You are on page 1of 146
REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA SUMARIO DO NUMERO DE JANEIRO DE 1939 APRESENTACAO por José Cantos pz Maceo Soares, Presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica . RESOLUGAO NO 18, de 12 de Julho de 1938 da Assembléia Geral do Conselho Nacional de Geografia, que “prove @ publicagdo da Revista Brasileira de Geografia . 5 ARTIGOS HISTORICO DA CRIACAO DO CONSELHO NACIONAL DE GEOGRAFIA, pela SECRETARIA GERAL DO CONSELHO .. poeaoH GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL, pelo Pror. P, Derrontamvss, da Universidade do Distrito Federal .... 19 ESBOGO DAS REGIOES NATURAIS DO ESTADO DA BAlA, pelo Exc. Stivzo Fors pe Apngv, Consultor Técnico do Conselho Na- cional de Geografia (secgdo I — Metodologia Geografica) . 68 COMENTARIOS ALTERAGOES NOS TIPOS DE POVOAMENTO NO ESTADO DE S. PAULO. Artigo do Pror. Dr. Preston E. Jams comentado pelo Paor. C. M. DeLcapo DE CARVALHO Son Booscoo penny) MAPAS MUNICIPAIS pela Secneranta GERAL 00 CONSELHO .. 80 NOTICIARIO ATIVIDADES DO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTA- TISTICA Relatério do Presidente, lido a 19 de jutho de 1937, ao se instalarem os trabalhos das Assembiéias Gerais dos Conselhos Nacionais de Geografia ¢ Estatistica . PRIMEIRA ASSEMBLEIA GERAL DO CONSELHO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA, Relatério do Secretério Geral e resolucdes tomadas .. Regulamento do Conselho Nacional de Geografia .. 123 LEGISLACAO DECRETO N° 24.609, DE 6 DE JULHO DE 1934 que “cria 0 Instituto Nacional de Estatistica e fiza disposicdes orga- nicas para a execucio e desenvolvimento dos Servicos Estatisticos” ... 129 DECRETO N° 1.022, DE 11 DE AGOSTO DE 1936 que “aprova e ratifica a Conven¢do Nacional de Estatistica” ... 134 PETROLEO NA BAIA Sob bons signos aparece a Revista Brasileira de Geografia: ao ser ultimada a sua impresséo, uma noticia sensacional espalhou-se pelo pais inteiro, rapidamente, provocando as mais intensas vibragdes — jorrou petréleo em Lobato, na Baia! O 21 de Janeiro de 1939, dia em que se de o fato de téo largas repercussées na geografia econémica nacional, esté fadado a figurar com destaque no quadro das principais datas da histéria da nossa economia. E’, pois, com 0 maior prazer que @ Revista Brasileira de Geografia, ao nascer, se congratula entusiastica- ‘mente com os seus leitores brasileiros e anuncia para o prézimo mimero um interessante artigo de autoria do eng. Silvio Fréis de Abreu, grande especialista no assunto e precursor da existéncia do petréleo naquela regiéo, 0 qual comentard os estudos e pesquisas que determinaram a descoberta do petréleo no Brasil. REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA Ano I | JANEIRO, 1939 | Noi APRESENTACAO Com o aparecimento do primeiro némero da Revista Brasileira de Geogratia, determinado pela Resolucio n.° 18, de 12 de julho de 1938, da Assembiéia Geral do Conselho Nacional de Geografia, o Instituto Brasileiro de Geogratia e Estatistica estréia mais uma das suas publi- cagdes periédicas. O Anuério Estatistico do Brasil, cuja publicag#o h4 muitos anos estava paralizada, presentemente a cargo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica, j4 ofereceu ao piblico os volumes referentes ao ano II-1936 e ano III-1937, restabelecendo-se assim, com ritmo seguro, © aparecimento de uma das mais dteis publicagées off As Sinopses Estatisticas regionais, complemento do Anudrio, des- tinadaé 2 apresontaco, sob forma padronizada e uniforme, dos mes- mos quadros estatisticos referentes a todas as Unidades Federadas —os Estados, o Distrito Federal e o Territério do Acre —constituem, por outro lado, uma interessante iniciativa do Instituto que, com a cola- borag&o dedicada dos sistemas estatisticos regionais, publicou a série quasi completa relativa a 1936 e a série completa de 1937. 4 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA Surge agora a Revista Brasileira de Geografia, com a qual o setor ge0grdfico do Instituto inicia a divulgacdo periédica de assuntos rela- tivos ao territ6rio brasileiro. © Conselho Nacional de Geografia, ao tomar essa iniciativa, teve em mira varios objetivos: contribuir para um melhor conhecimento do territério patrio, difundir no pais o ‘sentido moderno da metodo- Jogia geogréfica, promover o intercAmbio cultural com as instituicdes congéneres. O melhor conhecimento do territ6rio brasileiro 6, em esséncia, a finalidade do Conselho Nacional de Geografia o qual, nos termos do decreto n.° 1.527, de 24 de marco de 1937, que o instituiu, para preencher sua finalidade, deve promover o entendimento e com ele obter a coope- racio de quantos se ocupem de Geografia no pais. E’ fora de davida que a Revista Brasileira de Geografia trar4 con- tribuigdo apreciavel para esse desideratum. Em primeiro logar, como veiculo de divulgacio, ela serviré de instrumento de penetracio como idade geogrética do pais, levando uma afirmagio de vitalidade, uma palavra qual 0 Conselho se far4 presente em todos os recantos de a de estimulo © um aceno de conclamagio. Alem disso, pondo-se ao par das atividades geogréticas, culturais @ profissionais, oficiais ou parti- culares, e noticiando como se desdobram, ela facilitard o entendimento @ 0 fecundo intercambio dessas mesmas atividades, constituindo assim © Conselho a sua forca propulsora mais importante. Acresce ainda que, ventilando assuntos geogrdficos de natureza véria, ela traré a publico conhecimentos novos uns, mais perfeitos outros, e por veres suscitard debates dos quais surgird a conceituagaio mais verdadeira de determi- nados aspectos do territério nacional, considerado no seu todo ou nas suas particularidades. Por fim, aparecendo’com ritmo certo, a Revista Brasileira de Geogratia daré agasalho a boa colaboraco, proporcionando com isso a divulgagiio de estudos especializados © o estimulo a pro- ducio geogrdfica de qualidade. A Goografia 6 um dos ramos dos conhecimentos humanos que maior evoluco experimentou, evolugae sobretudo na sua metodo- logia. Em seu inicio, ela apenas dava nomes; e depois, em ciclos su- APRESENTAGAO 5 cessivos, passou tambem a medir e a descrever; hoje, gracas as con- quistas culturais ainda nio centendrias, a Geografia se preocupa com a explicago dos fenémenos fisicos, biolégicos e humanos que se exten- dem pela superficie da Terra. A nomenclatura, a medicio, a descri¢ao e a explicagiio, eis os elos da cadeia geogréfica. A Geografia explicativa, porem, 6 dos nossos dias; Karl Ritter e Alexandre Humboldt, os seus fundadores, viram a segunda metade do século passado, a cujo patri- ménio pertence 0 corpo de principios basicos do novo método cienti- fico : 0 principio da extensio, que reconhece como geogrdficos somente os fenémenos que se espalham pela superficie da Terra; 0 principio da causalidade, que determina a pesquisa da causa dessa distribui¢&o ter- ritorial do fenémeno; o principio da conexfio, que exige a investigactio das interrelagdes existentes entre os fenémenos ocorrentes no mesmo local; 0 principio da evolugao ‘ou da atividade, que obriga seja inves- tigado o fenémeno geogréfico nfo somente na sua apresentacao atual mas tambem no seus comportamentos passado e futuro provavel. Inspirando-se nesse espirito moderno, a Revista prestaré um ser- vico & cultura ‘brasileira, ao difundir uma prética cientifica encanta- dora e util, tanto mais que a conceituac&o moderna da Geografia al- terou a orientagiio do seu ensino, hoje nfio mais um exercicio da me- méria, enfadonho e sufocante as iniciativas da pesquisa, e sim uma disciplina educadora da observaciio do meio fisico e da sua relaglio com a vida humana. Hé a considerar ainda a necessidade da divulgac&o répida dos co- nhecimentos geogréficos; dai a relevante missio da revista na ciéncia geografica moderna, — como poucas outras ciéncias, extensa e nova, — oferecendo a cada instante pequenas mindcias, observagdes inéditas, 8 merecer difusio nos meios interessados. Finalmente, uma razio poderosa ainda veiu determinar o apare- cimento desta Revista: 6 que o Conselho Nacional de Geografia faz parte da Unio Geogrdfica Internacional, onde representa o Brasil, em consequéncia do decreto n.° 1.527 que instituiu 0 Consefho; nessas condi¢&es, no convivio com as organizagées geogrdficas estrangeir: 6 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA impunha-se uma publicag&o periédica brasileira, de cultura geogré- fica e noticiosa dos fatos e atividades geogréficas brasileiras. A Revista Brasileira de Geografia vem satisfazer a essa necessidade, de maneira a mais conveniente porquanto todas as organizacdes geogréficas estran- eiras adotam a revista como instrumento desse intercambio. Surgiu, pois, a Revista Brasileira de Geografia originada de im- periosas exigéncias do funcionamento do Conselho Nacional de Geo- rafia, em suas relacdes com as atividades nacionais e estrangeiras. As causas determinantes da criagdo da Revista enquadram as suas finalidades. Portanto existéncia longa, brilhante © fecunda merece a Revista Brasileira de Geografia. A vitalidade do Conselho Nacional de Geografia permite prever que assim seja. Jos# CARLOS DE MACEDO SOARES RESOLUCAO N.° 18—pe 12 DE JULHO DE 1938, DA ASSEMBLEIA GERAL DO CONSELHO NACIONAL DE GEOGRAFIA. Prové 2 publicacio da Revista Brasileira de Geografia, A Assembléia Geral do Consetho Nacional de Geografia, usando das suse atribuigies : considerando que é finalidade do Conselho promover um melhor conhecimento do ter- ritério patrio (art. 1.° do dec. 1.527, de 24 de Marco de 1938) eque esse conhecimento, por sua natureza, merece a msis ampla divulgacio; considerando que, com uma publicagio periédica e apropriada, o Conselho poder con- tribuir, de maneira atraente e educative, para uma vulgarizscdo, proveitosa ¢ extensa, dos co- nhecimentos geogrificos brasileiros; considerando que publicacdo de uma Revista ‘ilustrada é a norma de divulgacio univer. salmente adotada pelas instituicdes geogrdficas, oficiais ou nfo; considerando que uma Revista propria facilitaré a0 Conselho promover, como entidade oficial da geografia brasileira, o recomendado interc&mbio cultural com os demais paises estran- geiros, o qual, com a efetuada adestio do Brasil A Unitio Geogréfica Internacional, tornou- aconselhavel € oportuno; considerando a necessidade da difusio da metodologia geogréfica moderna, caracterizada pelo espirito explicativo dos fendmenos de superficie, observados segundo aspectos peculiares considerando que a publicacho regular de uma Revista, contendo colaboragBes individuais on coletivas, traré um apreciavel estimulo a elaboragio de trabalhos especislizados; considerando que a edico de uma Revista especializada, com a apresentacHo material ‘conveniente, impée onus consideraveis, tornando, assim, aconselhavel a prética da venda dos exemplares disponiveis, a qual néo s6 é usual em publicagdes congéneres de todos os paises do mundo mas tambem esté prevista no inciso III do art. 24,° do decreto n.° 24.609, de 6 de Julho de 1934, com referéncia as publicagdes do Instituto Brasileiro de Geografia e Extatistica; considerando, finalmente, 0 apelo formulado pela Assembléia Geral do Conselho Nacional de Estatistica, em sua resolugio n.° 68, de 4 de Julho de 1938 (art. 3.°, inciso TV); Resolve: Art. 1.°—O Conselbo Nacional de Geografia publicar a “REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA”, Art. 2.°—A Revista seré 0 6rgio de divulgacdo do Conselho, tendo por finalidade geral divulgar os conhecimentos geogréficos. Parégrafo ‘inico—Constituem objetivos principais da Revista: 1.2~a divulgactio do conhecimento do territério brasileiro; 2.8~a divulgacio da metodologia geogréfica moderna, da metodologia do ensino da Geo- fgrafia e dos conhecimentos da ciéncia geogréfica e ciéncias correlates; 3.°~a vulgarizacio da atividade geogréfica brasileira, especialmente dos empreendimentos € realizagées do Consetho. Art. 3A Revista seré trimestral, ssindo os seus nimeros, rigorosamente, n™% meses de Janeiro, abril, julho ¢ outubro. 0 primeiro néimero da Revista sairé, o mais tardar, em Janeiro de 1939. § 2°—A Assembicia Geral, quando julgar conveniente, alteraré o prazo dessa periodi- Art. 4.0—A Revista serd organizada e dirigida pela Secretaria Geral do Consetho e impressa no Servigo Gréfico do Instituto, logo que este estiver funcionando. § 1.°—A Presidéncia do Instituto providenciaré para que, no orgamento ordin: vigo Grafico, se inclua a impressio da Revista. 8 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA § 2.°—No corrente exercicio, as despesas de publicacio da Revista correriio por conta da consignacéo 5, da verba II do orcamento do Conselho, em vigor. Art, 5°~A tiragem da Revista ser, no minimo, de 5.000 exemplares, dos quais se faré a seguinte distribuigao : I.—2s autoridades superiores dos poderes da Reptiblica: TL.—as presidénciss do Tribunal de Contas e dos Conselhos Nacionais, do Conselho Fe- deral de Engenharia e Arquitetura e de seus Consclhos Regionais; TIT.—aos servigos ¢ representaciio de cada Ministério, no pafs ¢ fora dete, de acordo com ‘a relagio que o mesmo fornecers IV.—aos chefes dos governos regionais e respectivos secretérios de Estado; ‘V.—as principais instituigdes econdmicas e culturais do pafs; VI.—aos regis regionsis do Instituto e aos membros dos seus 6rgios centrais; VII.—aos Diretérios Municipais de Geografia; ‘VITI.—as bibliotecas ¢ escolas de ensino secundiirio e superior, que forem mantidas pelos poderes piiblicos; TX.—A Unitio Geogréfica Internacional, A Unitio Pan-Americana, as sociedades de geo- grafia e instituigSes intemacionais de maior significacio; X.—a principal organizacdo geogréfica de cada pais estrangciro, especialmente conside rados 08 paises aderentes a Unitio Geogréfica Internacional; ‘XI.—as demais personalidades e corporacées, a juizo do Diretério Central. § 1*—A distribuigso gratuita prevista neste artigo serd devidamente documentada, de- vendo os exemplares da Revista, remetidos sob registo postal ou em mio, Ievarem um aviso de recebimento para ser assinado pelo destinatério e devolvido @ Secretaria do Conselho. § 29-0 Presidente eo Secretério Geral do Instituto, os membros do Diretério Cen- tral © 0 Secretésio do Conselho poderdo oferecer, a titulo gratuito, a visitantes ifustres, a fun- cionérios de repartigées especializados, ¢ a titulo de permuta ¢ de casos outros de interesse para (© Consetho, exemplares da Revista. ‘Art, 6°—Os exemplares da Revista que excederem da referida distribuigtio gratuita serio postos A venda, & razo de cinco mil réis o exemplar. § 1.°-A Secretaria do Conselho fica responsavel pelo controle tanto da distribuigdo gra- tuita como da venda dos exemplares da Revista. § 2. —Semanalmente @ Secretaria do Conselho recolherd so Servigo de Contabilidade do Instituto o produto da venda dos exemplares da revista, o qual, levado a um fundo especial destinado & methoria da Revista, ficaré A disposicdo da Secretaria, que o aplicaré nas despesas, suplementates, gratificagées, prémios aos colaboradores, e demais despesas de organizacio, aperfeigoamento © desenvolvimento di Re: Art, 72—A diregio da Revista sera auxiliada por uma Comissio de Redac&o constituida de 3 membros, que seriio personalidades altamente especializadas em assuntos geogréficos, es- cothidos pelo Diretério Central dentre os nomes indicados pela Secretaria do Conselho. Parfgrafo finico.—A Secretaria do Conselho fica autorizada a tor 08 auxiliares ne- cessésios aos servicos da Revis Ast. &—A Revista publicaré os artigos individuais ou coletivos, que forem aprovsdos pela Comissiio de Redacio. § 1.5—A responsabilidade técnica e cient{fica das colaboracdes cabe aos respectivos au- toes. § 2.0—De todos os artigos serio feitos resumos em frances, inglés, alemfo, espanhol, ita- Tiano ¢ esperanto. Art. 9.--A Revista publicaré a legislagdo brasileira referente a assuntos geogréficos ¢ a0 Conselho; noticiaré os fatos relativos as atividades do Conselho e das demais instituicdes geograficas do pais, principalmente das instituig8es integradas no Consetho; ¢ informar& os prin- cipais acontecimentos da geografia mundial. Art, 10.°—S6 excepcionalmente a Revista publicard artigos e trabalhos referentes a paises estrangeiros 2 titulo de exemplificacto ou de comparacio. Rio de Janeiro, 12 de Julho de 1938, ano 3.° do Instituto. HISTORICO DA CRIACAO DO CONSELHO NACIONAL DE GEOGRAFIA Organizado pela Secretaria Geral do Consclho Introdugio Ao surgir a Revista Brasileira de Geografia, é justo dar-se a conhecer como se constituiu 0 Conselho Na- cional de Geografia, do qual é a Revista o orgio oficial. Duas ordens de fatos determinaram a criaco do Conselho: uma, a série de iniciativas em torno da adeséio do Brasil A Unido Geografica Internacional; outra, o conjunto de medidas empreendidas para a constituigo no pais de um organismo de coordenagao das atividades geogréficas brasileira. Em uma primeira fase, essas duas tendéncias agiram isoladamen- te, depois juntaram-se, concretizando-se logo a seguir a almejada cons- tituigdo do drgao oficial brasileiro de geografia. Antecedentes da © primeiro contato real da cultura geogréfica ades&e do Brasil brasileira com a Unio Geografica Interna- & Unifio Geografica _cional foi, sem duivida, a participagao do Bra- Internacional sil no Congreso Internacional de Geografia, promovido pela Unido, realizado em 1931, ex Paris e no qual o delegado brasileiro, o conhecido e acatado Prof. A. de Sampaio, desempenhou as funcées de vice-presidente da Secgao de Bio- geografia. Nasceu ai o primeiro anseio pela adeso do Brasil, da qual 0 Prof. Sampaio constituiu-se o advogado principal. Mais tarde, em Julho de 1933, vinha ao Brasil 0 eminente gedgrafo francés, Prof. Emmanuel De Martonne, Secretdrio Geral da Unido que, na memoravel sessdo conjunta do dia 25 daquele més, foi solenemente recebido pelas magnas instituigdes culturais brasileiras, o Instituto Historico e Geografico Brasileiro, a Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro e a Academia Brasileira de Ciéncias; nessa, casio, o ilustre visitante formulou 0 convite oficial no sentido de o Brasil coneretizar a desejada filiagao. Fez 0 discurso de recepeao 0 proprio Prof. A. de Sampaio que, com justeza, salientou a figura excepcional do visitante, dizendo que “pertence ao niimero dos que por tal forma se notabilizaram perante o mundo cientifico que, onde estejam ou onde cheguem, seu nome ilus- tre vale por si sé mais do que a mais minuciosa apresentacéio”. O emi- nente Prof. De Martonne, em seu discurso de agradecimento, encare- ceu © concurso da cultura geografica brasileira, salientou a riqueza e a variedade dos temas geograficos no nosso extenso pais e declarou, quanto & atividade geografica no Brasil, que “sua obra seré ainda mais fecunda no dia em que um “Comité” Nacional de Geografia puder co- ordené-la em espirito geogréfico, pondo-se em contato com organiza- c6es andlogas por intermédio da Unido Geografica Internacional. Os 0 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA proventos serdo grandes para a ciéncia em geral, mas tambem para este belo pais, tao cheio de selva e de possibilidades de desenvolvimento.” A idéia da constituigéo de um érgo nacional encarregado da co- ordenagéio dos problemas da geografia brasileira merecia assim uma definig&o precisa, uma enunciago clara, como uma necessidade im- periosa. As palavras de De Martonne encontraram eco e a Academia Bra- sileira de Ciéncias imediatamente promoveu uma tentativa para a ins- tituiciio do referido “Comité”: esbogou a organizacao do “Comité”, como entidade privada, distribuiu o esbogo entre os interessados, com 0 con- curso dos quais deveria ser levantada a instituigao. Por muito modesta que fosse a estrutura do projetado “Comité”, por limitada que fosse a sua funcdo, exclusivamente como elemento de adesfio & Unio Geogréfica Internacional, as dificuldades para a sua organizac&o deveriam ser enormes, como realmente foram: dificulda- de de congregar técnicos, dificuldade de obter colaboragbes e dados, di- ficuldade de reunir recursos financeiros suficientes; daf, a consequente impossibilidade de empreender os trabalhos e de satisfazer os encargos minimos que a referida adesfio exigiria. A propria Academia reconheceu a impraticabilidade da sua pri- meira tentativa, porem, tenaz no seu objetivo, encetou uma segunda tentativa, apelando para os poderes ptiblicos no sentido de o Governo se encarregar da referida organizagao geografica, que tantos empre- endimentos poderia efetivar, em beneficio da cultura nacional e dos conhecimentos geograficos no pais. Nesse sentido foi vasado o memorial de 29 de Dezembro de 1934, apresentado pela Academia ao Exmo. Snr. Dr. Odilon Braga, entao Ministro da Agricultura; nele, a Academia, revelando conhecimento das finalidades e da organizagéio dos servicos geograficos e estatisticos afetos ao Ministério, sobretudo os da sua Diretoria de Estatistica da Produciio, declara que os estudos geograficos a serem desenvolvidos com a efetivacdo da referida adesdo “sio estudos novos, subordinados ao carater quasi enciclopédico da Geografia moderna e para os quais 0 Ministério da Agricultura mantem hoje servicos técnicos nitidamente orientados para atender idénticos objetivos, que, em wltima anélise, sio os da Geografia Humana, através da Econémica”. Os professores de Geografia da Missao universitaria francesa junto as Universidades do Estado de Sao Paulo e do Distrito Federal, por seu turno, reforcando os convites anteriores, insistiram sobre o assunto, sendo de destacar as solicitagdes formuladas em 1936 pelo eminente geografo P. Deffontaines e pelo Prof. Pierre Monbeig junto ao Mi- nistério das Relacgdes Exteriores do Brasil. A essas vozes, nessa ocasido, juntou-se o pronunciamento signifi- cativo da Associagao dos Gedgrafos Brasileiros, novel instituigéo cul- tural que se vem caracterizando por uma atuagdo brilhante, fecunda HISTORICO DA CRIAGAO DO CONSELHO NACIONAL DE GEOGRAFIA au e de alto teor cientifico; na reuniao dos seus sécios, realizada em Sao Paulo, no dia 19 de Outubro de 1936, a Associagac encareceu a criagéio de um Conselho Nacional de Geografia, formulou votos para que este Conselho aderisse 4 Unido Geografica Internacional e depositou in- teira confianca na ag&o do Ministério das Relag6es Exteriores. Anseios pela orga- Profissionais de valor, homens de cultura, nizacio geografica todos brasileiros ilustres, veem, de longa brasileira data, se preocupando com os problemas da geografia nacional, destacando a neces- sidade de serem esses problemas entregues a uma organizacdo oficial adequada. Nas gloriosas classes militares, sobretudo dentre distintos oficiais do nosso valoroso Exército, o assunto tem sido considerado; in- felizmente, porem, o Exército Nacional, que sempre se preocupou com a solugao dos magnos problemas nacionais, ndo poude tomar a si o en- cargo de coordenar as atividades geograficas brasileiras, ao que parece, nao s6 porque a funcdo precipua da defesa da Patria absorve por intei- ro a sua atividade como tambem porque a conceituacéo moderna da geografia exige, alem dos levantamentos geodésicos e topograficos do territério, a investigacdo de intimeros fendmenos — fisicos, biolégicos e humanos —, muitos deles de natureza especulativa estranha as fina- lidades militares. Com o tempo, esbogou-se e firmou-se a orientagdo adequada. © ano de 1933 foi nesse particular de acentuada significacio, de- vido a dois fatos expressivos: um, a criagao do servico federal de esta- tistica territorial; outro, a constituicio da Comissao inter-ministerial encarregada da elaboracéio do projeto de organizagdo do sistema esta- tistico brasileiro. Pelo decreto n.