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QUAESTIO XC DE ESSENTIA LEGIS in quatuor articulos divisa Consequenter considerandum est de principiis exterioribus actuum. Principium autem exterius ad malum inelinans est diabolus, de cuius tentatione in Primo dictum est. Principium autem exterius movens ad bonum est Deus, qui et nos instruit per legem, et iuvat per gratiam. Unde primo, de lege; secundo, de gratia dicendum est. Circa legem autem, primo oportet considerare de ipsa lege in communi; secundo, de partibus eius. Circa legem autem in communi tria occurrunt consideranda: Primo quidem, de essentia ipsius; secundo, de differentia legum; tertio, de effectibus legis Circa primum quaeruntar quatuor, Primo: utrum lex sit aliquid rationis. Secundo: de fine legi Tertio: de causa eius Quarto: de promulgatione ipsius. Arricurts 1 Utrum lex sit aliquid rationis AD PRIMUM SiC PRocepiTuR. Videtur quod lex nn sit aliquid rationis J. Dicit enim Apostolus, Rm 7,23: Video aliam em in membris meis, etc. Sed nihil quod est ra- is, est in membris: quia ratio non utitur organo orali. Ergo lex non est aliquid rationis. potentia, - Sed lex non est ipsa potentia Vicinho da ideia de “causa”, 0 termo “prine‘pi ja atividade, ¢ ao mesmo tempo 0 que permite ter dele um QUESTAO 90: A ESSENCIA DA Lid, ARTIGO 1 QUESTAO 90 A ESSENCIA DA LEL em quatro artigos Em seguida, devem-se considerar 0s princ#- pios exteriores dos atos. O principio, porém, que inclina exteriormente ao mal é © diabo, de cuja tentaco tratou-se na I Parte*. Jd o prinefpio que move exteriormente ao bem é Deus, que nos ins- trui pela Iei e ajuda pela graga. Donde, em pri- meiro lugar, se deve tratar da lei; em segundo da graga. A respeito da lei, primeiramente € preciso considerar a prépria lei em geral; depois, as partes dela. A respeito da lei em geral hé tés questties que se devem considerar: a primeira, a esséncia da lei; a segunda, a diferenga das leis; a terceira. os efeitos da lei. A respeito da primeira, fazem-se quatro perguntas: 1A lei é algo da raza 2. Qual é o fim da lei? 3. Qual é a causa da lei? 4. B da razao da lei sua promulgacio? Arico 1 Aleié algo da razao? QUANTO AO PRIMEIRO ARTIGO, ASSIM SE PROCEDE: parece que a lei nfio é algo da razio. 1. Com efeito, diz o Apéstolo na Carta aos Romanos: “Vejo outra lei em meus membros” etc. Ora, nada que é da razao esté nos membros, porque a razio niio usa de érgdo corporal. Logo, a lei no 6 algo da razio. 2. ALi pisso, no hd na razdo sendo poténcia, hdbito e ato. Ora, a lei nao é a propria poténcia da ” designa agui o que csté na origem, no ponto de partida de um ser ¢ conhecimento original. Definido acima (1, q. 33, a. 1) como lilo de que uma coisa procede de algum modo”, o principio pode situar-se seja no plano do conhecimento, seja no plano di dade exisiente, Nesse caso, © principio pode ser intrinseco, designando © que constitui o ser em questdo em sua estruture Tais prinefpios intrinsecos dos atos humanos séio iio outros que as faculdades (potentiae) do homem (I. q. 77 € ss.) habitus correspondentes (virtudes e vicios), como lembra acima o prélogo da questio 49, Aqui. trata-se dos principios 008 dos atos humanos, ou seja, aqueles que, sem confundirse com © ipam de sua aedo. Quando se trata de um sto imoral, isto é, ndividuo que age, por Ihe sere exteriores, afastando 0 sujeito de seu verdadeiro fim, € um espirito do diabo) tentando © solicitando a vontade. Quando se trata, porém, de um alo moralmente bom, e deve ser 0 easo normal, que guia © sustonta a aco, Essa intervencao divina, s im de adaptar-se a estnutura humana, diversifiea-se de acorde las faculdades especificas do homem, invocadas pela progressiio ética: para 0 conhecimento racional, é o papel da fa 0 exercicio da vontade, é © papel da graca vindo ajudar e aperfeigoar a natureza humana, Kemos de passagem a originalidade de Sto, Toms, situando 0 cstudo da graca no conjunto da moral fundamental (adian- 109-114), € no no que, mais tarde, se chamou teologia dogmatica, soparada de uma moral, daf em diante reduzida na Paric das vezes a uma mera casuistica, Sto. Tomas enuncia entio a divisio de seu tratado da lei: em primeiro lugar, as Hades comuns a todas as leis (esséncia, especies ¢ efeitos). e depois as ‘521 !as duas eiapas na hisiéria da salvagio. QUESTA 9: rationis. Similiter etiam non est aliquis habitus rationis: quia habitus rationis sunt virtutes intel- lectuales, de quibus supra’ dictum est. Nec etiam est actus rationis: quia cessante rationis actu, lex cessaret, puta in dormientibus, Ergo lex non est aliquid rationis. PrarTeReA, lex movet cos qui subiiciuntur legi, ad recte agendum. Sed movere ad agen- dum proprie pertinet ad voluntatem, ut patet ex praemissis*, Ergo lex non pertinet ad rationem, sed magis ad yoluntatem: secundum quod etiam lurisperitus dicit’: Quod placuit principi, legis habet vigorem. SED CoNTRA est quod ad legem pertinet prae- cipere et prohibere. Sed imperare est rationis, ut supra! habitum est. Ergo lex est aliquid rationis. RESPONDEO dicendum quod lex quaedam regula est et mensura actuum, secundum quam inducitur aliquis ad agendum, vel ab agendo retrahitur: dici- tur enim lex a ligando, quia obligat ad agendum. Regula autem et mensura humanorum actuum est ratio, quae est primum principium actuum huma- norum, ut ex praedictis® patet: rationis enim est ordinare ad finem, qui est primum principium in agendis, secundum Philosophum®. In unoquoque autem genere id quod est principium, est mensu- ra et regula illius generis: sicut unitas in genere et motus primus in genere motuum. Unde relinquitur quod lex sit aliquid pertinens ad rationem Ap priMuM ergo dicendum quod, cum lex sit regula quacdam et mensura, dicitur dupliciter esse in aliquo. Uno modo, sicut in mensurante et regulante. Et quia hoc est proprium rationis, ideo per hune modum lex est in ratione sola. — Alio modo, sicut in regulato ct mensurato. Et sie lex TV: De consti. principium, leg, 1 1, a. 1,ad 3, 6. Pls. 11, 9: 200, a, 22-24; Euh. VIL, 9: 1151, a, 16. ‘b, Devido & sua propria fungaio, a razao. Do mesmo modo também nao é algum habi- to da razio, pois os hébitos da razio so as virtudes intelectuais, das quais se tratou acima. Também nvio € um ato da raz20, pois ao cessar 0 ato da razao, a lei também cessaria, por exemplo nos que dormem. Logo, a lei no é algo da razio. 