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A Economia do Subdesenvolvimento Coletiinea de artigos ¢ estudos, selecionados e organizados A. N. AGARWALA S. P. SINGH bs 3X FORENSE Rio be Jaxtuto - $i0 PavLo Primeira ediedo: 1969 ‘Teaduzido de: THE ECONOMICS OF UNDERDEVELOPMENT Sas, 330. Oxford University Press — New York Eclo Copyright © 1953, by a OXFORD UNIVERSITY PRESS Tombs 020, 230 Pre. ee Wn ‘aannn6747 tradugto q de ‘Manta Ceuiva WiateLy org Data Revisdo técnica ‘ de ANTONIO Barnos pe CasTao Reservados os direitos de propriedade desta tradugdo pela COMPANHIA EDITORA FORENSE Av, Brasmo Brags, 299 - 1.9 e 29 and, - Rio de Janeiro Largo de S. Francisco, 20 - loja - Sio Paulo Impresso no Brasil Printed in Brazil Plano da Obra IvtRODUGKO 1, ABORDAGENS DO PROBLEMA DO SUBDESENVOLVIMENTO ‘A Economia do Desenvolvimento — Iacob Viner... 17 ‘A Expansio Demogritica ¢ 0s Padres de Vida — Colin Clark 40 © Problema do Desenvolvimento Econémico Limitado — Gerald M, Meier ..... see 62 Feonomia Politica do Subdeseavolvimento — Paul A. Baran 83 ‘Uma Interpretagio do Atraso Econémico — H. Myint ...-..2... 99 2. © CONTEXTO HISTORICO Os Paises Subdesenvolvides e a Fase Pré-Industrial nos Paises Avan- ados — Simon Kuznets 1a ‘A Decolagem para 0 Desenvolvimento Avto-Sustentado — W. W. Rostow aoa aay 159) PROBLEMAS DE INDUSTRIALIZACAO DA EUROPA ORIENTAL E SUL-ORIENTAL * P. N. Rosensrein-Ropay “QUERIA COMPRAR UM OvO, POR FAVOR”, DISSE ELA TIMMAMENTE. “Qual o prego?” “Um custa cinco pence ¢ dois custam dois perce” respondeu o carneiro, “Entio, dois so mais baratos que um?” disse Alice, surprésa, enquanto abria sua cartein. “E, s6 que se voc’ comprar dois terd de comer ambos”, disse © carneiro, “Entio leva rei um, por favor”, disse Alice, colocando 0 dinheiro sdbre 0 baleio. | Alice pensara consigo mesma: “Pode ser que nio estejam bem fres- eos.” Lewis Carroit, No pais dos espelhor) ‘TeM-sE ADMITIDO GERALMENTE que a industrializacio! de areas de- primidas como a Europa Oriental e Sul-Oriental (ow 0 Extremo Orien- * Publicado em The Economic Journal, junho-setembro de 1943. Re- produzido com a permissio da Royal Economie Society ¢ do autor. Bste artigo esté meluido no relatério do Economie Group of the Committee fon Reconstruction, Royal Institute of International Affairs. 1 A industrializaedo désses paises poderia ser considerada por alguns como um eapitulo de sua reconstrucio agraria, enquanto outros podersio tratar da meihoria da produggo agricola como um capitulo da industria lizagdo. O que importa é lombrar que as duas tarefas so partes interli- gadas de um mesmo problema. 252 A ECONOMIA DO SUBDESENVOLVIMENTO te) interessa, de modo geral, nao s6 a ésses paises como também ao mundo como um todo. Eo meio para que se alcance distribuicao de renda mais cqiiitativa entre diferentes areas do mundo através de elevago da renda nas regides deprimidas, a uma taxa mais alta do que a das regides ricas. As hipsteses no caso em estudo so as se guintes: existe “excesso de populacdo agrdria” na Europa Oriental € na Sul-Oriental que corresponde a 20-25 milhdes de habitantes para uma populacio total de 100-110 milhdes, ou seja, cerca de 25% da populacao encontra-se total ou parcialmente (“desemprégo disfarga- do”) desocupada. © desperdicio de mao-de-obra_nio esti de modo algum limitado aos ricos paises industrializados. E considerivelmente maior nos paises agricolas pobres. Para que 0s principios da divisio internacional do trabalho f6ssem aplicados, seria necessadrio, ou que & mio-dle-obra fésse encaminhada ao capital (emigragio), ou que 0 ca- se levado & mio-de-obra (industrializagio). Do ponto de vista izagdo da renda mundial, a diferenga entre estas duas alter~ nativas é apenas de custos de transportes ¢ pode ser considerada insig- nificante. Nao obstante, a emigracao e colonizacdo apresentam tantas Gificuldades nas