° 22.984, de 25 de Julho de 1933, foi criada, no Ministério da Agricultura, a Diretoria de Estatistica e Publicidade, mais tarde denominada Diretoria de Estatistica da Produgao, tendo por 1. Secedo, a Secg&o de Estatistica Territorial, cujas finalidades ficaram definidas no Regulamento da Secretaria de Estado dos Negécios da Agricultura, aprovado pelo decreto n.° 23.979, de 8 de Margo de 1934, qual, em seu artigo 111° diz: “artigo 111° — Cabe a 1.8 seccao: I — reunir documentagées sobre o territério nacional, mediante coleta, critica, fichamento e arquivamento dos dados geograficos fornecidos pelas reparticées federais, esta- duais e municipais e por instituigdes particulares; II — organizar uma mapoteca do territério nacional, tanto quanto possivel completa e racional, principalmente quanto 4 agricultura do pais; II — elaborar trabalhos cartograficos padrées, mediante a execucdo tecnicamente rigorosa de cartas-tipos do territé- rio nacional, totais e parciais, gerais e especiais; 2 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA IV — promover, junto As administragtes estaduais e municipais, investigagdes sobre a geografia de regides conhecidas, sistematizando as instrugdes respectivas; V — instituir um servigo permanente de estatistica ter- ritorial, mediante participagdo nos inquéritos estatisticos da D. E. P. e em correspondéncia com as repartigées e insti- tuigdes que se ocupem do mesmo objeto; VI — estudar as caracteristeas fisiogrficas das regides do pats, visando principalmente a produgo agricola; VII — executar trabalhos de desenho da D. E. P., me- diante a representagio gratica e cartogratica, rigorosa e su- gestiva, dos resultados de suas investigagdes estatisticas.” Programa téo extenso e tao intenso, seja dito de passagem, havia de exigir um desenvolvimento apreciavel e répido da menciona- da Secefo, que, na sua rota de realizagSes, no poderia permanecer na situagdo contingente e limitada de uma dependéncia ministerial de segunda ordem. Tal progresso se efetuou e 0 Governo, reconhecendo a necessidade de fortalecer aquele 6rgéo da administracdo federal, transformou a Secedo de Estatistica Territorial em uma reparticao auténoma, subordinada ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatis- tica, com 0 nome de “Servigo de Coordenago Geografica”, atribuin- do-the a fungao de 6rgdo téenico dos trabalhos geogrficos do Recen- seamento Geral da Reptiblica — é 0 que estabeleceu o decreto lei n° 782, de 13 de Outubro de 1938. Ainda em 1933, 0 Governo da Republica voltava suas vistas para o problema da uniformizacdo da estat{stica brasileira: o entao Ministro da Agricultura, major Juarez Tavora, cujas excepcionais qualidades de administrador ainda nao foram devidamente enaltecidas, autori- zado pelo Chefe do Governo Provisério, constituiu uma Comissio in- terministerial para estudar um plano de organizagao e de uniformiza- cdo da estatistica brasileira, a qual, desarticulada, multipla e contra- dizente como estava, nfo preenchia a sua importante finalidade. Os anseios dos estatisticos brasileiros foram compreendidos. Jé em 1931 0 Dr. Heitor El6i Alvim de Freitas, diretor da 1.* sec- go da Diretoria de Estatistica do Ministério da Educagéo, em interes- sante exposic&o ao Diretor, reclamava a decretagéo de uma “Lei de estatistica”, que proporcionasse a estatistica brasileira “os requisitos es- senciais: integralidade, atualidade, uniformidade e sistematizacio”. Apreciando a exposi¢&o, 0 Diretor afirmou que “de fato, a exposi¢éo de que se trata colocou a questo nos seus exatos termos. Assinala em primeiro logar as trés condicSes indispensaveis & consecugSo daqueles objetivos, a saber: a obrigatoriedade da prestagao regular de informes ao poder piblico, a criaggo de adequados registos permanentes dos fatos a perquirir, e, finalmente, a instituic&o ou ampliagéo, a diferen- HISTORICO DA CRIAQAO DO CONSELHO NACIONAL DE GHOGRAFIA % ciago e a cooperacio, prescritas com carater obrigatério das ativida- des investigadoras, com finalidade estatistica da Unifio, dos Estados e dos Municipios. E sugere, em seguida, a tinica solugdo deveras eficaz: a decretacao do estatuto orginico da estatistica brasileira, compre- endendo uma lei e o competente regulamento com apropriado sistema de sangées e operante, tanto em relagdo aos particulares — indivi- duos e coletividades —, como para todas as entidades publicas, através de um conjunto bem ordenado de disposicdes, fixadas com estudo e prudéncia, e bem adaptadas as pecularidades do meio brasileiro e as necessidades que a experiéncia j4 denunciou” — e, finalizando, julgou a citada exposicao digna da considera do Governo da Reptblica. Esse mesmo diretor, o ilustre Dr. Mario Augusto Teixeira de Frei- tas, um pouco mais tarde, em 5 de Fevereiro de 1932, consubstanciava aquelas aspiragSes em um ante-projeto de criagdo de um “Instituto Nacional de Estatistica e Cartografia”, que submeteu & consideracio do Ministro da Educagdo; entretanto, so depois, quando se constituiu a re- ferida Comissfo Interministerial foi o ante-projeto definitivamente apre- ciado para fins de uma concretizagao A Comissio julgou inoportuna a incluséo da Cartografia nas fina- lidades da instituigao sistematizadora da estatistica brasileira e apresen- tou o projeto de criacao do Instituto Nacional de Estatistica, que 0 Go- verno tornou realidade, mediante o decreto n.° 24.609, de 6 de Julho de 1934, A idéia de Teixeira de Freitas, entretanto, nao ficara de todo aban- donada, sementes fecundas entranharam-se na organizacao do Instituto, nele encontrando agasalho as iniciativas cartograficas tambem neces- sitadas de intensificagio, uniformizagao e coordenagio. Instalado em 29 de Maio de 1936, o Instituto obtinha no dia 11 de Agosto do mesmo ano a assinatura da Convengao Nacional de Estatisti- ca, sem favor um dos mais notaveis documentos oficiais dos wltimos tempos: delegados dos Governos da Unido e de todas as Unidades da Federag&io — os Estados, o Distrito Federal e 0 Territério do Acre — es- tabeleceram o pacto fundamental, verdadeira carta magna, da coorde- nado estatistica brasileira, que os Governos todos representados con- firmaram posteriormente por meio de leis. A Convengao, que fixou as bases da Constituigao e da regulamen- taco do Conselho Nacional de Estatistica, tambem estabeleceu os com- promissos que os Governos compactuantes assumiram e depois confir- maram por leis; dentre esses compromissos figura o seguinte: “Clausula XII — Os Governos Federados, pelo érgiio dos servigos téonicos competentes, sejam os de engenharia em geral, sejam os espe- cializados de geogratia ou cartografia, filiados ou nao ao Instituto, co- laborardo nos trabalhos de cartografia geogréfica necessérios A Esta- tistica e centralizados, para os fins de sintese nacional, na Diretoria de Estatistica da Produgio, do Ministério da Agricultura, segundo proces- “ REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAPIA sos gerais aprovados pelo Conselho Nacional de Estatistica. Com esse objetivo seréo tomadas medidas, que assegurem a organizagao, para serem divuigadas nos anos de milésimo nove e quatro (precedentes aos censos gerais ou regionais), de cartas fisicas e politicas do territério estadual, das quais constem a divisio municipal, e, si possivel, tambem a distrital, bem como as demais ordens de cireunscrig6es administrati- vas e judicidrias. Aos Municipios, os mesmos servigos formularao, ain- da, as sugestdes convenientes e prestardo a assisténcia técnica neces- séria para, que facam levantar ou rever, com a perfeico possivel, os mapas dos respectivos territérios.” No seio do Instituto firmava-se a alianca da Geogratia com a Es- tatistica, conjugando-se o conhecimento da terra com o da atividade humana, para beneficio da Estatistica que necessita dos elementos geo- gréficos para bem interpretar os seus valores numéricos, para aperfei- goamento da Geografia que, na sua conceituacéo moderna, tanto se preocupa com a atitude do Homem. A criagio do Conselho —_As duas correntes de iniciativas para a Nacional de Geografia criagéo de um orgao oficial de Geogra- fia, uma relacionada com as ativida- des internacionais, a outra preocupada com a coordenagao das atividades nacionais, ao fim encontraram-se. Isto em Outubro de 1936. Era Minis- tro das Relagdes Exteriores 0 eminente brasileiro José Carlos de Ma- cedo Soares, tambem presidente do Instituto Nacional de Estatistica: como Chanceler, chegavam-lhe as solicitagdes partidas das maiores au- toridades mundiais em Geografia, dizendo da indispensavel colabora- Go cultural do Brasil, pais geograficamente interessantissimo, no con- certo de geografia internacional; como presidente do Instituto, aviva- vam-se-lhe os apelos no sentido de ser cuidada a geografia nacional, cujos problemas, téo ligados a estatistica, precisavam ser tratados por um organismo nacional, congregador das energias geogrAficas brasi- leiras, em uma patridtica somacio de esforcos. Certo dia, em Outubro de 1936, 0 Ministro Macedo Soares rece- bia no seu Gabinete de trabalho o Chefe da Secgo de Estatistica Ter- ritorial, que era portador de uma carta do Prof. P. Deffontaines, havia pouco condecorado Cavalheiro da Ordem do Cruzeiro, na qual apelava para a efetivagéio da adesiio do Brasil 4 Unido Geografica Internacional. Nesse entendimento, Sua Exceléncia sentiu chegado 0 momento e no mesmo dia iniciou as providéncias. Tendo obtido a aprovacio do Pre- sidente da Republica, o ilustre Chanceler convocou no Itamarati as figuras mais representativas da cultura geogréfica brasileira, as quais, em reuniées memoraveis, elaboraram o projeto de criacio do Conselho Brasileiro de Geografia. As reunides no Itamarati tiveram a presenga das seguintes perso- nalidades: General Moreira Guimardes, presidente da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro; Dr. Max Fleiuss, secretério perpétuo do Instituto Histérico e Geografico Brasileiro; almirante Raul Tavares, HISTORIGO DA CRIAGAO DO CONSELHO NACIONAL DE GEOGRAFIA 3 diretor de Navegagéo da Armada; coronel Alipio di Primio, diretor do Servico Geografico do Exéreito; eng. Euzébio de Oliveira, diretor do Servico Geolégico e Mineralégico; Profs. Fernando Raja Gabaglia e Ho- nério Silvestre, catedraticos de Geografia no Externato Pedro II; Prof. Silvio Fréis de Abreu, catedrético de Geografia no Instituto de Educa. gio; eng. Sebastido Sodré da Gama, diretor do Observatério Nacional dr. Alcides Bezerra, diretor do Arquivo Nacional; prof. Joao Felipe Pereira, presidente do Clube de Engenharia; coronel Renato Rodrigues Pereira, consultor técnico do Servico de Limites do Itamarati; prof. Ma- tias Roxo, catedratico de Geologia, Paleogeografia e Cartografia na Uni- versidade do Distrito Federal; almirante Anfiléquio Reis, chefe do Es- tado Maior da Armada; coronel Francisco de Paula Cidade, represen- tante do Estado Maior do Exército; professores Otelo Reis, Oscar Te- nério; prof. Basilio de Magalhdes, do Instituto de Educacéo; comandan- te Eugénio de Castro; prof. Alberto de Sampaio, do Museu Nacional; dr. Renato de Mendonga; eng. Rui de Lima e Silva, catedratico de Geologia e diretor da Escola Politécnica do Rio de Janeiro; ministro Bernardino José de Souza, presidente do Instituto Histérico e Geogré- fico da Baia; eng. Oscar Weinschenck; prof. Joaquim Licinio de Souza Almeida, chefe do Gabinete do Ministro da Viagéo; eng. Cristévao Leite de Castro, chefe do servigo federal de Estatistica Territorial. Nessas importantes reunides, em ntimero de cinco, realizadas res- pectivamente nos dias 26 e 29 de Outubro, 5, 13 e 18 de Novembro de 1936, colheu o Governo da Unido o pensamento conereto dos maio- res expoentes da geografia nacional sobre a constituigdo do érgio geo- grafico oficial. Finalmente, a 24 de marco de 1937, foi baixado o decreto n.° 1.527, que “institue o Conselho Brasileiro de Geografia incorporado ao Insti- tuto Nacional de Estatistica, autoriza a sua adesfo 4 Uniéo Geografica Internacional e d4 outras providéncias.” A seguir, dando cumprimento ao disposto no artigo 5.° desta lei, a Junta Executiva Central do Conselho Nacional de Estatistica, no dia 16 de Junho de 1937 baixou a Resolugéo n.° 15, que “aprova o Regula- mento do Conselho Brasileiro de Geografia, ad referendum da Assembléia Geral do Conselho Nacional de Estatistica”. Finalmente, no inesquecivel dia 1.° de Julho de 1937, no saléo de conferéncias do Palacio Itamarati, instalou-se solenemente o Conselho que, dando mostra da sua vitalidade no seio do Instituto Nacional de Estatistica, inaugurava no mesmo dia os trabalhos da sua Assembléia Geral, constituida de delegados dos Governos da Uniao, dos Estados, do Distrito Federal e do Territério do Acre, tal qual o fazia, no mesmo mo- mento, 0 Conselho Nacional de Estatistica. Envolvendo dois Conselhos, um, o de Estatistica, originario, outro, 0 de Geogratia, incorporado um ano apés, o nome do Instituto teria de ser modificado para enunciar com justeza e integridade as suas atribui- 1 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA g6es; assim fez 0 Governo Federal que, com o decréto n.° 218, de 26 de Janeiro de 1988, denominou-o “Instituto Brasileiro de Geografia e Es- tatistica”, e tambem, para fins de uniformizagao de nomenclatura, cha- mou de nacionais os seus dois Conselhos componentes, passando por- tanto o Conselho Brasileiro de Geografia, criado pelo decreto n.° 1.527, de 24 de Marco de 1937, a trazer o nome atual de “Conselho Nacional de Geografia”. Decreto N.° 1.527 0 Presidente da Republica: de 24 de Marco de 1987 considerando a conveniéncia da participagio do Brasil nos empreeendimentos clentificos Internacto- nais, para os quais 6 solicitada a sua colaboragio; Considerando a projecéo mundial da Unido Geografica Internacional, que reune a colaboragéo de grande maioria dos Paises; Considerando que a Convencéo Nacional de Estatistica, assinada e aprova- da pelo Governo Federal em 11 de Agosto de 1936 com o decreto n° 1.022, tambem assinada e aprovada pelos Governos de todos os Estados, do Distrito Federal e do Territério do Acre visa de maneira especial a um melhor conheci- mento geografico do Brasil; Considerando que, pela legislacio em vigor, no quadro da administragio federal, a centralizacio e a coordenacéo dos trabalhos de carater geografico ‘competem aos servicos de Estatistics Territorial da Diretoria de Estatistica da Produgio do Ministério da Agricultura e que esta Diretoria faz parte integrante do Instituto Nacional de Estatistica, como entidade fundamental no conjunto das organizagées federais; Considerando a necessidade, para a adesio do Brasil 8 Unido Geografica In- temnacional, da existencia de um orgv nacional de Gevgraflé, devidamente au- torizado pelo Governo Federal; Considerando, sobretudo, as vantagens de carater nacional da atividade de um Conselho Brasileiro de Geografia articulado com a administragéo federal na importante missio de coordenagdo da Geografia do Brasil; Considerando, finalmente, o pronunciamento da Junta Executiva do Instituto Nacional de Estatistica, aprovando unanimemente a incorporagéo do Conselho Brasileiro de Geografia ao Instituto, Deereta: Artigo 1.9 — Fica instituido o Conselho Brasileiro de Geografia, incorporado ao Instituto Nacional de Estatistica e destinado a reunir e coordenar, coni ‘a co- laboracio do Ministério da Educag&o e Saude, os estudos sobre a Geografia do Brasil e a promover a articulacio dos Servicos oficiais (federais, estaduais e municipais) , instituigdes particulares e dos profisstonais, que se ocupem de Geo- grafia do Brasil no sentido de ativar uma cooperac&o geral para um conhecimen- ‘to melhor e sistematizado do territéric patric. § 1.9 — A cooperacdo dos Servigos militares far-se-& sempre mediante apro- vagdo dos respectivos Estados-Maiores; e a cooperagao dos demais Servicos ofi- ciais obedecera nos dispositivos regulamentares correspondentes; regulada a das instituiedes particulares por seus estatutos. HISTORICO DA CRIAGAO DO CONSELHO NACIONAL DE GEOGRAFIA 7 § 29 — Os servicos federais ficam obrigados a fornecer ao Conselho Brasi- leiro de Geografia um exemplar de cada livro, mapa ou outra qualquer publiea- go, referente a assuntos geograficos do Brasil, que néo tenham carater secreto, bem como a prestar a colaboracéo e as informacées que forem solicitadas pelo Conselho, observadas as disposicées regulamentares. Att. 2° — A administracio do Conselho Brasileiro de Geografia compre- endera um Diretério e uma Secretaria Geral. § 1° — Compete ao Presidente do Instituto Nacional de Estatistica a designa- gio do primeiro Diretério, ouvida a Junta Executiva do Instituto, sendo os Di- retérios subsequentes eleitos pelo Conselho Brasileiro de Geografia. § 2° — A organizagéo e superintendéncia dos servicos da Secretaria Geral do Conselho competirao A Seccdo de Estatistica Territorial da Diretoria de Es- tatistica da Producio do Ministérlo da Agricultura, cujo assistente-chefe sera © Secretario Geral do Conselho, membro nato do Diretérlo. § 3. — Oportunamente serio constituidas Comissbes Técnicas, especializa- das nos varios assuntos geograficos em que se desdobrar a atuagio do Conselho, de acordo com as instrugdes que a respeito forem baixadas. Art, 3.0 — Fica 0 Conselho Brasileiro de Geografia, ora instituido, autorizado a aderir & Unido Geografica Internacional, correndo as despesas desta adesio pelas verbas correspondentes do Ministério das Relacées Exteriores. Art, 4.° — Os Ministérios das Relagdes Exteriores e 0 da Educacéo e Saude terio no Conselho Brasileiro de Geografia, como membros natos do Diretérlo, um representante de livre escolha do respectivo Ministro de Estado. Art. 5.° — O Presidente do Instituto Nacional de Estatistica baixaré o re- gulamento e as instrugées que, aprovadas pela Junta Executiva e ad referendum do Conselho Nacional de Estatistica, deverao reger a organizacio e o funciona- mento do Conselho Brasileiro de Geografia Art. 6° — O presente decreto entrar em vigor desde a data de sua pu- biicagao. Art, 7.9 — Revogam-se as disposigées em contrario, Rio de Janeiro, em 24 de Marco de 1937, 116.° da Independencia e 49.0 da Republica. GETULIO VARGAS Mario de Pimentel Brando. Odilon Braga Gen. Eurico Gaspar Dutra. Henrique A. Guilhem. Gustavo Capanema. (Publicado no Didrio Oficial de 7-4-37) RESUME — RESUMEN — RIASSUNTO — SUMMARY — ZUSAMMENFASSUNG — RESUMO Learvicle exptique la création du Conseil National de Géographie, montrant que cette création découle sie deur sérics Uc faite primo, den serie d'iitiaives en Saveur de 'edhésion du Bréail§ TUnion Geographigue ‘Internationale, se dietinguant par Vnterveaton des fminenta géographes francais MM. Buvnanuel de Martone et Piceve Delfontaince ct les fiagenblcs efferts de I’ Academie Erésitenne de Selences; secanaoy de Veneemble ‘Se mesures tendant la constitution dun crpane coordeneteur des activités geographiques bréslienaes, ot "oa ‘Siingue In precieuse cemtribution de Vilurtre bréslen, BM Mario Augusto Tevteira de Fests et ropportiaa ‘reation, dia prevtigicus Institut ‘National de" Statistique, "Finslement. Tarticie ait resertir Taction decisive de Y'éminent brésilien, ME. le Dr. Joxe Carlos de cedo Soares, quis én on double qualite de Chancellen et de Président de Mastitut National de Statiatiqaey a ‘SErnble Tes dei Couranca initiatives, concrétannt Vergasiation soubieitéer te Déeret n” 1527 du 24 Mare 137 tut, lequely & present siappelle Institut Ertan de Géo- ‘naticnaux, cell de Géographie et celui de Statetique, 2 eréé le Cencel de Geographie, ineorperé audit Im graphic et de Statistique, constitue per det co 6 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA El articulo historia Ia erescion del Consejo Nacional de Geografia, montrando que eta creacion decorre de dés series de hechoe' une, in trie de inicatives a favor de la adhesion del Bras A ta Union Geografica Ine fecnacional, distingwiendose la itervencicn e los eminenten gecgrafoe francéses, Emmanuel de Martone ¥ Pierre Detfontaines y toe incaneabies exfuerzon de la Academia Bradlena de Clenciam ia otra, el conjunto de ‘medidas tendientes A In constivacion de un organsamo coordenador de lat actividades geografiens brealenas, des {eandase la vaiona contribacign del dastee brasleno, Dr. Mario Augusto Teiscira Ge Freitas) ia oporsune cron: ‘Sin del prestigion Instituto. Nacional de Hxtataton a fin, el articulo deataca la acclén decisiva del eminente brasileno, Dr, Joxé Carlos de Macedo Soares, ‘que, en calidad de Canciler, 4 Gregao Ins ain corrientes de niciaiva oe {Ge Marao 1037, fat ereedo ef Conseio de Geografie,incorporado al cicho Tastituto, que hovdia xe llama Tastieuto ‘Brasilone de Gcografin y Eetatition, costivudo por dea Conselon Nacionales, cl de Geografia yl Ge Eatatistica, Lericolo fata storia della fondasione del Consiglio Nationale di Geografin, cimottrandola determinate da due serie fat" In pina, In erie delle inisative ettorgo Vadetione del Braale lle Unione Geografica Ine ternaionaie, ewendo da rlevare lintromissione der eminent gcograi frances emmanuel De Martone e Pierre Delfontaine'e gi attivt word della Academia Branicira de Clindat! la seconds, Passicme delle misure rivalee fla costiturione dun organismo coordinatore deiattivith geografiche brasiiane, realtando Ia valida contribu ons dellilustre Bresilano, i dott Mario Augusto Teixeira de Freitas © Topportuna crensione dal autorevole natieato Nacional de Batatiaticn In fine, Varticolo mette in evidensa Vasione decsiva aeleminente Brasitiang, il dott, Jos Carton de Ma. cedo Soares, che, come Cancelier ed allo stemo tempo presidente delTostituto Nacional de Batatistien, tani We due correati diniriative, concretszando in desiderata organizeasione, per il Deereto mo 1.527 del 24 mats Togz sue sita il Consigho 4 Geografia incorporato in detto Toatituto, ce ogg! tl chiama “insti de Geografia eBstatiticn", contitulto da due Consigh Nasional, quello di Geografia © quello al Statieten ‘The Author males the historical survey of the National Council of Geography, showing that this inati- tration was dus to two series of facta * firetly, the ree et, Bearing on the adhesion of Bratt to, the International Geographic Union —with the outstanding interference of the eminent French geogrephers, Ea fnanuel de Martoane and Pierre Deffontaines and the devoted efforts of the Braritan Academy of Science’ and, Sesondly, the ect of steps with a view to the constitution of Dody for the coordination of the Brazilian googre’ {ical activities, among which there should be emphasized the valuable contribstion of the iiluatrious Braciian, Bro Mario Augusto Teticira de Freitas and the timely creation of the prestigious National Institute of Statistics, ‘The article finally emphasizes the decisive action of the eminent Brazilian, Dr. José Carlos de Macedo ‘who, as Foreign Minister and, at tae sume time, President of the National Tasiltute of Statistica, con terognted the two currents of initativen, and realized the desired body : by Decree a 1527 of the 24th, March 1587 the Council of Geography was crested incorporated in ead Institute, which nowadays a called the'Tna. Lututo Braciliro de Geografia ¢ Hotatstice’ (Brarihen Institute of Geogrephy and Statistics) and is made Up ‘of two ational councils, the Couneit of Geography and the Council of Seatisticn, In dem Artikel int die Vorgeschichte der Schaffiung dex Nationalen Geographierates wiedergegeben nd cs wird darin eufgereigt, dase sel einen ‘von Tateachen au dessen Bildung gefulrt haben : Hretens de vere- Chintenen ‘Versuche, sveiche unternommen worden, un den Anschluss Brasiena an die Internationale Geogra: ‘hische Union herbelnufulren, wobel die Mitwircung det hervorragenden francosischen Geoutapen Haina: uel De Martonne nd Piere Deffontines sowie die hingcbungsvollen Berauhungen der Brasil anischen “Wis- ‘Sctvchafulichen Altademie hervormuheben sind: rweltens, die Geuumthelt der Masenahmen, dic auf die Sehalfung ‘incr Stele abnieiten, welche die Arbeit Breailiens auf gcographiechem Gebiet mitcinbeang, wobei auf die wert ‘Solie Mitarteit des Gekanaten Brasilianers Dr. MGério Augusto Tesrei de Freitas sowie auf dic jetst gerade irunstge Schaffung des beruhmten Nationalen Statistschea Instituts Rngewiesen Werden muss. ‘Zum Schluss hebt der Artikel das entachiedene Vorgeen des gronen Brasiinners, Ds. Joxé Carlos de ‘Macedo Soares nervor, der it Kansle: und nur selben Zeit als Prasident des Nationalen Staviatiachen Tasttats Gie besien Stomungen vor Bestrebungen zusammentarste und dadurch ie erwonschte Orgaaiaation verwir: lente * durch day Dekret Ne- 1-527 vom 24, Mary 1937 wurde der Geographlerat geschaffen, wobel er desa ge~ Dannten Institut elgverleibe wurde, das heute dea Namen: Brasiianisches Geographisches und Statisteches agus fut und’ ich aus swel Nationalraten, dem fur Geographle und dem far Statietie susemmensetrt. La artikolo rakontas la historion pri la kreado de la Nacia Konsilantaro de Geografio, montrante, ke tiu kreado rezultis el du serioj da faktoj : unu, la serio da iniciatoj éirkaii la aligo de Brazilo al la Internacia Geografia Unuigo, el kiu elstarigis la interhelpo de la famaj geografiistoj Emmanuel De Martonne kaj Pierre Deffontaines kaj la sindonaj klopodoj de la Brazila Scienca Akade- mio; alia, la aro da antaiirimedoj celantaj la starigon de organismo kapabla kun-ordigi la brazilajn geografiajn aktivecojn kaj pri tio estas rimarkinda la valora kontribuo de la klera brazilano, D-ro Mario Teixeira de Freitas, kaj la gustatempa kreado de la multvalora Nacia Instituto de Statistiko. Laste la artikolo rimarkigas la decidigan agemecon de la eminenta bra- zilano D-ro José Carlos de Macedo Soares, kiu, kiel Ministro por Eksterlandaj Aferoj kaj samtempe prezidanto de la Nacia Instituto de Statistiko kunligis la du éenojn de iniciatoj, konkretigante la dezirotan organizajon: per la de- kreto n.