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Grandes Temas Critica literaria: em busca do tempo perdido? Joao Cezar de Castro Rocha | asev ds Eaoras Universitas pode revelar-se extremamente produtiva, afinal, a necessidade de “provar” a correcao dos nossos argumentos, isto é de “demons- trar” 0 equivoco dos demais, obriga a uma relacdo dinamica de lei- tura critica do alheio, assim como de explicitagao das conjecturas do proprio discurso. Espero que o leitor nao veja nessa proposta 0 fantasma de uma idealizagao ingénua da polémica. Refiro-me ex- clusivamente ao efeito estruturador de rivalidades teéricas e me- todolégicas na constituicdo do sistema intelectual. Tal hipétese estimula a releitura que esbocarei a seguir do papel da polémica na histéria da critica literéria no Brasil. n No principio era a polémica ‘A polémica como estrutura Neste capitulo, formulo a seguinte hipétese para renovar 0 ‘entendimento da polémica no Brasil: a modernidade da vida in- telectual do Pais dependeu de uma sucessio de disputas que criou um sistema interno de emulagao, responsivel pela vitalidade iden- tificada nas décadas iniciais da segunda metade do século XX. A fim de testar a hipétese, esbogo um brevissimo panorama de sua ‘ocorréncia. Recupero entao a ressalva do capftulo anterior, quan- do ofereci um percurso talver ainda mais veloz da polémica a0 longo de culturas e séculos diversos: em qualquer outra circuns- tancia, a brevidade do que segue seria inaceitavel. Desejo acrescentar outra reserva. No caso, devido ao interes- se que me move, valorizo os duelos de ideias em seu aspecto, por assim dizer, solar, Em outras palavras, recupero conscientemente 0 éthos polémico em sua capacidade de estruturagao sistémica, ca- pacidade que demanda a explicitagao dos préprios pressupostos ea leitura atenta, ainda que belicosa, dos principios defendidos pelo adversirio do momento. Devo, no entanto, reconhecer que B an eee muitas vezes as polémicas efetivamente ocorridas caminharam (e caminham) em diregéo oposta. Assim, em lugar de explicitar 0 conflito, oculta-se a divergéncia; em lugar de dar voz ao outro, busca-se torné-lo invisivel por meio da temida conspiragao do silencio; em lugar de estimular o didlogo, cultiva-se a epigonia. Nesse horizonte, a polémica somente favorece a proliferacio de subsistemas autocentrados e repetidores do conhecimento pro- duzido pelos mestres. Aqui, epigonia e marasmo transformam-se em moeda corrente e a vida intelectual recorda 0 cendrio descrito no inicio do capitulo anterior. Ora, nao idealizo a polémica em si ‘mesma, mas proponho recuperar sua vitalidade, com o objetivo de propor interpretacGes alternativas da hist6ria cultural recente, sobretudo da mitica disputa entre cétedra e rodapé. De qualquer modo, uma vez que a interpretacao dominante apenas vislumbra autoritarismo e narcisismo na polémica, recuperar sua poténcia na estruturacao da critica literdria e da sistema intelectual pode ser um exercicio pelo menos provocador. Uma brevissima histéria Trata-se, alids, de intuicéo plenamente desenvolvida por ‘Marcelo Coelho em sua anilise de “quatro polemicas que mar- caram a vida cultural brasileira ~ mas néo sé a brasileira ~ a0 longo do século 20"! De igual modo, Alexei Bueno e George 1. Coelho, 2006, p.7. Na sequéncia da frase,o autor mencionou as quatro querelas: "A primeira parte contrapOs os representantes do modernismo aos defensores ” Ermakoff organizaram uma sugestiva antologia, cujo titulo vale por uma entrada de diciondrio: Duelos no serpentério, Talvez es- ses dois estudos, em que pese a diferenca entre eles, possam ser considerados um sintoma importante. E como se a condenagio suméria da polémica comecasse a dar lugar a um entendimento estrutural do debate de ideias na formagao do sistema intelectu- al. No tocante ao oitocentos brasileiro, a caracterizagio precisa de ‘Afrénio Coutinho (alids, ele mesmo, um polemista notavel) escla- receu a centralidade de imimeras querelas