3. Apemais, a lei move aqueles que a ela estiio sujeitos para agir retamente. Ora, mover a agir pertence propriamente 4 vontade, como se evi. dencia do que foi preestabelecido. Logo. a lei nao pertence & raza, porém mais & vontade, segundo © que também afirma o Jurisconsulio: “O que foi do agrado do principe, tem vigor de lei”. EM SENTIDO CONTRARIO, pertence 4 lei o preceitu- ar ¢ 0 proibir. Ora, ordenar é da razao, como acima_ se sustentou. Logo, a lei é algo da razio. Responno. 4 lei é certa regra e medida dos atos, segundo a qual alguém € levado a agir, ou a apartar-se da ago’. Diz-se, com efeito, “lei” “do que deve ser ligado”, pois obriga a agir. A regra € a medida dos atos humanos é, com efeito, a azo, a qual € 0 primeiro prinefpio dos atos hu- manos, como se evidencia do que jé foi dito; cabe, com efeito, a razio ordenar ao fim, que € 0 pri- meiro princfpio do agir, segundo o Filésofo. Em cada género, com efeito, o que é principio é me- dida e regra desse género, como a unidade no género do niimero, ¢ 0 primeiro movimento no género dos movimentos. Daf resulta que a lei € algo que pertence a raziio. Quanto 40 1°, deve-se dizer, portanto, que, como a lei € certa regra e medida, diz-se que est em algo, de dois modos. De um, como no que mede e regra. E porque isso € proprio da razio, assim, por este modo, a lei estd apenas na ra- zio. — De outro modo, como no regulado © pode ser uma obra da raziio. Com efeito,chamado a crescer e desenvolver-se livremente terido em vista o seu fim (bem-aventuranga), 0 homem deve dispor de um meio que Ihe permita adaptar cada um de seus aos a esse objetivo que confere 4 esses mesmo atos o seu sentido. Ora, quem diz adaptagio entre meio e fim diz atividade racional. Com efeito, é priprio da razao estabelever uma tal relagio. Devido ao fato de que o objeto da inteligéncia humana (chamaca de azo em suia atividade discursiva), que & o conhecimento do universal e de sua percepco no interior das realidade concretas & particulares (processo de abstragaio), a raza humana pode estabelecer tum vinculo entre tim ato (ou um objeto desejado) € 0 ideal perscguide, Tal doutrina ndo passa de uma aplicacdo do espirito geral ta mioral tomisia, moral de cardter intrinseco e racional, bem distante do voluntarismo moderno. A-D. Sectillanges resumiu-a da seguinte forma: “A moral nfo € uma ordem vind de fora, nem mesmo do eéu; é a voz da razio, reconhecida como uma voz divina” (La philosophie morale de 8. Thomas d’Aguin Paris, Aubier, 1946, p. 135). Quanto 3 etimologia de Jen, se Sto. Tomas seguia a opiniio corrente dos juristas de sua época, hoje deriva-se a palavea ler da raiz indo-europeia lagh, que evoea a ideia de eolocar, estabelecer (Meillet) 522 Aa1, ALGO 2 n Wexuliqua | medido, E assim a lei est em tudo que se inelina elinatio"ptoveniens'ex | a algo em razio de alguma lei; dessa forma qual- ex, non essentialiter, sed | quer Inelinaeao proveniente de alguma lei pode Bi hoc modo inclinatio ipsa | ser dita Ici, nfo essencial, mas por participacaio. ad Concupiscendum fex membrorum | E desse modo a inelinag&o dos membros a con- Baler cupiscéncia se chama lei dos membros, Quanto A0 2°, deve-se dizer que, como ocorre os atos exteriores, cumpre considerar a agio © a obra. por exemplo, a edificacio e 0 edi icio; nis! est considerare Ipsum actum | assim, nas obras da raza, cumpre considerar 9 ©6t intelligere et ratiocinari, et aliquid Proprio ato da razo, 0 entender e 0 raciocinar, ¢ odi actum constitutum, Quod quidem | o que é dessa maneira constituido pelo ato. Pelo iva ratione primo quidem est definitio: Que, na razéio especulativa, por primeiro é a defi. | ehuinciatio; tertio vero, syllogismus vel hicdo; em segundo, a enunciagdo e em terceiro o 102 Et quia ratio etiam Practica utitur silogismo ou a argumentagao. E porque também wzismo in operabilibus, ut supra’ habi- | a rasto Pratica usa de certo:silogismo nas obras indlum quod Philosophus docet in VII | q realizar, como acima se mostrou, de acortio Heo est invenire aliquid in ratione practica | como ue ensina 0 Filésofo, assim cumpre achar Hse habeat ad operationes, sieut se habet algo na razZo prética que esteja para as operacdes 0 in ratione speculativa ad conclusiones. como a proposi¢ao est, na razio especulativa modi propositiones universales rationis para as conclusdes. E tais proposigées universais “Ordinatae ad actiones, habent rationem | da razdo pratica ordenadas as agdes, tém a raziio die quidem propositiones aliquando actu- | de lei Essas proposigdes as vezes se consideram siderantur, aliquando vero habitualiter a atualmente, as vezes, porém, so mantidas pela enentur. razio, habitualmente. Perit dicendum quod ratio habet vim Quawio 40 32, deve-se dizer que a razio tem 4 voluntate, ut supra’ dictum est ex hoc | pela vontade a fora de mover, como acima foi iMod aliquis vult finem, ratio imperat de dito; dado que alguém quer o fim, a razio ordena Suntad finem. Sed voluntas de his quae os meios. Ora, a vontade, com relagao as coisas pitt, ac. hoe quod legis rationem habeat, gue so ordenadas, para que possua a razao de lei, SY quod sit aliqua ratione regulata. Et hoc | € necessario que soja regulada por alguma razo. E intelligitur quod voluntas. principis habet | desse modo se entende que'a vontade do principe legis: alioquin voluntas principis magis | tenha vigor de lei; caso contritio, a vontade do iquitas quam lex, Principe seria mais iniquidade do que lei vit dicendum quod, sicut in actibus ‘Bsteonsiderare operationem et ope 4edificationem ct acdificatum: ita in Articutus 2 Armico 2 Utrum lex ordinetur | Alei ordena-se sempre Semper ad bonum commune a0 bem comum? HP SECUNDUM SIC PROCEDITUR. Videtur Otdinctur semper ad bonum comm them. Quod lex | Quasrro A0 seauNDo, assim se sRocEDE: parece lune sicut | que a lei nfo se ordena sempre ao bem coma como ao fim, {Ai Tegem enim pertinct praccipere et pro- | | cams efeito, pertence a Ici preceituar e proi- » Sed praccepta ordinantur ad quaedam | bin Ora, os preceitos se ordenam a alguns bens tia bona. Non ergo semper finis legis est Singulares. Logo. nem sempre o fim da lei é o bem comum, IQ: 19,4. 