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JACINTO DO PRADO COELHO ALETRA EOLEITOR 2! eigho mores Sobre as ideias estéticas de Fernando Pessoa ‘Como térico da arte da literatura, Pessoa é um homem de espirto ‘europea, formadono convvio de autores egos latinos ingleses ales € franceses. Nio concebe uma cultura fechada sobre si mesma, E numa Perspectiva europela que situa habitualmente o caso portugues, ora ‘quand define o«pénio» do nosso pais, criador dum dos elements bisicos a chilizapdo moderna—a universlidade —, como se acentua em Erostratus, ora quando sublina a nossa pobreza clturl ecaracteriza 0 “provincianismo mental portuguese, ora 20 annciar, eto prof lum grande © nov Renascimento que Portugal vai dar as mundo. Valoria rasgadamente opre-romantic Jose Anastcio da Cunha porque ‘representa, no século XVII co primeirolampejo da alvorada noorizonte da iteatura portuguesa pois consttula primeira tentatvadedsslver& forma endurecida da extupider tradiconalista pelo proceso ual dos iiltplos contacts culturas» (Paginas de Estéica ede Teri e Critica Literitas de Portugal 1780, onde bem transparece 0 patria eclare ‘ido, toledo nium melo ingrato, mostram quanto fl cerciro o juizo de FFemando Pessoa. No fragmento que traz como titulo «Sobre yn inguéito Iitertion, Femando Pessoa, observando que Portugal constitu sum cespécie de adjacncia civilzaday da Europa (-Exire-pertencemos Europ), que somos um pas, «so de potas como dizem or dita nas , como tlc uma verse dfn, Pessoa um Weal risus Os presspostn Ines vie criss ot Sepetens eters os Imistrioquc reside naorigem deo sO falocspantons— unico ato Auéntico de que ay colts eristem (.)€ propria la de vos friess—ipse num pass de Bosra al 8 Tabacariar de Aveo de Campos) Omando com aura ou Tusa «inapacdade dedsvendoro aut porg metatsics x inldade do expetaculo em qucada un dens deserpena ose papel otic o pel de eri eco 0 _papel de rico PoP prace marge o homem deg, qual fora qe provoca ob -prima,portador de seeridade> ~ els prguntas pars as quai sca Aimparona sabedora lisa: eninaramonGeposque tudo de oe divin, st estrano so nono entendiento eae noma vontade> (Athena, in Pinas de Dourina Esc, pa. 182). Nao obtane apregoarunespinitocienic,falimenteperde pedo concrete evadese para um mundo slirio de enidader mctaficn de estcls, de rqutiposcomprometend, sim opropiita (ou sno? de tala 2 Ge me vet, relearn para os longs da opi. Discoreexolancamene, multipin on ses weridos dina reparte, ol, lassie, baseado em defines termine: er ‘studar detidamente a crea em si mona, an sun originaliade, tas suaesruturay em verde situa autores cabrasnarespetvaredede Telacies entre reaidadesconcetas, gando 0 lerrio m0 Politico, 20 econémico, a0 linguistic, integraon sumariamente em fategoras, em conceltin pads (genon,wlalenton, sespron sii roles, i). Del a_peiemiei. do wo dt literature sobre orice ieriig ui ator, us ob, era ats das vas, de snples prec de Tasso ORGS Da SED doematinnc © caquematamo vem agravaro fechamento 10 abstracto, na expeculasso spurae. Cero & que, numa carta a Miguel ‘orgs datads deJunbo de 1930, Pesonrefutaa acusagio de dogmatism {Nunca sou dogmitice, porque ono pode ser quem dedi para dia muda Ae epinia e , por temperamento, instavel eRutuante.» 0 que sucede, portin, € que, de cada ver, alirina de modo categrice; nos inediton Feuidos em Paginas de Esttica ede Teoria e Cries Lierarasencontra 0 Teitor tuna sucessdo de jnion dogmdtics, que podem completarse ou ‘ormoborarse mas podem tambem contradizerse. NSo usa ui estlo lentsistico de quem procura na duvida: nao expoe problemas: nunca factor, principios, lei, Svido de arrumario de scvera hirargul Tana, contudo, jastapor as verdades parca das suas rellexoes (co ‘nuldadeedescontinuidade na stra da cultura, independénciae depen ‘ércia do genio. relago 4 sua époa, ee) parasentrmos ox problem scam els exigencies engabantes, mais comply dite eee ca nto neceusariamente isesiadagenguanto a compreens¥o da vida € «percoca absracta dat Tnteigencia-,«acgdodesenrola-se numa efera parte: Paraa vida