reas de imigracdo (e emigracio), que nao podem ser consideradas possiveis em larga escala. Em sua maior parte 0 proble- ma tera de ser resolvido pela industrializagao. Para que as emprésas industriais alcancem o seu “tamanho étimo” tomna-se necessirio que a area de industrializagio seja suficientemente ampla. Este fato, bem como a possibilidade de diminuicio do risco ‘marginal do investimento, obrigam que se tenha em vista uma unidade econdmica compreendendo t6da a drea situada entre a Alemanha, Riissia ¢ Iidlia, Ainda que extensa em térmos de quildmetros quadra~ dos ou populagao, esta regiao no é tao grande em térmos de produgao total. A renda nacional total dessa unidade econémica atinge 2 bilhdes de libras esterlinas, isto & 40% da renda da Gra-Bretanha Existem duns maneiras fundamentalmente diferentes para a indus- trializagio dessa area 1. A Europa Oriental ¢ Sul-Oriental poderiam desenvolver-se, por sua prépria conta, seguindo o “modelo russo” (com 0 que nd {queremos dizer comunismo), objetivando a auto-suficiéncia © sem in- vestimento internacional. Isto implicaria a construcio de todos os tipos de indistria: industria pesada, inddstria de equipamentos, bem como indiistria leve, tendo como resultado final um sistema econdmi- co estruturado como emprésa industrial integrada verticalmente. Essa modalidade apresenta algumas graves desvantagens: a) a econo- INDUSTRIALIZACAO DA EUROPA ORIENTAL E SULORIENTAL 253 mia s6 pode crescer lentamente, porque 0 capital tem de ser suprido por fonies expensas dos padroes de vida e de consumo que ja se encontram a baixo nivel, Dai implicar um sacrificio pesa- do e, na nossa opinido, desnecessario; b) a adocao désse processo evara, finalmente, visto que existem recursos naturais adequados na iagfio de uma unidade independente na economia mundial, implicando redugio da divisio internacional do trabalho; isto & 1a produgio do mundo como um todo seria menor do que poderia ser, © mundo seria mais pobre em bens materiais; ¢) a diferenca na es- trotura econémica mundial é vista mais claramente no caso da indkis- tria pesada. A construcdo de indistrias pesadas na Europa Oriental Sul-Oriental, a custa de grandes sacrificios, virie aumentar 0 excesso da capacidade mundial das indistrias pesadas e constituiria, do ponto de vista da economia mundial, grande desperdicio de recursos. 2. A segunda alternativa de industrializagao teria como objetivo ajustar a Europa Oriental ¢ Sul-Oriental na economia mundial, © que preservaria as vantagens da divisio internacional do trabalho, produ- vindo, portanto, finalmente, mais riqueza para tedos. Fla seria basea~ a em substanciais investimentos internacionais ou empréstimos de ca- pital. Esta alternativa apresenta diversas vantagens: a) permitiria progresso mais rpido ¢ com menor sacrificio dos niveis de consumo da regiéo, Do ponto de vista da estabilidade politica internacional, faria grande diferenga se 50% da populagdo agréria excedente da Europa Oriental c Sul-Oriental estivessem lucratamente empregados dez anos apés a guerra do que, digamos, 20% ; b) 0s sadios principios a divisio internacional do trabalho postulam tenicas intensivas de mio-de-obra, isto 6, indistrias leves, para as regides subdesenvolvidass ) mesmo ma hipdtese de uma expansio da ecoromia mundial, as in= diistr’ s pesadas existentes nos Estados Unidos, Gri-Bretanha, Alema- nha, ranga e Suiga, poderiam certamente suprir tOdas as necessidades das reas internacionais deprimidas, E claro que esta forma de industrializagdo € muito preferivel & autérquica. E um grande empreendimento, quase sem_precedentes histérieos, Ndo h nenhuma analogia com 0 processo de industrializa- gio do inicio do século XIX, por uma série de razdes que podem ser brevemente mencionadas, antes de examinadas em maior detalhe: a) 0 investimento internacional no século XIX era, em grande