nessa constituigao: século XIX notabilizou-se, na vida literéria brasileira, por numerosas polémicas. A da Minerva Brasiliense com Santia- ‘g0 Nunes Ribeiro, Joaquim Norberto, Gama ¢ Castro, Abreu Lima, Januério da Cunha Barbosa; a em torno de A Con- {federagao dos Tamoios com José de Alencar, Porto-Alegre, D. Pedro Il, Alexandre Herculano; a das Questdes do Dia, com Franklin Tavora, José Feliciano de Castilho, José de Alencar; a entre Carlos de Laet © Camilo Castelo Branco; a entre José de Alencar e Joaquim Nabuco; a entre Julio Ribeiro e o Padre Sena Freitas; e outras, culminando com a em torno da redagio do Cédigo Civil, entre Rui Barbosa e Carneiro Ribeiro, mais limitada a questdes de vernaculidade* A ultima polémica referida teve lugar em 1902, na aurora de um novo século, mas o hdbito polémico em nada perdeu seu do academismo artistico. Na segunda, debatem-se os prés¢contras da industria cultural. A seguir, expds-se o confronto entre adversirios e adeptos do nacio- nalismo estético, Por timo, vem as discussbes em torno do conceito de pés- -modernismo” (Coelho, 2006, p. 7). 2. Coutinho, 1978, p. 5. B —); UC brilho; afinal, “a passagem do século XIX para 0 XX no Brasil lL. laridade, especialmente as polémicas e, um pouco mais tarde, as conferéncias”? Por sua vez, as conferéncias poderiam originar no- vas disputas verbais, pois foi ao longo do século XIX que o sistema intelectual configurou-se de maneira mais metédica. Em conse- quéncia, as disputas de poder eram inadiaveis, envolvendo a ex- foi marcada por certos modismos literérios de grande popu- plicitagao dos préprios pressupostos: dai a onipresenca do éthos polémico, Embora sem nenhuma pretensio de exaurir 0 tema, ¢ importante mencionar alguns confrontos que ajudaram a definir a face da cultura brasileira oitocentista. A primeira geracdo romantica, em sua estreia, em 1836, identificou na critica ao passado colonial, portanto, & dominagao portuguesa, a formula para afirmar a propria identidade. Nas pa- lavras diretas de Gongalves de Magalhaes: “Nao se pode lisonjear muito o Brasil de dever a Portugal sna primeira educacio, que tio ‘mesquinha foi ela, que bem parece ter sido dada por mos avaras ¢ pobres [...]"* Tratava-se, entio, de encontrar fontes mais ricas para a inspiragéo nacional. E, assim como os paises hispanicos da América Latina, essa geracdo voltou-se para a cultura francesa, re- jeitando a heranga ibérica, colonial. Contudo, o paradoxo latente no chegou a ser discutido, pois, se, de um lado, abandonou-se © metro lusitano (ou o espanhol), de outro, propunha-se a “au- 3, Bueno, 2005, p. 11, 4, Magalhies, 1978, p. 146. Antonio Candido resumiu a contribuicio da revista “A Niterdi tem importincia por assim dizer de combate, como porta-vor da pri- ‘meira geracio romantica”. (1988, p. 26). 76 tonomia estimulada pela descoberta e assimilagao do Romantis- ‘mo europeu, especialmente o francés”* Goncalves de Magalhies provavelmente acreditou ter superado o problema pela adogao do indianismo como matéria definidora da poesia brasileira; desse modo, sua critica a heranga portuguesa oferecia uma alternativa autéctone: “Por alguns escritos antigos sabemos que varias tribos indias pelo talento da miisica, e da Poesia, se avantajavam. Entre ‘todas, os Tamoios, que mais perto da costa habitavam, eram tam- bém os mais talentosos [...]"* No fundo, o antilusitanismo pro- gramitico, presente na primeira geracao romantica, e com ecos na revolucdo modernista de 1922, impede que se assimile plena- mente um elemento sem o qual a cultura brasileira torna-se inin- teligivel: o portugués. F como se a bravata divertida de Oswald de Andrade - “Antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade”” ~ tivesse sido antecipada pela dic- so imperial de Goncalves de Magalhaes, e, em alguma medida, seguisse contagiando a vida intelectual. Evaldo Cabral de Mello tem razdo em sua critica a permanéncia anacrOnica do modelo romantico: “Ainda hoje resulta incompreensivel que os departa- mentos de histéria das nossas universidades nao oferecam regu- larmente cursos de histéria portuguesa, que permitam aos bra- sileiros conhecerem um passado que até a Independéncia é tio 5. ho, 1994, p.6 6. Magalhaes, 1994, p. 155. 