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Carfruto 1 PrQUENA REFLEXAO soBRE CATEGORIAS DA Teoria Crtrica po Esraco;Terrtroio Usabo, Terrrrorio Praricapo Ana Clara Torres Ribeiro Milton Santos, em algumas de suas iiltimas obras, propée a (cc)valorizagio analitica do. territério. Acreditamos que essa revalorizacio esteja relacionada com as porencialidades do territério como “ponte” estrategicamente posicionada entre a teoria critica do espago e a agio politica. A centralidade atribuida ao territério manifesta-se, por exemplo, no livro, redigido com Maria Laura Silveira, O Brasil: Territério e sociedade no inicio do século XX1, ¢ também em alguns artigos Neste texto, gostarfamos de refletir sobre a naturcza dessa “ponte” ¢ de consideré-la como mediagao ¢ contexto para o didlogo transdisciplinar. Essa “ponte” possui uma dupla face. Na primeira acontece a énfase na problematica do poder. O territério, como fato © condigio, manifesta ¢ condiciona o exercicin da poder. Sua valorizagio corresponde & tradigio analitica ¢estratégica da geopolitica, continuamente desdobrada e agugada nna modernidade. Voltemos a Maquiavel (1469-1527) Quanto a (.) fo principe] deverd habituar 0 ‘corpo aos incémodos naturais da vida em campanha aprender a natureza dos lugares, saber como su 05 montes, como afundam os vales, como jazem as planicies, e saber da natureza dos tios edos pintanos, + empregando nesse trabalho os melhores cuidados Esses conhecimentos sio titeis sob dois aspectos principais: primeiro, aprende o principe a conhecer bem o seu pafs e ficard conhecendo melhor os seus meios de defesa; segundo ~ pelo conhecimento prstica daqueles sitios, conhecerd facil te qualquer outro, que the seja necessério especular (...) pelo conhecimento de uma provincia pode-se facilmente chegar ao conhecimento de outra (Maquiavel, 2000, pp. 141, 142). Nesta pequena citagao emergem, conjuntamente, condigio da agio ¢ projesao da ago, dependente do conhecimento praticado ¢ vivido do territério, Também nesta citagio, existem alguns elementos que permitem recordar que 0 Principe ¢ uma idéia viva, que sustenta a formulacio do conceito de agio politica. E a reflexao que permite a Gramsci reconhecer © Principe no partido pol ico, inscrevendo-o na problemética do Estado, na configurago da vontade coletiva, na luta por hegemonia e na dialética entre sociedade civil e sociedade politica Em Gramsci, a agio politica envolve tanto 0 conhecimento histérico como 0 conhecimento geogrifico, jé que é de natureza politico-militar ica, mesmo na auséncia da guerra. Afinal, a arte da politica, desde Maquiavel, & uma metamorfose da arte da guerra. E assim que Gramsci, na anilise da correlagio de forcas sociais e politicas, propée a consideragio simultinea de trés momentos espago-temporais: 0 momento “Esta relagio é a que é uma realidade rebelde: ninguém pode modificar 0 imero das fizendas e dos seus agregados, o niimero das cidades com suas populagées determinadas’ (Gramsci, 1968, p. 49); 0 momento em que se adquire a consciéncia da solidatiedade de intetesses entre todos os membros do grupo social eo momento “em que se adquire a consciéncia de que os préprios interesses corporatives, no seu desenvolvimento atual ¢ futuro, superam o cfreulo corporativo, le grupo meramente econdmico, ¢ podem € deve tomar-se os interesses de outros grupos subordinados” (Gramsci, op. cit, p. 30). Gramsci ainda afirma que na histéria real esses 11s momentos se confundem, combinando-se ¢ dividindo-se segundo relagdes horizontais (as atividades econdmicas ¢ sociais) e relagbes verticais (territérios). Dessa maneira, existe na problemstica gramsciana a compreensio simultanea dos, circulos de cooperacao € das escala, envolvendo agio ¢ espago através do conhecimento do tertitério e das condigdes (objetivas e subjetivas) da agéo. Na segunda face do retorno ao teritério, na obra de Milton Santos, reconhecemos a preservagio da ex incia analitica criada pelo trabalho conceitual, anteriormente realizado, em corno da problemstica da ago Assi iden da dialeticidade estab: além da centralidade da politica e da questao do poder, é necessétio 1, na (te)valorizagao do tetritério, os desafios tedricos decortentes ulada por este autor, entre sistema técnico e sistema de acio, entre tecnoesfera e psicoesfera (Santos, 1996) (— Acrediramos que a equivaléncia (articulagio e oposigao) entre técnica, \ caminho privilegiado para a pesquisa do