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Novas Formas de Regulagao ea «Diferenga» no ambito da Construcdo Europeia INTRODUGAO Nesta siltima parte do livro, procuramos levar até & questdo da construgao euro- peia as consequéncias da assungéo de «a diferenga somos nds». Trata-se de ident ficar, nesse processo, néo s6 0 impacto da alteragao do paradigma da elaboragéo de politicas e da sua implementagao (objecto da primeira parte), mas também as consequéncias da perda do centro epistemolégico e sociolégico a partir do qual tradicionalmente a Europa definiu os seus «outros». Como se viu, estes foram de ‘ordem externa e interna, sendo 0 nosso objectivo perspectivar a alteridade grupal ¢ individual a partir da criagdo de diferencas que dimanam de relagées e ndo de qualquer privilégio epistemolégico ou histérico. Neste sentido, «a diferenca somos nés» enquando perspectiva epistemolégica e politica tom, no caso em apreso, como paralelo «a Europa somos nés». Da mesma forma que a linearidade da accéo politica foi posta em causa pela crescente reflexividade dos actores sociais, que o privilégio de determinacdo de quem sio 0s outros se foi fragilizando, a Europa surge como uma possibilidade de agéncia politica que ndo s6 escapa aos cdnones modernos de elaboracdo de pol ‘cas como desafia a imaginagao sociolégica. E por isso que referiremos as metafo- ras para analisar a forma pela qual o processo esta a ser pensado. Da Europa como uemeganagio» Europa como afirmacae de «racionalidades minimas», procurare- mos identificar possibilidades estimulantes para a repensar. Na sequéncia da Cimeira de Lisboa de 2000, a Comissio Europeia assumiu como ‘objective central tornar a Europa o mais competitive espaco do globo, identificando como principal meio para tal designio o conhecimento. Esta assungéo parece impl ‘car uma reconfiguragao do mandato enderegado aos sistemas educativos. A estes & pedido no s6 que formem bons cidadaos e bons trabalhadores como também, @ sobretudo, cidaddos em permanente processo de aprendizagem (learning citi zens). Paralelamente, embora de uma forma nao obrigatoriamente conflitual, novos estilos de vida e de reclamagéo politica a partir das diferencas especificas dos in viduos e dos grupos parecem articular um conhecimento projectos educativos que dimanam dessa mesma alteridade. Esta ultima parte pretende mostrar que entre a Europa do conhecimento, a Europa enquanto unidade politica, a Europa como projecto ecolégico, a Europa da livre circulagao de pessoas e mercadorias, a Europa como riqueza cultural das nagées, etc., ¢ aquilo que Ihe se ope corre uma espécie de fio de navalha, no sentido em que as formas emergentes de regulago encerram importantes potencialidades de agéncia social e individual. A Europa como um bazar: educagio na Europa do conhecimento 0 espaco europeu e a construgao politica da Europa véem-se crescentemente confron- tados com um processo de heterogeneizacdo que se desenvolve espartilhado entre duas légicas. Uma baseada na ldgica moderna da homogeneidade que implica pensar a Europa ‘como um grande estado-nagéo (em competicao com outros grandes estados-nagao), & coutra baseada no que se poderia designar um conceito de unidade bricolada no ambito da qual a Europa seria pensada como uma unidade com base na diversidade. Esta dltima logica aponta para uma Europa onde as diferengas se resinem no sentido de tentarem conviver com base na sua incomensurabilidade e nao com base numa mitica heranga comum europeia. No Capitulo 5, referimo-nos a este encontro através da utiliza- «0 da metafora do bazar. Desenvolve-se aqui esta metéfora enquanto possibilidade de reconfiguragao das rela- «Ges dentro e entre os estados-nacdo modernos e os cidadios. Nesse sentido, questionar- -se-8 como € que as formas de recomposigao do estado-nagio e sua produgao/ construgao supranacional se relacionam com os processos de construgéo europeia e com as novas formas emergentes de cidadania a que nos referimos em «0 Lugar de cidadania», no Capt- tulo 4. Paralelamente, ¢ 4 medida que sio exploradas algumas metaforas que presidem a petspectivas sobre a construgio europeia, procuraremos cruzar esta construcao politica da Europa com 0 contexto da chamada «sociedade e economia do