3:4. 76,0. 154.7, 0.2, 004, | ©. 5: 1147, a, 24.31 hQ 17,01. MN Ita 95,8. 454, 96, x. 1: UT Sent, dist. 37, 0,2, gla 2, ad 5: V Phe. lect. 2. 523) QUESTAO 99: 4 ESSENCIA DA LEL, ARTIGO 2 2. Prarrerea, lex dirigit hominem ad agendum. Sed actus humani sunt in particularibus. Ergo et lex ad aliquod particulare bonum ordinatur. 3, Prarrerea, Isidorus dicit, in libro Etynol.! Si ratione lex constat, lex erit omne quod ratione constiterit, Sed ratione consistit non solum quod ordinatur ad bonum commune, sed etiam quod ordinatur ad bonum privatum. Ergo lex non ordi- natur solum ad bonum commune, sed etiam ad bonum privatum unius. SeD ConTRa est quod Isidorus dicit, in V Ey- mol2, quod lex est nullo privato commodo, sed pro communi utilitate civiun conscripta. Resronveo dicendum quod, sicut dictum est!, lex pertinet ad id quod est principium humanorum. actuum, ex eo quod est regula et mensura. Sicut autem ratio est principium humanorum actuum, ita ctiam in ipsa ratione est aliquid quod est principium respectu omnium aliorum. Unde ad hoe oportet quod principaliter et maxime pertineat lex. — Primum autem principium in operativis, quorum est ratio pra , est finis ultimus. Est autem ultimus finis humanae vitae felicitas vel beatitudo, ut supra! habitum est. Unde oportet quod lex maxime respiciat ordinem qui est in be- atitudinem. — Rursus. cum omnis pars ordinetur ad totum sicut imperfectum ad perfectum: unus autem homo est pars communitatis perfectae: necesse est quod lex proprie respiciat ordinem ad felicitatem communem. Unde et Philosophus, in praemissa definitione legalium, mentionem facit et de felicitate et communione politica, Dicit enim, in V Ethic’, quod legalia iusta dicimus factiva et conservativa jelicitatis et particularum ipsius, po- litica communicatione: perfecta enim communitas civitas est, ut dicitur in I Polit, In quolibet autem genere id quod maxime dicitur, est principium aliorum, et alia dicuntur secundum ofdinem ad ipsum: sicut ignis, qui est maxime calidus, est causa caliditatis in corporibus mixtis, quae intantum dicuntur calida, inquantum participant de igne. Unde oportet quod, cum lex maxime dicatur secundum ordinem ad bonum commune, quodeumque aliud praeceptum de Tl, c. 10; 1. V, e. 33: ML 82, 130.C, 199 A 21: ML 82, 203 A. 2. ALM pisso, a lei dirige 0 homem para agir. Ora, 08 atos humanos pertencem A classe dos par- ticulares. Logo, também a lei ordena-se a algum bem particular. 3. Avemats, diz Isidoro: “Se a lei existe pela razao, seré lei tudo que existir pela razio”. Ora, pela razo consiste niio s6 0 que se ordena ao bem comum, mas também o que se ordena ao bem par- ticular, Logo, a lei nao se ordena s6 a0 bem co- mum, mas também 20 bem particular de um s6. EM sextipo conrrdnio, diz Isidoro que a lei € “escrita no para yantagem particular, mas para acomum utilidade dos cidadaos”. Responpo. Como foi dito, « lei pertence aquilo que € prinefpio dos atos humanos, dado que é tegra ¢ medida, Como a razo, porém, € principio dos atos humanos, assim também existe na propria razio algo que € principio com relagio a todos os outros. Donde € necessdrio que a isso a lei pertenga principal e maximamente. — O primeira Principio no operar do qual trata a razAo prética, € fim ultimo. Mas o dltimo fim da vida humana € a felicidade ou bem-aventuranga, como acima se mostrou. Portanto, € necessdrio que a lei vise maximamente a ordem que & para a bem-aven- turanga. — Por outro lado, como toda parte se ordena ao todo como o imperfcito ao perfeito e cada homem ¢ parte da comunidade perfeita, é necessétio que a lei propriamente vise 4 ordem para a felicidade comum. Por isso, 0 Filésofo, na anteposta definigio do legal, faz menco tanto da felicidade quanto da comunhio politica. Diz, com efeito, no livro V da Erica que “dizemos justas as disposigdes legais que fazem e conservam a felicidade e as partes dessa, na comunicacaio politica”; a perfcita comunidade, com efeito, € a cidade, como se diz no livro I da Politica. Em qualquer género, porém, o que se nomeia maximamente € principio dos demais, ¢ esses se nomeiam segundo a ordenagao a ele; como o fogo que € maximamente quente, é causa do calor nos corpos mistos, que se dizem tao quentes quanto participam do fogo. Portanto, 6 necessério que, dado que a lei se nomeia maximamente segundo at ordenagao ao bem comum, qualquer outro preceiti 3524 ec ii Fationem legis nisi mem ad bonum commune. Et ideo Ad bonum commune ordinatur. inunitate generis vel speciei, sed communitate tausae finalis, secundum quod bonum commune licitur finis communis, Ab Tertium dicendum quod, sicut nihil constat firmiter secundum rationem speculativam nisi per fesolutionem ad prima principia indemonstrabilia, lla firmiter nihil constat per rationem practicam Hisi per ordinationem ad ultimum finem, qui est onum commune. Quod autem hoc modo ratione Onstat, legis rationem abet. ArticuLus 3 Utrum ratio cuiuslibet sit factiva legis Ab TeeTiuM sic poceprrur, Videtur quod cutis: libet ratio sit factiva legis 1, Dicit enim Apostolus, Rm 2,14, quod cwn | gentes, quae legem non habent, naturaliter ea fice legis sunt faciunt, ipsi sibi sunt lex. Hoe lutem communiter de omnibus dicit, Frgo quilibet test facere sibi legen 2. PraerEREA, sicut Philosophus dicit, in libro DA LET, ARTIGO 3 sobre uma obra particular nao tenha razao de lei a niio ser segundo a ordenacao ao bem comum. E assim toda lei ordena-se ao bem comune. AD Pain ergo dicendum quod Praeceptum | Quanto ao 1°, deve-se dizer, portanto, que © preceito implica a aplicagao da lei Aquelas coisas que sto reguladas pela lei. A ordem a0 bem comum, que pertence a lei, € aplicavel aos fins particulares. E segundo isso, também se dio preceitos a tespeito de alguns particulates, Quaxto ao 2, deve-se dizer que as aches $20 certamente da ordem do particular, mas aqueles Particulares podem referir-se ao bem comum, nao certamente pela comunidade do género ou da espécie, mas pela comunidade da causa final, enquanto 0 bem comum se diz fim comum. Quanto ao 3%, deve-se dizer que, como nada existe firmemente segundo a razio especulativa a niio ser pela resolugao aos primeiros princpios indemonstréveis, também nada existe firmemente pela razio pratica a nao ser pela ordenagio ao fim timo, que € 0 bem comum. O que existe desse modo pela razo, tem raziio de lei. Arrico 3 Arrazio de qualquer um pode fazer leis? QUANTO AO TERCEIRO, ASSIM SE PROCEDE: parece que a razéio de qualquer um pode fazer leis, 1. Com efeito, diz 0 Apéstolo na Carta aos Romanos que “os gentios, que ndo tm a lei, naturalmente fazem 0 que € da lei e sio lei para si mesmos”. Ora, diz isto comumente de todos. Logo, qualquer um pode fazer-se a lei, 2. ALEM DIsso, como diz o Filésofo “a intengaio Hl Exhic.