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O CONCEITO DE “SECURITY” NO DIREITO NORTE-AMERICANO E O CONCEITO ANALOGO NO DIREITO BRASILEIRO' LUIZ GASTAO PAES DE BARROS LEAES SUMARIO: I — Golocagio do tema: 0 easo People v. Syde. IL — A definigio legsl de security. II —"Considevactes sobre & interprecagiio dos statutes, VO eoncelto de eecurity como con frato de investiments. A formula Howey. V— Ag nogdes de “tran sagio” © de “empreendimento comum’. VI — caso Silver Hills Country Club v. Sobieski-e a apliceeso do rish teel. Vd — A suséncia de ingeréncia do investider no empzeendimento. comum como elemento earacterizador de security. VIM — A security como solicitagdo publica de reeursos. IX — Os elementos eavacteriza- ores de accurity. Definigao, X — A nogko de “titulos e valores mobilities” como eonceito andiogo ao de security no ditelta hra- sileiro. Conclusses. I — No dia 8 de margo de 1950, © procurador distrital do condado de Los Angeles, California, EE.UU., formulou um ' requisitério contra, Milton e Harry Syde, acusando-os de violar a Corporate Securities Law, art. 25.000 © segs., daguele Estado, por emissio e distribuieso de valores, isto 6, securities, sem prévio registro e sem a autorizacio das autoridades competentes. Apés uma sindicéneia preliminar junto & corte munieipal, a acusaelo foi mantida perante a Corte Superior, ©, posteriormente, devolvida & Su- prema Corte da Califérnia, que apreciou 0 caso em 19512 Os fatos nfo foram eontestados. Milton Syde Films, Inc. foi cons- tituida em julho de 1949 com 0 objetivo de produzir, realizar, com- prar, vender e promover exibigdes draméticas para 0 rédio, teatro, te- levisio ou cinema e atividades cor- 1. 0 presente artigo 6 reformulagio Go notas de aula, redigide pelo ator 1a Columbia Law School, mo periodo letivo 1978-74, onde estagiava na qualidade de viriting’ scholar in residence, 2, People v. Spe, 37 C.2d 765, 285 Pd 001 (Sup. 1051). Jenuinge & Marsh, Scouritise Bogulation, Cases Gest relatas. Milton era o diretor-presi dente e Harry 0 diretor-tesoureiro. A sociedade instalou uma escola preparatéria de artes draméticas & dew infeio a atividades de produgio de filmes em Santa Monica Bou- levard, em Hollywood, sob o nome de Rossmore Productions, Neste sentido, a Rossmore Stu- dios envion eartées postais a uma série de criancas cujos retratos fo- ram encontrados em varios estiidios fotogréficos da cidade, informande a seus pais que os referidos meni nos e meninas haviam sido consi derados aproveltaveis para um fil- me em vias de ser realizado, soli- citando-lhes uma entrevista. Varios atenderam 20 convite e acompa- nharam os filhos 20 estidio, onde as erianeas foram aceltas, ‘sendo, na ocasigo, eelebrados dois tipos de contrato entre os pais dos menores e a empresa cinematogrifiea, Num primeizo tipo, o artista (a erianea) acedia em devotar os sous melhores esforgos & producdo de um filme a ser realizado pela Rossmore, spés um treinamento que seria ministra- do a um certo mémero de criangas, oportunamente escolhido, ntimero esse nunca superior a vinte e cinco 2 REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 12 sais. O contrato estabelecia um pagamento inicial de $15 pelos pais das crianges, a que se adieionariam pagamentos iguais e sucessivos de § 5 por enssio, até atingir o total de § 98, para fazer frente ds des- pesas de treinamento. Pelo eontrato, a Rossmore tinha ainda o direito de rejeitar qualquer dos artistas, yeembolsando-o da importéneia adiantada, caso no 0 julgasse qua- lifieado. Convencionou-se, outros- sim, que, apés a venda ‘ou outra qualquer medida para a comerciali- zacéo do filme, 60% do Tuero bruto seria dividido de maneira eqiiitativa entre 0s membros do elenco, pa- gando-se a Rossmore dos custos & despesas da produedo. No segundo tipo de contrato, ficou convenciona- da a participacdo pelo artista em pelo menos um filme sonoro para televisdo, contra o pagamento pelos pais das crianeas de um total de § 198, mediante um sinal de $ 100 e@ de $7 por ensaio, Dos Iucros obtides na venda do filme, feito 0 desconto das despesas da produ- cdo, 60% seria rateado entre os membros do elenco. Tanto a pareela inicial, quanto as prestacSes sueessivas, deveriam ser recolhidas incontinenti, uma ver requisitadas pela Rossmore, fi- cando também certo e ajustado que 65 pais acompanhariam as criancas ao estidio, embora_néo tivessem acesso 205 ensaios. Dos autos nao consta se o3 filmes foram ou nao realizados. A questo discutida nos tribunais, em graus conseeutivos, verso so- bre a earacterizacio ou n&o dos meneionados contratos como seen vrities, pois, se earacterizados como tais, estariam aleancados pela dis- ciptina legal do mereado de ca- pitais. A decisio da Suprema Corte da Calif6rnia foi no sentido de que, muito embora os contratos refer: dos contemplassem a participagio do artista nos Iucros de filmes a sevem realizados pela empresa em aprego, e se bem que essa empresa tivesse iniciado a operaco fazendo convite ao ptiblico para o levanta- mento de recursos mediante o pa- gamento dos servigos de treinamen- to a serem ministrados, os contr tos em tela nfo configuravam se- curities no sentido da legislacéo tada, por the faltarem alguns dos elementos caracterizadores. Subsere- veram 0 aeérdo, sem voto discor- dante, além do juiz Shenk, relator, © chief justice Gibson, e os demais julgadores: Edmonds, Carter, Tray- nor, Schauer e Spence. © ‘caso acima relatado, talvex meio estranho, 6 trazido 2 colagio, para mostrar até que tipo de ope- ragio pode ser objeto de exame, na América do Norte, com possibi lidade de ser classificado como tran- sagio. suscetivel de ser aleancada pela legislagio especial diseiplina- dora do mereado de capitais, sem causar espanto aos tribunais e as agéneias governamentais fisealiza- doras do mercado de valores. Em linhas subseqiientes, voltare- mos ao julgado em exame. Por ora, queremés levantar apenas uma questo: Quais so esses elementos caracterizadores dos valores colo- cados com 0 piiblico, isto 6 secu ‘ities, que podem submeté-los A aludida legislac&o especial? TI — 0 termo seourity 6 definido em cinco leis federais: Securities Act de 1988, § 2(1), 15 U.S.C. § ‘Tib(1) (1970) ; Securities Exchan- ge Act de 1934, § 3(a) (10), 15 U.S.C. 78c(a) (10) (1970) ; Public Utility Holding Company ‘Act de DOUTRINA s 1935, § 2(a) (16), 15 U.S.C. § 79d(a) (16) °(1970) ;_ Investment Company Act de 1940, § 2(a) (85), 15 U.S.C. § 80a-2(a) (36) (1970) ; Investment Advisers Act de 1940, § 202(a) (17), 15 U.S.C. § 80b-2 (a) (8) (1970). Essas detinigdes 80 praticamente idénticas e as di- ferengas exigtentes, sobre serem ir- relevantes, foram ‘eliminadas pela interpretago judicial :? “0 termo sceurity compreende toda nota, ago, aco em tesouraria, obrigagdo, debénture, comprovante de divida, certifieado de direito em todo tipo de eontrato de participa eGo de Inero, certifieado de depé- sito em garantia, parte de funda- dor, boletim de’ subseriedo, aco tyansferivel, contrato de investi- mento, certifieado de transferéneia ce direito de voto, certificado de depésito de titulos, eo-propriedade de diveitos minerarios e petrolife- ros, e, de uma maneira geral, todo © instrumento ow o direito comu- mente conhecido como security, ou ainda todo certifieado de partici pagio ou interesse, permanente ou temporério, recibo, garantia, dire to & subscricéo e opedo referentes aos titulos ¢ valores acima men- cionados.”# 3 Veja Teherepnin v. Knight, 889, U.S. 98%, B44, 88 S.Ct 548 (1967), onde se digeute a omissio da evidence ‘of in- debtednese na Lei de 1984, de nenbuma controling significance. 4. Ad litteram. “Phe term “security” nmieans any note, stock, treasure stock, bond, debenture, evidence of indebtedness, certitieate of interest ox participation in any profit-sharing agreement, collater trust certificate, preoganization certificate fr subseription, transferable share, invest- ‘ment "contract, voting-trust. cartifieste, cextificate of deposit for a security, frace onal undivided interest in il, 23, oF other mineral rights, or, im general, any interest or instrument commonly know as a security, or any certificate of interest A definiego acima, desde logo, nao nos satisfaz, por the faliarem 08 elementos fundamentais préprios de toda definigdo. Com efeito, toda definig&o corresponde a uma deli mitagéo, quer dizer, a uma indica- 40 dos limites (conceituais) do ob- Jeto em foco, em relacio aos de- mais objets.’ Daf_a formula esco- istics: definitio fit per genus pro- imum et differentiam specificam. Definir consiste, fundamentalmente, em dizer a que classe pertence 0 ente em exame, situando-o no lugar ‘ontol6gico correspondente, tomado em relagio As demais classes de ob- jeto, de modo a revelar a sua “di- ferenca especffiea”, Por outro lado, 6 necessfrio que, em todas as defi- nigdes, se esgotem as notas consi- deradas essenciais do ente defini- do, pois, & mingua de algumas delas, 9 objeto néo fica adequadamente “situado” e pode, com facilidade, ser confundido com outro. Desa necessidade surgiram as rezras com vistas & boa definicio, dentre outras a de que o definido deve necessa- lamente fiear excluido da defi- nico. Ora, a definicfo legal acima transerita de security desobedece a essas regras. Primeiro, nfio esta belece os “limites coneeituais” do objeto definido: apenas enumera ti- pos da entidade designada pela de- finigdio. De resto, essa enumeracio nfo 6 exaustiva: 6 puramente exem- plificativa (numerus apertus). Ade- mais, com a expressfio final: “or, in general, any interest or instru: ment commonly known as security”, a definicao inclui, no seu contexto, a propria coisa definida, agredindo uma das regras basieas da boa con- or partielpation in, temporary or interim certificate for, rectipt for, gurantee of, or warrant of right to subscribe to oF purchase, any of the foregoing.” | “a REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 14 ceituacao. Longe, pois, de fornecer a “esséncia” do eonceito de security, © legislador se limita a enumerar, exemplificativamente, tips que partilhariam de uma esséncia co- mum, de resto deixada_ indefinida, Por outro lado, 2 assertiva, acima comentada, de que seria security “any interest commonly known as security", & sobremodo vasa, inde- finida, e'até perigosa: “Comumen te conhecida” por quem? Caberia essa identifieacdo aos tribunais ou seria da competéncia das agéncias federais fisealizadoras do mercado ae valores?s Natural, portanto, que a nogio legal de ‘security tenha chamado a atenc&io dos tribunais, pressiona- dos por necessidades concretas de aplicagio da lei, os quais procura- ram trabalhar ‘num denominador comum aos vérios exemplos ent- merados no texto legal, e que, por via de consegtiéneia, fornecesse os “elementos esseneiais" do conceito om tela, Nesse sentido, construiu-se uma interpretacio longa em torno da expresso investment contract, que consta do texto de lei e que explicaria o significado do vocébulo security. HII — Abramos aqui um_ breve parénteses. Os Estados Unidos é geralmente chamado de pais de common law. Se bem que o signifi- eado dessa expresso possa variar segundo o contexto em que seja in- serida, via de regra quer significar que o direito americano encontra as suas raizes no diveito britanice e nfo no direito continental euro- su. B No entanto, um engano su- por que, por derivar do direito in- Segundo a Légica de Port-Rosal, a definigdo: deseritiva ¢ uma minus qecure te definite glés, que surgiu de decistes juris- prudenciais, seja o direito norte- -americano um direito “decisional”, quer dizer, um direito que emana exclusivamente das decisdes dos tri- bunais, ndo implicando na existén- cia de’ textos de lei. Presentemente, a maioria esmagadora dos feitos, tanto nas cortes esiaduais quanto federais, versam sobre a interpre- tacio de um diploma legal.’ © erescente papel desempenhado pelas leis — os statutes — no direi- to americano se deve em grande parte & variedade de fontes legis- Jadovas nos Hstados Unidos. Nesse sentido, multiplicam-se as compila- goes de leis, ordenadas por assun- tos, que combinam a legislagio em vigor, omitindo leis temporarias © revogadas. O United States Code (a que pertencem todas as leis re- lativas & disciplina do mereado de valores atras citadas), 6, por exem- plo, uma compilagio oficial de leis iederais, com mais de cingtienta ca- becaihos, Compilaedes _ similares existem em cada estado da federa- 6. B, Allan Farnsworth, An Introduc- tion tothe Legal System of the United States, New York, 1968, pag. 70. Bm 1947, Justice Felix Frankfurter, da Suprema Gorte dos Hstados Unides, observava: “Inevitably, the work of tae Supreme Court refiets the great shift In the eon ter gravity of law making. Broadly speaking, the ‘number of eases disposed af by opinions “has not changed fom term to term, But even as Ints as 1875 more then 40% of the controversies bo fore the Court. were common law Htige- tion, fifty years later only 5% while to- day’ cases siot resting on statutes ave re- dueod almost ‘to gov. It is therefore accurate to say that courts have cesead to he primary makers of law in the sense in which they logislated the common Lav. It is eortainly true of tho Supreme Court that almost every ease hag a statute at its heart or close to it” ("Some Reflee- tions ‘on the Reading of Statutes”, 47 Col. Law R. 527, 1947). DOUTRINA 4s sao, sob designacées as mais diver- sas, como eddigos, compilagées, con- solidagoes, general statutes, ete. O termo “codigo”, alias, pode ser en- ganador, pois, Jonge de constituir um corpo unitério, posto em vigor como tal, como ocorre nos paises de civil law, nfo passa de uma me- ra colecéo de leis sancionadas em momentos diversos. Cumpre advertir, ademais, que 86 aparentemente 0 statute @ se- melhante & lei, & um texto legal muito mais detalhado e vem sem- pre acompanhado de uma longa lis- ta de definigdes, Essa énfase dada ao pormenor deve ser atribulda, se- gundo um agudo comparativista, a uma série de fatores: “a complexi- dade da matéria legisiada, para a qual muito contribuem uma socie- dade pluralistica, uma economia al- tamente desenvolvida e um sistema federativo; 0 desejo do legislador de especificar, por receio das inter- pretagées restritivas dos tribunais; e a0 baixo nivel de abstracio em que operam os profissionais do common Taro." Todavia, muito embora a inter- pretagéo dos estatutos dé enscjo a uma variedade de questdes que sfio pecuiliares a esse sistema legal nor- te-americano, varias das téenieas de hermenéutica so familiares 4 maio- ria dos sistemas legais. A mais agu- da diferenca repousa, talvez, no fa- to de que o intérprete americano traz para o caso toda a sua para- fernélia de técnicas oriundas do 7. Farnsworth, ob. cit, pég. 70. Esse ‘nivel inferior de abstragio’, que o autor atsibul aos common lew lavcyers, envolve wum juizo de valor, que deve ser” elimina dio, Na verdade, talvez fore melhor dizer ‘uma maior aderénela & realidade”, teu to da origem decisional do divelto anglo- camericang e da mentalidads pragmétien ‘iy povo anglo-amerieano, que os tomam avessos a thie. “eoneeitnaliome dnsidion”™ common law, othando o texto de ei A luz dos casos que o precede. ram, mesmo porque as leis norle- -americanas via de regra incorpo- ram com algum detalhe a li¢io acu- mulada de casos anteriores & sua vigéneis © Direito Comercial 6 nos EEUU, matéria do diveito esta- dual, ¢ 0 Congreso, embora tenha poder de baixar legislacko concer- nente 20 coméreio interestadual, sempre revelou corta relutancia em exereer esse poder na esfera do di- reito privado, Em déeadas recentes, porém, as atividades empresariais tém sido profundamente afetadas pelos stadutes federais. No que tan- Ge a0 mercado de capitais, as de- ficiéneias reveladas pelas leis esta- duais forearam o governo federal a agir, a fim de atender aos recla- mos da sociedade americana. Assim, apés vinte e dois anos de experién- cia de legislacio estadual, que se vevelou inadequada para proteger 0 piblico investidor, 0 governo federal passon a interferir no mercado de titulos valores, através de dois diplomas bisicos: 9 Securitice Act, de 1988, © 0 Securities and Bxehan- ge Act, de 1984, ora eodificados no 15 United States Code § Tia et sep. (1970). Essa regulamentago federal do mereado de titulos acompanha a técnica de redlagéo de leis dos s- tados Unidos: incorpora a experién- cia estadual anterior; dé énfase aos pormenores; abre os capftulos ini- ciais com uma extensa lista de de- fimigdes, que visa a prover 0 leitor da estrutura conceitual, sobre a qual so concebidos os dispositivos e comandos legais, 8. Cf. Dowling, Patterson and Powell, Maicriale for Legal Method (2° ed. por ee rr REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 14 A menos que essas distingdes se- jam acelias, nfo 6 possivel acom- panhar a andlise de um statute, ou manipuler 0s statutory cases! IV — Voltemos a definigio de security transerita linhas atrés. Bla inclui uma lista de figuras perfei- tamente identificdveis (ony note, stock, bond, [or] debenture), jun- to a tipos menos suscetfveis de for- necer um significado exato (‘‘certi fieate of interest or participation in any profit-sharing agreement. .. investment contract. ..or, in gene- ral, any interest or instrument com- monly known as a security”). As- sim, durante os primeiros dez anos de vigéncia dos Securities Acts, os tribunais federais ¢ 0 S.E.C. eram freqtientemente convocados para determinar se um dado esquema se inserevia ou nfo nos tipos sem si nificado exato alinhados na, defini cio constante do texto de lei. Ne- nhum desses casos porém stingiu a Suprema Corte. Somente em 1948, no caso S.E.C, 0.C.M. Joiner Lea- sing Corporation,"® veio ela apreciar, pela primeira vez, um desses con- ceitos vagos, ou seja, 0 conceito de investment contract. Versava a hipé- tese sobre uma companhia que to- mara em arrendamento varios lotes de terra, num total de 8.002 acres, comprometendo-se a realizar pes- quisa © perfuraggo de solo, visando A exploracao de petréleo. Para fa- zer frente As despesas inerentes a0 empreendimento, a companhia fez cessdes dos respectivos contratos de arrendamento a tereeiros. Susten- tando que as cesses em apreco cram securities, a Suprema Corte 9. Idem, pig. 207. 