espago, ¢ ado, caminho privilegiado de acesso aos vinculos entre passado, presente ¢ futuro, corresponde exatamente intengio deestabelecer, de forma irretocivel, a indissolubilidade |entre espago e tempo, forma e contetido, como proposto em A natureza do espago: Técnica e tempo | rato ¢ emogéo. Para Milton Santos, como para outros teéricos da politica, a ago retine scida, na teoria critica do espago fo atividade (economia) e projeto/transcendéneia (ago politica). Nas palavras de Gramsci: “(..) sendo a realidade o resultado de uma aplicacao da vontade humana & sociedade das coisas (do maquinista & méquina), prescindis de todo elemento volunciio, ou caleular apenas a intervengao de vontades como elemento objetivo do jogo geral, mucila a prépria realidade nsci, ep. ity p. AI) Na obra de Milton Santos, a agio, na plenitude da sua afirmagi pris, espaco. A agio € portadora do tempo na ;a medida em que manifesta, no mesmo ‘épria espacialidade das técn nento pratieo € politico, as condigdes historicamente herdadas ¢ 0 projeto da sua transformagio. Sem a consideragio da vontade, isto & sem a apacidade de superagio do herdado, do passado “presente ho haveria a possibilidade de um humanismo concreto (ver, por exemplo, Santos, 1987), daquele humanismo, verdadeiramente existencial, que horteou a vida de Milton Santos. Essa é rambém a orientagio analitica de Sartre, como demonstta a cate- 1 por Milton Santos. Recordemos pala goria pritico inerte, tio valoriza vras de Sartre: O fim se enriquece no decorrer da empresa, desenvolve ¢ supera suas contradigdes com a prépria emp do objeto produzido supera infinitamente a do fim sa; terminada a objetivacao, a riqueza concreta (tomado como hierarquia unitéria de sentidos) em qualquer momento do passado em que o consideremos. Mas € precisamente porque 0 objeto nao é mais tum fim: ele é o produto “em pessoa” de tum trabalho e existe no mundo, o que implica uma infinidade de relagées novas (Sartre, 1967, p. 129). Dessa maneira, a praxis inscreve designio em condigdes herdadas e cria designios, condigdes objetivas esubjetivas que esto para além da finalidade ‘que imediatamente conduziu a ago transformada em materialidade. Existem relagées previstas c imprevisfveis entre objeto © ago, 0 que constitui a condigio do acontecimento, compreendido como existénciae projero. Par: 4o entre dois momentos de Sartre, apenas 0 projeto, como media objetividade, possibilita a compreensio da histéria e da prépria criatividade humana (Sartre, op. eft, p. 82- 83) O projeto, que € portador da forga necessétia & superacio potencial da ce daalienacio, exige a compreensio dos sentidos da ago e, assim, refi da propria existéncia, O projeto contém a tebeldia da agio ¢, portanto, contém o principio da liberdade, que resiste, por exemplo, & globalizacio como prope Milton Santos em Por uma ourra globatizagia: Do pensamento tinico & consciéncia universal. A nogio de projeto introduz.a passagem presente“ futuro, expressando 1 poténcia da praxis. Articula técnica e agio e caractetiza a agao de naturera propriamente politica, como esclarece Renato Janine Ribeiro em sua leitura de Maquiiavel: “A politica tem a ver com a construgio do tempo. Nenhum politico, portanto, pode agir apenas considerando o que é certo ou errado segundo os principiost precisa levar em conta a duragio, a continuidade do jue faz ~ numa palavra, os efeitos ou resultados de seus atos” (Ribeiro, 2000, pp. 196-197) Também aqui, a dimensio temporal da acio traz o espago em sua esséncia, na medida em que a duracio possui, entre suas exigencias, 0 entaizamento, que é, por sua ver, condicio da permanéncia, Desse tertitério, acto, projeto, préxis consticuem a substincia da dinémica © que € menos observado ¢ do, societaria que direciona os fluxos e, compreendido, conduz a atualizacio de fixos ainda mais, a agio propriamente politica ¢ portadora de uma dupla cexigéncia. A primeira corresponde & necessiria sagacidade e& velocidade na definigio do projeto ¢ em sua defesa. A segunda expressa-se na duracio, no cenraizamento de priticas e normas sociais, na territorializacio de objetivos / metas que, nas esferas da politica e da cultura, surgem como aquele “senso de realidade” que viabiliza o alcance do convencimento ¢, portanto, 0 exercicio (legitimado) do poder politico. Na fase contemporanea do capitalismo, o império da velocidade e da esperteza,sécias da aceleracio do mundo (Santos, 1993), impde-se, de forma