° 1527, de la 24-a de Marto de 1937, estas kreita la Konsilantaro de Geografio, aligita al la citita Instituto, kiu nun estas nomata Brazila Instituto de Geografio kaj Statistiko, konsistanta el du Naciaj Konsilantaroj, tiu de Geografio kaj ti: de Statistiko. GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL Pelo Professor Pierre Deffontaines da Universidade do Distrito Federal Capiruto I 0S ELEMENTOS DA NATUREZA E A LUTA DOS HOMENS que parecem envolvidos por uma atmosfera de sonho: Fidrida, California, India, Alsdcia... Néo os pronunciamos sem provocar um surto de imaginacao. O Brasil 6, por exceléncia, um desses nomes cheios de legendas e de evocagées E XISTEM paises cujos nomes possuem uma sonoridade especial e Um potencial A propria extensio do pais é um motivo de estu- de espaco pefagéo. E’ um dos maiores paises do mundo em superficie; ele engloba a metade da América do Sul, cerca de 1.000.000 de quilémetros quadrados a mais do que os Estados Unidos; em tamanho s6 é ultrapassado pela Unido das Repitblicas So- viéticas, mas estas teem imensos territérios sem divida para sempre inaccessiveis a um verdadeiro povoamento humano, enquanto que 0 Brasil ndo possue nenhuma parte que seja verdadeiramente anectime- na, impossivel de ser ocupada pelo homem. Nenhuma alta montanha, nenhum deserto completo, nenhuma grande estepe fria. Nao hé regides em que caiam menos de 300 mili- metros de chuva (ora, 0 limite das zonas desérticas se estabelece a 250 milimetros), néo hé altitude que ultrapasse 3.000 metros. Natural- mente, nada de geleiras ou de neves eternas e as quedas de neve sdo ‘mesmo quasi desconhecidas. Sem diivida, a parte mais larga do Brasil, mais de 3.000 quilémetros, se acha em plena zona equatorial; entre- tanto, as regides sob 0 Equador néo sao necessariamente hostis a0 po- voamento humano, Nao séo equatoriais ou semi-equatoriais algumas das zonas mais densamente povoadas da terra, Java, India, Ceiléo? De mais a mais no Brasil o interior do Amazonas com suas florestas macissas est longe de ser a zona mais vasia e 0 seu povoamento é feito com uma populagao essencialmente branca; lé nao hé negros ¢ relati- vamente poucos indios. Assim o imenso Brasil 6 mais ou menos completamente povoavel, os algarismos de sua superficie, 8.500.000 quilémetros quadrados, séo plenamente utilizaveis e no escondem, como os algarismos da Aus- tralia, do Canad, da China ou da U. R. S. S., enormes claros. Todos os quilémetros quadrados teem aqui um verdadeiro valor de futuro. O Brasil é de todos os paises do mundo aquele que tem o mais conside- ravel potencial de espago e este é um primeiro motivo de reflexao. 2 REVISTA BRASILEIRA Di GEOGRAFIA A-escala das J& se disse algumas vezes que o pais era tao grande grandezas que nao estava na dimenséio do homem, que sua enormidade ultrapassava os limites habituais da vida humana. E’ verdade que é preciso mudar aqui a escala da medida, 0s rios atingindo neste pais a dimensées extraordindrias. Sub-afluentes, como 0 Tieté, em Sao Paulo, teem mais de 1.000 quilémetros. Todos os grandes afluentes do Amazonas sao rios gigantes de varios milhares de quilémetros de extensio. Que dizer do Amazonas cuja descarga deve montar a 120.000 m3 por segundo, isto é, tanto quanto os maiores rios da Europa reunidos? Este rio é um verdadeiro brago de mar e seu descobridor, Vicente Pinzon, reconheceu que era um rio e nao 0 Ocea- no pela docura das Aguas e por isso chamou-o “Mar Doce” ou 0 “Rio Mar”. Este rio permite aos navios transatlanticos subir em pleno con- tinente até Manaus e mesmo até Iquitos, isto é, até 5.000 quilémetros distante do oceano. A largura do rio na embocadura, incluindo a Tha de Marajé, ultrapassa bem 300 quilémetros. Cursos d’égua gigantescos garantindo uma grande drenagem para © mar, mas tambem imensos pantanos; o Brasil possue 0 maior pan- tano do mundo, o Pantanal no Rio Paraguai. ‘A massa florestal amazénica é, sem ditvida, uma das mais consi- deraveis do mundo, somente inferior em extenséo As monétonas flo- restas siberianas, bem superior, porem, em variedades e em riquezas. ‘Assim o Brasil se apresenta aos primeiros olhares como um Esta- do gigante, um verdadeiro continente, uma nagdo-continente. Os diferentes elementos Antes de estudar como os homens vao da natureza c a Juta utilizar e explorar este pais desmesura- dos homens contra cada do, importa conhecer o quadro fisico em um deles que se vai exercer a atividade humana, reproduzir-Ihe os grandes tracos caracte- risticos e mostrar a luta que os homens ali sustentaram contra os di- ferentes elementos da natureza. Esboco da A natureza brasileira oferece de inicio aos homens a histéria do variedade de seu solo e de suas rochas. Alguns carac- solo teres essenciais se destacam facilmente: primeiro a importéncia dos terrenos cristalinos antigos; gneiss, granitos, chistos e rochas vizinhas cobrem mais do tergo do territorio. Em compensagio as rochas sedimentarias e sobretudo os sedimentos de origem marinha séo menos representados, 0 que quer dizer que o pais permaneceu em grande parte emerso desde os tempos geolégicos mais antigos, entregue A destrui¢do superficial. Concebe-se entao a impor- tancia dos fenémenos de eroso e de decomposicao. © Brasil fez primeiro parte da grande massa continental do he- misfério sul, que reunia na era primaria a América do Sul, a Africa do Sul, Madagascar, as Indias, a Australia e o continente antartico, vasto continente que se batizou com o nome de “Gondwana”. Nas primeiras GEOGRAPIA HUMANA DO SRASTL a Vista do Vale de Santana, ¢ 0 limite da datzata For J. G. J, Sous épocas do primario, este continente foi abalado por dobras huronianas, depois caledonianas, vastas cadeias de montanhas a que se deu 0 nome de “Brasilidas”; elas foram completamente arrasadas pela erosfio desde thuito tempo; contudo encontra-se a antiga orientagéo das dobras, re- forcadas por falhas mais recentes, em muitos rios e cristas de monta- sihas. Esta’ diregdo é uma das mais tipicas do rebordo oriental do Brasil central, onde se reconhece um curioso paralelismo da rede hidrografica € das linhas de relevo seguindo uma direcdo Nordeste-Sudoeste. ‘As partes mais dobradas e mais metamorfizadas destas antigas terras se encontram sobretudo ao longo do litoral onde formam o que os gedlogos chamam o “complexo" brasileiro”, entremeiado de granitos, gneiss e mesmo calcéreos cristalinos; é ele que compée esta grande es- carpa costeira que se chama a Serra do Mar. Avangando para o Oeste, as rochas so menos antigas e menos metamorfizadas. O Brasil apre- senta este curioso dispositive de ter no seu rebordo maritimo os macis- sos mais antigos e para o interior terrenos cada vez mais jovens, como se 0 continente estivesse ao contrario e olhasse para o interior. Este fenémeno, cujas consequéncias encontraremos na distribuigao da rede hidrogréfica e até na organizagio das comunicagées, provem do fato de que o Brasil é um pedago de continente descolado de um blcco maior. A América do Sul, segundo a hipdtese imaginada pelo sdbio Wegener, ter-se-ia destacado da Africa e teria navegado lenta- mente para o Oeste; a correspondéncia dos contornos da costa é bas- tante notavel entre as duas margens do Atlantico Sul. De mais a mais, Pd REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAPIA os mesmos aspectos geolégicos, as floras e as faunas primérias indicam relagdes muito antigas entre a Africa e a América. Anteriormente o mar néo estava no atual Atlantico, mas a Oeste, 14 onde se ergue hoje a massa montanhosa da Cordilheira dos Andes. O continente no pa- recia 20 contrario como agora, e sim, olhava para os mares de Oeste, cujos depésitos marinhos se encontram ja na zona do vale do Sao Fran- cisco — camadas horizontais de caledreos coraligenos (série de Bam- bui, sem divida siluriana). Desde entao, poder-se-A opor a um Brasil oriental enrugado e cristalino, cheio de “serras” mais ou menos apla- nadas, em constante surreigéo e em perpétuos ciclos de erosdo, um Brasil do Oeste mais tabular, dominio das “chapadas” horizontais, em que preponderam as formacées sedimentares, frequentemente separa- das por linhas de “cuestas”, vestigios de camadas mais duras. Os primeiros depésitos sedimentares aparecem ao rebordo ociden- tal das Brasilidas; na zona meridional do Brasil grandes geleiras co- briram, os macissos antigos e acumularam morenas e lavras (varvitas ¢ tilitas) do Estado de Séo Paulo a Santa Catarina, em mais de 500 Esearpa da Serra do Mer em Santos. Viste da importante instalacdo hidro-elétrica metros de espessura e perto de 100 quilémetros de largura. Essas ro- chas moles constituem hoje uma longa depressio subsequente entre os planaltos cristalinos de Este e os rebordos de costas de grés e diabases do Oeste. Apés esta época glacidria, o clima mudou totalmente; depésitos vegetais, correspondendo a um clima muito quente, acumularam-se so- bre os depésitos glaciérios e produziram hulhas permianas, infeliz- GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL Eo mente de m4 qualidade, como quasi todos os depésitos dos continentes austrais (hulhas gondwanicas) : carvao do Rio Grande do Sul, do Pa- rand e de Santa Catarina. Durante essas épocas, nas montanhas das Brasilidas produziu-se um vasto aplanamento (peneplano) devido em parte & erosio glacié- ria; e, sem dtivida, os mais altos cumes das montanhas brasileiras acima de 2.400 metros, Serra Caparaé, Itatiaia, Serra dos Orgaos, so os restos so eles Sit Aguihas Negras, em Itatiaia, mosirando 0 efelto da erosdo pluviat sobre 0 macisso slenitico "Foro J.C. J. Scuntor desta antiga superficie de erosio que culmina a Leste e vem mergu- Thar a Oeste sob os sedimentos glacidrios; estas raras pontas se conser- varam gragas a dureza especial das rochas que as compéem: sienita, foiaita. Outras superficies de erosio mais recentes deixaram no planalto cristalino vestigios menos elevados (1.700 metros, Serra do Espinhaco; 1.500, Serra de Caldas; 1.450, Serra Negra, Serra Paranapiacaba) porem mais espalhados, correspondendo a essa erosdo depésitos na depressfio sedimentar de Oeste. E’ dificil estabelecer as correspondéncias entre os ciclos de erostio das montanhas cristalinas de Leste, em proceso de levantamento lento, € 08 ciclos de sedimentagéo do Oeste, num aprofundamento progres- sivo, segundo o fenémeno habitual de compensacio devido A isostasia. Foi no curso destes ciclos sucessivos que se formou uma grande su- perficie de aplanamento, numa altitude de 800 a 1.000 metros, que é © nivel predominante do planalto central cristalino. 4 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA A zona sedimentar recebia depésitos de origem diversas: glacidrios, marinhos, lacustres, mas sobretudo continentais; os que mais se en- contram so areias, provavelmente de origem eoliana e desértica, trans- formadas em grés que produziram os planaltos tabulares de Botucatti. Ao mesmo tempo, derrames vulcanicos de uma intensidade extraordi- néria extendiam vastos lengéis de diabases ¢ basaltos entre os grés (Trapp do Paran4) numa extensdo de mais de 1.500 quilémetros do Uruguai a Goiaz. Cobriam sobretudo a parte ocidental do Parana e Santa Catarina. Devido 4 sua resisténcia, os diabases semearam o pais de rebordos de planaltos e formaram nos rios inumeraveis casca- tas e rapidos. Essas manifestag6es vulcdnicas eram a unica atividade orogénica. © pais j4 se havia consolidado, nao experimentava mais dobras, como durante as épocas mais antigas das Brasilidas; ele se partiu apenas em inumeras falhas que seguiram duas direcdes, as de Nordeste-Sudo- este, relacionadas com as antigas dobras, e as de Noroeste-Sudeste, exa- tamente perpendiculares. (*) Esta quadriculagao de falhas, verdadeira “craquelure”, que alias, tambem se encontra na Africa do Sul, decompés 0 relevo em blocos paralelipipédicos muito numerosos, sobretudo ao longo do rebordo da Serra do Mar. Estas falhas, em geral antigas, foram niveladas pela erosio e depois reconstituidas pelos novos ciclos de erosao; outras re- apareceram sem duvida recentemente. Hoje elas dominam as principais linhas de montanhas. © relevo aqui ¢ essencialmente de falhas e nao de dobras. Com efeito, os grandes dobramentos, o herciniano do fim do pri- mario e o alpino do tercidrio, nao deixaram vestigio algum no Brasil, que, definitivamente rigido, como um vasto escudo foi em marcha para o Oeste, apés se ter destacado da Africa. Era aliés, na borda ocidental que a base menos rigida deveria vergar sob o impulso resultante da marcha para Oeste. Uma primeira cadeia formou-se na Argentina na época herciniena, sobretudo do fim do secundario 4 metade do tercidrio, constituindo a imensa ruga da Cordilheira dos Andes, onde anteriormente existia um vasto escava- do maritimo, que 0 lento avango do escudo brasileiro transformou em dobras. Este velho mar, para o qual se escoavam todos os primitivos rios brasileiro, tornou-se montanha. Constituiu-se entéo, na época tercidria, entre a jovem montanha e o antigo escudo, um imenso recep- téculo onde as 4guas se acumularam em forma de grandes lagos, notadamente na regido ocidental da Amazénia. Estes lagos internos se encheram e suas ‘aguas procuraram logo uma saida, utilizando-se para isso, do grande sulco amazénico ao norte do pais. A antiga marcha das aguas para Oeste mudara de sentido e elas refluiram para Leste, para 0 Oceano Atlantic, havia pouco aparecido; uma nova erosdo, ori- unda deste nivel de base maritima conquistador, formou superficies de (4) Vide, sobre ossas Guestdes, of trabathos de Preston , James, R. Moack, B. von Freyberg, Prois We Abreu, Buréblo de’ Oliveira, ‘wetim Pals Leme, GZOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 23 eroséio mais baixas a custa das antigas plataformas, como por exom- plo, os planaltos de 500 metros do Alto Rio Doce ou do Rio Pomba, afluente do Paraiba, inclinado para Leste e cavado, conquistando area As altas superficies de 1.000 metros do Rio Grande e do Rio Paraopeba, inelinados para Oeste. ‘Mas esta reversfio das 4guas para o Atlantico esta longe de ter sido completa; ela afetou sobretudo o Norte, a bacia amazénica e ja menos nitidamente a bacia do Sao Francisco, ao centro; mas, para o Sul, os rios continuam a ter suas nascentes nao longe do Atlantico e a descer 0 antigo declive do Oeste em direcdo a um mar ilusério; assim fazem 0 Rio Grande, em Minas, e sobretudo 0 Tieté, que nasce perto de Sao Paulo, a 16 quilémetros do Oceano e a 900 metros de altitude, cujas aguas, porem, s6 atingem o mar depois de ter aleancado a grande bacia do Parané-Paraguai e ter percorrido mais de 3.000 quilémetros. Distribuigdo do A histria geolégica deixou no Brasil um relevo que relevo se deve essencialmente As falhas e & erosao. A principal rede de falhas corre a9 longo do litoral do Brasil central, sern diivida re'acionado com o descolanento da Amé- Sera do Mar, num de 4:43 gontos altos, na regldo de PetrSzolis, Nota-se a pencplantete ‘ ds exdarpos @ pido de eentenas de Metron rica e da Africa. Foi ela que constituiu esta grande kazreira monta- nhosa que acompanha a costa numa extenséo de mais de 3.000 quilé- metros ¢ que se chama a Serra do Mar. A cada escala, o viajante que © famoso “Pao de Aguoar” na entrada da formosa Baie de Guanabora GHOGRAFIA HUMANA DO BRASIL n passa pelo Brasil encontra, como uma verdadeira obcessdo, a barreira ininterrupta desta grande “serra” e cré que o pais seja muito monta- nhoso; mas, em relagdo ao relevo, como em relacao A floresta, ao clima e mesmo aos géneros da vida humana, a fachada do Brasil é um pouco enganadora. A Serra do Mar nfo é uma montanha costeira, mas a escarpa de um planalto que desce lentamente para o interior, Nao é uma cadeia de montanhas com duas vertentes, é apenas uma escarpa abrupta para a costa; se assim se pode dizer, é uma semi-montanha, como a monta- nha da Mesa, na Africa do Sul, ou as Cevenas, em Franga. A escarpa 6 frequentemente tnica, como nos “paredées” de Santa Catarina e do Rio Grande; mas, &s vezes, o rebordo se enruga apresentando degraus e suleos orientados em geral para Oeste. A encosta é entao orlada por pequenos corredores, onde se puderam formar curtos vales longitudi- nais que, apesar de serem abruptos, facilitam 0 acesso do planalto; sio por depressdes deste género que se desenvolvem as vias férreas de San- tos a Sdo Paulo, do Rio a Nova Friburgo e a rodovia do Rio a Petropolis. A rede de falhas é complexa; elas se cortam muitas vezes em an- gulos retos e decompdem as cadeias em blocos quadrangulares, denti- Ihados; em volta desses blocos, os rios seguem estranhos cursos tortuo- sos, lembrando as redes dos montes Apalaches, nos Estados Unidos. No interior do pais encontram-se numerosas “serras” andlogas, com a mesma dissimetria de vertente, a disposicéio em xadrez e a orien- tagéio geral no sentido Nordeste-Sudoeste segundo as antigas diregdes das Brasilidas, que serviram de guias as falhas. ‘Ao lado deste tipo de relevo, em que dominam as formas geomé- tricas, deixou a histéria geolégica outras montanhas com perfis mais denticulados e contornos menos regulares; sio os macissos residuais, restos de antigas peneplanicies, geralmente relacionados com rochas mais duras, macissos de granito ou de rochas eruptivas mais recentes; sienitas, foiaitas. Os cumes mais altos do Brasil central pertencem a este tipo e sio as derradeiras testemunhas das velhas peneplanicies que nivelaram outrora o pais. O macisso do Itatiaia, na Mantiqueira, gragas a pre- senga de uma sienita muito dura, culmina a 2.787 m; sua altitude permitiu-the ter no quaterndrio algumas linguas de gelo que deixaram marcas circulares de lagos e um vasto cone de dejegdo fltivio-glacidria (Rio Campo Belo) . © Pico da Bandeira, na Serra Caparaé, com seus 2.884 metros, é © mais alto cume do Brasil. Existem rebordos de planalto que séo apenas escarpas de eroséo, frente de ataque de um ciclo de eroséo mais jovem sobre um ciclo mais antigo. Entre Santos Dumont (Palmira) e Barbacena, no Estado de Minas, atravessa-se um desses relevos a que chamam bem impropria- mente Serta da Mantiqueira. E’ simplesmente a frente de eroséo con- quistadora dos rios que vao para o Atlantico, rio Pomba, rio Doce, sobre is REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA a antiga superficie do Alto Rio Grande e de seu afluente, o rio das Ve- Thas. Muitos dos relevos brasileiros sao alias compésitos, determinados por falhas em certas partes, escarpas de erosio em outras, saliéncias de rochas duras alhures. Assim a Serra do Mar é um complexo de tipos de relevo diferentes, como o testemunha a extrema variedade dos perfis que ela apresenta vista do mar, ora planalto retilinio e tabular, ora cristas recortadas em agulhas verticais, como 0 Dedo de Deus no de- clive da Serra dos Orgios, ora cipolas de rochas arredondadas (pon- t6es), mais ou menos abruptas, como no Espirito Santo. A Serra de Mantiqueira apresenta os mesmos agregamentos com- pésitos e assim muitas outras serras. A Serra do Espinhaco parece per- Dedo de Deus e outros pico da Serra dos Orydos. Nota-se 0 efeito da erosdo conservando uma certe etmetria Foro J. ©. J, Semen tencer a um sistema montanhoso independente, mas é tambem com- posta de segmentos muito diferentes. Por isso, tais montanhas sao di- ficeis de ser cireunscritas e individualizadas; provem dai a impreci- sio da nomenclatura das cadeias brasileiras. Cortas designagdes se extendem sobre vastos territorios sem que as possamos localizar exata- mente. O que € propriamente a Serra do Mar? Dever-se-A distingui-la da Serra Geral ou limita-la ao Norte e ao Sul? Onde colocar a Serra Paranapiacaba? Ainda mais imprecisos sio os nomes Serra das Verten- tes ou Espigdo Mestre, em Goiaz. A toponimia de detalhe dos cumes individuais esta muito mais adiantada do que a toponimia geral dos grandes ccnjuntos. GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 20 Os aspectos A importancia da erosdo deu a todos esses relevos particulares formas muito particulares. Desde os tempos prima- do relevo rios, 0 territério brasileiro permaneceu emerso sem. que nenhum mar o recobrisse e 0 subtraisse & obra destrutiva; poucos territérios foram entregues durante tanto tempo aos agentes da eroso e esta ainda foi ativada pelas condigées climati- cas dos tropicos. Detathe duma “meta laranja” na regio de Belem Foro J. @. J, Scmavr Os aspectos do relevo variam segundo os tipos de clima e a natu- reza das rochas. Na zona em que reinam os verdes quentes e tmidos, as rochas cristalinas e sobretudo os gneiss porfiricos do complexo bra- sileiro deram esses “p&es de acucar”, dos quais um dos mais tipicos do- mina a entrada da baia do Rio de Janeiro. Esses cumes de rochas nuas so ainda mais numerosos no Estado do Espirito Santo, onde se cha- mam “pontées”; os picos de Itabira ou do “Frade”, perto de Cachoeiro do Itapemirim, so das mais estranhas montanhas que se possam ver! Os granitos fornecem tambem cumes arredondados mas frequente- mente menos bruscos; nfo se chamam mais “pes de agucar” e sim “meias laranjas” ou “cascos de tartaruga”. Encontram-se as vezes pai- sagens inteiras cheias dessas calotas, dando um aspecto de agitacao maritima que 6 bem definida pela expressdo “mar de morros”. Muitos desses monticulos nfo so de rochas e sim inteiramente de terras de- compostas, que sao dificilmente atacadas pela erosdo por causa da na- tureza coloidal do solo de decomposicéo. A espessura dos solos de de- composicao é extraordinaria, podendo atingir até 100 metros antes de 20 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAPIA chegar a rocha viva. O clima vence as rochas mais resistentes. As Aguas pretas, tao frequentes no Brasil, como o demonstra o grande ni- mero de Rios Pretos e Rios Pardos, so carregadas de dcidos (dcidos himicos) e cavam as rochas quimicamente mais do que mecanicamen- te. O relevo se funde sob as aguas tropicais; “duro como o granito” é uma expresso falsa nessas regides. Certas trincheiras de estradas de ferro abertas em pleno granito so tao rapidamente destruidas que, para proteger a rocha, foi necessario alcatrod-la. ‘Muitas vezes, no meio dessas terras de decomposigéo, conservaram- se alguns blocos redondos de rochas vivas, que as éguas acabam por des- prender e que formam, sobretudo nos granitos, grandes detritos cha- mados “matacées” (andlogos aos “compayrés” da Franga do Sul) . No Nordeste brasileiro encontram-se as mesmas rochas, mas 0 cli- ma mudou, nao se encontram mais “rios pretos” com Aguas carregadas de Acidos; os “pées de agucar” desaparecem para dar logar a grandes superficies peneplaneadas, cobertas de seixos rolados tao raros no Bra- sil meridional. Planaltos de grés dominam o “sertdo” cristalino com grandes massas tabulares chamadas “chapadas”: chapada do Apodi, Serra do Araripe, Serra Grande, no Piauf. 