10. Supreme Court of the United Sta cavacterizou-as como “contratos de investimento”. No caso, 0 Justice Jackson assim argumentou: “Os fatos nos levam a conclusio de que os suplicados nio oferece- ram meras eessées de arrendamen- to ao piiblico. Na realidade, 0 pro- pésito era antes de ofereeer instru- mentos que possibilitassem aos cessiondrios investidores terem a chance de participar, sem custos adicionais, dos Iucros eventuais que viessem a decorrer da exploracio dos pocos que forem deseobertos ). A oferta piblica de tais instrumentos de cessio apresenta- va todas as caracteristicas ineren- tes & oferta piblica de securities. Na legislacdo especifica, 0 termo em pauta foi definido de molde a permitir a incluso, por forea de nome ou de desericdo, de todo e qualquer instramento cnjo trago co- mum seja negéeio de investiment Alguns desses instrumentos, tais como nota, obrigagées, e agées, sie suficientemente estandardizados ¢ com significados perfeitamente es- tabelecidos. Outros, porém, sio de cardter indefinido e designados por express6es descritivas, tais como “contrato de investimento”, ou “to- do direito ou interesse comumente conhecido como security”. (...) ‘Todo instrumento pode ser abran- gido por uma dessas designacies, desde que corresponda a descricho legal. O aleance da lei nfo se limita, apenas ao que é evidente e ao que & conhecido, Processos novos, pou- co comuns ou irregulares, quais- quer que sejam, também séo atin gidos pela lei, desde que se prove que eles foram utilizados a fim de que os valores fossem oferecidos a0 Piiblico, nos mesmos moldes em que so oferecidos ao pablico os “eon- tratos de investimento”, ou como Sn nfowonidas no tinetymantne an DOUTRINA a direitos comumente conhecidos co- mo security”. ‘Trés anos depois, em 1946, a Suprema Corte voltou a abordar o assunto, no caso S.E.C. v. W.J. Howey’ Company. ‘Na hipétese, & Howey Company vendera pequenos lotes de terra a serem utilizados para o plantio de frutas citricas. Anexo ao contrato de venda e com- pra de terra, outra companhia, a Hovwey-in-the-Hills Service Compa- ny, subsidiéria da primeira, com- prometia-se a prestar servicos de plantio e cultivo da terra, bem co- to 0s de comercializagio’ das tru- tas ali produzidas. A Corte, A vista dos fatos, coneluitt que os contratos traduziam “investimentos” feitos por centenas de pessoas, que, care- cendo de conhecimento, experiéncia e equipamentos necessdrios ao cul- tivo das frutas eftrieas, investiram “passivamente” em um’ negécio di rigido por terceiros, na expectati- va de obter Iueros, nfo se tratando, pois, de simples aquisigdes de gle- bas de terra, alias divididas em fragées economicamente invidveis quando consideradas isoladamente.1" Caracterizando a operacdo como “contrato de investimento”, ¢, co- mo tal, configurando security, 0 juiz Murphy procurou oferecer uma conceituacdo de contrato de inves- timento, a que o caso Joiner nao ousara. Inicialmente, sublinhow que o termo no era definido pelas leis especificas, mas que os tribunais estaduais vinham construindo uma definigado de investment contract, mesmo antes das referidas leis: 11, Supreme Court of the United Sta- tes, 1946, 928 U.S. 298, 66 S.Ct. 1.100, 12, 0 cago State ¥ Gopher Tire & Rubber Go, 145 Minn. 52, 177 N.W. 997 (1920) foie primelro’ a levar em consi- deracdo a expresso investment contract, no eampo das securities, Outros casos em ‘Essa definigdo foi aplicada ite- vativamente pelos tribunais esta- duais a uma série de situagdes, cujos tragos comuns so a aplica- do pelos individuos de recursos pou- pados em empreendimentos comuns, €om a esperanga de eolher Incro com os esforcos desenvolvidos ex- clusivamente pelo lancador ou por tereeiros, nunea deles préprios. Ao ineluir contrato de investimento na definigao de security constante do § 2(1) da lei de 1933, 0 Con- gresso estava emprogando uma ex- Presséo cujo significado j4 se fir- mara nos tribunais. ¥, portanto, perfeitamente lito atvibuir ao ter mo, no contexto da lei, esse signi- ficado, tanto mais que ele se har- moniza com os objetivos do Con- gresso. Em suma, um contrato de investimento, para os propésitos do Securities Act, todo eontrato, tran- sacio ou esquema através do qual uma pessoa apliea o seu dinhelro em um empreendimento comum, com 0 objetivo de obter Iuero, em virtude exclusivamente dos esforeos que venham a ser desenvolvidos pe- Jo lancador ou por uma tereeira pessoa...” © caso Howey fornecia, assim, pela primeira vez, uma definigéo de contrato de investimento, que, por uma euriosa operacio de racio- cinio, passou a ser a propria defi- nigdo de “security”, Nao hé nenhu- ma alusio explicita a essa extra polacio, mas podemos reconstrut -la com’ 0s préprios termos do caso. que se diseute 0 aleance da expressio, antes da legislacdo federal: State v. Bus. hard, “16d “Minn. 455, 205 N-W. 210 (1925); Katt v. Guaranteed Bond Con, 218 Wis. 12, 250 NW. 825 (1988); Stex ‘ens v. Liberty Packing Corporation, 111, Nokg. Gr, 161 A. 192 (1992); People ¥, White, 124 Gal. App. 548, 12 P.2d 1078 (i922); "Prohasks y, ‘Hemmer-Mfiller De- ‘yelopment Co.. 256 TI, App. 891. (1920) 7 8 REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 15 |A principal liggo do caso Howey, a0 definir 0 investment contract, diz respeito ao processo de identi- ficago de uma security: para se identificar uma security a “subs- tancia prevalece sobre a forma e énfase é dada & realidade econd- mica subjacente”. Assim, no caso em tela, foi identificada, num eon- contrato de investimento, a reali dade econdmica da transacho, que seria a substincia comum as de- mais “formas” de securities alinha- das na defini¢ao legal. Destarte, to da ¢ qualquer security passa a ser identifieada 9 essa subslancia eco- nomica revelada na anélise dos contratos de investimento: “A security is a transaction. . whereby (1) a person invests his money (2) in a common interprise and (8) is led to expect profits (4) solely from the efforts of the promoter or a third party.” V_ — Essa formula Howey de identificacéo de uma security ga- nhon imediatamente a simpatia dos tribunals e a acolhida das agéncias federais. A Suprema Corte dos Es- tados Unidos tem feito referéneia a esse teste em varias ocasides, se bem que nfo tenham ainda exami- nado as questdes basicas levantadas por esse caso, ou esclarecido a lin- smagem extremamente vaga utiliza- da na definicao, Como resultado, as cortes estaduais e as federais de instfineia inferior tem sido entregue a tarefa de interpretar os termos do Howey test, no esforgo de Ihes atribuir significados exatos, & vis- 18, “Form [Is] disregarded for subs tance and emphasis [is]... placed upon econamie reality”. V. Ronald J. Goffey, ‘The Beonomic Realities of the Securi- ties: Is then a move Meaningful Formu- lat, 18 Western Res. E. Rev. 67, 402, (ase). ta dos casos coneretos que The sio com grande freqiiéneia submetidos. Fragmentando a definicdo supra, a security & conceituada como a “transagio” através da qual o in- vyestidor fornece recursos para um “empreendimento comum”.! Ambas as expressdes, “transagio” ¢ “em- preendimento'comum”, so bastan- te vegas, e visam dar 2 “security uma definiefo aberta, A expressio “transagio” 6 utilizada no seu sen- tido mais amplo, signifieando todo e qualquer negécio jurfdico,'s inde- pendentemente de forma, ‘que te- nha as caracteristicas apontadas, isto 6, que implique transferéncia, por parte do investidor, de dinhei- yo ou bem num empreendimento comum, com 0 objetivo de obter um beneficio qualquer. A expressio “empreendimento comum” também nio dispée de um significado pre- clso: apenas quer veferir-se 2 situa~ ces nas quais os valores fornecidos pelo investidor sujeitam-se, de algu- ‘ma maneira, aos riscos de wm mes- ‘mo negécio. Assim, constituem security os ti tulos (aedes, debéntures, partes be- nofieidvias) ‘emitides por uma_so- ciedade por agies. Mas configuram, ou podem configurar, security tam- bém os investimentos os mais di vyersos: em glebas de terra, em lo- teamento, em empreendimentos ru- rais, em obras de construgio civil, 14.0 Prof, Louis Loss, abordando a formula Howey, fragmentara em tes tlementos bisioos: "(1)_ investment of money, (2) 2 common enterprise and (3) tthe expectations of profits solely through the efforts of others" (L, Loss, Securities Regulation, tomo 1, pég- 491, 2. ed., 1901), 15. 