io pode haver mestres, porgue st Ils fatai, que a regem, im uma Sutoridade absolvtas, in Paginas de Estica, pag. 49 (eonfrontar com, Aifeente stitade na resposta a0 inqverito de Augusto da Costa sobre ‘Portugal Impérios:reconhecido ofacto de um povoprecisardemitosque ‘diamizem,oitclectusl pode intervrnventandoedifundindo mite) (Os nexos entre o pensamento esteico de Fernando Pessoa 0 sau, Pensamenta politico social, ou, pelo menos, aspectos, directriaes de ume {de wutro, parecem-me ntidos.Definidoo reno da arte como reno do incompatbilidade entre o temporal © 0 labstraimos de realidades coneretaslcalizadas no espago eno tempo)-0 hhomem de genio sera aquele que supera a sua epoca por estar sem erences i rns: See a eee Fatam wacima da espéces, tudo ¢ permitdo: os gulros sao meros ‘conponentes da massa ignaa, sto os chomens da espécies notes que todas as mulheres, sexo cuja fnalidade € prorat, se inluem nesta ‘categoria: «O bomem da especie nao pode er opines {do ndividvo,e desde que um bomem pertnca ore familia, uma classe a qualguer coisa que cnstitua ambiente i ‘ive dea de serum indviduo para ser uma cilula qualquer» (iginas de 13). Com esta concepgso mii, desumanizante do penio ‘onjuga-se uma concepcio antidemocrticada arte, cua fun consist mas sin em distancia: ~Toda aarte que fica eta para at arstocracian() A nossa arte (de moderns) ¢supremamente cate medaloe arstocritca, ands, porque wma are arstoritics we torna necesiia teste Outen da cvieaao erence, om ee aden antes 3h que, par de qualquer manera rag, no incu & nox ti, feeirectenetts rogers oreaueet ceieeanaet {farapor==s Barer do requ cmotio cds Wath nsccndre- ‘Br ean sparc al Fob + OL ple Te) PESTS as, NUTR O eater Osta een dob ner dovtevtinwe emdante Mansa poesia¢ para cctos, nto nko quer dar, na concep de Pessoa, que sc apenas um dvertimento um manjar de priviegado. 0 fealsnobre oma dgaicante acre eral opr da Mislc eda Iisis mals ceva ands que amis, porque toda palara come insrumentocnvolve un mal sto gras di absracs, xno, como es aluvrn ta sbsiracco prema (i, pig. €) Conforms ensnaha Goethe, im don grandee mentors do clasictomo de Fesum, sum case Singular ora-egerl epotcoprecisamente placid er vatadopor ten poctas a poeta realizes oe resto do particular pars ounivera domibjectivo para oobectivo vogue compete, pls avarta que quer txprmirdetcrminads sentiments por exe Peon), € ena Sse fentimento suit que cle ena de emu coms ntclnentor ndlogor lor tron homens, ¢ no o que enka de peesal, de particular e diterete’ dems sentimentors Ub pig 10), Por um proenss “alguimico de depuraio, o parts e com ceo leitor de posal erguese cima do partly do eat: Conta loge x poet una rma ‘Fedaropia Ein eto sons sn, De eordes neste poo com Beude Thre Pessa deende 3 astonomin da psa a obra dere ovale el ttlidade os ela verdade que conta, ve uma invensdo com valor Absolut thi pg 15) mas endo gore apericgoamentoda mundo xeriors (iid, ag 18), também uirapertegonment do omer oceu fim no €cagradar» mas sclera 0, shor sina, no case da at Superior, (pig. 209) Este pass de Ersraus pareceme extrema ‘mente signifcativ. Peson adopta a concepdo, ja vimos que de rai atisotlie, do poeria como organising, como farts: Nie considera orémn, forma onstituida por extuturas sonora independents dese ou ddaqucle sentido: a forme, para ee, €consttuda por cis; enretanto, Sendo tas ideas, a cra artista, clementos formas, no importa quay ‘sjam, sb mportaqucscjam slevadasrcsagradives» Dai que posamos ‘mira ivamente um grande pocma, embora rej men seis que 0 alimentam,tomadas estas em st mesmas, dof como cements formas dla obra mas desinegrada dela. poesia no ¢ apenas misia de paves, €o que dz. mas o que diz devemonreebé-lo como mensagem ettca, ‘eros assim em que se apronima ¢em que diverge Pessoa dat corentes critcas menconadas, Claro esta que, nuts lugares, completa ose pensamento, dando ‘ais ateredo ao facto de o pocma ser uma ciara verbal pondo em realce, partanto, op valores da palavra. Outtas reflexes insertas em Péginas de Esticae Critica Literirias ajodam a