2 Regio de “melas laranjas” na base da Serra do Mar, regio de Belem, B. do Rio Foro J. C. J. Somave H& tambem curiosos relevos caleéreos que, sob esse clima, apare- cem crivades de grutas, de sorvedouros de rios, chamados “sumidouros”, de buracos ou “funis”. As vezes existe uma dupla circulacéo de agua superposta; uma subterranea, em galerias, a outra superficial, por cur- sos d’fgua que ainda nao se perderam completamente nos funis da GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 3 rocha, como se dé nas estranhas paisagens calcdreas de Iporanga, no Sul do Estado de Sao Paulo e do Rio das Velhas, em Minas Gerais. As superficies calcdreas séo fendilhadas por profundas brechas particular- mente desenvolvidas no morro da Lapa, no Rio 8. Francisco. Vista duma plantacdo de laranja em Nove Iguases ‘Foro J. C. 3. Sesame © que o solo traz Tal 60 esquema da histéria do solo e do re- aos homens levo brasileiro. Ela deixou aos homens muitos recursos preciosos, mas tambera muitas dificuldades. No balango ativo ha em primeiro logar a impor- tancia excepcional dos depésitos minerais, sobretudo nas camadas cha- madas “Série de Minas”, um pouco mais recentes do que as do comple- xo brasileiro, um pouco menos metamorfizadas que ele. As rochas sio compostas sobretudo de filita, quartzita, itacolu- mita, em meio as quais abundam os depésitos de ouro ou as jazidas de ferro e manganés. A montanha de Itabira é sem diivida a massa de “ferro mais consideravel do mundo. Os outros metais so tambem muito abundantes: chumbo, niquel, cobre. Encontram-se igualmente diaman- tes em camadas um pouco mais recentes ainda. No balango ativo devem-se colocar tambem certos solos de d&comi- posig&o superficial, extremamente ferteis, notadamente a “terra roxa” ou terra violeta, resultante da decomposicéio dos diabases e atingindo até 25 metros de espessura. E’ a ela que o Estado de So Paulo deve a prosperidade de suas plantagées de café. A decomposicéo do gneiss e tambem a dos granitos sob 0 clima wmido produziu. um solo verme- tho coloidal frequentemente muito rico e oferecendo condigées favora- 2 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA veis a floresta e as plantagdes. Muitas vezes, ao pé dos blocos de gra- nitos, residuo de decomposi¢ao, encontram-se pequenas culturas e a casa do caboclo tem uma predilecdo por essas zonas de blocos amon- toados, os “matacées”, devido 4 maior fertilidade, verdadeira turfeira de rochas, como as chama o Snr. Chouard na Africa Ocidental. No interior do Brasil (Minas) Gnde reinam rochas menos metamor- fizadas, filita, itacolumita, a decomposigao fornece um solo poeirento, friavel, 0 “sabonete” (pedra sabio); a erosdo cava barrancos com as paredes desmoronantes, as “bossorocas”, anélogas as “bad lands” dos paises americanos. Essas terras so muitas vezes aridas e desertas, co- bertas de cerrados pobres, chamando-se as vezes “chisto da fome”; a €ecomposicéo do grés fornece tambem solos aridos (solo chamado “san- gue de tatt”, acima do grés de Bauri). Em certas condigSes de clima, a superficie do solo se constitue uma couraca ferruginosa, uma “canga”, andloga A laterita, que as culturas custam muito a conquistar. Serra @ pico de Itacotumi, om Ouro Preto, Minas Gerais. E' jormada elas rochas da Série de Minas @apresenta um eélebre pico de quartzito. Nola-se o vale do rio Fund eo vito da B. de Ferro ‘Central do Brasil Foro 8. F. Anny Ohomemea Que atitudes vao tomar os homens em face do re- montanha __ levo? Que vantagens, que obstdculos vao encontrar? A América do Sul apresenta um grande desenvolvi- mento da vida montanhesa e a antiga civilizagao dos indios ligou-se particularmente aos planaitos dos Andes, onde atingiu toda sua plenitu- de. Julgar-se-ia encontrar no Brasil uma antiga civilizacio monta- nhesa; nada disso. E’ uma surpresa da arqueologia brasileira reconhe- cer a auséncia quasi completa de descobertas pre-colombianas nas altas regides. GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL Fy Talvez se possa atribuir esta raridade da vida montanhesa entre os primeiros habitantes do Brasil A auséncia total de animais domésticos que, ao contrério, existiam abundantemente na América Andina, gra- gas & presenca da “Ihama”. O homem sé parece ter aprendido a utili zar a montanha com 0 auxilio de animais domésticos. A movtanha A montanha foi aqui essencialmente uma barreira, barreira a Serra do Mar e a Mantiqueira sobretudo. Seus continuos abruptos, quasi sem nenhuma garganta, e sobretudo sua macissa cobertura florestal constituiram um verdadei- ro obstaculo. Durante muito tempo a colonizagio ficou acantonada Pedra Aci, com uma vista tfpica da Serra do Mar. Arredores de Teresdpoi.e Por J. 6. J. Scum por causa dela ao longo do litoral e foi necessdria a audacia de explo- radores e aventureiros, os “bandeirantes”, para passar alem e penetrar no interior. Desenvolveu-se no outro lado da serra, na encosta ociden- tal, uma outra zona de colonizagéo. Mas a propria serra continuou vasia, atravessada apenas por algumas “picadas” de floresta que liga- vam 0 interior aos portos da costa. O obstaculo da floresta era ainda mais dificil do que 0 do relevo e os primeiros caminhos de passagem procuraram néo os trechos mais baixos, onde a ascensfo era mais facil, e sim os pontos em que a floresta parecia menor e menos espessa, mui- tas vezes justamente nas zonas mais elevadas; ao Norte do Rio de Ja~ neiro, os antigos caminhos preferiram subir as serras do Tingua ou dos Orgiios, com mais de 1.000 metros de altitude, do que passar pelo “li- miar” de Rodeio, com menos de 500 metros de altitude, e que é hoje u REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA seguido pela estrada de ferro. A entrada da zona de floresta e de mon- tanhas chama-se muitas vezes indiferentemente “raiz da serra” ou “boca do mato”. Atravessava-se a montanha mas néo se vivia nela. Ainda hé hoje no Brasil zonas montanhosas desertas e anecimenas. Mas, por etapas progressivas, a montanha sofreu ocupagées e utilizagées, atraiu suces- sivamente uma vida mineira, uma vida pastoril, uma vida agricola, uma, vida estival e facilitara talvez brevemente o estabelecimento de uma vida industrial. A montanha As primeiras montanhas ocupadas pela colonizacio mineira européia foram as montanhas de mineragao. A Serra Central de Minas é um verdadeiro bloco dos mais variados minerais; os homens procuravam ali a principio os metais pre- ciosos; instalaram-se em primeiro logar néo na propria montanha, mas ao pé da escarpa, na embocadura, dos rios que desciam das alturas; eles recolhiam nos aluvides moveis, por meio de simples lavagens, as pepitas que as 4guas haviam arrancado as rochas. Os rios se enchiam com 0 produto das escavagGes e os homens s6 tinham que rebuscar os aluvides. Todos os cursos d’agua de pé de monte se povoaram de garimpeiros. ‘Mas as aluvides se esgotaram e os mineiros, subindo. progressivamente os rios, penetraram na montanha mineira. Os métodos empregados mudaram; néo era mais o “garimpo” simples apanha, mas a extracao mesma dos filées, por galerias: a mineragdo de morro substituiu a de cascalho. Na zona em que reinava o garimpo, a beira da montanha, a propria instabilidade do trabalho de coleta do metal néo comportava o desen- volvimento de aglomeragées; uma cidade s6, Mariana, a primeira em data, aliés, das cidades mineiras, serviu de capital aos garimpeiros. Em compensagio os mineiros de montanha fixaram em-torno de suas galerias numerosas cidades, algumas importantes. Diz-se que Ouro Preto, fundada em 1711, contava no fim do século 100.000 habitantes; suas maravilhas arqueolégicas testemunham sua riqueza e extensé: outras cidades, igualmente cheias de recordagées de seu antigo esplen- dor, semeiam a montanha: Sabara, Queluz, S. Jodo del Rei, Caeté, Diamantina, Tiradentes. . . Toda esta exploragao mineira desenvolveu uma civilizacéo urbana; os mineiros foram fundadores de cidades como em muitas outras re- gides (na Boémia, por exemplo), de modo que por seu intermédio a montanha se encheu de cidades, Em Minas Gerais, a metade das sedes de municipios, 110 em 215, esto situadas a mais de 800 m; entre as cidades, porem, extendia-se uma regiéo vasia e nenhuma exploracgao velo assegurar uma utilizagdo dos campos. A floresta primitiva foi ra- pidamente destruida para atender as necessidades dos mineiros e 0 pais se cobriu de uma vegetacéo pobre. As minas tornaram o pais prés- pero, mas devastado. Essa prosperidade inaudita ndo durou mais de um QEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 35 século. O Brasil foi o principal produtor de ouro durante o século XVIII mas, desde 0 inicio do século XIX, a civilizagéo mineira entrou em decadéncia; as cidades, inativas, em sua majioria, néo siéo mais do que museus de antiguidade colonial: Ouro Preto sé tem hoje 8.000 habitantes; possue quarteirdes inteiros em ruina e acaba de ser decla- rada monumento histérico. A riqueza em metais acha-se contudo longe de estar esgotada, pois, mesmo quanto aos metais preciosos (mina de Morro Velho) e quanto aos outros metais, os ricos depésitos mal foram atacados. A vocacdo mineira continua sendo essencial. Instalacoes superficiais da The St. John D'el Rei Gold Mines Co, em Nova Lima. Ba mator fe mals tmportente mb ae ouro no Bresit ea mals profhinaa ao mundo. A montanha A vocacao pastoril, que é peculiar 4 maioria das mon- pastoril tanhas da terra, acha-se aqui pouco desenvolvida. A montanha coberta de florestas nao era nada atraen- te; muitos cumes altos desprovidos de Arvores constituiam, contudo, pastagens naturais e apresentavam certas vantagens: na estacéio seca ow na zona seca, conservavam pastos frescos e nutritivos; na estagio vimida ou na zona imida, eram um abrigo contra o pantano ou a inundagdo e, sobretudo, um refiigio contra os insetos e parasitas. Es- sas vantagens orientaram a vida pastoril para uma utilizacéo das mon- tanhas por estagdes, mas as datas de ocupacao no sao necessariamen- te estivais, como nas zonas temperadas, sendo mesmo mais frequente- mente hibernais, o que quer dizer que correspondem a estacéio seca, que esta geralmente no Brasil em relacao com a estagao fria. Esta vida pastoril nao é uma transumAncia dirigida, como nos pai- ses da Europa, sio movimentos quasi naturais: o gado se desloca por si 36 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA mesmo, tangido pelos mosquitos ou pela seca. Na zona seca do Nordeste sobretudo, este nomadissimo do gado é indispensavel, pois, como nin- guem possue reservas de forragem para alimentar os rebanhos duran- te as secas, confia-se no instinto dos animais para descobrir os logares em que ainda existe grama. O gado é animado de grandes movimentos naturais que constituem, sem diivida, o estégio embrionério de uma vida pastoril. A montanha Nao é provavel, aliés, que as montanhas brasilei- horticultora Tas acentuem sua vocacao pastoril. Nas zonas secas do Nordeste, as montanhas se apresentam muitas vezes como oasis, cultivadas pela pequena agricultura, com po- Pulagdo densa, isoladas no meio das extensdes pastoris dos planaltos. Os agricultores montanheses devem mesmo frequentemente adotat me- didas contra a invasio do gado tangido pela seca. Para proteger as cul- turas da Serra do Araripe, por exemplo, cavou-se em torno delas um “grande valo” que os animais nao podem atravessar. Aqui a montanha 6 que é agricola e a planicie, pastoril. Nas montanhas do rebordo ocednico, desenvolve-se hoje uma curio- sa utilizagdio das regiées altas: o fundo dos vales altos é cada vez mais invadido por uma pequena cultura de hortalicas. E’ a consequéncia de uma nova orientago tomada pela alimentacéo brasileira, que tende para um tipo europeu, em que os legumes e’as frutas de zona tempera- da adquirem uma importaneia cada vez maior. As culturas de hortali- ¢as, que caracterizam os arredores das grandes cidades de zona tempe- rada, localizam-se no Brasil nas zonas altas: tomates, couves-flores, ba tatas, morangos... Batatas, de Maria da Fé, um dos mais altos muni- cipios do Brasil, couves-flores de Terez6polis, tomates de Magé das Cru- zes, alcachofras de Sio Roque... Seguindo a mesma orientagio, desenvolveu-se ‘em outras zonas de montanhas uma fruticultura de tipo europeu; maciis, peras, marmelo e mesmo vinhas extendem seu dominio de producéo nas regides de 1.000 metros de altitude: peras de Barbacena, vinhas de Pocos de Cal- das... Esta vocagao horticultora da zona montanhosa acha-se em pleno progresso. A montanha, Esta curiosa especializagdo da montanha na produ- residéncia de cao de frutas e legumes é estimulada por uma nova verfio populacdo, que invade de pouco tempo para cé as regides altas, os veranistas, que veem se abrigar do calor das planicies. As primeiras cidades de veraneio foram as de Petré- polis e Terez6polis, na Serra dos Orgios, sobre a baia do Rio de Janeiro. ‘Mas hoje as estacdes de veraneio se multiplicam associadas muitas ve- zes a fontes minerais. Gracas a seu clima constantemente primaveril, elas atraem nao sé brasileiros, como tambem cada vez mais, estrangei- GBOGRAPIA HUMANA DO BRASIL a7 ros: Pogos de Caldas, Caxambi, Lambari, Sao Lourengo, Cambuquira... Fora das cidades, certos recantos de montanhas comecam a ser invadi- dos por belissimas vivendas: Itaipava, Campos do Jordiio, Miguel Pe- reira RL RR Aspecto geral das nequenas jazendas do Estado do Rio de Janeiro. A regiéo é acidentada, as culturas sao fottas nas encostas ingremes dos morros e, ndo raro, se enconiram os restos duma fldresta antiga ‘Foro 5. P. ABU A montanha, zona A montanha se torna um centro de repouso, de indastria mas est prestes a se tornar uma zona de atividade econdmica e mesmo industrial. Ela esta destinada a fornecer ao Brasil suas principais fontes de energia. Este grande pais quasi ndo possue boas reservas de carvéo de pedra e até agora nao tem igualmente bolsas de petréleo; a montanha, porem, sobretudo a Serra do Mar, que recebe em todos os pontos. mais de dois metros de chuva e, em certos logares, até 6 metros, é uma extraordind- ria reserva de Agua, suspensa a mais de 1.000 metros acima do nivel do mar. Instalag6es consideraveis jé foram efetuadas. Os lagos e usinas da Light and Power, perto de Sao Paulo, constituem uma das mais con- sideraveis instalagées hidro-elétricas do mundo. A montanha distribue a forea dessas Aguas pelas cidades do litoral: Rio, Baia, Vitoria... mas cla atraiu tambem fabricas cada vez mais numerosas, instaladas ao pé das cachoeiras: usinas de Petropolis, Paracambi, Cascatinha... No Rio Grande do Sul, foi ao pé da serra que se gruparam as principais indis- trias: Nova Hamburgo, Sao Leopoldo... Pode-se prever para a monta- nha brasileira uma nova vocagéo, a fungéo industrial, 8 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAPIA Assim a montanha brasileira, zona inaproveitada e deserta, exten- sa barreira litoral que por muito tempo prejudicou a penetracéo e o desenvolvimento econémico do pais, zona de obstéculos e causa de atra- zo, esta em vias de se tornar fonte de riqueza e beneficios. Represa de Santo Amaro ¢ vista da peneplantcie cristalina do alto da Serra As quatro zonas Brasil tem mais de 4.000 quilémetros de climaticas comprimento do 5.° grau de latitude norte ao 33.° de latitude sul, o que quer dizer que o pais 6 atravessado por varias zonas climsticas. Esperar-se-ia encontrar aqui, como na Africa, a sucesséo de faixas climaticas no sentido dos parale- los, indo do clima equatorial ao clima temperado-quente, passando por um clima tropical e até mesmo desértico. Na América do Sul, a carta dos climas é mais complexa. Acentua- se bem, sem duvida, uma zona equatorial. O Brasil possue mesmo a zona equatorial mais extensa do globo; o pais tem a sua maior largura quasi sob o Equador; contudo, o clima equatorial nao traga uma faixa paralela ao Equador acompanhando o rio Amazonas; ele se alarga para Oeste em leque e atinge a sua plenitude na zona mais afastada do mar, ao pé dos Andes, no desdobramento gigantesco dos afluentes do Ama- zonas. E 14 que se encontram as temperaturas mais regulares, ndo hé estacdes quentes nem frias. A pluviosidade é consideravel durante todo © ano e apresenta dois maximos na passagem do sol pelo zenite equa- torial. GBOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 2 A’ aproximagio do Atlantico, a importancia deste clima decresce de extensio; mas logo, para o Sul, ao longo do litoral, é atravessado por um outro clima absolutamente diferente. Todo o Nordeste brasileiro, que se adianta como um baluarte pelo oceano, apresenta este curioso carater de possuir o clima mais seco, mais continental, mais irregular, na regido que deveria ser a mais maritima; opée-se assim ao interior amazénico que, em pleno centro do continente, é mais wmido e mais regular. O clima do Nordeste brasileiro nao é um verdadeiro clima desértico com seca constante; 0 que o caracteriza sio as vagas de seca separadas por anos chuvosos: durante dois séculos, XVIII e XIX séculos, conta- ram-se 39 anos de secas calamitosas e 28 anos de inundacées desastro- sas. Contaram-se até 3 e mesmo 5 anos de secas consecutivas, mas, em compensagiio, permaneceu a regiéo certa vez durante 32 anos sem seca. A irregularidade é extensa Em principio, 0 ano se divide em duas estagées: seca e wmida. A estacao seca chama-se “inverno”, nao por causa do frio, e sim devido a auséncia total de folhas nas arvores; a estaco corresponde em geral ao contrario, aos meses de calor, sendo aliés pouco sensivel a dife- renga de temperatura entre as estacdes. Para os primeiros portugueses, as arvores sem folhas eram uma imagem do inverno, apesar do calor. Este clima esta localizado entre os Estados de Piaui e Baia. Para o Sul, ao longo do litoral, surge uma nova anomalia climati- ca; aproximamo-nos do trépico e deveriamos encontrar um clima seco Na realidade, é uma espécie de um novo clima equatorial que se des- dobra ao longo da costa, desde a Baia e mesmo desde Recife, até o golfo de Santa Catarina e mesmo até o Rio Grande do Sul. Este clima lito- ral nao é contudo uma réplica exata do clima amazonense; ¢ dominado pela passagem de massas de ar vindas do Pacifico e que atravessam a Cordilheira na altura de Buenos Aires e acompanham a costa brasilei- ta; so elas que trazem as chuvas de Sudoeste. As diferencas de esta- go existem: ha um verfio e um inverno, mas este no é, como no Nor- deste, a estacéo quente e sem folhas, é a estacéo fresca. A pluviosida- de continua muito forte, 1,50 m de chuva por toda parte e, em alguns contrafortes da Serra do Mar, até 6 metros. Uma tal umidade entre- tem uma floresta magnifica que lembra 0 Amazonas. Mas este clima ¢ esta paisagem sé constituem uma faixa de algumas centenas de qui- lometros, no maximo. Para o interior, nos planaltos que descem para Oeste, reina um quarto tipo de clima. Esté-se bem no centro do continente e,no entanto © carater continental nao é muito pronunciado. O trago dominante é a oposigao de uma estacao seca, correspondente a estacao fria do hemis- fério Sul, de Maio a Outubro, a uma estacéio chuvosa associada a esta- Ao quente, de Dezembro a Abril. No fim da estacao seca o céu se turva com espessos veus amarelados, que se chamam “fumaca”, e que se diz provirem dos incéndios provocados com finalidades agricolas ou pasto- ris. A paisagem é aliés formada por uma floresta de silveiras, o “cer- rado”, ou por vastas pastagens herbosas, os “campos”. Frequentemen- ® REVISTA DRASILEIRA DE GEOGRAFIA te, a floresta s6 ocupa as partes tmidas ao longo dos vales; os incéndios anuais contribuem para restringir sua area e sem dtivida para acentuar a seca tambem. Esta variedade dos climas, no Brasil, traduz-se sob 0 ponto de vista agricola em ciclos de trabalhos muito diferentes, como, por exem- plo, a colheita do algodao, cuja produgdo ocorre nos Estados do Sul (S. Paulo, Parana), de Abril a Junho e, no Nordeste, de Julho a Novem- bro; a mesma sucessdo quanto 4 colheita do café: de Abril a Agosto, para os Estados do Sul, de Julho a Novembro, para os do Nordeste; quan- to ao milho, os meses de colheita:sio Abril e Maio, para o Sul, e Julho e Agosto, para o Norte; o tabaco é colhido em Junho e Julho no Sul, e Outubro-Novembro, no Norte. Esta diversidade nos ciclos de trabalhos