parte, liqui- dado automiticamente, visto basear-se na troca de produtos agricolas ¢ industriais. Atualmente, jé nao & mais possivel esperar que essa Tk “automitica”, embora o problema possa ser resolvido, 254 A ECONOMIA DO SUBDESENVOLVIMENTO desde que adequadamente planejado; b) as instituicdes de investime to internacional existentes (langamento de ages. © empréstimos) sto inadequadas para a tarefa de industrializagio de téda uma regio, Lidam elas com unidades muito pequenas € mio se aproveitam das economias externas. O capital se dirige geralmente para as emprésas isoladas. Nunea houve esquema de industrializagio plancjada, con preendendo 0 plancjamento simultineo de diversas indistrias com- plementares, 0 que & parte do nosso plano para a Europa Oriental ¢ Sul-Oriental; ¢) 0 progresso técnico foi a principal {orca propulsora, no século XIX. A industrializagao das areas internacionais deprimidas, a0 contririo, implica 0 emprégo de um conhecimento téenico dado; d) © aumento dos custos fixos e das inversbes de capital, desde 0 sé- culo XIX, tem aumentado 0 risco de perda do capital e diminuido a mobilidade dos recursos ¢ a flexibilidade do sistema econdmico. E fz crescer enormemente 0 tamanho médio das emprésas; ¢) 05 riscos politicos de investimento internacional so muito maiores hoje do que © eram no século XIX, quando se supunha que certas coisas “nio se fazem”. A supervisio e a garantia do Estado podem, portanto, reduzir substancialmente 0s riscos e, por ésse motivo, representam conditio sine qua non para o investimento internacional em escala bastante ampla. A participagao ativa do Estado na vida econémica ¢ fator que precisa ser Ievado em consideracao, como um dado novo; {) 0s individuos (mesmo os europeus orientais!) nao stio hoje resistentes como o cram antigamente. A consciéncia social nao suportaria, em tempo de paz, tanta miséria quanto se admitia no darwinista século XIX. Métodos mais suaves precisam ser utilizados. Para uma bem sucedida industrializacdo das dreas internacionais deprimidas torna-se necessirio um ambiente institucional diferente do atual. Nos pardgrafos que se seguem apresentamos arguments que visam a demonstrat por que 0 conjunto industrial a ser criado deve ser tratado e planejado como grande emprésa ou truste © primeiro passo para a industrializacdo sera treinar e “hal tar” mio-de-obra, o que significa transformar os camponeses da Euro- pa Oriental em operarios industriais, de tempo integral ou parcial. O automatismo do laissez-faire nunca funcionou adequadamente nesse campo. E nao funcionou porque nao € lucrative para um empreséi privado fazer inversGes no treinamento da mdo-de-obra. Nao ha hi- potecas sébre operdrios eo empresério que investir no treinamento de pessoal pode perder seu capital se os operdrios contratarem empt go com outra cmprésa, Embora éste treinamento no seja boa aplicagio de capital para a emprésa privada, € 0 melhor tipo de INDUSTRIALIZACAO DA EUROPA ORIENTAL E SUL-ORIENTAL 255 investimento para o Estado. & também bom investimento para 0 conjunto de industrias a ser ctiado, quando consideradas como um todo, ainda que possa representar custos itrecuperiveis para uma uni~ dade. menor. Isto constitui importante exemplo da divergéncia pi- gouviana entre “o produto marginal liquido social € privado” em que © primeiro é superior ao tiltimo. As facilidades de treinamento (in- ‘elusive transporte ¢ habitacto) para um milhdo de operitios por ao, implicatiam certamente custos superiores a 100 milhocs de libras esterlinas anuais — importincia que pod> ser excessiva para ser cusicada pelo Estado (ou pela economia nacional da Europa Oriental) se considerada separadamente dos custos da participacdo correspon- dente a 50% no Truste Industrial da Europa Oriental,? cuja criagio Proporemos, Deveria scr contabilizado como investimento de capital no Truste Industrial