quase isolada, sobre a duragio, impedindo a afirmagio de projetos politicos verdadeiramente contra-hegemdnicos. E essa situagio particular, permitida pelas catacteristicas do meio técnico-cientifico informacional (Santos, 1994) @ imposta pela acumulacio financeira, que transforma, de maneia contraditéria, a duragio (entaizamento, territorializagio) em condi¢éo indispensivel & disputa conceeta do fututo, Trata-se assim, de um periodo que, ainda mais do que em qualquer momento anterior, exigea equivaléncia paco — tempo na concepcao teérica ¢ pritica da agao politica, Fssa exigéncia de conquista da duragéo, na luta contra-hegeménica, explicaria, 0 nosso ver, odidlogo novo e transformador, proposto por Milton Santos, da acio politica com ax hamens lentos, qie confarmam a maioria do povo. Nesse didlogo, a duragéo interage com a experiéncia humana da lentidao, com a sistematicidade (apropriagio de recursos) produrida pelos pobres: Cada lugar acolhe (...) sew pritico inerte local formando (...) uma tecnoesfera e uma psicoesfera, ambas suscetiveis de alteragio e mudanga, ainda que 4 primeira, a tecnoesfera, por sus materialidade, mais pertenca ao reino da necessidade, ao passo que @ veo sastcHo segunda, (..) mais pertence ao reino da liberdade. Se pobres, homens comuns, os “homens lentos” acabam por ser mais velozes na descoberta do mundo, seu 10 € pa comércio com 0 pritico inerte pode sé-lo, inseridos que estio num proceso intelectual contradit6rio e criativo (Santos, 1994, pp. 84, 85). Nesse olhar, a velocidade condutora da ago instrumental, do antficialismo e da imposigéo da técnica sobre o homem revertida por uma outra temporalidade, a da agio que “arrasta” 0 espaco em cada um dos seus movimentos téticos © sagazes (Certeau, 1998), exatamente porque assume as caracteristicas - contetidos e potencialidades indispensaveis & conquista cotidiana da sobrevivéncia. A agio enredada conscientemente no espago resiste as fabulas da globalizagao (Santos, 2000). Entre essas fabulas, encontra-se aquela que afirma a atual subordinacio do espago ao tempo, cujo limite é evidenciado, inclusive, pelo crescente e minucioso conhecimento do territério que orienta a fluider necessria & agio hegeménica, tao dependente do monopélio da técnica e da informagio, Em Milton Santos, como jé afirmado com relagio a Gramsci, as correntes fenoménicas que organizam a dinimica socioterritorial possuem uma dimensio horizontal e outra vertical acionéveis na andlise de contextos ¢ eventos. O conhecimento dessas dimensoes € indispensivel a0 desvendamento das estratégias dos atores dominantes € também para a emergéncia do local / lugar como contexto privilegiado da resistencia sociocultural A dimensio horizontal corresponde is atividades ¢ agbes que possibilitam a estruturagio da vida social: “Os lugares podem se unir horizontalmente, reconstruindo aquela base de vida comum, suscetivel de criar normaslocais, normas regionais (...) que acabam por afetar as normas nacionais € slobais’ (Santos, 1996, p. 206). Ji na verticalidade, Milton Santos reconhece 105 fatores e processos que criam a modernizagio alienada, distance da vida dos homens comuns: “(..) 0s vetores de madernizagio sao entrSpicos. Eles trazem desordem as regides onde se instalam, porque a ordem que criam & tem seu priiprio e exclusive beneticio. Isto se dé ao servigo do mercado, e ~ tende a corroer a coesio horizontal que esti posta ao servigo da sociedade civil tomada como um todo” (Santos, 1996, p. 206). Observamos assim, que na verticalidade acontecem tanto 0 impedimento daagio inovadora ecriadora, da verdadeira préxis, quanto a reafirmacio da dimensio territorial da alienagio. Ocortem, concretamente, movimentos de destruigéo nio-criadora, que retém inclusive a prépria dindmica disruptiva do mercado de trabalho. Historicamente capaz de destruit formas pretéritas de exploragio, como tio bem demonstrou Florestan Fernandes (1977), esta dinamica se faz, hoje, impedindo perspectivas de integragio social e 0 tempo da politica Como sintese histérica de investimentos sociais e condicio da praxis criadora, o tertitério assume, para Milton Santos, extraordindria relevincia tedrica e pritica. E a expressio latente da sociedade civil, cuja (re)unio, estabelecida nos (c entre) lugares, poder vir a apoiar, para retornarmos a Gramsci, a configuragao da vontade coletiva e o desvendamento de novos projetos de futuro, Vejamos essa concepao do territério