repercute na populacao e provoca importantes deslocamentos de traba- Ihadores agricolas, durante as estagdes. © homem 0 Brasil representa um dos mais grandiosos exemplos eo clima de batalha entre o homem e o clima. A mais antiga e, tambem, a mais dificil foi a-luta que as populacées tra- varam contra as secas do Nordeste, a zona mais vizinha da Europa, a primeira a ser colonizada e ainda hoje uma das mais densamente po- voadas, malgrado as condigdes hostis da atmosfera. A faixa litoral re- cebia indubitavelmente uma umidade suficiente para justificar outro- ra o nome de “zona da mata” e admitir belas plantacées, mas a me- nos de 100 quilémetros da praia comega o “sertéio” com seus solos sal- gados, os “‘saldes”, com sua estranha vegetacao de espinhos e de cactus, a “caatinga”. Foi 14 que se formou um tipo muito curioso: o sertanejo nordestino. Sua origem quasi unicamente branca, sobretudo portugue- sa do Norte, nao o impediu de ser uma das racas mais vivazes, mais adaptaveis em relacdo ao clima. Nao se criou aqui uma destas civili- zag6es de paises dridos, povoadas por construtores de canais, de perfu- radores de pogos, como se deu em paises ainda mais secos: Africa do Norte ou California. Os portugueses, na sua maioria originarios das regides timidas do Douro, néo possuiam atavismo algum para lutar contra a seca; eles se submeteram its intempéries, vivendo com seus re- banhos semi-némades de bovinos e caprinos, através do planalto arido e refluiam no tempo das secas para a costa ou para as montanhas mais regadas: Araripe, Baturité, Borborema. Cedo, porem, essas regides pri- vilegiadas se povoaram com pequenos cultivadores que recusaram re- ceber o gado e construiram mesmo curiosos trabalhos de defesa, como este valo do Araripe, para impedir a invasdo dos rebanhos famintos. Fomes terriveis assolavam periodicamente a regifo, Apés os ter- riveis flagelos do fim do XIX século, os trés anos de 1877 a 1879, procurou- se atacar o proprio mal, lutar contra as secas. Em vez de distribuir sim- ples socorros aos famintos, deu-se-lhes trabalho; elevaram-se barragens a0 longo dos rios tempordrios para reter as 4guas em lagos artificiais, os acudes, o que representava socorro, pois o dinheiro distribuido aos tra~ balhadores era um auxilio e a represa servia de reftigio ao gado e a gente. Estes acudes, construidos a principio em pequena escala por al- GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL “1 guns proprietarios, foram em seguida executados pelos servigos puibli- cos. Criou-se uma espécie de ministério da seca, as Obras Contra as Secas; concebeu-se um vasto programa de grandes acudes, transfor- mando completamente o regimen das bacias hidrograficas; propés-se nao s6 constituir reservas de agua, como nos primeiros lagos, mas tam- bem abrir, @ jusante dos acudes, uma rede de canais de irrigacio, que permitiré a cultura, sobretudo de plantas forrageiras para alimentar © gado. Calcula-se mesmo que a multiplicagdo dessas grandes exten- s6es de Agua modificara um pouco o clima, diminuindo sua irregulari- dade. Esses trabalhos estdo atualmente em curso, j4 se tendo assim retido 2 bilhdes de metros ciibicos de 4gua em mais de 100 grandes acu- des piblicos, Alguns desses trabalhos causaram sem dtivida dissabores: atulhamento rapido dos lagos pelas aluvides, dificuldade de ficarem cheios devido 4 evaporagao intensa. A obra continua no entanto com perseveranga e, depois da terrivel seca de 1932, recebeu mesmo créditos mais consideraveis: 4% das receitas federais do Brasil estao empenha- das nessas regides desherdadas. Ainda hoje, em cada seca, surgem gran- des vagas de emigracao; os infelizes nordestinos sdo entéo verdadeiros fugitivos, os “retirantes”, procurando refiigio em outras regides mais re- gadas. Elas se tornaram assim um dos elementos essenciais do povoa- mento do Brasil. Os cearenses se langaram 4 conquista da imensa ee out SS, mS Sete eae ts Set ne a Amazénia e iniciaram o povoamento das florestas do Territério do Acre. Curiosa anomalia: esses homens da seca conseguiram adaptar-se as terras da maior umidade, as zonas da floresta mais macissa; os extra- tores de borracha séo na sua maioria nordestinos; hoje, que a borracha nao da mais lucro, eles emigram para o Sul, para o Estado de Sao Paulo sobretudo. a REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA Tipos de De todos os elementos da natureza que os homens tiveram rios de utilizar foram, sem diivida, os rios, os mais gigantescos. O Brasil, j4 0 vimos, é 0 pais que possue a maior bacia fluvial do mundo, o Amazonas, que é 0 dobro da do Mississipi, 6.500.000 Km2; a bacia do Parana-Paraguai, ao Sul, que tem toda a sua parte setentrional em territério brasileiro, iguala quasi a do Mississipi ou a do Congo; e o Rio Sao Francisco, inteiramente em territério nacional, 6 tambem um dos maiores rios do mundo com mais de 3.000 Km. de comprimento. Estes grandes sistemas fluviais dispdem de um aprovisionamento d’4gua unicamente fluvial; ora, em quasi todo o Brasil, as chuvas cor- respondem & estagao quente; a época da subida das aguas é, portanto, geralmente em Janeiro, Fevereiro e Margo. Os rios se enchem de um modo progressivo e moderado; atingem as ribanceiras ou “vasantes” (parte descoberta nas vasantes) e muitas vezes até as florestas adjacen- tes, mas nao apresentam geralmente estas cheias suibitas, curtas e de- sastrosas, como se véem nos rios da zona temperada. © Amazonas tem um regimen especialmente estavel, devido A sua situago quasi a cavaleiro do Equador. Os afluentes da margem do Norte The trazem as Aguas crescidas na estagdo quente boreal de Julho a Se- tembro, enquanto que os da margem Sul, ao contrario, trazem sua prin- cipal contribuigao na estacao quente de Janeiro a Marco; é verdade que os rios meridionais séo acentuadamente mais consideraveis e assegu- ram uma influéncia austral dominante, mas o equilfbrio é assegurado gragas & expanstio formidavel das aguas pelos pintanos e bragos ane- xos, “igarapés” e “furos”, amortecendo as pulsagdes das aguas, e tam- bem devido ao pequeno declive (82 metros de altitude em Tabatinga, onde o rio entra em territério brasileiro, a mais de 3.000 quilémetros do mar), de modo que este rio, o maior do mundo, é tambem o mais regular. Os cursos d’4gua da zona das secas e mesmo 0 Rio Séo Francisco esto longe de gozar desta estabilidade, suas estiagens séo muito baixas; muitos rios mesmo secam completamente durante varios meses e lem- bram os “oueds” do Sara. Os rios do Sul do Brasil, Paraiba, Itajai, Jacui e Camapua, séo melhor providos, mas esto sujeitos a cheias bruscas, relacionadas com as trombas d’égua caidas sobre a Serra do Mar, donde graves inundacdes em Campos, Blumenau e Porto Alegre. Todos esses rios carregam uma enorme massa de aluvides, mas ra- ramente sob forma de seixos ou cascalhos, exceto na regido seca do Nordeste; os sedimentos sfo, quasi sempre, areias ou melhor ainda la- mas muito finas. Os cursos d’agua so aqui menos agentes de erosio do que de transporte; a destruicao das rochas é assegurada sobretudo pela decomposic&o quimica, devido as chuvas e ao calor e os talvegues so abertos nas rochas j4 decompostas onde as Aguas se carregam de materiais finos. Os vastos cones de dejecéo de blocos e seixos, como se véem ao pé dos sistemas torrenciais da zona temperada, sio aqui ex- cepcionais, Os materiais finos permitem que os rios tenham seccoes de GBOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 2 pequeno declive, mas obstruem As vezes os leitos com bancos de areia, formando aneurisma, que torna instavel a navegacio. Estes rios de materiais finos e pequeno declive nao sdo, como se poderia crer, cursos d’4gua antigos tendo efetuado um longo ciclo de erosao; apresentam, ao contrério, na sua maioria, aspectos de extre- ma juventude; sao cortados por intimeras cachoeiras e répidos (cor- redeiras) : 6 um dos aspectos essenciais da hidrografia brasileira, aproxi- mando-a da hidrografia canadense. Essas rupturas de declive teem con- tudo aqui uma origem muito diferente; no Canadé, séo devidas A ero- sao glacidria; no Brasil, proveem dos fil6es de diabases ou de quartzita, que cortam os cursos d’4gua, ou tambem de degraus devidos a levanta- mentos do planalto central brasileiro, em vias de surreigdo progressiva. Nas partes montanhosas, onde a rede de falhas, muito apertada, se orienta segundo duas direg6es perpendiculares NE — SO e NO — SE, 0s rios correm muitas vezes entre os blocos cortados pelas falhas, dese- nhando cotovelos em Angulo reto, apresentando numerosos exemplos de captura que lembram a hidrografia dos Montes Apalaches ou do Jura. ‘Mas aqui, é menos a direcdo das dobras do que a das falhas, que provo- cou este geometrismo da hidrografia. Tais séo os vales do Ribeiréo do Iguape, do Alto Paraiba, do Alto Piabanha; perto de Passa Vinte, o rio Preto, afluente do Paraiba, é particularmente curioso a este respeito. ‘Todos estes rios constituem uma rede hidrografica muito desenvol- vida; ndo hé ponto algum do territério que nao seja drenado por cursos d’4gua; a zona tropical do Brasil é nisto bem diferente das outras zonas is, Africa do Sul, Sara ou Australia, que comportam imensos ios sem escoamento algum. O Brasil é uma das massas continen- tais melhor drenadas da Terra. Nao s6 h& rios por toda parte, como tambem todos esses rios chegam ao mar. No entanto, a existéncia de uma grande depressio interior e o desenvolvimento dos relevos, em orla sobretudo, pareciam tornar dificil a drenagem para o mar, mas a extensio do clima equatorial, bem no centro do continente, triunfou de todos os obstdculos topograficos. A grande calha central facilitou as co- miunicagoes entre as diferentes redes fluviais; 6 uma das curiosidades do Brasil a multiplicacdo das ligagdes naturais entre rios acima dos divisores de 4guas: 0 Amazonas se comunica com 0 Orenoco e tambemn com 0 Paraguai e 0 Sao Francisco, e nao sé por um rio, como por toda uma série de bragos. Os homens _ Assim o Brasil dispde de uma das mais completas redes e os rios hidrograficas do mundo, grande vantagem para os ho- mens porque permitiu uma penetragao rapida do in- terior. Depois da Europa, é a América 0 continente em que os homens atingiram em primeiro logar as partes centrais. Desde o século XVI, Orellana revelou todo 0 curso do Amazonas e no inicio do século XVII ja se estava em pleno Mato-Grosso. Na América do Norte, s6 um século mais tarde, foi que se chegou as Montanhas Rochosas; e na Africa, s6 mais de trés séculos mais tarde, 14 por 1880, é que se elucidam os proble- “4 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA mas das fontes do Nilo e do Congo; o mesmo se deu na Australia. Quan- to a Asia, o Tibet ou a Mongolia foram durante muito tempo terras quasi fechadas. Os rios foram aliados do brasileiro na penetragéo do pais e sdo os Ynicos meios de circulagdo em toda a bacia amazénica, onde se cal- cula em 25.000 quilémetros de extensfio a rede navegavel. E’ mesmo a maior zona do mundo em que a estrada seja unicamente 0 rio; toda a circulago se faz de barco e até os mascates, afim de vender sua partida, viajam em jangadas. Do mesmo modo, no Nordeste brasileiro, pelo me- nos na zona litoral, “zona da mata”, menos seca, os rios foram até estes iltimos anos principal via de circulagao; a fachada das casas dava para o rio e no para a estrada. Contudo, os cursos d’4gua apresentavam muitas dificuldades aos homens. Em primeiro logar, muitos rios do centro e do sul do Brasil corriam, como vimos, para o “hinterland” e ndo para o mar; eles facilita- ram indubitavelmente a descida para o “‘sertao” e serviram de caminho As expediges dos “bandeirantes”, mas deixavam a zona litoral no mais completo isolamento, ao pé da escarpa da Serra do Mar. Singular re- gido para as comunicagées, em que os rios néo conduziam a0 Oceano; ee Repido ondulada grantto-gnétssloa do médio Rio Dove. Nota-te 0 inicio da, devastacdo das florestas i 0 tivo de navios que trajegam entre Golatina e Lighares Foro 8. F, Any por isso todo o Brasil central e meridional utilizou a circulagdo terrestre em dorso de mula e distinguiu-se totalmente do Brasil amazénico, com circulacdo unicamente fluvial, em barcos. Os intimeros répidos (corredeiras) e quedas que cortam a maioria dos rios foram outros obstaculos a circulagéo; pontos de parada, servi- ram para fixar as aglomeragées. E” incontavel o niimero de cidades que GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL ry teem o nome de “Cachoeira” no Brasil. Hoje em dia, estas cachoeiras atrairam 0 povoamento nao sé pelos entraves ao transporte como tam- bem pelo potencial de energia. O Brasil, tio mal provido de combusti- © Vale do Paratbe, num de seus trechoe apertados entre a Serra do Mar ¢ Mantiqueira For" mostrando parte Ga’ cidade ae Barra’ Matsa veis minerais, acha-se admiravelmente provido de quedas d’gua. Ha poucos paises que tenham tantas e tao importantes. A Cachoeira do Iguacti, no rio Paran4, na fronteira do Paraguai e da Argentina, é uma das mais consideraveis pela massa d’agua. A Cachoeira de Paulo Afonso, no rio Sao Francisco, cai de 70 metros de altura. Por isso, as possibilidades de aproveitamento hidro-elétrico so enormes. © Brasil tem mesmo uma formula especial de aproveitamento. © alto da Serra do Mar é uma zona importante de nascentes de rios, alimentadas por consideraveis precipitagdes de chuva; nascem nela muitos cursos d’égua que se afastam para o interior. Era facil reter neste planalto, por simples barragens, vastas bacias suspensas a cerca de 1.000 metros de altura e verter a massa d’égua em altas cachoeiras caindo diretamente para 0 oceano préximo; curioso desvio hidrografi- co operado pelos homens, restituindo ao Atlantico massas d’agua em de- trimento dos cursos d’Agua interiores. Assim foram transformados o Alto Tieté e seus afluentes dos arredores de Sao Paulo. Agricultura Infelizmente, os cursos d’gua brasileiros teem varia- e inundagao des de descarga correspondentes as estacdes, devi- do & divisdo habitual do ano em estagdo seca e esta- ¢do chuvosa. Essas variagées, que obrigaram as usinas elétricas a em- preender vastos aproveitamentos dos rios, permitiram por outro lado o 4 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAPIA desenvolvimento de um curioso tipo de agricultura. A baixa das dguas, na estag&o seca, deixa nas ribanceiras duas faixas mais ou menos largas de que as populagées ribeirinhas se apossam logo que as Aguas se reti- ram, So as “vasantes”, dominio de ricas culturas de estagdo, benefi- ciando-se das aluvides ferteis depositadas durante os meses de inunda- cao. Este tipo singular de cultura, em vale submersivel, praticado numa extensao de mais de 1.000 quilémetros ao longo do Sao Francis- co, encontra-se tambem muito frequentemente nos rios do Nordeste; em certas regides muito secas do sertao, constitue a tinica agricultura existente, estando todo o resto da regio entregue a criagao. As popula- ges ribeirinhas constroem, na planicie inundavel, cabanas sobre esta- cas que lhes permitem, no mesmo terreno, praticar sucessivamente a cultura e a pesca. ‘Na bacia amazénica, as Aguas montantes se extendem desmesura- damente as vezes por mais de cem quilémetros, especialmente na zona deltaica da ilha de Marajé. As ribanceiras sio ocupadas aqui, como na maior parte dos deltas brasileiros, ndo por florestas, mas por gran- des savanas relvosas, os “campos”. Os deltas teem uma vocagao pasto- Aspecto comum da planicte amazonica, Rios larger, wa mata monstona ¢ @ notavel escasses de povoamento humano Foro G. Cantos ril, formando ilhota de criacio em meio as florestas litorais: delta do Paraiba, do Doce, do Amazonas. Aqui néo é a agricultura que se adapta & inundagdo periédica e sim 0 gado. Muitas vezes os rebanhos GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL a emigram por si mesmos em grupos, guiados por um animal fazendo o papel de chefe e que se chama “madrinha”, e se refugiam nos pontos mais elevados, os “firmes”..Mas, quando se esta afastado de qualquer elevacdo, os proprietdrios constroem grandes jangadas chamadas “ma- rombas”, nas quais os animais podem ser concentrados; estes entdo se contentam em ter como alimento os tufos e folhagens que, felizmente, flutuam em abundancia nas aguas transbordadas, mas estas inunda- des provocam sempre grande mortalidade nos rebanhos. Vale da Ribetra de Iguépe ao sul de S. Paulo. Ao fundo a Serra da Votupoca. Tepido de colonisacdo faponesa Fore §. P. Auiry As formas Se os cursos d’4gua brasileiros desdenharam a costa de costa _atlantica para se afastarem para o interior, é que a praia era particularmente hostil e como que separada do continente. A costa permanece inteirica, sem sinuosidades; as pe- ninsulas, as ilhas e os cabos so excepcionais e pouco importantes. As costas do Brasil diferem nisto singularmente das costas atlinticas da América do Norte, com sinuosidades téo profundas e tao multiplicadas. © Brasil lembra, por suas costas, a Africa ou a Austrdlia; esta similitu- de de forma decorre sem divida de uma origem semelhante. Nos vi- mos que a América do Sul, segundo a hipétese de Wegener, destacou- se da Africa e estas duas costas deviam encaixar-se; na realidade, néo so as costas que se devem reajustar, mas os rebordos das plataformas litorais, que estfo imersas numa largura mais ou menos grande; esses rebordos submarinos so alias, flanqueados, pelo menos na costa brasi- Jeira, por fossas profundas e paralelas costa (fossa da baia de Todos 0s Santos, na Bafa) como se, por ocasifio da separagéio dos dois conti- 2 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA nentes, algumas porcGes de terreno tivessem ficado retardadas, no mo- vimento de translagio para Oeste, de toda a massa americana; a escar- pa costeira da Serra do Mar possue tambem tais acidentes. Esta costa nao é uniforme e apresenta varios tipos ao longo do imenso desdobramento das margens. Ao Norte, o mar parece ainda estar em ciclo de conquista e penetra pelas terras através de miltiplos ¢ largos estuarios, dos quais 6 0 do Amazonas o mais imponente, mas a grande porcao de sedimentes trazidos pelos rios combate este avanco marinho e forma imimeras ilhas de aluvifio. A costa baixa e lamacenta 6 coberta por uma vegetacao de paletiivios, com raises que mergulham na gua do mar; é a zona dos mangues (mangroves), curiosa floresta anfibia que tem muitas vezes varios quilometros de largura. A mar- gem néo é formada pela terra e sim pelas arvores; 0 mangue contribue para fixar o solo de aluvidio e permite que a costa avance pelo mar. Encontramo-nos aqui ante um caso singular em que a terra e o mar acham-se ambos em ciclo de conquista. ‘Nas imediagdes do Cabo Sio Roque, no ponto mais oriental do Brasil, a paisagem costeira muda; aparecem ao largo os recifes corali- genos, formando barreiras ou pequenos arquipélagos; a propria costa, a partir de Séo Luiz do Maranhao, é orlada por dunas muitas vezes mo- ha do Cabo, em Cady Frio. 4 he ¢ um grande macieso de rochas eruptivas alcatinas (aientios, fonolitos, tinguattos), com encostas bruptay °° OO veis e transportadas para o interior pelos ventos aliseos; essas dunas conquistadoras chamam-se “lengéis”. Nas embocaduras dos rios, as areias acumuladas pelos ventos teem entravado muitas vezes a saida das aguas e constituiram, gracas a esta barragem, lagos costeiros que formam um rosério litoral, tendo muitas vezes comunicagdo entre si. GROGRAFIA HUMANA DO BRASIL, 2 Mais ao Sul ainda, a partir da grande bafa de Todos os Santos, na Baja, encontra-se uma costa com pequenas escarpas bastante retilineas, talhadas nos grés e areias tercidrias pouco s6lidas; sio as “barreiras”. Mas os rebordos montanhosos aparecem logo e uma, costa muito diversa Ponta de Torres, no Rio Grande do Sul. At o planalto meridionat formado pelo lenzo! ae Glabase atinge @ costa diretamonte. 