da Europa Oriental (T.LE.O.). Esta nio é, contudo, a raziio mais importante a favor de uma ampla unidade de investimento. A complementagio das diferentes inddstrias constitui o mais im- ortante argumento a favor da industrializagao planejada em larga scala, Para dar uma idéia sObre a natureza dos problemas envolvidos, adotemos um método um tanto indireto para analisar dois exemplos. ‘Admitamos que 20.000 trabalhadores desempregados da Europa Oriental so retirados do campo ¢ transferidos para uma grande £4- brica de sapatos. Eles recebem salérios corsideravelmente superiores a escassa renda in natura de que dispunham antetiormente, Seria im- possivel colocé-los na indiistria com seus anteriores padres de renda porque éles necessitardo agora de mais alimentos do que quando esta- vam semi-ocupados no campo, porque ésses alimentos tem que ser transportados para as cidades € porque cs trabalhadores tém que pagar aluguéis. Se ésses trabalhadores gastassem todo seu sabirio em sapatos, surgiria um mercado para os produtos de sua emprésa, re- presentando uma expansio que nao perturbaria 0 mercado preexis- fente ¢, assim, 90% do problema (admitindo 10% de lucros) esta~ riam resolvidos. A dificuldade é que os trabalhadores nfo gastardo todo © seu sakirio na compra de sapatos. Se, ao contrério, um milhGo Ge trabalhadores desempregados fossem retirados do campo e coloca- dos, no em uma indistria, mas em téda uma série de indiistrias que 2 © nome € provisérlo, usado a falta de um melhor. Devera ser alte rado para evitar assaciagdes desagradaveis com o térmo truste. Poderia ser usad Corporagao Industrial ou Companhia Holding da Europa Ocidental 256 A ECONOMIA DO SUBD! VOLVIMENTO Froduziriam o grosso dos produtos em cuja compra os trabalhadores gastariam seus saldrios, 0 que nao era verdadeito no caso de uma fa- brica de sapatos seria verdadeiro no caso de todo um sistema de in- Giisirias: seria criado © seu préprio mercado adicional, realizando-se assim uma expansio da produco mundial com um minimo de pet- turbacdo do mercado mundial. As indiistrias que produziriam 0 grosso dos bens a serem adquiridos com salirios poderiam set chamadas, Portanto, de complementares. A criagdo planejada de um sistema de industrias complementares désse tipo reduziria 0 risco de insuficiéncia da procura ¢, visto que o risco pode ser considerado um custo, redu- ziria os custos. E nesse sentido um caso especial de “economias externas”, Pode-se ainda dizer que, enquanto nos pa desenvolvidos, dadas as suas mais variadas necessidades, € dificil esti- mar a demanda previsivel da populacao, isto nao ocorre nas regides de baixo padrao de vida, onde nao é tao dificil prever em que merca- dorias os trabalhadores’ anteriormente desempregados gastardo seus salérios. Dois outros tipos de “economias externas” poderdo também sur- gir quando um sistema de diversas indistrias € criado, Em primeiro Juger, as economias estritamente marshallianas, externas a uma em- présa, no conjunto de um ramo industrial em crescimento. O mesmo corre, entretanto (secundariamente), com as economias externas de que dispoe um ramo de indistria devido ao erescimento de outros ramos. Supde-se, de modo geral, tacitamente, que a divergéncia entre © “produto marginal liquido social e privado” nao € muito considerd- vel. Esta hip6tese pode ser muito otimista, mesmo no caso de um sis- tema cristalizado de economia madura do tipo competitivo. Certamente nao € verdadeiro no caso de fundamentais mudancas de estrutura nas reas internacionais deprimidas. Nesse caso, as economias externas podem ser da mesma ordem de magnitude que os luctos que aparecem na conta de lucros ¢ perdas da emprésa, As atuais instituigdes de investimento nacionais ¢ internacionais no tiram vantagens das economias externas. Dados seus padroes de comportamento nao ha nenhum incentivo para investimentos que