conhecimento». Neste Ambito, tentaremos destacar algumas implicagbes deste processo cruzado de reconfigura- «40 politica da Europa com a centralidade do conhecimento e da informacao para o campo de educagao. QUATRO METAFORAS PARA A CONSTRUCAO DA EUROPA ‘Se toda a linguagem tem uma matriz metaférica (Ricoeur, s/d) e sendo mesmo da ordem da postica a estrutura da linguagem cientifica, em termos sociolégicos as metéforas tem 18 .. So tropos politicos poderosos. A Europa deverd ser uma meganagao que engloba todas as outras e, de algum modo, as regionaliza, como questiona Anne-Marie Thiesse (2000)? Ou devera ser uma construgao de um novo tipo? De facto, parece que nem o sim- bolo da bandeira das estrelas, nem a moeda tinica, nem a promessa de uma constituigdo europeia veiculam, por si s6, um modelo politico capaz de reconfigurar o sentimento de pertenca nacional, proporcionando as bases de uma forma reinventada de cidadania. Actual- ‘mente, a ingenuidade é algo que nos ¢ reflexivamente vedado. Ninguém se pode dar a0 luxo da inocéncia: a construc da Europa dificilmente se poderé fundar na afirmacao de ‘um terri6rio «mae» (Vaterland ou Motherland), numa religido (seja ela a crista) ow numa lingua (seja ela a lingua franca ~o inglés europeu- ou outra). A Europa das nacbes poderd, antes, aproveitar 0 deslocamento ¢ a reconfiguragao do poder politico para outro centro ~ Bruxelas, Estrasburgo...~ para reequacionar 0 caso corso, 0 caso basco, 0 caso bela, etc, com novos actores para além de Londres, Madrid... Por um lado, dizem Held e McGrew, os cépticos «ao contrério de considerarem que os overnos nacionais estao a ficar imobilizados pelos imperativos internacionais, apontam, antes, para a activa promogao e regulacio das actividades entre fronteiras» (2002: 105), por outro, Hedley Bull enfatiza, precisamente, a necessidade de se desenvolver uma alter- nrativa aos sistemas estatais tais como os conhecemos até hoie. Eu ndo me proponho especular sobre como € que se configurariam essas alternati- vas nao historicas. Nao € evidentemente possivel confinar as variedades de possfveis formas futuras dentro de uma lista finita de sistemas politicos, e por isso nao se pode ‘tomar a sérioas tentativas de dita leis de transformagao de um dado tipo de sistema pol- Lico universal para outro. (.) Mas a nossa visio de possives altenativas ao sistema dos estados deve ter em consideragio as limitagdes da nossa propria imaginagio e a nossa incapacidade para transcender a experigncia passada. (Bull, 2002: 466) E neste sentido de alargamento das possibilidades sociolégicas que € importante con- frontar outras concepgdes do desenvolvimento da Europa para reconfigurar a prépria estrutura de soberania dos estados-nagao. A futura constituigao europeia (ver Convencdo Europeia, Esboco de um Tratado que Estabelece uma Constituigdo para a Europa, 18 de Julho de 2003) encontra-se, assim, numa posigao historicamente muito peculiar, pois © seu vicio e a sua tentagdo podem advir do facto de se procurar no passado o seu modelo futuro. B que alguns falam da Europa até aos Urais, outros limitam-na ao cristianismo e, outros ainda, a uma certa versio do nome de Deus. A questao da soberania politica na UE pode jé ser contemplada a partir deste aparente desencontro entre os sistemas estatais do passado e um novo modo de soberania emer- 5: educagio na Buropa do conhecimento gente, como se pode ver na definigao das «categorias de competéncias» (art. 11.), de ‘«competncia exclusiva» (art. 12.) ¢ das «éreas de competéncia partilhada» (art. 13.) (ibidem) da proposta de Constituigdo para a Europa, pois a forma como o exercicio dessa soberania se vem configurando é de alguma forma excepcional. Citando Keohane, «(..) a Comunidade Europeia nao é de modo algum um estado soberano, embora constitua um hibrido sem precedentes, ao qual jé nao se aplica o conceito tradicional de soberania» (2000: 116). 