4 Jovograjia mostra a experea camada’eruptioa’ fenaithade, Yormando ae colunas earacterisiicas, ° se prepara; a partir do Espirito Santo e sobretudo no Rio de Janeiro, 0 mar bordeia diretamente a montanha e segue todas as sinuosidades da costa, desenhando golfos com muiltiplas indentagées, como o de An- gra dos Reis, ou a imensa bacia maritima de Paranagua, no Parana, ou a admiravel baia de Guanabara, no Rio de Janeiro, destacando peque- nas ilhas bastante escarpadas: ilha Grande, ilha de Séo Sebastiio (1.300 m. de altitude), ilha de Santa Catarina; uma das mais belas costas do mundo, em que o mar envolve os singulares relevos de rochas cristalinas em forma de pao de aguear e onde a grande floresta se in- sinua entre o mar ¢ a montanha. Trata-se naturalmente de uma costa bastante jovem; a invasio do mar é recente e sem diivida ainda se esta processando; néo ha uma verdadeira “falaise” do mesmo modo que nao ha detritos. Contudo, o trabalho de regularizacao j4 comecou; du- nas em forma de flechas, as “restingas”, fecham os golfos, religam as ilhas & costa, fecham lagunas; essas areias so admiravelmente bran- cas, compostas unicamente de quartzo muito fino. Os raros rios de- sembocam néo por estudrios, como no Norte, mas por deltas com lagos adjacentes e miiltiplos cordGes litorais, formando sulcos paralelos a0 longo da costa: delta de Itajai, do Rio Doce, com a lagoa Juparané, do Paraiba, com a lagoa Feia. A plataforma litoral, sem duvida, recente- mente imersa, é larga: para encontrar 200 metros de profundidade, é % REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA preciso avangar mais de 100 quilémetros pelo mar a dentro. No fundo dos golfos, o “mangue” enche lentamente as zonas marinhas e os trans- forma em “baixada”. No extremo Sul do Brasil, no Estado do Rio Grande do Sul, o as- pecto do litoral muda de novo; as areias predominam mais uma vez, como no Nordeste; imensos cordées arenosos de mais de cem quiléme- tros barram enormes lagos litorais muito alongados, como a Lagoa dos Patos, em cujo fundo se ergue Porto Alegre, ou a Lagoa Mirim que é atravessada pela fronteira do Uruguai. A corrente maritima das Malvi- nas, vinda do Sul, contribuiu sem diivida para essas vastas construcées costeiras. A planiole Ktoranea ao Sul de Vitdria. Xo tipo de planicle entre o mar ¢ a terra, semeado de ‘peduenas logoas © pantanos. i ‘quente © pouco salubre, embora bastante povoeda. ‘For 8. P. Aasee O Brasil se apresenta _ A’ primeira vista, tais costas ndo parecem como uma ilha muito favoraveis aos homens; elas teem, contudo, uma importincia tal para as comunicagées, que fizeram do Brasil um estado essencialmente mariti- mo. O pais se apresenta sem duivida como u’a massa continental tao larga quanto longa, nao obstante, é essencialmente uma costa, uma praia; esta nacdo-continente comporta-se como uma ilha. Sé é abor- dada pelo mar e s6 do lado do mar fica a fachada verdadeira e util. As fronteiras continentais sio na verdade quasi iguais em extensio as fronteiras maritimas, mas em muitos trechos s6 recentemente foram fi- xadas e atravessam regides florestais ou pantanosas. Ir as fronteiras equivale a uma verdadeira expedigao e nao h4 quasi comunicagao algu- ma importante que se faga do lado da terra; mal atinge a um por cento GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL Ey a proporedo dos contingentes humanos que passam pela fronteira ter- restre, muito menos de 1%, a do trafico das mereadorias. O Brasil, mal- grado suas fortes ligagées continentais, ¢ um estado ilha.. 4A repido salineira de Cabo Frio ¢ a tIha do Cavo, ao fundo, representada por uma consideravel ‘massa de rochas eruptioas alealinas Foro 8. F. Aone Ele foi alids inicialmente um estado costeiro, foi mesmo, si assim se pode dizer, um estado-escala; as primeiras aglomeracoes foram escalas nas rotas do Sul e os mais antigos colonos estabelecidos foram pequenos cultivadores encarregados de fornecer aos navios legumes e viveres frescos, indispensaveis as longas travessias a vela. © Brasil foi sem diivida descoberto como escala na rota do Cabo. A pesea Nunca sera demasiado insistir sobre a importancia da vida de pesca nas civilizagées indigenas, como nas primeiras co- lonizagdes européias. A maioria das praias brasileiras sdo assinaladas por imensos depésitos de conchas e detritos de peixes misturados com a ceramica e as ossadas humanas. Esses depésitos ou “sambaquis” sfio 0 indicio de uma vida litoral antiga; parece que muitas dessas populagées primitivas eram némades e viviam na praia durante os meses frios em que os peixes abundavam; contrariamente ao que se observa na maio- ria das outras regides da América do Sul, o Brasil pré-colombiano tinha um litoral muito povoado e montanhas desertas. A colonizagao branea iniciou-se, em muitos pontos, por estabeleci- mentos de pescadores, sobretudo pela pesca da baleia, téo procurada ou- trora por seu éleo, no tempo em que os dleos vegetais eram raros.... Fica-se espantado com o mimero de portos de baleeiros que assinalaram a REVISTA BRASILEIRA DE GROGRAFIA as costas do Brasil, portos némades na maioria das vezes e que diferiam sob este particular das povoagSes-escalas dos pequenos cultivadores se- dentarios. Os esqueletos de baleia afundam em muitas praias e formam As vezes recifes que nao deixam de ser perigosos Ainda hoje o peixe é muito abundante na costa brasileira; puxam- se As vezes para a praia redes tao carregadas de peixes, que chegam a ser abatidos a pauladas. Pescam-se tambem em abundancia grandes cama- rdes. No Nordeste 0 pequeno braco de mar entre os recifes de corais e a costa é tao piscoso que se pratica a pesca ao voo; trata-se alids de pei- xes voadores e os pescadores colocam, para os apanhar, um engodo nas jangadas; os peixes se precipitam em grande mtimero sobre a embar- cacao, que a invadem literalmente. Esta riqueza facilitou a existéncia de uma populacdo litoral, os “caigaras”, vivendo quast unicamente de peixes. Em Pernambuco é 0 carangueijo que serve como base de ali-- mentagiio a esses pescadores. Pratas do Nordeste com os coquetrais tipicos ¢ as jangadas Os portos Contudo, 0 Brasil ainda nao conta com uma verdadei- ra, indtistria de pesca, como nao conta com portos de pesca; possue, em compensagao, intimeros portos de comércio. O Brasil é um pafs de portos, as cidades importantes esto localizadas em sua maioria na costa; no Norte e Nordeste do Brasil, onde existem grandes estudrios, esses portos esto situados nas embocaduras banhadas pelas marés: Belem, S40 Luiz, Parnaiba, Macau, Natal, Paraiba, Recife, Ma- ceid... GEOGRAFIA HUMANA DO BRASTL 3 A partir do Estado da Baia para 0 Sul, a situagaio dos portos mudou: encontram-se nas baias naturais e nfo nas embocaduras, que séo del- taicas, instaveis e sem profundidade. Nem o S. Francisco, nem 0 rio Doce, nem o Paraiba fizeram nascer em suas embocaduras organismos portuarios. Os portos se instalaram nas grandes baias cercadas de mor- ros rochosos: Baia, Vitéria, Rio de Janeiro, Angra dos Reis, Santos, Pa- ranagué, Laguna...; e mesmo alguns se fixaram em ilhas montanhosas: Sao Sebastido, Sao Francisco, Florianépolis... O Brasil conheceu uma verdadeira floragao de pequenos portos, toda a costa estava orlada de- les. A maior parte esta hoje em decadéncia; as aglomeragées da costa so em geral cidades mortas, cheias de velhas construgdes em estilo co- lonial muito pinturesco. No decorrer do século passado, assistiu-se a uma concentragio de toda a atividade comercial em alguns pontos privile- giados tanto por sua situagdo portuaria como por suas facilidades de comunicagao com 0 interior. Assim na costa dos Estados de Sao Paul Rio de Janeiro e Espirito Santo somente trés grandes portos subsisti ram: Santos, Rio de Janeiro e Vitoria, substituindo uns cincoenta peque- nos embarcadouros pelos quais se fazia outrora o tréfico. A zona litoral conservou sua importancia primordial, mudando, porem, completamen- te a distribuicio de seu povoamento: em vez da distribuicdo mais ou menos uniforme por uma faixa de povoamento continuo e bastante denso, que se encontrava outrora, vé-se hoje uma zona em plena letar- gia e despopulacao, entrecortada aqui e acolé por grandes cidades, que ao contrario progridem rapidamente. Aqui, o Brasil que se povoa se in- tereala no Brasil que se despovoa. A banana _ Assiste-se hoje, alids, ao inicio de um novo surto eco- do litoral _ némico desta zona litoral decadente. A banana encon- trou um verdadeiro solo de elei¢éo nas baixas terras ‘midas e submetidas a um clima timido; ela é exportada facilmente em pequenas embarcagées para os grandes portos; nos arredores de Santos jé hd mais de 15 milhdes de pés produzindo, e o bananal con- quista progressivamente todo 0 litoral em direcdo ao Rio, Angra dos Reis, Paranagué... Grandes companhias iniciaram uma exploragao metédica, mas a maioria dos bananais esté nas mos da gente pobre, “caigaras”, que abandonam assim sua antiga economia fechada e sua indoléncia; a banana esté operando uma verdadeira transformacao, mesmo na psicologia dos habitantes. Aspectos da — Entre as fungGes que exercia outrora o litoral, uma vegetacéo houve muito importante e que esté hoje bem dimi- nuida, a funcdo florestal. Aos primeiros descobrido- res 0 Brasil apareceu como uma imensa reserva florestal. De Natal 20 Rio Grande do Sul, a fachada do pais era u’a mata continua e densa, nela encontrando-se sobretudo madeiras preciosas, notadamente este antigo pau de tinturaria chamado “brasil”, o pau de brasa, que a Europa importava, outrora, do Oriente, com grandes despesas. Ey REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA A importancia deste pau foi de tal ordem que ligou seu nome ao do pais. O Brasil € 0 tinico pais que tem o nome de uma Arvore; ele justi- fica esta designacéio: mais da metade do pais acha-se ainda coberta de um manto florestal, que constitue uma das maiores reservas vegetais do mundo, cerca de 5.000.000 de quilémetros quadrados, ultrapassando em superficie as massas florestais das zonas frias, Canada ou Sibéria. © Brasil deve a sua importancia florestal ao fato de apresentar maior largura na zona equatorial; a floresta esta ai associada a zona das chuvas e dos calores regulares e fortes, que se espalham sobretudo na bacia do alto Amazonas e especialmente na zona do seu afluente, 0 Madeira. (*) ‘A mata virgem (hiléia) dos brasileiros, “rainforest”, floresta tmi- da dos ge6grafos ingleses, é um imenso dominio compacto, onde os tni- cos claros s&o os leitos dos rios; a onda vegetal nao parou senao & mar- gem dos rios e, mesmo assim, é necessario que sejam 4guas correntes; nas zonas dos pantanos uma interessante floresta amfibia se desenvol- veu, encobrindo, 0 mais possivel, 0 lengol d’Agua. Existe ao longo dos afluentes do Amazonas verdadeiras barreiras vegetais, so eles estreitos e sinuosos desfiladeiros entre paredes de arvores. O homem aproveitou estas entradas aquaticas para penetrar no interior da massa arborescen- te, o “inferno verde”, como o chamaram. Nao fosse o rio e o homem fi- caria perdido, enterrado, sem possibilidade de se orientar debaixo das folhagens, sem ponto de referéncia; na ocasiao das enchentes, durante © verao, a floresta fica metade debaixo d’égua, centenas de quilémetros ao largo; os homens se juntam nos pontos insubmersiveis, as terras fir- mes, onde aumentam as aglomeragdes. E’ a época em que as cidades ficam mais animadas; aparecem, entéo, como uma espécie de oasis, per- didas no meio do deserto das Aguas e das arvores, Esta floresta constitue um dos mais extraordinérios panoramas vegetais da terra; ela se distingue por completo das florestas das zonas temperadas, compostos de algumas espécies uniformes; na Amazénia, j4 se contaram mais de 4.000 espécies arborescentes, enquanto a Euro- pa toda conta com menos de 200, e cada exploracéo no Amazonas iden- tifica novas espécies. A floresta forma o bloco vegetal, as érvores sendo literalmente tomadas de assalto pelos arbustos e pelas parasitas, cipés, orquideas. Contaram-se j4 800 espécies vegetais vivendo numa s6 Arvo- re. A Amaz6nia constitue um verdadeiro museu vegetal; museu de va- riedade mas tambem museu de antiguidade, pois esta floresta é o res{- duo de florestagdes que datam das eras tercidrias e talvez mesmo mais antigas; ela representa um dos mais antigos panoramas da terra, mais antigo do que a maioria das costas e montanhas européias. Esta floresta estende-se pela bacia amazonense sob um aspecto um pouco diferente; ela invade a franja litoral do Brasil, de Pernambuco (*) ©, primetro explorador deste grandé rio, Francisco Patheto, em 1728, ficou admirado com o\quantidads de pau flutuante que cobria as aguas de verdideiras pontes inovels de arvores ede Matos entrelagados. Dal, © nome de “Madeira” dado 0 710. GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 55 até o Rio Grande do Sul. Em nenhuma, outra parte do mundo, paisa- gens quasi equatoriais descem tao baixo em latitude, ao sul dos trépicos, mesmo em regides, onde, em geral, reina um clima desértico. ‘Ao longo da costa toda, o Brasil oferece uma fisionomia de regiéo do Equador e assim se explica a lenda, enormemente espalhada, de um Brasil unicamente equatorial e florestal. Mas, na realidade, limita-se essa zona a uma faixa litoral; somente em certos logares (Espirito San- to, Sul de Minas e Sao Paulo), ela atravessa a grande escarpa da Serra do Mar e se estende ao interior. Mas, em geral este interior ¢ caracterizado por uma vegetacéo me- nos densa, onde as arvores perdem sua folhagem (sumidecideous forest). Este tipo de vegetacao entremeia a savana de grandes capinzais e os bos- ques, de Arvores espacadas; é 0 “cerrado”, muitas vezes com uma flo- resta-galeria no fundo de um vale; ele aparece especialmente nos rele- vos velhos das superficies elevadas do centro do Estado de Minas. Na zona mais seca do Nordeste domina uma vegetagéo pobre, es- pinhosa, de bromelidceas, cactaceas..., a “caatinga”. Enfim, ao sul, aparece um terceiro tipo de floresta, 0 pinhal, po- voado destas interessantes resinosas, as wmicas que possue 0 hemis- fério sul, as araucdrias (pinheiros); floresta homogénea, composta quasi que sé de uma espécie e muito diferente da extraordinéria varie- dade vegetal da floresta amaz6nica; ela corresponde as regides onde o inverno é acompanhado regularmente de geadas; cla tambem prefere os planaltos de relevo velho. A araucéria avanca em ponta, ou melhor em ilhotas, em direcao ao Norte, cobrindo os planaltos mais altos (Apiai, Lambari, Barbacena), orem, misturada com a floresta de folhagem. Em todas as outras partes predomina a relva, os campos, anélo- gos & zona dos pampas argentinos: Sul do Rio Grande, regifio central do Paranda... A floresta, Como utilizaré 0 homem esta imensa riqueza zona de colheita vegetal? A floresta aqui nfo aparece como inimigo dos homens, como parece ter sido na zona temperada; a zona florestal foi mesmo a primeira a ser habitada, nio s6 pelos indios, mas tambem pelos colonos europeus. As regiées de relva, os campos, foram as tltimas a serem povoadas e permaneceram durante muito tempo as mais desertas. A floresta ofereceu primeiramente uma, coleta, um mané que ne- cessitava apenas ser apanhado; oferecia uma quantidade de frutos; notou-se, na AmazOnia, que as zonas mais povoadas correspondiam as zonas mais ricas em Arvores frutiferas; a densidade dos frutos deter- mina a densidade de populagéio. O ruido da queda de um fruto do alto daquelas arvores gigantes ecoa estrondosamente no siléncio da flores- ta. Nestas regides de clima regular, os indios contam os anos pela lem- branga das sucessivas colheitas; as estagdes so frutiferas e néo climé- ticas. Os indios, como os caboclos, teem um regimen alimentar essencial- 36 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA mente frutifero; hd meses em que a alimentagio.consta de tal ou qual fruto, em regimens sucessivos: assim por exemplo, a jaboticaba atrai as familias para certas zonas ricas desta espécie, e entéo cons- troem uma cabana proviséria num “jaboticabal” na época da matura- ¢&0; imitando os indios, alguns fazendeiros tambem seguem para 0 campo na estado das jaboticabas; chamam-na, alias, a “fruta”, isto ¢, a fruta por exceléncia. No Brasil Meridional, a araucdria desempenha papel analogo; Saint Hilaire, nas suas viagens, conta que estes frutos alimentaram os Paulistas durante a expedi¢do contra o Paraguai; esta tambem 6 chamada “iba” pelos indios, o que quer dizer, o fruto. Na época da frutificacao, de Julho a Setembro, a floresta é invadida; ndo s6‘os homens instalam-se af em colénias, mas tambem manadas de por- cos nela procuram alimento. A floresta fornece tambem raises, tubérculos ou brotos; o broto ter- minal de certas palmeiras da 0 “palmito” que tem um gosto semelhante ao do aspargo, mas é um aspargo de dois ou trés metros de comprimen- Uma vista da mata amazénica com sua abundancia de paimeiras. Nota-se uma habitagto ‘de seringueiro (eaploredor de borracha) Foro G. Caseros to; em todos os mercados de legumes das cidades, vende-se o palmito; os apanhadores do palmito ou “palmiteiros” esgotam rapidamente a floresta proximo as grandes cidades. E’ necessArio ir procura-los cada vez mais longe, em auto-caminhées; comegou-se a fazer conservas de palmito e a exportd-las para as zonas temperadas. A floresta doou ao homem uma quantidade de bebidas; a mais conhecida das bebidas florestais é o mate; ele é produzido por uma 4r- vore parecida com o nosso “houx” que eresce & sombra das florestas de GHOGRAFIA HUMANA DO BRASIL a araucérias do Paranda e Santa Catarina. E explorado quasi sempre em estado nativo por descobridores que passam cerca de seis meses na flo- resta, colhendo, secando e torrando o mate. No norte do Brasil, uma outra bebida de origem indigena, fabrica- da com as favas de uma. espécie de liana florestai, tem hoje em dia gran- de saida, é o “guaran&”. Essas favas j4 serviram de moedas primiti- vas, Hoje, o guarané é um “refresco” servido em todos os cafés do Bra- sil; comega-se a exporté-lo para a América do Norte. A floresta brasileira fornece tambem grande quantidade de ér- vores oleosas, de utilidade incontestavel, posto que o Brasil nao culti- va quasi plantas oleaginosas; ele importa da Argentina o 6leo de linho, e da Europa, o de oliva. Uma grande Arvore do Nordeste do Brasil, a “oiticica”, d& um dos melhores dleos secativos; na costa do Estado de Sio Paulo, a nogueira de Iguape, “bancoulier”, é empregada no fabrico do 6leo para sabio. A floresta d& tambem ceras vegetais das quais a mais conhecida é a que se extrai das folhas da palmeira “carnauba”, abundante sobretu- do no Estado do Piaul. Esta cera emprega-se no fabrico de disco de fo- négrafo. A floresta produz numerosas plantas medicinais; os indios conhe- cem muitos remédios, todos extraidos da floresta; a planta medicinal tem muitas vezes 0 nome da moléstia para a qual é usada; a farmaco- péia indigena é quasi s6 florestal. Os mais curiosos dos pesquisadores de plantas medicinais, os hervateiros, so os poaieitos, apanhadores de poaia, nome indigena dada & “ipeca”; é uma raiz que se colhe nas flo- restas pantanosas do norte de Mato Grosso, em plena estagSo quente & wimida, de Dezembro a Marco. Os poaeiros partem em grupos de trés ou quatro, em canoa e permanecem durante varios meses na floresta, por mais profunda e insalubre que seja. Vivem como os seringueiros e, como eles, sujeitos & concurréncia dos produtos das plantactes que progressivamente substituem os produtos de colheita. ‘A extragiio da borracha se faz ainda de duas maneiras. As vezes tira-se 0 leite de uma grande arvore, o “castillo”, que é derrubada para ser sangrada; é 0 trabalho do “cauchero”, que muda constantemente de logar, 4 medida que vai esgotando a floresta; sua zona de exploraco restringe-se as fronteiras da Bolivia com o Brasil. O trabalho do serin- gueiro é diverso, ele tira a borracha das “héveas”, seringas, por meio de cortes que devem ser renovados periodicamente; ele percorre durante toda a época da extracéo, seu estreito caminho florestal, sua estrada, que liga entre si as diversas héveas que ele fiscaliza; nfo é pois um errante, um pesquisador de drvores como o cauchero; ele assegura em plena floresta um certo povoamento sedentério. A floresta é tambem uma zona de caca, mas sobretudo de pequenos animais.’ A variedade de péssaros é extraordinaria e permitiu aos in- dios uma verdadeira civilizagéo da plumagem com enfeites e até mes- mo vestimentas de plumas. se REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAPIA A floresta, © primeiro emprego humano da floresta é um zona de cultura trabalho de colheita. Todavia, ao mesmo tempo, a floresta brasileira adquiriu uma fungdo agri- cola. Enquanto que nas zonas temperadas as arvores foram as grandes inimigas das culturas, na América do Sul foram elas suas principais aliadas; e o trabalho agricola n4o foi durante muito tempo possivel se- no com o auxilio da érvore. As primeiras plantas cultivadas foram extraidas da floresta e continuam adaptadas ao solo florestal: man- dioca, feijao, banana, milho. ..; seu tnico adubo é a cinza das arvores; as culturas tiveram inicio nos bosques. Por outro lado, as zonas de pas- tagem, os campos e pampas, permaneceram dominio reservado & vida de caga e criagdo. Isto explica porque as zonas florestais foram, du- rante longo prazo, mais habitadas do que as zonas de pastagem. O Amazonas mesmo era mais favoravel & vida indigena do que os pampas argentinos. Ainda hoje no Brasil as zonas de Arvores constituem 0 do- minio da agriculture e as de pastagem, o dominio da criagdo. Nas pai- sagens de transi¢&o onde reina o cerrado, floresta mais xeréfila (sumi- cideous forest), 0 homem, por meio de incéndios anuais, fez a arvore re- cuar diante da grama; assim os planaltos do oeste mineiro foram com- pletamente rocados e entregues & criacio. © primeiro ato do cultivador nao é a plantagdo, mas uma der- rubada. Comega-se pela “rogada”, isto é, a limpesa dos arbustos com a foice, o que se dé em Mato, no comego da estago seca; a seguir, deixa- se secar 0 arbusto cortado durante algumas semanas, de modo a cobrir © solo de um leito de plantas bem secas, o “facho”; depois vem a “der- rubada”, que consiste em por abaixo as Arvores sobre o facho; as mais largas e mais duras no so abatidas, ou ficam para dar alguma som- bra ao futuro campo ou entéo corta-se-the a casca nas suas bases, em forma de anel, para impedir a subida da seiva e fazer com que pereca fa 4rvore em alguns anos; segue-se enfim, em Setembro ou Outubro, pouco antes da estagSo chuvosa, a “quelmada”, o incéndio; na zona litoral, a floresta € muito verde e timida para ser queimada no pé, nao hé nesta zona incéndio de floresta sem prévio derrubamento. O pri- meiro utensilio do cultivador é 0 machado do lenhador. Esta cultura ou roga, isto é rogada, 6 némade. A floresta fornece o adubo de seu humus e de sua cinza; as rendas sfio grandes no comego, mas baixam rapidamente e como néo se pratica a adubagdo, pols que néo hé gado, estdbulos e estrume, é necessério abandonar a terra e recomegar noutra parte o trabalho de devastamento. A floresta retorna mais ou menos rapidamente o antigo campo e as culturas vao sendo pouco a pouco abafadas com o crescimento da selva; alguns campos resistem por mais tempo, encontrando-se nas florestas que neles renasce (que se chamam “capoeira” para diferencé-las da mata ou floresta primitiva), bananei- ras, antigamente cultivadas e tornadas selvagens ou mesmo laranjeiras cujo fruto toma o gosto amargo da arvore inculta, assim é que, por transig&o insensivel, se passa do campo & floresta. Os melhores campos de cultura so 0s que sucedem ao ptimeiro devastamento de florestas virgens; as fazendas mais produtivas séo as da zona pioneira. Ins- GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 30 talar uma fazenda é logicamente devastar uma floresta; diz-se tambem “abrir terreno” como na América do Norte, e isto quer dizer destruir as Arvores. As primeiras plantag6es européias instalaram-se na faixa florestal que acompanha a costa, de Pernambuco a Santos, onde se achava a flo- resta mais densa, quasi equatorial. Mais tarde, as vastas plantagdes de café do Estado de Sio Paulo sucederam aos belos massicos florestais que prosperavam sobre as afamadas terras roxas. © reconhecimento da fertilidade do solo é feito frequentemente por meio de érvores testemunhas, Arvores padrées, como a “jangada brava” ou o “pau d’alho”, que séo provas de solo fertil. Quanto mais rica e densa for a floresta, mais préspero seré o cafesal que a substituir. A floresta, A floresta prestou pois ao homem o grande ser- produtora de vico de ceder seu logar, seu solo, seu humus, em combustivel uma utilizacio negativa, sem diwvida, posto que significa uma destruicgéo. Fol muito mais tarde que a floresta prestou o servigo de dar sua madeira. A floresta di ao homem o principal combustivel do Brasil, a madeira e o carvéo de lenha. © emprego intensivo da madeira como combustivel prejudica enorme- mente as reservas florestais; utilizam-se principalmente as florestas e capoeiras; & af que se instalam os acarmpamentos dos lenhadores e dos carvoeiros. © consumo da lenha é extraordinario, posto que ele tem que atender no s6 as necessidades da cosinha doméstica como tambem & maioria das fébricas; o Brasil no possue sendo poucas jazidas de hulha somente no extremo sul do pais. De outra parte, os produtos agricolas necessitam frequentemente de ser secados, 0 que importa tambem no consumo da lenha. Os grfios de café podem, sem dtivida, ser secados ao sol, no terreiro das fa~ zendas, mas isto é um privilégio do Estado de Sao Paulo devido & Iu- minosidade dos invernos; em todas as outras partes e principalmente perto da Bafa, onde as chuvas caem no inverno, & necessério secar café com a fumaga e os fazendeiros fazem provisdes de lenha para os secadores. O mesmo acontece com a mandioca, que deve passar pelo fogo antes de ser reduzida a farinha, afim de retirar o veneno que con- tem. E? preciso 4 ou 6 metros ctibicos de lenha para secar 50 quilogra- mas de farinha e os moinhos de mandioca sio grandes consumidores deste combustivel. No sul do Brasil, sio as folhas do mate que preci- sam ser expostas ao fogo de lenha. As estradas de ferro constituem igualmente grande escoadouro para as capoeiras; nas pequenas linhas do planalto, as locomotivas sfio acom- panhadas de um curioso tender de grades, cheio de lenha, que neces- sita ser constantemente renovado; é panorama cléssico das estagdes de estrada de ferro os montes de Jenha para as caldeiras. No Parand, uti- liza-se o fruto da araucéria, que junto aos depésitos das maquinas, cons- tituem pilhas curiosas exalando forte cheiro de resina; todo o trem fica impregnado deste cheiro forte e acre, espalhado pela locomotiva. © REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA Na zona amazonense, o transporte se faz s6 por meio dos rios. O aprovisionamento em combustivel das caldeiras de navios contribuiu para o povoamento dos vales, as escalas sendo habitadas sobretudo por grande ntimero de lenhadores ao servigo das companhias de navega- 40; os navios de rodas do Amazonas gastam 60 esteres de lenha por hora. Hoje, os navios de petréleo acabaram com esse meio de vida e as familias de lenhadores, que eram uma das carateristicas das margens amazénicas, ficaram arruinadas; seu éxodo aumentou ainda mais 0 des- povoamento que sofrem estas regides florestais, desde concurréncia da dorracha de plantio. Este nefasto emprego da floresta para combustivel, que contribue para a degradag&o rapida dos massigos, est4 felizmente diminuindo; enormes instalagdes hidro-elétricas permitem empreender uma larga eletrificagao das estradas de ferro e até a utilizagéo da energia termo- elétrica para as necessidades domésticas. Jé 6 tempo de a floresta brasi- Jeira nao suportar sozinha o encargo dos fornecimentos de forga motriz, tanto mais que a indistria, rapidamente progressiva, reclama cada vez mais o concurso da floresta. As madeiras A floresta deve ter um emprégo mais nobre do que o preciosas _de ser queimada, ela parece destinada essencialmen- te a fornecer esta maravilhosa matéria lenhosa, a madeira, o “material” como dizem os brasileiros. Afigura-se-nos que 0 principal emprego desta floresta brasileira, rica em esséncias preciosas, deva ser a producéo de madeiras de construgdo. E’, pois, surpresa ver © horizonte pequeno que representa o trabalho da madeira. A floresta pouco serviu 4 habitacio do homem; a casa de madeira, com troncos de Arvores empilhados horizontalmente, como existiu na América do Norte e na Europa Central, é quasi desconhecida no Brasil, exeeto no Parané e Rio Grande do Sul, onde os colonos alemées, poloneses e russos a in- troduziram recentemente, empregando os troncos retilineos das arau- cérias. A unica 4rvore que serviu muito para a construgao fol o palmito, 4rvore providencial para o pioneiro, que serve ao mesmo tempo para seu alimento e sua morada. O palmito fol empregado néo s6 para levantar as paredes em troncos verticais,'mas as vezes tambem para fazer os tetos, em que os troncos cortados ao melo servem de telhas (canal). As primeiras casas de colonos so frequentemente construidas de palmito. Nas novas cidades da zona pioneira, por vezes proibe-se a construgdo com palmito, nas ruas mais frequentadas, para mostrar que j no se est numa fase tao inicial. A casa brasileira do campo usou muito mais a folhagem, ramos, palhas e mais ainda a terra, que os troncos de arvores. 