s30 ucrativos em térmos de “produto marginal liquido social” mas que no parecem lucrativos em térmos de “produto marginal liquido privado”. A principal férea propulsora do investimento & a expectativa de Iucro do empreséirio individual, que se baseia na experigncia do pasado. No entanto, essa experiéneia do passado parcialmente irrelevante quan- INDUSTRIALIZACAO DA EUROPA ORIENTAL E SUL-ORIENTAL 257 do se trata de transformar téda a estrutura econdmica de uma regitio. © conhecimento do empresirio individual s6bre 0 mercado pode ser insuficiente neste caso, porque éle nio pode ter todos os dados de que poderia dispor © Conselho de Planejamento de um T.LE.O. Sua esti- mativa de risco subjetivo pode ser considerivelmente superior ao risco objetivo. Se a industrializagao das areas intemacionais deprimidas ti- vvesse que depender inteiramente do incentivo normal dos empresatios privados, 0 processo seria nao sSmente muito mais lento, a taxa de investimento mais baixa e (conseqiientemente) menor a renda nacio- ral, como também toda a estrutura ccondmica da regiao resultaria di- frente. O investimento seria distribuido em proporedes diferentes entre as diversas indkistrias e 0 equilibrio final estaria abaixo do stimo que poderia ser alcangado por um grande T.1.E.O. No mercado internacio- nal de capitais 2s instituigdes existentes sio utilizadas, principalmente, para investir ou conceder créditos em favor de emprésas individuais. Pode perfeitamente acontecer que determinada emprésa nao seja suficientemente lucrativa para garantir 0 pagemento de juros ou divi- dendos compensadores, retirados dos seus préprios Iucros. Mas a cria- io de tal emprésa, uma companhia de energia elétrica, por exemplo, pode criar novas oportunidades de investimento © lucros em outras emprésas, como, por exemplo, numa indistria de equipamentos elétri- cos. Se criarmos uma unidade de investimento suficientemente grande, incluindo t6das as novas indiistrias da regido, as economias externas se converterfio em lucros internos, em fungio dos quais os dividendos devidos poderdo ser facilmente pagos. célebre exemplo do Professor Allyn Young esclarece 0 nosso problema. Supunha éle que se deveria construir um ramal subterranco de trem em um distrito, a_partit de cuidadosa estimativa de custos e reccitas. Verificou-se, entio, que a taxa de lucros estaria abaixo da taxa normal de retro de outros investimentes alternativos. Coneluiu- se que 0 projeto nao era rentavel, sendo 0 mesmo abandonado. Uma utra emprésa comprou as terras'e casas situadas a0 longo do ramal proposto e pode, assim, construir a linha. Embora as receitas do tré- fego de passageiros no proporcionassem taxa de lucro satisfatria, a valorizagao das casas ¢ terras mais do que compensou a deficién- cia, Assim, 0 projeto foi realizado e © ramal, construfdo. O pro- blema consiste no seguinte: seré desejavel, isto é, levaré a uma otima alocagao de recursos e maximizacio de renda nacional, que se esta forma de ganho de capital (economia extema) como um mais no calculo da rentabilidade? Allyn Young da a entender que no 258 A ECONOMIA DO SUBDESENVOLVIMENTO. € desejavel porque a valorizacio de capital das casas ¢ terras, devido 20 influxo de populago de outros bairros, tem uma contrapartida nio- compensada na depreciagao de casas ¢ terras das zonas de onde pro- vém essa populacio. As terras agricolas da Europa Oriental e Sul- Oriental, contudo, ndo se depreciariam quando 0 excesso de popula- cdo agréria fésse dali retirado. Neste caso, as economias externas de- veriam ser ineluidas no eéleulo de rentabilidade. AS economias externas sio geralmente_referidas como argue mento a favor de outro tipo de industrializaga0. O investimento na- ional ¢ internacional deveria concentrar-se, de inicio, na construgio le “indiistrias bisicas” ¢ servicos piiblicos que fazem surgit nov: oportunidades