CASOS PRATICOS
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José Alberto Vieira - Tiago Soares da Fonseca - Vitor Palmela Fidalgo
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ALMEDINA1. PRINCIPIOS E CARACTERISTICAS DOS DIREITOS REAIS
VITOR PALMELA PIDALGO
Arlindo é um abastado latifundidrio, Proprictério de terrenos no
Alentejo, nos tiltimos tempos tem-se deparado com varios problemas
que necessitam de solucio urgente, nomeadamente:
1) Numa das herdades localizadas em Alcécer do Sal, Arlindo transmi-
tiu, hé cinco anos, a cortiga da herdade a Bento, Contudo, agora que falta.
‘menos de um ano para tiragem da mesma, Arlindo comunicoua Bento a
desisténcia do negécio, tendo decidido vender a herdade a Carlos. Bento
ameaga agora com uma aglo de reivindicago da cortica. Poderd fazt-lo?
2) Em setembro de 2017, Arlindo decidiu vender a Daniel um olival
que tinha na zona de Borba pelo valor de 80 mil euros, tendo sido cele-
brada escritura publica para o efeito. Dada a confianga que havia entre
08 dois, Arlindo procedeu desde logo a entrega do olival, tendo o paga-
mento do preco sido combinado para o final més. Contudo, Daniel nunca
realizou qualquer pagamento, sendo que Arlindo pretende intentar uma
ago de reivindicacao para reaver 0 Olival. Quid iuris?
3) Em janeiro de 2015, de forma a garantir o cumprimento de uma
divide, Arlindo constituiu uma hipoteca voluntéria sobre um imével
situado em Evora, propriedade de Eva. Acontece que, em maio de 2018,
Evadecide transmitiro imévelaFilipa, Sendo credor hipotecirio, Arlindo
quer saber se a hipoteca se mantém ou se teré de constituir uma nova,
4) Estando na casa dos 70 anos e nao tendo filhos, Arlindo pretende
deixar a vida orientada daqueles que mais o tm ajudado: dois dos seuscts #cARACTERIsTICAS DOS DIREITOS BEATS
1 ¢ Joaquim. Para isso, pretende doar um prédio que
Se ee ficaré para o Manuel ¢ 0 1 andar para o ng
yuim, Pode fazt-lo?
aa aaa creigimente dono de um pomar de péssegos. Em 2019,
celebrou um contrato com Filipe, no qual fol previsto que este poderia
colher os péssegos até 2020. A contraprestagio seria Filipe culdar de
tiguns animals que Arlindotinka num olivl peto do pessegal, Arlind
pretende agora vender o pomar a Eugénts, mas esta parece ter divides
fem relagio a0 negécio, dado que o contrato entre Arlindo ¢ Filipe men«
clona, expressamente, a sua eficicia real e Eugénia nfo pretende tolerar
tals presenga de Filipe. Quid urs? 4
RESOLUGKO:
1) No momento da celebracio do negécio, a cortiga é um bem objet
‘vamente futuro (artigo 211.° do Cédigo Civil). Constitui, assim, um fruto
pendente (artigo 212.° do Cédigo Civil) e, por esse motivo, é parte inte-
agrante da coisa imével (artigo 204, n 1, 2), do Cédigo Civil), no tendo
individualidade para ser, autonomamente, objeto de negécios reais,
‘Desta feta, nio existe assim qualquer transmissio do direito de proprie=
dade para Bento, dado que os direitos reais s6 podem incidir sobre coisas
presentes,
‘Nos termos do artigo 408°, n2 2, do Cédigo Civil, “se a transferéncla
sere coisa futura ou indeterminada, o direito transfere-se quando
ee ada Pelo alienante ou determinada com conhecimento
Partes, em prejutzo do disposto em matéria de obrigagbes
ee contrato de empreitada; se, porém, respeitar a frutos natu
artes componentes ou integrantes, a transferéncla s6 se verifica 0
momento da colts ou separa” (dlico nosso) ad Cb
leste cas¢ .
eae 2 gee aegumir presente tuto ima parte dO
eae alblentena ee que, ne ‘caso de frutos naturais, a transfe~
cortiga. Esta regra nfo constitul uma exec
Iidade, presente: No artigo 4082, n,
10 presente caso, a tiragem da
exce rizagio superior ao prédio Ito mesmo confirma o artigo 1340: n?