\, imentio legislatoris est ut inducat homi.. | do legislador é de induzir 0 homem a virtude”, hem ad virtutem. Sed quilibet homo potest alium Inducere ad viutem, Ergo cuiuslibet hominis ratio | tude. Logo, a tazfio de Ora, qualquer homem pode induzir outro a vir. qualquer homem pode est factiva legis. fazer leis. Past Infra, q, 97, 4.3, ad 3; TIL, q. $0, a. 1, ad 3, 1.0. 1: 1103, , 3-6. mst esse universalismo comunitério, possibiliando a comunicagdo, as troces & finalmente, Pamor entre todos os scres humanos. Ora, o meio de constituir toda comunidad Fonjunto de condigdes gemis que tomam possivel a vida em comum, a estrutura de fundo de seu ser: é sobre um ssoa humana. B, uma das primeiras fungces humana € 0 bem comum, entendido como 0 QUESTAO 96; 4 ESSENCIA DA LEL, ARTIGO 3 3, PRAETEREA, sicut princeps civitatis est ci- | 3. Abemais, como 0 principe da cidade é dela Vitatis gubernator, ita quilibet paterfamiliae est | 0 governante, assim qualquer pai de familia € o gubemator domus, Sed princeps civitatis potest | governante da casa. Ora, 0 principe da cidade legem in civitate facere. Ergo quilibet patcrfami- | pode fazer a lei na cidade. Logo, qualquer pai de liae potest in sua domo facere legem. famflia pode fazer a lei em sua casa. Sep conrra est quod Isidorus dicit, in libro EM sENtIDO ConTRARIO, diz Isidoro e estd nas Etymol2, et habetur in Decretis, dist. 2: Lex est | Decretais “A lei & a constituigdo do povo, se- constinutio populi, secundum quam maiores natu | gundo a qual os que sio maiores por nascimento, simul cum plebibus aliquid sancerunt. Non est | juntamente com as plebes, sancionaram algo”. Néo ergo cuiuslibet facere legem. &, portanto, de qualquer um fazer a lei. Responpeo dicendum quod lex proprie, primo Respoxno. A lei propriamente, por primeiro ¢ et principaliter respicit ordinem ad bonum com- | principalmente, visa a ordenagiio ao bem comum mune. Ordinare autem aliquid in bonum commune | Ordenar, porém, algo para o bem comum € ou de est vel totius multitudinis, vel alicuius gerentis | toda a multidéo ou de alguém que faz as vezes Vicem totius multitudinis. Et ideo condere legem | de toda a multidéo. E assim constituir a Iei ou vel pertinet ad totam multitudinem, vel pertinet ad | pertence a toda a multidiio, ow pertence & pessoa personam publicam quae totius multitudinis curam | ptiblica que tem 0 cuidado de toda a multidfio habet. Quia et in omnibus aliis ordinare in finem | Porque em todas as coisas ordenar para o fim € est cits cuius est proprius ille finis. daquele de quem este fim € préprio‘. ‘Ap primum ergo dicendum quod, sicut supra Quanto Ao [', deve-se dizer, portanto, como dictum est, lex est in aliquo non solu sicut in | foi afirmado acima, que a lei est4 em alguém nao regulante, sed etiam participative sicut in regulato. | s6 como em quem regula, mas também, partici- Et hoc modo unusquisque sibi est lex, inquantum | pativamente, como em quem € regulado. E desse participat ordinem alicuius regulantis. Unde et | modo cada um é lei para si mesmo, enquanto ibidem subditur [15]: Qui ostendunt opus legis | participa da ordem de alguém que regula. Por scriptum in cordibus suis. isso, ai mesmo se acrescenta: “Aqueles mostram a obra da lei, escrita em seus coragées”. ‘Ap secunpum dicendum quod persona priva- Quanto Ao 2, deve-se dizer que a pessoa ta non potest inducere efficaciter ad virtutem. | privada ndo pode induzir eficazmente A virtude. Potest enim solum monere, sed si sua monitio | Pode, com efeito, somente admoestar, mas, se non recipiatur, non habet vim coactivam; quam | sua admoestagao ndo ¢ recebida, néio tem fora debet habere lex, ad hoc quod efficaciter inducat | coativa, que a lei deve ter. para que cficazmente ad virtutem, ut Philosopbus dicit, in X Ethic. induza a virtude, como diz o Fildsofo. Tal virtude Hane autem virtutem coactivam habet multitudo | coativa tem a multidao ou a pessoa publica a qual vel persona publica, ad quam pertinet poenas | pertence infligir penas, como se diré abaixo. E infligere, ut infra* dicctur. Et ideo solius eius est | assim é apenas dela 0 fazer Icis. leges facere. ‘Ap TektiuM dicendum quod, sicut homo est pars Quanto Ao 3°, deve-se dizer que, como o domus, ita domus est pars civitatis: civitas autem | homem é parte da casa, assim a casa é parte da est communitas perfecta, ut dicitur in | Politic.’. Et | cidade; e a cidade é a comunidade perfeita, como ideo sicut bonum unius hominis non est ultimus | se diz no livro I da Politica. E assim, como o 2.L. Ve. 10: ML 82, 200 CG; eft. 1. 1, e. 10: ML 82, 130 C, 3, Geartanus (sace. XII), Decretum, P. I, dist. 2, can. 1: Ler est 4.A.1,ad 1. 5.C. 10: 1180, a, 20-22. 6. Ctr. q, 92, a. 2, ad 3; TIL 4. 64, 8.3. 7.C. 1: 1252, a, 5-7. “A destinago comunitaria (o bem comum) da lei exige que ela seja conduzida pelo responsivel desse bem comum, 0 detentar do poder. A esse propésito, o texto alude a uma dovtrina tipicamente tomisia, objeto de controvérsias na época tual devido a sva conotagio politica: ¢ poder, a0 qual cabe a promocao do bem comurn, reside fundamentalmente na propria Comunidade (multitude), que hoje chamariamos de “povo”, bu naquele que (em @ responsabilidade, € que portanto deve t@-la recebido desse povo (o que € especificado abaixo, na 4. 97, a. 3,1 3). 