nas palavras de Milton Santos: O territério €a arena da oposisio entre o mercado ‘que singulariza — com as técnicas da producio, a organizacao da producio, a “geografia da produgio” a sociedade civil — que generaliza ~ e desse modo envolve, sem distingdo, todas as pessoas. Com a presente democracia de mercado, 0 tertitério é suporte de redes que transportam as verticalidades, isto é, regras ¢ normas egofsticas€ utiliciias (do ponto de vista dos atores hegeménicos), enquanto as horizontalidades levam em conta a totalidade dos atores e das agGes (Santos, 1996, p. 207) Assim, 0 territdrio nao € apenas condigio da ag titica e estratégica, Manifesta, ao contririo, outras dimensées da experiéncia humana, /olvidas no propésito tedrico-politico de apreensio da totalidade concreta, Como afirma Karel Kosik: “A liberdade nao pode nascer da simples relagio objetiva com a natureza (..) Sem o momento existencial, que acomete 6 Vgggonee manipulagdo” (1976, p. 205). O impétio da da velocidade sobre o tempo vivido conduzem a vida alicnada, impeditiva, ca sobre a ago e o dominio como exige Sartte, do momento subjerivo entre duas objetivagies e, portanto, da. praxis. O atual perfodo histérico impée a superagao de fabulagées e, também, de ilusdes associadas 4 ago social, como aquela que estimula um ativismo permanente ¢ ininterrupto, marcado por um ritmo que controla a subjetivagao e que, desta maneira, impede a autonomia do sujeito social. Tal controle também se manifesta através de estimulos & disperséo de objetivos. Aliés, a manipulacio da psicoesfera procura reter a emergéncia ncinua do momento subjetivo mediante a ‘pansio do reino da necessidade. Esta expansio, que corresponde impede a ago propriamente politica: projeti e criadora onipoténcia da economia, , disruptiva, insubordinada ste ponto, nao resistimos a entagio de retornar a Karel Kosik: (..) a praxis compreende ~ além do momento laborativo - também o momento existencial: ea se manifesta tanto na atividade objetiva do homem, que transforma a natureza e marca com sentido humano os materiais naturais, como na formacio da subjetividade humana, na qual os momentos existenciais como a angiistia, a ndusea, 0 medo, a alegria, o riso, a esperanga, etc., no se apresentam pperiéncia” passiva, mas como parte da luta por reconhecimento, isto é, do processo de realizagio da liberdade humana (Kosik, op. cit, p. 204) (itdlicos no original). E assim que, cambém na revalorizagao do territétio desejada por Milton Santos, sio feitas exigencias relativas & superagio do economicismo e do mecanicismo, inclusive os de correntes que se afirmaram no interior do ilise marxismo, Em suas palavras: “O territério no é uma categoria de a categoria de anslise & 0 terivério usado. Ou sea, para que o terstéio se % torne uma categoria de anslise dentro das cincias sociais e com vistas 2 produgio de projetos, isto é, com vistas a politica, com 'P’ maitisculo, deve-se tomé-lo como tertitério usado” (Santos, 1999, p. 18). Petcebe-se que, nessa proposta, encontra-se presente um veio condutor da reflexdo que busca a superagao teérico e politica de andlises do territério aque se restringiram a reconhecer os seus usos, sem articuli-los a praxis Nessa em que ocorre o predominio da necessidade e da funcionalidade sistémica medida andlises, existe obsticulos 3 superagao do economicismo, n sobre as priticas sociais e a praxis. Ainda no dizer de Milton Santos: (..) €0 terrtério que constitu o trago de unigo entre © passado € o futuro imediatos. Ble tem que ser visto a expressio € (..) de Frangois Perroux - como um. campo de forgas, como o lugar do exercicio, de dialéticas econtradigées entre o vertical eo horizontal, cntte 0 Estado € 0 mercado, entre 0 uso econdmico ¢ © uso social dos recursos (Santos, 1999, p. 19) E essa concepgao do territério que permite enredar sistema técnico e io da totalidade concreta em que a problemitica do ser social envolve a experiéncia pratica do espaco ea valorizagéo plena da ago politica. O territorio nao é inerte. $6 0s atores sistema de agio numa proposta de compre hegeménicos podem criar e difundir essa fantasia, jé que nao necessitam, ou no querem reconhecer explicitamente, a agio do Outro. Aqueles que precisam construir condigoes de vida em contextos adversos no podem aderir a essa fantasia, que destréi a compreensio do jogo da politica territério usado, na perspectiva da dialética criadora entre sistema técnico € sistema