3 do Codigo Civil estipulando que, “se alguém, de bo ff construir obra
“mterreno alheio, ou nele fzersementera ou plantago, 0 valor que as
bras, sementeirss ou plantagSes tiverem trazido a rorlidade do prédio
for maior do que o valor que este tinha antes, o autor da incorporagéo
aadquire a propriedade dele, agundoo valor que préiotinha antes das
obras, sementeiras ou plantagées”,O valor aaferi deverd ser ovaloratual
do prédio,e nio o valor aque o mesmo foi dquirido. Neste sentido, e 0
‘mesmo, sem os implantes, ainda mantivero valor de 30 mil euros, Bea-
triz poderd adquirir o prédio unido, tendo de proceder 20 pagamento do
valor respetivo a Ant6nio,
2) Adimitindo que Beatriz tina razdo, em que momento é qu se daria a agui-
gto do direto de propriedade? Poderiam Beatriz e Antoni contrariar, vlunta-
riamente, a cominagdo legal?
‘Ao contrério da acessio natural, a acessio industrial constitui um
direito potestativo. Relacionando-se a nossa hipétese com um caso de
acessio industrial imobiliria, poderemos invocar a regra presente no
artigo 1340. n.*1, do Cédigo Civil, que estabelece que “o autor da incor-
poragio adquire a propriedade dele, pagando o valor que oprédiotinka antes
das obras (.)”(télico nosso). Com efeito, querendo Beatriz exercer 0 seu
direito de acessfo, esta terd de proceder ao pagamento do valor que 0
prédio tinha antes das obras, constituindo esta uma condicao para aquisi-
0 do direito de propriedade da coisa unida. Qualquer manifestagio de
vontade por parte de Beatriz em adquirr a propriedade da coisa unida,
‘quando néo acompanhada pelo pagamento do valor do prédio, ndo terd
uaisquer efeitos reais.
Sem embargo, 0 dieito de potestativo de acessio nio obstard a que
48 partes, por meio de negéciojurdico, estipulem uma solugo diferente
TS Saesrnecacl0 Fy
Jo, permitindo que
lei. Por exemp”
daquela que é reer Pei plaincorporaciorealizada po,
0 m0
tri da acessao.
pagne Best ao abeneticiat
sendo, com cfs
18. ESPECIFIOAGAO
‘TIAGO SOARES DA FONSECA /
‘Tani pinta de renome, estva a pasar na8 TU oe Lisboa quan
enconrou uma tela deum quadro, encostada aum vidrio,
ma vez que estava quase nov, levoura para casa e, depois de prog
ders uma limpeza geral, aplicou na tela as suas melhores artes, dan
origemavum belo quar. A pintur esti arualmente em exposiefo
das mais conhecidas galeris de arte da capital.
‘rsula, dona da tela desaparecida, que, por ocasiéo das mudangas
casa, tinha pousado algumas das suas mobilias junto do vidro, recon
ceu a sua tela na exposigio de Tania. Alegando que a tela era sua, pn
‘tende levi-lapara casa. Tania diz sim, mas apenas mediante o pagam
de15.000 €, prego de venda do quad,
Quid urs?
RESOLUGKO:
‘Tania adquire, por apossamento, uma tela que nao era sua (art
1263+ al), do Cédigo Civil), Apesar de a mesma aparentar en
Por ocupacio, a propriedade da
‘modifica-a com o seu trabalho, Isto
(4808 PRATICOS De DinerTOs naals
Estamos perante um caso de especfcazo, de que a pin
desenho, da fotografia, da gravura ou de outros a sale ad
texemplo (artigo 1338: do Cédigo Civil) A circunstancia de a combina.
fo ocortida nfo se verfcar entre coisas, mas entre uma cosa o tab
Tho de outrem, conduz a que pate signiicativa da doutrnacoloque em
ccqusa a integragio da especificacio na acessio, ndo obstante a mesma se
encontrar referida no artigo 1326. n,n fn, do Cdigo Civil propé-
sito das espécies de acessio, e de o seu regime se encontrar consagrado
naacessio industrial mobildria,
Relativamente & aquisicao do direito de propriedade por especifica-
«fo, encontra-se previsto nos artigos 1336.*e 1337: do Cédigo Civil, con-
soante 0 especificador tenha atuado de boa ou mé-fé. Vejamos.
Havendo boa-fé de Tania, se a restivuigio da tela & forma primitiva
néo for possivel, a mesma pertenceri a Tania, Se a restituigao da tela &
forma primitiva implicar a perda do valor acrescentado pelo trabalho,
a tela pintada tanto pode ser atribufda a Tania (especiicadora) como a
Ursula (a dona anterior), consoante o valor acrescentado seja superior ou
inferior ao da coisa (artigo 1336.,n° 1, do Cédigo Civil), Assim, se ovalor
acrescentado pelo trabalho for superior ao valor da tela, a mesma seri de
Tania. Se, pelo contrario, o valor acrescentado pelo trabalho nao exceder
covalor da tela, a mesma seré de Ursula.