de investimentos. “Devem ser constru‘da ferro, rodovias, canais, usinas hidrelétricas ¢ o resto se seguira automi- ticamente.” Onde a escassez de transporte constitui obsticulo evi- dente para o progresso econdmico como, por exemplo, na China € em algumas partes da América Latina, éste pode ser, na realidade, ‘© melhor coméco para © programa de investimento. A situacao &, no entanto, diferente na Europa Oriental ¢ Sul-Oriental. Nao ha at defi- jéncias désse tipo no setor de estradas de ferro. A quilometragem de linhas ferrovidrias por milhio de libras esterlinas de renda nacional & muito maior do que no Extremo Oriente, Faz-se necessiria‘uma visio geral da estrutura econémica futura a fim de saber onde, quantas ¢ Para que construir novos meios de comunicacoes. Além do mais, a natureza de “ind@strias bisicas” nao se restringe a alguns servigos p blicos. Ja vi mo a complementacdo torna tédas as indistrias até certo ponto “basicas”. Se houver suficiente capital (nacional e internacional) disponivel para investimento em “indistrias basicas”, 0 efeito multiplicador nor- aturalmente” a uma erescente industrializagao, de acdrdo com os que advogam ésse tipo de programa. O argumento presume, contudo, © funcionamento regular do mecanismo de equilibrio do bs Tango de pagamentos e dos movimentos de capital, 0 que ndo é pro- vavel que ocorra na situacto de desequilfbrio estrutural do pés-guerra, A industrializacao das dreas imernacionais deprimidas, uma vez reali- zada, pode criar determinado equilibrio, a partir do qual os incen- tivos. privados normais funcionariam com éxito. Mas parece pouco promissor confiar nesses incentivos, antes que tal ponto seja atingido, ‘A maioria dos paises do mundo vem empreendendo programas de di senvolvimento ou ird executd-los apds a guerra, & base de bens de ca importados — locomotivas, ago, tratores, escavadeiras, mistura~ INDUSTRIALIZAGAO DA EUROPA ORIENTAL E SUL-ORIENTAL 259 dores de cimento, turbinas. Em alguns casos, possuem ésses paises a vos em moeda estrangeira que podem ser utilizados na compra désse equipamento, Na maioria dos casos, contudo, sdmente poderao adq) rir ésses bens através da reducdo de importagdes de bens de con- sumo € aumento da exportacéo, a fim de obter saldo positive na balanga comercial, ou através de empréstimos. Os investidores priva- dos, depois das experiéncias dos Gltimos quinze anos, provivelmente io estarao dispostos a conceder empréstimos de valor considerdvel ¢ a taxas de juros suficientemente baixas para permitir que o desenvol- vimento dos paises devedores possa ter inicio de modo satisfatério. A Iternativa para os governos dos paises credoris € garantir os emprés- mos ou emprestar os recursos éles prop ‘A disponibilidade de recursos em moedas estrangeiras, a assisténcia técnica do exterior e os equipamentos estrangeiros transformario, no entanto, o desenvolvi- mento nacional em processo que representard contribuicao importante & expansao da renda mundial e & reorganizazio do comércio inte nacional, em vez de um processo que ameacaria perturbar as relagdes ‘econdmicas internacionais.* Os governos dos paises credores nao garantirao os empréstimos ou investimentos a menos que se sintam seguros em relac3o aos ser gos de juros ¢ dividendos. Se ésses governos tiverem suficiente contrile Sobre 0 T.LE.O. poderio dar essa garantia sem custos ou riscos pari les proprios, dado que os riscos reais de t6da a emprésa sao muito menores do que os riscos relatives as partes do conjunto, Mas, embora © investimento seja *justificével” na Europa Oriental, isso nao signi ca que éle seja necessariamente autoliquidavel. A amortizacao tera que ser planejada — isto é, uma parte das indastrias criadas nessa regiao tera que ser de exportacdo. O fluxo de exportayoes tera que ser dirig do para os paises credores. Essas exportacdes representardo principal parte