0 mesmo autor enfatiza que esté em causa uma nova forma de inter-relacio- namento entre os diferentes estados-nac2o europeus, isto €, a propria interdependéncia «é caracterizada por uma continua discordancia dentro de e entre os patses, dado que os inte- resses dos individuos, dos grupos e das empresas esto frequentemente em conflito entre si» (ibidem), A Europa como Associagio em torno de temas E neste sentido que se tora necessério procurar noutras metéforas a Europa. Mary Kaldor (1995) identificou quatro caracteristicas principais dos estados-nacao, essa «forma particular de estado que teve a sua origem durante o século XIX»: identidade politica aseada na cidadania que, por seu turno, estava ligada & cultura do territério; cultura vertical e homogeneizadora»; moeda, «consist(indo) numa moeda nacional controlada por um Banco central»; «violencia organizada» ~ sob «a forma de forgas armadas nacio- inais, que representam a sua tnica forma legitima» (sublinhado no original) (1995: 71-73). Segundo Kaldor, «0 estado-nacao teve uma vida curta», tornando-se evidente na titima parte do século XX que se tinha tornado «demasiado amplo para proteger as culturas», ‘«demasiado amplo para proporcionar um processo eficiente de tomada de decision, demasiado pequeno para impedir as guerras» (ibidem: 74-75). Foi sendo, entdo, subst tuido por aquilo a que a autora chama um «sistema de blocos, que assumiu as seguintes caracteristicas: identidade politica (...) fundada na pertenga nacional ao bloco, que, por set turmo, se haseava na ideolagia (isto é, um compromisso com a demacracia parlamen- tar e com o capitalismo no Ocidente ou com o socialismo no Leste)»; «uma cultura hori- zontal comum ligando as elites»; uma forma peculiar de moeda que «para o bloco oci- dental (..) era hegeménica»;¢ «forcas armadas» (...) «organizadas sob estrutras integra- das de comando» (ibidem: 75-76). Relativamente ao sistema de blocos», que foi também de curta duragéo, pergunta Kaldor: Em que sentido prefiguraram os blocos novas formas de estado? Eles nfo eram meras aliangas de estados-nagio. 0 sistema de blocos marcou um corte decisivo com o estado. -nagSo, pois @ nogZo de uma comunidade ideol6gica nao se baseava tanto numa comu- nidade fundada no teritério ou na cultura de uma comunidade, mas num universalismo 4 priori, se nao mesmo de facto, do bloco, na construgio de novas culturas horizontais de elites, na criagdo, em teoria, de uma moeda intemacional e, acima de tudo, nas limi- tagdes das forgas armadas nacionais. (Kaldor, 1995: 77) , para dar apenas estes exemplos. Pelo contrério, a associagio em torno de temas surge aqui sob formas hibridas de regulagao e de emancipagao. Nao 6 0 carécter «superior» (em termos éticos € politicos) do tema da identidade politica que o legitima como tal, mas, antes, 0 seu card ter de agregador de interesses e de vontades (uma «associagao voluntéria») que podem ser reclamados por parte dos cidadéos. Ora, estas reclamagdes nem sempre coincidern com as dos ideais ut6picos herdados do século XIX. Como sugere Kaldor, podem surgir também na reclamagao de livre circulagao de mercadorias e de medidas de padronizagao de produ- ‘tos ¢ modos de consumo em nome da gestao eficiente. A partida nao esta garantido 0 carécter emancipatorio ou regulatorio de quaisquer medidas politicas do ambito de qual- quer tema, Por exemplo, a normalizagao dos depdsitos de gua dos autoclismos pode ser vista como a intrusao dos burocratas de Bruxelas na mais intima zona dos nossos lares, ou 5: educagio na Buropa do conhecimento como uma racionalizagio dos gastos e controlo do desperdicio de agua. No sentido oposto, politicas desenhadas a partir de um tema assumido a partida como emancipatério, por exemplo a abertura ao piblico de zonas verdes como zonas de lazer, podem redundar no seu perverso oposto, a destruigio dessas mesmas zonas verdes, dando eventualmente origem a sua interdigao, 'No que diz respeito & dimensdo cultural referida por Kaldor, 0 questionamento do patriarcado, a afirmagio das diferencas de estilos de vida e a preocupacio «verde» surgem no como temas europeus, per se, mas com um forte potencial de agregacdo cultural da Europa. Os temas quer de identidade politica, quer de dimensao cultural sf0, como se sabe, 0 campo, por exceléncia, dos novos movimentos sociais que tém uma projecgao global. Ora, sendo a Europa também uma questio de identidade, uma questao de pertenca, seja 0 que for que tal possa significar, os «temas» parecem acabar por recusar & Europa aquilo que ela prépria, como diferenca em relagio aos outros espagos, necessita. Todavia, esta «ediferenga» € uma possibilidade de ser assumida como uma opsao dos estados-nago que dela pretendem fazer parte. Ao contrério das identidades e historias nacionais, tal como foram codificadas no ardente processo da construgdo do estado e da nagéo, a Buropa nko se pode dar ao luxo de discriminar particularismos marcadores de autenticidade. Bla deriva a sua legitim- dades de prineipios universalisticos e do futuro que projecta.F 0 futuro, ou a aspiracao por esse futuro, estio agora imbricados com os futuros dos outros, 0 que faz da Europa tua identidade mais ampla do que a pr6pria Europa. (Soysal, 2002: 62) Esta op¢ao por «fazer parte» surge como uma reconfiguracao do préprio estado-nacao, sobretudo no que concerne a sua soberania. A participagao através de temas como o Euro cu. defesa do ambiente tem como contrapartida oferecer uma part da sua soberania para 0 desenvolvimento do préprio tema, como é sugerido pelos princfpios da concessao, da suisidariedade e da proporcionalidade insertos na Proposta da Constituigao para a Europa (2003, ver art. 9.°). Por exemplo, prescindindo da utilizagao de dadas formas de energia se tal for compensador em termos a realizagio do tema da preservagio do meio ambiente. £ no aparente paradoxo entre o carécter universalista das perspectivas «tematicas» eo cardcter «local» da Europa, eentre a dimensio da identidade politica ea dimensio cultu- ral dos temas, que esta poderd potencialmente afirmar-se, por um lado, através da recon- figuragdo da sua politica interna e externa, isto é, nfo assumindo uma acgio politica com base no modelo dos blocos, pois, para falar como Habermas, a UE dificilmente poder ter como objectivo principal a confrontagio com o poder econémico americano ou outro, que a tornaria particularista (1999: 58); por outro lado, com a participagao do estado-nagao no tema podem ser desencadeadas dinémicas que conduzam & sua prépria reterrtoralizagéo. Dado que 0s territéros so simultaneamente reais evrtuais,€ possvel enecessiio repen- sar as diferentes polticas (quer as da diferenga, quer as da redistribuigéo) com base no 6 n0s «novos territérios» (local, regional, supranacional) ~a Europa, por exemplo ~ mas & rede (cf..0 processo de criagSo das European Networks), Esta perspectiva sobre a Europa fundada no conhecimento como factor central de pro- dugdo e na circulagao da informacdo, processos estes fortemente desterritorializados, ofe- rece, apesar do seu desgaste pela retérica politica, amplas possibilidades. No ambito das politicas educativas, por exemplo, esta centralidade tornou-se particularmente evidente, reconfigurando, mesmo, como argumentémos no Capitulo 2, 0 mandato politico para a (3 A Diferenga Somos Nose educagao, Todavia, pode defender-se que essas possibilidades em vez de terem sido explo- radas através das implicagbes da reconfiguragéo do capitalismo onde o conhecimento assume, como jé se disse, um lugar central no processo produtivo, 0 que tem acontecido €a conceptualizacao da rede como uma espécie de «lugar branco», ponto de consenso € convergéncia de tudo e de todos. Ser europeu, ser cidadio deste tipo de estado, pode, efec- tivamente, significar mais do que um mero reescalonamento da cidadania atribufda pelos estados nacionais. E por isso que nos parece fazer sentido a utilizagdo da metéfora do bazar para pers- pectivar a Europa. A Europa, como rede, j6 0 dissemos, corresponde & emergéncia de uma nova forma de regulagio que congrega os contributos das trés perspectivas para a concep- tualizagao da Europa. A metéfora do bazar possui fortes implicagdes que derivam da sua propria definigao especifica (ver acima). Estas implicagdes centram-se essencialmente em torno da questao da relacdo entre a justica redistributiva e a justica baseada no reconhe- cimento da diferenca ¢ da questao da reconfiguragao da cidadania, isto, da transigio da « privilegiada como actor cen- tral do novo espaco politico’; 2.a sua realizagao politica, como acima enfatizamos, é de geometia variavel, quer dizer, rna medida em que depende da relagio entre aquilo que é consensual e aquilo que é, eventualmente, da ordem do arbitréro, a sua configuragao & sempre frig (veja-se © exemplo do uso e abuso dos crtérios de convergéncia de gestiofinanceira