526 QUESTAO 90: 4 ESSENCIA DA LEE ARTICO 4 finis, sed ordinatur ad commune bonum; ita etiam et bonum unius domus ordinatur ad bonum unius civitatis, quae est communitas perfecta. Unde ille qui gubernat aliquam familiam, potest quidem fa- cere aliqua praecepta vel statuta; non tamen quae proprie habeant rationem legis, Arricutus 4 Utrum promulgatio sit de ratione legis AD QUARTUM sic PRocEDITUR. Videtur quod promulgatio non sit de ratione legis. 1. Lex enim naturalis maxime habet rationem legis. Sed lex naturalis non indiget promulgatione. Ergo non est de ratione legis quod promulgetur. 2. Prasterea, ad legem pertinet proprie obli- gare ad aliquid faciendum vel non faciendum. Sed non solum obligantur ad implendam legem illi coram quibus promulgatur lex, sed etiam alii. Ergo promulgatio non est de ratione legis. 3. PRAETEREA, obligatio legis extenditur etiam infuturum: quia leges futuris negotiis necessita- fet imponunt, ut iura dicunt'. Sed promulgatio fit ad praesentes, Ergo promulgatio non est de necessitate legis. Sep contra est quod dicitur in Decretis, 4 dist, quod leges instimuntur cum promulgantur. Responpe0 dicendum quod, sicut dictum est’, Jex imponitur aliis per modum regulae et mensu- rae. Regula autem et mensura imponitur per hoc quod applicatur his quae regulantur et mensu- intur. Unde ad hoc quod lex virtutem obligandi btineat, quod est proprium legis, oportet quod ipplicctur hominibus qui secundum eam regulari lcbent. Talis autem applicatio fit per hoc quod in titiam eorum deducitur ex ipsa promulgatione. Inde promulgatio necessaria est ad hoc quod lex ibeat suam virtutem, Et sic ex quatvor praedictis potest colligi de- itio legis, quae nihil est aliud quam quacdam Paratis De Verit., q. 17, a. 3; Quodlib. 1, 4, 9, art. 3. 3. Art. 1. e. Devido 20 fato de que a lei, com forsas © analégicas adaptacias aos diferentes tipos de leis. bem de um sé homem nao ¢ 0 fim tiltimo, mas ordena-se ao bem comum, assim também o bem de uma s6 casa ordena-se ao bem de uma cidade, que & a comunidade perfeita. Portanto, aquele que governa uma familia, pode certamente fazer alguns preceitos ou estatutas; nao, porém, aqueles que t8m propriamente razao de lei. Artico 4 A promulgacio é da raziio de lei? QUANTO AO QUARTO, ASSIN SE PROCEDE: parece que a promulgaciio néio é da razio de lei. 1, Com efeito, a lei natural tem ao maximo: taziio de lei. Ora, a lei natural naio necessita de promulgacao. Logo, nao é da razo da lei que | seja promulgada. 2. ALEM piso, pertence lei, propriamente, obrigar a fazer algo ou a nfo fazer. Ora, nao apenas sao obrigados a cumprir lei aqueles em presenga dos quais € cla promulgada, mas também os outros. Logo, a promulgagdo nao é da razao de lei. 3. Apeuals, a obrigagiio da lei se estende tam- bém ao futuro, pois “as leis impéem necessidade aos negécios futuros”, como afirmam os direitos Ora, a promulgagio se faz para os presentes. Logo, a promulgacao nao é por necessidade da lei. EM SENTIDO CONTRARIO, dizem as Decretais que “as leis se instituem quando sao promulgadas”. Responno. Como foi dito, a lei se impée a outros por modo de regra e de medida. F a regra € a medida se impdem enquanto se aplicam naquelas coisas que sito reguladas ¢ medidas. Donde, para que a Ici obtenha a forga de obrigar, que € préprio dela, é necessério que se aplique aos homens que segundo ela devem ser regulados. Tal aplicagiio se faz enquanto ¢ levada ao conhecimento deles pela propria promulgacao, Portanto, a promulgacio é | necessfria para que a lei tenha sua forea® | | E assim pode-se colher dos quatro elementos | anteriormente ditos a definig&io de lei, que nao & Codex fustintamus, 1.1, tit 14: De legibus et constit., lex 7: Leges et. 2. Gramanus, Decretum, PL, dist. 4, can. 3: In istis (append). regulago racional, dirige-se a sujeitos dotados de liberdade, ela apela para sua razio: {anto, eles devem poder conheeé-la, de algum modo, o que se realiza mediante um ato oficial ta autoridade legislativa, estabelece desse moto o contato nevessérie ¢ o vinculo entre lei e © sujeito. Tal alo € a promulgaggo, que assume formas 527 QUESTAO O1: A DIVER! rationis ordinatio ad bonum commune, ab eo qui curam communitatis habet, promulgata. Ap primum ergo dicendum quod promulgatio le- gis naturac est ex hoc ipso quod Deus eam menti- bus hominum inseruit naturaliter cognoscendam. Ap scunpuM dicendum quod illi coram quibus Jex non promulgatur, obligantur ad legem servan- dam, inquantum in corum notitiam devenit per alios, vel devenire potest, promulgatione facta. ‘Ap rexrium dicendum quod promulgatio prae- senis in futurum extenditur per firmitatem seriptu- rae, quae quodammodo semper eam promulgat. Unde Isidorus dicit, in Il Etymoi, quod lex a legendo vocata est, quia scripta est. 4. Chr g. 90, Introd QUAESTIO XCI DE LEGUM DIVERSITATE in sex articulos divisa Deinde considerandum est de diversitate Iegum. Et circa hoc quaeruntur sex. Primo: utrum sit aliqua lex aeterna. Secundo: utrum sit aliqua lex naturalis. Tertio: utcum sit aliqua lex humana. Quarto: utcum sit aliqua lex divina. Quinto: utrum sit una tantum, vel plures. Sexto; utrum sit aliqua lex peccati. Axericutus 1 Utrum sit aliqua lex aeterna ‘Ap PRIMUM Sic PROcEDITUR. Videtur quod non sit aliqua lex acterna. 1. Omnis enim lex aliquibus imponitur, Sed non fuit ab aeterno aliquis cui lex posset imponi: solus enim Deus fuit ab acterno, Ergo nulla lex est aeterna. 2. PRAETEREA, promulgatio est de ratione legis Sed promulgatio non poiuit esse ab aeterno: quia non erat ab acterno cui promulgaretur. Ergo nulla lex potest esse aeterna. [Pais tee he DADE DAS LEIS. ARTIGO outra coisa que uma ordenagio da raziio para 0 bem comum, promulgada por aquele que tem 0 cuidado da comunidade. Quanto Ao 12, deve-se dizer, portanto, que a promulgacio da lei natural é pelo fato mesmo que Deus a inseriu nas mentes dos homens para ser conhecida naturalmente. Quanto ao 22, deve-se dizer que aqueles em presenga dos quais nao é promulgada a lei, so obrigados a seu cumprimento, enquanto ela chega ‘a seu conhecimento por meio de outros, ou pode chegar, feita a promulgacio. Quanto 20 3%, deve-se dizer que a promulgagao presente se estende ao futuro pela firmeza da escrita, que de certo modo sempre a promulga. Por isso, diz Isidoro que “a lei deriva de ler, pois 6 eserita”. QUESTAO 91 A DIVERSIDADE DAS LEIS em seis artigos Em seguida, deve-se considerar a diversidade das leis, E a respeito disso fazem-se seis perguntas. 