7. Andrade, 1995a, p. 51 7 deles quanto dos portugueses" Embora a observacio seja correta, to a0 elogiar o talento artistico dos mesmos Tamoios de A Confe- vale a pena matizé-la em relagio aos cursos de Letras, nos quais a deragao. literatura e a cultura portuguesas possuem presenca assegurada no ‘Vimos, no capitulo anterior, que, na época em que Alencar curriculo. De igual modo, é importante compreender a motivacio foi diretor do Didrio do Rio de Janeiro, ele publicou a carta que antilusitana da primeira gera¢o romantica, pois ela proporcionou recebera de Lamartine, num golpe certeiro de autopromogio. Ora, um impulso unificador capaz de valorizar, por efeito de contraste, 0 no mesmo periodo, também aproveitou para publicar, sob 0 pseu- ‘que entio se julgava representar a expressio do propriamente bra- dénimo de Ig., uma série de cartas, condenando sumariamente sileiro: o indianismo? ‘A Confederagao dos Tamoios. Em suas criticas, Alencar defendia Duas décadas depois, em 1856, a grande polémica envolven- romance e nao o poema épico como o género mais adequado do José de Alencar e 0 mesmo Goncalves de Magalhaes, por oca- para a criagdo de um imaginério brasileiro autnomo. Na quinta sido da publicagéo do poema épico A Confederagdo dos Tamoios, das oito cartas escritas por Alencar, o leitor de hoje acredita en- ‘marcou época ¢ anunciou uma nova forma de compreensao da contrar 0 antincio de O Guarani: “Estou bem persuadido que se especificidade dos géneros literdrios. O debate envolveu, entre Walter Scott traduzisse esses versos portugueses no seu estilo ele- outros, Manuel de Araijo Porto-Alegre, oculto sob o pseudéni- gante e correto; se fizesse desse poema um romance, dar-lhe-ia um mo de “o amigo do poeta’; e ninguém menos do que o Imperador encanto e um interesse que obrigariam o leitor que folheasse as Pedro II, denominado 0 “outro amigo do poeta’, ambos defenso primeiras pdginas do livro a Ié-lo com prazer e curiosidade”” No res aguerridos de Gongalves de Magalhies. Por seu lado, Alencar ‘ano seguinte & polémica, Alencar langou a historia de Peri e Ceci; soube como poucos empregar o discurso polémico para propagar portanto, em alguma medida, o tom virulento das criticas criou um. seu credo estético ~ e esse é 0 ponto que mais interessa destacar, ambiente propicio, se nao francamente favordvel, d apresentacao de exatamente como 0 autor de Suspiros poéticos e saudades havia fei- seu préprio projeto, o que demonstra como o sistema interno de emulagio estimula a estruturacao da vida literdria. ‘Além disso, na sétima carta da série, ao condenar a expres- ee aes he eR ee Oe sao dos Tamoios no épico de Gongalves de Magalhies, é como se ela ali patarnrain Sc acta sere per aise Alencar antecipasse a experimentagao linguistica de seu segundo Sra, autor lmbrouthe a conerinca da cago de um curse de stra ianista:" ‘ ‘Portuguesa, mas seu interlocutor, que era antropélogo, olhou-o como se ele the ee ener i “stvetepropondo tanfrr para sua aronlaaademica ensine de ea nu lear ou de astonomi (Mell, 2003, p17). “[..] 0 indianismo na literatura bra €sindnimo de nacionalismo, assim co- smo medivalsmo do romania curpeu quer der anbm naconl ay (Casto, 1953,p-XLVID, 10. Alena, 1959, p40. B 79 da linguagem que o autor atribui aos indios, e que nao tem aque- le estilo poético e figurado, proprio das racas incultas; & excegao de uma ou outra comparagio, as vezes forgada, nao hé nada que se possa comparar as expresses simplices e graciosas de Paulo e Virginia’ Nessa passagem, o leitor tem a impressio de vislum- brar tanto o futuro projeto de tupinizagao do portugues" quanto 0 emprego sistematico do simile,” recursos definidores de Iracema € por meio dos quais Alencar buscou atingir 