86 hoje em dia, com a multiplicacéo das serrarias, aparece no Parané, e Santa Catarina a casa de troncos de araucaria. s indios antigos e mais tarde os portugueses nao conheciam a téc- ‘nica do trabalho de madeira, Portugal é um pais de casas de pedra. GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL a ‘A madeira das florestas brasileiras era muitas vezes uma espécie dura que exigia utensilios aperfeigoados; eram boas demais, si assim podemos dizer. Os portugueses, porem, quando chegaram ao Brasil, chocados com a exuberancia da floresta costeira, utilizaram sua nova possesséio primei- ramente para construgdes navais, como fizeram os colonos’ ingleses 20 longo da costa dos Estados Unidos; a primeira fungio do Brasil foi pres- tar servigos & frota. A América inteira, ao Norte como ao Sul, serviu pois como comple- mentos florestais da Europa j4 desprevenida de madeiras, que chegas- sem para prover as necessidades dos navios, tao reclamadas pelo adven- to da era dos grandes descobrimentos. Uma Arvore grande e solida, 6tima madeira para mastros, o “pau @arco”, abundante na costa do Nordeste, ficou reservada pata a real marinha de Portugal; uma ex- ploragio abusiva fez com que ele desaparecesse quasi por completo; mais tarde, 0 governo tentou tornar patrimoniais as florestas ribeiri- nhas. Hoje, quasi que nao hé construgao naval. No Brasil a marinha nao é mais sécia da floresta, mas sim, da metalurgia. O trabalho de madeira hoje em dia se orienta para outras 4rvores de madeira colorida e muito duras, cujo preparo era antes dificil pela precariedade do machado. Infelizmente, a exploragao dessas espécies raras é muito complexa; a riqueza botanica da floresta brasileira é uma pobreza econémica; as arvores utilizaveis se distanciam muito umas das outras; calcula-se, por exemplo, que existem em média 3 a 4 “pero- bas” por alqueire (2 hectares e meio); é necessrio um verdadeiro traba~ Iho de pesquisa, andlogo aquele do mineiro, para descobri-las; os cortes se fazem, no por grupos, mas por pés isolados. Cada arvore exige um ca- minho especial na floresta e a conducio pelo rio no é possivel para essas madeiras pesadas, sendo com a ajuda de uma jangada de madeira leve formando um suporte. Procede-se assim na floresta a uma espécie de colheita de madeiras preciosas; as florestas desprovidas de seus me- Thores elementos so pouco a pouco entregues as espécies de menor valor, Tal método causou o rapido desaparecimento das arvores mais preciosas; as madeiras rosas, as paliscandas, sfio raras e caras. © comércio de madeiras voltou-se para outras espécies que apresen- tam 6timas qualidades: — peroba, imbuia, jacarandé e sobretudo a araucdria (pinho do Parana). Uma nova marcenaria desenvolve-se ra- pidamente no Brasil. Nao sé o pais abastece-se a si mesmo de moveis, mas comega a exportar; a beleza do material e 0 prego accessivel da mio de obra abre & induistria brasileira de moveis belissimas perspectivas. Todavia, esta exportagio nascente esta longe de compensar uma grande importagdo de madeira; tao paradoxal como possa parecer, 0 Brasil, talvez o pais que possue mais florestas no mundo, é um grande importador de madeira: madeira branca do Baltico, pasta de madeira para papel, madeiras para tonéis. Compreender-se-4, pois, que 0 Brasil cogite no problema do reflo- restamento. a REVISTA BRASILEIRA DE GHOGRAFIA ‘Nas escarpas ingremes, quando 0 solo 6 leve e arenoso (decompost- cao dos filitos), as derrubadas provocaram erosées recentes, entalhes j4 profundos, chamadas “bossorocas”; elas serviram para abrir ora es- cavagbes mineiras, ora fossas cavadas para tragar limites de fazendas, ora picadas, pistas ou caminhos; muitas vezes, foi a méio do homem que abriu as primeirs feridas, rapidamente desenvolvidas pela eroséo. Em consequéncia disso, os cursos de égua mais carregados de aluvides so mais instaveis; 0 seu delta se levanta, sofrendo com isso a navegacao e tambem a seguranca dos ribeirinhos. E’ 0 caso, por exemplo, no baixo Paraiba, na planicie de Campos. E indispensavel reflorestar. Que espécie escolher para constituir estes novos povoamentos? Adotou-se uma espécie exética, o eucalipto, originério da Australia; esta arvore tem a vantagem de crescer rapida- mente; séio necessdrios 8 a 10 anos para se ter uma, 4rvore; alem do mais, ela fornece u’a madeira que substitue as importadas do Baltico para vigas de caminho de ferro e talvez para a pasta para papel. ‘A Companhia da Estrada de Ferro Paulista fez enormes planta- gées, mais de 10.000.000 de pés; muitos fazendeiros imitaram este exemplo; 0 eucalipto torna-se uma das 4rvores t{picas das paisagens brasileiras. Todo o esforgo reflorestal concentrou-se nesta Arvore e tal- ‘vez venha isto prejudicar o progresso de um verdadeiro reflorestamen- to brasileiro. O eucalipto é de fato uma Arvore de grandes vantagens, mas ele nao dé humus ao solo e por outro lado seu pau nao tem senfio um valor relativo. O Brasil deve preocupar-se em conservar a varie- dade e a beleza de suas espécies. Isto exige, antes de mais nada, uma politica de reservas florestais; & necessario criar parques nacionais. Alguns j4 foram organizados nos arredores das grandes cidades, como a Tijuca, nas montanhas que do- minam 0 Rio; Sdéo Paulo reservou dois grandes parques com bacia de abastecimento para suas Aguas potaveis, o parque da Cantareira e o de Campina Grande; na Serra do Mar paulista, um parque com 4rvores cheias de epifitos e orquideas foi delimitado e cobre 30.000 hectares. Um outro parque esté em vias de ser instalado ao redor de uma das mais altas montanhas do Brasil, o Itatiaia. © Brasil se prepara para seguir o exemplo dado pelos Estados Uni- des na protecdo das reservas vegetais naturais. RESUME — RESUMEN — RIASSUNTO — SUMMARY — ZUSAMMENFASSUNG — RESUMO Ceci eat le premier chapitre de la monographie sur le gtographic humaine du Brésil, laborée par le géo- raphe bien conn’ P. DetVontaines quy-en ea qualité de Protesseur de Universite de Sao Paulo ety deratrement Ee Cale de Kio de’ Janeiro, ert depuis plosicurs années au Brea “Lettre deco chaptre'"Les Elements dela Nature et i ute des hommes” dénonce Vimportance des sujet ‘Ensuite Auteur fait une cbauche de Vhiatoire du sol brésiten, dane laquelle il accepte la théori at die atte de Wegener, conidérant i trite du Brea’ comme une pare etachee de Vactuel continent fica St disloquee vere Fouest; i eouligne Vimportance den anciens terrains cryatallinn,gnelo, granit,echistes sul occupnt lus un ee de ayer du Breall dnkingte on plu aie Gur fe pa wet muiuens omer S'iavers les compe geologiquee, don Timporeance exeeptioncle des phénoméasa d'trosion et de décompentt GROGRAFIA HUMANA DO BRASIL 6 latingue encore la partic orientale du paye—dans la bordure marine—constituée de massfe de roches plus fanciennes, cry‘tallins, fortement plistes, de la partic occidentale-~plus tabulaire—formée de plateaux dane Iequele le formations abdimentaives dominent. ‘Romuite, cet le relief cut paye qui est ctudig, et Uauteur trouve que le relief beéalien eet exsentillemeat 448 aux falley'2t 2 Vérosion; fa'chaine'de montagnce--Seren do Aéar—qui #6tend plus de 3.000 idlometres at {ong de la cote, PAuteur ia considere comme le produit d'une fale, qut se rapporte aa dachement de TAmé- fate du Sad de Afrique, ef; en ta forme, Pauteur gusifie Ia chalnc de “montages deme-montagae™ comme la ‘Montagne de la Table en’ Afrique du Sud ou tos Cévennes en France, montagnes ayant une seale excarpe, pat ‘ou Ton gncne le platens interiour du pay: quant & erosion, que TAGtour conmidtre trea importante parce Que cteritore bresllen s'est mainten, en général Emerge elle « provogue des formes de tele! particlleren, come Ice “paing de aucre” dane lea rochea erystallines er dane ee gueiee de porphyre, élévations prononcéea, fracicurer, occurrentes dans les pays chauds et humides: comme les mametons (detis-oranges), forces agrou ‘Bes Gul ceassmblent © des calotten spherquer, qui paris 'amembient om grand nombre, formant de verieables elapot forts cela, Auteur Gtudie attitude de homme ea rapport ave Ja montagne ef il examine tes diverse fonctions que in montagne exerce aus HrGal: 2) la montagoe berérs, offrant une cocarpe qi aficute Paccia Gr Tinterisur du pays, commie oan tc cas cea chaines de moatagnes Serra do Mer et Hantiqueita, et FAnteur Sbacrve fe fait simgulitr que im aifficutte daceds est en uénéral plutbe duc A le force quau eohef, daveane ‘gue ics premicren punéirations ont été reusses, nou pat fea passages ios plus bes mais par cous oa lea forts Ctatent ‘loins howtles; by la montagne minige, in mingration ayant éts le premier moti de ia coiontation curopseane ‘See montagnes, surtout can Etat de Minas Gerais, ©) la meategne a paturages, dont le fonction eat, on St ‘hela, tia importante, mais oy au Brévil n'a qune iafluence relatvement insgnifiante! —d) Im montane, Pusldence d'éts, grace & la proximite des montagnes des grandes viles du littoral des ports maritimes importants! 6) ia montagne Undustriele, surtout cele pourvue d'mstallations hydrcsieetriaes, le potentel énergie que les fautes mootagae emmagarineat dans une’ sone ov la Pluvioute est tellement prononeée étant vraiment Femare rinbie. eb gaulte, en étudient le climat brésilien, UAuteur fat fe distinction entce quatre zones climatolog!ques principales: Ia vaste sone Equtoriie, la one sem-aride du Nordet, le zone cu littoral, la sone centrale: quant Rratdtuce humaine, PAuteur considére le Brésl tin des plus grandisaen exerples de ia Tatte de Yhomme conere Iecluat, surtout dans Ia sone du Nerden, ou, contrastant avec le cimat host, le peuplement et Fun dee plus Season di pay 1 Ateur examine fe réseau hydrouraphique bréilen qu'il Juge un des plus complets du monde et i fit, ceortis Tmportante fonction des sivieres dans la pénétration du paye, remarquant encore que fe continent [Smérieain aprés PBurope, a ct celui ou les blanca ont Te plus tapkiement acteint lea régions centrales, ‘onuite t Auteur etude ia cote brésilenne, dstinguant les types ce itoral, celul du Nord, avec ses terraing smaréeageus, celal du Nordest, avec sea recs, celui de 1st, aver acy petites falsises, appellees “bartieres",eelut {du Sud, o0 ia mer est en contact aves la montagne; et, quast aux agisements de Phomme, VAuteur fait reiaortir le fait important que le Brésll~malgré ou grande mane contiaeniale vert un paye exscatellement marie, If plus grande partie de la population bréaieane tant concentrée dans la ceinture du itor En végéeation ext chute Vobjet d'interemanten conidtrationa, dane lesguclles 1 Auteur étudie 1a forét ‘edeiicnne en ses diferentes fonctions’ a) le fort, comme tone de récolte,offrant, moyennant une simple ex- faction, les fruits pour Talimentation, le bois pour ia construction, le produits médicinau ct tant d'autres Byiin free, sone de'culture, exerpant dana le paya une fonction agricole prenoncte, puisque, en general, 'etabt Sement dea eultare agricol ve farce le fore, qui dieparatt, cedant sa place au champs fertile: c) laforét Droductrice de comburtible eet tne importante fonction pour fe paye gui he posrede pan de reserves de cherbon ‘hondant etde benae qualité; non plus que de neppes de petrole. Accra Tin premier chanire deta monouraphe em commentant eft ureus gue Je Be un paye avorisé par d'aussi abondantes réserves forestale, n'a pas géntralsé Tusage dey habitations de bot, ct le fait ‘lus cureus encore, que le Eréailimporte encore du bot de Itanger, ct termige ea intent A une politique Se teboisement d'espeses appropriges et Warr. Es exte el primer capitulo de Ia monoerafia respecto A la geosrafia humana del Brasil, elaborada por el conocido geogeafo'P, Deffontaines que, ea su calidad de Profesor ds la Universidad de Sao Paul ¥, icaaracnte Gein de Rio de Janeiro, ve encuentra hace varica aces en Sra TE Bitulo de este capitulo "Los elementos de la Naturalesa 9 la lucha de los hombres" denuncia la impor. tancia de los arunton que en elo som nbordados: ¥, resimente, el Auter, mostrando las caractersticas principales Ge in Naturalera brasicna y lau consecuonten aticadea del hombre, su habitente, empieza de tuna manera bien SSpcopinda aa trabajo ecbre la geografia humana, asunto en el cual eo universsimente reconocido como una grande ssuterida. i autor cmpiees por senor In imesnded del tevtctia bresitno cl cual sostituyeno un conjunto ‘er menester establecer una csvala do dimensionct adecaade para In consideracon de up clementor em goveral Setados de imenans dimensiones ‘Ea sequide ef Autor dace tn bosquete de fe historia del ouelo Urasleno, en el eval sexs fa diccutida teeeia ‘de Wegener, conaiderando ei srritorio dei Brasil como una parte ceveacerin Sel aetual cont oente aireano ¥ cer locada para’ some: el pons tambien de selave on tmportancla de jos aavigeos tetrenos Cacalnos, Ean, AAO, thintor 7 otzea que ocupen mas de un twreio co's auper ce del 2yanil~ cceatua za‘a el hacag due el pals, ae a amtenide conesto A craves de iss eras eclonicns, de dande relates, in hapetimnela excepeional de toe fences Sc eronon y de decomposiisn; distingds la parte oriental del ar‘, on ‘a Her Jura mating, eamstigica de ‘nacleos de roees mia aatiuesy faurtemente pisadas,—de ia parte cevidears, mis tabuler, — formacs de tesas donee ‘Somiaam lag formaciones wedimentarce Bi clove del pals eg cn eeuusen ciiado, haiendo ef Autor que et rieve brsileno e9eeanclatmente dex jt a len raen 9 i rot Sher de Mat sue me ectonde gor mv 3.92 fem ioer de Ct, 15 Autor ia comidera ei producto de une sa) folselonnda som el dsvtacanaiento de in Arseriea dal Gut da ¥en ta forma, el Autsrelasfiea Ia Sierra ce “media montana” oom ia Montana de la Alesa em Avion del Sa ‘tide is Cevenat en Francia, montanas com una eesuga par adoals 22 xcunve el planalte interior Gal past em {cuanto 8 ie erent, que el Autor fur importantisima -popque el teviorio Praslend ee ha mantenito ea general ‘Seton, provocundo fornia de relieve pecutiares, como Woe "Danes de skisar’ ca Ine fuces crvtalinas 9 guetee do ‘porfre, Gevaciones agudas ¥ gracioaaa ocorrientes en ice climas callentea ¥ humidos, y coaro ius mnediay-aarane Jan", formar redondeadas pareciine com calotes sferics” que por vYecer se juntan ef grange numero formando Yerdaderae ondulncon ‘Derpute cl Autor pase a cetudiar la atitud del hombre en relaciéa A la montana y examine las diversas fanciones ue ia montana ejerce en Brasil") la rontana berrera, lrecienda una esonrpa que dfculta cl acceso Gel interior del pela, como ea los casoa de Ino Sierras del Mar y Mantique'ry y el Autor observa la singularidad ‘Que In diftcldad de’acceso en, en peneral, mas veces debida A la flerenta que’ al releve, tanto asi que las prmeras enetraciones fueron eches, 6 por los pasajes mis baler, peré, por aquellos donde In’ Horesta era” menos hottl Byis'montane miners, hablendo la mineracion construido el rrimero. mative de ia coloneacion europen de int ontanas, sobretado cn et Estado de Minas Gerais: c) la montana pastor, cuya Suncion es em gencral Ty importante, pet, que eo Brasil ea de unm importencia relativemente diminuta; d) la montena, reaidencia Je vveranco, en rasta de ln proximidad de lan montenaa con las grandes ciudad del literal coa fou Pueitos maricimos Importantes; e). ia montana ingurtrial, sobretodo ia con instalaciin hidro-lectrea, sendo notable ef potencial ddevcnergia que lat altas montanes almacenan ea una tona donde la pluvionded es tan pronunciada, “ REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA Ea seguida et clima brasileno ea estutiado, y el Autor diatingue 4 zones climaticas principales : la vaste zona ecustoral, la 20na eemiari¢a del Nordest, In son del Wtoral, Ia sona central; ea coanto A la atitua Hur ane, cl Autor considera el Brasil tno de for més grandiovos elempioe de ia hicha de! hombre contra el cima, sobretodo en Ia sons del Nordeste, dande, en contraste con el clans host, la poblacion es de les mas densas del Pais. EI Autor examina el sistema hidrografico brasilene, que considera uno de los més completos del mundo ¥ accents ln importante funeién de loerioe a la penetraciGa del pais, endo que observa que e continents ame Ficano, despues de la Duropa, ea aque! donde toe blancos han mike tapidaments atinjide las regones contzales, ‘Después el Autor eatudia Ia euetta beasllens, distinguiendo los tipos de Uitoral, el del Norte, con au ter~ enon lagumerot, el del Nordeste Con tus arrecife, el el Hate, con vua pequents eras caearpadas lamadas "bar ‘eras", el del Sur donde el mer es en contacto con la montana; ¥, ea cuanto & la actaactoa del hombre, ef AUtOr detach hecho ionortante que, ravi, pent de eu qrande Sau cotnentl, cy tn Pale conics oat ino, ballandowe la mayor parte de la pepilacién brasiicas concentrada en Ia faja'Gel itor. ‘La veretaciSa en, denpuls, objeto de interessantes consideraciones en las cuales el Autor eatudia la flo- sexta brasiloaa en suo diferentes funciones * a) la fleresta como sone de covctha, olretiendo, mediante simples ‘cetracetn, el frato para In simentaciGo, In madera para la constrscin, low productos modicinales tantos toe 1) a floresta, soma de cultura, cjerciendo ea el pals una funcion agrictla pronancade, pate, en general, ek cata Dlecizntento dé ia cultura agricola be hace grecias 8 la floresta que deasparece, dejando su lager & cempos fertles, ‘in seve, productora de combustible estuna importants funcion para el pals que no posse reeervas de carbon thundante'y de buena calidad, ai ten poco yacusientos de: petiole. El Autor termina el primer eapitulo de ou monogralia comentando el hecho curioso que el Brasil, un pats dotado de tin abiundantes reservas floresteles, né ba generelizedo el uso de habitactones de madera, cl hecho tambien muy curioso que c! Brasil todavia importa madera del Rxtranjer, ¥ termina coneitands & una polities de reflorentamicnte de expeciee spropiadas yvariadas Questo € il primo cxpitolo della monografia gulla geografia umana del Brasile, elaborata dal conosciuto areourale B. Deffontaines cher nell sua qualtes di Profewsore deT Universita €i Sto Paolo ed ultimamente deli Unt Neraita oi Rio de Janeiro, si tora, da parecchi ani, ia Brasil 1 ttolo di questo capitolo “Gil elementi dela Natura ¢ la lotta de denuncia Vimportansa det soggetti che ei 2000 abordati e, veramente, I Avtore, mostrando ie carscterstiche principals delle Natura bra- Shana e le conequents attizadini delfuomo, suo abitante, iacomincla di una manicra molto appropriata il ‘ivoro di geografia umana, onde € universaimente conoscluto coms grande autorit izuere Timmemsité dol teritorio brasiliano che, costituendo un'assemie ‘Dopo ’Autore {4 una bossa della etoria del quolo brasilano, dove accetta ta discones teoria di Wegener conaiderando il verritario det Brass come uaa parte stacatta del attuale contincnte africano e dalocata per Vor ‘ete; distacea Limportanza det terrent crisalint antichy qociat granito, achisto ed altri, che oecupaae BiG di tun terzo de in euperfee del Branly onserva i fatto del Daese averal mantemuto tmerso a traverao fe ore geolo- ‘ice, da dove rnulta Vnportansa coceesonale dei fenoment i eronone e di decomporisions; distingue ia parte Srieniale del pace, nel'orlo marino, cowtiaita ca maanicie di rossie pis antiche, cristalline, fortemente “planes Sella parte oteidentale, pid tavolata, formata di planare dove domisana le formariont sedimentart, Tirllievo del pact, é poi studiato, trovando 'Autore cho i ilievo brasiltano 8 emencialmente dovuto alle fall ede Teronionc: la logaia Serra do’ Marche sf etende per piG di3.000 kan. al longo dca conta, ’Autore Ia Gtncifecs couse peodotterah una fail relaronstn sol stacceracnts de tAmerice dal Bud delvAticn, ovis sus Forma, PAutore clanoice in giogaia di “'mezonmontagne” come Ia Montagna defle Tavola, ia Africa del Sud 6'e Covenne, in Prancia, montagne che hanao solo ns scarpa pet dove si arrive all aleiprane interiore del paca, sutetssfcowone, he Autoe cones speraninna erent tritio eaniane we mantenat eeray Srovocande forme & ilevo partcolar, come "pani ai xiczhero” nelle roccie cristalline, nein di porfido,e ‘aston! aesentuate acute ¢ gration, cb occorrono nel limi caldied umnidi, ¢ come le “mesre-arancie’ forme ‘otondate, omigliaat al calotlsfril che tava w aggiungono in grandentmero formando vere ondulanont. 