1. Hé alguma lei eterna? 2. Uma lei natural? 3. Uma lei humana’? 4. Uma lei divina? Uma s6 ou varias? 6. Uma lei do pecado? Arrico 1 Ha uma lei eterna? QUANTO AO PRIMEIRO ARTIGO, ASSIM SE PROCEDE: parece que nfo hé uma lei eterna, 1. Toda lei, com efeito, impe-se a alguns. Ora, niio existiu desde toda a etemnidade alguém ao qual a lei pudesse ser imposta; s6 Deus, com efeito, existiu desde toda a eternidade. Logo, nenhuma Iei é etema. 2. ALém pisso, a promulgagtio € da raziio da lei. Ora, a promulgagao nao pode ser desde toda a eternidade, pois nao existiu desde toda a eter- nidade aguele a quem tivesse sido promulgada. Logo, nenhuma lei pode ser eterna. QUESTAO 91: A DIVERSIDADE DAS LEIS, ARTIGO 1 rationis ordinatio ad bonum commune, ab eo qui curam communitatis habet, promulgata. Ap paimunt ergo dicendum quod promulgatio le~ gis naturae est ex hoc ipso quod Deus eam menti- bus hominum inseruit naturaliter cognoscendam Ap secunpum dicendum quod illi coram quibus lex non promulgatur, obligantur ad legem servan- dam, inquantum. in eorum notitiam devenit per alios, vel devenire potest. promulgatione facta | outra coisa que uma ordenagdo da razao para 0 bem comum, promulgada por aquele que tem 0 cuidado da comunidade. Quanto ao IS, deve-se dizer, portanto, que a promulgagio da lei natural é pelo fato mesma que Deus a inscriu nas mentes dos homens para ser conhecida naturalmente. Quanto ao 2%, deve-se dizer que aqueles em presenca dos quais nao é promulgada a lei, sto obrigados a seu cumprimento, enquanto ela chega a seu conhecimento por meio de outros, ou pode | chegar, feita a promulgacao. Ap rernum dicendum quod promulgatio prac- sens in futurum extenditur per firmitatem soriptu- rac, quae quodammodo semper eam promulgat. Unde Isidorus dicit, in Il Etymol, quod lex a Tegendo vocata est, guia scripta est. \ 4. Che. g. 90, Introd. QUAESTIO XCI DE LEGUM DIVERSITATE in sex articulos divisa Deinde considerandum est de diversitate legum Ht circa hoc quaeruntur sex. Primo: utcum sit aliqua lex aeterna. Secundo: utrum sit aliqua lex naturalis. Tertiv: utrum sit aliqua lex humana. Quarto: utrum sit aliqua lex divina. Quinto: utrom sit una tantum, vel plures. Sexto: utrum sit aliqua lex peecati. ApricuLus 1 Utrum sit aliqua lex aeterna ‘Ap PRIMUM Sic PRocEDITUR. Videtur quod non. sit aliqua lex aetemna. 1. Omnis enim lex aliquibus imponitur. Sed non fuit ab aeterno aliquis cui lex posset imponi: solus enim Deus fuit ab aeterno. Ergo nulla lex | est aeterna. 2. PrazreREA, promulgatio est de ratione legis. Sed promulgatio non potuit esse ab aeterno: quia | non erat ab acterno cui promulgaretur. Ergo nulla lex potest esse aeterna. Quanto ao 3¢, deve-se dizer que a promulgagaio presente se estende ac futuro pela firmeza da escrita, que de certo modo sempre a promulga Por isso, diz Isidoro que “a lei deriva de ler, pois é escrita”. QUESTAO 91 A DIVERSIDADE DAS LEIS em seis artigos Em seguida, deve-se considerar a diversidade das leis. Ea respeito disso fazem-se seis perguntas. 1, Hé alguma lei eterna? 2. Uma lei natural? 3, Uma lei humana? 4. Uma lei divina? 5. Uma s6 ou varias 6. Uma lei do pecado? Arrico 1 Ha uma lei eterna? QUANTO AO PRIMEIRO ARTIGO, ASSIM SE PROCEDE: parece que nfio hd uma lei eterna. 1. Toda lei, com efeito, impde-se a alguns. Ora, nao existiu desde toda a eternidade alguém ao qual a lei pudesse ser imposta; s6 Deus, com efeito. existin desde toda a eternidade. Logo, nenhuma lei é eterna. 2. ALEM piso, a promulgacao € da razZio da lei. Ora, a promulgagiio nfo pode ser desde toda a eternidade, pois nao existiu desde toda a eter- nidade aquele a quem tivesse sido promulgada. Logo, nenhuma lei pode ser eterna 528 QUESTA 91: A DIVERSIDADE DAS LEIS, ARTIGO 1 3. Prarrerza, lex importat ordinem ad finem. Sed nihil est aeternum quod ordinetur ad finem: solus enim ultimus finis est aeternus. Ergo nulla lex est aeterna, SED CONTRA est quod Augustinus dicit, in I de Lib, Arb.': Lex quae summa ratio nominatur, non potest cuipiam intelligenti non incommutabilis aeternaque videri. Resronpeo dicendum quod, sicut supr est, nihil est aliud lex quam quoddam dictamen practicze rationis in principe qui guberat aliquam communitatem perfectam. Manifestum est autem, supposito quod mundus divina providentia regatur, ut in Primo* habitum est, quod tota communitas universi gubernatur ratione divina. Et ideo ipsa ratio gubernationis rerum in Deo sicut in principe universitatis existens, legis habet rationem. Et quia divina ratio nihil concipit ex tempore, sed habet acternum conceptum, ut dicitur Pr 8,23; inde est quod huiusmodi legem oportet dicere aeternam. ‘Ap Primum ergo dicendum quod ea quae in seipsis non sunt, apud Deum existunt, inquantum sunt ab ipso praecognita et praeordinata: secun- dum illud Rm 4,17: Qui vecat ea quae non sunt, ianquam ea quae sunt, Sic igitur aeternus divinae legis conceptus habet rationem legis acternac, se- cundum quod a Deo ordinatur ad gubernationem rerum ab ipso praecognitarum. ‘Ap secunpum dicendum quod promulgatio fit et verbo et scripto; et utrogue mode lex aeterna habet promulgationem ex parte Dei promulgantis: quia et Verbum divinum est aeternum, et seriptu- 1a libri vitae est aeterna, Sed ex parte creaturac audicntis aut inspicientis, non potest esse promul- gatio aeterna. Ap TeeTiu dicendum quod lex importat ordi- nem ad finem active, inquantum scilicet per eam ordinantur aliqua in finem: non autem passive, idest quod ipsa lex ordinetur ad finem, nisi per ‘Ao eolocar no topo de su heranca do pensamento antigo (0 estoicismo e Cicero, principalmente) transmitido por 3. Abeals, a Ici implica ordem ao fim. Ora, nada € eterno que se ordene ao fim: s6 0 tiltimo fim, com efeito, é eterno. Logo, nenhuma lei & eterna. Em SENTIDO ConTRARIO, diz Agostinho: “A lei que se nomeia raz&o suprema, niio pode pare- cer