0 conesito de negécto jurédico (Ie- chisgechajt),eneareeide pelos eserito- {res zermanigos como dos mais importantes da moderna eiénela do dizeito, 6 totalmen- te devcenheeido do direlio norte-america- DOUTRINA 49 em titulos de clube, ete. Desde que 05 recursos investidos nos empreen- dimentos sejam obtidos junto ao pi blico, ¢ néo haja expressa exelusio legal, o investimento consubstaneia security, e, como tal, se sujeita aos comandos das leis especiais, Casos 03 mais diversos podem ser trazidos & colacio.6 No citado caso $.E.C. vy. C.M. Joiner Lea- sing Corporation, a empresa em questio tomo em arrendamento, em MeCulloch County, no Estado do Texas, 3.002 acres’ para “prae- tically nothing exeept to drill a well”, Para financiar a perfuracio, a empresa levantou os fundos ne- cessdrios transferindo direitos sobre pequeninas pareelas de terra. A campanha de colocacio das cessdes de arrendamento foi realizada pelo correo, tendo sido enviados mais de mil prospectos aos interessados, nas mais distantes regides do pais, obtendo subseritores em 18 Esta- dos diferentes. Os lotes oferecidos nunea excediam 20 acres, e 08 pre- gos variavam de $5 a $15 por acre, podendo ser pagos & prestacio, To- da a literatura de venda fazia re- foréneia & pesquisa e exploracio do petréleo, A empresa defendeu- -se, na aco em pauta, sustentando que, na definigao de security cons- tante da lei, 0 legislador faz refe- reneia apenas a “co-propriedade de direitos minerdrios petroliferos”, mas no faz mengdo A transferéncia de arrendamento de terra, onde 0 minério e 0 petréleo 6 explorado. Contestando esse argumento, ¢ as- 16. V. Loss, ob. city pigs. 208 e sezs., ‘onde © auior alinha ‘un considerdvel mie mere de casos envolvendo © conceito de ge ‘Ao trazer eolagio alguns easos cnvolvende essa conceiteagio, deseiamos ‘apenas indicar 9 largo aleance da expres- do. V, William I. Cary, Cases and Mato. rials on Corporations, 4° ed., 1969, pag. 1809, severando que a realidade econémi- ca da operagao correspondia ao con- ceito de contrato de investimento, a Suprema Corte decidiu que na espécie ocorrera distribuicao de se- curities e ndo simples cessio de alu- guel de imével. Alias, em varios casos relaciona- dos com negécio de terra, os tr bunais tem entrevisto distribuigio de securities. No j citado caso S.E.C. v. W.J. Howey Co, a sociedade vendera, na realidade, uma plantacSo de frutas citricas em lotes to pequenos que 0 cultivo e © trato individuais nfo seriam eco- nomicamente vidveis. Ao mesmo tempo, uma empresa de servigos, controlads. pela empresa vendedora, oferecia servigos de cultivo, eolhei- ta © comercializagdo das frutas, a um prego prefixado. A Suprema Corte enxergou na transagio, um contrato de investimento. No caso S.E.C. v. Bailey D.C., 41, F. Supp. 647, localizou-se colocacao de security na venda de terras com plantacdo de rami, a ser explorada pelo vendedor. No caso Prohaska v. Hemmer-Miller Development Co., 256 III. App. 331, Zoi considerada security a venda’de lotes rurais, gue seriam pagos com os produtos das colheitas a serem feitas pelo vendedor, No caso Kerst v. Nelson, 171 Mimn., 191, 218 N. W. 904,54 A.L.R. 495, foram reputadas se- curities glebas de terras vendidas, para serem exploradas com vinhe- dos por terceiros interessados. Nos casos Holloway v. Thompson, Ind. App., 42 N.E. 2d. 421 ¢ In re Waldstein, 160 Mise. 763,291 N.Y. S. 697, a venda de lotes de cemi- tério, com intuitos iuerativos, foi reputada colocaeao de seouritics. No campo da construcao civil, tem sido profunda a intromissio dag leis de securities. Apés a Se- 50 REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 14 gunda Guerra Mundial, 0 investi- mento em construcio’ civil, nos BE.UU., recebeu um grande de- senvolvimento, Entre as varias for- mas de investimento nesse campo, obteve grande popularidade © con- dominio mediante a forma de so- ciedade, através da qual a_socie- dade assume a titularidade do te yeno e do prédio, detendo cada in- vestidor ag6es da sociedade. O3 in- teressados compram um bloco de agées no valor do apartamento, que iro oeupar, nfio em razio da’ pro- priedade das acées, mas em virtude de contratos de locagéo a que a posse das acdes Ihes da direito. Ti- tulares desses arrendamentos, pode- rao entdo sublocar o imével, de mo- do a perceber os rendimentos rela~ tivos 20 investimento efetuado, Sio 08 chamados co-operative apartment housings.” Posteriormente, 0 con dominium veio substituir 0s co-op apartments como meio apropriado para o investimento em proprieda- de imobilidria como habitagao mul- tifamiliar. No condominium, eada investidor adquire uma unidade, sendo proprictario de partes ideais da 4rea comum do imével, Os alu- gueres se submetem a condicées e restriedes a serem fixados por uma administracio eleita pelos proprie- ‘térios para administrar o empreen- dimento.8 Outra forma de investi mento no ramo 6 9 chamado eon- séreio imobilidrio (real state syn- dication), que, em sua forma mais simples, ‘6 a congregacio de um ntimero limitado de associados, ge- ralmente sob a forma de Limited 11. V. “Co-operative Apartment Hou- sing, 61, Harvard 1. Rev. 1407 (1948) Vogal, Phe Co-op Apartment, 1948: Mai sel, Financing Real Estate, 1965. 18, V. “Community Apartments: Con- dominium or Stock Cooperative?”, 50 Ga- lif. D. Rev. 298, 801 (1902), partnership, que fornece os fundos necessirios ‘a empreendimentos em prédios de apartamentos, esevité- Tios, hotéis, motéis, shopping cen- tere, garagens, ete.!? Em todos esses eases, se 05 lancadores levantam mheiro do piblico investidor, contra a promessa de Iucros futuros, con- ‘igura-se o contrato de investimento subjacente a toda security.2° Caso eurioso de transagio de se- curity € 0 da chamada operacdo de fronehising. Se bem que usada ha muitos anos, essa operac&o comer- cial adguiriu, nos wltimos tempos, dimensGes inusitadas nos EE.UU., cobrindo desde o negécio de refei- ‘edo pronta (p. ex., Chicken Delight Kentucky Fried Chicken) até as agencias de viagem eas nursing homes, Bem mais de 400.000 fran- chises estio hoje em operacko na América, gerando mais de 10% do Produto’ Nacional Bruto. Trata-se de um sistema de distribuigéo de mereadoria, que reflete 0 fendmeno, comum & economia de massa, de concentracio dos negécios de’ va- rojo. A. operacio mencionada é aguela através da qual 0 franchisor, buscando expandir o mereado para as suas mercadorias e servigos, per- mite que outrem, 0 franchisee, se engaje em seu negécio, utilizando- -se de seu nome, titulos, mareas, de- senhos, modelos industriais, segun- do método mereadolégico, plano de venda, controle de qualidade, postos pelo cedente. O franchisor fan jus, em razlio do contrato, a uma remuneracdo fixa, acrescida de royalties. Freqiientemente, uma 19. Berger, “Real state Syndication Property, Promotion andthe Need for Protection", 69 Yale L. J. 125, T58788 (1960). 20. GE, See. Act Release n. 5347, de 41.1978, @ See. Act Release nm. 6.882, de 94.1073, DOUTRINA st oreo. substancial do capital de viseo inieial necessitio & provisio de bens e servicos ao negécio 6 for- necido pelo proprio franchisee.2 Nesse caso, tem-se sustentado que se trata de “contratos de investi- mento”. Assim, no caso famoso da Tucker Corporation, relativo ven- da de carros, a $.E.C. caracterizou como securities os contratos de franchise celebrados entre a em- presa € 0s corretores de automéveis, obrigados a fazerem um depésito prévio para se estabelecerem ¢ po- derem distribuir os Tucker ears.2® Outro exemplo. Num caso recen- te, Huberman v. Denny's Restau- rants, Ine., 387 F, Supp. 1249 N.D. Cal, 1972, 0 tribunal caracterizou como distribuicdo de securities um importante sistema de financiamen- to de empreendimento imobilidri 0 sale-leaseback. Na hipétese em te- Ja, um imével pertencente a Den- ny’s Restaurant, Inc, construido precisamente para servir de restau- rante, foi comprado por Huberman, e, ato continuo, arrendado por este a empresa vendedora, mediante um contrato de leasing a longo prazo, com a eléusula de reversiio da pro- priedade, por _um preco residual. Na verdade, Huberman, na qual dade de investidor, estava suprindo a empresa de restaurante do capi- tal necessério a assegurar a explo- raedio do negécio no local. Em tro- ca, Huberman receberia, nos ter- mos contratuais, um alguel anual eorrespondente & 10.4% do investi- mento realizado, sendo também pre- viamente combinado o valor resi- dual a que faria jus por ocasiio da reyersio da propriedade, no 21. V. Comment, “The Franchising Agreement: A Security for Purpose of Rogalation”, 1970, Ulli, LP. 180, 2, Tucker Corp, Seo. Act Release termo final do contrato, ajustado para 20 anos, com promrogacio de eineo anos & opgdo da Denny's Res- taurant, In Outras situagdes: bizarras rece. beram por parte dos tribunais a configuracéo de security. No. easo Hollywood State Bank v, Wilde, 70 Cal. App. 24. 