exclarcer a prec & teora da cigiopotica de »O porta um fingers Obcrva Pessoa ue tr apie de erodes produc grande poesia —emovies fortes mas Fépidas, spreendidas para arte logo que pastam mas nao ants de hhaverem passado; emogées fortes eprofundasnarecordagdo que deixam longo terrpo depois; falsas emoxses, sel, emogdes sentidas no inelecto.A base de toda arte é, nfo a insncridade, mas sim um sinceridagetraduada~ (paz. 217) Assim, © poeta linge emogtor 30 Fimaginadss senidat no intelecow,atsticamente sincera, © afingee, tambon, otras vezes, movies que humanamente sent, No segundo caso ha anda fingmento porgue a emoxdee pasam sr lor, so fttradas,transpostas em fungso da expresso poctica —e diz por «e palayras implica um process de intelectualizaio.«Aarteé a intlectua- Tizagio da sensacio sentiment) através dacxpresio, A ntelectualizagao dada na, pelae mediante a prop danse (ou de repetivse translormando-se) na inteligencia do poct a emopio de leitor sera ainda outra porguc a palavras do pocms, so estimulos que, provocando um estado de alma, aloo determiam na fotalidade. No acto de ler convergem 0 objective 0 rubjetvo. Pessoa identifica na palavra strés coisas dstntas—o sentido que tem, ot ‘sentidos que evoca e 0 ritmo que envolve aquele e estes sentidose ‘Os sentidos que evoea«variamh de individuo pars indwidwo, comforme ae Dreocupagées, a cultura e outros elementos que contribuam para & ‘ssociagdodeidelassApalavra lima por enemplo, tem pars wm sentido secundério de sespiritualidades, para outro 0 rentido secundario de sirrealidades, et. (pig. 79) Pessoa podia conduit mais loge a andlise, fendo em conta os valores conotativor (no concepts) dos termor, ‘eparando na ineracego de estruturas sonore estruturas semantcas, ‘bem como no jogo de relages entre a palavra eo cntexto, Nao o fer, suponho, quer por desconhecer as aqulsigoes da linguistica moderna, quer or serintelectualista a sua cancepeso do fendmeno iteriria. reso, ainda aqui estétiea do classiciamo, pensa que o poeta nio ‘deveexploraramargem deindeterminacio exiatentenapalavra que deve ‘antes procurar a expresso clara, Inequivoca, de sentido nko" «nem & Possivel construir uma frase a que no se osta atribuir um sentido ualguer. © que é preciso @ que ese ‘sentido qualquer” sa 6 um, eno. possivelmente um de varios» (pég. II). E assim ‘Que considera aceltivela frase de Eaquilo-orisonimeredas ondase mas ‘condena ottulo © CorapdoImimero do iro de una poctsa francesa — isto porque na primeira oepteto « tem um sentido e no titulo pode tr virios. Modernament, ndo a etéticareconhece que va cra de arte & ‘uma mensagem fundamentalmente ambigua, uma pluralidade de sgn ficados que cocxistem num sé sigalicantes, como os artistas tne ‘explorarintencionalmente a ambiguidade fazendo dela um fim expliito ‘obra, um valor a realizar de preferéncia a qualquer outros (Umberto co, Opera Aperta) A cota esttica de Pesoa prope, oad ieal da obra fechada, que redux a indispensdvelacolaboraa do itor Gist. ‘menos. ao nivel do termo ou da frase) Entretanto, a sua obra potia, "co ela ado ane Out 9S 9 SOBRE 4S 1DEINS ESTETIEAS DE. FEANANDO PESSON a» “esdabrata em ortonima e heterdnim atinge noutro plano a ambigu ade ple facto de sere diversas, e ate antindmicas, emborainterdepen- lentes, os atitades expressas (modos de enfrentar vida, filosfias Dritias), no havendo entidade que, estando de tora, eej2 uma em, Aeslavor das outras —c expelhando assim o drama em gente> que €2 fobra de Peston a propria ambiguidade do mundo, O poeta cumpre-e dando lire curs ds suas varias linguagens, busce-se no encontro da ‘expresso miltplescomo um nada tabalhandonomada»paraplicars rave de Hegel” Em certo sentido, pos, obra poctica de Pessoa, com se logue de virtualdades exprssivas ea sua ambiguidade esens spantosumente beri, Efic-me asensagso de que a doutrina estética do, lhutor nie corresponde & pertrbante modernidade da sua poesia, onde a Fa 0 fT exlsopermanentemente em ogo. 2 mgoarid por Morice lace La Pr dF, 6, 19, p38

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