da contribuicao dos paises ricos para a expansao mundial. A ¢o- Jocagio dessas exportagoes tem que ser prevista e planejada de modo a minimizar o énus dos ajustes necessdrios na consignagao de recur- sos econémicos dos paises credores. A Europa Oriental e Sul-Oriental deixar, provivelmente, de ser exportadora de cereais, passando a exporiar produtos alimentares elaborados ¢ artigos de indiistrias leves. © comércio internacional do século XIX funcionow com maior ou menor intensidade devido ao fato de que todos os paises tinham alta elusticidade-renda para a demanda de importagoes. Levando- ® International Development Loans, Planning Pamphlets, National Planning Association, n® 13, pag. 14, Nova York, 1942. 260 ‘A ECONOMIA DO SUBDESENVOLVIMENTO se em consideragio os altos padres de vida dos paises ricos do século XX, essa clasticidade-renda da demanda de importacoes pode ser infe- ior, Talvez exista apenas um bem cuja elasticidade-renda continua alta: 0 écio — que niio requer importagoes de bens materiais. Conse- iientemente, os paises ricos podem ter que accitar que a sua participa- ‘gio na cxpansio econémica seja, em parte, sob a forma de mais dcio. Podem éles ter uma semana de 40 ou 35 horas de trabalho, enquanto 2 Europa Oriental mantém uma semana de 48 horas. ‘A nossa atengio se volta nesse estudo mais para aquilo que de- varia ser feito do que como deveria ser feito, A implementagao insti- tucional désse programa tem que ser deixada para outra acasiao. Scus pprincipais itens seriam: que pelo menos 50% do capital necessirio fossem supridos internamente. Divididos os paises em dois grupos — “devedores” ¢ “credores” — cada grupo deveria adquirir 50% das agbes de um truste formado por t6das as indiistrias criadas na regio, ‘Ambos 0s grupos planejariam ¢ atuariam como se féssem sécios de uma emprésa comercial, com representantes do govérno no Conselho. Os paises credores adquiriam agoes do truste, reembolsaveis no prazo de 20 anos, ¢ a 10% acima da paridade, se tivesse sido mantido no passado um dividendo médio de, pelo menos, 4,5%. Um dividendo médio de 3% seria garantido pelos governos para as ages subscritas nos seus paises. Os investimentos privados que exigissem créditos do exterior deveriam ficar sujeitos a Ticenca governamental. As agdcs po- deriam ser adquiridas através de contribuigdes in natura: por exem- plo, a construcio de fiibricas subsidifrias. Garantias contra politicas tributérias discriminatérias seriam obtidas das autoridades da Europa Oriental objetivo da industrializacio das dreas internacionais deprimidas € produzir equilibrio estrutural na economia mundial, através da criacdo de emprégo produtivo para a populacao agréria excedente. Pode admitir-se que os paises ctedores nao estejam dispostos asst- mir compromissos por mais de dez anos, Que se pode aleangar neste perfodo © qual a ordem aproximada de magnitude das inversies de Capital necessirias? Deve ser criado emprégo industrial para a) 20 milhdes de po- pulagio agrdria excedente + 6) 7-8 mithdes = 40-50% do aumento da populacdo no decorrer do priximo decénio (admitindo-se que 50 a 60% serdo absorvidos pela agricultura) = 28 milhdes de pessoas 9 milhdes de populagio masculina ativa € 3 milhdes de populagio feminina ativa = 12 milhdes de trabalhadores. Admitindo-se que até INDUSTRIALIZAGAO DA EUROPA ORIENTAL E SUL-ORIENTAL 261 2 milhdes de trabalhadores possam ser empregados mediante a utiliza Gao da capacidade ociosa das indiistrias existentes, deve ser mobiliza- do capital para empregar 10 milhGes de trabalhadores adicionais. Visto que 0 capital disponivel ¢ escasso, predominarao industrias intensivas de mao-de-obra, ou seja, indistrias eves. De acordo com as estatisti- cas disponiveis, propde-se a seguinte classificacdo de indstrias: 1. in- diistrias leves — investimento per capita de 100-400 libras esterlinas; 2. indiistrias