108, 107 (160 P. 24. 846), a venda de animais de pele, reservando-se ao vendedor o direi to de criar esses animais e vender as peles, foi caracterizada como distribuigao de securities. O mesmo se deu no caso S.E.C. v. Payne, D.C., 35 F, Supp. 878 (S.D.N.Y. 1940), que versou sobre a venda de raposas prateadas, ¢ no caso Ste- vens v. Liberty Packing Corp, 11 N.J. Esq. 61, 161 A. 198, "que versou sobre a venda de coelhos. Geralmente, trata-se de vendas ou arrendamentos com pacto adjeto de prestagdo de servicos de admi- nistracao. O rol de esquemas de investimen- to que envolvem distribuicho de se- curity & como adverte o Prof, Loss, ‘to Variado quanto a imaginacio dos Iangadores, de sorte que o seu conceito “é antes din&mico do que estitico, eapaz de abranger um sem- -niimero de esquemas financeiros através dos quais se procura cap- tar recursos do pubblico contra pro- messas de Incros futuros” (Tche- repin v. Knight, 389 U.S. 852, 88 Ct. 548 [1967]). VI — A terceira caracteristion das securities, segundo 0 teste Ho- ney, € a expectativa de algum tipo de beneficio ou ganho em virtude do investimento realizado. Devem eases beneficios ou ganhos ser tan- 28, Note, “The Expanding Definition of Security: Sale-Leaseback and Other Commercial Leasing Arrangements, 1972 1 | 3 62 REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 14 giveis, isto 6, destacados do valor Inicial investido? Nao hé uniformi- dade de opinido nesse ponto. Hé aqueles que sustentam que esse Iu- cro deve ser material e tangivel, apoiando-se numa deciséo, anterior A legislagdo federal, de ‘1981, da Corte de Apelacao ‘de Tilinois, no caso Hacker v. Goldberg, onde © tribunal foi solicitado a dizer se © titulo de um clube de campo co figurava ou nfo security. A def nico de security, na legislagéo estadual, eva muito similar a do Se- curities “Act de 1988. Apoiando-se na decisio Prohaska v. Hemmer- -Miller Development Co., j4 nossa conhecida ¢ anterior a 1981, 0 tr Dunal se pronunciou no sentido de que 0 titulo de um clube de campo niio era security, porquanto somen- te se reputaria como tal o investi- mento “de que se espera lucros” (securities from which income or profit was expected to be derived”). Em 1961, porém, a Suprema Cor- te da California,’ no caso Silver Hills Country Club v. Sobieski, 55 Gal. 2d. 811, 861 P. 2d. 906, sus- tentou a tese de que a associacéo que assegura ao associado o direito de usar as benfeitorias de um clube de campo, a serem conatruidas jus- tamente com o dinkeiro investido, confere a este um beneficio sufi cionte para tornar o titulo uma se- curity, se bem que no se materia- lize af um ganho tangivel e sepa- rado do valor inieial investido. No caso, 0 comprador reeebe um titulo de um clube de campo “inacabado”. Embora nao tenha reeebido nenhum Gireito sobre os ativos ou sobre os Jueros do clube, © prego pago pelo titulo seria, por eerto, bem menor caso 0 clube j4 tivesse as instala- ges completas. Comprando o titu- 24. 2AR THI. Ayn. 28 (1981) lo associative, o investidor ests car- reando recursos que, utilizades nas instalagdes programadas pelo clube, info reverter em beneffeio de todos os sécios, ¢, por via de conseatién- cia, do investidor. Cabe, alids, a0 caso Silver Hills a introdugio de um novo elemento na problemities em exame: o teste do risco, Aliado ao objetivo lucra- tivo, sempre almejado pelo inves- tidor, o risco de perder 0 valor ini- cial investido € também um atribu- to esseneial da security. Em todo tipo de captagao publica de valores, © investimento feito pelo poupador torna-se parte do capital comum utilizado pelo captador de recursos para conduzir 0 negéeio. Pois o Iangador sempre reeorre a esse ca- nal’ de suprimento de capital por- cue, ineapaz de suprir, ele mesmo, os seus negéelos com’ os recursos necessirios, procura-os de fora, Pa ra garantir esse fluxo de dinheiro ou bens, promete certos ganhos as pessoas que The trouxerem 0 capital adequados. Ja se esses investidores receberfio 0 ganho prometido, emes- mo 0 retorno do dinheiro aplicado, isso vai depender do bom emprego do capital no empreendimento co- mum, Para_exemplificar. No caso de obrigagées emitidas por sociedades andnimas, ao investidor pode ser prometido duas ordens de benefi- cios: 1.°) juros e correcéo moneté- ria sobre 0 capital aplicado; 2.°) 0 retorno do sen investimento (pon- do de lado a hipdtese de conversio em agdes). Mas, seja como for, 0 investidor assume 05 riscos de que fais promessas possam eventual- mente nao se cumprir esses bene- ficios nfo ocorrer. Como observou a corte federal da California, no caso S.E.C. v Latta, 250 F. Supp, 170 (ND. Cal.) DOUTRINA 53 aff'd per curiam, 356 F 2 103 (oth Cir. 1965) cert. denied, 884 U.S. 940 (1966), a menos que os su- plicados tenham sucesso no em- preendimento comum... os valores distribuidos permanecem pedacos de papel sem valor (scraps of worthless paper’) 25 £ essa a idéia do risk test. A idéia de que todas as securities en volvem a colocagio de um capital que corre riscos. Se bem que esse teste nfo seja novo, coube & S prema Corte da California 0 mé to de Ihe dar erédito, no caso Silver Hills, No acérddo, 0 juiz Traynor, fazendo referéneia ao art. 25.008 da California Securities Act, que define a security em termos amplos, como instrumento de protegio do piblico contra esquemas espirios, ainda que engenhosos, de atrair ea- pital de isco, assim’ se pronuncia sobre o esquema em exame, vale dizer, sobre a venda de titulos de um clube de campo: “Nao estamos de maneira nenhu- ma perante a alienagio de um di- reito de uso das instalagdes. Os di- vigentes do clube, na verdade, so- lieitaram do piblico capital de risco para poder desenvolver um negécio, com objetivos lueratives [os diri- gentes receberiam uma remuneractio proveniente da construcéo e da ope- raciio das instalacdes do clube]. 0 riseo do associado nao diminui pe- Jo simples fato de que o titulo que adquiriu The outorga a condigio de associado. Mas justamente porque arrisea 0 seu dinheizo, junto com outros associados, € que ha a pos- sibilidade de que as vantagens do 25. A coisa no é bom assim, ¢ as obri- gatdes (para nos Iimitarmos 0 exemplo Gm foco), uma. vez emitidas, ni é "wm edago de papel sem valor”, antes dos pax amentos dos rendimentos ou do resgate. Valha a énfase dada ao capital em risco. clube venham a se matertalizar & as instalagdes sejam edificadas.”*6 Um crescente mimero de doutri nadores logo foi abracando 0 con- eeito de capital de riseo como um elemento de definic&o de security. Igualmente, varios proeuradores gerais _estaduais _acompanharam essa orientagho, passando a fazer mencio ao capital de riseo quando convocados a opinar a respeito da configuragio deste ou daquele sis- tema finaneeiro como operacdo de seourities. Os tribunais tém-se mos- trado menos permedveis a esse tes- te, mas j4 comecam a afrouxar esta relutancia. 