0 “estilo poético e figurado’ Num primeiro momento, o triunfo coube ao autor de Ubi- rajara. Mas como o feitico costuma voltar-se contra o feiticeiro, se Alencar tornou-se conhecido por intermédio dos duros golpes que desferiu contra o fraco poema de Gongalves de Magalhies,"* Franklin Tavora, José Feliciano de Castilho e Joaquim Nabuco homenagearam o mestre atacando-o sem trégua. Para o interesse do meu argumento, a polémica iniciada por Nabuco é a mais im portante, porque, assim como Alencar considerava ultrapassada a concepgio estética de Goncalves de Magalhies, Nabuco acreditava que a obra de Alencar pertencia ao passado da literatura brasileira, 11, Alencar, 1953, p. 54 12. Sobre o tema, recomendo dois estudos fundamentals: “Iracema: uma arqueo- graf da vanguarda’ (Campos, H., 1990, p. 67-74); “Iracema: a tupinizacio do Portugués” (Barbier, 2003, p. 513-526), 13, 0 estudo pioneiro acerca desse aspecto da obra de Alencar & o de Proenga (1965, p. 281-328). 14, Acstratégia deu resultado ¢, reconhega-se, muitas vezes representa 0 maior ab- jetivo da polémica: “Quando surgiu a Confederagio dos Tamoios de Goncalves ‘de Magalhies, José de Alencar era ainda um nome praticamente desconhecido em nossas letras” (Castello, 1953, p. VN) 80 deixando claro seu jufzo por meio de uma analogia maliciosa: “O Sr. José de Alencar comeca por dizer-nos que nao lhe merecemos as mesmas deferéncias que a platéia de hd vinte anos que aplaudiu © Deménio Familiar. Também nés temos feito alguns progressos € a queda do Jesuita parece prové-lo” Jesuita, portanto, prometeria o triunfo de uma nova geracéo, e Nabuco apressou-se em tirar proveito da circunstancia, apresen- tando-se como seu arauto, Essa polémica permite passar da teoria & prética, mostran- do que nao se trata de idealizar a polémica, mas de destacar as- pectos pouco estudados. Ao perceber que nao triunfaria sobre 0 jovem Nabuco, Alencar langou mio do velho recurso autoritério de desqualificagio do rival. Em sua resposta de 28 de outubro de 1875, principiou com um cala-boca ainda moderado: “E um es- tudo curioso e divertido 0 que eu fago todos os domingos, du- rante a calma, ao ler os artigos do meu estudante”* O tiro saiu pela culatra: 0 estudante nao se deixou intimidar; pelo contrério, tornou-se mais audacioso, revelando a erudicao, por assim dizer, ctiativa de Alencar, e trazendo a baila seu conhecimento muito particular do idioma francés. Alencar nao pde mais, encerrando a polémica sem responder ao iiltimo folhetim de Nabuco, saido em 21 de novembro de 1875. No entanto, chegou a redigir uma nota final, cuja acidez prefigura o furacio Silvio Romero: “Hé dois meses um mogo, desejoso de mostrar-se, apareceu na imprensa O fracasso de piiblico de 15, Nabuco, 1978, p.45. 16, Alencar, 1978, p.115, rif do autor. 81 fazendo a critica de minhas obras’” O mesmo mogo que ele foi em 1856, e que fez sua reputacdo por meio do ataque a Gongalves de Magalhaes. No tiltimo parégrafo, a desqualificagio de Nabuco era completa: Alencar nao perderia seu tempo “com um projeto de candidato, ou como se diz em giria eleitoral, com um filhote”™ Essa nota nao chegou a ser publicada; afinal, o telhado do roman- cista era de vidro. Ora, se Joaquim Nabuco era filho(te) do senador José Thomaz Nabuco de Aratijo, um dos mais importantes politi- cos do Império,"® Alencar também nao deixava de ser filho(te) de outro destacado politico do Império, célebre por sua oratéria, 0 senador José Martiniano Pereira de Alencar. Porém, continuo propondo que o recurso alencariano & ar- gumentacio ad hominem & menos relevante do que a proposicao de uma nova corrente estética por parte de Nabuco, pois, para ele, ‘a obra do autor de Senhora ja no dava conta das necessidades con- tempordneas e por isso devia ser criticada, substituida pela concep- ‘slo defendida coincidentemente pelo autor de Minha formagao. Um pouco antes, e respirando 0 mesmo ar, 0 movimento iniciado na Escola do Recife, ou seja, pela “Geragio de 1870”, tam- bém propunha a atualizacdo do meio intelectual brasileiro, e do seu seio safram polemistas do calibre de Tobias Barreto, Silvio Ro- mero € 0 proprio Joaquim Nabuco. Por isso, o ataque a Alencar 17, Alencar, 1978, p. 219. 