médias — investimento per capita de 400-800 libras es terlinas; 3. indastrias pesadas — investimento per capita de 800-1.500 Tiras esterlinas, Visto qus algumas indastrits pesadas nfo podem deixar de set construfdas, suj-onhamos que seja necessério um inves- timento per capita de 300-350 libras esterlinas, incluindo habitacio, comunicagies e servicos piiblicos. Isto imporia em 3.000 milhdes de Tibras esterlinas, 8s quais devem ser adicionados 1.800 milhdes para a ‘manutenc&o do capital velho e ndvo, durante éez anos, dando um total de 4.800 milhdes. A Europa Oriental tera que suprir, pelo menos, 50% — isto 6, 2.400 milhdes. Outros 1.200 milhdes serdo necessétios para a melhoria da agricultura e supomos que a maior parte teria que ser financiada por recursos internos,* donde se deduz. que a Europa Oriental e Sul-Oriental teria que suprir internamente recursos de ca- pital de 3.600 milhoes de libras esterlinas, entre 1946 © 1956, apro- ximadamente. Visto que a sua renda global é da ordem de 2.000 mi: Thées por ano, isto representaria uma taxa de investimento da ordem de 18% (igual A taxa da Russia). Mesmo se levarmos em considera- cdo um crescimento gradual da renda nacional, & provével que taxas, de poupanga comegando com um nivel de 8% ¢ chegando a 15%, no fim de dez. anos, sejam o méximo que se possa planejar. Admitindo-se que a renda nacional cres¢a anualmente ii razio de 4% © supondo-se uma taxa média de investimento de 12%, 0 capital suprido interna- mente chegaria a apenas 3.000 milhées de libras esterlinas. Parece, portanto, que mesmo um programa de industrializagto ousado © bas tante otimista nfo poder climinar todo o excedente populacional, na Proxima década, Na melhor das hipsteses, 70 a 80% dos trabalhado- es desempregados poderiam ter oportunidades de emprégo. Deduz-se que a emigracdo ainda tera que suplementar a industrializagio. Alm 4 Uma _pequena parte pode ser tomada de empréstimo no exterior, mas neste casa sob a forma de créditos a eurto prazo, 5° periodo imediato de transigao nos primeiros dois anos apés a guerra nao esta incluido nesses cilculos; assim, de fato, é um plano de 12 anos, € ndo de 10 anos, 262 ‘A ECONOMIA DO SUBDESENVOLVIMENTO disso, no entanto, as indenizagdes de guerra alemis, em forma de equipamento, poderdo suprir parte do capital do T.LE.O. As in- denizacdes de guerra em dinheiro aos ricos paises ocidentais criaram um problema na ultima guerra, Nenhuma diticuldade existird com as indenizagoes in natura em favor dos paises pobres. A Alemanha pode aumentar seu consumo acima dos padrdes do tempo de guerra ¢ Pagar reparacses in natura, representando 25 a 50% do que gastava antetiormente em armas, ALGUNS ASPECTOS INTERNACIONAIS DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO * Raonar Nurxse “Un pais E pobre porque é pobre.” Isto parece um lugar-comum, mas expressa as relagdes citculares que afligem tento a demanda quanto a oferta no problema da formagao de capital nas zonas econdmicamente atrasadas. Este artigo analisard alguns dos aspectos internacionais das dificuldades de ambos os lados. Abordara apenas alguns pontos, sem tentar apresentar de modo algum um quadro completo. A induco ao investimento € limitada pela dimensio do mercado. Isto foi, essencialmente, 0 que Allyn Young? concluiu em sua reinte pretagdo da famosa tese de Adam Smith. Que determina a dimensio do mercado? Nao é sdmente a demanda monetéria, nem o nimero de habitantes, nem a superficie fisica. As facilidades de transporte, as quais Adam Smith deu realce especial, so importantes; a reducio * Publicado em The American Beonomic Review, maio de 1933. R produzido com permissao da American Economie Association e da vid= va do autor 1" “Inereasing Returns and Economie Progress’, publicado em ‘The Eeo- nomie Journat, dezembro de 1928

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