0 mais famoso caso nes. se sentido é 0 do State of Hawai (by its Commissioner of Securities) v. Hawaii Market, Center Inc, Su- prema Corte do Haval, 1971, 52 Hawaii 642, 485 P.2d. 105. O'Ha- waii Market Center, Inc. revelow © propésito de abrir uma retail store para vender mereadoria so- mente a pessoas possuidoras de “cartas de autorizagio de compra”. A fim de levantar o capital para © financiamento do empreendimen- to, recrutou “membros fundadores”, atm niimero maximo de 5.000. Se- ria reputado “‘membro fundador distribuidor” a pessoa que compras- se uma maquina de costura e um aparelho de cozinha (eujos precos de custo nfo ultrapassariam $ 70) por $ $20. Ao fazé-lo, 0 comprador celebraria também um contrato com a sociedade, que Ihe permitiria fa- zer dinheiro com essa aplicacio, de diversas maneiras: 1°) distribui- co de 50 cartas de autorizacdo de compra, emitidas em sen nome, ga- nhendo assim uma comissfio de 10% 26, Para uma discussio mais minu- ciosa a respeito da venda de titulos de clube, ver” Maxwell, "Ailing Country Clubs", Wall Street Journal, 28.12.1961, ag. 1, col. 1. we REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 14 sobre as compras feltas pelos por tadores dessas cartas; 2°) ganhar $ 50 de remuneragio cada ver que uma pessoa por ele indicada se tor- nasse também um founder-member distributor; 8.9) receber § 200 por cada novo'membro que conseguir, ndo mais como membro distribuidor mas como “membro fundador su- pervisor”, o que traduziria em no- vo fluxo de recursos 4 sociedade, pois, para adquirir esse status, a pessoa deveria comprar § §30 em mereadorias (cujos pregos de custo eram de $ 140).27 Apés uma andlise da “realidade econémica” subjacente as relacdes entre 0 Hawaii Market Center e os membros fundadores, a corte ge ma- nifestou Dela configuragio desses contratos como “contratos de inves- timentos", e, como tais, securities “0 aspecto saliente de uma colo- cagiio de valores 6 a solicitacio pi Bliea de recursos para o empreen- dimento (...). Essa sujeigio dos reoursos do investidor aos riscos empresariais, sem que possa exer- cer 0 minimo controle sobre o in- vestimento é a realidade econémica propria de uma security. Na hip6- tese, toda pessoa que celebrasse um contrato de membro fundador, so comprometia com a Hawaii Market Center a realizar uma compra de $ 320, a fim de se tornar um dis- tribuidor, em uma compra de $820, a fim de se tornar um supervisor, Os sutos informam que 0 prego de eusto das mereadorias nio_ultra- passam, respectivamente, $ 70 ¢ § 140. Os apelantes tentaram carac- terizar essas transacées como sim- ples compras de mercadorias, mas 27, Sore @ confisurseto dos. “Zoun- der/inember Contracts como senuitice, Noie: Founder Member Contract desined ay Securities under Tsk Capel Test iP. De Revy 114) (1912). ‘og termos em que esto vasados os contratos indieam elaramente que 08 pregos pagos pelos membros fun- dadores foram feitos com o obje- tivo de adquirir uma série de vantagens, de sorte que os sobre- precos pagos constituem investi- mentos que se sujeitam aos riscos do_empreendimento.” VII — Na definiggo oferecida pelo tese Howey, a security & con eebida como toda e qualquer tran- sacHo em que 0 investidor pée o seu dinheiro num negécio comum, com © escopo de obter Iucro através dos esforgos exelusivos do captador dos recursos ou de uma tercefra pes- soa (“solely from the efforts of the promoter or a third party”). Quer dizer: 6 caracterfstico do investidor a sua passividade: ele nio tem o diveito de participar das decisées do negécio, totalmente entregue a terceiros: ele 6 um simples forne- cedor de capital. Em termos de identifieacio de securities em cotejo com outras for- tas de investimento, esse fator é um dos mais decisivos. Outras for- mas de investimento tém uma ou mais das caraeteristicas apontadas, mas a colocacdo de titulos e valores € a tiniea forma na qual o investi- dor perde de fato o controle sobre ‘© investimento que faz. Esse fator, aliés, 6 0 principal motivador do complexo de leis sobre 0 mercado de titulos. Se o investidor nfo pode pedir o retorno de seu dinheiro apli cado, nem tem controle ou ingerén- cia na decisio referente ao seu uso, entio a ele deve ser confiada toda e qualquer informagio relative aos captadores e administradores dos Yecursos, € o esqtiema que ser obe- decido ma condugso do negécio co- mum. Sem essas informacdes, o in- vestidor nfo poderé tomar uma de- io eriteriosa a respeito do cap- DOUTRINA 5% tador dos recursos e da solidez do empreendimento, para concretizar © investimento. Por outro lado, se ele tem voz na decisio e no con trole do empreendimento, esti, teo- ricamente, em posicéo de proteger © seu investimento, sem a necessi- dade de leis protecionistas. No caso Polikoff v. Levy im resumida! "A vaio para se excluir do al canee das leis de mereado de can’ tais aquelas transacbes em que 0 investidor tem direito a uma ing réncia direta nos negécios é dbvia. ‘esses casos, 08 membros do em- preendimento colocam os seus re cursos nas mios de outros elementos da organizacdo, reservando-se 0 di- yeito de controlar o negécio e ter acesso a informagées a respeito do que ocorre na empresa. Em vista, disso, a protecdo por via de infor- magées completas (full disclosure) a serem prestadas, por ocasifio do registro prévio, ao S.E.C., antes da eoloeagéio dos recursos, nio & necessdria, como necessiria se faz essa protegdo na hipétese de inves- timento sem qualquer ingeréneta.” Advirta-se que a palavra solely (no contexto: esforcos exclusivos do captador ou de terceiros) dew origem a duas interpretagdes: ume exigindo dependéncia absolute do negécio & atividade de pessoas que niélo o investidor;®? outra, mais libe- 28. 55 Il. App. 24 299, 204 NE. 2d 807 (2965). 29. Rouney v. Richard Prows, Ine, 289 F. Supp. $13 (D. Utah 1968)} Poli: Koff v. "Levy, 55 Tl App. 24229, 204 NE. 2d 807’ (1965). Fol baseado nessa corrente que se negou gue as erlangas e a empresa cinematogriifiea, no caso. Poo ple v. Syde citedo no inielo deste artigo, terlam eelebrado contrato de investimen: to, 4 que a stuagio dos menores na reali- zagio ‘dos filmes, ¢ portanto no negocio comum, seria substancial. ral, permitindo uma atuagio do in- vestidor? A segunda corrente aos poueos prevaleceu, pois, como pon- Gerou um advogado ao Texas Se- curities Board, se 0 teste fornecido pelo juiz Murphy no caso Howey fosse ‘interpretado literalmente, bas. taria que 0 investidor colhesse com a3 proprias mos uma laranja pare que 8 Howey Company livrasse to- das as vendas, que fez, de lotes para cultivo de frutas citricas, da decisio famosa. Na verdade, a apli- cago da formula referente aos “es- forcos exclusivos” nao pode ser me- cénica, baseada uma concepgio estreita de participacio de inves- tidor, de sorte que deve aplicar-se © coneeito de security mesmo quan- do o investidor nao seja totalmente inativo, mas participe, ainda que em gran limitado, das operagdes empresariais, No caso Davenport v. United States 260 F.24.591, 9th Cir. 1958, discutiuse a hipstese de um investider que tinha aplica- do dinheiro num negéeio de madei ra compensada, sob a condicéo de que fosse admitido também como empregado da empresa. Ao admitir a participagdo do investidor em seu negécio, a Davenport nfo providen- ciou o registro da emissio de secu- rity, baseada na idéia de que, sendo co investidor também empregado, nfo se configuraria no caso um contrato de investimento, mas es- forgo combinado de ambos no em- preendimento. O tribunal no aco- 30, Blackwell y. Bentsen, 208 F. 2d 890 15:h Cir. (1958), cert, dismissed 347 U.S, 925, 14'S. Ct. 558 (1954), foi talver © primeito a se insurgir contra uma inter~ pretagio literal da iémmula Howey. Ver inde Texas Continental Life Ins. Co. ¥. Bankers Bond Co. 187 F. Supp. 14 (W-D.Ky 1960); Wilko v. Swan, 127 F. Supp. 85 (SD. N.Y. 1955); Sie Plan Portfolios v. Cazpenter, & il. App. 2d 254, 182, N. B. 2d 18 (ist Dist. 1956). ee 56 REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 14 Theu a tese, e a earacterizou como security, aproveitando a oportuni- dade para fazer uma distinglio entre ingeréncia direta © indireta.t Essa distingo entre ingeréncia direta e indireta é também lembra- da nos casos de joint ventures e de general partnerships. Em prine cipio, esses tipos sociais séo a an- titese de um contrato de investi. mento, posto que os sécios nio sio investidores passives que colocam © seu dinheiro em empreendimentos, ¢om a esperanca de obter lucros apenas com 03 esforcos dos demais séeios. Pelo contrério, esses sécios objetivam colher ganhos mediante a participagio ativa no controle © na gestdo do empreendimento, Possivel, porém, utilizar-se dessas Jormas sociais para encobrir inves timento passive, cabendo, entio, fazer referéneia ‘a0 conceito de se, curity (ef. Securities Act, de 1939, $8 2(2), 2(4) e 2(1). A moma distinedo permite falar em security com referéncia as limited partners, ships (espécie de sociedade em co. mandita), no caso dos sécios de responsabilidade limitada, que te. riam, no maximo, uma “ingeréneia indireta” nos negocios sociais,#* VIII — Por fim, eabe fazer alu- so a um elemento que esta impli- cito na definicao de security, quan- do situada no contexto geral das securities regulations. Queremos nos referir ao “caréter piblico” da colocagaio dos valores. O aspecto sa- liente da colocago de securities é @ ‘solicitacéo publica de recursos 81, C2 