de agéo, constitui, na obra de Milton Santos, uma configuragao espessa de mediagdes (maceriais e imateriais) que concretiza 0 agir politico, O tertitério usado e praticado. Assim é que se afirma em Brasil: Teritério e sociedade no inicio do séeulo XXI: Por territério entende-se geralmente a extensio apropriada € usada, Mas 0 sentido da palavra terrtorialidade como sindnimo de pertencer daguilo ero sa que nos pertence(..) ese sentimento de exclusividade ¢ limire ultrapassa a raga humana e prescinde da existéncia do Estado. Assim, essa idéia de territorialidade se estende aos prdprios animais, como sinénimo de dea de vivencia e de reprodugo. Mas a territorialidade humana pressupde também a preocupagio com o destino, a construcio do fucuro, © que, entre os seres vivos, é privilégio do homem (Santos, 2001, p. 19) (itélicos no original} Dessa maneia, na territorialidade especificamente humana, soberania autonomia articulam-se de forma indissocidvel, assim como tempo ¢ espago, emogio e razdo, liberdade ¢ necessidade. Na concepgio de territorialidade que orienta a (revalorizacio da categoria tertitério, no pensamento de Milton Santos, afirma-se a relevancia da agio politica, abrigando, 20 nosso ver, a figura do centauro de Maquiavel ou, como propoe Gramsci, a vontade coletiva: animal ¢ homem, lefo e raposa, economia € politica Por fim, é necessério ainda compreender, com Eduardo Griiner (1999), que Maquiavel, tornado esséncia da reflexao politica na modernidade, nao Eapenas um “clissico” Limitar-nos-emos a nos fazer metecedores do principal ensinamento de Maquiavel: a Histéria ¢ a Politica sio uma zona de ¢ em conflito, em perpétuo processo de redefinigio na luta pela refundagia permanente da pélis, uma luta que compete € compromete a todos ¢a cada um dos sujeitos sociais € politicos, e que se desenvolve na prdvis cotidiana, “dentro” ou “fora” das instituigdes na cultura em scu sentido mais amplo. A conclusio que retiro desse ensinamento 6 podeser uma. © “céssico” Maquiavel ainda nao € isto, aquilo ou aquilo outro: Maquiavel € um campo de batatha’ (Griiner, 1999, p. 267) (itilicos no original) (tradugao nossa). 8 ee sexo | Também com telagio a Milton Santos, devemos resistir 4s rentativas de ransformé-lo num “elissico”, Estas tentativas bucam controlar a forga propositiva do seu pensamento, Milton Santos nao pode ser prudentemente retido no passado. Nao! Milton Santos é um campo de batalha! As tarefas de construgio da teoria critica do espago precisam ser continuadas, em apoio 3 agio libertéria e transformadora. Uma obra ditigida ao futuro é sempre abertae, assim, capaz de abrigar novos questionamentos REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS CERTEAU, M. de. A invengao do cotidiano: Artes do fazer. BA. Luce Giard. Tradugao de Ephraim Ferreira Alves, Petrdpolis, Vores, 1998 (3. ed.) FERNANDES, E “Problemas de conceituagio das classes sociais na ‘América Latina”, In: ZENTENO, R. B. (org.). 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ORGANIZAGAO DO TERRITORIO BRASILEIRO: MontroraMENTO £ PLUIDEZ Ricardo Castillo Introdugio Propomos como objetivo para esse texto comentar duas idéias que con- sideramos muito importantes na obra de Milton Santos: a cognoscibilidade do planeta e a busca incessante por fluidez. no mundo de hoje e particular- mente no territ6rio brasileito, através da emergéncia e difusio das tecnologias da informagio como componentes dos sistemas técnicos atuais, s novidades do mundo contemporineo traduzem dois fundamen: conhecimento do meio a mobilidade geogréfica. Interessa, pois, discutit algumas das formas assumidas por esses dois fundamentos no periodo his geografia, pesentes no cotidiano de todas as pessoas desde sempre: 0 térico atual e suas repercussdes socioespaciais E de se supor que as novas formas conspiram contra a maioria das peso. agies verticais, freqientemente contratias aos interesseslocais e regionais, Pstado. conduzindo a um uso corporativo do territério e fundamentando em favor dos grandes capitais ¢ do aucoritarismo disfarcado do Como transformar essa suposigio em investigagGes concretas? Quais sio as bases tedricas que podem sustentara eaboragio dese conhecimento? Como identificar as varidveis significativas? Milton Santos, em sua obra, procura dar respostas a essas questoes, além de propor muitas outras. Cabe-nos agora 0 trabalho de substantivara

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