nao imutavel e eterna a qualquer um que entenda”. Resronpo. Assim como foi dito acima, nada € lei senao certo preceito da razdo pratica no principe que governa uma comunidade perfeita. Suposto, porsm, que o mundo seja regido pela providéncia divina, como se mostrou na I Parte, € manifesto que toda a comunidade do universo governada pela razio divina. E assim a propria razio do governo das coisas em Deus, como exis. tindo no principe do universo, tem raziio de lei. E porque a razéio divina nada concebe no tempo, mas tem 0 conceito eterno, como € dito no Livro dos Provérbios, segue-se que € necessario que tal lei eterna seja dita etema’ Quanto Ao 1°, deye-se dizer, portanto, que aquelas coisas que nio existem por si mesmas, existem em Deus, enquanto sio preconhecidas e preordenadas por Ele, segundo aquilo da Carta ‘aos Romanos: “Aquele que chama as coisas que nao séo como as que sao”. Assim, pois, 0 eterno conceito da lei divina tem a razfo de lei eterna, enquanto é por Deus ordenado 20 governo das coisas por Ele preconhecidas. Quanto ao 2°, deve-se dizer que a promulgacio se faz pela palavra e por escrito; ¢ de ambos os modos a lei eterna tem a promulgagao da parte de Deus que promulga, porque 0 Verbo divino é eterno, ¢ a escrita do livro da vida é eterna. Da parte, porém, da criatura quc ouve ou vé, nao pode ser eterna a promulgacao. Quanto 40 3%, deve-se dizer que a lei implica ‘ordem ao fim, ativamente, enquanto por ela se cordenam algumas coisas para o fim, no, porém, passivamente, isto €, que a mesma lei seja or- sintese sobre as leis a nogio de “ei eterna”, Sto, Toms mostrou a sua fidelidade a uma 10. Ag finho; a0 fax -lo, foi abrigado a dar ao conceito de lei um carfter bastante analégico, para colocar nele tanto a Providencia divina como a legislacao civil mai contingent (0 que tedlogos modemnos, seguindo Suarez, terdo dificuldade em admitir). Devido ao fato de que Deus € 0 ‘objetivo do destino humano, trazendo-The a bem-aventuranga perfeita, ¢ que toda lei é a norma regula tem sua origem no proprio Deus, Deve-se encontrar nele, portanto, segundo um modo di fa desse destino, cla que, por diversas 19, essa dial mediacOes, esclarece a rota do homem eo sustenta em sua marcha. Deus 6, portanto, a lei suprema, identificando-se com a sua Sabedoria ¢ seu govemo prrovidencial de todo o universo criado; e essa lei € Wo eterna quanto a propria ra7ao divina, 529 QUESTAO 91; A DIVERSIDADE DAS LEIS. ARI accidens in gubernante cuius finis est extra ipsum, ad quem etiam necesse est ut lex eius ordinetur. Sed finis divinae gubernationis est ipse Deus, nec ius lex est aliud ab ipso. Unde lex aeterna non ordinatur in alium finem. Articutus 2 Utrum sit in nobis aliqua lex naturalis ‘AD SECUNDUM SIC pRocEDITUR. Videtur quod non sit in nobis aliqua lex naturalis, 1. Sufficienter enim homo gubernatur per legem acternam: dicit enim Augustinus, in I de Lib. Arb.*; quod lex agierna est qua iustum est ut omnia sint ordinatissima. Sed natura non abundat in superfluis, sicut nec deficit in necessariis. Ergo non est aliqua lex homini naturalis. 2. Prarrera, per legem ordinatur homo in suis actibus ad finem, ut supra: habitum est. Sed ordinatio humanorum actuum ad finem non est per naturam, sicut accidit in creaturis irrationa- bilibus, quae solo appetitu naturali agunt propter finem: sed agit homo propter finer per rationem et voluntatem. Ergo non est aliqua lex homini naturalis. 3, PRAETEREA, quanto aliquis est liberior, tanto minus est sub lege. Sed homo est liberior omnibus animalibus, propter liberum arbitrium, quod prae aliis animalibus habet, Cum igitur alia animalia non subdantur legi naturali, nec homo alicui legi naturali subditur. Sep conrra est quod, Rm 2, super illud [14]: Cuin gentes, quae legem non habent, naturaliter ca quae legis sunt faciunt, dicit Glossa’: Etsi non habent legem scriptam, habent tamen legem nawuralem, qua quiliber intelligit et sibi conscius est quid sit bonum et quid main Responbeo dicendum quod, sicut supra‘ dictum est, lex, cum sit regula et mensura, dupliciter po- test esse in aliquo: uno modo, sicut in regulante et mensurante; alio modo, sicut in regulato et mensurato, quia inquantum participat aliquid de regula vel mensura, sic regulatur vel mensuratur. 2. Panatrs LY Sent dist. 33,4. 1,2. 1. 1, C. 6m. 15: ML 32, 1229. 2.Q.90,a.2 3. Ordin: ML 114,476 A; Lowsaxo: ML 191, 1345 B. 4.0.90. 1,ad 1 denada para o fim, a nao ser acidentalmente no governante, cujo fim é extemo a ele, para quem também € necessério que a sua lei seja ordenada. Ora, 0 fim do governo divino € o préprio Deus, nem sua lei ¢ algo diferente dele. Porianto, a lei eterna nao se ordena a outro fim. ArtiGo 2 HA em nés uma lei natural? QUANTO AO SEGUNDO, ASSIM SE PROCEDE: parece que no ha em nés uma lei natural. 1. Com efeito, 0 homem € suficientemente governado pela lei eterna: diz, Agostinho que “a lei eterna é aquela pela qual é justo que todas as coisas sejam ordenadissimas”. Ora, a natureza no se excede nas cvisas supérfluas, como nio falta nas necessirias. Logo, nfo ha uma lei natural para 0 homem. 2. ALM Disso, pela lei ordena-se 0 homem em seus atos para o fim, como acima se mostrou: Ora, a ordenagdo dos atos humanos para o fim nao € pela natureza, como acontece nas criaturas irracionais, que s6 pelo apetite natural agem em razo do fim; mas age 0 homem por causa do fim por razdo ¢ vontade. Logo, ndo ha uma Jei natural para o homem. 