18. Alencar, 1978, p. 219. 19, Ais, Joaquim Nabuco escreveu a biografia de seu pal, uma das mais impor- tantes obras da cultura brasileira: Um Estadista do Império (1998). Uma inter- pretacio inovadora do livo pode ser encontrada em Araujo (2003, p. 303-312). 82 nao foi um fato isolado; pelo contrério, deve ser compreendido ro ambito das imimeras polémicas iniciadas pelos partidérios da “ideia nova’, como a época se identificavam os principios defendi- dos pela Escola do Recife. Além de propor pressupostos filos6ficos e estéticos alterna- tivos, os membros da “Geragao de 1870” também contestavam a hegemonia dos intelectuais da Corte de Dom Pedro I. Tais polé- micas eram doutrindrias e, ao mesmo tempo, buscavam alterar a correlagio de forcas do sistema intelectual. Em termos atuais, as controvérsias oitocentistas objetivavam a criagdo de uma politica cultural renovada e descentralizada. No caso da Escola do Recife, posso dizé-lo sem diplomacia (e bem ao gosto de seu estilo): as periferias regionais disputavam a centralidade da vida literdria localizada no Rio de Janeiro ~ proble- ‘ma que ainda hoje nao foi de todo resolvido, pois a vida cultural se- gue concentrada no cixo Rio de Janciro ¢ Séo Paulo, A questio era ainda mais urgente no periodo imperial, pois Dom Pedro II criow uum influente sistema de mecenato, que concedia bolsas generosas de pesquisa, possibilitava viagens e financiava publicagdes de li- ros ~ por exemplo, a primeira e luxuosa edicdo de A Confederaciio dos Tamoios. Os membros da Escola do Recife contestavam esse modelo, talvez, pelo menos em parte, porque dele nao se benefi- ciavam. Sob esse Angulo de anslise, nao surpreende a viruléncia de Silvio Romero, seu porta-voz mais inflamado.” A violéncia do jo- 20, “Silvio Romero traz 8 cena histérica o escritor combatente, em confito com © status quo, que nio deve viver, como 0s romantics sombra da Coroa, sob 0 ‘manto do mecenato. Critica e polémica se aliam no combate do bacharel edo 83 vem José de Alencar contra o consagrado Goncalves de Magalhaes tinha animo similar, pois o favorito do imperador era 0 auténtico centro de gravidade da Repiiblica das Letras na Corte: atacé-lo po- deria representar o atalho para acelerar a propria carreira. Alids, essa também foi uma das razdes da investida de Joaquim Nabuco contra José de Alencar. Nos trés casos, se é inegivel a presenca tanto de recursos autoritérios quanto da argumentacio ad homti- nem, também é visivel a importancia da polémica para a definicao do campo estético, do debate das ideias e da estrutura de poder no campo literdrio brasileiro no século XIX. Allis, posso aprofundar esse comentario, aproveitando para abordar um lado nada solar da polémica. ‘As motivagées subjacentes aos debates ~ por assim dizer, 0 espélio da batalha de ideias ~ so embleméticas da funcionalidade propria da polémica: tal funcionalidade diz respeito tanto & rees- trnturagao do sistema quanto A autopromogio e A busca por no- toriedade e privilégios. E necessdrio admitir esse segundo aspecto, porém ainda mais importante é reconhecer que os resultados finais continuam sendo muito produtivos no Ambito intelectual. E, mes- ‘mo que nao seja sempre possivel determinar qual aspecto prevale- ce, reconheco o perigo de privilegiar o que naturalmente seria uma vvantagem para minha hipétese - 0 debate e a troca de ideias - e letrado contra o dominio oligarquico eas estruturasarcaias do pats (Ventura, 1995, p48). 21.0 Sr. José de Alencar [~] parece nio depender da critica e ter em nosso pals uma dessas posigdes litedrias, como a de Voltaire no século passado, e a de ‘Chateaubriand no comeso do nosso. Confesso que esse privlégio seria incon-

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