1a sequito VAutore studia Vatsitudine dell'uomo in relazione alla montagna ed eaamina le diverse func soni che fx montagne opera in Brasile: a)” ie montagne tarrcra,ia quale fire uns acarpa che toraa difficile acceso deifinteriore del paese, come nei casi delle giogaie del Mare ¢ Mantiqueira, © Fr Autore ooverva In sin- folarith cho ln difficol d'ecceneo 6, ia generale, od volte dovuta lla for {prime penctrasione furono fati non pet | panon! pie batei,paré per qui a). in moatagna residenra de tate, in wrt della pronsinita delle montagne alle grande ctta del httorale, dei porti maritimt importants ©) ta frontagna industriae, soprattatto quelia Cos inetallarione droslettrea, excendo notablle # potenniale di ener the le site montagne accumulano in una zona dove ia pluvicelta & tanto accentuate, Poi € studiato il lima brasiliano, 'Autore diatingue quattro zone climatologiche principale ‘zona equatoriale, Ia sons vemarida det Nordeste, in zona del ittorele, la ona centrale; quanto all ‘mane, "Autore’ considera il Brasle uno dei pid grandiost esompl della lotta delltuam> contra il clime ‘to Hella zona del nondeste, dove, contrastando Gol cima oatile, i popolamento € del pie densi ne ‘Autore esaming il sateme \drogretico brasliano, che considera uno dei pi§ completi del mondo ed tua Vimportante funsione dei funn! nella penetrazione del pacse, ed onserva che il continents amerieano, dope {iT Bvropay € quello dove gli uomini bianchi hanno il pil rapidamente practrato elle regioal ceatrall Dopo WAutore studia le costa brasilian, dstinguendo i tpi di littorale, quelio nel Norte coi sul terreni selmosi, quel del Nordeste, col suoi tmuchi di seogl, quel delle, col uot plccole scosces Chiamate“bar~ Fire" que del Sud dove il mare al trove in contatto colla montayas:” 6, quaato allattivith dell'womo, Tautore ‘istacca il fatto importante che i Brasil a dspetto di ua grande masse continentale, € un pacse exsencialmente ‘marino, tovundos! la meggiore parte della popolatione brasiiana concentrata nella fascial del Lttorale, ‘La vegetasione poi _cggetto (interessant considerazion, nelle quule Aurore sudia la foreste brasiiana salient usta: 2) te foerta come mona sca, oven megiante smoiceetrasione,rutto Per Talinentasion, i lego per la conracioae, | prodoe madielalle twat aly; 6) ta fore aona di coltura, Speranda' nel pace une funziong agricole prohuncints, poich i general io stablimento di una colt trans lls fortots che aparice, scene suo porto e capi rt’) Toren produttrice di combuvitile € {Sne importante funsione per if pacse che aon ha reserve di carbone, aeppure glacimeat! dl potralio. ‘Lrautore termina il primo capitulo della aaa monozrafia commontando il fatto carioso che il Brasle, tun pacse favorito di cout abondaati reserve forestall non ha ganvralizzazo Taio di abitariont di legao, « quello, [Pd coriowo ancora, che il Brasle importa ancora legao dello Stranlero, © terinina concitando aa una politica i Riteestamento delle specie appropriate © variates GEOGRAFIA HUMANA DO BRASIL 65 “Thin the first chapter ofthe Monography on the Human Geography of Brazil, writen by the well knowa ‘copraphier P. Deffontsines, who han been staying for meay Years tn Braal, an Profesor of S. Paulo Univer Styrand lately of the University of Rio de Jancro. "The oti of this chapter, "Nature's elements and the battle of man”, betrays the importance ofthe matter therein dealt with; and the author, by pointing oat the chiel characteristics of the picture of Bresilan nature, fand the consequent attitudes of fs inhabltantaen —y does Very appropriately begia his Worley ia which he i ‘Gnivermally secopnized as a great. authority "The author starts by calling attention £0 the immensity of Brazil's territory, which being a single and contiquows whole, with a0 uninhabitable regions ~~ represents am enormous potential of space, wherem there ‘ust be eetablshed an adequate seale of waiues for the consideration of its clementay all of which have, aaa rule, enormous dimensions. "The author writes an outline of the history of the soil of Brazil, whercin he endorees the disputed theory. of Wegenec, and considers the territory of Brazil a broken off piece of the present Alcan continent, displaced Srestwards he emphasises the importance of the ancient crystalline ells, gncias, granite, schists chd other, Decupying more than one thd of the surface of Breall; he points out the fact that the country hap remained emerged throughout geological cras, which accounts for the exceptional importance of eroion and decompes ‘Som phenomena he dicriminater between the eastern part of the country, slong the maritime berder — made ‘up of masses of older, crystalline end heavily creased focks ~~ and the weetern part, more tabular in shape, for~ ied by the tablelands where dominate sedimentary formations. "rhe relief of the country 18 next studied, and the author beliaves the relief of Brazil to be due, esvntialy, faults and erosion: ‘the Serta do Mar (chain of mountains) — which extends for more then 3.000 Kem. along {The coast “the author considera the product of «fault — due to the displacement of Sout America from Africa — fndy an tegarda its form, the author classifies the Serraay a*"half mountals", such ay Table Mountain ta South Afsca or the Ceverucnin France, that fx, a mountain with a single slope, up which one teaches the interior huh finde of the country: aa regards ercelon — which the author considers very impertant, becguse the territory ‘of Brasil remained emerged, as a rule it gave re to particular forms of falc, auch as the "auger loaves" ef Eryataline rocky, porniyrous gueise ~ sharply propousted and chariniag elevations which ecctr in warm and ‘Humid climates "and such ga the “half oranges", rounded forme, similar to spherical wisfacee, which ame {Emes occur together in great nomabers, forming veritable undulations. "The author deals next with the attitude of man towerd the mountain, and examines the various functions ‘which the mountain performs in Brasil a) the mountain as. barfet, presenting « slope which renders ditt ult the soonest the heart of the country’"~ as ie the cae with the Servar do Mar and Mantiquetra =, and the Suthor points out the singularity of the difficulty of cee being, aa rule, due more to the forest thar ta rele ‘wherefore the first penetrations occurred through the passes where the forest vegetation was ley hostile, and Bot through the lower passes, £) the mountain ay mine, mining having constituted the first motive for Euro ean coloaication of the meuntaine, specially in the State of Minas Gerais; o) the mountain av a pastureround, {his Function of the mountain ~- very important ae a Tale —y having but a relatively slight importance ta Branly {) ‘the mountain as a summer residence, due to the provimity of the mountain ranges to the large coastal cites find impertant seaports; e) the mountain from the fodustrial standpoint, specially whiea equipped with hydro- Stecric pants, the potesial of energy, stored up by the high mountains, being remarkable i's zone of such high ‘The Braziian climate ip next studied, there being, according to the euthor, four chief climatic zones, the large equatorial zone, che wem-arid-north-eestern cone, the coastal zone, the central tone; as regardn the at ‘tude of man, the author considers Brasil one of the mott wonderful examples of the battle of man with climate, specully [nthe north-eastern sone, where contraving with the howl cinate ~ population i one ofthe den “ane author exemines the hydrographic network of Brasil, which he esteem one of the most complete in the world, and emphasized the important function of rivers in the penetration of the couatey, pointing out the fact that the Americ-n continent was where, after Europe, the whites Fist attained the central portions, ‘The author studies next the brasil couat, dieceminating the coestal types, the aorthern, with ite mac ‘aes, the dortvenntern, with it rets, the eastern, with ie small iffa~~ called “barmare™"y the southern ‘Where the fer contacts the mountain: “aad —~reparding the action of man — the author calle attention to the important fect that Brasil 'an cweentially maritime country, notwithstanding her great continental Toast, Ce major pert of the Brazilian population being concentrated ‘along. the coastal finge. ‘he veectation is next the matter for interesting considerations, wherein the nurhor studies the Brazilian foreat in its various functions: a) the forest aa « crop sone, tendering to man —~ by’ simple extraction — [Fait {fer his nourishment, Umber for building purpoars, medicinal products ad many others 2) the forest an a tillage zone, exercising pronounced agricultural function ia the country, becaue the extablahment of huibandry 19 etfected at the expense of the forest, which disappears to give place to the fertile field; «) the forest as a fuel Droducer, ths being an important function in a country unprovided With reserves of good and abundant coal, or with ll depen fi the author closes the firet chapter of hia monograph, by commenting on the curious fact that Brazil — country so rich fa abundant forest reserves —haa net generalized Une ure of Gmnber dwellings, as well as. on the ‘ho less curious fact that Braet! sil importa foreign timber, and conclades by ealing for a policy of reforestation, with appropriate and. varied specie ics ist das erste Kapitel der Monographie ucber Voelkergeographie Brasiliens, welche von dem bean: ten Geographen P. Deffontaines ausgearbertct, wurde, der sich sls Professor der Universitaet Sa0 Paulo und ‘uletst els solcher an der Universitact in Rig de Janeiro menrere Jahre ia Brasilien aufnicie ‘Der Titel dee vorliegenden, Kapitels “Die Elemente der Natur und der Kampf des Menschen” zeigt die Bedeutung der darin chandelten Fragen auf; tnd tatsacchlich fuchst der Autor in ueberaus geochiciter Wea. a'r dle Hauptnerdsnaie ee Crailasiecon Notas ed dan dude Setmane Veale eet ‘edie Hin “Ser brasilaniachon Natur and dat dadurch bedingts Verhalten des ica, ele cher in ibr wohne. heravertlit muna ‘Der Verlasser beslnnt damit, die unerhoerte Ausdehnung des bruslanischen Bodens hervorsubebens welcher dadusch dase er sich aus cincr ip nich geachlowenen Einheit sueammensetst und keine unbewosabares Gegenden aufweist, einen in seinen Wirkungea unbegrensten Raum darvtele, wobel ea sich als notwendig:er- welst, cine angemeniene Rintelluay nach Gesichtspunirica bei der Betrachesng weiner Blemente en sigemeines Yorrunchimen, ‘da diere ihrerseite echon von ungsheurer. Ausdehung sind: ‘Danach ‘gibt der Verfaser einen Ucberblick usber die gescuichtiche Entwicklung des brasianiachen Bodens, wobel er sich dic vieleroerterte Wegener'sche ‘Theorie 2u eigen mackt, agch der das Gebict Brasilien als in abgetrennter und nach Westen verechobeacr ‘Teil des heutigen africanischea Xontinenta ru betachten int; “er hebt die Bedeutung der alten kistallinen, gnels, granie, achicleraltigen und andere Gebiete hervor, Weiche mehr als ein Dritte! der Obesflacche Brasilien musroachen; er unterstseit die Tatsacne, dees das Lend wachrend der geologischen Zeitalter nicht vom Meare ucberspueit wurde, woraus die ueneragende Bedeuting cr Erovions: und Verwittcrangaerecheinangen abrulciten ister unterscheidet den Osten den Landen, acage ddes Meera, wolcher sich aus hristellinen, stark gesliederten Felamamsiven aciterer Herknit_gusermmensets, ‘er elat Wwetichen, mehr tafelfoermizen Toth der aus Ebench beste, bel welchen de Sedimentacriorna: Daran schlleet sich das Stusium des Reliefs des Landes, wobel der Verfamser feststellt, dats sich bei Bildung dew brasiizlachen Relief vorwiegend um Zeriuettungs- ond. Brosionserecheinangen hemiele, Dic ‘Serra do Mar, welche sich weber 3000 kein. laengs der Kueste hinsicht, Betrachtet der Verlasser als Eigibracher kebiet, des bel der Losioesung Suedameriins vom Aika entetand tnd day vos Verfasser wegen seiner Ferm alo 6s REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA Hathgebirze"* (mein montanha),achnlich wie das Tafelgebirge in Afrika oder die Cevennen in Frankreich, geeprochen wind, ala einem Gebiege mit nur einer Abd sic Hocicbene dor Hane den Lan Eiren ‘Avoenng nimmt: die Erovonewirkungen betrachtet det Verfasser ala aumerordeatiich wichtgy da das ‘Braslianische Geblet durchwveg von Usherspuclungen tnberuehrt bileb, und Jene eigentuemlishen Aufbsuformen fercitige wurden, wie die''Zacleerhuete™ der krittallinen und der Gneis-Porphyr-fermationen, Echebuagen von (fer und grasiceser Form, dle den hlnsen und feuchten Klimaten eigen sind, ferber wie ie “helbes Apfelaiaen”, rundliche Formen, die mit Kugelschnitten verglichen worden Yeoeanen ad hie Und Gs durch le grome Zahl einer hewegven See (Clapots) aehneln im folgenden atadiert der Verfatecr das Verhalten des Menschen im Hinblick auf daa Gebirge und unt- cersucht die verschiedenen Funktionen, welche das Gebusge to Bratlien ueberaimmt : a) des Wallgebirge, da, ‘Ginen den Bintitt Soe Tonere des Landes erchwerenden Kamm aufwetst, wie dies bei der Serra do Mar und er Serra da Mantigueira der Fall lal, wobe! der Verfaaser auf die Higentucmichicet Nawelat, daon die Schwirig- Kcit des Aufutefes gewoehnlich mehr dem Walde als dec Bodenbiideng sumuschreiben it, 20 daay auch die ersten Eineuege ins fanere nicht ueber die niedrigaten Paease sondern an sclthen Stellen statanden, wo der Weld am ‘Weniesicn Widerstand leistete:®)_ daa Mlinenaer Gebirgaiand, wo der Bergbau den ersten Anlasn sur Each Sooty der Mincnaer Gebisge gab, hauptanechlich tm Staate Minas Geruest «) das Gebirge mt Weidetrfeen, Sine Higonschaft, die soant seb wichtg nt, in Brasilen jedoch von untergeordneter Bedeutung ist; d) das Ge- Ging als Sommerfrsche, danke Jer geriqzen Entfernung swiochon den Gebirgen und den wichtigen Soshacfem, ten gromen Staciten aa der Kueste, s) das focr die Industrie wichtige Gebirge, vor allem, mit den die Wac- fscrirnefee aaawertenden Binricheungen, wobel die gelieferte Energiemenge, welcke dle hohea Geblege Ia eines So nlederechlagercichen Gebiet aufypeichern, ‘bemerkeaswert iat. im Anschluss daran Wird das Klima rasiiens untersucht, hierbel unterecheidet der Verfaser 4 haup- tavacliche Hlimate’ dav der aurgedchnten Aequatorialzoae, der balbtrockenen Zone des Nordostens, der Hues tenvone Und des Zentralgebicter: ism Hinhiicle auf das Verhalten des Menschen sicht dor Veriaweer Brasilien tis ener der Masterbelsplle des Kempfes des Menschen gegen das Kita an, vor aller im Nerdoaten dee Lam Sen, way isn Gegensnts a dem feindichen Klima, die Bevocluerungediehte aon grocssten iat ‘Benn wnteroucht der Verfesser dao Netz der Wawerlaeufe Braalliens, welzhos er nis eines der vollkoram- ensten der Welt, Beneichnet, od er unterrtreicht die Dedeutence Aufgnbe der Flaeore als Verkeehrewoge durch Sita Lend, wobet er hervorhebt, dass, nach Europa, dle Welmen rues in Amerika in Gie sentral gelegench Geble- ‘ee vordrangen. ‘Danseh untersucht der Autor die brasiianische Kueste, bel der er foleende Kuestentypen unterscheidet: den dex Nordene malt seinen Suempfen, den dee Blippenteichen Nordostens, dea des Ontens mit selnea Kippen. Gldecs), welche such Schrenicea (oarriras) genanat werden; den des Suedens, bel welchem Meer and Gebige {S'Beruchrung stehea; was die Tactighelt dea Menachen angeht, so hebt der Verfareer hervor, dase Brasilien, Yorwicgead elm Waserland fst, trots aciner grosren Landmasse, denn auf dem Kucrtenstrifen konzentriert sch der groemnte. Tell der bracianischen Bevoclwerung ‘im folgenden unterstreicht der Verfasser die Vegetation ciner interessanten Betrachtung, in deren Veriaut er die verechisdenen Funitionen des braniianiachen Weldes studiert a) der Wiad als Erategebie, in welchem dem Menschen durch siafache Hataehme Prucchte sur Rraachrung, Bauhols, Hellkraeuter wm. geboten wer: ‘Gen; b) der Wala als Gebiet rar Feldbestellang, der eine bedeutenge Iandwirtechaftiche Rolle spicit, da ia der Roee Iandwitachafiche Nutsung des Bodenn da cost, wo der Wald verehwindt, im fuchtbarém Acker {and Plats wa machen; o) der Breennstoff erseugende Wald pitt im Lande, dan weder ueber genucgende tod ute Koblenachactre verfuest, noch Petoleumfelder besitst, tine ausserordentliche Rolle, ‘Der Verfaneer ochllest da erate Kapitel seiner Monographie mit dem Hinwels auf die cigenartige Tat- ‘ache, dass dao mit so reichen Waldbestaenden versehene Eratilen noch nicht don Flolahaeuseroaa aligemeis ‘Singefushrt fat, ja, dass es sogat Hole aus dem Ausland cinfuebrt; schliewlich fact er mu Aufforstungamass ‘nalimen ‘von sagememenen "und verschiedenen ‘Nutshoezern ‘Tiu Gi estas la unua éapitro de la monografio pri la Homa Brazila Geo- grafio ellaborita de la konata geografiisto P. Deffontaines, kiu, kiel Profesoro de la Universitato de Sao Paulo kaj lastatempe de la Universitato de Rio-de-Ja- neiro, en kelkaj jaroj vizitadis Brazilon. La titolo de la nuna éapitro “la elementoj de la naturo kaj la batalo de Ja homoj” elmontras la gravecon de la temo, kiun gi traktas: kaj, efektive, la atitoro montrante la éefajn karakterizajojn de I’ kadro de la brazila naturo kaj la sinsekvajn agmanierojn de ia homo, gia loganto, komencas per tre taiiga maniero sian verkon pri homa geografio, pri kiu li estas tutmonde konata kiel granda aiitoritatulo. La aiitoro komencas elstarigante la vastecon de la brazila teritorio, kiu, formante solan, kontinuan tutajon kaj ne havante nelogeblajn regionojn, pre- zentas vastegan potencialon de spaco,en kiu estas necese starigi gustan skalon de grandecoj por taksi giajn elementojn, generale dotitajn de grandegaj dimensioj. Poste la aiitoro faras skizon pri la historio de la brazila tero, pri kiu li akceptas la diskutatan teorion de Wegener, konsiderante la brazilan teritorion kiel parton disigintan de la nuna afrika kontinento kaj translokigintan okci- denten; i elstarigas ta gravecon dz la antikvaj kristalaj terspacoj, gnejso, granito, skisto kaj aliaj, kiuj okupas pli ol unu trionon de la brazila suprajo; i rimarkigas la fakton, ke la lendo restis emerginta tra la geologiaj tempoj, el Kio estigis la escepta graveco de la eroziaj kaj diserigaj fenomenoj;_ li dis- tingas la orientan parton de la lando, ée la maraj randelsterajoj, konsistantaj el masivoj de rokoj pli antikvaj, kristalaj, forte refalditaj, de la okcidenta arto, pli tabloforma, formita de ebenajoj, kie superas la sedimentaj formacioj. La reliefo de la lando estas poste studata kaj la aiitoro opinias, ke la bra- zila reliefo estas esence éuldita al la terfendetoj kaj al la erozio: la Montaro de la Maro, kiu etendgias je pli ol 3.000 km. laulonge de la marbordo, estas konsiderata de la aiitoro kiel produkto de fendeto, havanta rilaton al la apar- GEOGRAFIA HUMANA DO BRASTL er tigo de Suda Ameriko de Afriko, kaj, lait gia formo, la aiitoro grupigas la Mon- taron en la klaso de “duona monto”, kiel Monto de la Tablo, en Suda Afriko, aii la “Cevennes”, en Francujo, monto kun unu sola eskarpo, tra kiu oni grim- pas la internan ebenajon de la lando; pri la erozio, kiun Ia atitoro jugas tre grava, éar la brazila teritorio restis generale emerginta, gi katizis specialajn reliefformojn, kiel la “‘sukerkonusoj” sur la kristalaj rokoj, sur la porfizikaj gnejsoj, relicfigitajn altajojn, akrajn kaj graciajn, okazintain ée varmaj kaj malsekaj klimatoj, kiel la “duonaj orangoj”, rondajn formojn similajn al sferaj kelotoj, kiu iafoje kunigas grandnombre formante verajn “clapotis”. Poste 1a atitoro ekstudas la agmanieron de la homo en rilato al la monto kaj ekzamenas la diversajn funkciojn, kiujn la montoj pleaumas en Brazilo: a) la argila monto kun skarpo, kiu malfaciligas 1a eniron en la internon de Brazilo, kiel okazas kun la Montero de la Maro kaj Mantiqueira, kaj la atitoro rimarkigas la strangecon, ke la enira malfacilajo estas generale duldita pli al Ia arbaro ol al la reliefo, kaj tion pruvas la fakto, ke la unuaj eniroj estis fari- taj ne tra la pli malaltaj trapasejoj, sed tra tiuj de malpli densaj arbaroj; ) la minhavaj montoj, kies ekspluato estis la unua motivo de la eiiropa’ koloniigo de la montoj, precipe ée Stato Minas Gerais; c) la pastriéaj montoj, — tiu & funkcio de la montoj, kiu, generale, estas tre grava, en Brazilo havas relative malgrandan gravecon; d) 1a somerlogeja monto, dank’ al la proksimeco de la montaroj al la grandaj marbordaj urboj; ¢) 1a industria monto, precipe kun hidroelektrikaj instaloj; estas notinda la potencialo de la energio, kiun la altaj montoj enmagazenigas en zono, kie la pluvemeco estas tre forta. La brazila klimato estas poste studata, kaj 1a atitoro distingas en Brazilo kvar éefajn klimatajn zonojn, nome: la vastan ckvatoran zonon, la duon- senakvan Nordorientan zonon, 1a marbordan zonon kaj la centran zonon, Koncerne la homan agmaniron, la aiitoro konsideras Brazilon unu el ia plej grandiozaj ekzemploj de la batalo de la homo kontraii la klimato, precipe ée la nordorienta zono, kie, kontraste kun la kontraiia klimato, la logatigo estas unu el la plej densaj en Brazilo. La aiitoro ekzamenas la brazilan hidrografian reton, kiun li konsideras unu el la plej kumpletaj en la mondo, kaj elstarigas 1a gravan funcion de la riveroj por la enpenetrigo en la landon, rimarkigante, ke la amerika kontinento estis, post Etiropo, tie, kie la blankhaiituloj unue atingis la centrajn partojn. Poste la aiitoro studas la brazilan marbordon distingante la marbordajn tipojn, nome: la Nordan kun giaj manglujoj, 1a Nordorientan kun éiaj rifoj, Ja Orientan kun giaj malgrandaj klifoj (marbordaj krutajoj) kaj la Sudan, kie Ia maro kontaktigas kun la monto; kaj, koncerne la agadon de la homo, la axtoro elstarigas la gravan fakton, ke Brazilo estas esence mara lando, mal- la autoro elstarigas la gravan fakton, ke Brazilo estas esence mara lando, mal- grau sia granda kontinenta amaso, pro tio ke sur la marborda zone plidensigas la plej granda parto de la brazila logantaro. La vegetado estas poste objekto pri interesaj konsideroj, per kiuj la au- toro studas la brazilan arbaron en giaj diversaj funkcioj: a) la arbero kiel rikolta zono, donanta al Ia homo, pere de simpla alpreno, fruktojn por nutrado, kostruadajn lignojn, medicinajn produktojn kaj multajn aliajn; ) la arbaro, kultura zono, pienumante en Brazilo elstaran terkulturan funkcion, éar, or- dinare, 1a starigo de terkulturo estas farata dank’al la arbero, kiu malaperas por doni lokon al fruktodona kampo: c) la arbaro produktanta brulajon, kiu estas grava funkcio por la lando, kiu ne havas provizon da abunda kaj bona karbo, nek da tavoloj el benzino. La aiitoro finas 1a unuan éapitron de sia monografion komentariante la strangan fakton, ke Brazilo, estante lando dotita de tiom da abundaj arbaraj provizoj, ne generaligis la uzadon de la lignaj domoj kaj tiun é alian ne malpli strangan, ke Brazilo ankoraii importas lignojn el eksterlando, kaj lasteli konsilas, ke tiu é lando adoptu politikon de replantigo de taiigaj kaj diversspecaj arboj.

You might also like