3. AbEMAIS, quanto mais é alguém livre, tanto menos é sob a lei. Ora, 0 homem é 0. mais livre de todos os animais, por causa do livre-arbitrio, que tem acima dos outros animais. Logo, como os outros animais nfo so sujeitos 2 lei natural, nem o homem € sujeito a alguma lei natural EM seNTIDO CoNTRARIO, sobre aquilo da Carta aos Romanos: “Como os gentios, que niio tém a lei, fazem naturalmente aquelas coisas que sio da lei”, diz a Glosa: “Mesmo que no tenham a lei escrita, tém, porém, a lei natural, pela qual qualquer um entende ¢ 6 cdnscio do que é bem e do que é mal”. Responpo. Como acima foi dito, a lei, dado que € regra e medida, pode estar duplamente em algo: de um modo, como no que regula e mede, de outro, como no regulado ¢ medido, porque enquanto participa algo da regra ou medida, as- sim & regulado e medido. Por isso, como todas QUESPAO 01; A DIVERSIDADE DAS LEIS, ARTIGO 2 Unde cum omnia quae divinae providentiae sub- | as coisas que esto sujeitas & providéncia divina, duntur, a lege aeterna regulentur et mensurentur, | so reguladas e medidas pela lei eterna, como se ut ex dictis® patet; manifestum est quod omnia | evidencia do que foi dito, é manifesto que todas participant aliqualiter legem aeternam, inquantum | participam, de algum modo, da lei eterna, enquan- scilicet ex impressione eius habent inclinationes | to por impresstio dessa tém inclinagées para os in proprios actus et fines. Inter cetera autem | atose fins proprios. Entre as demai rationalis creatura excellentiori quodam modo | racional esté sujeita & providéncia divina de um divinae providentiae subiacet, inquantum et ipsa | modo mais excelente, enquanto a mesma se torna fit providentiae particeps, sibi ipsi et aliis provi- | participante da providéncia, provendo a si mesma dens. Unde et in ipsa participatur ratio aeterna, | ¢ aos outros. Portanto, nela mesma € participada per quam habet naturalem inclinationem ad de- | a razdo etema, por meio da qual tem a inclinacéo bitum actum et finem. Et talis participatio legis | natural ao devido ato e fim. E tal participagao aeternae in rationali creatura lex naturalis dicitur. | da lei eterna na criatura racional se chama lei Unde cum Psalmista dixisset Ps 4,6, Sacrificate | natural. Assim, ao dizer o Salmista, “Sacrificai sacrificium iustitiae, quasi quibusdam quaeren- | um sacrificio de justiga”, acrescenta como que tibus quae sunt iustitiae opera, subiungit: Muli para os que buscam quais so as obras da justica: dicunt, Quis ostendit nobis bona? cui quaestioni | “Muitos dizem: Quem nos mostra os bens?”, a respondens, dicit: Signatum est super nos lumen | qual questo responde, dizendo: “Foi assinalada yultus tai, Domine: quasi lumen rationis naturalis, | sobre nés a luz de tua face, Senhor”: como se a quo discernimus quid sit bonum et malum, quod | luz da razio natural, pela qual discernimos 0 que pertinet ad naturalem legem, nihil aliud sit quam | 60 bem e o mal, que pertence 4 lei natural, nada impressio divini luminis in nobis. Unde patet quod | mais seja que a impressdo da luz divina em nés. Jex naturalis nihil aliud est quam participatio legis | Daf se evidencia que a lei natural nada mais é que “fcternae in rationali creatura. a participagao da lei eterna na criatura racional’. 5. Amt. praec. b..O problema da lei natural é ceriamente aquele que, de toda a sintese tomista,.é em nossos dias o mais mal compreendido ‘un ponto tal que ceitos tedlogos chevan a rejeitar a prdpria ideia de lei natural e de seu papel na salvagéo cristé. De igual jxlo, vale salientar alguns pontos nevrilgicos desse ensino para compreender o seu valor permanente, A ideia de lei natural eveste de um contetido diferente de ecordo com a natureza dos seres que se submetem & divina providéncia (lei ctema). A ir da ideia de participacao, pode ocorrer participago na lei etema de duas maneiras: seja de maneira material, como unia esstio recebida do alto, ¢ que exprime o pensamento ¢ o querer divinos. F de maneira anal6giea, portanio, que se pode falar Iei (ver a resposta 3 deste artigo), E 0 caso de todos os sees infra-humanos que realizam a lei etema por seu determinismo, infos, ot melhor, por suas “inclinagdes” (é a expresso preferida de Sto. Tomas), que os leva a agi de maneira propria Weordo com sua espécie. A lei de suas naturezas diversas, as quais cles ndo dominam, € chamada, na linguagem comum, jpregando o plural, de “leis natursis”, sindnimo de leis fisicas, quimicas e biol6gicas, exprimindo um determinismo estrito, dado objeto da ciéncia. O prdprio homem, enquania animal (no sentido genérico) traz em si tas inclinagdes natucais, mas isto de especifico, que as suas inclinacoes, que ele fem em comum como 0 mundo infra-humano, devem ser assumidas sguledas por meio de sus razZo e de sua liberdade No homem, como ser espiritual e dotado de razao, participa-se na lei eterna também de outta maneira, dé uta maneita ii, ou seja, no mais como impress recebida, mas segundo a propria Formalidade da lei, ito 6, autor e fonte de regulagio. im. 9 homem é chamado a ser como sua prOpria ptovidéncia, providéncia de si em delegagao da Providéncia divina. Isto est rio, aliés. com o ensinamento da antropologia crista, que vé no homem a imagem de Deus. O hamem se conforma a essa Wonsabilidad de imagem de Deus, assummindo, por sua razéo € por sua libertade, a regulacao ética de seus aos. Nele, a su © como uma participaeao da luz divina, permitindo-Ihe ditigir-se a si proprio, ¢ discemi (vel, mais simplesmente a participago nele impressa do querer divino, mas ¢ a patticipacéo da luz do pens “Adeseraga & que, na sequéncia, 0 pensamento modemo, principalmente depois de Descartes, reduziu sentido da palavma “Aa” a0 dlominio material e corporal (0 mundo infra-humano), de modo que o natural no homem de Ser (res extensa), que € um dado puro contraposto a seu verdadeiro ser, que & o pensamenta reflexivo (res cogitans) & dade. Do mesmo modo, falar de lei natural como norma moral seria © mesmo que atribuir as leis fisicas e biologica hom uma fungZo normative, consequéncia que se cncontra em nossos dias em uma certa mentalidade conservadora de 4v5 da Tareja, um tanto quanto inguietos no que conceme & perspectiva de reconhecer A liberdade ¢ a razito natural o lugar i) Tomas thes reservava em sua douttinia sobre a lei natural st forma. essa derivacao semantica da palavra “natuteza” far que, no momento stual,a linguagem tomista tradicional iio “inais © discurso moderno, niio miais ousando evocar & ideia de lei natural como sindnimo de lei moral. Felizmente, uma (0 wais recente do mundo, a sua socializagzo, em particular, implicando uma retomada de eonsciéncia do universa (obretudo em matéria de justign social e de desenvolvimento), manifesta-se por uma espécie de apelo ético em prol do 531

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