por esta- dos-membro mais poderosos) ¢ renegocisve; 3.0 bazar nao se configura como uma estrutura ossficada, ou tendendo para a fixagio de harmonias,trata-s, antes, de processos continuos,instaveis, conflituais, em que a negociagSo, 0 consenso através do dissenso e vice-versa, ocuparao sempre um lugar politico central (8) Este aspecto € pleno de consequénetas para o campo da educagio, Devido ao facto desta estar pro aressivamente a escapar 8 2csH0 educativa do estado, para se transferir para 0 imbito da «formagio» e do ambiente do mercado, o desafio que se coloca ao estado em rede ¢ 0 de como tomar a posicionar-se no campo educativo, Eventualmente,fi-lo-é assurnindo a promogio da weducagSo a0 longo da vida» em con- trapeso a wformagao continua», A Buropa como tum bazar: educaso na Europa do conhecimento Terminamos este capitulo sublinhando uma duivida: seré que a Europa como bazar tem a potencialidade de desempenhar as fungdes que a Buropa das banderas, da associagao em torno de temas ¢ da rede parece desempenhar de uma forma eficaz? Sera que € capaz.de desenvolver, no ambito da sua prépria especificidade enquanto metéfora politica, o senti- ‘mento de pertenca da primeira, de promover 0 cosmopolitismo universalist da segunda, € as formas de produgao capazes de sustentar estilos de vida diversificados e a potencial sofisticacao da terceira? Obviamente que nao ha uma resposta fil a estas questdes, mas a ideia do bazar parece trazer para a ribalta da discussao uma preocupagao com formas de cidadania ligadas a0 local, mas de dimensio global, fundadas em discursos na primeira pessoa do singular e do plural (a cacofonia do bazar pode nao ser sinénimo de confusio, mas expressio de diferencas) e de formas de convivéncia estruturadas com base nas pré- prias diferencas. Nesse sentido, o bazar como metéfora politica para a construgao da Europa parece incorporar as diferentes metaforas, mediando as suas legitimas especific- dades sem as destruir em qualquer sintese superadora 0 tema deste livro corresponde a um esforgo para repensar as «politicas da diferenca» a luz das mudancas promovidas pelas chamadas Sociedade e Economia do Conhecimento. Estas mudancas esto ligadas & redefinicdo dos paradigmas do conhecimento, das relagdes sociais, da gestdo politica e da governacao, assim como da afirmagao das identidades muito para além do tipo das identidades nacionais. Colocamo-nos sob a égide do conceito de dife- renga e da preocupagio da politica enquanto forma de gerir, através da utilizagao do saber- -poder, as relagdes socias e as reivindicagoes que provém de novas formas de exercicio da cidadania A configuracio das polticas de redistribuigio nos diferentes sectores (satide, habita- fo, educagio, etc.) tem-se vindo a confrontar com reivindicagdes e com mandatos que complexificam exponencialmente a gestdo politica da redistribuigio, Nao se trata de dizer que estio esgotadas as tradicionais politicas sociais fundadas na consecuséo dos objectivos da igualdade, mas de enfatizar que essa perspectiva tem de abarcar outros aspectos que estdo para além, e para aquém, do desejo de igualdade econémica, Tudo se parece passar como se 0 desejo politico de igualdade se visse filtrado por um conjunto de condigdes que reformulam esse desfgnio: «trata-me como igual, mas deixa-me ser quem sout Este livro representa 0 nosso contributo para o repensar da igualdade num contexto em que a definigio da cidadania se faz crescentemente a partir daquilo que, em termos individuais e grupais, nos distingue dos outros concidadios. A situac3o surge como algo paradoxal: ao mesmo tempo que as reivindicagBes de maior justiga redstributiva erescem em quantidade, a assungio das diferencas de tipo cultural surge como organizador, quali- tativo, da prépria cidadania, Ao longo deste livro, procurmos identificar as teias com que este paradoxo se tem vindo a tecer. Neste sentido, ele é um contributo para repensar as politicas sociais em geral e as da educacao em particular, Alig, inicialmente, o nosso pro- jecto foi o de escrever a sintese das nossas investigacdes sob o titulo Unthinking Educa- tion, 0 que, a ser traduzido para portugues, seria qualquer coisa como «Desconstruir a 13

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