipse”, conforme um movimento, na cadeia de significantes, que
abre e fecha o número (incluindo o 0, da ausência, representado pelo 1) e abolindo-o no seu
sucessor, e por aí vai: (0, (0+1)=1, (0+1)=2, (0+1)=3, (0+1)=4,......n). De acordo com Correia
(20091) “o Um aí adicionado contém o símbolo originário da emergência da falta ao campo da
verdade, uma transgressão que vai se produzir sempre, na passagem do número a seu Sucessor,
um efeito de sentido”.

A relação entre sujeito e significante, portanto, é circular, não recíproca:

SUJEITO (EFEITO DO SIGNIFICANTE)

SIGNIFICANTE (REPRESENTANTE DO SUJEITO)

- O significante é o que representa o sujeito para outro significante –

Se a causalidade estrutural (causalidade na estrutura, na medida em que o sujeito está nela


implicado) não é uma palavra vã, é a partir da logica mínima aqui desenvolvida que ela
encontrará o seu estatuto.

1 Cf.http://www.interseccaopsicanalitica.com.br/int-
biblioteca/MPBCorreia/monica_palacio_import_conc_sucessor_upld.pdf

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