Em qualquer das situag6es descritas, a parte a quem couber o direito
sobre a tela ¢ obrigada a indemnizar a outra do valor que lhe couber
(artigo 13362, n# 2, do Cédigo Civil). Assim, se a tela ficar para Tania,
esta terd de indemnizar Ursula do valor da mesma, Se, pelo contrétio,a
tela ficar para Ursula, esta terd de indemnizar Tinia do valor do trabalho.
Se Tania estiver de mé-fé o direito coisa transformada cabe a Ursula,
tendo Tania o direito de ser indemnizada apenas se 0 valor acrescentado
for superior, em um tergo, ao valor da tela, Ainda assim, neste e280, 0
‘montante da indemnizagéo é apenas 0 correspondente ao que exceder
esse tergo (artigo 1337. do Cédigo Civil).
Apesar de o legislador ndo explicitar quando ¢ que existe boa-fé do
especificador, recorrendo a solugdes andlogas (artigo 1340, n? 4, do
(Cédigo Civil), deve considerar-se que ha boa-fé do especficador sempre
ue este ignorar, sem culpa (boa-fésubjtiva ica), aquando da especii
‘ago, que a coisa mével pertencia a outrem.Posse
exrgho vos pmsTTOS EME
caso pritco, o regime concretameny
cnsierandos doe 80 SUT. apossamento de Tia a
clvel serio dase ualmente séo colocadas cojgay
1 onde babi cols
ae oa pretendem para Assim, nfo de
cs seus proprictirios sanclas, faz sua a coisa (ainda
rnduta de quem, nestas circunst ae
ronan pea
a sidoabandonad
Se que ado dentro doregine daespciicagi de boa 6, cong
vandvo act de Tia er uma pintora de renome eo clevado preggg
pad tera no merado ¢ de conclir qu, ainda que a tela pudgy
crarulmente ser restivlds forma primitive (Porventura, eli
Tea pntra com vn) havera perda do valor eriado pelo
deTinia. 4
Em face do exposto Tani aria suatelaporstransformada, estan
obrigada a indemnizar Ursula do valor da mesma. Improcede, pois, apr
tenséo de Ursula, que apenas poders fica com a tela, pagando o valor
pintura,
16. EXTINGAO DOS DIREITOS REAIS E POSSE
TIAGO SOARES DA FONSECA
Hilder adquiriu a propriedade de uma quinta, no interior do pal
por sucessio de seu pa, falecido em 2000, Por essa ocasiéo,
2.000 €.
Tendo-se incompatibilizado com Isabel,
Fe | no final de 2010,
einige nae ote ds guint, impedindo I
Pee 4
deserccnteane ht Pusarinse de modo diferente: um ano 8
Seser lad ents os ainda era vivo, agervisfo
junto ao seu prédio, irnude de ter sido construida uma estrada muni
(A808 PRATICOS DB DIREITOS REAIS
Recentemente, em 2018, é publicada nova legislacdo, relat
pera de terreno ue obrign os proprictiris ate ie 2
faa limpeza, sob pena de aplicagio de clevadas mula. Preocupado com
4 situagio, Hélder obtém tum orgamento para limpeza do seu terreno:
2,000 € por ano, mais IVA.
Concluindo nfo ter condig6es para tratar da quinta, Hélder coloca as
chaves da mesma num envelope, enviando-as ao presidente da Cémara,
acompanhadas de uma carta onde se pode ler: “Exmo. Senhor Presidente,
Junto rmeto mv anez, as inias ches da quinta hedadado me pt, ore de
“nus ou encargos. A mesmnaé, a partir do present, do Estado?”
Quid turis?
RESOLUGAO!
presente caso pritico suscita diferentes questbes relativasa extingio
de direitos reais. Mais concretamente, a extingio do direito de usufruto,
do direito de servidao e, por fim, do préprio direito de propriedade.
Observemos.
Relativamente a0 direito de usufruto, encontra-se previsto nos artigos
14392 ¢ seguintes do Cédigo Civil, sendo definido como o dieito real
de gozo temporario e pleno de uma coisa ou direito alheio, sem alterar
‘sua forma ou substincia, Quanto & sua extingéo,o artigo 14762 refere,
nas alineas a) a ¢) do seu n. 1, as diferentes causas de cessagio do usu-
fruto, ndo sendo a situagdo do caso pritico reconduaivel a nenhuma des-
tas situagbes, Assim, se se entender que as causas de extingio do sufruto
constantes do artigo 1476. n° 1, sio taxativas, haverd que concluir pela
subsisténcia do direito de usufruto. Se, pelo contrario, como parece ser @
solugao mais acertada, se considerar que as causas de extingio al previs-
‘as néo slo taxativas, haverd que indagar se estamos perante uma ours
causa de extingéo desse direito,
Aatuagio de Helder, o proprietirio,relativamente a Isabel, «usufru=
‘tuftia, traduziu-se numa oposigéo ao gozo da coisa objeto do —
‘oncretizada num desapossamento por meio de substtuigio das
duras que do acesso ao controlo da quinta.ros nEAIS# POSSE
xrgho 08 DIE
Acposigto 20
de eo do direl
termos do dpsto mo atge
ssueapio, da liberdade do
5 iv, “a agua
749.1, do Codigo Civil, “a agus
ae darsequando haja por parte do prop
ari da send” Ouse}, a oposian
adapt een i eate ao exertco da servidto pelo prop
re Sominante, mantid por cero petiodo de tempo a
tario do pr 1 da duragéo da posse para efeitos de usucapidio (any
aa as do Chdigo Cl) ~ pode conduzi &extinglo do diettog
menor onerador.