Joseph C. Long, “An Attempt to Return “Investment Contracts” to. the Mainstream of Securities Regulation”, 24 Oktah. Lif. 135 Gatl)- 82 Fink, “Joint Ventures, Limited Partnerships, Sale-Leaeback and athe Devices: the Developer's “Approach”, se Chic. B. Ree. 923, 811 (07D), para um empreendimento, ¢ 0 pro- posito dessa legislacéo especial é ©, de proteger o piblico investidor. Algumas disposigdes procuram de- fender o pitblico contra os maus investimentos, através da selecio feita_pelas agéncias federais por eeasifio do registro dos lancamen- tos, pois estas tém o poder de re- cusar o registro, , assim, obstru © transito de qualquer security que julgar not fair, just, or equitable, O grande ntimero dos’ dispositivos | gais, porém, procuram impor a pré. tiea de “total revelacio de informa. goes” (full disclosure). O propésito desses comandos & 0 de possibilitar a0 investider dispor das informa- Ges necessétias para tomar deci- 8bes eriteriosas com relacio a seus inyestimentos, e assegurar também que essas informagées sejam ver- dadeiras, Nao procura questionar 2 solidez do empreendimento, nem proibir o investidor de realizar uma mé escolha, mas apenas e tio-so- mente fornecer-he informacdes per- tinentes para exame, Sequer tonta assegurar que as informagées sejam de fato examinadas pelo investidor. A sua aco parte do prinefpio, por Tongo tempo reconhecido no direito amerieano, de que uma pessoa deve estar habilitada a realizar um ne- géeio com pleno conhecimento dos fatos, se bem que a boa ou ma eseolha fique reservada exclusiva mente & sua vontade livr Essa filosofia fora enfatizada pelo Presidente Roosevelt, na mensagem que acompanhou a ‘Securities Act de 1938: *. let to the ancient rule of caveat emptor be added the fur- ther doctrine of let the seller also beware.” © a Suprema Corte dos Estados Unidos, desde entio, tem sempre manifestado essa preoeupa- sho pelo full disclosures: “The de- Sign of the statutes is to protect DoUTRINA 57 investors by promoting fall diselo sure of information through n: cessary to informed investment de- cisions.”> Em suma, um mereado livre de valores exize um acesso igual para compradores e vendedo- res a informagdes materialmente relevantes a fim de que possam tomar uma decisio criteriosa a res- peito dos investimentos. Aplicar-se-ia essa filosofia do full disclosure a todos os esquemas de investimento? 0 preambulo dos se- curities acts claramente indica que néo, e mostra que as leis em apre- go tencionam cobrir apenas as co- locagées de valores que recorram 4 poupanga do grande pablico. Tran- sagdes isoladas ou privadas, reali- zadas por pessoas que estio, ou poderiam estar, _suficientemente cientes das operagées de risco da empresa, sendo 0 perigo de fraude reduzido tanto qualitativa quanto quantitativamente, a ponto de Ihes ser suficiente a protecéo do direi- to comum, sto excluidas da obriga- toriedade do registro no 8.E.C, conforme dispde o § 4(1) do Se. curities Act de 1983. & verdade que ha certa intrangiiilidade quanto 4 caracterizagio de uma transacéo privada. Evideneiada a falibilidade de testes baseados no mimero dos investidores ox no volume dos in- Vestimentos, para a caracterizagio de uma transagdo privada, a Su- prema Gorte, no easo $.B.C. v. Ralston Purina Co. fixou mais dois critérios sobremodo elésticos. Pelo primeira, para a identificagio de uma oferta privada, caberia veri. ficar se os oblatos’ necessitariem das informagées que o registra thes garantem, para uma decisio cr teriosa; e, segundo, eaberia verifi- 88. SEC, ¥, Ralstom Purina Co, 346 U8 110 73 ee ae Ee car se, capacitados que sejam os investidores, tém eles, por si, aces. 80 8s informacdes que o registro na S.E.C. Thes forneceria. Dificil que seja a caracterizagio de uma oferta como privada, é eontudo pon- to pacifico que ela esté inaleancada pela obrigatoriedade do registro, Por nfo consubstanciar operagio de security, que implica sempre em oferta piblica. IX — A vista do exposto, pode. mos concluir que cinco sio as cas racteristicas que nos dio um teste uniforme para a identificaggo de uma security, e que, por via de conseqiiéneia, 0 definem. Security &: (1) todo investimento em dinheiro ou em bens suscetiveis de avaliacio monetéria, (2) realizado pelo in. Vestidor em razio de uma captacio piblica de recursos, (3) de modo & fornecer capital de risco a um empreendimento, (4) em que cle, © investidor, néo tem ingeréncia direta, (5) mas do qual espera ob- ter algum ganho ou beneficio fu. taro X — Gisado 0 conceito de s0- curity no direito norte-americano, 24. V, “Benchmarks of a non-public offering”, in Jennings & Marsh, ob. elt, pég. 407, 85. 0 Prof. Coffey (ob. cit, pag. 277) assim define security: "(1) a transaction in which (2) an investor contributes. to fan interprise something of value which (8) is subjected to © tisk of loss, where (4) ‘the investor ‘has ttle familiarity with or control over the interprise, andl where (5) he has reasonable expectation of receiving some of valuable ‘benetis in excess of ‘his original contribution.” Frof, Long, por sua vez (ob. cit, pig, Lis), define a security como “the invert. ment of money or money's worth tn the sick capital of a venture with the expos: tation of some benefit’ to. the investor where the investor has no direct) contol over the investment rleeisiane no se ee Ai aaa acnnntccsachaa 58 REVIS' yejamos se existe algum conceito andlogo no direito brasileiro. ‘A partir de 1964, 0 governo do Brasil empreenden @ execngao de um importante programa destinado a impulsionar o desenvolvimento do mereado de capitais. Consciente de que o desenvolvimento financeiro é indispensavel para o desenvolvimen- to econdmico geral do pais, con cebeu-ge um ambicioso plano de acéo governamental, destinado a interv! na economia e garantir uma répida expansiio das instituigdes financei- ras, Na opiniao de um professor da Yale Law School, “the Brazilian program is one of the most im- portant efforts in planed and for- ced-draft capital market develop- ment now underway in the develo- ping world”2® Nessa ordem de idéias, a par de um complexo siste- ma de incentivos fiscais, exerceram forga catalizadora no mereado bra- sileiro a Lei n. 4.728, de 14.7.1965, e as normas complementares, san- cionadas com 0 objetivo de “disc piinar o mereado de capitais e esta- belecer medidas para o seu desen- ‘volvimento” Ora, essa legislactio reguladora do mereado de capitais inspirou-se grandemente na legislagio norte- -amerieana, constituindo, a0 que s¢ saiba, o primeiro esforgo de adap- taco de um complexo de institui- ges e normas juridicas, oriundas de um pais de common law, no contexto de um pafs tributario da tradico continental européia. 80, David Trubele, Law, Planning, and the Development of the Brazilian Capital Market, Yale Lav School, Bulletin. ns. 7215, 1971; David Trubek, Jorge Hilério Gouveia Vieira e Paulo Femandes de S8, O Mercado do “Capitais ¢ 08 Incentives Fiseais, Rio, 1971; Caslos Alberto “Ame rieano 'e outros, O Mereado de Capitaie, Rio, 1970; Aleysio Lopes Pontes, Institut. caee Winamerivas, Pritmaina Bia 189 DE DIREITO MBRCANTIL — 14 Assim, por quatro déeadas, emissio'e a negoclacdo de titulos © valores, nos Estados Unidos, vém sendo polarizadas no sentido da full and fair disclosure, posto que um mereado livre, como salientamos li- nhas atrés, de valores, exige um igual acesso por parte de vendedo- ves e compradores a informagbes materialmente relevantes para rea- liar um investimento criterioso. Quer dizer: um mereado, para ser sadio, necesita de informagées es clarecidas, acessiveis a todos. Ora, esse objetivo é visado nas securities regulations americanas através de @uas ordens de medidas legais: 1) registro obrigatério das ofertas piiblicas de valores no S.E.C.; 2) Gispositivos antifraudes, objetivan- do deter priticas n&o eailitativas. Pots bem, a Lei n, 4.728/65 segue a mesma orientagio, verbis (regulatory agencies) “Avt. 1°, Os meveados financei- vo ¢ de eapitais sero disciplinados pelo Conselho Monetario Nacional e fisealizados pelo Banco Central do Brasil. Art. 2.°, QO Conselho Monetério Nacional ¢ © Banco Central exeree- ‘Ao as suas atribuigdes legais rela- tivas aos mereados financeiro ¢ de capitais com a finalidade de: (full, disclosure) I — Facilitar 0 acesso do piiblico @ informagées sobre os titulos ou valores mobiliarios distribuidos no mereado e sobre as sociedades que os emitivem; IL — proteger os investidores contra emissées egais ow fraudu- lentas de titulos on valores mobi- lidrios: DOUTRINA 59 (anti-fraud provisions) Ul — Evitar modalidades de fraude ¢ manipulagéo destinadas a criar condigées artificiais de deman- da, oferta ou pregos de titulos ou valores mobilidrios distribufdos no mereado; IV — assegurar a observancia de préticas comerciais eatiitativas por todos aqueles que exergam pro- fissionalmente fungdes de interme digo na distribuicao ou negociaesio de titulos ou valores mobilidrios. Art. 8.