de Helder nio se dé relativamente a0 exeretcio da
ue ee coloca é se a usuapio eran, expressamente prevista a propé
Tissertespredils € un facto extintivoespeciic deste direito rea
tum fact emit gral dos dritos reais de goz, segundo o qual ao
sigio do titular do direto real maior ao exercicio do titular do direito
menor, concreizada no desapossamento do titular do direito real meg
pode, em certas circunstincis, levar & extingo do direito real mes
‘Ainda que se acompanhe a doutrina segundo a qual a usucapio i
um facto exinivo geral dos direitos reais de gozo, a sua efetiva
«lo dependeré do preenchimento dos seguintes pressupostos:a
do titular do direto real maior, 0 decurso do prazo e a invocagio
benefcirio. Ora, apesar de existir uma oposicdo de Hélder ao g
usufutuiia no estariapreenchido.o decurso do prazo legal
ara a usupi libetatis ser efcz [artigos 1594., n° 2, e 129
‘do Cédigo Ctl} nem to-pouco houve invocagao da mesma pel rs
ot alee (rtigo 303." exi artigo 1292, do Cédigo Civil).
0 dirt de usufrto ndo se
SS ae
(64805 PRATICOS DE DiREtTOS REALS
Quanto sus extinglo, o artigo 1569" refere,nasalineas a) a4) do sun?
1s diferentes causa de cessagio da servidio, Em causa poses ne
sua exting por no uso, Sabe-se que a sevidéo em proveto do pédia
de Joao deixou, a partir: ‘de dado momento, de serutilizada. Sabe-se ainda
que foi numa data anterior a 2000, ainda que por esclarecer, Assim, con
firmando-se que, em 2019, a servidio nao foi utilizada durante 20 anos
~ contados a partir do momento em que a mesma deixou de ser ubiizada,
qualquer que seja 0 motivo para o seu nio.uso {artigos 1569.,n°'1,al.5),
1570, n~*1, do Cédigo Civil] -, poderiamos estar perante uma causa de
cextingdo da servidio,
Na hipétese de se concluir que, em 2019, haveria um nfo uso por umm
perfodo inferior a 20 anos, poderia, ainda assim, dar-se a extingio da ser-
vidio por uma outra causa: a sua desnecesidade. Importatia, para tanto,
distinguir se a serviddo em causa era uma servidso coativa ou voluntéria,
uma vez.que somente as servid6es coativas se podem extinguir por des-
necessidade (artigo 1569,*,n2*3, 1+ parte, do Cédigo Civil).
Estarlamos perante uma servido legal ou coativa sea mesma pudesse,
na falta de constitulgSo voluntétia, pr recusa do titular do prédio ser.
viente, ser imposta coativamente pelo benefictério do direito & servidio
(artigo 1547, 2, do Cédigo Civil). Por exemplo, uma servidao de pas-
sagem nos termos do disposto no artigo 1550.° do Cédigo Civil. elo con=
ttirio, seo direito de servidio s6 pudesse ser constituido por acordo das
artes, isto é, se ndo existisse um poder potestativo A sua constituicdo, a
servidio seria voluntétia. Por hipétese, uma servidio de passagem fora
‘dos casos previstos nos artigos 1550." e seguintes do Cédigo Civil.
(Ora na hipétese de a servidio de passagem entre a quinta o prédio Z
ser uma serviddo legal/coativa de passagem (p.¢.,em beneficio de préio
cncravado), significaria que, um ano depois de a mesma ter sido consti-
‘ulda, se tornou aparentemente desnecesséria, em virtude da construgéo
de uma comunicagio com a via piblica pelo prédio dominante, de que
resultou a perda de qualquer utilidade para a sua subsisténcia. Nessa cir-
Cunstincla, Jodo poderia, com tal fundamento, pedir a declaragio judicial
da sua extingto (artigo 15692, n. 2, por remissdo do artigo 1569. n.°3,
parte, do Cédigo Civil),
Por tltimo, relativamente ao direito de propriedade, estava em causa
‘tadmissibilidade da sua extingio por rentincia do respetivo titular, Bspe-