°, Compete ao Banco Central: (registration statements) IV — manter registro © fisea- ligar as operagbes das sociedades e firmas individuais que exergam as atividades de intermediagio na distribuigio de titulos ou valores mobilidrios, ou que efetuem, com qualquer propésito, a captacéo e poupanga popular ‘no mereado de capitais; V — registrar titulos e valores mobilidrios para efeito de sua no- gociagéo nas Bolsas de Valores; VI — registrar as emissies de titulos ou valores imobilidrios a se- vem distribuidos no mercado de ca- pitais, ssa adaptacéo de um complexo de instituigées de um sistema legal para outro representa um desafio de largas proporgdes, dando origem a um grande mimero de problemas, néo s6 de natureza estrutural, mas de ordem conesituale até etimolé- gica, Assim, nfo existe em portu- gués um voesbulo que corresponda a0 termo security, havendo o legis- Iador brasileiro, ‘como se vé das Pastagens acima transeritas, tradu- zido por “titulos e valores mobilié- vios”, Se bem que as conotacées dessa expresso ndo tenham ainda sido exploradas, existem alguns coneeitos arraigados que, em prin- cipio, tornam a tradugdo feita uma traicdo (traduttore, tradittore), No conceito em tela, o legislador pa- rece niio cogitar senfo daqueles ti- tulos e@ valores mobiliérios que se “materializam” em um documento, tais como os titulos de crédito ¢ os titulos de participagio em uma sociedade anénima. A Resolucio n. 39, de 20.10.1966, do Banco Cen- tral, que veio disciplinar as nego- ciagdes de titulos e valores mobi ligrios nas bolsas de valores, refe- re-se exclusivamente a agées, obri- gagbes e outros papéis de emissio de pessoas juridicas de direito pri vado (art. 57), assim como os di- reitos e€ subscricées e opedes eoncernentes a esses titulos (art. 58). A Resolugio mn. 88 de 80.1.1968, que disciplina o registro das pessoas juridicas de direito pri- vado, emissoras de titulos e valo- res mobiliarios, negociiveis em bol- sae nas demais instituicdes inte- grantes do sistema de distribuicio no mercado de capitais, bem como o registro das respectivas emissées, somente faz alusio as ages e obri- gagées emitidas pelas sociedades anénimag. Ainda que ambas as re- solugées facam referéncia a titulos e valores emitidos por pessoas juri- dicas de direito privado, 9 legis- Inder néo_cogita, por exemplo, da participagio em sociedade por quo- tas ou em sociedade em comandita simples, nfo porque essas partici- acdes néo se revistam do carater de oferta piiblica, mas porque nio se materializam em um titulo de participagéo. Ora no direito ame- ricano, a participagio em uma li- mited partnership 6 conceituada como security. @ canitniada nela isi ananaoitantisia 60 Securities and Exchange Act Rute Satt-1 na categoria das equity 8e- curities.” ‘Alias, a propria definigio legal de security, constante da Securities ‘Act de 1988, em sua redacdo ori- ginal, antes da alteragio efetuada pela Emenda n, 291, 73 Congress, de 6.6.1934, expressamente subli- nhava a irrelevancia da materiali- zagio em instrumento documental (“certificate of interest in prop:x- ty, tangible or intangible”) ‘Tendo em vista que o objetivo das leis disciplinadoras do mercade de capitais é 2 parte a sua carga estimuladora, proteger 0 pablico investidor dos mecanismos de cap- taco da poupanca, a construcéo jurisprudencial “norte-americana, lentamente formulada, em torno da nocio de security, livre de embara- gos formais, e com largo elastério, ST. Ad. Titteram: “The term equity ig hereby defined to include any stock or similar Security, eertifieate of interest or participation in’ any profit shaxing agr tment, preorganization certifieate or subscription, transferable share, voting trust certificate or certificate of deposit for an equity security, limited partnership interest, interest ina joint venture, or certificate of interest in'a business trusts for any. security convertible, without con- ideration into such a security, or eaxryng ‘any warrant or Tight to subscribe to or purchase such a security; ar any such ‘warvant or Tight". REVISTA DE DIREITO MERCANTIL — 14 constitui uma ligho que nfo pode deixar de ser cogitada pelos intér- pretes do direito brasileiro de mer cado de capitais. Nesse sentido, pa- rece-nos que o conceito de “titulos e valores mobilidrios”, utilizado pelo legislador para traduzir a rea- lidade ceondmiea anéloga, pode so- fyer uma leitura generosa, tal co- mo a interpretagao desenvolvida nos EE.UU. em torno do termo securi- ty, que permita ao Banco Central do Brasil policiar deveras 0 mei cado de valores, em sua expressio mais lata, fiscalizando todas as for- mas de captagéo de recursos da poupanca popular. Certos tipos de loteamento popular, algumas for- mas de leasing e renting, planos de promoc&o de venda de’ tecidos, cestas de natal, automéveis, merca- dorias varias subordinadas a earnés de poupanga e sorteio, © até lotes de cemitérios, que, em nosso pais, até agora, tém escapado da fiseali- zacio do Banco Central, mas que revelam todas as earacteristicas de solicitagao publica de valores, de- vem ser examinados, a luz de cr térios menos formalistas, visando a protecio do piblico investidor. Nes- te ponto, como em muitos outros, © estudo comparado do sistema vi- gente na América do Norte e em nosso pafs pode langar luzes esela- recedoras. EMPRESA MULTINACIONAL: DESCRICAO ANALITICA DE UM FENOMENO CONTEMPORANEO JOSé CARLOS DE MAGALHAES SUILARIC ‘nomico-pol 8. Goneettus I — Introdugdo. 11 — Conceituagies fo Jurfdiea, III — Des: ties, Parilelpante. Objetivos. Estrategia. Areas de. atuagl do poder. Resultados e efeitos. Trausferéneia de teenolog Janga de pagamentos. Controle da economia. Dependéncia teeno- gies @ distoreio da Eeonoinia, 1 — Introdueio © mundo moderno assiste a um movimento de transformac&o poli- tica, social e econdmica que, em muitos respeitos, & conseatiéncia di reta da Segunda Guerra Mundial. © papel dos Estados, fortalecido pe- Jo movimento nacionalista resultante das tendéncias do séeulo dezenove, comegou paulatinamente a declinar, nao 86 como conseqiiéneia da guer- ra em si, mas também com o sur- gimento das organizacdes interna cionais e 0 desenvolvimento répi- do dos meios de comunicacéo. Por outro lado, 0 ntimero de Wstados surgidos neste perfodo pés-colonial, muitos dos quais sem condigdes de exercitar realmente as prerrogati- vas e 0 papel de Estados, j que atados a uma estrutura ‘colonial, contribuiu muito para que a nogéo antiga de Estado soberano viesse a ser vista apenas como uma meté- fora, sem grande significado. Em todo’ esse panorama no plano poli- tieo, associa-se a crescente intera- eo das economias nacionais, como conseqtiéneia dos movimentos de in- tegracio econdmica e da propria expansio industrial dos paises de- senvolvidos. Nesse contexto surge a empresa como um instrumento de producio e distribuicio de riquezas. Se a principio ligada aos prineipios da nacionalidade, atada aos Estados nos quais seis interesses estavam radieados, aos poucos volta-se para as Areas’ internacionais, em busca de mereados maiores e de fontes de matéria-prima ou suprimento. Da empresa nacional ou desta em- presa com operagées no exterior para as empresas multinacionais Zoi um passo quase que imperceptivel, com intimeras conseqiiéncias. ‘Tal tipo de empresa nao se iden- tifiea com as antigas empresas que operavam como que agentes de go- vernos, tal como & 0 caso da Com- panhia das indias Ocidentais, gada & Inglaterra e eriada para eo- lonizar e explorar novos territérios. Nem com as empresas com opera- Ges internacionais, identificadas ou identifieaveis com determinado Es- tado. A empresa multinacional, de- senvolvendo-se das empresas naeio- nais que a compéem, surge como um todo, sendio em sua estruturacio jurfdica, pelo menos na sua ativi- Gade e’ comportamento, Usando 2 estratégia de ser “bom cidadio" em todo o Estado que a acolhe, possuindo tecnologia avangada, nem sempre acessivel aos Estados menos desenvolvidos e mostrando uma fle- xibilidade em captar recursos em toda a parte do mundo, a empresa multinacional comega a colocar em xeque 0 poder do Wstado, na con- ducio das suas atividades econd- micas. ‘Em verdade, a empresa multina- cional nfo se identifica exatamente com o Estado onde tem sua base,

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